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Superior Tribunal de Justiça RECURSO ESPECIAL 1.481.089 - SP (2014/0225534-0) RELATOR : MINISTRO RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA RECORRENTE : SUL AMÉRICA COMPANHIA DE SEGURO SAÚDE ADVOGADOS : FERNANDO NEVES DA SILVA E OUTRO(S) LUIZ HENRIQUE FERREIRA LEITE E OUTRO(S) ADVOGADOS : ANDRÉ PAULINO MATTOS E OUTRO(S) WEBER DO AMARAL CHAVES ADVOGADA : ADRIANA BARBOSA DE CASTRO E OUTRO(S) ADVOGADOS : CRISTINA MARIA GAMA NEVES DA SILVA E OUTRO(S) FELIPE ROSA RECORRENTE : PORTO SEGURO - SEGURO SAÚDE S/A ADVOGADOS : PEDRO DA SILVA DINAMARCO MELINA MARTINS MERLO E OUTRO(S) RECORRIDO : ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE ASMÁTICOS DE SÃO PAULO ADVOGADOS : SIDNEI TURCZYN CARLA TURCZYN BERLAND E OUTRO(S) INTERES. : UNIMED ARARAQUARA COOPERATIVA DE TRABALHO MÉDICO ADVOGADOS : ALCEU DI NARDO E OUTRO(S) ALUÍSIO DI NARDO EMENTA RECURSO ESPECIAL. CIVIL. PLANO DE SAÚDE. NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL. NÃO OCORRÊNCIA. AÇÃO COLETIVA PROPOSTA POR ASSOCIAÇÃO. LEGITIMIDADE ATIVA. PERTINÊNCIA TEMÁTICA. SENTENÇA CONDENATÓRIA. EFEITOS SUBJETIVOS DA COISA JULGADA. RESTRIÇÃO AOS FILIADOS. REGIME DE REPRESENTAÇÃO PROCESSUAL. ASSISTÊNCIA FARMACÊUTICA. DOENÇA COBERTA. TRATAMENTO IMPRESCINDÍVEL À RECUPERAÇÃO DO PACIENTE. MEDICAMENTO IMPORTADO COM REGISTRO NA ANVISA. USO RESTRITO EM HOSPITAIS E CLÍNICAS MÉDICAS. OBRIGATORIEDADE DO CUSTEIO. 1. Ação coletiva que visa o reconhecimento da obrigatoriedade de cobertura do tratamento da asma alérgica persistente moderada a grave com o medicamento "Xolair" ao argumento de ser um direito básico de todos os usuários dos planos de saúde dos segmentos hospitalar e ambulatorial. 2. A defesa dos interesses e direitos coletivos não se limita às relações de consumo (arts. 81 e 82 do CDC), podendo a associação civil buscar a tutela coletiva para amparar seus filiados independentemente de serem eles consumidores, nas mais diversas relações jurídicas, desde que haja a autorização dos associados e esteja presente a pertinência temática. 3. A legitimidade ativa ad causam mostra-se presente, visto que o objetivo social da autora (promover uma melhor qualidade de vida aos pacientes portadores da enfermidade asma) e os seus fins institucionais são compatíveis com o interesse coletivo a ser protegido com a demanda (proteção da saúde de seus filiados com o fornecimento, pelas operadoras de plano de saúde, de determinado medicamento - Xolair - para o tratamento eficaz de asma de difícil controle). Desnecessidade de alusão expressa da defesa dos interesses e direitos dos consumidores dentre os objetivos institucionais da entidade, pois não se discute direitos consumeristas em si, mas direitos oriundos de setor regulado, qual seja, a Saúde Suplementar (relações entre usuários e operadoras de planos de saúde, com base na Lei 9.656/1998). 4. A entidade associativa somente pode promover ação coletiva em defesa de seus associados por meio da representação processual (art. 5º, XXI, da CF), a exigir Documento: 1470664 - Inteiro Teor do Acórdão - Site certificado - DJe: 09/12/2015 Página 1 de 22

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Superior Tribunal de Justiça

RECURSO ESPECIAL Nº 1.481.089 - SP (2014/0225534-0) RELATOR : MINISTRO RICARDO VILLAS BÔAS CUEVARECORRENTE : SUL AMÉRICA COMPANHIA DE SEGURO SAÚDE ADVOGADOS : FERNANDO NEVES DA SILVA E OUTRO(S)

LUIZ HENRIQUE FERREIRA LEITE E OUTRO(S)ADVOGADOS : ANDRÉ PAULINO MATTOS E OUTRO(S)

WEBER DO AMARAL CHAVES ADVOGADA : ADRIANA BARBOSA DE CASTRO E OUTRO(S)ADVOGADOS : CRISTINA MARIA GAMA NEVES DA SILVA E OUTRO(S)

FELIPE ROSA RECORRENTE : PORTO SEGURO - SEGURO SAÚDE S/A ADVOGADOS : PEDRO DA SILVA DINAMARCO

MELINA MARTINS MERLO E OUTRO(S)RECORRIDO : ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE ASMÁTICOS DE SÃO PAULO ADVOGADOS : SIDNEI TURCZYN

CARLA TURCZYN BERLAND E OUTRO(S)INTERES. : UNIMED ARARAQUARA COOPERATIVA DE TRABALHO MÉDICO ADVOGADOS : ALCEU DI NARDO E OUTRO(S)

ALUÍSIO DI NARDO EMENTA

RECURSO ESPECIAL. CIVIL. PLANO DE SAÚDE. NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL. NÃO OCORRÊNCIA. AÇÃO COLETIVA PROPOSTA POR ASSOCIAÇÃO. LEGITIMIDADE ATIVA. PERTINÊNCIA TEMÁTICA. SENTENÇA CONDENATÓRIA. EFEITOS SUBJETIVOS DA COISA JULGADA. RESTRIÇÃO AOS FILIADOS. REGIME DE REPRESENTAÇÃO PROCESSUAL. ASSISTÊNCIA FARMACÊUTICA. DOENÇA COBERTA. TRATAMENTO IMPRESCINDÍVEL À RECUPERAÇÃO DO PACIENTE. MEDICAMENTO IMPORTADO COM REGISTRO NA ANVISA. USO RESTRITO EM HOSPITAIS E CLÍNICAS MÉDICAS. OBRIGATORIEDADE DO CUSTEIO.1. Ação coletiva que visa o reconhecimento da obrigatoriedade de cobertura do tratamento da asma alérgica persistente moderada a grave com o medicamento "Xolair" ao argumento de ser um direito básico de todos os usuários dos planos de saúde dos segmentos hospitalar e ambulatorial.2. A defesa dos interesses e direitos coletivos não se limita às relações de consumo (arts. 81 e 82 do CDC), podendo a associação civil buscar a tutela coletiva para amparar seus filiados independentemente de serem eles consumidores, nas mais diversas relações jurídicas, desde que haja a autorização dos associados e esteja presente a pertinência temática.3. A legitimidade ativa ad causam mostra-se presente, visto que o objetivo social da autora (promover uma melhor qualidade de vida aos pacientes portadores da enfermidade asma) e os seus fins institucionais são compatíveis com o interesse coletivo a ser protegido com a demanda (proteção da saúde de seus filiados com o fornecimento, pelas operadoras de plano de saúde, de determinado medicamento - Xolair - para o tratamento eficaz de asma de difícil controle). Desnecessidade de alusão expressa da defesa dos interesses e direitos dos consumidores dentre os objetivos institucionais da entidade, pois não se discute direitos consumeristas em si, mas direitos oriundos de setor regulado, qual seja, a Saúde Suplementar (relações entre usuários e operadoras de planos de saúde, com base na Lei nº 9.656/1998).4. A entidade associativa somente pode promover ação coletiva em defesa de seus associados por meio da representação processual (art. 5º, XXI, da CF), a exigir

