polÍtica tributÁria brasileira no perÍodo de 2003 a 2015 ... · no debate sobre as políticas...
TRANSCRIPT
Vitória da Conquista, Bahia, 02 à 07 de outubro de 2017
XVI Semana de Economia e II Encontro de Egressos de Economia da UESB
1
POLÍTICA TRIBUTÁRIA BRASILEIRA NO PERÍODO DE 2003 A 2015: ANÁLISE
DA REGRESSIVIDADE POR BASE DE INCIDÊNCIA
Modalidade: Artigo Completo
GT 2: Economia Brasileira, Macroeconomia e Economia Internacional
Jonathan Izaias Vieira Lopes1
Marco Antônio Araújo Longuinhos2
Resumo
O presente trabalho consiste em apresentar a evolução do sistema tributário brasileiro e as
principais políticas tributárias adotadas nos governos de Lula (2003-2010) e Dilma Roussef
(2011-2016). Analisa-se a arrecadação tributária, no período 2003 a 2015, incidente sobre
renda, bens e serviços, folha de salário, propriedade e transações financeiras a fim de
identificar a regressividade do sistema brasileiro.
Palavras-chave: sistema tributário brasileiro – regressividade – políticas tributárias
1. Introdução
O sistema tributário, especificamente a carga tributária, é um dos assuntos que mais
assusta e preocupa a maioria dos brasileiros. No debate sobre as políticas sociais a tributação
tem recebido pouco destaque no Brasil, a discussão se concentra quase que integralmente na
repartição da despesa e na eficácia dos gastos público. Candidatos a cargos públicos sempre
pautam em suas campanhas a reforma tributária como prioridade de suas gestões, entretanto, o
que se vê são medidas pontuais, como reduções de impostos por curtos períodos de tempo
com o objetivo de estimular a economia no sentido de aumentar renda e elevar o consumo.
1 Pós-Graduando em Finanças e Controladoria pela UNIGRAD, egresso do curso de Ciências Econômicas da
Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia. Email: [email protected]. Estrada do Bem Querer, Km
03, Parque Imperial, Av. P, nª 11, Vitória da Conquista – BA, CEP: 45000-000. Telefone: 77 988046205. 2Docente do curso de Ciências Econômicas vinculado ao Departamento de Ciências Sociais Aplicadas da
Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia. E-mail: [email protected].
Vitória da Conquista, Bahia, 02 à 07 de outubro de 2017
XVI Semana de Economia e II Encontro de Egressos de Economia da UESB
2
A hipótese aqui trabalhada é a de que o sistema tributário brasileiro é injusto e
regressivo, impondo aos mais pobres a maior fatia da arrecadação, e que, nesse sentido, é
necessário pensar em uma reforma no sistema tributário, uma reforma que mude a estrutura e
a legislação de impostos, taxas e contribuições vigente no país. Para aceitar tal assertiva o
presente artigo se valerá de pesquisa bibliográfica juntamente com coleta de dados
secundários nas bases de dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), por
meio das Contas Nacionais Trimestrais; Secretária da Receita Federal do Brasil (RFB), com
informações e dados coletados dos Estudos e Estatísticas da Carga Tributária Brasileira Anual
Além desta introdução o artigo apresenta, inicialmente, a evolução e a formação do
atual sistema tributário brasileira, desde a constituição de 1934 a 1988, observando que as
mudanças históricas feitas no sistema tributário brasileiro se preocuparam, principalmente, em
elevar a receita do governo e não em como a carga tributária seria distribuída na sociedade. A
segunda e terceira seção apresenta, respectivamente, as políticas tributárias adotadas nos
governos de Lula (2003 a 2010) e Dilma Roussef, (2011 a 2016). Em seguida, por meio da
análise feita da arrecadação tributária por base de incidência sobre bens e serviços, renda,
folha de pagamento, propriedade e transações financeiras, no período de 2003-2015, busca-se
identificar a regressividade e aceitar ou não a hipótese acima levantada do sistema e por
último segue as considerações finais.
2. Breve histórico da evolução do sistema tributário brasileiro e governo FHC (1994-
2002)
Desde a proclamação da República até os anos 1930 a economia brasileira era
predominantemente agroexportador sendo o seu dinamismo econômico calcado no alto grau
de abertura comercial com o exterior. O sistema tributário manteve-se estruturado em
conformidade a estrutura vigente à época do Império, sendo o imposto de importação a
principal fonte de receitas públicas. Varsano (1996, p.02) observa que durante todo o período
anterior à Constituição de 1934 o imposto de importação foi o responsável por cerca de
metade da receita total arrecada pela União enquanto o imposto de consumo correspondia a
aproximadamente 10% da mesma. A partir de 1937 a participação do imposto de importação
Vitória da Conquista, Bahia, 02 à 07 de outubro de 2017
XVI Semana de Economia e II Encontro de Egressos de Economia da UESB
3
no total arrecadado pela União começa a diminuir tendo em vista a reconfiguração do sistema
e um maior direcionamento para os impostos internos.
A Constituição de 1934 especificou o campo de competência de tributos para a esfera
federal, estadual e municipal mantendo a União e os estados à competência para instituir
impostos além de atribuir aos municípios a competência para decretar alguns tributos. Já a
Constituição de 1946 trouxe modificações consideráveis no sistema tributário. Em primeiro
lugar, no intuito de aumentar a receita dos municípios, criaram-se dois novos impostos: o
imposto do selo municipal e o imposto de indústrias e profissões. Em segundo lugar,
institucionalizou-se um sistema de transferência de impostos, o que modificou a
discriminação de rendas entre as esferas de governo. No período 1946/1966, aumentou a
importância relativa dos impostos internos sobre produtos, destacando-se os impostos sobre
consumo, vendas e consignações. O Brasil entrou em um processo em que a tributação sobre
bases domésticas passou a ser crescentemente a mais importante (GIAMBIAGI; ALÉM,
2008, p.245).
Varsano (1996, p. 05) afirma que em 1946, o imposto de consumo tornou-se
responsável por aproximadamente 40% da receita tributária da União e o Imposto de Renda
representava cerca de 27% da mesma. O Brasil passa a explorar principalmente as bases
domésticas ao passo que começava um processo de desenvolvimento industrial sustentado. O
processo de industrialização que ocorreu no Brasil, principalmente a partir da década de 1950,
elevou sistematicamente as despesas do governo federal. A despesa do Tesouro nacional
saltou de 8% do PIB no final da década de 1940 para 13% do PIB no início dos anos 1960. A
justificativa para tal foi apoio à industrialização e ao desenvolvimento regional que gerou um
crescimento das despesas que não pode ser acompanhado pelo das receitas. O sistema
tributário em vigor não suportou tal pressão uma vez que não existia uma estrutura
institucional que pudesse viabilizar o financiamento das despesas do governo. Dessa forma, o
gasto público foi financiado quase que integralmente através de emissões. A inflação anual,
que era de 12% em 1950, elevou-se para 29% em 1960, 37% e 52% nos anos seguintes,
atingindo 74% em 1963 (VARSANO, 1996, p. 07).
