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PODER JUDICIÁRIO Justiça Federal de Primeira Instância SEÇÃO JUDICIÁRIA DO ESTADO DE SERGIPE 1ª VARA FEDERAL Sentença Tipo “A” – Fundamentação Individualizada Processo nº 0006464-60.2009.4.05.8500 Classe 01 – Ação Civil Pública Autores: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL e MINISTÉRIO PÚBLICO ESTADUAL Réus: UNIÃO FEDERAL (Advocacia-Geral da União), ESTADO DE SERGIPE, MUNICÍPIO DE ARACAJU, FUNDAÇÃO DE BENEFICÊNCIA HOSPITAL DE CIRURGIA, HOSPITAL DE URGÊNCIA DE SERGIPE – HUSE e COMISSÃO NACIONAL DE ENERGIA NUCLEAR – CNEN (Procuradoria-Geral Federal) Processo nº 0001610-86.2010.4.05.8500 Classe 01 – Ação Civil Pública Autores: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL e MINISTÉRIO PÚBLICO ESTADUAL Réus: UNIÃO FEDERAL (Advocacia-Geral da União), ESTADO DE SERGIPE, MUNICÍPIO DE ARACAJU S E N T E N Ç A 1. RELATÓRIO 1.1. Relatório do Processo 0006464-60.2009.4.05.8500 O MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL e o MINISTÉRIO PÚBLICO ESTADUAL propuseram Ação Civil Pública, com requerimento de antecipação dos efeitos da tutela, em face da UNIÃO FEDERAL (Advocacia-Geral da União), do ESTADO DE SERGIPE, do MUNICÍPIO DE ARACAJU, da FUNDAÇÃO DE BENEFICÊNCIA HOSPITAL DE CIRURGIA, do HOSPITAL DE URGÊNCIA DE SERGIPE – HUSE e da COMISSÃO NACIONAL DE ENERGIA NUCLEAR – CNEN (Procuradoria-Geral Federal), visando, cumulativamente, o seguinte: 1) que a União Federal, o Estado de Sergipe e o Município providenciem a adequação da cobertura de oncologia aos mínimos preconizados pelo Ministério da Saúde, instalando mais centros e/ou unidades de assistência em alta complexidade de oncologia no Estado de Sergipe; 2) que o Estado de Sergipe disponibilize o tratamento fora do domicílio a todos os pacientes de oncologia que não possuem de forma eficaz obter o

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PODER JUDICIÁRIO

Justiça Federal de Primeira Instância SEÇÃO JUDICIÁRIA DO ESTADO DE SERGIPE

1ª VARA FEDERAL

Sentença Tipo “A” – Fundamentação Individualizada

Processo nº 0006464-60.2009.4.05.8500 Classe 01 – Ação Civil Pública Autores: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL e MINISTÉRIO PÚBLICO

ESTADUAL Réus: UNIÃO FEDERAL (Advocacia-Geral da União), ESTADO DE

SERGIPE, MUNICÍPIO DE ARACAJU, FUNDAÇÃO DE BENEFICÊNCIA HOSPITAL DE CIRURGIA, HOSPITAL DE URGÊNCIA DE SERGIPE – HUSE e COMISSÃO NACIONAL DE ENERGIA NUCLEAR – CNEN (Procuradoria-Geral Federal)

Processo nº 0001610-86.2010.4.05.8500 Classe 01 – Ação Civil Pública Autores: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL e MINISTÉRIO PÚBLICO

ESTADUAL Réus: UNIÃO FEDERAL (Advocacia-Geral da União), ESTADO DE

SERGIPE, MUNICÍPIO DE ARACAJU

S E N T E N Ç A

1. RELATÓRIO

1.1. Relatório do Processo 0006464-60.2009.4.05.8500

O MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL e o MINISTÉRIO PÚBLICO ESTADUAL propuseram Ação Civil Pública, com requerimento de antecipação dos efeitos da tutela, em face da UNIÃO FEDERAL (Advocacia-Geral da União), do ESTADO DE SERGIPE, do MUNICÍPIO DE ARACAJU, da FUNDAÇÃO DE BENEFICÊNCIA HOSPITAL DE CIRURGIA, do HOSPITAL DE URGÊNCIA DE SERGIPE – HUSE e da COMISSÃO NACIONAL DE ENERGIA NUCLEAR – CNEN (Procuradoria-Geral Federal), visando, cumulativamente, o seguinte:

1) que a União Federal, o Estado de Sergipe e o Município providenciem a adequação da cobertura de oncologia aos mínimos preconizados pelo Ministério da Saúde, instalando mais centros e/ou unidades de assistência em alta complexidade de oncologia no Estado de Sergipe;

2) que o Estado de Sergipe disponibilize o tratamento fora do domicílio a todos os pacientes de oncologia que não possuem de forma eficaz obter o

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tratamento dos serviços de radioterapia nos Hospitais Cirurgia e João Alves Filho;

3) que o Estado de Sergipe e o Hospital João Alves coloquem em funcionamento o aparelho de braquiterapia situado nesta unidade hospitalar, no prazo de 30 (trinta) dias;

4) que a CNEN, tão logo seja instada a fazê-lo, analise o requerimento de licença e, se tudo estiver em conformidade com as normas respectivas, conceda licença de funcionamento do serviço de radioterapia do Hospital Cirurgia no prazo máximo de 30 (trinta) dias.

Narram na inicial que: 1) no Estado de Sergipe, existiam 2 (dois) Serviços de Radioterapia habilitados em execução, isto é, um prestado pelo Hospital Cirurgia e outro pelo Hospital de Urgência de Sergipe – HUSE; 2) a Comissão Nacional de Energia Nuclear – CNEN interditou o serviço de radioterapia que funcionava no Hospital Cirurgia alegando irregularidades na sua execução, a exemplo de ausência de autorização para funcionamento e manutenção indevida das fontes radioativas no nosocômio; 3) com a interdição, grande parte dos pacientes do Hospital Cirurgia ficou sem atendimento, formando-se longa fila de espera, situação denunciada pela Associação dos Amigos da Oncologia – AAO ao Parquet Estadual; 4) em audiência realizada no Ministério Público Estadual, Hospital de Urgências de Sergipe – HUSE informou que ampliaria a sua carga horária de funcionamento e recepcionaria parte dos pacientes do Hospital Cirurgia, contudo essa ampliação não foi suficiente, o que tem ocasionado fila de espera, vale dizer, existem pacientes que estão sem tratamento; 5) passados mais de 05 (cinco) meses da interrupção do serviço, não se vislumbra nenhuma solução de cunho administrativo capaz de sanar de imediato o problema; 6) a partir da expedição de diversos ofícios aos envolvidos, recebeu as seguintes respostas: 6.1) a CNEN apenas informou a documentação necessária para a regularização do serviço pelo Hospital de Cirurgia; 6.2) o Município de Aracaju informou que estava aguardando a regularização do serviço, bem como que em outubro de 2009 lançou edital para contratação de empresa de radioterapia; 6.3) a UFS disse que já está apta a receber os equipamentos do Hospital de Cirurgia; 7) em audiência realizada em 10/11/2009, o representante do hospital de Cirurgia informou que ainda haviam pendências junto à CNEN, mas que apesar disso, outras pendências já estavam sendo resolvidas, e que dentro de 15 dias, as demais exigências teriam sido atendidas; 8) nessa oportunidade foram entregues documentos referentes ao histórico do serviço de radioterapia, através dos quais se pode constatar que desde novembro de 1999 o serviço de radioterapia do Hospital de Cirurgia funcionava irregularmente; 9) também nessa assentada, o representante da Secretaria do Estado da Saúde – SES informou que o serviço de radioterapia do HUSE estava funcionando no limite, com um atendimento de 116 pessoas por dia, enquanto outros 185 pacientes aguardavam na lista de espera; 10) a SES estava envidando esforços para encaminhar os pacientes para tratamento em outros Estados, através do TFD, porém não tem logrado êxito, uma vez que as filas de espera são maiores do que a de Sergipe; 11) apesar de funcionar, o serviço de radioterapia do HUSE é deficiente, em razão das sucessivas quebras do aparelho de aceleração linear e o não funcionamento do aparelho de braquiterapia; 11) esse aparelho de braquiterapia foi doado pela União há sete anos e ficou em funcionamento por apenas 15 dias, embora seja de suma importância para o tratamento de diversos tipos de câncer, inclusive o câncer de

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colo do útero; 12) quanto ao Hospital de Cirurgia, este sequer tem autorização sanitária para funcionamento, sendo por tal fato acionado por meio de ACP tombada sob o nº. 2008.85.00.004406-7.

Alegam, inicialmente, a competência da Justiça Federal para processar e julgar a causa em razão da União estar no pólo passivo e a lide versar sobre recursos federais, a legitimidade passiva ad causam dos entes federados em razão da responsabilidade solidária na prestação do dever de saúde;

No mérito, discorre sobre a responsabilidade solidária de cada um dos réus na prestação do direito fundamental à saúde e a participação de cada nos problemas verificados no serviço de oncologia no Estado de Sergipe, sobre a inobservância da política nacional de atenção oncológica e da necessidade de garantir aos sergipanos acesso aos serviços de oncologia via tratamento fora do domicílio enquanto perdurar a insuficiência no referido serviço público de saúde.

Quanto à responsabilidade dos réus, asseverou que: 1) a União é omissa porque doou equipamento e não diligenciou a sua devida instalação e o início de seu funcionamento, sendo também responsável pelo custeio das ações de alta complexidade; 2) o Estado de Sergipe e o HUSE também o são, uma vez que já deveriam ter providenciado a instalação do aparelho de braquiterapia e evitado a desassistência; 3) o Município é omisso por se encontrar na gestão plena do sistema municipal de saúde é o responsável pela Central de Regulação Municipal para o encaminhamento dos pacientes aos serviços de radioterapia, sendo que havia contratualizado com Hospital Cirurgia para a prestação do serviço de radioterapia; 4) a Comissão de Energia Nuclear é omissa, uma vez que “mesmo sendo necessário diversas ações para a instalação de aparelhos radioterápicos, demorou e demora a atender os chamados do Estado e dos hospitais para inspecionais as instalações e autorizar as licenças” (f. 14/15); 4) apesar de a Fundação Beneficente do Hospital de Cirurgia ter sido imprudente ao colocar em funcionamento um serviço de radioterapia, sem observar as regras sanitárias e segurança radiológica, é certo que “apresentava significativa importância no tratamento de pacientes oncológicos, na área de radioterapia, com atendimento mensal de mais de 100 (cem) usuários” (f. 14).

Requereram, ainda, a antecipação dos efeitos da tutela, nos moldes dos itens 1 a 4 do pedido principal.

Como a inicial, juntaram documentos (f. 57/294) e o PA nº 1.35.000.001627/2009-53, este último autuado em apenso (f. 296).

O Juiz Distribuidor determinou a distribuição livre por não verificar qualquer hipótese de prevenção com os autos do processo n.º 2009.85.00.006465-4, vindo os autos para a 1ª Vara/SE (f. 295)

Despacho de f. 297 determinou a intimação dos réus para se manifestarem, no prazo de 72 horas, sobre a real situação do serviço de oncologia, a qual foi realizada na f. 300/301 (União), f. 303/304 (Estado de Sergipe), f. 306/307 (Município de Aracaju), f. 309/310 (Hospital Cirurgia) e f. 312/313 (CNEN).

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A União Federal (f. 315-318) aduziu que: 1) tem cumprido com o dever de repassar ao Estado recursos e equipamentos necessários à prestação do serviço de oncologia; 2) com base no princípio federativo, não pode o ente central intervir nos demais entes federados para exercer o controle finalístico de suas atividades; 3) mesmo na qualidade de gestora nacional do SUS, a União não executa diretamente as ações de saúde, não podendo ser responsabilizada pela má prestação do serviço.

O Estado de Sergipe (f. 320-326) alegou: 1) o princípio da reserva do possível, uma vez que os Ministérios Públicos não podem impor ao Poder Público obrigação de cunho positivo, dependente de realização de despesas e licitação; 2) que “depende da dinâmica e da boa vontade da União Federal no desembolsar de recursos” (f. 323); 3) que o Poder Judiciário não pode interferir no mérito administrativo; 4) que não estão presentes os requisitos para a concessão das medidas antecipatórias pleiteadas, uma vez que a verossimilhança da alegação demanda dilação probatória que demarque, de forma objetiva, a necessidade de instalação de equipamentos e a instituição de novas clínicas de tratamento de oncologia, bem assim a urgência da situação não tem condição de suplantar os óbices legais.

O Hospital de Cirurgia (f. 330/331) informou que as medidas antecipatórias pleiteadas são compatíveis com a intenção da instituição de regularizar o serviço de radioterapia. Informou, ainda, que já diligenciou o fornecimento da documentação necessária para a apreciação do requerimento de licença junto ao CNEN. Pugnou pelo deferimento imediato da medida postulada no item 4 dos requerimentos liminares.

A CNEN (f. 347-356) discorreu acerca de suas atribuições e dos princípios que norteiam o licenciamento dos serviços de oncologia. Alegou que a demora no procedimento de licenciamento não foi por si ocasionada e que a instalação dos equipamentos no Hospital Universitário também depende do atendimento aos requisitos previstos na lei. Suscitou, ante a inexistência de omissão, a ausência de interesse de agir em relação à CNEN.

O Hospital de Urgência de Sergipe – HUSE se manifestou (f. 362-366), aduzindo, em síntese, que: 1) o centro de radioterapia do hospital se encontra funcionando no seu limite máximo, tendo em vista a absorção de toda demanda advinda com a interdição do serviço de radioterapia do Hospital Cirurgia; 2) o uso constante de equipamentos eletrônicos tipo aceleradores lineares produz o desgaste natural de seus componentes, sendo necessário a suspensão do atendimento por curtos lapsos de tempo para a manutenção. Quanto ao aparelho de braquiterapia, asseverou que: 1) trata-se de um tratamento complementar à radioterapia, de modo que um não substitui o outro; 2) a braquiterapia somente é autorizada para os casos de câncer do colo do útero; 3) para a reabertura do serviço, é necessária a aquisição da fonte de irídio-192 e formalização do contrato de manutenção do equipamento; 4) todas as providências para a instalação, funcionamento e manutenção do mencionado aparelho já foram adotadas, bem assim que a braquiterapia poderá ajudar a diminuir a quantidade de pacientes que necessitam de tratamento fora do domicílio.

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Requereu a dilação do prazo para a instalação do aparelho de braquiterapia em tempo compatível para a importação da fonte de Irídio-192, não inferior a 4 (quatro) meses.

Juntou procuração (f. 367) e documentos (f. 368-397).

O Município de Aracaju (f. 399-418) alegou: 1) inexistir omissão que justifique a pretensão ministerial; 2) que os entes públicos agem com discricionariedade na alocação de recursos para a implementação de políticas públicas; 3) a interferência do Ministério Público e do Judiciário nestas questões, somente pode acontecer quando houver ação ou omissão abusiva por parte do ente público, sob pena de violação ao princípio da separação dos Poderes; 4) a cláusula da reserva do possível, eis que é necessário haver previsão orçamentária para a realização de despesas públicas; 5) as medidas liminares pleiteadas têm um caráter irreversível, não sendo legalmente possível seu deferimento e que eventual descumprimento dos prazos determinados não pode ser atribuído à má-vontade do Poder Público, razão pela qual incabível sua aplicação.

Decisão de f. 462/475, datada de 17.12.2009, deferiu parcialmente a antecipação de tutela para determinar:

“1. que o Estado de Sergipe e o Município de Aracaju forneçam ajuda necessária, seja mediante convênio ou outro instrumento, mediante a entrega de recursos e também de cessão de pessoal, a Fundação de Beneficência Hospital de Cirurgia para que volte a funcionar o serviço de oncologia; 2. que o Estado de Sergipe fica obrigado a prestar Tratamento Fora de Domicílio no Sistema Único de Saúde a todos os pacientes que se encontram na lista de espera, nos termos da Portaria Ministério da Saúde/SAS/Nº 055 de 24 de fevereiro de 1999. Se houver necessidade de suplementação financeira, a União fica obrigada também a transferir os recursos necessários na proporção dos pacientes encaminhados; 3. que, dentro do prazo de contestação, o Estado de Sergipe e o Município de Aracaju providenciem a adequação da cobertura de oncologia aos mínimos preconizados pelo Ministério da Saúde, instalando mais centros e/ou unidades de assistência em alta complexidade de oncologia no Estado de Sergipe, nos termos da Portaria 741 de 19 de dezembro de 2005 e 3.535/GM de 02 de setembro de 1998, devendo apresentar um cronograma necessário para adoção de providências, contemplando as diversas fases (edital, projeto básico e executivo, custos), a ser discutido em sede de audiência pública a ser designada; 3. que o Estado de Sergipe, através da Secretaria Estadual de Saúde, e o Hospital João Alves (Fundação Hospitalar) apresentem, no prazo de 15 (quinze) dias, de um cronograma detalhado, apontando data da contratação direta, o envio do material e o prazo de sua chegada, colocação do equipamento em funcionamento, inclusive apontando eventuais problemas, a fim de que este magistrado examine a razoabilidade do prazo. Se não houver a apresentação do cronograma, os referidos réus ficam obrigados a colocar em funcionamento o aparelho de braquiterapia nessa unidade hospitalar, no prazo de 60 (sessenta) dias. 4. que a CNEN realize a inspeção de conformidade no prazo de 15 (quinze) dias, contados do deferimento da medida liminar e, mais de 30 (trinta) dias, para análise definitiva. Se houver necessidade de maior prazo, deverá a CNEN apontar o que já foi feito, o que ainda está pendente e data provável de conclusão”.

Na referida decisão, foi determinado que se oficiasse aos diversos CACON´s e UNACON´s credenciados pelo SUS para verificar a existência de vaga, cujas respostas se encontram nas f. 790, 809/810, 814, 815, 816, 817, 818/820, 821, 822, 834/835 e

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957/958, 836, 919, 920, 932/933, 934, 938, 940, 943, 945, 950, 986, 988/989, 990, 1025, 1027, 1029, 1078/1079, 1081, 1091/1093, 1095, 1096, 1098, 1100, 1110, 1113/1114, 1115, 1121/1124, 1126/1128, 1130, 1590/1592, 2716-2718.

A CNEN apresentou documentação (f. 488-490) sobre o andamento do cumprimento da medida liminar.

Os réus foram devidamente citados nas f. 492 (União), 493/494 (Estado de Sergipe), 495/496 (Município de Aracaju), 497/498 (Hospital Cirurgia), 499/500 (CNEN), 501/502 (HUSE).

Em razão da notícia da quebra do único aparelho de radioterapia em funcionamento no Estado de Sergipe (f. 510), foi designada uma audiência pública (f. 508).

Na f. 513/515, o MPF informou que o único aparelho de radioterapia no Estado de Sergipe se encontra quebrado e, em razão disso, requereu que os “réus coloquem, em 48 horas, ao menos uma UNACON em funcionamento no Estado de Sergipe” (f. 515). Juntou documentos (f. 516/517). Na f. 522, este juízo se reservou para apreciar o requerimento do MPF em audiência.

Na audiência pública realizada no dia 19.01.2010 (f. 567/572), cada uma das partes explanou acerca do problema do serviço de radioterapia. O Hospital Cirurgia afirmou que estava tentando um convênio com a União para a aquisição de tomógrafo e acelerador linear para um novo serviço de radioterapia, além de tentar abrir o antigo serviço de radioterapia. Informou os custos para abrir este novo serviço e solicitou colaboração dos entes públicos. Juntou o cronograma de regularização do antigo de serviço de radioterapia (f. 573/574) e de seus custos (f. 580/581), programa de reabertura (f. 584/608 e 611/632), email sobre o novo acelerador linear (f. 578/579), procuração (f. 609/610). O Estado de Sergipe informou que autorizou Aracaju a alterar a destinação de um repasse do convênio para “financiar as reformas/adequações necessárias no Hospital Cirurgia, desde que o Município de Aracaju assuma o aporte de outros recursos eventualmente necessários” (f. 576), no montante de R$767.400,00. Discutiu-se a situação dos pacientes que se encontravam na lista de espera. Ao final, designei audiência para o dia 27.01.2010 para que os entes públicos apresentassem uma solução conjunta para esses pacientes, bem assim determinei a adoção das seguintes providências:

“Considerando a urgência da situação, entendo que o prazo do CNEN para as inspeções cabíveis deve ocorrer em até 15 dias, contados a partir da comunicação do Hospital Cirurgia. O Hospital Cirurgia deverá trazer aos autos a documentação que comprove a comunicação para que este juízo possa controlar o prazo fixado” “Em relação ao aparelho de radioterapia do HUSE, deverá o Hospital informar, relativamente ao ano de 2008 e 2009, quantas vezes o serviço parou, quais peças foram substituídas e por quanto tempo ficou o equipamento parado para manutenção. Em relação às peças mais substituídas, deverá alterar o contrato para prever a sua manutenção imediata, a fim de que o serviço não seja interrompido”

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“Determino que a União traga a documentação referente à proposta de convênio nº 132.388/2009 relativo à aquisição do acelerador linear e do aparelho de ressonância no prazo de 15 dias” 1.

O HUSE apresentou petição (f. 634/636), acompanhada de documentos (f. 637/703), aduzindo que adquiriu, mediante inexigibilidade de licitação, 02 (duas) válvulas no valor de R$ 165.037,01 para que o acelerador linear voltasse a funcionar, o que teria ocorrido no dia 14.01.2010.

Nova audiência pública realizada no dia 27.01.2010 (f. 706/712), discutiu-se: 1) locais onde os pacientes poderiam ser tratados fora do Estado de Sergipe, através do TFD; 2) a ordem de prioridade que seria utilizada para tratamento dos pacientes que estão na lista de espera; 3) o que fazer com os pacientes que recusarem o tratamento através do TFD. O estado de Sergipe se comprometeu a encaminhar os pacientes para duas instituições, uma em Jaú/SP e outra em Maceió/AL e aumentar o valor da diária. O Estado de Sergipe afirmou que “O governador do estado autorizou o Secretario de estado da saúde a firmar convênio com o Hospital de Cirurgia para o repasse dos 2 milhões de reais faltantes para a conclusão da ala nova para o novo serviço de tratamento radioterápico” (f. 708). Em seguida, o Juiz decidiu que: 1) quanto ao local de tratamento, “A liminar foi deferida para que fosse oferecido o tratamento e não escolhido o local. Se o paciente não aceitar receber o tratamento no local oferecido é uma opção sua, devendo arcar com as conseqüências de seus atos”; 2) em relação à ordem dos pacientes, “a solução mais razoável é que em caso de recusa do tratamento fora do domicilio, fica autorizado a encaminhar os pacientes em posição subseqüente na lista, mantida a ordem do paciente que se recusou inicialmente. Em caso de arrependimento, o paciente poderá solicitar o seu tratamento de acordo com a sua posição na lista inicialmente e será encaminhado pra a próxima vaga disponível. O HUSE poderá fazer uma avaliação dos pacientes, conforme pré-seleção apresentada ou outros critérios de natureza científica, visando o encaminhamento para tratamento via TFD, devendo observar os documentos necessários para a solicitação do TFD. O HUSE e o Estado de Sergipe deverão solicitar que o paciente assine um termo de responsabilidade, no sentido de que não deseja se deslocar para outro Estado a fim de receber tratamento, estando consciente dos riscos que representa a ausência de tratamento. Em caso de recusa do paciente em assinar o referido termo, o médico poderá certificar relatando a situação mediante a assinatura de duas testemunhas”.

Ao final, modificou-se parcialmente a antecipação dos efeitos da tutela para acolher a proposta do Estado de Sergipe nos seguintes termos:

1. a secretaria do Estado da Saúde se compromete a contratar a FUNDEPES, até 30/04/2010, mês em que está previsto o funcionamento da unidade do Hospital de Cirurgia, desde que determinado pelo Juízo, a encaminhar os pacientes para o Hospital de Jaú e dada a excepcionalidade de não existir casa de apoio a pacientes em Maceió, bem como a dificuldade de encontrar pousadas para abrigar os pacientes e acompanhantes devido a alta estação turística, o Estado complementará a diária em mais R$ 23,00 por pessoa. Nessa proposta estão incluídos os custos com o transporte. Para tanto, o Estado de Sergipe fica autorizado a celebrar contratos ou convênios ou outro instrumento congênere, mediante procedimento de dispensa de licitação, para encaminhar os pacientes da lista de espera para tratamento via TFD, não estando liberado de cumprir os demais requisitos da dispensa;

1 Novo serviço de radioterapia que o Hospital Cirurgia pretendia abrir ao lado do antigo. Vide fala do representante do Hospital Cirurgia na f. 569-v e 570 e documentos de f. 578/579.

Processos nº 0006464-60.2009.4.05.8500 e 0001610-86.2010.4.05.8500

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2. Se houver possibilidade de tratamento nos nosocômios situados em Salvador, a União deverá adotar todas as providências necessárias para que os pacientes residentes nesse Estado sejam atendidos no limite da cobertura do Município de Salvador, ou se este for insuficiente, ampliar o teto MAC para que sejam abrangidos estes pacientes, desde que os nosocômios tenham capacidade de atendimento. 3. Nesta situação, o Estado de Sergipe fica obrigado também a encaminhar os pacientes nos termos do item 01 supra. 4. Tais medidas vigorarão provisoriamente até 30/04/2010. 5. Oficiar a Coordenação Geral do Sistema Aduaneiro da Receita Federal solicitando os bons préstimos no sentido de liberar, no prazo mais rápido possível, as peças necessárias para a recuperação do acelerador linear. Em caso de retenção por um prazo superior a dez dias, deverá informar as razões e também os documentos necessários para liberação dos bens. 6. Oficiar aos Hospitais São Rafael, Santa Isabel e Aristides Maltês, no prazo de 10 (dez) dias, a fim de informar o número de pacientes tratados nestes nosocômios pela COTA SUS e planos de saúde e a capacidade de atendimento dos pacientes que necessitam de radioterapia. 7. Sem prejuízo da medida referida no item 06, o estado de Sergipe e o Município de Aracaju ficam obrigados, quinzenalmente a apresentar listas de possíveis unidades para tratamento via TFD, devendo colacionar os documentos pertinentes. A fim de demonstrar o cumprimento da medida deverão os réus trazer cópias dos respectivos ofício endereçados a CACONS e UNACONS aptos a receber pacientes. Nos ofícios deverá constar pergunta sobre o numero de pacientes tratados na instituição pela COTA SUS e planos de saúde e a capacidade de atendimento de novos pacientes. Esta medida será adotada até que a demanda de excedentes seja integralmente suprida. Ficam obrigados também a encaminhar, quinzenalmente, a relação de pacientes atendidos via TFD. 8. Defiro o prazo de 60 (sessenta) dias, requerido pelo Hospital de Cirurgia, para apresentação dos custos definitivos para a implantação do novo serviço de radioterapia. 9. Os pacientes terão um prazo de até 10 (dez) dias para manifestar o seu interesse acerca do tratamento via TFD. Findo o qual o HUSE fica autorizado a contactar o paciente seguinte na lista de espera.

Na referida audiência, foram juntados diversos documentos (f. 713/735): 1) pelo HUSE 2, o relatório de manutenção do aparelho (f. 713/716); 2) pelo Estado de Sergipe, os locais para tratamento de pacientes fora do Estado (f. 717/723); 3) pelo Hospital Cirurgia, a chegada de peças importadas para a manutenção do acelerador linear na Alfândega (f. 724/735)

A CNEN juntou esclarecimentos sobre as informações prestadas pelas partes na audiência realizada em 19.01.2010 (f.737-739).

A União apresentou petição (f. 746), acompanhada de documentos (f. 747/755), informando que já solicitou: 1) cópia integral da proposta de convênio n.º 132388/09 com o Hospital Cirurgia, sem obter resposta; 2) o cumprimento da decisão de f. 706/712 (item 2 3) na parte que toca a União.

2 Em cumprimento a determinação contida na audiência do dia 19.01.2010 3 “2. Se houver possibilidade de tratamento nos nosocômios situados em Salvador, a União deverá adotar todas as providencias necessárias para que os pacientes residentes nesse Estado sejam atendidos no limite da cobertura do Município de Salvador, ou se este for insuficiente, ampliar o teto MAC para que sejam abrangidos estes pacientes, desde que os nosocômios tenham capacidade de atendimento”

Processos nº 0006464-60.2009.4.05.8500 e 0001610-86.2010.4.05.8500

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O Município de Aracaju noticiou a interposição de agravo de instrumento contra a decisão que deferiu a antecipação dos efeitos da tutela (f.761-788), sendo que o Relator do AGTR n.º 104513-SE indeferiu o efeito suspensivo, conforme resenha processual em anexo.

A Fundação Hospitalar de Saúde, na condição de mantenedora do Hospital de Urgência de Sergipe (HUSE), apresentou contestação (f. 792-807). Inicialmente, fez um resumo sobre as bases técnicas adotadas pelo Ministério da Saúde para a cobertura de oncologia e citou os diplomas normativos na área de oncologia. Afirmou que: 1) desde a interdição do serviço de radioterapia do Hospital Cirurgia, em 04.2009, pelo CNEN, o serviço de radioterapia do HUSE tem trabalhado no seu limite máximo, numa média de 115 (cento e quinze) pacientes por dia, o que gera a necessidade de interrupções periódicas do serviço por curtos lapsos de tempo para manutenções corretivas dos equipamentos, que são realizadas nos termos de acordo de manutenção firmado pelo HUSE; 2) existe uma insuficiência de Unidades de Assistência Alta Complexidade em Oncologia (UNACON) e Centro de Assistência de Alta Complexidade em Oncologia (CACON) no país, o que tem gerado filas; 3) embora seja de extrema importância o serviço de braquiterapia constitui um serviço complementar a radioterapia e que a sua instalação não reduzirá a fila de espera do serviço de radioterapia, uma vez que não há a substituição de um serviço pelo outro; 4) “o cronograma para colocação do equipamento em funcionamento já foi apresentado a esse MM. Juízo e será rigorosamente respeitado, salvo nas hipóteses de caso fortuito ou força maior” (f. 803)..

A Comissão Nacional de Energia Nuclear – CNEN apresentou contestação (f. 823-833), na qual explanou acerca de sua competência para atuação e sobre os princípios da justificação 4 e otimização 5 para licenciar atividades que utilizem radioatividade. Alegou, em relação ao Hospital de Cirurgia, que: 1) o referido nosocômio foi interditado através de uma inspeção conjunta efetuada pela Vigilância Sanitária Municipal (VISA/Aracaju), Agência Nacional de Vigilância Sanitária e pelo CNEN em 04.2009, uma vez que “a instalação em questão estava operando um Acelerador Linear de 6 MV de energia, pelo menos de 2002, de forma clandestina não possuindo qualquer autorização por parte desta CNEN para fazê-lo” (f. 830); 2) o nosocômio já encaminhou solicitação de licença de construção e autorização para operação do acelerador supracitado e que a CNEN está agendando “inspeção de conformidade com vista a emissão de autorização para operação para instalação em referência” (f. 830). Sustentou, em relação a transferência das fontes radioativas para a Fundação Universidade Federal de Sergipe, que: 1) já concedeu autorização para construção de sala para abrigar equipamento de telecobalto; 2) ao término da construção, será feita inspeção de conformidade. Sustentou que a inexistência de omissão administrativa, tendo atuado nos limites de suas competências legais, razão pela qual faleceria o interesse de agir por ausência de pretensão resistida.

O Estado de Sergipe apresentou contestação (f. 921-930), alegando preliminarmente a perda do objeto da ação civil pública em razão do cumprimento das

4 “nenhuma atividade que envolva exposições à radiação deve [ser] autorizada, a menos que gere benefícios aos indivíduos expostos ou à sociedade, que compensem os riscos associados à radiação” (f. 829) 5 “o princípio da otimização determina que, para qualquer fonte de radiação em uma atividade, (....) devem ser mantidos no mais baixo nível razoavelmente aceitável, levando-se em conta os fatores sociais e econômicos” (f. 829)

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obrigações que lhe são inerentes, dentro de sua realidade orçamentária. Defende a desproporção e irrazoabilidade na aplicação da astreinte e a impossibilidade cessão de pessoal para o Hospital Cirurgia e de bloqueio de recursos por se tratar de medida extremada diante das providências envidadas.

Considerando a notícia veiculada no Correio de Sergipe na edição de 19/02/2010, segundo a qual o aparelho de radioterapia do Hospital João Alves Filho não estaria funcionando, foi designada audiência para o dia 24/02/2010 (f. 946).

Ofício da Secretaria da Receita Federal informando que o desembaraço aduaneiro da DI nº 10/0115622-8 ocorreu em 01/02/2010 (f. 952/954).

Em manifestação (f.959/967), a União informou que: 1) a proposta de Convênio nº 132388/2009, apresentada pelo Hospital Cirurgia foi rejeitada, não sendo possível a sua readequação; 2) por se tratar de trâmite eletrônico, não houve a formação de autos físicos, pelo que é impossível a sua juntada aos autos; 3) a proposta foi apresentada no dia 23.12.2009, às vésperas do final do exercício financeiro; 4) a rejeição é relativa ao exercício de 2009, nada impedindo que seja apresentada nova proposta.

A União apresentou contestação (f. 968-984), alegando: 1) a ausência de omissão no repasse de recursos; 2) a falta de nexo causal entre a ausência de intervenção da União na administração dos recursos repassados ao Estado de Sergipe e o Município de Aracaju e o aumento da fila de espera por tratamento oncológico no Estado; 3) que “se os valores são insuficientes ou se é necessária a adoção de novas medidas, é preciso que o Estado ou Município requeiram ao Ministério da Saúde a ampliação da cobertura, já que os dados enviados àquela pasta – verdadeiros ou não – indicam que o acelerador linear instalado no HUSE está funcionando abaixo de sua capacidade instalada” (f. 976) 4) que cabe aos CACONS, de rede própria dos gestores do SUS (Estado e Município) administrar os repasses de acordo com as necessidades de cada paciente, inclusive no que se refere ao fornecimento de medicação; 5) que os órgãos da União não foram devidamente informados pelo Estado de Sergipe sobre a real situação em que se encontra a prestação do serviço de radioterapia no Estado, de modo que não há que se falar em omissão da União; 6) “nada obstante a existência de uma fila de espera para tratamento e as informações de que o acelerador linear instalado naquele nosocômio está trabalhando cerca de 20 (vinte) horas diárias, a informação constantes dos registros do Ministério de Saúde é que o equipamento além de trabalhar em apenas dois turnos está operando abaixo de sua capacidade instalada” (f. 982).

Audiência realizada em 24/02/2010 (f. 1016/1022). Durante a audiência, a Fundação Hospitalar explicou como é feita a manutenção, a empresa SIEMENS é quem faz a manutenção, em caso de quebra quanto tempo demora a chegada do técnico e a impossibilidade de fazer um estoque. Informou que a fila era de 262 pacientes. O Estado de Sergipe informou a dificuldade de celebrar convênio com UFAL consistente na contratação de pessoal, requerendo que “fosse ampliada a determinação contida na liminar para a contratação de pessoal, com dispensa de licitação, com resguardo de eventuais responsabilidades” (f. 1021). A União informou que “o INCA tem interesse em fornecer um novo aparelho para o estado de Sergipe, mediante o preenchimento de algumas condições” (f. 1019) e que, segundo os dados fornecidos ao Ministério da Saúde, não precisaria de um novo aparelho em Sergipe. A Fundação Hospitalar informou que não tem sido preenchido o documento relativo aos

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tratamentos feitos e que a dificuldade de aceitação do TFD vem da própria família do paciente e não da condição física. Hospital de Cirurgia requereu que o Juízo marcasse um prazo para que o Estado de Sergipe repasse os recursos prometidos para a construção da nova ala da radioterapia do Cirurgia. Os Ministérios Públicos requereram que, “caso não haja possibilidade de o tratamento ser realizado pelo SUS, seja realizado junto a instituições privadas” (f. 1030). Diante do requerimento da União para que fosse agendada uma audiência com os autores, o Estado de Sergipe, Município de Aracaju e Fundação Hospitalar com a presença de técnicos do INCA, foi designada nova audiência para o dia 24/03/2010.

Em manifestação (f.1031/1032), acompanhada de documentos (f. 1033/1076), o Hospital Cirurgia informou o andamento das etapas faltantes para a reabertura do serviço de radioterapia, com previsão de conclusão da obra para o dia 02.04.2010.

Decisão de f. 1084-1088 determinou: 1) que Fundação Hospitalar junte, no prazo de 10 (dez) dias, cópia do contrato de assistência técnica firmada com a SIEMENS; 2) que o Estado de Sergipe: a) oficiasse ao Ministério da Saúde, no prazo de 10 (dez) dias, informando os dados atualizados pertinentes ao serviço de oncologia prestado no Estado; b) oficiasse, no prazo de 10 (dez) dias, às CACONS e UNACONS do Estado de Recife, a fim de saber se ainda há disponibilidade para atender pacientes de Sergipe; c) oficiasse, no prazo de 10 (dez) dias, ao Instituto do Câncer Arnaldo Vieira de Carvalho e à Associação Matogrossense de Combate ao Câncer, cujos endereços se encontram nas fls. 990 e 938, respectivamente, a fim de que seja viabilizado o encaminhamento de pacientes sergipanos para o tratamento nos referidos locais; d) trouxesse, a cada 15 (quinze) dias, comprovação das providências adotadas para o encaminhamento dos pacientes sergipanos para tratamento via TFD. Na decisão foi deferida, ainda, a autorização, pleiteada pelo Estado de Sergipe, para a contratação, mediante dispensa de procedimento licitatório, de pessoal para operacionalizar o serviço de radioterapia junto ao Hospital Universitário de Alagoas. Quanto ao pleito do Hospital de Cirurgia para fixação de prazo para que o Estado de Sergipe efetuasse o repasse dos recursos já mencionados, foi indeferido o pedido, advertindo-se ao Estado de Sergipe que este Juízo deveria ser comunicado imediatamente assim que os valores forem colocados à disposição do referido Hospital. Na ocasião, foi fixado o prazo de 20 dias para que o Hospital de Cirurgia juntasse aos autos cópia da nova proposta de convênio junto ao Ministério da Saúde para a aquisição de novo aparelho de radioterapia e quanto ao requerimento do Ministério Público relativo ao custeio pelo Estado de Sergipe de tratamentos pela rede particular, foi mantida a determinação anterior.

A União juntou informação da Secretaria de Atenção à Saúde – SAS na qual a Secretaria de Estado da Saúde da Bahia compromete-se a receber 25 novos pacientes oriundos do Estado de Sergipe já a partir da primeira quinzena de março (f. 1104-1108).