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deles prévia autorização especial, seja por ato individual seja por deliberação em assembleia, que não se satisfaz com a mera autorização estatutária genérica. Hipótese de restrição, no caso dos autos, dos efeitos subjetivos da coisa julgada.5. Estão excluídos das exigências mínimas de cobertura assistencial a ser oferecida pelas operadoras de plano de saúde o fornecimento de medicamentos importados não nacionalizados e o fornecimento de medicamentos para tratamento domiciliar, salvo se for o caso, nessa última hipótese, de tratamentos antineoplásicos (art. 10, V e VI, da Lei nº 9.656/1998).6. Nos termos da RN nº 338/2013 da ANS, medicamento importado não nacionalizado é aquele produzido fora do território nacional e sem registro vigente na ANVISA. Por seu turno, medicamento de uso domiciliar é aquele prescrito pelo médico assistente para administração em ambiente externo ao de unidade de saúde.7. Embora o medicamento "Xolair" (princípio ativo omalizumabe) seja produzido fora do território nacional, possui registro na ANVISA, ou seja, é nacionalizado. Ademais, a sua administração deve ser feita em clínicas ou hospitais, sob supervisão médica, não podendo ser adquirido em farmácias (uso restrito nas unidades de saúde). Observância, ademais, da legislação sanitária (arts. 10, 12 e 66 da Lei nº 6.360/1976 e 10, IV, da Lei nº 6.437/1977).8. A exclusão da cobertura do produto farmacológico nacionalizado e indicado pelo médico assistente, de uso ambulatorial ou hospitalar e sem substituto eficaz, para o tratamento da enfermidade significaria negar a própria essência do tratamento, desvirtuando a finalidade do contrato de assistência à saúde. 9. A cobertura obrigatória da assistência suplementar à saúde abrange, caso haja indicação clínica, os insumos necessários para a realização de procedimentos cobertos, incluídos os medicamentos, sobretudo os registrados ou regularizados na ANVISA, imprescindíveis para a boa terapêutica do usuário (arts. 35-F da Lei nº 9.656/1998 e 6º, parágrafo único, 17 e 20, III, da RN nº 338/2013 da ANS). Precedentes.10. Recursos especiais parcialmente providos.

ACÓRDÃOVistos e relatados estes autos, em que são partes as acima indicadas, decide a

Terceira Turma, por unanimidade, dar parcial provimento aos recursos especiais, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator. Os Srs. Ministros Marco Aurélio Bellizze, Moura Ribeiro, João Otávio de Noronha e Paulo de Tarso Sanseverino votaram com o Sr. Ministro Relator.

Brasília (DF), 1º de dezembro de 2015(Data do Julgamento)

Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva Relator

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RECURSO ESPECIAL Nº 1.481.089 - SP (2014/0225534-0)

RELATÓRIO

O EXMO. SR. MINISTRO RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA (Relator):

Trata-se de dois recursos especiais interpostos, respectivamente, por PORTO

SEGURO - SEGURO SAÚDE S.A., com fulcro no art. 105, inciso III, alínea "a", da Constituição

Federal, e por SUL AMÉRICA COMPANHIA DE SEGURO SAÚDE, com espeque nas alíneas "a"

e "c" do permissivo constitucional, contra acórdão proferido pelo Tribunal de Justiça do Estado de

São Paulo.

Noticiam os autos que a ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE ASMÁTICOS DE SÃO

PAULO - ABRA/SP ajuizou ação coletiva contra as ora recorrentes visando, entre outras

providências, que fosse reconhecida a cobertura do tratamento da asma alérgica persistente

moderada a grave com o medicamento "Xolair", por ser um direito básico de todos os usuários

dos planos de saúde dos segmentos hospitalar e ambulatorial.

O magistrado de primeiro grau julgou procedentes os pedidos, condenando as rés

a custear o fármaco "Xolair" sempre que seus clientes apresentassem prescrição médica para o

tratamento da asma com o uso do aludido medicamento.

Irresignadas, as operadoras de plano de saúde interpuseram recursos de apelação,

os quais não foram providos, mas com a observação de que "os efeitos da coisa julgada se

restringirão ao território do Estado de São Paulo, para atingir toda a categoria de beneficiários dos

planos de saúde das requeridas, independentemente de filiação à associação autora, nos moldes

do pedido deduzido na inicial" (fl. 1.204).

O acórdão recebeu a seguinte ementa:

"PLANO DE SAÚDE - AÇÃO CIVIL PÚBLICA - Demanda deduzida por associação protetora dos interesses de pacientes portadores de asma, visando obrigar as requeridas a custear o tratamento da enfermidade por meio do medicamento 'Xolair' - Sentença de procedência - Inconformismo das requeridas - Não acolhimento - Aplicáveis as disposições da Lei n° 9.656/98 - Contrato de trato sucessivo, que se renova automaticamente - Não comprovação de que o medicamento seja utilizado em regime domiciliar, com função de profilaxia - Fármaco de uso restrito a hospitais, ministrado sob supervisão médica - Remédio importado, registrado na ANVISA e regularmente distribuído no país - Não comprovação de existência de medicamento nacional dotado de mesma eficácia para o tratamento, podendo substituir, sem prejuízos, o fármaco estrangeiro - Negar o custeio do remédio que é essencial ao tratamento implica, em última análise, negar o próprio tratamento recomendado, o que fere a boa-fé e ameaça o objeto e equilíbrio contratual - Abusividade reconhecida - Efeitos da coisa julgada restritos ao território do Estado de São Paulo, para atingir toda a categoria de beneficiários dos planos de saúde das requeridas, independentemente de filiação à associação autora - Sentença mantida - Recursos desprovidos, com observação"

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(fl. 1.186).

Os embargos de declaração opostos foram rejeitados (fl. 1.229).

No seu especial, PORTO SEGURO - SEGURO SAÚDE S.A. sustenta violação dos

arts. 131, 458, II, e 535, I e II, do Código de Processo Civil (CPC); 1.432, 1.434 e 1460 do Código

Civil de 1916; 757 do Código Civil de 2002 (CC); 51, IV, e § 1º, I e II, e 54, § 4º, do Código de

Defesa do Consumidor (CDC); 10, V e VI, e 12, II, "d", da Lei nº 9.656/1998 e 2º-A da Lei nº

9.494/1997.

Aduz, em síntese: a) ser nulo o acórdão dos embargos de declaração por negativa

de prestação jurisdicional, b) ser necessária a limitação dos efeitos da sentença apenas aos

associados da entidade autora que, no momento da propositura da ação, possuíam domicílio no

Estado de São Paulo (âmbito de competência territorial do órgão prolator da decisão

condenatória) e c) ser lícita a limitação dos riscos cobertos nos contratos de plano de saúde,

como a vedação de custeio de remédio importado não nacionalizado ou de uso domiciliar.

Acrescenta que

"(...) o Xolair é fabricado nos Estados Unidos da América, mais precisamente em São Francisco na Califórnia, pela empresa Genentech Inc.. E é embalado na sede da Novartis Pharma em Stein, na Suíça (cfr. bula - fls. 49). O XOLAIR é importado para o Brasil pela subsidiária da Novartis Pharma (Novartis Biociências), que se limita a cuidar da sua distribuição no país. Nessas condições, trata-se inquestionavelmente de medicamento importado.

(...)Mais um forte argumento para a reforma dos VV. Acórdãos

recorridos remete ao fato de que o Xolair é um medicamento de uso clínico ou domiciliar, com efeito eminentemente profilático; ele é ministrado justamente para prevenir a internação.

Ocorre que, de acordo com os arts. 10, VI, e 12, II, 'd', da Lei 9.656/98, as operadoras de seguro-saúde somente estão obrigadas à cobertura de medicamentos se - e somente se - eles forem necessários durante o período de internação hospitalar, estando liberadas do seu custeio em caso de tratamento domiciliar. Logo, não há mesmo brecha para impor à Porto Seguro o custeio do Xolair" (fls. 1.286/1.287).

Por sua vez, SUL AMÉRICA COMPANHIA DE SEGURO SAÚDE sustenta, além de

divergência jurisprudencial, ofensa aos arts. 128, 460 e 535 do Código de Processo Civil (CPC),

5º, V, da Lei nº 7.347/1985 e 82, IV e VI, do CDC.

