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MAS Nº 70071745830 (Nº CNJ: 0384777-73.2016.8.21.7000) 2016/CÍVEL 1 ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA APELAÇÕES CÍVEIS. DIREITO TRIBUTÁRIO. EMBARGOS À EXECUÇÃO FISCAL. ICMS. REALIZAÇÃO DE SEGUNDA PERÍCIA OU COMPLEMENTAÇÃO DO LAUDO PERICIAL. QUESTÃO PROCESSUAL PRECLUSA. A insurgência quanto à qualificação ou capacidade técnica do expert deve ocorrer quando nomeado para exercer o encargo no processo. Desnecessidade de realização de outra perícia na área de engenharia, não postulada pela embargante quando instada a especificar as provas a produzir. Matéria preclusa. CREDITAMENTO DE ICMS. PRINCÍPIO DA NÃO- CUMULATIVIDADE. LC Nº 87/96. PEÇAS DESTINADAS A MÁQUINAS E EQUIPAMENTOS. BENS DE USO E CONSUMO DO ESTABELECIMENTO CONTRIBUINTE. LIMITAÇÃO TEMPORAL PREVISTA NA LEI COMPLEMENTAR 87/96 E NO RICMS/RS. IMPOSSIBILIDADE DE CREDITAMENTO ATÉ 31/12/2019. Consoante Nota aposta ao art. 31, I, ‘b’, do Livro I do RICMS/RS, as partes e peças destinadas a máquinas e equipamentos utilizados em substituições regulares constituem bens destinados ao uso e consumo do estabelecimento industrial, não se inserindo no processo produtivo a ponto de caracterizar insumos. Incidência da limitação temporal prevista nos arts. 33 da LC nº 87/96 e 31 e 33 do RICMS/RS, a inviabilizar o creditamento do imposto na aquisição desses bens até 31/12/2019. MATERIAIS DE CONSTRUÇÃO, REFORMA E AMPLIAÇÃO. EMPREGO EM ATIVIDADE ALHEIA À FINALIDADE DA EMPRESA. APROVEITAMENTO INDEVIDO DO CRÉDITO. ART. 20, § 1º, DA LC Nº 87/96. Os valores de ICMS provenientes da aquisição de materiais para construção, reforma ou ampliação do estabelecimento, por isso que não destinados às atividades finalísticas da empresa, cujo objeto social reside precipuamente na produção e comércio de bebidas e alimentos, não ensejam o creditamento de ICMS, à luz do disposto nos arts. 20, § 1º, da LC nº 87/96, e 16 da Lei Estadual nº 8.820/89. DECADÊNCIA. TRIBUTO SUJEITO A LANÇAMENTO POR HOMOLOGAÇÃO. RECOLHIMENTO A MENOR. ART. 150, § 4º, DO CTN.

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MAS Nº 70071745830 (Nº CNJ: 0384777-73.2016.8.21.7000) 2016/CÍVEL

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ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL

PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA

APELAÇÕES CÍVEIS. DIREITO TRIBUTÁRIO. EMBARGOS À EXECUÇÃO FISCAL. ICMS. REALIZAÇÃO DE SEGUNDA PERÍCIA OU COMPLEMENTAÇÃO DO LAUDO PERICIAL. QUESTÃO PROCESSUAL PRECLUSA. A insurgência quanto à qualificação ou capacidade técnica do expert deve ocorrer quando nomeado para exercer o encargo no processo. Desnecessidade de realização de outra perícia na área de engenharia, não postulada pela embargante quando instada a especificar as provas a produzir. Matéria preclusa. CREDITAMENTO DE ICMS. PRINCÍPIO DA NÃO-CUMULATIVIDADE. LC Nº 87/96. PEÇAS DESTINADAS A MÁQUINAS E EQUIPAMENTOS. BENS DE USO E CONSUMO DO ESTABELECIMENTO CONTRIBUINTE. LIMITAÇÃO TEMPORAL PREVISTA NA LEI COMPLEMENTAR Nº 87/96 E NO RICMS/RS. IMPOSSIBILIDADE DE CREDITAMENTO ATÉ 31/12/2019. Consoante Nota aposta ao art. 31, I, ‘b’, do Livro I do RICMS/RS, as partes e peças destinadas a máquinas e equipamentos utilizados em substituições regulares constituem bens destinados ao uso e consumo do estabelecimento industrial, não se inserindo no processo produtivo a ponto de caracterizar insumos. Incidência da limitação temporal prevista nos arts. 33 da LC nº 87/96 e 31 e 33 do RICMS/RS, a inviabilizar o creditamento do imposto na aquisição desses bens até 31/12/2019. MATERIAIS DE CONSTRUÇÃO, REFORMA E AMPLIAÇÃO. EMPREGO EM ATIVIDADE ALHEIA À FINALIDADE DA EMPRESA. APROVEITAMENTO INDEVIDO DO CRÉDITO. ART. 20, § 1º, DA LC Nº 87/96. Os valores de ICMS provenientes da aquisição de materiais para construção, reforma ou ampliação do estabelecimento, por isso que não destinados às atividades finalísticas da empresa, cujo objeto social reside precipuamente na produção e comércio de bebidas e alimentos, não ensejam o creditamento de ICMS, à luz do disposto nos arts. 20, § 1º, da LC nº 87/96, e 16 da Lei Estadual nº 8.820/89. DECADÊNCIA. TRIBUTO SUJEITO A LANÇAMENTO POR HOMOLOGAÇÃO. RECOLHIMENTO A MENOR. ART. 150, § 4º, DO CTN.

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O prazo decadencial de lançamento de tributo sujeito à homologação recolhido a menor em face de creditamento indevido é de 5 (cinco) anos contados do fato gerador, a teor do disposto no art. 150, § 4º, do CTN. “In casu”, lançado de ofício o valor suplementar do ICMS em 04/11/2010 e notificado o contribuinte em 10/11/2010, verificou-se a decadência do crédito tributário cujo fato gerador ocorreu antes de 10/11/2005. Precedentes do STJ e desta Corte. MULTA LEGAL QUALIFICADA. PERCENTUAL DE 120%. CARÁTER CONFISCATÓRIO. LIMITAÇÃO. É pacífica a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal segundo a qual são confiscatórias as multas fiscais estabelecidas em percentual superior a 100% do valor do débito. Na espécie, constatada a apropriação de crédito de ICMS não previsto na legislação tributária (infração prevista no art. 8º, inc. I, ‘j’, da Lei Estadual nº 6.537/73), é devida a multa qualificada, cujo montante não pode ultrapassar ao percentual de 100% sobre o valor do principal. APELO DO ESTADO DESPROVIDO. APELO DA EMPRESA EMBARGANTE PROVIDO EM PARTE.

APELAÇÃO CÍVEL

VIGÉSIMA SEGUNDA CÂMARA CÍVEL

Nº 70071745830 (Nº CNJ: 0384777-73.2016.8.21.7000)

COMARCA DE PORTO ALEGRE

AMBEV COMPANHIA DE BEBIDAS DAS AMERICAS

APELANTE/APELADO

ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL

APELANTE/APELADO

A C Ó R D Ã O

Vistos, relatados e discutidos os autos.

Acordam os Desembargadores integrantes da Vigésima Segunda Câmara

Cível do Tribunal de Justiça do Estado, à unanimidade, em desprover o apelo do embargado

e dar parcial provimento ao apelo da embargante.

