pedro henrique de oliveira figueiredo o trabalho de campo ... · uma preparação metodológica e...

108
CENTRO UNIVERSITÁRIO UNA DIRETORIA DE EDUCAÇÃO CONTINUADA, PESQUISA E EXTENSÃO MESTRADO EM GESTÃO SOCIAL, EDUCAÇÃO E DESENVOLVIMENTO LOCAL Pedro Henrique de Oliveira Figueiredo O trabalho de campo na Geografia Escolar como estratégia para a percepção da dimensão socioespacial do real. Belo Horizonte Março 2011

Upload: truongdang

Post on 08-Nov-2018

219 views

Category:

Documents


0 download

TRANSCRIPT

CENTRO UNIVERSITÁRIO UNA

DIRETORIA DE EDUCAÇÃO CONTINUADA, PESQUISA E EXTENSÃO

MESTRADO EM GESTÃO SOCIAL,

EDUCAÇÃO E DESENVOLVIMENTO LOCAL

Pedro Henrique de Oliveira Figueiredo

O trabalho de campo na Geografia Escolar como estratégia

para a percepção da dimensão socioespacial do real.

Belo Horizonte

Março 2011

Pedro Henrique de Oliveira Figueiredo

O trabalho de campo na Geografia Escolar como estratégia

para a percepção da dimensão socioespacial do real.

Belo Horizonte

Março de 2011

Dissertação e proposta de intervenção apresentadas

ao Mestrado em Gestão Social, Educação e Desenvolvimento Local do Centro Universitário UNA, como requisito parcial à obtenção do título de Mestre

Área de concentração: Inovações Sociais Educação e

Desenvolvimento Local

Linha de pesquisa: Processos Educacionais: Tecnologias Sociais e Gestão do Desenvolvimento Local

Orientadora: Prof

a. Dr

a. Rosalina Batista Braga

Ficha catalográfica desenvolvida pela Biblioteca UNA campus Guajajaras

F476t Figueiredo, Pedro Henrique de Oliveira

O trabalho de campo na geografia escolar como estratégia para a

percepção da dimensão socioespacial do real / Pedro Henrique de Oliveira

Figueiredo. – 2011.

108f.: il.

Orientador: Profa. Dr

a. Rosalina Batista Braga.

Dissertação (Mestrado) - Centro Universitário UNA 2011. Programa de

Mestrado em Gestão Social, Educação e Desenvolvimento Local.

Bibliografia f. 90 – 93.

1. Geografia – estudo e ensino – Trabalho científico de campo. I. Braga,

Rosalina Batista . II. Centro Universitário UNA. III. Título.

CDU: 658.114.8

CENTRO UNIVERSITÁRIO UNA

DIRETORIA DE EDUCAÇÃO CONTINUADA, PESQUISA E EXTENSÃO

MESTRADO EM GESTÃO SOCIAL, EDUCAÇÃO E DESENVOLVIMENTO LOCAL

Dissertação intitulada ―O trabalho de campo na Geografia Escolar como estratégia

para a percepção da dimensão socioespacial do real‖, de autoria do mestrando

Pedro Henrique de Oliveira Figueiredo, aprovada pela banca examinadora,

constituída pelos seguintes professores:

_____________________________________________________

Prof.ª Dra. Rosalina Batista Braga (Orientadora) – UNA

____________________________________________________

Prof.ª Dra. Valeria de Oliveira Roque Ascenção – UFMG

__________________________________________________

Prof.ª Dra. Áurea Regina Guimarães Thomazi – UNA

______________________________________________________

Prof.ª Dra. Lucília Regina de Souza Machado

Coordenadora do Mestrado em Gestão

Social, Educação e Desenvolvimento Local

Belo Horizonte, 16 de março de 2011

A solidão da escrita foi uma conquista.

Por isso, reconheço o carinho de duas pessoas em

especial: minha orientadora Rosalina

pela persistência e competência

e minha esposa Caroline

pela paciência e compreensão.

Agradeço sempre a presença dos meus pais

e de todos que de certa forma

contribuíram para a realização desta pesquisa.

RESUMO

A ampliação da leitura de mundo dos alunos é um dos objetivos propostos para a educação básica. A

Geografia Escolar busca desenvolver essa leitura, promovendo uma ressignificação da dimensão

socioespacial do real. Partiu-se da hipótese de que uma das formas para se atingir essa leitura seria

por meio de uma apropriação adequada do trabalho de campo escolar. Esta pesquisa se propôs

investigar a potencialidade dessa estratégia pedagógica para a construção de percepções da

dimensão socioespacial da realidade dentro do universo da educação geográfica. Para isso, foi

desenvolvido um projeto de trabalho de campo em um assentamento de sem terra onde,

hipoteticamente, o grupo de assentados havia desenvolvido Tecnologias Sociais. Trabalhou-se com a

hipótese de que o contato com essas Tecnologias Sociais de produção e apropriação do espaço e

com o cotidiano do assentamento fomentaria novas leituras de mundo. Foram identificadas algumas

mudanças nas percepções dos alunos sobre a dimensão socioespacial dos processos de produção e

apropriação do espaço geográfico. A metodologia da pesquisa foi, essencialmente, qualitativa e a

coleta de dados foi organizada em três períodos: uma parte antes do trabalho de campo, para

identificar as percepções iniciais dos alunos; outra durante a execução do trabalho de campo, após

uma preparação metodológica e teórico-conceitual dos alunos e por fim uma após a realização do

trabalho de campo, para o processo de sistematização da atividade, quando foram identificadas

algumas mudanças ocorridas nas percepções dos alunos.

PALAVRAS-CHAVE: Educação geográfica. Trabalho de campo. Geografia escolar. Tecnologia social.

ABSTRACT

The expansion of students' reading of reality is one of the goals espoused for elementary and high

school in Brazil. The Geography taught in those levels tries to develop this approach, promoting a

redefinition of sociospatial dimension of reality. This research had the hypothesis which working with

outdoors classes would improve this redefinition. This study intended to investigate the potential this

strategy to develop new perceptions of the sociospatial dimension of reality. Furthermore, it was

developed a project in a settlement where, hypothetically, the group of landless had developed Social

Technologies. This research also worked with the hypothesis that the contact with these Social

Technologies of production and appropriation of space and with the daily work in the settlement would

encourage new readings of the world. We identified some changes in students' perceptions about the

sociospatial processes of production and appropriation of the geographical space. The research

methodology was essentially qualitative and the data collection was divided into three parts: the

previous one was to identify the initial perceptions of students; the second one happened during the

execution of project with a theoretical and methodological preparation of the students and the last one

was after the project with the process of systematization of the activity, when it was identified some

changes in the perceptions of students.

KEYWORDS: Geographic education. Outdoor class. School geography. Social technology.

LISTA DE GRÁFICOS

1. Depoimentos sobre as habitações populares entre e depois do trabalho

de campo ........................................................................................................37

2. Percepções sobre as condições de vida em aglomerados urbanos e no

assentamento..................................................................................................43

3. As percepções sobre a ocupação do espaço urbano e do espaço rural ........48

4. A percepção sobre a geração de renda antes e depois do trabalho de campo

em áreas de agroindústria..............................................................................56

5. A percepção sobre a geração de renda antes e depois do trabalho de campo

em áreas com agricultura de subsistência......................................................58

6. As percepções sobre a urbanização do Brasil................................................62

7. As percepções sobre as atribuições do poder público no meio urbano .........66

8. As percepções sobre a organização do espaço agrário antes e depois do

trabalho de campo ..........................................................................................70

9. As percepções sobre as atribuições do poder público no meio rural .............74

10. Técnicas e saberes percebidos pelos alunos no assentamento ....................77

11. As relações entre os assentados e o poder público .......................................78

12. Elementos percebidos pelos alunos para construção de técnicas e estratégias

para o equacionamento dos problemas do cotidiano......................................79

13. Depoimentos sobre as mudanças de percepção sobre o meio rural ocupados

por assentados ...............................................................................................80

LISTA DE QUADROS

1. Percepção sobre as habitações populares.................................................................35

2. Percepção após o trabalho de campo sobre as habitações

populares....................................................................................................................36

3. Percepção sobre as moradias de alto luxo.................................................................39

4. Percepção inicial sobre a condição de vida em áreas pobres....................................41

5. Percepção após o trabalho de campo sobre a condição de vida em áreas

pobres.........................................................................................................................42

6. Percepção inicial da ocupação do espaço rural e do espaço urbano.........................45

7. Percepção após o trabalho de campo da ocupação do espaço rural e

do espaço urbano........................................................................................................47

8. Percepção inicial sobre a agricultura de subsistência................................................50

9. Percepção inicial sobre as agroindústrias...................................................................51

10. Percepção inicial sobre a condição de vida no meio rural..........................................52

11. Percepção inicial sobre a ocupação do meio rural.....................................................54

12. Percepção após o trabalho de campo sobre as agroindústrias..................................55

13. Percepção após o trabalho de campo sobre a agricultura de

subsistência ...............................................................................................................57

14. Percepção inicial sobre o processo de urbanização...................................................60

15. Percepção após o trabalho de campo sobre a urbanização brasileira.......................61

16. Percepção inicial sobre as atribuições do poder público no meio urbano..................64

17. Percepção após o trabalho de campo sobre as atribuições do poder público

no meio urbano.................................................................................................................65

18. Percepção sobre a organização do espaço agrário brasileiro....................................68

19. Percepção após o trabalho de campo sobre a organização do espaço

agrário brasileiro...............................................................................................................69

20. Percepção sobre as atribuições do poder público no meio rural................................72

21. Percepção após o trabalho de campo sobre as atribuições do poder público

no meio rural.....................................................................................................................73

22. Análise das percepções dos alunos sobre o mundo agrário brasileiro antes e depois

do trabalho de campo.......................................................................................................81

SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO ....................................................................................................................................8

2 REVISÃO DA LITERATURA.............................................................................................................14

2.1 A Geografia Acadêmica e a Escolar e a aproximação da educação geográfica com a dimensão socioespacial do real.............................................................................................................14 2.2 O Trabalho de campo escolar ........................................................................................................21 2.3 As Tecnologias Sociais e o Ensino de Geografia...........................................................................25

3 METODOLOGIA E PROCEDIMENTO DE COLETA DE DADOS.....................................................27

4. APRESENTAÇÃO E ANÁLISE DOS DADOS .................................................................................33

4.1 Sobre as habitações.......................................................................................................................33 4.2 Sobre as condições de vida num aglomerado urbano e no Assentamento Pastorinha......................................................................................................................40 4.3 Sobre a ocupação do espaço rural e do espaço urbano................................................................44 4.4 A agricultura de subsistência e a agroindústria..............................................................................49 4.5 As condições de vida no espaço Rural Brasileiro (agricultura de subsistência e agroindústrias)...................................................................................................................................51 4.6 O processo de ocupação no espaço Rural Brasileiro (agricultura de subsistência e agroindústrias).......................................................................................................................................53 4.7 A geração de renda no meio rural (a agroindústria e a agricultura de subsistência.......................54 4.8 Sobre o processo de urbanização..................................................................................................59 4.9 Sobre as atribuições do poder público na organização do espaço urbano ....................................63 4.10 Sobre a organização do espaço agrário........................................................................................67 4.11 Sobre as atribuições do poder público na organização do espaço rural ......................................71

5. A PERCEPÇÃO DOS ALUNOS NO ASSENTAMENTO PASTORINHA E A

(RE) SIGNIFICAÇÃO DA DIMENSÃO SOCIOESPACIAL DO REAL..................................................75

5.1 Sobre as negociações comunitárias e a comercialização dos produtos agrícolas.........................75 5.2 Sobre os saberes e as técnicas comunitárias.................................................................................76 5.3 Sobre as lideranças comunitárias e poder público..........................................................................77 5.4 Sobre as estratégias de desenvolvimento da comunidade.............................................................78

6. AS MUDANÇAS NAS PERCEPÇÕES DOS ALUNOS SOBRE O

ASSENTAMENTO PASTORINHA .......................................................................................................80

7. CONSIDERAÇÕES FINAIS .............................................................................................................83

8. PROPOSTA DE INTERVENÇÃO ...................................................................................................87

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ....................................................................................................90

10. APÊNDICES ...................................................................................................................................94

10.1 - Roteiro para o diagnóstico antes do trabalho de campo.............................................................94 10.2 - Roteiro para a instrumentalização...............................................................................................96 10.3 - Roteiro para as entrevistas com os assentados.......................................... .............................101 10.4 - Roteiro para o diagnóstico depois do trabalho de campo.........................................................105

1. Introdução

Este trabalho parte da perspectiva de que a educação básica procura desenvolver

diversas formas de ampliação da leitura de mundo dos alunos por meio de diferentes

procedimentos pedagógicos. Frequentemente são desenvolvidas várias estratégias

didático-pedagógicas para a realização desse objetivo: visitas técnicas, pesquisas

em bibliotecas e na Internet, apresentações cênicas, exposições, mostras culturais e

atividades em ambientes fora da escola com destaque para o trabalho de campo.

Esse último, embora seja bastante utilizado, ainda carece de uma maior

sistematização, pois em seu planejamento, execução e na análise dos resultados,

ainda é possível verificar muitas insuficiências. Como professor de Geografia, o

autor dessa pesquisa vem tentando aprimorá-lo a cada saída a campo, contudo há

ainda limitações a serem superadas para se desenvolver um aprofundamento dessa

estratégia.

As discussões sobre o trabalho de campo não são recentes. Em diversas ciências,

ele tem sido um procedimento muito utilizado para a coleta de dados. Acredita-se

que o trabalho de campo organizado e sistematizado tenha sido um dos

procedimentos centrais e fundantes das atividades científicas do alemão Alexander

Von Humboldt, no século XIX. Grande parte da literatura sobre a construção do

pensamento geográfico identifica a publicação da coletânea Cosmos (1848) de

autoria de Alexander Von Humboldt (1769-1859) como marco inicial da ciência

geográfica. Humboldt, como Charles Darwin (1809-82), realizou longas viagens,

percorrendo grandes porções das áreas continentais e insulares, coletando dados

empíricos que, posteriormente, sustentaram suas formulações científicas.

A ciência geográfica, assim como as demais disciplinas científicas, convive e se

apropria das diversas alternativas metodológicas disponíveis para a produção do

conhecimento. A Geografia, como a maior parte das disciplinas ligadas às ciências

sociais e humanas, insere-se, historicamente, na produção do conhecimento

sistemático a partir do final da primeira metade do século XIX. As escolhas

8

metodológicas na produção do conhecimento geográfico deram origem às diversas

correntes no interior da Geografia e pode-se dizer que, hoje, existam ―Geografias‖.

Desde meados do século XIX, a Geografia, inscrita no universo acadêmico como

disciplina científica, passa a ser tomada como ciência de referência para o ensino dos

conteúdos geográficos nos processos de escolarização. Os recentes estudos que

consideram as especificidades das disciplinas escolares em relação às suas ciências

de referências destacam a necessidade de considerar a distinção de objetivos, função

e finalidades dessas práticas. (BRAGA, 2011. Prelo)1

Mesmo com essa tradição que remonta ao início do século XIX, o trabalho de campo

ainda é alvo de discussões e indagações no universo acadêmico e no universo

escolar. Qual seria a melhor forma de executá-lo? Que relações ele pode propiciar

entre teoria e prática? Quais as semelhanças e as diferenças com outras atividades

de campo? Como realizá-lo na educação básica para que ele se torne um

instrumento útil à ressignificação do espaço socialmente produzido? Por que ele, às

vezes, gera desconfianças quando às suas potencialidades pedagógicas nas

escolas? Há diferenças entre as práticas de trabalho de campo realizado na

Geografia Acadêmica e na Escolar?

Essas indagações se relacionam com a aprendizagem da dimensão socioespacial

do real na educação básica. Como o trabalho de campo tem um papel histórico e a

produção da Geografia científica o inscreveu em suas estratégias como instrumento

de coleta de dados, desde as suas origens em meados do século XIX, nessa

pesquisa se investigou a sua eficácia para a educação geográfica.

Como a geografia é trabalhada no universo escolar e no acadêmico e em ambos o

trabalho de campo é utilizado como estratégia de coleta de dados e de (re)

significação do espaço socialmente produzido, torna-se necessário distingui-las. A

Geografia Escolar não pode ser considerada como uma miniatura da Geografia

Acadêmica, ou seja, a Geografia na escola não tem a função de formar geógrafos

1 BRAGA, Rosalina Batista. A (re) significação do conceito de natureza e ambiente no ensino básico:

uma reflexão sobre as heranças iluministas e o trabalho de campo como mediação pedagógica.

Trabalho a ser apresentado e publicado em livro, contendo coletânea dos textos dos palestrantes do

XI Encontro Nacional de Prática de Ensino de Geografia — 11ENPEG — (Prelo)

9

menores. É desejável que a primeira construa, com os alunos, conceitos espaciais

básicos, respeitando as possibilidades cognitivas, socioafetivas dos educandos. O

objetivo principal da geografia escolar seria, então, possibilitar o desenvolvimento de

um raciocínio geográfico voltado para a compreensão da realidade socioespacial

que é mutável e historicamente construída.

É a partir das questões anteriormente que esta pesquisa foi construída. Seu

problema central está vinculado às dificuldades que os alunos têm apresentado para

perceberem a dimensão socioespacial do espaço, mesmo quando ocorre o

tratamento de conteúdos relacionados com a questão em sala de aula. Ela nasceu

da análise de alguns dados iniciais da prática pedagógica do pesquisador como

professor de Geografia. A pesquisa teve como objetivo identificar, em que medida, o

trabalho de campo escolar poderia ser uma ferramenta metodológica para superar a

tradição didática que reforça a memorização e afasta a possibilidade de uma

interpretação da espacialidade que possibilite uma percepção concreta e sistemática

da dimensão socioespacial do real pelos alunos.

A proposta desta pesquisa foi investigar a potencialidade do trabalho de campo para

a construção de novas leituras da dimensão socioespacial da realidade dentro do

universo da Geografia Escolar. O intuito foi verificar se o trabalho de campo

contribuiria para superar as características mnemônicas e enciclopedistas dessa

Geografia, construindo uma percepção do espaço mais significativa e real.

Considerando-se que as realidades sociais e econômicas são diversificadas e, além

disso, que o espaço vivido de cada aluno é único, a construção de significados no

processo de ensino/aprendizagem é diferenciado e por isso, não é aconselhável

trabalhar com análises herméticas do espaço.

A experiência do pesquisador como docente mostrou que na Geografia Escolar, os

alunos precisam construir conceitos e significados de forma autônoma, com o intuito

de elaborarem entendimentos e refletirem sobre as relações sociais e naturais. Para

isso, torna-se necessário, aliar o conteúdo da disciplina com as informações e

significados oriundos do espaço vivido pelos alunos para reduzir o distanciamento

do real em relação aos conteúdos dados em sala.

10

Por isso, práticas pedagógicas desenvolvidas em ambientes fora da sala de aula

podem, além de amenizar a tradição da geografia escolar, propiciar um contato

direto com as realidades em construção e ampliar o interesse do aluno pela

disciplina.

No entanto, a consolidação de novos significados sobre a dimensão socioespacial

do real que estruturam o espaço geográfico demanda um diálogo constante com a

teoria em sala de aula. Essa relação entre teoria e prática ainda é muito discutida

nas escolas sob o nome de contextualização e, até hoje, há muitas dificuldades para

a aproximação do que está dentro e fora dos muros da escola.

A partir da visualização dos processos de produção, organização e apropriação do

espaço geográfico a relação sociedade/natureza pode ganhar um significado ainda

não vivenciado pelos estudantes da escola básica. Por isso o trabalho de campo

pode favorecer a consolidação de práticas pedagógicas mais instigantes e

investigadoras na escola básica ao fomentar a (re) significação da dimensão

socioespacial do real

O trabalho de campo escolar pode se tornar uma atividade que auxilia o professor a

construir com os alunos uma interpretação sobre a complexidade da

produção/apropriação do espaço geográfico. Esse espaço que é o objeto de estudo

da ciência geográfica necessita de uma abordagem mais atenta da Geografia

Escolar, pois ele ―não pode ser estudado pelos geógrafos como uma categoria

independente uma vez que ele nada mais é que um dos elementos do sistema

social.‖ (KAISER, 2006, p. 97). Desta forma, a abordagem do espaço geográfico

sugere a busca de práticas interdisciplinares que integrem os vários campos

disciplinares.

Para verificar essa abordagem e a necessidade de compreensão do dinâmico

processo de produção/apropriação do espaço geográfico, os alunos realizaram um

trabalho de campo no Assentamento Pastorinha localizado no município de

Brumadinho (MG). Partiu-se da hipótese de que a produção de tecnologias sociais

nesse espaço e a gestão do desenvolvimento local poderiam oferecer maior

11

visibilidade para a dimensão social do espaço. A dinâmica do assentamento

explicitaria os processos conflituosos e contraditórios existentes, o que estimularia a

(re) significação da dimensão socioespacial por parte dos alunos.

A discussão sobre as Tecnologias Sociais ainda é pouco realizada no ambiente

escolar. O campo de estudo desse conceito é recente e trazê-lo para a sala de aula

abre novos caminhos para a interação da escola com a dinâmica social. Nesse

trabalho foi considerado como Tecnologias Sociais o conjunto

―[...] de técnicas e metodologias transformadoras, desenvolvidas e/ou aplicadas na interação com a população e apropriadas por ela, que representam soluções para inclusão social e melhoria das condições de vida” (PASSONI, 2007, p. 29)

Desde a redemocratização do país no final da década de 80, discute-se que as

escolas precisam dialogar mais com a comunidade do entorno. Desenvolver novos

conceitos e opções pedagógicas, dentre elas a identificação e percepção de

Tecnologias Sociais, pode trazer novos caminhos para a escolarização básica,

sobretudo, para os estudos ligados às disciplinas vinculadas às Ciências Humanas

nas escolas.

