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MINISTÉRIO DO DESENVOLVIMENTO AGRÁRIO CONSELHO NACIONAL DE DESENVOLVIMENTO RURAL SUSTENTÁVEL – CONDRAF Institucionalidades para a Gestão Social do Desenvolvimento Rural Sustentável Brasília, setembro 2005

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MINISTÉRIO DO DESENVOLVIMENTO AGRÁRIO

CONSELHO NACIONAL DE DESENVOLVIMENTO RURAL SUSTENTÁVEL – CONDRAF

Institucionalidades para a Gestão Social do

Desenvolvimento Rural Sustentável

Brasília, setembro 2005

PRESIDÊNCIA DA REPÚBLICA

Luiz Inácio Lula da Silva MINISTÉRIO DO DESENVOLVIMENTO AGRÁRIO

Miguel Soldatelli Rossetto Ministro de Estado do Desenvolvimento Agrário – MDA

José Humberto Oliveira Secretário de Desenvolvimento Territorial – SDT

Secretário do Conselho Nacional de Desenvolvimento Rural Sustentável – CONDRAF

Série “Documentos do CONDRAF”: número 01, setembro de 2005. “Institucionalidades para a Gestão Social do Desenvolvimento Rural Sustentável”

Os textos assinados não refletem necessariamente as posições do CONDRAF sendo, portanto, de responsabilidade de seus autores.

Revisão dos textos: Marcelo Miná Dias

Assessoria do CONDRAF: Roseli Andrade, Vera Azevedo e Marcelo Miná Dias.

Secretária: Mônica Vasconcelos Kuhlmann

Estagiário: Diego de Araújo Rodrigues

APRESENTAÇÃO DA SÉRIE

O Conselho Nacional de Desenvolvimento Rural Sustentável (CONDRAF) é uma instância colegiada, órgão de abrangência nacional, em cuja composição estão representados, paritariamente, órgãos governamentais, movimentos sociais e organizações da sociedade relacionadas às temáticas da promoção do desenvolvimento rural sustentável, da reforma agrária e da agricultura familiar.

Dentre suas competências e atribuições, como espaço de concertação e gestão social, destacam-se seu papel no apoio à formulação de políticas públicas estruturantes e sua adequação às demandas da sociedade e às necessidades da promoção do desenvolvimento rural sustentável dos territórios rurais.

Coerente com este papel e atribuições, o CONDRAF inicia, com a edição deste Caderno, uma série de publicações dos documentos e textos produzidos por seus Comitês, Grupos Temáticos e Grupos de Trabalho. À divulgação dos produtos dos Comitês e Grupos Temáticos e de Trabalho acrescente-se a publicação de palestras dos(as) convidados(as) especiais em Reuniões Ordinárias do Conselho, a divulgação de relatórios, avaliações, análises e estudos produzidos por sua Secretaria Executiva e por parceiros ou consultores do Conselho.

A publicação destes documentos e textos busca publicizar e dar maior visibilidade às discussões políticas, às resoluções e aos produtos do CONDRAF, sendo, inclusive, uma de suas diretrizes estratégicas, ou seja, tornar suas resoluções referências à ampliação, articulação e integração das políticas públicas de desenvolvimento rural sustentável.

Este conjunto de textos e documentos possibilita, inclusive, um importante material de consulta àqueles que exercem a gestão pública e aos estudiosos do tema da gestão social de políticas públicas.

APRESENTAÇÃO DO CADERNO

Este primeiro Caderno do CONDRAF apresenta textos e documentos que resultaram do trabalho do Grupo Temático “Institucionalidade para Gestão Social do Desenvolvimento Rural Sustentável”. Este Grupo, formado por representantes de órgãos governamentais e entidades e organizações da sociedade, foi criado em 2003 com o objetivo de construir referências para a implantação e fortalecimento das institucionalidades de gestão social das políticas públicas de desenvolvimento rural sustentável.

O trabalho incluiu um intercâmbio de experiências que levou membros do Grupo à região da Andaluzia, na Espanha, para conhecer experiências de institucionalidades que exercem a gestão social de programas da comunidade européia. A atribuição do Grupo foi estudar e colocar em discussão processos de gestão social do desenvolvimento rural sustentável. Para tanto, ouviu e sistematizou relatos de experiências no país.

No processo de construção destas referências e subsídios, além da elaboração de um Documento de Referência do Grupo, foi produzido um estudo que sistematizou o debate atual sobre a gestão de políticas públicas a partir da análise da diversidade de estudos sobre as experiências vivenciadas, principalmente, pelos Conselhos Municipais de Desenvolvimento Rural. Por fim, foram oferecidos ao CONDRAF subsídios para a oferta de orientações, diretrizes e atribuições aos colegiados de desenvolvimento rural sustentável que atuam em diversos níveis.

Destes textos derivaram duas Resoluções do CONDRAF, as de número 48 e 52, que propõem, respectivamente, diretrizes e atribuições para a rede de Conselhos de Desenvolvimento Rural Sustentável, nos seus diferentes níveis de atuação, e aprova recomendações do CONDRAF para as institucionalidades territoriais de desenvolvimento rural sustentável.

Neste Caderno Temático é apresentada a produção original do trabalho do Grupo, preservando-se a ordem cronológica dos documentos e textos. Desta forma, inicia-se com a Resolução do CONDRAF que criou o Grupo Temático e estabeleceu seus objetivos e competências. Na seqüência é publicado o estudo dos consultores Laura Maria Goulart Duarte (Professora da UnB) e Lauro Mattei (Professor da UFSC) a respeito dos potenciais e limites dos processos gestão social do desenvolvimento rural, vistos a partir das experiências dos Conselhos Municipais de Desenvolvimento Rural. O Documento de Referência do Grupo Temático surge na seqüência, sintetizando os debates e discussões realizadas pelo Grupo. Por fim, são apresentadas as duas Resoluções do CONDRAF que resultaram diretamente do trabalho do Grupo, as de número 48 e 52.

SUMÁRIO

Resolução no 38 do Conselho Nacional de Desenvolvimento Rural Sustentável, publicada no Diário Oficial da União em 25/03/2004, Seção 1, Página 98 .........................

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Estudo elaborado por Laura Duarte e Lauro Mattei sob encomenda do Grupo Temático “Institucionalidade para a Gestão Social do Desenvolvimento Rural Sustentável” do Conselho Nacional de Desenvolvimento Rural Sustentável – CONDRAF ..........................

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I. Apresentação ....................................................................................................... 13

II. Metodologia do trabalho .................................................................................... 14

III. Principais resultados ......................................................................................... 15

IV. Principais recomendações dos estudos ............................................................. 27

V. Considerações e sugestões ................................................................................. 29

VI. Referências bibliográficas ................................................................................ 33

Anexo 1. Cinco resenhas mais relevantes .............................................................. 37

Anexo 2. Resenhas adicionais ................................................................................ 45

Anexo 3. Referências bibliográficas e documentais .............................................. 51

Documento de referência produzido pelo Grupo Temático de “Institucionalidade para Gestão Social do Desenvolvimento Rural Sustentável” do Conselho Nacional de Desenvolvimento Rural Sustentável – CONDRAF ..............................................................

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I. Princípios e premissas ......................................................................................... 57

II. Objetivos, características e atribuições .............................................................. 60

III. Institucionalização e operacionalização ........................................................... 65

Resolução no 48 do Conselho Nacional de Desenvolvimento Rural Sustentável, publicada no Diário Oficial da União em 23/09/2004, Seção 1, Página 113 ......................

69

Resolução no 52 do Conselho Nacional de Desenvolvimento Rural Sustentável, publicada no Diário Oficial da União em 17/02/2005, Seção 1, Páginas 44 e 45 ..............

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Participantes do Grupo Temático “Institucionalidade para Gestão Social do Desenvolvimento Rural Sustentável” ..................................................................................

77

Resolução no 38 do Conselho Nacional de Desenvolvimento Rural Sustentável, publicada no Diário Oficial da União em

25/03/2004, Seção 1, Página 98.

MINISTÉRIO DO DESENVOLVIMENTO AGRÁRIO

CONSELHO NACIONAL DE DESENVOLVIMENTO RURAL SUSTENTÁVEL – CONDRAF

RESOLUÇÃO Nº 38 DE 24 DE MARÇO DE 2003

Cria o Grupo Temático de Institucionalidade para Gestão Social do Desenvolvimento Rural Sustentável do Conselho Nacional de Desenvolvimento Rural Sustentável – CONDRAF.

O PRESIDENTE DO CONSELHO NACIONAL DE DESENVOLVIMENTO RURAL SUSTENTÁVEL - CONDRAF, no uso de suas atribuições, conferidas pelo art. 4º e §§ 1o e 2º do Decreto nº 4.854, de 08 de outubro de 2003, e atendendo ao disposto no art. 23, nos incisos II, III, IV e V do art. 24, nos §§ 3º, 4º, 5º e 6º do art. 25, bem como nos arts. 27, 28, 29 e 30 do Regimento Interno, aprovado pela Resolução nº 35, de 10 de janeiro de 2004, torna público que o Plenário do CONDRAF, em Sessão Plenária realizada em 10 de março de 2004,

CONSIDERANDO:

a) a gestão social como o objetivo de um processo de autonomização das comunidades e integração dos atores sociais (poder público e sociedade), que passam a gerir o processo de desenvolvimento territorial, co-responsabilizando-se pelo planejamento, execução e avaliação das ações no território, e, desta forma, atuam pela construção de uma nova realidade que compatibilize as demandas sociais locais e a oferta de políticas públicas municipais, regionais, estaduais e nacionais;

b) que a institucionalidade, como elemento formalizador desta atuação, deve atender a características e procedimentos que garantam a legitimidade da gestão social;

c) a importância do diálogo e integração entre os instrumentos de gestão social para a efetivação da participação no processo deliberativo das políticas relacionadas ao Desenvolvimento Rural bem como no acompanhamento, monitoramento e avaliação dessas políticas,

RESOLVEU:

Art. 1º Instituir o Grupo Temático de Institucionalidade para a Gestão Social do Desenvolvimento Rural Sustentável com a finalidade de estudar, de forma crítica e analítica, assuntos pertinentes ao tema, encaminhando ao Plenário do CONDRAF propostas de estímulo e consolidação da gestão social das políticas e processos de desenvolvimento sustentável.

Parágrafo único. O Grupo Temático de Institucionalidade para a Gestão Social do Desenvolvimento Rural Sustentável deverá permanecer ativo por um período de até 06 (seis) meses, prazo em que deverá encaminhar as propostas supracitadas ao Plenário do CONDRAF para análise e apreciação.

Art. 2º Compete especificamente ao Grupo Temático:

I – formular proposta de caracterização das Institucionalidades Territoriais, contemplando os princípios e premissas, objetivos e atribuições; e referencial de desenho funcional com

Institucionalidades para a Gestão Social do Desenvolvimento Rural Sustentável

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descrição de processo de operacionalização, composição, formato jurídico e outros elementos que o Grupo Temático julgue necessário descrever;

II – elaborar proposta de diretrizes e atribuições da rede de órgãos colegiados de Desenvolvimento Rural, nos diferentes níveis de atuação - Nacional, Estadual, Territorial, Municipal e outros, considerando as propostas oriundas dos Seminários Regionais e Nacional de reestruturação da ação de Infra-estrutura e o papel dos Conselhos de Desenvolvimento Rural, realizados em 2003;

III – identificar as diferenças relevantes entre o perfil proposto para os órgãos colegiados de Desenvolvimento Rural e o atualmente existente e propor uma estratégia de atuação visando compatibilizar a atuação integrada e em rede dessas institucionalidades.

Art. 3º O Grupo Temático de Institucionalidade e Gestão Social será integrado pelos seguintes órgãos e entidades:

I. Secretaria do CONDRAF/MDA;

II. Secretaria da Agricultura Familiar/MDA;

III. Secretaria de Reforma Agrária/MDA;

IV. Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária – INCRA;

V. Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão;

VI. Ministério da Integração Nacional;

VII. Ministério do Meio Ambiente;

VIII. Ministério das Cidades;

IX. Ministério do Trabalho e Emprego;

X. Fórum Nacional de Secretários de Agricultura – FNSA;

XI. Confederação Nacional dos Municípios – CNM;

XII. Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas – SEBRAE;

XIII. Associação Brasileira das Empresas de Extensão Rural – ASBRAER;

XIV. Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura – CONTAG;

XV. Federação dos Trabalhadores na Agricultura Familiar da Região Sul – FETRAF-SUL;

XVI. Movimento dos Pequenos Agricultores – MPA;

XVII. Movimento das Mulheres Camponesas – MMC;

XVIII. Associação de Serviços em Projetos de Agricultura Alternativa (AS-PTA);

XIX. Instituto Brasil Central – IBRACE;

XX. Centro de Assessoria e Apoio aos Trabalhadores – CAATINGA;

XXI. Grupo de Trabalho da Amazônia – GTA;

XXII. Departamento de Estudos Sócio-Econômicos Rurais – DESER;

XXIII. Associação de Orientação às Cooperativas do Nordeste – ASSOCENE;

XXIV. Federação das Associações e Sindicatos dos Trabalhadores Rurais em Extensão – FASER;

XXV. União das Escolas Agrícolas do Brasil – UNEFAB;

XXVI. Coordenação das Organizações das Comunidades Indígenas da Amazônia Brasileira – COIAB.

§ 1º Essas entidades deverão indicar à Secretaria do CONDRAF os nomes do seu representante e respectivo suplente para compor o Grupo, acompanhado de descrição resumida da formação ou experiência do mesmo na área específica ou em assunto correlato.

§ 2º Poderão participar das reuniões do Grupo Temático, por iniciativa do Presidente do

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CONDRAF, da Secretaria, da Coordenação ou do próprio Grupo, convidados com direito a voz que possam contribuir para a discussão de temas em pauta.

§ 3º O Grupo poderá criar Comissões ou Sub-Grupos de Trabalho para estudar, propor, detalhar e analisar assuntos específicos pertinentes à Institucionalidade e Gestão Social.

Art. 4º A Coordenação do Grupo Temático, cujas atribuições estão descritas no Regimento Interno do CONDRAF, será escolhida entre seus membros, pelo próprio Grupo, na reunião de instalação do Grupo Temático.

Parágrafo único. Na referida reunião de instalação, os membros do Grupo Temático aprovarão o seu Regulamento Interno, em harmonia com o Regimento Interno do CONDRAF.

Art. 5º O Grupo Temático será instalado em até 30 (trinta) dias após a publicação desta Resolução no Diário Oficial da União.

Art. 6º Esta Resolução entra em vigor na data de sua publicação.

MIGUEL SOLDATELLI ROSSETTO

Presidente

Institucionalidades para a Gestão Social do Desenvolvimento Rural Sustentável

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Estudo elaborado por Laura Duarte e Lauro Mattei sob encomenda do Grupo Temático “Institucionalidade para Gestão

Social do Desenvolvimento Rural Sustentável” do CONDRAF

I – Apresentação

Os objetivos gerais deste trabalho de consultoria foram contribuir para a execução, da forma mais completa e qualificada, dos produtos do Grupo Temático (GT) “Institucionalidade e Gestão Social do Conselho Nacional de Desenvolvimento Rural Sustentável”, do Conselho Nacional de Desenvolvimento Rural Sustentável (CONDRAF), oferecendo dados e pareceres sobre os estudos das experiências de gestão social para o desenvolvimento rural, de forma a amparar propostas técnicas estabelecidas pelos integrantes do referido grupo. Ademais, identificar avanços e principais obstáculos apontados pelos estudos, no que se refere ao processo de efetivação da gestão social e do desenvolvimento rural.

A pesquisa bibliográfica e documental realizada cobriu um conjunto de 69 documentos. Aproximadamente 80% desses trabalhos têm os Conselhos Municipais de Desenvolvimento Rural (CMDR) como foco de análise. Buscou-se ampliar a pesquisa para os Conselhos de Meio Ambiente, com vistas a uma comparação entre essas duas formas de institucionalidade no nível municipal. Também foram incluídos estudos sobre o Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (PRONAF), os quais enfatizavam a relação entre os CMDR e o Programa.

Como norteadores da leitura e análise foram contemplados dois conjuntos de variáveis: (a) os processos de construção da institucionalidade; e (b) as bases territoriais e institucionais das diferentes esferas de gestão social.

Os resultados foram organizados da seguinte forma:

1) No item III desse Relatório estão contidos os principais resultados sínteses, analíticos e comparativos, que identificam:

os pontos centrais de convergência e divergência dos estudos; os principais avanços e obstáculos para a gestão social e para o

desenvolvimento rural; os instrumentos necessários para a superação das dificuldades

detectadas e para o funcionamento e consolidação das institucionalidades (financeiros, técnicos, administrativos, políticos etc.).

2) No item IV estão sistematizadas as principais recomendações existentes nos estudos consultados, cujas contribuições apresentam alguns dos instrumentos necessários à superação dos diversos problemas detectados pelos estudos citados.

Institucionalidades para a Gestão Social do Desenvolvimento Rural Sustentável

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3) Além dos resultados, o Relatório apresenta, no item V, as principais considerações e sugestões e, no item VI, as referências bibliográficas e documentais utilizadas.

4) O Anexo I apresenta as resenhas das cinco obras consideradas de grande relevância para o GT “Institucionalidade e Gestão Social do Conselho Nacional de Desenvolvimento Rural Sustentável”.

5) No Anexo II foram colocadas resenhas adicionais de outros trabalhos utilizados.

6) O Anexo III apresenta o referencial bibliográfico/documental pesquisado. Consideramos importante incluir esse conjunto de referências, uma vez que as mesmas poderão constituir importante fonte de consulta bibliográfica e documental para os membros do GT, técnicos e outros estudiosos do tema.

II – Metodologia do trabalho

Tendo em vista a abrangência das questões levantadas sobre o tema da institucionalidade para o desenvolvimento rural nos municípios brasileiros, bem como a dificuldade de acesso às fontes bibliográficas e documentais para consulta, foi necessária a definição de uma metodologia de trabalho que contemplasse:

os dois conjuntos de variáveis norteadores das análises; a diversidade de experiências desenvolvidas nas diferentes

regiões brasileiras; a diversidade de trabalhos produzidos.

Em primeiro lugar, com vistas à comparabilidade dos conteúdos dos trabalhos, houve o cuidado de definir os dois conjuntos de variáveis para análise, desdobrando-os em subitens que dessem conta das especificidades inerentes às problemáticas tratadas. Dessa forma, os eixos analíticos ficaram assim definidos:

Processos de construção da institucionalidade: articulação dos atores sociais; composição e representação dos conselhos (representação governamental, social etc.); caráter dos conselhos (deliberativo/consultivo; formulador/gestor); legitimidade das representações e nível/qualidade da participação dos atores sociais (controle social);

Bases territoriais e institucionais das diferentes esferas de gestão social: abrangência, interação e ação dos atores sociais e suas qualificações/capacitação, e mecanismos de ligação entre o representante e sua(s) base(s); amplitude e enfoque das discussões; continuidade/descontinuidade e temporalidade das ações; mecanismos de apoio ao funcionamento da institucionalidade (condições de participação dos representantes da sociedade civil frente aos representantes das instituições oficiais, custeio das atividades e dos deslocamentos das entidades civis etc.).

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Em segundo lugar, foi realizado (via Internet, contatos em bibliotecas universitárias especializadas, livrarias etc.) um levantamento de toda a bibliografia existente relacionada à temática do desenvolvimento rural e da institucionalidade, chegando-se a 69 documentos. Obedecendo aos critérios da diversidade regional (Norte, Nordeste, Centro-Oeste, Sudeste, Sul) e do tipo de trabalho (teses e dissertações, artigos, livros, relatórios de pesquisa etc.) foram selecionadas e efetivamente consultadas 26 obras para a elaboração do presente relatório.

Em terceiro lugar, os conteúdos dos trabalhos foram analisados e sistematizados buscando-se identificar os pontos de convergência e de divergência existentes entre eles. No que se refere aos dois eixos temáticos (processos de construção da institucionalidade e bases territoriais e institucionais das diferentes esferas de gestão social), foram sistematizados os pontos de convergência e divergência identificados nos estudos para cada um dos subitens que compõem esses eixos. Estes pontos são apresentados de acordo com a ordem de importância com que são citados em cada um dos trabalhos. Após essa primeira etapa, foram identificados os principais avanços e obstáculos para a gestão social e do desenvolvimento rural apontados no conjunto dos trabalhos analisados.

Posteriormente, foram sistematizadas as principais sugestões para a otimização das institucionalidades identificadas em alguns dos trabalhos consultados.

Finalmente, como conclusão do relatório, são apresentadas as considerações dos consultores sobre a temática abordada no trabalho e sugeridas algumas recomendações com o objetivo de auxiliar os trabalhos do GT “Institucionalidade e Gestão Social do Conselho Nacional de Desenvolvimento Rural Sustentável” do CONDRAF.

III – Principais resultados

Os resultados são apresentados, em primeiro lugar, em termos dos principais pontos de convergência e de divergência existentes e de acordo com a freqüência e ordem de importância com que os mesmos são citados no conjunto dos trabalhos consultados, ressaltando-se que esses quesitos estão contextualizados no interior de cada estudo realizado. Registre-se, entretanto, a ocorrência de uma enorme diversidade de situações que expressa as distintas formas de institucionalidade que vai se conformando nas diversas regiões do país, a qual nem sempre é devidamente considerada, apesar de evidenciar que o processo de democratização da participação dos atores sociais se apresenta de forma bastante irregular no âmbito do território nacional. Em segundo lugar, são apresentados os principais avanços e obstáculos identificados pelos estudos e, por último, são sistematizadas as principais recomendações elaboradas em alguns dos trabalhos analisados.

Apesar da heterogeneidade de situações expressa nos CMDR nas diversas regiões do país, observa-se muitos pontos de convergência apontados pelos estudos, conforme demonstrado a seguir.