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Custas na forma da lei.

Participaram do julgamento, além do signatário, os eminentes Senhores

DES. FRANCISCO JOSÉ MOESCH (PRESIDENTE) E DES.ª MARILENE BONZANINI.

Porto Alegre, 14 de setembro de 2017.

DES. MIGUEL ÂNGELO DA SILVA,

Relator.

R E L A T Ó R I O

DES. MIGUEL ÂNGELO DA SILVA (RELATOR)

ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL e AMBEV S/A interpõem recursos de

apelação da sentença proferida nos embargos opostos à execução fiscal que aquele ajuizou

contra essa, cujo dispositivo enuncia, "in verbis":

"ISSO POSTO, julgo parcialmente procedentes os embargos, apenas para para declarar a decadência do direito de o Estado lançar o débito fiscal apurado, no período compreendido entre 01/01/2005 e 10/11/2005.

Diante da sucumbência recíproca, condeno a embargante ao pagamento de 80% das custas processuais (reembolso) e honorários advocatícios, que fixo em R$ 3.500,00 (três mil e quinhentos reais). O embargado, por sua vez, arcará com o pagamento de 20% das custas processuais e honorários ao procurador da parte adversa, que vão fixados em R$ 980,00 (novecentos e oitenta reais), considerando, em ambos os casos, o trabalho desenvolvido e a natureza da causa (os embargos tramitam desde novembro de 2012, com dilação probatória), em conformidade com o art. 20, § 4º, do CPC."

Em razões (fls. 1156/1169), a empresa embargante sustenta, em preliminar,

a necessidade de realização de nova perícia ou de complementação da já efetuada. Alega

que o direito ao creditamento de ICMS depende da análise da natureza dos bens

adquiridos, e não, conforme concluiu a “expert”, da verificação das notas fiscais. Afirma

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que a controvérsia suscitada nos embargos não foi devidamente esclarecida pelo laudo

pericial, não se podendo conceber corretos os valores glosados. Destaca que o objetivo da

perícia era identificar, em cada caso, se os bens adquiridos pela empresa destinavam-se ou

não à manutenção da fonte produtiva, não contendo o laudo pericial resposta conclusiva a

respeito. Assevera que o tema em análise não é da expertise da Sra. Perita (contadora),

“ficando claro que se mostrava necessária a complementação da perícia, desta vez por um

profissional formado em engenharia”. No mérito, enfatiza que as "partes e peças

destinadas a máquinas e equipamentos em geral" foram classificadas pela perícia como

ativo fixo da empresa, gerando direito ao crédito de ICMS. Sublinha que a sentença, no

particular, partiu de premissa equivocada, de modo que “descabe invocar o princípio do

livre convencimento motivado quando a decisão julga a causa como se não tivessem sido

produzidas as provas que confirmam a causa de pedir da Apelante”. Quanto aos "materiais

de construção, reforma e ampliação", argumenta que, embora não ligados diretamente ao

seu processo produtivo, nem por isso deixam de ser úteis ou até mesmo necessários à

atividade industrial como um todo. Ressalta que, “sendo úteis, e não se qualificando como

bens de consumo, geram o direito ao creditamento por ocasião da entrada”. Pondera não

haver dúvidas “de que os galpões ou telhas adquiridos pela Apelante (dentre inúmeros

outros itens glosados pela fiscalização) foram utilizados na construção de imóveis”,

classificando-se “como o produto final, no ativo fixo/imobilizado, gerando o direito ao

crédito na aquisição”. Aduz que a aplicação da multa qualificada prevista no art. 9º, inc. III,

da Lei nº 6.537/73, “pressupõe atitude dolosa do contribuinte tendente a ocultar a

obrigação tributária”, o que não se verificou “in casu”. Argumenta que não houve qualquer

dolo de sua parte, muito menos falsificação ou adulteração de livros, havendo, quando

muito, mera controvérsia quanto à correta classificação contábil de determinados itens.

Deduz que a multa qualificada arbitrada em 120% sobre o total devido é manifestamente

confiscatória. Requer o provimento do apelo “para que, anulando-se a r. sentença

recorrida, seja determinado o retorno dos autos à primeira instância para que seja realizada

perícia complementar por Perito Engenheiro”. Subsidiariamente, pugna sejam os embargos

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julgados procedentes, a fim de se tornar insubsistente a execução fiscal embasada no Auto

de Infração nº 0022538682.

Nas razões de apelo (fls. 1213-1218), o Estado embargado sustenta que não

há falar em decadência do crédito exequendo. Afirma que a empresa embargante reduziu o

montante do tributo devido, creditando-se indevidamente de valores pagos a título de

ICMS na aquisição de bens que não se integraram ao seu ativo fixo ou imobilizado, em

manifesta afronta à legislação de regência. Alega que, em razão disso, o prazo de

decadência tem como marco inicial o primeiro dia do exercício seguinte àquele em que o

lançamento poderia ter sido efetuado, nos termos do art. 173, inc. I, do CTN. Destaca que o

art. 150, § 4º, do CTN tem aplicação restrita à parcela do imposto paga antecipadamente,

não incidindo na espécie. Enfatiza que, no período compreendido entre jan/2005 e

nov/2005, o termo inicial da contagem dos 5 (cinco) anos do prazo decadencial só ocorreu

em 01/01/2006, com o que o direito à constituição do crédito só se extinguiria em

31/12/2011. Ressalta que na data da notificação do lançamento (10/11/2010), a

decadência ainda não se havia consumado. Requer “seja provido o apelo, ao fim de que seja

julgado na integralidade”.

Os apelos foram respondidos (fls. 1203-1212 e 1223-1231).

Nesta instância, o Ministério Público exarou parecer opinando pelo parcial

provimento de ambos os recursos (fls.1234-1243).

Vieram os autos conclusos.

É o relatório.

V O T O S

DES. MIGUEL ÂNGELO DA SILVA (RELATOR)

Conheço de ambos os apelos, pois preenchidos seus requisitos de

admissibilidade.

Cuida-se de embargos opostos por AMBEV S/A à execução fiscal de débito

de ICMS não informado que lhe move o ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL (cf. CDA de fl. 03

do apenso).

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Necessidade de realização de nova perícia ou de complementação da já

efetuada. Preliminar rejeitada. Matéria preclusa.

De saída, rejeito a alegação de nulidade do processo por cerceamento de

defesa.

Descabe falar em necessidade de realização de nova perícia ou de

complementação do laudo pericial contábil produzido no feito, porquanto a embargante, já

em maio de 2013, ao se manifestar quando instada a indicar provas a produzir, requereu

unicamente a realização de perícia de natureza contábil (fl. 314).

Ademais, aberto o prazo para oferecimento de memoriais escritos, não se

insurgia a embargante de pronto contra o provimento judicial que declarou encerrada a

fase instrutória.

Bem analisou o tópico o parecer ministerial de lavra do ilustre Procurador

de Justiça Julio Cesar da Silva Rocha Lopes, do qual destaco este excerto, "in litteris":

“A controvérsia dos autos diz respeito, em linhas gerais, à necessidade de

realização de nova prova pericial ou, ao menos, de complementação da perícia efetuada.

