peirce - a fixação das crenças (1972)

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A FIXAÇÃO DAS CRENÇAS PEIRCE, Charles Sanders, 1839-1914. Semiótica e filosofia; introdução Sseleção e tradução de Octanny Silveira da Mota e Leonidas Hegenberg. São Paulo, Cultrix, Editora da Universidade de São Paulo, 1975. 164 p. Coletânea de textos extraídos de "Collected papers of Charles Sanders Peirce", em vários volumes, edições e datas diversas. Popular Science Monthly 12 (November 1877), 1-15. Poucas pessoas se preocupam com estudar lógica, pois todas se julgam suficientemente conhecedoras da arte de raciocinar. Observo, porém, que tal suficiência só é reconhecida em relação à própria inteligência, não se estendendo à dos demais homens. A capacidade de traçar inferências é a última das faculdades sobre que adquirimos amplo domínio; é menos um dom natural do que arte de aprendizado longo e difícil. A história da prática dessa arte constituiria ótimo assunto para um livro. Os educadores medievais, acompanhando os romanos, faziam com que a lógica fosse a primeira disciplina a ser estudada após a gramática e tinham por muito fácil esse estudo. E, tal como o entendiam, de fato o era. O princípio lógico fundamental, segundo aqueles educadores, era o de que todo conhecimento há de apoiar-se na autoridade ou na razão e tudo quanto seja deduzido pela razão depende, em última análise, de uma premissa decorrente da autoridade. Nesses termos, tão logo o menino alcançava perfeição no processo silogístico, entendia-se completo seu equipamento intelectual. Aos olhos de Roger Bacon, espírito notável que, em meados do século XIII, era quase um cientista, a concepção de raciocínio que tinham aqueles educadores só aparecia como um obstáculo à conquista da verdade. Insistiu ele em que só a experiência ensina — proposição que nos parece fácil entender porque gerações pretéritas nos transmitiram clara concepção de experiência e que a ele também parecia inteiramente clara porque as dificuldades que encerra não se haviam, ainda, patenteado. Dentre todas as formas de experiência, a que mais perfeita lhe parecia era a da iluminação interior que ensina, a respeito da Natureza, múltiplas coisas — como a transubstanciação do pão, por exemplo — que os sentidos externos jamais poderiam descobrir. ----- Página 71 ----- Quatro séculos depois, um Bacon mais famoso, no primeiro livro de seu Nevum Organum, ofereceu claro conceito de experiência, dando-a como algo que deve abrir-se à verificação e ao reexame. Contudo, por mais satisfatória que se mostre a concepção de Lord Bacon em relação a noções anteriores, o leitor moderno que não se deixe intimidar por sua grandiloqüência sentir-se-á, antes de tudo, chocado pelo insatisfatório de sua visão do processo científico. Dizer que basta fazermos alguns experimentos elementares, registrar os resultados, examinar sistematicamente esses resultados, rejeitar tudo quanto não seja provado, anotar as alternativas para, dentro de poucos anos, estar a ciência física inteiramente elaborada — que idéia! Sem dúvida, "ele escreveu a propósito de ciência à maneira de um Lord Chanceler", tal como observou Harvey, cientista genuíno. Os primeiros cientistas, Copérnico, Ticho Brahe, Kepler, Galileu, Harvey e Gilbert usavam métodos semelhantes aos de seus modernos confrades. Kepler propôs-se a traçar uma curva que unisse os pontos ocupados pelo planeta Marte e a determinar os períodos de tempo gastos por esse planeta para percorrer as diferentes porções dessa curva; não obstante, o maior serviço que prestou

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Page 1: Peirce - A fixação das crenças (1972)

A FIXAÇÃO DAS CRENÇAS

PEIRCE, Charles Sanders, 1839-1914.Semiótica e filosofia; introduçãoSseleção e tradução de Octanny Silveira da Mota e Leonidas Hegenberg. São Paulo, Cultrix, Editora da Universidade de São Paulo, 1975. 164 p.Coletânea de textos extraídos de "Collected papers of Charles Sanders Peirce", em vários volumes, edições e datas diversas.

Popular Science Monthly 12 (November 1877), 1-15.

Poucas pessoas se preocupam com estudar lógica, pois todas se julgam suficientemente conhecedoras da arte de raciocinar. Observo, porém, que tal suficiência só é reconhecida em relação à própria inteligência, não se estendendo à dos demais homens.

A capacidade de traçar inferências é a última das faculdades sobre que adquirimos amplo domínio; é menos um dom natural do que arte de aprendizado longo e difícil. A história da prática dessa arte constituiria ótimo assunto para um livro. Os educadores medievais, acompanhando os romanos, faziam com que a lógica fosse a primeira disciplina a ser estudada após a gramática e tinham por muito fácil esse estudo. E, tal como o entendiam, de fato o era. O princípio lógico fundamental, segundo aqueles educadores, era o de que todo conhecimento há de apoiar-se na autoridade ou na razão e tudo quanto seja deduzido pela razão depende, em última análise, de uma premissa decorrente da autoridade. Nesses termos, tão logo o menino alcan çava perfeição no processo silogístico, entendia-se completo seu equipamento intelectual.

Aos olhos de Roger Bacon, espírito notável que, em meados do século XIII, era quase um cientista, a concepção de raciocínio que tinham aqueles educadores só aparecia como um obstáculo à conquista da verdade. Insistiu ele em que só a experi ência ensina — proposição que nos parece fácil entender porque gerações pretéritas nos transmitiram clara concepção de experiência e que a ele também parecia inteiramente clara porque as dificuldades que encerra não se haviam, ainda, patenteado. Dentre todas as formas de experiência, a que mais perfeita lhe pare cia era a da iluminação interior que ensina, a respeito da Natu reza, múltiplas coisas — como a transubstanciação do pão, por exemplo — que os sentidos externos jamais poderiam descobrir.

----- Página 71 -----

Quatro séculos depois, um Bacon mais famoso, no primei ro livro de seu Nevum Organum, ofereceu claro conceito de experiência, dando-a como algo que deve abrir-se à verificação e ao reexame. Contudo, por mais satisfatória que se mostre a concepção de Lord Bacon em relação a noções anteriores, o leitor moderno que não se deixe intimidar por sua grandiloqüência sentir-se-á, antes de tudo, chocado pelo insatisfatório de sua visão do processo científico. Dizer que basta fazermos alguns experimentos elementares, registrar os resultados, examinar sistematicamente esses resultados, rejeitar tudo quanto não seja provado, anotar as alternativas para, dentro de poucos anos, estar a ciência física inteiramente elaborada — que idéia! Sem dúvida, "ele escreveu a propósito de ciência à maneira de um Lord Chanceler", tal como observou Harvey, cientista genuíno.

