pontifÍcia universidade catÓlica (puc-sp) faculdade de ... · cÁcia cristina franÇa rehem...

184
PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA (PUC-SP) FACULDADE DE EDUCAÇÃO PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO: CURRÍCULO DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E BACHARÉIS DOCENTES: PROCESSOS FORMATIVOS E A PRÁTICA PEDAGÓGICA São Paulo 2018 CÁCIA CRISTINA FRANÇA REHEM DOUTORADO EM EDUCAÇÃO

Upload: others

Post on 10-Aug-2020

1 views

Category:

Documents


0 download

TRANSCRIPT

Page 1: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA (PUC-SP) FACULDADE DE ... · CÁCIA CRISTINA FRANÇA REHEM DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E BACHARÉIS DOCENTES: PROCESSOS FORMATIVOS E A PRÁTICA PEDAGÓGICA

PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA (PUC-SP) FACULDADE DE EDUCAÇÃO

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO: CURRÍCULO

DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E BACHARÉIS DOCENTES: PROCESSOS FORMATIVOS E A PRÁTICA PEDAGÓGICA

São Paulo 2018

CÁCIA CRISTINA FRANÇA REHEM

DOUTORADO EM EDUCAÇÃO

Page 2: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA (PUC-SP) FACULDADE DE ... · CÁCIA CRISTINA FRANÇA REHEM DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E BACHARÉIS DOCENTES: PROCESSOS FORMATIVOS E A PRÁTICA PEDAGÓGICA

CÁCIA CRISTINA FRANÇA REHEM

DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E BACHARÉIS DOCENTES: PROCESSOS FORMATIVOS E A PRÁTICA PEDAGÓGICA

Tese submetida ao Programa de Pós-Graduação em Educação: currículo como pré-requisito para obtenção do título de Doutora em Educação pela PUC-SP

Orientador – Prof. Dr. Marcos Tarciso Masetto

São Paulo 2018

Page 3: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA (PUC-SP) FACULDADE DE ... · CÁCIA CRISTINA FRANÇA REHEM DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E BACHARÉIS DOCENTES: PROCESSOS FORMATIVOS E A PRÁTICA PEDAGÓGICA

Ficha catalográfica

Page 4: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA (PUC-SP) FACULDADE DE ... · CÁCIA CRISTINA FRANÇA REHEM DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E BACHARÉIS DOCENTES: PROCESSOS FORMATIVOS E A PRÁTICA PEDAGÓGICA

Banca Examinadora

___________________________________________________________________

Professor Dr. Marcos T. Masetto (Orientador)

__________________________________________________________________

Professora Dra. Maria Cecilia Damas Gaeta (sem/vínculo)

__________________________________________________________________

Professora Dra. Cristina Zurowsky Tavares (UNASP-SP)

____________________________________________________________ Professora Dra. Marina Graziella Feldmann (PUC-SP)

_____________________________________________________________ Professora Dra. Nadia Dumara Ruiz Silveira (PUC-SP)

Page 5: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA (PUC-SP) FACULDADE DE ... · CÁCIA CRISTINA FRANÇA REHEM DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E BACHARÉIS DOCENTES: PROCESSOS FORMATIVOS E A PRÁTICA PEDAGÓGICA

Dedicatória Especial Uma trajetória de vida

Esse trabalho é fruto de uma caminhada que não teve o seu início em 2015, mas

quando pude me entender por gente e observar o dia a dia da minha mãe D. Altair. Em

tempos que não se falava em feminismo e que lugar de mulher era em casa, em que

estudar era privilégio de alguns, inclusive para ela, que só estudou até a 5ª série e

casou aos 16 anos, ela era de um feminismo que orgulharia a mais radical delas.

Nos orientou a buscar caminhos de vida que permitissem a liberdade e o direito

de definir a nossa trajetória. Inteligente que só ela! Prendada, como diziam antigamente,

era capaz de ser cabelereira, cozinheira, costureira, bordadeira, empresária e tudo o

mais que se fizesse necessário para garantir às suas filhas o estudo e uma vida com

dignidade.

Desde muito pequena eu já compreendia a importância que ela tinha nas nossas

vidas. Meu pai, delegado de polícia, a maior parte do tempo estava trabalhando em

cidades distantes de onde morávamos. Mesmo auxiliando, era na minha mãe que

encontrávamos apoio.

Quando achou que a cidade no interior da Bahia não iria oferecer oportunidades

para ampliar os estudos e fazer faculdade, nos levou para a capital para que

pudéssemos continuar estudando. Para ela, estudar e ter uma profissão era a coisa

mais importante que poderíamos fazer e não desistiu enquanto suas três filhas não

fizessem a tão sonhada faculdade, “na de graça”, como dizia ela, pois sabia o quanto

difícil seria nos manter em faculdades particulares.

Fruto de uma família de quatro mulheres (minha mãe e suas três filhas, sendo eu

a mais nova) me permiti acompanhá-las e me mirar em seus exemplos. Minhas irmãs

são tudo aquilo que minha mãe desejou – mulheres livres, independentes e que se

permitiram definir os próprios caminhos. Seguiram o exemplo de minha mãe e

continuaram se desafiando e se transformando a cada dia.

Portanto, não iniciei esse doutorado em 2015, mas em cada momento que,

guiada pela minha mãe, não desisti, acreditando quando ela me dizia - “Cainha, você é

capaz, não desista!”. Isto, porque estaria num outro estado, distante de minha casa, de

meus filhos. Ela insistia, “isso não é empecilho, vá que eu estou aqui, vá que te ajudarei

como sempre”.

Esse trabalho vai para a minha mãe, mulher guerreira, meu amor, meu exemplo,

minha vida, que ela saiba que tudo o que sou e aquilo que consigo fazer de melhor é

sempre a partir dos seus exemplos e do seu amor a mim dedicado.

Page 6: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA (PUC-SP) FACULDADE DE ... · CÁCIA CRISTINA FRANÇA REHEM DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E BACHARÉIS DOCENTES: PROCESSOS FORMATIVOS E A PRÁTICA PEDAGÓGICA

Aluna Bolsista do CNPq

Agradeço ao Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) pelo apoio financeiro durante os quatro anos do meu processo de doutoramento. Agradeço a Fundação São Paulo (FUNDASP) pelo apoio financeiro durante os quatro anos do processo de doutoramento.

Page 7: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA (PUC-SP) FACULDADE DE ... · CÁCIA CRISTINA FRANÇA REHEM DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E BACHARÉIS DOCENTES: PROCESSOS FORMATIVOS E A PRÁTICA PEDAGÓGICA

Agradecimentos aos familiares e amigos Ao meu marido, Juvenal, meu grande parceiro de vida. Como é bom

encontros na vida que somam, agregam e nos ajudam a caminhar... Não poderia ter

melhor companheiro, marido, pai dos meus filhos, colega de profissão e, de quebra,

o amor da minha vida. Obrigada por ter tomado conta dos nossos filhos e ter me

ajudado a realizar essas tarefas com companheirismo e amor.

Aos meus filhos, Felipe e Vítor, obrigada pela paciência e por me oferecerem

amor e dedicação nesse momento tão difícil, mas, ao mesmo tempo, tão importante

para mim. Estou aqui e sempre estarei; contem sempre comigo.

Às minhas irmãs (Nancy e Fátima), parceiras de vida e de caminhada,

obrigada por toda a ajuda. Sei a importância de vocês para conseguir realizar mais

esse sonho.

Aos meus cunhados, Marcelo e Guio, meus sobrinhos, Henrique, Carol,

Marcelle e Rafaella, vocês são meu amor e orgulho. Obrigada por estarem sempre

junto em todos os momentos da minha vida.

À minha linda e amada Tia Vera e meu irmão Paulinho, o abrigo maior que

vocês me deram foi o amor e o sentimento de pertencimento que me ofereceram;

sem vocês não teria conseguido... Não tenho palavras para agradecer, para sempre

estarei com vocês.

Aos meus queridos de São Paulo - Cacalo, Elen, Sofia, Cida, Tio Tonho,

Fúlvia, Tia Euzari, Anderson, Cris, André, Lilí, Adriana, como foi bom conviver com

vocês, obrigada por tudo.

À minha amiga Liu, obrigada pelos estudos, pelos momentos de trabalho

juntas, pelas viagens, apresentação de trabalho; de colegas nos transformamos em

amigas e, espero, para toda a vida!

À Vanessa e Rogéria, colegas de turma e de trajetória, por ter chegado e me

deparado com vocês, isto me deu alento para continuar. Obrigada pela parceria.

À minha ex-aluna e agora grande amiga Ailana, obrigada pelos papos, pelos

cafés, pelas leituras; quero que saiba que sua amizade, em uma hora tão especial e

importante, foi de grande valia.

À minha colega Cássia Brandão, pela disponibilidade em me ouvir e oferecer

uma parceria que já dura mais de 20 anos.

À Jocélia, obrigada por mais uma vez por ter tomado conta da minha casa e

dos meus maiores amores.

Page 8: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA (PUC-SP) FACULDADE DE ... · CÁCIA CRISTINA FRANÇA REHEM DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E BACHARÉIS DOCENTES: PROCESSOS FORMATIVOS E A PRÁTICA PEDAGÓGICA

Agradecimentos Especiais Gostaria de agradecer ao meu orientador Professor Dr. Marcos T. Masetto,

que conheci pelos livros e nos congressos. A minha admiração já era enorme, mas

hoje não pode ser mensurada. Tudo que imaginei que o Sr. seria, não chega nem

perto do que realmente és. O Sr. se configura como aquilo que denominamos de

verdadeiro mestre! É generoso, companheiro, amigo, segura a nossa mão e faz a

trajetória ao nosso lado. Não existe um só momento de desamparo e solidão.

Obrigada do fundo do meu coração pela sua generosidade comigo e por ter me

dado o privilégio de ser sua orientanda. Toda a aprendizagem que levo não está nos

conteúdos aprendidos, mas nas atitudes de como um professor deva conduzir o seu

trabalho. Que Deus o abençoe sempre!

À universidade Estadual do Sudoeste da Bahia (UESB), por ter me permitido

realizar esse trabalho, pela ajuda financeira e pela liberação total. Na qualificação

adquirida, a certeza de dedicação e empenho para contribuir na formação de futuros

professores e de esforço para honrar cada vez mais as instituições públicas.

Aos professores, sujeitos dessa pesquisa, meus colegas de trabalho, que se

despiram de vaidades e concordaram na participação total e irrestrita, me permitindo

o máximo de informações através das respostas dadas nas entrevistas e da

observação das suas aulas. Meu muito obrigada e tenham certeza que as

ponderações são fruto exclusivamente do ouvido e visto, não me permitindo

preconceitos e nem sentenças ao que disseram ou fizeram.

Page 9: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA (PUC-SP) FACULDADE DE ... · CÁCIA CRISTINA FRANÇA REHEM DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E BACHARÉIS DOCENTES: PROCESSOS FORMATIVOS E A PRÁTICA PEDAGÓGICA

Agradecimentos

Aos professores do programa, representados aqui pelas professoras Marina

Graziela Feldman, Ana Maria Saul, Branca Jurema Ponce e pelo professor Chizzotti;

agradeço as contribuições na minha formação.

À funcionária do programa de Pós-graduação em Educação – Currículo,

Maria Aparecida – carinhosamente chamada de Cida, pelas palavras de incentivo,

pela disponibilidade em ajudar, pela paciência e carinho com que trata a todos.

Aos professores que participaram da minha banca de qualificação e defesa da

tese, pela inestimável colaboração.

À turma de 2015.1 – uma turma que comemorou os 40 anos do Programa de

Pós-Graduação em Educação- Currículo da PUC; uma turma rica e diversa que me

proporcionou inesquecíveis aprendizagens.

Aos colegas de aula e aos amigos do grupo de pesquisa FORPEC, por

oportunizarem ricos momentos de aprendizagens.

Page 10: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA (PUC-SP) FACULDADE DE ... · CÁCIA CRISTINA FRANÇA REHEM DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E BACHARÉIS DOCENTES: PROCESSOS FORMATIVOS E A PRÁTICA PEDAGÓGICA

RESUMO

O presente estudo teve como objeto a formação do bacharel docente e as implicações em suas práticas pedagógicas, bem como, as necessidades formativas que apresentam. Procurou-se investigar a formação e a prática pedagógica de bacharéis/docentes e discuti-las frente as atuais propostas de formação para a docência na educação superior. Para tanto o referencial teórico que serviu de fundamento desta tese está pautada nos estudos de autores − base da pesquisa em relação à categoria formação: Marcelo Garcia (1999, 2009); Masetto (1998, 2012a, b); Zabalza (2014); Nóvoa (1995); Freire (1998); Imbernón (2011). Em relação à profissionalização: Imbernón (2011), Contreras (2012), Gimeno Sacristán (1995); Mas Torelló (2011), Flores (2014), Day (2001). Com referência à prática pedagógica: Masetto (1998, 2012, 2014), Mas Torelló e Tejada Fernández (2013), Zabalza (2003, 2014), Perrenoud (1993), Anastasiou (2002), Altet (2000). Os sujeitos da pesquisa foram professores que livremente aceitaram participar da pesquisa, possuindo como único requisito que fossem bacharéis. A investigação baseou-se na abordagem qualitativa através do estudo de caso. Os dados foram coletados através de entrevistas semiestruturadas realizadas com os docentes, de documentos sobre a formação de professores para o ensino superior (PNPGs, LDB.9.309/96, Pareceres 977/65 e 77/97.644 do Conselho Nacional de Educação, atual Conselho Federal de Educação e o Decreto 97.644 de 23 de julho de 1987) e da observação das aulas. A análise dos dados desvelou um cenário com poucas alterações no perfil desses profissionais apesar das mudanças sociais, políticas, econômicas, culturais, que exigem uma nova configuração laboral para o docente desse nível de ensino, a maioria não possui formação especifica para a docência, tampouco a universidade, lócus da pesquisa, oferece formação inicial ou continuada aos seus docentes, levando a esses professores a exercerem a docência em uma perspectiva de isolamento, solidão e invisibilidade. A prática pedagógica por sua vez está fundamentada em uma lógica racionalista, tradicional, baseada em modelos vivenciados como alunos, na tentativa e no erro, com um repertório limitado sobre a docência em decorrência da não formação, ao mesmo tempo que apontam uma inquietação sobre a prática exercida e apontem necessidades formativas que o auxiliariam na condução de uma docência mais qualificada. Enfim, consideramos a formação como necessária e possível, ao passo que nos afastamos de uma formação distante da universidade e que não preconize a prática pedagógica dos professores envolvidos. Visualizamos ainda uma formação de caráter mais relacional, respeitando-se a cultura e o contexto comunitário. Para tanto, há que pensar em um espaço predominantemente articulado e interativo entre docentes, que estimule o professor a explorar e questionar seus próprios saberes, competências e práticas, aprender por meio do questionamento e compartilhamento das próprias convicções. Assim, permite-se estabelecer um fluxo de comunicação necessário, mediante análises do contexto educacional, tendo em vista compreender, interpretar e poder intervir em questões vitais para a melhoria da qualidade do ensino e do exercício docente.

Palavras-chave: Docência universitária, formação docente, necessidades formativas, práticas pedagógicas.

Page 11: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA (PUC-SP) FACULDADE DE ... · CÁCIA CRISTINA FRANÇA REHEM DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E BACHARÉIS DOCENTES: PROCESSOS FORMATIVOS E A PRÁTICA PEDAGÓGICA

ABSTRACT

The goal of this study was to analyze the teaching formation of bachelors and their implications in pedagogical practices, as well as the training needs requested by them. We attempted to investigate the training and pedagogical practices of bachelors/professors and discuss them in relation to the current proposals for training professors in higher education. Therefore, the theoretical framework of this work was based on the studies by paramount authors about formation: Marcelo Garcia (1999, 2009); Masetto (1998, 2012a, b); Zabalza (2014); Nóvoa (1995); Freire (1998); Imbernón (2011). As for professionalization, we followed: Imbernón (2011), Contreras (2012), Gimeno Sacristán (1995); Mas Torelló (2011), Flores (2014), Day (2001), while the pedagogic practice was based on: Masetto (1998, 2012, 2014), Mas Torelló and Tejada Fernández (2013), Zabalza (2003, 2014), Perrenoud (1993), Anastasiou (2002), Altet (2000). The research was carried out in professors that accepted voluntarily to take part in this study as long as they were bachelors. The investigation relied on qualitative approach based on case studies. The data were collected from semi-structured interviews with each professor, documents about the formation of professors in higher education (PNPGs, LDB.9.309/96, decrees 977/65 and 77/97.644 from the National Council of Education, currently Federal Council of Education, and the decree 97.644 from July 23rd 1987) and from observation of teaching classes. The data analysis revealed a scenario with few changes in the profile of these professionals in spite of the social, political, economic and cultural changes that require a new organization of teaching practices in higher education. Most of them lack specific training for teaching, while the university, the focus of this research, also lacks any initial or continuous training to professors, leading them to practice their teaching in isolation, solitude and invisibility. On the other hand, the pedagogical practice is based on a rationalistic and traditional viewpoint, based on models they have experienced as students themselves, directed by trial and error, with limited tools for teaching as a result of their non-formation. At the same time, these professors point out concerns about the practice and highlight the importance of training to help them moving towards a more qualified teaching. Thus, we consider that training is both required and possible, while we move away from a formation that is far from the university and does not advocate the pedagogical practice of the involved professors. We also witnessed the need to a formation based on relationship perspectives that are able to respecting cultural and community contexts. To accomplish these aims, it is necessary to think of a predominantly articulated and interactive space for professors, in order to stimulate them to explore and question their own knowledge, skills and practices, as well as to learn from questioning and sharing their own convictions. By this way, it should be possible to establish a necessary flow of communication, based on analyses of the educational context, to understand, interpret and interfere in essential issues for the improvement of the quality of teaching and their practices. Keywords: University teaching, teaching formation, formation needs, pedagogic practices.

Page 12: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA (PUC-SP) FACULDADE DE ... · CÁCIA CRISTINA FRANÇA REHEM DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E BACHARÉIS DOCENTES: PROCESSOS FORMATIVOS E A PRÁTICA PEDAGÓGICA

LISTA DE QUADROS

Quadro 1 − Adaptação dos elementos que compõem a competência pedagógica .. 90

Quadro 2 − As 6 competências da função docente e suas 34 unidades de

competências ............................................................................................................ 91

Page 13: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA (PUC-SP) FACULDADE DE ... · CÁCIA CRISTINA FRANÇA REHEM DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E BACHARÉIS DOCENTES: PROCESSOS FORMATIVOS E A PRÁTICA PEDAGÓGICA

SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO ................................................................................................................... 14

1.1 PROBLEMA: QUESTÕES E OBJETIVOS ...................................................................... 18

1.2 OBJETIVO GERAL .......................................................................................................... 19

1.2.1 Objetivos específicos ................................................................................................. 19

1.3 JUSTIFICATIVA ............................................................................................................... 20

1.3.1 Relevância científica dos estudos sobre a docência universitária de bacharéis/docentes ............................................................................................................. 20

1.3.2 A universidade e o compromisso com a formação dos docentes universitários: relevância social e institucional ......................................................................................... 22

2 DESENHO METODOLÓGICO: AS LINHAS TRAÇADAS PARA PERCORRER O CAMINHO .............................................................................................................................. 25

2.1 DELIMITAÇÃO DA PESQUISA: CENÁRIO E SUJEITOS ............................................... 25

2.1.1 Cenário ........................................................................................................................ 25

2.1.2 Sujeitos ........................................................................................................................ 25

2.2 O CAMINHO METODOLÓGICO: PESQUISA QUALITATIVA E ESTUDO DE CASO .... 25

2.2.1 Perspectivas teóricas: pesquisa qualitativa e estudo de caso .............................. 26

2.2.2 Procedimentos e instrumentos de coleta de dados ................................................ 28

2.2.2.1 O estudo bibliográfico ................................................................................................ 28

2.2.2.2 Análise documental ................................................................................................... 29

2.2.3 Trabalho de campo ..................................................................................................... 30

2.2.3.1 Entrevistas ................................................................................................................. 30

2.2.3.2 Observação ............................................................................................................... 31

2.2.4 Categorias de análise e interpretação dos dados ................................................... 32

3 MARCO CONCEITUAL ...................................................................................................... 34

3.1 FORMAÇÃO PARA A DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA: OS DESAFIOS IMPOSTOS

PELAS TRANSFORMAÇÕES DA CONTEMPORANEIDADE .............................................. 34

3.1.1 Formação: processo de desenvolvimento e da estruturação da pessoa e do profissional .......................................................................................................................... 36

3.1.2 Formação do docente da educação superior: reconstruindo o percurso através dos marcos legais ............................................................................................................... 41

3.1.3 Cenário e possibilidades de formação para o docente da educação superior .... 48

3.2 A PROFISSIONALIZAÇÃO DA DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA ....................................... 54

3.2.1 A docência universitária como profissão: a constituição de uma atividade profissional .......................................................................................................................... 55

3.2.2 A profissionalização da docência universitária: o tornar-se professor ................ 62

Page 14: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA (PUC-SP) FACULDADE DE ... · CÁCIA CRISTINA FRANÇA REHEM DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E BACHARÉIS DOCENTES: PROCESSOS FORMATIVOS E A PRÁTICA PEDAGÓGICA

3.3 ENTRE O SER E O FAZER: AS ESPECIFICIDADES DA PRÁTICA PEDAGÓGICA DO

DOCENTE DA EDUCAÇÃO SUPERIOR .............................................................................. 66

3.3.1 A prática pedagógica: o ensino, a aprendizagem e a formação do aluno como atividades do exercício da docência ................................................................................. 67

3.3.2 A prática e a sua contribuição na produção de conhecimentos: o professor como prático reflexivo ................................................................................................................... 75

3.3.3 Prática pedagógica: o que sabem ou que deveriam saber os professores para o seu efetivo exercício ........................................................................................................... 81

4 A PESQUISA DO CAMPO EMPÍRICO: ANÁLISE DOS DADOS ..................................... 95

4.1 O PERFIL DOS BACHARÉIS/ DOCENTES: OS DADOS REVELADOS NA PESQUISA95

4.1.1 O perfil do docente/bacharel ..................................................................................... 96

4.1.2 O processo formativo do bacharel/docente para o exercício da docência − o tornar-se professor ............................................................................................................ 107

4.2 O CAMPO EMPÍRICO: OBSERVAÇÕES DAS PRÁTICAS PEDAGÓGICAS (AULAS) 117

4.2.1 As aulas: observação, descrição e análise ............................................................ 118

4.2.2 As práticas pedagógicas dos docentes/bacharéis: o modelo pedagógico tradicional ........................................................................................................................... 128

4.2.3 Competências necessárias para o exercício da docência no ensino superior: o que dizem os professores ................................................................................................ 136

5 FORMAÇÃO ESPECÍFICA PARA O EXERCÍCIO DA DOCÊNCIA: NECESSÁRIA E POSSÍVEL ........................................................................................................................... 142

5.1 A FORMAÇÃO NECESSÁRIA: OS ELEMENTOS INDICADORES .............................. 143

5.2 A FORMAÇÃO POSSÍVEL ............................................................................................ 146

5.2.1 Modelo Colaborativo: o diálogo profissional ......................................................... 149

REFERÊNCIAS ................................................................................................................... 158

APÊNDICES ........................................................................................................................ 168

ANEXOS .............................................................................................................................. 175

Page 15: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA (PUC-SP) FACULDADE DE ... · CÁCIA CRISTINA FRANÇA REHEM DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E BACHARÉIS DOCENTES: PROCESSOS FORMATIVOS E A PRÁTICA PEDAGÓGICA

14

1 INTRODUÇÃO

O presente trabalho intitulado “Docência universitária e bacharéis docentes: processos formativos e a prática pedagógica” foi desenvolvido no

programa de Doutorado: em Currículo/Educação da Pontifícia Universidade de São

Paulo-PUC/SP, sob o enfoque da formação do bacharel/docente, as implicações em

suas práticas pedagógicas, bem como as necessidades formativas que apresentam.

As reflexões sobre docência universitária são oriundas da minha itinerância

profissional − licenciada em Pedagogia e atuação como docente na educação

superior desde 1994. Mesmo sendo licenciada, não me sentia preparada para

assumir a sala de aula na educação superior, pois não encontrei, na formação em

Pedagogia, elementos que me auxiliassem a constituir o processo de ensino nesse

nível. Entendia que a docência universitária, atrelada ao tripé de ensino, pesquisa e

extensão requeria uma maior compreensão e percepções conceituais mais amplas,

o que me levou a refletir sobre a falta de espaços formativos para esse fim.

Desde quando ingressei como docente na educação superior, percebi a forma

solitária com que lidei com a docência. Este fato me chamou a atenção; então,

nesse percurso, procurei uma formação para me constituir naquilo que denomino de

professor − o profissional do ensino. Entretanto, em nenhum momento dessa minha

trajetória, embora cumprisse os rituais previstos na Lei, encontrei espaços formativos

que me orientassem para exercer tal função.

Passei então a questionar se a docência universitária era uma profissão,

como esses professores construíam a sua prática, de que forma se apropriavam dos

elementos necessários para exercer a profissão, em função de que muitos, assim

como eu, entraram na universidade para assumir a sala de aula, apenas com a

graduação, que não contém elementos formativos para o exercício da docência no

ensino superior.

A preparação para a docência na educação superior está prevista na Lei de

Diretrizes e Bases da Educação nacional (LDB) nº 9.394/96 (BRASIL, 1996), a ser

realizada nos cursos de Pós-graduação: mestrado e doutorado. Contudo, estudos

realizados sobre o tema destacam que nem sempre esses cursos cumprem com

esse objetivo – preparam, principalmente, para a pesquisa, de forma bastante

evidenciada.

Page 16: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA (PUC-SP) FACULDADE DE ... · CÁCIA CRISTINA FRANÇA REHEM DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E BACHARÉIS DOCENTES: PROCESSOS FORMATIVOS E A PRÁTICA PEDAGÓGICA

15

Na itinerância docente e na construção diária do ser professor, precisava de

novas possibilidades que me auxiliassem a refletir e ir além na minha prática

pedagógica, haja vista que os elementos norteadores para o exercício da profissão

em nível superior, eram frutos da vivência como aluna e da minha experiência. Sob

esse aspecto, não davam conta da complexidade da prática que se fazia premente.

A “preparação” para a docência deveria estar presente nos cursos de Pós-

graduação. Logo, comecei a itinerância cursando, inicialmente, a especialização; em

seguida, o mestrado e, posso afirmar, que em nenhum dos dois eu encontrei

elementos que tratassem da docência. Em ambos, a pesquisa era primordial − no

primeiro caso, com a produção da monografia e no segundo a dissertação.

Essa inquietação tem norteado as minhas reflexões sobre essa temática.

Durante a realização do Mestrado, já com interesse na docência universitária,

estudei: A concepção e a prática de avaliação da aprendizagem dos professores da

educação superior, no curso de Pedagogia de uma Universidade Estadual do Estado

da Bahia. Os sujeitos da pesquisa foram os professores e alunos; mesmo não sendo

de forma intencional, dois grupos de professores apareceram na análise: um

composto por professores licenciados e outro por professores não licenciados − os

bacharéis.

A primeira diferença entre esses grupos foi o interesse pelo estudo sobre

avaliação. Os licenciados tinham lido algo a respeito, compreendiam a importância

dos elementos teóricos para ressignificar a sua prática e se preocupavam com a

condução do seu trabalho em sala de aula. Quanto aos bacharéis, estes não tinham

lido, nem apontaram interesse sobre o tema em questão. Uma segunda diferença

era a relação com a docência enquanto profissão − os licenciados se intitulavam

professores, assumiam essa profissão, mesmo não tendo a formação específica

para a atuação no ensino superior; já os bacharéis referiram, primeiramente, a sua

profissão de formação inicial; alguns acrescentaram serem também professores e

acreditavam que o fato de ter o conhecimento sobre a área específica os capacitava

para o ensino.

Já nesta pesquisa identifiquei que esses professores careciam de formação

para o exercício da docência; estavam desprovidos de algum outro referencial que

não os vivenciados como alunos. Assim, foi possível perceber que a prática

avaliativa acontecia destituída de maiores reflexões ou de significados − havia a

repetição e perpetuação de práticas vivenciadas como aluno. Respondiam que “não

Page 17: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA (PUC-SP) FACULDADE DE ... · CÁCIA CRISTINA FRANÇA REHEM DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E BACHARÉIS DOCENTES: PROCESSOS FORMATIVOS E A PRÁTICA PEDAGÓGICA

16

tenho tempo para leituras sobre o tema, nunca fiz por não ser da minha área de

interesse e não fazer parte do meu curso de formação.” (REHEM, 2008, p. 126).

A vasta experiência nesse nível de ensino, conquistada durante 23 anos de

docência, atuando como professora de Didática e Avaliação da Aprendizagem em

cursos de licenciatura como: Matemática, Biologia, Pedagogia, Letras e do

Bacharelado de Enfermagem e atuando como coordenadora de colegiado do curso

de Pedagogia, coordenadora geral do Programa de Formação de Professores em

Serviço (PARFOR), me possibilitaram reflexões sobre a docência como profissão e a

compreensão de que é necessária a aquisição de competências específicas para o

seu exercício

Nessa jornada participei de formações continuadas em faculdades

particulares e em institutos federais da região sudoeste da Bahia, que eram

basicamente para professores bacharéis. Percebi, então, o quão distantes esses

profissionais se encontram da docência e da formação que esta exige.

As temáticas propostas eram relacionadas à prática pedagógica; dessa forma,

o ensinar e o aprender eram temas recorrentes, as discussões não eram fáceis, pois

havia conceitos pré-concebidos sobre ensino, aprendizagem, avaliação, relação

professor/aluno. Os questionamentos eram sempre permeados de justificativas que

responsabilizavam os alunos pelos fracassos ou pelas dificuldades inerentes à sua

prática.

Essas formações continuadas também foram determinantes para o

delineamento dessa pesquisa, porque observei que alguns, dentre os participantes,

buscavam através da pedagogia receituário para que pudessem resolver os

problemas vivenciados na sala de aula, deixando claro qual o papel do pedagogo

nesse movimento – o de auxiliar o professor, oferecendo soluções prontas para

resolver as situações cotidianas.

As reflexões sobre o cotidiano da ação docente revelam que os docentes

necessitam de conhecimentos sobre a ação pedagógica que sustentem suas

práticas e, por não possuírem uma formação para o exercício da docência, muitas

vezes aliada ao fato de as instituições onde atuam não possuírem um projeto de

Desenvolvimento Profissional Docente (DPD), acabam por recorrer à tradição das

experiências vivenciadas como alunos, sem que tenham sido problematizadas,

refletidas e ressignificadas. Logo, continuam repetindo essas práticas que, além de

serem limitadas, não engendram um processo permanente de reflexão e

Page 18: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA (PUC-SP) FACULDADE DE ... · CÁCIA CRISTINA FRANÇA REHEM DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E BACHARÉIS DOCENTES: PROCESSOS FORMATIVOS E A PRÁTICA PEDAGÓGICA

17

ressignificações pessoais, profissionais, institucionais e organizacionais; portanto,

sem o rigor epistemológico necessário.

Durante dois anos − 2008 a 2010 −, atuei como assessora acadêmica na

Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia (UESB) - Campus de Jequié. Nesse

período, vários foram os conflitos que surgiram entre docentes e alunos,

principalmente, nos cursos de bacharelado, pertinentes às relações na sala de aula.

Muitos alunos se queixavam do que eles denominavam de “falta de didática”,

“sabe muito, mas não sabe transmitir”, “não consegue se relacionar bem com os

alunos, não nos ouve”, “está professor, não é professor”. Para os alunos faltava um

elemento na atuação daquele professor – competência para o exercício da docência.

Esses discursos são direcionados mais especificamente para a ação do

professor e os conhecimentos necessários sobre como deveria ser sua atuação em

sala de aula. Nas falas, aparece em destaque a compreensão desses alunos quanto

à relação que os professores possuem com a docência e, mais especificamente,

deixa claro as lacunas existentes na preparação desses docentes para exercerem a

docência no ensino superior.

Partindo desse cenário, proponho-me a compreender como esses

professores vêm construindo a sua profissionalização para o exercício qualificado da

sua profissionalidade. O fato é que a falta de um espaço que me oportunizasse

compreender e construir a docência universitária, sabendo lidar com a sua

complexidade, sempre foi um empecilho para a transformação da minha prática

pedagógica. A pós-graduação garante o título e a formação para a pesquisa, mas,

sabemos que essa formação não prepara para a docência.

Desempenho então meu papel em duplicidade − sou professora e, ao mesmo

tempo, aprendiz da minha profissão. Pesquisar os meandros que envolvem

formação docente é importante, pois me possibilitará dar sentido à minha itinerância

profissional, auxiliando na reconstrução e transformação da minha própria prática.

Em razão de estar realizando a pesquisa e ser também uma docente, bem

como ter vivenciado os conflitos e a complexidade da docência, a exemplo da

solidão com que vamos construindo as nossas ações, a realização dessa pesquisa,

oportunizará responder aos meus questionamentos, propiciando a compreensão da

docência universitária juntamente com os meus pares.

Page 19: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA (PUC-SP) FACULDADE DE ... · CÁCIA CRISTINA FRANÇA REHEM DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E BACHARÉIS DOCENTES: PROCESSOS FORMATIVOS E A PRÁTICA PEDAGÓGICA

18

Dessa forma, assumo uma inquietação com relação aos docentes, nesse

nível de ensino, e, mais especificamente pelos bacharéis/docentes. O fato de

conviver com alguns deles no ambiente de trabalho − por meio de uma escuta

sensível e interessada, ouvir seus questionamentos sobre suas atuações como

professores −, em alguns casos, atribuindo a essa atividade um espaço menor na

sua rotina e, em outros, preocupação com a maneira como conduzem a sua ação,

me levaram a querer investigar a docência exercida por esses profissionais.

1.1 PROBLEMA: QUESTÕES E OBJETIVOS

Nas últimas décadas, a docência universitária vem assumindo um

protagonismo nas pesquisas relacionadas à profissão docente, sendo que o

questionamento sobre a necessidade de formação específica para o ensino emerge

de forma intensa. Para os bacharéis, recrutados nas suas áreas de formação e com

mestrados e doutorados limitados aos estudos dessas áreas, a docência geralmente

acontece como mais uma atividade desenvolvida durante a sua carreira. São poucos

os que a assumem como uma profissão e insistem nas suas formações iniciais como

elemento principal no desenvolvimento profissional durante o seu percurso

acadêmico. Observamos, em alguns casos, que esses profissionais oferecem

resistências no que diz respeito a assumir a docência como profissão; buscam a

carreira acadêmica no intuito de permanecerem no campo da pesquisa, tratando a

docência como uma ação menor e que exige menos qualificação.

A prática desenvolvida nesse nível de ensino tem sido construída, apoiada no

que Garcia (1999) denomina de “orientação acadêmica”, presa a uma abordagem

enciclopédica, que enfatiza o conteúdo como o conhecimento mais importante e

essencial dos saberes do professor, reduz a docência universitária ao simples ato de

transmissão de conhecimentos, desconsiderando a necessidade da aquisição de

outros elementos relacionados à didática (o como ensinar), como necessários e

essenciais para o exercício da docência.

Na pesquisa em destaque, o levantamento da questão e a busca por

respondê-la foi norteadora desta tese:

Que caminhos formativos, trilhados pelos bacharéis/docentes, repercutem em

sua ação como docente − em suas práticas pedagógicas − e quais

necessidades de formação apresentam?

Page 20: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA (PUC-SP) FACULDADE DE ... · CÁCIA CRISTINA FRANÇA REHEM DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E BACHARÉIS DOCENTES: PROCESSOS FORMATIVOS E A PRÁTICA PEDAGÓGICA

19

1.2 OBJETIVO GERAL

Frente a tal questionamento, e mediante investigação a ser realizada,

propomos os seguintes objetivos geral e específicos:

Investigar a formação e a prática pedagógica dos bacharéis/docentes e

discuti-las frente as atuais propostas de formação do docente da educação

superior.

1.2.1 Objetivos específicos

Compreender o processo de formação dos bacharéis/docentes e as

implicações na sua prática pedagógica.

Interpretar as concepções de docência que emergem dos discursos e das

práticas pedagógicas dos bacharéis/docentes;

Identificar as competências presentes nas práticas pedagógicas dos

bacharéis/docentes

Analisar suas práticas pedagógicas e as necessidades delas decorrentes;

Page 21: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA (PUC-SP) FACULDADE DE ... · CÁCIA CRISTINA FRANÇA REHEM DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E BACHARÉIS DOCENTES: PROCESSOS FORMATIVOS E A PRÁTICA PEDAGÓGICA

20

1.3 JUSTIFICATIVA

1.3.1 Relevância científica dos estudos sobre a docência universitária de bacharéis/docentes

Temos visto o surgimento de um movimento que busca refletir e consolidar a

docência como profissão. Nessa perspectiva, destacam-se aqueles (VEIGA, 2008;

CUNHA, 2005; ZABALZA, 2004; MASETTO, 2012, 2013; SOARES, 2010; GARCIA,

1999, TAVARES, 2003) que versam sobre serem necessárias à constituição de um

espaço de formação, a definição e a aquisição de um conjunto de competências que

definam a ação desses profissionais.

Quando analisamos os docentes que exercem a docência universitária,

encontramos dois tipos de professores: os licenciados e os bacharéis − os primeiros

possuem uma formação didática, ainda baseada no esquema 3 + 1, pois o núcleo de

disciplinas que possibilitam a discussão é diluído durante o período de formação e

sem mudanças significativas desde a década de 1940 até hoje; já o segundo traz

consigo a experiência profissional e o conhecimento da área específica. Não

obstante ocorram percursos formativos diferentes, nenhum dos dois tipos é

preparado para exercer a docência na educação superior.

Para esse nível de ensino, a preparação é exigida através da realização dos

cursos de pós-graduação/mestrado e doutorado. Dessa forma, quando ingressamos

no ensino superior, passamos a ter somente um tipo de professor; porque então

escolhemos, nesse trabalho, tratar da docência dos bacharéis/docentes? Como

citado anteriormente, ao assumir a Assessoria Acadêmica, os atendimentos

realizados com os alunos, na sua maioria, aconteciam sempre nos cursos de

bacharelado, onde conflitos se relacionavam à prática pedagógica, em sua maioria,

no que se referia aos professores bacharéis.

Embora estejamos tratando do bacharel/docente, sabemos que as

licenciaturas necessitam de modificações na sua estrutura curricular que avancem e

1 As Faculdades de Filosofia, Ciências e Letras (FFCL), encarregadas da formação de recursos humanos, para a Educação, originaram-se da Reforma Francisco Campos, em 1931; porém, só conseguiram estruturar-se em 1939, pelo Decreto-Lei nº 1.190. Este Decreto de início ao esquema “3 + 1”, estrutura que foi mantida até os anos 1960, e que previa para as FFCL uma sessão de “Didática”, destinada a habilitar os licenciados para lecionar no ensino secundário. Os alunos cursavam o que era denominado de “cursos ordinários” das seções fundamentais” para que lhes fosse conferido o título de Bacharel; e ao Bacharel que completasse “o Curso de Didática” era concedido o diploma de Licenciado no grupo de disciplinas que formavam o seu curso de bacharelado. (SCHEIBE, 1983, p. 30-31)

Page 22: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA (PUC-SP) FACULDADE DE ... · CÁCIA CRISTINA FRANÇA REHEM DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E BACHARÉIS DOCENTES: PROCESSOS FORMATIVOS E A PRÁTICA PEDAGÓGICA

21

proponham novas perspectivas para a formação de professores, e que o fato de

alguns docentes da educação superior terem cursado a licenciatura, no currículo

desses cursos não existem elementos formativos para a docência universitária.

Todavia, esses professores compreendem a necessidade de uma formação mais

específica para exercer a docência nesse nível de ensino, por possuírem elementos

na sua formação sobre a educação formal e sua importância. Este professor, o

licenciado, não é o foco dos nossos estudos; e existem bacharéis/docentes que, a

partir das crenças produzidas ao longo da sua experiência como aluno, conseguem

reproduzir o modelo de professor que, no ideário de muitos, é considerado “bom

professor”.

Cunha (2005) e Masetto (1998) avultam a importância da reflexão mais

rigorosa da formação do professor universitário, chamando a atenção para a história

de sua constituição, o recrutamento feito nas áreas de conhecimento a partir do

notório saber, que convalidou a ideia de que quem sabe fazer, sabe

automaticamente ensinar, e instituiu a crença de que o profissional da área

específica é quem tem condições de definir o currículo do seu curso.

Para Floden e Buchmann (1990, p.45 apud GARCIA, 1999, p. 23-24)

Ensinar, que é algo que qualquer um faz em qualquer momento, não é o mesmo que ser professor. Existem preocupações conceituais mais vastas que contribuem para configurar o professor: ser professor implica lidar com outras pessoas (professores) que trabalham em organizações (escolas) com outras pessoas (alunos) para conseguir que estas pessoas aprendam algo (se eduquem). (Grifos do autor)

As relações humanas são relações pedagógicas; estamos sempre a ensinar e

a aprender. No entanto, corroboramos com Garcia quando diz que o ato de ensinar

nos espaços escolares requer outras configurações e, ouso acrescentar, que nesse

aspecto não são todos que podem fazê-lo.

É necessária a compreensão sobre os conhecimentos pedagógicos presentes

na atividade didática desses docentes. Como descrito por Cunha (2005, p. 72), “[...]

esses conhecimentos se constituíram distantes do espaço universitário e só

tardiamente alcançaram certa legitimação científica”.

Nesse sentido, em Imbernón (2011, p. 30), encontramos a seguinte

argumentação: A profissão docente comporta um conhecimento pedagógico específico, um compromisso ético e moral e a necessidade de dividir a responsabilidade com outros agentes sociais, já que exerce

Page 23: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA (PUC-SP) FACULDADE DE ... · CÁCIA CRISTINA FRANÇA REHEM DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E BACHARÉIS DOCENTES: PROCESSOS FORMATIVOS E A PRÁTICA PEDAGÓGICA

22

influência sobre outros seres humanos e, portanto, não pode nem deve ser uma profissão meramente técnica de “especialistas infalíveis” que transmitem unicamente conhecimentos acadêmicos.

Partindo desses pressupostos, o intuito deste trabalho é colaborar com uma

política de formação continuada/permanente e em serviço, a partir de elementos

direcionados pelos próprios docentes; o que pensam, como se sentem e o que

precisam para construir uma prática docente que favoreça aquilo que é mais

importante no desenvolvimento do seu trabalho: uma formação mais adequada para

os alunos.

Na literatura, nos últimos tempos tem sido fácil encontrar estudos sobre a

atuação do docente da educação superior; contudo, poucos são os trabalhos que

indicam ou orientam na busca de solução aplicada para a prática pedagógica. Por

sua vez, a reflexão sobre a docência exercida por profissionais bacharéis, ainda

precisa ser mais aprofundada. Esperamos, então, que este trabalho possa trazer

contribuições na construção de políticas de formação para o docente da educação

superior.

1.3.2 A universidade e o compromisso com a formação dos docentes universitários: relevância social e institucional

As universidades recebem os seus docentes mediante concurso público,

recrutados em suas áreas de formação. Geralmente os editais definem o perfil desse

profissional, com indicações sobre a sua formação (graduação) e a exigência de

especialização, mestrado e/ou doutorado em especificidades inerentes à formação

inicial.

Ao serem contratados e começarem a exercer suas atividades, se deparam

com uma realidade desconhecida − o fato de terem convivido no ensino superior,

como alunos, não os habilita para assumirem esse mesmo espaço como um local de

trabalho. Escartin et al destacam que:

O estudante que deixa de ser aluno para iniciar-se na profissão de docente universitário deve assumir um novo papel que comporta uma mudança de percepção da figura do professor. De um papel cômodo e anônimo de estudante protegido pelo grupo de classe assume uma posição ativa frente a um grupo de alunos com idades próximas à sua, cujas aprendizagens dependem em parte da sua aptidão profissional. (ESCARTIN et al, 2008, p. 4 apud GAETA; MASETTO, 2013, p. 12)

Page 24: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA (PUC-SP) FACULDADE DE ... · CÁCIA CRISTINA FRANÇA REHEM DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E BACHARÉIS DOCENTES: PROCESSOS FORMATIVOS E A PRÁTICA PEDAGÓGICA

23

A propósito, tal fato fica patente na maioria das instituições de ensino

superior. Esses professores recebem as ementas das disciplinas que ficarão sob sua

responsabilidade e, de forma solitária, começam a organizá-las, sem haver tido em

suas formações acadêmicas a oportunidade de aprender a ser docente no ensino

superior, tendo somente uma noção de que o ofício de professor venha a se

constituir num importante acréscimo à parte profissional da sua formação.

No período em que exerci a função de coordenadora acadêmica, encontrei

em muitos professores iniciantes e em alguns, já com uma trajetória de anos de

docência na universidade, pedidos de ajuda para resolver questões inerentes à ação

docente. Para estes professores, as repetições de práticas vivenciadas como aluno

não estavam mais sendo suficientes para auxiliá-los no dia a dia na sala de aula.

Um ponto fundamental sobre o assunto é destacado por Jackson (1985 apud

GIMENO SACRISTÁN, 1999, p. 70), uma vez que “os professores são um tipo de

pessoas que falam pouco do seu ofício entre si e de como melhorar, que transmitem

pouco a sua experiência profissional”, dificultando a divulgação e a consolidação de

um saber especializado para a profissão. Torna-se, então, um trabalho individualista,

com uma categoria de trabalhadores que, em muitos casos, permanecem distantes e

sem interação alguma.

Temos encontrado na literatura esforços de algumas universidades no Brasil

e no mundo (GARCIA, 1999), buscando oportunizar, dentro dos seus espaços,

cursos de capacitação pedagógica para os seus docentes; no entanto, são eventos

esporádicos e, em alguns casos, esquecidos logo que os membros daquela gestão

são substituídos. Notamos que em muitas universidades, inclusive as mais

avançadas, a formação de professores não representa uma tradição, principalmente

se compararmos com iniciativas formativas para a educação básica.

A proposta deste trabalho de oportunizar aos docentes informações

relevantes sobre o seu ofício, indicando um processo formativo em consonância com

as suas necessidades, contribuirá para que a universidade estabeleça políticas de

formação de professores voltadas para a construção de sua profissionalização.

Nesse sentido direcionamos nosso enfoque para investigar sobre a formação

e a prática pedagógica de bacharéis/docentes e discuti-las frente às atuais

propostas de formação para a docência na educação superior.

Page 25: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA (PUC-SP) FACULDADE DE ... · CÁCIA CRISTINA FRANÇA REHEM DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E BACHARÉIS DOCENTES: PROCESSOS FORMATIVOS E A PRÁTICA PEDAGÓGICA

24

Destarte, estruturamos os capítulos tendo em vista as necessárias

articulações sobre o tema, seu desenvolvimento e compreensão.

O primeiro capítulo contém a introdução que apresenta a origem da

pesquisa, o problema a ser investigado, os objetivos geral e específicos, a

delimitação do estudo e os argumentos que justificam a sua realização.

No segundo capitulo, apresentamos a metodologia desse trabalho,

delimitamos o campo, apresentamos o sujeito, os instrumentos, bem como os

indicativos para a realização da análise dos dados obtidos.

Na sequência, o terceiro capítulo, está dividido em três partes. Na primeira

parte apresentamos o arcabouço teórico, com uma discussão sobre a formação, a

partir dos desafios impostos pela contemporaneidade. Destacamos que a formação

não é somente profissional, mas também pessoal. Revisitamos os marcos legais da

formação do docente da educação superior, a partir da LDB e dos PNPG’s, o cenário

atual e as possibilidades de formação para esse profissional.

Na segunda parte, tratamos da definição da docência universitária como

profissão, da profissionalização, profissionalidade e do profissionalismo tão

recorrente nas diversas profissões e que entendemos ser fundante para a docência

universitária.

Na terceira parte encontra-se a conceituação de prática pedagógica, com um

olhar voltado à produção de conhecimentos para a formação desse profissional,

tendo em vista o que o docente universitário sabe e o que deve saber para o

exercício qualificado da docência.

O quarto capítulo trata das discussões sobre formação e prática pedagógica

– os elementos encontrados na pesquisa. Neste capítulo, as análises realizadas

apresentam o perfil profissional e percurso formativo desses profissionais. Em

seguida, apresentamos a análise das práticas pedagógicas exercidas por esses

professores a partir do visionamento das aulas, concepções e modelos.

Finalizamos então com as considerações finais sob uma perspectiva de

formação necessária e possível, a partir dos resultados obtidos sobre as

necessidades formativas.

Page 26: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA (PUC-SP) FACULDADE DE ... · CÁCIA CRISTINA FRANÇA REHEM DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E BACHARÉIS DOCENTES: PROCESSOS FORMATIVOS E A PRÁTICA PEDAGÓGICA

25

2 DESENHO METODOLÓGICO: AS LINHAS TRAÇADAS PARA PERCORRER O CAMINHO

2.1 DELIMITAÇÃO DA PESQUISA: CENÁRIO E SUJEITOS

2.1.1 Cenário

O cenário do estudo foi uma Universidade Estadual do interior da Bahia, com

28 anos de existência.

A universidade possui 16 cursos de graduação e 6 cursos de pós-graduação

(5 mestrados e 1 doutorado) distribuídos nas áreas de Ciências Humanas, Artes,

Ciências da Saúde e Ciências Exatas e da Terra. Atende um universo de mais de

2.000 alunos distribuídos entre os diversos cursos de graduação e pós-graduação,

com 429 professores, sendo 407 efetivos e 22 temporários.2

O projeto foi submetido ao Conselho de Ética em Pesquisa da Pontifícia

Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP) (Número do parecer de aprovação do

Conselho de Ética: 1.906.979) (Anexo B) e de uma Universidade Estadual do Estado

da Bahia. (Número do parecer de aprovação do Conselho de Ética: 2.065.019)

(Anexo C).

2.1.2 Sujeitos

A amostra foi constituída de sete professores, todos bacharéis de formação

em áreas diversas − odontologia, veterinária, nutrição, fisioterapia, enfermagem,

engenharia elétrica e ciências da computação, e que se dispuseram a participar do

trabalho de pesquisa proposto, tendo como único requisito exigido, serem bacharéis.

2.2 O CAMINHO METODOLÓGICO: PESQUISA QUALITATIVA E ESTUDO DE CASO

Era uma vez um cavalo-marinho que juntou as suas economias (moedas), e saiu em busca de fortuna. Ainda não havia andado muito quando encontrou uma enguia, que lhe disse: - Psiu.... Eh! Amigo. Aonde você vai? - Estou indo procurar minha fortuna - respondeu o cavalo-marinho

2 Fonte: Catálogo dos cursos de graduação (UESB). Disponível em:

<http://www.uesb.br/catalogo/index.asp?pag=docentes_campus.asp&tcab=Docentes%20por%20Departamento>. Acesso em: 15 jan. 2016.

Page 27: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA (PUC-SP) FACULDADE DE ... · CÁCIA CRISTINA FRANÇA REHEM DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E BACHARÉIS DOCENTES: PROCESSOS FORMATIVOS E A PRÁTICA PEDAGÓGICA

26

orgulhosamente. - Você está com sorte! - Disse a enguia - Por 4 moedas pode adquirir essas velozes nadadeiras, e assim será capaz de chegar lá mais rápido! - Oba, isso é óptimo! - Disse o cavalo-marinho e pagou o dinheiro, colocou as nadadeiras e saiu deslizando, numa velocidade duas vezes maior. Em seguida, encontrou uma esponja, que lhe disse: - Psiu.... Eh! Amigo. Aonde você vai? - Estou indo procurar minha fortuna - respondeu o cavalo-marinho. - Você está com sorte! - Disse a esponja - Por uma pequena recompensa deixarei você ficar com esta tábua de propulsão a jacto, para que possa viajar muito mais rápido. Então o cavalo-marinho comprou a tábua com o restante de suas moedas, e foi zunindo pelo mar, com uma velocidade cinco vezes maior. Logo, logo, encontrou um tubarão que lhe disse: - Psiu.... Eh! Amigo. Aonde você vai? - Estou indo procurar a minha fortuna - disse o cavalo-marinho. - Você está com sorte! Se tomar este atalho - e o tubarão apontou para a sua bocarra - vai economizar muito tempo. - Oba, obrigado - disse o cavalo-marinho, e saiu zunindo para dentro do tubarão, e nunca mais se ouviu falar dele. Mager, R. F. (1987).

2.2.1 Perspectivas teóricas: pesquisa qualitativa e estudo de caso

A fábula do cavalo-marinho indica que o foco e a objetividade do seu projeto

eram esvaziados na medida em que se desviava para o caminho mais fácil, sem

prévio planejamento na busca de seu propósito. A incerteza nos caminhos a serem

percorridos, na maioria das vezes, leva ao desconhecido, e podemos perder de vista

as metas traçadas. Partindo desse entendimento, ao pretendermos tamanha

empreitada, cumpre estabelecer claramente qual é o melhor caminho para evitarmos

equívocos de percursos no desenvolvimento do trabalho.

