perus e a transformação do espaço na metrópole paulista · plano do indivíduo já que haverá...

36
UNIVERSIDADE FEDERAL DE ALFENAS Instituto de Ciências da Natureza Natalia de Almeida Perus e a transformação do Espaço na Metrópole Paulista Alfenas/MG 2011

Upload: lydang

Post on 16-Dec-2018

214 views

Category:

Documents


0 download

TRANSCRIPT

Page 1: Perus e a transformação do Espaço na Metrópole Paulista · plano do indivíduo já que haverá uma transformação do espaço habitado, ... uma metamorfose com a chegada da Fábrica

UNIVERSIDADE FEDERAL DE ALFENAS

Instituto de Ciências da Natureza

Natalia de Almeida

Perus e a transformação do Espaço na Metrópole Paulista

Alfenas/MG

2011

Page 2: Perus e a transformação do Espaço na Metrópole Paulista · plano do indivíduo já que haverá uma transformação do espaço habitado, ... uma metamorfose com a chegada da Fábrica

Natalia de Almeida

Perus e a transformação do Espaço na Metrópole Paulista

Trabalho de Conclusão de Curso

apresentado ao curso de Geografia

na Universidade de Alfenas para

a obtenção do tìtulo de Geógrafo.

Orientador: Prof. Dr. Evânio S. Branquinho

Alfenas/MG

2011

Page 3: Perus e a transformação do Espaço na Metrópole Paulista · plano do indivíduo já que haverá uma transformação do espaço habitado, ... uma metamorfose com a chegada da Fábrica

Dedicatória

Agradeço a todas as pessoas que de alguma forma contribuíram para a conclusão

deste trabalho e que estiveram próximas a mim dando apoio e ânimo para que eu

não desistisse.

Ao Professor Evânio pela paciência e generosidade e por me acompanhar nesse

trajeto dando sempre muito apoio e contribuindo de forma grandiosa para o meu

conhecimento.

À Professora Ana Rute, pelo apoio nas horas de desespero e por estar sempre

próxima a mim desde os primeiros anos de graduação.

Às minhas amigas Mária, Ana Paula, Sara, Mayara e Suelen por proporcionarem

momentos agradáveis de discussões e conversas tornando meus dias em Alfenas

muito mais prazerosos.

À República Geolátras pelos momentos de alegria e pela companhia nos fins de

tarde e finais de semana.

À Tami e a Natália, pela amizade e paciência nos meus momentos de crise, e que

mesmo longe estiveram sempre ao meu lado.

À minha mãe Marli, por ter sido sempre tão presente e por não me fazer desistir

nunca me dando força e muito amor, ao meu pai Candido pelo apoio e generosidade

em possibilitar que eu concluísse mais esta etapa.

Às minhas irmãs Tamili e Talita pelo amor, paciência, amizade e companheirismo

sendo sempre a minha fonte de inspiração, e a quem devo muito respeito e

admiração.

Aos meus avós Assumpta e Gentil pelo amor de sempre!

E a todos os meus familiares tios e tias, primos e primas que estiveram sempre

muito presente na minha vida.

Page 4: Perus e a transformação do Espaço na Metrópole Paulista · plano do indivíduo já que haverá uma transformação do espaço habitado, ... uma metamorfose com a chegada da Fábrica

Dedico esse trabalho aos meus pais e

as minhas irmãs que foram sempre a

minha fonte de inspiração.

Page 5: Perus e a transformação do Espaço na Metrópole Paulista · plano do indivíduo já que haverá uma transformação do espaço habitado, ... uma metamorfose com a chegada da Fábrica

Resumo

O presente trabalho pretende fazer uma análise dos processos urbanos no

bairro de Perus a partir da modernização e metropolização da cidade de São Paulo.

O principal objetivo é apresentar uma reflexão sobre as transformações ocorridas no

bairro e a sua nova configuração de periferia com essa modernização da cidade,

tendo em vista os estudos sobre os processos urbanos como forma de compreender

as transformações do espaço. A ideia central apresentada é que a modernização da

cidade guarda estreita relação com o processo histórico do bairro e se comportou

como o agente de maior transformação e desenvolvimento da vida urbana.

Palavras-chave: Processos urbanos, modernização, metropolização, bairro-

periferia, processo histórico.

Abstract

The present work aims at an analysis of urban processes in the neighborhood

of Perus, from themodernization and metropolises of Sao Paulo. The main

objective is to present a reflection on the changes occurring in their neighborhood

and the new configuration of the periphery with the modernization of the city,

according to studies on urban processes as a way to understand the

transformations of space. The central idea presented is that the modernization of the

city is closely related to the history of the neighborhood and acted as the agent

of major transformation and development of urban life.

Keywords: Urban modernization processes, metropolises, neighborhood-

periphery, the historical process.

Page 6: Perus e a transformação do Espaço na Metrópole Paulista · plano do indivíduo já que haverá uma transformação do espaço habitado, ... uma metamorfose com a chegada da Fábrica

SUMÁRIO

INTRODUÇÃO

1. Metodologia.......................................................................................................8

2. A cidade e a metrópole no processo de modernização.....................................9

3. O Bairro de Perus e a Metrópole Paulista........................................................13

3.1. O Processo Histórico de Perus.................................................................13

3.2. Perus e seu sítio urbano...........................................................................15

3.3. A Metropolização de São Paulo...............................................................18

4. A nova configuração socioespacial de Perus a partir da Metrópole...............23

4.1. Perus e suas transformações dentro da Metrópole Paulista....................23

4.2. A desintegração da vida de bairro ...........................................................28

Considerações Finais

Referências Bibliográficas

Page 7: Perus e a transformação do Espaço na Metrópole Paulista · plano do indivíduo já que haverá uma transformação do espaço habitado, ... uma metamorfose com a chegada da Fábrica

7

Introdução

O trabalho aqui apresentado tem por objetivo mostrar as transformações

ocorridas no bairro de Perus a partir da modernização da cidade de São Paulo. Esse

processo de modernização marca a metamorfose da cidade em metrópole,

contribuindo para as transformações de bairros que também passam por um

processo urbanizador. Essa modernização mostra que a cidade cria no espaço

condições para o desenvolvimento industrial além de contribuir para as

transformações socioespaciais e imprimir na cidade características metropolitanas.

O trabalho surgiu de uma preocupação pessoal de tentar compreender as

transformações espaciais do bairro e a sua nova configuração, os estudos sobre o

bairro foram ganhando forma a partir de leitura de textos e livros que tentavam

compreender as transformações do espaço com a chegada de formas urbanas que

caracterizavam a modernização da cidade de São Paulo. Os estudos urbanos foram

os que contribuíram para a compreensão de todo esse processo transformador além

de permitir o entendimento do bairro aqui estudado.

Essa pesquisa tem por objetivo analisar as transformações do espaço

geográfico do bairro de Perus vinculada à metropolização da cidade de São Paulo,

além de apontar atividades significativas para esse processo como a criação da

fábrica de cimento Perus Portland e a ferrovia Estrada de Ferro São Paulo-Railway ,

que foram pontos cruciais para o desenvolvimento do bairro e também favoreceu a

modernização de São Paulo. E mais recentemente a sua transformação em bairro

periférico no contexto da metrópole.

Dentro desse processo de modernização e metropolização da cidade e como

fatores de transformação do bairro foram analisados de que forma a Estrada de

Ferro São Paulo-Railway contribuiu para a criação de núcleos urbanos,

principalmente no Bairro de Perus e redondezas, além de tentar fazer uma ligação

entre a construção da ferrovia e a intensificação de fábricas que passaram a surgir

ao longo da ferrovia, tendo como exemplo a Fábrica de Cimento Portland Perus.

No contexto da cidade foi possível analisar também o processo de

periferização que passou a ser consequência do processo de metropolização de São

Paulo, em Perus isso se mostra bastante presente uma vez que ao se inserir

totalmente na lógica da metrópole passou a conviver com as características que são

Page 8: Perus e a transformação do Espaço na Metrópole Paulista · plano do indivíduo já que haverá uma transformação do espaço habitado, ... uma metamorfose com a chegada da Fábrica

8

típicas dessas áreas, sofrendo com a precarização do lugar. E como resultado

desse processo temos a implosão do bairro, ou seja, a perda de características de

vida de bairro o transformando em um fragmento da cidade.

