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JOÃO FERRÃO
ANA DELICADO
COORDENAÇÃO
PORTUGAL NO CONTEXTO EUROPEU EM ANOS DE CRISE
PORTUGAL SOCIAL EM MUDANÇA
PORTUGAL SOCIAL EM MUDANÇAFicha Técnica
Este é o primeiro número do Portugal Social em Mudança, uma
publicação regular do Instituto de Ciências Sociais da Universi-
dade de Lisboa (ICS-ULisboa) que tem por objetivo disponibilizar
informação sobre questões sociais numa ótica comparada e
longitudinal. Os vários temas selecionados procurarão situar
Portugal em contextos mais amplos, do ponto de vista tanto
geográfico como temporal, a partir de indicadores quer objetivos
(estatísticos) quer subjetivos (perceções, opiniões) relativos a
diferentes facetas da realidade social.
O Portugal Social em Mudança destina-se a um público não
especialista. A disponibilização de dados organizados, ilustrados
através de mapas e gráficos, analiticamente enquadrados e critica-
mente comentados é útil não só para decisores e técnicos de
diversas áreas profissionais, mas também para cidadãos
portugueses que desejam estar informados ou para estrangeiros
que procuram entender o nosso país mas que se confrontam com
a existência de informação dispersa e nem sempre de fácil acesso.
Esta publicação do ICS-ULisboa concretiza uma das suas
missões: a de disseminação de conhecimento junto de públicos
alargados, reforçando a ligação entre a universidade e a sociedade
e, por essa via, o impacte social das investigações realizadas. O
Instituto acolhe, aliás, diversos Observatórios cuja finalidade é
garantir, de forma continuada, que os resultados dos trabalhos
desenvolvidos possam ser utilizados para fins não académicos:
BQD – Barómetro da Qualidade da Democracia, OBSERVA –
Observatório de Ambiente, Território e Sociedade, OFAP – Obser-
vatório das Famílias e das Políticas de Família, OPJ – Obser-
vatório Permanente da Juventude e IE – Instituto do Envelhecimen-
to. Eles constituem a fonte principal, embora não exclusiva, dos
conteúdos dos vários números do Portugal Social em Mudança.
EdiçãoInstituto de Ciências Sociaisda Universidade de Lisboa
Av. Prof. Aníbal de Bettencourt, 91600-189 Lisboa-PortugalTelef. 21 780 47 00 - Fax 21 794 02 74
www.ics.ulisboa.pt
TítuloPortugal Social em MudançaPortugal no contexto europeuem anos de crise
CoordenaçãoJoão Ferrão e Ana Delicado
RevisãoVasco Grácio
Conceção GráficaJoão Pedro Silva
Impressão e apoio de paginaçãoGuideline, Lda
FotografiaSusana Paiva
Depósito Legal402090/15
ISBN978-972-671-362-3
Tiragem250 exemplares
1ª Edição, Dezembro 2015
7
9
19
31
47
67
59
PORTUGAL NO CONTEXTO EUROPEU EM ANOS DE CRISE
Introdução
DEMOCRACIAEkaterina GorbunovaEdalina SanchesMarina Costa Lobo
AMBIENTEJoão Guerra José Gomes FerreiraLuísa Schmidt
FAMÍLIASKarin WallVanessa CunhaLeonor RodriguesRita Correia
JUVENTUDEJussara RowlandMaria Manuel Vieira
CONFIANÇAAna DelicadoAlice RamosJosé Gomes FerreiraJoão GuerraJussara Rowland
Comentário Final
Introdução
PORTUGAL NO CONTEXTO EUROPEU EM ANOS DE CRISE
«Portugal no contexto europeu em anos de crise» foi o tema escolhi-
do para o presente Portugal Social em Mudança. A integração, em
1986, de Portugal na então Comunidade Europeia tornou inevitável a
comparação do nosso país com os restantes Estados-membros. A crise
financeira e económica iniciada em 2008, e as subsequentes políticas
de ajustamento baseadas em medidas de austeridade, renovaram a
necessidade de analisar e compreender a evolução de Portugal no
contexto europeu. Como nos posicionamos em relação a outros países
da União Europeia e da Europa em geral? Em que medida estamos a
convergir ou a divergir em relação à média comunitária? Qual o
impacto da crise nos resultados observados? Estas são as questões
básicas colocadas ao longo desta publicação em relação a diferentes
aspetos sociais.
Selecionaram-se para análise domínios relevantes para o futuro do
país, potencialmente sensíveis aos efeitos da atual crise e que traduzem
algumas das linhas de divulgação científica que têm vindo a ser prosse-
guidas no âmbito dos Observatórios: democracia, ambiente, família,
transições juvenis e confiança.
Os futuros números do Portugal Social em Mudança aprofundarão
alguns destes temas e incluirão novos aspetos, em função da relevância
social e política que tenham entretanto alcançado ou da existência de
nova informação. Independentemente dos conteúdos selecionados,
manter-se-ão a ótica comparada e longitudinal presente no atual
número e a ilustração através de mapas e de gráficos de leitura intuiti-
va por parte de não especialistas. Esperamos, assim, contribuir de
forma útil para todos os que pretendem conhecer melhor o Portugal
social neste primeiro quartel do século XXI.
7
Nota: os dados do Eurostat e do Eurobarómetro dizem respeito a países da União Europeia (UE). Os dados do European Social Survey e do International Social Survey Programme referem-se aos países europeus participantes, que podem, ou não, ser membros da UE; nestes casos, os valores relativos a Portugal não incluem as Regiões Autónomas.
A SATISFAÇÃO COM A DEMOCRACIAEkaterina Gorbunova, Edalina Sanches, Marina Costa Lobo
PORTUGAL NO CONTEXTO EUROPEU EM ANOS DE CRISE1
Esta secção pretende fornecer um breve retrato do estado da democra-cia em Portugal, situando-a no contexto europeu. As perceções dos cidadãos sobre a democracia são o foco desta secção e serão analisadas numa perspetiva comparada e longitudinal.
A qualidade da democracia assumiu uma crescente centralidade nas sociedades de hoje e
ocupa um lugar de destaque na academia e na agenda pública. Especialmente desde o início
da terceira vaga de democratização (1974), um conjunto significativo de projetos internacio-
nais, tem analisado a «saúde» das democracias numa perspetiva global, através da monitoriza-
ção das perceções dos cidadãos sobre o funcionamento da democracia nos seus países e da
avaliação das várias dimensões dos regimes democráticos.
Estudos recentes sobre as atitudes dos cidadãos europeus em relação à democracia indicam
que estes mantêm níveis elevados de adesão aos valores e aos princípios democráticos, mas
que estão cada vez mais insatisfeitos com o funcionamento da democracia. Este desencanta-
mento poderá estar relacionado com diferenças entre as expectativas dos cidadãos e o
desempenho democrático dos governos (Norris, 2011), mas também dever-se ao facto de
os cidadãos possuírem diferentes entendimentos sobre o significado de democracia (Ceka e
Magalhães, 2014; Ferrin e Kriesi, 2014). Por outro lado, a avaliação da qualidade da democra-
cia por especialistas demonstra que, em termos agregados, a Europa apresenta níveis
elevados de democraticidade, ainda que persistam diferenças importantes entre países: no
norte da Europa estão as democracias com mais qualidade, enquanto no sul e no leste se
situam as que enfrentam mais desafios.
Portugal é um dos países europeus com níveis de satisfação com a democracia mais baixos
(Magalhães, 2009), um sentimento relativamente transversal aos grupos sociais. Em contra-
partida, os valores pós-materialistas e as avaliações de curto prazo (nomeadamente, sobre o
desempenho da economia e do governo) ganham terreno enquanto fatores explicativos da
satisfação dos cidadãos com a democracia (Teixeira et al., 2014). De acordo com as
avaliações de especialistas, a qualidade da democracia portuguesa registou recuos importantes
em matéria de governação e de soberania (Lobo, Jalali e Silva, 2013). 9
I
Satisfação com a democracia:os cidadãos portugueses no contexto europeu
A Figura 1.1 ilustra em que medida os cidadãos europeus estão
satisfeitos com o funcionamento da democracia no seu país, com
base numa escala em que 0 corresponde a «extremamente
insatisfeito(a)» e 10 a «extremamente satisfeito(a)». Neste
indicador, que capta o apoio específico ao regime democrático,
os cidadãos residentes nos países do norte da Europa (Dinamarca,
Noruega e Suécia) e também na Suíça destacam-se na medida em
que têm os níveis mais elevados de satisfação. Seguem-se os
cidadãos da Europa Ocidental (Holanda, Alemanha, Bélgica, Reino
Unido e França, entre outros) e, por último, os da Europa do Sul,
Central e de Leste, que são os mais críticos em relação ao funcio-
namento da democracia nos seus países.
Portugal integra o grupo de países cujos cidadãos se revelam
mais insatisfeitos, e esta é uma tendência que se tem vindo a
agravar. Os dados da Figura 1.2 revelam que durante a última
década a proporção de insatisfeitos aumentou significativamente.
A situação em Portugal é concomitante com o agravamento da
crise económica e financeira, que no curto prazo teve consequên-
cias negativas na qualidade de vida dos cidadãos. Contudo, vale a
pena salientar que mesmo antes da crise os níveis de satisfação
com a democracia eram muito baixos (Pinto et al., 2012).
A investigação em ciência política tem avançado com explica-
ções tanto no âmbinto micro (cidadãos) como macro (países) para
explicar a qualidade da democracia nas democracias avançadas
europeias. Neste texto iremos apresentar alguns dados que
remetem para três grandes hipóteses. Em primeiro lugar, a
hipótese de que cidadãos de países com melhores índices de
qualidade democrática estão mais satisfeitos com a democracia;
em segundo lugar, a hipótese de que o grau de satisfação com a
democracia está correlacionado com avaliações subjetivas e
objetivas do desempenho do governo em áreas políticas
fundamentais; e, finalmente, a hipótese de que a satisfação com a
democracia é mais elevada em sociedades com melhores índices
de desenvolvimento humano e maior acesso ao conhecimento. Fonte: European Social Survey, 6.ª vaga, 2012
Figura 1.2 Satisfação com o funcionamentoda democracia em Portugal (média)
2002
6,0
2004
2006
2008
2010
2012M
édia ESS
4,1
3,5
3,9
4,6
3,4
4,2
5,04,03,0
Figura 1.1 Satisfação com o funcionamentoda democracia na Europa, 2012 (média)
Fonte: European Social Survey, 6.ª vaga, 2012-2013
PTES
CY
FR
BE
NL
DK
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FI
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DE
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SIHUSK
CH
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IS
0 400Km
UK
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LT
PL
BG
AL
UA
10
<4,0
4,0 - 4,9
5,0 - 5,9
6,0 - 7,0
>7,0
II
Satisfação com a democraciae a qualidade da democracia dos países
A Figura 1.3 apresenta os valores do Economist Democracy
Index (EDI) sobre a qualidade da democracia na Europa em
2014. Este índice resulta de uma avaliação, por um painel de
especialistas, da qualidade da democracia em cinco grandes
áreas – processo eleitoral e pluralismo; liberdades cívicas; funcio-
namento do governo; participação política; cultura política –
numa escala de 0 a 10. Consoante o seu posicionamento no
ranking da revista The Economist, os países são agrupados nas
seguintes categorias: democracias plenas, democracias imperfei-
tas, regimes híbridos e regimes autoritários.
Verifica-se que há uma variação importante nos países
europeus que surgem classificados neste índice. Os países
nórdicos registam os valores mais altos, mantendo a tendência
de anos anteriores, enquanto os países da Europa Ocidental
apresentam um declínio nas suas pontuações médias desde a
primeira edição do EDI (2006). A queda acentuada dos níveis de
participação política, os problemas quanto ao funcionamento do
governo e as restrições às liberdades cívicas têm estado na
origem do declínio da qualidade da democracia em algumas das
democracias europeias mais consolidadas (por exemplo, a
França). Para países como Portugal, mas também para Grécia,
Itália, Espanha e Irlanda, estes fenómenos têm sido acompanha-
dos pela crise económica e financeira na zona euro, que colocou
grandes desafios tanto à soberania do Estado como à capacidade
de responsabilização democrática por parte dos cidadãos aos
governos destes países.
Na Europa de Leste – onde a idade média das democracias é
mais baixa e onde existe um clima generalizado de insatisfação
com a democracia – a qualidade da democracia tem vindo a
recuar desde 2006. Hoje, a região não tem uma única «demo-
cracia plena». Em alguns dos países mais desenvolvidos desta
região, como a República Checa e a Eslovénia, a crescente
instabilidade política tem contribuído para a queda da sua
posição no ranking do EDI.
<6 >86-8DEMOCRACIA
COMPLETADEMOCRACIAIMPERFEITA
REGIME HÍBRIDO
Figura 1.4 A qualidade da democraciaem Portugal, 2006-2014 (média)
Fonte: Democracy Index 2014: Democracy andits discontents, The Economist Intelligence Unit
Fonte: Democracy Index 2006-2014, The Economist Intelligence Unit
Figura 1.3 A qualidade das democraciaseuropeias, 2014 (média)
2006 8,2
2008 8,1
2010 8,0
2011 7,8
2012 7,9
2013 7,7
2014 7,8
PTES
CY
FR
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NL
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IMPE
RFEI
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11
<6,0
6,0 - 6,9
7,0 - 7,9
8,0 - 9,5
>9,5
A satisfação com a democraciaem função dos seus resultados
III
Em Portugal, a crise económica e financeira coincidiu
com uma quebra na avaliação por parte dos especialistas
sobre a qualidade do regime (ver Figura 1.4). Nessa figura,
apresentamos uma perspetiva longitudinal da evolução da
qualidade da democracia em Portugal, segundo o índice da
EDI. Verificamos que o país vem sendo avaliado como
«democracia imperfeita» desde 2011, devido a recuos em
matéria de funcionamento do governo, de participação
política (em 2011) e de cultura política (desde 2013). Em
2013 o país registou a sua pontuação mais baixa de
sempre. Note-se, no entanto, que a pontuação global
melhorou desde a conclusão do programa de resgate
financeiro em 2014.
Tendo em conta os valores deste índice, iremos agora
correlacioná-lo com o nível de satisfação dos cidadãos com
a democracia. Como demonstra a Figura 1. 5, existe uma
correlação significativa entre a qualidade da democracia
num país e o grau de satisfação dos cidadãos com o funcio-
namento da democracia. Ou seja, os cidadãos europeus
estão alinhados em larga medida com os especialistas na
avaliação que fazem da qualidade do seu regime político.
Mesmo assim, há casos de países – nomeadamente
Espanha, Portugal, Itália e Eslovénia onde a satisfação com
a democracia por parte dos cidadãos é substancialmente
inferior quando comparada com a de países – como
França, Estónia, Lituânia e República Checa – que foram
classificados com valores muito próximos no ranking da EDI
(em torno de 8 pontos numa escala de 0 a 10). Pelo
contrário, Finlândia, Dinamarca e Suíça são países em que
o nível de satisfação com a democracia é tendencialmente
maior do que faria prever a qualidade destas democracias
medida pelo mesmo índice. Existe pois uma forte associa-
ção entre qualidade da democracia e a forma como os
cidadãos a percecionam, mas existem países que fogem a
esta regra. Portugal faz parte desses países, juntamente
com outros que têm vivido uma grave crise económica,
nomeadamente Espanha, Grécia e Itália, cujos cidadãos se
revelam relativamente insatisfeitos com a democracia.
Desde 2011, Portugal tem vindoa ser avaliado como «democraciaimperfeita». Em 2013 o paísregistou a sua pontuação mais baixa de sempre.
Sabendo que a democracia tem várias dimensões, que aspetos
– princípios, processos ou resultados – terão um maior impacto
na sua avaliação por parte dos cidadãos? Vários estudos sugerem
que os cidadãos mais satisfeitos com os resultados da democra-
cia em áreas políticas fundamentais estão mais satisfeitos com o
seu funcionamento. Iremos pois brevemente abordar a segunda
grande hipótese testada na bibliografia da especialidade, a saber,
que a satisfação com a democracia é em parte explicada pelos
seus resultados.
Propomos fazê-lo utilizando para o efeito dados recolhidos na
sexta vaga do European Social Survey, que incluiu um módulo
especial sobre significados da democracia que permite testar esta
premissa. Neste módulo foi pedido aos cidadãos que avaliassem
a importância de um conjunto de elementos para a definição de
um regime como democrático e, de seguida, que avaliassem o
desempenho dos seus países em relação a esses mesmos
elementos. A figura 1.7 apresenta a média das avaliações dos
cidadãos europeus nas quatro dimensões consideradas, numa
escala de 0 (avaliação negativa) a 10 (avaliação positiva): direitos
e liberdades (tribunais equitativos, proteção dos direitos das
minorias e liberdade de imprensa), processo eleitoral (eleições
livres e justas, opções programáticas claras dos partidos, partici-
pação no debate político, responsabilização dos governos
através de eleições e direito de oposição), controlo popular
(justificação das decisões dos governos perante os cidadãos e os
referendos) e justiça social (proteção contra a pobreza e redução
das desigualdades).
Os resultados que se apresentam na Figura 1.7 demonstram
que, na grande maioria dos países europeus, os elementos
associados ao processo eleitoral e, logo depois, aos direitos e
liberdades, são os que suscitam melhores avaliações por parte da
população. Em contrapartida, os principais desafios das demo-
cracias europeias parecem estar relacionados com o controlo
popular e a justiça social. Com efeito, estas foram as dimensões
da democracia que receberam as avaliações mais baixas na
generalidade dos países.12
CY CZ
FR
UK
BEDE
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FL
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UA
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BG
SL
PT
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4
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0,700 0,750 0,800 0,850 0,900 0,950
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Indice de Desenvolvimento Humano (UNDP)
4
5
6
7
8
3
0,00 5,00 10,00 15,00 20,00 30,0025,00
UA
SL
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Taxa de desemprego (Banco Mundial)
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Figura 1.5 Correlação entre a satisfação com a democraciae a qualidade da democracia na Europa, 2012 (média)
Figura 1.6 Satisfação com a democraciae justiça social na Europa, 2012 (média)
Figura 1.7 A avaliação da democracia por parte dos cidadãos europeus, 2012 (média)
Figura 1.8 Satisfação com a democracia, de acordo com o Índice de Desenvolvimento Humano e a Taxa de Desemprego na Europa, 2012 (média)
Fonte: European Social Survey (ESS), 6.ª vaga, 2012
.
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cia
Índice da qualidade da democracia (Economist)
R2 = 0,87R2 = 0,701
R2 = 0,582 R2 = 0,369
13
0
5
10
15
20
25
30
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VÁQUIA (SK)
CHIPRE (
CY)
FRANÇA (F
R)
ESPA
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HUNGRIA (HU)
ESLO
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REPÚBLIC
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PORTUGAL (
PT)
ESTÓNIA (E
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L)
BULGÁRIA (B
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LITUÂNIA (L
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UCRÂNIA (UA)
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BÉLGIC
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5
5 55 5
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8 8 8
3
4 4 3 44
4
45 5
4
55
5 45
5 5 6 45
7 67 7 7
2
33 2
33
3
3
33
3
4 43 3
54
55
4
6
66
6 6 6
Direitos e liberdades
Controlo popular
Processo eleitoral
Justiça Social
A satisfação com a democraciae a modernização
IVO processo eleitoral e os direitose liberdades são as dimensõesque suscitam melhor avaliação porparte da população na grandemaioria dos países europeus.
O facto de a justiça social recolher as avaliações mais
negativas é importante na medida em que dá conta de
uma discrepância entre as expectativas democráticas
dos cidadãos e o desempenho dos respetivos
governos. A Figura 1.6 apresenta precisamente a
correlação entre a avaliação que os cidadãos fazem de
alguns elementos de justiça social (proteção contra a
pobreza e redução das desigualdades) e a satisfação
com a democracia. Verificamos que esta é uma
correlação positiva e significativa. Em linha com
contribuições recentes (Ceka e Magalhães 2014, Ferrin
e Kriesi 2014), é possível afirmar que para o cidadão
europeu a democracia não se resume apenas aos
direitos e aos procedimentos democráticos liberais, já
que inclui também uma componente de justiça social, o
que implica a satisfação de necessidades básicas em
matéria de saúde, emprego, educação, segurança
social, entre outras.
Para ilustrarmos este ponto, escolhemos dois
indicadores que fornecem uma aproximação ao nível
de justiça social do país, a saber, o Índice de Desenvol-
vimento Humano e a Taxa de Desemprego. Na Figura
1.8 apresentamos as correlações entre estes indicado-
res, respetivamente, e a satisfação com a democracia,
verificando-se em larga medida as relações esperadas.
