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Patógenos, Infecção e Imunidade Inata 24 Neste capítulo INTRODUÇÃO AOS 1486 PATÓGENOS BIOLOGIA CELULAR 1501 DA INFECÇÃO BARREIRAS CONTRA 1524 INFECÇÃO E O SISTEMA IMUNE INATO  As doenças infecciosas e parasitárias são responsáveis, atualmente, por cerca de um terço de todos os óbitos humanos no mundo, um número maior do que o das mortes provocadas por todos os diferentes tipos de câncer combinados. Em adição ao contínuo ônus de velhas doenças, como a tuberculose e a malária, novas doenças infecciosas emergem continua- mente, entre elas a atual pandemia (epidemia mundial) de AIDS ( síndrome da imunodefi- ciência adquirida), que já provocou mais de 25 milhões de mortes no mundo inteiro. Além disso, descobrimos que outras doenças, que imaginávamos serem devidas a outros fatores, estão, na verdade, associadas a infecções. A maioria das úlceras gástricas, por exemplo, não é causada pelo estresse ou por uma alimentação rica em temperos fortes, como se pensava anteriormente, mas por uma infecção bacteriana do estômago causada pela Helicobacter pylori. O ônus das doenças infecciosas e parasitárias não se encontra distribuído igualmente sobre o planeta. Os países e as comunidades pobres sofrem desproporcionalmente. Com fre- quencia, existe uma correlação entre a prevalência de uma determinada doença infecciosa e as baixas condições sanitárias e de higiene e os sistemas públicos de saúde deficientes, os quais se encontram mais comprometidos com desastres naturais ou inquietações políticas.  Algumas doenças infecciosas, entretanto, ocorrem principalmente, ou exclusivamente, em comunidades industrializadas: a doença dos legionários, comumente disseminada através dos ductos de sistemas de ar condicionado, é um exemplo recente. O homem tem sofrido há muito tempo o fascínio e os infortúnios das doenças infeccio- sas. Os primeiros registros escritos de como retardar a disseminação da raiva podem ser da- tados de três mil anos. Desde a metade do século XIX, os médicos e os cientistas têm lutado para identificar os agentes causadores das doenças infecciosas, coletivamente denominados patógenos. Mais recentemente, o advento da genética microbiana e da biologia molecular da célula tem aumentado nosso conhecimento sobre as causas e os mecanismos das doen- ças infecciosas. Atualmente, sabemos que os patógenos, com frequência, exploram os atri- butos biológicos das células hospedeiras para poder infectá-las. Este conhecimento tanto pode nos fornecer novas informações sobre a biologia normal da célula quanto pode ser útil ao desenvolvimento de estratégias de prevenção das doenças infecciosas. Em um mundo repleto de patógenos hostis, inteligentes e que evoluem rapidamente, como uma criatura frágil e de evolução lenta como o ser humano pode sobreviver? Como acontece com todos os outros organismos pluricelulares, desenvolvemos mecanismos para resistir à infecção por patógenos. Primeiro, barreiras físicas, como as nossas resistentes ca- madas mais externas da pele, e defesas químicas associadas, como o ácido do estômago, previnem que a maioria dos micro-organismos (micróbios) tenha contato com os tecidos estéreis do nosso corpo. Segundo, as células humanas individuais possuem capacidade de defesa intrínseca; por exemplo, as células degradam agressivamente moléculas de RNA de dupla-fita, uma caracteristica de certos tipos de infecção viral. Para combater especialmente patógenos poderosos que ultrapassam estas barricadas, os vertebrados usam dois tipos de defesa imune, que são realizados por células e proteínas especializadas: as  respostas imu- nes inatas entra em ação imediatamente após a implantação de uma infecção e não depen- dem da exposição anterior do hospedeiro, enquanto as respostas imunes adaptativas mais poderosas operam por último em uma infecção e são altamente específicas para o patógeno que as induz. Neste capítulo, inicialmente abordaremos os diferentes organismos que provocam as doenças. A seguir, discutiremos a biologia celular da infecção e, finalmente, consideraremos a imunidade inata. A imunidade adaptativa é tratada no Capítulo 25. Alberts_24.indd 1485 Alberts_24.indd 1485 29.07.09 15 29.07.09 15

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Patógenos, Infecção e

Imunidade Inata

24Neste capítulo

INTRODUÇÃO AOS 1486PATÓGENOS

BIOLOGIA CELULAR 1501DA INFECÇÃO

BARREIRAS CONTRA 1524

INFECÇÃO E O SISTEMAIMUNE INATO

 As doenças infecciosas e parasitárias são responsáveis, atualmente, por cerca de um terçode todos os óbitos humanos no mundo, um número maior do que o das mortes provocadaspor todos os diferentes tipos de câncer combinados. Em adição ao contínuo ônus de velhasdoenças, como a tuberculose e a malária, novas doenças infecciosas emergem continua-mente, entre elas a atual pandemia (epidemia mundial) de AIDS ( síndrome da imunodefi-ciência adquirida), que já provocou mais de 25 milhões de mortes no mundo inteiro. Alémdisso, descobrimos que outras doenças, que imaginávamos serem devidas a outros fatores,estão, na verdade, associadas a infecções. A maioria das úlceras gástricas, por exemplo, nãoé causada pelo estresse ou por uma alimentação rica em temperos fortes, como se pensava

anteriormente, mas por uma infecção bacteriana do estômago causada pela Helicobacter pylori.

O ônus das doenças infecciosas e parasitárias não se encontra distribuído igualmentesobre o planeta. Os países e as comunidades pobres sofrem desproporcionalmente. Com fre-quencia, existe uma correlação entre a prevalência de uma determinada doença infecciosae as baixas condições sanitárias e de higiene e os sistemas públicos de saúde deficientes, osquais se encontram mais comprometidos com desastres naturais ou inquietações políticas.

 Algumas doenças infecciosas, entretanto, ocorrem principalmente, ou exclusivamente, emcomunidades industrializadas: a doença dos legionários, comumente disseminada atravésdos ductos de sistemas de ar condicionado, é um exemplo recente.

O homem tem sofrido há muito tempo o fascínio e os infortúnios das doenças infeccio-sas. Os primeiros registros escritos de como retardar a disseminação da raiva podem ser da-tados de três mil anos. Desde a metade do século XIX, os médicos e os cientistas têm lutadopara identificar os agentes causadores das doenças infecciosas, coletivamente denominadospatógenos. Mais recentemente, o advento da genética microbiana e da biologia molecular

da célula tem aumentado nosso conhecimento sobre as causas e os mecanismos das doen-ças infecciosas. Atualmente, sabemos que os patógenos, com frequência, exploram os atri-butos biológicos das células hospedeiras para poder infectá-las. Este conhecimento tantopode nos fornecer novas informações sobre a biologia normal da célula quanto pode ser útilao desenvolvimento de estratégias de prevenção das doenças infecciosas.

Em um mundo repleto de patógenos hostis, inteligentes e que evoluem rapidamente,como uma criatura frágil e de evolução lenta como o ser humano pode sobreviver? Comoacontece com todos os outros organismos pluricelulares, desenvolvemos mecanismos pararesistir à infecção por patógenos. Primeiro, barreiras físicas, como as nossas resistentes ca-madas mais externas da pele, e defesas químicas associadas, como o ácido do estômago,previnem que a maioria dos micro-organismos (micróbios) tenha contato com os tecidosestéreis do nosso corpo. Segundo, as células humanas individuais possuem capacidade dedefesa intrínseca; por exemplo, as células degradam agressivamente moléculas de RNA dedupla-fita, uma caracteristica de certos tipos de infecção viral. Para combater especialmentepatógenos poderosos que ultrapassam estas barricadas, os vertebrados usam dois tipos de

defesa imune, que são realizados por células e proteínas especializadas: as respostas imu-nes inatas entra em ação imediatamente após a implantação de uma infecção e não depen-dem da exposição anterior do hospedeiro, enquanto as respostas imunes adaptativas maispoderosas operam por último em uma infecção e são altamente específicas para o patógenoque as induz.

Neste capítulo, inicialmente abordaremos os diferentes organismos que provocam asdoenças. A seguir, discutiremos a biologia celular da infecção e, finalmente, consideraremosa imunidade inata. A imunidade adaptativa é tratada no Capítulo 25.

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INTRODUÇÃO AOS PATÓGENOS

Normalmente, pensamos nos patógenos como invasores hostis que atacam nossos corpos.Porém, um patógeno, como qualquer outro organismo, está simplesmente cumprindo o seuimperativo biológico para viver e procriar. Viver às custas de um organismo hospedeiro éuma estratégia bastante atrativa, e é possível que todo organismo vivo na terra seja vítima dealgum tipo de infecção (Figura 24-1). Um hospedeiro humano é um ambiente rico em nu-trientes, aquecido e agradável, que se mantém a uma temperatura uniforme e que se renovaconstantemente. Dessa forma, não é surpresa o fato de que muitos micro-organismos te-nham desenvolvido a capacidade de sobreviver e de se reproduzir em um nicho tão desejá-

 vel. Nesta seção, discutiremos algumas das características comuns que os micro-organismosdevem apresentar para serem infecciosos. A seguir, exploraremos a grande diversidade deorganismos conhecidos por causarem doenças em humanos.

Os patógenos desenvolvem mecanismos específicos

de interação com seus hospedeiros

O corpo humano é um ecossistema próspero e complexo. Nele estão contidas aproximada-mente 1013 células humanas, além de aproximadamente 1014 células de bactérias, fungose protozoários, que representam milhares de espécies microbianas. Estes micróbios co-mensais, denominados flora normal, encontram-se geralmente limitados a certas áreasdo corpo, incluindo a pele, a boca, o intestino grosso e a vagina. A flora normal não sãosomente os comensais habitantes do ecossistema que é o corpo humano; ela tambémpode afetar nossa saúde. As bactérias anaeróbias que habitam intestinos contribuem paraa digestão do alimento e são também essenciais para o desenvolvimento apropriado dotrato gastrintestinal das crianças. A flora normal da pele e de outras localidades tambémnos ajuda pela competição com micro-organismos causadores de doenças. Além disso, osseres humanos são constantemente infectados por vírus; a grande maioria desses vírusraramente é sintomática.

Se é tão natural vivermos nesta íntima relação com uma grande variedade de micro-organismos, como é possível que alguns deles sejam capazes de causar doenças ou mesmo

provocar nossa morte? Como veremos, a questão tem diversas respostas e a habilidade deum micro-organismo particular de causar lesões e doenças em um hospedeiro depende-rá bastante de influências externas. Patógenos primários, que podem causar doenças namaioria das pessoas sadias, em geral são distintos daqueles da flora normal. Eles diferemdos organismos comensais em suas habilidades de romper barreiras e sobreviver em am-bientes inóspitos onde outros micro-organismos não poderiam. Nossos habitantes micro-bianos normais apenas causam algum dano ou problema se nossos sistemas de defesa en-contram-se enfraquecidos, ou se ganham acesso a regiões de nosso corpo que normalmentesão estéreis (p.ex. quando uma perfuração no intestino permite o acesso da flora intestinala cavidade peritoneal de nosso abdome, ocasionando uma peritonite; ocasionalmente, elescausam doenças se nossa resposta imune a eles for inapropriadamente fraca. Em contraste,

Figura 24-1 Parasitismo em todos os

níveis. (A) Microscopia eletrônica devarredura de uma pulga. A pulga é umparasita comum de mamíferos – comocães, gatos, ratos e seres humanos. Elaalimenta-se do sangue de seu hos-

pedeiro. A picada da pulga transmitea peste bubônica pela passagem dabactéria patogênica Yersinia pestis dacorrente sanguínea de um hospedeiroinfectado para outro. (B) Visão aumen-tada da pata de uma pulga revela queela também possui um parasita, umtipo de ácaro. O ácaro, por sua vez, estácoberto por bactérias. É bem possívelque estas bactérias estejam parasitadaspor bacteriófagos, que são vírus bac-terianos. Uma observação semelhantefoi feita por Jonathan Swift em 1733:assim, observa o naturalista, uma pulgaé presa de pulgas menores; e estas têmmenores ainda para picá-las; e assimprossegue, ad infinitum. (A, cortesia de

Tina Carvalho/MicroAngela; B, cortesiade Stanley Falkow.)

(B)(A)0,2 mm

Perna dapulga

Ácaro

Bactériasno ácaro

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Biologia Molecular da Célula 1487

os patógenos primários não necessitam de um hospedeiro imune comprometido ou com al-guma lesão. Os patógenos primários desenvolveram mecanismos altamente especializadospara romper as barreiras celulares e bioquímicas e induzir respostas específicas no organis-mo hospedeiro que contribuirão para a sobrevivência e a multiplicação do patógeno. Paraalguns patógenos, esses mecanismos são adaptados para uma única espécie de hospedeiro,

enquanto para outros eles em geral são suficientes para que o patógeno possa invadir, sobre- viver e vicejar em uma ampla variedade de hospedeiros. Alguns patógenos causam infecções epidêmicas agudas e são forçados a se espalharem

rapidamente de um hospedeiro doente ou moribundo para outro; historicamente, exem-plos importantes incluem a peste bubônica e a varíola. Outros causam infecções persistentesque podem durar anos em um único hospedeiro, sem necessariamente causar a doença; osexemplos incluem o vírus de Epstein-Barr (que pode causar uma doença severa – a mono-nucleose – com sintomas semelhantes à gripe em algumas pessoas), a bactéria Mycobacte-

rium tuberculosis (que causa a tuberculose, infecção pulmonar com risco de vida) e o vermeintestinal Ascaris. Apesar de cada patógeno poder fazer com que algumas pessoas fiquemcriticamente doentes, bilhões de pessoas podem estar infectadas, transportando-os, sem sa-ber, de maneira assintomática, o que torna difícil traçar uma linha entre infecção persistentee comensalismo. Neste capítulo, continuaremos a reconhecer a diversidade de patógenos einfecções enquanto focamos nos princípios da biologia celular comuns à maioria deles.

Com o objetivo de sobreviver e se multiplicar no hospedeiro, um patógeno de sucesso

deve ser capaz de: (1) colonizar o hospedeiro; (2) localizar um nicho nutricional compatívelno corpo do hospedeiro; (3) evitar, subverter ou escapar das respostas imunes adaptativas einatas do hospedeiro; (4) replicar, usando os recursos do hospedeiro, e (5) sair e disseminar--se para um novo hospedeiro. Sob alta pressão seletiva e visando induzir apenas as respostascorretas das células hospedeiras que lhe permitam desempenhar esse complexo conjuntode tarefas, os patógenos desenvolveram mecanismos que maximizam a biologia de seus or-ganismos hospedeiros. Muitos dos patógenos que serão discutidos neste capítulo são hábeise práticos biólogos celulares. Poderemos aprender muito sobre biologia celular por meio daobservação desses organismos.

 Ao mesmo tempo em que a nossa constante exposição aos patógenos influenciou for-temente a evolução humana, o desenvolvimento do sistema imune adaptativo extraordina-riamente preciso em vertebrados, descrito no Capítulo 25, foi uma importante escalada na“corrida armamentista” que sempre existiu entre o patógeno e seus hospedeiros. Nos tem-pos modernos, os humanos aumentaram as apostas pela alteração deliberada do compor-tamento para limitar a habilidade do patógeno de infectar. Melhorias do sistema público desaúde, incluindo a construção de redes de esgoto e o suprimento de água potável, contribu-íram para o declínio gradativo na frequência do total de mortes devido às doenças infecto-contagiosas nos últimos séculos. As sociedades que empregaram recursos para melhorar anutrição infantil foram beneficiadas pela melhoria geral do estado de saúde, incluindo umagrande redução da taxa de morte por infecções precoces da infância. Intervenções médicas,como vacinações, fármacos antimicrobianos, testes rotineiros no sangue antes de usá-lo emtransfusões, também reduziram substancialmente a carga de doenças infecciosas na hu-manidade. À medida que aprendemos mais sobre os mecanismos pelos quais os patógenoscausam doenças (patogênese), nossos cérebros continuarão a servir como uma extensão donosso sistema imune no combate às doenças infecciosas.

Os sinais e os sintomas de uma infecção podem ser causados

pelo patógeno ou pela resposta do hospedeiro

 Apesar de podermos facilmente compreender por que os micro-organismos infecciososdesenvolveram mecanismos de reprodução em um hospedeiro, não está tão claro porque desenvolvem doenças neles. Uma explicação para isso pode ser que, em alguns ca-sos, as respostas patológicas geradas pelo micro-organismo aumentam a eficiência de suadisseminação e de sua propagação e, desse modo, conferem claramente uma vantagemseletiva ao patógeno. Na genitália, as lesões que contêm vírus causadas por infecção peloherpes simples, por exemplo, facilitam a disseminação direta do vírus de um hospedeiroinfectado para um parceiro não-infectado, durante contato sexual. De forma semelhan-te, as infecções diarreicas são eficientemente transmitidas do paciente aos servidores dohospital. Em muitos casos, no entanto, a indução de uma doença não mostra vantagemaparente para o patógeno. Algumas respostas do hospedeiro à infecção, como letargia e

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retirada dos ambientes de interações sociais, parecem inibir a propagação do patógeno.Humanos infectados podem, de maneira altruística, tentar evitar a infecção de amigosou de membros da família, e humanos saudáveis podem de maneira consciente evitaros doentes; comportamento semelhante foi observado em lagostas tropicais. Estas sãorespostas adaptativas que foram selecionadas na população hospedeira com tendências

de vida em grupo.Muitos dos sintomas e sinais que geralmente associamos às doenças infecciosas sãomanifestações diretas do sistema imune do hospedeiro em ação. Alguns sinais característi-cos no sítio da infecção bacteriana, incluindo o inchaço, o rubor e a produção de pus (prin-cipalmente composto por células sanguíneas brancas mortas), são o resultado direto dastentativas das células do sistema imune de destruir os micro-organismos invasores. Tam-bém a febre é uma resposta defensiva, pois o aumento na temperatura corporal pode ini-bir o crescimento de alguns micro-organismos. Em casos extremos, a mais severa e danosaconsequência de uma doença infecciosa é diretamente causada por uma resposta imunesuperzelosa: a destruição massiva de tecidos vista em casos de leishmaniose (uma infecçãocausada por patógenos eucarióticos membros do gênero Leishmania) é um bom exemplo.

 Assim, a compreensão da biologia de uma doença infecciosa requer a apreciação da contri-buição dada tanto pelo patógeno quanto pelo hospedeiro.

Para se entender as contribuições relativas do micro-organismo infectante e do hospe-deiro em causar os sinais e sintomas da doença, é apropriado considerar a causa e a exten-

são do dano no tecido do hospedeiro durante a infecção. Cada interação entre um micro-organismo particular e um determinado hospedeiro é um fenômeno único, e o resultadodepende de uma constante mudança do panorama da atividade microbiana e da função dosistema imune do hospedeiro. A extensão dos danos causados no hospedeiro dependeráda interação destes fatores. Em alguns casos, um micro-organismo em particular poderáagir como inofensivo ou mesmo como um comensal benéfico em muitas pessoas, muitas

 vezes, porém, poderá também causar doença invasiva em pessoas com o sistema imune en-fraquecido; isto é verdadeiro para o habitante comum da pele Staphylococcus epidermidis,por exemplo (Figura 24-2 A). Outro micro-organismo, como o vírus que causa a caxumba,causará danos severos apenas na presença de uma forte resposta imune (Figura 24-2B).Uma categoria interessante ilustrando perfeitamente a importância da interação entre ohospedeiro e os fatores microbianos que causam as lesões, é a dos patógenos que causamuma doença severa em pessoas com uma resposta imune muito forte ou muito fraca, masnão causam danos em pessoas com uma resposta imune intermediária (Figura 24-2C). Umexcelente exemplo é a tuberculose que correntemente infecta entre 1 e 2 bilhões de pessoas

no planeta (geralmente nos pulmões), apesar de a maioria dos infectados não perceber porque o sistema imune efetivamente bloqueou a infecção. Quando, no entanto, uma pessoacom tal forma latente de infecção pelo M. tuberculosis se torna imuno deprimida, por tera-pia com fármacos imunossupressores ou infecção com o vírus da imunodeficiência (HIV),por exemplo, o equilíbrio delicado entre a bactéria e o sistema imune é modificado em favorda bactéria, que agora se replica de maneira incontrolada, levando a uma doença séria, fre-quentemente com uma tosse dolorida que produz um escarro sanguinolento. Inversamen-te, quando a resposta imune contra o bacilo é exacerbada, poderá destruir uma quantidadeextensiva de tecido pulmonar.

Os patógenos são filogeneticamente diversos

Muitos tipos de patógenos podem provocar doenças em seres humanos. Destes, os mais co-muns são os vírus e as bactérias. Os vírus provocam doenças que vão da AIDS e da varíola aoresfriado comum. Eles são, essencialmente, fragmentos de ácidos nucleicos (DNA ou RNA)

que codificam um número relativamente pequeno de produtos gênicos, envelopados emuma concha protetora de proteínas e (em alguns casos) em uma membrana (Figura 24-3 A).Os vírus não possuem capacidade metabólica para uma atividade independente e assim de-pendem de maneira absoluta da energia metabólica suprida pelo hospedeiro. Todos elesusam a maquinaria básica de síntese proteica da célula hospedeira para a sua replicação, emuitos deles dependem também da maquinaria de transcrição.

De todas as bactérias que encontramos ao longo de nossa vida, apenas uma pequenaparcela são patógenos primários. Muito maiores e mais complexas do que os vírus, as bacté-rias são células que geralmente apresentam vida livre e que podem realizar a maior parte dasfunções metabólicas básicas por si mesmas, dependendo dos hospedeiros primariamentepara a nutrição (Figura 24-3B).

Fraca Respostas imunes Forte

(A)

(B)

(C)

Figura 24-2 Interação entre micróbios

e a resposta imune na patogênese mi-

crobiana. O poder da resposta imuneaumenta na direção das setas, enquan-to a quantidade de danos ao hospe-deiro é indicada pelo aumento de som-breamento vermelho nas setas. (A) Floranormal como a bactéria Staphylococcusepidermidis e o fungo Pneumocystiscarinii somente causa doença quandoo sistema imune é anormalmente fraco.(B) Para alguns patógenos, como o para-myxovírus que causa caxumba e a bac-téria Chlamydia trachomatis que causauma doença sexualmente transmitidacomum, é a resposta imune, mais doque o patógeno, que é primariamenteresponsável pelo dano tecidual. (C) Paramuitos patógenos, hospedeiros comresposta imune normal podem ser co-lonizados assintomaticamente, porémhospedeiros com resposta imune muitofraca ou muito forte podem sofrer da-nos severos e mesmo a morte. Muitosmicro-organismos se comportam assim,incluindo o Mycobacterium tuberculosis,o fungo Aspergillus e o vírus da herpessimples.

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Biologia Molecular da Célula 1489

Outros agentes infecciosos são organismos eucariotos. Estes variam desde fungos eprotozoários unicelulares (Figura 24-3C), até grandes e complexos metazoários, como os

 vermes. Uma das doenças infecciosas mais comuns no mundo, que hoje afeta aproximada-mente um bilhão de pessoas, é a infestação intestinal pelo nematódeo Ascaris lumbricoides.O Ascaris é bastante semelhante ao seu primo Caenorhabditis elegans, utilizado mundial-

mente como organismo-modelo em pesquisas de genética e de biologia do desenvolvimen-to (discutido no Capítulo 22). O C. elegans, no entanto, tem cerca de 1 mm de comprimento,ao passo que os Ascaris podem alcançar 30 cm (Figura 24-3D).

 Algumas doenças neurodegenerativas raras, incluindo a “doença da vaca louca”, sãocausadas por uma partícula infecciosa atípica denominada príon, a qual é constituída unica-mente por proteína. Apesar de o príon não conter um genoma, ele pode replicar e provocara morte do hospedeiro.

Mesmo dentro de cada classe de patógeno, existe uma diversidade impressionante. Os vírus apresentam uma enorme variedade em relação ao tamanho, à forma e ao conteúdo(DNA versus RNA, envelopados ou não, e assim por diante). Esta mesma situação de diver-sidade é real para outros tipos de patógenos. A capacidade de causar doença é um nichoevolutivo não uma herança comum entre seres intimamente relacionados.

Cada patógeno individual provoca doença de uma forma diferente, e o mesmo patóge-no pode causar diferentes doenças em diferentes hospedeiros, o que constitui um desafiopara o entendimento da biologia básica da infecção. Contudo, quando consideramos as in-

terações dos agentes infecciosos com seus hospedeiros, emergem alguns temas comuns dapatogênese. Estes temas comuns são o foco deste capítulo.Inicialmente, introduziremos os mecanismos básicos de cada um dos principais tipos

de patógenos antes de examinar os mecanismos que os patógenos usam para controlarseus hospedeiros e a resposta imune inata que os hospedeiros usam para controlar os pa-tógenos.

As bactérias patogênicas possuem genes especializados em

virulência

 As bactérias são pequenas e estruturalmente simples. A maioria delas pode ser classifica-da, de forma geral, por suas formas como bastonetes, esferas ou espirais ( Figura 24-4 A) epor suas propriedades frente à coloração de Gram (Figura 24-4B e C). Seus tamanhos rela-tivamente pequenos com poucas formas guardam seus extraordinários metabolismos mo-leculares e sua diversidade ecológica. Ao nível molecular, as bactérias são mais diversas que

os eucariotos, e podem com sucesso ocupar nichos ecológicos em condições extremas de

Figura 24-3 Patógenos em diferentes

formas. (A) A estrutura da capa protei-ca, ou capsídeo, do poliovírus. Este vírusé o agente da paralisia (poliomielite).Comum por muito tempo, esta doençaestá hoje praticamente erradicada devi-do à vacinação generalizada. (B) A bac-téria Vibrio cholerae, agente causador dadoença diarreica epidêmica cólera. (C) Oprotozoário parasita Toxoplasma gondii .Este organismo normalmente é umparasita de felinos, de gatos domésticosa tigres, porém causa sérias infecções

no cérebro e nos músculos de pessoasimunocomprometidas com AIDS. (D)Esta massa de nematódeo, Ascaris, foiremovida do intestino obstruído de ummenino de dois anos de idade. (A, cor-tesia de Robert Grant, Stephan Crainice James M. Hogle; B, não conseguimoscontato com o detentor dos direitos e,ficaremos gratos se pudermos contatá-lo; C, cortesia de John Boothroyd eDavid Ferguson; D, de J. K. Baird et al., Amer. J. Trop. Med. Hyg. 35:314-318,1986.Fotografia de Daniel H. Connor.)1 m

(A)

(C)

(B) (D)

10 nm

1 m

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temperatura, sal e limitação de nutrientes que intimidariam o mais intrépido dos eucariotos. Apesar de não possuírem a variedade de morfologias das células eucarióticas, as bactériasapresentam um surpreendente arranjo de apêndices que permitem que elas nadem ou te-nham aderência a superfícies desejadas (Figura 24-4D). Seus genomas são pequenos, tipi-camente entre 1.000.000 e 5.000.000 de pares de nucleotídeos (comparado aos 12.000.000 dalevedura e mais de 3.000.000.000 do homem).

Como já enfatizado, apenas uma minoria de espécies bacterianas possui a habilidadede causar doenças em humanos. Alguns dos causadores de doenças que somente podemse replicar no interior do corpo dos seus hospedeiros são chamados de patógenos obrigató-rios. Outros se replicam no meio ambiente, na água ou no solo e somente causam doença seencontrarem um hospedeiro suscetível sendo, então chamados de patógenos facultativos.Muitas bactérias normalmente são inofensivas, porém possuem uma habilidade latente decausar doenças em um hospedeiro ferido ou imunocomprometido, sendo denominados pa-tógenos oportunistas. Como discutido previamente, se uma bactéria causa doença em umhospedeiro particular ou não dependerá de uma ampla variedade de fatores, incluindo oestado geral de saúde do hospedeiro; muitos membros da flora normal, por exemplo, podemcausar severas infecções em indivíduos com AIDS.

Figura 24-4 Morfologia da célula bacteriana e estruturas de superfície. (A) As bactérias são classificadas pela forma (B e C). Elastambém são classificadas em gram-positivas e gram-negativas. (B) As bactérias como o Streptococcus e o Staphylococcus possuemuma única membrana e uma parede celular espessa constituída de peptideoglicano com ligações cruzadas. Elas retêm o corante vio-leta utilizado nos processos de coloração de Gram e são, portanto, denominadas gram-positivas. As bactérias gram-negativas, comoa E. coli e a Salmonella, têm duas membranas, separadas por um espaço periplasmático (ver Figura 11-18). A camada de peptideogli-cano na parede celular desses organismos está localizada no espaço periplasmático e é mais delgada do que a das gram-positivas:

elas, portanto, não retêm o corante utilizado no processo de coloração de Gram. A membrana interna da bactéria gram-negativa éuma bicamada fosfolipídica, e o folheto interno da membrana externa também é primordialmente constituído por fosfolipídeos; ofolheto externo da membrana exterior, no entanto, é composto por um lipídeo glicosilado característico, denominado lipopolissa-carídeo (LPS) (ver Figura 24-47). (D) Os apêndices da superfície celular são importantes para o comportamento bacteriano. Muitasbactérias nadam pela rotação de um flagelo helicoidal (ver Figura 15-71). A bactéria ilustrada tem um único e simples flagelo em umdos polos; outras, como a E. coli , possuem múltiplos flagelos. Os pili retos (também chamados de fímbrias) são usados para aderir emsuperfícies do hospedeiro e para facilitar a troca de material genético entre bactérias. Tanto o flagelo quanto os pili estão ancoradosna superfície celular por grandes complexos multiproteicos.