A realização de uma pesquisa acontece necessariamente com a definição do

desenho metodológico. Trata-se do estabelecimento do caminho a ser percorrido

para o alcance de tais intentos – estabelecendo claramente o problema, as

questões, os objetivos e a trajetória que deverão atender e permitir o alcance dos

mesmos.

Assim se dá com a nossa opção metodológica, em que o processo de

pesquisa foi delineado e orientou nosso caminho investigativo, de maneira que

traçadas as etapas, a fim de alcançarmos os objetivos, envolvendo um nítido foco

sobre a questão da pesquisa: “que informações responderão melhor às questões

específicas da pesquisa e quais estratégias são mais eficazes para obtê-las”

(DENZIN; LINCOLN, 2006, p. 36). Posto isto, para o alcance dos objetivos desta

pesquisa, optamos pela pesquisa qualitativa.

Page 28: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA (PUC-SP) FACULDADE DE ... · CÁCIA CRISTINA FRANÇA REHEM DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E BACHARÉIS DOCENTES: PROCESSOS FORMATIVOS E A PRÁTICA PEDAGÓGICA

27

Segundo Bogdan e Biklen (1994), a pesquisa qualitativa apresenta

características peculiares − o ambiente natural como sua fonte direta de dados e o

pesquisador como seu principal instrumento; possui predominância dos dados

descritivos; permite maior imersão no contexto, pois interessa mais o processo do

que simplesmente os resultados dos produtos; conduz a um plano de trabalho

aberto e flexível, sempre contextualizando a realidade; oportuniza maior interação

com os participantes e atenção à realidade dos mesmos.

Nesse sentido, pelo caráter do trabalho, em que a fonte dos dados foi o

ambiente natural e pelo fato do pesquisador manter o contato direto com esse

ambiente, destacamos que não faltaram esforços, por parte da pesquisadora, para

evitar e eliminar os seus preconceitos, importando as palavras, as imagens, o

caminho natural a ser trilhado como direcionador das ações a serem desenvolvidas.

Chizzotti (2006, p. 29) chama a atenção para o fato de que: Diferentes tradições de pesquisa invocam o título qualitativo, partilhando o pressuposto básico de que a investigação dos fenômenos humanos, sempre saturados de razão, liberdade e vontade, está possuída de características específicas: criam e atribuem significados às coisas e às pessoas nas interações sociais e estas podem ser descritas e analisadas prescindindo de quantificações estatísticas.

A opção pela pesquisa qualitativa acontece em função desta oportunizar o

aprofundamento do estudo de um grupo social, neste caso, os bacharéis/docentes

da educação superior. Nessa perspectiva, nos valemos ainda de Chizzotti (2003, p.

221) ao explicitar que o termo qualitativo implica “uma partilha densa com pessoas,

fatos e locais que constituem objetos de pesquisa para extrair desse convívio os

significados visíveis e latentes que somente são perceptíveis a uma atenção sensível [...] (grifo nosso)”. Importa destacar que a mesma oportuniza ao

pesquisador ver o cenário e as pessoas a partir de uma perspectiva holística; as

pessoas, os palcos, os grupos não são reduzidos a variáveis, senão consideradas

como um todo (FRANCO, 2008).

Pretende-se, então, uma apropriação empírico-teórica, sobre o percurso

formativo e a prática pedagógica dos bacharéis/docentes, a partir da interpretação

crítica. Para Denzin e Lincoln (2006), toda pesquisa é interpretativa e possibilita ao

pesquisador ser guiado por um conjunto de concepções sobre o mundo, que

orientará o modo como compreende e estuda os fenômenos, exigindo-lhe esforços

para explicar as questões, bem como as interpretações fornecidas.

Page 29: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA (PUC-SP) FACULDADE DE ... · CÁCIA CRISTINA FRANÇA REHEM DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E BACHARÉIS DOCENTES: PROCESSOS FORMATIVOS E A PRÁTICA PEDAGÓGICA

28

2.2.2 Procedimentos e instrumentos de coleta de dados

Inicialmente, a proposta dessa pesquisa qualitativa era realizar uma pesquisa-

ação colaborativa, a partir das entrevistas, questionários, observações das aulas e

das sessões reflexivas. Construir de forma conjunta com os sujeitos da pesquisa

uma proposta de formação para o exercício da docência, que seria implantada em

um semestre e, no outro, seria avaliada através de sessões reflexivas que nos

permitiriam a validação ou não daquela proposta

No entanto, mudanças ocorreram em nosso campo de pesquisa, devido a um

momento de turbulência política envolvendo um movimento de alunos que ocuparam

os espaços da universidade. Estes não permitiram a circulação dos professores e

tampouco a realização das aulas. Só nos foi possível começar a ir a campo no

primeiro semestre de 2017, e não no segundo semestre de 2016, o que impediu

uma pesquisa-ação-colaborativa e nos levou a um estudo de caso com observação

direta.

O estudo de caso, segundo Bogdan e Biklen (1994, p. 90) “[...] incide sobre

uma organização específica, ao longo de um período, relatando o seu

desenvolvimento.” Apontamos como melhor maneira de recolhimento de dados a

observação, por nos interessar um grupo específico, nesse caso, docentes

bacharéis.

Dessa forma, nos valemos de abordagens metodológicas que serviram para a

coleta de dados e análise, movimento este realizado em dois momentos: o primeiro

de estudo bibliográfico e análise documental; o segundo de trabalho de campo

realizado através das entrevistas semiestruturadas e observação direta, onde

fizemos inicialmente o uso de questionários abertos pré e pós-aula, no intuito de

conhecermos as propostas metodológicas orientadoras das aulas para, em seguida,

realizarmos as filmagens (produção de imagens).

2.2.2.1 O estudo bibliográfico

Como primeira etapa para o desenvolvimento desse trabalho, a pesquisa

bibliográfica nos possibilitou a reunião de informações e dados que serviram de

suporte para o desenvolvimento da pesquisa. Foi possível o diálogo com autores,

Page 30: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA (PUC-SP) FACULDADE DE ... · CÁCIA CRISTINA FRANÇA REHEM DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E BACHARÉIS DOCENTES: PROCESSOS FORMATIVOS E A PRÁTICA PEDAGÓGICA

29

através da leitura, análise e interpretação de livros, artigos científicos, documentos,

periódicos e textos disponíveis em bibliotecas eletrônicas que abrangem uma

coleção selecionada de periódicos científicos, além de portais de instituições

governamentais e não governamentais.

Assim, adotamos como autores − base da pesquisa em relação à categoria

formação: Marcelo Garcia (1999, 2009); Masetto (1998, 2012a, b); Zabalza (2014);

Nóvoa (1995); Freire (1998); Imbernón (2011). Em relação à profissionalização:

Imbernón (2011), Contreras (2012), Gimeno Sacristán (1995); Mas Torelló (2011),

Flores (2014), Day (2001). Com referência à prática pedagógica: Masetto (1998,

2012, 2014), Mas Torelló e Tejada Fernández (2013), Zabalza (2003, 2014),

Perrenoud (1993), Anastasiou (2002), Altet (2000). A diversidade de autores se deve

pela necessidade de uma revisão ampla sobre a temática proposta.

2.2.2.2 Análise documental

Consideramos importante o trabalho com fontes documentais enquanto

oportuniza a coleta de dados qualitativos, contribuindo para a obtenção de

informações que complementam outras fontes, e podem desvelar novos elementos a

pesquisa pretendida.

No intuito de conseguirmos informações relevantes sobre a formação de

professores para o ensino superior no Brasil, foi fundamental buscarmos os

documentos oficiais que tratavam dessa temática: os pareceres 977/65 e 77/69 do

antigo Conselho Nacional de Educação (CFE), as Leis de Diretrizes e Bases (LDB)

4.024 de 20/12/1961 e a 9.394/1996, os cinco Planos Nacionais da Pós-Graduação

(PNPG’s) − do primeiro (PNPG 1975-1979) até o atual (2011-2020) − o Decreto

94.664, de 23 de julho de 1987 que aprova o Plano Único de Classificação de

Cargos e Empregos.

A escolha desses documentos determinados a priori (BARDIN, 1977) ocorreu

por conterem as informações oficiais sobre a formação dos professores

universitários no Brasil. Em Bardin (1977) encontramos um ritual para que fosse

possível a realização da análise documental. Orientados pelo mesmo, realizamos a

análise tendo como primeira ação a realização da pré-análise do material escolhido:

organizamos a etapa da descoberta inicial do material e retiramos as primeiras

impressões sobre os mesmos. A segunda ação aconteceu a partir de uma

Page 31: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA (PUC-SP) FACULDADE DE ... · CÁCIA CRISTINA FRANÇA REHEM DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E BACHARÉIS DOCENTES: PROCESSOS FORMATIVOS E A PRÁTICA PEDAGÓGICA

30

exploração mais aprofundada dos documentos, de onde pudemos retirar os pontos

que nos interessavam para o nosso trabalho. A terceira ação resultou em um

capítulo sobre a formação de professores, através dos marcos legais e de elementos

necessários para a análise da formação encontrada no campo da pesquisa.

2.2.3 Trabalho de campo

Como segunda etapa deste trabalho, fomos a campo para captar o fenômeno

estudado, com intenção de compreender o olhar das pessoas envolvidas nesse

caso. Segundo Bogdan e Biklen (1994, p. 113) “é esta a forma que a maioria dos

investigadores qualitativos utiliza para recolher os seus dados”. A escolha da

Universidade como campo da pesquisa se deveu a dois critérios: clima de confiança

dos sujeitos junto à pesquisadora, e por ser um local em que a aceitação da nossa

presença ocorreria de forma tranquila, como realmente foi.

Para ter acesso ao campo, obtivemos a autorização da universidade para a

realização da pesquisa de campo (Anexo A); com relação aos docentes, sujeitos da

pesquisa estabelecemos contatos pessoais e esclarecemos sobre o que

pretendíamos realizar e quais os procedimentos para a realização do trabalho.

Depois deste esclarecimento verbal, os sujeitos que aceitaram participar da

pesquisa, assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (Apêndice A)

Como instrumentos de coleta de dados optamos pela observação direta da

aula, com a realização de uma entrevista semiestruturada, utilização de questionário,

antes (pré-aula) (), através da filmagem (produção de imagens) para concluirmos

com a realização da aplicação do questionário, depois da aula ministrada (pós-aula)

(Apêndice B).

2.2.3.1 Entrevistas

A entrevista propõe interação entre quem pergunta e entre quem responde;

trata-se de um diálogo que resulta em informações importantes sobre a temática

proposta. Lüdke e André (1986) ressaltam que as entrevistas, principalmente as não

estruturadas − em que é permitido ao entrevistado discorrer sobre o tema proposto,

e a linearidade não é imposta − resultam em contribuições relevantes que acabam

Page 32: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA (PUC-SP) FACULDADE DE ... · CÁCIA CRISTINA FRANÇA REHEM DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E BACHARÉIS DOCENTES: PROCESSOS FORMATIVOS E A PRÁTICA PEDAGÓGICA

31

sendo a verdadeira razão da entrevista. Assim, “a entrevista é utilizada para recolher

dados descritivos na linguagem do próprio sujeito, permitindo ao investigador

desenvolver intuitivamente uma ideia sobre a maneira como os sujeitos interpretam

aspectos do mundo” (BOGDAN; BIKLEN, 1994, p. 134)

Como uma das fontes mais importantes de coleta de dados, a entrevista

permite dar voz aos sujeitos transformando-os em informantes e não apenas

respondentes.

Para o nosso trabalho, a entrevista serviu no intuito de desvelar os processos

formativos e a prática pedagógica dos docentes/bacharéis, a partir da sua fala,

sendo realizada com questões abertas e não lineares. No entanto, tal escolha não

eliminou um guia de orientação para a realização da entrevista, fundamentado nas

categorias definidas a priori (formação e prática pedagógica) que se desdobraram

em 23 questões (Apêndice B)

As entrevistas foram realizadas na Universidade, em consonância com a

indicação do entrevistado. Para tal, utilizamos gravador e, após a transcrição,

oportunizamos a cada um a leitura e correção, caso encontrassem algum equívoco

ou discordância da fala registrada.

2.2.3.2 Observação

A seletividade da mente humana ao observar objetos, fenômenos e situações,

torna provável que duas pessoas, ao olharem o mesmo objeto, o enxerguem de

maneiras diferentes. Lüdke e André (1986, p. 25) destacam que “[...] as observações

que cada um de nós faz na nossa vivência diária são muito influenciadas pela nossa

história pessoal, o que nos leva a privilegiar certos aspectos da realidade e

negligenciar outros”.

Portanto, a validade desse instrumento para a coleta de dados ocorre quando

tomamos o devido cuidado com o direcionamento e o planejamento. Antes de iniciar

a observação é imprescindível estabelecer “o quê” e “como observar”, “como

registrar e documentar as observações” definindo como primeira ação da

observação a delimitação do estudo. (LÜDKE; ANDRÉ, 1986)

A observação direta das aulas nos permitiu o contato in loco com o espaço

empírico do professor e com sua prática pedagógica em seu espaço. Como

observadores nos posicionamos de forma a não participar de nenhuma atividade

Page 33: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA (PUC-SP) FACULDADE DE ... · CÁCIA CRISTINA FRANÇA REHEM DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E BACHARÉIS DOCENTES: PROCESSOS FORMATIVOS E A PRÁTICA PEDAGÓGICA

32

que aconteceu na sala de aula, de forma que. “[...] olha para a cena, no sentido

literal ou figurativo, através de um espelho de um só sentido”. (BOGDAN; BIKLEN,

1994, p. 125)

O espaço definido pelo professor, como o melhor local para que pudéssemos

observar as aulas e realizar as filmagens, era geralmente o fundo da sala. A

observação direta ocorreu através de quatro momentos, a saber:

1º momento

Planejamento da observação direta

O que deveríamos observar: a aula – planejamento/execução/avaliação.

Procedimentos para o processo de filmagem das aulas:

- Através da filmagem das aulas e da anotação de momentos importantes e

significativos para a problemática em questão.

2º momento – realização da entrevista (pré-aula). (Apêndice B)

3º momento - Observação das aulas (filmagem)

4º momento – realização da entrevista (pós-aula). (Apêndice B)

2.2.4 Categorias de análise e interpretação dos dados

A análise de dados qualitativos nos permite obter significados do fenômeno

estudado. Por dados entendemos que são os “materiais em bruto que os

investigadores recolhem do mundo que se encontram a estudar, são os elementos

que formam a base de análise”. (BOGDAN; BIKLEN, 1994, p. 149)

A coleta de dados se deu a partir de três instrumentos − a entrevista, a

aplicação do questionário (pré e pós aulas) através de roteiro previamente definidos,

e a observação direta através da produção de imagens (filmagem) − para, em

seguida, definirmos como seria realizado o tratamento desses dados, propriamente a

análise e a interpretação destes.

Assim, escolhemos como técnica para desvendar os dados coletados a

análise de conteúdo que segundo Amoendo, Costa e Crusoé (2003, p.300) pode ser:

[...] uma técnica flexível e adaptável às estratégias de recolha de dados anteriormente apresentadas [...] e por ser uma técnica que aposta claramente na possibilidade de fazer inferências interpretativas a partir de conteúdos expressos, uma vez desmembrados em categorias, tendo em conta as ‘condições de produção’ desses mesmos conteúdos, com vistas à explicações e

Page 34: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA (PUC-SP) FACULDADE DE ... · CÁCIA CRISTINA FRANÇA REHEM DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E BACHARÉIS DOCENTES: PROCESSOS FORMATIVOS E A PRÁTICA PEDAGÓGICA

33

compreensão dos mesmos.

E ainda, conforme Bardin (1977, p. 46) “o objetivo da análise de conteúdo é a

manipulação de mensagens (conteúdo e impressão desse conteúdo) para evidenciar

os indicadores que permitam inferir sobre uma outra realidade que não a da

mensagem”.

Com esse objetivo, as entrevistas foram gravadas e depois transcritas de

forma literal; toda a fala proferida pelo entrevistador e entrevistado foi trabalhada.

Para análise dessas entrevistas, nos valemos das categorias definidas a priori;

formação e prática pedagógica – perfil e tipos de formação; processo de

profissionalização – o tornar-se professor, a compreensão e o desenvolvimento da

prática pedagógica e competências necessárias para o seu exercício.

A análise dos dados da observação das aulas e da produção de imagens, se

deu a partir: dos discursos do(a) professor (a) através das respostas do questionário

aplicado antes e após a aula e do visionamento das aulas. O roteiro de observação

foi estruturado centrado nos seguintes momentos: o início da aula; o seu

desenvolvimento (metodologia – participação dos alunos – organização do tempo) e

as atitudes e concepções pedagógicas presentes nas práticas observadas. Para

culminarmos com a análise dos atos pedagógicos do professor.

Na busca por manter o anonimato, tão necessário, em um trabalho de

pesquisa com humanos, os docentes serão apresentados através da representação:

DO1, DO2, DO3, DO4, DO5, DO6, DO7.

Page 35: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA (PUC-SP) FACULDADE DE ... · CÁCIA CRISTINA FRANÇA REHEM DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E BACHARÉIS DOCENTES: PROCESSOS FORMATIVOS E A PRÁTICA PEDAGÓGICA

34

3 MARCO CONCEITUAL

3.1 FORMAÇÃO PARA A DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA: OS DESAFIOS IMPOSTOS PELAS TRANSFORMAÇÕES DA CONTEMPORANEIDADE

A globalização que se instala de forma proeminente, nas três últimas décadas

do século XX3, no Brasil, veio a transformar as relações entre a sociedade, o Estado

e a Universidade. Uma nova agenda foi imposta e questões como avaliação,

financiamento, formação de professores, currículo, passaram a direcionar as

políticas de Estado para a Educação.

Na visão de Zabalza (2004), não é exagerado afirmar que a universidade

tenha passado por mudanças mais importantes do que as vividas ao longo da sua

história. Essas mudanças ocorreram pelas transformações no mundo do trabalho,

com forte pressão social pelo emprego, com exigências relacionadas ao

desempenho profissional e por novas formas de conceber o momento político e

social. Do mesmo modo é possível afirmar que essas mudanças aconteceram em

decorrência das transformações derivadas das inovações tecnológicas, do acesso

às informações, da produção do conhecimento científico e da apreensão dos

saberes − através da relação entre a aplicação do conhecimento produzido e o

processo de produção do conhecimento.

Sob a ótica de alguns estudiosos, o conhecimento tem uma dimensão fulcral

nos processos de produção da sociedade contemporânea. No entendimento de

Bernheim e Chauí (2008, p. 7), no novo paradigma econômico e produtivo “[...] o

fator mais importante deixa de ser a disponibilidade de capital, trabalho, matérias-

primas ou energia, passando a ser o uso intensivo de conhecimento e informação.”

Nessa perspectiva, a denominada “sociedade do conhecimento”, transformou

o conhecimento em poder e nos deparamos hoje com as maiores economias,

estabelecendo cada vez mais vantagens pelo uso do conhecimento e da informação

3 Segundo Burbules e Torres (2004, p. 17-18), teoricamente, um dilema central é se devemos localizar as origens da globalização contemporânea em torno de 1971-1973, com a crise do petróleo, que promoveu diversas mudanças tecnológicas e econômicas direcionadas para encontrar fontes substitutas para matérias-primas estratégicas e buscar novas formas de produção que consumissem menos energia e trabalho. [...] Podemos localizar as origens da globalização há mais de um século, com mudanças na tecnologia de comunicação, nos padrões de migração e no fluxo de capital (por exemplo aqueles afetados pelo processo de colonização do Terceiro Mundo. [...] Nossa visão sobre esse tema, todavia não é uma questão de escolher entre uma ou outra opção. Estamos em uma nova ordem global, em que as velhas formas estão mortas, mas as novas ainda não estão totalmente formadas.

Page 36: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA (PUC-SP) FACULDADE DE ... · CÁCIA CRISTINA FRANÇA REHEM DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E BACHARÉIS DOCENTES: PROCESSOS FORMATIVOS E A PRÁTICA PEDAGÓGICA

35

(BERNHEIM; CHAUÍ, 2008). Esta “sociedade do conhecimento” envolve um amplo

espectro de transformação social, cultural, econômica, política e institucional.

Essas transformações afetaram a universidade, principalmente no seu papel

de produtora e divulgadora do conhecimento, existe a constatação que a produção e

divulgação do conhecimento na contemporaneidade não mais acontecem

especificamente na universidade. Masetto (2012b, p. 21) explica que o: Conhecimento se apresenta hoje com uma multiplicidade quase infinita de fontes de sua produção. Se até bem pouco tempo poderíamos dizer que as universidades se constituíam no grande e privilegiado locus de pesquisa e produção científica, hoje, e já faz algum tempo, as investigações e a consequente produção de conhecimento partem de outros espaços também: dos organismos e institutos de pesquisas que não se encontram vinculados à universidade, dos laboratórios industriais das empresas, das ONGs, de organismos públicos e privados voltados para projetos de intervenção na realidade e realizadores de programas e de políticas governamentais em todos os níveis.

Aconteceram alterações e o papel central e as condições laborais dos

professores, de detentores do conhecimento e, em muitos casos, a fonte central do

saber, passaram a conviver com as mudanças ocorridas nos mecanismos de acesso

e divulgação do conhecimento pelos alunos, fazendo com que a sua função seja

questionada e novas possibilidades de formação sejam necessárias para

ressignificar a ação docente.

Diante dessa realidade, Garcia (2009, p. 8) argumenta: [...] para os docentes, ser professor no século XXI pressupõe o assumir que o conhecimento e os alunos (as matérias-primas com que trabalham) se transformam a uma velocidade maior à que estávamos habituados e que, para se continuar a dar uma resposta adequada ao direito de aprender dos alunos, teremos de fazer um esforço redobrado para continuar a aprender.

Dessa forma, as mudanças passaram a imprimir um novo perfil para esse

profissional. O fato de ter os seus papéis definidos e dos mesmos não sofrerem

alterações durante um longo período criou um escudo para esses profissionais que

acreditavam não ser necessária uma formação específica para a atuação nesse

nível educacional.

Nesse sentido, as discussões e estudos sobre a docência universitária, bem

como a necessária formação para o seu exercício, decorrem principalmente da

busca da confirmação dessa atividade como uma profissão, da necessidade de

formação profissional específica e dos elementos necessários para a construção da

prática pedagógica.

Page 37: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA (PUC-SP) FACULDADE DE ... · CÁCIA CRISTINA FRANÇA REHEM DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E BACHARÉIS DOCENTES: PROCESSOS FORMATIVOS E A PRÁTICA PEDAGÓGICA

36

Este capítulo tem como objetivo apresentar as discussões sobre formação de

docentes para a educação superior, enquanto um dos referenciais que embasam

esta pesquisa. Buscamos compreender a formação como uma necessidade no

processo de desenvolvimento pessoal e profissional, revisitar o percurso legal da

formação desses professores no Brasil e compreender qual o cenário e as

possibilidades para a formação desse profissional na atualidade.

3.1.1 Formação: processo de desenvolvimento e da estruturação da pessoa e do profissional

O que você vai ser quando crescer? Pergunta feita corriqueiramente nas

famílias às crianças, que acabam respondendo com as mais variadas alternativas,

repetindo as profissões exercidas pelos pais ou pessoas mais próximas. Indicam o

que na literatura, segundo Zabalza (2014), é rotineiro relacionar a formação

diretamente com o mundo acadêmico, com o mundo do trabalho e com uma

profissão.

A formação tem sido vista como algo decorrente de um processo externo e

ligado especificamente ao campo profissional, embora encontremos na literatura

propostas diferenciadas que apontem também o componente pessoal que está

contido nesse processo. O fato é que a formação para o exercício de uma profissão

tem prevalecido.

Nesse sentido, o conceito de formação tem sido banalizado. Do ponto de vista

de Garcia (1999):

A noção de formação encheu-se de tantos equívocos e aparece de tal modo pervertida pela utilização que dela se faz, desde a generalização da educação permanente, convertida numa empresa distribuidora de saberes etiquetados e de pequenas seguranças, que tem reforçado a relação direta entre formação e campo profissional.

Tem ocorrido também a falsa ideia, no entendimento de Zabalza (2014), que

quanto mais formação, mais capacitado para o desenvolvimento pessoal, o emprego

e a sobrevivência econômica, ou seja, existe um processo de supervalorização,

como se a formação profissional resolvesse todos os problemas. Isso faz crer que “a

formação se define, em muitos casos, pelo que se oferece ou pelo tipo de produto

externo que se pretende obter, mais que pelo efeito real que exercerá sobre as

pessoas que se beneficiam dela”. (ZABALZA, 2004, p. 38)

Page 38: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA (PUC-SP) FACULDADE DE ... · CÁCIA CRISTINA FRANÇA REHEM DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E BACHARÉIS DOCENTES: PROCESSOS FORMATIVOS E A PRÁTICA PEDAGÓGICA

37

Dessa forma, tem existido um grande movimento sobre a importância e a

necessidade de formação, sendo que a eficácia ou mesmo os produtos alcançados,

têm sido, em sua maioria, negligenciados. Garcia (1999, p. 21) aponta que “a

formação apresenta-se como um fenômeno complexo e diverso sobre a qual existe

apenas escassas conceptualizações e ainda menos acordo em relação às

dimensões e teorias mais relevantes para a sua análise.”

A formação tem uma base conceitual própria que se diferencia de outros

conceitos que também são usados, tais como educação, treino e ensino. Inclui uma

dimensão pessoal de desenvolvimento humano global e que não se resume a

dimensão eminentemente técnica e, ainda, é preciso que exista a capacidade de

formação e a vontade de formação, estabelecendo o indivíduo como o responsável

pela sua formação. (GARCIA, 1999)

Embora aceita, é possível questionar uma formação que se vincule

unicamente à obtenção de um diploma. Podemos inferir que essa perspectiva é

limitada e restrita, o que resulta em um processo em que prevalece a quantidade de

títulos, com a falsa impressão de que quanto mais diplomas adquiridos, melhor a

formação, banalizando excessivamente e estabelecendo esse único aspecto como

importante.

Nessa mesma perspectiva, Nóvoa (1995, p. 25) destaca um ponto

fundamental − a formação não se constrói por acumulação de cursos, de

conhecimentos ou de técnicas, mas através de um trabalho de reflexividade crítica

sobre as práticas e de (re)construção permanente de uma identidade pessoal.

Quando tratamos de formação, na maioria das vezes, estamos nos referindo

principalmente ao campo profissional. Zabalza (2014, p. 76) se fundamenta em

Buckeley e Caple (1991, p. 2) para esclarecer que a formação é um esforço

sistemático e planejado para modificar ou desenvolver o conhecimento, as técnicas

e atitudes, através das experiências de aprendizagens, no intuito de se “conseguir a

atuação adequada em uma atividade ou conjunto de atividades”. Portanto, estaria

mais voltada para o mundo do trabalho, ao passo que a aprendizagem seria o

processo pelo qual os sujeitos adquirem conhecimento, técnicas e práticas por meio

da experiência, da reflexão, estudo ou instrução (BUCKELEY; CAPLE, 1991, p. 2). A

perspectiva formativa recebida pela educação estaria encarregada de desenvolver

conhecimentos, técnicas e valores, de forma mais geral. Para esses autores, a

formação profissional seria um processo mais mecânico em que se buscam

Page 39: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA (PUC-SP) FACULDADE DE ... · CÁCIA CRISTINA FRANÇA REHEM DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E BACHARÉIS DOCENTES: PROCESSOS FORMATIVOS E A PRÁTICA PEDAGÓGICA

38

aprendizagens mais uniformes por meio de práticas repetidas. Nesse aspecto, o

mundo do trabalho aparece por detrás dessa ideia (ZABALZA, 2014).

No entanto, ainda segundo Zabalza (2014, p.85), as pessoas podem/devem

se desenvolver em quatro dimensões básicas: a social, a pessoal, a intelectual e a

prática; dessa forma, explicita o autor, caso se pretenda uma formação mais

equilibrada, esta deve se assentar nessas quatro dimensões; caso se centre em

alguns dos eixos e desconsidere os outros, esta acaba sendo incompleta.

A formação, em um processo de devir, vir a ser, tornar-se, acontece de forma

processual e nunca está conclusa; no entanto, não pode ser descartada nem

considerada como algo que limita e engessa, pois efetivamente nos permite tornar

quem somos.

Quando se trata de formação temos que nos desvencilhar da perspectiva

limítrofe, segundo padrões pré-estabelecidos, e assumir uma formação no sentido

nietzschiano “wie man wird, was man ist”, “como se chega a ser o que se é” ou como

se vem a ser o que se é (LARROSA, 2009, p. 41).

Nesse sentido, assumiremos nesse trabalho o conceito de formação proposto

por Pineau (1983 apud MOITA, 2000, p. 114), “tomado não só como uma atividade

de aprendizagem situada em tempos e espaços limitados e precisos, mas também

como a ação vital de construção de si próprio”, onde a relação entre os vários polos

de identificação é fundamental.

É importante este destaque, pois partimos do princípio de “inacabamento”

proposto por Freire (1998), assumido pela formação que se vincula à história de vida

dos sujeitos e, consequentemente, se ajusta ao seu processo de preparação

profissional. Sob esse enfoque, Garcia (1999, p. 19) infere que:

O conceito de formação é geralmente associado a alguma atividade, sempre que se trata de formação para algo (Honoré, 1980). Assim, a formação pode ser entendida como uma função social de transmissão de saberes, de saber-fazer ou do saber-ser que se exerce em benefício do sistema socioeconômico, ou da cultura dominante. A formação pode também ser entendida como um processo de desenvolvimento e estruturação da pessoa que se realiza com o duplo efeito de maturação. (Grifo do autor)

No entanto, o conceito de formação, assim como muitos outros de nossa área

de conhecimento, é passível de várias interpretações e de múltiplas abordagens.

Como caracteriza Garcia (1999), o conceito se associa ao de desenvolvimento

pessoal que o sujeito busca até completar um estado de plenitude pessoal; “[...] diz

Page 40: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA (PUC-SP) FACULDADE DE ... · CÁCIA CRISTINA FRANÇA REHEM DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E BACHARÉIS DOCENTES: PROCESSOS FORMATIVOS E A PRÁTICA PEDAGÓGICA

39

respeito ao processo que o indivíduo percorre na procura da sua identidade plena de

acordo com alguns princípios ou realidade sociocultural” (GARCIA, 1999, p. 19).

Nesse sentido, não se pode separar o componente pessoal do processo de

formação que, segundo Gonzáles Soto (1989, p. 83 apud GARCIA, 1999, p. 19) Inclui problemas relativos aos fins e/ou modelo a alcançar, a conteúdos/experiências a assumir, às interações sujeito-meio (social, cultural e axiológico), aos estímulos e planos de ‘apoio’ no processo. Mantém relação com o ideológico-cultural, como espaço que define o sentido geral dessa formação como processo.

Segundo Garcia (1999), o interesse pela formação de professores não é

recente e coincide com a própria história da educação; no entanto, estamos em um

momento que essa necessidade e a forma como deverá acontecer vem dominando

trabalhos e estudos no mundo todo. Pimenta e Almeida (2011, p.27) reconhecem

que: [...] a formação do professor deve estar aninhada numa perspectiva de desenvolvimento profissional, que tem então na formação inicial o princípio de um processo contínuo no qual a profissão se desenvolve por meio de descobertas individuais e coletivas, que se sedimentam e se reconstroem apoiadas em rigorosa reflexão sobre a prática, mediada pela teoria, o que permite a reconstrução da experiência na perspectiva do aprimoramento da atuação futura. Portanto, a interação com o contexto de atuação constitui elemento essencial ao processo de formação ao longo da carreira docente.

Nessa perspectiva, entendemos a formação como um processo que ocorre no

desenvolvimento profissional do docente (DPD) e que não se esgota na formação

técnica, mas alcançará o terreno prático e as concepções pelas quais se estabelece

a ação docente (IMBERNÓN, 2011).

A pretensão, nesse trabalho, é abandonar o conceito obsoleto de que

formação é atualização científica, didática e psicopedagógica do professor, voltada

unicamente para o campo do trabalho, para conceber um conceito de formação que

proporciona a descoberta, a capacidade de organização e construção do vir a ser e

se coaduna com a formação pessoal (produzir a vida do professor), com o

desenvolvimento profissional (produzir a profissão docente) e com o

desenvolvimento organizacional (produzir a universidade) (NÓVOA, 1995).

Para Nóvoa (1995, p. 24), a formação de professores tem ignorado

sistematicamente o desenvolvimento pessoal, confundindo-se “formar” e “formar-se”.

Assim, é oportuno frisar que quando abordamos sobre formação, embora atualmente

está venha sendo associada à ideia de formação acadêmica ou profissional –

(formar) – referimo-nos ainda à condição de formação humana que está diretamente

Page 41: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA (PUC-SP) FACULDADE DE ... · CÁCIA CRISTINA FRANÇA REHEM DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E BACHARÉIS DOCENTES: PROCESSOS FORMATIVOS E A PRÁTICA PEDAGÓGICA

40

relacionada aos propósitos de constituição do ser – (formar-se). Corroborando Ferry

(1991, p. 43 apud GARCIA, 1999, p. 19), “formar-se nada mais é senão um trabalho

sobre si mesmo, livremente imaginado, desejado e procurado, realizado através de

meios que são oferecidos ou que o próprio procura”.

O desenvolvimento pessoal envolve a reflexão sobre si próprio, inclusive no

contexto profissional. Oliveira (1997, p. 95) esclarece que “o desenvolvimento

pessoal do professor envolve processos reflexivos sobre si próprio, com contexto

profissional, com previsíveis implicações ao nível do seu autoconhecimento como

pessoa e como profissional”. É por meio dela que se abre um leque de

possibilidades de produzir novos significados, formas de pensar e agir, e solucionar

os problemas. Todos os processos de desenvolvimento no campo profissional não

poderão estar dissociados da formação inerente ao campo pessoal. Esse movimento

sustentará e contribuirá para a constituição do sujeito e do profissional.

Falar de formação profissional implica estabelecer uma necessária aquisição

de elementos que auxiliarão o docente a desenvolver as atividades inerentes àquele

campo profissional. Ao se considerar a docência enquanto profissão, é preciso

garantir a esses profissionais a constituição dos processos formativos que o

habilitarão para tal intento.

Torna-se então necessária a apreensão contínua dos elementos

indispensáveis ao exercício da docência; não somente uma atualização científica e

pedagógica, mas uma partilha através do desenvolvimento de comunidades de

aprendizagens, onde todos – professores, alunos, gestores, funcionários, a

universidade como um todo − se considerem parte desse processo. É importante ter

presente que "as desejáveis mudanças de atitudes e práticas pedagógicas dos

professores necessitam de um contexto de interajuda e de apoio entre os diferentes

parceiros de formação." (OLIVEIRA, 1997, p. 94), de tal forma que possamos

construir um percurso formativo que contribua para o desenvolvimento pessoal e

profissional desse docente.

Page 42: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA (PUC-SP) FACULDADE DE ... · CÁCIA CRISTINA FRANÇA REHEM DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E BACHARÉIS DOCENTES: PROCESSOS FORMATIVOS E A PRÁTICA PEDAGÓGICA

41

3.1.2 Formação do docente da educação superior: reconstruindo o percurso através dos marcos legais

Para abordagem da formação em seus aspectos normativos, é preciso

recapitular o já referido (seção 3.1.2 deste trabalho) a propósito da LDB − Lei

9.394/96 −, no que tange à preparação para o exercício do magistério superior ser

realizada em nível de pós-graduação, “prioritariamente em programas de mestrado e

doutorado”. (BRASIL, 1996). Contudo, convém atentarmos para o que contrapõe

Morosini (2000, p. 21):

A principal característica dessa legislação sobre quem é o professor universitário, no âmbito de sua formação didática, é o silêncio. Enquanto nos outros níveis de ensino o professor é bem identificado, no ensino superior, parte-se do princípio de que sua competência advém do domínio da área de conhecimento, na qual atua. E aí remetemos à definição apresentada por Pierre Bourdieu (1983) quando caracteriza o campo científico e discute a competência científica do professor como resultante entre competência técnica e poder social, sendo a primeira definida no próprio campo científico.

Essa definição da pós-graduação como o espaço de formação/preparação do

docente da educação superior, garantido pela LDB, teve o seu início quando no

Brasil surgiu a necessidade da definição e regulamentação desse nível como um

espaço de continuação aos estudos de graduação.

A trajetória da pós-graduação no Brasil, iniciada na década de 1930, com

alguns cursos oferecidos, a exemplo do Doutorado em Direito na Universidade de

Minas Gerais (SOARES, 2010a), teve o seu reconhecimento através do decreto nº

21.321/46 (BRASIL, 1946) em seu artigo 71; no entanto, a finalidade era a

especialização profissional.

Nessa década, através da proposta do Estatuto das Universidades

Brasileiras, Francisco Campos propunha o desenvolvimento de uma pós-graduação

seguindo os padrões europeus. Conforme Santos registrou (2003), na década de

1940 o termo pós-graduação foi utilizado formalmente e já na década de 1950 foram

firmados acordos entre Brasil e Estados Unidos que implicavam uma série de

convênios entre escolas e universidades norte-americanas e brasileiras, por meio do

intercâmbio de estudantes, pesquisadores e professores.

No entanto, somente em 03 de dezembro de 1965 foi aprovado o parecer de

nº 977/65 (BRASIL, 1965) tendo Newton Sicupira como relator e, entre os autores,

Page 43: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA (PUC-SP) FACULDADE DE ... · CÁCIA CRISTINA FRANÇA REHEM DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E BACHARÉIS DOCENTES: PROCESSOS FORMATIVOS E A PRÁTICA PEDAGÓGICA

42

Anísio Teixeira e Valnir Chagas. Neste parecer destacam-se a importância e a

necessidade de desenvolver e regulamentar a pós-graduação no Brasil, em virtude

da imprecisão sobre a natureza desses cursos existentes por aqui até então.

O parecer, que teve inspiração no modelo norte-americano, oferecia dois

níveis de pós-graduação: mestrado e doutorado; mesmo sendo hierarquizados, se

constituíam com relativa independência, haja vista que a realização do doutorado

não estava atrelada à realização do mestrado. Santos (2003, p. 630) assinala que:

[O] Parecer 977/65 estabelecia a pós-graduação conforme o modelo norte-americano. A pós-graduação stricto sensu dar-se-ia em dois níveis independentes e sem relação de pré-requisitos entre o primeiro e o segundo (mestrado e doutorado). A primeira parte dos cursos seria destinada a aulas e a segunda à confecção do trabalho científico de conclusão (dissertação ou tese). Os currículos seriam compostos conforme o modelo norte-americano, que compreendia o major (área de concentração) e o minor (matérias conexas).

No parecer ficava clara a importância, não só de definir o que seria a pós-

graduação, mas, principalmente da sua regulamentação, tendo como propósito

fundamental o de promover: [...]a implantação sistemática dos cursos pós-graduados afim de que possamos formar os nossos próprios cientistas e tecnólogos [...] acrescente-se, ainda, que o funcionamento regular dos cursos de pós-graduação constitui imperativo da formação do professor universitário. Uma das grandes falhas de nosso ensino superior está precisamente em que o sistema não dispõe de mecanismos capazes de assegurar a produção de quadros docentes qualificados. Daí a crescente expansão desse ramo de ensino, nessas últimas décadas, se ter feito com professores improvisados e consequentemente rebaixamento de seus padrões. Por isso mesmo o programa de ampliação das matrículas dos cursos superioressupõe uma política objetiva e eficaz de treinamento adequado do professor universitário. E o instrumento normal desse treinamento são os cursos de pós-graduação. O Aviso Ministerial, ao solicitar a regulamentação, aponta, em síntese, os três motivos fundamentais que exigem, de imediato, a instauração de sistema de cursos pós-graduados: 1) formar professorado competente que possa atender à expansão quantitativa do nosso ensino superior garantindo, ao mesmo tempo, a elevação dos atuais níveis de qualidade; 2) estimular o desenvolvimento da pesquisa científica por meio da preparação adequada de pesquisadores; 3) assegurar o treinamento eficaz de técnicos e trabalhadores intelectuais do mais alto padrão para fazer face às necessidades do desenvolvimento nacional em todos os setores. (PARECER 977/65). (Grifo nosso).

Page 44: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA (PUC-SP) FACULDADE DE ... · CÁCIA CRISTINA FRANÇA REHEM DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E BACHARÉIS DOCENTES: PROCESSOS FORMATIVOS E A PRÁTICA PEDAGÓGICA

43

A pós-graduação, como espaço de formação de professores, está

evidenciada, desde então, como um dos principais propósitos da pós-graduação.

Contudo, em seus 174 itens, quando propõem as características da organização da

pós-graduação, fica omitido quais critérios deveriam nortear a formação para a

docência desses professores. Mesmo com a aprovação do parecer 977/65 era

notório que, até a década de 1970, a pós-graduação oferecida no Brasil era

espontânea, desordenada e pressionada por motivos conjunturais. (PNPG, 2010-

2020).

O parecer 977/65 está presente em todas as propostas construídas no Brasil

sobre a pós-graduação até os dias atuais. As propostas que se sucederam, a partir

dos Planos Nacionais de Pós-Graduação (PNPG), sinalizam o parecer e, salvo

algumas alterações, os princípios originais da referida proposta, se mantêm.

O Sistema de pós-graduação foi efetivamente implantado no Brasil a partir

dos anos de 1970, sendo estruturado com base nas orientações jurídicas presentes

na Reforma Universitária de 1968, sob o modelo da universidade americana, e tendo

como funções a formação de professores e pesquisadores.

O I PNPG (1975-1979) buscou organizar e ordenar o oferecimento da pós-

graduação no Brasil e teve como principal missão:

introduzir o princípio do planejamento estatal das atividades da pós-graduação, então recentemente implantada em âmbito federal, integrando-as na graduação e fomentando a pesquisa, com o objetivo em âmbito federal, integrando-as na graduação e fomentando a pesquisa, com o objetivo de formar especialistas – docentes, pesquisadores e quadros técnicos – para o sistema universitário, o setor público e o segmento industrial. (BRASIL, 2010, p. 15) (grifo nosso)

Na elaboração do I PNPG, a relação entre a formação para a docência

universitária e a pós-graduação é confirmada, repetindo o que já tinha sido

estabelecido no parecer 977/65. Em seus Objetivos e Diretrizes Gerais constava que

a pós deveria ser o espaço de formação de professores: Dentre as funções gerais do sistema de ensino superior na atual sociedade brasileira, cabe particularmente à pós-graduação: formar professores para o magistério universitário, a fim de atender à expansão quantitativa deste ensino e à elevação da sua qualidade (BRASIL, 1974, p. 125).

4 Recomendo a leitura do Parecer 977/65 para o conhecimento dos 17 itens citados como propósitos

da pós-graduação no Brasil.

Page 45: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA (PUC-SP) FACULDADE DE ... · CÁCIA CRISTINA FRANÇA REHEM DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E BACHARÉIS DOCENTES: PROCESSOS FORMATIVOS E A PRÁTICA PEDAGÓGICA

44

No II PNPG (1982-1985) esse objetivo continua, mas, surge o destaque para

a formação de pesquisadores “Os cursos de pós-graduação ‘stricto sensu’ deverão

buscar seu fortalecimento qualitativo, enfatizando o objetivo de formar

pesquisadores” (BRASIL, 1982, p. 188), passando a ser o propósito fundamental da

pós-graduação strictu-sensu desde então. Todos as formas de fomento e as

orientações são direcionadas para a formação do pesquisador. É possível perceber

que, nestes documentos, relaciona-se a formação do docente à formação do

pesquisador, como se essa fosse uma condição para tal função, pois não aparece,

em nenhuma das propostas, indicação de como essa preparação (para a docência)

deveria ser concebida.

O III PNPG (1986-1989) destaca o reforço na formação de recursos humanos,

mas novamente a prioridade é a formação de pesquisadores: “No item referente à

formação de recursos humanos, no primeiro Plano, a ênfase foi para o atendimento

ao sistema educacional; já no segundo, o enfoque direcionou-se para uma postura

mais abrangente, atingindo o setor produtivo” (BRASIL, 1986, p. 193). E continua:

“Apesar do grande progresso alcançado na institucionalização da pós-graduação

nas universidades, este processo, ainda não concluído, deverá permanecer como

um dos objetivos do presente Plano, acrescido de um esforço para a

institucionalização e ampliação das atividades de pesquisa, como elemento indissociável da pós-graduação” (BRASIL, 1986, p. 193). (Grifo nosso).

Propõe ainda, além das diretrizes e recomendações gerais, medidas que

reforçavam a institucionalização da pesquisa, através de verbas específicas. No

tocante à carreira docente, destacava-se a valorização científica, pois estava

atrelada à promoção e ampliação dos quadros universitários. Propunha também a

institucionalização da licença sabática, como a atualização das bibliotecas e das

informações científicas e de laboratórios. (BRASIL, 1986)

O IV PNPG foi organizado a partir de um Seminário proposto pela Diretoria-

Executiva da CAPES, em 1996, que ciente da necessidade da construção de um

novo Plano Nacional de Pós-Graduação, constitui uma comissão Executiva para

organizar um Seminário Nacional, que serviria como marco inicial. Esse Seminário

contou com a presença de aproximadamente uma centena de pessoas, dentre as

quais destacavam-se pró-reitores, representantes da comunidade acadêmica, da

Associação Nacional de Pós-Graduandos (ANPG). O Seminário foi aberto pelo então

Ministro da Educação e Presidente da CAPES.

Page 46: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA (PUC-SP) FACULDADE DE ... · CÁCIA CRISTINA FRANÇA REHEM DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E BACHARÉIS DOCENTES: PROCESSOS FORMATIVOS E A PRÁTICA PEDAGÓGICA

45

Esse 4º Plano, não foi promulgado, mas suas diretrizes foram adotadas pela

CAPES; “se caracterizou pelas ênfases na expansão do sistema, na diversificação

do modelo de pós-graduação, na introdução de mudanças no processo de avaliação

e na inserção internacional do SNPG” (BRASIL, 2010, p. 16)

Dois aspectos estabelecidos pelo documento, contendo 11 estudos,

encomendado anteriormente pela CAPES e apresentado no Seminário Nacional

Discussão da Pós-Graduação Brasileira, merecem destaque, pois serviram como

referência para os posteriores: (i) integração entre pós-graduação e graduação; (ii)

relação carreira acadêmica e qualificação do corpo docente do sistema de ensino

superior. (BRASIL, 2010). Dessa forma, as universidades são obrigadas a manter

em seus quadros um número determinado de mestres e doutores.

Com relação a esse Plano cabe ainda ressaltar que várias questões

envolvendo restrições orçamentárias e falta de articulação entre as agências de

fomento nacional, impediram que esse Documento Final se consolidasse num Plano

Nacional de Pós-Graduação. “No entanto, diversas recomendações que subsidiaram

as discussões foram implantadas pela Diretoria da CAPES, ao longo do período, tais

como: expansão do sistema, diversificação do modelo de pós-graduação, mudanças

no processo de avaliação e inserção internacional da pós-graduação.” (BRASIL,

2010, p. 29)

Já o 5º Plano, PNPG 2005-2010, teve como objetivo

o crescimento equânime do sistema nacional de pós-graduação, com o propósito de atender com qualidade as diversas demandas da sociedade, visando ao desenvolvimento científico, tecnológico, econômico e do país. Esse Plano teve ainda como objetivo subsidiar a formulação e a implementação de políticas públicas voltadas para as áreas de educação, ciência e tecnologia. (BRASIL, 2010, p. 29)

Destacamos ainda a formação de professores dos diversos níveis de ensino

novamente como um dos objetivos da pós-graduação.

Finalmente, chegamos ao 6º PNPG (2011-2020) que estabelece cinco

grandes temas, dentre os quais: a formação e a valorização dos profissionais da

educação. Nesse período aconteceu a reestruturação da CAPES e foi criada uma

diretoria − Ensino Básico. Coube, nesse novo PNPG, uma seção relacionada à

formação do decente da educação básica, atribuindo à pós-graduação o lugar por

excelência para a qualificação desses professores, pelo fato de ser oferecida nas

universidades que já são responsáveis diretamente por essa formação.

Page 47: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA (PUC-SP) FACULDADE DE ... · CÁCIA CRISTINA FRANÇA REHEM DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E BACHARÉIS DOCENTES: PROCESSOS FORMATIVOS E A PRÁTICA PEDAGÓGICA

46

Não aparecem, nesse último PNPG (2011-2020), indicações sobre a

formação do docente universitário. Parece-nos claro que a pesquisa é o núcleo da

pós-graduação e que é nela que se prepara o docente universitário, tendo sido essa

a característica que define o que é necessário para ser professor nesse nível de

ensino.

Nesse sentido, essa valorização da pesquisa em todos os PNPG’s contribuiu

para reforçar o instituído no âmbito das universidades − “bom professor é aquele que

é bom pesquisador” − dificultando a compreensão e o estabelecimento de quais

características deve possuir um professor para lecionar nesse nível de ensino.

Morosini (2000, p.11) chama a atenção que: Questões novas passam a ocupar lugar comum: quem é o docente universitário? Ele está preparado para acompanhar as mudanças do terceiro milênio? A complexidade da resposta pode ser vista de ângulo diversos. Se nos reportarmos à formação docente, não há uma unidade. Exige-se, cada vez mais, capacitação permanente em cursos de pós-graduação da área do conhecimento. Mas o docente está preparado didaticamente para o exercício acadêmico?

Se, por lei, a “preparação” para a docência universitária deverá acontecer nas

pós-graduações, por outro lado, as análises destes planos evidenciaram ser

necessário que sejam encaminhadas discussões e reflexões sobre a problemática

da docência na educação superior, incluindo, além da formação do pesquisador,

outros elementos que são considerados fundamentais para o exercício da docência

nesse nível de ensino. No entendimento de Masetto (2012 b), além da pesquisa e do

conhecimento específico em determinada área de conhecimento, é fundamental o

conhecimento na área pedagógica. É notório que a maioria dos cursos de pós-

graduação, mesmo os de educação, que consideram essas características, no

máximo incluem uma ou duas disciplinas optativas e estágios de um semestre, os

quais não contemplam as experiências necessárias, nem possibilitam as reflexões

imprescindíveis sobre a ação desenvolvida.

A partir dessa breve retrospectiva, pode-se então concluir que a política de

pós-graduação no Brasil objetivou, inicialmente, capacitar o docente das

universidades, depois se preocupou com o desempenho do sistema de pós-

graduação e, finalmente, voltou-se para o desenvolvimento da pesquisa na

universidade. (BRASIL, 2010)

Nessa visada, perdeu-se a oportunidade de estabelecer políticas de formação

de professores para a educação superior que contemplassem uma

Page 48: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA (PUC-SP) FACULDADE DE ... · CÁCIA CRISTINA FRANÇA REHEM DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E BACHARÉIS DOCENTES: PROCESSOS FORMATIVOS E A PRÁTICA PEDAGÓGICA

47

profissionalização voltada também para o ensino. Falta a definição de princípios

direcionadores para a docência, o que resulta em um docente aprisionado ao

conhecimento específico da matéria e a pesquisa distanciada da sala de aula.

Sendo assim, a formação de professores, que aparece como um dos

objetivos prioritários da Pós-Graduação no primeiro PNPG, foi sendo tratada em

segundo plano nos posteriores e aparece como um espaço de preparação na atual

LDB de 1996.

Desse modo, os estudos de pós-graduação são definidos como a preparação

inicial5 para os professores universitários e acabam por legitimar o direito de exercer

tal função, sem especificarem ou atribuírem quais elementos seriam contemplados,

além da formação para a pesquisa, nem a clara definição das características que

devem nortear o desempenho desse profissional.

Em 1999, no XII Fórum Nacional de Pró-Reitores de Graduação das

Universidades Brasileiras (FORGRAD), foi apregoada a qualidade da formação

desejada e o perfil para os professores da graduação, que seria:

a) Formação científica na sua área de conhecimento;

b) Pós-graduação “stricto sensu”, preferencialmente no nível do doutorado,

com permanente atualização;

c) Domínio dos métodos que produziram o conhecimento da sua área;

d) Competência pedagógica. (BRASIL, 1999)

A proposta visa criar um clima colaborativo entre os pesquisadores e tem

como destaque o processo de formação pedagógica do docente universitário. Aqui

também a titulação é valorizada e se apresenta como condição necessária, mas,

diferente das propostas apresentadas pelos PNPG’s, reconhece que a formação na

pesquisa (a formação na pós-graduação) não é condição suficiente para o exercício

da docência; o título lhe confere a habilitação necessária, porém é fundamental a

compreensão e domínio dos conhecimentos pedagógicos.

