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INTERAÇÃO FAMÍLIA – ESCOLA POR: MERCÊDES ANGÉLICA MIRA DE PINA CORRÊA

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INTERAÇÃO FAMÍLIA – ESCOLA

POR: MERCÊDES ANGÉLICA MIRA DE PINA CORRÊA

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RESUMO

A família brasileira encontra-se em transição. As mudanças

sócio-comportamentais originaram uma constelação familiar de modelos distintos do

padrão tradicional - pai, mãe e filhos. Uma nova estrutura se faz presente. Essa variedade

de organização familiar cria uma nova realidade, novas demandas sobre a Escola, novas

contradições entre os valores da escola e os da casa e, consequentemente, novas formas de

relacionamento entre a família e a escola. Uma das dificuldades maiores da escola é

acostumar-se aos novos padrões familiares, bem como as características, problemas e

desafios que eles apresentam. Em muitos casos, os professores ainda guardam uma visão

idealizada da família, ignorando as suas limitações. Os pais demandam da escola um tipo

de questão específica: querem saber e obter respostas exatas – o que devem fazer para

resolverem aquilo que de algum modo se apresenta para eles como um problema na vida

de seus filhos. Sentindo-se impossibilitados de sustentar qualquer tipo de reflexão, de

pensamento, acerca da questão, "terceirizam" a educação: delegam à Escola a educação

integral de seus filhos. Sendo a Educação formal apresentada em legislação como ação

inerente ao Estado, algumas famílias entregaram totalmente às professoras e professores

essa responsabilidade, aumentando, assim, sua isenção no processo ensino-aprendizagem.

O resultado desse comportamento refletiu-se na perda da qualidade de ensino. Embora a

literatura e a experiência reforcem a importância da interação família-escola, esse

relacionamento, de modo geral, tende a ser sazonal e, quando ocorre, pode se resumir em

um mero repasse de informações sobre a disciplina e resultados acadêmicos do aluno. Para

que a família e escola assumam cada uma seu papel no sucesso integral do educando,

apresentam-se, hoje, inúmeras iniciativas e resoluções que convocam a família para a

retomada da presença na vida escolar de seus jovens e crianças. Pesquisas e artigos

ressaltam que, nas escolas em que há participação efetiva da família, apoio mútuo,

propósitos e valores morais definidos em conjunto e, existe, ainda, firmeza quanto às ações,

a relação família-escola assim fortalecida promove um melhor desempenho do educando.

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INTRODUÇÃO

DOS PRINCÍPIOS E FINS DA EDUCAÇÃONACIONALArt.2º A educação, dever da família e do Estadoinspirada nos princípios de liberdade e desolidariedade humana, tem por finalidade o plenodesenvolvimento do educando, seu preparo para oexercício da cidadania e sua qualificação para otrabalho.Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de l996.Diretrizes e bases da Educação Nacional.

O objetivo deste trabalho é obter elementos de análise sobre a

constituição e características da Família nos dias de hoje para uma reflexão do papel dos

pais e da família na educação do ser humano e ponto de partida para a vida em sociedade,

na busca de qualidade, em interação com a Escola e os parâmetros que esta lhe oferece.

A partir dessa análise, dois pontos serão considerados: - de

um lado, o jovem confuso diante da idéia de valores e compromissos que os pais

transmitem e os valores da sociedade atual vistos através dos meios de comunicação. - De

outro lado, os pais, atônitos, preocupados sem saber como agir, diante da transição radical

de uma sociedade altamente repressora, para a demasiadamente permissiva dos dias atuais.

A Família em seu aspecto mais amplo, tem sido motivo de

preocupação de governantes, psicólogos, sociólogos e educadores, uma vez que é um dos

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mais importantes alicerces para a formação, existência e sobrevivência de uma sociedade

organizada e cuja escala de valores esteja voltada para o bem comum. Essa consciência é de

fundamental importância para que a Escola possa atuar na educação de seus alunos, em sua

formação e aquisição de valores humanos e éticos, observando e interagindo junto à

Família, buscando um canal de comunicação eficaz e produtivo.

Educar, então, torna-se tarefa mais ampla, na qual os pais têm

de agir, em comunhão com a Escola. Cabendo a esta, propiciar um espaço de diálogo, para

a reflexão e conscientização de questões consideradas como relevantes, envolvendo a

Família no processo educacional, devolvendo-lhe a responsabilidade das escolhas que faz

para a vida do seu filho.

Nas últimas décadas, uma grande mudança comportamental

vem marcando a sociedade brasileira. A família como instituição social não conseguiu ficar

isenta a essas modificações, e ainda encontra-se em transição. O antigo padrão familiar

perdeu sua razão de ser, dando lugar a novíssimas composições familiares. As múltiplas

formas de organização familiar estabeleceram, na prática uma nova forma de

relacionamento com a Escola. Novas demandas, exigências e contradições entre seus

valores foram se impondo. A nova estrutura familiar com suas características e dificuldades

vem exigindo da escola uma mudança em sua postura. Ao educador é necessário uma

revisão da antiga organização familiar, tomando conhecimento das suas limitações e da

nova opinião esposada pela família sobre essa ou aquela orientação da escola, inclusive em

relação à ordem e à ética.

Uma pergunta se faz diante das mudanças ocorridas na

constituição da família até os dias atuais. Com que família a escola de hoje está

interagindo durante o processo ensino-aprendizagem do aluno?

Esta pergunta possibilita o levantamento de alguns dados

sobre os quais vale refletir e que podem ser instrumentos de auxílio para o educador.

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Capítulo 1: A TEORIA DA FAMÍLIA

O desejo de alcançar-se uma sociedade mais justa inclui

prioritariamente a educação das novas gerações. Questões fundamentais como respeito e

solidariedade para com o outro, justiça social e diálogo devem ser mantidos no processo

educativo, iniciando-se no primeiro grupo social que a criança conhece: a família .

O americano Robert Coles, psicanalista da Havard Medical

School e autor do livro "Inteligência moral das crianças" ( Editora Campus), alerta que a

integridade ética do adulto começa a ser construída na família: "os pais são os mestres da

ética na formação dos filhos. A criança é uma testemunha atenta da moralidade dos

adultos ou da ausência desta. Ela busca sugestões de como se comportar e as encontra

quando os pais fazem opções, mostrando na prática, seus valores e suas opiniões. " (*)

O testemunho de vida, a maneira de ser e de falar, de se

relacionar com os outros são absorvidos lenta e cumulativamente pela criança em

consonância com as características da família a que pertence. Conhecer e reconhecer como

se processa a educação inicial de seus alunos e o núcleo familiar em que está inserido, é

mais um objetivo que se impõe à tarefa ensino-aprendizagem.

______________________________________________________________________

(*) Apud: Pequenas corrupções , Jornal da Família O Globo, p.01 e 02, 25 mar.

2001

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1.1. O papel da família na estruturação psíquica do sujeito

humano:

Toda família inicia-se, basicamente com o casamento, ou

união consensual – talvez a relação mais profunda que se tem na vida, uma vez que é fruto

de uma escolha pessoal, diferente de nascer em uma certa família, ter um certo pai, uma

certa mãe, etc. É essa escolha, seja ela mais ou menos consciente, que torna o casamento

uma relação especial, porque é feita de acordo com as expectativas conscientes e

inconscientes que cada um tem do outro.

É nessa complexidade de vínculos que podem surgir sérios

conflitos. A família pode desenvolver neuroses, e os distúrbios psíquicos de um de seus

membros podem ter raízes no papel especial que esta lhe atribui. Isso é tão sério que às

vezes não basta tratar aquele indivíduo especificamente, mas toda a família.

Em vez de resolver os próprios conflitos, o indivíduo os traz

para a relação familiar e usa o outro como uma espécie de anteparo, que ao aceitar esse

papel, o alivia de sua tensão interna, mas também o impede de se desenvolver como pessoa.

A família pode , portanto, tanto ser uma relação altamente criativa quanto profundamente

doentia.

Algumas famílias se estruturam através da ansiedade. Nesse

caso, mesmo que queiram, seus integrantes não se separam porque nenhum deles julga

poder viver sozinho sem experimentar com isso um total abalo de sua segurança. Criam um

mundo próprio para si e ninguém ousa exprimir divergências de modo claro em relação a

qualquer um dos membros. Esse tipo de família adota comportamentos que evitam qualquer

coisa que ameace o seu equilíbrio. Pais que "se enganam", não admitindo que seus filhos

tenham problemas físicos ou intelectuais e não os enfrentam para solucioná-los.

Outro tipo de família escolhe, inconscientemente, um membro

para "adoecer". Com isso obtém alivio de suas tensões mal-resolvidas. Sobre ele são

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depositados todos os sentimentos de impotência e fragilidade da família. Assim, a vítima

desempenha um duplo papel: o de saco de pancada sem defesa e o de válvula de segurança.

Consideram que um filho rebelde ou doente ou um pai ausente representam o problema da

família, porque tentam esconder num só membro os conflitos sérios que se localizam no

próprio contexto familiar ou no relacionamento entre seus membros.