Alega, em suma: a) que o acórdão dos embargos declaratórios é nulo, porquanto

não foram sanadas as omissões apontadas, b) que a ABRA/SP não detém legitimidade ativa para

a propositura da ação coletiva, visto que não consta nos seus fins institucionais a defesa do

consumidor, e c) que o pedido feito na inicial restringiu-se aos associados da autora, de forma

que os efeitos condenatórios da sentença não podem ser extrapolados para beneficiar também os

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usuários de planos de saúde não associados.

Após a apresentação de contrarrazões (fls. 1.342/1.376), ambos os recursos foram

admitidos na origem (fls. 1.383/1.388).

O Ministério Público Federal, no parecer de fls. 1.442/1.448, opinou pelo não

provimento dos recursos especiais.

É o relatório.

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RECURSO ESPECIAL Nº 1.481.089 - SP (2014/0225534-0)

VOTO

O EXMO. SR. MINISTRO RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA (Relator):

As questões controvertidas nestes autos são: a) se houve negativa de prestação

jurisdicional pela Corte estadual quando do julgamento dos embargos de declaração, b) se a

ABRA/SP detém legitimidade ativa para a propositura da ação coletiva, visto que não consta entre

seus fins institucionais a defesa do consumidor, c) se os efeitos condenatórios da sentença

proferida na ação coletiva podem beneficiar também os usuários de plano de assistência

médico-hospitalar não associados da entidade autora e d) se a cobertura do tratamento da asma

alérgica persistente moderada a grave com o medicamento "Xolair" é obrigatória aos planos de

saúde dos segmentos hospitalar e ambulatorial, haja vista a vedação legal de custeio de remédio

importado não nacionalizado ou de uso domiciliar.

1. Da negativa de prestação jurisdicional

Não há falar em negativa de prestação jurisdicional nos embargos declaratórios, a

qual somente se configura quando, na apreciação do recurso, o Tribunal de origem insiste em

omitir pronunciamento a respeito de questão que deveria ser decidida, e não foi.

Concretamente, verifica-se que as instâncias ordinárias enfrentaram a matéria

posta em debate na medida necessária para o deslinde da controvérsia. É cediço que a escolha

de uma tese refuta, ainda que implicitamente, outras que sejam incompatíveis.

Registre-se, por oportuno, que o órgão julgador não está obrigado a se pronunciar

acerca de todo e qualquer ponto suscitado pelas partes, mas apenas sobre aqueles considerados

suficientes para fundamentar sua decisão, o que foi feito.

Nesse sentido:

"AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. RESPONSABILIDADE CIVIL. DANOS MORAIS E MATERIAIS. TRANSFERÊNCIA CONDICIONADA AO PAGAMENTO DE RENOVAÇÃO DE MATRÍCULA. PRETENSÃO DE REEXAME DO CONJUNTO FÁTICO-PROBATÓRIO DELINEADO PELA CORTE LOCAL. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA 07/STJ. VIOLAÇÃO AO ARTIGO 535 DO CPC. JULGADO QUE TRAZ FUNDAMENTAÇÃO SUFICIENTE. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO.(...)2. 'Quando o Tribunal de origem, ainda que sucintamente, pronuncia-se de forma clara e suficiente sobre a questão posta nos autos, não se configura ofensa ao artigo 535 do CPC. Ademais, o magistrado não está obrigado a rebater, um a um, os argumentos trazidos pela parte' (AgRg no Ag 1.265.516/RS, 4ª Turma, Rel. Min. João Otávio de Noronha, DJe de 30/06/2010).

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3. Agravo regimental desprovido" (AgRg no AREsp nº 205.312/DF, Rel. Min. PAULO DE TARSO SANSEVERINO, Terceira Turma, DJe 11/2/2014).

2. Da legitimidade ativa da ABRA/SP para a propositura da ação coletiva

No tocante à legitimidade ativa da Associação Brasileira de Asmáticos de São

Paulo - ABRA/SP para o ajuizamento da presente ação coletiva, já que não consta no seu

estatuto, entre os fins institucionais, a defesa do consumidor, cumpre fazer, inicialmente, algumas

considerações sobre a questão.

A legitimidade das entidades associativas para defender em juízo os interesses de

seus filiados encontra assento constitucional, como se extrai do art. 5º, XXI, da Constituição

Federal (CF), podendo ser exercida através da representação processual.

Desse modo, como as associações civis, nas ações coletivas, só podem

atuar no processo como representantes de seus associados, deve haver uma

correspondência entre a finalidade institucional da entidade e o objeto da lide. Esse é o

requisito da pertinência temática.

Ademais, apesar de ser a hipótese mais comum, a defesa dos interesses e

direitos coletivos não se limita às relações de consumo (arts. 81 e 82 do CDC), podendo a

associação civil buscar a tutela coletiva para amparar seus filiados independentemente de

serem eles consumidores, nas mais diversas relações jurídicas.

Nesse sentido, a seguinte lição de Teori Zavascki, doutrinador e Ministro do

Supremo Tribunal Federal (STF):

"(...)7.4.3 Legitimação das entidades associativasA Constituição Federal, em notável medida de estímulo e prestígio

às ações coletivas, criou duas importantes hipóteses de legitimação ativa: a das entidades associativas e a das entidades sindicais. A primeira, no art. 5º, XXI: 'As entidades associativas, quando expressamente autorizadas, têm legitimidade para representar seus filiados judicial ou extrajudicialmente'. E a segunda, no art. 8°, III: 'Ao sindicato cabe a defesa dos direitos e interesses coletivos ou individuais da categoria inclusive em questões judiciais ou administrativas'. A primeira, mais que a segunda (voltada para as questões trabalhistas), tem sua direção focada para o âmbito do processo civil, e daí merecer aqui atenção especial.

Diferentemente do que ocorre com outras formas de legitimação, a do art. 5.°, XXI, da CF é específica quanto à identificação dos legitimados ('entidades associativas'), mas é inespecífica quanto aos bens jurídicos passíveis de tutela, que nela não estão expressamente determinados. Certamente não se trata de legitimação com objeto ilimitado. Há limitações implícitas, que podem ser identificadas por interpretação sistemática.

Se a legitimação é para 'representar seus filiados', um limite de atuação fica desde logo patenteado: o objeto material da demanda deve ficar circunscrito aos direitos e interesses desses filiados. Um outro limite é

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imposto pelo interesse de agir da instituição legitimada: sua atuação deve guardar relação com seus fins institucionais. Às associações culturais cabe tutelar direitos de seus filiados relacionados à cultura (e não a outros, estranhos ao âmbito associativo); às associações esportivas e recreativas, os interesse relacionados com esporte e recreação; às associações de defesa do consumidor, os direitos decorrentes de relações de consumo; às entidades profissionais, os direitos dos seus filiados ligados ao exercício da sua profissão. Quem se filia a associação destinada a pesca submarina não o faz imaginando que a entidade vá tutelar seus direitos relacionados à questões fiscais, ou suas relações condominiais ou de vizinhança.

Um equívoco deve ser, entretanto, evitado: o de se imaginar que só cabe ação coletiva quando seu objeto for a tutela de direitos individuais homogêneos decorrentes das relações de consumo. Essa afirmação - freqüente, ainda que de forma implícita, até mesmo na jurisprudência - faz uma interpretação reducionista das variadas hipóteses legais de legitimação para demandas coletivas, restringindo-as às do art. 82, do Código de Proteção e Defesa do Consumidor. Na verdade, excetuadas certas limitações ao cabimento da ação coletiva impostas por via da legislação (adiante referidas), a legitimação prevista no art. 5º, XXI, da Constituição é ampla: a entidade associativa está habilitada a promover ações coletivas para tutela de quaisquer direitos subjetivos dos seus filiados, desde que tais direitos guardem relação de pertinência material com os fins institucionais da associação, fins esses que, afinal de contas, constituíram o móvel propulsor da própria filiação.