As propostas definidas nos PNPG’s apresentam a ideia de que a realização

da pós-graduação stricto sensu, formando pesquisadores, estará automaticamente

5 Importante destacar que ainda há professores da Classe Auxiliar, somente com graduação e, em

alguns casos, a especialização Lato-Sensu. O fato de, por lei, ser estabelecida a Pós-Graduação Strictu Sensu, como o lugar de “preparação” para o exercício da docência universitária, legitimando que o pesquisador é o professor universitário, esse cenário que ainda encontramos em algumas universidades brasileiras, aponta que a posse do conhecimento específico sobre determinada área, também legitima o docente universitário.

Page 49: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA (PUC-SP) FACULDADE DE ... · CÁCIA CRISTINA FRANÇA REHEM DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E BACHARÉIS DOCENTES: PROCESSOS FORMATIVOS E A PRÁTICA PEDAGÓGICA

48

os qualificando para o ensino. Cunha (2010, p. 294) argumenta que: Se as competências próprias de um pesquisador são altamente significativas para o professor da educação superior, fazendo-o um produtor de conhecimento, certamente nelas não se resume o que se requer de um professor.

Os marcos legais da construção da pós-graduação no Brasil e a definição

desta como espaço de formação do docente da educação superior não garantiram,

até então, a inclusão dos elementos necessários para a constituição de uma política

de formação inicial e continuada para o docente da educação superior, tampouco

possibilitou a definição da mesma como profissão. Dessa forma, temos conseguido

resultados pífios na relação com o ensino, a aprendizagem e com os alunos.

3.1.3 Cenário e possibilidades de formação para o docente da educação superior

Embora tenhamos avançado e regulamentado um sistema de pós-graduação,

que se configurou pela qualidade, é certo que nesse mesmo período apareceu um

nível de insatisfação quanto à preparação do docente para o exercício das

atividades de docência que extrapolem a pesquisa. Temos visto na realidade pouca

inovação e transformação dos docentes em nossas universidades.

O cenário tradicionalmente definido é que a pesquisa e o ensino são as

principais atividades que o docente universitário deve desenvolver, mas, de forma

contraditória, para a pesquisa existe uma formação com espaço e fomentos

definidos, inclusive com um orientador que juntamente com aquele sujeito em

formação, oportuniza as características inerentes para se desenvolver como

pesquisador. De forma contrária, para o ensino, além de não existir um espaço de

formação inicial, não há programas de formação para esse professor iniciante ou

mesmo para aquele que já possui um tempo de docência nesse nível de ensino. O

que se vê é o divórcio entre a pesquisa e o ensino (GARCIA, 1999).

Nesse viés, a pesquisa tem sido a principal e mais valorizada atividade

desenvolvida pelo docente universitário, incluindo nessas atividades, além do

ensino, a gestão administrativa e o desenvolvimento universitário.

O professor universitário atende a uma variedade de funções, que acaba

dividindo o seu tempo e esforço para cada uma delas, gerando conflitos e fazendo

com que uma delas seja mais valorizada, nesse caso a pesquisa, por fornecer mais

Page 50: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA (PUC-SP) FACULDADE DE ... · CÁCIA CRISTINA FRANÇA REHEM DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E BACHARÉIS DOCENTES: PROCESSOS FORMATIVOS E A PRÁTICA PEDAGÓGICA

49

prestígio e fomentos. Para Ruiz (1996) fundamentada em Ya Harding (1976), o fato

é que, geralmente, quando um bacharel adota a docência universitária como

profissão, na maioria dos casos, não é atraída pela docência. O mais usual é que

esteja motivada pela pesquisa.

Nesse sentido, o cenário de formação para a docência universitária tem que

levar em consideração esses dilemas que não são novos, como relacionar essas

tarefas, sem necessariamente valorizar uma em detrimento da outra. Sob esse

aspecto, Ruiz (1996) sinaliza para dois modelos de formação desses profissionais:

1) O modelo da Europa Continental: com algumas exceções, está

caracterizado por uma sobreposição de formação profissional, já que se é ao mesmo

tempo pesquisador e professor de uma disciplina acadêmica universitária;

2) O modelo Anglo-Americano: caracterizado por uma clara especialização ao

longo da carreira, e, portanto, formado unicamente para uma determinada função.

No Brasil, o modelo estabelecido propõe a sobreposição das tarefas desse

profissional; no entanto, esse profissional é contratado para assumir uma disciplina

acadêmica e ministrar aulas, mas são selecionados e promovidos principalmente em

virtude da sua capacidade e méritos como pesquisador.6

Conforme Anastasiou, isso fez com que em nossas salas de aula estivessem

atuando: [...] profissionais competentes em suas áreas de atuação, com pleno domínio dos saberes científicos de suas áreas, sendo desafiados a construírem-se como professores, a assumirem-se nessa nova profissão, que tem estatuto, características, compromissos e procedimentos próprios, a serem apreendidos, questionados e constantemente reformulados, pelos participantes dos colegiados institucionais da educação superior. Ficam, então, desconsiderados os elementos constitutivos dessa categoria profissional: o ideal, os objetivos, os compromissos pessoais e sociais, a regulamentação profissional, o conceito de profissão e de profissional, o código de ética, as participações nas entidades de classe, que são fundamentais para exercer-se com competência uma profissão, o que possibilitará um reconhecimento social da profissão. (2002, p. 176)

6 O Regimento Geral da Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia (2005), em seu Art. 156,

determina os critérios de promoção de carreira dos docentes: “A promoção do docente entre as diversas classes da carreira de magistério far-se-á, exclusivamente por análise de mérito, considerando desempenho acadêmico e titulação, regulamentada por Resolução específica do CONSEPE”. (UESB, 2005)

Page 51: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA (PUC-SP) FACULDADE DE ... · CÁCIA CRISTINA FRANÇA REHEM DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E BACHARÉIS DOCENTES: PROCESSOS FORMATIVOS E A PRÁTICA PEDAGÓGICA

50

Estudos realizados em vários países (GARCIA, 1999) apontam que a

pesquisa é a atividade preferida desses docentes, seguida pela publicação. A

justificativa por essa preferência ocorre, principalmente, pela valorização e

recompensas sociais e financeiras, em detrimento ao ensino, que não possui

recompensas concretas.

Segundo Fernández Pérez (1989 apud GARCIA 1999, p. 244): [...] é necessário salientar que o prestígio profissional (reconhecimento social, capacidade de influência, recompensas intrínsecas e extrínsecas, etc.) lhe é proporcionado exclusivamente pela atividade de investigação e pela produção científica. Assim, uma medíocre atitude didática pode ser compensada se o professor for um bom investigador. O caso contrário – um bom professor que não investiga – teria um menor reconhecimento institucional e prestígio social.

Temos visto, de forma bastante intensa, que a produtividade do professor,

geralmente constatada através do número de publicações e orientação em pós-

graduação, é estimulada enquanto a atividade de ensino não. A relação entre

produtividade docente e o ensino são praticamente inexistentes e se configuram de

maneira independente uma da outra.

Dessa forma, tendo a pós-graduação como o espaço destinado para a

formação ou preparação do docente universitário, o fato é que a pesquisa realizada

por Baibich-Faria com coordenadores de cursos de pós-graduação no Brasil aponta

que: [os] Coordenadores não possuem uma concepção homogênea sobre a importância da formação em nível de Pós-Graduação para o exercício da docência universitária. Suas respostas variaram desde o não considera importante até a consideração como fundamental. Há os que consideram importante na medida em que possa, via atitude de busca aprendida na/pela pesquisa, qualificar a docência, afastando-a de um exercício dogmático; há os que observam uma relação importante ainda que não direta; há os que atribuem importância como sendo outro lugar de formação e não o único lugar; há os que acham importantes, mas observam que quem forma é o orientador; há ainda quem entenda que a pesquisa, as orientações, as bancas, qualificam muito o trabalho do professor; há quem critique a imposição do sistema de avaliação da pós-graduação definindo-a como requisito para o exercício da docência; e há também quem entenda que é fundamental para melhor formar o futuro professor, tanto no que tange às políticas do Ensino Superior quanto no que se refere às formas como um adulto aprende neste nível já avançado de escolarização, o que pede um lócus próprio da aprendizagem (BAIBICH-FARIA, 2010, p. 211).

Page 52: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA (PUC-SP) FACULDADE DE ... · CÁCIA CRISTINA FRANÇA REHEM DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E BACHARÉIS DOCENTES: PROCESSOS FORMATIVOS E A PRÁTICA PEDAGÓGICA

51

Mesmo definido e estabelecido por lei, não há consenso sobre o cenário da

pós-graduação; este revela dificuldades inerentes à sua definição e contribuição

enquanto espaço formativo para a docência universitária. Como foi destacado por

Almeida (2012, p. 64): Na maioria das instituições brasileiras de ensino superior, incluindo as universidades, embora seus professores, ou parte deles, tenham realizado sua formação em cursos de pós-graduação stricto sensu e possuam experiência profissional significativa e até mesmo anos de estudos em suas áreas especificas, predomina o desconhecimento científico e até o despreparo para lidar com o processo de ensino-aprendizagem, pelo qual passam a ser responsáveis.

Cunha (2010), em pesquisa realizada com a análise de teses e dissertações

em programas de pós-graduação no campo da educação, com docentes

universitários das mais diferentes áreas de conhecimento, e através de questionários

respondidos on-line por esses professores, que foram estimulados a responder

porque tinham realizado seus estudos nesses programas, embora tenham apontado

razões das mais diferentes natureza, relatam que a motivação mais presente foi a

insatisfação com as práticas pedagógicas que vinham realizando.

No entanto, é importante destacar que, em sua maioria as escolhas foram

pessoais, principalmente pelo fato de afirmarem que as universidades em questão

não solicitaram formação específica para o desenvolvimento com as atividades de

ensino, a não ser o conhecimento específico da área que iria atuar.

Nesse sentido, Cunha (2010a, p. 181) aponta que: As motivações nem sempre pressupõem processos sistemáticos de reflexão prévia. Envolvem intuições e representações de cada sujeito. São, entretanto, produzidas numa teia de condições que estimulam a opção dos sujeitos. Diferentes fatores se imbricam e resultam em uma tomada de decisão que interfere na trajetória de formação de cada docente.

Estabelecido por lei como lócus de preparação para o exercício da docência

universitária, é pertinente questionar esse espaço porquanto, por si só, não tem

garantido essa preparação. Comumente observamos a prioridade em preparar o

pesquisador e, no máximo, exigir um estágio em uma disciplina, por um semestre,

para os alunos iniciantes; para os que já são docentes este estágio é dispensado e a

maioria retorna às suas universidades sem desenvolver ou participar de disciplinas

que contemplem a docência e os elementos necessários para a sua formação.

No entanto, é necessário ressaltar alguns eventos que têm possibilitado

algum tipo de formação aos docentes universitários, como: seminários, palestras,

Page 53: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA (PUC-SP) FACULDADE DE ... · CÁCIA CRISTINA FRANÇA REHEM DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E BACHARÉIS DOCENTES: PROCESSOS FORMATIVOS E A PRÁTICA PEDAGÓGICA

52

cursos de curta duração, oficinas, publicação de livros e materiais de apoio

(ALMEIDA, 2012), e ainda a realização de pós-graduação em programas de

educação, estágio docência, redes virtuais (CUNHA, 2010a). Acabam sendo

iniciativas individuais, eventos esporádicos e não processuais, que não são

suficientes para fornecer o aprofundamento necessário para compreensão e

desenvolvimento de uma prática educativa que possibilite a superação dos desafios

que se apresentam na complexidade da ação docente. Sob esse aspecto, é

importante remeter ao que infere Cunha (2010a, p. 295): Em geral, constitui alguns lugares, diluídos em experiências tópicas e nem sempre compreendidas na sua significação institucional, [...] por essa razão, não se constituem territórios, pois estes indicam uma condição resultante do seu conhecimento no contexto de uma estrutura de poder. Só se constituirão quando forem firmadas ações como uma cultura, delineando processos decisórios e visões epistemológicas que se tornem preponderantes. Certamente serão acompanhadas por dispositivos legais e normativos.

Embora o quadro venha se alterando nas últimas décadas, principalmente

nos países europeus e nos EUA, segundo Garcia (1999), no Brasil, ainda não é

muito comum nos espaços acadêmicos, que ocorram processos de formação para o

exercício da docência – o ensino. O referido autor destaca a experiência da França,

através da criação dos Centres, d’Initiation a l’Enseignament Superiur (CIES), que

servem às diversas universidades e formam futuros professores − bolsistas

selecionados que realizam tarefas docentes de aulas práticas e orientação de

trabalhos de alunos, supervisionados por um professor tutor pedagógico. Garcia

também apresenta o programa da Universidade da Flórida para professores de

Francês, e o da Universidade de Surrey (Inglaterra). No entanto, chama a atenção

para o fato de que a oferta não é muito variada.

Masetto (2014, p. 209) tem ressaltado que: Não é um curso ou uma vivência isolada que transformará o professor em docente profissional. A docência é uma atividade multifacetada que implica interação de conhecimento, atividades, estrutura, recursos e que envolve estudantes, professores, coordenadores de ensino, pessoal, administrativo, empresários, pais e em última instância o governo através das políticas públicas. É na interação do professor com todos esses atores e com as variadas oportunidades de formação que participar que a profissão docente será socialmente construída.

Apesar de reconhecer a limitação desses modelos vivenciados até aqui em

nossas universidades e mesmo não sendo algo ainda muito comum, algumas

instituições brasileiras têm estabelecido espaços formativos para os seus docentes,

Page 54: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA (PUC-SP) FACULDADE DE ... · CÁCIA CRISTINA FRANÇA REHEM DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E BACHARÉIS DOCENTES: PROCESSOS FORMATIVOS E A PRÁTICA PEDAGÓGICA

53

como o caso da Universidade de São Paulo (USP). Almeida (2012, p. 114) aponta

que “passar do âmbito das transformações individuais para o das mudanças

institucionais representa alteração no paradigma no desenvolvimento das políticas

universitárias”.

Cunha (2010a, p. 292) chama a atenção para o fato de que: Ao estudarmos e refletirmos sobre as diferentes modalidades de formação do professor da educação superior, diluídas em espaços múltiplos que, em algumas situações, se constituem em lugares, compreendemos que estes não se transformam em territórios porque há uma fragilidade epistemológica e cultural no campo da pedagogia universitária. Essa condição implica o não reconhecimento da sua importância para o exercício da docência na educação superior. Os conhecimentos que fazem parte de sua estrutura são pouco valorizados, em decorrência da condição histórica da docência, baseada em saberes do senso comum. (grifo nosso)

Reforçamos a necessidade da formação para a docência, destacando que

esta não se enquadrará em uma única forma, mas como uma atividade de

aprendizagem, vivenciada e localizada em tempos e espaços como uma

possibilidade de construção de si própria. Nesse sentido, a formação de professores

terá como principal função formar o docente, educar o futuro profissional para o

exercício do magistério. (VEIGA, 2008, p. 15)

A complexidade do cotidiano na educação superior ressalta a urgência de

novas possibilidades e novas reflexões para o docente universitário. O desafio posto

pelas transformações sociais, políticas e econômicas e as novas tecnologias

contribuíram para o entendimento e a constatação de que o domínio do conteúdo da

disciplina a ser lecionada não seria suficiente, indicando novas possibilidades e

novos desafios para a docência universitária.

A docência como exercício profissional possui conhecimentos próprios e

condições específicas, além do domínio da própria especialidade, o que impõe um

âmbito determinado de conhecimentos, estabelecendo-se uma preparação

específica para o seu exercício. Sobre essa discussão Zabalza (2004, p. 108)

elucida: Como em qualquer outro tipo de atividade profissional, os professores devem ter os conhecimentos e as habilidades exigidos a fim de poder desempenhar adequadamente as suas funções. Essa ideia opõe-se à ideia dos que mantêm uma visão não-profissional da docência. A afirmativa bastante usual e difundida de que “ensinar se aprende ensinando” reflete essa visão não-profissional, ou seja, não é preciso preparar-se para ser docente, pois essa é uma atividade prática para a qual não serão necessários conhecimentos

Page 55: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA (PUC-SP) FACULDADE DE ... · CÁCIA CRISTINA FRANÇA REHEM DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E BACHARÉIS DOCENTES: PROCESSOS FORMATIVOS E A PRÁTICA PEDAGÓGICA

54

específicos, mas experiência e “vocação”.

Essa formação de professores, atualmente definida como necessidade e uma

exigência, deve ser assumida através de políticas institucionais, e não através de

programas implementados por gestões esporádicas. Somente nessa perspectiva é

que teremos políticas de qualidade que oportunizem a formação desses profissionais

para um exercício competente da docência.

Atualmente o discurso vem se modificando; surgem preocupações com o

processo de formação desses professores e a constatação de que a docência

implica desafios e exigências, sendo a docência considerada uma profissão. Implica

em um processo contínuo de profissionalização, possibilitando o entendimento de

que deve permanecer em contínua construção e aperfeiçoamento e que urge a

necessidade de um espaço contínuo de formação, que deve ser implementado

dentro das universidades, organizado, segundo Cunha (2010) a partir de três

âmbitos − (i) das políticas, (ii) dos processos de formação, (iii) e da pesquisa.

Dessa forma, modificaremos o cenário, quando as atividades que são

inerentes ao docente sejam integradas e igualmente valorizadas. Como esses

profissionais chegam à docência sem possuírem os conhecimentos necessários

para o exercício de uma nova profissão – a docência – que seja a universidade o

espaço para tal intento, não somente como uma escolha isolada e pessoal, mas

como uma exigência institucional.

3.2 A PROFISSIONALIZAÇÃO DA DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA

Na década de 1980 começamos a vivenciar um movimento que busca refletir

sobre a docência exercida por professores universitários. Se antes não existiam

questionamentos quanto às funções exercidas por esse profissional, com mudanças

ocorridas na sociedade e a crise pela qual a universidade vem passando, surgem

questionamentos e novas perspectivas sobre quem é esse profissional.

Passamos a discutir que tipo de profissão e que profissional seria necessário

para atuar nesse nível de ensino. Recrutados em suas áreas de atuação e formação

inicial, esses profissionais possuem o domínio sobre os conteúdos a serem

transmitidos aos alunos.

Diante desse novo cenário decorrente das transformações socioeconômicas,

políticas e tecnológicas, surge a necessidade de uma compreensão acerca da

Page 56: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA (PUC-SP) FACULDADE DE ... · CÁCIA CRISTINA FRANÇA REHEM DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E BACHARÉIS DOCENTES: PROCESSOS FORMATIVOS E A PRÁTICA PEDAGÓGICA

55

docência universitária como profissão e a constituição de uma atividade profissional,

bem como a análise sobre a construção da sua profissionalização.

3.2.1 A docência universitária como profissão: a constituição de uma atividade profissional

Pelo caráter em que foi estruturada e veio ao longo dos tempos se

organizando, a docência universitária não precisou se afirmar como profissão; o

“status profissional” era garantindo pelo fato de fazer parte de uma instituição que

sempre se manteve como espaço privilegiado dentro do contexto social e da

garantia de pertencimento a uma profissão determinada a partir da sua formação

inicial, se configurando, na maioria dos casos, como uma atividade ou ocupação a

mais dentro da sua atividade principal.

Nesse contexto, tarda a conscientização necessária de que a docência seja

uma profissão7, da mesma forma que não tem sido fácil a sua constituição, no que

tange à definição das características e funções necessárias para o seu exercício.

Nesse movimento, a docência universitária ainda não constituiu um processo

de mobilização necessária para a sua profissionalização; no entanto, esta

necessidade vem sendo desenhada a partir de alguns fatores, dentre os quais

consideramos como principais:

1) As mudanças geradas pelas transformações, econômicas, sociais,

políticas, culturais, das últimas décadas, que modificaram o cenário na universidade,

transformando o mundo e o espaço que os professores trabalham (HARGREAVES,

2004). Por outro lado, também houve transformações nos paradigmas educativos,

estruturais (MAS TORELLÓ, 2011), trazendo o professor como um dos elementos

nucleares, apontando para novas abordagens nos processos de ensino-

aprendizagem.

2) Os dilemas impostos à docência via ampliação das vagas e a chegada de

um novo tipo de aluno. (IMBERNÓN, 1998)

O primeiro fator mudou o contexto de trabalho indicando a necessidade de um

profissional que se aproprie da docência como profissão, principalmente pelas

transformações laborais a que vem sendo submetido, bem como um novo perfil de

7 [...] profissão é uma palavra de construção social, cujo conceito muda em função das condições

sociais em que as pessoas a utilizam. (POPKEWITZ, 1998, p. 38)

Page 57: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA (PUC-SP) FACULDADE DE ... · CÁCIA CRISTINA FRANÇA REHEM DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E BACHARÉIS DOCENTES: PROCESSOS FORMATIVOS E A PRÁTICA PEDAGÓGICA

56

docentes que ingressam hoje nas universidades, profissionais que migram da

graduação para a pós-graduação e, em seguida, assumem a docência, não

desenvolvendo a profissão de origem. Essas mudanças irreversíveis no cenário

mundial afetaram consideravelmente a universidade, no entendimento de alguns

(HARGREAVES, 2004, MÁS TORELLÓ; TEJADA FERNÁNDEZ, 2011, 2013,

MASETTO, 2012).

Considerando que esse caminho não tem retorno, é necessário o

estabelecimento de políticas de formação inicial e continuada para que esses

profissionais possam, ao assumirem a docência, compreender e conhecer de que

forma é possível desenvolver uma docência profissionalizada e contribuir na

formação desses alunos (futuros profissionais). Ao considerar essa perspectiva, Más

Torelló e Tejada Fernández (2013, p. 374) inferem que:

Todas essas mudanças produzidas no contexto social, laboral e cultural, causaram e estão causando, como não podiam ser de outra maneira, mudanças no âmbito universitário, todas essas mudanças que são produzidas em nossa sociedade e que afetam a nossa universidade devem ser enfrentados como oportunidades, como impulsos, como circunstâncias favoráveis para a melhoria.8 (tradução nossa)

Sendo considerada como oportunidade, essas mudanças podem

profissionalizar a docência a partir de novas possibilidades de formação. Dessa

forma, é imprescindível que seja a universidade a oferecer essa formação, pois não

teremos alterações nesse quadro, se os professores não forem incluídos nesse

movimento; sem esse processo de constituição e desenvolvimento profissional não

será possível transformar as práticas pedagógicas vivenciadas até aqui e que

ajudarão professores e alunos a fazerem parte desse novo cenário social.

Em função dessas mudanças, Masetto (2012 b) afirma que são necessárias a

reflexão e a atualização do debate sobre a docência universitária. Ele então aponta

para as três questões fundamentais, que necessitam de reflexão e atualização, são:

(a) a estrutura organizacional do ensino superior no Brasil, alicerçado até os nossos

dias no modelo francês napoleônico orientado para os cursos profissionalizantes,

com currículos seriados e fechados, voltados unicamente para uma formação

8 Todos estos câmbios producidos em el contexto social, laboral, cultural, etc.,ham provocado y están

provocando, como no podia ser de otra manera, cambio em el ámbito universitário; todos estos câmbios que se están produciendo em nuestra sociedade y que afentam a nuestra Universidade deben ser afrontados como oportunidades, como impulsos, como circunstâncias favorables para la melhora. (MAS TORELLÓ; TEJADA FERNÁNDEZ, 2013, p. 374)

Page 58: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA (PUC-SP) FACULDADE DE ... · CÁCIA CRISTINA FRANÇA REHEM DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E BACHARÉIS DOCENTES: PROCESSOS FORMATIVOS E A PRÁTICA PEDAGÓGICA

57

específica, com professores reconhecidamente eficientes em suas respectivas

áreas; (b) o impacto das tecnologias de informação e comunicação sobre a produção

e socialização do conhecimento e sobre a formação de profissionais, com o

surgimento da Sociedade do Conhecimento ou da Aprendizagem – essa introdução

das tecnologias nas universidades modificou a relação da mesma com o

conhecimento , quanto à divulgação e à produção; (c ) as carreiras profissionais –

que transformam-se para atender às novas exigências, pois são necessárias novas

capacitações “adaptabilidade ao novo, criatividade, autonomia, comunicação,

iniciativa, cooperação”. (MASETTO, 2012 b, p. 14; 19)

Não será possível introduzir essas mudanças na educação superior, sem

entrar nesse debate e, consequentemente, fazer as transformações necessárias.

Para tanto, se torna fundamental incluir e relacionar os aspectos laborais do

professorado e as suas competências.

As modificações desse panorama de mudanças, por sua vez, exigem uma

nova configuração para o exercício da atividade docente, principalmente no campo

da docência. O novo perfil docente propõe a superação de um professor transmissor

de conteúdos, para mediador de aprendizagem, incluindo uma maior preparação e

compromisso com os alunos, bem como o domínio correto das TICs.

No entendimento de Day (2001, p. 30):

Não há dúvidas de que as circunstâncias em que os professores trabalham e as exigências que lhes são feitas estão a mudar à medida que as tecnologias da comunicação diminuem o papel do professor como detentor exclusivo do saber especializado.

Sendo assim, não basta apenas entender como as TICs funcionam, tampouco

somente o conhecimento sobre a ferramenta; é preciso a apropriação do processo

de produção de conhecimento, incluindo-as como um elemento fundamental da

estratégia de desenvolvimento, comunicação e ensino que pode ser usado a partir

deste suporte.

Igualmente, torna-se fundamental o desenvolvimento e a apropiação, por

parte desses docentes, não mais como uma atividade desenvolvida, dentro das

tantas definidas pela sua profissão inicial, mas, principalmente, como uma profissão

com princípios, conhecimentos, destrezas e competências próprias.

No percurso em que nos encontramos, as perspectivas de constituição de

uma atividade profissional, passam sem sobra de dúvida pela inclusão dessas

Page 59: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA (PUC-SP) FACULDADE DE ... · CÁCIA CRISTINA FRANÇA REHEM DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E BACHARÉIS DOCENTES: PROCESSOS FORMATIVOS E A PRÁTICA PEDAGÓGICA

58

mudanças na universidade, aliada a uma definição e à aprendizagem de um campo

de competências necessárias para o desenvolvimento das funções estabelecidas

para a docência.

Soma-se ainda a isso o segundo fator - o novo aluno que chega nas

universidades. Segundo dados do INEP, em 2016 o número de alunos matriculados

na educação superior era de 8.052.254; entretanto, é fato que os números que

vinham em um crescente estejam diminuindo e que as vagas ociosas venham

aumentando com um número considerável de evasão. Frente a essa realidade, é

importante ressaltar que houve certo desconforto, o que contribuiu para uma maior

reflexão sobre a função docente. Antes o aluno era oriundo das classes mais

privilegiadas e possuía um percurso escolar que o preparava adequadamente para

cursar a universidade. A crença estabelecida era de que esses alunos não careciam

de maiores preocupações por parte do professor e, em sua maioria, avançavam sem

grandes questionamentos sobre o ensino ministrado até então.

Na primeira década do século XXI, com as mudanças vivenciadas a partir da

ampliação de vagas nas universidades públicas e nas privadas, através de

programas de incentivo para jovens das classes populares e oriundos das escolas

públicas, percebe-se a massificação do acesso e ampliação dos cursos. Em virtude

disso, a princípio, acreditava-se que esses alunos não possuíam aprendizagem

significativa e suficiente no processo formativo da educação básica; esta ótica era

corroborada por uma parcela da academia e da sociedade que questionavam essas

políticas compensatórias.

Esse novo aluno, com alto grau de heterogeneidade e diversidade de

interesses, de disponibilidade de tempo, de bagagem formativa e experiencial, gerou

a necessidade de replanejar as estratégias didáticas utilizadas, os materiais

didáticos, etc. Os desafios impostos à docência aumentaram e tornaram-se mais

complexos, que passa a ser confrontada. Em vista disso, surgem dilemas

relacionados à prática pedagógica e que são recorrentes: como ensinar para fazer o

aluno aprender? Como motivar esses alunos? Como ensinar grupos tão distintos?

Um outro fator a se levar em evidência, nesse contexto, foi a necessidade de

ampliação do número de professores − um grupo de neófitos, em sua maioria, sem

preparação específica para exercer o ensino, estabelecendo uma prática cada vez

mais tradicional e repetitiva.

Page 60: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA (PUC-SP) FACULDADE DE ... · CÁCIA CRISTINA FRANÇA REHEM DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E BACHARÉIS DOCENTES: PROCESSOS FORMATIVOS E A PRÁTICA PEDAGÓGICA

59

A década de 1990, quando da promulgação da LDB 9.394/96, passamos a

conviver com a exigência de formação em cursos de Pós-Graduação Lato e Strictu

Sensu. Esse período inaugura a cobrança pelas titulações, selecionando

profissionais que, em sua maioria, passaram da graduação para a pós-graduação,

sem nunca atuarem como profissionais no campo da sua formação inicial, nem

terem vivenciado uma sala de aula como professor ou num espaço específico que

tratasse dos aspectos formativos necessários para o exercício da docência. Havia,

como requisito prioritário apenas a posse de títulos de mestre ou de doutor.

Esses docentes, ao serem selecionados, principalmente através das bancas

de concurso ou seleção, foram submetidos a um processo avaliativo que, de forma

geral nas universidades brasileiras, solicitavam o Curriculum-Vitae, uma prova

escrita sobre determinado tema relacionado à disciplina em questão e à prática de

uma aula, sendo observados os conhecimentos pedagógicos-didáticos. Mesmo

sendo aprovado, mediante o alcance das médias em cada um desses itens, a partir

de então, salvo raríssimas exceções, esse professor nunca mais será submetido a

processos de avaliação que o qualifiquem para o exercício da função para a qual foi

selecionado, principalmente com relação aos denominados saberes pedagógicos-

didáticos. Quanto à competência para a pesquisa, os títulos de Mestre e Doutor são

suficientes daí para a frente.

Sobre essa questão, Más Torelló (2011, p. 202) tece a seguinte consideração:

O professor universitário trabalha na instituição formativa de maior nível existente e, curiosamente em sua imensa maioria, não é formado para exercer essa função, já que tem ingressado no corpo docente depois de formar-se largamente nos conteúdos próprios de sua área (com um registro mais ou menos brilhante que não garante nenhuma competência docente) em instituições de formação superior e sem receber nenhum tipo de formação pedagógica, já que majoritariamente não tem sentido esta necessidade formativa, nem a instituição lhes tem exigido nenhuma formação pedagógica antes do desenvolvimento da função docente.9 (tradução nossa)

Já se convencionou que a definição de uma ocupação adquire o status de

profissão ou não de acordo com a presença ou ausência de um conjunto de

9 El professorado universitário trabaja em la institución formativa e mayor nível existente y, curiosamente em su imensa mayoria, no se han formado para ejercer esa función docente después de formarse largamente em los contenidos próprios de su área (com um expediente más o menos brilhante que no garantiza ninguna competência docente) em instituiciones de formaci[on superior y sin recibir ningún tipo de formación pedagógica, ya que mayoritariamente no han sentido esta necessidade formativa, ni la instituicione les há exigico ninguna formación pedagógica previa al desarrolho de dicha función docente.

Page 61: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA (PUC-SP) FACULDADE DE ... · CÁCIA CRISTINA FRANÇA REHEM DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E BACHARÉIS DOCENTES: PROCESSOS FORMATIVOS E A PRÁTICA PEDAGÓGICA

60

atributos ou características próprias, que são definidas quando do estabelecimento

de algumas regras específicas, tais como: (i) um corpo codificado de conhecimentos;

(ii) a existência de mecanismos de regulação e controle, recrutamento, preparação,

acesso e exercício; (iii) uma responsabilidade ética ante os alunos, sua família e a

sociedade (IMBERNÓN, 1998, p. 18)

Diante do exposto, a discussão sobre se a docência universitária é ou não

uma profissão, se estamos diante de uma semiprofissão e a tentativa de encaixá-la

no mesmo patamar das disciplinas liberais tradicionais (Medicina e Direito), embora

não esteja esgotada10, já trazem reflexões importantes e ao mesmo tempo a

superação desse discurso.

Tal contexto aponta para as considerações de Flores:

Outros autores, porém, argumentam que o debate sobre se o ensino é ou não uma profissão deve ser entendida à luz das chamadas (caring professions), tais como serviço social e enfermagem (Hargreaves, Goodson, 1996), com base no pressuposto de que a visão mais convencional ou clássica do que significa ser profissional não tem em consideração as características intrínsecas ou peculiares do ensino (nomeadamente as suas dimensões pessoal, moral, emocional e social). Nesse contexto, Imbernón (1994) sustenta que a perspectiva clássica se tornou obsoleta, não sendo, por isso válida para analisar a natureza profissional do ensino, sugerindo que esta visão estática e determinista deve dar lugar a uma visão mais dinâmica e multidimensional de modo a compreender mais profundamente a cultura profissional de uma dada ocupação (FLORES, 2014b, p. 855).

Sabemos o quão difícil e longo tem sido o processo de reconhecimento e

confirmação da docência como profissão. É comum a apresentação da mesma como

uma semiprofissão, fato esse reforçado pelas características determinadas para a

configuração das profissões. Cada profissão é reconhecida a partir do

estabelecimento da definição de uma base de conhecimentos específicos.

Schumann (2005) considera ser essencial a definição desses conhecimentos em

função da variedade, complexidade e unicidade que os profissionais enfrentam no

cotidiano. (TARDIF, 2009)

10 Uma reinvindicação tradicional básica dos professores é a de que são “profissionais”. Nesta ideia

está implícita a percepção de uma tradição segundo a qual a sua formação lhes proporciona o domínio do conhecimento especializado da disciplina, da pedagogia e dos alunos, ao mesmo tempo que a sua posição enquanto professores lhes confere um certo grau de autonomia. Saber se os professores são ou não profissionais é uma questão que tem sido amplamente discutida ao longo dos anos. (DAY, 2001, p. 21)

Page 62: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA (PUC-SP) FACULDADE DE ... · CÁCIA CRISTINA FRANÇA REHEM DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E BACHARÉIS DOCENTES: PROCESSOS FORMATIVOS E A PRÁTICA PEDAGÓGICA

61

No entanto, sem a compreensão, por parte dos docentes universitários, do

que venha a ser a docência como profissão, não é possível a sua transformação em

uma atividade profissional. Zabalza (2004, p. 109) faz uma análise sobre as

transformações pelas quais passam os docentes universitários atualmente:

Ainda que na visão de alguns, o papel do professor universitário continue sendo o mesmo, não há dúvida de que estamos diante de uma expressiva transformação, seja das características formais da dedicação dos professores (com uma presença ampla de professores associados e em tempo parcial), seja das exigências que são impostas a eles. Usamos o termo “docência” para nos referir ao trabalho dos professores, mas somos conscientes de que eles desempenham, na realidade, um conjunto de funções que ultrapassa o exercício da docência. As funções formativas convencionais (terum bom conhecimento sobre sua matéria e saber explicá-la) foram se tornando mais complexas com o passar do tempo e com o surgimento de novas condições de trabalho (massificação dos estudantes, divisão dos conteúdos, incorporação de novas tecnologias, associação do trabalho em sala de aula com o acompanhamento da aprendizagem em empresas, surgimento dos intercâmbios e outros programas interinstitucionais, etc.).

O exercício de uma profissão está diretamente relacionado às funções que

são definidas como de sua competência. Ao considerarmos essa perspectiva, em se

tratando da profissão docente na educação superior e pelo caráter da sua formação,

é possível afirmar que carece de elementos para tal exercício. Estes precisam ser

adquiridos e não serão obtidos no percurso do desenvolvimento profissional;

portanto, que sejam incluídos em seus processos formativos − no processo de

profissionalização. Para que assumissem a docência universitária como profissão,

no entendimento de Tardif (2009, p. 61), “as pessoas que desejam ocupar tal função

deveriam dominar uma base de conhecimentos especializados antes de assumir, de

maneira criteriosa e ética, responsabilidade nesse trabalho”.

Entendemos que o fato de possuir o saber denominado de disciplinar, sem o

domínio dos elementos necessários à prática pedagógica, o docente acaba por

assumir uma prática intuitiva, espontânea, baseada no ensaio e erro, o que impede

que a docência seja admitida como uma profissão. Convém salientar que, embora

não a encaixemos no sentido proposto pela “sociologia das profissões”, e rejeitemos

a denominação corriqueira de “semiprofissão”, estamos defendendo que seja uma

profissão diferenciada pelas características inerentes ao seu processo de

constituição e estruturação.

Page 63: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA (PUC-SP) FACULDADE DE ... · CÁCIA CRISTINA FRANÇA REHEM DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E BACHARÉIS DOCENTES: PROCESSOS FORMATIVOS E A PRÁTICA PEDAGÓGICA

62

Ainda em relação ao exposto, vale mencionar que a constituição da docência

como profissão, frente às referidas transformações, recai consequentemente na

definição de atribuições para essa nova universidade. Destacamos a importância do

professor, como um dos elementos fundamentais nesse contexto, inaugurando um

novo perfil docente e uma nova profissionalidade, que serão estruturados a partir de

alguns elementos, tais como: a total incorporação das tecnologias de informação e

comunicação ao seu trabalho; o ensino como mediação – estabelecendo ao docente

o papel de guia e mediador da aprendizagem do aluno; a gestão da sua formação e

da sua ação dentro da universidade; o comprometimento com a formação do aluno

(profissionalização), a gestão do ensino – se responsabilizando pelos recursos, pela

seleção de materiais, a superação da individualidade e a busca pelo trabalho em

grupo entre os docentes. (MAS TORELLÓ; TEJADA FERNÁNDEZ, 2013).

3.2.2 A profissionalização da docência universitária: o tornar-se professor

Pretendemos aqui definir e assumir um posicionamento teórico sobre o

conceito de profissionalização, profissionalidade e profissionalismo, partindo do

princípio que são termos que se constituem a partir de significados e posições

diferentes. Não são termos que devem ser usados de forma justaposta, pois não se

referem sobre a mesma coisa e cumprem a função de compor a concepção de

profissão docente, conforme o assumido nesse trabalho.

A profissionalização é o processo de tornar-se docente, da aquisição das

características necessárias para um exercício qualificado da docência, e das

condições postas para o exercício da profissão, o vir a ser – incluídas e

determinadas pelo desenvolvimento profissional permanente. Para Day (2001, p. 20-

21): O desenvolvimento profissional envolve todas as experiências espontâneas de aprendizagem e as atividades conscientemente planificadas, realizadas para benefício, direto ou indireto, do indivíduo, do grupo ou da escola e que contribuem, através destes, para a qualidade da educação na sala de aula. É o processo através do qual os professores enquanto agentes de mudança, reveem, renovam e ampliam, individual ou coletivamente, o seu compromisso com os propósitos morais de ensino, adquirem e desenvolvem, de forma crítica, juntamente com as crianças, jovens e colegas o conhecimento, as destrezas e a inteligência emocional, essenciais para uma reflexão, planificação e prática profissionais eficazes, em cada uma das fases de sua vida profissional.

Page 64: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA (PUC-SP) FACULDADE DE ... · CÁCIA CRISTINA FRANÇA REHEM DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E BACHARÉIS DOCENTES: PROCESSOS FORMATIVOS E A PRÁTICA PEDAGÓGICA

63

Com efeito, é o “processo socializador de aquisição de tais características”

(IMBERNÓN, 2011, p. 25). Similarmente, é a possibilidade de estruturar a docência

universitária a partir da formulação de políticas de formação docente inicial e

continuada, e da definição de lugares específicos para que a formação ocorra, além

de possibilitar o respeito, a dignidade e a valorização tão necessárias aos docentes.

Contreras (2012) chama a atenção para o perigo da busca pela

profissionalização incorrer no silenciamento e na aceitação, por parte dos

professores, de políticas oficiais que impliquem na perda de autonomia11, na

homogeneização das práticas e na burocratização do ensino. Aponta ainda que os

administradores empregam a luta e o reconhecimento do processo de

profissionalização dos docentes, com o intuito de neutralizar os conflitos existentes;

no entanto, para os professores, a profissionalização incorre na possibilidade de

obter conquistas e melhores condições de trabalho, como possibilidade de

reconhecimento e constituição permanente de uma categoria profissional, tal como é

defendido neste trabalho.

Outrossim, quando assumimos a necessidade de profissionalização para o

exercício da docência no ensino superior, acreditamos ser possível “dar caráter de

profissão a uma ocupação e converter um amador em profissional” (MONTERO,

2001, p. 95) − é possibilitar ao profissional a capacidade para fundamentar as suas

decisões de forma especializada.

Por profissionalidade, entendemos que vem a ser, “a expressão da

especificidade de atuação dos professores na prática, ou seja, o conjunto de

atuações, habilidades, conhecimentos, atitudes e valores ligados a elas, que

constituem a prática específica de ser professor” (GIMENO SACRISTÁN, 1995, p.

65), adquiridas no processo de profissionalização no percurso profissional, seja na

prática, seja em espaços específicos de formação. Ou ainda, “como um conjunto de

atributos, socialmente construídos, que permitem distinguir uma profissão de outros

tipos de atividades, igualmente relevantes e valiosos (ROLDÃO, 2005, p. 108)

Outro aspecto dessa concepção, difundido por Contreras (2012, p. 82), se

refere “às qualidades da prática profissional dos professores em função do que

requer o trabalho educativo”; dessa forma, reafirma a ideia da profissionalidade não

11 [...] é o da paulatina perda por parte dos professores daquelas qualidades que faziam deles

profissionais, ou, ainda, a deterioração daquelas condições de trabalho nas quais depositavam suas esperanças de alcançar tal status. (CONTRERAS, 2012, p. 37-38)

Page 65: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA (PUC-SP) FACULDADE DE ... · CÁCIA CRISTINA FRANÇA REHEM DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E BACHARÉIS DOCENTES: PROCESSOS FORMATIVOS E A PRÁTICA PEDAGÓGICA

64

somente como a descrição do trabalho docente, mas, também, do que se espera

alcançar realizando esse trabalho. Sendo assim, a profissionalidade, no

entendimento desses autores, tem como principal característica garantir uma prática

com os conhecimentos e fundamentos necessários para o exercício consciente da

sua função.

O profissionalismo, por sua vez, está relacionado à dimensão ética do

exercício da profissão, como infere Silva (1997, p. 165): A dimensão ética do profissionalismo é irrecusável no caso da docência. A regulação ética do desempenho profissional surge, a par da formação profissional adquirida no decurso de uma escolarização prolongada, da profissionalização daqueles que exercem a atividade, da existência da associação de classe, como um dos elementos constitutivos do profissionalismo e com uma das mais fortes expressões da autonomia dos profissionais que dão a si mesmos as suas regras de conduta.

Embora no Brasil a ética docente passe pelo crivo individual, pois não

possuímos regulamentação estabelecida por uma associação de classe e nem

possuímos um código de ética, ainda assim, tem sido possível aos professores

exercerem a docência com sentimento de coesão e pertencimento a um grupo, o

que tem possibilitado, mesmo que de maneira insuficiente, a consciência de que a

docência se configura como uma profissão.

O profissionalismo implica também um exercício de uma atividade de forma

responsável e com o domínio necessário das capacidades e habilidades específicas

para tal função. É então interessante ressaltar o esclarecimento de Imbernón (2011,

p. 26):Em termos gerais, o profissionalismo na docência implica uma referência à organização do trabalho dentro do sistema educativo e à dinâmica externa do mercado de trabalho. Ser profissional, portanto, implica dominar uma série de capacidades e habilidades especializadas que nos fazem ser competentes em um determinado trabalho, além de nos ligar a um grupo profissional organizado e sujeito a controle.

Não obstante as eternas discussões sobre a profissão docente ser ou não

uma profissão, entendemos ser necessário compreender que a profissionalização –

o vir a ser, juntamente com a profissionalidade e o profissionalismo compõem o

processo de constituição profissional, para todas as atividades e incluímos nesse rol

a docência universitária.

A escolha pela profissão faz parte do ritual de crescimento. Somos impelidos

desde cedo a manifestar o “que queremos ser quando crescer”, o que incide na

Page 66: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA (PUC-SP) FACULDADE DE ... · CÁCIA CRISTINA FRANÇA REHEM DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E BACHARÉIS DOCENTES: PROCESSOS FORMATIVOS E A PRÁTICA PEDAGÓGICA

65

forma como conduzimos a nossa vida acadêmica, pois o acesso à

profissionalização12 passa pela formação inicial, ou seja, é preciso acesso e

realização de um curso (graduação), dando início ao processo de profissionalização,

que acontece durante toda vida profissional13.

Dessa forma, corroboramos Mesquita e Machado (2017, p. 51), quando

afirmam ser “a formação inicial uma etapa peculiar onde o/a formando/a, futuro/a

professor/a, pelo contato direto que tem com a docência, constrói imagens do

professor ideal e dos papéis que deve desempenhar”. No caso da docência

universitária, exercida por profissionais bacharéis, isso não ocorre. É no momento do

ingresso na universidade, quando já vai assumir as funções, que se inicia o processo

de profissionalização; nesse caso se torna necessário acontecer uma “nova

profissionalização”, pois possuímos uma profissão anterior à profissão de docente

universitário – uma profissionalização não voltada para a docência.

No entanto, a profissionalização do docente da educação superior, acontece

distante de uma das suas funções prioritárias. Em geral, somos contratados para

ministrar aulas, ensinar, se a profissionalização ocorre durante o percurso do

exercício da profissão, com a posse e aquisição dos fundamentos necessários para

um exercício profissional qualificado, a falta de lugares de formação, acarreta um

trabalho solitário, sem espaços colaborativos ou troca de experiências entre os

professores, além de uma prática baseada em memórias e repetições.

Continuidades e rupturas, a existência de tensão entre uma lógica academizante e

uma lógica profissionalizante requerem um balanço, um aprofundamento sob o

enfoque de uma “nova profissionalização” para o exercício da docência no ensino

superior.

Essa “nova profissionalização”, dada a sua complexidade, deve ser

reconfigurada no próprio sistema de formação e profissionalização, anterior à

docência, investindo-se agora e especificamente para essa sua nova profissão.

Nesse sentido, quando negligenciamos uma formação específica para a docência,

12 Processo socializador de aquisição das características e capacidades específicas da profissão. (IMBERNÓN, 2011, p. 3)

13 Mesmo sendo aceito que a formação inicial dos professores ocorra desde o período vivido como aluno, acrescentamos que não configuramos o aluno e o professor como sujeitos que tenham os mesmos papéis no processo de ensino-aprendizagem; portanto, a observação decorrente das aulas vivenciadas não os transforma e nem garante a legitimidade de sua ação ao tornar-se professor. Logo, reforçamos o posicionamento de Mesquita e Machado (2017) ao afirmarem que é na formação inicial que começamos a nos tornar profissionais.

Page 67: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA (PUC-SP) FACULDADE DE ... · CÁCIA CRISTINA FRANÇA REHEM DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E BACHARÉIS DOCENTES: PROCESSOS FORMATIVOS E A PRÁTICA PEDAGÓGICA

66

reforçamos as premissas básicas que garantem a qualquer profissional exercer a

docência, não como uma profissão, mas como uma atividade a mais da sua

profissão inicial, além de manter o ensino e a sua natureza distante dos processos

formativos.

Falar de profissionalização de docentes na educação superior, exige, além do

estabelecimento de competências pedagógicas, a criação de espaços e tempos de

formação que permitam desenvolvê-las através de uma prática reflexiva e

cooperativa entre os docentes, para que, assim, e de fato, essa categoria avance e

se constitua profissionalmente – tornem-se professores, a partir do processo,

inicialmente, de uma “nova profissionalização” e, ao longo da vida profissional, com

os processos formativos incluídos no desenvolvimento profissional.

Portanto, o tornar-se docente da educação superior, se dará em um primeiro

momento, a partir da aceitação desse profissional “de que a docência é uma

profissão”; em um segundo momento, de que ele “é docente”, portanto um

profissional da docência e no terceiro momento que sendo uma profissão, “precisa

necessariamente de posse dos elementos necessários para exercê-la”. Por analogia,

será possível a constituição de espaços formativos, de políticas de formação para

esses profissionais, estabelecidas como políticas de Estado e Institucional.

3.3 ENTRE O SER E O FAZER: AS ESPECIFICIDADES DA PRÁTICA PEDAGÓGICA DO DOCENTE DA EDUCAÇÃO SUPERIOR

A proposta, nesse capítulo, é discutir a prática pedagógica, sua constituição

e seus elementos através da análise do ensino desenvolvido pelos docentes – o ato

de ensinar, a repercussão na aprendizagem e na formação do aluno, compreender

que tipo de professor é necessário para constituir uma prática inovadora e produtora

de conhecimentos, como também especificar as competências necessárias para a

realização do ensino de forma inovadora, permeadas por práticas pedagógicas

conscientes e rupturas com as práticas pedagógicas instituídas, até então, nesse

nível de ensino.

Page 68: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA (PUC-SP) FACULDADE DE ... · CÁCIA CRISTINA FRANÇA REHEM DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E BACHARÉIS DOCENTES: PROCESSOS FORMATIVOS E A PRÁTICA PEDAGÓGICA

67

3.3.1 A prática pedagógica: o ensino, a aprendizagem e a formação do aluno como atividades do exercício da docência

Até o presente momento, a prática pedagógica vivenciada no ensino superior

pode ser vista em uma perspectiva positivista da ciência, marcada pela ideia do

conhecimento como algo pronto e determinado, com papéis de professores e alunos

já determinados a priori – ao professor cabe a transmissão desse conhecimento e ao

aluno a recepção passiva, levando o docente a realizar uma prática dividida entre a

rotina e improvisação regulada (PERRENOUD, 1993).

Visto sob essa ótica, as narrativas sobre o ensino, a aprendizagem e a

formação do aluno acontecem em uma prática pedagógica realizada de forma

mecânica e sem reflexividade. Perrenoud (1993, p. 21) destaca que: Uma boa parte dos atos de ensino não estão, deixaram de estar ou nunca estiveram sob o controle da razão e da escola deliberada. Por um lado, a profissão é composta por rotinas que o docente põe em ação de forma relativamente consciente, mas sem avaliar o seu caráter arbitrário, logo sem as escolher e controlar verdadeiramente. É parte da reprodução da tradição coletiva retomada por conta própria ou de hábitos pessoais cuja origem se perde no tempo. [...] tendo em consideração a urgência e o caráter inconfessável ou impensável da prática, o professor realiza coisas que desconhece ou prefere não ver.

Em outras palavras, a prática pedagógica realizada por esses professores é

muito mais fruto de uma rotina improvisada e mecanizada do que algo racional e

planejado, o que gera uma desconfiança generalizada por parte da comunidade

educativa. Sendo assim, torna-se tranquilizador achar que os professores sabem o

que estão realizando e que conseguem dominar as situações que surgem no

cotidiano da sala de aula.

Do mesmo modo, é possível visualizar uma rotina pautada em programas que

mudam muito pouco ano após ano; mesmo com situações diversas e turmas

diferentes é notório que, em muitos casos, o professor repita as práticas

pedagógicas preso a uma rotina que tem pouca ressignificação. Entendemos que a

prática pedagógica vem a ser a realização do trabalho docente, mas aqui

compreendida, na perspectiva de Fernandes (1998, p. 98), como: Prática intencional de ensino e aprendizagem, não reduzida à questão didática ou às metodologias de estudar, mas articulada à educação como prática social e ao conhecimento como produção-histórica, datada e situada, numa relação dialética entre prática-teoria, conteúdo-forma.

Page 69: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA (PUC-SP) FACULDADE DE ... · CÁCIA CRISTINA FRANÇA REHEM DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E BACHARÉIS DOCENTES: PROCESSOS FORMATIVOS E A PRÁTICA PEDAGÓGICA

68

Por certo, a prática pedagógica extrapola o simples ato do ensino como

transmissão de conhecimento fundamentado em uma única competência – a da

posse do conhecimento por parte do professor − o ensino que, quando realizado de

forma intencional, tem como finalidade a formação de sujeitos em contextos sociais

estabelecidos. Este deve acontecer de forma planejada, assumindo-se que todo

ensino mediatizado por intervenções pedagógicas deve ser precedido, por parte do

docente, de um cuidadoso planejamento, sem desconsiderar a diversidade dos

indivíduos e a existência do não racional, pois nem tudo que diz respeito à ação do

professor pode ser controlado.

Esses três eixos da prática pedagógica (ensino-aprendizagem-formação

profissional do aluno) compõem a atividade do professor no que se refere tanto à

ação docente quanto ao ensino. O ensino realizado na educação superior tem sido

alvo de estudos, a exemplo de Anastasiou (2002) Cunha (2005), Masetto (1980,

1992, 2003, 2004, 2010, 2012, 2013, 2015), Zabalza (2004, 2014) Mas Torelló e

Tejada Fernández (2011, 2013) entre outros, e apontam para a necessidade de

ressignificações e transformações nesse ato, que vem sendo realizado de forma

espontânea e improvisada, na maioria dos casos.

Anastasiou (2007, p. 17) chama a atenção para a ideia que os docentes

possuem sobre o ato: Ensinar é apresentar ou explicar o conteúdo numa exposição, o que a grande maioria dos docentes procura fazer com a máxima habilidade de que dispõe; daí a busca por técnicas de exposição ou oratória, como elementos essências para a competência docente.

Dessa forma, estaria definido então que o ensinar acontece através da

transmissão/passar os conteúdos, utilizando-se de aulas expositivas.

