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popcom - informação e formação | Esta edição contém uma entrevista exclusiva a Michael Seufert, deputado do CDS e ex-Presidente da Juventude Popular. Para além disso, uma entrevista aos autores do livro 'Grandes Discursos do Século XX', um dossier ideológico, uma peça com o melhor da actualidade internacional e os habituais artigos de opinião, são excelente pontos de interesse de mais um número recheado de qualidade!

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Ano 2 | Número 6 | Maio de 2013

Tiago Loureiro

Diogo Pascoal

Francisco Ancêde

Joana Martins Rodrigues

Lúcia Santos

Luís Pedro Mateus

Rafael Borges

Eduardo Pereira Correia

Maria Luísa Aldim

Michael Seufert

Miguel Pires da Silva

Rui Albuquerque

O não está de acordo com

o novo acordo. Por isso, é escrito

segundo a antiga ortografia.

Lg. Adelino Amaro da Costa, nº 5

1149-063 Lisboa

goncalobegonha.org

popcom.blogs.sapo.pt

[email protected]

2 sumário

Editorial Tiago Loureiro

Palavra de Presidente Miguel Pires da Silva

Da eternidade dos muros Rafael Borges

Sustentabilidade do Estado Social: que caminho? Lúcia Santos

A insustentável indiferença Francisco Ancêde

Michael Seufert: ‘Acho dramático que qualquer política de corte na despesa seja inconstitucional.'

Indefinições, tensões e novos rumos Rafael Borges

Faz ainda algum sentido ser de ‘direita’? Rui Albuquerque

Grandes Discursos do Século XX Eduardo Pereira Correia e Maria Luísa Aldim

A vida e a obra de Margaret Thatcher

Page 3: popcom #06

Qual é a pressa?

Partido Socialista vive num permanente

estado de negação, representado fielmente

na actuação do seu líder e do seu

secretário-geral. Sócrates, o líder regressado com ar

triunfante, qual D. Sebastião saído da névoa

parisiense, vai cumprindo na RTP a exigente tarefa de

negar as evidências, que ainda nos habitam a

memória, dos seis anos em que o país, sob o seu

governo, percorreu um caminho que quase nos fez

chegar à bancarrota. Seguro, o secretário-geral, luta

para cumprir uma tarefa mais difícil e esquizofrénica:

ao mesmo tempo que também ele tenta negar que

esses seis anos existiram, vai negando que teve,

algum dia, alguma coisa a ver com eles e com o seu

resultado.

Uma das piores consequências desse estado de

negação é uma postura de grave irresponsabilidade.

A resposta que o PS tem na ponta da língua para os

sérios problemas do país, para além de um discurso

vago e demagógico, é uma constante tendência para a

sacudir a responsabilidade para os outros. Seja a

responsabilidade nas causas do actual estado de

coisas, seja a responsabilidade de criar soluções para

a resolução das suas consequências.

É por isso que ver o PS envolvido num processo de

reforma do Estado que implicará coragem,

responsabilidade e, previsivelmente, um encontro

doloroso com a impopularidade, é pouco mais do que

um exercício de imaginação. E isso não deixa de ser

irónico, uma vez que foi o PS que, através do falhanço

das suas opções, condenou o País à inevitável

necessidade de uma reforma virtuosa, regeneradora

e capaz de oferecer um modelo eficaz e adequado ao

funcionamento do Estado, constantemente adiada até

pelo Governo actual.

Se levássemos a sério as palavras de Seguro, o PS

devia assumir a dianteira do processo. Afinal, "quem

criou o problema que o resolva". O PS é hoje uma

O

Tiago Loureiro

editorial 3

A resposta que o PS tem

na ponta da língua para os

sérios problemas do país,

para além de um discurso

vago e demagógico, é uma

constante tendência para a

sacudir a responsabilidade

para os outros.

esses seis anos existiram, vai negando que teve,

algum dia, alguma coisa a ver com eles e com o seu

resultado.

Uma das piores consequências desse estado de

negação é uma postura de grave irresponsabilidade.

A resposta que o PS tem na ponta da língua para os

sérios problemas do país, para além de um discurso

vago e demagógico, é uma constante tendência para a

sacudir a responsabilidade para os outros. Seja a

responsabilidade nas causas do actual estado de

coisas, seja a responsabilidade de criar soluções para

A resposta que o PS tem na ponta da língua para os

sérios problemas do país, para além de um discurso

vago e demagógico, é uma constante tendência

para a sacudir a responsabilidade para os outros.

Seja a responsabilidade nas causas do actual estado

de coisas, seja a responsabilidade de criar soluções

para a resolução das suas consequências.

É por isso que ver o PS envolvido num processo de

reforma do Estado que implicará coragem,

responsabilidade e, previsivelmente, um encontro

doloroso com a impopularidade, é pouco mais do

que um exercício de imaginação. E isso não deixa

de ser irónico, uma vez que foi o PS que, através do

falhanço das suas opções, condenou o País à

inevitável necessidade de uma reforma virtuosa,

regeneradora e capaz de oferecer um modelo eficaz

e adequado ao funcionamento do Estado,

constantemente adiada até pelo Governo actual.

Se levássemos a sério as palavras de Seguro, o PS

devia assumir a dianteira do processo. Afinal,

"quem criou o problema que o resolva". O PS é hoje

uma perigosa mão cheia de nada, de onde apenas

emerge, cada vez com mais pressa, o dedo que

ameaça apertar o gatilho para ajudar à morte do

País.

Por isso, a pergunta que António José Seguro fazia

aos seus camaradas que o queriam ver pelas costas

é a pergunta ideal para lhe fazer quando clama que

quer ver o governo pelas costas: afinal, qual é a

pressa? À esquerda do Governo, onde o sentido de

estado impunha a presença de um partido com

soluções, mora um partido vazio. Um verdadeiro

zero à esquerda.

Page 4: popcom #06

Um dos pontos da ordem de

trabalhos do último Conselho

Nacional da Juventude Popular

que reuniu em Vila Nova de

Famalicão foi a entrega dos

prémios Amaro da Costa, Krus

Abecassis e Ricardo Medeiros.

A concelhia de Braga da Juventude

Popular venceu o Prémio Amaro

da Costa que distingue a melhor

concelhia do ano de 2012.

Francisco Mota, presidente da

concelhia bracarense, enalteceu o

trabalho da sua equipa desde

2009, que culminou com esta

distinção.

O prémio Krus Abecassis, para a

melhor Distrital, foi arrecadado

pela Distrital de Lisboa. Artur

Alvez, em representação da

estrutura, realçou o facto de o

prémio ter sito ganho pelo

terceiro ano consecutivo pela

Distrital lisboeta.

Já Vera Rodrigues, Presidente da

Mesa do Conselho Nacional da JP,

foi galardoada com o Prémio

Ricardo Medeiros para o militante

do ano, e foi num tom emocionado

que proferiu um discurso que

mereceu uma ovação de pé de

todo o auditório do Conselho

Nacional.

se novamente, não só contornam o

nosso entendimento sobre o

verdadeiro espírito da lei, como

constituem um defraudar das

expectativas que esta criou na

sociedade portuguesa, sob o ponto

de vista da renovação de dirigentes

locais, que a lei efetivamente

pretendia fazer suscitar e justificou a

iniciativa legislativa em si mesma".

Para a JP, a "situação é agravada, pela

nova questão de a lei ter um 'de' ou

um 'da'", considerando que, "por

significativo que isto eventualmente

possa querer parecer a nível legal,

não é de todo aceitável que se venha,

nesta fase (para tentar resolver

artificialmente o assunto), descobrir

um 'suposto erro' na publicação da

lei". Os jovens do CDS assinalam

ainda que o erro seria "muito

conveniente e cirúrgico" e "facilitaria

hipoteticamente a resolução do

'problema'".

O Conselho Nacional da JP, reunido

em Vila Nova de Famalicão, definiu

ainda um grupo de trabalho para

levar a cabo uma proposta de revisão

consctitucional.

A Juventude Popular aprovou no

final do passado mês de Fevereiro,

em Conselho Nacional, uma moção

de repúdio à "discussão artificial"

sobre a interpretação da lei de

limitação de mandatos, defen-

dendo que as candidaturas de

autarcas que já atingiram esse

limite descredibilizam os políticos

e a política.

"Repudiamos a discussão artificial

que tem sido feita sobre a

interpretação desta lei, criando

incerteza e dúvida sobre a realidade

do poder local, que é justamente

aquele que, pela sua própria natu-

reza, maior proximidade deverá ter

junto das populações", lê-se na

moção aprovada com seis votos

contra e 15 abstenções.

Os conselheiros nacionais da Juven-

tude Popular exprimem, assim, "o

seu profundo descontentamento,

perante a polémica que tem vindo a

ser suscitada, ao nível de cândi-

daturas autárquicas no país" e

afirmam que "as candidaturas de

autarcas que já cumpriram os três

mandatos consecutivos, mudando de

concelho para poderem candidatar-

se novamente, não só contornam o

nosso entendimento sobre o

verdadeiro espírito da lei, como

constituem um defraudar das

expectativas que esta criou na

sociedade portuguesa, sob o ponto

4 notícias

Conselho Nacional da JP pronuncia-se sobre lei de limitação de mandatos

JP Braga e Distrital de Lisboa distinguidos

Page 5: popcom #06

altura de credibilizar a polític: “são

os políticos que fazem as leis, não

devemos procurar contornar essas

mesmas leis”, afirmou.

Dirigentes do CDS como o antigo

coordenador autárquico Hélder

Amaral e o vice-presidente Nuno

Melo pronunciaram-se contra a

interpretação da lei segundo qual

atingido o limite de mandatos num

determinado concelho os autarcas

podem candidatar-se a outro

concelho. Nuno Melo chegou a

advertir para o risco de essas

candidaturas serem inviabilizadas

pelos tribunais.

posição clara e transparente” sobre

a matéria.

Questionado sobre se o apoio a

Seara em Lisboa abre um

precedente, Miguel Pires da Silva

respondeu: “Não sei qual é a

estratégia do coordenador autár-

quico e do presidente do partido,

mas espero que não aconteça em

mais lado nenhum”.

“A lei foi feita para dar oportu-

nidade a pessoas novas que queiram

servir os seus concelhos. Portugal,

apesar de inúmeras crises, não tem

uma crise de talentos”, argumentou.

Para o líder dos jovens do CDS é

altura de credibilizar a polític: “são

os políticos que fazem as leis, não

devemos procurar contornar essas

mesmas leis”, afirmou.

Dirigentes do CDS como o antigo

coordenador autárquico Hélder

Amaral e o vice-presidente Nuno

Melo pronunciaram-se contra a

interpretação da lei segundo qual

atingido o limite de mandatos num

determinado concelho os autarcas

podem candidatar-se a outro

concelho. Nuno Melo chegou a

advertir para o risco de essas

candidaturas serem inviabilizadas

pelos tribunais.

Miguel Pires da Silva contesta candidaturas de autarcas que atingiram o limite de mandatos

O presidente da Juventude Popu-

lar e autarca em Ponte de Lima,

Miguel Pires da Silva, contestou

no final do passado mês de

Janeiro que o CDS apoie cândida-

turas de autarcas que atingiram o

limite de mandatos, defendendo

que é uma “chico-espertice”.

“Não devemos arranjar esquemas

para contornar a lei. A lei não foi

feita com esse sentido e se foi mal

feita não devemos usar isso”,

afirmou Miguel Pires da Silva. O

líder da Juventude Popular, que é

vereador em Ponte de Lima desde

2009, escreveu na rede social

Facebook depois de ser conhecido

que o CDS-PP vai apoiar a

candidatura de Fernando Seara a

Lisboa, que não alinha em “chico-

espertices”. “Eu não alinho em

chico-espertices, como tal não

apoiarei nenhum candidato a presi-

presidência de câmara que tenha já

atingido o limite de mandatos numa

outra autarquia. Espero que o povo

saiba condenar nas urnas esses

ditos chicos-espertos”, escreveu

então na rede social.

Miguel Pires da Silva afirmou ainda,

em comunicação aos orgãos de

comunicação social, que o tema

seria objecto de um Conselho

Nacional da Juventude Popular,

convocado com o objetivo de os

jovens da organização terem “uma

posição clara e transparente” sobre

a matéria.

Questionado sobre se o apoio a

Seara em Lisboa abre um

precedente, Miguel Pires da Silva

respondeu: “Não sei qual é a

notícias 5

Page 6: popcom #06

O que mudou com o 25 de Abril?

Este foi o mote de discussão

introduzido pela Juventude Popu-

lar de Lisboa (JP Lisboa), no

passado dia 29 de Abril, numa

das faculdades mais prestigiadas

de Portugal, a Faculdade de Di-

reito da Universidade de Lisboa.

Através das doutas experiencias

históricas pré e pós 25 de Abril dos

Excelentíssimos Senhores Profes-

sores Marcelo Rebelo de Sousa e

Pedro Pais de Vasconcelos, o

recheado auditório pode conhecer

outras realidades paralelas e infor-

mais deste marco histórico.

Mas o objectivo capital deste evento

não passava, apenas, pela discussão

da data per si e das correlativas

experiencias, mas sim, também, pelo

impacto da mesma nos dias de hoje.

Foi neste sentido que a JP Lisboa

ouviu com deleite as palavras do

Secretário de Estado do Turismo,

Excelentíssimo Senhor Dr. Adolfo

Mesquita Nunes, que tratou com

optimismo as prepectivas de futuro.

A História só é História se ficar na

memória de quem a viveu e se se

não devemos esquecer que a rigidez, a

severidade, austeridade, muitas vezes,

são condições necessárias para repor

o país e a situação conjuntural

económico-financeira.

Recordámos respeitosamente,

também, os ensinamentos severos,

patrióticos, rígidos, mas não menos

humanos de Margaret Thatcher, os

quais foram recordados em jeito de

esperança para Portugal, na última

conferência organizada pela JP Lisboa,

no passado dia 6 de Maio, em

memória da Baronesa que marcou o

pensamento liberal e conservador

que perfilhamos.

Já dizia George R.R. Martin, a História

é uma roda que se repete. Esperemos

que os jovens de hoje façam renascer

a liberdade com regras, na tentativa

de fazer o melhor em detrimento do

bom ou mau.

Cátia Muchacho, JP Lisboa

Secretário de Estado do Turismo,

Excelentíssimo Senhor Dr. Adolfo

Mesquita Nunes, que tratou com

optimismo as prepectivas de futuro.

A História só é História se ficar na

memória de quem a viveu e se se

perpetuar nas gerações vindouras.

Nesse sentido, a JP Lisboa pauta-se

pela formação educada, infor-

mada e baseada em interpretações

correctas da História, para assim

conseguir imperar a meritocracia na

política portuguesa. Política perante a

qual a JP Lisboa não assume uma

posição de pessimismo, de des-

confiança e de conformismo. Não

esqueçamos que foi o 25 de Abril que

providenciou a pluralidade democrá-

tica que hoje assistimos.

Aludindo à mensagem optimista

passada pelo painel desta confe-

rencia para os mais de cem jovens

presentes naquele Auditório:

devemos esquecer que a rigidez, a

severidade, austeridade, muitas

vezes, são condições necessárias para

repor o país e a situação conjuntural

económico-financeira.

Recordámos respeitosamente,

JP Lisboa debate ‘O que mudou com o 25 de Abril?’

6 notícias

Page 7: popcom #06

Durante a manhã do passado dia

4 de Maio decorreu em Tomar a

Assembleia Distrital de Santarém

da Juventude Popular. O evento,

que teve lugar no auditório da Junta

de Freguesia de S. João Baptista, foi

organizado pela JP Tomar, repre-

sentando um marco importante no

crescimento da estrutura distrital

na região de Santarém, tendo sido

convocado o I Congresso Distrital de

Santarém da Juventude Popular,

assim como foi aprovado por

unanimidade o Regulamento para o

I Congresso Distrital.

A Juventude Popular continua desta

forma em clara expansão na região

de Santarém, sendo cada vez mais

os jovens que fazem parte das

diferentes estruturas concelhias,

sempre interessados em defender

os interesses das suas

localidades. O surgimento da

estrutura distrital visa agilizar os

contactos entre as diferentes

concelhias e a nacional, tornando

os processos mais rápidos e

eficazes, contribuindo para um

trabalho mais profícuo em prol

da comunidade. João Ribeiro -

Vogal JP Tomar

No decorrer das últimas semanas,

foi lançado o site da Distrital de

Setúbal da Juventude Popular, com

vista a manter os militantes

informados sobre a realidade da

Juventude Popular e do CDS no

Distrito. Contando regularmente

com artigos escritos tanto pelos

militantes do Distrito bem como

contribuições de outros militantes

da Juventude Popular e do CDS, é

um objectivo desta actual Distrital

de Setúbal manter todos os

interessados a par da realidade

política distrital e nacional, nunca

esquecendo porém, a necessidade

da reflexão ideológica e política.

É apresentado no site o primeiro

volume do Caderno de Apoio ao

Jovem Candidato Autárquico

destinado a preparar a Juventude

Popular para as Eleições

Autárquicas que se avizinham e que

conta com a contribuição de

algumas figuras bem conhecidas.

A Distrital de Setúbal da Juventude

Popular convida todas os inte-

ressados a a visitarem o site em

jpdistritalsetubal.wix.com/site

Hélder Rodrigues, JP Distrital Setúbal

A Juventude Popular continua desta

forma em clara expansão na região

de Santarém, sendo cada vez mais

os jovens que fazem parte das

diferentes estruturas concelhias,

sempre interessados em defender

os interesses das suas localidades. O

surgimento da estrutura distrital

visa agilizar os contactos entre as

diferentes concelhias e a nacional,

tornando os processos mais rápidos

e eficazes, contribuindo para um

trabalho mais profícuo em prol da

comunidade.

João Ribeiro, JP Tomar

Tomar recebe Assembleia Distrital de Santarém

notícias 7

Distrital de Setúbal lança novo site e a primeira parte do seu Manual Autárquico

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8 notícias

A Juventude Popular de Braga

realizou no passado dia 8 de

Março a tertúlia “A Mulher na

Sociedade”, como forma de

celebrar o Dia Internacional da

Mulher, e contou com sala cheia

na sede do CDS local.

As oradoras convidadas para esta

tertúlia foram Paula Remoaldo,

professora associada do

Departamento de Geografia da

Universidade do Minho, Ana Maria

Brandão, professora auxiliar do

Departamento de Sociologia da

Universidade do Minho e Vera

Rodrigues, adjunta do Secretário de

Estado do Turismo e Presidente da

Mesa do Conselho Nacional da JP.

A tertúlia debruçou-se em reflexões

sobre as conquistas das mulheres

em várias áreas, bem como o

especial contributo das mesmas,

com especial incidência nas áreas

da saúde e na política.

estrutura concelhia, através do seu

Departamento de Implantação, levou

a cabo, no Externato Ribadouro, as

sessões de "E TU, já sabes como vai

ser o TEU futuro no Ensino

Supeiror?", projecto tem como

objectivo aproximar os alunos do

ensino secundário do concelho do

Porto à estrutura da Juventude

Popular local, proporcionando um

evento onde alunos do ensino

superior partilham os desafios e as

oportunidades dos seus respectivos

cursos.

Numa primeira fase os alunos

ouviram uma breve apresentação de

cada curso e no final tiveram uma

conversa informal com o aluno que

representava o curso que lhe des-

pertava mais interesse.