Em petição de f. 1132-1157, os Ministérios Públicos Estadual e Federal afirmaram que: 1) o Estado não tem conseguido encaminhar, através de TFD, pacientes para serem tratados no sistema único de saúde, mas, caso fosse no sistema privado, haveria vagas; 2) os pacientes não aceitam o TFD porque o “pagamento das diárias somente 30 (trinta) dias após a saída do paciente dificulta muito a aceitação do tratamento em fora do domicílio” (f. 1136), já que “muitas vezes, os pacientes são carentes de recursos econômicos, não possuindo condições de arcar nem mesmo com a

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passagem da cidade do interior do Estado de Sergipe para o tratamento na capital” (f. 1136). Ao final, requereram que os réus sejam obrigados a providenciar o tratamento fora do domicílio em Estados circunvizinhos os pacientes referenciados da lista de espera, ainda que na rede privada de saúde, tendo em vista a insuficiência de vagas em hospitais conveniados ao SUS. Requereu ainda que as despesas com diárias e passagens sejam pagas aos pacientes e seus acompanhantes de forma antecipada.

O Município de Aracaju apresentou contestação (f.1160-1188) na qual defendeu a inexistência de atos a serem imputados ao Município de Aracaju quanto à adequação do serviço de oncologia e a ausência de previsão de nova despesa na lei orçamentária e a incidência da cláusula da reserva do possível. Alegou ainda ser exorbitante e abusiva a multa por atentado à dignidade da jurisdição cominada contra o gestor público.

O Hospital Cirurgia apresentou contestação (f.1213-1216) na qual afirmou que a suspensão do serviço de radioterapia deu-se em razão da inércia do CNEN, que não realizou a inspeção do acelerador linear por existirem fontes radioativas em desuso no interior do nosocômio, embora já estivesse em andamento a obra para construção do local que iria abrigá-las na Universidade Federal de Sergipe.

O Estado de Sergipe apresentou petição que embora faça referência a informações, veio desacompanhada de documentos (f. 1229).

A União noticiou a agendamento de visita da equipe técnica do INCA a fim de analisar se o HUSE e o HU atendem aos requisitos necessários para instalação de um CACON (f.1230-1235).

A Fundação Hospitalar de Saúde acostou cópia do contrato firmado com a SIEMENS para manutenção preventiva e corretiva com reposição de peças no acelerador Linear-Mevat (f.1237-1243).

O Estado de Sergipe juntou documentos visando demonstrar as providências tomadas pela Secretaria de Estado da Saúde para tratamento fora do domicílio dos pacientes em fila de espera (f.1246-1302).

Audiência pública realizada no dia 24.03.2010 (f.1303-1323) em que se discutiu: 1) a instalação de um novo serviço de radioterapia em Sergipe; 2) a retomada do antigo serviço de radioterapia do Hospital e o cronograma das obras; 3) soluções para o problema das filas de espera. Para isso, o INCA fez visitas do nos Hospitais Públicos (HUSE e Hospital Universitário) com objetivo de doar um acelerador linear. Na assentada, o INCA fez uma série de observações quanto às irregularidades em outros setores da oncologia do HUSE e a regularização de tais desconformidades seria condição para a doação do aparelho. Afirmou que não vistoriou o Hospital Cirurgia. A União afirmou que “o INCA prioriza a atuação dentro do sistema público de saúde. Somente não existindo entidades aptas a receber os serviços de oncologia é que, excepcionalmente, o INCA realiza parcerias com entidades filantrópicas” (f. 1306). O Estado de Sergipe se manifestou contrário à instalação no HUSE porque o hospital já se encontra bastante sobrecarregado. Afirmou que a solução a médio prazo seria a construção de um Hospital Especializado e que, enquanto isso, “o Estado se comprometeria em fazer as adequações necessárias, mantendo os três turnos de

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funcionamento e as anotações dos tratamentos para encaminhar informações ao Ministério da Saúde” (f. 1308) e “O Estado manteria ainda o encaminhamento para tratamento fora do domicilio” (1309). A União informou qual seria o procedimento para a reabilitação do serviço de radioterapia do Hospital Cirurgia, juntando nota técnica (f. 1331). A CNEN e a Coordenação de Vigilância Sanitária Municipal falaram sobre a paralisação do Serviço de Radioterapia do Hospital Cirurgia (f. 1315/1316). O Hospital de Cirurgia informou o andamento da reforma realizada em seu prédio, ressaltando que já lhe foi concedida a licença para operação do acelerador linear por parte da CNEN (f. 1328-1332).

Ao final, este Juízo determinou: – O INCA, conforme termo de audiência, se compromete a apresentar os relatórios das unidades hospitalares vistoriadas, no prazo de 15 (quinze) dias – sejam juntados a lista de espera dos pacientes oncologicos (sic), os termos de recusas – Considerando as ponderações apresentadas pelo Arquiteto do Hospital de Cirurgia, concedo o prazo de 45 dias para conclusão da obra. Tão logo terminada a Vigilância Sanitária terá o prazo de 05 (cinco) dias para vistoriar e liberar o serviço de radioterapia. Autorizada pela Vigilância Sanitária e encaminhada a documentação pelo Hospital de Cirurgia, o Estado e o Município terão o prazo máximo de 10 (dez) dias para aprovar no âmbito da comissão bipartite, devendo inclusive convocar reunião extraordinária, se for necessária. Por sua vez a SAS terá um prazo máximo de 15 (quinze) dias para aprovar e publicação da habilitação do serviço. Para comprovar o cumprimento das determinações, cada parte deverá encaminhar cópia do documentação (sic), aos autos. – Tendo em vista que o serviço do Hospital de Cirurgia não será inaugurado no prazo estipulado inicialmente, determino que: 1) o Estado encaminhe a cada 15 dias a lista dos pacientes que estão na fila de espera e dos que já foram encaminhados para tratamento via TFD, contendo a data do encaminhamento e o também o nosocômios para o qual foi encaminhado; 2) o Estado de Sergipe deverá entrar em contato com os Hospitais de Araraquara/SP e São Carlos/SP para encaminhar os pacientes via TFD, conforme manifestação do Dr. Willian Soares; 3) oficiar ao Hospital Universitário da UFAL para, no prazo de 10 (dez) dias, apresentar informações acerca do andamento do contrato a ser firmado entre o Estado de Sergipe e a FUNDEPE, inclusive apontando eventuais óbices à conclusão da tratativa; 4) o Estado de Sergipe deverá realizar novo contato com o FUNDEPES, ficando mantido a autorização (sic), para a contratação mediante dispensa do processo licitatório de pessoal para operacionalizar o serviço de radioterapia e também dos complementos das diárias. – Considerando a excepcionalidade da situação, caso não seja aprovado na CIB, autorizo o Ministério da Saúde, temporariamente, a realizar a compensação dos valores repassados ao ente Federativo que estiver na posse dos recursos destinados para o tratamento da oncologia - Estado de Sergipe ou ao Município de Aracaju – até o limite de 100 pacientes por mês. O excedente será custeado pela União que deverá repassar ao ente federativo que efetivamente tratar o paciente encaminhado pelo Estado de Sergipe. A lista dos pacientes que forem atendidos fora do domicilio deverá ser encaminhada ao Ministério da Saúde através do fone/fax (61) 3315-2013 ou por e-mail [email protected] ou [email protected]. Determino que a Secretaria extraia cópias dos ofícios em que houve resposta positiva para o recebimento de novos pacientes, devendo a União e o Estado de Sergipe comparecerem a sede da 1ª Vara para receber a cópia dos ofícios. – Concedo o prazo de 10 (dez) dias para os réus trazerem um cronograma de discussão referente à implantação de um novo serviço de oncologia no Estado. Fixo multa diária de R$ 5.000,00 (cinco mil reais), que incidirá automaticamente após o decurso de prazo sem cumprimento e reverterá ao Fundo de Interesses Difusos. Em caso de descumprimento injustificado fixo uma multa por atentado à dignidade da

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jurisdição de R$ 2.000,00 (dois mil reais), com fulcro no art. 14, inciso V do CPC que incidirá sobre o funcionário público responsável pelo descumprimento. Advirto que a legislação autoriza a fixação de multa de até 20% sobre o valor da causa, fixada em R$ 1.000.000,00 (um milhão de reais), tal valor poderá ser elevado.

O Estado de Sergipe juntou aos autos documentos referente ao encaminhamento de pacientes para tratamento fora do domicilio (f. 1333-1385).

O Hospital de Cirurgia juntou aos autos (f. 1387-1412) documentos relativos à proposta de convênio junto ao Ministério da Saúde para a aquisição de um novo aparelho de radioterapia.

Em cumprimento ao determinado na audiência do dia 24.03.2010, o Estado de Sergipe, por intermédio de sua Secretaria de Saúde, juntou, na f. 1416/1428, cópia da minuta do convênio entre o Estado de Sergipe e a Fundação Universitária de Desenvolvimento de Extensão e Pesquisa – FUNDEPES e a Universidade Federal de Alagoas – UFAL, sendo que, em 08.04.2010, juntou o contrato de convênio n.º 04/2010 (f. 1437/1450), o qual foi assinado em 05.04.2010.

A União, em petitório juntado às f. 1452-1473, informou que, segundo as informações constantes na base de dados do Ministério da Saúde, o Estado de Sergipe utiliza apenas 60% dos recursos destinados para TFD. Informou, ainda, que a Administração Estadual não encaminhou ao Ministério da Saúde qualquer dado sobre o encaminhamento de pacientes para outros Estados, bem assim que o aproveitamento das vagas ofertadas pelo Dr. João Victor Salvajoli, nos Hospitais de Araraquara/SP e de São Carlos/SP, depende da interveniência do Estado de Sergipe. Por fim, a União sustenta que não pode ser penalizada, uma vez que não descuidou em nenhum momento das obrigações que lhe foram determinadas, bem assim que a apresentação de um cronograma de discussão sobre o novo serviço de radioterapia depende da análise de projeto encaminhado pelo Estado de Sergipe, ao INCA.

O MPF, por sua vez, requereu que o Estado de Sergipe se manifestasse acerca do tratamento que será oferecido à Sra. Maria Jivalda da Silva, uma vez que há comprovação da necessidade urgente de que a mesma seja submetida à radioterapia. (f.1474-1478).

Em cumprimento ao determinado na assentada do dia 24/03/2010, o INCA apresentou relatório (f. 1509-1526).

O Estado de Sergipe, também em cumprimento às determinações, apresentou relatório informando (f. 1528-1576): a) a lista de pacientes já encaminhados e cujos tratamentos já estão agendados em outros Estados; b) lista de pacientes cuja documentação foi enviada para agendamento do inicio do tratamento; c) informações sobre os contatos realizados com a Associação Matogrossense de Combate ao Câncer, com a Santa Casa de Misericórdia de Porto Alegre/RS e com o Instituto do Câncer Arnaldo Vieira de Carvalho, com o qual já se encontra em fase de tratativas para o encaminhamento de pacientes, via TFD; d) relação dos Hospitais para os quais o TFD encontra-se inviabilizado; e) cópia dos termos de recusas dos pacientes.

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O Hospital de Cirurgia informou que a Energisa não atendeu o pedido de instalação de uma rede elétrica independente para atender o serviço de radioterapia instalado nesse nosocômio (f. 1578-1579).

Em decisão (f. 1580-1584), foram dadas as seguintes determinações: 1) o Estado de Sergipe deverá ser intimado na pessoa do Exmo. Procurador Geral do Estado, a fim de que, no prazo improrrogável de 05 (cinco) dias, comprove o cumprimento de todas as medidas supracitadas a si destinadas, ou justifique o seu não cumprimento, sob pena de implementação da multa diária já fixada, que incidirá automaticamente após o decurso do prazo; 2) o Estado de Sergipe fica autorizado a firmar contrato diretamente e sem a necessidade de procedimento licitatório com os hospitais para fins de TFD, devendo informar imediatamente à União acerca da celebração desses contratos e do número de pacientes encaminhados, a fim de que se promova eventual remanejamento do recursos do SUS; 3) o Estado de Sergipe deverá apresentar, no prazo improrrogável de 05 (cinco) dias, proposta de contrato com os Hospitais de São Carlos e Araraquara, cujas vagas para atendimento de pacientes via TFD foram disponibilizadas pelo Dr. João Victor Salvajoli (f. 1488-1489); 4) o Estado de Sergipe deverá informar, ainda, no prazo de 05 (cinco) dias, a lista de pacientes que estão sendo tratados no Estado, que estão na lista de espera, que já foram encaminhados para outros Estados, via TFD e que recusaram esse tipo de atendimento; 5) em reforma ao posicionamento adotado na assentada do dia 24/03/2010, determino que o Hospital de Cirurgia restabeleça o atendimento radioterápico tão logo lhe seja concedida liberação pela Vigilância Sanitária, devendo o Ministério da Saúde adotar todas as providencias necessárias para que o nosocômio possa registrar todos os atendimentos realizados, mediante o preenchimento de APAC, bem assim seja devidamente remunerado por tais atendimentos segundo a tabela do SUS; 6) a União fica autorizada a efetuar o bloqueio do valores comprovadamente não utilizados pelo Estado de Sergipe para custear o TFD; 7) quanto à paciente Sra. Maria Jivalda da Silva, esta deverá ser submetida imediatamente a avaliação pela equipe do HUSE, a fim de que, de acordo com a gravidade do caso, seja realizado seu tratamento; 8) oficie-se à Fundação Hospitalar de Saúde, a fim de que, no prazo de 10 (dez) dias, sejam informados os critérios da avaliação a que são submetidos os pacientes para fins de inclusão na lista de espera; 9) oficie-se à Energisa solicitando, no prazo de 05 (cinco) dias, informando quais seriam os impedimentos à instalação de uma rede elétrica complementar no Hospital de Cirurgia.

O Estado de Sergipe apresentou relatório e documentos relativos ao andamento das medidas necessárias ao fornecimento de TFD aos pacientes em lista de espera (f.1605-1688).

A Energisa apresentou manifestação na qual afirma que não foi formalizada nenhuma solicitação para a ligação de energia da unidade de Radioterapia do Hospital Cirurgia. Afirmou ainda que as condições da subestação comprometem a segurança das pessoas e das instalações do Hospital e recomendou medidas a serem adotadas pelos responsáveis pela unidade hospitalar (f.1693-1724).

Inspeção Judicial e audiência realizadas no dia 04.05.2010 (f. 1737-1741). Na audiência, discutiram-se os problemas que impedem a abertura do antigo serviço de radioterapia. O Hospital Cirurgia falou do atraso das obras e da readequação da rede

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elétrica. Disse que “dos R$ 800.000,00 recebeu R$ 662.000,00 mil reais da Prefeitura de Aracaju, restando receber R$ 138.000,00, que serão utilizados para a aquisição do sistema de planejamento terapêutico, visando o mapeamento do paciente antes de submetê-lo ao tratamento radioterápico” (f. 1738). A União alegou que “o Hospital de Cirurgia está credenciado junto ao Ministério da Saúde como UNACON sem radioterapia e que deverá ser habilitado como UNACON com radioterapia, necessitando cumprir todo o checklist” (f. 1738v). Ao final, este juízo decidiu o seguinte:

– considerando o extravio do cronograma de funcionamento do serviço de braquiterapia (f. 1739), concedeu ao HUSE “o prazo de 05 (cinco) dias para a juntada do cronograma com o protocolo e para informar a situação atual, sob pena de multa diária de R$ 5.000,00 que incidirá automaticamente após o decurso do prazo sem o cumprimento e que reverter-se-á em favor do fundo de interesses difusos” – determinou que o Município comprove o efetivo repasse dos valores remanescentes, no prazo de 05 (cinco) dias, também sob pena de multa diária de R$ 5.000,00 que incidirá automaticamente após o decurso do prazo sem o cumprimento e que reverter-se-á em favor do fundo de interesses difusos. – indeferiu o requerimento da União de que fosse feito o checklist de todo o Hospital, considerando que “o Município de Aracaju continua pagando por serviços de cirurgia onocologica, tratamento ambulatorial e quimioterapia o que não foram afetados pelo seu descredenciamento” (f. 1739-v), sem prejuízo de, querendo, realizar a fiscalização de todo o nosocômio – novas medidas em relação ao TFD, principalmente em relação aos pacientes que estão na lista, mas não foram encontrados

O Estado de Sergipe informou que o tratamento da Sra. Maria Jivalda da Silva foi agendado para 11/05/2010, no Hospital Amaral Carvalho na cidade de Jaú/SP (f. 1833).

A Fundação Hospitalar de Saúde manifestou-se sobre o tratamento da Sra. Maria Jivalda da Silva, afirmando que todas as medidas que cabiam ao HUSE foram devidamente tomadas, cumprindo-se integralmente o comando judicial (f. 1835-1859).

O Ministério Público Estadual juntou aos autos cópia de sentença prolatada no processo nº 2008.85.00.4406-7, que reconhece a natureza jurídica de fundação estatal regida pelo Direito Público à Fundação de Beneficência Hospital de Cirurgia (FBHC) (f.1861-1869).

A Fundação Hospitalar de Saúde juntou cronograma para funcionamento do equipamento de braquiterapia (f. 1871-1919).

Despacho de f. 1923 determinou: 1) a aplicação de multa ao Município de Aracaju pelo não repasse das verbas remanescentes ao Hospital Cirurgia para a reabertura do antigo serviço de radioterapia; 2) que aguardasse o prazo concedido ao Estado de Sergipe para viabilizar o TFD em relação ao Hospital de Araraquara e São Carlos; 3) a intimação do MPF e MPE para se manifestar sobre a contestações e requeresse as provas que entendessem pertinentes; 4) que o prazo do MPE e MPF seria comum e não sucessivo, devendo transcorrer em cartório, salvo se houver ajuste.

Em manifestação de f. 1926/1927, o Município de Aracaju aduziu que não repassou o restante da verba, no montante de R$ 105.400,00, “tendo em vista todas as implicações legais e administrativas, inclusive junto ao Tribunal de Contas, sendo esta a única razão para

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a retenção do valor até a presente data” (f. 1927). Requereu que “seja ordenado expressamente em juízo o repasse ao Hospital Cirurgia da referida ajuda financeira que se encontra em poder do Ente Municipal” (f. 1927).

O Ministério Público Estadual juntou termo de audiência realizada naquela Promotoria em relação ao funcionamento do serviço de energia elétrica na unidade de radioterapia do Hospital Cirurgia (f. 1929-1933).

O Estado de Sergipe apresentou documentação relativa ao fornecimento de TFD aos pacientes em lista de espera (f. 1936-2023).

O despacho de f. 2024 manteve a multa do Município de Aracaju e aplicou a multa em relação ao Estado de Sergipe (Vide despacho de f. 1923)

Diante do descumprimento pelo Município de Aracaju quanto ao repasse de recursos ao Hospital Cirurgia e pelo Estado de Sergipe quanto ao encaminhamento de pacientes aos Hospitais de Araraquara e São Carlos para TFD, foi determinado o cumprimento integral do despacho def. 1923 (f. 1024).

O Ministério Público Federal apresentou requerimento impugnando sua intimação por mandado e requerendo a remessa dos autos à Procuradoria da República em Sergipe (f.2037-2040), o que foi indeferido (f. 2044-2045).

O Município de Aracaju informou a regularização dos repasses em razão dos serviços prestados pelo Hospital Cirurgia, conforme documentação que junta (f. 2048-2070).

Ofício da Secretaria de Estado da Saúde apresentando informações atualizadas em relação ao fornecimento de TFD aos pacientes em lista de espera (f. 2071-2097 e 2097-2103).

O Hospital Cirurgia informou ter recebido a licença da vigilância sanitária para funcionamento do setor de radioterapia, estando marcada a inauguração do setor para o dia 17/06/2010. (f. 2110-2114).

O Ministério Público Federal noticiou a interposição de agravo de instrumento contra as decisões de f. 1923 e 2044/2045 que indeferiram a intimação do Parquet por vista dos autos (f.2119-2135), sendo que o relator do AGTR n.º 107866/SE indeferiu o efeito suspensivo (f. 2822/2823) e, no mérito do recurso, negou provimento (f. 2824/2829).

Em petição de f. 2137/2140, acompanhada de documentos (f. 2141/2143), o Hospital Cirurgia aduziu que: 1) o serviço de radioterapia está pronto somente para pacientes que necessitem atendimento “2D”, uma vez que o tratamento de pacientes “3D” é necessário instalar o tomógrafo, o que ainda não ocorreu (f. 2137-2146); 2) o Estado de Sergipe se comprometeu em audiência a firmar um convênio para conclusão das obras do novo serviço de radioterapia, sendo assim é necessário o repasse de R$ 1.866.975,11 (um milhão oitocentos e sessenta e seus mil, novecentos e setenta e cinco reais e onze centavos).

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O Estado de Sergipe acostou documentação sobre os pacientes que necessitam de radioterapia e que estão em tratamento fora de domicílio e afirmou não ter provas a produzir. (f. 2148-2166).

O Ministério Público Estadual noticiou a interposição de agravo de instrumento contra as decisões de f. 1923 e 2044/2045 que indeferiram a intimação do Parquet por vista dos autos (f. 2168-2185), sendo que o relator do AGTR107991/SE indeferiu o efeito suspensivo e, no mérito do recurso, negou provimento, conforme resenha processual em anexo.

A Fundação Hospitalar de Saúde requereu a produção de prova testemunhal com vistas a comprovar a adoção de todas as medidas necessárias para colocar o aparelho de braquiterapia em funcionamento (f. 2187).

O Município de Aracaju informou não ter provas a produzir (f. 2189).

Em despacho (f. 2190) foi designada audiência para o dia 10/08/2010 e determinado: 1) que o Município de Aracaju e o Estado de Sergipe comprovassem o cumprimento das medidas acima determinadas e informar a situação atual do processo de credenciamento do Hospital de Cirurgia como UNACON com radioterapia, junto ao Ministério da Saúde; 2) que o Hospital de Cirurgia deveria informar se o aparelho tomógrafo e o sistema de planejamento já se encontram em funcionamento e em caso negativo, justificar e esclarecer qual a previsão para instalação do aparelho e implantação do sistema; 3) que o Estado de Sergipe deveria informar quais medidas já foram adotadas para a celebração de convênio para o repasse dos R$ 2.000.000,00 faltantes para a conclusão da nova ala para o serviço de tratamento radioterápico e a previsão para o efetivo repasse do valor mencionado.

O Estado de Sergipe acostou documentação sobre os pacientes que necessitam de radioterapia e que estão em tratamento fora de domicílio e afirmou não ter provas a produzir. (f. 2192-2200).

O CNEN afirmou não ter provas a produzir, uma vez que o único pedido dirigido a ela já fora devidamente atendido (f. 2214-2216).

Audiência pública realizada 6 (f. 2217/2220) com a finalidade de discutir “a habilitação do Hospital de Cirurgia, o serviço de braquiterapia do HUSE, readequação do serviço de radioterapia no Estado e o andamento da lista de pacientes” (f. 2217). O Hospital Cirurgia informou que: 1) selecionou alguns pacientes da lista de espera e com a instalação do tomógrafo poderia ampliar a sua cobertura; 2) já comprou o tomógrafo, estando pendente de instalação. Afirmou, ainda, que “Que em relação ao SINCOV, o técnico solicitou a autorização da CIB – Comissão Intergestora Bipartite (Estado de Sergipe e Municípios). Quanto à habilitação do antigo serviço de Radioterapia, já existe a portaria que habilita o Hospital como UNACON apta a receber tratamento radioterápico” (f. 2217). No tocante ao novo serviço, afirmou que é necessária a aprovação na comissão bipartite para que seja realizado o convênio. O Município de Aracaju alegou que: 1) o teto de média e alta complexidade é

6 Não obstante constar a data de 04.05.2010, a referida audiência foi realizada em 28.07.2010 (Vide despacho de f. 2201)

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único e serve ao tratamento da radioterapia e outros tratamentos; 2) ao solicitar o aumento do teto, a União informa da sua desnecessidade, pois o teto do Estado de Sergipe já foi aumentado; 3) A reabilitação foi feita sem aprovação unânime da CIB, justamente por haver divergência sobre quem cobrirá essa nova despesa. Em relação a Braquiterapia, a Fundação Hospitalar requereu a dilação de prazo em relação ao primeiro cronograma apresentado. Durante a audiência, ficou definido entre o MPF e o MPE acerca da retirada dos autos de que, enquanto estivesse válida a decisão que entendeu ser o prazo comum, os autos seriam retirados pelo MPF e a Secretaria do Juízo intimaria o MPE por mandado. Ao final, determinei que os réus se manifestassem na Comissão Bipartite acerca da instalação de um novo serviço de radioterapia ou não no Hospital Cirurgia e designei audiência para o dia 25.08.101 com a seguinte pauta: 1) lista de espera; 2) a questão do novo serviço de radioterapia no Hospital Cirurgia e a posição dos dois entes. Na audiência, as partes promoveram juntada de documentos (f. 2221-2342).

O Hospital Cirurgia juntou o contrato firmado entre o nosocômio e o GAC – Grupo de Alta Complexidade LTDA e o requerimento feito junto à Secretaria Municipal de Saúde para habilitação de um novo serviço de radioterapia no hospital (f. 2345-2361).

O Estado de Sergipe, através da Secretaria Estadual de Saúde juntou cópia do ofício que comprova o encaminhamento à Coordenadoria Geral de Alta Complexidade do Ministério da Saúde do processo contendo a documentação referente ao pedido Reabilitação da Unidade de Alta Complexidade em Oncologia – UNACON do Hospital de Cirurgia (f. 2364-2366).

Através de petição (f. 2368/2370), a Fundação Hospitalar de Saúde manifestou-se sobre as medidas já tomadas e o andamento do processo para instalação e início do serviço de braquiterapia e requereu a juntada de ata de reunião entre o HUSE e o Cirurgia acerca do gerenciamento da lista de espera. A petição veio acompanhada dos documentos (f. 2371/2401).

Em petição (f. 2414), a União informou que: 1) “mesmo com a suspensão dos serviços de radioterapia no Hospital Cirurgia, o Estado de Sergipe continuou a receber os recursos do Governo Federal, relativos ao tratamento oncológico”; 2) “a reabilitação do serviço de radioterapia não implica em nova despesa para o Estado de Sergipe e sim o retorno ao status quo anterior à interdição do nosocômio”; 3) “nos registros do Ministério da Saúde todos os recursos para o tratamento oncológico são repassados para o Estado de Sergipe”; 4) na condição de gestor pleno, o Município pode até receber recursos para o tratamento, mas é necessário que haja pactuação na Comissão Bipartite – CIB.; 5) para a União é indiferente a destinação dos recursos, mas “se não houver pactuação entre o Estado e o Município, as APACs relativas a procedimento oncológico deverão ser debitados à conta do Estado de Sergipe e não do Município de Aracaju”.

Em cumprimento a determinação contida na audiência do dia 28.07.2010 7, Município de Aracaju informou que todos os documentos do Hospital Cirurgia foram

7 “Determino que Hospital de Cirurgia provoque o Município de Aracaju, com todo a documentação necessária para a implantação de um novo serviço no referido hospital, no prazo de 05 (cinco) dias. O Município de Aracaju encaminhará a documentação, se estiver em ordem, no prazo de 05 (cinco) dias, para o Estado de Sergipe convocar extraordinariamente, no prazo de 10 (dez) dias a partir do recebimento da documentação ou incluir o debate na próxima reunião ordinária da CIE, o que ocorrer primeiro” (audiência do dia 28.07.2010 – f. 2219).

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encaminhados ao Estado de Sergipe, aguardando-se a instalação do CIE para deliberação conjunta sobre a implementação do novo serviço de radioterapia (f. 2415-2456).

O Hospital Cirurgia apresentou petição informando sobre o tomógrafo que auxiliará no tratamento de pacientes oncológicos (f. 2460-2461)

Os Ministérios Públicos Federal e Estadual manifestaram-se sobre as contestações afirmando, em síntese: 1) a legitimidade passiva dos réus; 2) a impossibilidade utilização do argumento de existência de limitações orçamentárias e reserva do possível de forma genérica; 3) a correção do valor fixada para as astreintes; 4) a possibilidade de atuação do Poder Judiciário em demandas relativas ao direito à saúde; 5) a devida inclusão da CNEN no pólo passivo da demanda; 6) possibilidade de cessão de pessoal do Estado de Sergipe ao Hospital Cirurgia mediante autorização judicial (f. 2462-2467).

Audiência pública realizada (f. 2471-2474) com o escopo de “saber a posição dos entes para a instalação do novo serviço de radioterapia” (f. 24717). O Município e o Estado de Sergipe não chegaram a um consenso acerca da instalação do novo serviço de radioterapia. O Município de Aracaju informou que foi formada uma comissão. O Estado de Sergipe defendeu que a melhor solução no momento é a instalação no Hospital Cirurgia porque seria necessário construir no HUSE uma casa mata e isto impactaria os demais serviços. Asseverou que existe a proposta de construção de um Hospital do Câncer, contudo “a viabilização desse projeto depende de uma agenda mais complexa, não se tratando de projeto a curto prazo” (f. 2471-v). O Município de Aracaju questionou a necessidade de aumento do teto de alta complexidade. Já o Estado de Sergipe respondeu que “Que o pleito de aumento de teto teve como objetivo ampliar a rede hospitalar no interior e está vinculado a esse objetivo, não podendo ser utilizado para a radioterapia. Que já existem os recursos para o município custear o serviço de radioterapia. Assim, se o Hospital de Cirurgia volta a funcionar, o município deve custear o serviço de radioterapia desse hospital” (f. 2472). Na audiência, foi informado ao Juízo que o Hospital de Jaú não estaria sendo remunerado pelos serviços de radioterapia, tendo este Juízo determinado que Aracaju custeasse o serviço na proporção de R$ 20.000,00 por mês, já que o Estado de Sergipe já estaria custeando o Hospital de Maceió.

Na audiência, juntaram aos autos documentos relativos à fila de espera dos seus pacientes oncológicos (f. 2475-2491).

A Fundação Hospitalar de Saúde informou não ter provas a produzir (f. 2501).

A União apresentou manifestação relativa à transferência de recursos para o Estado de São Paulo com vistas a custear o tratamento dos pacientes oncológicos transferidos para o Hospital Amaral Carvalho, situado no Município de Jaú (f. 2504-2506).

O Hospital Cirurgia apresentou petição informando sobre a atual situação do serviço de radioterapia, no que tange à instalação do tomógrafo e de um novo acelerador linear e à retirada das fontes radioativas inativas das dependências do nosocômio (f. 2507-2518).

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Tendo em vista notícia veiculada sobre suspensão de vários serviços prestados pelo Hospital Cirurgia, inclusive de radioterapia, em razão da suspensão de repasses, foi designada audiência (f. 2532).

Audiência pública realizada em 26.10.2010 (f. 2560-2601), na qual foi determinado que: 1) os hospitais ficariam obrigados a informar a este Juízo qualquer paralisação nos aparelhos pelo prazo superior a 48 horas, as medidas adotadas para sanar o problema e o prazo para o retorno do funcionamento do aparelho; 2) o Hospital Cirurgia apresentasse lista informando os motivos pelos quais os pacientes admitidos ainda não começaram o tratamento, sob pena de multa por atentado à dignidade da jurisdição; 3) caso o óbice seja a ausência das tomografias e considerando que o Município não opõe resistência a sua realização, até o limite de 500 tomografias mensais, previsto no contrato, que começasse imediatamente a realização dos exames, sob pena de multa por atentado à dignidade da jurisdição; 4) Estado de Sergipe encaminhasse a lista de pacientes encaminhados para Maceió e Jaú para a próxima audiência e a cópia do contrato de renovação com o serviço prestado em Maceió e quinzenalmente informasse ao Município de Aracaju os referidos dados; 5) ficou designada audiência para o dia 09/11/2010, às 14:00 h, com a finalidade de os gestores apresentarem uma solução para o gerenciamento da fila de espera de pacientes na qual os entes deveriam apresentar os pontos convergentes e eventualmente divergentes. Na audiência, foram juntados os documentos de f. 2566/2601.

O Hospital Cirurgia requereu a intimação da União para dar celeridade na conclusão do processo de liberação do acelerador linear e informar quais as pendências eventualmente existentes para tanto (f. 2606-2610). Acostou documento de f. 2608/2610

Na audiência pública realizada em 09.11.2010 (f. 2621-2705), foi discutido o gerenciamento da fila de espera. O Hospital Cirurgia aventou a possibilidade de abrir um terceiro turno de atendimento, desde que haja autorização do CNEN. O Estado de Sergipe e Município de Aracaju relataram problemas no tocante à realização de exames, já que “os prestadores não aceitam os valores pagos pela tabela SUS e que o serviço deve ser contratado pelo Município de Aracaju por ser o gestor pleno” (f. 262-v.). O MPF e MPE requereram que “este Juízo determine que o Município de Aracaju faça a contratação de emergência dos serviços com o auxílio financeiro do Estado de Sergipe, tendo em vista a situação exposta nessa assentada de não atendimento ao chamamento público para a contratação dos referidos serviços, pelos valores da tabela SUS, observados os princípios da legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade, eficiência, as regras da Lei 8.666/93, aplicáveis à contratação de emergência, os princípios da Lei 8.080, ainda que necessário o pagamento acima da tabela SUS, dentro dos valores de mercado (tabela da AMB)” (f. 2621-v). O Estado de Sergipe requereu o encerramento do convênio com o Hospital de Maceió porque o valor é fixo, no mês de outubro de 2010 não foi encaminhado nenhum paciente para Maceió e a quantidade de pacientes encaminhada para Maceió pode ser atendida pelo hospital de Jaú. Os MPF e MPE não se opuseram ao pleito. Ao final, foram tomadas as seguintes determinações:

1) foi acolhida a proposta (f. 2624/2627) para o gerenciamento da fila de espera e forma de encaminhamento ao Hospital Cirurgia, a qual foi “integralmente incorporada à presente decisão e será assinada por todos aqui presentes, com a única ressalva que as comunicações solicitadas pelo HUSE ao Hospital de Cirurgia e vice-versa serão

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feitos por meio eletrônico por meio de e-mail’s cujo endereço serão comunicados a esse Juízo, no prazo de 03 (três) dias” (f. 2622v). Para viabilizar a proposta apresentada, autorizo que o Município de Aracaju realize contratação emergencial, mediante dispensa de licitação, pelo prazo inicial de 180 (cento e oitenta) dias, prorrogáveis por iguais períodos, apresentadas as devidas justificativas. Caso não sejam apresentadas propostas de orçamento, o Município de Aracaju fica autorizado a contratar com a empresa que apresentar o menor custo constante na fatura dos serviços. Para assegurar a impessoalidade, deverá realizar mais de um serviço por prestador, a fim de que se possa verificar o menor preço. As contratações deverão ter por limite máximo os valores estabelecidos na CBHPM. 2) foi autorizado o encerramento do convênio com o Hospital de Maceió, contudo mantive o repasse ao Hospital de Jaú até o final do ano e de que “ambos os entes políticos apresentem uma proposta de repartição dos custos relativos à manutenção do serviço prestado pelo Hospital de Jaú”; 3) as partes sejam intimadas para apresentarem seus memoriais, observando o prazo em dobro do art 191 do CPC, permanecendo os autos em Secretaria, salvo manifestação quanto a forma de retirada.

A Fundação Hospitalar de Saúde e o Hospital de Cirurgia informaram a criação dos respectivos endereços eletrônicos para otimizar as negociações relativas aos pacientes oncológicos (f. 2707-2708).

O Hospital de Cirurgia noticiou a paralisação do aparelho de tomografia em razão da necessidade de substituição de uma peça e informou as medidas já tomadas para a manutenção do aparelho (f. 2712-2714).

O Estado de Sergipe apresentou memoriais afirmando, em síntese, que tomou todas as medidas necessárias a regularizar o atendimento aos pacientes com câncer, quais sejam, disponibilizar recursos matérias, equipamentos, estrutura humana e física, ampliações de limites de tetos, requerendo assim a improcedência da ação (f. 2725-2729).

Os Ministérios Públicos Federal e Estadual apresentaram memoriais na qual defendem, em suma, a total responsabilidade dos réus pelos problemas ocasionados no tratamento radioterápico, uma vez que não se preocuparam em se preparar adequadamente para receber o impacto do número de pacientes que necessitam de radioterapia (f. 2730-2753).

Em petição de f. 2755/2760, a Fundação Hospitalar de Saúde apresentou requerimento de dilação de prazo de mais 30 dias em “virtude da fonte radioativa já está armazenada na alfândega de cargas áereas da Infraero em Salvador/BA, restando apenas a liberação por parte da Receita Federal” (f. 2766). Aduziu que o problema de liberação decorreu da discussão se a Fundação Hospital seria beneficiária ou não de imunidade tributária, requerendo que fosse depositado nestes autos o valor do imposto de importação.

Em petição de f. 2776/2778, a Fundação Hospitalar informou que: 1) o serviço de radioterapia foi interrompido por danificação da rede elétrica e de fibra ótica ocorrida durante o processo de escavação para reforma e ampliação do Hospital, mas que já foram tomadas todas as medidas necessárias à regularização do problema; 2) em relação ao serviço de braquiterapia, o equipamento já está instalado, passando por manutenção corretiva, com previsão de conserto e início das atividades para 18.01.2011.

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Em nova manifestação, a Fundação Hospitalar de Saúde relatou novos problemas no atendimento de radioterapia, mas afirmou que o mesmo encontrava-se, naquela data, funcionando adequadamente e que o funcionamento para o terceiro turno já estava devidamente autorizado (f.2781-2782).

O Ministério Público Estadual requereu a juntada de termo de audiência realizada por aquela promotoria sobre a quebra do aparelho de radioterapia em 05/01/2011 e informações sobre o restabelecimento do serviço em 21/01/2011 (f. 2783-2786).

O Hospital de Cirurgia informou que a solicitação para abertura do terceiro turno de atendimento de pacientes na ala de radioterapia do Hospital estava em fase final de autorização, pendente de ulterior liberação do CNEN, conforme documentação que junta (f. 2795-2797). Em outra petição, informou os procedimentos para encaminhamento de pacientes ao setor de radioterapia (f. 2799-2800).

O Município de Aracaju apresentou memoriais (f. 2802-2807), nos quais afirma ter cumprido integralmente as determinações judiciais, bem como ter envidado os esforços necessários, dentro de sua competência funcional e legal, para regularizar o atendimento radioterápico no Estado.

A CNEN reiterou os termos da contestação e demais manifestações (f. 2809).

Em petição de f. 2813-2838, o Hospital de Cirurgia informou que os recursos disponibilizados pela emenda parlamentar estariam prestes a ser devolvidos à União, uma vez que até a presente data não há manifestação do Ministério da Saúde quanto ao mencionado convênio, e em consequência não há empenho para a referida verba. Informou que para não serem devolvidos, tais recursos devem ser empenhados até o dia 30/04/2011. Requereu que os recursos da emenda parlamentar sejam mantidos à disposição do Hospital, enquanto não apreciada a proposta de convênio.

