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UNIVERSIDADE DE LISBOA FACULDADE DE CIÊNCIAS DEPARTAMENTO DE QUÍMICA E BIOQUÍMICA Papel dos esfingolípidos complexos na organização da membrana plasmática da levedura Saccharomyces cerevisiae Catarina Sofia Alves Correia Antunes Dissertação Mestrado em Bioquímica Área de especialização: Bioquímica Médica (2013)

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UNIVERSIDADE DE LISBOA

FACULDADE DE CIÊNCIAS

DEPARTAMENTO DE QUÍMICA E BIOQUÍMICA

Papel dos esfingolípidos complexos na

organização da membrana plasmática da

levedura Saccharomyces cerevisiae

Catarina Sofia Alves Correia Antunes

Dissertação

Mestrado em Bioquímica

Área de especialização: Bioquímica Médica

(2013)

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UNIVERSIDADE DE LISBOA

FACULDADE DE CIÊNCIAS

DEPARTAMENTO DE QUÍMICA E BIOQUÍMICA

Papel dos esfingolípidos complexos na

organização da membrana plasmática da

levedura Saccharomyces cerevisiae

Catarina Sofia Alves Correia Antunes

Dissertação

Mestrado em Bioquímica

Área de especialização: Bioquímica Médica

Orientadores: Doutor Rodrigo Freire Martins de Almeida e Professora Doutora Helena

Susana Pappámikail da Costa Marinho

(2013)

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I

Agradecimentos

Agradeço aos meus orientadores, Professor Doutor Rodrigo Almeida e Professora

Doutora Susana Marinho não só por me terem dado a oportunidade de realizar a minha

tese de mestrado nos seus laboratórios, mas também por toda a ajuda, disponibilidade,

conselhos e sobretudo pelo apoio que me deram ao longo deste ano de estágio.

Agradeço-lhes também por terem contribuído bastante para o enriquecimento do meu

conhecimento e por me terem dado a possibilidade de aprender novas técnicas.

À Professora Doutora Luísa Cyrne pela ajuda e apoio prestado ao longo deste ano

de trabalho.

Ao Grupo de Química dos Glúcidos, em especial à Professora Doutora Amélia

Pilar, por permitir a hidrólise alcalina dos meus extratos lipídicos e pela cedência do

rotavapor. Também á Catarina Dias, Rita e ao restante pessoal do grupo pela boa

disposição, simpatia e pela ajuda que me deram.

À Professora Doutora Ana Viana e ao Mestre Joaquim Marquês por possibilitarem

a análise dos meus extratos lipídicos por AFM.

Ao Doutor Pedro Falé e à Professora Doutora Luísa Serralheiro pela cedência do

rotavapor.

Ao Mestre Tiago e Doutor Pedro Alves pela disponibilidade e pelas diversas

tentativas de análise das minhas bandas de esfingolípidos por ESI-MS, e em geral à

Professora Helena Florência pela cedência da utilização de equipamento de

espectrometria de massa do seu grupo.

Aos meus colegas de laboratório, Andreia, André, Filipa, Inês, Ana Matos, Ana

Lopes, e Ana Carreira pela preocupação, paciência, amizade, ajuda, apoio e diversão

que proporcionaram ao longo deste ano. Ao meu Sensei Joaquim por me ter dado não só

um grande apoio e incentivo quando as coisas corriam mal, mas também pelas

brincadeiras e batalhas que tornaram este ano muito mais divertido.

À minha madrinha (Catarina) e à Vera, pelas grandes amigas que são, por se

preocuparem e por estarem sempre lá quando eu precisava.

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II

À Telma por ter estado sempre presente, pela preocupação, apoio e por levar muitas

vezes por tabela quando as coisas não me estavam a correr bem. Para além da grande

amiga que és, foste uma ótima colega de laboratório.

Por fim queria agradecer à minha família, principalmente aos meus pais e à minha

tia Feli por me terem dado a oportunidade de concretizar este meu objetivo, e por apesar

de longe estarem sempre presentes.

Muito Obrigada a todos!

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III

Índice

Agradecimentos ........................................................................................................... I

Símbolos e Abreviaturas ......................................................................................... VII

Resumo ...................................................................................................................... XI

Abstract .................................................................................................................. XIII

1. Introdução ........................................................................................................... 1

1.1. Estrutura das membranas biológicas ................................................................ 1

1.2. Fases lipídicas e formação de domínios em sistemas modelo de membranas ... 6

1.3. A membrana plasmática da levedura Saccharomyces cerevisiae ...................... 9

1.3.1. A levedura como modelo biológico .......................................................... 9

1.3.2. Composição lipídica da membrana plasmática da levedura .................... 10

1.4. Espetroscopia de Fluorescência na caraterização biofísica de membranas ..... 21

1.4.1. Parâmetros fotofísicos mais relevantes ................................................... 21

1.4.2. Sondas de membrana fluorescentes ........................................................ 22

2. Objetivos ............................................................................................................ 25

3. Materiais e Métodos .......................................................................................... 27

3.1. Reagentes ..................................................................................................... 27

3.2. Material biológico ......................................................................................... 28

3.3. Meios de cultura ........................................................................................... 28

3.4. Culturas e condições de crescimento ............................................................. 29

3.5. Curvas de crescimento .................................................................................. 30

3.5.1. Parâmetros de crescimento celular ......................................................... 30

3.6. Preparação de células intactas em fase exponencial e em fase estacionária .... 30

3.7. Extração de lípidos totais da levedura em fase estacionária ........................... 31

3.7.1. Variante do Método de Hanson e Lester [56] ......................................... 32

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IV

3.7.2. Variante do Método de Folch et al. [57,58] ............................................ 32

3.8. Extração dos esfingolípidos complexos ......................................................... 33

3.9. Doseamento de fosfolípidos .......................................................................... 33

3.10. Doseamento de sondas .............................................................................. 34

3.11. Preparação de lipossomas a partir de extratos de lípidos totais ................... 34

3.12. Espetroscopia de Fluorescência ................................................................. 35

3.12.1. Espectroscopia de fluorescência em estado estacionário ..................... 36

3.12.2. Espectroscopia de fluorescência em estado transiente ......................... 38

3.13. Análise da composição lipídica dos extratos lipídicos totais e purificação dos

esfingolípidos por cromatografia de Camada Fina ................................................... 41

3.14. Microscopia de Força Atómica .................................................................. 43

3.15. Análise estatística ...................................................................................... 44

4. Resultados .......................................................................................................... 45

4.1. Estudo do crescimento de células da levedura S. cerevisiae ........................... 45

4.2. Caraterização biofísica da membrana plasmática de levedura com a sonda

t-PnA 47

4.2.1. Espectros de absorção, excitação e emissão do t-PnA ............................. 47

4.2.2. Anisotropia de fluorescência .................................................................. 49

4.2.3. Decaimento da intensidade de fluorescência .......................................... 50

4.3. Caraterização biofísica da membrana plasmática da levedura com a sonda

DPH…. ................................................................................................................... 56

4.3.1. Espectros de absorção, excitação e emissão do DPH .............................. 56

4.3.2. Anisotropia de fluorescência em estado estacionário .............................. 58

4.4. Otimização das condições experimentais de extração de lípidos totais ........... 59

4.5. Análise lipídica dos extratos de lípidos totais e de esfingolípidos .................. 63

4.6. Transição de fase do extrato de lípidos totais com a sonda t-PnA .................. 67

4.7. Transição de fase de extratos de lípidos totais com a sonda DPH .................. 71

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V

4.8. Estudo preliminar da formação de domínios com os extratos de lípidos totais 72

5. Discussão ............................................................................................................ 77

5.1. Estudos biofísicos realizados na membrana plasmática de células de

levedura… .............................................................................................................. 77

5.2. Estudos realizados em extratos lipídicos de células de levedura..................... 82

6. Conclusões e Perspetivas Futuras ..................................................................... 89

7. Referências Bibliográficas................................................................................. 91

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VI

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VII

Símbolos e Abreviaturas

%b Percentagem de branco

µ Taxa de crescimento

αi Pré-exponencial da componente i do decaimento de intensidade

de fluorescência do fluoróforo

<r> Anisotropia de fluorescência em estado estacionário

<τ> Tempo de vida médio de fluorescência

i Tempo de vida associado à componente i do decaimento de

intensidade de fluorescência do fluoróforo

Rendimento quântico ponderado pelos tempos de vida de

fluorescência do fluoróforo

AFM Microscopia de força atómica

CCM Canal de contagens máximas

CL Cardiolipina

D Coeficiente de difusão lateral

DPH 1,6- difenil-1,3,5-hexatrieno

DTT Ditiotreitol

EDTA Ácido Etilenodiaminotetracético

Erg Ergosterol

FL Fosfolípidos

G Fator de correção instrumental para medidas de anisotropia de

fluorescência

GL Glicerofosfolípidos (Fosfoacilgliceróis)

GPI Glicosilfosfatidilinositol

HEPES Ácido 4-(2-hidroxietil)-1-piperazinoetanosulfónico

IF Intensidade de fluorescência em estado estacionário

IHH Componente horizontal da emissão de fluorescência com

excitação horizontal

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VIII

IHV Componente horizontal da emissão de fluorescência com

excitação vertical

IVH Componente vertical da emissão de fluorescência com excitação

horizontal

IVV Componente vertical da emissão de fluorescência com excitação

vertical

IPC Inositol fosfoceramida

LCB Bases de cadeia longa (Long Chain Base)

ld Fase líquido desordenado

LED Díodo emissor de luz (do inglês Light Emitting Diode)

LN Lípidos neutros

lo Fase líquido ordenado

M(IP)2C Manosildi-inositol fosfoceramida (Manosildi-fosfato de

inositol-ceramida)

MCC Compartimento membranar ocupado por Can1p

MCP Compartimento membranar ocupado por Pma1p

MCT Compartimento membranar ocupado pela proteína TORC2

MIPC Manosilinositol fosfoceramida

MLV Vesículas multilamelares (do inglês multillamelar vesicle)

PA Ácido Fosfatídico

PC Fosfatidilcolina

PE Fosfatidiletanolamina

PG Fosfatidilglicerol

Pi Fosfato inorgânico

PI Fosfatidilinositol

POPC 1-palmitoil-2-oleoil-sn-glicero-3-fosfocolina

PS Fosfatidilserina

Rf Fator de retardação (do inglês retardation factor)

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IX

SL Esfingolípidos

SLB Bicamadas lipídicas suportadas (do inglês supported lipid

bilayers)

Sn Numeração estereospecífica

so Fase sólido ordenado

SUV Vesículas unilamelares pequenas (do inglês small unillamelar

vesicle)

TAC Conversor tempo-amplitude (do inglês Time-to-amplitude

converter)

TCSPC Método de cronometragem de fotão único (do inglês Time-

Correlated Single-Photon Counting)

tg Tempo de geração

TLC Cromatografia de Camada Fina (do inglês Thin-Layer

Chromatography)

Tm Temperatura de transição de fase principal

TMA-DPH 1-(4-tri-metilamóniofenil)-6-fenil-1,3,5-hexatrieno

p-toluenosulfonato

t-PnA Ácido todas-trans-9,11,13,15-octadecatetraenoico

(ácido trans-parinárico)

UV-Vis Ultravioleta-visível

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X

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XI

Resumo

Na levedura Saccharomyces cerevisiae observa-se um aumento da resistência a

antibióticos poliénicos, como a nistatina, nas células em que não há formação do

esfingolípido manosildi-fosfato de inositol-ceramida, M(IP)2C, (ipt1Δ). Assim, com o

objetivo de avaliar se a ausência de M(IP)2C induz alterações na organização da

membrana, realizaram-se estudos biofísicos recorrendo tanto a células intactas como a

extratos lipídicos de células wild type (wt) e ipt1Δ, utilizando técnicas de fluorescência e

microscopia de força atómica (AFM). Foi feita uma otimização da extração dos lípidos

totais celulares com o intuito de obter um maior rendimento de extração e

posteriormente proceder à purificação dos esfingolípidos complexos.