Há ainda famílias que se caracterizam pela total ausência de

cuidados, na qual seus membros não têm como obter amor e reconhecimento. Nesse caso,

os efeitos são danosos sobre a auto-estima. As relações condicionais dentro da família

sempre estabelecem vínculos neuróticos, pois induzem um ou mais membros da família a

agir de determinada maneira para serem aceitos e merecedores de afeto.

Por outro lado, atitudes superprotetoras solapam a

autoconfiança porque traduzem aos filhos a sensação de que não são capazes de se cuidar

sozinhos. Espera-se que o filho acerte no que os pais erraram, que seja o "cartão de visitas",

o orgulho da família. De preferência, que não dê trabalho.

Diante desses poucos modelos, percebe-se que as relações

familiares que deveriam ser estruturantes para o ser humano passam a ser paralisadoras

para o seu desenvolvimento.

Isso leva o educador à seguinte reflexão: a família não pode

só ser vivida mas, para que o processo de desenvolvimento individual possa continuar, ela

precisa ser compartilhada. Ignorá-la significa desconhecer seus valores, suas condutas e

negar seu fruto, assim como ele se lhe apresenta com suas características próprias.

Se a família permitir que ocorra essa inferência, a experiência

pode ser muito rica. Pode haver uma inovação e uma flexibilização de suas estruturas,

erguendo-se uma nova concepção em torno do grupo. Ou, em contrapartida, a família pode

se sentir atacada, questionada, e fechar-se em suas "verdades" exclusivas.

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1.2. Identidade familiar

Há muitas leituras sobre a família, do ponto de vista social e

econômico. Mas, pode-se defini-la essencialmente como um "sistema de laços emocionais

responsável pela formação e estrutura psicológica do indivíduo." É através dos vínculos

com as chamadas figuras de apego – mãe, pai, ou seus substitutos- que se dá a transmissão

de padrões de comunicação, de afeto e de disciplina.

Das relações iniciais de uma criança, surge a percepção de si

próprio e dos outros, assim como o modo e a capacidade de interagir com a vida e com seus

semelhantes. Através das interações, na infância, com seu primeiro grupo social, o

indivíduo irá compor seu repertório pessoal de experiências, que será acionado no momento

em que se relacionar com outros grupos.

Ortega y Gasset afirma que : "Eu sou eu e minhas

circunstâncias e, se eu não as preservo, não posso preservar a mim". É na família que cada

um adquire as bases do comportamento, da identidade sexual, das noções de direito e

deveres e as maneiras de lidar com afetos ou emoções. É no seio da família, onde se vivem

as idiossincrasias e características, valores e ideais de cada sociedade, facilitando o

surgimento de um estado permanente de mudanças e aprimoramento.

A família, portanto, não é só um conjunto de relações entre os

seus membros, mas um conjunto de papéis socialmente definidos. A experiência do homem

é determinada pela interação que ocorre entre ele e o seu ambiente, influenciando-o e sendo

por ele influenciado. O homem sobrevive em grupos e isto é inerente à condição humana. A

organização da vida em família depende do que a sociedade, através de seus usos e

costumes, espera de um pai, de uma mãe, dos filhos e dos demais membros.

M. Andolfi, estudioso da família, assegura que: "O sistema

familiar é uma realidade tridimensional na qual relações familiares passadas manifestam-

se no presente, a fim de desenvolver-se no futuro."(*) Os hábitos familiares desenvolvidos

durante a infância, sedimentarão relações que se projetarão no campo social mais amplo.

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A moderna civilização industrial urbana impõe ao homem

duas experiências conflitantes:

- a capacidade de desenvolver habilidades altamente

especializadas;

- a capacidade de adaptar-se rapidamente a uma situação

sócio-econômica constantemente em mudança.

Numa visão sistêmica de psicólogos e sociólogos modernos,

a família sadia é aquela que lida com várias verdades possíveis e não com um

comportamento em bloco. É necessário haver interesse mútuo sobre a maneira como cada

um se sente nesse convívio e quais as suas necessidades. Respeitar as individualidades, as

características de cada ser faz parte de uma convivência saudável e harmoniosa.

Segundo a Psicologia, as funções da família atendem aos

seguintes objetivos:

a) interno - proteção psicossocial de seus membros;

b) externo- a acomodação a uma cultura a transmissão dessa

cultura;

c) preenchimento das necessidades afetivas, e de ajuda

mútua.

______________________________________________________________________

(*) Apud: A primeira pessoal do plural, Revista Reformador, RJ, Federação Espírita

Brasileira, ano 106, n.l910, maio 1988, p.15

Família é, por conseguinte, mais do que o resultado de

combinações genéticas. A influência das relações familiares na transmissão de hábitos e

valores, exige estudo, pois essa influência é o que constituirá a estrutura de uma nova

personalidade.

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1.3. A Família como instituição social

Família, grupo social básico criado por vínculos de

parentesco ou matrimônio presente em todas as sociedades. A família proporciona a seus

membros proteção, companhia, segurança e sociabilização. A estrutura e o papel da

família variam segundo a sociedade. A família nuclear (dois adultos com filhos) é a

unidade principal das sociedades mais avançadas. Na família monoparental: os filhos

vivem só com o pai ou só com a mãe em situação de celibato, viuvez ou divórcio.

Ao falar-se do conceito de família neste início de século, faz-

se necessária a observação de que , quer a estrutura familiar, quer o desempenho dos papéis

parentais já não são aqueles conhecidos. Todas as transformações econômicas, sociais e

laborais que se operaram a partir dos anos 40, a par da mudança do papel da mulher, com

uma participação cada vez mais ativa na sociedade, vêm contribuir para alterar este

conceito.

A cientista Raquel Soifer coloca a "Família como um núcleo

de pessoas que convivem em determinado lugar, durante um lapso de tempo mais ou menos

longo e que se acham unidas, ou não, por laços consangüíneos". Este núcleo está também

relacionado com a sociedade, que lhe impõe uma cultura e ideologia particulares, bem

como recebe dele influências específicas.

Para que o indivíduo adquira a noção de justiça, que se

estende ao plano da cidadania, é preciso que tenha incorporado as regras com base no

respeito mútuo, na cooperação e não no respeito unilateral e na coação. Essas noções, que

devem ser adquiridas na família, pressupõem pais que sejam capazes de exercer esse

sentido de justiça em suas próprias vidas, que consigam respeitar os limites da autonomia,

que envolvem tanto o sentido de si como do outro, em busca de um ambiente mais propício

ao desenvolvimento de seus filhos.

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O campo de estudo aqui proposto é a investigação do caráter

da família, quanto à área que intermedeia a função e o seu papel dentro da estrutura social

frente aos riscos que a ameaça. A palavra risco, segundo o Dicionário Aurélio, edição de

l986, significa possibilidade de perda ou responsabilidade pelo dano; Perigo ou

possibilidade de perigo. Geralmente, a palavra risco está associada a situações de conflitos

ou crises.

O risco para a família existe se os pais não conseguem

estabelecer seus papéis formadores e gerarem recursos financeiros. O que vai refletir de

maneira incontestável no perfil da sociedade que se forma reciprocamente.

E qual o papel que está realmente reservado à família?

A verdade é que a grande família já não predomina, e a

família nuclear instalou-se, reduzida a um espaço relacional cada vez mais pequeno. Há um

aumento das famílias mono-parentais, substitutas, urbanas, socialmente excluídas e famílias

ausentes. (Luis Patrício IREFREA – Seminário "Velhas Fronteiras/ Novos Horizontes"

Coimbra, 1998) " A precariedade do relacionamento, as mudanças – trouxeram

dificuldades de comunicação, mais negativas que positivas- uma quebra nos primeiros

contatos a favor dos contatos secundários, com o respectivo enfraquecimento das relações

de consangüinidade ( parentesco), um declínio da importância social da família, do

desaparecimento do sentido de vizinhança e a erosão das bases tradicionais do bem-estar

social".

A família, hoje, passa por uma crise de identidade e valores ,

em que ela própria se encontra perplexa e necessitada de amparo e continente para suas

necessidades básicas. Então, falar de família em risco é pensar em criança e adolescente em

risco, no sentido de que se encontram com perdas das grandes narrativas da comunicação,

ocasionando mudanças em sua história, em seus ideais e projetos. O ritmo acelerado do

cotidiano, as pesquisas confirmando a redução da sensibilidade das relações entre os

membros que constituem os núcleos familiares, colocam a criança em risco. Risco este que

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configura nas perdas dos relacionamentos familiares e de seus grupos secundários, para

relacionar-se com o "todo" ou com todos. É um salto, para o qual muitas das vezes , a

criança não está preparada.