Os primeiros cientistas, Copérnico, Ticho Brahe, Kepler, Galileu, Harvey e Gilbert usavam métodos semelhantes aos de seus modernos confrades. Kepler propôs-se a traçar uma curva que unisse os pontos ocupados pelo planeta Marte e a determi nar os períodos de tempo gastos por esse planeta para percorrer as diferentes porções dessa curva; não obstante, o maior serviço que prestou

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à ciência foi o de imprimir na mente humana a convicção de que assim se devia proceder, se o objetivo era o de fazer avançar astronomia; a convicção de que os homens não poderiam contentar-se com debater a excelência de um sis tema de epiciclos em relação a outro, mas deveriam ater-se aos números e descobrir qual, em verdade, o traçado da curva. Alcançou essa meta graças a energia e coragem incomparáveis, vagando de maneira (para nós) incompreensível de uma para outra hipótese irracional até que — depois de haver examinado vinte e duas dessas hipóteses — encontrou, por mera exaustão da capacidade inventiva, a órbita pela qual um espírito bem aparelhado dos recursos da lógica moderna teria, quase de início, optado. 1

De maneira semelhante, todo trabalho científico suficientemente significativo para ser lembrado por umas poucas gerações oferece exemplo do imperfeito estágio da arte de raciocinar do tempo em que foi escrito; e todo avanço importante no campo da ciência tem correspondido a uma lição de lógica. Assim ocorreu quando Lavoisier e seus contemporâneos se entregaram ao estudo da química. A máxima dos químicos antigos havia sido

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"Lege, lege, lege, labora, ora et relege". O método de Lavoisier não era o de ler e rezar, mas o de imaginar que determinado processo químico, longo e complexo, teria certo efeito, passando a experimentá-lo com obstinada paciência; e, após a falha inevitável, imaginar que algumas alterações trariam outro resultado, terminando por dar a público o último sonho como se fosse um fato: sua maneira de proceder consistia em levar o espírito ao laboratório e, literalmente, transformar alambiques e retortas em instrumentos de reflexão, fazendo emergir uma nova concepção de raciocínio em termos de algo que deve desenvolver-se estando os olhos abertos, como manipulação de coisas reais em vez de manipulação de palavras e fantasias.

A controvérsia a propósito da teoria de Darwin é, em gran de parte, um problema de lógica. Darwin propôs-se a aplicar o método estatístico à biologia. O mesmo se fez com relação a um muito diferente ramo da ciência, a teoria dos gases. Em bora incapazes de antecipar quais seriam, de acordo com certa hipótese relativa à constituição dessa classe de corpos, os movimentos de uma particular molécula de gás, Clausius e Maxwell tinham, entretanto, oito anos antes da publicação da imortal obra de Darwin, meio de predizer, pela aplicação da doutrina das probabilidades, que, a longo alcance, tal e tal proporção de molé culas atingiria, sob certas condições, tais e tais velocidades; que ocorreria, a cada segundo, tal e tal número relativo de colisões, etc.; e, a partir dessas proposições, tinham como deduzir certas propriedades dos gases, especialmente no que diz respeito a suas relações-calor. Analogamente, Darwin, embora incapaz de apontar, frente a um caso individual, qual a operação de mutação e seleção natural a ter lugar, demonstra que, a longo prazo, essas operações adaptarão ou adaptariam o animal ao respectivo ambi ente. Se as formas animais existentes resultaram de uma ação dessa ordem ou que posição deveria a teoria assumir constituem o tema de um debate onde questões de fato e questões de lógica se entrelaçam curiosamente.

O objetivo do raciocinar é descobrir, a partir da considera ção do que já sabemos, algo que não sabemos. Em conseqüência, o raciocínio será procedente se for levado a efeito de tal forma que nos conduza de premissas verdadeiras à conclusão verdadeira, afastadas outras possibilidades. Assim, o problema da validade é puramente fatual e não intelectual. Indicando por A os fatos

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enunciados nas premissas e por B o que se concluiu, o problema consiste em saber se os fatos estão efetivamente relacionados de forma tal que, ocorrendo A, geralmente ocorrerá B. Se assim se der, será válida a inferência; caso contrário, não. Está inteiramente fora de causa o problema de saber se, aceitando as premissas, o espírito sente inclinação por também aceitar a conclusão. É certo que, em geral, raciocinamos corretamente por força da própria natureza. Isso é, porém,

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acidental; a conclusão verdadeira continuaria a ser verdadeira, ainda que não nos sentíssemos inclinados a aceitá-la; e a conclusão falsa permaneceria falsa, ainda que não pudéssemos resistir à tendência de nela acreditar.

Somos, sem dúvida, dominantemente animais lógicos, mas não o somos de maneira perfeita. A maioria de nós, por exemplo, é mais confiante e esperançosa do que a lógica justificaria. Somos, aparentemente, constituídos de maneira tal que nos sentimos contentes e felizes na ausência de fatos com que tropeçar, como se o efeito da experiência fora o de continuamente escolher nossos desejos e expectativas. E a aplicação desse corretivo pela extensão de uma vida inteira não destrói, em geral, nosso ânimo esperançado. Quando a esperança não repousa na experiência, cabe ter o otimismo por esdrúxulo. Ser lógico em relação a questões práticas (entendendo a expressão não em seu vetusto sentido, mas como correspondente a sábia união da segurança com o proveito do raciocínio) é o dom mais útil que um animal pode possuir e caberia, pois, aceitar que decorresse do processo de seleção natural. Contudo, desconsideradas aquelas ques tões, seria provavelmente mais vantajoso para o animal ter o espírito ocupado por visões agradáveis e estimulantes, independentemente de serem elas verdadeiras; e, assim, a propósito de questões não-práticas, a seleção natural poderia dar margem a uma falaciosa inclinação de pensamento.

O que nos leva a, dadas certas premissas, retirar esta ou aquela inferência é uma tendência de espírito, seja ela constitucional ou adquirida. A tendência será adequada ou não con forme conduza ou não a conclusões verdadeiras a partir de premissas verdadeiras; e uma inferência é tida por válida ou não independentemente de referência à verdade ou falsidade da conclusão a que leva e apenas considerando ser a tendência que determina essa conclusão tal que, em geral, conduz ou não

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a conclusões verdadeiras. A especial tendência de espírito que disci plina esta ou aquela inferência pode ser formulada através de uma proposição cuja verdade depende da validade das inferências que a tendência determina; tal fórmula é denominada, princípio orientador da inferência. Suponhamos observar, por exemplo, que um disco giratório de cobre se detém rapidamente quando colocado entre os pólos de um ímã e suponhamos daí inferir que assim acontecerá com todos os discos de cobre. O princípio orientador é o de que o verdadeiro para uma porção de cobre é também verdadeiro para outra. Tal princípio orientador se aplica ao cobre com segurança muito maior do que a muitas outras substâncias — o bronze, por exemplo.

Poder-se-ia escrever um livro para apontar todos os mais importantes princípios orientadores do raciocínio. Esse livro, devemos confessá-lo, provavelmente não teria qualquer utilidade para uma pessoa cujo pensamento se preocupe exclusivamente com questões práticas e cuja atividade se desenvolva ao longo de caminhos inteiramente explorados. Os problemas que se apresentam a um espírito desse jaez são questões de rotina que ele, ao aprender seu ofício, aprendeu, uma vez por todas, a dominar. Permitamos, entretanto, que um homem se aventure por campo desconhecido ou por setor onde os resultados não recebam a contínua confirmação da experiência e veremos que o mais viril dos intelectos se desorientará com freqüência e seus esforços se dissiparão por trilhas que não o aproximam do objetivo ou que o levam a perder-se por completo. O homem figurado se assemelhará a um navio em mar alto e sem contar com tripulante que domine as regras de navegação. Em tais condições, seria, certamente, útil algum estudo dos princípios orientadores do raciocínio.