A caraterização biofísica da membrana plasmática em células vivas através do

decaimento de intensidade de fluorescência do ácido trans-parinárico revelou que a

ausência de M(IP)2C não altera a rigidez dos domínios gel, indicando que este

esfingolípido não deverá ser um componente importante daqueles domínios. Contudo, a

anisotropia de fluorescência do difenil-hexatrieno mostra que a membrana é,

globalmente, mais ordenada na ausência deste esfingolípido. Estes resultados sugerem

que outros esfingolípidos complexos, que em células wt se encontram maioritariamente

em domínios gel, estejam mais uniformemente distribuídos pelas membranas em células

ipt1Δ e/ou que o ergosterol, possa também estar distribuído na célula de forma

diferente.

Os lipossomas preparados a partir dos extratos lipídicos obtidos provenientes de

células wt por um método que favorece a extração de glicerofosfolípidos relativamente a

esfingolípidos apresentam-se mais ordenados e imagens de AFM sugerem uma maior

fração de domínios ordenados, e, eventualmente, uma maior espessura de domínios

desordenados, do que em extratos lipídicos de células ipt1Δ.

Globalmente, os resultados obtidos sugerem que, na membrana plasmática, o

M(IP)2C pode favorecer a tendência da membrana aumentar a abundância de domínios

gel, e ainda influenciar as propriedades dos restantes domínios da membrana plasmática

(líquido ordenado e líquido desordenado).

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XII

Palavras-Chave:

Manosildi-fosfato de inositol-ceramida; Espetroscopia de fluorescência; Domínios de

esfingolípidos; Extratos lipídicos; Biofísica de membranas.

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XIII

Abstract

In Saccharomyces cerevisiae, cells that do not synthesize mannosyl-

diinositolphosphorylceramide, M(IP)2C, (ipt1), exhibit higher resistance towards

polyene antibiotics, such as nystatin. Thus, in order to evaluate whether the absence of

M(IP)2C changes membrane organization, fluorescence spectroscopy and atomic force

micrscopy (AFM) studies carried out with intact cells or lipid extracts from wild type

(wt) and ipt1Δ strains were performed. Total lipid extraction from both strains was

optimized to increase extraction yield and in the future purify complex sphingolipids.

The biophysical characterization of the plasma membrane of intact cells through

time-resolved trans-parinaric acid fluorescence intensity showed that the absence of

M(IP)2C does not affect the rigidity of gel domains, suggesting that this sphingolipid

should not be a major component of those domains. However, fluorescence anisotropy

of diphenylhexatriene reveals that the plasma membrane exhibits a higher global order

in the absence of this sphingolipid, indicating that other complex sphingolipids which in

wt are mainly involved in the formation of gel domains might be dispersed throughout

the membrane of ipt1 and/or that the ergosterol might also have a different cellular

distribution in the absence of this complex sphingolipid.

Liposomes prepared from lipid extracts of wt cells (which contain M(IP)2C)

obtained by a method that favors the extraction of glycerophospholipids as compared to

sphingolipids show a higher degree of order over a large range of temperatures. In

addition, AFM results suggest a larger fraction of ordered domains and, eventually, a

larger thickness of the disordered domains.

Globally, the results obtained in this work suggest that M(IP)2C may positively

affect the ability of the membrane to increase the abundance of gel domains, and it also

modulates the properties of the remaining membrane domains (liquid disordered and

liquid ordered).

Keywords:

Mannosyl-diinositolphosphorylceramide; Fluorescence spectroscopy; Sphingolipid

domains; Lipid extracts; Membrane biophysics.

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Papel dos esfingolípidos complexos na organização da membrana plasmática da levedura Saccharomyces cerevisiae

XIV

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Introdução

1

1. Introdução

1.1. Estrutura das membranas biológicas

As membranas biológicas (ou biomembranas) servem não só de separação dos

componentes da célula do meio extracelular, comportando-se como barreiras seletivas,

mas também como forma de compartimentação dos organelos intracelulares. A

membrana plasmática apresenta grande dinâmica complexidade composicional, e está

envolvida numa série de processos biológicos. Estes incluem estabelecer e manter

gradientes transmembranares, participar nas reações de compartimentação bioquímica

nos diferentes domínios funcionais e nos eventos de transdução de sinal, controlar o

transporte para dentro e fora da célula e a comunicação intra e extracelular; e permitir o

reconhecimento entre células [1,2]. As membranas biológicas constituem assim um

importante tema para estudos bioquímicos e biofísicos.

A modelação da estrutura da membrana plasmática teve início com a proposta por

Gorter e Grendel (1925) [3] do arranjo em bicamada, na qual os grupos polares dos

lípidos estavam orientados para dentro e para fora da célula. O estudo destes autores

passou pela extração dos lípidos de eritrócitos com grandes quantidades de acetona

pura, tendo sido, posteriormente, colocados numa tina com água e sujeitos à ação de

uma barreira móvel, de modo a formar um filme unimolecular contínuo de lípidos. A

área deste filme foi medida, bem como a área superficial total dos eritrócitos. Pela

comparação das duas áreas obtidas observou-se que a área ocupada pelos lípidos era,

aproximadamente, o dobro da área superficial total do eritrócito, apontando assim para a

ideia de que os lípidos na membrana plasmática estão dispostos segundo duas camadas

(bicamada) [3,4].

Em 1935 surgiu um novo modelo para a estrutura da membrana biológica proposto

por Danielli e Davson, segundo o qual se defendia que a membrana não era constituída

apenas por lípidos, tal como Gorter e Grandel haviam sugerido, apresentando também

proteínas incorporadas. Como na altura apenas se conheciam proteínas globulares, estes

autores propuseram que as proteínas globulares contactavam livremente com a parte

polar (superfície) da bicamada, cobrindo os dois lados (apresentando-se segundo folhas

β), o que explicava o registo de uma tensão interfacial inferior em células vivas do que

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Papel dos esfingolípidos complexos na organização da membrana plasmática da levedura Saccharomyces cerevisiae

2

em interfaces água-lípido sintéticas. Este modelo era estático, e não apresentava

proteínas incorporadas no interior da membrana. Mais tarde, Danielli notou que, de

alguma forma, a membrana tinha de ser semipermeável, adicionando ao modelo o

conceito de canais trans-membranares constituídos por péptidos (poros na membrana),

de modo a explicar a passagem de moléculas hidrófilas através da membrana [1,4].

Contudo, foram apontados alguns problemas a este modelo de Danielli e Davson

como, por exemplo, a incapacidade de explicar a assimetria da topologia e estrutura da

membrana, e a diversidade de proteínas na membrana; o não reconhecimento da

dinâmica da membrana; e o facto de o revestimento de proteínas impedir interações

favoráveis entre os grupos das cabeças de fosfolípidos e a água [1]. Deste modo, em

1972, surgiu o modelo do mosaico fluido proposto por Singer e Nicolson [5]. De acordo

com estes autores, a massa de fosfolípidos estava organizada como uma bicamada fluída

descontínua, embora uma pequena fração interagisse, especificamente, com as proteínas

de membrana. Assim, o modelo do mosaico fluido define a membrana como uma

solução viscosa, orientada, bidimensional, de proteínas anfipáticas e lípidos, em

equilíbrio termodinâmico instantâneo [1,5]. Segundo este modelo algumas proteínas

estariam mergulhadas na bicamada lipídica, ao passo que outras estariam apenas

associadas à superfície da membrana, ambas distribuídas assimetricamente na

membrana. Os glúcidos estariam ligados a proteínas (glicoproteínas) e a lípidos

(glicolípidos), tendo sido apenas encontrados na superfície que está em contacto com o

meio extracelular. Este foi o primeiro modelo a reconhecer a membrana plasmática

como dinâmica, fluída e em constante alteração. Ao longo do tempo, algumas correções

e aperfeiçoamentos foram feitos a este modelo, entre elas, o facto de a difusão de

algumas proteínas ser limitada devido à sua interação com uma rede proteica imóvel

essencial, o citoesqueleto, e de na verdade existir uma densidade de proteínas na

superfície da membrana muito maior do que aquela considerada pelo modelo de Singer-

Nicolson [1,2]. Uma extensão deste modelo foi feita por Simons e Ikonen [6], que

introduziram o conceito de jangadas lipídicas, atualmente definidas como domínios

lipídicos, heterogéneos, e muito dinâmicos, ricos em esterol e esfingolípidos (Figura 1)

[1].

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Introdução

3

Figura 1- Modelo das jangadas lipídicas de Kai Simons. Adaptado de [1].

Em todos os modelos propostos para a estrutura da membrana plasmática desde

Danielli e Davson a membrana é, essencialmente, constituída por lípidos e proteínas. De

facto, a maioria das membranas apresenta cerca de 50 % de lípido e 50 % de proteína

em massa [1,7]. No caso da membrana plasmática esta também apresenta,

eventualmente, componentes de natureza glicídica.

Uma das características da membrana plasmática é a assimetria lipídica observada

entre os dois folhetos da membrana. Esta assimetria lipídica é consequência de

múltiplos fatores incluindo, as propriedades biofísicas que ditam a capacidade de um

lípido atravessar a bicamada espontaneamente, os mecanismos de retenção que prendem

os lípidos a um dos folhetos da bicamada, e a presença de transportadores que auxiliam

a translocação de lípidos (transportadores de aminofosfolípidos dependentes de ATP)

[8,9].

Os lípidos são o componente maioritário nas membranas, e são responsáveis pela

sua estrutura básica. Os lípidos são definidos como pequenas moléculas hidrófobas ou

anfipáticas, que são solúveis em solvente orgânico, e que podem ser originados

inteiramente ou em parte a partir de condensações de ácidos carboxílicos com álcoois

para formar ésteres (fosfolípidos e glicofosfolípidos), de ácidos carboxílicos com

aminas para formar amidas (esfingolípidos e glicoesfingolípidos) e/ou de unidades

isopreno (caso dos esteroides) [10,11].

