pedro abelardo x são bernardo - 1141 - filosofia
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Trecho histórioco do Templários,TRANSCRIPT
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O PENSAMENTO FILOSFICO MEDIEVAL DE PEDRO
ABELARDO: EDUCAO E DOCNCIA
RODRGUEZ, Margarita Victoria
Universidade Catlica Dom Bosco
RESUMO: O presente artigo tem por objetivo discutir os princpios educativos e filosficos de
Pedro Abelardo no contexto da educao crist na baixa Idade Mdia, especificamente no
perodo do florescimento da escolstica, e a lutas travadas pelo monge-educador em defesa de
uma filosofia baseada no pensamento racional.
PALAVRAS CHAVE: Pedro Abelardo. Docncia. Filosofia Medieval.
ABSTRACT: This article aims to discuss the educational and philosophical principles of Peter
Abelard in the context of Christian education in low Middle Ages, especially during the
flowering of scholastic, and the struggles waged by the monk-educator in defense of a
philosophy based on rational thought.
KEYWORDS: Peter Abelard. Teaching. Medieval Philosophy.
A partir do sculo XI, durante a Baixa Idade Mdia, o Ocidente experimentou
transformaes que originaram novas estruturas econmicas culturais, polticas e sociais. Este
perodo foi marcado por intensas mudanas, tanto no mbito da educao como da cultura. O
processo de urbanizao intensificou-se e com isto novas demandas sociais emergiram e
modificaram a estrutura do modo de produo feudal1.
Cambi (1999, p. 171) se refere Baixa Idade Mdia da seguinte forma:
Estamos diante de uma retomada de iniciativa da histria ocidental que se delineia em torno
da nova realidade da Europa: o desenvolvimento econmico, o incremento tcnico, a
afirmao de uma nova classe social a burguesia , o impulso do pensamento, a dissenso poltica e uma sociedade mais dinmica e mais mvel; so fatores que vm definir uma
poca nova. [...] Antes de tudo, estamos agora longe dos limites da sociedade feudal,
fechada e bloqueada, agrcola e sem intercmbios; estamos longe daquela sociedade de
ordens (trinitria, como foi chamada, e hierarquizada) e dentro de um mundo que se torna
cada vez mais conflitual e complexo, cada vez mais articulado e plural, que v o
crescimento de protagonistas e tenses (no nvel poltico: o papado, o Imprio, as comunas,
os estados nacionais).
Na educao, verificou-se o surgimento de instituies educativas mantidas pela Igreja,
que assumiram a educao da populao laica, tais como as escolas catedrais, universidades,
entre outras. Desde o sculo VI, os monastrios das diferentes ordens religiosas a ordem beneditina foi a mais importante eram responsveis de cuidar da cultura e da educao. Segundo Luzuriaga (1963), inicialmente os monastrios no tinham como objetivo a formao
1 No existe consenso em relao peridiodizao da poca feudal. Duby (1988, p. 179) considera que o perodo
feudal se iniciou "nos decnios que enquadram o ano mil" e explica que se trata de "uma simples revelao de um
movimento de amplitude muito grande, cujo curso foi precipitado pelas invases dos sculos IX e X, mas que,
dissimulada, havia se iniciado desde a poca carolngia". Marc Bloch (1979, p. 98) situa o feudalismo entre o sculo
IX e o sculo XIII, e assinala que no Norte da Itlia se observa que as relaes sociais se diferenciaram do resto da
Europa, evidenciado precocemente o surgimento de novas dinmicas econmicas, polticas e sociais diferenciadas.
Hobsbawn (1977, p.11) considera que entre l450 e l650 teve lugar a fase de transio que dar lugar ruptura entre a
base e a superestrutura da sociedade feudal. O autor salienta ainda que na Inglaterra, durante o sculo XVII se
evidencia o primeiro momento do surgimento da sociedade burguesa e as relaes de produo capitalistas.
Entretanto para Jacques Le Goff (1984, p.11) o perodo feudal muito mais abrangente este longo equilbrio do modo de produo feudal dominado pela ideologia crist, que se alonga do fim da Antiguidade clssica at a
Revoluo Industrial, no sem crises nem inovaes.
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intelectual, privilegiavam os aspectos morais e espirituais. Mas, com as transformaes sociais
esta situao mudou:
Mas o florescimento geral da vida social tambm os mosteiros se renovaram e se renovam
as Regulae, repondo o problema da instruo dos monges e, especialmente, dos oblatos.
Temos, de fato, vrios testemunhos de mosteiros, como o de Montecassino no sculo XI,
onde s vezes se prescreve que todos os monges aprendam as letras (MANACORDA, 1989, p. 140).
Aps o ano 1000, a Europa sofreu profundas mudanas como conseqncia da
interrupo dos ataques brbaros, reabriu o trfego no Mediterrneo e reconciliou o poder papal
e imperial, transferindo o imprio aos germanos. Tambm surgiram novos centros urbanos, com
grande desenvolvimento da cultura e da educao, especialmente na Itlia. Manacorda (1989, p.