Em decisão (f. 2839-2842), o feito foi convertido em diligência, sendo determinado à União que se abstivesse de devolver ao erário os recursos oriundos de emenda parlamentar não empenhada relativos à proposta de convênio nº. 132.388/09, tombado junto ao Ministério da Saúde com o nº 25000669818/2009-19, enquanto pender sua apreciação, bem como que a União fosse intimada para, no prazo de 15 (quinze) dias, apresentar o resultado da apreciação da proposta ou justificar a impossibilidade de fazê-lo, afim de que esse juízo pudesse aquilatar a necessidade da manutenção da providência deferida.

A União noticiou a interposição de agravo de instrumento contra a decisão que determinou “bloqueio de emenda parlamentar não empenhada” (f. 2852-2864 e 2866-2883), o qual se encontra pendente de apreciação, conforme consulta extraída do sítio do TRF da 5ª Região. Além disso, afirma que a proposta de Convênio 132.388/09 já foi devidamente analisada no exercício financeiro em que foi apresentada, tendo recebido parecer desfavorável, não havendo nenhuma nova proposta do Hospital Cirurgia a ser analisada.

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Em nova manifestação (f. 2887), a União ratificou o conteúdo da petição de f. 2852-2864.

A Fundação Hospitalar de Saúde informou a paralisação dos serviços de radioterapia do HUSE devido a repetitivos entravamentos do tipo “water flow”. Afirma que os técnicos da empresa SIEMENS já se encontram no local tentando solucionar o problema e que o serviço será retomado o mais rapidamente possível (f. 2889-2890).

1.2. Relatório do Processo 0001610-86.2010.4.05.8500

O MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL e o MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SERGIPE ajuizaram Ação Civil Pública em face da UNIÃO FEDERAL, ESTADO DE SERGIPE e MUNICIPIO DE ARACAJU objetivando fixar a responsabilidade genérica pelos supostos danos morais e materiais sofridos pelos pacientes em lista de espera para tratamento de radioterapia, em apuração individual posterior, mediante liquidação de sentença.

Os autores afirmam, inicialmente, possuírem legitimidade ativa para a propositura da presente demanda. Sustentam, também a legitimidade passiva dos requeridos. Quanto ao aspecto fático, expõem que: 1) em razão das denuncias formuladas pelos pacientes foi instaurado procedimento administrativo que culminou no ajuizamento da ACP nº. 0006464-60.2009.4.05.8500; 2) apesar das determinações contidas na liminar concedida no bojo do mencionado processo, pouco vem sendo feito e a lista de espera já conta aproximadamente 295 pacientes.

Alegam que os requeridos possuem responsabilidade por todos os eventos ocorridos por várias razões: 1) não houve preparação adequada para atender o crescente número de novos casos de câncer em Sergipe; 2)não promovem o atendimento dos pacientes que estão na lista de espera, mediante o tratamento fora do domicílio; 3) também em virtude das sucessivas interrupções no funcionamento do aparelho de radioterapia, os danos aos pacientes são sensíveis.

Sustentam que a responsabilidade dos entes federados requeridos, fundamenta-se na teoria da culpa administrativa e decorre do dever de incolumidade devido à pessoa humana. Defendem que, em razão disso, o Estado deve indenizar, por danos materiais e morais, todos os pacientes que aguardam em lista de espera, bem assim aqueles que tiveram seu tratamento interrompido.

Juntaram documentos (fl. 30-53).

Decisão de fls. 54/55 determinou a distribuição da presente ação por dependência ao processo nº. 0006464-60.2009.4.05.8500.

Citado (66-67), o Estado de Sergipe apresentou contestação (f. 73-79) defendendo, preliminarmente, a ilegitimidade do Ministério Público para a propositura de ação coletiva buscando reparação de alegado dano moral e a impossibilidade de julgamento desta demanda antes da ação anterior que apura eventuais ilegalidades no atendimento radioterápico. No mérito, defendeu: 1) a existência de prejuízo ao sistema e à coletividade caso haja pagamento das indenizações, uma vez que o valore deixará de ser

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aplicado na saúde para incorporar-se ao patrimônio particular; e a inexistência do dever de indenizar, uma vez que o Estado tem cumprido com tudo que lhe é determinado pelo juízo, contudo suas ações estão limitadas pelo princípio da reserva do possível.

A União, citada (64-65), apresentou contestação (f. 81-108) defendendo, preliminarmente, sua ilegitimidade passiva. No mérito, alega: 1) que o julgamento da presente demanda deve ser pautado com base em eventual culpa da Administração e não em sua responsabilidade objetiva: 2) que inexiste o nexo de causalidade entre o alegado dano e a conduta da União, tampouco omissão específica da União, tendo em vista a repartição de competência através da descentralização do SUS; 3) que não houve repasse de informações corretamente pelo Estado de Sergipe quanto à real situação dos pacientes radioterápicos; 4) que a União tem repassado para o Estado os recursos necessários ao custeio do programa de Tratamento Fora do Domicílio; 5) a ausência de provas quanto aos danos matérias; 6) a ausência de direito a indenização dos pacientes que optaram por realizar tratamento em rede particular em detrimento do TFD; 7) a inexistência de dano moral que pode ser deduzido somente pela permanência do paciente em fila de espera, uma vez que è disponibilizado o TFD e 8) a limitação de eventual indenização aos pacientes que mesmo tendo aceitado o TFD, não foram atendidos pela Secretaria de Estado da Saúde.

O Município de Aracaju apresentou sua contestação (f. 110-188), afirmando a preliminar de ilegitimidade ativa do Ministério Público para a propositura de ação reparatória que visa resguardar direitos divisíveis e individuais. No mérito, defendeu a inexistência de atos a serem imputados ao Município de Aracaju quanto à adequação do serviço de oncologia e inexistência de dano moral e material, a inexistência de omissão relevante e ausência de comprovação quanto aos danos morais e materiais alegados.

Intimados para se manifestarem sobre as contestações, os Ministérios Públicos Federal e Estadual questionaram suas intimações por mandado, requerendo a remessa dos autos às respectivas procuradorias (f.193-196), o que foi indeferido (f.197-198).

Os Ministérios Públicos Federal e Estadual noticiaram a interposição de agravos de instrumento contra a decisão que indeferiu sua intimação com vista dos autos (f.199-206 e 218-231, respectivamente).

Réplica dos Ministérios Públicos Federal e Estadual nas f. 232-238, na qual refutaram as preliminares de ilegitimidade ativa dos Ministério Públicos e passiva dos réus. Ratificam a existência de dano indenizável, a impossibilidade de utilização do argumento da limitação orçamentária e reserva do possível, e a responsabilidade objetiva do Estado. Por fim, defende a desnecessidade de sobrestamento do feito, tendo em vista da reunião deste processo com o de número 0006464-2009.4.05.8500 e requerem o julgamento antecipado da lide.

Decisões do TRF da 5ª Região de f. 241-242 e 248-249, informando o recebimento dos agravos interpostos pelo MPF e MPE somente no efeito devolutivo.

Conforme decisão proferida no dia 25.08.2010 em audiência relativa ao processo 0006464-2009.4.05.8500 (f. 256-259), as partes foram intimadas para dizerem

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sobre o interesse na produção de provas, tendo o prazo transcorrido in albis para todos os réus (f. 265 e 269).

Os Ministérios Público Federal e Estadual apresentaram memoriais relativamente ao presente feito conjuntamente com os dos autos de nº 0006464-60.2009.4.05.8500.

O Município de Aracaju apresentou memoriais (f.280-294) reiterando o conteúdo da contestação.

O Estado de Sergipe e a União não apresentaram memoriais, conforme certidão de f. 296.

Nas f.299-300, manifestação da Fundação Hospitalar de Saúde apresenta informações sobre a prestação dos serviços de radioterapia por ela executados.

Decisão do TRF da 5ª Região informando ter sido negado provimento ao agravo de instrumento interposto pelo MPF (f. 306-314).

É o relatório. Passo a decidir.

2. FUNDAMENTAÇÃO

Por questão de economia processual, procederei ao julgamento conjunto das ações nº 0006464-60.2009.4.05.8500 e 0001610-86.2010.4.05.8500 através de uma única sentença por estarem ambas em condições de serem sentenciadas.

Inicialmente, cumpre relembrar, para fins de eventuais embargos de declaração, que incumbe ao órgão julgador decidir o litígio segundo o seu livre convencimento motivado, utilizando-se das provas, legislação, doutrina e jurisprudência que entender pertinentes à espécie. Assim, o julgador não se encontra obrigado a manifestar-se sobre todas as alegações das partes, nem a ater-se aos fundamentos indicados por elas ou a responder, um a um, a todos os seus argumentos, quando já encontrou motivo suficiente para fundamentar sua a decisão. Isto porque a decisão judicial não constitui um questionário de perguntas e respostas, nem se equipara a um laudo pericial a guisa de quesitos. Neste sentido, colacionam-se os seguintes precedentes:

“O não acatamento das argumentações contidas no recurso não implica cerceamento de defesa, posto que ao julgador cabe apreciar a questão de acordo com o que ele entender atinente à lide. Não está obrigado o magistrado a julgar a questão posta a seu exame de acordo com o pleiteado pelas partes, mas sim com o seu livre convencimento (art. 131, do CPC), utilizando-se dos fatos, provas, jurisprudência, aspectos pertinentes ao tema e da legislação que entender aplicável ao caso concreto.” 8

8 AgRg no Ag 512437/RJ, 1ª Turma, Rel. Ministro JOSÉ DELGADO, julgado em 16.10.2003, DJ 15.12.2003 p. 210.

Processos nº 0006464-60.2009.4.05.8500 e 0001610-86.2010.4.05.8500

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“Processo civil. Sentença. Função prática. A função judicial é prática, só lhe importando as teses discutidas no processo enquanto necessárias ao julgamento da causa. Nessa linha, o juiz não precisa, ao julgar procedente a ação, examinar-lhe todos os fundamentos. Se um deles e suficiente para esse resultado, não esta obrigado ao exame dos demais. Embargos de declaração rejeitados.” 9 “(....) A função teleológica da decisão judicial é a de compor, precipuamente, litígios. Não é peça acadêmica ou doutrinária, tampouco se destina a responder a argumentos, à guisa de quesitos, como se laudo pericial fosse. Contenta-se o sistema com a solução da controvérsia, observada a res in judicium deducta, o que se deu no caso ora em exame.” 10

2.1.Preliminares

Não foram alegadas preliminares no processo nº 0001610-86.2010.4.05.8500.

Já no processo nº 0006464-60.2009.4.05.8500, as preliminares relativas à incompetência da Justiça Federal, à ilegitimidade ativa dos Ministérios Públicos e passiva dos réus os réus e à ausência de interesse de agir em relação à CNEN, já foram devidamente apreciadas e refutadas por ocasião da decisão de f. 462-483.

2.1.1. Perda do objeto. Cumprimento da tutela antecipada

Em sua contestação (f. 921/930), o Estado de Sergipe alegou a perda do objeto porque “atendeu, dentro das possibilidades de tempo e de recursos, a tudo que havia sido determinado pelo Juízo” (f. 925) em sede de antecipação dos efeitos da tutela.

Não houve perda do objeto porque a tutela de urgência deferida na f. 462/475, modificada na decisão de f. 706/712, visou cuidar de uma situação emergencial, qual seja, o tratamento dos pacientes que se encontravam na lista de espera para o serviço de radioterapia, sendo que o objeto desta demanda é bem mais amplo no sentido de que a União Federal, o Estado de Sergipe e o Município providenciem a adequação da cobertura de oncologia aos mínimos preconizados pelo Ministério da Saúde, instalando mais centros e/ou unidades de assistência em alta complexidade de oncologia no Estado de Sergipe.

2.1.2. Da parcial prejudicialidade do pedido relativo à atuação da CNEN

Quanto à CNEN, o único pedido que lhe foi dirigido no processo de n.º 0006464-60.2009.4.05.8500 consistia em que tão logo fosse instada a fazê-lo, analisasse o requerimento de licença e, se tudo estivesse em conformidade com as normas respectivas,

9 EDcl no REsp 15450/SP, Rel. Ministro ARI PARGENDLER, 2ª Turma, julgado em 01.04.1996, DJ 06.05.1996 p. 14399. No mesmo sentido:REsp 172329/SP, 1ª Seção, Rel. Ministro FRANCISCO PEÇANHA MARTINS; REsp 611518/MA, 2ª Turma, Rel. Ministro FRANCIULLI NETTO, REsp 905959/RJ, 3ª Turma, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI; REsp 807690/SP, 2ª Turma, Rel. Ministro CASTRO MEIRA. 10 EDcl no REsp 675.570/SC, 2ª Turma, Rel. Ministro FRANCIULLI NETTO, julgado em 15.09.2005, DJ 28.03.2006 p. 206.

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concedesse licença de funcionamento do serviço de radioterapia do Hospital Cirurgia no prazo máximo de 30 (trinta) dias.

Este pedido, de fato, resta prejudicado, uma vez que já foram encerrados os trâmites para regularização do serviço de radioterapia do Hospital de Cirurgia, já tendo o mesmo voltado a funcionar em julho de 2010.

Não obstante isso, entendo que a legitimidade passiva da CNEN estende-se também ao pedido principal, qual seja, de adequação do serviço de radioterapia no Estado, tendo em vista que o seu eventual deferimento implicará, em sede de execução, na instalação de novos UNACONS, que demandarão a atuação ostensiva da Comissão de Energia Nuclear, no sentido de impor prazos para a análise dos projetos. Assim, a CNEN deve ser mantida como litisconsorte passiva necessária na demanda, não havendo que se falar em prejuízo à sua defesa, uma vez que participou durante toda a lide.

Não havendo outras preliminares argüidas ou conhecíveis de ofício, passo a examinar o mérito.

2.2. Mérito

Trata-se de duas demandas conexas propostas pelo Ministério Público Federal – MPF e pelo Ministério Público Estadual. A 1ª de n.º 0006464-60.2009.4.05.8500 foi proposta em face de da UNIÃO FEDERAL (Advocacia-Geral da União), do ESTADO DE SERGIPE, do MUNICÍPIO DE ARACAJU, da FUNDAÇÃO DE BENEFICÊNCIA HOSPITAL DE CIRURGIA, do HOSPITAL DE URGÊNCIA DE SERGIPE – HUSE e da COMISSÃO NACIONAL DE ENERGIA NUCLEAR – CNEN (Procuradoria-Geral Federal), visando basicamente a regularização do serviço de radioterapia, mediante a instalação de mais centros e/ou unidades de assistência em alta complexidade de oncologia no Estado de Sergipe aos mínimos preconizados pelo Ministério da Saúde e funcionamento o aparelho de braquiterapia situado no HOSPITAL DE URGÊNCIA DE SERGIPE – HUSE. A segunda de n.º 0001610-86.2010.4.05.8500 foi proposta somente em face da UNIÃO FEDERAL, ESTADO DE SERGIPE e MUNICIPIO DE ARACAJU objetivando fixar a responsabilidade genérica pelos supostos danos morais e materiais sofridos pelos pacientes em lista de espera para tratamento de radioterapia, em apuração individual posterior, mediante liquidação de sentença.

Quanto à posição do Hospital Cirurgia no processo de n.º0006464-60.2009.4.05.8500, é mister salientar que, em que pese tenha sido incluído no pólo passivo pelos Ministérios Públicos, não é réu, conforme excerto de decisão proferida na audiência do dia 04.05.2010 (f. 1737-1741):

“Contudo, observa-se o seguinte: embora colocado no pólo passivo da demanda o Cirurgia encontra-se numa situação peculiar, pois não foi feito qualquer pedido contra o mesmo. Em razão disso, sua situação processual, mais se aproxima de um assistente que está recebendo auxilio do poder público para que seu serviço de radioterapia volte a funcionar. Por conta disso, esse juízo não tem como determina medidas sancionatórias ao referido ente. É mister ressaltar que a situação do Cirurgia é bem peculiar, tendo em vista recente decisão da Justiça Federal que declarou a sua natureza pública. Saliente-se que tal decisão ainda não transitou em julgado. Não obstante isso,

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verifica-se que durante toda a sua existência vem funcionando com o apoio do Poder Público, inclusive o serviço de radioterapia do referido nosocômio ocupa parcela substancial dos serviços prestados no âmbito do Estado de Sergipe. Em virtude dessas peculiaridades, esse Juízo determinou medidas de apoio ao referido ente. Apesar de todo o quadro peculiar já declinado, verifica-se que existem situações pendentes de regularização pelo Cirurgia que dificultam a reabertura do serviço radioterápico, tais como a instalação elétrica, liberação pela Vigilância Sanitária municipal e a realização de uma vistoria pelos gestores municipal, estadual e federal.

De início, destaco que a atuação do Ministério Público não se restringe à defesa dos interesses individuais indisponíveis, mas também na defesa do interesse social, mormente quando a suposta lesão é capaz de atingir milhares de pessoas. É preciso prestigiar o acesso à justiça por meio das ações coletivas, como meio de desafogar o Poder Judiciário.

Por outro lado, questiona-se muito a judicialização de políticas públicas, mas o que fazer quando a Administração, estando obrigada a agir, deixa de agir? O litígio, por óbvio, acabaria por desaguar no Poder Judiciário, com este saindo da posição de que nada poderia fazer, à exemplo de Pôncio Pilatos. A judicialização decorre de uma ineficiência, para não dizer omissão do Estado como um todo. Destaco que não estou aqui afirmando que a culpa é deste ou daquele Governo, mas sim destes e de tantos outros que se sucederam sem que nenhuma providência efetiva fosse adotada em relação ao problema.

2.2.1. Processo n.º 0006464-60.2009.4.05.8500

Passando ao caso dos autos, os pedidos autorais direcionam-se a quatro vértices, quais sejam:

1) que a União Federal, o Estado de Sergipe e o Município providenciem a adequação da cobertura de oncologia aos mínimos preconizados pelo Ministério da Saúde, instalando mais centros e/ou unidades de assistência em alta complexidade de oncologia no Estado de Sergipe;

2) que o Estado de Sergipe disponibilize o tratamento fora do domicílio a todos os pacientes de oncologia que não possuem de forma eficaz obter o tratamento dos serviços de radioterapia nos Hospitais Cirurgia e João Alves Filho;

3) que o Estado de Sergipe e o Hospital João Alves coloquem em funcionamento o aparelho de braquiterapia situado nesta unidade hospitalar, no prazo de 30 (trinta) dias;

4) que a CNEN, tão logo seja instada a fazê-lo, analise o requerimento de licença e, se tudo estiver em conformidade com as normas respectivas, conceda licença de funcionamento do serviço de radioterapia do Hospital Cirurgia no prazo máximo de 30 (trinta) dias.

A questão em debate envolve os limites do direito à saúde, passando pelo exame da: 1) possibilidade e os limites de intervenção do Poder Judiciário em políticas

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públicas, tais como mínimo existencial 11, princípio da proporcionalidade, reserva do possível e separação de poderes. ; 2) política pública voltada para o tratamento dos pacientes com câncer; 3) dos aspectos da doença do câncer.

Por ocasião da análise do pedido de antecipação dos efeitos da tutela, manifestei-me exaustivamente sobre a matéria, razão pela qual passo a reproduzir alguns dos argumentos ali expostos, que passam a fundamentar também a presente sentença.

2.2.1.1 Princípio de Reserva do Possível. Discricionariedade Administrativa. Controle Judicial de Políticas Públicas.

O Estado de Sergipe e o Município de Aracaju aduziram, durante todo o processo, que não podem ser compelidos a atuar e que os pedidos feitos pelos Ministérios Públicos estão submetidos a reserva do possível, não sendo possível ao Judiciário interferir nas questões em que o administrador atua com discricionariedade.

As políticas públicas constituem o principal meio de efetivação dos direitos fundamentais. Sem embargo da controvérsia 12 quanto ao seu conceito, entende-se por política pública “um programa de ação governamental que consiste numa atividade – ou seja, uma série ordenada de atos e normas conjugados para a realização de um objetivo – que implica numa meta a ser alcançada” 13. Segundo Nagibe de Melo Jorge Neto 14, esta noção pode ser decomposta em três elementos, sendo dois necessários e um acidental, a saber: (a) uma ação, um fazer estatal orientado, mediata ou imediatamente, para a consecução de (b) um fim, um objetivo, uma meta, ou seja, a efetivação dos direitos de segunda e terceira dimensões, que, todavia, pode estar implícita. Essa atuação estatal poderá estar condicionada ou não a (c) programa ou planejamento previamente estabelecido.

A política pública é instrumento racional de planejamento, em que se observa quanto gastar e como gastar. O objetivo de uma política é maximizar os benefícios com o mínimo de dispêndio financeiro, pois não se pode perder a perspectiva de que os direitos fundamentais possuem um custo e que as receitas do Estado não são suficientes para atender a todas as necessidades.

O texto constitucional, modelo de constituição dirigente, é pródigo em políticas publicas, tais como Segurança Pública (art. 144 da CF/88), Política Urbana (arts. 182-183 da CF/88), Saúde (arts. 196-200 da CF/88), Assistência Social (arts. 203-204 da CF/88), Educação (arts. 205-214 da CF/88), Cultura (arts. 215-216 da CF/88), Desporto

11 Mínimo existencial é conjunto de prestações mínimas indispensáveis para a existência do indivíduo com dignidade. Esta a garantia (e direito fundamental) do mínimo existencial independe de expressa previsão constitucional para poder ser reconhecida. A impossibilidade de se estabelecer, de forma apriorística e acima de tudo de modo taxativo, um elenco dos elementos nucleares do mínimo existencial, no sentido de um rol fechado de posições subjetivas negativas e positivas correspondentes ao mínimo existencial. 12 Uma resumo das principais correntes podem ser vistas no artigo intitulado “A legitimidade do Poder Judiciário para o controle de políticas públicas”, de Felipe de Melo Fonte, Revista Brasileira de Direito Público – RBPD, v. 6, n. 20, Jan./Mar. 2008 13 Garcia, Rafael Barreto. O Poder Judiciário e as políticas públicas no Brasil: análise doutrinária e evolução casuística. Revista Interesse Público, São Paulo, ano X, n. 51, p. 74-109. 14 O controle jurisdicional das políticas públicas – concretizando a democracia e dos direitos sociais fundamentais. Salvador: Editora JusPODIVM, 2008. págs 56/57.

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(art. 217 da CF/88), Ciência e Tecnologia (arts. 218-219 da CF/88), Meio ambiente (art. 225 da CF/88), entre outros.

Em princípio, não se inclui, nas funções institucionais do Poder Judiciário, a atribuição de formular e de implementar políticas públicas, residindo tal encargo, primariamente, nos Poderes eleitos pelo povo, isto é, o Executivo e Legislativo. A razão disso é muito simples: 1) em muitos desses programas, o Constituinte limitou-se a estabelecer diretrizes, linhas gerais, deixando a cargo do Poder Legislativo defini-las e o Poder Executivo de executá-las; 2) a criação e/ou expansão de uma política pública envolve a definição do que gastar, como gastar, quanto gastar e quando gastar. Como as políticas públicas envolvem o dispêndio de recursos públicos e é necessário fazer escolhas em razão dos recursos serem finitos, é natural que tal escolha recai sobre os órgãos de representação política; 3) o Princípio da Separação de Poderes reconhece um margem de liberdade aos demais Poderes na interpretação e aplicação da Constituição, devendo o Judiciário adotar um postura moderada de judicial self-restrainte 15.

Ora, por muito tempo, o Judiciário se absteve peremptoriamente de adentrar nesta seara com esteio no princípio da Separação de Poderes, contudo, modernamente, ampliou progressivamente o seu controle ao constatar que:

“(...) o gozo minimamente adequado dos direitos fundamentais seria indispensável para o regular funcionamento da democracia e, portanto, para a existência do próprio controle social das políticas públicas. Caso contrário, sustenta-se que, não existindo respeito a um conjunto básico de direitos fundamentais, dificilmente teriam os governados condições de exercer sua liberdade de participar, de forma consciente, no processo político democrático, bem como de participar no diálogo do espaço público. O que se teme, por outro lado, é que, na falta de participação, perde-se por parte do povo, autonomia crítica em face dos seus representantes políticos, mormente quando se percebe que a corrupção, a ineficiência e o clientelismo sabotam a capacidade das políticas públicas atingirem sua finalidade, que, em ultima ratio, seria a promoção dos direitos fundamentais” 16

Por sua vez, o princípio da Separação de Poderes não pode ser utilizado desconectado de sua finalidade 17. Isto porque os direitos fundamentais e o princípio da

15 “A maior parte dos Estados democráticos do mundo se organizam em um modelo de separação de Poderes. As funções Estatais de legislar (criar o direito positivo), administrar (concretizar o Direito e prestar serviços públicos) e julgar (aplicar o Direito nas hipóteses de conflito) são atribuídas a órgãos distintos. Nada obstante, Legislativo, Executivo e Judiciário exercem um controle recíproco sobre as atividades de cada um, de modo a impedir o surgimento de instância hegemônicas, capazes de oferecer riscos para a democracia e para os direitos fundamentais. Note-se que os três Poderes interpretam a Constituição, e sua atuação deve respeitar os valores e promover os fins nela previstos. No arranjo institucional em vigor, em caso de divergência na interpretação das normas constitucionais ou legais, a palavra final é do Judiciário. Essa primazia não significa, porém, que toda e qualquer matéria deva ser decidida em um tribunal. Nem muito menos legitima a arrogância judicial” (BARROSO, Luís Roberto. Ano do STF: Judicialização, ativismo e legitimidade democrática. Consultor Jurídico, 22 dez 2008. Disponível em: <http://www.conjur.com.br/2008-dez-22/judicializacao_ativismo_legitimidade_democratica>. Acesso em: 01 jul. 2009. 16 GARCIA, Rafael Barreto. O Poder Judiciário e as políticas públicas no Brasil: análise doutrinária e evolução casuística. Revista Interesse Público, Ano X, n. 51, p. 74-110, 2008. 17 “(....) é uma experiência eterna a de que todo homem que tem poder tende a abusar dele; ele vai até onde encontra limites. Quem o diria! A própria virtude tem necessidade de limites. Para que não se possa abusar do poder é preciso que, pela disposições das coisas, o poder detenha o poder” E logo adiante: “Quando na mesma ou no mesmo corpo de magistratura o poder legislativo está reunido ao poder executivo, não há liberdade, porque se pode temer que o mesmo monarca ou o mesmo senado façam leis tirânicas para executá-las

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Separação de Poderes são instrumentos utilizados para a limitação do Poder Político perante a sociedade. Encontra-se superada a idéia de que o princípio da Separação de Poderes constituiria um impedimento absoluto e a priori para o exame da política, mas sim em que medida se dará esse controle.

O Judiciário pode intervir quando houver descumprimento dos encargos políticos-jurídicos a ponto de comprometer a eficácia e a integridade dos direitos individuais e/ou coletivos, ainda que derivados de cláusulas programáticas. Adaptando-se a lição de Rafael Barreto Garcia, “o que se verifica é que cada vez mais os atos da Administração Pública – ainda que no exercício de competências discricionárias – devem expressar não mais a decisão isolada e pessoal do agente, mas, acima de tudo, escolhas politicamente informadas que por tal meio evidenciem os interesses públicos a serem concretizados” 18.

Por outro lado, tão importante quanto respeitar a margem de liberdade dos demais Poderes, é a construção de parâmetros judiciais para que se torne o controle o mais racional possível, seja para os demais Poderes, seja para a sociedade, pois, segundo Marcos Maselli Gouvêa, “o princípio da separação de poderes veda que o julgador substitua o parecer da Administração por seu mero subjetivismo, impondo que fundamente suas conclusões no direito legislado e em outras categorias aceitas intersubjetivamente pela comunidade jurídica” 19. No mesmo sentido, é a observação de Felipe Melo Fonte, verbis:

“(...) Nada obstante o exposto, é preciso que as incursões judiciais nesta seara não sejam pautadas pelo exclusivo voluntarismo dos juízes. Não se duvida da boa intenção os que militam neste campo, mas os excessos, como no visto nos exemplos ação, podem conduzir ao arbítrio e à injustiça, causando prejuízos inestimáveis ao sistema como um todo. Uma decisão judicial sem qualquer lastros no sistema, nos dizeres de Daniel Sarmento, trata-se de ‘um decisionismo travestido sob as vezes do politicamente correto, orgulhoso com os seus jargões grandiloqüentes e com a sua retórica inflamada, mas sempre um decisionismo’. Em última instância, a irracionalidade da atuação judicial acaba servindo de argumento contra a própria causa. Eis a importância de se analisar os critérios que têm pautado as decisões judicis sobre o assunto, e formular parâmetros de atuação razoáveis, que sejam aceitáveis para os demais poderes, e que convençam aos jurisdicionados”20.

Esta dimensão assume uma maior importância em se tratando de direito à saúde, uma vez que, em virtude de sua hierarquia axiológica (garantia do direito à vida), a Constituição traçou linhas específicas sobre a matéria, limitando a liberdade de conformação do legislador e discricionariedade do administrador, ao prever a forma

tiranicamente. Não há liberdade se o poder de julgar não está separado do poder legislativo e do executivo. Se ele estivesse confundido com o poder legislativo, o poder sobre a vida e a liberdade dos cidadãos seria arbitrário, pois o juiz seria legislador. Se ele estiver confundido com o poder executivo, o juiz poderá ter a força de um opressor. Tudo estaria perdido se o mesmo homem ou o mesmo corpo de principais, nobre ou povo, exercessem estes três poderes: o de fazer as leis, o de executar as resoluções públicas e o de julgar as questões dos particulares” (apud Montesquieu apud MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo. 15. ed. São Paulo: Malheiros, 2003, p.29/30. 18 Garcia, Rafael Barreto. O Poder Judiciário e as políticas públicas no Brasil: análise doutrinária e evolução casuística. Revista Interesse Público, São Paulo, ano X, n. 51, p. 74-109. 19 GOUVÊA, Marcos Maselli, "O direito ao fornecimento estatal de medicamentos", em < http://www.mp.ro.gov.br/c/document_library/get_file?p_l_id=42534&folderId=42469&name=DLFE-32335.pdf.> Acesso em: 01 jul. 2009.. 20 FONTE, Felipe de Melo. A legitimidade do Poder Judiciário para o controle de políticas públicas. Revista Brasileira de Direito Público – RBPD, v. 6, n. 20, p. 91/126, Jan./Mar. 2008

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como será prestado – Sistema Único de Saúde – SUS – e as características do objeto protegido – integralidade e assistência.

Seguindo esta tendência, Ana Paula de Barcellos21 propõe cinco aspectos básicos que poderiam ser objeto de controle: (1) a fixação de metas e prioridades, por parte do Poder Público, em matéria de direitos fundamentais; (2) o resultado final esperado das políticas públicas; (3) a quantidade de recursos a ser investida em políticas públicas vinculadas à realização de direitos fundamentais, em termos absolutos ou relativos; (4) a constatação do alcance (ou não) das metas fixadas pelo Poder Público; e (5) a eficiência mínima na aplicação dos recursos públicos destinados a determinada finalidade.

Ressalte-se, ainda, que, excepcionalmente, é possível o Judiciário determinar o cumprimento de uma política pública definida expressamente pela Constituição ou que deflua dos seus princípios. É claro que, em qualquer hipótese, o Judiciário carrega um ônus maior de demonstrar a imprescindibilidade para a sociedade, calcada na proteção dos direitos fundamentais e do respeito ao mínimo existencial.

“Chega-se, por fim, à argumentação [19], à razão prática, ao controle da racionalidade das decisões proferidas, mediante ponderação, nos casos difíceis, que são aqueles que comportam mais de uma solução possível e razoável. As decisões que envolvem a atividade criativa do juiz potencializam o dever de fundamentação, por não estarem inteiramente legitimadas pela lógica da separação de Poderes – por esta última, o juiz limita-se a aplicar, no caso concreto, a decisão abstrata tomada pelo legislador. Para assegurar a legitimidade e a racionalidade de sua interpretação nessas situações, o intérprete deverá, em meio a outras considerações: (i) reconduzi-la sempre ao sistema jurídico, a uma norma constitucional ou legal que lhe sirva de fundamento – a legitimidade de uma decisão judicial decorre de sua vinculação a uma deliberação majoritária, seja do constituinte ou do legislador; (ii) utilizar-se de um fundamento jurídico que possa ser generalizado aos casos equiparáveis, que tenha pretensão de universalidade: decisões judiciais não devem ser casuísticas; (iii) levar em conta as conseqüências práticas que sua decisão produzirá no mundo dos fatos [20]”. 22

Conforme será abordado adiante, restou comprovado que o Estado (União, Estado de Sergipe e Município de Aracaju) nem sequer vem cumprindo as metas estabelecidas pelas Portarias nºs 2439/GM, 08 de dezembro de 2005 e 741/SAS, de 19 de dezembro de 2005, que estabelece um mínimo no que tange ao atendimento oncológico no Estado. . Assim, o objeto desta demanda não é a criação de uma política pública, mas apenas de fazer-se cumprir o que já está estabelecido nos normativos referentes ao serviço de oncologia prestado no Estado, conforme adiante será mostrado. Nessa senda, é plenamente justificável a atuação do Judiciário para determinar que o Estado supra a omissão em cumprir uma política pública já prevista.

21 Constitucionalização das políticas públicas em matéria de direitos fundamentais: o controle político-social e o controle jurídico no espaço democrático. Revista de Direito do Estado, Ano 1, n. 3, p. 17/54, jul/set 2006. 22 BARROSO, Luís Roberto. Neoconstitucionalismo e constitucionalização do Direito. O triunfo tardio do Direito Constitucional no Brasil. Jus Navigandi, Teresina, ano 9, n. 851, 1 nov. 2005. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=7547>. Acesso em: 01 jul. 2009.

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2.2.1.2. Direito à saúde

A conformação constitucional da saúde está em consonância com a concepção estabelecida pela Organização Mundial de Saúde, assim compreendida como o “completo bem-estar físico, mental e social”, superando-se a noção de saúde como a mera ausência de doença.

No âmbito do texto constitucional, encontram-se inúmeras referências a este direito fundamental de caráter social, em dispositivos esparsos – art. 6º, 7º, IV e XXI, 23, II, 24, XIII, 30, VII, 34, VII, 35, III, 167, IV, 208, VII, 220, §3º, II, 227 caput e §1º – e em um capítulo próprio (arts. 196 a 200 da CF/88). Destaco deste 1º conjunto que: 1) a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios possuem competência comum para cuidar da saúde; 2) a União, os Estados e o Distrito Federal possuem competência concorrente para legislar sobre a defesa da saúde, sendo que o Município possui competência para suplementar a legislação federal e estadual no que não contrariá-las; 3) compete aos Municípios prestar, com a cooperação técnica e financeira da União e do Estado, serviços de atendimento à saúde.

Em seu capítulo próprio, consta o seguinte: “Art. 196. A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação. Art. 198. As ações e serviços públicos de saúde integram uma rede regionalizada e hierarquizada e constituem um sistema único, organizado de acordo com as seguintes diretrizes: I - descentralização, com direção única em cada esfera de governo; II - atendimento integral, com prioridade para as atividades preventivas, sem prejuízo dos serviços assistenciais; III - participação da comunidade.”

Do conjunto constitucional, pode-se extrair um arquétipo mínimo:

1) o dever de saúde não é responsabilidade exclusiva de um ente, a exemplo da segurança pública. Ao contrário, o dever de prestação à saúde foi atribuído aos três entes em caráter global. A solidariedade existe externamente em relação ao cidadão no tocante à prestação do serviço de saúde, de modo que nenhum dos 3 entes pode simplesmente se demitir do seu encargo, quanto mais o Município. Todavia, isto não impede alguma especialização com vista a uma melhor eficiência. Esta descentralização visa assegurar a autonomia e a possibilidade de cada ente perseguir as suas próprias políticas;

2) a existência de um Sistema único importa em que os serviços e as ações de saúde, públicos ou privados, devem pautar-se e se desenvolver sob as mesmas políticas, diretrizes e comando. Contudo, embora seja um sistema único composto por uma rede regionalizada e hierarquizada, preserva a direção única em cada esfera de governo (descentralização), com vistas a assegurar uma adaptação das ações e dos serviços de saúde de acordo com o perfil ideológico local;

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3) o princípio da universalidade assegura que o direito a saúde é reconhecido a todos pelo fato de serem pessoas;

4) o princípio da integralidade de atendimento determina que a cobertura oferecida pelo SUS deve ser a mais ampla possível;

5) a Constituição assegura a função curativa, sem prejuízo das medidas preventivas (“visem à redução do risco de doença e de outros agravos”). Sarlet, ao tecer considerações sobre o direito fundamental à proteção e promoção da saúde em cotejo com os 20 anos da Constituição Federal de 1988 afirmou:

“(...) De qualquer modo, já é possível extrair da Constituição que necessariamente o direito à proteção e promoção da saúde abrange tanto a dimensão preventiva, quanto promocional e curativa da saúde, bastante uma rápida leitura do que dispõe o artigo 196. Nesse sentido, ao referir-se à “recuperação”, a Constituição de 1988 conecta-se com a chamada “saúde curativa”, quer dizer, a garantia de acesso dos indivíduos aos meios que lhes possam trazer, senão a cura da doença, pelo menos uma sensível melhora na qualidade de vida, o que, de modo geral, ocorre nas hipóteses de tratamento contínuo. Além disso, as expressões “redução do risco de doença” e “proteção” parecem guardar relação com a idéia de “saúde preventiva”, isto é, a efetivação de medidas que tenham por escopo evitar o surgimento da própria doença, inclusive pelo contágio. O termo “promoção”, enfim, atrela-se à busca da qualidade de vida, por meio de ações que objetivem melhorar as condições de vida e saúde das pessoas. (12) Por todo o exposto, verifica-se que a nossa Carta Magna guarda sintonia explícita com a garantia do “mais alto nível possível de saúde”, tal como prescreve o artigo 12 do Pacto Internacional de Direitos Econômicos, Sociais e Culturais (PIDESC) de 1966, regularmente ratificado e incorporado pelo Brasil. (13)” 23

Por sua vez, do ponto de vista infraconstitucional a saúde encontra-se regulada na Lei 8.080/99 – que dispõe sobre as condições para a promoção, proteção e recuperação da saúde, a organização e o funcionamento dos serviços correspondentes e dá outras providências – e na Lei 8.142/91 – que dispõe sobre a participação da comunidade na gestão do Sistema Único de Saúde (SUS) e sobre as transferências intergovernamentais de recursos financeiros na área da saúde e dá outras providências – e por diversos atos normativos infralegais, formando um complexo bloco normativo.