Há de se considerar, quanto ao âmbito subjetivo da substituição processual, os limites estabelecidos pelo art. 2.°-A da Lei 9.494, de 10.09.97, que dispõe: 'A sentença civil prolatada em ação de caráter coletivo proposta por entidade associativa, na defesa de interesses e direitos dos seus associados, abrangerá apenas os substituídos que tenham, na data da propositura da ação, domicílio no âmbito da competência territorial do órgão prolator'. Sendo esses os limites estabelecidos para a eficácia subjetiva da sentença, é certo que o rol dos substituídos no processo fica restrito aos domiciliados no território da competência do juiz".(ZAVASCKI, Teori Albino. Processo Coletivo: tutela de direitos coletivos e tutela coletiva de direitos. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006, págs. 175-177 - grifou-se)

Na espécie, não se discutem direitos consumeristas em si, mas direitos oriundos de

setor regulado, qual seja, a Saúde Suplementar, motivo pelo qual as relações são entre usuários

e operadoras de planos de saúde, a atrair a aplicação primordial da Lei nº 9.656/1998. É por isso

que não precisaria constar no estatuto social da ABRA/SP, entre as finalidades institucionais, a

defesa dos interesses e direitos dos consumidores. A legitimação para a causa não adveio do art.

82 do CDC, mas da representação processual (autorização de filiados) e do cumprimento do

requisito da pertinência temática.

Com efeito, a legitimidade ativa ad causam mostra-se presente, visto que o objetivo

social da autora (promover uma melhor qualidade de vida aos pacientes portadores da

enfermidade asma) e os seus fins institucionais são compatíveis com o interesse coletivo a ser

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protegido com a demanda (proteção da saúde de seus filiados com o fornecimento, pelas

operadoras de plano de saúde, de determinado medicamento - Xolair - para o tratamento eficaz

de asma de difícil controle).

A propósito, o seguinte trecho do acórdão estadual, proferido em embargos de

declaração:

"(...)A legitimidade ativa da autora, embora questionada pelas rés

somente em sede de embargos de declaração, foi reconhecida implicitamente pelo acórdão atacado.

De fato, a decisão vergastada fez constar de modo expresso que a autora ajuizou ação civil pública 'na qualidade de associação civil sem fins lucrativos, que tem por objeto social 'promover uma melhor qualidade de vida aos pacientes portadores da enfermidade ASMA' (fls. 20)'.

Evidente que, assim dispondo, o Acórdão reconhece tacitamente que o objetivo social da autora lhe confere legitimidade para o manejo da presente ação, não sendo lícito falar em restrição derivada de seu estatuto social" (fl. 1.231).

Cabe conferir também, por pertinente, os seguintes julgados deste Tribunal

Superior:

"DIREITO COLETIVO E DIREITO DO CONSUMIDOR. ASSOCIAÇÃO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. RENEGOCIAÇÃO DE DÉBITOS ORIUNDOS DE CONTRATO DE CÉDULA DE CRÉDITO RURAL. DIREITOS INDIVIDUAIS HOMOGÊNEOS. INCIDÊNCIA DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. 1. 'As Turmas que compõem a Seção de Direito Privado não discrepam sobre a legitimidade ativa de associação civil de defesa do consumidor, preenchidos os requisitos legais, para ajuizar ação civil pública com o fim de declarar a nulidade de cláusulas do contrato e pedir a restituição de importâncias indevidamente cobradas' (REsp 313.364/SP, Rel. Ministro CARLOS ALBERTO MENEZES DIREITO, TERCEIRA TURMA, julgado em 27/11/2001, DJ 06/05/2002, p. 287). 2. A Carta Magna (art. 5°, XXI) trouxe apreciável normativo de estímulo às ações coletivas ao estabelecer que as entidades associativas detêm legitimidade para representar judicial e extrajudicialmente seus filiados, sendo que, no tocante a legitimação, '[...] um limite de atuação fica desde logo patenteado: o objeto material da demanda deve ficar circunscrito aos direitos e interesses desses filiados. Um outro limite é imposto pelo interesse de agir da instituição legitimada: sua atuação deve guardar relação com seus fins institucionais' (ZAVASCKI, Teori Albino. Processo coletivo: tutela de direitos coletivos e tutela coletiva de direitos. São Paulo: RT, 2014, p. 162). 3. Chegar à conclusão diversa quanto à existência de previsão estatutária que autorizasse a representação dos associados, bem como o cumprimento das finalidades institucionais compatíveis, demandaria o reexame do contexto fático-probatório dos autos e das cláusulas do contrato social, o que encontra óbice nas Súmulas n. 5 e 7 do STJ. 4. No tocante ao objeto, a presente ação civil pública bem delimitou a sua pretensão, tanto com especificação da providência jurisdicional (objeto imediato) como com a delimitação do bem pretendido (objeto mediato), havendo nexo de logicidade entre o pedido e a causa de pedir para fins de delimitação de sua pretensão, não havendo falar em inépcia da inicial. 5. Tratando-se de ações de massa, deve-se conferir primazia ao princípio do

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interesse jurisdicional no conhecimento do mérito do processo coletivo, haja vista que o aplicador da lei deve ter em conta que a solução do litígio, de uma só vez, resolverá conflitos que envolvem uma gama de indivíduos, quando, para isso, apenas se fizer necessário uma releitura de elementos processuais, especialmente para afastar eventual invalidade que esteja em detrimento do direito em si. 6. É torrencial a jurisprudência do STJ reconhecendo a incidência do Código do Consumidor nos contratos de cédula de crédito rural. 7. O próprio CDC estabelece (art. 52) que a outorga de crédito ou concessão de financiamento caracteriza típica relação de consumo entre quem concede e quem o recebe, pois o produto fornecido é o dinheiro ou crédito, bem juridicamente consumível. 7. A norma que institucionaliza o crédito rural (Lei n. 4.829/1965) estabelece como um dos objetivos específicos do crédito rural (art. 3°) é o de 'possibilitar o fortalecimento econômico dos produtores rurais, notadamente pequenos e médios' (inciso III) e o de 'incentivar a introdução de métodos racionais de produção, visando ao aumento da produtividade e à melhoria do padrão de vida das populações rurais, e à adequada defesa do solo' (inciso IV). 8. Dessarte, mesmo que o financiamento por meio de cédula de crédito rural se destine ao desenvolvimento da atividade rural, há, em regra, presunção de vulnerabilidade do contratante produtor, equiparando-o ao consumidor stricto sensu, dando-se prevalência à destinação fática para fins de qualificação do consumidor. Precedentes. 9. Conforme jurisprudência consolidada no STJ, 'nas cédulas de crédito rural, comercial e industrial, não se admite a cobrança de comissão de permanência. Precedentes' (AgRg no AREsp 129.689/RS, Rel. Ministro ANTONIO CARLOS FERREIRA, QUARTA TURMA, julgado em 03/04/2014, DJe 11/04/2014). 10. Recurso especial não provido." (REsp nº 1.166.054/RN, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, Quarta Turma, DJe 18/6/2015 - grifou-se)

"AMBIENTAL E PROCESSUAL CIVIL. PRESERVAÇÃO ARQUITETÔNICA DO PARQUE LAGE (RJ). ASSOCIAÇÃO DE MORADORES. LEGITIMIDADE ATIVA. PERTINÊNCIA TEMÁTICA CARACTERIZADA. CONCEITO LEGAL DE 'MEIO AMBIENTE' QUE ABRANGE IDEAIS DE ESTÉTICA E PAISAGISMO (ARTS. 225, CAPUT, DA CR/88 E 3º, INC. III, ALÍNEAS 'A' E 'D' DA LEI N. 6.938/81).1. O estatuto da associação recorrente prevê, em seu art. 4º (1), que um de seus objetivos é '[z]elar pela manutenção e melhoria da qualidade de vida do bairro, buscando manter sua ocupação e seu desenvolvimento em ritmo e grau compatíveis com suas características de zona residencial'.2. Desta cláusula, é perfeitamente possível extrair sua legitimidade para ação civil pública em que se pretende o seqüestro do conjunto arquitetônico 'Mansão dos Lage', a cessação imediata de toda atividade predadora e poluidora no conjunto arquitetônico e a proibição de construção de anexos e de obras internas e externas no referido conjunto arquitetônico. Dois são os motivos que levam a tal compreensão.3. Em primeiro lugar, a Constituição da República vigente expressamente vincula o meio ambiente à sadia qualidade de vida (art. 225, caput), daí porque é válido concluir que a proteção ambiental tem correlação direta com a manutenção e melhoria da qualidade de vida dos moradores do Jardim Botânico (RJ).4. Em segundo lugar, a legislação federal brasileira que trata da problemática da preservação do meio ambiente é expressa, clara e precisa quanto à relação de continência existente entre os conceitos de loteamento, paisagismo e estética