Os glicerofosfolípidos, também designados por fosfoacilgliceróis, apresentam uma

região hidrófoba que é constituída por dois resíduos de ácidos gordos (cadeias acilo)

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Papel dos esfingolípidos complexos na organização da membrana plasmática da levedura Saccharomyces cerevisiae

4

ligados por uma ligação éster ao primeiro e segundo átomos de carbono de uma

molécula de glicerol, e um grupo muito polar (cabeça), carregado, que se liga, por uma

ligação fosfodiéster, ao terceiro carbono. As cadeias acilo encontrados nos fosfolípidos

podem ser insaturadas ou saturadas, pelo que a sua nomenclatura vulgarizada indica o

número de átomos de carbono do ácido e o número de insaturações, separados por dois

pontos. A denominação dos glicerofosfolípidos é feita de acordo com o álcool polar

presente na cabeça, estando apresentadas no Tabela 1 as denominações dos

glicerofosfolípidos mais comuns, bem como as abreviaturas que serão usadas ao longo

deste trabalho [4,12].

Tabela 1- Denominação e abreviaturas para os glicerofosfolípidos mais comuns. Adaptado de

[4,12].

Grupo polar

ligado ao fosfato Nome genérico Nome sistemático Abreviatura

Hidrogénio Ácido Fosfatídico Ácido 1,2-diacil-sn-glicero-3-fosfórico PA

Etanolamina Fosfatidiletanolamina 1,2-diacil-sn-glicero-3-fosfoetanolamina PE

Colina Fosfatidilcolina 1,2-diacil-sn-glicero-3-fosfocolina PC

Serina Fosfatidilserina 1,2-diacil-sn-glicero-3-fosfoserina PS

Glicerol Fosfatidilglicerol 1,2-diacil-sn-glicero-3-fosfoglicerol PG

Inositol Fosfatidilinositol 1,2-diacil-sn-glicero-3-fosfo-1’-mio-

inositol PI

Fosfatidilglicerol Cardiolipina

(Difosfatidilglicerol)

1’,3’-Bis-(1,2-diacil-sn- glicero-3-

fosfo)-sn-glicerol CL

A PE e a PC são zwitteriónicos (carga global neutra), enquanto o PA, PS, PI, PG e

CL são aniónicos (carga global negativa), a pH fisiológico (pH 7) [1,4,12].

Outra classe de lípidos que pode ser encontrada nas membranas biológicas de

eucariotas (e excepcionalmente alguns procariotas) são os esfingolípidos. Estes são

constituídos por um ácido gordo que se liga a uma amina de longa cadeia alifática

hidroxilada e muitas vezes trans-insaturada, a base esfingóide, formando a ceramida,

que é estruturalmente semelhante ao diacilglicerol. O álcool que se liga ao terceiro

carbono da base esfingoide dos esfingolípidos é do mesmo tipo que os álcoois dos

glicerofosfolípidos (Tabela 1).

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Introdução

5

Para além de glicerofosfolípidos e esfingolípidos, algumas membranas biológicas,

contêm ainda glicolípidos. Os glicolípidos foram encontrados, exclusivamente, na

camada exterior da membrana plasmática. Estes constituem apenas 2 % dos lípidos da

maior parte das membranas [7]. Os glicolípidos apresentam uma estrutura semelhante à

dos glicerofosfolípidos e esfingolípidos, diferindo apenas no facto de terem um mono-,

oligo- ou poliósido associado por uma ligação osídica. Assim, estes podem ser

glicósidos de 1,2-diacilgliceróis (glicoglicerofosfolípidos), ou glicolípidos com uma

ligação osídica ao grupo hidroxilo terminal da ceramida (glicosfingolípidos) [1,4,12].

Os esteróis encontram-se aproximadamente na mesma quantidade molar que os

fosfolípidos nas membrana plasmática de eucariotas, e são caraterizados por um sistema

rígido de quatro anéis de carbono fundidos (três anéis com 6 átomos de carbono, e um

com 5 átomos de carbono), que constituem a parte hidrófoba da molécula, e por um

grupo -OH hidrófilo [1,4,12]. Devido à sua estrutura rígida e compacta, os esteróis

desempenham um papel diferente na membrana plasmática. Estes inserem-se na

bicamada de fosfolípidos com o seu grupo hidroxilo polar junto dos grupos da cabeça

dos fosfolípidos [7]. Dentro desta classe destaca-se o colesterol, presente nas células de

mamífero, e o ergosterol, em células de levedura e fungos, por serem os esteróis

maioritários [1,4].

Contudo, os lípidos não expressam diretamente qualquer tipo de atividade

bioquímica catalítica. Esta atividade é desempenhada pelas proteínas de membrana.

Atualmente, consideram-se duas grandes classes de proteínas de membrana, as proteínas

periféricas ou extrínsecas, e as proteínas integradas ou intrínsecas. As proteínas

periféricas são essencialmente proteínas globulares solúveis em água e que se

encontram ligadas à superfície da membrana através de interações essencialmente

electroestáticas. Estas proteínas podem facilmente ser removidas da membrana

alterando a força iónica do meio, ou ajustando o pH. Estas podem estar ligadas, através

de interações electroestáticas, a proteínas integradas ou aos grupos aniónicos da cabeça

dos fosfolípidos. Já as proteínas integradas penetram no interior hidrofóbico da

membrana e só podem ser removidas da membrana por métodos mais drásticos, por

exemplo envolvendo o uso de detergentes [1,4,7]. Estima-se que 20 - 30 % de todas as

proteínas celulares sejam integradas e se liguem à membrana forte e permanentemente,

ao contrário das proteínas periféricas, que se ligam fracamente à superfície da

membrana [1].

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Papel dos esfingolípidos complexos na organização da membrana plasmática da levedura Saccharomyces cerevisiae

6

1.2. Fases lipídicas e formação de domínios em sistemas modelo de

membranas

Os lípidos podem encontrar-se em múltiplas fases, que podem ser fases lipídicas

lamelares ou não-lamelares, e pensa-se que todas elas serão de relevância para descrever

a organização das membranas biológicas. As fases não-lamelares, tais como a fase

hexagonal e cúbica, estão normalmente relacionadas com eventos transientes das

biomembranas, como por exemplo, fusão, cisão e formação de poros. As fases lamelares

são aquelas em que os lípidos estão organizados segundo uma bicamada, e que são mais

representativas da organização estrutural das biomembranas [8]. Na configuração de

bicamada, os lípidos podem adotar diferentes fases, esquematizadas na Figura 2 e

descritas a seguir.

Figura 2- Estrutura esquemática das fases lipídicas lamelares comummente encontradas em

membranas biológicas. Adaptado de [13–15]. A – Fase gel ou sólida ordenada (so ou Lβ), apresenta

elevada ordem das cadeias acilo; B- Fase fluida ou líquido desordenado (ld ou Lα), apresenta baixa ordem

das cadeias acilo; C-Fase fluida ou líquido ordenado (lo), apresenta elevada ordem das cadeias acilo. As

cabeças polares dos fosfolípidos estão representadas a cinzento, e o sistema de anéis do esterol, a roxo.

Indica-se também a ordem de grandeza do coeficiente de difusão lateral dos lípidos em cada fase (D).

A temperatura constante, a fase física adotada pelos lípidos depende,

essencialmente, da sua estrutura química, nomeadamente, o comprimento e grau de

insaturação das cadeias acilo no caso dos fosfolípidos. A fase gel é também designada

como fase sólida ordenada (so, onde “s” se refere à difusão lateral lenta das moléculas, e

“o”, de ordenado, à conformação média das cadeias acilo), sendo este tipo de fase

adotada principalmente por lípidos de cadeias acilo longas e saturadas [8]. As cadeias

acilo, numa fase gel, encontram-se predominantemente na conformação todas-trans, isto

é, completamente distendidas, observando-se um forte empacotamento por parte dos

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Introdução

7

lípidos, o que resulta tanto numa reduzida difusão lateral como na formação de uma

região mais espessa quando comparada com bicamadas fluidas (Figura 2-A) [2,4,15,16].

No caso da fase gel, as duas cadeias saturadas podem ocupar uma área semelhante à do

grupo polar, como é o caso das PEs, apresentando uma orientação normal ao plano da

bicamada (Figura 2-A). O mesmo não se observa para fosfolípidos com cabeça mais

larga (por exemplo, as PCs), cujas cadeias acilo adquirem a inclinação necessária, para

garantir um empacotamento ideal, sendo atribuída a esta fase a denominação de fase gel

inclinada [4].

A fase líquida cristalina ou fluida pode-se subdividir em líquido ordenado e líquido

desordenado (lo e ld, respetivamente) [2,15]. Nas fases líquidas cristalinas, as moléculas

dos lípidos apresentam maior difusão lateral através da bicamada, com as cadeias acilo

maioritariamente estendidas (na fase lo) ou mostrando variações de conformação

rotacional (na fase ld) [2,16], Os ácidos gordos da maioria dos fosfolípidos naturais têm

uma ou mais ligações duplas cis (insaturações), que introduzem torções nas cadeias

acilo, tornando, assim, mais difícil o seu empacotamento, levando a que a membrana

apresente um comportamento de um fluido [4,12]. Estas ligações duplas cis apresentam

o mesmo tipo de alteração conformacional de uma conformação gauche. Assim, numa

fase fluida, há um aumento do número de conformações gauche, que leva à ocorrência

dos chamados “defeitos de cadeia”, observando-se um encurtamento das cadeias. Por

esta razão, estas regiões fluidas apresentam uma espessura menor relativamente à de

regiões mais compactas [4]. Para além disso, as cadeias acilo dos fosfolípidos movem-

se mais livremente no interior da membrana, o que a torna mais flexível, e por isso mais

suscetível à formação de fases líquidas cristalinas [7,8,12]. Numa fase fluida, há então

um aumento da área ocupada por cada cadeia, o que leva a que não seja necessária uma

inclinação, mesmo no caso da PC. Outro aspeto importante surge no facto de as cabeças

polares, nesta fase, se encontrarem mais afastadas, levando a que sejam necessárias

moléculas de água para servirem de ponte entre as cabeças, ocorrendo um aumento da

hidratação da fase gel para a fluida [4]. Quando comparada com a fase gel, a fase

líquida cristalina apresenta-se fracamente empacotada, mais permeável, mais fina,

menos estável, mais dinâmica, mais fluida, e ocupa uma grande área por lípido [1]. O

conceito de líquido ordenado foi introduzido para descrever características peculiares de

bicamadas mistas, contendo colesterol ou alguns dos seus análogos (por exemplo, o

ergosterol) em elevada concentração em misturas binárias com determinados

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Papel dos esfingolípidos complexos na organização da membrana plasmática da levedura Saccharomyces cerevisiae

8

fosfolípidos ou esfingolípidos. Várias experiências independentes permitiram chegar à

nomenclatura de fase líquido ordenado, isto por terem demonstrado a ocorrência, em

simultâneo, de uma elevada ordem das cadeias acilo próxima da que é tipicamente

encontrada numa fase gel, mas também, uma elevada mobilidade translacional

característica de uma fase fluida [8,16,17], apesar de ligeiramente mais lenta na fase lo

que na fase ld (Figura 2-C) [14,15].