Do assunto, entretanto, dificilmente poderei tratar sem, pri meiro, delimitá-lo, pois quase todos os fatos podem atuar como princípio orientador. Ocorre, porém, que os fatos são suscetí veis de divisão tal que numa classe se colocam todos os absolutamente essenciais como princípios orientadores e a outras classes pertencem todos os que, como objetos de pesquisa, se revestem de um outro interesse qualquer. Essa divisão separa os fatos que são necessariamente admitidos quando indagamos por que se pensa que certa conclusão deflui de certas premissas, pondo tais fatos à parte dos que não estão envolvidos naquela

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indagação. Um momento de reflexão mostrará que muitos fatos estão já presumidos quando se formula a indagação lógica. Está implícito, por exemplo, que existem estados de espírito como o de dúvida e o de crença — e que, permanecendo o mesmo o ob jeto de pensamento, é possível a passagem de um desses estados para o outro, estando a transição sujeita a certas regras a que todos os espíritos se prendem. Como devemos conhecer fatos dessa ordem antes de conseguirmos conceito claro acerca do que seja raciocínio, não cabe supor de muito interesse continuar a perquirir de sua verdade ou falsidade. De outra parte, é fácil crer que as regras de raciocínio deduzidas da própria idéia do processo são as de caráter essencial e que, pelo menos enquanto se afeiçoe a tais regras, o raciocínio não será conduzido a falsas conclusões a partir de premissas verdadeiras. Com efeito, a importância do que pode ser deduzido a partir de presunções presentes na indagação lógica mostra-se mais importante do que se poderia supor, devido a razões que seria, de pronto, difícil alinhar. Uma única dessas razões será aqui mencionada: as concepções que são efetivamente produtos de reflexão lógica — sem serem prontamente reconhecidas como tais entremeiam-se a nossos pensamentos comuns e constituem, com freqüência, motivo de grande confusão. É o que se dá, por exemplo, com o conceito de qualidade. Uma qualidade, como tal, nunca é objeto de observação. Olhando, vemos que uma coisa é azul ou verde, mas a qualidade de ser azul e a qualidade de ser verde não são coisas que possamos ver; são produtos de reflexões lógicas. A verdade é que o senso comum, ou o pensamento, tal como aflora acima do nível do estritamente prático, está profundamente penetrado daquela qualidade lógica a que o epíteto metafísico freqüentemente se aplica; e nada pode esclarecer esse ponto a não ser intenso curso de lógica.

De modo geral, sabemos quando é de nosso desejo formu lar uma pergunta ou formular um juízo, pois há diferença entre a sensação de duvidar e a de crer.

Aí não está, porém, tudo que distingue a dúvida da crença. Há uma diferença prática. Nossas crenças orientam nossos desejos e dão contorno a nossas ações. Os Assassinos, ou sequazes do Velho da Montanha precipitavam-se para a morte à sua mais leve palavra de ordem, pois acreditavam que dar-lhe obediência asseguraria a felicidade eterna. Duvidassem, e não teriam agido

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como agiram. Assim ocorre com toda crença, na dependência do grau de que se revista. O sentimento de crença é indicação mais ou menos segura de se ter estabelecido em nossa natureza uma tendência que determinará nossas ações. A dúvida nunca se acompanha de tal efeito.

Não devemos esquecer um terceiro ponto de distinção. A dúvida é um estado desagradável e incômodo, de que lutamos por libertar-nos e passar ao estado de crena; este é um estado de tranqüilidade e satisfação que não desejamos evitar ou trans formar na crença em algo diverso. Pelo contrário, apegamo-nos tenazmente não apenas a crer, mas a crer no que cremos.

Desse modo, tanto a dúvida como a crença têm sobre nós efeitos positivos, embora muito diversos. A crença não nos leva a agir de imediato, mas nos coloca em situação tal que, chegada a ocasião, nos comportaremos de certa maneira. A dúvida não tem, absolutamente, esse efeito ativo, mas estimula-nos a indagar até vê-la destruída. Essa observação nos traz à lembrança um nervo estimulado a ação reflexa a que isso conduz; por analogia com o que se passa no campo da crença, devemos buscar, no sistema nervoso, as chamadas associações nervosas — por exemplo, aquela tendência dos nervos em conseqüência da qual o odor de um pêssego provoca salivação.

O estímulo da dúvida leva a esforço por atingir um estado de crença. A esse esforço denominamos Investigação, embora eu deva admitir que, por vezes, tal designação não se mostra muito adequada. O estímulo da dúvida é o único motivo imediato do esforço por chegar à crença. É certamente convenientíssimo serem nossas crenças tais que nos orientem devidamente as ações, de sorte a satisfazermos nossos desejos; e essa reflexão nos levará a rejeitar toda crença que não pareça ter-se estruturado de forma a assegurar esse resultado. Isso só ocorrerá,

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entretanto, se uma dúvida substituir aquela crença. Com a dúvida, o esforço co meça e tem fim quando cessa a dúvida. Conseqüentemente, a investigação tem por objetivo único o acordo de opiniões. Podemos pretender que isso não nos basta e que buscamos não apenas uma opinião, mas uma opinião verdadeira. Exponhamos, porém, essa pretensão à prova e ela se revelará sem fundamento, pois, tão logo alcançamos uma crença firme, sentimo-nos

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satisfeitos por completo, seja essa crença verdadeira ou falsa. E, claro está, nada que se mantenha alheio a nossa esfera de conhecimento pode constituir-se, para nós, em objeto, pois só, o que afeta o espírito é suscetível de ver-se transformado em mo tivo e esforço mental. Podemos, no máximo, sustentar que buscamos uma crença que julguemos verdadeira. Julgamos, contudo, que é verdadeira cada uma de nossas crenças e, assim, a afirmação é mera tautologia.

Que o acordo de opiniões seja o único objetivo da investigação constitui proposição muito importante. Afasta, de imediato, diversas concepções vagas e errôneas do que seja prova. Algumas dessas concepções cabe aqui mencionar.

1. Certos filósofos imaginaram que, para começo de uma investigação, bastaria colocar, por escrito ou oralmente, uma indagação, e chegaram a recomendar que iniciássemos nossos estudos questionando tudo. Entretanto, o simples colocar uma proposição em forma interrogativa não estimula o espírito a correr empós da crença. Deve existir uma dúvida viva e real, sem o que toda discussão será vazia.

2. Idéia comum é a de que uma demonstração deve apoiar-se em certas proposições últimas e absolutamente indubitáveis. Essas proposições seriam, de acordo com uma escola, primeiros princípios de caráter geral e, segundo outra escola, seriam as pri meiras sensações. Em verdade, contudo, para que uma investigação atinja o resultado inteiramente satisfatório denominado demonstração, basta ter começo a partir de proposições inteira mente isentas de dúvida. Não recaindo qualquer dúvida sobre as premissas, não se pode pedir que sejam mais satisfatórias.