GRAM-POSITIVO GRAM-NEGATIVO

Ácidos teicoicos

Camada depeptideoglicano(parede celular)

Membranaexterna

Espaçoperiplasmático

Membranainterna

Proteínasde membrana

CITOSOL

Proteína de poro

Lipopolissacarídeo (LPS) da folhaexterna da membrana externa

(B) (C) (D)

Flagelolongo

helicoidal

CITOSOL

Pilusreto

Membranaexterna

Membranainterna

Peptideoglicano

(A)

Cocos Cocobacilo

Espirilo Espiroqueta

Vibrião Bacilo

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Biologia Molecular da Célula 1491

 Alguns patógenos bacterianos são exigentes em sua escolha de hospedeiros e somenteinfectarão uma espécie única ou um grupo de espécies relacionadas, enquanto outros sãogeneralistas. Shigella flexneri, por exemplo, que causa a disenteria epidêmica (diarreia san-guinolenta) em áreas do planeta que não possuem suprimento de água tratada, infectarásomente o homem ou outros primatas. Ao contrário, a bactéria estreitamente relacionada

Salmonella enterica, uma causa comum de infecção alimentar em humanos, pode tambéminfectar muitos outros vertebrados, incluindo aves e tartarugas. O generalista campeão é opatógeno oportunista Pseudomonas aeruginosa, que é capaz de causar doenças em plantasassim como em animais.

Um número relativamente pequeno de genes causa a diferença significativa entre umpatógeno virulento e o seu parente não-patogênico e estreitamente relacionado. Genes quecontribuem para a habilidade de um organismo de causar doença são chamados de genes

de virulência, e as proteínas que eles codificam são chamadas de fatores de virulência. Osgenes de virulência frequentemente são aglomerados em grupos chamados de ilhas de pa-togenicidade no cromossomo bacteriano ou em plasmídeos extracromossômicos chamadosde plasmídeos de virulência (Figura 24-5). Estes genes também poderão ser transportadosem bacteriófagos móveis (vírus bacterianos). Dessa forma, ao que parece, um novo patógenosurge quando grupos de genes de virulência são transferidos em uma bactéria previamenteavirulenta. À medida que novos genomas de bactérias patogênicas e não-patogênicas sãocompletamente sequenciados, torna-se claro que a aquisição de grandes nacos de DNA e

outras alterações grosseiras contribuíram para a evolução bacteriana, permitindo às espé-cies bacterianas habitar novos nichos ecológicos e nutricionais, assim como causar doenças.Mesmo dentro de uma única espécie bacteriana, a quantidade de variações cromossômicasé atordoante; cepas diferentes de E. coli podem ter 25% ou mais de diferenças em seus ge-nomas.

 A aquisição de genes ou aglomerados de genes poderá conduzir a rápida evoluçãodos patógenos e tornar não-patógenos em patógenos. Consideremos, por exemplo, Vibriocholerae – a bactéria gram-negativa que causa a diarreia epidêmica chamada de cólera. Osgenes que codificam as duas subunidades da toxina que causa a diarreia são transportadospor bacteriófagos móveis (Figura 24-6 A e B). Das centenas de cepas de Vibrio cholerae encontradas em lagos, na natureza, as únicas que causam a pandemia da doença humanasão as infectadas com o vírus bacteriano. Como resumido na Figura 24-6C, houve oito pan-demias de V. cholerae desde 1817. As primeiras seis foram causadas pela reemergência pe-riódica de cepas semelhantes, chamadas de cepas Clássicas. Ao lado da toxina codificadapelo bacteriófago e das ilhas de patogenicidade, as cepas Clássicas possuem em comum

um antígeno de superfície que é um carboidrato primário, chamado de O1, que é parte dolipopolissacarídeo constituinte da folha mais externa da membrana externa (ver Figura 25--4C). Em 1961, começou a sétima pandemia, causada por uma nova cepa (denominada “ElTor”), que era marcadamente diferente das cepas Clássicas e ao que parece surgiu quandouma cepa expressando o antígeno O1 adquiriu na natureza dois bacteriófagos, assim comopelo menos duas ilhas de patogenicidade, não encontrados nas amostras Clássicas. A cepaEl Tor eventualmente deslocou as cepas clássicas em todo mundo. Em 1991, começou aoitava epidemia, dessa vez com o alarmante fato de que mesmo pessoas que tiveram cóle-ra previamente não eram imunes devido ao antígeno O diferente, tornando os anticorposantiO1 presentes no sangue dos sobreviventes da epidemia anterior ineficientes contra anova cepa. A nova cepa era semelhante à cepa El Tor em outras características; aparen-temente, ela simplesmente adquiriu um aglomerado de genes para a síntese de um tipodiferente de antígeno O.

Quais são os genes que capacitam uma bactéria a causar uma doença em um hospedei-ro saudável? Muitos genes de virulência codificam para proteínas que interagem diretamen-

te com células hospedeiras. Dois transportados pelo fago do Vibrio cholerae, por exemplo,

Figura 24-5 Diferenças genéticas en-

tre bactérias patogênicas e não-

-patogênicas. A E. coli não-patogênicapossui um único cromossomo circular.A E. coli é bastante próxima de doistipos de patógenos encontrados emalimentos – Shigella flexneri , que causadisenteria, e Salmonella enterica, causacomum de infecção alimentar. Se estestrês organismos fossem descritos hoje,com base em técnicas moleculares,

seriam classificados em um mesmo gê-nero e, talvez, em uma mesma espécie.O cromossomo de S. flexneri difere docromossomo de E. coli em uns poucosloci; a maioria dos genes necessáriosà patogênese (genes de virulência)encontra-se em um plasmídeo extra-cromossômico virulento. O cromosso-mo de S. enterica possui dois grandesinsertos (ilhas de patogenicidade) quenão são encontrados no cromossomode E. coli ; cada um desses insertos con-têm vários genes de virulência.

E. coli 

Cromossomo

Shigella flexneri 

Plasmídeo de virulência contendogenes de virulência

Salmonella enterica

Ilhas de patogenicidadecontendo genes de

virulência

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1492 Alberts, Johnson, Lewis, Raff, Roberts & Walter

codificam para duas subunidades da toxina da cólera (ver Figura 24-6B). A subunidade Bdessa proteína tóxica secretada liga-se a um componente glicolipídico da membrana plas-mática das células epiteliais do intestino de uma pessoa que consumiu água contaminada

com a Vibrio cholerae. A subunidade B transfere a subunidade A através da membrana plas-mática. A subunidade A é uma enzima que catalisa a transferência da ADP-ribose do NAD+ para a proteína trimérica Gs, que normalmente ativa a enzima adenilil-ciclase para que con-

 verta 5’ AMP em cAMP (AMP cíclico) (discutido no Capítulo 15). A ADP-ribosilação da pro-teína G resulta em um acúmulo exagerado de cAMP e em um desbalanço de íons, levandoa uma diarreia aquosa massiva, associada à cólera. A infecção então se espalha para novoshospedeiros pela rota fecal-oral via água e alimentos contaminados.

 Alguns patógenos usam diversos mecanismos independentes para causar toxicida-de nas células do hospedeiro.  Antraz , por exemplo, é uma doença infecciosa aguda deovinos, bovinos e outros herbívoros e ocasionalmente humanos. Em geral é causada pelocontato com esporos da bactéria gram-positiva Bacillus anthracis. Ao contrário da cólera,

Figura 24-6 Organização genética do Vibrio cholerae. Uma micrografia eletrônica do Vibrio cholerae (V. cholerae) é mostrada naFigura 24-3B. (A) Vibrio cholerae é incomum por ter dois cromossomos circulares em vez de apenas um. Os dois cromossomos têmorigens de replicação distintas (OriC1 e OriC2). Três loci das linhagens patogênicas de V. cholerae estão ausentes nas linhagens não--patogênicas e parecem ser uma aquisição recente. O CT X no cromossomo 1 é um genoma bacteriófago integrado e carrega osgenes para a toxina da cólera. A ilha de patogenicidade VPI do cromossomo 1 inclui genes de fatores necessários para a colonizaçãointestinal. A ilha integron no cromossomo 2 facilita a inserção de fragmentos de DNA recentemente adquiridos downstream de umforte promotor transcricional, promovendo assim a aquisição sequencial de novos genes. Apesar de ainda não ter sido demonstradoque esta ilha integron é necessária à virulência em V. cholerae, ilhas integron semelhantes em muitos outros patógenos contêm ge-nes de virulência e genes envolvidos em resistência a antibióticos. (B) Mapa do lócus CTX. Os genes codificantes das duas subuni-dades da toxina da cólera são CtxA e CtxB. Outros genes da região central ( Ace e Zot ) também encontram-se envolvidos em virulência.

As duas sequências flanqueadoras repetidas RS2 e RS1 estão envolvidas na inserção do genoma do bacteriófago no cromossomo 1.(C) Modelo com base em genômica comparativa para a evolução das cepas patogênicas de V. cholerae. As cepas progenitoras na na-tureza primeiro adquiriram a via de biossíntese necessária para fazer o antígeno Tipo O1 da cadeia de carboidrato do lipopolissacarí-deo da membrana externa (ver Figuras 24-4C e 24-47) e talvez também tenham adquirido uma ou duas ilhas de patogenicidade doVibrio (VPI1 e VPI2). Incorporação do bacteriófago CTX criou a cepa patogênica Clássica responsável pelas seis primeiras epidemiasglobais de cólera entre 1817 e 1923. Em alguma época do século XX, uma cepa O1 foi invadida pelo CTX novamente, e tambémpelo bacteriófago associado RS1 e duas novas ilhas de patogenicidade (VSP1 e VSP2), criando a amostra El Tor que emergiu como asétima pandemia global em 1961. Antes de 1991, a cepa El Tor adquiriu um novo aglomerado de genes, capacitando-a a produzir oantígeno Tipo O139 da tipo cadeia de carboidrato em vez do O1. Esse fato alterou sua interação com o sistema imune humano, semdiminuir sua virulência engatilhando o começo da oitava pandemia; esta bactéria adquiriu uma nova ilha de patogenicidade (SXT) eperdeu a maior parte da ilha VPI2.

CtxACtxB Zot 

 Ace

âmago RS1RS2

Cromossomo 1 Cromossomo 2

oriCI

oriC2

CTXf 

VPI

Ilha integron

(A)

(B)

(C)

V. choleraeprogenitor

V. choleraesorogrupo 01

V. choleraesorogrupo 01Clássico 01

V. choleraesorogrupo 01El Tor

V. choleraesorogrupo0139

via 01VPI1

VPI2

VSP1VSP2

CTXf Clássica

CTXf El Tor

CTXf 

Antígeno0139

SXTRegião de37 quilobases

1ª a 6ª pandemia 7ª pandemia

8ª pandemia

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Biologia Molecular da Célula 1493

antraz não é transmitida de pessoa para pessoa. Esporos dormentes podem sobreviverpor um longo período de tempo no solo e são altamente resistentes às condições adversasdo meio, incluindo calor, radiação ionizante e ultravioleta, pressão e reagentes químicos. Após os esporos serem inalados, ingeridos ou esfregados na pele não íntegra, os espo-ros germinam e a bactéria começa a replicar-se. Ela secreta duas toxinas, denominadas

toxina letal e toxina causadora de edema, e qualquer uma sinaliza a infecção. Como atoxina colérica, ambas as toxinas do antraz são feitas de duas subunidades. A subunidadeB é idêntica nas duas toxinas e liga-se a uma proteína receptora na superfície celular paratransferir as duas subunidades A para a célula hospedeira (Figura 24-7). A subunidade doedema é uma adenilil-ciclase que diretamente converte o ATP da célula hospedeira emcAMP, levando ao desequilíbrio iônico que causa um acúmulo de fluidos extracelulares(edema) na pele infectada ou no pulmão. A subunidade A da toxina letal é uma proteaseque hidrolisa diversos membros de proteínas da família MAP-cinase-cinase (ver Figura15-60). Injeção da toxina letal na corrente sanguínea de um animal causa choque (quedada pressão sanguínea) e morte. Os mecanismos moleculares que levam à morte no antrazsão incertos.

Estes exemplos ilustram um tema comum entre os fatores de virulência. Os fatores fre-quentemente são proteínas tóxicas (toxinas) que interagem diretamente com proteínas es-truturais ou sinalizadoras para induzir uma resposta da célula do hospedeiro que é benéficaà colonização do patógeno ou à replicação, ou elas são proteínas necessárias para conduzir

tais toxinas aos alvos na célula hospedeira. Um mecanismo de entrega comum e particular-mente eficiente encontrado em muitos patógenos gram-negativos, chamado de sistema de

secreção tipo III, atua como uma minúscula seringa que injeta proteínas tóxicas do cito-plasma de uma bactéria extracelular diretamente no citoplasma de uma célula hospedeiraadjacente (Figura 24-8). As proteínas efetoras que tais dispositivos injetam no citoplasmadas células do hospedeiro podem induzir uma variedade de respostas celulares que capa-citam a bactéria a invadir ou sobreviver. Existe um alto grau de similaridade entre a seringado sistema tipo III e a base de um flagelo bacteriano (ver Figura 15-71), e muitas das proteí-nas nas duas estruturas são homólogas. Dado que o flagelo é encontrado em uma grande

 variedade de bactérias em número maior do que o sistema de secreção tipo III, parece queo sistema de secreção é uma adaptação específica para a patogênese, sendo bem provávelque o sistema de secreção tipo III tenha evoluido do flagelo e não o contrário. Outros tiposde sistemas especializados de direcionamento de toxinas encontrados em patógenos, ao queparece, evoluíram independentemente. Por exemplo, o sistema de secreção tipo IV , usadopor diversos patógenos para direcionar toxinas para o citoplasma da célula hospedeira, é

muito próximo do aparelho de conjugação que muitas bactérias usam para a troca de mate-rial genético.

Figura 24-7 Entrada da toxina do

antraz nas células hospedeiras. (A) Assubunidades B da toxina formam umporo para transportar a subunidade Aenzimaticamente ativa no citoplasmada célula hospedeira. A subunidade Bliga-se a uma proteína receptora na su-perfície da célula do hospedeiro, onde éclivada autocataliticamente, liberandoum pequeno fragmento e um fragmen-to maior que permanece ligado ao re-ceptor. Sete cópias do fragmento maiore seus receptores associados se agre-gam na superfície celular para formarum anel heptamérico. A subunidade Ada toxina se liga então ao anel hepta-mérico e é endocitada juntamente como anel. Como o pH diminui no endos-somo, o anel passa por uma dramáticamudança conformacional que gera umporo na membrana endossomal, e asubunidade A é entregue no citosol dacélula hospedeira, através do poro. (B)

Estrutura cristalina, obtida por difraçãopor raios X, vista de cima e de lado. (B,de C. Petosa et al., Nature 385:833-838,1997, com permissão de Macmillan Pu-blishers Ltd.)

H+

Subunidade BSubunidade A

Subunidade A

CITOPLASMA DACÉLULA HOSPEDEIRA

Receptorda toxina

Fragmento menorda subunidade B

Anel hexaméricodo fragmentomaior e receptores

Fragmento maiorda subunidade B

Endossomo

(A) (B)

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1494 Alberts, Johnson, Lewis, Raff, Roberts & Walter

Os fungos e os protozoários parasitas têm um ciclo de vida

complexo com formas diversas

Os fungos patogênicos e os protozoários parasitas são eucariotos. Desse modo, é mais di-fícil o desenvolvimento de fármacos que atuarão sobre eles sem afetar o hospedeiro. Con-sequentemente, os fármacos antifúngicos e antiparasitários em geral são menos eficientese mais tóxicas do que os antibióticos. Uma segunda característica das infecções fúngicas eparasitárias que as torna mais difíceis de tratar é a tendência apresentada pelos organismosinfectivos de assumir diferentes formas durante seu ciclo celular. Muitas vezes um fármacoeficiente na indução da morte de um estágio do parasita é ineficiente para outro que, portan-to, sobreviverá ao tratamento.

O ramo dos fungos no reino eucariótico inclui tanto as leveduras unicelulares (como o

Saccharomyces cerevisiae e o Schizosaccharomyces pombe) quanto os fungos filamentosospluricelulares ou mofo (como o que aparece nas frutas ou no pão). A maioria dos principaisfungos patogênicos apresenta dimorfismo – habilidade de crescer tanto na forma unicelularquanto na forma filamentosa. A transição unicelular-filamentosa e filamentosa-unicelularfrequentemente está associada com a infecção. O Histoplasma capsulatum, por exemplo,cresce sob a forma filamentosa no solo, a baixas temperaturas, mas assume a forma unicelu-lar quando inalado, alojando-se nos pulmões, onde causa a doença chamada de histoplas-mose (Figura 24-9).

Os protozoários parasitas são eucariotos unicelulares com um ciclo de vida maiselaborado do que o dos fungos. Estes ciclos frequentemente necessitam da participaçãode mais de um hospedeiro. A malária é a mais comum das doenças provocadas por pro-tozoários, infectando de 200 a 300 milhões de pessoas a cada ano e provocando a mortede 1 a 3 milhões delas. A doença é causada por quatro espécies de Plasmodium, as quaissão transmitidas para o homem pela picada da fêmea de qualquer uma das 60 espécies demosquitos Anopheles. O Plasmodium falciparum – o mais estudado dos parasitas causa-

dores da malária – apresenta não menos do que oito formas e necessita tanto de hospe-deiros humanos quanto de mosquitos para completar seu ciclo sexual ( Figura 24-10 A).Os gametócitos são formados na corrente sanguínea de seres humanos infectados, mas sópoderão se diferenciar em gametas e fusionar para a formação do zigoto no intestino deum mosquito. Três das formas de Plasmodium são altamente especializadas na invasão ena replicação em tecidos específicos – as células de revestimento do intestino do inseto, ofígado humano e as células vermelhas do sangue humano. Mesmo no interior de um dostipos de células, o eritrócito, o parasita Plasmodium passa por uma sequência complexade eventos ligados à diferenciação, refletidos nas mudanças morfológicas notáveis (Figura24-10B, C, D) assim como na regulação estágio-específica da maioria dos seus transcritos(Figura 24-11).

Figura 24-8 Sistemas de secreção tipo

III que podem depositar fatores de vi-

rulência no interior do citoplasma das

células hospedeiras. (A) Micrografiaseletrônicas de sistemas de secreção etipo III purificados. Aproximadamente 

duas dúzias de proteínas são necessá-rias para formar as estruturas comple-tas, as quais podem ser vistas nas trêsmicrografias eletrônicas aumentadas.(B) O anel maior inferior está inseridona membrana interna, e o anel menorsuperior á inserido na membrana exter-na. Durante a infecção, o contato entrea extremidade do tubo e a membranacitoplasmática da célula hospedeira de-sencadeia a secreção. Aqui, o bacilo dapeste, Yersinia pestis, injeta toxinas emum macrófago. (A, de K. Tamano et al.,EMBO J. 19:3876-3887, 2000. Com per-missão de Macmillan Publishers Ltd.)

(A)

(B)

FUNGO

LEVEDURA

Figura 24-9 Dimorfismo no fungo pa-

togênico Histoplasma capsulatum. (A)A baixas temperaturas no solo, o Histo- plasma cresce como um fungo filamen-toso. (B) Após ser inalado para o interiordo pulmão de um mamífero, ele sofreuma modificação morfológica induzidapela mudança de temperatura. Nestaforma semelhante a uma levedura,assemelha-se muito ao Saccharomycescerevisiae.

bacterium

(A)

50 nm

 

toxina secretada para dentrodo macrófago dohospedeiro

membranaplasmáticado macrófago aparato

de secreçãotipo III

toxina produzida nobacilo da peste

(B)

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Biologia Molecular da Célula 1495

Como a malária é extremamente devastadora e amplamente distribuída, tem atuadocomo fator de forte pressão seletiva sobre as populações humanas nas áreas com presençado mosquito Anopheles. A anemia falciforme, por exemplo, é uma doença genética recessivacausada por uma mutação pontual no gene que codifica a cadeia da hemoglobina, sendocomum em áreas da África com alta incidência da forma mais grave de malária (causadapelo Plasmodium falciparum). Os parasitas da malária apresentam crescimento deficientenas células vermelhas do sangue de pacientes homozigotos para a anemia falciforme e deportadores heterozigotos saudáveis. Como resultado, a malária raramente é encontrada emportadores desta mutação. Por essa razão, a malária tem mantido uma alta frequência damutação da anemia falciforme nestas regiões da África.

Figura 24-10 O complexo ciclo de

vida do parasita da malária. (A) Ociclo sexual do Plasmodium falciparum requer a passagem por um hospedeirohumano e por um inseto hospedeiro.(B)-(D) Esfregaços de sangue de pessoas

infectadas com malária mostrando trêsdiferentes formas do parasita que apa-recem nas células vermelhas do sangue:(B) estágio de anel; (C) esquizonte; (D)gametócito. (Micrografias cortesia doCentro para o Controle de Doença, Divi-são de Doenças Parasitárias, DPDx.)

Figura 24-11 Programa transcricional tempo-dependente em parasitas damalária se desenvolvendo em eritrócitos. O RNA foi isolado de eritrócitos in-fectados com Plasmodium falciparum a intervalos de 1 hora em 48 horas. Na ima-gem, cada linha horizontal representa um dos ~2.700 genes nos quais o nível detranscrição muda significativamente durante o curso da infecção.Vermelho indicaum aumento na abundância de mRNA com relação à média verde indica um de-créscimo. Os genes foram arranjados em ordem da parte superior para a inferior,de acordo com as fases relativas de sua ativação transcricional. Esta progressãoordenada regular da expressão gênica tem um paralelismo com a diferenciaçãomorfológica do Plasmodium através dos estágios de anel, trofozoíto, esquizontee merozoito, todos observados no interior do eritrócito em humanos infectados(ver Figura 24-10B, C, D) (Adaptada de Z. Bosdech et al., PLoS Biol. 1:E5, 2003. Compermissão da Public Library of Science.)

(D)

Invasão do intestinoe crescimento

Zigoto

FertilizaçãoGametócitosse diferenciamem gametas

MOSQUITOHOSPEDEIRO

HUMANOHOSPEDEIRO

Liberação dosesporozoítos e

migração para aglândula salivar

O mosquitosuga o sangue

e coletagametócitos

Replicaçãono fígado

Infecção deeritrócitos

Replicação

Produção degametócitos

(A)

O mosquitosuga o sangue

e injetaesporozoítos

(B)5 m

(C)10 m 10 m

Estágio de anel Esquizonte

MerozoítoTrofozoíto

1 6 12 18 24 30 36 42 48

Horas após a infecção

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1496 Alberts, Johnson, Lewis, Raff, Roberts & Walter

Os vírus utilizam a maquinaria da célula hospedeira em

todos os aspectos de sua multiplicação

 As bactérias, os fungos e os parasitas eucariotos são células. Mesmo quando são patóge-nos intracelulares, eles usam sua própria maquinaria de replicação, de transcrição e de tra-

dução de DNA, provendo eles próprios seus recursos de energia metabólica. Os  vírus, emcontraste, são os supremos “caroneiros”, carregando pouca informação sob a forma de ácidonucleico. A informação é totalmente replicada, empacotada e preservada pelas células hos-pedeiras (Figura 24-12). O vírus tem um genoma pequeno, constituído de um único tipo deácido nucleico – ou DNA ou RNA – o qual, em ambos os casos, poderá ser de fita simples oufita dupla. O genoma é empacotado em um envelope proteico, que em alguns vírus é por sua

 vez empacotado em um envelope lipídico.Os vírus se replicam por meio de vários mecanismos. Em geral, a replicação envolve (1)

desmonte da partícula infecciosa viral, (2) replicação do genoma viral, (3) síntese das proteí-nas virais pela maquinaria de tradução da célula hospedeira e (4) reorganização e montagemdesses componentes, formando as novas partículas virais. Uma única partícula viral (vírion)que infecta uma única célula hospedeira pode produzir milhares de partículas novas nesta cé-lula infectada. Essa prodigiosa multiplicação viral frequentemente é suficiente para provocara morte da célula hospedeira: esta célula sofre rompimento (lise) e, assim, proporciona à pro-gênie viral acesso às células adjacentes. Muitas das manifestações clínicas das infecções virais

são os reflexos deste efeito citolítico dos vírus. Tanto as feridas formadas pelo vírus do herpessimplex quanto as lesões causadas pelo vírus da varíola, por exemplo, refletem a morte de cé-lulas epidérmicas em uma região infectada da pele. Como discutido anteriormente, a morte dealgumas células do hospedeiro é causada pela resposta imune do hospedeiro contra o vírus.

Os vírions existem sob uma extensa variedade de formas e de tamanhos e, diferente dasformas de vida celulares, não é possível classificá-los sistematicamente por meio de suasrelações em uma única árvore filogenética. Em razão de seu tamanho diminuto, já foi pos-sível estabelecer as sequências genômicas completas de praticamente todos os vírus de im-portância clínica. Os vírions dos poxvírus estão entre os maiores, alcançando até 450 nm decomprimento, que é o tamanho de algumas bactérias pequenas. Seu genoma de DNA de fitadupla consiste em aproximadamente 270 mil pares de nucleotídeos. Na outra extremidadeda escala, encontram-se os parvovírus, com menos de 20 nm de comprimento e um genomade DNA de fita simples com menos de 5 mil nucleotídeos (Figura 24-13). A informação ge-nética nos vírus pode ser transportada sob uma série de formas de ácidos nucleicos poucocomuns (Figura 24-14).

DNA

DNA

DNARNA

VírusProteína docapsídeo

Proteínado capsídeo

ENTRADA NA CÉLULA HOSPEDEIRAE DESNUDAMENTO DO DNA

Célula hospedeira

TRANSCRIÇÃO

TRADUÇÃO

REPLICAÇÃO

MONTAGEM DASPARTÍCULAS DA PROGÊNIEVIRAL E SAÍDA DA CÉLULA

Figura 24-12 Ciclo simples de vida

viral. O vírus hipotético mostrado con-siste em uma molécula de DNA de fitadupla que codifica uma única proteínado capsídeo viral. Nenhum vírus conhe-cido é tão simples.

PoxvírusHerpesvírus

Adenovírus Parvovírus

Papilomavírus

VÍRUS DE DNA

VÍRUS DE RNA

Vírus da influenza

RotavírusCoronavírus

(resfriado comum)Poliovírus

Vírus da caxumbaVírus da raiva

Vírus LCM

HIV(vírus da AIDS)

Vírus da encefaliteequina do leste

100 nm

Figura 24-13 Exemplos de morfologia

viral. Como pode ser observado, am-bos os vírus de DNA e RNA apresentamgrande diversidade de forma e detamanho.

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Biologia Molecular da Célula 1497

O capsídeo que envolve o genoma viral é constituído por uma ou por várias proteínas,

organizadas em camadas e padrões regularmente repetidos; o genoma viral junto com ocapsídeo é chamado de nucleocapsídeo . Em vírus envelopados, o capsídeo será por sua vez envolvido em uma membrana constituída por uma bicamada lipídica que é adquiridadurante o processo de brotamento a partir da membrana plasmática da célula hospedei-ra (Figura 24-15). Os vírus não-envelopados geralmente saem de uma célula infectada pormeio de lise da mesma, ao passo que os vírus envelopados deixam a célula por brotamento,sem o rompimento da membrana plasmática e, consequentemente, sem provocar a morteda célula. Os vírus envelopados podem causar infecções crônicas que podem durar anos,frequentemente sem causar nenhum efeito deletério no hospedeiro.

 Apesar dessa diversidade, todos os genomas virais contêm três tipos de proteínas: pro-teínas para a replicação do genoma, proteínas para o empacotamento do genoma e o dire-cionamento da infecção de novas células e proteínas que modificam a estrutura ou a funçãoda célula hospedeira visando adequá-la à replicação dos vírions (Figura 24-16). Na segundaseção deste capítulo, abordaremos principalmente esta terceira classe de proteínas. Muitos

Figura 24-14 Esquemas de vários

tipos de genomas virais. Os menoresvírus contêm poucos genes e podem tertanto genoma de RNA quanto de DNA.Os vírus maiores contêm centenas degenes e apresentam genoma de DNA

dupla-fita. Extremidades peculiares(assim como formas circulares) sãoutilizadas para suplantar a dificuldaderelativa à replicação dos nucleotídeosterminais da fita de DNA (apresentadono Capítulo 5).

