pesquisa participativa: saber pensar para intervir

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Revista Ciências da Educação Maceió, ano I, vol. 02, n. 01, Abr./Jun. 2014 PESQUISA PARTICIPATIVA: SABER PENSAR PARA INTERVIR¹ PAULA CRISTINA DE OLIVEIRA VILELA CANUTO² [email protected] RESUMO Percebe-se uma grande preocupação quanto ao desempenho acadêmico em relação à cultura individual do estudante de nível superior diante de uma pesquisa participativa. Deste modo, faz-se necessária a introdução do processo de aprendizagem como algo natural dentro do meio científico, já que esse tipo de intervenção existe rotineiramente a fim de que o indivíduo pensante saiba intervir não só na sua realidade, mas também mudar o meio em que está inserido. Identificar os determinantes do desempenho educacional na formação docente dos acadêmicos com a pesquisa participativa. Trata-se de um estudo com delineamento descritivo, observacional do tipo retrospectivo, considerando como variáveis: individualidade, coletividade e os determinantes do desempenho educacional. Os dados foram analisados por meio dos diferentes tipos de pesquisa: participativa/participante, de intervenção e pesquisa-ação, nos quais foi identificado o impacto da disponibilidade e qualidade dos serviços educacionais, as atratividades no mercado de trabalho e a influência dos recursos familiares. Espera-se que, com a introdução do processo de aprendizagem na formação docente os acadêmicos tornem-se indivíduos pensantes capazes de intervir na própria realidade quanto no meio em que está inserido. PALAVRAS-CHAVE: PESQUISA PARTICIPATIVA; DETERMINANTES DE DESEMPENHO EDUCACIONAL; CULTURA. 1 INTRODUÇÃO Os processos de avaliação Institucional já podem ser considerados parte da história no contexto da educação superior. No entanto, é importante reconhecer que esta dinâmica é recente principalmente, em si tratando de Brasil, quando se verifica que foi a partir da década de 90 que este processo teve seu impulso. Com a necessidade reconstrução dos modelos de gestão, estão surgindo novas abordagens gerenciais como a pesquisa participativa e os programas de qualidade que preconizam, dentre outras, a descentralização das decisões e aproximação de todos os integrantes da equipe de trabalho. ______________________

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Percebe-se uma grande preocupação quanto ao desempenho acadêmico em relação à cultura individual do estudante de nível superior diante de uma pesquisa participativa. Deste modo, faz-se necessária a introdução do processo de aprendizagem como algo natural dentro do meio científico, já que esse tipo de intervenção existe rotineiramente a fim de que o indivíduo pensante saiba intervir não só na sua realidade, mas também mudar o meio em que está inserido. Identificar os determinantes do desempenho educacional na formação docente dos acadêmicos com a pesquisa participativa. Trata-se de um estudo com delineamento descritivo, observacional do tipo retrospectivo, considerando como variáveis: individualidade, coletividade e os determinantes do desempenho educacional. Os dados foram analisados por meio dos diferentes tipos de pesquisa: participativa/participante, de intervenção e pesquisa-ação, nos quais foi identificado o impacto da disponibilidade e qualidade dos serviços educacionais, as atratividades no mercado de trabalho e a influência dos recursos familiares. Espera-se que, com a introdução do processo de aprendizagem na formação docente os acadêmicos tornem-se indivíduos pensantes capazes de intervir na própria realidade quanto no meio em que está inserido.

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Revista Ciências da Educação

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Maceió, ano I, vol. 02, n. 01, Abr./Jun. 2014

PESQUISA PARTICIPATIVA: SABER PENSAR PARA INTERVIR¹

PAULA CRISTINA DE OLIVEIRA VILELA CANUTO²

[email protected]

