parte xxvi

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Quinta da Confusão – O nascimento de um império 126 Dia 6 A fundação do Império da Quinta da Confusão Época da fundação do império 6 de Janeiro de 2009 Seg Ter Qua Qui Sex Sab Dom 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 13 14 15 16 17 18 19 20 21 22 23 24 25 26 27 28 29 30 31

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Parte XXVI de «O nascimento de um império»

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Quinta da Confusão – O nascimento de um império

126

Dia 6

A fundação do Império

da Quinta da Confusão

Época da fundação do

império

6 de Janeiro de 2009

Seg Ter Qua Qui Sex Sab Dom

1 2 3 4

5 6 7 8 9 10 11

12 13 14 15 16 17 18

19 20 21 22 23 24 25

26 27 28 29 30 31

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7:30 Habitantes: 285

Tal como normalmente, os animais da Quinta da Confusão acordaram aos primeiros raios de sol, preparando-se para mais um dia de aventuras. Fora assim desde a racionalização: no Dia 1 fora a I Guerra dos Animais, no Dia 2 o ataque dos funcionários ao Celeiro-Forte, nos Dias 3 e 4 a Fuga do Mercado e a II Guerra dos Animais e, por fim, no Dia 5 fora a vinda do touro e a III Guerra dos Animais, que agora estava parada devido à prisão do touro. Pensando no que os esperaria nesse dia, os animais levantaram-se e saíram do abrigo nocturno. Mal andaram uns metros, viram o acontecimento que os aguardava: a inundação das margens da ribeira. A chuva forte dessa noite, tal como acontecera antes, aumentara o caudal da ribeira e fizera-a alargar-se. Em vez dos 5 metros de largura normais, a ribeira tinha agora uns estrondosos 120. A água invadira 65 metros de terreno na margem direita e 50 na esquerda, apanhando tudo o que se encontrava no caminho. Os cavalos e as carroças deixados no caminho da água aguardavam os proprietários em cima de alguns cm de água nada quente. A feira e o armazém haviam sido invadidos pela ribeira, e as mercadorias mais leves flutuavam em cima da água. Vários hectares de plantações haviam sido destruídos, até as que estavam abrigadas por estufas. Mas o mais devastador era a total inundação da Mina de Ferro, que privava de trabalho cerca de um quarto da população da Quinta da Confusão e punha em risco as actividades de outro quarto. Os mineiros ficaram sem o seu local de trabalho, e os fabricantes de instrumentos perderam o seu fornecimento de ferro visto que o da feira não duraria muito. Mas ninguém ficou de braços cruzados perante tal catástrofe. Os agricultores atingidos pela cheia, mesmo sabendo que as suas ervas haviam morrido com a água, tentaram colher as que já estavam crescidas o suficiente para serem comidas. Os fabricantes de instrumentos foram à feira, que acabara de abrir, para comprarem o máximo de ferro que pudessem antes de este se tornar demasiado caro. Por seu lado, os mineiros compraram botijas de ar e entraram na Mina de Ferro, para tentarem trabalhar o máximo que conseguissem debaixo de água. Os madeireiros, não afectados pela cheia, continuaram o seu trabalho como normalmente.

No entanto, a cheia não se combatia tão facilmente. Na feira, algum do ferro enferrujou sob o efeito das águas. As ervas escaparam porque estavam fechadas em caixas que se mantiveram estanques. O que os empregados da empresa mais temiam era que a água tivesse estragado as notas da feira, o que seria verdadeiramente um duríssimo golpe para a empresa. Mas, por sorte, o dinheiro estava fechado em caixas também estanques, e manteve-se intacto. Assim, a feira perdeu apenas algum ferro.

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Os agricultores afectados tiveram mais prejuízos, mas safaram-se relativamente bem da cheia. Colheram as ervas mais crescidas, aquelas que não tinham ficado totalmente submersas, e venderam-nas para compensar os prejuízos. Quando as águas recuassem, poderiam iniciar uma nova plantação de ervas. Os fabricantes de instrumentos depararam-se com o aumento do preço do ferro, e cada vez conseguiam arranjar menos ferro com o dinheiro que pagavam habitualmente. Por isso tinham que pagar cada vez mais para obterem o mesmo ferro, e para compensar tinham que fazer instrumentos de madeira e couro. Os mineiros foram o grupo mais afectado pela cheia. Ao contrário do que pensavam, era bem mais difícil trabalhar debaixo de água por um razão: a água estava cheia de lama e fazia arder os olhos dos mineiros, que se viam forçados a voltar à superfície frequentemente para recuperarem. Trabalhavam um ou dois minutos e depois voltavam para a superfície por causa do ardor nos olhos. Mas os animais eram persistentes, e continuaram a trabalhar mesmo naquelas condições, com pouca visibilidade e com os olhos a arderem cada vez mais à conta da água cheia de terra. Naturalmente, era impossível acender os altos-fornos debaixo de água, pelo que a fundição do ferro teria que ser feita à superfície nos altos-fornos dos fabricantes de instrumentos. Os mineiros tinham uma compensação pelo seu árduo trabalho: cada barra de ferro que vendessem à feira valia várias vezes mais do que o habitual. A cheia fora mais devastadora para a Quinta da Confusão do que o touro e a Crise do Dia 5, mas ainda assim os animais souberam contorná-la e vencer os seus efeitos. Pelo menos, alguns deles.

Tal como os outros animais da quinta, o touro acordou com o começo da manhã. O animal já não se lembrava de que estava preso ao algeroz da casa dos donos, e por isso começou a andar. Mas, tal como acontecera no dia anterior, a corda impediu-o de continuar ao fim de poucos metros. Com isso, o animal lembrou-se da sua situação e voltou a tentar escapar. Tanto puxou que entortou ainda mais o algeroz, deixando-o com uma curva saliente, mas cansou-se antes de o conseguir partir de vez. O touro resignou-se a descansar, mas sabia que, quando voltasse a acordar, tentaria escapar novamente. Haveria de conseguir fugir alguma vez, levasse o tempo que fosse preciso.

