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JOÃO FERRÃO ANA DELICADO COORDENAÇÃO PORTUGAL NO CONTEXTO EUROPEU EM ANOS DE CRISE PORTUGAL SOCIAL EM MUDANÇA

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JOÃO FERRÃO

ANA DELICADO

COORDENAÇÃO

PORTUGAL NO CONTEXTO EUROPEU EM ANOS DE CRISE

PORTUGAL SOCIAL EM MUDANÇA

PORTUGAL NO CONTEXTO EUROPEU EM ANOS DE CRISE

2015

PORTUGAL SOCIAL EM MUDANÇA

PORTUGAL SOCIAL EM MUDANÇAFicha Técnica

Este é o primeiro número do Portugal Social em Mudança, uma

publicação regular do Instituto de Ciências Sociais da Universi-

dade de Lisboa (ICS-ULisboa) que tem por objetivo disponibilizar

informação sobre questões sociais numa ótica comparada e

longitudinal. Os vários temas selecionados procurarão situar

Portugal em contextos mais amplos, do ponto de vista tanto

geográfico como temporal, a partir de indicadores quer objetivos

(estatísticos) quer subjetivos (perceções, opiniões) relativos a

diferentes facetas da realidade social.

O Portugal Social em Mudança destina-se a um público não

especialista. A disponibilização de dados organizados, ilustrados

através de mapas e gráficos, analiticamente enquadrados e critica-

mente comentados é útil não só para decisores e técnicos de

diversas áreas profissionais, mas também para cidadãos

portugueses que desejam estar informados ou para estrangeiros

que procuram entender o nosso país mas que se confrontam com

a existência de informação dispersa e nem sempre de fácil acesso.

Esta publicação do ICS-ULisboa concretiza uma das suas

missões: a de disseminação de conhecimento junto de públicos

alargados, reforçando a ligação entre a universidade e a sociedade

e, por essa via, o impacte social das investigações realizadas. O

Instituto acolhe, aliás, diversos Observatórios cuja finalidade é

garantir, de forma continuada, que os resultados dos trabalhos

desenvolvidos possam ser utilizados para fins não académicos:

BQD – Barómetro da Qualidade da Democracia, OBSERVA –

Observatório de Ambiente, Território e Sociedade, OFAP – Obser-

vatório das Famílias e das Políticas de Família, OPJ – Obser-

vatório Permanente da Juventude e IE – Instituto do Envelhecimen-

to. Eles constituem a fonte principal, embora não exclusiva, dos

conteúdos dos vários números do Portugal Social em Mudança.

EdiçãoInstituto de Ciências Sociaisda Universidade de Lisboa

Av. Prof. Aníbal de Bettencourt, 91600-189 Lisboa-PortugalTelef. 21 780 47 00 - Fax 21 794 02 74

www.ics.ulisboa.pt

TítuloPortugal Social em MudançaPortugal no contexto europeuem anos de crise

CoordenaçãoJoão Ferrão e Ana Delicado

RevisãoVasco Grácio

Conceção GráficaJoão Pedro Silva

Impressão e apoio de paginaçãoGuideline, Lda

FotografiaSusana Paiva

Depósito Legal402090/15

ISBN978-972-671-362-3

Tiragem250 exemplares

1ª Edição, Dezembro 2015

7

9

19

31

47

67

59

PORTUGAL NO CONTEXTO EUROPEU EM ANOS DE CRISE

Introdução

DEMOCRACIAEkaterina GorbunovaEdalina SanchesMarina Costa Lobo

AMBIENTEJoão Guerra José Gomes FerreiraLuísa Schmidt

FAMÍLIASKarin WallVanessa CunhaLeonor RodriguesRita Correia

JUVENTUDEJussara RowlandMaria Manuel Vieira

CONFIANÇAAna DelicadoAlice RamosJosé Gomes FerreiraJoão GuerraJussara Rowland

Comentário Final

Introdução

PORTUGAL NO CONTEXTO EUROPEU EM ANOS DE CRISE

«Portugal no contexto europeu em anos de crise» foi o tema escolhi-

do para o presente Portugal Social em Mudança. A integração, em

1986, de Portugal na então Comunidade Europeia tornou inevitável a

comparação do nosso país com os restantes Estados-membros. A crise

financeira e económica iniciada em 2008, e as subsequentes políticas

de ajustamento baseadas em medidas de austeridade, renovaram a

necessidade de analisar e compreender a evolução de Portugal no

contexto europeu. Como nos posicionamos em relação a outros países

da União Europeia e da Europa em geral? Em que medida estamos a

convergir ou a divergir em relação à média comunitária? Qual o

impacto da crise nos resultados observados? Estas são as questões

básicas colocadas ao longo desta publicação em relação a diferentes

aspetos sociais.

Selecionaram-se para análise domínios relevantes para o futuro do

país, potencialmente sensíveis aos efeitos da atual crise e que traduzem

algumas das linhas de divulgação científica que têm vindo a ser prosse-

guidas no âmbito dos Observatórios: democracia, ambiente, família,

transições juvenis e confiança.

Os futuros números do Portugal Social em Mudança aprofundarão

alguns destes temas e incluirão novos aspetos, em função da relevância

social e política que tenham entretanto alcançado ou da existência de

nova informação. Independentemente dos conteúdos selecionados,

manter-se-ão a ótica comparada e longitudinal presente no atual

número e a ilustração através de mapas e de gráficos de leitura intuiti-

va por parte de não especialistas. Esperamos, assim, contribuir de

forma útil para todos os que pretendem conhecer melhor o Portugal

social neste primeiro quartel do século XXI.

7

Nota: os dados do Eurostat e do Eurobarómetro dizem respeito a países da União Europeia (UE). Os dados do European Social Survey e do International Social Survey Programme referem-se aos países europeus participantes, que podem, ou não, ser membros da UE; nestes casos, os valores relativos a Portugal não incluem as Regiões Autónomas.

A SATISFAÇÃO COM A DEMOCRACIAEkaterina Gorbunova, Edalina Sanches, Marina Costa Lobo

PORTUGAL NO CONTEXTO EUROPEU EM ANOS DE CRISE1

Esta secção pretende fornecer um breve retrato do estado da democra-cia em Portugal, situando-a no contexto europeu. As perceções dos cidadãos sobre a democracia são o foco desta secção e serão analisadas numa perspetiva comparada e longitudinal.

A qualidade da democracia assumiu uma crescente centralidade nas sociedades de hoje e

ocupa um lugar de destaque na academia e na agenda pública. Especialmente desde o início

da terceira vaga de democratização (1974), um conjunto significativo de projetos internacio-

nais, tem analisado a «saúde» das democracias numa perspetiva global, através da monitoriza-

ção das perceções dos cidadãos sobre o funcionamento da democracia nos seus países e da

avaliação das várias dimensões dos regimes democráticos.

Estudos recentes sobre as atitudes dos cidadãos europeus em relação à democracia indicam

que estes mantêm níveis elevados de adesão aos valores e aos princípios democráticos, mas

que estão cada vez mais insatisfeitos com o funcionamento da democracia. Este desencanta-

mento poderá estar relacionado com diferenças entre as expectativas dos cidadãos e o

desempenho democrático dos governos (Norris, 2011), mas também dever-se ao facto de

os cidadãos possuírem diferentes entendimentos sobre o significado de democracia (Ceka e

Magalhães, 2014; Ferrin e Kriesi, 2014). Por outro lado, a avaliação da qualidade da democra-

cia por especialistas demonstra que, em termos agregados, a Europa apresenta níveis

elevados de democraticidade, ainda que persistam diferenças importantes entre países: no

norte da Europa estão as democracias com mais qualidade, enquanto no sul e no leste se

situam as que enfrentam mais desafios.

Portugal é um dos países europeus com níveis de satisfação com a democracia mais baixos

(Magalhães, 2009), um sentimento relativamente transversal aos grupos sociais. Em contra-

partida, os valores pós-materialistas e as avaliações de curto prazo (nomeadamente, sobre o

desempenho da economia e do governo) ganham terreno enquanto fatores explicativos da

satisfação dos cidadãos com a democracia (Teixeira et al., 2014). De acordo com as

avaliações de especialistas, a qualidade da democracia portuguesa registou recuos importantes

em matéria de governação e de soberania (Lobo, Jalali e Silva, 2013). 9

I

Satisfação com a democracia:os cidadãos portugueses no contexto europeu

A Figura 1.1 ilustra em que medida os cidadãos europeus estão

satisfeitos com o funcionamento da democracia no seu país, com

base numa escala em que 0 corresponde a «extremamente

insatisfeito(a)» e 10 a «extremamente satisfeito(a)». Neste

indicador, que capta o apoio específico ao regime democrático,

os cidadãos residentes nos países do norte da Europa (Dinamarca,

Noruega e Suécia) e também na Suíça destacam-se na medida em

que têm os níveis mais elevados de satisfação. Seguem-se os

cidadãos da Europa Ocidental (Holanda, Alemanha, Bélgica, Reino

Unido e França, entre outros) e, por último, os da Europa do Sul,

Central e de Leste, que são os mais críticos em relação ao funcio-

namento da democracia nos seus países.

Portugal integra o grupo de países cujos cidadãos se revelam

mais insatisfeitos, e esta é uma tendência que se tem vindo a

agravar. Os dados da Figura 1.2 revelam que durante a última

década a proporção de insatisfeitos aumentou significativamente.

A situação em Portugal é concomitante com o agravamento da

crise económica e financeira, que no curto prazo teve consequên-

cias negativas na qualidade de vida dos cidadãos. Contudo, vale a

pena salientar que mesmo antes da crise os níveis de satisfação

com a democracia eram muito baixos (Pinto et al., 2012).

A investigação em ciência política tem avançado com explica-

ções tanto no âmbinto micro (cidadãos) como macro (países) para

explicar a qualidade da democracia nas democracias avançadas

europeias. Neste texto iremos apresentar alguns dados que

remetem para três grandes hipóteses. Em primeiro lugar, a

hipótese de que cidadãos de países com melhores índices de

qualidade democrática estão mais satisfeitos com a democracia;

em segundo lugar, a hipótese de que o grau de satisfação com a

democracia está correlacionado com avaliações subjetivas e

objetivas do desempenho do governo em áreas políticas

fundamentais; e, finalmente, a hipótese de que a satisfação com a

democracia é mais elevada em sociedades com melhores índices

de desenvolvimento humano e maior acesso ao conhecimento. Fonte: European Social Survey, 6.ª vaga, 2012

Figura 1.2 Satisfação com o funcionamentoda democracia em Portugal (média)

2002

6,0

2004

2006

2008

2010

2012M

édia ESS

4,1

3,5

3,9

4,6

3,4

4,2

5,04,03,0

Figura 1.1 Satisfação com o funcionamentoda democracia na Europa, 2012 (média)

Fonte: European Social Survey, 6.ª vaga, 2012-2013

PTES

CY

FR

BE

NL

DK

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FI

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CZ

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0 400Km

UK

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LT

PL

BG

AL

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10

<4,0

4,0 - 4,9

5,0 - 5,9

6,0 - 7,0

>7,0

II

Satisfação com a democraciae a qualidade da democracia dos países

A Figura 1.3 apresenta os valores do Economist Democracy

Index (EDI) sobre a qualidade da democracia na Europa em

2014. Este índice resulta de uma avaliação, por um painel de

especialistas, da qualidade da democracia em cinco grandes

áreas – processo eleitoral e pluralismo; liberdades cívicas; funcio-

namento do governo; participação política; cultura política –

numa escala de 0 a 10. Consoante o seu posicionamento no

ranking da revista The Economist, os países são agrupados nas

seguintes categorias: democracias plenas, democracias imperfei-

tas, regimes híbridos e regimes autoritários.

Verifica-se que há uma variação importante nos países

europeus que surgem classificados neste índice. Os países

nórdicos registam os valores mais altos, mantendo a tendência

de anos anteriores, enquanto os países da Europa Ocidental

apresentam um declínio nas suas pontuações médias desde a

primeira edição do EDI (2006). A queda acentuada dos níveis de

participação política, os problemas quanto ao funcionamento do

governo e as restrições às liberdades cívicas têm estado na

origem do declínio da qualidade da democracia em algumas das

democracias europeias mais consolidadas (por exemplo, a

França). Para países como Portugal, mas também para Grécia,

Itália, Espanha e Irlanda, estes fenómenos têm sido acompanha-

dos pela crise económica e financeira na zona euro, que colocou

grandes desafios tanto à soberania do Estado como à capacidade

de responsabilização democrática por parte dos cidadãos aos

governos destes países.

Na Europa de Leste – onde a idade média das democracias é

mais baixa e onde existe um clima generalizado de insatisfação

com a democracia – a qualidade da democracia tem vindo a

recuar desde 2006. Hoje, a região não tem uma única «demo-

cracia plena». Em alguns dos países mais desenvolvidos desta

região, como a República Checa e a Eslovénia, a crescente

instabilidade política tem contribuído para a queda da sua

posição no ranking do EDI.

<6 >86-8DEMOCRACIA

COMPLETADEMOCRACIAIMPERFEITA

REGIME HÍBRIDO

Figura 1.4 A qualidade da democraciaem Portugal, 2006-2014 (média)

Fonte: Democracy Index 2014: Democracy andits discontents, The Economist Intelligence Unit

Fonte: Democracy Index 2006-2014, The Economist Intelligence Unit

Figura 1.3 A qualidade das democraciaseuropeias, 2014 (média)

2006 8,2

2008 8,1

2010 8,0

2011 7,8

2012 7,9

2013 7,7

2014 7,8

PTES

CY

FR

BELU

NL

DK

NO

FI

IT

DE

CZ

ATSI HR

HU

SK

CH

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IS

0 400Km

UK

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PL

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BG

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RO

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DEM

OCR

ACIA

IMPE

RFEI

TA

11

<6,0

6,0 - 6,9

7,0 - 7,9

8,0 - 9,5

>9,5

A satisfação com a democraciaem função dos seus resultados

III

Em Portugal, a crise económica e financeira coincidiu

com uma quebra na avaliação por parte dos especialistas

sobre a qualidade do regime (ver Figura 1.4). Nessa figura,

apresentamos uma perspetiva longitudinal da evolução da

qualidade da democracia em Portugal, segundo o índice da

EDI. Verificamos que o país vem sendo avaliado como

«democracia imperfeita» desde 2011, devido a recuos em

matéria de funcionamento do governo, de participação

política (em 2011) e de cultura política (desde 2013). Em

2013 o país registou a sua pontuação mais baixa de

sempre. Note-se, no entanto, que a pontuação global

melhorou desde a conclusão do programa de resgate

financeiro em 2014.

Tendo em conta os valores deste índice, iremos agora

correlacioná-lo com o nível de satisfação dos cidadãos com

a democracia. Como demonstra a Figura 1. 5, existe uma

correlação significativa entre a qualidade da democracia

num país e o grau de satisfação dos cidadãos com o funcio-

namento da democracia. Ou seja, os cidadãos europeus

estão alinhados em larga medida com os especialistas na

avaliação que fazem da qualidade do seu regime político.

Mesmo assim, há casos de países – nomeadamente

Espanha, Portugal, Itália e Eslovénia onde a satisfação com

a democracia por parte dos cidadãos é substancialmente

inferior quando comparada com a de países – como

França, Estónia, Lituânia e República Checa – que foram

classificados com valores muito próximos no ranking da EDI

(em torno de 8 pontos numa escala de 0 a 10). Pelo

contrário, Finlândia, Dinamarca e Suíça são países em que

o nível de satisfação com a democracia é tendencialmente

maior do que faria prever a qualidade destas democracias

medida pelo mesmo índice. Existe pois uma forte associa-

ção entre qualidade da democracia e a forma como os

cidadãos a percecionam, mas existem países que fogem a

esta regra. Portugal faz parte desses países, juntamente

com outros que têm vivido uma grave crise económica,

nomeadamente Espanha, Grécia e Itália, cujos cidadãos se

revelam relativamente insatisfeitos com a democracia.

Desde 2011, Portugal tem vindoa ser avaliado como «democraciaimperfeita». Em 2013 o paísregistou a sua pontuação mais baixa de sempre.

Sabendo que a democracia tem várias dimensões, que aspetos

– princípios, processos ou resultados – terão um maior impacto

na sua avaliação por parte dos cidadãos? Vários estudos sugerem

que os cidadãos mais satisfeitos com os resultados da democra-

cia em áreas políticas fundamentais estão mais satisfeitos com o

seu funcionamento. Iremos pois brevemente abordar a segunda

grande hipótese testada na bibliografia da especialidade, a saber,

que a satisfação com a democracia é em parte explicada pelos

seus resultados.

Propomos fazê-lo utilizando para o efeito dados recolhidos na

sexta vaga do European Social Survey, que incluiu um módulo

especial sobre significados da democracia que permite testar esta

premissa. Neste módulo foi pedido aos cidadãos que avaliassem

a importância de um conjunto de elementos para a definição de

um regime como democrático e, de seguida, que avaliassem o

desempenho dos seus países em relação a esses mesmos

elementos. A figura 1.7 apresenta a média das avaliações dos

cidadãos europeus nas quatro dimensões consideradas, numa

escala de 0 (avaliação negativa) a 10 (avaliação positiva): direitos

e liberdades (tribunais equitativos, proteção dos direitos das

minorias e liberdade de imprensa), processo eleitoral (eleições

livres e justas, opções programáticas claras dos partidos, partici-

pação no debate político, responsabilização dos governos

através de eleições e direito de oposição), controlo popular

(justificação das decisões dos governos perante os cidadãos e os

referendos) e justiça social (proteção contra a pobreza e redução

das desigualdades).

Os resultados que se apresentam na Figura 1.7 demonstram

que, na grande maioria dos países europeus, os elementos

associados ao processo eleitoral e, logo depois, aos direitos e

liberdades, são os que suscitam melhores avaliações por parte da

população. Em contrapartida, os principais desafios das demo-

cracias europeias parecem estar relacionados com o controlo

popular e a justiça social. Com efeito, estas foram as dimensões

da democracia que receberam as avaliações mais baixas na

generalidade dos países.12

CY CZ

FR

UK

BEDE

NL

FL

DKNO

SE

CH

LT

EE

IEIS

UA

AL

BG

SL

PT

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4

5

6

7

8

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1 2 3 4 5 6 7

4

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0,700 0,750 0,800 0,850 0,900 0,950

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PT

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Indice de Desenvolvimento Humano (UNDP)

4

5

6

7

8

3

0,00 5,00 10,00 15,00 20,00 30,0025,00

UA

SL

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PTIT

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Taxa de desemprego (Banco Mundial)

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Figura 1.5 Correlação entre a satisfação com a democraciae a qualidade da democracia na Europa, 2012 (média)

Figura 1.6 Satisfação com a democraciae justiça social na Europa, 2012 (média)

Figura 1.7 A avaliação da democracia por parte dos cidadãos europeus, 2012 (média)

Figura 1.8 Satisfação com a democracia, de acordo com o Índice de Desenvolvimento Humano e a Taxa de Desemprego na Europa, 2012 (média)

Fonte: European Social Survey (ESS), 6.ª vaga, 2012

.

Satis

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Índice da qualidade da democracia (Economist)

R2 = 0,87R2 = 0,701

R2 = 0,582 R2 = 0,369

13

0

5

10

15

20

25

30

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VÁQUIA (SK)

CHIPRE (

CY)

FRANÇA (F

R)

ESPA

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HUNGRIA (HU)

ESLO

VÉNIA (S

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REPÚBLIC

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PORTUGAL (

PT)

ESTÓNIA (E

E)

ALBÂNIA (A

L)

BULGÁRIA (B

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DINAMARCA (D

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56 6 6

56

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5

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66

6 6 66

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4 4 3 44

4

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5 45

5 5 6 45

7 67 7 7

2

33 2

33

3

3

33

3

4 43 3

54

55

4

6

66

6 6 6

Direitos e liberdades

Controlo popular

Processo eleitoral

Justiça Social

A satisfação com a democraciae a modernização

IVO processo eleitoral e os direitose liberdades são as dimensõesque suscitam melhor avaliação porparte da população na grandemaioria dos países europeus.

O facto de a justiça social recolher as avaliações mais

negativas é importante na medida em que dá conta de

uma discrepância entre as expectativas democráticas

dos cidadãos e o desempenho dos respetivos

governos. A Figura 1.6 apresenta precisamente a

correlação entre a avaliação que os cidadãos fazem de

alguns elementos de justiça social (proteção contra a

pobreza e redução das desigualdades) e a satisfação

com a democracia. Verificamos que esta é uma

correlação positiva e significativa. Em linha com

contribuições recentes (Ceka e Magalhães 2014, Ferrin

e Kriesi 2014), é possível afirmar que para o cidadão

europeu a democracia não se resume apenas aos

direitos e aos procedimentos democráticos liberais, já

que inclui também uma componente de justiça social, o

que implica a satisfação de necessidades básicas em

matéria de saúde, emprego, educação, segurança

social, entre outras.