RESUMO

Percebe-se uma grande preocupação quanto ao desempenho acadêmico em relação à cultura individual do estudante de nível superior diante de uma pesquisa participativa. Deste modo, faz-se necessária a introdução do processo de aprendizagem como algo natural dentro do meio científico, já que esse tipo de intervenção existe rotineiramente a fim de que o indivíduo pensante saiba intervir não só na sua realidade, mas também mudar o meio em que está inserido. Identificar os determinantes do desempenho educacional na formação docente dos acadêmicos com a pesquisa participativa. Trata-se de um estudo com delineamento descritivo, observacional do tipo retrospectivo, considerando como variáveis: individualidade, coletividade e os determinantes do desempenho educacional. Os dados foram analisados por meio dos diferentes tipos de pesquisa: participativa/participante, de intervenção e pesquisa-ação, nos quais foi identificado o impacto da disponibilidade e qualidade dos serviços educacionais, as atratividades no mercado de trabalho e a influência dos recursos familiares. Espera-se que, com a introdução do processo de aprendizagem na formação docente os acadêmicos tornem-se indivíduos pensantes capazes de intervir na própria realidade quanto no meio em que está inserido. PALAVRAS-CHAVE: PESQUISA PARTICIPATIVA; DETERMINANTES DE DESEMPENHO EDUCACIONAL; CULTURA. 1 INTRODUÇÃO

Os processos de avaliação Institucional já podem ser considerados parte da

história no contexto da educação superior. No entanto, é importante reconhecer que

esta dinâmica é recente principalmente, em si tratando de Brasil, quando se verifica

que foi a partir da década de 90 que este processo teve seu impulso.

Com a necessidade reconstrução dos modelos de gestão, estão surgindo

novas abordagens gerenciais como a pesquisa participativa e os programas de

qualidade que preconizam, dentre outras, a descentralização das decisões e

aproximação de todos os integrantes da equipe de trabalho.

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¹Artigo apresentado ao Centro de Estudos Superior Arcanjo Mikael de Arapiraca – CESAMA, em parceria com a Central de Ensino e Aprendizado de Alagoas – CEAP, como requisito final para obtenção de nota da Disciplina Metodologia e Projeto de Pesquisa sob a orientação da Professora Doutora Fabíola de Almeida Brito.

²Pós-Graduada em Gestão da Saúde Pública – UFAL, 2013; Especialista em Enfermagem do Trabalho – IBEPEX, 2011; Graduada em Enfermagem – CESMAC, 2009.

Para Demo (2004) a pesquisa participativa sempre reivindicou a imersão prática em que as comunidades não precisam apenas estudar os seus problemas, precisam, sobretudo, resolvê-los. Assim, a comunidade é estipulada a assumir o seu papel social não se esquecendo de valorizar também os seus saberes construídos através da sua experiência empírica determinante fundamental para a compreensão desse espaço no âmbito do processo de pesquisa.

A pesquisa participativa poderá auxiliar na construção de políticas de combate

as desigualdades de oportunidades, bem como na participação democrática da

comunidade no processo e ações coletivas. Assim, pode beneficiar seguimentos que

estão a margem do sistema educacional, econômico e dominante.

Essa abordagem oferece oportunidade de participação do docente na

discussão, na tomada de decisões e no aperfeiçoamento constante do processo de

trabalho.

Segundo Siqueira (2001) as instituições precisam capacitar-se ´para

acompanhar a evolução, traçando estratégias que irão orientar o caminho a ser

seguido. É necessário para isso investir nos clientes internos, maior bem da

instituição, oportunizando uma aprendizagem contínua, para que possam satisfazer

as suas necessidades pessoais e profissionais, traçando as melhores estratégias no

coletivo para encontrar as soluções que venham ao encontro das necessidades dos

usuários-clientes e docentes. (SIQUEIRA, 2001)

Destarte, essas estarão cada vez mais conscientes de que seu sucesso será

determinado pela capacitação e qualificação dos seus docentes, passarão a atribuir

maior relevância à pesquisa participativa como estratégias de aprendizagem. Essa

forma gerencial busca promover não somente a atualização e transmissão de novos

conhecimentos, mas orienta a sua ação em direção à mobilização do potencial

criativo dos sujeitos à busca de um fazer diferente criativo e inovador capaz de

operar novos saberes através dos conhecimentos do cotidiano de trabalho

elaborados no coletivo.

Corroborando com Freire (2005) nesta linha de pensamento a mudança é

capaz de acontecer quando o homem capta e compreende a realidade e não está

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reduzido a um mero espectador ou transformado em objeto, cumpridor de ordens

pré-determinadas. Na concepção problematizadora, os [docentes] são parte do

processo de aprendizagem [grifo da autora].

As novas competências gerenciais, integradas à pesquisa participativa,

necessitam ser construídas no coletivo, no e pelo trabalho, possibilitando, assim, a

criação de estratégias para gerir a competitividade a complexidade, a

adaptabilidade, o trabalho em equipe, a incerteza e o aprendizado permanente,

levando a co-gestão.