A concelhia do Porto da Juventude

Popular trabalha a todo o vapor

nas tarefas de formação dos seus

militantes e de implantação da

estrutura no concelho. Por isso,

realizou já duas sessões da

sua "Formação de 1ª". A primeira

foi dedicada ao Marketing Político,

com a presença do Dr.º Custódio

Oliveira, consultor de comunicação,

investigador de marketing político

e docente universitário; a segunda

debruçou-se sobre a oratória e a arte

de falar em público, contando com a

colaboração da Dr.ª Maria Luísa

Malato, docente na Universidade

do Porto.

Já no que diz respeito à política de

próximidade com os jovens

portuenses, nos dias 6 e 9 de Maio, a

estrutura concelhia, através do seu

Departamento de Implantação, levou

a cabo, no Externato Ribadouro, as

sessões de "E TU, já sabes como vai

ser o TEU futuro no Ensino

Supeiror?", projecto tem como

JP Porto aposta nas políticas de formação e implantação

JP Braga realiza tertúlia sobre “A Mulher na Sociedade”

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notícias 9

Distrital de Leiria apresenta Cadernos Formativos nas Caldas da Rainha

com a imprensa, e são identificados

alguns lapsos comuns que podem e

devem ser evitados.

Fica mais uma vez presente a forte

convicção e aposta da Distrital de

Leiria na formação dos jovens que,

segundo Diogo Carvalho, “podem

ficar ainda mais esclarecidos sobre

aquilo em que acreditam, sobre o

que é comum a todos os presentes e

sobre os caminhos que têm para se

fazerem ouvir”. Durante a sua

intervenção, José Lello salientou que

"foi muito bom entrar e ver uma

sala cheia de jovens, é um sinal de

crescimento, de trabalho, e

sobretudo de interesse por parte

dos jovens naquilo que importa na

vida de todos". Rodrigo Cipriano, JP Distrital Leiria

Realizou-se no passado dia 27 de

Abril, nas Caldas da Rainha, a

apresentação dos cadernos for-

mativos da Distrital de Leiria da

Juventude Popular. A iniciativa

contou com a presença do

secretário-geral da JP, José Miguel

Lello, o presidente da Distrital da JP,

Diogo Carvalho, e várias dezenas de

jovens do distrito de Leiria. Foram

apresentados o Caderno do Militante

e o Caderno Super Militante, através

dos quais se pretende contribuir

para uma juventude esclarecida e

consciente, que defenda valores e

convicções de uma forma segura. O

Caderno do Militante, apoiando-se

naquilo que são o passado e as

origens da JP, apresenta sucin-

tamente os princípios e pilares

ideológicos que sustentam a

convicção política da Juventude

Popular e sobre os quais a sua acção

deve ser fundada. Neste caderno

faz-se ainda um panorama da

expansão da Juventude, num

contexto do distrital, com o qual se

percebe o crescimento sustentado

que tem vindo a acontecer nas

várias regiões desse mesmo distrito.

No caderno Super Militante são

identificados e explicados os

trâmites legais para a criação de

uma concelhia (bem como os seus

órgãos constituintes), sugerindo aos

jovens uma posição pro-activa e de

iniciativa, que lhes permita intervir

na vida do seu concelho. Ainda neste

caderno são dadas sugestões e

indicações sobre como comunicar

com as pessoas e com a imprensa, e

são identificados alguns lapsos

comuns que podem e devem ser

ideológicos que sustentam a com-

vicção política da Juventude Popular

e sobre os quais a sua acção deve

ser fundada. Neste caderno faz-se

ainda um panorama da expansão da

Juventude, num contexto do distri-

tal, com o qual se percebe o

crescimento sustentado que tem

vindo a acontecer nas várias regiões

desse mesmo distrito. No caderno

Super Militante são identificados e

explicados os trâmites legais para a

criação de uma concelhia (bem

como os seus órgãos constituintes),

sugerindo aos jovens uma posição

pro-activa e de iniciativa, que lhes

permita intervir na vida do seu

concelho. Ainda neste caderno são

dadas sugestões e indicações sobre

como comunicar com as pessoas e

com a imprensa, e são identificados

alguns lapsos comuns que podem e

devem ser evitados.

Fica mais uma vez presente a forte

convicção e aposta da Distrital de

Leiria na formação dos jovens que,

segundo Diogo Carvalho, “podem

ficar ainda mais esclarecidos sobre

aquilo em que acreditam, sobre o

que é comum a todos os presentes e

sobre os caminhos que têm para se

fazerem ouvir”. Durante a sua

intervenção, José Lello salientou que

"foi muito bom entrar e ver uma

sala cheia de jovens, é um sinal de

crescimento, de trabalho, e

sobretudo de interesse por parte

dos jovens naquilo que importa na

vida de todos".

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Palavra de Presidente

10 opinião

Mergulhamos numa era do politicamente

correcto, esquecendo muitas vezes o

moralmente correcto. Assistimos no Parlamento,

salvo honrosas excepções, a debates dignos de

autenticas encenações teatrais onde todos

querem brilhar, todos querem dar a conhecer o

seu vasto vocabulário, esquecendo-se muitas

vezes que o povo quer ouvir propostas, quer

soluções e acima de tudo espera mais

proximidade entre os políticos e a

sociedade civil.

Não é fácil estar hoje na política, os erros do

passado dificultam a nossa acção, mas uma coisa

é certa a democracia sem políticos não funciona.

Neste sentido, é nossa obrigação de fazer

diferente, dar o exemplo e recuperar a

credibilidade política perante o Povo Português.

Estamos preparados, estamos convictos e vamos

lutar por um Portugal melhor.

Miguel Pires da Silva

omo é do conhecimento geral vivemos

hoje uma das piores crises de sempre,

fruto de inúmeras irresponsabilidades,

de politicas desajustadas, de políticos fracos e

cuja seriedade deixa muito a desejar. Nos

últimos anos a corrupção e a política apareceram

várias vezes de braço dado. É uma vergonha e é

inaceitável que alguém que está na politica

supostamente com o intuito de servir a

população se preste a tal papel, mas na minha

opinião é tão culpado o político como o cidadão

que se dispõem a corromper, o que me leva a

crer que este é um problema de base. Um

problema para nós, uma banalidade para outros.

Cabe-nos a nós a difícil tarefa de inverter esta

situação, e de uma vez por todas encarar a

politica como um verdadeiro serviço!

É triste mas passados tantos anos após o golpe

de estado de 25 de Abril, as maiores prioridades

continuam a ser as aparências e o ‘show off’.

Mergulhamos numa era do politicamente

correcto, esquecendo muitas vezes o

moralmente correcto. Assistimos no Parlamento,

salvo honrosas excepções, a debates dignos de

autenticas encenações teatrais onde todos

querem brilhar, todos querem dar a conhecer o

seu vasto vocabulário, esquecendo-se muitas

vezes que o povo quer ouvir propostas, quer

soluções e acima de tudo espera mais

C

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Page 12: popcom #06

Rafael Borges

tália

Poucos foram os indivíduos

que, ao longo da história dos

homens, foram capazes de

assenhorear-se de nações

inteiras. Silvio Berlusconi, ex-

primeiro-ministro italiano e

magnata dos mídia, porém, foi

um deles. E não há muito que

possa sugerir à Itália e à Europa

que o seu reinado tenha já

chegado ao fim.

Não é difícil compreender os

motivos pelos quais a república

transalpina se habituou a viver à

sombra de Berlusconi. Chefe de

governo entre 1994 e 1995,

2001 e 2006 e 2008 e 2011, 'Il

Cavaliere' tornou-se no âmago da

própria política italiana, no centro

gravitacional à volta do qual tudo

o resto gira. Durante os seus

sucessivos consulados, porém, o

2001 e 2006 e 2008 e 2011, 'Il

Cavaliere' tornou-se no âmago da

própria política italiana, no centro

gravitacional à volta do qual tudo o

resto gira. Durante os seus

sucessivos consulados, porém, o

país que dirigiu viveu anos de uma

mediocridade económica que

deveria ter sido suficiente para

descredibilizar tanto o homem,

como a agenda que propugnava.

As eleições italianas do passado mês

de Fevereiro foram, para os

italianos, uma oportunidade de

expressar esse exacto sentimento de

exasperação. Com Silvio Berlusconi

mais desgastado que nunca e 'Il

Cavaliere' humilhado pelo golpe

palaciano que viu, em 2011, a União

Europeia afastá-lo do poder, o

centro-esquerda tinha tudo para

atingir um bom resultado eleitoral.

Porém, se é verdade que um

desemprego recorde, uma dívida

galopante e um crescimento

anémico tornavam provável o

esmagamento eleitoral do centro-

direita, a verdade é que, como

sempre, Berlusconi foi capaz de

reinventar-se. Liberto do ónus de

três mandatos desastrosos, o líder

do Povo da Liberdade apresentou-

esmagamento eleitoral do centro-

direita, a verdade é que, como

sempre, Berlusconi foi capaz de

reinventar-se. Liberto do ónus de

três mandatos desastrosos, o líder

do Povo da Liberdade apresentou-

se como um homem novo, impoluto,

sem responsabilidade no caos

económico e financeiro em que

mergulhou o país. Pior: os italianos

deixaram-se ludibriar pela mudança

de imagem e discurso.

Já do lado do Partido Democrático,

principal formação de centro-

esquerda do país, parece evidente

que a oportunidade aberta pelas

eleições de Fevereiro foi

absurdamente mal aproveitada. Se

em Janeiro de 2013 as sondagens se

atreviam a conjecturar um resul-

tado próximo dos 45% para os

social-democratas, a verdade é que

Bersani, líder do PD, não logrou

persuadir mais que 29.5% dos

italianos. Esbanjando uma van-

tagem que chegou a ser de quase

20%, Pierluigi Bersani deitou por

terra qualquer esperança de

estabilidade política para o seu país.

O mau resultado do Partido

Democrático, assim como o relativo

sucesso – Berlusconi perdeu, apesar

Indefinições, tensões e novos rumos

12 internacional

I

Page 13: popcom #06
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20%, Pierluigi Bersani deitou por

terra qualquer esperança de

estabilidade política para o seu país.

O mau resultado do Partido

Democrático, assim como o relativo

sucesso – Berlusconi perdeu, apesar

de tudo, perto de 17% do eleitorado

– de 'Il Cavaliere' não foram,

todavia, as grandes surpresas do

sufrágio transalpino. Ainda mais

inesperada foi a ascensão meteórica

do Movimento 5 Estrelas, um

partido de protesto formado em

2009. Fundada pelo célebre

comediante Beppe Grillo, a nova

plataforma partidária manifestou,

até agora, apenas um objectivo

primordial: o desmantelamento do

sistema político vigente em Itália, a

destruição daquilo que refere serem

os “partidos do sistema” – i.e., o PD e

o PDL – e o abandono da moeda

única. Fora isso, não houve, nos

inflamados discursos de Grillo, uma

palavra sobre segurança,

recuperação económica, posicio-

namento europeu ou política

externa. Aí, como em quase tudo, o

Movimento 5 Estrelas é omisso. A

verdade, porém, é que os italianos

não o penalizaram por isso.

Beppe Grillo, um actor de 64 anos, é

conhecido, sobretudo, pela sua

retórica mordaz. Orador experiente

e político astuto, afirmou-se como

um 'Berlusconi anti-Berlusconi', um

homem disposto a utilizar a política

espectáculo de 'Il Cavaliere' contra o

próprio. Surpreendente e, por vezes,

chocante, Grillo não hesitou em

afirmar que veria com bons olhos

um “ataque da Al Qaeda” desde que

isso auxiliasse a “extinguir os

políticos do sistema.” Aparen-

temente, os italianos gostaram do

que ouviram: com um dos mais

baixos níveis de confiança popular

na classe política, a Itália parecia

destinada a recolher-se no leito da

demagogia radical do M5S.

O rescaldo das legislativas italianas,

assim, não poderia ter sido mais

eleições, o país viu-se desprovido do

único activo que ainda detinha: uma

relativa estabilidade política.

Pierluigi Bersani ficou-se pelos

29.5% dos votos, Silvio Berlusconi

recebeu 29.1% e Beppe Grillo, o

novo político-sensação de Itália,

atingiu a surpreendente marca dos

25.5%. Se as sondagens eram

unânimes no 15-16% que davam a

Grillo, o comediante foi capaz de

dilatar enormemente essa pro-

jecção. Já Mario Monti, incumbente

e candidato do statu quo, ficou-se

por uns vexatórios 10.5%.

As eleições de Fevereiro foram as

primeiras, desde o colapso do

regime fascista, a deixar o país sem

um vencedor claro. Para além de

uma população profundamente

dividida, o presidente italiano

Georgio Napolitano teve de

baixos níveis de confiança popular

na classe política, a Itália parecia

destinada a recolher-se no leito da

demagogia radical do M5S.

O rescaldo das legislativas italianas,

assim, não poderia ter sido mais

inesperado. Entre as sondagens de

Janeiro que garantiam aos social-

democratas uma maioria absoluta

em ambas as câmaras do parla-

mento italianos e o final de

Fevereiro, Bersani perdeu cerca de

15% dos sufrágios. Berlusconi e

Grillo, por outro lado, viram as suas

intenções de voto subir paulati-

namente. Quando chegou o dia das

eleições, o país viu-se desprovido do

único activo que ainda detinha: uma

relativa estabilidade política.

Pierluigi Bersani ficou-se pelos

29.5% dos votos, Silvio Berlusconi

recebeu 29.1% e Beppe Grillo, o

14 internacional

Atirados para um limbo, votados a um contexto de incerteza e indefinição políticas, os italianos têm agora bons motivos para temer pelo seu futuro. E a União Europeia também. Com a chave do equilíbrio político agora nas mãos de Berlusconi, tudo parece ser possível. E, considerando o historial de desonestidade estratégica do ex-primeiro-ministro, há bons motivos para conjecturar um fim prematuro para o actual governo.

Page 15: popcom #06

Venezuela

Igualmente conturbado foi o acto

eleitoral venezuelano. Ainda na

ressaca da morte de Hugo Rafael

Chávez Frias, o decano dos dita-

dores da América do Sul, a

República Bolivariana não poderia

ter evitado um certo sentimento de

orfandade. Para o bem, e para o mal.

Para os seus defensores, o

desaparecimento de Chávez relem-

brou-os de que, afinal, o regime que

edificou não é algo inamovível,

imune ao tempo. Lamentam o fim

do homem que fez a Venezuela

caminhar pela estrada do socia-

lismo, nacionalizou boa parte da

economia e posicionou a nação sul-

americana ao lado de párias

internacionais como a República

Islâmica do Irão, a República Árabe

da Síria, o Sudão ou a Coreia do

Norte. Para os seus detractores, a

morte de Chávez representou o fim

da era a que emprestou o nome – e

devolveu ao povo a oportunidade de

reconsiderar o caminho por que

optou.

Chávez Frias não foi um caudillo sul-

americano qualquer. Oficial do

exército, tentou chegar ao poder

pela primeira vez em 1992, ano em

que liderou um golpe de estado

contra o então presidente, Carlos

Andrés Pérez. Andréz Pérez, um

centrista, havia sido eleito com a

promessa de cortar laços com o

Fundo Monetário Internacional – a

Venezuela beneficiava, na altura, de

um resgate financeiro – e com os

Estados Unidos. Na verdade, porém,

fez o contrário daquilo com que se

tinha comprometido. Renegando a

intenção de abandonar a

austeridade promovida pelo FMI,

Pérez aprofundou-a; ignorando o

desígnio de afastar-se de

Washington, o presidente reforçou

as relações com os Estados Unidos.

Chocado com o 'U-turn'

presidencial, Chávez sentiu-se

primeiras, desde o colapso do

regime fascista, a deixar o país sem

um vencedor claro. Para além de

uma população profundamente divi-

dida, o presidente italiano Georgio

Napolitano teve de enfrentar um

parlamento igualmente incoeso. Se

na Câmara dos Deputados, câmara

baixa do Parlamento, Bersani logrou

atingir uma maioria absoluta, o

mesmo não sucedeu no Senado da

República. Para resolver um

diferendo que se manteve durante

mais de um mês, Napolitano foi

obrigado a recandidatar-se ao cargo

de Presidente da República – para o

qual foi rapidamente eleito –, e

forçar um compromisso entre as

partes discordantes. Face à recusa

do centro-direita em coligar-se com

um PD liderado por Bersani, o ex-

comunista concordou em retirar-se

de cena. Daí até à formalização de

uma coligação PD-PDL liderada por

Enrico Letta, ex-presidente da

Juventude do Partido Popular

Europeu e sobrinho de Gianni Letta,

homem próximo de Berlusconi, foi

uma questão de dias. A Itália tem já

governo. Resta apenas saber quanto

tempo durará.

Atirados para um limbo, votados a

um contexto de incerteza e

indefinição políticas, os italianos

têm agora bons motivos para temer

pelo seu futuro. E a União Europeia

também. Com a chave do equilíbrio

político agora nas mãos de

Berlusconi, tudo parece ser possível.

E, considerando o historial de

desonestidade estratégica do ex-

primeiro-ministro, há bons motivos

para conjecturar um fim prematuro

para o actual governo. Materialize-

se isso, e a permanência da Itália na

zona euro pode ter os dias contados.

Norte. Para os seus detractores, a

morte de Chávez representou o fim

da era a que emprestou o nome – e

devolveu ao povo a oportunidade de

reconsiderar o caminho por que

optou.

Chávez Frias não foi um caudillo sul-

americano qualquer. Oficial do

exército, tentou chegar ao poder

pela primeira vez em 1992, ano em

que liderou um golpe de estado

contra o então presidente, Carlos

Andrés Pérez. Andréz Pérez, um

centrista, havia sido eleito com a

promessa de cortar laços com o

Fundo Monetário Internacional – a

Venezuela beneficiava, na altura, de

um resgate financeiro – e com os

Estados Unidos. Na verdade, porém,

fez o contrário daquilo com que se

tinha comprometido. Renegando a

intenção de abandonar a auste-

ridade promovida pelo FMI, Pérez

aprofundou-a; ignorando o desígnio

de afastar-se de Washington, o

presidente reforçou as relações com

os Estados Unidos. Chocado com o

'U-turn' presidencial, Chávez sentiu-

se impelido a removê-lo da chefia da

nação. E, embora não tenha

conseguido fazê-lo, Hugo Chávez

afirmou-se, pelo menos, como

principal opositor do consenso pró-

austeridade então existente no país.

Após uma sentença de prisão de

dois anos, o oficial do exército

lançou-se numa segunda tentativa

para alcançar o poder. Fundou um

partido de cariz comunista, o

Movimento Quinta República, e

concorreu a eleições. Venceu.

Cansados de anos de corrupção,

violência e austeridade, os

venezuelanos dispuseram-se a

confiar no homem que, há apenas

alguns anos, havia tentado

subverter o estado de direito

democrático. Depois, já presidente,

Hugo Rafael Chávez Frias iniciou um

amplo programa de reformas. As

principais empresas – bancos,

indústria petrolífera e seguros –

internacional 15

Page 16: popcom #06

Mahmoud Ahmadinejad, de Bashar

al Assad a Fidel e Raúl Castro,

poucos foram os tiranos com quem

não privou.

A principal dificuldade do regime foi

a economia. Sem dinheiro para

pagar os inúmeros serviços sociais

que facultou aos venezuelanos mais

pobres, o regime chavista foi for-

çado a desvalorizar o Bolívar várias

vezes. Em 2007, a moeda

venezuelana encontrava-se já tão

desvalorizada que Caracas se viu

obrigada a trocá-la por outra: o

Bolívar Fuerte. Carcomido por uma

inflação galopante – que atingiu, em

2012, o valor astronómico de 31.6%

-, o país foi ultrapassado economi-

camente pela maioria dos seus

pares sul-americanos.