DNA de dupla-fitacircular

DNA de dupla-fita com extremidadesseladas covalentemente

DNA de fita simplescircularRNA de dupla-fita

DNA dupla-fita

DNA de dupla-fitacom proteínas terminaisligadas covalentemente

Vírus do mosaico do tabacobacteriófago R17

poliovírus

RNA de fita simples

DNA de fita simples

ParvovírusSV40

papilomavírus

Reovírus M13Bacteriófagos174

circovírus

Bacteriófago T4herpesvírus

AdenovírusPoxvírus

Figura 24-15 A aquisição de um en-

velope viral. (A) Micrografia eletrônicade uma célula animal a partir da qualestão brotando seis cópias de um vírusenvelopado (vírus da floresta Semlik ). (B)Esquema de montagem de envelope eprocesso de brotamento. A bicamadalipídica que envolve o capsídeo viral éderivada diretamente da membranacitoplasmática da célula hospedeira. Emcontraste, as proteínas nesta bicamadalipídica (em verde) são codificadas pelogenoma viral. (A, cortesia de M. Olsen eG. Griffith.)

Capsídeo contendocromossomo viral(nucleocapsídeo)

Proteínastransmembrana doenvelope viral

O nucleocapsídeo induza montagem dasproteínas do envelope

Proteína docapsídeo

Cromossomoviral

(DNA ou RNA)

BROTAMENTO

Progênieviral

Bicamada lipídica

(B)(A)100 nm

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genomas virais codificam uma quarta classe de proteínas, que modulam ou subvertem osmecanismos de defesa imune normal do hospedeiro. Muitas delas são descritas na seçãofinal deste capítulo.

Dado que os passos críticos da replicação viral são realizados pela maquinaria da célulahospedeira, a identificação de fármacos antivirais eficientes é bastante problemática. O anti-biótico tetraciclina, por exemplo, bloqueia especificamente os ribossomos bacterianos, masnão é possível identificar um fármaco que bloqueie especificamente os ribossomos virais,pois os vírus utilizam os ribossomos da célula hospedeira para fazer suas proteínas. A melhorestratégia para a contenção de doenças virais é a prevenção por vacinação dos possíveis hos-pedeiros. Os programas de vacinação alcançaram enorme sucesso eliminando eficientemen-te a varíola de nosso planeta, e a erradicação da poliomielite é iminente (Figura 24-17).

Os príons são proteínas infecciosas

Toda a informação em sistemas biológicos é estruturalmente codificada. Estamos acostuma-dos a pensar em informação biológica sob a forma de sequências de ácidos nucleicos (comona descrição dos genomas virais), mas a sequência por si só é um código, uma forma simpli-ficada de descrever a estrutura do ácido nucleico. A replicação e a expressão da informaçãocodificada sob a forma de DNA e RNA são estritamente dependentes da estrutura dessesácidos nucleicos e das interações com outras macromoléculas. A propagação da informaçãogenética necessita primeiramente que esta esteja estocada em uma estrutura que possa serduplicada a partir de precursores não-estruturados. As sequências de ácidos nucleicos sãoa solução mais simples e consistente que os organismos encontraram para o problema de

fidelidade de replicação de uma estrutura.Entretanto, os ácidos nucleicos não são a única solução para o problema. Os príons são agentes infecciosos que são replicados em um hospedeiro por meio da cópia de umaestrutura proteica aberrante. Os príons foram encontrados a partir de leveduras a molus-cos marinhos até o homem e causam várias doenças neurodegenerativas em mamíferos. Amais estudada dessas infecções por príons é a encefalopatia espongiforme bovina (BSE oudoença-da-vaca louca), que, eventualmente, pode infectar humanos que se alimentaram departes infectadas de bovinos (Figura 24-18); também pode ser transmitida do homem parao homem via transfusão sanguínea. O isolamento do príon infeccioso que causa a doençascrapie em ovinos, seguido de anos de árduo trabalho laboratorial na caracterização de ca-mundongos infectados pelo scrapie, finalmente demonstrou que a proteína é infecciosa porsi mesma.

O mais intrigante é que não somente a proteína é produzida pelo hospedeiro, mas asequência de aminoácidos é idêntica à da proteína normal. Além disso, é impossível dife-renciar o príon da forma proteica normal com base nas modificações pós-tradução. A única

Figura 24-16 Um mapa do genoma

do HIV. Este genoma retroviral consisteem aproximadamente 9 mil nucleo-tídeos e contém nove genes, cujaslocalizações estão mostradas em verde e em vermelho. Três destes genes (verde)

são comuns para todos os retrovírus:Gag codifica proteínas do capsídeo, Env codifica proteínas do envelope ePol codifica a transcriptase reversa (quecopia o RNA em DNA) e as proteínas in-tegrase (que inserem a cópia do DNA nogenoma da célula hospedeira) (discuti-do no Capítulo 5). O genoma do HIV éincomumente complexo, porque, alémdos três grandes genes (verde) normal-mente necessários ao ciclo de vida viral,contém 6 genes pequenos (vermelho).Pelo menos alguns desses pequenosgenes codificam proteínas que regulama expressão gênica viral (Tat e Rev – verFigura 7-103); outros codificam proteí-nas que alteram processos celulares do

hospedeiro, como o tráfego de proteí-nas (Vpu e Nef ) e a progressão do ciclocelular (Vpr ). Como indicado pela linhavermelha, o splicing de RNA (utilizandoo spliceossomo do hospedeiro) é ne-cessário para a produção das proteínasRev e Tat.

Rev 

Tat Nef Vif 

Vpr Vpu

Gag

Pol 

Env 

Quepe

5

3

Terminações repetidas

40

30

20

10

01940 1950 1960 1970 1980 1990

    C   a   s   o   s   r   e   p   o   r   t   a    d   o   s    d   e   p    ó    l    i   o   p   o   r

   p   o   p   u    l   a   ç    ã   o    d   e    1    0    0 .    0

    0    0

Vacinainativada

Vacinaoral

Figura 24-17 Erradicação de uma

doença viral pela vacinação. O gráfico

mostra o número de casos de poliomie-

lite registrado por ano nos Estados Uni-

dos. As setas indicam a introdução da va-

cina Salk (vírus inativado, administrado

por injeção) e a vacina Sabin (vírus vivo

atenuado, administrado oralmente).

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Biologia Molecular da Célula 1499

diferença entre as duas formas parece ser a conformação tridimensional da estrutura. A pro-teína príon dobrada de maneira irregular tende a formar agregados, formando fibras helicoi-dais regulares denominadas fibras amiloides. As fibras amiloides crescem nas extremidades,como os filamentos de proteínas de citoesqueleto, discutido no Capítulo 16, exceto que assubunidades da proteína sofrem uma conversão estrutural do dobramento normal da pro-

teína para o dobramento anormal à medida que se tornam parte do polímero amiloide (verFigura 6-95). Em outras palavras, o príon dobrado de forma incorreta tem a notável capaci-dade de induzir a proteína normal a adotar sua conformação anômala e, assim, tornar-seinfecciosa, que é o equivalente a uma replicação do príon no hospedeiro. Quando uma dasfibrilas amiloides é fragmentada em pedaços menores, cada um deles torna-se uma sementepara o processo de conversão em uma nova célula; então, o príon poderá se propagar assimcomo se replicar. Se ingerido por um hospedeiro suscetível, o príon inadequadamente do-brado poderá transmitir a infecção de organismo para organismo.

Não está estabelecido como a maioria das proteínas normais é capaz de encontrar umúnico e correto dobramento entre os bilhões de possibilidades conformacionais, sem quefiquem presas em intermediários semelhantes a “becos sem saída” (discutido nos Capítu-los 3 e 6). Os príons são um bom exemplo de como a dobradura de proteínas pode tomarum caminho perigosamente errado. Contudo, por que as doenças priônicas são incomuns?Quais são os controles que determinam se uma proteína com dobradura incorreta vai secomportar como um príon, ou simplesmente ser redobrada ou degradada pela célula que a

sintetizou? Não sabemos ainda as respostas para estas questões, e o estudo dos príons per-manece uma área de intensa investigação.

Agentes causais das moléstias infecciosas estão ligados ao

câncer, a doenças cardíacas e a outras doenças crônicas

 Até aqui, consideramos os micro-organismos primariamente nos seus papéis de agentescausais de doenças infecto-contagiosas. Entretanto, está claro que em muitos casos as in-fecções bacterianas e virais podem contribuir para a patogênese de doenças importantes,com risco de vida e que não são classificadas normalmente como doenças infecciosas. Umexemplo óbvio é o câncer. O conceito de oncogene que define que certos genes alterados po-dem engatilhar a transformação celular e o desenvolvimento de tumores surgiu inicialmentedos estudos com o vírus do sarcoma de Rous, que causa uma forma de câncer (sarcomas) emgalináceos. Um dos genes encontrados no vírus foi descoberto como codificador de umatirosina-cinase hiper-ativa homóloga à tirosina-cinase Src do hospedeiro, que desde então

tem sido implicada em muitos tipos de câncer. Apesar de o vírus do sarcoma de Rous não causar cânceres em humanos, sabe-se agora

que muitos cânceres humanos têm uma origem viral. O papilomavírus humano, por exem-plo, que causa as verrugas genitais, também é responsável por mais de 90% dos cânceres dacérvice uterina. Em termos globais, o câncer de cérvice é o segundo mais comum em mulhe-res, com uma taxa de mortalidade de 40%. Nos países ricos, medidas preventivas intensas,como a realizacão do exame de Papanicolau, reduzaram a incidência e a severidade do cân-cer cervical, contudo ainda é muito comum nos países em desenvolvimento. O desenvol-

 vimento recente de uma vacina contra as amostras do papilomavírus associadas ao câncermais comum, traz esperança de que esta forma de câncer poderá ser amplamente prevenidaem escala global por uma medida simples e econômica.

O vírus de Epstein-Barr (EBV , Esptein-barr vírus) fornece um exemplo mais complexo deum câncer humano ligado a uma infecção viral. A infecção por este vírus de DNA é tão co-mum que cerca de 90% dos adultos nos Estados Unidos acima dos quarenta anos possuemníveis detectáveis de anticorpos anti-EBV no sangue. O EBV prefere invadir as células B dosistema imune adaptativo, especialmente as células B de memória de vida longa (discutidono Capítulo 25). Em sua maioria, as pessoas infectadas quando crianças apresentam pou-cos sintomas e não percebem que foram infectadas, porém adolescentes e adultos jovensinfectados pela primeira vez frequentemente desenvolvem mononucleose infecciosa (tam-bém chamada de febre glandular ), uma doença severa semelhante à gripe que leva a febresaltíssimas, inchaço doloroso dos linfonodos e fadiga que pode perdurar por vários meses.

 Após o desaparecimento dos sintomas, o EBV pode permanecer dormente na célula B peloresto da vida, com o seu genoma sendo mantido como um plasmídeo extracromossômicono núcleo da célula B. Alguns dos produtos gênicos codificados pelo genoma do EBV inibema apoptose e, dessa forma, presumivelmente ajudam a prevenir a eliminação do vírus docorpo humano. Assim, quando uma célula B adquire as chamadas mutações promotoras de

Orifícios cheios de fluido no tecido do cérebro

10m

Figura 24-18 Degeneração neural em

uma infecção priônica. Esta micro-grafia mostra uma fatia do cérebro deuma pessoa que morreu de kuru. Kurué uma doença humana causada porpríon muito semelhante à encefalopatiaespongiforme bovina (BSE), que eratransmitida de pessoa à pessoa por ri-tuais mortuários na Nova Guiné (Papua).Os grandes orifícios cheios de fluido são

os locais de morte neuronal. Os orifícioscaracterísticos servem para designar adoença como encefalopatia espongifor-me. (Cortesia de Gary Baumbach.)

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câncer, o mecanismo usual de eliminação das células pré-cancerosas por apoptose é inibido,e uma forma de câncer de células B chamada de linfoma de Burkitt se estabelece.

Em alguns casos, danos teciduais crônicos causados por infecções podem aumentar aprobabilidade de desenvolvimento do câncer no tecido infectado. A bactéria habitante doestômago Helicobacter pylori tem sido implicada como uma grande causa de cânceres ou

úlceras estomacais, e os vírus da hepatite que causam infecções crônicas no fígado (hepatitecrônica) estão associados a mais de 60% dos cânceres do fígado. Ao lado do câncer, a outra maior causa de óbitos nos países industrializados é a doença

cardiovascular, frequentemente associada à aterosclerose, o acúmulo de depósitos de gor-duras nos vasos sanguíneos que podem bloquear o fluxo normal do sangue. A isquemia re-sultante tem consequências terríveis para o coração e para o cérebro. Uma característicamarcante da aterosclerose precoce é o aparecimento, na parede dos vasos sanguíneos, deaglomerados de macrófagos de aparência anormal, chamados de células espumosas por es-tarem cheios de glóbulos de gordura engolfados. As células espumosas secretam citocinasque recrutam outras células brancas para a placa aterosclerótica em formação, que, por sua

 vez, acumula matriz extracelular. O contínuo acúmulo de células e matriz extracelular pode-rá gradualmente bloquear o fluxo sanguíneo, ou, alternativamente, a placa poderá ser libera-da, causando um trombo, que agudamente bloqueia a circulação sanguínea; por outro lado,pedaços do trombo poderão se fragmentar e formar êmbolos que bloqueiam a passagem dosangue pelos vasos menores abaixo do trombo. Um fato interessante é que as células espu-

mosas nas placas ateroscleróticas frequentemente contêm a bactéria patogênica Chlamydiapneumoniae, que comumente causa pneumonia em humanos (Figura 24-19). Numerosaslinhas de evidência sugerem que a infecção pela C. pneumoniae é um fator de risco signifi-cativo para a aterosclerose em homens e modelos animais. O DNA de outras espécies bac-terianas tem sido encontrado nas placas ateroscleróticas, incluindo bactérias comumenteassociadas a dentes e gengivas, como a Porphyromonas gingivalis. A conexão entre agentesinfecciosos e aterosclerose é motivo de intensa pesquisa.

Em adição à contribuição para doenças de risco como o câncer e doenças cardiovascu-lares, agentes infecciosos também podem ter um papel importante nas doenças crônicas,apesar de ser difícil dizer se uma infecção é a causa das doenças crônicas ou é a consequên-cia das doenças. Um exemplo claro de uma causa infecciosa para uma doença crônica é adoença de Lyme, uma infecção bacteriana causada pela espiroqueta Borrelia burgdorferi. Ainfecção é adquirida pela picada de carrapato e pode causar uma artrite crônica e doloro-sa se não for detectada e tratada imediatamente com antibióticos. Muitas outras infecçõesbacterianas, particularmente infecções por cocos gram-positivos e por pequenas bactérias

desprovidas de parede celular, chamadas de Mycoplasma, poderão engatilhar uma respos-ta imune levando à artrite. Em algumas pessoas, Mycoplasma, Chlamydia pneumoniae, ouambos, estão associados à asma crônica. À medida que aprendemos mais sobre a interaçãoentre patógenos e o corpo humano, é bem provável que mais e mais doenças crônicas sejamencontradas em associação a um agente infeccioso. Como o caso da úlcera péptica, a cura dainfecção cura a doença, ou pelo menos alivia os sintomas dolorosos.

Figura 24-19  Chlamydia pneumoniae 

dentro de um macrófago espumoso

em uma placa aterosclerótica. Osmarcadores nesta micrografia eletrônicaindicam: EB, corpo elementar (bactéria);FG (glóbulo de gordura); N, núcleo domacrófago. (De L. A. Campbell e C. C.Kuo, Nat. Rev. Microbiol . 2:23-32, 2004.Com permissão de Macmillan Publi-shers Ltd.) 1 m

EB

N

FGFG

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Biologia Molecular da Célula 1501

Resumo

 As doenças infecciosas são causadas por patógenos, que incluem bactérias, fungos, protozoários,

vermes, vírus e mesmo proteínas infecciosas denominadas príons. Todos os patógenos devem ter 

mecanismos para penetrar seus hospedeiros e evitar sua destruição imediata pelo sistema imune

do hospedeiro. A maioria das bactérias não é patogênica. Aquelas que o são possuem genes espe-

cíficos de virulência que medeiam interações com o hospedeiro e provocam respostas particula-

res das células hospedeiras, promovendo sua replicação e disseminação. Os fungos patogênicos, os

protozoários e os outros parasitas eucarióticos, tipicamente, passam por uma série de diferentes

estágios ao longo do curso da infecção; a capacidade de passar de um estágio para outro geralmente

é necessária para que o parasita seja capaz de sobreviver em um hospedeiro e provocar a doença.

Em alguns casos, como na malária, os parasitas devem passar sequencialmente por diversas espé-

cies para completar seu ciclo de vida. Diferentemente das bactérias e dos parasitas eucarióticos, os

vírus não possuem nem metabolismo próprio, nem capacidade intrínseca de produzir as proteínas

codificadas pelos seus genomas de DNA ou de RNA. Eles se apoiam totalmente na subversão da

maquinaria das células hospedeiras para produzir suas proteínas e replicar seus próprios genomas.

Os príons, os menores e mais simples dos agentes infecciosos, não contêm ácidos nucleicos; em vez 

disso, eles são proteínas pouco comuns que sofreram uma estruturação conformacional anormal e

que se replicam catalisando o dobramento aberrante de proteínas normais do hospedeiro que pos-

suem a mesma sequência primária de aminoácidos.

BIOLOGIA CELULAR DA INFECÇÃO

Os mecanismos que os patógenos usam para causar doenças são tão diversos quanto ospróprios patógenos. Não obstante, todos os patógenos realizam tarefas comuns: eles devemcolonizar o hospedeiro, alcançar um nicho apropriado, evitar as defesas do hospedeiro, re-plicar, e sair de um hospedeiro infectado para infectar um hospedeiro sadio. Nesta seção,examinaremos as estratégias comuns que muitos patógenos usam para realizar tais tarefas.

Os patógenos atravessam barreiras protetoras para colonizar o

hospedeiro

O primeiro passo de uma infecção é a colonização do hospedeiro pelo patógeno. A maiorparte das regiões do corpo humano está bem-protegida do ambiente por uma cobertura es-

pessa e bastante resistente de pele. As barreiras protetoras em alguns outros tecidos huma-nos (olhos, narinas e trato respiratório, boca e trato digestivo, trato urinário e trato genitalfeminino) são menos resistentes. Por exemplo, nos pulmões e no intestino delgado, ondeo oxigênio e os nutrientes são absorvidos do ambiente, respectivamente, a barreira é umasimples monocamada de células epiteliais.

 A pele e as outras barreiras epiteliais de superfície em geral encontram-se densamentecolonizadas pela flora normal. Algumas bactérias e fungos patogênicos também colonizamessas superfícies na tentativa de substituir a flora normal, mas a maioria dos patógenos (as-sim como todos os vírus) evita essa competição atravessando as barreiras para ganhar aces-so a nichos desocupados no interior do hospedeiro.

 As lesões na barreira epitelial, inclusive na pele, permitem o acesso dos patógenos di-retamente aos nichos. Esta via de entrada não requer muita especialização por parte do pa-tógeno para ser utilizada. Mais do que isso, muitos membros da flora normal podem causarsérias doenças se penetrarem os ferimentos. As bactérias anaeróbias do gênero Bacteroides,por exemplo, estão presentes como flora inócua em alta densidade no intestino grosso, mas

podem causar peritonites graves se penetrarem a cavidade peritoneal pela perfuração do in-testino causada por traumatismo, por cirurgia ou por infecções da parede intestinal. Os Sta-phylococcus presentes na pele e no nariz, ou o Streptococcus da garganta ou da boca, tambémsão responsáveis por muitas infecções sérias resultantes de quebras das barreiras epiteliais.

Os patógenos declarados, no entanto, não necessitam esperar que ocorra uma lesão nomomento adequado para que acessem o hospedeiro. Um mecanismo particularmente efi-ciente para que o patógeno atravesse a pele é “pegar uma carona” na saliva da picada de umartrópode. Muitos insetos e carrapatos alimentam-se pela sucção de sangue, e um grupo di-

 versificado de bactérias, vírus e protozoários desenvolveu a capacidade de sobrevivência nosartrópodes de modo a utilizá-los como vetores de disseminação de um mamífero hospedeiropara outro. Como discutido anteriormente, o protozoário Plasmodium, que causa a malária,

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tem seu ciclo de vida e desenvolvimento em vários estágios, incluindo alguns que são especia-lizados para sobreviver em humanos e outros especializados para sobreviver no mosquito (vera Figura 24-10). Entre os vírus disseminados pelas picadas de insetos estão os agentes causaisde diferentes tipos de febre hemorrágica, incluídas aqui a febre amarela e a dengue, bem comoos agentes de muitos tipos de encefalites virais (inflamações do cérebro). Todos esses vírus

desenvolveram a habilidade de replicar tanto em células de insetos quanto em células de ma-míferos, pois isso era necessário para que utilizassem um inseto como vetor. Os vírus que sedesenvolvem exclusivamente no sangue e não são capazes de replicação nos insetos, como é ocaso HIV, raramente, ou nunca, são transmitidos do inseto para o ser humano.

 A transmissão eficiente do patógeno via um inseto vetor necessita que um único inseto,individualmente, alimente-se do sangue de numerosos mamíferos hospedeiros. Em poucose surpreendentes casos, o patógeno parece ser capaz de alterar o comportamento do insetode forma a tornar a transmissão mais provável. Como a maioria dos animais, a mosca tsé-tsé(cujas picadas disseminam o protozoário parasita Trypanosoma brucei, causador da doençado sono na África) para de se alimentar quando está saciada. Contudo as moscas tsé-tsé, quecarregam tripanossomos picam com mais frequência e ingerem muito mais sangue do queaquelas que não estão infectadas. A presença do tripanossomo desregula o funcionamentode mecanorreceptores do inseto que medem a pressão do fluxo de sangue pela gargantapara acessar a quantidade de conteúdo do estômago, enganando efetivamente a mosca, queacredita ainda estar com fome. A bactéria Yersinia pestis, que causa a peste bubônica, usa

um mecanismo diferente para assegurar que a pulga que a transporta picará repetidas vezes:ela multiplica-se no intestino da pulga formando agregados que ocasionalmente aumentamde tamanho e bloqueiam fisicamente o trato digestivo. Desse modo, o inseto não será capazde alimentar-se normalmente e começará a definhar. Ao longo das repetidas tentativas desatisfazer seu apetite, algumas bactérias do intestino serão descarregadas na região da pica-da, transmitindo a peste para novos hospedeiros (Figura 24-20).

Os patógenos que colonizam o epitélio evitam

ser eliminados pelo hospedeiro

“Pegar uma carona” em um proboscídeo de inseto para atravessar a pele é apenas uma dasestratégias que os patógenos utilizam para atravessar a barreira inicial das defesas do hospe-deiro. Apesar de algumas zonas de barreiras como a pele e o revestimento da boca e do intes-tino grosso serem densamente habitadas pela flora normal, outras, incluindo o revestimentodos pulmões, do intestino delgado e da bexiga, normalmente são mantidas praticamente

estéreis, apesar de possuírem um acesso relativamente direto ao ambiente. Como o epité-lio nessas regiões resiste ativamente à colonização bacteriana? Como discutido no Capítulo22, o epitélio respiratório está coberto por uma camada de muco protetor, e o batimentocoordenado dos cílios prende as bactérias e os resíduos e varre o muco, levando-o para forado pulmão. O epitélio de revestimento da bexiga e do trato gastrintestinal superior tambémapresenta uma espessa camada de muco, sendo esses órgãos constantemente lavados pelamicção e pelo peristaltismo, respectivamente, o que elimina os micróbios indesejáveis. Asbactérias patogênicas e parasitas que infectam essas superfícies epiteliais possuem meca-nismos específicos para escapar dos mecanismos de limpeza do hospedeiro. Os organismosque infectam o trato urinário, por exemplo, resistem à ação de lavagem pela urina por meiode forte adesão ao epitélio da bexiga via adesinas específicas, que são proteínas ou comple-

 xos proteicos que reconhecem e se ligam a moléculas da superfície das células do hospedei-ro. Um importante grupo de adesinas em linhagens de E. coli uropatogênicas é compostopelos membros dos pili P que ajudam a bactéria a se aderir nas células epiteliais dos rins.Estas projeções da superfície da bactéria podem medir vários micrômetros de comprimento,sendo, assim, capazes de atravessar a espessa camada de muco protetor (ver Figura 24-4D).Na extremidade de cada pilo existe uma proteína que se liga firmemente a um determinadoglicolipídeo associado a um dissacarídeo encontrado na superfície das células renais. Cepasde E. coli que infectam a bexiga expressam um segundo tipo de pilo que permite uma adesãoàs células epiteliais da bexiga. A especificidade de adesão das adesinas da extremidade dosdois tipos de pilo é responsável pela colonização bacteriana em diferentes partes do tratourinário (Figura 24-21). A especificidade das adesinas também restringe o leque de hospe-deiros a estas e a outras bactérias patogênicas.

Um dos mais difíceis órgãos a ser colonizado por um micro-organismo é o estômago. Além da lavagem por peristaltismo e da proteção de uma espessa camada de muco, o es-tômago está repleto de ácido (pH médio em torno de dois). Esse ambiente extremo é letal

Esôfago Intestino

100m

Figura 24-20 A bactéria da peste no

interior de uma pulga. Esta microgra-fia mostra o trato digestivo dissecadode uma pulga que se alimentou háaproximadamente duas semanas dosangue de um animal infectado pelabactéria da peste, Yersinia pestis. A bac-téria se multiplicou no intestino da pul-ga para produzir grandes agregados co-esivos, indicados pelas setas vermelhas;a massa bacteriana, à esquerda, estáimpedindo a passagem entre o esôfagoe o intestino. Este tipo de bloqueioevita que a pulga realize a digestão dosangue ingerido, fazendo com que elapique mais frequentemente, transmi-tindo a infecção. (De B. J. Hinnebusch, E.R. Fischer e T. G. Schawann,  J. Infect. Dis 178:1406-1415, 1998. Com permissãode The University of Chicago Press.)

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Biologia Molecular da Célula 1503

para a maioria das bactérias ingeridas junto com a alimentação. No entanto, ele é passívelde colonização pela resistente e audaz bactéria Helicobacter pylori, a qual foi recentementereconhecida como a principal causadora de úlceras estomacais e, possivelmente, de câncer

do estômago. Notável é sua habilidade de persistir por toda a vida como um comensal ino-fensivo na maioria dos hospedeiros. Apesar dos antigos tratamentos para úlcera (fármacosredutores de acidez e dieta leve) ainda serem usados para reduzir a inflamação, um trata-mento curto e relativamente barato com antibióticos pode efetivamente curar um pacienteacometido por úlceras recorrentes de estômago. A hipótese de que as úlceras de estômagopodiam ser causadas por infecções bacterianas persistentes foi encarada inicialmente combastante ceticismo. A prova foi finalmente dada por um jovem médico australiano que fez adescoberta inicial: ele bebeu um frasco de cultura pura de H. pylori e desenvolveu uma úlce-ra típica. Um mecanismo utilizado por H. pylori para sobreviver no estômago é a produçãoda enzima urease, que converte ureia em amônia e em dióxido de carbono; desse modo, abactéria envolve-se em uma camada de amônia, a qual neutraliza a acidez do estômago emtorno dela. A bactéria também expressa pelo menos cinco diferentes tipos de adesinas, asquais possibilitam sua adesão ao epitélio do estômago e também produzem várias citotoxi-nas que destroem as células epiteliais do estômago, gerando dolorosas úlceras. A inflamaçãocrônica resultante provoca proliferação celular e, desse modo, predispõe o indivíduo infec-

tado ao desenvolvimento de câncer de estômago.Um exemplo mais extremo de colonização ativa é dado pela Bordetella pertussis, a bac-

téria que causa a coqueluche. O primeiro passo na infecção por B. pertussis é a colonizaçãodo epitélio respiratório. A bactéria escapa do mecanismo normal de limpeza (o elevador mucociliar descrito no Capítulo 23) por meio de forte ligação à superfície das células cilia-das que recobrem o trato respiratório seguido de multiplicação nestas células. A B. pertussis expressa pelo menos quatro tipos de adesinas que se ligam fortemente a glicolipídeos carac-terísticos das células ciliadas. A bactéria aderente produz uma série de toxinas que eventual-mente provocarão a morte da célula ciliada, comprometendo a habilidade do hospedeirode eliminar a infecção. A mais conhecida delas é a toxina pertussis, a qual – assim comoa toxina da cólera – é uma enzima de ADP-ribosilação. Ela ADP-ribosila a subunidade daproteína G tipo Gi, inibindo a proteína G de suprimir a atividade da adenilil-ciclase da célulahospedeira e a superprodução do AMP cíclico (discutido no Capítulo 15). A toxina tambéminterfere com a via quimiotática que os neutrófilos usam para caçar e eliminar as bactériasinvasoras. (ver Figura 16-101). Não satisfeita com isso, a B. pertussis também produz umaadenilil-ciclase própria, a qual é inativa a menos que se ligue à proteína eucariótica calmo-dulina, uma proteína ligadora de Ca2+ no citoplasma da célula hospedeira. Apesar de tanto aB. pertussis quanto a V. cholerae apresentarem efeito similar de aumentar os níveis de cAMPdrasticamente nas células hospedeiras às quais elas se aderem, os sintomas das doenças sãobastante diferentes devido às diferentes regiões de colonização no hospedeiro: B. pertussis coloniza o trato respiratório e causa a tosse convulsa, enquanto V. cholerae coloniza o intes-tino e causa a diarreia aquosa.