Com o golpe militar, ocorrido em 1964, a reforma tributária retorna para a agenda do
governo com urgência. Com o objetivo de aumentar a capacidade de arrecadação do Estado
Vitória da Conquista, Bahia, 02 à 07 de outubro de 2017
XVI Semana de Economia e II Encontro de Egressos de Economia da UESB
4
sem inflacionar; reduzir a desigualdade entre as regiões, priorizar a tributação direta por meio
de um sistema mais progressivo; modernizar o sistema tributário, definindo mais
objetivamente os fatos geradores dos tributos, entre 1964 e 1966 um novo sistema tributário
foi paulatinamente implantado. Giambiagi e Além (2008, p. 246) afirmam que o principal
aspecto modernizador da reforma foi priorizar a tributação sobre o valor agregado invés dos
impostos ditos “em cascatas”. A ideia era elevar o nível de esforço fiscal com o objetivo de
alcançar o equilíbrio fiscal ao passo que se pudesse, por meio de incentivos fiscais, dispensar
recursos à acumulação de capital e impulsionar o crescimento econômico.
Houve uma racionalização do sistema tributário com a redução do número de tributos,
uma reformulação dos mesmos e de suas partilhas federativas, foram criados dois impostos
sobre o valor agregado: o imposto sobre produtos industrializados (IPI) e o imposto sobre
circulação de mercadorias (ICM)3. Tais impostos, de caráter não-cumulativo
4, substituíram os
antigos impostos "em cascata" que incidiam sobre vendas e consignações (estadual) e sobre
consumo (GIAMBIAGI; ALÉM, 2008, p.247).
Considerada bem-sucedida a reforma da década de 1960 reabilitou as finanças do
governo e ao adotar impostos sobre o valor adicionado eliminou os impostos cumulativos.
Para além do interesse de aumentar a arrecadação tributária, pela primeira vez no Brasil,
concebeu-se um sistema tributário que possuía objetivos econômicos e por meio dele
estabelecer políticas e estratégias de crescimento. O final da década de 1970 e início dos anos
1980 uma série de reivindicações da sociedade civil, através dos setores empresariais e alguns
sindicatos, com a campanha pelas diretas-já, foram preponderantes para o surgimento de novo
reordenamento político e econômico. Assim, o debate para a convocação de uma Assembléia
Constituinte ganha impulso.
O sistema tributário criado pela Constituição de 1988 foi resultado de um processo em
que os principais atores que a elaboraram eram políticos que possuíam formação técnica. A
reforma tributária da Constituição de 1988 teve como principal objetivo a descentralização
3 Duas décadas depois o ICM foi transformado no imposto sobre circulação de mercadorias e serviços (ICMS).
(GIAMBIAGI e ALÉM, 2008, p.247) 4 Segundo Souza et al (2008), diferentemente dos impostos sobre valor adicionado, que geram crédito sobre os
pagamentos nas fases anteriores da produção, de forma que a cobrança se dá apenas sobre o valor efetivamente
adicionado naquela fase de produção, os impostos cumulativos vão se acumulando ao longo da cadeia produtiva,
sem ser compensado, acabam incluídos no preço final das mercadorias.
Vitória da Conquista, Bahia, 02 à 07 de outubro de 2017
XVI Semana de Economia e II Encontro de Egressos de Economia da UESB
5
dos recursos tributários, o aumento do grau de autonomia fiscal dos estados e municípios, a
desconcentração dos recursos tributários disponíveis e a transferência de encargos da União
para aquelas unidades. A constituição de 1988 foi concebida com o intuito de dar maior
autonomia fiscal para Estados e Município. O quadro 01, a seguir, detalha como ficou a nova
divisão.
Quadro 01 – Sistema tributário definido na reforma de 1966 e na Constituição de 1988
Competência Definição reforma de 1966 Definição Constituição de 1988
UNIÃO importação;
exportação;
imposto territorial rural;
imposto de renda;
imposto sobre produtos
industrializados;
imposto sobre serviços de transporte
e comunicações;
imposto sobre operações financeiras;
imposto sobre energia;
imposto sobre combustíveis e
lubrificantes;
imposto sobre minerais;
receita extra-orçamentária: FGTS
importação de produtos estrangeiros (II);
exportação, para o exterior, de produtos
nacionais ou nacionalizados (IE);
renda e proventos de qualquer natureza (IR);
produtos industrializados (IPI);
operações de crédito, câmbio e seguro, ou
relativas a títulos ou valores mobiliários (IOF);
propriedade territorial rural (ITR);
grandes fortunas, nos termos de lei
complementar;
contribuição para financiamento da seguridade
social (COFIN);
contribuição para o Programa de Integração
Social e para o Programa de Formação do
Patrimônio do Servidos Público (PIS/PASEP);
contribuição social sobre o lucro das pessoas
jurídicas (CSLL);
contribuição sobre a folha de pagamento
(empregado e empregador)
ESTADOS E
DISTRITO
FEDERAL
imposto de transferência de bens
imóveis;
imposto sobre circulação de
mercadorias;
transmissão causa mortis e doação de
quaisquer bens ou direitos;
operações relativas à circulação de
mercadorias e sobre prestações de serviços de
transportes interestadual e intermunicipal e de
comunicação (ICMS);
propriedade de veículo automotores (IPVA);
MUNICÍPIOS imposto predial e territorial urbano;
imposto sobre serviços;
propriedade territorial e predial urbana
(IPTU);
transmissãointer vivos a qualquer título, por
ato oneroso, de bens imóveis, por natureza ou
acessão física, e de direitos reais sobre
imóveis, exceto os de garantia, bem como
cessão de direitos a sua aquisição;
vendas a varejo de combustíveis líquidos e
gasosos, exceto óleo diesel (IVVC);
serviço de qualquer natureza (ISS).
Fonte: Fonte: Rezende (1998) e Brasil (1988). Elaboração própria
Vitória da Conquista, Bahia, 02 à 07 de outubro de 2017
XVI Semana de Economia e II Encontro de Egressos de Economia da UESB
6
Ao longo da década de 1980 diversas foram as medidas criadas no intuito de evitar a
queda da arrecadação. Em 1982 criou-se a Contribuição para o Fundo de Investimento Social
(Finsocial) e aumentou os tributos não partilhados com os estados e municípios. Varsano
(2002, p.238-239) afirma que ao abusar das contribuições sociais cumulativas, aliadas ao
regime de economia fechada com inflação altíssima, o resultado de tais ações foi o desgaste
da qualidade do sistema tributário brasileiro. Ampliaram a base tributária estadual e o
montante a ser transferido pela União aos estados e municípios, assegurando a eles total
autonomia na escolha de como utilizar seus recursos, próprios ou originários de
transferências. O resultado foi um desequilíbrio fiscal concentrando na União além de
deteriorar as contas públicas.