Para ilustrarmos este ponto, escolhemos dois

indicadores que fornecem uma aproximação ao nível

de justiça social do país, a saber, o Índice de Desenvol-

vimento Humano e a Taxa de Desemprego. Na Figura

1.8 apresentamos as correlações entre estes indicado-

res, respetivamente, e a satisfação com a democracia,

verificando-se em larga medida as relações esperadas.

Por último, analisemos as explicações segundo as quais o grau de

satisfação com a democracia resulta de mudanças a longo prazo no

acesso ao conhecimento, que aqui medimos pelo aumento dos

níveis de escolaridade. Inúmeros estudos demonstram existir um

forte impacto da educação nas atitudes relativamente à democracia,

postulando que o desenvolvimento económico é acompanhado

pelo aumento dos níveis de literacia, os quais, por sua vez,

contribuem para o desenvolvimento das competências, dos conhe-

cimentos e das capacidades cívicas dos cidadãos. É expectável que

os cidadãos com maiores níveis de escolarização tendam a apresen-

tar maior interesse e maior ativismo político. O que podemos

esperar então das atitudes dos mais escolarizados relativamente à

democracia? É o tema que iremos abordar nesta parte.

A Figura 1.9 revela que na Europa, segundo os dados do

European Social Survey, o grau de escolaridade e a satisfação com

o funcionamento da democracia estão positivamente correlaciona-

dos entre si, isto é, os cidadãos de ensino superior tendem a avaliar

a democracia do seu país mais positivamente do que os menos

escolarizados. Estes resultados corroboram vários estudos que

encontraram uma relação positiva entre o apoio específico dos

cidadãos ao regime democrático e os seus níveis de escolaridade.

Esta correlação positiva confirma-se mesmo quando utilizamos

indicadores semelhantes mas medidos no âmbito do país. O

Knowledge Economy Index (KEI), um índice elaborado pelo Banco

Mundial, permite-nos uma aproximação, na medida em que reflete

a capacidade de um país gerar, adotar e difundir o conhecimento e

usá-lo de forma eficaz para o desenvolvimento económico. O KEI

é composto por quatro pilares da economia do conhecimento:

ambiente económico e quadro institucional; educação e recursos

humanos; sistemas de inovação; e tecnologias de informação e de

comunicação. Como revela a Figura 1.10, os cidadãos dos países

que fazem uma aposta mais forte no papel do conhecimento – e,

consequentemente, da educação, da inovação e das novas tecnolo-

gias de informação e de comunicação – estão bastante mais satisfei-

tos com o funcionamento da sua democracia.

14

Figura 1.9 Satisfação com a democracia, por nível de educação, na Europa 2012 (média)

nenhum, ensino primárioensino secundárioensino superior

BULGÁRIA (BG)

ESLOVÉNIA (SI)

UCRÂNIA (UA)

ITÁLIA (IT)

ALBÂNIA (AL)

ESPANHA (ES)

HUNGRIA (HU)

FRANÇA (FR)

LITUÂNIA (LT)

REPÚBLICA CHECA (CZ)

ESTÓNIA (EE)

REINO UNIDO (UK)

IRLANDA (IE)

POLÓNIA (PL)

ESLOVÁQUIA (SK)

BÉLGICA (BE)

ISLÂNDIA (IS)

ALEMANHA (DE)

HOLANDA (NL)

CHIPRE (CY)

FINLÂNDIA (FI)

SUÉCIA (SE)

DINAMARCA (DK)

NORUEGA (NO)

SUIÇA (CH)

1098765

Fonte: European Social Survey, 6.ª vaga, 2012

4

5

6

7

8

3

Font

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Indice de Economia do Conhecimento (Banco Mundial)

Figura 1.10 Satisfação com a democracia, em função do Índice de Economia

do Conhecimento na Europa, 2012 (média)

Os cidadãos com ensino superiortendem a avaliar a democraciado seu país mais positivamentedo que os menos escolarizados.

Tendo em conta a associação evidente entre educa-

ção, economia do conhecimento e satisfação com a

democracia, como é que Portugal tem vindo a evoluir

desse ponto de vista? Verificamos que no caso

português, e do ponto de vista longitudinal, essa

associação também se verifica. A Figura 1.11 apresenta

dados de inquéritos à opinião pública recolhidos em

2004 e 2014, respetivamente. Em 2004, ainda antes

da crise económica, mais de metade dos portugueses

com ensino superior estavam muito ou razoavelmente

satisfeitos com o funcionamento da democracia

portuguesa (ao contrário de 43% dos inquiridos

pertencentes aos grupos menos escolarizados). Dez

anos mais tarde, em 2014, esta diferença tornou-se

ainda mais acentuada: se entre os cidadãos mais

escolarizados um terço estavam satisfeitos com a

democracia no país, entre os grupos com níveis de

ensino mais baixos este valor não ultrapassa os 29%

(entre as pessoas com o ensino secundário) e os

13,5% (entre as pessoas que completaram o ensino

básico).

Figura 1.11 Satisfação com a democraciaem função da escolaridade dos cidadãos

portugueses, 2004 e 2014 (%)

Muito /razoavelmente

satisfeito

Pouco /nadasatisfeito

Fonte: Inquéritos «30 anos do 25 de Abril» e «40 anos do 25 de Abril», Instituto de Ciências Sociais – Universidade

de Lisboa, www.bqd.ics.ul.pt

44

56

43

57

56

44

2004

Nenhum, Ensino

Primário

Ensino Secundário

Ensino Superior

Nenhum, Ensino

Primário

Ensino Secundário

Ensino Superior

13

87

29

71

33

67

2014

Satis

façã

o co

m a

dem

ocra

cia

R2 = 0,787

16

Conclusão

V

referências bibliográficas

Os resultados indicam quecada vez mais os cidadãosentendem a democracia emfunção dos seus resultados.

Neste capítulo analisaram-se as perceções dos

cidadãos portugueses sobre a democracia situando-as no

contexto europeu. A análise efetuada indica que os

portugueses permanecem entre os mais insatisfeitos da

Europa, juntamente com outros cidadãos de países do

sul e do leste da Europa. Este facto parece estar associa-

do a condições específicas dos países mas também dos

cidadãos. Com efeito, onde os índices de democraticida-

de são mais elevados, os níveis de desenvolvimento

humano mais altos e as taxas de desemprego mais baixas,

os cidadãos tendem a apresentar-se mais satisfeitos com

o funcionamento da democracia. Esta tendência é

também maior entre os mais escolarizados.

No que diz respeito às perceções dos cidadãos,

verifica-se, de um modo global, que estes estão mais

satisfeitos com o desempenho do país no que se refere à

qualidade das eleições e à garantia das liberdades cívicas

do que quanto à sua capacidade de promover participa-

ção e de reduzir as desigualdades sociais. Precisamente a

justiça social é a dimensão mais mal avaliada pelos

cidadãos europeus – principalmente os que residem no

sul e no leste da Europa – e a que apresenta uma correla-

ção mais forte com a satisfação com a democracia.

Ceka, B. e P.C. Magalhães. 2014. «The Meaning of

Democracy and its Determinants». In How Europeans View and

Evaluate Democracy, org. H. Kriesi, no prelo.

Ferrin, M. e H. Kriesi. 2014. Europeans' Understandings and

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European Social Survey. ESS Topline Results Series, 4.

www.europeansocialsurvey.org

Lobo, M.C., Jalali, C. e Silva, F.F. 2013. «A Responsividade

Política em Portugal: Retrato de um processo de deterioração

em curso», in Magalhães, P., Costa Pinto, A. e Sousa, L. (ed.),

Qualidade da Democracia em Portugal, Lisboa: Imprensa de

Ciências Sociais.

Lobo, M.C. 2015. A Qualidade da Democracia em Portugal,

2014. Policy Brief 2014. Lisboa: Instituto de Ciências Sociais da

Universidade de Lisboa.

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Portugal: A Perspectiva dos Cidadãos. Lisboa: SEDES.

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#3. Lisboa: Instituto de Ciências Sociais da Universidade de

Lisboa.

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cidadãos. Lisboa: Imprensa de Ciências Sociais.

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for Democracy in Times of Crisis: Diffuse and Specific Regime

Support in Portugal and Greece». South European Society and

Politics, 19, n.°4: 501-518.

17

João Guerra, José Gomes Ferreira, Luísa Schmidt

PORTUGAL NO CONTEXTO EUROPEU EM ANOS DE CRISE2O AMBIENTE EM PORTUGAL E NA EUROPA

Nesta secção analisamos a evolução do investimento público em ambiente e quais as principais preocupações dos cidadãos relativamen-te a este tema, com enfoque no saneamento básico (águas e resíduos urbanos) por ter sido o sector de melhor desempenho.

As políticas ambientais assumiram uma importância crescente ao longo das últimas décadas,

sobretudo desde a adesão de Portugal à União Europeia em 1986. Contudo, a este “impulso

externo” raramente correspondeu uma dinâmica interna capaz de acolher e implementar com

sucesso e continuidade muitas destas medidas e políticas ambientais. Acresce que os ciclos

políticos que se foram sucedendo tiveram, no caso português, uma influência determinante na

maior ou menor relevância atribuída às questões ambientais, que se repercutiu na descontinui-

dade das políticas definidas, no investimento que lhes foi atribuído e, consequentemente, na

concretização das ações previstas.

Talvez por isso, os portugueses se distingam dos restantes cidadãos da UE pela maior ênfase

atribuída aos problemas ambientais básicos, considerados de «primeira geração», ligados

nomeadamente ao saneamento, em detrimento dos problemas designados de «segunda

geração», como são os casos das alterações climáticas, dos recursos naturais e dos hábitos de

consumo. Também no âmbito das práticas ambientais, estudos recentes demonstram que os

portugueses são menos ativos do que a média dos cidadãos da UE, apenas se aproximando

destes nos hábitos de separação de resíduos (Valente e Ferreira, 2014). Tal revela que ainda

subsistirá em Portugal uma leitura algo elementar das crises globais, tardando a impor-se uma

visão mais integrada dos problemas ambientais no sentido de uma maior sustentabilidade.

A crise económica e a mudança de ciclo político na viragem da década (2011) vieram desviar

atenções e investimentos das questões ambientais, fragilizando as suas estruturas de gestão e

desinvestindo até em questões-chave como a monitorização, a fiscalização e a informação

ambientais. Como resultado, a já de si precária confiança dos cidadãos face ao Estado em

matéria ambiental foi afetada, retomando-se uma apreensão até sobre temas que se julgavam

resolvidos ou em vias de resolução como, por exemplo, a contaminação dos rios nacionais.

19

I

Investimento públicoem ambiente

Uma das dimensões que ajuda a compreender a relevância

política assumida pelo ambiente ao longo dos últimos anos é o

investimento público global que o Estado lhe tem conferido em

termos absolutos e relativos à média europeia. Vejamos, pois, a

evolução da despesa pública global, tanto em função do seu

peso percentual face ao PIB, como em função do seu valor per

capita. Analisa-se em seguida a distribuição da despesa global em

ambiente por domínios-alvo de proteção ambiental.

Comparando a despesa pública per capita na proteção do

ambiente nos 28 Estados-membros da União Europeia em

2013¹, verifica-se que a Holanda e o Luxemburgo se destacam

com valores substancialmente mais elevados:

respetivamente, 517,9€ e 483,4€ de despesa ambiental per

capita. Um segundo grupo de países com valores acima da

média da UE28 inclui Dinamarca, Reino Unido, Itália, Malta,

Finlândia, Bélgica e França. Já abaixo da média seguem-se

Áustria, Suécia, Eslovénia, Alemanha, Chipre e Letónia, e

também Portugal que ocupa o 16.º lugar com apenas 69€ per

capita, ficando acima de nove países do Leste e de Espanha

(Figura 2.1).

Os dados nacionais sobre a despesa ponderada com base no

PIB per capita mostram uma flutuação entre 0,7% em 2000 e

0,6% em 2013, passando por alguns períodos em que essa

percentagem não ultrapassou 0,5% (Figura 2.2). Por seu turno,

ainda segundo a Figura 2.2, o total das despesas públicas em

ambiente também regrediu. Os cortes iniciaram-se logo no

arranque da década de 2000, seguindo-se a subidas pontuais

que globalmente nunca recuperam os valores alcançados no ano

2000, proporcionados pela dinâmica particularmente favorável

alcançada na segunda metade da década de 1990. Entre 2000 e

2013 o valor mínimo foi atingido em 2012, com apenas 1% do

total das despesas públicas no ambiente.

¹ Os dados são maioritariamente de 2013. Porém, alguns países não apresentam valores para esse ano, optando-se por usar os existentes: Alemanha: 2010; Estónia, Itália e Holanda: 2011; Bélgica, Espanha, França, Letónia, Hungria, Malta, Áustria, Eslovénia, Finlândia e Reino Unido: 2012.

Figura 2.1 Despesa pública per capita em proteção

ambiental na União Europeia, 2013 (euros)Fonte: Eurostat, 2015

<50

50 - 100

101 - 200

201 - 300

>300

PTES

CY

FR

BELU

NL

DK

FI

IT

DE

CZ

ATSI HR

HU

SK

0 400Km

UK

SE EE

LVLT

PL

BG

RO

20

Fonte: Pordata, 2014 e 2015 (* valor preliminar/provisório)

Em Portugal, entre 2000 e 2013,o valor mínimo foi atingido em 2012,com apenas 1% do total dasdespesas públicas no ambiente.

Figura 2.2 Despesa pública em ambiente, segundo a percentagem do PIB e dototal de despesas, 2000-2013 (%)

Temos assim que, em termos gerais, as despesas públicas em

ambiente decresceram em ambas as dimensões (percentagem

do total de despesas e do PIB), com algumas oscilações positivas

entre 2006 e 2009, e mais recentemente em 2013. Constata-se

uma tendência para o desinvestimento público no ambiente,

sobretudo quando comparado com os dados da segunda

metade de 1990. Estes factos prendem-se com três tipos de

fatores: i) opções resultantes das mudanças de ciclo político,

leia-se mudanças governamentais – casos de 2001 e 2011 no

sentido negativo, e de 2005-06 no sentido positivo; ii) alterações

na configuração ministerial – caso da subida da percentagem no

total das despesas em 2013 quando o Ministério do Ambiente se

desligou do «megaministério» da Agricultura e que corresponde

à altura em que se regista uma redução tanto na percentagem do

PIB como no total da despesa; iii) efeitos da crise e medidas de

austeridade que lhe estão associadas que implicaram cortes na

despesa e no investimento na qualidade ambiental.

Quanto às despesas em ambiente em função do PIB (Figura 2.3),

evidenciam-se algumas mudanças na posição relativa dos países

europeus. A Holanda garante de novo o primeiro lugar (1,44%),

seguindo-se Malta (1,38%) e, já a alguma distância, Bulgária, Reino

Unido e Itália. No extremo oposto encontramos Espanha, Eslová-

quia, Estónia, Croácia, Alemanha e Suécia. Portugal situa-se um

pouco acima destes países (0,44%), apesar de tudo muito abaixo

da média comunitária que se situa em 0,67%.

O esforço público na gestão ambiental dependerá assim da

capacidade económica dos países, mas também de outros fatores.

MUDANÇASDE CICLOPOLÍTICO

ALTERAÇÕES NACONFIGURAÇÃO

MINISTERIAL

EFEITOSDA CRISE E

AUSTERIDADE

Figura 2.3 Despesa com proteção ambiental

em face do PIB, na UE28, 2013 (%)Fonte: Eurostat, 2015

0,0

0,4

0,8

1,2

1,6

2000 2013

% do PIB

% total de despesas

(*1,2)

(*0,6)

<0,35

0,35 - 0,50

0,51 - 0,65

0,66 - 0,80

>0,80

PTES

CY

FR

BELU

NL

DK

FI

IT

DE

CZ

ATSI HR

HU

SK

0 400Km

UK

SE EE

LVLT

PL

BG

RO

21

Fonte: Eurostat, 2015

Figura 2.4 Despesa na proteção ambiental por domínio, em Portugal e na UE, 2001-2013 (milhões de euros)

Nalguns casos, a riqueza assim como as opções políticas

determinadas explicam um maior investimento (e.g.,

Holanda). Noutros casos, como acontece em alguns países

da Europa de Leste, a recente atribuição de fundos

europeus para a modernização ambiental pode ajudar a

explicar a maior percentagem de PIB investido no ambien-

te. Noutros casos ainda, como acontecerá em países mais

ricos, o facto de já terem sido atingidas metas essenciais

justifica a menor necessidade de investimento ambiental

(e.g., Alemanha). O caso português, que não se enquadra

em nenhuma destas tendências, evidencia um baixo peso

da despesa pública na proteção ambiental comparativa-

mente à média europeia.

No que respeita à distribuição da despesa corrente em

proteção ambiental por diferentes domínios, na média

comunitária, o crescimento tem sido quase ininterrupto,

embora explicável, em grande parte, pelo efeito da adesão

de mais 10 países à UE a partir de 2004. Por domínios,

destacam-se os resíduos, cuja fatia no total das despesas do

ambiente tem vindo a aumentar, desde 2005. Também em

2005, na rubrica «outros domínios» (que inclui a proteção

de solos, o ruído, a biodiversidade e a paisagem) se

verificou um aumento das despesas em 3124,71 milhões

de euros relativamente ao ano anterior. Com valores

menos expressivos, na proteção do ar e do clima registou

um acréscimo nas despesas de 533,62 milhões de euros.

Em Portugal, foi o setor dos resíduos que absorveu os

principais montantes, registando mais de 52% do total de

investimento em 2009, ano em que o volume total destas

despesas foi o mais elevado desde 2001 (Figura 2.4). Com

um peso igualmente considerável seguem-se as despesas

no tratamento de águas residuais. Só depois surgem outras

matérias, tais como a proteção de solos e de águas subter-

râneas, o ruído, a biodiversidade e a paisagem. Já no que

respeita aos problemas relacionados com o ar e com as

alterações climáticas, as despesas públicas têm uma expres-

são limitada e só ganham alguma relevância a partir de

2010, mas mesmo assim residual. Comparando com os

dados da UE, vemos que em Portugal se quebra o

crescimento continuado das despesas correntes em

ambiente em 2009 (1000,64 milhões de euros), assistindo-

-se, a partir daí, a um decréscimo que perdura, não

ultrapassando, em 2013, os 723,6 milhões de euros.

Na comparação entre Portugal e a UErevela-se uma quebra assinável deinvestimento português que contrastacom a situação geral na UE.

No seu conjunto, os dados evidenciam uma prevalência dos

problemas ambientais básicos (sobretudo resíduos e esgotos),

tanto em Portugal como na média da União Europeia. Já no que

respeita aos problemas de «segunda geração» (i.e., clima e

biodiversidade), as despesas ganharam relevância no cômputo da

União Europeia, mas têm uma expressão diminuta em Portugal.

Em suma, na comparação entre Portugal e a UE revela-se uma

quebra assinalável de investimento português que contrasta com a

situação geral na UE, o que confirma que o país está aquém do

desejável no que respeita ao investimento em políticas públicas de

ambiente, designadamente para enfrentar os problemas de

«segunda geração». Vejamos se tal desaceleração tem correspon-

dência com os anseios e as preocupações dos portugueses e dos

restantes europeus utilizando, para isso, os resultados de inquéri-

tos representativos das opiniões públicas nacional e internacional.

2001 2013

Uni

ão E

urop

eia

Portu

gal

Protecção do ar e do climaÁguas residuais

ResíduosOutros domínios

2001 2013

1000

600

400

200

0

800

0,00

10 000,00

20 000,00

30 000,00

40 000,00

50 000,00

60 000,00

70 000,00

80 000,00

90 000,00

22

II

Preocupação públicacom o ambiente

Através de diversos inquéritos recentes aplicados às escalas

europeia e internacional, verifica-se que, em geral, a preocupa-

ção dos portugueses com o ambiente atinge valores bastante

elevados. Por exemplo, no último inquérito sobre ambiente do

International Social Survey Programme (ISSP – Ambiente III),

aplicado em Portugal em 2012, 81,6% dos inquiridos declararam

estar «preocupados» e/ou «muito preocupados» com o estado

do ambiente, situação que confirma as tendências já verificadas

em Eurobarómetros anteriores (Valente e Ferreira, 2014).

Em termos comparativos, como podemos verificar na Figura

2.5, numa escala entre 1 e 5 (1. Nada preocupado e 5. Muito

preocupado) os portugueses são dos inquiridos que mais se

mostram preocupados com o ambiente, preocupação apenas

superada pela dos eslovenos. Esta tendência, aliás, é acompanha-

da de uma forma global ainda que com um grau menos intenso,

pelos inquiridos do Sul da Europa que demonstram níveis de

preocupação superiores em relação aos seus congéneres do

Norte (e.g., dinamarqueses, suecos e britânicos).

Relativamente à avaliação do desempenho nacional nas

questões ambientais, com base nos valores médios das respostas

em que (1) corresponde à ideia de que o respetivo país «tem

feito muito pouco» e (2) corresponde a uma avaliação claramen-

te positiva – o país tem feito mais do que o suficiente –, os dados

mostram que os inquiridos do Sul (em particular os portugueses)

avaliam mais negativamente os respetivos desempenhos

nacionais. Destacando-se aqui, com avaliações mais positivas, os

holandeses, os alemães e os suecos (Figura 2.6). Por seu turno,

analisando especificamente a avaliação que os portugueses fazem

do desempenho geral do país quanto à gestão do ambiente,

entre 2000 e 2012, os resultados evidenciam um acentuado e

crescente sentido crítico.