Analisando a Lei 8.080/90, verifica-se que, além de repetir os ditames constitucionais e especializar os entes conforme uma área de atuação, dispõe expressamente de um direito à assistência farmacêutica. Destaco os seguintes dispositivos pertinentes a lide:

Art. 6º Estão incluídas ainda no campo de atuação do Sistema Único de Saúde (SUS): I - a execução de ações: d) de assistência terapêutica integral, inclusive farmacêutica; Art. 7º As ações e serviços públicos de saúde e os serviços privados contratados ou conveniados que integram o Sistema Único de Saúde (SUS), são desenvolvidos de

23 SARLET, Ingo Wolfgan Sarlet. Algumas considerações sobre o direito fundamental à proteção e promoção da saúde aos 20 anos da Constituição Federal de 1988. Revista de Direito do Consumidor – RDC, Ano 17, n.67,125-171, jul/set 2008.

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acordo com as diretrizes previstas no art. 198 da Constituição Federal, obedecendo ainda aos seguintes princípios: IX - descentralização político-administrativa, com direção única em cada esfera de governo: a) ênfase na descentralização dos serviços para os municípios; b) regionalização e hierarquização da rede de serviços de saúde; X - integração em nível executivo das ações de saúde, meio ambiente e saneamento básico; XI - conjugação dos recursos financeiros, tecnológicos, materiais e humanos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios na prestação de serviços de assistência à saúde da população; XII - capacidade de resolução dos serviços em todos os níveis de assistência; e XIII - organização dos serviços públicos de modo a evitar duplicidade de meios para fins idênticos.

2.2.1.3. Política Pública para os doentes com câncer e aspectos da doença

A Portaria nº 2439/GM, 08 de dezembro de 2005 institui a Política Nacional de Atenção Oncológica: Promoção, Prevenção, Diagnóstico, Tratamento, Reabilitação e Cuidados Paliativos, a ser implantada em todas as unidades federadas, respeitadas as competências das três esferas de gestão do SUS. Visando garantir aos doentes com câncer a assistência médica de alta complexidade, através de Unidades de Assistência de Alta Complexidade em Oncologia e Centros de Assistência de Alta Complexidade em Oncologia (CACON).

Portarias nºs 2439/GM, 08 de dezembro de 2005

Art. 3° Definir que a Política Nacional de Atenção Oncológica seja constituída a partir dos seguintes componentes fundamentais: V - alta complexidade: garantir o acesso dos doentes com diagnóstico clínico ou com diagnóstico definitivo de câncer a esse nível de atenção, determinar a extensão da neoplasia (estadiamento), tratar, cuidar e assegurar qualidade de acordo com rotinas e condutas estabelecidas, assistência essa que se dará por meio de Unidades de Assistência de Alta Complexidade em Oncologia e Centros de Assistência de Alta Complexidade em Oncologia (CACON);

Esta Portaria foi complementada pela de n.º 741/SAS, de 19 de dezembro de 2005, que classifica as unidades em UNACON e CACON, segundo dispositivos abaixo:

“Art. 1º - Definir as Unidades de Assistência de Alta Complexidade em Oncologia, os Centros de Assistência de Alta Complexidade em Oncologia (CACON) e os Centros de Referência de Alta Complexidade em Oncologia e suas aptidões e qualidades: §1º - Entende-se por Unidade de Assistência de Alta Complexidade em Oncologia o hospital que possua condições técnicas, instalações físicas, equipamentos e recursos humanos adequados à prestação de assistência especializada de alta complexidade para o diagnóstico definitivo e tratamento dos cânceres mais prevalentes no Brasil. Estas unidades hospitalares, compostas pelos serviços discriminados no Art. 2º, cujas Normas de Classificação e Credenciamento encontram-se no Anexo I desta Portaria, também devem, sob regulação do respectivo Gestor do SUS, guardar articulação e integração com a rede de saúde local e regional e disponibilizar, de forma complementar e por decisão do respectivo Gestor, consultas e exames de média complexidade para o diagnóstico diferencial do câncer.

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§2º - Entende-se por Centro de Assistência de Alta Complexidade em Oncologia (CACON) o hospital que possua as condições técnicas, instalações físicas, equipamentos e recursos humanos adequados à prestação de assistência especializada de alta complexidade para o diagnóstico definitivo e tratamento de todos os tipos de câncer. Estes centros hospitalares, compostos pelos serviços discriminados no Art. 3º, cujas Normas de Classificação e Credenciamento encontram-se no Anexo I desta Portaria, também devem, sob regulação do respectivo Gestor do SUS, guardar articulação e integração com a rede de saúde local e regional e disponibilizar, de forma complementar e por decisão do respectivo Gestor, consultas e exames de média complexidade para o diagnóstico diferencial do câncer. §3º - Entende-se por Centro de Referência de Alta Complexidade em Oncologia um CACON que exerça o papel auxiliar, de caráter técnico, ao Gestor do SUS nas políticas de Atenção Oncológica e que possua os seguintes atributos:

Os arts. 2º e 3º da Portaria n.º 741/SAS, de 19 de dezembro de 2005, prevêem os serviços que os hospitais devem oferecer conjuntamente, sendo proibido o seu oferecimento isolado (art. 4º), salvo hipóteses taxativas e temporárias.

Art. 2º - As Unidades de Assistência de Alta Complexidade em Oncologia podem prestar atendimento nos serviços abaixo descritos: I. Serviço de Cirurgia Oncológica; II. Serviço de Oncologia Clínica; III. Serviço de Radioterapia; IV. Serviço de Hematologia; V. Serviço de Oncologia Pediátrica. Art. 3º - Os Centros de Assistência de Alta Complexidade em Oncologia (CACON) devem prestar atendimento em todos os serviços abaixo descritos: I. Serviço de Cirurgia Oncológica; II. Serviço de Oncologia Clínica; III. Serviço de Radioterapia; e IV. Serviço de Hematologia. Art. 4º - Nenhum Serviço constante dos artigos 2º e 3º, acima, será credenciado isoladamente. §1º - Os serviços credenciados à data da publicação desta Portaria, como isolados de radioterapia e/ou de quimioterapia, poderão manter o credenciamento, pelo prazo de doze meses, desde que: a) seja julgado necessário pelo respectivo Gestor do SUS e possuam autorização específica da Secretaria de Atenção à Saúde; b) atuem de forma complementar, atendendo, exclusivamente, pacientes encaminhados sob autorização e regulação do respectivo Gestor do SUS; c) a produção das Unidades de Assistência de Alta Complexidade em Oncologia e dos CACON não seja suficiente nesta área, conforme os parâmetros publicados no Anexo III; d) cumpram os requisitos das respectivas normas de credenciamento constantes do Anexo II desta Portaria; e e) estejam vinculados, de acordo com a rede planejada pelo Gestor, a uma Unidade de Assistência de Alta Complexidade em Oncologia ou CACON, para cooperação técnica e planejamento terapêutico global conjunto dos casos. f) após o prazo estabelecido, poderá ser renovada a autorização desde que os pré-requisitos se mantenham. §2º - Para os serviços isolados já credenciados ao SUS, localizados em hospitais que, no mínimo possam ser credenciados como Unidade de Assistência de Alta Complexidade em Oncologia, deverão ser adotadas medidas de adequação a esta

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Portaria, neste sem deverão ser adotadas medidas de adequação a esta Portaria, neste sentido, no prazo máximo de doze meses.

Em texto extraído no site do INCA 24 sobre o tratamento em hospitais, cito artigo “Tratamento do câncer no SUS”:

O tratamento é um dos componentes do programa nacional de controle do câncer. As metas são, principalmente, cura, prolongamento da vida útil e melhora da qualidade de vida. As principais modalidades de tratamento são a cirurgia e a radioterapia/ quimioterapia (incluindo manipulação hormonal), com apoio de outras áreas técnico-assistenciais, como enfermagem, farmácia, serviço social, nutrição, fisioterapia, reabilitação, odontologia, psicologia clínica, psiquiatria e a estomaterapia (cuidados de ostomizados). Embora cada área tenha papel bem-estabelecido, a abordagem multidisciplinar integrada é mais efetiva do que uma sucessão de intervenções isoladas no manejo do paciente. (...) As Unidades de Assistência de Alta Complexidade em Oncologia (Unacon) são hospitais terciários estruturados para tratar, no mínimo, os cânceres mais prevalentes no país (mama, próstata, colo do útero, estômago, cólon e reto), menos pulmão. O câncer de pele não-melanoma pode ser tratado em serviços não-especializados. Os Centros de Alta Complexidade em Oncologia (Cacon) são hospitais terciários estruturados para tratar todos os tipos de cânceres, em todas as modalidades assistenciais.

Cirurgia, quimioterapia e radioterapia são técnicas distintas para o tratamento da doença. A ausência de um deles impede o tratamento adequado da doença, bem assim frustra o conceito de UNACON ou CACON que pressupõe a integração entre os serviços. Novamente, transcrevem-se a importância das técnicas:

Cirurgia e radioterapia são apropriadas para tratamento da doença localizada e regional, e pode curar nos estádios precoces do câncer, especialmente quando há uma política de detecção precoce. Em geral, radioterapia e cirurgia têm papel limitado no câncer em estádios avançados. A quimioterapia pode curar alguns tipos de câncer e ter atuação efetiva em doenças disseminadas, como na doença de Hodgkin, linfomas não-Hodgkin de alto grau e leucemias, além de ser válida na paliação de várias outras doenças. Exceto para cirurgias de doenças muito limitadas ou lesões pré-cancerosas (como a lesão de alto grau do colo do útero), serviços oncológicos dependem do apoio de uma estrutura hospitalar terciária, especialmente preparada para confirmar o diagnóstico e fazer o estadiamento, promover o tratamento, a reabilitação e os cuidados paliativos, que podem ser organizados na rede de serviços de saúde de forma integrada com os níveis primários e secundários de atenção.

Extraio da contestação da Fundação Hospitalar de Saúde (f. 793/796) responsável pelo HOSPITAL DE URGÊNCIA DE SERGIPE – HUSE, os seguintes excertos:

“Existem três formas de tratamento do câncer: cirurgia, radioterapia e quimioterapia. Elas são usadas em conjunto no tratamento das neoplasias malignas, variando apenas quanto à importância de cada uma e a ordem de sua indicação. Atualmente, poucas são as neoplasias malignas tratadas apenas com uma modalidade terapêutica.

24 O Instituto Nacional de Câncer (INCA) é o órgão do Ministério da Saúde responsável por desenvolver e coordenar ações integradas para a prevenção e o controle do câncer no Brasil.

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No organismo, verificam-se formas de crescimento celular controladas e não controladas. A hiperplasia, metaplasia e a displasia são exemplos de crescimento controlado, enquanto que as neoplasias correspondem às formas de crescimento não controladas e são denominadas, na prática, de ‘tumores’

A quimioterapia é a forma de tratamento sistêmico do câncer que usa medicamentos denominados de ‘quimioterápicos’ administrados em intervalos regulares, que variam de acordo com os esquemas terapêuticos.

(...)

A outra modalidade de tratamento é a radioterapia, método de tratamento local ou locorregional, do câncer, que utiliza equipamentos e técnicas variadas para irradiar áreas do organismo humano, prévia e cuidadosamente demarcadas.

A radioterapia externa (cuja fonte de irradiação está localizada longe do organismo – contatoterapia, roengenterapia superficial, roengenterapia profunda, cobaltoterapia a radioterapia por acelerador linear) consiste na aplicação diária de uma dose de radiação, expressa em centigray (cGy) ou em gray (Gy), durante um intervalo de tempo pré-determinado.

Tendo em vista o apscto multidisciplinar e multiprofissional do tratamento do câncer, a autorização da radioterapia também deverá estar sempre dentro de um planejamento terapêutico global, com início e fim previstos. As principais finalidades da radioterapia são: i) radioterapia paliativa; radioterapia pré-operatória; iii) radioterapia pós-operatória; iv) radioterapia curativa.

O objetivo da radioterapia paliativa é o tratamento local do tumor primário ou de metástase(s), sem influenciar a taxa da sobrevida global do paciente.

A radioterapia pré-operatória é aquela que antecedente a principal modalidade de tratamento, a cirurgia, para reduzir o tumor e facilitar o procedimento operatório,

Importante modalidade de radioterapia, a radioterapia pós-operatória tem como finalidade esterilizar possíveis focos microscópicos do tumor.

A radioterapia curativa consiste na principal modalidade de tratamento e visa à cura do paciente além de não se associar a outra(s) modalidade(s) terapêutica(s).

Em geral, a radioterapia é aplicada durante 05 dias, fazendo pausa de 02 para recuperação dos tecidos normais. Na prática, o tratamento é feito nos dias uteis da semana e a suspensão do mesmo, por causa dos efeitos colaterais, constitui exceção e não a regra”.

No mesmo sentido são os ensinamentos hauridos do texto do Dr. William E. N. Soares, constante nas f. 1324/1327.

Considerando que os serviços exigidos são altamente especializados, é necessária uma autorização para que os hospitais funcionem como CACON´s ou UNACON´s, seja de hospitais públicos ou privados.

Art. 10 - Na situação de ausência de prestação de serviço de alta complexidade oncológica em sua área de gestão, o respectivo Gestor do SUS deverá garantir, através dos mecanismos de regulação, o acesso da população ao atendimento integral. Art. 11 - As Secretarias de Estado da Saúde encaminharão a relação dos Centros de Referência, aprovados na Comissão Intergestores Bipartite - CIB, para a Coordenação Geral de Alta Complexidade da Secretaria de Atenção à Saúde / MS, ficando a autorização a cargo desta.

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Parágrafo Único - Preferencialmente, deverão ser autorizados como Centros de Referência os hospitais públicos, filantrópicos, sem fins lucrativos e com fins lucrativos, nesta ordem.

ANEXO I –NORMAS DE CLASSIFICAÇÃO E CREDENCIAMENTO DE UNIDADES E CENTROS DE ASSISTÊNCIA E AUTORIZAÇÃO DOS

CENTROS DE REFERÊNCIA DE ALTA COMPLEXIDADE EM ONCOLOGIA

Entende-se por credenciamento de Unidade de Assistência de Alta Complexidade em Oncologia ou de Centro de Assistência de Alta Complexidade em Oncologia (CACON) o ato do respectivo Gestor Pleno Municipal ou Estadual do SUS de contratar para que preste serviços de média e alta complexidade ao SUS o hospital cadastrado no Cadastro Nacional de Estabelecimentos de Saúde (CNES), que, respectivamente, tenha o perfil definido nos §1º e §2º do Artigo 1º e, também respectivamente, cumpra as exigências constantes nos Artigos 2º e 3º, desta Portaria. Entende-se por habilitação de Unidade de Assistência de Alta Complexidade em Oncologia ou de Centro de Assistência de Alta Complexidade em Oncologia (CACON) o ato do Gestor Federal que ratifica o credenciamento do Gestor Pleno Municipal ou Estadual do SUS, devidamente encaminhado ao Ministério da Saúde pelo respectivo Gestor Estadual do SUS. Entende-se por autorização para atuar como Centro de Referência de Alta Complexidade em Oncologia o licenciamento pelo Ministério da Saúde do CACON que cumpra as exigências constantes no §3º do Art.1º e no Art. 3º, desta Portaria, indicado pelo respectivo Gestor Estadual do SUS. Entende-se por autorização para a prestação de procedimentos de cirurgia oncológica o licenciamento pelo Ministério da Saúde do estabelecimento de saúde que cumpra as respectivas exigências constantes desta Portaria, indicado pelo respectivo Gestor do SUS.

As Portarias nº. 3.535/GM e 741/2009 acima citadas estabelecem o número mínimo de Unidades de Assistência de Alta Complexidade (UNACON) e Centros de Assistência de Alta Complexidade que deve ser calculado na proporção de 01 para cada 1.000 novos casos anuais de câncer (Anexo III da Portaria 741/2009 cuja cópia encontra-se em anexo).

PARÂMETROS PARA O PLANEJAMENTO E AVALIAÇÃO DA REDE DE ALTA COMPLEXIDADE EM ONCOLOGIA 1. Introdução O número de casos novos anuais por UF, calculado a partir das taxas brutas de incidência de câncer específicas por 100.000 homens ou por 100.000 mulheres, encontra-se disponibilizado em www.inca.gov.br . O número de Unidades de Assistência de Alta Complexidade em Oncologia e Centros de Assistência de Alta Complexidade em Oncologia (CACON) deve ser calculado por no mínimo cada 1.000 casos novos anuais, excetuando-se o câncer de pele (não melanoma), para efeito de cálculo de estruturas e serviços hospitalares de alta complexidade (Oncologia Clínica, Radioterapia com equipamentos de megavoltagem, Hematologia e Oncologia Pediátrica), podendo-se considerar a adequação do acesso e a cobertura regional. Nos Estados em que esse número anual for inferior a 1.000, deverá ser avaliada a possibilidade de instalação de um serviço hospitalar de alta complexidade, levando-se em conta características técnicas, de acesso e de possibilidade de acesso regional. Unidades ou CACON´s com produção correspondente a mais de 1.000 casos novos anuais devem ser computados como múltiplo em tantas vezes o seja do estimado por

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1.000, reduzindo-se correspondentemente o número de Unidades ou CACON´s necessários e os respectivos números dos serviços. 2. Parâmetros de Necessidade De forma geral, para 1.000 casos novos de câncer espera-se que: 500 a 600 casos necessitem de cirurgia oncológica 700 casos necessitem de quimioterapia 600 casos necessitem de radioterapia Nota: A produção das Unidades de Alta Complexidade em Oncologia e CACON deverá guardar proporcionalidade entre as modalidades terapêuticas acima descritas, respeitando a finalidade do seu credenciamento. A incidência média de câncer hematológico é em torno de 5% do total de cânceres estimados, exceto o câncer de pele (não melanoma). A incidência média de câncer pediátrico (0 a 18 anos) é de 2% a 3% do total de cânceres estimados, exceto o câncer de pele (não melanoma). Nota: Um Serviço de Oncologia Pediátrica deverá atender no mínimo 75 casos novos/ano (tumores sólidos e de origem hematopoética). Para o cálculo do quantitativo necessário de serviços de oncologia pediátrica a serem credenciados, deverá ser levado em conta a existência de Unidades de Alta Complexidade Oncológica e de CACON’s com serviço de Hematologia credenciados na região, uma vez que esse serviço tem também capacidade de prestar assistência às crianças e adolescentes com tumores hematológicos pediátricos, tumores estes que representam cerca de 40% de todas as neoplasias malignas que acometem as pessoas nessa faixa etária.

Posto isto e considerando a natureza do direito ora discutido, houve modificações no quadro fático da demanda após a decisão que deferiu a antecipação dos efeitos da tutela. Contudo, em que pese as partes tenham tomado algumas providências, o fato é que pouco foi feito no sentido de efetivamente solucionar o problema, de modo que a crise no sistema de atendimento radioterápico no Estado permanece. Sendo assim, é preciso reanalisar os pedidos autorais, sob o prisma da atual situação do atendimento em radioterapia em Sergipe.

2.2.1.4. Dos fatos relevantes

Antes de examinar a questão da necessidade ou não de adequação do serviço radioterapia, é necessário contextualizar os fatos relevantes antes do ajuizamento da demanda e alguns que surgiram no curso da lide 25.

Havia dois serviços de radioterapia que atendiam os usuários do SUS, a saber:

Fundação de Beneficência Hospital de Cirurgia UNACON com Serviço de Radioterapia

Sergipe SES CENAH/ Hospital Governado João Alves Filho

UNACON com Serviços de Radioterapia, de Hermatologia, e de Oncologia Pediátrica.

O serviço radioterapia do Hospital Cirurgia foi interditado pela Vigilância Sanitária Municipal, em inspeção conjunta com Agência Nacional de Vigilância Sanitária – ANVISA e Comissão Nacional de Energia Nuclear – CNEN, em abril de 2009.

25 Não vou citar todos os fatos em ordem cronológica porque estão descritos no relatório, mas pinçar aqueles mais relevantes que subsidiarão o convencimento deste juízo.

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“O hospital de Cirurgia (SE) foi interditado pela Vigilância Sanitária, a partir de inspeção conjunta realizada pela VISA/ARACAJU, Agência Nacional de Vigilância Sanitária e por esta CNEN em abril de 2009. A instalação em questão estava operando um Acelerador Linear de 6 MV de energia, pelo menos desde 2003, de forma clandestina não possuindo qualquer autorização por parte desta CNEN para fazê-lo. Trata-se de equipamento que produz grandes doses de radiação podendo causar exposições letais” (f. 357)

De fato, verificou-se que o Hospital Cirurgia teve autorização para construção e operação de um acelerador linear 4 MV (f. 76), com validade até 27.11.1999 (f. 75), contudo estava operação um acelerador de 6 MV sem licença. Havia fontes de radiação que não estavam mais em uso e que necessitavam serem removidas. Os documentos de f. 77/96 demonstram esta situação.

“que antes do aparelho de acelerador linear existia um aparelho denominado bomba de cobalto; que esse aparelho funcionou até 1999; que naquele momento, no Estado de Sergipe não havia nenhum equipamento de radioterapia em funcionamento; quando esvaiu-se a fonte radioativa da bomba de cobalto, o hospital cuidou de adquirir um aparelho de aceleração linear; como não dispunha de recursos, houve um acerto para que o radioterapeuta responsável Dr. Regis Meira adquirisse o aparelho com recursos próprios e doasse ao hospital; que supõe que tenha sido dessa forma porque não há registro de entrada desses recursos; que foi autorizada a operação de um aparelho de 4 MV mas foi adquirido um aparelho com energia de 6 MV” (Hospital Cirurgia – f. 568) “2) O Hospital de Cirurgia operou durante anos um acelerador linear de forma clandestina. Tal fato é grave e inédito. A interdição do Hospital pela vigilância municipal, a qual estava acompanhada desta CNEN e da ANVISA no ato de interdição, deu-se, portanto, com o objetivo de assegurar a saúde dos pacientes, trabalhadores e público e não o contrário. (...) 3) O hospital jamais tentou regularizar a situação do acelerador linear de 4MV. Emitiu sim licença de construção para as instalações que viriam a abrigá-lo. Quando o hospital solicitou licença para modificação de instalações, a fim de aprovar novas instalações para acelerador de maior energia (6MV), esse o fez já de posse e operando o referido acelerado. Observamos que tais atos, aquisição e operação, têm de ser autorizados por esta CNEN e não o foram. Repetimos que este fato é grave e demonstra a má-fé dos então responsáveis pelo serviço de radioterapia. A devolução do pedido de licença de modificação para as instalações que abrigariam o acelerado de 6MV ocorreu, portanto sob o total desconhecimento por parte da CNEN da situação real do hospital, o qual para nós permanecia suspenso e inoperante, apenas buscando uma solução para a transferência das fontes em desuso então sob sua guarda” (f. 739)

A par disso, o Hospital foi desabilitado pelo Ministério da Saúde para realizar serviço de radioterapia pelo SUS, pois de UNACON com Serviço de Radioterapia foi rebaixada para UNACON.

“O Hospital de Cirurgia possuía habilitação com Serviço de Radioterapia,

porém esta Coordenação foi comunicada pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA) e pela Comissão Nacional de Energia Nuclear (CNEN) que em inspeção nesse hospital, no início de 2009, foi verificado que o sérvio de radioterapia possuía instalações inapropriadas e funcionava em condições precárias, em termos de segurança radiológica (nuclear), não tendo autorização de funcionamento do CNEN.

Diante dessa situações, este Ministério da Saúde esperou uma comunicação oficial da Secretária de Estado da Saúde de Sergipe ou Secretária Municipal de Saúde

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de Aracaju, porém como não houve manifestação dessas secretarias e considerando que ao se verificar a produção do referido hospital, o mesmo não produziu procedimentos de radioterapia desde maio de 2009; aliado ao fato de que este foi interditado pela ANVISA, não restou outra alternativa a esta Coordenadoria-Geral senão promover, unilateralmente, a alteração da habilitação do Hospital de Cirurgia, de Unacon com Serviço de Radioterapia para Unacon.

Enfatiza-se que a atitude do Ministério da Saúde de alterar a habilitação do Hospital de Cirurgia foi no intuito de preservar o doente e os profissionais que atuam nesse serviço, pois este não tinha condição de estar funcionando e os seus malefícios eram maiores que os benefícios” (Nota Técnica n.º 261 – f. 1331/1132)

Como foi alterada a habilitação, não bastava o serviço de radioterapia voltasse a funcionar, era necessária nova habilitação, através da Secretária do Estado de Saúde de Sergipe, conforme trecho da nota técnica acima citada:

“Esta Coordenadoria fica impossibilitada de efetuar a alteração da habilitação

do Hospital de Cirurgia, como Unacon com Serviço de Radioterapia. Solicito que tão logo o hospital esteja em conformidade com a Portaria SAS/MS nº 741/05, incluindo a regularização de sua situação junto ao CNEN, que a Secretaria de Estado de Saúde de Sergipe encaminhe cópia da autorização de funcionamento do serviço de radioterapia da CNEN para aas providências cabíveis”. (f. 1332)

Não obstante o acerto da interdição, isto provocou um impacto no serviço de radioterapia do HUSE, uma vez que os pacientes provenientes do Hospital Cirurgia foram remanejados, com a criação de mais um turno de trabalho e o aparelho funcionando por 20 (vinte) horas por dia.

“Pela Promotora de Justiça foi dito que entrou em contato com o Secretário Estadual e Municipal tendo os mesmos informado que o acelerador linear do Hospital João Alves, a partir 14 h do presente dia, passará a funcionar por 20 Horas, podendo assim absorver os pacientes que faziam radioterapia no Hospital Cirurgia” (Audiência do MPE no dia 16.04.2009 – f. 61/62)

Ocorre que o serviço de radioterapia do HUSE, que possui somente um aparelho, não estava preparado para absorver a demanda, aumentando-se consideravelmente a lista de espera.

O representante do SES 26 diz que “o serviço de oncologia [do Hospital João Alves] encontra-se em seu limite, o aparelho está funcionando 20 (vinte) horas, com atendimento de 116 (cento e dezesseis) pacientes e outros 185 (cento e oitenta) em lista de espera 27. (Audiência do MPE no dia 16.04.2009 – f. 61/62)

Tal manifestação é corroborada pela manifestação do HUSE acerca da prestação do serviço de radioterapia naquele nosocômio:

“Primeiro, ratifica-se que o centro de oncologia do HUSE encontra-se no limite de sua capacidade, tendo em vista a absorção de toda demanda advinda do serviço de radioterapia do Hospital de Cirurgia, atendendo a aproximadamente 115 (cento e quinze) pacientes/dia, com o horário de funcionamento elastecido de 20 horas (05:30 hs/AM às 01:00/AM) (...)

26 Secretaria Estadual de Saúde 27 Na f. 97/103, consta a referida lista de espera.

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O uso constante de equipamentos eletrônico tipo acelerados lineares produz o desgaste natural de seus componentes, tornando o feixe de irradiação instável.” (f. 363/364 e 801/802). “que o equipamento, perante a CNEN foi autorizado para tratar 70 pacientes dia; que em virtude do fechamento do outro serviço, solicitou ampliação para poder atender mais pacientes; que hoje atendem cerca de 115 pacientes; que a comissão permitiu a ampliação, desde que a blindagem garantisse que não haveria dano a paciente e profissionais; que a ampliação da utilização do equipamento foi liberada em razão da necessidade de ampliação do atendimento mas que isso não deve ser permanente;” (audiência do dia 19.01.2010 – f. 569)

A partir daí, o único aparelho 28 (acelerador linear) do serviço de radioterapia do HUSE passou a quebrar constantemente em razão de não suportar a demanda, prejudicando os pacientes que estavam fazendo tratamento e que estavam na lista de espera.

Com a propositura de uma ação civil pública pelos Ministérios Público Federal e Estadual, este Juízo deferiu a antecipação dos efeitos da tutela em 17.12.2009, nos seguintes termos:

“1. que o Estado de Sergipe e o Município de Aracaju forneçam ajuda necessária, seja mediante convênio ou outro instrumento, mediante a entrega de recursos e também de cessão de pessoal, a Fundação de Beneficência Hospital de Cirurgia para que volte a funcionar o serviço de oncologia; 2. que o Estado de Sergipe fica obrigado a prestar Tratamento Fora de Domicílio no Sistema Único de Saúde a todos os pacientes que se encontram na lista de espera, nos termos da Portaria Ministério da Saúde/SAS/Nº 055 de 24 de fevereiro de 1999. Se houver necessidade de suplementação financeira, a União fica obrigada também a transferir os recursos necessários na proporção dos pacientes encaminhados; 3. que, dentro do prazo de contestação, o Estado de Sergipe e o Município de Aracaju providenciem a adequação da cobertura de oncologia aos mínimos preconizados pelo Ministério da Saúde, instalando mais centros e/ou unidades de assistência em alta complexidade de oncologia no Estado de Sergipe, nos termos da Portaria 741 de 19 de dezembro de 2005 e 3.535/GM de 02 de setembro de 1998, devendo apresentar um cronograma necessário para adoção de providências, contemplando as diversas fases (edital, projeto básico e executivo, custos), a ser discutido em sede de audiência pública a ser designada; 3. que o Estado de Sergipe, através da Secretaria Estadual de Saúde, e o Hospital João Alves (Fundação Hospitalar) apresentem, no prazo de 15 (quinze) dias, de um cronograma detalhado, apontando data da contratação direta, o envio do material e o prazo de sua chegada, colocação do equipamento em funcionamento, inclusive apontando eventuais problemas, a fim de que este magistrado examine a razoabilidade do prazo. Se não houver a apresentação do cronograma, os referidos réus ficam obrigados a colocar em funcionamento o aparelho de braquiterapia nessa unidade hospitalar, no prazo de 60 (sessenta) dias.”

Naquela oportunidade, entendi que seria mais fácil recuperar a capacidade instalada, com a reativação do serviço de radioterapia do Hospital Cirurgia do que a criação de um novo serviço e que, enquanto isso não ocorria, os pacientes que estavam na fila fossem encaminhados para outros Estados, através do Tratamento Fora do

28 Existe também um aparelho de braquiterapia no HUSE sem funcionar, que também é objeto da presente demanda, mas que não é oferecido como opção de tratamento (será tratado a parte).

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Domicílio. Sem prejuízo destas medidas, determinei que os réus apresentassem um cronograma para “a adequação da cobertura de oncologia aos mínimos preconizados pelo Ministério da Saúde, instalando mais centros e/ou unidades de assistência em alta complexidade de oncologia no Estado de Sergipe” (f. 474-v)

A partir daí, a presente demanda girou em derredor quatro pontos temáticos: 1) restabelecimento do antigo serviço de radioterapia do Hospital Cirurgia, o que foi deferido mediante a decisão que deferiu a antecipação dos efeitos da tutela; 2) o gerenciamento da lista de espera do serviço de radioterapia que já existia e foi crescendo durante a demanda; 3) a instalação de mais um serviço de radioterapia no Estado de Sergipe, seja mediante a instalação no próprio HUSE, seja no Hospital Cirurgia; 4) o funcionamento do serviço de braquiterapia 29. Não obstante os fatos estarem relatados no relatório, este Juízo gostaria de pontuar algumas questões que servirão de anteparo para o próximo tópico desta sentença (2.2.1.5. Da adequação do serviço de radioterapia)

2.2.1.4.1. Antigo serviço de radioterapia

Na audiência do dia 19.01.2010, a FUNDAÇÃO DE BENEFICÊNCIA HOSPITAL DE CIRURGIA apresentou cronograma (f. 573/574), e os custos necessários para o antigo serviço de radioterapia (580/581 e 583/608), com data provável para o dia 05.04.2010.

Na audiência do dia 19.01.2010, o Estado de Sergipe informou que autorizou que o Município de Aracaju alterasse o objeto do convênio a fim que fossem destinados os recursos ao Hospital Cirurgia:

“que quando tomaram conhecimento do processo, fizeram reunião com as demais partes, na Secretaria de Estado, inclusive com o Cirurgia, Município de Aracaju; que o projeto custa aproximadamente R$ 800.000,00; que como há um termo de compromisso com o Município em relação a um outro objeto para o qual o Município ainda não possui autorização, logo os recursos teriam que ser devolvidos, no valor de R$767.400,00, sugeriram ao Município que fizessem uma alteração do objeto do repasse e não devolvessem o valor ao Estado de Sergipe, aplicando-os na reforma estrutural” (f. 568)

O Município de Aracaju encaminhou ofício ao Ministério da Saúde solicitando a sua reabilitação como UNACON com radioterapia (f. 1188), contudo o Ministério da Saúde, através da Nota Técnica n.º 261 (f. 1332/1333), entendeu que “qualquer solicitação de habilitação ou alteração deve ser proveniente da Secretária de Estado de Saúde”. No mesmo sentido, foi a manifestação do representante do SAS na audiência do dia 24.03.2010, verbis:

Pela União foi dito que o MS para conceder a habilitação para serviços oncológicos necessita de um encaminhamento do Estado de Sergipe e do Município. Pela Dra. Maria Ângela, representante da SAS foi dito que antes da interdição, o Hospital de Cirurgia era um UNACON com serviço de radioterapia. Com a interdição desse serviço, o hospital passou a ostentar a posição de UNACON. A Portaria autoriza que o gestor público organize a sua rede de atendimento de acordo com os critérios epidemiológicos, escala. É necessário que haja uma redefinição da rede de

29 A questão do serviço de braquiterapia será enfrentado em tópico próprio.

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atendimento na área de oncologia na comissão bipartite (no âmbito dos estados) para ser encaminhado à comissão tripartite (no âmbito nacional). Após essa autorização, o processo é encaminhado à SAS – Secretaria de Atenção à Saude para a publicação de uma portaria, com a inclusão de mais um UNACON. Pela Secretaria da Saúde, foi dito que é necessários se requerer a habilitação do HU para funcionar como serviço oncológico dentro do redesenho da rede de atendimento proposto e pactuado nas instâncias colegiadas do SUS.

No curso da lide, surgiram alguns problemas, tais como demora na liberação das peças na Secretária da Receita Federal (f. 706/712 e 952/954), o atraso na obra (vide audiência do dia 24.03.2010), readequação da rede de energia elétrica (f. 1378/1379), demora na liberação integral dos recursos por parte do Município de Aracaju (f. 1737/1741, 1923, 1926/1927 e 2024).

Na audiência pública realizada no dia 24.03.2010 (f.1303-1323), determinei: – Considerando as ponderações apresentadas pelo Arquiteto do Hospital de Cirurgia, concedo o prazo de 45 dias para conclusão da obra. Tão logo terminada a Vigilância Sanitária terá o prazo de 05 (cinco) dias para vistoriar e liberar o serviço de radioterapia. Autorizada pela Vigilância Sanitária e encaminhada a documentação pelo Hospital de Cirurgia, o Estado e o Município terão o prazo máximo de 10 (dez) dias para aprovar no âmbito da comissão bipartite, devendo inclusive convocar reunião extraordinária, se for necessária. Por sua vez a SAS terá um prazo máximo de 15 (quinze) dias para aprovar e publicação da habilitação do serviço. Para comprovar o cumprimento das determinações, cada parte deverá encaminhar cópia do documentação aos autos.

O Hospital Cirurgia informou ter recebido a licença da vigilância sanitária para funcionamento do setor de radioterapia, estando marcada a inauguração do setor para o dia 17/06/2010 (f. 2110-2114). Não obstante o prazo final de reabertura do antigo serviço (05.04.2010 – Vide f. 573/574), o serviço de radioterapia somente foi inaugurado em 19.07.2010 (f. 2397). Após a abertura, houve uma suspensão temporária em razão da demora da contratualização com o Hospital Cirurgia e a forma de pagamento dos seus serviços, realização de exames necessários para o início do tratamento (f. 2560-2601 e f. 2621/2705) etc.

Quanto à reabilitação do Hospital Cirurgia, surgiu uma discussão sobre quem iria remunerar o referido Hospital pelos serviços prestados.

Na audiência pública realizada 30 (f. 2217/2220), o Município de Aracaju alegou que: 1) o teto de média e alta complexidade é único e serve ao tratamento da radioterapia e outros tratamentos; 2) ao solicitar o aumento do teto, a União informa da sua desnecessidade, pois o teto do Estado de Sergipe já foi aumentado (Vide Portaria nº 897, de 20.04.2010 – f. 2233); 3) a reabilitação foi feita sem aprovação unânime da CIB, justamente por haver divergência sobre quem cobrirá essa nova despesa.

Através da Portaria n.º 252, de 21.05.2010 (f. 2232), a União promoveu a habilitação como UNACON com radioterapia, cujo impacto financeiro deverá onerar o

30 Não obstante constar a data de 04.05.2010, a referida audiência foi realizada em 28.07.2010 (Vide despacho de f. 2201)

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teto do Estado e/ou Município de acordo com o vínculo da unidade e da modalidade de gestão.

Ocorre que a Secretaria de Saúde do Estado de Sergipe oficiou ao Ministério da Saúde para que os recursos para o pagamento recaíssem sobre o orçamento do Município de Aracaju (f. 2235/2236):

“Acreditando na proposta do Estado de Sergipe e atendendo a solicitação supracitada, o Ministério da Saúde publicou a Portaria GM/MS nº 897, de 20 de abril do corrente ano, a qual estabelece recursos no montante de R$ 20.500.00,00 a serem, incorporados ao teto financeiro anual de média e alta complexidade do Estado de Sergipe. Ocorreu, entretanto, que, em 21 de maio de 2010, o Ministério da Saúde publicou a Portaria SAS/MS n.º 252, que altera a habilitação do Hospital Cirurgia para Unidade de Assistência de Alta Complexidade (UNACOM) com serviço de Radioterapia, estabelecendo que o custeio do impacto financeiro deveria onerar o teto do Estado e/ou Município de acordo com o vínculo da unidade e modalide de gestão; fazendo, em sua parte final, remissão à Portaria GM/MS n.º 897, de 20 de abril do corrente ano. Ocorre que os recursos que trata a Portaria GM/MS 897 de 20/04/2010 foram destinados ao custeio da rede hospitalar sob gerência do Estado, assim como, a habilitação de Radioterapia do Hospital Cirurgia, não se trata de um novo serviço, e sim, de reabilitação do serviço de radioterapia, que tinha sido desabilitado pela Portaria SAS/MS 259, de 31 de julho de 2009 e seus recursos já estão alocados no teto financeiro da médida e alta complexidade do referido município”

Tal posição foi ratificada na audiência pública realizada (f. 2471-2474), na qual o Estado de Sergipe respondeu “Que o pleito de aumento de teto teve como objetivo ampliar a rede hospitalar no interior e está vinculado a esse objetivo, não podendo ser utilizado para a radioterapia. Que já existem os recursos para o município custear o serviço de radioterapia. Assim, se o Hospital de Cirurgia volta a funcionar, o município deve custear o serviço de radioterapia desse hospital” (f. 2472).

