participação social na elaboração de pm

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participação da sociedade para plano de manejo

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  • Lies aprendidas sobre

    Participao Social na Elaborao de Planos de Manejo de Unidades de ConservaoComunidade de Ensino e Aprendizagem em Planejamento de Unidades de Conservao

    ESTA PUBLICAO FOI PRODUZIDA EM COLABORAO COM:

    LiES APrEndidAS SobrE PArtiCiPAo SoCiAL nA ELAborAo dE PLAnoS dE MAnEjo dE UnidAdES dE ConSErvAo

  • Braslia, junho de 2013

    Lies aprendidas sobre

    Participao Social na Elaborao de Planos de Manejo de Unidades de ConservaoComunidade de Ensino e Aprendizagem em Planejamento de Unidades de Conservao

    ESTA PUBLICAO FOI PRODUZIDA EM COLABORAO COM:

  • FICHA TCNICA

    Membros da Comunidade de Ensino e Aprendizagem em Planejamento de Unidades de Conservao que contriburam para essa publicao Alessandro Neiva - ConsultorAlexandre Krob - Instituto CuricacaAna Rafaela DAmico - ICMBioAugusta Gonalves - ICMBioCamila Gonalves - URFRJCarlos Brancato - ConsultorCla de Oliveira - ConsultoraCecil Barros - ICMBioCristiane Leonel - Fundao Florestal de SPGuillermo Moises - ConsultorGustavo Irgang - ConsultorJane Vasconcellos - ConsultoraLda Luz - Consultora Lilian Hangae - ICMBioLuciana Mota - ICMBioMaria Auxiliadora Drummond - UFMGMaria Olatz Cases - GIZMarcos Pinheiro - PINSMarisete Catapan - WWF-BrasilPaola Prates Stumpf - SEMA/RSStanley Arguedas - ELAP/ UCI

    Colaboradores Tcnicos para esta Publicao Adriana de Arruda Bueno - Fundao Florestal de SPAndrea Curi Zaratinni - ICMBioAndr Luis Lima - DAP/MMAAngela Pellin - IPEArlindo Gomes Filho - ICMBioBernd Mitlewski - GOPA/GIZCarlos Eduardo Marinelli - Grupo NSC, UnB, INPA Cesar Haag - CI - BrasilCludia Conceio Cunha - ICMBio

    Deusdet Alle Son - IPEMAFtima Guedes - DCBio/SBF/MMAFelipe Cruz Mendona - ICMBioGisela Hermmann - Consultora Valor NaturalHeitor Schulz Macedo - ICMBioLeila Mattos - Pacto AmaznicoLuiz Fernando S. Loureiro - MMAMarcelo Limont - Mater NaturaMarcos A. Danieli - APREMAVIMarta de Azevedo Irving - UFRJMauro Luis Ruffino - GOPA/GIZRaquel Pasinato - ISARafael Luis Fonseca - GIZSimo Marrul Filho - ICMBioSilvia Futada - ISATiago Juru Damo Ranzi - ICMBioVernica Barros - MMA

    OrganizadorasAndrea Caro Carrillo- Consultora WWF-BrasilCristiane Leonel Ferreira - FFSPJane Vasconcellos - ConsultoraLda Luz - ConsultoraMaria Auxiliadora Drummond - UFMGMarisete Catapan - WWF-Brasil

    Equipe de EdioReviso tcnica da Comunidade Edio Frederico Brando - WWF-Brasil

    Reviso ortogrfica e gramaticalCarmen da Gama

    Ilustraes - Roberto Xavier de Lima

    Editorao Eletrnica - Supernova Design

    Lies aprendidas sobre participao social na elaborao de planos de manejo de unidades de conservao : comunidade de ensino e aprendizagem em planejamento de unidades de conservao / Alessandro Neiva ...[et al.]. Braslia : WWF-Brasil, 2013 66 p. : il ; 24 cm.

    Inclui bibliografiaISBN 978-85-86440-73-1

    1. Meio ambiente - preservao. 2. Meio ambiente - diagnstico. 3. Unidade de conservao manejo. 4. Plano de manejo elaborao. 5. Plano de manejo participao social. I. Neiva, Alessandro. CDD 363.7

    L711

  • AGRADECIMENTOSA Comunidade de Ensino e Aprendizagem em Planejamento de Unidades de Conservao agradece aos seus apoiadores pelo financiamento de longo prazo que vem recebendo, o qual possibilita a discusso virtual organizada, os encontros presenciais e o compartilhamento de seus aprendizados na forma de publicaes. So apoiadores: WWF-Brasil, GIZ, MMA, ICMBio e rgos gestores de UCs estaduais.

    No mbito desta temtica, agradece o apoio do Projeto Proteo da Mata Atlntica II do Ministrio do Meio Ambiente. E, ainda, a todos que compartilharam suas experincias e aprendizados nas discusses da Reunio Tcnica, alm de contriburem para enriquecer as reflexes da Comunidade e desta publicao.

  • 7Lies Aprendidas sobre Participao Social na Elaborao de Planos de Manejo de Unidades de Conservao - Comunidade de Ensino e Aprendizagem em Planejamento de Unidades de Conservao.

    SUMRIOLista de Siglas 8Apresentao 9Antecedentes da Participao Social no Planejamento e Gesto de reas Protegidas 11Benefcios da Participao Social em Processos de Elaborao de Planos de Manejo de Unidades de Conservao 17Desafios da Participao Social em Processos de Elaborao de Planos de Manejo de Unidades de Conservao 20Condies Necessrias para um Processo Participativo de Planejamento 30Aprendizados da Comunidade de Ensino e Aprendizagem em Planejamento de UC com Processos Participativos 32Boas Experincias com a Participao Social na Elaborao de Planos de Manejo e Gesto de Unidades de Conservao 38Bibliografia 64

  • 8Lies Aprendidas sobre Participao Social na Elaborao de Planos de Manejo de Unidades de Conservao - Comunidade de Ensino e Aprendizagem em Planejamento de Unidades de Conservao.

    LISTA DE SIGLASARPA Programa reas Protegidas da Amaznia

    CDB Conveno da Diversidade Biolgica

    DGPAR Diviso de Gesto Participativa

    DISAT Diretoria de Aes Socioambientais e Consolidao Territorial

    EE Enfoque Ecossistmico

    FF Fundao Florestal de So Paulo

    ICMBio Instituto Chico Mendes de Conservao da Biodiversidade

    IUCN Unio Internacional para Conservao da Natureza

    MMA Ministrio do Meio Ambiente

    ONG Organizao No Governamental

    OSCIP Organizao da Sociedade Civil

    PARNA Parque Nacional

    FLONA Floresta Nacional

    PM Plano de Manejo

    PNAP Plano Nacional de reas Protegidas

    PNUMA Programa das Naes Unidas para o Meio Ambiente

    RESEX Reserva Extrativista

    SEMA/RS Secretaria de Meio Ambiente do Estado do Rio Grande do Sul

    SNUC Sistema Nacional de Unidades de Conservao da Natureza

    UC Unidade de Conservao

  • 9Lies Aprendidas sobre Participao Social na Elaborao de Planos de Manejo de Unidades de Conservao - Comunidade de Ensino e Aprendizagem em Planejamento de Unidades de Conservao.

    APRESENTAOA Comunidade de Ensino e Aprendizagem no Planejamento de Unidades de Conservao formada por pessoas que atuam em instituies governamentais federal e estadual, instituies de ensino, organizaes no governamentais, empresas privadas e consultores autnomos. Conta, atualmente, com 46 integrantes, que possuem a responsabilidade de assegurar a qualidade tcnica das discusses e dos documentos produzidos.

    A Comunidade tem como objetivo geral: Contribuir para tornar os esforos de planejamento em Unidades de Conservao (UCs) brasileiras mais eficientes, visando uma gesto socialmente justa, participativa e efetiva para a conservao da natureza, com nfase na Amaznia. E, ainda, possui os seguintes objetivos especficos:

    Gerar uma fonte sistemtica e confivel de lies aprendidas, especfica para o planejamento de Unidades de Conservao;

    Contribuir no aprimoramento das metodologias utilizadas nos esforos de planejamento de Unidades de Conservao;

    Desenvolver uma base de informaes que compile, sistematize e divulgue as experincias de planejamento e implantao de planos de manejo em Unidades de Conservao, mantendo um processo contnuo de anlise sobre o tema;

    Fomentar a difuso de lies aprendidas, por meio de publicaes e espaos de discusso com a comunidade de tcnicos vinculados ao planejamento de Unidades de Conservao;

    Desenvolver e oferecer um programa de ensino em planejamento e implementao de planos de manejo;

    Promover a integrao entre os resultados de execuo de planos de manejo e os processos de planejamento;

    Promover a integrao entre os resultados de execuo de planos de manejo aos processos de planejamento.

    O grupo possui uma estrutura de funcionamento horizontal, com encontros presenciais realizados a cada seis meses. Entre

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    Lies Aprendidas sobre Participao Social na Elaborao de Planos de Manejo de Unidades de Conservao - Comunidade de Ensino e Aprendizagem em Planejamento de Unidades de Conservao.

    as sesses presenciais, as pessoas-partes mantm um fluxo de comunicao por meio de ferramenta da web, vinculada ao frum virtual, que permite a troca de arquivos, a realizao de discusses e a disponibilizao de informaes. No ambiente virtual, so postadas reflexes na forma de perguntas-norteadoras ou exerccios sobre um tema em discusso. As questes so respondidas pelo grupo, sendo que, todas as lies aprendidas e as recomendaes da Comunidade so sistematizadas. A socializao desses resultados se d na forma de publicaes tcnico/cientficas, alm da circulao entre os que atuam com o planejamento de reas protegidas, e, em especial, na elaborao de planos de manejo. Tem-se, em acrscimo, a apresentao de trabalhos em congressos, voltados para a rea da conservao ambiental. Por ltimo, mas no menos importante, os resultados so socializados de maneira informal, por meio da transmisso de aprendizados pelos integrantes para seus pares, vinculados s instituies em que atuam.

    Para nortear os trabalhos, foi acordado que, para cada tema eleito, sero identificadas barreiras/obstculos e as lies aprendidas a partir da experincia de cada um, tanto conceitualmente como metodologicamente. Com vistas ao desenvolvimento das discusses, optou-se pela seguinte ordem lgica:

    Tema 01 Organizao para a Elaborao de Planos de Manejo;

    Tema 02 Planejamento para Gesto (Enfoque Ecossistmico; Diagnstico; Participao Social e Zoneamento em Planos de Manejo);

    Tema 03 Monitoramento da Execuo do Plano de Manejo.