À data das eleições de 14 de Abril,

era esta a situação enfrentada pela

República Bolivariana. Como

dauphin de Chávez, avançou Nicolás

Maduro. Motorista de profissão,

Maduro iniciou a sua vida política

como sindicalista. Depois disso, teve

um papel preponderante na

organização e fundação do partido

de Chávez, o Movimento Quinta

República. Com a vitória, em 1998,

do seu mentor político, o ex-

motorista tornou-se deputado à

Assembleia Nacional venezuelana –

isto é, o parlamento do país.

Tido como mais colérico que

Chávez, Maduro cedo trouxe

nervosismo à diplomacia norte-

americana. Principalmente, quando

se tornou óbvio que seria ele, e não

o presidente da Assembleia

Nacional, Diosdado Cabello Rondón,

o candidato do PSUV, ou Partido

Socialista Unido da Venezuela. Em

Washington, temia-se que a

assunção, por Maduro, da liderança

do país levasse a um

posicionamento internacional ainda

mais extremista - assim como o

aprofundamento de relações com

países como o Irão, a Síria, a Coreia

do Norte ou o Sudão. Mas Maduro,

aprofundou-a; ignorando o desígnio

de afastar-se de Washington, o

presidente reforçou as relações com

os Estados Unidos. Chocado com o

'U-turn' presidencial, Chávez sentiu-

se impelido a removê-lo da chefia da

nação. E, embora não tenha

conseguido fazê-lo, Hugo Chávez

afirmou-se, pelo menos, como

principal opositor do consenso pró-

austeridade então existente no país.

Após uma sentença de prisão de

dois anos, o oficial do exército

lançou-se numa segunda tentativa

para alcançar o poder. Fundou um

partido de cariz comunista, o

Movimento Quinta República, e

concorreu a eleições. Venceu.

Cansados de anos de corrupção,

violência e austeridade, os vene-

zuelanos dispuseram-se a confiar no

homem que, há apenas alguns anos,

havia tentado subverter o estado de

direito democrático. Depois, já

presidente, Hugo Rafael Chávez

Frias iniciou um amplo programa de

reformas. As principais empresas –

bancos, indústria petrolífera e

seguros – foram nacionalizados pelo

governo, os dissidentes silenciados,

o seu poder fortalecido. As prisões

sucederam-se, as acusações de

“golpismo” também. Em 2002, apro-

veitou uma tentativa de golpe de

estado para enviar adversários

políticos para a prisão. Um deles,

Henrique Capriles Radonski, tornar-

se-ia depois no Governador do

Estado de Miranda e candidato da

oposição no último sufrágio que

disputou. Na frente externa, Chávez

aproximou-se de párias inter-

nacionais, desenvolveu amizades

com ditadores e aprofundou laços

com regimes totalitários. De Kim

Jong Il – e, depois, Kim Jong Un - a

Mahmoud Ahmadinejad, de Bashar

al Assad a Fidel e Raúl Castro,

poucos foram os tiranos com quem

não privou.

A principal dificuldade do regime foi

a economia. Sem dinheiro para

como sindicalista. Depois disso, teve

um papel preponderante na orga-

nização e fundação do partido de

Chávez, o Movimento Quinta

República. Com a vitória, em 1998,

do seu mentor político, o ex-

motorista tornou-se deputado à

Assembleia Nacional venezuelana –

isto é, o parlamento do país.

Tido como mais colérico que

Chávez, Maduro cedo trouxe nervo-

sismo à diplomacia norte-

americana. Principalmente, quando

se tornou óbvio que seria ele, e não

o presidente da Assembleia

Nacional, Diosdado Cabello Rondón,

o candidato do PSUV, ou Partido

Socialista Unido da Venezuela. Em

Washington, temia-se que a assun-

ção, por Maduro, da liderança do

país levasse a um posicionamento

internacional ainda mais extremista

- assim como o aprofundamento de

relações com países como o Irão, a

Síria, a Coreia do Norte ou o Sudão.

Mas Maduro, embora escolhido por

Chávez como seu sucessor, é

também menos carismático e

conhecido que o anterior

presidente. E terá sido isso,

juntamente com outros factores, a

ditar o mau resultado eleitoral que

alcançou.

Contra Maduro, a força do Estado, e

o peso da memória de Hugo Chávez,

avançou Henrique Capriles

Radonski. Capriles, Governador do

Estado de Miranda e opositor de

longa data do regime venezuelano,

havia já defrontado Chávez nas

eleições de Outubro de 2012. Jovem

(tem apenas 40 anos) e carismático,

o candidato da Mesa de Unidade

Democrática, ou MUD, arrancou a

Chávez o melhor resultado da

oposição em anos. Ainda assim, a

votação que alcançou não foi

suficiente para conquistar a

presidência. Após o

desaparecimento do chefe de estado

e consequente repetição do acto

eleitoral, no entanto, as esperanças

Contra Maduro, a força do Estado, e o peso da memória de Hugo Chávez, avançou Henrique Capriles, opositor de longa data do regime venezuelano. Jovem e carismático, arrancou o melhor resultado da oposição em anos.

16 internacional

Page 17: popcom #06

Chávez como seu sucessor, é

também menos carismático e

conhecido que o anterior presi-

dente. E terá sido isso, juntamente

com outros factores, a ditar o mau

resultado eleitoral que alcançou.

Contra Maduro, a força do Estado, e

o peso da memória de Hugo Chávez,

avançou Henrique Capriles Radon-

ski. Capriles, Governador do Estado

de Miranda e opositor de longa data

do regime venezuelano, havia já

defrontado Chávez nas eleições de

Outubro de 2012. Jovem (tem

apenas 40 anos) e carismático, o

candidato da Mesa de Unidade

Democrática, ou MUD, arrancou a

Chávez o melhor resultado da

oposição em anos. Ainda assim, a

votação que alcançou não foi

suficiente para conquistar a

presidência. Após o desapa-

recimento do chefe de estado e

consequente repetição do acto

eleitoral, no entanto, as esperanças

de Capriles – e, por isso, da oposição

– ressurgiram. Agora sem o caudillo

que havia liderado o país durante

14 anos, supuseram, os dissidentes

estavam mais perto de reconquistar

a chefia do Estado.

O resultado eleitoral espelhou uma

nação dividida ao meio. De acordo

com a Comissão Eleitoral, Nicolás

Maduro venceu com 50% dos

sufrágios, ao passo que Henrique

Capriles arrecadou 49% deles. Mas

a proximidade entre as votações de

ambos os candidatos, assim como os

múltiplos relatos de fraude eleitoral,

impediram um desfecho pacífico das

eleições.

Nos dias seguintes ao anúncio dos

resultados, o país explodiu em

indignação. Quando Capriles lançou

dúvidas sobre a legitimidade do

processo eleitoral, milhares de

venezuelanos, defensores e

adversários do regime, saíram às

ruas. Daí até à eclosão de confrontos

e à morte de 7 civis, pouco demorou.

Suspeitando de uma fraude eleitoral

maioria do povo venezuelano? –

acham ser ilegítimo, o país está

destinado a ter uns próximos seis

anos particularmente difíceis. Na

melhor das hipóteses, Nicolás

Maduro terá um mandato profun-

damente conturbado, em que a

oposição generalizada ao seu

governo o forçará à progressiva

totalitarização do Estado. Na pior,

as desconfianças que rodeiam o

presidente poderão, a prazo, levar a

um golpe de estado por oficiais

extremistas do regime. Um outro

cenário, porventura menos previ-

sível, seria ainda a eclosão de uma

guerra civil entre apoiantes e

oponentes da República Bolivariana.

Qual destas hipóteses se materi-

alizará, é ainda incerto. Isto,

contudo, parece ser inquestionável:

o futuro pouco trará de bom à nação

sul-americana.

processo eleitoral, milhares de

venezuelanos, defensores e adver-

sários do regime, saíram às ruas. Daí

até à eclosão de confrontos e à

morte de 7 civis, pouco demorou.

Suspeitando de uma fraude eleitoral

generalizada, o candidato da opo-

sição requisitou à Comissão

Eleitoral que recontasse os votos.

Maduro, porém, recusou fazê-lo – e

essa é uma posição que manteve até

agora.

Sem uma aceitação pacífica do

sufrágio de Abril, a Venezuela pode

bem encontrar-se numa crise de

consequências imprevisíveis. Já não

são apenas os problemas econó-

micos; a inflação galopante, o

crescimento anémico ou os

elevadíssimos níveis de pobreza já

não, para os venezuelanos, o cerne

das suas preocupações. Com um

presidente-eleito que muitos – a

maioria do povo venezuelano? –

acham ser ilegítimo, o país está

destinado a ter uns próximos seis

anos particularmente difíceis. Na

melhor das hipóteses, Nicolás

Maduro terá um mandato

O resultado eleitoral espelhou

uma nação dividida ao meio.

Maduro venceu com 50% dos

sufrágios, ao passo que Capriles

arrecadou 49% deles. Mas a

proximidade entre as votações

de ambos os candidatos, assim

como os múltiplos relatos de

fraude eleitoral, impediram um

desfecho pacífico das eleições.

internacional 17

Page 18: popcom #06

Reino Unido

Era um dos grandes testes à

coligação governamental liderada

por David Cameron. Forçado a pôr

em marcha políticas draconianas de

contenção orçamental, o governo

britânico caminhou para as eleições

locais de 2 de Maio com um

irremediável sentimento de perda.

Para eles, a batalha eleitoral

acarretava um único objectivo: o de

limitar, tanto quanto possível, as

perdas que sofreriam. Os traba-

lhistas, por outro lado, viram-nas

como o momento de afirmação

política do seu líder, Ed Miliband.

Nenhum dos dois, porém, alcançou

os resultados que almejava.

Primeiro-ministro desde 2010, o

conservador David Cameron não

tem tido um mandato fácil. No ano

em que ascendeu à liderança do seu

país, Cameron deparou-se com uma

nação escravizada pela dívida e em

severa depressão económica. Após

treze anos de socialismo, a herança

era pesada: o défice estrutural, que

em 1997 – isto é, no último ano dos

Conservadores no governo - não

ultrapassava os 2.2% do PIB,

aumentou entretanto para uns

históricos 11%. O desemprego teve

comportamento semelhante, ao

passo que a dívida pública tocou, em

2010, a fasquia dos 7.8%. Confron-

tados com este cenário, os

conservadores dispuseram-se a

impor ao Reino Unido uma dolorosa

receita de rigor orçamental. Isto,

aliado à aparente irresolução do

Governo britânico no palco europeu,

tem causado uma séria perda de

popularidade para a coligação entre

Conservadores e Liberais.

Mas nem por isso o futuro parece

risonho para a oposição trabalhista.

Embora os conservadores registem

mínimos históricos de apoio nas

sondagens, Ed Miliband aparenta

ser incapaz de conquistar o público

britânico. Esse é, aliás, um dos dois

ao líder da oposição: arrasando o

Partido Conservador, acharam os

trabalhistas, a liderança de Miliband

tornar-se-ia inquestionável.

Não foi, todavia, isso que acabou por

verificar-se. A grande surpresa da

noite eleitoral foi, não o resultado

dos trabalhistas, mas o sucesso dos

eurocépticos do UKIP. Liderado por

Nigel Farage, um ex-conservador

célebre pelos seus discursos entusi-

ásticos no Parlamento Europeu, o

United Kingdom Independence

Party tem vindo a afirmar-se como a

nova pedra angular da política

britânica. E não sem bom motivo:

partido novo com propostas

inovadoras, o UKIP pugna pela saída

da União Europeia, por um sistema

contributivo de taxa proporcional –

ou fixa – e pelo abandono dos

grandes projectos de obras públicas

risonho para a oposição trabalhista.

Embora os conservadores registem

mínimos históricos de apoio nas

sondagens, Ed Miliband aparenta

ser incapaz de conquistar o público

britânico. Esse é, aliás, um dos dois

aspectos em que todos os estudos

de opinião logram convergir: por

um lado, a derrota dos partidos do

governo; por outro, a incapacidade

de Miliband em afirmar-se como

alternativa política. Estas eleições

locais, realizadas num dos

momentos de maior pressão para o

executivo Con-Lib, forneceram,

porém, uma oportunidade de ouro

ao líder da oposição: arrasando o

Partido Conservador, acharam os

trabalhistas, a liderança de Miliband

tornar-se-ia inquestionável.

Não foi, todavia, isso que acabou por

verificar-se. A grande surpresa da

18 internacional

Page 19: popcom #06

Liderado por Nigel Farage, um ex-conservador célebre pelos seus discursos entusiásticos no Parlamento Europeu, o UKIP tem vindo a afirmar-se como a nova pedra angular da política britânica. Partido novo com propostas inovadoras, o UKIP pugna pela saída da União Europeia, por um sistema contributivo de taxa proporcional – ou fixa – e pelo abandono dos grandes projectos de obras públicas que tanto os conservadores como os trabalhistas apoiam.

permanência britânica da União

Europeia seja antecipado para a

actual legislatura e mão forte contra

a imigração ilegal. E, se Cameron

não se vergou - pelo menos, por

agora – às exigências da ala mais

eurocéptica do seu partido, a

verdade é que foi já forçado a

radicalizar a sua posição face aos

imigrantes. Durante o próximo ano,

anunciou já, serão postos em

marcha projectos-lei com o anun-

partido novo com propostas

inovadoras, o UKIP pugna pela saída

da União Europeia, por um sistema

contributivo de taxa proporcional –

ou fixa – e pelo abandono dos

grandes projectos de obras públicas

que tanto os conservadores como os

trabalhistas apoiam.

Não menos relevante para o

crescimento eleitoral do partido, é a

personalidade do próprio Farage.

Tribuno insigne, Nigel Farage alia à

personificação da imagem do

conservador inglês uma aura de

intensa pugnacidade política. É aí

que, afirma, o UKIP se distingue das

restantes forças partidárias: na

determinação com que se agarra aos

objectivos com que se compromete.

O esforço, compreende-se isso hoje,

deu bons resultados. Apesar de uma

incessante campanha mediática

contra o partido, o UKIP tomou o

lugar dos liberais como terceira

força do país. Já lhe chamaram um

pouco de tudo: Cameron, primeiro-

ministro e líder dos conservadores,

sugeriu que os eurocépticos –

quantos deles, ex-membros do

partido do governo – são “racistas

de armário”. Acusações semelhantes

– e.g., de homofobia, xenofobia e

chauvinismo – choveram sobre o

novo o UKIP. Mas isso não deteve

Farage. Nada o logrou. E, contra

tudo e contra todos, o combativo

eurodeputado britânico fez-se dono

de 23% do eleitorado.

Não se fizeram esperar as reacções

ao terramoto político britânico.

Confrontados com a pior votação da

sua história – um mero 25% dos

votos -, os conservadores reite-

raram o seu pedido por uma política

externa mais firme. Ao primeiro-

ministro, exigiram que o referendo à

permanência britânica da União

Europeia seja antecipado para a

actual legislatura e mão forte contra

a imigração ilegal. E, se Cameron

não se vergou - pelo menos, por

agora – às exigências da ala mais

ciou já, serão postos em marcha

projectos-lei com o objectivo de

limitar o acesso de imigrantes

provenientes da União Europeia a

prestações sociais e serviços públi-

cos – saúde e educação incluídos.

Que influência isso terá na

contenção eleitoral do UKIP, porém,

é ainda uma incógnita. Uma coisa,

ainda assim, é certa: há muitos anos

que a política britânica não era

tão interessante.

internacional 19

Page 20: popcom #06

A insustentável indiferença

20 opinião

sua matilha/vara - pretendem lançar a dúvida sobre uma Lei

desta Republica. Mas não! A própria Republica conhece hoje

uma Ética que permite aos seus guardiões, numa situação de

alerta para o seu status quo, transformar, travestir e inverter

qualquer Lei. A Ética Republicana hoje, permite aos

autonomeados guardiões do espirito da Lei, a subversão,

alteração e ultraje de Leis votadas na Assembleia com

consagração de poder de ius imperium.

Afinal a República Democrática, terreno da praça pública e

emanação da vontade da maioria, tem dono. E desengane-se quem

pense que este caso de grosseiro desrespeito à Lei é pontual. O

caso é paradigmático ao estado a que chegou a política neste País.

Os partidos políticos - com a humilhante excepção do Bloco de

Esquerda - por conveniência financeira, aparelhista e eleitoral,

principiaram a apresentar de ânimo leve candidatos em total

desrespeito pela referida Lei. Rapidamente muitos foram os que se

insurgiram contra esta situação, apresentando acções judiciais e

promovendo a discussão pública. Face à constatação do problema

gerado os interessados trataram rapidamente de ligar à corrente o

'Playmobil de Belém' que, sem voz, mas com caneta comandada,

tratou de agradar aos seus fornecedores de permutas, bocejos e

sorrisos, descobrindo um erro na redação da Lei.

Não vou perder uma linha a discutir “de” e “da”, deixo isso para

quem o desespero alimenta a imaginação. Mas não posso deixar

de aproveitar este espaço para alertar que nunca como hoje se

tornou público que a República Portuguesa tem sobre a sua alçada

dois Países diferentes, a quem a Lei se aplica conforme o Estatuto,

finança e poder. É verdadeiramente inexplicável que num estado

de direito democrático europeu se possa assistir, com a conivência

dos lideres dos partidos do arco governamental, aos piores

defeitos do cacique eleitoral.

O tacticismo político, a chicana, o desrespeito e a distância dos

partidos políticos face à população Portuguesa são alarmantes,

numa altura em que todos os partidos deveriam estar à altura da

situação nacional. Ser líder é muito mais do que isto, ser politico

não é seguramente isto. A podridão da discussão, a forma como se

pretende abafar as críticas e o silêncio ensurdecedor dos que

pretendem que tudo se passe com a calma de uma manhã serena,

são o sinal da insustentável indiferença que a classe politica

demonstra pelo povo Português e pela Lei aprovada em seu nome.

Resta-nos acreditar que os Tribunais não deixarão passar pelo seu

crivo este fasciculo negro do nosso já tão debilitado estado de

direito democrático.

Francisco Ancêde

uando aceitei o desafio de participar neste

Gabinete de Estudos – cujo trabalho muito me

orgulha - prometi que não deixaria a minha

opinião escorregar para o ziguezaguear

quotidiano da politica nacional. Hoje não me sinto capaz de

continuar a cumprir essa promessa. Os recentes

desenvolvimentos na questão da limitação dos mandatos

autárquicos obrigam-nos a todos a descer ao lamaçal onde

se encontra a discussão.

A Lei 46/2005 encontra-se publicada em Diário da

República desde 29 de Agosto de 2005. A intenção

legislativa era inquestionavelmente limitar a recandidatura

pessoal dos membros dos órgãos aí referidos, ficando estes

limitados a três mandatos consecutivos. Essa foi também a

percepção pública à data da discussão e publicação da lei,

tendo sido recebida com regozijo pela opinião pública. Mas

afinal o que terá mudado? Qual a razão para que haja

discussão nesta matéria? Qual é a dúvida?

Em boa verdade, nada mudou, nem existe nenhuma dúvida.

A lei é clara, transparente e ao alcance de qualquer ser

humano capaz de ler um artigo com apenas três alíneas

escritas em Português. Foi apenas a proximidade das

eleições autárquicas a realizar no próximo mês de Outubro

que trouxe à praça pública a discussão. Como todos

sabemos vários Presidentes de Camara e de Juntas de

Freguesia encontram-se legalmente impossibilitados de se

recandidatarem, uma vez que atingiram o limite dos três

mandatos previstos. Ora heis que nos bate à porta a Ética

Republicana.