Esse entendimento foi reforçado, principalmente, em função da premissa

estabelecida historicamente de que “quem sabe fazer, sabe ensinar” (MASETTO,

2012 b) permitiu que fosse aceito como verdade que a docência universitária, pela

sua constituição, tinha características bem definidas quanto aos conhecimentos,

competências e saberes que seriam necessários para o seu exercício.

As discussões em torno da prática pedagógica dos docentes universitários

ficaram longe dos muros da academia, pois, segundo a premissa acima, o

conhecimento sobre o conteúdo da disciplina seria suficiente para um pleno

exercício da docência.

Page 70: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA (PUC-SP) FACULDADE DE ... · CÁCIA CRISTINA FRANÇA REHEM DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E BACHARÉIS DOCENTES: PROCESSOS FORMATIVOS E A PRÁTICA PEDAGÓGICA

69

Perrenoud (1993, p. 93) destaca que alguns: [...] pensam que a pedagogia não existe, que para ensinar basta dominar o saber a ser transmitido. Outros, sem negarem a importância do método, valorizam as questões de talento ou personalidade. Outros ainda admitem que a competência didática se adquire, pensam que a formação tem pouco peso em relação à experiência profissional, à aprendizagem concreta.

Nesse sentido, para muitos professores era o bastante possuir o

conhecimento específico da disciplina que iria ministrar, “mesmo porque ensinar

significava ministrar grandes aulas expositivas ou palestrar sobre um determinado

assunto” (MASETTO, 1998, p. 11) e repetir práticas de ensino vivenciadas como

aluno.

A Universidade tinha um papel definido e as discussões sobre práticas

pedagógicas: relação professor-aluno, avaliação da aprendizagem, ensino-

aprendizagem não faziam parte e não eram necessárias para que a docência se

efetivasse.

Tavares (2003, p. 21), chama a atenção para o fato de que: A tese de que basta saber as matérias ou as ciências pedagógicas para ensinar não, faz, hoje, qualquer sentido, nem nunca o fez verdadeiramente. Não vale a pena gastar mais tempo e recursos para alimentar diálogos de surdos, em que as pessoas parecem simplesmente ter perdido o bom senso. É preciso as duas coisas, ou seja, preparar-se bem científica e pedagogicamente para ser um bom profissional, seja ao nível da formação básica, secundária ou superior.

Não obstante a resistência de um grupo de professores, já é possível

enxergar outros das mais diversas áreas do conhecimento, que compreendem a

necessidade de uma formação que alie conhecimento científico às especificidades

da prática educativa. Para Gimeno Sacristán (1995, p. 78) cada tarefa do docente

exige conhecimentos específicos, sendo diferente o grau de apoio e a influência do

componente pessoal face aos fundamentos científicos. Nesse mesmo entendimento

Maciel (2009, p. 65) destaca que: A pedagogia universitária precisa ainda ser desdobrada em sua aplicabilidade às práticas pedagógicas desenvolvidas nos diferentes cursos, assumindo que ensinar a aprender uma profissão exige competências, habilidades e atitudes diferenciadas daquelas que o profissional desenvolveu em seu perfil profissiográfico inicial e que lhe credenciou a ensinar essa profissão.

Os bacharéis/docentes, em seu percurso formativo inicial, não adquirem

conhecimentos necessários para exercer a docência. Se entendermos que a

formação inicial é muito importante, já que o conjunto de atitudes, valores e funções

Page 71: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA (PUC-SP) FACULDADE DE ... · CÁCIA CRISTINA FRANÇA REHEM DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E BACHARÉIS DOCENTES: PROCESSOS FORMATIVOS E A PRÁTICA PEDAGÓGICA

70

que esta formação confere à profissão, se é na universidade que se geram

determinados hábitos que incidirão no exercício da profissão, não se conceberia

professores universitários que não se submetessem a essa formação (IMBERNÓN,

2011).

Já nos parece claro que, atualmente, a docência é considerada uma

profissão; portanto, assim como nas demais, é fundamental garantir que esses

profissionais possuam um domínio adequado da ciência, técnica e arte da mesma.

Por conseguinte, é indispensável que possuam competência profissional. (GARCIA,

1999).

Por outro lado, Benedito, Pavía e Cerveró (1995, p. 131) chamam a atenção

que: [...] o professor universitário aprende a sê-lo mediante um processo de socialização em parte intuitiva, autodidata ou (...) seguindo a rotina dos “outros”. Isso se explica, sem dúvida, devido à inexistência de uma formação específica como professor universitário. Nesse processo, joga um papel mais ou menos importante sua própria experiência como aluno, o modelo de ensino que predomina no sistema universitário e as relações de seus alunos, embora não há que se descartar a capacidade autodidata do professorado. Mas ela é insuficiente. (tradução nossa) 14

Nesse sentido, é público que as práticas pedagógicas desenvolvidas na

educação superior, baseadas principalmente em uma concepção de ensino

tradicional centrada na transmissão e repetição de conhecimentos expostos pelo

professor, guiam o desenvolvimento dessas práticas nesse nível de ensino e só

recentemente passaram a ser elemento de investigação e análise. Essa

preocupação está assinalada por Almeida (2012, p. 124): Há consenso entre analistas dos processos de formação docente no ensino superior sobre o fato de que nunca foi exigido aos professores que aprendessem a ensinar e muito menos lhes foram propiciadas referências para lidar com os processos pedagógicos e organizacionais mais amplos do ensino.

O ingresso como docente na educação superior ocorre mediante processo de

seleção e concurso, sendo que os editais estabelecem em sua maioria que o

candidato da área pretendida tenha especialização, mestrado e doutorado, em suas

14 el profesor universitario aprende a serlo mediante un proceso de socialización en parte intuitiva, autodidacta o (...) siguiendo la rutina de los "otros". Esto se explica, sin duda, debido a la inexistencia de una formación específica como profesor universitario. En este proceso, juega un papel más o menos importante su propia experiencia como alumno, el modelo de enseñanza que predomina en el sistema universitario y las relaciones de sus alumnos, aunque no hay que descartar la capacidad autodidacta del profesorado. Pero es insuficiente.

Page 72: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA (PUC-SP) FACULDADE DE ... · CÁCIA CRISTINA FRANÇA REHEM DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E BACHARÉIS DOCENTES: PROCESSOS FORMATIVOS E A PRÁTICA PEDAGÓGICA

71

áreas específicas de conhecimento.

Dessa forma, não existem exigências no que diz respeito a aprendizagens

relativas ao como ensinar, nem quando ainda está no processo inicial, muito menos

ao longo da sua carreira. Nesse percurso, todo o movimento estabelecido para a

progressão e promoção na carreira dos docentes universitários ocorre mediante a

qualificação para a pesquisa, seus títulos e suas publicações e os resultados das

suas pesquisas determinam o avanço ou a estabilização do percurso. Masetto

(1998, p. 11) destaca que: Só recentemente os professores universitários começaram a ser conscientizar de que a docência, como a pesquisa e o exercício de qualquer profissão, exige capacitação própria e específica. O exercício docente no ensino superior exige competências específicas, que não se restringem a ter um diploma de bacharel, ou mesmo de mestre ou doutor, ou ainda, apenas o exercício de uma profissão. Exige isso tudo, além de outras competências próprias.

Quanto ao ato de ensinar, não é elemento de avaliação pela maioria das

universidades. Gauthier et al. (2013, p. 18) ajuízam que “A ciência do ensino é muito

mais uma ideia a ser guardada no velho baú das utopias educativas do que uma

tarefa já concretizada”.

Em um sentido habitual, e que faz parte do ideário sobre ensino, é comum

acreditarmos que a sua ação se apoia em conhecimentos adquiridos na experiência,

centrados especificamente no “saber-fazer” desses docentes, crendo que a prática

acumulada fornecerá as noções necessárias para o desenvolvimento do ensino.

Entretanto, sob a ótica de Corrêa (2011, p. 81) A pouca valorização dos processos inovadores de ensinar e aprender está relacionada à desvalorização da dimensão do ensino no espaço acadêmico, principalmente se cotejada com a pesquisa. [...] desse modo, o que traz prestígio ao professor do ponto de vista de sua carreira e da cultura acadêmica, são a pesquisa, a publicação, a participação em bancas examinadoras, as conferências ministradas e os financiamentos obtidos das agências de fomento para subsidiar pesquisas (CUNHA, 2007). O campo da pesquisa constitui-se como estruturante da profissão do professor universitário no processo de construção de conhecimentos, enquanto o campo da docência, considerado de baixo prestígio acadêmico e social, expressa a socialização e a difusão do conhecimento.

A identificação de práticas alternativas diferenciadas, ou seja, a passagem do

“especialista da disciplina” para o “didata da disciplina” (ZABALZA, 2004), relaciona-

se ao que Masetto (2012 b, p. 32) identifica como “competência na área pedagógica”

− uma amálgama entre conhecimento disciplinar e conhecimento pedagógico −

Page 73: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA (PUC-SP) FACULDADE DE ... · CÁCIA CRISTINA FRANÇA REHEM DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E BACHARÉIS DOCENTES: PROCESSOS FORMATIVOS E A PRÁTICA PEDAGÓGICA

72

constitui uma esfera exclusiva dos professores. Sua forma particular de

compreensão profissional, esse conhecimento que permite ao professor a

compreensão do como ensinar, de como transformar o conhecimento da matéria em

conhecimento específico para ser ensinado, não se tem verificado. Masetto, (2012 b,

p. 43) ainda destaca que “[...] prevalece na atuação docente um processo de ensino

no qual o professor “ensina” aos alunos que “não sabem”, enquanto estes

reproduzem as informações recebidas nas provas ou nos exames buscando sua

aprovação”. É evidente que temos uma prática de ensino mecanizada, onde o

professor fala e o aluno escuta, depois repete, o que tem gerado alunos

desinteressados e sem entusiasmo. Tal constatação leva a crer que o principal

problema reside em não desafiar os alunos, de forma crítica e reflexiva, pois não

apresenta nada significativo; a educação torna-se trivial, um jogo sem sentido.

(KINCHELOE, 1997, p. 15). Essa questão sinaliza a problemática de que a simples

transmissão de informação passa a ser considerada como ensino e o professor fica

como garantia de saber (ANASTASIOU, 2007).

A fim de elucidar, em Masetto (2010, p. 12) encontra-se a seguinte

argumentação: Tradicionalmente, a sala de aula nos cursos de ensino superior tem se constituído como um espaço físico e um tempo determinado durante o qual o professor transmite conhecimentos e experiências aos seus alunos, ora com exposições orais e lousa, ora com uso de slides ou transparências e atualmente com a exploração quase contínua do PowerPoint, procurando demonstrar a atualização de recursos didáticos, mas com a manutenção do mesmo princípio epistemológico de se adquirir o conhecimento mediante a reprodução da informação apresentada em aula.

Não fica difícil identificar a maneira como conduzimos as nossas aulas na

universidade; geralmente, cabe ao professor a exposição do conhecimento e aos

alunos a função de copistas, através da posição passiva de ouvinte da preleção do

mestre, às vezes fazendo perguntas, mas, na maioria das vezes, repetindo o que o

mestre ensinou ipsis litteris.

Page 74: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA (PUC-SP) FACULDADE DE ... · CÁCIA CRISTINA FRANÇA REHEM DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E BACHARÉIS DOCENTES: PROCESSOS FORMATIVOS E A PRÁTICA PEDAGÓGICA

73

Pozo e Monereo15 (2009, p. 12): Sem querer caricaturizar, e não exaustivamente descrever as formas predominantes de ensino em nossas salas de aula, este parece ainda ser guiado por uma prática baseada na transmissão de conhecimentos monológica e unidirecional transmissão de conhecimentos, os alunos tendem a copiar e repetir relativamente às cegas, assim que estão cada vez mais longe da forma como estes mesmos estudantes como futuros profissionais devem usar o conhecimento ora, por fim, fora destas salas de aula. (Tradução nossa)

Nesse sentido, as práticas docentes universitárias, ainda segue um modelo

que é predominantemente expositivo, centrado na transmissão de saberes

disciplinares específicos, formado e selecionado como especialista no conteúdo,

mais que nas habilidades para gerir esse conhecimento com seus alunos.

Em termos de aprendizagem diretamente relacionada com as atividades de

ensino, começa a surgir um novo entendimento que define que a meta do ato de

ensinar não seja o de transmitir conhecimentos, mas sim de oportunizar aos alunos

construir competências para saber usá-los, “saber que ensinar não é transferir

conhecimento, mas criar as possibilidades para a sua própria produção ou a sua

construção.” (FREIRE, 1998, p. 47)

Nesse sentido, o ensino se realiza, conforme entendimento de Altet (2000, p.

26): Como um processo interpessoal e intencional, que utiliza essencialmente a comunicação verbal e o discurso dialógico finalizado como meios para provocar, favorecer e levar êxito à aprendizagem em uma dada situação; é uma prática relacional finalizada. Ensinar é fazer aprender e, sem a sua finalidade de aprendizagem, o ensino não existe. Porém este “fazer aprender” se dá pela comunicação e pela aplicação; o professor é um profissional da aprendizagem, da gestão de condições de aprendizagem e da regulação interativa em sala de aula.

A reflexão sobre o ensino e a aprendizagem na Educação Superior tem

demonstrado que, para além do ato simplista que transforma o ensinar em

transmissão e o aprender em recepção, é necessário avançar nesta temática para

que seja possível ressignificar a concepção que preside as práticas pedagógicas dos

docentes neste nível de ensino. Nem tudo é permitido ao ensino; quando se trata do

15 Sin pretender caricaturizar, pero tampoco describir exaustivamente, las formas de ensenanza que predomina em nuestras aulas parecen estar aún guiadas por uma práctica basada em las transmissión monológica y unidirecional del conocimiento que los alunos tienden a copiar y repetir de forma relativamente ciega, com lo que están cada vez mas lejos de la forma em que esos mismos alunos, como futuros profesionales, deberán usar el conocimiento cuando, por fin, salgan de essas aulas.

Page 75: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA (PUC-SP) FACULDADE DE ... · CÁCIA CRISTINA FRANÇA REHEM DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E BACHARÉIS DOCENTES: PROCESSOS FORMATIVOS E A PRÁTICA PEDAGÓGICA

74

ensino formal, há que se ter coerência, conhecimento sobre como ensinar e quais

condições interferem no seu desenvolvimento.

Em virtude disso, e corroborando Pozo (2008, p. 55-56), compreendemos

então que “ensinar e aprender são dois verbos que tendem a ser conjugados juntos,

embora nem sempre seja assim”. Esse entendimento poderá nortear sobremaneira a

forma usual com que esses docentes/bacharéis lidam com aspectos didático-

metodológicos e relações de ensino e aprendizagem no ensino superior, refletindo

sobre a sua prática, ampliando concepções de educação. Isto, no que concerne ao

trabalho docente articulado ao conhecimento científico, transformando-se em

pedagógico, estabelecendo-se relação entre conceitos essenciais para a formação e

reflexão do aluno, uma vez que, conforme bem frisa Pereira (2015, [s/p.]) “a ação

docente é, além de educacional, uma ação social, psicológica e cultural.”

Assim, podemos afirmar que o ato de ensinar se configura no papel que o

professor possui como mediador e orientador da aprendizagem e da formação do

aluno, sendo essa a condição essencial do ensinar. Em se tratando do ensino

superior, Pereira (2015) acrescenta que “O processo de ensino e aprendizagem

desenvolvido na universidade é um processo de formação do ser humano, do

profissional e do cidadão, isto é, de um indivíduo que desempenha vários papéis na

sociedade.”

Ao possibilitar ao aluno a obtenção de conhecimentos mediante o ensino,

mesmo que inicialmente o objetivo maior seja a aquisição de conhecimentos

específicos de determinada área ou disciplina, é possível contribuir na formação do

aluno de forma mais ampla, caso o professor possua consciência da complexidade,

dentro de um processo mais crítico de sua atividade docente − estimular o aluno a

aprender e crescer, facultando-lhe construir seu conhecimento. Nessa visada, a sua

ação em sala de aula certamente contribui na formação do homem, do profissional e

do cidadão – uma ação que ultrapassa a sala de aula.

Por outro lado, é importante se distanciar de um processo de formação que

visualiza o aluno como um objeto a ser formado, como aponta, Freire (1998, p. 23): É preciso que, pelo contrário, desde os começos do processo, vá ficando cada vez mais claro que, embora diferentes entre si, quem forma se forma e re-forma ao formar e quem é formado forma-se e forma ao ser formado. É neste sentido que ensinar não é transferir conhecimentos, conteúdos, nem formar é ação pela qual um sujeito criador dá forma, estilo ou alma a um corpo indeciso e acomodado.

Page 76: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA (PUC-SP) FACULDADE DE ... · CÁCIA CRISTINA FRANÇA REHEM DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E BACHARÉIS DOCENTES: PROCESSOS FORMATIVOS E A PRÁTICA PEDAGÓGICA

75

Cabe então a compreensão de que, mesmo sendo objetivo do ensino na

educação superior, a formação para o exercício de uma profissão, a preparação

para o trabalho, não podemos restringir o ensino à transmissão de conteúdos com o

único propósito de formação profissional. Sob esse enfoque, Puentes, Aquino e

Quillici Neto (2009, p. 174) citam García (1992, p. 3), ao tomar como pressuposto o

fato de que “é preciso prestar maior atenção – conceitual e empírica – à forma em

que os professores ‘transformam’ o conhecimento que possuem da matéria em

conhecimento ‘ensinável’ e compreensível para os alunos”.

Destarte, a formação profissional tem que estar aliada a um processo de

formação que ultrapasse o técnico e alcance os aspectos culturais, sociais e

políticos. É preciso que o processo de ensino e de aprendizagem sejam

significativos para o indivíduo como homem, profissional e cidadão. O ato de ensinar

desenvolvido pelo professor deve ter um compromisso com a preparação do aluno

considerando-se sua autonomia intelectual, emocional, social, cultural política e

profissional.

3.3.2 A prática e a sua contribuição na produção de conhecimentos: o professor como prático reflexivo

Entendemos e não desqualificamos a prática como produtora de experiência

e de conhecimentos. Assim como Charlier e Henri (2006, p. 289 apud CHARLIER,

2014, p. 198) entendemos que a prática inclui: [...] um corpus de diversos tipos de conhecimentos empíricos, teóricos, procedimentais, de quadros de referência, de modelos, de princípios, de instrumentos, de especialistas, de documentos, de lições aprendidas, de práticas exemplares, de elementos heurísticos. Em paralelo, inclui ainda os conhecimentos tácitos e explícitos da comunidade, os objetos concretos ou intangíveis (manifestação ou exteriorização de competências).

Ou seja, a prática não vem desprovida de conteúdo, não é um ato puramente

mecânico; é constituída por representações, teorias pessoais, regras,

comportamentos, saberes, emoções, conhecimentos, rotinas, mas também objetos.

(CHARLIER, 2014, p. 199)

Nesse sentido, podemos então considerar que o docente/bacharel, pelo

caráter da sua formação, desenvolve a sua prática pedagógica através da

mobilização do seu conhecimento tácito. Polanyi (1967 apud DAY, 2001, p. 49)

reforça esse entendimento ao afirmar que “[...] as ações explícitas dos professores,

Page 77: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA (PUC-SP) FACULDADE DE ... · CÁCIA CRISTINA FRANÇA REHEM DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E BACHARÉIS DOCENTES: PROCESSOS FORMATIVOS E A PRÁTICA PEDAGÓGICA

76

quer como educadores, quer como práticos, fundamentam-se, frequentemente, no

conhecimento implícito, não declarado, da natureza da prática num determinado

contexto”. Em outras palavras, são as suas experiências e vivências, geralmente

aprendidas através dos anos vividos como aluno que orientam a sua ação − “parte

do que sabem os professores, como a noção de que a aula seja o lugar adequado

onde se desenvolve a educação tem suas raízes no hábito, no ritual, no precedente,

no costume, nas opiniões e impressões. (CARR; KEMMIS, 1988, p. 58) (tradução

nossa).16

Não desconsiderando a importância do conhecimento tácito, que se constitui

e é mobilizado durante a ação, quando se depara com as situações cotidianas na

sua prática, o professor precisa acionar os recursos teóricos incorporando-os às

experiências vividas como docente e, dessa forma, conseguir prever e intervir nos

acontecimentos.

Pérez Gómez infere, fundamentado em Zeichner (1987) e Clandinin e

Connely (1986), que “Ainda que possam ser explicitados e consciencializados

mediante um exercício de meta-análise, a maioria dos recursos intelectuais que se

ativam na ação são de caráter tácito e implícito.” (1995, p.103). Sob esse viés, não

há relação direta com os conhecimentos teóricos.

É comum nas instituições de educação superior a convivência com práticas

pedagógicas, na sua maioria denominadas de tradicionais e conservadoras,

fundamentadas na ciência moderna em que o conhecimento é fragmentado e

isolado em suas áreas. Behrens (2013, p. 23) destaca que: A visão fragmentada levou os professores e os alunos a processos que restringem à reprodução do conhecimento. As metodologias utilizadas pelos docentes têm estado assentadas na reprodução, na cópia e na imitação. A ênfase do processo pedagógico recai no produto, no resultado, na memorização do conteúdo, restringindo-se em cumprir tarefas repetitivas que, muitas vezes, não apresentam sentido ou significado para quem as realiza.

Como consequência, os professores trabalham de forma solitária e sem

conexão com os demais campos do conhecimento; cada um na sua sala de aula

com a sua disciplina e o seu conhecimento. Behrens (2013, p. 82) ainda ressalta

que:

16 Parte de lo que saben los maestros, como la noción de que la classe sea el lugar adequado em onde deve desarrollar la educación, tiene suas raices em el hábito, el ritual, el precedente, la costumbre, la opinión o las meras impressiones. (CARR; KEMMIS, 1988, p. 58)

Page 78: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA (PUC-SP) FACULDADE DE ... · CÁCIA CRISTINA FRANÇA REHEM DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E BACHARÉIS DOCENTES: PROCESSOS FORMATIVOS E A PRÁTICA PEDAGÓGICA

77

A primeira impressão que se tem ao percorrer os corredores das universidades, salvaguardardando as exceções, é que o paradigma tradicional de ensino nunca abandonou a sala de aula. Observa-se o professor expondo o conteúdo e os alunos em silêncio, copiando receitas e modelos propostos. Com alguma habilidade, os alunos conseguem fazer questionamentos sobre os conteúdos, mas nem sempre encontram respostas que venham estabelecer um resultado significativo para sua formação. (grifo nosso).

O paradigma dominante (tradicional)17 cumpriu o papel inicial de evolução do

pensamento humano, podendo-se dizer que “não se caracterizou como um erro

histórico” (BEHRENS, 2013, p. 18), já que serviu para firmar avanços da ordem

material e cumpriu o papel de transformar a ordem vigente; no entanto, ainda

segundo essa autora “não justifica o desencontro que o homem atingiu nestas

últimas décadas” (p.18).

Esse paradigma, de racionalidade técnica, vem permeando a prática

pedagógica dos docentes universitários, principalmente pelo fato de ser o modelo

predominante de formação de professores no Brasil e no mundo. Nessa perspectiva,

Pérez Goméz (1995, p. 92) descreve o papel do professor como técnico: A metáfora do professor como técnico mergulha as suas raízes na concepção tecnológica da atividade profissional (prática), que pretende ser eficaz e rigorosa, no quadro da racionalidade técnica (Schön, 1983). Trata-se de uma concepção epistemológica da prática, herdada do positivismo, que prevaleceu ao longo de todo o século XX, servindo de referência para a educação e socialização dos profissionais em geral e dos docentes em particular.

Para tanto, em decorrência das experiências vivenciadas como aluno e de

serem essas experiências o espaço de aprendizado inicial dos docentes/bacharéis,

é fato que a prática pedagógica exercida por esses profissionais é decorrente desse

modelo, implicando em uma dissociação entre o pensar e o fazer. Dessa forma,

mesmo grandes pesquisadores acabam tratando o conhecimento disciplinar de

forma fragmentada e desconectada das suas pesquisas, e com uma prática

pedagógica separada da teoria, referendada pelo conhecimento implícito imerso na

sua própria prática. (DAY, 2001)

A então denominada racionalidade técnica produziu uma prática que, até os

dias de hoje, guia as ações docentes a tal ponto, que os movimentos contrários –

com vistas ao desenvolvimento de uma prática mais significativa, mais abrangente e

17 Boaventura Santos (2003) denominou de Paradigma Dominante o modelo de racionalidade

vivenciada nos séculos XIX e XX. Segundo esse autor, a forma de organização do pensamento, nesse modelo, gerou um reducionismo e uma visão fragmentada do conhecimento.

Page 79: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA (PUC-SP) FACULDADE DE ... · CÁCIA CRISTINA FRANÇA REHEM DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E BACHARÉIS DOCENTES: PROCESSOS FORMATIVOS E A PRÁTICA PEDAGÓGICA

78

que atenda melhor às transformações que ocorrem na sociedade e na forma como

lidamos com o conhecimento − não têm tido a adesão dos currículos de formação e

tampouco dos professores. A capacidade de pensar a prática a partir de um contexto

dinâmico, individual e coletivo, em sua complexidade e historicidade, ainda deixa a

desejar, se a considerarmos sob um espectro mais ampliado que envolvem os

processos de produção e reprodução dos saberes, em seus aspectos didáticos,

dentro de uma instituição de ensino superior.

Destarte, em uma outra vertente, decorrente principalmente do esgotamento

do modelo da racionalidade técnica e da denominada crise do paradigma

dominante18, sob um novo paradigma para o ensino e a aprendizagem –

denominado de emergente, vemos surgir uma nova perspectiva: a do professor

como um prático reflexivo. Behrens (2013, p. 95) propõe superação dos paradigmas

conservadores, sustentados pela reprodução do conhecimento, devem dar lugar à

emergência de um paradigma, cuja abordagem seja sistêmica ou holística,

progressista e aliada ao ensino com pesquisa.

Essa nova perspectiva é defendida e vem dominando as discussões sobre a

formação de professores, principalmente nas três últimas décadas do século XX,

inclusive pelo fato de as pessoas estejam perdendo de vista valores que facultam a

própria vida em sociedade, a exemplo do respeito, da solidariedade, da preservação

da natureza. Frente a isso, faz-se mister a necessidade de uma prática docente que

recupere esses valores e, ao mesmo tempo, conscientize o indivíduo norteado para

trilhar seu percurso de forma autônoma. Behrens (2013) ressalta que, para que as

mudanças de fato ocorram, é fulcral um pouco de ousadia por parte dos professores

e uma certa dose de inconformismo diante da realidade. Assim, a prática no

exercício da docência, contribui, de maneira significativa, para a produção dos

conhecimentos necessários e adquire uma importância fundamental na atividade do

professor.

Nesse sentido, essa perspectiva traz à tona a importância de superar a

relação linear e mecânica entre o conhecimento científico-técnico, a prática de sala

de aula (PÉREZ GÓMEZ, 1995) e da utilização da prática como espaço de produção

dos conhecimentos necessários para o desenvolvimento da ação dos professores.

18 São hoje muito fortes os sinais de que o modelo de racionalidade científica atravessa uma profunda crise. (SANTOS, 2003, p. 40)

Page 80: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA (PUC-SP) FACULDADE DE ... · CÁCIA CRISTINA FRANÇA REHEM DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E BACHARÉIS DOCENTES: PROCESSOS FORMATIVOS E A PRÁTICA PEDAGÓGICA

79

Sob esse enfoque, o professor é um prático reflexivo que, no entendimento de

Schön (1995), desenvolve a capacidade de reflexão advindo de um envolvimento

direto com a sua prática, através de uma imersão consciente na sua experiência,

denominada de “conhecimento prático”. Sendo assim, o elemento inicial e articulador

desse processo denominado de “conhecimento-na-ação”, orienta a ação que vai se

manifestar no saber fazer, primeira etapa do processo de reflexão sobre o

pensamento prático do professor.

Para Pérez Gómez (1995), ao se revelar flexível e aberto à prática, e ao

mesmo tempo realizando um processo de reflexão, em mais dois momentos a

reflexão-na-ação e reflexão-sobre-ação e sobre a reflexão-na-ação, o docente passa

a ter um espaço enriquecedor e que se constitui como o melhor instrumento de

aprendizagem e produção de conhecimentos sobre a docência.

A prática é vista como produtora de conhecimento. Zabalza (2014, p. 112), no

entanto, destaca que tem sido tarefa difícil convencer “aos que defendem a tese de

que se ‘aprende a ensinar, ensinando’, aos que acreditam que os conhecimentos

específicos são desnecessários, exceto aqueles que têm origem na disciplina

específica”. Para muitos professores, é fácil aceitar que o conhecimento específico

da sua área de atuação é imprescindível e deve ser fruto de atualização constante,

mas, não, que uma prática realizada com processos de reflexão possa se constituir

em produtora de conhecimentos.

Para que a prática seja uma produtora de conhecimentos, cremos que é

necessário o estabelecimento da união entre o pensar e a ação. Zabalza (1994)

concebe que a ação é composta por uma dupla − pensamento e atuação: O ponto de partida é o de que ambos funcionem intrinsecamente coligados e, ainda que se possa distinguir um pensar que não implica atuar e um atuar não reflexivo, o que se constrói sobre automatismos, a ideia de ação refere-se a essa união entre o pensar e o atuar como constituintes necessários da ação completa (ZABALZA, 1994, p. 44-45)

No caso específico da docência exercida por docentes/bacharéis na

universidade, a prática deveria ser o local por excelência de produção de

conhecimentos sobre o ensino. Poucos são os que se aventuram em formações,

análises e discussões coletivas ou individuais sobre a sua prática pedagógica.

Outrossim, a reflexão sobre a mesma contribuiria para uma formação em serviço; no

entanto, para que se constituísse como espaço de formação e produção de

conhecimentos, seria necessário que estivesse atrelada aos componentes teóricos

Page 81: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA (PUC-SP) FACULDADE DE ... · CÁCIA CRISTINA FRANÇA REHEM DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E BACHARÉIS DOCENTES: PROCESSOS FORMATIVOS E A PRÁTICA PEDAGÓGICA

80

produzidos e a uma reflexão constante da sua prática pedagógica. Para Montero

(2001, p. 101): O conhecimento real sobre a educação escolar que contribui para um exercício profissional da docência obtém-se sobretudo na prática. Mas se se pretende ir além das percepções do senso comum ou da repetição da história passada ou próxima do ensinante, é necessário tomar em consideração outras perspectivas: as que se ligam àquilo a que normalmente se chama de teoria... É essa teoria que permite levar a cabo uma prática reflexiva, de forma que não se perca em si mesma e não seja bloqueada pela imediatez do quotidiano. (grifo da autora)

O docente/bacharel carece de formação pedagógica e didática, mesmo

porque esses elementos não fazem parte do seu processo formativo; dessa forma,

para que fosse possível desenvolver uma prática reflexiva seria necessário o aporte

teórico que sustentaria essa reflexão.

Não é possível a constituição de uma prática reflexiva se não temos pontos

de referências para realizar o confronto entre a ação realizada e uma ação

idealizada, de certo, a teoria não seria a possibilidade de um arcabouço de

conteúdos que seriam sacados quando surgisse a necessidade de resolver alguma

situação, “ quando tiver decidido qual é a dificuldade de aprendizagem de tal aluno

ou grupo, seleciona entre o repertório disponível o tratamento que melhor se adapta

à situação e o aplica” (IMBERNÓN, 2012, p.107) , mas, ainda, segundo esse autor,

“resgatando a base reflexiva da atuação profissional, com o objetivo de entender a

forma em que realmente se abordem as situação problemáticas da prática”. (2012, p.

107).

Analogamente, a prática é um forte condutor da produção do conhecimento,

quando constituída atrelada ao processo de reflexão19, entendendo por reflexão a

possibilidade de revisar constantemente a ação, buscando a sua descrição, análise,

avaliação, informações sobre a mesma, no intuito de transformá-la, caso seja

necessário, possibilitando uma relação consciente com a sua experiência. Logo,

torna-se necessário um grande leque de conhecimentos teóricos, que juntos

possibilitem a reflexão sobre a sua adequação e possibilidades de resolver as

19 Carr & Kemmis (1985, p. 148-149) traz algumas considerações fundamentais sobre a natureza da

reflexão, ao destacar, entre outros, que: (i) a reflexão não é determinada biológica ou psicologicamente, nem é pensamento puro, antes expressa uma orientação para a ação e refere-se às relações entre o pensamento e ação nas situações históricas em que nos encontramos; (ii) a reflexão não é um processo mecânico, nem simplesmente um exercício criativo de construção de novas ideias, antes é uma prática que exprime o nosso poder para reconstruir a vida social, ao participar na comunicação, na tomada de decisões e nas ações sociais.

Page 82: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA (PUC-SP) FACULDADE DE ... · CÁCIA CRISTINA FRANÇA REHEM DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E BACHARÉIS DOCENTES: PROCESSOS FORMATIVOS E A PRÁTICA PEDAGÓGICA

81

situações que surgem.

Ainda segundo Zabalza (1994, p. 126) [...] refletir não é retomar

constantemente os mesmos assuntos utilizando os mesmos argumentos; na

verdade, é documentar a própria atuação, avaliá-la (ou auto avaliá-la) e implementar

os processos de ajuste que sejam convenientes.

Em virtude disso, ser um docente que reflete sobre a sua ação traduz-se na

capacidade de se relacionar com a prática como espaço/momento de reflexão

crítica, problematizando a realidade pedagógica, bem como analisando, refletindo e

reelaborando os caminhos da sua ação de modo a resolver os conflitos, construindo

e reconstruindo seu papel no exercício profissional.

3.3.3 Prática pedagógica: o que sabem ou que deveriam saber os professores para o seu efetivo exercício

Ao assumir o campo da docência no ensino superior, os candidatos a essa

atividade deveriam admitir que estão assumindo uma nova profissão e, por

conseguinte, adquirir as competências próprias e necessárias para o seu exercício.

Sabemos que não tem sido isso o que acontece. O comum é a constatação de que

faltam os conhecimentos específicos sobre a prática pedagógica necessários para o

desenvolvimento qualificado do ensino, para os docentes da educação superior, no

momento do ingresso na docência.

Pela própria estruturação da docência na educação superior, que não exige

esses conhecimentos, na maioria dos casos, é possível perceber a inexistência da

necessidade de adquiri-las durante o seu desenvolvimento profissional. No entanto,

não existem culpados; existe uma posição estabelecida e institucionalizada de que

esses conhecimentos não são necessários e que o fato de não possuírem não

inviabiliza a sua tarefa – o ensino.

Anastasiou (2002, p. 175) considera que: Não trazendo consigo elementos de formação inicial para a docência, era de se esperar que esse processo fosse objeto imediato de compromisso institucional, que proveria momentos específicos de formação em serviço. No entanto, tais inciativas, não ocorrem institucionalmente, e nem mesmo individualmente, como seria necessário e esperado.

Page 83: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA (PUC-SP) FACULDADE DE ... · CÁCIA CRISTINA FRANÇA REHEM DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E BACHARÉIS DOCENTES: PROCESSOS FORMATIVOS E A PRÁTICA PEDAGÓGICA

82

Vale reiterar que não desconsideramos a bagagem de conhecimentos trazida

por esse profissional como, por exemplo, o conhecimento da disciplina que foi selecionado para ensinar, mas insistimos na premissa de que ‘não é condição

suficiente’, pois depende da sua capacidade em lidar com as situações pedagógicas

próprias à atividade de ensino. Consideramos ainda corpo de conhecimentos sobre ensino adquiridos durante o percurso como aluno, através de observação direta

como participante, embora esteja comprovado que também não é suficiente para o

desenvolvimento de uma prática pedagógica qualificada e que não o transforma em

professor.

Nessa mesma sintonia, nos posicionamos a favor da defesa de que ‘não se

nasce professor’, “torna-se professor” através da formação e da prática aliadas às

habilidades e características pessoais consideradas importantes para o

desenvolvimento dessa função profissional.

Dessa forma, a estruturação de uma formação para a docência universitária

tem que se constituir de um arcabouço que contemple o processo de

profissionalização para o ensino, entendendo que a mesma não acontecerá se, além

dos aspectos que envolvem a ciência de sua área específica, não contemplar

também a ciência da educação que lhe proporcione uma formação pedagógica.

Anastasiou (2002, p. 175) destaca que: Os estudos e pesquisas que fazemos nas especializações, mestrados e doutorados possibilitam o aprofundar de nossas áreas de pesquisa, nem sempre coincidentes com a área pedagógica; sendo que, muitas vezes, a única oportunidade de refletir e estudar de forma mais sistemática as questões do ensinar e fazer apreender se dá no cursar de uma disciplina normalmente chamada Metodologia de Ensino Superior, com carga horária média de 60 horas, período insuficiente para formação de profissionais de qualquer área, o que inclui a área pedagógica.

Nesse sentido, é fundamental a constituição de um corpo de conhecimentos

sobre a docência universitária que deve ser dominado por esses profissionais, que

não deixaram de ser administradores, médicos, engenheiros, advogados, mas que

agora assumem nova profissão: a de docentes no ensino superior.

A pesquisa sobre a prática pedagógica exercida por professores bacharéis,

objeto desta tese, tem o propósito o investigar o contexto prático em que o trabalho

Page 84: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA (PUC-SP) FACULDADE DE ... · CÁCIA CRISTINA FRANÇA REHEM DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E BACHARÉIS DOCENTES: PROCESSOS FORMATIVOS E A PRÁTICA PEDAGÓGICA

83

docente se realiza − a sala de aula20. Entendemos que a prática pedagógica é a

realização do trabalho do professor nesse espaço para que o ensino-aprendizagem

se realize. Isto exigirá competência pedagógica por parte desse professor.

A busca decorrente da necessidade da definição dessa competência tem

gerado estudos ao redor do mundo. Autores como: Freire (1998); Gaultier et al.

(1998); Tardif (2002); Perrenoud (2001, 2002); Cunha (2004); Schulman (2005);

Zabalza (2003, 2004, 2014); Masetto (1998, 2010, 2013, 2012, 2015) têm buscado

compreender e definir quais conhecimentos subjacentes à docência no ensino

superior são necessários para um exercício consciente e reflexivo dessa profissão.

É possível, mediante uma quantidade considerável desses estudos a partir da

década de 1980, com abundante produção a partir de 1990, encontrar definições

diferentes para a identificação desses elementos. Estudos realizados por Puentes,

Aquiles e Quillici Neto (2009), com 11 autores internacionais e nacionais,

identificaram diferentes abordagens: Apoiados na premissa de que existe um conjunto de conhecimentos base (Knowledge base) para o ensino, os teóricos afirmavam, e ainda afirmam, que é possível convalidar esse corpus de saberes com a intenção de melhorar a formação dos professores. Cunha (2004, p.37) por sua vez, tem enfatizado que “assumir a perspectiva de que docência se estrutura sobre debates próprios, intrínsecos à sua natureza e objetivos, é reconhecer uma condição profissional para a atividade do professor”. (PUENTES, AQUILES; QUILLICI NETO, 2009, p. 171)

Ainda, segundo esses autores, foram encontradas tipologias diferentes

(conhecimentos, saberes e competências), o que, ao invés de contribuir para

melhorar a compreensão dos saberes estudados, tornou-os inteligíveis e complexos

e que: Independentemente do agrupamento feito das classificações e tipologias para uma melhor análise, foi possível perceber que o significado conceitual dos termos empregados, para referir-se ao conjunto de capacidades mais ou menos sistematizadas necessárias para pôr em prática a profissão de professor (“conhecimento”, “saberes” e “competências”), é quase o mesmo nos onze autores consultados. Para todos eles, a profissionalização da docência compõe-se de três ingredientes fundamentais, mas não suficientes:

20 Aceitando que a sala de aula extrapola o espaço definido tradicionalmente para o encontro entre professores e alunos, Masetto (2012 b, p. 94) refere que “Sala de aula é o espaço onde os sujeitos de um processo de aprendizagem (professores e alunos) se encontram para realizar uma série de ações (na verdade, “interações”) na busca de seu desenvolvimento pessoal, profissional e como cidadão. Este conceito de aula universitária faz com que ela transcenda o espaço corriqueiro em que se dá: só na universidade, para projetá-la para todo e qualquer ambiente onde quer que possa haver uma aprendizagem significativa, buscando atingir intencionalmente objetivos definidos para a formação universitária”.

Page 85: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA (PUC-SP) FACULDADE DE ... · CÁCIA CRISTINA FRANÇA REHEM DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E BACHARÉIS DOCENTES: PROCESSOS FORMATIVOS E A PRÁTICA PEDAGÓGICA

84

de saber, de saber-fazer e de saber-ser apresentados na forma de saberes, de conhecimentos ou de competências. (PUENTES, AQUILES; QUILLICI NETO, 2009, p. 182)

Nos diversos estudos considera-se que o professor precisa de um cabedal de

elementos para um exercício qualificado da sua prática; que a prática pedagógica

não pode ser exercida mediante a repetição de um conhecimento adquirido quando

da sua vivência como aluno, ou no exercício de uma prática, descontextualizada e

não refletida; que a competência profissional, inerente a todas as profissões, não é

algo dispensável no exercício da docência.

Ao optarmos pela competência como o elemento necessário e indispensável

para o exercício da docência universitária, assumiremos nesse trabalho o conceito

de competência proposto por Zabalza (2013, p. 70) “como uma construção molar

que serve para nos referirmos ao conjunto de conhecimentos e habilidades que os

sujeitos necessitam para desenvolver algum tipo de atividade”.

Compreende-se então que o desenvolvimento de competência para o

exercício da docência universitária, requer a mobilização dos conhecimentos,

habilidades, experiências, atitudes exigidas pela profissão e o agir eficiente para que

haja efetividade nas atividades docentes. A esse respeito Zabalza (2013, p.71)

infere: Um aspecto importante das competências profissionais é que a capacidade de ação não surge espontaneamente ou por uma forma puramente experimental (pela prática simples) Ela precisa de especialização. [...] a docência universitária aparece como um conjunto de competências em cuja gênese desempenha um importante papel − o conhecimento teórico combinado obviamente com a prática. 21 (tradução nossa)

É bom acrescentar ainda ser necessário mobilizar recursos dos mais variados

domínios; cognitivos, afetivos, psicomotores, sociais, culturais e políticos que

permitam uma ação educativa que incentive um processo de aprendizagem e

formação de profissionais para atuarem na sociedade contemporânea. Mas Torelló

(2011, p. 197) infere que: O constructo competência é um termo polissêmico, ambíguo com diversidade de acepções (segundo o referente cultural, segundo o âmbito onde seja utilizado...) e complexo pelos componentes que a integram. Considera que as competências são muito mais que uma

21 Um aspecto importante de las competências profesionales es que la capacidade de actuación no

surge de manera espontânea ni por uma via puramente experiencial (por la simple práctica) sino que precisa de conocimientos especializados. [...] la docencia universitária aparece como um conjunto de competências en cuya génesis juega un importante papel el conocimiento teórico combinado, obviamente, com lá prática.21 (ZABALZA, 2003, p. 71).

Page 86: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA (PUC-SP) FACULDADE DE ... · CÁCIA CRISTINA FRANÇA REHEM DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E BACHARÉIS DOCENTES: PROCESSOS FORMATIVOS E A PRÁTICA PEDAGÓGICA

85

simples acumulação de conteúdo (saber) mas, são construídas pelas habilidades (saber-fazer), atitudes e valores (saber ser e estar) adquirindo-as e/ou desenvolvendo-as mediante simulações formativas e da própria experiência sociolaboral...’. (Tradução nossa)22

Ademais, possuir competência é a capacidade de, na ação, em seu contexto

profissional, mobilizar os conhecimentos necessários para resolver as mais variadas

situações que são próprias da sua função. Partindo desse princípio, Lizarraga (2010,

p. 17-18) aponta que a competência supõe a interação entre três componentes

essenciais:

um conjunto de capacidades (habilidades) que se apoiam entre si para

executar com êxito uma determinada tarefa acadêmica, profissional ou social

em um cenário completo;

um conjunto de conhecimentos gerais procedentes de disciplinas científicas

afins e de conhecimentos específicos próprios de uma profissão;

uma atitude apropriada para o desempenho de uma função, isto é, vontade de

usar um comportamento antes do outro, uma tendência à compreensão,

aceitação de valores sociais ou culturais, comunicação e cooperação com

outros. Saber como autorregular o comportamento de alguém, tomar

decisões, assumir a responsabilidade e lidar com a frustração.

O conceito de competência, entendido como a possibilidade de mobilização

de variados recursos e domínios, afasta a crença tão criticada de competência

unicamente como ação técnica − o fazer, desconectado do saber e do saber ser. No

nosso entendimento, o desenvolvimento de competências para o exercício

qualificado de uma ação docente em educação superior ocorre a partir de um

compromisso pessoal com o seu processo de desenvolvimento profissional

(profissionalização).

Apoiados em autores como Zabalza (2004, 2013,2014), Perrenoud (2010),

Mas Torelló e Tejada Fernández (2011, 2013); Masetto (2012), a princípio, é

necessário o desenvolvimento de competências nas três grandes funções atribuídas

ao fazer docente: docência, pesquisa e gestão. Essas funções têm suscitado 22 El constructo competência es um término pelisémico, ambíguo com diversidade de acepciones

(según el refetente cultural, según el ámbito donde sea utilizado...) e complexo por los componentes que la integram.Consideramos que las competencias son mucho más que una simple acumulación de contenidos (saber), están también constituidas por habilidades (saber hacer), actitudes y valores (saber ser y estar), adquiriéndose y/o desarrollándose mediante simulaciones formativas, mediante la propia experiencia sociolaboral... (MAS TORELLÓ, 2011, p. 197)

Page 87: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA (PUC-SP) FACULDADE DE ... · CÁCIA CRISTINA FRANÇA REHEM DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E BACHARÉIS DOCENTES: PROCESSOS FORMATIVOS E A PRÁTICA PEDAGÓGICA

86

reflexões que dizem respeito a como organizar processos formativos para que os

docentes as desenvolvam de forma qualificada. A pesquisa está oficialmente

estabelecida nas pós-graduações, com relação ao ensino; poucos espaços são

determinados para tal qualificação; quanto à gestão é uma adesão pessoal, em

função do modelo de administração assumida pelas universidades. (MAS TORELLÓ,

2011)

Essas funções diferenciadas, porém, intimamente relacionadas e

interconectadas, acontecem em determinados cenários de atuação, a saber: (i) o

contexto geral (entorno socioprofissional e cultural); (ii) o contexto institucional

(departamento, faculdade, universidade); (iii) o micro contexto aula-seminário-

laboratórios. (MAS TORELLÓ, 2011)

Ocorre que, desde a década de 1980, temos encontrado estudos no Brasil e

em outros países, com uma grande preocupação voltada a como programar

processos formativos para que os docentes desenvolvam essas funções de forma

qualificada nesses cenários determinados. O professor então deverá desenvolver

competências para o desenvolvimento qualificado dessas três funções. Pela

especificidade desse trabalho focaremos a análise na função da docência, que

procurará envolver essas três funções nas fases de atuação do docente na sala de

aula expandida e em seu planejamento.

É preciso, no entanto, assumir que existem competências específicas que

compõem a função da docência, composta por determinados elementos, que são

construídos e reconstruídos durante a sua vida profissional em relação direta com a

teoria e a prática.

Na análise e na definição de quais competências são necessárias para o

exercício da função da docência, encontramos em Masetto (2012 b) três

competências para o exercício qualificado da função de docente no ensino superior,

a saber; (i) competência em determinada área do conhecimento – domínio dos

conhecimentos básicos de determinada área; (ii) competência na área pedagógica −

conceito de processo ensino-aprendizagem, concepção e gestão de currículo,

integração das disciplinas como componentes curriculares, compreensão da relação

professor-aluno e aluno-aluno, teoria e prática da tecnologia educacional; concepção

do processo avaliativo e suas técnicas para feedback, planejamento como atividade

educacional e política, gestão de sala de aula; (iii) competência política – o professor

como cidadão. Essas três competências colaboram para que o professor possa

Page 88: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA (PUC-SP) FACULDADE DE ... · CÁCIA CRISTINA FRANÇA REHEM DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E BACHARÉIS DOCENTES: PROCESSOS FORMATIVOS E A PRÁTICA PEDAGÓGICA

87

construir seu fazer docente de forma profissional nas várias funções que compõem

seu ofício de professor.

A denominada competência científica, é condição principal para o ensino,

sendo essa a primeira preocupação do docente universitário − para ensinar é

preciso saber. Dessa forma, entendemos que o conteúdo é de conhecimento do

professor e que já foi realizado um trabalho prévio de seleção e organização deste.

Entretanto, Zabalza (2003, p. 77) adverte: Não podemos deixar de considerar a competência científica dos professores universitários, pois não cabe dúvidas de que é nela que reside boa parte da qualidade de sua docência. Sem conhecer bem e de uma maneira muito precisa o âmbito científico em que exerce sua docência é inútil tentar buscar caminhos didáticos suplementares de melhoria da qualidade.23

A competência científica é composta pelo que denominamos de

“conhecimento científico” − possuir conhecimento sobre a temática estabelecida

como especialidade da área e das Ciências da Educação. Para Masetto (2012 b, p.

31): Essa competência significa, em primeiro lugar, um domínio dos conhecimentos básicos em determinada área, bem como experiência profissional de campo, domínio este que se adquire, em geral, em cursos de bacharelado que se realizam nas universidades e/ou faculdades e com alguns anos de exercício profissional.

A posse desses conhecimentos acontece durante o percurso formativo, a

partir da dedicação aos estudos, leituras e principalmente de uma atualização

contínua no percurso profissional. É adquirida no momento da graduação e continua

no momento da realização da pós-graduação (mestrado e doutorado), fazendo parte

também desse universo os conhecimentos produzidos pelos professores através das

suas pesquisas.

No entanto, essa relação entre o conteúdo que é selecionado para o ensino e

aquele fruto de pesquisa própria dos professores − a sua produção na área de

conhecimento de sua atuação − em muitos casos, fica restrita a seus laboratórios de

pesquisa, aos congressos, publicações e seu pequeno grupo de alunos de iniciação

científica ou de orientação; em raríssimos casos são levados para as salas de aula

de atuação desse professor.

23 No podemos entrar a considerar la competência científica de los professores universitários, pero no

cabe duda de que en ella reside buena parte de la calidad de su docencia. Si no conocen bien y de uma manera muy precisa em ámbito científico en el que ejercen su docencia es inútil intentar buscar vías didácticas suplementares de mejora de la calidad. (ZABALZA, 2003, p. 77)

Page 89: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA (PUC-SP) FACULDADE DE ... · CÁCIA CRISTINA FRANÇA REHEM DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E BACHARÉIS DOCENTES: PROCESSOS FORMATIVOS E A PRÁTICA PEDAGÓGICA

88

A produção científica de um professor da educação superior é estruturada a

partir da sua relação com a pesquisa. Masetto (2012 b, p. 31-32) esclarece que o

termo “pesquisa”, nesse caso, vai abranger diversos níveis e atividades, tais como:

(i) os estudos e reflexões críticas a respeito de temas teóricos, produção de textos,

papers, (ii) os trabalhos apresentados em congressos e simpósios, a redação de

capítulos de livros, artigos científicos, etc., (iii) produção de tecnologia de ponta.

Para esse autor, a construção da competência, passa essencialmente pela

capacidade de se atualizar constantemente, pela produção e divulgação do

conhecimento referente a sua área de atuação.

Nessa mesma concepção Más Torelló (2011, p. 200) ressalta: [..] o professor universitário deverá se preocupar por desenvolver sua função de pesquisador, para continuar criando conhecimento científico e melhorar deste modo seu campo científico, para oferecer novas propostas metodológicas adaptadas a seus alunos e matérias, para inovar em sua realidade e em seu contexto, etc. Para conseguir todos estes objetivos será necessário manter uma atitude de constante reflexão e crítica, de autoperfeccionismo, de formação e de compromisso ético com a profissão.24 (tradução nossa)

Sob esse prisma, a posse dessa competência garante ao professor as

habilidades necessárias para lidar com o conhecimento científico como produtor e

não apenas como um repetidor dos conteúdos produzidos por outros, não somente

como alguém que consome o que está posto nos manuais, livros e pesquisas

alheias, mas um profissional que consegue apresentar uma produção científica

própria e atual.

No entanto, só o domínio do saber científico não garantirá uma competência

para o professor desenvolver sua atuação docente de forma profissional, visto que

acima domínio da área pedagógica, uma segunda competência a se integrar a

competência do conhecimento disciplinar. É necessário então saber combinar esse

conhecimento com o didático. É preciso ser detentor de saberes e da ação

pedagógica, para ultrapassar limitações em dimensões epistemológicas, políticas ou

sociais.