Ocorre que, concluída a perícia e intimada a autora, esta impugnou o método

utilizado pela perita, apontando que o equívoco ocorreu “porque o tema envolvido não é de sua

expertise (a Sra. Perita é contadora). Diante disso, mister seja designado novo perito judicial na área

de engenharia, a fim de que o mesmo forneça elementos hábeis a um deslinde adequado (e justo) da

demanda (fls. 1132/1138).

No entanto, a designação da perita ocorreu em 28.06.2013 (fl. 323), sendo sua

qualificação apontada quando aceitou o encargo para o qual foi nomeada (fl.324), sem que tenha

sido oposta qualquer insurgência.

Assim, há que ser reconhecida a preclusão do pleito ora posto no na via recursal.

Isto porque, passados anos da designação da perita contadora, não houve insurgência da parte. A

decisão, assim tomou contornos de definitividade, não podendo agora ser objeto de discussão.

Sobre a preclusão, leciona Fredie Didier Jr.:

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De acordo com o princípio da preclusão, o procedimento não deve ser interrompido ou embaraçado (ou, ao menos, as interrupções e os embaraços devem ser reduzidos ao mínimo inevitável). Deve-se caminhar sempre avante, de forma ordenada e proba: não se admite o retorno para etapas processuais já ultrapassadas; não se tolera a adoção de comportamentos incoerentes e contraditórios1.

Assim, percebe-se que, no momento adequado para se insurgir, o procurador da

parte permaneceu, ao que parece, silente quanto ao ponto, razão pela qual precluso está o pleito ora

posto em sede recursal.

Nesse sentido, julgado do Tribunal de Justiça:

Ementa: AGRAVO DE INSTRUMENTO. PROVA PERICIAL. PERITO NOMEADO PELO JUÍZO. IMPUGNAÇÃO AO PERITO. PRECLUSÃO. A impugnação ao perito deve ocorrer na primeira oportunidade em que couber à parte falar nos autos, e não após a apresentação do laudo pericial, como ocorreu in casu. Trata-se, pois, de matéria encoberta pela preclusão. Inteligência do art. 138, parágrafo 1º, do Código de Processo Civil. AGRAVO DE INSTRUMENTO DESPROVIDO. (Agravo de Instrumento Nº 70063233894, Segunda Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: João Barcelos de Souza Junior, Julgado em 03/06/2015)

Ementa: AGRAVO DE INSTRUMENTO. DESAPROPRIAÇÃO. PROVA PERICIAL. IMPUGNAÇÃO AO PERITO. PRECLUSÃO TEMPORAL E LÓGICA. 1. A impugnação da qualificação do expert deve ocorrer quando da nomeação e não após a apresentação do laudo pericial, sob pena de consumação da preclusão temporal. Precedentes do STJ e desta Corte. 2. Havendo expressa manifestação reconhecendo a qualificação do Perito para a avaliação, opera-se a preclusão lógica que impede a sua impugnação posterior. Precedentes desta Câmara. Agravo de Instrumento provido. (Agravo de Instrumento Nº 70061824660, Quarta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Francesco Conti, Julgado em 17/12/2014)”

De efeito.

Do detido compulsar dos autos constata-se que, após nomeada “Perita

Contábil” para realizar a prova pericial (cf. fls. 323-325), a empresa embargante de pronto

1 DIDIER JR. Fredie. Curso de Direito Processual Civil: Teoria Geral do Processo e Processo de Conhecimento. 9ª ed., rev., ampl. e atual., v. 1. Editora JusPODIVM: Salvador, 2008. p. 271.

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aportou comprovante de antecipação dos honorários periciais, indicou assistente técnico e

formulou quesitos, sem questionar a capacidade técnica do perito nomeado pelo juízo (fl.

334).

Assim, inviável que, efetuada a perícia e declarada finda a fase probatória,

suscite a embargante, ao depois, questão preclusa.

A propósito, anotam LUIZ GUILHERME MARINONI e SÉRGIO CRUZ

ARENHART (“in” Curso de Processo Civil, vol. II, Processo de Conhecimento, Ed. Revista dos

Tribunais, SP, 2011, 10ª ed. rev. e atual., p. 626): “O processo é uma marcha para frente,

tendente a atingir certo objetivo predeterminado, que é a prestação integral da tutela jurisdicional.

Para que o processo possa seguir sempre adiante, é preciso que se criem

mecanismos destinados a impedir a repetição da prática de atos processuais ou o retorno a fases e

atos já praticados, evitando-se, com isso, contradições (entre atos já praticados e outros a serem

praticados) e círculos viciosos na tramitação processual.”

Desse modo, não impugnada oportunamente a qualificação ou capacitação

técnica do expert nomeado para realizar a perícia, a questão restou preclusa.

Creditamento de ICMS. Princípio da não-cumulatividade. LC nº 87/93.

Na espécie, do auto de lançamento juntado às fls. 04-15 do feito apensado,

vê-se que o executivo fiscal tem por base autuação assente em imposto não informado,

verificando-se alegada apropriação indevida de valores a título de ICMS.

O crédito glosado, referente a aquisições efetuadas pela empresa

embargante nos exercícios de 2001 a 2009, foi dividido pelo Fisco Estadual no auto de

lançamento em dois itens específicos, nestes termos, “verbis”:

“Dividimos este Auto de Lançamento em dois itens específicos de glosa de crédito fiscal referente a aquisições efetuadas nos exercícios de 2001 a 2009, apropriados no período de janeiro de 2005 a junho de 2010:

I – Créditos fiscais glosados, correspondentes às aquisições de imobilizado, cujo aproveitamento é indevido.

II – Créditos fiscais glosados, correspondentes a aquisições de materiais e peças de manutenção.”

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- Peças destinadas a máquinas e equipamentos.

Em relação às "peças destinadas a máquinas e equipamentos", o auto de

lançamento as identifica como bens de uso e consumo do estabelecimento (cf. fls. 14-15 do

apenso). E não há nos autos prova de que integrariam o ativo imobilizado da empresa,

como sustenta a embargante.

O laudo pericial de fls. 353-369, aliás, é categórico em asseverar que “Os

bens do ativo imobilizado que estão listados no auto de infração, não puderam ser

identificados, por que não foram disponibilizadas as notas fiscais com as correspondentes

informações analíticas que descrevam quais são os materiais e/ou produtos que foram

agregados ao bem que foi imobilizado, para permitir a identificação dos mesmos, para ver

se é máquina, equipamento, instalações, etc.”.

Assim, impende atentar à limitação temporal imposta pelo art. 33, inc. I, da

LC nº 87/96, que prevê a impossibilidade de aproveitamento de crédito fiscal decorrente da

entrada de mercadorias destinadas ao uso ou consumo do estabelecimento contribuinte

até 31/12/2019.

Pois bem.

A consagrar o princípio da não-cumulatividade em matéria tributária,

dispõe o art. 155, § 2º, inc. I, da CF, “in litteris”:

Art. 155. Compete aos Estados e ao Distrito Federal instituir impostos sobre:

(...)