3. Algumas pessoas deliciam-se contestando ponto que já mereceu assentimento geral. Contudo, não é possível avançar mais. Quando a dúvida cessa, cessa também a ação mental relativa ao assunto; e, se prosseguir, estará privada de propósito.

Se o acordo de opiniões é o objetivo único da investigação e se a crença reveste a natureza de um hábito, por que não atingiríamos o alvo desejado tomando da resposta a uma indaga ção qualquer, repetindo-a constantemente a nossos próprios ouvidos, apegando-nos a tudo que pode conduzir àquela crença e aprendendo a desviar-nos, com desgosto e irritação, de tudo quanto possa perturbá-la? Esse método simples e direto é,

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em verdade, observado por muitos. Lembro-me de certa vez em que fui aconselhado a não ler determinado jornal porque isso poderia alterar minha opinião a respeito do livre comércio. "Eu poderia ser envolvido por suas falácias e falsas afirmações" foi a forma de expressão usada. "Você não é", disse meu amigo, "estudioso de economia política. Poderia, portanto, ser facilmente iludido por argumentos capciosos a respeito do assunto. E poderia, em conseqüência, caso lesse o jornal, ser levado a crer no sistema de proteção. Você, porém, admite que a doutrina do livre comércio é a verdadeira e não deseja acreditar que não seja a verdadeira." Sei que muitas vezes esse procedimento é deliberadamente adotado. E, com freqüência ainda maior, o instintivo desagrado que se tem pela indecisão de espírito, adqui rindo as proporções de um vago horror à dúvida, faz com que os homens se apeguem ferrenhamente a posições já adotadas. O homem acha que, se aderir sem titubeio a sua crença, ela será inteiramente satisfatória. Não se pode negar que a fé sólida e imutável proporciona grande paz de espírito. É possível, naturalmente, que dê

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margem a inconveniência, como no caso de o homem persistir resolutamente em crer que o fogo não queimará ou que estará condenado à danação eterna se receber seus ingesta por outra forma que não através de uma sonda estomacal. Contudo, o homem que se inclina por esse procedimento não permitirá que suas inconveniências superem as van tagens. Ele dirá: "Apego-me estreitamente à verdade e a verdade é sempre um todo". Em muitos casos, poderá dar-se que o prazer que esse homem retira de sua fé calma sobrepujem as inconveniências que decorram de seu aspecto menos favorável. Assim, se for verdade que a morte é aniquilação total, o homem crente de que, ao morrer, há de ir certamente para o céu, contanto que haja observado certos preceitos simples nesta vida, gozará de um prazer trivial que não se acompanhará de qualquer desapontamento. Observação análoga parece procedente em re lação a muitas pessoas, no que se refere a questões religiosas, pois freqüentemente se ouve dizer "Não posso crer nisso ou naquilo, pois seria desgraçado se o acreditasse". Quando, à aproximação de um perigo, o avestruz enterra a cabeça na areia, está provavelmente escolhendo o caminho mais fácil. Dissimula o perigo e diz calmamente que o perigo não existe; e se está perfeitamente seguro de que o perigo não existe, por que

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levantaria a cabeça para verificar? Um homem pode atravessar a vida afastando sistematicamente de seus olhos tudo o que fosse suscetível de conduzi-lo a alterar opiniões e se o consegue — apoiando seu método em duas leis psicológicas fundamentais — não sei o que possa ser dito contra o procedimento. Seria uma impertinência egotista objetar que é irracional a atitude referida, pois só equivaleria a dizer que aquele m étodo de firmar uma crença é diferente do nosso. O homem que o acolhe não se propõe a ser racional e, em verdade, se referirá freqüentemente está provavelmente escolhendo o caminho mais fácil. Dissimula pois, pensar como lhe agrada.

Não obstante, esse método de fixar a crença — que pode ser chamado método da tenacidade — será incapaz de sustentar-se na prática. A corrente social lhe é contrária. O homem que o acolhe verificará que outros homens pensam de maneira dife rente e poderá ocorrer-lhe, em momento de maior lucidez, que outras opiniões são tão boas quanto as suas e isso abalará a confiança na crença que tem. Essa concepção — a de que o pen samento ou sentimento de outro homem pode ser tão procedente como o nosso — é uma conquista claramente nova e altamente importante. Brota de um impulso demasiadamente forte para ser suprimido sem risco de destruição da espécie humana. A menos que nos façamos eremitas, haverá necessariamente recíproca influência de opiniões; e, dessa maneira, o problema se transforma no de saber como fixar a crença não simplesmente no indivíduo, mas na comunidade.

Permitamos, pois, que opere a vontade do Estado e não a do indivíduo. Crie-se uma instituição que terá por meta oferecer à atenção do povo as doutrinas corretas, reiterando-as continuadamente, transmitindo-as à juventude e tendo, ao mesmo tempo, o poder de impedir que doutrinas contrárias sejam ensinadas, advogadas ou proclamadas. Que todas as possíveis cau sas de mudança de idéia sejam afastadas, deixando de ser mo tivo de apreensão para os homens. Que eles se mantenham ignorantes e não conheçam razão alguma que os leve a pensar diver samente de como pensam. Que suas paixões sejam recenseadas para que eles possam encarar, com aversão e asco, opiniões individuais incomuns. Que todos os homens que repelem a crença estabelecida se vejam condenados ao silêncio. Que o povo aponte esses homens e os unte de alcatrão e cubra de penas

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ou se institua uma inquisição para perquirir da maneira de pensar de pessoas suspeitas e que estas, declaradas culpadas de crenças proibidas, estejam expostas a punição exemplar. Quan do não se consegue acordo completo por outra forma, o massa cre de todos os que não pensem de certa maneira tem-se mostrado meio muito eficaz de igualar as opiniões em um país. Se o poder de assim agir não bastar, que seja preparada um lista de opiniões — com a qual homem algum

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com a mínima independência de pensamento poderia concordar — e que os fiéis se jam conclamados a aceitar essas opiniões, para que possam ver-se segregados tão radicalmente quanto possível da influência do resto do mundo.

Esse método tem sido, desde os primeiros tempos, um dos principais meios de sustentar corretas doutrinas teológicas e políticas e de preservar-lhes o caráter católico ou universal. Em Roma, especialmente, foi praticada desde os tempos de Numa Pompílio até os de Pio IX. Esse é o mais perfeito exemplo histórico; mas, onde quer que tenha surgido um clero — e ne nhuma religião dele prescindiu — esse método foi utilizado em maior ou menor escala. Onde quer que haja uma aristocracia, grêmio profissional ou associação de classe, cujos interesses de pendam ou suponha-se que dependam de certas proposições, encontram-se, inevitavelmente, traços desse produto natural do sentimento coletivo. O sistema sempre se acompanha de cruel dade e, quando coerentemente imposto, os procedimentos cruéis adquirem, aos olhos de qualquer homem racional, as proporções de atrocidades da pior espécie. E isso não deve causar surpresa, pois o defensor de uma sociedade não vê justificativas para sacrificar o interesse dessa mesma sociedade no altar da mercê, onde sacrificaria interesses individuais. Natural, portanto, que a simpatia e a amizade levem, por esse caminho, ao mais brutal exercício de poder.