Nem todos os exemplos de colonização específica necessitam que a bactéria expresseadesinas que se ligam a proteínas ou a glicolipídeos da célula hospedeira. A E. coli enteropa-togênica que causa diarreia em crianças utiliza, em vez de adesinas, o sistema de secreçãotipo III (ver a Figura 24-8) para introduzir na célula hospedeira o receptor proteico por ela

Figura 24-21  E. coli uropatogênica

na bexiga infectada de um camun-

dongo. (A) Micrografia eletrônica devarredura de E. coli uropatogênica, umagente comum de infecções renais eda bexiga, ligada à superfície de células

epiteliais que revestem a bexiga deum camundongo infectado. (B) Um au-mento mostrando o pilo na superfície.(A, de G. E. Soto e S. J. Hultgren,  J. Bact. 181:1059-1071, 1999; B, cortesia de D.G. Thanassi e S. J. Hultgren, Meth. Comp.Meth. Enzym. 20:111.126, 2000. Compermissão de Academic Press.)

5 m(B)

1 m(A)

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produzido (denominado Tir) (Figura 24-22 A). Após a inserção de Tir na membrana da cé-lula hospedeira, uma proteína de superfície da bactéria liga-se ao domínio extracelular deTir, engatilhando uma espetacular série de eventos no interior da célula hospedeira. Inicial-mente, os resíduos de tirosina da proteína receptora Tir são fosforilados por uma proteínatirosina-cinase hospedeira, o que não é comum, porque as bactérias geralmente não fosfo-rilam seus resíduos de tirosina. A seguir, é provável que a proteína Tir fosforilada recrute ummembro da família Rho de pequenas GTPases, o qual promove a polimerização de actinapor meio de uma série de passos intermediários (discutidos no Capítulo 16). A actina poli-merizada forma uma protuberância característica na superfície celular, denominada pedes-tal , que empurra a bactéria fortemente aderida a aproximadamente 10 m da superfície dacélula hospedeira (Figura 24-22B, C).

Esses exemplos de colonização bacteriana ilustram a importância da comunicação en-tre o patógeno e o hospedeiro durante o processo de infecção e sua evolução. Os organismospatogênicos adquiriram genes que codificam proteínas que interagem especificamente commoléculas particulares das células hospedeiras. Em alguns casos, como o da adenilil-ciclasede B. pertussis, um ancestral do patógeno deve ter adquirido o gene da ciclase de seu hospe-deiro, ao passo que em outros, como em Tir, mutações ao acaso podem ter dado origem àssequências em proteínas que são reconhecidas pela proteína eucariótica tirosina-cinase.

Os patógenos intracelulares possuem mecanismos tanto para a

penetração quanto para a saída das células hospedeiras

Muitos patógenos, incluindo V. cholerae e B. pertussis, infectam seus hospedeiros sem pe-netrar as células hospedeiras e são conhecidos como patógenos extracelulares. Outros, en-tretanto, incluindo todos os vírus e muitas bactérias e protozoários, são patógenos intra-

celulares. Seu nicho preferido para replicação e sobrevivência é o interior do citosol ou oscompartimentos intracelulares de determinadas células hospedeiras. Esta estratégia apre-senta uma série de vantagens. Os patógenos não estão acessíveis aos anticorpos (discutidosno Capítulo 25) e não são alvos fáceis para as células fagocíticas (discutido adiante); assim,eles são banhados em uma fonte rica em muitos açúcares, aminoácidos e outros nutrientespresentes no citoplasma da célula hospedeira. Esse estilo de vida, no entanto, necessita queo patógeno desenvolva mecanismos para a penetração na célula hospedeira, para a localiza-ção do nicho subcelular adequado, onde ele poderá replicar, bem como de mecanismos de

Figura 24-22 Interação da E. coli enteropatogênica (EPEC enteropathogenic  E. coli ) com células hospedeiras do intestino. (A)Quando a EPEC entra em contato com as células do revestimento epitelial do intestino humano, ela injeta a proteína bacteriana Tirno interior das células hospedeiras, utilizando o sistema de secreção tipo III. A Tir será então inserida na membrana citoplasmáticada célula hospedeira, onde funcionará como um receptor para a adesina bacteriana intimina. (B) O domínio intracelular de Tir é fos-

forilado em um resíduo tirosina pela enzima tirosina-cinase da célula hospedeira. A Tir fosforilada recruta várias proteínas da célulahospedeira, que engatilha a polimerização de actina. Consequentemente, um feixe de filamentos de actina é montado abaixo dabactéria, formando-se um pedestal de actina. (C) EPEC em um pedestal. Nesta micrografia de fluorescência, o DNA de EPEC e o dacélula hospedeira estão corados em azul ; a proteína Tir está corada em verde, e os filamentos de actina da célula hospedeira estãocorados em vermelho. O quadro em destaque mostra um aumento de duas bactérias em pedestais. (C, de D. Goosney et al., Annu. Rev.Cell Dev. Biol. 16:173-189, 2000. Com permissão de Annual Reviews.)

E. coli enteropatogênica

Membrana externa

Membrana interna

E. coli enteropatogênica

Intimina

Tir

Tir

Sistemade secreçãotipo III

Membranaplasmática dohospedeiro

(A) (B)

Pedestal

Tirfosforilada

Filamentos de actina

Célula hospedeira

Proteínas dohospedeiro quepromovem apolimerizaçãoda actina

(C)

20 m

P

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Biologia Molecular da Célula 1505

saída da célula infectada para disseminação da infecção. No restante desta seção, conside-raremos algumas das diversas maneiras utilizadas por patógenos intracelulares específicospara modificar a biologia da célula hospedeira e satisfazer suas necessidades.

Partículas virais ligam-se a moléculas apresentadas na

superfície da célula hospedeira

O primeiro passo para qualquer patógeno intracelular é a adesão à superfície da célulahospedeira-alvo. O vírus realiza essa ligação por meio da associação de uma proteína dasuperfície viral com um receptor específico da superfície da célula hospedeira. Obviamen-te, nenhuma célula hospedeira desenvolveu um receptor com o objetivo único de servir debase de ancoramento para um patógeno; todos os receptores realizam outras funções. O pri-meiro desses “receptores virais” a ser identificado foi uma proteína de superfície de E. coli que permite a ligação do bacteriófago lambda à bactéria. Sua função normal é a de proteínade transporte responsável pela internalização da maltose. Os receptores não precisam serproteínas, no entanto; o vírus do herpes simples, por exemplo, liga-se ao proteoglicano sul-fato de heparana através de proteínas específicas da membrana viral.

Os vírus que infectam células animais geralmente utilizam moléculas receptoras da su-perfície celular que são extremamente abundantes (como os oligossacarídeos que contêmácido siálico, os quais são utilizados pelo vírus influenza) ou são encontradas exclusivamen-

te naquelas células em que o vírus pode se replicar (como é o caso do uso do receptor defator de crescimento neuronal, o receptor nicotínico de acetilcolina ou a proteína de adesãocélula/célula N-CAM, todos usados pelo vírus da raiva, que infecta especificamente os neu-rônios). Frequentemente, um único tipo de receptor é utilizado por uma gama de vírus, ealguns vírus diferentes podem utilizar receptores diferentes. Dessa maneira, vírus diferentesque infectam o mesmo tipo de célula devem usar receptores diferentes. Por exemplo, mem-bros de pelo menos seis famílias de vírus que preferencialmente replicam em células hepá-ticas (hepatócitos) causam hepatite. Já foram identificados receptores para quatro vírus dahepatite, e todos eles diferem uns dos outros. Muitos vírions se ligam a receptores expressosnas células do sistema imune. Embora pareça paradoxal, como se espera, que a ativação deuma resposta imune não aumente a chance de sobrevivência viral, a invasão de uma célulado sistema imune poderá ser uma maneira de viajar pelo corpo para alcançar um órgão lin-foide, que é repleto de outras células do sistema imune.

Frequentemente, os vírus necessitam tanto de um receptor principal quanto de um cor-

receptor secundário para que ocorra uma ligação eficiente e uma penetração na célula hospe-deira. Um exemplo importante é o vírus da AIDS, o HIV. O seu receptor principal é a molécula

CD4, uma proteína da superfície celular de células T auxiliares e macrófagos que está envolvi-

da no reconhecimento imune (discutido no Capítulo 25). A penetração do vírus requer a pre-

sença de um correceptor, o CCR5 (um receptor de -quimiocinas) ou o CXCR4 (um receptor

de -quimiocinas), dependendo da variante específica do vírus (Figura 24-23). Os macrófa-

gos são suscetíveis apenas às variantes de HIV que utilizam o CCR5 para entrada, ao passo que

as células T são mais eficientemente infectadas por variantes que utilizam o CXCR4. Os vírus

encontrados nos primeiros meses após uma infecção com HIV quase que invariavelmente

necessitam do CCR5, o que potencialmente explica por que os indivíduos que carregam um

Figura 24-23 Receptor e correceptores

para o HIV. Todas as linhagens de HIVnecessitam do CD4 como receptor prin-

cipal. Em uma infecção inicial, a maioriados vírus utiliza CCR5 como correceptor,o que lhes permite infectar os macrófa-gos e seus precursores, os monócitos.Conforme a infecção progride, surgemvariantes mutantes que utilizam CXCR4como correceptor, fazendo com queessas variantes sejam eficientes na in-fecção de células T. Os ligantes naturaispara os receptores de quimiocinas (Sdf-lpara CXCR4; Rantes, Mip-1 ou Mip-1 para CCR5) bloqueiam a função do cor-receptor e previnem a infecção viral.

-quimiocina(Rantes, Mip 1ou Mip 1)

-quimiocina receptor(CCR5)

-quimiocina(Sdf1)

CD4 CD4

HIV HIV-quimiocinareceptor (CXCR4)

Macrófago Célula T auxiliar

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gene Ccr5 defectivo não são suscetíveis à infecção pelo HIV. Nos estágios tardios da infecção,os vírus podem passar a utilizar o correceptor CXCR4, ou adaptarem-se para o uso de ambosos correceptores; com este processo, o vírus pode modificar o tipo de célula que ele infectadurante a progressão da doença.

Os vírions penetram as células hospedeiras por fusão de membrana,

por formação de poros ou por rompimento da membrana

 Após o reconhecimento e a ligação à superfície da célula hospedeira, o vírus deve penetrar

essa célula e liberar seu genoma de ácido nucleico que se encontra no interior do capsídeoproteico ou do envelope lipídico. Na maior parte das vezes, o ácido nucleico liberado perma-nece complexado a algumas proteínas virais. Os  vírus envelopados penetram a célula hos-pedeira por meio da fusão com a membrana plasmática ou com a membrana endossomal,seguida de endocitose (Figura 24-24 A, B). A fusão provavelmente ocorre via um mecanismosimilar à fusão de vesículas mediada por SNARE, durante o tráfego intracelular vesicularnormal (discutido no Capítulo 13).

 A fusão é regulada tanto para garantir que as partículas virais apenas se fusionem com amembrana da célula hospedeira apropriada quanto para prevenir que elas fusionem umasàs outras. No caso de vírus como o HIV, que se fusiona à membrana plasmática sob pH neu-tro, a ligação a receptores ou a correceptores geralmente engatilha modificações conforma-

Figura 24-24 Quatro estratégias

de desempacotamento viral. (A)

Alguns vírus envelopados, comoo HIV, fusionam-se diretamenteà membrana citoplasmática dacélula hospedeira para liberarseu genoma (azul ) e proteínas docapsídeo (laranja) no interior docitosol. (B) Outros vírus envelopa-dos, como o vírus da influenza, primeiroligam-se a receptores de superfíciecelular e então engatilham a endocitosemediada por receptores. Quando o en-dossomo acidifica, o vírus envelopadofusiona com a membrana endossomal,liberando seu genoma (azul ) e proteínasdo capsídeo (laranja) no interior do ci-tosol. (C) O poliovírus, um vírus não-en-velopado, liga-se a um receptor (verde)

na superfície e, então, forma poros namembrana da célula hospedeira para aextrusão de seu genoma de RNA (azul ).(D) O adenovírus, outro vírus não--envelopado, usa uma estratégia maiscomplicada. Ele induz endocitose me-diada por receptores e então provoca adisrupção da membrana endossomal, li-berando parte do capsídeo no citosol. Ocapsídeo, finalmente, irá ancorar sobreum poro nuclear e liberar seu genomade DNA (vermelho) diretamente no inte-rior do núcleo.

CITOSOL CITOSOL CITOSOL CITOSOL

(A)

HIV (vírus da AIDS)

Endossomo

Vírus influenza

PoliovírusAdenovírus

(B)

(C)

(D)

NÚCLEO

Envelopenuclear

Fusão

Desnu-damento

EndocitoseDesnu-damento

Endocitose

Desnu-damento

Lise

Fusão edesnu-damento

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cionais na proteína do envelope viral, fazendo com que seja exposto um peptídeo de fu-são que normalmente se encontra inacessível (ver a Figura 13-16). Outro vírus envelopado,como o vírus da influenza, somente se fusiona com a membrana da célula hospedeira após aendocitose; nesse caso, geralmente é o ambiente ácido do endossomo precoce que engatilhaa mudança conformacional das proteínas virais que irá expor o peptídeo de fusão (ver Figura

24-24B). O H

+

bombeado no endossomo precoce penetra a partícula do vírus da influenzaatravés de um canal iônico e provoca um desempacotamento do ácido nucleico do vírus, oqual é diretamente liberado no interior do citosol assim que o vírus se fusiona à membranaendossômica. Em alguns vírus, o desempacotamento ocorre após a liberação no citosol. Nocaso do vírus Semliki forest, por exemplo, a ligação dos ribossomos do hospedeiro ao capsí-deo causa a separação das proteínas do capsídeo do genoma viral.

É mais difícil visualizar o mecanismo de penetração das células hospedeiras por vírusnão-envelopados, pois não está claro o processo pelo qual grandes conjuntos de proteínase de ácidos nucleicos conseguem atravessar as membranas plasmática ou endossômica.Segundo o que conhecemos dos mecanismos de penetração, os vírus não-envelopados,geralmente, formam poros na membrana celular para transportar seu genoma para o inte-rior do citoplasma, ou então provocam a rompimento da membrana do endossomo apósendocitose.

O poliovírus usa a primeira estratégia. Sua ligação ao receptor engatilha tanto uma en-docitose mediada pelo receptor quanto uma modificação conformacional na partícula viral.

 A modificação conformacional expõe uma projeção hidrofóbica em uma das proteínas docapsídeo, a qual, aparentemente, insere-se na membrana do endossomo para formar umporo. O genoma viral, então, penetra o citoplasma através desse poro, deixando o capsídeono endossomo ou na superfície da célula, ou mesmo em ambas as localizações (ver a Figura24-24C).

O adenovírus utiliza a segunda estratégia. Inicialmente é internalizado por endocitosemediada pelo receptor. Conforme o endossomo amadurece e torna-se mais ácido, o víruspassa por múltiplas etapas de desempacotamento nas quais as proteínas estruturais são re-movidas sequencialmente do capsídeo. Alguns desses passos precisam da ação da protea-se viral, que é inativa nas partículas virais extracelulares (provavelmente devido às ligaçõesdissulfeto entre as cadeias, mas é ativada no ambiente redutor do endossomo). Uma dasproteínas liberadas do capsídeo provoca a lise da membrana do endossomo, liberando osremanescentes do vírus no citosol. Este vírus modificado ancora-se no complexo do poronuclear, e o DNA genômico viral é transportado através do poro no interior do núcleo, ondeé transcrito (ver Figura 24-24D).

Nessas diferentes estratégias de penetração, o vírus explora uma grande diversidade deprocessos e de moléculas da célula hospedeira, incluindo componentes da superfície celu-lar, da endocitose mediada por receptor e das etapas da maturação endossomal e do trans-porte nuclear. Essas estratégias, mais uma vez, ilustram os mecanismos sofisticados que ospatógenos desenvolveram para utilizar a biologia celular básica de seus hospedeiros.

As bactérias penetram as células hospedeiras por fagocitose

 As bactérias são muito maiores do que os vírus e são também muito grandes para seremcaptadas por endocitose mediada por receptores. Em vez disso, elas penetram as célulasdo hospedeiro por meio de fagocitose. A fagocitose de bactérias é uma função normal dosmacrófagos. Eles patrulham os tecidos do corpo e ingerem e destroem micróbios indesejá-

 veis. Alguns patógenos, entretanto, adquiriram a capacidade de sobreviver e de replicar nointerior dos macrófagos após terem sido fagocitados.

O Mycobacterium tuberculosis é um desses tipos de patógenos. Como discutido ante-

riormente, ele causa a tuberculose, uma infecção grave dos pulmões, bastante comum entrealgumas populações urbanas. A tuberculose geralmente é adquirida por inalação da bactérianos pulmões, onde é fagocitada pelos macrófagos alveolares. Apesar de este micróbio podersobreviver e se replicar no interior dos macrófagos, os macrófagos da maioria dos indivíduossaudáveis, com a ajuda do sistema imune adaptativo, conseguem conter a infecção dentrode uma lesão denominada tubérculo. Na maior parte dos casos, a lesão fica isolada dentrode uma cápsula fibrosa que sofre calcificação, podendo facilmente ser observada em raios Xdos pulmões. Uma característica incomum do M. tuberculosis é a sua capacidade de sobrevi-

 ver por décadas dentro dos macrófagos presos nessas lesões. Mais tarde, no decorrer da vida,especialmente quando o sistema imune encontra-se enfraquecido por doenças ou fármacos,a infecção pode ser reativada, disseminando-se nos pulmões e, mesmo, em outros órgãos.

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 A tuberculose tem sido uma presença constante junto a populações humanas há mi-lhares de anos, mas outra bactéria que vive dentro dos macrófagos alveolares só foi iden-tificada como patógeno humano em 1976. A Legionella pneumophila normalmente é umparasita da ameba de água doce, que a ingere por fagocitose. Quando pequenas gotas deágua contendo L. pneumophila ou amebas infectadas são inaladas e penetram os pulmões,

a bactéria pode invadir e viver no interior dos macrófagos alveolares (Figura 24-25), osquais se assemelham, para a bactéria, a grandes amebas. Essa infecção leva a um tipo depneumonia conhecido como doença dos legionários. O patógeno pode ser eficientemen-te disseminado pelos sistemas de ar condicionado centrais, tendo em vista que as amebas,que são o hospedeiro natural dessas bactérias, são particularmente peritos na colonizaçãoe no crescimento em torres de refrigeração de condicionadores de ar; além disso, os sis-temas de refrigeração produzem microgotas de água que são facilmente inaladas. A inci-dência da doença dos legionários tem aumentado drasticamente nas últimas décadas, eos surtos frequentemente ocorrem devido a sistemas de ar condicionado de prédios co-merciais, hospitais e hotéis. Outra forma moderna de produção de aerossóis, incluindochafarizes decorativos e fontes produtoras de aerossol em supermercados, também temsido implicada em surtos desta doença.

 Algumas bactérias invadem células que normalmente não apresentam capacidade fa-gocítica. Uma das formas pelas quais as bactérias podem forçar uma célula a fagocitá-las épela expressão de uma adesina que se liga com alta afinidade a uma proteína de adesão ce-

lular normalmente usada pela célula-alvo para aderir à outra célula ou à matriz extracelular(discutido no Capítulo 19). Por exemplo, a bactéria causadora de diarreia, Yersinia pseudo-tuberculosis (parente próxima da bactéria que provoca a peste Yersinia pestis), expressa umaproteína chamada de invasina, que se liga às integrinas 1, e a Listeria monocytogenes, quecausa uma forma rara, mas grave de intoxicação alimentar, expressa uma proteína que seliga à caderina-E. A ligação dessas proteínas de adesão transmembrana funciona como umfalso sinal de formação de junção celular para a célula hospedeira e provoca a iniciação deum movimento de actina e de outros componentes do citoesqueleto para a região de ligaçãoda bactéria. Tendo em vista que a bactéria é pequena em relação ao tamanho da célula, atentativa desta última em ligar-se à superfície adesiva da bactéria resulta no englobamento ena fagocitose dessa bactéria – um processo conhecido como mecanismo de ziper de invasão(Figura 24-26 A). A similaridade entre essa forma de invasão e o processo natural de adesãocelular foi colocada em evidência com a determinação da estrutura tridimensional da in-

 vasina. Esta proteína bacteriana possui uma sequência RGD cuja estrutura é praticamenteidêntica à sequência encontrada na região do sítio ligador de integrina da proteína de matriz

extracelular laminina (discutido no Capítulo 19).Uma segunda via por meio da qual as bactérias podem invadir células não-fagocíticas

é conhecida como mecanismo de gatilho (Figura 24-26B). Este mecanismo é utilizado por vários patógenos, incluindo a Salmonella enterica, um agente de intoxicação alimentar. Estadramática forma de invasão é iniciada quando uma bactéria injeta um conjunto de molécu-las efetoras no interior da célula do hospedeiro pelo sistema de secreção tipo III. Algumasmoléculas efetoras ativam GTPases da família Rho, as quais estimulam a polimerização deactina (discutido no Capítulo 16). Outras interagem mais diretamente com elementos docitoesqueleto, interferindo nos filamentos de actina e provocando o rearranjo das proteínasde ligação cruzada. O objetivo propriamente dito é causar um ondulamento acentuado nasuperfície da célula hospedeira (Figura 24-26C), a qual produzirá grandes protrusões ricasem actina, que se elevarão, prendendo a bactéria no interior de grandes vesículas endocíti-cas denominadas macropinossomos (Figura 24-26D). A aparência geral de uma célula sendoinvadida por meio do mecanismo de gatilho assemelha-se ao ondulamento acentuado ob-servado em reposta a certos fatores de crescimento, sugerindo que as cascatas de sinalização

intracelulares semelhantes devem ser ativadas nas duas situações.

Os parasitas eucarióticos intracelulares invadem de forma ativa a

célula hospedeira

 A célula hospedeira supre a energia necessária para a internalização dos vírus pela endoci-tose mediada pelo receptor e das bactérias pela fagocitose ou macropinocitose. O patógenoé um participante relativamente passivo, em geral, puxando o gatilho para o início do pro-cesso de invasão. Ao contrário, a invasão de parasitas eucarióticos intracelulares, que sãotipicamente maiores do que as bactérias, pode ocorrer por vários caminhos complexos quegeralmente necessitam de um gasto de energia significativo por parte do parasita.

Fagócitohumano

BactériaLegionella

0,5m

Figura 24-25 Captura de Legionella

 pneumophila por um fagócito huma-

no. Esta micrografia eletrônica mostrauma estrutura pouco comum em espiralinduzida pela bactéria na superfície deum fagócito. Alguns outros patógenos,incluindo a bactéria Borrelia burgdorferi ,agente causal da doença de Lyme, o pa-tógeno eucariótico Leishmania e a leve-dura Candida albicans, podem algumasvezes invadir as células usando este tipode fagocitose espiral. (De M. A. Horwitz,Cell 36:27-33, 1984. Com permissão deElsevier.)

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Biologia Molecular da Célula 1509

O Toxoplasma gondii, um parasita de gatos que pode causar sérios problemas ao infec-tar humanos, é um exemplo bastante instrutivo. Quando este protozoário entra em contatocom a célula hospedeira, ele faz a protrusão de uma estrutura com base em microtúbuloschamada de conoide. O parasita então vagarosamente força sua entrada na célula hospe-deira. A energia necessária para a invasão parece vir unicamente do parasita, e o processorequer pelo menos uma miosina incomum (Classe XIV; ver a Figura 16-57); a despolimeri-

zação do citoesqueleto de actina no parasita, mas não a despolimerização do hospedeirointerrompe este processo. Conforme o parasita movimenta-se dentro da célula hospedeira,uma membrana derivada da invaginação da membrana plasmática da célula hospedeira ocircunda. Notavelmente, o parasita de alguma maneira remove proteínas da transmembranacircundante à medida que ela se forma para protegê-lo em um compartimento membranosofechado que não é fusionado ao lisossomo e não participa no processo de tráfego da mem-brana plasmática (Figura 24-27). A membrana especializada permite ao parasita interna-lizar metabólitos intermediários e nutrientes do citosol da célula hospedeira excluindo asmoléculas maiores. O parasita da malária invade eritrócitos usando um mecanismo similar.

O protozoário Trypanosoma cruzi, que causa a doença de Chagas, bastante prevalente noMéxico, na América Central e na América do Sul, usa uma estratégia de invasão peculiar e in-teiramente diferente. Após a ligação aos receptores da superfície celular, o parasita induz umaelevação do Ca

2+no citosol da célula hospedeira. A sinalização de Ca

2+recruta lisossomos

para o sítio de ligação do parasita, os quais se fusionam com a membrana plasmática, duranteo processo de internalização, permitindo o rápido acesso do parasita ao compartimento lisos-

somal (Figura 24-28). Como discutiremos a seguir, a maioria dos patógenos intracelulares fazo possível para evitar a sua exposição ao meio hostil e proteolítico do lisossomo, no entantoTrypanosoma cruzi usa o lisossomo como porta de entrada na célula. No compartimento li-sossômico, o parasita secreta uma enzima que remove o ácido siálico das glicoproteínas li-sossômicas e o transfere para suas moléculas de superfície, recobrindo-se dessa maneira comaçúcares da célula hospedeira. A seguir, o parasita secreta uma toxina formadora de porosque lisa a membrana lisossômica e libera o parasita no citosol celular, onde ele se prolifera.

Os microsporídios talvez usem o mais bizarro dos mecanismos ativos de invasão. Este di-minuto parasita eucariótico, intracelular obrigatório, tem um tamanho de 5 m e um geno-ma de 2.900.000 pares de nucleotídeos, estando entre os menores genomas para uma célulaeucariótica. Normalmente, os microsporídios causam doenças primariamente em insetos,

Figura 24-26 Mecanismos usados pela

bactéria para induzir fagocitose por

células não-fagocíticas. (A) O meca-nismo de zíper e (B) o mecanismo degatilho para a fagocitose induzida pelopatógeno requerem a polimerização da

actina no ponto de entrada da bactéria.(C) Micrografia eletrônica de varreduramostrando um estágio precoce dainvasão de Salmonella enterica pelo me-canismo de gatilho. Cada uma das trêsbactérias (pseudocoloridas em amarelo)é circundada por uma pequena pro-trusão de membrana. (D) Micrografiafluorescente mostrando que a protru-são maior que engolfa a Salmonella érica em actina. A bactéria é marcadaem verde e os filamentos de actina, emvermelho; por causa da sobreposiçãodas cores, a bactéria aparece em ama-relo. (De J. E. Galan, Annu. Rev. Cell. Dev.Biol . 17:53-86, 2001. Com permissão deAnnual Reviews.)

AdesinaReceptores de adesina(integrinas e caderinas)

CÉLULA HOSPEDEIRA

Filamento de actina MECANISMODE GATILHO

(B)

Polimeri-zação da actina GTPase da família Rho

Aparelho desecreção tipo III

BACTÉRIABACTÉRIA

Outros efetores do citoesqueletoMECANISMODE ZÍPER

(A)

(C) (D)5 m 20 m

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porém podem causar doenças oportunistas em pacientes com AIDS. Tendo sido adapta-dos por um longo período a um estilo de vida parasitário, eles dependem da célula hospe-deira para algumas funções metabólicas e perderam muito dos genes e estruturas celularesrequeridos para uma existência independente; por exemplo, eles não possuem mitocôndriasou peroxissomos, no entanto possuem um estranho aparato de extrusão, o tubo polar, que oshabilita a invadir as células hospedeiras. No estágio de esporo do seu ciclo de vida, resistente

às intempéries do meio, o tubo polar encontra-se espiralado em volta do núcleo ( Figura 24-

-29 A). No contato com uma célula hospedeira apropriada, o tubo polar projeta-se de umamaneira explosiva, desenrolando-se em menos de dois segundos para formar uma estruturamadura que poderá ter dez vezes o tamanho do esporo. A ponta do tubo polar em projeçãomovendo-se a uma velocidade de 100 m/seg penetra a célula hospedeira e transfere (aparen-temente por pressão osmótica) o conteúdo interno do esporo, incluindo o núcleo do microspo-rídio, no citoplasma da célula hospedeira, onde o parasita se replica para formar uma progêniede centenas (Figura 24-29B e C). Finalmente, a progênie torna-se esporos e a célula hospedeiralisa para liberá-los. Os esporos dos microsporídios são suficientemente pequenos para seremfagocitados por macrófagos, porém quando são fagocitados eles movimentam o seu tubo polardos confins do fagossomo, liberando o seu conteúdo no citosol da célula hospedeira.

Figura 24-27 O ciclo de vida do parasita intracelular Toxoplasma gondii . (A) Após a ligação à célula hospedeira, T. gondii usaseu corpo conoide para forçar sua entrada na célula hospedeira. À medida que a membrana da célula hospedeira se invagina paracircundar o invasor, o parasita de alguma maneira remove as proteínas das células hospedeiras associadas aos fagossomos ou en-dossomos normais para que não haja fusão do compartimento (mostrado em vermelho) com o lisossomo. Depois de várias rodadasde replicação, o parasita rompe o compartimento e ocorre lise celular, liberando a progênie no espaço extracelular, a partir do qualeles infectam outras células hospedeiras. (B) Micrografia óptica do T. gondii se replicando dentro de um compartimento embutido namembrana de uma célula em cultivo. (B, cortesia de Manuel Campos e John Boothroyd.)