II - operações relativas à circulação de mercadorias e sobre prestações de serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação, ainda que as operações e as prestações se iniciem no exterior;

§ 2º O imposto previsto no inciso II atenderá ao seguinte:

I - será não-cumulativo, compensando-se o que for devido em cada operação relativa à circulação de mercadorias ou prestação de serviços com o montante cobrado nas anteriores pelo mesmo ou outro Estado ou pelo Distrito Federal;

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Com base no referido princípio, é autorizado ao sujeito passivo, na

qualidade de contribuinte de direito, efetuar compensação do imposto sobre circulação de

mercadorias na forma dos arts. 20 e 33, inc. I, da Lei Complementar nº 87/96, prevendo tais

dispositivos:

Art. 20. Para a compensação a que se refere o artigo anterior, é assegurado ao sujeito passivo o direito de creditar-se do imposto anteriormente cobrado em operações de que tenha resultado a entrada de mercadoria, real ou simbólica, no estabelecimento, inclusive a destinada ao seu uso ou consumo ou ao ativo permanente, ou o recebimento de serviços de transporte interestadual e intermunicipal ou de comunicação.

Art. 33. Na aplicação do art. 20 observar-se-á o seguinte:

I – somente darão direito de crédito as mercadorias destinadas ao uso ou consumo do estabelecimento nele entradas a partir de 1o de janeiro de 2020;

Por sua vez, dispõem os arts. 31, I, ‘b’, e 33, XII, ambos do Livro I do

Regulamento do ICMS/RS (Decreto nº 37.699/97), "in verbis":

Art. 31 - Para a compensação a que se refere o artigo anterior, é assegurado ao sujeito passivo o direito de creditar-se do imposto:

NOTA - Ver: hipóteses em que não é admitido crédito fiscal, art. 33; apropriação de crédito fiscal mediante a emissão de Nota Fiscal relativa à entrada, Livro II, art. 26.

I - anteriormente cobrado e destacado na 1ª via do documento fiscal, nos termos do disposto neste Capítulo, em operações ou prestações de que tenha resultado:

a) a entrada de mercadorias, real ou simbólica, inclusive as destinadas ao ativo permanente do estabelecimento, ou o recebimento de prestações de serviços de transporte interestadual e intermunicipal;

(...)

b) a partir de 1º de janeiro de 2020, a entrada de mercadorias destinadas ao uso ou consumo do estabelecimento;

NOTA - Incluem-se entre as mercadorias destinadas ao uso ou consumo do estabelecimento, as partes, peças e acessórios de máquinas, adquiridos em separado, considerando:

a) "parte", como o elemento ou porção de um todo, cuja retirada descaracteriza a máquina;

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b) "peça", como cada uma das partes que compõem a máquina e a integram individualmente, destinadas à reposição; (...)

Art. 33 - Para efeito de apuração do montante devido a que se referem os arts. 37 e 38, não é admitido crédito fiscal:

(...)

XII - até 31 de dezembro de 2019, relativo à entrada de mercadorias destinadas ao uso ou consumo do estabelecimento; (Redação dada pelo art. 1º (Alteração 3345) do Decreto 47.805, de 27/01/11. (DOE 28/01/11) - Efeitos a partir de 01/01/11.) (...)

Desse modo, no tocante às aquisições de mercadorias destinadas ao uso ou

consumo do estabelecimento, a Lei Complementar nº 87/96, prevê, às expressas, a

possibilidade de creditamento do imposto somente a partir de 01/01/2020.

E tal limitação temporal é considerada legítima pela jurisprudência assente

do eg. Superior Tribunal de Justiça:

TRIBUTÁRIO. ICMS. EXPORTAÇÃO. DIREITO DE CRÉDITOS NAS OPERAÇÕES ANTERIORES. LIMITAÇÃO TEMPORAL DA LC 87/1996. LEGALIDADE.

1. Consoante jurisprudência do STJ, são legítimas as restrições impostas pela Lei Complementar 87/1996, inclusive a limitação temporal prevista em seu art. 33, para o aproveitamento dos créditos de ICMS em relação à aquisição de bens destinados ao uso e consumo ou ao ativo permanente do estabelecimento contribuinte.

2. A alegação de que a restrição temporal estabelecida no art. 33, inciso I, da LC 87/1996 não seria aplicável às operações de exportação, por ser incompatível com o art. 155, §2º, inciso X, "a", da Constituição Federal, na redação que lhe foi dada pela Emenda constitucional 42/2003, não pode se analisada pelo STJ, pois tal discussão cabe ao STF, por ser matéria de índole constitucional.

3. Agravo Regimental não provido.

(AgRg nos EDcl no REsp 1275994/RS, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 05/06/2012, DJe 15/06/2012)

TRIBUTÁRIO – ICMS – AQUISIÇÃO DE BENS DESTINADOS AO ATIVO FIXO – CREDITAMENTO - LIMITAÇÕES IMPOSTAS POR LEIS COMPLEMENTARES.

1. Embora possível o creditamento de ICMS na aquisição de bens destinados ao ativo fixo após a vigência da Lei Complementar

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87/96, são válidas as restrições qualitativas e temporais ao creditamento estabelecidas por Leis Complementares posteriores. Precedentes do STJ e do STF.

2. Não há óbice em escalonar o legislador ordinário a outorga de um crédito concedido sob a rubrica da isenção.

3. Recurso especial não provido.

(REsp 1105151/SP, Rel. Ministra ELIANA CALMON, SEGUNDA TURMA, julgado em 23/04/2009, DJe 13/05/2009)

Portanto, em relação às peças destinadas a máquinas e equipamentos

adquiridas pela empresa embargante, impõe-se mantida a glosa impugnada.

- Materiais de construção, reforma e ampliação.

No tocante aos materiais de construção, reforma e ampliação do

estabelecimento contribuinte, bem examinou a controvérsia a sentença apelada, nestes

termos, “verbis”:

“Especialmente em relação aos materiais de construção, entendo que correta a

glosa realizada pela autoridade fiscal. Ocorre que, embora a construção integre o ativo permanente

da empresa, os materiais empregados não estão relacionados à atividade exercida pela autora

(fabricante e distribuidora de bebidas e alimentos).

No mesmo sentido, são os seguintes julgado do Superior Tribunal de Justiça:

AGRAVO REGIMENTAL EM AGRAVO DE INSTRUMENTO. ICMS. CREDITAMENTO. BENS DESTINADOS AO ATIVO FIXO. MATERIAL UTILIZADO NA CONSTRUÇÃO DE SUPERMERCADO. ATIVIDADE ALHEIA À FINALIDADE DA EMPRESA. IMPOSSIBILIDADE.

1. O julgamento do agravo regimental pelo Tribunal a quo, interposto contra decisão monocrática do Relator, atende o requisito da colegialidade, afastando a alegação de ofensa ao artigo 557, parágrafo 1º-A, do Código de Processo Civil, suscitada em sede de recurso excepcional.

2. Os valores de ICMS advindos dos materiais adquiridos para a construção do prédio onde funcionará o supermercado, por serem mercadorias alheias à finalidade da empresa, não podem ser objeto de creditamento, conforme permite o artigo 20 da Lei Complementar nº 87/96, em virtude da exceção prevista em seu parágrafo 1º. Precedentes.

3. Agravo regimental improvido.

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(REsp AgRg no Ag nº 1.145.693/RS, 1ª Turma, Relator: Ministro Hamilton Carvalhido, julgado em 22/06/2010) – grifei.

EXECUÇÃO FISCAL. ICMS. HIPERMERCADO. MATERIAL DE CONSTRUÇÃO UTILIZADO NA EDIFICAÇÃO DA SEDE. ART. 20, § 1º, DA LEI COMPLEMENTAR Nº 87⁄96. EMPREGO EM ATIVIDADE ALHEIA À FINALIDADE DA EMPRESA. CREDITAMENTO. IMPOSSIBILIDADE. TAXA SELIC. INCIDÊNCIA. HONORÁRIOS. FUNDAMENTO. ART. 20, § 4º, DO CPC. LIMITES DE 10% E 20% MITIGADOS.