    A Comunidade de Ensino e Aprendizagem em Planejamento de UCs desenvolve seus trabalhos h quatro anos, durante os quais foram realizadas sete oficinas presenciais e duas reunies tcnicas. Os resultados deste trabalho constam em quatro publicaes sobre os temas: Organizao do Planejamento em Unidades de Conservao, Aplicao do Enfoque Ecossistmico em Plano de Manejo; Diagnstico em Planos de Manejo, alm de publicaes sobre o mtodo de trabalho do grupo. Dentre estas citadas, duas publicaes foram lanadas por meio da srie de Cadernos ARPA/MMA.

    Dando continuidade divulgao dos aprendizados da Comunidade, a presente publicao compartilha as Lies Aprendidas sobre Participao Social na Elaborao de Planos de Manejo.

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    Lies Aprendidas sobre Participao Social na Elaborao de Planos de Manejo de Unidades de Conservao - Comunidade de Ensino e Aprendizagem em Planejamento de Unidades de Conservao.

    ANTECEDENTES DA PARTICIPAO SOCIAL NO PLANEjAMENTO E GESTO DE REAS PROTEGIDAS Se a proteo da biodiversidade no pode estar dissociada dos valores sociais, quais so os valores com os quais lidamos com a natureza?

    Nesse sentido, importante considerarmos a questo da participao social na gesto de recursos naturais. E, em especial, no planejamento e gesto de reas protegidas, sob uma perspectiva histrica e, portanto, imbuda dos mais diversos valores econmicos, culturais, polticos, entre outros.

    No que se refere participao social na gesto das reas protegidas, diferentes marcos internacionais e nacionais vm se consolidando. E se constituem por meio de polticas que, alm de serem construdas com base no dilogo com a sociedade, tambm trazem conceitos elaborados em parceria com acadmicos.

    importante considerar que, historicamente, a importncia da participao social no manejo do patrimnio natural comeou a crescer em 1968, quando foi fundado o Clube de Roma. Neste clube, especialistas originrios de dez pases estiveram reunidos com o objetivo de discutir a crise ambiental e a sua relao com o futuro da humanidade. O fruto deste encontro foi o relatrio Os Limites do Crescimento (MEADOWS et al, 1972). Iniciou-se, ento, uma sria discusso mundial que indica que o paradigma positivista da cincia, aliado consolidao do capitalismo, parece no conseguir responder aos novos problemas caracterizados pela complexidade ambiental (MEDINA, 1997).

    Nas dcadas posteriores, vrias conferncias de mbito mundial discutiram a questo ambiental e a relevncia de uma participao mais organizada da sociedade, no que diz respeito a essas questes. Isto aconteceu em: Estocolmo (1972), Belgrado, (1975), Conferncia

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    Lies Aprendidas sobre Participao Social na Elaborao de Planos de Manejo de Unidades de Conservao - Comunidade de Ensino e Aprendizagem em Planejamento de Unidades de Conservao.

    Intergovernamental sobre a Educao Ambiental em Tibilisi - ex-URSS (1977), a Conferncia da ONU sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, Rio- 92 e a Conferncia Internacional sobre o Meio Ambiente e Sociedade: Educao e Conscientizao Pblica para a Sustentabilidade, realizada em Tessaloniki- Grcia, em 1996.

    Todas essas importantes conferncias tiveram, como fio condutor, os limites do crescimento, a finitude dos recursos naturais e a busca por uma melhor qualidade de vida da populao humana. No campo de percepo desta busca, tm-se alguns dos componentes bsicos do bem-estar social, a exemplo de boas condies de fomento educao, de promoo da sade e de acesso moradia.

    Alertou-se, tambm, para a inviabilidade do padro de desenvolvimento em vigncia, no qual se considera o aumento de produo e o consumo de bens e servios, mas no se leva em conta o uso e o eventual esgotamento dos recursos naturais, alm da crescente m distribuio dos recursos financeiros em todo o planeta.

    Ainda salientaram que, para minimizar os problemas ambientais mundiais, seria necessria a reafirmao do novo paradigma do desenvolvimento sustentvel. A partir desta viso, ressalta-se a definio da Comisso Mundial sobre o Meio Ambiente e Desenvolvimento, a saber: O desenvolvimento sustentvel o que satisfaz as necessidades do presente sem comprometer as geraes futuras de satisfazerem as suas (UNCED, 1987).

    Ao corroborar com essas reflexes, a Estratgia para Sustentabilidade da Diversidade, publicada em 1991 pela Unio Internacional para a Conservao da Natureza (UICN), pelo Programa das Naes Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA) e pelo Fundo Mundial para a Natureza (WWF), identificou os seguintes princpios para a construo de uma sociedade sustentvel, como consta em WILSON (1992):

    a) Respeitar e cuidar da vida comunitria - os custos e benefcios da utilizao dos recursos naturais, desenvolvimento e proteo ambiental devem ser distribudos equitativamente, entre as comunidades e naes, e entre a gerao atual e as futuras;

    b) Melhorar a qualidade de vida humana - o desenvolvimento deve possibilitar s pessoas, a realizao de seu potencial e uma vida digna e plena;

    O DESENvOLvIMENTO SUSTENTvEL O qUE SATISfAz AS NECESSIDADES DO PRESENTE SEM COMPROMETER AS GERAES fUTURAS DE SATISfAzEREM AS SUAS

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    Lies Aprendidas sobre Participao Social na Elaborao de Planos de Manejo de Unidades de Conservao - Comunidade de Ensino e Aprendizagem em Planejamento de Unidades de Conservao.

    c) Conservar a vitalidade e a diversidade da Terra - o desenvolvimento deve ser baseado na conservao: ele precisa proteger a estrutura, as funes e a diversidade dos ecossistemas naturais do mundo, dos quais todos dependem;

    d) Reduzir ao mnimo o consumo dos recursos no renovveis - promover tcnicas de reutilizao de produtos oriundos de recursos no sustentveis;

    e) Respeitar a capacidade de suporte da Terra - as polticas que equilibrem a populao e seu estilo de vida com a capacidade de sustentao da Terra precisam ser complementadas por tecnologias que promovam o incremento desta capacidade atravs de uma administrao cuidadosa;

    f) Mudar prticas e atitudes pessoais - para adotar uma tica de vida sustentvel, as pessoas precisam reexaminar os objetivos que perseguem e alterar seu comportamento. A sociedade precisa promover valores que respaldem esta tica e dissuadir os que sejam incompatveis com um modo de vida sustentvel;

    g) Criar condies para que as comunidades cuidem de seu prprio ambiente - para que isso acontea, as comunidades precisam de autoridade, poder e conhecimentos para agir;

    h) Criar um marco nacional de integrao entre desenvolvimento e conservao - todo programa nacional que leve sustentabilidade deveria envolver todos os interesses, e tentar identificar e prevenir os problemas antes que surjam;

    i) Forjar uma aliana mundial - a sustentabilidade mundial depender do estabelecimento de uma firme aliana entre todos os pases. Porm, pases de renda mais baixa precisam ser ajudados a se desenvolver de maneira sustentvel e proteger seu ambiente. (WILSON, 1992)

    Nesse sentido, mas voltado para a participao social no manejo de reas protegidas, em 1997, a IUCN alertava, em seu documento sobre Manejo Participativo de reas Protegidas, para o fato de que, embora a responsabilidade de manejar essas reas esteja designada, geralmente, para uma instituio especfica, fato, tambm, que esse manejo afeta diversos grupos da sociedade (BORRINI-FEyERABEND, 1997).

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    Lies Aprendidas sobre Participao Social na Elaborao de Planos de Manejo de Unidades de Conservao - Comunidade de Ensino e Aprendizagem em Planejamento de Unidades de Conservao.

    Somando-se s polticas e instrumentos acima, em 2000, foi estabelecido, no Brasil, o Sistema Nacional de Unidades de Conservao da Natureza (SNUC), institudo por meio da Lei 9.985/2000, e seu decreto regulamentador de n 4.340/2002. Ao contrrio do sistema de leis ambientais, que, naquele momento, dava nfase aos mecanismos de controle e represso de prticas lesivas ao meio ambiente, o SNUC instituiu, definitivamente, a participao social na criao, planejamento e na gesto das Unidades de Conservao brasileiras.

    Segundo o SNUC, essa participao deve acontecer em diferentes instncias, espaos e processos diversos da gesto das UCs, em conformidade com sua categoria de manejo, tais como: na criao, planejamento e gesto da UC, na elaborao e implementao de Planos de Manejo; nas iniciativas de Educao Ambiental; nos Conselhos Gestores das UCs, nas aes de manejo e uso dos recursos naturais pelas populaes do entorno e residentes nas UCs. E, tambm, por meio da gesto compartilhada de UCs entre instituies governamentais e instituies que representam a sociedade civil, como as Organizaes da Sociedade Civil de Interesse Pblico (OSCIP).

    Em 2004, corroborando com esse vis, durante a realizao da Conveno sobre Diversidade Biolgica (CDB), realizada na Malsia, o Brasil se comprometeu a reduzir a taxa de perda de biodiversidade, por meio da consolidao de um sistema abrangente de reas protegidas. Sistema que deveria ser ecologicamente representativo e efetivamente manejado.

    importante salientar que a CDB , sem dvida, o mais importante acordo internacional sobre diversidade biolgica. Dentre os seus diversos pilares, constitudos em prol da conservao da diversidade biolgica, tem-se a utilizao sustentvel de seus componentes e a repartio justa e equitativa para com a sociedade dos benefcios derivados do uso dos recursos genticos (MMA,1992).

    Como um dos resultados desse acordo, em 2006, foi estabelecido, no Brasil, o Plano Estratgico de reas Protegidas (PNAP), que enfoca, prioritariamente, o SNUC, as Terras Indgenas e os Territrios Quilombolas. O documento elucida a importncia da participao social para o planejamento e manejo eficaz das Unidades de Conservao, por meio de alguns de seus princpios, entre os quais:

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    A promoo da participao, da incluso social e do exerccio da cidadania na gesto das reas protegidas, buscando permanentemente o desenvolvimento social, especialmente para as populaes do interior e do entorno das reas protegidas;

    A valorizao dos aspectos ticos, tnicos, culturais, estticos e simblicos da conservao da natureza;

    A repartio justa e equitativa dos custos e benefcios advindos da conservao da natureza, contribuindo para a melhoria da qualidade de vida;

    A erradicao da pobreza e reduo das desigualdades regionais;

    A adoo da abordagem ecossistmica na gesto das reas protegidas.