Sendo assim, é possível fazer uma análise a partir de uma ligação entre a

formação do bairro de Perus e o processo de modernização e metropolização da

cidade de São Paulo, levando em consideração os processos históricos e as

transformações espaciais que marcaram o período nas duas localidades. Na

tentativa de elucidar essa análise, foram usados como fonte de pesquisa no campo

da Geografia, que se mostra tão vasto, teóricos que discutem dentro da Geografia

Urbana os processos de transformações socioespaciais.

1. Metodologia

A metodologia consiste em realizar estudos e revisão bibliográfica de textos

que apresentem formas de compreensão dos processos de urbanização, análise da

modernização como uma forma de produção social do espaço, compreender os

processos que levam a cidade à constituição de metrópole e como se dá a sua

metropolização, tentar analisar os conceitos de centro-periferia de maneira que

permitam compreender a nova configuração do bairro de Perus etc. O estudo teve

como foco os processos de modernização e metropolização de São Paulo como

base para a contextualização das transformações do bairro de Perus, a análise se

deu especialmente a partir da Fábrica de Cimento Portland Perus e da Estrada de

Ferro São Paulo Railway como fatores para a formação e transformação

socioespacial do bairro.

As entrevistas realizadas procuraram contrapor dois grupos da população de

Perus, o primeiro grupo foram os moradores mais antigos que viveram o período da

Fábrica de Cimento Portland Perus acompanhando o processo histórico do bairro, o

segundo grupo contou com moradores recentes tendo na sua composição migrantes

e a população mais jovem, as entrevistas realizadas no segundo grupo eram na sua

maioria composta por moradores do loteamento “Recanto dos Humildes” e nos

conjuntos habitacionais.

No total foram feitas 10 entrevistas que possibilitaram a partir da visão dos

moradores compreender como estes enxergam o processo histórico do bairro e

também a sua nova configuração espacial.

Page 9: Perus e a transformação do Espaço na Metrópole Paulista · plano do indivíduo já que haverá uma transformação do espaço habitado, ... uma metamorfose com a chegada da Fábrica

9

Considerando a pesquisas teóricas junto às pesquisas de campo, procuramos

desenvolver:

- Estudos dos processos históricos a partir de textos com o intuito de comparar

essas transformações em campo e compreender o processo.

- Entender e analisar o atual processo de urbanização do bairro e de seu entorno,

assim como a sua decadência com relação à influência para a modernização de São

Paulo a partir de entrevistas feitas.

- Análise das transformações no espaço geográfico da região a partir do uso de

fotografias para melhor compreensão.

2. A cidade e a metrópole no processo de modernização

O processo que marca a transformação da cidade em Metrópole está pautado

em uma gama de características, que mencionado por Lencioni (2006), aparece

como sendo uma forma urbana de tamanho expressivo, levando em consideração o

tamanho de sua população e o seu território, a metrópole possui uma diversificação

de atividades econômicas, com destaque para a concentração de serviços, é um

locus de inovação, garante um fluxo grande de comunicação e informação e é vista

como um nó importante de redes.

Quando tratamos de Metrópole há uma relação íntima com a cidade, mas ao

tratarmos da metropolização estamos lidando com transformações que acontecem

no espaço. Em São Paulo, observamos que além da sua transformação em

metrópole tivemos também uma metamorfose de sua paisagem, ou seja, foi

impresso no espaço características metropolitanas, um processo que marca

contínua ação.

Dentro desse processo que marca o desenvolvimento e modernização de São

Paulo, vemos que há uma produção do espaço, ou seja, a produção do espaço

capitalista. Como vemos em Lefebvre (1980), o espaço mostra as suas

contradições, uma vez que como produto social é visto também como mercadoria.

Tendo no seu interior as contradições, o espaço passa a se fragmentar e implode, e

é nesse contexto que podemos analisar a metrópole e os bairros que como produto

desse processo também foram fragmentados.

As transformações causadas pela metropolização também se passam no

plano do indivíduo já que haverá uma transformação do espaço habitado, ou seja, a

Page 10: Perus e a transformação do Espaço na Metrópole Paulista · plano do indivíduo já que haverá uma transformação do espaço habitado, ... uma metamorfose com a chegada da Fábrica

10

sua fragmentação tornando o mesmo estranho ao indivíduo uma vez que há a perda

de seus referenciais. Os bairros são exemplos claros desse processo, por terem sido

descaracterizados para atender a essa acumulação desenfreada do capital que

produz os espaços metropolitanos, mudando o comportamento e os referenciais da

população (CARLOS, 2009).

As modificações ocorridas tanto na cidade como nos lugares trarão também a

modificação da vida cotidiana que transformará a realidade urbana. A modificação

não acontece apenas por fatores globais, que são contínuos (tais como o

crescimento da produção material no decorrer das épocas, como suas

consequências nas trocas, ou o desenvolvimento da racionalidade), mas também

em função das modificações do modo de produção, nas relações cidade e campo, e

nas ralações de classe e propriedade (LEFEVBRE, 2010).

Com a introdução da lógica capitalista essas mudanças se mostram

presentes também na escala do vivido, isso percebemos em Perus que passou por

uma metamorfose com a chegada da Fábrica de Cimento Portland Perus, dando

continuidade a uma transformação que foi dada com a vinda da Estrada de Ferro

São Paulo Railway. Vemos que a configuração do bairro de Perus possui muitas

mudanças, a começar pela sua classificação já que agora é visto como um bairro

periférico, fazendo parte com isso das novas periferias que foram se formando com

a explosão da cidade.

As transformações ocorridas no bairro a partir da metropolização de São

Paulo trouxeram para o antigo morador o sentimento de perda e é percebido que a

sua inserção na metrópole fez com que o bairro se transformasse num fragmento

desta, tendo suas características cada vez mais esvaziadas de sentidos e

significados (SEABRA, 2003). Desse modo, podemos dizer que o bairro entra numa

forma de reprodução da metrópole, estabelecendo nele uma lógica que vem de fora,

ou seja, a lógica da metrópole.

Segundo Seabra (2003), esse processo de urbanização e a constituição de

uma sociedade industrial vão redefinir as lógicas internas do bairro, rompendo com

as relações imediatas existentes além de provocar intensos deslocamentos. A

industrialização e a formação da metrópole provocaram um processo de

metamorfose na cidade o que acabou gerando a não sobrevivência dos bairros

Page 11: Perus e a transformação do Espaço na Metrópole Paulista · plano do indivíduo já que haverá uma transformação do espaço habitado, ... uma metamorfose com a chegada da Fábrica

11

“tradicionais” fazendo com que eles se fragmentassem, e consequentemente

houvesse a sua implosão, caracterizados agora como bairros periféricos.

Assim percebemos que o processo de modernização permite que essa nova

configuração seja estabelecida, mudando o modo de vida da população no local e

configurando uma nova organização social e cultual, rompendo com estruturas que

antes faziam parte da vida cotidiana local, e é justamente esse processo que pode

ser observado nos bairros que passam de uma estrutura ainda que não totalmente

urbanizada, mas com traços dessa urbanização para uma configuração mais

complexa e intensa.

As cidades sofreram e ainda sofrem um intenso processo de modernização,

mostrando com isso uma nova organização do seu espaço, esse processo foi

acompanhado por intensos fatores históricos vivenciados e que foram modificados a

partir do processo de modernização. Aqui tentamos compreender que a

modernidade não pode ser entendida como um simples momento de grande

desenvolvimento, já que ela não conseguiu eliminar as desigualdades existem no

espaço.

Perus se encaixa nesse contexto e sofreu intensamente com todo esse

processo modernizador da cidade de São Paulo, foi a partir de um estudo histórico e

geográfico que analisamos o quanto essas transformações imprimiram no lugar uma

nova configuração espacial. Como resultado desse processo Perus passou de bairro

para uma forma típica de periferia, sofrendo com todas as características que são

inerentes a essas áreas.

Com a metropolização da cidade, bairros, como no caso Perus, passaram a

ser continuidades dessa nova formação e a sua análise deve ser feita a partir da

cidade para que as diferenças sejam bem compreendidas, já que a cidade era o

centro da vida civil e agora, com as transformações instauradas pelo processo

modernizador, passa a ser o cenário para os novos circuitos capitalistas, tratando

estes a partir da escala da metrópole.