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urbana e o conceito de meio ambiente, sendo que este último abrange os primeiros.5. Neste sentido, importante citar o que dispõe o art. 3º, inc. III, alíneas 'a' e 'd', da Lei n. 6.938/81, que considera como poluição qualquer degradação ambiental resultante de atividades que direta ou indiretamente prejudiquem a saúde e o bem-estar da população e afetem condições estéticas do meio ambiente.6. Assim sendo, não há como sustentar, à luz da legislação vigente, que inexiste pertinência temática entre o objeto social da parte recorrente e a pretensão desenvolvida na presente demanda, na forma do art. 5º, inc. V, alínea 'b', da Lei n. 7.347/85.7. Recurso especial provido." (REsp nº 876.931/RJ, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, Segunda Turma, DJe 10/9/2010 - grifou-se)

Depreende-se, assim, a existência de legitimidade processual da ABRA/SP, haja

vista a adequação do direito vindicado na demanda coletiva, de setor regulado, aos seus fins

sociais (pertinência temática), sendo desnecessária, portanto, a alusão expressa da defesa dos

interesses e direitos dos consumidores dentre os objetivos institucionais da entidade.

3. Dos limites subjetivos da sentença condenatória proferida em ação coletiva proposta por entidade associativa

No tocante à abrangência subjetiva da sentença proferida na ação coletiva ajuizada

por associação, sobretudo se seus efeitos podem beneficiar os não associados, cabe fazer, por

primeiro, uma distinção.

A Constituição Federal, no art. 5º, inciso XXI, conferiu legitimidade às entidades

associativas para promover, por meio da representação processual, a defesa judicial e

extrajudicial de seus associados, a exigir deles, portanto, prévia autorização especial, seja por ato

individual, seja por deliberação em assembleia, para a propositura de ação coletiva, que não se

satisfaz com a mera autorização estatutária genérica. Por outro lado, as entidades sindicais,

como atuam como substitutas processuais (art. 8º, III, da CF), não necessitam dessa

manifestação individual ou assemblear.

Ademais, no caso do mandado de segurança coletivo, a teor do art. 5º, LXX, da

CF, a legitimação da organização sindical, da entidade de classe e da associação legalmente

constituída e em funcionamento há pelo menos 1 (um) ano para a sua impetração também

prescinde de autorização específica (Súmula nº 629/STF), ainda que veicule pretensão que

interesse a apenas parte de seus membros e associados (Súmula nº 630/STF e art. 21 da Lei nº

12.016/2009), pois o regime é o de substituição processual.

Nesse sentido, os seguintes julgados, proferidos pelo Supremo Tribunal Federal,

no regime da repercussão geral, e por esta Corte Superior:

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"REPRESENTAÇÃO – ASSOCIADOS – ARTIGO 5º, INCISO XXI, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. ALCANCE. O disposto no artigo 5º, inciso XXI, da Carta da República encerra representação específica, não alcançando previsão genérica do estatuto da associação a revelar a defesa dos interesses dos associados. TÍTULO EXECUTIVO JUDICIAL – ASSOCIAÇÃO – BENEFICIÁRIOS. As balizas subjetivas do título judicial, formalizado em ação proposta por associação, é definida pela representação no processo de conhecimento, presente a autorização expressa dos associados e a lista destes juntada à inicial ." (STF, RE nº 573.232/SC, Rel. p/ acórdão Min. MARCO AURÉLIO, Pleno, DJe 19/9/2014 - grifou-se)

PROCESSUAL CIVIL E PREVIDÊNCIA PRIVADA. RECURSO ESPECIAL. EXTENSÃO DA DECISÃO, PROLATADA EM AÇÃO COLETIVA, AOS PARTICIPANTES E/OU ASSISTIDOS QUE NÃO SÃO FILIADOS À ASSOCIAÇÃO, AO FUNDAMENTO DE ISONOMIA. DESCABIMENTO. RELAÇÃO CONTRATUAL AUTÔNOMA DE PREVIDÊNCIA PRIVADA E RELAÇÃO ESTATUTÁRIA E/OU CELETISTA. VÍNCULOS CONTRATUAIS DISTINTOS, QUE NÃO SE COMUNICAM. INEXISTÊNCIA DE INTERESSE JURÍDICO A JUSTIFICAR O AJUIZAMENTO DE AÇÃO COLETIVA, POR ASSOCIAÇÃO QUE TEM POR FIM INSTITUCIONAL APENAS A DEFESA DE SERVIDORES PÚBLICOS, PARA DISCUSSÃO CONCERNENTE EXCLUSIVAMENTE À RELAÇÃO CONTRATUAL PREVIDENCIÁRIA. CONTUDO, EM VISTA DO TRÂNSITO EM JULGADO DA DECISÃO, CABE OBSERVÂNCIA AO QUE FORA DECIDIDO, EM DECISÃO SOB O MANTO DA COISA JULGADA MATERIAL, FIXANDO OS SEUS LIMITES SUBJETIVOS. AÇÃO COLETIVA MOVIDA POR ASSOCIAÇÃO EM FACE DE ENTIDADE DE PREVIDÊNCIA PRIVADA. À LUZ DA INTERPRETAÇÃO DO ART. 5º, XXI, DA CF, CONFERIDA PELO PLENÁRIO DO STF, EM DECISÃO COM REPERCUSSÃO GERAL, NÃO CARACTERIZA - À EXCEÇÃO DO MANDADO DE SEGURANÇA COLETIVO - A ATUAÇÃO DE ASSOCIAÇÃO COMO SUBSTITUIÇÃO PROCESSUAL, MAS COMO REPRESENTAÇÃO, EM QUE É DEFENDIDO O DIREITO DE OUTREM (DOS ASSOCIADOS), NÃO EM NOME PRÓPRIO DA ENTIDADE. 1. Na ação prévia de conhecimento, houve inequívoca limitação aos associados da autora que os representou naquela lide, definindo o campo subjetivo. Ademais, o próprio acórdão recorrido reconhece que, na verdade, não está cumprindo a coisa julgada, mas sim estendendo à autora o decidido na sentença coletiva, ao fundamento de que 'todos aqueles que se encontrarem em situação análoga devem ser beneficiados pela procedência da lide, na medida em que foi declarado irregular o ato normativo expedido pela ré/apelada, sob pena de se criarem situações jurídicas diversas dentro da mesma classe de funcionários públicos'. (...)4. Ademais, não se desconhece que prevalece na jurisprudência do STJ o entendimento de que, indistintamente, os sindicatos e associações, na qualidade de substitutos processuais, detêm legitimidade para atuar judicialmente na defesa dos interesses coletivos de toda a categoria que representam, por isso, caso a sentença coletiva não tenha uma delimitação expressa dos seus limites subjetivos, a coisa julgada advinda da ação coletiva deve alcançar todas as pessoas da categoria, legitimando-as para a propositura individual da execução de sentença. 5. No entanto, não pode ser ignorado que, por ocasião do julgamento do Recurso Extraordinário n. 573.232/SC, sob o regime do artigo 543-B do CPC, o Plenário do

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STF proferiu decisão, com repercussão geral, perfilhando entendimento acerca da exegese do art. 5º, inciso XXI, da Constituição Federal, em que fez distinção entre a representação, conferida pelo mencionado dispositivo às associações, da substituição processual dos sindicatos. 6. Com efeito, à luz da interpretação do art. 5º, XXI, da CF, conferida por seu intérprete Maior, não caracterizando a atuação de associação como substituição processual - à exceção do mandado de segurança coletivo -, mas como representação, em que é defendido o direito de outrem (dos associados), não em nome próprio da entidade, não há como reconhecer a possibilidade de execução da sentença coletiva por membro da coletividade do plano de benefícios de previdência privada que nem sequer foi filiado à associação autora da ação coletiva. 7. Recurso especial provido." (REsp nº 1.374.678/RJ, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, Quarta Turma, DJe 4/8/2015 - grifou-se)

Logo, como a entidade associativa somente pode promover ação coletiva por meio

da representação processual, deve ser acolhido o pedido feito nos recursos especiais de restrição

dos efeitos da coisa julgada apenas aos associados da autora que detinham essa condição até a

data da propositura da demanda.