    O princpio, que explicita a importncia da incorporao da abordagem ecossistmica, refora, significativamente, a importncia da participao social no manejo de Unidades de Conservao. Este princpio foi adotado, inicialmente, pela CDB, como marco principal para o alcance de seus trs objetivos: conservao, uso sustentvel e distribuio justa e equitativa dos bens e servios da biodiversidade.

    No atual momento histrico, tendo-se clareza de que a participao social na gesto de reas protegidas uma demanda da sociedade, fica explicitada a preocupao com uma atuao integrada. Ou seja, com a conservao dos recursos naturais, no dissociada do contexto e do desenvolvimento local e regional, juntamente com a necessidade de melhoria na qualidade e de legitimidade desses processos participativos. Nesse sentido, crescente a preocupao dos rgos governamentais e de seus parceiros para estarem aptos a desenvolverem, com efetividade, a ampla gama de funes que essa demanda necessita.

    Uma demonstrao recente dessa realidade encontra-se na verso de 2010 do Mapa Estratgico1 do ICMBio, onde est explicitado, como um dos objetivos: Consolidar a gesto participativa em todos os

    1 Mapa Estratgico ferramenta do mtodo Balanced Scorecard (BSC), onde so explicitados os objetivos estratgicos da instituio para o cumprimento de sua misso. Foi desenvolvido por Kaplan e Norton em 1992, visando contribuir para a maior eficcia da gesto. O mapa estratgico

    expressa a maneira pela qual um objetivo impacta positivamente no alcance dos demais. Ver Mapa do ICMBio no site: http://www.icmbio.gov.br/intraneverificou-set/download/arquivos/

    planejamento_estrategico/download/MapaEstrategicoCurtoPrazo.pdf

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    Lies Aprendidas sobre Participao Social na Elaborao de Planos de Manejo de Unidades de Conservao - Comunidade de Ensino e Aprendizagem em Planejamento de Unidades de Conservao.

    nveis. A relevncia desse fato est na importncia do ICMBio, rgo responsvel pela gesto da maior parcela de Unidades de Conservao do pas. Alm disso, ressalta-se a sua influncia sobre os rgos gestores de meio ambiente, nos mbitos estaduais e municipais.

    Entretanto, importante salientar que, em geral, o contexto poltico-institucional das instituies governamentais gestoras de reas protegidas ainda frgil, no que se refere implementao da gesto participativa no cotidiano da gesto das UCs. Existem caractersticas intrnsecas nas organizaes que atuam como foras limitadoras nesse processo.

    fundamental considerar que, no universo da gesto das UCs, a elaborao e implementao do Plano de Manejo, principal documento tcnico que fundamenta a gesto da Unidade, somente acontecer de uma maneira efetiva se os planos representarem o resultado de um pacto social. Para tanto, a sua construo precisa ser compartilhada com os diferentes atores que atuam no universo da rea protegida.

    Nesse sentido, o Plano de Manejo deve ser fundamentado em informaes tcnicas qualificadas, articuladas com as realidades polticas e sociais do entorno das Unidades de Conservao e com as polticas pblicas. No entanto, deve constituir-se no resultado de um pacto social. Tarefa rdua, diante da complexidade das relaes sociedade/natureza contemporneas, mas, sem dvida, imprescindvel.

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    Lies Aprendidas sobre Participao Social na Elaborao de Planos de Manejo de Unidades de Conservao - Comunidade de Ensino e Aprendizagem em Planejamento de Unidades de Conservao.

    BENEfCIOS DA PARTICIPAO SOCIAL EM PROCESSOS DE ELABORAO DE PLANOS DE MANEjO DE UNIDADES DE CONSERvAOA participao social nas polticas pblicas do Brasil e de outros pases tem sido objeto de inmeros estudos nas ltimas dcadas. Vrios autores investigaram experincias de participao social em processos de licenciamento ambiental, em conselhos gestores de polticas pblicas, no manejo participativo de recursos naturais, na gesto de reas protegidas, entre outros. (Borrini-Feyerabend, 1997; Andelman, 2002; Irving et alli, 2006; Loureiro et alli, 2007, Macedo, 2008; Assuno et alli, 2010;Loureiro et alli, 2010; Silva, 2011)

    No existem, entretanto, suficientes estudos relacionados participao social na gesto de UC no Brasil, que possibilitem responder como qualificar - e manter no longo prazo - essa participao.

    O aprendizado das experincias de alguns membros da Comunidade de Ensino e Aprendizagem em Planos de Manejo de Unidades de Conservao sobre os benefcios da participao social nos processos de elaborao de planos de manejo so compartilhados abaixo:

    Empreender processos participativos de planejamento de UC importante para a aproximao e o estabelecimento do dilogo entre a gesto das Unidades de Conservao e as comunidades do entorno. Tambm contribuem no aperfeioamento da leitura do contexto local e na melhor compreenso dos conflitos de uso do patrimnio natural e de outros conflitos sociais, que interferem na conservao da natureza. Isso se d em especial nas UCs recm-criadas ou em rea de muito conflito com comunidades do entorno, contrrias criao da UC, para as quais os momentos participativos no Plano de Manejo

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    Lies Aprendidas sobre Participao Social na Elaborao de Planos de Manejo de Unidades de Conservao - Comunidade de Ensino e Aprendizagem em Planejamento de Unidades de Conservao.

    so essenciais para a aproximao e para melhorar a percepo destes em relao UC. Ana Rafaela DAmico/ICMBio

    A participao social enriquece o diagnstico das UCs e as possibilidades de aes visando mitigao das presses e ameaas que recaem sobre as mesmas, ou o melhor aproveitamento das oportunidades existentes ou potenciais. Muitas vezes, as contribuies dos participantes, nos diferentes espaos, como reunies abertas, oficinas de planejamento participativo e oficinas de pesquisadores, corroboram com aspectos das Unidades de Conservao, confirmando ou ampliando as percepes dos gestores sobre os desafios de gesto a serem enfrentados. Luciana Mota/ICMBio

    Desta forma, a participao social na elaborao do Plano de Manejo, em geral, propicia maior conhecimento e compreenso entre todos os interessados a respeito das opinies e posies dos demais. Evidenciando e explicitando quais so os verdadeiros interesses das partes envolvidas e, outras vezes, prevenindo problemas, disputas e conflitos. Do mesmo modo, amplia o conhecimento pblico sobre as interfaces do tema da conservao com aspectos relevantes do cotidiano.

    A aproximao com as comunidades para a execuo de processos participativos oportuniza a construo de relaes de confiana entre a instituio gestora e as organizaes locais e abre espao para negociaes junto s comunidades, gerando benefcios s partes envolvidas. Carlos Brancato/consultor

    Outro importante ganho de processos participativos a criao de oportunidades para o dilogo de saberes, especialmente entre os acadmicos e os tradicionais e comunitrios. Cecil Maya/ICMBio

    O processo participativo tambm amplia a possibilidade de integrao dos esforos de conservao previstos no Plano de Manejo com as demais agendas do territrio, como planos diretores municipais, planos de desenvolvimento rural, entre outros. Dessa forma, se incrementa a legitimidade e a consistncia das decises, tornando os planos mais fortes e representativos, funcionando tambm como um facilitador para aprovao dos mesmos

    IMPORTANTE LEMBRAR qUE UM PROCESSO PARTICIPATIvO TAMBM UMA BOA OPORTUNIDADE EDUCATIvA PARA DEMONSTRAR OS BENEfCIOS, OS BENS E SERvIOS fORNECIDOS PELAS REAS PROTEGIDAS

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    Lies Aprendidas sobre Participao Social na Elaborao de Planos de Manejo de Unidades de Conservao - Comunidade de Ensino e Aprendizagem em Planejamento de Unidades de Conservao.

    em audincias pblicas (para discusses de zoneamento, planos e programas setoriais) e em outras reunies com a sociedade local/regional. Carlos Brancato/consultor

    Nesse sentido, fica claro que o envolvimento social no planejamento fundamental para que se incorporem os diferentes saberes neste processo, com vistas formao de alianas entre instituies governamentais e atores locais. Tais alianas propiciam tanto a promoo de usos e solues sustentveis para a regio, como a defesa contra as ameaas externas ao patrimnio natural da UC. Em acrscimo, ocasionam, ainda, uma maior possibilidade do comprometimento da sociedade local com as solues a serem buscadas para o cumprimento dos objetivos da rea protegida.

    Dessa forma, criam-se condies propcias para o compartilhamento de responsabilidades, aumenta-se a eficcia na implementao da UC e so reduzidos os custos de execuo, por meio da adeso voluntria de instituies pblicas e organizaes sociais locais/regionais. Desonerando, assim, a carga das instituies gestoras.

    As aproximaes e dilogos entre os diferentes atores e interesses possibilitam uma maior estabilidade no mbito da poltica local. Alm disso, os aprendizados podem contribuir, tambm, para o desenvolvimento de polticas pblicas mais pertinentes realidade.

    importante lembrar que um processo participativo tambm uma boa oportunidade educativa para demonstrar os benefcios, os bens e servios fornecidos pelas reas protegidas. Sabe-se que estas aes benficas satisfazem vrias necessidades da sociedade de seus entornos, como a manuteno do regime hdrico e o fornecimento de gua, a conservao do solo e dos estoques de recursos naturais, alm de locais de contemplao e de recreao.

    A elaborao do Plano de Manejo em dilogo estreito com a sociedade, em especial com aqueles diretamente afetados de algum modo pela existncia da UC, oportuniza colocar em prtica os princpios da abordagem ecossistmica, propostos pela CDB. Tambm, amplia o controle social sobre a criao e execuo de polticas pblicas e se traduz na insero da UC no seu contexto socioeconmico. Possibilita-se, desta maneira, rea protegida, o cumprimento dos objetivos da Lei do SNUC e o desempenho de papel relevante na promoo do desenvolvimento social e econmico local e regional.

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    Lies Aprendidas sobre Participao Social na Elaborao de Planos de Manejo de Unidades de Conservao - Comunidade de Ensino e Aprendizagem em Planejamento de Unidades de Conservao.