A ocupação de Perus se deu no final do século XIX com a chegada da

Estrada de Ferro São Paulo Railway, onde foi se formando pequenos aglomerados

de casas, intitulados por Langenbuch como povoados-estação (1971). Mas foi com a

vinda da Fábrica de Cimento Perus Portland em 1926, que o bairro ganha uma nova

Page 12: Perus e a transformação do Espaço na Metrópole Paulista · plano do indivíduo já que haverá uma transformação do espaço habitado, ... uma metamorfose com a chegada da Fábrica

12

configuração e também a constituição de uma nova lógica, a do trabalho para a

população ali residente.

Esse processo urbano passa a consumar a fragmentação do espaço e do

tempo, e a cidade e os bairros que estavam na base da cidade histórica passam a

fazer parte da metrópole como fragmentos. Compreender essa modernização da

cidade e dos bairros e analisar como eles sobrevivem a esse novo modelo implica

entender o capitalismo como formação social (SEABRA, 2001).

Com a modernização, a vida passa a ser mais diversa, o urbano transforma o

quadro de vida mostrando que apesar das contradições sociais que envolvem esse

processo é essa nova maneira de pensar e viver que vai ser imposta. É com a

modernização que os circuitos capitalistas vão ganhar maior importância, denotando

outra sociedade que passa a se caracterizar e se identificar mais com o que a

cidade tem para oferecer deixando de lado algumas características que antes eram

tradicionais.

O momento pelo qual a cidade de São Paulo estava passando marca à

metamorfose da cidade em metrópole, dando ao lugar do bairro um processo de

urbanização. Essa metropolização mostra que a modernização da cidade cria no

espaço condições para o desenvolvimento industrial além de contribuir para as

transformações socioespaciais.

As metrópoles contemporâneas estavam inscritas dentro do que prescreviam

as cidades modernas, estas surgiram dentro da base da cidade histórica e de seus

bairros. O aumento da divisão manufatureira do trabalho na base da cidade histórica

mostra as contradições desta nova sociedade que já estava se industrializando,

dando lugar a modernidade que trazia uma vida mais diversa, com um novo cenário

social nos espaços.

O bairro no processo de metropolização e consequentemente no processo de

urbanização é visto primeiramente como uma entidade sociocultural, ou seja,

possuidora de uma identidade que estava fora do contexto da cidade que na época

passava por transformações. O bairro no seu interior é visto como o lugar do vivido,

das experiências de vida e com a industrialização há um rompimento desses

aspectos redefinindo as características do bairro e os nexos da vida imediata, com

isso o enraizamento existente anterior ao processo de metropolização não

Page 13: Perus e a transformação do Espaço na Metrópole Paulista · plano do indivíduo já que haverá uma transformação do espaço habitado, ... uma metamorfose com a chegada da Fábrica

13

sobrevivem devido à intensificação das características de um modo de vida que está

na cidade e que passa a incorporar o bairro.

As Metrópoles foram estruturas a partir da industrialização e sua

materialidade seu deu com a concentração econômica e a concentração geográfica

dos processos de produção e reprodução do capital (SEABRA, 2010), considerando

que outros fatores como a produção do espaço, política e cultural também se

mostram presentes dando ao processo de urbanização e metropolização sua

totalidade.

Sendo assim, é possível fazer uma análise a partir de uma ligação entre a

formação do bairro de Perus e o processo de modernização e metropolização da

cidade de São Paulo, levando em consideração os processos históricos e as

transformações espaciais que marcaram o período nas duas localidades, o bairro de

Perus e a cidade de São Paulo e, a partir disso, compreender a necessidade que a

cidade de São Paulo passava para se inserir no processo de metropolização, ou

seja, um nível mais elevado de produção socioeconômica e espacial.

3. O Bairro de Perus e a Metrópole Paulista

3.1. O Processo Histórico de Perus

O Bairro de Perus, situado na cidade de São Paulo, era conhecido nos anos

coloniais como Ajuá e servia como local de parada de tropas, já que estava situado

na estrada entre São Paulo e Jundiaí. A região era constituída por grandes

fazendas, como a fazenda dos Pires com uma considerável produção vinícola e a

fazenda Ajuá, que possuía uma grande cultura de cereais, sendo considerada uma

das maiores da capital, ficando próxima à estrada de ferro São Paulo Ralway e foi

nos arredores desta fazenda que tivemos o surgimento do Bairro de Perus

(SIQUEIRA, 2001).

O lugar que no período colonial servia apenas como pouso de tropas, teve no

final do século XIX a instalação da ferrovia São Paulo-Railway, e esta teve grande

importância para o desenvolvimento do Estado de São Paulo, que estava passando

por um momento de grande modernização. A estrada foi construída por uma

empresa inglesa entre os anos de 1860 e 1867, sendo a primeira via férrea paulista

e tinha como objetivo tirar o planalto paulista do isolamento, já que seu grande feito

foi ter superado o desnível da Serra do Mar. (PRADO JÚNIOR, 1989).

Page 14: Perus e a transformação do Espaço na Metrópole Paulista · plano do indivíduo já que haverá uma transformação do espaço habitado, ... uma metamorfose com a chegada da Fábrica

14

A ocupação em Perus se deu primeiramente com a instalação da Estrada de

Ferro São Paulo Railway no final do século XIX, e com isso o bairro passou a

apresentar algumas aglomerações, principalmente próximos à ferrovia, que segundo

Langenbuch (1971), eram chamados de povoados-estação.

Em 1926, houve no bairro a instalação da Fábrica de Cimento Portland Perus,

dando assim uma maior importância ao lugar. A Fábrica de Cimento teve sua

instalação no bairro devido ao acesso que ele oferecia à ferrovia e pela grande

quantidade de matéria-prima necessária para a produção de cimento. Com a Fábrica

houve um maior impulso das aglomerações, além de imprimir o ritmo do trabalho

fazendo com que o lugar sofresse algumas mudanças na sua organização social e

espacial, uma vez que passa a seguir essa nova lógica que começa a ser imposta

no bairro.

Com a vinda da Fábrica, o bairro passou a sofrer algumas transformações, já

que o novo empreendimento necessitava de um contingente grande de

trabalhadores, e estes passaram a ocupar o bairro vindo das regiões mais próximas,

ou de outros estados e até mesmo países. O trabalho especializado da Fábrica foi

ocupado principalmente por trabalhadores estrangeiros, já o trabalho pesado e sem

muita especialização foi ocupado pelos trabalhadores nacionais.

Com a ocupação do bairro por uma quantidade significativa de trabalhadores

houve a necessidade de construir algumas vilas operárias além de alguns

loteamentos. As vilas que se encontravam próximas à Fábrica dispunham de boa

infraestrutura, como água e energia elétrica, estas eram a Vila Triângulo e a Vila

Portland, já fora do perímetro da fábrica existiam loteamentos que tinham por

objetivo atender a necessidade de moradia da massa de trabalhadores e que não

possuíam tanta infra-estrutura, como as vilas localizadas dentro da fábrica, vivendo

esses trabalhadores sem energia e saneamento, estas vilas ficaram conhecidas

como Vila Inácio e Vila Hungaresa.

Em 1934, Perus deixa de fazer parte da Freguesia do Ó, transformando-se

em Distrito, apresentando já nessa época características urbanas numa área

tipicamente rural (BEZERRA, 2011). No desenvolvimento do bairro houve algumas

permanências, principalmente rurais, e assim era possível perceber características

tanto urbanas como rurais. Com o crescimento da cidade de São Paulo e seu

Page 15: Perus e a transformação do Espaço na Metrópole Paulista · plano do indivíduo já que haverá uma transformação do espaço habitado, ... uma metamorfose com a chegada da Fábrica

15

desenvolvimento industrial, o bairro passa por fortes transformações tanto na sua

vida cotidiana como na sua organização social e espacial.

Em 1950 e 1960, São Paulo intensifica sua importância no cenário econômico

e industrial, assim Perus ganha uma nova configuração passando a apresentar

características de bairro residencial, tendo a sua mão-de-obra excedente que

procurar trabalho em outros locais da capital, sendo chamado agora de “bairro

dormitório”.

3.2. Perus e seu sítio urbano

Perus é um distrito e está localizado a extremo noroeste da cidade de São

Paulo, ele faz divisa com outros dois distritos, de Jaraguá e Anhanguera além de

limitar o município de Caieiras, que já não faz parte da região metropolitana de São

Paulo. O distrito possui 89.500 habitantes, e por fazer parte das periferias de São

Paulo possui problemas inerentes a essa formação, como habitação de baixa

qualidade, altos índices de violência, falta de saneamento básico em algumas

localidades, principalmente em lugares de ocupação mais recente, além de pouco

investimento em saúde pública.