4. Da obrigatoriedade de cobertura do medicamento "Xolair" pelos planos de saúde

No que tange à cobertura obrigatória do medicamento "Xolair" pelos planos de

saúde, visto que essencial para o tratamento de portadores da asma de difícil controle, a

recorrente PORTO SEGURO - SEGURO SAÚDE S.A. alega ser lícita a limitação de riscos

cobertos, a exemplo da vedação de custeio de remédio importado não nacionalizado ou de uso

domiciliar.

Efetivamente, consoante a Lei nº 9.656/1998, estão excluídos das exigências

mínimas de cobertura assistencial a ser oferecida pelas operadoras de plano de saúde o

fornecimento de medicamentos importados não nacionalizados e o fornecimento de

medicamentos para tratamento domiciliar, salvo se for o caso, nessa última hipótese, de

tratamentos antineoplásicos.

Eis a redação do art. 10, incisos V e VI, da Lei de Planos de Saúde:

"Art. 10. É instituído o plano-referência de assistência à saúde, com cobertura assistencial médico-ambulatorial e hospitalar, compreendendo partos e tratamentos, realizados exclusivamente no Brasil, com padrão de enfermaria, centro de terapia intensiva, ou similar, quando necessária a internação hospitalar, das doenças listadas na Classificação Estatística Internacional de Doenças e Problemas Relacionados com a Saúde, da Organização Mundial de Saúde, respeitadas as exigências mínimas estabelecidas no art. 12 desta Lei, exceto : (...)

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V - fornecimento de medicamentos importados não nacionalizados ;VI - fornecimento de medicamentos para tratamento domiciliar , ressalvado o disposto nas alíneas ‘c’ do inciso I e ‘g’ do inciso II do art. 12;(...)§ 1º As exceções constantes dos incisos deste artigo serão objeto de regulamentação pela ANS." (grifou-se)

Nesse passo, resta definir se o fármaco "Xolair" se enquadra nessas restrições

normativas e, caso não se inclua, se possui cobertura obrigatória pelos planos de saúde.

De acordo com a Resolução Normativa (RN) nº 338/2013 da Agência Nacional de

Saúde Suplementar (ANS), a qual atualiza o Rol de Procedimentos e Eventos em Saúde, que

constitui a referência básica para cobertura assistencial mínima nos planos privados de

assistência à saúde, medicamento importado não nacionalizado é aquele produzido fora do

território nacional e sem registro vigente na ANVISA - Agência Nacional de Vigilância

Sanitária. Por seu turno, medicamento de uso domiciliar é aquele prescrito pelo médico

assistente para administração em ambiente externo ao de unidade de saúde.

A propósito, confira-se a redação do art. 19, § 1º, V e VI, da RN nº 338/2013 da

ANS:

"Art. 19. A cobertura assistencial de que trata o plano-referência compreende todos os procedimentos clínicos, cirúrgicos, obstétricos e os atendimentos de urgência e emergência, na forma estabelecida no artigo 10 da Lei nº 9.656, de 1998.§ 1º São permitidas as seguintes exclusões assistenciais previstas no artigo 10 da Lei nº 9.656, de 1998:(...)V - fornecimento de medicamentos e produtos para a saúde importados não nacionalizados, isto é, aqueles produzidos fora do território nacional e sem registro vigente na ANVISA ;VI - fornecimento de medicamentos para tratamento domiciliar, isto é, aqueles prescritos pelo médico assistente para administração em ambiente externo ao de unidade de saúde , com exceção dos medicamentos previstos no inciso XII do art. 20 e inciso X do art. 21 desta RN e, ressalvado o disposto no artigo 13 desta Resolução Normativa . (Redação dada pela RN nº 349, de 9 de maio de 2014)." (grifou-se)

Cumpre ainda assinalar que a exclusão da assistência farmacêutica para o

medicamento importado sem registro na ANVISA encontra fundamento nas normas de controle

sanitário. Isso porque a importação de medicamentos e outras drogas, para fins industriais ou

comerciais, sem a prévia e expressa manifestação favorável do Ministério da Saúde constitui

infração de natureza sanitária (arts. 10, 12 e 66 da Lei nº 6.360/1976 e 10, IV, da Lei nº

6.437/1977), não podendo a operadora de plano de saúde ser obrigada a custeá-los em afronta à

lei (vide REsp nº 874.976/MT, Rel. Ministro João Otávio de Noronha, Quarta Turma, DJe

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14/12/2009).

Nesse sentido, os seguintes enunciados da I Jornada de Direito da Saúde,

realizada pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ):

"Enunciado nº 6A determinação judicial de fornecimento de fármacos deve evitar os medicamentos ainda não registrados na Anvisa, ou em fase experimental, ressalvadas as exceções expressamente previstas em lei."

"Enunciado nº 26É lícita a exclusão de cobertura de produto, tecnologia e medicamento importado não nacionalizado, bem como tratamento clínico ou cirúrgico experimental."

No caso dos autos, como se extrai do acórdão estadual, o medicamento "Xolair"

(princípio ativo omalizumabe), embora seja fabricado nos Estados Unidos, possui registro na

ANVISA, sob o nº 100680983, desde 7/10/2004, sendo distribuído no Brasil pela empresa

Novartis Biociências S.A. Assim, é um remédio produzido fora do território nacional, mas

nacionalizado, ou seja, atendeu às exigências da legislação sanitária, o que não permite a sua

exclusão assistencial nos planos de saúde, por não se enquadrar na hipótese do art. 10, V, da Lei

nº 9.656/1998.

Além disso, a aplicação do aludido fármaco (injetável) deve ser feita em clínicas ou

hospitais, sob supervisão médica, devido ao risco de anafilaxia, não podendo ser adquirido em

farmácias. Logo, como o "Xolair" deve ser administrado na própria unidade de saúde, não há

como ser classificado como de uso domiciliar, sendo de afastar também a regra do art. 10, VI, da

Lei nº 9.656/1998.

Nesse sentido, o seguinte trecho do acórdão impugnado:

"(...)(...) importa perquirir, à luz dos documentos que instruem os autos, a

natureza do medicamento e do tratamento ora discutido na lide.De acordo com Dossiê Técnico produzido pela Novartis, fabricante

do medicamento 'Xolair®' (princípio ativo omalizumabe), trata-se de remédio indicado para adultos e crianças com asma alérgica persistente moderada a grave, cujos sintomas são inadequadamente controlados com corticosteroides inalatórios (fls. 57).

Ainda de acordo com o Dossiê Técnico, o medicamento 'é de uso hospitalar e portanto, não poderá ser adquirido em farmácias'. Sua administração 'será feita no hospital ou em clínicas, sob supervisão médica', sendo os 'regimes de internação ambulatorial, semi-internação, 'Dayclinic', e similares os mais recomendados para a administração do tratamento' (fls. 60).

Na bula do medicamento, há inscrição de que seu uso é 'restrito a hospitais' (fls. 49), confirmando que o paciente portador de asma não pode se dirigir a farmácias e adquirir o produto. A aplicação do medicamento, portanto, é realizada por médico, somente em clínicas ou hospitais.

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Do pronto exame das circunstâncias fáticas exsurge, sem maiores complicações, a conclusão de que o medicamento ora em estudo não é utilizado para o tratamento e controle profilático domiciliar da asma.