I - Esta Corte tem-se manifestado no sentido da possibilidade de creditamento dos valores despendidos para aquisição de bens destinados ao ativo imobilizado. Todavia, a hipótese dos autos se subsume à exceção prevista no parágrafo 1º do artigo 20 da Lei Complementar nº 87⁄96, pois os bens adquiridos pelo executado foram empregados na construção do prédio onde funciona o hipermercado. Neste caso, por serem aplicados em atividade alheia à finalidade da empresa, a aquisição dos referidos bens não dão direito ao creditamento pretendido.

II - (...)

IV - Recurso Especial do CARREFOUR COMÉRCIO E INDÚSTRIA LTDA improvido, Recurso Especial do ESTADO DE MINAS GERAIS parcialmente provido.

(REsp nº 860.701⁄MG, 1ª Turma, Relator: Ministro Francisco Falcão, julgado em 19⁄04⁄2007) - grifei.

(...)

Assim, o ICMS relativo à aquisição de material de construção não pode ser objeto

de creditamento, por ser mercadoria alheia à finalidade da empresa, nos termos do art. 20, § 1º, da

Lei Complementar nº 87/96.”

“In casu”, como o objeto social da empresa embargante consiste

precipuamente na produção e no comércio de bebidas e alimentos, forçoso é convir que os

materiais adquiridos para construção, reforma ou manutenção não se destinam à sua

atividade fim, o que inviabiliza o aproveitamento de crédito de ICMS pretendido, à luz do

preceituado nos arts. 20, § 1º, da LC nº 87/962, e 16 da Lei Estadual nº 8.820/893.

2 § 1º Não dão direito a crédito as entradas de mercadorias ou utilização de serviços resultantes de operações ou prestações isentas ou não tributadas, ou que se refiram a mercadorias ou serviços alheios à atividade do estabelecimento.

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A propósito, vale colacionar precedentes desta Corte:

APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO TRIBUTÁRIO. ANULATÓRIA DE ICMS. CREDITAMENTO QUANTO À AQUISIÇÃO DE MATERIAIS DESTINADOS A CONSTRUÇÃO, REFORMA OU AMPLIAÇÃO DO ESTABELECIMENTO. IMPOSSIBILIDADE. MERCADORIAS ALHEIAS À ATIVIDADE FIM DO CONTRIBUINTE. (...) 2. Com relação às aquisições de bens para uso e consumo do estabelecimento ou ao ativo permanente, somente a partir de 1º-01-2020 será possível o creditamento, pois incide a limitação temporal definida no art. 33, inc. I, da Lei Complementar nº 87/96. Não bastasse a mencionada limitação temporal ao creditamento de ICMS nas aquisições de bens uso e consumo e do ativo permanente (no que se insere a aquisição de mercadorias e bens para a construção e reforma de estabelecimento), de qualquer modo, não logra êxito a demandante. Ocorre que, com relação à aquisição de materiais destinados a construção, reforma ou ampliação do estabelecimento, incide a restrição prevista no art. 20, § 1º, da Lei Complementar nº 87/96, uma vez que configuram mercadorias alheias à atividade do estabelecimento. Vedação específica contida no art. 16, inc. V, da Lei Estadual nº 8.820/89 e no art. 33 do RICMS/RS. Precedentes desta Corte e do STJ. (...) (AgRg no Ag 1145693/RS). APELAÇÃO DESPROVIDA (Apelação Cível Nº 70064368988, Segunda Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Ricardo Torres Hermann, Julgado em 24/06/2015)

AGRAVO EM APELAÇÕES CÍVEIS. DIREITO TRIBUTÁRIO. ICMS. PRELIMINAR DE NULIDADE DO AUTO DE LANÇAMENTO POR AUSÊNCIA DE ESPECIFICAÇÃO DA MATÉRIA TRIBUTÁVEL. INOCORRÊNCIA. DECADÊNCIA. CREDITAMENTO INDEVIDO. APLICAÇÃO DO ART. 150, §4º, DO CTN. CREDITAMENTO DE BENS OBJETO DE COMODATO. POSSIBILIDADE. INOCORRÊNCIA DE CIRCULAÇÃO JURÍDICA DE MERCADORIAS. MERCADORIAS DESTINADAS A USO E CONSUMO DO ESTABELECIMENTO. IMPOSSIBILIDADE DE CREDITAMENTO DIANTE DA LIMITAÇÃO TEMPORAL DA LC Nº 87/96. IMPOSSIBILIDADE DE CREDITAMENTO REFERENTE A AQUISIÇÃO DE MERCADORIA UTILIZADA NA REFORMA, CONSTRUÇÃO OU AMPLIAÇÃO DE ESTABELECIMENTO. ATIVIDADE ALHEIA À FINALIDADE DA EMPRESA. APLICAÇÃO DO ART. 21, §1º, DA LC 87/96.

3 Art. 16 - Para efeito de apuração do montante devido a que se refere o artigo 21, não é admitido crédito fiscal: (...) III - relativo à entrada de mercadorias ou utilização de serviços resultantes de operações ou prestações isentas ou não tributadas, ou que se refiram a mercadorias ou serviços alheios à atividade do estabelecimento; (...) V - relativo à entrada de mercadorias ou aos serviços recebidos que se destinem à construção, reforma ou ampliação do estabelecimento.

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HONORÁRIOS SUCUMBENCIAIS. SUCUMBÊNCIA RECÍPROCA. REDIMENSIONAMENTO. (...) 5. A atividade da embargante consiste no comércio varejista, de forma que a aquisição de materiais de construção, reforma ou mesmo ampliação de estabelecimento não gera, conforme regra do art. 20, §1º da LC n.87/96, direito ao creditamento, justamente porque tais mercadorias são alheias as atividades do estabelecimento. (...). AGRAVO PARCIALMENTE PROVIDO. (Agravo Nº 70063065932, Vigésima Segunda Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Marilene Bonzanini, Julgado em 12/03/2015)

Decadência. Tributo sujeito a lançamento por homologação.

Recolhimento a menor. Art. 150, § 4º, do CTN.

Alinhada à jurisprudência do egrégio STJ, a sentença hostilizada analisou

percucientemente a questão alusiva ao transcurso do prazo quinquenal de que dispunha o

Fisco estadual para constituição do crédito de ICMS impugnado, sublinhando o seguinte, “in

litteris”:

“De início, entendo que procede a alegação de decadência do direito da Fazenda

Pública na cobrança das diferenças de ICMS relativas ao período compreendido entre 01/01/2005 e

10/11/2005 (fl. 62), considerando que a embargante foi notificada do lançamento em 10/11/2010 (fl.

61).

É incontroverso nos autos que houve declaração e recolhimento a menor do

imposto, tanto que no auto de lançamento percebe-se que há cobrança das diferenças devidas.

Em que pesem os argumentos apresentados pelo embargado, a jurisprudência vem

se posicionando de forma pacífica, no sentido de que o prazo de decadência para constituição do

crédito tributário dos tributos sujeitos a lançamento por homologação – como é o caso do ICMS -,

quando há pagamento antecipado e parcial, é de cinco anos contados do fato gerador.