No debate constitucional, em 1988, o legislador constituinte estabeleceu um conjunto
de princípios tributários baseados na justiça fiscal e social. A Carta Magna definiu que a
tributação deve ser, preferencialmente, direta, de caráter pessoal e progressiva, no entanto, a
nova ordem econômica que estava em curso nos anos 1990, aprofundando a regressividade do
sistema tributário brasileiro. Após a promulgação da Constituição a carga tributária tem
superado os níveis alcançados nas décadas anteriores. Em 1990 a carga tributária alcançou um
o patamar de 29,6%, justificada pelo Plano Collor que possibilitou um aumento temporário da
receita federal e, pelo seu impacto sobre o nível da inflação, permitiu melhor desempenho da
arrecadação nas três esferas de governo (VARSANO, 1996, p.16).
A distribuição das receitas entre as três esferas do governo foi alterada, a receita
própria da União foi reduzida, mas o crescimento ocorrido nos estados e municípios elevou a
carga tributária geral a níveis históricos. A receita total da União foi reduzida graças ao
aumento das transferências e fatores como a estagnação econômica e a aceleração da inflação.
Para enfrentar o desequilíbrio fiscal o governo federal adotou uma série de medidas para
compensar suas perdas: criação de novos tributos, como a contribuição incidente sobre o lucro
líquido das empresas, em 1989, aumento da Cofins de 0,5% para 2% e da do imposto sobre
operações financeiras, em 1990, criação do Imposto Provisório sobre Movimentações
Financeiras, em 1993. O resultado em adotar tais medidas foi a piora na qualidade da
tributação e dos serviços prestados (VARSANO, 1996, p. 17).
Vitória da Conquista, Bahia, 02 à 07 de outubro de 2017
XVI Semana de Economia e II Encontro de Egressos de Economia da UESB
7
Os governos de Fernando Henrique Cardoso - FHC, em seu primeiro mandato de 1994
a 1997 e no segundo mandato 1998-2002, foram marcados pela implementação das políticas
neoliberais no Brasil. Os anos FHC foram marcados pela estabilização dos preços e as
profundas reformas que tiveram início no governo Collor, tais como: privatizações,
transferindo para o setor privado empresas deficitárias, deixando de pressionar as contas
públicas; fim dos monopólios estatais nos setores de petróleo e telecomunicação; mudança no
tratamento do capital estrangeiro; reforma na previdência; aprovação do fator previdenciário;
aprovação de Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF), com o estabelecimento de teto para as
despesas com pessoal nas três esferas da federação, além de outros mecanismos de controle
das finanças públicas; ajuste fiscal, a partir de 1999; estabelecimento do regime de metas de
inflação, entre outros (GIAMBIAGI et al., 2005, p. 182). A política fiscal não era o foco da
atenção no primeiro mandato de FHC devido à forte resistência legislativa e política, ela ficou
restrita a cumprir a função de equilibrar as contas primárias, ou seja, que os gastos públicos
fossem iguais as receitas públicas que na prática não aconteceu.
Tabela 1 – Receita Federal: médias de períodos – 1991/94, 1995/98 e 1999/2002 (em %
do PIB)
Composição 1991/94 1995/98 1999/2002
Imposto de Importação 0,43 0,65 0,79
IPI 2,26 1,95 1,69
Imposto de Renda 3,72 4,50 5,47
Pessoa Física 0,20 0,33 0,34
Pessoa Jurídica 1,12 1,48 1,61
Retido na Fonte 2,40 2,69 3,52
IPMF/CPMF 0,27 0,43 1,29
IOF 0,69 0,42 0,35
Cofins 1,46 2,23 3,74
PIS/Pasep 1,09 0,90 0,97
Contribuição sobre o Lucro Líquido 0,68 0,87 0,80
Contribuição para a Seguridade do Servidor 0,06 0,31 0,32
Outras Receitas 1,19 0,92 1,08
Total 11,85 13,18 16,50
Memo: Carga Tributária 25,65 28,75 32,80
ICMS 6,64 6,99 7,50
Fonte: Oliveira e Turolla (2003).
Vitória da Conquista, Bahia, 02 à 07 de outubro de 2017
XVI Semana de Economia e II Encontro de Egressos de Economia da UESB
8
No que diz respeito aos aspectos tributário destaca-se a criação da Contribuição
Provisória sobre a Movimentação Financeira ou Transmissão de Valores e de Créditos e
Direitos de Natureza Financeira (CPMF), antigo Imposto Provisório sobre Movimentações
Financeiras (IPMF), conhecido como “imposto do cheque”. O IPI, o ICMS bem como a
COFINS e PIS, com base nos estudos tributários realizados pela RFB, nos anos de 1994 a
1998, estiveram mais expostos aos humores da economia não tendo sofrido alterações
normativas significativas em 1994 e 1995. Em 1996, apesar da redução da alíquota do IOF
nas operações de crédito, a isenção do IR sobre os lucros distribuídos a sócios ou acionistas, a
redução da CSLL de 10% para 8% para as Pessoas Jurídicas em geral e de 23% para 18%
para as Instituições Financeiras, além da redução das alíquotas do IRPJ, a carga tributária
apresentou resultado crescente.
O acréscimo de carga tributária, especificamente no período 1999/2002, foi obtido
mais em razão de uma postura ativa da administração tributária do que como uma resposta aos
humores da economia. Esse aspecto é facilmente constatado quando se verifica que o
crescimento econômico em 1999 foi determinado pelo comportamento do setor agropecuário,
que apresenta um baixo potencial tributário. A atividade industrial, a qual, em virtude do
maior número de etapas de produção e maior capacidade de agregação de valor, constitui-se
na mais importante fonte geradora de receita tributária nesse período (OLIVEIRA e
TUROLA, 2003).
Os índices observados a partir dos anos 1990 foram reflexos de planos econômicos
da época e da reforma tributária ocorrida em 1988, como conclui Riani (2011, p.129). O plano
Cruzado, por exemplo, foi indutor de aumento do consumo, ao congelar preços e aumento do
salário nominal e real. Já o plano Collor autorizou a utilização de recursos financeiros
bloqueados para pagamento de tributos. A partir de 1994, com o Plano Real, com a
estabilidade dos preços o país atingiu os maiores níveis de arrecadação, justificado também
pela elevação das contribuições sociais.