Nunca percebi a necessidade de acrescentar à palavra Ética

o adjectivo Republicana. Ética é e sempre será algo que se

verifica ou espera-se que se verifique em qualquer

circunstância, relação ou momento. Mas esta Ética é

diferente, é a Republicana. Baseada no sagrado primado da

Lei, verdadeira e única representação escrita da vontade da

maioria, deveria ser argumento bastante para calar todos

os que – para proveito próprio ou cumprindo mandato da

sua matilha/vara - pretendem lançar a dúvida sobre uma

Lei desta Republica. Mas não! A própria Republica conhece

hoje uma Ética que permite aos seus guardiões, numa

situação de alerta para o seu status quo, transformar,

Q

Page 21: popcom #06
Page 22: popcom #06

Um grande discurso deve agitar a alma e inspirar uma nação. Esta inédita antologia reúne discursos completos e memoráveis, introduzidos pelas mais proeminentes figuras da política nacional, que através dos seus escritos e ao longo do tempo, marcaram Portugal. Por isso, e pelo facto de a ex-coordenadora do Gabinete de Estudos Gonçalo Begonha, Maria Luísa Aldim, ser co-autora deste livro, interessamo-nos por saber mais sobre a obra e o que pensam os seus autores da importância da palavra e da oratória na actividade política.

QUANTO VALE UM DISCURSO? ENTREVISTAMOS MARÍA LUÍSA ALDIM E EDUARDO PEREIRA CORREIA, autores do livro ‘grandes discursos do século xx’

Page 23: popcom #06
Page 24: popcom #06

Qual a motivação para fazer este

livro?

Ao longo da nossa formação,

apercebemo-nos que subsistia um

vazio literário ao nível de uma

antologia política, que reunisse os

discursos completos e mais memo-

ráveis do século XX, proferidos por

figuras proeminentes da política

nacional que, ao longo do tempo, a

marcaram. Esta é uma prática

comum em diversos países da

Europa e do mundo, e muitos deles

não têm metade da nossa história

política. Sentimos que faltava na

realidade uma investigação de cariz

politológico, que soubesse seleccio-

nar os momentos que contavam um

século da história política de

Portugal.

O século passado espelhou uma

série de mudanças, contando com

um amplo debate sobre as linhas

gerais e estratégicas do pensamento

e da política externa portuguesa, o

enigma das contas públicas portu-

guesas ao longo de cem anos, as

múltiplas alterações ao sistema

eleitoral mas também de governo, o

período do Estado Novo marcado

pela II Guerra Mundial e pelo

reconhecimento dos territórios

ultramarinos, a Revolução de Abril,

e por fim o processo de demo-

cratização, com destaque na

integração de Portugal no seio da

comunidade europeia, entre muitos

outros temas.

Ao longo de cinco anos fomos

reunindo com diversas personali-

dades que tinham uma memória

histórica e política do século XX, o

que culminou com uma rara

selecção de discursos políticos

notáveis, muitos deles inéditos,

onde se apresentam questões

transversais na política portuguesa.

Como dizemos no livro, são

discursos de D. Carlos I a Francisco

Louçã, o que demonstra bem a

nossa motivação em deixar bem

patente a diversidade de temas e

‘Esta é uma prática comum em

diversos países da Europa e do

mundo, e muitos deles não têm

metade da nossa história

política. Sentimos que faltava na

realidade uma investigação de

cariz politológico, que soubesse

seleccionar os momentos que

contavam um século da história

política de Portugal.’

No caso português, o risco da

compilação de um século da nossa

história é de nos depararmos com

algo que preferíamos não ter a

percepção constante. Quando nos

vangloriamos da nossa posição

neutral e não beligerante na

segunda guerra mundial, esquece-

mo-nos que porventura perdemos

muito mais ao longo de cem anos.

Repare-se que num século, Portugal

perdeu todo o império colonial

português: Angola, Cabo Verde,

Guiné-Bissau, Moçambique, Goa,

Damão e Diu, São Tomé e Príncipe,

Timor e Macau. Sentimos que ainda

existe uma convivência difícil com

esta matéria, como foi possível

perdermos o lugar de destaque no

mundo em tão pouco tempo,

sobretudo desenvolvendo uma

política paralela às grandes ques-

tões internacionais? Só percebendo

a acção política durante o século XX,

torna possível ter uma opinião

formada.

O que é necessário para estarmos

transversais na política portuguesa.

Como dizemos no livro, são

discursos de D. Carlos I a Francisco

Louçã, o que demonstra bem a

nossa motivação em deixar bem

patente a diversidade de temas e

actores políticos que marcaram o

século XX em Portugal.

A que grandes conclusões

chegaram sobre o poder e a

importância da palavra e do

discurso no mundo da política?

O discurso é o reflexo do pensa-mento

político. Pela palavra, se transmite o

pensamento e a emoção, mas sem o

dom da oratória não seria possível

mover uma nação. Claro que são

muitos os factores que fizeram a

nossa história, e o discurso foi o

veículo de trans-missão do pensa-

mento político dos seus actores.

No caso português, o risco da

compilação de um século da nossa

história é de nos depararmos com

algo que preferíamos não ter a

percepção constante. Quando nos

vangloriamos da nossa posição

24 entrevista

Page 25: popcom #06

através novas tecnologias de

informação e das redes sociais, a

palavra política é sem dúvida o meio

privilegiado para abordar os

cidadãos. Cremos que grande parte

do processo de descredibilização da

actividade política e das suas

instituições deve-se sobretudo a um

facilitismo precoce que foi atingindo

uma geração de poder que

menosprezou e considerou dispen-

sável um discurso completo e

organizativo das políticas defen-

didas. Não basta governar bem, é

necessário fazer uma difusão

política adequada para que esta

possa ser julgada tão claramente

como foi transmitida.

De todos os discursos que

incluíram no livro, qual vos

marcou mais?

É muito difícil escolher somente um

discurso entre tantos, cada discurso

marca um tempo, uma história, a

vida de um autor e a sua posição

naquele momento. Contudo, há

discursos que por serem inéditos na

sua forma e conteúdo, bem como

por nunca terem sido publicados,

despertam mais a atenção e a

curiosidade, como o caso do

discurso do deputado João

Camoesas, em 1925. É um caso raro

no mundo de um discurso de nove

horas num parlamento, afim de

garantir a hegada de diversos

deputados do Porto para contrariar

uma moção de censura. Na

realidade os deputados chegaram,

mas ainda assim os votos não foram

suficientes e o governo caiu. Ficou

para a história o discurso mais

longo alguma vez realizado numa

câmara em Portugal, e reflecte a

história do nosso país desde a sua

fundação. Em contrapartida, o

discurso mais curto desta selecção

pertence a António José de Almeida,

quando em 1914 explica no

Parlamento a razão de Portugal se

envolver na Grande Guerra. Destas

tões internacionais? Só percebendo

a acção política durante o século XX,

torna possível ter uma opinião

formada.

O que é necessário para estarmos

perante um grande discurso

político?

Existem dois grandes tipos de

discursos, que merecem ambos um

destaque póstumo pela História. O

primeiro é automaticamente reco-

nhecido pela audiência, é um

discurso que percepciona sem

mácula o momento, capta a fé dos

auditores e transmite uma mensa-

gem que é totalmente esclarecida e

aplaudida. Depois há discursos que

passam despercebidos, motivados

por um erro ou falta de divulgação,

e só mais tarde são reconhecidos

como palavras de grande sabedoria

e poder. Um discurso político deve

ser crítico e motivador, capaz de

inspirar uma comunidade. Para

além do texto político, um grande

discurso obriga à oratória exemplar

e à demonstração de um coração

acelerado de paixão, que seja capaz

de transformar batalhas, exaltando

a crítica, reformando o mundo e

inspirando um povo para um

esforço excepcional. Os grandes

discursos descrevem de forma

exemplar a história de uma nação.

Crêem que o poder da oratória já

foi mais importante do que é

hoje?

Pelo contrário, cada vez mais a

palavra atinge um poder que é em

muito subestimado. Se associarmos

o discurso político a uma vasta

difusão, seja em comunicações ou

em comícios, que são mais tarde

transmitidos vezes sem conta

através novas tecnologias de

informação e das redes sociais, a

palavra política é sem dúvida o meio

privilegiado para abordar os

cidadãos. Cremos que grande parte

do processo de descredibilização da

discurso entre tantos, cada discurso

marca um tempo, uma história, a

vida de um autor e a sua posição

naquele momento. Contudo, há

discursos que por serem inéditos na

sua forma e conteúdo, bem como

por nunca terem sido publicados,

despertam mais a atenção e a

curiosidade, como o caso do

discurso do deputado João Camo-

esas, em 1925. É um caso raro no

mundo de um discurso de nove

horas num parlamento, afim de

garantir a hegada de diversos

deputados do Porto para contrariar

uma moção de censura. Na reali-

dade os deputados chegaram, mas

ainda assim os votos não foram

suficientes e o governo caiu. Ficou

para a história o discurso mais

longo alguma vez realizado numa

câmara em Portugal, e reflecte a

história do nosso país desde a sua

fundação. Em contrapartida, o

discurso mais curto desta selecção

pertence a António José de Almeida,

quando em 1914 explica no

Parlamento a razão de Portugal se

envolver na Grande Guerra. Destas

três páginas, escrevem-se ainda

hoje centenas de livros.

Certamente que tiveram de deixar

alguns discursos de fora. Qual vos

deu mais pena?

A nossa investigação é fruto de uma

análise exaustiva de mais de

quinhentos discursos examinados,

diversos singulares, com um

carácter único e uma memória

sólida que contam um século da

história política de Portugal. Pese

embora o livro seja somente de

discursos políticos, podemos

encontrar discursos de diversos

poetas, pintores, para além de Reis,

Presidentes da República,

Primeiros-Ministros, e vários

deputados. Porventura lamentamos

não ter tido espaço para alguns

discursos marcantes na sociedade

portuguesa, mas que repetiam

entrevista 25

Page 26: popcom #06

O livro abrange os grandes

discursos do século passado. Que

discursos feitos já no século XXI

destacam, no plano nacional e

internacional?

A última década tem sido bastante

profícua ao nível de discursos

políticos, sobretudo de acordo com

as novas ameaças e desafios que se

foram formando, sendo que a actual

crise económica tem também dado

lugar a muitos políticos profetas.

Em Portugal fazem-se excelentes

discursos. Na realidade, a língua

portuguesa tem uma forte

identidade e a memória linguística é

propícia a discursos líricos. É

possível vermos diariamente diver-

sos oradores que têm ainda um

espírito deestadistas, e com um

cuidado muito especial de falar para

a história e de capacidade impres-

cindível no enriquecimento da

palavra no discurso político. No

plano internacional há discursos

marcantes que assinalaram a

política internacional, o caso dos

presidentes norte-americanos que

são um exemplo paradigmático na

condução da política norte-

americana e consequentemente

mundial. O mediatismo destes

políticos bem como a diversidade de

postura discursiva no tom

expressado, ora humorístico, ora

fatalista, ora paternal, ora crítico e

severo, pretende sempre expressar

as ideias e emoções para aproximar

e convencer ouvinte. O marketing e

a comunicação política, são cada vez

mais usados como ferramenta para

direccionar e potenciar o poder da

palavra, pelo que assistimos cada

vez mais à sua adopção por este

mundo fora.

Podemos contar com um segundo

volume em breve?

Este livro foi muito bem recebido

pelo público, tem sido uma surpresa

para nós o destaque da

comunicação social, e

fundação. Em contrapartida, o

discurso mais curto desta selecção

pertence a António José de Almeida,

quando em 1914 explica no

Parlamento a razão de Portugal se

envolver na Grande Guerra. Destas

três páginas, escrevem-se ainda

hoje centenas de livros.

Certamente que tiveram de

deixar alguns discursos de fora.

Qual vos deu mais pena?

A nossa investigação é fruto de uma

análise exaustiva de mais de

quinhentos discursos examinados,

diversos singulares, com um

carácter único e uma memória

sólida que contam um século da

história política de Portugal. Pese

embora o livro seja somente de

discursos políticos, podemos

encontrar discursos de diversos

poetas, pintores, para além de Reis,

Presidentes da República, Pri-

meiros-Ministros, e vários depu-

tados. Porventura lamentamos não

ter tido espaço para alguns

discursos marcantes na sociedade

portuguesa, mas que repetiam

excessivamente o autor ou simples-

mente não respeitavam o princípio

de compilar os discursos políticos

fundadores de Portugal. E neste

sentido fomos irredútiveis, nenhum

discurso considerado impres-

cindível poderia ficar de fora, o que

levou à edição de mais de setecentas

páginas. Mas era impossível

compilar as palavras que fizeram a

história política de Portugal no

século XX em menos do que isso,

sobretudo porque existiu da nossa

parte uma grande exigência no

respeito ao equilíbrio histórico de

cada período político.

O livro abrange os grandes

discursos do século passado. Que

discursos feitos já no século XXI

destacam, no plano nacional e

internacional?

A última década tem sido bastante

portuguesa tem uma forte identi-

dade e a memória linguística é

propícia a discursos líricos. É

possível vermos diariamente diver-

sos oradores que têm ainda um

espírito deestadistas, e com um

cuidado muito especial de falar para

a história e de capacidade impres-

cindível no enriquecimento da

palavra no discurso político. No

plano internacional há discursos

marcantes que assinalaram a

política internacional, o caso dos

presidentes norte-americanos que

são um exemplo paradigmático na

condução da política norte-

americana e consequentemente

mundial. O mediatismo destes

políticos bem como a diversidade de

postura discursiva no tom

expressado, ora humorístico, ora

fatalista, ora paternal, ora crítico e

severo, pretende sempre expressar

as ideias e emoções para aproximar

e convencer ouvinte. O marketing e

a comunicação política, são cada vez

mais usados como ferramenta para

direccionar e potenciar o poder da

palavra, pelo que assistimos cada

vez mais à sua adopção por este

mundo fora.

Podemos contar com um segundo

volume em breve?

Este livro foi muito bem recebido

pelo público, tem sido uma surpresa

para nós o destaque da

comunicação social, e

particularmente o vasto interesse

que existe sobre esta matéria.

Apesar de algum cepticismo inicial,

o mercado livreiro aceitou o espaço

necessário para tratar a nossa

história política, e verificamos que

existe uma especial atenção no

tratamento destas matérias.

Actualmente já é possível encontrar

bons livros que descrevem a

memória da política portuguesa. Da

nossa investigação, evidentemente

ficaram muitos discursos por

publicar e sobretudo novas ideias

26 entrevista

Page 27: popcom #06

palavra, pelo que assistimos cada

vez mais à sua adopção por este

mundo fora.

Podemos contar com um segundo

volume em breve?

Este livro foi muito bem recebido

pelo público, tem sido uma surpresa

para nós o destaque da comuni-

cação social, e particularmente o

vasto interesse que existe sobre esta

matéria. Apesar de algum cepti-

cismo inicial, o mercado livreiro

aceitou o espaço necessário para

tratar a nossa história política, e

verificamos que existe uma especial

atenção no tratamento destas

matérias. Actualmente já é possível

encontrar bons livros que

descrevem a memória da política

portuguesa. Da nossa investigação,

evidentemente ficaram muitos

discursos por publicar e sobretudo

novas ideias que, de acordo com

outras perspectivas, poderá acolher

o interesse do público.

são um exemplo paradigmático na

condução da política norte-

americana e consequentemente

mundial. O mediatismo destes

políticos bem como a diversidade de

postura discursiva no tom

expressado, ora humorístico, ora

fatalista, ora paternal, ora crítico e

severo, pretende sempre expressar

as ideias e emoções para aproximar

e convencer ouvinte. O marketing e

a comunicação política, são cada vez

mais usados como ferramenta para

direccionar e potenciar o poder da

palavra, pelo que assistimos cada

vez mais à sua adopção por este

mundo fora.

Podemos contar com um segundo

volume em breve?

Este livro foi muito bem recebido

pelo público, tem sido uma surpresa

para nós o destaque da

comunicação social, e

particularmente o vasto interesse

que existe sobre esta matéria.

Apesar de algum cepticismo inicial,

o mercado livreiro aceitou o espaço

necessário para tratar a nossa

história política, e verificamos que

existe uma especial atenção no

tratamento destas matérias.

Actualmente já é possível encontrar

bons livros que descrevem a

memória da política portuguesa. Da

nossa investigação, evidentemente

ficaram muitos discursos por

publicar e sobretudo novas ideias

que, de acordo com outras

perspectivas, poderá acolher o

interesse do público.

tratar a nossa história política, e

verificamos que existe uma especial

atenção no tratamento destas

matérias. Actualmente já é possível

encontrar bons livros que

descrevem a memória da política

portuguesa. Da nossa investi-

gação, evidentemente ficaram

muitos discursos por publicar

e sobretudo novas ideias que,

de acordo com outras pers-

pectivas, poderá acolher o interesse

do público.

‘O discurso é o reflexo do

pensamento político. Pela

palavra, se transmite o

pensamento e a emoção,

mas sem o dom da oratória

não seria possível mover

uma nação. Claro que são

muitos os factores que

fizeram a nossa história, e o

discurso foi o veículo de

transmissão do pensamento

político dos seus actores.’

entrevista 27

Page 28: popcom #06

Da eternidade dos muros

28 opinião

'apparatchiks' mantém-se incólume. A mensagem da

Europa para si própria é a mesma que Honecker

endereçava aos súbditos da Alemanha socialista: pesem

ou não as dificuldades, este é um edifício que não ruirá.

Valha o que valer. Custe o que custar.

É um sentimento generalizado, o de Barroso. Como ele,

abundam os intelectuais de algibeira que não hesitam

em associar ao processo de amalgamação comunitária

uma ideia de fatalidade. É o caso de Henrique Monteiro,

comentador diário do Expresso. Para justificar o

eurofanatismo que revela em “Pelo Euro, pela Europa”,

Monteiro não tem qualquer pejo em ignorar tudo o que

há de objectivo. Mas, diz-nos Ayn Rand, "podemos fugir

à realidade, mas não às consequências de fugir à

realidade." E essa é uma ideia tão válida para os

indivíduos como para as nações. Como Barroso,

Monteiro rejeita o papel que a NATO, verdadeira fonte

da estabilidade continental, teve na preservação da paz

europeia. Como o presidente da Comissão e demais

eurocratas, Monteiro refere que, abandonar o projecto,

seria “a confissão de que não somos capazes de

pertencer ao que se chamou, um dia, o pelotão da

frente.” Mas esse pelotão, a que tantos querem agrilhoar

Portugal, é o mesmo que, de 25% do PIB mundial em

1973, passou a representar, em 2011, uns meros 15%

da riqueza produzida no globo. O louvado clube é hoje

um entrave ao crescimento mundial, exibe níveis

recorde de desemprego e encontra-se em profunda

recessão económica. Goste-se ou não do facto, o

“pelotão da frente” está a ficar para trás. E Portugal não

deve acompanhá-lo nesse processo.

A Europa voltou à era das batalhas de produção:

combate-se, não por causas, mas para não parar de

combater. A peleja autojustifica-se. Os sacrifícios, talvez

acrescentasse Henrique Monteiro, fazem-se por

capricho – e não, como no caso português, por efectiva

necessidade de passar por eles. Para o insigne colunista

do Expresso, Portugal deve manter-se no Euro, não por

ele ser economicamente viável, mas por dotar Lisboa de

Rafael Borges

estado da realidade sobrepõe-se sempre à

realidade do Estado. Em Janeiro de 1989, o

secretário-geral do Partido Socialista Unido da

Alemanha, Erich Honecker, asseverava o mundo de que

“o muro [de Berlim] estará de pé daqui a 50, 100 anos,

se as razões para a sua existência não forem removidas.”

