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Série SÉRIE AULA NOTA 10 – TÉCNICAS DE DOUG LEMOV Fabio Venturini “Q uestionar é a arte de sequenciar perguntas. O questionamento em sequência é, portanto, a construção de degraus”. Essa é a principal pro- posta de Doug Lemov, autor do livro Aula nota 10 – 49 técnicas para se tor- nar um professor campeão de audiên- cia, para possibilitar que as pergun- tas e respostas produzidas em aula favoreçam o pensamento crítico. As seis técnicas que consti- tuem o capítulo 9 do livro (veja o quadro com as práticas), intitulado “Estimular os alunos a pensar cri- ticamente – Técnicas adicionais pa- PERGUNTAS QUE AJUDAM A PENSAR Capítulo 9 da obra de Doug Lemov apresenta práticas para o professor estimular os alunos a pensar criticamente ra fazer perguntas e responder aos alunos”, concentram-se na maneira em que o professor pode formular questões para que, além de auxi- liar na correção de erros e verificar o aprendizado, possa também gerar a compreensão e o domínio de no- vas e complexas ideias, assim como deixar para os alunos a maior parte do raciocínio. Para tanto, o docente deve di- vidir o objetivo principal em diver- sas etapas. Ou seja: quanto maior a meta, maior o número de degraus. Para Luciano Castro, diretor de en- sino e professor de Matemática Arquivo pessoal Luciano Castro: “Os bons professores brasileiros são mais acostumados a tra- balhar o pensamento crítico” 22 PROFISSÃO MESTRE ® dezembro 2011

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22 PROFISSÃO MESTRE® dezembro 2011

SérieSÉRIE AULA NOTA 10 – TÉCNICAS DE DOUG LEMOV Fabio Venturini

“Q uestionar é a arte de

sequenciar perguntas.

O questionamento em

sequência é, portanto, a construção

de degraus”. Essa é a principal pro-

posta de Doug Lemov, autor do livro

Aula nota 10 – 49 técnicas para se tor-

nar um professor campeão de audiên-

cia, para possibilitar que as pergun-

tas e respostas produzidas em aula

favoreçam o pensamento crítico.

As seis técnicas que consti-

tuem o capítulo 9 do livro (veja o

quadro com as práticas), intitulado

“Estimular os alunos a pensar cri-

ticamente – Técnicas adicionais pa-

PERGUNTAS QUE AJUDAM A PENSARCapítulo 9 da obra de Doug Lemov apresenta práticas para o professor estimular os alunos a pensar criticamente

ra fazer perguntas e responder aos

alunos”, concentram-se na maneira

em que o professor pode formular

questões para que, além de auxi-

liar na correção de erros e verificar

o aprendizado, possa também gerar

a compreensão e o domínio de no-

vas e complexas ideias, assim como

deixar para os alunos a maior parte

do raciocínio.

Para tanto, o docente deve di-

vidir o objetivo principal em diver-

sas etapas. Ou seja: quanto maior a

meta, maior o número de degraus.

Para Luciano Castro, diretor de en-

sino e professor de Matemática

Arquivo pessoal

Luciano Castro: “Os bons professores brasileiros são mais acostumados a tra-balhar o pensamento crítico”

22 PROFISSÃO MESTRE® dezembro 2011

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PROFISSÃO MESTRE® dezembro 2011 23

Resumo das técnicas para estimular o pensamento crítico

Eu testei

23

do Sistema Elite Rio (com diver-

sas unidades na cidade do Rio de

Janeiro), as propostas desse capítu-

lo não chegam a ser algo inovador,

uma vez que se tratam de uma re-

visão das técnicas propostas ante-

riormente. “Estimular o pensamen-

to crítico é justamente o ponto forte

dos bons professores brasileiros, o

que não é tão comum nos Estados

Unidos. Esse é um aspecto impor-

tante a se considerar antes de apli-

car as técnicas de Doug Lemov”,

avalia.

Na parte de questionamentos,

o diretor acredita que a propos-

ta é mais pertinente para promo-

ver a compreensão das perguntas, o

que também é essencial. A técnica

“Uma de Cada Vez”, por exemplo,

mesmo que seja usada naturalmen-

te pelos bons docentes, é funda-

mental para ajudar o aluno a evitar

confusão e saber o que deve respon-

Cada Vez” – Quando o docente tiver uma se-quência de perguntas para a turma, deve fa-zer uma por vez para facilitar a compreensão e o desenvolvimento das ideias dos alunos. Também ajuda o professor a se concentrar em questionamentos com propósitos mais claros.