Os alunos, ao compartilharem informações com a comunidade do entorno e ao

construírem novos significados após um trabalho de campo em áreas que

hipoteticamente desenvolveram Tecnologias Sociais, poderiam ressignificar o

processo de produção e apropriação social desse espaço. Porém, há outro desafio:

as articulações comunitárias e a própria escola estão diante de cenários novos e

mutantes no século XXI. Os alunos de escolas da rede privada, em sua maioria,

apropriam-se pouco dessas transformações. Muitos estão desconectados das novas

realidades sociais onde a supressão da desigualdade e a necessidade de geração

de renda ainda são aspirados.

Desta maneira, o objetivo geral dessa pesquisa foi verificar se o trabalho de campo

escolar em áreas em que a comunidade, hipoteticamente, tenha desenvolvido

Tecnologias Sociais, contribuiria para que os estudantes incorporassem a dimensão

social do espaço geográfico. Isto significaria novas leituras do mundo, (re)

significação da dimensão socioespacial do real.

12

Na coleta de dados, inicialmente, foi necessário identificar como os estudantes

significavam a dimensão social do espaço através de um diagnóstico em sala de

aula. Após esse diagnóstico, houve realização de um trabalho de campo escolar,

com um grupo de alunos do 1º ano do ensino médio. Nesse houve uma coleta de

dados por meio da observação da realidade e entrevistas junto à comunidade

investigada sobre os processos de produção, comercialização e organização no

interior do assentamento em Brumadinho.

Após o trabalho de campo, os dados foram analisados com esses alunos, sendo

produzidas sínteses para identificar novos possíveis significados construídos por

eles sobre a dimensão social do espaço geográfico. Por fim, foram elaborados dois

canais para o fomento de discussões e divulgação de trabalhos de campo entre

escolas, professores e alunos: um encarte cujo modelo está disponível neste

trabalho e uma comunidade virtual em um site de relacionamento.

13

2. Revisão da literatura

Eu perguntei se não aprendiam nada de Geografia. Não

precisa, disse um deles, isso a gente aprende é no pé. Os

igarapés vão pro Tocantins. O Tocantins desce pro mar, é só

olhá, né? No topo daquele monte não serve pra plantá. A terra é

ruim. No baixo é boa. É no pé mesmo, andando e olhando.

(Maria Regina C. T. Sader – Espaço e Luta no Bico do

Papagaio)

A revisão da literatura nesta pesquisa foi arquitetada para sistematizar produções

conceituais significativas a respeito da Geografia Escolar e da Acadêmica e também

sobre o trabalho de campo escolar e bem como as Tecnologias Sociais.

Por isso, esse capítulo, foi dividido em três partes. A primeira aborda as

especificidades da Geografia Escolar e a complementaridade entre a Geografia

Escolar e a Acadêmica. A segunda parte focaliza as observações e as percepções

sobre o trabalho de escolar. Finalmente, a última parte faz um levantamento sobre o

conceito de Tecnologia Social.

2.1. A Geografia Acadêmica e a Escolar e a aproximação da educação geográfica

com a dimensão socioespacial do real.

O ensino de Geografia na educação básica é alvo de diversas discussões teóricas.

Entre essas se destaca a relação teoria/prática materializada no tratamento dado ao

conteúdo desenvolvido em sala de aula e suas interações com a dimensão

socioespacial do real. Isso, de acordo com alguns autores, pode levar o ensino da

Geografia Escolar a uma redução aos conteúdos da Geografia Acadêmica ou a um

14

formato enciclopedista e mnemônico. Entretanto, pensar sobre essa questão requer

pensar nas diferenciações da Geografia como ciência e disciplina escolar.

O pesquisador André Chervel (1990) fundamentou, em seus estudos, a distinção

entre as disciplinas escolares e as disciplinas científicas que lhes servem de

referência. Segundo Braga (2003), no caso da Geografia, essa distinção ocorre,

inclusive, com a separação dessas práticas no tempo. Segundo afirma a autora, a

Geografia, como um conjunto de conteúdos escolares, existiu muito antes da

Geografia se tornar uma disciplina científica. Alimentada por um conjunto de

informações e dados espaciais a Geografia Escolar apresenta uma história própria

que se constrói mediante objetivos, funções, estruturas e características ligadas e

constituídas, historicamente, nas práticas de escolarização.

Ainda segundo a mesma autora, a prática de confundir ou fundir a Geografia

Acadêmica com a Geografia Escolar, como frequentemente é feito no cotidiano da

sala de aula e até mesmo nas universidades, tem prestado um grande desserviço,

sobretudo à última. Não se trata de afirmar que a Geografia Acadêmica e a Escolar

são práticas isoladas e nem de pensá-las como distintas. A primeira tem sido após

meados do século XIX, a ciência de referência para a segunda.

Para os estudos sobre a educação geográfica básica, a fusão das duas práticas (escolar e acadêmica) tem significado, principalmente, uma secundarização, senão a própria eliminação das questões específicas sobre o ensino, na educação geográfica. (BRAGA, 2003,p.76)

Para Braga (1997), a predominância da prática de memorização na Geografia

Escolar no Brasil ainda é um traço importante da tradição didática escolar. Esse

traço da Geografia Escolar ainda perdura nas escolas até hoje e, não raro, torna

essa disciplina desinteressante para grande parte dos educandos. A memorização

na educação geográfica tem levado ao esvaziamento da construção de significados

e das habilidades geográficas.

[...] com freqüência, trabalhamos um conteúdo de determinada forma porque já vimos alguém fazendo assim ou pensamos que esta é uma forma possível e desejável de ensinar aquele conteúdo. É freqüente trabalharmos um conteúdo sem, verdadeiramente, nos perguntarmos: por que este conteúdo e não outro? Por que assim e não de outra forma? Enfim, por que trabalhar isto, desta forma, nesta disciplina? (BRAGA, 2003, p. 64)

15

Na educação geográfica os alunos precisam construir conceitos para elaborarem

entendimentos e refletirem sobre as relações entre a sociedade e a natureza, ou

seja, sobre a dimensão socioespacial do real. Isso significa que aliar teoria e prática

é fundamental para a estruturação dessa disciplina escolar. E, é essa perspectiva

que precisa ser projetada pelo professor em seus planejamentos. A necessidade de

redução do apelo à memorização na Geografia Escolar pode ser favorecida por

práticas pedagógicas desenvolvidas em ambientes fora da sala de aula que

propiciem um contato direto com as realidades em construção. Braga (2003) reforça

a ideia de que os alunos precisam acessar, processar e interpretar as informações e

os dados geográficos e não apenas memorizá-los e repeti-los. A educação

geográfica pautada na memorização pode enfraquecer a apropriação do conteúdo e

gerar uma desmotivação no ambiente de sala de aula. As relações espaciais,

essenciais para o desenvolvimento do raciocínio geográfico, precisam ser

construídas nos processos pedagógicos. Elas não podem ser tratadas

como se fossem uma aquisição natural e/ou automática. São tomadas como se fossem apenas resultantes de automatismos, sem se vincularem à subjetividade dos sujeitos envolvidos, sem necessitar de um processo pedagógico que considere os significados espaciais dos educandos. Destacamos que a aquisição das relações espaciais é uma necessidade para o desenvolvimento do raciocínio geográfico e para a construção de estruturas mentais ligadas ao pensamento lógico, mas raramente são tratadas no ensino. (BRAGA, 2003, p. 78)

O francês Jean Michel Brabant questionou, em 1976, as práticas mnemônicas e

enciclopedistas no ensino da Geografia. Para ele, essas afastam a Geografia do real

e maximizam a desmotivação dos alunos frente a essa disciplina. O autor destaca

situações na Geografia Escolar onde o enciclopedismo prevalece em sala de aula.

Para ele,

[...] o enciclopedismo contribuiu para a abstração crescente do discurso geográfico, ao mesmo tempo que alimentou o tédio das gerações de alunos que classificaram a geografia entre as matérias a memorizar. (BRABANT, 1976, p.19).

Entretanto, é necessário destacar que ―nem sempre a realidade visível esclarece

completamente o que de fato acontece no espaço.‖ (SERPA, 2006, p. 16). Fazer um

trabalho de campo representa, portanto, um

16

[...] momento de reconstrução do conhecimento que não pode prescindir da teoria, sob pena de tornar-se vazio de conteúdo, incapaz de contribuir para revelar a essência dos fenômenos geográficos. (ALENTEJANO e ROCHA-LEÃO, 2006, p. 57)

Contudo, levar os alunos a campo para essa (re) significação da dimensão social do

espaço poderia ser feito por qualquer disciplina escolar e em qualquer série. Porém,

trata-se dessa dimensão social produzida e reproduzida no espaço geográfico e

então, a Geografia Escolar é a disciplina que deve possuir competência construída

para realizar esta atividade já que o mesmo é o seu objeto de estudo. Contudo, fazer

essa afirmação não pode significar uma secundarização da necessidade das

práticas multi e interdisciplinares e sim deixar clara a necessidade de precisar o

campo de produção original dessa abordagem.

A Geografia trabalhada dentro da sala de aula não pode ter objetivos semelhantes

aos da formação dos geógrafos, mas deve servir para construir os significados que

possibilitem uma releitura do mundo pelos alunos. Braga (2003) ressalta que é

necessário ultrapassar práticas pedagógicas da educação geográfica que

configuram como uma mera repetição da Geografia Acadêmica, pois a Geografia

como disciplina escolar tem características próprias, principalmente no que tange ao

desenvolvimento da percepção da dimensão socioespacial do real. Moraes (1986)

também problematiza essa questão entre a Geografia Acadêmica e a Escolar,

ressaltando a necessidade de uma revisão dos processos desenvolvidos na

formação inicial dos professores com o que será trabalhado em sala de aula ao

pontuar que as

[...] práticas questionadas na discussão universitária acabam estranhas ao cotidiano do professor. O abismo da linguagem, numa época de rápida renovação, avança exponencialmente. Na mesma circularidade tem-se a defasagem do currículo universitário, que coloca o ingressante no magistério despreparado para a situação de aula. (MORAES, 1986, p.120).

Outros autores também ressaltam o enfraquecimento da Geografia Escolar quando

há uma reprodução da Geografia Acadêmica.

[...] ainda há bem pouco tempo a geografia praticada nas escolas não ia além de uma diluição da geografia universitária, enciclopédica e com os conhecimentos organizados por gavetas. Este problema, associado a muitos outros, nomeadamente, a crise geral do ensino e da identidade da geografia, que junto do grande público se afigura como uma ciência menor, de interesse limitado e, ao nível da educação, como

17

uma disciplina fastidiosa e inútil, voltada para a simples memorização de factos sem importância. (HERCULANO, 2000, p.74)

Herculano (2000) ainda pontua em seu artigo que o ensino de Geografia na escola

básica deve ser oriundo de uma problemática real. Por duas razões:

1) ―Em vez de tudo querer conhecer, devem-se selecionar os principais problemas que realmente se colocam às comunidades humanas inseridas nos distintos contextos sócio-espaciais‖ 2) ―(…)a resolução de problemas alimenta a curiosidade‖ (HERCULANO, 2000, p.75)

Além dessa distinção, Oliveira (1987) mostra um problema da Geografia Escolar ao

criticar os livros didáticos. Para ele, a geografia que se ensina é definida pelos

conteúdos encontrados nesses livros e isso pode criar uma ameaça à autonomia do

professor e distanciar os conteúdos tratados em sala de aula da realidade local.

Nesse processo o professor foi perdendo ou, então, nem teve a oportunidade de formar a sua condição de produtor de conhecimentos. Ele se tornou ou foi transformado em um mero repetidor dos conteúdos dos livros didáticos. As editoras chegaram inclusive a publicar o ―livro do professor‖, uma espécie de ―cartilha‖ na suposição de lhe facilitar o trabalho. (OLIVEIRA, 1987, p. 138)

Essa Geografia Escolar estagnada ou repetidora da Geografia Acadêmica desmotiva

os alunos. ―A Geografia foi perdendo aquilo que de especial ela sempre teve, discutir

a realidade presente dos povos, particularmente no que se refere a seu contexto

espacial.‖ (OLIVEIRA, 1987, p. 138). Esse mesmo autor ainda aprofunda essa

discussão ao mostrar que para

[...] entender esse espaço produzido, é necessário entender as relações entre os homens, pois dependendo da forma como eles se organizam para a produção e distribuição dos bens materiais, os espaços que produzem vão adquirindo determinadas formas que materializam essa organização social. (OLIVEIRA, 1987, p. 142)

Brabant (1976) destaca que a Geografia como disciplina escolar além de trabalhar o

espaço que é o seu objeto de estudo, precisa enfatizar a realidade vivida pelo aluno,

tornando-a compreensível e significativa.

Esse mesmo autor escreveu que, já em 1822, se lia que ―tudo aquilo de que a

ciência se ocupa tem uma existência atual.‖ Para ele, a

18

A geografia escolar, apesar de uma predisposição aparente a tratar do mundo que nos rodeia, acabou se desenvolvendo no mesmo plano das outras disciplinas, um plano antes de tudo marcado pela abstração. Esta contradição é tão mais surpreendente na medida em que por mais longe que se remontar a história da instituição escolar contemporânea em geral e da geografia na escola em particular, encontra-se esta preocupação permanente da ligação privilegiada da geografia com o real. (BRABANT, 1976, p.15)

Verifica-se que esse questionamento sobre a relação entre a Geografia e o real

ainda precisa se concretizar. Essa disciplina ainda é trabalhada de uma forma muito

descritiva em algumas escolas e isso pode torná-la desinteressante.

Para Brabant (1976), a ênfase na descrição implica em uma despolitização do aluno,

ou seja, ela se distancia de possíveis críticas e intervenções no seu respectivo

cotidiano. Ao trabalhar a Geografia Escolar em conteúdos encaixotados e de forma

enciclopédica oriunda de conhecimentos produzidos pela Geografia Acadêmica, o

aluno acaba se distanciando do real.

No entanto, há um paradoxo. Segundo Brabant (1976), ao mesmo tempo em que a

Geografia se propõe a ser a ciência do espaço, o mesmo, no ambiente escolar, é

barrado nos portões da escola. Isso reafirma o problema da pesquisa e por isso, o

incentivo ao trabalho de campo na educação geográfica pode favorecer uma

aproximação com o real e uma melhor compreensão da distinção entre a Geografia

Escolar e Acadêmica que possuem objetivos próprios.

A pesquisadora Callai (1986) sinaliza essa necessidade de aproximação com o real

ao escrever que ―o mundo tem mudado rapidamente e com ele devem mudar

também a escola e o ensino que nela se faz.‖ (CALLAI, 1986, p.134)

Essa mudança no ensino de Geografia deve acontecer também para Cavalcanti

(2005) ao ressaltar que ―o aluno é o sujeito ativo de seu processo de formação e de

desenvolvimento intelectual, afetivo e social; o professor tem o papel de mediador no

processo de formação do aluno.‖ (CAVALCANTI, 2005, p.67),

Callai (1986) também trabalha sob essa perspectiva. De acordo com a autora, para

minimizar a mesmice da educação atual e transformar o aluno em um sujeito ativo

no processo de ensino – aprendizagem, é preciso desenvolver

19

[...] uma prática que seja aberta à possibilidade de questionar o que se faz, de incorporar de fato os interesses dos alunos e de ser capaz de produzir a capacidade de pensar, agindo com criatividade e com autoria de seu pensamento. (CALLAI 1986, p.134)

Trazer a problemática do real para o ensino de Geografia implica em modificações

no planejamento dessa disciplina escolar. Vesentini (1984) mostra que o conteúdo

programático deveria ser adequado à realidade social e existencial do aluno

tornando-o co-autor do saber. Para esse autor ―uma renovação na Geografia

permeia-se pela mutação constante dos temas, afinal, tudo muda ao mesmo tempo:

os conceitos, as categorias e os métodos.‖ (VESENTINI, 1984, p. 112)

Moraes (1986) também mostra essa necessidade de um aluno co-autor. Para ele, é

mister tentar aproximar a teoria e a prática no plano do ensino de Geografia. Para

isso é preciso uma reflexão pedagógica além do planejamento e do método que

assimile os avanços teóricos da ciência geográfica nas últimas décadas.

Contudo, essa assimilação da ciência geográfica não pode ser feita por meio da

aplicação direta, mas sim por processos de construção endógenos desenvolvidos

pela Geografia Escolar.

Além dessa reflexão, uma luta por modificações na conduta pedagógica do ensino

de Geografia é presumível. Wettstein (1982) comunga com Moraes (1986) a ideia de

que o aluno precisa enxergar as transformações do cotidiano. Ele ressalta que é

necessário um compromisso com um trabalho menos distante do real, por parte do

professor.

Desta maneira, a relação aluno/professor/realidade tende a ser mais sólida e

produtora de um ambiente mais propício para a educação geográfica. Assim, o

ensino de geografia na educação básica poderia fomentar o interesse do aluno ao

trabalhar essa perspectiva de significação e aproximação do real que ainda está em

construção, deixando mais claro para professores e alunos os objetivos da

Geografia Escolar.

20

2.2 O trabalho de campo escolar

Ao conhecer a trajetória histórica do trabalho de campo, o professor de Geografia

pode não perceber outra intencionalidade para o mesmo na escola, pois falar sobre

[...] a importância do trabalho de campo para a produção do conhecimento geográfico, creio seja desnecessário. Penso que a maior parte dos geógrafos concorde com o fato de que a ida a campo seja um instrumento didático e de pesquisa de fundamental importância para o ensino e pesquisa da/ na Geografia. Enquanto recurso didático, o trabalho de campo é o momento em que podemos visualizar tudo o que foi discutido em sala de aula, em que a teoria se torna realidade, se ―materializa‖ diante dos olhos estarrecidos dos estudantes, daí a importância de planejá-lo o máximo possível, de modo a que ele não se transforme numa ―excursão recreativa‖ sobre o território, e possa ser um momento a mais no processo ensino/aprendizagem/produção do conhecimento. (MARCOS. 2006. p. 106)

Ao mesmo tempo em que a autora Marcos (2006) ressalta a importância do trabalho

de campo, Alentejano e Rocha-leão (2006) mostram que ainda há um desconforto

na escola básica em relação às saídas a campo.

A utilização do trabalho de campo como instrumento didático não tem sido alvo de muitas reflexões. Não deveria ser assim, afinal, todo professor de Geografia – principalmente dos ensinos médio e fundamental – já deve ter se irritado quando ouviu de seus alunos ou dos professores de outras disciplinas que no dia tal não haveria aula porque tinha passeio, marcado pelo professor de Geografia... Será que de fato promovemos passeios? (ALENTEJANO e ROCHA-LEÃO, 2006, p. 62)

Discute-se muito o local a ser visitado e como será feita a organização do mesmo.

Porém, ―muitas vezes nos esquecemos de relatar o processo que permitiu a

realização do produto.‖ (DUARTE, 2002, p. 140)

Esse processo citado por Duarte (2002) é vagaroso e demanda uma organização e

disponibilidade do corpo docente. Realizar um pré-campo, discutir com os alunos as

possibilidades de áreas a serem visitadas e trabalhadas são etapas essenciais de

um trabalho de campo, mas que às vezes, não são realizadas pelos professores. É

aconselhável que o corpo docente discuta com os alunos os objetivos do trabalho,

converse sobre a importância da atividade, mostre aos alunos as potencialidades e

as fragilidades do local e realizem reflexões sobre o que será visto em campo. Os

alunos precisam perceber que um trabalho de campo é estudar em um ambiente

21

fora da sala de aula e não apenas um momento de descontração onde buscarão

informações desconectadas de um contexto teórico.

As reflexões sobre o trabalho de campo na universidade ainda apresentam limites e

na escola básica as discussões ainda são muito embrionárias. A sua importância

pedagógica é real, mas, Alentejano e Rocha-leão (2006) afirmam que ―se realizado

desarticulado do método e da teoria, torna-se banal.‖ Mesmo assim, o trabalho de

campo ―apesar dos riscos e dificuldades que impõe, revela-se sempre um

empreendimento profundamente instigante, agradável e sedutor.‖ (DUARTE, 2002,

p. 140)

A afirmação de Duarte (2002), ao dizer que uma atividade em campo pode ser

instigante, agradável e sedutora levanta discussões, pois os trabalhos de campo

escolares podem ter especificidades, potencialidades e interesses diversos. Desta

forma, seu planejamento e preparação merecem uma atenção, principalmente, no

ensino básico, pois ainda há divergências conceituais e discordâncias metodológicas

no processo de elaboração do mesmo.

Os próprios autores Alentejano e Rocha-leão (2006) cometeram impropriedades

conceituais ao escrevem ―excursões‖ referindo-se ao trabalho de campo que é bem

mais sistematizado que uma simples excursão, com uma organização prévia e

posterior dos dados ..

A nosso ver, se estas excursões forem previamente preparadas, instigando-se os alunos a problematizar o que vão ver, a preparar o que vão perguntar e refletir acerca do que vão observar, podem representar uma importante contribuição para o processo de formação destes alunos como pesquisadores. (ALENTEJANO e ROCHA- LEÃO, 2006, p. 63).

Além dessas limitações, há alguns professores que acreditam na execução do

trabalho de campo como suficiente para gerar respostas às algumas questões

postas em sala de aula. Esse tipo de visão pode resultar em pouca credibilidade

para a atividade pedagógica em campo, com a possibilidade de esgotá-la na

superficialidade, pois simplifica a relação teoria/prática, que, por natureza, apresenta

grande complexidade. Alentejano e Rocha-Leão (2006, p.56) ressaltam que o

trabalho de campo ―não deve se reduzir ao mundo do empírico, mas ser um

22

momento de articulação teoria-prática‖ e, dessa forma, é necessário planejá-lo

desde a teorização da atividade em si, para que ele possa se tornar efetivamente

uma inovação educacional no ensino básico.