Ao fazer a apreciação desse método de fixar a crença — método que pode ser chamado método da autoridade — devemos, antes de tudo, reconhecer sua imensa superioridade mental e moral sobre o método da tenacidade. Seu êxito é proporcionalmente maior; e, em verdade, ele tem, repetidamente, produzido imponentes resultados. As estruturas de pedra que foram, por força dele, reunidas — no Sião, por exemplo, no Egito e na Europa — revestem-se de uma sublimidade que as mais

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grandiosas obras da Natureza excedem de pouco. E, se excluirmos as eras geológicas, não há períodos de tempo tão amplos como os que podem ser medidos por algumas dessas fés organizadas. Se examinarmos aprofundadamente o assunto, verificaremos que nenhum dos credos dessas fés permaneceu sempre idêntico a si mesmo; e, contudo, como a transformação é tão lenta que se torna imperceptível durante o período de uma vida humana, a crença individual permanece, no que e sensível, fixa. Para a massa da humanidade não haverá, talvez e por esse motivo, melhor método. Se o mais intenso impulso que experimentam os leva a serem escravas intelectuais, escravos devem continuar.

Nenhuma instituição poderá, entretanto, propor-se a regu lamentar as opiniões acerca de todos os assuntos. Só os de maior importância podem ser considerados e, quanto ao resto, os espíritos se verão expostos à ação das causas naturais. Essa imperfeição não se constituirá em fonte de fraqueza enquanto os homens permanecerem num estado de cultura tal que as opi niões não se influenciem reciprocamente — isto é, enquanto não souberem somar idéias. Contudo, mesmo nos Estados de maior domínio clerical, surgem indivíduos que ultrapassam aquela condição. Tais indivíduos são dotados de uma espécie mais aguça da de sentimento social, percebem que, em outras regiões e outras idades, os homens cultivaram doutrinas muito diversas da quelas que eles foram ensinados a professar; e não podem deixar de reconhecer que só o mero acidente de lhes terem ensinado o que ensinaram e de os terem rodeado de certos hábitos e certos grupos é que os levou a acreditarem no que acreditam e não em algo muito diverso. E nem a própria simplicidade resistirá à reflexão de que não há motivo para emprestar valor maior às próprias maneiras de ver do que às de outros povos e de outros séculos; e, desse modo, a dúvida surge nos espíritos.

Esses homens perceberão ainda que dúvidas semelhantes podem penetrar os espíritos com referência a qualquer crença que pareça brotada do capricho deles próprios ou dos que fizeram surgir as opiniões populares. A deliberada adesão a uma crença e sua imposição arbitrária a outros devem, portanto, ser abandonadas. Há de ser adotado um método diferente de ajustar opiniões e ele deverá não só induzir a crer, mas permitir escolha da proposição em que se decida crer. Que não se ponha obstáculo à ação das preferências naturais

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e que sob sua influência os homens, dialogando e contemplando as coisas a diferentes luzes, gradualmente desenvolvam crenças que se harmonizem com as causas naturais. Esse método se assemelha ao que permitiria que as concepções artísticas alcanças sem maturidade. Seu mais perfeito exemplo pode ser encontrado na história da filosofia metafísica. Sistemas dessa ordem geralmente não se apoiaram em fatos observados ou, pelo me nos, neles deixaram de apoiar-se com intensidade maior. Foram escolhidos principalmente porque suas proposições fundamentais pareciam "agradáveis à razão". A expressão é ade quada; não alude ao que é confirmado pela experiência, mas ao que nos sentimos inclinados a acreditar. Platão, por exemplo, considera agradável à razão o fato de as distâncias que se param uns dos outros os corpos celestes serem proporcionais aos comprimentos das cordas que produzem sons harmônicos. Muitos filósofos alcançaram suas conclusões mais significativas levados por considerações dessa espécie 2; trata-se, porém, de forma inferior e menos desenvolvida que o método reveste, pois claro está que outro homem poderia considerar mais agra dável à sua razão a teoria de Kepler, segundo a qual as esferas celestes são proporcionais às esferas inscritas e circunscritas nos diferentes sólidos regulares. O choque de opiniões cedo leva ria o homem a apoiar-se em preferências de natureza mais geral. Consideremos, por exemplo, a doutrina de que o homem só age egoisticamente — ou seja, a partir da idéia de que agir de cer ta maneira lhe proporcionará prazer maior do que agir de outro modo. Tal doutrina não se apóia em fato algum, porém merece ampla aceitação, sendo tida como a única teoria razoável.

O método a que acabamos de aludir é muito mais inte lectual e, do ponto de vista da razão, muito mais respeitável do que qualquer dos antes mencionados. Com efeito, enquan to não for possível aplicar método melhor, deve ele ser aco lhido, pois é expressão do instinto que, em todos os casos, põe-se como causa última da crença. Seu fracasso, entretanto, tem sido notável. O método transforma a investigação em algo semelhante ao desenvolvimento do gosto; o gosto, porém e infelizmente, é sempre, em termos, questão de moda, e os metafísicos jamais chegaram a um acordo estável, tendo o pên dulo, desde os primeiros tempos até os tempos recentes, oscilado entre uma filosofia de caráter acentuadamente materialista

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e uma filosofia acentuadamente espiritualista. E assim, a partir desse ponto — o método referido foi denominado método a priori — fomos levados, segundo a expressão de Lord Bacon, a uma verdadeira indução. Estudamos o método a priori como algo que prometia libertar nossas opiniões de seus elementos acidentais e caprichosos. Contudo, o método do desenvolvimento, embora seja processo que elimina o efeito de algumas circunstâncias casuais, só multiplica o efeito de outras. E não difere, portanto, de maneira essencial, do mé todo da autoridade. Pode ocorrer que o governo não mova uma palha para influenciar minhas opiniões; posso ter sido deixado inteiramente livre para decidir, digamos, entre a monogamia e a poligamia e, apoiando-me apenas em minha própria consciência, ter decidido que a última prática é, em si mesma, licenciosa. Entretanto, quando chego à verificação de que o principal obstáculo para a disseminação do Cristianismo entre um povo de cultura tão elevada como o hindu foi a convicção da imoralidade da nossa maneira de tratar a mulher, não pos so deixar de reconhecer que, sem a interferência dos governos,

desenvolver dos sentimentos será determinado, em grande margem, por causas acidentais. Ora, há pessoas, dentre as quais devo supor que o leitor se encontre, que, ao perceberem que qualquer de suas crenças é determinada por circunstâncias alheias aos fatos, passarão a admitir — não apenas da boca para fora — que é duvidosa aquela crença e passarão a dela efetivamente duvidar, de sorte que, pelo menos até certo ponto, ela deixará de ser uma crença.