143) afirma que a Igreja tinha o controle da educao:
A crise do imprio carolngio levara a uma nova situao: a fonte, agora imperial, do direito
escolar passara de fato Igreja, como tambm passa para ela o controle poltico,
anteriormente do imprio, sobre as escolas eclesisticas. Alm disso, a Igreja foi abrindo
suas escolas episcopais e paroquiais tambm aos leigos, dando-lhes ao mesmo tempo
instruo religiosa e literria. Criou-se, em suma, um monoplio eclesistico da instruo
[...].
Em 1079, o Papa Gregrio VII reconfirmou aos bispos a obrigao de ensinar as artes
liberais2 nas escolas das igrejas. Os mosteiros renovavam seus ensinamentos, porm buscavam
no confundir os ensinamentos religiosos com as cincias naturais e mundanas.
Deste modo, um novo tipo de educao eclesistica foi implementada, especialmente
nas escolas das catedrais, que tinham como objetivo a formao de clrigos. Estas escolas
deram origem s universidades3, instituies que enfrentaram uma longa luta para conquistar
sua autonomia em relao intromisso das autoridades. Segundo Cambi (1999, p. 183), Foi pela evoluo das escolas catedrais, que comearam a assumir um carter mais corporativo e no giro relativamente de um sculo evoluram para o novo instituto de universidade [...].
La universidad de Pars se deriva de las escuelas de Notre-Dame, de Santa Genoveva y de la
Abada de San Victor. Ya antes de fines del siglo XII los maestros de esas escuelas estavam
organizados en una corporacin. Maestros gremiales entre los que destaca Abelardo contribuyeron a dar forma a la escuela parisina y parepararon la constitucin de la
Universidad (ABBAGNANO; VISALDERGHI, 2001, p. 154).
Um dos mestres que contribui com a fama das escolas de Paris, foi Abelardo, que
colaborou para a implementao do studium generale. Por volta de 1150, se instalou o curso
referente s artes liberais (trivium), depois foi criado o curso de teologia, de direito, e de
medicina, constituindo assim, o nvel superior de ensino (CAMBI, 1999, 183).
Abelardo: dialtica e mtodo pedaggico
Durante a Idade Mdia, grande parte da sociedade era analfabeta. Os conhecimentos
privilegiavam as idias tradicionais e a f catlica que eram transmitidos por meios orais e
visuais, sendo as ordens religiosas responsveis por este processo de divulgao cultural e
educacional. Depois do ano mil, pregadores religiosos (franciscanos e dominicanos)
propagavam mensagens religiosas, numa linguagem simples, para o povo. Entretanto, as elites
2 O currculo das escolas na Idade Mdia estava organizado pelas chamadas artes liberais, divididas em tvium -
gramtica, retrica, dialtica - e quadrvium - aritmtica, geometria, astronomia, msica. Ou seja, o ensino se
constitua pelas matrias humanistas e realistas, alm do estudo dos Evangelhos ou teologia. 3 A Universidade de Paris no existia como uma instituio organizada academicamente, s adquiriu o status de
universidade depois da morte de Abelardo, aproximadamente em 1170-, esta instituio foi uma das mais importantes
do perodo.
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em geral eram alfabetizadas, seja no mbito da igreja-convento, ou no castelo- palcios.
Contavam com instituies e agentes educativos especializados que cuidavam da educao. Os
conhecimentos, tanto da cultura religiosa como da cultura laica, eram transmitidos mediante
mdios escritos, e privilegiam-se os valores e modelos cristos, embora a oralidade tambm
fosse uma metodologia utilizada para discutir os textos escritos.
Conforme Luzuriaga (1963, p. 89), na Idade Mdia, destacaram-se vrios educadores,
porm no foi um perodo no qual emergiram tericos da educao:
Na Idade Mdia no houve grandes tericos da educao. Em compensao, houve muitos
educadores, geralmente monges e eclesisticos, alguns dos quais escreveram sobre
educao. Distinguem-se dois grandes grupos: um constitudo pelos autores de
enciclopdias pedaggicas, nos primeiros sculos medievais; outro, pelos filsofos da
Escolstica, na segunda parte da Idade Mdia. Aqueles conservaram em parte o ensino
clssico, com obras sobre as artes liberais, estes sistematizaram as idias filosficas do
cristianismo.
O autor destaca entre os pedagogistas Santo Anselmo (1033-1109), Abelardo (1079-
1142), Alberto Magno (1193-1280), entre outros. Este movimento de educadores atuou num
contexto histrico em que a Igreja detinha a hegemonia cultural, poltica e econmica, com
predominncia das idias filosficas influenciadas pela escolstica. A filosofia crist conhecida
como escolstica, desenvolveu-se desde o incio do sculo IX at fim do sculo XVI, ou seja,
at o fim da Idade Mdia. O nome de escolstica faz referncia filosofia ensinada nas escolas
da poca pelos mestres que eram chamados de escolsticos. Abbagnano (2000, p. 344) explica
que:
Nos primeiros sculos da Idade Mdia, era chamado de scholaticus o professor de artes
liberais e, depois, o docente de filosofia ou teologia que lecionava primeiramente na escola
do convento ou da catedral, depois na Universidade. Portanto, E. significa filosofia da
escola. Como as formas de ensino medieval eram duas (lectio, que consistia no comentrio
de um texto, e disputatio, que consistia no exame de um problema atravs da discusso dos
argumentos favorveis e contrrios), na E. a atividade literria assumiu predominantemente
a forma de Comentrios ou de coletneas de questes.