Assim, embora o art. 10, VI, da Lei dos Planos de Saúde permita a exclusão de cobertura de fornecimento de medicamentos para tratamento domiciliar, resta evidente que o medicamento ora em discussão é de aplicação eminentemente hospitalar e clínica, não se justificando a recusa das operadoras com fundamento nesse simplório argumento.

(...)Noutro giro, observa-se que o art. 10, V, da Lei dos Planos de Saúde

admite a possibilidade de exclusão de cobertura de fornecimento de medicamentos importados quando estes não forem nacionalizados.

Fabricado nos Estados Unidos, o medicamento 'Xolair®' possui registro na ANVISA sob o nº 100680983, desde 07/10/2004, sendo distribuído pela empresa Novartis Biociências S/A (fls. 50).

Segundo se depreende dos autos não existe outro medicamento produzido e embalado no Brasil que detenha a mesma eficácia para tratamento dos casos de asma persistente, fato que não foi contestado pelas requeridas.

(...)Isso porque, se os planos ambulatoriais e hospitalares

comercializados pelas requeridas incluem cobertura para o tratamento indicado por médico assistente para a doença asma, não há sentido em excluir cobertura para o produto farmacológico que constitui a essência do tratamento. À evidência que, assim procedendo, as operadoras estão negando a própria natureza e o objeto do contrato, que é de assistência à saúde" (fls. 1.193/1.195 - grifou-se).

Impende asseverar que a asma, segundo dados do Ministério da Saúde, é uma

doença muito comum, que afeta aproximadamente 7% a 10% da população, constituindo um

problema de saúde pública, sendo responsável por cerca de 350.000 internações hospitalares no

Sistema Único de Saúde (SUS) por ano. É uma enfermidade inflamatória crônica que se

caracteriza por aumento da responsividade das vias aéreas inferiores a variados estímulos, com

consequente obstrução ao fluxo aéreo, de caráter recorrente e tipicamente reversível.

Existem diversos graus da doença, podendo a asma ser intermitente ou persistente

leve, moderada ou grave. Além disso, apesar de serem apenas 5% a 10% dos casos, pacientes

com asma grave apresentam maiores chances de mortalidade, e são responsáveis por um

consumo desproporcionalmente alto dos recursos de saúde em relação aos grupos de menor

gravidade. De fato, portadores de asma grave não controlada procuram 15 (quinze) vezes mais

as unidades de emergência médica e são hospitalizados 20 (vinte) vezes mais que os asmáticos

moderados. O não tratamento ou o tratamento inadequado da enfermidade leva a alterações da

estrutura da parede brônquica que podem se tornar irreversíveis, levando à redução da função

pulmonar e a limitações para as atividades da vida diária, podendo, inclusive, levar à morte (vide

Portaria SAS/MS nº 1.317, de 25 de novembro de 2013, que instituiu o Protocolo Clínico e

Diretrizes Terapêuticas - PCDT - para a Asma).

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Cumpre ressaltar que não existe similar nacional ou outro medicamento que tenha

a mesma eficácia terapêutica que o "Xolair" para o tratamento da asma persistente moderada a

grave, sendo inadequada, para muitos pacientes, a terapia com medicamentos controladores ou

de alívio conhecidos como corticosteróides inalatórios (CI) e orais (CO), broncodilatadores ou

beta-2 agonistas de curta (B2CA) e de longa ação (B2LA) e corticosteróides sistêmicos (CS).

O custo econômico da asma é considerável, havendo prejuízos diretos (internação

hospitalar e medicamentos) e indiretos (tempo de trabalho perdido e morte prematura) que

poderiam ser evitados com o controle apropriado da moléstia.

A exclusão, portanto, da cobertura do produto farmacológico nacionalizado e

indicado pelo médico assistente, de uso ambulatorial ou hospitalar e sem substituto eficaz,

para o tratamento da enfermidade significaria negar a própria essência do tratamento,

desvirtuando a finalidade do contrato de assistência à saúde.

De fato, a assistência suplementar à saúde compreende todas as ações

necessárias à prevenção da doença e à recuperação, manutenção e reabilitação da higidez física,

mental e psicológica do paciente (art. 35-F da Lei nº 9.656/1998). É por isso que a cobertura

assistencial obrigatória abrange, caso haja indicação clínica, os insumos necessários para

realização de procedimentos cobertos, incluídos os medicamentos, sobretudo os registrados ou

regularizados na ANVISA, imprescindíveis para a boa terapêutica do usuário (arts. 6º, parágrafo

único, 17 e 20, III, da RN nº 338/2013 da ANS).

Nesse contexto, a jurisprudência deste Tribunal Superior é firme no sentido de ser

abusiva a negativa de cobertura pelo plano de saúde de procedimento, tratamento, medicamento

ou material considerado essencial para preservar a saúde e a vida do paciente, mesmo porque a

opção da técnica a ser utilizada cabe ao médico especialista.

Como cediço, a integralidade da assistência terapêutica alcança, de forma

harmônica e igualitária, as ações e os serviços de saúde preventivos e curativos, inclusive

farmacêuticos, implicando atenção individualizada, para cada caso, segundo as suas exigências.

Aliás, como bem asseverado pelo Ministro João Otávio de Noronha, quando do

julgamento do REsp nº 874.976/MT (Quarta Turma, DJe 14/12/2009), "Em princípio, a prestadora

de serviços de plano de saúde está obrigada ao fornecimento de tratamento de saúde a que se

comprometeu por contrato, pelo que deve fornecer os medicamentos necessários à recuperação

da saúde do contratado ".

Sobre o tema, cumpre mencionar também os seguintes precedentes:

"AGRAVO REGIMENTAL EM AGRAVO (ART. 544, DO CPC) - DEMANDA POSTULANDO CUMPRIMENTO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER CONSISTENTE NO

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FORNECIMENTO DE MEDICAMENTO PARA USO DOMICILIAR - DECISÃO MONOCRÁTICA NEGANDO PROVIMENTO AO AGRAVO, MANTIDA A INADMISSÃO DO RECURSO ESPECIAL. INSURGÊNCIA DA OPERADORA DE PLANO DE SAÚDE. (...)2. Recusa indevida, pela operadora de plano de saúde, de cobertura financeira a medicamento prescrito ao usuário. 2.1. Ainda que admitida a possibilidade de o contrato de plano de saúde conter cláusulas limitativas dos direitos do consumidor (desde que escritas com destaque, permitindo imediata e fácil compreensão, nos termos do § 4º do artigo 54 do código consumerista), revela-se abusivo o preceito excludente do custeio dos meios e materiais necessários ao melhor desempenho do tratamento clinico ou do procedimento cirúrgico ou de internação hospitalar relativos a doença coberta. 2.2. Consoante assente pela Corte estadual: (i) 'se o contrato celebrado entre as partes não exclui a cobertura para transplante renal, fato incontroverso no caso concreto, não pode excluir o tratamento pré-operatório prescrito como adequado à realização da cirurgia necessária à sua cura'; e (ii) 'o medicamento em questão já se encontra registrado na ANVISA, conforme documento de fls.62'. 2.3. Consonância entre o acórdão estadual e a jurisprudência desta Corte (o que atrai a incidência da Súmula 83/STJ), revelando-se, outrossim, necessária a incursão no acervo fático-probatório dos autos a fim de suplantar a cognição acerca da natureza (experimental ou não) do medicamento em questão (aplicação do óbice da Súmula 7/STJ). 3. Agravo regimental desprovido." (AgRg no AREsp nº 678.575/SP, Rel. Ministro MARCO BUZZI, Quarta Turma, DJe 2/9/2015 - grifou-se)

"AGRAVO REGIMENTAL. AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. PLANO DE SAÚDE. TRATAMENTO. MEDICAMENTO. NEGATIVA DE COBERTURA. CLÁUSULA ABUSIVA. 1. Uma vez coberto o tratamento de saúde, a opção da técnica a ser utilizada para sua realização cabe ao médico especialista. 2. Delineado pelas instâncias de origem que o contrato celebrado entre as partes previa a cobertura para a doença que acometia a autor, é abusiva a negativa da operadora do plano de saúde de fornecimento dos medicamentos prescritos pelo médico que assiste o paciente . Precedentes. 3. Agravo regimental a que se nega provimento." (AgRg no AREsp nº 87.799/MG, Rel. Ministra MARIA ISABEL GALLOTTI, Quarta Turma, DJe 12/8/2015 - grifou-se)

"CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. CONTRATO DE PLANO DE SAÚDE. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. OMISSÃO, CONTRADIÇÃO OU OBSCURIDADE. NÃO OCORRÊNCIA. RECUSA NO CUSTEIO DE TRATAMENTO COM MEDICAMENTO PRESCRITO POR MÉDICO ESPECIALISTA. ABUSIVIDADE RECONHECIDA . JULGAMENTO DO APELO EM CONSONÂNCIA COM ORIENTAÇÃO DESTE SODALÍCIO. SÚMULA 83/STJ. (...)3. Entende-se por abusiva a cláusula contratual que exclui tratamento prescrito para garantir a saúde ou a vida do segurado, porque o plano de saúde pode estabelecer as doenças que terão cobertura, mas não o tipo de terapêutica indicada por profissional habilitado na busca da cura.