Afinal, imaginar que a execução e a sistematização do trabalho de campo são

suficientes para acessar o conhecimento da dimensão socioespacial do real já foi

superado e isso faz parte da crítica ao empirismo positivista. Além disso, houve

situações na história da Geografia que a importância dessa atividade foi minimizada

pela ideia de que apenas a quantificação dos fenômenos conseguiria responder as

questões sociais. Na

[...] Geografia Teorético-Quantitativa, os trabalhos de campo passaram a ser execrados e praticamente riscados do mapa das práticas dos geógrafos, sob o argumento de que as tecnologias da informação e os modelos matemáticos seriam instrumentos mais adequados para a investigação da realidade. (ALENTEJANO e ROCHA- LEÃO, 2006, p. 55)

Para que o trabalho de campo escolar, como processo mediador para a produção do

conhecimento na escola sobre os problemas sociais e ambientais do espaço tenha

sucesso, seu planejamento e desenvolvimento precisam seguir um caminho

metódico criterioso e ocorrer de forma articulada entre professores, alunos e

supervisão da escola, bem como expressar uma rica relação entre teoria e prática

Rodrigues e Otaviano (2001) justificaram a importância do trabalho de campo em

geografia em um guia metodológico ao afirmarem que o

[...] contato com a realidade dará ao aluno uma nova dimensão dos assuntos tratados nas aulas o que, se bem programado e orientado, servirá entre tantas finalidades para estimular o estudo articulado com as diferentes disciplinas. (RODRIGUES e OTAVIANO, 2001, p.36)

Diferentemente de uma visita técnica ou de uma excursão, o trabalho de campo

pressupõe uma relação mais ativa dos alunos. Os alunos precisam ser vistos como

os protagonistas do trabalho de campo escolar, pois o mesmo, como uma

ferramenta de (re) significação da dimensão social do real, torna o aluno um sujeito

ativo em seu processo de formação e desenvolvimento intelectual, pois ―cabe aos

alunos a tarefa de coleta de dados e materiais, entrevista, observação e anotação

dos aspectos naturais e culturais [...].‖ (TOMITA, 1999, p.14). E, posteriormente,

23

cabe também aos alunos a discussão e a produção de sínteses das informações

coletadas.

Assim, o espaço geográfico que é constantemente mudado pelas intervenções

antrópicas e pela dinâmica natural pode ser interpretado pelos alunos por meio do

trabalho de campo que serviria como uma ponte para a percepção dessas mutações

em cada ecossistema ou em cada comunidade onde há articulações e conflitos,

aproximando o aluno de uma forma mais significativa da realidade.

Por isso, a utilização do trabalho de campo pode ser favorável à construção de

novos significados sobre a realidade encontrada no espaço e reduzir o

distanciamento da realidade concreta em que vivem os alunos, ou seja, essa

estratégia pedagógica pode ampliar as possibilidades de ressignificação da

dimensão social do espaço, contribuindo para uma renovação da educação

geográfica.

Para que haja uma possível consolidação dessa estratégia de ensino-aprendizagem

é necessário sensibilizar os alunos para que eles tomem consciência de possíveis

mudanças no espaço a partir da construção de um saber integrado à realidade e

possivelmente atrelado ao conhecimento e difusão de Tecnologias Sociais.

Contudo, não é possível creditar ao trabalho de campo, por si só, a construção dos

significados desejados para a compreensão da realidade, principalmente se

articulado com as questões socioambientais ou com as tecnologias criadas de forma

endógena em uma comunidade. Alentejano e Rocha-leão (2006) afirmam que se o

trabalho de campo escolar, como uma prática pedagógica para o ensino de

Geografia gerar um ―retorno ao saber integrado se ancorando em um discurso

ambiental‖, o mesmo pode se perder em discussões vagas e sem a gênese de

novos significados. Desta forma, o trabalho de campo necessita de um planejamento

adequado, pois, ele não resolve os limites da educação geográfica como um passe

de mágica. A imersão no contexto, de forma sistematizada e organizada, pode então

ser um estímulo à aprendizagem.

24

Gohn (2006) sinalizou que há vários espaços de aprendizagem. Para ela, a escola

não é o único local de geração de conhecimentos. Há espaços externos à sala de

aula (tecnicamente denominados não-formais de ensino-aprendizagem) que são

sustentados por saberes locais, mas que também são geradores de modificações

concretas da realidade. Por isso, esta pesquisa partiu da hipótese de que o trabalho

de campo, quando articulado metodologicamente de forma adequada, poderia se

tornar um suporte pedagógico para a superação dos limites existentes na tradição

didática da Geografia Escolar.

2.3. As Tecnologias Sociais e o ensino de Geografia Escolar

Como a hipótese dessa pesquisa envolve a discussão das Tecnologias Sociais,

houve a necessidade de uma conceituação desse termo.

Para Rodrigues e Barbieri (2008),

[...] a tecnologia social implica a construção de soluções de modo coletivo pelos que irão se beneficiar dessas soluções e que atuam com autonomia, ou seja, não são apenas usuários de soluções importadas ou produzidas por equipes especialistas, a exemplo de muitas propostas das diferentes correntes da tecnologia apropriada. (RODRIGUES e BARBIERI, 2008, p.1075)

A proposta de se utilizar o trabalho de campo em áreas que supostamente tenham

desenvolvido Tecnologias Sociais pode ser um caminho para que os alunos

identifiquem, por intermédio desta estratégia, o modo como uma tecnologia se torna

social gerando benefícios individuais ou coletivos no processo de produção e

apropriação do espaço geográfico. Afinal,

[...] as TSs são ―técnicas e metodologias‖, ―produtos e processos‖, como quaisquer tecnologias, elas também envolvem de maneira intrínseca um modo próprio de pensar e agir. Muitas vezes, é no modo de aplicação que uma tecnologia torna-se social. Este ―modo‖ é então compreendido como uma abordagem sistêmica que leva em conta todo um conjunto de fatores, desde o reconhecimento das necessidades e da mobilização para a mudança, até os métodos de gestão e a eficácia da solução tecnológica desenvolvida, passando pela avaliação de impactos socioambientais e a busca direta de impactos positivos para o conjunto da sociedade. (PASSONI, 2007, p. 30)

25

Para Novaes e Dias (2009) o conceito de Tecnologias Sociais surge em

contraposição à lógica capitalista, já que ela precisa ser orientada para a satisfação

das necessidades humanas sem promover um tipo de controle capitalista, como por

exemplo, de dominação dos trabalhadores. Nesse contexto é possível trabalhar com

os alunos uma perspectiva diferenciada da dominante sobre a produção e

apropriação do espaço geográfico. O conhecimento de áreas que desenvolvem

Tecnologias Sociais pode estimular novas perspectivas pedagógicas para o ensino

de Geografia, pois os alunos vivenciariam alternativas mais justas e solidárias de

construção e produção do espaço. Afinal, essas tecnologias transitam pela ―inclusão

cidadã, pela acessibilidade, pela sustentabilidade, pela organização, pela promoção

do bem-estar e pela inovação‖ (PASSONI, 2007, p.40). Por isso nessa pesquisa foi

escolhido um assentamento de sem terra na região metropolitana de Belo Horizonte,

pois se trabalhava também com a hipótese de que naquele espaço estariam sendo

desenvolvidas Tecnologias Sociais que pudessem possibilitar aos alunos visualizar

as contribuições expostas acima com o intuito de potencializar seus respectivos

significados dados à dimensão socioespacial do real.

26

3. Metodologia e procedimento de coleta de dados

Esta pesquisa trabalha, principalmente, com a articulação de duas temáticas: a

educação geográfica e o trabalho de campo como estratégia pedagógica. Ao fazer

essa delimitação, foi possível identificar o problema dessa investigação que se

refere à dificuldade que os alunos têm de elaborarem significados e interpretações

sobre a dimensão socioespacial da realidade. A identificação desse problema foi

essencial, pois o ―que determina como trabalhar é o problema que se quer trabalhar:

só se escolhe o caminho quando se sabe aonde se quer chegar‖ (GOLDENBERG,

1999, p.14).

A partir desse pressuposto foi possível escolher a metodologia, as técnicas de coleta

de dados, as fontes dos dados e os métodos de interpretação e análise dos

resultados.

No caso desta investigação, cujo tema foi as dificuldades de apropriação da

dimensão socioespacial do real pelos alunos e cujo objeto de estudo foram as

potencialidades do trabalho de campo escolar como estratégia para potencializar

uma melhor percepção da dimensão socioespacial do real, a metodologia traçada

insere-se dentro do paradigma qualitativo. Essa perspectiva de investigação

responde às necessidades desta pesquisa, pois, segundo Chizzotti (2003), a

[...] pesquisa qualitativa recobre, hoje, um campo transdisciplinar, envolvendo as ciências humanas e sociais, assumindo tradições ou multiparadigmas de análises (...) e adotando multimétodos de investigação para o estudo de um fenômeno situado no local em que ocorre, e enfim, procurando tanto encontrar o sentido desse fenômeno quanto interpretar os significados que as pessoas dão a eles. (CHIZZOTTI, 2003, p. 221)

O referencial teórico metodológico que orientou a coleta e análise dos dados foi a

Análise de Conteúdo trabalhada por Bardin (1976). Silva, Gobbi e Simão (2005, p.

73) destacam que ―a análise de conteúdo é uma técnica de investigação que tem por

finalidade a descrição objetiva, sistemática e quantitativa do conteúdo manifesto da

comunicação.‖ No caso desta pesquisa, a descrição quantitativa aconteceu no

27

levantamento de depoimentos dos alunos sobre as percepções in loco a partir das

orientações disponíveis no material levado a campo.

Silva, Gobbi e Simão (2005) ainda sinalizam que a análise de conteúdo aparece

como uma ferramenta para a compreensão da construção de significados que os

atores sociais exteriorizam no discurso.

Análise de Conteúdo costuma ser feita através do método de dedução frequencial ou análise por categorias temáticas. A dedução frequencial consiste em enumerar a ocorrência de um mesmo signo lingüístico (palavra) que se repete com freqüência, visando constatar ―a pura existência de tal ou tal material lingüístico‖, não preocupando-se com o ―sentido contido no texto, nem à diferença de sentido entre um texto e outro‖, culminando em descrições numéricas e no tratamento estatístico. A análise por categorias temáticas tenta encontrar ―uma série de significações que o codificador detecta por meio de indicadores que lhe estão ligados; [...] codificar ou caracterizar um segmento é colocá-lo em uma das classes de equivalências definidas, a partir das significações, [...] em função do julgamento do codificador. (CAREGNATO e MUTTI, 2006, p.683)

Esse referencial teórico-metodológico de análise foi utilizado para a análise dos

dados coletados após uma categorização e um registro de frequência de diversas

percepções dentro dessas categorias. Essa frequência extraída das percepções dos

alunos permitiu a construção de tabelas e gráficos.

Godoy (1995) destaca que qualquer comunicação que vincule um conjunto de

significações de um emissor para um receptor pode, em princípio, ser traduzida

pelas técnicas de análise de conteúdo. Parte-se do pressuposto de que por trás do

discurso encontra-se um sentido que deve ser desvendado e descoberto pelo

pesquisador.

O método de análise de conteúdo aparece como um instrumento para a percepção

da elaboração de significados que os atores sociais expressam no discurso. Esses

significados são o foco da investigação para desvendar os sentidos dos discursos

elaborados. A partir deles foi possível averiguar se o trabalho de campo realmente

modificou ou não a interpretação e a sensibilização dos alunos sobre a dimensão

social do espaço.

No que tange à coleta de dados no assentamento estudado, o recurso utilizado foi a

entrevista. Os alunos, após a explanação da líder do assentamento, caminharam em

28

direção às moradias e entrevistaram os assentados. Fraser e Gondim (2004)

mostram a importância desse recurso ao pontuarem que a

[...] entrevista na pesquisa qualitativa, ao privilegiar a fala dos atores sociais, permite atingir um nível de compreensão da realidade humana que se torna acessível por meio de discursos, sendo apropriada para investigações cujo objetivo é conhecer como as pessoas percebem o mundo. Em outras palavras, a forma específica de conversação que se estabelece em uma entrevista para fins de pesquisa favorece o acesso direto ou indireto às opiniões, às crenças, aos valores e aos significados que as pessoas atribuem a si, aos outros e ao mundo circundante. (FRASER e GONDIM, 2004, p.140)

Foi levantada a percepção dos alunos sobre a dimensão socioespacial do real em

dois momentos e locais. Um deles ocorreu durante as aulas onde foi feito um

diagnóstico sobre os conceitos e significados já construídos pelos discentes sobre

articulações comunitárias e sobre as características e o processo de produção e

apropriação do espaço rural e do espaço urbano, antes do trabalho de campo,

realizado no Assentamento Pastorinha.

A teorização em sala de aula aconteceu antes da saída a campo. Os alunos, além

de estudarem os conceitos necessários para a coleta de dados, trabalharam com os

mesmos articulando-os com o conteúdo da série, por meio de um diagnóstico

(apêndice 10.1) aplicado em sala de aula. Todo o trabalho foi feito de forma

individual e depois houve momento de debates para a socialização das ideias e

percepções.

O segundo momento de coleta de dados ocorreu no assentamento Pastorinha no

município de Brumadinho (MG) onde os alunos, por meio de entrevistas realizadas

com os assentados, tiveram uma maior aproximação da realidade socioespacial do

assentamento. Havia um roteiro previamente trabalhado com os alunos, mas eles

tinham autonomia para perguntar outras questões que julgassem pertinente no

momento. Os alunos investigaram, principalmente, questões ligadas à apropriação

do território e sobre as técnicas elaboradas pela comunidade para se manter no

assentamento.

Em relação à saída a campo, uma empresa de Turismo Pedagógico organizou o

ônibus e o seguro dos alunos, juntamente com o professor de Geografia da turma e

29

a orientadora da escola. A contratação da empresa foi uma exigência da escola,

mas foi solicitado que não houvesse uma interferência da mesma na coleta de

dados dos alunos. A função da empresa era transportar, com segurança, os alunos

até o assentamento. O trabalho de campo foi também acompanhado pela

orientadora da pesquisa em questão e pela orientadora pedagógica do colégio.

A turma escolhida poderia ser do ensino fundamental ou médio. A exigência para a

escolha da turma centrou-se na adequação do conteúdo programático da série com

as temáticas abordadas na pesquisa que estavam relacionadas com as questões

sociais e econômicas do espaço geográfico. Como a 1ª série do Ensino Médio

estuda o território brasileiro e as modificações antrópicas ocorridas no mesmo, seus

alunos/as foram escolhidos como os sujeitos de investigação. Além disso, cabe

ressaltar que esses alunos selecionados pertenciam a uma escola de elite da rede

privada e isso, de certa forma, influenciou alguns depoimentos.

Em síntese, toda a investigação e seus procedimentos foram feitos em quatro

etapas. Primeiramente, a aplicação do diagnóstico em sala de aula antes do trabalho

de campo. Depois, a teorização (apêndice 10.2) com os alunos sobre a questão

agrária no país. A terceira etapa foi composta pela saída a campo e pelas

entrevistas feitas pelos alunos com os assentados (apêndice 10.3) e por fim, a

quarta etapa contemplou a sistematização em sala de aula das novas percepções

por meio do diagnóstico pós trabalho de campo (apêndice 10.4).

A primeira etapa, então, aconteceu por meio da realização de um diagnóstico, em

sala de aula, com os alunos, antes das primeiras iniciativas ligadas ao planejamento

do trabalho de campo. O objetivo desse diagnóstico foi verificar os significados já

construídos pelos alunos sobre a dimensão socioespacial do real, abordando as

características e o processo de produção/apropriação do espaço rural e do espaço

urbano. O instrumento de coleta de dados utilizado nessa parte (apêndice 10.1) foi

elaborado associando imagens e textos e questões construídas sobre os espaços

citados.

Na segunda etapa (Apêndice 10.2), houve uma teorização em sala de aula sobre os

conceitos estruturantes da temática e a contextualização da área que seria

30

investigada. Em seguida, foi feito o planejamento e a organização do trabalho de

campo no município de Brumadinho (MG). Nesse momento os alunos observaram,

por meio de slides digitais, o espaço que seria investigado e discutiram textos em

sala de aula sobre a temática, como por exemplo, sobre a Reforma Agrária.

A terceira etapa foi a realização do trabalho de campo propriamente dito. No dia de

sua execução, os alunos participaram de algumas atividades no assentamento

Pastorinha que visavam o máximo conhecimento do local. Primeiramente, foi servido

um café da manhã para os alunos e depois a líder do assentamento conversou em

torno de uma hora com eles. Depois dessa atividade, houve uma caminhada para

conhecer toda a área ocupada pela comunidade. Isso durou até a hora do almoço.

Após a refeição, os alunos foram liberados para entrevistar os assentados e

perceber técnicas e saberes que eram utilizados pelos mesmos para equacionar

questões do cotidiano. O roteiro da entrevista foi elaborado pelo pesquisador, com a

participação dos alunos. Ressalta-se que no assentamento em questão, algumas

pessoas acessaram a terra por meio de uma ocupação ilegal e tentam, até hoje, se

manterem na localidade de forma autônoma. O motivo desse ato foi a escassa

oportunidade de acessar o mercado de terras legal. A partir dessa situação, os

alunos, in loco, tentaram identificar quais eram os laços de domínio do território bem

como o papel dos líderes locais. Além disso, eles coletaram informações se havia ou

não Tecnologias Sociais produzidas no local que causariam formas de geração de

renda, que possibilitariam a inclusão social de membros da comunidade e o fomento

da qualidade de vida.

Em síntese, os alunos, além de participarem de uma longa exposição dialogada com

a principal liderança local e da observação do espaço, coletaram informações com

os assentados, por meio de entrevistas, que serviram de norte para a sistematização

das percepções em categorias e para identificar se houve ou não a produção de

Tecnologias Sociais. A quarta etapa foi o processo de sistematização das

percepções que começou ainda no espaço do assentamento (FIG 1), com um rápido

debate e com a participação de alguns assentados. Esse diálogo foi sustentado pela

seguinte questão colocada pelo pesquisador: o que mudou na percepção de vocês

após a visita no assentamento Pastorinha?

31

FIGURA 1 – Socialização das percepções sobre o Assentamento

Pastorinha

Fonte: Produção da pesquisa

A sistematização continuou e terminou, no espaço da escola, quando os alunos

desenvolveram, individualmente, uma síntese retomando o roteiro do primeiro

diagnóstico (Apêndice 10.1) no qual foi feita uma adaptação, agora convertido num

instrumento para a elaboração da síntese (Apêndice 10.3). Esse instrumento de

coleta de dados recuperava a questões do primeiro instrumento com o objetivo de

permitir a verificação das mudanças nas percepções dos alunos. Deste modo, foi

possível sistematizar e categorizar os dados coletados a partir dessa organização

que captou as visões dos alunos antes do contato com os conteúdos em sala de

aula, durante o contato dos mesmos em campo e depois do contato com a realidade

empírica, no assentamento. Uma análise das percepções dos alunos foi organizada

em antes e depois do trabalho de campo. Buscou-se perceber a (re) significação

ocorrida na percepção dos alunos sobre da dimensão socioespacial do real.

Como proposta de intervenção decorrente dos resultados desta pesquisa, foi

elaborada uma comunidade no site de relacionamentos e de troca de informações

denominado ORKUT cujo link está disposto no encarte que será enviado por email

para escolas que desejarem realizar trabalhos de campo em áreas onde,

potencialmente, tenham desenvolvido Tecnologias Sociais em sua ocupação.

Busca-se um intercâmbio de experiências entre professores sobre ao trabalhos de

campo, sobre a conceituação e a importância desse recurso pedagógico e sobre a

discussão da importância da abordagem das Tecnologias Sociais na educação

geográfica para que os alunos percebam a dinâmica social do processo de

produção/apropriação do espaço geográfico.

32

4. Apresentação e análise dos dados

Para a apresentação e análise dos dados foi traçado um caminho para que

houvesse um confronto de informações e dados sobre a percepção dos alunos

anterior ao planejamento e à realização do trabalho de campo, sobre a dimensão

socioespacial da realidade e as alterações, se houvessem, das percepções dos

mesmos alunos, posteriores ao trabalho de campo.

Afinal, se houvesse uma real mudança de leitura de mundo, após o o trabalho de

campo o mesmo poderia ser, então, visto como uma ferramenta para tornar a

educação geográfica mais próxima da realidade.

Os instrumentos de coleta de dados utilizado estão disponíveis nos apêndices 10.1,

10.2 e 10.3 desse trabalho.

As diversas percepções dos dezessete alunos sobre a dimensão socioespacial do

real foram organizadas em subtemas oriundos dos instrumentos de coleta de dados

e dos textos dos alunos.

4.1. Subtema 1- Sobre as habitações

Os alunos se depararam nos diagnósticos com imagens de habitações do

assentamento visitado e de algumas moradias localizadas em um aglomerado

(favela) típico do município de Belo Horizonte (Apêndice 10.1). No primeiro

diagnóstico, os alunos descreveram sobre as casas existentes num aglomerado e no

diagnóstico após o trabalho de campo, eles confrontaram as descrições com o que

foi visto no assentamento no que tange a questão da moradia.

Na percepção inicial, um aluno pontuou que a falta de organização nos aglomerados

foi causada pela atração descontrolada de pessoas para o meio urbano, ou seja,

pelo êxodo rural.

33

Cinco alunos disseram que a situação precária dos aglomerados era fruto da falta de

higiene no local. Isso foi extraído de exemplos como: falta de saneamento, esgoto a

céu aberto e sujeira generalizada nas ruas. Um aluno escreveu que a localização

era o fator determinante da existência de moradias precárias. Para ele, o fato das

moradias estarem numa favela, já determinava uma qualidade ruim de construção e

acabamento. Outro aluno ressaltou que o fraco investimento nessas áreas por parte

do poder público era a razão das dificuldades e da falta de estrutura locais. Nove

alunos não escreveram as possíveis causas da precariedade das moradias dessas

áreas e apenas sinalizaram que havia uma baixa qualidade construtiva ou que as

casas eram ―feias‖. A percepção da origem do problema social foi, então, pouco

discutida pelos alunos. Foi detectada apenas uma percepção simplista de causa e

consequência ao analisarem a questão da moradia em áreas mais pobres. Deixou

entender que construir moradias ―feias‖, morar em locais ―feios‖, era uma escolha do

pobre e que apenas os mais afortunados possuem ―bom gosto‖.