As fases lipídicas são também influenciadas pela temperatura. A transição entre

fases lamelares gel e fluida (fase sólido ordenado para uma fase líquido desordenado) é

considerada a temperatura de transição de fase principal (Tm) [4]. A temperatura de

transição de fase de um lípido da membrana corresponde, assim, à temperatura

requerida para induzir a fusão dos lípidos, de uma, podendo esta ser determinada por

diferentes técnicas, nomeadamente de varrimento calorimétrico. A Tm de lípidos é

fortemente influenciada pelo comprimento e grau de insaturação das cadeias acilo

[4,13]. A Tm fosfolípidos saturados aumenta com o comprimento da cadeia, e a Tm de

fosfolípidos insaturados é inferior à dos saturados, com o mesmo comprimento de

cadeia [12].

Ao longo do tempo, foram acumuladas várias evidências de que as membranas

exibem caraterísticas específicas num determinado local, e, portanto, pode-se dizer que

são compartimentadas lateralmente. Alguns microdomínios de membrana podem

resultar da tendência que certos constituintes lipídicos têm para a segregação espontânea

em diferentes fases quando misturados em sistemas modelo. Por exemplo, lipossomas

formados por uma mistura de dois lípidos diferindo na sua Tm, podem apresentar

coexistência de fases gel e fluida para determinadas gamas de temperatura e fração

molar de cada um dos componentes. Nas membranas biológicas, segundo o modelo das

jangadas lipídicas, existem regiões com características da fase lo ricas em esteróis e

esfingolípidos (Figura 2-C), e regiões com comportamento de fase ld ricas em

glicerofosfolípidos (Figura 2-B), ambas contendo um conjunto específico de proteínas

associadas. Nesta mistura, regiões da mesma fase são capazes de coalescer ou

desagregar rapidamente, dependendo das condições presentes, facilitando a adaptação

local a estímulos ou alterações ambientais. [2,6]. Apesar de a cabeça dos esfingolípidos,

presentes nas jangadas, ocupar grandes áreas, qualquer espaço vazio entre os

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Introdução

9

esfingolípidos a elas associados é preenchido por moléculas de esterol, que funcionam

como espaçadores (Figura 2-C) [6].

1.3. A membrana plasmática da levedura Saccharomyces cerevisiae

1.3.1. A levedura como modelo biológico

A levedura Saccharomyces cerevisiae tem sido amplamente utilizada como

organismo eucariota modelo por apresentar algumas características vantajosas do ponto

de vista laboratorial e do desenho de experiências. A utilização da levedura possibilita

ultrapassar restrições éticas e experimentais da experimentação animal e permite o

desenvolvimento e otimização de métodos analíticos que facilitam e padronizam

análises. Pelo fato de serem células eucariotas, as leveduras são representativas de uma

larga classe de seres vivos, para quaisquer fenómeno ou processo que a comunidade

científica esteja interessada em estudar [18]. Ao contrário de outros microrganismos, as

estirpes da levedura são estáveis tanto na forma haploide como na diploide [19]. O

desenvolvimento da técnica de DNA recombinante tornou a levedura particularmente

acessível a técnicas de engenharia genética e clonagem de genes.

Para além de apresentar um genoma completamente sequenciado, a levedura exibe

também a vantagem de ser um sistema muito mais simples, barato e fácil de trabalhar

quando comparada com sistemas celulares de mamíferos, o que leva a que a levedura

seja muitas vezes selecionada como organismo modelo no estudo de novas vias

metabólicas. No caso concreto de estudos referentes a lípidos, a levedura oferece a

vantagem de possuir um lipidoma muito mais simples do que as células de mamífero, e

um número de genes consideravelmente menor, envolvido nas vias de síntese

metabólica de lípidos [20]. Estudos recentes, que utilizam a levedura como modelo

biológico, têm permitido um avanço na compreensão do metabolismo de lípidos

neutros, da homeostase de esfingolípidos, das interações fisiológicas entre os

esfingolípidos e os esteróis, bem como a integração do metabolismo lipídico nos sinais

do ciclo celular e na proliferação celular [20,21].

O crescimento de células de levedura engloba várias fases de crescimento, sendo

elas a fase exponencial, mudança diaúxica, fase pós-diaúxica e estacionária (Figura 3).

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10

Figura 3- Representação de curva de crescimento celular em função do tempo, bem como as fases

de crescimento típicas de células de levedura. Adaptado de [22].

Durante a fase exponencial, as células de levedura crescem essencialmente por

fermentação. Nesta fase a divisão celular segue uma função logarítmica e todas as

atividades biossintéticas ocorrem à mesma taxa da divisão celular. A mudança diaúxica

ocorre quando a sua fonte de carbono fermentável se esgota do meio de cultura e as

células se adaptam ao metabolismo respiratório. A fase pós-diaúxica apresenta uma taxa

de crescimento mais baixa, utilizando a energia que é fornecida pelo metabolismo

respiratório. Perante a ausência total da fonte de carbono, as células entram na fase

estacionária. Esta é caraterizada pela diminuição da taxa metabólica, por não haver

qualquer evento de divisão celular, e pela necessidade absoluta de efetuar respiração

celular [22].

1.3.2. Composição lipídica da membrana plasmática da levedura

1.3.2.1. Glicerofosfolípidos

A composição lipídica das células de levedura é relativamente simples quando

comparada com organismos multicelulares mais complexos. Contudo, as características

principais são comparáveis com o lipidoma de qualquer outra célula eucariota. Na

Tabela 2 apresenta-se a percentagem de cada glicerofosfolípido presente na membrana

plasmática de levedura, obtida por estudos realizados por vários autores.

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Introdução

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Tabela 2 - Comparação da composição de glicerofosfolípidos na membrana plasmática da levedura

Saccharomyces cerevisiae, obtida por estudos realizados por vários autores. Adaptado de [23]. As

culturas de levedura cresceram em meio líquido rico YPD [extrato de levedura 1% (m/v), peptona 2%

(m/v) e glucose 2 %(m/v)]. Nos estudos realizados por Zinser e Daum (1991) [24]; Patton e Lester (1991)

[25]; Tuller et al. (1999) [26] e Van den Hazel (1999) [27] a extração ocorreu na fase exponencial de

crescimento, enquanto em Blagović et. al (2005) [23] foi na fase estacionária de crescimento. Os lípidos

foram extraídos da membrana plasmática previamente isolada e quantificados pelo método de

quantificação dos fosfatos.

% (m/m) de fosfolípidos totais

PC 16,8 18,9 17 11,3 10

PE 20,3 16,5 14 24,6 41,8

PI 17,7 36,7 27,7 27,2 7,9

PS 33,6 4,8 3,8 32,2 20,3

CL 0,2 6,3 4,2 - -

PA 3,9 13,3 2,5 3,3 3,5

Outros 6,9 3,5 - 1,4 16,5

Referência [24] [23] [25] [26] [27]

As classes de glicerofosfolípidos mais abundantes na membrana plasmática da

levedura são, a PC, a PE, o PI, a PS e os seus respetivos derivados. O PA e o PG são

menos predominantes na membrana de levedura (Tabela 2) [20,23,24]. As cadeias de

ácidos gordos mais comuns nestas classes de glicerofosfolípidos são o ácido palmítico

(C16:0); ácido palmitoleico (C16:1); e ácido oleico (C18:1) [20,28]. A membrana

plasmática da levedura contém apenas ácidos gordos mono- ou di-insaturados, ao

contrário dos vertebrados que possuem ácidos gordos polinsaturados. A razão de ácidos

gordos insaturados/saturados é de 1,83 ± 0,16 em células da estirpe wt da levedura

S. cerevisiae [28].

O PA, um dos glicerofosfolípidos menos abundantes, é o mais simples e pequeno,

sendo por isso o precursor de todos os outros fosfolípidos mais complexos [1]. A PS

está envolvida em fenómenos de ancoramento à membrana e ativação de proteínas, tais

como ATPases, cinases, recetores e proteínas importantes envolvidas na transdução de

sinal. Os derivados de PI têm sido associados a eventos regulatórios na membrana

plasmática de células eucariotas [4]. Existem também evidências de que o PI está

envolvido na síntese de ceramidas contendo fosfato de inositol [29]. Nas células de

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12

levedura, a abundância de PG é muito baixa, representando no máximo cerca de um

décimo dos fosfolípidos celulares totais. O PG é considerado o precursor metabólico

principal da CL [30], o que pode explicar a sua abundância reduzida. Relativamente à

PE, esta apresenta uma cabeça que não só é quimicamente reativa, como também

pequena e fracamente hidratada. Ao contrário da PC, a PE pode formar ligações de

hidrogénio com grupos polares vizinhos. Comparativamente a outros fosfolípidos, a PE

tem maior propensão para a formação de fases não lamelares [1,28]. A PC tem uma

forma global cilíndrica e tende a organizar-se como uma bicamada, prevenindo a

integridade da membrana.

Estudos em mutantes de S. cerevisiae mostraram que fosfolípidos zwiteriónicos

podem substituir-se uns aos outros, isto é, o papel que a PC tem na membrana pode ser

desempenhado pela PE, e vice-versa. O mesmo se observa para o PI, que também pode

substituir a PS. Contudo a PS não consegue substituir o PI, possivelmente porque este

tem um papel considerado único na geração, modelação e manutenção da composição

assimétrica das membranas plasmáticas de levedura [1,29].

A camada lipídica externa é constituída, essencialmente, por PC, enquanto na

camada mais interna predomina PE, PS e PI. Uma vez que os grupos da cabeça, tanto da

PS como do PI, estão carregados negativamente, e estes encontram-se,

predominantemente, na camada interna, observa-se uma rede com carga negativa na

face citosólica da membrana plasmática. Quando se observa uma acumulação de PS no

folheto externo, o que acontece tipicamente com o envelhecimento da célula, é sinal de

que a célula deve ser reciclada [1].

1.3.2.2. Esfingolípidos

Os esfingolípidos complexos presentes na membrana plasmática da levedura são

o inositol fosfoceramida, IPC; o manosilinositol fosfoceramida, MIPC; e o manosildi-

inositol fosfoceramida (manosil-di-fosfato de inositol-ceramida), M(IP)2C. Estes

esfingolípidos são constituídos por uma fitoceramida, que contém uma base de cadeia

longa geralmente de 18 átomos de carbono (LCB), à qual se liga, através de uma ligação

amida, uma cadeia de ácido gordo muito longa, frequentemente de 26 átomos de

carbono saturado (C26:0) e hidroxilado, ocasionalmente de 24 átomos de carbono

[31,32].

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Introdução

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Figura 4 – Estrutura dos esfingolípidos complexos IPC, MIPC e M(IP)2C presentes nas membranas

de células de levedura S. cerevisiae. Adaptado de [33]. Os números junto ao grupo –OH representam as

várias posições onde pode ocorrer hidroxilação nas ceramidas.