“Do Simples ao Complexo” – Consiste em elaborar perguntas que demandem para res-ponder um raciocínio conciso e concreto, num primeiro momento. Apenas em seguida se de-ve pedir que os alunos pensem de forma mais complexa, com profundidade e amplitude.

“Ipsis Litteris” – Quando o professor elabo-ra uma pergunta e aguarda voluntários para a resposta é normal refazer o questionamento. Nesse caso, a questão deve ser dita exatamen-te da mesma forma, com as mesmas palavras. Reformulá-la pode confundir quem vai respon-der, como se fosse dada outra demanda.

“Claro e Conciso” – Cinco detalhes para au-mentar a clareza das perguntas: começar com um pronome interrogativo, limitar a pergunta a duas frases, escrever as perguntas mais im-portantes e fazer questionamentos reais, di-retamente aos alunos.

“Estoque de Perguntas” – Pensar em vá-rias versões das mesmas perguntas e aplicá--las a diferentes panoramas de acordo com os objetivos da aula, de modo que o profes-sor sempre terá questionamentos a fazer ra-pidamente. Reduz a demanda intelectual no ato de perguntar e aumenta a praticidade.

“Taxa de Acerto” – Se os alunos acertam 100% das perguntas, a menos que seja em uma revisão de conteúdo, isso pode significar que devem ser feitos questionamentos mais difíceis. Por outro lado, acertos abaixo dos 70% são um sinal de que o docente precisa rever a forma como está ensinando.

Arquivo pessoal

“Tive contato com o livro nos debates de HTPC [Hora de Trabalho Pedagógico Coletivo], apresentado pela Secretaria Municipal de Educação em mar-ço de 2011. Comecei a usar al-gumas técnicas, mas muitas delas eu já praticava. É o caso de ‘Certo é Certo’ e ‘Puxe Mais’ [ambas do capítulo 1], bastan-te adequadas à necessidade das minhas aulas de Língua Portuguesa para que o aluno se expresse bem.

A grande contribuição é que os procedimentos passaram a ter nomes e foram aprimora-dos. Na parte de literatura e poesia, por exemplo, como o intuito é estimular a criativida-de do aluno, as práticas apri-moradas vieram de encontro ao trabalho que já vinha sen-do feito. Senti uma boa dife-rença logo no início com ‘Sem Escapatória’ [capítulo 1], que aumentou a participação e o interesse dos alunos.

O capítulo 9 é praticamen-te uma revisão de várias téc-nicas para conseguir mais ren-dimento dos alunos. ‘Uma de Cada Vez’ mostra como de-ve ser a forma de questionar sem confundir os alunos. A pe-sagem do trabalho cognitivo é gradativa para facilitar a com-preensão e a apreensão. ‘Do Simples ao Complexo’ é algo que eu já realizava, pois, para mim, o processo de aprendiza-gem é naturalmente dessa ma-neira. Essa proposta também é muito parecida com a técni-ca ‘Puxe Mais’ [capítulo 1], se-

melhante ao que acontece com ‘Taxa de Acerto’.”

Também era prática mi-nha a técnica “Claro e Conciso”. Essa proposta é importante em qualquer disciplina, mas em Língua Portuguesa o cuida-do com enunciados que sejam compreendidos pelos alunos é premissa. Deve-se prezar pa-ra que as perguntas não sejam mal elaboradas, evitando que se crie confusão. As respostas obtidas devem ser lógicas e a pergunta interfere nisso.

Uso “Estoque de Perguntas” de acordo com a aula e o tema. Costumo ser objetiva e otimizar o tempo. Uso essa técnica so-mente quando não comprome-te o período reservado para outras atividades. Não empre-guei “Ipsis Litteris” porque sou um pouco agitada e falo muito rápido, sempre volto e explico um pouco mais.

Eliane Reis Gomes é pedagoga e professora de Língua Portuguesa em turmas de 8º e 9º anos na Escola Municipal de Ensino Fundamental Francisco Álvares Florêncio, de Novo Horizonte (SP).

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SérieO teste da reportagem

O repórter Fabio Venturini, também histo-riador e professor universitário na área de Comunicação Social, testou as técnicas pa-ra esta reportagem durante o 1º semestre de 2011, com uma turma de 5º período de Jornalismo no Centro Universitário Estácio Radial, de São Paulo (SP).