REORIENTAÇÃO

INVASÃO

REPLICAÇÃO EMCOMPARTIMENTOENVOLVIDO POR

MEMBRANA

LISE CELULARE LIBERAÇÃODOS PARASITAS

LIGAÇÃO Núcleo

Célula hospedeira

Toxoplasmagondii 

Conoide

(A)

Parasita novacúolo

Núcleo da célulahospedeira

(B)

14 m

Figura 24-28 A invasão da célula hos-pedeira pelo Trypanosoma cruzi . Oparasita recruta lisossomos da célulahospedeira para o seu sítio de ligação.Os lisossomos fusionam-se com a mem-brana citoplasmática invaginada paracriar um compartimento intracelularconstruído quase que exclusivamentede membranas lisossomais. Após umpequeno período no vacúolo, o parasitasecreta uma proteína formadora deporos que rompe a membrana circun-dante, permitindo que o parasita esca-pe para o interior do citosol da célulahospedeira e prolifere.

2. SINAL Ca2+ RECRUTALISOSSOMOS

CITOSOL DO HOSPEDEIRO

Trypanosomacruzi 

Ca2+ Ca2+

Compartimentoderivado damembranalisossômica

4. INVASÃO 5. SECREÇÂO DA PROTEÍNA FORMADORA DE POROS

REPLICAÇÃO

1. LIGAÇÃO NOS RECEPTORESDA SUPERFÍCIE CELULAR

3. FUSÃO DOS LISOSSOMOS COMA MEMBRANA PLASMÁTICA

6. LISE DA MEMBRANACIRCUNDANTE, LIBERAÇÃO

DO PATÓGENO

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Biologia Molecular da Célula 1511

Muitos patógenos alteram o tráfego da membrana

de células hospedeiras

Os três exemplos de parasitas intracelulares discutidos há pouco levantam um problema deordem geral que abrange todos os patógenos intracelulares, incluindo vírus, bactérias e pa-rasitas eucarióticos. De alguma maneira, eles têm que negociar com o tráfego da membranada célula hospedeira. Após endocitose por uma célula hospedeira, eles se encontram em umcompartimento endossômico que normalmente se fusionaria com o lisossomo para formaro fagolisossomo. Então, eles têm que modificar o compartimento para prevenir a fusão como lisossomo, escapar do compartimento antes da fusão, escapar após a fusão mas antes deserem digeridos, ou encontrar uma maneira de sobreviver no ambiente inóspito do fagoli-

sossomo (Figura 24-30). A maioria dos patógenos usa a primeira ou a segunda estratégia. Como vimos, Trypa-

nosoma cruzi usa a via de escape, como essencialmente fazem todos os vírus (ver Figura24-24). A bactéria Listeria monocytogenes também usa tal estratégia. Ela entra na célula viamecanismo de zíper discutido anteriormente e secreta uma proteína chamada de listeriolisi-na O que forma grandes poros na membrana fagossômica, liberando as bactérias no citosolantes de serem digeridas. Uma vez no citosol, a bactéria continua secretando a listeriolisinaO, porém não destrói outras membranas plasmáticas celulares, por duas razões: primeiro,ela é 10 vezes mais ativa no pH ácido encontrado no fagossomo do que no pH neutro do ci-

Figura 24-29 Invasão da célula hospedeira por microsporídios. (A) A forma esporulada do parasita é recoberta por uma cober-

tura rígida e envolve um tubo polar es piralado que se enrola várias vezes no núcleo. (B) O tubo polar se estende de maneira explo-

siva quando o esporo entra em contato com uma célula hospedeira apropriada, que é penetrada com a liberação do núcleo e de

outros componentes do esporo no citoplasma da célula hospedeira. Os microsporídios então proliferam na célula. (C) Micrografia

imunofluorescente de um esporo do microsporídio Encephalitozoon cuniculi . As partes do esporo que estão fora do hospedeiro

estão coradas em amarelo e as partes no interior da célula estão coradas em verde. A projeção do tubo polar muda de amarelo 

para verde no ponto de entrada na célula, que não é visível. Escala 10 m. (C, de C. Franzen, Trends Parasitol . 20:275-279, 2004. Com

permissão de Elsevier.)

Vacúolo posterior

Núcleo

Membranaplasmática

Tubo polar

Polaroplasto

Coberturado esporo

ESPORO(A) (B) (C)

Citoplasma dacélula hospedeira

Tubo polar

Esporo

10 m

Figura 24-30 As escolhas enfrentadas

por um patógeno intracelular. Após aentrada na célula, geralmente por en-docitose mediada por receptores ou porfagocitose no interior de um comparti-mento delimitado por uma membrana,

os patógenos intracelulares podemusar uma de três estratégias para so-breviver e replicar. Incluídos no grupode patógenos que seguem a estratégia(1) estão todos os vírus, Trypanosomacruzi , Listeria monocytogenes e Shigellaflexneri . Dentre aqueles que seguem aestratégia (2) podemos citar Mycobac-terium tuberculosis, Salmonella enterica,Legionella pneumophila e Chlamydia tra-chomatis. Dentre aqueles que seguema estratégia (3) estão Coxiella burnetii eLeishmania .

1

2

3

ESCAPAMSOBREVIVÊNCIA NOFAGOLISOSSOMO

PREVENÇÃO DA FUSÃOCOM LISOSSOMOS

Patógeno intracelular

Célula hospedeira

Fusão com o lisossomopara formar

o fagolisossomo

Endossomoou fagossomo

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tosol; segundo, ela é rapidamente degradada no citosol pelo proteossomo celular (ver Figura6-80), que não tem acesso à listeriolisina O no fagossomo (Figura 24-31).

Se um patógeno sobreviver e replicar na célula hospedeira, em um compartimento cir-cundado por membrana, terá de modificar o tráfego da membrana da célula hospedeira, oque é feito de várias maneiras. O compartimento deverá ser modificado em pelo menos duasmaneiras: primeiro, deverá prevenir a fusão lisossomal e prover uma via para importação denutrientes do citosol da célula hospedeira. Em adição, muitos patógenos (particularmen-te os vírus) alteram o tráfego na membrana para prevenir que sejam apresentados como

antígenos estranhos na superfície da célula; do contrário, células T poderão detectar a suapresença e matar a célula hospedeira (discutido no Capítulo 25).

Diferentes patógenos possuem diferentes estratégias para alterar o tráfego de mem-brana na célula hospedeira (Figura 24-32). Como vimos, Toxoplasma gondii cria um com-partimento protegido por membrana que não participa do tráfego normal das membranasdas células hospedeiras e ainda assim especificamente permite a importação de nutrien-tes. Mycobacterium tuberculosis de alguma maneira previne o endossomo precoce que ocontém de maturar, de maneira que o endossomo nunca acidifica ou adquire as caracterís-ticas de endossomo tardio ou lisossomo. Endossomos de Salmonella enterica, ao contrário,não só acidificam como adquirem características de endossomos tardios, porém param amaturação em um estágio antes da fusão com o lisossomo. Outras bactérias parecem en-contrar refúgio em compartimentos intracelulares que são completamente distintos da viaendocítica normal. Legionella pneumophila, por exemplo, replica-se em compartimentosque são recobertos por camadas do retículo endoplasmático (RE) rugoso (Figura 24-33).Chlamydia trachomatis, patógeno bacteriano sexualmente transmitido que pode causar

cegueira ou esterilidade, é um compartimento que parece similar a uma parte da via exo-cítica. Alguns patógenos bacterianos intracelulares parecem ser capazes de manipular a

Figura 24-31 Destruição seletiva da

membrana do fagossomo pela Listeria

monocytogenes. A L. monocytogenes

liga-se caderina-E na superfície de célu-las epiteliais e induz sua internalizaçãopelo mecanismo de zíper (ver Figura 25--26A). Dentro do fagossomo, a bactériasecreta a proteína hidrofóbica listerioli-sina O, que forma oligômeros na mem-brana da célula hospedeira, criandoporos e, em consequência, provocando

rompimento da membrana. Uma vez nocitosol da célula hospedeira, a bactériainicia sua replicação e continua a secre-tar a listeriolisina O. Como a listeriolisinaO é rapidamente degradada pelosproteossomos, a membrana da célulahospedeira permanece intacta.

1 Listeria liga-se àcaderina-E

2Entrada pelomecanismo de zíper

3 Secreção delisteriolisina

4 A listeriolisina medeia o

rompimento damembrana

5 Liberação e replicaçãobacteriana

6 A listeriolisina secretada é destruídapelo proteossomo do hospedeiro

Fagossomo

Célula epitelial do hospedeiro

Caderina-E

Proteossomo

Mycobacteriumtuberculosis

Salmonellaenterica

Legionella pneumophila

Chlamydiatrachomatis

Endos-somo inicial

Endos-somo tardio

Reciclagem

Via endocíticanormal

Via exocíticanormal

RE

TGN

Golgi

?

Figura 24-32 Modificação do tráfego

de membrana da célula hospedeira

por patógenos bacterianos. Quatropatógenos bacterianos intracelulares,Mycobacterium tuberculosis, Salmonellaenterica, Legionella pneumophila e Chla-mydia trachomatis replicam-se em com-partimentos delimitados por membra-na que diferem entre si. M. tuberculosis permanece em um compartimento quetem marcas precoces do endossomo econtinua a se comunicar com a mem-brana plasmática via vesículas de trans-

porte. S. enterica se replica em um com-partimento que possui marcas tardiasdo endossomo e não se comunica coma membrana plasmática. L. pneumo- phila se replica em um compartimentoincomum que é embrulhado em váriascamadas de membrana do retículo en-doplasmático (RE) rugoso; apenas umacamada é mostrada para simplificação.C. trachomatis se replica em um com-partimento exótico que se fusiona avesículas provenientes da rede de trans Golgi (TGN, trans Golgi network ).

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Biologia Molecular da Célula 1513

localização de outras organelas delimitadas por membrana, não em contato físico diretocom o seu compartimento. Por exemplo, endossomos tardios contendo Salmonella nor-

malmente são encontrados em posição próxima e contrária ao aparelho de Golgi (Figura24-34). Os mecanismos usados por estes organismos para alterar seus compartimentosde membrana e outros aspectos do tráfego de membrana na célula hospedeira são aindapouco entendidos.

Os vírus também alteram o tráfego de membrana da célula hospedeira. Os vírus envelo-pados adquirem sua membrana de fosfolipídeos da célula hospedeira. No mais simples doscasos, proteínas codificadas pelo vírus são inseridas na membrana do RE e seguem o cami-nho normal através do aparelho de Golgi para a membrana plasmática, passando por váriasmodificações pós-tradução na rota. O capsídeo viral e o genoma são montados na membranaplasmática e brotam na superfície celular. Este é um mecanismo usado pelo HIV. Outros vírusenvelopados interagem de maneira mais complexa com a via do tráfego de membrana dacélula hospedeira (Figura 24-35). Mesmo vírus não-envelopados alteram o tráfego de mem-brana na célula hospedeira para o seu próprio proveito. Por exemplo, uma RNA-polimerasecodificada pelo vírus e associada à membrana é responsável pela replicação do poliovírus. Areplicação procede mais rapidamente se a superfície da área da membrana do hospedeiro

aumenta. Para realizar a tarefa, o vírus induz a síntese aumentada de lipídeos na célula hos-pedeira e bloqueia o transporte de membrana do RE. A membrana do RE desta forma acu-mula expandindo a área de superfície onde a replicação viral ocorre (Figura 24-36). Muitospatógenos virais e bacterianos frequentemente são encontrados em associação com autofa-gossomos, que se formam por autofagia (discutido no Capítulo 13). Na maioria dos casos, nãoestá claro se a célula hospedeira inicia a indução da autofagia como uma resposta protetoraou o patógeno invasor engatilha a autofagia para auxiliá-lo em sua replicação.

(A) (B)5 m 0,5 m

Figura 24-33 Associação da mem-

brana do retículo endoplasmático

(RE) com patógenos bacterianos in-

tracelulares. (A) Pouco tempo após ainfecção com Legionella pneumophila,o RE (verde) do hospedeiro é recrutado

para envolver a bactéria intracelular. ODNA da bactéria e o da célula hospe-deira estão marcados em vermelho. Emdestaque, a associação do RE e da bac-téria. (B) Brucella abortus, uma bactériagram-negativa causadora de abortosem bovinos, também se multiplicadentro de um compartimento associa-do ao RE. Na micrografia eletrônica, asmarcas escuras dentro do RE indicama presença da enzima específica de RE,glicose-6-fosfatase. A seta preta mostraa concentração da enzima na membra-na que recobre a bactéria, indicandoque ela fusionou-se diretamente ao RE.(A, de J. C. Kagan e C. R. Roy, Nat. Cell Biol . 4:945-954, 2002. Com permissão de

Macmillan Publishers Ltd; B, de J. Celli eJ. P. Gorvel, Curr. Opin. Microbiol . 7:93-97,2004. Com permissão de Elsevier.)

Salmonella Cisterna de Golgi

500 nm

10 m

(B)

(A)

Figura 24-34 Proximidade do aparelho de Golgi se empilha com o endossomo contendo Salmo-

nella enterica. (A) Na célula infectada, as bactérias são coloridas de verde e o aparelho de Golgi foimarcado (vermelho) com anticorpos contra uma proteína estrutural do aparelho de Golgi. (B) Micro-grafia eletrônica mostrando a aposição muito próxima de um aparelho de Golgi empilhado a umendossomo tardio contendo bactérias. (De S. P. Salcedo e D. W. Holden, EMBO J. 22:5003-5014, 2003.Com permissão de Macmillan Publishers Ltd.)

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Os vírus e as bactérias utilizam o citoesqueleto da célula

hospedeira para seus movimentos intracelulares

O citoplasma das células dos mamíferos é extremamente viscoso. Ele está repleto de orga-nelas e tem como suporte uma malha de filamentos do citoesqueleto, que inibe a difusão departículas do tamanho de uma bactéria ou de um capsídeo viral. Se um patógeno pretende

chegar a um local determinado da célula para realizar parte de seu ciclo de replicação, eledeve movimentar-se ativamente. Assim como o transporte intracelular de organelas, os pa-tógenos geralmente utilizam o citoesqueleto celular para o movimento ativo.

 Várias bactérias que replicam no citosol da célula hospedeira (em vez de uti lizaremcompartimentos delimitados por membranas) adotaram impressionantes mecanismospara movimentação que dependem de polimerização de actina. Estas bactérias, entre elasListeria monocytogenes, Shigella flexneri, Rickettsia rickettsii (que causa a febre maculosadas montanhas rochosas), Burkholderia pseudomallei (que causa melioidose) e Mycobac-terium marinum (parente próximo da bactéria da tuberculose), induzem o agrupamento ea nucleação dos filamentos de actina da célula hospedeira em um dos polos da bactéria. Ocrescimento dos filamentos gera uma força substancial capaz de fazer a bactéria avançar

Figura 24-35 Estratégias complicadas

para a aquisição do envelope viral. (A)O nucleocapsídeo do vírus herpéticoé montado no núcleo e então brotaatravés da membrana nuclear internano espaço entre as membranas interna

e externa, adquirindo assim uma capamembranosa. As partículas virais entãoaparentemente perdem a capa quandose fusionam com a membrana nuclearexterna para escapar para o citosol.Subsequentemente, os nucleocapsí-deos brotam para dentro do aparelhode Golgi e de novo brotam para o ex-terior do outro lado, adquirindo assimduas novas capas de membranas. Ovírus então finalmente brota da célulacom uma única membrana, dado quesua membrana externa se fusiona coma membrana celular. (B) O vírus da va-cínia (que é relacionado intimamentecom o vírus que causa a varíola, sendousado como vacina contra esta doença)

é montado em “fábricas de replicação”dentro do citosol, longe da membranaplasmática. A primeira estrutura mon-tada contém duas membranas, ambasadquiridas do aparelho de Golgi porum mecanismo de empacotamentoainda não bem definido. Algumas daspartículas virais são então engolfadaspelas membranas de uma segunda es-trutura delimitada por membrana; estaspartículas virais possuem um total dequatro camadas de membrana. Após afusão com a membrana plamática o ví-rus escapa das células com apenas trêscamadas de membrana.

Nucleo-

capsídeo

Núcleo

núcleo

Retículoendoplasmático

Retículoendoplasmático

Cisternade Golgi

CITOSOLESPAÇO

EXTRACELULAR

CITOSOLESPAÇO

EXTRACELULAR

(A)

(B) Vírion imaturo(2 membranas)

Vírionintracelularmaturo (2

membranas)

Vírionintracelularenvelopado(4 membranas)

Vírionextracelularenvelopado(3 membranas)Aparelho de Golgi

Membrana externado envelope nuclear

Membranaplasmática

DNA viral

DNA viral

MATURAÇÃO

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Biologia Molecular da Célula 1515

pelo citoplasma a taxas de até 1 m/seg. Novos filamentos formam-se atrás de cada bactériae, conforme ela avança, vão sendo deixados para trás como o rastro de um foguete, sendodespolimerizados novamente dentro de aproximadamente um minuto, assim que entramem contato com fatores de despolimerização presentes no citosol. Quando uma bactéria emmovimento alcança a membrana citoplasmática, ela continua sua trajetória rumo ao exte-rior, induzindo a formação de uma longa e fina protuberância que contém a bactéria em suaextremidade. Esta projeção muitas vezes será englobada por uma célula adjacente, permi-tindo que a bactéria penetre o citoplasma da célula vizinha sem a necessidade de exposiçãoao ambiente extracelular e, consequentemente, evitando o reconhecimento por anticorposproduzidos pelo sistema imune adaptativo do hospedeiro (Figura 24-37).

10 m

Célulahospedeira

Bactéria livre

Fagocitosepelo mecanismo

de zíper

Escapebacterianodo fagossomo

Nucleaçãoda actina

Montagem da caudade actina

Bactériamóvel

Formação daprotrusão

Engolfamento porcélulas hospedeiras vizinhas

(A) (B)10 m

Figura 24-36 Alterações de membra-

nas intracelulares induzidas por uma

proteína do poliovírus. Os poliovírus,assim como outros vírus de RNA de fitasimples positiva, replicam seu genomade RNA usando uma polimerase que

associa-se às membranas intracelulares.Várias das proteínas codificadas por seugenoma alteram a dinâmica de compor-tamento das organelas delimitadas pormembrana da célula hospedeira. Estasmicrografias eletrônicas mostram umacélula de rim de macaco não-transfecta-da (esquerda) e o mesmo tipo de célula(direita) expressando um transgene quecodifica a proteína 3A de poliovírus. Nacélula transfectada, o RE apresenta uminchaço, porque a proteína codificadapelo transgene inibe o tráfego do REpara o aparelho de Golgi. (De J. J. R.Doedens, T. H. Giddings Jr. e K. Kirkeg-aard, J. Virol . 71:9054-9064, 1997.)

Figura 24-37 O movi-

mento com base em

actina de Listeria mo-

nocytogenesno interior

e entre as células hospe-

deiras. Estas bactériasinduzem a montagem de

caudas ricas em actina

no citoplasma das células

hospedeiras que lhes

permitem uma rápida lo-

comoção. As bactérias mó-

veis passam de uma célula

a outra por meio da for-

mação de protuberâncias

envoltas por membrana

que são englobadas pelas

células adjacentes. (B) A

micrografia fluorescente

de bactérias em movi-

mento no interior de uma

célula que foi corada para

revelar tanto as bactérias(vermelho) quanto os fila-

mentos de actina (verde).

Notar a cauda semelhante

a um cometa formada

pelos filamentos de actina

atrás de cada bactéria em

movimento. As regiões so-

brepostas de fluorescên-

cias verdes e vermelhas

aparecem em amarelo. (B,

cortesia de Julie Theriot e

 Tim Mitchison.)

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O mecanismo molecular da polimerização de actina induzida pelo patógeno já foi deter-minado para muitas dessas bactérias. Os mecanismos são diferentes para diferentes patógenos,sugerindo que eles evoluíram de forma independente. Apesar de ambos utilizarem a mesma viametabólica da célula hospedeira que controla a nucleação de filamentos de actina, eles explo-ram pontos diferentes dessa via. Como discutido no Capítulo 16, a ativação da pequena GTPaseCdc42 por certos sinais extracelulares que leva à ativação de uma proteína denominada N-WA--Sp, que, por sua vez, ativa o complexo ARP, que pode induzir a nucleação e o crescimento deum novo filamento de actina. Em L. monocytogenes, uma proteína de superfície liga-se direta-

mente ao complexo ARP, ativando-o para iniciar a formação da cauda de actina. B. pseudomal-

tei e R. Rickettsii usam uma estratégia similar, no caso de S. flexneri, uma proteína de superfí-cie não-relacionada liga-se a N-WASp, ativando-a, e esta, por sua vez, ativará o complexo ARP.Surpreendentemente, o vírus da vacínia usa outro mecanismo para movimentação intracelularpela indução de polimerização de actina nessa mesma via metabólica (Figura 24-38).

Outros patógenos apoiam-se principalmente no transporte com base em microtúbu-los para movimentar-se dentro das células hospedeiras. Esse sistema de movimento é par-ticularmente bem-ilustrado por vírus que infectam os neurônios. Um exemplo importanteé dado pelo herpesvírus alfa neurotrópico, um grupo no qual se insere o vírus da varíola degalinhas. Os vírus entram nos neurônios sensoriais na extremidade dos seus axônios e sãotransportados para o núcleo por um sistema de transporte com base em microtúbulos, donucleocapsídeo do axônio para o núcleo neuronal, provavelmente mediado pela ligaçãode proteínas do capsídeo à proteína motora dineína. Após a replicação e a montagem nonúcleo, o vírus envelopado é transportado por microtúbulos para longe do corpo da célulaneuronal ao longo do axônio, provavelmente pela ligação a uma proteína motora quinesina(Figura 24-39). Um grande número de vírions, incluindo os da AIDS (HIV), raiva, influenza,

Figura 24-38 Mecanismos molecu-

lares para a nucleação da actina por

vários patógenos. As bactérias Listeriamonocytogenes e Shigella flexneri e ovírus da vacínia movem-se intracelu-larmente utilizando a polimerização

da actina. Para induzir a nucleação daactina, estes patógenos recrutam eativam o complexo ARP (ver Figura 16--34), embora cada patógeno use umaestratégia diferente de recrutamento. L.monocytogenes expressa uma proteínade superfície, ActA, que se liga direta-mente e ativa o complexo ARP. S. flexneri expressa uma proteína de superfície,IcsA (não-relacionada à ActA), que re-cruta a proteína sinalizadora do hospe-deiro N-WASp, que por sua vez recrutao complexo ARP e outras proteínas dohospedeiro, incluindo WIP (proteína deinteração com WASp, de WASp--interacting protein). O vírus da vacíniaexpressa uma proteína de envelope que

é fosforilada em um resíduo de tirosinapor uma proteína tirosina-cinase dacélula hospedeira. A proteína fosforiladarecruta então Nck, que liga WIP. WIP, porsua vez, liga-se a N-WASp que entãorecruta e ativa ARP. O mecanismo maiscomplicado usado pelo vírus da vacíniaé semelhante ao modo como fatoresquimiotáticos ativam o complexo ARPem células eucarióticas móveis. Apesardas diferentes estratégias molecularesusadas na montagem, as caudas deactina com a aparência de cometa for-madas pelos três patógenos são bemsemelhantes. Os patógenos se movemcom velocidade semelhante no interiorda célula infectada.

Vírus da vacíniaShigella flexneri Listeria monocytogenes

WIPWIP

ActinaComplexo ARP

Actina ComplexoARP

Actina ComplexoARP

N-WASp

N-WASp

Parede celularParede celular

IcsAActA

Duas membranas

Nck 

P

1

23

4 5 6

7 8

1

3

13

15 seg10 m

Figura 24-39 Micrografia fluorescente

de um herpesvírus movendo-se em um

axônio. Esta célula neuronal foi infecta-da com o vírus da herpes alfa, o qual foi

geneticamente projetado para expressara proteína fluorescente verde (GFP, green

fluorescent protein) fusionada a umade suas proteínas do capsídeo. Nestesegmento do axônio, várias partículasvirais podem ser observadas, e duas de-las (indicadas pelos números um e três)estão movendo-se para longe do corpoda célula, que é para a direita e fora dafotografia. (De G. A. Smith, S. P. Gross eL. W. Enquist, Proc. Natl. Acad. Sci . U.S.A. 98:3466-3470, 2001. Com permissão deNational Academy of Sciences.)

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Biologia Molecular da Célula 1517

adenovírus, parvovírus canino e vírus da vacínia (o parente do vírus da varíola usado para vacinação), conforme demonstrado, associam-se às proteínas motoras dineína ou quinesinae são diretamente movimentados ao longo dos microtúbulos em algum ponto da replicação.Uma função primária dos microtúbulos, vistos como uma autopista nas células eucarióticas,é servir como uma estrada sinalizada para o tráfego de membrana; não é surpresa que mui-tos vírus independentemente desenvolveram a habilidade de engajar-se nestes sistemas detransporte para realçar sua própria replicação.

Sabe-se que uma bactéria que se associa a microtúbulos é a Wolbachia. Este fascinantegênero inclui muitas espécies que são parasitas ou simbiontes de insetos ou de outros inver-tebrados e que vivem no citosol de cada célula do animal. A infecção é transmitida vertical-mente de mãe para filho, visto que a Wolbachia também está presente nos ovos. A bactériagarante sua transmissão em todas as células pela ligação com microtúbulos e consequen-te segregação junto ao fuso mitótico, simultaneamente com a segregação cromossômica,

quando da divisão de uma célula infectada (Figura 24-40). Como discutiremos a seguir, ainfecção por Wolbachia pode alterar significativamente o comportamento reprodutivo dosinsetos hospedeiros.

As infecções virais apropriam-se do metabolismo das células

hospedeiras

Muitas bactérias e parasitas intracelulares carregam consigo a informação genética bási-ca necessária a seu próprio metabolismo e replicação e dependem das células hospedei-ras apenas para os nutrientes. Os vírus, ao contrário, usam a maquinaria básica da célulahospedeira para a maior parte dos aspectos referentes a sua replicação: eles dependem dosribossomos da célula hospedeira para a produção de suas proteínas, e alguns utilizam asenzimas DNA e RNA-polimerase da célula hospedeira para a sua replicação e transcrição,respectivamente.

Muitos vírus codificam proteínas que modificam o aparato de transcrição ou de tradu-ção do hospedeiro com o objetivo de favorecer a síntese de proteínas virais em detrimentoda síntese das proteínas da célula hospedeira. Como resultado, a capacidade de síntese dacélula hospedeira é direcionada principalmente para a produção de novas partículas virais.O poliovírus, por exemplo, codifica uma protease que cliva especificamente o fator ligadorde TATA, componente do TFIID (ver Figura 6-18), desligando efetivamente toda a transcri-ção da célula hospedeira via RNA-polimerase II. O vírus influenza produz uma proteína quebloqueia tanto o splicing quanto a poliadenilação dos RNAs mensageiros (mRNAS) transcri-tos, que, consequentemente, não serão exportados do núcleo (ver Figura 6-40).

 A iniciação da tradução da maioria dos mRNAs da célula hospedeira depende do reco-nhecimento de seu quepe 5’ por um grupo de fatores iniciadores da transcrição (ver Figura6-72). A iniciação da tradução dos mRNAs da célula hospedeira frequentemente está inibi-da durante uma infecção viral, de tal forma que os ribossomos da célula hospedeira podemser usados de forma eficiente para a síntese de proteínas virais. Alguns genomas virais comoo da influenza, codificam endonucleases que clivam o quepe 5’ dos mRNAs da célula hos-

pedeira. Alguns inclusive usam o quepe 5’ liberado dessa maneira como iniciador para asíntese de mRNAs virais, um processo chamado de tomada rápida do quepe. Vários outrosgenomas virais de RNA codificam proteases que clivam fatores de iniciação da traduçãodeterminados. Estes vírus apoiam-se na tradução do RNA viral independente do quepe 5,’usando sítios de entrada interna de ribossomos (IRESs, internal Ribosome entry sites) (verFigura 7-108).

 Alguns poucos vírus usam a DNA-polimerase da célula hospedeira para replicar seu ge-noma. Infelizmente para o vírus, a DNA-polimerase é expressa em altos níveis apenas duran-te a fase S do ciclo celular, e a maioria das células que os vírus infectam passa grande partede seu tempo em fase G1. Os adenovírus desenvolveram um mecanismo de indução quefaz com que a célula hospedeira entre na fase S, produzindo grandes quantidades de DNA-

Figura 24-40 A associação da Wolbachia com microtúbulos. Esta micro-grafia fluorescente mostra a Wolbachia (vermelho) associada a microtúbulos(verde) de quatro fusos mitóticos no sincício de um embrião de Drosophila.Os grumos de bactérias nos polos do fuso segregarão com os cromossomos(não-visível no equador do fuso) quando estes segregarem. (De H. Kose e T. L.F. Karr, Mech. Cell Dev. 51:275-288, 1995. Com permissão de Elsevier.)