Em petição (f. 2414), a União informou que: 1) “mesmo com a suspensão dos serviços de radioterapia no Hospital Cirurgia, o Estado de Sergipe continuou a receber os recursos do Governo Federal, relativos ao tratamento oncológico”; 2) “a reabilitação do serviço de radioterapia não implica em nova despesa para o Estado de Sergipe e sim o retorno ao status quo anterior à interdição do nosocômio”; 3) “nos registros do Ministério da Saúde todos os recursos para o tratamento oncológico são repassados para o Estado de Sergipe”; 4) na condição de gestor pleno, o Município pode até receber recursos para o tratamento, mas é necessário que haja pactuação na Comissão Bipartite – CIB; 5) para a União é indiferente a destinação dos recursos, mas “se não houver pactuação entre o Estado e o Município, as APACs relativas a procedimento oncológico deverão ser debitados à conta do Estado de Sergipe e não do Município de Aracaju”.

O Estado de Sergipe e Município somente chegaram a um acordo na audiência pública realizada em 09.11.2010 (f.2621-2705).

2.2.1.4.2. Utilização do TFD

Em razão da formação de filas de espera para o serviço de radioterapia, determinei na tutela antecipada a utilização do TFD, nos seguintes termos:

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2. que o Estado de Sergipe fica obrigado a prestar Tratamento Fora de Domicílio no Sistema Único de Saúde a todos os pacientes que se encontram na lista de espera, nos termos da Portaria Ministério da Saúde/SAS/Nº 055 de 24 de fevereiro de 1999. Se houver necessidade de suplementação financeira, a União fica obrigada também a transferir os recursos necessários na proporção dos pacientes encaminhados;

Conforme manifestação da Secretaria Municipal de Saúde (f. 1183/1184), “o TDF consiste em uma ajuda de custo ao paciente e, em alguns casos, também ao acompanhante, encaminhados por ordem médica, à unidade de saúde de outro município ou Estado da Federação, quando esgotados todos os meios de tratamento na localidade de residência do mesmo, desde que haja a possibilidade de cura total ou parcial, limitado no período estritamente necessário a este tratamento e aos recursos orçamentários existentes” 31. Constitui um programa executado pelo Estado.

O Estado de Sergipe informou “que a quota SUS dos hospitais para os quais o Estado transfere os pacientes mediante TFD já está no limite; que se propõe, juntamente com o Município, a, no prazo de 05 dias, apresentar uma proposta referente ao tratamento dos pacientes que estão na lista de espera” (f. 568-v).

Na audiência pública realizada no dia 27.01.2010 (f. 706/712), o Estado de Sergipe se comprometeu a encaminhar os pacientes para duas instituições, uma em Jaú/SP e outra em Maceió/AL e aumentar o valor da diária.

“o Estado de Sergipe localizou e já tem o compromisso de duas entidades. A primeira é o Hospital de Jaú em São Paulo que previu o atendimento de 20 pessoas/mês, devendo ser encaminhado 05 pacientes por semana. A segunda entidade é o Hospital Universitário Prof. Alberto Antunes de Maceió/Al que se disponibilizou a criar um novo turno de trabalho, das 16 as 22 horas, disponibilizando um atendimento de 25 pacientes/mês, a um custo de aproximadamente R$ 50.900,00 por mês. Para viabilizar o custeio se faz necessário que seja contratada a Fundação Universitária de Desenvolvimento de Extensão e Pesquisa – FUNDEPES (CNPJ – 12.449.880/0001-67), vinculada a Universidade federal de Alagoas” (f. 706/707).

O Estado de Sergipe afirmou na referida audiência que alguns pacientes e familiares recusam o tratamento fora do Estado.

Em seguida, este Juízo decidiu: 1) que quanto ao local de tratamento, “A liminar foi deferida para que fosse oferecido o tratamento e não escolhido o local. Se o paciente não aceitar receber o tratamento no local oferecido é uma opção sua, devendo arcar com as conseqüências de seus atos”; 2) que em relação à ordem dos pacientes, “a solução mais razoável é que em caso de recusa do tratamento fora do domicilio, fica autorizado a encaminhar os pacientes em posição subseqüente na lista, mantida a ordem do paciente que se recusou inicialmente. Em caso de arrependimento, o paciente poderá solicitar o seu tratamento de acordo com a sua posição na lista inicialmente e será encaminhado pra a próxima vaga disponível. O HUSE poderá fazer uma avaliação dos pacientes, conforme pré-seleção apresentada ou outros critérios de natureza científica, visando o encaminhamento para tratamento via TFD, devendo observar os documentos necessários para a solicitação do TFD. O HUSE e o Estado de Sergipe deverão solicitar que o paciente assine um termo de responsabilidade, no sentido de que não deseja se deslocar para outro Estado a fim de receber tratamento, estando consciente dos riscos que representa a ausência de tratamento. Em caso de recusa do paciente em assinar o referido termo, o médico poderá

31 A questão do TFD será mais abordada na frente se poderia ser utilizada como possível solução para o problema da radioterapia.

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certificar relatando a situação mediante a assinatura de duas testemunhas”; 3) modificar parcialmente a antecipação dos efeitos da tutela para acolher a proposta do Estado de Sergipe nos seguintes termos:

1. a secretaria do Estado da Saúde se compromete a contratar a FUNDEPES, até 30/04/2010, mês em que está previsto o funcionamento da unidade do Hospital de Cirurgia, desde que determinado pelo Juízo, a encaminhar os pacientes para o Hospital de Jaú e dada a excepcionalidade de não existir casa de apoio a pacientes em Maceió, bem como a dificuldade de encontrar pousadas para abrigar os pacientes e acompanhantes devido a alta estação turística, o Estado complementará a diária em mais R$ 23,00 por pessoa. Nessa proposta estão incluídos os custos com o transporte. Para tanto, o Estado de Sergipe fica autorizado a celebrar contratos ou convênios ou outro instrumento congênere, mediante procedimento de dispensa de licitação, para encaminhar os pacientes da lista de espera para tratamento via TFD, não estando liberado de cumprir os demais requisitos da dispensa; 2. Se houver possibilidade de tratamento nos nosocômios situados em Salvador, a União deverá adotar todas as providências necessárias para que os pacientes residentes nesse Estado sejam atendidos no limite da cobertura do Município de Salvador, ou se este for insuficiente, ampliar o teto MAC para que sejam abrangidos estes pacientes, desde que os nosocômios tenham capacidade de atendimento. 3. Nesta situação, o Estado de Sergipe fica obrigado também a encaminhar os pacientes nos termos do item 01 supra.

Na audiência realizada em 24/02/2010 (f. 1016/1022), o Estado de Sergipe informou a dificuldade de celebrar convênio com UFAL consistente na contratação de pessoal, requerendo que “fosse ampliada a determinação contida na liminar para a contratação de pessoal, com dispensa de licitação, com resguardo de eventuais responsabilidades” (f. 1021). A União informou que “o INCA tem interesse em fornecer um novo aparelho para o estado de Sergipe, mediante o preenchimento de algumas condições” (f. 1019) e que, segundo os dados fornecidos ao Ministério da Saúde, não precisaria de um novo aparelho em Sergipe. Os Ministérios Públicos requereram que, “caso não haja possibilidade de o tratamento ser realizado pelo SUS, seja realizado junto à instituições privadas” (f. 1030).

Na decisão de f. 1084-1088, foi deferida, ainda, a autorização, pleiteada pelo Estado de Sergipe, para a contratação, mediante dispensa de procedimento licitatório, de pessoal para operacionalizar o serviço de radioterapia junto ao Hospital Universitário de Alagoas.

Em petição de f. 1132-1157, os Ministérios Públicos Estadual e Federal afirmaram que: 1) o Estado não tem conseguido encaminhar, através de TFD, pacientes para serem tratados no sistema único de saúde, mas, caso fosse no sistema privado, haveria vagas; 2) os pacientes não aceitam o TFD porque o “pagamento das diárias somente 30 (trinta) dias após a saída do paciente dificulta muito a aceitação do tratamento em fora do domicílio” (f. 1136), já que “muitas vezes, os pacientes são carentes de recursos econômicos, não possuindo condições de arcar nem mesmo com a passagem da cidade do interior do Estado de Sergipe para o tratamento na capital” (f. 1136). Ao final, requereram que os réus sejam obrigados a providenciar o tratamento fora do domicílio em Estados circunvizinhos os pacientes referenciados da lista de espera, ainda que na rede privada de saúde, tendo em vista a insuficiência de vagas em hospitais conveniados ao SUS. Requereu ainda que as despesas com diárias e passagens sejam pagas aos pacientes e seus acompanhantes de forma antecipada.

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Na audiência do dia 24.03.2010 (f. 1303/1323), o Estado de Sergipe se comprometeu a pagar antecipadamente as diárias.

Que a questão do pagamento antecipado das diárias para tratamento via TFD já foi resolvida. Que o paciente dá entrada no TFD e o próprio serviço prepara o procedimento do paciente e após a autorização da Secretaria é feito o depósito dos valores na conta do paciente. Que o monitoramento da quantidade das sessões é feita pelo serviço onconlógico.

Em relação ao TFD, não obstante o deferimento da antecipação dos efeitos da tutela em 17/12/2009, o Estado de Sergipe somente conseguiu começar a encaminhar os pacientes para o Hospital de Jau/SP, Hospital da UFAL e Hospital de Itabuna/BA, nos moldes determinados na decisão judicial, em 22/03/2010, conforme documento de f. 1333. Já o convênio com a UFAL somente foi celebrado em 05/04/2010, sendo que só a partir desta data os pacientes puderam ser encaminhados ao Hospital da UFAL.

Como se viu acima, boa parte da demanda girou em torno do restabelecimento do serviço de radioterapia do Cirurgia, das quebras dos aparelhos (f. 508, 946) e gerenciamento da fila de espera para tratamento fora do domicílio - TFD, mas a presente demanda possui um objetivo mais nobre, qual seja, a regularização do serviço de radioterapia no Estado de Sergipe, na proporção dos números de casos de câncer.

2.2.1.5. Da adequação do serviço de radioterapia

Atualmente, o Estado de Sergipe possui dois hospitais habilitados para a prestação de assistência oncológica, a saber:

Fundação de Beneficência Hospital de Cirurgia UNACON com Serviço de Radioterapia

Sergipe SES CENAH/ Hospital Governado João Alves Filho

UNACON com Serviços de Radioterapia, de Hermatologia, e de Oncologia Pediátrica.

De acordo com as acordo com as estatísticas mais atualizadas publicadas no site do INCA – Instituto Nacional do Câncer, em Sergipe, estavam estimados para o ano de 2010 o surgimento de 3.610 casos novos por câncer, sendo que 2540 seriam de variados tipos e 1070 seria de câncer não melanoma.

As Portarias nº. 3.535/GM e 741/2009 estabelecem o número mínimo de Unidades de Assistência de Alta Complexidade (UNACON) e Centros de Assistência de Alta Complexidade que deve ser calculado na proporção de 01 para cada 1.000 novos casos anuais de câncer, excetuando-se o câncer de pele (não melanoma), (Anexo III da Portaria 741/2009 cuja cópia encontra-se em anexo).

PARÂMETROS PARA O PLANEJAMENTO E AVALIAÇÃO DA REDE DE ALTA COMPLEXIDADE EM ONCOLOGIA 1. Introdução O número de casos novos anuais por UF, calculado a partir das taxas brutas de incidência de câncer específicas por 100.000 homens ou por 100.000 mulheres, encontra-se disponibilizado em www.inca.gov.br .

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O número de Unidades de Assistência de Alta Complexidade em Oncologia e Centros de Assistência de Alta Complexidade em Oncologia (CACON) deve ser calculado por no mínimo cada 1.000 casos novos anuais, excetuando-se o câncer de pele (não melanoma), para efeito de cálculo de estruturas e serviços hospitalares de alta complexidade (Oncologia Clínica, Radioterapia com equipamentos de megavoltagem, Hematologia e Oncologia Pediátrica), podendo-se considerar a adequação do acesso e a cobertura regional. Nos Estados em que esse número anual for inferior a 1.000, deverá ser avaliada a possibilidade de instalação de um serviço hospitalar de alta complexidade, levando-se em conta características técnicas, de acesso e de possibilidade de acesso regional. Unidades ou CACON´s com produção correspondente a mais de 1.000 casos novos anuais devem ser computados como múltiplo em tantas vezes o seja do estimado por 1.000, reduzindo-se correspondentemente o número de Unidades ou CACON´s necessários e os respectivos números dos serviços. 2. Parâmetros de Necessidade De forma geral, para 1.000 casos novos de câncer espera-se que: 500 a 600 casos necessitem de cirurgia oncológica 700 casos necessitem de quimioterapia 600 casos necessitem de radioterapia Nota: A produção das Unidades de Alta Complexidade em Oncologia e CACON deverá guardar proporcionalidade entre as modalidades terapêuticas acima descritas, respeitando a finalidade do seu credenciamento. A incidência média de câncer hematológico é em torno de 5% do total de cânceres estimados, exceto o câncer de pele (não melanoma). A incidência média de câncer pediátrico (0 a 18 anos) é de 2% a 3% do total de cânceres estimados, exceto o câncer de pele (não melanoma). Nota: Um Serviço de Oncologia Pediátrica deverá atender no mínimo 75 casos novos/ano (tumores sólidos e de origem hematopoética). Para o cálculo do quantitativo necessário de serviços de oncologia pediátrica a serem credenciados, deverá ser levado em conta a existência de Unidades de Alta Complexidade Oncológica e de CACON’s com serviço de Hematologia credenciados na região, uma vez que esse serviço tem também capacidade de prestar assistência às crianças e adolescentes com tumores hematológicos pediátricos, tumores estes que representam cerca de 40% de todas as neoplasias malignas que acometem as pessoas nessa faixa etária.

Assim, de acordo com o estudo acima, seria necessário, no mínimo, mais um aparelho no Estado de Sergipe. Digo isso porque a estatística utiliza o número novo de casos de câncer por Estado.

A partir dos fatos relevantes acima narrados, ficou demonstrada a necessidade imediata na instalação de mais um serviço de radioterapia e não é preciso muito esforço para verificar que a cobertura insuficiente, abaixo mínimo preconizado, tem prejudicado a todos.

O câncer é uma doença que se exige tratamento multidisciplinar (cirurgia, radioterapia e quimioterapia). Não raro, há associação de duas ou mais técnicas e, quando um não é suficiente, parte-se para outra. O câncer é uma doença, cujo tratamento exige regularidade 32.

32 Vide reportagem de f. 1140

Processos nº 0006464-60.2009.4.05.8500 e 0001610-86.2010.4.05.8500

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“Que o paciente que inicia o tratamento e este é interrompido por problemas no aparelho ele pode perder o tratamento a depender da quantidade de frações já recebidas, o tempo da interrupção e o tipo de patologia” (f. 1146) “O câncer exige continuidade do tratamento e principalmente regularidade. A guerra se vence quando é ofertado ao paciente todo o conjunto de ações, que vão de exames a medicamentos. As aplicações de radioterapia são eficazes no tratamento de tumores e muito valorizadas pelos médicos que acompanham pacientes que têm a doença em estágio avançado. A falta do tratamento reduz as chances de vitória e cria uma angústia no doente. Tempo é justamente o fator decisivo quando se luta contra a doença. Os tumores costumam retornar mais agressivo e resistentes quando há interrupções no tratamento. É como se desse terreno ao inimigo para avançar” (f. 105)

Sobre o tema, vale citar as palavras do Dr. William Giovanni, em entrevista concedida ao Jornal da Cidade, na edição dos dias 06 e 07 de novembro de 2011:

“O câncer hoje é considerado uma doença altamente curável quando descoberta no estágio inicial. Em estágios mais avançados os índices de cura são mais baixos ou até mesmo o tratamento é só paliativo”

É truísmo que quanto mais cedo diagnosticado e iniciado o tratamento, maiores são as chances de cura. A continuidade do tratamento contra o câncer é imprescindível para que haja uma maior possibilidade de cura. Assim, os pacientes portadores desta moléstia que tiveram seus tratamentos interrompidos, se vêem em situação cujo perigo é manifesto, uma vez que suas chances de cura são diretamente afetadas.

O que ocorreu nos presentes autos.

Antes da interdição do serviço de radioterapia do Hospital Cirurgia, já existia uma lista de espera, já que o tratamento da radioterapia não era imediato. Contudo, tal situação se agravou ainda mais com a interdição da radioterapia do Hospital Cirurgia. Durante a presente demanda, foram apresentadas várias listas relativas à fila de espera para tratamento em serviço de radioterapia:

DATA DE

APRESENTAÇÃO DA LISTA

DATA DE ATUALIZAÇÃO DA

LISTA

NUMERO DE PACIENTES

FOLHA DOS AUTOS

10/11/2009 (audiência no MPE)

--- 185 97/103

19/01/201 (audiência)

--- 216 570

24/02/2010 (audiência)

---- 262 1019

12/03/2010 08/03/2010 294 1154/1157 27/04/2010 26/04/2010 325 1673/1677 05/05/2010 03/05/2010 343 1842/1850

18/05/2010 (lista apresentada em

27/04/2010) 26/04/2010 325 2019/2023

15/08/2010 02/06/2010 253 2150/2154 13/07/2010 01/07/2010 267 2475/2479

Processos nº 0006464-60.2009.4.05.8500 e 0001610-86.2010.4.05.8500

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25/08/2010 23/08/2010 273 2475/2479 26/10/2010 26/10/2010 219 2597/2601 09/11/2010

(desatualizada) 27/09/2010 144 2634/2639

Salvo as prioridades (criança/adolescente) e situação de urgência (vide f. 1838/1839), os pacientes que têm câncer diagnosticado e possuem indicação de radioterapia entram no final da lista de espera. Enquanto isso, o tumor vai crescendo.

“Os pacientes são inseridos na lista de acordo com a ordem cronológica em que

são atendidos e recebem a indicação médica para o tratamento. A quebra no fluxo da ordem cronológica só é possível mediante relatório médico

em que se justifique a urgência do caso segundo critérios clínicos já estabelecidos. No que tange a Regulação Médica das vagas em Radioterapia existem critérios de urgência onde alguns pacientes não podem seguir a ordem cronológica da lista, devido à gravidade do caso e risco de morte iminente. São eles:

1. Metástase cerebral; 2. Hemorragia por tumor; 3. Dor incoercível em uso de analgésico; 4. Risco de fratura patológica em metástase óssea; 5. Compressão medular em metástase de coluna; 6. Compressão respiratória em tumores torácicos ou de cabeça e pescoço; 7. Compressão vascular determinando congestão e desconforto em tumores próximos a vasos sanguíneos” (f. 2347/2348) “após a consulta com radioterapeuta, o nome do paciente é inserido no final da lista de espera. Destarte, caso o paciente apresente o quadro clínico caracterizado pela algia, compressão medular ou sangramento, realiza-se o planejamento para tratamento imediato, dando-se preferência a este, portanto” (f. 1836) “Existe uma fila ordenada por ordem de chegada, todavia, caso haja indicação médica para urgência, muitas vezes há uma alteração da lista, tudo de acordo com a gravidade do problema e os indícios prováveis de recuperação do paciente” (f. 1143)

Em verdade, todos os casos de câncer demandam urgência, porque se a doença for descoberta no início e não for imediatamente tratada, pode-se perder a chance de cura. O câncer, antes doença incurável, hoje é visto como uma doença curável na maioria dos casos, desde que descoberto no seu estágio inicial. Por exemplo, quem faz cirurgia oncológica tem indicação de tratamento radioterápico para que não ocorra metástase e para matar o tecido canceroso residual. E, ainda que esteja no estágio avançado, a ausência de tratamento pode implicar no encurtamento da vida do paciente. Ambas as situações são graves e necessitam de tratamento imediato.

No afã de dar conta da demanda, aumentou-se mais um turno de trabalho, provocando sucessivas quebras do equipamento.

“que o equipamento [do HUSE], perante a CNEN foi autorizado para tratar 70 pacientes dia; que em virtude do fechamento do outro serviço, solicitou ampliação para poder atender mais pacientes; que hoje atendem cerca de 115 pacientes; que a comissão permitiu a ampliação, desde que a blindagem garantisse que não haveria dano a paciente e profissionais; que a ampliação da utilização do equipamento foi liberada em razão da necessidade de ampliação do atendimento mas que isso não deve ser permanente; (Audiência do dia 19.01.2010 – f. 569)

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A utilização das máquinas além de sua capacidade normal tem provocado a interrupção do serviço para realização de manutenção corretiva do aparelho (f. 510, 714, 715, 716, 947, 2784/2786), que prejudica tanto os pacientes que estão em tratamento quanto os que estão na lista de espera.

Os primeiros porque têm o seu tratamento interrompido no meio, com a diminuição de sua eficácia terapêutica. Os segundos porque têm que aguardar mais tempo na lista de espera. Aí está um outro problema: o paciente é avaliado diante de um quadro clínico e, se houver alteração drástica do seu quadro, é necessário refazer todos os exames, o que atrasaria ainda mais o início do seu tratamento.

“Quanto à fila de espera, pelo HUSE foi dito: que a fila tem 262 pacientes, mas o atendimento de novos casos continua acontecendo. Que com a paralisação do atendimento o tempo que o paciente ocupa na lista se alonga. Que durante a primeira consulta os médicos tem ressaltado a importância do tratamento fora do domicílio” (audiência do dia 24.02.2010 – f. 1019).

Mesmo estando na lista de espera, corre-se o risco da situação que não era urgente assim se tornar ou, em razão do crescimento do tumor, os exames que tiveram sido realizados se tornarem inúteis, por ocasião da sua vez de ser tratado. Ainda existe a questão de o paciente entrar na lista de espera e, por erro de avaliação, o seu caso ser de urgência.

O caso da Sra. Maria Jivalda da Silva foi bastante emblemático: “Dito isso, passa-se a trata especificamente da Sra. Maria Jivalda da Silva, paciente que, na lista de controle dos paciente em tratamento na radioterapia do HUSE, ocupava a 275ª posição, por seu quadro de saúde, na oportunidade em que foi submetida a atendimento médico, não ser considerado de caráter urgente, o que implica dizer que, por essa razão, o nome da mesma foi inserido ao final da referida lista, e não enxertado no início desta., como acontece com aqueles pacientes que têm seu quadro clínico julgado como de urgência. Entretanto, impende ressaltar a Sra. Maria Jivalda teve sua situação revaliada e, com isso, conclui-se que o seu caso reclamava emergência, motivo que levou a Gerência do Ambulatório do Centro de Oncologia do HUSE a encaminha os documentos da paciente para o Setor de Tratamento Fora do Domicílio, a fim de que a mesma seja submetida a tratamento fora do domicílio em teleterapia, ocupando o seu nome a 5 posição na lista constante da Comunicação Interna oriunda da citada gerência (documento anexo). (f. 1836)

A existência da lista é uma anomalia, transformando num episódio degradante e causador de sofrimento para o doente e seus familiares. Isto porque o médico, profissional que está na linha de frente do problema e diante da escassez de meios disponíveis, é obrigado a escolher quem vai receber tratamento primeiro, ou seja, quem vai sobreviver ou então quem vai viver mais tempo. Nesta situação, o médico pode ser levado a tratar somente aqueles que têm alguma chance de cura.

“quanto à lista de espera tem-se que um paciente em um estado da doença mais avançado possui um índice de cura e sobrevida menor, e um paciente que está no estado inicial da doença, se receber o tratamento no início, pode ter maiores chances de curas definitivas. Ressalte-se que existe uma dificuldade dos médicos em definir qual paciente terá que receber o tratamento imediatamente”. (f. 707-v)

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“Existe uma fila ordenada por ordem de chegada, todavia, caso haja indicação médica para urgência, muitas vezes há uma alteração da lista, tudo de acordo com a gravidade do problema e os indícios prováveis de recuperação do paciente” (f. 1143)

Não estou questionando o comportamento dos médicos, mas procurando mostrar a gravidade da existência de lista de espera.

Em sua contestação, o HUSE alegou que a formação de filas de espera é inevitável, face à escassez de CACON’s e UNACON’s no país:

“Ora, se no plano nacional há uma insuficiência de Unidades de Assistência de Alta Complexidade em Oncologia (UNACON) e Centros de Assistência de Alta Complexidade em Oncologia – v. lista anexa, a formação de fila de espera é quase inevitável dada a obrigatoriedade de tratamento para pacientes oriundos de outros estados” (f. 800)

De fato, oficiado aos diversos CACON´s UNACON´s, verifica-se que há uma carência de vagas (Vide f. 790, 809/810, 814, 815, 816, 817, 818/820, 821, 822, 834/835, 836 , 919, 920, 931, 932/933, 934, 935, 937, 938, 940, 943, 945, 950, 957/958,986, 988/989, 990, 992, 1025, 1027, 1029, 1078/1079, 1081, 1091/1093, 1095, 1096, 1098, 1100, 1110, 1113/1114, 1115, 1121/1124, 1126/1128, 1130, 1193/1198, 1203/1208, 1209, 1210, 1212, 1586/1587)

Na verdade, a demanda pelo servido de radioterapia é bem mais antiga porque o MPF e MPE fizeram juntar diversas reportagens nos anos de 2005 e 2006 apontando as constantes interrupções nos serviços em razão de quebras no aparelho (f. 106, 107, 109, 112, 113 e 114), o crescimento na demanda e a formação de filas. Inclusive, nas reportagens, consta a tentativa do HUSE de obter mais um acelerador linear perante o INCA.

Na atual realidade do sistema de saúde pública, filas sempre irão existir, mas a existência de lista de espera em outros Estados não é uma desculpa para a omissão. Pelo contrário, se existe uma lista de espera em outros Estados, é mais uma justificativa para prover o seu serviço no seu território.

O maior problema que identifico não é a existência da fila em si, mas o tempo de permanência nela. Os meios disponíveis devem ser proporcionais a demanda existente.

Assim, entendo que o paciente tem o direito de ser atendido dentro de um prazo razoável, não superior a 30 (trinta) dias, salvo se a situação for mais grave e o parecer médico indicar necessidade de início imediato de tratamento.

A partir da data em que estiver pronto para realizar o serviço, o Estado tem até trinta dias para iniciar o tratamento, contados da data do primeiro atendimento do paciente. Passado esse prazo, a multa por descumprimento passará a incidir. O réus serão multados toda vez que algum paciente permanecer mais de 30 (trinta) dias aguardando o serviço de radioterapia.

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Com efeito, o que se verifica é que o problema não é de falta de lei, mas de cumprimento daquilo que já foi determinado, uma vez que a própria legislação diz qual é o quantitativo mínimo considerado o número de casos prováveis da doença. Tratando-se de política pública voltada para doença que atinge a população, independente de classe social, é fundamental que os gestores atuem com prioridade, garantindo recursos, dotando de infra-estrutura e de pessoal qualificada ao invés de empurrar o “problema com a barriga”. Pacientes com câncer não podem esperar a boa vontade dos entes públicos em resolver os problemas porque a questão reclama solução para ontem. A judicialização ocorre porque não se dá a atenção necessária ao problema, reclamando a intervenção jurisdicional sobre a matéria.

Se existe uma proporção de números de casos novos para o número de CACON, tal esquema constitui um piso mínimo que não pode ser descumprido/desconsiderado sob o pretexto de conveniência ou oportunidade. Isto porque a discricionariedade é a margem de liberdade dentro da lei concedida ao administrador para decidir de acordo com os critérios de conveniência e oportunidade.

Se existir norma de caráter impositivo determinando a oferta mínima de um serviço, abaixo deste piso não se encontra na zona da discricionariedade e sim de plena vinculação do gestor público ao cumprimento de uma política pública. Vale dizer: a discricionariedade reside em criar UNACON ou CACON acima do mínimo, mas jamais abaixo deste patamar legal.

É preciso ressaltar que tais normas são auto-vinculantes e não constituem um mero conselho ao administrador público. Assim como o administrador se encontra vinculado ao regime de despesa ou de licitação, também está obrigado a cumprir as políticas públicas expressamente previstas na CF/88, marcadas pelos atributos da universalidade e da integralidade, as quais estão num patamar superior a outras despesas supérfluas (grande eventos festivos, propaganda institucional para informar ações de governo).

Assim, a oferta abaixo do valor mínimo equivale à proteção insuficiente do direito à saúde, violando o dever de proteção do Estado em manter uma estrutura adequada aos doentes com câncer.

Por sua vez, qualquer alegação de carência de recursos (reserva do possível) deve estar amparada em dados concretos e só pode ser aceita desde que o Estado demonstre efetivamente que está buscando soluções. Tratando-se de uma política pública vital, a reserva do possível não levaria a um juízo de improcedência do pedido, mas, no máximo, o dilatamento no cumprimento da medida determinada pelo Judiciário.

O caso dos autos demonstra que o serviço público de oncologia de Sergipe, notoriamente, não abrange todos os pacientes, ocasionando uma longa fila de espera, assim como a frequente interrupção do tratamento. As instalações atualmente existentes estão muito aquém do necessário. As freqüentes notícias de interrupção no atendimento, seja pela sobrecarga nos equipamentos, seja pela necessidade frequente de manutenção, tais como as noticiadas pela Fundação Hospitalar de Saúde (f. 2781-2782 e 2819-2820) e pelo Ministério Público Estadual (de 2783-2786), deixam transparente a necessidade de

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ampliação da rede de atendimento radioterápico. E a responsabilidade por esta ampliação, frise-se, é de todos os entes: União, Estado e Município.

Com efeito, é pacífica na jurisprudência a existência da solidariedade no tocante à prestação da saúde. Como já consignei, “o dever de saúde não é responsabilidade exclusiva de um ente, a exemplo da segurança pública. Ao contrário, o dever de prestação à saúde foi atribuído aos três entes em caráter global. A solidariedade existe externamente em relação ao cidadão no tocante à prestação do serviço de saúde, de modo que nenhum dos 3 entes pode simplesmente se demitir do seu encargo, quanto mais o Município. Todavia, isto não impede alguma especialização com vista a uma melhor eficiência. Esta descentralização visa assegurar a autonomia e a possibilidade de cada ente perseguir as suas próprias políticas”

Neste sentido, é o entendimento do STF sobre a matéria: EMENTA: AGRAVO REGIMENTAL EM AGRAVO DE INSTRUMENTO. CONSTITUCIONAL. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTO. LEGITIMIDADE PASSIVA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL. OBRIGAÇÃO SOLÍDARIA ENTRE OS ENTES DA FEDERAÇÃO EM MATÉRIA DE SAÚDE. AGRAVO IMPROVIDO. I – O Supremo Tribunal Federal, em sua composição plena, no julgamento da Suspensão de Segurança 3.355-AgR/RN, fixou entendimento no sentido de que a obrigação dos entes da federação no que tange ao dever fundamental de prestação de saúde é solidária. II – Ao contrário do alegado pelo impugnante, a matéria da solidariedade não será discutida no RE 566.471-RG/RN, Rel. Min. Marco Aurélio. III - Agravo regimental improvido. 33 EMENTA: Suspensão de Segurança. Agravo Regimental. Saúde pública. Direitos fundamentais sociais. Art. 196 da Constituição. Audiência Pública. Sistema Único de Saúde - SUS. Políticas públicas. Judicialização do direito à saúde. Separação de poderes. Parâmetros para solução judicial dos casos concretos que envolvem direito à saúde. Responsabilidade solidária dos entes da Federação em matéria de saúde. Fornecimento de medicamento: Zavesca (miglustat). Fármaco registrado na ANVISA. Não comprovação de grave lesão à ordem, à economia, à saúde e à segurança públicas. Possibilidade de ocorrência de dano inverso. Agravo regimental a que se nega provimento.34

Esta solidariedade existe em favor do usuário do serviço, uma vez que não pode ficar perdido na burocracia do serviço público. Estão corretos o MPF e MPE ao afirmarem que: (f. 21)

“Essa divisão, por óbvio, foi implementada para facilitar a operacionalização do sistema e não para dificultar a vida da população. (...) Enfim, é preciso conjugar o dever de solidariedade, estabelecido na Constituição Federal, pela União, Estados e Municípios são responsáveis, em conjunto, pelo dever de prestar os serviços de saúde, com a possibilidade de divisão de atribuições, entre eles. Daí decorre que, se o dever é solidário, mas pode haver divisão de atribuições, essa divisão só tem validade internamente entre eles, não podendo ser argüida em desfavor do cidadão.

33 STF, AI 808059 AgR, 1ª Turma, Relator(a): Min. RICARDO LEWANDOWSKI, Primeira Turma, julgado em 02/12/2010, DJe-020 DIVULG 31-01-2011 PUBLIC 01-02-2011 EMENT VOL-02454-13 PP-03289 34 STF, STA 175 AgR, Tribunal Pleno, Relator(a): Min. GILMAR MENDES (Presidente), julgado em 17/03/2010, DJe-076 DIVULG 29-04-2010 PUBLIC 30-04-2010 EMENT VOL-02399-01 PP-00070

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Posto isto, conclui-se que, em razão da solidariedade, a divisão de atribuições não pode ser oposta aos cidadãos, mas somente entre os próprios entes federativos, em caso de omissão de um deles em cumprir os seus deveres explicitados nas leis que tratam do direito à saúde”

Não existem normas precisas delimitando a responsabilidade. Os réus pactuam as suas responsabilidades no âmbito de Comissões Bipartites ou Tripartites, sendo que até mesmo para este magistrado fica difícil identificá-las.35 Ora, descabe perquirir a responsabilidade individual porque a solidariedade opera em favor dos assistidos pelos SUS. O entre que se sentir prejudicado deverá se voltar contra os demais no limite de sua responsabilidade.

E mais: o que se percebe é que todos buscam eximir-se de suas obrigações, num verdadeiro jogo de “empurra empurra”, no qual a maior prejudicada é a população que necessita do serviço, e não o tem à sua disposição a contento. No curso desta demanda, surgiram episódios lamentáveis em que bem demonstram como o cidadão, sem plano de saúde e usuário do SUS, fica órfão de atendimento público de saúde porque os réus ficam discutindo entre si sem chegar a uma conclusão. Destaco dois fatos marcantes: 1) a questão de quem seria responsável pelo pagamento ao Cirurgia após a reabilitação do seu serviço de radioterapia; 2) o Hospital de Jaú, alternativa para os pacientes em fila de espera, estava sem receber recursos para tratamento de pacientes no Estado de Sergipe, tendo sido necessário que este juízo determinasse a retirada de recursos do teto financeiro dos réus a fim de pagar o referido hospital.

Os réus não se entendem voluntariamente acerca da forma de resolver o problema da adequação da cobertura. No curso da demanda, surgiram diversas soluções, mas nenhuma foi à frente por falta de acordo dos réus.

Na decisão de f. 462-483, proferida em 17.12.2009, determinei ao Estado e ao Município de Aracaju que apresentassem, em audiência, um cronograma necessário para adoção de providências, contemplando as diversas fases (edital, projeto básico e executivo, custos), com vista a permitir, em conjunto com a União, a instalação de novos aceleradores lineares no Estado.

“3. que, dentro do prazo de contestação, o Estado de Sergipe e o Município de Aracaju providenciem a adequação da cobertura de oncologia aos mínimos preconizados pelo Ministério da Saúde, instalando mais centros e/ou unidades de assistência em alta complexidade de oncologia no Estado de Sergipe, nos termos da Portaria 741 de 19 de dezembro de 2005 e 3.535/GM de 02 de setembro de 1998, devendo apresentar um cronograma necessário para adoção de providências, contemplando as diversas fases (edital, projeto básico e executivo, custos), a ser discutido em sede de audiência pública a ser designada;”

Ocorre que, apesar da cominação de multa diária, tal providência jamais foi cumprida pelos réus (Estado de Sergipe e Município de Aracaju), não obstante instados por mais de uma vez:

Audiência do dia 24.03.2010:

35 Basta examinar a discussão de quem seria o responsável por remunerar os serviços prestados pelo Hospital Cirurgia em que os réus adotaram posicionamentos opostos – vide f. 46/47 da presente sentença.

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“Concedo o prazo de 10 (dez) dias para os réus trazerem um cronograma de discussão referente à implantação de um novo serviço de oncologia no Estado. Fixo multa diária de R$ 5.000,00 (cinco mil reais), que incidirá automaticamente após o decurso de prazo sem cumprimento e reverterá ao Fundo de Interesses Difusos. Em caso de descumprimento injustificado fixo uma multa por atentado à dignidade da jurisdição de R$ 2.000,00 (dois mil reais), com fulcro no art. 14, inciso V do CPC que incidirá sobre o funcionário público responsável pelo descumprimento. Advirto que a legislação autoriza a fixação de multa de até 20% sobre o valor da causa, fixada em R$ 1.000.000,00 (um milhão de reais), tal valor poderá ser elevado” (f. 1320/1321). Audiência do 28.07.2010: “Na esteira dos diversos pronunciamentos que já exarei nestes autos foi dito que um dos objetivos dessa demanda é a readequação do serviço de radioterapia, considerando os casos novos de câncer. Como será feita essa readequação, em princípio está situado na zona de discricionariedade dos entes, contudo isto não pode significar omissão diante do problema. É mister ressaltar ainda que os Ministérios Públicos propuseram outra ação civil pública, objetivando a responsabilização dos entes solidariamente por danos morais coletivos e o reconhecimento da responsabilidade individual pelo serviço deficiente. Este Juízo na primeira decisão que exarou, havia já determinado que: 3. que, dentro do prazo de contestação, o Estado de Sergipe e o Município de Aracaju providenciem a adequação da cobertura de oncologia aos mínimos preconizados pelo Ministério da Saúde, instalando mais centros e/ou unidades de assistência em alta complexidade de oncologia no Estado de Sergipe, nos termos da Portaria 741 de 19 de dezembro de 2005 e 3.535/GM de 02 de setembro de 1998, devendo apresentar um cronograma necessário para adoção de providências, contemplando as diversas fases (edital, projeto básico e executivo, custos), a ser discutido em sede de audiência pública a ser designada. Tal decisão foi exarada no dia 17/12/2009. Passados mais de 06 meses, continua-se o impasse de como será feita a adequação da cobertura do serviço de radioterapia. Ressalte-se, ainda, que foi fixada multa e que a mesma está incidindo desde então, haja vista a inércia dos entes em solucionar a questão, enquanto os pacientes ficam em listas de espera sofrendo por uma doença que não tem culpa e que o Estado brasileiro assumiu o dever de cuidar destas pessoas. Não resolvida a questão, compete ao Judiciário decidi-la. Assim, dou uma ultima oportunidade de os entes procurarem mutuamente resolver a questão” (f. 2219).

Em verdade, ambos os réus limitaram-se a cumprir as determinações judiciais relativas à regularização do antigo serviço de radioterapia do Hospital Cirurgia e ao encaminhamento dos pacientes, através do TFD.