Os esfingolípidos complexos da levedura S. cerevisiae contêm um dos cincos

esqueletos de ceramida (A, B’, B, C, e D) que diferem nas posições onde ocorrem as

hidroxilações (Figura 4 e Tabela 3) [34].

Tabela 3 – Diferentes estados de hidroxilação das ceramidas. Adaptado de [34,35]. Os números 1, 2,

e 3 correspondem à posição onde pode ocorrer hidroxilação, de acordo com as posições indicadas na

Figura 4. Os símbolos + e – correspondem, respetivamente, à presença e ausência de hidroxilação.

-OH Tipo A Tipo B’ Tipo B Tipo C Tipo D

1 - - + + +

2 - + - + +

3 - - - - +

Na levedura Saccharomyces cerevisiae, a via de síntese dos esfingolípidos

inicia-se com a condensação de uma serina com o palmitoil-CoA, formando a 3-cetodi-

hidroesfingosina. Esta é reduzida por ação do NADPH, resultando uma base de cadeia

longa, a di-hidroesfingosina (DHS). A hidroxilação do C4 da DHS é importante para a

formação da base esfingóide, a fitoesfingosina, presente essencialmente em fungos e

plantas. Esta difere da LCB primária encontrada nos esfingolípidos de mamíferos, a

esfingosina, pois em vez de uma ligação dupla entre C4 e C5, apresenta um grupo

hidroxilo no C4. Um ácido gordo de cadeia muito longa liga-se à amida desta base

esfingóide dando origem à fitoceramida. A fitoceramida por sua vez é convertida em

IPC pela transferência de um fosfato de inositol, proveniente de um PI, para o grupo

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1-OH da fitoceramida. Esta reação é catalisada pelo IPC sintase, um enzima que se

encontra ligado à membrana (Figura 5).

Vários estudos mostraram que a atividade deste enzima pode ser inibida por agentes

antifúngicos. De seguida, a IPC é manosilada, formando a MIPC. O passo final da via

de síntese de esfingolípidos corresponde à transferência de um fosfato de inositol para a

MIPC, levando à formação do esfingolípido complexo maioritário na membrana de

levedura, a M(IP)2C. A análise de estirpes mutadas no gene IPT1, mostrou a ausência de

atividade de M(IP)2C sintase e, consequentemente, a ausência completa do

esfingolípido M(IP)2C. Observou-se também, que na ausência deste gene, ocorria um

aumento de MIPC, o que pode indicar que as células de levedura têm a capacidade de

controlar a sua composição de esfingolípidos totais, neste caso concreto, pela

compensação da ausência de M(IP)2C, ajustando os níveis de MIPC.

Os esfingolípidos são componentes abundantes na membrana plasmática em

eucariotas. Na membrana plasmática de S. cerevisiae correspondem a 30 % dos

fosfolípidos ou cerca de 7 % da massa da membrana plasmática [31,38]. Nas estirpes

selvagens (wt) da levedura, o esfingolípido maioritário, M(IP)2C, constitui cerca de

75 % dos esfingolípidos, estando os restantes 25 % divididos entre a IPC e MIPC [32].

A síntese de ceramidas ocorre na superfície luminal da membrana do ER [9,38].

Contudo, a maturação das ceramidas a esfingolípidos mais complexos ocorre após o seu

transporte para o complexo de Golgi [32]. Estes encontram-se, predominantemente, no

folheto externo da membrana plasmática [9,32,38].

Estudos recentes mostraram que a atividade de IPC sintase é essencial, e como este

enzima não está presente nos mamíferos, torna-se um alvo promissor para fármacos

antifúngicos, dos quais há uma grande necessidade, devido ao aumento de infeções

fúngicas em pacientes imunossuprimidos, nomeadamente aqueles que foram sujeitos a

transplante de órgãos ou quimioterapia, ou mesmo de pacientes imunocomprometidos,

como é o caso daqueles portadores de SIDA [32].

Os esfingolípidos complexos têm-se mostrado essenciais em certos eventos

biológicos, tais como transdução de sinal, crescimento celular, endocitose, e transporte

vesicular de proteínas ancoradas a glicosilfosfatidilinositol (GPI) do ER para o

complexo de Golgi [39].

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Introdução

15

Figura 5-Via de síntese de esfingolípidos contendo inositol na levedura S. cerevisiae (Adaptado de

[21,32,36,37]). À direita de cada seta encontram-se os nomes dos enzimas que catalisam as reações, e à

esquerda encontra-se representado o gene que codifica para cada enzima envolvido na reação.

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16

1.3.2.3. Esteróis

Nas membranas de levedura, o esterol maioritário é o ergosterol (erg),

representando cerca de 70 % de esteróis totais e cerca de 80 % dos esteróis da

membrana plasmática [28]. Em relação à proporção de ergosterol/fosfolípidos em

extratos de lípidos totais, esta é próxima de 1 (mol/mol) [8,24,27]. O ergosterol difere

do colesterol em três modificações estruturais, uma num anel aromático e outras duas

nas cadeias laterais (Figura 6) [38].

Figura 6- Estrutura química do ergosterol (A) e colesterol (B). (Retiradas do sítio

http://avantilipids.com/ acedido no dia 21 de Novembro de 2013).

Vários estudos apontam para um papel importante do ergosterol na regulação da

fluidez das membranas [28]. O ergosterol não se encontra distribuído homogeneamente

na membrana plasmática, e associa-se a esfingolípidos com cadeias acilo longas para

formar microdomínios (jangadas lipídicas) dentro da membrana [6]. Em resposta a

níveis elevados de esfingolípidos, a membrana plasmática da levedura contém elevados

níveis de esterol [38]. Considera-se que estes elevados níveis de esteróis e

esfingolípidos estão envolvidos na redução da permeabilidade da maioria das

membranas externas, protegendo assim a célula contra condições ambientais hostis [38].

Dependendo da temperatura, o ergosterol tem diferentes efeitos na fluidez da

membrana. A elevadas temperaturas, o ergosterol interfere no movimento das cadeias

acilo dos fosfolípidos, tornando a membrana menos fluida, reduzindo assim a

permeabilidade a pequenas moléculas. Por outro lado, a baixas temperaturas, o

ergosterol tem o efeito oposto, pois ao interferir com as interações entre as cadeias acilo,

o ergosterol impede a formação da fase gel, mantendo a fluidez da membrana [7].

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Introdução

17

1.3.2.4. Variabilidade da composição lipídica em diferentes condições

experimentais

A membrana plasmática de células eucariotas é muito dinâmica e a sua composição

está em constante remodelação de forma a exercer diversas funções e a lidar com

stresses ambientais.

No estudo da membrana plasmática da levedura S. cerevisiae torna-se importante

perceber a influência das várias condições de crescimento celular, tais como a

temperatura, a fonte de carbono e a fase de crescimento celular na composição lipídica

da célula.

Estudos referentes à quantificação do lipidoma das células de levedura nas várias

condições de crescimento, revelaram que tanto a fonte de carbono utilizada no meio de

cultura das células, como a fase de crescimento, têm efeitos significativos na

composição lipídica global [20,29].

A análise do lipidoma obtido para as diferentes fases de crescimento da levedura

[20] permitiu observar que, quando se passava do início para meio da fase exponencial

(fase “mid-log”), os níveis de PI baixavam para mais de 75 %, enquanto os níveis de PE

diminuíam em cerca de 50 % a partir da fase mid-log. Por sua vez, os níveis de PC

permaneciam inalteráveis ao longo das várias fases de crescimento. Em média, o

comprimento das cadeias acilo de GL aumenta com a progressão do crescimento

celular, enquanto o índice de insaturação das cadeias acilo permanece inalterável.

Embora a insaturação de PC diminua fortemente na fase mid-log, há um aumento

pronunciado no comprimento das cadeias acilo na fase estacionária. Relativamente aos

esfingolípidos complexos, os níveis de M(IP)2C permanecem constantes ao longo das

várias fases de crescimento. Os níveis de IPC diminuem ao longo do crescimento,

enquanto os níveis de MIPC aumentam [20].

A análise do lipidoma obtido para as diferentes fases de crescimento da levedura

permitiu observar que, quando se passava do início para meio da fase exponencial (fase

“mid-log”), os níveis de PI baixavam para mais de 75 %, enquanto os níveis de PE

diminuíam em cerca de 50 % a partir da fase mid-log. Por sua vez, os níveis de PC

permaneceram inalteráveis ao longo das várias fases de crescimento. Em média, o

comprimento das cadeias acilo de GL aumentou com a progressão do crescimento

celular, enquanto o índice de insaturação das cadeias acilo permaneceu inalterável.

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Papel dos esfingolípidos complexos na organização da membrana plasmática da levedura Saccharomyces cerevisiae

18

Embora a insaturação de PC tenha diminuído fortemente na fase mid-log, houve um

aumento pronunciado no comprimento das cadeias acilo na fase estacionária.

Relativamente aos esfingolípidos complexos, os níveis de M(IP)2C permaneceram

constantes ao longo das várias fases de crescimento. Os níveis de IPC diminuíram ao

longo do crescimento, enquanto os níveis de MIPC aumentaram [20].

Quanto à influência da fonte de carbono no lipidoma da levedura, observou-se que a

composição lipídica apresentava diferenças quando o meio de cultura continha glucose

em vez de rafinose ou de glicerol. A abundância de PC e PI foi afetada pelo tipo de

fonte de carbono, ao passo que os níveis de PE não sofreram qualquer alteração. A fonte

de carbono também teve impacto na quantidade de esfingolípidos. Num meio contendo

glucose, a IPC foi a classe mais abundante de esfingolípidos, e em meio contendo

rafinose ou glicerol, foi a M(IP)2C [20].

1.3.2.5. Organização da membrana de levedura

As moléculas na membrana plasmática de levedura não estão distribuídas

equitativamente, e há sub-compartimentos laterais constituídos por diferentes

microdomínios [2,40]. Estes microdomínios no plano da membrana plasmática exibem

uma composição, estrutura e função biológica diferente do resto da membrana que os

rodeia, independentemente do seu tamanho, estabilidade, ou mecanismo de formação.

Um aspeto relevante prende-se com o facto destes microdomínios individuais serem

resultantes de segregações laterais espontâneas e/ou dependentes de energia de uma

plenitude de constituintes da membrana plasmática (lípidos e proteínas) [2,41]. Neste

contexto surge mais uma vez o conceito de jangadas lipídicas que são flutuações à

nanoescala de agregados de esfingolípidos, esteróis, e proteínas, que podem ser

estabilizadas ao coalescerem, formando plataformas com função nos eventos de tráfego

e sinalização na membrana [41]. Estas jangadas foram inicialmente definidas como

membranas resistentes a detergentes (DRM), por constituírem frações insolúveis da

membrana extraídas por um detergente suave não iónico (1% de TritonX-100, a 4 °C)

[2,40]. Contudo esta abordagem tem sido desaconselhada, uma vez que associações

específicas podem ser rompidas pelos detergentes, e componentes de proteínas que são

possivelmente muito mais importantes são rejeitadas por ficarem na parte solúvel ao

detergente [2].