Institucionalidades para a Gestão Social do Desenvolvimento Rural Sustentável

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1 – Panorama da Institucionalidade

1.1 – Articulação dos Atores Sociais

a) Principais pontos de convergência entre os estudos resenhados:

1) Existe uma pequena articulação entre cooperativas, sindicatos, associações e outras formas de organização dos agricultores no âmbito dos conselhos municipais;

2) Entrevistas realizadas junto aos produtores em várias localidades mostram que os mesmos desconheciam o funcionamento e o papel dos CMDR;

3) O CMDR ainda é visto apenas como uma instância burocrática, cuja maior serventia é a obtenção de recursos do Governo Federal, especificamente no que diz respeito ao programa PRONAF Infra-estrutura e Serviços Municipais;

4) Nos locais onde os conselhos foram constituídos sem debates entre os diferentes atores sociais e com forte peso do executivo municipal, eles acabam existindo somente para homologar as decisões do executivo municipal, sem qualquer articulação maior entre os agentes e/ou atores sociais locais, fato que descaracteriza as perspectivas iniciais desses conselhos;

5) Como a coordenação dos conselhos continua fortemente concentrada nas mãos dos prefeitos ou de seus representantes, são comuns as preocupações de que os conselhos têm servido para legitimar interesses do poder local à revelia das necessidades e posições assumidas pelas organizações dos agricultores familiares, sendo este fato ainda mais relevante nos casos de municípios periféricos e isolados;

6) Em muitos estados/municípios, a mobilização das comunidades nos municípios decorre mais das ações das administrações públicas (estaduais e municipais), do que propriamente pelas vontades e iniciativas dos atores sociais locais.

b) Principais pontos de divergência entre os estudos resenhados:

1) Na maioria dos CMDR pesquisados pelo Instituto Paranaense de Desenvolvimento Econômico e Social (IPARDES), no estado do Paraná, ocorre uma boa interação entre beneficiários do PRONAF e órgãos gestores da política pública, conforme documento resenhado em anexo a este relatório;

2) Estudo de caso no município de Rolante (RS), mostrou que houve um intenso debate na montagem do CMDR e na definição do Plano Municipal de Desenvolvimento Rural (PMDR), tanto entre as diferentes esferas da administração municipal como entre as comunidades rurais do município, por meio do processo de “assembléias comunitárias”;

3) Nos fóruns locais ocorrem articulações entre os sindicatos, associações, igrejas, administração municipal e equipes técnicas. Este aspecto foi destacado no estudo realizado em dois municípios da Bahia (Lapão e Ibitiá);

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4) O CMDR é o espaço efetivo de articulação entre todos os atores municipais ligados ao setor rural;

5) A diversificação de segmentos presentes nos CMDR e na direção dos mesmos aponta para um efetivo compartilhamento do poder de planejamento e decisão nos municípios, com boa articulação entre os atores sociais.

1.2 – Composição dos CMDR

a) Principais pontos de convergência entre os estudos resenhados:

1) A maior parte dos conselhos tem uma composição que varia entre 10 e 25 membros;

2) Os homens predominam na composição dos CMDR, revelando que a participação de mulheres é bastante baixa. Também é praticamente inexistente a participação de jovens;

3) Em praticamente 100% dos CMDR a composição é paritária entre as esferas do governo e da sociedade civil; situação semelhante também ocorre na composição dos Conselhos de Meio Ambiente em alguns estados do país;

4) Grande heterogeneidade na montagem e funcionamento dos conselhos, com casos de “prefeiturização” dos mesmos;

5) Na totalidade dos casos é respeitada a indicação de que, ao menos, 50% dos membros sejam agricultores;

6) Na maioria dos casos a composição dos conselhos se restringe às forças do município vinculadas à agricultura e, no caso dos representantes do poder público municipal e/ou estadual, a maioria é ligada às Secretarias da Agricultura ou órgãos afins, resultando em uma hegemonia das equipes técnicas;

7) Ocorre a participação de agricultores e suas representações (sindicatos e associações), além de gestores da política pública no âmbito municipal;

8) A presença de agricultores familiares nos CMDR é expressiva, sendo que a representação dos agricultores familiares varia de 50 a 100%, em grande parte dos municípios visitados pelo estudo nacional realizado pelo IBASE.

b) Principais pontos de divergência entre os estudos resenhados:

1) Predomínio dos produtores rurais no CMDR, porém a maioria faz parte do CMDR por indicação e não por eleição de suas entidades;

2) Fazem parte do CMDR sindicatos (patronal e de trabalhadores rurais), cooperativa, associação de produtores, órgãos públicos e representação comercial do município. Assim nota-se que, na representação do CMDR, há uma ampla maioria de membros da sociedade civil;

Institucionalidades para a Gestão Social do Desenvolvimento Rural Sustentável

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3) Em parte dos municípios pesquisados em diversos estados do país, os conselheiros não atuam de forma legalizada, conforme preconizado pela lei que criou os CMDR;

4) A presidência é ocupada pela prefeitura, na metade dos casos. Na outra metade é exercida por representantes dos agricultores;

5) Na maioria dos casos, a presidência dos CMDR é ocupada pela prefeitura, mais especificamente pelo secretário de agricultura;

6) O número de membros em cada conselho é dado, basicamente, pelo número de associações envolvidas, uma vez que todas as associações e cooperativas de agricultores são representadas no conselho. Em alguns casos a representação dos agricultores corresponde a 70% dos membros;

7) A representação dos agricultores corresponde a 51%, ou pouco mais, dos membros. É interessante observar que os representantes das igrejas e dos bancos entram na cota do Poder Público, no caso específico do estudo realizado no estado de Mato Grosso do Sul;

8) A escolha dos membros se dá em reuniões realizadas nas comunidades e, posteriormente, o poder executivo acata a indicação e nomeia os indicados.

1.3 – Caráter dos Conselhos

a) Principais pontos de convergência entre os estudos resenhados:

1) Embora os agricultores participam das discussões, notou-se um comportamento quase padrão de funcionamento dos CMDR, os quais assumem um caráter apenas consultivo;

2) Os CMDR só têm um caráter deliberativo oficialmente, porque na prática os conselhos atendem prioritariamente as demandas das administrações municipais;

3) Em muitos casos, o caráter é deliberativo somente para alocar os recursos públicos, como é o caso do PRONAF Infra-estrutura e Serviços Municipais;

4) Há casos, como no estado do Paraná, onde a maioria dos CMDR tem caráter orientador e consultivo, porém com baixo poder deliberativo.

b) Principais pontos de divergência entre os estudos resenhados:

1) Os CMDR têm autonomia para definir os planos de trabalho e a respectiva aplicação dos recursos;

2) O caráter deliberativo dos conselhos é um dos pontos de avanço do PRONAF Infra-estrutura e Serviços Municipais;

3) Os conselhos são consultivos e deliberativos na grande maioria dos municípios;

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4) Quanto à regulamentação, praticamente todos os CMDR são instituídos por meio de leis municipais;

5) Os conselhos são criados como órgãos executivos e deliberativos junto ao poder executivo municipal;

6) Na área ambiental, observou-se que os conselhos assumem, no caso do estado da Bahia, um caráter mais amplo, sendo ao mesmo tempo normativo, consultivo, deliberativo e gestor de recursos, como complemento do trabalho de educação ambiental e da implantação da Agenda 21;

7) Como a maioria dos conselhos tem um caráter deliberativo, sobressai o status decisório dos conselhos.

1.4 – Legitimidade da representação

a) Principais pontos de convergência entre os estudos resenhados:

1) O envolvimento dos agricultores e de suas organizações é, na maioria das vezes, formal. Entretanto, o fato de que em muitos municípios os representantes dos agricultores estão na presidência dos conselhos, sendo esses próprios agricultores que elegem seus representantes, demonstra que a gestão é participativa e que há um certo grau de representatividade e legitimidade da mesma;

2) Os CMDR foram sendo constituídos com a participação progressiva das representações de agricultores. Porém, mesmo que mais de 50% dos conselheiros tenham sido eleitos pelas entidades ou comunidades, há muitos casos de indicações feitas pelas administrações municipais e órgãos públicos;

3) Nos estados visitados pesquisados pela equipe da Plural Cooperativa de Consultoria, Pesquisa e Serviços, as associações votam em um representante de sua comunidade para fazer parte do conselho, o que evidencia que os membros são escolhidos democraticamente pela comunidade. Esse processo passou a vigorar a partir do segundo mandato dos conselhos, acarretando maior legitimidade da representação, mesmo que o Poder Público ainda tenha presença marcante na presidência e na secretaria dos CMDR.

b) Principais pontos de divergência entre os estudos resenhados:

1) A presidência do CMDR é cargo de confiança do prefeito;

2) A participação no conselho se dá via convite feito pelo secretário executivo, com forte influência da administração pública na definição da representatividade local;

3) No caso dos conselhos de meio ambiente analisados, os mesmos são formados por representantes de todos os segmentos da população local. São vistos pela comunidade de ambientalistas como o instrumento de controle mais confiável para tratar dos assuntos do licenciamento ambiental;

4) O processo de constituição dos CMDR conseguiu aglutinar, na maioria dos casos, as forças sociais organizadas dos municípios.

Institucionalidades para a Gestão Social do Desenvolvimento Rural Sustentável

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1.5 – Papel do CMDR enquanto formulação e gestão de políticas públicas

a) Principais pontos de convergência entre os estudos resenhados:

1) Os conselhos, em sua grande maioria, criados por exigência do PRONAF Infra-estrutura e Serviços Municipais, são apenas gestores dos recursos do referido programa;

2) Os conselhos restringem suas ações ao atendimento das demandas relacionadas às atividades agrícolas;

3) Observa-se uma baixa participação dos agricultores familiares nos momentos de elaboração das propostas de desenvolvimento rural;

4) As ações contempladas nos planos de trabalho dos CMDR ficam reduzidas, praticamente, às atividades do PRONAF Infra-estrutura e Serviços.

b) Principais pontos de divergência entre os estudos resenhados:

1) O CMDR é formulador e gestor das políticas ao mesmo tempo;

2) No caso de experiências na área ambiental, a atuação dos conselhos de meio ambiente vai desde o assessoramento ao executivo municipal até a formulação de políticas e realização de trabalhos em parcerias com instituições locais que atuam na mesma área.

1.6 – Capacitação e qualidade da participação dos atores sociais

a) Principais pontos de convergência entre os estudos resenhados:

1) Há marcante diversidade no grau de formação dos conselheiros. O estudo notou que, das pessoas que fazem parte dos CMDR, existem desde analfabetos até pessoas com o ensino médio completo que, na maioria dos casos, são os técnicos da EMATER. O baixo grau de formação dos conselheiros se traduz em dificuldade de compreensão em relação a suas atribuições, ao papel que deve ser desempenhado pelos conselhos e aos mecanismos disponíveis para alcançar seus objetivos;

2) Muitos conselheiros desconhecem o caráter do próprio CMDR, pois não sabiam diferenciar “consultivo” de “deliberativo”;

3) Falta de preparo dos agricultores, dos sindicatos e das associações de agricultores. Com isso, as equipes técnicas acabam definindo as prioridades dos planos;

4) Falta capacitação aos membros dos CMDR que não sabem sequer o papel que devem desempenhar nos conselhos;

5) Há unanimidade quanto à importância dos cursos de capacitação permanente dos conselheiros.

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b) Principais pontos de divergência entre os estudos resenhados:

1) O PMDR previu um conjunto de ações de capacitação dos agricultores, sobretudo em ações relacionadas aos problemas ambientais, tendo em vista a necessidade de mudar o caráter do proprietário rural, de destruidor para protetor do meio ambiente;

2) O grau de participação das comunidades nas reuniões dos conselhos é precário, mas há vários casos documentados que dão conta do aumento dos interesses das comunidades locais em participar dos CMDR;

3) O corpo técnico que assessora a formulação dos PMDR não está capacitado para elaborar planos voltados ao desenvolvimento, mas apenas para atender as necessidades imediatas dos agricultores;

4) O CMDR faz reuniões periódicas e realiza cursos de capacitação aos conselheiros, mas os planos normalmente são elaborados pelo técnico local e endossados pelo CMDR posteriormente. Não há participação da representação social na elaboração dos planos de desenvolvimento;

5) A participação da comunidade foi considerada regular nos três municípios, com forte influência do executivo municipal.

2 – Bases Territoriais e Institucionais das Diferentes Esferas de Gestão Social

2.1 – Abrangência e Interação das Ações

a) Principais pontos de convergência entre os estudos resenhados:

1) A interação entre os atores envolvidos nos CMDR é bastante baixa;

2) A definição das linhas dos planos de trabalho dos CMDR e a gestão dos mesmos geralmente ficam ao encargo das equipes técnicas dos órgãos municipais e estaduais;

3) As ações propostas nos planos de trabalho dificilmente transcendem a esfera setorial (agrícola) e o horizonte municipal;

4) Há uma baixa cooperação entre as forças sociais pertencentes a diversos municípios, fazendo com que as iniciativas sejam, quase sempre, de competição e não de complementaridade entre as localidades de uma mesma região geográfica;

5) O grau de articulação entre as secretarias e órgãos públicos relacionados aos programas de desenvolvimento rural, nas três esferas de governo, ainda é muito precário;

6) Nos municípios periféricos e mais isolados nota-se que há uma maior fragilidade das organizações sociais locais, enquanto a natureza da maioria dos problemas cresce, exigindo ações e articulações intermunicipais que nem sempre são buscadas;

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7) Praticamente não existe interação entre os CMDR e os outros conselhos existentes nos municípios, sendo que a única relação institucional do CMDR ocorre via Conselho Estadual de Desenvolvimento Rural.

b) Principais pontos de divergências entre os estudos resenhados:

1) Os projetos estão sendo construídos em parcerias entre as administrações municipais, órgãos estaduais e associações dos produtores;

2) A maioria dos produtores participa dos conselhos apenas recebendo informações;

3) A visão de desenvolvimento dos conselheiros se restringe ao fortalecimento do setor agropecuário municipal;

4) A abrangência das atribuições dos conselhos ultrapassou a simples destinação de recursos do PRONAF e sua fiscalização;

5) Na maioria dos municípios (caso do estado do Mato Grosso do Sul) existe uma articulação dos CMDR com as instituições que trabalhem com desenvolvimento rural. Porém, essas relações são bastante pontuais, não levando a uma interação entre as ações dos conselhos e essas instituições;

6) A abrangência dos PMDR, embora contemple o PRONAF Infra-estrutura e algumas outras ações das prefeituras municipais, apresenta um baixo grau de articulação das ações com outras instâncias governamentais de nível estadual ou federal, ou até mesmo com outras organizações da sociedade civil.

2.2 – Amplitude e Enfoque dos Debates

a) Principais pontos de convergência entre os estudos resenhados:

1) Grande parte dos PMDR analisados nos estados de São Paulo e Minas Gerais elaboraram mais uma lista de compras do que propriamente “planos de desenvolvimento rural”, pois até compra de ambulâncias e construção de hospitais fazia parte dos primeiros PMDR;

2) Os conselhos têm atuado em torno da solução de problemas pontuais, sendo poucos aqueles que conseguiram iniciar um trabalho capaz de impulsionar transformações locais;

3) São praticamente inexistentes as discussões no âmbito dos conselhos sobre os impactos que programas, como é o do PRONAF Infra-estrutura, causam no desenvolvimento das economias locais.

b) Principais pontos de divergência entre os estudos resenhados:

1) Muitos projetos são propostos por órgãos externos às comunidades rurais, o que nem sempre atende as necessidades das mesmas;

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2) Parte dos conselheiros desconhece previamente os assuntos que serão discutidos nas reuniões;

3) A familiaridade dos conselheiros com o tema do desenvolvimento rural é bastante baixa;

4) Os temas abordados pelos CMDR não se restringem ao mundo agrícola, procurando enfocar outras esferas do desenvolvimento rural;

5) Os planos de trabalho são estritamente agrícolas e voltados apenas às ações econômicas já estão sendo desenvolvidas pelos membros das comunidades;

6) Não existem reflexões coletivas sobre as potencialidades e vocações dos municípios no âmbito regional;

7) Na área ambiental nota-se que todas as questões relativas à gestão ambiental são discutidas no âmbito dos conselhos municipais de meio ambiente.

2.3 – Continuidade e Descontinuidade das Ações

a) Principal ponto de convergência entre os estudos resenhados:

1) Como boa parte das ações dos CMDR diz respeito apenas às discussões sobre os destinos dos recursos do PRONAF, ficam claras as dificuldades de continuidade das ações dos conselhos, caso venha a ocorrer mudanças na lógica operacional do referido programa.

b) Principais pontos de divergência entre os estudos resenhados:

1) Dentre as principais dificuldades mencionadas destaca-se a falta de cumprimento dos objetivos definidos pelos planos de trabalho em algumas localidades, o que provoca descontinuidade das ações definidas no âmbito dos CMDR;

2) O planejamento e a gestão do PRONAF no âmbito da política agrícola gerou conflitos institucionais que afetam a continuidades das ações, mas que podem tranqüilamente ser minimizados com o tempo;

3) Existem disputa entre instituições e esferas de governo (municipal, estadual e federal) que acabam atrasando e, até mesmo, inviabilizando projetos locais;

4) A continuidade das ações é também afetada pela burocratização e pela pouca presença dos interessados (comunidades);

5) A temporalidade das ações está diretamente relacionada ao mandato das administrações municipais, uma vez que o funcionamento do CMDR está atrelado à agenda das administrações públicas locais. Assim, quando esta muda, poderá ocorrer uma descontinuidade das ações e, até mesmo, a remontagem do próprio conselho;

6) Parte dos conselhos tem reuniões mensais abertas à participação externa e com direito a voz;

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7) A maioria dos conselhos mantém atividades constantes, com um razoável grau de organização;

8) Há uma dinâmica fortemente marcada pelo formalismo nas reuniões dos CMDR;

9) Constatou-se que há uma relativa estabilidade na composição dos CMDR.

2.4 – Mecanismos de Apoio ao Funcionamento da Institucionalidade

a) Principal ponto de convergência entre os estudos resenhados:

Na verdade, poucos foram os estudos que abordaram este quesito de forma detalhada como está sendo enfatizada neste trabalho, razão que explica a inexistência de uma convergência de opiniões relativas a este quesito.

b) Principais pontos de divergência entre os estudos resenhados:

1) Falta de recursos, tanto técnicos como de material permanente, para facilitar deslocamento dos membros dos conselhos;

2) A estrutura de apoio aos conselhos é inadequada;

3) Não existe infra-estrutura própria na maioria dos conselhos, sendo que as prefeituras municipais tornam-se o principal espaço de apoio ao funcionamento dos mesmos, ao disponibilizar recursos, veículos, combustível, funcionários, assistência técnica e espaço físico.

3 – Principais Avanços e Obstáculos

3.1 – Principais Avanços

a) No âmbito do desenvolvimento rural municipal: o PMDR é apontado como o principal instrumento para impulsionar o desenvolvimento do município. A democratização na gestão das políticas, as obras e equipamentos adquiridos para o município, o apoio para o aumento da produtividade, a melhoria da qualidade de vida e renda dos agricultores e a conseqüente fixação do homem no campo, o desenvolvimento do município e o fortalecimento da agricultura familiar foram os principais aspectos positivos apontados em muitos dos trabalhos analisados.

b) No âmbito da articulação entre os diferentes atores sociais: em alguns casos houve avanços nos últimos anos, com o estabelecimento de parcerias entre as administrações municipais e as representações sociais. Deu-se início a um processo de co-gestão da política voltada ao fortalecimento da agricultura familiar, reduzindo-se os atritos institucionais entre diferentes esferas de órgãos públicos (federais, estaduais e municipais). Os avanços ocorrem quando existem sinergias entre as administrações municipais e os CMDR, com estabelecimento de ações de complementaridade entre prefeituras e conselhos. Ao apoiar projetos de

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consórcios de municípios, o PRONAF busca, desde 2002, incentivar a articulação entre municípios e quebrar o isolamento das pequenas localidades.

c) No âmbito da organização, da participação e da capacitação dos atores sociais, em especial dos agricultores familiares e das comunidades: o PRONAF desencadeou um inédito e frutífero processo de discussão local sobre os rumos do desenvolvimento rural, apesar dos problemas iniciais de sua implantação. Os CMDR possibilitam a democratização e a participação dos agricultores familiares e das comunidades no exercício do poder local. Observa-se a ampliação da participação dos agricultores, bem como a reflexão crítica sobre os rumos do desenvolvimento Mesmo que ainda restrita, constatou-se um avanço da participação e envolvimento das mulheres e de jovens em vários empreendimentos. O conhecimento e o aprendizado adquiridos na participação das reuniões, nos cursos de capacitação e na permanência no campo, são avanços importantes para a consolidação dos processos democráticos.

d) No âmbito do ambiente institucional e da consolidação de novas institucionalidades: o PRONAF está conseguindo produzir um ambiente institucional, necessário à ampliação da base social da política nacional, embora com conseqüências práticas ainda tímidas e parciais. Grande parte dos CMDR foi criada a partir de legislações debatidas e aprovadas pelas câmaras municipais; apresentam funcionamento periódico e conseguem estabelecer um mínimo de diálogo e debate sobre as ações de desenvolvimento voltadas para o município. No caso dos conselhos de meio ambiente, os principais avanços aparecem explicitamente na dimensão administrativa, técnica e institucional nos municípios estudados, merecendo destaque: as parcerias, os projetos, as licenças ambientais. De forma especial houve um avanço no monitoramento dos recursos públicos investidos e na participação da sociedade nos processos de tomada de decisão sobre os investimentos públicos no município. Altíssimo percentual de regulamentação local, da existência de estrutura de apoio e do cumprimento satisfatório das exigências burocrático-formais que regem o funcionamento desses conselhos também foram apontados como avanços.