A escolstica surgiu do especial desenvolvimento da dialtica. Os intelectuais da poca
debatiam a respeito da dialtica e a metafsica e Abelardo foi uns dos filsofos que desenvolveu
os princpios da dialtica. Considerava como todos os filsofos anteriores ao Sculo XIII que a
pesquisa filosfica se focava na discusso e elucidao dos problemas destacados nos tratados
de Aristteles e os posteriores comentrios de autores como Porfrio e Bocio. No livro, Lgica
para principiantes, Abelardo (1973, p. 207) afirmava que:
Para aqueles dentre ns que se iniciam no estudo da lgica digamos algumas palavras sobre
as suas propriedades, e comecemos por tratar do gnero a que ela pertence, ou seja, a
filosofia. Bocio no denomina qualquer cincia filosfica, mas s aquele que consiste no
estudo das coisas mais elevadas. De fato no damos o nome de filsofos a quaisquer
estudiosos, mas apenas aos sbios cuja inteligncia se aprofunda nas consideraes das
questes sutis. Bocio distingue trs espcies de filosofia, isto , a especulativa, que
investiga a natureza das coisas; a moral, que considera a questo da vida honesta; e a
racional, denominada lgica pelos gregos e que trata da argumentao.
Abelardo humanizou as relaes escolares e exps seus sentimentos e fraquezas tanto
na suas obras como nos ensinamentos. Cambi (1999, p. 187) afirma que:
Abelardo, j a partir de sua obra autobiografia (Historia calamitatum mearum), em que
narra o atormentado amor por Helosa, pe em destaque uma nova identidade humana, mais
individual, mais racional, mais livre, que se prope tambm como modelo formativo.
Assim, no Epistolrio, retornam o Abelardo professor e o Abelardo-homem, carregados de
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dvidas, de paixes, estimulados por um desejo de busca que pe a razo (a dialtica) como
instrumento-chave de uma formao propriamente humana.
Uma das contribuies filosficas de Abelardo foi seu mtodo, marcando uma
pedagogia prpria no contexto medieval. Este mtodo que, posteriormente foi retomado e
aprofundado por Santo Toms de Aquino, consistia em colocar o estudante em situaes nas
que se apresentavam questes com seus prs e contras. Assim, baseando-se no princpio da
verdade, mediante uma discusso dialtica de argumentos aparentemente contraditrios, ou seja,
perante um mesmo problema, confrontavam-se solues opostas, para posteriormente discuti-las
e resolv-las, refutando opinies adversas. O mestre aplicava este mtodo racionalista para
refletir sobre as questes teolgicas o que lhe causou muitos problemas entre os membros da
igreja.
No mbito das scholae, sero Pedro Abelardo (1079-11420 e Hugo de Saint-Victor, ambos
parisienses e contemporneos, que delinearo um primeiro quadro inovador dos processos
educativos. [...] Com o j lembrado Sic et nom, Abelardo, porm consigna Escoltica o
mtodo de estudo e de estudo racional articulado sobre a dialtica- dos vrios assuntos (CAMBI, 1999, p. 187).
O problema dos Universais ocupava os filsofos escolsticos dialticos e foi o centro
das discusses filosficas. Abelardo atacou cruamente a postura de Roselino4 e foi intransigente
com o realismo de Guilherme Champeaux (1070-1121) porque no concordava com a
concepo filosfica destes mestres. A soluo de Abelardo aos problemas dos universais
baseava-se na funo do conceito que significar as coisas. Aceitavam ento a idia de
Aristteles o universal nascido para ser predicado de muitas coisas (ABBANANO, VISALBERGHI, 2001). Abelardo afirmava que:
Uma palavra universal, entretanto aquela que apta pela sua descoberta para ser predicada
singularmente de muitos seres, tal como este nome homem, que se pode ligar com os nomes
particulares dos homens segundo a natureza das coisas sujeitas (substncias) s quais foi
imposto. [...] Portanto, quando se afirma que o universal aquilo que predicado de muitos,
a expresso aquilo que, usada no incio da definio, no apenas indica a simplicidade da
palavra para distingui-la das proposies, como tambm, a unidade do significado para
distingui-la dos termos equvocos.
Com respeito questo da tica, Abelardo enfatizava a questo da moralidade,
salientando que os atos bons ou maus eram definidos pela inteno, ou seja, no era a ao
fsica que se constitua numa ofensa a Deus, seno o aspecto psicolgico que se imprimia nesta
ao, ou seja, a inteno de pecar. Assim, o mestre Abelardo imprimiu na sua pedagogia um
contedo baseado no respeito formao do sujeito como intelectual autnomo, e justamente,
critica esta concepo prxima ao sujeito moderno (CAMBI, 1999).
As vicissitudes do mestre Abelardo
Pedro Abelardo nasceu em 1070, na aldeia de Pallete, prxima da cidade de Nantes, na
Bretanha e morreu em 1142, em Chalons-sur-Sane. Seu pai, Berengario, cavalheiro amante das
letras, era o senhor da aldeia. Sua me, Luca e o pai, fizeram votos monsticos. Pedro era o
filho primognito, sua vida estava destinada carreira militar, mas como ele mesmo explica,
abandonou a Marte por Minerva, ou seja, a profisso das armas pelo saber:
4 Roscelino (c.1050 c.1122) conhecido como o principal defensor na Idade Mdia do nominalismo na disputa dos universais. [...] No foram conservados escritos completos de Roscelino, mas tem-se informao sobre suas
doutrinas pelas refutaes de Abelardo e de Santo Anselmo (FERRATER MORA, 2001, p. 2551). Roscelino considerava os universais como sendo to somente sons, ou seja, palavras e tambm afirmava que apenas o indivduo
possui realidade.