Figura 2.6 Perceção do desempenho ambiental do país, 2010 Fonte: ISSP, 2010-2012

Figura 2.5 Grau de preocupação relativamente

Mínimo. 1 (Muito pouco) . Máximo 3 (Mais do que o suficiente)

Mínimo. 1 (Nada preocupado) . Máximo 5 (Muito preocupado)

3,0 ou menos

3,1 - 3,4

3,5 - 3,6

3,7 - 3,8

4,0 ou mais

PTES

FR

BE

NL

DK

DE

CZ

ATSI HR

SK

0 400Km

UK

SE

LVLT

BG

1,3 ou menos

1,4 - 1,5

1,6 - 1,7

1,8 - 1,9

2,0 ou mais

PTES

FR

BE

NL

DK

IT

DE

CZ

ATSI HR

SK

0 400Km

UK

SE

LVLT

BG

23

Fonte: ISSP, 2010-2012ao ambiente, 2010

Figura 2.7 Em geral, relativamente ao ambiente, pensa que Portugal está a fazer…, 2000 e 2012 Fonte: ISSP, 2000 e 2012

6%

39%

41%

14%

2%

32%

57%

9%

O SUFICIENTE

MUITO POUCO

2000 2012

MAIS DO QUE O SUFICIENTE

NÃO RESPONDENÃO SABE

Figura 2.8 Problemas ambientais que mais preocupam os europeus e os portugueses, 2014 (%) Fonte: Eurobarómetro 416, 2014

POLUIÇÃO DO AR

POLUIÇÃO DE MARES, RIOS, LAGOSE ÁGUAS SUBTERRÂNEAS

IMPACTO NA SAÚDE DE PRODUTOSQUÍMICOS DE USO DIÁRIO

ESGOTAMENTO DE RECURSOS NATURAIS

AUMENTO DA QUANTIDADE DE LIXO

POLUIÇÃO AGRÍCOLA

ESCASSEZ DE ÁGUA POTÁVEL

REDUÇÃO OU EXTINÇÃO DE ESPÉCIES

OS NOSSOS HÁBITOS DE CONSUMO

PROBLEMAS URBANOS

POLUIÇÃO SONORA

OCUPAÇÃO DE TERRAS COM A CONSTRUÇÃO DE ESTRADAS OU CIDADES

DEGRADAÇÃO DOS SOLOS

PROPAGAÇÃO DE ESPÉCIES INVASIVAS

OUTRA

66

51

26

48

36

22

48

14

15

14

12

8

17

6

1

56

50

43

43

36

29

27

26

24

23

15

15

13

11

2

UE28 PORTUGAL

24

IIIQuanto à gestão do ambiente,entre 2000 e 2012, os resultadosevidenciam um acentuado ecrescente sentido crítico.

Sucessos e insucessos dapolítica ambiental:água e resíduos Com efeito, de acordo com os dados do ISSP aplicados em momentos

diferentes (Figura 2.7), o valor da categoria que considera que «o país está a

fazer muito pouco pelo ambiente» sobe de 41% para 58%. A este

crescimento do sentido crítico corresponde um decréscimo, também

assinalável, da categoria que melhor avalia o desempenho nacional (i.e., «o

país está a fazer mais do que o suficiente») e, o que também não é de

somenos, uma subida da capacidade crítica dos cidadãos portugueses, cuja

taxa de não resposta é inferior em 5%, em 2012. Os portugueses parecem

progressivamente mais conscientes e mais exigentes em termos ambientais,

assim como relativamente ao desempenho do país e dos seus responsáveis

nesta matéria. Posição que é, aliás, consonante com a desconfiança também

crescente nas atuais capacidade e eficácia da ação do Estado no que respeita

à política e à qualidade ambientais (Guerra, Schmidt e Valente, 2015).

Relativamente aos cinco problemas ambientais que, do seu ponto de vista,

mais os afetam, os portugueses elegem, antes de mais, a poluição do ar

(66%), que fazem acompanhar pela deficiente qualidade/poluição (51%) e

disponibilidade da água (48%). A par destas preocupações surge o aumento

da quantidade de lixo (48%) e, já a alguma distância, o esgotamento dos

recursos naturais (36%). Dir-se-ia, portanto, que os problemas de «primeira

geração» são ainda dominantes nas preocupações dos portugueses, enquan-

to os seus congéneres europeus (pelo menos se globalmente auscultados)

parecem assumir posições mais abrangentes. De acordo com os dados

expostos na Figura 2.8, não deixando de valorizar o mesmo tipo de

questões, os europeus inquiridos no Eurobarómetro atribuem maior impor-

tância ao impacto na saúde dos químicos usados no consumo diário (43%

contra 26% entre os inquiridos portugueses); à redução/extinção de

espécies (26% contra 14%); aos hábitos de consumo (24% contra 15%),

ou, ainda, aos problemas urbanos (23% contra 14%).

Em síntese, sendo ainda prematuro tirar conclusões quanto aos impactos

da recente desaceleração do investimento no ambiente nas preocupações

dos portugueses, o que para já podemos deduzir destes resultados é que o

adiamento de soluções setoriais e a desfragmentação de alguns serviços

públicos terão aumentado a desconfiança e o sentido crítico relativamente ao

desempenho ambiental do país, com repercussões no aumento da preocu-

pação com o ambiente e com a generalidade dos problemas ambientais,

entre os quais se destacam, ainda, problemas de «primeira geração» que, do

ponto de vista dos inquiridos, não estarão ainda resolvidos.

Como vimos, a inquietação com os problemas

ambientais manifestada é atualmente muito elevada e

agudiza-se entre os portugueses. Importa, pois, avaliar

o modo como esta preocupação se repercute nas

práticas quotidianas. Com esse objetivo analisamos

duas áreas fundamentais que, como constatámos

acima, corresponderam a um maior investimento

público ao longo das últimas décadas: i) o abastecimen-

to de água, a drenagem e o tratamento de águas

residuais e ii) a produção/reciclagem de resíduos.

Quando considerados à escala da UE (Figura 2.9), os

dados mostram que o abastecimento público de água

atingiu valores confortáveis na generalidade dos países

(com 100% na Holanda, em Espanha, em Chipre, na

Hungria e em Malta), surgindo os países bálticos e,

sobretudo, a Roménia como a grande exceção

(61,9%). Pelo contrário, a cobertura por sistemas de

drenagem de águas residuais está longe de estar

resolvida em muitos países europeus (Figura 2.10),

designadamente da Europa de Leste, com pior desem-

penho em Chipre (29,8%), na Roménia (46,8%) e na

Croácia (52,9%). Já em Portugal, o abastecimento de

água às populações e o tratamento de RSU (Resíduos

Sólidos Urbanos) são geralmente apontados como

casos de sucesso das políticas de ambiente financiadas

pelos fundos europeus. O mesmo acontece com a

taxa de cobertura de esgotos e com o tratamento de

águas residuais, verificando-se um aumento considerá-

vel na década de 2000, na sequência do que já ocorria

na década anterior com a aplicação dos fundos do II

Quadro Comunitário de Apoio (1992-1999).

25

A Figura 2.11 é esclarecedora quanto a esta evolução: em

2000, o abastecimento público de água para consumo já cobria

90% da população, progredindo lentamente a partir daí, até

alcançar uma taxa de cobertura que, atualmente, ultrapassa os

95% de população servida. A evolução da cobertura da

drenagem e do tratamento de águas residuais tem sido mais

lenta e encontra-se ainda longe da meta de 90% estabelecida na

década de 1990. Mesmo assim, o aumento foi sensível: a

drenagem passou de 69% em 2000 para uma cobertura de

81% em 2012, e o tratamento de águas residuais de 50% para

79% em 2012, melhorias estruturais que se traduziram numa

redução das cargas poluentes descarregadas nas massas de água

pelo setor urbano (APA, 2015). Adicionalmente, segundo a

ERSAR (2015), em Portugal, a água hoje captada e distribuída,

atinge um nível de qualidade superior a 98,2%. Refira-se no

entanto que, apesar deste cenário francamente positivo, no que

respeita à drenagem e ao tratamento de águas residuais, algumas

intervenções tiveram uma implementação insuficiente com

consequências na qualidade da água dos rios nacionais, o que

levou o recente Plano Nacional da Água (APA, 2015) a concluir

que cerca de 48% dos rios nacionais continuam poluídos.

Os dados expostos na Figura 2.12 mostram que, se entre

2008 e 2010 a produção de RSU per capita em Portugal igualou

ou superou a média comunitária, a partir de 2011 (quando os

efeitos da crise adquiriram maior visibilidade em Portugal) se

iniciou uma tendência de decréscimo que acompanhou a

redução do poder de compra dos portugueses. Assim, em 2012

com menos 36 kg per capita e em 2013 com menos 41 kg per

capita, a produção de RSU em Portugal voltou a situar-se

claramente abaixo da média dos países da UE27.

Comparando os valores relativos a 2013 verificamos que as

diferenças entre os vários países europeus são bastante expressi-

vas, variando entre os 272 kg da Roménia e os 747 kg per capita

da Dinamarca. No caso português, os 453 kg per capita situam-se

abaixo da média europeia (481 kg). Assinale-se que o decresci-

mento registado parece decorrer da austeridade imposta pela

crise, com a consequente redução do poder de compra. Este é,

aliás, um fator determinante também noutras paragens. Com

efeito, são os países da Europa de Leste – que chegaram mais

tarde à sociedade de consumo – que continuam a produzir

menos RSU per capita (Figura 2.13).

Quanto à taxa de reciclagem de RSU (incluindo a composta-

gem dos resíduos orgânicos), o desempenho nacional fica ainda

muito aquém da média comunitária e, ainda mais, resultados de

países como a Alemanha, a Áustria ou a Bélgica (v. Eurostat

2015).

Contudo, em termos evolutivos, como se verifica na Figura

2.14, apesar de algumas flutuações e do fosso entre os valores

portugueses e a média europeia não ter regredido, a dinâmica

tem sido positiva. Com efeito, passámos de 10,5% de taxa de

reciclagem em 2000 para 25,8% em 2013. Valores que, tendo

em conta o desnível que ainda separa os valores nacionais dos

valores médios europeus, continuam a pecar por insuficiência.

Quanto à taxa de reciclagem deresíduos urbanos, o desempenhonacional fica ainda muito aquém damédia comunitária.

Fonte: Eurostat, 2015

Figura 2.9 População servida por abastecimento públicode água na UE, 2013 (%) Fonte: Eurostat, 2015

Figura 2.10 População servida por drenagem de águasresiduais na UE, 2013 (%)

<85

85 - 89

90 - 94

95 - 99

100

PTES

CY

FR

BELU

NL

DK

FI

DE

CZ

AT

HRHU

SK

0 400Km

SE EE

LT

PL

BG

RO

<70

70 - 79

80 - 89

90 - 99

100

PTES

CY

FR

BELU

NL

DK

FI

IT

DE

CZ

ATSI HR

HU

SK

0 400Km

UK

SE EE

LVLT

PL

BG

RO

EL

IE

EL

26

2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012 2013

Fonte: Pordata, 2015; ERSAR, 2013

Figura 2.11 Abastecimento de água, drenagem e tratamento de águas residuais urbanas em Portugal(% da população servida), 2003-2012 (%)

2000

2000

2000

2012

2012

2012

95%

81%

79%

90%

69%

50%

Abastecimento de água

Drenagem de águas residuais urbanas

Tratamento de águas residuais urbanas

UE27

Portugal

2000

2013

Portugal

União Europeia 27 42,0%

25,8%

25,2%

10,5%

513 516 522 524 521 520 516 498 489 481

440453490504512518471465452445

Fonte: Eurostat, 2015Figura 2.12 Produção de resíduos urbanos per capita em Portugal e na UE27, 2003-2012 (kg)

Figura 2.13 Produção de resíduos urbanos Kg per capita em Portugal e na UE, 2013 Fonte: Eurostat, 2015

Fonte: Eurostat, 2015

Figura 2.14 Taxa de reciclagem em Portugale na UE27, 2000-2013 (%)

PTES

CY

FR

BELU

NL

DK

FI

IT

DE

CZ

ATSI HR

HU

SK

0 400Km

UK

SE EE

LVLT

PL

BG

RO

EL

IE400 - 499

270 - 399

27

500 - 599

600 - 747

Fonte: EB51.1 (1999), EB68.2 (2008), EB 75.2 (2011), EB81.3 (2014)

Conclusão

IVFigura 2.15 Prática de separação doméstica deresíduos urbanos, 1999-2013 (% da população)

Portugal UE

40%

54%

66%

59%

1999

2008

A evolução positiva da reciclagem de RU, analisada anterior-

mente, relaciona-se e até decorre da adesão dos portugueses

às práticas de deposição seletiva, área em que o sucesso dos

programas escolares – em boa parte patrocinados pelos

municípios (Schmidt, Nave & Guerra, 2010) – é incontestável,

pelo menos a julgar pelos dados presentes na Figura 2.15. Se,

em 1999, vinte e dois pontos percentuais separavam a

percentagem de portugueses que declarava práticas de recicla-

gem da média europeia, em 2014 a diferença inverteu-se e o

valor português é agora 4,6% superior à média europeia.

Claro que o alargamento que entretanto aconteceu, com a

entrada de mais 13 países com desempenhos e pontos de

partida muito distintos, terá uma relevância que não se poderá

desprezar nesta matéria, mas é inegável a evolução registada

que, aliás, é confirmada pelos dados: a percentagem de

portugueses que declara separar os resíduos subiu de 40% em

1999 para 71% em 2014.

Ao longo dos últimos 15 anos viveram-se períodos

irregulares no que respeita aos investimentos no ambiente.

Os ciclos políticos e os ciclos comunitários de fundos

estruturais são os determinantes fundamentais para explicar

estas oscilações nos programas e nas políticas ambientais.

Podemos, contudo, constatar que as tendências mais

recentes apontam para um desinvestimento a partir de

2011. A diminuição dos montantes reservados para as

despesas de ambiente refletirá, talvez, mais os efeitos de

opções políticas do que aqueles decorrentes da própria

crise económica e financeira.

Tudo somado, e comparativamente com as médias

europeias nestas questões do ambiente, estamos

certamente aquém do desejável, seja no que se refere à

despesa pública aplicada em proteção ambiental, seja no

que se refere a práticas sociais instaladas, cujo incentivo

público para a mudança recua, tarda, ou acontece de forma

ziguezagueante.

Apesar disso, esta situação decorre à revelia do que

parece corresponder aos anseios manifestados pela popula-

ção portuguesa em diversos inquéritos, ao longo das últimas

décadas. Quando analisamos os resultados, verificamos

crescentes preocupação, interesse e vontade de obter mais

e melhor informação sobre os problemas ambientais. O

ambiente é uma preocupação que não abranda entre os

portugueses, mesmo se as consequências da crise os

pressionam em sentido contrário. Assim, para os portugue-

ses, entre os problemas mais prementes nos últimos

inquéritos, destacam-se a poluição do ar e a poluição da

água. Apesar disso e fazendo jus ao que se disse anterior-

mente, a falta de correspondência entre investimentos

públicos e preocupações sociais é flagrante e as despesas

com o ar e o clima mantêm níveis residuais, apesar da

visibilidade que atingiram nos media e da pressão advinda

das organizações de governança internacional e da própria

União Europeia.

71% 66,4%2014

60% 66%2011

28

referências bibliográficas

O ambiente é uma preocupaçãoque não abranda entre os portugueses, mesmo se as consequências da crise ospressionam em sentido contrário.

Já em relação à água tem havido um maior nivelamento

entre investimentos públicos e preocupações manifestadas,

seja quanto ao abastecimento, seja quanto à qualidade da água

de consumo, seja ainda quanto ao tratamento das águas

residuais, o investimento per capita cresceu paulatinamente,

assim como cresceu a taxa de cobertura da população servida.

Finalmente, a produção e a separação dos resíduos urbanos

– refletindo, respetivamente, o consumo de bens/poder de

compra e a consciência ambiental – têm sofrido uma evolução

particularmente positiva que decorre de dois fenómenos

aparentemente pouco imbricados. Por um lado, acompa-

nham o reflexo da crise económico-financeira que implicou o

repensar de consumos excessivos ou não excessivos, já que as

dificuldades económicas nem sempre são boas conselheiras.

Por outro lado, beneficiam de uma crescente consciencializa-

ção ecológica que, entre os portugueses, há muito faz o seu

percurso. Quer isto dizer que confluentemente e, desta feita,

produzindo um resultado positivo, a redução do poder de

compra potenciou a diminuição da produção de resíduos per

capita, enquanto o desenvolvimento social das últimas

décadas, bem como o investimento público anterior (por

exemplo, na educação ambiental) possibilitou um maior

empenho cívico e, consequentemente, um aumento da

separação seletiva, assim como uma maior capacidade (e

vontade) para intervir na coisa pública e para exigir mais e

melhores políticas públicas ambientais.

APA (2015). Plano Nacional da Água. Lisboa: Agência

Portuguesa do Ambiente. Acedido a 22 de setembro de

2015 em www.apambiente.pt

ERSAR. 2015. Qualidade da água para consumo humano

2013. Lisboa: Entidade Reguladora dos Serviços de Águas e

Resíduos.

Ferreira, J. G., Schmidt, L., Jacobi, P. R. e Arteiro da Paz,

M. G. 2014. «Água: percepções, valores e preocupações

em perspectiva comparada». Recursos Hídricos 35 (2),

99-106.

Guerra, J., Schmidt, L. e Valente, S. 2015. «Dilemmas of

sustainability in turbulent times». In Green European.

Environmental Behaviour and Attitudes in Europe in a

Historical and Cross-Cultural Comparative Perspective, ed.

Audrone Telesiene e Matthias Gross. London: Routledge.

Schmidt, L. e Delicado, A. 2014. Ambiente, Alterações

Climáticas, Alimentação e Energia. A Opinião dos Portugueses.

Lisboa: Imprensa de Ciências Sociais.

Valente, S. e Ferreira, J. G. 2014. «Ambiente: das

preocupações às práticas». In Ambiente, Alterações

Climáticas, Alimentação e Energia. A Opinião dos Portugueses,

org. Luísa Schmidt.

29

Karin Wall, Vanessa Cunha, Leonor Rodrigues, Rita Coelho

PORTUGAL NO CONTEXTO EUROPEU EM ANOS DE CRISE3FAMÍLIAS EMPORTUGAL E NA EUROPA

Neste capítulo procuram identificar-se algumas das principais mudanças na vida familiar em Portugal ocorridas ao longo da última década e situar o caso português no contexto europeu. A mudança no campo dos valores e dos comportamentos familiares na sociedade portuguesa é complexa.

Existe um tempo longo de evolução, assente em movimentos de fundo que alteram

progressivamente as dinâmicas familiares ao longo de várias décadas, e um tempo mais curto,

caracterizado por épocas de mudança social acelerada que podem precipitar, consolidar ou

inverter as tendências. É o caso, por exemplo, da recente crise económica que terá afetado,

de forma visível e profunda, alguns elementos da paisagem da vida familiar.

No sentido de mapear estas mudanças, começa-se por analisar, desde o ano 2000 até

hoje, os processos de transformação relativos à dimensão e aos tipos de família, à fecundidade,

à conjugalidade e ao divórcio. Apresenta-se, em seguida, a evolução do risco de pobreza em

diferentes tipos de família, procurando avaliar o impacto da crise e comparar o risco de pobre-

za em famílias com crianças em Portugal e noutros países europeus. Por último, num olhar

que incide sobre a organização interna da família, comparam-se as atitudes e os comporta-

mentos, em 2002 e 2014, nos domínios da divisão do trabalho pago e da divisão das tarefas

domésticas no casal. Interessa averiguar, através destes indicadores, até que ponto se está a

desenvolver um modelo de família centrado numa divisão simétrica e igualitária de papéis, em

que ambos os cônjuges contribuem para o rendimento da família e participam nas tarefas

domésticas.

31

Famílias: principais características

I

Dimensão das famílias

2000 2014

2,4

2,6

2,8

3,0

2,9

2,8

2,6

A análise dos agregados domésticos revela uma diminuição da

dimensão média das famílias de 2,9 indivíduos em 2000 para 2,6

em 2014 (Figura 3.1). Este indicador tem evoluído de forma

gradual e consistente, retratando as transformações que têm

vindo a ocorrer na vida das famílias e nos modos de residência

na sociedade portuguesa há várias décadas. São transformações

em várias frentes que concorrem para a diminuição da dimensão

média dos agregados: a crescente autonomia residencial de

jovens e casais, que leva ao aumento dos jovens que vivem a

solo e à diminuição das famílias complexas; o adiamento da

parentalidade e a diminuição do número de filhos nas famílias,

que se reflete no aumento dos casais sem filhos e na diminuição

das famílias numerosas; mas também o envelhecimento da

população aliado ao seu crescente isolamento, pois são os

idosos que mais vivem sozinhos (Delgado e Wall, 2014). Mas

para lá das tendências de fundo, quanto à dimensão média das

famílias, importa pensar sobre o significado da quebra mais

intensa, de 0,2 pontos percentuais, que ocorreu entre 2008 e

2011. Esta quebra poderá refletir uma acomodação por parte

das famílias ao impacto da crise, por um lado acentuando

tendências já existentes, como o adiamento e a diminuição da

natalidade, e por outro intensificando os fluxos emigratórios.