De acordo com Ciampone (2004), para rever e recompor os modelos de

gestão, bem como, as competências inerentes a formação dos

profissionais/docentes é importante a participação da academia juntamente com as

instituições no sentido de repensar as práticas e teorias relacionadas ao processo de

trabalho e educação.

2. PESQUISA PARTICIPATIVA

2.1 MODO DE PRODUÇÃO DE CONHECIMENTO

Fazendo um breve histórico, pode-se afirmar que no início as pesquisas de

campo tinham como objetivo trabalhar as crises nas relações de trabalho e aliviar

tensões em situações problemáticas, resolver questões concernentes aos problemas

de ajustamento das populações marginais, tudo isso através de ações concretas na

realidade, refletindo criticamente e avaliando seus resultados.

Como assevera Rocha e Aguiar (2003)

na América Latina a pesquisa-ação crítica estará ligada a projetos emancipatórios e autogestionários, principalmente nos movimentos comunitários e nas iniciativas em educação popular junto a populações excluídas. (ROCHA E AGUIAR, 2003)

Pois bem. A pesquisa-ação tem os seus objetivos definidos no campo de

atuação pelo pesquisador e pelos participantes, sendo centrada no agir, através de

uma metodologia exploratória, com resultados vinculados na participação coletiva

para a mudança da ordem social e para a tomada de consciência dos fatores

envolvidos nas situações de vida imediata. (ROCHA E AGUIAR, 2003).

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Trazendo à baila para o contexto do Brasil, percebe-se que, mais

especificamente, no final de 1970, outra perspectiva de investigação surgirá. Rocha

e Aguiar explicam muito bem, declarando que nas pesquisas tradicionais serão

incluídas “[...] discussões no que tange ao fracionamento da vida social, à

dicotomização entre ciência e política e à consequente inviabilização de uma

participação efetiva de grupos sujeitados nos rumos da sociedade.”

Outrossim, para a construção e exercício de uma cidadania ativa, faz-se

necessário uma contextualização das questões e ações empreendidas, as quais são

fundamentais na complexidade dos processos de mudança, e que também são

próprias do referencial básico das pesquisas participativas. Relativizando a ideia de

"verdade", abandonam a neutralidade, a objetividade e a totalização dos saberes,

pilares das ciências tradicionais. (ROCHA E AGUIAR, 2003)

Com efeito, para Rocha e Aguiar (2003)

[…] a transformação da realidade vivida não seria uma questão da correta aplicação dos conhecimentos produzidos nas hierarquias formalizadas, colocando-se como possibilidade a partir da interação entre o saber acadêmico, em seus diversos campos de conhecimento, e os saberes dos sujeitos individuais e coletivos envolvidos na pesquisa. (ROCHA E AGUIAR, 2003, p. 66)

3 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

3.1 DETERMINANTES DO DESEMPENHO EDUCACIONAL

O primeiro conjunto de determinantes do investimento em capital humano

tratado neste estudo é o volume de recursos escolares, que é importante insumo da

produção de educação e afeta diretamente a taxa de retorno desse tipo de

investimento. Dentre os custos relacionados a recursos escolares, podemos

destacar gastos diretos (matrícula e mensalidades) e indiretos (uniformes, livros,

transporte etc.).

Ambos os custos devem variar de acordo com o grau de escassez de

escolas disponíveis para as pessoas estudarem. Além disso, uma melhoria na

qualidade dos recursos escolares (professores e equipamentos) deve contribuir para

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a redução de custos e aumento dos benefícios associados à produção de capital

humano.

Outro importante insumo da produção de educação é o tempo utilizado pelos

indivíduos nessa atividade, e que deixa de ser aproveitado em oportunidades

eventuais no mercado de trabalho. De outro modo, quanto mais atraentes as

alternativas de trabalho para os indivíduos em idade de estudar, menos atrativos

serão os estudos e maior será o impacto das restrições de crédito sobre o grau de

subinvestimento em capital humano.

Como indicador do custo de oportunidade do tempo de um determinado

indivíduo, utilizamos principalmente o valor esperado de seu salário no mercado de

trabalho local (da comunidade). O valor esperado do salário para um indivíduo é

entendido como o produto do salário médio recebido por trabalhadores com

idênticas características de idade e escolaridade na comunidade, pela probabilidade

de que esses trabalhadores estejam empregados.