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Introdução

19

Atualmente sabe-se que a membrana plasmática da levedura é constituída por pelo

menos três compartimentos: i) MCC (compartimento membranar ocupado por Can1p);

ii) MCP (compartimento membranar ocupado por Pma1p); e iii) MCT (compartimento

membranar ocupado por TORC2p) (Figura 7) [2,39].

Figura 7- Esquema representativo da organização da membrana plasmática da levedura em

domínios com uma composição lipídica e proteica distinta. Adaptada de [42]. Encontram-se

realçados o compartimento contendo o complexo 2 alvo da cinase de rapamicina (MCT), o

compartimento contendo Pma1p (MCP), e o compartimento da membrana/eisossomas contendo Can1p

(MCC). O MCC aparece como invaginações revestidas por proteínas Pil1p e Lsp1p e enriquecidos em

esteróis.

Estudos do papel dos lípidos no transporte de proteínas de membrana, permitiram

observar que, em condições fisiológicas, a permease de arginina Can1p marcada com

GFP não se encontrava distribuída homogeneamente na membrana plasmática de

levedura, mas sim concentrada em cerca de 50-80 domínios/célula, cada um com,

aproximadamente, 300 nm de diâmetro [43,44]. Estes microdomínios ocupados pela

proteína Can1p (MCC) revelaram-se ricos em ergosterol, e equivalentes a domínios

líquido ordenado. A ideia destes microdomínios MCC serem ricos em ergosterol surge

do facto de que, quando comparada com células wt de levedura, a estirpe mutada na via

de síntese do ergosterol exibe uma captação menor de arginina mediada pela Can1p,

sugerindo que a presença de ergosterol é essencial nos domínios ocupados pela Can1p

[43].

Contudo, vários estudos revelaram que a proteína mais abundante na membrana

plasmática, Pma1p, era excluída do domínio MCC formando o seu próprio

sub-compartimento em forma de rede, o MCP. A separação destes dois compartimentos

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20

é notavelmente estável. Enquanto o MCC é um compartimento rico em ergosterol, o

microdomínio MCP é possivelmente rico em esfingolípidos [2].

Por outro lado, o complexo 2 alvo da rapamicina (TORC2) não se localiza em

nenhum dos domínios da membrana plasmática referidos atrás, ocupando um

compartimento distinto denominado MCT (de “membrane compartment containing

TORC2”). Uma hipótese para o modelo de agregação de TORC2 consiste no facto de

complexos individuais de TORC2 estarem ligados à membrana plasmática onde

interatuam para formar complexos dinâmicos muito ordenados. Este modelo é

suportado pela observação de que TORC2 são formados, longe uns dos outros, e podem

fundir e segregar [45].

Como já foi referido, as jangadas lipídicas constituem microdomínios com

composição e propriedades reminiscentes da fase lo encontrada em sistemas modelo.

Contudo, estudos relativamente recentes apresentaram evidências de que existem

domínios gel na membrana plasmática de levedura, que não são jangadas lipídicas ricas

em ergosterol, mas sim principalmente compostas por esfingolípidos (Figura 8-A).

Biofisicamente, estes microdomínios podem ser descritos como domínios gel ou sólido

ordenado, diferindo assim das jangadas lipídicas descritas como domínios líquido

ordenado [39].

Outro aspeto importante é o facto de na ausência da parede celular (estudos com

esferoblastos) se observar uma ordem global da membrana maior do que em células

intactas, e uma diminuição da abundância em domínios de esfingolípidos (Figura 8).

Isto leva-nos a crer que a estabilização destes domínios é (pelo menos em parte)

induzida pela parede celular, e possivelmente envolvendo proteínas ancoradas a

glicosilfosfatidilinositol (GPI) [39].

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Introdução

21

Figura 8- Representação do modelo proposto para explicar a relação entre a abundância de

domínios ricos em esfingolípidos e a ordem global da membrana. (Adaptado de [39]). A- Imagem

representativa dos componentes lipídicos da membrana plasmática de células wt. B- Esquema que pode

representar a membrana plasmática de esferoblastos wt ou o sistema de membrana celular de células

intactas de erg6Δ ou scs7Δ. As cabeças polares dos esfingolípidos estão representadas a cinzento, e as

cabeças dos glicerofosfolípidos, a preto. O sistema de anéis representa o ergosterol.

1.4. Espetroscopia de Fluorescência na caraterização biofísica de

membranas

A espetroscopia de fluorescência tem sido muito utilizada no estudo de domínios

lipídicos in vivo, por ser uma técnica não invasiva, muito sensível, que apresenta um

mínimo de perturbações na amostra e requer pequenas concentrações de sonda [15]. A

fluorescência constitui uma abordagem ideal no estudo das propriedades físicas da

membrana, tais como a ordem, distribuição de carga, polaridade e hidratação, uma vez

que as propriedades dos marcadores florescentes podem ser determinadas através de

mudanças espectrais, tempos de vida de fluorescência e anisotropia de fluorescência

[15].

1.4.1. Parâmetros fotofísicos mais relevantes

Um dos parâmetros mais importantes em estudos das propriedades biofísicas da

membrana é a anisotropia de fluorescência. Esta reflete as diferenças no comportamento

rotacional das moléculas. Por exemplo, no caso de uma sonda excitada, se esta

conseguir rodar durante o tempo de vida no estado excitado, então a fluorescência

emitida vai ser, parcial ou mesmo totalmente, despolarizada, dado que a polarização da

luz emitida não apresenta uma orientação preferencial. Este exemplo é muito comum

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22

em ambientes mais fluidos, onde se observa uma maior movimentação por parte da

sonda, obtendo-se valores de anisotropia baixos. No caso de a sonda estar inserida num

ambiente com um grau de rigidez mais elevado, esta não vai conseguir rodar tanto,

apresentando uma orientação preferencial para a polarização da fluorescência emitida,

que se reflete em valores de anisotropia mais elevados. Assim, através da

despolarização de fluorescência, é possível obter informação relativa ao movimento

molecular, que depende do tamanho e forma da molécula, e da fluidez do seu

microambiente [46,47]. Para além de nos dar informação relevante sobre a ordem das

membranas, permite determinar as temperaturas de transição de fases de misturas de

lípidos sintéticos ou até mesmo de extratos de lípidos totais, através da variação da

anisotropia em função da temperatura.

A fluorimetria resolvida no tempo tem sido muito utilizada no estudo do tipo,

número, fração, composição e tamanho de domínios e fases lipídicas presentes em

modelos de biomembranas e crescentemente em membranas biológicas [48]. Esta

técnica fornece informação relativa ao tempo de vida de um fluoróforo no estado

excitado, ou seja, o tempo médio que o fluoróforo permanece no estado excitado, após

absorção da luz, até ocorrer a emissão de fluorescência. O decaimento da intensidade de

fluorescência baseia-se na diminuição da probabilidade de emissão com o tempo, após a

excitação [15]. Muitas vezes o tempo de vida de fluorescência das sondas de membrana

em ambientes aquosos é muito mais curto que em ambientes lipofílicos. Assim, através

do tempo de vida de fluorescência é possível obter informação sobre a hidratação de

bicamadas lipídicas ou sobre a sua compactação.

1.4.2. Sondas de membrana fluorescentes

O 1,6-difenil-1,3,5-hexatrieno (DPH) e o ácido trans-parinárico (t-PnA) são duas

sondas de membrana muito utilizadas na caracterização biofísica de membranas

biológicas. Ambas as sondas apresentam o cromóforo integrado na região hidrófoba da

bicamada lipídica. Desta forma, estas sondas permitem-nos tirar informações relativas

ao empacotamento das cadeias acilo de fosfolípidos [39].

Na Figura 9 encontram-se as estruturas químicas das sondas de membrana DPH e

t-PnA.

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Introdução

23

Figura 9- Estrutura química das sondas DPH e t-PnA (B). Adaptado de [47].

O t-PnA é um ácido gordo polinsaturado de 18 carbonos apresentando quatro

ligações C=C conjugadas, às quais estão ligadas cadeias de hidrocarbonetos mais curtas

ou mais longas em ambas as suas extremidades (Figura 9-B) [49].

Em relação ao DPH, estabeleceu-se que este exibe essencialmente uma orientação

na membrana, paralela ao eixo das cadeias acilo dos fosfolípidos (Figura 10). Além

disso, o DPH não apresenta uma partição preferencial nem para fases gel nem para

fluidas, distribuindo-se uniformemente na maioria dos domínios da membrana, dando

informação relativa sobre ordem global da bicamada lipídica [39,50]. Assim, esta sonda

é muitas vezes utilizada para estimar a ordem e/ou fluidez da membrana, pois exibe um

forte aumento da fluorescência quando ligado a lípidos e o valor de anisotropia é

sensível à orientação dos fosfolípidos [51]. O rendimento quântico do DPH é baixo à

superfície da membrana devido a interações de DPH com a água, mas aumenta quando

o fluoróforo se movimenta para o centro da bicamada [52]. É também importante

realçar que, em células intactas, a sonda DPH não marca apenas a membrana

plasmática, mas também as membranas dos organelos intracelulares, caraterizando

assim todas as membranas da célula [53].

Por sua vez, o t-PnA, devido à configuração todas-trans das suas insaturações

(Figura 9-B), é mais facilmente acomodado em ambientes lipídicos ordenados, sendo

desta forma conhecido pela partição preferencial por domínios muito ordenados, tais

como domínios gel ricos em esfingolípidos (Figura 10) [28,54]. Nestes domínios

ordenados, o rendimento quântico do t-PnA aumenta quando comparado com ambientes

fluido desordenado, sendo desta forma sensível a alterações na quantidade e composição

destes domínios ordenados [28,39].

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Figura 10- Esquema representativo da localização das sondas fluorescentes DPH e t-PnA nas

diferentes fases lamelares lipídicas de uma bicamada. As cabeças polares dos esfingolípidos estão

representadas a verde; e as cabeças dos fosfolípidos a azul. O ergosterol está representado como um

sistema de anéis. Na figura encontram-se identificadas as várias fases lamerares lipídicas: Fase gel; Fase

líquido ordenado (lo); e Fase líquido desordenado (ld). Quanto à sonda t-PnA (laranja), esta apresenta uma

partição preferencial por fases gel, podendo se encontrar na fase lo e também ld, na qual apresenta um

baixo rendimento quântico (preto) [28,39]; enquanto a sonda DPH (roxo) não apresenta preferência nem

para fase gel, nem para fase fluida [46].

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Objectivos

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2. Objetivos

Estudos realizados em células de estirpes mutadas no gene IPT1 (ipt1Δ), que não

sintetizam o esfingolípido complexo M(IP)2C revelaram um aumento da resistência a

antibióticos poliénicos, como por exemplo à nistatina [55]. Isto sugere que talvez este

esfingolípido complexo venha a constituir um bom alvo para fármacos antimicóticos.