A comparação europeia revela que há uma relativa homoge-

neidade do indicador (Figura 3.2). Em 2014, a dimensão média

das famílias variava entre 2,0 na Alemanha e 2,7 em países como

Chipre, a Eslováquia, a Irlanda, a Roménia, a Polónia e Malta.

Apesar da evolução recente deste indicador na sociedade

portuguesa, Portugal ainda integrava o grupo de países cuja

dimensão média das famílias era mais elevada. No extremo

oposto encontravam-se a Alemanha e os países nórdicos, com

valores inferiores a 2,2. Curiosamente, alguns países onde as

famílias são mais reduzidas – como a Suécia e a Finlândia, mas

também a França e o Reino Unido – são, ao mesmo tempo, dos

mais fecundos no contexto atual da UE28 (ver Figura 3.6),

Figura 3.1 Dimensão média das famílias(agregado doméstico) em Portugal,

2000-2014 (%)

Figura 3.2 Dimensão média das famílias(agregado doméstico) na Europa, 2014

Fonte: Pordata, a partir de dados do Eurostat e Institutos Nacionais de Estatística

Fonte: Pordata/ INE, Projeções baseadas nos Censos 2001, 2011

PTES

FR

BELU

NL

DK

FI

IT

CY

DE

CZ

ATSI

HU

SK

IE

2,0 - 2,1

2,2 - 2,3

2,4 - 2,5

2,6 - 2,8

0 400Km

UK

SE EE

LVLT

PL

EL

BG

RO

RS

32

HR

Fonte: Pordata/INE - Censos. Quebra de série em 2011

Em Portugal, entre 2000 e 2014assistiu-se a uma diminuição dadimensão média das famílias.

o que revela que não há, necessariamente, uma relação direta entre

natalidade e dimensão da família. Nesses países serão, então, o

peso significativo dos indivíduos que vivem sozinhos e a autonomia

precoce dos jovens a explicar a reduzida dimensão das famílias.

A composição interna das famílias – com quem se reside –

também muda significativamente ao longo da vida dos indivíduos,

constituindo a infância o período da vida no qual a diversidade de

modos de corresidir é menor (Delgado e Wall, 2014). Mesmo

assim, importa conhecer com quem vivem as crianças e os jovens;

e como evoluiu a distribuição desta população pelos diferentes

tipos de família entre os dois últimos momentos censitários (Figura

3.3). Em 2011, a população residente até aos 19 anos vivia maiori-

tariamente em famílias de casal com filhos (72%). Quanto às

restantes crianças e jovens, 16% viviam em famílias complexas,

11% em famílias monoparentais e menos de 1% noutro tipo de

agregado doméstico. Comparando com os dados de 2001,

constata-se que a evolução foi no sentido do aumento de crianças

e jovens a viver em famílias monoparentais, traduzido em 4 pontos

percentuais, enquanto decresceram ligeiramente em outros tipos

de família. Por conseguinte, tem vindo a aumentar o número de

crianças e jovens que vivem apenas com a mãe ou com o pai e

eventualmente com irmãos, o que reflete o crescimento dos

divórcios e das separações (ver Figura 3.9), mas também a maior

autonomia residencial destas famílias. Importa ainda sublinhar que,

apesar da ligeira diminuição de crianças e de jovens a viverem em

famílias de casais com filhos, dentro deste tipo de famílias tem

vindo a aumentar a proporção das recompostas (Delgado e Wall,

2014), o que significa que há um número crescente de crianças e

de jovens que vivem com um dos progenitores e um padrasto ou

uma madrasta.

Tipos de família:onde vivem as crianças e os jovens

Figura 3.3 População residente até aos 19 anos,por tipo de famílias, em Portugal, 2001-2011 (%)

Fonte: OCDE Family Database Dados de 2009: França; Dados de 2010:Estónia, Finlândia, Letónia; 2011: restantes países

Figura 3.4 Famílias monoparentais com filhosaté aos 25 anos, na Europa, 2011 (%)

PTES

FR

BELU

NL

DK

IT

DE

CZ

CY

ATSI

HU

SK

IE

5,0 - 9,0

9,1 - 12,0

12,1 - 16,0

16,1 - 20,4

0 400Km

UK

EE

LVLT

PL

EL

BG

RO

FI

20112001

72,474,4

Monoparentais

Complexas

Outros agregados

domésticos

11,26,7

15,617,7

0,81,2

Casal com filhos

33

Fecundidade

Fonte: Pordata/INE - Estatísticas de Nados-Vivose estimativas anuais de População Residente

2000 2014

1,10

1,20

1,30

1,00

ISF

Idade média da mãe

1,40

1,50

1,60 31

30

29

28

27

26

25

Apesar da evolução significativa das famílias monoparentais no

período em análise, em 2011 Portugal pertencia ao grupo de

países com a proporção mais baixa deste tipo de famílias (com

filhos menores de 25 anos), juntamente com França, Alemanha,

Itália, Grécia, Bulgária, Lituânia e Finlândia (Figura 3.4). Uma

incidência mais elevada, entre 13% e 17%, reunia cinco países:

Estónia, Polónia, República Checa, Croácia e Bélgica. Já a

Letónia, isoladamente, destacava-se pela incidência particular-

mente elevada de famílias monoparentais (20%), o que poderá

estar associado à alta divorcialidade no país (ver Figura 3.10 ).

O declínio e o adiamento da fecundidade não são comporta-

mentos demográficos recentes na sociedade portuguesa. O

índice sintético de fecundidade (ISF) está em queda desde o

início da década de setenta do século XX, apesar de oscilações

pontuais sem impacto significativo na tendência; e a idade média

da mulher ao nascimento do primeiro filho está a aumentar de

forma ininterrupta desde meados dos anos oitenta (Cunha,

2014). Embora reflitam já tendências duradouras, importa

mesmo assim conhecer a sua evolução recente (Figura 3.5).

Entre 2000 e 2013, o ISF caiu de 1,55 para 1,21, o valor mais

baixo de sempre. Se em 2014 o indicador registou um aumento

de duas centésimas, tal não permite falar em recuperação nem

mitiga o impacto destes níveis de fecundidade muito baixos no

volume e na estrutura da população. Como se sabe, níveis de

fecundidade abaixo de 1,30 (lowest-low fertility) aceleram os

processos de envelhecimento e de declínio demográficos e

dificultam a recuperação dos nascimentos (Rosa, 2012), tendo

Portugal atingido esse patamar em 2012. Estes desenvolvimen-

tos do ISF não podem ser desligados do expressivo adiamento

da maternidade, pois a idade média da mulher ao nascimento

do primeiro filho aumentou quase cinco anos no período em

análise, atingindo os 30 anos em 2014. Estes dados não podem

ser dissociados da crise, que parece ter acelerado o declínio da

fecundidade entre 2010 e 2013 em virtude da drástica redução

dos nascimentos que ocorreu neste período.Os baixos níveis

de fecundidade são uma realidade à escala europeia. Se Portugal

registava, em 2013, o ISF mais baixo no contexto da UE28, e se

situava com Espanha e Polónia no grupo restrito de países de

fecundidade lowest-low, a maioria dos países registava, então,

Figura 3.5 Índice sintético de fecundidade (ISF) eidade média da mãe ao nascimento

do primeiro filho, Portugal, 2000-2014

Fonte: Eurostat

Figura 3.6 Índice sintético de fecundidade (ISF), Europa, 2013

PTES

FR

BELU

NL

DK

FI

IT

DE

CZ

ATSI

HU

SK

IE

0 - 1,28

1,29 - 1,50

1,51 - 1,70

1,71 - 1,90

1,91 - 2,00

0 400Km

UK

EE

LVLT

PL

EL

BG

ROHR

SE

34

CY

Nascimentos fora do casamento

O declínio e o adiamento da fecundidade não são comportamentos demográficos recentes na sociedade portuguesa.

Fonte: Eurostat

nados-vivos fora do casamento(total)

nados-vivos fora do casamento com coabitação dos pais

nados-vivos fora do casamento sem coabitação dos pais

um ISF baixo, entre 1,50 e 1,69, ou mesmo muito baixo,

entre 1,30 e 1,49 (Figura 3.6). O primeiro grupo reunia os

países bálticos, o Luxemburgo, a Eslovénia, os Países Baixos

e ainda, com 1,67, a Dinamarca. O segundo grupo reunia o

conjunto mais alargado de países, onze ao todo, da Europa

do Sul e Sudeste, Central e de Leste. No extremo oposto,

com níveis de fecundidade relativamente elevados (se bem

que abaixo do valor de 2,1 necessário para a reposição

natural das gerações), estavam a França e a Irlanda. Com

níveis moderados, entre 1,70 e 1,89, estavam a Suécia, a

Finlândia, o Reino Unido e a Bélgica.

Outro indicador importante na análise da evolução da

família diz respeito aos nascimentos fora do casamento.

Trata-se de um indicador que abarca duas realidades

distintas: a da informalização da vida em casal, ocorrendo os

nascimentos em casais coabitantes (uniões de facto); e a das

mães sós, mulheres em regra mais jovens que têm filhos fora

de uma relação de coabitação. No período em análise, os

nascimentos fora do casamento mais do que duplicaram,

representando em 2014 metade do total de nascimentos

ocorridos nesse ano (Figura 3.7). Por outro lado, há que

sublinhar que as duas realidades têm vindo a crescer, se bem

que a ritmos diferenciados a partir de 2010: os nascimentos

com coabitação dos pais desaceleraram o ritmo, sucedendo

o oposto com os nascimentos sem coabitação dos pais, que

praticamente triplicaram entre 2000 e 2014. Sendo esta

tendência acompanhada pelo adiamento da fecundidade e

pela forte diminuição dos nascimentos em mulheres em

idades mais jovens, importa conhecer o impacto que a crise

poderá estar a ter neste fenómeno, nomeadamente por via

da emigração (masculina) e do difícil acesso à habitação por

parte dos casais.

2000 2014

10

20

30

0

40

50

Fonte: Pordata/INE - Estatísticas de Nados-Vivos

Figura 3.7 Nascimentos fora do casamento, total,com e sem coabitação dos pais, em Portugal,2000-2014 (%)

22,2

16,8

5,4 5,89,2

15,823,2

32,0

33,629,1

41,3

49,3

Figura 3.8 Nascimentos fora do casamento, total, Europa, 2012 (%)

PTES

FR

BELU

NL

DK

FI

IT

DE

CZ

ATSI

HU

SK

IE

0 400Km

UK

EE

LVLT

PL

EL

BG

ROHR

SE

0 - 15,0

15,1 - 30,0

30,1 - 45,0

45,1 - 60,0

35

CY

Casamentos / Divórcios

Taxa bruta de divorcialidade

Taxa bruta de nupcialidade

Divórcios por 100 casamentos

Os dados sobre os nascimentos fora do casamento em 2012

confirmam que Portugal é um dos países da UE28 onde este

fenómeno é mais prevalente (Figura 3.8). França, Reino Unido,

Bélgica, Países Baixos, Dinamarca, Suécia, Eslovénia, Estónia,

Letónia e Bulgária são os outros países que fazem parte do

grupo no qual a percentagem destes nascimentos é mais

elevada, entre 45 e 60%. No entanto, importa sublinhar que

esta elevada incidência poderá retratar realidades diferentes.

Nos países onde há uma crescente informalização da conjugali-

dade e uma forte regulação dos nascimentos, como é o caso de

Portugal ou da Suécia, o indicador reflete sobretudo os

nascimentos com coabitação dos pais. Nos países onde persiste

o fenómeno dos nascimentos em idades muito jovens, como é

o caso paradigmático da Bulgária, mas também do Reino Unido

e da Letónia, o indicador poderá retratar os nascimentos sem

coabitação dos pais, ou seja, o fenómeno das jovens mães sós.

No extremo oposto encontra-se a Grécia, isolada, com menos

de 15% de nascimentos fora do casamento, o que se associa à

menor informalização da conjugalidade.

A evolução recente da nupcialidade e da divorcialidade retrata

mudanças profundas que estão em marcha, há já várias décadas,

na vida em casal. A informalização crescente das relações

conjugais tem levado ao declínio acentuado do casamento e em

particular do casamento católico, que é já minoritário face ao

civil (Delgado e Wall, 2014). Por outro lado, o divórcio é um

acontecimento cada vez mais comum nas trajetórias dos casais.

Entre 2000 e 2013, a taxa bruta de nupcialidade, que reflete os

casamentos celebrados por mil habitantes, caiu para metade, de

6,2‰ para 3,1‰ (Figura 3.9). Já a taxa bruta de divorcialidade,

que traduz os divórcios decretados por mil habitantes, registou

um ligeiro aumento até 2010, de 1,9‰ para 2,6‰, infletindo

a tendência desde então. No entanto, estes indicadores têm

algumas limitações na leitura da realidade, na medida em que

pesam o casamento e o divórcio no conjunto de uma popula-

ção crescentemente envelhecida. Um indicador alternativo e

mais esclarecedor é o rácio entre casamentos e divórcios, i.e.,

o número de divórcios decretados por 100 casamentos

celebrados num dado ano civil. No período em análise, o

indicador mais do que duplicou: de 30 divórcios em 2000, para

2000 2013

2

4

6

0

8 80

60

40

20

0

Figura 3.10 Rácio entre casamentos e divórcios,Fonte: Eurostat - Estimativas e recenseamento da populaçãona Europa, 2012

Figura 3.9 Nupcialidade, divorcialidade e rácio entrecasamentos e divórcios, em Portugal,

2000-2013 (‰ e rácio) Fonte: Residente | DGPJ/MJ - Estatísticas de divórcios e separação de

pessoas e bens; Pordata/INE - Estimativas anuais da população

30,0

6,25,4

4,7

3,1

1,92,7 2,2 2,6 2,2

49,1 47,1

70,4

3,8

74,2

PTES

FR

LU

NL

DK

FI

IT

DE

CZ

ATSI

HU

SK

IE

0 400Km

EE

LVLT

PL

EL

BG

ROHR

SE

1,5 - 24,9

25,0 - 49,9

50,0 - 74,9

75,0 - 77,5

36

Quebra de série

CY

Famílias em risco de pobreza

II70 em 2013. Mas 2011 foi o ano em que o número

de divórcios foi mais elevado, 74 em 100 casamen-

tos, diminuindo desde então. O indicador segue a

tendência da taxa bruta, sugerindo uma ligeira

desaceleração dos níveis de divorcialidade. Em 2012,

Portugal, Espanha, França, Dinamarca, Estónia,

Lituânia, República Checa e Hungria constituíam o

grupo de países com um elevado número de

divórcios por 100 casamentos, entre 50 e 75 (Figura

3.10). Apenas a Letónia registava um valor superior,

77. No extremo oposto, com menos de 25 divórcios

por 100 casamentos, apenas se encontravam a

Grécia, com 23 divórcios, a Irlanda, com 14, e Malta,

onde o divórcio só foi aprovado em 2011, com

menos de 2 divórcios por 100 casamentos. O grupo

mais numeroso de países, que reunia os restantes

países da UE28, apresentava um rácio de 25 a 50

divórcios por 100 casamentos.

Ao longo da última década o risco de pobreza – i.e., a situação

de famílias com rendimentos inferiores a 60% do rendimento

mediano em Portugal – tem vindo a aumentar entre as famílias

portuguesas com crianças e a diminuir entre as famílias sem

crianças (Figura 3.11). Nesse sentido, acentua-se a diferença no

risco de exposição à pobreza entre esses tipos de agregados.

Com efeito, se em 2003 o risco de pobreza era sensivelmente

igual em agregados com e sem crianças (respetivamente, 20,6%

e 20,0%), em 2012 tal diferença era de 7,2 pontos percentuais

(respetivamente, 22,2% e 15,0%). Entre as famílias com

crianças, o risco de pobreza é particularmente elevado nos

agregados com dois adultos e três ou mais crianças (famílias

numerosas) e nos agregados com um adulto e pelo menos uma

criança, onde predominam as famílias monoparentais. Os

cenários das famílias com crianças em geral, e das famílias nume-

rosas e monoparentais em particular, agravaram-se especial-

mente a partir de 2010 no contexto da atual crise económica. A

deterioração das condições de vida, motivada pela degradação

dos rendimentos e das condições laborais, pela redução dos

apoios sociais do Estado e pelo aumento de impostos, atingiu

fortemente as famílias com crianças (Wall et al., 2015). A análise

comparativa do contexto nacional face ao dos restantes países da

União Europeia coloca Portugal numa posição pouco favorável,

especialmente face aos países nórdicos – onde apenas cerca de

7 a 13% das famílias com crianças estão em risco de pobreza –,

mas também em relação a países como o Reino Unido, a Alema-

nha e a França, onde a incidência do risco varia entre 13 e 19%

(Figura 3.12). Em situação idêntica a Portugal, mas ainda assim

com valores inferiores a 20%, encontram-se países de Leste

como a Hungria, a Polónia, a Letónia e a Lituânia. Por sua vez, a

Roménia, a Espanha e a Grécia – estes dois últimos países, tal

como Portugal, com programas de austeridade nos últimos anos

– apresentam a maior percentagem de famílias com crianças em

risco de pobreza da União Europeia (entre 25,9% e 28,9%).

O divórcio é umacontecimento cada vezmais comum nastrajetórias dos casais.

37

Figura 3.12 Risco de pobreza em famílias com crianças, Fonte: Eu-SILC 2013, Eurostatna Europa, 2012 (%)

Figura 3.11 Risco de pobreza em famílias com e sem crianças, por tipo de família, Portugal, 2003-2012 (%) Fonte: EU-SILC 2004-2013

Famílias sem crianças

Famílias com crianças

Um adulto com, pelo menos, uma criança

Dois adultos com uma criança

Dois adultos com duas crianças

Dois adultos com três ou maiscrianças

2003 2012

10

15

20

25

30

35

40

45

40,4

33,1

37,0

34,8

41,0

24,0

20,020,6 18,7

12,817,7

19,9 22,219,9

16,015,0

15,0

13,4

36,1

Discordototalmente

+ discordo

Não concordo nem discordo

Concordo totalmente

+ concordo

2002 - 2014 2002 - 2014

24,333,0

Respondentes com mais de 18 anosFonte: Elaboração própria a partir de dados do ISSP 2002 e ISSP 2012

– Módulos Família, Género e Mudança

Mulheres Homens

29,0 22,8

60,5 59,3 55,055,4

20,811,717,910,5

Figura 3.13 «Compete ao homem ganhar dinheiroe à mulher cuidar da casa e da família», Portugal,2012 e 2014 (%)

Figura 3.14 «Compete ao homem ganhar dinheiro e à mulher cuidar da casa e da família»*, Europa, 2012 (%)

Fonte: Elaboração própria a partir de dados do ISSP 2012 - Módulos Família Género e Mudança. Em Portugal os dados foram recolhidos em 2014

* escala de resposta 1 «concordo totalmente» a 5 «discordo totalmente»respondentes com mais de 18 anos

7,4 - 13,0

13,1 - 18,6

18,7 - 24,3

24,4 - 29,0

PTES

FR

BELU

NL

DK

FI

IT

DE

CZ

ATSI

HU

SK

IE

0 400Km

UK

EE

LVLT

PL

EL

BG

RO

SE

HR

5,8 - 18,1

18,2 - 30,4

30,5 - 42,8

42,9 - 55,1

PT

FR

DK

FI

DE

CZ

ATSI

SK

IE

0 400Km

UK

LVLT

PL

BG

SE

HR

38

CY

Famílias e trabalho:atitudes e práticas

III

Práticas relativas ao trabalho pago

Atitude face à divisão do trabalho no casal

Entre os portugueses, tanto os homens como as mulheres trabalham mais do que as 40 horas semanaisregulamentares.

Os resultados do inquérito do ISSP sobre Família e Género,

realizado em 2014 junto de uma amostra representativa da

população portuguesa com 18 e mais anos, revelaram que a

maioria dos inquiridos discorda da afirmação «Compete ao

homem ganhar dinheiro e à mulher cuidar da casa e da família»,

o que sugere uma expressiva recusa da divisão tradicional dos

papéis de género (Figura 3.13). No entanto, 24% dos homens e

23% das mulheres concordam com aquela afirmação, ou seja,

que deve haver uma especialização complementar de papéis nos

casais: o homem tem a responsabilidade económica por via da

inserção profissional; a mulher tem a responsabilidade doméstica

e a dos cuidados às crianças e a outros familiares. Embora não se

observem alterações acentuadas em relação à ronda de 2002 do

ISSP, regista-se, todavia, uma descida na concordância com este

modelo de divisão do trabalho pago e não-pago no casal, descida

essa que foi inclusivamente mais expressiva no caso dos homens

do que no das mulheres. Daqui advém uma atenuação do

desfasamento de género a este respeito, baseada no padrão de

resposta tendencialmente mais tradicional dos homens do que

das mulheres. Importa ainda acrescentar que, em 2014, a

concordância com a afirmação apenas é frequente na população

com 65 e mais anos (entre 46 e 48%), reduzida para valores

entre 13 e 15% nos homens e nas mulheres com menos de 45

anos, o que evidencia a importante mudança de valores que tem

vindo a ocorrer na sociedade portuguesa e que marcou particu-

larmente as gerações nascidas a partir da década de 1970.