Para aplacar nossa dúvida, faz-se necessário, por conse guinte, que se encontre método por força do qual nossas crenças passem a ser determinadas, não por algo humano mas por algo externo e estável — por algo sabre que nossa reflexão não tenha efeito. Alguns místicos imaginam que

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dispõem de tal método sob a forma de inspiração particular baixada das al turas. Contudo, essa é apenas uma forma de que se reveste o método da tenacidade, forma em que a concepção da verda de como algo público ainda não se desenvolveu. O algo externo e estável a que nos referimos não seria externo no sentido indicado, caso sua influência atingisse um único indivíduo. De vemos dispor de algo que afete ou possa afetar todas as pes soas. E embora as maneiras de afetar sejam necessariamente

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tão diversas quanto as condições individuais, o método deve ser tal que as conclusões últimas de todas as pessoas sejam as mesmas. Tal é o método da ciência. Sua hipótese fundamen tal , vazada em l inguagem comum é esta: Há coisas Reais, cujos caracteres independem por completo de nossas opiniões a respeito delas; esses Reais afetam nossos sentidos segundo leis regulares e conquanto nossas sensações sejam tão diver sas quanto nossas relações com os objetos, poderemos, valendo-nos das leis da percepção, averiguar, através do raciocínio, como efetiva e verdadeiramente as coisas são; e todo homem, desde que tenha experiência bastante e raciocine suficientemente acerca do assunto, será levado à conclusão única e Verdadeira. A concepção nova que se introduz é a de Realidade. Cabe per guntar como sei que há Reais. Se tal hipótese é a base única de meu método de investigação, meu método de investigação não deve ser usado para dar apoio à hipótese. A resposta é a seguinte: 1. Se a investigação não pode ser encarada como comprobatória de que há coisas Reais, ela não conduz, pelo menos, a uma conclusão contrária; o método e a concepção sobre a qual se funda permanecem em harmonia contínua. Em conseqüência, nenhuma dúvida acerca do método aparece necessariamente — como aparece em todos os outros casos — quando o método é posto em prática. 2. O sentimento que permite o surgimento de todos os métodos de fixação da crença é o de insatisfação diante de duas proposições conflitantes. Aqui já aparece vaga concessão à idéia de que há uma coisa que a proposição deve representar. Ninguém pode, portanto, duvidar de que efetivamente existam Reais, pois que, se duvi dasse, a dúvida não seria fonte de insatisfação. A hipótese, portanto, é tal que todos os espíritas a admitem. O impulso social não leva os homens a dela duvidarem. 3. Todos utilizam o método científico para muitas coisas e só deixam de assim proceder quando não sabem como aplicá-lo. 4. Utilização do método não nos leva a dele duvidar, mas, pelo contrário, a investigação científica tem alcançado triunfos estrondosos no campo da conciliação de opiniões. Esses triunfos oferecem a explicação do eu não duvidar do método, nem da hipótese em que se fundamenta; e por não ter qualquer dúvida e nem acreditar que a tenha pessoa que eu pudesse influenciar, es tender-me sobre o assunto seria falar em vão. Se houver alguém com dúvida séria a propósito do assunto, demos-lhe oportunidade de examiná-lo.

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Descrever o método da investigação científica é o objeti vo desta série de trabalhos. De momento, só disponho de espaço para assinalar alguns pontos de contraste entre esse e outros métodos de fixar a crença.

Esse é o único dos quatro métodos que apresenta distinção entre uma forma certa e uma forma errada. Se eu adotar o método da tenacidade e fechar-me a todas as influências, tudo que eu julge necessário para consegui-lo será necessário segundo esse método. O mesmo ocorre com o método da autoridade: o Estado de tentar afastar uma heresia por meios que, do ponto de vista científico, pareçam inadequados para colimar o objetivo; contudo, o único teste de acordo com aquele método é o que o Estado pensa; e, assim, não há possibilidade de ele empregar o método equivocadamente. Coisa igual se dá com o método a priori. A essência deste método consiste em pensar da forma como se está inclinado a pensar. Todos os metafísicos estão seguros de assim agir e, não obstante, cada um pode inclinar-se a pensar que todos os demais incidem em perversa erronea. O sistema hegeliano admite como lógicas todas as ten dências naturais de pensamento,

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embora certo que elas possam ser aniquiladas por contratendências. Hegel acredita que haja um sistema de regularidade na sucessão dessas tendências, em conseqüência do que, depois de ter hesitado, por longo tempo, entre esta e aquela direção, a opinião tomará, por fim, o caminho certo. E, com efeito, os metafísicos chegam a idéias acertadas, ao termo de longo percurso; o sistema da Natureza, proposto por Hegel, traduz aceitavelmente a ciência de seu tempo; e podemos estar certos de que tudo quanto a investigação científica libertasse do peso da dúvida receberia demonstração a priori por parte dos metafísicos. Com relação ao método cien tífico, entretanto, a situação é diversa. Posso partir de fatos conhecidos e observados para caminhar em direção ao desconhecido; e, contudo, as regras que observo, ao assim proceder, tal vez não sejam as que a investigação aprovaria. Verificação acerca de eu estar efetivamente adotando o método não se faz por apelo a meus sentimentos e objetivos, mas, pelo contrário, en volve a aplicação do método. Tornam-se possíveis, em conseqüência, tanto o raciocínio procedente quanto o incorreto; e tal fato é o fundamento do ângulo prático da lógica.

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Não se deve supor que os três primeiros métodos de assentar opinião deixem de ter qualquer vantagem sobre o método científico. Pelo contrário, cada qual deles apresenta algumas particulares conveniências próprias. O método a priori se caracteriza por suas conclusões fáceis. É da essência do processo acolher qualquer crença a que nos sintamos inclinados e há certas lisonjas à vaidade humana em que acreditamos com naturalidade até vermos destruidos nossos agradáveis sonhos por fatos brutos. O método da autoridade dominará sempre sobre a massa dos homens; e os que, no Estado, detêm as várias formas de força organizada jamais se convencerão de que não devam suprimir, de algum modo, o pensamento ameaçador. Se a liberdade de palavra se vir isenta das formas de coação mais grosseiras, a uniformidade de opinião será garantida por um terrorismo de ordem moral a que a respeitabilidade da sociedade dará assentimento pleno. Observar o método da autoridade é trilhar o caminho da paz. Certos não-conformismos são permitidos; certos outros (considerados perigosos) são proibidos. Serão diferentes em diferentes países e diferentes épocas; mas esteja uma pessoa onde estiver, basta saberem que ela professa convictamente uma crença repelida e poderemos estar seguros de que será tratada com crueldade menos brutal, porém mais refinada do que se fosse caçada como um lobo. Por isso, os maiores benfeitores intelectuais da humanidade jamais ousaram e não ousam na atualidade revelar o todo de seu pensamento; e, assim, lança-se uma sombra de dúvida prima facie sobre toda proposição considerada essencial para a segurança da sociedade. Assaz surpreendente é que a perseguição não vem toda do exterior; o homem se atormenta a si próprio e, muitas vezes, sente-se perturbado ao deparar consigo mesmo crendo em proposições que foi levado a en carar com aversão. O homem cordial e pacífico experimenta, conseqüentemente, dificuldade de resistir à tentação de submeter suas opiniões à autoridade. Acima de todos, entretanto, eu admiro o método da tenacidade, por sua força, simplicidade e sentido direto. Os homens que o observam marcam-se pelo caráter decidido, que é fácil ter, se acolhemos essa regra mental. Esses homens não perdem tempo buscando decidir o que dese jam, mas lançam-se como um raio sobre a alternativa que primeiro

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se apresente, apegam-se a ela até o fim, aconteça o que acontecer e não manifestam, nem por um instante, irresolução. Essa é uma das esplêndidas qualidades que, em geral, acompanham o êxito brilhante, duradouro. É impossível deixar de invejar o homem capaz de descartar-se da razão, embora saibamos como, afinal, será.