Por último, analisemos as explicações segundo as quais o grau de
satisfação com a democracia resulta de mudanças a longo prazo no
acesso ao conhecimento, que aqui medimos pelo aumento dos
níveis de escolaridade. Inúmeros estudos demonstram existir um
forte impacto da educação nas atitudes relativamente à democracia,
postulando que o desenvolvimento económico é acompanhado
pelo aumento dos níveis de literacia, os quais, por sua vez,
contribuem para o desenvolvimento das competências, dos conhe-
cimentos e das capacidades cívicas dos cidadãos. É expectável que
os cidadãos com maiores níveis de escolarização tendam a apresen-
tar maior interesse e maior ativismo político. O que podemos
esperar então das atitudes dos mais escolarizados relativamente à
democracia? É o tema que iremos abordar nesta parte.
A Figura 1.9 revela que na Europa, segundo os dados do
European Social Survey, o grau de escolaridade e a satisfação com
o funcionamento da democracia estão positivamente correlaciona-
dos entre si, isto é, os cidadãos de ensino superior tendem a avaliar
a democracia do seu país mais positivamente do que os menos
escolarizados. Estes resultados corroboram vários estudos que
encontraram uma relação positiva entre o apoio específico dos
cidadãos ao regime democrático e os seus níveis de escolaridade.
Esta correlação positiva confirma-se mesmo quando utilizamos
indicadores semelhantes mas medidos no âmbito do país. O
Knowledge Economy Index (KEI), um índice elaborado pelo Banco
Mundial, permite-nos uma aproximação, na medida em que reflete
a capacidade de um país gerar, adotar e difundir o conhecimento e
usá-lo de forma eficaz para o desenvolvimento económico. O KEI
é composto por quatro pilares da economia do conhecimento:
ambiente económico e quadro institucional; educação e recursos
humanos; sistemas de inovação; e tecnologias de informação e de
comunicação. Como revela a Figura 1.10, os cidadãos dos países
que fazem uma aposta mais forte no papel do conhecimento – e,
consequentemente, da educação, da inovação e das novas tecnolo-
gias de informação e de comunicação – estão bastante mais satisfei-
tos com o funcionamento da sua democracia.
14
Figura 1.9 Satisfação com a democracia, por nível de educação, na Europa 2012 (média)
nenhum, ensino primárioensino secundárioensino superior
BULGÁRIA (BG)
ESLOVÉNIA (SI)
UCRÂNIA (UA)
ITÁLIA (IT)
ALBÂNIA (AL)
ESPANHA (ES)
HUNGRIA (HU)
FRANÇA (FR)
LITUÂNIA (LT)
REPÚBLICA CHECA (CZ)
ESTÓNIA (EE)
REINO UNIDO (UK)
IRLANDA (IE)
POLÓNIA (PL)
ESLOVÁQUIA (SK)
BÉLGICA (BE)
ISLÂNDIA (IS)
ALEMANHA (DE)
HOLANDA (NL)
CHIPRE (CY)
FINLÂNDIA (FI)
SUÉCIA (SE)
DINAMARCA (DK)
NORUEGA (NO)
SUIÇA (CH)
1098765
Fonte: European Social Survey, 6.ª vaga, 2012
4
5
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Indice de Economia do Conhecimento (Banco Mundial)
Figura 1.10 Satisfação com a democracia, em função do Índice de Economia
do Conhecimento na Europa, 2012 (média)
Os cidadãos com ensino superiortendem a avaliar a democraciado seu país mais positivamentedo que os menos escolarizados.
Tendo em conta a associação evidente entre educa-
ção, economia do conhecimento e satisfação com a
democracia, como é que Portugal tem vindo a evoluir
desse ponto de vista? Verificamos que no caso
português, e do ponto de vista longitudinal, essa
associação também se verifica. A Figura 1.11 apresenta
dados de inquéritos à opinião pública recolhidos em
2004 e 2014, respetivamente. Em 2004, ainda antes
da crise económica, mais de metade dos portugueses
com ensino superior estavam muito ou razoavelmente
satisfeitos com o funcionamento da democracia
portuguesa (ao contrário de 43% dos inquiridos
pertencentes aos grupos menos escolarizados). Dez
anos mais tarde, em 2014, esta diferença tornou-se
ainda mais acentuada: se entre os cidadãos mais
escolarizados um terço estavam satisfeitos com a
democracia no país, entre os grupos com níveis de
ensino mais baixos este valor não ultrapassa os 29%
(entre as pessoas com o ensino secundário) e os
13,5% (entre as pessoas que completaram o ensino
básico).
Figura 1.11 Satisfação com a democraciaem função da escolaridade dos cidadãos
portugueses, 2004 e 2014 (%)
Muito /razoavelmente
satisfeito
Pouco /nadasatisfeito
Fonte: Inquéritos «30 anos do 25 de Abril» e «40 anos do 25 de Abril», Instituto de Ciências Sociais – Universidade
de Lisboa, www.bqd.ics.ul.pt
44
56
43
57
56
44
2004
Nenhum, Ensino
Primário
Ensino Secundário
Ensino Superior
Nenhum, Ensino
Primário
Ensino Secundário
Ensino Superior
13
87
29
71
33
67
2014
Satis
façã
o co
m a
dem
ocra
cia
R2 = 0,787
16
Conclusão
V
referências bibliográficas
Os resultados indicam quecada vez mais os cidadãosentendem a democracia emfunção dos seus resultados.
Neste capítulo analisaram-se as perceções dos
cidadãos portugueses sobre a democracia situando-as no
contexto europeu. A análise efetuada indica que os
portugueses permanecem entre os mais insatisfeitos da
Europa, juntamente com outros cidadãos de países do
sul e do leste da Europa. Este facto parece estar associa-
do a condições específicas dos países mas também dos
cidadãos. Com efeito, onde os índices de democraticida-
de são mais elevados, os níveis de desenvolvimento
humano mais altos e as taxas de desemprego mais baixas,
os cidadãos tendem a apresentar-se mais satisfeitos com
o funcionamento da democracia. Esta tendência é
também maior entre os mais escolarizados.
No que diz respeito às perceções dos cidadãos,
verifica-se, de um modo global, que estes estão mais
satisfeitos com o desempenho do país no que se refere à
qualidade das eleições e à garantia das liberdades cívicas
do que quanto à sua capacidade de promover participa-
ção e de reduzir as desigualdades sociais. Precisamente a
justiça social é a dimensão mais mal avaliada pelos
cidadãos europeus – principalmente os que residem no
sul e no leste da Europa – e a que apresenta uma correla-
ção mais forte com a satisfação com a democracia.
Ceka, B. e P.C. Magalhães. 2014. «The Meaning of
Democracy and its Determinants». In How Europeans View and
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Politics, 19, n.°4: 501-518.
17
João Guerra, José Gomes Ferreira, Luísa Schmidt
PORTUGAL NO CONTEXTO EUROPEU EM ANOS DE CRISE2O AMBIENTE EM PORTUGAL E NA EUROPA
Nesta secção analisamos a evolução do investimento público em ambiente e quais as principais preocupações dos cidadãos relativamen-te a este tema, com enfoque no saneamento básico (águas e resíduos urbanos) por ter sido o sector de melhor desempenho.
As políticas ambientais assumiram uma importância crescente ao longo das últimas décadas,
sobretudo desde a adesão de Portugal à União Europeia em 1986. Contudo, a este “impulso
externo” raramente correspondeu uma dinâmica interna capaz de acolher e implementar com
sucesso e continuidade muitas destas medidas e políticas ambientais. Acresce que os ciclos
políticos que se foram sucedendo tiveram, no caso português, uma influência determinante na
maior ou menor relevância atribuída às questões ambientais, que se repercutiu na descontinui-
dade das políticas definidas, no investimento que lhes foi atribuído e, consequentemente, na
concretização das ações previstas.
Talvez por isso, os portugueses se distingam dos restantes cidadãos da UE pela maior ênfase
atribuída aos problemas ambientais básicos, considerados de «primeira geração», ligados
nomeadamente ao saneamento, em detrimento dos problemas designados de «segunda
geração», como são os casos das alterações climáticas, dos recursos naturais e dos hábitos de
consumo. Também no âmbito das práticas ambientais, estudos recentes demonstram que os
portugueses são menos ativos do que a média dos cidadãos da UE, apenas se aproximando
destes nos hábitos de separação de resíduos (Valente e Ferreira, 2014). Tal revela que ainda
subsistirá em Portugal uma leitura algo elementar das crises globais, tardando a impor-se uma
visão mais integrada dos problemas ambientais no sentido de uma maior sustentabilidade.
A crise económica e a mudança de ciclo político na viragem da década (2011) vieram desviar
atenções e investimentos das questões ambientais, fragilizando as suas estruturas de gestão e
desinvestindo até em questões-chave como a monitorização, a fiscalização e a informação
ambientais. Como resultado, a já de si precária confiança dos cidadãos face ao Estado em
matéria ambiental foi afetada, retomando-se uma apreensão até sobre temas que se julgavam
resolvidos ou em vias de resolução como, por exemplo, a contaminação dos rios nacionais.
19
I
Investimento públicoem ambiente
Uma das dimensões que ajuda a compreender a relevância
política assumida pelo ambiente ao longo dos últimos anos é o
investimento público global que o Estado lhe tem conferido em
termos absolutos e relativos à média europeia. Vejamos, pois, a
evolução da despesa pública global, tanto em função do seu
peso percentual face ao PIB, como em função do seu valor per
capita. Analisa-se em seguida a distribuição da despesa global em
ambiente por domínios-alvo de proteção ambiental.
Comparando a despesa pública per capita na proteção do
ambiente nos 28 Estados-membros da União Europeia em
2013¹, verifica-se que a Holanda e o Luxemburgo se destacam
com valores substancialmente mais elevados:
respetivamente, 517,9€ e 483,4€ de despesa ambiental per
capita. Um segundo grupo de países com valores acima da
média da UE28 inclui Dinamarca, Reino Unido, Itália, Malta,
Finlândia, Bélgica e França. Já abaixo da média seguem-se
Áustria, Suécia, Eslovénia, Alemanha, Chipre e Letónia, e
também Portugal que ocupa o 16.º lugar com apenas 69€ per
capita, ficando acima de nove países do Leste e de Espanha
(Figura 2.1).
Os dados nacionais sobre a despesa ponderada com base no
PIB per capita mostram uma flutuação entre 0,7% em 2000 e
0,6% em 2013, passando por alguns períodos em que essa
percentagem não ultrapassou 0,5% (Figura 2.2). Por seu turno,
ainda segundo a Figura 2.2, o total das despesas públicas em
ambiente também regrediu. Os cortes iniciaram-se logo no
arranque da década de 2000, seguindo-se a subidas pontuais
que globalmente nunca recuperam os valores alcançados no ano
2000, proporcionados pela dinâmica particularmente favorável
alcançada na segunda metade da década de 1990. Entre 2000 e
2013 o valor mínimo foi atingido em 2012, com apenas 1% do
total das despesas públicas no ambiente.
¹ Os dados são maioritariamente de 2013. Porém, alguns países não apresentam valores para esse ano, optando-se por usar os existentes: Alemanha: 2010; Estónia, Itália e Holanda: 2011; Bélgica, Espanha, França, Letónia, Hungria, Malta, Áustria, Eslovénia, Finlândia e Reino Unido: 2012.
Figura 2.1 Despesa pública per capita em proteção
ambiental na União Europeia, 2013 (euros)Fonte: Eurostat, 2015
<50
50 - 100
101 - 200
201 - 300
>300
PTES
CY
FR
BELU
NL
DK
FI
IT
DE
CZ
ATSI HR
HU
SK
0 400Km
UK
SE EE
LVLT
PL
BG
RO
20
Fonte: Pordata, 2014 e 2015 (* valor preliminar/provisório)
Em Portugal, entre 2000 e 2013,o valor mínimo foi atingido em 2012,com apenas 1% do total dasdespesas públicas no ambiente.
Figura 2.2 Despesa pública em ambiente, segundo a percentagem do PIB e dototal de despesas, 2000-2013 (%)
Temos assim que, em termos gerais, as despesas públicas em
ambiente decresceram em ambas as dimensões (percentagem
do total de despesas e do PIB), com algumas oscilações positivas
entre 2006 e 2009, e mais recentemente em 2013. Constata-se
uma tendência para o desinvestimento público no ambiente,
sobretudo quando comparado com os dados da segunda
metade de 1990. Estes factos prendem-se com três tipos de
fatores: i) opções resultantes das mudanças de ciclo político,
leia-se mudanças governamentais – casos de 2001 e 2011 no
sentido negativo, e de 2005-06 no sentido positivo; ii) alterações
na configuração ministerial – caso da subida da percentagem no
total das despesas em 2013 quando o Ministério do Ambiente se
desligou do «megaministério» da Agricultura e que corresponde
à altura em que se regista uma redução tanto na percentagem do
PIB como no total da despesa; iii) efeitos da crise e medidas de
austeridade que lhe estão associadas que implicaram cortes na
despesa e no investimento na qualidade ambiental.
Quanto às despesas em ambiente em função do PIB (Figura 2.3),
evidenciam-se algumas mudanças na posição relativa dos países
europeus. A Holanda garante de novo o primeiro lugar (1,44%),
seguindo-se Malta (1,38%) e, já a alguma distância, Bulgária, Reino
Unido e Itália. No extremo oposto encontramos Espanha, Eslová-
quia, Estónia, Croácia, Alemanha e Suécia. Portugal situa-se um
pouco acima destes países (0,44%), apesar de tudo muito abaixo
da média comunitária que se situa em 0,67%.
O esforço público na gestão ambiental dependerá assim da
capacidade económica dos países, mas também de outros fatores.
MUDANÇASDE CICLOPOLÍTICO
ALTERAÇÕES NACONFIGURAÇÃO
MINISTERIAL
EFEITOSDA CRISE E
AUSTERIDADE
Figura 2.3 Despesa com proteção ambiental
em face do PIB, na UE28, 2013 (%)Fonte: Eurostat, 2015
0,0
0,4
0,8
1,2
1,6
2000 2013
% do PIB
% total de despesas
(*1,2)
(*0,6)
<0,35
0,35 - 0,50
0,51 - 0,65
0,66 - 0,80
>0,80
PTES
CY
FR
BELU
NL
DK
FI
IT
DE
CZ
ATSI HR
HU
SK
0 400Km
UK
SE EE
LVLT
PL
BG
RO
21
Fonte: Eurostat, 2015
Figura 2.4 Despesa na proteção ambiental por domínio, em Portugal e na UE, 2001-2013 (milhões de euros)
Nalguns casos, a riqueza assim como as opções políticas
determinadas explicam um maior investimento (e.g.,
Holanda). Noutros casos, como acontece em alguns países
da Europa de Leste, a recente atribuição de fundos
europeus para a modernização ambiental pode ajudar a
explicar a maior percentagem de PIB investido no ambien-
te. Noutros casos ainda, como acontecerá em países mais
ricos, o facto de já terem sido atingidas metas essenciais
justifica a menor necessidade de investimento ambiental
(e.g., Alemanha). O caso português, que não se enquadra
em nenhuma destas tendências, evidencia um baixo peso
da despesa pública na proteção ambiental comparativa-
mente à média europeia.
No que respeita à distribuição da despesa corrente em
proteção ambiental por diferentes domínios, na média
comunitária, o crescimento tem sido quase ininterrupto,
embora explicável, em grande parte, pelo efeito da adesão
de mais 10 países à UE a partir de 2004. Por domínios,
destacam-se os resíduos, cuja fatia no total das despesas do
ambiente tem vindo a aumentar, desde 2005. Também em
2005, na rubrica «outros domínios» (que inclui a proteção
de solos, o ruído, a biodiversidade e a paisagem) se
verificou um aumento das despesas em 3124,71 milhões
de euros relativamente ao ano anterior. Com valores
menos expressivos, na proteção do ar e do clima registou
um acréscimo nas despesas de 533,62 milhões de euros.
Em Portugal, foi o setor dos resíduos que absorveu os
principais montantes, registando mais de 52% do total de
investimento em 2009, ano em que o volume total destas
despesas foi o mais elevado desde 2001 (Figura 2.4). Com
um peso igualmente considerável seguem-se as despesas
no tratamento de águas residuais. Só depois surgem outras
matérias, tais como a proteção de solos e de águas subter-
râneas, o ruído, a biodiversidade e a paisagem. Já no que
respeita aos problemas relacionados com o ar e com as
alterações climáticas, as despesas públicas têm uma expres-
são limitada e só ganham alguma relevância a partir de
2010, mas mesmo assim residual. Comparando com os
dados da UE, vemos que em Portugal se quebra o
crescimento continuado das despesas correntes em
ambiente em 2009 (1000,64 milhões de euros), assistindo-
-se, a partir daí, a um decréscimo que perdura, não
ultrapassando, em 2013, os 723,6 milhões de euros.
Na comparação entre Portugal e a UErevela-se uma quebra assinável deinvestimento português que contrastacom a situação geral na UE.
No seu conjunto, os dados evidenciam uma prevalência dos
problemas ambientais básicos (sobretudo resíduos e esgotos),
tanto em Portugal como na média da União Europeia. Já no que
respeita aos problemas de «segunda geração» (i.e., clima e
biodiversidade), as despesas ganharam relevância no cômputo da
União Europeia, mas têm uma expressão diminuta em Portugal.
Em suma, na comparação entre Portugal e a UE revela-se uma
quebra assinalável de investimento português que contrasta com a
situação geral na UE, o que confirma que o país está aquém do
desejável no que respeita ao investimento em políticas públicas de
ambiente, designadamente para enfrentar os problemas de
«segunda geração». Vejamos se tal desaceleração tem correspon-
dência com os anseios e as preocupações dos portugueses e dos
restantes europeus utilizando, para isso, os resultados de inquéri-
tos representativos das opiniões públicas nacional e internacional.
2001 2013
Uni
ão E
urop
eia
Portu
gal
Protecção do ar e do climaÁguas residuais
ResíduosOutros domínios
2001 2013
1000
600
400
200
0
800
0,00
10 000,00
20 000,00
30 000,00
40 000,00
50 000,00
60 000,00
70 000,00
80 000,00
90 000,00
22
II
Preocupação públicacom o ambiente
Através de diversos inquéritos recentes aplicados às escalas
europeia e internacional, verifica-se que, em geral, a preocupa-
ção dos portugueses com o ambiente atinge valores bastante
elevados. Por exemplo, no último inquérito sobre ambiente do
International Social Survey Programme (ISSP – Ambiente III),
aplicado em Portugal em 2012, 81,6% dos inquiridos declararam
estar «preocupados» e/ou «muito preocupados» com o estado
do ambiente, situação que confirma as tendências já verificadas
em Eurobarómetros anteriores (Valente e Ferreira, 2014).
Em termos comparativos, como podemos verificar na Figura
2.5, numa escala entre 1 e 5 (1. Nada preocupado e 5. Muito
preocupado) os portugueses são dos inquiridos que mais se
mostram preocupados com o ambiente, preocupação apenas
superada pela dos eslovenos. Esta tendência, aliás, é acompanha-
da de uma forma global ainda que com um grau menos intenso,
pelos inquiridos do Sul da Europa que demonstram níveis de
preocupação superiores em relação aos seus congéneres do
Norte (e.g., dinamarqueses, suecos e britânicos).
Relativamente à avaliação do desempenho nacional nas
questões ambientais, com base nos valores médios das respostas
em que (1) corresponde à ideia de que o respetivo país «tem
feito muito pouco» e (2) corresponde a uma avaliação claramen-
te positiva – o país tem feito mais do que o suficiente –, os dados
mostram que os inquiridos do Sul (em particular os portugueses)
avaliam mais negativamente os respetivos desempenhos
nacionais. Destacando-se aqui, com avaliações mais positivas, os
holandeses, os alemães e os suecos (Figura 2.6). Por seu turno,
analisando especificamente a avaliação que os portugueses fazem
do desempenho geral do país quanto à gestão do ambiente,
entre 2000 e 2012, os resultados evidenciam um acentuado e
crescente sentido crítico.