Apenas dez meses depois, os portões que haviam

separado os filhos da Alemanha estavam abertos,

milhões de famílias voltavam a encontrar-se e o regime

comunista colapsava. Bastou a realidade para derrotar

aquilo que Honecker julgava – ou esperava – ser eterno.

O passado dia 9 não poderia senão ter-nos relembrado

dos derradeiros meses do totalitarismo alemão. De

Lisboa a Varsóvia, de Atenas a Helsínquia, a Europa

lançou-se numa campanha de auto-enaltecimento.

Frente ao parlamento romeno, foi depositado um

estandarte comunitário de 140 metros. Por todo o

continente, centenas de instalações e escritórios da

União foram abertos ao público, numa tentativa de

mostrar proximidade entre os cidadãos e as instituições

europeias. Em Florença, o Presidente da Comissão

Europeia, o português José Manuel Durão Barroso, falou

do “Estado da União.” Na cidade italiana, um dia após

ter-se pronunciado pela “inevitabilidade” da

“intensificação da união política” continental, o ex-

primeiro-ministro pediu mais poderes para Bruxelas.

Enquanto a economia europeia abeira o colapso, o seu

desemprego atinge níveis históricos e a sua dívida

aumenta desmesuradamente, o discurso dos

'apparatchiks' mantém-se incólume. A mensagem da

Europa para si própria é a mesma que Honecker

endereçava aos súbditos da Alemanha socialista: pesem

ou não as dificuldades, este é um edifício que não ruirá.

Valha o que valer. Custe o que custar.

É um sentimento generalizado, o de Barroso. Como ele,

abundam os intelectuais de algibeira que não hesitam

O

Page 29: popcom #06

combate-se, não por causas, mas para não parar de

combater. A peleja autojustifica-se. Os sacrifícios, talvez

acrescentasse Henrique Monteiro, fazem-se por

capricho – e não, como no caso português, por efectiva

necessidade de passar por eles. Para o insigne colunista

do Expresso, Portugal deve manter-se no Euro, não por

ele ser economicamente viável, mas por dotar Lisboa de

uma aura de “modernidade”. A palavra utilizada foi

mesmo essa. Portugal deve abdicar da sua prosperidade

futura pelo desígnio pueril de ser um país “moderno”.

Deve esvaziar de poderes o seu parlamento, entregá-los

a burocratas não eleitos e manter uma divisa que,

taxativamente, teve efeitos perniciosos sobre a sua

economia. Tudo para poder dizer-se mais moderno que

estados como a Suíça, a Noruega, o Reino Unido, a

Islândia, a Suécia ou a Dinamarca.

Hoje, 63 anos após a Declaração de Schuman, a Europa

encontra-se num limbo. Mas não, creio, por muito

tempo. Os muros, lembra-nos o exemplo alemão, não

duram para sempre – e a realidade não pode ser contida

pela pompa dos Estados. Fora dos escritórios da

Comissão Europeia, há uma Europa que definha. Com ou

sem os receios dos burocratas, pesem ou não os desejos

dos intelectuais de quarta categoria que pululam pelo

continente, acabará por chegar o momento em que a

Europa acordará para a realidade. Compreenderá nessa

ocasião que, malgrado todos os seus esforços, o projecto

comunitário não teve sucesso. E isso é aquilo de que o

continente mais necessita neste momento: após a

'tragōidia', a catarse. O nosso futuro colectivo depende

de como nos prepararmos para essa circunstância.

opinião 29

Page 30: popcom #06

Rui Albuquerque *

um tempo de diluição de

fronteiras políticas e ideo-

lógicas, agravado pela

queda do muro de Berlim e pela

convicção generalizada de que, desde

esse momento, o mundo vive numa

panaceia de capitalismo liberal,

questiona-se frequentemente a perti-

nência de se manterem as categorias

de “esquerda” e “direita”, como se

entre ambas, e dentro de cada uma

delas, as diferenças fossem ténues,

ou mesmo inexistentes. Está também

muito em voga a moda de tentar

criar novas categorias políticas que

horizontalmente ocupem espaços à

direita e à esquerda, sem verdadei-

ramente se poderem catalogar numa

ou noutra posição. Para algumas

pessoas, o liberalismo, o anarco-

capitalismo

Num tempo de diluição de

fronteiras políticas e ideológicas,

agravado pela queda do muro de

capitalismo e a social-democracia

(da «terceira via» blairiana) são

bons exemplos de teorias e práticas

políticas que não se podem

catalogar em nenhum daqueles dois

campos tradicionais. Frequente-

mente, ouvimos figuras históricas

da esquerda, como Mário Soares,

acusarem correligionários seus,

como Tony Blair ou mesmo José

Sócrates, de cedências ao “mercado”

e ao “capitalismo”, como ouvimos e

lemos liberais e anarco-capitalistas

a recusarem ser catalogados na

direita. Fará, então, algum sentido

manter ainda essa dicotomia

fundadora da nossa modernidade

política?

A minha resposta é claramente

afirmativa: mais do que nunca, faz

agora sentido o aggiorna-

mento político e ideológico à

esquerda e à direita. E acrescento

que esta diluição só prejudica

aqueles que defendem uma ideia

liberal da liberdade, o livre-

mercado, a iniciativa privada, a

redução do estado e os direitos

naturais do indivíduo. É graças a

essa diluição e à crescente falta de

identidade política, que vemos a

esquerda a condenar a direita e o

mercado, a iniciativa privada, a

redução do estado e os direitos

naturais do indivíduo. É graças a

essa diluição e à crescente falta de

identidade política, que vemos a

esquerda a condenar a direita e o

“mercado” ou o “neoliberalismo”

(que ela habilmente utiliza como

sinónimos) dos resultados catas-

tróficos das suas próprias políticas.

Ou será que, por exemplo, não

foram José Sócrates e o governo do

PS os responsáveis pela crise

económica portuguesa, mas sim os

“mercados especulativos”, a “desre-

gulamentação financeira”, enfim, o

“neoliberalismo” os grandes

responsáveis, como nos pretendem

impingir?

É da tradição católica dizer-se que o

grande truque do diabo é negar a

sua inexistência. Com a falta de

demarcação entre direita e

esquerda, esta última, que manieta

habilmente a comunicação social e,

por meio dela, a opinião pública,

tem vindo a alijar as suas

responsabilidades na crise dos

últimos anos, endossando-as a

quem elas não são devidas, nem

poderiam nunca ser, desde logo, por

ausência de responsabilidades

N

Faz ainda algum sentido ser de ‘direita’?

30 ideologia

Page 31: popcom #06

nacional 31

tem vindo a alijar as suas respon-

sabilidades na crise dos últimos

anos, endossando-as a quem elas

não são devidas, nem poderiam

nunca ser, desde logo, por ausência

de responsabilidades governativas.

Mas, a “explicação” oficial, é que os

pobres governos de esquerda

ficaram reféns dos grandes interes-

ses dos criminosos mercados

especulativos, inspirados por um

desapiedado «neoliberalismo», que

agora há que dominar com férrea

regulamentação. As consequências

disto, a não ser desmentido,

poderão ser avassaladoras para a

liberdade. Até porque, no meio

desta intencional confusão, a

esquerda não deixa para outros os

seus próprios valores…

Como poderemos, então, estabe-

lecer uma demarcação entre

esquerda e direita? Saliente-se,

desde já, que se tratam de duas

grandes famílias, de dois ramos

separados de um enorme tronco

comum – a das ideologias políticas

modernas e democráticas, porque

só destas faz sentido falar – que

conhecem, dentro de cada uma

delas, variações consideráveis. Tem

que haver, todavia, um, ou vários,

comum – a das ideologias políticas

modernas e democráticas, porque

só destas faz sentido falar – que

conhecem, dentro de cada uma

delas, variações consideráveis. Tem

que haver, todavia, um, ou vários,

critérios de distinção, assim como

elementos comuns em cada uma

delas, para que a distinção possa

manter-se e fazer sentido.

O primeiro e mais significativo de

todos os critérios diferenciadores é

o da forma como esquerda e direita

olham para o homem.

Enquanto que a direita vê nele o

indivíduo, a esquerda tem-no como

cidadão. Nesta perspectiva, o

homem é, para a direita, por si

mesmo, sujeito e objecto de direitos

face ao poder político, enquanto

que, para a esquerda, ele existe

essencialmente na sua relação com

a coisa pública, sendo esta que lhe

garante os direitos (e impõe as

obrigações) que a direita vê como

naturais e inerentes à sua condição.

Esta distinção parte de uma

perspectiva diferente da natureza

humana.

Para a direita, o homem não é

naturalmente bom, tão-pouco é mau

por ter sido corrompido pela

Esta distinção parte de uma

perspectiva diferente da natureza

humana.

Para a direita, o homem não é

naturalmente bom, tão-pouco é mau

por ter sido corrompido pela

sociedade. Mas também não é

naturalmente mau, nem segue

instintos que sejam anti-sociais ou

destrutivos. Para a direita, o homem

tem interesses e manifesta-os,

defende-os e, se necessário for,

conflitua por eles, mas consegue

habitualmente compor as suas

necessidades com as necessidades

dos outros. É por isso que a direita

acredita no princípio da cooperação

como instinto social primário, e que

acredita que as pessoas podem

articular, entre si mesmas, os seus

interesses fundamentais. Poderá

dizer-se, a este respeito, que a

direita varia entre uma confiança

plena nas capacidades ordenadoras

naturais dos indivíduos (o mercado)

e uma confiança reservada quanto a

essas capacidades, confiando ao

governo e às instituições políticas e

jurídicas (bem mais do que ao

estado) os poderes necessários e

suficientes para evitar, ou dirimir,

conflitos mais acentuados. No

ideologia 31

Page 32: popcom #06

essas capacidades, confiando ao

governo e às instituições políticas e

jurídicas (bem mais do que ao

estado) os poderes necessários e

suficientes para evitar, ou dirimir,

conflitos mais acentuados. No

primeiro caso temos as posições

liberais, no segundo teremos as

posições ideologicamente mais

conservadoras. Arriscaria, contudo,

dizer que as segundas são, na

prática, a face político-governativa

das primeiras, e que não existe

verdadeira antinomia política (que

não teórica) entre ambas.

Em contrapartida, para a esquerda o

homem nunca é, por si só, sufi-

ciente. Ele é uma criatura indefesa,

que carece de protecção. Seja pela

via hobbesiana, que alguma direita

ideologicamente mais conservadora

também aceita, do perigo da confli-

tualidade social extremada, seja

pela via mais esquerdista da

dominância de exploradores –

detentores do capital – dos pobres

explorados – apenas detentores da

força “bruta” do trabalho – a esquer-

da considera que o homem só será

objecto de direitos se esses direitos

forem reconhecidos e protegidos

pelo estado (mais do que pelo

governo). Por isso, para a esquerda,

antes do homem está o cidadão.

Melhor dizendo, o homem só o será

em pleno se existir uma estrutura

política que o proteja e lhe confira

os direitos fundamentais à liber-

dade e à igualdade. Também na

esquerda existem óbvias tonali-

dades de cores diferentes deste

princípio, que vão dos que

pretendem a conciliação entre um

estado interventor e um mercado

devidamente regulado, aos que

pretendem que o mercado é sempre

uma fonte de desigualdade e

discriminação, pelo que só

subsidiariamente, face ao poder

público, poderá funcionar.

A segunda distinção tem a ver com a

forma como a direita e a esquerda

O mais significativo d os critérios diferenciadores é a forma como olham para o homem. Enquanto que a direita vê nele o indivíduo, a esquerda tem-no como cidadão. O homem é, para a direita, sujeito e objecto de direitos face ao poder político. Para a esquerda, ele existe essencialmente na sua relação com a coisa pública, sendo esta que lhe garante os direitos (e impõe as obrigações) que a direita vê como naturais e inerentes à sua condição.

direita olha para a sociedade como o

resultado da acção individual, e/ou

da aprendizagem com tradição

cumulativa, da eficácia das insti-

tuições comunitárias, ou mesmo da

vontade superior de Deus, ela será

sempre, de todo o modo, algo que

não é transformável por actos

direccionados da simples vontade

humana, a esquerda olha para a

sociedade como uma ideia moldável

pelas convicções ideológicas de

quem a dirige, isto é, do governo

regulamentador e intervencionista,

actuante sobre os indivíduos e a

sociedade, ou mesmo de vanguardas

ditas esclarecidas.

Esta última distinção estabelece

uma diferença subtil, mas

substantiva, quanto à forma como a

esquerda e a direita olham para a

razão humana. Diferenciam, assim, o

racionalismo político de uma e de

outra, isto para os ramos das duas

uma fonte de desigualdade e discri-

minação, pelo que só subsidiaria-

mente, face ao poder público,

poderá funcionar.

A segunda distinção tem a ver com a

forma como a direita e a esquerda

vêem a sociedade.

A direita considera a sociedade o

resultado de forças que extravasam

o político, podendo essas forças

oscilar do indivíduo isolado no

universo ao indivíduo como parte

integrante de uma ordem trans-

cendental. A esquerda entende que

o “mundo” pode ser transfor-mado

por golpes de vontade e é o

resultado de forças inteligentes e

direccionadas. Enquanto que a

direita olha para a sociedade como o

resultado da acção individual, e/ou

da aprendizagem com tradição

cumulativa, da eficácia das

instituições comunitárias, ou

mesmo da vontade superior de

32 ideologia

Page 33: popcom #06

normativos que o protejam perante

o poder público, é marca da direita.

O estabelecimento, ou a criação, dos

direitos dos indivíduos, não enquan-

to tal, mas como cidadãos, isto é, os

direitos que o estado atribui às

pessoas na sua relação com o poder

político é marca da esquerda.

O respeito pela tradição, enquanto

experiência acumulada pelas suces-

sivas gerações, é próprio da direita.

A possibilidade de rupturas sociais,

mais ou menos violentas, com

pendor revolucionário ou simples-

mente dirigista, é próprio da

esquerda.

E, last but not least, a função da

política e do governo. Seja por

acreditar numa ordem social

espontânea, seja por duvidar da

bondade do poder, seja por um

certo cepticismo antropológico, seja,

ainda, por crer que existem valores

de ordem superior que não estão à

disposição da simples vontade

humana, a direita oscila entre as

posições liberais do ideal do não-

governo e do reconhecimento

objectivo de um aparelho de poder

público, que importa reduzir ao

mínimo expoente possível, e as

posições mais conservadoras,

segundo as quais se aceita a

necessidade de um governo

concentrado nas funções

tradicionais da soberania (justiça,

segurança, negócios estrangeiros) e

distanciado daquelas que

pertencem ao domínio privado

(economia, educação, ambiente,

etc.). Em qualquer dos casos, a

direita defende sempre um governo

mínimo ou um governo com funções

bem determinadas. Em

contrapartida, o voluntarismo

idealista da esquerda atira-a para

um governo de amplas dimensões.

Se o homem é um ser indefeso, se a

sociedade é aquilo que nós

quisermos que ela seja e se o

destino está nas nossas mãos, então

faz todo o sentido que o político,

uma diferença subtil, mas

substantiva, quanto à forma como a

esquerda e a direita olham para a

razão humana. Diferenciam, assim, o

racionalismo político de uma e de

outra, isto para os ramos das duas

famílias que adoptam o

racionalismo como critério funda-

mental da natureza humana.

Enquanto que para a direita a razão

é sempre atributo do indivíduo, com

o qual ele pode aprender, descobrir

e tomar decisões para a sua vida,

para a esquerda existe uma razão

colectiva das coisas e dos

movimentos da História que pode

ser conhecida e manipulada por

quem governa a sociedade e os

homens.

Como corolários destas duas essen-

ciais diferenças, a esquerda e a

direita abraçam valores políticos e

filosóficos bem diferenciados.

O primado do colectivo e do

colectivismo, para as posições mais

extremadas, é apanágio da esquer-

da. O primado do indivíduo, ou do

indivíduo enquanto filho de Deus e

centro do plano divino, para a

direita mais próxima das religiões

tradicionais, é apanágio da direita.

A propriedade privada, enquanto

direito a dispor de si mesmo ou

enquanto direito fundamental a

dispor do que é seu por legítima

aquisição, versus a sujeição da

propriedade privada a critérios de

utilidade e finalidade pública,

distinguem também a direita da

esquerda.

Os direitos naturais do indivíduo à

liberdade e à propriedade, isto é, os

direitos negativos sobre os quais o

estado não poderá nunca dispor,

reconhecidos por via da Cons-

tituição ou de outros instrumentos

normativos que o protejam perante

o poder público, é marca da direita.

O estabelecimento, ou a criação, dos

direitos dos indivíduos, não

enquanto tal, mas como cidadãos,

isto é, os direitos que o estado

A possibilidade de rupturas sociais,

mais ou menos violentas, com

pendor revolucionário ou simples-

mente dirigista, é próprio da

esquerda.

E, last but not least, a função da

política e do governo. Seja por

acreditar numa ordem social espon-

tânea, seja por duvidar da bondade

do poder, seja por um certo

cepticismo antropológico, seja,

ainda, por crer que existem valores

de ordem superior que não estão à

disposição da simples vontade

humana, a direita oscila entre as

posições liberais do ideal do não-

governo e do reconhecimento

objectivo de um aparelho de poder

público, que importa reduzir ao

mínimo expoente possível, e as

posições mais conservadoras,

segundo as quais se aceita a

necessidade de um governo

concentrado nas funções

tradicionais da soberania (justiça,

segurança, negócios estrangeiros) e

distanciado daquelas que

pertencem ao domínio privado

(economia, educação, ambiente,

etc.). Em qualquer dos casos, a

direita defende sempre um governo

mínimo ou um governo com funções

bem determinadas. Em

contrapartida, o voluntarismo

idealista da esquerda atira-a para

um governo de amplas dimensões.

Se o homem é um ser indefeso, se a

sociedade é aquilo que nós

quisermos que ela seja e se o

destino está nas nossas mãos, então

faz todo o sentido que o político,

este consubstanciado nos seus

aparelhos de poder, o estado e o

governo, tenha poderes suficientes

para proteger o homem e

transformar a sociedade. Num caso

e no outro, significa isto que a

função principal do político,

segundo a esquerda, é promover a

igualdade entre os homens, de

modo, primeiro, a protegê-los

reciprocamente e a formar a

ideologia 33

A direita considera a

sociedade o resultado de

forças que extravasam o

político, podendo essas forças

oscilar do indivíduo isolado no

universo ao indivíduo como

parte integrante de uma ordem

transcendental. A esquerda

entende que o “mundo” pode

ser transformado por golpes

de vontade e é o resultado de

forças inteligentes e

direccionadas.

Page 34: popcom #06

distribuindo recursos e desen-

volvendo políticas de promoção

económica e de igualdade social.

Este conjunto de diferenças não

esgotará a distinção entre esquerda

e direita. Certamente que mais

haverá a acrescentar e que

certamente encontraremos algumas

excepções a estas regras. Todavia,

parecem-me suficientes para esta-

belecer critérios de diferenciação e

para manter a utilidade da

dicotomia.

ainda, por crer que existem valores

de ordem superior que não estão à

disposição da simples vontade

humana, a direita oscila entre as

posições liberais do ideal do não-

governo e do reconhecimento

objectivo de um aparelho de poder

público, que importa reduzir ao

mínimo expoente possível, e as

posições mais conservadoras,

segundo as quais se aceita a

necessidade de um governo

concentrado nas funções tradi-

cionais da soberania (justiça,

segurança, negócios estrangeiros) e

distanciado daquelas que perten-

cem ao domínio privado (economia,

educação, ambiente, etc.). Em

qualquer dos casos, a direita

defende sempre um governo

mínimo ou um governo com funções

bem determinadas. Em contra-

partida, o voluntarismo idealista da

esquerda atira-a para um governo

de amplas dimensões. Se o homem é

um ser indefeso, se a sociedade é

aquilo que nós quisermos que ela

seja e se o destino está nas nossas

mãos, então faz todo o sentido que

o político, este consubstanciado

nos seus aparelhos de poder, o

estado e o governo, tenha poderes

suficientes para proteger o homem

e transformar a sociedade.