3. Governo Lula (2003-2010)
Vitória da Conquista, Bahia, 02 à 07 de outubro de 2017
XVI Semana de Economia e II Encontro de Egressos de Economia da UESB
9
Luiz Inácio Lula da Silva foi eleito presidente da república em 2002 assumindo
efetivamente em janeiro de 2003. Cercado de dúvidas sobre os caminhos que a economia
percorreria sob seu comando sua posse teve dois grandes significados: incertezas quanto à
defesa da instabilidade e em termos político-ideológicos representou a ascensão da esquerda
ao poder. As desconfianças tinham origem nos discursos propagados pelo Partido dos
Trabalhadores, desde 1989 quando Lula se candidata pela primeira vez, ao passar a mensagem
de que era necessária uma transformação. Com a estabilidade econômica alcançada no
governo FHC e as reformas estruturais realizadas muitos observadores internacionais
encaravam com receio e pessimismo com as possíveis mudanças que um governo de esquerda
pudesse fazer.
No que tange as políticas tributárias Lula enviou ao congresso, logo no sue primeiro
ano de mandato, um projeto de emenda constitucional (PEC nº 41/2003) a fim de reformular o
sistema tributário. Tendo por objetivos elevar a eficiência econômica e a competitividade,
minorar a regressividade, reduzir a evasão fiscal e a informalidade, simplifica e eliminar a
guerra fiscal, a aprovação do texto teve como principais destaques: Desvinculação de Receitas
da União (DRU), mecanismo orçamentário que permite que o governo federal use livremente
20% das receitas de impostos e contribuições federais; Partilha de 25% da CIDE, 18,75% para
estados e 6,35% para os municípios; Prorrogação da CPMF para até 2007, a criação do
Simples Nacional, o Estatuto da Pequena e Média Empresa e a cobrança não-cumulativa do
PIS/Cofins. Entretanto, a unificação nacional da legislação do ICMS e a mudança da cobrança
da origem para o destino, considerado os pontos centrais da proposta, não foram aprovados.
No geral a reforma ficou restrita a ajuste fiscal (SOUZA et al, 2008).
A carga tributária no governo Lula (2003-2010) e a arrecadação dos principais
tributos pode ser observada na tabela 01, a seguir. Nota-se que houve uma tendência crescente
até o ano de 2007, quando atinge seu pico, com uma carga tributária total de 33,66%, uma
leve queda no ano subsequente e uma queda acentuada de 0,92 p.p seguida de um leve
aumento no ano de 2010. Nesse período, o Governo Federal arrecadou em média de 22,70%
do PIB, sendo o IR seu principal tributo, participando com uma média de 5,68%, e as
Contribuições para a Previdência Social com 5,05%. Já os Estados e os Municípios
participam com média de 8,47% e 1,72%, respectivamente. Para os Estados, destaca-se o
Vitória da Conquista, Bahia, 02 à 07 de outubro de 2017
XVI Semana de Economia e II Encontro de Egressos de Economia da UESB
10
ICMS com participação média de 7,1% do PIB, superior ao IR de competência federal. Já o
ISS, principal imposto dos municípios, participa com média inferior a 1%.
As principais medidas nas questões tributárias começam a acontecer principalmente
a partir de 2007 no sentido de aliviar o peso da tributação. Em nível federal, destacaram-se as
reduções de alíquotas do IPI e dos prazos de aproveitamento de créditos da contribuição para
o PIS e da Cofins. Destacaram-se, também, medidas pró-crescimento voltadas para setores
como construção civil, infra-estrutura e software. Outro fato relevante foi a entrada em vigor,
a partir do segundo semestre de 2007, do Simples Nacional que flexibilizou as regras de
adesão e reduziu alíquotas do IR. Isto gerou o deslocamento para o Simples de contribuintes
que antes eram tributados segundo as regras dos regimes do Lucro Real e do Lucro
Presumido. Como o regime simplificado abrange o pagamento de vários tributos, o efeito
negativo sobre a arrecadação distribuiu-se entre seus componentes (RFB, 2007).
Tabela 01– Participação tributos/competência em % do PIB período 2003-2010
Tributo/competência 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010
Total da receita
tributária
31,41 32,24 33,35 33,31 33,66 33,63 32,27 32,44
Governo Federal 21,61 22,26 23,22 23,06 23,56 23,26 22,20 22,36
IR 5,41 5,22 5,80 5,63 5,87 6,21 5,73 5,48
IRPF 0,29 0,30 0,32 0,33 0,47 0,45 0,41 0,42
IRPJ 1,85 1,88 2,26 2,16 2,42 2,53 2,32 2,12
IRRF 3,28 3,04 3,22 3,15 2,99 3,23 3,00 2,94
Prev. Social (1) 4,75 4,83 5,05 5,02 5,06 5,11 5,36 5,43
PIS/PASEP e COFINS 4,42 5,01 4,93 4,68 4,66 4,80 4,44 4,67
IPI 1,06 1,14 1,17 1,11 1,15 1,18 0,83 0,96
IOF 0,26 0,27 0,28 0,28 0,29 0,65 0,58 0,68
CIDE 0,49 0,40 0,36 0,32 0,29 0,19 0,15 0,20
Outros 5,22 5,39 5,63 6,02 6,24 5,12 5,11 4,94
Governo Estadual 8,40 8,60 8,74 8,56 8,36 8,54 8,30 8,28
IPVA 0,46 0,46 0,49 0,51 0,54 0,55 0,60 0,55
ICMS 7,07 7,12 7,21 7,06 6,86 7,14 6,84 6,90
Outros 0,87 1,02 1,04 0,99 0,96 0,85 0,86 0,83
Governo Municipal 1,40 1,39 1,39 1,70 1,74 1,73 1,77 1,80
IPTU 0,45 0,44 0,43 0,48 0,46 0,44 0,46 0,45
ISS 0,54 0,56 0,60 0,74 0,76 0,80 0,82 0,84
Outros 0,41 0,39 0,36 0,58 0,52 0,49 0,49 0,50 Fonte: RFB (2007, 2015). Elaboração própria.
Vitória da Conquista, Bahia, 02 à 07 de outubro de 2017
XVI Semana de Economia e II Encontro de Egressos de Economia da UESB
11
Notas:
(1)Receitas Correntes INSS + Recuperação de Créditos INSS. Exclui Transferências a terceiros (Sistema "S" e
Salário-Educação) e Inclui a Contribuição do INSS sobre faturamento.