A seguir, há a categorização das percepções dos alunos antes do trabalho de

campo sobre as habitações populares.

34

QUADRO 1

PERCEPÇÃO SOBRE AS HABITAÇÕES POPULARES

Categorias Número de

depoimentos

Alguns depoimentos antes do

trabalho de campo

Qualidade construtiva

das habitações

populares

9 “(...) casas de um aglomerado em

situações precárias, sem saneamento

básico (...)” – Aluno S

“(...) onde cada um constrói o que quer

(...)” – Aluno E

Higiene 5 “(...)em condições precárias, sem

higiene e esgoto onde pessoas de

baixo nível e com menor renda vivem

(...)” – Aluno V

“(...) higiene precária do local, casas e

barracões em péssimo estado.‖ –

Aluno T

Localização 1 “as casas estão muito mal localizadas,

em cima de uma montanha (...)” –

Aluno R

Relação com o poder

público

1 “(...) as consequências [...] do mau

investimento do governo.” – Aluno L

Origem do êxodo rural 1 “ Esses aglomerados surgiram devido

ao êxodo rural (...)” – Aluno L

Fonte: Dados e elaboração da pesquisa

No quadro a seguir que mostra os resultados após o trabalho de campo realizado,

foi possível identificar que quatorze alunos perceberam uma melhoria da qualidade

construtiva das casas do assentamento em relação às do aglomerado, mesmo

sendo uma área com habitações populares.

Três alunos destacaram que a relação com o poder público foi determinante para

que houvesse casas melhores no Assentamento Pastorinha, pois o governo federal

disponibilizou o material de construção. Isso foi relatado pelos assentados. Um aluno

apenas descreveu que esteticamente as casas dos assentados eram mais atraentes

35

e confortáveis, sem se preocupar em relatar as causas desse depoimento. Não

houve observações sobre êxodo rural, localização e higiene no segundo diagnóstico.

No quadro a seguir, há a categorização das percepções dos alunos após o trabalho

de campo, tanto no gráfico quanto na tabela, sobre as habitações populares em

áreas de aglomerados e do assentamento Pastorinha.

QUADRO 2:

PERCEPÇÃO APÓS O TRABALHO DE CAMPO

SOBRE AS HABITAÇÕES POPULARES

Categorias Número de

depoimentos

PERCEPÇÃO

INICIAL

Número de

depoimentos

PERCEPÇÃO

PÓS-

TRABALHO

DE CAMPO

Alguns depoimentos após do

trabalho de campo

Qualidade

construtiva

9

14 “(...) com telhado e infraestrutura

no meio da zona rural.” – Aluno L

“(...) a área é bem feita e há

bastante vegetação ao redor.” –

Aluno R

Higiene 5 0

Localização 1 0

Relação com

o poder

público

1

3

“A ocupação dos assentados

ocorreu com a ajuda do governo

que paga ao proprietário a terra

(...)” – Aluno P

“O número de moradores é

delimitado pelo governo.” – Aluno

F

Origem rural

(êxodo)

1 0

Fonte: Dados e elaboração da pesquisa

36

Gráfico 1: Depoimentos sobre as habitações populares antes e depois

do trabalho de campo

Fonte: Dados e elaboração da pesquisa

As respostas elaboradas pelos alunos no segundo diagnóstico apresentaram

diversas abordagens sobre as condições estruturais e sociais de moradias

populares. Ao tratarem sobre os aglomerados, os alunos pontuaram, principalmente,

questões vinculadas à precariedade das construções e a má organização do

espaço. O saneamento básico também foi um problema citado em cinco

diagnósticos e a observação que há um escasso apoio do governo surgiu em

apenas um.

Percepções cotidianas dos aglomerados fazem parte da rotina dos alunos

investigados, pois a grande maioria mora em Belo Horizonte. Foi possível identificar

que há uma relação de segregação entre essas realidades, justificada pelo alto

número de depoimentos dos alunos que retrataram a precária condição de vida em

área de aglomeração urbana mais popular.

Por outro lado, ao escreverem sobre o assentamento, os alunos destacaram a

diferença na organização do espaço em relação aos aglomerados. Em quatorze

depoimentos, os alunos pontuaram que há uma variação na qualidade estrutural e

organizacional do espaço, sendo melhor no assentamento que no aglomerado. Isso

indicou que o trabalho de campo no assentamento Pastorinha mostrou uma nova

leitura sobre as habitações populares. Isso confirma a fala de Marcos (2003) ao

dizer que o trabalho de campo é

37

[...] um instrumento didático e de pesquisa de fundamental importância para o ensino e pesquisa da/ na Geografia. Enquanto recurso didático, o trabalho de campo é o momento em que podemos visualizar tudo o que foi discutido em sala de aula, em que a teoria se torna realidade, se ―materializa‖ diante dos olhos estarrecidos dos estudantes, daí a importância de planejá-lo o máximo possível, de modo a que ele não se transforme numa ―excursão recreativa‖ sobre o território, e possa ser um momento a mais no processo ensino/aprendizagem/produção do conhecimento. (MARCOS. 2006. p. 106)

Durante as abordagens com os assentados, os alunos foram informados de que a

comunidade local desenvolveu mutirões e acordos para que todos pudessem

melhorar as condições de moradia. Isso provavelmente favoreceu a percepção dos

alunos sobre a questão da moradia, mesmo sendo uma área cuja renda per capita

se assemelha à de áreas de favelização.

A organização do espaço no assentamento pode ter sido outro motivo da

identificação que a moradia no local era melhor. Afinal, foi possível extrair do

primeiro diagnóstico uma percepção da relação entre as moradias em locais

impróprios com a falta de espaço e com as altas densidades demográficas. Para os

alunos, a disponibilidade de espaço na área do assentamento contribuiu para uma

melhor qualidade de vida no local.

Os alunos também descreveram, no primeiro diagnóstico, sobre habitações em

áreas cuja população apresenta uma renda elevada. Essa descrição foi incluída,

pois todos os alunos investigados pertencem às classes sociais mais privilegiadas

economicamente e uma visão desses espaços seria interessante como critério de

análise e comparação.

Entre os dezessete depoimentos, onze pontuaram sobre temas vinculados à

estética, organização e à qualidade do imóvel, ou seja, destacaram a beleza dos

imóveis nas áreas mais ricas. Isso confirma a percepção que as áreas mais pobres

apresentam uma qualidade estética inferior, ou seja, para a maioria dos alunos

investigados há uma relação entre poder aquisitivo e beleza do imóvel. Houve

também a caracterização por meio da meritocracia e pela facilidade de acesso à

renda, ou seja, para os alunos, o acesso à moradia é vinculado à capacidade

financeira do cidadão. Se um indivíduo possui uma renda maior, logo ele pode

acessar uma residência melhor. Isso para alguns alunos determinou a melhor

38

qualidade construtiva das moradias em áreas mais ricas. Além disso, vale ressaltar

que os agentes fundiários e imobiliários escolhem as melhores áreas urbanas para

os melhores empreendimentos.

QUADRO 3

PERCEPÇÃO SOBRE AS MORADIAS DE ALTO LUXO

Categorias Número de

depoimentos

Alguns depoimentos antes do trabalho

de campo

Qualidade construtiva 11 “(...) uma casa de luxo com um espaço

grande ao seu redor e bem planejada.” –

Aluno H

“(...) casa grande e bem construída”- Aluno

L

Higiene 0

Localização 0

Relação com o poder

público

0

Origem rural (êxodo) 0

Acesso à riqueza 6 “(...) moradia das classes mais altas da

população brasileira.‖ – Aluno P

“(...) ambiente propício para a vida, com

uma notável alta renda” – Aluno S

Fonte: dados e elaboração da pesquisa

Confirmando a ideia exposta no parágrafo anterior, nos depoimentos sobre a

Qualidade construtiva foi perceptível uma relação entre a beleza do imóvel e a

renda. Na categoria Acesso à riqueza foi possível notar uma relação entre o mérito

das classes mais afortunadas de ter os melhores salários e empregos com o acesso

aos melhores empreendimentos nas melhores áreas do município.

Não houve depoimentos sobre as categorias: higiene, localização, relação com o

poder público e origem rural. Isso pode indicar um distanciamento dos reais

problemas, causas e caminhos para o acesso à moradia. Para os alunos, as

categorias vinculadas à beleza e à riqueza eram suficientes para justificar o

39

predomínio dos melhores empreendimentos nas melhores áreas da cidade. Talvez,

isso seja fruto de educação geográfica pouco investigativa que eles tiveram e que

proporcionou mais uma memorização do que uma (re) leitura da dimensão

socioespacial do real. Cabe aos professores de geografia promover uma abertura

para que essa disciplina se torne mais investigativa e crítica, tornando os alunos

pesquisadores da realidade. Reafirmando, nós, professores, trabalhamos um

conteúdo de determinada forma porque já vimos alguém fazendo assim ou pensamos que esta é uma forma possível e desejável de ensinar aquele conteúdo. É freqüente trabalharmos um conteúdo sem, verdadeiramente, nos perguntarmos: por que este conteúdo e não outro? Por que assim e não de outra forma? Enfim, por que trabalhar isto, desta forma, nesta disciplina? (BRAGA, 2003, p. 64).

4.2. Subtema 2: Sobre as condições de vida num aglomerado urbano e no

assentamento Pastorinha

A pergunta solicitou aos alunos que descrevessem sobre as possíveis condições de

vida das populações que habitavam os dois espaços representados por imagens no

segundo diagnóstico. Eles se depararam com uma imagem de um aglomerado

oriunda do primeiro diagnóstico e também analisaram uma imagem capturada in

loco de uma moradia do assentamento Pastorinha (disponível apenas no segundo

diagnóstico).

Oito alunos sinalizaram que, no primeiro caso, antes do trabalho de campo, a

precária condição de vida nos aglomerados era oriunda do restrito acesso à riqueza

e aos serviços básicos de um município. Dois escreveram que havia um precário

acesso ao lazer, educação e saúde e sete alunos relacionaram a pior condição de

vida no local com a estrutura física existente no aglomerado.

40

QUADRO 4

PERCEPÇÃO INICIAL SOBRE A CONDIÇÃO DE VIDA EM ÁREAS POBRES

Categorias Número de

depoimentos

Alguns depoimentos antes do

trabalho de campo

Acesso à renda e aos

serviços públicos.

8 “A condição de vida da população

da primeira imagem não é boa, o

salário das famílias muitas das

vezes não dá para alimentar (...)”

Aluno H

“(...) são pessoas humildes que

devem ganhar 1 ou 2 salários

mínimos (...)” – Aluno R

Lazer, estudo, emprego,

e saúde.

2 “(...) as pessoas não estudam em

uma boa escola e o contato com o

crime é enorme (...)” – Aluno L

Estrutura física local 7 “(...) As condições de vida

possivelmente são ruins por não

ter infraestrutura de modo que

cubra as necessidades do cidadão

(...)” – Aluno G

“(...) Eles não têm água tratada,

tratamento de esgoto, não têm

postos de saúde e para ter esses

serviços é necessário descer para

a área dos ricos. (...)” – Aluno L

Fonte: dados e elaboração da pesquisa

41

QUADRO 5

PERCEPÇÃO APÓS O TRABALHO DE CAMPO

SOBRE A CONDIÇÃO DE VIDA EM ÁREAS POBRES

Categorias Número de

depoimentos

PERCEPÇÃO

INICIAL

Número de

depoimentos

PERCEPÇÃO

PÓS

TRABALHO

DE CAMPO

Alguns depoimentos após o

trabalho de campo

Acesso à renda

e aos serviços

públicos.

8

(precário

acesso)

7

(acesso

garantido por

articulações

comunitárias)

“(...) pois eles têm uma

moradia com infraestrutura e

um possível saneamento

básico (...)” – Aluno C

“(...) possuem um trabalho fixo,

uma renda estável e um bom

lugar para morar.” – Aluno F

Lazer, estudo,

emprego e

saúde.

2 9 “Uma população pobre, mas

que tem uma condição de vida

melhor, com mais higiene,

alimentos e até mesmo mais

dinheiro.” – Aluno T

―(...) embora precária a

condição de vida, estes têm

acesso à escola, saneamento

e alimento (...)‖ – Aluno L

Estrutura física

local

7 0

Relação com o

poder público

0 1 “(...) o governo não leva

melhorias nenhuma para os

assentados (...)” Aluno L

Fonte: dados e elaboração da pesquisa

42

Gráfico 2: Percepções sobre as condições de vida em aglomerados

urbanos e no assentamento.

Fonte: dados e elaboração da pesquisa

Após a ida ao assentamento, sete alunos destacaram que o planejamento

comunitário favoreceu o acesso à renda e aos serviços numa área cuja renda per

capita média se assemelhava à existente nos aglomerados urbanos. Isso contradiz o

que foi exposto antes do trabalho de campo, pois os alunos escreveram que as

áreas mais pobres apresentavam uma má qualidade de vida devido ao restrito

acesso à renda e aos serviços.

Nove alunos escreveram que havia melhores condições de vida no assentamento

devido ao acesso ao lazer, estudo, emprego e saúde. Apenas um aluno escreveu

que o governo ajuda mais os assentados do que os moradores de aglomerados em

áreas urbanas.

Os alunos identificaram que o assentamento visitado possui algumas articulações

sociais que favoreceram uma melhor organização do local e por consequência

melhores condições de vida, fato esse justificado pela categoria lazer, estudo,

emprego e saúde. Os alunos notaram que havia, no assentamento, áreas

diferenciadas para o plantio, para o lazer e para a moradia. Ou seja, para os alunos,

essas áreas, aliadas à baixa densidade demográfica do local, favoreceram uma

melhor organização do espaço. Isso aprofunda o que foi dito sobre os aglomerados,

43

pois nos depoimentos iniciais dos alunos foi visível a relação entre alta densidade

demográfica com a precariedade da organização do espaço.

Houve outros destaques: um depoimento citou uma relação entre o baixo uso de

tecnologias (convencionais) nas atividades com as condições de vida do local. No

mesmo, o aluno escreveu que as duas áreas usufruem de pouca tecnologia e isso

compromete a qualidade de vida desses espaços. (Esse depoimento foi incluído na

categoria: Planejamento). Outros depoimentos ressaltaram a geração de renda

como premissa para a melhoria na qualidade de vida.

Como o espaço do assentamento era mais organizado, logo, alguns alunos inferiram

que a renda local seria maior. Por outro lado, um depoimento destacou a

necessidade de investimentos do poder público na ampliação da qualidade de vida.

Nesse depoimento, mesmo com o trabalho de campo, a aluna ressaltou que o

governo municipal ―leva‖ mais investimentos para os aglomerados e ―não leva

melhoria nenhuma para os assentados.‖ Isso é contraditório, afinal, os assentados

sinalizaram diversas vezes a presença do poder público em várias questões locais.

4.3. Subtema 3: Sobre a ocupação do espaço urbano e rural

O instrumento de coleta de dados apresentou a seguinte questão: ―Que hipóteses

você elabora sobre os possíveis processos de ocupação desses espaços?‖

Tinha-se a expectativa de que os alunos, a partir das descrições feitas sobre as

habitações, escrevessem sobre as possíveis estratégias utilizadas pelas classes

sociais menos privilegiadas economicamente, residentes em aglomerados urbanos

(favelas) e em assentamentos rurais e pelas classes mais ricas sobres suas

respectivas estratégias de acesso a terra.

44

QUADRO 6

PERCEPÇÃO INICIAL SOBRE A OCUPAÇÃO DO

ESPAÇO RURAL E DO ESPAÇO URBANO

Categorias Número de

depoimentos

Alguns depoimentos antes do trabalho de

campo

Migração 9 “A ocupação das favelas foi devido ao êxodo

rural que várias famílias saíram da área rural

para a urbana (...)” – Aluno L

―A ocupação se deu pelo êxodo rural, pessoas

procurando melhores condições de vida e

acabam sofrendo exclusão social (...)” – Aluno S

Distribuição

de renda.

4 “(...) as pessoas de alta renda que com certeza

tiveram oportunidades em suas vidas.” Aluno F

“(...) não têm dinheiro para comprar uma moradia

melhor(...)”- Aluno R

Organização

para o

acesso à

terra

2 “(...) as pessoas foram se instalando de pouco

em pouco e chamando parentes e amigos para

morar lá (...)” Aluno R

“(...) feita de forma errada e desorganizada, o que

pode levar a desabamentos (...)” – Aluno C

Acesso por

herança

2 “(...) pelo fato dos ancestrais já possuírem (...)

uma renda estável para se estabelecer no local.”

Aluno S

Fonte: dados e elaboração da pesquisa

Nove depoimentos destacaram o processo de êxodo rural como determinante para o

crescimento dos aglomerados em áreas urbanas. Quatro alunos balizaram a má

distribuição de renda como causa das disparidades de acesso a terra. Dois

identificaram que a organização comunitária é determinante para o processo de

ocupação de uma área e, por fim, dois alunos destacaram que a ocupação de uma

área acontece por herança.

45

Por conseguinte, a migração campo – cidade foi indicada como o principal fator

percebido pelos alunos sobre a ocupação/surgimento de aglomerados urbanos.

Esse fato pode ser oriundo dos conteúdos trabalhados no ensino fundamental. Na 7º

série do ensino fundamental, mais precisamente, há uma discussão sobre essa

temática com os alunos. Essa relação êxodo rural/aglomerados é muito forte entre

os alunos. Para eles, isso é quase um modelo. Se há aglomerados, logo sua

formação é consequência de um êxodo rural. Os alunos desconhecem que muitas

pessoas que moram em favelas não têm qualquer ligação em sua trajetória com o

espaço rural.

Contudo, a formação de vilas e favelas em grandes centros é diferenciada e há

diversos motivos, mas vários livros didáticos abordam esse tema desta forma. No

entanto, após o trabalho de campo no assentamento Pastorinha, essa percepção

caiu de nove para dois depoimentos (ver quadro a seguir). Isso mostra que esse

recurso foi útil para uma mudança na leitura de mundo dos alunos e que sua difusão

e aprimoramento deve ser algo de perene reflexão entre os gestores da escola.

Isso ratifica a fala de Alentejano e Rocha-Leão (2003), pois se essas atividades em

campo

forem previamente preparadas, instigando-se os alunos a problematizar o que vão ver, a preparar o que vão perguntar e refletir acerca do que vão observar, podem representar uma importante contribuição para o processo de formação destes como pesquisadores. (ALENTEJANO e ROCHA- LEÃO, 2006, p. 63)

A seguir, há a categorização das percepções dos alunos antes e depois do trabalho

de campo sobre o processo de ocupação de aglomerados em áreas rurais e do

assentamento Pastorinha.

46

QUADRO 7

PERCEPÇÃO APÓS O TRABALHO DE CAMPO SOBRE A OCUPAÇÃO DO ESPAÇO

RURAL E DO ESPAÇO URBANO

Categorias Número de

depoimentos

PERCEPÇÃO

INICIAL

Número de

depoimentos

PERCEPÇÃO PÓS

TRABALHO DE

CAMPO

Alguns depoimentos após o trabalho de

campo

Migração 9 2

“No assentamento, o processo de

ocupação é feito por pessoas que

preferem a vida no campo (...), pois

viram que a quantidade de pessoas que

não conseguem uma vida melhor na

cidade” – Aluno V

Distribuição

de renda.

4 0 -

Organização

para o

acesso à

terra

2 4 “O processo de ocupação deste espaço

se deve pela procura de pessoas por

terras no campo que os levam à lugares

como esse (assentamento)” – Aluno B

“Indivíduos [...] que procuraram

assistência e entraram em comunidades

produtivas agrícolas onde são

estabelecidas regras de produção e

comércio de acordo com um líder”–

Aluno L

Acesso por

herança

2 1 “Esses produtores (...) recebem essas

terras por hereditariedade (...)” Aluno T

Influência do

poder

público

0 10 “A ocupação dos assentamentos

ocorrem com a ajuda do governo que

paga por propriedades de terra (...)” –

Aluno P

“A ocupação desse espaço deve ter sido

difícil, pois ocorreram muitas batalhas

com o governo (...)” – Aluno F

Fonte: dados e elaboração da pesquisa

47

Gráfico 3: As percepções sobre a ocupação do espaço urbano e do espaço rural

Fonte: dados e elaboração da pesquisa

Sobre a ocupação do espaço urbano e do rural, também foi evidente o número de

alunos que pontuaram a influência do poder público na conquista da terra por parte

dos assentados do Pastorinha. Diferentemente do primeiro diagnóstico em que os

alunos ressaltaram o êxodo rural como o principal motivo de deslocamentos entre

esses espaços, na segunda percepção foi notável a influência do poder público para

o acesso a terra. Isso pode ter sido resultado da ênfase dada pela líder comunitária

do assentamento sobre esse tema durante a sua explanação para os alunos. Ao

explicar o processo de acesso a terra, ela pontuou que o governo desapropriava e

comprava o terreno e o repassava para os assentados que deveriam pagá-lo nos

anos seguintes. Isso foi significativo para os alunos, pois, as discussões em sala de

aula mostraram uma ideia de um poder público distante dessa temática ou que

serviria apenas para conter as ocupações ilegais nas áreas rurais. Isso demonstra

que o

[...] contato com a realidade dará ao aluno uma nova dimensão dos assuntos tratados nas aulas o que, se bem programado e orientado, servirá entre tantas finalidades, estimular o estudo articulado com as diferentes disciplinas. (RODRIGUES e OTAVIANO, 2001, p.36)

Por isso que entre todas as abordagens dessa investigação, a categoria de análise

Influência do poder público, no que diz respeito à ocupação do espaço, foi a que

apresentou a maior discrepância entre o antes e o depois. Em alguns depoimentos,

Migração

48

os alunos sinalizaram que realmente desconheciam a importância do poder

executivo nas questões agrárias brasileiras.