Além disso, em alguns experimentos utilizamos, como determinantes

separados do custo de oportunidade do tempo de um indivíduo, o salário médio

recebido por trabalhadores com mesmas características pessoais e que vivem na

mesma comunidade e a probabilidade de que esses trabalhadores estejam

empregados.

3.1.1 Impacto da Disponibilidade e Qualidade dos Serviços Educacionais

Em particular, é surpreendente que o impacto da qualidade dos demais

insumos seja tão ou mais importante que a escolaridade dos professores. O impacto

estimado (pelo índice sintético/média simples) de passarmos de uma escola próxima

à casa do aluno, que funciona durante o dia, onde os alunos passam mais de quatro

horas por dia e que possua todos os equipamentos desde livros até computadores e

vídeo, para uma sem qualquer equipamento, distante, que funciona à noite e uma

jornada diária inferior a quatro horas é equivalente a cerca de 0,9 ano de estudo.

Mais uma vez, vimos que a qualidade dos serviços educacionais tem grande

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importância durante a segunda etapa do ensino fundamental, mas perde a influência

quando se trata do ensino médio.

3.1.2 As Atratividades no Mercado de Trabalho

Comunidades em que as oportunidades no mercado de trabalho são mais

atraentes tendem a apresentar pior desempenho nos indicadores educacionais.

Além disso, observou-se que a probabilidade de estar empregado parece

exercer maior influência sobre a decisão de trabalhar ou não do que o valor do

salário propriamente.

Outro resultado interessante é que o impacto estimado do custo de

oportunidade

do tempo varia bastante de acordo com gênero e região. Observou-se que as

mulheres parecem estar menos propensas a estudar menos para aproveitar

oportunidades de trabalho que os homens. Já no Nordeste, nota-se que, as pessoas

estão muito mais dispostas a trocar os estudos por emprego que no Sudeste.

Em suma, os resultados deste estudo revelam um importante mecanismo de

geração de desigualdade de oportunidade e de transmissão intergeracional da

pobreza. Na medida em que a escolaridade dos pais é um fator predominante na

determinação do nível de escolaridade dos filhos, crianças cujos pais tenham baixa

escolaridade possuem grandes chances de tornar-se adultos com pouca

escolaridade.

Como a escolaridade é também um fator importante na determinação da

renda, caracteriza-se assim uma situação onde prevalece a desigualdade de

oportunidade e, por conseguinte, a transmissão intergeracional da pobreza.

3.1.3 A Influência dos Recursos Familiares

De todos os tipos de determinantes que afetam o nível de escolaridade das

pessoas, os recursos familiares são os que aparecem com maior frequência nos

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estudos aplicados à realidade brasileira. De fato, é fácil acreditar que o volume de

recursos familiares pode estar relacionado tanto à taxa de retorno desse tipo de

investimento quanto às limitações impostas pelas restrições ao crédito.

Na medida em que o mercado de crédito não é perfeito, os investimentos em

capital humano passam a ser realizados, na sua maioria, com recursos próprios da

família. Quanto menos pobres as famílias mais recursos elas têm, e portanto mais

recursos elas dedicam ao investimento em capital educacional.

Contudo, as famílias com menos recursos são aquelas em que o volume de

investimentos em capital humano ficará mais aquém do desejável, provocando um

fenômeno ainda mais preocupante que o subinvestimento em si, que é o processo

de transmissão intergeracional da pobreza. Uma vez que um indivíduo é tão mais

pobre quanto menos educado for, aqueles nascidos hoje em famílias pobres serão

provavelmente menos escolarizados e, portanto, tenderão a ser os mais pobres

futuramente.

4.DIFERENÇA ENTRE PESQUISA PARTICIPANTE/PARTICIPATIVA, PESQUISA-

INTERVENÇÃO E PESQUISA-AÇÃO

Rocha e Aguiar (2003, p. 66), apud Rizzini, et al (1999), afirma que:

na literatura estrangeira a principal preocupação entre os pesquisadores não está diretamente ligada à diferença entre as metodologias da pesquisa participativa (PP) e da pesquisa-ação (PA), mas entre as pesquisas participativas e não participativas. Já na literatura brasileira, as diversas tendências metodológicas que envolvem o conceito de participação apresentam maior polêmica, gerando muitas vezes dificuldades quanto à sua compreensão. (RIZZINI et al, 1999)