O "desabamento" das relações e as perdas ou substituições das

figuras importantes na estrutura familiar- que é a base da estrutura social, integrada por

pessoas que convivem na mesma habitação com papéis diferenciados constituem fator de

interesse para os estudiosos da organização social:" Se a família não consegue promover

seus membros, pode-se supor que a sociedade está em risco."(*)

(*) Apud: http://www.unisantos.com.br/pesquisas/ipec/pesquisas/familia.htm

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Capítulo 2: A FAMÍLIA NA HISTÓRIA

"Qual é o tipo de família, de cultura familiar que estamos em

via de romper? Se a família é uma realidade muito antiga, tanto quanto a humanidade,

quem sabe?" Indaga a historiadora francesa Michelle Perrot.

2.1. Nascimento e organização da família:

Etimologicamente, segundo Engels, o termo "família" é

derivado de "famulus", que significa "escravo doméstico, termo este criado na Roma antiga

para designar um novo grupo social que surgia entre as tribos latinas, ao serem introduzidas

à agricultura e à escravidão legal. Já na Roma republicana, o conceito de família tinha um

contorno nitidamente patriarcal, sendo considerada como "tudo aquilo que estivesse

debaixo do poder paterno, mulher, filhos, escravos e até bens como terra, instrumentos e

animais de trabalho".

A variabilidade histórica dessa instituição torna difícil a

elaboração de um conceito geral de família, já que esta se modifica no tempo e no espaço,

de acordo com suas funções na sociedade em que está inserida, desde as reprodutivas até às

econômicas e políticas.

Pensando-se no Brasil, pode-se afirmar que desde os

primórdios da colonização brasileira, ocorreram influências diversas que propiciaram o

surgimento de várias possibilidades de organização familiar.

Os vários povos indígenas que ocupavam o solo brasileiro há

mais de 5 milênios organizavam-se segundo o sistema de parentesco e os vínculos eram

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enfatizados por uma série de rituais, sendo os mais comuns: nascimento, puberdade,

casamento, velhice e morte. Os conceitos atuais de família e casamento eram inconcebíveis;

o que valia era o grupo ampliado de parente, sendo proibido o casamento dentro do próprio

grupo. As uniões podiam ser duradouras ou não e a poligamia era normal. Os tupis

ofereciam a mulher a um estranho que fosse aceito pela tribo e ele se tornava parente por

afinidade de todo o grupo, ocupando papel definido e participando de todas as atividades.

Oferecer uma mulher a um chefe de outra tribo possibilitava a construção de alianças

políticas.

No início da colonização, cada navio português, espanhol ou

francês que aqui aportava, deixava uma leva de europeus que sobreviviam casando-se com

índias. Esses grupos de parentes auxiliavam no corte do pau brasil e no abastecimento das

naus, tornando-se peças chave no sistema de escambo existente. Assim nasceram os

primeiros brasileiros, identificados com o pai poderoso, mas herdeiros dos costumes da

mãe.

Traçando o quadro etnográfico dos africanos na sociedade

brasileira, Nina Rodrigues ressalta a diversidade de cultura e de religião das várias raças

africanas, que para cá foram trazidas como escravas, entre elas os nagôs islamizados, que

eram letrados e poligâmicos. Há ainda a considerar fatores de ordem político-institucional,

ou seja, o autoritarismo e a violência contra essa parte da população foram responsáveis

pela separação entre casais, pais e filhos e outros parentes e amigos, causando perda de

vínculos e crises de identidade marcantes e irreversíveis. As crianças nascidas de ligações

efêmeras, construíam suas identidades de forma ambígua e contraditória, atuando a

comunidade mais ampla de escravos como referência.

Até hoje, a maioria dos estudiosos das classes populares

costumam enfatizar a relação pobreza/família irregularmente, quando na realidade, além

dos aspectos econômicos, as dificuldades da classe popular são principalmente de ordem

política e ideológica.

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Principalmente nas grandes áreas metropolitanas, observa-se ,

hoje, a existência de inúmeras famílias monoparentais, formadas por mulheres que

sustentam sozinhas os seus filhos. A família nuclear quase que desaparece ante a família

ampla, formada por conterrâneos e parentes. A solidariedade conterrânea e parental é

condição essencial para a sobrevivência de famílias em situação de pobreza e

discriminação. Essa família de baixa renda também acaba assimilando novos valores e

padrões sociais: gera menos filhos, observa-se a mulher como força de trabalho e se

estabelece a diferenciação entre chefe e provedor.

Segundo Mina Regen (*), " o mais importante ao se trabalhar

com famílias é valorizá-las enquanto espaço de produção de identidade social básica de

qualquer criança, tendo em vista a formação de sua cidadania. Também é necessário que

se desenvolva a tolerância pela diversidade humana, isto é, que sejamos capazes de

primeiramente enxergar as diferenças étnico-culturais da sociedade em que vivemos e que

aprendamos a respeitar politicamente essas diferenças. Isto significa que precisamos evitar

os paradigmas de família regular x família irregular, de família pobre = família

desorganizada, grandes responsáveis pela existência de preconceitos que produzem as

atitudes inadequadas em relação às famílias de crianças que freqüentam as nossas

instituições ".

2.2. A família desde a Idade Média até hoje

Na Idade Média e no início dos tempos modernos, as famílias eram

extensas e as crianças misturavam-se com os adultos aproximadamente a partir dos sete

anos, quando eram capazes de se separarem das mães ou das amas de leite e

______________________________________________________________________

(*) Mina Regen, assistente social e consultora da Sorri-Brasil, autora do texto "Instituição

família", In: http://www.entreamigos.com.br/temas/dinfam/instituicao.htm

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eram enviadas a outras casas, onde realizavam a aprendizagem dos afazeres domésticos e

de ofícios. À família cumpria a função de assegurar a transmissão da vida, dos bens e dos

nomes, mas não implicava envolvimento afetivos e não tinha idéia de sua função educativa.

As casas na Europa ocidental, dos séculos XV ao XVII,

abrigavam patrões, crianças e um grande número de empregados e aprendizes, que

formavam um verdadeiro grupo social. Essa casa grande desempenhava uma função

pública: não havia locais separados para a vida privada e a profissional, e tudo se passava

nos mesmos cômodos. As mesas de jantar e as camas eram montadas de acordo com as

necessidades e o número de visitantes.

Para os moralistas da época, os deveres de um bom pai de

família reduziam-se a 3 pontos principais: controlar sua mulher, bem educar seus filhos e

bem governar seus criados.

No século XVIII, com o surgimento da burguesia, a família

começou a manter a sociedade a distância e a organização da casa passou a espelhar essa

preocupação. A casa moderna, confortável, implicava a existência de cômodos que

propiciassem discrição, intimidade e isolamento. Essa especialização dos cômodos foi uma

das maiores mudanças da vida quotidiana. Os criados, agora confinados em áreas

separadas, eram chamados por meio de campainhas. Teve início a separação entre a vida

mundana, a profissional e a privada. As visitas deveriam ser previamente marcadas, no

sentido de proteger a liberdade e a intimidade individual ou familiar contra a pressão

social.

Também em relação às crianças, foram grandes as

modificações: a partir da valorização da criança como ser em formação e da preocupação

com a sua educação é que a família assumiu uma função moral e espiritual. O cuidado

dispensado às crianças passou a sentimentos novos, uma nova afetividade que passou a

caracterizar a família moderna. Além de trazer filhos ao mundo ou se interessar somente

pelo primogênito, em detrimento das meninas, a moral da época impunha aos pais

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proporcionar a todos os filhos uma preparação para a vida. A aprendizagem tradicional, que

se realizava em casas de famílias, passou a ser substituída pela escola.

As escolas de caridade do século XVII, que haviam sido

fundadas com a intenção de educar os pobres, também eram freqüentadas pelos ricos. Mas

a partir do século XVIII, com o surgimento da burguesia, essa mistura passou a não ser

mais aceita e seus filhos foram retirados aquilo que se tornaria um sistema escolar primário

popular e colocados em colégios especialmente criados para essa classe.

Essa reorganização da casa, bem como a reforma de

costumes, fizeram surgir a família moderna, nuclear, formada pelos pais e seus filhos, que

passaram a constituir pequenas sociedades com seus valores, padrões e culturas próprias.

No século XX, vários fatores contribuem para as mudanças

ocorridas na família:

as duas grandes guerras;

a maior participação da mulher no trabalho fora do lar;

a possibilidade das mulheres exercerem o controle da natalidade;

as Declarações dos Direitos Humanos;

abandono da tradição;

a ênfase dada à individualidade;

a migração da população rural para áreas urbanas;

a grande influência da mídia, principalmente da TV, que invade os lares e sobrepõe seus

valores, nem sempre verdadeiros, aos das famílias.

Nas famílias tradicionais, fundadas no princípio da

reciprocidade e da hierarquia, os papéis familiares são predeterminados e não conflitivos. A

partir do momento em que se abre espaço para a individualidade, os papéis familiares se

tornam conflitivos, embora a vida continue tendo o mesmo valor social. A família

nuclear, unidade mais comum na época pré-industrial, é ainda a

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unidade básica de organização social na maior parte das sociedades industrializadas

modernas. Entretanto, a família moderna tem variado no que diz respeito a sua forma mais

tradicional, bem como nas suas funções, composição, ciclo de vida e nas ações da mãe e do

pai. Ocorrem mudanças significativas em duas áreas que provocam a alteração da ordem

familiar tradicional: a autoridade patriarcal e a divisão de papéis familiares.

