porque greve o críquete uspiano · agora chegamos em 2009. É pri-meiro semestre e o projeto de...

1
O críquete uspiano “Mal tinha acabado de cantar o primei- ro verso”, disse o Chapeleiro, “quando a Rainha berrou ‘Ele está matando o tempo! Cortem-lhe a cabeça!’” POR THIAGO MAHRENHOLZ, 2º ANO DO AUDIOVISUAL Assim como a comunicação e a arte, não achamos que debater e en- tender a vida política da USP seja per- da de tempo. Pra isso o CA está aqui, pra lhe contar um pouco o porquê da USP se movimentar quase todo ano. Voltemos a 2007. O governador decretou o fim da autonomia da USP e abriu caminho para sua privatização, ao entregar ainda mais a Universida- de ao controle de grandes empresas e fundações. Os estudantes queriam saber a opinião da reitora sobre esses decretos. Ela não foi aos estudantes. Os estudantes foram à reitoria. Com a entrada trancada e nem sinal de dispo- sição ao diálogo, ocuparam o prédio em forma de protesto. A ocupação da reitoria, mantida por 51 dias, e a gre- ve barraram os decretos e abriram um amplo questionamento. Em 2008, governo e reitoria vol- taram à cena com sua política “linha dura”, com demissões no sindicato, processos contra alunos e funcioná- rios que participaram da ocupação da reitoria no ano anterior, além de mul- tas às entidades de estudantes e fun- cionários. O objetivo era fazer sumir o movimento iniciado com a ocupação. Agora chegamos em 2009. É pri- meiro semestre e o projeto de ensino à distância chamado Univesp gera indig- nação em muitos cursos. Estudantes começam a realizar paralisações e mes- mo entrar em greve contra o projeto. A reitora tem a grande ideia de ocupar mi- litarmente o campus para acabar com a greve. Escudos, bombas de efeito mo- ral e balas de borracha transformam as ruas e as rotatórias da Cidade Univer- sitária em praças de guerra. A luta pela retirada da PM do campus evolui e se combina com o questionamento da es- trutura de poder autoritária. Isso por- que na USP quase nenhum aluno pode participar da escolha do reitor e no final é coroado mesmo quem o governador quer. Serra escolhe Rodas, segundo co- locado, por saber, pela sua história, que Rodas não irá tremer a mão na hora de pôr em prática seus projetos pra USP. Agora é necessário reunir os es- tudantes para debater e pensar 2010. Um dos espaços que teremos esse ano será o X Congresso de Estu- dantes da USP, onde deverá haver a exposição de teses, grupos de dis- cussão e decisões sobre os mais di- versos assuntos que nos nortearão nos próximos dois anos. Desde já, você está convidado a acompanhar e construir a luta em defesa da USP. Sua história na Uni- versidade está apenas começando. Aproveite para aprender, conhecer novas pessoas, estudar e também deixar aquela que é a principal marca que nós, estudantes, podemos dei- xar: garantir que a qualidade da USP permanecerá. Procure-nos no CA e seja muito bem vindo! porque greve POR CAMILA SOUZA RAMOS, 4 º ANO DO JORNALISMO E aí, bixo, depois de passar por toda a ralação pré-vestibular, tá ani- mado com tudo o que você poderá aprender daqui pra frente? Acredite, as coisas mais valiosas da faculdade não estão entre as quatro paredes da sala de aula, mas nos corredores, nas conversas durante a QiB e nos debates que o Centro Acadêmico vai realizar ao longo do ano. E com o tempo, vai perceber que daria para termos uma universidade muito melhor do que a que temos hoje. “Ih, já vão começar a falar de greve. Ouvi dizer que greve na USP tem ano sim, ano também. Por que na USP tem tanta greve?” Bom, greve de professores, estu- dantes e funcionários já ocorreram na USP em certa quantidade. Nos últimos 10 anos, duas greves foram feitas por conta de verbas para a universidade, uma para contratação de professores, outra contra decretos do governo es- tadual, que violavam a “autonomia universitária”, princípio constitucion- al que garante a autonoma administra- tiva e político-pedagógica com relação aos governos. “E não dava para terem feito outra coisa sem ser a greve? Eu ouvi falar que ficamos sem ônibus circular e bandejão.” É uma longa discussão. Em alguns casos, os professores, funcionários e estudantes entendem que todos os recursos já foram usados para que se atendessem às reivindicações e re- solvem organizar uma greve. A ideia é pressionar as instâncias de poder, levando as reivindicações à imprensa e à sociedade. Ficar sem poder com- er ou sem transporte é sempre ruim, mas às vezes os problemas são tão piores que, dependendo da avalia- ção, é preferível ficar um tempo sem o bandejão, pra pressionar para que as coisas melhorem. “Mas eu ouvi dizer que no ano passado os estudantes queriam que a Polícia Militar saísse do campus. Como garantir a segurança, então?” Lembra-se da tal “autonomia uni- versitária”? Por isso, uma força policial do estado não pode entrar na USP por qualquer motivo, só quando chamada em caso de ocorrência. O problema é que, no ano passado, a PM foi chama- da pela antiga reitora para acabar com os piquetes dos trabalhadores, direito garantido pela Constituição. A PM barbarizou quando, em uma manifes- tação, entrou na USP agredindo estu- dantes, funcionários e professores. Isso foi o estopim da greve e onde surgiu a reivindicação de que a reitora, que au- torizou a entrada da PM para bater nas pessoas, renunciasse ao cargo. “E por quê a greve tam- bém era contra cursos de ensino à distância?” Antes de mais nada, é preciso es- clarecer que o que se quer implantar na USP não é um simples curso de ensino à distância, mas licenciaturas à distância, que é a Univesp. Você confiaria em professores que se for- maram longe de seu principal local de trabalho, a sala de aula? Além disso, o projeto que já tem vários problemas, foi aprovada sem ser debatido com a comunidade da USP. Há 20 anos, Pau- lo Freire falava que a participação de todos os atores envolvidos com a ed- ucação – professores, funcionários e estudantes - é fundamental para con- struir políticas públicas que garantam um ensino de qualidade. A conversa é longa, e o CALC ainda realizará muitos debates para entend- ermos como podemos garantir uma educação realmente de qualidade. Movimento estudantil, que bicho é esse? 7