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Meu pai foi um pouco versado nas letras antes de haver cingido o cinturo de soldado e
mais tarde abraou com tanto amor as letras que se disps a fazer com que nelas fossem
instrudos, antes dos exerccios militares, quaisquer filhos que tivesse. E, sem dvida, assim
foi feito. Por isso, tratou com tanto mais cuidado da minha formao quanto mais me
dedicava o seu afeto, uma vez que era o seu filho primognito. Eu, na verdade, quanto mais
longe e mais facilmente me adiantei nos estudos das letras, tanto mais ardentemente a elas
me apeguei, e fui seduzido por um to grande amor por elas que, abandonando aos meus
irmos a pompa da glria junto com a herana e a prerrogativa dos primognitos, renunciei
completamente corte de Marte para ser educado no regao de Minerva (ABELARDO,
1973, p. 250).
Assim, sendo muito jovem, deixou o castelo de seu pai visando aprofundar sua
formao e viajou por vrias cidades, como estudante itinerante na procura dos mestres mais
renomados da poca. Porm, seu esprito inquieto, curioso e instigador o levou a enfrentar
vrios obstculos e disputas com seus colegas e mestres.
E, visto que eu preferi as armas dos argumentos dialticos a todos os ensinamentos da
filosofia, troquei as outras armas por essas e antepus os choques das discusses aos trofus
das guerras. Por isso, perambulando, pelas diversas provncias a travar debates, onde quer
que ouvisse dizer que florescesse o estudo dessa arte, tornei-me um mulo dos peripatticos
(ABELARDO, 1973, p. 250).
Grande parte da Idade Mdia foi ocupada pelos debates sobre a questo dos universais.
No incio, tratava-se apenas de um problema de carter lgico-gramatical. Porm,
posteriormente, estendeu-se para os problemas teolgicos e metafsicos e acabou envolvendo os
dogmas da igreja crist. Um dos primeiros mestres que Abelardo confrontou foi Joo Roscelino,
o nominalista, que ensinava em Compigne, Loches. Roscelino duvidava do dogma trinitrio de
deus: a nica substncia divina era s um nome, as trs pessoas (Pai, Filho e Esprito Santo)
eram trs substncias diversas, indicadas por um nome comum, mas, Abelardo refutou este
pensamento. Abelardo foi um dos principais incentivadores da lgica at o sculo XIII, sua obra
"Dialtica" distinguia a lgica da metafsica, dando-lhe assim autonomia.
Abelardo passou um tempo na escola do Roscelino e posteriormente se trasladou a
Paris, onde havia grande efervescncia cultural e intelectual, contando com renomadas escolas
como a Escola da Catedral, a Escola de Ste. Genevive, e la de St. Germain des Prs, que foram
precursoras das instituies universitrias. A Escola da Catedral era a mais importante da poca.
Nela, Abelardo estudou dialtica com o mestre Guilherme de Champeaux. Apesar da fama do
mestre, Abelardo no se intimidou e comeou a questionar seus ensinamentos, transformando-se
em seu rival. Abelardo relata sua passagem pela escola:
Finalmente cheguei a Paris, onde essa disciplina conseguira florescer ao mximo, junto a
Guilherme, a saber, o de Champeaux, meu preceptor, reputado ento como o principal
expoente nesse magistrio, tanto pela fama como de fato. Com ele demorei algum tempo; de
incio fui bem aceito, mas logo depois eu lhe pareci muito incmodo quando tentei refutar
algumas das suas opinies e acometi contra ele a argumentar freqentemente, sendo que,
por vezes, eu parecia levar a melhor nas discusses (ABELARDO, 1973, p. 250).
Assim, discordando com os ensinamentos de Guilherme, tentou se estabelecer como
mestre na cidade de Paris, porm sua atuao foi muito difcil. Abriu duas escolas, primeiro em
Melun e depois em Corbeil. O intrpido Abelardo pretendia ser mestre, mas teve que enfrentar
vrios obstculos:
Por fim, aconteceu que, presumindo do meu engenho acima das foras da idade, eu aspirava
a direo de uma escola sendo ainda um adolescente, e imaginava o lugar em que realizaria
esse plano, a saber, na ento famosa cidade de Melun, que era sede real. Meu j mencionado
mestre pressentiu isso, tendo envidado esforos para afastar para bem longe de si a minha
escola. Maquinou ocultamente com todos os meios de que disps para, antes que eu me
afastasse da sua escola, prejudicar a preparao da minha e me arrebatar o lugar previsto.
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Mas como entre as pessoas influentes da terra eu contava ali com alguns partidrios,
confiado no seu auxlio consegui quanto desejava, sendo que a inveja manifestada por ele
angariou para mim a aprovao de muitas pessoas (ABELARDO, 1973, p. 251).