Figura 2.6 Perceção do desempenho ambiental do país, 2010 Fonte: ISSP, 2010-2012
Figura 2.5 Grau de preocupação relativamente
Mínimo. 1 (Muito pouco) . Máximo 3 (Mais do que o suficiente)
Mínimo. 1 (Nada preocupado) . Máximo 5 (Muito preocupado)
3,0 ou menos
3,1 - 3,4
3,5 - 3,6
3,7 - 3,8
4,0 ou mais
PTES
FR
BE
NL
DK
DE
CZ
ATSI HR
SK
0 400Km
UK
SE
LVLT
BG
1,3 ou menos
1,4 - 1,5
1,6 - 1,7
1,8 - 1,9
2,0 ou mais
PTES
FR
BE
NL
DK
IT
DE
CZ
ATSI HR
SK
0 400Km
UK
SE
LVLT
BG
23
Fonte: ISSP, 2010-2012ao ambiente, 2010
Figura 2.7 Em geral, relativamente ao ambiente, pensa que Portugal está a fazer…, 2000 e 2012 Fonte: ISSP, 2000 e 2012
6%
39%
41%
14%
2%
32%
57%
9%
O SUFICIENTE
MUITO POUCO
2000 2012
MAIS DO QUE O SUFICIENTE
NÃO RESPONDENÃO SABE
Figura 2.8 Problemas ambientais que mais preocupam os europeus e os portugueses, 2014 (%) Fonte: Eurobarómetro 416, 2014
POLUIÇÃO DO AR
POLUIÇÃO DE MARES, RIOS, LAGOSE ÁGUAS SUBTERRÂNEAS
IMPACTO NA SAÚDE DE PRODUTOSQUÍMICOS DE USO DIÁRIO
ESGOTAMENTO DE RECURSOS NATURAIS
AUMENTO DA QUANTIDADE DE LIXO
POLUIÇÃO AGRÍCOLA
ESCASSEZ DE ÁGUA POTÁVEL
REDUÇÃO OU EXTINÇÃO DE ESPÉCIES
OS NOSSOS HÁBITOS DE CONSUMO
PROBLEMAS URBANOS
POLUIÇÃO SONORA
OCUPAÇÃO DE TERRAS COM A CONSTRUÇÃO DE ESTRADAS OU CIDADES
DEGRADAÇÃO DOS SOLOS
PROPAGAÇÃO DE ESPÉCIES INVASIVAS
OUTRA
66
51
26
48
36
22
48
14
15
14
12
8
17
6
1
56
50
43
43
36
29
27
26
24
23
15
15
13
11
2
UE28 PORTUGAL
24
IIIQuanto à gestão do ambiente,entre 2000 e 2012, os resultadosevidenciam um acentuado ecrescente sentido crítico.
Sucessos e insucessos dapolítica ambiental:água e resíduos Com efeito, de acordo com os dados do ISSP aplicados em momentos
diferentes (Figura 2.7), o valor da categoria que considera que «o país está a
fazer muito pouco pelo ambiente» sobe de 41% para 58%. A este
crescimento do sentido crítico corresponde um decréscimo, também
assinalável, da categoria que melhor avalia o desempenho nacional (i.e., «o
país está a fazer mais do que o suficiente») e, o que também não é de
somenos, uma subida da capacidade crítica dos cidadãos portugueses, cuja
taxa de não resposta é inferior em 5%, em 2012. Os portugueses parecem
progressivamente mais conscientes e mais exigentes em termos ambientais,
assim como relativamente ao desempenho do país e dos seus responsáveis
nesta matéria. Posição que é, aliás, consonante com a desconfiança também
crescente nas atuais capacidade e eficácia da ação do Estado no que respeita
à política e à qualidade ambientais (Guerra, Schmidt e Valente, 2015).
Relativamente aos cinco problemas ambientais que, do seu ponto de vista,
mais os afetam, os portugueses elegem, antes de mais, a poluição do ar
(66%), que fazem acompanhar pela deficiente qualidade/poluição (51%) e
disponibilidade da água (48%). A par destas preocupações surge o aumento
da quantidade de lixo (48%) e, já a alguma distância, o esgotamento dos
recursos naturais (36%). Dir-se-ia, portanto, que os problemas de «primeira
geração» são ainda dominantes nas preocupações dos portugueses, enquan-
to os seus congéneres europeus (pelo menos se globalmente auscultados)
parecem assumir posições mais abrangentes. De acordo com os dados
expostos na Figura 2.8, não deixando de valorizar o mesmo tipo de
questões, os europeus inquiridos no Eurobarómetro atribuem maior impor-
tância ao impacto na saúde dos químicos usados no consumo diário (43%
contra 26% entre os inquiridos portugueses); à redução/extinção de
espécies (26% contra 14%); aos hábitos de consumo (24% contra 15%),
ou, ainda, aos problemas urbanos (23% contra 14%).
Em síntese, sendo ainda prematuro tirar conclusões quanto aos impactos
da recente desaceleração do investimento no ambiente nas preocupações
dos portugueses, o que para já podemos deduzir destes resultados é que o
adiamento de soluções setoriais e a desfragmentação de alguns serviços
públicos terão aumentado a desconfiança e o sentido crítico relativamente ao
desempenho ambiental do país, com repercussões no aumento da preocu-
pação com o ambiente e com a generalidade dos problemas ambientais,
entre os quais se destacam, ainda, problemas de «primeira geração» que, do
ponto de vista dos inquiridos, não estarão ainda resolvidos.
Como vimos, a inquietação com os problemas
ambientais manifestada é atualmente muito elevada e
agudiza-se entre os portugueses. Importa, pois, avaliar
o modo como esta preocupação se repercute nas
práticas quotidianas. Com esse objetivo analisamos
duas áreas fundamentais que, como constatámos
acima, corresponderam a um maior investimento
público ao longo das últimas décadas: i) o abastecimen-
to de água, a drenagem e o tratamento de águas
residuais e ii) a produção/reciclagem de resíduos.
Quando considerados à escala da UE (Figura 2.9), os
dados mostram que o abastecimento público de água
atingiu valores confortáveis na generalidade dos países
(com 100% na Holanda, em Espanha, em Chipre, na
Hungria e em Malta), surgindo os países bálticos e,
sobretudo, a Roménia como a grande exceção
(61,9%). Pelo contrário, a cobertura por sistemas de
drenagem de águas residuais está longe de estar
resolvida em muitos países europeus (Figura 2.10),
designadamente da Europa de Leste, com pior desem-
penho em Chipre (29,8%), na Roménia (46,8%) e na
Croácia (52,9%). Já em Portugal, o abastecimento de
água às populações e o tratamento de RSU (Resíduos
Sólidos Urbanos) são geralmente apontados como
casos de sucesso das políticas de ambiente financiadas
pelos fundos europeus. O mesmo acontece com a
taxa de cobertura de esgotos e com o tratamento de
águas residuais, verificando-se um aumento considerá-
vel na década de 2000, na sequência do que já ocorria
na década anterior com a aplicação dos fundos do II
Quadro Comunitário de Apoio (1992-1999).
25
A Figura 2.11 é esclarecedora quanto a esta evolução: em
2000, o abastecimento público de água para consumo já cobria
90% da população, progredindo lentamente a partir daí, até
alcançar uma taxa de cobertura que, atualmente, ultrapassa os
95% de população servida. A evolução da cobertura da
drenagem e do tratamento de águas residuais tem sido mais
lenta e encontra-se ainda longe da meta de 90% estabelecida na
década de 1990. Mesmo assim, o aumento foi sensível: a
drenagem passou de 69% em 2000 para uma cobertura de
81% em 2012, e o tratamento de águas residuais de 50% para
79% em 2012, melhorias estruturais que se traduziram numa
redução das cargas poluentes descarregadas nas massas de água
pelo setor urbano (APA, 2015). Adicionalmente, segundo a
ERSAR (2015), em Portugal, a água hoje captada e distribuída,
atinge um nível de qualidade superior a 98,2%. Refira-se no
entanto que, apesar deste cenário francamente positivo, no que
respeita à drenagem e ao tratamento de águas residuais, algumas
intervenções tiveram uma implementação insuficiente com
consequências na qualidade da água dos rios nacionais, o que
levou o recente Plano Nacional da Água (APA, 2015) a concluir
que cerca de 48% dos rios nacionais continuam poluídos.
Os dados expostos na Figura 2.12 mostram que, se entre
2008 e 2010 a produção de RSU per capita em Portugal igualou
ou superou a média comunitária, a partir de 2011 (quando os
efeitos da crise adquiriram maior visibilidade em Portugal) se
iniciou uma tendência de decréscimo que acompanhou a
redução do poder de compra dos portugueses. Assim, em 2012
com menos 36 kg per capita e em 2013 com menos 41 kg per
capita, a produção de RSU em Portugal voltou a situar-se
claramente abaixo da média dos países da UE27.
Comparando os valores relativos a 2013 verificamos que as
diferenças entre os vários países europeus são bastante expressi-
vas, variando entre os 272 kg da Roménia e os 747 kg per capita
da Dinamarca. No caso português, os 453 kg per capita situam-se
abaixo da média europeia (481 kg). Assinale-se que o decresci-
mento registado parece decorrer da austeridade imposta pela
crise, com a consequente redução do poder de compra. Este é,
aliás, um fator determinante também noutras paragens. Com
efeito, são os países da Europa de Leste – que chegaram mais
tarde à sociedade de consumo – que continuam a produzir
menos RSU per capita (Figura 2.13).
Quanto à taxa de reciclagem de RSU (incluindo a composta-
gem dos resíduos orgânicos), o desempenho nacional fica ainda
muito aquém da média comunitária e, ainda mais, resultados de
países como a Alemanha, a Áustria ou a Bélgica (v. Eurostat
2015).
Contudo, em termos evolutivos, como se verifica na Figura
2.14, apesar de algumas flutuações e do fosso entre os valores
portugueses e a média europeia não ter regredido, a dinâmica
tem sido positiva. Com efeito, passámos de 10,5% de taxa de
reciclagem em 2000 para 25,8% em 2013. Valores que, tendo
em conta o desnível que ainda separa os valores nacionais dos
valores médios europeus, continuam a pecar por insuficiência.
Quanto à taxa de reciclagem deresíduos urbanos, o desempenhonacional fica ainda muito aquém damédia comunitária.
Fonte: Eurostat, 2015
Figura 2.9 População servida por abastecimento públicode água na UE, 2013 (%) Fonte: Eurostat, 2015
Figura 2.10 População servida por drenagem de águasresiduais na UE, 2013 (%)
<85
85 - 89
90 - 94
95 - 99
100
PTES
CY
FR
BELU
NL
DK
FI
DE
CZ
AT
HRHU
SK
0 400Km
SE EE
LT
PL
BG
RO
<70
70 - 79
80 - 89
90 - 99
100
PTES
CY
FR
BELU
NL
DK
FI
IT
DE
CZ
ATSI HR
HU
SK
0 400Km
UK
SE EE
LVLT
PL
BG
RO
EL
IE
EL
26
2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012 2013
Fonte: Pordata, 2015; ERSAR, 2013
Figura 2.11 Abastecimento de água, drenagem e tratamento de águas residuais urbanas em Portugal(% da população servida), 2003-2012 (%)
2000
2000
2000
2012
2012
2012
95%
81%
79%
90%
69%
50%
Abastecimento de água
Drenagem de águas residuais urbanas
Tratamento de águas residuais urbanas
UE27
Portugal
2000
2013
Portugal
União Europeia 27 42,0%
25,8%
25,2%
10,5%
513 516 522 524 521 520 516 498 489 481
440453490504512518471465452445
Fonte: Eurostat, 2015Figura 2.12 Produção de resíduos urbanos per capita em Portugal e na UE27, 2003-2012 (kg)
Figura 2.13 Produção de resíduos urbanos Kg per capita em Portugal e na UE, 2013 Fonte: Eurostat, 2015
Fonte: Eurostat, 2015
Figura 2.14 Taxa de reciclagem em Portugale na UE27, 2000-2013 (%)
PTES
CY
FR
BELU
NL
DK
FI
IT
DE
CZ
ATSI HR
HU
SK
0 400Km
UK
SE EE
LVLT
PL
BG
RO
EL
IE400 - 499
270 - 399
27
500 - 599
600 - 747
Fonte: EB51.1 (1999), EB68.2 (2008), EB 75.2 (2011), EB81.3 (2014)
Conclusão
IVFigura 2.15 Prática de separação doméstica deresíduos urbanos, 1999-2013 (% da população)
Portugal UE
40%
54%
66%
59%
1999
2008
A evolução positiva da reciclagem de RU, analisada anterior-
mente, relaciona-se e até decorre da adesão dos portugueses
às práticas de deposição seletiva, área em que o sucesso dos
programas escolares – em boa parte patrocinados pelos
municípios (Schmidt, Nave & Guerra, 2010) – é incontestável,
pelo menos a julgar pelos dados presentes na Figura 2.15. Se,
em 1999, vinte e dois pontos percentuais separavam a
percentagem de portugueses que declarava práticas de recicla-
gem da média europeia, em 2014 a diferença inverteu-se e o
valor português é agora 4,6% superior à média europeia.
Claro que o alargamento que entretanto aconteceu, com a
entrada de mais 13 países com desempenhos e pontos de
partida muito distintos, terá uma relevância que não se poderá
desprezar nesta matéria, mas é inegável a evolução registada
que, aliás, é confirmada pelos dados: a percentagem de
portugueses que declara separar os resíduos subiu de 40% em
1999 para 71% em 2014.
Ao longo dos últimos 15 anos viveram-se períodos
irregulares no que respeita aos investimentos no ambiente.
Os ciclos políticos e os ciclos comunitários de fundos
estruturais são os determinantes fundamentais para explicar
estas oscilações nos programas e nas políticas ambientais.
Podemos, contudo, constatar que as tendências mais
recentes apontam para um desinvestimento a partir de
2011. A diminuição dos montantes reservados para as
despesas de ambiente refletirá, talvez, mais os efeitos de
opções políticas do que aqueles decorrentes da própria
crise económica e financeira.
Tudo somado, e comparativamente com as médias
europeias nestas questões do ambiente, estamos
certamente aquém do desejável, seja no que se refere à
despesa pública aplicada em proteção ambiental, seja no
que se refere a práticas sociais instaladas, cujo incentivo
público para a mudança recua, tarda, ou acontece de forma
ziguezagueante.
Apesar disso, esta situação decorre à revelia do que
parece corresponder aos anseios manifestados pela popula-
ção portuguesa em diversos inquéritos, ao longo das últimas
décadas. Quando analisamos os resultados, verificamos
crescentes preocupação, interesse e vontade de obter mais
e melhor informação sobre os problemas ambientais. O
ambiente é uma preocupação que não abranda entre os
portugueses, mesmo se as consequências da crise os
pressionam em sentido contrário. Assim, para os portugue-
ses, entre os problemas mais prementes nos últimos
inquéritos, destacam-se a poluição do ar e a poluição da
água. Apesar disso e fazendo jus ao que se disse anterior-
mente, a falta de correspondência entre investimentos
públicos e preocupações sociais é flagrante e as despesas
com o ar e o clima mantêm níveis residuais, apesar da
visibilidade que atingiram nos media e da pressão advinda
das organizações de governança internacional e da própria
União Europeia.
71% 66,4%2014
60% 66%2011
28
referências bibliográficas
O ambiente é uma preocupaçãoque não abranda entre os portugueses, mesmo se as consequências da crise ospressionam em sentido contrário.
Já em relação à água tem havido um maior nivelamento
entre investimentos públicos e preocupações manifestadas,
seja quanto ao abastecimento, seja quanto à qualidade da água
de consumo, seja ainda quanto ao tratamento das águas
residuais, o investimento per capita cresceu paulatinamente,
assim como cresceu a taxa de cobertura da população servida.
Finalmente, a produção e a separação dos resíduos urbanos
– refletindo, respetivamente, o consumo de bens/poder de
compra e a consciência ambiental – têm sofrido uma evolução
particularmente positiva que decorre de dois fenómenos
aparentemente pouco imbricados. Por um lado, acompa-
nham o reflexo da crise económico-financeira que implicou o
repensar de consumos excessivos ou não excessivos, já que as
dificuldades económicas nem sempre são boas conselheiras.
Por outro lado, beneficiam de uma crescente consciencializa-
ção ecológica que, entre os portugueses, há muito faz o seu
percurso. Quer isto dizer que confluentemente e, desta feita,
produzindo um resultado positivo, a redução do poder de
compra potenciou a diminuição da produção de resíduos per
capita, enquanto o desenvolvimento social das últimas
décadas, bem como o investimento público anterior (por
exemplo, na educação ambiental) possibilitou um maior
empenho cívico e, consequentemente, um aumento da
separação seletiva, assim como uma maior capacidade (e
vontade) para intervir na coisa pública e para exigir mais e
melhores políticas públicas ambientais.
APA (2015). Plano Nacional da Água. Lisboa: Agência
Portuguesa do Ambiente. Acedido a 22 de setembro de
2015 em www.apambiente.pt
ERSAR. 2015. Qualidade da água para consumo humano
2013. Lisboa: Entidade Reguladora dos Serviços de Águas e
Resíduos.
Ferreira, J. G., Schmidt, L., Jacobi, P. R. e Arteiro da Paz,
M. G. 2014. «Água: percepções, valores e preocupações
em perspectiva comparada». Recursos Hídricos 35 (2),
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Guerra, J., Schmidt, L. e Valente, S. 2015. «Dilemmas of
sustainability in turbulent times». In Green European.
Environmental Behaviour and Attitudes in Europe in a
Historical and Cross-Cultural Comparative Perspective, ed.
Audrone Telesiene e Matthias Gross. London: Routledge.
Schmidt, L. e Delicado, A. 2014. Ambiente, Alterações
Climáticas, Alimentação e Energia. A Opinião dos Portugueses.
Lisboa: Imprensa de Ciências Sociais.
Valente, S. e Ferreira, J. G. 2014. «Ambiente: das
preocupações às práticas». In Ambiente, Alterações
Climáticas, Alimentação e Energia. A Opinião dos Portugueses,
org. Luísa Schmidt.
29
Karin Wall, Vanessa Cunha, Leonor Rodrigues, Rita Coelho
PORTUGAL NO CONTEXTO EUROPEU EM ANOS DE CRISE3FAMÍLIAS EMPORTUGAL E NA EUROPA
Neste capítulo procuram identificar-se algumas das principais mudanças na vida familiar em Portugal ocorridas ao longo da última década e situar o caso português no contexto europeu. A mudança no campo dos valores e dos comportamentos familiares na sociedade portuguesa é complexa.
Existe um tempo longo de evolução, assente em movimentos de fundo que alteram
progressivamente as dinâmicas familiares ao longo de várias décadas, e um tempo mais curto,
caracterizado por épocas de mudança social acelerada que podem precipitar, consolidar ou
inverter as tendências. É o caso, por exemplo, da recente crise económica que terá afetado,
de forma visível e profunda, alguns elementos da paisagem da vida familiar.
No sentido de mapear estas mudanças, começa-se por analisar, desde o ano 2000 até
hoje, os processos de transformação relativos à dimensão e aos tipos de família, à fecundidade,
à conjugalidade e ao divórcio. Apresenta-se, em seguida, a evolução do risco de pobreza em
diferentes tipos de família, procurando avaliar o impacto da crise e comparar o risco de pobre-
za em famílias com crianças em Portugal e noutros países europeus. Por último, num olhar
que incide sobre a organização interna da família, comparam-se as atitudes e os comporta-
mentos, em 2002 e 2014, nos domínios da divisão do trabalho pago e da divisão das tarefas
domésticas no casal. Interessa averiguar, através destes indicadores, até que ponto se está a
desenvolver um modelo de família centrado numa divisão simétrica e igualitária de papéis, em
que ambos os cônjuges contribuem para o rendimento da família e participam nas tarefas
domésticas.
31
Famílias: principais características
I
Dimensão das famílias
2000 2014
2,4
2,6
2,8
3,0
2,9
2,8
2,6
A análise dos agregados domésticos revela uma diminuição da
dimensão média das famílias de 2,9 indivíduos em 2000 para 2,6
em 2014 (Figura 3.1). Este indicador tem evoluído de forma
gradual e consistente, retratando as transformações que têm
vindo a ocorrer na vida das famílias e nos modos de residência
na sociedade portuguesa há várias décadas. São transformações
em várias frentes que concorrem para a diminuição da dimensão
média dos agregados: a crescente autonomia residencial de
jovens e casais, que leva ao aumento dos jovens que vivem a
solo e à diminuição das famílias complexas; o adiamento da
parentalidade e a diminuição do número de filhos nas famílias,
que se reflete no aumento dos casais sem filhos e na diminuição
das famílias numerosas; mas também o envelhecimento da
população aliado ao seu crescente isolamento, pois são os
idosos que mais vivem sozinhos (Delgado e Wall, 2014). Mas
para lá das tendências de fundo, quanto à dimensão média das
famílias, importa pensar sobre o significado da quebra mais
intensa, de 0,2 pontos percentuais, que ocorreu entre 2008 e
2011. Esta quebra poderá refletir uma acomodação por parte
das famílias ao impacto da crise, por um lado acentuando
tendências já existentes, como o adiamento e a diminuição da
natalidade, e por outro intensificando os fluxos emigratórios.
A comparação europeia revela que há uma relativa homoge-
neidade do indicador (Figura 3.2). Em 2014, a dimensão média
das famílias variava entre 2,0 na Alemanha e 2,7 em países como
Chipre, a Eslováquia, a Irlanda, a Roménia, a Polónia e Malta.