Foi possível identificar que os alunos perceberam que as etapas de conquista da

terra de um movimento de luta fundiária na área rural são mais vagarosas e

demandam uma organização e um planejamento de diversos atores, além da

interferência do poder público. Possivelmente, por esse motivo, o número de

depoimentos da categoria Organização para o acesso a terra aumentou de dois para

quatro. A estruturação do assentamento em glebas fragmentadas, os depoimentos

de alguns assentados e a visível organização social do local e motivaram uma

grande mudança na visão dos alunos sobre a ocupação do meio rural. Esse fato,

reforçou a necessidade de trabalhos de campo nesse tipo de ambiente para a (re)

significação da dimensão socioespacial do real.

4.4. Subtema 4: A agricultura de subsistência e a agroindústria

No primeiro diagnóstico, os alunos se depararam com uma imagem de uma área

rural bem simples com uma casa de pau-a-pique, com uma horta de subsistência e,

ao lado, outra figura com uma agroindústria. Apenas seis depoimentos destacaram

as condições precárias da moradia representada na imagem e não aprofundaram

sobre as origens desse tipo de situação. Por outro lado, quatro alunos escreveram

que a pobreza na área rural era resultante da ausência do uso de tecnologias e

outros sete pontuaram a fraca geração de renda como o motivo da precariedade da

habitação e que a baixa qualidade construtiva do imóvel era vinculada ao uso do

solo baseado na subsistência.

49

QUADRO 8

PERCEPÇÃO INICIAL SOBRE A AGRICULTURA DE SUBSISTÊNCIA

Categorias Número de

depoimentos

Depoimentos sobre agricultura de

subsistência

Condições

precárias

6 “(...) uma pequena casa de pau a pique

em um terreno seco e com uma pessoa

vestindo humildemente.” – Aluno R

“(...) pessoas que provavelmente já

nasceram ali e estão apenas

produzindo sem conseguir muitos

lucros (...)”– Aluno B

Ausência de

tecnologia.

4 “Uma área de agricultura com uma

baixa tecnologia (...).” – Aluno S

“tem falta de recursos e tecnologia e

dependem de sua produção para

viverem. – Aluno L

Defasagem

econômica e

produtiva

7 “Uma humilde fazenda onde se vê uma

sede própria com animais vivendo

como as pessoas, um local de

pobreza” – Aluno T

“A qualidade de vida defasada e a má

produção agrícola (...) – Aluno L

Fonte: dados e elaboração da pesquisa

Sobre a imagem que mostrava uma agroindústria, onze alunos perceberam que a

presença de uma agroindústria contribuía para a geração de riquezas para a

localidade e que a possibilidade de ampla produção agrícola seria o motivo da

presença da mesma naquele local. Cinco alunos relacionaram a existência da

empresa com a oferta de tecnologia convencional. Tudo indica que para os alunos,

tecnologia seria algo regado de softwares e sistemas operacionais. Isso, para eles,

estaria presente apenas nas áreas de agronegócio e não de agricultura de

subsistência. Apenas um depoimento relacionou a existência de indústrias em áreas

rurais com a oferta de espaço, sem explicar o vínculo entre espaço e indústria.

50

QUADRO 9

PERCEPÇÃO INICIAL SOBRE AS AGROINDÚSTRIAS

Categorias Número de

depoimentos

Depoimentos sobre agroindústria

Oferta de tecnologia. 5 “O uso do avanço tecnológico para lucros

é o fator primordial que determina esta

área.” – Aluno L

“(...) onde se tem máquinas tecnológicas

desempenhando o trabalho do homem

tendo em vista o lucro.” – Aluno V

Área de alta

produção agrícola

11 “(...) onde o produto é produzido para a

exportação (geração de dinheiro).” –

Aluno H

“(...) o plantio deve ser grande e para

vender e essa fazenda deve ter muito

lucro.” – Aluno F

Oferta de espaço 1 “(...) que provavelmente foi construída ali

por causa do espaço.” – Aluno B

Fonte: dados e elaboração da pesquisa

4.5. Subtema 5: As condições de vida no Rural Brasileiro (agricultura de

subsistência e agroindústrias)

A intenção era que os alunos, por meio das mesmas imagens (agricultura de

subsistência e agroindústrias), descrevessem sobre a condição de vida desses

locais. Oito alunos perceberam o antagonismo das imagens por razões econômicas

e que isso influenciaria a condição de vida dos espaços em questão.

A aluna H escreveu que a condição de vida na ―primeira imagem - agricultura de

subsistência - não é boa, eles produzem para gerar renda para a família‖. Na

segunda imagem - agroindústrias -, ela sinalizou que a condição de vida ―é boa, eles

51

produzem para fornecerem alimentos para a população e para terem dinheiro para

manter os funcionários.‖ O aluno relacionou a produção/produtividade com condição

de vida e produção de riqueza. Houve outras razões expostas pelos alunos. Três

depoimentos relacionaram a pior condição de vida em áreas de agricultura de

subsistência com o baixo uso de tecnologias e seis vincularam ao precário acesso a

uma adequada higiene local.

QUADRO 10

PERCEPÇÃO INICIAL SOBRE A CONDIÇÃO DE VIDA NO MEIO RURAL

Categorias Número de

depoimentos

Alguns depoimentos antes do trabalho de

campo

Disparidades

sociais e

econômicas

8 “Pessoas simples com uma condição de vida

ruim onde provavelmente não tiveram

oportunidades de estudar” – Aluno B

“(...) o proprietário não reside neste lugar e suas

condições financeiras devem ser altas.” – Aluno

B

Relação:

qualidade de

vida / uso de

tecnologias.

3 “(...) é mais humilde, sem um desenvolvimento

tecnológico e sem infraestrutura o que gera

uma econômica muito menor (...)” – Aluno S

“(...)as condições de vida são sub humanas,

provavelmente não deve ter dinheiro para

comprar comida” – Aluno R

Disparidades:

higiene /

infraestrutura

(acesso)

6 “A população (...) deve ter muitos problemas

com higiene, saúde e provavelmente com a

distância do meio urbano (...)” – Aluno T

“(...) por não ter acesso a infraestrutura e não

ter recursos financeiros suficientes (...)”- Aluno

G

Fonte: dados e elaboração da pesquisa

52

4.6. Subtema 6: O processo de ocupação no Rural Brasileiro (agricultura de

subsistência e agroindústrias)

Os estudos, na Geografia Escolar, sobre a questão agrária no Brasil problematizam

as disparidades do acesso a terra e trabalham as estratégias desenvolvidas pelos

seus respectivos atores para se manterem no local. Antes do trabalho de campo,

observou-se que os alunos, em sua maioria, repudiavam os mecanismos de acesso

a terra via ocupações e imaginavam o ambiente de um assentamento desorganizado

e com pessoas ―baderneiras‖.

Essa percepção preconceituosa era esperada antes do trabalho de campo no

assentamento, pois as percepções expostas pelos alunos no primeiro diagnóstico

levavam a isso. Esperava-se, então, que os alunos relatassem o processo de

ocupação de áreas rurais de alto e baixo poder aquisitivo por meio da diferença de

renda, sendo o acesso a terra mais fácil por indivíduos mais ricos. Isso foi

comprovado nas percepções escritas sobre a imagem 2 – agroindústria - que, com

nove depoimentos, obteve o maior índice. Para os alunos, as melhores áreas rurais

foram ocupadas por grupos sociais com maior poder aquisitivo que, posteriormente,

instalaram agroindústrias. Afinal, a classe mais rica detém maior disponibilidade

financeira para acessar os melhores locais. E isso, por consequência, gera mais

qualidade de vida para os alunos.

Como exemplo, o aluno R sinalizou que: ―Na foto 1– agricultura de subsistência-, a

mulher deve ter construído sua casa em um lugar desabitado, ou ocupou o lugar de

uma forma desorganizada. Na foto 2, um fazendeiro comprou uma fazenda, montou

uma indústria onde ela cresceu, o terreno foi ocupado de maneira legal.‖

A seguir, há um quadro com as informações sobre as percepções iniciais sobre a

ocupação do meio rural.

53

QUADRO 11

PERCEPÇÃO INICIAL SOBRE A OCUPAÇÃO DO MEIO RURAL

Categorias Número de

depoimentos

Alguns depoimentos antes do trabalho de

campo

Renda para

acessar o

mercado fundiário

(compra e

ocupação de

terras)

9 “(...) um fazendeiro comprou uma fazenda

montou uma indústria onde ela cresceu, o

terreno foi ocupado de forma legal.” – Aluno E

Migração 1 “(...) pessoas que migram de zonas urbanas

querendo uma vida mais calma sem o stress

das cidades.” Aluno P

Hereditário 6 “(...) a habitação foi de família de um pai que

passou para o filho” – Aluno R

Finalidade: gerar

renda

1 “(...) é pelo fato de precisarem produzir algo

para se sustentar” – Aluno L

Fonte: dados e elaboração da pesquisa

4.7. Subtema 7: A geração de renda no meio rural (a agroindústria e a

agricultura de subsistência)

No segundo diagnóstico, após o trabalho de campo, os alunos se depararam

novamente com imagens de uma área rural que no caso era uma do assentamento

visitado e outra de uma agroindústria. Os quadros e os gráficos a seguir mostram as

mudanças nas percepções dos alunos.

54

QUADRO 12

PERCEPÇÃO APÓS O TRABALHO DE CAMPO SOBRE AS AGROINDÚSTRIAS

Categorias Número de

depoimentos

PERCEPÇÃO

INICIAL

Número de

depoimentos

PERCEPÇÃO

PÓS

TRABALHO

DE CAMPO

Alguns depoimentos após o

trabalho de campo

Oferta de

tecnologia.

5 7 “(...) a colheita é feita com

máquinas por isso o cultivo e o

lucro são muito grandes” – Aluno F

“(...) a produção é alta devido à

utilização da tecnologia como

base” – Aluno L

Área de alta

produção

agrícola

11 8 “Uma agroindústria busca o seu

lucro pela grande venda de

produtos agrícolas” – Aluno B

“(...) a agroindústria usa muitas

máquinas para ter o lucro muito

grande” – Aluno E

Oferta de

espaço

1 0

-

Qualificação

profissional

0 1 “(...) a industrialização em áreas

rurais exigem uma maior

qualificação e é mais concorrida” –

Aluno G

Uso de

agrotóxicos

0 1 “A agricultura das agroindústrias

normalmente usam agrotóxicos na

produção gerando uma produção

maior” – Aluno P

Fonte: dados e elaboração da pesquisa

55

Gráfico 4: A percepção sobre a geração de renda antes e depois do

trabalho de campo em áreas de agroindústria.

Fonte: dados e elaboração da pesquisa

As mudanças na percepção em relação ao meio rural no que tange a existência de

agroindústrias foram mínimas, apenas uma queda na segunda categoria. Um fato

que pode ajudar a compreender essa permanência pode ser o fato da não

contemplação, no trabalho de campo, desse tipo de atividade (agroindústria) que faz

parte do conteúdo programático dos alunos da 1ª série do Ensino Médio. Isso pode

estar mostrando, também que o trabalho de campo não pode focalizar um número

excessivo de temas e questões, pois os alunos precisam focar em apenas alguns

para que a (re) significação da dimensão socioespacial do real aconteça de forma

mais densa. Entretanto, alguns dados que foram extraídos do segundo diagnóstico

apresentam mudanças maiores em relação a esse tema. Os alunos relacionaram a

alta produtividade das agroindústrias ao uso de tecnologias, de agrotóxicos e da

existência de qualificação profissional. Esse tipo de percepção não foi visível quando

os alunos escreveram sobre as áreas de assentamento e isso, para eles, acabou

influenciando na baixa produtividade de áreas rurais mais pobres. Essa percepção

dos alunos sobre as agroindústrias, mesmo após o trabalho de campo, mostra que a

relação entre oferta de capital para investimentos e o desenvolvimento econômico é

muito presente no cotidiano dos mesmos. Vários alunos possuem pais que são

proprietários ou trabalham em grandes empresas que investem maciçamente em

tecnologias de ponta. Contudo, após a ida ao assentamento, os alunos perceberam

que era possível ampliar a qualidade de vida e gerar renda com técnicas e

tecnologias mais simples. O quadro a seguir mostra essa percepção.

56

QUADRO 13

PERCEPÇÃO APÓS O TRABALHO DE CAMPO SOBRE A AGRICULTURA DE SUBSISTÊNCIA

Categorias Número de

depoimentos

PERCEPÇÃO

INICIAL

Número de

depoimentos

PERCEPÇÃO

PÓS

TRABALHO DE

CAMPO

Alguns depoimentos após o trabalho

de campo

Condições

precárias

6 0

Ausência de

tecnologia.

4 1 “(...) o mecanismo utilizado pelo

agricultor é a mão ou ferramentas

que não são nada tecnológico e

que não tem um grande margem

de lucro” – Aluno V

Defasagem

econômica e

produtiva

7 5 “(...) é uma agricultura familiar por

isso não produz muito e não gera

muito lucro também” – Aluno F

“(...) não tem a ajuda de máquinas,

é uma agricultura familiar e por isso

não produz muito (...)– Aluno F

Ausência de

agrotóxico

0 2 “A agricultura dos assentamentos

são feitas sem o uso de

agrotóxicos gerando menos

colheita, porém tendo menos

concorrência” – Aluno T

Plantio e

comercialização

(organização

endógena)

0 9 “(...) eles são comercializados em

feiras e a produção não é muito

grande” – Aluno L

“(...)as pessoas colhem o próprio

cultivo para comer e o resto usam

para vender e gerar uma renda” –

Aluno C

Fonte: dados e elaboração da pesquisa

57

Gráfico 5: A percepção sobre a geração de renda antes e depois do

trabalho de campo em áreas com agricultura de subsistência.

Fonte: dados e elaboração da pesquisa

Os alunos perceberam que no assentamento Pastorinha cuja renda per capita é

baixa, houve possibilidades de uma gestão econômica e social do espaço de forma

a garantir uma melhor qualidade de vida ainda que com um baixo poder aquisitivo.

Nenhum aluno havia sinalizado sobre um possível arranjo endógeno em uma

comunidade rural de baixa renda no primeiro diagnóstico. Tal fato ganhou um

destaque no segundo. Nove alunos pontuaram essa questão. Isso ocorreu,

possivelmente, pela presença da líder comunitária e dos acordos entre os

assentados como a divisão de tarefas existentes no assentamento que vão desde o

plantio à comercialização. As técnicas para o plantio orgânico também foram

apresentadas e polemizadas.

Provavelmente, as ferramentas e as soluções práticas descobertas e/ou construídas

pelos assentados chamaram a atenção dos alunos cuja percepção sobre a ausência

de tecnologia sofreu uma queda de quatro para apenas um aluno. Porém, os alunos

não disseram que tais tecnologias e organização endógena seria uma Tecnologia

Social. Eles poderiam ter escrito sobre isso, pois essa discussão foi feita durante a

etapa de instrumentalização. No entanto, foi possível identificar que os alunos

perceberam possíveis Tecnologias Sociais no assentamento e isso contribuiu para

as categorias: ausência de tecnologia e organização endógena. Ou seja, ao

58

escreverem nos depoimentos sobre a comercialização, sobre a divisão de tarefas e

sobre o uso de técnicas orgânicas para combater as pragas, os alunos as

sinalizaram. Eles perceberam que

[...] a tecnologia social implica a construção de soluções de modo coletivo pelos que irão se beneficiar dessas soluções e que atuam com autonomia, ou seja, não são apenas usuários de soluções importadas ou produzidas por equipes especialistas, a exemplo de muitas propostas das diferentes correntes da tecnologia apropriada. Uma definição de tecnologia social proposta pelo Instituto de Tecnologia Social (ITS, 2004:130) é a seguinte: ―um conjunto de técnicas, metodologias transformadoras, desenvolvidas e/ou aplicadas na interação com a população e apropriadas por ela, que representam soluções para a inclusão social e melhoria das condições de vida‖. (RODRIGUES e BARBIERI, 2008. p.1075)

Na etapa de análise dos dados, esses nove depoimentos sobre uma organização

endógena e a queda de quatro para um depoimento sobre a escassez de tecnologia

em assentamentos foram cruciais para a confirmação parcial das hipóteses. As

entrevistas realizadas pelos alunos e o momento que eles tiveram para conhecer o

assentamento favoreceram essas mudanças de percepções que potencializam a

importância do trabalho de campo escolar. Mesmo sendo um resultado pequeno

frente ao número de categorias e percepções, as mudanças detectadas foram

relevantes.

4.8. Subtema 8: Sobre o processo de urbanização

Tanto no primeiro quanto no segundo diagnóstico havia uma parte sobre a

urbanização brasileira. O intuito era identificar as relações que os alunos

identificariam entre o processo urbanização e a organização do espaço rural.

Sobre esse tema, antes do trabalho de campo, seis alunos destacaram que o motivo

da urbanização foi o êxodo rural. Dois alunos escreveram que as indústrias foram

responsáveis pelo crescimento das cidades no Brasil. E, um aluno sinalizou que o

processo de urbanização foi delimitado pela divisão de classes no espaço

geográfico. Por fim, oito alunos ressaltaram que tal fenômeno apresentou falhas em

sua organização durante o século XX.

59

QUADRO 14

PERCEPÇÃO INICIAL SOBRE O PROCESSO DE URBANIZAÇÃO

Categorias Número de

depoimentos

Alguns depoimentos antes do trabalho de campo

Êxodo rural 6 “(...) é perceptível uma grande distinção econômica,

os aglomerados são resultado de imigrantes e dos

que vieram do campo‖ – Aluno S

Papel da

indústria

2 “A urbanização brasileira teve a indústria como o

principal fator (...)” – Aluno B

Segregação

socioespacial

1 “(...) como organizada no papel e desorganizada na

realidade. Suas principais características são as

misturas de bairros nobres com aglomerados e a

diferença de preços dos terrenos (...).” – Aluno R

Organização 8 “Eu vejo a organização como correta em algumas

áreas onde o governo preocupa com as pessoas” –

Aluno B

Fonte: dados e elaboração da pesquisa

Após o trabalho de campo, os alunos também foram questionados sobre a

urbanização brasileira. Veja os dados a seguir.

60

QUADRO 15

PERCEPÇÃO APÓS O TRABALHO DE CAMPO

SOBRE A URBANIZAÇÃO BRASILEIRA

Categorias Número de depoimentos PERCEPÇÃO

INICIAL

Número de depoimentos PERCEPÇÃO

PÓS TRABALHO DE CAMPO

Alguns depoimentos após o trabalho de campo

Êxodo rural 6 4 “O processo de urbanização brasileira

foi muito intenso, havia pessoas que

saíam do campo em busca de

melhorias na vida (...)” – Aluno T

Papel da

indústria

2 1 “(...) devido ao grande desenvolvimento

dessas regiões em relação à indústria e

à tecnologia.” – Aluno P

Segregação

socioespacial

1 0 -

Organização 8 9 “Eu vejo uma má organização urbana,

desequilibrada socialmente (...)” –

Aluno L

“(...) má administração do governo e

desorganizado.” – Aluno R

Campo x

cidade

0 2 “Eu vejo a organização do processo de

urbanização melhorando pois o governo

está criando novas ideias para que o

agricultor continue no campo” – Aluno V

Influência poder público

0 1 “Acho por um ponto desorganizado pelo jeito que as favelas foram construídas, mas a parte que é para ser feita pelo governo acho que é organizado” – Aluno L

Fonte: dados e elaboração da pesquisa

61

Gráfico 6: As percepções sobre a urbanização do Brasil

Fonte: dados e elaboração da pesquisa

Nesta etapa, as mudanças de percepção foram reduzidas. Durante o trajeto até o

assentamento foram discutidos alguns temas sobre o processo de urbanização no

Brasil bem como sua relação com o espaço rural. A fraca mudança de percepção

dos alunos coincidiu com o mesmo resultado obtido no subtema que discutia sobre a

agroindústria.

Contudo, ainda se manteve alto o número de alunos que relacionaram a precária

organização do espaço urbano com a presença de vilas e favelas. De acordo com a

visão do pesquisador, isso aconteceu, pois os alunos destacaram que a presença de

assentamentos urbanos ilegais ou com baixa qualidade construtiva eram resultantes

de uma gestão inadequada do poder público durante a urbanização do país que

levou à formações de moradias em áreas de risco social e geológico.

Tal conclusão se correlaciona com a ideia, oriunda do primeiro diagnóstico, de que

esses espaços eram ―feios‖ e que descaracterizam a paisagem urbana. Isso mostra

uma relação simplista entre estética, organização e o processo de produção e

apropriação do espaço.

Segregação

socio-

espacial

62

Esse tipo de relação foi recorrente nas percepções, demonstrando novamente que

para alguns alunos apenas os mais ricos vivem em locais mais organizados no meio

urbano.

4.9. Subtema 9: Sobre as atribuições do poder público na organização do

espaço urbano

O poder público foi tratado sistematicamente pelos alunos em doze depoimentos

como algo gerador de benefícios às comunidades assistidas por suas políticas. Tais

depoimentos estabeleceram uma relação de beneficiador, ou seja, eles pontuaram

que o governo deveria oferecer todas as necessidades básicas, mas não sinalizaram

que os grupos sociais precisam gerir, cuidar e fiscalizar o que foi investido no local.

Os alunos não apontaram para uma gestão coletiva e popular como uma perspectiva

de melhoria na qualidade de vida.

As outras categorias apresentaram apenas um depoimento cada. Um aluno

escreveu sobre o papel do poder público como algo controlador das interferências

humanas no espaço. Outro ressaltou que há uma disparidade de investimentos entre

as regiões do país e outro balizou que o Estado tem como função garantir a

segurança da população. Um aluno identificou que a geração de emprego e renda

foi diretamente proporcional à vontade do poder público em criá-los.

Por fim, um aluno apenas destacou que o papel do Estado era vinculado à

consolidação da harmonia entre o campo e cidade, mantendo as relações

econômicas sadias entre ambos.

O quadro a seguir mostra a organização dessas percepções sobre as atribuições do

poder público na organização do espaço urbano.