Em 2008 destaca-se a extinção da CPMF e o aumento das alíquotas do IOF, com o
objetivo de compensar parcialmente a perda de arrecadação decorrente do fim da incidência
da CPMF. O governo reduz a alíquota da CIDE, incidente sobre gasolina e diesel, afim de
absorver o reajuste nos preços dos combustíveis, evitando o aumento do preço para o
consumidor final e aumenta de 9% para 15% a alíquota da CSLL sob entidades financeiras,
justificados pelo governo em função da elevada lucratividade do setor. Para o ano de 2009 os
destaques foram as reduções de alíquotas do IPI direcionadas a alguns produtos para estimular
o consumo e a produção, na tentativa de neutralizar os efeitos negativos da crise. Os
benefícios tributários foram direcionados a setores considerados estratégicos por sua
relevância econômica, como por exemplo, o automotivo, o da construção civil e o de
eletrodomésticos. Em 2010 dentre as alterações promovidas na legislação tributária federal,
destacam-se o aumento das alíquotas do IOF e ajustes dos parâmetros do IRPF (RFB, 2008,
2009, 2010).
No seu primeiro mandato de governo Lula dá sequência aos ajustes fiscais iniciados
pelo governo FHC já no segundo, com o esgotamento das políticas neoliberais, inicia-se uma
mudança na política fiscal e tributária. Passa a se adotar medidas de estimulo fiscal e
monetário para acelerar o crescimento da economia. As medidas de redução e isenção de
tributos, mencionadas acima, corroboram com essa assertiva. O objetivo de tais ações
consistia em estimular o consumo privado e impulsionar os investimentos, mecanismo esse
adotado mais claramente no governo Dilma.
4. Governo Dilma (2010-2016)
Dilma Vana Rousseff foi a primeira mulher eleita presidente da República do Brasil,
após anos de militância política que incluíram a luta contra o regime militar e cargos de
primeiro escalão no governo do ex-presidente Lula. Em 2002, ela assumiu o cargo de ministra
de Minas e Energia no governo Lula, sendo também nomeada presidente do Conselho de
Vitória da Conquista, Bahia, 02 à 07 de outubro de 2017
XVI Semana de Economia e II Encontro de Egressos de Economia da UESB
12
Administração da Petrobras e em 2005 nomeada ministra-chefe da Casa Civil. Nas eleições de
2010 se candidatou à Presidência da República onde venceu com 56,05% dos votos e se
tornou a primeira mulher a comandar o país.
De modo geral, o governo Dilma foi marcado por uma série de medidas
intervencionistas na economia dando continuidade à tendência de ampliação da presença do
Estado na economia promovida pelo governo Lula. Destaque para o papel dos bancos
públicos utilizados como instrumento de ampliação do crédito e para redução das taxas de
juros praticadas no mercado. Após crescer nos três primeiros anos de governo, os sinais de
desgaste das políticas adotadas começaram a aparecer e como consequência trouxeram uma
das maiores recessões da história brasileira, com cinco trimestres consecutivos de
encolhimento da economia. A inflação disparou, o desemprego teve alta por 16 meses
consecutivos, somando mais de 11 milhões de brasileiros desempregados, os juros subiram, a
arrecadação despencou e o resultado foi uma grave crise fiscal. Motivos pelo qual culminaria
na sua queda, em 2016, por meio do impeachment. Em cenário de redução no ritmo de
crescimento econômico, com estabilidade na receita total, assistiu-se sistematicamente à
ampliação das despesas do governo central, de 16,7% do PIB em 2011 para 18,3% do PIB em
2014. O efeito desta política foi reduzir o superávit primário de 2,3% do PIB em 2011 para
1,6% em 2013. O déficit primário de R$ 17 bilhões ou 0,6% do PIB registrado em 2014 é o
ápice deste processo de fragilização da situação fiscal (RFB, 2015).
No que diz respeito à carga tributária no governo Dilma (2011-2015) nota-se que no
primeiro ano de seu mandato houve um aumento de 0,95 p p, na arrecadação total, conforme
demonstrado na tabela 02, entretanto, os anos que se seguem apontam para um ligeiro
decréscimo. Esta tendência à estabilidade decorre do fato de que, nos últimos anos, não tem
havido medidas tendentes a aumentar tributos, e sim um aumento considerável de benefícios
tributários na forma de redução de alíquotas e concessão de regimes especiais. Verifica-se
que o Governo Federal arrecadou em média de 22,52% do PIB, para o período de 2011 a
2015, sendo o IR o principal tributo participando com uma média de 5,56% e as
Contribuições para a Previdência Social com 5,59%. Já os Estados e os Municípios
participam com média de 8,23% e 1,9%, respectivamente. Para os Estados, destaca-se o
Vitória da Conquista, Bahia, 02 à 07 de outubro de 2017
XVI Semana de Economia e II Encontro de Egressos de Economia da UESB
13
ICMS com participação média de 6,8% do PIB, superior ao IR de competência federal. Já o
ISS, principal imposto dos municípios, participa com média de menos de 1%.
Com participação média de 4,64% do PIB nos seis anos do governo Dilma, observa-
se uma tendência a queda do PIS/PASEP e COFINS. Sendo o maior percentual da
arrecadação em 2011, explicado pelo bom desempenho de alguns setores, como o Comércio e
de Eletricidade e Gás, que apresentaram um crescimento de 3,4% e 3,8%, respectivamente,
comparado a 2010 (IBGE, 2017). Os recolhimentos desses tributos nos anos subsequentes
apresentaram redução devido principalmente a retração observada na indústria e ao comércio
e a alteração da base de cálculo do PIS/Cofins – Importação. A queda mais acentuada em
2014 e 2015 pode ser justificada pelas desonerações ocorridas nos últimos anos, nos setores
de fabricação de automóveis, produtos alimentícios e vestuário e as alterações nas alíquotas
do PIS/Cofins incidentes sobre gasolina, diesel e na importação de bens e serviços em 2015
(RFB, 2014, 2015).
