planos textuais

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PLANOS TEXTUAIS Podemos dizer que um texto escrito qualquer pode ser apreciado a partir de, pelo menos, quatro planos articulados: o plano interacional, o plano textual, o plano gramatical e o plano gráfico. O plano interacional diz respeito ao fato de que escrevemos para alguém ler, ou seja, o texto é um evento de comunicação e tem um destinatário. Esse destinatário poderá ser uma pessoa muito bem definida e individualizada (como numa carta ou num e-mail pessoal) ou um leitor genérico (com o qual trabalha, por exemplo, a imprensa). Por outro lado, nossa escrita é uma prática situada no interior de uma determinada atividade social. Quando escrevemos estamos no interior de alguma das inúmeras esferas sociointeracionais – estamos na esfera das relações pessoais próximas, familiares; ou em esferas menos próximas como o jornalismo, o ensino, a ciência, o sistema jurídico; ou estamos em meio a uma das muitas dimensões do mundo do trabalho ou da criação literária, entre muitas outras. Cada uma dessas esferas admite diferentes tipos de textos, concretizando cada uma toda uma tradição discursiva historicamente construída. Ao escrever para um determinado destinatário e no interior de uma determinada atividade social, temos objetivos a alcançar e selecionamos temas e tópicos a tratar. No plano interacional, há, portanto, múltiplos elementos inter- relacionados (onde estamos situados; a quem nos dirigimos; com que objetivos; sobre que assunto) que condicionam a nossa produção. Tendo-os como referência, tomamos decisões, fazemos recortes, delineamos um cenário que enquadre essas decisões e recortes e oriente a sua textualização. O redator imaturo revela sua imaturidade no plano interacional por não atrelar adequadamente sua escrita às condições da interação verbal. O redator imaturo não se dá conta dos condicionantes de seu texto e, por isso, derrapa, por exemplo, nas características do gênero (num texto argumentativo confunde fatos e opiniões; ou afirma sem sustentar a afirmação com argumentos; ou escolhe argumentos aleatórios e incoerentes).

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PLANOS TEXTUAIS

Podemos dizer que um texto escrito qualquer pode ser apreciado a partir de, pelo menos, quatro planos articulados: o plano interacional, o plano textual, o plano gramatical e o plano gráfico.

O plano interacional diz respeito ao fato de que escrevemos para alguém ler, ou seja, o texto é um evento de comunicação e tem um destinatário. Esse destinatário poderá ser uma pessoa muito bem definida e individualizada (como numa carta ou num e-mail pessoal) ou um leitor genérico (com o qual trabalha, por exemplo, a imprensa).

Por outro lado, nossa escrita é uma prática situada no interior de uma determinada atividade social. Quando escrevemos estamos no interior de alguma das inúmeras esferas sociointeracionais – estamos na esfera das relações pessoais próximas, familiares; ou em esferas menos próximas como o jornalismo, o ensino, a ciência, o sistema jurídico; ou estamos em meio a uma das muitas dimensões do mundo do trabalho ou da criação literária, entre muitas outras. Cada uma dessas esferas admite diferentes tipos de textos, concretizando cada uma toda uma tradição discursiva historicamente construída.

Ao escrever para um determinado destinatário e no interior de uma determinada atividade social, temos objetivos a alcançar e selecionamos temas e tópicos a tratar.

No plano interacional, há, portanto, múltiplos elementos inter-relacionados (onde estamos situados; a quem nos dirigimos; com que objetivos; sobre que assunto) que condicionam a nossa produção. Tendo-os como referência, tomamos decisões, fazemos recortes, delineamos um cenário que enquadre essas decisões e recortes e oriente a sua textualização.

O redator imaturo revela sua imaturidade no plano interacional por não atrelar adequadamente sua escrita às condições da interação verbal. O redator imaturo não se dá conta dos condicionantes de seu texto e, por isso, derrapa, por exemplo, nas características do gênero (num texto argumentativo confunde fatos e opiniões; ou afirma sem sustentar a afirmação com argumentos; ou escolhe argumentos aleatórios e incoerentes).

É também indicador de imaturidade interacional o uso de vocabulário inadequado (é o redator que usa termos técnicos de forma imprecisa; ou usa gíria num texto formal sem marcar que se trata de um uso monitorado para alcançar determinado efeito de sentido; ou, acreditando que se deve escrever “difícil”, usa palavras raras sem ter clareza de seu significado e assim por diante). Por fim, o redator imaturo no plano interacional do texto escrito recorta mal o conteúdo e sobrecarrega o texto com um excesso de ideias fragmentadas.

Passando agora para o plano textual, podemos dizer que este é o plano da construção do texto propriamente dito, do objeto linguístico que vai alcançar nosso interlocutor, desse todo que é muito mais que a soma de suas partes porque sua significação pressupõe uma organização hierarquizada e sequencial dos conteúdos e uma amarração entre as partes.