O mestre Abelardo ganhou fama e prestgio entre seus discpulos, alimentando o seu
ego pessoal. Logo, trasladou-se para a cidade de Corbeil, nas imediaes da cidade de Paris.
No entanto, em conseqncia desse meu tirocnio na escola, o meu nome comeou a
difundir-se de tal modo na arte da dialtica, que no apenas a fama dos meus condiscpulos,
como tambm a do prprio mestre, reduzida pouco a pouco, acabou por se extinguir. Da
resultou que, presumindo eu prprio cada vez mais de mim mesmo, transferisse o mais
depressa possvel a minha escola para Corbeil, mais prxima da cidade de Paris, para que
da certamente a minha indiscrio promovesse assaltos mais freqentes de discusso. No
havia, porm, transcorrido muito tempo quando, por causa do ardor desconhecido pelos
estudos, e atingido pela doena, fui obrigado a retornar terra natal (ABELARDO, 1973, p.
251).
Com efeito, depois de sua estadia na Frana, retornou para sua terra natal, por
problemas de sade. Posteriormente, voltou a Paris para estudar retrica e novamente foi aluno
de Guilherme de Chapeaux, porm, mais uma vez entrou em conflito com o mestre devido
discusso sobre o conceito dos universais:
Alm de outras tentativas das nossas discusses, eu o constrangi por meio de clarssimas
provas racionais a modificar, ou melhor, a destruir sua antiga sentena a respeito dos
universais. Na verdade era da opinio, a respeito da comunidade dos universais, de que a
mesma coisa existia essencial e, ao mesmo tempo, inteiramente em cada um dos seus
indivduos, dos quais, por certo, no havia nenhuma diversidade na essncia a no ser a
variedade na multiplicidade dos acidentes. Ento ele corrigiu de tal modo essa sua sentena,
que em seguida, afirmava que a mesma coisa existe no essencialmente, mas
indiferentemente (ABELARDO, 1973, p. 251).
Quando o mestre Guilherme se retirou ao mosteiro de So Vitor, porque havia perdido
prestgio por conta dos debates travados com Abelardo, a respeito dos universais, a disciplina de
Guilherme foi retirada do ensino oficial. Nesse perodo, Abelardo que havia reiniciado suas
aulas na escola de Melun, tentou ocupar a ctedra deixada pelo velho mestre, porm no teve
sucesso. O sucessor de Guilherme, entusiasmado com a fama de Abelardo, convidou-lhe para
ministrar a disciplina dialtica, mas teve srios problemas de relacionamento. Segundo o
prprio Abelardo, sua sada deveu-se influncia negativa de seu antigo mestre que sentia
muita inveja:
No entanto no fcil exprimir como, poucos dias depois de eu a reger a cadeira de
dialtica, meu mestre comeou a consumir-se de inveja, e com que sofrimento se
atormentava, de tal modo que, no sustentando por muito tempo o ardor da misria que o
dominara, empreendeu astutamente conseguir a minha remoo. Mas como no tinha
motivo para agir contra mim abertamente, resolveu privar da escola, sob acusao de crimes
detestveis, aquele que me cedera o seu lugar de professor e que foi substitudo na sua
funo por um outro que fora outrora meu rival (ABELARDO, 1973, p. 252).
Em 1108, Abelardo estabeleceu-se na escola de Monte de Santa Genoveva e sua fama
de mestre cresceu enormemente. Posteriormente, em 1113, conseguiu ocupar a ctedra de
dialtica to desejada, na Escola da Catedral, adquirindo grande renome, como mestre de
dialtica e retrica.
Antes de assumir a ctedra de teologia na Escola da Catedral, trasladou-se Laon para
estudar teologia com o mestre Anselmo (1033-1109), que na poca era a mxima autoridade na
disciplina. Mas, Abelardo o desconsiderou como mestre porque no estava preparado
intelectualmente para ministrar os ensinamentos teolgicos. Em suas memrias, criticava
implacavelmente a incapacidade do mestre:
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Ento fui ter com esse velho que conquistara um grande nome mais pela sua longa prtica
do que pelo engenho ou pela memria. Se algum vinha bater sua porta, incerto, para
consult-lo sobre alguma questo, voltava mais incerto. Na verdade, parecia admirvel aos
olhos dos seus ouvintes mas era nulo aos olhos dos que lhe faziam perguntas. Tinha uma
elocuo admirvel, mas era vazio de contedo, oco de pensamento (ABELARDO, 1973, p.
254).
Deste modo, perante a falta de interesse nos ensinamentos do mestre Anselmo, e, ainda
na sua petulncia de jovem que ansiava apreender novos contedos, Abelardo enfreou
abertamente o velho mestre e o acossou da mesma forma como havia perturbado o mestre de
Paris. Em conseqncia, Anselmo comeou a perseguir-lhe:
Em conseqncia disso, esse velho senhor, abalado por violenta inveja e j estimulado ento
contra mim pelas instigaes de alguns, como lembrei acima, comeou a perseguir-me pelas
minhas aulas sobre a cincia sagrada, no menos do que anteriormente o fizera meu Mestre
Guilherme pelas de filosofia (ABELARDO, 1973, p. 255).