Em comparação com outros dezasseis países da União

Europeia que participaram no inquérito do ISSP, Portugal, com

um valor de concordância global de 24%, situa-se entre o

segundo grupo de países com menor adesão ao modelo de

ganha-pão masculino (Figura 3.14), aliado às altas taxas de

emprego feminino (ver Figura 3.18). Entre os países menos

favoráveis a esta divisão tradicional de papéis encon-

tram-se os países nórdicos, com valores inferiores a

10%, e ainda o Reino Unido, a Irlanda, a França e a

Alemanha, com valores entre 12 e 16%. Pelo

contrário, os países da União Europeia mais a leste

evidenciam uma atitude mais positiva face à divisão

assimétrica da vida familiar, apresentando níveis de

concordância acima dos 42%, ou mesmo, no caso

da Letónia e da Eslováquia, dos 50%.

A análise do número médio de horas semanais de

trabalho pago de trabalhadores em regime de

trabalho a tempo inteiro (mais de 30 horas

semanais), revela que, entre os portugueses, tanto

os homens como as mulheres trabalham mais do

que as 40 horas semanais regulamentares (Figura

3.15). Tendo em conta todo o período em análise,

houve um aumento da carga horária para ambos em

praticamente uma hora semanal: de 42,9 para 43,8

horas para os homens; e de 40,8 para 41,7 para as

mulheres. No entanto, esta evolução não foi linear,

pois entre 2000 e 2010 houve mesmo uma paulati-

na redução do número médio de horas, de 0,7

pontos percentuais para os homens e de 0,5 para as

mulheres. O ano de 2010 marca a viragem na

tendência anterior, intensificando a jornada de

trabalho desde então, e esta mudança não pode ser

desligada da atual conjuntura económica do país e

eventualmente também do novo regime de 40

horas de trabalho instaurado na função pública no

final de 2013. Em quatro anos, mulheres e homens

passaram a trabalhar, em média, respetivamente

39

mais 1,4 e 1,6 horas por semana. Importa ainda sublinhar a

persistência da disparidade de género na participação de

homens e de mulheres no mercado de trabalho, de cerca de

duas horas semanais, apesar das mudanças que ocorreram na

carga laboral ao longo destes 14 anos. Não há, portanto,

sinais de convergência no tempo que homens e mulheres

despendem a trabalhar profissionalmente.

Todavia, no contexto da União Europeia, Portugal apresen-

ta um valor relativamente reduzido de disparidade de género

no número médio de horas semanais de trabalho pago em

regime de trabalho a tempo inteiro (Figura 3.16). Esse valor é

idêntico aos de Espanha, França e Finlândia e aos da maioria

dos países da Europa Central, como Alemanha, Bélgica,

Áustria, Polónia e República Checa. Os países com maior

disparidade neste indicador são o Reino Unido, a Itália e a

Grécia (entre 3,0 e 4,2 horas) e ainda a Irlanda, onde os

homens trabalham em média cerca de mais meio-dia por

semana do que as mulheres (4,4 horas). Pelo contrário, os

países onde homens e mulheres que trabalham a tempo

inteiro menos diferem no número de horas despendidas

(entre 0,5 e 1,7 horas) são os países da Europa de Leste (e.g.

Estónia, Letónia, Lituânia, Roménia, Bulgária, Hungria), assim

como a Holanda e a Suécia.

Com base nas respostas ao ISSP 2002/2012 à questão

relativa à situação no emprego e ao número de horas

despendidas a trabalhar profissionalmente, foi possível definir

diferentes modelos de divisão do trabalho pago dos casais em

que ambos são economicamente ativos (Figura 3.17). Os

resultados indicam o predomínio e a estabilidade de um

padrão de duplo emprego a tempo inteiro (mais de 30 horas

semanais): 69,7% em 2002 e 70,8% em 2014. Já o modelo

de duplo emprego «assimétrico», em que um trabalha a

tempo inteiro e o outro a tempo parcial, decresceu nos

últimos 12 anos praticamente em 10 pontos percentuais. Na

verdade, parece ter havido uma decomposição deste modelo

específico em modalidades que mais claramente refletem a

precarização das condições laborais, pois cresceram as

situações em que ambos estão desempregados, ambos

trabalham a tempo parcial, um a tempo parcial e o outro está

desempregado e, principalmente, o modelo em que um está

a tempo inteiro e o outro está desempregado (passou de

9,7% para 16,2%). Neste sentido, a evolução nos modelos

de divisão conjugal do trabalho pago parece resultar não de

uma escolha das famílias, mas da crise económica atual e da

consequente deterioração do mercado de trabalho e do

aumento do desemprego. A comparação da situação dos

casais economicamente ativos em dezasseis países da UE28

que participaram no ISSP 2012 coloca Portugal, França, países

nórdicos e Letónia no grupo de países com uma elevada

percentagem de casais em que ambos os cônjuges trabalham

a tempo inteiro, entre 65% e 75% (Figura 3.18). Apenas a

República Checa, a Eslováquia e a Eslovénia apresentam uma

prevalência superior deste modelo. Já a Polónia, a Lituânia e a

Croácia registam uma percentagem inferior de casais a

trabalhar a tempo inteiro, entre 55% e 65%, enquanto a

Irlanda, a Alemanha, a Áustria e a Espanha fazem parte do

grupo com a menor percentagem, entre 44% e 55%. Mas se

na Alemanha e na Áustria tal se deve à saliência do trabalho

feminino a tempo parcial, em Espanha, à semelhança do que

se observa em Portugal, a crise económica desencadeou uma

escalada no desemprego. Com efeito, atualmente a Espanha

é o segundo país europeu com a taxa de desemprego mais

elevada (24% em 2014, segundo a OCDE).

40

Fonte: Elaboração própria a partir de dados do ISSP 2012 – Módulos Família, Género e Mudança. Em Portugal os dados foram recolhidos em 2014. Por questões metodológicas a Bulgária e o

Reino Unido não puderam ser incluídos na análise

Figura 3.16 Disparidade de género no número de horas semanais despendidas em trabalho pago a tempo inteiro*, na Europa, 2014 (horas) Fonte: EU-LFS, Eurostat

* Cálculo com base na diferença entre o número médio de homens e de mulheres

Homens

Mulheres

2000 2014

45

44

43

42

41

40

39

38

Figura 3.15 Número médio de horas semanais despendidas em trabalho pago a tempo inteiro, por sexo,Portugal, 2000 e 2014 (n.º horas) Fonte: EU-LFS, Eurostat

Figura 3.18 Casais em que ambos trabalhama tempo inteiro, na Europa, 2012 (%)

Figura 3.17 Modelos de divisão do trabalho pagoem casais ativos, Portugal, 2002 e 2014 (%)

Fonte: Elaboração própria a partir dos dados do ISSP 2002 e do ISSP 2012 – Módulos Família, Género e Mudança

PTES

CY

FR

BELU

NL

DK

FI

IT

DE

CZ

ATSI HR

HU

SK

IE

0 400Km

UK

SE EE

LVLT

PL

EL

BG

RO

0,5 - 1,8

1,9 - 2,9

3,0 - 4,1

4,2 - 4,5

PTES

FR

DK

FI

DE

CZ

ATSI HR

SK

IE

0 400Km

SE

LVLT

PL

44,4 - 54,7

54,8 - 65,0

65,1 - 75,2

75,3 - 84,4

2002

2014

2 Desempregados

1 Tempo parciale 1 Desempregado

1 Tempo inteiroe 1 Desempregado

1 Tempo inteiroe 1 Tempo parcial

2 Tempo inteiro

2 Tempo parcial

1,1 0,51,6

17,2

69,7

9,7

2,81,4

1,4

16,2

7,4

70,8

41

Fonte: Elaboração própria a partir de dados do ISSP 2002e do ISSP 2012 – Módulos Família, Género e Mudança

Questão: Em média, quantas horas por semana gasta a fazer tarefas domésticas (se tem filhos, não contar com os cuidados às crianças e as atividades de tempos livres)?

Fonte: Elaboração própria a partir de dados do ISSP 2012 – Módulos Família, Género e Mudança. Em Portugal os dados foram recolhidos em 2014.

Figura 3.22 Número médio de horas semanais despendidas em tarefas domésticas por homens que vivem em casal, em 16 países da UE,2012/2014 (n.º de horas)

Faço um bocado/muito mais do que seria justo

Faço mais ou menos o

que é justo

Faço um bocado/ muito menos do

que seria justo

39,9 33,1

2002 - 2014 2002 - 2014

4,93,9

53,947,7

6,248,4

65,454,5

1,540,6

Homens Mulheres

Questão: Qual das seguintes afirmações se aplica melhor à forma como são divididas as tarefas domésticas entre si e o seu cônjuge/companheiro?

Fonte: Elaboração própria a partir de dados do ISSP 2002 e do ISSP 2012 – Módulos Família, Género e Mudança

Figura 3.19 Perceção sobre a justiça na divisãoconjugal das tarefas domésticas, por sexo, Portugal,2002 e 2014 (%)

Questão: Qual das seguintes afirmações se aplica melhor à forma como são divididas as tarefas domésticas entre si e o seu cônjuge/companheiro?

Fonte: Elaboração própria a partir de dados do ISSP 2012 – Módulos Família, Género e Mudança. Em Portugal os dados foram recolhidos em 2014.

Figura 3.21 Número médio de horas semanais despendidasem tarefas domésticas, por homens e mulheres a viver emcasal, Portugal, 2002 e 2014 (n.º de horas)

2002 2014

7,0

26,3

8,1Homens

Mulheres 24,5

Europa, 2014 (%)

divisão conjugal das tarefas domésticas Figura 3.20 Perceção das mulheres sobre a justiça na

(«Faço muito» ou «um bocado mais do que seria justo»),

33,0 - 45,0

45,1 - 51,5

51,6 - 60,8

60,9 - 70,0

PTES

FR

DK

FI

DE

CZ

ATSI

SK

IE

0 400Km

LVLT

PL

BG

HR

SE

UK

6,8 - 10,0

10,1 - 13,2

13,3 - 16,3

16,4 - 18,6

PTES

FR

FI

DK

DE

CZ

ATSI

SK

IE

0 400Km

LVLT

PL

BG

HR

SE

42

UK

IV

Práticas relativas às tarefasdomésticas

A consonância de posições dehomens e de mulheres face ao sentido da injustiça reflete, então,o reconhecimento da sobrecargafeminina da esfera doméstica.Atitude face à divisão das

tarefas domésticas no casal

A participação dos homens na esfera doméstica é um tópico

central na discussão sobre a igualdade de género na vida familiar.

As duas rondas do ISSP indicam que os homens e as mulheres

que vivem em casal manifestam um sentimento de justiça em

relação à divisão das tarefas, ou seja, «fazem mais ou menos o

que é justo» (Figura 3.19). Se a perceção prevalecente é a de

uma distribuição justa do trabalho doméstico, que se acentuou

aliás entre 2002 e 2014 (mais 7 pontos percentuais nos homens

e mais 12 p.p. nas mulheres), a perceção contrária não deixa de

ainda ser expressiva em 2014: 41% dos homens consideram

que fazem «menos do que seria justo» e 33% das mulheres

consideram que fazem «mais do que seria justo». Esta consonân-

cia de posições de homens e de mulheres face ao sentido da

injustiça reflete, então, o reconhecimento da sobrecarga femini-

na na esfera doméstica. Este resultado é tão mais interessante

quanto é acompanhado de um sentimento de justiça geral mais

elevado nas mulheres do que nos homens (65% e 55% em

2014, respetivamente), sugerindo algum nível de incorporação e

de conformação femininas com a desigualdade de género na vida

familiar.

Com efeito, no contexto europeu as mulheres portuguesas são

das que menos se sentem injustiçadas, juntamente com as

eslovacas, as lituanas e as dinamarquesas (entre 33% e 45%)

(Figura 3.20). O segundo grupo de países onde o sentimento de

injustiça é menor, com valores entre 45% e 52%, reúne

Espanha, Suécia, Finlândia, Bulgária e Letónia. Importa frisar que

nestes diferentes países os baixos níveis de sentimento de

injustiça podem consubstanciar, tal como em Portugal, uma

conformação com a desigualdade de género ou, contrariamente,

um reconhecimento de uma divisão efetivamente mais equilibra-

da do trabalho doméstico. Já a Irlanda, o Reino Unido, a França

e a Áustria são os países onde a perceção de injustiça é mais

acentuada, com 61% a 70% das inquiridas a manifestarem que

fazem «mais do que seria justo».

Apesar do relativo sentimento de justiça na divisão

das tarefas, este não é acompanhado, na prática, por

uma distribuição igualitária no casal do número de

horas dedicado ao trabalho doméstico: em 2014,

segundo os dados do ISSP, as mulheres dedicavam em

média semanalmente mais do triplo do tempo do que

os homens (Figura 3.21). Em relação à ronda anterior

do ISSP verifica-se, mesmo assim, uma ligeira diminui-

ção do desfasamento entre a participação de homens

e de mulheres, que era em 2002 de 19 horas. Esta

evolução resultou da combinação entre a diminuição

de cerca de uma hora semanal de trabalho doméstico

realizado pelas mulheres e o incremento, mesmo que

ligeiro, na participação dos homens de 7 para pratica-

mente 8 horas semanais. Não obstante o ónus do

trabalho doméstico ainda recair grandemente sobre as

mulheres, não podemos deixar de relacionar a

mudança gradual que se observa quanto às práticas

masculinas com o aumento do sentimento de justiça

na divisão conjugal das tarefas.

No contexto europeu, segundo dados do ISSP

2012, Portugal situa-se entre os países onde os

homens dedicam menos horas semanais ao trabalho

doméstico, juntamente com França, Finlândia, Alema-

nha, Áustria, Lituânia (entre 7 e 9 horas) (Figura 3.22).

Os polacos, isoladamente, destacam-se pelo elevado

número de horas (mais de 17), seguidos pelos

homens da Letónia e Eslováquia. Por seu lado, os

restantes países registam valores intermédios de

participação dos homens nas tarefas domésticas, entre

10 horas e 12 horas.

43

Entre 2002 e 2014 observa-seuma tendência para maiorparticipação dos homens nastarefas domésticas.

A divisão conjugal do trabalho doméstico remete não só para o

tempo que homens e mulheres em casal dedicam às tarefas, mas

também para a forma como distribuem entre si o desempenho de

cada uma das tarefas domésticas. Os resultados do ISSP

confirmam, em Portugal, a persistência da feminização de algumas

tarefas rotineiras específicas, como tratar da roupa ou, em menor

grau, cozinhar (Figura 3.23). São tarefas cujo desempenho é

assegurado esmagadoramente pelas mulheres e nas quais a

participação dos homens (nos casos em que participam) ocorre

mais por via da partilha conjugal da tarefa e menos pelo assumir

integralmente a realização da mesma. Entre 2002 e 2014 observa-

-se, mesmo assim, uma tendência para maior participação dos

homens nessas tarefas: de 6% para 10% dos casais no caso da

roupa; de 22% para 30% no caso da confeção das refeições. Já as

compras correspondem a uma tarefa na qual os homens mais

participam e há mais tempo: em 2002, as compras eram partilha-

das em 40% dos casais; em 2014, mais de metade dos casais

partilham essa tarefa. É uma tarefa com características diferentes

das anteriores, pois envolve deslocações, gestão da economia

familiar e tem uma carga simbólica menos negativa, pois está ligada

à esfera do consumo e mesmo do lazer familiar. Das tarefas

tradicionalmente femininas, aquela que está em maior transforma-

ção é a confeção das refeições. Parece haver uma crescente

valorização dessa tarefa, em especial por parte dos homens mais

novos, até aos 29 anos (em que os níveis de participação

ascendem a 38%).

Comparando, no âmbito europeu, a percentagem de casais em

que os homens cozinham «sempre» ou «habitualmente» (sozinhos

ou em partilha), Portugal situa-se numa posição intermédia,

juntamente com outros países da Europa do Sul, Central e de

Leste (Figura 3.24). É na Suécia e na Dinamarca que os homens

mais assumem ou partilham a tarefa de cozinhar (entre 41% e

50% dos casais), seguindo-se França, Finlândia, Reino Unido e

Irlanda. O grupo de países onde os homens cozinham menos

reúne a Bélgica, a Croácia, a República Checa e a Eslováquia (entre

15% e 24% dos casais).

Figura 3.24 Homens que cozinham «sempre»ou «habitualmente» (sozinhos ou em casal), Europa, 2012 (%)

Figura 3.23 Divisão conjugal do trabalho doméstico, por tarefa, em Portugal, 2002 e 2014 (%)

Sempre ou habitualmente

o homem

Ambos Sempre ou habitualmente

a mulher

Fonte: Elaboração própria a partir de dados do ISSP 2002 e do ISSP 2012 – Módulos Família, Género e Mudança.

20142002

Quemfaz as

compras?

Quem trata daroupa?

Quemcozinha?

Fonte: Elaboração própria a partir de dados do ISSP 2012 – Módulos Família, Género e Mudança. Em Portugal os dados foram recolhidos em 2014.

6

16

78

7

70

23

3 7

90

1 5

94

7

53 40

9

40

51

15,5 - 24,2

24,3 - 32,9

33,0 - 41,5

41,6 - 49,3

PTES

FR

BE

DK

FI

DE

CZ

ATSI HR

SK

0 400Km

UK

SE

LVLT

PL

IE

44

BG

Conclusão

V

As expectativas, os valores e os comportamentos familiares

evoluíram de forma gradual e consistente desde o início do

seculo XXI. A década de 2000 veio acentuar as mudanças que já

se desenhavam nos anos noventa: um padrão mais uniforme de

vida familiar assente em famílias pequenas; uma diversidade mais

acentuada das formas de viver em família (apesar de se manter,

como predominante, a família de casal com filhos); conjugalida-

des cada vez menos formalizadas, assistindo-se a um aumento

contínuo das uniões de facto e dos nascimentos fora do

casamento; o aumento da divorcialidade e a queda da fecundida-

de.

O impacto da crise económica nestes indicadores é, também,

visível e significativo. O que mais se destaca é sobretudo o

aceleramento da queda da fecundidade a partir de 2010,

situando-se hoje Portugal no grupo restrito de países de fecundi-

dade «muito muito» baixa. Mas também encontramos uma

quebra acentuada na dimensão da família, como efeito provável

do envelhecimento da população e da queda da natalidade,

assim como o crescimento recente dos nascimentos sem

coabitação dos pais, que poderá estar relacionado com a emigra-

ção masculina em casais jovens ou com o difícil acesso a casa

própria em tempos de crise. O divórcio, pelo contrário, registou

nos últimos anos uma ligeira desaceleração. No contexto

europeu, Portugal situa-se no grupo de países com níveis

elevados de divórcio e uma informalização crescente das

relações conjugais.

No que diz respeito ao risco de pobreza económica nas

famílias com crianças, é importante sublinhar duas tendências.

Por um lado, o agravamento do risco de pobreza em famílias

com crianças a partir de 2009, ao contrário do que acontece em

famílias sem crianças, onde o risco de pobreza se mantém mais

ou menos estável. Em segundo lugar, o aumento acentuado do

risco de pobreza em famílias com descendências numerosas e

em famílias monoparentais. No contexto europeu, Portugal

situa-se no grupo de países que apresentam hoje as percenta-

gens mais elevadas de risco de pobreza em famílias com crianças.

Por último, a análise relativa à divisão familiar do trabalho

revela um movimento de fundo gradual em direção a um

modelo de família mais igualitária. Nas atitudes, uma menor

adesão a papéis de género assimétricos em que o homem é o

principal ganha-pão da família, cabendo à mulher a responsabili-

dade doméstica e, também, um menor desfasamento entre as

atitudes dos homens, há uma década bastante mais favoráveis ao

modelo assimétrico, e das mulheres. Nas práticas, o predomínio

de um modelo em que ambos os cônjuges participam a tempo

inteiro no mercado de trabalho, mantendo-se, no entanto, uma

disparidade de género em que os homens trabalham em média

mais duas horas semanais do que as mulheres, e uma crescente,

embora ainda muito desigual, partilha das tarefas domésticas.

No contexto europeu, Portugal apresenta um valor relativa-

mente reduzido de disparidade de género no trabalho pago e

ocupa uma posição intermédia no que diz respeito à participa-

ção dos homens nas tarefas domésticas.