Todos os países industrializados estão experimentando

tendências familiares similares às do Ocidente. O avanço dos métodos de controle da

natalidade e a legalização do aborto reduziram de forma considerável o número de famílias

monoparentais não auto-suficientes. Além disso, em todas as sociedades industriais estão

aparecendo unidades familiares menores com uma fase pós-paternal mais longa.

Nos países em desenvolvimento, a taxa de filhos que

sobrevivem em uma família tem aumentado com rapidez à medida que vão sendo

controladas as enfermidades infecciosas, a fome e outras causas da mortalidade infantil.

Entretanto, a redução desta taxa de mortalidade infantil e o conseqüente crescimento da

população apresentam nesses países um grave problema de recursos para a manutenção dos

filhos.

No Brasil, a política social a cada década vem ampliando as

taxas de desigualdade social. Os Mapas da Fome e os Mapas da Criança , elaborados pelo

IPEA em 1993, registraram 9 milhões de famílias e 32 milhões de pessoas com rendas que

não lhes permitem a satisfação das necessidades básicas. Embora o governo mostre

preocupação frente aos segmentos empobrecidos da população, continua mantendo atitude

assistencialista e tutelar, legitimando o autoritarismo e a subalternidade dos dominados.

A partir desta década, tenta-se acabar com o centralismo das

decisões sociais e, embora se exaltem as vantagens dessa descentralização e

municipalização das atenções básicas à população, isto não vem ocorrendo da forma

esperada, não tanto pela ausência de recursos, mas por sua malversação.

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A crise pela qual estamos passando, no que diz respeito

à previdência e bem-estar social, ao déficit público, ao desemprego estrutural, à

globalização da economia e à pobreza crescente, faz ressurgir a família e a comunidade

como forças e parcerias na tentativa de se mudar o status quo.

Esta crise vem sendo responsável por profundas alterações na

estrutura familiar, em seu sistema de relações, papéis e formas de reprodução social. Assim,

a sociedade contemporânea, embora baseada no princípio da igualdade entre os homens,

mostra-se profundamente desigual e o impacto da pobreza em cada região do país assume

perfis diversificados, exigindo respostas também diversas.

Com o elevado índice de desemprego e subemprego do

homem, a mulher passa a ter importante papel no mundo do trabalho e o adolescente

começa a trabalhar cada vez mais cedo, abandonando os estudos. Estabelece-se uma nova

relação de poder intrafamiliar. Além disso, a situação de carência e o desejo de consumo

provocam reações que variam da apatia e alcoolismo aos atos de violência, intra e extra

familiares.

Outro fator digno de destaque e que torna o estudo da família

contemporânea bastante complexo é a possibilidade de dissolução das uniões e a formação

de novas famílias, nas quais os papéis parentais se tornam extremamente confusos, com a

convivência "dos meus, dos teus e dos nossos filhos" e toda a gama de novas relações que

surgem no seio das famílias.

Nos dias de hoje, ao se lidar com famílias, é preciso deixar de

lado o velho modelo de família nuclear burguesa, que aceita, como verdade estabelecida, a

família composta por mãe, pai e filhos, com uma relação baseada na hierarquia e

subordinação, poder e obediência, com a autoridade masculina no topo e conseqüentes

relações entre desiguais. É preciso ter em mente que cada família constitui um universo, um

sistema de relações.

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2.3. Uma nova estrutura familiar

Quem, nos anos 70 e 80, iria imaginar que o olhar moderno

fosse desviar-se do seu centro de atenção (isto é, o indivíduo) para voltar-se com interesse

para essa instituição tão desacreditada – a família ?

Em 1932 Aldous Huxley, escritor inglês, lançava seu mais

famoso livro: "O admirável Mundo Novo", uma visão considerada pessimista do futuro da

Humanidade, em que imaginava uma sociedade onde a família estaria abolida. Isso deveria

ocorrer até o final deste século.

Nessa "admirável" sociedade, a mulher não mais daria à luz.

Os filhos nasceriam de incubadoras altamente sofisticadas. Ninguém teria pai ou mãe. Seria

, segundo o autor, "considerado subversão" falar-se do assunto. Exercitar-se-ia o sexo sem

compromisso, heterogeneamente. Cada indivíduo cuidaria da própria vida, sem deveres

com ninguém a não ser com o Estado. A partir dos anos cinqüenta com o rompimento de

tabus relacionados com o sexo e o advento do amor livre, imaginou-se que estivéssemos a

caminho de uma sociedade dessa natureza.

Extinguiu-se a família? Não, argumenta a historiadora

Michelle Perrot. "Uma outra está a caminho: a que tenta conciliar a liberdade individual

com os laços afetivos do velho lar." A família nuclear, heterossexual, monógama,

patriarcal, tal qual a herdamos do século XIX era investida de uma missão político-social.

Ela deveria assegurar a manutenção da sociedade civil e a estabilidade do Estado. Ela

assegurava a transmissão de patrimônios fossem eles culturais ou econômicos. A família

era, ela, a responsável por formar "bons cidadãos". Era uma família patriarcal. O pai, o

chefe, o regente, representava o grupo familiar, cujos interesses sempre prevaleciam sobre

os demais membros. Os filhos deveriam submeter as suas escolhas, profissionais e

amorosas, às necessidades familiares.

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As rupturas a que se assistem hoje são a culminância de um

processo de dissociação iniciado há muito tempo. Ele está ligado , em particular, ao

desenvolvimento do individualismo moderno iniciado nos fins do século XIX. Não se

transmite mais nem fortuna, nem saber, nem profissão.. O revolucionário Saint-Just

considerava uma nova idéia que se espalhou na Europa: "ser a gente mesmo, escolher sua

atividade, sua profissão, seus amores, sua vida ".

Entre as duas guerras mundiais a família tradicional sofre

ainda mais o choque de fatores externos. Para a mulher, a livre disposição de seu corpo, de

seu ventre, de seu sexo, tornou-se no século XX uma reivindicação prioritária.

Ocorreram profundas mudanças no período pós-guerra,

principalmente nos modelos de relacionamento conjugal e de organização familiar. A

própria instituição legal do divórcio, facilitando a formação de novas famílias, impôs o

remanejamento dos padrões de relacionamento com os filhos. A mulher exerce, agora,

múltiplas funções, dentro e fora do lar. Dividindo responsabilidades ou sendo substituída

pelo pai. Como exemplifica Clara Rappaport em seu livro Encarando a adolescência: "O

homem se dispõe a tarefas anteriormente impensáveis como acalentar o filho choroso e

conversar sobre sexo com a filha adolescente...(...) ".

Há, hoje, nos núcleos familiares, uma dissonância em todas as

formas de transmissão do conhecimento: social, cultural ou simbólico. Nem os saberes

constituem mais uma herança. Os pais modernos mostram-se ainda despreparados diante

dos avanços tecnológicos, quase sempre de domínio dos filhos. A desigualdade de saberes

deixou de ser de cima para baixo. Os pais perderam a capacidade de iniciadores do saber de

que os filhos precisam, ao se verem diante dos meios de comunicação tão ágeis. Perdeu-se

o que pode ser chamado de "consciência tribal", o pai, o grande pajé, figura de secretos e

misteriosos ensinamentos, não é mais o detentor da magia do conhecimento. A sua figura é

substituída pelos meios de comunicação massificantes, o que altera profundamente o

relacionamento familiar.

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Capítulo 3: A FAMÍLIA CONTEMPORÂNEA

O período atual é marcado por profundas e reais

transformações. A família, em especial, vive em crise na busca da sua autonomia. De

acordo com a origem da própria palavra "crise" (do grego), que é o ato ou faculdade de

escolher, decidir ou resolver, a família vive toda essa transformação de acordo com suas

possibilidades e recursos internos. As dificuldades de relacionamento nesta época são

maiores do que em outras, por toda a complexidade de fatos sócio-comportamentais que a

envolve. Os pais revivem intensa, consciente e inconscientemente a sua própria vida -

ainda em construção- suas conquistas e dificuldades no momento em que os filhos estão

vivendo a deles.

3.1. A família em transição

Num mundo em mudança, certos padrões que regiam a

estrutura familiar precisam ser modificados para atender às novas exigências.

Tradicionalmente era considerada família o pai, a mãe e os filhos, sendo estes basicamente

do mesmo casal. Os tios, primos e avós conviviam muito mais proximamente e exerciam

também maior influência sobre o indivíduo. O padrão clássico familiar era autoritário e

repressor; a figura do pai, mandante supremo, encarnava a lei. A ele se devia obediência

que ninguém ousava questionar.

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Nas últimas décadas, como foi falado em capítulos anteriores,

esse quadro vem se transformando. O crescente número de separações e divórcios trouxe

sua colaboração para tal mudança. A família moderna abriga agora não somente os filhos

do próprio casal, como também os de suas outras uniões. Hoje, homossexuais que têm

filhos de uma união heterossexual anterior os educam junto de seus pares. As produções

independentes, ou seja, solteiros que aceitam ter filhos sem a convivência do cônjuge, e o

crescente número de jovens mães de 13, 15 anos, configuram também os novos contornos

familiares.