Tais as vantagens que os demais métodos de estabelecer opinião apresentam sobre a investigação científica. Importa que bem as consideremos; e consideremos, a seguir, que, acima de tudo, desejamos que nossas opiniões coincidam com os fatos, não havendo razão por que os três primeiros métodos atinjam esse objetivo. Colimá-lo é prerrogativa do método da

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ciência. Com base em tais considerações, importa escolhermos — escolha que ultrapassa de muito o acolhimento de uma opinião intelectual, porque é uma das mais importantes decisões da vida — e, uma vez feita, a escolha nos obriga a adesão. A força do hábito fará, muitas vezes, com que o homem mantenha velhas crenças, mesmo depois de adquirir condição de perceber que elas são desprovidas de base sólida. A reflexão permitirá, entretanto, domínio sobre esses hábitos e o homem deve conceder à reflexão o seu peso total. As pessoas se recusam, por vezes, a proceder assim, tendo idéia de que as crenças constituem um todo que elas não podem imaginar que se apóie no nada. Façamos, porém, com que essas pessoas figurem uma situação diferente, embora análoga. Levemo-las a indagarem de si mesmas o que diriam de um muçulmano convertido que hesitasse em abandonar seus velhos conceitos com respeito às relações entre os sexos ou de um convertido ao catolicismo que persistisse na negativa de ler a Bíblia. Não diriam elas ser preciso que esses convertidos considerassem a matéria amplamente, que compreendessem claramente a nova doutrina para então abraçá-la em seu todo? Tenha-se em conta, entretanto, acima de tudo, que mais saudável do que qualquer crença particular é a integralidade de crença e que evitar o exame da base de qualquer crença por temor de que ela possa mostrar-se apodrecida é tão imoral quanto desvantajoso. Está, sem dúvida, em l amentável estado de espírito a pessoa que admite a existência de uma coisa chamada verdade, distinta da falsidade simplesmente pelo fato de que, se agirmos fundados nela, de olhos abertos, chegaremos ao ponto desejado e não nos perderemos eque, não obstante convencida disso, ousa desconhecer a mesma verdade e busca evitá-la.

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Sim, os outros métodos têm os seus méritos: uma clara consciência lógica tem o seu preço — tal como toda virtude, tal como tudo que valorizamos nos custa caro. Não devemos, contudo, desejar que as coisas sejam de outro modo. A genialidade do método lógico desenvolvido por um homem deve ser por ele amada e reverenciada como uma companheira que ele houvesse escolhido dentre todas as coisas do mundo. Não é necessário que ele despreze o que não seja ela; pelo contrário, ele pode prestar homenagem profunda a tudo o mais, pois que, ao fazê-lo, honra maior lhe estará concedendo. Foi o que ele escolheu e ele sabe que fez escolha correta. Tendo-a feito, ele trabalhará e lutará por ela, não se queixará dos golpes que deva suportar, esperando que possa devolvê-los em número e em força, e se empenhará por fazer-se o cavaleiro e campeão digno da chama de cujos esplendores retira sua inspiração e sua coragem.

NOTAS

1. Sinto vergonha por ver-me obrigado a confessar que neste a r t i go se contém t ão fa l sa e to la observação a r espe i to de Kepler. Quando a escrevi, não tinha lido o original do autor, como pude fazê-lo d ep o i s . Te nh o , a go r a , a o p i n i ão co n vi c t a d e q ue se t r a t a do ma i s impressionante exemplo de raciocínio indutivo com que jamais deparei.

2. Examinemos a maneira como alguns dos maiores filósofos se propuseram a fixar as opiniões e anotemos o êxito que alcançaram. Descar tes , que que r i a ve r o homem começa r duvidando de t udo , ob se r va que de u ma co i sa não se t e r i a como capaz de duvida r — não t e r i a co mo du v id a r de qu e d u vi da va ; e q ua nd o s e d á co n t a d e q ue d u v i d a , j á n ã o p o d e d u v i d a r d e q u e e x i s t e . E c o m o p e r s i s t e e m dúvida de que exis tam coisas ta is como a forma e o movimento, Des cartes julga dever persuadir-se de que forma e movimento não fazem pa r t e de sua na tu reza , nem de qua lque r ou t r a co i sa , a não se r de sua consc iênc i a . I s so é da r por supos to que nada que faça par te de sua natureza se esconde para a lém da superfíc ie . A segui r, Descartes pede a quem duvida para observar que ne le res ide a idé ia de um Ser inteligente, poderoso e perfeito no mais alto grau. Ora, um Ser não teria essas

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qualidades a menos que existisse necessária e eternamente. Por existência necessária, Descartes pretende significar existência por força da exis tência da idéia. Conseqüentemente, deve cessar qualquer dúvida quanto à ex is tênc ia des se Se r. I s so i nd ica de manei ra c l a r a

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que a crença há de ser firmada com base no que os homens encontram no próprio esp ír i to . Descar tes racioc ina da seguinte manei ra : encon tro escr ito no l ivro de meu espíri to que exis te um X, que é coisa de espéc ie ta l que, uma vez escr i ta , exis te . Es tá e le se or ien tando para u m t i p o d e v e r d a d e e m q u e m e n ç ã o v a l h a e x i s t ê n c i a . E d á d u a s outras provas da exis tência de Deus. Descartes torna o conhecimento de Deus ma is fác i l do que o de qua lque r ou t ra co i sa : tudo que pensemos que Ele é, Ele será . Descartes deixa de mencionar, entretanto, que essa é precisamente a definição de f icção. De modo especial, Deus nã o no s po de d ece pc io na r : s e gu e - se , e m co ns eq üê nc i a , qu e há d e ser verdadeiro tudo quanto clara e dist intamente nosso espír i to divise como verdadeiro acerca de qualquer coisa. Nesses termos, se o povo deba te r amplamente um assunto e , de manei ra bem c la ra e d i s t in ta , assentar idé ia a respe i to do que dele pensa, o dese jado acordo a pro pós i to da ques t ão se rá a lcançado. Obse rvo que o mundo examinou l a rga men te e s sa t eo r ia e , de mane i r a mu i to c l a r a , conc lu iu que se trata de despropósi to completo; conseqüentemente, esse juízo é indis cutivelmente correto.