O grande desafio do processo de textualização é justamente este: dar forma linear, unidimensional, a uma estrutura que é multidimensional. O desafio aqui é manter sob controle a dimensão linear própria do signo linguístico de tal modo que se garanta que o

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multidimensional – ou seja, os múltiplos elementos do plano interacional em suas múltiplas inter-relações – não se perca ou fique prejudicado na

passagem para o unidimensional. Há um custo operacional para dar unidade temática e unidade estrutural ao texto, custo este que cobra de quem escreve um planejamento, uma antecipação, uma antevisão do que vai ser a totalidade.

O redator imaturo revela sua imaturidade no plano textual por se deixar controlar pela linearidade do signo e vai dando forma ao texto à medida que vai preenchendo as linhas sem ter uma visão prévia do conjunto, sem se orientar pela antevisão do todo. O redator imaturo parte para a escrita do texto sem um plano de voo. O texto resulta falho em sua coerência, em sua sequência, na amarração entre as partes, em sua clareza.

O plano gramatical, por sua vez, diz respeito à construção das sentenças e dos períodos em conformidade com as características morfossintáticas da variedade linguística que a tradição discursiva definiu como adequada para cada tipo de texto no interior de uma determinada atividade socioverbal.

Estamos, agora, no plano infratextual (estão em pauta as estruturas das sentenças e dos períodos) e no plano da acomodação da expressão às expectativas sociais referentes à variação linguística.

MODALIDADES DE COESÃO TEXTUAL

Três grandes modalidades de coesão: a coesão referencial, a coesão sequencial e ainda a coesão interfrásica.

1. Coesão referencial

A coesão referencial é aquela que se estabelece entre dois ou mais componentes da superfície textual que remetem a (ou permitem recuperar) um mesmo referente (que pode, evidentemente, ser acrescido de outros traços que se lhe vão agregando textualmente).

A coesão referencial ocorre quando um componente da superfície textual é retomado (anáfora) ou precedido (catáfora) por um pronome, verbo, advérbio ou quantificadores que substituem outros elementos do texto. Em outras palavras, esse tipo de coesão é feito pela citação de elementos que já apareceram, ou vão aparecer, no próprio texto. Para a efetivação dessas citações, são utilizados pronomes pessoais, possessivos, demonstrativos ou expressões adverbiais. Esses recursos tanto podem se referir, por antecipação, a elementos que serão citados na sequência do texto, quanto podem retomar elementos já citados no texto ou que são facilmente identificáveis pelo leitor.

Exemplo de coesão referencial:

O consumo de bebidas alcoólicas no Brasil apresenta um índice elevado, o que é preocupante. Para minimizar os efeitos do uso descontrolado dessas bebidas, foi aprovada a Lei Seca.

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Existe também a coesão por ausência de um elemento referencial (Ø), a elipse. A coesão por elipse é uma estratégia que permite a omissão de elementos facilmente identificáveis ou que já tenham sido citados anteriormente. Algumas vezes, essa omissão é marcada por uma vírgula. Pronomes, verbos, nomes e frases inteiras podem estar omissos. Exemplo de coesão referencial por elipse:

Diante dessa situação, o governo aprovou a Lei Seca. De cunho autoritário e intolerante, Ø visa a resultados imediatos, porém Ø é apenas um passo para conscientizar a população.

A coesão pode ser lexical, ou seja, por meio do léxico: hiperônimos, sinônimos, nomes genéricos, expressões nominais definidas, repetição do mesmo item lexical e nominalizações. Também a manutenção da unidade temática do texto, que exige certa carga de redundância, é reforçada pela coesão lexical. Por isso, pode-se estabelecer uma corrente de significados retomando-se as mesmas ideias e partes de ideias por meio de diferentes termos e expressões. Essa corrente é formada pela reutilização intencional de palavras, pelo uso de sinônimos, ou, ainda, pelo emprego de expressões equivalentes para substituir termos já usados, ou para identificar ou nomear elementos que já apareceram no texto.

Exemplo de coesão lexical:

As autoescolas viraram empreendimentos lucrativos. As empresas responsáveis por ensinar a dirigir dão duas semanas de aula teórica ou um intensivo de três dias, para que os alunos possam ter aulas práticas.

2. Coesão sequencial

A coesão sequencial se faz por mecanismos como recorrência de termos, de estruturas (o chamado paralelismo), de conteúdos semânticos (paráfrase, com expressões como “isto é”, “ou seja”, “quer dizer”, “ou melhor”, “em outras palavras”, “em síntese”, “em resumo”).

3. Coesão Interfrásica

Há também a coesão interfrásica, que designa mecanismos de sequenciação que marcam diversos tipos de interdependência entre as frases que ocorrem em um texto. Basicamente, a conexão interfrásica é assegurada por conectores: conjunções, advérbios, locuções conjuncionais, locuções adverbiais, preposições, locuções prepositivas, expressões adjetivas ou orações completas.

Exemplo de coesão interfrásica:

É necessário que o governo promova campanhas de conscientização da sociedade na TV, nas escolas, nas Ongs, nas universidades, sobre os riscos de dirigir alcoolizado. Junto às ações educativas citadas anteriormente, as ações punitivas precisam ser mantidas, com leis severas, sem brechas para a impunidade.

RECURSOS COESIVOS

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