Apesar da evolução recente deste indicador na sociedade
portuguesa, Portugal ainda integrava o grupo de países cuja
dimensão média das famílias era mais elevada. No extremo
oposto encontravam-se a Alemanha e os países nórdicos, com
valores inferiores a 2,2. Curiosamente, alguns países onde as
famílias são mais reduzidas – como a Suécia e a Finlândia, mas
também a França e o Reino Unido – são, ao mesmo tempo, dos
mais fecundos no contexto atual da UE28 (ver Figura 3.6),
Figura 3.1 Dimensão média das famílias(agregado doméstico) em Portugal,
2000-2014 (%)
Figura 3.2 Dimensão média das famílias(agregado doméstico) na Europa, 2014
Fonte: Pordata, a partir de dados do Eurostat e Institutos Nacionais de Estatística
Fonte: Pordata/ INE, Projeções baseadas nos Censos 2001, 2011
PTES
FR
BELU
NL
DK
FI
IT
CY
DE
CZ
ATSI
HU
SK
IE
2,0 - 2,1
2,2 - 2,3
2,4 - 2,5
2,6 - 2,8
0 400Km
UK
SE EE
LVLT
PL
EL
BG
RO
RS
32
HR
Fonte: Pordata/INE - Censos. Quebra de série em 2011
Em Portugal, entre 2000 e 2014assistiu-se a uma diminuição dadimensão média das famílias.
o que revela que não há, necessariamente, uma relação direta entre
natalidade e dimensão da família. Nesses países serão, então, o
peso significativo dos indivíduos que vivem sozinhos e a autonomia
precoce dos jovens a explicar a reduzida dimensão das famílias.
A composição interna das famílias – com quem se reside –
também muda significativamente ao longo da vida dos indivíduos,
constituindo a infância o período da vida no qual a diversidade de
modos de corresidir é menor (Delgado e Wall, 2014). Mesmo
assim, importa conhecer com quem vivem as crianças e os jovens;
e como evoluiu a distribuição desta população pelos diferentes
tipos de família entre os dois últimos momentos censitários (Figura
3.3). Em 2011, a população residente até aos 19 anos vivia maiori-
tariamente em famílias de casal com filhos (72%). Quanto às
restantes crianças e jovens, 16% viviam em famílias complexas,
11% em famílias monoparentais e menos de 1% noutro tipo de
agregado doméstico. Comparando com os dados de 2001,
constata-se que a evolução foi no sentido do aumento de crianças
e jovens a viver em famílias monoparentais, traduzido em 4 pontos
percentuais, enquanto decresceram ligeiramente em outros tipos
de família. Por conseguinte, tem vindo a aumentar o número de
crianças e jovens que vivem apenas com a mãe ou com o pai e
eventualmente com irmãos, o que reflete o crescimento dos
divórcios e das separações (ver Figura 3.9), mas também a maior
autonomia residencial destas famílias. Importa ainda sublinhar que,
apesar da ligeira diminuição de crianças e de jovens a viverem em
famílias de casais com filhos, dentro deste tipo de famílias tem
vindo a aumentar a proporção das recompostas (Delgado e Wall,
2014), o que significa que há um número crescente de crianças e
de jovens que vivem com um dos progenitores e um padrasto ou
uma madrasta.
Tipos de família:onde vivem as crianças e os jovens
Figura 3.3 População residente até aos 19 anos,por tipo de famílias, em Portugal, 2001-2011 (%)
Fonte: OCDE Family Database Dados de 2009: França; Dados de 2010:Estónia, Finlândia, Letónia; 2011: restantes países
Figura 3.4 Famílias monoparentais com filhosaté aos 25 anos, na Europa, 2011 (%)
PTES
FR
BELU
NL
DK
IT
DE
CZ
CY
ATSI
HU
SK
IE
5,0 - 9,0
9,1 - 12,0
12,1 - 16,0
16,1 - 20,4
0 400Km
UK
EE
LVLT
PL
EL
BG
RO
FI
20112001
72,474,4
Monoparentais
Complexas
Outros agregados
domésticos
11,26,7
15,617,7
0,81,2
Casal com filhos
33
Fecundidade
Fonte: Pordata/INE - Estatísticas de Nados-Vivose estimativas anuais de População Residente
2000 2014
1,10
1,20
1,30
1,00
ISF
Idade média da mãe
1,40
1,50
1,60 31
30
29
28
27
26
25
Apesar da evolução significativa das famílias monoparentais no
período em análise, em 2011 Portugal pertencia ao grupo de
países com a proporção mais baixa deste tipo de famílias (com
filhos menores de 25 anos), juntamente com França, Alemanha,
Itália, Grécia, Bulgária, Lituânia e Finlândia (Figura 3.4). Uma
incidência mais elevada, entre 13% e 17%, reunia cinco países:
Estónia, Polónia, República Checa, Croácia e Bélgica. Já a
Letónia, isoladamente, destacava-se pela incidência particular-
mente elevada de famílias monoparentais (20%), o que poderá
estar associado à alta divorcialidade no país (ver Figura 3.10 ).
O declínio e o adiamento da fecundidade não são comporta-
mentos demográficos recentes na sociedade portuguesa. O
índice sintético de fecundidade (ISF) está em queda desde o
início da década de setenta do século XX, apesar de oscilações
pontuais sem impacto significativo na tendência; e a idade média
da mulher ao nascimento do primeiro filho está a aumentar de
forma ininterrupta desde meados dos anos oitenta (Cunha,
2014). Embora reflitam já tendências duradouras, importa
mesmo assim conhecer a sua evolução recente (Figura 3.5).
Entre 2000 e 2013, o ISF caiu de 1,55 para 1,21, o valor mais
baixo de sempre. Se em 2014 o indicador registou um aumento
de duas centésimas, tal não permite falar em recuperação nem
mitiga o impacto destes níveis de fecundidade muito baixos no
volume e na estrutura da população. Como se sabe, níveis de
fecundidade abaixo de 1,30 (lowest-low fertility) aceleram os
processos de envelhecimento e de declínio demográficos e
dificultam a recuperação dos nascimentos (Rosa, 2012), tendo
Portugal atingido esse patamar em 2012. Estes desenvolvimen-
tos do ISF não podem ser desligados do expressivo adiamento
da maternidade, pois a idade média da mulher ao nascimento
do primeiro filho aumentou quase cinco anos no período em
análise, atingindo os 30 anos em 2014. Estes dados não podem
ser dissociados da crise, que parece ter acelerado o declínio da
fecundidade entre 2010 e 2013 em virtude da drástica redução
dos nascimentos que ocorreu neste período.Os baixos níveis
de fecundidade são uma realidade à escala europeia. Se Portugal
registava, em 2013, o ISF mais baixo no contexto da UE28, e se
situava com Espanha e Polónia no grupo restrito de países de
fecundidade lowest-low, a maioria dos países registava, então,
Figura 3.5 Índice sintético de fecundidade (ISF) eidade média da mãe ao nascimento
do primeiro filho, Portugal, 2000-2014
Fonte: Eurostat
Figura 3.6 Índice sintético de fecundidade (ISF), Europa, 2013
PTES
FR
BELU
NL
DK
FI
IT
DE
CZ
ATSI
HU
SK
IE
0 - 1,28
1,29 - 1,50
1,51 - 1,70
1,71 - 1,90
1,91 - 2,00
0 400Km
UK
EE
LVLT
PL
EL
BG
ROHR
SE
34
CY
Nascimentos fora do casamento
O declínio e o adiamento da fecundidade não são comportamentos demográficos recentes na sociedade portuguesa.
Fonte: Eurostat
nados-vivos fora do casamento(total)
nados-vivos fora do casamento com coabitação dos pais
nados-vivos fora do casamento sem coabitação dos pais
um ISF baixo, entre 1,50 e 1,69, ou mesmo muito baixo,
entre 1,30 e 1,49 (Figura 3.6). O primeiro grupo reunia os
países bálticos, o Luxemburgo, a Eslovénia, os Países Baixos
e ainda, com 1,67, a Dinamarca. O segundo grupo reunia o
conjunto mais alargado de países, onze ao todo, da Europa
do Sul e Sudeste, Central e de Leste. No extremo oposto,
com níveis de fecundidade relativamente elevados (se bem
que abaixo do valor de 2,1 necessário para a reposição
natural das gerações), estavam a França e a Irlanda. Com
níveis moderados, entre 1,70 e 1,89, estavam a Suécia, a
Finlândia, o Reino Unido e a Bélgica.
Outro indicador importante na análise da evolução da
família diz respeito aos nascimentos fora do casamento.
Trata-se de um indicador que abarca duas realidades
distintas: a da informalização da vida em casal, ocorrendo os
nascimentos em casais coabitantes (uniões de facto); e a das
mães sós, mulheres em regra mais jovens que têm filhos fora
de uma relação de coabitação. No período em análise, os
nascimentos fora do casamento mais do que duplicaram,
representando em 2014 metade do total de nascimentos
ocorridos nesse ano (Figura 3.7). Por outro lado, há que
sublinhar que as duas realidades têm vindo a crescer, se bem
que a ritmos diferenciados a partir de 2010: os nascimentos
com coabitação dos pais desaceleraram o ritmo, sucedendo
o oposto com os nascimentos sem coabitação dos pais, que
praticamente triplicaram entre 2000 e 2014. Sendo esta
tendência acompanhada pelo adiamento da fecundidade e
pela forte diminuição dos nascimentos em mulheres em
idades mais jovens, importa conhecer o impacto que a crise
poderá estar a ter neste fenómeno, nomeadamente por via
da emigração (masculina) e do difícil acesso à habitação por
parte dos casais.
2000 2014
10
20
30
0
40
50
Fonte: Pordata/INE - Estatísticas de Nados-Vivos
Figura 3.7 Nascimentos fora do casamento, total,com e sem coabitação dos pais, em Portugal,2000-2014 (%)
22,2
16,8
5,4 5,89,2
15,823,2
32,0
33,629,1
41,3
49,3
Figura 3.8 Nascimentos fora do casamento, total, Europa, 2012 (%)
PTES
FR
BELU
NL
DK
FI
IT
DE
CZ
ATSI
HU
SK
IE
0 400Km
UK
EE
LVLT
PL
EL
BG
ROHR
SE
0 - 15,0
15,1 - 30,0
30,1 - 45,0
45,1 - 60,0
35
CY
Casamentos / Divórcios
Taxa bruta de divorcialidade
Taxa bruta de nupcialidade
Divórcios por 100 casamentos
Os dados sobre os nascimentos fora do casamento em 2012
confirmam que Portugal é um dos países da UE28 onde este
fenómeno é mais prevalente (Figura 3.8). França, Reino Unido,
Bélgica, Países Baixos, Dinamarca, Suécia, Eslovénia, Estónia,
Letónia e Bulgária são os outros países que fazem parte do
grupo no qual a percentagem destes nascimentos é mais
elevada, entre 45 e 60%. No entanto, importa sublinhar que
esta elevada incidência poderá retratar realidades diferentes.
Nos países onde há uma crescente informalização da conjugali-
dade e uma forte regulação dos nascimentos, como é o caso de
Portugal ou da Suécia, o indicador reflete sobretudo os
nascimentos com coabitação dos pais. Nos países onde persiste
o fenómeno dos nascimentos em idades muito jovens, como é
o caso paradigmático da Bulgária, mas também do Reino Unido
e da Letónia, o indicador poderá retratar os nascimentos sem
coabitação dos pais, ou seja, o fenómeno das jovens mães sós.
No extremo oposto encontra-se a Grécia, isolada, com menos
de 15% de nascimentos fora do casamento, o que se associa à
menor informalização da conjugalidade.
A evolução recente da nupcialidade e da divorcialidade retrata
mudanças profundas que estão em marcha, há já várias décadas,
na vida em casal. A informalização crescente das relações
conjugais tem levado ao declínio acentuado do casamento e em
particular do casamento católico, que é já minoritário face ao
civil (Delgado e Wall, 2014). Por outro lado, o divórcio é um
acontecimento cada vez mais comum nas trajetórias dos casais.
Entre 2000 e 2013, a taxa bruta de nupcialidade, que reflete os
casamentos celebrados por mil habitantes, caiu para metade, de
6,2‰ para 3,1‰ (Figura 3.9). Já a taxa bruta de divorcialidade,
que traduz os divórcios decretados por mil habitantes, registou
um ligeiro aumento até 2010, de 1,9‰ para 2,6‰, infletindo
a tendência desde então. No entanto, estes indicadores têm
algumas limitações na leitura da realidade, na medida em que
pesam o casamento e o divórcio no conjunto de uma popula-
ção crescentemente envelhecida. Um indicador alternativo e
mais esclarecedor é o rácio entre casamentos e divórcios, i.e.,
o número de divórcios decretados por 100 casamentos
celebrados num dado ano civil. No período em análise, o
indicador mais do que duplicou: de 30 divórcios em 2000, para
2000 2013
2
4
6
0
8 80
60
40
20
0
Figura 3.10 Rácio entre casamentos e divórcios,Fonte: Eurostat - Estimativas e recenseamento da populaçãona Europa, 2012
Figura 3.9 Nupcialidade, divorcialidade e rácio entrecasamentos e divórcios, em Portugal,
2000-2013 (‰ e rácio) Fonte: Residente | DGPJ/MJ - Estatísticas de divórcios e separação de
pessoas e bens; Pordata/INE - Estimativas anuais da população
30,0
6,25,4
4,7
3,1
1,92,7 2,2 2,6 2,2
49,1 47,1
70,4
3,8
74,2
PTES
FR
LU
NL
DK
FI
IT
DE
CZ
ATSI
HU
SK
IE
0 400Km
EE
LVLT
PL
EL
BG
ROHR
SE
1,5 - 24,9
25,0 - 49,9
50,0 - 74,9
75,0 - 77,5
36
Quebra de série
CY
Famílias em risco de pobreza
II70 em 2013. Mas 2011 foi o ano em que o número
de divórcios foi mais elevado, 74 em 100 casamen-
tos, diminuindo desde então. O indicador segue a
tendência da taxa bruta, sugerindo uma ligeira
desaceleração dos níveis de divorcialidade. Em 2012,
Portugal, Espanha, França, Dinamarca, Estónia,
Lituânia, República Checa e Hungria constituíam o
grupo de países com um elevado número de
divórcios por 100 casamentos, entre 50 e 75 (Figura
3.10). Apenas a Letónia registava um valor superior,
77. No extremo oposto, com menos de 25 divórcios
por 100 casamentos, apenas se encontravam a
Grécia, com 23 divórcios, a Irlanda, com 14, e Malta,
onde o divórcio só foi aprovado em 2011, com
menos de 2 divórcios por 100 casamentos. O grupo
mais numeroso de países, que reunia os restantes
países da UE28, apresentava um rácio de 25 a 50
divórcios por 100 casamentos.
Ao longo da última década o risco de pobreza – i.e., a situação
de famílias com rendimentos inferiores a 60% do rendimento
mediano em Portugal – tem vindo a aumentar entre as famílias
portuguesas com crianças e a diminuir entre as famílias sem
crianças (Figura 3.11). Nesse sentido, acentua-se a diferença no
risco de exposição à pobreza entre esses tipos de agregados.
Com efeito, se em 2003 o risco de pobreza era sensivelmente
igual em agregados com e sem crianças (respetivamente, 20,6%
e 20,0%), em 2012 tal diferença era de 7,2 pontos percentuais
(respetivamente, 22,2% e 15,0%). Entre as famílias com
crianças, o risco de pobreza é particularmente elevado nos
agregados com dois adultos e três ou mais crianças (famílias
numerosas) e nos agregados com um adulto e pelo menos uma
criança, onde predominam as famílias monoparentais. Os
cenários das famílias com crianças em geral, e das famílias nume-
rosas e monoparentais em particular, agravaram-se especial-
mente a partir de 2010 no contexto da atual crise económica. A
deterioração das condições de vida, motivada pela degradação
dos rendimentos e das condições laborais, pela redução dos
apoios sociais do Estado e pelo aumento de impostos, atingiu
fortemente as famílias com crianças (Wall et al., 2015). A análise
comparativa do contexto nacional face ao dos restantes países da
União Europeia coloca Portugal numa posição pouco favorável,
especialmente face aos países nórdicos – onde apenas cerca de
7 a 13% das famílias com crianças estão em risco de pobreza –,
mas também em relação a países como o Reino Unido, a Alema-
nha e a França, onde a incidência do risco varia entre 13 e 19%
(Figura 3.12). Em situação idêntica a Portugal, mas ainda assim
com valores inferiores a 20%, encontram-se países de Leste
como a Hungria, a Polónia, a Letónia e a Lituânia. Por sua vez, a
Roménia, a Espanha e a Grécia – estes dois últimos países, tal
como Portugal, com programas de austeridade nos últimos anos
– apresentam a maior percentagem de famílias com crianças em
risco de pobreza da União Europeia (entre 25,9% e 28,9%).
O divórcio é umacontecimento cada vezmais comum nastrajetórias dos casais.
37
Figura 3.12 Risco de pobreza em famílias com crianças, Fonte: Eu-SILC 2013, Eurostatna Europa, 2012 (%)
Figura 3.11 Risco de pobreza em famílias com e sem crianças, por tipo de família, Portugal, 2003-2012 (%) Fonte: EU-SILC 2004-2013
Famílias sem crianças
Famílias com crianças
Um adulto com, pelo menos, uma criança
Dois adultos com uma criança
Dois adultos com duas crianças
Dois adultos com três ou maiscrianças
2003 2012
10
15
20
25
30
35
40
45
40,4
33,1
37,0
34,8
41,0
24,0
20,020,6 18,7
12,817,7
19,9 22,219,9
16,015,0
15,0
13,4
36,1
Discordototalmente
+ discordo
Não concordo nem discordo
Concordo totalmente
+ concordo
2002 - 2014 2002 - 2014
24,333,0
Respondentes com mais de 18 anosFonte: Elaboração própria a partir de dados do ISSP 2002 e ISSP 2012
– Módulos Família, Género e Mudança
Mulheres Homens
29,0 22,8
60,5 59,3 55,055,4
20,811,717,910,5
Figura 3.13 «Compete ao homem ganhar dinheiroe à mulher cuidar da casa e da família», Portugal,2012 e 2014 (%)
Figura 3.14 «Compete ao homem ganhar dinheiro e à mulher cuidar da casa e da família»*, Europa, 2012 (%)
Fonte: Elaboração própria a partir de dados do ISSP 2012 - Módulos Família Género e Mudança. Em Portugal os dados foram recolhidos em 2014
* escala de resposta 1 «concordo totalmente» a 5 «discordo totalmente»respondentes com mais de 18 anos
7,4 - 13,0
13,1 - 18,6
18,7 - 24,3
24,4 - 29,0
PTES
FR
BELU
NL
DK
FI
IT
DE
CZ
ATSI
HU
SK
IE
0 400Km
UK
EE
LVLT
PL
EL
BG
RO
SE
HR
5,8 - 18,1
18,2 - 30,4
30,5 - 42,8
42,9 - 55,1
PT
FR
DK
FI
DE
CZ
ATSI
SK
IE
0 400Km
UK
LVLT
PL
BG
SE
HR
38
CY
Famílias e trabalho:atitudes e práticas
III
Práticas relativas ao trabalho pago
Atitude face à divisão do trabalho no casal
Entre os portugueses, tanto os homens como as mulheres trabalham mais do que as 40 horas semanaisregulamentares.
Os resultados do inquérito do ISSP sobre Família e Género,
realizado em 2014 junto de uma amostra representativa da
população portuguesa com 18 e mais anos, revelaram que a
maioria dos inquiridos discorda da afirmação «Compete ao
homem ganhar dinheiro e à mulher cuidar da casa e da família»,
o que sugere uma expressiva recusa da divisão tradicional dos
papéis de género (Figura 3.13). No entanto, 24% dos homens e
23% das mulheres concordam com aquela afirmação, ou seja,
que deve haver uma especialização complementar de papéis nos
casais: o homem tem a responsabilidade económica por via da
inserção profissional; a mulher tem a responsabilidade doméstica
e a dos cuidados às crianças e a outros familiares. Embora não se
observem alterações acentuadas em relação à ronda de 2002 do
ISSP, regista-se, todavia, uma descida na concordância com este
modelo de divisão do trabalho pago e não-pago no casal, descida
essa que foi inclusivamente mais expressiva no caso dos homens
do que no das mulheres. Daqui advém uma atenuação do
desfasamento de género a este respeito, baseada no padrão de
resposta tendencialmente mais tradicional dos homens do que
das mulheres. Importa ainda acrescentar que, em 2014, a
concordância com a afirmação apenas é frequente na população
com 65 e mais anos (entre 46 e 48%), reduzida para valores
entre 13 e 15% nos homens e nas mulheres com menos de 45
anos, o que evidencia a importante mudança de valores que tem
vindo a ocorrer na sociedade portuguesa e que marcou particu-
larmente as gerações nascidas a partir da década de 1970.