Em que pese a incúria do Estado de Sergipe e do Município de Aracaju, abriram-se duas vertentes quanto à instalação de um terceiro serviço de radioterapia no Estado:

1) o Hospital Cirurgia demonstrou estar interessado em abrir mais um serviço de radioterapia (novo serviço em contraposição ao antigo), desde que houvesse auxílio do Poder Público, mediante a celebração de um convênio, para a conclusão das suas instalações e doação dos equipamentos pela União Federal, na forma abaixo:

“que existe a possibilidade de convênio via Ministério da Saúde para a aquisição de um acelerador linear e também de um aparelho de ressonância magnética; que o custo estimado do primeiro aparelho é de R$ 4.000.000,00 e do segundo é de R$

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2.000.000,00; que este novo aparelho seria instalado no novo serviço de radioterapia que está sendo construído e já aprovado pelo CNEN” (f. 567/572 “que para finalizar a infraestrutura são necessários R$ 4.000.000,00 e o Hospital vem pagando R$2.000.000,00, parceladamente, já tendo pago R$ 130.000,00; que pugna que os entes públicos se sensibilizem para fornecer os R$2.000.000,00 faltantes; requer prazo para apresentar a documentação relativa aos custos e necessidades do novo serviço de radioterapia” (f. 567/572)

2) na audiência do dia 24.02.2010, a União informou a possibilidade de doação, através do INCA:

Pelo Advogado da União foi informado que o INCA tem interesse me fornecer um novo aparelho para o estado de Sergipe, mediante o preenchimento de algumas condições. Que o INCA se mostrou interessado em resolver a questão.

Em resumo, existe a possibilidade de instalação de um novo aparelho no HUSE ou no Hospital Cirurgia. Tais soluções se desenvolveram autonomamente, de maneira que vou tratá-las em separado.

No tocante à instalação de um novo serviço de radioterapia no Hospital Cirurgia, o Estado de Sergipe chegou a afirmar que o Governador autorizou o repasse dos R$ 2.000.000,00 restantes para a conclusão do serviço novo.

Pelo Estado de Sergipe, foi dito: “O governador do estado autorizou o Secretario de estado da saúde a firmar convênio com o Hospital de Cirurgia para o repasse dos 2 milhões de reais faltantes para a conclusão da ala nova para o novo serviço de tratamento radioterápico”. (f. 708)

Ocorre que este convênio para repasses de recursos para a conclusão das obras do novo serviço jamais foi efetivado pelo Estado de Sergipe, tendo o Hospital de Cirurgia requerido a este Juízo mais de uma vez que fixasse prazo para a entrega de recursos, tendo este juízo indeferido tal requerimento (f. 1084/1088).

Audiência do dia 24.02.2010 “Pelo Hospital de Cirurgia foi requerido que, “em virtude da informação fornecida em Juizo de que já foi autorizado pelo Estado de Sergipe o repasse de dois milhões para ser utilizado no novo serviço de radioterapia, requer que este douto Juizo se digne em fixar prazo para que seja efetivado o mencionado repasse aos cofres do Hospital de Cirurgia. Requer, outrossim, que este Juízo determine que o Estado de Sergipe apresente nos autos justificativa formal que ateste a impossibilidade de aportar na rede pública o equipamento que o hospital busca adquirir, bem como a imprescindibilidade da aquisição do acelerador linear para a manutenção incólume da rede hospitalar sergipana. Pede deferimento”. (f. 1021) “Quanto ao pleito do Hospital de Cirurgia para fixação de prazo para que o Estado de Sergipe efetue o repasse dos recursos já mencionados, entendo que, por não se ter tratado de determinação judicial, mas de ato voluntário do ente federativo, a este Juízo não cabe dizer quando esse repasse deve ser efetuado. Desse modo, indefiro o pedido, advertindo ao Estado de Sergipe que este Juízo deve ser comunicado imediatamente assim que os valores forem colocados à disposição do referido Hospital” (decisão de f. f. 1084/1088).

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Na petição de f. 2137/2140, o Cirurgia afirmou que o Estado de Sergipe se comprometeu em audiência a firmar um convênio para conclusão das obras do novo serviço de radioterapia, sendo assim é necessário o repasse de R$ 1.866.975,11 (um milhão oitocentos e setenta e cinco mil e onze centavos). Ao final, requereu:

“Assim sendo, diante de tais considerações bem como mandamentos judiciais requer que seja determinado que a Secretaria de Estado de Saúde promovam o repasse dos valores apurados, que chegam à exata soma de R$ 1.866.975,11 (um milhão oitocentos e setenta e cinco mil e onze centavos), a fim de que se dê cumprimento aos objetivos outrora traçados na Ação de Civil Pública, tal qual, o atendimento aos pacientes que necessitam de tratamento oncológico da forma mais ampla possível”

Na audiência do dia 28.07.201036 (f. 2217/2220), o Hospital de Cirurgia reiterou que protocolou ofício na Secretaria de Saúde visando a celebração de convênio (f. 2293//2295 e 2296/2298):

“Quanto á reforma do Hospital de Cirurgia, foi protocolizado no Estado de Sergipe pedido de providências para a formalização de convênio para disponibilização dos recursos oferecidos pelo Estado de Sergipe” (f. 2218-v)

Em petição de f. 2137/2140, acompanhada de documentos (f. 2141/2143), o Hospital Cirurgia aduziu que: 1) o serviço de radioterapia está pronto somente para pacientes que necessitem atendimento “2D”, uma vez que o tratamento de pacientes “3D” é necessário instalar o tomógrafo, o que ainda não ocorreu (f.2137-2146); 2) o Estado de Sergipe se comprometeu em audiência a firmar um convênio para conclusão das obras do novo serviço de radioterapia, sendo assim é necessário o repasse de R$ 1.866.975,11 (um milhão oitocentos e setenta e cinco mil e onze centavos).

No despacho de f. 2190 determinei “que o Estado de Sergipe deveria informar quais medidas já foram adotadas para a celebração de convênio para o repasse dos R$ 2.000.000,00 faltantes para a conclusão da nova ala para o serviço de tratamento radioterápico e a previsão para o efetivo repasse do valor mencionado”, sem que o mesmo desse alguma resposta.

Quanto à aquisição do acelerador linear, mediante convênio com a União, o Hospital Cirurgia não obteve êxito, conforme cronologia abaixo:

Página Conteúdo 578/579 Email sobre a Proposta de Convênio nº 1332388/2009 informando que é desfavorável

sob o fundamento de que: “o Serviço de Radioterapia do Hospital de Cirurgia foi fechado por intervenção da ANVISA/MS e da CNEN, dada as instalações inapropriadas e funcionamento em condições precárias, em termos de segurança radiológica (nuclear)”.

959/967 A União informou que: 1) a proposta de Convênio nº 132388/2009, apresentada pelo Hospital Cirurgia foi rejeitada, não sendo possível a sua readequação; 2) por se tratar de trâmite eletrônico, não houve a formação de autos físicos, pelo que é impossível a sua juntada aos autos; 3) a proposta foi apresentada no dia 23.12.2009, às vésperas do final do exercício financeiro; 4) a rejeição é relativa ao exercício de 2009, nada impedindo que seja apresentada nova proposta.

1020 Audiência do dia 24.02.2010.

36 Não obstante constar a data de 04.05.2010, a referida audiência foi realizada em 28.07.2010 (Vide despacho de f. 2201)

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Pelo Advogado da União foi esclarecido que é necessário que o Cirurgia deve apresentar nova proposta de convênio, já que a anteriormente apresentada não foi aprovada, em razão disso não é possível a juntada do procedimento administrativo relativo a esse convênio. Requer a designação de assentada para discutir proposta para a instalação de nova unidade de radioterapia.

1387/1412 O Hospital Cirurgia reapresentou a proposta de Convênio em 24.03.2010 2217/2220 Audiência do dia 28.07.2010

Hospital de Cirurgia foi dito que: “É necessário que o Hospital de Cirurgia comprove que teve o novo serviço aprovado pela comissão bipartite para que seja aprovada a compra do novo aparelho de radioterapia” (f. 2218-v). Para tanto juntou documento de f. 2234. Ao final da audiência, designei nova audiência para o dia para saber o posicionamento do Estado de Sergipe e do Município de Aracaju quanto a instalação do novo serviço de radioterapia no Hospital Cirurgia e a posição dos dois entes

2234 Parecer favorável quanto a aquisição da Ressonância Magnética e diligência quanto ao mérito relativo ao Acelerador Linear para o Hospital Cirurgia. Consta no documento que o proponente deve anexar “a Deliberação ou Resolução da Comissão Intergestores Bipartite do Estado de Sergipe (CIB/SE) no qual aprova a instalação deste serviço, bem como sua prévia aprovação na rede de oncologia deste Estado” (f. 2234)

2471/2474 Audiência do dia 25.08.2010 O Município e o Estado de Sergipe não chegaram a um consenso acerca da instalação do novo serviço de radioterapia. O Município de Aracaju informou que foi formada uma comissão.

“houve uma reunião entre os representantes do Estado e Município, onde foi pactuada a formação de uma comissão para decidir a questão do recebimento do aparelho linear. Que foi pedida uma avaliação técnica tanto do Hospital de Cirurgia quanto do HUSE. Que mesmo havendo uma emenda parlamentar destinada ao Hospital de Cirurgia, trata-se de um hospital privado. Que encaminhou dois técnicos do município, que está aguardando dois técnicos do Estado para agendar as visitas aos hospitais. Havendo parecer técnico positivo, o Município não se opõe. Que o financiamento vai ter que ser discutido, pois não há verba para esse fim”.

O Estado de Sergipe defendeu que a melhor solução no momento é a instalação no Hospital Cirurgia porque seria necessário construir no HUSE uma casa mata e isto impactaria os demais serviços. que recebeu um telefonema do ministério da saúde, solicitando que

houvesse um posicionamento para definir o local onde seria instalado o novo acelerador linear. Que essa decisão deve se conformar dentro do pacto sanitário firmado entre os entes. O colegiado tem o suporte de uma câmara técnica onde se discutiu o assunto. A câmara montou a comissão para a avaliação técnica dos hospitais. O Estado de Sergipe tem uma posição em relação a esse encaminhamento, e vai se empenhar para convencer a câmara técnica de que o melhor luar para se instalar o acelerador linear é o Hospital de Cirurgia, porque já tem uma casa mata, faltando apenas finalizar a obra. O HUSE não tem condições de receber o aparelho, pois seria necessária a construção de uma nova casa-mata. Que existe ainda uma limitação quanto a capacidade instalada em razão da necessidade de ampliação dos leitos, de salas cirúrgicas. Além disso, não é compatível com o perfil do HUSE, que é de urgências e emergências de forma geral, politraumatismo. Que será discutido com a câmara técnica esse encaminhamento. Que já houve a indicação dos técnicos do Estado para a avaliação dos hospitais. Que a comissão será composta pelos coordenadores da vigilância sanitária do estado e do município, pelo coordenador estadual da assistência hospitalar e um auditor do município. Essa comissão terá ate a

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próxima semana para fazer as avaliações, quando será realizada uma reunião extraordinária para que seja tomada essa decisão. Que até a primeira semana de setembro essa decisão será tomada e será encaminhada para o Ministério da Saúde que adotará as providências necessárias. Que não há previsão orçamentária e financeira para esse ano, o que o Estado está viabilizando o empenho para assegurar o acelerador linear no Hospital de Cirurgia, bem assim habilitar o serviço o mais rápido possível, para que com os recursos federais se discuta a repartição dos custos. Que o Estado tem intenção de instalar um hospital do câncer. Que já existe um projeto, que foi apresentado no INCA e será objeto de audiência, com a finalidade de viabilizar a captação de recursos para esse hospital. Que o INCA fomenta o financiamento de institutos regionais, dentro de uma visão nacional. Que a viabilização desse projeto depende de uma agenda mais complexa, não se tratando de projeto a curto prazo.

2512/2513 Deliberação ad referedum n.º 78/2010 autorizando a instalação de mais um acelerador linear no Hospital Cirurgia

2606-2610 Na f. 2606/2607, o Hospital Cirurgia requereu a intimação da União para dar celeridade na conclusão do processo de liberação do acelerador linear e informar quais as pendências eventualmente existentes para tanto. Juntou cópia do parecer (f. 2608/2610) favorável quanto à aquisição da Ressonância Magnética e quanto ao Acelerador Linear para o Hospital de Cirurgia. Consta, ainda, que “este projeto deverá ser submetido à análise Técnica –econômica a ser emitida pela Coordenação Geral de Investimentos em Saúde – CGIS, que emitirá parecer quanto ao custo e especificações técnicas apresentas conforme normas de cooperação técnica e financeira por meio de convênio, onde os valores discriminados no detalhamento do projeto serão analisados frente aos valores de mercado da região de inserção da unidade requerente, podendo ocorrer ajuste” (f. 2610)

2813/2838 Em petição de f. 2813/2815, o Hospital de Cirurgia informou que os recursos disponibilizados pela emenda parlamentar de autoria do Senador Almeida Liminar estariam prestes a ser devolvidos à União, uma vez que até a presente data não há manifestação do Ministério da Saúde quanto ao mencionado convênio, e em consequência não há empenho para a referida verba. Requereu que os recursos da emenda parlamentar sejam mantidos à disposição do Hospital, enquanto não apreciada a proposta de convênio. Juntou documentos, dentre eles, fotos de uma construção inacabada (f. 2819/2820), autorização do CNDN para a construção de um Acelerador Linear Varian 6 MV e 15 MV, plantas de imóvel (2834/2838)9

2839/2842 Decisão determinou que a União se abstivesse de devolver ao erário os recursos oriundos de emenda parlamentar não empenhada relativos à proposta de convênio nº. 132.388/09, tombado junto ao Ministério da Saúde com o nº 25000669818/2009-19, enquanto pender sua apreciação.

Quanto à 2ª solução, a União sugeriu uma visita do INCA nas unidades públicas de saúde com vista à possível doação de um acelerador linear e requereu a designação de uma audiência (f. 1021/1022), o que foi deferido por este Juízo.

Na audiência realizada no dia 24.03.2010 (f. 1303-1323), o INCA informou que fez a inspeção nos Hospitais Públicos (HUSE e Universitário) com objetivo de doar um acelerador linear. O INCA afirmou, em relação ao HUSE, que: 1) tem boa estrutura para tratamento radioterápico, mas é um hospital de urgência que se encontra sobrecarregado; 2) existem irregularidades em outros setores da oncologia do HUSE e a regularização de tais desconformidades seria condição para a doação do aparelho.

Em visita ao HUSE foi constatado que o mesmo tem boa estrutura para tratamento radioterápico. Contudo esse hospital é de urgência, havendo alguns obstáculos para o

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atendimento de pacientes com câncer, uma vez que é dada prioridade aos pacientes de emergência. Outro aparelho de radioterapia nesse hospital poderia trazer mais pacientes o que somente agravaria a situação do funcionamento do hospital. Quanto à oncologia clínica, a quimioterapia que é complementar no tratamento do câncer necessita ser reestrutarada existindo uma série de inadequações às regras atuais. É necessária a resolução dessas obstáculos para se candidatar ao recebimento de um novo aparelho. Todo o processo para a instalação de um novo aparelho é complexo e demanda um maior tempo. Nesse sentido, o Hospital não apresenta o perfil adequado para a instalação de um novo serviço de radioterapia. É importante destacar que é necessário um tempo para adequar o hospital para receber esse serviço. (1305) Pelo Sr. Antônio foi esclarecido que o INCA exige contrapartidas para a doação do aparelho. As principais seriam que o serviço seja prestado de acordo com as normas técnicas, isso inclui o serviço de oncologia clinica. E as outras são relativas ao planejamento da rede de atenção oncológica, ou seja, diagnóstico, detectação precoce e tratamento do câncer. O INCA não exige que a casa-mata esteja pronto, pois é feito um termo em que se exige que esse projeto para a construção dessa casa-mata esteja pronto. (f. 1307)

Quanto ao projeto do Hospital Universitário, o INCA disse: “Foi indicado um prédio de 04 andares, sendo uma área adequada. Contudo, o projeto necessita de diversas adequações, especificamente quanto à existência de uma área de manipulação de quimioterápicos. Essa adequação é perfeitamente viável. Esse projeto é relativo à oncologia clínica. O projeto para o serviço de radioterapia ainda não existe” (f. 1307/1308)

Não vistoriou o Hospital Cirurgia porque “o INCA prioriza a atuação dentro do sistema público de saúde. Somente não existindo entidades aptas a receber os serviços de oncologia é que, excepcionalmente, o INCA realiza parcerias com entidades filantrópicas” (f. 1306).

O Estado de Sergipe se manifestou contrário à instalação do acelerador linear no HUSE porque o hospital já se encontra bastante sobrecarregado. A solução a médio prazo seria a construção de um Hospital Especializado e, enquanto isso, “o Estado se comprometeria em fazer as adequações necessárias, mantendo os três turnos de funcionamento e as anotações dos tratamentos para encaminhar informações ao Ministério da Saúde” (f. 1308) e “O Estado manteria ainda o encaminhamento para tratamento fora do domicilio” (1309).

Diante desse quadro, tem-se o seguinte:

1) a União, com o auxílio do INCA, diz que possui um aparelho, mas condiciona a sua a doação, desde que seja um Hospital Público, e melhoria nos demais setores.

2) o Hospital Cirurgia que acompanha este processo como um terceiro interessado está disposto a ampliar a estrutura do serviço, possui uma estrutura inacabada, mas depende de recursos financeiros dos réus para inaugurar um novo serviço.

3) o Estado de Sergipe não quer que mais uma radioterapia seja instalada no HUSE porque as instalações já se encontram sobrecarregadas em razão de se tratar de um Hospital de Urgência/Emergência.

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4) HUSE se mantém numa posição dúbia: não diz nem que quer receber o novo serviço, nem que não quer.

5) o Município diz que, como gestor pleno, somente tem a obrigação de contratar os serviços já existentes.

Sendo assim, quanto a questão principal posta em discussão nos autos e a única afeta ao âmbito das atribuições do Município,, qual seja a reformulação dos serviços de oncologia do Estado de Sergipe, com a instalação de novas unidades e/ou centros de assistência de alta complexidade assim como a regularização dos serviços já existentes no Hospital de Cirurgia e no Hospital de Urgência de Sergipe - HUSE, há que se consignar que o próprio autor da demanda, ao delimitar as responsabilidades no âmbito do serviço de alta complexidade em oncologia, reconheceu que o ente responsável pela instalação de outras unidades de tratamento oncológico (UNACON ou CACON) é o ESTADO DE SERGIPE com suporte financeiro da UNIÃO, sendo de competência do Município apenas o processo de regulação dos serviços quando já estejam em funcionamento, o que se dará através da contratação dos prestadores de serviços e ordenação do atendimento (f. 2803)

Na audiência realizada no dia 24.03.2010, a então Secretária Estadual de Saúde afirmou a intenção do Estado de futuramente construir um Hospital do Câncer:

“Além disso, seria necessária a construção de um novo espaço para a implantação de um serviço de radioterapia, o que acarretaria para o Estado despesas com licitação e com a construção. O estado também encaminhou um projeto que visa a construção do Hospital do Câncer, que já possui projeto arquitetônico. Foram visitados vários centros de tratamento de câncer, o Hospital de Jau/SP e o Sírio Libanês/SP. A proposta inicial é que a construção desse hospital seja feita através de uma parceria público-privada. Semana passada o Ministério foi visitado para a busca de uma solução. (...)Que a médio prazo se dispõe a discutir com o INCA e todos os órgãos envolvidos para buscar a melhor solução para a construção de um novo serviço de radioterapia no Estado. O Estado está aberto à discussão da construção de um Hospital do câncer, mas enquanto isso é necessário o funcionamento do aparelho existente no Hospital do Cirurgia, com as adequações pertinentes.”(f. 1308/1310)

Embora a demanda esteja tramitando em juízo, os réus jamais informaram nos autos ter praticado quaisquer atos no sentindo de efetivamente construir um Hospital do Câncer em Sergipe, tendo este juízo tomado conhecimento, somente através da imprensa, de que foi apresentada uma emenda parlamentar para construção do referido nosocômio.

Pois bem.

Considero que já se passou tempo mais do que razoável para que os entes apresentassem uma solução razoável para o problema. A presente demanda foi proposta em novembro de 2009.

A decisão de f. 462-483 que concedeu prazo ao Estado de Sergipe e Município de Aracaju foi proferida em 17.12.2009 e o fato é que, passados dois anos do ajuizamento da presente demanda, ainda continuamos com 2 UNACON’s, quando a demanda seria de, no mínimo, 3 (três).

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A União insiste em afirmar que sua obrigação se restringe a financiar o serviço, olvidando que é também sua função fiscalizar sua execução, ajuizando as medidas judiciais cabíveis quando o mesmo não funcionar de foram devida, o que no caso em tela nunca foi feito. Ocorre que nunca demonstrou preocupação em deslocar seus recursos para outros locais, seja criando um hospital federal, ou seja, adequando um já existente, a exemplo do Hospital Universitário, onde os pacientes oncológicos poderiam ser atendidos, ao invés de continuar sustentando um sistema que não funciona como deveria.

O Estado e o Município, por seu turno, não demonstram qualquer esforço no sentido de criar a estrutura necessária, talvez com medo de que os recursos que lhe são repassados pela União não sejam suficientes para a manutenção do serviço, o que faria com que tais entes ocupassem grande parte dos seus próprios orçamentos com a manutenção do sistema de saúde. Ocorre que este tipo de gasto público não lhes interessa, uma vez que não garante bons resultados nas eleições, ao contrário da construção de praças, pontes, viadutos, ou a realização de grandes festas e shows em espaços públicos.

De fato, a construção de hospitais e postos de saúde, além de demandar gastos com a criação da sua estrutura, constituem um gasto permanente, com alto custo para sua manutenção. Contudo, tal fato não constitui, em favor dos entes públicos, desculpa para não agir. Se não há recursos suficientes para tudo que se deseja fazer, deve-se primar pelos bens de primeira grandeza, cortando-se os gastos com a realização de festas, propagandas institucionais etc. Ora, a saúde é problema de todos, e assim sendo, é dever de todos envidar os esforços necessários a garantir este. E a responsabilidade, frise-se, é sim de todos os entes: União, Estado e Município.

Destaco que, conforme previsão constitucional, cabe ao Poder Público oferecer o atendimento em saúde a toda população. A participação do setor privado deve ocorrer em caráter complementar e não supletiva, de modo que o Estado não pode demitir-se do seu encargo quando se trata de saúde.

Destaco que por diversas vezes durante o feito, destaquei a responsabilidade do Estado em oferecer o TFD a todos os pacientes em lista de espera. Contudo, tal responsabilidade não exime os demais entes de sua obrigação principal, qual seja, adequar o serviço de radioterapia do Estado, para que os pacientes não tenham que buscar em outros locais o atendimento que não lhes é disponibilizado em seu Estado. Os pacientes têm direito de receber o tratamento próximo à família, tendo em vista o grande impacto que uma doença como o câncer causa em suas vidas, seja física ou psicologicamente. Em tais casos, tão importante quanto receber o tratamento médico adequado, é poder contar com o apoio da família e dos amigos para vencer essa batalha, o que somente é possível caso o tratamento seja oferecido no domicílio do paciente ou em local o mais próximo possível.

Sendo assim, permanece hígido o pleito autoral no sentido de que os entes políticos adequem o serviço de radioterapia às diretrizes mínimas preconizadas pelas Portarias nº. 3.535/GM e nº 741/2009, observando a proporcionalidade, e ampliando a rede de atendimento radioterápico toda vez que a demanda de pacientes com câncer que necessitam deste tipo de tratamento assim exigir.

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Considerando os termos das Portarias nºs 2439/GM, 08 de dezembro de 2005 e 741/SAS, de 19 de dezembro de 2005 e os dados do INCA já referidos, faz-se necessária a instalação de, no mínimo, mais 1 (um) serviços de radioterapia, na rede pública de saúde, a fim de atender ao preconizado pelo INCA, possibilitando assim a cobertura integral da demanda em radioterapia através do SUS, sem prejuízo da manutenção do serviço que já existe e ampliação da rede de atendimento, sempre que houver aumento do número de novos casos de câncer. Observe que, em caso de revogação das citadas portarias, ficam mantidas as determinações constantes desta sentença.

Digo, no mínimo, porque o estudo do INCA esquece que a demanda por tratamento não respeita os limites territoriais dos Estados, como por exemplo, o caso de pacientes dos interiores da Bahia e de Alagoas que vêm se tratar em Sergipe por estarem mais próximos deste Estado do que de suas respectivas capitais. Tais dados não podem ser ignorados no momento de elaboração das políticas públicas no tratamento da doença, uma vez que o SUS possui vocação universal e o paciente do SUS não pode ser discriminado e/ou privilegiado quanto a sua origem. Parece ser esta a situação do Estado de Sergipe:

“que existe uma estimativa de 3600 novos casos de câncer no Estado; que além de Sergipe, atendem pessoas de outros Estados (30%), o que totalizam cerca de 4000 novo casos; destes, de 50% a 60% necessitam de radioterapia; que um aparelho de radioterapia é estimado para tratar 600 pacientes/ano” (f. 569)

Assim, em verdade, deve se tomar como parâmetro para fixar a necessidade de aparelhos de radioterapia o número de casos de câncer tratados no Estado, independentemente do domicílio do paciente.

O tema das políticas públicas transporta o julgador para os limites da atuação jurisdicional. Os problemas aqui trazidos possuem implicações jurídicas e também políticas, devendo o magistrado observá-las no momento de decidir a controvérsia. Isto porque, a Poder Judiciário não é legitimado para tomar decisões exclusivamente políticas, cabendo aos representantes eleitos democraticamente, tomarem esta decisão. Contudo, o magistrado pode conformar a questão política, quando implicar numa questão jurídica. Pode apontar o fim a ser perseguido, ficando os meios necessários para o seu atingimento a cargo da classe política. Excepcionalmente, o magistrado pode afastar determinadas soluções e apontar os meios necessários, reduzindo a discricionariedade a zero quando estiver convencido de que não existe outra solução.

Neste passo, já consignei que “o juiz deve agir em colaboração com as partes, visando alcançar a melhor solução. A solução deve ser buscada, ao máximo, mediante consenso, somente devendo decidir após a ouvida das partes e identificada a divergência e também respeitados os parâmetros constitucionais. Um desses parâmetros que deve ser observado é a discricionariedade de meios dos entes da administração pública na escolha da solução, contudo essa discricionariedade não se converte em arbítrio (liberdade) para optar entre agir e não agir, quando os gestores públicos editaram políticas públicas sobre a matéria”. (f. 567/572). Infelizmente, os réus não chegaram a um consenso, obrigando este Juízo a definir qual é a solução.

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Visando acabar com as filas de espera, existem 4 soluções: 1) a ampliação dos turnos de equipamentos utilizados na radioterapia; 2) a ampliação do TFD; 3) construção de um Hospital Especializado; 4) a ampliação de um hospital existente; sendo que esta subdivide-se em duas: 4.1) instalação mais um serviço de radioterapia no Cirurgia; 4.2) instalação mais um serviço de radioterapia no HUSE.

A alternativa 1 deve ser prontamente descartada.

Na audiência do dia 24.03.2010 (f. 1305/1321), o representante do INCA afirmou que o funcionamento de 2 máquinas em três turnos poderia levar a diminuição da fila de espera.

“Que os encaminhamentos a serem dados são o retorno do funcionamento do serviço dos hospital de cirurgia e o funcionamento do aparelho no HUSE. Em cada 1000 novos casos 600 necessitam de tratamento com radioterapia. Assim o estado necessita de três aparelhos funcionando. A curtíssimo prazo seria possível com um funcionamento em três turnos dos dois hospitais a diminuição da lista de espera.” (f. 1305)

Além do HUSE já estar funcionando em três turnos, o Hospital de Cirurgia informou que a abertura do terceiro turno de atendimento de pacientes na ala de radioterapia do Hospital estava em fase final de autorização, pendente de ulterior liberação do CNEN, conforme documentação que junta (f. 2795-2797).

Ora, o funcionamento dos aparelhos por três turnos não resolve o problema, mas somente o mascara (existência de fila) e prejudica a todos. A máquina tem um limite de utilização e o excedente provoca maiores quebras no equipamento, prejudicando os pacientes que estão em tratamento e os que estão na lista de espera.

Ressalte-se ainda que o aparelho do Hospital Cirurgia é antigo (de 1999), que ficou parado algum tempo (04/2009 a 07/2010), recomendando-se maior cautela quanto à sua utilização para não ultrapassar a capacidade de atendimento da própria máquina. Impõe-se limitar-se sua utilização para que não ocorram os mesmos problemas de paralisação do acelerador linear do HUSE (vide f. 510, 714, 796, 947, 2784/2786).

Embora o Hospital Cirurgia não seja réu, este juízo pode determinar ao Município que não contrate os serviços além da capacidade daquele nosocômio, conforme autorização inicialmente concedida pelo CNEN. Assim, impende determinar que o Município contratualize com o Hospital Cirurgia nos limites de sua capacidade, por até dois turnos de trabalho.

Quando o Cirurgia estiver com toda a capacidade de atendimento será capaz de manter de 70 a 100 pacientes por dia em tratamentos que duram cerca de 20 a 30 dias. (Hospital Cirurgia - f. 2217- v.)

A alternativa 2 também não pode ser acolhida. O tratamento fora do domicílio -TFD nada mais é do que um programa para deslocar um paciente que não conseguiu tratamento no Estado de seu domicílio para outro Estado (Portaria SAS nº 55, de 24.02.1999 – f.1668/1671). Ressalte-se que o TFD somente cobre os custos com deslocamento, hospedagem e alimentação do paciente e de seu acompanhante, sendo

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que os gastos com o tratamento em si serão suportados pelo Município/Estado de destino.

Existe uma demora para o efetivo início do tratamento através do TFD, conforme se verifica na lista abaixo:

NOME DO PACIENTE DATA 1º

ATENDI-MENTO

DATA DE INICIO DO TRATAMENTO

LOCAL DO ATENDI- MENTO

TEMPO DE ESPERA (aproximado)

1 Maria Alice dos Santos Ramos 26/11/2009 Agendado para 22/03/2010 TFD Jaú/SP 4 meses2 Augusto Santos Arão 27/11/2009 Agendado para 30/03/2010 TFD Jaú/SP 4 meses3 José Batista da Silva 05/01/2010 Agendado para 22/03/2010 TFD Jaú/SP 3 meses4 Antônio dos Santos 31/11/2009 Agendado para 05/04/2010 TFD Jaú/SP 5 meses5 Dirce Maria dos Santos 14/12/2009 Agendado para 26/04/2010 TFD Jaú/SP 4 meses6 Francisco Xavier da Silva 05/03/2010 Agendado para 17/06/2002 TFD Jaú/SP 3 meses7 Epifania Cardoso Bispo 18/02/2010 Agendado para 05/04/2010 TFD Jaú/SP 2 meses8 Iraci de Azevedo Borba 19/02/2010 Agendado para 17/03/2010 TFD Rio de

Janeiro 1 mês

9 Josefa Feliz Alves dos Santos 08/03/2010 Agendado para 26/04/2010 TFD Jaú/SP 1 mês10 Luiz dos Santos Neto 02/03/2010 Agendado para 29/03/2010 TFD Jaú/SP 1 mês11 Miguel Bispo de Sales 09/02/2010 Agendado para 14/04/2010 TFD Jaú/SP 2 meses12 Maurina da Silva Andrade 12/02/2010 Agendado para 12/04/2010 TFD Jaú/SP 2 meses13 Maria Barbosa do Nascimento 09/11/2009 Agendado para 30/03/2010 TFD Jaú/SP 4 meses14 Maria Alice dos Santos Ramos 26/11/2009 Agendado para 22/03/2010 TFD Jaú/SP 4 meses15 Roberto Lopes de Alencar 05/04/2010 Agendado para 02/05/2010 TFD Rio de

Janeiro 1 mês

16 Josefa Delmira Santos 09/03/2010 Agendado para 10/05/2010 TFD Jaú/SP 2 meses17 Maria Jivalda da Silva 06/04/2010 Agendado para 11/05/2010 TFD Jaú/SP 1 mes18 Ernandes Santos Bispo 01/10/2009 Agendado para 11/05/2010 TFD Jaú/SP 7 meses19 Leia Vieira Dantas de Sá 06/04/2010 Agendado para 26/05/2010 TFD

Salvador 1 mês

20 Antônio Barreto de Souza 04/03/2010 Agendado para 24/05/2010 TFD Jaú/SP 3 meses21 Enilde Alves dos Santos 27/01/2010 Agendado para 24/05/2010 TFD Jaú/SP 4 meses22 Rubens Gonçalves Lima 08/04/2010 Agendado para 21/05/2010 TFD Jaú/SP 1 mês 23 Maria do Carmo Lima Silva 10/03/2010 Agendado para 14/05/2010 TFD Jaú/SP 2 meses 24 Alberto de Oliveira Pinto 03/03/2010 Agendado para 17/05/2010 TFD Jaú/SP 2 meses25 Maria Celma Conceição dos

Santos 30/03/2010 Agendado para 17/05/2010 TFD Jaú/SP 2 meses

26 Luiz Gustavo da Silva 08/03/2010 Agendado para 17/05/2010 TFD Jaú/SP 2 meses27 Genailde Antônio 09/04/2010 Agendado para 14/05/2010 TFD Jaú/SP 2 meses28 Raimundo Reis de Santana 12/04/2010 Agendado para 21/05/2010 TFD

Maceió/AL 2 meses

29 Ana Maria Souza Cruz 06/04/2010 Agendado para 31/05/2010 TFD Jaú/SP 2 meses30 Sebastião Santos Galiza 23/03/2010 Agendado para 24/05/2010 TFD São

Paulo/SP 2 meses

31 Vitalina Francisca Costa 01/03/2010 Agendado para 17/05/2010 TFD Maceió/AL

2 meses

32 Maria José F. dos Santos 08/02/2010 Agendado para 17/05/2010 TFD Maceió/AL

3 meses

33 José Luis dos Santos 16/03/2010 Agendado para 17/05/2010 TFD Maceió/AL

2 meses

34 José Feitosa Filho 07/04/2010 Agendado para 18/05/2010 TFD Maceió/AL

1 mês

35 Manoel Laurindo dos Santos 26/04/2010 Agendado para 18/05/2010 TFD Maceió/AL

1 mês

36 Maria Vieira de Jesus 14/01/2010 Agendado para 19/05/2010 TFD Maceió/AL

4 meses

Processos nº 0006464-60.2009.4.05.8500 e 0001610-86.2010.4.05.8500

70

37 Sizino Batista dos Santos 19/10/2009 Agendado para 21/05/2010 TFD Maceió/AL

7 meses

38 Ana Lucia Santana 25/01/2010 Agendado para 20/05/2010 TFD Maceió/AL

4 meses

39 Pedro Maximino de Santana 15/11/2009 Agendado para 25/05/2010 TFD Maceió/AL

6 meses

40 Selma Silva Santos 25/01/2010 Agendado para 18/05/2010 TFD Maceió/AL

4 meses

41 Tereza Leão dos Santos 15/04/2010 Agendado para 20/05/2010 TFD Maceió/AL

1 mes

42 João Ulisses de Queiroz 10/03/2010 Agendado para 21/05/2010 TFD Maceió/AL

2 meses

43 Uilson Francisco Ramos 09/03/2010 Agendado para 27/05/2010 TFD Jaú/SP 3 meses44 Martinho da Silva Fontes 05/04/2010 Agendado para 17/06/2010 TFD Jaú/SP 2 meses45 Arivaldo Araújo Figueiredo

Junior 31/03/2010 Agendado para 21/06/2010 TFD Jaú/SP 3 meses

46 José Valdoni Gomes 19/04/2010 Agendado para 28/06/2010 TFD Jaú/SP 2 meses47 Joselita Olinda dos Santos 18/01/2010 Agendado para 01/06/2010 TFD Jaú/SP 5 meses48 Antônio Alves dos Santos 16/03/2010 Agendado para 28/06/2010 TFD Jaú/SP 3 meses49 Carlos de Oliveira Santos 23/03/2010 Agendado para 01/06/2010 TFD

Maceió/AL 2 meses

50 Geni Rodrigues Lima 02/02/2010 Agendado para 18/06/2010 TFD Maceió/AL

4 meses

Conforme já afirmado, o câncer hoje é considerado uma doença altamente curável quando descoberta no estágio inicial. Em estágios mais avançados os índices de cura são mais baixos ou até mesmo o tratamento é só paliativo.

Outro ponto negativo em relação à utilização do TFD é burocracia que envolve tal procedimento. Conforme visto alhures, não obstante o deferimento da antecipação dos efeitos da tutela em 17/12/2009, o Estado de Sergipe somente conseguiu começar a encaminhar os pacientes para o Hospital de Jau/SP e Hospital de Itabuna/BA, nos moldes determinados na decisão judicial, em 22/03/2010. Já o convênio com a UFAL somente foi celebrado em 05/04/2010, sendo que só a partir desta data os pacientes puderam ser encaminhados ao Hospital da UFAL. Ora, mesmo havendo decisão judicial, os trâmites burocráticos fizeram com que a decisão só começasse a ser cumprida mais de três meses depois de ser proferida, o que demonstra a ineficiência do sistema de TFD.

A propósito, cito trecho de manifestação da Secretaria Municipal de Saúde de Aracaju (1183/1184):

“Assim, o TFD consiste em uma ajuda de custo ao paciente , e em alguns casos, também ao acompanhante, encaminhados por ordem médica à unidade de saúde de outro município ou Estado da federação, quando esgotados todos os meios de tratamento na localidade de residência do mesmo, desde que haja possibilidade de cura total ou parcial, limitado no período estritamente necessário a este tratamento e aos recursos orçamentários existentes. A sua autorização depende de alguns fatores, entre eles quando estiver garantido o atendimento no município de destino, através do aprazamento pela Central de marcação de Consultas e Exames especializados e/ou pela Central de Disponibilidade de Leitos. É sabido que o procedimento de radioterapia é escasso em todo território nacional (demanda maior que a oferta).”

Processos nº 0006464-60.2009.4.05.8500 e 0001610-86.2010.4.05.8500

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A maior prova de que o TFD não funciona é que as listas de espera somente aumentaram (vide página 52 da presente sentença), seja pela carência de vagas em outros Estados, seja porque impacta o teto de outros Estados/Municípios que já tem problema com os seus pacientes, seja pela os custos, seja pela recusa do paciente.

O TFD é um paliativo para situações extraordinárias, tal como ocorreu com a desativação da radioterapia do Hospital Cirurgia. Embora seja importante, não pode se tornar uma coisa permanente porque equivaleria a empurrar o problema com a barriga para outro Estado. Haveria outro aspecto: as pessoas não somente tem o direito a saúde, mas o de se tratado próximo a sua residência. Do contrário, o Estado poderia dar a desculpa de não ampliar a sua rede e, em contrapartida, oferecer o TFD para os pacientes acometidos por esta doença, o que é óbvio não atende o desiderato da lei.