    DESAfIOS DA PARTICIPAO SOCIAL EM PROCESSOS DE ELABORAO DE PLANOS DE MANEjO DE UNIDADES DE CONSERvAODesafios no Contexto Geral

    A sociedade brasileira - entendida como todos os setores sociais, incluindo-se organizaes civis, instituies pblicas, empresas e outros - possui uma herana cultural e histrica baseada no autoritarismo e na centralidade de poder nas elites polticas e econmicas que se entremeiam com o aparato do Estado. Na atualidade, esta herana se reflete, entre outros aspectos, em aguda assimetria de poder entre setores da sociedade, em organizaes sociais frgeis, e em reduzida prtica de participao. E, ainda, est presente em estruturas institucionais deficitrias e insuficientes para trabalhar em estreita cooperao com a sociedade civil. Este cenrio conforma-se em um ambiente pouco favorvel aos empreendimentos participativos, de maneira geral, e, inclusive, diante dos processos de planejamento participativo das Unidades de Conservao.

    Outro fruto deste contexto sociocultural o arraigado entendimento de que as reas protegidas so de propriedade do governo, e no patrimnio natural da sociedade brasileira. Em adio, o histrico autoritrio dos antigos processos de criao das UCs refora o imaginrio social negativo sobre as reas protegidas. Transformar estes entendimentos e reconhecer as Unidades de Conservao como bens comuns toda a sociedade consiste em um desafio, tanto para a sociedade quanto para a gesto pblica.

    Apesar das diretrizes inclusivas, presentes nos marcos legais, desde a Constituio Federal de 1988, passando-se pela Lei do SNUC, de 2000 e pelo Decreto do PNAP, de 2006, a prtica democrtica na

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    gesto das reas protegidas brasileiras ainda necessita de avanos e de transformaes profundas.

    Se a sociedade no compreende a UC como bem comum, o interesse em participar de sua gesto permanece restrito s questes pontuais e/ou de interesse imediato. Adicionalmente, o plano de manejo, principal documento de gesto, com sua linguagem e carter tcnico e legal, de difcil compreenso e apropriao por parte da sociedade, o que refora este distanciamento. Esta uma realidade que deve ser objeto de ateno por parte daqueles que pretendem desenvolver processos participativos de planejamento.

    Este contexto tambm resulta em desafios, tais como fortalecer as organizaes de base para os processos de participao, garantir a representao do conjunto de setores e interesses e afianar a representatividade dos diversos grupos sociais atuantes na regio.

    Para enfrentar tais desafios, preciso compreender as foras atuantes no contexto geral. E, ainda, ir mais alm, concentrando esforos no que for considerado possvel para promover transformaes, no campo de atuao da gesto, entendendo-se o planejamento como parte desta gesto.

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    Desafios no Contexto das Estruturas Institucionais

    No mbito das estruturas institucionais governamentais, entendidas tambm como partes da sociedade, persistem heranas do contexto histrico cultural brasileiro. A partir desta perspectiva, diversos desafios relacionam-se com a maneira de se trabalhar de forma produtiva, diante de posturas ainda autoritrias nas instituies gestoras, muitas vezes refratrias aos processos participativos. Nesse mbito identificamos algumas caractersticas, como: 1) O sistema hierarquizado vigente que dificulta a consolidao da gesto participativa. 2) A fragilidade na percepo sobre o papel do Estado e do servidor pblico. 3) A cultura organizacional vigente, que no prioriza a participao social. 4) O insuficiente preparo dos servidores, quanto s habilidades exigidas para o cumprimento dessa tarefa. 5) A centralizao dos processos nas sedes administrativas. 6) O incipiente respaldo institucional para iniciativas nascidas nas UCs. 7) O insuficiente planejamento estratgico nas UCs. 8) O entendimento equivocado da participao social apenas como uma questo legal a ser contemplada.

    necessrio superar resistncias; inserir a pauta da participao nas prioridades institucionais; garantir estrutura mnima de gesto que possibilite a realizao de processos participativos, incluindo qualificao dos gestores e investimentos de tempo e recursos (humanos e financeiros). Em outras palavras, preciso institucionalizar os processos participativos, em todos os nveis das instituies, tanto por meio do seu reconhecimento como de sua prtica.

    No que se refere aos planos de manejo, um dos desafios institucionais entender, coletivamente, que o plano, alm de ser um documento tcnico, como determina o SNUC, deve ser ao mesmo tempo, fruto de um acordo poltico entre os diferentes interesses presentes no territrio, como j apontado anteriormente. preciso considerar a governabilidade do rgo gestor sobre o territrio da UC e os marcos legais que incidem sobre este territrio e, finalmente, encontrar o equilbrio entre as demandas da sociedade e as do rgo gestor.

    Outra compreenso que deve ser assumida nas instituies a de que o processo participativo dinmico. E que, independente do momento de elaborao do Plano de Manejo (aps ou durante a formao do Conselho Gestor da UC), o importante que este

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    motive o empoderamento do Conselho e de outros espaos de participao na gesto.

    preciso, ainda, que as equipes e suas instituies, de um modo geral, entendam o planejamento como parte do ciclo de gesto adaptativa2. Um processo que abarca a investigao e a compreenso sobre o contexto, o planejamento, a execuo, o monitoramento e avaliao, o aprendizado e sua incorporao no ciclo de gesto seguinte.

    Cada etapa deste ciclo de gesto merece organizao e preparao, incluindo a abordagem participativa. De acordo com tal proposta, no decorrer de um ciclo de gesto adaptativa, ressalta-se a importncia dos mecanismos de avaliao, para que seja possvel a adaptao e no a improvisao ao longo do processo.

    Para tanto, a necessidade de capacitao, no mbito institucional, pode ser pontuada como um desafio. Segundo LUZ et alli (2011), a pertinncia e, ainda, a urgncia do processo de capacitao se baseia no fato de que a gesto de reas protegidas contempla um extenso rol de temas. Uma gama variada de vertentes que vo, desde o conhecimento de diferentes realidades ecolgicas, histricas, sociais, culturais e econmicas dessas reas, at o gerenciamento de insumos, planejamento, processos e resultados. Alm do mais, a gesto e manejo de reas protegidas so raramente tratados como disciplinas em cursos de graduao no Brasil.

    Portanto, a preparao de gestores pblicos ligados s reas naturais protegidas complexa. Requer um amplo conhecimento interdisciplinar e uma viso holstica dos sistemas naturais. Demanda profissionais com capacidade de gerenciar recursos, processos e com sensibilidade e habilidade para o gerenciamento de processos participativos.

    Neste sentido, vale ressaltar o investimento que o ICMBio vem fazendo na capacitao de servidores para atuarem na construo participativa da gesto. Como, por exemplo, a realizao do Ciclo de Capacitao em Gesto Participativa, Curso de Educao Ambiental na Gesto Pblica da Biodiversidade, entre outros.

    2 Mtodo que visa conferir uma maior adaptabilidade s organizaes em aspectos do ciclo de gesto de projetos, programas, planos e pessoas, e assim poder realizar mudanas necessrias.

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    Desafios sob a tica de Dois rgos Gestores

    A Fundao Florestal de So Paulo (FF/SP), responsvel pela gesto de 94 Unidades de Conservao de diferentes categorias, foi convidada a contribuir para o enriquecimento das discusses da Comunidade de Ensino e Aprendizagem em Planejamento de UCs. A equipe abordou a temtica da participao social nos PMs e pontuou desafios que so enfrentados no contexto dos planos de manejo, comuns, tambm, a outros rgos gestores. A FF/SP est na busca de formatos e metodologias adequadas, visando construir legitimidade junto aos atores sociais, com contribuies de consultores, de universidades e dos prprios conselhos (sejam consultivos ou deliberativos) para avanar na construo de PMs mais efetivos para a gesto das UCs.

    No plano institucional, pode-se pontuar como desafios a limitada clareza sobre os objetivos da participao social e como alcan-la (considerando acordos, conhecimento local/tradicional, demandas e expectativas). A insuficiente capacitao em tcnicas de planejamento participativo e de gesto de conflitos, visando escolhas adequadas na conduo dos processos (uso de tcnicas e linguagens acessveis aos distintos pblicos), tambm merece destaque.

    A equipe do ICMBio, tambm convidada para contribuir com as reflexes, ressaltou que a participao social em unidades de conservao no deve ocorrer apenas no Conselho Gestor, mas sim em todos os instrumentos de gesto, incluindo a visitao, a fiscalizao, entre outros. No entanto, os conselhos gestores so espaos relevantes na gesto das UCs. E o desafio, no momento, orientar seu funcionamento, buscando uma participao que se traduza em participao nos processos decisrios e em responsabilidade pelos resultados, com desenvolvimento de conscincia crtica e descentralizao das decises. Considerando que a participao social na gesto a estratgia mais eficaz para a conservao da biodiversidade, torna-se necessrio despertar, na sociedade, o sentimento de pertencimento em relao s unidades de conservao.

    Nessa linha de entendimento, a participao compreendida como um processo dialgico no qual todos (sociedade e rgos gestores) esto em constante aprendizado.

    PERCEBE-SE qUE AS INSTITUIES COMEAM A RECONhECER A IMPORTNCIA DA PARTICIPAO SOCIAL NA GESTO DA BIODIvERSIDADE

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    A equipe do ICMBio considerou, ainda, que h algumas questes determinantes quando se promove um processo participativo em Unidades de Conservao. Destacam-se, como exemplo: i) postura aberta do gestor da UC na construo do dilogo, uma vez que haver maior ou menor participao, na medida em que se consegue dialogar; ii) aspectos culturais locais; iii) nvel de organizao das comunidades locais; iv) assimetrias entre os atores sociais que atuam na tomada de deciso; v) caractersticas do processo de criao da UC; vi) capacitao dos atores sociais, prioritariamente os que se encontram em vulnerabilidade socioambiental; vii) gesto adaptativa com a participao social desde o incio, realimentando o processo, e viii) clareza de objetivos e relevncia do processo participativo para a gesto.

    Nesse sentido, a equipe do ICMBio deixa a seguinte provocao:

    Entendendo-se que o Estado um reflexo da sociedade, aquilo que a hegemonia da sociedade quer que seja, que participao a democracia brasileira quer na gesto das reas protegidas? Simo Marrul Filho, APA da Baleia Franca/ICMBio

    Conclui-se que os desafios expostos acima devem ser superados por todos, sejam eles a pouca tradio de participao da sociedade brasileira ou as desigualdades sociais entre os atores presentes na gesto da UC. Alm de preparar as equipes dos rgos gestores, necessrio, tambm, fortalecer a capacitao dos atores externos para apoio e interveno na gesto.