Em comparação com outros dezasseis países da União
Europeia que participaram no inquérito do ISSP, Portugal, com
um valor de concordância global de 24%, situa-se entre o
segundo grupo de países com menor adesão ao modelo de
ganha-pão masculino (Figura 3.14), aliado às altas taxas de
emprego feminino (ver Figura 3.18). Entre os países menos
favoráveis a esta divisão tradicional de papéis encon-
tram-se os países nórdicos, com valores inferiores a
10%, e ainda o Reino Unido, a Irlanda, a França e a
Alemanha, com valores entre 12 e 16%. Pelo
contrário, os países da União Europeia mais a leste
evidenciam uma atitude mais positiva face à divisão
assimétrica da vida familiar, apresentando níveis de
concordância acima dos 42%, ou mesmo, no caso
da Letónia e da Eslováquia, dos 50%.
A análise do número médio de horas semanais de
trabalho pago de trabalhadores em regime de
trabalho a tempo inteiro (mais de 30 horas
semanais), revela que, entre os portugueses, tanto
os homens como as mulheres trabalham mais do
que as 40 horas semanais regulamentares (Figura
3.15). Tendo em conta todo o período em análise,
houve um aumento da carga horária para ambos em
praticamente uma hora semanal: de 42,9 para 43,8
horas para os homens; e de 40,8 para 41,7 para as
mulheres. No entanto, esta evolução não foi linear,
pois entre 2000 e 2010 houve mesmo uma paulati-
na redução do número médio de horas, de 0,7
pontos percentuais para os homens e de 0,5 para as
mulheres. O ano de 2010 marca a viragem na
tendência anterior, intensificando a jornada de
trabalho desde então, e esta mudança não pode ser
desligada da atual conjuntura económica do país e
eventualmente também do novo regime de 40
horas de trabalho instaurado na função pública no
final de 2013. Em quatro anos, mulheres e homens
passaram a trabalhar, em média, respetivamente
39
mais 1,4 e 1,6 horas por semana. Importa ainda sublinhar a
persistência da disparidade de género na participação de
homens e de mulheres no mercado de trabalho, de cerca de
duas horas semanais, apesar das mudanças que ocorreram na
carga laboral ao longo destes 14 anos. Não há, portanto,
sinais de convergência no tempo que homens e mulheres
despendem a trabalhar profissionalmente.
Todavia, no contexto da União Europeia, Portugal apresen-
ta um valor relativamente reduzido de disparidade de género
no número médio de horas semanais de trabalho pago em
regime de trabalho a tempo inteiro (Figura 3.16). Esse valor é
idêntico aos de Espanha, França e Finlândia e aos da maioria
dos países da Europa Central, como Alemanha, Bélgica,
Áustria, Polónia e República Checa. Os países com maior
disparidade neste indicador são o Reino Unido, a Itália e a
Grécia (entre 3,0 e 4,2 horas) e ainda a Irlanda, onde os
homens trabalham em média cerca de mais meio-dia por
semana do que as mulheres (4,4 horas). Pelo contrário, os
países onde homens e mulheres que trabalham a tempo
inteiro menos diferem no número de horas despendidas
(entre 0,5 e 1,7 horas) são os países da Europa de Leste (e.g.
Estónia, Letónia, Lituânia, Roménia, Bulgária, Hungria), assim
como a Holanda e a Suécia.
Com base nas respostas ao ISSP 2002/2012 à questão
relativa à situação no emprego e ao número de horas
despendidas a trabalhar profissionalmente, foi possível definir
diferentes modelos de divisão do trabalho pago dos casais em
que ambos são economicamente ativos (Figura 3.17). Os
resultados indicam o predomínio e a estabilidade de um
padrão de duplo emprego a tempo inteiro (mais de 30 horas
semanais): 69,7% em 2002 e 70,8% em 2014. Já o modelo
de duplo emprego «assimétrico», em que um trabalha a
tempo inteiro e o outro a tempo parcial, decresceu nos
últimos 12 anos praticamente em 10 pontos percentuais. Na
verdade, parece ter havido uma decomposição deste modelo
específico em modalidades que mais claramente refletem a
precarização das condições laborais, pois cresceram as
situações em que ambos estão desempregados, ambos
trabalham a tempo parcial, um a tempo parcial e o outro está
desempregado e, principalmente, o modelo em que um está
a tempo inteiro e o outro está desempregado (passou de
9,7% para 16,2%). Neste sentido, a evolução nos modelos
de divisão conjugal do trabalho pago parece resultar não de
uma escolha das famílias, mas da crise económica atual e da
consequente deterioração do mercado de trabalho e do
aumento do desemprego. A comparação da situação dos
casais economicamente ativos em dezasseis países da UE28
que participaram no ISSP 2012 coloca Portugal, França, países
nórdicos e Letónia no grupo de países com uma elevada
percentagem de casais em que ambos os cônjuges trabalham
a tempo inteiro, entre 65% e 75% (Figura 3.18). Apenas a
República Checa, a Eslováquia e a Eslovénia apresentam uma
prevalência superior deste modelo. Já a Polónia, a Lituânia e a
Croácia registam uma percentagem inferior de casais a
trabalhar a tempo inteiro, entre 55% e 65%, enquanto a
Irlanda, a Alemanha, a Áustria e a Espanha fazem parte do
grupo com a menor percentagem, entre 44% e 55%. Mas se
na Alemanha e na Áustria tal se deve à saliência do trabalho
feminino a tempo parcial, em Espanha, à semelhança do que
se observa em Portugal, a crise económica desencadeou uma
escalada no desemprego. Com efeito, atualmente a Espanha
é o segundo país europeu com a taxa de desemprego mais
elevada (24% em 2014, segundo a OCDE).
40
Fonte: Elaboração própria a partir de dados do ISSP 2012 – Módulos Família, Género e Mudança. Em Portugal os dados foram recolhidos em 2014. Por questões metodológicas a Bulgária e o
Reino Unido não puderam ser incluídos na análise
Figura 3.16 Disparidade de género no número de horas semanais despendidas em trabalho pago a tempo inteiro*, na Europa, 2014 (horas) Fonte: EU-LFS, Eurostat
* Cálculo com base na diferença entre o número médio de homens e de mulheres
Homens
Mulheres
2000 2014
45
44
43
42
41
40
39
38
Figura 3.15 Número médio de horas semanais despendidas em trabalho pago a tempo inteiro, por sexo,Portugal, 2000 e 2014 (n.º horas) Fonte: EU-LFS, Eurostat
Figura 3.18 Casais em que ambos trabalhama tempo inteiro, na Europa, 2012 (%)
Figura 3.17 Modelos de divisão do trabalho pagoem casais ativos, Portugal, 2002 e 2014 (%)
Fonte: Elaboração própria a partir dos dados do ISSP 2002 e do ISSP 2012 – Módulos Família, Género e Mudança
PTES
CY
FR
BELU
NL
DK
FI
IT
DE
CZ
ATSI HR
HU
SK
IE
0 400Km
UK
SE EE
LVLT
PL
EL
BG
RO
0,5 - 1,8
1,9 - 2,9
3,0 - 4,1
4,2 - 4,5
PTES
FR
DK
FI
DE
CZ
ATSI HR
SK
IE
0 400Km
SE
LVLT
PL
44,4 - 54,7
54,8 - 65,0
65,1 - 75,2
75,3 - 84,4
2002
2014
2 Desempregados
1 Tempo parciale 1 Desempregado
1 Tempo inteiroe 1 Desempregado
1 Tempo inteiroe 1 Tempo parcial
2 Tempo inteiro
2 Tempo parcial
1,1 0,51,6
17,2
69,7
9,7
2,81,4
1,4
16,2
7,4
70,8
41
Fonte: Elaboração própria a partir de dados do ISSP 2002e do ISSP 2012 – Módulos Família, Género e Mudança
Questão: Em média, quantas horas por semana gasta a fazer tarefas domésticas (se tem filhos, não contar com os cuidados às crianças e as atividades de tempos livres)?
Fonte: Elaboração própria a partir de dados do ISSP 2012 – Módulos Família, Género e Mudança. Em Portugal os dados foram recolhidos em 2014.
Figura 3.22 Número médio de horas semanais despendidas em tarefas domésticas por homens que vivem em casal, em 16 países da UE,2012/2014 (n.º de horas)
Faço um bocado/muito mais do que seria justo
Faço mais ou menos o
que é justo
Faço um bocado/ muito menos do
que seria justo
39,9 33,1
2002 - 2014 2002 - 2014
4,93,9
53,947,7
6,248,4
65,454,5
1,540,6
Homens Mulheres
Questão: Qual das seguintes afirmações se aplica melhor à forma como são divididas as tarefas domésticas entre si e o seu cônjuge/companheiro?
Fonte: Elaboração própria a partir de dados do ISSP 2002 e do ISSP 2012 – Módulos Família, Género e Mudança
Figura 3.19 Perceção sobre a justiça na divisãoconjugal das tarefas domésticas, por sexo, Portugal,2002 e 2014 (%)
Questão: Qual das seguintes afirmações se aplica melhor à forma como são divididas as tarefas domésticas entre si e o seu cônjuge/companheiro?
Fonte: Elaboração própria a partir de dados do ISSP 2012 – Módulos Família, Género e Mudança. Em Portugal os dados foram recolhidos em 2014.
Figura 3.21 Número médio de horas semanais despendidasem tarefas domésticas, por homens e mulheres a viver emcasal, Portugal, 2002 e 2014 (n.º de horas)
2002 2014
7,0
26,3
8,1Homens
Mulheres 24,5
Europa, 2014 (%)
divisão conjugal das tarefas domésticas Figura 3.20 Perceção das mulheres sobre a justiça na
(«Faço muito» ou «um bocado mais do que seria justo»),
33,0 - 45,0
45,1 - 51,5
51,6 - 60,8
60,9 - 70,0
PTES
FR
DK
FI
DE
CZ
ATSI
SK
IE
0 400Km
LVLT
PL
BG
HR
SE
UK
6,8 - 10,0
10,1 - 13,2
13,3 - 16,3
16,4 - 18,6
PTES
FR
FI
DK
DE
CZ
ATSI
SK
IE
0 400Km
LVLT
PL
BG
HR
SE
42
UK
IV
Práticas relativas às tarefasdomésticas
A consonância de posições dehomens e de mulheres face ao sentido da injustiça reflete, então,o reconhecimento da sobrecargafeminina da esfera doméstica.Atitude face à divisão das
tarefas domésticas no casal
A participação dos homens na esfera doméstica é um tópico
central na discussão sobre a igualdade de género na vida familiar.
As duas rondas do ISSP indicam que os homens e as mulheres
que vivem em casal manifestam um sentimento de justiça em
relação à divisão das tarefas, ou seja, «fazem mais ou menos o
que é justo» (Figura 3.19). Se a perceção prevalecente é a de
uma distribuição justa do trabalho doméstico, que se acentuou
aliás entre 2002 e 2014 (mais 7 pontos percentuais nos homens
e mais 12 p.p. nas mulheres), a perceção contrária não deixa de
ainda ser expressiva em 2014: 41% dos homens consideram
que fazem «menos do que seria justo» e 33% das mulheres
consideram que fazem «mais do que seria justo». Esta consonân-
cia de posições de homens e de mulheres face ao sentido da
injustiça reflete, então, o reconhecimento da sobrecarga femini-
na na esfera doméstica. Este resultado é tão mais interessante
quanto é acompanhado de um sentimento de justiça geral mais
elevado nas mulheres do que nos homens (65% e 55% em
2014, respetivamente), sugerindo algum nível de incorporação e
de conformação femininas com a desigualdade de género na vida
familiar.
Com efeito, no contexto europeu as mulheres portuguesas são
das que menos se sentem injustiçadas, juntamente com as
eslovacas, as lituanas e as dinamarquesas (entre 33% e 45%)
(Figura 3.20). O segundo grupo de países onde o sentimento de
injustiça é menor, com valores entre 45% e 52%, reúne
Espanha, Suécia, Finlândia, Bulgária e Letónia. Importa frisar que
nestes diferentes países os baixos níveis de sentimento de
injustiça podem consubstanciar, tal como em Portugal, uma
conformação com a desigualdade de género ou, contrariamente,
um reconhecimento de uma divisão efetivamente mais equilibra-
da do trabalho doméstico. Já a Irlanda, o Reino Unido, a França
e a Áustria são os países onde a perceção de injustiça é mais
acentuada, com 61% a 70% das inquiridas a manifestarem que
fazem «mais do que seria justo».
Apesar do relativo sentimento de justiça na divisão
das tarefas, este não é acompanhado, na prática, por
uma distribuição igualitária no casal do número de
horas dedicado ao trabalho doméstico: em 2014,
segundo os dados do ISSP, as mulheres dedicavam em
média semanalmente mais do triplo do tempo do que
os homens (Figura 3.21). Em relação à ronda anterior
do ISSP verifica-se, mesmo assim, uma ligeira diminui-
ção do desfasamento entre a participação de homens
e de mulheres, que era em 2002 de 19 horas. Esta
evolução resultou da combinação entre a diminuição
de cerca de uma hora semanal de trabalho doméstico
realizado pelas mulheres e o incremento, mesmo que
ligeiro, na participação dos homens de 7 para pratica-
mente 8 horas semanais. Não obstante o ónus do
trabalho doméstico ainda recair grandemente sobre as
mulheres, não podemos deixar de relacionar a
mudança gradual que se observa quanto às práticas
masculinas com o aumento do sentimento de justiça
na divisão conjugal das tarefas.
No contexto europeu, segundo dados do ISSP
2012, Portugal situa-se entre os países onde os
homens dedicam menos horas semanais ao trabalho
doméstico, juntamente com França, Finlândia, Alema-
nha, Áustria, Lituânia (entre 7 e 9 horas) (Figura 3.22).
Os polacos, isoladamente, destacam-se pelo elevado
número de horas (mais de 17), seguidos pelos
homens da Letónia e Eslováquia. Por seu lado, os
restantes países registam valores intermédios de
participação dos homens nas tarefas domésticas, entre
10 horas e 12 horas.
43
Entre 2002 e 2014 observa-seuma tendência para maiorparticipação dos homens nastarefas domésticas.
A divisão conjugal do trabalho doméstico remete não só para o
tempo que homens e mulheres em casal dedicam às tarefas, mas
também para a forma como distribuem entre si o desempenho de
cada uma das tarefas domésticas. Os resultados do ISSP
confirmam, em Portugal, a persistência da feminização de algumas
tarefas rotineiras específicas, como tratar da roupa ou, em menor
grau, cozinhar (Figura 3.23). São tarefas cujo desempenho é
assegurado esmagadoramente pelas mulheres e nas quais a
participação dos homens (nos casos em que participam) ocorre
mais por via da partilha conjugal da tarefa e menos pelo assumir
integralmente a realização da mesma. Entre 2002 e 2014 observa-
-se, mesmo assim, uma tendência para maior participação dos
homens nessas tarefas: de 6% para 10% dos casais no caso da
roupa; de 22% para 30% no caso da confeção das refeições. Já as
compras correspondem a uma tarefa na qual os homens mais
participam e há mais tempo: em 2002, as compras eram partilha-
das em 40% dos casais; em 2014, mais de metade dos casais
partilham essa tarefa. É uma tarefa com características diferentes
das anteriores, pois envolve deslocações, gestão da economia
familiar e tem uma carga simbólica menos negativa, pois está ligada
à esfera do consumo e mesmo do lazer familiar. Das tarefas
tradicionalmente femininas, aquela que está em maior transforma-
ção é a confeção das refeições. Parece haver uma crescente
valorização dessa tarefa, em especial por parte dos homens mais
novos, até aos 29 anos (em que os níveis de participação
ascendem a 38%).
Comparando, no âmbito europeu, a percentagem de casais em
que os homens cozinham «sempre» ou «habitualmente» (sozinhos
ou em partilha), Portugal situa-se numa posição intermédia,
juntamente com outros países da Europa do Sul, Central e de
Leste (Figura 3.24). É na Suécia e na Dinamarca que os homens
mais assumem ou partilham a tarefa de cozinhar (entre 41% e
50% dos casais), seguindo-se França, Finlândia, Reino Unido e
Irlanda. O grupo de países onde os homens cozinham menos
reúne a Bélgica, a Croácia, a República Checa e a Eslováquia (entre
15% e 24% dos casais).
Figura 3.24 Homens que cozinham «sempre»ou «habitualmente» (sozinhos ou em casal), Europa, 2012 (%)
Figura 3.23 Divisão conjugal do trabalho doméstico, por tarefa, em Portugal, 2002 e 2014 (%)
Sempre ou habitualmente
o homem
Ambos Sempre ou habitualmente
a mulher
Fonte: Elaboração própria a partir de dados do ISSP 2002 e do ISSP 2012 – Módulos Família, Género e Mudança.
20142002
Quemfaz as
compras?
Quem trata daroupa?
Quemcozinha?
Fonte: Elaboração própria a partir de dados do ISSP 2012 – Módulos Família, Género e Mudança. Em Portugal os dados foram recolhidos em 2014.
6
16
78
7
70
23
3 7
90
1 5
94
7
53 40
9
40
51
15,5 - 24,2
24,3 - 32,9
33,0 - 41,5
41,6 - 49,3
PTES
FR
BE
DK
FI
DE
CZ
ATSI HR
SK
0 400Km
UK
SE
LVLT
PL
IE
44
BG
Conclusão
V
As expectativas, os valores e os comportamentos familiares
evoluíram de forma gradual e consistente desde o início do
seculo XXI. A década de 2000 veio acentuar as mudanças que já
se desenhavam nos anos noventa: um padrão mais uniforme de
vida familiar assente em famílias pequenas; uma diversidade mais
acentuada das formas de viver em família (apesar de se manter,
como predominante, a família de casal com filhos); conjugalida-
des cada vez menos formalizadas, assistindo-se a um aumento
contínuo das uniões de facto e dos nascimentos fora do
casamento; o aumento da divorcialidade e a queda da fecundida-
de.
O impacto da crise económica nestes indicadores é, também,
visível e significativo. O que mais se destaca é sobretudo o
aceleramento da queda da fecundidade a partir de 2010,
situando-se hoje Portugal no grupo restrito de países de fecundi-
dade «muito muito» baixa. Mas também encontramos uma
quebra acentuada na dimensão da família, como efeito provável
do envelhecimento da população e da queda da natalidade,
assim como o crescimento recente dos nascimentos sem
coabitação dos pais, que poderá estar relacionado com a emigra-
ção masculina em casais jovens ou com o difícil acesso a casa
própria em tempos de crise. O divórcio, pelo contrário, registou
nos últimos anos uma ligeira desaceleração. No contexto
europeu, Portugal situa-se no grupo de países com níveis
elevados de divórcio e uma informalização crescente das
relações conjugais.
No que diz respeito ao risco de pobreza económica nas
famílias com crianças, é importante sublinhar duas tendências.
Por um lado, o agravamento do risco de pobreza em famílias
com crianças a partir de 2009, ao contrário do que acontece em
famílias sem crianças, onde o risco de pobreza se mantém mais
ou menos estável. Em segundo lugar, o aumento acentuado do
risco de pobreza em famílias com descendências numerosas e
em famílias monoparentais. No contexto europeu, Portugal
situa-se no grupo de países que apresentam hoje as percenta-
gens mais elevadas de risco de pobreza em famílias com crianças.
Por último, a análise relativa à divisão familiar do trabalho
revela um movimento de fundo gradual em direção a um
modelo de família mais igualitária. Nas atitudes, uma menor
adesão a papéis de género assimétricos em que o homem é o
principal ganha-pão da família, cabendo à mulher a responsabili-
dade doméstica e, também, um menor desfasamento entre as
atitudes dos homens, há uma década bastante mais favoráveis ao
modelo assimétrico, e das mulheres. Nas práticas, o predomínio
de um modelo em que ambos os cônjuges participam a tempo
inteiro no mercado de trabalho, mantendo-se, no entanto, uma
disparidade de género em que os homens trabalham em média
mais duas horas semanais do que as mulheres, e uma crescente,
embora ainda muito desigual, partilha das tarefas domésticas.
No contexto europeu, Portugal apresenta um valor relativa-
mente reduzido de disparidade de género no trabalho pago e
ocupa uma posição intermédia no que diz respeito à participa-
ção dos homens nas tarefas domésticas.
De sublinhar, por fim, o impacto da crise económica na partici-
pação dos homens e das mulheres no mercado de trabalho. Por
um lado, quando trabalham, o aumento da carga horária para
ambos, entre 2010 e 2014, em praticamente uma hora. Por
outro, nos casais em que os dois são ativos, o aumento significa-
tivo das situações em que ambos estão desempregados ou em
que um trabalha a tempo inteiro e o outro está desempregado.
Reveladores do desemprego e da precariedade gerados pela
crise económica, estes dados apontam para mudanças na divisão
conjugal do trabalho que resultam sobretudo dos constrangi-
mentos do mercado de trabalho e não das opções das famílias.
referências bibliográficas
Cunha, V. 2014. «Quatro décadas de declínio da fecundidade em
Portugal». In INE/FFMS, Inquérito à Fecundidade 2013. Lisboa: INE,
19-28.