Num caso e no outro, significa

isto que a função principal do

político, segundo a esquerda, é

promover a igualdade entre os

homens, de modo, primeiro,

a protegê-los reciprocamente e a

formar a sociedade justa, depois.

Para isso, impõe-lhes direitos e

deveres que os tornam cidadãos,

isto é, iguais para e perante o

estado, e promove as leis

necessárias à igualdade material,

belecer critérios de diferenciação e

para manter a utilidade da

dicotomia.

_______________

* Rui Albuquerque é Doutor em Ciência

Política e CEO do Grupo Lusófona Brasil.

Este artigo foi originalmente publicado

em oinsurgente.org

Seja por acreditar numa ordem social espontânea, seja por duvidar da bondade do poder, seja por um certo cepticismo antropológico, a direita oscila entre as posições liberais do ideal do não-governo e do reconhecimento objectivo de um aparelho de poder público, que importa reduzir ao mínimo expoente possível, e as posições mais conservadoras, segundo as quais se aceita a necessidade de um governo concentrado nas funções tradicionais da soberania. Em qualquer dos casos, a direita defende sempre um governo mínimo.

34 ideologia

Page 35: popcom #06
Page 36: popcom #06
Page 37: popcom #06

Seufert Michael

Acho dramático que qualquer política de corte na despesa seja inconstitucional. ‘ ‘

Page 38: popcom #06

ichael Seufert

tem 30 anos e

é deputado do

CDS e da Juventude

Popular à Assembleia da

República. Natural do

Porto, foi Coordenador

do Gabinete de Estudos

Gonçalo Begonha entre

2007 e 2009, e Presidente

da Juventude Popular

desde 2009 até 2011.

Actualmente,

desempenha as funções

de Presidente da Mesa do

Conselho Nacional da

organização.

Eleito deputado pelo

círculo eleitoral do Porto

em 2009 e em 2011,

representa o CDS na

Comissão de Orçamento,

Finanças e Administração

Pública e na Comissão de

Educação, Ciência e

Cultura, na qual é o

Coordenador do Grupo

Parlamentar do partido.

38 entrevista

M

que mudam o país todos os dias.

Mais difícil é perceber o impacte a

prazo mais longo. Eu gostaria de ter

a esperança que houvesse o reco-

nhecimento que não podem haver

políticas despesistas e contas

deficitárias como as dos últimos

anos Sócrates e que é a conse-

quência dessas políticas que hoje

vivemos. Infelizmente para muitos

“especialistas” e fazedores de

opinião a austeridade é uma opção

dos malvados direitistas do governo

e não uma consequência lógica e

expectável do que vivemos nos

últimos anos.

Globalmente, que avaliação fazes do

trabalho do Governo PSD/CDS até

O país vive uma grave crise

financeira que tem provocado

significativos problemas a nível

social. Parece-te inevitável que o

momento que vivemos provocará

profundas mudanças na nossa

forma de viver? Quais?

Nem é preciso fazer futurolo-

gia para já ver as consequências

imediatas da crise financeira: im-

postos muito elevadas e cortes na

despesa pública – mesmo naquela

que as pessoas consideram “boa” –

que mudam o país todos os dias.

Mais difícil é perceber o impacte a

prazo mais longo. Eu gostaria de ter

a esperança que houvesse o

reconhecimento que não podem

haver políticas despesistas e contas

Page 39: popcom #06

v

e não uma consequência lógica e

expectável do que vivemos nos

últimos anos.

Globalmente, que avaliação fazes

do trabalho do Governo PSD/CDS

até ao momento?

Acho que o governo está, dentro das

condicionantes que tem, a fazer um

bom trabalho. Os números de

redução da despesa e do défice são

muito respeitáveis. No entanto há

dois factores que são de difícil

aceitação: por um lado só agora em

Maio de 2013 é que aparecem

verdadeiras medidas estruturais na

despesa do estado (repare-se que

até agora os cortes foram atendidos

com reduções salariais que, quando

não foram inconstitucionais tout

court, eram sempre assumidas

como temporárias). Por outro lado,

e ainda que o efeito de reduzir o

défice seja importante para futuro, a

opção por mais impostos sempre

que os cortes na despesa não

bastavam era tomada, a meu ver,

muito depressa. Vale a pena repisar

no entanto que uma parte muito

significativa dos impostos de hoje

está a pagar políticas, despesa e

dívida do passado – na exacta

proporção do peso dos juros na

despesa pública.

Como classificas o papel do

CDS no contexto da coligação

governamental? Achas que o

partido tem sido 'mal tratado'

pelo PSD?

Não acho que tenha havido “maus

tratos” na coligação. Existem dois

partidos que têm diferentes

eleitorados e projectos e que por

isso nem sempre têm de estar de

acordo. Há em Portugal alguma

dificuldade em lidar com governos

de coligação, mas basta acompanhar

a política na Inglaterra ou na

Alemanha (para nem falar da Itália)

para perceber que é normal noutros

países que em coligações os

entrevista 39

‘Vale a pena repisar

que uma parte muito

significativa dos

impostos de hoje está a

pagar políticas, despesa

e dívida do passado – na

exacta proporção do

peso dos juros na

despesa pública.’

Page 40: popcom #06

Claramente a diferença é que do

ponto de vista do governo se tem

acesso à realidade em primeira mão.

Por outro lado não temos tantos

graus de liberdade na nossa acção

porque, até em coligação, há

realidades que temos de acomodar.

No entanto, os partidos como os

entendo existem para governar e

não para estar na oposição, por

muito bons que sejam nisso, é

claramente no governo que

podemos desenvolver a nossa

vocação. Se é nesta altura ou com

esta herança que queremos, já é

outra questão.

Tem-se verificado no interior do

CDS e no seio do seu eleitorado,

manifestações de desagrado com

algumas medidas do governo,

nomeadamente as que têm

incidência no aumento da carga

fiscal, e que vai contra algumas

orientações do partido no passado.

recursos que circulavam por via da

dívida que hoje já não podemos

mais contrair. O governo e os

partidos não avaliaram bem o

impacte destas políticas e portanto

houve a ideia de que o ajustamento

seria simples e rápido o que nunca

seria o caso. Ao mesmo tempo o

enquadramento constitucional im-

pede o recurso a medidas menos

dolo-osas e mais rápidas – e com

isso temos de viver e a isso temos

de responder.

Foste deputado na oposição e

agora és deputado num Grupo

Parlamentar que apoia o

governo. Quais as principais

diferenças?

Claramente a diferença é que do

ponto de vista do governo se tem

acesso à realidade em primeira mão.

Por outro lado não temos tantos

graus de liberdade na nossa acção

porque, até em coligação, há

dificuldade em lidar com governos

de coligação, mas basta acompanhar

a política na Inglaterra ou na

Alemanha (para nem falar da Itália)

para perceber que é normal noutros

países que em coligações os

dirigentes e até ministros de dife-

rentes partidos assumam diver-

gências. A lealdade mede-se na

atitude e no momento dos votos nas

diferentes matérias.

Será justo para este governo que

a dimensão da crítica que lhe é

feita supere tantas vezes a que se

fez a José Sócrates, quando é mais

do que evidente que as respon

sabilidades pela difícil situação

do país se encontram mais no

passado do que no presente?

Não é certamente. Basta olhar para

o que este governo enfrenta na

gestão duma situação para a qual

pouco ou nada contribuiu (o

governo nada mesmo, os partidos

que a sustentam já a doutrina diver-

girá) e o branqueamento a que se

assiste do anterior executivo, cujo

responsável tem até direito a tempo

de antena no “serviço público”. No

entanto é razoável dizer que houve,

na campanha eleitoral e nos iniciais

momentos do governo uma péssima

gestão de expectativas.

Portugal viveu anos a fio com 4%,

5% e até 9% e 10% de défices

públicos. Ou seja, o estado endivi-

dava-se ano após ano para pagar

serviços públicos, salários, etc, sem

que se sentisse no imediato o

verdadeiro custo dessas políticas.

Ora com metas exigentes – e bem! –

de redução desse desequilíbrio

(que, tirando a despesa com juros,

ate já ocorreu!) a economia

ressente-se porque se vê privada de

recursos que circulavam por via da

dívida que hoje já não podemos

mais contrair. O governo e os

partidos não avaliaram bem o

impacte destas políticas e portanto

houve a ideia de que o ajustamento

40 entrevista

Page 41: popcom #06

entrevista 41

manifestações de desagrado com

algumas medidas do governo,

nomeadamente as que têm

incidência no aumento da carga

fiscal, e que vai contra algumas

orientações do partido no

passado. Reves-te nessa crítica ou

encontras alguma 'atenuante'

para essa postura?

Acho que é preciso ver que o

Memorando de Entendimento prevê

expressamente aumentos de receita

fiscal e que o CDS sabia disso e que

por isso, no seu manifesto eleitoral,

deixa de assumir a necessidade da

redução da carga fiscal no imediato

- justamente porque isso estava

vedado pelo memorando. Mas claro

que não é do dia para a noite que

isso muda na cabeça das pessoas – e

ainda bem, porque acho que não

devemos perder esse património.

Percebo no entanto e apesar dessas

atenuantes que haja um impacte

negativo nos nossos apoiantes dos

sucessivos aumentos da carga fiscal

que o CDS tem apoiado. Mas chamo

também a atenção para outra barri-

cada que olha apenas para o défice

como a variável a combater e que

mesmo com aumentos da carga

fiscal importa é reduzir o défice

presente para permitir menos

impostos futuros.

Creio que, por não termos moeda

própria o que permitiria o recurso a

medidas igualmente dolorosas mas

menos visíveis como a inflação, o

ajustamento que estamos a fazer é

absolutamente original. Além disso,

como já disse, muitas medidas de

corte na despesa (e as mais estru-

turais e definitivas) são infelizmente

inconstitucionais; pelo que não se

adivinha grande solução que não

passe pelo aumento de impostos.

Nos últimos tempos, o PS tem

radicalizado a sua ruptura com o

governo, pondo em causa o

consenso político de que o país tem

benefíciado. Que importância tem

‘Os partidos como os entendo existem para governar e não para estar na oposição, por muito bons que sejam nisso, é claramente no governo que podemos desenvolver a nossa vocação. Se é nesta altura ou com esta herança que queremos, já é outra questão.’

Page 42: popcom #06

42 entrevista

governo, pondo em causa o

consenso político de que o país

tem benefíciado. Que importância

tem esse consenso? Como

classificas essa atitude do maior

partido da oposição?

O consenso tem interesse relativo. É

importante para a nossa credi-

bilização externa e para o nosso

programa, até porque foi negociado

pelo PS. Mas por outro lado é claro

que há políticas que têm de ser de

ruptura com o passado e com as

políticas de endividamento público.

Eu diria que é importante o governo

ter uma porta aberta e que tente

negociar o possível. Para lá disso

não há que ter medo em avançar.

Que consequências práticas

temes possam vir a resultar das

recentes decisões do Tribunal

Constitucional a respeito do

Orçamento de Estado?

Acho dramático, ainda que com-

preenda no nosso enquadramento

constitucional, que qualquer política

de corte na despesa seja incons-

titucional. Ainda para mais

invocando princípios universais e

constituicionais como o da igual-

dade e o da proporcionalidade. É de

assinalar, no entanto que 5 a 6

juízes do TC não fazem essa leitura –

dependendo dos artigos em causa –

e que por isso cai por terra o

discurso de que “era óbvio que era

inconstitucional”. A leitura que se

faz dos ditos princípios é necessa-

riamente subjectiva e muitas vezaes

circunstancial.

As consequências orçamentais prá-

ticas são o encontrar de novas

medidas – e em boa hora o governo

desta vez exclui novas subidas de

impostos – que substituam a pou-

pança intencionada no Orçamento

de Estado. Fundamentalmente

foram as medidas anunciadas no

início deste mês passada pelo

primeiro-ministro que até são

globalmente bem-vindas e pecam

que o CDS tem apoiado. Mas chamo

também a atenção para outra barri-

cada que olha apenas para o défice

como a variável a combater e que

mesmo com aumentos da carga

fiscal importa é reduzir o défice

presente para permitir menos

impostos futuros.

Creio que, por não termos moeda

própria o que permitiria o recurso a

medidas igualmente dolorosas mas

menos visíveis como a inflação, o

ajustamento que estamos a fazer é

absolutamente original. Além disso,

como já disse, muitas medidas de

corte na despesa (e as mais estru-

turais e definitivas) são infelizmente

inconstitucionais; pelo que não se

adivinha grande solução que não

passe pelo aumento de impostos.

Nos últimos tempos, o PS tem

radicalizado a sua ruptura com o

governo, pondo em causa o

consenso político de que o país

tem benefíciado. Que importância

tem esse consenso? Como

classificas essa atitude do maior

partido da oposição?

O consenso tem interesse relativo. É

importante para a nossa credi-

bilização externa e para o nosso

programa, até porque foi negociado

pelo PS. Mas por outro lado é claro

que há políticas que têm de ser de

ruptura com o passado e com as

políticas de endividamento público.

Eu diria que é importante o governo

ter uma porta aberta e que tente

negociar o possível. Para lá disso

não há que ter medo em avançar.

Que consequências práticas

temes possam vir a resultar das

recentes decisões do Tribunal

Constitucional a respeito do

Orçamento de Estado?

Acho dramático, ainda que

compreenda no nosso

enquadramento constitucional, que

qualquer política de corte na

despesa seja inconstitucional. Ainda

‘Passados 37 anos desta Constituição,

ela cumpre com muita dificuldade um

propósito fundamental que é o de

enquadrar a acção do governo de modo a

promover a defesa dos cidadãos face aos

poderes do estado. Defendo um regime

que limite a acção e o poder do estado

frente às liberdades dos indivíduos.’

Page 43: popcom #06

cidadãos face aos poderes do

estado. É sabido e digo-o sem medo

– ainda que encontrando muitas

vezes uma ignorante incompre-

ensão dos princípios de liberdade

que subjazem a este pensamento –

que defendo um regime que limite a

acção e o poder do estado frente às

liberdades dos cidadãos e dos

indivíduos.

E olhando para três bancarrotas

públicas, pagas com as poupanças

ou o trabalho dos contribuintes (os

“impostados”, como alguém escre-

veu), é evidente que temos de pôr

um travão aos ciclos socialistas da

insustentabilidade das contas

públicas.

Ao mesmo tempo, quem hoje nasça

já tem a seu cargo uma dívida de

mais de 18000€ de dívida pública.

Há algo de profundamente injusto

nisto com uma solidariedade inter-

geracional de sentido único e há

uma imoralidade subjacente no

sistema que o permite. 'No taxation

without representation' é um lema

fundamental do estado de direito

que não vale para os futuros

pança intencionada no Orçamento

de Estado. Fundamentalmente

foram as medidas anunciadas no

início deste mês passada pelo

primeiro-ministro que até são

globalmente bem-vindas e pecam

por tardias.

Ainda a esse propósito,

defendeste recentemente que o

melhor a fazer à actual

Constituição seria porventura

revogá-la e “escrever uma nova”.

Onde é que te parece que a actual

constituição falha de forma mais

grave, e porque é que este texto

já não serve o país?

É evidente que passados 37 anos de

regime desta Constituição, ela

cumpre com muita dificuldade um

propósito fundamental que é o de

enquadrar a acção do governo de

modo a promover a defesa dos

cidadãos face aos poderes do

estado. É sabido e digo-o sem medo

– ainda que encontrando muitas

vezes uma ignorante

incompreensão dos princípios de

liberdade que subjazem a este

Orçamento de Estado?

Acho dramático, ainda que com-

preenda no nosso enquadramento

constitucional, que qualquer política

de corte na despesa seja incons-

titucional. Ainda para mais invo-

cando princípios universais e

constituicionais como o da igual-

dade e o da proporcionalidade. É de

assinalar, no entanto que 5 a 6

juízes do TC não fazem essa leitura –

dependendo dos artigos em causa –

e que por isso cai por terra o

discurso de que “era óbvio que era

inconstitucional”. A leitura que se

faz dos ditos princípios é necessa-

riamente subjectiva e muitas vezaes

circunstancial.

As consequências orçamentais prá-

ticas são o encontrar de novas

medidas – e em boa hora o governo

desta vez exclui novas subidas de

impostos – que substituam a pou-

pança intencionada no Orçamento

de Estado. Fundamentalmente

foram as medidas anunciadas no

início deste mês passada pelo

primeiro-ministro que até são

globalmente bem-vindas e pecam

entrevista 43

Page 44: popcom #06

acelerem mutuamente os efeitos

num espaço de moeda único –

seriam sempre os mais novos e os

mais velhos (que mais dificuldade

têm em entrar no mercado de

trabalho) os mais prejudicados. No

caso dos jovens é particularmente

injusto porque não tiveram voz nas

decisões políticas que aqui levaram.

Mas é nisto que dão políticas

quando se acredita que “no longo

prazo estamos todos mortos”. Por

isso volto a repetir: porque são os

jovens de hoje que sentem na pele e

de forma particular as conse-

quências do descalabro das políticas

de mais de 30 anos de desgoverno

são também os jovens que têm de

dar um sinal de que não querem que

isso se repita com os seus filhos.

Com a experiência que tens

enquanto deputado da Juventude

Popular e seu ex-Presidente, que

análise fazes da participação dos

jovens na política? O que esperar do

futuro?

Os jovens têm por vezes o “vício” de

politicamente intervirem de forma

Portugal não precisa nem deve

procurar um conflito geracional,

mas devemos reconhecer que para o

evitar devemos (a nossa geração)

tudo fazer para entregar aos nossos

filhos um país mais solidário.

As gerações mais novas parecem

ser as mais prejudicadas pelas

decisões que nos conduziram à

infeliz situação actual, ao mesmo

tempo que foram os que menos

contribuiram para ela. Como

fazer- lhes justiça e salvaguardar

o seu futuro?

É muito importante, do meu ponto

de vista, perceber que o sucessivo

acumular de dívida levaria sempre a

uma situação de dificuldade como a

que hoje vivemos. E que no

momento em que rebentasse – que

é relativamente imprevisível, dife-

rente de país para país, ainda que se

acelerem mutuamente os efeitos

num espaço de moeda único –

seriam sempre os mais novos e os

mais velhos (que mais dificuldade

têm em entrar no mercado de

trabalho) os mais prejudicados. No

geracional de sentido único e há

uma imoralidade subjacente no

sistema que o permite. 'No taxation

without representation' é um lema

fundamental do estado de direito

que não vale para os futuros

contribuintes.

Assim não vejo outra solução que

não seja introduzir garantias de

defesa dos mais fracos e dos sem

voz – que são as crianças e os que

ainda não nasceram – nomeada e

principalmente na limitação dos

endividamentos públicos.

Não há nada pior para um regime

que ver uma geração a apontar à

anterior o dedo e a viver um conflito

geracional. Aconteceu nos anos 60,

na sequência da segunda guerra

mundial, na Alemanha e na França

onde levou ao terrorismo armado

de extrema-esquerda e ao Maio de

68, respectivamente.

Portugal não precisa nem deve

procurar um conflito geracional,

mas devemos reconhecer que para o

evitar devemos (a nossa geração)

tudo fazer para entregar aos nossos

filhos um país mais solidário.

