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Liberalismo, neoliberalismo e fakeliberalismoPassados 19 meses de mandato, um plano consistente com os princípios liberaisainda não é conhecido
Por Roberto Troster
30/07/2020 05h01 · Atualizado
há um dia
— Foto: Ricardo Stuckert
A autoproclamação e a adoção de algumas medidas pró empresários não tornam
um governo liberal, da mesma forma que a autodenominação de
desenvolvimentista é insuficiente para promover o crescimento e a inclusão social de
um país. É necessária a execução de um plano consistente com a ideologia
apregoada.
Anarcocapitalismo, conservadorismo, desenvolvimentismo, liberalismo e socialismo
são ideologias. Todas têm conjuntos de princípios próprios que deveriam ser
adotados para a gestão da política econômica. Estão fundamentados em relações de
causas e efeitos objetivas, assim como, no desejo de certos propósitos, influenciados
por juízos de valor.
Passados 19 meses de mandato, um plano consistente comos princípios liberais ainda não é conhecido
Esses princípios balizam as decisões sobre inserção externa, estrutura tributária,
setores favorecidos e a composição dos gastos públicos, entre outros aspectos da
gestão pública. Ilustrando, enquanto no socialismo e no desenvolvimentismo é
desejável que o Estado tenha uma participação importante na economia, no
anarcocapitalismo e no conservadorismo, o ideal é que seja mínima.
A classificação da ideologia da política econômica de um determinado governo é
feita comparando a consistência das ações adotadas com os princípios apregoados.
No Brasil, nas últimas décadas, as duas ideologias mais debatidas foram o
desenvolvimentismo e o liberalismo, que coincidem em alguns aspectos e se
contrapõem em outros.
A questão é se o atual governo pode ser considerado liberal ou não. Seu discurso é.
Propõe a redução da intervenção do Estado, as privatizações, a eficiência, o
favorecimento da agricultura, estabilização da moeda e responsabilidade fiscal.
Todas são bandeiras liberais. Todavia, sua atuação mostra dissonâncias em relação
ao que apregoa.
O auxílio emergencial ilustra o ponto. A necessidade do mesmo é consistente como
os princípios do liberalismo e do desenvolvimentismo. A operação de distribuir o
auxílio emergencial exclusivamente pela Caixa foi apresentada como um sucesso,
que aumentou a bancarização. Uma visão mais focada na eficiência e na
participação de outros bancos teria tido um resultado melhor.
Em 31 de março deste ano, o Brasil tinha 211 milhões de habitantes, dos quais 167
milhões tinham 15 anos ou mais. Na mesma data, 166 milhões de brasileiros tinham
algum tipo de relacionamento ativo com o Sistema Financeiro Nacional, que tinha
um total de 478 relacionamentos com cidadãos e empresas. Possuíam pelo menos
ou uma poupança ou uma conta corrente ou um cartão de crédito. Estavam
bancarizados.
Nos três meses seguintes, o número de relacionamentos no Sistema Financeiro
Nacional aumentou 47 milhões, a maioria de contas na Caixa. Na data em que foi
decidido o auxílio, o Banco do Brasil e o Bradesco tinham mais agências do que a
Caixa e os quatro maiores bancos dispunham de mais postos de atendimentos do
que a instituição escolhida para a distribuição do benefício.
Antes do início da distribuição do auxílio, Bradesco, Itaú e Santander juntos tinham
cinco vezes mais clientes do que a Caixa e, no primeiro trimestre, os três tinham
realizado quase sete vezes mais operações de crédito do que a Caixa. Surpreende a
imposição de abrir novas contas, quando a maioria já as possuía. A exclusividade ao
banco estatal não foi consistente com os princípios liberais.
Outra proposta passível de reparos pelos liberais é a de mudar a legislação para que
o Banco Central possa comprar títulos privados. Atualmente, os três maiores bancos
estatais detêm 40,7% do crédito do Sistema Financeiro Nacional e podem comprar
ativos de bancos privados, se assim decidir o governo.
Dar à autoridade monetária esse atributo é dar uma carta branca para que limpe os
balanços de bancos estatais. É uma volta ao passado estatizante, em que o Banco
Central era o maior executor de política fiscal brasileira, usando créditos
subvencionados, antes da constituição de 1988. Na virada do século, a Emgea
(Empresa Gestora de Ativos), do governo federal, comprou créditos da Caixa
deixando prejuízos de bilhões de reais absorvidos pelo Tesouro Nacional e em
última instância com recursos do contribuinte.
A relação gastos do governo/PIB brasileira é maior que da China, da Venezuela, da
Bolívia. É razoável que aumente nos quatro países, por conta da pandemia, mas não
é o fato de que a relação dos rendimentos do funcionalismo aumente
desproporcionalmente mais aqui.
Em três meses de crise, o rendimento efetivo em relação ao habitual caiu em média
18% para todo o Brasil. Para os militares, 2% e para os por conta própria 40%. Como
não se pode reduzir o salário do funcionário público, pode-se instituir a contribuição
cívica para o futuro da pátria, voluntária ou compulsória. Melhoraria a igualdade, as
finanças públicas e a moral do país.
O turismo é um setor onde há espaços para avanços que não são ocupados por
conta de uma visão antiliberal. O turista que chega ao Brasil, quando troca suas
divisas por reais tem que pagar IOF, e, quando vai embora, paga mais impostos. Um
comerciante, que acolhe o turista, não pode depositar os dólares no banco, tem que
converter e pagar mais imposto. Enquanto os bancos americanos podem custodiar
até criptomoedas, os brasileiros estão impedidos de abrir contas em dólares. Há
mais exemplos.
O liberalismo tem uma longa tradição acadêmica no mundo e no Brasil. Ideias
liberais existem há séculos - Adam Smith, considerado o “pai do liberalismo
econômico” as consolidou em 1776. Sua visão era a de promover o bem-estar de um
país combinando liberdade, igualdade, eficiência e controles. Quando bem
implantada, pode de fato, melhorar o bem-estar de uma nação.
A execução de uma agenda liberal no Brasil é possível. Pode promover a inclusão, o
investimento e o crescimento. Há espaços para aumentar a competitividade do país,
com as grandes reformas e pequenos ajustes. Passados 19 meses de mandato, um
plano consistente com os princípios liberais ainda não é conhecido. Há tempo ainda.
Roberto Luis Troster lecionou história do pensamento econômico na USP e na
PUC-SP. [email protected]
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