3.2 – Principais Obstáculos

a) No âmbito do desenvolvimento rural municipal: Os CMDR foram criados apenas para atender as exigências legais para receber verbas públicas, em especial do PRONAF Infra-estrutura e Serviços. Há falta de cumprimento dos objetivos definidos no CMDR, ou seja, o desenvolvimento rural dos municípios, uma vez que os CMDR não expressam uma dinâmica local significativa. O caráter municipal dos conselhos é limitante porque, em municípios rurais pobres e com baixa densidade populacional, as chances de se construir processos inovadores de desenvolvimento são reduzidas. Os conselhos se tornam instâncias de decisão sobre uso de recursos e não momentos de reflexão coletiva sobre a maneira como uma determinada sociedade descobre suas vocações. Os planos de trabalho do Conselho se reduzem a uma lista de demandas dos municípios e os temas apreciados ficam restritos aos pontos que demandam decisões do conselho sobre planos de trabalho para PRONAF, cujo conteúdo é uma sobreposição de demandas municipais relativas à agricultura. O fato da maioria dos conselhos ter sido criada após o surgimento do PRONAF confirma a

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falta de experiência em processos participativos na gestão pública, o que se apresenta como um obstáculo. Outro obstáculo é a atuação dos conselhos em torno da solução de problemas pontuais, sendo poucos os que conseguiram iniciar um trabalho propulsor de transformações locais. Os CMDR têm a função, mas não os meios, para a promoção do desenvolvimento rural, no entanto prevalece uma visão tradicional quanto à possibilidade da promoção do desenvolvimento, com ações que se restringem aos limites do município e da agricultura. Não há inovações tecnológicas, articulação entre o setor primário e outros setores, nem preocupação com as formas sociais de utilização dos recursos naturais/culturais dos territórios.

b) No âmbito da articulação entre os diferentes atores sociais: dependência dos CMDR em relação ao poder executivo municipal, além das interferências político-partidárias no CMDR. O processo de municipalização, em algumas regiões do país, encontra obstáculos nas pressões das oligarquias locais e nos vínculos familiares tradicionais que inibem a atuação articulada do conjunto dos atores sociais do município. Os Conselhos apresentam um funcionamento meramente burocrático, apenas cumprindo com as formalidades a eles preestabelecidas para o recebimento dos recursos do programa, não se propondo uma atuação mais ampla no sentido de articular as forças existentes no território. Os principais aspectos negativos apontados em alguns estudos remetem à fragilidade da articulação dos CMDR com outras institucionalidades e com atores fundamentais para o desenvolvimento rural.

c) No âmbito da organização, da participação e da capacitação dos atores sociais, em especial dos agricultores familiares e das comunidades: baixa participação dos agricultores e de outros setores da sociedade civil na definição de propostas pelos CMDR, especialmente na elaboração dos PMDR, que ficam, em grande parte dos casos, ao encargo das equipes técnicas. Desconhecimento do papel dos conselhos e falta de mecanismos adequados para articular as forças locais rurais. Parte dos conselheiros desconhecem os assuntos que são discutidos nos CMDR. Baixa e quase inexistente presença de mulheres e dos jovens. A grande maioria dos municípios selecionados é composta por atores sociais rurais que não estão preparados para as novas iniciativas (definição de PMDR e gestão social), sofrendo facilmente a ascendência dos demais atores presentes nos conselhos: representantes do poder público, entidades empresariais etc. Falta de capacitação técnica, tanto dos conselheiros como dos técnicos que elaboram os planos municipais. Pouca formação e capacitação dos membros para a atuação nos CMDR.

d) No âmbito do ambiente institucional e da consolidação de novas institucionalidades: poucos CMDR exercitam o caráter deliberativo. Ausência de periodicidade das discussões e reuniões dos CMDR. A manutenção de muitos conselhos é motivada apenas para cumprir exigências legais de recebimento de recursos dos programas governamentais (PRONAF). Os projetos obedecem a determinadas exigências burocráticas que impedem avanços. As mudanças de atores responsáveis por projetos (institucionais e/ou sociais) levam à descontinuidade e desvios dos mesmos. Os Conselhos têm pouca capacidade de promover mudanças no “ambiente institucional”. A maioria dos conselhos foi instituída de forma emergencial, sem capacitação dos conselheiros e, muitas

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vezes, com a escolha dos membros feita exclusivamente pelo executivo municipal. A inadequada estrutura de apoio para o funcionamento dos CMDR, da qual deriva uma série de dificuldades: falta de apoio das prefeituras municipais; falta de técnicos; falta de incentivo e estímulo; interesses políticos; falta de transporte para as reuniões etc. Estrutura inadequada e dependência das prefeituras (processo de “prefeiturização” dos CMDR). CMDR constituídos “no afogadilho”. Funcionamento formal e burocrático dos CMDR, que limita o alcance das ações dos mesmos. O distanciamento entre as linhas do PRONAF e processos e critérios de escolha dos municípios do PRONAF são incompatíveis com a função dos CMDR. Centralização do poder e das decisões caracterizando um processo não democrático.

IV – Principais recomendações dos estudos

Esta seção procura sistematizar e organizar as principais recomendações por blocos temáticos, enquanto instrumentos necessários para superação dos problemas e dificuldades detectados pelos estudos. Porém, registre-se a dispersão e a baixa presença dessas sugestões na maioria das obras consultadas. Assim, destacam-se os seguintes aspectos:

4.1 – Proposições sobre desenvolvimento rural:

a) Sugere-se que durante o processo de formulação e implementação dos PMDR sejam tomadas iniciativas que procurem aprimorar o ambiente institucional, por meio de mecanismos que garantam a representatividade e a capacidade de gestão dos mesmos;

b) Em relação à estrutura e o conteúdo dos PMDR, sugere-se que sejam considerados, desde o início do processo de formulação dos mesmos, os estudos e diagnósticos já elaborados e demais informações existentes que contemplem: a identificação dos agricultores familiares, de outros setores da sociedade civil e as respectivas demandas; a caracterização da institucionalidade municipal e de sua dinâmica; as iniciativas governamentais em curso; situações especiais da agricultura familiar; assistência técnica e a capacitação dos agricultores familiares;

c) Sugere-se, também, que os PMDR incorporem temas que potencializem o fortalecimento da agricultura familiar, tais como as questões de gênero, multifuncionalidade, pluriatividade, a juventude rural e suas perspectivas etc;

d) Os PMDR devem ser formulados para além do PRONAF, sugerindo-se que o poder público municipal assuma contrapartidas nos planos, com maior comprometimento de recursos municipais para o desenvolvimento da agricultura familiar.

4.2 – Proposições sobre organização, participação e capacitação dos atores sociais

a) Reestruturar profundamente a política de capacitação, por intermédio da segmentação dos conteúdos a partir da realidade dos municípios, visando

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imprimir uma perspectiva continuada às ações de capacitação com o objetivo de impulsionar a vinculação entre a política de capacitação e outras iniciativas de assessoria técnica e de pesquisa;

b) Estruturar e promover o intercâmbio entre os diferentes conselhos municipais, tanto em termos do acesso às informações sobre políticas públicas ou experiências afins como da integração de procedimentos burocráticos.

4.3 – Proposição sobre articulações entre atores sociais e instituições

a) São necessárias iniciativas concretas que aumentem a integração entre os diferentes conselhos e atores sociais, visando integrar e articular programas governamentais que tenham efeitos diretos sobre desenvolvimento local.

4.4 – Proposições sobre o ambiente institucional e a consolidação de novas institucionalidades

a) Estabelecer mecanismos para conferir um caráter contratual às políticas e às relações entre os agentes, com a adoção do Contrato Territorial de Desenvolvimento entre os agentes, uma vez que o mesmo é considerado um importante instrumento de articulação, diálogo e complementaridade entre as políticas que incidem sobre um mesmo território;

b) Fortalecer os CMDR como espaços de gestão social das políticas e de articulação das forças sociais de um território, delegando ao próprio Contrato Territorial a definição dos mecanismos de sua gestão em âmbito regional, desde que respeitadas algumas regras básicas, como a obrigatoriedade da representação de agricultores, dentre outras;

c) Definir parâmetros mínimos para a constituição e funcionamento dos CMDR, com a adoção de critérios básicos para a criação e funcionamento dos conselhos, os quais serão posteriormente reconhecidos pelos Conselhos Estaduais de Desenvolvimento Rural Sustentável (CEDRS) e pelo Conselho nacional de Desenvolvimento Rural Sustentável (CONDRAF);

d) Recomenda-se a adoção do sistema de eleição nas comunidades rurais para a escolha de seus representantes nos conselhos, o que proporcionará uma maior democratização na sua composição dessas instituições como também uma maior mobilização dessas comunidades diante do novo ambiente institucional;

e) Sugere-se também a adoção de quota mínima para mulheres agricultoras; um sistema de ajuda de custo para as despesas, especialmente para as despesas de transporte dos membros; aperfeiçoamento dos critérios de composição dos CMDR, de tal forma que esteja garantida uma distribuição geográfica equilibrada; além do fortalecimento da presença de outros atores sociais na presidência dos Conselhos, para que a mesma não fique restrita aos executivos municipais.

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4.5 – Proposições de caráter geral

a) Criar instrumentos que permitam focalizar melhor e diferenciar as ações, de acordo com as diferentes situações dos municípios rurais, adotando-se uma tipologia dos municípios rurais baseada na leitura dessas diferentes situações identificadas, com a criação posterior de um Índice de Desenvolvimento Rural Sustentável (IDRS);

b) Instituir um sistema de planejamento, monitoramento e avaliação como base para a alocação de recursos e para a contratualização das relações e novos investimentos, tomando-se a caracterização atual dos espaços rurais para desenhar diferentes tipos de ações que, ao final de um determinado período, poderiam ser avaliadas em termos da sua evolução;

c) Organizar um sistema concentrado de informações provenientes dos principais agentes responsáveis pelas ações de apoio e suporte à agricultura familiar nos três níveis de governo, bem como daquelas informações provenientes de outras fontes, como agentes financeiros, órgãos de pesquisa e extensão rural, redes de conselhos municipais e estaduais, sindicatos e organizações dos agricultores, etc.

V – Considerações e sugestões

5.1 – Considerações

Hoje está em curso um processo de valorização do local e do território como espaços de realização de novos pactos sociais. Assim, novos atores sociais e novas institucionalidades se fazem presentes nesse processo, tendo papel fundamental nos cenários para o desenvolvimento brasileiro no início do século XXI, em especial para o desenvolvimento rural e territorial sustentável.

A justiça social, traduzindo-se na diminuição das desigualdades existentes e na ampliação da cidadania; a desburocratização e a descentralização, via municipalização; foram os eixos básicos que orientaram as discussões constituintes e a elaboração do texto da Constituição de 1988. No contexto de profundas transformações propiciadas pela Carta Constitucional, os conselhos se multiplicaram por todo o país, com atuação de distintos atores sociais em diferentes setores, como saúde, educação, infância, meio ambiente e desenvolvimento rural. De certa forma, instaurou-se uma cultura e prática “conselhistas”, em que a cada nova proposição de política pública buscava-se criar uma nova instituição para gerenciá-la.

Os trabalhos indicam que quanto mais ampla tem sido a representação dos diferentes setores governamentais e não-governamentais nos conselhos, mais consistentes têm sido a construção e a implementação de um novo pacto sócio-político. Importante passo nessa direção foi o estabelecimento da paridade e o equilíbrio entre os vários grupos de interesse. No caso dos conselhos municipais, dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) de 2001, indicam a existência de aproximadamente 27 mil

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conselhos, abrangendo 99% dos municípios brasileiros, numa média de 4,9 conselhos por município.

No entanto, após a leitura e análise de diversos artigos, teses e documentos, pode-se registrar, como uma primeira consideração, que a ocorrência da grande diversidade de situações expressa nas distintas experiências locais de institucionalidade constatada nos trabalhos analisados, está ligada, em parte, às questões de natureza estrutural própria de países como o Brasil, cujo processo de desenvolvimento foi cunhado por forte dependência externa e gritantes desigualdades internas. Cabe salientar as desigualdades regionais, marcadas pela desigualdade socioeconômica e cultural (incluindo-se aqui as desigualdades de gênero e étnicas), bem como pela concentração de renda, de terra, de informação e de poder político. Esses fatores são condicionantes importantes que podem explicar o sucesso ou insucesso de políticas públicas, de programas e/ou projetos, e de formas de organização e participação social. Criar as condições necessárias para superar esses “gargalos” estruturais é fundamental para mudar o rumo dessa trajetória, em direção a uma sociedade mais justa e democrática.

Em segundo lugar, percebe-se que, movidos pelos objetivos de resolver mais rapidamente os problemas emergenciais dos municípios rurais e dos agricultores e, ao mesmo tempo, induzir um processo de mobilização, de organização e de participação da sociedade civil, programas públicos, como é o caso PRONAF Infra-estrutura e Serviços Municipais, ignoraram as desigualdades acima referidas. Dessa forma, foram corroboradas as hipóteses levantadas por diversos autores de que há problemas na constituição dos CMDR, ou seja, existem “problemas de origem” que têm efeitos sobre o funcionamento da institucionalidade. Os CMDR, na grande maioria dos casos, foram criados para atender a uma formalidade imposta pelo PRONAF e constituídos num curto espaço de tempo, ou como citam diversos trabalhos, no “afogadilho”. Desses “problemas de origem” derivam outros tantos dos quais podem ser destacados:

a) No âmbito do desenvolvimento rural: os CMDR, ao limitar sua atuação ao tratamento de questões relacionadas à melhoria das condições de produção agrícola, ou com problemas e demandas pontuais de curto prazo, acabam não discutindo, e sequer implementando, ações mais abrangentes que poderiam alterar os rumos do desenvolvimento rural nos municípios e territórios. Ao priorizar questões técnicas e administrativas, os CMDR passam a ser vistos, por grande parte dos atores sociais, apenas como instâncias burocráticas para a obtenção de recursos do Governo Federal, especificamente no que diz respeito ao programa PRONAF Infra-estrutura e Serviços Municipais, fato que acaba desmotivando a participação daqueles segmentos sociais rurais mais preocupados e comprometidos com um desenvolvimento sustentável. Além disso, neste tipo ambiente institucional deixa-se de fazer reflexões periódicas sobre os problemas e a realidade rural, tornando essas instâncias incapazes de propor soluções inovadores, em termos de processos de desenvolvimento local e territorial.

b) No âmbito da articulação entre os diferentes atores sociais: o processo de descentralização e de municipalização encontra, em diversas regiões do país, obstáculos nas pressões das oligarquias, nos poderes locais e nos vínculos familiares tradicionais, os quais inibem a atuação articulada do conjunto das forças sociais dos municípios e, até mesmo, de territórios. Assim, os trabalhos

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analisados apontam para o fato de que a articulação entre os atores sociais que, potencialmente poderiam estar envolvidos no processo de desenvolvimento rural dos municípios, é bastante baixa. Igualmente é praticamente nula a articulação entre as diferentes institucionalidades recentemente constituídas; tome-se como exemplo a inexistência de relações entre os Conselhos de Meio Ambiente e os Conselhos de Desenvolvimento Rural, que teoricamente trabalham com questões e políticas públicas transversais e com fortes interfaces. Com isso, observa-se que a articulação entre as instituições ocorre, em muitos casos referenciados pelos estudos, apenas no nível individual, ou seja, por meio de indivíduos que participam concomitantemente de mais de um conselho. Dentre outros problemas, a falta de envolvimento, de sinergia e de articulação dos atores faz com que as iniciativas sejam, quase sempre, de competição e não de complementaridade, aspecto que pode interferir na continuidade das ações e de programas destinados a promover desenvolvimento territorial rural. Da mesma forma, pode-se criar obstáculos à institucionalização e consolidação do processo de descentralização das decisões e da própria gestão das políticas públicas. Esses fatos nos levam a concluir que o processo democrático de descentralização e municipalização, previsto legalmente na Constituição de 1988, mesmo quando implementado formalmente, ainda não se encontra devidamente introjetado como cultura e prática institucional.

c) No âmbito da organização, da participação e da capacitação dos atores sociais: A predominância de homens na composição dos CMDR revela que a desigualdade nas relações de gênero ainda é bastante forte nas comunidades rurais. Também é praticamente inexistente a participação de jovens nos processos decisórios sobre os rumos do desenvolvimento rural. Considerando-se a importância desses atores na construção de projetos futuros, entende-se como fundamental e urgente a criação de mecanismos de inserção dos mesmos nas novas institucionalidades. O grau de formalidade do envolvimento dos agricultores e de suas organizações é um indicativo de que ainda não foram superadas as desigualdades apontadas anteriormente. Entretanto, o fato de que, em muitos municípios, os representantes dos agricultores exercem a presidência dos conselhos e são eleitos pelas próprias comunidades, demonstra que a gestão participativa com representatividade e legitimidade é perfeitamente possível. As desigualdades nos níveis de formação, educação e capacitação, tão presente na sociedade brasileira e, especialmente no setor rural, são traduzidas em dificuldades de compreensão, pela maioria dos conselheiros, em relação a suas atribuições, ao papel que deve ser desempenhado pelos Conselhos e aos mecanismos disponíveis para alcançar seus objetivos. Além desse condicionante, a falta de tempo hábil para a discussão junto aos atores sociais envolvidos e a falta de informação acarretaram o desconhecimento sobre o funcionamento e o papel dos CMDR, por sua vez dificulta e, muitas vezes, até inviabiliza uma participação mais efetiva dos diferentes atores sociais nos processos decisórios. Outro aspecto que merece destaque, no que se relaciona à questão da participação dos atores, que não foi considerado quando da implementação do PRONAF e dos CMDR, mas ao qual os trabalhos analisados fazem menção, diz respeito à importância de experiências organizativas e participativas prévias por parte dos atores e comunidades. Essas experiências podem definir, tanto a qualidade da participação como o papel desempenhado pelos atores no âmbito dos CMDR.

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d) No âmbito do ambiente institucional e da consolidação de novas institucionalidades (funcionamento e abrangência dos CMDR): a burocratização e “prefeiturização” dos conselhos reflete-se, por um lado, na forte ingerência política e, por outro, na dependência dos conselhos em relação ao poder executivo municipal, fazendo com que a mobilização nos municípios decorra mais das ações das administrações públicas do que propriamente pelas vontades e iniciativas dos atores sociais locais. A amplitude e a temporalidade das ações estão, em alguns casos, diretamente relacionadas às disputas políticas locais e ao mandato das administrações municipais, uma vez que o funcionamento de alguns dos CMDR está atrelado à agenda das administrações públicas locais. Assim, quando ocorrem mudanças nas administrações, pode ocorrer uma descontinuidade das ações e, até mesmo, a remontagem do próprio conselho. Um aspecto que reforça essa dependência do executivo local é a inexistência de infra-estrutura própria na maioria dos conselhos, sendo que as prefeituras municipais tornam-se o principal espaço de apoio ao funcionamento dos conselhos, ao disponibilizar recursos, veículos, combustível, funcionários, assistência técnica e espaço físico. Esse fato limita sobremaneira a atuação dos CMDR, que acabam existindo, em alguns casos, apenas para legitimar interesses do poder local, homologar decisões ou para atuar como órgão consultivo, em detrimento do seu papel deliberativo.

Apesar de todas as dificuldades apontadas, considera-se que os CMDR são espaços potenciais de articulação entre todos os atores municipais ligados ao setor rural, nos quais é possível aglutinar as forças vivas dos municípios num efetivo processo de compartilhamento do poder de planejamento, decisão e gestão nos municípios e territórios para impulsionar o desenvolvimento rural sustentável de municípios e territórios. A democratização na gestão das políticas, as obras e equipamentos adquiridos para o município, o apoio para o aumento da produtividade, a melhoria da qualidade de vida e renda dos agricultores e a conseqüente fixação do homem no campo, o desenvolvimento do município e o fortalecimento da agricultura familiar foram os principais aspectos positivos apontados em muitos dos trabalhos analisados e podem ser ampliados a todos os municípios brasileiros, desde que seja desencadeado um processo de capacitação e formação e de reestruturação das relações de forças entre os atores sociais.

5.2 – Sugestões

Considerando-se a enorme diversidade de situações registradas pelos estudos e os pontos anteriormente destacados, são sugeridas algumas medidas no sentido de aprofundar o processo de democratização e de descentralização das políticas destinadas à promoção do desenvolvimento rural. Assim, ressaltamos os seguintes aspectos:

a) Rumos do desenvolvimento rural: a crença de que o ambiente rural é algo maleável que pode ser facilmente modificado por pessoas que apenas detém vontade política não condiz com a realidade retratada em diversos trabalhos analisados, uma vez que qualquer mudança institucional trás embutida em si mesma uma gama de conflitos e resistências, que não são superadas apenas por meio de medidas administrativas. Neste sentido, é preciso superar a marca da “artificialidade” de programas e projetos, garantindo o espaço para a legitimação

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social e política dos atores, bem como da própria política pública. Para tanto, as novas instituições já criadas e/ou em construção devem aprofundar, ao máximo, o processo de democratização. Existe uma enorme quantidade de medidas já sugeridas por diversos estudos, mas que nem sempre estão sendo consideradas, que poderiam atuar na direção acima apontada, destacando-se, dentre outras, a alteração da composição dos conselhos; a forma de escolha dos conselheiros; a estruturação operacional dos mesmos; o caráter de suas decisões etc.

b) Ambiente Institucional: a falta de integração entre os diferentes atores e as próprias instituições em uma mesma base territorial acaba provocando instabilidades sobre o processo de desenvolvimento rural, levando a uma desintegração de ações e de projetos concebidos como elementos promotores de mudanças. Muitos estudos registram este aspecto em termos de descompasso entre as deliberações dos conselhos – caso dos CMDR – e as respostas efetivamente adotadas a partir daquelas deliberações. Neste sentido, sugere-se uma maior potencialização do capital social, sobretudo naquelas localidades distantes e em processo de estruturação, uma vez que nem as administrações municipais e as próprias organizações sociais são capazes de dar conta dos novos desafios. Além disso, é preciso estimular continuamente a articulação entre os atores locais e outros atores, tais como universidades, serviços de pesquisa e extensão, visando superar os limites impostos às discussões pela dimensão municipal, apostando-se em processos locais e regionais.

c) Articulação entre os atores sociais: esse debate não pode mais ficar restrito apenas aos aspectos administrativos e gerenciais de determinados programas e políticas públicas. Para tanto, é necessário transformar o espaço institucional – caso dos CMDR – também em um espaço de reflexão sobre todos os temas relacionados ao desenvolvimento territorial rural. Neste sentido, é importante reverter a lógica de atuação de muitos desses conselhos que, conforme atestado por diversos estudos, só se reúnem nos momentos de definições da aplicação dos recursos oriundos dos programas públicos. É de fundamental importância que a problemática rural esteja no centro da agenda dessas instituições, o que poderia estimular uma maior participação e envolvimento dos diferentes atores sociais de um mesmo território.

VI – Referências bibliográficas

ABRAMOVAY, Ricardo e VEIGA, Jose Eli da. Novas Instituições para o desenvolvimento Rural: o caso do Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (PRONAF). Convênio FIPE/IPEA 07/97. Brasília: IPEA, 1999.

ABRAMOVAY, Ricardo. Conselhos além dos limites: Texto preparado para o Seminário Desenvolvimento Local e Conselhos Municipais de Desenvolvimento Rural, Rio Grande do Sul: 2001b. Disponível em: www.fao.org/regional/Lamerica/prior/desrural/brasil/abram. Acesso em 20 de março de 2003.