Upload: others

Post on 30-Sep-2020

2 views

Category:

Documents


0 download

TRANSCRIPT

Page 1: porque greve O críquete uspiano · agora chegamos em 2009. É pri-meiro semestre e o projeto de ensino à distância chamado univesp gera indig-nação em muitos cursos. estudantes

O críquete uspiano“Mal tinha acabado de cantar o primei-ro verso”, disse o Chapeleiro, “quando a

Rainha berrou ‘Ele está matando o tempo! Cortem-lhe a cabeça!’”

por Thiago Mahrenholz, 2º ano do audiovisual

assim como a comunicação e a arte, não achamos que debater e en-tender a vida política da usp seja per-da de tempo. pra isso o Ca está aqui, pra lhe contar um pouco o porquê da usp se movimentar quase todo ano.

voltemos a 2007. o governador decretou o fim da autonomia da USP e abriu caminho para sua privatização, ao entregar ainda mais a universida-de ao controle de grandes empresas e fundações. os estudantes queriam

saber a opinião da reitora sobre esses decretos. ela não foi aos estudantes. os estudantes foram à reitoria. Com a entrada trancada e nem sinal de dispo-sição ao diálogo, ocuparam o prédio em forma de protesto. a ocupação da reitoria, mantida por 51 dias, e a gre-ve barraram os decretos e abriram um amplo questionamento.

em 2008, governo e reitoria vol-taram à cena com sua política “linha dura”, com demissões no sindicato, processos contra alunos e funcioná-rios que participaram da ocupação da reitoria no ano anterior, além de mul-tas às entidades de estudantes e fun-cionários. o objetivo era fazer sumir o movimento iniciado com a ocupação.

agora chegamos em 2009. É pri-meiro semestre e o projeto de ensino à

distância chamado univesp gera indig-nação em muitos cursos. estudantes começam a realizar paralisações e mes-mo entrar em greve contra o projeto. a reitora tem a grande ideia de ocupar mi-litarmente o campus para acabar com a greve. escudos, bombas de efeito mo-ral e balas de borracha transformam as ruas e as rotatórias da Cidade univer-sitária em praças de guerra. a luta pela retirada da pM do campus evolui e se combina com o questionamento da es-trutura de poder autoritária. isso por-que na usp quase nenhum aluno pode participar da escolha do reitor e no final é coroado mesmo quem o governador quer. serra escolhe rodas, segundo co-locado, por saber, pela sua história, que rodas não irá tremer a mão na hora de pôr em prática seus projetos pra usp.