O processo de favelização em Perus se deu principalmente com a vinda das

rodovias Anhanguera e Bandeirantes, que induziu a ocupação de suas proximidades

pela população mais carente do bairro. Como é bem característico dos bairros

periféricos das grandes cidades, Perus não possui hospital tendo apenas um posto

de saúde, mas que devido a grande procura por atendimento hospitalar se torna

insuficiente. O bairro possui um dos menores IDH (Índice de Desenvolvimento

Humano) da região evidenciando a baixa qualidade de vida de sua população.

Page 16: Perus e a transformação do Espaço na Metrópole Paulista · plano do indivíduo já que haverá uma transformação do espaço habitado, ... uma metamorfose com a chegada da Fábrica

16

FIGURA 1: Localização do Distrito de Perus

Fonte: Site Prefeitura do Estado de São Paulo, 2011

Adaptação: Natalia de Almeida

IMAGEM 1: Localização de Perus

A imagem mostra a atual configuração urbana de Perus. Temos em destaque a Fábrica de Cimento

Portland Perus, Estação de trem da CPTM, os conjuntos habitacionais CDHU e COHAB e a Rodovia

Bandeirantes e o Rodoanel Mário Covas.

Fonte: Google Earth. Adaptado por Natalia de Almeida 2011.

Page 17: Perus e a transformação do Espaço na Metrópole Paulista · plano do indivíduo já que haverá uma transformação do espaço habitado, ... uma metamorfose com a chegada da Fábrica

17

Nos seus aspectos morfológicos ele se encontra no chamado rebordo

granítico-gnaissico que envolve a bacia sedimentar de São Paulo (BEZERRA, 2011).

Por estar localizado numa região que é bastante recortada, já que faz parte da bacia

hidrográfica do rio Juquery, o bairro é constituído por morros e estes são ocupados

em sua maioria por moradias, e ao observar essas ocupações percebemos que as

moradias foram construídas sem nenhum tipo de planejamento e de forma

desordenada.

O bairro tem características residenciais bem marcantes, mas na sua

paisagem podemos fazer distinções bastante claras entre áreas mais pobres e

outras com uma população mais abastada, apontando com isso uma diferenciação

bem marcante na sua constituição socioespacial. As áreas de ocupação mais

antigas, como por exemplo, nos arredores da estação ferroviária, encontramos

residências organizadas com maior infra-estrutura, já as ocupações mais recentes

encontradas principalmente nas extremidades do bairro, foram ocupadas de forma

desordenada por uma população de baixa renda, sendo a maioria da população do

bairro, podemos citar como exemplo o loteamento “Recanto dos Humildes”.

.

FOTO 1 - Loteamento “Recanto dos Humildes”, a foto mostra o grande adensamento de casas.

Créditos: Natalia de Almeida

Page 18: Perus e a transformação do Espaço na Metrópole Paulista · plano do indivíduo já que haverá uma transformação do espaço habitado, ... uma metamorfose com a chegada da Fábrica

18

O Bairro possui como principal atividade o comércio, é possível observar

alguns comércios tradicionais como lojas e restaurantes, mas nos últimos dez anos

algumas lojas que estão ligadas às grandes redes comerciais começaram a se

instalar no lugar, são elas Casas Bahia, Loja Cem, Magazzine Luiza, Boticário etc,

com isso podemos observar que o bairro está sendo palco de processos bastante

característicos da modernização da metrópole de São Paulo, integrando-se dessa

forma ao seu circuito comercial.

3.3. A Metropolização de São Paulo

A história de Perus tem grandes ligações com a metropolização da cidade de

São Paulo, sofrendo no seu desenvolvimento as conseqüências de todo esse

processo histórico que a cidade vinha passando. A chegada das indústrias e o

aumento desenfreado da centralidade que São Paulo passou a exercer fizeram com

que as periferias se tornassem parte dessa nova paisagem que passou a imperar na

cidade.

Dentro desse processo, Perus passou a ser visto como um bairro periférico,

uma vez que sua posição geográfica além de suas características econômicas e

sócioespaciais davam ao lugar essa condição. Mas para que possamos

compreender essa nova configuração do bairro, temos que adentrar no processo

que fez a cidade de São Paulo se transformar na Metrópole dos dias atuais, e

também passar a analisar como se deu a sua industrialização e seu processo de

urbanização.

Analisando a industrialização a partir da perspectiva de aprofundamento das

relações capitalistas, a cidade vai passando por transformações tanto técnicas como

científicas, produzindo uma nova centralidade, ou seja, pontos que serão valorizados

principalmente se considerarmos o seu papel econômico, as características urbanas

vão desenvolver no lugar uma infraestrutura que será necessária para a

concretização dessa modernização vigente, com isso haverá a expansão das

periferias que são precariamente inseridas nesse contexto do capitalismo industrial,

passando a ser segregadas.

Page 19: Perus e a transformação do Espaço na Metrópole Paulista · plano do indivíduo já que haverá uma transformação do espaço habitado, ... uma metamorfose com a chegada da Fábrica

19

Nesse contexto, a cidade passa a seguir as estruturas impostas pela

produção capitalista industrial, seguindo uma linha que condiciona a sua produção

para o mercado. A industrialização de São Paulo se deu principalmente ao longo das

ferrovias, tendo pontos que já se mostravam importantes e dinamizados. O seu

início se deu a partir da concentração de capital vinda da produção cafeeira, dando

continuidade ao processo que vinha se estabelecendo com a expansão das ferrovias

que adentravam o planalto paulista.

Vemos nascer assim uma nova configuração espacial da cidade de São

Paulo, onde temos lugares com manifestação intensa da pobreza, enquanto outros

são possuidores de grande dinamismo. Assim percebemos a fragmentação da

cidade e do urbano, gerando espaços precarizados nesse processo industrial e que

foram subjugadas às periferias pobres e alienadas.

O processo de metropolização produz uma intensa centralidade e marca no

território um processo de hierarquização, a partir de seus centros. Nesse contexto, a

metrópole aparece como sendo algo que transcende a modernidade, onde a vida

passa a ser efêmera e dinâmica, além de introduzir no espaço urbano um processo

de homogeneização. Com isso os problemas que vemos acontecer pela

urbanização, que não é para todos, passam a fazer parte da reprodução da

sociedade.

A fragmentação do espaço, resultado dessa metropolização também se

passa no plano do indivíduo já que haverá uma transformação do espaço habitado,

ou seja, a fragmentação do lugar tornando estranho ao indivíduo, uma vez que há a

perda de suas referências. Os bairros são exemplos claros desse processo, por

terem sido descaracterizados para atender a essa acumulação desenfreada do

capital, que produz os espaços metropolitanos, mudando o comportamento e os

referências da população (CARLOS, 2009).

Assim, para que possamos compreender melhor as transformações da cidade

de São Paulo, temos que fazer um paralelo com a intensa urbanização como

consequência de um processo de industrialização caracterizado como dependente,

uma vez que o Brasil ocupa uma posição na Divisão Internacional do Trabalho,

apresentando intensa exploração da força de trabalho e, além disso, o mercado não

consegue ocupar toda essa mão-de-obra existente, tendo assim o aparecimento do

Page 20: Perus e a transformação do Espaço na Metrópole Paulista · plano do indivíduo já que haverá uma transformação do espaço habitado, ... uma metamorfose com a chegada da Fábrica

20

trabalho informal como alternativa de renda para essa população que ficou à

margem do processo de industrialização.

O processo de urbanização no contexto da industrialização está atrelado a

uma urbanização que explora a cidade, ou seja, há uma extensão cada vez maior da

mancha urbana com a ocupação da população de trabalhadores de baixa renda nas

periferias que circundam a cidade e que mostra uma segregação socioespacial,

onde nem todos têm a possibilidade de obter essa urbanidade que caracterizam os

lugares que são privilegiados da Metrópole.

A industrialização de São Paulo não proporcionou para a cidade como um

todo os efeitos da urbanização que é a consequência desse processo, muito pelo

contrário, ela criou espaços que foram privilegiados por essa industrialização, tendo

como resultado intensos investimentos nesses lugares de infraestrutura, garantindo

condições para um melhor desenvolvimento da população residente nessas

localidades, como também o progresso de atividades tanto industriais como

comerciais. A urbanização se deu de forma desigual, ou seja, criou-se uma

separação entre o centro e a periferia, marcando as características que são típicas

nos grandes centros brasileiros, como na Metrópole paulista.