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Institucionalidades para a Gestão Social do Desenvolvimento Rural Sustentável

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ANEXO 1

Cinco resenhas consideradas mais relevantes

RESENHA Nº 1

ABRAMOVAY, Ricardo. Conselhos além dos limites. Seminário de Desenvolvimento Local e Conselhos Municipais de Desenvolvimento Rural organizado pela EMATER/RS, pela FETAG/RS com apoio da GTZ, 2001.

O autor inicia o trabalho chamando a atenção para o fato de que a “profusão de conselhos gestores é a mais importante inovação institucional das políticas públicas no Brasil democrático”. Faz referência à precariedade da participação social nessas novas formas organizativas e sua submissão a poderes locais dominantes, que têm sido enfatizadas nos estudos sobre a temática. Salienta, entretanto, que apesar das lacunas e obstáculos existentes, os conselhos têm um potencial de transformação política bastante forte e que, pelo simples fato de existirem, abrem caminho para a discussão de temas até então ausentes, bem como para a ampliação do círculo social em que se dão essas discussões. A curta existência dos CMDR talvez possa explicar a quase inexistência de estudos sistemáticos de caráter nacional dedicados aos mesmos. Aponta a existência do PRONAF como uma “virada significativa nas políticas públicas voltadas ao meio rural no Brasil”, tanto por incluir a agricultura familiar na pauta das mais importantes agências governamentais, e por propiciar a extensão do crédito agrícola a segmentos sociais até então excluídos do sistema, como por viabilizar a criação dos conselhos de desenvolvimento rural, dos quais a maioria formou-se como condição para que os municípios recebessem os recursos do Programa em sua linha infra-estrutura e serviços. Alerta que os benefícios derivados dessa linha do PRONAF não são organicamente integrados às iniciativas dos agricultores tomadores de empréstimo, não se constituindo, assim, “em um real aumento da capacidade de geração de renda e da confiança da sociedade em suas possibilidades de desenvolvimento”. Indica como um importante ponto de estrangulamento do PRONAF o fato de não existir uma extensa e capilarizada rede de conselhos que promova a sinergia e mobilização “das forças vivas que compõem o meio rural”, o que torna o Programa “um pouco mais do que um banco de crédito”. Indica como problema fundamental o fato de, na maioria dos casos, a forma de criação, o funcionamento e o alcance das ações, não estimularem “o preenchimento das funções básicas para as quais foram organizados”. O artigo sustenta duas idéias básicas: 1) os critérios a partir dos quais são escolhidos os municípios beneficiados pelo PRONAF contribuem para a burocratização dos CMDR; e 2) os técnicos e as representações sociais envolvidos nos CMDR não estão capacitados para as funções de desenvolvimento rural. Para que sejam realizadas mudanças nesse cenário são necessárias duas alterações na sistemática atual de trabalho: 1) os PMDR devem ter um caráter regional e não apenas municipal, e 2) são necessários critérios qualitativos, além dos quantitativos já existentes, na escolha dos municípios beneficiados pelo PRONAF. Na primeira parte do artigo, o autor apresenta as principais falhas ou problemas que são recorrentes nos estudos sobre os CMDR. São eles: a) os conselhos são formados estritamente como contrapartida à exigência legal para a obtenção de recursos públicos por parte dos municípios e não expressam uma dinâmica local significativa; b) a participação da comunidade, especialmente de mulheres e jovens, nas reuniões do conselho é minoritária; c) presença massiva do executivo municipal na presidência dos CMDR; d) falta de representatividade e de legitimidade dos agricultores nas reuniões e descontinuidade da participação de universidades, ONGs e outros atores na vida cotidiana dos conselhos. Ao final da análise sobre a situação dos CMDR, aponta como grande desafio dos mesmos, a valorização da vida associativa no meio rural que não se confunde com as organizações formais, mas que “forma o substrato que lhes dá sentido e consistência”. Alerta para o fato de que o potencial transformador dos CMDR “é permanentemente ameaçado pela tentação de burocratizar as decisões, de incorporar o conselho à rotina da vida local, de permitir que seja dominado por decisões já consolidadas”. Questiona sobre o papel dos municípios como uma instância fundamental de tomada de decisões políticas e administrativas no cotidiano do cidadão e coloca a pergunta se o município pode ser a esfera principal do processo de desenvolvimento. Como

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resposta, afirma que os pequenos municípios não são verdadeiras unidades de planejamento e que apenas a mobilização das forças do município não basta para enfrentar os problemas. É necessário otimizar sua capacidade de ampliar o círculo de relações e, assim, articular-se a atores sociais que não pertencem à vida cotidiana local, desenvolvendo um tipo de vínculo entre indivíduos chamado de “formato de ponte” pela literatura recente sobre capital social. Segundo o autor, o desenvolvimento desses vínculos, associado a um comportamento da burocracia estatal que defina regras universais, não clientelistas, podem canalizar as iniciativas individuais para projetos coletivos. Salienta que os Planos de Trabalho elaborados pelos conselhos têm um formato mais próximo de “uma lista de compras” do que de um projeto de desenvolvimento, além de ter um desenho estritamente agrícola e voltado apenas às ações econômicas. Os PMDR devem ser “um protocolo de práticas que materializam a ambição de uma certa comunidade a respeito de seu território” e visem o desenvolvimento territorial. Aponta como a primeira missão dos CMDR opor-se contra a visão fatalista de que o rural é incompatível com o desenvolvimento. Salienta, ainda, que por um lado “um conselho de desenvolvimento rural não pode ser norteado pela preocupação estrita de oferecer condições melhores ao funcionamento das unidades agropecuárias de um determinado município”, e por outro, deve ser “capaz de estabelecer contratos confiáveis tanto entre seus membros e a população beneficiada por seu funcionamento como também com os organismos que o financiam”, além de manter uma assessoria permanente e consistente e organizações especializadas na questão rural. Vencer o desafio de enfrentar e superar o conflito entre manter-se limitado às bases locais e extrapolar os limites dos municípios pode converter CMDR em espaços efetivos de planejamento e de desenvolvimento rural.

RESENHA Nº 2

FAVARETO, Arilson & DEMARCO, Diogo (Orgs.). Políticas públicas, participação social e as instituições para o desenvolvimento rural sustentável – uma avaliação dos Conselhos Municipais de Desenvolvimento Rural – Relatório final da pesquisa. PLURAL/IICA (SAF/MDA), São Paulo/Brasília, maio de 2002.

O Relatório é resultado de uma pesquisa realizada entre agosto e dezembro de 2001 em municípios de cinco estados brasileiros – Mato Grosso do Sul, Rondônia, Pernambuco, Espírito Santo e Santa Catarina – com o objetivo de avaliar a estrutura, o funcionamento e o alcance das ações dos Conselhos Municipais de Desenvolvimento Rural (CMDR). Apresenta os antecedentes, a justificativa e os objetivos da pesquisa, enfatizando o caráter inovador do PRONAF como um marco na trajetória das políticas para o desenvolvimento do meio rural brasileiro e no processo de constituição dos CMDR, a medida em que o programa foi a primeira política pública de envergadura especificamente voltada para a agricultura familiar; por ter inserido mecanismos destinados a induzir o desenvolvimento rural, mais do que simplesmente repassar recursos creditícios; e por induzir a constituição dos CMDR naqueles municípios vinculados ao programa. Salienta que “nesse desenho institucional, do PRONAF, a esfera municipal ocupa um lugar de destaque. É nela que as demandas tomam forma e é nela que se dão as mediações entre os agricultores familiares e o programa. As ações de planejamento, monitoramento e avaliação, em âmbito estadual, deveriam estruturar-se em razão daquilo que se passa no âmbito dos municípios; e neles, por sua vez, são os CMDR o elo de ligação institucionalizada do programa com o público beneficiário. A esfera municipal é, assim, o lugar geográfico, político e econômico de contado entre a institucionalidade do programa e o conjunto de agentes que potencialmente ou efetivamente promovem o desenvolvimento rural”. Aponta como um avanço a criação de centenas de conselhos po intermédio dos quais são canalizados aos respectivos municípios recursos financeiros expressivos. Por outro lado, salienta dois obstáculos à plena eficácia do programa, já identificada pela literatura: o recorte dos planos, circunscrito ao âmbito municipal e um possível formalismo no funcionamento dos CMDR. O trabalho apresenta o contexto histórico do processo de surgimento dos CMDR, entendidos nos marcos da nova institucionalidade das políticas públicas brasileiras, posteriores à Constituição de 1988. Coloca dois elementos importantes nesse processo: o movimento de municipalização e a pressão de setores populares por maior participação social. Apresenta, igualmente, os dados do IBGE de 2001 que apontam para “a existência de aproximadamente 27 mil conselhos, abrangendo 99% dos municípios brasileiros, numa média de 4,9 conselhos por município”. Enfatiza o caráter contraditório dessa nova modalidade de gestão: por um lado, a precariedade da participação

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nesses espaços e as tentativas de submetê-los aos esquemas tradicionais de poder e, por outro, os conselhos como instrumentos que possibilitam a efetiva participação de segmentos que até então se encontravam excluídos dos processos decisórios e de gestão. Salienta o PRONAF como um marco na trajetória das políticas para o desenvolvimento do meio rural brasileiro e no processo de constituição dos CMDR. Parte da hipótese de Abramovay (2001) de que os limites dos conselhos estão intimamente relacionados à forma como foram criados, aos modelos de funcionamento dos mesmos e ao alcance de suas ações. Segundo o autor, esses fatores estão relacionados ao fato dos critérios a partir dos quais foram e são escolhidos os municípios beneficiados pelo programa favorecerem a burocratização dos CMDR e tenderem a fazer deles “pouco mais que um instrumento pelo de recebimento dos recursos federais, com a supervisão de representantes da sociedade civil local, por um lado; e, por outro, estão relacionados também à falta de preparo do corpo técnico para a promoção do desenvolvimento rural. Esses fatores não estimulam o preenchimento das funções básicas para as quais os conselhos foram criados. Outros dois aspectos problemáticos em relação ao programa são identificados: (i) a total separação entre o PRONAF-Infraestrutura e as demais linhas que compõem o programa; e o isolamento institucional do PRONAF em relação ao restante das políticas públicas que incidem sobre o mesmo espaço e sobre as mesmas pessoas, ou seja, um problema que é identificado na pesquisa como inerente à conformação do ambiente institucional das políticas para o desenvolvimento rural no Brasil. O trabalho aponta para uma nova lógica na evolução das políticas públicas para o desenvolvimento rural que desponta na primeira década do século XXI: “sob a influência da abordagem territorial, numa tentativa de valorizar a escala local no estabelecimento das dinâmicas de desenvolvimento e, além disso, de superar a dicotomia rural/urbano e a redução do rural ao agrícola. Essa nova lógica requer uma reforma das instituições promotoras do desenvolvimento rural, na qual o PRONAF e os CMDR têm um papel fundamental como indutores do desenvolvimento e como sensibilizadores, mobilizadores e articuladores das forças sociais de um mesmo território. Relativamente ao processo de constituição dos conselhos, há muitas críticas ao fato de em quase 100% dos casos o mesmo estar atrelado às exigências oficiais para acesso aos recursos do PRONAF (de 32 municípios visitados, em apenas cinco casos a existência do conselho é anterior ao PRONAF) e de ser, em 85% dos casos, dirigido pelo Poder Executivo municipal. Segundo os estudos, essa “falha original” transformou-se em um dos principais problemas dos CMDR. O executivo municipal também teve forte ingerência na escolha da forma de escolha dos membros, sendo que as representações dos agricultores não se organizaram nem se mobilizaram para uma maior participação no processo. Assim, a “prefeiturização” dos CMDR tem início desde sua gênese. Além disso, os dados da pesquisa indicam que os limites atuais dos CDMR têm sua origem também no processo de constituição realizado em curto espaço de tempo, ou seja, no “afogadilho”. Assim um processo mais cuidadoso de articulação e concertação entre os agentes que aprofundasse as questões referentes à constituição e funcionamento de instituições para o desenvolvimento local ou debates sobre desenvolvimento e sustentabilidade foi dificultado.

RESENHA Nº 3

INSTITUTO BRASILEIRO DE ANÁLISE SOCIAIS E ECONÔMICAS – IBASE. Avaliação de Planos Municipais de Desenvolvimento Rural – PMDRs em quatro estados: ES, MS, PE, SC. Relatório Final da Avaliação. Brasília, IICA-MDA-SAF, 2001.

O Relatório é resultado de uma pesquisa realizada com o objetivo de avaliar uma amostra representativa dos 185 Planos Municipais de Desenvolvimento Rural (PMDR) dos estados do Espírito Santo (45 municípios), Mato Grosso do Sul (23 municípios), Pernambuco (60 municípios) e Santa Catarina (57 municípios). Os principais parâmetros para a avaliação foram: o grau de representatividade, o nível técnico e a efetividade do uso do plano na promoção do desenvolvimento rural dos municípios. Os PMDR foram avaliados igualmente quanto aos principais problemas e dificuldades enfrentados, especialmente no que se refere à sua abrangência, representatividade, gestão ao nível técnico e à efetividade. Ao final são feitas algumas sugestões relativas ao processo, à estrutura e aos conteúdos dos Planos. Em 43% dos municípios selecionados nos quatro estados, os CDMR são compostos por até 15 membros, e 38% com 16 a 25 membros. Assim, 80% dos municípios têm conselhos com até 25 membros. A quase ausência de mulheres é uma característica da grande maioria dos conselhos. A presença de

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agricultores familiares nos CDMR é bastante expressiva, sendo que a representação dos agricultores familiares varia de 50 a 100% em 80% dos municípios. Os PMDR foram elaborados no mesmo ano em que os CDMR foram criados em cerca de 43% dos municípios. De um modo geral (86% dos municípios), a regulamentação dos CDMR se deu por meio de aprovação pela câmara de vereadores municipal, e a nomeação dos conselheiros é feita de forma diversificada nos municípios (30% por decreto, 30% por portaria e 26% por registro em ata). Na maior parte dos casos, 64% das respostas, os conselheiros dos CDMR são indicados pelas comunidades ou entidades que representam. Em 57% dos municípios, a presidência do conselho é exercida por algum representante do executivo municipal, na maioria dos casos pelo Secretário de Agricultura ou seu representante. Em 25% dos municípios a presidência do CDMR é exercida por representante dos agricultores familiares e em 10% pelo representante local da extensão rural. A eleição da presidência é feita diretamente pelos membros do conselho em 63% dos municípios dos quatros estados, em 17% dos municípios a presidência é indicada e em 18% é definida em lei ou por regimento. No caso da secretaria executiva, em 46% dos municípios é ocupada por representante da extensão rural e em 20% por representante dos agricultores familiares. Também é a eleição a forma de escolha da secretaria executiva, em 68% dos municípios. A periodicidade das reuniões dos conselhos é mensal, em praticamente a metade dos municípios e, na maioria (86%), a duração do mandato dos conselheiros é de dois anos, sendo que há uma relativa estabilidade na composição dos CDMR. O caráter dos CDMR, em 97% dos municípios é deliberativo e em 51% consultivo. Relativamente aos PMDR, a pesquisa aponta para a estreita relação entre a implementação do PRONAF e a elaboração dos mesmos, sendo que em um número importante de municípios essa relação tem rebatimento nas ações contempladas pelos planos que ficam reduzidas e restritas ao PRONAF Infra-estrutura e Serviços, o que pode ser observado em 43% dos municípios no conjunto dos quatros estados. Sobre o grau de representatividade do processo de elaboração dos Planos, o trabalho concluiu que a grande maioria dos envolvidos é do sexo masculino (80% ou mais), sendo que a participação das mulheres fica em torno de, apenas, 20% apenas na posição de Secretários Executivos do CDMR. De um modo geral, a pesquisa concluiu que é praticamente inexistente a participação das mulheres na composição dos CDMR e no processo de elaboração dos PMDR. Mesma conclusão foi obtida no que se refere à participação de lideranças indicadas pelos movimentos ligados à luta pela terra. Quanto à participação dos atores sociais, por categoria, na elaboração dos Planos, a pesquisa aponta para o prefeito ou representante da prefeitura (68% das respostas), o representante da EMATER (61%), as lideranças locais da agricultura familiar (56%) e o representante do STR (53%). Para todas as categorias de entrevistados, os PMDR representam o interesse da maioria das comunidades ou dos setores do município. Em todos os quatros estados pesquisados houve concordância no que se refere à importância do fator “organização social” quando considerada a origem dos agricultores beneficiados pelos PMDR: são mais freqüentes os que provêm de “comunidades organizadas” do que os originários de “comunidades não organizadas”. Ainda quanto ao grau de representatividade do processo de elaboração dos PMDR, cerca de 79% do conjunto dos atores entrevistados respondeu que as demandas e as atividades previstas nos planos eram as mais importantes para o desenvolvimento rural dos municípios. Por outro lado, 60% dos atores responderam que existiam outras demandas e atividades que não foram contempladas nos PMDR e que deveriam ter sido. A representatividade do processo foi considerada boa por 56% dos atores entrevistados, regular por 22% e ótima por 11%. No conjunto, 67% dos entrevistados julgam a representatividade de boa a ótima, 25% de regular a péssima, e os 8% restantes não sabem ou não responderam. É interessante observar que a representatividade é considerada boa em todas as categorias de entrevistados, exceto entre as lideranças do MST, e é considerada ótima nos casos do prefeito, liderança da agricultura familiar e do representante local do setor produtivo/financeiro. No que se refere à gestão dos PMDR o relatório aponta que essa função é exercida pelo prefeito (39% dos casos), pelo secretário executivo do CMDR (26%), pelo secretário municipal de agricultura (24%) ou pelo representante da empresa estadual de assistência e extensão rural (22%). Aponta também para a pequena presença de representantes dos agricultores, apenas 8%. O acompanhamento da execução das demandas/atividades foi considerado regular, segundo 43% das respostas é realizado de forma parcial. Para 35% dos entrevistados é realizado de forma plena e para 8%, não é realizado. Há consenso entre os atores de que a execução das demandas/atividades/pleitos previstos no PMDR também se apresenta como regular, 73% das respostas apontam para uma execução parcial. As categorias que menos têm conhecimento sobre a execução do que estava previsto nos PMDR são: lideranças do movimento de luta pela terra (60%), lideranças femininas indicadas pelo Movimento de Mulheres Trabalhadoras Rurais (MMTR) (33%) e representantes do setor

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produtivo/financeiro (29%). Os motivos apresentados como obstáculos/impedimentos à execução dos PMDR foram principalmente: dificuldades operativas/dificuldades da prefeitura (40%) ou da gestão (35%), problemas financeiros oriundos de atraso ou não liberação dos recursos do PRONAF (35%), ou por falta de recursos financeiros da prefeitura (31%). Também há consenso quanto à abrangência dos PMDR, que se apresentou como regular, por contemplarem apenas o PRONAF (43% das respostas), ou, quando muito, outras ações da prefeitura (36%), não apresentando qualquer articulação de ações com outras instâncias governamentais de nível estadual ou federal ou com organizações da sociedade civil e/ou cooperação internacional. Mesmo com as dificuldades apontadas, 42% dos entrevistados consideram bom o nível de gestão e o nível técnico dos PMDR. Os autores da pesquisa consideram que essa avaliação positiva não condiz com os resultados apontados anteriormente e que a gestão e o nível técnico necessitam de aperfeiçoamento. Em 79% dos casos existe uma visão positiva em relação à importância dos PMDR, em função de: as principais demandas e/ou potencialidades dos municípios estarem contempladas nos planos (28%), os agricultores familiares são beneficiados (24%), os problemas da seca e/ou de acesso à água foram atingidos (18%) e as condições de produção dos agricultores foram melhoradas (11%). Apesar da avaliação positiva, alguns problemas foram apontados, tais como: os PMDR só atendem em parte as questões mais importantes para o município (10%); algumas obras/ações são questionáveis (8%); os recursos, equipamentos e ações não estão sendo bem administrados (4%); o processo não foi democrático (4%). O alto nível de desconhecimento do próprio plano, de suas atividades e de sua importância, aponta para a falta de divulgação dos mesmos e de seus conteúdos no contexto municipal, estes circulam de forma restrita entre apenas alguns atores do município. Por outro lado, não são exploradas todas as potencialidades de articulação que os PMDR apresentam. Os principais benefícios proporcionados pelos Planos que foram apontados pelos entrevistados são: infra-estrutura; condições técnicas de produção; transformação e comercialização; empoderamento dos agricultores familiares e suas comunidades em termos sócio-políticos (19% apontaram maior organização e 16% maior participação) e em termos econômicos (13% apontaram o acesso a máquinas e equipamentos). Os pontos negativos mais importantes e recorrentes referem-se às obras e ações não concluídas ou realizadas de forma inadequada (20%); baixa participação dos agricultores e das comunidades (15%); má gestão dos recursos pelas administrações municipais (13%). Sobre os Conselhos Municipais de Desenvolvimento Rural, a principais críticas são: baixa participação dos diferentes segmentos sociais (9%), falta de capacitação dos conselheiros (8%), condições de trabalho inadequadas e/ou dificuldades no funcionamento dos conselhos (6%) e centralização do poder e das decisões caracterizando um processo não democrático (5%). Sobre o PRONAF, foi questionada a falta de divulgação e de informações sobre o plano e/ou sobre o programa (11%) e a insuficiência dos recursos (8%). Também foi feita crítica à falta ou à inadequação da assistência técnica (7%) e, no caso dos conteúdos e da estratégia dos PMDR, a crítica mais recorrente é o não atendimento de demandas e prioridades (4%). Foram apontados pontos negativos sobre as relações com os governos estadual e municipal (2%) e sobre os conflitos entre as organizações (1%). O relatório apresenta uma série de sugestões para adequação na formulação, na implementação e no acompanhamento dos planos. Em relação ao processo de formulação e implementação sugere que sejam tomadas iniciativas que aprimorem os CMDR em sua representatividade e capacidade de gestão. Recomenda o sistema de eleição nas comunidades rurais para a escolha de seu representante no Conselho, o que proporcionará uma maior democratização na sua composição, como também uma maior mobilização dessas comunidades frente ao conselho. Sugere ainda: quota mínima para mulheres agricultoras; um sistema de ajuda de custo para as despesas, especialmente para as despesas de transporte dos membros; aperfeiçoamento dos critérios de composição dos CMDR, de tal forma que esteja garantida uma distribuição geográfica equilibrada; fortalecimento da presença de outros atores sociais na presidência dos Conselhos, além do executivo municipal. Sobre a abrangência dos Conselhos para além do PRONAF, sugere que o poder público municipal assuma-se como contraparte no plano, com maior comprometimento de recursos municipais para o desenvolvimento da agricultura. Devem ser incorporados nos planos temas que potencializem o fortalecimento da agricultura familiar, tais como as questões de gênero, a multifuncionalidade, a pluriatividade, a juventude rural e suas perspectivas etc. São necessárias, igualmente, iniciativas concretas que aumentam a integração entre os CMDR, os Conselhos Estaduais de Desenvolvimento Rural e o CONDRAF. O esforço de integração deve privilegiar a articulação de programas governamentais que tenham rebatimento no desenvolvimento municipal/local. O Conselho Estadual do PRONAF deve desempenhar função de controle e fiscalização de projetos, flexibilizando, quando necessário, as regras e normas do programa. O trabalho salienta, ainda a

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necessidade de desenvolver instrumentos de capacitação dos conselheiros que incluam questões políticas que preparem os conselheiros para a preparação e a gestão dos Planos. Também um maior tempo para a elaboração dos PMDR foi sugerido. Em relação à estrutura e conteúdo dos PMDR, a sugestão é de que sejam considerados, de início, os estudos, dados e diagnósticos já elaborados, e toda a sorte de informações existentes, mas que também haja um avanço na abordagem contemplando: a identificação dos agricultores familiares, de outros setores da sociedade civil e das respectivas demandas; a caracterização da institucionalidade municipal e de sua dinâmica; levantamento das iniciativas governamentais; situações especiais da agricultura familiar; assistência técnica e capacitação de agricultores e de familiares. Para um melhor acompanhamento e avaliação, é necessário um sistema concentrado de informações provenientes dos principais agentes responsáveis pelas mais variadas ações de suporte à agricultura familiar nos três níveis de governo, bem como provenientes de três fontes: agente financeiro, extensão rural e a rede de conselhos municipais e estaduais. Nesse sentido, a preservação da rede de conselhos municipais e estaduais – os CMDR e CEDR – é extremamente importante, assim como é importante a participação e colaboração dos atores envolvidos na criação e manutenção do sistema, tal como a própria Secretaria de Agricultura Familar do Mnistério do DesenvolvimentoAgrário (SAF/MDA) – coordenadora de todo o sistema – os agentes financeiros e as empresas estaduais de assistência técnica e extensão rural.