Em relação à opção 3, de fato, a melhor alternativa é um hospital especializado para o tratamento do câncer ante as múltiplas possibilidades desta doença, mais precisamente um CACON, e não que esta doença faça parte de um setor especializado de um nosocômio já existente.

Conforme informações colhidas da imprensa37, existe uma proposta de convênio protocolada em 21/09/2011 para construção do Hospital do Câncer, com data de início das obras da primeira etapa para 01/11/2011 e data de término em 31/10/2012.

Ora, a proposta sequer foi aprovada, e ainda que o seja, dificilmente este hospital estará funcionando no próximo ano (2012) para atender toda a demanda. Basta pensar na reabertura do antigo serviço do Hospital de Cirurgia, que envolveu somente o conserto do equipamento e a reforma das instalações.

Conforme cronograma de f. 573/574, havia uma previsão de 03 (três) meses para o retorno do antigo serviço de radioterapia, fechado desde abril de 2009, contudo o mesmo somente foi reaberto em julho de 2010. No decorrer das reformas, surgiram uma série de questões, tais como reforma da rede elétrica, demora da empreiteira e nada indica que será diferente em relação à construção de um hospital novo.

Isto porque, como é do conhecimento de todos, a atuação administrativa demanda uma série de atos materiais para concretizar as políticas públicas, sejam as preconizadas constitucionalmente, sejam as previstas em seus planos de governo, tais como, autorização orçamentária, realização de licitações, concursos públicos para contratação de pessoal, compra de materiais etc. Neste passo, a construção de um hospital novo é mais complexa e demanda mais tempo porque muitas vezes é necessário partir do zero.

A melhor solução seria um hospital especializado, mas continua um sonho distante para uma realidade premente. Por sua vez, a necessidade de instalação de mais de um serviço de radioterapia é urgente, considerando que não vai atender somente a população do Estado Sergipe, mas todo um contingente que vem do interior da Bahia e de Alagoas buscar os serviços neste Estado. Não obstante isso, não é possível esperar o

37 http://www.nenoticias.com.br/lery.php?var=1322597897 .Acesso em 15.12.2011. No referido endereço eletrônico, consta cópia da proposta de convênio extraída do SICONV.

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concerto políticos dos três entes porque, durante o período, as pessoas ficariam desguarnecidas do seu direito mais elementar.

Conforme já exposto nas f. 67 e ss., restam duas alternativas: 1) investir no Cirurgia, hospital filantrópico, que já tem uma estrutura pré-acabada; 2) ampliar a ala de radioterapia do Hospital de Urgência de Sergipe.

Nenhuma das alternativas é perfeita, cabendo apontar as vantagens e desvantagens de cada um delas.

O Hospital de Urgências de Sergipe – HUSE constitui um hospital de urgência/emergência que também trata pacientes com câncer, possuindo serviço de radioterapia. De acordo com a avaliação do INCA, do ponto de vista radioterápico, tem condições de receber mais um serviço de radioterapia.

“Em visita ao HUSE foi constatado que o mesmo tem boa estrutura para tratamento radioterápico. Contudo esse hospital é de urgência, havendo alguns obstáculos para o atendimento de pacientes com câncer, uma vez que é dada prioridade aos pacientes de emergência. Outro aparelho de radioterapia nesse hospital poderia trazer mais pacientes o que somente agravaria a situação do funcionamento do hospital. (...) O HUSE tem condições físicas de receber um aparelho de radioterapia, mas isso causaria um impacto nos outros serviços relativos ao tratamento do câncer”.

Tal circunstância é confirmada pelo médico radioterapeuta, Dr. Willian Soares: Audiência do dia 24.03.2010: “para instalação do aparelho de acelerador linear no HUSE no local da radioterapia, tem uma planta inicial do HUSE, elaborada em março/98. Todos os serviços que têm dois aparelhos fiquem um do lado do outro, para se ter rapidez e economia. Serviço de radioterapia é constituído de: a) aparelho de radioterapia - acelerador linear; b) braquiterapia; c) tomógrafo, d) sistema de planejamento.; uma sala para confecção de blocos, mascaras e moldes; além disso, serviços agregados, psicologia, fisioterapia, nutrição, assistente social, enfermagem, odontologia e os especialistas que irão trabalhar os radioterapeutas, físicos e técnicos. Isso essa estrutura já existe no HUSE e funcionando. Temos 5 radioterapeutas (4 estatutários e um contratado); 4 físicos e 9 técnicos; reputa esse pessoal que está hoje trabalhando no João Alves, capaz, e estão ociosos porque só tem um aparelho em funcionamento; pelo volume de pacientes é necessário a instalação de mais um aparelho de radioterapia; a OMS reputa que grande parte da população necessitará do serviço de radioterapia e nesse ano está previsto uma estimativa de 3100 casos novos, sem considerar os municípios vizinhos. Necessidade de mais um aparelho no estado. Reputa como melhor local no HUSE 4 a 5 meses para instalação do aparelho no HUSE. Depende da intensidade do aparelho e o local onde vai ser colocado para ser utilizado mais rápido. O HUSE necessita para melhorar o atendimento de oncologia: a)01 aparelho de radioterapia, b) colocar o serviço de braquiterapia para funcionar (não é possível a cura de pacientes com câncer de colo uterino sem a associação da teleterapia com a braquiterapia); c) não basta trazer a fonte radioativa, é necessário colocar um novo aparelho de raio X e repreparar toda a equipe técnica; d) construção de no mínimo duas salas de cirurgia oncologica. Hoje funcionam 06 salas de cirurgia no HUSE, mas os médicos não conseguem fazer cirurgias eletivas. (...) Que o valor para a construção do bunker depende da potência do aparelho. Em média se gasta de US$ 200 a 300 mil.

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Conforme explicação acima, o aparelho poderia ser construído ao lado do atual acelerador linear, aproveitando uma das paredes existentes. Existem profissionais em número suficiente para operar mais um serviço de radioterapia. A construção de um bunker (casa-mata) no HUSE demoraria entre 04 a 06 meses, sem contar com o processo licitatório, porque não seria necessária a construção dos demais setores, já que já existe toda a estrutura para o serviço de radioterapia em funcionamento. Outra vantagem é que se trata de um hospital público, sendo o destino preferencial para o investimento das verbas dos SUS.

A desvantagem é que, como se cuida de um hospital de Urgência/Emergência, já se encontra sobrecarregado e não consegue fazer cirurgia eletiva por questão de sala (isto aqui deverá ser objeto de uma demanda própria). Não obstante a vocação do HUSE, o certo é que o Estado de Sergipe tem procurado ampliar a sua rede de hospitais no interior com vistas a desafogar o HUSE. Além disso, seria necessário elaborar um projeto para a construção da casa mata e submetê-lo a aprovação do CNEN.

Outra questão é que o Estado de Sergipe, por mais de uma vez, manifestou-se contrariamente à criação de um novo serviço de radioterapia no HUSE, ao passo que a Fundação Hospitalar se manteve em silêncio acerca de sua posição.

Já o Hospital Cirurgia constitui um hospital filantrópico que atua no SUS.

Já possui uma estrutura inacabada para receber o novo acelerador linear (f. 2819), que necessita ser concluída, bem como uma autorização do CNEN para a construção e operação de um acelerador linear no referido local (f. 2821/2822). Dito de outra forma, já possui um projeto pronto, faltando executá-lo.

A desvantagem é de que se criaria uma dependência maior do terceiro setor, já que o nosocômio constitui uma pessoa jurídica de direito privado (hospital filantrópico), que já presta a maior parte do serviço de radioterapia no Estado de Sergipe.

“Em Sergipe somente duas instituições recebem autorizações do SUS (APACs) para a realização de tratamento de radioterapia com acelerador nuclear: o Hospital de Cirurgia (privado-filantrópico) e o Hospital João Alves Filho (público). Os recursos do SUS no ano de 2008 para os tratamentos com radioterapia no Estado de Sergipe totalizaram R$ 1.773.528,50 dos quais R$ 1.461.627,74 (82,4%) foram repassados para o Hospital Cirurgia e R$ 3111.900,76 (17,6%) foram repassados para o Hospital João Alves Filho. O número elevado de APACs que foram encaminhadas para a iniciativa privada (893 APACs) em comparação com o número reduzido de APACs que foram encaminhadas para os serviços públicos (187 APACS) está em desacordo com a Lei 8.080/80 e PT/SAS/MS n.º 741/05 (art. 11 e Anexo II, 2.2). A Lei 8.080/90, no art. 4º, § 2º dispõe que: ‘iniciativa privada poderá participar do Sistema único de Saúde-SUS, em caráter complementar’ art. 199. A assistência à saúde é livre à iniciativa privada. Na mesma lei, no art. 24, impõe que: ‘Quando as suas disponibilidades forem insuficientes para garantir a cobertura assistencial à população de uma determinada área, o Sistema Único de Saúde –SUS poderá recorrer aos serviços ofertados pela iniciativa privada’. A Fundação Beneficente Hospital de Cirurgia – FBHC está cadastrada no CNES como hospital filantrópico. Portanto, segundo o artigo 25 da lei 8080/90 de forma complementar.... ‘as entidades filantrópicas e as sem fim lucrativos terão preferência para participar do Sistema Único de Saúde-SUS’, no âmbito dos procedimentos

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(primários e secundários) inerentes as APACs para o tratamento com radioterapia que são encaminhadas para a FBHC são realizados por empresa privada terceirizada” (f. 18/19 do Apenso I – dados anteriores a interdição)

Outro ponto divergente é que, caso venha a ser instalado um novo serviço no Hospital de Cirurgia, o Estado de Sergipe e o Município de Aracaju não se entendem sobre quem irá pagar por estes serviços, conforme audiência do dia 25.08.2010, de f. 2471/2474 (vide tabela constante na f. 62/63 da presente sentença).

Conforme já explanei na audiência do dia 19.01.2010, “Gostaria de consignar que trata-se de um processo especial, envolvendo o controle judicial de uma política pública da mais alta relevância, que é o direito à vida e a uma saúde digna. Neste passo, o juiz deve agir em colaboração com as partes, visando alcançar a melhor solução. A solução deve ser buscada, ao máximo, mediante consenso, somente devendo decidir após a ouvida das partes e identificada a divergência e também respeitados os parâmetros constitucionais. Um desses parâmetros que deve ser observado é a discricionariedade de meios dos entes da administração pública na escolha da solução, contudo essa discricionariedade não se converte em arbítrio (liberdade) para optar entre agir e não agir, quando os gestores públicos editaram políticas públicas sobre a matéria”.

Como se trata de um desenvolvimento de uma política pública e permanente, é de bom alvitre ouvir os gestores públicos antes de decidir aonde será implantado mais um serviço de radioterapia. Neste momento processual, este Juízo não possui dados suficientes para escolher entre o HUSE e o Cirurgia, já que a escolha primariamente deve recair sobre os atuais gestores. Em havendo omissão, caberá a este Juízo decidir a partir dos elementos fornecidos pela parte.

Sem prejuízo dos parâmetros fixados nesta sentença, em sede de execução provisória, será adotada uma solução, seja escolhida de comum acordo entre as partes ou determinada por este Juízo, a partir dos dados apresentados. O que não é mais possível é esperar enquanto o Hospital do Câncer não é construído.

Assim, desde que o Ministério Público Estadual e Federal promovam a execução provisória desta sentença, será designada uma audiência para colher a manifestação dos réus, em até 30 dias, sobre em qual local será instalado o novo serviço de radioterapia: se no HUSE ou no Hospital de Cirurgia.

Caso os réus não cheguem a um consenso, a solução de tal questão se transfere ao Poder Judiciário, ficando este juízo incumbido de escolher onde será instalado o novo serviço, a partir dos informes trazidos pelas partes na audiência a ser designada.

Isto porque o art. 461 do CPC assegura que o Juiz pode modificar a forma de cumprimento da obrigação de fazer a fim de assegurar “o resultado prático equivalente” ao do adimplemento. Neste passo, autoriza que o fato seja prestado por terceiro às expensas dos réus, independentemente e até mesmo contra a sua vontade. São esses os ensinamentos de Eduardo Talamini:

“Entre as providências destinadas à consecução do ‘resultado prático equivalente’, enquadram-se, por exemplo, a realização por terceiro de tarefa fungível que o réu se obrigara a fazer” 38;

38 Idem, p. 291

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“No mais das vezes, a atuação dos mecanismos sub-rogatórios implicará: a) a necessidade de escolha de terceiro, para desenvolver a atividade devida, no lugar do réu; b) significativas despesas, que deverão ser desde logo compostas. O exemplo mais claro, ainda que não o único, tem-se a realização por terceiro da tarefa a que o réu estava obrigado. A simples autorização para que se desenvolva a atividade sub-rogatória não basta. O terceiro encarregado de desenvolvê-la atuará como auxiliar do órgão jurisdicional, cabendo ao juiz escolhê-lo Além disso, o terceiro (especialmente quando particular, alheio à estrutura judiciária) só realizará a obra na medida em que seja pago. O custo de tal atuação deverá recair, em última instância sobre o réu” 39 “Ao lado da eficácia mandamental (tendente à “tutela específica”, na terminologia da lei), o provimento concessivo de tutela ex art. 461 contém eficácia executiva lato sensu: autoriza a tomada de providências destinadas à “obtenção do resultado prático equivalente”, independentemente do concurso da vontade do réu, no próprio processo em que se proferiu a decisão e através de medidas atípicas (§5º - v. itens 8.3 e 10.1) Em casos como esses, opera-se a substituição da conduta do demandado pela do próprio Estado, através de agentes seus – a fim de alcançar o mesmo resultado (ou o mais próximo) que se teria com o cumprimento voluntário. A sub-rogação é da via para a produção final – e não do bem jurídico almejado (v item 10.5). Não há, assim, a usualmente denominada “sub-rogação da obrigação” – ao contrário do que acontece na conversão em perdas e danos.

Como é do conhecimento de todos, a atuação administrativa demanda uma série de atos materiais para concretizar as políticas públicas, sejam as preconizadas constitucionalmente, sejam as previstas em seus planos de governo, tais como, autorização orçamentária, realização de licitações, concursos públicos para contratação de pessoal, compra de materiais etc. Assim, em que pese a atuação do Poder Judiciário no sentido de determinar ao Estado (Poder Executivo e Legislativo) que efetivem as políticas públicas, o Poder Judiciário não pode substituir o Administrador em sua função essencial, qual seja a de administrar, cabendo-lhe tão somente indicar os caminhos a serem trilhados.

Por sua vez, seria inútil a presente demanda se o Poder Judiciário determinasse o caminho a ser seguido e não dispusesse de meios hábeis a fazer com que fossem cumpridas suas determinações. Neste passo, a aplicação de astreintes pelo Poder Judiciário não resolve, por si só, o problema, já que as prerrogativas do Estado (pagamento por precatório e impenhorabilidade de bens públicos) terminam por estimular que continuem a descumprir a decisão judicial, enquanto os pacientes continuam desassistidos e este, sem dúvida, não é este o interesse primordial nesta lide. Ressalte-se ainda que existe um péssimo vezo de descumprir a decisão judicial e deixar as consequências (multas) para o seu sucessor.

Insta ainda salientar que não existe óbice a que o novo serviço seja instalado no Hospital Cirurgia. Embora sua participação seja complementar no Sistema Único de Saúde, se o Poder Público já tem optado por utilizar serviços de terceiro ao invés de ampliar a sua própria rede hospitalar, assume o risco de ter que custear e remunerar um novo serviço instalado no referido nosocômio. Tal solução foi adotada na Ação Civil

39 Idem, p. 294

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Pública nº 2007.81.03.000799-0, em trâmite na 18ª Vara Federal de Sobral/CE, que tratou da ampliação da quantidade de leitos de UTI na região de Sobral, sendo que está sendo ampliado um hospital filantrópico para atender à demanda.40

No caso de o juiz optar por instalar o novo serviço no Hospital Cirurgia fica condicionado ao compromisso de que o aparelho seja utilizado para tratar exclusivamente pacientes do Sistema Único de Saúde – SUS.

2.2.6. Do tratamento fora do domicílio para pacientes em lista de espera e outras medidas

Em sua inicial, os Ministérios Públicos Federal e Estadual fizeram o pedido em relação ao fornecimento de TFD para “que o Estado de Sergipe disponibilize o tratamento fora do domicílio a todos os pacientes de oncologia que não possuem de forma eficaz obter o tratamento dos serviços de radioterapia nos Hospitais Cirurgia e João Alves Filho”.

Em sede de tutela antecipada, foi determinado o fornecimento de tratamento fora do domicílio – TFD para todos os pacientes em fila de espera, a fim de que os mesmos não tivessem que interromper ou aguardar indefinidamente o início de seus tratamentos, até que fosse normalizado o atendimento nos Hospitais de Urgência de Sergipe e Cirurgia.

Analisando os termos da inicial, tem-se que o móvel da questão reside na adequação do serviço de radioterapia do Estado ao mínimo preconizado pelo Ministério da Saúde, sendo que o pedido de fornecimento de TFD foi formulado de maneira instrumental, em relação àquele.

Durante a tramitação do processo (vide f. 510, 714, 796, 947, 2784/2786) e até em anos anteriores (2005/2006 - f. 104/111), foram noticiadas diversas vezes quebras nos aparelhos existentes no Estado, o que gerou o aumento da fila de espera dos pacientes que necessitam de radioterapia. Além disso, conforme exposto acima, ainda que os aparelhos hoje existentes não quebrem, a demanda ainda é muito superior ao que a capacidade instalada pode atender, de modo que enquanto não forem instalados os demais aceleradores lineares no Estado haverá a formação de fila de espera, tornando-se imprescindível a manutenção do TFD.

Considerando que ainda existe fila de espera para o tratamento, persiste a necessidade de manutenção do TFD para os pacientes que, não querendo aguardar na fila, possam fazer o tratamento em outros Estados.

Assim, apesar do fornecimento do TFD constituir medida inicialmente temporária, meramente paliativa, sua manutenção mostra-se necessária enquanto o serviço de radioterapia não atinge o padrão necessário no Estado, conforme preconizado pelo Ministério da Saúde.

40 Notícia extraída do sitio do STF em quarta-feira, 15 de outubro de 2008: Ministro determina a disponibilização de UTIs para pacientes do SUS no Ceará. http://www.stf.jus.br/portal/cms/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=97755&caixaBusca=N (acesso em 15/12/2011)

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Não basta o Estado somente oferecer o TFD, fazendo-se necessário a adoção de medidas adicionais, com esteio no art. 461 do CPC.

Conforme já consignei alhures: O tratamento fora do domicílio-TFD nada mais é do que um programa para deslocar um paciente que não conseguiu tratamento no Estado de seu domicílio para outro Estado (Portaria SAS nº 55, de 24.02.1999 – f.1668/1671). Ressalte-se que o TFD somente cobre os custos com deslocamento, hospedagem e alimentação do paciente e de seu acompanhante, sendo que os gastos com o tratamento em si serão suportados pelo Município/Estado de destino. A propósito, cito trecho de manifestação da Secretaria Municipal de Saúde de Aracaju (1183/1184):

“Assim, o TFD consiste em uma ajuda de custo ao paciente , e em alguns casos, também ao acompanhante, encaminhados por ordem médica à unidade de saúde de outro município ou Estado da federação, quando esgotados todos os meios de tratamento na localidade de residência do mesmo, desde que haja possibilidade de cura total ou parcial, limitado no período estritamente necessário a este tratamento e aos recursos orçamentários existentes. A sua autorização depende de alguns fatores, entre eles quando estiver garantido o atendimento no município de destino, através do aprazamento pela Central de marcação de Consultas e Exames especializados e/ou pela Central de Disponibilidade de Leitos. É sabido que o procedimento de radioterapia é escasso em todo território nacional (demanda maior que a oferta).”

A maior prova de que o TFD não funciona é que as listas somente aumentaram (vide quadro acima), seja pela carência de vagas em outros Estados, seja porque impacta o teto de outros Estados/Municípios que já tem problema com os seus pacientes, seja pela os custos, seja pela recusa do paciente. Ressalte-se que o TFD somente cobre os custos com o deslocamento do paciente e de seu acompanhante, sendo que os gastos com o tratamento serão suportados pelo Município/Estado de destino. O TFD é um paliativo para situações extraordinárias, tal como ocorreu com a desativação da radioterapia do Hospital Cirurgia. Embora seja importante, não pode se tornar uma coisa permanente porque equivaleria a empurrar o problema com a barriga para outro Estado. Haveria outro aspecto: as pessoas não somente tem o direito a saúde, mas o de se tratado próximo a sua residência. Do contrário, o Estado poderia dar a desculpa de não ampliar a sua rede e, em contrapartida, oferecer o TFD para os pacientes acometidos por esta doença, o que é óbvio não atende o desiderato da lei.

Em petição de f. 1132-1157, os Ministérios Públicos Estadual e Federal afirmaram que: 1) o Estado não tem conseguido encaminhar, através de TFD, pacientes para serem tratados no sistema único de saúde, mas, caso fosse no sistema privado, haveria vagas; 2) os pacientes não aceitam o TFD porque o “pagamento das diárias somente 30 (trinta) dias após a saída do paciente dificulta muito a aceitação do tratamento em fora do domicílio” (f. 1136), já que “muitas vezes, os pacientes são carentes de recursos econômicos, não possuindo condições de arcar nem mesmo com a passagem da cidade do interior do Estado de Sergipe para o tratamento na capital” (f. 1136). Ao final, requereram que os réus sejam obrigados a providenciar o tratamento fora do domicílio em Estados circunvizinhos os pacientes referenciados da lista de espera, ainda que na rede privada de saúde, tendo em vista a insuficiência de vagas em hospitais

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conveniados ao SUS. Requereu ainda que as despesas com diárias e passagens sejam pagas aos pacientes e seus acompanhantes de forma antecipada.

De acordo com as informações colhidas com servidores que lidam no TFD, os pacientes são transferidos para outros locais para serem atendidos na vagas do SUS, sendo que acabam impactando o teto de media e alta complexidade – MAC do Município/Estado onde estão recebendo tratamento.

João Augusto Guimarães Figueiredo (1147/1148) “Que atualmente existe uma relação de 34 pacientes para encaminhamento para procedimento de radioterapia, sendo que destes 7 já agendados para atendimento em Jaú e Salvador, com possibilidade de atendimento para a cidade de Itabuna/BA. Informa que o Estado formaliza os contatos necessários para acolhimento mínimo desses pacientes, com o pagamento de passagem aérea, ida e volta, inclusive para o acompanhante e posterior pagamento de diárias para esses pacientes. Que as diárias somente são pagas, aproximadamente, após 30 dias do requerimento do TFD, constituindo esses um dos principais problemas para a saída do paciente, porque se trata de pessoas com poucos recursos que muitas vezes não condição de arcar com o custo das despesas. (...). O pagamento após trinta dias é realizado por conta da tramitação burocrática necessária ao pagamento. (...) Que os hospitais contactados pelo Estado fazem atendimento pelo SUS possuindo um teto limite para atendimento, todavia, também faz atendimento particular informando o depoente que neste caso, no atendimento particular, o paciente poderia ser atendido, todavia, na cota do SUS há lista de espera” Valdenice Silveira Ferreira (f. 1145/1146) Que os contatos tem sido feitos pelo Estado para atendimento em outros Estados respeitado o teto do SUS, todavia perguntando se seria possível o tratamento custeado pelo Estado em serviço privado, foi dito que sim. Perguntando se seria mais fácil e rápido o tratamento em serviço privado, foi dito que sim”

Ocorre que, de fato, exista uma carência de radioterapia para os pacientes do SUS, seja na rede própria, seja na rede conveniada. Não obstante o Estado não dar conta do serviço na sua rede própria, impõe alguns limites à rede conveniada, a saber: os atendimentos ficam limitados a tabela do SUS e a um número determinado de vagas (quotas). Não obstante tais dificuldades, elas inexistem quando o paciente é atendido no sistema privado.

Ruthe Andrade – f. 1143 “Perguntado se seria mais fácil e rápido o tratamento em serviço privado, foi dito que sim” Valdenice Silveira Ferreira (f. 1145/1146) Que os contatos tem sido feitos pelo Estado para atendimento em outros Estados respeitado o teto do SUS, todavia perguntando se seria possível o tratamento custeado pelo Estado em serviço privado, foi dito que sim. Perguntando se seria mais fácil e rápido o tratamento em serviço privado, foi dito que sim”

De fato, o paciente não pode ficar aguardando em fila de espera enquanto o Estado de Sergipe procura um local para sua transferência. Isto porque que a doença somente progride e a chance de cura reduz com o passar do tempo.

Conforme já afirmei alhures:

Processos nº 0006464-60.2009.4.05.8500 e 0001610-86.2010.4.05.8500

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“O maior problema que identifico não é a existência da fila em si, mas o tempo de permanência nela. Os meios disponíveis devem ser proporcionais a demanda existente. Assim, entendo que o paciente tem o direito de ser atendido dentro de um prazo razoável, não superior a 30 (trinta) dias, salvo se a situação for mais grave e o parecer médico indicar necessidade de início imediato de tratamento. A partir da data em que estiver pronto para realizar o serviço, o Estado tem até trinta dias para iniciar o tratamento, contados da data do primeiro atendimento do paciente. Passado esse prazo, a multa por descumprimento passará a incidir. O réus serão multados toda vez que algum paciente permanecer mais de 30 (trinta) dias aguardando o serviço de radioterapia.

Assim, para assegurar a efetividade o encaminhamento do TFD, os recursos deverão ser retirados do teto MAC do Estado de Sergipe e Município de Aracaju, que já recebe recursos da União para tratar estes pacientes, mas, por deficiência do serviço, não possui no seu âmbito territorial serviço suficiente de radioterapia para fazer frente à demanda. Neste passo, entendo que a União, o Estado de Sergipe e o Município de Aracaju, este último na condição de gestor pleno, deverão arcar cada um com 1/3 das despesas, ficando autorizada a União a alocar os valores para o Estado/Município que estiver conveniado ao nosocômio onde o paciente receber tratamento.

Considerando que o tratamento em rede privada deve ser excepcional e pode onerar ainda mais os custos, ficam os réus autorizados a contratarem com instituições privadas, mediante convênio, com dispensa de licitação, preferencialmente em Estado adjacente (Estado da Bahia ou Alagoas) ou centros de reconhecida capacidade técnica. Poderá celebrar convênio prevendo o pagamento acima da tabela SUS, desde dentro dos valores de mercado, conforme tabela da AMB.

2.2.7. Do aparelho de braquiterapia

O MPF e MPE formularam pedido em relação ao Estado de Sergipe e o Hospital João Alves para que colocassem em funcionamento o aparelho de braquiterapia situado nesta unidade hospitalar, no prazo de 30 (trinta) dias.

Em sua contestação (f. 792-807), a Fundação Hospitalar de Saúde, na condição de mantenedora do Hospital de Urgência de Sergipe (HUSE) sustentou que embora seja de extrema importância o serviço de braquiterapia constitui um serviço complementar a radioterapia e que a sua instalação não reduzirá a fila de espera do serviço de radioterapia, uma vez que não há a substituição de um serviço pelo outro.

A braquiterapia é indicada para pacientes, portadores de neoplasia de colo uterino, conforme reconhecido pela Fundação Hospitalar de Saúde – FHS (f. 803)

Embora a braquiterapia seja complementar, é fundamental a sua associação com a teleterapia 41 , consoante fala do medico radioterapeuta, Willian Soares, verbis:

Audiência do dia 24.03.2010:

41 Acerca da distinção entre uma e outra, vide o texto de f. 1324/1327.

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“O HUSE necessita para melhorar o atendimento de oncologia: a) 01 aparelho de radioterapia, b) colocar o serviço de braquiterapia para funcionar (não é possível a cura de pacientes com câncer de colo uterino sem a associação da teleterapia com a braquiterapia);” (f. 1312)

Conforme audiência do MPE com o representante do HUSE, “o não funcionamento do mesmo [braquiterapia] impõe tratamento fora do domicílio e alternativamente o uso de cobaltoterapia e radioterapia mediante acelerador linear” (f. 235), o que acaba sobrecarregando ainda mais este último.

Assim, está mais do que demonstrada a necessidade do funcionamento do aparelho de braquiterapia para que os pacientes com indicação do tratamento possam ter tratamento completo dentro do Estado de Sergipe.

Com a propositura de uma ação civil pública pelos Ministérios Público Federal e Estadual, este Juízo deferiu a antecipação dos efeitos da tutela em 17.12.2009, nos seguintes termos:

“3. que o Estado de Sergipe, através da Secretaria Estadual de Saúde, e o Hospital João Alves (Fundação Hospitalar) apresentem, no prazo de 15 (quinze) dias, de um cronograma detalhado, apontando data da contratação direta, o envio do material e o prazo de sua chegada, colocação do equipamento em funcionamento, inclusive apontando eventuais problemas, a fim de que este magistrado examine a razoabilidade do prazo. Se não houver a apresentação do cronograma, os referidos réus ficam obrigados a colocar em funcionamento o aparelho de braquiterapia nessa unidade hospitalar, no prazo de 60 (sessenta) dias.

Quanto à cronologia da questão da braquiterapia, confira a seguinte tabela:

DATA INFORMAÇÃO FOLHAS 17/12/2009 Liminar para que o Estado de Sergipe, através da Secretaria Estadual de

Saúde, e o Hospital João Alves (Fundação Hospitalar) apresentem, no prazo de 15 (quinze) dias, de um cronograma detalhado, apontando data da contratação direta, o envio do material e o prazo de sua chegada, colocação do equipamento em funcionamento, inclusive apontando eventuais problemas.

462/475

19/01/2010 Apresentação, em audiência, do cronograma para instalação do aparelho de braquiterapia, que foi extraviado, conforme certidão de f. 704.

567/572

10/05/2010 Reapresentação pela Fundação Hospitalar de Saúde do cronograma para funcionamento do equipamento de braquiterapia extraviado na audiência do dia 19/01/2010.

1871/1919

28/07/2010 Em audiência, a Fundação Hospitalar de Saúde manifestou-se sobre as medidas já tomadas e o andamento do processo para instalação e início do serviço de braquiterapia42

2220

42 Pela Fundação Hospitalar de Saúde, pelo Dr. Tiago foi dito: “Que pelo primeiro cronograma apresentado, demoraria em torno de 06 (seis) meses para o funcionamento do aparelho de braquiterapia. Que a Fundação esta finalizando o cadastramento junto à Receita Federal como importador, estando pendente a emissão de licença de importação. Que o procedimento de inexigibilidade de licitação já está concluído. Que primeiro o Hospital tem que estar cadastrado como importador das fontes na Receita federal e com a emissão da licença de importação, a importação das fontes deverá passar pelos órgãos da CNEN, DCEX e ANVISA. Que necessitaria de 04 meses para iniciar o serviço de braquiterapia, sendo 15 dias para finalizar o cadastro de importador, o deferimento de licença de importação e envio da instrução de embarque; 12 semanas para a produção da fonte de irídio e mais 15 dias para transporte e desembaraço. A Fundação se compromete a avisar qualquer atraso no cronograma ora

Processos nº 0006464-60.2009.4.05.8500 e 0001610-86.2010.4.05.8500

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02/08/2010 A Fundação Hospitalar de Saúde juntou documentação em complementação ao que foi exposto na audiência do dia 28/07/2010 e informou que a data prevista para início do serviço seria 16/11/2010.

2368/2401

15/12/2010 A Fundação Hospitalar de Saúde apresentou requerimento de dilação de prazo para por em funcionamento o aparelho de braquiterapia no HUSE, tendo em vistas os trâmites para desembaraço da fonte radiativa importada

2755/2774

13/01/2011 A Fundação Hospitalar de Saúde informou que o equipamento já está instalado, passando por manutenção corretiva, com previsão de conserto e início das atividades para 18.01.2011.

2776/2778

De acordo com a tabela inicial apresentada pela ré (f. 1879), o prazo final para funcionamento do aparelho de braquiterapia seria 23.06.2010.

Durante todo o feito, foram prestadas informações relativas à instalação do aparelho de braquiterapia, inclusive com relação à questão do desembaraço aduaneiro da fonte radioativa a ser utilizada.

Contudo, a última notícia que há nos autos é de 13.01.2011, quando em manifestação de f. 2776-2778, a Fundação Hospitalar de Saúde informou que o equipamento já estaria instalado, passando por manutenção corretiva, com previsão de conserto e início das atividades para 18.01.2011. Não há informações posteriores se o equipamento teve concluída sua manutenção e se efetivamente entrou em funcionamento ou mesmo se vem funcionando corretamente.

Não obstante os problemas com o desembaraço aduaneiro 43 possam causar algum atraso no funcionamento do serviço, entendo que a ré não foi totalmente diligente na resolução da questão, uma vez que não tentou a via judicial cabível visando a liberação dos mesmos. Ressalte-se que a mesma poderia consignar na demanda o valor do imposto cabível, visando a liberação do bem.

Como o prazo total concedido é mais do que suficiente para a instalação, entendo que a multa deve incidir desde a retenção na Receita Federal (15/12/2010) até a data em que o equipamento efetivamente entrar em funcionamento. Em sede de execução, será liquidado o valor da multa cabível, devendo a ré trazer documento comprobatório demonstrando que já iniciou o tratamento do paciente. Objetivando evitar que problemas com o desembaraço aduaneiro voltem a se repetir, sugiro ao réu que ajuíze ação cabível visando o reconhecimento da sua imunidade tributária/isenção.

apresentado, em especial no tocante ao deferimento da licença de importação. Que não há nenhum paciente para braquiterapia na lista de espera. Que após a chegada das fontes de irídio o funcionamento do aparelho de braquiterapia será imediato. Pelo MM Juiz foi dito: “Reservo-me para analisar a ampliação de prazo e eventual incidência de multa após a Fundação Hospitalar trazer os documentos a que se refere. Deverá também informar todo o procedimento necessário para o treinamento da equipe que irá operar o aparelho. A Fundação Hospitalar terá o prazo de 05 (cinco) dias para trazer as informações solicitadas, sob pena de multa diária de R$ 1.000,00 (mil reais) que incidirá automaticamente após o decurso do prazo sem cumprimento e reverterá em favor do fundo de interesses difusos”. 43 Em petição de f. 2755/2760, a Fundação Hospitalar de Saúde apresentou requerimento de dilação de prazo de mais 30 dias em “virtude da fonte radioativa já está armazenada na alfândega de cargas áereas da Infraero em Salvador/BA, restando apenas a liberação por parte da Receita Federal” (f. 2766). Aduziu que o problema de liberação decorreu da discussão se a Fundação Hospital seria beneficiária ou não de imunidade tributária, requerendo que fosse depositado nestes autos o valor do imposto de importação.

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2.2.8. Da indenização dos pacientes em fila de espera por danos morais e materiais - Processo nº 0001610-86.2010.4.05.8500

Na ação sob n.º 0001610-86.2010.4.05.8500, Ministério Público Federal – MPF e Ministério Público do Estado de Sergipe propuseram ação civil pública somente em face da UNIÃO FEDERAL, ESTADO DE SERGIPE e MUNICIPIO DE ARACAJU objetivando fixar a responsabilidade genérica pelos supostos danos morais e materiais sofridos pelos pacientes em lista de espera para tratamento de radioterapia, em apuração individual posterior, mediante liquidação de sentença.

Quanto a este ponto, a controvérsia da demanda cinge-se à existência de omissão da administração em prover o atendimento radioterápico de forma adequada, o causando danos morais e materiais aos pacientes em fila de espera, bem como de dano moral e material indenizáveis e de nexo causal entre a conduta do Estado e os eventuais danos.

A obrigação de indenizar nasce a partir da prática de um ato ilícito, cujos requisitos mínimos são: 1) conduta (ação ou omissão); 2) dano patrimonial ou moral (extrapatrimonial); 3) nexo de causalidade entre a conduta e o dano. A exigência de culpa “lato sensu” (culpa ou dolo) é exigida para se distinguir a responsabilidade subjetiva da objetiva (independente de culpa).

Ressalte-se que “pode haver responsabilidade civil sem culpa, mas não pode haver responsabilidade sem dano” 44, uma vez que este instituto tem por objetivo tornar indene (sem dano), mediante a reposição do lesado a um estado anterior a prática do ato ilícito.

Já no que diz respeito a caracterização do tipo de dano, o dano material e moral se distinguem quanto à natureza do bem atingido, a necessidade de prova e a finalidade de sua reparação. Primeiramente, o dano material atinge diretamente o patrimônio, entendido como o conjunto de bens apreciáveis economicamente, ao passo o dano moral agride os bens de natureza imaterial integrantes do direito da personalidade. Segundo, o dano material necessita ser provado enquanto o moral existe in re ipsa, isto é, decorre da demonstração de uma situação constrangedora, consoante a lógica da razoável e a moralidade comum, não se prestando para reparar situações que não ultrapassam o mero dissabor, aborrecimento, mágoa, irritação ou decorram da sensibilidade exarcebada de um indivíduo. Terceiro, a indenização por dano material tem finalidade reparatória mediante a colocação do lesado em um estado anterior a prática do ato ilícito ao passo que o moral não almeja reparar o pretium doloris (preço da dor), mas visa a sua compensação mediante a colocação de uma soma em dinheiro para atenuar a ocorrência de um episódio dolorosa e deprimente de que tenha sofrido. Ressalte-se que os danos materiais e morais são independentes entre si, podendo ser cobrados de maneira cumulativa ou isolados a partir de um mesmo fato (súmula n.º 37 do STJ).

44 CAVALIERI FILHO, Sergio. Programa de Responsabilidade Civil. 5.ed. rev. aum. atual. de acordo com o novo Código Civil. São Paulo: Malheiros, 2004. p. 87.

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Por sua vez, o dano material compreende o dano emergente (aquilo que ele efetivamente se perdeu) e o lucro cessante (aquilo que razoavelmente deixou de lucrar), não servindo para indenizar por danos hipotéticos ou remotos.

Sobre a responsabilidade civil do Estado, dispõe o art. 37, § 6º da CF/88, verbis:

CF/88, Art. 37 (omissis), § 6º - As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa.

Grassa na doutrina e na jurisprudência se a responsabilidade por omissão é objetiva ou culposa na modalidade anônima (desnecessidade de identificar o causador do dano), com base na teoria da falta do serviço. A respeito do tema, transcrevo excerto de sentença proferida no processo n.º 003210.50.2007.4.05.8500, da lavra da Juíza Titular Telma Maria Santos:

“De fato, embora exista certo dissenso doutrinário, comungo do entendimento daqueles que defendem a aplicação da teoria da “culpa” ou “falta do serviço” frente às posturas omissivas do Estado.

Citada teoria, desbordante em responsabilidade subjetiva, conduz ao dever de indenizar quando, devendo funcionar, o serviço público não funciona, funciona mal ou funciona a destempo, propiciando o surgimento de dano em detrimento de outrem.

Uma vez que a norma consignada no art. 37, § 6°, da CF/1988, adota o verbo “causar” para caracterização da responsabilidade objetiva, sustenta-se a sua não–incidência em evento omissivo, pois este não atuaria como causa, mas condição do dano.