Delgado, A. e Wall, K. 2014. Famílias nos Censos 2011: Diversidade e
mudança. Lisboa: ICS. Imprensa de Ciências Sociais.
Rosa, M. J. V. 2012. O Envelhecimento da Sociedade Portuguesa.
Lisboa: FFMS/Relógio D'Água Editores.
Wall, K., Almeida, A. N., Vieira, M. M., Cunha, V., Rodrigues, L.,
Coelho, F., Leitão, M. e S. Atalaia. 2015. Impactos da Crise nas Crianças
Portuguesas: Indicadores, Políticas, Representações. Lisboa: ICS. Imprensa
de Ciências Sociais.
45
TRANSIÇÕES JUVENISEM PORTUGAL E NA EUROPA
PORTUGAL NO CONTEXTO EUROPEU EM ANOS DE CRISE4Jussara Rowland, Maria Manuel Vieira
Com o impacto da crise económica e financeira na Europa, assiste-se à situação paradoxal de nos confrontarmos atualmente com uma geração que, sendo embora a mais qualificada de sempre, enfrenta uma situação de precarização acentuada das suas condições de vida.
Ao longo das últimas décadas tem-se assistido, em toda a Europa, ao crescente alonga-
mento e complexificação dos processos de transição dos jovens para a vida adulta. As trajetó-
rias juvenis são atualmente marcadas por uma maior indeterminação, consequência de
mudanças sociais e económicas, mas também de alterações de crenças e de valores no seio
desta população (Alves et al., 2011).
Se a melhoria dos níveis de escolaridade é uma realidade entre os jovens, a precarização
das condições sociais e laborais dos jovens é um fenómeno igualmente estruturante da
condição juvenil atual, que tem vindo progressivamente a dificultar o acesso a condições de
independência económica e de real autonomização desta faixa etária (Pais e Ferreira, 2010).
Com o objetivo de melhor mapear tais fenómenos, este texto foca-se na análise de uma
seleção de indicadores-chave (de escolarização, de transição para o mercado de trabalho e de
autonomização), analisados quer do ponto de vista da sua evolução longitudinal (em Portugal
e na Europa) quer do ponto de vista sincrónico, comparando os vários países europeus num
dado momento específico. Mais concretamente, pretende-se retratar algumas especificidades
das realidades atuais dos jovens, não só do ponto de vista das suas condições objetivas, mas
também do ponto de vista das suas avaliações subjetivas, tendo neste caso como base
indicadores retirados de questionários à juventude aplicados recentemente na União Europeia.
Tendo em conta a sua pertinência no atual contexto económico, é dado especial enfoque
à perceção dos jovens em relação a questões relacionadas com a transição para o mercado de
trabalho, nomeadamente a sua avaliação sobre a adequação da formação escolar ao mundo
profissional, as suas principais preocupações em relação ao trabalho, ou a sua apetência para a
criação do seu próprio emprego. Por último, e de forma mais abrangente, é aferida a perceção
dos jovens sobre o seu grau de felicidade global.
47
Escolarização superior epercepções sobre a adequação daformação ao mundo do trabalho
I
Figura 4.1 Jovens adultos entre os 30 e os 34 anos com nível de educação terciário, Portugal e UE28, 2000-2014 (%)
Jovens na UE28
20
15
10
5
0
25
30
35
40
45
Jovens em Portugal
31,3
37,9
2000 2014
22,4
11,3
Os níveis de escolarização superior em Portugal têm vindo a
aumentar de forma progressiva ao longo das últimas décadas
(Figura 4.1). Em 2000, apenas 11,3% dos jovens adultos entre
os 30 e 34 anos tinham completado algum grau de ensino
superior (bacharelato, licenciatura, mestrado ou doutoramento),
quando, no mesmo ano, 22,4% dos jovens adultos da União
Europeia já possuíam um diploma do superior. Nos dois casos
assistimos, ao longo dos últimos 14 anos, a um aumento
considerável destes valores: na ordem de mais 15,5% para a
média dos países da UE e, no caso Português, de mais 20%. De
facto, em 2014 quase um terço (31,3%) dos residentes em
Portugal com idades compreendidas entre os 30 e os 34 anos
tinha completado um grau de ensino superior.
Apesar do aumento rápido e considerável da proporção de
jovens adultos com ensino superior em Portugal, o país apresen-
ta ainda valores relativamente baixos por comparação com
outros países europeus. Em 2014, na União Europeia, 37,9%
dos jovens entre os 30 e os 34 anos tinham obtido este nível de
ensino, bastante acima dos valores portugueses. Em termos
comparativos, na UE28 (Figura 4.2), apenas Itália (23,9%),
Roménia (25,0%), Malta (26,6%), Eslováquia (26,9%), Repúbli-
ca Checa (28,2%) e Bulgária (30,9%), apresentam uma percen-
tagem de jovens adultos com educação terciária inferior à dos
portugueses. No extremo oposto encontram-se países como
Lituânia (53,3%), Luxemburgo (52,7%), Chipre (52,5%),
Irlanda (52,2%) e Suécia (49,9%), que apresentam a maior
percentagem de jovens com diplomas de nível superior.
Portugal, no entanto, destaca-se por estar entre os países que
no período de referência mais aumentaram o seu número de
jovens adultos com ensino superior. Neste grupo, apenas
Luxemburgo (+31,5%), Polónia (+29,6%), Irlanda (+24,7%),
Eslovénia (+22,5%), República de Chipre (+21,4%) e Letónia
(+21,3%) superaram Portugal no crescimento de diplomados
com nível de educação terciária.
Fonte: Eurostat
Figura 4.2 Jovens adultos entre os 30 e os 34 anos com nível de educação terciário, UE28, por países, 2014 (%)
Fonte: Eurostat
PTES
FR
BELU
NL
DK
FI
IT
CY
DE
CZ
ATSI HR
HU
SK
IE
23,9 - 30,3
30,4 - 40,0
40,1 - 49,7
49,8 - 54,3
0 400Km
UK
SE EE
LVLT
PL
EL
BG
RO
48
Portugal UE28
62,971,8
51,153,3
54,756,3
45,74,8
< 15 anos
16-19 anos
>20 anos
ainda a estudar a tempo inteiro
Os jovens que abandonaramprecocemente os estudos (até aos15 anos) são bastante mais críticosem relação à escola do que osrestantes.
A perceção dos jovens quanto à adequação da formação recebi-
da ao mundo do trabalho varia tendo em conta o seu percurso
escolar (Figura 4.3). De facto, os jovens que abandonaram preco-
cemente os estudos (até aos 15 anos) são bastante mais críticos
em relação à escola do que os restantes: apenas 45,7% dos
jovens europeus inseridos neste grupo declaram considerar a
educação recebida adaptada ao mundo do trabalho, valor que
desce significativamente para 4,8% no caso dos jovens com níveis
de escolaridade homóloga a viver em Portugal. Entre os jovens
com percursos escolares mais longos, a maioria considera que a
educação recebida nas instituições de ensino está adaptada ao
mundo do trabalho. Ainda assim, é de relevar que uma percenta-
gem considerável de jovens a viver na União Europeia indica
considerar que a escola, instituições de formação ou universidade
não se encontram bem adaptadas às necessidades do atual mundo
do trabalho. Os jovens que ainda estão a estudar (em Portugal e
na UE) e que, por isso, na sua maioria ainda não tiveram de se
confrontar com o mundo do trabalho, têm uma avaliação mais
positiva sobre a adequação da formação escolar ao mundo
profissional (71,8% em Portugal e 62,9% na Europa).
No que se refere à avaliação desta questão nos diferentes países
da União Europeia (Figura 4.4), verifica-se que os jovens dos
países do norte da Europa – Holanda (85,1%), Finlândia (81,8%),
Bélgica (81,4%), Alemanha (79,3%), Áustria (77,9%), Irlanda
(77%), Suécia (75,6%), Reino Unido (75,2%) e Dinamarca
(72,7%) – são quem faz uma avaliação mais positiva sobre a
adequação da educação no seu país ao mercado de trabalho. Por
seu turno, são sobretudo os jovens dos países do sul da Europa e
da Europa do Leste quem faz uma avaliação menos positiva:
Grécia (19%), Espanha (25,8%), Bulgária (35,5%), Eslovénia
(36,1%), Roménia (37,4%) e Itália (38,4%). Portugal destaca-se
por apresentar uma avaliação relativamente positiva por parte dos
jovens em relação a esta questão (para 57,6% dos seus jovens a
educação recebida está bem adaptada ao atual mundo do
trabalho) face a outros países com situações económicas e laborais
similares (nomeadamente Grécia, Espanha e Itália).
Figura 4.4 Jovens entre os 16 e os 30 anos quedeclaram que no seu país a educação recebida quanto
à formação, à escola e à universidade está bemadaptada ao atual mundo do trabalho, UE28,
Fonte: Eurobarómetro 395 European Youth
Fonte: Eurobarómetro 395 European Youthpor países, 2014 (%)
Figura 4.3 Jovens entre os 16 e os 30 anos quedeclaram que no seu país a educação recebida quanto
à formação, à escola e à universidade está bemadaptada ao atual mundo do trabalho, segundoa idade que tinham quando deixaram de estudar
a tempo inteiro, Portugal e UE28, 2014 (%)
PTES
FR
BELU
NL
DK
FI
IT
CY
DE
CZ
ATSI HR
HU
SK
IE
19,0 - 35,6
35,7 - 52,4
52,5 - 69,2
69,3 - 86,1
0 400Km
UK
SE EE
LVLT
PL
EL
BG
RO
49
Inserções no mercado de trabalho:realidades e preocupações
IIOs dados em Portugal evidenciama progressiva dificuldade deinserção laboral dos jovens aolongo da última década e meia.
O indicador relativo às taxas de emprego de recém-diplomados
refere-se às taxas de emprego de jovens entre os 20 e os 34 anos,
empregados, que tenham atingido pelo menos o nível secundário
de escolaridade (ISCED 3) e completado a sua formação há pelo
menos três anos. Esta taxa permite apurar as dificuldades de
inserção dos jovens no mercado de trabalho uma vez terminada a
sua formação escolar (secundária ou superior). Os dados em
Portugal evidenciam a progressiva dificuldade de inserção laboral
dos jovens ao longo da última década e meia (Figura 4.5). De facto,
em 2000 a taxa de emprego de recém-diplomados situava-se em
valores em torno dos 90%, tendo baixado ao longo dos primeiros
anos da década para estabilizar em torno dos 82%. No entanto,
com a crise económica e o aumento do desemprego essa situação
alterou-se, sofrendo uma acentuada quebra a partir de 2010 e
apresentando o seu valor mais baixo em 2012 quando esta taxa se
fixou nos 67,5%. Desde esse ano assistimos a uma ligeira melho-
ria: em 2014 o valor ascende a 69,4%. Comparativamente com a
evolução da média da União Europeia (apenas disponível a partir
de 2006), constata-se que os valores em Portugal mantêm-se
sempre relativamente próximos até 2012, ano em que a taxa de
emprego dos recém-diplomados desce consideravelmente em
Portugal, contrastando com a estabilidade demonstrada pela
média da União Europeia.
Esta média esconde, no entanto, uma grande pluralidade de
situações (Figura 4.6). Grécia (43,2%), Itália (45,0%), Croácia
(62,0%), Espanha (65,1%), Bulgária (65,4%), Roménia (66,2%) e
República de Chipre (68,7%) têm taxas de emprego de recém-di-
plomados mais baixas do que Portugal, sendo que os valores da
Grécia e da Itália se destacam por evidenciarem a grave dificuldade
que os jovens têm atualmente em inserir-se profissionalmente no
mercado de trabalho nestes países. No espectro contrário verifica-
mos que Suécia (85,0%), Áustria (87,2%), Holanda (86,2%),
Alemanha (90,0%) e Malta (93,0%) são os países onde os jovens
têm mais facilidade em encontrar emprego após terminada a sua
formação escolar.
Entre os estudantes da União Europeia com idades
compreendidas entre os 15 e os 30 anos a principal
preocupação em relação ao trabalho futuro prende-se
com a natureza do vínculo do contrato (Figura 4.8). De
facto, para 31,1% dos jovens «não conseguir um
trabalho estável ou um contrato de longa duração» é o
maior receio manifestado. Por ordem decrescente, as
outras preocupações assinaladas pelos jovens são «ter de
se deslocar para encontrar trabalho» (15,8%), «não ter
as competências ou os conhecimentos adequados»
(12,7%) e o «nível salarial» (12,7%). Por sua vez, 19,5%
dos jovens estudantes declaram não ter preocupações
em relação a encontrar trabalho.
Em Portugal os valores estão próximos da média da
UE28 em relação ao receio de não encontrar «trabalho
estável ou contrato a longo termo» (32,2%) e um pouco
mais baixos em relação a «ter de se deslocar para encon-
trar trabalho» (11,2%) e a «não ter as competências ou
os conhecimentos adequados» (8,4%). Portugal
destaca-se, no entanto, por apresentar valores bastante
mais elevados do que a média da União Europeia no que
toca à preocupação com o «nível salarial» (21,7% vs.
12,7%), o que estará relacionado com os baixos salários
praticados no país, sobretudo em início de carreira.
No âmbito europeu, a principal preocupação dos
jovens estudantes – «não encontrar trabalho estável ou
contrato a longo termo» – assume proporções mais
elevadas em Itália, onde mais de metade dos seus jovens
estudantes indica ter esse receio (52,5%), seguida, com
alguma distância, pela Espanha com 43,1% (Figura 4.7).
Os países onde os jovens referem menos essa preocu-
pação (face a outras) situam-se no Leste e do Norte da
Europa, em particular Estónia (3,9%), Lituânia (15,6%),
Bulgária (15,9%) e Letónia (15,9%).
50
UE28
Portugal
Não encontrar um contrato a longo
termo ou um trabalho estável
Não ter as competências ou os conhecimentos
necessários
Ter de se deslocar para
encontrar um trabalho
O nível salarial Outro
19,5
Não tenhopreocupações
17,5
8,2
9,1
12,7
21,7
15,8
11,2
12,7
8,4
31,1
32,2
Fonte: Eurostat
Figura 4.5 Taxas de emprego dos jovens entre os 20 e os 34 anos recém-diplomados, Portugal e UE28, 2000-2014 (%)
Figura 4.8 Jovens estudantes entre os 15 e os 30 anos, segundo a sua principal preocupação em relação a encontrar um trabalho, Portugal e UE28, 2014 (%) Fonte: Eurobarómetro 408
Figura 4.6 Taxas de emprego dos jovens entre os 20 e os 34 anos recém-diplomados, UE28, por países, 2014 (%)
Fonte: Eurostat
Figura 4.7 Jovens estudantes entre os 15 e os 30 anos que declararam que a sua principal preocupação em relação a encontrar um trabalho é não conseguir um contrato a longo termo ou um trabalho estável, UE28, por países, 2014 (%)
Fonte: Eurobarómetro 408
44,3 - 56,4
56,5 - 69,4
69,5 - 81,4
81,5 - 94,0
PTES
CY
FR
BELU
NL
DK
FI
IT
DE
CZ
ATSI HR
HU
SK
0 400Km
UK
SE EE
LVLT
PL
BG
RO
EL
IE
3,9 - 16,2
16,3 - 28,6
28,7 - 41,0
41,1 - 53,5
PTES
CY
FR
BELU
NL
DK
FI
IT
DE
CZ
ATSI HR
HU
SK
0 400Km
UK
SE EE
LVLT
PL
BG
RO
EL
IE
69,4
76,0União Europeia 2890,7
Portugal
2000
2014
78,9
2006
2014
51
Desemprego e propensão parao empreendedorismo
III
A progressiva dificuldade de inserção profissional dos jovens
diplomados no mercado de trabalho deve ser contextualizada no
fenómeno mais abrangente do aumento das taxas de desempre-
go na União Europeia nos últimos anos. Em Portugal, o aumento
do desemprego, em parte como consequência da crise econó-
mica, foi particularmente sentido por parte da população mais
jovem, tendo atingindo, em 2013, o valor de 28,9% entre os
indivíduos dos 15 aos 29 anos (Figura 4.9). Em comparação com
a média da União Europeia, Portugal tinha, no início do século,
taxas de desemprego jovem muito mais baixas (6,2% vs.
14,8%). O crescimento do desemprego jovem foi no entanto
aumentando de forma progressiva, distanciando-se consideravel-
mente dos valores da UE a partir de 2011. Em 2014 a taxa de
desemprego da população com idades compreendidas entre os
15 e os 29 anos fixava-se em 25,4% em Portugal, bem acima
dos 17,7% registados na UE28. Ao longo do mesmo período de
referência, a taxa de desemprego jovem para a média da União
Europeia manteve-se mais constante, tendo no entanto também
aumentado a partir de 2011, chegando a valores próximos dos
19% em 2013.
No interior da União Europeia sempre existiram situações
muito diversificadas em relação ao desemprego juvenil. A crise,
contudo, veio agravar essas diferenças, tendo os valores
mantido-se relativamente baixos em alguns países – Alemanha
(6,9%), Áustria (8,9%) e Malta (8,9%), países que em 2014
tinham uma taxa de desemprego jovem com valores abaixo dos
10% – e aumentado drasticamente em alguns casos, nomeada-
mente no sul da Europa e em alguns países de Leste (Figura
4.10). Em 2014, entre os países com mais altas taxas de desem-
prego jovem, a Grécia apresentava a situação mais preocupante
com uma taxa de desemprego de 45% nos jovens entre os 15 e
os 29 anos, seguida da Espanha (39,7%), Croácia (32,3%), Itália
(31,6%), República de Chipre (26,2%) e Portugal. Com o
aumento do desemprego entre os jovens que tem emergido em
Portugal, como noutros países afetados pela crise, um
discurso de responsabilização do jovem desempregado
pela situação em que se encontra, alimentado pelo
crescente incentivo a práticas de criação do próprio
emprego e pelo pressuposto de que Portugal tem baixos
níveis de empreendedorismo. Uma questão do Euroba-
rómetro em que se avalia o posicionamento dos jovens
em relação à hipótese de criação do seu próprio negócio
vem no entanto evidenciar que os jovens portugueses
apresentam valores muito próximos da média dos jovens
na UE28 (Figura 4.12). De facto em 2014, 5,7% dos
jovens portugueses já tinha criado uma empresa (contra
5,1% dos jovens da UE), 16,7% gostaria de criar uma
empresa nos próximos anos, 30,2% gostaria de vir a
abrir uma empresa, mas consideravam que era demasia-
do difícil e 2,9% tentára abrir uma empresa, mas desisti-
ram por ser demasiado difícil. Menos de metade dos
jovens portugueses indicava não querer abrir uma
empresa (44,5%), quando a média para os jovens da
União Europeia era bastante superior (53,1%).
Ao analisar a percentagem de jovens que declara não
querer abrir uma empresa nos diferentes países da União
Europeia, verifica-se que é nos países de Leste e no Sul
da Europa que os jovens menos repudiam a hipótese de
montar o seu próprio negócio (Figura 4.11). Apenas
18,7% dos jovens búlgaros, 25,5% dos jovens letões,
28,5% dos jovens croatas, 30,1% dos jovens lituanos e
31,1% dos jovens romenos afirmam não o querer fazer.
Os países do Sul da Europa, como Itália (35,5%), Grécia
(36,1%), Chipre (36,2%), Portugal (44,5%) e Espanha
(48,3%), apresentam também valores bastante abaixo
da média europeia em relação a esta questão.
Em contracorrente encontramos os países que
oferecem aos jovens uma situação laboral mais estável
e/ou mais apoios sociais. Em países como Alemanha
(73%), Holanda (70,9%), Áustria (68,3%), Dinamarca
(62,2%), Reino Unido (61,2%), Finlândia (60,6%) e
Suécia (59,9%) existe uma menor propensão para o
empreendedorismo entre as faixas mais jovens da
população, posição que é muito possivelmente incenti-
vada pelas condições laborais satisfatórias que o mercado
de trabalho oferece nesses países à grande maioria da
população jovem.