A educação, por sua vez, também sofreu uma transformação.

Tornou-se mais permissiva. Em muitos casos, os pais que foram reprimidos "perderam a

noção do que é estruturante e do que é apenas coercitivo"(*). Passaram da repressão

extrema para a liberdade excessiva: vale tudo. Assim, os limites tão necessários ao

desenvolvimento do senso da realidade e respeito ao outro passaram a ser considerados

prejudiciais ao crescimento.

Institui-se também uma noção errônea de se poupar, ao

máximo, os filhos; com isso, experiências muito importantes deixaram de fazer parte do

seu desenvolvimento. A família, sem dúvida, perdeu o seu perfil tradicional.

3.2. Limites - sim ou não ?

Uma das maiores preocupações de pais e educadores,

atualmente, diz respeito à dificuldade de lidar com a falta de limites das crianças e jovens.

Sabe-se, inclusive, que este é um dos fatores que contribuem para o surgimento ou

agravamento das dificuldades que interferem aprendizagem, conduta e relacionamento

social.

Educar os filhos é um trabalho contínuo, que consome muitos

anos de dedicação dos pais. Exige que se esteja genuinamente atento ao que se passa com

eles e que permita acompanhá-los a uma certa distância, estando porém

(*) ZAGURY, Tânia (vide bibliografia)

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sempre prontos a intervir, se necessário. Fala-se muito, atualmente, em não interferir na

"liberdade" dos filhos, em deixá-los seguir seu caminho. Mas como assim ? A partir de que

momento na existência deles os pais devem abster-se de opinar e dar-lhes uma ajuda em

seu direcionamento, mesmo que não lhes seja abertamente solicitado?

A psicóloga Tânia Zagury, autora do best-seller "Limites sem trauma" (Editora Record)

acha que "a melhor educação é a que estabelece limites de ambos os lados". Para ela, os

filhos precisam ter limites para que possam assumir responsabilidades por seus atos e os

pais também precisam de limites no papel de protetores porque não podem determinar a

vida dos filhos.

Com o crescimento do individualismo nos dias atuais, os pais

também estão muito preocupados em obter o máximo de suas vidas para o seu próprio

gozo. Além de ter um trabalho que agrade, todo mundo quer ser "feliz", se divertir,

consumir, viajar, ficar bonito, enfim, todos têm inúmeros objetivos absolutamente

individualistas a serem perseguidos e alcançados.

A psicanalista Ruth Goldemberg, professora da Universidade

Santa Úrsula, comenta que uma das questões mais difíceis da educação hoje, é combinar

liberdade e criatividade, ambas necessárias ao desenvolvimento humano, ao controle e aos

limites, que também, segundo Ruth, são básicos para esse desenvolvimento (*) "Isso só

será possível quando a educação estiver fundamentada numa base amorosa "- diz.

Os pais têm a responsabilidade de dar condições,

especialmente afetivas, para que a criança possa crescer com amor, integridade e alegria.

Mas, a autoridade também tem limites. Os pais devem respeitar os filhos e jamais usar a

autoridade em proveito pessoal, violando regras para esconder impaciência ao desatenção.

Para o psicanalista Jurandir Freire, incertezas sobre o que é melhor para os filhos são um

problema permanente na história da família.

(*) Apud: Os limites da Mãe, Jornal da Família, O Globo, p.01, 23 jan. 200l

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O mundo é apresentado à criança, através dos pais que de

forma gradativa, vão criando possibilidades para que a sua rede de relações se amplie da

família à escola e a outros núcleos sociais. No entanto, a formação moral e emocional

sólida dos filhos não é mais, freqüentemente, parte desses objetivos a serem atingidos. A

"abstinência" dos pais, deve-se à crise geral da família, que numa sociedade cada vez mais

competitiva, se afasta de valores como afetividade, compreensão e amizade. Os pais, no

entanto, não admitem isso. Crêem-se adultos competentes, modernos e "liberais". Na

verdade, por trás de tal "liberalidade" esconde-se muitas vezes uma dose de comodismo. É

muito mais difícil educar realmente os filhos, "perder" tempo conversando com eles sobre

suas experiências e anseios, do que, em nome de uma suposta postura liberal, deixá-los

sozinhos fazer suas escolhas muito cedo.

Há quem diga que a culpa é da educação liberal dos pais da

geração dos anos 60 e 70. Ë o caso do pesquisador americano Robert Blum, da Escola de

Medicina da Universidade de Minnesota. Para o pesquisador, ao invés de policiar os filhos,

como a geração anterior, esses pais deram a eles uma educação liberal que muitas vezes

esconde indiferença, ausência e desatenção, sob uma aparência de cumplicidade.

A sensação de falta de respeito e amparo causa isolamento e

agressividade. A criança que não se sente amada e respeitada pelos pais torna-se

distante.(*) "Esta situação agravou-se- comenta Blum- quando mais mães entraram no

mercado de trabalho, ficando mais de 12 horas longe dos filhos."

Educar é um processo de maturação lenta e difícil. Não se

formam conceitos, hábitos e atitudes de um dia para outro. Educar pressupõe tempo,

desgaste físico e emocional, requer paciência, habilidade e, às vezes, uma dose de

determinação. Educar uma criança é torná-la autônoma, não "desamparada", é fornecer as

regras, as referências, as interdições principais que lhe garantirão a segurança existencial.

______________________________________________________________________

(*) Apud: Mamãe é virtual, Jornal da Família, O Globo, p. 01 e 02, 06 maio 200l

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3.3. Conflitos familiares - um olhar na adolescência

A complexidade das relações familiares atuais manifesta-se

no confronto de gerações esbarrando na caótica disseminação da insegurança: insegurança

registrada através de uma moralidade social questionável , da inversão de valores, da falta

de parâmetros entre o reprimir e o fomentar e dos conceitos sociais distorcidos.

Desconforto este que contribui com mais motivos para que pais, professores e jovens

enfrentem de forma completamente deturpada as mudanças que deveriam ser sabidamente

rotineiras.

Para a psicanalista Julli Milman, autora do Livro

"Cresceram"!!!- um guia para pais de adolescentes" "A perplexidade dos pais diante dos

filhos(....) é a mesma de seus próprios pais quando, nos anos 60 e 70 , eles, na época

jovens libertários, resolveram fazer sexo antes de casar". A conduta dos jovens mudou,

mas o discurso dos pais ansiosos, que não compreendem a atitude dos filhos e a consideram

um absurdo, é o mesmo. Até o discurso, que esconde um moralismo, é igual.

A família é uma célula importante para a sociedade. Se a

família tiver dificuldades para compreender o seu papel diante do momento em que está

inserida, dificilmente compreenderá o momento que os seus filhos estão vivendo. "Para

compreender os filhos jovens, os pais de hoje, têm que primeiro, se conscientizar que

ficaram ultrapassados "afirma a psicanalista Julli Milman. E ainda, " a maturidade para

refletir sobre o comportamento dos adolescentes deve ser dos pais, não dos filhos. Os pais

devem reconhecer que envelheceram, estão ultrapassados e o mundo mudou nos últimos 20

anos. Esse é o primeiro passo para se aproximar da realidade da juventude"

Toda pessoa leva além do selo individual, o selo do meio

cultural, social e histórico. A dificuldade na elaboração harmônica desse conjunto permite

compreender o desconforto e a dor do processo da adolescência. A família quando se

depara com o "caos" que o adolescente traz para a sua estrutura celular, depara-se com

uma nova ordem. O assombro e a impotência diante de pais inseguros, autoritários,

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ausentes ou perseguidores são tão comuns entre os adolescentes que transformaram em

best-seller o livro "Como educar seus pais", na décima edição pela Editora Objetiva. Os

cinco autores – Juca Filho, Emanuel Jacobina, Cláudia Souto, Cesar Cardoso e Mauro

Wilson, que formam o grupo Obrigado Esparro - ensinam os adolescentes a lidar com "os

piores pais do mundo": os ausentes, os violentos e os que não podem ser apresentados para

ninguém.

"O sucesso se deve, segundo eles, à crise geral da família,

que, numa sociedade cada vez mais competitiva, se afasta de valores como afetividade,

compreensão e amizade."(*)

Um estudo do médico americano Jeffrey G. Johnson, do

Instituto de Psiquiatria de Nova York fala sobre os efeitos da violência das palavras dentro

das relações familiares e revela que a agressividade verbal pode levar a uma série de

distúrbios emocionais e até psiquiátricos, em crianças e adolescentes. Johnson investigou o

papel dos pais nas desordens psiquiátricas em 600 crianças e adolescentes e descobriu que

60% dos jovens cujos pais são agressivos ao falar desenvolvem uma personalidade ansiosa,

com tendências depressivas, ou se tornam viciados em drogas pesadas.