63

QUADRO 16

PERCEPÇÃO INICIAL SOBRE AS

ATRIBUIÇÕES DO PODER PÚBLICO NO MEIO URBANO

Categorias Número de

depoimentos

Depoimentos dos alunos antes do

trabalho de campo

Planejamento e

gestão

1 “(...) tem que controlar o número de prédios

e casas em cada região (...)” – Aluno E

Benevolência/Estado

provedor

12 “(...) contribuindo na área da saúde,

construindo hospitais e dando saneamento

básico (...)” – Aluno T

“(...) interferir nas moradias irregulares só

que com o crescimento muito acelerado não

tem mais como ajudar a todos” – Aluno H

Favorecimento

desigual

1 “O poder público favorece as regiões

Sudeste e Centro Oeste (...) há uma

desigualdade em relação às outras” – Aluno

P

Segurança

1 “(...) eles têm que manter a paz, a

organização e o crescimento urbano

estrutural” – Aluno B

Emprego

1 “A geração do desenvolvimento econômico

para o Estado através de empregos.” –

Aluno L

Harmonizar campo e

cidade

1 “(...) manter uma relação econômica entre a

área urbana e a área rural‖ – Aluno S

Fonte: dados e elaboração da pesquisa

A seguir, há a categorização das percepções dos alunos depois do trabalho de

campo sobre as atribuições do poder público na organização do espaço urbano no

Brasil, além de uma síntese dos resultados num gráfico.

64

QUADRO 17

PERCEPÇÃO APÓS O TRABALHO DE CAMPO

SOBRE AS ATRIBUIÇÕES DO PODER PÚBLICO NO MEIO URBANO

Categorias Número de

depoimentos

PERCEPÇÃO

INICIAL

Número de

depoimentos

PERCEPÇÃO

PÓS-

TRABALHO

DE CAMPO

Alguns depoimentos após o

trabalho de campo

Planejamento e gestão

1 10 “As atribuições do poder público

são de melhor uso dos espaços

urbanos e também uma visão

ampla das ações (...)” – Aluno F

“Controlar a taxa de emprego, a

renda, acumulação de impostos

para sustentar a sociedade” –

Aluno B

Benevolência / provedor

12 7 “As atribuições do poder público é

a saúde e escolas públicas e o

Bolsa Família que ajuda bastante‖

– Aluno L

“(...) investir em infraestrutura para

realizar uma possível correção ou

melhora nesse espaço” – Aluno G

Favorecimento desigual

1 0 -

Segurança 1 0 -

Emprego 1 0 -

Harmonizar campo e cidade

1 0 -

Fonte: dados e elaboração da pesquisa

65

Gráfico 7: As percepções sobre as atribuições do poder público no meio urbano

Fonte: dados e elaboração da pesquisa

A benevolência do poder público ainda apresentou índices elevados, mesmo com a

queda de doze para sete depoimentos. Alguns alunos ainda acreditavam que o

poder público deve ter um caráter provedor, ou seja, deve solucionar os problemas

sociais e caso não os solucione, torna-se o culpado direto por eles.

Por outro lado, o resultado do item ―Planejamento e gestão‖ foi significativo. Após o

trabalho de campo e juntamente com as falas da líder comunitária sobre a

importância da aproximação cidadão – governo, o número de alunos que

ressaltaram isso subiu de um para dez, mesmo se tratando de uma área urbana. O

caráter de provedor deu lugar para um poder executivo necessário, mas na gestão e

no planejamento do espaço e não como um provedor de serviços e de qualidade de

vida.

Os alunos perceberam que se uma comunidade qualquer – como o assentamento

visitado – desenvolve mecanismos internos de geração de renda e emprego, seria

possível ampliar a qualidade de vida sem a benevolência do poder público. Desta

forma, ele se tornaria um aliado e não um benfeitor. Essa categoria pode ser

utilizada para potencializar a hipótese da investigação, pois o trabalho de campo

66

proporcionou uma construção de novos significados do conceito de espaço

geográfico que possibilita a incorporação da dimensão socioespacial do real.

4.10. Subtema 10: Sobre a organização do espaço agrário

No primeiro diagnóstico, os alunos se depararam com a seguinte pergunta: Como

você vê a organização do espaço agrário brasileiro e quais são as suas principais

características?

Sete alunos, na categoria que apresentou o maior número de depoimentos,

escreveram que há um acesso desigual a terra no Brasil. Isso pode ter como causa

os estudos feitos no ensino fundamental sobre a questão agrária brasileiro. Esse

conteúdo é sistematicamente trabalhado pela disciplina de Geografia e ressalta a

histórica concentração de renda e terra no país.

Além desses sete depoimentos, um aluno destacou a precária infraestrutura

disponível para pequenos produtores. Possivelmente, o mesmo tinha a intenção de

escrever sobre as dificuldades de acesso desses agricultores a insumos e

maquinários. Seis alunos sinalizaram que o meio rural serve apenas para produzir

alimentos.

Isso é uma visão distante da realidade atual onde enxerga-se uma aproximação do

meio urbano e do meio rural. Dois alunos escreveram que a organização do espaço

rural brasileiro era melhor que a urbana. Isso é interessante, pois, possivelmente,

eles relacionaram a inexistência de aglomerados no local, nos moldes presentes em

áreas urbanas. E, apenas um aluno identificou o preço da terra com um elemento

que organiza a aquisição fundiária no espaço rural.

A categorização das percepções desta etapa está disposta no quadro a seguir.

67

QUADRO 18

PERCEPÇÃO DA ORGANIZAÇÃO SOBRE O ESPAÇO AGRÁRIO BRASILEIRO

Categorias Número de

depoimentos

Alguns depoimentos antes do trabalho de

campo

O desigual

acesso

à terra

7 “O espaço agrário é mal dividido, pois existem

poucos com muita terra e muitos com pouca terra

(...)” – Aluno V

“(...) as terras ou são de fazendeiros ou são de

indústrias que necessitam das terras (...)‖ – Aluno

E

Pouca infra-

instrutora

1 “(...) os agricultores não conseguiram acompanhar

os latifúndios que tinham acesso à tratores (...)‖ –

Aluno B

Produção de

alimentos

6 ―Eu vejo que o espaço agrícola está crescendo,

pois o número de indústrias agrícolas no campo

está grande (...)‖ Aluno L

“(...) obtenção de terras para o plantio econômico

[...] há uma relação industrial (...)‖ – Aluno S

Organização 2 “Eu vejo a organização do espaço agrário como

mais organizado que o espaço urbano‖ Aluno B

“(...)há pouca ajuda para os moradores do campo‖

– Aluno R

Preço da terra 1 “As pessoas mais ricas têm áreas maiores e mais

modernas e as pessoas mais pobres têm áreas

menores e sem modernização‖ Aluno F

Fonte: dados e elaboração da pesquisa

No quadro seguinte, há a categorização das percepções dos alunos depois do

trabalho de campo sobre a organização do espaço agrário no Brasil.

68

QUADRO 19 PERCEPÇÃO APÓS O TRABALHO DE CAMPO

SOBRE A ORGANIZAÇÃO DO ESPAÇO AGRÁRIO BRASILEIRO

Categorias Número de depoimentos PERCEPÇÃO

INICIAL

Número de depoimentos PERCEPÇÃO

PÓS-TRABALHO DE CAMPO

Alguns depoimentos após o trabalho de campo

O desigual acesso à terra

7

9

“(...) muitos ficam sem terra alguma devido à má distribuição dessas áreas.” – Aluno L “A organização [...] é desigual, muitos agricultores têm pouco e poucos têm muita terra (...)‖ – Aluno F

Pouca infraestrutura

1

1

―Eu vejo a organização do espaço agrário com dificuldades de desenvolvimento e suas principais características são as agroindústrias e os agricultores.” – Aluno V

Produção de alimentos

6 0 -

Organização

2

6

―O espaço agrário brasileiro é bem organizado e tem uma boa estrutura onde coloca em prática planos como a desapropriação de terras não produtivas.‖ – Aluno R “O espaço agrário brasileiro é muito mal organizado (...)‖ – Aluno T

Preço da terra 1 0

Produção desigual

0

1

―Os meios de produção variam entre a mão-de-obra e o uso da tecnologia, há também uma desigualdade social.‖ – Aluno L

Fonte: dados e elaboração da pesquisa

69

Gráfico 8: As percepções sobre a organização do espaço agrário antes e

depois do trabalho de campo

Fonte: dados e elaboração da pesquisa

Há duas percepções mais significativas nessa categoria. A queda de seis para

nenhum depoimento sobre a principal finalidade do campo ser a produção de

alimentos. Isso indicou que os alunos perceberam, após o trabalho de campo no

assentamento, novas finalidades para a de organização do espaço agrário. Os

alunos notaram in loco que havia uma organização com o intuito de gerar e ampliar

a renda por meio do plantio e cultivo de produtos orgânicos. Ou seja, a visão sobre o

campo como algo apenas para a produção de alimentos foi modificada para uma

que mostrava uma área rural onde havia lazer, emprego e moradia, qualidade de

vida.

Outro destaque foi o número de depoimentos sobre a organização do espaço em si.

O aumento de dois para seis alunos mostrou uma diferente percepção desse

espaço. A maneira como os assentados organizavam suas atividades cotidianas

fomentou essa percepção traduzindo-a em novas leituras sobre o universo rural.

O aluno R ao escrever que o ―espaço agrário brasileiro é bem organizado e tem uma

boa estrutura onde coloca em prática planos como, por exemplo, a desapropriação

de terras não produtivas‖ reforçou a ideia (e a comprovação da hipótese) de que o

70

trabalho de campo em áreas onde a comunidade desenvolveu Tecnologias Sociais

pode gerar possíveis novos significados da dimensão socioespacial do real. Os

outros alunos que escreveram que o meio rural ainda era desorganizado

relacionaram esse motivo com a má distribuição de terra.

Em nenhum dos depoimentos, houve percepções que identificavam o assentamento

como uma área desorganizada.

4.11. Subtema 11: Sobre as atribuições do poder público na organização do

espaço rural

Assim como na pergunta sobre o papel do poder público na organização do espaço

urbano, o número de alunos que escreveu sobre a benevolência do Estado no meio

rural também foi alto, onze em dezessete. Apenas três alunos destacaram a

importância do poder público em criar políticas específicas para a fixação do homem

no campo por meio de caminhos que priorizassem a geração de renda no local.

Dois alunos sinalizaram que o poder público é negligente e que pouco faz para o

desenvolvimento social e econômico do meio rural.

Apenas um aluno apresentou um depoimento diferenciado ao pontuar o papel do

Estado no campo essencial para ―acabar‖ com a ocupação de terras.

A síntese desses resultados está no quadro a seguir.

71

QUADRO 20

PERCEPÇÃO SOBRE AS ATRIBUIÇÕES DO PODER PÚBLICO NO MEIO RURAL.

Categorias Número de

depoimentos

Alguns depoimentos antes do trabalho de

campo

Políticas públicas

para o

desenvolvimento

do campo e

diminuição do

êxodo rural

3 “(...) onde o governo poderia interferir par uma

possível reforma agrária e tornar mais terras

improdutivas em produtivas.” – Aluno T

―O poder público faz vários projetos para

melhorar o campo‖ – Aluno C

O governo é

negligente com o

campo

2 “O poder público contribui menos para o

crescimento e o desenvolvimento do espaço

agrário em relação às cidades (...).” – Aluno P

―O poder público permitiu que os ricos

ficassem com os grandes latifúndios‖ – Aluno

R

Presença do

poder público

11 ―O poder público deveria levar mais tecnologia

e cursos de aprimoramento na agricultura‖ –

Aluno H

―(...) possui um dever de suporte de apoio aos

produtores rurais‖ – Aluno F

Acabar com a

ocupação de

terras

1 “(...) o governo deve acabar com o MST,

doando casas para eles, colocar asfalto nas

estradas e melhorar a infraestrutura.”

– Aluno E

Fonte: dados e elaboração da pesquisa

No quadro a seguir, há as percepções dos alunos após o trabalho de campo sobre

as atribuições do poder público no meio rural. Muitas percepções foram oriundas das

discussões feitas pela líder comunitária e pelos diversos assentados que

contribuíram com as entrevistas dos alunos.

72

QUADRO 21

PERCEPÇÃO APÓS O TRABALHO DE CAMPO

SOBRE AS ATRIBUIÇÕES DO PODER PÚBLICO NO MEIO RURAL

Categorias Número de

depoimentos

PERCEPÇÃO

INICIAL

Número de

depoimentos

PERCEPÇÃO

PÓS-

TRABALHO

DE CAMPO

Alguns depoimentos após o

trabalho de campo

Políticas

públicas para o

desenvolvimento

do campo e

diminuição do

êxodo rural

3

2

“As atribuições do poder público

(..) seriam grandes pois assim

não existiria um grande êxodo

rural e com isso concentraria

muito mais dinheiro no campo‖ –

Aluno B

“(...) ajudando os pequenos

agricultores para a concorrência

com os grandes fazendeiros ‖ –

Aluno R

O governo é

negligente com

o campo

2

0

-

Presença do

poder público

11 15 “O poder público é quem precisa

comprar os produtos do espaço

agrário para poder gerar renda‖

– Aluno L

“(...) reorganizar as terras e levar

tecnologia‖ – Aluno H

Acabar com a

ocupação de

terras

1 0 -

Fonte: dados e elaboração da pesquisa

73

Gráfico 9: As percepções sobre as atribuições do poder público no meio rural

Fonte: dados e elaboração da pesquisa

A categoria presença do poder público apresentou um número de depoimentos alto,

mesmo após o trabalho de campo. Isso pode ser um resultado das constantes falas

dos assentados aos alunos sobre a relação de dependência dos mesmos com o

poder público local. Contudo, a relação poder público/assentado retratada pelos

alunos após o trabalho de campo foi de complementaridade. Diferentemente das

percepções anteriores ao trabalho de campo cujos verbos utilizados para

caracterizar o poder público eram levar, fornecer e dar, após a ida ao assentamento

novos verbos foram utilizados pelos alunos como: comprar e reorganizar. Isso

mostra que eles perceberam novas atribuições do poder público, mas que a

dependência frente ao mesmo ainda era forte.

Em diversas situações, os alunos se deparam com depoimentos dos assentados

sobre a luta dos mesmos para adquirir o acesso à serviços oriundos do poder

executivo local. Além disso, a líder do assentamento destacou em sua fala que

durante um processo legal de ocupação de terras no Brasil há a participação do

poder público na aquisição e na gestão fundiária. Tais elementos potencializaram

esse quesito, afinal os alunos sinalizaram essa situação em quinze depoimentos.

74

5. A percepção dos alunos no assentamento Pastorinha e a (re) significação da

dimensão socioespacial do real.

Apenas no segundo diagnóstico, havia questões específicas sobre o cotidiano do

assentamento Pastorinha. Como isso não poderia ser contemplado no primeiro, as

análises não puderam ser feitas no estilo antes e depois do trabalho de campo. As

sínteses descritas a seguir são oriundas das entrevistas feitas pelos alunos, após o

almoço, com os assentados em suas casas ou nas áreas de plantio. As perguntas

das entrevistas seguiram um roteiro de elaborado pelo pesquisador juntamente com

os alunos (apêndice 10.3).

5.1. Sobre as negociações comunitárias e a comercialização dos produtos

agrícolas.

As perguntas da entrevista focalizavam as discussões e decisões comunitárias e a

venda da produção do assentamento. Os alunos destacaram nos depoimentos

escritos durante as entrevistas que as áreas de venda consolidadas em Belo

Horizonte eram as principais fontes de circulação dos produtos do assentamento. As

discussões e negociações dos assentados ocorriam em reuniões frequentes dos

assentados no galpão. Essas eram muito úteis para a organização da comunidade

local, principalmente, no que dizia respeito à divisão de tarefas. Isso foi destacado

em sete depoimentos num universo de dezessete. Essa articulação social existente

para a comercialização dos produtos pode ser considerada uma Tecnologia Social

desenvolvida pelos assentados. Após a colheita em cada gleba, os assentados

reuniam os produtos e acondicionavam-os em uma caminhonete que transportava-

os à Belo Horizonte.

Todo o processo era comunitário e dependia de vários assentados para a sua

conclusão e para o futuro acesso ao dinheiro adquirido com a venda. Como as

Tecnologias Sociais têm um caráter de produção coletiva, tal atividade pode ser

75

considerada como o desenvolvimento de tecnologias sociais. O público consumidor

de produtos orgânicos é específico. Como a produção de produtos orgânicos é uma

exigência federal para o apoio a assentamentos rurais, os assentados construíram

critérios para localizar esse público consumidor potencial em Belo Horizonte. Assim,

o processo de identificação e localização do público alvo para os produtos

orgânicos, cuidadosamente desenvolvido pela comunidade, pode ser considerado

como a construção de uma tecnologia social. Dez alunos conseguiram identificar

essa construção de TS pelos assentados que consistiu na identificação de critérios

para a localização de pontos de venda em colégios e igrejas da regional Centro Sul

de Belo Horizonte. Essa percepção representou 58,8% dos depoimentos escritos

pelos alunos.

5.2. Sobre os saberes e as técnicas comunitárias.

Outra questão da entrevista com os assentados era identificar os saberes

construídos para o cultivo e para o armazenamento da produção. Essa pergunta

também tinha o intuito de levar os alunos a identificarem possíveis construções de

tecnologias sociais no cotidiano do assentamento. Cinco depoimentos destacaram

técnicas diversas e específicas de plantio, mas não as descreveram. Oito alunos

sinalizaram que as técnicas desenvolvidas pelos assentados eram repassadas entre

eles ou de forma hereditária. Por fim, quatro alunos escreveram que os novos

saberes e as técnicas existentes eram vinculados ao não uso de agrotóxico no

plantio, sendo que o uso de cinzas como um meio de prevenir pragas foi destacado.

Essa técnica pode ser considerada uma Tecnologia Social identificada pelos alunos.

76

Gráfico 10: Técnicas e saberes percebidos pelos alunos no assentamento

Fonte: dados e elaboração da pesquisa

5.3. Sobre as lideranças comunitárias e poder público.

A terceira pergunta era sobre a relação entre as lideranças do assentamento com os

governos e com as políticas públicas. Em alguns depoimentos, os alunos

consideraram as políticas públicas como um indivíduo. O aluno E escreveu: ―A

relação entre as lideranças do assentamento com as políticas públicas não eram

muito boas (...)‖. Outra citação de um aluno disse que a relação era pouco

harmoniosa entre o governo local com os líderes da comunidade. Isso mostra um

desconhecimento conceitual entre política pública e poder público. Para a maioria

dos alunos, ambos são considerados a mesma coisa.

Com isso, foi possível levantar, no segundo diagnóstico, que doze alunos não viram

de imediato a presença do poder público e de políticas públicas na área e pontuaram

a falta de apoio do governo no assentamento. Além disso, cinco expressaram a

relação da líder comunitária com o poder público no que tange a necessidade de

infraestrutura e oferta de serviços.

77

Gráfico11: As relações entre os assentados e o poder público

Fonte: dados e elaboração da pesquisa

5.4. Sobre as estratégias de desenvolvimento da comunidade.

Nesta parte do trabalho, os alunos se depararam com uma pergunta sobre as

estratégias para o desenvolvimento da comunidade. Os alunos identificaram vinte e

duas estratégias sendo que destas, onze transitavam sobre as reuniões e os

acordos comunitários existentes no assentamento referentes às questões ligadas ao

plantio, à comercialização e à moradia.

A rotação de cultura, a construção comunitária das casas, a venda em pontos

estratégicos em Belo Horizonte e uma poupança interna foram citados uma vez. O

não uso de agrotóxicos que é uma exigência de áreas de assentamento foi pontuada

duas vezes. A irrigação por gravidade foi balizada duas vezes, bem como o uso de

cinzas para combater pragas nas áreas de plantio que também obteve dois

depoimentos. Apenas um aluno escreveu que não identificou estratégias

diferenciadas de desenvolvimento no assentamento.

78

Gráfico 12: As percepções sobre as estratégias desenvolvidas pelos assentados

para resolver questões do cotidiano

Fonte: dados e elaboração da pesquisa

79

6. As mudanças nas percepções dos alunos sobre o Assentamento Pastorinha.

Os alunos, no final do roteiro de entrevistas, poderiam escrever sobre o que foi

mudado ou acrescido em suas percepções após o trabalho de campo no

assentamento Pastorinha. Não havia um critério pré estabelecido. Eles poderiam

escrever aleatoriamente suas novas percepções sobre o mundo rural e sobre a sua

interação com o meio urbano. Não era necessário ―agradar‖ o professor para ter

uma boa pontuação no trabalho. Bastava o aluno expor suas percepções que ele

teria acesso à pontuação atribuída na atividade. Desta forma, a possibilidade de

respostas induzidas ou maquiadas foi reduzida. Foram identificados setenta e oito

depoimentos que foram classificados em seis categorias. Moradia, tecnologia,

trabalho e renda, qualidade de vida, acesso a terra e governo. Esses dados estão

organizados no gráfico e no quadro a seguir e mostram que a percepção dos alunos

que mais foi modificada diz respeito à qualidade de vida num assentamento rural

oriundo de uma ocupação ilícita. Para eles, a organização dos assentados no

cotidiano surpreendeu e isso fortalece a ideia do investimento em trabalhos de

campo para a Geografia Escolar.

Gráfico 13: Elementos percebidos pelos alunos para construção de técnicas e estratégias para o equacionamento dos problemas do cotidiano. Fonte: dados e elaboração da pesquisa

80

QUADRO 22

ANÁLISE DAS PERCEPÇÕES DOS ALUNOS SOBRE O MUNDO AGRÁRIO BRASILEIRO

ANTES E DEPOIS DO TRABALHO DE CAMPO

O mundo Agrário Brasileiro para

você antes do trabalho de campo

no assentamento Pastorinha.

O mundo Agrário Brasileiro para você após o

trabalho de campo

CATEGORIAS No

DEPOIMENTOS Percepções apresentadas pelos alunos

Moradia

(estética e

higiene)

9

Os alunos pontuaram as casas de alvenaria como um

avanço, pois imaginavam que, em geral, as casas

seriam de lonas.