RESENHA Nº 4

INSTITUTO PARANAENSE DE DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO E SOCIAL – IPARDES. Caracterização dos Conselhos Municipais de Desenvolvimento Rural do Paraná. Curitiba (PR): PRONAF – IPARDES, 2001.

Segundo o estudo, os conselhos municipais de desenvolvimento rural são fóruns de discussões e decisões sobre os rumos que podem ser seguidos para melhorar as condições de vida da população rural porque são instrumentos de participação dos cidadãos na defesa de seus interesses e na partilha do poder de decidir. A maioria deles tem cerca de cinco anos, sendo que nasceram de exigências dos governos federal e estadual para participar de programas de políticas públicas, particularmente do PRONAF Infra-estrutura e Serviços Municipais. O estudo foi realizado durante o processo de capacitação dos conselheiros municipais do PRONAF Infra-estrutura, atividade realizada em conjunto pelo DESER, EMATER/PR e Instituto Paranaense de Desenvolvimento Econômico e Social (IPARDES), com o objetivo de qualificar algumas observações empíricas da instituição (IPARDES) sobre a composição e o funcionamento dos CMDR, bem como do próprio perfil dos conselheiros. Assim, as atividades de campo foram realizadas no período de junho a setembro de 2000, cobrindo 20 dos 57 municípios paranaenses contemplados com o PRONAF. Em termos metodológicos foram realizadas entrevistas com os presidentes e secretários executivos dos CMDR, além de técnicos da EMATER-PR, representantes de agricultores familiares e demais conselheiros presentes nos referidos cursos de capacitação e gestão social. Com isso, o índice de entrevistas com conselheiros, em 13 dos 20 municípios selecionados, foi superior a 80%. Os resultados gerais do estudo são apresentados a seguir. Do ponto de vista da regulamentação dos conselhos, nota-se que dos 20 CMDR pesquisados, 80% deles foram instituídos através de lei municipal; 75% deles foram criados no ano de 1997, período de implantação do PRONAF nos municípios; apenas 55% dos municípios tinham um documento legal de nomeação dos conselheiros pelos prefeitos. Quanto à composição e organização dos conselhos, oito podem ser considerados como conselhos pequenos – com nove a 13 membros; outros oito como conselhos médios – com 14 a 23 membros – e o restante como conselhos grandes – com mais de 24 membros. O tempo de mandato dos conselheiros é de dois anos, para 90% dos conselheiros. A presidência dos conselhos é exercida, em 50% dos casos, por secretários municipais de agricultura. Já o caráter dos conselhos é bem definido, sendo que em apenas quatro municípios eles são deliberativos e nos demais são apenas consultivos. Em termos de funcionamento dos conselhos, se constatou que não há uma periodicidade de reuniões, além do que os conselheiros não são avisados antecipadamente dos assuntos que serão tratados nas reuniões. Já a participação nas reuniões é muito diversa, uma vez que apenas 80% dos conselheiros disseram participar sempre das reuniões, sendo que as faltas mais importantes são as dos representantes do poder público. Já perfil dos conselheiros mostra que, dos 297 conselheiros entrevistados, apenas 26 eram mulheres; 33% deles estudaram até a quarta série do ensino fundamental e 72% se situavam na faixa etária de 28 a 52 anos de idade. Dentre as

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conclusões do estudo destacam-se a questão da sustentabilidade dos conselhos, uma vez que os mesmos estão ancorados no PRONAF; a questão deliberativa que não pode ser confundida com o bom relacionamento entre administrações municipais e conselheiros e o tamanho dos conselhos, pois não se tem clareza os limites deste crescimento e os respectivos critérios.

RESENHA Nº 5

CRUZ, Maria Alves da. Municipalização da gestão ambiental na Bahia: avanços e desafios de um processo em construção. CRA/CDS-UNB, SALVADOR/BRASÍLIA, 2004.

A dissertação traz a análise dos avanços e desafios da municipalização da gestão ambiental na Bahia, com estudos de caso realizados nos municípios de Lauro de Freitas, Ilhéus e Itabuna, e das possibilidades dos municípios conveniados arcarem com as responsabilidades resultantes deste processo. Dos 417 municípios da Bahia, cinqüenta e seis municípios assinaram convênios de cooperação técnica e administrativa com o Centro de Recursos Ambientais (CRA), com o objetivo de implementar o Programa de Descentralização da Gestão Ambiental: municipalização do licenciamento ambiental, visando a reestruturação da máquina municipal, a implantação das unidades de meio ambiente, a capacitação de recursos humanos, e a parceria na orientação dos pareceres técnicos e dinamicidade da fiscalização ambiental. O estudo ressalta que, apesar da implementação do Programa, as ações no que tange à questão ambiental não evoluíram. O que se observa são tímidas mudanças na estrutura organizacional da prefeitura, na mobilização da sociedade, na articulação com os atores locais e nas políticas de meio ambiente. A mobilização da comunidade local nos municípios se deu mais pelo incentivo do Governo do Estado ao implementar a municipalização do que pela vontade e iniciativa dos atores. A atuação dos conselhos de meio ambiente nos três municípios vai desde o assessoramento ao executivo municipal a trabalhos em parceria com instituições locais que atuam na área de meio ambiente. Os conselhos têm como competência: propor a Política Municipal de Proteção ao Meio Ambiente; estabelecer normas, diretrizes e critérios de controle e avaliação; deliberar sobre recursos em matéria ambiental; elaborar seu regimento interno; apreciar e deliberar na forma da legislação ambiental municipal sobre estudos de impactos e respectivos relatórios por requerimento de quaisquer um de seus membros. O grau de articulação entre as secretarias ainda é muito tímido. O trabalho indica o fortalecimento de parcerias com universidades públicas, com outros órgãos ambientais, como o IBAMA, e com o SEBRAE. Indica também a criação de Consórcios Intermunicipais, o que possibilitará a sustentabilidade do processo de municipalização da gestão ambiental no estado da Bahia. A relação entre os conselhos municipais de meio ambiente e os executivos municipais dos três municípios acontece de forma cautelosa, sem conflitos explícitos registrados até o momento da elaboração do trabalho. O Governo do Estado tem tentado fazer a sua parte, cumprindo as cláusulas do convênio quanto a: instrumentalizar, capacitar os recursos humanos municipais e promover assistência técnica e administrativa. O processo de municipalização encontra obstáculos nas pressões das oligarquias locais, nos vínculos familiares tradicionais, na falta de credibilidade nos municípios, na ausência de recursos humanos estabelecidos nos municípios, na falta de recursos financeiros e na descontinuidade administrativa. De um modo geral, os resultados da pesquisa permitem concluir que a municipalização da gestão ambiental não se configura como garantia de comprometimento, por parte das prefeituras ou das comunidades locais, com as questões ambientais. Mas traduz-se como avanço nas questões institucionais locais, na democratização dos serviços, no reconhecimento da cidadania e no despertar de uma nova consciência no trato com o meio ambiente.

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ANEXO 2

Resenhas adicionais

RESENHA 1

ABRAMOVAY, Ricardo. O capital social dos territórios: repensando o desenvolvimento rural. Economia Aplicada, v.4, n.2, abr./jun. 2000.

De início, o artigo apresenta a idéia de que a questão do desenvolvimento rural não se restringe às possibilidades de sua expansão. Aponta para um importante resultado de pesquisas: o fenômeno da proximidade social que permite uma forma de coordenação entre os atores, ou seja, uma densa rede de relações entre atores sociais, serviços e organizações públicas, e iniciativas empresariais urbanas e rurais, agrícolas e não agrícolas, são mais importantes do que vantagens competitivas dadas por atributos naturais, de localização ou setoriais. Aponta, igualmente, para duas correntes contemporâneas de pensamento sobre o desenvolvimento rural: (i) a que enfatiza a dimensão territorial do desenvolvimento, no sentido das “redes”, das “convenções” e das instituições que permitem ações cooperativas capazes de enriquecer o tecido social de uma certa localidade; (ii) a que enfatiza o capital social como elementos que caracterizam a organização social. Alerta para a desatenção da sociedade brasileira para com o processo de tomada de consciência e de organização (CMDR, Secretaria Municipal de Agricultura, pressão social sobre os recursos dos Fundos Constitucionais e sobre a política agrícola, etc.) que pode levar a novas relações com e no rural, caracterizado por práticas clientelistas, autoritárias e burocráticas. Ao salientar a importância de uma reflexão amadurecida sobre temas e experiências relacionadas ao capital social e formas de organização rural, indica como objetivos do trabalho insistir no aspecto territorial do desenvolvimento das regiões rurais e sugerir pistas sobre os obstáculos a serem superados. O texto está organizado em três sessões, além da apresentação: (i) noção de capital social; (ii) noção de desenvolvimento territorial; (iii) proposições para a superação dos obstáculos à formação de capital social no meio rural. O autor inicia o trabalho salientando a recente incorporação do conceito de capital social no vocabulário das instituições internacionais de desenvolvimento, bem como o destaque dado às condições institucionais para seu fortalecimento. Sobre o conceito de capital social propriamente dito, o mesmo indica ser uma resposta ao mito do individualismo na sociedade moderna, uma vez que mostra que os indivíduos não agem independentemente e de maneira isolada. Esta perspectiva fortalece a visão sobre a importância das estruturas sociais como recursos, “como um ativo de capital de que os indivíduos podem dispor”, e coloca-se como um instrumento teório-conceitual para a solução dos dilemas sobre a ação coletiva, uma vez que representa o ethos de uma certa sociedade. Assim, o autor afirma que “o capital social corresponde a recursos cujo uso abre caminho para o estabelecimento de novas relações entre os habitantes de uma determinada região”, e aponta para uma “nítida convergência entre os pressupostos subjacentes à noção de capital social e as premissas que dão lugar à formação do desenvolvimento territorial”. Aborda a questão do desenvolvimento territorial, salientando o quanto essa dimensão do desenvolvimento vem despertando a atenção e o interesse de cientistas sociais. Após uma retrospectiva da trajetória da construção do conceito e a abordagem de algumas experiências conclui que é enorme a “distância entre as situações em que as forças organizadoras de um certo território constroem processos de coordenação e o que ocorre na esmagadora maioria dos municípios brasileiros”. Os principais obstáculos constatados pelo autor nesse artigo são: “falta de confiança dos agricultores na própria capacidade; dependência dos membros da comissão com relação ao prefeito; sentimento do prefeito de que a comissão é um adversário ao seu próprio poder; ingerência político-partidária na vida das comissões; falta de preparo dos próprios técnicos; baixa participação da sociedade civil local nas Comissões; baixa informação de seus membros; participação exclusivamente dos homens, com exclusão das mulheres e dos jovens”. O autor coloca alguns desafios que precisam ser enfrentados, dos quais salienta a construção de um “novo sujeito coletivo do desenvolvimento” com capacidade de articular “as forças dinâmicas de uma determinada região”. Algumas condições são necessárias para o enfrentamento desses desafios e dos demais expostos no trabalho: mudança do ambiente educacional existente no meio

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rural, com ênfase na dinâmica de aprendizagem, de valorização das práticas produtivas e da cultura técnica locais; formação de uma rede de atores trabalhando para a valorização dos atributos de uma certa região, desenvolvimento de projetos e ações extra municipais; organização de iniciativas que materializem a existência da dinâmica territorial; criação de novos mercados que ponham em destaque capacidades regionais “territorializada”; parcerias com as instituições de ensino superior existentes no interior do país e com as universidades; construção de uma nova visão do que significa o meio rural. Conclui que “construir novas instituições propícias ao desenvolvimento rural consiste, antes de tudo em fortalecer o capital social dos territórios, muito mais do que em promover o crescimento desta ou daquela atividade econômica”.

RESENHA 2

BANCO INTERAMERICANO DE DESENVOLVIMENTO/MINISTÉRIO DO MEIO AMBIENTE. Diálogos de Política Social e Ambiental: Aprendendo com os Conselhos Ambientais Brasileiros. Primeira Parte. Banco Interamericano de Desenvolvimento-Departamento de Desenvolvimento Sustentável. Brasília, 2002.

A obra é composta por cinco Capítulos e retrata as discussões realizadas no Seminário “Diálogos de Política Social e Ambiental: Aprendendo com os Conselhos Ambientais Brasileiros”, realizado em maio de 2002 no marco da 43a. Reunião do Conselho de Governadores e da 17a. Reunião Anual das Assembléias de Governadores do Banco Interamericano de Desenvolvimento e da Corporação Interamericana de Investimentos (IIC). O livro retrata a estrutura do Seminário, e diz respeito à primeira parte do mesmo “que se concentrou na descrição discussão da gestão ambiental brasileira e, essencialmente, nos fundamentos políticos, legais e operativos do Conselho Nacional de Meio Ambiente (CONAMA), e dos conselhos ambientais e municipais” (p. 21). O primeiro capítulo, como prólogo, além de apresentar o Seminário, seus antecedentes, contexto e organização, contém o discurso de abertura do mesmo, proferido pelo então Ministro do Meio Ambiente, Sr. José Carlos Carvalho. O segundo capítulo trata especificamente do Sistema Nacional do Meio Ambiente do Brasil (SISNAMA), apresentando sua história desde os primeiros passos até o processo de implantação e consolidação. Recupera, também, a evolução histórica da Política Nacional de Meio Ambiente brasileira, da administração ambiental e dos instrumentos legais, bem como os fundamentos políticos e legais do CONAMA. Ressalta-se nesse capítulo a abordagem sobre a arquitetura da gestão ambiental colegiada. O terceiro capítulo trata dos Conselhos Ambientais Estaduais e Municipais, analisando-os de forma detalhada e rica. Na primeira parte do quarto capítulo, é trazido à luz o ponto de vista dos atores nos conselhos: a sociedade civil, os estados e os municípios. Na segunda parte, a discussão recai sobre a participação do Ministério Público na proteção ao meio ambiente, por meio de sua participação no CONAMA. O quinto e último capítulo fazem uma abordagem sobre a replicabilidade da experiência do Brasil na América Latina, e conclui com o resumo dos debates. Por seu conteúdo, o livro é uma fonte rica de dados históricos sobre a Política Nacional de Meio Ambiente e suas estruturas e espaços institucionais e políticos, bem como de informações sobre os Conselhos Estaduais e Municipais. O trabalho informa que há pouca informação consolidada sobre a institucionalização da política de meio ambiente no âmbito municipal no Brasil, apesar dos vários fatores que determinaram a criação de novos espaços de gestão ambiental: a criação do Conselho Nacional de Meio Ambiente (CONAMA) e dos conselhos estaduais, a influência da Constituição de 1988 e a multidisciplinaridade da questão ambiental. Num primeiro momento, os conselhos ficaram restritos aos representantes da administração pública, de setores como a indústria, comércio, planejamento, ciência e tecnologia, saneamento, saúde, abrindo-se, posteriormente, para uma participação mais ampla de outros setores não governamentais, universidades, cientistas, poder legislativo, entre outros. Foi observado que quanto mais ampla tem sido a representação dos diferentes setores governamentais e não-governamentais nos conselhos, mais consistentes tem sido o pacto sócio-político ambiental. Importante passo nessa direção foi o estabelecimento da paridade e o equilíbrio entre os vários grupos de interesse. A representatividade não necessariamente está associada ao tamanho do conselho. Conforme as conclusões do trabalho, mais importante é “agregar valor à representação, estabelecendo-se certo número de vagas para determinados segmentos ou grupos de interesse representativos, que serão estimulados a se articularem para escolherem sua representação; a prática do rodízio vem sendo utilizada com sucesso em algumas experiências. O funcionamento dos conselhos, dessa forma,

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tem ensejado a setores de governo e à sociedade civil uma melhor organização em prol da melhoria ambiental”. O regimento interno é um importante instrumento para o bom funcionamento dos conselhos, deve ser elaborado e aprovado pelo próprio conselho. Igualmente importante é o processo de escolha dos conselheiros, feita por decreto do executivo ou, em alguns casos, por lei municipal. O poder deliberativo é que se constitui no verdadeiro apelo para a participação dos diversos segmentos. Finalizando, o trabalho chama a atenção para o principal resultado da implementação de conselhos de meio ambiente que “é a mobilização e motivação dos diversos segmentos governamentais e não governamentais para a implementação de políticas públicas de meio ambiente. É importante considerar ainda a sinergia entre esses agentes, o que potencializa as ações. As discussões pelos vários grupos de interesse, nos foros dos conselhos, para a definição de políticas e diretrizes, elaboração de normas, concessão de licenças ambientais e aplicação de penalidades é que tem permitido a transformação de todos os atores, governos, setor produtivo, cientistas, profissionais liberais, trabalhadores e ONGs; enfim, a própria sociedade, produzindo o pacto ou a governança”.

RESENHA 3

ALTAFIN, Iara. Sustentabilidade, Políticas Públicas e Agricultura Familiar: Uma apreciação sobre a trajetória brasileira. Tese de doutorado. CDS/UNB. Brasília-DF: Agosto, 2003.

Este trabalho tem como foco a discussão sobre a permeabilidade ou transversalidade entre os princípios do desenvolvimento sustentável e as políticas públicas voltadas para a promoção da agricultura familiar no Brasil. Inicialmente, o conceito de agricultor familiar é discutido, pontuando sua diversidade no contexto brasileiro, sua relevância para o desenvolvimento do País e o tratamento secundário que historicamente esse segmento tem recebido do Estado. Como fundamentos para a discussão do momento atual, foram reunidos os compromissos assumidos pelo Estado brasileiro para com a construção do desenvolvimento sustentável, tendo como base a evolução da noção de sustentabilidade, as múltiplas funções da agricultura familiar e o perfil da ação do Estado direcionada à produção para o mercado interno, numa perspectiva histórica. Na análise sobre a política atual, centrada no Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (PRONAF), identificamos incoerências desde o desenho do programa, que não incorpora a noção de agroecossistemas, como base para as dinâmicas das ocupações agrícolas no território brasileiro. A análise do PRONAF em sua linha de apoio aos municípios aponta avanços alcançados na gestão pública compartilhada e demonstra que o programa tem conseguido chegar às localidades periféricas. No entanto, o estudo do PRONAF Crédito mostra que os recursos direcionados ao financiamento da produção continuam concentrados nas regiões mais dinâmicas e que, da mesma forma como nas políticas públicas convencionais, o programa separa as ações sociais das econômicas e mantém como retórica a dimensão ambiental. Medidas voltadas à promoção da agroecologia, da silvicultura, da maior participação das agricultoras e jovens do meio rural, e da inclusão de populações indígenas e quilombolas são pontuais e submissas aos instrumentos que alimentam a mentalidade produtivista e modernizante. Os resultados analisados em sete anos de política específica de fortalecimento da agricultura familiar demonstram que não houve alteração nas alianças históricas entre o Estado e a grande agricultura, que continua garantindo prioridade no conjunto das políticas agrícolas nacionais. As medidas direcionadas às unidades familiares de produção têm permitido acomodar as pressões dos movimentos organizados do campo, sem alterar as relações de poder estabelecidas. As conseqüências do fracionamento das ações e da inexistência de um projeto de desenvolvimento para o setor e para o país são analisadas no presente trabalho, sendo sugeridos mecanismos para a internalização dos princípios da sustentabilidade nas políticas públicas brasileiras direcionadas aos agricultores e agricultoras familiares. Sobre os avanços ocorridos com o PRONAF no incentivo à participação e à gestão pública compartilhada, o trabalho ressalta que os propósitos do PRONAF de promover a descentralização das ações e a articulação local têm ficado restritos à linha de Infra-estrutura. A gestão compartilhada nessa linha do programa representa um avanço frente à histórica distância entre a população rural e as esferas decisórias, num País com tradição de políticas pontuais para os agricultores familiares e onde as verbas públicas foram freqüentemente manipuladas pelo poder local. Como a prática anterior era nula em termos de gestão participativa, a atuação dos conselhos tem sido analisada como uma evolução. Porém, já não se pode mais manter como referência à nulidade anterior, devendo-se já assumir o compromisso com a promoção da

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qualidade da participação na gestão de recursos públicos, o que requer a correção dos erros e a ampliação de investimentos no trabalho de agentes de desenvolvimento. Experiências mostraram que onde a orientação técnica esteve presente e comprometida, foi mais rápida e mais consolidada a evolução do processo organizativo, resultando em conselhos municipais mais legítimos e representativos. Facilitadores são peças essenciais para transformar a histórica manipulação da gestão municipal no Brasil e para reverter o quadro de exclusão de agricultores familiares.