Esse momento marca dois processos que são inerentes à urbanização da

metrópole, o primeiro mostra que a urbanização, como resultado da industrialização,

provoca o crescimento das grandes periferias, ou seja, a explosão da cidade e o

segundo dizem respeito ao processo que liga a industrialização ao capital financeiro

vigente. Uma das alternativas para que o capital financeiro se reproduza é por meio

da compra da terra urbana, através do espaço criam-se novas funções para que a

reprodução econômica se concretize, assim o espaço é uma condição para que isso

ocorra, mudando o papel do solo urbano a partir das pretensões econômicas.

Assim, percebemos que a produção da cidade capitalista está inserida num

contexto onde ela se torna uma mercadoria e que a partir disso se torna

fragmentada, uma vez que a propriedade privada é vendida e ocupada em pedaços,

uma vez que o mercado imobiliário tem em mãos a terra urbana e com ela produz

espaços com alto custo onde só pode morar a população mais abastada, sendo a

outra parcela da população resignada a ocupar a mancha urbana que se alastra

pelas periferias.

Page 21: Perus e a transformação do Espaço na Metrópole Paulista · plano do indivíduo já que haverá uma transformação do espaço habitado, ... uma metamorfose com a chegada da Fábrica

21

Analisando a metropolização de São Paulo, podemos observar que ela não

se dá por completo, pois ocorre como um processo de modernização incompleta, na

qual mesmo que se continue uma industrialização forte, ainda há resquícios do que

em períodos anteriores foram tradicionais na cidade, como setores financeiros e

pequenas indústrias que estão nas mãos de grupos familiares, sem se inserirem na

grande produção capitalista que temos nos dias atuais. Podemos dizer que no Brasil

como um todo houve a introdução do moderno, mas sem que essa modernidade

fosse homogênea, temos clara a divisão do trabalho, a racionalidade do lucro, mas

ao mesmo tempo, observamos que há uma realidade conservadora e resistente ao

seu modo de vida (DAMIANI, 2009).

Neste contexto, Damiani mostra que diante desse processo de urbanização,

vemos que há uma impossibilidade do urbano para todos, o que para ela seria

denominado de urbanização crítica. Esse movimento poderia ser transformado a

partir de uma mudança radical das bases da produção e reprodução social. Se

existe urbanização para uns, deixa de existir para outros, uma vez que no processo

de produção capitalista não é possível uma urbanização completa e homogênea que

consiga atender todo o território da Metrópole paulista, sendo necessário que a

propriedade privada e sua capitalização dentro do espaço urbano sejam enfrentadas

e transformadas para que a população faminta por moradia e melhores condições de

vida sejam atendidas.

Esse processo de privatização do solo urbano sofre muito influência do

Estado, já que planos elaborados para atender as necessidades da população com

relação ao acesso a esse solo urbano tende a privatizar cada vez mais a vida,

interferindo na produção e reprodução da sociedade. Dessa forma, a cidade de São

Paulo vai reformulando o seu espaço, onde a sua fragmentação se dá para que

necessidades inerentes ao capitalismo sejam atendidas, sem se preocupar com as

necessidades individuais nem mesmo com a cultura de cada lugar, realocando

populações para as periferias, restringindo o acesso a esse processo de produção

capitalista.

Na impossibilidade de permitir que todos tenham acesso à urbanização e,

como consequência disso, a Metrópole como centro de hierarquização e de nó de

atração de fluxos, comporta-se como grande objeto de orientação desses fluxos

Page 22: Perus e a transformação do Espaço na Metrópole Paulista · plano do indivíduo já que haverá uma transformação do espaço habitado, ... uma metamorfose com a chegada da Fábrica

22

como também a responsável pela divisão espacial do trabalho. Esse processo de

hierarquização dos espaços ocorre “excluindo” grande parte da população, ou seja,

inserida precariamente neste contexto. As grandes mutações por que passa a

Metrópole paulista retira parte do seu papel industrial, permitindo que ela se insira

em novas atividades econômicas, contribuindo para o aprofundamento dessa divisão

espacial do trabalho, além de configurar um espaço onde impera a segregação

socioespacial.

Como é observado em São Paulo, a industrialização e, consequentemente, a

urbanização gera uma problemática no espaço, sendo considerado por muitos o

motor das transformações na sociedade como um todo. A industrialização é vista

como o indutor dessas transformações e teremos como os induzidos os problemas

gerados na sociedade que são relativos ao crescimento e planificação da cidade

(LEFEBVRE, 2010). Anterior à industrialização, tínhamos a cidade e seu solo urbano

com um maior peso do uso e com a introdução de novos modelos econômicos há

uma transferência, passando o solo urbano a ter cada vez mais valor de troca, ou

seja, ele dentro do capitalismo aparece como mercadoria.

Assim com a industrialização as estruturas anteriores foram quebradas, e

teremos a ruptura do sistema urbano preexistente, implicando na desestruturação

das estruturas estabelecidas (LEFEBVRE, 2010). Com a industrialização a mancha

urbana tende a se expandir, chegando a ocupar grande parte do território, a

crescente concentração de capital resultado da indústria é acompanhada pelas

concentrações urbanas, essas localidades caracterizam-se como pontos onde o

capital será inserido de forma mais intensa. A consequência dessa nova estrutura

imposta pela indústria permite que a capitalização do centro crie ao redor da cidade

lugares que vão abrigar a população que passa a ser expulsa, não podendo mais

ocupar os principais centros que agora passam a ser super valorizados.

As transformações da cidade, como já foram citadas, têm como resultado os

problemas urbanos que passam a ser induzidos por essa nova estrutura, e estes vão

provocar na cidade a sua “implosão/explosão”, marcando a expansão do tecido

urbano por todo o território, que constituirá a metrópole. A explosão da cidade é

marcada pela fragmentação do espaço e a sua expansão formando as novas

periferias, ela acontece uma vez que não consegue inserir uma parte da população

Page 23: Perus e a transformação do Espaço na Metrópole Paulista · plano do indivíduo já que haverá uma transformação do espaço habitado, ... uma metamorfose com a chegada da Fábrica

23

que está subjugada a ocupar essas localidades. Assim vemos aparecer no contexto

da cidade a suburbanização, que vai gerar a sua desconcentração, e ao seu redor

há um preenchimento por periferias dependentes da cidade.

A implosão acontece na cidade e principalmente nos antigos bairros, havendo

nesses lugares uma desestruturação dos antigos modos de vida, rompendo com as

relações imediatas, provocando no lugar uma sensação de desconhecimento, de

estranhamento, onde o espaço da vivência, da vida de bairro passa a não ser mais

identificado como tal. Acontecendo o mesmo com a cidade, a praça passa a não ser

mais o ponto de encontro, as pessoas adquirem um modo de vida marcado pela

rapidez das coisas, pela efemeridade das relações, onde tudo acontece ao mesmo

tempo, deixando de existir as reações mais imediatas e o caráter de vizinhança.

Assim temos o novo momento da cidade, onde vai imperar um modo de

produção voltado para o mercado, transformando o espaço como forma de se

adequar a essa nova produção. A cidade perde as suas características tradicionais e

se transformando em metrópole, fragmentando espaços, desvalorizando lugares,

desestruturando relações e deixando a população mais pobre “excluída” desse

processo. A análise da industrialização e metropolização da cidade de São Paulo

servem como cenário para as transformações dos espaços, como no caso Perus,

que estavam intimamente ligados a esse desenvolvimento, mostrando que nessas

localidades houve uma nova configuração socioespacial.

4. A nova configuração socioespacial de Perus a partir da Metrópole

4.1. Perus e suas transformações dentro da Metrópole Paulista

Perus sendo um local que está inserido na Metrópole de São Paulo possui

certa dependência com relação às centralidades da cidade, por ser um bairro

“dormitório”, a sua população se desloca diariamente para os principais centros, uma

vez que o bairro não consegue empregar toda a força de trabalho existente. Essas

características demonstram que o bairro está inserido na Metrópole como uma

periferia, mantendo um modo de vida característico dessa situação, assim como a

sua cotidianidade.