Exemplo: “Limpo e com muita higiene e cuidado com

os produtos” - Aluno B

Produção e

tecnologia

11

Os alunos reconheceram que há saberes e técnicas

endógenas no assentamento. Entre elas: a

comercialização dos produtos em áreas específicas e

o uso de cinzas para o combate de pragas.

Exemplo: “Percebi que nem toda produção usa-se

agrotóxicos” - Aluno P

Trabalho e

geração de

renda

9

Eles identificaram que os assentados vivem sem o

auxílio pleno do governo, ou seja, eles conseguem

gerir a produção de forma autônoma.

Exemplo: “Todos os assentados ajudam de alguma

forma na produção” – Aluno L

Condição social

(qualidade de

vida e conflitos)

32

Foi o quesito mais citado. Ficou visível que os alunos

tinham uma ideia de conflitos perenes e que após a

visita perceberam uma organização social estrutura e

com regras de convivência.

Exemplo: “Não ocorrem tantos conflitos nos

assentamentos” – Aluno H

Acesso e uso

da terra

11

Os alunos pontuaram as formas e as estratégias de

ocupação e de fixação do homem no campo.

Anteriormente, eles conceituavam os sem terra como

baderneiros.

Exemplo: “A lei favorece a ocupação em

determinadas circunstâncias” – Aluno R

81

Governo e

políticas

públicas

6

Categoria menos citada. Os alunos que escreveram

sobre isso destacaram a autonomia dos assentados

frente ao poder público. Contudo, é importante

ressaltar que alguns depoimentos nas outras

questões da investigação mostraram que os alunos

identificaram a necessidade do poder público na

consolidação da posse da terra. Ainda assim, foi

perceptível que a ideia anterior se baseava na

descrença em relação ao ―governo‖ em resolver a

questão agrária e que perante isso há mecanismos

de acesso à terra.

Exemplo: “Sobrevivem sem muita ajuda do governo”

– Aluno B

Fonte: dados e elaboração da pesquisa

Sintetizando o quadro acima se pode inferir que os alunos reconheceram alguns

saberes e algumas técnicas endógenas no assentamento que poderiam estar

vinculadas ao desenvolvimento de Tecnologias Sociais, principalmente, no que

tange a comercialização e o plantio de algumas hortaliças. Outra percepção

identificada pelos alunos foi sobre uma possível autonomia que os assentados

apresentaram frente ao poder público. No primeiro diagnóstico, eles escreveram que

o governo era muito presente e necessário para manter a sobrevivência e o acesso

aos serviços básicos. Já no diagnóstico após o trabalho de campo, os alunos

sinalizaram que os assentados possuíam uma organização própria, construída sem

o envolvimento do governo municipal. Porém, mesmo com a essa autonomia, os

alunos notaram que os assentados apresentavam certos conflitos com o poder

público local em relação aos sistemas viário e educacional. Os alunos também

tinham uma ideia de conflitos perenes em áreas de assentamento e que após o

trabalho de campo perceberam uma organização social com regras de convivência e

mercadológicas. A ideia de que os assentados seriam baderneiros e que ocupavam

terras para diversos fins também foi mudada. Os alunos pontuaram as formas e as

estratégias de ocupação e de fixação do homem no campo e ressaltaram ainda as

dificuldades de manutenção no local bem como os problemas com a

comercialização e a produção de hortaliças orgânicas que têm um público alvo

específico e que são de plantio obrigatório em áreas de assentamento.

82

7. Considerações finais

Os resultados dessa investigação serviram para comprovar, parcialmente, as

hipóteses que o trabalho de campo propicia e fortalece a possibilidade de (re)

significação da dimensão socioespacial do real e que a identificação do

desenvolvimento de Tecnologias Sociais a partir do contato com saberes locais

reforçaria essa possibilidade de (re) significação. Essa comprovação parcial foi

oriunda dos textos dos alunos, onde foi possível verificar novas significações da

dimensão socioespacial do real em apenas alguns itens previstos nos diagnósticos,

principalmente no que tange a organização social e econômica as áreas rurais mais

pobres como o assentamento Pastorinha.

A visão geral sobre algumas atitudes e sobre o cotidiano dos sem terra foi

modificada. Os alunos modificaram suas visões, pois a ideia divulgada pelo senso

comum e muito reforçada pela imprensa de que os assentados são baderneiros foi

suprimida. Os alunos passaram a percebê-los como pessoas que sabem como

articular socialmente e economicamente seus desejos e anseios. A organização do

assentamento favoreceu essa ideia e isso surpreendeu os alunos durante o trabalho.

Foi identificada também, nos relatórios dos alunos, a construção de algumas

Tecnologias Sociais, sobretudo sobre os processos de comercialização dos produtos

orgânicos produzidos pelos assentados. Este fato colocou um novo elemento na

percepção da inserção social dos assentados. Eles se articulam de forma inovadora

para permitir a sustentabilidade de suas atividades.

Além disso, essa comprovação parcial explicita o conflito entre o processo

pedagógico e o processo de uma pesquisa strictu sensu que apresentam tempos

diferentes e que cobram a focalização de uma grande quantidade de temas

(matérias) num curto espaço de tempo.

Isso é previsto num planejamento anual, que nem sempre pode se adequar ao

tempo de uma pesquisa como a realizada. Ou seja, além da temática da pesquisa

83

em questão, a turma tinha outras atividades e outros conteúdos da série e essa

investigação não poderia se apropriar exclusivamente do cotidiano dos alunos e

muito menos relacionar, com a mesma ênfase temporal, o conteúdo programático e

com o conteúdo da pesquisa. Como o horário de trabalho do pesquisador na escola

naquela série era de três aulas por semana, era necessário dar conta das questões

que envolviam a pesquisa e o restante do conteúdo da série.

Essa não é uma dificuldade vivida apenas nessa pesquisa. Braga (1999) destacou

os conflitos entre os tempos e espaços da pesquisa strictu sensu e dos processos

de ensino. Ressalta a autora que esses conflitos decorrem do fato de serem, o

ensino e a pesquisa, atividades com natureza diferentes, organizadas em tempos

necessariamente diversos.

Apesar dessas dificuldades, foi possível identificar algumas (re) significações da

dimensão socioespacial do real pelos alunos, o que fortalece a necessidade de se

sistematizar mais trabalhos de campo multidisciplinares e com uma disponibilidade

de tempo maior.

Os resultados detalhados da pesquisa, oriundos das análises dos depoimentos dos

alunos, podem ser relacionados com a metodologia utilizada na pesquisa, cuja

duração, em quatro etapas, foi de aproximadamente cinco meses. A pesquisa exigiu

um grande envolvimento do pesquisador ao requerer mais encontros semanas com

a turma, pois as atividades ocuparam um tempo muito maior do que o previsto tanto

durante a coleta de dados, quanto durante os processos de teorização e

instrumentalização com a turma envolvida com a pesquisa. Equacionar o conteúdo

da série com o conteúdo do trabalho de campo foi um desafio à parte.

Após os resultados, pode-se perceber que o trabalho de campo, frente às outras

modalidades de atividades em ambientes fora de sala de aula como a visita técnica,

exige um aluno mais protagonista no processo de ensino-aprendizagem. Entretanto,

para que esse protagonismo seja potencializado, é necessário um projeto de

investigação onde o trabalho de campo seja precedido de uma preparação e

planejamento cuidadosos. É necessário que haja uma articulação entre teoria e

prática e um acompanhamento sistemático dessa estratégia pedagógica, para que

84

seus resultados sejam de fato avaliados. Pela experiência do pesquisador, o

trabalho de campo realizado, se distinguiu das outras atividades semelhantes pelo

seu nível de planejamento e sistematização. Nesse sentido, a afirmação de Kaecher

(2003) de que o trabalho de campo não pode se esgotar no momento que termina,

tornando-o apenas um ―gastar tempo‖, foi confirmada pela pesquisa.

Um trabalho de campo, metodicamente construído, precisa ir além da visita técnica,

principalmente se ele se propõe a ser um apoio pedagógico para o ensino de

disciplinas escolares. O planejamento de um trabalho de campo deve ser criterioso,

inclusive com um amplo envolvimento e engajamento dos alunos, para que eles

possam valorizar e assumi-lo como protagonistas.

Assim, após a interpretação dos dados foi possível afirmar que o trabalho de campo

em questão serviu, parcialmente, como um instrumento de (re) significação da

dimensão socioespacial do real e que os alunos conseguiram identificar embriões de

construção de Tecnologias Sociais no local. O número alto de depoimentos sobre as

mudanças de percepção por parte dos educandos embasou tal afirmação. Como

exemplo, ao final da atividade no assentamento, um aluno comentou que ele achava

os sem terra desorganizados e após o trabalho ele mudou a concepção e

reconheceu que as técnicas e as articulações endógenas e exógenas dos

assentados eram sinais de organização e profissionalização. Essas novas leituras

repercutiram no ambiente escolar, pois os alunos socializaram as conclusões com

outros colegas e principalmente com as famílias que deram retornos positivos da

atividade.

A investigação de processos e tecnologias desenvolvidas na produção/apropriação

do espaço geográfico do assentamento e na comercialização do plantio fomentou

novas leituras da realidade por parte dos alunos. Isso potencializou a capacidade de

crítica dos alunos e, possivelmente, contribuiu para uma politização dos alunos,

confirmando Brabant (1976) que indicou a ênfase na descrição como facilitadora da

despolitização do ensino.

Por fim, o uso do trabalho de campo para a educação geográfica em áreas que

apresentam a construção de Tecnologias Sociais pode ser então uma estratégia

85

eficaz para superar a prática mnemônica e enciclopedista, discutida na literatura

sobre a educação geográfica como traços ainda presentes na tradição didática

dessa disciplina escolar. Contudo os projetos de trabalho de campo devem ter

objetivos claros e não muito ambiciosos porque os docentes terão diante de si

desafios como a problematização, a execução e a análise dos resultados. Além

disso, a necessária adequação entre o processo pedagógico e o processo de uma

pesquisa exige um investimento teórico-prático específica.

Concluindo, mesmo que algumas mudanças na leitura de mundo dos alunos não

tenham sido objetivadas em algumas temáticas, nessa pesquisa foi possível um

aprofundamento e uma verificação do processo de (re) significação de grande parte

das temáticas abordadas no trabalho de campo e ele se manifestou como uma

estratégia com grande potencialidade para a (re) significação da dimensão

socioespacial do real.

86

8. Proposta de intervenção

A difusão de trabalhos de campo cuja temática central passa pela identificação e

problematização de Tecnologias Sociais ainda é incipiente.

A proposta de intervenção desta investigação foi baseada nessa dificuldade e por

isso houve a elaboração de um encarte que apresenta sugestões metodológicas

sobre o trabalho de campo em áreas que, potencialmente, tenham desenvolvido

Tecnologias Sociais. Este encarte poderá ser enviado por email ou acessado no site

do Mestrado cujo endereço eletrônico é http://www.mestradoemgsedl.com.br/.

Além disso, é possível acessar, por esse endereço, outro link que conduz a uma

comunidade do ORKUT que tem o intuito de promover a discussão das temáticas:

Trabalho de Campo, Tecnologias Sociais e Educação Geográfica. Tanto a proposta

quanto a comunidade virtual são destinadas a professores das redes privada e a

população que deseja contribuir com o processo de discussão. Nessa comunidade é

possível participar de fóruns de discussão, acessar conceitos de temas afins, inserir

enquetes, visitar comunidades correlatas, conversar com outras pessoas que

tenham interesse pelos temas e alimentá-la com novas contribuições, tornando-se

seu membro. Trata-se de um ambiente virtual livre e amplo para o fomento dos

debates sobre esses temas. Possivelmente, após a distribuição impressa de alguns

exemplares do encarte, a quantidade de acessos e adesões aumentará, tornando-o

um espaço com credibilidade e confiabilidade. Afinal, o trabalho de campo escolar

não se esgota no momento em que ele termina. Há diversas possibilidades que

podem ser exploradas pelos professores e um ambiente virtual como esse pode ser

uma fonte de estímulo.

A seguir, há uma cópia do encarte e a reprodução da comunidade virtual cujo link é

acessado caso a pessoa esteja conectada no seguinte site

(http://www.orkut.com.br/Main#Community?cmm=109025930.)

87

ENCARTE: O TRABALHO DE CAMPO

E EDUCAÇÃO GEOGRÁFICA

Prezado professor.

A execução de um trabalho de campo em áreas

que hipoteticamente desenvolveram Tecnologias

Sociais pode ampliar a releitura de mundo dos seus

alunos.

Para que o trabalho de campo nessas áreas ocorra

de forma satisfatória, eis algumas dicas e

procedimentos:

1- Conceitue tecnologias sociais com os seus

alunos

2- Procure identificar possíveis tecnologias sociais

desenvolvidas na comunidade a ser visitada.

3- Escolha o local e problematize os referenciais

teóricos necessários à compreensão do espaço em

estudo.

Grupo de alunos em um assentamento de sem

terra na região metropolitana de Belo Horizonte

4- Crie um ambiente de debate com

os alunos após o trabalho de

campo.

5- Estimule-os a escrever sobre

suas novas percepções.

6- Peça-os, após o trabalho de

campo, para identificar possíveis

tecnologias sociais no entorno da

escola.

7- Entre na comunidade: geografia

e tecnologia social e participe dos

fóruns e alimente-a com

informações sobre os trabalhos de

campo executados por você.

O link da comunidade é:

http://www.orkut.com.br/main#com

munity?cmm=109025930

88

89

9. Referências bibliográficas

ALENTEJANO, Paulo R. R. & ROCHA-LEÃO, Otávio M (Orgs). Boletim Paulista de

Geografia / Seção São Paulo - Associação dos Geógrafos Brasileiros. Nº 84 (2006) -

São Paulo: AGB, 2006.

BARDIN, Laurence. Análise de Conteúdo. 1997. Lisboa: Edições 70.

BRABANT. Jean-Michel. Crise da Geografia, Crise da Escola. 1976. In - Para onde

vai o ensino de geografia? Coleção repensando o ensino. Ariovaldo Umbelino de

Oliveira, (org). São Paulo: Contexto, 1989. p.15-23.

BRAGA, Rosalina Batista. Os conteúdos geográficos na escola elementar brasileira:

uma interpretação interessada em sua transformação. In: III Encontro Estadual de

Geografia de Minas Gerais. III Encontro, 1997,.As transformações no trabalho e no

espaço e a geografia mineira. Belo Horizonte, FAE/UFMG, novembro de 1997,

p.110-122.

_____________________. O cotidiano da sala de aula e a prática de pesquisa:

tensão entre o fazer pedagógico e a produção do conhecimento. In: ENCONTRO

NACIONAL DE ENSINO DE GEOGRAFIA — FALA PROFESSOR, 40 Encontro,

1999, As transformações no Mundo da Educação: Geografia, Ensino e

Representação Social. Curitiba, AGB, 18.23 de julho de 1999, p1-15.

____________________.. A geografia como ciência e como disciplina escolar. In:

MINAS GERAIS- Secretaria de Estado da Educação.SALGADO, Maria Umbelina C.;

MIRANDA, Glaura Vasque de.(orgs.) . Veredas - Formação Superior de

Professores. Belo Horizonte: SEE-MG, 2003, mód. 3, v.3, p 55-85.

CALLAI, Helena. A Geografia e a escola: muda a Geografia? Muda o ensino? Terra

Livre, ano 1, n.1, São Paulo, 1986

90

CALLAI, Helena. Ensino de geografia: práticas e textualizações no cotidiano.

Apreensão e compreensão do espaço geográfico. 3.ed. São Paulo: Meditação, 2003.

CAREGNATO, Rita Catalina Aquino & MUTTI, Regina. Pesquisa qualitativa: análise

de discurso versus análise de conteúdo. Florianópolis, 2006 Out-Dez; 15(4): 679-84.

CHERVEL, André. História das disciplinas escolares: reflexão sobre um campo

pesquisa. Teoria e Educação. Porto Alegre: n. 2, v.1, 1990, p. 177-229.

CAVALCANTTI, Lana de Souza. Cotidiano, mediação pedagógica e formação de

conceitos: uma contribuição de Vygotsky ao ensino de geografia. Cad. Cedes,

Campinas, v. 25, n. 66, p. 185-207, maio/ago. 2005 185. Disponível em

<http://www.cedes.unicamp.br>

CHIZZOTTI, Antônio. A pesquisa qualitativa em ciências humanas e sociais:

evolução e desafios. Revista Portuguesa de Educação. Braga, Portugal. Número

002. 2003, v. 16, p. 221-236.

DUARTE, Rosália. Pesquisa qualitativa: reflexões sobre o trabalho de campo. Cad.

Pesquisa. [online]. 2002, n.115, pp. 139-154.

FRASER, Márcia Tourinho Dantas; GONDIM, Sônia Maria Guedes. Da fala do outro

ao texto negociado: discussões sobre a entrevista na pesquisa qualitativa. Paidéia,

2004, 14 (28), p. 139- 152. (Universidade Federal da Bahia).

GODOY, A. S. Pesquisa qualitativa: tipos fundamentais. Revista de Administração

de Empresas, São Paulo, v. 35, n. 3, p. 20-29, maio/jun. 1995.

GOLDENBERG, M. A Arte de pesquisar: como fazer pesquisa qualitativa em

ciências sociais. Rio de Janeiro: Record, 1997.

GOHN, Maria da Glória. Educação não-formal, participação da sociedade civil e

estruturas colegiadas nas escolas. Ensaio: aval. pol. públ. Educ., Rio de Janeiro,

v.14, n.50, p. 27-38, jan./mar. 2006

91

HERCULANO, Alberto Pinto Cachinho. Geografia escolar: Orientação teórica e

práxis didáctica. Inforgeo, 15, Lisboa, Edições Colibri, 2000, p. 69-90.

KAISER, Bernard. Boletim Paulista de Geografia. Boletim Paulista de Geografia /

Seção São Paulo - Associação dos Geógrafos Brasileiros. Nº 84 (2006), São Paulo:

AGB, 2006.

KAECHER, Nestor André. Geografizando o jornal e outros cotidianos: práticas em

Geografia para além do livro didático. p 135 – 170. In_CASTROGIOVANNI, Antônio

Carlos. Ensino de geografia: práticas e textualizações no cotidiano. 3.ed. São Paulo:

Meditação, 2003.

MARCOS, Valéria de. Trabalho de campo em geografia: reflexões sobre uma

experiência de pesquisa participante. Boletim Paulista de Geografia / Seção São

Paulo - Associação dos Geógrafos Brasileiros. Nº 84 (2006), São Paulo: AGB, 2006.

MORAES, Antônio Carlos Robert. Renovação da Geografia e Filosofia da Educação.

1986. In - Para onde vai o ensino de geografia? Coleção repensando o ensino.

Ariovaldo Umbelino de Oliveira, org. – São Paulo: Contexto, 1989, p. 118-124.

NOVAES, Henrique T. DIAS, Rafael. Contribuições ao Marco Analítico-Conceitual da

Tecnologia Social. (17-54) (apud) DAGNINO, Renato Peixoto. Tecnologia social:

ferramenta para construir outra sociedade / Renato Dagnino; colaboradores

Bagattolli, Carolina ...[et al.] . -- Campinas,SP.:

IG/UNICAMP, 2009.

OLIVEIRA. Ariovaldo Umbelino de. Educação e Ensino de Geografia na Realidade

Brasileira. 1987. In - Para onde vai o ensino de geografia? Coleção repensando o

ensino. Ariovaldo Umbelino de Oliveira (org.). São Paulo : Contexto, 1989. p.135-

144.

PASSONI. INSTITUTO DE TECNOLOGIA SOCIAL. Tecnologia social.

Conhecimento e Cidadania. 1, Fev. 2007, 23p. Disponível em:

<www.itsbrasil.org.br/pages/23/CadernoTS2007.pdf>

92

RODRIGUES, Antonia Brito, OTAVIANO, Claudia Arcanjo. Guia metodológico de

trabalho de campo em Geografia. Revista do Departamento de Geociências da

Universidade Estadual de Londrina. 2001, v.10. p. 35-44. JAN/JUN, 2001.

RODRIGUES, Ivete & BARBIERI, José Carlos. A emergência da tecnologia social:

revisitando o movimento da tecnologia apropriada como estratégia de

desenvolvimento sustentável. Rev. Adm. Pública [online]. 2008, v.42, n.6, pp. 1069-

1094.

SERPA, Ângelo. Boletim Paulista de Geografia. Boletim Paulista de Geografia /

Seção São Paulo - Associação dos Geógrafos Brasileiros. Nº 84 (2006), São Paulo:

AGB, 2006.

SILVA, Cristiane R, GOBBI, Beatriz Christo, SIMÃO, Ana Adalgisa. O uso da análise

de conteúdo como uma ferramenta para a pesquisa qualitativa: descrição e

aplicação do método. Organ. rurais agroind. Lavras, v. 7, n. 1, p. 70-81, 2005

TOMITA, Luiza M. Saito. Trabalho de campo como instrumento de ensino em

geografia. Revista do Departamento de Geociências da Universidade Estadual de

Londrina. 1999, v.08. p. 13-15. JAN/JUN, 1999.

TRIVINOS, Augusto N. S. Introdução à pesquisa em ciências sociais. Editora Atlas,

São Paulo: 1994, p.145-158.

VESENTINI. José William. Ensino de Geografia e Luta de Classes. (1984). In: Para

onde vai o ensino de geografia? Coleção repensando o ensino. Ariovaldo Umbelino

de Oliveira (org.). São Paulo: Contexto, 1989, p.109-117

WETTSTEIN. Gérman. O que se deveria ensinar hoje em Geografia. 1982. In - Para

onde vai o ensino de geografia? Coleção repensando o ensino. Ariovaldo Umbelino

de Oliveira (org.). São Paulo: Contexto, 1989, p.125-134.