Entre os anos 1108 e 1118, Abelardo teve muito sucesso como mestre em Paris, foi o
perodo mais brilhante de sua atuao, era procurado por alunos das mais distantes cidades da
Europa. Efetivamente, contava com sua capacidade de oratria e desempenho intelectual para
atrair os mais variados pblicos, como o prprio Abelardo (1973) relata. Era eloqente, vivaz,
charmoso, com uma voz cativante, ou seja, tinha todas as condies fsicas e intelectuais para
encantar o auditrio. Condio esta que o levou a vangloriar-se de suas capacidades e perder o
gosto pela sabedoria, dando livre passo s paixes humanas:
Assim, depois de alguns dias, voltei a Paris e desfrutei por alguns anos tranquilamente da
escola que, havia muito tempo, me fora destinada e oferecida e da qual eu havia sido
expulso. [...] E, na verdade, essas aulas foram to bem recebidas pelos estudantes, que j
admitiam que eu no tinha menos encanto na cincia sagrada do que aquele que eles j
haviam apreciado na filosfica [...].
Mas, porquanto a prosperidade sempre faz inchar os tolos, e o repouso mundano debilita o
Igor da alma e facilmente o enfraquece por meio dos atrativos carnais, quando eu j me
considerava como o nico filsofo eminente e no temia mais nenhuma outra inquietao
comecei a afrouxar as rdeas s paixes, eu que antes vivera na maior continncia. E quanto
mais eu me adiantava na filosofia e na cincia sagrada, mais eu me afastava dos filsofos e
dos santos pela vida impura (ABELARDO, 1973, p. 256).
Segundo Abelardo, esta atitude incongruente com sua condio de mestre fez com que
rapidamente perdesse o respeito de seus colegas e discpulos, motivando sua queda repentina e
trgica, como relata na suas memrias. Nesse contexto, conheceu Helosa, sobrinha do cnego
Fulberto, jovem moa que o encantou com sua beleza e admirao. A histria amorosa
conhecida pelos escritos do prprio Abelardo, quem narra detalhadamente as desventuras de sua
paixo pela jovem. Assim, na mencionada obra, os infortnios do filsofo se confundem com
sua reflexo dialtica e recorre a diversas interpretaes para explicar as circunstncias trgicas
que deram fim histria amorosa. Abelardo conta em detalhes como foi a brutal vingana do
cnego, a fugida de Helosa a Pallet, cidade em que nasceu o filho chamado Astrolbio. Fala
tambm de seu casamento segrego, descreve a entrada da Heloisa ao monteiro de Argenteuil e
seu posterior abandono da carreira acadmica.
Ora logo que nasceu o nosso filho, depois de o ter confiado minha irm, voltamos
ocultamente a Paris e, depois de poucos dias, tendo passado a noite numa certa igreja
entregues a uma secreta viglia de oraes, a mesmo, de madrugada, estando presente o tio
dela e alguns amigos seus e meus, fomos unidos pela beno nupcial. Imediatamente depois,
retiramo-nos ocultamente cada um para o seu lado, e no nos vimos mais a no ser
raramente e s escondidas, encobrindo com muita dissimulao o que tnhamos feito. O tio
dela, porm, e seus familiares, procurando uma consolao para a sua desonra, comearam a
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divulgar o matrimnio que havamos contrado e a violar a respeito disso a palavra que me
haviam empenhado. [...]
Quando me interei do que acontecia, envie-a para certa abadia de monjas, perto de Paris,
chamada Argenteuil, onde ela outrora, quando menina, fora educada e instruda
(ABELARDO, 1973, p. 265).
No obstante ter divulgado o casamento secreto de Abelardo e Heloisa, o tio dela
tambm se vingou fazendo com que Abelardo fosse atacado fisicamente e mutilado na sua casa,
porque a famlia pensava que ele era responsvel pela entrada da sobrinha ao convento:
[...] o tio dela e os seus parentes ou cmplices acharam que eu j zombara imensamente
deles e que, ao faz-la monja, eu queria desembaraar-me dela facilmente. Donde,
profundamente indignados e mancomunados contra mim, certa noite, enquanto eu repousava
e dormia num quarto retirado da minha residncia, tendo corrompido com dinheiro o meu
servidor, puniram-me com a vingana mais cruel e vergonhosa, e de que o mundo tomou
conhecimento com o maior espanto, isto , cortaram aquelas partes do meu corpo com as
quais eu havia perpetrado a faanha que eles lamentavam (ABELARDO, 1973, p. 265).
Depois do ataque, escndalo apoderou-se da vida de Abelardo. Ele era um clrigo com
ordens menores e havia tentado construir uma carreira distinta como mestre eclesistico.
Quando foi conhecido seu infortnio, os clrigos e os discpulos tiveram compaixo de seu
sofrimento, porm isto o envergonhava profundamente. Por iniciativa dos clrigos, foi para real
abadia de So Dionsio para se dedicar aos estudos religiosos, virando monge beneditino. E,
Helosa tornou-se freira em Arbenteuil.