24 [...] el professor universitário se deberá preocupar por desarrollar su función invstigadora, para continuar creando conocimiento científico y mejorar de este modo su campo cientifíco, para oferecer nuevas porpuestas metodológicas adaptadas a sus alunos y materias, para inovar em su realidade y em su contexto, etc. Para conseguir todos estos objetivos será necessário mantener uma actitud de constant reflexión y crítica, de autoperfeccionamento, de formación, de compromisso ético com la profesión, etc. (TORELLÓ, 2011, p. 200)

Page 90: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA (PUC-SP) FACULDADE DE ... · CÁCIA CRISTINA FRANÇA REHEM DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E BACHARÉIS DOCENTES: PROCESSOS FORMATIVOS E A PRÁTICA PEDAGÓGICA

89

Sobre o assunto, há que se recorrer a Gauthier et al. (2013, p. 34) para os

quais os saberes da ação pedagógica são um dos fundamentos da identidade

profissional do professor. Os autores fazem a ressalva de que “Os saberes da ação

pedagógica legitimados pela pesquisa são atualmente o tipo de saber menos

desenvolvido no reservatório de saberes do professor e, também paradoxalmente, o

mais necessário à profissionalização do ensino”. (GAUTHIER et al. 2013, p. 34)

A competência na área pedagógica implica conhecimentos e habilidades

sobre o ensino-aprendizagem, como ação formal, mediatizada pelos elementos que

a constituem: planejar as disciplinas de um currículo como componentes

curriculares, integrando umas às outras. Zabalza (2003, p. 72) destaca que a

capacidade de planejar é o primeiro grande ato do docente: [...] conceber sua atuação como um desenvolvimento de um projeto, desenhar um programa adaptado às circunstâncias, selecionar diversos dispositivos e procedimentos para comunicar os conteúdos e facilitar a aprendizagem dos alunos, etc. No fundo, é um desempenho comum no ensino”25. (tradução nossa)

A competência pedagógica permite ao docente a compreensão e a

possibilidade de organizar o processo de ensino-aprendizagem de forma consciente

utilizando-se dos conhecimentos sobre a prática pedagógica validados e

comunicados pela literatura científica. Sob a ótica de Masetto (2012b), para o

exercício da docência é necessário que a competência pedagógica seja

desenvolvida envolvendo diversos aspectos que a compõem, a saber:

25 [...] concebir su actuación como el desarrolo de un proyecto, diseñar um programa adaptado a las

circunstancias, selecionar diversos dispositivos y procedimientos para comunicar los contenidos y facilitar el aprendizaje de los alunnos, etc. En el fondo, es una actuación habitual en el trabajo docente. (ZABALZA, 2003, p. 72)

Page 91: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA (PUC-SP) FACULDADE DE ... · CÁCIA CRISTINA FRANÇA REHEM DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E BACHARÉIS DOCENTES: PROCESSOS FORMATIVOS E A PRÁTICA PEDAGÓGICA

90

Quadro 1 − Adaptação dos elementos que compõem a competência pedagógica

ASPECTOS ELEMENTOS 1) Conceito de processo ensino-aprendizagem • ter clareza sobre o que significa aprender.

• conhecer os princípios básicos da aprendizagem. • ter clareza sobre o que se deve aprender atualmente. • orientar aprendizagens de modo significativo. • possuir conhecimentos sobre as teorias atuais sobre aprendizagem. • saber como se aprende no ensino superior. • conhecer os princípios básicos da aprendizagem de pessoas adultas. • integrar no processo de aprendizagem o desenvolvimento cognitivo, afetivo-emocional, de habilidades e a formação de atitudes. • aprender a aprender permanentemente.

2) A concepção e a gestão do currículo • inteirar-se do currículo do curso em que leciona. • ter clareza sobre as diretrizes curriculares e as competências básicas de formação profissional esperadas pela instituição onde trabalha.

3) A integração das disciplinas como componentes curriculares

• compreender o papel curricular da disciplina pelo qual o seu conteúdo é planejado, adaptado e recortado de acordo com o curso que está se desenvolvendo e com a formação esperada para aquele profissional.

4) A compreensão da relação professor-aluno e aluno-aluno

• motivador e incentivador do desenvolvimento de seus alunos. • organizar com seus alunos um grupo de trabalho com objetivos comuns. • estimular o trabalho em equipe. • desenvolver atitudes de parceria e corresponsabilidade com os alunos.

5) A teoria e prática da tecnologia educacional • Utilizar de metodologias ativas e as Tecnologias de Comunicação e Informação como auxiliares ao processo de aprendizagem de forma autônoma e autoral.

6) A concepção do processo avaliativo e suas técnicas para feedback

• transformar o conceito e prática da avaliação da aprendizagem, superando a sua utilização somente para aprovar ou reprovar o aluno. • desenvolver uma prática voltada para a aprendizagem.

7) O planejamento como atividade educacional e política.

• utilizar o planejamento como um instrumento que compõe a prática educativa.

Fonte: Adaptado pela autora com base em Masetto (2012 b, p. 32-39)

Mas Torelló (2011) apresenta que o domínio da área pedagógica se realiza

mediante o desenvolvimento de 6 competências e de 34 unidades, conforme quadro

2 a seguir:

Page 92: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA (PUC-SP) FACULDADE DE ... · CÁCIA CRISTINA FRANÇA REHEM DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E BACHARÉIS DOCENTES: PROCESSOS FORMATIVOS E A PRÁTICA PEDAGÓGICA

91

Quadro 2 − As 6 competências da função docente e suas 34 unidades de competências

COMPETÊNCIAS FUNÇÕES DOCENTE: UNIDADES DE COMPETÊNCIAS

1. Criar o guia docente de acordo com asnecessidades, o contexto e o perfil profissional; tudo isso em coordenação com outros profissionais.

1.1 Caracterizar o grupo de aprendizagem. 1.2 Diagnosticar as necessidades. 1.3 Formular os objetivos de acordo com as competências do perfil profissional. 1.4 Selecionar e sequenciar conteúdos de aprendizagem. 1.5 Escolher estratégias metodológicas atendendo à diversidade dos alunos e à especificidade do contorno. 1.6. Selecionar e criar meios e recursos didáticos de acordo com a estratégia. 1.7. Elaborar unidades didáticas do conteúdo. 1.8 Organizar o plano de avaliação da aprendizagem e os instrumentos necessários.

2. Desenvolver o processo de ensino-aprendizagem propiciando oportunidades de aprendizagem tanto individual como grupal.

2.1 Aplicar estratégias metodológicas multivariadas de acordo com os objetivos. 2,2 Utilizar diferentes meios didáticos no processo de ensino-aprendizagem. 2.3 Administrar a interação didática e as relações com os alunos. 2.4 Estabelecer ótimas condições e um clima social positivo para o processo de ensino-aprendizagem e a comunicação. 2.5 Utilizar as TIC para a combinação do trabalho presencial do aluno. 2.6 Administrar os recursos e infraestrutura fornecidos pela instituição. 2.7 Administrar entornos virtuais de aprendizagem.

3. Tutorizar o processo de aprendizagem doaluno

3.1 Planejar ações de tutorização, considerando os objetivos da matéria e as características dos alunos, para otimizar o processo de aprendizagem. 3.2 Criar um clima favorável para manter a comunicação e interação positiva com os alunos. 3.3 Orientar de forma individual e/ou em grupo o processo de construção do conhecimento dos estudantes proporcionando-lhes orientações, informações, recursos para favorecer a aquisição de competências. 3.4 Utilizar técnicas de tutorização virtual.

4. Avaliar o processo de ensino-aprendizagem

4.1 Aplicar os dispositivos de avaliação de acordo com o plano avaliativo estabelecido. 4.2 Verificar o alcance de aprendizagem dos alunos. 4.3 Avaliar o processo de ensino-aprendizagem dos alunos. 4.4 Promover e utilizar técnicas e instrumentos de autoavaliação discente. 4.5 Tomar decisões baseando-se nas informações obtidas. 4.6 Implicar-se nos processos de avaliação. 4.7 Desenvolver o deveres e dilemas éticos da avaliação.

Page 93: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA (PUC-SP) FACULDADE DE ... · CÁCIA CRISTINA FRANÇA REHEM DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E BACHARÉIS DOCENTES: PROCESSOS FORMATIVOS E A PRÁTICA PEDAGÓGICA

92

5. Contribuir ativamente para a melhoria dadocência

5.1 Participar com outros profissionais na concepção e elaboração de novos instrumentos, materiais e recursos didáticos para ampliar e/ou melhorar as competências profissionais. 5.2 Manter relações com o entorno socioprofissional, de forma sistemática e periódica, para sua atualização e aperfeiçoamento docente. 5.3 Participar ativamente em ações de inovação orientadas à otimização dos processos de aprendizagem. 5.4 Aplicar técnicas e instrumentos de autoavaliação docente. 5.5 Autodiagnosticar necessidades de formação para a melhoria da docência.

6.Participar ativamente da dinâmica acadêmica-organizativa da instituição (universidade, faculdade, área, departamento, titulações...)

6.1 Participar de grupos de trabalho. 6.2 Participar das comissões multidisciplinares de docência. 6.3 Promover e participar de grupos de trabalhos sobre programações de assuntos pertencentes à área de conhecimento. 6.4 Participar da programação de ações, módulos formativos. 6.5 Promover a organização e participar do desenvolvimento de jornadas acadêmicas, debates, mesas-redondas. 6.6 Participar do projeto e desenvolvimento de novos planos de estudo a partir das indicações, descritores apontados pelos organismos competentes.

Fonte: Adaptado pela autora com base em Mas Torelló (2011, p. 199-220)

Comparando as duas propostas, percebemos que são similares e

complementares. Os autores destacam a importância da posse de competências

fundamentadas em aspectos relacionados ao processo de ensino-aprendizagem

através do envolvimento com o ambiente, da parceria com os grupos de trabalho

(outros professores), do planejamento da prática pedagógica (organização e

desenvolvimento da aula), do cuidado com a aprendizagem dos alunos, das

relações estabelecidas entre alunos/alunos e professores/alunos, tendo em vista o

desenvolvimento de uma prática consciente e qualificada.

Para o exercício da função docente, que está diretamente ligada à prática

pedagógica – a ação −, no entendimento desses autores, é necessário a

compreensão e desenvolvimento dessas competências, pois as mesmas cumprem a

função de instrumentalizar o docente para lidar com o conhecimento a ser

compartilhado com os alunos, com o planejamento competente das suas ações, com

as relações entre seus pares e entre os alunos, e possibilitando a formação

profissional do aluno na universidade.

Page 94: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA (PUC-SP) FACULDADE DE ... · CÁCIA CRISTINA FRANÇA REHEM DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E BACHARÉIS DOCENTES: PROCESSOS FORMATIVOS E A PRÁTICA PEDAGÓGICA

93

Acreditamos no fato de que, mesmo assumindo a autonomia e as

particularidades de cada profissional (docente), é possível uma formação que

ofereça o desenvolvimento de competências para uma prática pedagógica

consciente, afinal, aprender a ensinar requer treinamento específicos, apoio e

supervisão, principalmente nas etapas iniciais. (CRUZ TOMÉ, 1994)

Atrelamos à competência pedagógica, um outro elemento − a experiência

adquirida com o tempo de exercício na docência − mas, uma experiência refletida,

transformadora e que vai permitindo um refazer constante e ressignificado da prática

pedagógica, com criatividade, tomando o conhecimento produzido em constante

tensão com a realidade concreta que possibilita a ampliação, um movimento

dinâmico e dialético entre o fazer e o pensar docente na vida acadêmica. Há que se

estar implicado em reavaliar e produzir novos conhecimentos com a superação dos

desafios da realidade.

A experiência como local de formação precisa ser legitimada quando

oportunizado ao professor espaços formativos que permitam o confronto e a análise

da sua ação. Torres e Almeida (2013, p. 18), são bastante contundentes no que

tange à prática e à experiência − “[...] são privilegiadas quando falamos em aprender

a ser professor, talvez porque essas tragam crenças, juízos de valor, juízos de fato e

uso de precedentes e probabilidade ao trabalho cotidiano da docência, sendo essas

características da própria vida cotidiana”.

As autoras acrescentam que há “grande fosso” entre a prática e a teoria.

Então, há que se considerar uma imbricação entre elas, a partir de “[...] um

movimento constante de reflexão e crítica sobre o fazer docente devido ao caráter

mutável e fluido da realidade. Compreender a prática como casual, artesanal ou

simplesmente como rotina, na qual só se aprende a fazer fazendo, esvazia a

reflexão vinculada à prática educativa com objetivo transformador.”

Mesmo complexa, e entendendo a subjetividade dessas ações, existe hoje,

uma compreensão de que a docência se organiza e se materializa a partir de

competências aprendidas no processo de profissionalização e no exercício através

da profissionalidade, atreladas a uma reflexão pertinente da prática pedagógica

desenvolvida.

A terceira competência – a política, permite ao professor a compreensão de

que nenhum ato educacional é neutro; “como experiência especificamente humana,

a educação é uma forma de intervenção no mundo” (FREIRE, 1998, p. 98). Sendo

Page 95: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA (PUC-SP) FACULDADE DE ... · CÁCIA CRISTINA FRANÇA REHEM DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E BACHARÉIS DOCENTES: PROCESSOS FORMATIVOS E A PRÁTICA PEDAGÓGICA

94

assim, ao entrar em uma sala de aula para ensinar, esse professor permanece como

um cidadão, alguém que produz história e participa ativamente da construção da

vida e da história do seu povo. (MASETTO, 2012)

A competência política permite, ao mesmo tempo, consciência cidadã e social

a esse professor, e que deva ser de sua responsabilidade formar profissionais com

compreensão de mundo e consciência cidadã. Nessa perspectiva, entendemos, por

conseguinte, que a competência política do professor, permite consciência crítica e

responsabilidade com a formação integral dos seus alunos.

A competência política permite ainda ao professor compreender qual o seu

papel como formador de profissionais que, inseridos na sociedade, vão contribuir

para que as relações sejam conscientes e solidárias. É necessário, para esse

professor, que a formação oferecida aos futuros profissionais não se configure

distante das relações humanas; portanto, será possível, através da competência

política, possibilitar a esses sujeitos consciência de mundo, de homem, de

sociedade e que possam agir de maneira refletida.

Podemos então estabelecer que, para o exercício da função da docência, o

docente deve saber e possuir competências (científica/pedagógica/política) que

nutram o seu fazer e o lhe permita lidar com o processo de ensino-aprendizagem de

forma consciente e qualificada, facultando aos seus alunos o desenvolvimento e

autonomia como profissionais competentes e cidadãos.

Quando assumimos nesse trabalho que o professor deva possuir

competências para o exercício profissional da docência, entendemos que essas

competências precisam ser legitimadas através de um processo formativo, a fim de

instrumentalizar o docente para a ação. Com efeito, ressalvamos e reiteramos que a

subjetividade faz parte desse processo. A relação entre a subjetividade, a história de

vida pessoal e escolar do professor e sua prática docente são inegavelmente

relevantes, de modo que, individualmente e coletivamente, cada professor irá

construindo o seu fazer e desenvolvendo essas competências. Corroborando Torres

e Almeida (2013, p. 18), consideramos que ser fulcral “Entender que a experiência é

construída a partir da reflexão constante sobre/na prática, atentando para o contexto

sociocultural, abriga e fomenta valores e conteúdos à instituição de educação

superior e, consequentemente, ao trabalho docente; é entender que compreensão e

ação mutuamente se potenciam.”

Page 96: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA (PUC-SP) FACULDADE DE ... · CÁCIA CRISTINA FRANÇA REHEM DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E BACHARÉIS DOCENTES: PROCESSOS FORMATIVOS E A PRÁTICA PEDAGÓGICA

95

4 A PESQUISA DO CAMPO EMPÍRICO: ANÁLISE DOS DADOS

As duas categorias de análises definidas a priori − formação e prática

pedagógica – nortearam os caminhos investigativos. Em cada uma delas a

pesquisadora buscou a maior quantidade de informações, a fim de esclarecer os

movimentos apresentados pelos sujeitos pesquisados no desvelamento da formação

para a docência e do desenvolvimento da prática pedagógica.

Na categoria formação pretendeu-se identificar o perfil profissional desse

bacharel/docente na atualidade e compreender quais foram as contribuições,

advindas da formação profissional − inicial e continuada −, especificamente os

percursos construídos no cotidiano do fazer docente – a prática pedagógica.

Almejamos identificar como essas práticas são desenvolvidas, as necessidades

decorrentes dela, bem como a identificação das competências presentes na ação do

bacharel/docente.

Para tanto, a partir da transcrição das entrevistas, buscamos compreender

suas opiniões sobre as questões formuladas, e analisá-las a partir da retomada das

discussões apresentadas no capítulo 3, construindo um diálogo entre o que refere a

literatura e os dados coletados na pesquisa de campo.

4.1 O PERFIL DOS BACHARÉIS/ DOCENTES: OS DADOS REVELADOS NA PESQUISA

Nesta seção desvelamos qual o perfil que possuem os bacharéis/docentes na

atualidade e buscamos compreender os processos formativos para o exercício da

docência no cotidiano do fazer docente.

Outrossim revelamos o desenvolvimento da prática pedagógica exercida por

esses professores, suas concepções e quais competências foram citadas como

necessárias para o exercício da docência, bem como quais necessidades formativas

possuem.

Page 97: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA (PUC-SP) FACULDADE DE ... · CÁCIA CRISTINA FRANÇA REHEM DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E BACHARÉIS DOCENTES: PROCESSOS FORMATIVOS E A PRÁTICA PEDAGÓGICA

96

4.1.1 O perfil do docente/bacharel

Estudos realizados no Brasil e no mundo, principalmente a partir da década

de 1980, dão conta do perfil do docente universitário − profissional liberal,

geralmente recrutado em suas áreas de conhecimento e de formação inicial,

possuindo uma relação com a docência como complementação de renda e de status

e, em sua maioria, nunca optaram pela docência como atividade principal.

Acreditavam ser uma atividade a mais dentre as que contemplavam a sua profissão.

(MASETTO, 2012; CUNHA, 2005; MAS TORELLÓ, 2011; PIMENTA, 2002, entre

outros)

Assumiram não ser preciso formação ou preparação para o seu exercício: a

posse do conhecimento científico e a prática vivenciada no campo profissional

garantia a competência necessária para tal empreitada. Isso posto, conforme

Zabalza (2004), “dificilmente se reconheciam como professores”. Quando muito, o

reconhecimento advinha de momentos específicos em que, ao se intitular “professor

do ensino superior”, era sinônimo de reconhecimento e status.

Para Fávero (2013, p. 3):

A identidade da docência universitária é extremamente controversa e vinculada ao status socioprofissional. Em outras palavras, dependendo do contexto, nos definimos pelo âmbito científico (químicos e engenheiros), principalmente quando precisamos justificar nossa estreita compreensão sobre as opções políticas-pedagógicas que perpassam à docência, por outro lado, se estamos em um evento científico, somos apresentados não pela via da docência. Se, no entanto, estamos a dialogar com pessoas pouco escolarizados, basta dizer que somos professores universitários para se instituir a relação de poder.

Os sujeitos da pesquisa em questão tinham como perfil inicial serem

bacharéis/docentes das mais diversas áreas (Bacharel em Ciências da Computação,

Bacharel em Medicina Veterinária, Bacharel em Nutrição, Bacharel em Fisioterapia,

Bacharel em Engenharia Elétrica, Bacharel em Odontologia, Bacharel em

Enfermagem) e possuíam pós-graduação stricto sensu em áreas específicas de

formação inicial, sendo:

2 (dois) docentes com mestrado (Biofísica e Saúde Pública)

Page 98: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA (PUC-SP) FACULDADE DE ... · CÁCIA CRISTINA FRANÇA REHEM DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E BACHARÉIS DOCENTES: PROCESSOS FORMATIVOS E A PRÁTICA PEDAGÓGICA

97

1 (um) docente com mestrado e em doutoramento (Ciências da

Computação)

4 (quatro) docentes com doutorado (Genética e evolução, Ciências da

Computação, Endodontia, Enfermagem).

Masetto (2010, p. 67) destaca que os docentes na universidade brasileira, em

geral, sempre apresentaram um perfil de:

[...] profissionais que, atualizados em suas áreas de conhecimento e dominando as práticas profissionais, se apresentavam como os mediadores entre a ciência e os alunos, fazendo com que pudessem se formar por meio das sábias lições teórico-práticas que seus mestres lhes passavam e exigiam que fossem reproduzidas.

Para desvelarmos o perfil do bacharel/docente e identificarmos a relação

entre a formação obtida na graduação e a docência, perguntarmos aos nossos

sujeitos: Exerceu ou exerce alguma atividade no seu campo de formação profissional inicial? Como resultado encontramos três tipos, a saber:

1. Nunca atuou na área de formação inicial. Após a graduação, ingressou no

mestrado, doutorado e, em seguida, na docência universitária, conforme

observamos nos seguintes relatos:

DO1 – Não, nunca exerci a profissão da formação inicial; saí da graduação, emendei com o mestrado e, em seguida, fiz o concurso e passei a lecionar. DO2 – Não, sai da graduação e, em seguida, já comecei o mestrado; após o doutorado e após que ingressei na universidade. DO3 – Não, já no segundo semestre do curso de graduação, me interessei pela docência, e após a graduação fui fazer o mestrado. DO5 – Não. Nunca. Após a graduação já comecei a lecionar e fui fazer mestrado. DO7 – Não, logo após a graduação apareceu a oportunidade de fazer o mestrado; fiz a disciplina de docência, gostei e consegui, ainda durante o mestrado, ser professora substituta; em seguida apareceu a oportunidade desse concurso, fiz e fui aprovada. Desde então atuo como professora e não saberia fazer outra coisa.

2. Atuou na área de formação inicial, mas optou pela docênciaDO4 – Exerci durante cinco anos, mas eu trabalhava em regime de plantão; trabalhava em clínica e tinha uma vida muito corrida, e aí eu queria ter uma qualidade de vida melhor. Então eu soube do concurso e aí resolvi vir para a docência, também pela questão da estabilidade.

Page 99: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA (PUC-SP) FACULDADE DE ... · CÁCIA CRISTINA FRANÇA REHEM DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E BACHARÉIS DOCENTES: PROCESSOS FORMATIVOS E A PRÁTICA PEDAGÓGICA

98

3. Permanece atuando na profissão mesmo sendo docente universitário

DO6 – Sim, tenho consultório e pratico a odontologia. Acho importante estar atuando na minha profissão, pois posso me atualizar constantemente e ajudar mais os alunos na formação.

Entre os sujeitos de nossa pesquisa somente dois docentes tiveram inserção

no campo profissional. Os demais atuam especificamente como docentes, nunca

exerceram a profissão no campo prático, fizeram o percurso acadêmico

(graduação/pós-graduação), na área específica de formação inicial e, em seguida,

assumiram à docência.

Em estudos realizados junto ao grupo de pesquisa Paradigmas Educacionais

na Formação de Professores (PEFOP) por Behrens (2011, p. 442), foram levantados

quatro grupos representativos de profissionais que atuam na universidade, a saber:

(i) profissionais de variadas áreas de conhecimento e que se dedicam à docência em tempo integral; (ii) profissionais que atuam no mercado de trabalho específico e se dedicam ao magistério algumas horas por semana; (iii) profissionais docentes da área pedagógica e das licenciaturas que atuam na universidade, e paralelamente no ensino básico; (iv) profissionais da área de educação e das licenciaturas que atuam em tempo integral na universidade.

Destacamos na citação duas categorias presentes em nossa pesquisa, no

que se refere ao perfil do docente na atualidade: profissionais bacharéis de

formação, que exercem unicamente a docência como atividade profissional, e

profissionais que atuam no mercado de trabalho e dedicam algumas horas para a

docência.

Quanto aos grupos encontrados na pesquisa, é relevante o grande número de

profissionais que migraram da graduação para a pós-graduação e, em seguida, para

a docência, revelando um complicador para a docência exercida por esses

profissionais. Se antes eles traziam os conhecimentos da ciência e os

conhecimentos que vivenciavam no cotidiano da profissão, o fato de não a exercer

ou de ter tido pouco contato com a mesma, dificulta-lhes uma relação mais estreita

com as transformações vivenciadas pelas profissões no decorrer do tempo,

conforme ressaltado por Behrens (2011, p. 442):

A experiência vivenciada do bacharel agrega uma contribuição significativa na formação para os alunos. Esse fato precisa ser considerado, pois em geral eles trazem para o curso contribuições relevantes para discutir e exemplificar na sala de aula

Page 100: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA (PUC-SP) FACULDADE DE ... · CÁCIA CRISTINA FRANÇA REHEM DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E BACHARÉIS DOCENTES: PROCESSOS FORMATIVOS E A PRÁTICA PEDAGÓGICA

99

Dessa forma, esse perfil dos sujeitos entrevistados, em seus percursos para a

docência, exercem um processo formativo profissional baseado em modelos, sendo

que, em muitos casos, o único contato com a prática profissional foi a vivenciada no

estágio, nos últimos semestres da formação. Isso posto, é relevante refletir sobre o

papel da universidade na contribuição da formação profissional desses alunos.

Sob esse prisma, convém observar o que Behrens (1998, p. 58) acentua:

Existem docentes que ensinam o que nunca experimentaram e, nesse caso, não se coloca em questão a competência do professor, mas a pertinência da proposta a ser desenvolvida com os alunos. Esse fato se torna desafiador quando o docente está distante do mercado do trabalho e não está habituado a fazer leitura especializada que traga produção de conhecimento moderno na área em que atua no curso.

Para um docente desta pesquisa, essa é uma questão real, uma vez que o

distanciamento do campo de trabalho pode acarretar no afastamento da profissão de

origem, conforme fica patente na fala de DO5 “[...] até na questão profissional, daqui

a pouco nem fisioterapeuta eu vou ser mais, pois não tenho me aperfeiçoado.” Essa

constatação reforça a ideia de que, apesar de a sua profissão inicial ser

fisioterapeuta, o desenvolvimento profissional se concretiza, como um processo

individual, no local de trabalho do docente, distanciada da formação original.

Embora a posse do conhecimento científico atualizado e ressignificado seja

importante para o ensino e a formação do aluno, o distanciamento e a falta de

contato com o campo prático da profissão, no entendimento desse sujeito da

pesquisa, implica em não mais identificar-se, “a não ser mais “fisioterapeuta”, pois

falta-lhe o campo prático dessa profissão.

Outro docente aponta a importância de realizar as duas funções

concomitantemente DO.5 – “Acho importante estar atuando na minha profissão, pois

posso me atualizar constantemente e ajudar mais os alunos na formação”. Essa

perspectiva é similar àquela referida por Behrens (2011) − mesmo reconhecendo a

importância do professor com Dedicação Exclusiva (DE), haja vista poder se dedicar

somente à docência, a autora chama a atenção que a imersão no campo profissional

também é relevante e significativa, pois permite atualização e ressignificação que

podem ser ofertados ao aluno, corroborando com o posicionamento da autora.

No entanto, em relação aos docentes que atuam unicamente na

Universidade, ainda segundo Behrens (2011), estes são fundamentais, pois dedicam

todo o seu tempo à universidade, dividindo o seu tempo entre a docência e a

Page 101: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA (PUC-SP) FACULDADE DE ... · CÁCIA CRISTINA FRANÇA REHEM DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E BACHARÉIS DOCENTES: PROCESSOS FORMATIVOS E A PRÁTICA PEDAGÓGICA

100

pesquisa e podem atender melhor aos alunos. Por certo, ainda segundo a autora, os

dois tipos (docentes com dedicação exclusiva e docentes que trabalham algumas

horas na docência) devem conviver harmoniosamente na universidade, pois

agregam valores significativos na formação dos alunos.

Outro dado relevante, e diferente dos perfis até aqui estabelecidos, é o que

aparece na literatura especializada sobre o perfil do docente universitário que, em

sua maioria, opta pelo campo da docência visando à pesquisa como elemento

prioritário. Este fato, segundo Behrens (2011, p. 3) é um complicador sério para as

gestões na universidade, “pois defendem suas horas na pesquisa e negociam

exaustivamente a redução da jornada na atuação na docência, especialmente na

graduação”.

Nesse particular, em nossa pesquisa, quando formulamos a seguinte questão

aos docentes/bacharéis: Quais foram os motivos que os encaminharam para a docência? este perfil de docente referido por Behrens apareceu somente em um

relato − DO2 “tinha jeito para a pesquisa e o ensino”. Os demais depoimentos sobre

a citada questão revelam, em alguns casos, que as escolhas aconteceram ainda

durante a graduação, por motivos diversos, mas, na sua maioria, não foi a pesquisa

que os motivou a ingressarem na docência e, inicialmente, não era uma opção

profissional, conforme observamos a seguir:

1. Primeira oportunidade de trabalho:

DO1 – Durante a graduação um professor me perguntou se eu queria continuar os estudos e fazer mestrado no ITA; fiz a inscrição e passei. Depois de terminar o mestrado, comecei imediatamente a ensinar; não foi uma opção inicial, foi uma oportunidade que surgiu. DO7 – Primeira opção de trabalho, após a formatura; não foi uma escolha, foram as oportunidades de trabalho que surgiram que me levou à docência.

2. Influência e incentivo de bons professores:

DO3 – Foi uma escolha pessoal, motivada por bons professores e seus exemplos; no segundo ano do curso de graduação decidi que iria para a docência.

DO6 – Na realização de um curso de pós-graduação, na minha área específica, um professor me disse que eu tinha jeito para ensinar; a partir daí, busquei a docência, mas nunca tive a intenção de largar o trabalho no consultório. Para mim, foi uma opção, uma escolha pessoal.

Page 102: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA (PUC-SP) FACULDADE DE ... · CÁCIA CRISTINA FRANÇA REHEM DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E BACHARÉIS DOCENTES: PROCESSOS FORMATIVOS E A PRÁTICA PEDAGÓGICA

101

3. Busca pela estabilidade no emprego:

DO4 – Não era a minha opção, mas a estabilidade da carreira docente no ensino público e a qualidade de vida me motivaram a buscar essa oportunidade.

4. Desejo de ser pesquisador:

DO2 – A oportunidade de realizar iniciação científica na graduação, o apoio da orientadora, que sempre destacou a minha facilidade para a pesquisa e o ensino, ratificou um desejo que eu já possuía de ser professor, foi uma escolha pessoal.

5. Desejo de ser professor:

DO5 – Na graduação já senti o desejo de ser professor.

Retomando, embora o depoimento de DO2 revelasse um desejo pessoal de

ser professor e ser afeito ao ensino e pesquisa, evidenciamos que a docência não

foi inicialmente uma opção profissional. Por outro lado, como perceberemos adiante

nas falas desses entrevistados, a docência não é entendida como uma profissão que

requer competências especificas, como o conhecimento pedagógico da disciplina,

no que tange aos seus aspectos mais específicos das situações de ensino e que

exige maneiras mais didáticas de se formular e apresentar os tópicos, diferentes

daquelas oferecidas na formação inicial.

Em síntese, podemos identificar, nesse movimento de ingresso na docência,

que, para os sujeitos da pesquisa, o exercício da docência não necessita de muitos

requisitos, posto que o fato de possuir a graduação e a pós-graduação, por si só, já

lhes habilita a se candidatar para exercer a função de docente no ensino superior.

De fato, esse profissional chega à docência, contudo não traz em sua bagagem o

que requer um trabalho educativo, aliado às constantes mudanças no mundo

contemporâneo que envolvem conhecimentos e situações difíceis de prever na vida

acadêmica, no ensino. Isto implica a necessidade constante de um contínuo

processo de reflexão e adequação a essas inovações e demanda pesquisa, imersão

na extensão, inerentes às atividades da docência.

Nesse sentido, a docência universitária e suas atribuições envolvem a

indissociabilidade entre o ensino, pesquisa, extensão, e acrescentamos um quarto

elemento − a administração e gestão (direção de departamento, coordenação de

colegiados e de áreas de conhecimento, pró-reitoras, reitoria, etc.). Todo esse

Page 103: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA (PUC-SP) FACULDADE DE ... · CÁCIA CRISTINA FRANÇA REHEM DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E BACHARÉIS DOCENTES: PROCESSOS FORMATIVOS E A PRÁTICA PEDAGÓGICA

102

conjunto de conhecimentos está atribuído ao docente e, para tal, faz-se mister

investir na profissão.

Partindo desse pressuposto, quando perguntados sobre as atividades que

desenvolvem na universidade e quais as preferidas, as informações obtidas

revelaram que atuam no ensino, pesquisa, extensão e gestão, tendo o ensino

aparecido como a atividade preferida.

1. Ensino, extensão, sendo o ensino a preferida:

DO1 – Desenvolvo ensino e extensão, pesquisa não faço, e a minha preferência é pelo ensino, por causa do retorno, ver o aluno aprender, trabalhar a prática, ver o retorno, eu gosto disso.

2. Apenas ensino, e gosta mais do ensino:

DO3 – Gosto mais da sala de aula, de ensinar, do contato com os alunos, não faço pesquisa e nem extensão; minha área é muito difícil, já tentei me encaixar em alguns grupos, mas não consegui.

3. Ensino, pesquisa e extensão, sendo o ensino a preferida

DO2 – Gosto mais de dar aula. Lógico que a parte de pesquisa eu sempre quis fazer, as duas coisas têm que estar conjunta; estar com os alunos é muito bom, a gente reclama, mas gosta. A pesquisa é muito legal, eu gosto, mas, é uma curiosidade minha, de tentar resolver algumas questões, mas, a questão de transferir conhecimentos, eu me sinto mais útil, quando posso transferir o que aprendi para a garotada. Eu me sinto mais útil para a sociedade, tenho um papel mais importante para a sociedade, é quando eu me sinto realizado. Eu gosto de lidar com os alunos, essa coisa de transferir o conteúdo de ver o aluno aprendendo. Eu tenho energia para estar ali, me dá ânimo, posso estar desanimado, mas ali eu me encontro. DO5 – Desenvolvo ensino, extensão e pesquisa; gosto mais de ensino e extensão. Muita coisa da pesquisa pode linkar com o ensino, então eu tento trazer essa experiência da pesquisa para a sala de aula. DO7 – Faço as três atividades − pesquisa, ensino e extensão. Trabalho com gestão também, já fui coordenador (a) do colegiado do curso de graduação e pós-graduação e diretor(a) do departamento. Hoje faço pesquisa, porque faço parte do programa de pós-graduação. Já fiz muita extensão, mas hoje em dia está praticamente impossível, nós já fomos considerados o campus da extensão, mas por falta de apoio praticamente não fazemos mais. A extensão vai te dar a visão da pesquisa que você tem que fazer e aí eu levo para o ensino, mas a minha preferida é o ensino.

DO6 – Sou colaborador em um projeto de extensão. Faço pesquisa com alguns alunos, por causa do artigo de final de curso, o TCC, e

Page 104: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA (PUC-SP) FACULDADE DE ... · CÁCIA CRISTINA FRANÇA REHEM DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E BACHARÉIS DOCENTES: PROCESSOS FORMATIVOS E A PRÁTICA PEDAGÓGICA

103

gosto mais de ensinar; eu amo ensinar, porque para mim ensinar é uma paixão.

4. Ensino, pesquisa e extensão, sendo a pesquisa a preferida

DO4 – Faço ensino, extensão e pesquisa, mas gosto mais da pesquisa; acho que me identifico mais. A pesquisa é mais clínica, tenho mais facilidade de desenvolver.

Esses professores atuam nas diversas funções que são determinadas pela

universidade, através da Resolução Consepe/201726. Essas atividades compõem as

atribuições acadêmicas do docente, cumprindo a distribuição da carga horária em

ensino, pesquisa, extensão e atividades administrativas ou sindicais. A realização

dessas funções se concretiza através de: pesquisa − apresentações de trabalho em

congresso, publicações científicas, orientações de aluno, iniciação científica etc.;

ensino − cursos, aulas, seminários; extensão e gestão − através do oferecimento de

serviços à comunidade externa e interna (nesse caso realizando funções nos

diversos espaços universitários e na comunidade).

Todavia, os resultados evidenciam que esses sujeitos, ainda que compondo o

mesmo espaço de trabalho, cumprem de forma diferente essas atividades; a única

comum é o ensino, as demais como pesquisa, por exemplo, nem todos realizam ou

a têm como atividade preferencial.

Podemos atribuir esse distanciamento da pesquisa, por esses professores, às

características da própria universidade (espaço da pesquisa) que possui um viés

mais profissionalizante. Até o final da década de 1990, a universidade não possuía

grupos de pesquisa consolidados e o número de mestres e doutores era insipiente.

A partir do final dessa década a universidade começa um processo de expansão

ampliando os cursos e sendo necessário a contratação de muitos professores.

Nesse momento, passa a privilegiar a contratação de professores que possuíam

mestrado e doutorado.

Em consequência disso, há também o incentivo aos professores efetivos que

já trabalhavam na instituição, com estímulo à realização das pós-graduações e

oferecendo vários convênios com universidades brasileiras e internacionais. Hoje, o

26 RESOLUÇÃO CONSEPE nº 56/2017 – Define parâmetros para atribuição de carga horária docente

das atividades acadêmicas/administrativas. Capítulo I – Art. 1º - A carga horária atribuída ao docente será cumprida de acordo com o planejamento departamental, obedecendo a indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão. Parágrafo único – Também compõem a distribuição da carga horária docente as atividades acadêmicas, administrativas e sindicais.

Page 105: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA (PUC-SP) FACULDADE DE ... · CÁCIA CRISTINA FRANÇA REHEM DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E BACHARÉIS DOCENTES: PROCESSOS FORMATIVOS E A PRÁTICA PEDAGÓGICA

104

quadro de mestres e doutores da universidade − ambiente de atuação dos

professores entrevistados − já atinge 75% do quadro docente27.

No entanto, no entendimento desses professores, não tem sido fácil realizar

pesquisas na universidade. Foi-nos relatado que existem problemas que entravam

tal atividade, tais como: “dificuldade de se encaixar em grupos de pesquisa,

financiamentos escassos, prioridade a determinadas áreas, falta de recursos e de

editais de pesquisa na universidade”.

Considerando-se a atividade de extensão, embora tenha um número

considerável que a realiza, é importante observar o relato por DO7 – “apesar de que

a universidade, através desse campus, já tenha tido o título de ‘campus da

extensão’, atualmente é praticamente impossível realizar projetos extensionistas e

têm sido escassos os financiamentos e realizações desses projetos.”

Por outro lado, há de se reiterar o já referido − são vários as atividades a

serem exercidas na docência universitária e, para dar conta das novas tarefas que

dele são exigidas, há que se lidar com importantes necessidades e potencialidades

de trabalho tanto coletivas e individuais, porquanto é inerente ao trabalho docente a

justaposição das atividades correlacionadas ao ensino, pesquisa, extensão. Este

não é um trabalho isolado e há que se lidar com concepções que não formam um

todo relativamente homogêneo, diferenciados quanto aos níveis de ensino, origem

profissional, inserção social e por opções ideológicas e educativas. Nesse âmbito

acadêmico, forçosamente, espera-se que o docente seja capaz de sobrepor várias

atividades e de que consiga realizá-las todas com qualidade, com carga horária

considerada alta e, sendo o ensino a atividade prioritária, os dados revelaram que a

maioria não faz pesquisa/extensão e não tem essa atividade como prioritária.

Quanto às atividades de gestão, os professores as realizam através de

coordenação de área de conhecimento, direção de departamento e coordenação de

colegiado. Contudo, geralmente, quando são direcionados a esses cargos, os

resultados mostram que somente um docente afirmou que realizava atividades de

gestão.

Fica então demonstrado, no perfil desses docentes, que a formação na pós-

graduação não incluiu a docência em seu processo de formação continuada.

27 Fonte: Catálogo de Cursos de Graduação da UESB. Disponível em: <http://www.uesb.br/catalogo/index.asp?pag=docentes_campus.asp&tcab=Docentes%20por%20Departamento>. Acesso em: 18 jul. 2018.

Page 106: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA (PUC-SP) FACULDADE DE ... · CÁCIA CRISTINA FRANÇA REHEM DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E BACHARÉIS DOCENTES: PROCESSOS FORMATIVOS E A PRÁTICA PEDAGÓGICA

105

Segundo alguns, ainda que seja considerada importante e a principal atividade a ser

desenvolvida, não aparece como prioridade, ou algo fundamental para que fosse

incluída em seus processos formativos. Todavia, há de se considerar um dos pontos

fundamentais que o contexto acadêmico lhes exige − a aprimoração dos

conhecimentos que possui, tendo em vista as práticas de ensino atuais, que exigem

do docente, cada vez mais, além de formação permanente, desenvolvimento

profissional através de novas experiências e competências.

Do ponto de vista de Mas Torelló (2011), de certo modo isso se justifica pelo

fato que a formação para a docência não é considerada importante e necessária,

pois ao ser contratado, não existe obrigatoriedade, no currículo desse profissional,

de uma formação pedagógica para verificar sua competência docente, além do que

as universidades podem contratar pessoal sem qualificação pedagógica e sem

experiência prévia para o ensino.

Outro fator determinante para esse perfil refere-se aos professores que são

contratados para ministrar aulas, visto que a realização a pesquisa é uma opção.

Realizar a pesquisa ou se dedicar somente ao ensino, é escolha pessoal; no

entanto, segundo resolução28, somente a realização da formação na pós-graduação

stricto senso garantirá a sua promoção, progressão e qualificação profissional

perante a universidade.

Quanto à identificação com a profissão, a relação inicial é com a formação

profissional inicial, em um primeiro momento, e só em casos específicos se

denominaram professores, corroborando Fávero (2012) e Zabalza (2004). Nesse

estudo, quando foram perguntados “se identifica com a docência, és professor?

obtivemos as seguintes respostas:

1. Se considera professor, mesmo tendo dificuldades e não tendo preparação:

DO1 – Professor, sou sim, um professor. DO2 – Professor, sou um professor sim, mesmo tendo dificuldades, pois não me preparei para ser professor. Hoje me considero um professor. DO5 – Mesmo não tendo uma preparação específica para a docência, hoje me considero professor.

28 Resolução Consepe 16/2003. Dispõe sobre Normas e Critérios para Promoção e Progressão na

Carreira do Magistério Superior. Disponível em: <http://www2.uesb.br/consepe/arquivos/016-%20Promo%C3%A7ao%20e%20Progressao.pdf>. Acesso em: 20 jun. 2017.

Page 107: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA (PUC-SP) FACULDADE DE ... · CÁCIA CRISTINA FRANÇA REHEM DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E BACHARÉIS DOCENTES: PROCESSOS FORMATIVOS E A PRÁTICA PEDAGÓGICA

106

2. Se considera professor e incorpora a formação inicial: DO3 – Sou professora e não me vejo sendo outra coisa; mesmo sendo nutricionista, sempre atuei como professora e sou uma professora nutricionista. DO7 – Sou uma professora enfermeira.

3. É profissional específico e a docência é mais uma atividade: DO4 – Eu ainda me acho fisioterapeuta, eu acho que pelas características das minhas atividades; as disciplinas que ministro que são muito específicas do curso, a minha carga horária em sala de aula ela é muito extensa em aula prática, dentro do hospital, dentro de clínica e aí hoje eu ainda me vejo como fisioterapeuta. Ainda me considero fisioterapeuta; a docência é como se fosse uma subárea da fisioterapia. DO6 – Sou odontólogo, mas também me considero professor; quando exerço a docência, naquele momento, sou um professor.

Os participantes da pesquisa se consideravam professores, mesmo não

possuindo formação específica; no entanto, a profissão inicial aparecia, em primeiro

plano, ao afirmarem “sou odontólogo, mas também me considero professor” ou

ainda, “ainda me considero fisioterapeuta; a docência é como se fosse uma subárea

da fisioterapia” e em segundo plano, “sou uma professora enfermeira” e “sou uma

professora nutricionista”. A formação inicial aparece e, mesmo os que a colocam em

segundo plano, não deixam de citar a sua formação inicial como indicativo

profissional.

Ainda que se definam como professores universitários, não existe preparação

para sê-lo. A docência está vinculada ao campo científico a que pertence sendo

comum a falta do conhecimento específico sobre a natureza, os componentes e as

condições que caracterizam o ensino. (ZABALZA, 2013)

Para complementar a composição desse perfil, destacamos o tempo de

docência dos sujeitos da pesquisa, que variava entre 06 e 32 anos, conforme

informações oferecidas: DO1 – 13 anos DO2 – 09 anos DO3 – 15 anos DO4 – 16 anos DO5 – 06 anos DO6 – 13 anos DO7 – 32 anos

No caso apresentado aqui, o tempo variava entre a fase de estabilização,

diversificação e desinvestimento, já que não se encontram em período inicial,

Page 108: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA (PUC-SP) FACULDADE DE ... · CÁCIA CRISTINA FRANÇA REHEM DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E BACHARÉIS DOCENTES: PROCESSOS FORMATIVOS E A PRÁTICA PEDAGÓGICA

107

(HUBERMAN, 2000), mas sinaliza experiência na docência. Ainda foi possível

identificar que todo o processo de desenvolvimento profissional (DPD) está

relacionado a sua formação inicial, apontando um viés comum na docência

universitária − docentes que fazem o seu processo formativo em suas áreas de

formação inicial.

Enfim, podemos apresentar como perfil encontrado nessa pesquisa que os

docentes entrevistados possuem a formação específica em áreas de conhecimento

(bacharelado), com formação stricto senso em suas áreas de formação e a opção

pela docência universitária foi motivada por oportunidades de trabalho e outros

motivos, não especificamente para tornarem-se pesquisadores, e que possuem

como atividade preferida o ensino.

Nesse caso, especificamente, revelam um perfil docente que, desde a sua

origem, vem se alterando muito pouco e corrobora a maioria dos estudos

desenvolvidos sobre essa temática, até o momento − esse bacharel/docente que

assumiu a docência como única atividade profissional desde a graduação; aqueles

que continuam atuando no campo de trabalho, não incluíram em seus processos

formativos os conhecimentos sobre ensino − continuam a prática docente de forma

empírica, baseada na tentativa e no erro e sem maiores modificações ao longo do

exercício profissional.

4.1.2 O processo formativo do bacharel/docente para o exercício da docência − o tornar-se professor

Sabemos que não tem sido comum, por parte das universidades, a

institucionalização do processo formativo dos seus docentes, mesmo encontrando

algumas universidades no Brasil, e em alguns países, que oferecem espaços

formativos aos seus docentes, diversificando essa oferta através de cursos,

seminários, semanas pedagógicas, palestras etc. (CUNHA, 2005; ALMEIDA, 2011;

GARCIA, 2001; FLORES, 2014 entre outros). De fato, se constituem

fundamentalmente em eventos esporádicos, turísticos, não obrigatórios, deixando

sob a responsabilidade do docente participar ou não.

Por certo, era necessário desvelar os processos formativos realizados

especificamente para a docência, para então identificá-los através da questão:

possui formação específica para a docência?

Page 109: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA (PUC-SP) FACULDADE DE ... · CÁCIA CRISTINA FRANÇA REHEM DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E BACHARÉIS DOCENTES: PROCESSOS FORMATIVOS E A PRÁTICA PEDAGÓGICA

108

1. Nunca realizou processos formativos específicos para a docência:

DO1 – Não, nunca tive uma formação voltada para a docência; aprendi no dia a dia, na prática.

DO4 – Não, aprendi na prática e com meu pai que era professor e no início me dava algumas dicas.

2. Realizou disciplinas no mestrado e no doutorado.DO2 – Nada específico; no doutorado, realizei um estágio em docência e curiosidade pessoal pela temática, mas nada formal.

DO3 – Muito pouco, uma disciplina no mestrado, mas não recordo o nome.

3. Alguns cursos voltados para a docênciaDO5 – Nada específico; na faculdade particular tinham os cursos de didática online, com feedback online, uma experiência interessante, mas foi só isso.

DO6 – Um curso de especialização em metodologia do ensino superior, não concluído.

DO7 – Quando fui contratada, passei três meses fazendo um curso de capacitação pedagógica, oferecido pela universidade, antes de assumir a sala de aula; após esse período, nunca mais fiz nada ligado à docência.

Como fica demonstrado nesses depoimentos, a formação específica para o

exercício da docência está dividida entre não terem realizado nenhum tipo de

formação, ou terem acontecido em eventos esporádicos, sem maiores significações.

Os dados e as informações fornecidas pelos sujeitos evidenciam ausência de

formação quando relatam em suas falas, “nunca fiz”, “muito pouco, uma disciplina no

mestrado, que não recordo o nome”, “aprendi na prática”, “nada específico”, “no

início a universidade me propiciou, depois nunca mais fiz nada”. Embora, a

constatação da necessidade de formação para o exercício da docência seja

entendida como fundamental, na maioria das universidades, ainda evidenciamos

uma lacuna, conforme as falas dos participantes dessa pesquisa.

Mas Torelló (2013) chama a atenção para o fato de que existem justificativas

que são utilizadas ainda hoje para combater a necessidade de formação

pedagógica; entre essas, acreditamos que as mais divulgadas trazem em seu bojo

como argumento “Quem não sabe [conteúdo específico da área de atuação] não

pode ensinar; porém, possuir um bom conteúdo é suficiente para ensinar”; “ensinar,

se aprende ensinando”. Em outras palavras, a formação para o exercício da

docência é realizada no cotidiano das salas de aula; mas há que se compreendê-la

Page 110: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA (PUC-SP) FACULDADE DE ... · CÁCIA CRISTINA FRANÇA REHEM DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E BACHARÉIS DOCENTES: PROCESSOS FORMATIVOS E A PRÁTICA PEDAGÓGICA

109

não apenas como um ato de ministrar aula, já que o conceito de docência vai muito

além disso – os professores devem ser parceiros/colaboradores na transformação

de gestão, currículos, organização, projetos educacionais e as formas de trabalho

pedagógico nas IES.

Acrescentamos que a docência do ensino superior requer atenção especial –

a formação na pós-graduação possibilita promoção e prestígio profissional perante a

universidade e sua comunidade; mas somente isto não basta. Em certo sentido,

parece conveniente mencionar que isto gera certa “acomodação” e torna-se um

entrave para uma formação pedagógica adequada. O “ensinar, se aprende

ensinando” revela certo empirismo, como veremos adiante nos relatos, endossa a

reprodução de atitudes e propostas produzidas pelos professores que participaram

de suas formações específicas, quando na realidade exige-se profissionalismo do

docente, como em qualquer outra profissão, aperfeiçoamento de sua didática,

especialmente na educação que deve acompanhar as transformação e inovações

advindas da sociedade.

Partindo dessa perspectiva – a falta de formação específica para a docência –

elaboramos a seguinte questão: ao assumir a função docente na universidade, como foi seu acolhimento e quais mecanismos foram oferecidos pelos órgãos responsáveis pela graduação, PROGRAD, departamento, colegiado e áreas de conhecimentos que lhe possibilitou compreender como seria o exercício da sua atividade docente? Obtivemos as seguintes respostas:

1. A universidade e seus órgãos específicos nunca proporcionaram nenhum tipo

de orientação ou formação:

DO1 – Não existe orientação, não fui orientado para o como ensinar. O Departamento deu algumas orientações sobre as disciplinas, carga horária, horário de aulas, nada além disso.

DO4 – Não, nada. Em um primeiro momento nada.

2. A universidade, através dos amplos setores responsáveis, só ofereciaorientações específicas sobre a organização administrativa:

DO5 – Orientações administrativas, dadas pelo Departamento, nada pedagógico ou que fosse sobre o curso.

DO6 – Não, a única preocupação era com as disciplinas que devia ministrar, o preenchimento do PIT e do RIT; quanto às aulas, ninguém me orientou para nada.

Page 111: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA (PUC-SP) FACULDADE DE ... · CÁCIA CRISTINA FRANÇA REHEM DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E BACHARÉIS DOCENTES: PROCESSOS FORMATIVOS E A PRÁTICA PEDAGÓGICA

110

3. Auxílio de colegas − professores veteranos:DO2 – Os meus colegas de área que me ajudaram, me ensinaram o “caminho das pedras”, carga horária, disciplinas, direitos e deveres; a universidade em si nunca me chamou ou ofertou nada que me orientasse para a docência.

DO3 – Nenhum, nesse sentido não, só administrativo; a diretora da época me ajudou, foi muito boa comigo, me orientou, foi uma “mãe” que me disse todos os meus direitos, mas pedagógico não; eu que fui buscar; nem o audiovisual eu fui orientada. PROGRAD, nunca tive contato com a PROGRAD; o colegiado também não, nunca marcou uma reunião com os professores novos. Na época que eu cheguei, chegaram muitos professores, poderia ter feito uma reunião com esses professores, uma capacitação, mas não fez.

A universidade, enquanto campo da pesquisa, não oferece aos seus

profissionais em início de carreira e nem aos que já possuem uma trajetória,

orientação/formação para o exercício da docência. A maioria das respostas indicam

um cenário ainda muito recorrente no Brasil − a falta de formação docente para os

professores iniciantes e veteranos por parte da maioria das universidades

brasileiras.