    Sugestes para Superar os Desafios

    Para que o processo de elaborao do plano de manejo no concentre todas as expectativas sobre a participao social na gesto das unidades de conservao, torna-se necessrio que a participao seja construda no cotidiano da gesto, facilitando, assim, o planejamento de processos sustentveis. Neste sentido, a participao no pode ser tratada como uma etapa que deve ser cumprida no check-list da elaborao do plano de manejo, mas, sim, deve ser incorporada no cotidiano da gesto da UC.

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    Alerta-se, tambm, para a importncia da incluso do componente poltico no processo de planejamento, j na etapa de Organizao do Planejamento, buscando-se o maior envolvimento dos tomadores de deciso. O objetivo assegurar que os pactos gerados no processo participativo de planejamento sejam assumidos pelos tomadores de deciso, nos diferentes nveis: tcnico, legal e poltico.

    Percebe-se que as instituies comeam a reconhecer a importncia da participao social na gesto da biodiversidade. Entretanto, ainda necessrio investir esforos na construo de um caminho de baixo para cima, ou seja, das UCs para as estruturas centrais das instituies.

    A sociedade deve se empoderar para intervir na gesto das instituies. No entanto, o imaginrio da gesto pblica um imaginrio de comando e controle. E mudanas nesta percepo demandam tempo. Considerando-se que as instituies so feitas pelas pessoas, necessrio reconhecer que as mudanas ocorrem inicialmente na mentalidade individual, para, depois, se congregarem em transformaes institucionais.

    Neste sentido, a Comunidade de Ensino e Aprendizagem em Planejamento de UCs ressalta alguns aspectos sobre a participao social na elaborao dos planos de manejo que devem ser especialmente considerados:

    Definio clara do alcance da tomada de decises. Esta deve ser feita por meio de regras pactuadas no incio do processo participativo, na tentativa de evitar ou minimizar as expectativas e potenciais frustraes.

    O envolvimento, desde o incio, de representantes da sociedade no grupo de governana do processo de planejamento uma forma de enfrentar o desafio de promover a participao dos interessados na Unidade de Conservao. Para tanto, desejvel explorar o planejamento de outras instituies envolvidas na gesto do territrio, conciliando agendas e interesses, estabelecendo parcerias tanto para a etapa de planejamento quanto para a execuo do plano.

    Na etapa de Organizao do Planejamento do PM imperioso prever e criar, ao longo do trabalho, espaos e condies para

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    que a negociao de conflitos seja vinculada aos diretamente interessados. Promovendo-se, assim, a real insero destes setores, dando-lhes voz e a responsabilidade na tomada de deciso sobre os problemas que os afetam diretamente. Desta forma, cumpre-se os princpios do enfoque ecossistmico, que expressam que as decises sobre a conservao da natureza devem estar na mo da sociedade. E que a gesto deve ser descentralizada no nvel mais baixo, apropriado a cada caso.

    importante reconhecer, desde o incio, que todo processo participativo gera expectativas. Portanto, necessrio trabalh-las sem ampliar conflitos e frustraes nos setores envolvidos.

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    O processo de elaborao do plano de manejo tem potencial para gerar resultados que vo alm da formalidade do documento. Portanto, a equipe de planejamento deve definir os resultados esperados e sua forma de registro e documentao.

    Ainda, importante buscar que, nas demais etapas do processo de planejamento, haja a capilaridade necessria, abrangendo os diferentes setores atuantes na regio. Nesse sentido, a comunicao ganha relevncia, pois necessrio investir no uso de meios e linguagens comuns e acessveis aos diferentes setores sociais, permitindo ampliar a capilaridade do planejamento e a manuteno da mobilizao dos atores envolvidos. Os atuais investimentos so pontuais no desenvolvimento de capacidades na rea de comunicao e esto muito aqum das necessidades do SNUC.

    Outro aspecto que merece a ateno das equipes de planejamento a importncia de equacionar, considerar e provocar interao entre o conhecimento cientfico e os saberes locais, no sentido de aprender e construir novos conhecimentos sobre a gesto social da biodiversidade. Essa interao pode contribuir para a superao do desafio de identificar o impacto dos processos participativos na conservao da natureza. As instituies de ensino e pesquisa tambm tem importante contribuio na incorporao de mecanismos de avaliao (instrumentos e indicadores) da participao social e de seu impacto na gesto das UCs e na proteo da biodiversidade. Alm de apoiar a construo de lies aprendidas sobre processos participativos de planejamento.

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    Fatores que devem ser considerados na promoo de envolvimento social na elaborao dos PMs (Augusta Gonalves/ICMBio)

    Questes relacionadas gesto e manejo da UC: A Unidade de Conservao permite, ou no, a permanncia

    da populao em seu interior? E qual o estgio do processo de regularizao fundiria?;

    H quanto tempo a UC foi criada?;

    Considerando-se o tempo da sua criao, quando, efetivamente, foram iniciadas as aes de gesto em campo?;

    A UC tem, ou no, um Conselho? E qual a mobilizao feita para cri-lo?;

    A chefia da Unidade se mantm prxima, ou longe de sua rea?.

    Relacionados motivao da sociedade: Existe, ou no, a apropriao de recursos da UC por parte

    da comunidade local, tais como: pesca, pinho, madeira, castanha etc.?;

    Trata-se de uma populao considerada tradicional, ou no?;

    Qual a vocao da regio para plantar ou utilizar recursos que podem ter alguma restrio por parte da UC, a exemplo do uso de transgnicos?;

    A UC utilizada para aulas de campo, cursos universitrios, etc.?

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    CONDIES NECESSRIAS PARA UM PROCESSO PARTICIPATIvO DE PLANEjAMENTOProcessos participativos que tragam resultados positivos para a gesto das Unidades de Conservao demandam o estabelecimento de condies para a interao produtiva entre governo e sociedade.

    Alguns pontos foram observados como condio para a boa qualidade da participao social no planejamento da UC, tais como:

    A unidade de conservao pertence sociedade brasileira como um bem comum;

    A participao social processo que permeia todas as fases do planejamento e ocorre em diferentes nveis, de diferentes formas e em diferentes momentos;

    Os instrumentos de gesto da UC, especialmente o Conselho Gestor e o plano de manejo, devem ser interpretados como pactos sociais entre os rgos gestores das UCs e os diferentes setores da sociedade;

    Participao um espao de acordos polticos em que nem sempre os critrios tcnicos prevalecem. Portanto, a Instituio deve estar preparada, e de acordo, ao avaliar um produto final de um processo participativo com olhar tcnico e poltico;

    Processos participativos, de um modo geral, requerem a construo de relaes de confiana entre os diferentes atores envolvidos, o que pode demandar tempo. Deste modo, reitera-se que a participao social deve estar no cotidiano da UC, com equipe presente e atuante e no se restringir ao perodo de elaborao do plano de manejo.

    No mbito da sociedade em geral, so condies essenciais no processo participativo de planejamento, a disposio e a capacidade dos diferentes setores em participar e aprender sobre a gesto de espaos naturais protegidos, incluindo

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    a legislao pertinente, as limitaes institucionais dos rgos gestores e as responsabilidades advindas da gesto democrtica.

    Em situaes de conflitos, necessrio considerar qual o nvel de animosidade presente para que se possa garantir um processo de negociao. Mas, importante reforar o entendimento de que a UC bem comum da sociedade brasileira, resgatando os preceitos da nossa Constituio.

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    APRENDIzADOS DA COMUNIDADE DE ENSINO E APRENDIzAGEM EM PLANEjAMENTO DE UC COM PROCESSOS PARTICIPATIvOSNa Organizao do Planejamento

    A primeira etapa do processo a Organizao do Planejamento dever conter a previso de como ser a participao da sociedade, desde a mobilizao, at a aprovao e execuo do plano de manejo. Alm disso, devem ser definidas tambm metodologias adequadas, resultados esperados, tempos necessrios, entre outros. Neste momento de preparao inicial, determina-se, conjuntamente, que tipo de envolvimento social dever ser buscado. E, ainda, quais so as estratgias que devero ser empregadas para a incluso de cada segmento.

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    OS APRENDIzADOS DEMONSTRAM qUE A ELABORAO DO PLANO DE MANEjO DEvE vALORIzAR OS ESPAOS fORMAIS ExISTENTES

    Recomenda-se que, nesta etapa, a partir das informaes j disponveis, ou do conhecimento prvio construdo, sejam adotadas ainda as seguintes estratgias: 1) identificao e reconhecimento do cenrio histrico-cultural. 2) identificao das polticas pblicas que incidem sobre o territrio e suas interfaces com a UC. 3) mapeamento prvio dos interesses e atores relevantes e da sua rede de interaes. 4) verificao do nvel de envolvimento dos atores com a UC.

    Essas aes facilitam o entendimento da complexidade da situao e a necessidade de negociaes. Com base na anlise das informaes existentes, busca-se, tambm, dimensionar adequadamente as capacidades do processo. Tendo-se em vista o equilbrio entre participao e governabilidade para cada caso especfico.

    tambm na organizao do planejamento que devem ser previstos os meios e as linguagens apropriadas para a comunicao entre o grupo de governana e os atores envolvidos. Diferentes meios de comunicao devem ser usados, para esclarecer a todos os participantes, com base nos marcos legais, quais so os limites de tomada de deciso e de governabilidade do processo.

    fundamental que a participao social se desenvolva com um conjunto de regras claras e pactuadas entre os envolvidos, desde o incio. O grupo de governana, no entanto, deve estar disponvel e predisposto a apoiar os encaminhamentos das demandas sociais, ao mesmo tempo em que insere a unidade de conservao nas agendas locais.

    Adequao ao Contexto

    importante trazer para o processo as condies favorveis ao estabelecimento do pacto social inerente ao plano de manejo, buscando-se o reconhecimento e o respaldo poltico necessrios para a elaborao e a execuo do mesmo. Assim, abre-se a possibilidade de alcanar uma articulao efetiva da UC com as polticas pblicas que incidem sobre o territrio e sobre os processos de gesto. Para tanto, preciso que o processo esteja adequado ao contexto no qual e para o qual se desenvolve.

    Experincias mostram que algumas aes podem contribuir para garantir o apoio poltico local pretendido. Como por exemplo, incluir os tomadores de deciso desde o incio, por meio de articulaes envolvendo a alta direo do rgo gestor e as lideranas locais.

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    Negociao de Interesses

    Considerando-se que o PM um documento tcnico, resultado de um pacto social, importante se ter clareza sobre a existncia de diferentes espaos de negociao na sociedade, que possuem foras polticas e econmicas assimtricas. Esta assimetria tende a refletir-se, tambm, nos espaos de negociao do PM.