93

10. Apêndices 10.1-Roteiro utilizado no diagnóstico antes do trabalho de campo

DIAGNÓSTICO: ANTES DO TRABALHO DE CAMPO

PERCEPÇÃO INICIAL

ÁREA URBANA

1- a) Analise as duas imagens de ÁREAS URBANAS anteriores 2- e DESCREVA-AS.

b) Fale sobre as possíveis CONDIÇÕES DE VIDA das populações que habitam os dois espaços fotografados. c) Que HIPÓTESES você elabora sobre os possíveis processos de ocupação desses espaços.

http://ww.phmengenharia.com.br/images/obras/residencias_nova3.gif

www.ips.org/

94

ÁREA RURAL

2- a) Analise as duas imagens de ÁREAS RURAIS anteriores e DESCREVA-AS. b) Fale sobre as possíveis CONDIÇÕES DE VIDA das populações que habitam os dois espaços fotografados. c) Que HIPÓTESES você elabora sobre os possíveis processos de ocupação desses espaços. 3- Como você vê a organização do processo de urbanização brasileira e quais são as suas principais características? 4- Quais são as atribuições do poder público na organização do espaço urbano? 5- Como você vê a organização do espaço agrário brasileiro e quais são as suas principais características? 6- Quais são as atribuições do poder público na organização do espaço agrário?

http://i117.photobucket.com/albums/o61/ulilopes/Figura013.jpg http://www.ladycbarra.com.br/sudeste/rio_arquivos/valenca-quilombo2.jpg

95

10.2-Roteiro para a Instrumentalização teórica INTRUMENTALIZAÇÃO LEIA os textos a seguir e DESTAQUE as informações mais importantes a partir da sua percepção sobre a relação campo-cidade. A RELAÇÃO CAMPO – CIDADE ―[...] o próprio debate acerca da importância da reforma agrária como uma política de reestruturação espacial das sociedades tem sido recolocado. Sem dúvida, trata-se de questão polêmica, uma vez que para os representantes do patronato rural e alguns estudiosos da agricultura brasileira o que está em jogo, pelo contrário, é a expansão do modelo agrícola vigente no país. Para estes setores a reforma agrária não traria nenhuma contribuição para a sociedade brasileira, uma vez que a agricultura já se encontraria fortemente modernizada, não fazendo sentido pensar na massificação da pequena produção familiar no campo, mas sim retomar uma política de apoio à agricultura patronal que amplie ainda mais seu processo de modernização, repetindo a estratégia adotada nos anos 1960/70. A pauta da reivindicação destes setores é clara: liberalização comercial, incentivo às exportações e liberação da produção de organismos geneticamente modificados (transgênicos), consolidando o que seria na versão destes a ‗nova revolução verde‖. ―[...] O caráter fortemente urbanizado da sociedade brasileira deve ser o ponto de partida para a nova reflexão sobre o lugar da reforma agrária no debate sobre o modelo de desenvolvimento a ser adotado no país, mas não para negar importância à reforma agrária, mas para afirmá-la como essencial para, no curto prazo, garantir melhores condições de vida para uma imensa massa de explorados e excluídos presentes hoje no campo e na cidade e, a médio e longo prazo, possibilitar a construção de uma sociedade justa e democrática[...]‖ ―[...] Graziano da Silva (1996) tem sido um dos principais autores a defender a existência de uma nova dinâmica no campo brasileiro, marcada fundamentalmente pela urbanização. Em sua concepção o rural não pode mais ser associado à atividade agrícola como tradicionalmente o fora. Um outro lado de sua formulação diz respeito ao profundo processo de modernização da agricultura patronal e de parcelas da agricultura familiar, particularmente os integrados, que por seu grau de tecnificação e integração em circuitos financeiros e informacionais também não mais poderiam ser classificados como rurais. Assim, estaria em curso um duplo processo de urbanização do campo brasileiro: uma expansão da lógica de produção urbana para os setores modernizados da agricultura e a expansão de atividades tipicamente urbanas para as áreas onde a agricultura modernizada não se implantou[...]‖ Trechos retirados do texto: As relações campo-cidade no Brasil do século XXI de Paulo Roberto R. Alentejano. a) LEIA o texto a seguir da Agência Estado sobre a concentração fundiária no Brasil. JACQUELINE FARID - Agencia Estado

96

O Censo Agropecuário 2006, divulgado hoje pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), mostra que a concentração de terras persiste no País. O levantamento, cuja coleta de dados foi realizada em 2007, é o primeiro dessa magnitude feito pelo instituto desde 1996. "As diferenças verificadas na área dos estabelecimentos agropecuários continuam a caracterizar a manutenção da desigualdade na distribuição de terra no País nos últimos censos agropecuários", dizem os técnicos do IBGE. De acordo com o instituto, enquanto os estabelecimentos rurais de menos de 10 hectares ocupam menos de 2,7% da área total ocupada pelos estabelecimentos rurais, a área ocupada pelos estabelecimentos de mais de mil hectares concentram mais de 43% da área total. A concentração e a desigualdade regional são comprovadas pelo Índice de Gini da estrutura agrária do País. Quanto mais perto esse índice está de 1, maior a concentração. Os dados mostram um agravamento da concentração de terras nos últimos 10 anos. O Censo do IBGE mostrou um Gini de 0,872 para a estrutura agrária brasileira no Censo divulgado hoje, superior aos índices apurados nos anos de 1985 (0,857) e 1995 (0,856). A evolução do Gini, no entanto, foi muito diferente entre as Unidades da Federação. Em São Paulo, passou de 0,758 no Censo anterior para 0,804. No Maranhão, por outro lado, recuou de 0,903 para 0,864. No Censo 2006, o maior índice de Gini estava em Alagoas (0,871), enquanto o menor foi apurado em Roraima (0,664). O coordenador do Censo, Antonio Carlos Simões Florido, disse que os dados de Gini devem ser analisados com cautela, já que nem sempre a concentração reflete uma situação desfavorável para os produtores. Ele ressalta que em algumas culturas de grande escala, como a soja, é comum que um grande produtor arrende muitas terras de outros agricultores menores, o que acaba elevando o índice. Segundo ele, há 2.360 municípios nos quais o Índice de Gini caiu nos últimos anos e, nesses locais, há agricultura familiar, com assentamentos. MAPA GRÁFICO

O índice Gini (inventado pelo estatístico italiano Corrado Gini) é muito usado para medir a concentração de renda, mas serve para medir qualquer desigualdade. Ele varia de 1,000 (desigualdade

97

absoluta: no caso da renda, por exemplo, uma pessoa tem tudo e os outros nada) até 0,000 (igualdade absoluta: todos têm uma mesma renda).

b) RELACIONE-O com o mapa e com o gráficoanteriores. TECNOLOGIA SOCIAL LEIA O trecho a seguir sobre o conceito de TECNOLOGIA SOCIAL “A tecnologia social implica a construção de soluções de modo coletivo pelos que irão se beneficiar dessas soluções e que atuam com autonomia, ou seja, não são apenas usuários de soluções importadas ou produzidas por equipes especialistas, a exemplo de muitas propostas das diferentes correntes da tecnologia apropriada. Uma definição de tecnologia social proposta pelo Instituto de Tecnologia Social (ITS, 2004:130) é a seguinte: “um conjunto de técnicas, metodologias transformadoras, desenvolvidas e/ou aplicadas na interação com a população e apropriadas por ela, que representam soluções para a inclusão social e melhoria das condições de vida”.” Informações retiradas do texto: A emergência da tecnologia social: revisitando o movimento da tecnologia apropriada como estratégia de desenvolvimento sustentável Ivete Rodrigues - José Carlos Barbieri a) Após a leitura do trecho anterior, desenvolva a questão proposta a seguir: Há possibilidades de um assentamento de reforma agrária ser uma área que onde ocorra o desenvolvimento de Tecnologias Sociais? EXEMPLO DE TECNOLOGIA SOCIAL

Título AGROEXTRATIVISMO SUSTENTÁVEL DA FAVELA

Entidade responsável pela tecnologia

CEDAC - Centro de desenvolvimento agroecológico do cerrado.

Responsável pela tecnologia ALESSANDRA KARLA DA SILVA

Problemas Apresentados

Em 2000 o CEDAC realizou um diagnóstico sócio-ambiental do extrativismo da favela na região do nordeste goiano, nos municípios de Posse, São Domingos, Iaciara, Guarani, Formosa, Sítio D‘Abadia e Mambaí, no qual estimou-se que cerca de 1034 famílias sobreviviam ou complementavam a renda familiar com a coleta dos frutos da favela, que ocorre no período de abril a agosto. A maior parte da população

98

extrativista são trabalhadores braçais, crianças e adolescentes, que ganhavam em média R$.5,00 a R$.8,00 por dia de serviço, em atividades como: a colheita de semente de capim, capina, limpeza de roça e outras, entretanto é quase inexistente a oferta de trabalho nesta época do ano. A sociedade brasileira desconhece a importância do extrativismo da favela, uma planta do cerrado, cuja forma de exploração tem coexistido a mais de quarenta anos, não apenas com a exploração da espécie em questão, mas também das populações tradicionais que se submetem a coleta dos frutos por valor ínfimo dentro da cadeia de comercialização da espécie, quer seja por falta de emprego, acesso aos meios de produção como a terra e os recursos naturais do Cerrado.

Solução Adotada

Em 2001 o CEDAC desencadeou um processo de organização local de seis comunidades agroextrativistas do município de São Domingos, envolvendo 52 famílias. Os princípios do projeto: - todos os participantes do projeto deveriam ser extrativistas (vivem exclusivamente da atividade ou usam para complementação da renda); - nenhum dos extrativistas poderia explorar outros extrativistas através da compra ou intermediação; - nenhuma criança poderia participar da extração ou beneficiamento; - pelo menos 1/3 dos frutos deveriam ser deixados por árvore para não prejudicar a cadeia alimentar da fauna e a dispersão natural da espécie; - proibido colocar fogo no cerrado; - para a extração dos frutos só poderia ser utilizado gancho ou galho bifurcado. Esta experiência contribuiu com o fortalecimento de uma nova ―trama‖ social com os sujeitos de fato do cerrado, saindo do isolamento e da marginalidade, através da organização coletiva e valorização das riquezas do Cerrado, de modo que a cultura e seus produtos pudessem ser acessados e valorizados pela sociedade brasileira. Assim foi constituída em 2001 a Rede de Comercialização Solidária de Agricultores Familiares e Extrativistas do Cerrado. Com a mudança do código civil a Rede decide constituir como instrumento de comercialização a COOPCERRADO-Cooperativa mista de agricultores familiares, extrativistas, pescadores, vazanteiros e guias turísticos do Cerrado. Nos anos seguintes a Rede ampliou o trabalho, atingindo outras comunidades e municípios através do trabalho do monitor-agroextrativista desde a capacitação realizada de agroextrativista a agroextrativista até a gestão do empreendimento. Atualmente, o trabalho com a favela atinge 400 famílias dentro da Rede, nos municípios de São Domingos, Mambaí, São João da Aliança, Formosa, Guarani de Goiás, Posse Cidade de Goiás no estado de Goiás, Lassance, Santa Fé de Minas, Jequitaí, Augusto de Lima, Corinto, Buenopólis, Paracatu, Ibiaí e Olhos D‘Água em Minas Gerais e Cocos, Jaborandi na Bahia.

Resultados Alcançados

Após seis anos, com resultados significativos o trabalho que deu contorno e identidade a Rede, possibilitando o protagonismo dos agroextrativistas do Cerrado,

99

que transformaram a sua realidade em torno de uma planta do Cerrado a favela, dá mostra da importância deste modo de vida ainda invisível na sociedade. A cultura construída em torno da favela, encontrado nas regiões imprimiam aos coletores um caráter de exploradores e aos frutos de mercadoria, estimulados por uma demanda externa, das indústrias. Entretanto, distante desse olhar os agroextrativistas desenvolveram propostas que pudessem resgatar o conhecimento sobre a espécie, bem como sair da marginalidade e da exploração do indivíduo e do ambiente. Essa mudança foi ocasionada pelo desenvolvimento da atividade, implementação do manejo sustentável, geração de renda e domínio dos próprios sujeitos sobre a cadeia de comercialização. De 2001 a 2006 ampliou-se o número de famílias envolvidas passando de 52 para 400 famílias, comercializando diretamente para indústria 142,5ton de frutos, gerando uma renda entre R$350,51 a R$539,99/coletor. Aspectos considerados relevantes também foram conquistados pelas comunidades, como a não participação de crianças no duro trabalho de coleta e beneficiamento dos frutos, a garantia da participação da mulher desde a coleta até o recebimento da receita da atividade e a não exploração de outros agroextrativistas pela compra de frutos. Essa perspectiva gerou uma avaliação da importância da mulher, que era subestimada pelos homens por sua capacidade produtiva e subjugada a uma condição inferior, felizmente comprovada a partir de dados das cadernetas de coleta, onde a mulher coleta cerca de 65% a mais que o homem. A Rede se tornou um movimento em expansão contínua, onde algumas propostas vêm se transformando em política pública pela reivindicação direta da Rede como a aprovação da Lei nº15.015, de 29/12/2004 do estado de Goiás, que dispôe sobre a redução da base de cálculo do ICMS sobre a industrialização de produtos típicos do cerrado (de 17% passou para 7%).

http://www.tecnologiasocial.org.br/bts/tecnologiaSocialAction.do?metodo=detalhesTecnologia&codigoTecnologiaSocial=1811 AVALIE o exemplo de tecnologia social apresentado acima ressaltando em que medida ela melhorou ou não a qualidade de vida dos beneficiários. Questionamentos sobre a relação campo-cidade e sobre reforma agrária elaborados pelos alunos. 1- EXPLIQUE a origem da desigualdade na estrutura fundiária brasileira. 2- Existem propostas para modificar a concentração de terras no Brasil? 3- EXPLIQUE o papel do governo como gestor/regulador da relação campo-cidade. 4- Quais são os produtos cultivados pela agricultura familiar no Brasil? 5- EXPLIQUE o que são terras improdutivas. 6- JUSTIFIQUE a atuação dos movimentos de luta pela terra no Brasil. 7- DISCORRA sobre os caminhos utilizados pelos sem terra para consolidar um assentamento legalizado. 8- Qual é o destino das famílias que são retiradas dos assentamentos ilegais por meio da força policial? 9- Como são as relações sociais entre os assentamentos e com o ambiente externo (pontos de venda – familiares que ficaram na terra natal - governo) 10- Qual é o destino principal dos produtos comercializados no assentamento?

100

10.3-Roteiro para as entrevistas com os assentados

Querido aluno(a),

este roteiro lhe auxiliará na execução das entrevistas durante o trabalho de campo

no Assentamento Pastorinha em Brumadinho, MG.

Procure coletar o maior número de informações e entrevistar pessoas de famílias

diferentes.

As entrevistas acontecerão em dois momentos distintos cuja organização está

detalhada no esquema abaixo.

HORÁRIO ATIVIDADE

0730h Saída para o assentamento

0900h Café da manha

1000h Exposição de ideias e conhecimento da historia do assentamento

com a líder comunitária: Valéria.

Neste momento acontecerá a primeira rodada de entrevistas. De

forma conjunta, os alunos direcionarão perguntas à líder comunitária

para verificar questões sobre a gestão local.

1100h Caminhada pelo assentamento com o objetivo de conhecer as

moradias e as áreas de cultivo.

1200h Almoço

1300h Segunda rodada de entrevistas: os alunos se direcionarão às áreas

de plantio e moradia para coletar dados sobre o cotidiano da

comunidade.

1500h Café da tarde

1530h Debate final e retorno à escola.

ENTREVISTAS

MOMENTO 1 – 1000h (galpão)

1- Como as famílias envolvidas na ocupação se reuniram para lutar por esta área?

_____ As famílias se reuniram em grupos organizados ao acaso.

_____ As famílias se reuniram a partir de um vinculo familiar já existente.

101

_____ As famílias se conheceram em processos de ocupação diversos.

_____ As famílias foram reunidas por líder comunitário.

Outras opções ou observações:

2- Como foi feita a distribuição de terras no assentamento?

_____ Através de um sorteio.

_____ As famílias com mais membros ficaram com as áreas maiores.

_____ Por decisão do juiz.

_____ Condicionamento ao envolvimento da família no processo de ocupação.

Outras opções ou observações:

3- Durante a época da colheita, as famílias se reúnem para uma ajuda mútua?

_____ Sim, isso sempre acontece.

_____ Sim, de acordo com uma escala estabelecida no assentamento.

_____ Depende qual é o tipo de hortaliça a ser colhida. Há colheitas que precisam

de mais ajuda e outras não.

_____ Não, cada família colhe o que está na sua respectiva área.

Outras opções ou observações:

4- Após a colheita, quem é responsável pelo armazenamento, transporte e

comercialização?

_____Cada um é responsável por isso.

_____Existem pessoas no assentamento que são responsáveis por isso.

_____Há um rodízio semanal ou mensal

Outras opções ou observações:

5- Os recursos financeiros necessários para o plantio vêm de onde?

_____Cada um é responsável pelo dinheiro utilizado na plantação.

_____As pessoas do assentamento utilizam um credito especial do banco.

_____Existem pessoas que nos ajudam a manter as plantações.

Outras opções ou observações:

6- Como funciona a distribuição do dinheiro gerado pelo cultivo das hortaliças?

102

_____Cada um recebe o seu dinheiro de acordo com o que plantou, ou seja, não há

alguém que distribui o lucro entre os assentados.

_____Há uma pessoa no assentamento responsável pela distribuição do dinheiro.

Outras opções ou observações:

7- Como são tomadas decisões do assentamento?

_____Cada assentado toma as decisões sobre o que será plantado.

_____ Um engenheiro agrônomo nos ajuda a decidir o que deve ser feito.

_____Alguns assentados nos ajudam a decidir o que devemos fazer e plantar.

Outras opções ou observações:

8- Qual é a relação dos assentados com o governo local?

_____ A prefeitura de Brumadinho ajuda muito a decidir o que se deve fazer, além

de oferecer apoio financeiro para o plantio.

_____ O governo só vem aqui para fiscalizar nossa produção.

_____Os assentados não precisam do governo para manter a produção de

hortaliças.

Outras opções ou observações:

ENTREVISTAS

MOMENTO 2 – 1300h (nas áreas de moradia e de plantio)

1- Toda a sua família é composta por pessoas que trabalham com a plantação de

hortaliças?

_____ Sim.

_____ Não.

Outras opções ou observações:

2- Qual é o local de nascimento das pessoas da sua família?

3- Como é decidido o que será plantado na terra de vocês?

_____ O chefe da família decide o que será plantado.

_____ As pessoas no assentamento decidem coletivamente o que será plantado.

103

Outras opções ou observações:

4- Vocês precisam da ajuda de outras famílias para o plantio e para a colheita?

_____ Sim.

_____ Não.

Outras opções ou observações:

5- Como é feito o armazenamento e o transporte dos produtos de vocês?

_____ Temos um galpão para isso e um carro que leva os produtos.

_____ Guardamos e vendemos juntos com os outros assentados.

Outras opções ou observações:

6- Vocês precisam pegar dinheiro no banco para comprar os produtos necessários

para a plantação?

_____ Sim.

_____ Não.

_____ Cada família ajuda a outra.

_____ Existem pessoas que nos ajudam.

Outras opções ou observações:

7- Onde vocês vendem os produtos colhidos em suas terras?

_____ Nas cidades mais próximas.

_____ Nos locais onde o assentamento conseguiu espaço para vender como

escolas e igrejas.

Outras opções ou observações:

8- O dinheiro da venda vem direto para vocês?

_____ Sim. Todo o dinheiro da venda vem diretamente para a família que plantou.

_____ Não, os assentados se reúnem para fazer a divisão do resultado da venda.

Outras opções ou observações:

104

10.4-Roteiro para o diagnóstico depois do trabalho de campo

DIAGNÓSTICO: UTILIZADO DEPOIS DO TRABALHO DE CAMPO

A PERCEPÇÃO DA DIMENSÃO SOCIOESPACIAL DO REAL

ÁREA URBANA x ÁREA RURAL

1- a) Analise as duas imagens de HABITAÇÕES POPULARES acima e DESCREVA-AS. FOTO 1 FOTO 2 b) Fale sobre as possíveis CONDIÇÕES DE VIDA das populações que habitam os dois espaços fotografados. FOTO 1 FOTO 2 c) Que HIPÓTESES você elabora sobre os possíveis processos de ocupação desses espaços.

A GERAÇÃO DE RENDA EM ÁREAS RURAIS

FOTO 2: Moradia no Assentamento Pastorinha – arquivo pessoal

FOTO1: Moradias em aglomerados de áreas urbanas - www.ips.org/

FOTO 2: Agroindústria

1http://i117.photobucket.com/albums/o61/ulilopes/Figura013.jpg FOTO 1: Agricultores do Assentamento Pastorinha – arquivo pessoal

105

2- Analise as duas imagens de ÁREAS RURAIS anteriores e ESCREVA sobre os mecanismos de geração de riquezas em cada uma. 3- Como você vê a organização do processo de urbanização brasileira e quais são as suas principais características? 4- Quais são as atribuições do poder público na organização do espaço urbano? 5- Como você vê a organização do espaço agrário brasileiro e quais são as suas principais características? 6- Quais são as atribuições do poder público na organização do espaço agrário? 7- Como você percebeu, no Assentamento Pastorinha, os seguintes aspectos: a) as negociações da comunidade para a comercialização de seus produtos; b) os processos, as técnicas e os novos saberes construídos para o cultivo e o armazenamento da produção; c) as relações e as negociações entre as lideranças do Assentamento com as políticas públicas e com os governos. 8- Você identificou alguma estratégia que os assentados construíram para melhorar o desenvolvimento da comunidade. Descreva-as. 9- Que percepções você possuía sobre o mundo agrário brasileiro e seus sujeitos antes do trabalho de campo ao Assentamento Pastorinha? 10- O que mudou ou o que foi acrescentado em suas percepções?

Para responder à questão dez preencha o quadro a seguir:

O mundo Agrário Brasileiro para você antes do trabalho de campo

O mundo Agrário Brasileiro para você após o trabalho de campo

106