Abelardo pretendia ocultar-se definitivamente e dedicar-se a sua vida monstica, porm,
novamente, entrou em conflitos com os monges da So Dionsio porque abadia qual eu me recolhera apresentava um estilo de vida muito profana e vergonhosa, e o seu prprio abade,
quanto mais se avantajava aos outros pela dignidade, tanto mais era conhecido pela vida
dissoluta e pela m reputao (ABELARDO, 1973, p. 267). Em conseqncia, brigou com os monges e foi viver numa casinhola a fim de consagrar-me da forma costumeira ao ensino (ABELARDO, 1973, p. 267). Rapidamente suas aulas ganharam fama e foi procurado por
muitos estudantes em busca de seus ensinamentos sobre filosofia:
Ali, o que era mais conveniente ao meu estado de vida, eu me aplicava grandemente ao
estudo da cincia sagrada mas sem ter abandonado totalmente o ensino das artes seculares
com as quais eu estivera mais habituado e que eles reclamavam bastante de mim. Fiz das
artes liberais uma espcie de anzol com o qual, sob o engodo do sabor filosfico, eu os
atraa ao estudo da verdadeira filosofia, tal como a Histria Eclesistica, de Eusbio,
recorda que costumava fazer Orgenes, o maior dos filsofos cristos (ABELARDO, 1973,
p. 267).
Mas, Abelardo se enfrentou com os mestres e monges que no concordavam com o
estudo de livros profanos e queriam que fosse proibido de ensinar. A ruptura com os monges da
Abadia de So Dionsio teve lugar quando Abelardo fez uma irreverente crtica lenda do santo
padroeiro da abadia, defendendo a tese de que para ensinar algum conceito, este deve ser
entendido antes pelo mestre:
Ora aconteceu que eu me aplicasse, de incio a discorrer sobre o prprio fundamento da
nossa f por meio de analogias propostas pela razo humana, e que eu compusesse para os
meus alunos um tratado Sobre a Unidade e a Trindade de Deus. Eles me pediam
argumentos humanos e filosficos, e insistiam mais naqueles que pudessem ser entendidos
do que proferidos, dizendo ser suprflua a prolao de palavras em a compreenso das
mesmas, e que no se pode crer naquilo que antes no se entendeu, e que ridculo algum
pregar aos outros o que nem ele prprio nem aqueles que ensina podem compreender com o
intelecto (ABELARDO, 1973, p. 268).
-
Por conta desta crtica, foi enviado para uma instituio filial e inquirido em vrias
oportunidades para explicar o que havia escrito no seu livro, alm de ser questionado pelo que
ensinava. Mas, apesar dos ataques sofridos, de novo, chamou a ateno das pessoas por seu
pensamento. Abelardo reiniciou sua disputa histrica com os discpulos de Anselmo e de
Guilherme, conhecidos como Alberico e Lotulfo, que atacaram a doutrina sobre a Santssima
Trindade defendida por Abelardo no seu livro. Seus adversrios contriburam tambm para
convocar em 1121, um conclio presidido por Cano, bispo de Preneste em Soisson,
Abelardo no foi condenado formalmente por suas doutrinas, pelo Conclio, porm foi
obrigado a queimar o livro sobre a Trindade e a recitar o Credo de Atansio, sendo humilhado
publicamente. Abelardo (1973, p. 274) relata esse episdio:
Depois disso, convocado para o conclio, compareci imediatamente, e sem nenhum exame
ou discusso, obrigaram-me a lanar ao fogo, com minha prpria mo, o meu livro, que
assim foi queimado. [...]
Todavia, quando eu me levantei para professar e expor a minha f, a fim de exprimir o que
eu sentia, com palavras prprias, meus adversrios disseram que eu no precisava de outra
coisa seno recitar o smbolo de Atansio, o que qualquer criana poderia fazer igualmente.
E para que eu no alegasse uma desculpa por ignorncia, como se eu no estivesse
acostumado com aquelas palavras, fizeram trazer o texto para que eu o lesse. Eu o fiz, em
meio a suspiros, solues e lgrimas, do modo que meu foi possvel. Em seguida, entregue,
como se fosse um ru e um convicto, ao abade de So Medardo, que estava presente, fui
arrastado para o seu claustro como para um crcere, e imediatamente o conclio foi
dissolvido.
Na sua estadia na abadia de Medardo, no incio foi muito bem tratado, embora,
Abelardo se encontrava muito envergonhado porque estava privado de sua liberdade.
Posteriormente, foi enviado novamente para o monastrio de Dionsio, porm ali enfrentou
terrveis hostilidades de seus antigos inimigos. Passados alguns meses, confrontou com os
monges, quando descobriu o texto de Beda Comentrio dos Atos dos Apstolos, que explicava
que Dionsio, o Areopagita, foi bispo de Corinto e no de Atenas. Este descobrimento irritou os
membros da abadia, porque eles se ... vangloriavam de que o seu Dionsio (fundador de monastrio) era o Areopagita e que a histria dele indicava haver sido bispo de Atenas (ABELARDO, 1973, 275). Os monges acusaram Beda de mentiroso, e ficaram enfurecidos com
Abelardo porque este defendia a autoridade de Beda, dado que seus escritos eram seguidos por
todas as igrejas latinas. Abelardo foi ameaado e temeroso fugiu do local, refugiando-se num
local deserto nas proximidades de Troyes. Novamente, comeou a receber inmeros alunos,
retomando a fama de antanho. No local, foram construdas cabanas para alojar os viajantes, foi
construdo um oratrio, denominado Parclito.