RESENHA 4

HIRATA, Márcio Fontes. Políticas públicas, participação social e as instituições para o desenvolvimento rural sustentável – uma avaliação dos Conselhos Municipais de Desenvolvimento Rural – Relatório do estado de Rondônia. São Paulo/Brasília, Maio de 2002.

O Relatório é resultado de uma pesquisa realizada entre os meses de agosto e dezembro de 2001 nos municípios do estado de Rondônia, com o objetivo de avaliar a estrutura, o funcionamento e o alcance das ações dos Conselhos Municipais de Desenvolvimento Rural (CMDR). O trabalho apresenta o contexto histórico do processo de surgimento dos CMDR, entendidos nos marcos da nova institucionalidade das políticas públicas brasileiras, posteriores à Constituição de 1988. Coloca dois elementos importantes nesse processo: o movimento de municipalização e a pressão de setores populares por maior participação social. Neste estudo é utilizada a hipótese de Abramovay (2001) de que os limites dos conselhos estão intimamente relacionados à forma como foram criados, aos modelos de funcionamento dos mesmos e ao alcance de suas ações. Assim como nos demais estudos realizados em outros estados, esse trabalho enfatiza o caráter burocrático dos CMDR, advindo de sua estreita relação com o PRONAF desde sua criação. A composição dos CMDR foi considerada boa/adequada, apesar do viés agrícola que pode tornar-se um fator limitante para que os conselhos possam atuar como indutores do desenvolvimento rural. A presidência é ocupada pela prefeitura na metade dos casos. Na outra metade é exercida por representantes dos agricultores. Quanto à regulamentação, 100% dos CMDR foram instituídos em lei municipal discutida nas respectivas Câmaras Municipais e aprovada pelos vereadores. A duração do mandato é de 2 anos. Os conselhos são consultivos e deliberativos em sua maioria. Verifica-se um baixo grau de formação dos conselheiros, que se traduz em dificuldade de compreensão em relação a suas atribuições, ao papel que deve ser desempenhado pelos conselhos e aos mecanismos disponíveis para alcançar seus objetivos. Quanto à participação, nota-se que o envolvimento dos agricultores e de suas organizações é muitas vezes formal. Entretanto, o fato de que em 50% dos municípios os representantes dos agricultores estão na presidência dos conselhos sinaliza que a gestão é participativa e que há um certo grau de representatividade e legitimidade da mesma. Em termos das atribuições, nota-se que os conselhos não foram para além da destinação dos recursos do PRONAF e sua fiscalização. Mantém sua atuação burocraticamente centrada na recepção e aplicação dos recursos do PRONAF. A interação com outros conselhos é quase inexistente, sendo que a única relação institucional existente é com o Conselho Estadual de Desenvolvimento Rural (CEDERURAL). Os CMDR apresentam uma atuação bastante isolada e tímida em relação à busca de ações conjuntas para superação das restrições que enfrenta. A deficiência na formação do conjunto dos conselheiros, com destaque para os representantes dos agricultores, e a inadequada estrutura de apoio para o funcionamento dos CMDR são apresentados como os principais obstáculos enfrentados, dos quais derivam uma série de dificuldades. Dentre os principais aspectos negativos apontados pelo estudo destacam-se: a inadequada relação entre os CMDR e o executivo municipal; o funcionamento precário dos conselhos; a participação deficiente dos agricultores familiares; e os limites das ações dos CMDR.

RESENHA 5

ROMAGNOLLI, Reynaldo & BREDERODE, Roberto. Políticas públicas, participação social e as instituições para o desenvolvimento rural sustentável – uma avaliação dos

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Conselhos Municipais de Desenvolvimento Rural – Relatório do estado de Pernambuco. São Paulo/Brasília, Maio de 2002.

O Relatório é resultado de uma pesquisa realizada entre os meses de agosto e dezembro de 2001 nos municípios do estado de Pernambuco, com o objetivo de avaliar a estrutura, o funcionamento e o alcance das ações dos Conselhos Municipais de Desenvolvimento Rural (CMDR). O trabalho enfatiza o caráter contraditório dessa nova modalidade de gestão: por um lado, a precariedade da participação nesses espaços e as tentativas de submetê-los aos esquemas tradicionais de poder e, por outro, os conselhos como instrumentos que possibilitam a efetiva participação de segmentos que até então se encontravam excluídos dos processos decisórios e de gestão. Salienta-se, também, que o PRONAF é um novo marco na trajetória das políticas para o desenvolvimento do meio rural brasileiro, sobretudo através do processo de constituição dos CMDR. O fato dos conselhos terem sido constituídos sem grandes debates entre os diferentes atores sociais e com forte peso do executivo municipal faz com que, em muitos casos, os conselhos existam somente para homologar as decisões do executivo municipal, sem haver qualquer articulação/concertação entre os agentes ou atores sociais, o que acaba descaracterizando as intenções iniciais do programa. Em todos os casos pesquisados a representação dos agricultores corresponde a 51%, ou pouco mais, dos membros. É interessante observar que os representantes das igrejas e dos bancos entram na cota do poder público local. A participação de jovens e mulheres praticamente inexiste, não havendo preocupação com esta questão. Quanto à regulamentação, 100% dos CMDR foram instituídos em lei municipal. A regulamentação se resume a aprovação de uma adaptação da disposição federal que orienta a formação dos CMDR. Em sua maioria, os conselhos são consultivos e deliberativos. No entanto, não há interação com conselhos de outros municípios, assim como não há qualquer iniciativa para a discussão de ações conjuntas em várias áreas dos diferentes municípios, inexistindo qualquer iniciativa nesta direção. Da mesma forma, inexiste relação ou articulação com instituições que trabalhem com desenvolvimento rural. Não existe discussão nos conselhos sobre o impacto do PRONAF no desenvolvimento das economias locais. Não existe infra-estrutura própria dos conselhos. Os recursos financeiros para despesas de transporte, liberação para ligações telefônicas, uso de computadores e materiais para o funcionamento. Assim, a estrutura disponibilizada foi considerada inadequada por 89% dos conselhos pesquisados. Dentre os principais obstáculos ao funcionamento da institucionalidade local, destacam-se a estrutura inadequada e dependência da prefeitura que disponibiliza os recursos necessários para o funcionamento dos CMDR; a visão tradicional quanto à possibilidade da promoção do desenvolvimento, com ações restritas aos limites do município e da agricultura; a falta de articulação entre o setor primário e outros setores; a despreocupação com as formas sociais de utilização dos recursos naturais/culturais dos territórios; a baixa capacitação dos conselheiros; a relação com o executivo municipal; além das próprias tensões políticas locais que se expressam dentro dos conselhos.

RESENHA 6

FAVARETO, Ariane. Políticas públicas, participação social e as instituições para o desenvolvimento rural sustentável – uma avaliação dos Conselhos Municipais de Desenvolvimento Rural – Relatório do estado de Mato Grosso do Sul. São Paulo/Brasília, Abril de 2002.

O Relatório integra um conjunto de estudos realizados sobre os CMDR em diferentes regiões do país e tem seu foco no estado do Mato Grosso do Sul, onde foram visitados seis municípios dos quais quatro fizeram parte da amostra. Em princípio o estudo lembra que o processo de constituição de 100% dos conselhos foi atrelado às exigências oficiais para acesso aos recursos do PRONAF e que, num primeiro momento, foi dirigido pelo poder executivo municipal, uma “falha original” que foi parcialmente sanada em um segundo momento. O fato dos conselhos terem sido constituídos sem grandes debates entre os diferentes atores sociais e com forte peso do executivo municipal, faz com que em muitos casos os conselhos existam somente para homologar as decisões do executivo municipal, sem haver articulação/concertação entre os agentes ou atores sociais, descaracterizando as intenções iniciais do programa. Assim, nota-se que o executivo municipal teve forte ingerência na forma de escolha dos membros dos conselhos, sendo que as representações dos agricultores não se organizaram nem se mobilizaram

Institucionalidades para a Gestão Social do Desenvolvimento Rural Sustentável

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para uma maior participação no processo. Com isso, em alguns casos a representação dos agricultores não corresponde a 70% dos membros, enquanto que a participação de jovens e mulheres é praticamente inexistente. Quanto à regulamentação, 100% dos CMDR foram instituídos em lei municipal aprovada pela Câmara Municipal. A duração do mandato é de 2 anos, prorrogáveis por igual período. Os conselhos são criados como órgão executivos e deliberativos e de assessoramento ao poder executivo municipal. Observou-se a falta de capacitação dos membros dos CMDR que não sabem sequer o papel que devem desempenhar nos conselhos. Há muita reclamação quanto à falta de participação de alguns membros e quanto à falta de substitutos para representar a comunidade. Um dos problemas mais sérios relativos à falta de participação é a distância entre a sede do município e a propriedade dos agricultores. Do ponto de vista da amplitude e enfoque das discussões dos CMDR, nota-se que elas são bastante reduzidas, limitando-se ao uso do maquinário financiado pelo PRONAF e a programação do uso de verbas para o ano seguinte. Em termos de mecanismos de apoio não existe infra-estrutura própria para funcionamento dos conselhos. A prefeitura é o principal espaço de apoio dos conselhos, especialmente na disponibilização de recursos, de veículos, combustível para viabilizar a participação dos membros dos conselhos nas reuniões, funcionários, de assistência técnica e de espaço físico. Finalmente, verifica-se que não há uma relação estável entre os CMDR e outros conselhos existentes nos municípios.

RESENHA 7

ABRAMOVAY, Ricardo & VEIGA, José Eli da. Novas instituições para o desenvolvimento rural: o caso do Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura familiar (PRONAF). Convênio FIPE/IPEA. Brasília: IPEA, 1999.

O texto analisa o PRONAF crédito rural e o PRONAF Infra-estrutura e serviços municipais, sendo que nesta última linha de financiamento, os recursos são aplicados de acordo com um plano de desenvolvimento rural que, teoricamente, deveria ser elaborado por um conselho cuja maioria deveria ser composta por agricultores familiares. Os planos de desenvolvimento rural deveriam ajudar na obtenção de recursos necessários à implementação de ações voltadas ao fortalecimento da agricultura familiar nos municípios, inclusive aquelas ações não contempladas no PRONAF. Para tanto, sua elaboração deve contar com a participação efetiva dos agricultores familiares e de suas representações. Trabalho mostra que em muitas localidades, o CMDR é visto apenas como uma atividade burocrática para obtenção de recursos do Governo federal, não havendo grande envolvimento dos distintos atores sociais. O estudo constatou uma grande heterogeneidade na montagem e funcionamento dos conselhos, com casos de “prefeiturização” dos mesmos, além de outros com hegemonia das equipes técnicas. Mas se observaram casos em que se desencadeou uma boa discussão municipal sobre os rumos do desenvolvimento rural. O estudo coletou diversas afirmações relacionadas a capacitação: falta de preparo dos agricultores; sindicatos não estão preparados para este tipo de trabalho; as associações de agricultores não participam, etc. Com isso, o técnico da Emater acaba definindo as prioridades dos planos. O estudo mostrou que grande parte dos PMDR analisados em SP e MG continha mais uma lista de compras mal justificadas do que propriamente planos de desenvolvimento rural, pois até compra de ambulâncias e construção de hospitais faziam parte dos primeiros PMDR. Dentre os principais obstáculos, destacam-se: (ii) a grande maioria dos municípios selecionados é composta por atores sociais rurais que não estão preparados para as novas iniciativas (definição de PMDR e gestão social), sofrendo facilmente a ascendência dos demais atores presentes nos conselhos: representantes do poder público, outras entidades empresariais; (ii) baixa participação dos agricultores familiares e de suas representantes na definição dos rumos do desenvolvimento rural. Já em termos de avanços são relacionados aos seguintes aspectos: (i) redução dos atritos institucionais entre diferentes esferas de órgãos públicos (federais, estaduais e municipais); (ii) início de um processo de co-gestão da política voltada ao fortalecimento da agricultura familiar; (iii) o PRONAF desencadeou um inédito e frutífero processo de discussão local sobre os rumos do desenvolvimento rural, apesar dos problemas iniciais de sua implantação; (iv) o PRONAF está conseguindo produzir um ambiente institucional (no sentido de North, 1994), necessário à ampliação da base social da política nacional, embora com conseqüências práticas ainda tímidas e parciais.

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ANEXO 3

Referências bibliográficas e documentais

ABRAMOVAY, Ricardo e VEIGA, Jose Eli da. Novas Instituições para o desenvolvimento Rural: o caso do Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (Pronaf.). Convênio FIPE / IPEA 07 / 97. Brasília: IPEA, 1999.

ABRAMOVAY, Ricardo. Conselhos além dos limites: Texto preparado para o Seminário Desenvolvimento Local e Conselhos Municipais de Desenvolvimento Rural, Rio Grande do Sul: 2001b. Disponível em www.fao.org/regional/Lamerica/prior/desrural/brasil/abram.

ABRAMOVAY, Ricardo. O Capital Social dos Territórios: repensando o desenvolvimento rural. Economia Aplicada, v. 4, n. 2, abr./jun. 2000.

ABRAMOVAY Ricardo. Obstáculos ao desenvolvimento territorial brasileiro. Jornal Gazeta Mercantil, 13/3/2002, 3p.

ALENCAR, Maria das Graças. Descentralização e municipalização da assistência social: Um estudo sobre os conselhos municipais em municípios cearenses, 1999. 115 f. Dissertação (Mestrado) – Universidade de Brasília, Brasília, 1999.

ALMEIDA, Josemar Ribeiro de. et al. Planejamento Ambiental, Caminho para a participação popular e gestão ambiental para nosso futuro comum, uma necessidade um desafio, 2ª ed, Rio de Janeiro: Thex Editora, 1999.

ALMEIDA, Maria Hermínia Tavares de. E Carneiro, Leandro Piquet. Liderança local, democracia e políticas públicas no Brasil. IV encontro Nacional da ABCP – Associação Brasileira de Ciências Políticas, Niterói: Universidade de São Paulo, 2002.

ALTAFIN, I. G. Sustentabilidade, Políticas Públicas e Agricultura Familiar: Uma apreciação sobre a trajetória brasileira. 2003. Tese de Doutorado em Desenvolvimento Sustentável. CDS/UNB. Brasília, 2003.

ANAMMA. MUNICÍPIOS E MEIO AMBIENTTE. Perspectiva para a municipalização da Gestão Ambiental no Brasil, São Paulo: 1999.

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Institucionalidades para a Gestão Social do Desenvolvimento Rural Sustentável

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Documento de referência produzido pelo Grupo Temático de “Institucionalidade para Gestão Social do Desenvolvimento

Rural Sustentável” do CONDRAF

I – Princípios e premissas

1 – Conceito de Território

Conceitua-se território como “um espaço físico, geograficamente definido, não necessariamente contínuo, compreendendo cidades e campos, caracterizado por critérios multidimensionais, tais como o ambiente, a economia, a sociedade, a cultura, a política e as instituições, e uma população com grupos sociais relativamente distintos, que se relacionam interna e externamente por meio de processos específicos, onde se pode distinguir um ou mais elementos que indicam identidade e coesão social, cultural e territorial”.

Entendendo ainda, por um lado, a coesão social como expressão de sociedades nas quais prevaleça a eqüidade, o respeito à diversidade, à solidariedade, à justiça social, o sentimento de pertencimento e inclusão e, por outro, a coesão territorial como expressão de espaços, recursos, sociedades e instituições imersas em regiões, nações ou espaços supranacionais, que os definem como entidades cultural, política e socialmente integradas.

Os Territórios Rurais, por sua vez, apresentam, explicita ou implicitamente, a predominância de elementos “rurais”1. Nestes, incluem-se os espaços urbanizados que compreendem pequenas e médias cidades, vilas e povoados.

Assim sendo, o Território2 é visto como projeção e expressão da identidade de uma população com características sócio-culturais, ambientais, político-institucionais e econômicas peculiares. Na realidade, estamos tratando de território como “construção social” – uma autoconstrução que busca afirmar/consolidar uma identidade e definir uma “estratégia” de promoção e valorização dos atores3 e dos recursos locais. De tal forma que o “desenvolvimento territorial” passa sempre por um “processo de concertação social”, fazendo interagir todos estes elementos.

1 Ambiente natural pouco modificado e/ou parcialmente convertido a atividades agro-silvo-pastoris; baixa densidade demográfica população pequena; base na economia primária e seus encadeamentos secundários e terciários; hábitos culturais e tradições típicas do universo rural. 2 O conceito de território está muito ligado à idéia de domínio ou de gestão de determinada área. Milton Santos refere-se ao “território abrigo” (visão do cidadão), ao “território poder” (visão do Estado) e ao “território recurso” (visão das empresas). 3 Os membros do GT decidiram incluir esta expressão para reforçar a perspectiva da 'atuação' consciente e protagônica em busca da transformação de uma realidade social considerada desfavorável.

Institucionalidades para a Gestão Social do Desenvolvimento Rural Sustentável

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2 – Conceito de Desenvolvimento Sustentável e a Abordagem Territorial

Entendendo o desenvolvimento sustentável como o desenvolvimento com foco no ser humano, a participação efetiva das pessoas (como sujeitos dos processos e não como objetos de intervenção política) é fundamental nesta perspectiva, objetivando a “melhoria da qualidade de vida” das populações, banindo a fome e a miséria do nosso povo e livrando da pobreza grande parte da população brasileira por meio de processos variados de inclusão social, cultural, política, econômica e ambiental.

Com esse horizonte, a Abordagem Territorial do Desenvolvimento almeja resultados e soluções aos problemas vivenciados pelas populações contemplando a combinação das dimensões do desenvolvimento sustentável:

Econômica: resultados econômicos com níveis de eficiência mensurados por meio da capacidade de usar e articular recursos locais para gerar oportunidades de trabalho e renda, fortalecendo a diversidade e as cadeias produtivas e integrando redes solidárias de empresas familiares;

Sociocultural: mais eqüidade social, por meio da intensa participação dos cidadãos e cidadãs nas estruturas do poder, tendo como referência a história, os valores, a cultura do território e o respeito pela diversidade de atores sociais;

Político-institucional: novas institucionalidades que permitam a construção de políticas territoriais negociadas, ressaltando o conceito de governabilidade democrática e a promoção da conquista e do exercício da cidadania; e

Ambiental: compreensão do meio ambiente como ativo do desenvolvimento, considerando o princípio da sustentabilidade, enfatizando o conceito de gestão da base de recursos naturais.

A intenção da abordagem territorial é centrar o foco das políticas no território, pois nele se combinam a proximidade social, favorecendo a solidariedade e a cooperação, com a diversidade de atores sociais, melhorando a articulação dos serviços públicos, organizando melhor o acesso ao mercado interno, chegando até ao compartilhamento de uma identidade própria, que fornece uma sólida base para a coesão social e territorial – verdadeiros alicerces para o capital social.

Por fim, é uma visão essencialmente integradora de espaços, atores sociais, agentes de desenvolvimento, mercados e políticas públicas de intervenção, e tem na eqüidade, no respeito à diversidade, na solidariedade, na justiça social, no sentimento de pertencimento cultural e na inclusão social metas fundamentais a serem atingidas e conquistadas.

Contudo, cabe assinalar que os territórios são heterogêneos e diversos, revelando uma identidade peculiar a cada um. Justamente por isto, é preciso conhecer e considerar suas especificidades porque não se podem aplicar processos idênticos em todos os territórios; é preciso construir novas estratégias à medida que os trabalhos progridem.

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3 – Gestão Social do Desenvolvimento Territorial

A gestão social do desenvolvimento deve ser estimulada pela concretização dos espaços de debate e concertação para garantir a transparência, a participação e a sustentabilidade. Ela deve ser vista como um universo em construção que visa a gestão de assuntos públicos, principalmente políticas de valor social para o desenvolvimento territorial.

Assim sendo, a gestão social se relaciona com os processos de descentralização política e administrativa, redefinindo novas relações entre o político, o social e o econômico, além de conduzir ao empoderamento da sociedade por meio de novas formas e compromissos entre esta (sociedade) e o governo.

Para ter êxito, por um lado, a gestão social do território necessita desenvolver a capacidade de negociação, de regulação, de articulação e complementação das iniciativas locais com as ações do Estado, das organizações sociais, dos empresários e com os mercados, baseada na forte participação, na maior densidade de informação, nas parcerias e articulações em rede. Ou seja, é preciso estabelecer sinergias – administrações, representações sociais, institucionalidades pré-existentes – no sentido de fortalecimento da agricultura familiar.

Por outro lado, é preciso garantir o espaço para a legitimação social e política dos atores, bem como da própria política pública. Para tanto, as institucionalidades, já criadas e/ou em construção, devem aprofundar, ao máximo, o processo de democratização na gestão social, efetivando a participação dos agricultores e agricultoras familiares e das comunidades no exercício do poder local, produzindo um ambiente institucional necessário à ampliação da base social das políticas de Desenvolvimento Rural Sustentável. Ou seja:

Desencadear um processo de capacitação/formação e de reestruturação das relações de forças entre os atores sociais buscando uma mudança na sua atuação, basicamente centrada em comunidades rurais/assentamentos ou em municípios, para ações de âmbito territorial, superando a visão comum que vê a ação territorial como uma ameaça;

Estabelecer mecanismos para conferir um caráter contratual às políticas e às relações entre os atores sociais, com a adoção do Contrato/Pacto Territorial de Desenvolvimento, considerado um importante instrumento de articulação, diálogo e complementaridade entre as políticas que incidem sobre um mesmo território;

Fortalecer os Conselhos de Desenvolvimento Rural (municipais, territoriais e estaduais) como espaços de gestão social das políticas e de articulação das forças de um território, delegando ao próprio Contrato/Pacto Territorial a definição dos mecanismos de sua gestão em âmbito regional, desde que respeitadas algumas regras básicas, como a obrigatoriedade da representação de agricultores, dentre outras;

Publicizar e coletivizar as ações e políticas, evitando assim relações viciadas existentes entre o Estado e a Sociedade (“clientelismo”, “corporativismo”, “tecnocratismo” e “basismo inadequado”) que sempre levaram à apropriação

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das políticas públicas por pessoas ou por grupos, em detrimento do interesse público e coletivo;

Fazer um esforço de articulação institucional, no setor público, tanto no plano horizontal, entre as políticas e os programas, projetos e ações delas decorrentes, no sentido de não setorializar, nem tampouco, segmentar ações; quanto no plano vertical, entre a União, os estados, os territórios e os municípios; e

Ter como princípio, por um lado, a complementaridade de ações e esforços – sinergias – entre as entidades da sociedade civil, e não estimular a competição e/ou a disputa pelo “mercado” de prestação de serviços ou por espaços de poder e, por outro, a solidariedade e a cooperação entre os atores sociais e institucionais do território.