44 entrevista

Page 45: popcom #06

Que mensagens deixas aos nossos

leitores, em especial os militantes

da Juventude Popular?

Digo que, apesar de ser a altura

mais difícil do país desde o 25 de

Abril, sermos chamados a governar

é um desafio que temos de enfrentar

com grande responsabilidade e

resiliência. E que no entanto

saibamos sempre questionar e

avaliar com espírito crítico. A JP

deve servir para juntar todos os que

dizem não aos socialismos em

Portugal e criticar, nesse espírito, os

socialismos também no governo e

assumir-se como a grande força

juvenil de direita em Portugal.

quem votar. Se havia vontade de

combater a corrupção, era mais útil

criar meios e legislação que ajudasse

ao seu combate “no acto”. Quanto à

reforma, poderia ter ido mais longe

com, por exemplo., um debate sobre

as competências e atribuições das

freguesias em meio urbano (que hoje

em dia e não obstante alguns grandes

autarcas pouco fazem). A fusão de

municípios que muitas vezes é

chamada a este debate poderia ter

existido nalguns sítios (nas áreas

metropolitanas de Porto e Lisboa,

p.ex.) mas trariam provavelmente a

necessidade de criar algum tipo de

outra estrutura intermédia.

Que mensagens deixas aos nossos

leitores, em especial os militantes

da Juventude Popular?

Digo que, apesar de ser a altura

mais difícil do país desde o 25 de

Abril, sermos chamados a governar

é um desafio que temos de enfrentar

com grande responsabilidade e

resiliência. E que no entanto

saibamos sempre questionar e

avaliar com espírito crítico. A JP

deve servir para juntar todos os que

dizem não aos socialismos em

Portugal e criticar, nesse espírito, os

socialismos também no governo e

assumir-se como a grande força

juvenil de direita em Portugal.

Popular e seu ex-Presidente, que

análise fazes da participação dos

jovens na política? O que esperar

do futuro?

Os jovens têm por vezes o “vício” de

politicamente intervirem de forma

fechada em temas “de juventude”, o

que eu acho um erro. Acho que é

importante intervirem de forma

transversal, transmitindo a sua

visão (igual ou diferente, mas

sempre própria) sobre o que está na

agenda. Isso obriga, ao nível das

organizações políticas de juventude,

à constituição de equipas multi-

facetadas o que na JP sempre se fez

com bastante sucesso – hoje vejo

muitas pessoas das equipas do João

Almeida e do Pedro Moutinho a

intervirem politica ou empresa-

rialmente duma forma directa nas

áreas que acompanhavam na

direcção nacional da JP.

O que vejo hoje directamente na JP é

uma grande importância na forma-

ção e na produção de documentos

de imensa qualidade sobre o

pensamento político e os temas

mais quentes. Acho que isso indica

um futuro muito saudável, se esses

documentos chegarem aos militantes

e forem debatidos internamente.

Ainda este ano, o país será

chamado a um novo acto

eleitoral: as eleições autárquicas.

Parece-te que a reforma

administrativa levada a cabo era

fundamental e foi bem feita? Qual

a tua opinião sobre a questão da

limitação de mandatos

autárquicos, que muita polémica

tem causado?

Sou contra a limitação de mandatos

– acho que os eleitores não

precisam duma tutela sobre em

quem votar. Se havia vontade de

combater a corrupção, era mais útil

criar meios e legislação que

ajudasse ao seu combate “no acto”.

Quanto à reforma, poderia ter ido

mais longe com, por exemplo., um

O que vejo hoje na JP é uma grande importância na formação e na produção de documentos de imensa qualidade sobre o pensamento político e os temas mais quentes. Acho que isso indica um futuro muito saudável, se esses documentos chegarem aos militantes e forem debatidos internamente.

entrevista 45

Page 46: popcom #06
Page 47: popcom #06

Margaret thatcher

A VIDA E a OBRA da

seus governos ajudaram a incen-

tivar outas tendências interna-

cionais que alargaram e apro-

fundaram, durante os anos 1980 e

1990, como o fim da Guerra Fria, a

propagação da democracia e do

crescimento de mercados livres e o

reforço da liberdade política e

económica em todos os continentes.

Margaret Thatcher tornou-se um

dos líderes políticos mais influentes

e respeitados em todo o mundo,

bem como um dos mais contro-

versos. Um ponto de referência para

os amigos e os inimigos.

mente com Ronald Reagan, um dos

fundadores de uma escola de

fundadores de uma escola de

políticos de convicções conser-

vadoras, o que teve um impacto

poderoso e duradouro sobre a

política na Grã-Bretanha (bem como

nos Estados Unidos) e lhe rendeu

uma maior visibilidade inter-

nacional do que qualquer político

britânico tivera desde Winston

Churchill. Com a progressiva – e

bem sucedida – mudança da política

britânica em termos económicos e

de política externa para a direita, os

seus governos ajudaram a incen-

tivar outas tendências interna-

cionais que alargaram e apro-

fundaram, durante os anos 1980 e

1990, como o fim da Guerra Fria, a

propagação da democracia e do

urante os seus mandatos,

Thatcher reformulou quase

todos os aspectos da

política britânica, reavivando a

economia, reformando as institui-

ções ultrapassadas e revigorando a

política externa do país. Desafiou e

contribuiu decisivamente para

derrubar a mentalidade de declínio

que se enraizara no país desde a

Segunda Guerra Mundial, procu-

rando a recuperação nacional com

uma energia e uma determinação

impressionantes. Nesse processo,

Margaret Thatcher tornou-se, junta-

mente com Ronald Reagan, um dos

fundadores de uma escola de

políticos de convicções

conservadoras, o que teve um

impacto poderoso e duradouro

sobre a política na Grã-Bretanha

D

Page 48: popcom #06

com os traumas do pós-guerra, bem

como com o aumento do nível de

tributação e regulação estatal. Ao

contrário de muitos conservadores

na época, tinha facilidade em conse-

guir a atenção de qualquer audi-

ência e falando de forma simples e

directa, com força e confiança, em

questões que eram importantes

para os eleitores.

1951-1970

FAMÍLIA E CARREIRA

Foi também em Dartford que

Margaret conheceu o seu marido,

Denis Thatcher, um empresário local,

que geriu a empresa da sua família

antes de se tornar um executivo da

indústria do petróleo. Casaram em

1951. Em 1953 foram pais pela

primeira vez, dos gémeos Mark e

Carol.

Na década de 1950, Margaret

Thatcher estagiou como advogada,

1950-1951

CANDIDATA POR DARTFORD

Com vinte e poucos anos, Margaret

concorreu como candidata conser-

vadora par o lugar de Dartford, um

bastião trabalhaista, nas Eleições

Gerais de 1950 e 1951, ganhando

notoriedade nacional como a

mulher candidata mais jovem do

país. Perdeu as duas vezes, mas

contribuiu para reduzir a maioria

do Partido Trabalhista de forma

acentuada e gostou extremamente

da experiência de campanha. Alguns

aspectos do seu estilo político foram

forjados em Dartford, perante um

eleitorado em grande parte cons-

tituído por operários, que sofreram

com os traumas do pós-guerra, bem

como com o aumento do nível de

tributação e regulação estatal. Ao

contrário de muitos conservadores

na época, tinha facilidade em

conseguir a atenção de qualquer

1925-1947

GRANTHAM E OXFORD

O início da vida de Margaret

Thatcher em Grantham desem-

penhou um grande papel na

formação das suas convicções

políticas. Os seus pais, Alfred e

Beatrice Roberts, eram metodistas.

A vida social da família foi vivida,

em grande parte, dentro da

comunidade perto da congregação

local, definida por fortes tradições

de auto-ajuda, o trabalho de

caridade e a honestidade pessoal. A

família Roberts geria uma loja e

criava as suas duas filhas num

apartamento por cima da loja.

Margaret Roberts frequentou uma

escola pública local e, poste-

riormente, conseguiu um lugar na

Universidade de Oxford, onde

estudou química na Somerville

College (1943-1947). O seu tutor foi

Dorothy Hodgkin, um pioneiro da

cristalografia de raios X, que ganhou

o Prémio Nobel em 1964. A sua visão

foi profundamente influ-enciada pela

sua formação científica. Mas a

química ficou em segundo plano,

perdendo o primeiro para a política

nos planos de Margaret Thatcher

para o futuro. Política conservadora

sempre foi uma característica da sua

vida: o seu pai desempenhara

funções políticas em Grantham e

partilhava com ela as questões do

dia-a-dia. Margaret foi eleita

presidente da Associação de Estudan-

tes Conservadores em Oxford e

conheceu muitos políticos proemi-

nentes, tornando-se conhecida para

as figuras mais relevantes do seu

partido no momento da derrota

devastadora frente ao Partido Tra-

balhista nas eleições gerais de 1945.

1950-1951: CANDIDATA POR

DARTFORD

Com vinte e poucos anos, Margaret

Margaret Thatcher nasceu no seio de uma família de

comerciantes, na pequena localidade de Grantham. A

educação e a vivência da infância haveriam de marcar

decisivamente o seu futuro político.

48 especial

Page 49: popcom #06

1975

LÍDER DO PARTIDO

CONSERVADOR

Muitos conservadores estavam

prontos para uma nova abordagem

depois do governo de Heath e

quando o partido perdeu uma

segunda eleição geral em Outubro de

1974, Margaret Thatcher concorreu

contra Heath para a liderança. Para

surpresa geral (ela próprio incluída),

em Fevereiro de 1975, Thatcher

derrotou Heath, embora contestada

por meia dúzia de colegas mais

velhos. Ela tornou-se, assim, a

primeira mulher a liderar um partido

político ocidental e a servir como

líder da oposição na Câmara dos

Comuns.

1975-1979: LÍDER DA OPOSIÇÃO

O Governo trabalhista de 1974-1979

foi um dos mais profícuos em crises

na história britânica, levando o país a

um estado de falência técnica em

1976, quando um colapso no valor

da moeda nas bolsas estrangeiras

forçou o governo a negociar crédito

do Fundo Monetário Internacional

(FMI). O FMI impôs controlos

rigoroso da despesa do Estado como

condição para o empréstimo, que,

ironicamente, melhorou a opinião

pública sobre o Partido Trabalhista.

No verão de 1978, ainda parecia a

reeleição ainda parecia possível. Mas

durante o inverno de 1978/79, a

sorte do governo esgotou-se. As

reivindicações sindicais conduziram

a uma epidemia de greves e mostrou

que o governo pouca influência

conseguiu exercer sobre os seus

aliados no movimento sindical. A

opinião pública virou-se contra o

Partido Trabalhista e os

Conservadores conquistaram a

maioria parlamentar na eleição geral

de Maio de 1979. No dia seguinte,

Margaret Thatcher tornou-se

Eleito com promessas de

recuperação económica através do

controlo dos sindicatos e da intro-

dução de políticas de mercado livre,

executou uma série de políticas

contrárias - apelidadas de 'U-Turns' -

para se tornar um dos governos mais

intervencionistas da história bri-

tânica. A negociação com os

sindicatos para introduzir um

controlo detalhado dos salários, pre-

ços e dividendos, foi disso exemplo.

Derrotado nas eleições gerais em

Fevereiro de 1974, o governo Heath

deixou um legado de inflação e

conflito industrial.

1975: LÍDER DO PARTIDO

CONSERVADOR

Muitos conservadores estavam

prontos para uma nova abordagem

depois do governo de Heath e

quando o partido perdeu uma

segunda eleição geral em Outubro de

1974, Margaret Thatcher concorreu

contra Heath para a liderança. Para

surpresa geral (ela próprio incluída),

em Fevereiro de 1975, Thatcher

derrotou Heath, embora contestada

por meia dúzia de colegas mais

velhos. Ela tornou-se, assim, a

primeira mulher a liderar um partido

político ocidental e a servir como

líder da oposição na Câmara dos

Comuns.

1975-1979: LÍDER DA OPOSIÇÃO

O Governo trabalhista de 1974-1979

foi um dos mais profícuos em crises

na história britânica, levando o país a

um estado de falência técnica em

1976, quando um colapso no valor

da moeda nas bolsas estrangeiras

forçou o governo a negociar crédito

do Fundo Monetário Internacional

(FMI). O FMI impôs controlos

rigoroso da despesa do Estado como

condição para o empréstimo, que,

indústria do petróleo. Casaram em

1951. Em 1953 foram pais pela pri-

meira vez, dos gémeos Mark e Carol.

Na década de 1950, Margaret

Thatcher estagiou como advogada,

particularmente em matéria relaci-

onadas com fiscalidade. Foi eleita

para o Parlamento em 1959 por

Finchley, um circunscrição no norte

de Londres que continuou a

representar até ser eleita membro da

Câmara dos Lordes (como Baronesa

Thatcher) em 1992. Em de dois anos,

foi-lhe dado um pequeno cargo no

governo de Harold Macmillan e entre

1964-1970 (quando os conser-

vadores estavam novamente em

oposição), estabeleceu o seu lugar

entre as figuras séniores do partido,

servindo continuamente como um

dos ministros sombra. Quando os

conservadores voltaram ao poder,

em 1970, sob a liderança de Edward

Heath, Thatcher manteve a sua tem-

dência ascendente e chegou a

ministra da Educação.

1970-1974

MINISTRA DA EDUCAÇÃO

Margaret Thatcher passou um mau

bocado como ministra da Educação.

No início dos anos 1970 viveu o pico

do radicalismo estudantil, bem como

enormes tumultos em termos sociais.

Manifestantes interrompiam os seus

discursos, a imprensa ligada à

oposição difamava-a, e a política de

educação em si parecia caminha

inexoravelmente para a esquerda

sem que ela o conseguisse travar, o

que a deixou muito desconfortável. O

próprio governo de Heath teve vida

difícil durante o seu mandato (1970-

1974) e decepcionou muita gente.

Eleito com promessas de

recuperação económica através do

controlo dos sindicatos e da

introdução de políticas de mercado

livre, executou uma série de políticas

contrárias - apelidadas de 'U-Turns' -

Após uma experiência no governo como Ministra da

Educação, Tatcher concorre à liderança do Partido

Conservador em Fevereiro de 1975 derrota o adversário,

Edward Heath.

especial 49

Page 50: popcom #06

de que faria o que fosse necessário

para mantê-la baixa. O orçamento da

Primavera de 1981, com um

aumento de impostos no ponto mais

baixo da recessão não pareceu o

mais convencional, mas permitiu um

corte nas taxas de juro e reiterou a

determinação férrea das convicções

do governo. A recuperação econó-

mica iniciada no mesmo trimestre e

foi seguida de oito consecutivos anos

de crescimento. O apoio político

aumentou com as conquistas, mas a

reeleição do governo só foi

determinada por um evento impre-

visível: a Guerra das Falkland. A

invasão argentina das ilhas em Abril

de 1982 encontrou uma Margaret

Thatcher firme e determinada na

direcção certa. Embora tenha traba-

lhado com os EUA na busca de uma

solução diplomática, um contingente

militar britânico foi enviado para

tomar as ilhas de volta. Quando a

diplomacia falhou, a ação militar foi

rápida e bem sucedida e as Ilhas

Falkland estavam novamente sob

controlo britânico em Junho de 1982.

O eleitorado ficou impressionado.

Poucos líderes britânicos ou

europeua teriam lutado por ilhas tão

pequensa e distantes. Ao fazer isso,

Margaret Thatcher lançou as bases

para uma política externa muito mais

vigorosa e independente durante o

resto do 1980s. Nas eleições gerais

de Junho de 1983, Thatcher foi

reeleita e a maioria parlamentar dos

Conservadores mais do que triplicou

(144 lugares).

2º MANDATO

O segundo mandato de Thatcher

começou com quase tantas

dificuldades como o primeiro. O

governo viu-se desafiado pelo

sindicato dos mineiros, que pôs em

marcha uma greve de um ano de

duração em 1984-85. O movimento

sindical como um todo tentava

colocar uma dura resistência às

económico do país. A curto prazo,

medidas dolorosas foram neces-

sárias. Embora os impostos directos

tivessem sido cortados, para

restaurar os incentivos, o orçamento

teve de ser equilibrado, e os

impostos indiretos foram aumen-

tados. A economia já estava a vias de

entrar numa recessão, mas a inflação

subia e as taxas de juro tiveram que

ser aumentadas para a controlar. Até

o final do primeiro mandato de

Margaret Thatcher, o desemprego no

Reino Unido representava três

milhões de pessoas e começou a cair

somente em 1986. Uma grande parte

da ineficiente indústria britânica

estava a fechar. Ninguém previra a

gravidade da crise. Mas ganhos de

longo prazo fundamentais foram

conseguidos. A inflação foi contro-

lada e o governo criou a expectativa

de que faria o que fosse necessário

para mantê-la baixa. O orçamento da

Primavera de 1981, com um

aumento de impostos no ponto mais

baixo da recessão não pareceu o

mais convencional, mas permitiu um

corte nas taxas de juro e reiterou a

determinação férrea das convicções

do governo. A recuperação

económica iniciada no mesmo

trimestre e foi seguida de oito

consecutivos anos de crescimento. O

apoio político aumentou com as

conquistas, mas a reeleição do

governo só foi determinada por um

evento imprevisível: a Guerra das

Falkland. A invasão argentina das

ilhas em Abril de 1982 encontrou

uma Margaret Thatcher firme e

determinada na direcção certa.

Embora tenha trabalhado com os

EUA na busca de uma solução

diplomática, um contingente militar

britânico foi enviado para tomar as

ilhas de volta. Quando a diplomacia

falhou, a ação militar foi rápida e

bem sucedida e as Ilhas Falkland

estavam novamente sob controlo

britânico em Junho de 1982. O

eleitorado ficou impressionado.

primeira mulher a liderar um partido

político ocidental e a servir como

líder da oposição na Câmara dos

Comuns.

1975-1979

LÍDER DA OPOSIÇÃO

O Governo trabalhista de 1974-1979

foi um dos mais profícuos em crises

na história britânica, levando o país a

um estado de falência técnica em

1976, quando um colapso no valor

da moeda nas bolsas estrangeiras

forçou o governo a negociar crédito

do Fundo Monetário Internacional

(FMI). O FMI impôs controlos

rigoroso da despesa do Estado como

condição para o empréstimo, que,

ironicamente, melhorou a opinião

pública sobre o Partido Trabalhista.

No verão de 1978, ainda parecia a

reeleição ainda parecia possível. Mas

durante o inverno de 1978/79, a

sorte do governo esgotou-se. As

reivindicações sindicais conduziram

a uma epidemia de greves e mostrou

que o governo pouca influência

conseguiu exercer sobre os seus

aliados no movimento sindical. A

opinião pública virou-se contra o

Partido Trabalhista e os Conser-

vadores conquistaram a maioria

parlamentar na eleição geral de Maio

de 1979. No dia seguinte, Margaret

Thatcher tornou-se Primeira-

Ministra do Reino Unido.

1979-1990

OS ANOS EM DOWNING STREET

1º Mandato

O novo governo liderado por

Margaret Thatcher comprometeu-se

a analisar e inverter o declínio

económico do país. A curto prazo,

medidas dolorosas foram

necessárias. Embora os impostos

directos tivessem sido cortados, para

restaurar os incentivos, o orçamento

teve de ser equilibrado, e os

Em Maio de 1979, Margaret Thatcher e o Partido

Conservador obtém uma significativa vitórias na Eleição

Geral. Thatcher sobe ao cargo de Primeira-MInnistra,

herdando um país economica e socialmente de rastos.