Tais idéias não seriam inferidas apenas da literalidade do dispositivo, porquanto o texto constitucional, com sua carga política, não é sede apropriada para preciosismos técnicos, puramente jurídicos.

A exegese teria raiz superiormente lógica, pois competindo ao Estado curar o bem-estar social e a incolumidade dos direitos em grau objetivo e subjetivo, poderia ser chamado a reparar danos em qualquer fato lesivo praticado por terceiro, caso fosse invariavelmente objetiva sua responsabilidade.

Sempre cabível seria a afirmação, em tal hipótese, de que o Poder Público não assegurara a devida proteção dos interesses da coletividade, cabendo-lhe, por conseguinte, o débito de recomposição do status quo ante.

A Carta da República, é de se convir, jamais tencionaria transferir tamanha carga ao erário, por autodestrutiva que seria a aplicação indiscriminada da responsabilidade objetiva amparada no risco administrativo.

Sob o prisma da responsabilidade subjetiva estruturada na falta do serviço, o Estado está livre do dever de indenizar com a simples demonstração do funcionamento regular e eficiente do serviço de fiscalização, globalmente considerado.

Estaria afastado o fator culpa, cuja representação reside na inoperância do serviço, na operação abaixo dos padrões razoavelmente exigíveis ou na sua operação ineficaz.

Expoente dessa linha de entendimento, Celso Antônio Bandeira de Mello preleciona:

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Quando o dano foi possível em decorrência de uma omissão do Estado (o serviço não funcionou, funcionou tardia ou ineficientemente) é de aplicar-se a teoria da responsabilidade subjetiva. Com efeito, se o Estado não agiu, não pode, logicamente, ser ele o autor do dano. E, se não foi o autor, só cabe responsabilizá-lo caso esteja obrigado a impedir o dano. Isto é: só faz sentido responsabilizá-lo se descumpriu dever legal que lhe impunha obstar ao evento.

Deveras, caso o Poder Público não estivesse obrigado a impedir o acontecimento danoso, faltaria razão para impor-lhe o encargo de suportar patrimonialmente as conseqüências da lesão. Logo, a responsabilidade estatal por ato omissivo é sempre responsabilidade por comportamento ilícito. E, sendo responsabilidade por ilícito, é necessariamente responsabilidade subjetiva, pois não há conduta ilícita do Estado (embora do particular possa haver) que não seja proveniente de negligência, imprudência ou imperícia (culpa) ou, então, deliberado propósito de violar a norma que o constitua em dada obrigação (dolo). Culpa e dolo são justamente as modalidades de responsabilidade subjetiva.

Não bastará, então, para configurar-se a responsabilidade estatal, a simples relação entre ausência do serviço (omissão estatal) e o dano sofrido. Com efeito: inexistindo obrigação legal de impedir certo evento danoso (obrigação, de resto, só cogitável quando haja possibilidade de impedi-lo mediante atuação diligente), seria um verdadeiro absurdo imputar ao Estado responsabilidade por um dano que não causou, pois isto equivaleria a extraí-la do nada; significaria pretender instaurá-la prescindindo de qualquer fundamento racional ou jurídico. Cumpre que haja algo mais: a culpa por negligência, imprudência ou imperícia no serviço, ensejadoras do dano, ou então o dolo, intenção de omitir-se, quando era obrigatório para o Estado atuar e fazê-lo segundo um certo padrão de eficiência capaz de obstar ao evento lesivo.45

Na esfera da responsabilidade subjetiva pela falta do serviço, realça-se a importância da culpa do comportamento estatal para a eclosão do dever de indenizar. Esse aspecto subjetivo, por óbvio, não se equipara à noção de culpa própria das relações de direito privado. Caracteriza-se, no âmbito do direito administrativo, por uma posição de inferioridade do Poder Público diante dos padrões normais de eficiência, aquilatados em função do patamar de desenvolvimento da sociedade, sob a perspectiva da tecnologia, da cultura, da economia e do momento histórico.

Por outro lado, evitando engendrar embaraços intransponíveis à tutela dos direitos dos administrados, a teoria da “culpa” ou “falta” do serviço presume, em nível relativo, a culpa da administração, motivo pelo qual cabe ao Estado o ônus de provar a regularidade de sua conduta, especialmente nas situações limítrofes.

(...)

Em suma, em caso de omissão do Estado, o dever de indenizar surgirá – nos moldes da teoria da falta do serviço – se caracterizados: a) conduta; b) dano; c) dever de impedir o dano; d) quebra desse dever, em razão de funcionamento deficiente do aparelho administrativo (este não opera, opera irregularmente ou opera sem a presteza devida quando, pelos padrões razoavelmente exigíveis, deveria atuar de modo a impedir o dano)”.

No caso em tela, seria preciso definir se houve ou não omissão do Estado, como um todo, no que tange ao atendimento radioterápico.

A responsabilidade dos réus é mais do que induvidosa, uma vez que decorreu da falta de planejamento ao não dimensionar a sua demanda para atender aos pacientes

45 MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo. 12ª ed. – São Paulo: Malheiros, 2000, p. 794-795.

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que necessitam de radioterapia. A atividade de planejamento constitui uma atividade inerente ao Estado.

Em que pese a interdição da radioterapia do Hospital Cirurgia, a demanda pelo servido de radioterapia é bem mais antiga porque o MPF e MPE fizeram juntar diversas reportagens nos anos de 2005 e 2006 apontando as constantes interrupções nos serviços em razão de quebras no aparelho (f. 106, 107, 109, 112, 113 e 114), o crescimento na demanda e a formação de filas. Inclusive, nas reportagens, consta a tentativa do HUSE de obter mais um acelerador linear perante o INCA

Durante a demanda, os réus não deram a importância adequada visando a readequação da cobertura de oncologia aos mínimos preconizados pelo Ministério da Saúde, instalando mais centros e/ou unidades de assistência em alta complexidade de oncologia no Estado de Sergipe.

Conforme já afirmei alhures: A decisão de f. 462-483 que concedeu prazo ao Estado de Sergipe e Município de Aracaju foi proferida em 17.12.2009 e o fato é que, passados dois anos do ajuizamento da presente demanda, ainda continuamos com 2 UNACON’s, quando a demanda seria de, no mínimo, 3 (três). A União insiste em afirmar que sua obrigação se restringe a financiar o serviço, olvidando que é também sua função fiscalizar sua execução, ajuizando as medidas judiciais cabíveis quando o mesmo não funcionar de foram devida, o que no caso em tela nunca foi feito. Ocorre que mas nunca demonstrou preocupação em deslocar seus recursos para outros locais, seja criando um hospital federal ou seja adequando um já existente, à exemplo do Hospital Universitário, onde os pacientes que necessitassem de atendimento poderiam ser atendidos, ao invés de continuar sustentando um sistema que não funciona como deveria. O Estado e o Município, por seu turno, não demonstram qualquer esforço no sentido de criar a estrutura necessária, talvez com medo de que os recursos que lhe são repassados pela União não sejam suficientes para a manutenção do serviço, o que faria com que tais entes ocupassem grande parte dos seus próprios orçamentos com a manutenção do sistema de saúde. Ocorre que este tipo de gasto público não lhes interessa, uma vez que não garante bons resultados nas eleições, ao contrário da construção de praças, pontes, viadutos, ou a realização de grandes festas e shows em espaços públicos.

Em outra parte, volto a afirmar: E mais: o que se percebe é que todos buscam eximir-se de suas obrigações, num verdadeiro jogo de “empurra empurra”, no qual a maior prejudicada é a população que necessita do serviço, e não o tem à sua disposição a contento. No curso desta demanda, surgiram episódios lamentáveis em que bem demonstram como o cidadão, sem plano de saúde e usuário do SUS, fica órfão de atendimento público de saúde porque os réus ficam discutindo entre si sem chegar a uma conclusão. Destaco dois fatos marcantes: 1) com a reabilitação do Hospital Cirurgia, os réus Estado de Sergipe e Município de Aracaju ficaram discutindo qual o teto seria onerado para pagar os serviços do nosocômio; 2) o Hospital de Jaú, alternativa para os pacientes em fila de espera, estava sem receber recursos para tratamento de pacientes no Estado de Sergipe, tendo sido necessário que este juízo determinasse a retirada de recursos dos réus do teto financeiro dos réus para pagar o hospital.

Processos nº 0006464-60.2009.4.05.8500 e 0001610-86.2010.4.05.8500

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Os réus não se entendem voluntariamente acerca da forma de resolver o problema à adequação da cobertura. No curso da demanda, surgiram diversas soluções, mas nenhuma foi a frente por falta de acordo dos réus.

Ora, conforme já visto, a obrigação de agir do Estado para garantir o atendimento em saúde a toda a população possui matriz constitucional e impõe o dever de agir aos três réus em questão: União, Estado e Município. Conforme amplamente exposto nos tópicos acima, o problema existe, mas os três entes insistem em atuar como se o mesmo não existisse ou como se o problema deles não fosse, num verdadeiro jogo de “empurra-empurra”. O fato é que o serviço de radioterapia não vem sendo prestado a contento no Estado, e tanto é assim que se tornou corriqueira a formação de filas de espera para tratamento, uma vez que os equipamentos em funcionamento não são suficientes para atender a demanda e, ainda que o fossem, estão sujeitos a freqüentes quebras e pausas para manutenção.

A oferta de serviços de radioterapia abaixo do valor mínimo preconizado pelo Ministério da Saúde equivale a proteção insuficiente do direito à saúde, violando o dever de proteção do Estado em manter uma estrutura adequada aos doentes com câncer e gerando, por si só, o dever de indenizar aqueles que são privados do atendimento médico adequado.

Por outro lado, é preciso considerar que por mais que a existência de uma fila de espera para tratamento tenha se tornado habitual em nosso sistema de saúde, por trás da frieza dos números estão pessoas e cada número na lista corresponde a um indivíduo, dotado de dignidade e credor de prestações sociais do Estado, a começar pelo direito básico à saúde. Além disso, no universo da população, os números constantes na lista podem parecer pouco, mas cada pessoa ali tem família e nesses casos, como se sabe, não é só o paciente que sofre, mas sim toda a sua família, amigos etc.

Ora, é absurdo conceber que a medicina avance, aumentando consideravelmente a chance de sobrevida dos pacientes com câncer e que, ao mesmo tempo, os mesmos sejam privados de tais tratamentos por questões de incompetência da administração ou má aplicação do dinheiro público.

Considerando que em razão da omissão dos réus, permaneceram em listas de espera sem o atendimento em tempo adequado, é mister analisar a responsabilidade sob a ótica da Teoria da Perda de Uma Chance. Sobre essa teoria:

“A teoria da perda de uma chance, como é comumente denominada, objetiva a indenização da vítima que teve frustrado o seu objetivo. O dano em si não será imputado ao agente, pois poderá haver outras concausas; todavia, o agente será responsável pela chance perdida, ou seja, a certeza de ganho que foi encerrada por sua conduta. Assim, a reparação não é do dano, mas sim da chance. Não se admitem as expectativas incertas ou pouco prováveis, que serão repudiadas pelo nosso direito. Com efeito, a chance a ser indenizada deve ser algo que certamente iria ocorrer, mas cuja concretização restou frustrada em virtude do fato danoso. Conforme ensina Bustamante Alsina, ‘A chance configura um dano atual, não hipotético. É ressarcível quando implica uma probabilidade suficiente de benefício econômico que resulta frustrado pelo responsável, e pode ser valorada em si mesma, prescindindo do resultado final incerto, em seu intrínseco valor de probabilidade.

Processos nº 0006464-60.2009.4.05.8500 e 0001610-86.2010.4.05.8500

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Os elementos que caracterizam a perte dúne chance são, segundo Fraçois Chabas, a conduta do agente; um resultado que se perdeu, podendo ser caracterizado como dano; o nexo causal entre a conduta e as chances que se perderam” 46

Dos ensinamentos supra, colhem-se os pressupostos para a adoção da referida teoria. Primeiro é necessário que haja a frustração de um objetivo da vítima. Segundo é preciso que a certeza de ganho da vítima tenha sido encerrada por uma conduta do agente do ilícito.

Em verdade, todos os casos de câncer demandam urgência, porque se a doença for descoberta no início e não for imediatamente tratada, pode-se perder a chance de cura. O câncer, antes doença incurável, hoje é visto como uma doença curável na maioria dos casos, desde que descoberto no seu estágio inicial. Por exemplo, quem faz cirurgia oncológica tem indicação de tratamento radioterápico para que não ocorra metástase e para matar o tecido canceroso residual. E, ainda que esteja no estágio avançado, a ausência de tratamento pode implicar no encurtamento da vida do paciente. Ambas as situações são graves e necessitam de tratamento imediato.

Quanto mais cedo diagnosticado e iniciado o tratamento, maiores são as chances de cura. A continuidade do tratamento contra o câncer é imprescindível para que haja uma maior possibilidade de cura. Assim, os pacientes portadores desta moléstia que tiveram seus tratamentos interrompidos, se vêem em situação cujo perigo é manifesto, uma vez que suas chances de cura são diretamente afetadas.

“Que o paciente que inicia o tratamento e este é interrompido por problemas no aparelho ele pode perder o tratamento a depender da quantidade de frações já recebidas, o tempo da interrupção e o tipo de patologia” (f. 1146) “O câncer exige continuidade do tratamento e principalmente regularidade. A guerra se vence quando é ofertado ao paciente todo o conjunto de ações, que vão de exames a medicamentos. As aplicações de radioterapia são eficazes no tratamento de tumores e muito valorizadas pelos médicos que acompanham pacientes que têm a doença em estágio avançado. A falta do tratamento reduz as chances de vitória e cria uma angústia no doente. Tempo é justamente o fator decisivo quando se luta contra a doença. Os tumores costumam retornar mais agressivo e resistentes quando há interrupções no tratamento. É como se desse terreno ao inimigo para avançar” (f. 105)

Embora não se possa demonstrar o dano e o nexo de causalidade da ausência de tratamento em gerar o óbito/agravamento da doença do paciente, em tais casos, é possível examinar a responsabilidade da ré sob o prisma da teoria da perda de uma chance, que serve como um norte para que a impossibilidade de quantificação do dano a um valor material não seja um óbice absoluto para o ressarcimento do dano. Neste sentido:

INDENIZAÇÃO POR ERRO MÉDICO. HOSPITAL PÚBLICO. OMISSÃO LESIVA À DIREITOS DE PESSOA. NATUREZA DE RESPONSABILIDADE OBJETIVA. NEXO CAUSAL EM CONCAUSALIDADE. TRATAMENTO MÉDICO QUE DEIXA DE REALIZAR EXAME CAPAZ DE INFLUIR NO

46 GONDIM, Glenda Gonçalves. Responsabilidade civil: A teoria da perda de uma chance. Revista dos Tribunais, São Paulo, ano 94, v. 840, p. 11-36, out/2005.

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DIAGNÓSTICO DE UMA DAS CAUSAS DA MORTE. PERDA DE UMA CHANCE CONFIGURADA. 1. O conceito de culpa administrativa (faute de service) somente pode ser aplicado para os casos de omissão pura, ou seja onde a inércia não interfere no fluxo causal. Diferente, entretanto, é o caso da conduta omissiva que se sobrepõe diretamente ao curso normal dos fatores de imputação, sobretudo quando a Administração possui o dever de impedi-lo e não o faz. Nesses casos, a omissão é concretamente "lesiva aos direitos de qualquer pessoa, induz à responsabilidade civil objetiva do Estado". (STF. RE 495740 AgR, Relator Min. Celso de Mello) 2. Dentro desse contexto caberia à entidade universitária ré a demonstração de que agiu sob uma fundante de exclusão de responsabilidade civil, como, por exemplo, o caso fortuito, ou a força maior, que, no caso da responsabilidade por erro medico tiveram seus conceitos sistematicamente ampliados pela jurisprudência para albergar situações assemelhadas onde não se é possível exigir do profissional da área da saúde conduta diversa em razão da ausência de eventuais recursos. 3. A prova coligada nos autos demonstrou que: a) um dos fatores da morte foi segundo a certidão de óbito um AVC isquêmico antigo e; b) que o exame recomendado pela residente que internou a paciente era capaz de diagnosticar o AVC. 4. A parte ré, ademais, nada pontuou de concreto sobre os eventuais motivos para haver recusado a realização do referido exame de ressonância magnética, que, ainda segundo a prova colhida, não foi realizado apenas porque a equipe médica não os considerou urgente, mesmo tendo a profissional que atendeu a paciente sugerido sua prática. 5. Concausalidade entre os fatores que levaram à morte da paciente que, diante da prova colhida, não exclui a aplicação da chamada teoria da perda de uma chance na medida em que o dano ocorreu porque não houve a detenção do processo causal, embora sem se saber ao certo se isso haveria conseguido salvar a paciente, porquanto houve a má prestação do serviço, retirando-se do interessado uma possibilidade eficiente de diagnóstico que lhe poderia ter poupado a vida, ou pelo menos a estendido em algum grau. Aplicação do princípio iura novit curia. 6. Apelação parcialmente provida, fixando-se indenização civil no importe de R$ 10.000,00 (dez mil reais) à data do óbito a titulo de danos morais por perda de uma chance, pois a prova é induvidosa em afirmar que esse exame poderia haver concorrido para um diagnóstico mais preciso de uma das causas da morte. 47

O fato de ser obrigado a esperar em uma fila de espera para receber tratamento, tendo em mãos um diagnóstico de câncer, cuja probabilidade de cura notoriamente é maior quanto mais cedo se começa o tratamento, por si só, constitui situação por demais gravosa que gera sim dano moral indenizável. Os pacientes, vêem, a cada dia, esvair-se sua chance de vencer a doença. É como se houvesse ali uma sentença de morte, cujo cumprimento ocorre dia a dia, enquanto o paciente é privado do seu tratamento, convivendo com a angústia de ver seu quadro de saúde se agravar, à espera de um tratamento que não se sabe quando irá chegar.

De fato, não há certeza de que os pacientes teriam sido curados do câncer se tivessem recebido o tratamento em tempo hábil, mas a sua ausência frustra a expectativa de cura, já que ao iniciar o tratamento, não é possível voltar atrás e o câncer se torna cada vez mais agressivo, com risco, em muitos casos, de atingir outros órgãos. Uma coisa é a

47 TRF5, AC 497053, Quarta Turma. Rel. Des. Federal Bruno Leonardo Câmara Carrá, DJE- 01/07/2010, p. 724.

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demora na descoberta da doença, outra, é demorar a receber tratamento, tendo certeza da doença.

Para aqueles que morreram por ausência de tratamento, o dano é mais evidente, sendo que nesses casos, a legitimidade para exigir a reparação transmite-se a seus sucessores.

Em ambos os casos, considerando que o nexo causal de dano apontado pelos autores é hipotético, e não seria possível obter certeza da cura do paciente, tem-se que a eventual indenização deve ser baseada na própria chance, considerando o provável resultado que ocorreria caso a chance se tivesse concretizado. Assim, não há que se cogitar numa reparação equivalente ao benefício que somente provavelmente ocorreria.

Ressalte-se que o dano moral ora em análise não visa ressarcir os gastos que os pacientes tiveram durante seu tratamento. Tais valores estão ligados à existência de dano material. O dano moral neste caso está consubstanciado no fato de que o paciente que se vê privado do tratamento, de forma devidamente comprovada, fica fragilizado pela demora/recusa da Administração em prestar-lhe o devido atendimento. Não há como negar que os pacientes em fila de espera passaram e ainda passam por angústia e sofrimento em razão da ausência de prestação do serviço de radioterapia na rede pública.

E o dever de indenizar existe também para os pacientes que, estando em lista de espera, optaram por não utilizar o TFD. Isto porque é um direito do paciente ser tratado em seu domicílio ou em local próximo de sua casa, que não exija a alteração de sua residência, e que lhe permita ser assistido por seus parentes e amigos, dada a fragilidade física e psicológica gerada pela doença.

Neste mesmo passo, também resta evidente o dever de indenizar os danos materiais daqueles pacientes que foram colocados em fila de espera mas que, dada a gravidade da sua doença, decidiram não aguardar pelo TFD e reuniram esforços para arcar com os custos de um tratamento em outros UNACON’s, fora do Estado de Sergipe.

Destarte, impõe-se o reconhecimento da responsabilidade genérica da União, Estado de Sergipe e Município de Aracaju em indenizar os danos morais e materiais todos os pacientes incluídos em fila de espera, a partir da lista acostada com a inicial, nas f. 97/103, e seguintes tais como 1333/1336, 1534/1537, 1613, 1940/1948, 2074/2077, 2150/2160, 2194/2200 e todas as outras que tenham se formado desde o ajuizamento da demanda, com base no art. 37, §6º da CF, cabendo aos mesmos ou a seus sucessores liquidar o julgado em sede de execução, a teor do disposto no art. 95, c/c art. 98 da Lei 8.078/90.

Por ocasião da fixação do quantum indenizatório, dever-se-á levar em consideração, que a indenização por dano moral visa, por um lado, punir “o infrator pelo fato de haver ofendido um bem jurídico da vítima, posto que imaterial”, e de outro, “pôr nas mãos do ofendido uma soma que não é o pretium doloris, porém o meio de lhe oferecer a oportunidade de conseguir uma satisfação de qualquer espécie, seja de ordem intelectual ou moral, seja mesmo de cunho material.” (Caio Mário da Silva Pereira, Responsabilidade Civil, Rio de Janeiro: Editora Forense, 1991, pág. 338). Além disso, deve-se evitar os

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exageros na fixação do montante devido, porquanto, em qualquer hipótese, o princípio da equivalência deve ser observado

Ainda em relação a este ponto, destaco que a liquidação e execução do presente julgado poderão ser feitas, individual ou coletivamente, nos domicílios das vítimas, a teor do art. 98, I da Lei 8.078/90, sob pena de não assim sendo, dificultar-se o acesso das mesmas à reparação do dano sofrido, bem como sobrecarregar o Poder Judiciário. Sobre o tema, destaco o seguinte precedente do STJ:

PROCESSUAL CIVIL. CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA. SERVIDOR PÚBLICO FEDERAL. AÇÃO COLETIVA. EXECUÇÃO INDIVIDUAL NO DOMICÍLIO DO AUTOR. FORO DIVERSO DO FORO DO PROCESSO DE CONHECIMENTO. POSSIBILIDADE. INCIDÊNCIA DAS LEIS 8.078/90 E 7.347/85. CONFLITO CONHECIDO. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL DO ESTADO DO AMAZONAS. 1. As ações coletivas lato sensu – ação civil pública ou ação coletiva ordinária – visam proteger o interesse público e buscar a realização dos objetivos da sociedade, tendo, como elementos essenciais de sua formação, o acesso à Justiça e a economia processual e, em segundo plano, mas não de somenos importância, a redução dos custos, a uniformização dos julgados e a segurança jurídica. 2. A sentença coletiva (condenação genérica, art. 95 do CDC), ao revés da sentença que é exarada em uma demanda individualizada de interesses (liquidez e certeza, art. 460 do CPC), unicamente determina que as vítimas de certo fato sejam indenizadas pelo seu agente, devendo, porém, ser ajuizadas demandas individuais a fim de se comprovar que realmente é vítima, que sofreu prejuízo e qual o seu valor. 3. O art. 98, I, do CDC permitiu expressamente que a liquidação e execução de sentença sejam feitas no domicílio do autor, em perfeita sintonia com o disposto no art. 101, I, do mesmo código, que tem como objetivo garantir o acesso à Justiça. 4. Não se pode determinar que os beneficiários de sentença coletiva sejam obrigados a liquidá-la e executá-la no foro em que a ação coletiva fora processada e julgada, sob pena de lhes inviabilizar a tutela dos direitos individuais, bem como congestionar o órgão jurisdicional. 5. Conflito de competência conhecido para declarar competente o Juízo Federal da 2ª Vara da Seção Judiciária do Estado do Amazonas/AM, o suscitado.48

2.3. Das verbas referentes à proposta de Convênio nº 132.388/09

Em petição de f. 2743/2745, o Hospital de Cirurgia noticiou ter apresentado proposta de convênio nº 132.388/09, tombada junto ao Ministério da Saúde com o nº 25000669818/2009-19, visando a compra de um novo aparelho acelerador linear e de um aparelho de ressonância magnética. Segundo argumenta, a citada proposta de convênio estaria pendente de apreciação desde o dia 24/03/2010, e caso não fosse apreciada até 30.04.2011, tornar-se-ia inútil, uma vez que esta é a data limite para devolução das verbas oriundas de emenda parlamentar ainda não empenhadas.

Com base em tais informações, a MM. Juíza Federal Telma Maria Santos deferiu o requerimento do Hospital de Cirurgia, determinando à União que se abstivesse de devolver ao erário os recursos oriundos de emenda parlamentar não empenhada, relativos à proposta de convênio nº. 132.388/09, enquanto pendente sua apreciação. 48 STJ, CC 96682/RJ, Terceira Seção, Relator: Min. Arnaldo Esteves Lima, DJe 23/03/2010.

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Determinou, ainda, que a União fosse intimada para, no prazo de 15 (quinze) dias, apresentar o resultado da apreciação da proposta ou justificar a impossibilidade de fazê-lo, afim de que esse juízo pudesse aquilatar a necessidade da manutenção da providência ora deferida. Pois bem.

A União noticiou a interposição de agravo de instrumento contra esta decisão (f. 2782) e esclareceu que a proposta de convênio nº. 132.388/09 já foi devidamente analisada no exercício financeiro de 2009, tendo recebido parecer desfavorável e que nenhuma outra proposta de convênio foi apresentada pelo Hospital Cirurgia após isso.

Ora, do exposto nos autos, verifica-se que o pleito do Hospital de Cirurgia não merece amparo.

Na esteira da decisão de f. 1084/1088, entendo que não se pode compelir os entes políticos a celebrar convênio, uma vez que se trata de ato voluntário do ente federativo, não cabendo a este Juízo dizer quando esse repasse deve ser efetuado.

Não obstante isso, caso este juízo venha a decidir pela instalação do novo serviço de radioterapia no Hospital Cirurgia, tal medida constituirá ordem judicial, cujo cumprimento não se sujeita às limitações de ordem orçamentária alegadas pelos réus ou ao juízo de conveniência e oportunidade acerca da medida.

Por todo o exposto, torna-se inócuo impedir a devolução pela União dos recursos não empenhados relativos à emenda parlamentar, razão pela qual revogo a decisão de 2769/2772, que determinou que a União se abstivesse de devolver as verbas não empenhadas relativas a emenda parlamentar.

3. DISPOSITIVO

Diante do exposto, julgo procedentes os pedidos, com resolução de mérito (art. 269, inciso I, do CPC), nos seguintes termos:

Em relação aos pedidos formulado no processo nº 0006464-60.2009.4.05.8500:

Radioterapia:

1) a União, Estado e Município devem adequar o atendimento oncológico de radioterapia em Sergipe, nos termos das Portarias nºs 2439/GM, 08 de dezembro de 2005 e 741/SAS, de 19 de dezembro de 2005, ampliando a rede de atendimento, sempre que houver aumento do números de casos de câncer.

1.1. Nos termos do item 1 supra, e tendo em vista o número de casos verificados por este juízo até a data da prolação desta sentença, ficam União, Estado de Sergipe e Município de Aracaju obrigados a instalar imediatamente, no mínimo, mais um serviço de radioterapia, sem prejuízo da manutenção dos serviços já existentes.

1.2 A revogação das citadas portarias, não prejudica as obrigações ora impostas nesta sentença.

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2) para fins de cumprimento do item 1 acima, a CNEN, desde que esteja tudo em conformidade com as normas respectivas, fica obrigada a conceder as licenças de funcionamento do novo serviço de radioterapia, no prazo máximo de 30 dias.

3) em relação ao serviço de radioterapia já existente, deverá ser respeitada a capacidade de atendimento inicialmente concedida pelo CNEN, evitando a utilização dos aparelhos em um terceiro turno de trabalho49. Quanto ao Cirurgia50, o Município51 está autorizado a contratualizar com o Hospital Cirurgia o serviço de radioterapia nos limites de sua capacidade, ou seja, por até dois turnos de trabalho, conforme autorização inicialmente concedida pelo CNEN.

4) o paciente tem o direito de ser atendido dentro de um prazo razoável, não superior a 30 (trinta) dias, seja dentro do Estado de Sergipe, seja via TFD, salvo se a situação for mais grave e o parecer médico indicar necessidade de início imediato de tratamento.

5) deve ser mantida a lista única de regulação para o tratamento dos pacientes que necessitam de serviço de radioterapia.

5.1) quem estiver gerenciando a fila de espera, deve informar mensalmente a este juízo:

a) o nome dos pacientes que estão na lista de espera, data de ingresso na fila, posição, diagnóstico, médico responsável e dados para contato (telefone e endereço), devendo destacar aqueles pacientes que ingressam na lista no mês em que a informação estiver sendo prestada.

b) os pacientes que estão em tratamento, hospital e o local (Estado de Sergipe ou TFD).

5.2) a Secretaria deverá formar autos suplementares com as informações deste item e dar vistas aos Ministérios Públicos na forma determinada na audiência do dia 28.07.2010, ou seja, os autos serão retirados pelo MPF e a Secretaria do Juízo intimará o MPE por mandado. Qualquer observação acerca das listas de espera acostadas aos autos suplementares deverá ser apresentada nos autos de eventual execução provisória.

Tratamento Fora do Domicílio – TFD

6) o Estado de Sergipe fica obrigado a fornecer Tratamento Fora de Domicílio no Sistema Único de Saúde a todos os pacientes que se encontram na lista de espera, nos termos da Portaria Ministério da Saúde/SAS/Nº 055 de 24 de fevereiro de 1999 enquanto houver na lista pacientes que optem por este tipo de tratamento.

49 Segundo o HUSE, “o equipamento, perante a CNEN foi autorizado para tratar 70 pacientes dia” (f. 569). 50 Segundo o Cirurgia “quando estiver com toda a capacidade de atendimento será capaz de manter de 70 a 100 pacientes por dia em tratamentos que duram cerca de 20 a 30 dias” (f. 2217- v.) 51 Se o Cirurgia passar a ser remunerado por outro ente político (Estado de Sergipe ou União), fica obrigado este a respeitar igual limite.

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6.1) as diárias devem ser pagas antecipadamente aos pacientes encaminhados para fora do Estado, conforme compromisso assumido pelo Estado de Sergipe na audiência do dia 24.03.2010 (f. 1303/1323).

6.1) o TFD deve ser acionado sempre que necessário para que o paciente seja atendido no prazo de 30 (trinta) dias, salvo se a situação for mais grave e o parecer médico indicar necessidade de início imediato de tratamento.

6.2) no caso de tratamento no Sistema Único de Saúde, a União, o Estado de Sergipe e o Município de Aracaju, este último na condição de gestor pleno, deverão custear o tratamento dos pacientes encaminhados para fora do Estado, cada um na proporção de com 1/3, ficando autorizada a União a alocar os valores para o Estado/Município que estiver conveniado ao nosocômio onde o paciente receber tratamento.

6.3) a União deverá informar mensalmente ao Estado de Sergipe e ao Município de Aracaju os recursos que foram transferidos do seu teto de Média e Alta Complexidade – MAC.

6.4) se o paciente não for tratado dentro do prazo de 30 (trinta) dias (item 4), deverá ser transferido para a rede privada, desde que haja execução provisória do julgado.

6.4.1) neste caso, os réus ficam autorizados a contratarem com instituições privadas, mediante convênio, com dispensa de licitação, preferencialmente em Estado adjacente (Estado da Bahia ou Alagoas) ou centros de reconhecida capacidade técnica; poderá também celebrar convênio prevendo o pagamento acima da tabela SUS, desde dentro dos valores de mercado, conforme tabela da AMB.

Braquiterapia

7) o Estado de Sergipe e o Hospital de Urgência de Sergipe ficam obrigados a colocar imediatamente em funcionamento o aparelho de braquiterapia.

Em relação ao pedido formulado no processo nº 0001610-86.2010.4.05.8500

8) reconhecer a responsabilidade genérica da União, Estado de Sergipe e Município de Aracaju em indenizar os danos morais e materiais sofridos pelos pacientes incluídos em fila de espera a partir da lista acostada com a inicial, nas f. 9797/103, incluídos os que optaram por não realizar o TFD, em razão do não fornecimento adequado do serviço de radioterapia, com base no art. 37, §6º da CF, cabendo aos mesmos ou a seus sucessores apurar o valor devido em liquidação a ser realizada em sede de execução, a teor do disposto no art. 95, c/c art. 98 da Lei 8.078/90.

Da antecipação dos efeitos da tutela e eventual execução provisória

Modifico a decisão que antecipou os efeitos da tutela de f.462-483 para determinar o imediato cumprimento das determinações contidas nesta sentença, à exceção do item 8, desde que os Ministérios Público promovam a execução provisória do julgado.

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Mantenho o termo inicial e o valor das multas fixadas na decisão que antecipou os efeitos da tutela e as aplicadas no curso do processo (f 1923 e 2024), até a presente sentença.

Considerando que os réus permaneceram inadimplentes quanto aos itens 3 e 352 da decisão que antecipou os efeitos da tutela (f.462-483), os quais foram confirmados na presente sentença (itens 1 e 7), elevo a pena de multa diária para o valor de R$ 50.000,00 (cinquenta mil reais) caso haja descumprimento injustificado dos citados itens.

Em relação aos itens 2 a 6, elevo a multa diária para R$ 10.000,00 (dez mil reais), sendo que a multa dos itens 4 e 6 será de R$ 10.000,00 para cada paciente não tratado.O réus serão multados toda vez que algum paciente permanecer mais de 30 (trinta) dias aguardando o serviço de radioterapia.

As multas incidirão automaticamente após o decurso do prazo sem cumprimento e reverter-se-ão em favor do Fundo a que se refere o art. 13 da Lei 7.347/85. Ressalto que o não pagamento das multas impostas poderá gerará a inclusão dos réus no CADIN ou outro cadastro restritivo.

No tocante à implantação imediata do novo serviço de radioterapia (item 1.1), desde que o Ministério Público Estadual e Federal promovam a execução provisória desta sentença, será designada uma audiência para colher a manifestação dos réus, em até 30 dias, sobre em qual local será instalado o novo serviço de radioterapia: se no HUSE ou no Hospital de Cirurgia.

Na audiência a ser designada, caso os réus não cheguem a um consenso, a solução de tal questão se transfere ao Poder Judiciário, ficando este juízo incumbido de escolher onde será instalado o novo serviço, a partir dos informes trazidos pelas partes. Na ocasião, também serão fixados os prazos necessários para o funcionamento do novo serviço de radioterapia.

Sem prejuízo da multa diária acima imposta e para os fins de escolha imediata do local onde será instalado o novo serviço de radioterapia, fixo multa por atentado à dignidade da jurisdição, no montante de 20% sobre o valor atualizado da causa, com fulcro no art. 14, V, PU do CPC. Neste caso, determino que sejam pessoalmente intimados o Ministro de Estado da Saúde, o Governador do Estado e o Secretário Estadual de Saúde de Sergipe, bem como o Prefeito e o Secretario Municipal de Saúde de Aracaju, para dar fiel cumprimento à presente sentença.

52 3. que, dentro do prazo de contestação, o Estado de Sergipe e o Município de Aracaju providenciem a adequação da cobertura de oncologia aos mínimos preconizados pelo Ministério da Saúde, instalando mais centros e/ou unidades de assistência em alta complexidade de oncologia no Estado de Sergipe, nos termos da Portaria 741 de 19 de dezembro de 2005 e 3.535/GM de 02 de setembro de 1998, devendo apresentar um cronograma necessário para adoção de providências, contemplando as diversas fases (edital, projeto básico e executivo, custos), a ser discutido em sede de audiência pública a ser designada; 3. que o Estado de Sergipe, através da Secretaria Estadual de Saúde, e o Hospital João Alves (Fundação Hospitalar) apresentem, no prazo de 15 (quinze) dias, de um cronograma detalhado, apontando data da contratação direta, o envio do material e o prazo de sua chegada, colocação do equipamento em funcionamento, inclusive apontando eventuais problemas, a fim de que este magistrado examine a razoabilidade do prazo. Se não houver a apresentação do cronograma, os referidos réus ficam obrigados a colocar em funcionamento o aparelho de braquiterapia nessa unidade hospitalar, no prazo de 60 (sessenta) dias.

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Assim, intimar o MPF, em querendo, promover a execução provisória da sentença, nos termos do art. 475-O do CPC.

Fica revogada a decisão de 2769/2772, que determinou que a União se abstivesse de devolver as verbas não empenhadas relativas a emenda parlamentar.

No tocante aos honorários advocatícios, não é o caso de condenação em favor do Ministério Público, pois: 1) estes se destinam a remunerar o advogado, dispondo o art. 23 da Lei 8.906/94 [Estatuto da OAB] que “os honorários incluídos na condenação, por arbitramento ou sucumbência, pertencem ao advogado [...]”; 2) o art. 128, § 5º, II, da Carta Magna, veda expressamente a percepção de honorários pelos membros do Ministério Público, sendo a interposição de ação civil pública função institucional do “Parquet” 5; 3) por simetria de tratamento, na hipótese de quando o autor da ação civil pública é vencido, não se fala em honorários, nos termos do precedente abaixo:

EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA – PROCESSO CIVIL – AÇÃO CIVIL PÚBLICA – HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS – MINISTÉRIO PÚBLICO AUTOR E VENCEDOR. 1. Na ação civil pública movida pelo Ministério Público, a questão da verba honorária foge inteiramente das regras do CPC, sendo disciplinada pelas normas próprias da Lei 7.347/85. 2. Posiciona-se o STJ no sentido de que, em sede de ação civil pública, a condenação do Ministério Público ao pagamento de honorários advocatícios somente é cabível na hipótese de comprovada e inequívoca má-fé do Parquet. 3. Dentro de absoluta simetria de tratamento e à luz da interpretação sistemática do ordenamento, não pode o parquet beneficiar-se de honorários, quando for vencedor na ação civil pública. Precedentes. 4. Embargos de divergência providos. 53

Juntar a resenha processual dos AGRT n.ºs 115949-SE, 104513-SE e 107991-SE e dos respectivos acórdãos no site da Internet. Comunicar aos relatores dos agravos pendentes de julgamento o inteiro teor da presente sentença.

Sentença sujeita a reexame necessário. Decorrido o prazo sem a interposição do recurso, remeter os autos ao eg. TRF da 5ª Região.

Publicar. Registrar. Intimar.

Aracaju, 15 de dezembro de 2011.

Fábio Cordeiro de Lima Juiz Federal Substituto da 1ª Vara/SE

53 STJ, EREsp 895530/PR, 1ª Seção, Rel. Min. ELIANA CALMON, julgado em 26/08/2009, DJe 18/12/2009