Nesse sentido, transcrevo ementa do AgRg no AREsp nº 200.933, julgado sob o rito

do art. 543-C do CPC:

TRIBUTÁRIO. AGRAVO REGIMENTAL. DECADÊNCIA. TRIBUTO SUJEITO A LANÇAMENTO POR HOMOLOGAÇÃO. PAGAMENTO PARCIAL. TERMO INICIAL. FATO GERADOR. ART. 150, § 4°, DO CTN. IMPOSSIBILIDADE DE CUMULAÇÃO COM O ART. 173, I, DO CTN. ORIENTAÇÃO CONFIRMADA EM RECURSO REPETITIVO. RECURSO MANIFESTAMENTE DESCABIDO. MULTA.

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1. Na hipótese de tributo sujeito a lançamento por homologação, quando o contribuinte constitui o crédito, mas efetua pagamento parcial, sem constatação de dolo, fraude ou simulação, o termo inicial da decadência é o momento do fato gerador. Aplica-se exclusivamente o art. 150, § 4°, do CTN, sem a possibilidade de cumulação com o art. 173, I, do mesmo diploma (REsp 973.733/SC, Rel. Ministro Luiz Fux, Primeira Seção, DJe 18/9/2009, submetido ao regime do art. 543-C do CPC).

2. In casu, os fatos geradores dizem respeito aos meses de julho a novembro de 1998, e a constituição do crédito pelo Fisco ocorreu apenas em dezembro de 2003, após o transcurso do prazo quinquenal (fl. 480). Acrescente-se que o Tribunal a quo constatou a existência de pagamento antecipado a menor, o que atrai a regra do art. 150, § 4°, do CTN (fl. 479).

3. Agravo Regimental não provido. Multa fixada em 10% do valor atualizado da causa.

(AgRg no AREsp 200.933/SC, 2ª Turma, Relator: Ministro Herman Benjamin, julgado em 20/09/2012) – grifei.

Além disso, não há como se presumir o dolo de fraude da empresa, a fim de aplicar

dispositivo legal mais prejudicial.

Assim, impõe-se o reconhecimento da decadência de parte do débito fiscal,

conforme referido acima.”

De efeito.

Conforme o entendimento jurisprudencial prevalente no eg. STJ, o prazo

decadencial para o lançamento suplementar de tributo recolhido a menor em face de

creditamento indevido é de 5 (cinco) anos, contados da ocorrência do fato gerador (art.

150, § 4º, do CTN4). Vale dizer, o termo “a quo” desse prazo não corresponde ao primeiro

dia do exercício seguinte àquele em que o lançamento poderia ter sido efetuado,

sobretudo quando não houver sido constatado qualquer indício de dolo, fraude ou

simulação do contribuinte.

Nesse sentido, invoco ilustrativo aresto do eg. STJ:

4 § 4º Se a lei não fixar prazo a homologação, será ele de cinco anos, a contar da ocorrência do fato gerador; expirado esse prazo sem que a Fazenda Pública se tenha pronunciado, considera-se homologado o lançamento e definitivamente extinto o crédito, salvo se comprovada a ocorrência de dolo, fraude ou simulação.

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TRIBUTÁRIO. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. ICMS. LANÇAMENTO SUPLEMENTAR. CREDITAMENTO INDEVIDO. PAGAMENTO PARCIAL. DECADÊNCIA. TERMO INICIAL. FATO GERADOR. ART. 150, § 4º, DO CTN.

1. O prazo decadencial para o lançamento suplementar de tributo sujeito a homologação recolhido a menor em face de creditamento indevido é de cinco anos contados do fato gerador, conforme a regra prevista no art. 150, § 4º, do CTN. Precedentes: AgRg nos EREsp 1.199.262/MG, Rel. Ministro Benedito Gonçalves, Primeira Seção, DJe 07/11/2011; AgRg no REsp 1.238.000/MG, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, DJe 29/06/2012.

2. Agravo regimental não provido. (AgRg no REsp 1318020/RS, Rel. Ministro Benedito Gonçalves, Primeira Turma, julgado em 15/08/2013, DJe 27/08/2013)

Outro não é o entendimento adotado nesta Câmara:

APELAÇÃO CÍVEL. TRIBUTÁRIO. EMBARGOS À EXECUÇÃO FISCAL. ICMS. IMPOSTO SUPOSTAMENTE INFORMADO A MENOR. APROPRIAÇÃO DE CRÉDITO PRESUMIDO. LANÇAMENTO POR HOMOLOGAÇÃO. PRAZO DECADENCIAL. TERMO INICIAL. FATO GERADOR. CONSTITUIÇÃO DO CRÉDITO TRIBUTÁRIO. METODOLOGIA APLICADA NA APURAÇÃO DO CRÉDITO PRESUMIDO. IRRETROATIVIDADE DO DECRETO Nº 45.217/2007. 1. Cuidando-se de tributo sujeito a lançamento por homologação e que teria havido pagamento antecipado inferior ao efetivamente devido a título de ICMS, sem que o contribuinte tenha incorrido em fraude, dolo ou simulação, o prazo para a Fazenda Pública constituir o crédito tributário obedece a regra prevista no § 4º do art. 150 do CTN. (...)

2. O lançamento de ofício da diferença de ICMS deveria ocorrer dentro de 5 (cinco) anos, a contar do fato gerador. No caso concreto, o fato gerador se refere ao período de janeiro a novembro de 2006 e o lançamento ocorreu em 05.12.2011, ocorrendo a decadência, não podendo a Fazenda Pública exigir da embargante o crédito tributário que ampara a CDA. (...)

APELAÇÃO DESPROVIDA. (Apelação Cível Nº 70068988401, Vigésima Segunda Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: José Aquino Flôres de Camargo, Julgado em 14/07/2016).

“In casu”, portanto, lançado de ofício o valor suplementar do ICMS em

04/11/2010 e notificado o contribuinte em 10/11/2010 (cf. fl. 61), evidente a decadência

do crédito tributário com fato gerador anterior a nov/2005.

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Por conseguinte, no tópico, não vinga o apelo do Estado.

Multa legal qualificada. Percentual de 120%. Caráter confiscatório.

Limitação. Cabimento.

No tocante à multa legal qualificada de 120% aplicada pela Fazenda Pública,

a inconformidade da embargante procede em parte.

Enquadrando-se a conduta praticada pela contribuinte (aproveitamento

integral do crédito de ICMS sobre o valor pago na aquisição de mercadorias) à hipótese

prevista no art. 8º, inc. I, ‘j’, da Lei Estadual nº 6.537/735, afigura-se devida a multa

qualificada prevista no art. 9º, inc. III6, do mesmo diploma, limitada, entretanto, ao

montante equivalente a 100% sobre o valor do principal.

É que, consoante entendimento assente na jurisprudência do eg. Supremo

Tribunal Federal, o valor da obrigação principal deve funcionar como limitador da multa

estipulada na norma sancionatória, considerando-se confiscatórias as multas fiscais

punitivas cujo montante excede o percentual de 100% do valor do tributo devido.