Enfim, entende-se que o rompimento com as “práticas predatórias e “vícios antidemocráticos”, no sentido de fomentar os reais princípios da gestão social, deve ser um dos principais escopos da estruturação e qualificação do aparato institucional que se responsabilizará pelo planejamento e gestão das ações territoriais. Isto implicará não somente na implantação de espaços colegiados paritários, mas também (e com maior relevância) na adequada qualificação das entidades e pessoas que deles vierem a participar, com vistas à adoção de novas atitudes e comportamentos que venham a, gradualmente, substituir as “práticas viciosas” por novos estilos na condução das políticas públicas, com maior democracia e justiça social.

II – Objetivos, características e atribuições

1 – Justificativas e objetivos das novas institucionalidades

1.1 – As institucionalidades territoriais e a gestão social participativa

As institucionalidades territoriais devem ser espaços efetivos de gestão social participativa, viabilizando processos permanentes e transparentes de diálogo e negociação entre atores da sociedade civil e do Estado na formulação, na gestão e no controle social das políticas públicas de desenvolvimento territorial sustentável.

Devem ser ainda constituídas instâncias de decisão estratégica e não apenas de envolvimento, legitimação e consulta do Poder Executivo na implantação de programas e ações. Assim sendo, para o fortalecimento da gestão social participativa, deve-se, portanto, ampliar a efetiva participação das organizações da agricultura familiar, das populações tradicionais e dos assentamentos de reforma agrária, no processo de discussão e de definição de políticas públicas.

Para além dos espaços instituídos, é necessário viabilizar a criação de canais de participação e comunicação como as conferências públicas, seminários, debates abertos com a população, descentralizando o processo de discussão, formulação e decisão sobre as políticas públicas.

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Estes espaços devem ser instituídos como espaços permanentes de sensibilização, mobilização e comprometimento dos atores sociais (governamentais, da sociedade civil e da iniciativa privada) que atuam no território, legitimando as decisões e promovendo o efetivo envolvimento desses atores na implementação das ações estratégicas para o desenvolvimento territorial sustentável.

1.2 – As institucionalidades territoriais e articulação de políticas públicas de desenvolvimento territorial sustentável

As institucionalidades territoriais devem ser instrumentos eficazes de rompimento com as práticas de setorialização, fragmentação e verticalização dos processos decisórios, buscando maior integração e sinergia entre as instituições que atuam nas esferas da União, dos estados, dos territórios e dos municípios, favorecendo a articulação horizontal dentro dos territórios de modo a maximizar as ações do conjunto das políticas públicas.

Devem priorizar também a formulação, construção e adequação das políticas públicas a partir das potencialidades e demandas territoriais, favorecendo a construção de compromissos e parcerias, consolidando a articulação dos esforços e a otimização dos recursos para promoção do desenvolvimento territorial sustentável.

Considerando ainda a perspectiva multidimensional do desenvolvimento territorial sustentável, as institucionalidades territoriais, por um lado, deverão ser espaços de incorporação de um número crescente de ações possibilitando um progressivo e constante aperfeiçoamento no processo de planejamento do desenvolvimento territorial, agregando, no decorrer do trabalho, novas dimensões do desenvolvimento sustentável ao conjunto das ações, como também nas diversas etapas do processo de planejamento e gestão.

Por outro lado, deve incorporar e se apropriar de um número crescente de políticas públicas no planejamento territorial. Essa diversidade de ações e de políticas articuladas deverá garantir também o aumento da capacidade de intervenção por meio de projetos específicos dotados de interfaces complexas que materializem as diferentes propostas de desenvolvimento e do aumento do número e da abrangência de projetos específicos e constantes aperfeiçoamentos.

Por fim, a articulação de políticas públicas, desde a base, e a ampliação dos espaços da gestão e da participação social até os territórios, poderá resultar em alguns efeitos práticos bastante relevantes:

Fusão de alguns conselhos, cujos temas têm a ver com a perspectiva territorial, passando os temas específicos a serem tratados nas comissões setoriais que os comporiam;

Qualificação do capital humano para participar nesses conselhos, pois o conjunto formado por diversos municípios permitiria ampliar o universo de representados e de organizações da sociedade civil, contribuindo para que se revelassem mediadores sociais ainda mais comprometidos, representativos e qualificados;

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O capital social alcançaria níveis mais elevados de articulações horizontais e verticais, ampliando as possibilidades de entendimentos entre grupos sociais distintos e habitantes de regiões diversas, formando novas institucionalidades mais autênticas, com maior capacidade para participar da formulação e do controle social das políticas públicas.

1.3 – As institucionalidades territoriais e a passagem do setorial e do imediato para os aspectos estratégicos no desenvolvimento territorial

As institucionalidades territoriais são espaços privilegiados para realização de processos participativos de planejamento estratégico, passando a ter um caráter referencial ou norteador ao processo de desenvolvimento territorial sustentável.

Devem ser constituídas institucionalidades capazes de ampliar o enfoque das discussões e de atuação nas questões estratégicas para o processo de desenvolvimento territorial, não se restringindo a questões ligadas à operacionalização de programas públicos. Ou seja, as institucionalidades devem ser espaços de formulação e negociação de políticas públicas consideradas estratégicas e de discussão das atribuições das diferentes instâncias governamentais e da sociedade organizada nesse processo.

A ampliação das capacidades das institucionalidades territoriais se justifica diante da necessidade de dotar os territórios de instrumentos eficazes de rompimento com as práticas de verticalização dos processos decisórios, tendo em vista que as decisões estratégicas têm sido concentradas no nível nacional e aquelas relacionadas à operacionalização das políticas nas demais esferas de atuação.

Além de reduzir a verticalização dos processos decisórios entre as esferas de atuação, as institucionalidades territoriais deverão favorecer a desconcentração do poder de decisão também nas esferas territoriais, contribuindo efetivamente para que as decisões estratégicas sejam tomadas de forma democrática e participativa e não apenas pelo gestor da política pública ou em espaços paralelos privados que alimentam o patrimonialismo e o clientelismo.

1.4 – As institucionalidades territoriais e a promoção de ações estratégicas para o desenvolvimento territorial sustentável

As institucionalidades territoriais devem ser instrumentos de promoção e coordenação colegiada de ações estratégicas pactuadas no território, favorecendo a cooperação, a complementaridade e a cooperação entre os diversos atores governamentais e da sociedade civil. Viabilizando, quando necessário, o aporte de apoio técnico e de recursos para o alcance dos objetivos propostos.

Devem ser ainda dotadas de canais apropriados de divulgação das potencialidades e demandas sociais e territoriais viabilizando a identificação e atração de parceiros potenciais para implantação de projetos e ações para o desenvolvimento territorial, evitando a assim chamada “guerra fiscal” entre as esferas municipais que dilapidam o erário público.

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2 – Caráter e abrangência (de acordo com resolução nº 48 do CONDRAF)

Recomendar às institucionalidades territoriais a ampliação dos temas das discussões, visando atuar nas questões estratégicas do processo de desenvolvimento sustentável dos territórios rurais, não se restringindo à gestão operacional de programas e políticas públicas. Ou seja, trabalhar na construção, priorização, adequação e aprimoramento das políticas públicas (federais, estaduais, territoriais e municipais) a partir das necessidades e avaliação dos atores envolvidos com o desenvolvimento rural sustentável, firmando compromissos e consolidando parcerias.

Sugerir que as intitucionalidades tenham um caráter norteador, referenciador e definidor dos processos de construção dos territórios, sendo, para isso, necessário o reconhecimento, pelos atores governamentais e da sociedade organizada, como espaços legítimos de decisões ou formulações efetivamente consideradas em torno das políticas, programas e projetos relevantes e estratégicas nos diferentes níveis – federal, estadual, territorial e municipal.

2.1 – Abrangência, amplitude e enfoque

É dever dessa institucionalidade buscar agregar nos processos de planejamentos as discussões e ações que vão para além do agrícola, articulando-as com questões gerais: meio ambiente, saúde, educação, diversidade social e cultural etc. Assim sendo, espera-se que essas institucionalidades não se limitem ao tratamento de questões relacionadas à melhoria das condições de produção agrícola, ou com problemas e demandas pontuais de curto prazo, mas discutam, formulem e implementem ações mais abrangentes que poderão alterar os rumos do desenvolvimento rural nos municípios e territórios.

Além disso, este espaço deverá se configurar como um ambiente institucional capaz de fazer reflexões periódicas sobre os problemas e a realidade rural, tornando essas instâncias capazes de propor soluções inovadores, em termos de processos de desenvolvimento local e territorial.

Essa instância estará voltada, portanto, para a dinamização econômica e social dos territórios, criando condições para que as necessidades e demandas, bem como seus potenciais, sejam o insumo necessário ao desenvolvimento sustentável nos territórios.

3 – Modelos ou Tipologias organizativas de Referência

Propõe-se o seguinte formato às institucionalidades territoriais, ressaltando que não se deve considerá-lo um “desenho amarrado”, mas um referecial.

Nível Deliberativo-Máximo (Fórum): Preconiza-se a necessidade da existência de uma esfera que atue como instância máxima deliberativa, com características de Fórum e com ampla participação dos diferentes segmentos sociais, governamentais e econômicos atuantes no território em consideração. Neste nível, as decisões devem envolver as políticas, as linhas de ação e as prioridades, sendo este o responsável pela orientação geral e pelas opções adotadas na condução dos programas e dos planos;

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Nível Decisório-Gerencial (Comissão Executiva): Considera-se aqui a necessidade da existência de uma esfera voltada para os aspectos gerenciais dos programas e dos planos, com características de Comissão, Comitê ou similar, incumbido da implementação de ações e articulação de parcerias. Este será responsável pela gestão da execução das ações articuladas nos diferentes Programas; Esse nível também será uma espécie de Conselho Fiscal, responsabilizando-se pela fiscalização tanto das finanças quanto da contabilidade. Ou seja, a área responsável pelo acompanhamento das contas e ações dos programas e planos.

Nível Operacional-Executivo (Secretaria Executiva): Enfatiza-se a necessidade da existência de um órgão de caráter marcadamente operacional, que se encarregará do apoio logístico às ações territoriais, dando suporte administrativo e permanente ao funcionamento da institucionalidade territorial.

Ressalta-se ainda a preocupação com necessidade de formalização jurídica das institucionalidades territoriais.

4 – Relações entre institucionalidades e redes

Haverá a necessidade de envolver as redes já estruturadas e em operação no âmbito dos territórios, promovendo serviços de assistência técnica e extensão rural, educação profissional, pesquisa e experimentação participativas, dentre outros.

Caberá à institucionalidade territorial o estímulo à sinergia desse conjunto de atores sociais, realizando esforços no sentido de estabelecer consensos e negociações que conduzam à atuação cooperativa e solidária por meio das Redes Institucionais já existentes nos territórios, evitando assim a competição e as divergências entre elas. O fortalecimento permanente da solidariedade e da cooperação, com aperfeiçoamento das relações interpessoais e inter-institucionais, tanto no plano dos colegiados (estaduais, territoriais e municipais) quanto no plano da gestão dos projetos específicos e nas redes territoriais, visa, principalmente, o aperfeiçoamento das atividades de publicização das demandas sociais, de modo a torná-las menos particularidades e mais coletivas.

Por outro lado, é preciso estimular a integração entre os diferentes Conselhos (nos municípios e nos estados) com e/ou entre as outras institucionalidades constituídas que, de uma forma ou de outra, tem algum grau de atuação nos territórios, evitando assim a sobreposição de ações, mas estimulando complementaridades e potencializando os esforços – criando sinergias, enfim.

À institucionalidade territorial caberá estimular a promover de intercâmbios entre diferentes conselhos municipais e/ou institucionalidades outras, tanto em termos do acesso às informações sobre políticas públicas ou experiências afins como da integração de procedimentos administrativos, operacionais burocráticos e de planejamentos, no sentido de fomentar uma cultura institucional.

Um outro elemento importante é a integração entre as políticas públicas, sejam elas de âmbito federal, estadual ou municipal. Esta é uma condição indispensável à obtenção dos níveis de eficiência e eficácia necessários à sustentabilidade dos projetos prioritários

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e, como conseqüência, do próprio trabalho territorial. Para tanto, é condição essencial à institucionalidade territorial a sensibilização, mobilização e efetivo comprometimento dos gestores sociais responsáveis pela condução das políticas públicas, bem como a qualificação dos membros dos colegiados para promover a sua articulação nos diferentes níveis: estados, territórios e municípios.

À institucionalidade territorial caberá ainda dispor de informações variadas sobre os processos e políticas. Embora haja um reconhecimento de que os atores sociais estão satisfatoriamente informados sobre os fatos locais e sobre sua própria história, porém não detêm informações e conhecimentos suficientes sobre o ambiente externo ao território.

As ameaças que vêm de fora, novas potencialidades, tendências de mercado, novas políticas públicas ou modificações nas existentes e investimentos em infra-estrutura a serem viabilizados, são algumas das informações de grande utilidade para a tomada de decisões e que, se não forem levadas aos atores locais, podem passar desapercebidas, sacrificando a qualidade do processo de planejamento.

Poderá algumas vezes, solicitar a realização de estudos e/ou análises de caráter técnico e acadêmico, aos quais, somados ao aporte dado pelos atores locais, promoverão a união de saberes indispensável aos avanços qualitativos dos planos.

III – Institucionalização e operacionalização 1 – Processo instituinte

As institucionalidades territoriais devem ser criadas, reconhecendo e valorizando os “espaços” socialmente concebidos anteriormente, envolvendo atores que os conceberam e que atuam “territorialmente”. A importância de experiências organizativas e participativas prévias, por parte dos atores sociais e comunidades, merece destaque, especialmente no que se relaciona à questão da participação, bem como o papel desempenhado no âmbito dos conselhos. Ou seja, a implantação das institucionalidades nos territórios devem negociar, interagir e integrar as iniciativas existentes. Os casos mais comumente observados são:

os Fóruns que atuam nas mesorregiões; as ações de desenvolvimento regional que vêm sendo implementadas

por alguns governos estaduais; os CONSAD do Ministério do Desenvolvimento Social; os Fóruns ou Comitês Gestores de Bacias Hidrográficas; os Comitês do Projeto Dom Helder Câmara; os Colegiados Gestores de Projetos Integrados em Micro Bacias; as ações de desenvolvimento local gerenciadas por associações de

municípios; os Fóruns Gestores dos Pólos Agroindustriais do Nordeste (Banco do

Nordeste) e de algumas microrregiões que vêm sendo trabalhadas pelo SEBRAE;

Institucionalidades para a Gestão Social do Desenvolvimento Rural Sustentável

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algumas propostas elaboradas por Superintendências Regionais do INCRA, para a atuação em áreas reformadas;

Pactos para o desenvolvimento regional e/ou consórcios intermunicipais encampados pelo SEBRAE;

Fóruns e/ou redes e articulações das organizações da sociedade civil; e

Fóruns de assentados e/ou Pólos sindicais e das organizações da agricultura familiar, dentre outros.

Paralelamente, faz-se necessário acompanhar o processo instituinte, por um lado, uma adequada sensibilização e mobilização da sociedade em geral e, por outro, uma qualificação dos atores sociais para o planejamento e gestão de todas as ações orientadas para o desenvolvimento territorial. Espera-se com isso evitar a “formalização” das institucionalidades apenas em função de projetos e programas governamentais ou evitar que as institucionalidades sejam formadas exclusivamente, ou em sua maioria, por membros de representações governamentais.

Por outro lado, recomenda-se que a institucionalidade territorial estimule e crie as condições para a adoção do sistema de eleição nas comunidades rurais, organizações sociais e municípios para a escolha de seus representantes, proporcionando uma “radicalização da democracia” na composição dessas instituições como também uma maior mobilização dessas comunidades, organizações sociais e municípios diante do novo ambiente institucional. Processo esse que já vem ocorrendo em muitos municípios do país, onde os próprios agricultores e agricultoras familiares elegem seus representantes.

2 – Mecanismos e modelos de institucionalização

A institucionalidade deve ser formada respeitando a autonomia dos territórios. Não existe modelo fechado, mas é preciso evitar que as institucionalidades sejam criadas de cima para baixo, ou exclusivamente em função das representações governamentais. No item anterior foram colocadas algumas recomendações, mas o CONDRAF tem um papel fundamental para dar caráter legítimo e formal.

3 – Composição e coordenação

A institucionalidade, por um lado, deverá ser composta em função dos atores presentes no território, bem como em função de suas necessidades, levando-se em consideração o Art.4º da Resolução nº 48 do CONDRAF.

Por outro lado, é importante debater a questão de Gênero e Geração. Mais especificamente a inserção das mulheres agricultoras, na proporção de uma quota mínima de 30% nessas institucionalidades, evitando as desigualdades percebidas nas instâncias decisórias. Faz-se necessário também a inserção de representação da juventude, pois o desenvolvimento sustentável depende das futuras gerações.

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Na organização e funcionamento dessas institucionalidade territoriais, os processos devem ser coordenados no sentido criar aberturas para inclusão de “novos atores sociais”, considerando que, a cada ciclo do processo de planejamento e gestão, novas dimensões, programas e projetos irão sendo incorporados às ações territoriais.

As institucionalidades territoriais devem ainda ter como princípio a diversidade de atores sociais. Esta diversidade deve ser pensada (aperfeiçoamento dos critérios) também em função da relação entre setores (primário, no caso, a agricultura, com outros setores, como comercial, empresarial) criando uma articulação coordenada para o desenvolvimento amplo do território e assumindo legitimidade perante a sociedade geral como uma instância adequada e consistente na construção e a implementação de um novo pacto sócio-político.

Enfim, essas institucionalidades devem ter uma representatividade qualificada, permitindo que os membros dos colegiados exerçam com eficiência as suas atribuições especificas, mas também sejam qualificados para atuar com base em novas atitudes e comportamentos que substituam as tradicionais “práticas viciosas”, ditadas pelo individualismo e centralização das decisões, por práticas democráticas e dialógicas indispensáveis à verdadeira cooperação solidária.

4 – Dinâmica de suporte e funcionamento

4.1 – Capacitação dos Conselheiros

Para dinamizar o funcionamento das institucionalidades territoriais faz-se necessária uma ampla capacitação para os atores sociais que farão parte dessas instâncias. Deste modo, é preciso reestruturar profundamente a política de capacitação, por meio da segmentação dos conteúdos a partir da realidade dos territórios, visando imprimir uma perspectiva continuada às ações de capacitação com o objetivo de impulsionar a vinculação entre a política de capacitação e outras iniciativas de assessoria técnica e de pesquisa.

Deseja-se que essa “ação qualificadora” não se restrinja apenas aos membros das institucionalidades territoriais, mas envolva também outros gestores sociais (nos estados, territórios e municípios), os técnicos e outros agentes que atuarão como planejadores e gestores das ações territoriais, bem como os dirigentes de organizações da agricultura familiar e assentados (as), dirigentes e técnicos das entidades públicas e privadas que assessorarão e/ou executarão projetos orientados para o desenvolvimento local.

Nesse processo, a informação adequada é fundamental para qualificar as representações. Isto implica a necessidade de ações efetivas de divulgação e de comunicação no sentido de se ajustar às demandas e decisões a serem tomadas, às vezes com certa urgência.

O desafio é viabilizar e fortalecer, de modo dinâmico e flexível, uma (re)estruturação e uma (re)qualificação do aparato institucional envolvido na gestão social dos territórios, em suas diversas etapas e processos.

Institucionalidades para a Gestão Social do Desenvolvimento Rural Sustentável

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4.2 – Assessoria, acompanhamento e apoio ao funcionamento

As institucionalidades territoriais devem dispor de uma infra-estrutura (recursos, veículos, combustível, funcionários, assistência técnica e espaço físico) própria para seu adequado funcionamento e para sua plena autonomia em relação aos governos.

É importante ainda criar uma periodicidade para as reuniões e processos de gestão e planejamento das institucionalidades territoriais no sentido de reverter a lógica de muitas institucionalidades que só se reúnem nos momentos de definição para aplicação dos recursos oriundos dos programas públicos, ou a lógica em que as ações estejam diretamente relacionadas à temporalidade e ao mandato das administrações municipais e/ou estaduais.

Também é fundamental que, ao menos uma parte das reuniões das institucionalidades, sejam abertas à participação externa e com direito a voz, bem como a manutenção de atividades constantes, como forma de dar uma relativa estabilidade ao funcionamento da institucionalidade territorial.

5 – Indicadores de acompanhamento e avaliação

Faz-se necessário instituir no planejamento um sistema de monitoramento e avaliação, com base em indicadores quantitativos e qualitativos.

Estes monitoramento, acompanhamento e avaliação devem ser feitos com base em metodologias participativas e apropriadas às diferentes realidades territoriais, estando abertas ao aprimoramento e ajuste.

Nesse sentido, um banco de dados com informações sobre os conselhos estaduais e municipais pode ser o início para este processo.

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Resolução no 48 do Conselho Nacional de Desenvolvimento Rural Sustentável, publicada no Diário Oficial da União em

23/09/2004, Seção 1, Página 113.