    Os atores sociais envolvidos nem sempre possuem condies equivalentes de poder nos espaos de negociao para a tomada de deciso. Nesse sentido, fundamental a contnua disposio para a implementao de mecanismos que reduzam a assimetria de foras, proporcionando o empoderamento dos atores com menor poder e o gradativo crescimento qualitativo dos processos participativos.

    Capacitao Continuada

    Ter estratgia de formao continuada, fundamentada na realidade local e envolvendo todos os atores, de extrema relevncia para qualificar a participao, em especial, de setores fragilizados, de modo a garantir a participao mais efetiva e equitativa.

    valorizao dos Espaos formais Existentes

    O conselho gestor da UC, como espao formal de participao social na gesto, imprescindvel para o processo de elaborao do PM e, deve participar de forma ativa. Caso no esteja constitudo, o processo de elaborao do plano de manejo uma oportunidade para que esse seja formado e exera seu papel como espao de negociao e estrutura de gesto da UC.

    Os aprendizados demonstram que a elaborao do plano de manejo deve valorizar os espaos formais existentes, como os conselhos gestores de UCs, conselhos de meio ambiente, fruns, Oficinas de Planejamento Participativo (OPP), entre outros, com vistas tomada de deciso. Se necessrio, podem ser criados novos espaos, como reunies setoriais, grupos de trabalho, entre outros, sempre visando qualificar a participao social e a tomada da deciso.

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    Diversidade de Mecanismos de Participao

    Na busca de capilaridade e consistncia no processo participativo de planejamento, as experincias demonstram que se deve explorar a diversidade de mecanismos de participao. Com base no tempo e nos recursos financeiros disponveis, possvel combinar diferentes estratgias para coligir opinies e interesses dos segmentos sociais envolvidos, tais como: oficinas, reunies de trabalho com grupos sociais especficos, entrevistas, conversas formais e informais, apresentaes, troca de informaes por e-mail, fruns virtuais e outros. De forma adaptativa, se deve respeitar os atores envolvidos, a realidade local e o cenrio de conflitos e oportunidades. A organizao da discusso pode se dar por setores, por conflitos ou oportunidades, ou mesmo de forma totalmente integrada.

    importante considerar, tambm, que a origem da OPP, prevista nos roteiros metodolgicos vigentes, vem da necessidade de se assegurar espao de escuta aos diversos setores sociais. Assim sendo, este no deve ser o nico espao e momento para a participao social na elaborao do PM, pois apenas a realizao de uma oficina no garante um processo participativo de qualidade. Portanto, cada situao ir demandar estratgias especficas.

    Outro aspecto a ser ponderado que nem sempre possvel ter a participao de todos os envolvidos em todas as etapas do planejamento. Fatores como distncia, atividades comunitrias, custos e dificuldades com transporte, hospedagem e alimentao, so frequentes e, muitas vezes, impeditivos. Por conta disso, os momentos de participao devem ser bem planejados, objetivos e no muito extensos.

    Adequao dos Meios e da Linguagem na Comunicao

    Os processos participativos demandam ateno especial, quanto ao uso dos meios de comunicao e linguagem utilizada. Estes precisam ser adequados e especficos ao contexto local, muitas vezes, para que sejam eficazes. imprescindvel estabelecer estratgias claras de comunicao e buscar instrumentos adequados realidade local e ao pblico interessado. E, isto, com comunicao contnua ao longo do trabalho e no somente na sistematizao final.

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    Considerando-se o pblico que se quer alcanar, importante ter o cuidado de evitar o tecniqus, muito usual entre as equipes tcnicas. Sempre que possvel, bom utilizar representaes grficas e esquemas simples, alm dos vrios mtodos, tcnicas e ferramentas existentes para o planejamento participativo.

    Os documentos norteadores da gesto da UC, como o plano de manejo e demais documentos especficos (planos de uso pbico, de proteo, de uso dos recursos, por exemplo) precisam ser traduzidos para linguagens mais acessveis e menos tcnicas. Para isso, podem ser elaboradas cartilhas, exposies, itinerantes ou no, vdeos, entre outros meios que facilitam o acesso informao, por parte do pblico envolvido.

    Tratar os Conflitos de forma Transparente

    Ao longo de todo o trabalho de planejamento, recomendvel tratar os conflitos de forma transparente e criativa, explicitando-os e buscando gerencia-los de forma equilibrada.

    Do mesmo modo, recomendvel estabelecer os vnculos de compromisso e responsabilidade com a implementao do processo participativo, deixando claro as instituies e as pessoas vinculadas s aes propostas.

    Documentao e Transparncia do Processo

    preciso registrar todo o trabalho por meio, por exemplo, de atas das reunies e oficinas realizadas, gravaes, filmagens, fotos, dirios de expedies, registros de lies aprendidas, entre outros. Quando socializados, os registros das atividades desenvolvidas contribuem para dar transparncia ao processo.

    A documentao representa no apenas uma importante ferramenta para manter a memria da riqueza da caminhada realizada, mas tambm contribui para a evoluo da capacidade institucional e da sociedade envolvida, constituindo-se em oportunidades para a reflexo e o aprendizado.

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    Entender o Planejamento Participativo como Integrante do Ciclo de Gesto da Unidade de Conservao

    O planejamento no termina com os documentos finais, mas se fortalece medida que o planejado executado, avaliado e replanejado, sempre que necessrio, como algo dinmico, em um ciclo contnuo de gesto adaptativa.

    Desta forma, a participao social tambm precisa ser contnua, presente no cotidiano das UCs. E nas vrias atividades da gesto, tais como visitao, proteo, educao, extrativismo, pesquisa, monitoramento, entre outras.

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    BOAS ExPERINCIAS COM A PARTICIPAO SOCIAL NA ELABORAO DE PLANOS DE MANEjO E GESTO DE UNIDADES DE CONSERvAO A Participao Social no Processo de Elaborao do Plano de Uso Pblico do Parque Estadual de Itapeva, Torres/RS Por Alexandre Krob3 & Paola Prates Stumpf4

    ContextualizaoCriado pelo Decreto Estadual no 42.009 de 12 de dezembro de 2002, o Parque Estadual de Itapeva (PEVA), com rea aproximada de 1.000 hectares, est localizado no municpio de Torres, Litoral Norte do Rio Grande do Sul. A rea delimitada pelo Balnerio Itapeva, situado ao sul, pela Estrada do Mar (RS-389), a oeste, pelo oceano Atlntico, a leste, e pela zona urbana do municpio de Torres, ao norte.

    A rea de abrangncia da UC inclui o gradiente mar, dunas mveis, dunas fixadas por restinga, banhados, reas alagveis e mata paludosa. Os ecossistemas que compem este gradiente, caractersticos da faixa litornea do Rio Grande do Sul, encontram-se extremamente alterados, ou, at mesmo, suprimidos, na maior parte do litoral norte do Estado.

    O PEVA um dos ltimos remanescentes de rea destinada preservao desses ecossistemas, o que abrange a biodiversidade a

    3 Agrnomo, mestre em cincias do solo, coordenador tcnico do Instituto Curicaca e representante institucional no Conselho do Parque Estadual de Itapeva, membro da Comunidade de Ensino e Aprendizagem em Planos de Manejo.

    4 Biloga, coordenadora de Planos de Manejo da Diviso de Unidades de Conservao (DUC) da Secretaria Estadual de Meio Ambiente do Rio Grande do Sul (SEMA).

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    eles associada, a qual apresenta espcies endmicas e ameaadas de extino. Considerado, por muitos, como o ltimo parque nestas condies, o PEVA possui Plano de Manejo (Portaria SEMA no 55, de 22/11/2007) e Conselho Gestor atuantes e cumpridores do importante papel de auxiliar na gesto da UC. Tal atuao realizada por meio da elaborao de produtos e da tomada de decises que contribuem para a sua efetiva implantao.

    O Conselho Consultivo foi criado em 2005, em uma situao de conflito ocasionada pela resistncia de setores desenvolvimentistas locais criao do parque. Por conta disto, o Conselho teve, na sua composio, mais de 40 instituies. Essa primeira formao, embora paritria, ofereceu muita dificuldade para que, de fato, o Conselho ajudasse na implementao da Unidade de Conservao. Alm disso, o rgo acabou servindo apenas como uma arena de disputas polticas, sem que seus integrantes tivessem algum interesse de chegar ao consenso.

    Houve, ento, por parte de algumas de suas instituies-membros, as quais tinham o propsito de apoiar a implantao do Parque, uma mobilizao que culminou com a construo de uma estratgia de aperfeioamento da composio do Conselho. Por meio de um complexo processo, chegou-se reduo qualificada para cerca de 20 instituies-membros, representantes dos principais setores sem sombreamentos.

    A partir desse momento, as dinmicas internas do Conselho, mesmo sem nenhum tipo de qualificao para a gesto participativa, tornaram-se cada vez mais coerentes com os objetivos do Parque. Construiu-se um espao colegiado, altamente reconhecido por seu protagonismo na implantao da Unidade de Conservao. E isso se deu pela auto-qualificao coletiva do grupo, principalmente apoiada na troca de experincias e na interao de vises.

    O Processo de Elaborao do Plano de Uso Pblico do PEVAParte da rea abrangida pelo PEVA corresponde ao local onde funcionava um camping, poca, criado com a finalidade de proporcionar oportunidade de hospedagem e lazer em local prximo praia. Aps a criao do PEVA, o mesmo ainda permaneceu em operao, administrado, ento, pela SEMA/RS, atravs da equipe da UC, correspondendo nica rea aberta ao uso pblico.

    A falta de condies do local, somadas realizao de prticas que conflitavam com os objetivos da UC, foram pautas constantes das

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    reunies do Conselho Gestor. Mas a SEMA no atendia a contento as demandas de uma interveno qualificada.

    O conflito chegou ao seu limite quando o Conselho considerou que seria necessria a formalizao de uma denncia junto ao Ministrio Pblico. A denncia foi feita pelo Instituto Curicaca, ONG integrante do colegiado, e culminou na interdio judicial do camping. Este fato foi a oportunidade para a realizao de uma anlise tcnica da prtica da atividade no interior do PEVA, elaborada por um Grupo de Trabalho, institudo por Portaria da SEMA.