Questões sérias e preocupantes , como drogas, gravidez

precoce, aborto, AIDS, suicídios entre outros , fazem parte do universo do adolescente.

Querer evitá-las, não dialogando, usando uma postura de medo, de superproteção, de

negligência ou autoritarismo, não irá afastar esses riscos da vida do adolescente.

A agravante é que os adolescentes sabem e sentem esse receio

por parte dos pais e adultos. Estes problemas fazem parte e estão presentes na realidade e

na vida do adolescente e de seus pais. Precisam ser olhados de frente e em parceria,

conversando muito a respeito, trocando idéias e opiniões. A adolescência

(*) Apud: Violência verbal, Jornal da Família, O Globo, p. 01, 17 jun. 200l

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do filho provoca mudanças na dinâmica familiar, na relação de pais. É uma grande

reviravolta na vida do filho que não será mais o mesmo, dependendo da maneira que seus

pais irão lidar com isso, poderá ser bem melhor.

3.4. A Família eletrônica

O significativo poder de influência que a mídia exerce

sobre a população, em especial jovens e crianças, tem sido objeto de inúmeras pesquisas e

estudo. Parece ser consensual a percepção de que os meios de comunicação em geral e a

televisão, em particular – sem abrir mão de seu apelo visual- são o veículo da difusão de

conteúdos culturais e sociais junto às camadas carentes de alternativas, o que é o caso de

grande parcela da população brasileira.

Dr. Flemmer(*), responsável pela programação infantil numa

das estações de televisão da Alemanha, em seminário realizado em São Paulo, em 1979,

intitulado "Limites da televisão como meio educacional", mostra que as crianças e jovens

podem ser influenciados em suas ações, em seus pontos de vista, em seus valores, a partir

dos temas expostos nos programas.

Uma pesquisa realizada em 1978 por Luescher, citada pelo

Dr. Flemmer, concluiu que as crianças aprendem padrões de comportamento que vêem na

televisão quando: a) Um determinado comportamento é recompensado como bom; b) a

criança se identifica com a pessoa que manifesta esse comportamento; c) a situação

representada é semelhantes àquelas vividas pela criança; d) a criança é reforçada pelos

companheiros no que se refere à compreensão do conteúdo apresentado.

Mas, é importante considerar que a programação não incide

da mesma maneira em todas as crianças. Segundo Clara Rappaport , em seu artigo

Socialização, cap. 3 (**), "uma criança que vive num lar onde as discussões,

(*) RAPPAPORT, Clara (coord.) Socialização In: Psicologia do Desenvolvimento, São

Paulo, EPU, 1981.

(**) idem

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brigas e outras cenas agressivas são constantes, assistindo a programas onde o

relacionamento entre as pessoas se dá de modo agressivo, poderá desenvolver também

esse padrão de reação, pois é o único que lhe está sendo apresentado. Já a criança que

vivencia um relacionamento familiar onde as pessoas resolvem seus conflitos pelo diálogo,

onde a interação pais-filhos é afetuosa, continua a autora, "não sofrerá conseqüências tão

negativas ao assistir um conteúdo agressivo".

Isto se dá porque a televisão interfere de forma homeopática

no cotidiano dos telespectadores, oferecendo-lhes uma dose ficcional que- embora não

sendo capaz de transformá-los intimamente e de forma duradoura- também não os deixa

mais como eram antes.

Ë preciso, então, observar em que condições as crianças

assistem à TV. Em algumas famílias ela é tida como a "verdadeira babá eletrônica",

substituindo o brinquedo livre, o contato com outras crianças e adultos.

Ë claro que neste caso o efeito é mais pernicioso porque a

televisão está substituindo elementos afetivos fundamentais, e os modelos apresentados

podem ser incorporados com mais facilidade pela criança, em vista das inadequações dos

modelos familiares.

Afastados do lar, pelas necessidades que se fazem presentes

no mundo atual, os pais dividem com a televisão a tarefa de educar e informar a criança e o

adolescente. Assim sendo, se estabelece uma relação profunda, visceral mesmo, das

famílias com a tevê, uma vez que esta lhe oferece entretenimento e realização de suas

fantasias, além de cultura e lazer.

Essa divisão de responsabilidade e de poderes na transmissão

de valores e conceitos que a família (consciente ou inconscientemente) delega à mídia ,

deixa atônitos educadores , psicólogos e sociólogos preocupados com os limites éticos

atuais da TV .

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Capítulo 4: A FAMÍLIA E A ESCOLA

Escola é escola, família é família. O que ambas as instituições

têm em comum? É o fato de prepararem os membros jovens para sua inserção futura na

sociedade e para o desempenho de funções que possibilitem a continuidade da vida social.

Às duas é destinado um papel importante na formação do indivíduo e futuro cidadão. São

elas, os primeiros mundos em que o indivíduo habita, podendo parecer- lhe como

acolhedores ou hostis, com suas regras, costumes e linguagem. A escola, entretanto, tem

uma especificidade - a obrigação de ensinar (bem) conteúdos de áreas do saber, escolhidos

como sendo fundamentais para a instrução de novas gerações.

"Embora seja inegável a importância da família como

grupo socializador, outras agências sociais e até

mesmo alguns espaços competem com ela.

Diuturnamente. E vão se tornando demasiadamente

fortes na sociedade atual. Uris positivos e até

desejáveis, outros, no mínimo discutíveis. "

GOMES,J. Socialização primária: tarefa familiar?Cadernos de Pesquisa, 1994, São Paulo, nº91, p.54-61.

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Na possibilidade positiva, as escolas podem criar para a

criança um ambiente que venha a constituir-se num instrumento de transposição entre a

família de origem e a sociedade em que está inserida, fornecendo subsídios para a

reformulação e/ou manutenção de valores, criando uma rede de novas possibilidades , que

lhes garanta uma vida digna, com relações humanas estáveis e desconflitantes.

4.1. Encontros e desencontros

Entre os inúmeros fatores que devem ser levados em conta

na relação família-escola destaca-se que a ação educativa dos pais difere necessariamente

da ação da escola nos seus objetivos, conteúdos e métodos; no padrão de sentimentos e

emoções que estão em jogo; na natureza dos laços pessoais entre os protagonistas e,

evidentemente, nas circunstâncias que ocorrem.

A História brasileira vem sendo marcada por profundas

mudanças na organização e no funcionamento da nossa sociedade. Entre os anos 60 e 80

um movimento institucional sobre o Estado quebrou o legítimo e importante elo da corrente

que mantinha a relação escola-família. Impôs-se à população um modelo centralizado de

decisões do governo, que assumiu um indesejável papel paternalista, na condução dos

destinos da Educação. Isso levou o sistema a um emperramento e à submissão de normas

excessivamente burocratizadas, culminando com o afastamento dos pais da escola, os quais

delegaram a essa a total responsabilidade na educação de seus filhos.

Não existem absolutos nessa relação, isto é, não existe

nenhuma escola totalmente integrada com a família e com a comunidade, como não existe

também nenhuma escola totalmente desintegrada da família e da comunidade.

Observou-se, na efetivação da pesquisa para o presente

trabalho, que os extremos de integração e da desintegração totais não são reais. Existe um

conjunto de situações intermediárias, que podem assumir as mais diversas configurações,

em termos de natureza e de grau. Os quatro tipos de relação registrados, a seguir,

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compilados do artigo "APRIMORANDO A RELAÇÃO FAMÍLIA-ESCOLA" (*), não

esgotam as possibilidades existentes. Podem assumir as mais diversas configurações,

ficando sempre, situada em algum ponto desta amostra.

Tipo 1: Trata-se de uma relação burocrático formal. Os pais matriculam seus filhos,

pedem transferência, são chamados para receber reclamações ou convocados para

alguma atividade regimental. As autoridades locais, vez por outra, são convidadas a

participar de alguma cerimônia em ocasiões especiais;

Tipo 2: Trata-se de uma relação de natureza tutelar. Os pais são vistos pela escola como

uma extensão dos seus filhos, isto é, também como educandos. São alvo pela escola de

um trabalho constante de informação, esclarecimento, motivação, orientação, de modo a

se tornarem mais cooperativos no processo de educação escolar de seus filhos;

Tipo 3 : Trata-se de uma relação pragmática-utilitária. A escola vê na comunidade e nas

famílias fontes de bens e serviços destinados a suprir suas deficiências e necessidades.

Pais e lideranças comunitárias são envolvidos em mutirões, campanhas, quermesses e

promoções de todo tipo, visando melhorar as condições de funcionamento da escola;

Tipo 4: Trata-se de uma relação plenamente participativa. Os pais são chamados a

compartilhar decisões e responsabilidades com a equipe escolar, atuando de maneira

(co)operativa no encaminhamento de solução para os problemas levantados.

Através da pesquisa e acompanhamento de trabalhos

realizados em algumas escolas da rede pública e particular, observou-se também que outra

consideração que deve ser levada em conta na interação família-escola é o que se

______________________________________________________________________

(*) Apud: OLIVEIRA, João Batista Aprimorando a relação família-escola. Disponível

em : http://redeglobo.globo.com/brasil500/br500novo/educação/sala_leitura

Acesso em: 15 ago. 200l

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refere ao comportamento das famílias das diferentes camadas sociais em relação à escola.