8:00 Apesar dos esforços dos mineiros, que trabalhavam arduamente em

condições adversas para manter o fornecimento de ferro à feira, o metal estava-se a esgotar rapidamente. Das 4 toneladas que a feira tinha no fim do Dia 5 já só restavam 750 kg, menos de 20% do valor original. E, apesar do alto preço do ferro, que ultrapassava já 25 euros por kg, os fabricantes

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de instrumentos continuavam a comprá-lo para fazerem reservas. Chegavam a haver animais que compravam ferro só para o venderem mais tarde, depois de os preços subirem novamente. Mas o director da feira sabia que, quando o ferro da feira esgotasse de vez, tudo ficaria bem, uma vez que a empresa tinha uma reserva de instrumentos de ferro para satisfazer a procura. Não iria durar para sempre, mas deveria aguentar até se encontrar outra mina de ferro capaz de funcionar normalmente. A grande procura de ferro até beneficiava a feira, ajudando-a a recompor-se da Crise do Dia 5. Além disso, os fabricantes de instrumentos tinham os instrumentos de madeira e couro para se sustentarem. Mas os animais, em especial os fabricantes de instrumentos, não queriam saber das previsões do director da feira. Continuavam a comprar ferro cada vez mais caro, e a aumentar cada vez mais as reservas de dinheiro da empresa. A feira era o centro da Quinta da Confusão, e o seu director era quase o governante da quinta visto que as suas decisões sobre a feira afectavam, de uma maneira ou de outra, todos os animais da quinta. Mas nem ele nem os outros animais sabiam isso.

250

1.000

2.0002.500

4.000

2.500

750

0400800120016002000240028003200360040004400

Dia 4 (16:00)

Dia 4 (19:00)

Dia 4 (Fim)

Dia 5 (17:30)

Dia 5 (Fim)

Dia 6 (7:30)

Dia 6 (8:00)

Ilustração 16 - Gráfico com o ferro existente na feira, em kg, entre a sua

criação, na tarde do Dia 4, e as 8:00 do Dia 6. Note-se a grande queda

nas reservas de ferro da feira a partir do final do Dia 5.

9:00 Após 1 hora e meia de trabalho árduo, exaustos e com os olhos a

doerem bastante, os mineiros desistiram de continuar a lutar com a inundação da Mina de Ferro. A visibilidade debaixo de água era

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praticamente nula, após 90 minutos de escavações que despejaram ainda mais terra para a água. Pelo que tinham conseguido ver, os moldes e os altos-fornos tinham perdido imensa argila em contacto com a água, e o ferro exposto havia enferrujado. Quando a água da mina desaparecesse, seria preciso refazer os moldes e os fornos. Mas os mineiros tinham noção de que, por si só, a água levaria vários dias a evaporar e a ser absorvida pela terra, pelo que teriam de fazer alguma coisa. Então, compraram baldes e foram fazendo o possível para retirarem as dezenas de milhares de litros de água que enchiam a Mina de Ferro. Isso levaria muito tempo, mas os mineiros tinham tempo para isso. Não voltariam a trabalhar na mina até a água desaparecer de vez. O encerramento da Mina de Ferro apressou o fim das reservas de ferro da feira. As últimas centenas de kg foram vendidas ainda antes de o director ter tempo para aumentar os preços. Ainda assim, os últimos kg foram vendidos a uns estrondosos 100 euros por kg, um valor inimaginável. Com esse impulso final, a feira conseguiu recuperar da Crise do Dia 5, apagando de vez os efeitos desse acontecimento. E, tal como o director da feira previu, a falta de ferro não teve grandes efeitos na Quinta da Confusão. A procura de instrumentos de ferro manteve-se igual, suportável para as reservas de instrumentos da empresa. Se não houvesse nenhum acontecimento inesperado que aumentasse a necessidade de ferro, não haveria nenhum problema. Os fabricantes de instrumentos trabalharam o ferro que tinham e depois focaram-se em instrumentos de madeira e couro para ganharem dinheiro. As águas da ribeira também estavam a recuar, lentamente mas estavam. Já tinham recuado alguns metros, o suficiente para libertar a Mina de Ferro. Era por isso que os mineiros a podiam esvaziar, porque até ali a ribeira chegava à entrada da mina. Algumas plantações também já estavam livres da água, e podiam recomeçar o trabalho. Mas a feira e o armazém, assim como as plantações junto da ribeira, só se libertariam das águas pela tarde desse dia. A ribeira só voltaria ao normal pelas 18 horas, e ainda faltava muito até essa altura.

Ignorando os acontecimentos da Quinta da Confusão, o touro voltou a acordar após um descanso de hora e meia. E, tal como das 3 vezes anteriores, de novo tentou libertar-se puxando ao máximo pela corda que o prendia. Após várias tentativas sem que nada acontecesse, o touro achou que, tal como das outras vezes, nada conseguiria dessa vez. Mas enganava-se. O algeroz já estava danificado pelas 3 tentativas de fuga anteriores do touro, e não resistiu à quarta. Quando o animal voltou a tentar a fuga, a parte do algeroz que estava dobrada começou a separar-se do resto da estrutura. O touro ouviu os ruídos e percebeu que alguma coisa se passara, pelo que voltou a tentar puxar a corda com todas as suas forças. Por fim, o algeroz cedeu. Um último ruído e a parte já dobrada separou-se de vez, dando a liberdade ao touro. O animal começou a vaguear pela Quinta da