Essa falta de capacitação e qualificação do docente que atua no ensino

superior é reafirmada por Pimenta e Anastasiou (2008, p. 79):

Os professores quando chegam à docência na universidade, trazem consigo inúmeras e variadas experiências do que é ser professor. Experiências que adquiriram como alunos de diferentes professores ao longo de sua vida escolar. Experiência que lhes possibilita dizer quais eram bons professores, quais eram bons em conteúdo, mas não em didática, isto é, não sabiam ensinar. Formaram modelos positivos e negativos, nos quais se espelham para reproduzir ou negar.

No entanto, cabe o destaque para a resposta oferecida por um dos

professores, ao informar que só foi possível ingressar efetivamente na universidade,

após a aprovação no concurso, depois de realizar um processo formativo de três

meses.

DO7 - Hoje eu não vejo isso não; falei da época que eu cheguei, hoje vejo isso não. Teve uma época que tinha uma pró-reitora muito boa, não vou dizer o nome, ela não travava os campus de forma diferente, ela puxava a orelha da gente forte, era colega, mas puxava, e dizia olha vê lá seu conteúdo, reveja isso, não é assim mais que deve ser dado, semana pedagógica a gente chega não tem nada, não foi preparado. Eu hoje acho que a gente cresceu muito, tem muitos doutores, muitas pesquisas, mas que se desenvolveu e o “doutorite”, é muito forte aqui. Acho que a gente tem que rever os nossos conceitos...hoje não muito pouco, aliás quase nada; eu vejo um

Page 112: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA (PUC-SP) FACULDADE DE ... · CÁCIA CRISTINA FRANÇA REHEM DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E BACHARÉIS DOCENTES: PROCESSOS FORMATIVOS E A PRÁTICA PEDAGÓGICA

111

egocentrismo, uma disputa, quando saí daqui eu saí para fazer planejamento e quando voltei o departamento tinha feito um concurso e colocado um professor no lugar da gente e eu me preparei quatro anos ou mais para isso, e o professor que chegou não fala comigo! A gente tem posturas diferentes, a gente não se conversa, mas eu queria que a universidade voltasse a fazer, eu gosto muito, gosto muito dessa parte de tecnologia de inovações, eu acho lindo!

Atualmente esses profissionais não possuem acompanhamento, por parte da

universidade, de como executam a sua profissionalidade, ou seja, de como

desenvolvem as suas práticas de ensino, nem tão pouco processos formativos,

vivenciando a docência em um cenário de isolamento e solidão. Para Isaia, (2006, p.

67):

Em decorrência desse contexto, instaura-se na educação superior, o exercício solitário da docência centrado no sentimento de desamparo dos professores ante a ausência de interlocução e de conhecimentos pedagógicos compartilhados para o enfrentamento do ato educativo como docente. Eles assumem desde o início da carreira inteira responsabilidade de cátedra, sem contar com o apoio dos professores mais experientes, nem com espaços institucionais voltados para a construção conjunta dos conhecimentos relativos a ser professor.

Esse processo de isolamento vivenciado pelos docentes universitários é

frequente. Dessa forma, entendemos que, ao longo do tempo, ao invés de atualizar

e fortalecer o processo formativo desses professores, a universidade abandonou a

exigência e deixou de oferecer qualquer processo formativo para o ingresso na

universidade. Esse despreparo e isolamento, a partir do instante em que ingressam

na sala de aula, inclusive de pós-graduados stricto sensu, não leva esse

professor/docente a redimensionar a importância da profissionalidade docente, no

sentido da autonomia, reflexão e crítica que, por conseguinte, requer uma

profundidade científico-pedagógica.

É então oportuno frisar, tal como Pimenta e Anastasiou constatam, que

Geralmente os professores ingressam em departamentos que atuam em cursos aprovados, em que já estão estabelecidas as disciplinas que ministrarão. Aí recebem ementas prontas, planejam individual e solitariamente, e é nesta condição individual e solitariamente que devem se responsabilizar pela docência exercida. (PIMENTA; ANASTASIOU, 2008, p. 37)

Sem possuírem formação para a docência e, ao mesmo tempo, sem

receberem essa formação da universidade, buscamos o desvelamento da

Page 113: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA (PUC-SP) FACULDADE DE ... · CÁCIA CRISTINA FRANÇA REHEM DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E BACHARÉIS DOCENTES: PROCESSOS FORMATIVOS E A PRÁTICA PEDAGÓGICA

112

importância da formação para o exercício da docência desses sujeitos. Coube

identificar se acreditavam possuir necessidades formativas para o exercício

qualificado da docência, quando perguntados: você possui necessidades formativas para desenvolver a docência? Nas respostas não encontramos

unanimidade − três docentes informaram que não possuíam necessidades

formativas para o exercício da docência; afirmaram que possuem conhecimento

sobre o conteúdo, sabem a forma de como ministrar uma aula e que os principais

problemas para um ensino mais qualificado estão no âmbito da própria estrutura da

universidade.

1. Não possui necessidades formativas − as dificuldades são estruturais:

DO1 – É difícil responder, sempre tenho uma avaliação boa da parte dos alunos; é difícil, não consigo fazer essa autocrítica. Pelas avaliações eu sou sempre bem avaliado, eu não tenho dificuldades não. Então acho que sei como dar uma aula, não tenho não. Meus maiores problemas são a falta de softs específicos para a minha disciplina. DO2 – As maiores dificuldades estão relacionadas à estrutura da universidade; nem ar condicionado funcionando a gente está tendo; o setor audiovisual não funciona, não tem computadores suficientes, muita coisa quebrada e eles dizem que não têm dinheiro para consertar. Então as maiores necessidades estão relacionadas à estrutura física da universidade. Eu consigo desenvolver as minhas aulas satisfatoriamente, não, acredito que não. DO5 – Minhas necessidades não são formativas; tenho segurança no conteúdo que tenho que passar para o aluno, a forma como vou fazendo isso, eu vou ajeitando, mas a nossa necessidade e aí penso que não é só minha, mas da universidade como um todo, é na infraestrutura; por não termos recursos apropriados, o nosso trabalho é dificultado.

2. Possui necessidades formativas: DO3 – Acho que seria bom ter um espaço de discussão sobre a prática docente. A universidade nos deixa muito só, e isso acaba influenciando no nosso trabalho, tenho necessidades de saber como avaliar melhor, por exemplo, de como mudar a metodologia, não ficar só na aula expositiva, de como motivar o aluno para participar das aulas; tenho sim, e acredito que muitas. DO4 – Possuo necessidades sim, pois a minha maior dificuldade está em ter segurança de que o que faço está certo; falta embasamento teórico para isso. Eu queria ter mais subsídios para poder enfrentar as dificuldades. DO6 – Sim, se eu achar que eu estou pronto, meu Deus! Tenho necessidade de avaliar se a minha conduta está certa; queria fazer oficinas de avaliação, saber avaliar, preciso de direcionamento.

Page 114: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA (PUC-SP) FACULDADE DE ... · CÁCIA CRISTINA FRANÇA REHEM DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E BACHARÉIS DOCENTES: PROCESSOS FORMATIVOS E A PRÁTICA PEDAGÓGICA

113

Deveria existir formação pedagógica sempre, pelo menos uma vez por ano oficina, para que pudéssemos aprender sobre como ensinar. D07 – Sim, tenho necessidades formativas, pois quando comecei a lecionar aqui na universidade eu fiz um curso de Didática de três meses e de lá para cá nunca mais fiz nada relacionado; a universidade deveria promover cursos de formação docente através dos departamentos de educação.

No primeiro grupo, os profissionais relacionam o exercício da docência com a

posse do conteúdo, sendo esse o requisito prioritário e necessário para a sua

prática, destacando o fato de que a universidade e a sua qualidade são

determinadas mais pela sua estrutura que pelo ensino ministrado − “sei como dar

uma aula”; “as maiores dificuldades são na estrutura oferecida pela universidade”;

“minhas necessidades não são formativas, tenho segurança no conteúdo que vou

passar para o aluno”. Portanto, reforçam a ideia de que ser docente se configura a

partir da posse de conteúdos e da melhor forma de transmitir esse conteúdo.

No segundo grupo, no entanto, a formação para a docência é relevante e eles

necessitariam de formação para que o ensino fosse mais qualificado. Para os que

apontam a existência de necessidades formativas, a realização de momentos de

formação iria contribuir na sua prática pedagógica oportunizando a ressignificação

das suas ações, oferecendo “subsídios para poder enfrentar as dificuldades”, “para

aprender como ensinar”, ou seja, uma formação para a docência iria possibilitar a

posse de elementos ausentes na sua prática pedagógica.

Tanto para os que possuem quanto aqueles que não possuem necessidades,

as respostas foram coincidentes quando lhes questionamos: acha necessário participar de cursos de formação específicos para a docência? Em caso positivo, que tipo de formação e quais espaços seriam adequados para o desenvolvimento de tais formações?

1. Sim, deveria ser na pós-graduação:

DO2 – Sem dúvida...eu acho que é o que falta; a gente vai muito na tentativa e erro. Em geral, é uma coisa meio empírica, a gente testa e vê o que não funciona. Com certeza, com um curso, eu ficaria mais preparado; para isso já poderia antever certas situações e de como me comportar diante de tais dificuldades. Acho que a pós-graduação é o lugar mais adequado para isso.

2. Sim, mas não sabe especificar o local: DO1 – Sim, um tipo de formação que nos oferecesse conhecimentos sobre o como ensinar, que nos oferecesse alternativas

Page 115: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA (PUC-SP) FACULDADE DE ... · CÁCIA CRISTINA FRANÇA REHEM DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E BACHARÉIS DOCENTES: PROCESSOS FORMATIVOS E A PRÁTICA PEDAGÓGICA

114

metodológicas, que fosse possível mudar a rotina da sala de aula, como avaliar melhor, essas coisas; quanto ao lugar não saberia dizer, não tenho essa pretensão. DO3 – Com certeza, se eu tivesse conhecimentos, cursos de reciclagem, capacitação com o pessoal da área pedagógica, que trouxessem novas metodologias, novas formas de avaliação, acho que teríamos um crescimento exponencial. DO5 – Eu acho que sim, agrega e não atrapalha, eu me considero professor, embora a minha formação não tenha sido para ser professor, eu queria ser professor; então acho que para complementar a minha formação, poderia ter sim uma formação específica para a docência.

3. Sim, a universidade deveria ser o local:DO4 – Eu acho que deveria sim, acho que a universidade deveria oferecer essa formação através das palestras seminários, de cursos de aperfeiçoamento; acho que ela deveria fazer isso, acho que a universidade deveria ter essa responsabilidade, em parceria com o professor e não deixar na mão do professor a responsabilidade por sua formação; até na questão profissional, daqui a pouco nem fisioterapeuta eu vou ser mais, pois não tenho me aperfeiçoado. DO6 – Acho que sim e a universidade deveria organizar cursos de aperfeiçoamento e atendimento semestral sobre a prática pedagógica, inovações no ensinar. DO7 – Sim e deveria ser a universidade que poderia criar comissões com docentes da área de educação que promovessem formações periódicas sobre ensino.

Em suas respostas, o fato de não possuírem formação para a docência não

inviabiliza o seu trabalho, mas, fazer uma formação específica para a docência, “é

importante”, “agrega”, “complementa” “não atrapalha”, ou seja, seria um auxílio na

sua prática pedagógica.

Desse modo, a importância de realizarem formação para a docência se daria,

no entendimento dos sujeitos, através de curso de capacitação, reciclagem,

palestras, seminários e apontaram que a universidade e a própria prática deveriam

ser o local para que essa formação acontecesse. Na opinião de “DO4 [...] deveria ser

a universidade em parceria com o professor e não deixar só na mão do professor”. No entanto, destacamos a ideia de que formação para a docência vem a ser a

complementação do que eles já possuem, como um auxílio e que deveria ser

realizada através de eventos esporádicos oferecidos pela universidade. A ideia de

formação continuada, desenvolvida através da participação dos sujeitos de forma

colaborativa e contínua, não se configura do ponto de vista desses docentes.

Page 116: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA (PUC-SP) FACULDADE DE ... · CÁCIA CRISTINA FRANÇA REHEM DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E BACHARÉIS DOCENTES: PROCESSOS FORMATIVOS E A PRÁTICA PEDAGÓGICA

115

Perguntamos, também, o que deveria ser contemplado em um processo formativo específico para a docência?

1. Relação entre teoria e prática:

DO1 – A relação entre a teoria e a prática. DO4 – Aspectos relacionados com a teoria e a prática; por exemplo, temos muitas deficiências em avaliação, um curso que contemplasse conteúdos sobre a prática.

2. Sobre como transmitir melhor os conteúdos: DO5 – Um curso sobre como transmitir o conteúdo de forma mais efetiva.

3. Que contemplasse elementos que auxiliassem a prática em sala de aula: DO2 – Elementos teóricos que oferecesse condições para evitar a tentativa e erro que vem resumindo a minha prática. Realizo as atividades e vou vendo o que dá certo ou não, mas sempre de forma empírica, sem base de análise. DO3 – A didática, como melhorar ou modificar as aulas. DO6 – Uma formação que contemplasse as questões relativas ao ensino e à aprendizagem; como bacharel sou muito limitado nesse tema. DO7 – Que contemplasse a conduta na sala de aula, como ensinar de forma mais efetiva e satisfatória para os alunos.

Os participantes da pesquisa indicaram conteúdos para essa formação que

estivessem relacionados à competência pedagógica: a relação entre a teoria e a

prática, a didática, como melhorar as aulas, uma formação que ensinasse a

transmitir os conteúdos de forma melhor, questões relativas ao ensino e a

aprendizagem, e que promovessem a melhoria da qualidade do ensino tornando-o

mais efetivo para os alunos. Ficou evidenciado, junto aos sujeitos da pesquisa, que

um processo formativo para a docência se configuraria como um lugar em que

“receitas” fossem ensinadas para melhorar o ensino.

Um ponto que merece ressalva refere-se à transmissão de conteúdo. Com

base ao que atenta Libâneo (2002), existem interpretações equivocadas quanto à

identificação mecânica entre “conteúdo” e “matéria”. O autor ressalta que conteúdos

universais são os conhecimentos sistematizados, advindos das bases das ciências e

dos modos de ação acumulados pela experiência social da humanidade; estes não

podem ser apenas “ensinados”, tampouco recriados pelo aluno, mas devem ser

articulados indissociavelmente à sua significação humana e social. “Os métodos de

Page 117: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA (PUC-SP) FACULDADE DE ... · CÁCIA CRISTINA FRANÇA REHEM DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E BACHARÉIS DOCENTES: PROCESSOS FORMATIVOS E A PRÁTICA PEDAGÓGICA

116

uma pedagogia crítico-social dos conteúdos não partem, então, de um saber

artificial, depositado a partir de fora, nem do saber espontâneo, mas de uma relação

direta com a experiência do aluno, confrontada com o saber trazido de fora”

(LIBÂNEO, 2002, p. 40).

Em suma, o tornar-se professor para os sujeitos da pesquisa em questão

acontece em um primeiro momento, quando do encaminhamento profissional dado

ainda na graduação, por motivos diversos; primeira opção de trabalho, admirar a

docência por causa de bons professores, sugestão de professores, querer o

percurso acadêmico. Enfim, nesse momento a docência surgiu como oportunidade

de trabalho e pode ser concretizada sem maiores problemas, pois, pela Lei

9.394/96, o fato de possuírem a pós-graduação em áreas específicas os habilita a

adentrarem e assumirem a docência.

Em um segundo momento, o tornar-se professor vai acontecendo no

processo de trabalho e por assumirem a atividade, “sou professor, mesmo não tendo

preparação” “sou professor, mesmo tendo dificuldades”.

Os dados dos participantes da pesquisa revelam que desenvolvem práticas

fundamentadas na “racionalidade técnica” e acreditam em uma formação que

possibilite o domínio de um conhecimento especializado, com o “domínio técnico

demonstrado na solução de problemas, ou seja, no conhecimento dos

procedimentos adequados de ensino e em sua aplicação inteligente”. (IMBERNÓN.

2012, p.105)

Dessa forma, na improvisação, na rotina, sem maiores reflexões e

questionamentos, o bacharel/docente incorpora a docência − o ser professor −,

como mais uma das atividades que são atribuições da sua profissão. Acreditam que

essa profissão (professor do ensino superior) pode ser assumida, unicamente pelo

fato de terem sido aprovados no concurso; sendo assim, estarão aptos a realizar

essa atividade.

Todavia, como argumenta Behrens (1998, p. 61), o contexto em que vivemos

revela a necessidade formativa para o exercício da docência universitária, em função

das mudanças impostas à universidade nesse novo século: “é o de que o professor

profissional ou o profissional liberal professor, das mais variadas áreas do

conhecimento, ao optar pela docência no ensino universitário, precisam ter

consciência de que, ao adentrar a sala de aula, seu papel essencial é ser professor”.

Page 118: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA (PUC-SP) FACULDADE DE ... · CÁCIA CRISTINA FRANÇA REHEM DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E BACHARÉIS DOCENTES: PROCESSOS FORMATIVOS E A PRÁTICA PEDAGÓGICA

117

Compreendemos ser indispensável, portanto, a definição de que tipo de

formação, quais conteúdos formativos devem ser incluídos, em quais momentos

devem ser realizadas, quais métodos devem ser escolhidos. É preciso acentuar que

não basta a consciência e confirmação que a formação para a docência é

imprescindível; é fundamental definir o seu processo de realização.

Nesse sentido, a formação para a docência deve ser um movimento instituído

como política da/na universidade de forma inicial e continuada, tendo os docentes

incluídos no seu processo de elaboração e execução. Assim, de fato, consciente das

suas necessidades formativas, quiçá esses docentes possam conduzir as formações

de forma colaborativa, entendendo que aprender a ser professor não acontece a

partir de eventos esporádicos e desconectados, mas de processos articulados que

busquem envolver a análise da sua docência e as necessidades de ressignificação

delas recorrentes.

4.2 O CAMPO EMPÍRICO: OBSERVAÇÕES DAS PRÁTICAS PEDAGÓGICAS (AULAS)

A aula, enquanto instrumento para a observação da prática pedagógica, foi

entendida como o espaço onde o professor executa o seu trabalho de docência,

onde a ação acontece e as competências para o seu exercício se manifestam.

Outrossim, pelo fato de ser o local em que acontecem as interações entre

estudantes e professores; no entanto, “[...] as aulas que acontecem nas classes são

difíceis de estudar, devido ao fato de serem contextos extremamente complexos,

com muitas dimensões” (CID SABUCEDO, 2012). Dessa forma, alguns elementos

fundamentais para esse estudo, como: o currículo, os fatores sociais, culturais e

éticos, entre outros, não foram incluídos nesse trabalho, mas entendemos que

compõem o contexto da classe e da aula.

As observações das práticas pedagógicas (aulas), através da produção de

imagens, aconteceram a partir da definição de um roteiro. Inicialmente foram feitas

entrevistas com questões definidas a priori sobre a aula (pré-aula) (Apêndice B), no

intuito de compreendermos o seu desenvolvimento. Não obtivemos planos físicos de

aula; os professores alegavam que não faziam, pois possuíam o plano de curso e

por este orientavam as suas ações pedagógicas. Assim, a entrevista, antes da

observação e da filmagem da aula se tornou imprescindível para abarcarmos como a

Page 119: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA (PUC-SP) FACULDADE DE ... · CÁCIA CRISTINA FRANÇA REHEM DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E BACHARÉIS DOCENTES: PROCESSOS FORMATIVOS E A PRÁTICA PEDAGÓGICA

118

aula iria acontecer e depois possuir elementos para constatarmos se de fato

aconteceu. Em seguida, assistíamos e gravávamos as aulas; nesse momento um

roteiro previamente organizado orientava o nosso olhar (Apêndice B)

O roteiro foi estruturado com base nos seguintes momentos: o início da aula

(introdução); o seu desenvolvimento (metodologia – participação dos alunos –

organização do tempo) e as atitudes e concepções pedagógicas presentes nas

práticas observadas. Essa observação e análise foram fundamentadas em uma

posição que entendemos como características necessárias para a condução da

aula, a saber: organização e estruturação dos conhecimentos para ensinar; clareza

na exposição; apresentação dos conteúdos de forma que desperte no estudante a

vontade de aprender; assistência à classe; pontualidade. (CRUZ TOMÉ, 1994)

Ao término das aulas realizávamos a entrevista (pós-aula) para identificarmos

se o professor refletia sobre o processo, se o planejamento tinha sido executado e

como analisava a aula dada. Nesse intuito, observamos 13 aulas dos docentes

participantes da pesquisa, dentre as quais 11 aulas eram identificadas como teóricas

e 2 como práticas. A universidade contempla, na organização curricular das

disciplinas, a divisão entre créditos de aulas teóricas e de aulas práticas,

estabelecendo espaços e olhares diferentes para cada um.

4.2.1 As aulas: observação, descrição e análise

Para compreensão do processo de observação desenvolvido na obtenção das

imagens, passamos à descrição e análise dos dados coletados nas imagens e nos

questionários ‘pré e pós-aula”.

Antes de iniciar as observações das aulas, realizamos a entrevista através do

questionário pré-aula, com as seguintes questões: 1. Que objetivos estabeleceu

para esta aula? 2. Qual temática será tratada? 3. Que metodologias vai utilizar,

porque as escolhestes? 4. Como pretende envolver os alunos na aula?

Em seguida, passávamos a observar as aulas através da produção de

imagens que foram utilizadas na análise e interpretação das mesmas.

Ao iniciar as aulas, os docentes organizavam o recurso que iriam utilizar,

esperavam os alunos se acomodarem e iniciavam a exposição do conteúdo da aula.

Parecia um ritual previamente acordado, pois, em quase todas as aulas, o processo

foi similar.

Page 120: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA (PUC-SP) FACULDADE DE ... · CÁCIA CRISTINA FRANÇA REHEM DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E BACHARÉIS DOCENTES: PROCESSOS FORMATIVOS E A PRÁTICA PEDAGÓGICA

119

No desenvolvimento das aulas observamos que a metodologia29 escolhida

pela maioria dos docentes, foram “aulas expositivas” fundamentadas na metodologia

tradicional30, centradas na exposição do professor com o uso do Datashow; dessa

forma, o protagonismo do professor era explícito, pois era quem as definia, em

termos de conteúdos e ritmo. As aulas eram desenvolvidas com os professores

expondo o conteúdo; em alguns momentos faziam perguntas aos alunos e, em

seguida, continuavam a exposição.

1. Aula expositiva

DO1 – A aula será ministrada através da aula expositiva.

2. Aula expositiva com o uso de Datashow e slides DO2 – Aula expositiva com o Datashow, porque preciso apresentar imagens.

DO3 – Aula expositiva participada com o uso de slides, e o quadro também para resolver algumas equações DO5 – Aula expositiva com o uso do Datashow.

DO6 – Aula expositiva com slides; preciso mostrar as imagens para que os alunos possam entender o assunto.

DO7 – Expositiva dialogada com o uso do Datashow e uma atividade com textos.

3. Aula com a metodologia do PBL (Problem-Based Learning)31.

DO4 – Nessa aula a metodologia vai ser o PBL

A aula expositiva, conforme elucida Masetto (2010, p. 114), “trata-se de uma

técnica que a maioria dos professores do ensino superior usa frequentemente”.

Nessa perspectiva, comprovamos que das 13 aulas observadas, 12 foram

desenvolvidas mediante a técnica da “aula expositiva”, algumas com slides e textos

e outras somente com a exposição. Assim, buscamos desvelar de que forma essa

aula era executada.

29 A forma de proceder que tem os docentes para desenvolver sua atividade docente. (DE MIGUEL,

2005, p. 82) 30 [...] fundamentada na perspectiva da concepção positivista da ciência, pelo conhecimento do

mundo, marcado pela certeza, pela prescrição, pela precisão, pelo conhecimento oriundo da tradição, verdade pronta, “sacramentada, solidificada de tal maneira que não percebemos que é uma tradição”. (FERNANDES, 1998, p. 98)

31 PBL é uma metodologia de ensino e aprendizagem com larga utilização em escolas superiores (especialmente de medicina) e em outros níveis educacionais. Concebido no final dos anos 1960, o PBL, em síntese, emprega problemas da vida real (reais ou simulados) para iniciar, motivar e focar a aprendizagem de conhecimentos conceituais, procedimentais e atitudinais.

Page 121: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA (PUC-SP) FACULDADE DE ... · CÁCIA CRISTINA FRANÇA REHEM DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E BACHARÉIS DOCENTES: PROCESSOS FORMATIVOS E A PRÁTICA PEDAGÓGICA

120

Partimos do pressuposto que uma aula expositiva acontece segundo

procedimentos definidos, não aleatórios, e “como toda e qualquer técnica, sua

escolha deverá se orientar pelos critérios básicos de seleção, adequação ao objetivo

de aprendizagem pretendido e eficiência para colaborar na execução deste”.

(MASETTO, 2010, p. 114). De acordo com esse autor, a aula expositiva pode

responder a três objetivos: abrir um tema de estudo; fazer uma síntese após o

estudo do assunto procurando reunir os pontos mais significativos; comunicar

experiências e estabelecer comunicações que tragam atualidade ao tema ou

explicações necessárias. (p. 115)

Na nossa pesquisa, constatamos que todo o desenvolvimento da aula se deu

através da exposição do professor – que apresentou a temática, desenvolveu os

subtemas e concluiu a aula, sempre através da exposição do conteúdo. Em alguns

momentos, elaboravam questões para os alunos responderem, sendo que poucos

eram os que participavam e respondiam tais perguntas.

Dessa forma, expondo o conteúdo e, em determinados momentos, deixando

espaços para a participação dos alunos, as aulas iam acontecendo como ‘palestras’

em que os professores, detentores do conhecimento, iam conduzindo a temática até

a conclusão.

Mesmo as aulas denominadas como “práticas” aconteciam através da

exposição do professor. No primeiro caso, o professor fez a exposição de um

procedimento e, em seguida, orientou aos alunos que treinassem uns com os outros.

A aula não foi realizada em laboratório, mas em uma sala de aula comum. No

segundo caso, a aula, embora denominada de prática, segundo o professor, não

poderia ser realizada em laboratório; a justificativa era de que o conteúdo não

permitia. Então, a solução encontrada pelo professor era apresentar figuras e

explicar como o procedimento poderia ser feito.

Uma aula que se apresentou um pouco diferente das demais aconteceu

segundo a metodologia Aprendizagem Baseada em Problemas (ABP) ou PBL

(Problem-based Learning). Foi conduzida por dois alunos e os demais participavam

a partir da orientação recebida. Ao professor cabia o papel de observador das

discussões. Conforme afirmou o docente, o curso estava mudando o currículo para o

uso de PBL. Estava no início do processo e alguns professores estavam aprendendo

como conduzir uma aula nesse modelo. Nesse caso, o professor permaneceu o

tempo todo calado, não aconteceram interferências na condução dada pelos alunos;

Page 122: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA (PUC-SP) FACULDADE DE ... · CÁCIA CRISTINA FRANÇA REHEM DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E BACHARÉIS DOCENTES: PROCESSOS FORMATIVOS E A PRÁTICA PEDAGÓGICA

121

somente após o seu término, a professora fez algumas considerações e apresentou

o problema para a aula seguinte.

Quanto ao conteúdo determinado pelos professores para a aula, nos pareceu

que possuíam domínio e segurança, pois era fácil a compreensão através da

exposição, mesmo para um leigo, como era o caso da pesquisadora.

Com relação à participação dos alunos nas aulas, chama a atenção a

passividade com que os mesmos vivenciavam o seu desenvolvimento. Como

cenário observamos celulares e computadores ligados, poucos questionamentos e

interferências nas aulas, mesmo quando solicitados a fazê-lo. Questionamos aos

professores como faziam para envolver os alunos na aula? As respostas seguiam o

mesmo padrão, que era fazer perguntas durante a exposição para que os alunos

respondessem:

1. Através de perguntas durante a aula:

DO1 – A ideia é, através da apresentação dos exemplos, durante a exposição, perguntar como eles resolveriam e aí fazer com que fiquem mais atentos e envolvidos na aula.

DO2 – Eu solicito através de perguntas a participação deles; é mais ou menos isso. Pergunto se estão entendendo, se sabem responder aquela questão, isso aí.

DO5 – Geralmente foco em instigar para que perguntem muito.

DO6 – Apresentando casos e solicitando que questionem sobre a temática, que busquem tirar as dúvidas.

DO7 – Através da exposição dialogada, vou perguntando e respondendo às perguntas deles.

2. Atividades propostas antes da aula:DO3 – Geralmente, solicito que pesquisem sobre a temática antes e início a aula sempre a partir dessa pesquisa; alguns alunos fazem a tarefa e participam, uma outra parte não.

DO4 – No PBL, são os coordenadores da aula que organizam a forma como os alunos participam; todos têm que pesquisar sobre a temática e participarem das aulas. Nas aulas expositivas, procuro sempre ir perguntando se estão entendendo ou fazer perguntas sobre o assunto.

Durante a produção de imagens, assistindo as aulas, pudemos constatar que,

em algumas aulas, a participação acontecia em virtude de o professor ter organizado

atividades anteriores para serem realizadas pelos alunos. Os professores

começavam fazendo questionamentos ou solicitando aos alunos que apresentassem

Page 123: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA (PUC-SP) FACULDADE DE ... · CÁCIA CRISTINA FRANÇA REHEM DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E BACHARÉIS DOCENTES: PROCESSOS FORMATIVOS E A PRÁTICA PEDAGÓGICA

122

a atividade requerida; em outras aulas, o professor ia perguntando se tinham

entendido e algumas questões eram lançadas para que respondessem.

No entanto, eram poucos os que participavam; uma parcela considerável dos

alunos permanecia calada, desmotivada e apática. Sem motivação para participarem

das aulas, nesses momentos, a impressão que nos passava era de que pareciam

ausentes do espaço educacional.

Quando questionamos no que consistia a atividade do aluno, ou seja, qual era

o papel do aluno no processo de ensino-aprendizagem, as respostas indicaram o

aluno como o responsável pelo processo de aprendizagem.

1. O papel do aluno é participar e se envolver:

DO1 – O papel dos meus alunos é participar e desenvolver as atividades propostas. DO2 – Participar das aulas e se envolver buscando sempre algo a mais que o professor dá. DO3 – Se envolver e participar das aulas. DO7 – Participar e buscar aprender.

2. O papel do aluno é contribuir no desenvolvimento da aula: DO4 – Os alunos hoje são muito passivos; a gente precisa fazer com que quebrem essa passividade, pois o papel deles na aula é fundamental, depende deles a aula ser boa ou ruim. DO5 – O papel deles é o mais importante, não existe aula sem alunos. DO6 – O papel deles é me mostrar que estou no caminho certo da docência; se não tiver o aluno, não existe a docência... Eu mantenho liberdade com muito respeito; sem eles eu não teria prazer nenhum de estar aqui. Eu respeito muitos os meus alunos.

Atribuem à sua participação, o seu envolvimento como responsável pelo

resultado da aula, sendo que, pelas respostas dadas por esses docentes, a aula que

não acontece de forma satisfatória também é de responsabilidade do aluno. Por

outro lado, DO5 ressalta a importância dos alunos − “não existe aula sem alunos”.

Isso indica que há uma correlação entre o desempenho didático do professor e o

desempenho do aluno, o que pode, mesmo indiretamente, ser correlacionado à

qualidade docente. Não se pode deixar de considerar a importância do

envolvimento, da participação do aluno tanto em sala de aula quanto em demais

âmbitos acadêmicos. Daí a importância de se perceber o fracasso do modelo atual,

no que tange à organização do ensino superior, em que há uma dicotomia entre a

Page 124: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA (PUC-SP) FACULDADE DE ... · CÁCIA CRISTINA FRANÇA REHEM DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E BACHARÉIS DOCENTES: PROCESSOS FORMATIVOS E A PRÁTICA PEDAGÓGICA

123

teoria e a prática. Trata-se da transmissão de conhecimento em que o professor é

“detentor de saber”, sem o incentivo à criticidade e à criatividade, sem contextualizar,

fazer questionamentos que suscitem a reflexão da realidade, do presente histórico

junto aos alunos.

Pelo fato de trabalharem com alunos adultos, os professores não se

comprometem com o comportamento, a participação e o compromisso dos alunos

durante as aulas; as atitudes dos professores, na maioria dos casos, são de

condução das suas aulas sem questionamentos sobre a participação dos alunos.

Cabe aos mesmos, na visão desses professores, se comprometerem com o

processo de aprendizagem, sendo de sua responsabilidade o seu processo

formativo. De fato, não compreendem o ato educativo como um ato catalisado pela

recriação e ressignificação de acepções.

Pozo (2009, p. 208) explicita seus pressupostos sob o seguinte enfoque:

A necessidade de sentir-se motivado, dar sentido ao aprendizado, é um axioma na psicologia. Os professores universitários aceitam essa ideia teórica, principalmente. No entanto, eles não consideram necessariamente que precisam planejar seu ensino com o objetivo de provocar essa motivação. Costuma-se afirmar que os alunos já são mais velhos e, se atingirem este nível, devem esforçar-se mesmo que as tarefas apresentadas não despertem motivação suficiente para mobilizar seus recursos de aprendizagem.32 (tradução nossa).

Por outro lado, ao serem questionados sobre o seu papel como docente, as

respostas indicam que acreditam que vem a ser organizar o processo de ensino.

Através dos relatos podemos identificar que a organização da aula, a maneira de

desenvolvê-las, a escolha do conteúdo, bem como a melhor maneira de fazer com

que os alunos aprendam, correspondem à sua atividade como docente; para tanto,

perguntamos: No que consiste a sua atividade de ensinar?

1. Preparar a aula:

DO1 – Preparar ferramentas adequadas para fazer o aluno aprender; eu preparo slides, apresento ferramentas adequadas.

32 La necesidad de sentirse motivado, de dar sentido al aprendizaje, es um requisito que se considera um axioma em psicologia. Los professores universitários aceptam em su maiorya esta idea teórica. Sin embargo no consideran que tengan que ser necessariamente elles y ellas los que planifiquen su enseñanza teniendo como objetivo provocar esta motivación. Suele afirmarse que llos alunos ya son mayores, y si han llegado a este nível deben esforzarse incluso si las tareas que se les plantean no despiertan em ellos la motivación suficiente para mobilizar sus recursos de aprendizaje.

Page 125: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA (PUC-SP) FACULDADE DE ... · CÁCIA CRISTINA FRANÇA REHEM DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E BACHARÉIS DOCENTES: PROCESSOS FORMATIVOS E A PRÁTICA PEDAGÓGICA

124

DO2 – Embora eu esteja tentando mudar, eu uso muito slides e aulas expositivas. DO3 – Hoje vejo que a famosa aula expositiva não surte muito efeito; a gente fica falando e os alunos lá parecendo que estão em outro lugar. Então eu tenho tentado mudar as minhas aulas, tenho levado textos, tenho tentado fazer muitas aulas práticas. DO4 – Eu confesso que agora tenho procurado essas novas práticas, mas, em geral, principalmente na graduação, é aquele modelo clássico de aula expositiva, passando o conteúdo da maneira que eu julgo mais didática possível.

2. Oferecer as condições para que o aluno aprenda:DO5 – Consiste em oferecer as melhores condições para fazer o aluno aprender.

DO6 – O docente é um facilitador, o papel dele consiste em mostrar caminhos é apontar direções, é transformar aquela matéria em algo absorvível para os alunos... A docência consiste em apresentar o conhecimento e facilitar esse processo de aprendizagem, e temos que mudar o status do aluno; ele deve chegar de um jeito e sair de outro.

3. Sensibilizar o aluno:DO7 – Sensibilizar o aluno para que assimile aquilo que eu estou dizendo para ele construir o seu conhecimento; então é isso que eu estou fazendo, buscando dar uma luz.

Diante desses relatos, é pertinente afirmar que os docentes da pesquisa

compreendem que é de sua responsabilidade organizar o processo de ensino para

que os alunos aprendam; no entanto, percebemos que, em sua maioria, as falas dos

docentes são dotadas de significados ambíguos no que tange à qualidade do ensino

− ora evocam aproximação entre professor-aluno, enquanto “facilitadores”, ora é

unilateralizada, sob o entendimento da doutrina tradicional de ensino, como

analisamos a seguir.

Nas entrevistas notamos que cada um é responsável pela sua parte, não

existe uma interação e nem o processo de ensino e aprendizagem se configura de

forma colaborativa, pois apontam que o “ aluno tem que se comprometer”, “participar

e buscar aprender”, “cabe ao aluno me mostrar que estou no caminho certo”,

“participar das aulas e buscar se envolver”. Ao mesmo tempo, em outro parâmetro,

os relatos referendam a percepção desses docentes enquanto sujeito “mediador”,

como “facilitador”, “aquele que sensibiliza”, “oferece melhores condições” “prepara

ferramentas adequadas”.

No viés desse contexto, os resultados evidenciam que as relações

estabelecidas entre professores e alunos é notoriamente dicotômica: cabe ao

Page 126: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA (PUC-SP) FACULDADE DE ... · CÁCIA CRISTINA FRANÇA REHEM DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E BACHARÉIS DOCENTES: PROCESSOS FORMATIVOS E A PRÁTICA PEDAGÓGICA

125

professor ensinar e ao aluno aprender, papéis definidos e aceitos sem maiores

questionamentos. Isso indica a necessidade de domínio de novas

habilidades/competências, formação didático-pedagógica frente à complexidade do

ensino/aprendizagem que envolve a formação dos discentes, tendo em vista criar as

condições para que o aluno, ao se comprometer, possa se envolver, engajar, por

conseguinte, consiga aprender.

Em virtude do processo de organização e execução das aulas observadas,

podemos constatar que os bacharéis/docentes desenvolvem a sua prática

pedagógica baseada no modelo de ensino tradicional, centrado na transmissão do

conteúdo e da aprendizagem como recepção, sendo essa maneira dos alunos

aprenderem.

Após a realização da aula, aplicávamos o questionário pós-aula, que

continham as seguintes perguntas: 1. O que achou, de maneira geral, do

desenvolvimento da tua aula? 2. É comum para você realizar reflexões antes e

depois das aulas? Se sim, como você faz isso e com que frequência?

As respostas indicaram que as aulas aconteceram dentro do que estava

previsto e que ficaram satisfeitos com o que apresentaram. Constatavam isso a

partir de duas condições:

1. Em função dos objetivos alcançados:

DO1 - Foi bom, os objetivos foram alcançados. DO2 – Satisfatória. DO7 – Apesar dos enfrentamentos ocorridos, contamos com uma participação e entendimento da turma sobre nosso objetivo proposto.

2. Pelo feedback dos alunos: DO3 –Achei que a aula foi dinâmica, usando diferentes estratégias (exposição de slides, uso da lousa, perguntas e participação dos alunos). De fato, ao final da aula, alguns alunos vieram espontaneamente dizer que tinham gostado, provavelmente, porque conseguiram acompanhar as discussões.

DO4 – Achei satisfatória, pois consegui envolver a maioria dos alunos e a aula não ficou monótona.

DO5 – Pelo feedback positivo dos alunos, com relação ao esclarecimento de dúvidas que tinham sobre o funcionamento de dispositivos que fazem uso da teoria vista em sala de aula. Achei, de maneira geral, que o desenvolvimento foi satisfatório.

DO6 – De forma geral eu fiquei bastante satisfeito por ter conseguido ministrar o conteúdo e perceber, nas perguntas feitas durante a apresentação, que havia entendimento por parte dos discentes.

Page 127: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA (PUC-SP) FACULDADE DE ... · CÁCIA CRISTINA FRANÇA REHEM DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E BACHARÉIS DOCENTES: PROCESSOS FORMATIVOS E A PRÁTICA PEDAGÓGICA

126

O corpo docente entrevistado avaliou suas aulas como satisfatórias, e

apontaram a participação e feedback dados pelos alunos, como os indicadores para

essa constatação. No entanto, em comparação com as aulas assistidas, não

constatamos essa efetividade na participação dos alunos, nas aulas e atividades

propostas. Dessa forma, creio que a resposta acontece a partir das suas próprias

impressões e não pela consideração dos alunos.

Os dados coletados apontam que, após realizarem as suas práticas, a

reflexão aparece e não é desconsiderada; no entanto, acontece de “forma natural e

informal”, de maneira superficial”, “através do feedback dos alunos”, “faço reflexões

sobre a eficácia dos meus métodos”, conforme informações coletadas:

1. Através do feedback dos alunos:

DO1 –... fico observando o feedback dos alunos durante a aula, mas que sento para fazer uma análise da aula desenvolvida, não, ocorre de forma natural e informal. DO3 – Na verdade minha reflexão se dá através da observação da turma. Quando ficam todos muito apáticos, ficam com dificuldade em responder às perguntas que faço durante a aula, ninguém participa, me preocupo um pouco, fico com um sentimento de que talvez não tenham entendido, mesmo eles dizendo que entendeu.

DO5 – Através do feedback dos alunos e me colocando no lugar deles, tento imaginar e planejar metodologias visando a melhor apresentação e forma de transferência de conteúdo que, muitas vezes, requer um nível alto de abstração por parte dos discentes

2. Através da reflexão antes e depois da aula dada:DO2 –Sempre faço as reflexões antes e após a aula − do que planejo objetivando o conhecimento-chave sobre aquele assunto e depois para saber o que pode ser melhorado ou o que deve ser removido ou mantido dependendo da avaliação (subjetiva) do entendimento e participação dos discentes.

DO4 – As reflexões do questionário pré-aula sempre faço para todas as aulas, no momento em que as planejo. Sobre as questões pós-aula, eu sempre observo se consegui atingir meu objetivo, se a programação foi cumprida e sobre o desenvolvimento geral da aula, porém de maneira muito superficial. Raramente reflito sobre os aspectos positivos e negativos, assim como os sentimentos.

3. Não é comum a reflexão:DO6 – Não é muito comum, pois ao longo desses 13 anos de docência eu acabei entrando no automático com relação ao que eu preciso ministrar. No entanto, quando sinto que a aula não foi capaz de envolver e motivar os alunos para o que eu apresentei, faço reflexões sobre a eficácia dos meus métodos de ensino e sobre os diferentes perfis das turmas. Já teve situações em que modifiquei as aulas seguintes em funções de minha autoavaliação.

Page 128: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA (PUC-SP) FACULDADE DE ... · CÁCIA CRISTINA FRANÇA REHEM DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E BACHARÉIS DOCENTES: PROCESSOS FORMATIVOS E A PRÁTICA PEDAGÓGICA

127

4. Possui o hábito, mas não especifica como:DO7 – Sim. Tenho hábito desde muito tempo.

A reflexão sobre a prática pedagógica desenvolvida por esses

bacharéis/docentes, acontece de forma superficial visando exclusivamente a

modificação de uma aula para outra (quando ocorre). Constatamos essa assertiva

quando dizem que: “sentar para fazer reflexões sobre a aula? Não, ocorre de forma

natural e informal”, “raramente reflito sobre os pontos positivos e negativos”, “não é

muito comum...eu acabei entrando no automático, sobre o que preciso ensinar”. Isso

demonstra que a reflexão crítica sobre a prática e na prática, não é fator

preponderante para os professores entrevistados. Caso contrário, a construção de

uma prática reflexiva transformadora, significativa, pertinente ao contexto

sociocultural dos alunos, poderia nortear a o repensar dos conteúdos e conceitos,

identificando em sua prática como docente técnicas que favoreçam o

autodesenvolvimento do aluno, incentivando uma posição ativa dos educandos,

legitimando assim seu papel de docente.

Como, neste caso, tal como encontramos nas imagens respostas dos

questionários (pré e pós-aulas), isto não se verifica, reforça a ideia que essa prática

pedagógica se constitui a partir dos conhecimentos tácitos e implícitos. Ou seja,

essa reflexão de maneira espontânea, acarreta uma prática mecânica, que tem

como principal finalidade repassar conteúdos, e realizar atividades meramente

repetitivas. Essa prática pedagógica estável, vem fundamentada em um ideal de

aulas e perpetuadas através do mesmo ritual. A reflexão não é sistemática, mas

pontual. Em dado momento, podem até se questionarem sobre a prática pedagógica

realizada ou até se permitem rever novas formas de aplicarem a mesma técnica de

forma diferente, mas não ultrapassam esse aspecto.

Destarte, essa prática enraizada em conceitos ultrapassados não favorece um

aprender autônomo, que privilegia a formulação de novos conceitos, uma série de

hipóteses e questões, ideias e olhares. Reconstruir constantemente a prática

significa, dentre outras, ser capaz de transformar, inovar a sua prática, de modo que

possibilite aos educandos um aprofundamento e articulação entre teoria/prática em

um contexto de aprendizagem que proporcione conhecimentos válidos e

significativos.

Page 129: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA (PUC-SP) FACULDADE DE ... · CÁCIA CRISTINA FRANÇA REHEM DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E BACHARÉIS DOCENTES: PROCESSOS FORMATIVOS E A PRÁTICA PEDAGÓGICA

128

4.2.2 As práticas pedagógicas dos docentes/bacharéis: o modelo pedagógico tradicional

A atividade do docente na universidade, mesmo não sendo limitada ao ato de

ensinar, pois como já referido, as atividades que a compõem extrapolam essa ação,

é no ensino, seja na graduação ou na pós-graduação, que reside o maior tempo de

trabalho e tem sido para ensinar que as universidades contratam os seus

professores.

Nesse sentido, aqui nos interessou a atividade de ensino, como desenvolvem

a prática pedagógica, entendendo a aula como o local onde o professor desenvolve

a ação de ensinar. Foi na observação dessa aula, enquanto ação do professor “in

loco” que buscamos compreender como esses docentes norteiam as suas práticas

pedagógicas.

Primeiramente identificamos como esses professores aprenderam/aprendem

a ensinar, por meio da seguinte questão: a sua formação na graduação ou na pós-graduação contribuiu para o exercício da docência; onde aprendeu a ensinar?

1. Aprendeu na prática, no dia a dia, sozinho: DO1 – Não, nunca tive disciplinas voltadas para a docência, o que eu aprendi foi no dia a dia. DO4 – Não, tive que estudar sozinha, aprendi na prática mesmo. DO6 – Quando eu entrei aprendi a ser professor ensinando, que não deveria ser o caminho e nem é correto. Eu não entrei professor aqui na graduação, eu fui aprendendo a montar as minhas aulas; no início uma professora do departamento me ajudou como seria a didática. Até 2008 eu era um professor, depois do mestrado, entre 2009 e 2010, voltei outro. O mestrado foi um divisor de águas para mim. Hoje em dia eu sei montar uma aula pensando no olhar do aluno da graduação, o que ele tem que fazer.

2. Aprendeu com exemplos dos bons professores: DO2 – Não, nada voltado para o ensino, a não ser o exemplo dos professores que a gente admirava, se eram didáticos ou não. No mestrado nada e no doutorado começou um pouco com o estágio em docência e aí a gente começou a discutir um pouco mais, seminários essas coisas assim, mas nada específico ou formal; aprendi com os exemplos.

Page 130: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA (PUC-SP) FACULDADE DE ... · CÁCIA CRISTINA FRANÇA REHEM DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E BACHARÉIS DOCENTES: PROCESSOS FORMATIVOS E A PRÁTICA PEDAGÓGICA

129

3. Aprendeu a partir de contribuições: mestrado, curso de metodologia,

promovido pela universidade:

DO3 – Muito pouco, porque eu só tive uma disciplina no mestrado, que não sei se era didática o nome, não lembro o nome da disciplina. O que me ajudou foi que fiz magistério e na graduação que a gente fazia muito seminário, a gente ia muito para a frente, isso me ajudou muito, mas eu sempre tive facilidade para falar. DO5 – Sim. O mestrado contribuiu, porque era uma exigência do programa você realizar estágio em docência, ou seja, você atuar como professor nas disciplinas de graduação. Você acabava substituindo o professor nas atividades, tanto nas aulas quanto nas avaliações, para tentar aperfeiçoar, com orientação do próprio orientador e tinha seminários de docência. DO7 – A única que contribuiu foi a de metodologia oferecida pela universidade quando eu assumi. Preparava para a sala de aula, e tínhamos que fazer o que eles mandavam. Eram tempos difíceis. Aprendi a ensinar mesmo foi no dia a dia, na prática.

Essas respostas “Aprendi a ensinar, ensinando”, “aprendi na prática, sozinha

mesmo”, “aprendi com os exemplos dos professores”, “uma disciplina que não

recordo o nome, feita no mestrado”, “ seminários de docência na pós-graduação” e

ainda “aprendi na graduação, porque apresentava muitos seminários”, reiteram o

referido anteriormente e indicam que aprender a ensinar, para esses docentes,

acontece como um processo individual e, na prática, no cotidiano, sem

necessariamente incluírem processos formativos que contribuam nessa ação.

Inegavelmente, não desconsideramos, e já o fizemos antes, que a prática seja

um espaço para a produção de conhecimento sobre o ensino; isso se dá quando se

recorre à teoria, explicando-as, ou seja, quando considerada a sua interpretação e

as relações que devem existir entre teoria e prática.

Para esses bacharéis/docentes aprende-se a ensinar nos eventos

vivenciados no cotidiano da prática, de forma solitária e com exemplos de bons

professores, distantes, portanto, do conhecimento científico produzido sobre essa

temática. Contudo, para Montero (2001, p. 165) aprender a ensinar é:

[...] um processo que implica efetivamente a aquisição de um repertório de conhecimentos, aptidões, atitudes, crenças, afetos construídos em todo o espaço do exercício profissional de qualquer professor, em relação estreita com os diversos contextos em que o mesmo se verifica.

Por certo, aprender a ensinar não ocorre a partir de eventos isolados e

desconectados, mas através de processos que envolvem um repertório de

Page 131: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA (PUC-SP) FACULDADE DE ... · CÁCIA CRISTINA FRANÇA REHEM DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E BACHARÉIS DOCENTES: PROCESSOS FORMATIVOS E A PRÁTICA PEDAGÓGICA

130

conhecimentos e que inclui a reflexão sobre a prática de forma individual e

colaborativa no desenvolvimento da profissão.

Dessa forma, e a partir desse posicionamento apresentado pelos docentes,

acreditamos ser pertinente desvelar o que compreendiam ser a prática pedagógica,

sob a seguinte indagação: O que entende por prática pedagógica? DO1 – É a organização do ensino né? DO2 – Inicialmente minha preocupação era só com o conteúdo; achava que tinha que transmitir o máximo possível, agora penso na aula como um todo. DO3 – No meu caso, como não tive formação para o ensino, penso ser uma coisa muito de experiência e conhecimento. DO4 – É a mesma coisa que ensinar né. DO5 – É possibilitar que o aluno aprenda. DO6 – Organizar passo a passo a aula, ou seja, como vou fazer para o aluno aprender. DO7 – Sensibilizar o aluno para fazê-lo aprender.

Os sujeitos desta pesquisa entendem que a prática pedagógica está

diretamente relacionada a sua ação na sala de aula, “é a organização do ensino”,

“transmitir o conteúdo”, “experiência e conhecimento” e “sensibilizar o aluno para

fazê-lo aprender”, DO6 ainda destaca que vem a ser “organizar passo a passo a

aula”. Concebem, portanto, a organização da prática pedagógica através da

elaboração do planejamento da aula.

Dessa forma, a prática pedagógica para esses docentes se estrutura a partir

de uma perspectiva mais tradicional, dando “ênfase às situações de sala de aula,

onde os alunos, são ‘instruídos’ e ‘ensinados’ pelo professor” (MIZUKAMI, 1986, p.

13).

Entendendo a prática pedagógica como uma ação intencional que visa

atender determinados propósitos de uma comunidade social, essa prática se

concretiza através do planejamento − elaboração, execução e avaliação. Coube

então compreender como organizavam a sua prática pedagógica; para isso

perguntamos: Como planeja a sua prática pedagógica?

1. A partir do objetivo:

D01 – Busco planejar para relacionar a teoria com a prática; dessa forma, estabeleço os objetivos e busco cumprir, selecionar conteúdos em sites, livros, revistas atualizadas, (nunca li o projeto do curso, mas tenho a ementa), uso técnicas tais como: aula expositiva e projetos que permitem a utilização dos conteúdos teóricos.

DO2 – Para organizar a minha prática, ou seja, planejar, parto sempre do objetivo e procuro selecionar conteúdos importantes que

Page 132: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA (PUC-SP) FACULDADE DE ... · CÁCIA CRISTINA FRANÇA REHEM DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E BACHARÉIS DOCENTES: PROCESSOS FORMATIVOS E A PRÁTICA PEDAGÓGICA

131

são escolhidos em livros, textos e na internet; uso muito slides para mostrar as imagens, porque não é possível no laboratório; trabalho com aulas expositivas, utilizo também muitos documentários e filmes.