Desta forma, torna-se importante estudar o papel deste esfingolípido complexo na

organização da membrana, e perceber de que forma, na sua ausência, a organização da

membrana é afetada, tornando a célula resistente a estes fármacos. Assim, um dos

objetivos deste trabalho foi a caraterização das propriedades biofísicas da membrana

plasmática de duas estirpes de levedura, da estirpe mutada ipt1Δ, e sua comparação com

a wt, com duas sondas de membrana, o t-PnA e o DPH. Utilizando estas sondas

pretendia-se estabelecer o papel do M(IP)2C na abundância relativa e compactação dos

domínios de gel, na ordem global da membrana, e na reação desta com os domínios de

gel, lo e ld, in vivo.

Outro dos objetivos que se pretendia com este trabalho era purificar os três

esfingolípidos complexos, IPC, MIPC e M(IP)2C, para posteriormente se estudar o

efeito de cada um na organização da membrana, através de estudos biofísicos em

sistemas modelo contendo cada um dos esfingolípidos complexos referidos. Para tal,

pretendeu-se estudar qual o melhor método de extração lipídica para a extração destes

esfingolípidos. Outro dos objetivos passou pela análise da composição tanto dos

extratos de lípidos totais como de esfingolípidos através de uma cromatografia de

camada fina (TLC). Por fim, de forma a estabelecer a ligação entre o comportamento

dos extratos lipídicos e as experiências in vivo, realizaram-se estudos biofísicos em

lipossomas preparados a partir de extratos lipídicos obtidos pelo método de Folch et al.,

com as sondas t-PnA e DPH, para determinar a influência do M(IP)2C na temperatura

de transição dos domínios de gel e para perceber até que ponto as interações

lípido-lípido são determinantes da organização dos lípidos in vivo. Também se

pretendeu estudar a influência do M(IP)2C na formação de diferentes tipos de domínios

e detetar eventuais diferenças na espessura e quantidade relativa de domínios ordenados

e desordenados devido à ausência daquele esfingolípido. Para tal, foram preparadas

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Papel dos esfingolípidos complexos na organização da membrana plasmática da levedura Saccharomyces cerevisiae

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bicamadas suportadas a partir de extratos lipídicos totais obtidos pelo método de Folch

et al., analisadas por microscopia de força atómica (AFM).

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Materiais e Métodos

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3. Materiais e Métodos

3.1. Reagentes

A bacto-peptona, o extrato de levedura, a yeast nitrogen base (YNB), e o bacto agar

foram adquiridos na Difco (Detroit, MI, EUA).

Da Sigma-Aldrich provieram a suspensão aquosa Ludox [sílica coloidal diluída

50 % (m/m)], o ácido 4-(2-hidroxietil)-1-piperazinoetanosulfónico (HEPES), esferas de

vidro, e o ácido perclórico (HClO4).

Os solventes orgânicos, clorofórmio e metanol, de grau espectroscópico, foram

obtidos na VWR Internacional (Radnor, PA, EUA). O etanol absoluto (grau de

pureza > 99,9 %) foi comprado à Scharlau, e o ácido acético, de grau analítico, à J.T.

Baker.

Em relação às sondas de membrana, o 1,6-difenil-1,3,5-hexatrieno (DPH) foi

adquirido à Molecular Probes/Invitrogen (Eugene, OR, EUA), e o ácido

trans-parinárico (t-PnA) à Santa Cruz Biotechnology (Santa Cruz, CA, EUA). O t-PnA

foi armazenado em etanol espectroscópico, e o DPH em metanol espectroscópico, a

- 20 °C.

O hidrogenofosfato de sódio (Na2HPO4) e molibdato de amónio [(NH4)6Mo7O24 ·

4 H2O] foram comprados à Merck (Darmstadt, Alemanha), e o ácido ascórbico

(C6H8O6) à Farma-Química Sur S.L. (Málaga, Espanha).

Dentro dos lípidos sintéticos, o 1-palmitoil-2-oleoil-sn-glicero-3-fosfocolina

(POPC) foi adquirido à Lipoid (Newark, NJ, EUA), e o 1,2-dipalmitoil-sn-glicero-3-

fosfoetanolamina (PE) à Avanti polar lipids (Alabaster, AL, EUA), sendo o seu grau de

pureza foi > 99%. Os lípidos de fonte natural, o ergosterol, o L-α-Fosfatidilinositol (PI)

proveniente de soja, e a L-α-Fosfatididilserina (PS) proveniente de bovino foram

adquiridos na Sigma-Aldrich.

As soluções tampão utilizadas neste trabalho foram designadas de tampão A

(NaH2PO4·H2O 100 mM, NaCl 100 mM, EDTA 1 mM, pH 7,4) e tampão B (HEPES

10 mM, NaCl 150 mM, pH 7,4), e foram preparadas com água bidestilada obtida

através dum sistema Gradiente Milli-Q da MILLIPORE.

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Papel dos esfingolípidos complexos na organização da membrana plasmática da levedura Saccharomyces cerevisiae

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3.2. Material biológico

As estirpes de levedura S. cerevisiae utilizadas neste trabalho foram, a estirpe

selvagem (wt) haploide (Número de ACC - Y00000; ORF - BY4741) e a estirpe ipt1Δ

(Número de ACC - Y04007; ORF - YDR072c) que apresenta o gene que codifica para o

inositol fosfotransferase 1 (IPT1) deletado. A estirpe wt apresenta o genótipo MATa,

his3Δ1, leu2Δ0, met15Δ0, ura3Δ0, enquanto que a estirpe mutada ipt1Δ é isogénica à

BY4741 com YDR072c::kanMX4. Ambas as estirpes foram adquiridas na

EUROSCARF (Frankfurt, Alemanha).

3.3. Meios de cultura

Os meios de cultura utilizados ao longo deste estudo, para o crescimento das

culturas das estirpes da levedura S. cerevisiae, encontram-se referidos no Quadro 1.

Quadro 1 - Meios de cultura utilizados no crescimento das culturas de células e respetiva

composição.

Meios de Cultura Composição

Meio sólido rico YPD Extrato de levedura 1 % (m/v), peptona 2 % (m/v) e

glucose 2 % (m/v) suplementado com agar 2 % (m/v).

Meio líquido SC

(Synthetic Complete)

Glucose 2 % (m/v), YNB 6,85 % (m/v), arginina

0,002 % (m/v), metionina 0,002 % (m/v), tirosina

0,003 % (m/v), isoleucina 0,003 % (m/v), lisina

0,003 % (m/v), fenilalanina 0,005 % (m/v), valina

0,015 % (m/v), ácido aspártico 0,01 % (m/v), ácido

glutâmico 0,01 % (m/v), triptofano 0,005 % (m/v),

histidina 0,01 % (m/v), leucina 0,01 % (m/v), adenina

0,0025 % (m/v), uracilo 0,0025 % (m/v), treonina

0,02 % (m/v) e serina 0,04 % (m/v).

Meio líquido rico YPD Extrato de levedura 1 % (m/v), peptona 2 % (m/v) e

glucose 2 % (m/v).

As soluções stock de Glucose e YNB foram autoclavadas a 120 C durante 20 min,

e as soluções de aminoácidos foram autoclavadas a 110 C durante 20 min.

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Materiais e Métodos

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Tanto na preparação de meio líquido rico YPD como na de meio sólido YPD, os

meios foram autoclavadas a 120 C durante 20 min, tendo sido a glucose apenas

adicionada ao meio no instante da sua utilização.

3.4. Culturas e condições de crescimento

As soluções stock das estirpes de levedura encontravam-se conservadas numa

solução de glicerol a 20 % (v/v), a - 80 °C. De uma solução stock, retiraram-se algumas

células com as quais se fez um riscado numa caixa de Petri em meio sólido rico YPD.

Esta cultura foi incubada numa estufa a 30 °C, cerca de 2 dias, sendo de seguida

armazenada a uma temperatura de 4 °C. Os riscados foram renovados, a partir do

riscado anterior, de aproximadamente 15 em 15 dias, podendo-se realizar cerca de 3

renovações. Após a terceira renovação, o riscado foi feito a partir da solução stock da

estirpe. A partir do riscado foram feitas as pré-culturas, que consistem na inoculação das

células da estirpe pretendida num volume de meio líquido de crescimento (meio líquido

SC ou YPD), seguida de incubação num agitador orbital a uma velocidade de 160 rpm a

30 °C durante a noite. Após o crescimento, a densidade ótica da suspensão celular a

600 nm1 (OD600) da pré-cultura foi medida no espectrofotómetro. A densidade ótica a

600 nm permitiu estimar o número de células na cultura. A cultura de células foi

realizada com a inoculação de um determinado volume de células da pré-cultura de

modo a que esta apresentasse o valor de OD600 inicial pretendido. As leituras de OD600

foram realizadas no espectrofotómetro de feixe duplo M350 UV-Visible CamSpec.

Através da contagem de células numa câmara de Neubauer (hemocitómetro),

determinou-se que 1 OD600 ≈ 1,25x107 células/mL. Recorreu-se à solução de azul de

tripano 0,4 % (m/v) para identificar as células inviáveis as quais se encontravam coradas

de azul por apresentarem as membranas permeabilizadas.

1 Apesar da designação “densidade ótica” (OD) ter deixado de ser recomenda pela IUPAC, devendo

utilizar-se preferencialmente o termo “absorvência”, optou-se por utilizar OD no contexto da avaliação da

concentração celular, uma vez que o que se está a medir é a turbidez da suspensão, não estando envolvido

um processo de absorção de luz. Assim, quando se utiliza o termo absorvência, é porque está envolvido

um processo desse tipo, e portanto está a ocorrer a promoção de determinadas moléculas para um estado

eletrónico excitado.

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3.5. Curvas de crescimento

As curvas de crescimento das estirpes wt e ipt1Δ da levedura S. cerevisiae foram

realizadas tanto em meio líquido SC como em meio líquido rico YPD, com o intuito de

observar a existência de possíveis diferenças no seu crescimento. Inicialmente foi

preparada uma pré-cultura de cada uma das estirpes. No dia seguinte, foram inoculados

50 mL de meio com células da pré-cultura da estirpe, a uma densidade celular inicial de

0,2 OD600, sendo esta cultura incubada a 30 °C, com agitação. Posteriormente foram

realizadas leituras de absorvência a 600 nm em intervalos curtos de tempo.

3.5.1. Parâmetros de crescimento celular

Os parâmetros de crescimento celular englobam o tempo de geração ou duplicação

(tg) e a taxa de crescimento celular ().

Tendo em conta que o crescimento de uma população microbiana é dada por:

Equação 1

Onde N corresponde ao número de células num determinado tempo t, N0 ao número

de células inicias (t=0), a taxa de crescimento, e t o tempo de geração.

Pela linearização da Equação 1, a taxa de crescimento que consiste na variação do

número de células por unidade de tempo, corresponde ao declive da recta.