De sublinhar, por fim, o impacto da crise económica na partici-

pação dos homens e das mulheres no mercado de trabalho. Por

um lado, quando trabalham, o aumento da carga horária para

ambos, entre 2010 e 2014, em praticamente uma hora. Por

outro, nos casais em que os dois são ativos, o aumento significa-

tivo das situações em que ambos estão desempregados ou em

que um trabalha a tempo inteiro e o outro está desempregado.

Reveladores do desemprego e da precariedade gerados pela

crise económica, estes dados apontam para mudanças na divisão

conjugal do trabalho que resultam sobretudo dos constrangi-

mentos do mercado de trabalho e não das opções das famílias.

referências bibliográficas

Cunha, V. 2014. «Quatro décadas de declínio da fecundidade em

Portugal». In INE/FFMS, Inquérito à Fecundidade 2013. Lisboa: INE,

19-28.

Delgado, A. e Wall, K. 2014. Famílias nos Censos 2011: Diversidade e

mudança. Lisboa: ICS. Imprensa de Ciências Sociais.

Rosa, M. J. V. 2012. O Envelhecimento da Sociedade Portuguesa.

Lisboa: FFMS/Relógio D'Água Editores.

Wall, K., Almeida, A. N., Vieira, M. M., Cunha, V., Rodrigues, L.,

Coelho, F., Leitão, M. e S. Atalaia. 2015. Impactos da Crise nas Crianças

Portuguesas: Indicadores, Políticas, Representações. Lisboa: ICS. Imprensa

de Ciências Sociais.

45

TRANSIÇÕES JUVENISEM PORTUGAL E NA EUROPA

PORTUGAL NO CONTEXTO EUROPEU EM ANOS DE CRISE4Jussara Rowland, Maria Manuel Vieira

Com o impacto da crise económica e financeira na Europa, assiste-se à situação paradoxal de nos confrontarmos atualmente com uma geração que, sendo embora a mais qualificada de sempre, enfrenta uma situação de precarização acentuada das suas condições de vida.

Ao longo das últimas décadas tem-se assistido, em toda a Europa, ao crescente alonga-

mento e complexificação dos processos de transição dos jovens para a vida adulta. As trajetó-

rias juvenis são atualmente marcadas por uma maior indeterminação, consequência de

mudanças sociais e económicas, mas também de alterações de crenças e de valores no seio

desta população (Alves et al., 2011).

Se a melhoria dos níveis de escolaridade é uma realidade entre os jovens, a precarização

das condições sociais e laborais dos jovens é um fenómeno igualmente estruturante da

condição juvenil atual, que tem vindo progressivamente a dificultar o acesso a condições de

independência económica e de real autonomização desta faixa etária (Pais e Ferreira, 2010).

Com o objetivo de melhor mapear tais fenómenos, este texto foca-se na análise de uma

seleção de indicadores-chave (de escolarização, de transição para o mercado de trabalho e de

autonomização), analisados quer do ponto de vista da sua evolução longitudinal (em Portugal

e na Europa) quer do ponto de vista sincrónico, comparando os vários países europeus num

dado momento específico. Mais concretamente, pretende-se retratar algumas especificidades

das realidades atuais dos jovens, não só do ponto de vista das suas condições objetivas, mas

também do ponto de vista das suas avaliações subjetivas, tendo neste caso como base

indicadores retirados de questionários à juventude aplicados recentemente na União Europeia.

Tendo em conta a sua pertinência no atual contexto económico, é dado especial enfoque

à perceção dos jovens em relação a questões relacionadas com a transição para o mercado de

trabalho, nomeadamente a sua avaliação sobre a adequação da formação escolar ao mundo

profissional, as suas principais preocupações em relação ao trabalho, ou a sua apetência para a

criação do seu próprio emprego. Por último, e de forma mais abrangente, é aferida a perceção

dos jovens sobre o seu grau de felicidade global.

47

Escolarização superior epercepções sobre a adequação daformação ao mundo do trabalho

I

Figura 4.1 Jovens adultos entre os 30 e os 34 anos com nível de educação terciário, Portugal e UE28, 2000-2014 (%)

Jovens na UE28

20

15

10

5

0

25

30

35

40

45

Jovens em Portugal

31,3

37,9

2000 2014

22,4

11,3

Os níveis de escolarização superior em Portugal têm vindo a

aumentar de forma progressiva ao longo das últimas décadas

(Figura 4.1). Em 2000, apenas 11,3% dos jovens adultos entre

os 30 e 34 anos tinham completado algum grau de ensino

superior (bacharelato, licenciatura, mestrado ou doutoramento),

quando, no mesmo ano, 22,4% dos jovens adultos da União

Europeia já possuíam um diploma do superior. Nos dois casos

assistimos, ao longo dos últimos 14 anos, a um aumento

considerável destes valores: na ordem de mais 15,5% para a

média dos países da UE e, no caso Português, de mais 20%. De

facto, em 2014 quase um terço (31,3%) dos residentes em

Portugal com idades compreendidas entre os 30 e os 34 anos

tinha completado um grau de ensino superior.

Apesar do aumento rápido e considerável da proporção de

jovens adultos com ensino superior em Portugal, o país apresen-

ta ainda valores relativamente baixos por comparação com

outros países europeus. Em 2014, na União Europeia, 37,9%

dos jovens entre os 30 e os 34 anos tinham obtido este nível de

ensino, bastante acima dos valores portugueses. Em termos

comparativos, na UE28 (Figura 4.2), apenas Itália (23,9%),

Roménia (25,0%), Malta (26,6%), Eslováquia (26,9%), Repúbli-

ca Checa (28,2%) e Bulgária (30,9%), apresentam uma percen-

tagem de jovens adultos com educação terciária inferior à dos

portugueses. No extremo oposto encontram-se países como

Lituânia (53,3%), Luxemburgo (52,7%), Chipre (52,5%),

Irlanda (52,2%) e Suécia (49,9%), que apresentam a maior

percentagem de jovens com diplomas de nível superior.

Portugal, no entanto, destaca-se por estar entre os países que

no período de referência mais aumentaram o seu número de

jovens adultos com ensino superior. Neste grupo, apenas

Luxemburgo (+31,5%), Polónia (+29,6%), Irlanda (+24,7%),

Eslovénia (+22,5%), República de Chipre (+21,4%) e Letónia

(+21,3%) superaram Portugal no crescimento de diplomados

com nível de educação terciária.

Fonte: Eurostat

Figura 4.2 Jovens adultos entre os 30 e os 34 anos com nível de educação terciário, UE28, por países, 2014 (%)

Fonte: Eurostat

PTES

FR

BELU

NL

DK

FI

IT

CY

DE

CZ

ATSI HR

HU

SK

IE

23,9 - 30,3

30,4 - 40,0

40,1 - 49,7

49,8 - 54,3

0 400Km

UK

SE EE

LVLT

PL

EL

BG

RO

48

Portugal UE28

62,971,8

51,153,3

54,756,3

45,74,8

< 15 anos

16-19 anos

>20 anos

ainda a estudar a tempo inteiro

Os jovens que abandonaramprecocemente os estudos (até aos15 anos) são bastante mais críticosem relação à escola do que osrestantes.

A perceção dos jovens quanto à adequação da formação recebi-

da ao mundo do trabalho varia tendo em conta o seu percurso

escolar (Figura 4.3). De facto, os jovens que abandonaram preco-

cemente os estudos (até aos 15 anos) são bastante mais críticos

em relação à escola do que os restantes: apenas 45,7% dos

jovens europeus inseridos neste grupo declaram considerar a

educação recebida adaptada ao mundo do trabalho, valor que

desce significativamente para 4,8% no caso dos jovens com níveis

de escolaridade homóloga a viver em Portugal. Entre os jovens

com percursos escolares mais longos, a maioria considera que a

educação recebida nas instituições de ensino está adaptada ao

mundo do trabalho. Ainda assim, é de relevar que uma percenta-

gem considerável de jovens a viver na União Europeia indica

considerar que a escola, instituições de formação ou universidade

não se encontram bem adaptadas às necessidades do atual mundo

do trabalho. Os jovens que ainda estão a estudar (em Portugal e

na UE) e que, por isso, na sua maioria ainda não tiveram de se

confrontar com o mundo do trabalho, têm uma avaliação mais

positiva sobre a adequação da formação escolar ao mundo

profissional (71,8% em Portugal e 62,9% na Europa).

No que se refere à avaliação desta questão nos diferentes países

da União Europeia (Figura 4.4), verifica-se que os jovens dos

países do norte da Europa – Holanda (85,1%), Finlândia (81,8%),

Bélgica (81,4%), Alemanha (79,3%), Áustria (77,9%), Irlanda

(77%), Suécia (75,6%), Reino Unido (75,2%) e Dinamarca

(72,7%) – são quem faz uma avaliação mais positiva sobre a

adequação da educação no seu país ao mercado de trabalho. Por

seu turno, são sobretudo os jovens dos países do sul da Europa e

da Europa do Leste quem faz uma avaliação menos positiva:

Grécia (19%), Espanha (25,8%), Bulgária (35,5%), Eslovénia

(36,1%), Roménia (37,4%) e Itália (38,4%). Portugal destaca-se

por apresentar uma avaliação relativamente positiva por parte dos

jovens em relação a esta questão (para 57,6% dos seus jovens a

educação recebida está bem adaptada ao atual mundo do

trabalho) face a outros países com situações económicas e laborais

similares (nomeadamente Grécia, Espanha e Itália).

Figura 4.4 Jovens entre os 16 e os 30 anos quedeclaram que no seu país a educação recebida quanto

à formação, à escola e à universidade está bemadaptada ao atual mundo do trabalho, UE28,

Fonte: Eurobarómetro 395 European Youth

Fonte: Eurobarómetro 395 European Youthpor países, 2014 (%)

Figura 4.3 Jovens entre os 16 e os 30 anos quedeclaram que no seu país a educação recebida quanto

à formação, à escola e à universidade está bemadaptada ao atual mundo do trabalho, segundoa idade que tinham quando deixaram de estudar

a tempo inteiro, Portugal e UE28, 2014 (%)

PTES

FR

BELU

NL

DK

FI

IT

CY

DE

CZ

ATSI HR

HU

SK

IE

19,0 - 35,6

35,7 - 52,4

52,5 - 69,2

69,3 - 86,1

0 400Km

UK

SE EE

LVLT

PL

EL

BG

RO

49

Inserções no mercado de trabalho:realidades e preocupações

IIOs dados em Portugal evidenciama progressiva dificuldade deinserção laboral dos jovens aolongo da última década e meia.

O indicador relativo às taxas de emprego de recém-diplomados

refere-se às taxas de emprego de jovens entre os 20 e os 34 anos,

empregados, que tenham atingido pelo menos o nível secundário

de escolaridade (ISCED 3) e completado a sua formação há pelo

menos três anos. Esta taxa permite apurar as dificuldades de

inserção dos jovens no mercado de trabalho uma vez terminada a

sua formação escolar (secundária ou superior). Os dados em

Portugal evidenciam a progressiva dificuldade de inserção laboral

dos jovens ao longo da última década e meia (Figura 4.5). De facto,

em 2000 a taxa de emprego de recém-diplomados situava-se em

valores em torno dos 90%, tendo baixado ao longo dos primeiros

anos da década para estabilizar em torno dos 82%. No entanto,

com a crise económica e o aumento do desemprego essa situação

alterou-se, sofrendo uma acentuada quebra a partir de 2010 e

apresentando o seu valor mais baixo em 2012 quando esta taxa se

fixou nos 67,5%. Desde esse ano assistimos a uma ligeira melho-

ria: em 2014 o valor ascende a 69,4%. Comparativamente com a

evolução da média da União Europeia (apenas disponível a partir

de 2006), constata-se que os valores em Portugal mantêm-se

sempre relativamente próximos até 2012, ano em que a taxa de

emprego dos recém-diplomados desce consideravelmente em

Portugal, contrastando com a estabilidade demonstrada pela

média da União Europeia.

Esta média esconde, no entanto, uma grande pluralidade de

situações (Figura 4.6). Grécia (43,2%), Itália (45,0%), Croácia

(62,0%), Espanha (65,1%), Bulgária (65,4%), Roménia (66,2%) e

República de Chipre (68,7%) têm taxas de emprego de recém-di-

plomados mais baixas do que Portugal, sendo que os valores da

Grécia e da Itália se destacam por evidenciarem a grave dificuldade

que os jovens têm atualmente em inserir-se profissionalmente no

mercado de trabalho nestes países. No espectro contrário verifica-

mos que Suécia (85,0%), Áustria (87,2%), Holanda (86,2%),

Alemanha (90,0%) e Malta (93,0%) são os países onde os jovens

têm mais facilidade em encontrar emprego após terminada a sua

formação escolar.

Entre os estudantes da União Europeia com idades

compreendidas entre os 15 e os 30 anos a principal

preocupação em relação ao trabalho futuro prende-se

com a natureza do vínculo do contrato (Figura 4.8). De

facto, para 31,1% dos jovens «não conseguir um

trabalho estável ou um contrato de longa duração» é o

maior receio manifestado. Por ordem decrescente, as

outras preocupações assinaladas pelos jovens são «ter de

se deslocar para encontrar trabalho» (15,8%), «não ter

as competências ou os conhecimentos adequados»

(12,7%) e o «nível salarial» (12,7%). Por sua vez, 19,5%

dos jovens estudantes declaram não ter preocupações

em relação a encontrar trabalho.

Em Portugal os valores estão próximos da média da

UE28 em relação ao receio de não encontrar «trabalho

estável ou contrato a longo termo» (32,2%) e um pouco

mais baixos em relação a «ter de se deslocar para encon-

trar trabalho» (11,2%) e a «não ter as competências ou

os conhecimentos adequados» (8,4%). Portugal

destaca-se, no entanto, por apresentar valores bastante

mais elevados do que a média da União Europeia no que

toca à preocupação com o «nível salarial» (21,7% vs.

12,7%), o que estará relacionado com os baixos salários

praticados no país, sobretudo em início de carreira.

No âmbito europeu, a principal preocupação dos

jovens estudantes – «não encontrar trabalho estável ou

contrato a longo termo» – assume proporções mais

elevadas em Itália, onde mais de metade dos seus jovens

estudantes indica ter esse receio (52,5%), seguida, com

alguma distância, pela Espanha com 43,1% (Figura 4.7).

Os países onde os jovens referem menos essa preocu-

pação (face a outras) situam-se no Leste e do Norte da

Europa, em particular Estónia (3,9%), Lituânia (15,6%),

Bulgária (15,9%) e Letónia (15,9%).

50

UE28

Portugal

Não encontrar um contrato a longo

termo ou um trabalho estável

Não ter as competências ou os conhecimentos

necessários

Ter de se deslocar para

encontrar um trabalho

O nível salarial Outro

19,5

Não tenhopreocupações

17,5

8,2

9,1

12,7

21,7

15,8

11,2

12,7

8,4

31,1

32,2

Fonte: Eurostat

Figura 4.5 Taxas de emprego dos jovens entre os 20 e os 34 anos recém-diplomados, Portugal e UE28, 2000-2014 (%)

Figura 4.8 Jovens estudantes entre os 15 e os 30 anos, segundo a sua principal preocupação em relação a encontrar um trabalho, Portugal e UE28, 2014 (%) Fonte: Eurobarómetro 408

Figura 4.6 Taxas de emprego dos jovens entre os 20 e os 34 anos recém-diplomados, UE28, por países, 2014 (%)

Fonte: Eurostat

Figura 4.7 Jovens estudantes entre os 15 e os 30 anos que declararam que a sua principal preocupação em relação a encontrar um trabalho é não conseguir um contrato a longo termo ou um trabalho estável, UE28, por países, 2014 (%)

Fonte: Eurobarómetro 408

44,3 - 56,4

56,5 - 69,4

69,5 - 81,4

81,5 - 94,0

PTES

CY

FR

BELU

NL

DK

FI

IT

DE

CZ

ATSI HR

HU

SK

0 400Km

UK

SE EE

LVLT

PL

BG

RO

EL

IE

3,9 - 16,2

16,3 - 28,6

28,7 - 41,0

41,1 - 53,5

PTES

CY

FR

BELU

NL

DK

FI

IT

DE

CZ

ATSI HR

HU

SK

0 400Km

UK

SE EE

LVLT

PL

BG

RO

EL

IE

69,4

76,0União Europeia 2890,7

Portugal

2000

2014

78,9

2006

2014

51

Desemprego e propensão parao empreendedorismo

III

A progressiva dificuldade de inserção profissional dos jovens

diplomados no mercado de trabalho deve ser contextualizada no

fenómeno mais abrangente do aumento das taxas de desempre-

go na União Europeia nos últimos anos. Em Portugal, o aumento

do desemprego, em parte como consequência da crise econó-

mica, foi particularmente sentido por parte da população mais

jovem, tendo atingindo, em 2013, o valor de 28,9% entre os

indivíduos dos 15 aos 29 anos (Figura 4.9). Em comparação com

a média da União Europeia, Portugal tinha, no início do século,

taxas de desemprego jovem muito mais baixas (6,2% vs.

14,8%). O crescimento do desemprego jovem foi no entanto

aumentando de forma progressiva, distanciando-se consideravel-

mente dos valores da UE a partir de 2011. Em 2014 a taxa de

desemprego da população com idades compreendidas entre os

15 e os 29 anos fixava-se em 25,4% em Portugal, bem acima

dos 17,7% registados na UE28. Ao longo do mesmo período de

referência, a taxa de desemprego jovem para a média da União

Europeia manteve-se mais constante, tendo no entanto também

aumentado a partir de 2011, chegando a valores próximos dos

19% em 2013.

No interior da União Europeia sempre existiram situações

muito diversificadas em relação ao desemprego juvenil. A crise,

contudo, veio agravar essas diferenças, tendo os valores

mantido-se relativamente baixos em alguns países – Alemanha

(6,9%), Áustria (8,9%) e Malta (8,9%), países que em 2014

tinham uma taxa de desemprego jovem com valores abaixo dos

10% – e aumentado drasticamente em alguns casos, nomeada-

mente no sul da Europa e em alguns países de Leste (Figura

4.10). Em 2014, entre os países com mais altas taxas de desem-

prego jovem, a Grécia apresentava a situação mais preocupante

com uma taxa de desemprego de 45% nos jovens entre os 15 e

os 29 anos, seguida da Espanha (39,7%), Croácia (32,3%), Itália

(31,6%), República de Chipre (26,2%) e Portugal. Com o

aumento do desemprego entre os jovens que tem emergido em

Portugal, como noutros países afetados pela crise, um

discurso de responsabilização do jovem desempregado

pela situação em que se encontra, alimentado pelo

crescente incentivo a práticas de criação do próprio

emprego e pelo pressuposto de que Portugal tem baixos

níveis de empreendedorismo. Uma questão do Euroba-

rómetro em que se avalia o posicionamento dos jovens

em relação à hipótese de criação do seu próprio negócio

vem no entanto evidenciar que os jovens portugueses

apresentam valores muito próximos da média dos jovens

na UE28 (Figura 4.12). De facto em 2014, 5,7% dos

jovens portugueses já tinha criado uma empresa (contra

5,1% dos jovens da UE), 16,7% gostaria de criar uma

empresa nos próximos anos, 30,2% gostaria de vir a

abrir uma empresa, mas consideravam que era demasia-

do difícil e 2,9% tentára abrir uma empresa, mas desisti-

ram por ser demasiado difícil. Menos de metade dos

jovens portugueses indicava não querer abrir uma

empresa (44,5%), quando a média para os jovens da

União Europeia era bastante superior (53,1%).

Ao analisar a percentagem de jovens que declara não

querer abrir uma empresa nos diferentes países da União

Europeia, verifica-se que é nos países de Leste e no Sul

da Europa que os jovens menos repudiam a hipótese de

montar o seu próprio negócio (Figura 4.11). Apenas

18,7% dos jovens búlgaros, 25,5% dos jovens letões,

28,5% dos jovens croatas, 30,1% dos jovens lituanos e

31,1% dos jovens romenos afirmam não o querer fazer.

Os países do Sul da Europa, como Itália (35,5%), Grécia

(36,1%), Chipre (36,2%), Portugal (44,5%) e Espanha

(48,3%), apresentam também valores bastante abaixo

da média europeia em relação a esta questão.

Em contracorrente encontramos os países que

oferecem aos jovens uma situação laboral mais estável

e/ou mais apoios sociais. Em países como Alemanha

(73%), Holanda (70,9%), Áustria (68,3%), Dinamarca

(62,2%), Reino Unido (61,2%), Finlândia (60,6%) e

Suécia (59,9%) existe uma menor propensão para o

empreendedorismo entre as faixas mais jovens da

população, posição que é muito possivelmente incenti-

vada pelas condições laborais satisfatórias que o mercado

de trabalho oferece nesses países à grande maioria da

população jovem.