    O resultado preliminar desse trabalho apontou para a necessidade de fechamento do camping. Entretanto, essa proposta foi discutida no Conselho, que recomendou que, ao invs do fechamento, fosse realizado um Plano de Uso Pblico (PUP), que, alm de definir as formas mais adequadas para o parque cumprir com seus objetivos de lazer e recreao na natureza, poderia fortalecer o seu papel de contribuir para a melhoria social da comunidade local e para a educao ambiental.

    O PUP poderia, tambm, responder com mais subsdios tcnicos s questes referentes ao que deveria ser feito com a rea de camping. O parecer tcnico final do GT apontou, ento, para a necessidade de elaborao de um Plano de Uso Pblico. O resultado desse trabalho foi apresentado ao Conselho Gestor, o qual recomendou que a elaborao do referido documento deveria ser uma ao prioritria, juntamente com a regularizao fundiria da UC.

    Assim, foi estabelecido um Grupo Tcnico de Coordenao (GTC), no mbito da Diviso de Unidades de Conservao (DUC) da SEMA/RS, composto por servidores da sede, e pela equipe tcnica do PEVA. O GTC ficou responsvel pelo processo de elaborao do PUP em todas as suas fases, tendo o Conselho Gestor do PEVA como instncia de acompanhamento, encarregada de zelar pela qualidade do servio.

    A elaborao do Termo de Referncia (TdR), realizada pelo GTC, em conjunto com o Conselho, foi uma experincia bastante positiva, diante da reflexo feita pelos componentes das equipes, enfocando a sua concepo e os resultados esperados do TdR, alm da apropriao do processo pelos conselheiros. Desse modo, o TdR ficou ajustado s necessidades e o acompanhamento da execuo do servio foi melhor qualificado.

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    Conforme estabelecido no termo de referncia, aps a contratao do servio, o Conselho Gestor acompanhou todas as etapas do processo. Tendo em vista que os produtos apresentados pela consultoria eram de baixa qualidade, a participao do Conselho foi fundamental, fornecendo o respaldo necessrio ao GTC, a fim de fazer com que a contratada cumprisse o contrato a contento.

    No entanto, apesar dos apontamentos do Conselho quanto baixa qualidade dos produtos apresentados e do posicionamento do GTC pela no continuidade do servio pela consultoria contratada, a SEMA/RS posicionou-se favorvel manuteno da contratao, exigindo que a DUC compusesse uma soluo em conjunto com a contratada. Assim, a dificuldade encontrada e, ainda, no solucionada foi a de garantir a legitimidade do processo. Pois, no mbito da SEMA/RS, as decises tomadas de forma participativa, visando a qualidade dos servios contratados e, por consequncia, o bom uso dos recursos no foram acatadas.

    Lies Aprendidas e RecomendaesDestaca-se, como lio aprendida, a importncia do controle social na garantia da qualidade dos servios prestados pelo poder pblico. Para tanto, fundamental que o Conselho seja envolvido e se aproprie do processo, para que as discusses realizadas e as decises tomadas sejam qualificadas.

    Recomenda-se que o conselho esteja envolvido, desde a construo da concepo da ao que deve ser realizada. Em todos os planejamentos das UCs, seja no seu Plano de Manejo, no Plano de Uso Pblico, nos planos de ao, entre outros, deve existir forte participao dos atores diretamente envolvidos com a gesto da rea protegida.

    Se no houver um conselho estabelecido, recomenda-se a criao de um grupo de acompanhamento social, que pode, inclusive, ser o embrio da formao do Conselho. Se o Conselho estiver desativado, o planejamento colaborativo pode ser um elemento motivador da retomada, alm de tambm vir a ser um exerccio que permita identificar os verdadeiros parceiros da Unidade de Conservao.

    Existem, no Rio Grande do Sul, alguns conselhos de UCs bem formados, que j passaram pelos aperfeioamentos necessrios ao processo e vm demonstrando serem aliados dos gestores, desde

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    que estes saibam enxergar dessa forma. Um dos aprendizados dessa experincia que as condies de bom funcionamento dos conselhos, no planejamento participativo, no requer apenas investimento em qualificao dos conselheiros. Mas, tambm, e principalmente, requer investimento na construo dos laos de confiana entre os gestores e os membros do Conselho. O que exige tempo e muito esforo de todos os lados.

    Um aprendizado sobre a fragilidade dos processos participativos tambm merece uma anlise criteriosa. Embora a participao social na gesto das UCs esteja garantida no SNUC, a deciso de fazer a gesto de forma legitimamente participativa ainda depende da vontade poltica do rgo gestor. Essa vontade, nem sempre bem clara e verdadeira em todas as posies hierrquicas da tomada de deciso dos gestores pblicos, pode no ser confirmada at a deciso final, como aconteceu na experincia aqui relatada.

    Recomenda-se que haja, por parte dos gestores da Unidade de Conservao e de seus conselheiros, um esforo maior para que o compromisso de encarar com respeito as decises do Conselho seja assumido por todas as instncias de deciso. No caso, seja assumido, inclusive, pelo prprio secretrio(a) do meio ambiente, no estado. Este compromisso deve ser explicitado, preferencialmente, em uma reunio do conselho.

    Outra lio relevante refere-se ao nvel da qualidade e do comprometimento das equipes tcnicas gestoras das Unidades de Conservao. Hoje, contamos, na Diviso de Unidades de Conservao da Secretaria Estadual de Meio Ambiente do Rio Grande do Sul, com uma parcela significativa de tcnicos qualificados, que demonstram terem forte compromisso com as Unidades de Conservao. Em acrscimo, estes tcnicos tm, ou pela formao, ou pela viso de mundo, uma compreenso clara da importncia da participao social no planejamento e na gesto das reas protegidas.

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    Plano de Manejo da Reserva Extrativista do Cazumb Iracema, Acre Por Arlindo Gomes filho, Cludia Conceio Cunha e Tiago juru Damo Ranzi5

    ContextualizaoA experincia de elaborao do Plano de Manejo da Reserva Extrativista do Cazumb-Iracema teve algumas peculiaridades, uma vez que ocorreu de forma descontnua e num contexto de inexistncia de experincias prvias de elaborao de planos de manejo de Reservas Extrativistas (RESEX) que pudessem servir de referncia orientadora quele processo.

    A Reserva foi criada em setembro de 20026. E, j no final daquele ano, a Diretoria de Gesto Estratgica do Ibama (DIGET)7, com a colaborao de tcnicos da ento Gerncia Executiva do Ibama/AC e de alguns moradores da UC iniciou o planejamento para a elaborao de seu plano de manejo. As atividades planejadas (por exemplo: diagnstico socioeconmico e reunio para discusso do zoneamento) foram executadas nos meses que se seguiram. E uma verso preliminar do documento foi concluda em dezembro de 2003 (plano de manejo - primeira fase).

    Submetido ao ento Centro Nacional de Desenvolvimento Sustentado das Populaes Tradicionais CNPT/Ibama para anlise, o documento foi encaminhado ao Ministrio do Meio Ambiente, tendo recebido, nessa instncia, um parecer desfavorvel. Tal parecer foi contestado formalmente pelos tcnicos que participaram da elaborao do Plano, por meio de documento encaminhado ao CNPT. Entretanto, em razo de mudanas internas e do conturbado contexto tcnico-poltico daquele setor do Ibama, na ocasio, o Plano de Manejo elaborado permaneceu sem um posicionamento institucional conclusivo.

    Paralelamente ausncia de manifestao institucional conclusiva por parte do CNPT/Ibama, a equipe de gesto da UC redirecionou seus esforos de trabalho para a execuo do projeto Estrutura

    5 Analistas Ambientais do Instituto Chico Mendes de Conservao da Biodiversidade.

    6 Conforme Decreto s/n, de 19 de setembro de 2002.

    7 Representada pela Coordenao de Projetos de Cooperao e Financiamento Externo.

    A vALORIzAO DA fALA DOS COMUNITRIOS fOI UMA DAS METAS PERSEGUIDAS.

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    de Gesto da Reserva Extrativista do Cazumb-Iracema8, voltado ao fortalecimento da organizao social e criao do Conselho Deliberativo da RESEX.

    Em 2006, com novas mudanas no Ibama e a criao da Diretoria de Desenvolvimento Socioambiental (DISAM), resultante da reestruturao do CNPT, foi elaborado o Roteiro Metodolgico para Elaborao de Plano de Manejo das Reservas Extrativistas e RDS9. Neste novo cenrio, com o Conselho Gestor da UC j criado10

    e em funcionamento, a equipe tcnica da Reserva Extrativista do Cazumb-Iracema sentiu-se motivada a revisar o Plano de Manejo elaborado, visando adapt-lo s diretrizes do novo roteiro.

    As etapas planejadas para a reviso e adequao do plano foram executadas (PM - segunda fase) e incluram a discusso e aprovao, por parte dos moradores da Reserva, do Plano de Utilizao da Unidade11. As informaes e produtos gerados foram, a partir da, sistematizados numa nova verso revisada do Plano de Manejo da Reserva Extrativista do Cazumb-Iracema. O documento foi aprovado pelo Conselho Deliberativo da Reserva12 e pela Diretoria de Unidades de Conservao de Uso Sustentvel e Populaes Tradicionais (DIUSP), setor do ICMBio, ento responsvel pelas RESEXs. Em agosto de 2008, o Plano de Manejo foi, finalmente, formalizado por meio de Portaria13, publicada no Dirio Oficial da Unio.

    Como aconteceu a participao social?Ao longo das etapas do processo que culminou na elaborao e aprovao do Plano de Manejo, adotou-se, como princpio norteador, a construo participativa. Buscou-se assegurar aos comunitrios e tcnicos espaos de interveno que oportunizassem a troca de experincias e capacitao mtua, visando diminuir as assimetrias

    8 Projeto financiado pelo Fundo Nacional do Meio Ambiente e executado de 2003 a 2006 (Edital

    FNMA n 03/2003 Fortalecimento da Gesto Participativa em Unidades de Conservao de Uso Sustentvel)

    9 Posteriormente, esse roteiro foi oficializado pela Instruo Normativa ICMBio n 01, de 18 de

    setembro de 2007, que instituiu as diretrizes, normas e procedimentos para a elaborao de Plano de Manejo Participativo de Unidades de Conservao Federais das categorias RESEX e RDS.

    10 Institudo pela Portaria Ibama n 25, de 09 de maro de 2006.

    11 Atualmente denominado Acordo de Gesto pelo ICMBio.

    12 O Conselho aprovou o Plano de Manejo da UC em sua 8. Reunio Ordinria, realizada em 11 de maro de 2008 em Sena Madureira/AC - Resoluo n. 004, de 18 de maro de 2008.