Nesse sentido, à guisa de ilustração:

AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO. MULTA PUNITIVA DE 120% REDUZIDA AO PATAMAR DE 100% DO VALOR DO TRIBUTO. ADEQUAÇÃO AOS PARÂMETROS DA CORTE. A multa punitiva é aplicada em situações nas quais se verifica o descumprimento voluntário da obrigação tributária prevista na legislação pertinente. É a sanção prevista para coibir a burla à atuação da Administração tributária. Nessas circunstâncias, conferindo especial destaque ao caráter pedagógico da sanção, deve ser reconhecida a possibilidade de aplicação da multa em percentuais mais rigorosos, respeitados os princípios constitucionais relativos à matéria. A Corte tem firmado entendimento no sentido de que o

5 Art. 8º - Consideram-se, ainda: I - qualificadas, as seguintes infrações tributárias: (...) j) reduzir o montante do imposto devido mediante a apropriação de valor a título de crédito de ICMS, não previsto na legislação tributária. 6 Art. 9º - Às infrações tributárias materiais serão cominadas as seguintes multas: (...) III - de 120% do valor do tributo devido, se qualificadas.

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valor da obrigação principal deve funcionar como limitador da norma sancionatória, de modo que a abusividade revela-se nas multas arbitradas acima do montante de 100%. Entendimento que não se aplica às multas moratórias, que devem ficar circunscritas ao valor de 20%. Precedentes. O acórdão recorrido, perfilhando adequadamente a orientação jurisprudencial do Supremo Tribunal Federal, reduziu a multa punitiva de 120% para 100%. Agravo regimental a que se nega provimento. (ARE 836828 AgR, Relator(a): Min. ROBERTO BARROSO, Primeira Turma, julgado em 16/12/2014, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-027 DIVULG 09-02-2015 PUBLIC 10-02-2015) AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO. MULTA FISCAL. CARÁTER CONFISCATÓRIO. VIOLAÇÃO AO ART. 150, IV, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. AGRAVO IMPROVIDO. I – Esta Corte firmou entendimento no sentido de que são confiscatórias as multas fixadas em 100% ou mais do valor do tributo devido. Precedentes. II – Agravo regimental improvido. (RE 657372 AGR, Relator(a): Min. Ricardo Lewandowski, Segunda Turma, julgado em 28/05/2013, acórdão eletrônico DJE-108 divulg 07-06-2013 public 10-06-2013)

Idêntico entendimento tem perfilhado este Colegiado:

APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO TRIBUTÁRIO. ICMS. CONCESSÃO DE CRÉDITO PRESUMIDO. CONDICIONAMENTO À INEXISTÊNCIA DE DÉBITOS INSCRITOS EM DÍVIDA ATIVA OU À GARANTIA DESSES, NAS FORMAS PREVISTAS PELA NOTA 05 DO RICMS. POSSIBILIDADE. O Decreto n. 37.699/1997 (Regulamento do ICMS) fundamenta-se no Convênio ICMS 20/08, cuja cláusula primeira autoriza os Estados a vedar a fruição de créditos presumidos pelo contribuinte que tenha crédito tributário inscrito como Dívida Ativa, salvo se esse crédito tributário estiver parcelado, ou garantido na forma da lei. Podendo o Estado dispor sobre a revogação de crédito presumido, evidente a possibilidade de dispor igualmente sobre o condicionamento dessa presunção aos casos em que a garantia se der por depósito em dinheiro, fiança bancária, hipoteca ou penhora de bens imóveis registrada no R.I.. Legalidade. Precedentes. MULTA. PERCENTUAL DE 120%. CARÁTER CONFISCATÓRIO. LIMITAÇÃO. CABIMENTO. A multa fiscal de 120% foi considerada confiscatória pelo STF. Redução do percentual da multa para 100% do valor do débito, de acordo com o entendimento do Supremo Tribunal Federal e desta Câmara. Precedentes. APELAÇÃO PARCIALMENTE PROVIDA. UNÂNIME. (Apelação Cível Nº 70069784791, Vigésima

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Segunda Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Denise Oliveira Cezar, Julgado em 10/11/2016) APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO TRIBUTÁRIO. EXECUÇÃO FISCAL. EMBARGOS. ICMS. SUBSTITUIÇÃO TRIBUTÁRIA. TRANSFERÊNCIAS ENTRE MATRIZ E FILIAL. INAPLICABILIDADE, NO CASO CONCRETO, À LUZ DO ART. 219, I E II, DO LIVRO III DO RICMS/RS. MULTA QUALIFICADA. CARÁTER CONFISCATÓRIO. REDUÇÃO. (...) - O princípio do não confisco em matéria tributária (art. 150, IV, da CRFB) constitui a interdição, pela Constituição da República, de qualquer pretensão governamental que possa conduzir à injusta apropriação estatal, ainda que parcial, do patrimônio ou dos rendimentos dos contribuintes, o que significaria o comprometimento do exercício de direitos fundamentais diante da insuportabilidade da carga tributária. Nesse sentido, segundo entendimento do STF e do TJRS, nas hipóteses em que fixada acima de 100%, a multa ostenta caráter confiscatório. Na espécie, reduzida a multa fiscal ao percentual de 100%. APELO PARCIALMENTE PROVIDO. (Apelação Cível Nº 70070833017, Vigésima Segunda Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Marilene Bonzanini, Julgado em 27/10/2016)

Assim, impende reduzir a multa imposta pelo Fisco Estadual a 100% sobre o

valor do principal do crédito tributário, em sintonia com a norma inscrita no art. 150, inc.

IV, da CF/88, a estabelecer vedação expressa ao emprego do tributo com finalidade

confiscatória.

Dispositivo:

Ante o exposto, voto por desprover o apelo do Estado e dar parcial

provimento à apelação da empresa embargante, apenas para limitar o montante da multa

qualificada a 100% do valor do principal do débito.

Não havendo alteração significativa na proporção do decaimento das

partes, estou em manter os ônus da sucumbência tal como fixados na sentença.

DES. FRANCISCO JOSÉ MOESCH (PRESIDENTE)

Estou de acordo com o Relator.

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No tocante à prova pericial, a questão mostra-se preclusa, na medida em

que a qualificação/capacidade técnica do perito deveria ter sido impugnada no momento

da sua nomeação.

Quanto ao creditamento do imposto decorrente da aquisição de

mercadorias destinadas ao uso e consumo do estabelecimento, resta caracterizada sua

impossibilidade, visto que a limitação temporal prevista nos arts. 33 da LC nº 87/96 e 31 e

33 do RICMS/RS deve ser respeitada.