Tabela 02 – Participação tributos/competência em % do PIB período 2010-2015
Tributo/competência 2010 2011 2012 2013 2014 2015
Total da receita tributária 32,44 33,39 32,70 32,67 32,42 32,66
Governo Federal 22,36 23,37 22,58 22,52 22,17 22,29
IR 5,48 5,53 5,53 5,62 5,62 5,59
IRPF 0,42 0,47 0,47 0,45 0,45 0,46
IRPJ 2,12 2,17 1,93 2,06 1,92 1,78
IRRF 2,94 3,20 3,13 3,11 3,25 3,55
Prev. Social (1) 5,43 5,57 5,65 5,55 5,54 5,43
PIS/PASEP e COFINS 4,67 4,75 4,61 4,67 4,33 4,28
IPI 0,96 0,94 0,89 0,81 0,87 0,81
IOF 0,68 0,73 0,65 0,55 0,52 0,59
CIDE 0,20 0,20 0,06 0,01 0,00 0,06
Outros 4,94 5,65 5,19 5,31 5,19 5,53
Governo Estadual 8,28 8,17 8,22 8,26 8,23 8,28
IPVA 0,55 0,55 0,56 0,55 0,57 0,61
ICMS 6,90 6,80 6,79 6,83 6,76 6,72
Outros 0,83 0,81 0,88 0,88 0,91 0,95
Governo Municipal 1,80 1,85 1,89 1,90 2,01 2,08
IPTU 0,45 0,45 0,45 0,46 0,49 0,52
ISS 0,84 0,88 0,92 0,90 0,97 0,98
Outros 0,50 0,52 0,53 0,54 0,55 0,58
Vitória da Conquista, Bahia, 02 à 07 de outubro de 2017
XVI Semana de Economia e II Encontro de Egressos de Economia da UESB
14
Fonte: RFB (2015). Elaboração própria. (1)Receitas Correntes INSS + Recuperação de Créditos INSS. Exclui Transferências a terceiros (Sistema "S" e
Salário-Educação) e Inclui a Contribuição do INSS sobre faturamento.
A partir de 2011 o que se percebe é uma redução na participação dos tributos federais
na arrecadação total, o que pode ser explicada, em parte, pelos efeitos das sucessivas
desonerações que tem ocorrido nos últimos anos. Dentre as medidas a RFB (2012) destaca:
(1) Decreto nº 7.764 reduzindo a zero a alíquota da CIDE-Combustíveis para gasolina, diesel,
QAV,GLP e Álcool; (2) IPI Automóveis: Decretos nº 7.796, 7.834 (Prorrogação de redução
de alíquota) e 7.725 (Redução de alíquota) e Linha Branca: Decretos 7.705; 7.770 e 7.796
(Prorrogação da desoneração); (3) Decreto nº 7.726 - Redução do IOF sobre operações de
crédito de pessoas físicas de 2,5% para 1,5% e (4) Medida Provisória 563. Lei nº 12.715 -
Contribuição sobre o faturamento substitutiva da contribuição previdenciária sobre a folha de
salários. Essas medidas justificam a queda da arrecadação do IPI, explicado, principalmente,
pela alteração da tabela de incidência do IPI-Automóveis para os fatos geradores a partir de
maio de 2012. A redução da Contribuição Previdenciária deve-se ao efeito das desonerações
da folha de pagamento, a partir também de 2012.
Em 2013 o valor das desonerações supera o de 2012 em cerca de 31 bilhões. Dentre
os tributos federais, os que mais contribuíram para o crescimento da carga tributária,
positivamente em 2013, foram o IRPJ, a Cofins e a Contribuição para o FGTS. Já as maiores
reduções se devem à Contribuição para a Previdência Social, ao IPI e ao IOF. Por outro lado,
ocorreu aumento da participação dos Estados e Municípios no percentual total da arrecadação.
Em 2014, a União também apresentou uma redução na sua participação na arrecadação total,
sendo a explicação pelos efeitos das desonerações concedidas em 2014.
Os tributos que mais contribuíram para a redução se devem ao PIS/PASEP, Cofins,
IRPJ e CSLL, além da redução de impostos sobre o comércio exterior (Impostos de
Importação e Exportação), a previdência, com a desoneração da folha de pagamento, que
respondeu por uma desoneração de cerca de R$ 21 bilhões e a CIDE Combustíveis, que
permaneceu com as alíquotas de diesel e gasolina zeradas em 2014. Já o aumento do IPI, em
aparente contradição com a desaceleração da indústria, deve-se, em grande medida, à
elevação gradual das alíquotas de IPI do setor automotivo e à elevação das alíquotas do setor
Vitória da Conquista, Bahia, 02 à 07 de outubro de 2017
XVI Semana de Economia e II Encontro de Egressos de Economia da UESB
15
de fumo. Do ponto de vista de tendência anual, nota-se que a tendência de redução da
participação da União na arrecadação total continua a se acentuar, registrando a terceira
redução seguida. Em relação aos tributos estaduais e municipais as variações foram discretas,
sendo mais influenciadas pelos tributos incidentes sobre o consumo e serviços (ICMS e ISS)
(RFB, 2013, 2014).
Em 2015 a carga tributária, apesar do pequeno acréscimo verificado, manteve a
tendência à estabilidade apresentada nos últimos anos. Embora, tenha se verificado aumento
de alíquotas de alguns tributos, grande parte das desonerações instituídas nos anos anteriores
continuaram a surtir efeitos em 2015. Apesar das desonerações implantadas nos últimos anos,
em 2015, houve uma recomposição de alíquotas de alguns tributos, como por exemplo, CIDE
e PIS/Cofins sobre combustíveis, CSLL do setor financeiro, IOF sobre operações de crédito
de pessoas físicas e redução do percentual do Regime Especial de Reintegração de Valores
Tributários para Empresas Exportadoras (REINTEGRA). Já os tributos incidentes sobre bens
e serviços (ICMS, IPI, PIS e Cofins) acompanharam o desempenho da economia e
apresentaram declínio em termos reais. As alíquotas da CIDE-Combustíveis, que estavam
zeradas em 2014, foram recuperadas em 2015. (RFB, 2014, 2015).
A variação negativa do IRPJ e da CSLL deve-se principalmente a redução da
atividade econômica, com consequente redução do lucro das empresas. Já os tributos cujo
desempenho está diretamente atrelado à atividade econômica (IPI, PIS/Pasep e Cofins)
acompanharam o desempenho da economia, queda da atividade industrial de 8,3% em 2015,
com relação a 2014, como aponta o IBGE (2017). Quanto aos tributos estaduais, destacam-se
o IPVA e o ICMS. O incremento do IPVA pode estar relacionado ao aumento das bases de
cálculos e das alíquotas nos estados. No que se refere ao ICMS a redução do montante
arrecadado está relacionada ao fraco desempenho da economia em 2015. Segundo os dados
do IBGE (2017), o comércio sofreu queda de 8,9%, em 2015. No âmbito municipal, o
aumento do IPTU pode ser creditado à melhoria da eficiência arrecadatória dos municípios
(RFB, 2015).
A estratégia de política tributária utilizada no governo Dilma foi de compensar a
perda de dinamismo econômico, que se iniciou em 2011, com a concessão de vários tipos de
desonerações. Fazendo uso de política fiscal expansionista, o objetivo final consistia em
Vitória da Conquista, Bahia, 02 à 07 de outubro de 2017
XVI Semana de Economia e II Encontro de Egressos de Economia da UESB
16
aumentar renda, por meio de alíquota zero do PIS/Pasep e confins de alguns produtos da cesta
básica, redução do IPI e desoneração de vários setores, e desoneração da folha de pagamentos.