Page 24: Perus e a transformação do Espaço na Metrópole Paulista · plano do indivíduo já que haverá uma transformação do espaço habitado, ... uma metamorfose com a chegada da Fábrica

24

Pensando na metropolização de São Paulo e na sua relação com as

transformações do bairro de Perus, percebemos que analisar o bairro a partir da

totalidade que é a cidade é ao mesmo tempo perceber que a metamorfose da cidade

em metrópole fez com que o bairro fosse se perdendo nesse processo e se

integrando na metrópole, tornando-se um fragmento desta. Dessa forma, o bairro

como era concebido vai perdendo as suas características de convívio social e se

desintegrando não fazendo mais parte de uma organização social mais autônoma.

Quando tratamos da metrópole, notamos que dentro dela há formas urbanas

que estão em constante mutação, ou seja, há uma recriação de novos espaços a

partir dessas transformações, com isso percebemos que os lugares vão se recriando

e características que eram consideradas anteriormente à transformação vão se

perdendo e passam a ganhar novos sentidos e novos usos. Essas transformações

se passam também no bairro, se formos considerar a metrópole como mediadora

entre o local e global, notaremos que no plano local haverá a introdução de novos

valores e novos comportamentos uma vez que o global acaba condicionando essas

transformações (CARLOS, 2006).

Esse processo de metamorfose dos lugares, falando aqui especificamente do

bairro de Perus, apesar de ser condicionado por uma lógica que vai além do poder

público, não podemos ignorar que o Estado passa a se comportar como mediador

de todo esse processo contribuindo para que ele se fortifique. Com isso temos uma

intensa valorização e desvalorização dos lugares, onde temos a expulsão e atração

da população e, no caso do bairro como periferia, vemos que ele faz parte de um

contexto em que habitantes foram expulsos de determinado lugar e passaram a

ocupar locais mais distantes dos principais centros.

Em Perus isso fica muito claro porque num primeiro momento percebemos

que a sua ocupação se deu com a necessidade de modernização que a cidade de

São Paulo passava, ou seja, essa ocupação estava mais ligada à possibilidade de

novas oportunidades de emprego trazidas pela fábrica como também a possibilidade

que a estrada de ferro dava para que essa população se locomovesse. Mas num

período a posteriori, vemos que o crescimento do bairro está totalmente atrelado à

explosão da cidade, uma vez que não há um agente incentivador de atração e sim

Page 25: Perus e a transformação do Espaço na Metrópole Paulista · plano do indivíduo já que haverá uma transformação do espaço habitado, ... uma metamorfose com a chegada da Fábrica

25

uma expulsão de habitantes que não conseguem se inserir nesse processo

avassalador de modernização.

Considerando a Metrópole como uma condição para a centralidade,

percebemos que ela se comporta como um pólo de atração de fluxos e com isso

veremos que o processo de divisão espacial do trabalho será cada vez mais

acentuado, isso mostra que ele trará para o espaço produzido uma lógica marcada

pela sua hierarquização, uma vez que lugares passaram a receber instrumentos

modernizadores para produção enquanto outros vivem na inércia podendo ou não

ser valorizados. Partindo desse pressuposto, vemos que Perus, num primeiro

momento da sua história, aparece como um ponto de atração, já nos dias atuais não

temos algo economicamente marcante que possa gerar atração para o lugar.

Para compreender as transformações ocorridas em Perus, temos que

perceber que na constituição da Metrópole há um movimento marcado pela

produção e reprodução dos espaços, dentre as formas que contribuem para esse

movimento, temos as formas urbanas que se comportam de várias maneiras dentro

do processo de formação da metrópole, assim haverá dentro dos lugares que

recebem a estrutura urbana uma modificação de seus sentidos assim como uma

recriação dos lugares dando a eles novos usos.

O bairro de Perus sempre esteve intimamente ligado ao processo histórico

de São Paulo, num primeiro momento, ele teve importância por servir como pouso

de parada das tropas que seguiam para o interior, posteriormente ele teve

importância por trazer uma das fábricas mais modernas da época, a Fábrica de

Cimento Portland Perus que, Estrada de Ferro São Paulo Railway, foi a que

provocou a maior transformação no lugar.

As transformações se deram principalmente pelo aumento de habitantes

ligados à agricultura na região e também de uma população que passou a ocupar as

localidades próximas à ferrovia, tendo sido considerado como povoado-estação, em

razão de uma concentração grande de moradores nos arredores da ferrovia.

Passados alguns anos, Perus iria ressurgir como o bairro ao receber uma das

fábricas mais modernas para a época, a Fábrica de Cimento Portland Perus, que se

instalou no bairro em 1926.

Page 26: Perus e a transformação do Espaço na Metrópole Paulista · plano do indivíduo já que haverá uma transformação do espaço habitado, ... uma metamorfose com a chegada da Fábrica

26

Com a chegada da fábrica, houve uma mudança na paisagem do bairro e

também do seu modo de vida, a fábrica trouxe para o lugar a lógica do trabalho, o

tempo do relógio, que não estava presente no cotidiano da população, houve um

aumento no número de moradores, pois tivemos a vinda de muitos migrantes de

todas as regiões do país como também de estrangeiros.

A história de Perus tem grandes ligações com o processo de metropolização

da cidade de São Paulo, sofrendo no seu desenvolvimento as consequências de

todo esse processo histórico que a cidade vinha passando. A chegada das indústrias

e o aumento desenfreado da centralidade que São Paulo passou a exercer, fez com

que a mancha urbana se expandisse expulsando a população para as periferias que

estavam surgindo. Dentro desse processo, como já referido, Perus passou a ser

visto como um bairro periférico, em função de suas características econômicas e

socioespaciais.

Perus é um bairro que sofreu todas as transformações inerentes a Metrópole,

nele vemos as relações entre as populações sendo rompidas e degradadas dentro

da lógica capitalista que passou a imperar na cidade, o trabalho passou a ser a

única alternativa de sobrevivência nessa sociedade. Essas transformações fizeram

com que o conceito de bairro se perdesse diante do crescimento da cidade, já que

dentro do conceito de cidade o bairro aparece como o lugar da vida comunitária

havendo uma unidade das relações e da vida (BEZERRA, 2011). Mesmo os bairros

mantendo algumas características que eram anteriores a essas transformações pela

sua posição principalmente geográfica, ou seja, mais afastadas dos centros

principais e pela sua dependência com a cidade é difícil ele não ser inserido dentro

dessa lógica de reprodução da cidade.

Assim podemos enxergar Perus como sendo um bairro típico de periferia que

vai sofrer todas as consequências desse novo momento da cidade, sendo visto na

sua configuração atual como um bairro que sofre com uma exclusão socioespacial,

já que suas características demarcam essa posição. Hoje, a estação ferroviária

passa a ser o ponto que marca a centralidade do bairro, nos seus arredores estão os

principais pontos de meios de transportes e as ruas comerciais.

Essas transformações do bairro a partir da modernização de São Paulo

permite entender a sua atual configuração, onde percebemos que houve uma

Page 27: Perus e a transformação do Espaço na Metrópole Paulista · plano do indivíduo já que haverá uma transformação do espaço habitado, ... uma metamorfose com a chegada da Fábrica

27

expansão do mesmo, caracterizando assim o seu imenso crescimento. Com a

chegada das Rodovias Anhanguera e Bandeirantes, percebemos o aumento da

favelização, uma vez que a população que chegava, sendo na sua maioria de baixa

renda, passou a ocupar as margens das rodovias.

Houve no bairro uma precarização do espaço, nele há a possibilidade da

população que não possui outra oportunidade de moradia de se instalar em lugares

de forma irregular, não tendo nenhum tipo de infraestrutura. Perus sofreu na década

de 1990 um processo mais intenso de periferização com a chegada dos conjuntos

habitacionais COHAB e CDHU, esse processo resulta do crescimento metropolitano

que tanto expulsa população das áreas de valorização como atrai uma população

vinda do campo e também de pequenas cidades, que se instalam como podem na

metrópole e acabam se aglomerando nas enormes periferias.

FOTO 2: Conjunto habitacional CDHU, instalado na década de 1990 marcando um processo de

periferização de Perus.

Créditos: Natalia de Almeida

Com a chegada do rodoanel Mário Covas, houve uma pequena valorização

de algumas localidades do bairro, principalmente de casas que ficam próximas,

devido à facilidade que proporcionou de acesso ao centro da Metrópole. Houve, por

Page 28: Perus e a transformação do Espaço na Metrópole Paulista · plano do indivíduo já que haverá uma transformação do espaço habitado, ... uma metamorfose com a chegada da Fábrica

28

exemplo, a abertura de um loteamento para construção de casas de padrão

considerado de classe média nas margens do rodoanel, demonstrando com isso

uma valorização do lugar.