50 especial

Page 51: popcom #06

as greves de fome nas prisões em

1980-1981. A sua política era

implacavelmente hostil face ao

terrorismo, o que não a impediu de

negociar o Acordo Anglo-Irlandês de

1985, com a República da Irlanda. O

acordo foi uma tentativa de melhorar

a cooperação de segurança entre o

Reino Unido e a Irlanda e de dar

algum reconhecimento para a visão

política dos católicos na Irlanda do

Norte, uma iniciativa que ganhou o

apoio da Administração Reagan e do

Congresso dos EUA. A economia

continuou a melhorar durante 1983-

87 com as políticas de liberalização

económica que até foram prorro-

gadas. O governo começou a adoptar

uma política de venda de activos

estatais, que haviam totalizado mais

de 20 por cento da economia quando

os conservadores chegaram ao poder

em 1979. As privatizações britânicas

dos anos 1980 foram o primeiro do

seu género e veio a ter grande

influência em todo o mundo. A ala

esquerda do Partido Conservador

sempre se mostrara desconfortável

com esta líder. Em Janeiro de 1986,

as divisões duradoura entre

esquerda e direita no gabinete de

reverter as suas principais

características. Em outubro de 1984,

quando a greve ainda estava em

andamento, o Exército Republicano

Irlandês (IRA) tentou assassinar

Margaret Thatcher e muitos ele-

mentos do seu gabinete, bombar-

deando um hotel em Brighton

durante a conferência anual do

Partido Conservador. Embora ela

tenha saído ilesa, alguns de seus

colegas mais próximos estavam

entre os feridos e mortos e o quarto

ao lado do dela foi severamente

danificado. No século XX, nenhum

outro primeiro-ministro britânico

chegou perto de ser assassinado. A

política britânica na Irlanda do Norte

tinha sido uma fonte permanente de

conflitos para cada primeiro-minis-

tro desde 1969, mas Margaret

Thatcher despertou um ódio especial

do IRA devido À sua recusa em

atender as pretensões políticas da

organização, nomeadamente durante

as greves de fome nas prisões em

1980-1981. A sua política era

implacavelmente hostil face ao

terrorismo, o que não a impediu de

negociar o Acordo Anglo-Irlandês de

1985, com a República da Irlanda. O

militar britânico foi enviado para

tomar as ilhas de volta. Quando a

diplomacia falhou, a ação militar foi

rápida e bem sucedida e as Ilhas

Falkland estavam novamente sob

controlo britânico em Junho de 1982.

O eleitorado ficou impressionado.

Poucos líderes britânicos ou

europeua teriam lutado por ilhas tão

pequensa e distantes. Ao fazer isso,

Margaret Thatcher lançou as bases

para uma política externa muito mais

vigorosa e independente durante o

resto do 1980s. Nas eleições gerais

de Junho de 1983, Thatcher foi

reeleita e a maioria parlamentar dos

Conservadores mais do que triplicou

(144 lugares).

2º Mandato

O segundo mandato de Thatcher

começou com quase tantas dificul-

dades como o primeiro. O governo

viu-se desafiado pelo sindicato dos

mineiros, que pôs em marcha uma

greve de um ano de duração em

1984-85. O movimento sindical

como um todo tentava colocar uma

dura resistência às reformas que o

governo tentava introduzir no

mundo sindical, que começaram com

a legislação em 1980 e 1982 e

continuou após a eleição geral. A

greve dos mineiros foi uma das mais

violentas e de longa duração na

história britânica. O resultado era

incerto, mas depois de muitas voltas,

o sindicato foi derrotado. Este

acontecimento veio a revelar-se um

desenvolvimento crucial, pois asse-

gurou que as reformas de Thatcher

teriam viabilidade. Nos anos que se

seguiram, a oposição trabalhista

tranquilamente aceitou a populari-

dade e o sucesso da legislação

sindical e comprometeram-se a não

reverter as suas principais

características. Em outubro de 1984,

quando a greve ainda estava em

andamento, o Exército Republicano

Irlandês (IRA) tentou assassinar

Margaret Thatcher e muitos

Um dos acontecimentos mais marcantes do seu primeiro

mandato em Downing Street foi a Guerra das Falkland. A

invasão argentina das ilhas em Abril de 1982 encontrou

uma Margaret Thatcher firme e determinada.

especial 51

Page 52: popcom #06

influência em todo o mundo. A ala

esquerda do Partido Conservador

sempre se mostrara desconfortável

com esta líder. Em Janeiro de 1986,

as divisões duradoura entre

esquerda e direita no gabinete de

Thatcher foram expostos publica-

mente pela renúncia súbita do

ministro da Defesa, Michael

Heseltine, devido a uma disputa

sobre os problemas de negócios da

fabricante de helicópteros britânicos,

Westland. A precipitação do "Caso

Westland 'desafiou a liderança de

Margaret Thatcher como nunca. Ela

sobreviveu à crise, mas seus efeitos

foram significativos. Thatcher foi

submetida a fortes críticas dentro do

próprio partido devido à decisão de

permitir que aviões dos EUA

voassem a partir de bases britânicas

para atacar alvos na Líbia (Abril de

1986). Houve rumores de que o

governo e a sua líder estariam

'cansados' depois de tanto tempo no

poder.

A sua resposta foi característica: na

conferência anual do Partido

Conservador, em Outubro de 1986, o

seu discurso prenunciou uma massa

de reformas para um terceiro

governo Thatcher. Com a economia

tão forte, as perspectivas eram boas

para uma eleição e o governo foi

reconduzido com uma nova maioria

parlamentar em Junho de 1987.

3º Mandato

A plataforma legislativa do terceiro

mandato de Thatcher esteve entre os

mais ambiciosos alguma vez

apresentados por uma adminis-

tração britânica. Houve medidas

para reformar o sistema de ensino

(1988), a introdução de um pro-

grama nacional para a primeira vez.

Implementou-se um novo sistema

fiscal para o governo local (1989), a

Comissão de Comunidade, ou

"imposto de votação", como foi

apelidado pelos adversários. E não

havia legislação para compradores e

Major, em 1991). Por outro lado, as

reformas na educação e na saúde

mostraram-se duradouras. Dentro

do Partido Conservador e do próprio

governo havia uma discordância

profunda sobre a política europeia.

Thatcher encontrava-se cada vez

mais em desacordo com seu ministro

das Relações Exteriores, Sir Geoffrey

Howe, sobre todas as questões que

diziam respeito à integração

europeia. O seu discurso em Bruges,

em Setembro de 1988, começou o

processo pelo qual o Partido

Conservador - ao mesmo tempo em

grande parte "pró-europeu" - se

tornou predominantemente "euro-

céptico". Paradoxalmente, tudo isso

aconteceu em um cenário de eventos

internacionais profundamente úteis

à causa conservadora. Margaret

Thatcher, desempenhou um papel

importante na última parte na última

fase da Guerra Fria, tanto no

fortalecimento da aliança ocidental

contra os soviéticos no início de

1980, como no sucesso da vitória

nesse conflito. Os soviéticos haviam

Implementou-se um novo sistema

fiscal para o governo local (1989), a

Comissão de Comunidade, ou

"imposto de votação", como foi

apelidado pelos adversários. E não

havia legislação para compradores e

fornecedores distintos dentro do

Serviço Nacional de Saúde (1990),

abrindo o serviço a uma medida de

competição pela primeira vez, que

aumentou as possibilidades de uma

gestão eficaz. A maior parte das

medidas foi profundamente contro-

versa. A Comissão de Comunidade,

em particular, tornou-se um sério

problema político, com conselhos

locais a aproveitarem a introdução

de um novo sistema para aumentar

os impostos, responsabilizando por

esse aumento o governo Thatcher (o

sistema foi abandonado pelo su-

cessor de Margaret Thatcher, John

Major, em 1991). Por outro lado, as

reformas na educação e na saúde

mostraram-se duradouras. Dentro

do Partido Conservador e do próprio

52 especial

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conquistou a maioria dos votos. No

entanto, sob as regras do partido a

margem era insuficiente, e um

segundo escrutínio foi exigido. Tendo

recebido a notícia numa conferência

em Paris, ela imediatamente anunciou

a sua intenção de lutar pela vitória.

Mas um terremoto político aproxima-

va-se . Após o seu regresso a Londres,

quando muitos colegas do seu

gabinete - insensíveis sobre a sua

posição sobre a Europa e duvidando

que ela poderia ganhar uma quarta

eleição geral – abandonaram abrupta-

mente Thatcher deixando-a sem apoio

e sem outra escolha que não a retirada.

Thatcher renunciou ao cargo de

Primeiro-Ministro em 28 de novembro

de 1990. John Major sucedeu-lhe,

tendo ficado no cargo até a eleição

esmagadora do governo trabalhista de

Tony Blair em Maio de 1997.

nhou um papel construtivo na diplo-

macia que tornou mais suave o

desmembramento da União Soviética.

No final de 1990, a Guerra Fria

acabou e capitalismo venceu. Mas

esse evento desencadeou a fase

seguinte da integração europeia, uma

vez que a França retomou o projecto

de uma moeda única europeia, com a

esperança de controlar o poder de

uma Alemanha reunificada. Como

resultado, as divisões sobre política

europeia no seio do governo britânico

que foram aprofundadas até o final da

Guerra Fria, agora tornar-se-iam pro-

zfundamente agudas. No dia 1 de

Novembro de 1990, Sir Geoffrey

Howe fez um discurso de renúncia

amargo e precipitou um desafio à

liderança de Margaret Thatcher do

seu partido por Michael Heseltine. Na

votação que se seguiu, Thatcher

conquistou a maioria dos votos. No

entanto, sob as regras do partido a

margem era insuficiente, e um

segundo escrutínio foi exigido. Tendo

recebido a notícia numa conferência

em Paris, ela imediatamente anunciou

importante na última parte na última

fase da Guerra Fria, tanto no

fortalecimento da aliança ocidental

contra os soviéticos no início de 1980,

como no sucesso da vitória nesse

conflito. Os soviéticos haviam

apelidado Thatcher de "Dama de

Ferro" – algo que ela adorou –

inspirados pela dureza dos discursos

que proferira contra eles pouco

depois de se tornar líder do Partido

Conservador em 1975. Durante os

anos 1980, Thatcher ofereceu um

forte apoio às políticas da

Administração Reagan. Mas quando

Mikhail Gorbachev surgiu como um

potencial líder da União Soviética,

Thatcher convidou-o a ir ao Reino

Unido em Dezembro de 1984 e

anunciou que aquele seria um homem

com o qual ela estaria disposta a

negociar. Por isso, Thatcher desempe-

nhou um papel construtivo na

diplomacia que tornou mais suave o

desmembramento da União Soviética.

No final de 1990, a Guerra Fria

acabou e capitalismo venceu. Mas

esse evento desencadeou a fase

Em 1990, Margaret

Thatcher abandonou

Downing Street, deixando o

Reino Unido numa situação

económicao e financeira

melhor do que a tinha

encontrado. Foi uma grande

estadista, responsável pela

recuperação do respeito

internacional pelo Reino

Unido e pela queda do

comunismo. A 'Dama de

Ferro' deixou uma marca

inigualável na política do

século XX.

especial 53

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54 especial

Sustentabilidade do Estado Social: que caminho?

sofrer sucessivas alterações a nível da designação e da

respectiva orgânica. Actualmente, com a entrada em funções

do XIX Governo Constitucional, foi extinto o Ministério do

Trabalho e da Solidariedade Social e criado o Ministério da

Solidariedade e da Segurança Social, transitando as áreas do

trabalho, emprego e formação profissional para o Ministério

da Economia e do Emprego.

Mas as transformações que foram ocorrendo não foram

apenas no nome e na estrutura, que não representam mais

do que a simples adaptação ao evoluir dos tempos e das

necessidades, as verdadeiras modificações aconteceram ao

nível das condições sobre as quais assentou a construção do

Estado Social como hoje o conhecemos, que se alteraram por

completo, tornando a discussão do seu modelo de

financiamento um tema actual e urgente.

A composição etária da população portuguesa entre 1970 e

2011 mudou radicalmente. Em 1970 a população portuguesa

tinha mais jovens (28,47%) do que idosos (9,67%), sendo os

adultos o grupo predominante (61,86%). Duas décadas

passadas, no ano de 1991, o povo português continua a

registar mais jovens (19,99%) do que idosos (13,61%),

embora já seja evidente o decréscimo da população entre os

0 e os 14 anos, e os adultos permanecem como grupo

predominante (66,40%). Mais vinte anos depois esta

realidade assume contornos dramáticos.

No final da primeira década do século XXI o grupo

maioritário continua a ser o dos adultos (66,08%), mas os

idosos cresceram de forma preocupante (19,03%), o que

seria apenas um sinal positivo resultante do aumento da

esperança média de vida, reflexo da grande evolução ao nível

das condições de vida, se este não fosse acompanhado por

uma igualmente forte redução do número de jovens

(14,89%), fruto da diminuição do número de nascimentos.

Em cerca de 40 anos, o país e o seu território mudaram

profundamente. A população activa manteve-se o grupo

maioritário, verificando um acréscimo de 31,04%, passando

de 5 326 435 a 6 979 785 habitantes. Por sua vez, a

população jovem registou um decréscimo de -35,87%,

passando de 2 451 850 a 1 572 329 habitantes, enquanto a

população idosa observou um aumento de 141,35%,

passando de 832 840 a 2 010 064 habitantes.

A realidade é que, numa Europa em contínuo e crescente

Lúcia Santos

mbora imperfeito e com inúmeras contradições,

o Estado Social é uma conquista civilizacional que

tem contribuído para a coesão social e a

correcção de desequilíbrios, assentando na ideia de uma

forma organizativa de sociedade que dá uma resposta

colectiva às necessidades de cada uma das pessoas.

Mas sem colocar em causa nenhum destes pressupostos,

nem a sua importância, a verdade é que estamos

perante um cenário crítico, no qual as economias

europeias e, em especial, a portuguesa, não se

desenvolvem a um ritmo suficiente para assegurar a

sustentabilidade financeira deste modelo, ao mesmo

tempo que os gastos com os sistemas sociais e de saúde

aumentam para níveis dificilmente suportáveis.

Apesar da criação do Ministério do Trabalho e

Previdência Social em 1916, extinto nove anos depois

após várias alterações orgânicas, foi durante o período

do Estado Novo, com a criação do modelo da

Previdência Social, que se formaram as bases

institucionais em que assenta o actual Estado Social em

Portugal. As decisões políticas sobre a previdência

tomadas no período entre 1933 e 1973, em particular a

Reforma da Previdência de 1962, constituíram marcos

significativos na história desta construção.

As etapas ultrapassadas durante este período foram

muito relevantes, mas a grande transformação na

Previdência Social ocorreu na década de 70, com a

criação das bases para a concretização de um

verdadeiro sistema de Segurança Social, o qual apenas

foi concluído na década seguinte.

Ao longo de todos estes anos, e segundo as políticas

definidas por cada Governo, o sector governamental das

vulgarmente chamadas “áreas sociais” tem vindo a

sofrer sucessivas alterações a nível da designação e da

respectiva orgânica. Actualmente, com a entrada em

funções do XIX Governo Constitucional, foi extinto o

Ministério do Trabalho e da Solidariedade Social e

criado o Ministério da Solidariedade e da Segurança

E

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inserção, é um contributo desestabilizador decisivo em todo

este processo.

Analisando novamente apenas a evolução na primeira

década do século XXI é possível constatar que o número de

beneficiários do subsídio de desemprego cresceu 57,06%

em apenas 10 anos, passando de 190 463 a 299 147

beneficiários. Por sua vez, o número de beneficiários do

rendimento social de inserção verificou um acréscimo de

128,47%, passando de 46 357 a 105 911 habitantes.

De facto, a seguir ao aumento dos gastos do Estado com as

pensões, a subida da despesa com o subsídio de

desemprego, segunda mais importante prestação social,

provocou um impacto social profundamente negativo, pelo

custo adicional que introduziu na equação.

Perante este cenário a questão que se impõe é como

poderemos nós assegurar a manutenção do Estado Social

em Portugal.

Em qualquer situação que se possa colocar, a distribuição

depende sempre da criação de riqueza, pelo que a sua

garantia tem obrigatoriamente de significar, sempre e em

primeiro lugar, gerar os recursos necessários para a sua

preservação.

Mas a verdade é que o modelo está assente num pressuposto

que já não se observa. A deterioração do ratio de

dependência entre os que pagam e os que recebem é uma

realidade e perante esta restam apenas duas opções: ou

temos a coragem de desenhar um novo sistema adequado à

nossa estrutura social ou deixamos que a demagogia leve a

melhor e por um simples populismo eleitoral nada fazemos.

Esta segunda opção apenas tem um desfecho possível, o

colapso do Estado Social.

Nós, enquanto jovens, temos a obrigação de exigir a coragem

necessária para a mudança. Que a esquerda radical não

assuma este problema em nada surpreende. A novidade é

ver o Partido Socialista (PS) recusar participar neste debate,

mas o momento em que os socialistas olham para o lado

procurando o eleitoralismo fácil está registado.

Fica assim claro que, apesar da coragem demostrada pelo

Governo em trazer esta discussão fundamental para a ordem

do dia, a esquerda se demitiu da sua obrigação de encarar

estes factos e de apoiar na construção de um modelo ade-

quado aos nossos dias. O PS arruinou o nosso presente e está

com vontade de destruir o nosso futuro. Vamos deixar?

população jovem registou um decréscimo de -35,87%,

passando de 2 451 850 a 1 572 329 habitantes, enquanto a

população idosa observou um aumento de 141,35%,

passando de 832 840 a 2 010 064 habitantes.

A realidade é que, numa Europa em contínuo e crescente

declínio demográfico, Portugal sobressai pela velocidade a

que este envelhecimento populacional acontece. Em 2012

nasceram 90 026 bebés e morreram 107 287 pessoas,

valores que se traduzem em mais 17 261 funerais do que

partos. Esta situação ganha outra dimensão quando se

verifica que em 2008 o saldo era positivo em 314 indivíduos.

Foram necessários apenas quatro anos para que estes

valores atingissem uma discrepância com esta ordem de

grandeza.

Quando se analisa a evolução do número de beneficiários de

pensões, principal prestação social, facilmente se percebe o

custo social deste envelhecimento demográfico. Em apenas

uma década (2001-2011) o número de pensionistas sofreu

um acréscimo de 18,55%, passando de 2 074 443 a 2 459

338 beneficiários. O mesmo tem vindo a acontecer com a

saúde, embora em menor escala.

Este cenário torna-se ainda mais dramático quando

considerados os valores das projeções demográficas para o

ano de 2050, que tornam possível constatar que o

envelhecimento populacional se vai manter e agravar,

prevendo-se atingir um total de 243 idosos para cada 100

jovens em 40 anos.

Considerando que o Estado Social tem como um dos seus

pilares de sustentação a população activa suportar a

dependente, facilmente se percebe que, com uma demografia

que desequilibra as transferências intergeracionais e

aumenta a despesa com a protecção social e a saúde, estamos

perante uma equação de difícil resolução.

Mas este não é o único problema que assombra o Estado

Social. A verdade é que outros factores há que tornam o

sistema actual ainda mais desequilibrado.

A actual conjuntura socio-económica tem favorecido o

crescimento gravoso do desemprego e a consequente

degradação do poder económico da população. Este

acréscimo da população em situação de grave carência

económica e em risco de exclusão social, que se traduz num

aumento do recurso a subsídios de desemprego e a outras

medidas de protecção social, como o rendimento social de

inserção, é um contributo desestabilizador decisivo em todo

este processo.

Analisando novamente apenas a evolução na primeira

década do século XXI é possível constatar que o número de

beneficiários do subsídio de desemprego cresceu 57,06% em

apenas 10 anos, passando de 190 463 a 299 147

opinião 59

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