Mesmo na escola pública, famílias de classe média desenvolvem estratégias de

participação tendo em vista a criação de condições para o sucesso escolar de seus filhos, de

maneira individualista. O nível de escolaridade e a facilidade de verbalização possibilitam a

esses pais uma crítica que famílias das classes menos favorecidas não conseguem ou não

ousam fazer. Esses pais optam por uma saída individual, nem sempre se engajam num

projeto coletivo de melhoria de ensino e das relações da escola com a comunidade.

4.2. Pais na Escola - Uma relação marcada pela

diversidade

Durante esta pesquisa , observou-se que os pais têm formas

diferentes de representar a trajetória escolar dos filhos. E a integração com a escola faz-se

através da lógica das classes sociais e da lógica do funcionamento das famílias.

Há muitas vezes, a suposição de que essa capacidade de

formação é inata e natural; caso a família não eduque direito seus filhos, é porque não quer

ou porque o filho "não tem jeito". Outras vezes é considerada condição inerente à classe

social de nascimento, o que condena, preconceituosamente, à incompetência todos os que

não pertencem às camadas sociais mais altas, ou que não tiveram acesso a uma educação

formal.

Raramente é atribuído as dificuldades de educar à simples

falta de informação e mais raramente se pensa em desenvolver competência para essa

tarefa. Tais informações que deveriam ser levadas a todas as famílias, são de acesso a bem

poucas. Os aspectos de saúde, nutrição, desenvolvimento psicoafetivo e relações sociais

deveriam ser de domínio e análise dos responsáveis pela educação da criança.

Uma condição importante nas relações entre família e escola

seria que ambas falassem a mesma linguagem. Que ambas tivessem conhecimento sobre o

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valores e conceitos exercidos em cada uma delas. Esta integração realiza-se com a criação

de um clima de respeito mútuo – favorecendo sentimentos de confiança à competência em

que cada uma exerce o seu papel – tendo claramente delimitados os âmbitos de atuação de

cada uma.

A inferência de equipes multidisciplinares apresenta-se como

colaboradora para a construção de um conhecimento mútuo. A intermediação da

comunidade, com a participação de seus representantes, também abre perspectivas de uma

parceria, na qual a troca de saberes substitua a imposição, e o respeito mútuo possa fazer

emergir novos modelos educativos, abertos à continua mudança.

4.3. Desfazendo nós

O ponto de partida é o reconhecimento mútuo. O

conhecimento das escolas a respeito das famílias é, muitas vezes, baseado em preconceitos.

O preconceito limita a interpretação que se tem do outro, o qual se fecha no seu mundo,

construindo conceitos, sentimentos e ações que guardam a mesma atitude de rigidez. As

famílias vêem as escolas como um mundo fechado, com o poder de dar um veredicto sobre

o futuro do seu filho.

Implementar a participação da família à vida escolar do

educando implica criar um ambiente que venha a se constituir numa rede de situações

facilitadoras de acesso aos pais que devem se sentir como protagonistas e não como

espectadores. ( vide anexo 2)

Outro fator a ser considerado refere-se às estratégias da prática

educativa familiar: se são complementares ou não às da escola, independente da classe

social a que a família pertence. Em parceria com a escola, a família pode desenvolver

práticas que venham a facilitar a aprendizagem escolar e desenvolver hábitos coerentes com

os exigidos pela escola.

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As famílias diferem uma das outras quanto aos modelos educativos.

Bouchard distingue, de forma geral, três modelos – o racional, o humanista e o

simbiosinérgico, que aqui são retratados:

No racional , os pais mantém uma hierarquia na qual decidem e impõem suas decisões

sobre as atividades e o futuro dos filhos. Dão muita importância à disciplina , à ordem,

à submissão, à autoridade, Nas suas estratégias educativas, os pais " distribuem ordens,

impõem, ameaçam, criticam, controlam, proíbem, dão as soluções para as crianças".

Orientam mais para um conformismo social do que para a autonomia;

No modelo humanista, os pais se colocam mais como guias, dando aos filhos o poder de

decisão, numa política que Bouchard chama de "autogestão do poder pela criança".

Entre as estratégias educativas estão as seguintes: permite e estimula a expressão das

emoções pelos filhos, encoraja-os nos seus empreendimentos, reconhece e valoriza as

capacidades e potencialidades dos filhos, favorece a autonomia, a autodeterminação nos

seus filhos. Sua comunicação orienta-se pelas necessidades dos filhos;

No modelo simbiosinérgico há uma "co-gestão do poder e pais e filhos são parceiros

nas atividades que concernem a ambos" . SIMBIO significa "associação durável e

reciprocamente proveitosa entre dois ou mais seres vivos" e SINÉRGICO corresponde

"aos recursos das pessoas e à ação coordenada de muitos". Entre as estratégias,

Bouchard cita as seguintes: respeitam os deveres e direitos de pais e filhos, partilham

responsabilidades cotidianas, desenvolvem uma consciência social ( além das paredes

da casa) trocam com os filhos suas experiências, emoções e sentimentos. Explicam as

conseqüências das ações das crianças, reconhecem seus próprios erros.

Esses modelos dificilmente são encontrados em sua forma

pura, além de cada um apresentar vantagens e desvantagens ,dependendo do momento.

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O interessante no relato de Bouchard é que as escolas repetem

modelos semelhantes na sua relação com os pais. Há escolas que oferecem aos pais o

modelo racional de participação; outras, o humanista; e outras, o simbiosinérgico.

Na tendência do modelo racional, as escolas se portam como

detentoras do poder de decisão e de conhecimento. é de se esperar choques com os pais

que seguem outras tendências. Na tendência humanista, há uma crença nos recursos das

famílias, acatam-se suas decisões e há uma aceitação empática de sentimentos e emoções.

Já na simbiosinérgica, há a valorização da interdependência, da reciprocidade e da co-

gestão.

Assim, os conflitos entre famílias e escolas podem advir das

diferenças de classes sociais, valores, crenças, hábitos de interação e comunicação

subjacentes aos modelos educativos. Isto pode não ser um problema para famílias das

camadas sociais mais altas, que têm a possibilidade de escolher uma escola que se

assemelhe ao seu próprio modelo. Esta não é a realidade, entretanto, para as classes mais

baixas.

O que fazer ? Como adaptar o modelo da escola ao modelo

pretenso pela família ? Como chegar a um consenso, caso haja discrepância entre as

estratégias educativas da família e os pré-requisitos exigidos pela escola ?

Uma forma da escola tentar superar as dificuldades advindas

dessa situação, seria desenvolver parcerias com outras agências ( serviço de formação de

professores, universidades, serviços de saúde, cursos especializados, p.ex), Para dar

conhecimento à família dos hábitos e comportamentos esperados pela escola. desenvolver

programas de (in)formação para os pais (vide anexo 3). Tais encontros podem promover

um conhecimento mútuo e o desenvolvimento de estratégias educativas comuns.

O processo de reconhecimento pede também um dar-se a

conhecer, o que ocorre na relação face a face, aberta e respeitosa ( não é tão difícil assim...)

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4.4. Família <Internet> Escola

A Internet uma das maiores redes de comunicação do mundo,

transformou-se, nos últimos anos, em referencial para milhares de pessoas, concretizando

no cotidiano o caráter globalizado da nova sociedade. Tornou-se, portanto, relevante,

pensar-se no seu impacto sobre a Educação.

"As crianças sabem mais sobre os computadores e Internet

que os seus pais. Trata-se da 1ª vez na história que as crianças são uma autoridade na

grande revolução que está a mudar o mundo"-(*) afirma Don Topscott, considerado pai da

economia digital. Então, por que não aproveitar estas potencialidades? Assim, deve-se

ponderar qual a maneira que a Internet deverá ser usada como instrumento para intensificar

e aprofundar a relação com a família, valorizando a sua participação. Dessa forma, será

necessário aproveitar o interesse crescente dos jovens pela Internet para passar a usá-la num

contexto educativo, englobando a própria família. Deverá ser, pois, uma ferramenta

interativa entre os intervenientes.

Em algumas escolas de classe média do Rio de Janeiro, a

Internet veio contribuir para solucionar problemas de convivência limitada pelos

compromissos e atividades dos responsáveis. Com o acúmulo de trabalho e com a

multiplicidade de tarefas, as mães usam e-mails ( correio eletrônico) para mandarem

______________________________________________________________________

(*) Apud: Família, escola, Internet , 20 fev. 200l .

Disponível em : http:/www.projectochave.net/phorum/list

recados para os filhos e professores, acessam o site ( endereço eletrônico) da escola para

acompanhar o rendimento escolar do filho.

"Estamos perante um "Homo Multimídia" a que a escola não

pode deixar de estar atenta" declara Ana Maria Pina no seu artigo Família, Escola, Internet.

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"Chegou a hora da escola tomar consciência das virtualidades e da eficácia deste meio",

conclui.