agora é necessário reunir os es-tudantes para debater e pensar 2010. um dos espaços que teremos esse ano será o X Congresso de estu-dantes da usp, onde deverá haver a exposição de teses, grupos de dis-cussão e decisões sobre os mais di-versos assuntos que nos nortearão nos próximos dois anos.

desde já, você está convidado a acompanhar e construir a luta em defesa da usp. sua história na uni-versidade está apenas começando. aproveite para aprender, conhecer novas pessoas, estudar e também deixar aquela que é a principal marca que nós, estudantes, podemos dei-xar: garantir que a qualidade da usp permanecerá. procure-nos no Ca e seja muito bem vindo!

porque greve

por CaMila souza raMos, 4 º ano do jornalisMo

e aí, bixo, depois de passar por toda a ralação pré-vestibular, tá ani-mado com tudo o que você poderá aprender daqui pra frente? acredite, as coisas mais valiosas da faculdade não estão entre as quatro paredes da sala de aula, mas nos corredores, nas conversas durante a QiB e nos debates que o Centro acadêmico vai realizar ao longo do ano. e com o tempo, vai perceber que daria para termos uma universidade muito melhor do que a que temos hoje.

“Ih, já vão começar a falar de greve. Ouvi dizer que greve na USP tem ano sim, ano também. Por que na USP tem tanta greve?”

Bom, greve de professores, estu-dantes e funcionários já ocorreram na usp em certa quantidade. nos últimos 10 anos, duas greves foram feitas por

conta de verbas para a universidade, uma para contratação de professores, outra contra decretos do governo es-tadual, que violavam a “autonomia universitária”, princípio constitucion-al que garante a autonoma administra-tiva e político-pedagógica com relação aos governos.

“E não dava para terem feito outra coisa sem ser a greve? Eu ouvi falar que ficamos sem ônibus circular e bandejão.”

É uma longa discussão. em alguns casos, os professores, funcionários e estudantes entendem que todos os recursos já foram usados para que se atendessem às reivindicações e re-solvem organizar uma greve. a ideia é pressionar as instâncias de poder, levando as reivindicações à imprensa e à sociedade. Ficar sem poder com-er ou sem transporte é sempre ruim, mas às vezes os problemas são tão piores que, dependendo da avalia-

ção, é preferível ficar um tempo sem o bandejão, pra pressionar para que as coisas melhorem.

“Mas eu ouvi dizer que no ano passado os estudantes queriam que a Polícia Militar saísse do campus. Como garantir a segurança, então?”

lembra-se da tal “autonomia uni-versitária”? por isso, uma força policial do estado não pode entrar na usp por qualquer motivo, só quando chamada em caso de ocorrência. o problema é que, no ano passado, a pM foi chama-da pela antiga reitora para acabar com os piquetes dos trabalhadores, direito garantido pela Constituição. a pM barbarizou quando, em uma manifes-tação, entrou na usp agredindo estu-dantes, funcionários e professores. isso foi o estopim da greve e onde surgiu a reivindicação de que a reitora, que au-torizou a entrada da pM para bater nas pessoas, renunciasse ao cargo.

“E por quê a greve tam-

bém era contra cursos de ensino à distância?”

antes de mais nada, é preciso es-clarecer que o que se quer implantar na usp não é um simples curso de ensino à distância, mas licenciaturas à distância, que é a univesp. você confiaria em professores que se for-maram longe de seu principal local de trabalho, a sala de aula? além disso, o projeto que já tem vários problemas, foi aprovada sem ser debatido com a comunidade da usp. há 20 anos, pau-lo Freire falava que a participação de todos os atores envolvidos com a ed-ucação – professores, funcionários e estudantes - é fundamental para con-struir políticas públicas que garantam um ensino de qualidade.

a conversa é longa, e o CalC ainda realizará muitos debates para entend-ermos como podemos garantir uma educação realmente de qualidade.

Movimento estudantil, que bicho é esse?

7