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4. A prestadora de serviço não apresentou argumento novo capaz de modificar as conclusões adotadas, que se apoiaram em entendimento aqui consolidado. Incidência da Súmula nº 83 do STJ. 5. Agravo regimental não provido." (AgRg no REsp nº 1.476.276/SP, Rel. Ministro MOURA RIBEIRO, Terceira Turma, DJe 7/4/2015 - grifou-se)

"AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. PLANO DE SAÚDE. EXCLUSÃO DE PROCEDIMENTO E MEDICAMENTO PRESCRITO PARA TRATAMENTO OFTALMOLÓGICO. CLÁUSULA ABUSIVA. DANO MORAL. IMPROVIMENTO. 1.- A negativa de cobertura de procedimento e medicamento quando essencial para garantir a saúde do paciente gera a obrigação de indenizar o dano moral daí resultante . Sucumbente, arcará a Recorrida com as custas e honorários advocatícios fixados na Sentença. 2.- Agravo Regimental improvido." (AgRg no REsp nº 1.431.932/SP, Rel. Ministro SIDNEI BENETI, Terceira Turma, DJe 9/6/2014 - grifou-se)

"CONSUMIDOR. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. PLANO DE SAÚDE. CLÁUSULA EXCLUDENTE DA COBERTURA DETERMINADO PROCEDIMENTO OU MEDICAMENTO NECESSÁRIO AO TRATAMENTO DE DOENÇA. ABUSIVIDADE. CLÁUSULA DECLARADA ILEGAL À LUZ DOS PRECEITOS DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. PRINCÍPIO DO MUTUALISMO E PACTA SUNT SERVANDA QUE NÃO AUTORIZAM A IMPOSIÇÃO DE DESVANTAGEM EXCESSIVA EM PREJUÍZO DO CONSUMIDOR. INAFASTABILIDADE DA ANÁLISE DA ILEGALIDADE PELO PODER JUDICIÁRIO. PREJUÍZO IMATERIAL RECONHECIDO PELAS INSTÂNCIAS ORDINÁRIAS. VALOR DA INDENIZAÇÃO DENTRO DOS PARÂMETROS DA RAZOABILIDADE. AGRAVO IMPROVIDO. 1. É assente nesta Corte Superior o entendimento pela ilegalidade de cláusula contratual que exclua da cobertura do plano de saúde determinado tipo de procedimento ou medicamento necessário para assegurar o tratamento de doenças previsto na contratação. 2. A aplicação do princípio do mutualismo e do pacta sunt servanda não autoriza a imposição de cláusula que configure desvantagem excessiva em prejuízo do consumidor, condição que a lei tipifica como ilegal, devendo ser declarada sua nulidade (CDC, art. 51, § 1º, IV). 3. Em circunstâncias da espécie, o dano moral caracteriza-se in re ipsa, não se exigindo a efetiva comprovação de sua ocorrência. Precedentes do STJ. 4. No caso concreto, as instâncias ordinárias reconheceram expressamente a ocorrência de prejuízo imaterial, afigurando-se desnecessária a incursão no campo fático-probatório para confirmá-lo. 5. O valor da indenização fixado pelo Juízo singular não escapa das balizas da razoabilidade, razão pela qual não se mostra necessária a sua revisão. 6. Agravo regimental a que se nega provimento." (AgRg no REsp nº 1.334.008/DF, Rel. Ministro ANTONIO CARLOS FERREIRA, Quarta Turma, DJe 26/8/2014 - grifou-se)

Desse modo, deve ser mantida a condenação das recorrentes a custear o

medicamento "Xolair", sempre que haja prescrição médica para o tratamento da asma persistente

moderada a grave, limitados, contudo, os efeitos da coisa julgada aos filiados da entidade Documento: 1470664 - Inteiro Teor do Acórdão - Site certificado - DJe: 09/12/2015 Página 1 9 de 22

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associativa autora que comprovarem, na data de ajuizamento da presente ação coletiva, essa

condição.

5. Do dispositivo

Ante o exposto, dou parcial provimento aos recursos especiais para limitar os

efeitos da coisa julgada aos associados da autora que comprovarem a filiação até a data de

ajuizamento da ação coletiva, como requerido nas petições recursais.

É o voto.

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CERTIDÃO DE JULGAMENTOTERCEIRA TURMA

Número Registro: 2014/0225534-0 PROCESSO ELETRÔNICO REsp 1.481.089 / SP

Números Origem: 01452938520068260100 1452938520068260100 20120000502730 20120000668978 5830020061452935

PAUTA: 01/12/2015 JULGADO: 01/12/2015

RelatorExmo. Sr. Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA

Presidente da SessãoExmo. Sr. Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA

Subprocurador-Geral da RepúblicaExmo. Sr. Dr. MÁRIO PIMENTEL ALBUQUERQUE

SecretáriaBela. MARIA AUXILIADORA RAMALHO DA ROCHA

AUTUAÇÃO

RECORRENTE : SUL AMÉRICA COMPANHIA DE SEGURO SAÚDEADVOGADOS : FERNANDO NEVES DA SILVA E OUTRO(S)

LUIZ HENRIQUE FERREIRA LEITE E OUTRO(S)ADVOGADOS : ANDRÉ PAULINO MATTOS E OUTRO(S)

WEBER DO AMARAL CHAVESADVOGADA : ADRIANA BARBOSA DE CASTRO E OUTRO(S)ADVOGADOS : CRISTINA MARIA GAMA NEVES DA SILVA E OUTRO(S)

FELIPE ROSARECORRENTE : PORTO SEGURO - SEGURO SAÚDE S/AADVOGADOS : PEDRO DA SILVA DINAMARCO

MELINA MARTINS MERLO E OUTRO(S)RECORRIDO : ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE ASMÁTICOS DE SÃO PAULOADVOGADOS : SIDNEI TURCZYN

CARLA TURCZYN BERLAND E OUTRO(S)INTERES. : UNIMED ARARAQUARA COOPERATIVA DE TRABALHO MÉDICOADVOGADOS : ALCEU DI NARDO E OUTRO(S)

ALUÍSIO DI NARDO

ASSUNTO: DIREITO DO CONSUMIDOR - Contratos de Consumo - Planos de Saúde

SUSTENTAÇÃO ORAL

Dr(a). ANDRÉ PAULINO MATTOS, pela parte RECORRENTE: SUL AMÉRICA COMPANHIA DE SEGURO SAÚDE

CERTIDÃO

Certifico que a egrégia TERCEIRA TURMA, ao apreciar o processo em epígrafe na sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:

A Terceira Turma, por unanimidade, deu parcial provimento aos recursos especiais, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator.Documento: 1470664 - Inteiro Teor do Acórdão - Site certificado - DJe: 09/12/2015 Página 2 1 de 22

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Os Srs. Ministros Marco Aurélio Bellizze, Moura Ribeiro, João Otávio de Noronha e Paulo de Tarso Sanseverino votaram com o Sr. Ministro Relator.

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