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-polimerase que então replicam o genoma viral. Seu genoma codifica proteínas que inativamtanto Rb quanto p53, dois genes supressores-chave da progressão do ciclo celular (discutidono Capítulo 17). Como era de se esperar em qualquer mecanismo que induz desregulaçãoda replicação de DNA, esses vírus frequentemente são oncogênicos.

Os patógenos podem alterar o comportamento do organismohospedeiro para facilitar a sua disseminação

Como vimos anteriormente, os patógenos normalmente alteram o comportamento da cé-lula hospedeira de modo a beneficiar a sua própria sobrevivência e replicação. De maneirasemelhante, os patógenos com frequência alteram o comportamento do organismo hos-pedeiro como um todo para facilitar a sua disseminação, como vimos no caso do Trypano-soma brucei e de Yersinia pestis. Em alguns casos, é difícil dizer se uma resposta particulardo hospedeiro é mais favorável ao hospedeiro ou ao patógeno. Os patógenos que causamdiarreia, como a Salmonella enterica, por exemplo, em geral provocam infecções autolimi-tantes, pois a diarreia pode eficientemente eliminar o patógeno. As bactérias eliminadas nofluxo, no entanto, podem disseminar a infecção, atingindo novos hospedeiros. De formaanáloga, a tosse e o espirro ajudam a eliminar o patógeno do trato respiratório, mas tambémpodem espalhar a infecção para novos hospedeiros. Uma pessoa com um resfriado comumpode produzir 20 mil microgotas em um único espirro, todas transportando rinovírus ou

coronavírus.Um exemplo assustador de modificação do comportamento do hospedeiro pelo pató-

geno é visto na raiva, já descrita por escribas egípcios há mais de três mil anos. Esse vírusreplica nos neurônios e provoca nas pessoas e nos animais infectados um comportamento“rábico”: eles se tornam incomumente agressivos e desenvolvem um forte desejo de morder.O vírus aloja-se na saliva e é passado através da lesão causada pela mordida para a correntesanguínea da vítima, transmitindo a infecção para o novo hospedeiro.

Contudo, a Wolbachia exibe o mais dramático exemplo de modificação comportamen-tal de um hospedeiro pela ação de um patógeno. Esta bactéria manipula o comportamentosexual de seu hospedeiro para maximizar sua própria disseminação. Como descrito ante-riormente, a Wolbachia é transmitida verticalmente para a prole por meio dos ovos. Se abactéria vive em um macho, entretanto, ela encontra-se em um “beco sem saída”, pois osparasitas são excluídos dos espermatozoides. Em algumas espécies de Drosophila, a Wol-bachia modifica o espermatozoide de seu hospedeiro de tal forma que ele poderá fertilizarapenas os ovos das fêmeas infectadas. Esta modificação cria uma vantagem reprodutiva para

as fêmeas infectadas sobre as fêmeas não-infectadas, de tal modo que a proporção médiade carreadores de Wolbachia aumenta. Em outras espécies hospedeiras, uma infecção porWolbachia mata o macho e poupa a fêmea, aumentando o número de fêmeas na populaçãoe, assim, aumentando o número de indivíduos que podem produzir ovos para passar a in-fecção. Em alguns poucos tipos de vespas, a infecção por Wolbachia permite que as fêmeasproduzam ovos que se desenvolvem por partenogênese, sem a necessidade de fertilizaçãopor espermatozoides; nessas espécies, os machos foram completamente eliminados. Paraalguns de seus hospedeiros, a Wolbachia tornou-se um simbionte indispensável, e a cura dainfecção causa a morte do hospedeiro. Em pelo menos uma situação os seres humanos estãousando esta dependência: o nematódeo que causa a cegueira dos rios na África (uma filária)é difícil de eliminar com medicamentos antiparasitários, mas quando as pessoas acometidaspela cegueira dos rios são tratadas com antibióticos que curam a infecção por Wolbachia doparasita, a infecção de nematódeos também é eliminada.

Os patógenos evoluem rapidamente A complexidade e a especificidade das interações moleculares entre os patógenos e os seushospedeiros sugerem que a virulência deve ser uma característica difícil de ser adquiridapor mutações ao acaso. Mesmo assim, novos patógenos estão surgindo constantemente, epatógenos antigos estão sob constante modificação, de tal modo que as infecções comunstornam-se difíceis de ser tratadas. Os patógenos apresentam duas grandes vantagens quepermitem sua rápida evolução. Primeiro, eles replicam rapidamente, fornecendo uma gran-de quantidade de matéria-prima para a atuação da seleção natural. Se os humanos e oschimpanzés apresentam uma diferença de 2% entre suas sequências genômicas após apro-

 ximadamente 8 milhões de anos de divergência evolutiva, o poliovírus atinge a marca de2% de mudanças no seu genoma em cinco dias, o tempo aproximado necessário para que

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Biologia Molecular da Célula 1519

o vírus passe da abertura bucal humana e chegue ao intestino. Segundo, pressões seletivasencorajam a rápida variação genética. O sistema imune adaptativo do hospereiro e os mo-dernos fármacos antimicrobianos, os quais são destruidores de patógenos que falham emmudar, são as principais fontes dessas pressões seletivas.

Em muitos casos, mudanças no comportamento humano exacerbam a emergência e a

evolução de novas moléstias infecciosas. Nas cidades medievais, as condições de vidas sujei-tas à sujeira e ao superpovoamento, por exemplo, contribuíram para a disseminação da bac-téria Yersinia pestis nos humanos a partir das pulgas habitantes de seus hospedeiros roedo-res que transmitiam a peste. A tendência do homem moderno de viver em grandes cidadescom grande densidade populacional criou a oportunidade para os organismos infecciososiniciarem epidemias, como a influenza, a tuberculose e a AIDS, que não se disseminariamtão rapidamente se a população humana fosse esparsa. Viagens aéreas podem em princípiopermitir que um hospedeiro, recentemente infectado, mas assintomático, transporte umaepidemia para uma população não exposta dentro de poucas horas ou dias.

A variação antigênica nos patógenos ocorre por mecanismos

múltiplos

Um exemplo em miniatura da constante batalha entre a infecção e a imunidade é o fenôme-no da variabilidade antigênica. Uma importante resposta imune adaptativa contra muitos

patógenos é a produção de anticorpos que reconhecem especificamente os antígenos desuperfície dos patógenos (discutido no Capítulo 25). Muitos patógenos escapam da elimi-nação completa pelos anticorpos por meio da modificação desses antígenos no curso dainfecção. Alguns parasitas eucarióticos, por exemplo, passam por uma sequência progra-mada de rearranjo de genes que codificam os antígenos de sua superfície. O exemplo maisimpressionante ocorre em tripanossomos africanos, como o Trypanosoma brucei, o para-sita agente da doença do sono, disseminado por um inseto vetor (T. brucei é um parasitapróximo do T. cruzi – ver a Figura 24-28 – mas ele sofre replicação extracelular em vez dereplicar no interior das células). O T. brucei encontra-se envolto por um único tipo de glico-proteína chamada de glicoproteína variante-específica (VSG, variant-specífic glycoprotein),que induz uma resposta de anticorpos protetores que rapidamente elimina os parasitas. Ogenoma do tripanossomo, no entanto, contém aproximadamente mil genes de VSG, cadaum codificando uma VSG com propriedades antigênicas distintas. Apenas um desses genesé expresso por vez, por meio de cópia para uma região de expressão ativa do genoma. Orearranjo gênico que copia novos alelos no sítio de expressão repetidamente muda o gene

Vsg expresso. Dessa forma, alguns poucos tripanossomos que expressam uma VSG alte-rada escapam da eliminação mediada pelos anticorpos específicos, replicam e são a cau-sa da recorrência da doença, levando ao estabelecimento de uma infecção crônica cíclica(Figura 24-41). Muitos outros parasitas eucarióticos, incluindo o protozoário Plasmodium

x1.000 VSGa

Sítio deexpressãoa f b c

x1.000 VSGb

x1.000 VSGc

(A)

(B)

Infecção

Tempo (semanas)

Anti-VSGa

VSGa

VSGb

VSGc

Anti-VSGb Anti-VSGc

    N    ú   m   e   r   o    d   e   p   a   r   a   s    i   t   a   s

    N    í   v

   e    l    d   e   a   n   t    i   c   o   r   p   o   s

Genes Vsg inativos

Gene b copiadopara o sítio deexpressão

Gene c copiadopara o sítiode expressão

Figura 24-41 Variação antigênica emtripanossomos. (A) Existem cerca de1.000 genes Vsg distintos em Trypano-soma brucei , por apenas um sítio paraa expressão do gene Vsg. Um geneinativo é copiado no sítio de expressãopor conversão gênica, onde é agora ex-presso. Cada gene Vsg codifica uma pro-teína (antígeno) de superfície diferente.Raros eventos de comutação permitemrepetidamente ao tripanossomo mudaro antígeno de superfície expresso. (B)Uma pessoa infectada com tripanos-somos expressando uma VSGa produzuma resposta protetora de anticorpos,que liquida a maioria dos parasitasexpressando o antígeno. No entanto,

uma pequena proporção dos parasitaspode ter comutado para expressarVSGb, podendo agora proliferar até queanticorpos anti-VSGb liquide-os. Nessetempo, no entanto, alguns parasitas te-rão comutado para VSGc, e assim o ciclose repetirá indefinidamente.

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 falciparum, que causa a malária, e o fungo Pneumocystis carinii, que causa pneumonia empacientes com AIDS, usam estratégias muito semelhantes para escapar da resposta imuneadaptativa. Patógenos bacterianos também podem mudar rapidamente seus antígenos desuperfície. As espécies do gênero Neisseria são as campeãs. Estes cocos gram-negativos po-dem causar meningites e doenças sexualmente transmitidas, que empregam um surpreen-

dente número de mecanismos para promover a variação antigênica. Primeiro, eles passampor recombinação genética, muito semelhante à descrita para patógenos eucarióticos, queos capacita a variar (com o tempo) a proteína pilina usada para fazer as fímbrias da superfí-cie celular: por recombinação de múltiplas cópias silenciosas de genes variantes de pilina, em um único lócus de expressão eles podem expressar dezenas de versões de proteínaslevemente diferentes. Segundo, muitas proteínas da superfície celular, assim como muitasdas enzimas biossintéticas envolvidas na síntese de carboidratos da superfície celular, pos-suem seus níveis de expressão continuamente alterados por erros inesperados ao acaso ereparo dos nucleotídeos repetidos na região promotora ou nas sequências codificadorasdos seus genes, que modulam a transcrição ou a tradução. Neisseria, por exemplo, possuicerca de dez tipos diferentes de genes que codificam variantes da família Opa de proteínasde membranas externas, sendo que cada uma realiza variações ao acaso dos níveis de ex-pressão de proteínas e, dessa maneira, cria um excesso de composições diferentes de pro-teínas de superfície para confundir o sistema imune adaptativo do hospedeiro. Análise, desequências do genoma de diversas espécies de Neisseria sugerem que mais de 100 genes

podem variar os seus níveis de expressão usando algum tipo de variação deste mecanismo.Terceiro, Neisseria é capaz de captar DNA do meio ambiente e incorporá-lo nos seus geno-mas, contribuindo assim para sua extraordinária variabilidade. Finalmente, Neisseria nãopossui vários sistemas de reparo de DNA presentes em outras bactérias como a E. coli, e apossibilidade de adquirir novas mutações é mais alta do que a média. Com todos estes me-canismos trabalhando em conjunto, não é surpresa que até o momento não se desenvolveuuma vacina efetiva contra infecções por Neisseria.

 Apesar de a Neisseria ser um exemplo extremo, muitos outros patógenos bacterianosempregam um ou mais destes mecanismos para aumentar sua variação antigênica. Alémdisso, vários estudos mostraram que patógenos bacterianos isolados de pacientes com sin-tomas da doença são muito mais passíveis de ter defeitos nas suas vias de reparo de DNA doque isolados do mesmo patógeno provenientes de reservatórios do meio ambiente.

 A evolução rápida em bactérias frequentemente acontece portransferência horizontal  de genes, e não por mutação pontual. A transferência horizontal em bactérias em geral émediada por bacteriófagos ou pela aquisição de plasmídeos. A bactéria adquire com facili-

dade ilhas de patogenicidade e plasmídeos virulentos de outras bactérias (ver Figura 24-5).Uma vez adquirido um novo grupo de genes relacionados à virulência, ela pode rapida-mente estabelecer-se como agente de uma nova doença epidêmica humana. A Yersiniapestis, por exemplo, é uma bactéria endêmica de ratos e de outros roedores e apareceupela primeira vez na história humana em 542 D.C., quando a cidade de Constantinopla foidevastada pela peste. A comparação de sequência da Y. pestis com sua aparentada maispróxima, a Y. pseudotuberculosis, agente de uma doença diarreica grave, sugere que a Y.pestis pode ter emergido como uma linhagem distinta não mais do que poucos milharesde anos atrás, não muito antes de sua devastadora emergência como agente causador dapeste negra.

Replicação propensa a erros dominou a evolução viral

 A replicação propensa a erros, mais do que rearranjos genômicos, é a principal responsávelpela variação antigênica dos vírus. Os genomas retrovirais, por exemplo, adquirem na média

uma mutação pontual a cada ciclo de replicação, porque a transcriptase reversa que produzDNA a partir do RNA viral não pode corrigir os erros de incorporação incorreta de nucleo-tídeos. Uma infecção típica por HIV não-tratada produzirá genomas de HIV com todas aspossíveis mutações pontuais. De algum modo, a alta taxa de mutações é benéfica para opatógeno. Pelo processo microevolutivo da mutação e seleção dentro de cada hospedeiro,a maioria dos vírions muda com o tempo de uma forma eficiente para infectar macrófagospara uma forma mais eficiente para infectar células T, como descrito anteriormente (ver Fi-gura 24-23). De maneira semelhante, uma vez que o paciente é tratado com um antirretro-

 viral, o genoma viral pode rapidamente mutar e ser selecionado para resistência ao fármacoutilizado no tratamento. Se, no entanto, a taxa de erro da transcriptase reversa for muito alta,mutações deletérias poderão acumular-se rapidamente para a sobrevivência viral. Deste

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Biologia Molecular da Célula 1521

modo, uma variante que obtém sucesso em um hospedeiro não necessariamente poderá seespalhar para outros, dado que um vírus mutado talvez não seja capaz de infectar um novohospedeiro. Para o HIV-1, podemos estimar a extensão do impedimento pelo exame da di-

 versidade de sequências entre diferentes indivíduos infectados. Notável é que um terço dasposições dos nucleotídeos na sequência codificante do genoma viral não varia, e sequências

nucleotídicas em algumas áreas do genoma, como o gene env, podem variar em torno de30%. Esta extraordinária plasticidade genômica complica bastante as tentativas de obtençãode uma vacina contra o HIV, e poderá também levar à rápida emergência de cepas resisten-tes a fármacos (discutido adiante), assim como a rápida emergência de novas cepas de HIV.Comparações das sequências entre várias amostras de HIV e o vírus muito semelhante daimunodeficiência símia (SIV) de uma variedade de espécies de macacos diferentes sugeremque o tipo mais virulento de HIV, HIV-1, talvez tenha passado dos chimpanzés para os huma-nos por volta de 1930 (Figura 24-42).

Os vírus da influenza são uma importante exceção à regra de que as mutações propen-sas a erros dominaram a evolução viral. Eles são incomuns, pois seus genomas consistemem muitas (em geral oito) fitas de RNA. Quando duas amostras do vírus da influenza in-fectam o mesmo hospedeiro, as fitas das duas cepas podem se recombinar para formar umnovo tipo de vírus da influenza. Antes de 1900, a cepa do vírus da influenza que infectava oshumanos causava uma doença branda; uma cepa diferente do vírus da influenza infectavaaves como galinhas e patos, porém raramente o homem. Em 1918, uma variante virulenta do

 vírus da influenza de aves (pássaros) cruzou a barreira natural entre as espécies para infectaro homem, engatilhando a epidemia catastrófica de 1918, chamada de gripe espanhola, quematou entre 20 e 50 milhões de pessoas no planeta, mais do que a I Guerra Mundial. Subse-quentemente, a pandemia de influenza foi engatilhada por recombinação, na qual um novosegmento de DNA de uma forma aviária do vírus substituiu um ou mais segmentos do DNA

 viral que governa a resposta imune humana contra o vírus (Figura 24-43). Tais eventos derecombinação permitiram que o novo vírus se replicasse rapidamente e se espalhasse na po-pulação humana imunologicamente desprotegida. Geralmente, dentro de dois a três anos, apopulação humana desenvolve imunidade para o novo tipo recombinante do vírus, e comoresultado a taxa de infecção diminui para um estágio estacionário. Em anos ditos normais, ainfluenza é uma doença branda em adultos saudáveis, porém pode colocar em risco de mor-te as crianças e os idosos. Nos anos de pandemia, no entanto, especialmente na pandemiade 1918, adultos saudáveis pareciam incomumente suscetíveis à infecção letal por influenza,talvez devido ao dano tecidual causado por uma resposta imune exacerbada. Dado que oseventos recombinatórios não são previsíveis, não é possível saber quando a próxima pande-

mia de influenza ocorrerá e quão severa ela será.

Os patógenos resistentes a fármacos são um problema crescente

Se algumas atividades humanas, como viagens aéreas, têm favorecido a disseminação decertas doenças infecciosas, os avanços na saúde pública e na medicina têm evitado ou ali-

 viado o sofrimento causado por muitas outras. As vacinas efetivas e os programas mundiaisde vacinação eliminaram a varíola e reduziram enormemente a poliomielite, além de fazercom que muitas doenças infecciosas típicas da infância, como a caxumba e o sarampo, se-

 jam hoje raridade nos países ricos e desenvolvidos. No entanto, ainda existem no mundointeiro muitas doenças infecciosas graves, como a malária, para as quais não existe vacinadisponível.

O desenvolvimento de fármacos curativos, em vez de fármacos que previnam as infec-ções, teve também um grande impacto na saúde humana. A classe de medicamentos demaior sucesso é a dos antibióticos, que matam as bactérias. A penicilina foi um dos pri-

meiros antibióticos usados para o tratamento de infecções em humanos. Esse antibiótico foiintroduzido na clínica no momento exato, evitando milhares de mortes de indivíduos infec-tados nos campos de batalha da II Guerra Mundial. Dado que as bactérias formam um reinodistinto dos eucarióticos que elas infectam, muito da sua maquinaria básica para replicação,transcrição, tradução de DNA e metabolismo fundamental difere de seus hospedeiros. Taisdiferenças nos permitiram achar fármacos antibacterianos que especificamente inibem taisprocessos em bactérias sem afetá-los no hospedeiro. A maioria dos antibióticos usados paratratar infecções bacterianas são pequenas moléculas que inibem a síntese macromolecularem bactérias por visar enzimas bacterianas que são distintas das enzimas dos eucariotos ouestão envolvidas em vias metabólicas, como biossíntese da parede, que estão ausentes nohomem (Figura 24-44 e Tabela 6-3).

SIV de chimpanzé

HIV-2

SIV de mangabei (Cercocebus atys)

SIV do macaco verde africano

SIV de macaco Sykes

SIV de mandril

Grupo HIV-1 O

Grupo HIV-1 M

Figura 24-42 Diversificação do HIV-1,

do HIV-2 e de cepas relacionadas de

SIV. A distância genética entre qual-quer duas amostras isoladas é encon-trada seguindo o caminho mais curtoque os relacionados na árvore. HIV-1 édividido em dois grupos, maior (M) e fo-rasteiro (O). O grupo HIV-1 é o responsá-vel pela epidemia global da AIDS. HIV-1ainda é subdividido em vários subtipos(de A a G, não nomeados na figura). Osubtipo B é dominante na América ena Europa; B, C e E são dominantes naÁsia; e todos os subtipos são encontra-

dos na África. Pelo menos dois vírus demacaco, chimpanzé e mandril são maisrelacionados ao HIV-1 do que ao HIV-2,sugerindo que HIV-1 e HIV-2 surgiramde maneira independente. É estimadoque a divergência de HIV-1 e SIV dechimpanzé tenha ocorrido pelos anosde 1930. A árvore foi construída a partirda sequência nucleotídica do gene Gag,usando um banco de dados contendocerca de 16.000 sequências do vírus,isoladas ao redor do planeta.

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 A rápida evolução dos patógenos, no entanto, permitiu que as bactérias-alvo desenvol- vessem resistência aos antibióticos muito rapidamente, sendo o espaço de tempo entre aintrodução de um novo antibiótico na prática médica e o aparecimento de linhagens resis-tentes de não mais do que poucos anos. Do mesmo modo, a resistência a fármacos é umfenômeno comum entre vírus, quando as infecções são tratadas com agentes antivirais. Apopulação viral em uma pessoa infectada com HIV tratada com o inibidor da transcriptasereversa AZT, por exemplo, irá desenvolver resistência ao fármaco em um espaço de poucosmeses. O protocolo atual de tratamento de infecções por HIV envolve o uso simultâneo detrês fármacos, o que minimiza a possibilidade de desenvolvimento de resistência.

Existem três estratégias gerais pelas quais os patógenos desenvolvem resistência aosfármacos. Os patógenos podem (1) alterar o alvo molecular do fármaco, de tal forma que estenão seja mais sensível ao fármaco, (2) produzir uma enzima que destrói o fármaco, ou (3)

evitar a chegada do fármaco ao alvo, por exemplo, por um bombeamento ativo do fármacopara o exterior do patógeno (Figura 24-45).Geralmente, tendo o patógeno encontrado uma estratégia efetiva de resistência a fár-

maco, os novos genes adquiridos ou mutados que conferem resistência são disseminadosna população de patógenos e podem até mesmo ser transferidos para patógenos de outrasespécies que sejam tratados com o mesmo fármaco. O antibiótico vancomicina, bastanteefetivo e caro, por exemplo, tem sido usado como uma última opção de tratamento em mui-tas infecções hospitalares graves de origem bacteriana que já tenham se mostrado resisten-

Figura 24-43 Modelo para a evolu-

ção da cepa pandêmica do vírus da

influenza por recombinação. O vírusda influenza A é um patógeno naturalde pássaros, particularmente avesaquáticas, e está sempre presente na

população de aves selvagens. Antesde 1900, o vírus da influenza causavainfecções brandas no homem. Em 1918,uma forma particularmente virulentado vírus cruzou a barreira de espéciesdos pássaros para os humanos e causouuma epidemia global devastadora. Estaamostra foi denominada H1N1, comreferência à forma específica dos seusantígenos principais, hemaglutinina(HA ou H) e neuraminidase (NA ouN). Alterações no vírus geraram umaamostra menos virulenta, e a ascensãoda imunidade adaptativa na populaçãohumana preveniu a pandemia de conti-nuar em estações subsequentes, apesarde a cepa H1N1 continuar causando

casos sérios da doença anualmente, so-bretudo em crianças e idosos. Em 1957,uma nova pandemia emergiu quandoos genes codificantes de HA e NA foramsubstituídos por genes equivalentes deum vírus de aves (barras verdes); a novacepa (designada H2N2) não era sensívelaos anticorpos gerados pelas pessoaspreviamente infectadas pela cepa H1N1da influenza. Em 1968, outra pandemiafoi engatilhada quando o gene HA deH2N2 foi substituído por outro genede um vírus de aves; o novo vírus foidesignado H3N2. Em 1977, houve umare-emergência do vírus H1N1, que tinhasido previamente substituído quase quecompletamente pela cepa N2. Informa-ção das sequências moleculares sugereque esta pandemia menor foi causadapor uma liberação acidental de umaamostra de influenza conservada emlaboratório desde 1950. Como indicado,a maioria das infecções humanas porinfluenza, hoje, é causada por cepasH1N1 e H3N2.

Os aviários trazem o homem paraum contato próximo com um gran-de número de pássaros que podemtransportar diferentes versões do vírusinfluenza. Os vírus de aves ocasional-mente podem causar uma doença fatalem humanos com contato direto compássaros infectados (chamada de gripedas aves), porém até o momento estesvírus não adquiriram a capacidade deespalhar-se efetivamente de homempara homem. Monitorar o cruzamentode espécies e tentar predizer a origemda próxima epidemia séria de influenzapermanece um desafio significante paraa saúde pública.

H2N2

H1N1

H3N?

H1N1 H1N1 H2N2 H3N2

H1N1

H1N1

H3N2

todos os 8genes

transferidos

3 genes transferidos 2 genes transferidos

Vírus da gripedas aves

Humano Humano Humano

Humano

1918

(gripe espanhola)

1957

(gripe asiática)

1950

(cepa de laboratório)

1977

(gripe russa)

1968

(gripe de Hong Kong)

INFECÇÕESDE GRIPEHUMANA

HOJE

DNA

mRNA

Membrana celular

Polimixinas

DNA-girase

Quinolonas

RNA-polimerase

RifampicinaSíntese da paredecelular

VancomicinaPenicilinasCefalosporinas

Síntese proteica, inibi-

dores do ribossomo 50S

Eritromicinacloranfenicol

Síntese proteica, inibi-dores do ribossomo 30S

TetraciclinaEstreptomicinaBiossíntese de ácido fólico

Trimetoprim

Sulfonamidas

Figura 24-44 Alvos dos antibióticos. Apesar do número de antibióticos em uso clínico, eles possuemalvos limitados, realçados em amarelo. Alguns antibióticos representativos de cada classe estão listados.Quase todos os antibióticos usados para tratar infecções se encontram em uma ou outra categoria. Amaioria inibe a síntese proteica bacteriana ou a síntese da parede bacteriana.

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Biologia Molecular da Célula 1523

tes à maioria dos outros antibióticos conhecidos. A vancomicina interfere em um passo da

 via de biossíntese da parede celular bacteriana, por meio da ligação a uma região da cadeiade peptideoglicano em crescimento, evitando que ela sofra ligações cruzadas com outras ca-deias (ver Figura 24-4). Pode ocorrer resistência se a bactéria sintetizar outro tipo de paredecelular, usando subunidades diferentes que não liguem a vancomicina. O tipo mais eficientede resistência à vancomicina depende de um transposon contendo sete genes; os produtosdestes genes trabalham em conjunto, identificando a presença da vancomicina, desligandoa via normal de síntese da parede bacteriana e, finalmente, produzindo uma parede celulardiferente. Apesar de a união destes sete genes em um único transposon ter sido uma árduatarefa evolutiva (o aparecimento de resistência à vancomicina levou 15 anos, bem mais doque o espaço típico de um ou dois anos), o transposon pode agora ser facilmente transmiti-do para muitas outras espécies de bactérias patogênicas.

De onde são originários os genes de resistência? Algumas vezes quando as bactérias es-tão sob pressão seletiva devido à exposição a fármacos, genes de resistência surgem por mu-tações espontâneas e se expandem dentro de uma população. Em muitos casos, no entanto,

eles aparecem no genoma de um patógeno como um novo segmento de DNA adquirido portransferência horizontal, frequentemente transportados por transposons ou plasmídeos re-plicativos. Ao contrário das células eucarióticas, as bactérias comumente trocam materiaisgenéticos que cruzam a fronteira de espécies.

Genes de resistência a fármacos adquiridos por transferência horizontal parecem seoriginar de reservatórios ambientais, onde possuem um papel importante na competiçãoentre os micro-organismos. Quase todos os antibióticos usados hoje para tratar infecçõesbacterianas não são criações sintéticas de químicos; ao contrário, a maioria deles são produ-tos naturais produzidos por fungos ou bactérias: a penicilina, por exemplo, é um produto dofungo Penicillium, e mais de 50% dos antibióticos correntemente usados na clínica são pro-duzidos pelo gênero gram-positivo Streptomyces. Acredita-se que estes micro-organismosproduzam compostos antimicrobianos como armas na sua competição com outros micro-organismos no meio ambiente. Muitos destes compostos provavelmente existem na Terrapor pelo menos centenas de milhões de anos, o que é um amplo período de tempo paraoutros micro-organismos, assim como para os produtores, terem desenvolvido mecanismos

de resistência. Testes às escuras de bactérias isoladas de amostras do solo que nunca foramdeliberadamente expostas aos antibióticos revelam que tais bactérias são tipicamente re-sistentes a sete ou oito antibióticos amplamente usados na prática clínica. Quando micro-organismos patogênicos enfretam a pressão seletiva estabelecida pelo tratamento com an-tibióticos, eles podem aparentemente apelar para esta ampla e essencialmente inesgotávelfonte de material genético para adquirirem resistência.

 Assim como muitos outros aspectos das doenças infecciosas, o problema de resistênciaa fármacos tem sido exacerbado pelo comportamento humano. Muitos pacientes ingeremantibióticos no tratamento de doenças virais que não são afetadas por estes medicamen-tos, incluindo influenza, resfriados, dor de garganta e otites. O uso persistente e inadequadode antibióticos nesses casos pode, finalmente, levar ao desenvolvimento de resistência ao

Figura 24-45 Três mecanismos gerais

da resistência aos antibióticos. (A) Bac-térias sensíveis imersas em um fármaco(triângulos vermelhos) que se liga a umaenzima crítica e a inibe (verde-claro) se-rão mortas devido à inibição da enzima.