É necessário observar que mesmo com o seu crescimento e valorização de

alguns pontos, ele ainda possui características marcantes de periferia, apontando

baixos índices de desenvolvimento humano, uma população com traços bastante

humildes, falta de infraestrutura, hospitais, violência etc. Assim percebemos que a

modernização de São Paulo, apesar de num primeiro momento permitir que o bairro

tivesse uma importância econômico-industrial, permitiu também após a desativação

da Fábrica de Cimento Portland Perus em 1985, que o bairro sofresse como todas

as mazelas de uma periferia, sendo exemplo de um processo de segregação

socioespacial, característico desse novo momento da cidade.

4.2. A desintegração da vida de bairro

A concepção de bairro na geografia é revelada por suas articulações internas,

pelo que lhe dava unidade como lugar de trabalho, de moradia, de entretenimento e

trajetos vivenciados. O bairro aparece como ordem de proximidade marcada por

transitoriedade, que apesar dessa transitoriedade como fenômeno socioespacial, há

uma reprodução de estereótipos, em que tem lugar as ideologias de bairro

(SEABRA, 2003).

A modernização e a industrialização de São Paulo, a partir da década de

1950, trouxe para a cidade uma massa de trabalhadores atraídos pela possibilidade

de emprego, essa população não tendo oportunidades de habitação passou a

ocupar as áreas periféricas, pois são áreas desvalorizadas do ponto de vista

imobiliário. Nesse contexto da Metrópole, tanto as periferias como os bairros vão se

transformando, já que estamos vivendo um momento em que há uma passagem da

cidade para a forma de metrópole, estando esta intimamente ligada ao

desenvolvimento que tem como característica a produção capitalista.

Dessa forma, os bairros mesmo possuindo uma forma própria, além de

características bastante particulares, vão sendo englobados nessa nova lógica

apresentada pela cidade. A modernização provoca uma nova configuração no

Page 29: Perus e a transformação do Espaço na Metrópole Paulista · plano do indivíduo já que haverá uma transformação do espaço habitado, ... uma metamorfose com a chegada da Fábrica

29

espaço da cidade, há a sua fragmentação tendo como consequência a formação das

novas periferias e também a desintegração de antigos modos de vida,

principalmente nos bairros.

Perus é característico dessa transformação, onde num primeiro momento foi

visto como um lugar de pouso de tropas, possuindo um número pequeno de

moradores e tendo uma vida totalmente rural; num segundo momento, com a vinda

de Estrada de Ferro, houve a introdução de um aglomerado de casas ao redor da

ferrovia, caracterizando um povoado-estação; e com a chegada da fábrica as

transformações se tornam mais intensas introduzindo no bairro as formas urbanas,

que se contrapõem com as formas que antes eram na sua totalidade rurais, há então

a introdução de uma lógica e vida ligadas à Fábrica.

A inserção da fábrica traz para o bairro um modo de vida diferente, de

características urbanas, fragmentando a vida já que haverá uma distinção entre o

viver e o vivido, ou seja, um estranhamento para a população residente que já não

reconhece o bairro como o lugar das experiências cotidianas, da vivência deixando

de ser assim a sua referência de vida. Há então a introdução do cotidiano

programado, no qual ritmo de vida metropolitano passa a predominar, tendo uma

reconfiguração das relações de trabalho como também uma transformação do

tempo, que agora passa a ser visto como controlador dessa nova vida,

desintegrando assim a vida de bairro.

Quando tratamos da vida de bairro, nos remetemos a um modo de vida

pautado numa prática social específica, mostrando com isso certas singularidades, a

vida de bairro se caracteriza por uma vida de relações espontâneas, imediatas,

tendo a família e vizinhança como a base do bairro, mas que com a metropolização

foram desagregadas, permanecendo apenas no imaginário da população mais

antiga esse modo de vida. Dessa forma, a lógica do trabalho é introduzida no bairro,

passando a transformar a sua configuração sociespacial, uma vez que há uma forte

periferização do lugar, recebendo uma massa grande de trabalhadores que na sua

maioria é imigrante nordestino, que passa a viver em condições precárias, sem

nenhuma infraestrutura.

Com a industrialização e a formação da sociedade industrial, há uma

imposição das formas urbanas, as relações vão sendo rompidas como resposta da

Page 30: Perus e a transformação do Espaço na Metrópole Paulista · plano do indivíduo já que haverá uma transformação do espaço habitado, ... uma metamorfose com a chegada da Fábrica

30

reprodução do capital. Essa nova configuração da cidade faz com que o significado

do bairro, uma vez que suas características já não permanecem e, se permanecem,

ficam apenas na memória dos mais antigos. Dessa forma, percebemos que o bairro

também vai se perdendo dentro da metrópole, tornando apenas uma parte desta,

que agora está totalmente inserido na sua lógica.

A vida de bairro floresce e se desdobra a partir da industrialização, ou seja,

os bairros vão se integrando numa lógica cada vez mais complexa ao serem

reconfigurados por investimentos públicos e privados. A inserção do bairro na lógica

da metrópole faz com que este se torne um fragmento da mesma por não apresentar

mais as características pretéritas que faziam parte da vida de bairro, a

industrialização vai aprofundar a divisão do trabalho, o tempo e a vida vão sendo

funcionalmente articulados à reprodução social (SEABRA, 2003).

Os bairros mesmo marcando no seu interior uma dinâmica formada por

características que remetem ao passado, ou seja, características que são próprias

da sua história vão sendo incorporadas à lógica de reprodução da cidade, tendo com

isso um aprofundamento das desigualdades socioespaciais. Observando a

população de Perus, percebemos que há uma diferença na percepção de bairro

entre os moradores mais antigos e os migrantes, essa diferença foi constatada com

as entrevistas realizadas com essa população.

As entrevistas coletadas em campo mostram que a população mais antiga

ainda mantém uma relação forte com a vida de bairro, e guarda na lembrança as

características dessa época. A população mais jovem e os migrantes não

conseguem enxergar o lugar como bairro e sim como uma periferia, tendo como

referência aspectos ruins do lugar como a violência, tráfico de drogas, falta de

infraestrutura etc. São duas visões bastante distintas, mas que demostram que a

fragmentação não acontece apenas no espaço como também no plano do vivido.

Desse modo, a modernização caracterizada por um processo de

transformação e rupturas no seu interior tem como consequência a fragmentação,

gerando nos bairros um processo de desintegração, ou seja, os bairros que eram

tidos como o lugar da sociabilidade, da vida comunitária, da proximidade entre os

moradores vão tomando uma nova configuração e se perdendo dentro do contexto

da metrópole. Assim a metropolização reproduz os espaços, dando a eles novas

Page 31: Perus e a transformação do Espaço na Metrópole Paulista · plano do indivíduo já que haverá uma transformação do espaço habitado, ... uma metamorfose com a chegada da Fábrica

31

formas e novos usos suprimindo as relações antes estabelecidas, tendo como

principal objetivo a expansão do modo de desenvolvimento pautado na produção

capitalista.

A atual configuração de Perus demonstra essa reprodução de espaços

provocada pela intensa modernização da metrópole paulista, o lugar que antes era

visto como um povoado-estação se vê totalmente inserido na lógica da metrópole.

Perus se tornou uma zona típica de aglomeração de uma população mais carente, e

a sua configuração socioespacial demonstra bem esse momento, uma vez que é

visto uma forte presença de ocupações irregulares, um intenso processo de

favelização etc.

Nas periferias, como no caso de Perus, há resquícios de momentos históricos

que marcaram a formação do lugar, a Fábrica de Cimento e a Estrada de Ferro

ainda remetem a um momento em que a população possuía outro modo de vida. A

Fábrica, apesar de estar totalmente abandonada, provoca na população uma

procura por um resgate histórico devido, principalmente pela sua longa história de

luta. Essas são a rugosidades, em que num mesmo espaço vemos conviver vários

momentos históricos e uma refuncionalização dos mesmos.