Mui tos c r í t i cos as s ina l a r am que apresento ma l os f i l óso fos do a priori , quando os apresento como adotando qualquer opinião a que uma incl inação natural possa levar. Ninguém pode negar, entretanto, que isso defina, de modo preciso, a posição de Descartes — e em que se apó ia e l e , a não se r em manei ra s na tura i s de pensar? Ta lvez me d iga m, po ré m, que , depo i s de Kan t , e s se v í c io de sapa receu . Kan t muito se jacta de examinar crit icamente nossas inclinações naturais no sen t ido de cer tas op in iões . A opin ião de que algo é universa lmente verdadeiro ul trapassa claramente o que a experiência pode assegurar. A opinião de que algo é necessariamente verdadeiro (ou seja, verdadei ro não apenas face ao presente, mas face a qualquer estado de coisas) ul t rapassa igualmente o que a experiência pode garant i r. Essas obser vações haviam s ido fe i t as po r Le ibn iz e aco lh idas por Hume; Kant as re i te ra . Embora se t ra te de propos ições de t ipo nomina l i s ta , d i f i ci lmente poderiam ser contestadas. Sinto-me autorizado a acrescentar que tudo quanto se sustenta ser inteiramente verdadeiro se coloca para a lém do que a exper iênc ia es tá em condição de cor roborar. Ace i tan do esses cr i té r ios acerca da or igem das idéias , Kant passa a rac ioci na r do seguin t e modo: Sus ten t a -se que as propos ições geomé t r icas são universalmente verdadeiras; logo, não brotam da experiência. Con seqüentemente , deve cor re sponder a uma ín t ima neces s idade da na t u r e z a h u ma n a o f a t o d e e l a t u d o c o n t e mp l a r n o e s p a ç o . E rg o , a soma dos ângulos de um tr iângulo será igua l a do is re tos para todos os ob j e tos de nossa v i são . Essa e nenhuma ou t r a é a l i nha de pen s a me n t o d e Kan t . Co n t ud o , a de ca dê nc i a da r az ão n os se min á r io s fo i ao ponto de ver n i sso uma argumentação admiráve l . Eu poder ia examinar a Crítica da Razão Pura, parágrafo por parágrafo, mostrando q u e t o d a a l i n h a d e p e n s a me n t o é p re c i s a me n t e d e s sa o r d e m. E m todos os pontos, Kant mos t ra que os obje tos comuns , como árvores e moedas de ou ro , envo l ve m e l emen tos que não se con tê m nas p r i meiras manifestações de sent ido. Não poderemos, contudo, persuadir-n os a n e ga r a r e a l i d ad e d as á r vo re s e d a s moe da s de o u r o . H á , a

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propósito, co n t u má c i a í n t i ma ge ra l e e s sa é a f i an ça co m b as e na q ua l ad mi t i r t o do o co n j un to da c r enç a q ue lh e d i z r e spe i t o . I s so corresponde a s implesmente acei tar uma crença sem contestação, tão l o go se de mons t r a que e l a mu i to agrada a mu i t a s pe s soas . Quando Kant chega às idéias de Deus, Liberdade, Imortalidade, hesita, porque os que pensam tão -somente no pão e na man te iga , no domín io e no prazer, são ind i fe rentes a essas idé ias . Kant expõe essas idéias a um t i po d iver so de exame e f ina lmente as aco lhe com fundamen to que os seminaristas consideram mais ou menos suspeito, mas que, aos olhos dos labora tor i s tas , são inf in i tamente mais ponderáve is que os fundamentos com apoio nos quais e le ace i tou o espaço, o tempo e a causa l idade . Es te s ú l t imos fundamentos não pas sam, a l iá s , do segu in te : havendo ampla e decidida incl inação no sent ido de crer a lguma coisa, essa a lguma coisa deve ser verdadeira . Se Kant houvesse di to apenas qu e a do ta r i a a c r e nç a se gun do a qu a l o s t r ê s ân gu l os d e u m t r i â n gulo são iguais a dois re tos porque, a té o momento, ninguém, exceto o i rmão Lamber t e a lguns i t a l ianos , ques t ionara esse ponto, sua a t i t u de se r i a pe r fe i t a men te ac e i t á ve l . A o c on t r á r io , con tu do , Ka n t e seus atuais seguidores sustentam que a proposição está provada e os lambert is tas refutados simplesmente pela geral fa lta de inclinação de pensar de acordo com eles.

Hegel , que or ientou a Alemanha durante uma geração, reconhece c la ramente a pos ição em que se encont ra . Apenas lança o seu barco à corrente de pensamento e deixa-se carregar para onde essa corrente o conduza. Ele próprio denomina dialét ico o seu método, pretendendo s ignificar que a

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discussão franca das dificuldades a que qualquer opinião dá naturalmente lugar leva a a lteração após al teração, até que sustentável posição seja at ingida. Trata-se de clara profissão de fé cm favor do método das inclinações.

Outros f i lósofos fazem apelo ao " teste do opos to inconcebível ", apelo a "pressupostos" (pretendendo dizer Voraussetzungen que, adequadamente t raduzidos, são postulados) e efúgios semelhantes: todos esses não passam de alguns dos muitos sistemas de dar busca minucio sa nos desvãos do cérebro para encontra r fundada opin ião acerca do Universo.

Quando passamos do exame de obras que defendem o método da autoridade para o exame das obras dos fi lósofos, passamos não apenas a uma atmosfera intelectual enormemente mais elevada, mas também a uma a t mos fe ra mora l ma i s c l a r a , ma i s l i v r e , ma i s b r i l han t e e ma i s a lentadora. Tudo isso, en tretan to, é a lhe io à questão relevante de sa ber se o método tem êxito no fixar as opiniões dos homens. As concepções desses au tores são persuasivas ao ext remo. Há quem ouse jura r que es tão fadadas ao êxi to . Contudo, em verdade, a té ho je , decidida mente , não a l cançaram êxi to ; e a pe rspec t iva nes ta d i r eção é de se s t imulante . A d i ficu ldade es tá em que opin iões hoje cons ideradas inabaláveis são t idas, amanhã, por ul trapassadas. São, com efei to , muito mais suscet íveis de al teração do que poderia parecer a um lei tor apres sado; e f rases e laboradas para ves t i r op in iões defuntas passam a se r usadas, em segunda mão, pelas idéias que lhes sucedem.

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C o n t i n u a m o s a f a l a r d e " c a u s a e e f e i t o " , e mb o r a , n o m u n d o m e c â n i c o , t e n h a s i d o , h á m u i t o , a b a n d o n a d a a o p i n i ã o q u e e s s a f rase pre tendia expr imir. Sabemos , ho je , que a ace le ração de cer ta partícula cm qualquer instante depende de sua posição relativa quanto a outras partículas, naquele mesmo instante, ao passo que a concepção an t e r io r e ra a de que o pa ssado a fe t a o fu tu ro e o fu tu ro não a fe ta o p a s sa do . De fo r ma an á l o ga , a " l e i d a o fe r t a e d a p ro cu ra " t e m, para diferentes economistas, significados inteiramente diversos.

("The Fixation of Belief", ob. cit. , Vol. V, Book 2, Paper IV, pp. 223-247.)