O que achou desta reportagem? Mande elogios, críticas e sugestões para [email protected]

Na próxima edição, técnicas para esti-mular os alunos a pensar criticamente

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ex-diretor de uma escola em Nova

York que também foi observada por

Lemov no seu trabalho e onde o li-

vro é usado como base para trei-

namento de professores. Com um

exemplar da edição em inglês que

ganhou de presente, Castro implan-

tou um projeto-piloto para o uso

das técnicas no Sistema Elite Rio,

com professores de uma turma in-

disciplinada. “Não foi um paraíso.

Alguns docentes continuaram com

problemas, mas pelo menos qua-

tro relataram melhoras significati-

vas”, conta. A ênfase ao manejo de

sala de aula foi auxiliada pela de-

monstração das técnicas. Além dis-

so, durante os treinamentos desse

grupo, foi usado o DVD que acom-

panha a edição estadunidense do

livro, na qual Lemov apresenta al-

guns exemplos gravados ao longo

dos cinco anos de observação.

Embora estimular o pensamen-to crítico também seja a propos-ta das técnicas do capítulo 9, elas aparentam ser uma tentativa do autor de “corrigir” eventuais postu-ras automatizadas do docente na adoção de um conjunto de técni-cas que, na prática, podem privi-legiar o manejo da sala de aula e a correção de comportamentos. A maior contribuição foi na forma de elaborar as perguntas.

Como o docente também é jor-nalista, as questões eram feitas habitualmente, de modo seme-lhante a entrevistas, em séries. A técnica “Uma de Cada Vez” foi bas-tante útil para melhorar esse pro-cedimento e tornar as perguntas mais adequadas a relações tão específicas que são as de ensino e aprendizagem.

A técnica “Do Simples ao Complexo” é viável em algumas situações em que os tópicos são mais densos, mas já era contem-plada em “Divida em Partes” (ca-pítulo 2). “Ipsis Litteris”, por outro lado, é uma sugestão bastante in-teressante, pois somente após ler a técnica o professor percebeu que reformulações das perguntas ge-ram confusões.

“Taxa de Acerto” contribuiu mais na avaliação da aprendiza-gem do que no estímulo ao pen-samento crítico. “Claro e Conciso” e “Estoque de Perguntas” já eram práticas do docente.

Na próxima edição, técnicas e ha-bilidades fundamentais para tirar o máximo da leitura

Doug Lemov dedica a segunda parte do livro a técnicas para que os professores tirem dos alunos o máximo rendimento de leitura. São três capítulos com dinâmica diferen-te de todo o restante da obra, que se dedicam a controlar as ativida-des de leitura (capítulo 10), a pra-ticar e desenvolver habilidades de decodificação, enriquecimento de vocabulário e fluência (capítulo 11) e a ensinar os alunos a compreen-derem o que leem (capítulo 12).

der. “É uma questão de foco, de sa-

ber o que se quer fazer antes de ini-

ciar. É óbvio, mas nem todo mundo

faz”, completa.

Embora o autor sugira uma

construção paulatina, Castro acre-

dita que são necessários cuidados

com cada situação, como na técni-

ca “Do Simples ao Complexo”. Em

Matemática, por exemplo, uma per-

gunta simples pode levar a respos-

tas que demandem raciocínios bas-

tante complicados. “Com alunos

avançados, o mais adequado é jus-

tamente o contrário.”

Algumas técnicas são conside-

radas bastante interessantes, como

“Claro e Conciso”, que pode ser com-

pletada com o uso correto da fala em

norma culta. “Sempre insisto com

os professores, especialmente com

os mais jovens, para incluírem o uso

formal da Língua Portuguesa, para

que, além da compreensão das per-

guntas, os alunos também se habi-

tuem a usar a correção que será co-

brada deles fora da escola”, explica.

A prática “Taxa de acerto” é con-

siderada uma revisão tratada em

técnicas de desempenho acadêmi-

co (do capítulo 2 de Lemov) e estru-

turação de aulas (capítulo 3), com

auxílio na avaliação constante da

compreensão dos alunos e adapta-

ção das aulas, enquanto a técnica

“Ipsis Litteris” pode mostrar firme-

za e convicção do professor, além de

enviar ao aluno a mensagem de que

confia na sua capacidade de enten-

der e responder. Já “Estoque de per-

guntas”, para Castro, não pareceu

um conceito muito útil, pois está li-

gada ao conhecimento e à transmis-

são do conteúdo a ser apresentado.

“A sequência de perguntas flui a

partir desse domínio”, acredita.

Castro teve contato com a obra

Aula nota 10 em abril de 2011, após

uma visita do professor Ky Adderly,

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