2. A partir da ementa:

DO4 – Planejo a partir da ementa, defino os objetivos e seleciono o conteúdo, uso slides e textos diversificados, sempre utilizei muita aula expositiva, principalmente no início. Agora tento diversificar um pouco mais. Estamos utilizando o PBL em um curso, que foi opção do colegiado do curso. Estamos mudando o currículo e introduzindo o PBL. DO6 – Planejo para preparar a minhas aulas e é sempre a partir da ementa no planejamento; para preparar as aulas teóricas, uso muito imagem, é a minha maior preocupação; seleciono os conteúdos através de livros, textos que são padrões, depois vou colocando o conteúdo de forma gradual, vou em uma sequência clínica para eles aprenderem. A ementa direciona, mas te permite outras possibilidades. Os recursos utilizados são aqueles que possibilitam simular uma situação real. As disciplinas que leciono não dá para usar gente, pois é uma disciplina que trata de traumas dentários; a principal técnica de ensino que uso é a expositiva. Acho melhor para explicar o assunto. DO3 – Como eu planejo? Eu tenho um cronograma, com as aulas e as datas no semestre inteiro. Vou ser sincera, eu não mudo meus slides todo semestre, já tive o trabalho de montar, de construir né, com figuras, com tudo...às vezes eu digo assim − vou parar para rever essa aula, e vê se tira alguma coisa, mas não fiz ainda, vou ser sincera. O que muda muito são os artigos, que eu estou sempre procurando coisa nova. Não seleciono objetivos e os meus conteúdos eu retiro da ementa da disciplina. As metodologias eu escolho as que acho mais interessante e me deixa confortável, no caso, uso mais aula expositiva.

3. A partir do conteúdo: DO5 – Para organizar, ou seja, planejar, a minha principal preocupação é o conteúdo que é o núcleo de tudo. Seleciono o meu conteúdo através de artigos nacionais e internacionais e a ementa também auxilia. Uso aulas expositivas, aulas práticas, produção de textos; toda disciplina que eu trabalho, faço com que meus alunos produzam textos. DO7 – Eu planejo a partir da elaboração do plano de curso e seleciono o conteúdo que vou ministrar a partir da ementa. As metodologias são selecionadas a partir do conteúdo, aquilo que melhor se adequa ao conteúdo.

O planejamento da prática pedagógica dos bacharéis/docentes indica que os

objetivos, a ementa e os conteúdos são os elementos norteadores e estruturam esse

planejamento, dando ênfase à seleção dos conteúdos, tratando esse item como o

mais importante para a realização dessa prática.

Page 133: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA (PUC-SP) FACULDADE DE ... · CÁCIA CRISTINA FRANÇA REHEM DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E BACHARÉIS DOCENTES: PROCESSOS FORMATIVOS E A PRÁTICA PEDAGÓGICA

132

Indicam também que selecionam os conteúdos em sites, revistas atualizadas,

não mudam muitos os recursos escolhidos, e selecionam a metodologia de acordo

com o conteúdo, embora admitam usar muito a aula expositiva.

Os denominados ‘planos de ensino/plano de curso/plano de disciplina”, em

uma estrutura mais clássica de planejamento, eram compostos por: objetivos,

conteúdos, metodologia e avaliação (ZABALZA. 2013, p. 76). Assim sendo, não

existem modificações nem acréscimos de outros elementos fundamentais para a

transformação desse entendimento e execução da prática pedagógica por esses

docentes, como, por exemplo, a contextualização do projeto, as estratégias de apoio

aos estudantes e os dispositivos para avaliar o desenvolvimento do programa

(ZABALZA, 2013, p. 76) que não são considerados e nem incluídos nesse

planejamento.

O domínio do conhecimento necessário para a organização da prática

pedagógica na docência universitária é imprescindível, tanto quanto saber como

selecionar, organizar e executar. Dessa forma, compreendemos que para se ter uma

prática pedagógica consistente é necessário considerar alguns elementos, entre

eles: planejamento do curso e da aula, das atividades de aprendizagem, formulação

de objetivos, critérios para a seleção adequada dos conteúdos e dos métodos,

seleção de recursos adequados, avaliação da aprendizagem e da docência.

Acrescentamos, aos citados acima, a compreensão sobre ensinar e aprender,

a concepção e gestão do currículo, a compreensão da relação professor-aluno, a

utilização adequada das novas tecnologias aplicadas à educação. (MASETTO,

2012) e, principalmente, a consciência dos propósitos desses elementos no

processo de ensino e aprendizagem.

O ato de planejar na educação superior adquire a mesma falta de prestígio e

importância que a função da docência na universidade, por estarem diretamente

relacionados. Diante disso, foi significativo desvelar o procedimento adotado por

esses docentes para a elaboração do planejamento do curso, pois, a partir das

informações obtidas, foi possível realizar algumas ponderações, dentre elas: que o

plano de curso é obrigatório e deve ser entregue e aprovado na área de

conhecimento desse professor, para, em seguida, ser submetido à apreciação da

plenária departamental. Entretanto, segundo as informações obtidas, não existem

inferências da plenária, nem na área de conhecimento e tampouco no departamento

− são aprovados pelo simples fato de serem apresentados.

Page 134: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA (PUC-SP) FACULDADE DE ... · CÁCIA CRISTINA FRANÇA REHEM DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E BACHARÉIS DOCENTES: PROCESSOS FORMATIVOS E A PRÁTICA PEDAGÓGICA

133

Outro ponto interessante se refere à elaboração desse planejamento; são

cobrados no início do semestre, mas, às vezes, utilizam o mesmo, de um semestre

para o outro, com pequenas alterações, como data, alguns conteúdos e referências

bibliográficas. Conforme pode-se constatar, o ato de planejar se configura como um

ato para cumprir exigências da universidade e desconectado da sua ação diária na

sala de aula.

Isto faz crer que está enraizada uma problemática pedagógica

inevitavelmente central, visto que, diante da dinâmica de solicitações da sociedade

contemporânea, ou “sociedade de informação”, “sociedade da aprendizagem”,

imersa em transformações sociais, culturais e tecnológicas, não há inovações

importantes ou significativas no planejamento. Então, como se dá a disseminação do

conhecimento, o ensino renovado e suas aplicações práticas, se não são

contemplados no planejamento? Percebe-se então a reminiscência de um ensino

tradicional, esse viés arraigado que desconecta o papel docente de orientar e

transformar a sua prática.

Partindo-se do pressuposto que o planejamento é fundamental para a gestão

de sala de aula e deve ser condizente ao projeto político-pedagógico, cumprindo a

função de auxiliar a prática pedagógica, torna-se basilar superar a compreensão de

que o planejamento serve apenas para ser entregue ao departamento no início do

semestre. Há que se considerar que o planejamento didático é um processo

dinâmico – dentre muitos outros fatores, envolve analisar, refletir, definir, selecionar,

estruturar, distribuir ao longo do tempo, e prever formas de agir e organizar

atividades e experiências de construção do conhecimento docentes e discentes.

Portanto, torna-se um instrumento eficaz de auxílio para a reflexão e apreensão da

realidade em prol da qualidade do ensino.

Dando continuidade à nossa investigação e para que pudéssemos prosseguir

esclarecendo os elementos constantes da prática pedagógica desse professor,

perguntamos: Como avaliam os seus alunos, quais instrumentos utilizam e que destino dão aos resultados?

1. Para comprovar se o aluno aprendeu:

DO1 – Avalio para comprovar se o aluno aprendeu; os instrumentos que mais utilizo são provas, apresentação de trabalho e os resultados uso para atribuir notas.

Page 135: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA (PUC-SP) FACULDADE DE ... · CÁCIA CRISTINA FRANÇA REHEM DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E BACHARÉIS DOCENTES: PROCESSOS FORMATIVOS E A PRÁTICA PEDAGÓGICA

134

DO2 – Eu sou bem tradicional; uso avaliação escrita formal, relatórios de atividades práticas e através da observação do comportamento. DO3 – Para identificar a aprendizagem do aluno. Mas eu não renuncio às provas; já abri mão, mas percebo que todas as vezes que digo que não vou fazer prova, eles relaxam não querem estudar; isso é um fato, a prova é uma pressão. O resultado uso para aprovar ou reprovar; é o que está definido na universidade, no regimento, é o que eu faço.

2. Para classificar o aluno: D04 – Avaliar serve para classificar o aluno. Hoje eu faço prova ainda, mas eu avalio muito pelas atividades também no desenrolar das disciplinas; por exemplo, nas discussões desenvolvidas nas aulas eu ali também estou avaliando os alunos. Eu reprovo e aprovo; agora antes eu procuro fazer as correções com ele, eu corrijo junto com eles antes do resultado.

3. Para aprovar ou reprovar: DO5 – Avalio através da aplicação de provas escritas e oral, seminários, trabalhos escritos em forma de artigo; agora, uma tendência que eu tenho é fazer várias avaliações, se tem que valer dez, eu faço dez, valendo um cada uma, sei lá se o aluno está bem preparado para aquele momento; se fizer uma só ele ficará prejudicado. O resultado é usado para aprovar ou reprovar, mas comento os erros, chamo a atenção e algum momento pode refazer. DO6 – Uso portfólio daquilo que ele fez no semestre. No final do semestre aplico uma prova teórica e faço a relação entre o portfólio e a prova escrita e dou a média. O resultado eu público no Sagres; eu não tenho orgulho de dizer, mas a minha disciplina, pelo caráter dela, que tem que testar o caráter prático e teórico, eu tenho algumas reprovações, mas a odontologia a reprovação é pouca; geralmente é fluxo contínuo, não tem muita reprovação... Aqui vejo algumas aberrações, alunos que não estão habilitados e passa, você banaliza a sua disciplina. DO7 – Avalio através de observação e seminário; dou a nota; aprovo ou reprovo, faço o que está definido pela universidade.

A avaliação é desenvolvida com o uso de instrumentos como: prova, artigos,

seminários, observação e portfólio; indicam, ainda, que não renunciam ao uso de

“provas”, utilizando como argumento que os alunos “relaxam” ou “sei lá se o aluno

está bem preparado para aquele momento”; logo, a prova torna-se um instrumento

tradicional de “pressão”, “serve para classificar os alunos”, “aprovar ou reprovar”,

“identificar a aprendizagem do aluno”. Dessa forma, reforçam o uso dos

instrumentos de avaliação como “acerto de contas”, “punição” e “hora da verdade”.

Masetto (2010, p. 158) destaca que existem “professores que entendem a avaliação

Page 136: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA (PUC-SP) FACULDADE DE ... · CÁCIA CRISTINA FRANÇA REHEM DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E BACHARÉIS DOCENTES: PROCESSOS FORMATIVOS E A PRÁTICA PEDAGÓGICA

135

como produto, isto é, como um resultado de uma atividade (em geral, prova) que se

usa para classificar alunos, aprová-los ou reprová-los”.

Avaliam como foram avaliados, não ultrapassam uma rotina estabelecida de

aplicação de instrumentos que perpetuam ritos estabelecidos para, simplesmente

obterem a exatidão do conteúdo comunicado durante as aulas. Por certo,

encontramos indicativos que esses bacharéis/docentes, sujeitos dessa pesquisa,

constituem a sua prática pedagógica fundamentada na racionalidade técnica,

modelo tradicionalmente dominante nas universidades até o momento. (IMBERNÓN,

2012).

Constatamos, portanto, que mesmo após pesquisas realizadas e produzidas

sobre a inovação curricular e didática nas universidades, não encontramos essas

inovações incluídas na prática pedagógica desses professores.

Em síntese podemos resumir a prática desses bacharéis/docentes através

das seguintes perspectivas:

1. Uma prática pedagógica fundamentada na improvisação, na tentativa e

erro; por não possuírem conhecimentos específicos, baseiam a sua prática

em crenças e modelos que possuem sobre o ensino;

2. Elaboração do planejamento de curso, como mera atividade burocrática

para cumprir o que está previsto na universidade;

3. Aulas magistrais, centradas na exposição do professor;

4. Uma preocupação excessiva com a seleção do conteúdo. Embora alguns

pontuem que já superaram esse viés, muitos são os que apontam o

conteúdo como o núcleo de tudo e a principal preocupação no momento

do planejamento.

5. Ensino como transmissão e aprendizagem como recepção;

6. Alunos como objetos do processo de ensino/aprendizagem;

7. Relação professor-aluno vertical – papéis definidos – professor ensina e

cuida do processo de ensino, aluno cuida da sua aprendizagem;

8. Avaliação da aprendizagem voltada especificamente para os alunos;

9. Avaliação da aprendizagem como finalização do processo e direcionada

para o produto;

10. Avaliação usada para aprovar e reprovar os alunos.

Page 137: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA (PUC-SP) FACULDADE DE ... · CÁCIA CRISTINA FRANÇA REHEM DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E BACHARÉIS DOCENTES: PROCESSOS FORMATIVOS E A PRÁTICA PEDAGÓGICA

136

Fundamentados nas situações observadas, constatamos que a prática

pedagógica exercida por esses bacharéis/docentes, partem de um planejamento

meramente burocrático para cumprir as exigências da universidade. Ao

confrontarmos, através da rotina e da prática de cada professor, com os referenciais

teóricos que versam sobre a temática, percebemos semelhanças entre os

professores − são eleitas determinadas práticas sob uma perspectiva tradicional,

muitas vezes, presos a ritos que são frutos de vivências enquanto aluno.

Outrossim, não foram evidenciadas nas entrevistas nem nas aulas desses

docentes as bases de construção desse ensino junto com a turma, de modo a

propiciar um ambiente favorável à aprendizagem, tendo em vista ser o ensino uma

prática social concreta, dinâmica, multidimensional, interativa, inédita e imprevisível.

A título de reflexão é importante ter presente o que infere Tardif:

Ensinar é, portanto, fazer escolhas constantemente em plena interação com os alunos. Ora, essas escolhas dependem da experiência dos professores, de seus conhecimentos, convicções e crenças, de seu compromisso com o que fazem de suas representações a respeito dos alunos e, evidentemente, dos próprios alunos. (TARDIF, 2002, p. 132)

Em suma, embora possuam experiência no ensino, essa mesma experiência

vem se cristalizando e as transformações e ressignificações não ocorrem; nesse

caso, acontecem por dois motivos: (i) acreditam não possuírem necessidades

formativas e (ii) mesmo admitindo possuírem necessidades formativas não

encontram espaços para realizarem essas formações.

4.2.3 Competências necessárias para o exercício da docência no ensino superior: o que dizem os professores

O desenvolvimento e a posse de competências para o exercício da função da

docência no ensino superior, são aqui estabelecidos e assumidos como necessários.

Nessa perspectiva, através dos discursos dos sujeitos dessa pesquisa, identificamos

quais seriam essas competências e quais espaços seriam designados para esse

desenvolvimento. Iniciamos então com a seguinte questão: São necessárias competências para o exercício da docência? Obtivemos como resultado as

seguintes categorias a serem analisadas:

Page 138: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA (PUC-SP) FACULDADE DE ... · CÁCIA CRISTINA FRANÇA REHEM DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E BACHARÉIS DOCENTES: PROCESSOS FORMATIVOS E A PRÁTICA PEDAGÓGICA

137

1. A competência como auxílio para aprimorar e melhorar a docência

considerada como um dom ou inata:

DO1 – Sim, ensinar é um dom, mas pode ser aprimorada em cursos de formação. DO5 – Sim, acredito que uma parte é inata, uma outra parte vai sendo construída. DO6 – Sim. A docência é um dom, a competência pode auxiliar a melhorar o ensino.

2. A competência como contribuição para melhorar a docência:

DO2 – Sim. Contribui e auxilia a melhorar a prática.

DO3 – Sim, assim como em qualquer atividade, é necessário possuir competência para ensinar também. DO4 – Sim. DO7 – Sim, é necessário possuir e desenvolver competências para ensinar melhor.

A competência aparece como auxílio para melhorar a docência e pode ser

desenvolvida, embora, nos discursos de alguns, transpareça o significado da

docência como um dom ou algo inato. Sob essa ótica, os conhecimentos

necessários para o exercício já existiriam por si só, e as competências cumpririam o

papel de complementar a sua ação. Essa imagem equivocada da docência é uma

construção ideológica e perpetua no campo dos valores altruístas, sendo marcada

na história da profissão docente por um discurso que atribui à atuação do

professor(a) o dom como dádiva, da vocação para tal. Isto faz parte de um

entendimento socialmente construído, que oculta a existência de um conjunto de

saberes indispensável ao trabalho docente, que requer qualificação, formação e

aperfeiçoamento para que este sujeito esteja apto para atuação profissional. A ideia

de que o docente “nasce pronto” para ensinar pode implicar em situação

desfavorável à formação continuada do educador.

Para outros cumpriria o papel de auxiliar a melhorar a prática. Essa

perspectiva de competência como auxílio da prática denota competência enquanto

ação, mobilização de recursos, conhecimentos, habilidades e atitudes na

“transmissão de conhecimentos”. Talvez essa compreensão sobre a docência e a

competência explique as respostas dadas quando adiante perguntamos quais

seriam essas competências.

Page 139: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA (PUC-SP) FACULDADE DE ... · CÁCIA CRISTINA FRANÇA REHEM DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E BACHARÉIS DOCENTES: PROCESSOS FORMATIVOS E A PRÁTICA PEDAGÓGICA

138

Inicialmente houve dificuldades em indicá-las, sendo que o domínio e a

transmissão dos conteúdos figuraram como suficientes: Quais competências o docente da educação superior deve possuir para o exercício da docência?

1. Possuir conhecimento e saber transmitir:

DO1 – Penso que são o conhecimento da matéria e saber transmitir. DO2 – O conhecimento atualizado e transmitir conhecimentos, fazendo com que os alunos fiquem interessados. DO3 – Acredito que o primordial é o domínio do conteúdo e saber transmitir de modo que os alunos aprendam. DO5 – Saber o conteúdo é primordial, aliado ao saber transmitir.

2. Possuir capacidade de comunicação, ter o domínio do conteúdo e a

competência específica da profissão:

DO4 – Possuir a capacidade de comunicação e ter domínio do conteúdo, além que acho que tem a competência específica da profissão também, né, pela minha atividade de ensino que é uma disciplina muito específica.

3. Saber planejar, saber passar o conteúdo e saber avaliar: DO6 – As competências são, no meu entendimento, saber planejar, saber passar o conteúdo, saber identificar a necessidade ou não da avaliação e qual avaliação empregar. DO7 – Saber o conteúdo que vai ensinar e saber a melhor forma de transmitir esse conteúdo para que o aluno aprenda.

Posto de diferentes formas, “saber o conteúdo”, “possuir o domínio do

conteúdo” “saber transmitir”, “saber comunicar”, resumem a docência ao

conhecimento disciplinar – saber o conteúdo e a competência pedagógica − saber

passar o conteúdo.

Através do conhecimento produzido sobre as competências necessárias para

um exercício qualificado da docência e trazida por nós nesse trabalho, é possível

perceber que os docentes/bacharéis, ainda acreditam na visão “conteudista” −

bastam apenas duas competências para o exercício da docência: “transmissão” e

“conteúdo”. Dessa forma, a crença difundida de “quem sabe, sabe ensinar” e que

“ensinar é transmitir conhecimentos” ainda estão vivas, assumidas como legítimas e

suficientes.

Cruz Tomé (1994) atribui essa concepção como mais um dos muitos mitos

que rondam a docência universitária, o mito de que “professor nasce, não precisa de

formação”, que ensinar é uma tarefa vocacional e com a prática se vai aprendendo.

Page 140: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA (PUC-SP) FACULDADE DE ... · CÁCIA CRISTINA FRANÇA REHEM DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E BACHARÉIS DOCENTES: PROCESSOS FORMATIVOS E A PRÁTICA PEDAGÓGICA

139

Para essa autora, fundamentada em Ellis, a docência acaba sendo a única

profissão, salvo a mais antiga do mundo, que não exige para seu exercício uma

formação reconhecida e exigida “é complementada com o voluntarismo e é

aprendida por ensaio e erro com muitos custos adicionais que se criam vítimas33”

(ELLIS, 1993 apud CRUZ TOMÉ, 1994, p. 15).

Diante das transformações sociais, políticas, econômicas e culturais que

pedem aportes de conhecimentos diversificados, multifacetados, interdisciplinares,

por parte dos professores, frente aos novos papéis que o labor docente hoje impõe −

novos conteúdos, novos instrumentos e recursos, novos canais comunicativos para

a elaboração da aprendizagem (videoconferências, chats, lista de distribuição),

novos métodos pedagógicos, conhecimento das tecnologias educacionais, etc.,

(MAS TORELLÓ, 2013) − permanecer relacionando o ensino como a posse e a

transmissão do conteúdo é desconsiderar as transformações impostas ao trabalho

docente e ao novo aluno que chega à universidade.

Questionamos também quais espaços deveriam ser disponibilizados ao

professor para desenvolver essas competências.

Quais locais seriam adequados para a aquisição e desenvolvimento dessas competências?

1. O mestrado e o doutorado:

DO1 – Não saberia dizer, mas acho que o mestrado e o doutorado. DO5 – Penso que o mestrado e o doutorado e a universidade deveriam ser esses espaços. DO6 – Os cursos de pós-graduação, principalmente o mestrado, deveriam ter essa responsabilidade.

2. Na universidade:

DO2 – Devem acontecer na universidade, sempre no início do semestre e de forma obrigatória. DO7 – Deveria acontecer na universidade, através de uma equipe pedagógica.

3. Na prática:

DO3 – O melhor local para adquirir as competências é a prática.

4. No curso de graduação, como uma subárea de formação:

33 Se suple com voluntarismo y se aprende por ensayo e error com muchos custos añadidos que

crean victimas. Tradução nossa.

Page 141: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA (PUC-SP) FACULDADE DE ... · CÁCIA CRISTINA FRANÇA REHEM DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E BACHARÉIS DOCENTES: PROCESSOS FORMATIVOS E A PRÁTICA PEDAGÓGICA

140

DO4 – Devem ser adquiridas na formação, no curso de graduação como mais um elemento, como se fosse uma especialidade do curso; quem quer ensinar teria essa especialidade para fazer junto com o curso.

Quanto aos espaços para a aquisição e desenvolvimento das competências,

os sujeitos da pesquisa apontam que pode acontecer na graduação como mais uma

especialidade do curso, na pós-graduação, na universidade através de propostas de

formação inicial e continuada, e na prática. Porém, é preciso acentuar que a

formação didático-pedagógica para o educador, enquanto condição para o exercício

das suas atividades nas Instituições de Ensino Superior, não é contemplada na pós-

graduação, apesar de ser este o espaço legitimado por lei para a “preparação” do

docente universitário. Contudo, como já referido, os estudos revelam ser a pesquisa

a proposta da pós-graduação no Brasil. Reforça o docente universitário como o

pesquisador e a posse do conteúdo específico como a principal competência que

esse docente deve possuir. Disto resulta que a compreensão de competência está

relacionada ao conhecimento específico da área de formação do professor.

Outro ponto interessante é que, apesar de todos terem titulação de mestres

e/ou doutores, ao referendarem esse espaço como o local de formação do docente,

não se recordam que, nesses mesmos espaços, tal como afirmaram anteriormente,

não lhes foi oferecida formação didático-pedagógica. Esta se configurou como

insignificante, ao esquecerem até o nome da disciplina cursada e dos conteúdos

vistos.

Ainda foi sinalizada a ideia de que seria na graduação. Neste caso, o

bacharelado, a formação para a docência no ensino superior se daria através de

uma subárea sobre ensino, onde os alunos interessados em seguir carreira

acadêmica deveriam cursar uma licenciatura, dentro do bacharelado. Embora

partamos do princípio de que o professor de medicina deva ser o médico,

acreditamos que essa formação para a docência deva ser incluída a partir do início

da carreira docente, nos espaços da universidade e em confronto direto com a sua

prática – sendo possibilitado a esse profissional uma nova profissionalização. A

formação contínua remeteria a um investimento na formação docente, com vista a

uma construção de identidade profissional docente. É chegada a hora de tratarmos a

docência universitária de forma que o processo de constituição profissional seja

imprescindível.

Page 142: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA (PUC-SP) FACULDADE DE ... · CÁCIA CRISTINA FRANÇA REHEM DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E BACHARÉIS DOCENTES: PROCESSOS FORMATIVOS E A PRÁTICA PEDAGÓGICA

141

A universidade e a prática como lugares de desenvolvimento de

competências nos parece ser o mais legítimo, pois permite, através de espaços

colaborativos, a possibilidade de pesquisa e de reflexão sobre essa prática,

possibilitando as transformações necessárias.

A docência não é algo imutável, algo fixo que precisa somente de alguns

ajustes vez por outra; a constituição da docência acontece através da itinerância

profissional. A competência, por sua vez, se constitui como um conjunto de

conhecimentos, habilidades e atitudes que, combinadas, permite a ação e o

exercício profissional.

Reafirmamos que a competência é uma construção que se dá no

enfrentamento diário do exercício profissional, acontecendo de forma contínua, tal

como a formação, um vir a ser diário. Nos tornamos competentes à medida que

vamos exercendo a nossa profissionalidade.

Com base nos dados encontrados nesta pesquisa, é lícito supor que, caso

não seja valorizada a formação docente, enquanto preparação de professores

protagonistas que participam e assumiram a responsabilidade de formar outros

profissionais, por meio do exercício da docência, não será possível a modificação

das práticas pedagógicas encontradas nesse trabalho.

Esta prática traz o desafio de articular conteúdos, métodos e teoria por meio

da ação e interação, visto que a formação vai além da transmissão de conteúdos

específicos, “aplicar conhecimentos”, o que se traduziria em “competências”.

Envolve tanto propostas sistematizadas de trabalho autônomo quanto colaborativo.

Trata-se de um leque opções que visem superar a centralização didática no discurso

docente e considere dinâmica inerente e complexa a relação estudante-professor de

tal modo que favoreça a esses estudantes construírem os seus próprios esquemas

de pensamento e de ação, adequados a contextos específicos.

Dada a relevância do tema não podemos aqui, de antemão, afirmar que os

resultados apresentados pela docência, nesta pesquisa, sejam prejudiciais aos

alunos. Reconhecemos, de maneira muito nítida, o empenho desses docentes, mas

sob o enfoque do campo de pedagogia, tendencialmente existe a reminiscência de

um ensino tradicional, que se caracteriza como transmissivo e uma concepção de

docência como dom, algo inato, construída na prática e no cotidiano, sem indicativos

formativos. Em suma, as competências assumem contornos mal definidos sob a

égide de um discurso notadamente de posse do conteúdo e o saber transmitir.

Page 143: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA (PUC-SP) FACULDADE DE ... · CÁCIA CRISTINA FRANÇA REHEM DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E BACHARÉIS DOCENTES: PROCESSOS FORMATIVOS E A PRÁTICA PEDAGÓGICA

142

5 FORMAÇÃO ESPECÍFICA PARA O EXERCÍCIO DA DOCÊNCIA: NECESSÁRIA E POSSÍVEL

A formação específica para a docência se configura imprescindível,

principalmente no que tange aos profissionais bacharéis que não têm formação

específica para o ensino. São poucos os docentes que ainda acreditam que a

docência pode ser realizada apenas a partir do conhecimento específico do

conteúdo da disciplina e que “ensinar, se aprende ensinando”, haja vista que não a

compreendemos meramente como um ato de ministrar aula. Entretanto, mesmo

verificando-se a importância pedagógica da formação para o exercício da docência,

constatamos que as instituições de ensino superior não se preocupam com essa

formação; apenas exigem suas titulações.

Da mesma forma, na universidade, lócus dessa pesquisa, verificamos que

não existem propostas de formação específica para a docência. Os

bacharéis/docentes conduzem a sua docência centrada na repetição e na empiria –

na base da tentativa e erro, conforme relatos das informações analisadas no estudo.

Após a análise, interpretação e compreensão dos dados, sobre o processo de

formação e a prática pedagógica desses docentes, acreditarmos que a formação

atualmente é necessária, urgente e imprescindível. No entanto, os exemplos

encontrados na literatura apresentam propostas pontuais, cursos rápidos de

formação oferecidos na extensão, trabalhando conteúdos distantes da prática

desses professores e que não conseguem modificar e nem intervir de forma

substancial nas práticas desses docentes.

A proposta desse capítulo é apresentar, em um primeiro momento, a

justificativa da necessidade dessa formação encontrada no campo de pesquisa e,

em seguida, apresentar o modelo de formação considerado possível, na perspectiva

de superar o cenário encontrado e possibilitar uma formação colaborativa e crítica.

Page 144: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA (PUC-SP) FACULDADE DE ... · CÁCIA CRISTINA FRANÇA REHEM DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E BACHARÉIS DOCENTES: PROCESSOS FORMATIVOS E A PRÁTICA PEDAGÓGICA

143

5.1 A FORMAÇÃO NECESSÁRIA: OS ELEMENTOS INDICADORES

Nas análises dos dados coletados na pesquisa realizada, constatamos que a

formação específica para a docência é considerada necessária pelos sujeitos

participantes e deveria acontecer na prática. Contudo, os resultados obtidos revelam

que os mesmos não realizaram está formação. Num outro viés, constatamos ainda

que, mesmos os participantes que já tinham feito algum tipo de formação,

apontaram-na como irrelevante.

A despeito disso, pudemos averiguar que as necessidades formativas

apontados pelos próprios sujeitos da pesquisa, quanto à prática pedagógica, aliadas

às análises da pesquisa em campo (salas de aula) além da literatura sobre a

temática, indicam que a formação para a docência universitária não pode ser algo

dispensável na constituição da profissão docente.

Entretanto, nesse cenário, nos esbarramos com a não exigência dessa

formação em várias instâncias. Primeiramente, por parte da universidade que, a

depender da cultura da IES, privilegia a pesquisa ou o conhecimento técnico.

Outrossim, destacamos a inconsistência do aparato legal – (Artigo n. 66 da

LDB/1966), PNE e PNPG omissos na abordagem da formação didático-pedagógica

do professor para o ensino superior. Percebemos ainda o reflexo disso atrelado à

insuficiência de políticas públicas de uma formação para o professor da educação

superior que contemple os saberes específicos da prática docente. Por fim, tal

situação denota a falta de prestígio da docência na universidade, pois o que se

observa é um entendimento que a formação é direcionada para a atualização

científica.

Permanece a lacuna de uma formação permanente do professorado que seja

menos funcionalista, individualista, menos centrada nos ‘bancos acadêmicos’. O

momento exige um repensar das IES sob o enfoque de uma formação inovadora do

ensino colaborativo, que busque alternativas para o desgastado modelo atual, seja

norteado por experiências compartilhadas entre os pares, de modo mais dialógico e

participativo priorizando um equilíbrio entre a prática e a teoria, conforme

discutiremos com mais acuidade adiante.

Há que se pontuar essas questões, tendo em vista que esse contexto é

recorrente e preocupante, já que professor ignora os elementos constitutivos da

Page 145: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA (PUC-SP) FACULDADE DE ... · CÁCIA CRISTINA FRANÇA REHEM DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E BACHARÉIS DOCENTES: PROCESSOS FORMATIVOS E A PRÁTICA PEDAGÓGICA

144

própria ação docente, posto que os dados obtidos em campo incitam à reflexão

sobre a importância dos espaços e modelos para que essa formação se realize.

Quando perguntados sobre quais espaços essas formações deveriam

acontecer? A universidade aparece na maioria das respostas dos sujeitos, seguida

da pós-graduação – local já definido por lei onde a ‘preparação deva ocorrer’ e na

universidade, como espaço legitimado por ser o local de atuação desse profissional.

Corroboramos com esses professores, quando apontam a universidade, por

acreditarmos ser o lugar privilegiado de planejamento e realização das atividades de

formação. Quanto à “pós-graduação”, a literatura pesquisada sobre essa temática

(ALMEIDA; PIMENTA, 2009; ANASTASIOU, 2008; BASTOS, 2007; CORRÊA;

RIBEIRO, 2013; CUNHA, 2009; ISAIA, 2006; PIMENTA; ANASTASIOU, 2008;

MASETTO, 2009; SOARES; CUNHA b, 2010) aponta pouca contribuição na

formação para a docência. Para que se constitua efetivamente como espaço de

formação para a docência universitária, deverá passar por reformulação quanto aos

seus objetivos e metodologia.

Quanto à forma, os participantes da pesquisa indicaram que deveriam

acontecer em pós-graduações sobre docência no ensino superior; seminários,

semanas pedagógicas, palestras, entre outros. Indicaram também quais conteúdos

deveriam ser tratados na formação: relação entre teoria e prática, como ensinar

melhor, como motivar os alunos, como avaliar melhor, etc.

A ideia desses professores é de que a formação venha oferecer ‘teoria’ para

auxiliá-los na resolução dos problemas vivenciados por eles no cotidiano da sala de

aula, tal como ‘fórmulas mágicas’ que os ajudariam a transformar a prática

pedagógica sem maiores esforços.

No entanto, essas formações consideradas esporádicas e pontuais, com

conteúdos fragmentados, não têm conseguido alterar, em muitos casos, a

concepção de docência desses professores e não geram transformações em suas

práticas pedagógicas.

Ao mesmo tempo em que não há obrigatoriedade de formação para a prática

docente, deixando sob a incumbência do docente a escolha, observa-se uma

participação um tanto quanto tímida, em muitos casos, inexpressivas nos eventos

promovidos geralmente por departamentos e colegiados dos cursos em semanas

pedagógicas, apenas no início do semestre.

Page 146: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA (PUC-SP) FACULDADE DE ... · CÁCIA CRISTINA FRANÇA REHEM DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E BACHARÉIS DOCENTES: PROCESSOS FORMATIVOS E A PRÁTICA PEDAGÓGICA

145

Constatamos ao longo das observações das aulas, que esses docentes

possuem um repertório limitado sobre o ensino e a aprendizagem, o fato de que a

maioria das aulas foram executadas de forma padronizada – aulas expositivas,

cabendo ao aluno ouvir para aprender - indica que a maioria desses docentes,

segue acreditando que as competências que um professor deva possuir se resumam

a ‘saber e transmitir o conteúdo específico’.

Nas primeiras impressões sobre a docência exercida por esses bacharéis

aparece a ideia de solidão, em função de não receberem orientações para o ensino,

e o fato de não possuírem experiências anteriores. Compreendemos que, na

percepção dos participantes da pesquisa, a universidade não oferece formação e

tampouco fomenta oportunidades de reflexão sobre a prática pedagógica de seus

docentes em pleno exercício.

A segunda impressão é de isolamento, já que os demais professores que

possuem mais experiência dentro da universidade, não se comunicam entre si, nem

com os novatos e, quando o fazem, orientam sobre as questões administrativas,

levando ao docente iniciante a acreditar que a docência é um trabalho que se faz

individualmente, conduzindo a sua docência dessa maneira ao longo da sua

carreira.

Ao identificarmos a maneira como a docência universitária vem sendo

realizada por esses bacharéis/docentes, constatamos que a formação específica

para o exercício da docência é imprescindível e não pode mais ser adiada,

postergada ou mesmo negligenciada.

Possibilitar a esses docentes a reflexão crítica sobre a sua prática e

participação na construção do conhecimento pedagógico, por certo auxiliará nas

mudanças do campo laboral desses profissionais. Apesar dessa discussão vir

ganhando força nos meios acadêmicos, provocando muitas indagações e angústias,

percebemos que a formação pedagógica ainda é um tema que carece de especial

atenção por parte das universidades para assegurar o crescimento e a melhoria

contínua da qualidade do exercício da docência no ensino superior.

Nesse sentido, tivemos como alicerce autores que tratam da formação de

professores para o exercício da docência universitária (MAS TORELLÓ, 2011, 2013;

IMBERNÓN; 1998, 2014; ZABALZA 2004; CRUZ TOMÉ; 1994; MONEREO, et al.

2014), no intuito de apontar um caminho possível que permita a esse docente uma

formação mais aprofundada, o que implica em ampliar o leque de atividades

Page 147: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA (PUC-SP) FACULDADE DE ... · CÁCIA CRISTINA FRANÇA REHEM DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E BACHARÉIS DOCENTES: PROCESSOS FORMATIVOS E A PRÁTICA PEDAGÓGICA

146

necessárias, oferecer oportunidades para a aquisição de competências diversas

num espaço mais amplo de formação e de possibilidades.

5.2 A FORMAÇÃO POSSÍVEL

Ao assumir a formação específica para a docência como necessária, sob o

alicerce de referencial teórico, tomamos como possível a formação inicial e

continuada desses docentes, e agora tecemos algumas considerações

fundamentais, sinalizando algumas propostas para sua efetivação.

A primeira consideração refere-se ao oferecimento e às condições de

realização dessa formação. Para tanto, cabem as seguintes indagações: quem é

responsável pela organização? Quando deverá ocorrer? Como será definida a

participação dos docentes? O que se entende como formação inicial e continuada?

A universidade, comprometida com a formação dos seus docentes, terá a

responsabilidade de organizar, promover e cuidar para que esses professores

participem do processo de formação para a docência. De acordo com Imbernón

(1998) a formação deve ocorrer no centro educativo – espaço de atuação desse

docente −:

A formação, a inovação e reivindicação são três vértices de um triângulo na melhoria dos centros. E dizemos dos centros, porque o centro educativo é o lugar privilegiado para o planejamento e a realização das atividades de formação34. (tradução nossa)

A segunda consideração, diz respeito à participação desses docentes nas

formações. É fundamental que seja uma atividade obrigatória na carga horária

desses professores, assim como temos definido uma carga horária para a realização

de cada função na universidade. Então, que seja estabelecida também uma carga

horária para a formação inicial e continuada desse docente. Evidente que a proposta

não seria aumentar a carga horária desses professores, considerada por demais

excessiva, mas incluir essas horas nas disponíveis para as diversas funções que o

professor executa.

Sem a determinação, por parte da universidade, de uma carga horária

34 La formación, la innovación y la reivindicación son tres vértices de un triángulo em la mejora de los

centros. Y decimos de los centros porque es el centro educativo el lugar privilegiado de la planificación y realización de actividades de formación. (IMBERNÓN, 1998, p. 96)

Page 148: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA (PUC-SP) FACULDADE DE ... · CÁCIA CRISTINA FRANÇA REHEM DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E BACHARÉIS DOCENTES: PROCESSOS FORMATIVOS E A PRÁTICA PEDAGÓGICA

147

obrigatória e definida dentro do seu Plano Individual de Trabalho35 (PIT),

continuaremos com a formação entendida como um evento, uma atualização, que se

pode ou não aderir. Por não ter tradição de oferecer formação aos seus docentes, a

universidade tem que partir do que denominamos, neste estudo, de marco

conceitual – as definições das intenções e de que formação será oferecida aos seus

professores, bem como a institucionalização da proposta.

Contudo, é preciso deixar claro que, para haver mudanças profundas, a

formação deve ser pautada em responsabilidades e compromissos coletivos, como

lócus de aprendizagem permanente. Esse tem sido um dos maiores problemas

encontrados no cenário de formação docente no ensino superior. O fato de não

possuímos ainda muitas referências sobre propostas implantadas e mantidas,

apesar das mudanças de gestão consideradas como eficientes, denota

despreocupação e falta de vontade, por parte das instituições públicas, em assumir a

profissão docente como protagonista, a fim de priorizar a legitimação e otimização

das práticas formativas.

Nesse sentido, propomos a seguinte iniciativa: formar uma comissão,

composta pela pró-reitora de graduação (PROGRAD), representantes docentes de

departamentos e representantes dos alunos, para elaborar uma proposta

colaborativa a ser apresentada e analisada pela comunidade acadêmica e aprovada

nos órgãos competentes como política institucional e não de gestão. Essa proposta

estaria fundamentada em estudos proeminentes sobre a temática, considerando-se

a fala dos docentes e dos alunos sobre as necessidades vivenciadas no cotidiano da

sala de aula.

A terceira consideração é a superação da solidão e do individualismo.

Precisamos criar sentimentos de integração, colaboração e partilha entre os

profissionais que conseguem se agrupar para a realização da pesquisa, mas se

mantêm isolados em suas salas de aula, sem compartilhar as práticas, os problemas

e quiçá as soluções que encontram na sua atuação profissional.

35 Os professores devem preencher, no início do semestre letivo, o Plano Individual de Trabalho (PIT),

onde constam os locais para especificar a carga horária das diversas funções atribuídas ao professor e o Relatório Individual de Trabalho (RIT) quando o semestre termina. A Resolução Consepe nº 72/2009 – permite a organização e o preenchimento on-line, mas só foi implantado em 2018.

Page 149: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA (PUC-SP) FACULDADE DE ... · CÁCIA CRISTINA FRANÇA REHEM DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E BACHARÉIS DOCENTES: PROCESSOS FORMATIVOS E A PRÁTICA PEDAGÓGICA

148

Imbernón (1998, p. 96) atenta que:

A formação de professores não depende tanto da aquisição de conhecimentos teóricos das disciplinas acadêmicas e de rotinas e competições didáticas, como o desenvolvimento de capacidades analíticas, de investigação, reflexão, crítica e processamento de informações para o desenho de projetos antes e depois, durante a ação, superando o caráter individualista para compartilhar a reflexão com os colegas. Isso nos leva à formação e ao desenvolvimento de um pensamento prático que se aprende na reflexão e na autoavaliação, na prática de forma colegiada e que é legitimado pela implementação de umas práxis contextualizada. (IMBERNÓN, 1998, p.96) (tradução nossa)

Portanto, a perspectiva de uma formação baseada na colaboração emerge

por possibilitar romper com a cultura fundamentalmente individualista e solitária que

tem predominado na universidade, bem como promover novos olhares, horizontes e

possibilidades de uma formação baseada em trocas, integração e parceria com os

seus iguais.

Blanch e Corcelles (2014, p. 57) acrescentam que a formação baseada na

colaboração,

[...] se trata de um sistema de formação experiencial e participativo que se poderia definir como uma metaformação, já que os professores praticam a competência cooperativa durante a formação e aprendem os conteúdos mediante a interação com outros docentes e, por sua vez, incrementam sua consciência sobre como desenvolver estas habilidades cooperativas com seus estudantes. (SHAARAN, 2010) 36(tradução nossa).

Ainda fundamentada nessas autoras, encontramos argumentos importantes e

significativos que reforçam uma formação sob a perspectiva colaborativa:

1) O trabalho cooperativo promove o diálogo e o intercâmbio de experiências

entre os participantes e permite criar dinâmicas grupais em que todas as

pessoas participam em diferentes níveis;

2) A pesquisa tem mostrado amplamente que a interação cooperativa e o

trabalho em equipe podem repercutir em uma maior produtividade e

36 [...] se trata de un sistema de formación, ya que los profesores practican la competencia cooperativa durante la formación y aprenden los contenidos mediante la interacción con otros docentes y, a su vez, incrementan su consciencia sobre cómo desarrollar estas habilidades cooperativas con sus estudiantes (SHAARAN, 2010)

Page 150: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA (PUC-SP) FACULDADE DE ... · CÁCIA CRISTINA FRANÇA REHEM DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E BACHARÉIS DOCENTES: PROCESSOS FORMATIVOS E A PRÁTICA PEDAGÓGICA

149

criatividade do que o trabalho individual ou competitivo. (BLANCH;

CORCELLES, 2014, p. 158-160)37

Por certo, uma formação baseada na colaboração pode propiciar a tomada de

consciência sobre a sua prática a partir de uma reflexão conjunta, ao mesmo tempo

em que possibilitará uma aprendizagem fundamentada na sua ação, conforme

ressalta Imbernón (1998, p. 93):

O professor ou professora pode atuar como teórico crítico, criador de suas próprias teorias, comprovando sua validade e aplicação na prática, e como estrategista na prática, tonando rentáveis seus esforços políticos e decisões para a solução das situações problemáticas.38. (tradução nossa)

Entendemos que a escolha de uma abordagem de formação com proposta

colaborativa é significativa, pois permitirá um processo reflexivo em conjunto,

permitindo repensar a sua prática a partir das discussões vivenciadas e analisadas

em parceria. Sob essa perspectiva, não se resumirá ao “que eu faço”, mas ao que

nós pensamos e fazemos, levando a uma compreensão mais significativa do

processo de ensino-aprendizagem.

5.2.1 Modelo Colaborativo: o diálogo profissional

Entendemos que uma proposta, por melhor que seja, precisa ser

prioritariamente submetida à comunidade que dela se beneficiará e deve ser

ajustada às condições, aos interesses e contexto do espaço.

A escolha pelo modelo ‘diálogo profissional’ acontece por temos

compreendido, durante a coleta de dados, que esses professores desenvolvem a

docência de forma isolada. Esse isolamento docente, muitas vezes, é oriundo de

uma cultura profissional, terminando por acarretar projetos pedagógicos

37 El trabajo cooperativo promueve el diálogo y el intercambio de experiencias entre los participantes y permiten crear dinámicas de experiencias entre los participantes y permiten crear dinámicas grupales em las que todas las personas participan em diferentes niveles.

La investigación ha mostrado sobradamente que la interacción cooperativa y el trabajo em equipo puede repercutir em una mayor productividad y creatividad que el trabajo individual o competitivo.

38 El profesor o profesora puede actuar como teórico crítico, creador de sus propias teorías, comprobando su validez y aplicación em la práctica y también como estratega em la práctica, rentabilizando sus esfuerzos políticos y decisiones para la solución de las situaciones problemáticas.

Page 151: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA (PUC-SP) FACULDADE DE ... · CÁCIA CRISTINA FRANÇA REHEM DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E BACHARÉIS DOCENTES: PROCESSOS FORMATIVOS E A PRÁTICA PEDAGÓGICA

150

compartimentados, em âmbito competitivo, funcionalista e individualista onde cada

qual tem sua proposta.

Destarte, não existe uma relação dialógica entre os pares, inclusive entre os

que atuam nos mesmos cursos. Não se reflete sobre suas fases de desenvolvimento

profissional, necessidades formativas, experiências profissionais, que deveriam

nortear um espaço democrático e emancipatório de ensino e aprendizagem. Por

conseguinte, nesse modelo defasado, não existe uma rede de colaboração, para

que tenham a possibilidade de trabalhar e responsabilizar-se conjuntamente,

favorecendo o intercâmbio de práticas, o que permitiria se detectar as necessidades

de ensino-aprendizagem. Ao contrário, permanecem desconectados do contexto em

que exercem a docência

As reuniões de colegiado dos cursos tratam apenas de questões

administrativas, quando se deparam com situações de conflitos entre professores e

alunos, as discussões são esvaziadas e dificilmente alguém participa.

Outro ponto relevante para a proposta dessa metodologia vem a ser a

possibilidade de reflexão sobre a prática que uma abordagem de formação dialógica

permite aos seus membros. Imbernón (1998, p. 94) destaca que:

Os professores para assumirem essa tradição ou cultura reflexiva, deveriam se capacitar para analisar os fundamentos de sua ação e as consequências que geram nos alunos (autoavaliação) para fazer melhorias (reflexão e questionamentos). Como Oberg (1984) aponta, os professores serão melhores profissionais na medida em que estejam mais conscientes de sua prática e reflitam mais sobre suas intervenções)39 (tradução nossa).

Portanto, uma formação que não contribua para a reflexão e que não construa

uma relação de cooperação entre os seus pares dificilmente conseguirá obter êxitos

e transformar as práticas pedagógicas encontradas por nós nesse estudo.

Para ser possível uma formação colaborativa que supere esses modelos

vivenciados até aqui, optamos por apresentar um modelo de formação colaborativo

denominada de ‘o diálogo profissional’ que vem a ser grupos de professores que

refletem através do diálogo sobre sua prática educativa muitas vezes orientados por

39 El profesorado, para asumir esa tradición o cultura reflexiva, debería capacitar-se para analizar los

fundamentos de su acción y las consecuencias que genera en los alumnos (autoevaluación) para realizar mejoras (reflexión e indagación). Como señala Oberg (1984), los profesores serán mejores profesionales en tanto en cuanto sean más conscientes de su práctica y más reflexionen sobre sus intervenciones. (IMBERNÓN, 1998, p. 94)

Page 152: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA (PUC-SP) FACULDADE DE ... · CÁCIA CRISTINA FRANÇA REHEM DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E BACHARÉIS DOCENTES: PROCESSOS FORMATIVOS E A PRÁTICA PEDAGÓGICA

151

um profissional que orienta as reuniões40” (BLANCH; CORCELLES, 2014, p. 156)

(tradução nossa)

Essa proposta tem como principal objetivo criar um clima de ajuda mútua

colaborativa para auxiliar aos professores a aprenderem a ser mais reflexivos na

tomada de decisões e ampliar suas concepções sobre o processo de ensino-

aprendizagem.

Blanch e Corcelles (2014, p. 165) ressalvam que, para que essa proposta de

formação seja produtiva, é necessário seguir uma estrutura de três fases: (i)

compartilhar um marco de conhecimento externo, (ii) ativar o conhecimento pessoal

e (iii) quais implicações terão o que é compartilhado na prática.

Essas autoras ainda destacam que, neste tipo de diálogo, é importante refletir

sobre a representação do papel do professor a partir dos seguintes pressupostos:

• planejamento das aulas e a avaliação de sua implementação,

• pensamentos e decisões tomadas pelos professores durante o ensino,

• concepções e crenças dos professores.

É facultado aos professores que participam nesses grupos de formação o

compartilhamento de experiências que auxiliam na análise, no confronto e nas

transformações das práticas pedagógicas. O grupo que prima pela diversidade de

profissionais favorece a troca de experiências e possíveis transformações nas

concepções e crenças que norteiam as suas práticas.

A proposta de formação colaborativa, segundo Blanch e Cordeles (2014),

inicialmente pode se constituir a partir da ideia de criação de uma comunidade de

aprendizagem que possibilite a reflexão sobre a própria prática docente na

universidade com base nas situações problemas. O foco é que os professores

possam identificar incidentes críticos (IC) em seu dia a dia na universidade,

analisarem suas concepções, as emoções geradas, as estratégias utilizadas e as

que poderiam utilizar para resolver, de forma satisfatória, essas situações.

Para que seja possível a criação de grupos colaborativos, como modelo de

formação inicial e continuada dos bacharéis/docentes, é necessário que esses

professores sejam sensibilizados a participar favorecendo-se um ambiente de

confiança. É evidente que isso não acontece de imediato, mesmo que seja uma

40 Grupos de profesores que reflexionan a través del diálogo sobre su práctica educativa a menudo acompañados por un profesional que guía los encuentros.

Page 153: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA (PUC-SP) FACULDADE DE ... · CÁCIA CRISTINA FRANÇA REHEM DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E BACHARÉIS DOCENTES: PROCESSOS FORMATIVOS E A PRÁTICA PEDAGÓGICA

152

obrigatoriedade a ser estabelecida pela universidade, dada a cultura arraigada do

individualismo, observando-se o grau de emancipação docente e seu estágio de

desenvolvimento profissional. Isso demanda um processo de socialização entre os

professores, um período de ajustamento, de comprometimento, fundamentais para o

sucesso de intervenções de formação continuada colaborativa.

Outrossim, esses docentes terão a liberdade de optarem pelo grupo que

coaduna mais com os seus interesses e compartilharem entre os pares com os quais

mais se identificam. Do mesmo modo, poderão estabelecer intercâmbios

significativos, em uma mescla equilibrada de estímulo, apoio para integrar esforços,

recursos e planejamento conjuntos. Para tanto, os conteúdos e a forma como deve

ser conduzida a formação ficará a cargo da organização da universidade que,

juntamente com os seus pares, apresentará uma proposta viável aos seus docentes.

Enfim, consideramos a formação como necessária e possível, ao passo que

nos afastamos de uma formação distante da universidade e que não preconize a

prática pedagógica dos professores envolvidos. Visualizamos ainda uma formação

de caráter mais relacional, respeitando-se a cultura e o contexto comunitário. Para

tanto, há que pensar em um espaço predominantemente articulado e interativo entre

docentes, que estimule o professor a explorar e questionar seus próprios saberes e

práticas, aprender por meio do questionamento e compartilhamento das próprias

convicções. Assim permite-se estabelecer um fluxo de comunicação necessário,

mediante análises do contexto educacional, tendo em vista compreender, interpretar

e poder intervir em questões vitais para a melhoria da qualidade do ensino e o

exercício docente.

Page 154: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA (PUC-SP) FACULDADE DE ... · CÁCIA CRISTINA FRANÇA REHEM DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E BACHARÉIS DOCENTES: PROCESSOS FORMATIVOS E A PRÁTICA PEDAGÓGICA

153

6 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Chega agora o momento em que se faz necessário ‘finalizar’ esse trabalho −

uma exigência do tempo estabelecido para o doutoramento. Contudo, creio na

impossibilidade de estabelecer esse propósito, tendo em vista que a formação

docente está imersa em movimentos diários e no devir característico do humano

que, enquanto processual, nunca está conclusa. O tempo nos limita, estabelece

prazos e propõe conclusões, encerramentos e posicionamentos. Para nós, no

entanto, somente é chegado o momento de oportunizar algumas considerações que

julgamos possíveis, fruto da minha vivência como professora desse nível de ensino,

das conversas enriquecedoras com os docentes sujeitos dessa pesquisa e da

observação das suas práticas pedagógicas.

Partiremos então da questão orientadora desse estudo: Que caminhos

formativos, trilhados pelos bacharéis/docentes, repercutem em sua ação como

docente − em suas práticas pedagógicas − e quais necessidades de formação

apresentam?