52

Figura 4.12 Jovens entre os 16 e os 30 anos segundo a sua posição face à hipótese de criaçãode uma empresa, Portugal e UE28, 2014 (%)

UE28

Portugal

Criou uma empresa

Pretende criar uma empresa nos próximos

anos

Gostaria de criar uma empresa, mas acha que é demasiado difícil

Tentou criar uma empresa, mas desistiu porque era

demasiado difícilNão quer criar uma empresa

5,1

5,7

2,5

2,9

22,2

30,2

17,1

16,7

53,1

44,5

Fonte: Eurobarómetro 395 European Youth

Fonte: Eurobarómetro 395 European Youth

Figura 4.10 Taxas de desemprego jovem (dos 15 aos 29 anos),UE28, por países, 2014 (%)

Figura 4.11 Jovens entre os 16 e os 30 anos que declaram não querer criar uma empresa, UE28, por países, 2014 (%)

Fonte: Eurostat

Figura 4.9 Taxa de desemprego jovem (dos 15 aos 29 anos), Portugal e UE28, 2014 (%) Fonte: Eurostat

6,5 - 14,9

15,0 - 24,9

25,0 - 34,9

35,0 - 46,0

PTES

CY

FR

BELU

NL

DK

FI

IT

DE

CZ

ATSI HR

HU

SK

0 400Km

UK

SE EE

LVLT

PL

BG

RO

EL

IE

18,7 - 32,4

32,5 - 46,2

46,3 - 60,0

60,1 - 74,0

PTES

CY

FR

BELU

NL

DK

FI

IT

DE

CZ

ATSI HR

HU

SK

0 400Km

UK

SE EE

LVLT

PL

BG

RO

EL

IE

Portugal2014

6,2

25,4

2000

17,7União Europeia 2814,8

2000

201418,9

28,9

13,3

12,0

(2008)

(2013)

53

Autonomizaçãoe perceções de felicidade

IV

O aumento dos níveis de escolarização e, em particular,

o crescimento do número de jovens a frequentar o ensino

superior, a crise económica, as dificuldades de inserção no

mercado de trabalho e o crescimento do desemprego,

sobretudo junto das faixas mais jovens, têm tido impacto

também na capacidade e na possibilidade de autonomiza-

ção, nomeadamente residencial, dos jovens. Portugal,

como vários outros países do sul da Europa, apresenta,

tradicionalmente, uma idade mais tardia de saída de casa dos

pais. Em comparação com a média da União Europeia

verifica-se que em 2000 os jovens portugueses saíam de

casa dos pais em média aos 28,2 anos, quando na UE a

idade média era de 25,4 (Figura 4.13). Entre 2000 e 2013

assistimos, na UE e em Portugal, a uma tendência de

aumento desta idade média. No caso europeu, essa idade

elevou-se para os 26,1 anos, ao passo que em Portugal ela

ascende aos 29 anos.

Também no que se refere à idade média de saída de casa

dos pais o espaço europeu apresenta fortes contrastes

(Figura 4.14). Os países escandinavos destacam-se por

serem aqueles onde os jovens se autonomizam mais cedo

do agregado doméstico de origem, nomeadamente a

Suécia (19,6), a Dinamarca (21) e a Finlândia (21,9). Esta

autonomização precoce dos jovens nestes países prende-se

com questões culturais, mas é certamente também favore-

cida pelos apoios oferecidos pelo Estado aos jovens no

momento da transição para o ensino superior. Por contras-

te, os jovens dos países do Sul e do Leste da Europa tendem

a sair de casa dos pais em idades muito mais tardias: em

Portugal (29), Espanha (28,9), Grécia (29,3) e Itália (29,9) os

jovens tendem a sair de casa dos pais já perto dos 30 anos;

idêntico padrão regista-se em países como a Bulgária (29,2),

Polónia (28,7) Roménia (28,5) e Eslovénia (28,8).

Finalmente, observa-se ainda um grupo de países em que

os jovens saem de casa já depois de ultrapassar os 30 anos:

são eles Malta (30,1), Eslováquia (30,7) e Croácia (31,9).

Quando questionados sobre o seu grau de felicidade

(numa escala de 1 a 10), constata-se que a média de respos-

tas dos jovens residentes em Portugal tende a ser próxima

da média europeia, ainda que esta última seja mais constan-

te ao longo dos anos do que o que se verifica em Portugal

(Figura 4.16). Uma análise longitudinal ao longo de 10 anos

sugere o impacto que a crise económica (e os problemas

sociais e laborais que daí advêm) parece ter na perceção de

felicidade dos jovens em Portugal. Se no início do século

essa perceção atingia os 7,7 entre os jovens portugueses

(acima da média europeia), em 2004 e em 2012 esse valor

sofre uma quebra acentuada (para 7,1), muito possivelmen-

te na sequência dos efeitos da recessão económica de 2003

e do plano de resgate económico implementado em 2011.

A estabilidade da média dos valores europeus durante esse

período pode explicar-se, pelo menos em parte, pela

ausência, neste grupo em análise, de países como a Grécia

e a Itália, onde os impactos da crise sobre a juventude

fizeram sentir-se com particular acuidade.

Em relação ao ano para o qual dispomos de dados mais

recentes (2012), verificamos que os países europeus onde

os jovens declaram ser mais felizes são a Dinamarca (8,4), a

Noruega (8,3), a Finlândia (8,2), a Suíça (8,1) e a Holanda

(8,1), todos eles países com um nível de vida elevado e que

não foram tão afetados pela crise económica (Figura 4.15).

Ainda assim é de notar que a perceção de felicidade por

parte dos jovens não está sempre necessariamente associa-

da às condições económicas e laborais do país. De facto, se

em Portugal (7,1), Irlanda (7,2) e Itália (7,2), países afetados

fortemente pelo desemprego jovem, os valores de

perceção de felicidade são relativamente baixos, suplantan-

do apenas os valores médios apurados junto dos jovens dos

países da Europa de Leste, como a Bulgária (6,4), a Hungria

(6,8) e a Ucrânia (6,9), já a Espanha, país com taxas de

desemprego jovem entre as mais altas da União Europeia,

destaca-se por ter perceções de felicidade mais próximas

das do Norte da Europa (7,9).

54

29,0

União Europeia 28

25,4

Portugal2000

2013

28,2

2000

2013

26,1

28,8

26,4

Europa

Portugal

7,7 7,5 7,6 7,7 7,8 7,7

7,6

2002

7,1 7,3 7,6 7,5 7,1

20122010200820062004

Figura 4.14 Idade média estimada de saída dos jovens de casa dos pais, UE28, por países, 2013 (anos)

Figura 4.15 Perceção de felicidade dos jovens entre os 15 e os 29 anos, na Europa, por países, 2012 (média) Fonte: European Social Survey, Ronda 6Fonte: Eurostat

(2004)

(2008)

Figura 4.13 Idade média estimada de saída dos jovens de casa dos pais, Portugal e UE28, 2000-2013 (anos) Fonte: Eurostat

Figura 4.16 Perceção de felicidade dos jovens entre os 15 e os 29 anos, Portugal e Europa, 2002-2012 (média)Para esta análise foram tidos em conta apenas os países europeus que participaram em todas as rondas do European Social Survey: Bélgica, Suíça, Alemanha, Dinamarca, Espanha, França,Finlândia, Hungria, Irlanda, Reino Unido, Holanda, Noruega, Polónia, Suécia, Portugal e Eslovénia.

Fonte: European Social Survey, Ronda 1-6

19,6 - 22,1

22,2 - 24,8

24,9 - 27,4

27,5 - 30,1

PTES

CY

FR

BELU

NL

DK

FI

IT

DE

CZ

ATSI HR

HU

SK

0 400Km

UK

SE EE

LVLT

PL

BG

RO

EL

IE

6,4 - 6,8

6,9 - 7,3

7,4 - 7,8

7,9 - 8,5

PTES

CY

FR

BELU

NL

DK

FI

IT

DE

CZ

SIHU

SK

0 400Km

UK

SE EE

LT

PL

BG

IE30,2 - 32,9

IS

NO

CH

UA

55

O aumento dos níves deescolarização, a crise económicae o crescimento do desempregotêm tido impacto na capacidadede autonomização dos jovens.

ESCOLARIZAÇÃO

EMPREGO RECÉM-DIPLOMADOS

DESEMPREGO

AUTONOMIZAÇÃO RESIDENCIAL

AVAL

IAÇÕ

ES S

UBJ

ETIV

AS

CON

DIÇ

ÕES

OBJ

ETIV

AS

ADEQUAÇÃO DA FORMAÇÃO AO MERCADO DE

TRABALHO

PREOCUPAÇÕESEM RELAÇÃO AENCONTRAR

UM TRABALHO

PROPENSÃO AO EMPREENDEDORISMO

PERCEPÇÃO DE FELICIDADE

56

Conclusão

V Em Portugal, a população jovemestá fortemente vulnerável aosefeitos da crise económica.

Os elevados níveis de qualificação representam um

atributo genérico da população jovem que vive na União

Europeia. A percentagem de jovens adultos com diploma

superior não tem parado de crescer ao longo do tempo e

Portugal, neste domínio, tem registado uma notável aproxi-

mação à média europeia.

Se os dados da escolarização dos jovens na União

Europeia revelam uma tendência positiva, já a análise de

outros indicadores evidencia algumas das dificuldades com

que a população jovem se tem vindo a debater nos últimos

anos, agravadas pelo impacto da recente crise económica.

E comprova a sua incidência diversa no espaço europeu,

marcado por duas realidades com contornos bem distintos:

a dos países do Sul e do Leste, por um lado, e a dos países

do Norte e Centro, por outro.

Observando elementos-chave para a autonomização dos

jovens, como sejam o acesso ao emprego, constatam-se de

facto fortíssimas assimetrias no espaço europeu. Os impac-

tos da crise atingem de forma particularmente intensa a

população jovem que vive em países como a Grécia,

Espanha, Itália, Croácia, Chipre, Roménia e Bulgária,

refletidos quer na diminuição das taxas de emprego, quer no

aumento das taxas de desemprego aí observados. Por

contraste, em países como a Suécia, Áustria, Alemanha,

Holanda e Malta os jovens estão mais salvaguardados desses

efeitos, uma vez que encontram mais facilidade em obter

emprego após concluídos os estudos. Talvez por isso, e

pelos apoios sociais de que usufruem, a propensão para o

empreendedorismo junto dos jovens destes e de outros

países do centro da Europa revela-se bem menor do que

entre os jovens que vivem em países mais afetados do

ponto de vista económico.

Portugal inscreve-se no primeiro contingente de países,

com a população jovem fortemente vulnerável aos efeitos

da crise económica. Não obstante, em todos os países

europeus, ricos ou pobres, a ameaça de precariedade nas

relações laborais constitui preocupação comum aos

jovens – ainda que mais acentuada entre os que vivem

em países com economias mais débeis.

A escassez de apoios sociais, aliada a uma conjuntura

económica desfavorável e a fatores culturais mais

impregnantes, estarão na origem de um retardamento

da saída de casa dos pais por parte dos jovens que

residem nos países do Sul, mas também do Leste

europeu. Portugal não é exceção. As elevadas idades

médias estimadas para a saída de casa dos pais revelam

acrescidas dificuldades de autonomização, nomeada-

mente residenciais, que se oferecem aos jovens.

Este conjunto de bloqueamentos às transições juvenis,

nomeadamente em países como Portugal, não deixa de

ter reflexos na perceção de felicidade manifestada pelos

mais novos: em tempos de crise, o seu grau de felicidade

diminui.

referências bibliográficas

Alves, N. A., Cantante, F., Baptista, I. e Carmo R. M. 2011,

Jovens em Transições Precárias. Trabalho, Quotidiano e Futuro.

Lisboa: Mundos Sociais.

Pais, J. M., Ferreira, V. S. (Eds.). 2010. Tempos e transições

de vida: Portugal ao espelho da Europa. Lisboa: ICS.

57

CONFIANÇA

PORTUGAL NO CONTEXTO EUROPEU EM ANOS DE CRISE5

Porque confiamos uns nos outros ou nas instituições que regulam o nosso quotidiano? Quais são as implicações que daí advêm para a formação dos futuros cidadãos e para o funcionamento da sociedade? As pessoas mais confiantes são mais felizes?

Ana Delicado, Alice Ramos, José Gomes Ferreira,João Guerra, Jussara Rowland

Estes são apenas alguns exemplos de perguntas que têm preocupado cientistas sociais de

diferentes áreas, e que nem sempre conseguiram obter uma resposta conclusiva. De acordo

com Putnam (2000), uma sociedade caracterizada pela reciprocidade generalizada é mais

eficiente do que uma sociedade onde reina a desconfiança: a confiança é um lubrificante da

vida social que funciona como um facilitador de relações, sejam elas interpessoais ou institucio-

nais. A confiança permite delegar e, quer se trate de um grupo de amigos, de uma família, de

uma empresa ou da governação de um país, confiar que estamos todos a trabalhar para um

mesmo objetivo simplifica as regras e reduz o conflito. A confiança está associada aos valores

do universalismo e à preocupação com o bem-estar da humanidade, à abertura a diferentes

formas de pensar e de viver. A confiança gera empatia e a empatia também é social. Contudo,

a confiança é um sentimento difícil de conquistar e talvez aquele que, uma vez perdido, mais

difícil é de recuperar. Em todos os inquéritos europeus nos quais a confiança é tema, os

portugueses destacam-se consistentemente pela desconfiança manifestada. Seja no plano

individual, seja no institucional, os portugueses tendem a não confiar. Porquê? Sociólogos,

psicólogos sociais, cientistas políticos, filósofos, têm procurado responder a esta pergunta.

Tendo-se encontrado regularidades (por exemplo, baixos níveis de escolaridade, de bem-es-

tar, de perceção de controlo sobre a vida ou de participação cívica estão associados a baixos

níveis de confiança), ainda estão por encontrar os fatores que explicam por que razão os

cidadãos dos países nórdicos apresentam os níveis mais altos de confiança e os portugueses

(juntamente com cidadãos dos ex-países de Leste) os mais baixos. Vejamos, então, qual o

panorama da confiança em Portugal e na Europa.

59

Figura 5.1 Confiança interpessoal na Europa, 2012 (média)

Figura 5.4 Confiança na polícia, 2012 (média) Figura 5.5 Confiança no sistema legal, 2012 (média)

Figura 5.3 Confiança na política e nos políticos, 2012 (média)Figura 5.2 Confiança no parlamento nacional, 2012 (média)Fonte: European Social Survey

Fonte: European Social Survey

Fonte: European Social Survey

Fonte: European Social SurveyFonte: European Social Survey

IS

PTES

FR

BELU

NL

DK

FI

IT

CY

DE

CZ

CHSI

HU

SK

IE

0 400Km

UK

SE EE

LT

UA

PL

BG

NO

1,8 - 3,0

3,1 - 4,4

4,5 - 5,8

5,9 - 7,3

PTES

CY

FR

BE

CH

NL

DK

FI

IT

DE

CZ

SIHU

SK

0 400Km

UK

SE EE

LT

PL

BG

IE

IS

UA

NO

1,8 - 2,8

2,9 - 3,9

4,0 - 5,0

5,1 - 6,3

3,6 - 4,5

4,6 - 5,6

5,7 - 6,6

6,7 - 7,8

PTES

CY

FR

BE

CH

NL

DK

FI

IT

DE

CZ

SIHU

SK

0 400Km

UK

SE EE

LT

PL

BG

IS

UA

NO

2,0 - 3,6

3,7 - 5,4

5,5 - 7,2

7,3 - 9,1

PTES

CY

FR

BE

CH

NL

DK

FI

IT

DE

CZ

SIHU

SK

0 400Km

UK

SE EE

LT

PL

BG

IS

UA

NO

1,9 - 3,5

3,6 - 5,2

5,3 - 6,9

7,0 - 8,7

PTES

CY

FR

BELU

CH

NL

DK

FI

IT

DE

CZ

SIHU

SK

0 400Km

UK

SE EE

LT

PL

BG

IS

UA

NO

IE IE

60

Confiança interpessoal

I

Confiança nas instituições

II

Portugal, Polónia, Ucrânia,Eslováquia e Bulgária são os paísesonde se regista uma clara falta deconfiança interpessoal.

A confiança interpessoal foi medida através de três

perguntas, que foram posteriormente agregadas num

índice. As perguntas fazem parte do European Social

Survey e são as seguintes:

1) De uma forma geral, acha que todo o cuidado é

pouco quando se lida com as pessoas ou acha que se pode

confiar na maioria das pessoas?

2) Acha que a maior parte das pessoas tentam aprovei-

tar-se de si sempre que podem, ou pensa que a maior

parte das pessoas são honestas?

3) Acha que, na maior parte das vezes, as pessoas estão

preocupadas com elas próprias ou acha que tentam ajudar

os outros?

As respostas eram dadas numa escala de 0 a 10, em que 0

representa a atitude menos confiante e 10 a mais confiante.

A Figura 5.1 mostra Portugal, a Polónia, a Ucrânia, a

Eslováquia e a Bulgária como os países onde se registam

valores abaixo do ponto médio da escala (5), indicativos de

clara falta de confiança. Os países nórdicos (Islândia,

Noruega, Suécia e Finlândia) são, em contrapartida,

aqueles em que se observam níveis mais elevados de

confiança interpessoal, apresentando, juntamente com a

Holanda e a Suíça, valores sistematicamente acima do

ponto médio da escala (5), indicativos de franca confiança.

Os países do centro da Europa (a que se junta a Espanha)

registam valores intermédios de confiança.

A par da confiança interpessoal foi também perguntado o grau de

confiança que um número alargado de instituições inspirava nos

inquiridos. As instituições foram as seguintes: parlamento nacional,

sistema legal, polícia, políticos e política. A análise da confiança nas

instituições revela contrastes e semelhanças muito interessantes

entre os vários países europeus (Figuras 5.2 a 5.5).

Antes de mais podemos ver como, de uma forma geral, o padrão

de confiança por conjunto de países se mantém relativamente ao

observado no caso da confiança interpessoal, sendo os nórdicos os

que mais confiam também nas instituições e Portugal e os antigos

países de Leste os que menos confiam. A confiança, seja em

pessoas ou em instituições, parece, assim, ter alicerces comuns.

No que se refere a contrastes, o maior será talvez a diferença que

separa a polícia da política (e dos políticos). Em todos os países é

manifesta a confiança na polícia, e mesmo não estando Portugal

entre os países com valores mais elevados também aqui a confiança

na polícia supera os níveis de confiança nas restantes instituições.

No extremo oposto encontramos dois alvos de avaliação dificilmen-

te dissociáveis, a classe política e a política. O descrédito é generali-

zado. Mesmo nos países nórdicos, o valor máximo de confiança

situa-se apenas um ponto acima da média da escala. Apesar de

também se tratar de uma instituição do foro político, o parlamento

nacional regista níveis de confiança superiores. Possivelmente, o

parlamento é avaliado como uma instituição estável e fundamental

do sistema democrático. Os políticos (e a política) têm um impacto

muito mais direto na vida das pessoas, ficando por isso mais vulnerá-

veis a serem associados a medidas concretas (cortes nas remunera-

ções, desemprego, etc.) e alvo de generalizações de casos mediáti-

cos (em Portugal os exemplos de José Sócrates e de Miguel Relvas,

na Holanda a recente situação de envolvimento do ministro da

justiça Ivo Opstelten com um barão da droga). Note-se ainda que

só no caso da confiança nas instituições Portugal se assemelha aos

países de Leste. O sistema legal é igualmente das instituições mais

credíveis, sendo apenas alvo de desconfiança maioritária na Ucrânia

e na Bulgária, aliás os dois únicos países que estão sistematicamente

entre os que menos confiam, seja nas pessoas seja nas instituições.

61

5,3

4,1

5,15,35,15,15,1

4,24,24,2 4,34,2

3,53,53,84,03,94,4

4,33,7 3,8 3,5

2,92,5

1,82,02,42,52,12,8

Confiança interpessoal

Confiança na polícia

Confiança no sistema legal

Confiança no parlamento

Confiança na política enos políticos

2002 2004 2006 2008 2010 2012

2002 2004 2006 2008 2010 2012

Figura 5.7 Confiança nas fontes de informação ambiental, 2014 (média - %) Fonte: Special Eurobarometer 416, 2014

Figura 5.8 Confiança na televisão como fonte de informação ambiental, 2014 (%) Fonte: Special Eurobarometer 416, 2014

Figura 5.6 Confiança nas Instituições em Portugal, 2002-2012 (média) Fonte: European Social Survey

PTES

CY

FR

BELU

NL

DK

FI

IT

DE

CZ

SIHUSK

IE

0 400Km

UK

SE EE

LT

PL

BG

HR RO

EL

LV

AT

PTES

CY

FR

BELU

NL

DK

FI

IT

DE

CZ

SIHUSK

IE

0 400Km

UK

SE EE

LT

PL

BG

HR RO

EL

LV

AT

62

<13,5

13,5 - 15,0

15,1 - 16,5

16,6 - 18,0

>18,0

<25

25 - 35

36 - 45

46 - 55

>55

Evolução da confiançaem Portugal

III

Confiança nas fontes deinformação ambiental

IV

No período 2002-2012, apenas aconfiança na polícia aumentouligeiramente, tendo a confiança noparlamento sofrido a maior quebra.