(B) Bactérias com enzima-alvo alteradanão mais ligam ao fármaco, e assim so-brevivem e proliferam. Em muitos casos,ocorre resistência devida a mutaçõespontuais no gene que codifica a prote-ína-alvo. (B) Bactérias que expressamum gene de resistência (Fator R) quecodifica uma enzima (verde-escuro) quedegrada ou se liga covalentemente aofármaco sobrevivem e proliferam. Algu-mas bactérias resistentes, por exemplo,sintetizam as enzimas -lactamases,que clivam a penicilina e compostossemelhantes. (D) Outras bactérias re-sistentes expressam ou super-regulamuma bomba de efluxo que ejeta o fár-maco do citoplasma bacteriano usando

energia derivada da hidrólise do ATP oudo gradiente eletroquímico que cruza amembrana-plasmática bacteriana. Algu-mas bombas de efluxo como a bombade efluxo TetR que confere resistênciaà tetraciclina, são específicas para umúnico fármaco; outras, chamadas debombas de efluxos para resistência amúltiplos fármacos (MDR, multi-drug

resistance), são capazes de exportar umaampla variedade de fármacos que sãodiferentes estruturalmente e podem tor-nar uma bactéria resistente a um grandenúmero de antibióticos diferentes emum único passo.

Antibiótico Enzimacrítica

Enzima crítica alterada

(A) Antibiótico mata a bactéria tipo selvagem

(B) R es is tê ncia a o a nt ibiótico (C) Re sistê ncia a o a ntibiótico (D) R es istê ncia a o antibiótico

Produto do gene R Bomba de efluxo

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antibiótico na flora normal; essa resistência pode subsequentemente ser transmitida aospatógenos. Por exemplo, vários surtos de diarreia causada por Shigella flexneri resistente aantibióticos originam-se dessa forma. O problema é especialmente grave em países ondeos antibióticos são adquiridos sem a necessidade de uma receita médica, como é o caso doBrasil, onde mais de 80% das linhagens de S. flexneri encontradas em pacientes infectados

são resistentes a quatro ou mais antibióticos. Os antibióticos também são usados de formainadequada na agricultura e na pecuária, onde são comumente empregados como aditivosna alimentação dos animais para promover seu crescimento e saúde. Um antibiótico bas-tante semelhante à vancomicina comumente era utilizado na alimentação de bovinos naEuropa. O aparecimento de resistência na flora normal desses animais é a explicação maisaceita para a origem da resistência à vancomicina, o que atualmente ameaça a vida de pa-cientes hospitalizados.

Dado que a aquisição de resistência a fármacos é quase inevitável, é crucial que conti-nuemos a desenvolver tratamentos inovadores para doenças infecciosas. Devemos tambémtentar retardar o aparecimento da resistência a fármacos.

Resumo

Todos os patógenos compartilham a habilidade de interagir com as células hospedeiras por meio

de mecanismos que promovam a replicação e a disseminação do patógeno; no entanto, existe

uma grande diversidade de interações hospedeiro-patógeno. Os patógenos frequentemente co-lonizam o hospedeiro pela adesão ou pela invasão através das superfícies epiteliais que reco-

brem os pulmões, o intestino, a bexiga e outras superfícies de contato direto com o ambiente. Os

patógenos intracelulares, incluindo todos os vírus, muitas bactérias e protozoários, replicam no

interior da célula hospedeira, a qual foi invadida por uma série de mecanismos diferentes. Os

vírus dependem muito da endocitose mediada por receptores para a invasão da célula hospe-

deira, ao passo que as bactérias exploram a fagocitose e as vias de adesão celular; em ambos os

casos, a célula hospedeira providencia a maquinaria e a energia. Os protozoários, ao contrário,

empregam estratégias características de invasão que, normalmente, necessitam de um gasto me-

tabólico significativo por parte do invasor. Uma vez dentro da célula hospedeira, os patógenos

devem procurar um nicho favorável para sua replicação, o que fazem frequentemente alterando

o tráfego de membrana da célula hospedeira e explorando o citoesqueleto para a movimentação

intracelular. Além de alterar o comportamento de células hospedeiras individuais, os patógenos

em geral alteram o comportamento do organismo como um todo, com o objetivo de favorecer 

sua disseminação para outros hospedeiros. Os patógenos evoluem com rapidez, normalmente

ocorrendo o aparecimento de novas doenças infecciosas e a aquisição, por parte de agentes dedoenças infecciosas antigas, de novos mecanismos de escape das tentativas humanas de trata-

mento, de prevenção e de erradicação.

BARREIRAS CONTRA INFECÇÃO E O SISTEMA IMUNEINATO

Os seres humanos estão expostos a milhões de patógenos potenciais diariamente por meiode contato, de ingestão e de inalação. Nossa capacidade de evitar uma infecção depende, emparte, de nosso sistema imune adaptativo (discutido no Capítulo 25), que é capaz de lembrarcontatos prévios com patógenos específicos e destruí-los quando acontece um novo ataque.

 As respostas imunes adaptativas, no entanto, são de desenvolvimento lento em uma pri-meira exposição a um novo patógeno, visto que os clones específicos de células B e T devemser ativados e expandidos; assim, pode ser necessária uma semana ou mais para que esseprocesso seja efetivo. Em contraste, uma única bactéria, com tempo médio de duplicaçãode uma hora, poderá produzir aproximadamente 20 milhões de células-filhas e desencadearuma infecção plena, em um único dia. Assim, durante as primeiras horas críticas e os pri-meiros dias de exposição a um novo patógeno, dependemos de nosso sistema imune inato para nossa proteção. Como discutido no Capítulo 25, dependemos também do sistema imu-ne inato para ativar a resposta imune adaptativa.

 As respostas do sistema imune inato não são específicas para patógenos em particular,como o são as respostas imunes adaptativas. Geralmente, existem três linhas da defesa imu-ne inata que podem prevenir uma infecção ou pará-la no começo, antes do sistema imuneadaptativo ser ativado. A primeira delas são as barreiras físicas e químicas que previnem o

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Biologia Molecular da Célula 1525

fácil acesso de micro-organismos ao interior do corpo humano. As barreiras incluem a gros-sa camada de células queratinizadas mortas que forma a superfície de nossa pele, as junçõescompactas entre as células epiteliais, o pH ácido do estômago e os componentes da camadade muco que inibem a colonização e mesmo matam bactérias patogênicas. A flora normaltambém tem um papel protetor nas superfícies corporais contra invasores por competir pelo

mesmo nicho ecológico, e assim limitar a colonização. A segunda linha de defesa inata compreende as respostas intrínsecas da célula pelasquais uma célula individual reconhece que está sendo infectada e toma medidas paradanificar ou matar o invasor. A maioria das células que ingerem uma bactéria por fago-citose mediada pelo patógeno (ver Figura 24-26), por exemplo, imediatamente posicio-na o fagossomo para ser fusionado ao lisossomo, expondo o organismo invasor a umabarragem de enzimas digestivas. Outro mecanismo de defesa intrínseco é a habilidadeda célula hospedeira em degradar RNA de dupla-fita que é um intermediário comum dareplicação viral; as células infectadas podem mesmo degradar um RNA de fita simplesque possua identidade de sequência com a fita dupla gatilho. Esse mecanismo não ape-nas serve como uma defesa intrínseca efetiva contra muitas infecções virais, mas tambémpermite que biólogos celulares manipulem a expressão gênica usando a técnica de RNAde interferência (RNAi).

 A terceira linha da defesa imune inata depende de um conjunto de proteínas e célulasfagocíticas que reconhecem características conservadas do patógeno e se ativam rapida-

mente para ajudar a destruir o invasor. Entre elas estão as células fagocíticas profissionais,como os neutrófilos e macrófagos, as células matadoras naturais e o sistema do complemen-to. Enquanto o sistema adaptativo em termos evolutivos tem menos de 500 milhões de anos eestá confinado a vertebrados, a resposta imune inata opera nos vertebrados e invertebrados,assim como em plantas, e os mecanismos básicos que a regulam são semelhantes nesses or-ganismos. Como discutido no Capítulo 25, a resposta imune inata em vertebrados também érequerida para ativar a resposta imune adaptativa pela produção de sinais moleculares queajudam a chamar o sistema imune adaptativo para a ação.

A superfície epitelial e as defensinas ajudam a prevenir a infecção

Em vertebrados, a pele e outras superfícies epiteliais, incluindo as que recobrem os tratosrespiratório, intestinal e urinário (Figura 24-46), fornecem uma barreira física entre a parteinterna do corpo e o mundo exterior. Uma camada de muco fornece uma proteção adicionalcontra danos de origem microbiana, química e mecânica do interior das superfícies epite-

liais; muitos anfíbios e peixes possuem uma camada mucosa cobrindo suas peles. A cober-tura de muco viscoso é feita primariamente de mucina secretada e outras glicoproteínas, efisicamente ajuda a prevenir a adesão de patógenos ao epitélio, assim como facilita tambéma limpeza de patógenos pelo batimento dos cílios nas células epiteliais (discutido no Capí-tulo 23).

 A camada de muco também contém substâncias que matam patógenos ou inibem suaproliferação. Entre os mais abundantes estão os peptídeos antimicrobianos chamados dedefensinas , que são encontrados em todos os animais e plantas. Eles geralmente são cur-tos (12 a 50 aminoácidos), positivamente carregados e possuem domínios hidrofóbicos ouanfipáticos. Eles compreendem uma família diversa com um amplo espectro de atividadesantimicrobianas, incluindo a habilidade de matar ou inativar bactérias gram-positivas egram-negativas, fungos (incluindo leveduras), parasitas (incluindo protozoários e nematoi-des) e até vírus envelopados como o HIV. As defensinas são as mais abundantes proteínasem neutrófilos (ver adiante), que as usa para matar patógenos fagocitados.

É ainda incerta a maneira como as defensinas matam patógenos. Uma possibilidadeé usarem seus domínios anfipáticos ou hidrofóbicos para se inserirem nas membranas deseus alvos e dessa forma romper a integridade da membrana. Um pouco de sua seletividadepara patógenos e não para as células do hospedeiro pode vir da preferência por membranasque não possuem colesterol. Após o rompimento da membrana do patógeno, os peptídeospositivamente carregados também podem interagir com componentes internos da célulabacteriana, incluindo DNA. Por causa da natureza relativamente inespecifíca, da interaçãoentre peptídeos antimicrobianos e os micróbios que eles matam é difícil para os patógenosadquirirem resistência a eles. Assim, em princípio, as defensinas e outros peptídeos antimi-crobianos podem ser úteis como agentes terapêuticos para combater infecções, sozinhos ouem combinação com outros fármacos tradicionais.

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Células humanas reconhecem características

conservadas dos patógenos

Micro-organismos algumas vezes ultrapassam as barreiras epiteliais. Depende então dossistemas imune inato e adaptativo entrarem em ação para reconhecê-los e destruí-los sem

afetar o hospedeiro. Consequentemente, o sistema imune deve ser capaz de distinguir opróprio do não-próprio. Discutiremos no Capítulo 25 como o sistema imune adaptativofaz isso. O sistema imune inato repousa sobre o reconhecimento de tipos particulares demoléculas que são comuns a muitos patógenos, mas ausentes no hospedeiro. As molécu-las associadas a patógenos (chamadas de patógeno-associadas ou imunoestimulantes as-sociados a micróbio) engatilham dois tipos de resposta imune inata – resposta inflamató-ria (discutida a seguir) e fagocitose por fagócitos profissionais (neutrófilos e macrófagos)e por células dendríticas, que ativam células T do sistema imune adaptativo (discutido noCapítulo 25). Ambas as respostas inflamatória e fagocítica podem ocorrer rapidamente,mesmo que o hospedeiro nunca tenha sido previamente exposto a um patógeno em par-ticular.

Os imunoestimulantes associados a micróbio são de vários tipos, vendo que a maiorianão é exclusiva para patógenos, mas são encontrados em muitas bactérias benignas, assimcomo as prejudiciais. O início da tradução em bactérias difere do início da tradução em eu-cariotos pelo fato de uma metionina formilada em vez de uma metionina regular normal-

mente ser usada como primeiro aminoácido. Sendo assim, qualquer peptídeo contendoformilmetionina na porção N-terminal deve ser de origem bacteriana. Peptídeos contendoformilmetionina atuam como potentes quimioatraentes para neutrófilos, que migram rapi-damente para a fonte de tais peptídeos e engolfam a bactéria que os está produzindo (verFigura 16-101).

Em adição, moléculas que não ocorrem em hospedeiros multicelulares compõem a su-perfície externa de muitos micro-organismos, e estas moléculas também agem como imu-noestimulantes. Elas incluem o peptideoglicano da parede celular e o flagelo da bactéria,assim como lipopolissacarídeos (LPSs) em bactérias gram-negativas (Figura 24-47) e ácidos

Figura 24-46 Defesas epiteliais contra

a invasão microbiana. (A) Micrografiaóptica de uma secção longitudinalatravés da parede do intestino delgadomostrando três vilosidades. As célulascaliciformes secretoras de muco estão

coradas em magenta. A camada pro-tetora de muco recobre a superfícieexposta das vilosidades. Na base dasvilosidades localizam-se as Criptas, ondeas células epiteliais proliferam. (B) Au-mento da cripta, corada por um métodopara mostrar os grânulos das células dePaneth (escarlate). Estas células secre-tam grandes quantidades de peptídeosantimicrobianos e defensinas no lúmenintestinal. (B, cortesia de H. G. Burkitt,de P. R. Wheater, Functional Histology,2nd ed.London: Churchill-Livingstone,1987.)

Vilosidades

Célulasabsortivas

da borda

Célulascaliciformes

secretorasde muco

Cripta

(A)

100 m 50 m(B)

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Biologia Molecular da Célula 1527

teicoicos em bactérias gram-positivas (ver Figura 24-4B). Eles também incluem moléculasda parede celular de fungos, incluindo manana, glucana e quitina. Muitos parasitas eucarió-ticos também contêm componentes únicos de membranas que atuam como imunoestimu-lantes, incluindo glicosifosfatidilinositol em Plasmodium. Para evitar uma resposta imunedesnecessária, o hospedeiro tem de ser capaz de distinguir entre um imunoestimulante pro-duzido por patógenos e as moléculas muito semelhantes ou idênticas liberadas pela floranormal. Em muitos casos, diferenças na concentração do imunoestimulante podem ser osuficiente; uma concentração crônica baixa da molécula pode ser monitorada pelo sistemaimune sem provocar uma reação, enquanto o repentino aumento na concentração ou noaparecimento do imunoestimulante em áreas normalmente estéreis do corpo engatilharáuma resposta imune inata.

Sequências curtas no DNA bacteriano ou viral também podem agir como imunoesti-mulantes. O culpado é o “motivo CpG”, que consiste no dinucleotídeo não-metilado CpGflanqueado por dois resíduos de purinas e dois 3’ pirimidinas. Esta sequência curta é pelomenos 20 vezes menos comum no DNA de vertebrados do que em DNA bacteriano ou viral,

o que pode ativar uma resposta imune inata. As várias classes de imunoestimulantes associados a micróbio frequentemente ocorremem padrões repetidos, os quais são deste modo chamados de padrões moleculares associa-dos a patógenos (PAMPs, pathogen-associated molecular paterns). Muitos tipos de receptoresdedicados no hospedeiro, coletivamente chamados de receptores de reconhecimento de

padrões, reconhecem tais padrões. Estes receptores incluem receptores solúveis no sangue(componentes do sistema do complemento, que será discutido adiante) e receptores embu-tidos na membrana, externos ou internos à célula do hospedeiro (incluindo membros da família dos receptores semelhantes a Toll , considerados mais tarde). Os receptores associadosà célula têm duas funções: eles iniciam a fagocitose do patógeno e ativam um programa de

Figura 24-47 Estrutura do lipopolissacarídeo (LPS). À esquerda está representada a estrutura tridimensional da molécula de LPS,com os ácidos graxos mostrados em amarelo e os açúcares em azul . A estrutura molecular da base de LPS é mostrada à direita. Aâncora de membrana hidrofóbica é feita de dois açúcares glicosamina ligados e atracados a três fosfatos e seis caudas de ácidosgraxos. Ligada a esta estrutura básica está uma longa cadeia de açúcares, em geral bastante ramificada. Este esquema mostra o tipomais simples de LPS que permite a sobrevivência de E. coli ; ele possui apenas duas moléculas de açúcar na cadeia, e ambas são iguais(3-desoxi-D-mano-ácido octulossônico). Na posição indicada por uma seta, as bactérias gram-negativas tipo selvagem também li-gam um oligossacarídeo cerne feito de 8 a 12 açúcares e um antígeno O longo, que é composto de uma unidade de oligossacarídeosrepetida até 40 vezes. Os açúcares que compõem o oligossacarídeo cerne e o antígeno O são diferentes de uma espécie de bactériapara outra e mesmo entre diferentes linhagens da mesma espécie. Todas as formas de LPS são altamente estimulantes de uma forteresposta imune inata.

OH

O

OHP

OH

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HO

HO

HOOH

OO

O

HO

HO

HO

HO

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HO

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HOO O

Folha externa damembrana externa

Sítio de ligação para oligossacarídeocerne e polissacarídeo antígeno O

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expressão gênica na célula do hospedeiro responsável pela resposta imune inata. Alguns doscomponentes do sistema do complemento também ajudam na fagocitose e, em alguns ca-sos, na morte direta do invasor, como discutido a seguir.

A ativação do complemento marca os patógenos para fagocitose

ou para lise

O sistema do complemento consiste em aproximadamente 20 proteínas solúveis interati- vas, produzidas principalmente pelo fígado, que circulam no sangue e nos fluidos extrace-lulares. A maior parte destas proteínas é inativa até o momento inicial de uma infecção. Elasforam inicialmente identificadas pela capacidade de amplificar e “complementar” a açãodos anticorpos, mas alguns dos componentes do complemento são receptores de reconhe-cimento de padrões que podem ser ativados diretamente por imunoestimulantes associa-dos a patógeno.

Os componentes precoces do complemento são ativados primeiro. Existem três gruposde componentes do complemento, pertencentes a três vias distintas de ativação do com-plemento – a via clássica, a via de lectina e a via alternativa. Os componentes iniciais docomplemento das três vias atuam localmente para ativar C3, que é o componente-chave dosistema do complemento (Figura 24-48). Indivíduos com deficiência de C3 são suscetíveis ainfecções bacterianas repetidas. Os componentes precoces e o C3 são proenzimas, as quais

são ativadas em sequência por clivagem proteolítica. A clivagem de cada proenzima ativa,em série, o próximo componente que gerará uma serino-protease, a qual cliva a próximaproenzima da série e assim por diante. Como cada enzima ativada cliva várias moléculas dapróxima proenzima da cadeia, a ativação dos componentes iniciais gera uma cascata proteo-lítica amplificadora.

 Várias dessas clivagens liberam um pequeno fragmento de peptídeo ativo biologica-mente que atrai células fagocíticas como neutrófilos e um fragmento maior que se liga àmembrana. A ligação do fragmento maior a uma membrana celular, geralmente a mem-brana do patógeno, auxilia na passagem para a reação subsequente. Desse modo, a ativa-ção do complemento fica bastante restrita à superfície particular da célula na qual o pro-cesso teve início. O fragmento grande de C3, chamado de C3b, liga-se covalentemente àsuperfície do patógeno, e então recruta fragmentos de C2 e C3 clivados para formar umcomplexo proteolítico (C4b, C2b, C3b) que catalisa os passos subsequentes na cascata docomplemento. Receptores específicos nas células fagocíticas que aumentam a capacidadedessas células de fagocitarem o patógeno também reconhecem C3b. Adicionalmente, nas

células B reconhecem C3b, que é a razão de patógenos recobertos por C3b serem especial-mente eficientes na estimulação das células B para fazer anticorpos (discutido no Capítulo25). O fragmento menor de C3 (chamado de C3a), assim como os fragmentos de C4 e C5

Figura 24-48 Os principais estágios na

ativação do complemento pelas vias

clássica, de lectina e alternativa. Nastrês vias as reações de ativação do com-plemento em geral acontecem na su-

perfície de um micróbio invasor, comoas bactérias, e leva à clivagem de C3. C1-C9, lectina ligadora de manose (MBL), eserina-protease associada a MBL (MASP)e os fatores B e D são os componentescentrais do sistema do complemento;vários outros componentes regulam osistema. Os componentes precoces sãomostrados dentro de setas em cinza,enquanto os componentes tardios sãovistos dentro de setas em marrom.

C5C6C7C8C9

MBL

MASP

C2

C4

CLIVAGEM DE C3

C4

C1

C2D

B

VIACLÁSSICA

VIA DELECTINA

FORMAÇÃO DEPOROS E LISE

VIAALTERNATIVA

COBERTURA DOMICRÓBIO E INDUÇÃO

DE FAGOCITOSE

RECRUTAMENTODE CÉLULAS

INFLAMATÓRIAS

ESTÍMULO DASRESPOSTAS IMUNES

ADAPTATIVAS

Ligação deanticorpos

Superfíciesdo patógeno

Ligação demanana

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Biologia Molecular da Célula 1529

(ver Figura 24-48), atuam independentemente como sinais de difusão para promover res-postas inflamatórias por meio do recrutamento de linfócitos e de fagócitos para a regiãoda infecção.

Moléculas de anticorpos tipo IgG ou IgM (discutidas no Capítulo 25) ligadas à superfí-cie do micróbio ativam a via clássica. A lectina ligadora de manana, a proteína que inicia

a segunda via de ativação do complemento, é uma proteína sérica que forma arranjos deseis unidades de cabeças ligadoras de carboidratos, reunidas em torno de uma haste centralsemelhante à estrutura em pedúnculo do colágeno. Este arranjo liga-se especificamente aresíduos de manose e de fucose da parede celular da bactéria, os quais apresentam espa-çamento e orientação que permitem um encaixe perfeito dos seis sítios ligadores de car-boidratos, fornecendo um excelente exemplo de receptor de reconhecimento de padrões.Esses eventos iniciais de ligação nas vias clássica e de lectina provocam o recrutamento ea ativação dos componentes precoces do complemento. Moléculas na superfície dos pató-genos frequentemente ativam a via alternativa; ativação da via clássica ou da via de lectinatambém ativa a via alternativa, formando uma alça de retroalimentação que amplifica osefeitos das vias clássica e de lectina.

 As células hospedeiras produzem várias proteínas e modificações de superfície queprevinem a reação do complemento que se realize na superfície. A molécula mais im-portante é a porção carboidrato ácido siálico, um constituinte comum de glicoproteínase glicolipídeos da superfície celular. Dado que os patógenos geralmente não possuem

tais componentes de superfície, eles são marcados para a destruição, enquanto as célulashospedeiras são preservadas. Pelo menos um patógeno, Neisseria gonorrhoeae, a bacté-ria que causa a doença sexualmente transmissível gonorreia, desenvolveu a habilidadede explorar tais características de autoproteção do hospedeiro, recobrindo-se com umacamada de ácido siálico e efetivamente se escondendo do sistema de ativação do com-plemento.

C3b imobilizado à membrana, produzido por qualquer das três vias, engatilha uma cas-cata de reações ulteriores que leva à montagem dos componentes tardios do complementopara formar os complexos de ataque à membrana (Figura 24-49). Estes complexos são mon-tados na membrana do patógeno, perto do sítio de ativação de C3, e possuem uma aparênciacaracterística em micrografias eletrônicas coradas negativamente, onde podem ser vistosformando poros aquosos através da membrana (Figura 24-50). Por esta razão, e tambémporque eles perturbam a estrutura da bicamada na sua vizinhança, eles fazem a membrana

 vazar e podem, em alguns casos, causar a lise da célula microbiana, semelhante às defensi-nas mencionadas anteriormente.

 As propriedades autoamplificável, inflamatória e destrutiva da cascata do complemen-to tornam essencial que os componentes-chave sejam rapidamente inativados após seremgerados para garantir que o ataque não se espalhe pelas células hospedeiras vizinhas. A ina-tivação é alcançada de pelo menos duas maneiras. Primeiro, proteínas específicas inibido-ras no sangue ou na superfície das células hospedeiras encerram a cascata por clivagem ouligação a certos componentes uma vez ativados por clivagem proteolítica. Segundo, muitosdos componentes ativados na cascata são instáveis; a menos que se liguem imediatamentea outro componente da cascata ou a uma membrana próxima, eles são rapidamente inati-

 vados.

Figura 24-49 Montagem dos com-

ponentes tardios do complemento

para formar o complexo de ataque à

membrana. Quando C3b é produzidopor uma das três vias de ativação docomplemento, ele se torna imobilizado

na membrana, onde recruta C4b e C2bpara formar um complexo proteolítico.Este complexo então cliva o primeirodos componentes tardios, C5, paraproduzir C5a (não-mostrado) e C5b,que permanece frouxamente ligado aC3b (não-mostrado) e rapidamente seassocia com C6, C7 para formar C567,que então se liga via C7, firmemente àmembrana, como ilustrado. Ao comple-xo é adicionado uma molécula de C8para formar C5678. A ligação de umamolécula de C9 a C5678 induz umamudança conformacional em C9 queexpõe uma região hidrofóbica e faz comque C9 se insira na bicamada lipídica dacélula-alvo, o que começa uma cadeia

de reações na qual C9 alterado liga umasegunda molécula de C9, que se ligaa outra molécula de C9, e assim pordiante. Deste modo, uma cadeia de mo-léculas C9 forma um grande canal trans-membrana na membrana do patógeno.

C5bC5b

C5b

C9

C9

n

CITOSOL

Canal transmem-brana aquoso

Membrana plasmática

C8

C8

C7C6

C7C6

C6 C7

(A)

10 nm

(B)

Figura 24-50 Micrografia eletrônica

de lesões na membrana plasmática

de um eritrócito negativamente cora-

do. A lesão em (A) é vista na face, en-quanto que em (B) é vista de lado comoum canal transmembrana aparente.O corante negativo preenche o canal,que então parece negro. O eritrócito foideliberadamente sensibilizado para sersuscetível à lise pelo complemento. (DeR. Dourmashkin, Immunology 32:205-212, 1978. Com permissão de BlackwellPublishing).

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As proteínas semelhantes a Toll e NOD pertencem a uma antiga

família de receptores de reconhecimento de padrões característicos

 Vários receptores de reconhecimento de padrões da superfície de células de mamíferos,responsáveis pelo engatilhamento da resposta imune inata, são membros da família do

receptor semelhantes a Toll (TLR, Toll-like receptor ). Toll em Drosophila é uma proteínatransmembrana com um domínio extracelular consistindo em uma série de repetiçõesricas em leucina (ver Figura 15-82). Foi originalmente identificado como uma proteínaenvolvida no estabelecimento da polaridade dorso-ventral durante o desenvolvimento deembriões de mosca (discutido no Capítulo 22). No entanto, Toll também está envolvidona resistência da mosca adulta a infecções por fungos. A via intracelular de transdução desinal ativada downstream de Toll, quando a mosca é exposta a um fungo patogênico, leva àtranslocação da proteína NF-B (discutida no Capítulo 15) para o interior do núcleo, ondeesta ativa uma série de genes, incluindo aqueles que codificam defensinas antifúngicas. As repetições ricas em leucina encontradas em Toll e TLR são motivos estruturais que sãoúteis para ligar uma ampla variedade de ligantes. Ao lado do seu papel no reconhecimentode patógenos em animais e plantas, proteínas com repetições ricas em leucina têm umpapel importante em transdução de sinal, reparo de DNA e adesão célula-célula e célula--matriz.

Nos humanos existem pelo menos dez TLRs, tendo sido demonstrado que vários deles

participam ativamente no reconhecimento de imunoestimulantes de bactéria, vírus, fun-gos e parasitas. Diferentes ligantes ativam TLRs diferentes: TLR4, por exemplo, reconhecelipopolissacarídeo (LPS) da membrana externa de bactérias gram-negativas, TLR reconheceDNA CpG, e TLR reconhece a proteína do flagelo. A maioria dos TLRs está na superfície ce-lular; eles são abundantes, por exemplo, na superfície de macrófagos, células dendríticas eneutrófilos, assim como na superfície de células epiteliais que revestem os tratos respiratórioe intestinal. Outros, no entanto, estão associados a membranas intracelulares, onde podemdetectar patógenos intracelulares. Os TLRs atuam como um sistema de alarme para alertaraos sistemas de resposta imune inato e adaptativo que uma infecção irá ocorrer. Em ma-míferos, eles ativam uma variedade de vias de sinalização intracelulares que por seu turnoestimulam a transcrição de centenas de genes, especificamente aqueles que promovem aresposta inflamatória (discutido adiante) e ajudam a induzir uma resposta imune adaptativa(Figura 25-51).