A consequência é o aumento a patamares elevados da renúncia de receita tributária, só em
2013 deixou de arrecadar R$ 268,1 bilhões e em 2014 R$ 250 bilhões, segundo a RFB (2015).
Esses benefícios favoreceram tanto a indústria como o setor de comércio e serviços bem como
o de saúde, com as desonerações concentrada no IR, Cofins, IPI e folha de pagamento.
5. Arrecadação tributária e a regressividade no Brasil
A oscilação da arrecadação tributária está estreitamente vinculada a dois fatores: a
variação do nível da atividade econômica e as alterações da legislação tributária. O
desempenho econômico afeta as receitas tributárias de acordo com a natureza do tributo,
sendo que a resposta da arrecadação dos impostos sobre consumo e produção é, geralmente,
observada no curto prazo, como pode ser detectado com as medidas adotadas no governo
Dilma, com as desonerações do IPI linha branca e automóveis, com o objetivo de reduzir os
preços e assim elevar o consumo. Já a arrecadação dos impostos sobre renda, folha de
pagamentos e propriedade tende a ser mais estável no curto prazo, apresentando variações no
médio e longo prazos.
A arrecadação tributária da União distribui-se entre os impostos/contribuições sobre
renda, trabalho, consumo, produção e comércio exterior, apresentando uma variação
heterogênea em relação ao desempenho da economia. A receita tributária dos estados baseia-
se fundamentalmente na tributação do consumo (ICMS). Já os impostos sobre a propriedade
(IPTU e ITBI) e sobre serviços (ISS) são os principais componentes da receita tributária
municipal. O incremento de carga tributária pode ser explicado em função do crescimento da
atividade econômica ocorrido no ano, a evidência mais clara dessa resposta elástica ao
crescimento econômico reside no fato de a expansão da receita tributária ocorrer,
principalmente, em tributos vinculados ao faturamento ou ao valor agregado (Cofins e IPI) e à
massa salarial (Contribuição previdenciária ao INSS).
Para compreender se o sistema tributário brasileiro é regressivo faz-se necessário
avaliar a base de incidência como renda, propriedade, produção, circulação e consumo. Essa
Vitória da Conquista, Bahia, 02 à 07 de outubro de 2017
XVI Semana de Economia e II Encontro de Egressos de Economia da UESB
17
análise pode ser feita em termos de participação no PIB, com os dados obtidos junto à RFB
(2007, 2015). Considerando os tributos incidentes sobre a renda (IRPF, IRPJ, IRRF); os
tributos incidentes sobre a folha de salário (contribuições para a previdência social, seguro
desemprego); os tributos incidentes sobre propriedade (ITR, IPTU, IPVA, ITBI entre outros);
sobre bens e serviços, (PIS/COFINS, SIMPLES, CSLL,IPI, ICMS, IE, II, INSS, entre outros)
e os incidentes sobre operações financeiras (CPMF e IOF), o resultado da arrecadação, para o
período de 2003 a 2015, pode ser observado na tabela 03.
Verifica-se que os tributos incidentes sobre bens e serviços são os que possuem
maior participação no PIB, uma média de 16,21%, contra 5,97% dos tributos que incidem
sobre a renda. Nesse sentido pode-se afirmar que o sistema tributário brasileiro está
concentrado em tributos regressivos e indiretos, justamente os que oneram mais os
trabalhadores e os pobres. No que diz respeito à arrecadação total o gráfico 01, abaixo,
demonstra que, em média, 49,42% dela, para o período de 2003 a 2015, é provenientes dos
tributos que incidem sobre os bens e serviços, sobre folha de salário, média de 25,51%,
seguido da renda, com 18,47%, e propriedade e transações financeiras com 3,74% e 2,11%,
respectivamente. A queda na arrecadação dos tributos sobre operações financeiras, observada
no gráfico 01, a partir de 2008, é reflexo da extinção da CPMF.
Tabela 03 – Participação dos tributos, por incidência, em % do PIB de 2003 a 2015
Tipo 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009
Renda 5,82 5,57 6,28 6,15 6,50 6,86 6,33
Folha de salário 6,83 7,04 7,33 8,15 8,16 8,12 8,48
Propriedade 1,06 1,03 1,06 1,16 1,19 1,19 1,26
Bens e serviços 15,13 15,93 16,00 16,21 16,11 16,69 15,63
Transações financeiras 1,62 1,63 1,64 1,61 1,62 0,68 0,58
Tipo 2010 2011 2012 2013 2014 2015
Renda 5,92 6,37 5,86 5,93 5,85 5,97
Folha de salário 8,44 8,55 8,64 8,43 8,41 8,44
Propriedade 1,23 1,25 1,27 1,29 1,35 1,45
Bens e serviços 16,13 16,47 16,29 16,47 16,28 16,22
Transações financeiras 0,68 0,73 0,64 0,55 0,52 0,59 Fonte: RFB (2007, 2015). Elaboração própria.
Vitória da Conquista, Bahia, 02 à 07 de outubro de 2017
XVI Semana de Economia e II Encontro de Egressos de Economia da UESB
18
Gráfico 01 – Participação dos tributos, por tipo de incidência, em % da arrecadação no
período de 2003 - 2015
Fonte: RFB (2007, 2015). Elaboração própria.
Ao consideramos tributação direta a que incide sobre renda e patrimônio e indireta a
incidente sobre produção e consumo, os dados apresentados apontam para a maior
participação da arrecadação indireta, atingindo indiscriminadamente toda a população,
independentemente da renda e da riqueza. Essa cobrança vem embutida no preço final das
mercadorias caso do ICMS, IPI e COFINS. As classes de renda mais baixa, onde a propensão
a consumir é maior, são as mais penalizadas, pois há uma retirada proporcionalmente maior
das pessoas com menor capacidade de contribuir. Fica evidente assim o caráter regressivo do
sistema tributário brasileiro. Nos países capitalistas desenvolvidos a maior parte da carga
tributária é direta e recai sobre a renda, a riqueza, a propriedade e a herança e sobre grandes
fortunas.