Em recente precedente do Supremo Tribunal Federal, foi reconhecido que

as operações de aquisição de materiais de uso e consumo não geram direito a crédito de

ICMS, bem como que as alterações previstas no art. 33 da LC 87/96 não violam o princípio

da não-cumulatividade:

EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO. EMBARGOS RECEBIDOS COMO AGRAVO REGIMENTAL. TRIBUTÁRIO. ICMS. CRÉDITO. AQUISIÇÃO DE BENS DESTINADOS AO CONSUMO OU ATIVO FIXO. PRINCÍPIO DA NÃO CUMULATIVIDADE. BENEFÍCIO FISCAL. PRINCÍPIO DA ISONOMIA. LEGISLADOR POSITIVO. VERIFICAÇÃO DA DESTINAÇÃO DOS BENS ADQUIRIDOS PELO CONTRIBUINTE. INCURSIONAMENTO NO CONTEXTO FÁTICO-PROBATÓRIO DOS AUTOS. SÚMULA Nº 279 DO STF. LEGISLADOR POSITIVO. 1. Os embargos de declaração opostos objetivando a reforma da decisão do relator, com caráter infringente, devem ser convertidos em agravo regimental, que é o recurso cabível, por força do princípio da fungibilidade. (Precedentes: Pet 4.837-ED, rel. Min. Cármen Lúcia, Tribunal Pleno, DJ de 14/3/2011; Rcl 11.022-ED, rel. Min. Cármen Lúcia, Tribunal Pleno, DJ de 7/4/2011; AI 547.827-ED, rel. Min. Dias Toffoli, 1ª Turma, DJ de 9/3/2011; RE 546.525-ED, rel. Min. Ellen Gracie, 2ª Turma, DJ de 5/4/2011). 2. A inexistência de direito a crédito de ICMS pago em razão de operações de consumo de energia elétrica, de utilização de serviços de comunicação ou de aquisição de bens destinados ao ativo fixo e de materiais de uso

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e consumo não viola o princípio da não cumulatividade. De igual modo, não ofendem o princípio da não cumulatividade a modificação introduzida no art. 20, § 5º, da LC 87/96, e as alterações ocorridas no art. 33 da mencionada lei. 3. O Poder Judiciário não pode atuar na condição de legislador positivo, para, com base no princípio da isonomia, desconsiderar os limites objetivos e subjetivos estabelecidos na concessão de benefício fiscal, de sorte a alcançar contribuinte não contemplado na legislação aplicável, ou criar situação mais favorável ao contribuinte, a partir da combinação – legalmente não permitida – de normas infraconstitucionais. (...) (ARE 710026 ED, Relator(a): Min. LUIZ FUX, Primeira Turma, julgado em 07/04/2015, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-075 DIVULG 22-04-2015 PUBLIC 23-04-2015)

Da mesma forma, a jurisprudência é uníssona no sentido de que os valores

de ICMS advindos dos materiais adquiridos para a construção, reforma ou ampliação do

estabelecimento, por serem mercadorias alheias à finalidade da empresa, não podem ser

objeto de creditamento.

Nesse sentido já se manifestou o Superior Tribunal de Justiça:

AGRAVO REGIMENTAL EM AGRAVO DE INSTRUMENTO. ICMS. CREDITAMENTO. BENS DESTINADOS AO ATIVO FIXO. MATERIAL UTILIZADO NA CONSTRUÇÃO DE SUPERMERCADO. ATIVIDADE ALHEIA À FINALIDADE DA EMPRESA. IMPOSSIBILIDADE.

1. O julgamento do agravo regimental pelo Tribunal a quo, interposto contra decisão monocrática do Relator, atende o requisito da colegialidade, afastando a alegação de ofensa ao artigo 557, parágrafo 1º-A, do Código de Processo Civil, suscitada em sede de recurso excepcional.

2. Os valores de ICMS advindos dos materiais adquiridos para a construção do prédio onde funcionará o supermercado, por serem mercadorias alheias à finalidade da empresa, não podem ser objeto de creditamento, conforme permite o artigo 20 da Lei Complementar nº 87/96, em virtude da exceção prevista em seu parágrafo 1º. Precedentes.

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3. Agravo regimental improvido.

(AgRg no Ag 1145693/RS, Rel. Ministro HAMILTON CARVALHIDO, PRIMEIRA TURMA, julgado em 22/06/2010, DJe 03/08/2010)

Também, o Supremo Tribunal Federal:

Agravo regimental no recurso extraordinário. Contribuinte que pretende creditar-se do ICMS decorrente da aquisição de materiais para reforma e construção, ainda que explore atividade comercial desatrelada dos fins a que se destinam as mercadorias. Tentativa de classificar os bens como ativo fixo. Impossibilidade. Os bens destinados ao ativo fixo estão sujeitos a um regime de creditamento que não provém da Carta Política. A estreita via do recurso extraordinário não comporta o debate sobre a classificação das mercadorias. Incidência da Súmula nº 279 na espécie. 1. A agravante vindica o direito de creditar-se de mercadorias supostamente destinadas ao ativo fixo. Pretensão que deve ser rechaçada de plano em virtude de o referido crédito possuir fundamento na Lei Complementar nº 87/96, não tendo, portanto, a tese de direito ressonância constitucional. 2. A contribuinte pretende fazer imprimir a predicação de ativo fixo às mercadorias que destinou a reforma e construção de estabelecimento. A estreita via do apelo extremo não comporta o debate acerca da classificação das mercadorias, dada a vedação ao reexame de fatos e provas. Óbice constante da Súmula nº 279/STF. 3. Agravo regimental não provido. (RE 489012 AgR, Relator(a): Min. DIAS TOFFOLI, Primeira Turma, julgado em 06/08/2013, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-188 DIVULG 24-09-2013 PUBLIC 25-09-2013)

Relativamente à decadência, aplicável o disposto no § 4º do art. 150 do CTN

nos casos de imposto sujeito a lançamento por homologação em que o contribuinte efetua

o pagamento antecipado do tributo, ainda que parcial, como in casu.

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Assim, considerando a notificação do contribuinte em 10/11/2010, resta

caracterizada a decadência dos créditos anteriores a Nov/2005.

Por fim, a multa de 120% deve ser reduzida, porquanto o Supremo Tribunal

Federal firmou entendimento no sentido de que são confiscatórias as multas punitivas

fixadas acima de 100% do valor do tributo devido:

AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO. MULTA PUNITIVA DE 120% REDUZIDA AO PATAMAR DE 100% DO VALOR DO TRIBUTO. ADEQUAÇÃO AOS PARÂMETROS DA CORTE. A multa punitiva é aplicada em situações nas quais se verifica o descumprimento voluntário da obrigação tributária prevista na legislação pertinente. É a sanção prevista para coibir a burla à atuação da Administração tributária. Nessas circunstâncias, conferindo especial destaque ao caráter pedagógico da sanção, deve ser reconhecida a possibilidade de aplicação da multa em percentuais mais rigorosos, respeitados os princípios constitucionais relativos à matéria. A Corte tem firmado entendimento no sentido de que o valor da obrigação principal deve funcionar como limitador da norma sancionatória, de modo que a abusividade revela-se nas multas arbitradas acima do montante de 100%. Entendimento que não se aplica às multas moratórias, que devem ficar circunscritas ao valor de 20%. Precedentes. O acórdão recorrido, perfilhando adequadamente a orientação jurisprudencial do Supremo Tribunal Federal, reduziu a multa punitiva de 120% para 100%. Agravo regimental a que se nega provimento.

(ARE 836828 AgR, Relator(a): Min. ROBERTO BARROSO, Primeira Turma, julgado em 16/12/2014, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-027 DIVULG 09-02-2015 PUBLIC 10-02-2015)

Deste modo, estou em votar pelo parcial provimento do apelo da

embargante e desprovimento do apelo do Estado, nos termos do voto do Relator.

DES.ª MARILENE BONZANINI - De acordo com o(a) Relator(a).

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DES. FRANCISCO JOSÉ MOESCH - Presidente - Apelação Cível nº 70071745830, Comarca de

Porto Alegre: "À UNANIMIDADE, DESPROVERAM O APELO DO EMBARGADO E DERAM

PARCIAL PROVIMENTO À APELAÇÃO DA EMPRESA EMBARGANTE."

Julgador(a) de 1º Grau: MARIA ELISA SCHILLING CUNHA