Para desvelar e responder a essa questão foi preciso uma imersão na

literatura disponível sobre essa temática que, acredito, proporcionou o diálogo com

autores relevantes para o estudo dessa área. Alicerçados nessa reflexão teórica,

fomos esquadrinhando os elementos para o desenvolvimento da análise, nos

discursos produzidos pelos docentes sujeitos da nossa pesquisa, e com base na

observação da prática pedagógica desenvolvida.

Ainda, na busca por resolver essa questão foi preciso investigar a formação e

a prática pedagógica de bacharéis/docentes e discuti-las frente às atuais propostas

de formação para a docência na educação superior. Assim fomos desvelando o

processo de formação, a concepção de docência presente nos discursos, as

implicações nas práticas pedagógicas e quais necessidades formativas emergiam

como decorrência. Os dados coletados, foram fios condutores que, articulados com

bastante zelo e cuidado, priorizaram as falas dos sujeitos da nossa pesquisa, sem

julgamentos ou inquisição, aceitando o processo de cada sujeito, as peculiaridades

do seu processo formativo e da sua prática pedagógica. Portanto, cabe agora

oferecer as respostas à nossa questão nuclear e apresentar uma síntese dos

resultados.

Page 155: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA (PUC-SP) FACULDADE DE ... · CÁCIA CRISTINA FRANÇA REHEM DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E BACHARÉIS DOCENTES: PROCESSOS FORMATIVOS E A PRÁTICA PEDAGÓGICA

154

Pesquisar sobre formação de professores para a docência universitária talvez

não nos parecesse, em um primeiro momento, um tema que trouxesse muitas

novidades. Entretanto, após análise da literatura, em revistas, livros, teses,

dissertações, artigos, etc., constatamos que essa temática começou a aparecer, em

maior número, a partir da década de 1980, inicialmente tendo como foco os estudos

do perfil desse docente. Contudo, ainda são poucos os estudos sobre a prática

pedagógica desenvolvida e as necessidades formativas desses profissionais.

Portanto, ainda existem lacunas que habilitam a pesquisa sobre essa

temática. Outro ponto que destacamos, quanto a esses estudos produzidos, é a

reduzida inserção na universidade e nos profissionais possibilitando transformações

efetivas na formação e na condução das suas práticas pedagógicas.

A primeira categoria formação, nos trouxe a compreensão de que, para o

exercício qualificado da docência, é imprescindível, e não pode mais ser adiado, que

seja oferecida formação específica para docência a esses profissionais, aqui

entendida como uma nova profissionalização. Nos parece que, assim, como as

demais profissões, a docência universitária não pode dispensar a aquisição e posse

de conhecimentos específicos sobre a sua função primordial – o ensino.

Como já tratamos anteriormente nesse trabalho, o ingresso desse profissional

bacharel para o exercício da docência acontece mediante o preenchimento de

alguns critérios estabelecidos em editais dos concursos; no entanto, não constam

nesses editais que o candidato deva ter formação ou mesmo experiência em

docência para que seja contratado − a graduação garante o critério do conhecimento

específico da disciplina e o título de mestre e/ou doutor a qualificação necessária.

Vivenciamos um período em que não era comum ouvirmos falar ou sermos

cobrados por uma formação específica para a docência e nem que seria necessário

a realização de formação continuada, inclusive na área específica da formação

inicial (graduação). Atualmente, superado esse período, a exigência pela

qualificação gera um movimento de procura por pós-graduações stricto senso.

Assim, todos os professores entrevistados, já realizaram o mestrado, sendo que a

maioria também possui o doutorado, cumprindo a exigência estabelecida pela lei e

pelas universidades, que foram pressionadas a possuir em seu quadro docente pelo

menos um terço de professores mestres e/ou doutores.

Resolvida essa questão, surge uma outra, a formação específica para a

docência. Essa exigência não parte da universidade, mas faz-se necessária diante

Page 156: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA (PUC-SP) FACULDADE DE ... · CÁCIA CRISTINA FRANÇA REHEM DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E BACHARÉIS DOCENTES: PROCESSOS FORMATIVOS E A PRÁTICA PEDAGÓGICA

155

dos desafios de um novo cenário que revela mudanças do perfil dos alunos, os quais

passaram a ingressar nas universidades, a partir da ampliação do número de vagas,

e por alguns professores insatisfeitos com a sua prática.

Dessa forma, os dados analisados apontam para uma inquietação, por parte

desses docentes, sobre a limitação que possuem para o desenvolvimento da prática

pedagógica, embora tratem a docência como mais uma atividade que pode ser

incluída na sua profissão. Entendem a necessidade de ampliar o repertório sobre a

docência que não foram contemplados na sua formação inicial, nem em sua

experiência profissional, emergindo assim novas reflexões sobre a sua ação. Nessa

linha de pensamento, apesar de acreditarem que conseguem “transmitir

conhecimentos”, a partir da experiência e dos conhecimentos específicos de sua

área de formação e ainda que a docência é um dom ou é inata, já admitem que é

necessária uma formação que amplie os conhecimentos sobre a docência,

ajudando-os a superar uma prática repetitiva, baseada na tentativa e erro e em

modelos vivenciados como alunos.

As investigações sobre a necessidade formativa sinalizam, ao mesmo tempo,

que o fato de serem bacharéis dificulta a sua prática. No entanto, mesmo assumindo

que seria importante ter uma formação em docência, são imprecisos em indicar

quais conhecimentos essa formação deveria oferecer, como essa formação deveria

acontecer, em quais espaços. Referem que o mais importante seria uma formação

que os auxiliassem a resolver os problemas que encontram no momento em que vão

ensinar − ‘modelos’, ‘fórmulas mágicas’.

Outro ponto importante vem a ser a falta de acompanhamento, por parte da

universidade, através dos seus órgãos responsáveis pela docência exercida por

esses professores. Essa atividade é invisível aos olhos da comunidade acadêmica e

não se configura como uma preocupação institucional. Cabe ao professor a escolha

de como conduzirá a sua docência e, caso não aconteçam conflitos com os alunos,

dificilmente o professor será importunado pelas escolhas que faz. Não obstante, a

autonomia tão necessária para o exercício da docência acaba por desmotivar esses

professores, em relação à profissionalização docente, configurando-se, nesse

estudo, como solidão e abandono.

O que encontramos como resultado tem reforçado, para nós, que as

discussões sobre a formação para a docência universitária se encontram restritas a

grupos específicos, visto que a própria legislação não enfatiza a necessidade de

Page 157: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA (PUC-SP) FACULDADE DE ... · CÁCIA CRISTINA FRANÇA REHEM DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E BACHARÉIS DOCENTES: PROCESSOS FORMATIVOS E A PRÁTICA PEDAGÓGICA

156

conhecimentos didático-pedagógicos, teórico/epistemológicos sobre os processos de

ensino-aprendizagem dos docentes que passam a compor os quadros funcionais

dessas instituições.

Ao mesmo tempo que eventos discutem, no mundo e no Brasil, sobre

docência universitária e inovações educacionais, nos parece que são atitudes

pontuais de alguns grupos e opção individual de alguns professores. Esse fato

transparece nos resultados desta pesquisa, haja vista que a maioria dos sujeitos

entrevistados nunca realizou formação específica para a docência e, quando

apontam que realizaram algum tipo de formação para a docência, declaram a

inconsistência e até mesmo a irrelevância desses modelos.

Assumindo a obrigatoriedade dessa formação institucionalmente, tanto no

início da carreira quanto em seu desenvolvimento, entendemos que esses eventos

esporádicos, turísticos, com conteúdo desconectados dos conhecimentos

específicos da docência, não colaboram para a formação e nem tem surtido efeito

para modificar as práticas desses docentes.

A formação deve partir das necessidades dos docentes para um exercício

qualificado da sua prática pedagógica, buscando superar a solidão, o isolamento e a

invisibilidade com que desenvolvem a docência, para isso, deverá ser oferecida uma

formação colaborativa com os seus pares e com o amparo da universidade, como

apresentamos no capítulo anterior. Destarte, faz-se mister uma formação que

oportunize a reflexão e a produção de conhecimentos sobre a docência – o ensinar,

o aprender e a formação do aluno.

Quanto a nossa segunda categoria – prática pedagógica − o seu

desvelamento levou-nos à compreensão de que está estruturada a partir de uma

concepção de docência baseada na “transmissão de conteúdo”. As ações são

executadas centralizadas na figura do professor – o detentor do conteúdo, que

conduz as aulas e orienta a participação dos alunos. Nas observações realizadas

constatamos que esses docentes possuem um repertório limitado sobre os

conhecimentos pedagógicos; o planejamento e a execução das suas ações

acontecem mediante uma rotina estabelecida; alguns elementos que constituem

suas ações se dão mediante o que denominamos de “pedagogia tradicional”.

Decerto, as lacunas existentes na formação profissional desses bacharéis-

docentes incidem na falta de clareza sobre a importância de seu papel social e

educativo visando uma formação cidadã. Há que se considerar que seu

Page 158: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA (PUC-SP) FACULDADE DE ... · CÁCIA CRISTINA FRANÇA REHEM DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E BACHARÉIS DOCENTES: PROCESSOS FORMATIVOS E A PRÁTICA PEDAGÓGICA

157

conhecimento deve partir de uma constante reflexão, de questionamentos sobre a

responsabilidade de sua prática docente, estando em sintonia com as

transformações tecnológicas e sociais, em frequente ressignificação, para que possa

ser um agente transformador perante os discentes.

Nesse sentido, ao respondermos a nossa questão nuclear, podemos

considerar que esses docentes, bacharéis de formação, percorrem um caminho

formativo distante da docência; continuam no seu processo de desenvolvimento

profissional trilhando o caminho da graduação, realizam pós-graduação em suas

áreas de formação inicial e suas publicações e participações em eventos são

também sobre pesquisas nessas áreas, o que impacta de maneira efetiva na prática

pedagógica desenvolvida e na concepção de docência desses docentes.

Buscamos aqui desvelar o caminho formativo e as práticas pedagógicas dos

bacharéis/docentes. No entanto, defendemos como elemento central que somente a

partir da colaboração entre os docentes e do protagonismo da universidade, como

articuladora desse processo, poderemos alterar o cenário encontrado. Outrossim,

podemos considerar que os objetivos desejados foram alcançados e acreditamos

que essa temática complexa ainda dá os primeiros passos nos seus estudos.

Esperamos ter então contribuído com a discussão apontando possibilidades

de alteração desse cenário. Isso posto, desejamos que esse trabalho se constitua

como mais uma fonte de pesquisa para aqueles que, assim como eu, se interessam

por essa complexa temática que se entrelaça com diversas interfaces, a exemplo da

construção da identidade docente, a organização e gestão da universidade enquanto

espaço de formação do fazer docente, aspectos humanos na formação do cidadão e

do professor, os dilemas na construção da carreira docente, a formação continuada

por meio da institucionalização de ações formativas na IES, só para citar algumas.

Ademais, aos que começam essa empreitada sugerimos um feliz começo e uma

caminhada iluminada...

Page 159: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA (PUC-SP) FACULDADE DE ... · CÁCIA CRISTINA FRANÇA REHEM DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E BACHARÉIS DOCENTES: PROCESSOS FORMATIVOS E A PRÁTICA PEDAGÓGICA

158

REFERÊNCIAS

ALMEIDA, Maria Isabel de. A construção da pedagogia universitária no âmbito da Universidade de São Paulo. In: PIMENTA, Selma Garrido; ALMEIDA, Maria Isabel de (Org.). Pedagogia universitária: caminhos para a formação de professores. São Paulo: Cortez, 2011, p. 7-15.

______; PIMENTA, Selma Garrido. Pedagogia universitária: valorizando o ensino e a docência na Universidade de São Paulo. In: ALMEIDA, Maria Isabel de; PIMENTA, Selma Garrido (Org.). Pedagogia universitária. São Paulo: EDUSP, 2009. p. 13-38.

______. Formação do professor do ensino superior: desafios e políticas institucionais. São Paulo: Cortez, 2012.

ALTET, Marguerite. Análise das práticas dos professores e das situações pedagógicas. Porto: Porto Editora, 2000.

AMADO, João (Org.). Manual de investigação em educação. 2. ed. Coimbra: NSG – Novas Soluções Gráficas, S/A.,. 2014.

ANASTASIOU, Léa das Graças Camargos. Construindo a docência no ensino superior: relação entre saberes pedagógicos e saberes científicos. In: ROSA, Dalva E. Gonçalves; SOUSA, Vanilton Camilo de (Org.). Didática e práticas de ensino: interfaces com diferentes saberes e lugares formativos. Rio de Janeiro: DP&A, 2002.

______. A teoria e a prática de processos de formação continuada do docente universitário. In: ALMEIDA, Maria Isabel de; PIMENTA, Selma Garrido (Org.). Pedagogia universitária. São Paulo: EDUSP, 2009. p. 39-70.

______; ALVES, Leonir Pessate. Processos de ensinagem na universidade: pressupostos para as estratégias de trabalho em aula. 7 ed. Joinville, SC: Editora Univille, 2007.

BAIBICH-FARIA, Tânia Maria et al. O espaço da pós-graduação em educação: uma possibilidade de formação do docente em educação superior: culturas e compreensões dos programas de pós-graduação em educação. In: CUNHA, Maria Isabel (Org.). Trajetórias e lugares de formação da docência universitária: da perspectiva individual ao espaço institucional. Araraquara, SP: Junqueira & Marin; Brasília, DF: CAPES: CNPq, 2010.

BASTOS, Carmen Célia B. Correia. Docência, pós-graduação e a melhoria do ensino na universidade: uma relação necessária. Educere et Educare, Cascavel, v. 2, n. 4, p. 103-112, jul./dez. 2007.

BARDIN, Laurence. Análise de conteúdo. Lisboa, Portugal: Edições 70, 1977.

BLANCH, Silvia; CORCELLES, Mariona. Reciprocidades. Sistemas de formación basados en la cooperación entre docentes. In: MONEREO, Carles (Coord.). Enseñando a enseñar en la Universidad. La formación del profesorado basada en

Page 160: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA (PUC-SP) FACULDADE DE ... · CÁCIA CRISTINA FRANÇA REHEM DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E BACHARÉIS DOCENTES: PROCESSOS FORMATIVOS E A PRÁTICA PEDAGÓGICA

159

incidentes críticos. Barcelona: Ediciones Octaedro, 2014. Cap. 6, p. 156-187. (Colección Educación Universitaria).

BEHRENS, Marilda Aparecida. A formação pedagógica e os desafios do mundo moderno. In: MASETTO, M. T. (Org.). Docência na universidade. Campinas, SP. Ed. Papirus, 1998. p.57-68. (Coleção Práxis)

_____. Docência universitária: formação ou improvisação? Educação (UFSM), Santa Maria, p. 441-453, out. 2011. Disponível em: <https://periodicos.ufsm.br/reveducacao/article/view/2976>. Acesso em: 27 jun. 2018.

______. O paradigma emergente e a prática pedagógica. 6. ed. Petropólis/RJ: Vozes, 2013.

BENEDITO, Antolí Vicente; PAVÍA, Vicente Sebastián Ferreres, CERVERÓ, Virginia. La formación universitaria a debate. Análisis de problemas y planteamiento de propuestas para la docencia y la formación del profesorado universitário. Barcelona: Publicacions Universitat de Barcelona, 1995.

BERNHEIM, Carlos Tünnermamm; CHAUÍ, Marilena de Souza. Desafios da universidade na sociedade do conhecimento: cinco anos depois da conferência mundial sobre educação superior. Brasília: UNESCO, 2008. 44p.

BLANCH, Silvia; CORCELLES, Mariona; DURAN, David; Dekhinet, Rayenne y Topping, Keith (2014). “La tutoría entre iguales como estrategia de aprendizaje colaborativo”. Revista de Educación, 363, 191-217.

BOGDAN, Robert C.; BIKLEN, Sari Knopp. Investigação qualitativa em educação: uma introdução à teoria e aos métodos. Porto, Portugal: Porto Editora, 1994.

BOLZAN, Dóris Pires Vargas; MACIEL, Adriana Moreira da Rocha (Org.). Pedagogia Universitária: tecendo redes sobre a educação superior. Santa Maria: Ed. UFSM, 2009.

BRASIL. Presidência da República. Leis de Diretrizes e Bases (LDB) 4.024 de 20 dez. 1961. Fixa as diretrizes e bases da educação nacional. D.O.U. de 27 dez. 1961, p. 11429.

______. Ministério da Educação. Conselho Federal de Educação. Parecer CFE nº 977/1965, aprovado em 3 dez. 1965. Definição dos cursos de pós-graduação. A. Almeida Júnior, Presidente da C. E. Su – Newton Sucupira, relator. – Clóvis Salgado, José Barreto Filho, Maurício Rocha e Silva, Durmeval Trigueiro, Alceu Amoroso Lima, Anísio Teixeira, Valnir Chagas e Rubens Maciel. Solicita ao Conselho pronunciamento sobre a matéria que defina e, se for o caso, regulamente os cursos de pós-graduação a que se refere a letra b do art. 69 da Lei de Diretrizes e Bases. Disponível em: <https://capes.gov.br/images/stories/download/avaliacao/avaliacao-n/Parecer-977-1965.pdf> Acesso em: 20 abr. 2016.

______. Ministério da Educação. Conselho Federal de Educação. Parecer CFE nº 77/69. Nova regulamentação da pós-graduação. Documenta. Brasília: MEC/CFE, n. 98, p. 128-132, dez. 169.

Page 161: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA (PUC-SP) FACULDADE DE ... · CÁCIA CRISTINA FRANÇA REHEM DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E BACHARÉIS DOCENTES: PROCESSOS FORMATIVOS E A PRÁTICA PEDAGÓGICA

160

______. Ministério da Educação e Cultura. I Plano Nacional de Pós-Graduação - PNPG 1975-1979. Brasília: MEC/CNPG/Departamento de Documentação e Divulgação, 1974. Disponível em: <http://www.capes.gov.br/images/stories/download/editais/I_PNPG.pdf>. Acesso em: 12 abr. 2016.

______. II Plano Nacional de Pós-Graduação - PNPG 1982/1985. Brasília: MEC/ SESu/CAPES, 1982. Disponível em: <http://www.capes.gov.br/images/stories/download/editais/II_PNPG.pdf>. Acesso em: 12 abr. 2016.

______. III Plano Nacional de Pós-Graduação - PNPG 1986 – 1989. Brasília: MEC/SESu/CAPES, 1986. Disponível em: <http://www.capes.gov.br/images/stories/download/editais/III_PNPG.pdf>. Acesso em: 12 abr. 2016.

______. Presidência da República. Decreto 94.664, de 23 de julho de 1987. Aprova o Plano Único de Classificação e Retribuição de Cargos e Empregos de que trata aLei nº 7.596, de 10 de abril de 1987. D.O.U. de 24 jul. 1987, p. 11768.

______. Presidência da República. Lei nº 9.396/96 de dezembro de 1996. Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDBEN). Estabelece as diretrizes e bases da educação nacional. D.O.U. de 23 dez. 1996, p. 27833.

______. Ministério da Educação/FORGRAD - Fórum de Pró-Reitores de Graduação das Universidades Brasileiras. Plano Nacional de Graduação – Um projeto em construção. 1999. Texto apreciado e aprovado no XII Fórum Nacional de Pró-Reitores de Graduação das Universidades Brasileiras, realizado na cidade de Ilhéus/BA, em maio de 1999. Disponível em: <http://portal.mec.gov.br/sesu/arquivos/pdf/png.pdf>. Acesso em: 19 jun. 2017.

______. Ministério da Educação. Coordenação de Pessoal de Nível Superior. V Plano Nacional de Pós-Graduação - PNPG 2005-2010. Brasília: MEC/CAPES, 2004. Disponível em: <http://www.capes.gov.br/images/stories/download/editais/PNPG_2005_2010.pdfAcesso em: 12 abr. 2016.

______. Ministério da Educação. Coordenação de Pessoal de Nível Superior. Plano Nacional de Pós-Graduação 2011-2020 - PNPG 2011-2020. Brasília, DF: CAPES, 2010. v. 1. Disponível em: <http://www.capes.gov.br/images/stories/download/Livros-PNPG-Volume-I-Mont.pdf>. Acesso em: 12 fev. 2016.

______. Plano Nacional de Pós-Graduação 2011-2020 - PNPG 2011-2020. Brasília, DF: CAPES, 2010. v. 2. Disponível em: <http://www.capes.gov.br/images/stories/download/PNPG_Miolo_V2.pdf>. Acesso em: 12 fev. 2016.

______. Projeto de Lei n. 867 de 2015 (da Câmara dos Deputados) do Deputado Izalci PSDB/DF. Inclui, entre as diretrizes e bases da educação nacional, o

Page 162: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA (PUC-SP) FACULDADE DE ... · CÁCIA CRISTINA FRANÇA REHEM DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E BACHARÉIS DOCENTES: PROCESSOS FORMATIVOS E A PRÁTICA PEDAGÓGICA

161

"Programa Escola sem Partido". 2015. Disponível em: <http://www.camara.gov.br/sileg/integras/1317168.pdf> Último acesso: 27 jun. 2017.

______. Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep). MEC e Inep divulgam dados do Censo da Educação Superior 2016. Assessoria de Comunicação. 31 ago. 2017. Disponível em: <http://portal.inep.gov.br/artigo/-/asset_publisher/B4AQV9zFY7Bv/content/mec-e-inep-divulgam-dados-do-censo-da-educacao-superior-2016/21206>. Acesso em: 10 no. 2017.

BUCKLEY, Roger; CAPLE, Jim. La formación: teoría y práctica. Madrid: Ediciones Díaz de Santos, 1991.

BURBULES, Nicholas C.; TORRES, Carlos Alberto. Globalização e educação: uma introdução. In: ______. Globalização e educação: perspectivas críticas. Trad. Ronaldo Cataldo Costa. Porto Alegre: Artmed, 2004.

CARR, Wilfred; KEMMIS, Stephen. Teoria crítica de la ensenanza: la investigación en la formación del profesorado. Trad. De J. Bravo. Barcelona: Martínez Roca S.A. 1988.

CHARLIER, Bernadette. A troca e a partilha das práticas de ensino como elemento central no desenvolvimento profissional dos professores. In: FLORES, Maria Assunção (Org.) Formação e desenvolvimento profissional dos professores: contributos internacionais. Coimbra: Edições Almedina S.A, 2014.

CID SABUCEDO, Alfonso; ZABALZA CERDEIRIÑA, María Ainoa; DOVAL RUÍZ, María Isabel. La docencia universitaria: Un modelo para su análisis. REDU. Revista de Docencia Universitaria, [S.l.], v. 10, n. 1, p. 87-104, abr. 2012. ISSN 1887-4592. Disponible en: <https://polipapers.upv.es/index.php/REDU/article/view/6123>. Acesso em: 09 jul. 2018.

CHIZZOTTI, Antonio. Pesquisa qualitativa em ciências humanas e sociais: evolução e desafios. Revista Portuguesa de Educação, Braga, Portugal, v. 16, n. 002, p. 221-236, 2003.

______. Pesquisa qualitativa em ciências humanas e sociais. Petrópolis, RJ: Vozes, 2006.

CONTRERAS, José. A autonomia dos professores. São Paulo: Editora Cortez, 2012.

CORRÊA, Adriana Katia. Formação pedagógica de docentes universitários: aspectos teóricos e práticos. In: PIMENTA, Selma Garrido; ALMEIDA, Maria Isabel de (Org.). Pedagogia universitária: caminhos para a formação de professores. São Paulo: Cortez, 2011. p. 75-100.

CORRÊA, Guilherme Torres; RIBEIRO, Victória Maria Brant. A formação pedagógica no ensino superior e o papel da pós-graduação stricto sensu. Educ. Pesqui., São Paulo, v. 39, n. 2, p. 319-334, abr./jun. 2013.

Page 163: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA (PUC-SP) FACULDADE DE ... · CÁCIA CRISTINA FRANÇA REHEM DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E BACHARÉIS DOCENTES: PROCESSOS FORMATIVOS E A PRÁTICA PEDAGÓGICA

162

CRUZ TOMÉ, Maria África de la. Formación inicial del profesor universitario: fundamentación teórica y experiencias en la Universidad Autónoma de Madrid. Revista de Enseñanza Universitaria, n. 7-8, p. 11-31, jun./dez. 1994.

CUNHA, Maria Isabel. Formatos avaliativos e concepção de docência. Campinas, SP: Autores Associados, 2005.

______. O espaço de formação da docência universitária em programas de pós-graduação em educação na perspectiva de egressos. In: CUNHA, Maria Isabel (Org.). Trajetórias e lugares de formação da docência universitária: da perspectiva individual ao espaço institucional. Araraquara, SP: Junqueira & Marin, Brasília, DF: CAPES: CNPq, 2010a.

______. A docência como ação Complexa. In: CUNHA, Maria Isabel (Org.). Trajetórias e lugares de formação da docência universitária: da perspectiva individual ao espaço institucional. Araraquara, SP: Junqueira & Marin; Brasília, DF: CAPES: CNPq, 2010b.

_____. Trajetória e lugares da formação do docente da educação superior: do compromisso individual à responsabilidade institucional. In: REUNIÃO ANUAL DA ANPED, 2009, Caxambu. Anais... Caxambu/MG: ANPED, 2009. p. 1-13.

D’ÁVILA, Cristina. Trilhas percorridas na formação de professores: da epistemologia da prática à fenomenologia existencial. In: VEIGA, Ilma Passos A.; D’ÁVILA, Cristina (Org.). Profissão Docente: novos sentidos, novas perspectivas. Campinas, SP: Papirus, 2008, p. 23-44.

DAY, Christopher. Desenvolvimento profissional dos professores: os desafios da aprendizagem permanente. Porto: Porto Editora, 2001.

DENZIN, Norman K.; LINCOLN, Yvonna S. O planejamento da pesquisa qualitativa: teorias e abordagens. Tradução Sandra Regina Netz. Porto Alegre: Artmed, 2006.

DINIZ-PEREIRA, Júlio Emílio. Da racionalidade técnica à racionalidade crítica: formação docente e transformação social. Perspectivas em diálogo. Revista de Educação e Sociedade. v. 01, jan/jun. 2014.

______; ZEICHNER, Kenneth M. A pesquisa na formação e no trabalho docente. 2. ed. Belo Horizonte: Autêntica Editora (edição digital), 2012.

FERNANDES, Cleoni Maria Barboza. Formação do professor universitário: tarefa de quem? In: MASETTO, Marcos T. (Org). Docência na universidade. Campinas, SP: Papiros, 1998. p. 95-112.

FERRY, G. El trayeto de la formación. Madrid: Paidós, 1991.

FLORES, Maria Assunção. Discursos do profissionalismo docente: paradoxos e alternativas conceituais. Revista Brasileira de Educação, v. 19, n. 59 out-dez. 2014a.

Page 164: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA (PUC-SP) FACULDADE DE ... · CÁCIA CRISTINA FRANÇA REHEM DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E BACHARÉIS DOCENTES: PROCESSOS FORMATIVOS E A PRÁTICA PEDAGÓGICA

163

______. Formação e desenvolvimento profissional de professores: contributos internacionais. Coimbra: Almedina, 2014b. (Coleção de Ciências da Educação e Pedagogia).

FRANCO, Maria Amélia Santoro; LISITA, Verbena Moreira S. de Sousa. Pesquisa-ação: limites e possibilidades na formação docente. In: PIMENTA, Selma Garrido; FRANCO, Maria Amélia Santoro. (Org.). Pesquisa em Educação: possibilidades investigativas/formativas da pesquisa-ação II. São Paulo: Edições Loyola, 2008.

FREIRE, Paulo. Pedagogia da Autonomia: saberes necessários à prática educativa. 7. ed. São Paulo: Paz e Terra, 1998.

GAETA, Cecília; MASETTO, Marcos T. O professor iniciante no ensino superior: aprender, atuar e inovar. São Paulo: Editora SENAC São Paulo, 2013.

GARCIA, Carlos Marcelo. Formação de professores: para uma mudança educativa. Porto: Porto Editora, 1999.

______. Desenvolvimento profissional docente: passado e futuro. Sísifo: revista de ciências da educação, Lisboa, n. 8, p. 7-22, jan./abr. 2009. Disponível em: <https://idus.us.es/xmlui/handle/11441/29247?show=full>. Acesso em: 26 set. 2016.

GAUTHIER, Clermont et al. Por uma teoria da Pedagogia: pesquisas contemporâneas sobre o saber docente. Trad. Francisco Pereira de Lima. Ijuí: Ed. Unijuí, 2013.

GIMENO SACRISTÁN, J. Consciência e ação sobre a prática como libertação profissional dos professores. In: NÓVOA, António. (Org.). Profissão professor. 2. ed. Porto: Porto Editora, 1995. p.63-92.

GONZÁLEZ SOTO, Angel Pío. Proyecto docente. Didáctica y Organización escolar. Barcelona: Departamento de Pedagogía, Universidad de Barcelona, 1989.

HARGREAVES, Andy. O ensino na sociedade de conhecimento: educação na era da insegurança. Trad. Roberto Cataldo Costa. Porto Alegre: Artmed, 2004.

HUBERMAN, Michaël. O ciclo de vida profissional dos professores. In: NÓVOA, Antonio. (Org.). Vidas de professores. 2. ed. Porto: Porto, 2000. p. 31-61. (Ciências da Educação - V. 4).

IMBERNÓN, Francisco. La formación y el desarrollo profesional del profesorado: hacia uma nueva cultura profesional. 3. ed. Barcelona: Editorial Graó, 1998. (Serie Formacón y desarrollo professional del professorado).

______. Formação docente e profissional: forma-se para a mudança e a incerteza. Tradução de Silvana Cobucci Leite. 9. ed. São Paulo: Cortez, 2011. (Coleção Questões da nossa época, v. 14).

ISAIA, Margarida do Amaral Silva. Desafios à docência superior: pressupostos a considerar. In: RISTOFF, Dilvo; SEVEGNANI, Palmira (Org.). Docência na educação superior. Brasília: INEP, 2006. p. 63-84. – (Coleção Educação Superior em Debate; v. 5).

Page 165: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA (PUC-SP) FACULDADE DE ... · CÁCIA CRISTINA FRANÇA REHEM DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E BACHARÉIS DOCENTES: PROCESSOS FORMATIVOS E A PRÁTICA PEDAGÓGICA

164

KINCHELOE, Joe L. A formação do professor como compromisso político: mapeando o pós-moderno. Porto Alegre: Artmed, 1997.

______. Ser docente em uma sociedade compleja: la difícil tarefa de enseñar. São Paulo: Editora Cortez; Barcelona: Editorial Graó, 2017.

KUENZER, Acácia. Z. Conhecimento e competência no trabalho e na escola. Boletim Técnico do Senai, v. 13, n. 1, 2003.

LARROSA, Jorge. Nietzsche & a Educação. Trad. Semíramis Gorini da Veiga. 3. ed. Belo Horizonte: Autêntica, 2009.

LIZARRAGA, María Luisa Sanz de Acedo. Competencias cognitivas em educación superior. Madrid: Narcea Ediciones, 2010.

LÜDKE, Menga; ANDRÉ, Marli E.D.A. Pesquisa em educação: abordagens qualitativas. São Paulo: EPU, 1986. (Temas básicos de educação e ensino).

MACIEL, Adriana M. da Rocha. O processo formativo do professor no ensino superior: em busca de uma ambiência (trans.) formativa. In: ISAIA, Silvia Maria de Aguiar; BOLZAN, Doris Pires Vargas; MACIEL, Adriana M. da Rocha. (Org.). Pedagogia universitária: tecendo redes sobre a educação superior. Santa Maria: Editora UFSM, 2009, v. 01, p. 63-77.

MAGER, R. F. A formulação de objetivos de ensino. 7. ed. Porto Alegre: Globo, 1987.

MAS TORELLÓ, Òscar. El professor universitario: sus competencias y formación. Profesorado. Revista de Curriculum y Formación del Profesorado, v. 15, n. 3, p. 195-211, jan. 2011.

______; TEJADA FERNÁNDEZ, José. Funciones y competencias de la docencia universitaria. Madrid: Editorial Sintesis, 2013.

MASETTO, Marcos Tarcísio (Org.). Docência na universidade. Campinas, SP: Papirus, 1998. (Coleção Práxis Universitária).

_____. Professor universitário: um profissional da educação na atividade docente. In: MASETTO, Marcos Tarciso (Org.). Docência universitária. 10. ed. Campinas: Papirus, 2009. p. 9-26.

______. O professor na hora da verdade: a prática docente no ensino no ensino superior. São Paulo: Avercamp, 2010.

______. Inovação no ensino superior. São Paulo: Edições Loyola, 2012a.

______. Competência pedagógica do professor universitário. São Paulo: Summus, 2012b.

MASETTO, Marcos Tarcísio; GAETA, Cecília. Os desafios para a formação dos professores do ensino superior. Revista Triângulo, v. 8, n.2. p. 04-13, 2015.

Page 166: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA (PUC-SP) FACULDADE DE ... · CÁCIA CRISTINA FRANÇA REHEM DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E BACHARÉIS DOCENTES: PROCESSOS FORMATIVOS E A PRÁTICA PEDAGÓGICA

165

MESQUITA, Elza; MACHADO, Joaquim. Formação inicial de professores em Portugal: evolução e desafios. In: SHIGUNAV NETO Alexandre; FORTUNATO, Ivan (Org.). Educação superior e formação de professores: questões atuais. Edições São Paulo: Edições Hipótese. p. 97-115.

MIZUCAMI, Maria das Gracas Nicoletti. Ensino as abordagens do processo. São Paulo. Editora EPU, 1986.

MOITA, Maria da Conceição. Percursos de formação e de trans-formação. In: NÓVOA, António (Org.). Vidas de professores. Porto: Porto, 2000. p.111-140.

MONTERO, Lourdes. A construção do conhecimento profissional docente. Lisboa: Horizontes Pedagógicos, 2001.

MOROSINI, Marília Costa (Org.). Professor do ensino superior: identidade, docência e formação. Brasília: Instituto Nacional de Estudos e Pesquisadores Educacionais, 2000. 80 p.

NÓVOA, António. Formação de professores e profissão docente. In: ______ (Org.). Os professores e a sua formação. 2. ed. Lisboa: Publicações Dom Quixote, 1995a. p. 15-33.

______. O passado e o presente dos professores. In: _______. Profissão professor. Porto: Porto Editora, 1995b. p. 13-34.

______. Os professores e as histórias de sua vida. In: ____ (Org.). Vida de professores. Porto: Porto Editora, 2000.

OLIVEIRA, Lúcia. A acção-investigação e o desenvolvimento profissional dos professores: um estudo no âmbito da formação contínua. In: SÁ CHAVES, Idália (org.). Percursos de formação e desenvolvimento profissional. Porto: Porto Editora, 1997, p. 92-105.

PEREIRA, Elizabete Monteiro de Aguiar. Muito mais que adestramento. Docência na universidade ultrapassa preparação para mundo do trabalho. Ensino Superior Unicamp. Rev. trimestral da Universidade Estadual de Campinas. 28 jul. 2015. Disponível em: <https://www.revistaensinosuperior.gr.unicamp.br/artigos/docencia-na-universidade-ultrapassa-preparacao-para-mundo-do-trabalho>. Acesso em: 11 dez. 2017.

PÉREZ GÓMEZ, Angel. O pensamento prático do professor: a formação do professor como profissional reflexivo. In: NÓVOA, António (Org.). Os professores e sua formação. Lisboa: Publicações Dom Quixote, 1995, p. 93-114.

PERRENOUD, Philippe. Práticas pedagógicas, profissão docente e formação: perspectivas sociológicas. Lisboa: Publicações Dom Quixote, 1993.

PIMENTA, Selma Garrido; ALMEIDA, Maria Isabel de. A construção da pedagogia universitária no âmbito da Universidade de São Paulo. In: ______ (Org.). Pedagogia universitária: caminhos para a formação de professores. São Paulo: Cortez, 2011. p. 19-43.

Page 167: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA (PUC-SP) FACULDADE DE ... · CÁCIA CRISTINA FRANÇA REHEM DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E BACHARÉIS DOCENTES: PROCESSOS FORMATIVOS E A PRÁTICA PEDAGÓGICA

166

______; ANASTASIOU, Léa das Graças Camargos. Docência no ensino superior. São Paulo: Cortez, 2008. (Coleção Docência em Formação).

POPKEWITZ, Thomas S. Profissionalização e formação de professores: algumas notas sobre a sua história, ideologia e potencial. In: NÓVOA, António (Coord.). 2. ed. Os professores e a sua formação. Lisboa: Publicações Dom Quixote, 1995. p. 35-50.

POZO, Ignácio Juan. Aprendizes e mestres: a nova cultura da aprendizagem. Porto Alegre: Artmed, 2008.

______; MONEREO, Carles. Introducción: la nueva cultura del aprendizaje universitario o por qué cambiar nuestras formas de enseñar y aprender. In: POZO, IGNÁCIO Juan; PÉREZ ECHEVERRÍA, Maria del Puy (Coord.). Psicologia del aprendizaje universitario: la formación en competencias. Madrid: Ed. Morata, 2009.

PUENTES, Roberto Valdés; AQUINO, Orlando Fernandéz; QUILLICI NETO, Armindo. Profissionalização dos professores: conhecimentos, saberes e competências necessários à docência. Educar, Curitiba, n. 34, p. 169-184, 2009.

REHEM, Cácia Cristina França. A avaliação da aprendizagem no ensino superior: práticas avaliativas do Curso de Pedagogia-UESB – Campus de Jequié. 2008. Dissertação (Mestrado em Educação) – Universidade Federal de São Luís, São Luís, 2008. https://tedebc.ufma.br/jspui/handle/tede/tede/146

ROLDÃO, Maria do Céu Neves. Profissionalidade docente em análise – especificidades dos ensinos superior e não superior. Nuances: estudos em Educação, ano XI, v. 12, n. 13, jan/dez. 2005.

RUIZ, Cristina Mayor. Las funciones del profesor universitario analizadas por sus protagonistas. Un estudio atendiendo al grupo de titulación y los años de experiencia, en la Universidad de Sevilla. Relieve, v. 2, n. 1. Disponível em: <https://www.uv.es/RELIEVE/v2n1/RELIEVEv2n1.htm>. Acesso em: 26 jul. 2016.

SANTOS, Boaventura de Souza. Um discurso sobre as ciências. São Paulo: Cortez, 2003.

SANTOS, Cássio Miranda. Tradições e contradições da pós-graduação no Brasil. Educação e Sociedade, Campinas, v. 24, n. 83, p. 627-641, ago. 2003.

SCHÖN, Donald A. Formar professores como profissionais reflexivos. In: NÓVOA, António (Org.). Os professores e a sua formação. 2. ed. Lisboa: Publicações Dom Quixote. Portugal, 1995.

SCHUMANN, Lee S. Conocimientos y ensinanza: fundamentos de la nueva reforma. Revistas de Curriculun y formación del professorado, v. 9, n. 2, 2005.

SHEIBE, Leda. A formação pedagógica do professor licenciado – contexto histórico. Florianópolis: Perspectiva, CED, 1983.

Page 168: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA (PUC-SP) FACULDADE DE ... · CÁCIA CRISTINA FRANÇA REHEM DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E BACHARÉIS DOCENTES: PROCESSOS FORMATIVOS E A PRÁTICA PEDAGÓGICA

167

SILVA, Maria de Lourdes. A docência é uma ocupação ética. In: ESTRELA, M. Tereza (Org.) Viver e construir a profissão docente. Porto: Porto Editora, 1997. p. 161-190.

SOARES, Sandra Regina. Revisitando os marcos legais: a pós-graduação em educação e a formação de professores universitários: o caso da Bahia. In: CUNHA, Maria Isabel da (Org.) Trajetórias e lugares de formação da docência universitária: da perspectiva individual ao espaço institucional. Araraquara/SP: Junqueira & Marins Editores, 2010. p. 223-242.

______; CUNHA, Maria Isabel da. Programas de pós-graduação em educação: lugar de formação da docência universitária? Revista Brasileira de Pós-Graduação, Brasília, v. 7, n. 14, p. 577-604, dez. 2010a.

______. Formação do professor: a docência universitária em busca de legitimidade. Salvador. EDUFBA, 2010b.

TARDIF, Jacques. Se o professorado universitário fosse uma profissão. In: CUNHA Maria Isabel da; SOARES Sandra Regina; RIBEIRO, Marinalva Lopes. (Org.) Docência universitária: profissionalização e práticas educativas. Feira de Santa, BA: Editora UEFS, 2009.

TAVARES, José. Formação e inovação no ensino superior. Porto: Porto Editora, 2003.

TORRES, Alda Roberta; ALMEIDA. Maria Isabel de. Formação de professores e suas relações com a pedagogia para a educação superior. Formação Docente. Rev. Bras. de Pesq. sobre Formação Docente. Belo Horizonte, v. 05, n. 08, p. 11-22, jan./jun. 2013.

UESB - Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia. Regimento Geral. Disponível em: <http://www.uesb.br/consu/ANEXO_REGIMENTO_UESB.pdf>. Acesso em: 10 jan. 2016.

VEIGA, Ilma Passos Alencastro. Docência como atividade profissional. In: ______; D’Ávila. Cristina (Org.). Profissão docente: novos sentidos, novas perspectivas. Campinas, SP. Papirus, 2008. p. 13-21.

YIN, Robert K. Estudo de caso: planejamento e métodos. Porto Alegre: Bookman, 2006.

ZABALZA, Miguel. Competencias docentes del professorado universitário: calidad y desarrollo professional. Madrid: Narcea Ediciones, 2003.

________. O ensino universitário: seu cenário e seus protagonistas. Trad. Ernani Rosa. Porto Alegre: Artmed, 2004.

_____. O estágio e as práticas em contextos profissionais na formação universitária. São Paulo: Cortez, 2014.

Page 169: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA (PUC-SP) FACULDADE DE ... · CÁCIA CRISTINA FRANÇA REHEM DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E BACHARÉIS DOCENTES: PROCESSOS FORMATIVOS E A PRÁTICA PEDAGÓGICA

168

APÊNDICES

Page 170: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA (PUC-SP) FACULDADE DE ... · CÁCIA CRISTINA FRANÇA REHEM DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E BACHARÉIS DOCENTES: PROCESSOS FORMATIVOS E A PRÁTICA PEDAGÓGICA

169

APÊNDICE A – TERMO DECONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO

Termo de Consentimento Livre e Esclarecido

TÍTULO DO PROJETO: Docência Universitária e bacharéis: processos formativos e a prática pedagógica

PESQUISADOR RESPONSÁVEL:

CÀCIA CRISTINA FRANÇA REHEM

DESCREVER ABAIXO AS INFORMAÇÕES DADAS AOS PARTICIPANTES SOBRE: 1) A justificativa e o objetivo da pesquisa;2) Os procedimentos que serão utilizados e seu propósito, bem como a identificação

dos procedimentos que são experimentais;3) Os desconfortos e riscos esperados;4) Os benefícios que se pode obter.5) As informações supracitadas devem ser redigidas em termos simples conhecidos

pelos participantes e de forma que possam entender:

A CADA PARTICIPANTE SERÁ DITO QUE: Temos por objetivo: investigar a docência exercida por bacharéis/docentes a

partir da análise da concepção de ensino e aprendizagem que esses

possuem, bem como, identificar os elementos que são mobilizados no

desenvolvimento da prática pedagógica.

Serão realizadas entrevistas, observações em sala de aula, gravações em

vídeo dessas aulas, discussões individuais e coletivas e formação em grupo.

Não vemos a possibilidade de desconforto e/ou riscos na pesquisa, uma vez

que a participação dos sujeitos foi resultado de um convite, não é obrigatória,

poderá ser interrompida a qualquer momento e ninguém sofrerá nenhum

prejuízo por não participar. Inclusive o nome dos participantes não será

revelado, garantindo-se o anonimato dos participantes.

Os resultados serão usados para dar continuidade ao processo de formação

dos docentes da Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia (USB) e

incentivar o desenvolvimento da formação de professores de outras IES da

região.

Page 171: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA (PUC-SP) FACULDADE DE ... · CÁCIA CRISTINA FRANÇA REHEM DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E BACHARÉIS DOCENTES: PROCESSOS FORMATIVOS E A PRÁTICA PEDAGÓGICA

170

Caso os resultados venham a ser publicados, não incidirá custos para

nenhum dos participantes. PARA ESTABELECER CONTATO COM A PESQUISADORA PRINCIPAL: Profa. MS. Cácia Cristina França Rehem

Fone: (73) 99121-9142 Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia Departamento de Ciências Humanas e Letras Rua José Moreira Sobrinho, s/n, Jequiezinho, Jequié – BA

Eu _____________________________________________________________________ Abaixo assinado, tendo recebido as informações acima, concordo em participar e estou ciente: 1) Da garantia de receber a resposta a qualquer pergunta ou esclarecimento a

qualquer dúvida acerca dos procedimentos, que serão utilizados na coleta de

dados.

2) Da liberdade de retirar meu consentimento a qualquer momento e deixar de

participar no estudo sem que isso traga prejuízo à minha condição de docente

desta instituição.

3) Da segurança de que não serei identificado e que será mantido o caráter

confidencial da informação relacionada com a minha privacidade;

4) Do compromisso de me proporcionarem informação atualizada durante o estudo,

ainda que esta possa afetar minha vontade de continuar participando;

Jequié (BA), 01 de setembro de 2016

Assinatura do Participante

Page 172: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA (PUC-SP) FACULDADE DE ... · CÁCIA CRISTINA FRANÇA REHEM DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E BACHARÉIS DOCENTES: PROCESSOS FORMATIVOS E A PRÁTICA PEDAGÓGICA

171

APÊNDICE B – INSTRUMENTOS DE COLETA DE DADOS

OBSERVAÇÃO DIRECIONADA DAS AULAS

1º momento – observação direta

A aula – planejamento/execução/avaliação.

Através da entrevista com o uso do questionário pré-aula, buscamos ter acesso ao processo de planejamento da aula.

2º momento – realização da entrevista (pré-aula).

3º momento - Observação das aulas (filmagem)

Acompanhamento da execução das aulas, o início, a metodologia escolhida, a

relação professor-aluno, concepções presentes na execução da aula

4º momento – realização da entrevista (pós-aula).

Buscamos comprovar a partir da entrevista com o uso do questionário pós-

aula, o sentimento do professor sobre a aula dada e o que ocorreu de acordo

com o planejamento e o que foi necessário mudar.

Page 173: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA (PUC-SP) FACULDADE DE ... · CÁCIA CRISTINA FRANÇA REHEM DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E BACHARÉIS DOCENTES: PROCESSOS FORMATIVOS E A PRÁTICA PEDAGÓGICA

172

QUESTIONÁRIO DE ENTREVISTA

Entrevista semiestruturada

Questões orientadoras.

Categoria: Formação

1. Qual sua formação acadêmica? Em qual área? Possui especialização/mestrado e ou doutorado? Em qual área?

2. Exerce outra atividade profissional, além da docência? 3. Se sim para a questão anterior como divide o seu tempo entre as duas

atividades? 4. Como chegou à docência? Em que momento da sua carreira? Quanto tempo

exerce à docência? 5. Sua formação anterior na graduação, contribuiu para o exercício da docência? 6. Se sim em que aspectos? 7. Que tipo de formação você acredita que auxiliaria na sua prática docente? 8. Teve oportunidade durante sua docência de realizar algum curso de formação

pedagógica ou atividades desse gênero? Se sim, como avalia a experiência? 9. Das suas atividades realizadas na universidade, qual a que você mais gosta e

por que? 10. Ao assumir a função de docente na universidade como foi seu acolhimento e

quais mecanismos foram oferecidos pela PROGRAD, Departamento, colegiado, área que lhe possibilitasse compreender como seria o exercício da sua atividade como docente?

11. A universidade lhe propicia momentos e atividades para o exercício da docência? Em que frequência?

Categoria: Docência

12. O que é docência? 13. Você se define como docente? 14. Se sim. Quais atividades desenvolvidas por você que possam ser

consideradas como atividades da docência? 15. Quais competências e habilidades são necessárias para o desenvolvimento

da docência? Essas competências são adquiridas de que forma e em que espaços?

Page 174: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA (PUC-SP) FACULDADE DE ... · CÁCIA CRISTINA FRANÇA REHEM DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E BACHARÉIS DOCENTES: PROCESSOS FORMATIVOS E A PRÁTICA PEDAGÓGICA

173

Categoria: Prática Educativa

11. O que concebe por ensino? E por aprendizagem?12. A partir de seu trabalho docente, como você descreve sua atividade de

ensinar e a atividade do aluno de aprender?13. Nessa perspectiva, quais recursos materiais devem ser mobilizados para que

o ensino e a aprendizagem aconteçam?14. Como planeja as suas aulas?15. Existe preocupação com a definição dos objetivos de aprendizagem para

seus alunos?16. Como você organiza os conteúdos de sua disciplina?17. Como escolhe a metodologia para que seus alunos aprendam?18. Você acha que seus alunos aprendem em sua aula? Como verifica isso?

Como você avalia seus alunos? O que você faz com o resultado dasavaliações?

19. Como se relaciona com os seus alunos? E qual o papel deles na sua aula?20. O que entende por prática pedagógica? Dê exemplos de suas práticas

pedagógicas e como as escolhe para suas aulas. E qual a importância quepossui na relação entre ensino e aprendizagem?

21. Quais dificuldades ou necessidades que você apontaria para a elaboração eexecução da sua atividade de ensino?

22. Qual seria a forma mais adequada para que esses temas fossem tratadospela Universidade?

Page 175: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA (PUC-SP) FACULDADE DE ... · CÁCIA CRISTINA FRANÇA REHEM DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E BACHARÉIS DOCENTES: PROCESSOS FORMATIVOS E A PRÁTICA PEDAGÓGICA

174

ROTEIRO PARA A FILMAGEM

Elementos a serem observados:

O roteiro foi estruturado com base nos seguintes momentos: 1.A chegada dos professores e alunos;2. o início da aula (introdução); 3. o seu desenvolvimento (metodologia – participação dos alunos – organização do tempo) 3. e as atitudes e concepções pedagógicas presentes nas práticasobservadas

Entrevista para a filmagem da aula.

Pré-gravação.

Nome:

Data da gravação:

1. Que objetivos estabeleceu para esta aula?

2. Qual temática será tratada?

3. Que metodologias vai utilizar, porque as escolhestes?

4. Como pretende envolver os alunos na aula?

Pós-gravação?

1. Que achou de maneira geral do desenvolvimento da tua aula?

2. É comum para você realizar reflexões antes e depois das aulas? Se sim como

você faz isso e com que frequência?

Page 176: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA (PUC-SP) FACULDADE DE ... · CÁCIA CRISTINA FRANÇA REHEM DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E BACHARÉIS DOCENTES: PROCESSOS FORMATIVOS E A PRÁTICA PEDAGÓGICA

175

ANEXOS

Page 177: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA (PUC-SP) FACULDADE DE ... · CÁCIA CRISTINA FRANÇA REHEM DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E BACHARÉIS DOCENTES: PROCESSOS FORMATIVOS E A PRÁTICA PEDAGÓGICA

176

ANEXO A – AUTORIZAÇÃO PARA REALIZAÇÃO DE PESQUISA

Page 178: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA (PUC-SP) FACULDADE DE ... · CÁCIA CRISTINA FRANÇA REHEM DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E BACHARÉIS DOCENTES: PROCESSOS FORMATIVOS E A PRÁTICA PEDAGÓGICA

177

ANEXO B – PARECER DE MÉRITO PELO COMITÊ

Page 179: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA (PUC-SP) FACULDADE DE ... · CÁCIA CRISTINA FRANÇA REHEM DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E BACHARÉIS DOCENTES: PROCESSOS FORMATIVOS E A PRÁTICA PEDAGÓGICA

178

Page 180: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA (PUC-SP) FACULDADE DE ... · CÁCIA CRISTINA FRANÇA REHEM DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E BACHARÉIS DOCENTES: PROCESSOS FORMATIVOS E A PRÁTICA PEDAGÓGICA

179

Page 181: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA (PUC-SP) FACULDADE DE ... · CÁCIA CRISTINA FRANÇA REHEM DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E BACHARÉIS DOCENTES: PROCESSOS FORMATIVOS E A PRÁTICA PEDAGÓGICA

180

ANEXO C − PARECER 1906.979 CONSELHO DE ÉTICA PUC/SP

Page 182: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA (PUC-SP) FACULDADE DE ... · CÁCIA CRISTINA FRANÇA REHEM DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E BACHARÉIS DOCENTES: PROCESSOS FORMATIVOS E A PRÁTICA PEDAGÓGICA

181

Page 183: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA (PUC-SP) FACULDADE DE ... · CÁCIA CRISTINA FRANÇA REHEM DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E BACHARÉIS DOCENTES: PROCESSOS FORMATIVOS E A PRÁTICA PEDAGÓGICA

182

ANEXO C – PARECER 2065.019 CONSELHO DE ÉTICA UESB

Page 184: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA (PUC-SP) FACULDADE DE ... · CÁCIA CRISTINA FRANÇA REHEM DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E BACHARÉIS DOCENTES: PROCESSOS FORMATIVOS E A PRÁTICA PEDAGÓGICA

183