52
Figura 4.12 Jovens entre os 16 e os 30 anos segundo a sua posição face à hipótese de criaçãode uma empresa, Portugal e UE28, 2014 (%)
UE28
Portugal
Criou uma empresa
Pretende criar uma empresa nos próximos
anos
Gostaria de criar uma empresa, mas acha que é demasiado difícil
Tentou criar uma empresa, mas desistiu porque era
demasiado difícilNão quer criar uma empresa
5,1
5,7
2,5
2,9
22,2
30,2
17,1
16,7
53,1
44,5
Fonte: Eurobarómetro 395 European Youth
Fonte: Eurobarómetro 395 European Youth
Figura 4.10 Taxas de desemprego jovem (dos 15 aos 29 anos),UE28, por países, 2014 (%)
Figura 4.11 Jovens entre os 16 e os 30 anos que declaram não querer criar uma empresa, UE28, por países, 2014 (%)
Fonte: Eurostat
Figura 4.9 Taxa de desemprego jovem (dos 15 aos 29 anos), Portugal e UE28, 2014 (%) Fonte: Eurostat
6,5 - 14,9
15,0 - 24,9
25,0 - 34,9
35,0 - 46,0
PTES
CY
FR
BELU
NL
DK
FI
IT
DE
CZ
ATSI HR
HU
SK
0 400Km
UK
SE EE
LVLT
PL
BG
RO
EL
IE
18,7 - 32,4
32,5 - 46,2
46,3 - 60,0
60,1 - 74,0
PTES
CY
FR
BELU
NL
DK
FI
IT
DE
CZ
ATSI HR
HU
SK
0 400Km
UK
SE EE
LVLT
PL
BG
RO
EL
IE
Portugal2014
6,2
25,4
2000
17,7União Europeia 2814,8
2000
201418,9
28,9
13,3
12,0
(2008)
(2013)
53
Autonomizaçãoe perceções de felicidade
IV
O aumento dos níveis de escolarização e, em particular,
o crescimento do número de jovens a frequentar o ensino
superior, a crise económica, as dificuldades de inserção no
mercado de trabalho e o crescimento do desemprego,
sobretudo junto das faixas mais jovens, têm tido impacto
também na capacidade e na possibilidade de autonomiza-
ção, nomeadamente residencial, dos jovens. Portugal,
como vários outros países do sul da Europa, apresenta,
tradicionalmente, uma idade mais tardia de saída de casa dos
pais. Em comparação com a média da União Europeia
verifica-se que em 2000 os jovens portugueses saíam de
casa dos pais em média aos 28,2 anos, quando na UE a
idade média era de 25,4 (Figura 4.13). Entre 2000 e 2013
assistimos, na UE e em Portugal, a uma tendência de
aumento desta idade média. No caso europeu, essa idade
elevou-se para os 26,1 anos, ao passo que em Portugal ela
ascende aos 29 anos.
Também no que se refere à idade média de saída de casa
dos pais o espaço europeu apresenta fortes contrastes
(Figura 4.14). Os países escandinavos destacam-se por
serem aqueles onde os jovens se autonomizam mais cedo
do agregado doméstico de origem, nomeadamente a
Suécia (19,6), a Dinamarca (21) e a Finlândia (21,9). Esta
autonomização precoce dos jovens nestes países prende-se
com questões culturais, mas é certamente também favore-
cida pelos apoios oferecidos pelo Estado aos jovens no
momento da transição para o ensino superior. Por contras-
te, os jovens dos países do Sul e do Leste da Europa tendem
a sair de casa dos pais em idades muito mais tardias: em
Portugal (29), Espanha (28,9), Grécia (29,3) e Itália (29,9) os
jovens tendem a sair de casa dos pais já perto dos 30 anos;
idêntico padrão regista-se em países como a Bulgária (29,2),
Polónia (28,7) Roménia (28,5) e Eslovénia (28,8).
Finalmente, observa-se ainda um grupo de países em que
os jovens saem de casa já depois de ultrapassar os 30 anos:
são eles Malta (30,1), Eslováquia (30,7) e Croácia (31,9).
Quando questionados sobre o seu grau de felicidade
(numa escala de 1 a 10), constata-se que a média de respos-
tas dos jovens residentes em Portugal tende a ser próxima
da média europeia, ainda que esta última seja mais constan-
te ao longo dos anos do que o que se verifica em Portugal
(Figura 4.16). Uma análise longitudinal ao longo de 10 anos
sugere o impacto que a crise económica (e os problemas
sociais e laborais que daí advêm) parece ter na perceção de
felicidade dos jovens em Portugal. Se no início do século
essa perceção atingia os 7,7 entre os jovens portugueses
(acima da média europeia), em 2004 e em 2012 esse valor
sofre uma quebra acentuada (para 7,1), muito possivelmen-
te na sequência dos efeitos da recessão económica de 2003
e do plano de resgate económico implementado em 2011.
A estabilidade da média dos valores europeus durante esse
período pode explicar-se, pelo menos em parte, pela
ausência, neste grupo em análise, de países como a Grécia
e a Itália, onde os impactos da crise sobre a juventude
fizeram sentir-se com particular acuidade.
Em relação ao ano para o qual dispomos de dados mais
recentes (2012), verificamos que os países europeus onde
os jovens declaram ser mais felizes são a Dinamarca (8,4), a
Noruega (8,3), a Finlândia (8,2), a Suíça (8,1) e a Holanda
(8,1), todos eles países com um nível de vida elevado e que
não foram tão afetados pela crise económica (Figura 4.15).
Ainda assim é de notar que a perceção de felicidade por
parte dos jovens não está sempre necessariamente associa-
da às condições económicas e laborais do país. De facto, se
em Portugal (7,1), Irlanda (7,2) e Itália (7,2), países afetados
fortemente pelo desemprego jovem, os valores de
perceção de felicidade são relativamente baixos, suplantan-
do apenas os valores médios apurados junto dos jovens dos
países da Europa de Leste, como a Bulgária (6,4), a Hungria
(6,8) e a Ucrânia (6,9), já a Espanha, país com taxas de
desemprego jovem entre as mais altas da União Europeia,
destaca-se por ter perceções de felicidade mais próximas
das do Norte da Europa (7,9).
54
29,0
União Europeia 28
25,4
Portugal2000
2013
28,2
2000
2013
26,1
28,8
26,4
Europa
Portugal
7,7 7,5 7,6 7,7 7,8 7,7
7,6
2002
7,1 7,3 7,6 7,5 7,1
20122010200820062004
Figura 4.14 Idade média estimada de saída dos jovens de casa dos pais, UE28, por países, 2013 (anos)
Figura 4.15 Perceção de felicidade dos jovens entre os 15 e os 29 anos, na Europa, por países, 2012 (média) Fonte: European Social Survey, Ronda 6Fonte: Eurostat
(2004)
(2008)
Figura 4.13 Idade média estimada de saída dos jovens de casa dos pais, Portugal e UE28, 2000-2013 (anos) Fonte: Eurostat
Figura 4.16 Perceção de felicidade dos jovens entre os 15 e os 29 anos, Portugal e Europa, 2002-2012 (média)Para esta análise foram tidos em conta apenas os países europeus que participaram em todas as rondas do European Social Survey: Bélgica, Suíça, Alemanha, Dinamarca, Espanha, França,Finlândia, Hungria, Irlanda, Reino Unido, Holanda, Noruega, Polónia, Suécia, Portugal e Eslovénia.
Fonte: European Social Survey, Ronda 1-6
19,6 - 22,1
22,2 - 24,8
24,9 - 27,4
27,5 - 30,1
PTES
CY
FR
BELU
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ATSI HR
HU
SK
0 400Km
UK
SE EE
LVLT
PL
BG
RO
EL
IE
6,4 - 6,8
6,9 - 7,3
7,4 - 7,8
7,9 - 8,5
PTES
CY
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BELU
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FI
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CZ
SIHU
SK
0 400Km
UK
SE EE
LT
PL
BG
IE30,2 - 32,9
IS
NO
CH
UA
55
O aumento dos níves deescolarização, a crise económicae o crescimento do desempregotêm tido impacto na capacidadede autonomização dos jovens.
ESCOLARIZAÇÃO
EMPREGO RECÉM-DIPLOMADOS
DESEMPREGO
AUTONOMIZAÇÃO RESIDENCIAL
AVAL
IAÇÕ
ES S
UBJ
ETIV
AS
CON
DIÇ
ÕES
OBJ
ETIV
AS
ADEQUAÇÃO DA FORMAÇÃO AO MERCADO DE
TRABALHO
PREOCUPAÇÕESEM RELAÇÃO AENCONTRAR
UM TRABALHO
PROPENSÃO AO EMPREENDEDORISMO
PERCEPÇÃO DE FELICIDADE
56
Conclusão
V Em Portugal, a população jovemestá fortemente vulnerável aosefeitos da crise económica.
Os elevados níveis de qualificação representam um
atributo genérico da população jovem que vive na União
Europeia. A percentagem de jovens adultos com diploma
superior não tem parado de crescer ao longo do tempo e
Portugal, neste domínio, tem registado uma notável aproxi-
mação à média europeia.
Se os dados da escolarização dos jovens na União
Europeia revelam uma tendência positiva, já a análise de
outros indicadores evidencia algumas das dificuldades com
que a população jovem se tem vindo a debater nos últimos
anos, agravadas pelo impacto da recente crise económica.
E comprova a sua incidência diversa no espaço europeu,
marcado por duas realidades com contornos bem distintos:
a dos países do Sul e do Leste, por um lado, e a dos países
do Norte e Centro, por outro.
Observando elementos-chave para a autonomização dos
jovens, como sejam o acesso ao emprego, constatam-se de
facto fortíssimas assimetrias no espaço europeu. Os impac-
tos da crise atingem de forma particularmente intensa a
população jovem que vive em países como a Grécia,
Espanha, Itália, Croácia, Chipre, Roménia e Bulgária,
refletidos quer na diminuição das taxas de emprego, quer no
aumento das taxas de desemprego aí observados. Por
contraste, em países como a Suécia, Áustria, Alemanha,
Holanda e Malta os jovens estão mais salvaguardados desses
efeitos, uma vez que encontram mais facilidade em obter
emprego após concluídos os estudos. Talvez por isso, e
pelos apoios sociais de que usufruem, a propensão para o
empreendedorismo junto dos jovens destes e de outros
países do centro da Europa revela-se bem menor do que
entre os jovens que vivem em países mais afetados do
ponto de vista económico.
Portugal inscreve-se no primeiro contingente de países,
com a população jovem fortemente vulnerável aos efeitos
da crise económica. Não obstante, em todos os países
europeus, ricos ou pobres, a ameaça de precariedade nas
relações laborais constitui preocupação comum aos
jovens – ainda que mais acentuada entre os que vivem
em países com economias mais débeis.
A escassez de apoios sociais, aliada a uma conjuntura
económica desfavorável e a fatores culturais mais
impregnantes, estarão na origem de um retardamento
da saída de casa dos pais por parte dos jovens que
residem nos países do Sul, mas também do Leste
europeu. Portugal não é exceção. As elevadas idades
médias estimadas para a saída de casa dos pais revelam
acrescidas dificuldades de autonomização, nomeada-
mente residenciais, que se oferecem aos jovens.
Este conjunto de bloqueamentos às transições juvenis,
nomeadamente em países como Portugal, não deixa de
ter reflexos na perceção de felicidade manifestada pelos
mais novos: em tempos de crise, o seu grau de felicidade
diminui.
referências bibliográficas
Alves, N. A., Cantante, F., Baptista, I. e Carmo R. M. 2011,
Jovens em Transições Precárias. Trabalho, Quotidiano e Futuro.
Lisboa: Mundos Sociais.
Pais, J. M., Ferreira, V. S. (Eds.). 2010. Tempos e transições
de vida: Portugal ao espelho da Europa. Lisboa: ICS.
57
CONFIANÇA
PORTUGAL NO CONTEXTO EUROPEU EM ANOS DE CRISE5
Porque confiamos uns nos outros ou nas instituições que regulam o nosso quotidiano? Quais são as implicações que daí advêm para a formação dos futuros cidadãos e para o funcionamento da sociedade? As pessoas mais confiantes são mais felizes?
Ana Delicado, Alice Ramos, José Gomes Ferreira,João Guerra, Jussara Rowland
Estes são apenas alguns exemplos de perguntas que têm preocupado cientistas sociais de
diferentes áreas, e que nem sempre conseguiram obter uma resposta conclusiva. De acordo
com Putnam (2000), uma sociedade caracterizada pela reciprocidade generalizada é mais
eficiente do que uma sociedade onde reina a desconfiança: a confiança é um lubrificante da
vida social que funciona como um facilitador de relações, sejam elas interpessoais ou institucio-
nais. A confiança permite delegar e, quer se trate de um grupo de amigos, de uma família, de
uma empresa ou da governação de um país, confiar que estamos todos a trabalhar para um
mesmo objetivo simplifica as regras e reduz o conflito. A confiança está associada aos valores
do universalismo e à preocupação com o bem-estar da humanidade, à abertura a diferentes
formas de pensar e de viver. A confiança gera empatia e a empatia também é social. Contudo,
a confiança é um sentimento difícil de conquistar e talvez aquele que, uma vez perdido, mais
difícil é de recuperar. Em todos os inquéritos europeus nos quais a confiança é tema, os
portugueses destacam-se consistentemente pela desconfiança manifestada. Seja no plano
individual, seja no institucional, os portugueses tendem a não confiar. Porquê? Sociólogos,
psicólogos sociais, cientistas políticos, filósofos, têm procurado responder a esta pergunta.
Tendo-se encontrado regularidades (por exemplo, baixos níveis de escolaridade, de bem-es-
tar, de perceção de controlo sobre a vida ou de participação cívica estão associados a baixos
níveis de confiança), ainda estão por encontrar os fatores que explicam por que razão os
cidadãos dos países nórdicos apresentam os níveis mais altos de confiança e os portugueses
(juntamente com cidadãos dos ex-países de Leste) os mais baixos. Vejamos, então, qual o
panorama da confiança em Portugal e na Europa.
59
Figura 5.1 Confiança interpessoal na Europa, 2012 (média)
Figura 5.4 Confiança na polícia, 2012 (média) Figura 5.5 Confiança no sistema legal, 2012 (média)
Figura 5.3 Confiança na política e nos políticos, 2012 (média)Figura 5.2 Confiança no parlamento nacional, 2012 (média)Fonte: European Social Survey
Fonte: European Social Survey
Fonte: European Social Survey
Fonte: European Social SurveyFonte: European Social Survey
IS
PTES
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CY
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CZ
CHSI
HU
SK
IE
0 400Km
UK
SE EE
LT
UA
PL
BG
NO
1,8 - 3,0
3,1 - 4,4
4,5 - 5,8
5,9 - 7,3
PTES
CY
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BE
CH
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SIHU
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0 400Km
UK
SE EE
LT
PL
BG
IE
IS
UA
NO
1,8 - 2,8
2,9 - 3,9
4,0 - 5,0
5,1 - 6,3
3,6 - 4,5
4,6 - 5,6
5,7 - 6,6
6,7 - 7,8
PTES
CY
FR
BE
CH
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FI
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CZ
SIHU
SK
0 400Km
UK
SE EE
LT
PL
BG
IS
UA
NO
2,0 - 3,6
3,7 - 5,4
5,5 - 7,2
7,3 - 9,1
PTES
CY
FR
BE
CH
NL
DK
FI
IT
DE
CZ
SIHU
SK
0 400Km
UK
SE EE
LT
PL
BG
IS
UA
NO
1,9 - 3,5
3,6 - 5,2
5,3 - 6,9
7,0 - 8,7
PTES
CY
FR
BELU
CH
NL
DK
FI
IT
DE
CZ
SIHU
SK
0 400Km
UK
SE EE
LT
PL
BG
IS
UA
NO
IE IE
60
Confiança interpessoal
I
Confiança nas instituições
II
Portugal, Polónia, Ucrânia,Eslováquia e Bulgária são os paísesonde se regista uma clara falta deconfiança interpessoal.
A confiança interpessoal foi medida através de três
perguntas, que foram posteriormente agregadas num
índice. As perguntas fazem parte do European Social
Survey e são as seguintes:
1) De uma forma geral, acha que todo o cuidado é
pouco quando se lida com as pessoas ou acha que se pode
confiar na maioria das pessoas?
2) Acha que a maior parte das pessoas tentam aprovei-
tar-se de si sempre que podem, ou pensa que a maior
parte das pessoas são honestas?
3) Acha que, na maior parte das vezes, as pessoas estão
preocupadas com elas próprias ou acha que tentam ajudar
os outros?
As respostas eram dadas numa escala de 0 a 10, em que 0
representa a atitude menos confiante e 10 a mais confiante.
A Figura 5.1 mostra Portugal, a Polónia, a Ucrânia, a
Eslováquia e a Bulgária como os países onde se registam
valores abaixo do ponto médio da escala (5), indicativos de
clara falta de confiança. Os países nórdicos (Islândia,
Noruega, Suécia e Finlândia) são, em contrapartida,
aqueles em que se observam níveis mais elevados de
confiança interpessoal, apresentando, juntamente com a
Holanda e a Suíça, valores sistematicamente acima do
ponto médio da escala (5), indicativos de franca confiança.
Os países do centro da Europa (a que se junta a Espanha)
registam valores intermédios de confiança.
A par da confiança interpessoal foi também perguntado o grau de
confiança que um número alargado de instituições inspirava nos
inquiridos. As instituições foram as seguintes: parlamento nacional,
sistema legal, polícia, políticos e política. A análise da confiança nas
instituições revela contrastes e semelhanças muito interessantes
entre os vários países europeus (Figuras 5.2 a 5.5).
Antes de mais podemos ver como, de uma forma geral, o padrão
de confiança por conjunto de países se mantém relativamente ao
observado no caso da confiança interpessoal, sendo os nórdicos os
que mais confiam também nas instituições e Portugal e os antigos
países de Leste os que menos confiam. A confiança, seja em
pessoas ou em instituições, parece, assim, ter alicerces comuns.
No que se refere a contrastes, o maior será talvez a diferença que
separa a polícia da política (e dos políticos). Em todos os países é
manifesta a confiança na polícia, e mesmo não estando Portugal
entre os países com valores mais elevados também aqui a confiança
na polícia supera os níveis de confiança nas restantes instituições.
No extremo oposto encontramos dois alvos de avaliação dificilmen-
te dissociáveis, a classe política e a política. O descrédito é generali-
zado. Mesmo nos países nórdicos, o valor máximo de confiança
situa-se apenas um ponto acima da média da escala. Apesar de
também se tratar de uma instituição do foro político, o parlamento
nacional regista níveis de confiança superiores. Possivelmente, o
parlamento é avaliado como uma instituição estável e fundamental
do sistema democrático. Os políticos (e a política) têm um impacto
muito mais direto na vida das pessoas, ficando por isso mais vulnerá-
veis a serem associados a medidas concretas (cortes nas remunera-
ções, desemprego, etc.) e alvo de generalizações de casos mediáti-
cos (em Portugal os exemplos de José Sócrates e de Miguel Relvas,
na Holanda a recente situação de envolvimento do ministro da
justiça Ivo Opstelten com um barão da droga). Note-se ainda que
só no caso da confiança nas instituições Portugal se assemelha aos
países de Leste. O sistema legal é igualmente das instituições mais
credíveis, sendo apenas alvo de desconfiança maioritária na Ucrânia
e na Bulgária, aliás os dois únicos países que estão sistematicamente
entre os que menos confiam, seja nas pessoas seja nas instituições.
61
5,3
4,1
5,15,35,15,15,1
4,24,24,2 4,34,2
3,53,53,84,03,94,4
4,33,7 3,8 3,5
2,92,5
1,82,02,42,52,12,8
Confiança interpessoal
Confiança na polícia
Confiança no sistema legal
Confiança no parlamento
Confiança na política enos políticos
2002 2004 2006 2008 2010 2012
2002 2004 2006 2008 2010 2012
Figura 5.7 Confiança nas fontes de informação ambiental, 2014 (média - %) Fonte: Special Eurobarometer 416, 2014
Figura 5.8 Confiança na televisão como fonte de informação ambiental, 2014 (%) Fonte: Special Eurobarometer 416, 2014
Figura 5.6 Confiança nas Instituições em Portugal, 2002-2012 (média) Fonte: European Social Survey
PTES
CY
FR
BELU
NL
DK
FI
IT
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CZ
SIHUSK
IE
0 400Km
UK
SE EE
LT
PL
BG
HR RO
EL
LV
AT
PTES
CY
FR
BELU
NL
DK
FI
IT
DE
CZ
SIHUSK
IE
0 400Km
UK
SE EE
LT
PL
BG
HR RO
EL
LV
AT
62
<13,5
13,5 - 15,0
15,1 - 16,5
16,6 - 18,0
>18,0
<25
25 - 35
36 - 45
46 - 55
>55
Evolução da confiançaem Portugal
III
Confiança nas fontes deinformação ambiental
IV
No período 2002-2012, apenas aconfiança na polícia aumentouligeiramente, tendo a confiança noparlamento sofrido a maior quebra.