Os dados do European Social Survey permitem-nos

ainda ter uma perspetiva da evolução da confiança nas

cinco dimensões anteriormente analisadas. Na Figura 5.6

podemos ver como a confiança é, apesar de tudo, um

fenómeno relativamente estável. Em 2002 a confiança

na política e nos políticos ocupava a posição mais baixa,

enquanto os níveis de confiança nas restantes instituições

e nas pessoas partilhavam valores igualmente baixos,

apesar de tudo próximos do ponto médio da escala. A

partir de 2006, esta separação começa a diluir-se com a

descida generalizada dos níveis de confiança, tendência

que se mantém observável até 2012. Comparando os

dados de 2012 com os de 2002, apenas a confiança na

polícia aumentou ligeiramente, tendo a confiança no

parlamento sido a que maior queda registou (em 2002 a

média era de 4,5, em 2012 passou para 2,5).

Considerando que a confiança está relacionada com a

perceção, por um lado, de que as pessoas são honestas

e se preocupam umas com as outras e, por outro, de

que as instituições servem os cidadãos defendendo os

seus direitos e os seus interesses, esta quebra de uma

confiança já de si baixa não será certamente alheia ao

clima socioeconómico que o país vive desde 2008 e às

consequências diretas no dia a dia dos portugueses. Mas

só um estudo aprofundado poderá levantar o véu que

cobre as razões desta possível associação.

No domínio ambiental, a dimensão da confiança está

geralmente associada nos inquéritos de opinião a uma

pluralidade de atores, entre os quais têm particular

destaque os atores políticos (governos, instâncias

supranacionais), as organizações de sociedade civil

(organizações não governamentais de ambiente, associa-

ções de consumidores) e os meios de comunicação

social, sobretudo no seu papel como fontes de informa-

ção fidedigna.

Tomando o mais recente Eurobarómetro sobre

questões ambientais como referência (Special Eurobaro-

meter 416, 2014), verifica-se que em termos médios

(quando consideradas as 17 variáveis – ver Figura 5.9),

tal como nos indicadores anteriores, Portugal revela

índices de confiança mais baixos do que os seus congé-

neres europeus (Figura 5.7). É também notória uma

clivagem Norte-Centro-Sul e Este-Oeste: as taxas de

confiança mais elevadas registam-se nos países nórdicos,

as intermédias no centro da Europa e as mais baixas no

Sul e no Leste. Os países nórdicos, em conjunto com a

Áustria, o Chipre e a Holanda, lideram o índice geral de

confiança (todos superiores a 18%). A uma grande

distância surge Portugal que, a par da Roménia, Letónia,

Itália e Hungria, não ultrapassam os 15%.

No entanto, este padrão inverte-se quando se isola a

televisão como fonte de informação ambiental (a fonte

mais frequentemente mencionada em Portugal, como

abaixo se verá) (Figura 5.8). É substancialmente maior a

confiança na televisão em Portugal e nos países do Leste

(com destaque para a Roménia e a Bulgária; são estes

três países, aliás, os únicos a ultrapassar a fasquia dos

55% de confiança na televisão entre os 28 Estados-

-membros) e tende a decrescer à medida que se

caminha para o centro e para o norte da Europa.

63

26

60

47

27

27

televisão ONGA

30

33

27

25

36

UniãoEuropeia

cientistasautoridades locais/regionais

empresasgovernos nacionais

Figura 5.10 Confiança nas fontes de informação ambiental em Portugal, 2002-2014 (%)Fonte: Special Eurobarometer 58.0 (2002), 62.1 (2004), 68.2 (2007), 75.2 (2011), 416 (2014)

34

40

37

12

25

19

13

18

8

7

10

12

6

6

6

2

3

60

33

33

19

16

16

12

11

8

7

6

5

4

2

2

2

4

21

7

6

13

25

4

2

2

2

3

5

2

5

4

14

23

33

26

26

17

23

7

8

12

22

Figura 5.9 Confiança nas fontes de informação ambiental em Portugal e na UE28, 2014 (%) Fonte: Special Eurobarometer 416, 2014

TELEVISÃO

CIENTISTAS

ONGA

INTERNET REDES SOCIAIS

PROFESSORES

JORNAIS

ONG INTERNACIONAIS

ASSOC. CONSUMIDORES

REVISTAS

UNIÃO EUROPEIA

FAMÍLIA, AMIGOS, VIZINHOS...

RÁDIO

PARTIDOS AMBIENTALISTAS

GOVERNO NACIONAL

GOVERNOS REGIONAIS

EMPRESAS

SINDICATOS

2014

2011

2007

2004

2002

UE28 PORTUGAL

64

Conclusão

IV

referências bibliográficas

Comparando os níveis de confiança nos diferentes

agentes (Figura 5.9), verifica-se que a televisão tem

particular destaque em Portugal (60%, face a 34% na

UE), enquanto na União Europeia se registam taxas mais

elevadas de confiança nos cientistas (40% face a 33% em

Portugal) e nas ONGA (37% face a 33%). Portugal

destaca-se também pela maior confiança nos professo-

res (19% face a 12%). Segundo o mesmo inquérito, as

fontes de informação ambiental a que os portugueses

mais recorrem são a televisão (81%), a Internet e as

redes sociais (38%), os jornais (25%) e os filmes e

documentários na televisão (21%).

Por fim, em termos longitudinais (Figura 5.10), apesar

de uma alteração na forma como a pergunta é formulada

nos inquéritos a partir de 2014 ², é notório o crescimen-

to da confiança na televisão, sobretudo a partir de 2007,

e nos cientistas, a que estará associado o substancial

esforço de divulgação da ciência que se faz em Portugal

nos últimos anos (Delicado 2006). Há também que

considerar que os cientistas se têm tornado figuras mais

conhecidas do público, com uma presença assídua nos

noticiários televisivos (Schmidt 2008: 101), por vezes

mesmo em representação de ONGA. Ao contrário do

que sucede noutros países, a cobertura mediática da

ciência (por exemplo, no caso das alterações climáticas

analisado por Ramos e Carvalho 2008) tende a

representar mais o consenso e a solidez do conhecimen-

to científico do que as divergências e as incertezas.

Verifica-se também alguma oscilação da confiança nas

ONGA (decréscimo entre 2004 e 2007, subida desde

então) e o declínio acentuado da confiança no governo e

nas autoridades locais, que poderá estar associado ao

desinvestimento estatal no ambiente, como visto no

capítulo 2, e à generalizada falta de confiança no sistema

político, acima registada. As empresas suscitam níveis de

confiança sistematicamente baixos e com tendência de

descida.

Apesar da multidimensionalidade do conceito de confiança aqui

utilizado, que se aplica tanto aos outros (interpessoal) como às institui-

ções políticas e às fontes de informação, uma regularidade é notória:

Portugal encontra-se sempre no grupo de países onde os níveis de

confiança são mais baixos. Os dados longitudinais mostram que esta

tendência está longe de se atenuar com o tempo. Em lugar de se

aproximar dos países do centro da Europa, Portugal assemelha-se

crescentemente a congéneres improváveis a Leste, os países com um

passado de regimes comunistas. Se em alguns indicadores a divisão

Norte-Sul se mantém (confiança no parlamento, nos políticos, no

sistema legal), noutros os nossos usuais parceiros Espanha e Itália

aproximam-se mais da média europeia (confiança interpessoal,

confiança na polícia). No domínio ambiental, é de certa forma preocu-

pante a ascensão da confiança na televisão, um meio particularmente

sujeito a manipulações e a interesses (em que o agenda setting é muito

orientado para a maximização das audiências), face à estagnação da

confiança em cientistas e nas ONGA e a uma descrença quase total nos

políticos e nas empresas.

Se a estrutura da sociedade portuguesa, em particular os baixos

níveis de escolaridade, pode em parte explicar a prevalência da descon-

fiança em todos estes domínios, não estão ainda identificadas com

clareza as causas (e as consequências) deste atavismo cultural nacional.

² Até 2011, a pergunta referia-se a «confiança quanto a assuntos ambientais», a partir de 2014 refere-se a «confiança no fornecimento de informação fiável sobre assuntos ambientais», apesar de as opções de resposta se terem mantido e a pergunta sempre ter sido feita na sequência de outra pergunta sobre informação ambiental.

Delicado, A. 2006. «A promoção da cultura científica nos museus em

Portugal», Sociologia Problemas e Práticas, n.º 51, 53-72.

Putnam, R. D. 2000. Bowling alone: The collapse and revival of American

democracy. New York: Simon and Schuster.

Ramos, R. e Carvalho, A. 2008. «Science as rhetoric in media discourses

on climate change». In J. Strunck, L. Holmgreen, & L. Dam (Eds.), Rhetorical

aspects of discourse in present-day society. Cambridge: Cambridge Scholars

Publishing, 223-247.

Schmidt, L. 2008. «Comunicar a ciência: o papel dos media e os

problemas científico-ambientais», in L. Schmidt e J. Pina Cabral, Ciência e

cidadania: homenagem a Bento de Jesus Caraça, Lisboa: Imprensa de Ciências

Sociais, 85-112.65

MÉDIA EUROPEIA ou da UNIÃO EUROPEIA

IENB TM EAPreocupação

com o ambiente

Abastecimento público de água

Satisfação com a democracia

IENB TM EA

Perceção do desempenho nacional

NTUE DV EUJ

Jovens com nível de escolarização terciário

ÍLM IAAFFamílias

monoparentais

Qual a posição relativa de Portugalface a outros países europeus?

CRO ACM IE AD

Drenagem de águas residenciais

Separação doméstica de resíduos

MÍLIAAF

Dimensão média das famílias

Nascimentos fora do casamento

Rácio entre casamentos e divórcios

Acima da média

Abaixo da média

Risco de pobreza nas famílias com crianças

Casais que trabalham ambos a tempo inteiro

Horas semanais de trabalho

TN UE DV EUJ

Taxa de desemprego

Idade média de saída de casa dos pais

Índice de fecundidade

Confiança interpessoal

Qualidade da democracia

Avaliação da justiça social

Confiança nas instituições políticas

Despesa pública

Taxa de reciclagem de resíduos urbanos

Confiança nas fontes de informação ambiental

Taxas de emprego dos recém-diplomados

Perceção de felicidade dos jovens

(2010-14)

66

COMENTÁRIO FINAL

PORTUGAL NO CONTEXTO EUROPEU EM ANOS DE CRISE6

Qual a posição relativa de Portugal face a outros países europeus? De que países europeus nos aproximamos mais? Estamos a convergir ou a divergir em relação à média comunitária? Estas são as três questões a partir das quais serão organizados os resultados mais relevantes apresen-tados nos capítulos anteriores.

Os vários capítulos destacaram as principais conclusões a ressaltar em cada um dos

domínios analisados. Uma visão de conjunto permite agora responder de forma mais global às

questões subjacentes a todos eles:

i) Numa perspetiva sincrónica e comparada, que posição relativa ocupa hoje Portugal no

contexto da Europa e da UE28 e quais os países com que apresenta maiores semelhanças?

ii) Numa ótica longitudinal, está Portugal a convergir ou a divergir em relação à média

comunitária?

A resposta a estas questões pressupõe uma outra: em que medida a evolução recente

do país foi influenciada pelo contexto de crise e pelas consequentes medidas de austeridade

que se fazem sentir desde 2009?

Os resultados respeitantes a cada um dos temas abordados, e dentro deles relativos aos

diversos indicadores considerados, mostram que não existe uma resposta linear e inequívoca

para qualquer das questões colocadas.

Qual a posição relativa de Portugal face a outros países europeus?

Para os indicadores suscetíveis de serem ordenados numa escala linear positivo/negativo,

Portugal tende a ocupar uma posição média-baixa, isto é, com valores inferiores à média

europeia ou da União Europeia ainda assim à frente de outros países com piores resultados.

Portugal distingue-se de forma positiva em aspetos pontuais, como sucede no domínio

Ambiente, especificamente com os indicadores relativos ao elevado grau de preocupação

com o ambiente ou à população servida por abastecimento público de água. Na situação

oposta, o país destaca-se negativamente sobretudo pelos baixos valores em relação a alguns

67

PORTUGAL

EUROPADO SUL

EUROPADO

LESTE

EUROPADO

NORTE

EUROPACENTRAL

indicadores de confiança (interpessoal; na política e nos políticos), à insatisfação

com o funcionamento da democracia e à taxa de desemprego juvenil.

Dos cinco domínios considerados – e embora a comparação deva ser

prudente, já que o tipo e o número de indicadores variam bastante – o da Família

salienta-se pelo facto de Portugal ocupar posições distantes da média em diversos

casos, como dimensão do agregado doméstico, o do total de nascimentos fora

do casamento e o rácio entre casamentos e divórcios (valores bastante superio-

res à média) ou o da percentagem de famílias monoparentais com filhos até aos

25 anos e o do índice sintético de fecundidade (ISF) (bem aquém da média).

De que países europeus nos aproximamos mais?

É habitual integrar Portugal no conjunto de países da Europa do Sul. No que

se refere a vários indicadores, é realçada nas secções anteriores a maior proximi-

dade em relação a esse conjunto e, secundariamente, aos países da Europa de

Leste. Contudo, uma leitura de pormenor mostra que existem exceções

significativas a esta tendência geral, que, aliás, variam de domínio para domínio.

Embora com variações entre domínios, os países da Europa do Sul com

maior similitude global com Portugal parecem ser a Itália, a França, a Eslovénia e

Chipre. A Espanha destaca-se pela analogia quanto a alguns indicadores sobre

família (rácio casamento/divórcio, fecundidade, número de horas no trabalho

pago e não pago) e, de forma menos marcada, nos índices de confiança, mas,

curiosamente, apresenta poucas semelhanças no que concerne aos indicadores

sobre ambiente ou a alguns dos indicadores relativos às transições juvenis. A

Grécia ocupa uma posição próxima do nosso país no domínio da juventude e,

ainda, das atitudes face à qualidade da democracia.

No que se refere à Europa de Leste, a Polónia, a República Checa e alguns

países bálticos (sobretudo a Lituânia) revelam semelhanças significativas em

diversos domínios e indicadores.

Na generalidade, são os países da Europa Central e sobretudo da Europa do

Norte que tendem a apresentar resultados mais afastados, porque mais

positivos, de Portugal. Contudo, ocorrem convergências com alguns desses

países em subdomínios específicos, como sucede com os países nórdicos no que

se refere à divisão conjugal do trabalho pago (valor relativamente reduzido de

disparidade de género).

É, portanto, genericamente correto afirmar que Portugal se aproxima

bastante de outros países da Europa do Sul quanto a situações, perceções e

práticas sociais, mas esta afirmação não deve ocultar a existência de exceções em

ambos os sentidos: países meridionais do continente europeu que se distanciam

em aspetos relevantes (a Espanha, por exemplo) e outros, sobretudo do Leste,

que revelam semelhanças significativas com Portugal. Por outro lado, é necessá-

rio levar em conta que os resultados em comparação refletem uma análise

estática. A adoção de uma visão dinâmica permitirá um melhor entendimento

dos graus de semelhança e de diferença entre os diversos países europeus.

Portugal aproxima-se bastante de

outros países da Europa do Sul quanto a

situações, perceções e práticas sociais.

68

EUROPA

DRENAGEM DE ÁGUAS

RESIDENCIAIS

FAMÍLIAS EM RISCO DE POBREZA

ABASTECIMENTO DE ÁGUA

FERTILIDADEFERTILIDADE

DESEMPREGO JUVENIL

FELICIDADE JOVEM

DIVERGÊNCIA

CONVERGÊNCIA

HORAS SEMANAIS DE TRABALHO

RECICLAGEM

EDUCAÇÃO JUVENIL

TERCIÁRIA

Estamos a convergir ou a divergir em relação à médiacomunitária?

A diversidade de domínios e de indicadores levados em consideração não permite

uma resposta unívoca a esta questão. Há aspetos em que persiste uma tendência de

convergência (por exemplo, percentagem de jovens com 30-34 anos com nível de

educação terciário) ou até de superação dos valores médios da União Europeia

(práticas de separação de resíduos urbanos). Mas são diversos os indicadores que,

encontrando-se há vários anos numa trajetória de aproximação às respetivas médias

comunitárias, desaceleraram ou inverteram essa tendência em domínios tão distintos

como a produção de resíduos urbanos per capita ou a taxa de reciclagem, o desempre-

go juvenil ou a perceção de felicidade dos jovens, ou ainda o número de horas

semanais de trabalho a tempo inteiro. Os pontos de inflexão destes vários indicadores

tendem a situar-se entre 2009 e 2011 e são um claro reflexo da crise financeira e

económica iniciada em 2008 e das medidas de austeridade que daí decorreram.

O contexto de crise deteriorou situações (aumento do risco de pobreza em famílias

com crianças, por exemplo), alterou perceções (aumento dos graus de insatisfação e de

desconfiança) e práticas, nomeadamente por parte das famílias visando fazer face à

deterioração das condições materiais de vida e de prestação de alguns serviços públicos

(queda da fecundidade, alteração da divisão conjugal do trabalho remunerado, redução

do número de divórcios, etc.).

Nos anos de 2013 e 2014 verificaram-se sinais pontuais de desaceleração ou

mesmo de inversão em algumas tendências de divergência. Conforme foi sublinhado

nas secções anteriores, são múltiplas as razões que podem ter contribuído para este

tipo de comportamento, pelo que é prematuro concluir que se regressou de forma

sustentada a trajetórias de convergência com as médias comunitárias.

A evolução ocorrida nos últimos anos não decorreu apenas do efeito conjugado

de trajetórias históricas de convergência e dos efeitos da crise iniciada em 2008. Fatores

como os ciclos governativos ou até os ciclos de programação comunitária, ao definirem

opções políticas e investimentos prioritários distintos, podem ter igualmente uma

importância significativa nas situações, perceções e práticas analisadas, mesmo que as

suas consequências não se façam sentir de imediato.

O Portugal social está hoje certamente mais europeu do que no início do século.

No entanto, ao desacelerar ou interromper esse processo de convergência, a crise

financeira e económica colocou a nu várias das vulnerabilidades estruturais da socieda-

de portuguesa. Ao mesmo tempo, porém, permitiu identificar focos de resiliência e de

adaptação transformadora por parte dos cidadãos e das famílias. Num período que é

sem dúvida de charneira, os portugueses oscilam entre a insatisfação e a conscienciali-

zação, a desconfiança e o sentido crítico, o recurso a comportamentos reativos e a

emergência de novas práticas, a reversibilidade de tendências de convergência e a

capacidade de afirmar trajetórias sustentadas de desenvolvimento. Os próximos núme-

ros do Portugal Social em Mudança procurarão desvendar e compreender estas várias

tensões, atualizando a informação relativa aos domínios analisados e alargando o

âmbito de observação através da incorporação de novas áreas e de questões adicionais.

69

SOBRE O ICS-ULISBOA Observatórios ICS

Barómetro da Qualidade da Democraciawww.bqd.ics.ulisboa.pt

Observatório de Ambiente e Sociedadewww.observa.ics.ulisboa.pt

Observatório das Famílias e das Políticas de Famíliawww.observatoriofamilias.ics.ulisboa.pt

Observatório Permanente da Juventudewww.opj.ics.ulisboa.pt

Instituto do Envelhecimentowww.ienvelhecimento.ul.pt

O Instituto de Ciências Sociais da Universidade de Lisboa,

Laboratório Associado (ICS), é uma instituição universitária

consagrada à investigação e à formação avançada em ciências

sociais, reconhecida em Portugal e no estrangeiro pela

qualidade do seu desempenho. A investigação desenvolvida

no ICS é inovadora e interdisciplinar, resultando da combi-

nação virtuosa entre investigadores, projetos de investigação,

uma cultura científica caracterizada pela diversidade teórica e

metodológica e um compromisso com a sociedade. A principal

missão do ICS é contribuir para o conhecimento das

sociedades contemporâneas. Até 2020, a sua agenda de

investigação centrar-se-á em torno do tema: «Sociedades em

Mudança: Legados e Transformações», privilegiando três eixos

de investigação: Inclusão, Cidadania e Sustentabilidade. Parte

da investigação põe especial ênfase na realidade portuguesa e

nas sociedades e culturas com as quais Portugal mantém fortes

relações históricas, quer no espaço europeu quer noutros

espaços geográficos. A investigação individual e coletiva, a

participação num amplo conjunto de redes de pesquisa nacio-

nais e internacionais, o Centro de Estudos Avançados em

Ciências Sociais, o ensino pós-graduado diretamente articula-

do com a investigação, as atividades de outreach, nomeada-

mente através dos Observatórios, constituem as principais vias

de concretização desta missão.

www.ics.ulisboa.pt

UID/SOC/50013/2013

PORTUGAL SOCIAL EM MUDANÇA

Este é o primeiro número do Portugal Social em Mudança, uma

publicação regular do Instituto de Ciências Sociais da Universidade

de Lisboa (ICS-ULisboa) que tem por objetivo disponibilizar

informação sobre questões sociais numa ótica comparada e

longitudinal. Os vários temas selecionados procurarão situar

Portugal em contextos mais amplos, do ponto de vista tanto

geográfico como temporal, a partir de indicadores quer objetivos

(estatísticos) quer subjetivos (perceções, opiniões) relativos a

diferentes facetas da realidade social.