Gori (2006) apud DEMO (1995), afirma que a pesquisa participativa é

classificada como:

“metodologia alternativa”, sedimentada em uma avaliação qualitativa das manifestações sociais, comprometida com intervenções que contemplam o autodiagnóstico (conhecimento, acumulação e sistematização dos dados); a construção de estratégia de enfrentamento prático dos problemas detectados e a organização política da comunidade como meio e fim. (DEMO, 1995)

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Já Rocha e Aguiar (2003), citando Thiollent, afirma que este faz uma clara

distinção entre pesquisa participativa (PP) e pesquisa-ação (PA), asseverando que:

[…] a PA é uma forma de PP, mas nem todas as PP são PA: "A PP se preocupou sobretudo com o papel do investigador dentro da situação investigada e chegou a problematizar a relação pesquisador/pesquisado no sentido de estabelecer a confiança e outras condições favoráveis a uma melhor captação de informação. No entanto, os partidários da PP não concentraram suas preocupações em torno da relação entre investigação e ação dentro da situação considerada. É justamente esse tipo de relação que é especificamente destacado em várias concepções da PA. A PA não é apenas PP, é um tipo de pesquisa centrada na questão do agir" (THIOLLENT, 1987, p.83).

É de bom alvitre destacar, que é imprescindível, nas pesquisas participativas,

que o conhecimento frutificado esteja disponível para todos, pois esta é uma forma

de ampliar a qualidade de vida da população.

Com relação a pesquisa-ação, Thiollent (2000) define três objetivos claros da

pesquisa-ação, quais sejam: I) o primeiro deve ser de ordem técnica, também

conhecido como instrumental, pois visa resolver um problema prático; II) já o

segundo está relacionado com a consciência, já que busca desenvolver a

consciência coletiva a respeito de problemas enfrentados; III) já o terceiro almeja a

produção de de conhecimento, com a ressalva de que esta não seja útil apenas para

a coletividade considerada na investigação local.

Segundo Thiollent (2000) [...] pesquisa-ação promove a participação de

integrantes do contexto escolar na busca de solução para os seus problemas,

observando, descrevendo e planejando ações.

No entanto, para Freire (1987)

a relevância deste método de pesquisa e da pesquisa participante em educação é interferir na ordem social, uma vez que toda ação cultural é sempre uma forma sistematizada e deliberada de ação que incide sobre a estrutura social, ora no sentido de mantê-la como está ou mais ou menos como está, ora no de transformá-la (FREIRE, 1987, p.178).

No que compete a pesquisa-intervenção consiste em uma tendência das

pesquisas participativas que busca investigar a vida de coletividades na sua

diversidade qualitativa, assumindo uma intervenção de caráter socioanalítico

(AGUIAR, 2003; ROCHA, 2001).

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Rodrigues e Souza (1987) evidenciam que a pesquisa-intervenção representa

uma crítica à política positivista de pesquisa:

A antiga proposta lewiniana vem sendo resignificada à luz do pensamento institucionalista: trata-se, agora, não de uma metodologia com justificativas epistemológicas, e sim de um dispositivo de intervenção no qual se afirme o ato político que toda investigação constitui. Isso porque na pesquisa-intervenção acentua-se todo o tempo o vínculo entre a gênese teórica e a gênese social dos conceitos, o que é negado implícita ou explicitamente nas versões positivistas 'tecnológicas' de pesquisa (RODRIGUES E SOUZA, 1987,p. 31).

O processo de formulação da pesquisa-intervenção aprofunda a ruptura com

os enfoques tradicionais de pesquisa e amplia as bases teórico-metodológicas das

pesquisas participativas, enquanto proposta de atuação transformadora da realidade

sócio-política, já que propõe uma intervenção de ordem micropolítica na experiência

social.

O que se coloca em questão é a construção de uma "atitude de pesquisa" que irá radicalizar a idéia de interferência na relação sujeito/objeto pesquisado, considerando que essa interferência não se constitui em uma dificuldade própria às pesquisas sociais, em uma subjetividade a ser superada ou justificada no tratamento dos dados, configurando-se, antes, como condição ao próprio conhecimento (SANTOS, 1987, STENGERS, 1990).

Corroborando com Coimbra (1995) a pesquisa afirma seu caráter

desarticulador das práticas e dos discursos instituídos, inclusive os produzidos como

científicos, substituindo-se a fórmula "conhecer para transformar" por "transformar

para conhecer".