Perus hoje está totalmente inserido na lógica da metrópole, não conseguimos

enxergar mais a vida de bairro de anos atrás, as referências passam a ser

diferentes, principalmente para a população mais recente. O tráfico e a violência

marcam o cotidiano do bairro, com mais intensidade nos lugares de ocupação mais

recente, pois são nessas localidades que temos a população mais carente. Houve

uma total ruptura das relações, não existe mais a vida comunitária, as pessoas

passaram a viver de forma mais individual, sem relações mais efetivas e um

enraizamento com o lugar.

Perus inserido nesse momento da metrópole perdeu todas as suas

características de bairro, houve uma intensa transformação da sua paisagem e uma

grande ruptura nas relações entre as pessoas. Hoje devido à intensa periferização, a

população vive com a falta de infraestrutura, saúde, segurança etc., é uma nova

forma de viver ligada muito mais com as necessidades da metrópole, deixando de

lado a sua história e vivência da população, restando apenas à memória dos mais

velhos como forma de resgate do seu processo de formação.

Page 32: Perus e a transformação do Espaço na Metrópole Paulista · plano do indivíduo já que haverá uma transformação do espaço habitado, ... uma metamorfose com a chegada da Fábrica

32

Considerações finais

A modernização da cidade de São Paulo pode ser entendida como a

reestruturação de processo materiais, ligados principalmente à introdução de

indústrias que permitiu uma transformação do espaço da cidade a partir desses

processos materiais, como também impôs uma nova forma de consumo para a

população. Assim podemos perceber que os fatores que levaram a essa

modernização também afetaram a vida social da população e suas relações,

marcando uma intensificação dessa lógica nas cidades.

São notadas transformações intensas nas cidades, culminando em um

processo já comentado de homogeneização, fragmentação e hierarquização dos

lugares da metrópole. Em São Paulo, o processo de metropolização teve grandes

proporções, fazendo com que bairros fossem totalmente modificados e inseridos

dentro dessa lógica. O novo modo de vida urbano introduzido pela metrópole causou

transformações gradativas nos bairros, fazendo com que eles fossem

desaparecendo, rompendo assim as relações e introduzindo novos referenciais.

Perus está inserido nesse processo e, a partir disso, houve grandes

transformações na sua paisagem, denotando no lugar uma nova configuração

socioespacial. Mesmo estando totalmente inseridas na lógica da metrópole as

periferias, como no caso de Perus, ainda guardam resquícios da sua história. Isso é

evidenciado, por exemplo, na paisagem com a presença da Fábrica de Cimento e da

Estrada de Ferro que remetem para a população a história do bairro. Mesmo com a

modernização, os bairros conseguiram acumular na paisagem características

pretéritas, que com o tempo foram engolidas pela metrópole, restando na paisagem

algo que se sobrepõe a todo processo histórico vivido pelo lugar, que são as

intensas desigualdades, resultado dessa nova forma de reprodução da cidade.

A vida de bairro é estabelecida a partir da vida imediata que é traduzida com

a prática social, pela disposição de caminhos, ruas, casas. Podemos reconhecer o

bairro e é esse conteúdo que o define. Em Perus vemos ser destruídas essas

características com a introdução da vida urbana, não há mais o reconhecimento com

o lugar, imperando agora o estranhamento por parte da população mais velha e a

Page 33: Perus e a transformação do Espaço na Metrópole Paulista · plano do indivíduo já que haverá uma transformação do espaço habitado, ... uma metamorfose com a chegada da Fábrica

33

sua fragmentação por parte de jovens e imigrantes, não possuindo mais o

referencial, já que o bairro agora se tornou apenas uma parte da metrópole.

A atual configuração do espaço em Perus demonstra uma grande

desigualdade socioespacial, característica das periferias nas grandes cidades. As

populações mais jovens enxergam o bairro de forma fragmentada, não fazendo

relação com o seu processo histórico. Há uma preocupação por parte de alguns

movimentos sociais no bairro em resgatar a memória da população, tentando inseri-

la de forma que possa se reconhecer dentro do bairro.

O presente trabalho tentou compreender todas essas transformações dentro

do bairro, além de analisar o seu atual papel na cidade como fragmento da mesma.

Hoje são as condições mais precárias que assolam a população do bairro, ou seja, o

reconhecimento de periferia já está bastante presente no imaginário da população,

assumindo como referências a violência, a falta de infraestrutura, a precariedade na

educação e na saúde. Esses fatores contribuem para a realidade local que se

estabelece a partir de uma “exclusão” social que se mostra como resultado do

processo de metropolização.

Dessa forma, Perus, como parte integrante do todo que é a metrópole,

constitui-se como uma periferia, demonstrando a intensa desigualdade e contradição

que são estabelecidas com a modernização da cidade. Os espaços desiguais

aparecem como uma condição para esse desenvolvimento, no qual é necessário

que exista uma massa de trabalhadores para atender as necessidades da produção

capitalista. E mesmo que no bairro existam permanências que tentam manter a sua

configuração de bairro, o processo de reprodução do capital acaba se apropriando

do lugar, excluindo os resquícios de sua história.

Page 34: Perus e a transformação do Espaço na Metrópole Paulista · plano do indivíduo já que haverá uma transformação do espaço habitado, ... uma metamorfose com a chegada da Fábrica

34

Referências Bibliográficas

Carlos, Ana Fani Alessandri; CARLOS, A. F. A. A metrópole de São Paulo no

contexto da urbanização contemporânea. Estudos Avançados, v. 23, p. 313-316,

2009.

DAMIANI, Amelia Luisa. Reflexões sobre uma urbanização crítica a partir da

metrópole de São Paulo. In: 8º Encuentro de Geógrafos de América Latina, 2001,

Santiago. 8º Encuentro de Geógrafos de América Latina, 2001. v. CDroom.

DAMIANI, Amelia Luisa. Urbanização Crítica e Produção do Espaço. Cidades

(Presidente Prudente), v. 6, p. 307-339, 2009.

KOWARICK, Lúcio. A Espoliação Urbana. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1993.

LANGENBUCH, Juergen R. A Estruturação da Grande São Paulo. Rio de Janeiro:

Fund. IBGE, 1971.

LEFEBVRE, HENRI. O Direito à Cidade. São Paulo: Editora Centauro, 2010.

LEFEBVRE, Henri. A vida cotidiana no mundo moderno. São Paulo: Ed.

Ática,1980.

LENCIONI, Sandra. Reconhecendo Metrópoles: território e sociedade. In: Catia

Antonia da Silva; Désirée Guichard Freire; Floriano Godinho de Oliveira. (Org.).

Metrópole: governo, sociedade e territóro. 1 ed. Rio de Janeiro: DP&A: Faperj, 2006,

v. 1, p. 41-58

MARICATO, Ermina (org.). A Produção Capitalista da Casa (e da Cidade). São

Paulo: Alfa - Omega, 1982.

PRADO JR, Caio. A cidade de São Paulo geografia e história. São Paulo: Editora

Brasiliense, 1989.

SANTOS, Milton. Metrópole Corporativa Fragmentada. São Paulo, Editora: Edusp,

2009.

SEABRA, Odette Carvalho de Lima, Urbanização e Fragmentação: Cotidiano e

vida de bairro na metamorfose da cidade em metrópole, a partir das

transformações do Bairro do Limão. Tese de Livre Docência, Depto. Geografia,

FFLCH-USP, 2003.

SEABRA, Odette Carvalho de Lima, Metropolização: A Reprodução do Urbano na

Crise da Sociedade do Trabalho. Cidades (Presidente Prudente), v. 6 n.10, p. 415-

434, 2010.

SIQUEIRA, Elcio. Companhia de Cimento Portland Perus: contribuição para a

história da indústria pioneira do ramo do Brasil (1926-1987). Araraquara, Dissert.

Mestrado – Unesp, 2001.

Page 35: Perus e a transformação do Espaço na Metrópole Paulista · plano do indivíduo já que haverá uma transformação do espaço habitado, ... uma metamorfose com a chegada da Fábrica

35

SUZUKI, Julio Cesar, Metamorfoses da expansão urbana na gênese da moderna

cidade de São Paulo. In: Ariovaldo Umbelino de Oliveira; Ana Fani Alessandri

Carlos. (Org.). Geografias de São Paulo. 1 ed. São Paulo: Contexto, 2004, v. 1, p.

131-156.

Page 36: Perus e a transformação do Espaço na Metrópole Paulista · plano do indivíduo já que haverá uma transformação do espaço habitado, ... uma metamorfose com a chegada da Fábrica

36