Esses critérios são mais justos do que os existentes no Brasil porque tributa
diretamente quem ganha mais e tem melhor condição de pagamento. Nos países europeus, por
exemplo, o imposto é progressivo, na medida em que cresce a renda aumenta a contribuição
ao fisco. Ressalta-se aqui que as comparações dos valores de carga tributária nacional com as
de outros países devem ser feitas com cautela, pois algumas espécies tributárias existentes em
alguns país podem não existir em outros, a exemplo das contribuições para a previdência, que,
em determinadas nações é privada, não fazendo parte da carga tributária. Além de se levar em
0
10
20
30
40
50
60
2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012 2013 2014 2015
Bens e serviços Folha de salário Renda
Propriedade Transações financeiras
Vitória da Conquista, Bahia, 02 à 07 de outubro de 2017
XVI Semana de Economia e II Encontro de Egressos de Economia da UESB
19
considerações diversos fatores, tais como: nível de desenvolvimento, produtividade, renda,
entre outros. No entanto, quando se compara a tributação por base de incidência observa-se
que, para a base Renda, o Brasil tributa menos que a média dos países da OCDE, enquanto
que para a base Bens e Serviços, tributa mais. Em 2014 a média dos países da OCDE para a
participação do imposto sobre a renda em % do PIB ficou em 8,42% frente a 5,92% do Brasil
e a participação do imposto sobre bens e serviços ficou com 10,96% contra 16,28% do PIB no
Brasil (OCDE, 2017).
6. Considerações finais
Existe, no Brasil, um sentimento generalizado de que a carga tributária é
extremamente elevada principalmente quando comparada aos países vizinhos. Em média a
carga tributária dos países da América Latina gira em torno de 25%, quando aqui, segundo a
RFB, em 2015 ela ficou em 32,66%. Outro fator relevante, para se afirmar tal preposição, diz
respeito a já mencionada participação exacerbada dos impostos sobre a produção e consumo e
impostos cumulativos na arrecadação total, ao invés de impostos sobre a renda, propriedade e
sobre valor agregado. Tem-se uma sensação de sacrifício, por parte do contribuinte, uma vez
que o consumo privado individual é compulsoriamente reduzido para dar espaço à provisão de
bens públicos. É nesse sentido que se pode considerar uma carga tributária baixa, suportável
ou excessiva.
As análises desenvolvidas neste artigo observaram distorções na arrecadação entre as
unidades de governo, com maior participação da União na arrecadação total, apesar de ser um
imposto estadual, o ICMS, o responsável pela maior parte da receita total. Os tributos
indiretos, que incidem sobre o consumo de bens e serviços, são os que possuem mais
participação na carga tributária total. Os dados e as analises levantadas corroboram com a
assertiva de que o sistema tributário brasileiro é injusto, regressivo, impondo aos pobres a
maior fatia da arrecadação. Essas distorções identificadas perpetuam os mecanismos de
desigualdade social, indo, inclusive na contramão das políticas de transferência de renda tão
propaganda nos governos Lula (2003-2010) e Dilma (2011-2016).
Vitória da Conquista, Bahia, 02 à 07 de outubro de 2017
XVI Semana de Economia e II Encontro de Egressos de Economia da UESB
20
Faz-se necessário pensar em uma reforma no sistema tributário, uma reforma que
mude a estrutura e a legislação de impostos, taxas e contribuições vigente no país. Como visto
a grande última reforma ocorrida foi a dos anos de 1960, sob um regime autoritário que não
encontrou obstáculos para sua formulação e execução. Os principais dilemas que se coloca
estão atrelados a três questões básicas: a carga tributária, a equidade do sistema tributário e a
qualidade do sistema. No tocante a carga tributária há de se ressaltar que o seu nível resulta de
decisão política, quanto maior ou menor foi o papel que se atribui ao Estado ou ao mercado.
Depende ainda de como se queira distribuir a renda entre capital e trabalho na sociedade. A
correção do sistema tributário exige escolhas que impactam na distribuição de renda tanto no
que diz respeito a dimensão de classe, capital e trabalho, como dimensão política, na relação
público e privado, dimensão institucional, entre União, estados e municípios, e federativa, na
distribuição regional dos recursos. Conclui-se, portanto, que é preciso empreender uma
reforma tributária com o objetivo de assegurar uma melhor distribuição da carga entre os
contribuintes, tornando-a mais justa, equânime e simples possível, promovendo assim a
justiça tributária.
Referências
BRASIL. Constituição Brasileira de 1988. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm> Acesso em: 05 de jun.
2017.
GIAMBIAGI, F. et al. Economia Brasileira Contemporânea. Rio de Janeiro: Elsevier,
2005.
GIAMBIAGI, Fabio; ALÉM, Ana Claudia. Finanças Públicas: teoria e prática no Brasil.3.
ed. Rio de Janeiro: Elsevier, 2008.
IBGE, Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Contas Nacionais
Trimestrais.Disponível em:
http://www.ibge.gov.br/home/estatistica/indicadores/pib/defaultcnt.shtm>acesso em :05 de
jan. 2017.
OCDE. Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico. 2017. Disponível
em: https://data.oecd.org/government.htm#profile-Tax>. Acesso em: 06 de maio de 2017
Vitória da Conquista, Bahia, 02 à 07 de outubro de 2017
XVI Semana de Economia e II Encontro de Egressos de Economia da UESB
21
OLIVEIRA, G. ; TUROLLA, F. A. . A Política Econômica do Segundo Governo FHC:
Mudança em Condições Adversas. SãoPaulo-SP, v. 15, n.2, p. 195-217, 2003. Disponível em:
<http://www.scielo.br/pdf/ts/v15n2/a08v15n2>. Acesso em: 26 fev. 2017.
RIANI, Flávio. Economia do setor público: uma abordagem introdutória. 5. ed. Rio de
Janeiro: LTC, 2011.
RFB, Receita Federal do Brasil. Carga tributária no Brasil: análise por tributo e bases de
incidência.Consulta aos Estudos tributários referentes aos períodos de 2000 a 2015.
Disponível em: <http://idg.receita.fazenda.gov.br/dados/receitadata/estudos-e-tributarios-e-
aduaneiros/estudos-e-estatisticas/carga-tributaria-no-brasil> Acesso em: 02 de fev. 2017.
REZENDE, J.B. Reforma e Política Tributária: as formulações do atual sistema tributário
na constituinte de 1987/88. Londrina: jornal de Londrina, 1998.
SOUZA, L.E.S. et al. Reforma tributária: temas e dilemas. São Paulo: LCTE Editora, 2008.
(Série economia de bolso)
VARSANO, R. A evolução do sistema tributário brasileiro ao longo do século: anotações e
reflexões para futuras reformas.Texto para discussão, nº 405. IPEA, Rio de Janeiro, 1996.
VARSANO, R. et al. Uma análise da carga tributária do Brasil. Texto para discussão, nº
583. IPEA, Rio de Janeiro, 1998.
VARSANO, R. Sistema tributário para o desenvolvimento. In: CASTRO, A. C. (org.).
Desenvolvimento em debate: painéis do desenvolvimento brasileiro- I. Rio de Janeiro:
Mauad, BNDES, 2002, p. 231-250.