5. PESQUISA-INTERVENÇÃO COMO DISPOSITIVO DE TRANSFORMAÇÃO

Na pesquisa-intervenção, não visamos à mudança imediata da ação instituída,

pois a mudança é consequência da produção de uma outra relação entre teoria e

prática, assim como entre sujeito e objeto. No âmbito da Sociologia, a questão se

vincula à afirmação de uma micropolítica do cotidiano construindo uma trajetória

concreta dos movimentos; no da Psicologia, envolve a recusa da individualização e

da psicologização dos conflitos.

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A corrente da Análise Institucional Socioanalítica, desenvolvida a partir das

décadas de 60/70 na França (Lourau, Lapassade, Hess) e que ganha adeptos na

América Latina na década de 80 (Rodrigues, Baremblitt, Barros), possibilitará a

formulação da pesquisa-intervenção com a perspectiva de interrogar os múltiplos

sentidos cristalizados nas instituições (RODRIGUES E SOUZA et al, 2003)

Como prática desnaturalizadora, o que inclui a própria instituição da análise e

da pesquisa, as estratégias de intervenção terão como alvo a rede de poder e o jogo

de interesses que se fazem presentes no campo da investigação, colocando em

análise os efeitos das práticas no cotidiano institucional, desconstruindo territórios e

facultando a criação de novas práticas.

Procedemos desse modo, à crítica ao estatuto da verdade, interpelando o

poder das teorias, das organizações e das formas constituídas no que tange ao

conhecimento e às relações sócio-institucionais, frente à realidade complexa e

diferenciada.

Para tal fim, propomos metodologias coletivas, favorecendo as discussões e a

produção cooperativa com a perspectiva de fragilização das hierarquias burocráticas

e das divisões em especialidades que fragmentam o cotidiano e isolam os

profissionais. A pesquisa-intervenção, por sua ação crítica e implicativa, amplia as

condições de um trabalho compartilhado.

Entre os aspectos centrais que vêm norteando o desenvolvimento da

pesquisa-intervenção, destacamos os seguintes: mudança de parâmetros de

investigação no que tange à neutralidade e à objetividade do pesquisador,

acentuando-se o vínculo entre gênese teórica e social, assim como a produção

concomitante do sujeito e do objeto, questionamento dos especialismos instituídos,

ampliando as análises do nível psicológico ao microssocial, ênfase na análise da

implicação, acentuando-se que, para além dos vínculos afetivos, profissionais ou

políticos […].

A intervenção está associada à construção e/ou utilização de analisadores,

conceito-ferramenta formulado no percurso do institucionalismo francês, que

funcionam como catalizadores de sentido, desnaturalizando o existente e suas

condições e realizando a análise.

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O conceito de instituição também é modificado, não se identificando com o de

estabelecimento, ganhando um sentido dinâmico, uma vez que remete a um

processo de produção constante de novos modos de existência, de configuração

das práticas sociais (Rodrigues, 1993, Barros, 1994a), do mesmo modo que o

conceito de implicação trabalhado pelos analistas institucionais não é uma questão

de vontade, de decisão consciente de ligar-se a um processo de trabalho. Ele inclui

uma análise do sistema de lugares ocupados ou que se busca ocupar ou ainda do

que lhe é designado, pelo coletivo, a ocupar e os riscos decorrentes dos caminhos

em construção. A análise das implicações com as instituições em jogo nas situações

afirma também a recusa da neutralidade do analista/pesquisador, procurando

romper com as barreiras entre sujeito que conhece e objeto a ser conhecido. A

intervenção evidencia que pesquisador/pesquisado, ou seja, sujeito/objeto fazem

parte do mesmo processo.

Para Aguiar e Rocha (1997)

na pesquisa-intervenção, a relação pesquisador/objeto pesquisado é dinâmica e determinará os próprios caminhos da pesquisa, sendo uma produção do grupo envolvido. Pesquisa é, assim, ação, construção, transformação coletiva, análise das forças sócio-históricas e políticas que atuam nas situações e das próprias implicações, inclusive dos referenciais de análise. É um modo de intervenção, na medida em que recorta o cotidiano em suas tarefas, em sua funcionalidade, em sua pragmática - variáveis imprescindíveis à manutenção do campo de trabalho que se configura como eficiente e produtivo no paradigma do mundo moderno (AGUIAR E ROCHA, 1997, p.97).