    13 Portaria ICMBio n 56, de 28 de agosto de 2008, publicada no Dirio Oficial da Unio de

    29/08/2008.

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    existentes e ampliar o conhecimento desses atores para uma interveno mais qualificada na gesto conjunta da Reserva.

    Adaptaes de mtodos e tcnicas participativas conhecidas (por exemplo: diagrama de Venn, identificao e anlise de problemas) foram empregadas. De acordo com as necessidades da equipe frente dos processos, foram consideradas as limitaes impostas pelas circunstncias locais (por exemplo: reas de difcil acesso, grandes distncias, baixa escolaridade da populao).

    A valorizao da fala dos comunitrios foi uma das metas perseguidas. Alm disto, quando possvel, buscou-se propiciar atividades em pequenos grupos, com o objetivo de se estimular as manifestaes e favorecer a interao e a troca de ideias. Foram utilizados, predominantemente, linguagem e materiais acessveis, visualmente atrativos e de fcil compreenso. Assim, as pessoas no alfabetizadas, que representavam uma significativa parcela da populao da UC, no foram excludas.

    A participao dos comunitrios e demais atores deu-se por meio de reunies nas comunidades (em 2003, 2004, 2005, 2006 e 2007) e na sede do municpio de Sena Madureira (2005 e 2007). Envolvendo-se um grande nmero de moradores das diversas regies da Reserva e alguns moradores do entorno.

    Nessas reunies, foram identificados e discutidos temas relevantes, a saber: importncia da Reserva, instituies relacionadas, perfil socioeconmico dos moradores, o plano de utilizao, o zoneamento e os programas que constariam no Plano de Manejo da UC14. Alguns moradores colaboraram, tambm, de forma regular, na coleta de dados, aes de apoio logstico e em discusses de planejamento das atividades.

    Alm da participao das comunidades, foi criada, no mbito do Conselho Deliberativo, uma cmara tcnica multidisciplinar, formada por especialistas de instituies parceiras. O objetivo foi contribuir, na condio de revisores tcnicos, com crticas e sugestes para o aprimoramento do documento.

    O processo tambm envolveu aes do Ibama/ICMBio, formalizadas em diversos nveis de parceria, com instituies e programas (por exemplo:

    14 Relatrios, atas e fotos de grande parte desses eventos encontram-se disponveis na sede administrativa da Unidade de Conservao.

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    Associao dos Seringueiros do Seringal Cazumb, WWF-Brasil, Programa reas Protegidas da Amaznia ARPA/MMA, Universidade Federal do Acre (UFAC), Cmara Municipal de Sena Madureira).

    Dificuldades encontradas e como foram superadas?No processo de elaborao do Plano de Manejo, compatibilizar o tempo das comunidades com os tempos institucionais revelou-se um desafio permanente, assim como reunir condies que permitissem assegurar um nvel minimamente aceitvel de representatividade, legitimidade e de participao qualificada. Foi detectada, nas comunidades, uma tendncia priorizao de problemas mais imediatos, com implicaes no processo de elaborao do Plano de Manejo, diante de seu carter predominantemente estratgico.

    A aplicao do conhecimento tradicional como orientador do planejamento tambm apresentou limitaes. Isto ocorreu a partir do teor mais local e territorial desse tipo de conhecimento emprico, alm das escalas amaznicas que se aplicam ao Plano de Manejo da Reserva15.

    A inexistncia de planos de manejo de reservas extrativistas somou-se s diferenas de percepo dos indivduos envolvidos na sua elaborao, anlise e aprovao. O que dificultou o exerccio de equilibrar o componente estratgico e o operacional, no documento final.

    Algumas dificuldades encontradas e no superadas incluem a elaborao de um documento para alm da prpria UC, integrado aos planos de outras Unidades e a outros planos de desenvolvimento regionais. Buscando-se, assim, uma gesto territorial efetiva, alm da definio e do registro, no prprio plano, de metas e indicadores para monitorar e avaliar a evoluo de sua implementao.

    No plano Institucional, a instabilidade provocada por sucessivas mudanas na estrutura organizacional do Ibama e posterior criao do ICMBio tambm dificultou o processo. Esta situao foi provocada pelo fato de que indefinies quanto aos mtodos para elaborao e o perfil desejado para o Plano de Manejo geraram descontinuidades que contriburam para provocar o descrdito da equipe e da instituio junto comunidade.

    15 A Reserva Extrativista do Cazumb-Iracema tem cerca de 750.000 ha.

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    Lies AprendidasA necessidade de capacitao continuada, visando qualificar a participao dos moradores e suas representaes, nos aspectos mais tcnicos do plano, foi constatada. A apresentao e discusso de conceitos ou termos tcnicos, tais como: planejamento, zoneamento, programas de manejo, preferencialmente acompanhada de exerccios prticos e ldicos para facilitar a manuteno do interesse e compreenso, revelou-se de grande importncia no processo.

    A elaborao do Plano de Manejo, por ser um processo, tende a intensificar a presena do rgo gestor e outras instituies na rea, resultando na aproximao e aumento da confiana entre esses grupos envolvidos na gesto da UC. Entretanto, a paralisao no processo em andamento tambm apresenta o efeito contrrio, podendo levar a um enfraquecimento das relaes em construo.

    A disponibilidade de recursos financeiros de acesso simplificado e com maior flexibilidade de aplicao reafirmada, atravs da participao de instituies parceiras, a exemplo do WWF-Brasil e do Programa ARPA/MMA. Desta maneira, o suporte direcionado para aes pontuais e complementares, fundamentais para a elaborao do Plano de Manejo da Reserva Extrativista do Cazumb-Iracema, adquire mais fora.

    Apesar de no terem sido inicialmente planejadas como fases do processo de elaborao do Plano de Manejo da Unidade de Conservao, as atividades de criao do Conselho Deliberativo, intercaladas s duas fases de elaborao do Plano de Manejo, contriburam para incrementar e integrar parcialmente esses dois processos/produtos. Isto se deu com ganhos perceptveis para ambos.

    Sempre que as condies favorecerem, a construo paralela e, idealmente integrada desses dois instrumentos, parece ser uma estratgia muito positiva. E, especialmente, se houver um planejamento prvio para a otimizao dos resultados.

    RecomendaesVisando intensificar a utilizao do Plano de Manejo como documento norteador da gesto da UC, disseminar o conhecimento e o cumprimento das normas nele estabelecidos e alcanar sua efetiva implantao, recomendvel ampliar o fluxo de informaes e a comunicao entre as diversas instncias de gesto (grupos sociais informais, associaes, Conselho Gestor, cmaras tcnicas,

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    chefia da UC, etc.). O Plano deve ser divulgado de diferentes formas e em diferentes linguagens, para atingir os diversos pblicos que interagem com a Unidade. A implementao do plano deve tambm ser monitorada e avaliada, com uma periodicidade que permita ajustes e correes.

    importante que o Plano de Manejo seja elaborado como um documento de carter predominantemente estratgico. Mas que consiga apresentar, de forma clara, o rebatimento de suas diretrizes e orientaes gerais, na definio e no delineamento das atividades prticas e cotidianas da gesto da UC.

    necessrio, ainda, o empenho do rgo gestor e de demais instituies parceiras, envolvidas com a UC. Todos devem assumir o compromisso de assegurar condies mnimas equipe gestora, para que o Plano de Manejo possa ser implementado e, efetivamente, utilizado como instrumento de gesto.

    Por fim, o histrico de elaborao e execuo (ou no execuo) dos planos de manejo no pas, as interminveis discusses conceituais do que seria um Plano de Manejo adequado ou correto e o mito desse instrumento como um solucionador de todos os problemas das UCs indicam que uma exagerada expectativa acerca das transformaes que resultaro de sua implementao criada antes e durante seu processo de elaborao. Esse aspecto deve ser tambm tratado, ao longo da elaborao do Plano de Manejo, de forma a se conferir a esse instrumento a importncia que ele reconhecidamente tem. Porm, na medida de sua real capacidade de induzir/contribuir para as transformaes desejadas.

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    Plano de Manejo da APA Anhatomirim/Santa Catarina Por heitor Schulz Macedo16

    Caracterizao da ExperinciaA APA Anhatomirim uma Unidade de Conservao federal com 4.750 hectares, criada em 1992 (Decreto Federal no 528/1992), com os seguintes objetivos: assegurar a proteo da populao residente de golfinhos, bem como os remanescentes de mata atlntica e fontes hdricas de relevante interesse para a sobrevivncia das comunidades de pescadores artesanais da regio. (Decreto Federal no 528/1992, art. 1o).

    Est localizada na Grande Florianpolis, municpio de Governador Celso Ramos. Cerca de 60% de sua rea marinha. Em suas cinco comunidades, residem aproximadamente 4.000 pessoas, a maioria com relao direta com a pesca artesanal. Atualmente, o turismo e a maricultura esto crescendo em importncia econmica na regio.

    O processo de elaborao do Plano de Manejo da APA Anhatomirim respeitou as seguintes fases, considerando que a legislao exige um carter simultaneamente tcnico e participativo: compilao de dados secundrios e identificao de lacunas de pesquisa; realizao de pesquisas primrias; realizao de reunies e oficinas participativas; consolidao e revalidao.

    Como se deu a participao social?A participao social ocorreu durante todo o processo, inclusive durante a realizao de algumas das pesquisas, principalmente no diagnstico pesqueiro. Mas os esforos centrados especificamente na participao social se deram durante a realizao das reunies e oficinas e, finalmente, na revalidao.

    Inicialmente, foi realizada uma srie de reunies e oficinas com os diferentes atores que guardam relao com a UC. O diagrama abaixo busca ilustrar o fluxograma do processo participativo adotado.

    16 Socilogo, mestre em Meio Ambiente e Desenvolvimento. Analista Ambiental do ICMBio na APA Anhatomirim.

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    Duas reunies comunitrias

    Duas reunies comunitrias na

    Costeira

    Duas reunies comunitrias na

    Fazenda

    Duas reunies comunitrias na

    Armao

    Duas reunies comunitrias em

    So Miguel

    Duas reunies comunitrias em

    Joo Rosa

    Uma reunio Agricultura em Areias

    Oficina Turismo

    Embarcado

    Oficina Maricultura

    Oficina Pesca

    ReunioTurismo Terra

    Oficina Conselho Gestor

    Oficina Pesquisa

    Reunies de Planejamento Participativo