Os dados do European Social Survey permitem-nos
ainda ter uma perspetiva da evolução da confiança nas
cinco dimensões anteriormente analisadas. Na Figura 5.6
podemos ver como a confiança é, apesar de tudo, um
fenómeno relativamente estável. Em 2002 a confiança
na política e nos políticos ocupava a posição mais baixa,
enquanto os níveis de confiança nas restantes instituições
e nas pessoas partilhavam valores igualmente baixos,
apesar de tudo próximos do ponto médio da escala. A
partir de 2006, esta separação começa a diluir-se com a
descida generalizada dos níveis de confiança, tendência
que se mantém observável até 2012. Comparando os
dados de 2012 com os de 2002, apenas a confiança na
polícia aumentou ligeiramente, tendo a confiança no
parlamento sido a que maior queda registou (em 2002 a
média era de 4,5, em 2012 passou para 2,5).
Considerando que a confiança está relacionada com a
perceção, por um lado, de que as pessoas são honestas
e se preocupam umas com as outras e, por outro, de
que as instituições servem os cidadãos defendendo os
seus direitos e os seus interesses, esta quebra de uma
confiança já de si baixa não será certamente alheia ao
clima socioeconómico que o país vive desde 2008 e às
consequências diretas no dia a dia dos portugueses. Mas
só um estudo aprofundado poderá levantar o véu que
cobre as razões desta possível associação.
No domínio ambiental, a dimensão da confiança está
geralmente associada nos inquéritos de opinião a uma
pluralidade de atores, entre os quais têm particular
destaque os atores políticos (governos, instâncias
supranacionais), as organizações de sociedade civil
(organizações não governamentais de ambiente, associa-
ções de consumidores) e os meios de comunicação
social, sobretudo no seu papel como fontes de informa-
ção fidedigna.
Tomando o mais recente Eurobarómetro sobre
questões ambientais como referência (Special Eurobaro-
meter 416, 2014), verifica-se que em termos médios
(quando consideradas as 17 variáveis – ver Figura 5.9),
tal como nos indicadores anteriores, Portugal revela
índices de confiança mais baixos do que os seus congé-
neres europeus (Figura 5.7). É também notória uma
clivagem Norte-Centro-Sul e Este-Oeste: as taxas de
confiança mais elevadas registam-se nos países nórdicos,
as intermédias no centro da Europa e as mais baixas no
Sul e no Leste. Os países nórdicos, em conjunto com a
Áustria, o Chipre e a Holanda, lideram o índice geral de
confiança (todos superiores a 18%). A uma grande
distância surge Portugal que, a par da Roménia, Letónia,
Itália e Hungria, não ultrapassam os 15%.
No entanto, este padrão inverte-se quando se isola a
televisão como fonte de informação ambiental (a fonte
mais frequentemente mencionada em Portugal, como
abaixo se verá) (Figura 5.8). É substancialmente maior a
confiança na televisão em Portugal e nos países do Leste
(com destaque para a Roménia e a Bulgária; são estes
três países, aliás, os únicos a ultrapassar a fasquia dos
55% de confiança na televisão entre os 28 Estados-
-membros) e tende a decrescer à medida que se
caminha para o centro e para o norte da Europa.
63
26
60
47
27
27
televisão ONGA
30
33
27
25
36
UniãoEuropeia
cientistasautoridades locais/regionais
empresasgovernos nacionais
Figura 5.10 Confiança nas fontes de informação ambiental em Portugal, 2002-2014 (%)Fonte: Special Eurobarometer 58.0 (2002), 62.1 (2004), 68.2 (2007), 75.2 (2011), 416 (2014)
34
40
37
12
25
19
13
18
8
7
10
12
6
6
6
2
3
60
33
33
19
16
16
12
11
8
7
6
5
4
2
2
2
4
21
7
6
13
25
4
2
2
2
3
5
2
5
4
14
23
33
26
26
17
23
7
8
12
22
Figura 5.9 Confiança nas fontes de informação ambiental em Portugal e na UE28, 2014 (%) Fonte: Special Eurobarometer 416, 2014
TELEVISÃO
CIENTISTAS
ONGA
INTERNET REDES SOCIAIS
PROFESSORES
JORNAIS
ONG INTERNACIONAIS
ASSOC. CONSUMIDORES
REVISTAS
UNIÃO EUROPEIA
FAMÍLIA, AMIGOS, VIZINHOS...
RÁDIO
PARTIDOS AMBIENTALISTAS
GOVERNO NACIONAL
GOVERNOS REGIONAIS
EMPRESAS
SINDICATOS
2014
2011
2007
2004
2002
UE28 PORTUGAL
64
Conclusão
IV
referências bibliográficas
Comparando os níveis de confiança nos diferentes
agentes (Figura 5.9), verifica-se que a televisão tem
particular destaque em Portugal (60%, face a 34% na
UE), enquanto na União Europeia se registam taxas mais
elevadas de confiança nos cientistas (40% face a 33% em
Portugal) e nas ONGA (37% face a 33%). Portugal
destaca-se também pela maior confiança nos professo-
res (19% face a 12%). Segundo o mesmo inquérito, as
fontes de informação ambiental a que os portugueses
mais recorrem são a televisão (81%), a Internet e as
redes sociais (38%), os jornais (25%) e os filmes e
documentários na televisão (21%).
Por fim, em termos longitudinais (Figura 5.10), apesar
de uma alteração na forma como a pergunta é formulada
nos inquéritos a partir de 2014 ², é notório o crescimen-
to da confiança na televisão, sobretudo a partir de 2007,
e nos cientistas, a que estará associado o substancial
esforço de divulgação da ciência que se faz em Portugal
nos últimos anos (Delicado 2006). Há também que
considerar que os cientistas se têm tornado figuras mais
conhecidas do público, com uma presença assídua nos
noticiários televisivos (Schmidt 2008: 101), por vezes
mesmo em representação de ONGA. Ao contrário do
que sucede noutros países, a cobertura mediática da
ciência (por exemplo, no caso das alterações climáticas
analisado por Ramos e Carvalho 2008) tende a
representar mais o consenso e a solidez do conhecimen-
to científico do que as divergências e as incertezas.
Verifica-se também alguma oscilação da confiança nas
ONGA (decréscimo entre 2004 e 2007, subida desde
então) e o declínio acentuado da confiança no governo e
nas autoridades locais, que poderá estar associado ao
desinvestimento estatal no ambiente, como visto no
capítulo 2, e à generalizada falta de confiança no sistema
político, acima registada. As empresas suscitam níveis de
confiança sistematicamente baixos e com tendência de
descida.
Apesar da multidimensionalidade do conceito de confiança aqui
utilizado, que se aplica tanto aos outros (interpessoal) como às institui-
ções políticas e às fontes de informação, uma regularidade é notória:
Portugal encontra-se sempre no grupo de países onde os níveis de
confiança são mais baixos. Os dados longitudinais mostram que esta
tendência está longe de se atenuar com o tempo. Em lugar de se
aproximar dos países do centro da Europa, Portugal assemelha-se
crescentemente a congéneres improváveis a Leste, os países com um
passado de regimes comunistas. Se em alguns indicadores a divisão
Norte-Sul se mantém (confiança no parlamento, nos políticos, no
sistema legal), noutros os nossos usuais parceiros Espanha e Itália
aproximam-se mais da média europeia (confiança interpessoal,
confiança na polícia). No domínio ambiental, é de certa forma preocu-
pante a ascensão da confiança na televisão, um meio particularmente
sujeito a manipulações e a interesses (em que o agenda setting é muito
orientado para a maximização das audiências), face à estagnação da
confiança em cientistas e nas ONGA e a uma descrença quase total nos
políticos e nas empresas.
Se a estrutura da sociedade portuguesa, em particular os baixos
níveis de escolaridade, pode em parte explicar a prevalência da descon-
fiança em todos estes domínios, não estão ainda identificadas com
clareza as causas (e as consequências) deste atavismo cultural nacional.
² Até 2011, a pergunta referia-se a «confiança quanto a assuntos ambientais», a partir de 2014 refere-se a «confiança no fornecimento de informação fiável sobre assuntos ambientais», apesar de as opções de resposta se terem mantido e a pergunta sempre ter sido feita na sequência de outra pergunta sobre informação ambiental.
Delicado, A. 2006. «A promoção da cultura científica nos museus em
Portugal», Sociologia Problemas e Práticas, n.º 51, 53-72.
Putnam, R. D. 2000. Bowling alone: The collapse and revival of American
democracy. New York: Simon and Schuster.
Ramos, R. e Carvalho, A. 2008. «Science as rhetoric in media discourses
on climate change». In J. Strunck, L. Holmgreen, & L. Dam (Eds.), Rhetorical
aspects of discourse in present-day society. Cambridge: Cambridge Scholars
Publishing, 223-247.
Schmidt, L. 2008. «Comunicar a ciência: o papel dos media e os
problemas científico-ambientais», in L. Schmidt e J. Pina Cabral, Ciência e
cidadania: homenagem a Bento de Jesus Caraça, Lisboa: Imprensa de Ciências
Sociais, 85-112.65
MÉDIA EUROPEIA ou da UNIÃO EUROPEIA
IENB TM EAPreocupação
com o ambiente
Abastecimento público de água
Satisfação com a democracia
IENB TM EA
Perceção do desempenho nacional
NTUE DV EUJ
Jovens com nível de escolarização terciário
ÍLM IAAFFamílias
monoparentais
Qual a posição relativa de Portugalface a outros países europeus?
CRO ACM IE AD
Drenagem de águas residenciais
Separação doméstica de resíduos
MÍLIAAF
Dimensão média das famílias
Nascimentos fora do casamento
Rácio entre casamentos e divórcios
Acima da média
Abaixo da média
Risco de pobreza nas famílias com crianças
Casais que trabalham ambos a tempo inteiro
Horas semanais de trabalho
TN UE DV EUJ
Taxa de desemprego
Idade média de saída de casa dos pais
Índice de fecundidade
Confiança interpessoal
Qualidade da democracia
Avaliação da justiça social
Confiança nas instituições políticas
Despesa pública
Taxa de reciclagem de resíduos urbanos
Confiança nas fontes de informação ambiental
Taxas de emprego dos recém-diplomados
Perceção de felicidade dos jovens
(2010-14)
66
COMENTÁRIO FINAL
PORTUGAL NO CONTEXTO EUROPEU EM ANOS DE CRISE6
Qual a posição relativa de Portugal face a outros países europeus? De que países europeus nos aproximamos mais? Estamos a convergir ou a divergir em relação à média comunitária? Estas são as três questões a partir das quais serão organizados os resultados mais relevantes apresen-tados nos capítulos anteriores.
Os vários capítulos destacaram as principais conclusões a ressaltar em cada um dos
domínios analisados. Uma visão de conjunto permite agora responder de forma mais global às
questões subjacentes a todos eles:
i) Numa perspetiva sincrónica e comparada, que posição relativa ocupa hoje Portugal no
contexto da Europa e da UE28 e quais os países com que apresenta maiores semelhanças?
ii) Numa ótica longitudinal, está Portugal a convergir ou a divergir em relação à média
comunitária?
A resposta a estas questões pressupõe uma outra: em que medida a evolução recente
do país foi influenciada pelo contexto de crise e pelas consequentes medidas de austeridade
que se fazem sentir desde 2009?
Os resultados respeitantes a cada um dos temas abordados, e dentro deles relativos aos
diversos indicadores considerados, mostram que não existe uma resposta linear e inequívoca
para qualquer das questões colocadas.
Qual a posição relativa de Portugal face a outros países europeus?
Para os indicadores suscetíveis de serem ordenados numa escala linear positivo/negativo,
Portugal tende a ocupar uma posição média-baixa, isto é, com valores inferiores à média
europeia ou da União Europeia ainda assim à frente de outros países com piores resultados.
Portugal distingue-se de forma positiva em aspetos pontuais, como sucede no domínio
Ambiente, especificamente com os indicadores relativos ao elevado grau de preocupação
com o ambiente ou à população servida por abastecimento público de água. Na situação
oposta, o país destaca-se negativamente sobretudo pelos baixos valores em relação a alguns
67
PORTUGAL
EUROPADO SUL
EUROPADO
LESTE
EUROPADO
NORTE
EUROPACENTRAL
indicadores de confiança (interpessoal; na política e nos políticos), à insatisfação
com o funcionamento da democracia e à taxa de desemprego juvenil.
Dos cinco domínios considerados – e embora a comparação deva ser
prudente, já que o tipo e o número de indicadores variam bastante – o da Família
salienta-se pelo facto de Portugal ocupar posições distantes da média em diversos
casos, como dimensão do agregado doméstico, o do total de nascimentos fora
do casamento e o rácio entre casamentos e divórcios (valores bastante superio-
res à média) ou o da percentagem de famílias monoparentais com filhos até aos
25 anos e o do índice sintético de fecundidade (ISF) (bem aquém da média).
De que países europeus nos aproximamos mais?
É habitual integrar Portugal no conjunto de países da Europa do Sul. No que
se refere a vários indicadores, é realçada nas secções anteriores a maior proximi-
dade em relação a esse conjunto e, secundariamente, aos países da Europa de
Leste. Contudo, uma leitura de pormenor mostra que existem exceções
significativas a esta tendência geral, que, aliás, variam de domínio para domínio.
Embora com variações entre domínios, os países da Europa do Sul com
maior similitude global com Portugal parecem ser a Itália, a França, a Eslovénia e
Chipre. A Espanha destaca-se pela analogia quanto a alguns indicadores sobre
família (rácio casamento/divórcio, fecundidade, número de horas no trabalho
pago e não pago) e, de forma menos marcada, nos índices de confiança, mas,
curiosamente, apresenta poucas semelhanças no que concerne aos indicadores
sobre ambiente ou a alguns dos indicadores relativos às transições juvenis. A
Grécia ocupa uma posição próxima do nosso país no domínio da juventude e,
ainda, das atitudes face à qualidade da democracia.
No que se refere à Europa de Leste, a Polónia, a República Checa e alguns
países bálticos (sobretudo a Lituânia) revelam semelhanças significativas em
diversos domínios e indicadores.
Na generalidade, são os países da Europa Central e sobretudo da Europa do
Norte que tendem a apresentar resultados mais afastados, porque mais
positivos, de Portugal. Contudo, ocorrem convergências com alguns desses
países em subdomínios específicos, como sucede com os países nórdicos no que
se refere à divisão conjugal do trabalho pago (valor relativamente reduzido de
disparidade de género).
É, portanto, genericamente correto afirmar que Portugal se aproxima
bastante de outros países da Europa do Sul quanto a situações, perceções e
práticas sociais, mas esta afirmação não deve ocultar a existência de exceções em
ambos os sentidos: países meridionais do continente europeu que se distanciam
em aspetos relevantes (a Espanha, por exemplo) e outros, sobretudo do Leste,
que revelam semelhanças significativas com Portugal. Por outro lado, é necessá-
rio levar em conta que os resultados em comparação refletem uma análise
estática. A adoção de uma visão dinâmica permitirá um melhor entendimento
dos graus de semelhança e de diferença entre os diversos países europeus.
Portugal aproxima-se bastante de
outros países da Europa do Sul quanto a
situações, perceções e práticas sociais.
68
EUROPA
DRENAGEM DE ÁGUAS
RESIDENCIAIS
FAMÍLIAS EM RISCO DE POBREZA
ABASTECIMENTO DE ÁGUA
FERTILIDADEFERTILIDADE
DESEMPREGO JUVENIL
FELICIDADE JOVEM
DIVERGÊNCIA
CONVERGÊNCIA
HORAS SEMANAIS DE TRABALHO
RECICLAGEM
EDUCAÇÃO JUVENIL
TERCIÁRIA
Estamos a convergir ou a divergir em relação à médiacomunitária?
A diversidade de domínios e de indicadores levados em consideração não permite
uma resposta unívoca a esta questão. Há aspetos em que persiste uma tendência de
convergência (por exemplo, percentagem de jovens com 30-34 anos com nível de
educação terciário) ou até de superação dos valores médios da União Europeia
(práticas de separação de resíduos urbanos). Mas são diversos os indicadores que,
encontrando-se há vários anos numa trajetória de aproximação às respetivas médias
comunitárias, desaceleraram ou inverteram essa tendência em domínios tão distintos
como a produção de resíduos urbanos per capita ou a taxa de reciclagem, o desempre-
go juvenil ou a perceção de felicidade dos jovens, ou ainda o número de horas
semanais de trabalho a tempo inteiro. Os pontos de inflexão destes vários indicadores
tendem a situar-se entre 2009 e 2011 e são um claro reflexo da crise financeira e
económica iniciada em 2008 e das medidas de austeridade que daí decorreram.
O contexto de crise deteriorou situações (aumento do risco de pobreza em famílias
com crianças, por exemplo), alterou perceções (aumento dos graus de insatisfação e de
desconfiança) e práticas, nomeadamente por parte das famílias visando fazer face à
deterioração das condições materiais de vida e de prestação de alguns serviços públicos
(queda da fecundidade, alteração da divisão conjugal do trabalho remunerado, redução
do número de divórcios, etc.).
Nos anos de 2013 e 2014 verificaram-se sinais pontuais de desaceleração ou
mesmo de inversão em algumas tendências de divergência. Conforme foi sublinhado
nas secções anteriores, são múltiplas as razões que podem ter contribuído para este
tipo de comportamento, pelo que é prematuro concluir que se regressou de forma
sustentada a trajetórias de convergência com as médias comunitárias.
A evolução ocorrida nos últimos anos não decorreu apenas do efeito conjugado
de trajetórias históricas de convergência e dos efeitos da crise iniciada em 2008. Fatores
como os ciclos governativos ou até os ciclos de programação comunitária, ao definirem
opções políticas e investimentos prioritários distintos, podem ter igualmente uma
importância significativa nas situações, perceções e práticas analisadas, mesmo que as
suas consequências não se façam sentir de imediato.
O Portugal social está hoje certamente mais europeu do que no início do século.
No entanto, ao desacelerar ou interromper esse processo de convergência, a crise
financeira e económica colocou a nu várias das vulnerabilidades estruturais da socieda-
de portuguesa. Ao mesmo tempo, porém, permitiu identificar focos de resiliência e de
adaptação transformadora por parte dos cidadãos e das famílias. Num período que é
sem dúvida de charneira, os portugueses oscilam entre a insatisfação e a conscienciali-
zação, a desconfiança e o sentido crítico, o recurso a comportamentos reativos e a
emergência de novas práticas, a reversibilidade de tendências de convergência e a
capacidade de afirmar trajetórias sustentadas de desenvolvimento. Os próximos núme-
ros do Portugal Social em Mudança procurarão desvendar e compreender estas várias
tensões, atualizando a informação relativa aos domínios analisados e alargando o
âmbito de observação através da incorporação de novas áreas e de questões adicionais.
69
SOBRE O ICS-ULISBOA Observatórios ICS
Barómetro da Qualidade da Democraciawww.bqd.ics.ulisboa.pt
Observatório de Ambiente e Sociedadewww.observa.ics.ulisboa.pt
Observatório das Famílias e das Políticas de Famíliawww.observatoriofamilias.ics.ulisboa.pt
Observatório Permanente da Juventudewww.opj.ics.ulisboa.pt
Instituto do Envelhecimentowww.ienvelhecimento.ul.pt
O Instituto de Ciências Sociais da Universidade de Lisboa,
Laboratório Associado (ICS), é uma instituição universitária
consagrada à investigação e à formação avançada em ciências
sociais, reconhecida em Portugal e no estrangeiro pela
qualidade do seu desempenho. A investigação desenvolvida
no ICS é inovadora e interdisciplinar, resultando da combi-
nação virtuosa entre investigadores, projetos de investigação,
uma cultura científica caracterizada pela diversidade teórica e
metodológica e um compromisso com a sociedade. A principal
missão do ICS é contribuir para o conhecimento das
sociedades contemporâneas. Até 2020, a sua agenda de
investigação centrar-se-á em torno do tema: «Sociedades em
Mudança: Legados e Transformações», privilegiando três eixos
de investigação: Inclusão, Cidadania e Sustentabilidade. Parte
da investigação põe especial ênfase na realidade portuguesa e
nas sociedades e culturas com as quais Portugal mantém fortes
relações históricas, quer no espaço europeu quer noutros
espaços geográficos. A investigação individual e coletiva, a
participação num amplo conjunto de redes de pesquisa nacio-
nais e internacionais, o Centro de Estudos Avançados em
Ciências Sociais, o ensino pós-graduado diretamente articula-
do com a investigação, as atividades de outreach, nomeada-
mente através dos Observatórios, constituem as principais vias
de concretização desta missão.
www.ics.ulisboa.pt
UID/SOC/50013/2013
PORTUGAL SOCIAL EM MUDANÇA
Este é o primeiro número do Portugal Social em Mudança, uma
publicação regular do Instituto de Ciências Sociais da Universidade
de Lisboa (ICS-ULisboa) que tem por objetivo disponibilizar
informação sobre questões sociais numa ótica comparada e
longitudinal. Os vários temas selecionados procurarão situar
Portugal em contextos mais amplos, do ponto de vista tanto
geográfico como temporal, a partir de indicadores quer objetivos
(estatísticos) quer subjetivos (perceções, opiniões) relativos a
diferentes facetas da realidade social.