É nesse sentido que a intervenção se articula à pesquisa para produzir uma

outra relação entre instituição da formação/aplicação de conhecimentos,

teoria/prática, sujeito/objeto, recusando-se a psicologizar conflitos. Conflitos e

tensões são as possibilidades de mudança, pois evidenciam que algo não se ajusta,

está fora da ordem, transborda os modelos. Diante disso, ou ocupamos o lugar de

especialistas, indagando sobre as doenças do indivíduo, ou o de sócio-analistas,

indagando sobre a ordem da formação que exclui os sujeitos.

Grande parte das questões que bloqueiam a processualidade das práticas de

formação nas quais nos inserimos estão presentes nas instituições universitárias,

entre as quais a atualização de modelos universais, a naturalização da realidade

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social, o especialismo cientificista, traduzidos em um conjunto de técnicas a serem

aplicadas.

A pesquisa-intervenção vem viabilizando trabalhos de campo que colocam em

análise as instituições que determinam a realidade sócio-política e os suportes

teórico-técnicos, construídos no território educacional. Não há, portanto, o que ser

revelado, descoberto ou interpretado, mas criado.

Com efeito, por intermédio de uma abordagem micropolítica das produções

coletivas, constatamos que a realidade social resiste aos quadros formulados a

priori, às categorias gerais bem delimitadas, aos modelos já circunscritos que não

conseguem mais explicar as condições da mulher, da família, da infância, dos

excluídos, instaurando-se o desafio de uma teorização permanente.

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Possíveis implicações para a política educacional é o fato de que incrementos

na escolaridade do professor contribuem para um melhor desempenho de todos os

alunos, mas de forma crescente com o nível sócio-econômico destes. Claramente, o

aumento da

escolaridade do professor, por aumentar a eficácia das escolas é, por si só,

desejável.

Caso almejemos, entretanto, reduzir a desigualdade de oportunidades

educacionais entre famílias mais e menos afortunadas, conviria tentarmos

desenvolver políticas educacionais e pedagógicas voltadas para identificar e retificar

as razões específicas por trás do pior desempenho dos alunos mais pobres. Tais

políticas poderiam incluir uma maior disponibilidade do professor fora do horário de

aula, para quem deseje procurá-lo; programas de incentivo ao uso da biblioteca; a

disponibilidade de acompanhamento psicológico, ou uma série de outras ideias.

A investigação do mérito de cada uma foge ao escopo do presente estudo,

no qual apenas constatamos a necessidade de tais políticas para evitar que

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aumentos na eficácia escolar sejam acompanhados por aumentos na desigualdade

de oportunidades dentro da escola.

Portanto, o desafio reside em identificar estratégias e modelos participativos

que promovam a cultura dos docentes no seu próprio percurso de aprendizagem,

desde que contextualizados com as vivências do seu cotidiano. Esta reconstrução

implica, coletivamente, que os docentes devem ser capazes de inovar e construir

continuamente de modo que planeje e implemente novas estratégias possibilitando o

desenvolvimento da iniciativa e criatividade dos acadêmicos.

6 REFERÊNCIAS

AGUIAR, K. F. E ROCHA, M. L. Ligações Perigosas e Alianças Insurgentes.

Subjetividades e Movimentos Urbanos. Tese de doutorado, Pontifícia Universidade

Católica de São Paulo, São Paulo, 2003.

BARROS, R. D. B. Grupos: a Afirmação de um Simulacro. Tese de doutorado,

Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, São Paulo, 1994a.

CIAMPONE MHT, Kurcgant P. O ensino de administração em enfermagem no

Brasil: o processo de construção de competências gerenciais. Rev Bras Enferm

2004.

COIMBRA, C.M. B. Os Caminhos de Lapassade e da Análise Institucional: uma

Empresa Possível. Revista do Departamento de Psicologia da UFF, vol 7, nº 1,

1995.

DEMO, Pedro. Pesquisa participante: saber pensar e intervir juntos. V 8. Brasília:

Límber, 2004.

____________. Metodologia científica em Ciências Sociais. São Paulo: Atlas, 1995.

FREIRE, Paulo. Pedagogia do oprimido. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2005, p. 178.

Ibidem, p.178.

GORI, Renata Machado de Assis. Observação participativa e pesquisa-ação:

aplicações na pesquisa e no contexto educacional. Disponível em:

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