Propõe-se que a escola utilize o correio eletrônico (e-mail)

para contatar o responsável, este terá acesso sem intermediários, em tempo real e a baixo

custo, à informação acerca do seu educando, à sua atuação acadêmica, às diversas

atividades culturais que a Escola propõe. Assim, o responsável com dificuldades de se

deslocar ao estabelecimento de ensino, efetuaria a sua participação na relação com a escola

acompanhando de uma forma regular, o percurso de seu filho, assim como o

desenvolvimento do projeto educativo da escola

Mas as facilidades da Internet podem se tornar perigosas. O

contato virtual e o excesso de horas passadas longe dos pais, podem ser nocivos à criança.

O psicólogo inglês Jail Belsky, por exemplo, que coordenou uma pesquisa com 1. 364

crianças de dez cidades americanas concluiu que aquelas que ficam mais de 30 horas

afastadas de seus pais, adquirem níveis elevados de agressividade, comportamentos

explosivos com gritos prolongados, falam e perguntam demais e solicitam exagerada

atenção.

Isso leva a questionar a ação da Escola em face da

legitimidade do progresso da ciência e da tecnologia. A renovação é cada vez mais veloz e

esta não é apenas uma forma de transcendência diante das exigências do mercado de

trabalho e da economia, mas também uma forma de apropriação do material cognitivo e

simbólico, elaborado pela sociedade.

Portanto, é grande o desafio da Escola diante da modernidade.

Ela deve incorporar criticamente os meios de comunicação modernos, fazendo a revisão

consciente da eficiência de um tipo de prática pedagógica que traz formas estimulantes e

necessárias de um novo canal de comunicação entre família e escola, sem ignorar que,

embora legítima, esta nova forma que se apresenta com o avanço da ciência e da

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tecnologia, não substitui a presença física dos pais à escola, tão necessária para a

manutenção e/ou recuperação dos laços afetivos familiares.

4.5. Programas de interação família-escola

O acesso ao processo integrador família –escola depende de

uma estratégia que a escola pode desenvolver observando os recursos de que dispõe cada

comunidade. Experiências com grupos de pais mostram o quanto a comunicação e

discussões de práticas educativas entre eles pode ser muito eficiente no fortalecimento de

suas funções. Além de descobrir a própria ignorância sobre o outro e seu mundo, desvela

seus saberes e suas competências. Este encontro é o que Bouchard chama de apropriação :

"...significa que o indivíduo se torne mais apto a definir e compreender suas necessidades,

atualizar seus recursos, gerar seu desenvolvimento partilhando seu savoir-faire

(conhecimento prático) com os outros e com recursos de apoio a seu meio ambiente".

O importante nos programas pesquisados é que a parceria se

desenvolve na base de recursos e possibilidades pessoais e da comunidade, e, não a partir

das dificuldades e limitações.

São projetos que exigem um investimento pessoal na fase de

implantação e um acompanhamento permanente. O que muitas outras escolas não

perceberam ainda, é que as pessoas se desgastam mais numa relação de isolamento e/ou

tensão com as famílias do que desenvolvendo parcerias. Por outro lado, felizmente,

multiplicam-se as situações em que escolas e pais constituem associações de pais,

colegiados, APMs e outras formas de colaboração, gerando efeitos positivos e salutares.

Partindo do pressuposto de que a melhoria da escola só será

possível se for desejada e construída por todos os atores envolvidos - professor, aluno,

família- os projetos aqui pesquisados demonstram privilegiar o diálogo e a reflexão

participativa sobre a tarefa da escola. Como exemplo O PROJETO EDUCATIVO DE

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ESCOLA ( Escola Básica Barbosa du Bocage – Portugal) em que os pais, através da

Associação de Pais, são convocados para a elaboração em parceria do Regulamento

Interno da Escola (*). Os alunos desenvolvem uma proposta de pesquisa em busca de

soluções para os problemas de falta de adequação das instalações. Efetuando-se a eleição de

alunos representantes , estes são chamados em parceria com o pai representante a

discutirem e analisarem as situações geradoras de indisciplina e definição de normas de

atuação, com criação de alternativas para alunos que apresentem dificuldades de integração

e aprendizagem.

A prefeitura de São Paulo, através da sua secretaria de

Educação, propõe uma parceria interativa-virtual, isto é, escolas e alunos são chamados,

enviando seus textos para um site (página eletrônica) organizado pela SEC para discutirem

os problemas que envolvem o relacionamento familiar de maneira geral. E,

particularmente, cada escola leva para o seu núcleo estes problemas a serem questionados.

(vide anexo 4)

No Rio de Janeiro, o Estado em parceria com o Conselho

Tutelar, apresenta um programa a ser desenvolvido pelas escolas, que objetiva o retorno do

aluno evadido, contactando a família e procurando resolver os problemas que acaso

impeçam a reinclusão deste. A escola é a responsável por esse reingresso, interagindo com

a família no processo de readaptação.(vide anexos 5 e 6)

Para finalizar, ressaltando: a família é a base de tudo. Se a

família muda, muda a escola, muda a comunidade, muda o município, muda o estado, muda

o país. Neste fim de século e início de um novo milênio, mais do que nunca é preciso

acreditar e investir no binômio escola-família.

______________________________________________________________________

(*) buscar site< http://www.eb23-bocage.rcts.pt/pe-acao.htm

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CONCLUSÃO

- Relação família-escola; um diálogo possível.

O compromisso ético, a vontade política, a adesão dos

diversos segmentos da sociedade, a motivação dos pais e professores, técnicos, diretores,

enfim, de todos aqueles que estão comprometidos com a educação, são o alicerce que

constituem um conjunto de fatores subjetivos capazes de influenciar construtivamente

numa mudança no modo de ver, sentir e cuidar da educação.

Pais e professores - família e escola - são os principais

condutores no processo de transmissão do saber social, dos conhecimentos, dos valores, das

práticas, das tradições, dos ritos, dos mitos e de tudo que permite uma convivência solidária

e produtiva A proposta deste trabalho não foi o de se constituir numa cartilha sobre o que a

escola pode ou não fazer para melhor interagir com a família.

De fato, participar nos mecanismos de co-gestão escolar

historicamente tem sido uma tarefa realizada por uma fração reduzida, porém, mais

sensível, consciente e comprometida dos pais, que se dispõem a protagonizar esse papel,

enquanto a grande maioria atua tão somente como coadjuvante ou mero espectador, sendo

ignorado pela escola. A família, em termos de ator social, foi a grande esquecida na

trajetória da maioria dos programas de gestão escolar. Sua importância e seu papel

estratégico ainda não foram suficientemente compreendidos e valorizados, seja pela escola

pública ou particular. É preciso um diálogo mais estreito entre família e escola.

O objetivo, sim, deste trabalho foi o de apresentar subsídios

para que o educador, em face da mobilidade que se apresenta a família nos dias de hoje,

desenvolva um conhecimento mais objetivo das características dos núcleos familiares e de

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suas relações interpessoais, na construção de propostas que conduzam à melhoria das

condições do relacionamento família-escola.

Faz-se necessário uma colaboração mútua entre a escola e a

família. Isso incluí interesse genuíno, criar condições, hábitos e ambientes. E o mais

importante: que a escola desenvolva um conhecimento mais objetivo das condições da vida

familiar e suas características intrínsecas.

A causa positiva para a qual a família deve ser convocada a

trabalhar e lutar em parceria com a escola, não pode ser outra senão a da criação de

condições que contribuam para que cada criança e cada adolescente que passem pela

escola, tenham sucesso na sala de aula e na vida.

Para tanto, urge que a escola (re)conheça e percorra os

caminhos desta mutante instituição chamada família, suas características, seus conflitos

internos e suas inseguranças, que não são privilégios só dela, mas de toda uma sociedade,

fragilizada e perplexa, diante das mudanças que a realidade atual impõe.

Reconhecer significa ultrapassar os limites estreitos do

preconceito e abrir-se para as novas possibilidades de ser do outro e de ser-com-o-outro.

Num primeiro momento é preciso que a escola encare seus próprios preconceitos e deseje

sair dessa perspectiva limitada e ensaiar um outro olhar em direção a esse novo núcleo

familiar que se apresenta. Um olhar, de preferência interrogativo, curioso.

Não existe uma família desestruturada, mas uma nova

estrutura familiar que, hoje, demanda da escola retomar reflexões acerca da sua prática

educativa e instiga a novos questionamentos sobre os objetivos e anseios desse atual

núcleo familiar constituído, recuperando e/ou mantendo seus valores.

Pensar nas formas de incorporação da co-gestão escolar ao

trabalho pedagógico é repensar a legitimação da relação família-escola , é conduzir a

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prática educativa em consonância com o núcleo familiar em que o aluno está inserido,

promovendo um conhecimento mútuo e estratégias comuns para que as crianças possam

realmente crescer e desenvolver-se, utilizando a expressão de Joffre Dumazedier, sem que

se sintam "estrangeiros na esfera na qual são chamados a viver."

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ANEXOS

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