MINISTÉRIO DO DESENVOLVIMENTO AGRÁRIO

CONSELHO NACIONAL DE DESENVOLVIMENTO RURAL SUSTENTÁVEL – CONDRAF

RESOLUÇÃO Nº 48 DE 16 DE SETEMBRO DE 2004

Propõe Diretrizes e Atribuições para a rede de Conselhos de Desenvolvimento Rural Sustentável – CDRS, nos diferentes níveis de atuação

O PRESIDENTE DO CONSELHO NACIONAL DE DESENVOLVIMENTO RURAL SUSTENTÁVEL – CONDRAF, no uso de suas atribuições, de acordo com o disposto no Decreto nº 4.854, de 08 de outubro de 2003, e atendendo ao disposto no art. 23, nos incisos II, III, IV e V do art. 24, nos §§ 3º, 4º, 5º e 6º do art. 25, e nos arts. 27, 28, 29 e 30, todos do Regimento Interno, aprovado pela Resolução nº 35, de 10 de janeiro de 2004, torna público que o Plenário do CONDRAF, em Sessão Plenária realizada em 1º de setembro de 2004,

CONSIDERANDO: a) o desenvolvimento rural sustentável como um processo dinâmico e multidimensional,

portanto, necessariamente articulador e conciliador de setores econômicos, atores sociais, práticas culturais e realidades ambientais diversas e diversificadas;

b) a necessidade de integração e complementação de ações, entre as diferentes esferas de atuação dos Conselhos de Desenvolvimento Rural Sustentável, visando potencializar esforços em torno de objetivos integradores relacionados ao desenvolvimento do meio rural brasileiro;

c) o papel dos Conselhos de Desenvolvimento Rural Sustentável como fóruns aglutinadores, potencializadores das articulações sociais e de consolidação de acordos sobre os rumos do desenvolvimento rural, nos níveis federal, estadual, territorial e municipal; e

d) a necessidade de efetivação e democratização dos Conselhos de Desenvolvimento Rural Sustentável como espaços de decisão das questões estratégicas do desenvolvimento rural, com circulação de informações entre Conselheiros, e destes com a sociedade organizada, eliminando interferências político-partidárias e das oligarquias locais no processo decisório,

RESOLVEU:

Art. 1º Recomendar que o processo de criação e/ou reformulação dos Conselhos de Desenvolvimento Rural Sustentável contemplem a representatividade, diversidade e pluralidade dos atores envolvidos nas diferentes dimensões do desenvolvimento rural (social, econômica, cultural, política e ambiental), e baseie-se em processos de articulação existentes, de modo a buscar-se a efetividade e legitimidade da gestão social - objeto desses espaços colegiados.

§ 1º Estabelecer que:

I – por representatividade entende-se que a base das organizações sociais esteja representada por essas entidades;

Institucionalidades para a Gestão Social do Desenvolvimento Rural Sustentável

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II – a diversidade é a representação dos diferentes atores sociais que atuam no processo de desenvolvimento rural sustentável, sejam jovens, mulheres, quilombolas, agricultores familiares ligados à diferentes comunidades e/ou arranjos produtivos, pequenos empreendedores etc;

III – a pluralidade pressupõe que as diferentes organizações (associações, sindicatos, cooperativas, etc) de uma mesma categoria estejam representadas, assim como todas as concepções de desenvolvimento rural existentes.

§ 2º Recomendar a realização de um amplo processo de sensibilização, informação e consulta aos principais atores envolvidos para a criação e/ou reformulação desses espaços colegiados, seja por meio de reuniões prévias ampliadas, audiências, oficinas ou outras formas de articulação.

§ 3º Recomendar que o processo de que trata o parágrafo anterior seja precedido de mapeamento das comunidades rurais e entidades ligadas à agricultura familiar e ao desenvolvimento rural sustentável, de modo a garantir a efetividade dos princípios ressaltados no caput deste artigo.

§ 4º Recomendar que esse processo culmine com a normatização dos Conselhos em Lei Municipal, Estadual ou Federal, com o objetivo de legitimar sua criação e/ou reformulação, minimizar a descontinuidade de ações e contribuir na efetividade de decisões dos mesmos.

Art. 2º Recomendar aos Conselhos a ampliação dos temas das discussões, visando atuar nas questões estratégicas do processo de desenvolvimento rural sustentável, não se restringindo à gestão operacional de programas e políticas públicas.

Parágrafo único. Os Conselhos devem trabalhar na construção, priorização, adequação e aprimoramento das políticas públicas (federais, estaduais e municipais) a partir das necessidades e avaliação dos atores envolvidos com o desenvolvimento rural sustentável, firmando compromissos e consolidando parcerias.

Art. 3º Sugerir que os Conselhos tenham um caráter norteador, referenciador e definidor do processo de desenvolvimento rural sustentável, sendo, para isso, necessário o reconhecimento, pelos atores governamentais e da sociedade organizada, como espaços legítimos de decisões ou formulações efetivamente consideradas em torno das políticas, programas e projetos relevantes e estratégicas nos diferentes níveis – federal, estadual, territorial e municipal.

Art. 4º Recomendar uma composição representativa, diversa e plural dos atores sociais relacionados ao desenvolvimento rural, contemplando as seguintes situações:

I - que, no mínimo 50% (cinqüenta por cento) das vagas sejam ocupadas por representantes de entidades da sociedade civil organizada, que representem a agricultura familiar, estudem ou promovam ações voltadas para seu apoio e desenvolvimento (movimentos sociais, entidades sindicais, cooperativas e/ou associações produtivas, comunitárias, entidades de assessoria técnica e organizacional, etc);

II - que, no máximo 50% (cinqüenta por cento) das vagas sejam ocupadas por representantes do poder público (executivo, legislativo ou judiciário), vinculadas ao desenvolvimento rural sustentável (inclusive universidades), de organizações de caráter para-governamental (tais como: associações de municípios, sociedades de economia mista cuja presidência é indicada pelo poder público, entre outros) e de outros setores da sociedade civil organizada não diretamente ligados à agricultura familiar (como empreendedores rurais dos setores de serviços e industrial);

III - que os Conselheiros(as) sejam indicados(as) pelas respectivas organizações, anexando a ata da reunião da indicação, para formalização junto às Secretarias dos Conselhos;

IV - que a Presidência seja exercida por qualquer órgão/entidade integrante dos Conselhos de Desenvolvimento Rural Sustentável, a partir da definição dos próprios Conselheiros.

Parágrafo único. Entende-se por agricultor(a) familiar, o conceito adotado pelo Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar - PRONAF, que inclui:

a) produtores(as) rurais cujo trabalho seja de base familiar, quer sejam proprietários(as), posseiros(as), arrendatários(as), parceiros(as) ou concessionários(as) da Reforma Agrária;

b) remanescentes de quilombos e indígenas;

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c) pescadores(as) artesanais que se dediquem à pesca artesanal, com fins comerciais, explorem a atividade como autônomos, com meios de produção próprios ou em parceria com outros pescadores artesanais;

d) extrativistas que se dediquem à exploração extrativista ecologicamente sustentável;

e) silvicultores(as) que cultivam florestas nativas ou exóticas, com manejo sustentável;

f) aqüicultores(as) que se dediquem ao cultivo de organismos cujo meio normal, ou mais freqüente de vida seja a água.

Art. 5º Sugerir que o funcionamento dos Conselhos contemple uma dinâmica de trabalho e capacidade institucional adequados aos desafios apresentados, e, ainda, conte com processos democráticos de coordenação e decisão, de modo a consolidá-los como fóruns efetivos de gestão social do desenvolvimento rural sustentável.

§ 1º O processo de discussão, no âmbito dos Conselhos, deve passar por uma articulação ampliada com a sociedade organizada, por meio de canais constantes de comunicação como conferências, seminários, oficinas, ou outras formas de interação, objetivando a construção mais representativa e legítima das decisões.

§ 2º A dinâmica de trabalho deve ser aprimorada por meio de reuniões sistemáticas e criação de câmaras técnicas, comitês ou grupos temáticos que contemplem a abrangência temática e a estratégia de atuação definidas pelos próprios Conselhos.

§ 3º O aprimoramento da capacidade institucional deve passar por uma estruturação técnica e financeira de apoio ao funcionamento dos Conselhos, a ser exercida por suas Secretarias ou estruturas semelhantes, com recursos específicos para custeio de despesas diversas (transporte, alimentação e hospedagem de Conselheiros, assessorias técnicas e administrativa, processos de capacitação, dentre outros), a serem previstas nos orçamentos dos governos municipais, estaduais e federal.

Art. 6º Os Conselhos de Desenvolvimento Rural Sustentável devem trabalhar para efetivar um processo de interação entre os diferentes níveis de atuação – nacional, estadual, territorial e municipal – visando a consolidação de uma rede desses órgãos colegiados, sem hierarquização de decisões e com intenso fluxo de informações.

Art. 7º Esta Resolução entra em vigor na data de sua publicação.

MIGUEL SOLDATELLI ROSSETTO

Presidente

Institucionalidades para a Gestão Social do Desenvolvimento Rural Sustentável

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Resolução no 52 do Conselho Nacional de Desenvolvimento Rural Sustentável, publicada no Diário Oficial da União em

17/02/2005, Seção 1, Páginas 44 e 45.

MINISTÉRIO DO DESENVOLVIMENTO AGRÁRIO

CONSELHO NACIONAL DE DESENVOLVIMENTO RURAL SUSTENTÁVEL – CONDRAF

RESOLUÇÃO Nº 52 DE 16 DE FEVEREIRO DE 2005

Aprova Recomendações do Conselho Nacional de Desenvolvimento Rural Sustentável – CONDRAF para as Institucionalidades Territoriais de Desenvolvimento Rural Sustentável

O PRESIDENTE DO CONSELHO NACIONAL DE DESENVOLVIMENTO RURAL SUSTENTÁVEL – CONDRAF, no uso de suas atribuições, e tendo em vista o disposto nos incisos II e VI do art. 2º e art. 6º do Decreto nº 4.854, de 08 de outubro de 2003, torna público que o Plenário do CONDRAF, em Sessão Plenária da 20ª Reunião Ordinária realizada em 03 de dezembro de 2004,

CONSIDERANDO: a) a concepção de território utilizada pelo Ministério do Desenvolvimento Agrário,

como “espaço físico, geograficamente definido, não necessariamente contínuo, compreendendo cidades e campos, caracterizado por critérios multidimensionais, tais como o ambiente, a economia, a sociedade, a cultura, a política e as instituições e uma população com grupos sociais relativamente distintos, que se relacionam interna e externamente por meio de processos específicos, onde se pode distinguir um ou mais elementos que indicam identidade e coesão social, cultural e territorial.”;

b) que os territórios rurais apresentam, explícita ou implicitamente, a predominância de elementos “rurais”. Nestes, incluem-se os espaços urbanizados que compreendem pequenas e médias cidades, vilas e povoados;

c) que a abordagem territorial está baseada em uma visão essencialmente integradora de espaços, agentes governamentais, atores sociais, agentes de desenvolvimento, mercados e políticas públicas de intervenção;

d) que a abordagem territorial tem na eqüidade, no respeito à diversidade, à solidariedade, à justiça social, no sentimento de pertencimento cultural e na inclusão social, metas fundamentais a serem atingidas e conquistadas;

e) que o desenvolvimento territorial busca centrar o foco das políticas no território, pois nele se combinam a proximidade social que favorece a solidariedade e a cooperação, com a diversidade de atores sociais, melhorando a articulação dos serviços públicos, o acesso ao mercado interno, podendo chegar ao compartilhamento de uma identidade própria;

f) que o desenvolvimento territorial almeja resultados e soluções aos problemas vivenciados pelas populações contemplando a combinação das diferentes dimensões do desenvolvimento sustentável: econômica, sociocultural, político-institucional e ambiental;

g) que a gestão social do desenvolvimento territorial deve ser concretizada por meio de espaços de debate e concertação, com transparência e participação; e

h) por fim, levando em conta a Resolução nº 48 do CONDRAF que “Propõe Diretrizes e Atribuições para a Rede de Conselhos de Desenvolvimento Rural Sustentável – CDRS, nos diferentes níveis de atuação”,

Institucionalidades para a Gestão Social do Desenvolvimento Rural Sustentável

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RESOLVEU:

Art. 1º Aprovar, em complementação à Resolução nº 48 do CONDRAF, as seguintes recomendações em relação às institucionalidades territoriais do desenvolvimento rural sustentável para que se constituam em espaços de gestão e controle social, com os objetivos de:

I – formular e adequar políticas públicas e iniciativas locais às potencialidades e demandas territoriais;

II – sensibilizar, mobilizar, elaborar o planejamento estratégico e o comprometimento dos atores que atuam no território – governamentais, da sociedade civil e da iniciativa privada – legitimando as decisões e promovendo o envolvimento desses atores na implementação das ações estratégicas para o desenvolvimento territorial;

III – incorporar um número crescente de ações e políticas possibilitando progressivo e constante aperfeiçoamento do planejamento do desenvolvimento territorial, agregando, no decorrer do trabalho, novas dimensões do desenvolvimento sustentável;

IV – dotar as institucionalidades territoriais de canais de divulgação das potencialidades e demandas dos territórios, viabilizando a identificação e atração de parceiros potenciais para implantação de projetos e ações para o desenvolvimento territorial;

V – propor mecanismos de formalização das relações entre os atores e as políticas públicas, com a adoção de Pacto Territorial de Desenvolvimento, como importante instrumento de articulação, diálogo e complementaridade entre as políticas que incidem sobre o território;

VI – propor soluções inovadoras para a dinamização econômica e social dos territórios;

VII – publicizar as ações e políticas, de modo a evitar clientelismo, corporativismo e basismo, que levam à apropriação restrita das políticas públicas em detrimento do interesse público;

VIII – fazer um esforço de articulação institucional, no setor público, tanto no plano horizontal, entre políticas, programas, projetos e ações, quanto no plano vertical, entre a União, Estados, Territórios e Municípios, buscando não setorializar ações.

Art. 2º Recomenda-se o seguinte formato às institucionalidades territoriais:

I – Nível Deliberativo Máximo – instância máxima de decisão, com características de fórum e ampla participação dos segmentos sociais, governamentais e econômicos atuantes no território, responsável pela orientação geral e pela condução dos programas e dos planos, com base em diretrizes e objetivos gerais estabelecidos pelas políticas e programas federais e estaduais;

II – Nível Decisório Gerencial ou Comissão Executiva - instância gerencial dos programas e planos, com características de comissão, comitê ou similar, incumbido da implementação de ações e articulação de parcerias;

III – Nível Operacional ou Secretaria Executiva - instância de caráter operacional, encarregado do apoio técnico e administrativo às ações territoriais, dando suporte permanente ao funcionamento da institucionalidade.

Art. 3º Recomendar que, no processo de constituição e de amadurecimento das discussões, as institucionalidades territoriais definam a sua formalização organizacional.

Art. 4º A institucionalidade territorial deverá ser composta em função dos atores presentes no território, levando-se em consideração o art. 4º da Resolução nº 48 do CONDRAF, devendo ainda:

I – contemplar as questões de gênero, raça, etnia e geração na sua composição;

II – estar aberta para a inclusão de novos atores;

III – levar em conta os princípios da representatividade, diversidade e pluralidade dos atores, constantes no art. 1º da Resolução nº 48 do CONDRAF.

Parágrafo único. As indicações de representantes das organizações e entidades, presentes no território ou com abrangência regional, devem ser responsabilidade das próprias organizações e entidades, respeitando sua autonomia.

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Art. 5º Implementar a qualificação dos membros das institucionalidades territoriais e desencadear processos de capacitação e formação para:

I – buscar o equilíbrio de forças entre os atores dos territórios; II – debater a mudança de estratégia da atuação de âmbito local, centrada em

comunidades rurais ou municípios, para territorial, superando a visão de que o enfoque territorial representa uma ameaça para o processo de desenvolvimento;

III – contribuir para que os membros dos colegiados exerçam com eficiência suas atribuições e atuem com base em novas atitudes e comportamentos em substituição ao individualismo e centralização das decisões;

IV – promover a articulação dos órgãos colegiados nos diferentes níveis, estadual, territorial e municipal;

V – dotar os territórios de instrumentos que possibilitem o rompimento das práticas de verticalização dos processos decisórios , favorecendo a descentralização do poder de decisão e contribuindo para que as decisões estratégicas sejam tomadas de forma democrática e participativa;

VI – envolver outros gestores públicos e sociais nos estados, territórios e municípios, técnicos, dirigentes de organizações sociais, entre outros;

VII – contemplar conteúdos adequados à realidade, de forma continuada e vinculada às iniciativas de assessoria técnica e de pesquisa.

Art. 6º Caberá à institucionalidade territorial articular-se às Redes Institucionais existentes nos territórios, evitando a competição e as divergências entre elas e o estímulo à integração entre os Conselhos, nos municípios e nos estados, e entre as institucionalidades territoriais constituídas, evitando a sobreposição de ações e buscando a complementaridade e potencialização de esforços.

Parágrafo único. Estimular e promover intercâmbios entre diferentes conselhos e institucionalidades territoriais, no que se refere às informações sobre políticas públicas, experiências, procedimentos operacionais e de planejamento, no sentido de fomentar uma cultura institucional.

Art. 7º O CONDRAF deverá manter um cadastro das institucionalidades territoriais criadas, no qual constem informações sobre sua composição e principais deliberações para serem agregadas à Rede Nacional de Órgãos Colegiados, disponibilizando aos Conselhos Estaduais e Municipais de Desenvolvimento Rural Sustentável as referidas informações.

Art. 8º As institucionalidades territoriais devem dispor de infra-estrutura, como recursos, veículos, combustível, funcionários, assistência técnica e espaço físico para seu adequado funcionamento e para sua plena autonomia, bem como planejar estrategicamente mecanismos de auto-sustentação financeira.

Parágrafo único. As institucionalidades territoriais teriam, no momento de implantação, um aporte financeiro do governo federal. Recomenda-se, no decorrer de sua constituição, uma discussão sobre sua sustentabilidade financeira, tanto com os demais representantes dos governos estaduais e municipais quanto com as organizações da sociedade que deverão disponibilizar recursos que permitam o seu adequado funcionamento.

Art. 9º É importante garantir periodicidade às reuniões e processos de gestão e planejamento, no sentido de reverter a lógica de reunião apenas nos momentos de definição de aplicação de recursos públicos, ou a relação direta das ações à temporalidade e ao mandato das administrações municipais e/ou estaduais.

Parágrafo único. Recomendar a elaboração de um sistema de acompanhamento, monitoramento e avaliação, com base em indicadores quantitativos e qualitativos e utilizando metodologias participativas, apropriadas às realidades territoriais e abertas ao aprimoramento e ajuste.

Art. 10. Esta Resolução entra em vigor na data de sua publicação.

MIGUEL SOLDATELLI ROSSETTO

Presidente

Institucionalidades para a Gestão Social do Desenvolvimento Rural Sustentável

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Participantes do Grupo Temático “Institucionalidade para a Gestão Social do Desenvolvimento Rural Sustentável”

Adolfo Brás Sundehus (Federação das Associações e Sindicatos dos Trabalhadores da Extensão Rural e do Setor Público Agrícola do Brasil – FASER) Agnaldo Lelis (Fórum Nacional de Secretários de Agricultura) Antônio César Ramos dos Santos (Ministério das Cidades) Antônio Gutemberg Gomes da Silva (Ministério do Meio Ambiente) Carcius Azevedo dos Santos (Ministério do Meio Ambiente) Carla de Araújo Ferreira (Secretaria do CONDRAF) Celina Bragança (Secretaria de Desenvolvimento Territorial/MDA) Débora Tan Huare (Coordenação das Organizações das Comunidades Indígenas da Amazônia Brasileira – COIAB) Dino de Castilhos (Secretaria de Reordenamento Agrário/MDA) Dorotea Blos (Ministério da Integração Nacional) Eriberto Buchmann (Federação das Associações e Sindicatos dos Trabalhadores da Extensão Rural e do Setor Público Agrícola do Brasil – FASER) Francisco Carlos Gândara (Agência de Cooperação Técnica Alemã – GTZ) Glauco Régis Florisberto (Centro de Tecnologias Alternativas da Zona da Mata – CTA-ZM) Irenêo Ceciliano J. Bezerra (Ministério das Cidades) Jeanne Maria Duarte dos Santos (Associação de Orientação às Cooperativas do Nordeste – ASSOCENE) Joaquim de Oliveira Nogueira (União Nacional das Escolas Famílias Agrícolas do Brasil – UNEFAB) Laura Duarte (Universidade de Brasília – UnB) Lauro Mattei (Universidade Federal de Santa Catarina – UFSC) Leônidas dos Santos Martins (União Nacional das Escolas Famílias Agrícolas do Brasil – UNEFAB) Luciana Dinah Ribeiro Helou (Secretaria de Agricultura Familiar/MDA) Luciano Marçal da Silveira (Assessoria e Serviços em Projetos de Agricultura Alternativa – AS-PTA) Ludgério Monteiro Corrêa (Confederação Nacional dos Municípios) Luiz Antonio Dombek (Ministério da Integração Nacional) Luiz Antônio Nolasco de Freitas (Ministério da Saúde) Marcelo Duncan (Secretaria de Desenvolvimento Territorial/MDA) Marcos Emílio Pereira (Instituto Brasil Central – IBRACE) Marcos Santos Kroll (Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão Social) Maria Moema Borges Leal de Britto (Ministério da Saúde)

Institucionalidades para a Gestão Social do Desenvolvimento Rural Sustentável

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Maria Rodrigues Nagy (Secretaria de Reordenamento Agrário/MDA) Natal Ribeiro Maciel (Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura – CONTAG) Rafael F. R. Monteiro (Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão Social) Reginaldo Alves de Souza (Centro de Assessoria e Apoio aos Trabalhadores e Instituições Não-Governamentais Alternativas – CAATINGA) Ricardo Barbosa de Lima (Instituto Brasil Central – IBRACE) Rita da Luz Serra (Grupo de Trabalho da Amazônia – GTA) Roberto Marinho Alves da Silva (Ministério do Trabalho e Emprego) Roseli Bueno de Andrade (Secretaria do CONDRAF) Rosimere Maria V. Teles (Coordenação das Organizações das Comunidades Indígenas da Amazônia Brasileira – COIAB) Sérgio Bezerra de Menezes (Secretaria de Agricultura Familiar/MDA) Vera Maria Moura Echenique Azevedo (Secretaria do CONDRAF) Volmir Luiz Santolin (Federação dos Trabalhadores na Agricultura Familiar da Região Sul – FETRAF-SUL) Zaré Augusto Brum Soares (Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura – CONTAG)

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