Uma segunda família de receptores de reconhecimento de padrões é exclusivamenteintracelular. Eles são chamados de proteínas NOD e também possuem motivos repetidos

Figura 24-51 A ativação de macrófa-

gos por lipopolissacarídeo (LPS). OLPS é ligado à proteína ligadora de LPS(LBP, LPS-Binding protein) no sangue, eeste complexo liga-se ao receptor CD14que se encontra ancorado por GPI àsuperfície do macrófago. A seguir, estecomplexo ternário ativa o receptor 4semelhante a Toll ( TLR4), que por suavez ativa múltiplas vias de sinalizaçãodownstream . Como resultado, quatroproteínas reguladoras de genes são

ativadas, incluindo NFB, um complexoAP1 de Jun e Fos, e dois fatores regula-dores de interferons, IRF3 e IRF5. Essaresposta transcricional, forte e multi-facetada resulta na produção de inter-ferons e citocinas pró-inflamatórias,incluindo quimiocinas que recrutamvárias células brancas do sangue parao local da ativação de macrófagos,refletindo o perigo significante que omacrófago percebe quando encontrauma alta concentração de LPS.

CITOSOL

SANGUE

LPS

CD14

Proteína ligadora de LPS (LBP)

Receptor 4 semelhante a Toll (TLR4)

Membrana plasmática do macrófago

Âncora GPI

NFBativada

Jun/Fos

IRF5 IRF3

TRANSCRIÇÃO DEGENES PRÓ-INFLAMATÓRIOS

TRANSCRIÇÃO DEGENES INDUZÍVEIS POR INTERFERON

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Biologia Molecular da Célula 1531

ricos em leucina. Funcionalmente, são semelhantes aos TLRs, porém reconhecem um con- junto distinto de ligantes, incluindo componentes da parede bacteriana. As formas alélicasdiferentes de NODs e TLRs que um indivíduo expressa desempenham uma parte importanteem influenciar a suscetibilidade a certas doenças infecciosas; polimorfismos particulares

em TLR4 e TLR5, por exemplo, correlacionam-se com susceptibilidade a Legionella pneumo-phila, e membros de famílias que expressam um alelo particular de NOD2 têm uma grandee crescente chance de sofrer da doença de Crohn, uma doença inflamatória do intestinodelgado que, ao que parece, é engatilhada por uma infecção bacteriana.

Proteínas relacionadas a Toll, TLRs e NODs estão aparentemente envolvidos com aimunidade inata em todos os organismos multicelulares. Em plantas, proteínas com repe-tições ricas em leucina e com domínios homólogos à porção citosólica dos TLRs são reque-ridas para resistência aos patógenos virais, bacterianos e fúngicos (Figura 24-52). Assim,pelo menos duas famílias de proteínas que funcionam na imunidade inata – as defensinase as famílias TLR/NOD – parecem ser evolutivamente muito antigas, talvez de muito antesda divisão entre animais e plantas, há mais de um bilhão de anos. Sua conservação durantea evolução ressalta a importância da resposta imune inata na defesa contra patógenos mi-crobianos.

As células fagocíticas caçam, englobam e destroem os patógenos

Em todos os animais, tanto nos vertebrados quanto nos invertebrados, o reconhecimen-to de invasores microbianos normalmente é seguido por seu rápido englobamento pelascélulas fagocíticas. As plantas, no entanto, não possuem este tipo de resposta imune inata.Nos vertebrados, os macrófagos são fagócitos profissionais que residem em todos os te-cidos do corpo e são especialmente abundantes em áreas que apresentam alto potencialde sofrer infecção, como os tratos respiratório e intestinal, por exemplo. Também estãopresentes em grande número nos tecidos conectivos, no fígado e no baço. Estas célulasde longa duração patrulham os tecidos do organismo e estão entre as primeiras célulasa estabelecer contato com os micróbios invasores. Pertencentes à segunda maior famíliade células fagocíticas nos vertebrados, os neutrófilos são células de curta duração, abun-dantes no sangue, mas normalmente ausentes em tecidos saudáveis normais. Eles sãorapidamente recrutados para a região de infecção tanto por macrófagos ativados quantopor moléculas como os peptídeos contendo formilmetionina liberados pelos próprios pa-tógenos e pelos fragmentos de peptídeos de componentes do complemento. Neutrófilos

podem detectar quimioatraentes derivados do complemento em concentrações tão bai- xas quanto 10-11 M.

Os macrófagos e os neutrófilos apresentam uma grande diversidade de receptores desuperfície celular que permitem a estas células reconhecer e englobar os patógenos. En-tre esses receptores encontram-se os receptores de reconhecimento de padrões, como osTLRs, receptores para anticorpos produzidos pelo sistema imune adaptativo e receptorespara o componente C3b do complemento. A ligação do ligante em qualquer um dessesreceptores induz a polimerização de actina na região de contato com o patógeno, fazendocom que a membrana citoplasmática do fagócito envolva o patógeno e englobe-o em umgrande fagossomo delimitado por membranas (Figura 24-53). Apesar de algumas bac-

Figura 24-52 Doença microbiana

em uma planta. As folhas de tomateaqui mostradas estão infectadas com ofungo de folhas Cladosporium fulvum.Resistência a esse tipo de infecçãodepende do reconhecimento de uma

proteína fúngica por receptores da célu-la hospedeira que são estruturalmenterelacionados a TLRs. (Cortesia de Jona-than Jones.)

10m

Figura 24-53 Fagocitose. Esta micro-grafia eletrônica de varredura mostraum macrófago em vias de destruir cincocélulas vermelhas sanguíneas que fo-ram recobertas com um anticorpo con-tra glicoproteínas de superfície. (De E. S.Gold et al., J. Exp. Med . 190:1849-1856,1999. Com permissão de RockefellerUniversity Press.)

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térias poderem ativamente induzir uma célula hospedeira, como uma célula epitelial, afagocitá-las como um mecanismo para invasão da célula (ver Figura 24-25) a fagocitosepor macrófagos ou neutrófilos em geral leva à morte do patógeno ingerido. Não é sur-preendente que alguns patógenos usem mecanismos específicos para evitar a fagocitosepor macrófagos ou neutrófilos. Uma estratégia é secretar uma grossa camada de polissa-

carídeos, chamada de cápsula, que bloqueia o acesso de componentes do complementoà superfície bacteriana e ainda torna fisicamente difícil para a célula fagocítica se ligar eenglobar a bactéria. Outra estratégia usada por Yersinia pestis (o agente causal da pestebubônica), por exemplo, é secretar uma toxina dentro do macrófago via sistema de secre-ção tipo III (ver a Figura 24-8) que rompe a montagem do citoesqueleto de actina e assimprevine a fagocitose.

Uma vez que o patógeno tenha sido fagocitado, os macrófagos ou os neutrófilos uti-lizam uma incrível diversidade de armas para matá-lo. Exposição aos imunoestimulantesderivados de micróbios ou a sinais químicos produzidos pela resposta imune contra o pa-tógeno aumenta o poder de fagocitar e de matar do fagócito. Esta exposição é considerada“ativada” porque o fagócito fica em um estado de alerta alto, no qual não apenas é maisefetivo na fagocitose e na liquidação de patógenos, como também libera citocinas paraatrair mais células brancas para o sítio da infecção. A localização do armamento do fa-gócito é prontamente visível no microscópio óptico ou eletrônico como organelas densasdelimitadas por membranas chamadas de  grânulos. Estes derivativos especializados do

lisossomo se fusionam com o fagossomo liberando enzimas como a lisozima e hidrolasesácidas que degradam a parede celular e proteínas do patógeno. Os grânulos contêm tam-bém defensinas, os peptídeos antimicrobianos que representam 15% do total de proteínasnos neutrófilos. Em adição, os fagócitos montam complexos NADPH-oxidase na membra-na do fagolisossomo, que catalisa a produção de compostos altamente tóxicos, incluindosuperóxido (O2

-) hipoclorito (HOCl, o ingrediente ativo da clorofina), água oxigenada eradicais hidroxila. Um aumento transiente no consumo de oxigênio pelas células fagocí-ticas, chamado de explosão respiratória, acompanha a produção dos compostos tóxicos.Não são somente os compostos derivados do oxigênio altamente reativos que lesionam opatógeno na armadilha do fagolisossomo. A ação da NADPH-oxidase transporta elétronspara o fagolisossomo e induz um movimento compensatório de K+ em conjunto com o elé-tron cujo efeito imediato é a diminuição do pH. O pH alto no fagolisossomo ativa um gru-po potente de proteases neutras, as quais o pH baixo nos grânulos lisossomais conservouinativas antes da fusão com o fagossomo. As proteases neutras rapidamente destroem opatógeno encarcerado no fagolisossomo. Enquanto os macrófagos geralmente sobrevivem

à matança e vivem para matar de novo, os neutrófilos em geral não sobrevivem. Neutrófilosmortos e morrendo são o maior componente do pus que se forma em feridas agudamenteinfectadas. A coloração esverdeada do pus ocorre devido à presença em abundância noneutrófilo da enzima contendo cobre mieloperoxidase, que é um dos componentes ativosna explosão respiratória.

Se um patógeno é grande demais para ser fagocitado (p. ex., um grande parasita comoum nematódeo), um grupo de macrófagos, de neutrófilos ou de eosinófilos (discutidos noCapítulo 23) vai juntar-se em torno do invasor. Eles vão secretar suas defensinas e outrosprodutos lisossomais por exocitose e liberar os produtos tóxicos do espasmo respiratório(Figura 24-54). Esta barreira geralmente é suficiente para a destruição do patógeno. Em al-guns casos foi observado que neutrófilos ejetam grandes quantidades de sua cromatina como conteúdo dos seus grânulos. O DNA ejetado com suas histonas ligadas forma uma redepegajosa que prende as bactérias próximas, prevenindo o escape (Figura 24-55). Dado quesua função precípua é se sacrificar para matar os patógenos invasores, os neutrófilos nãohesitam em usar todas as armas disponíveis incluindo o seu próprio DNA, para cumprir a

tarefa.

Figura 24-54 Eosinófilos atacando uma larva de esquistossomo. Os pa-rasitas grandes, como os vermes, não podem ser ingeridos por fagócitos.Quando a larva é recoberta por anticorpos ou por complemento, no entanto,os eosinófilos e as outras células brancas do sangue podem reconhecê-lo eatacá-lo coletivamente. (Cortesia de Anthony Butterworth.)

Larva de esquistossomo

15m

Eosinófilos

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Biologia Molecular da Célula 1533

Os macrófagos ativados contribuem para a resposta

inflamatória nos sítios da infecção

Quando um patógeno invade um tecido, ele quase sempre provoca uma resposta inflama-

tória. Esta resposta é caracterizada por dor, vermelhidão, calor e inchaço no local da in-fecção (os médicos reconheceram estes quatro sinais da inflamação, em latim dolor, rubor,

calor e turgor, há milhares de anos). Os vasos sanguíneos se dilatam e se tornam permeá- veis aos fluidos e às proteínas, levando a um inchaço localizado e ao acúmulo de proteínassanguíneas que auxiliam na defesa, como os componentes da cascata do complemento. Aomesmo tempo, as células epiteliais que revestem os vasos sanguíneos locais são estimuladase expressam moléculas de adesão celular (discutido no Capítulo 19) que facilitam a ligação eo extravasamento de células brancas do sangue, como neutrófilos, linfócitos e monócitos (osprecursores sanguíneos dos macrófagos).

Enquanto os macrófagos em geral morrem no sítio da inflamação, os macrófagos fre-quentemente sobrevivem ao encontro inicial com o invasor e podem migrar para outras par-tes do corpo. Patógenos que sobrevivem dentro do macrófago como a bactéria Salmonellaenterica serovar Typhi, por exemplo, podem usar o macrófago para disseminar a infecçãolocalizada para sítios distantes no corpo, convertendo uma invasão local menor do intestinoem uma doença severa sistêmica, a febre tifoide.

 Várias moléculas de sinalização medeiam a resposta inflamatória no local da infecção. A ativação de TLRs resulta na produção tanto de moléculas sinalizadoras lipídicas, como as

prostaglandinas, quanto proteicas (ou peptídeos), como as citocinas (discutidas no Capítulo15), todas contribindo para a resposta inflamatória, assim como fazem fragmentos do com-plemento liberados durante a ativação do complemento. Algumas das citocinas produzidaspelos macrófagos ativados são quimioatratores (conhecidas como quimiocinas). Algumasquimiocinas atraem neutrófilos, os quais serão as primeiras células recrutadas em grandesquantidades para o local da nova infecção. Outras citocinas engatilham a febre, um aumen-to da temperatura corporal. No balanço geral, a febre ajuda a combater a infecção, porquea maioria dos patógenos bacterianos e virais prolifera melhor a temperaturas mais baixas,

Figura 24-55 Neutrófilos ejetam a sua

cromatina para prender as bactérias

em uma rede pegajosa. (A) Microsco-pia eletrônica de varredura mostrandoneutrófilos em repouso. (B) Neutrófilosativados com muitas protrusões e asso-

ciados a fitas fibrosas (seta). As fitas con-têm DNA e histonas, e parece ser cro-matina do núcleo do neutrófilo que foiejetado durante o processo de ativação.(C) A cromatina pegajosa pode encarce-rar muitos tipos diferentes de bactérias,incluindo (da esquerda para a direita)Staphylococcus aureus, Salmonella ente-rica e Shigella flexneri. (De V. Brinkmannet al., Science 303:1532-1535, 2004. Compermissão de AAAS.)

(A)

(C)

(B)10 m10 m

1 m1 m1 m

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enquanto a resposta imune adaptativa é mais potente a temperaturas mais altas. Algumasmoléculas pró-inflamatórias de sinalização estimulam as células endoteliais a expressaremproteínas que engatilham a formação de coágulos em pequenos vasos locais. Por meio daoclusão de vasos, evitando o fluxo de sangue, esta resposta pode auxiliar na prevenção daentrada do patógeno na corrente sanguínea e sua consequente disseminação para outraspartes do organismo.

 As mesmas respostas inflamatórias, tão eficientes no controle local de infecções, po-dem, no entanto, ter consequências desastrosas se ocorrerem em uma infecção disseminadana corrente sanguínea, condição esta denominada sepsis. A liberação sistêmica de molécu-las de sinalização pró-inflamatórias no sangue causa dilatação dos vasos sanguíneos, perdado volume de plasma e coagulação sanguínea generalizada, que causa uma queda acen-tuada da pressão sanguínea, ou choque; adicionalmente, existe formação disseminada decoágulos. O resultado final é conhecido por choque séptico, geralmente fatal. As respostas

inflamatórias inapropriadas ou extremamente fortes estão também associadas com algumasdoenças crônicas, como a asma (Figura 24-56) e a artrite.

 Alguns patógenos desenvolveram mecanismos para evitar a consequência final da fa-gocitose, alguns desenvolveram mecanismos para evitar as respostas inflamatórias ou, emalguns casos, aproveitam-se dessas respostas para disseminar a infecção. Muitos vírus, porexemplo, codificam potentes antagonistas de citocinas que bloqueiam diversos pontos daresposta inflamatória. Alguns desses antagonistas são simplesmente formas modificadas dereceptores de citocinas, codificadas por genes adquiridos do hospedeiro pelo genoma vi-ral. Eles se ligam às citocinas com alta afinidade e bloqueiam seu funcionamento. Algumasbactérias, como a Salmonella, induzem uma resposta inflamatória no intestino nos estágiosiniciais da infecção, recrutando macrófagos e neutrófilos e, a seguir, invadem-nas e literal-mente pegam carona para outros tecidos do organismo.

As células infectadas por vírus desenvolvem medidas

drásticas para evitar a replicação viralOs imunoestimulantes associados aos micróbios presentes na superfície das bactérias e dosparasitas, e que são importantes na indução de respostas imunes inatas, geralmente não seencontram presentes na superfície dos vírus. As proteínas virais são construídas pelos ri-bossomos da célula hospedeira, e as membranas de vírus envelopados são compostas peloslipídeos das próprias células hospedeiras. A única maneira pela qual uma célula hospedeirapode reconhecer a presença de um vírus é a detecção de um elemento incomum do genoma

 viral, como o RNA de fita dupla (dsRNA, double-stranded RNA), uma forma intermediáriano ciclo de vida de vários vírus. Genomas de vírus de DNA frequentemente contêm umaquantidade significante do dinucleotídeo CpG, que pode ser reconhecido pelo receptor se-melhante a Toll TLR9, como discutido anteriormente.

Células de mamíferos são particularmente pródigas em reconhecer a presença de dsR-NA e mobilizar um programa de resposta intracelular para eliminá-lo. O programa ocorreem duas etapas. Primeiro, a célula degrada o dsRNA em fragmentos pequenos (de cerca de

21 a 25 pares de nucleotídeos em tamanho) usando a enzima Dicer . Os fragmentos de fitadupla se ligam a qualquer RNA fita simples (ssRNA, Single-Stranded RNA) na célula hospe-deira que tenha a mesma sequência de qualquer das fitas do fragmento do dsRNA, levandoà destruição do ssRNA. O dsRNA que dirige a destruição do ssRNA é a base da técnica doRNA de interferência (RNAi) que os pesquisadores usam para destruir RNAs mensageiros(mRNAs) especificos e desta forma bloquear a expressão gênica específica (discutido no Ca-pítulo 8). Segundo, o dsRNA induz a célula hospedeira a produzir e secretar, duas citocinas– interferon (IFN) e interferon (IFN), que atuam tanto de modo autócrino, sobre acélula infectada, quanto parácrino, sobre as células vizinhas não-infectadas. A ligação das

Figura 24-56 Inflamação das vias respiratórias na asma severa. Micro-grafia óptica de uma secção através de um brônquio de um paciente quemorreu durante um ataque severo e prolongado de asma. Existe uma quasetotal oclusão da via respiratória por um tampão de muco. O tampão de mucoé um denso infiltrado que inclui eosinófilos, neutrófilos e linfócitos. (Cortesiade Thomas Krausz.)

Brônquio

Via respiratória restante0,1 mm

Tampão de muco

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Biologia Molecular da Célula 1535

moléculas de interferon em seus receptores de superfície celular estimula a transcrição gêni-ca específica através da via de sinalização intracelular Jak/STAT (ver Figura 15-68), levando àprodução de mais de 300 produtos gênicos, incluindo um amplo número de citocinas, refle-tindo assim a complexidade de resposta celular aguda a uma infecção viral.

 A resposta ao interferon parece ser uma reação geral de uma célula de mamífero a uma

infecção viral, e componentes virais além do dsRNA podem engatilhá-la. Adicionalmenteaos seus efeitos na transcrição gênica da célula hospedeira, os interferons ativam uma ribo-nuclease latente, que de maneira inespecífica degrada ssRNA. Eles também indiretamenteativam uma proteína-cinase que fosforila e inativa o fator de iniciação de síntese proteicaeIF-2, e dessa maneira inibe a maior parte da síntese proteica da célula que luta contra o ví-rus. Aparentemente, pela destruição de grande parte de seu RNA e transitoriamente parandoa sua síntese proteica, a célula do hospedeiro inibe a replicação viral sem morrer. Porém,se estas medidas falham, as células tomam então medidas in extremis, suicidando-se porapoptose para evitar a replicação viral, frequentemente com ajuda do linfócito killer , comodiscutiremos a seguir e no Capítulo 25.

 As células de mamíferos possuem um mecanismo especial de defesa para ajudá-lascontra os retrovírus. Estes vírus ativam uma família de proteínas chamadas de APOBEC(denominadas assim por também serem membros do complexo de edição que modifica omRNA da proteína ApoB, o maior componente proteico da lipoproteína de baixa densida-de, LDL). Esta enzima desamina citosinas em DNA complementar (cDNA) viral nascente,

convertendo-as a uridina e, dessa forma, gerando um grande número de mutações, o queleva eventualmente ao término da replicação viral.

Não é surpresa que muitos vírus adquiriram mecanismos para derrotar ou evitar estesprocessos intracelulares de defesa. O vírus da influenza codifica uma proteína que bloqueiao reconhecimento do dsRNA pela proteína Dicer. O HIV codifica uma proteína que medeia aubiquitinilação e a degradação mediada pelo proteossomo do complexo proteico APOBEC.Muitos vírus, incluindo muitos que são capazes de causar doenças em pacientes saudáveis,usam vários mecanismos para bloquear a ativação das vias do interferon. Alguns vírus tam-bém inibem a apoptose da célula hospedeira, cujo efeito colateral é o desenvolvimento decâncer; esta é uma maneira que o vírus de Epstein-Barr usa para ocasionalmente causar olinfoma de Burkitt.

As células matadoras naturais induzem as células infectadas

por vírus a cometer suicídio

Os interferons têm outras maneiras menos diretas de bloquear a replicação viral. Uma de-las é aumentar a atividade de células matadoras naturais (células NK, de natural killer )que são parte do sistema imune inato. Como as células T citotóxicas do sistema imuneadaptativo (discutido no Capítulo 25), as células NK destroem as células infectadas pelos vírus por indução ao suicídio apoptótico. A maneira pela qual as células T citotóxicas e ascélulas NK distinguem as células infectadas pelos vírus das não-infectadas, no entanto, édiferente.

 Ambas, as células T citotóxicas e as células NK, reconhecem a mesma classe especialde proteínas de superfície para detectar células do hospedeiro infectadas. As proteínas sãochamadas de proteínas MHC de classe I, porque são codificadas por genes no complexo dehistocompatibilidade maior; quase todas as células de vertebrados expressam tais genes, eserão discutidos em detalhes no Capítulo 25. As células T citotóxicas reconhecem fragmen-tos de peptídeos de proteínas virais ligados a estas proteínas do complexo de histocompati-bilidade maior na superfície das células infectadas. Ao contrário, as células NK monitoram o

nível de proteínas do complexo MHC de classe I na superfície das células hospedeiras. Altosníveis inibem a atividade assassina das células NK e, assim, as células NK seletivamente ma-tam células hospedeiras expressando baixos níveis, que são em sua maioria células infecta-das por vírus ou células cancerosas (Figura 24-57).

 A razão de os níveis das proteínas do MHC I estarem sempre baixos em células infec-tadas é porque muitos vírus desenvolveram mecanismos para inibir a expressão de taisproteínas na superfície das células que eles infectam, para evitar a detecção por linfócitosT citotóxicos. Adenovírus e HIV, por exemplo, codificam proteínas que bloqueiam a trans-crição dos genes MHC de classe I. Os vírus herpes simples e citomegalovírus bloqueiam os

Célula matadora natural Célula cancerosa

5 m

Figura 24-57 Uma célula matadora

natural (NK) atacando uma célula can-cerosa. A célula NK é a célula menor à 

esquerda. Esta micrografia eletrônica devarredura foi tomada um pouco depoisda interação da célula NK, mas antes deela induzir a célula cancerosa a suicidar-se. (Cortesia de J. C. Hiserodt, em Mecha-nisms of Cytotoxicity by Natural KillerCells [R. B. Herberman and D. Callewaert,eds.]. New York: Academic Press, 1995.)

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translocadores de peptídeos na membrana do RE que transportam fragmentos de peptídeosderivados do proteossomo de proteínas virais e proteínas da célula hospedeira do citosolpara o lúmen do RE; tais peptídeos são requeridos para a montagem das proteínas do MHCde classe I na membrana do RE, para serem transportadas via aparelho de Golgi para a su-perfície celular como peptídeos do complexo MHC (ver Figura 25-59). Citomegalovírus cau-

sa a retrotranslocação das proteínas do complexo MHC I da membrana do RE para o citosol,onde são rapidamente degradadas no proteossomo. Proteínas codificadas por outros vírusda classe infectante previnem a entrega de proteínas do MHC de classe I do RE para o apare-lho de Golgi ou do aparelho de Golgi para a membrana plasmática.

Pela evasão do reconhecimento por células T citotóxicas desta maneira, no entanto, o vírus se vê frente a frente com o poder raivoso das células NK. A produção local de INF ativa a propriedade assassina das células NK e também aumenta a expressão de proteínasdo MHC de classe I em células não-infectadas. As células infectadas com um vírus que blo-queia a expressão das proteínas do MHC de classe I são, dessa forma, expostas como sendodiferentes e se tornam vítimas das células NK ativadas. Assim, é muito difícil para um ví-rus se esconder simultaneamente das células T citotóxicas e das células NK. Notavelmente,entretanto, alguns vírus grandes de DNA incluindo o citomegalovírus, codificam proteínassemelhantes às do MHC de classe I que são expressas nas superfícies das células hospedei-ras que eles infectam. Como as bona fide (pretensas) proteínas do MHC de classe I, estasproteínas fajutas ativam receptores inibidores nas células NK e bloqueiam a atividade letal

das células NK. Ambos, células NK e linfócitos T citotóxicos, matam as células-alvo por induzi-las àapoptose antes de os vírus terem a chance de se replicar. Não é surpreendente, então, quemuitos vírus tenham desenvolvido mecanismos para inibir a apoptose, particularmente nosestágios iniciais da infecção. Como discutido no Capítulo 18, a apoptose depende de umacascata proteolítica intracelular que as células citotóxicas podem engatilhar ou pela ativaçãodos receptores de superfície de morte celular ou pela injeção de uma proteína na célula--alvo (ver Figura 24-47). As proteínas virais podem interferir em quase todos os passos des-sas vias.

As células dendríticas suprem a ligação entre as respostas

inata e adaptativa do sistema imune

 As células dendríticas são cruciais no sistema imune inato que é distribuído amplamentenos tecidos e órgãos dos vertebrados. Elas mostram uma enorme quantidade de receptores

de padrões de reconhecimento, incluindo as proteínas TLRs e NOD, que capacitam as célu-las a reconhecer e fagocitar patógenos invasores e se tornar ativadas no processo. As célulasdendríticas clivam as proteínas dos patógenos em fragmentos peptídicos que se ligam entãoa proteínas do MHC que transportam o fragmento para a superfície celular. As células den-dríticas ativadas carregam, agora, os peptídeos derivados do patógeno complexados comproteínas do complexo MHC para um órgão linfoide próximo, como um linfonodo, ondeelas ativam células T do sistema imune adaptativo chamando-as para entrarem na batalhacontra o invasor específico. Adicionalmente ao complexo das proteínas MHC e dos peptí-deos microbianos expostos na sua superfície, as células dendríticas ativadas também ex-põem uma proteína de superfície coestimuladora que ajuda a ativar as células T. As célulasdendríticas ativadas também secretam uma variedade de citocinas que influenciam o tipode resposta que as células T farão, garantindo que ela seja apropriada para combater umpatógeno particular. Dessa maneira, as células dendríticas servem como uma ligação crucialentre o sistema imune inato, que propicia uma linha de defesa primária contra os patógenosinvasores, e o sistema imune adaptativo, que apesar da lentidão providencia uma maneiramais poderosa e altamente específica de atacar o invasor.

 A batalha entre os patógenos e as defesas do hospedeiro é notavelmente balanceada. Nopresente, os humanos parecem estar com uma pequena vantagem pelo uso de medidas desaneamento, vacinas e fármacos para ajudar os esforços dos nossos sistemas imunes inato eadaptativo. No entanto, doenças infecciosas são globalmente a principal causa de morte, enovas epidemias como a AIDS continuarão a emergir. A evolução rápida dos patógenos e aquase infinita variedade de maneiras pelas quais eles invadem o corpo humano e enganama resposta imune indicam que jamais seremos os vencedores desta batalha.

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Biologia Molecular da Célula 1537

No próximo capítulo, consideraremos as estratégias únicas e notáveis que o nosso siste-ma imune adaptativo desenvolveu para nos defender contra nossos poderosos oponentes.Surpreendentemente, este sistema imune pode montar uma resposta imune patógeno-es-pecífica contra patógenos que nunca existiram.

Resumo As barreiras físicas prevenindo infecções, as respostas intrínsecas da célula às infecções e a reposta

imune inata providenciam as primeiras linhas de defesa contra patógenos invasores. Todos os or-

 ganismos multicelulares possuem tais defesas. Nos vertebrados, respostas imunes inatas podem re-

crutar a específica e mais poderosa resposta imune adaptativa. A resposta imune inata depende da

habilidade do corpo de reconhecer características conservadas das moléculas na superfície dos mi-

cróbios e das moléculas de RNA de fita dupla de alguns vírus. Muitas destas moléculas microbianas

são reconhecidas por receptores de reconhecimento de padrões, incluindo os receptores semelhantes

a Toll (TLRs) encontrados em plantas e animais. Nos vertebrados, moléculas de superfície dos mi-

cróbios também ativam o complemento, um grupo de proteínas do sangue ativadas em sequência

para marcar o micróbio para fagocitose pelos macrófagos ou neutrófilos, que rompem a membrana

do micróbio e produzem uma resposta inflamatória . Os fagócitos usam uma combinação de enzi-

mas degradativas, peptídeos antimicrobianos e moléculas de oxigênio reativas para matar os mi-

cro-organismos invasores; adicionalmente, eles secretam moléculas sinalizadoras que engatilham

uma resposta inflamatória. Células infectadas por vírus produzem interferons, que induzem umasérie de respostas celulares, inibem a replicação viral e ativam a atividade assassina das células NK.

 As células dendríticas do sistema imune inato ingerem micróbios no sítio da infecção e os carregam

assim como seus produtos para os linfonodos locais, onde eles ativam células T do sistema imune

adaptativo para fazer uma resposta específica contra o micróbio.

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