Com a morte de Adam, o abade de So Dionsio, seu sucessor Suger (1081-1151),
absolveu Abelardo e levantou sua censura, alm de restaurar seu status de monge. Em 1125, foi
escolhido para assumir o cargo de abade, na abadia de Sait-Gildas-de-Rhuis, situada perto de
Vannes, na costa da Bretanha. Porm, sua vida nesta instituio foi muito tumultuada, era
incomodado pelos monges da instituio e fora dela era atacado pelo senhor feudal que
dominava a regio.
Sua esposa tambm sofreu perseguio. O abade de So Dionsio, que reclamava a
propriedade da abadia de Argenteuil, expulsou Helosa. Abelardo alojou sua esposa
definitivamente no seu Oratrio do Parclito, no qual chegou a ser Abadessa. Como abade de
Sait-Gildas-de-Rhuis, Abelardo enfrentou resistncias entre os monges porque era considerado
muito rgido, inclusive, tramaram envenenar-lhe, e acabou abandonando a abadia. Conservando
o ttulo de abade, morou um tempo nas mediaes de Nantes e depois retomou sua carreira de
mestre em Paris, teve muito sucesso com suas lies, atraindo todos os jovens intelectuais de
Europa.
No perodo que morou em Paris, novamente enfrentou a ira de Bernardo de Claraval
(1090-1153), devido sua doutrina. Com efeito, Abelardo, foi um dos primeiros escolsticos
que havia dado incio a dialtica e considerava que era necessrio buscar os fundamentos da F,
com base na razo humana, argumentava:
-
Na verdade a primeira chave da sabedoria define-se como uma assdua ou freqente
interrogao, para a qual Aristteles, o filsofo mais perspicaz de todos, exorta os letrados a
apoderarem-se com todo o desejo, quanto diz, a propsito do predicamento da relao: talvez difcil, nestes casos, fazer afirmaes positivas a no ser que os examinemos
constantemente. Mas no ser intil duvidar de cada um [...]. De fato, da dvida chega-se
interrogao e a partir desta captamos a verdade, segundo o que a prpria Verdade diz:
Procurai e achareis, batei e abrir-se-vos- [MT. 7,7] (ABELARDO, 1994, p. 178).
Em 1139, as idias de Abelardo foram rejeitadas. Guilherme de Saint-Thierry (1085-
1148) destacou 19 proposies consideradas herticas e Bernardo as remitiu a Roma para sua
condenao. Bernardo estava horrorizado pela ortodoxia dos ensinamentos de Abelardo e
questionou a sua doutrina da Trindade, denunciando-lhe aos bispos da Frana. Abelardo
subestimando tal denncia, solicitou uma reunio, ou seja, um conclio de bispos, no qual
Bernardo e ele disputariam suas idias. Abelardo foi condenado em 1141, no conclio de Sens
por heresia e obrigado a se manter em silncio. Na vspera do conclio, realizaram uma reunio
de bispos, na qual esteve Bernardo, sem a presena de Abelardo. Nesta reunio, foram
selecionadas algumas preposies escritas por Abelardo e ele foi condenado. No outro dia foram
lidas as proposies, no conclio, na presena de Abelardo, que no se defendeu, porm manteve
sua liberdade.
Bernardo escreveu para os membros da Igreja romana um documento informando do
resultado da reunio. Na Carta a Inocncio II Contra erros de Pedro Abelardo - refutou os supostos erros, dado que considerava que a f s deve ser aceita. Assim, Abelardo iniciou uma
viagem a Roma para apelar ao Papa, porm ficou doente e s conseguiu chegar at a cidade de
Cluny. L, recebeu o decreto de Inocncio II que confirmava a sentena do Concilio de Sens.
Nessa cidade, recebeu o apoio de Pedro o Venervel (1122-1155), que obteve de Roma uma
mitigao da sentena e tambm contribuiu para que se reconciliasse com Sam Bernardo
(SANTOS DIAS, 2006, p. 171). Abelardo passou os ltimos anos de sua vida, na cidade Cluny,
tornou-se monge e foi mestre do monastrio de Cluny. Finalmente, em 1142, morreu em
Chalons-sur-Sane, sendo enterrado em Parclito. Em 1817, os restos dele e de Heloisa foram
trasladados ao Cemitrio de Pre La Chaise, em Paris.
Enfim, Abelardo teve um papel importante no processo de renovao pedaggica
durante a Idade Mdia, foi um filsofo e educador que enfrentou e questionou a filosofia de seu
tempo, visava formao do ser humano e colocava em evidncia as limitaes do sujeito no
seu relacionamento com o mundo. Aprofundou o mtodo dialtico, baseado no princpio
pedaggico de expor os prs e contras de cada questo, para chegar ao conhecimento filosfico.
Propunha a utilizao da razo para explicar os mistrios da F, apesar de que no chegou a
questionar as razes da teologia catlica. Sua atuao e fama, como mestre, contriburam para a
criao da Universidade de Paris.
REFERNCIAS
ABBAGNANO, N., V. A. Histria de la Pedagogia. Mxico: Fondo de Cultura Econmica,
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_______________ Lgica para principiantes. So Paulo: Abril, 1973.
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MANACORDA, M. A. Histria da Educao:da antiguidade aos nossos dias. So Paulo:
Cortez: Autores Associados, 1989.
SANTOS DIAS, C. E. Pedro Abelardo Confessio Fidei Universis. Veritas, Porto Alegre, v. 51, n. 3, p. 169-181, setembro 2006.