Por outro lado, o tempo de geração que corresponde ao intervalo de tempo

necessário para as células se duplicarem, é determinado por:

Equação 2

Este parâmetro depende da composição do meio de crescimento, e das condições

ambientais.

3.6. Preparação de células intactas em fase exponencial e em fase

estacionária

No caso da caracterização da membrana da levedura em fase exponencial, as células

de S. cerevisiae foram inoculadas em 40 mL de meio líquido SC a uma densidade

celular inicial de 0,098 OD600. A cultura foi deixada a crescer por cerca de 5 horas, a

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30 °C e 160 rpm. Este tempo de crescimento foi escolhido de modo a garantir que

tivessem ocorrido no mínimo dois ciclos de duplicação, e as células se encontrassem na

fase exponencial de crescimento com uma quantidade de células por mL de cerca de

0,488 OD600. Recolheu-se 30 mL de cultura para um tubo Falcon de 50 mL estéril e

centrifugou-se a 3500 rpm na centrífuga Sigma-302, durante 2 min. O sobrenadante foi

desprezado, e o precipitado foi lavado duas vezes com água destilada estéril.

Imediatamente a seguir, o precipitado lavado foi ressuspendido em tampão A num

volume adequado, para uma concentração de células final por mL de 1,95 OD600. Desta

suspensão de células, 2 mL e 3 mL foram sujeitos à adição de sonda t-PnA e DPH,

respetivamente, para a caracterização da membrana da levedura com cada uma das

sondas. Para cada uma das amostras foi realizado o respetivo branco ao qual se

adicionou o mesmo volume de solvente em que a sonda se encontra à suspensão celular.

Seguiu-se o mesmo procedimento nos estudos biofísicos em células na fase

estacionária, com duas exceções: as experiências foram realizadas em meio líquido rico

YPD em vez de meio líquido SC, e a cultura cresceu durante 24 h, encontrando-se assim

na fase estacionária de crescimento.

3.7. Extração de lípidos totais da levedura em fase estacionária

Inicialmente,500 mL de meio líquido rico YPD foram inoculados com células das

estirpes wt ou ipt1Δ, a uma densidade celular inicial por mL de 0,2 OD600. A cultura foi

efetuada num agitador orbital, a uma velocidade de 160 rpm, a 30 °C, durante 24 horas.

Ao fim das 24 horas, as células encontravam-se na fase estacionária de crescimento.

Optou-se por fazer a extração nesta fase de crescimento, não só pelo facto de apresentar

um maior número de células, mas também porque já se tinha observado que a proporção

do esfingolípido complexo M(IP)2C não se alterava significativamente com as fases de

crescimento [20], permitindo, desta forma, obter um rendimento de extração de M(IP)2C

superior do que na fase exponencial de crescimento. De seguida, as células foram

recolhidas e centrifugadas a 3244 rpm, durante 5 min, na centrífuga Beckman

J2-21M/E, com o rotor JA-14. O precipitado de células foi lavado duas vezes com água

estéril à temperatura ambiente.

Depois deste procedimento, a extração de lípidos totais das estirpes wt e ipt1Δ foi

feita segundo uma variante do método desenvolvido por Hanson e Lester [56], ou

segundo o método desenvolvido por Folch et al.[57,58].

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3.7.1. Variante do Método de Hanson e Lester [56]

Após a lavagem do precipitado, os lípidos totais foram extraídos com múltiplas

extrações de 5 mL usando uma solução de etanol/água (4:1, v/v), a 100 °C, durante 15

minutos, num termobloco SB42000D/3 da Stuart Scientific. De seguida, procedeu-se à

filtração usando um filtro Whatman 1, de modo a evitar a passagem de possíveis células

intactas ou restos da lise celular. O extrato lipídico foi seco num balão de fundo redondo

usando um rotavapor BÜCHI R-200. Esta massa foi dissolvida em cerca de 7 mL da

mistura clorofórmio/metanol (2:1, v/v).

3.7.2. Variante do Método de Folch et al. [57,58]

Por este método, após a primeira centrifugação a 3244 rpm na centrífuga Beckman

J2-21M/E, com o rotor JA-14, durante 5 min, o precipitado de células foi ressuspendido

em água estéril, e transferido para tubos Falcon de 50 mL. Procedeu-se a duas lavagens

com água estéril, à temperatura ambiente. Para garantir o sucesso da lise celular,

adicionou-se esferas de vidro num volume correspondente ao volume de precipitado

(1 g de precipitado equivale a 1 mL [58]), e um agente redutor, ditiotreitol (DTT) para

uma concentração final de 10 mM. A adição de DTT torna-se essencial, pois na fase

estacionária, as células apresentam uma parede celular espessa e menos porosa [22], o

que limita a eficiência de extração. Posteriormente foram realizados 7 ciclos de agitação

em vórtex durante 2 min intercalando com o arrefecimento durante 2 min em gelo. Este

procedimento passou por um processo de otimização, sendo estas condições favoráveis

à obtenção de uma concentração de lípido total razoável. No fim, o precipitado é

transferido para uma proveta.

O método de Folch et al. consistiu na utilização de 20 vezes o volume de

clorofórmio/metanol (2:1, v/v) por volume de precipitado de células. Após a adição da

solução de clorofórmio/metanol ao precipitado de células, a suspensão foi agitada

durante 1 h num agitador orbital a 140 rpm, a 20 °C. De seguida, procedeu-se à filtração

com um filtro Whatman 1, de modo a remover células intactas ou restos celulares.

Adicionou-se uma solução de CaCl2 0,04 % (v/v) num volume correspondente a 20 %

do volume total. A fase superior, fase aquosa, foi desprezada, e a fase inferior, fase

orgânica, foi lavada com uma solução de clorofórmio/metanol/água (3:47:48, v/v/v)

num volume correspondente a 20 % do volume total. O solvente orgânico foi evaporado

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com fluxo de N2, numa hote. O extrato lipídico foi, depois, dissolvido em

clorofórmio/metanol (2:1, v/v).

3.8. Extração dos esfingolípidos complexos

Para a extração dos esfingolípidos complexos, o extrato de lípidos totais seco foi

dissolvido em cerca de 20 mL de metilamina 33 % (em etanol) de modo a submeter os

lípidos a uma hidrólise alcalina por 24 horas a 55 °C, num condensador de refluxo. Esta

hidrólise permite remover os glicerofosfolípidos do extracto de lípidos totais, uma vez

que as ligações acilo são hidrolisadas (e assim a maioria dos glicerofosfolípidos), mas

as ligações amida dos esfingolípidos permanecem intactas [21,59]. De seguida a

metilamina foi evaporada num rotavapor e os lípidos ressuspendidos em

clorofórmio/metanol (2:1, v/v). O extracto de esfingolípidos foi doseado pelo método de

Rouser [60,61]. Posteriormente procedeu-se à purificação dos esfingolípidos através de

cromatografia de camada fina preparativa (TLC) (ver secção 3.13).

3.9. Doseamento de fosfolípidos

De modo a determinar a concentração de fosfolípidos presente nos extratos de

lípidos totais, recorreu-se a uma adaptação do método de Rouser [60,61]. Este método

colorimétrico consiste, essencialmente, na determinação de fosfato inorgânico livre

resultante da hidrólise ácida a quente dos fosfolípidos com ácido perclórico 70% (v/v).

A quantificação de fosfato foi feita pela adição de molibdato de amónio 1,25 % (m/v), o

qual reage com o fosfato inorgânico, numa solução ácida, formando o ácido

fosfomolíbdico. Este é depois reduzido na presença de ácido ascórbico 5 % (m/v),

produzindo um complexo azul. A quantidade relativa deste complexo azul foi

determinada pela leitura da absorvência a 797 nm no espectrofotómetro Jasco V-560

(Easton, MD, EUA).

Para a construção da curva de calibração usou-se fosfato dissódico numa gama de

concentrações de 0 a 0,03 mM.

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3.10. Doseamento de sondas

A concentração de cada solução de sonda foi determinada no espectrofotómetro,

pela leitura da absorvência a 300 nm, no caso do t-PnA, e a 350 nm, no caso do DPH.

Os coeficientes de absorção molar (ɛ) utilizados na determinação da concentração,

foram de, 89000 M-1

cm-1

para o t-PnA (em etanol) [49,62], e de 88000 M-1

cm-1

para o

DPH (em metanol).

3.11. Preparação de lipossomas a partir de extratos de lípidos totais

A partir dos extratos de lípidos totais, prepararam-se vesículas multilamelares

(MLV), e vesículas unilamelares pequenas (SUV). É preciso salientar que a

concentração lipídica dos lipossomas preparados a partir de extratos de lípidos totais é

uma estimativa baseada apenas no doseamento de fosfato inorgânico.

Após a adição de um volume adequado de extrato lipídico, a fase orgânica foi

evaporada sob um fluxo contínuo de N2 (g). De seguida, os lípidos foram deixados a

secar num exsicador por cerca de 3 horas, de forma a remover possíveis vestígios de

solvente orgânico.

Na preparação de MLV’s para estudos de fluorescência, as amostras foram

hidratadas com tampão A. De seguida foram realizados 5 ciclos de congelamento em

azoto líquido/ descongelamento a uma T > Tm/ vórtex, de forma a homogeneizar as sua

composição lipídica e diminuir o número de fases lamelares das vesículas [63]. Os

ciclos foram realizados a 75 °C, para garantir que todos os lípidos se encontravam a

uma temperatura superior à sua Tm, uma vez que a Tm de extratos lipídicos de levedura é

de 42 °C [39]. A concentração total de lípidos na suspensão de MLV era 0,2 mM

(considerando o doseamento de fosfolípidos), nos ensaios com a sonda DPH. No estudo

das propriedades biofísicas das MLV’s com o t-PnA, a concentração total de lípido foi

otimizada de forma a diminuir a percentagem de branco nas medidas de fluorescência.

Em ambos os casos, após a adição da sonda, realizaram-se mais 5 ciclos de

congelamento/descongelamento/vórtex. Posteriormente, a sonda foi incubada a 75 °C

durante uma hora. Após esta incubação, as amostras foram arrefecidas à temperatura

ambiente, e equilibradas durante a noite a 4 °C, realizando-se as medidas de

fluorescência no dia seguinte. Em todos os passos do procedimento experimental, as

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soluções e suspensões foram saturadas com N2 (g) e as amostras foram protegidas da

luz [39].

A preparação da suspensão de SUV’s a utilizar na preparação de bicamadas

suportadas (SLBs) para observação por microscopia de força atómica (AFM), consistiu

na sonificação da suspensão de MLV’s, preparada em tampão B, num sonificador de

potência Hielscher UP200S com sonda de titânio, sendo a sonificação realizada com

75 % da potência do aparelho (200 W). Foram realizados 24 ciclos de sonificação de

1 min e 15 seg e repouso durante 15 seg, mantendo sempre a suspensão de lípidos num

banho de gelo. A sonificação não deve ser durante longos períodos de tempo pois pode

levar à oxidação e mesmo à hidrólise dos lípidos. A concentração de lípidos na

suspensão de SUV’s foi de 0,5 mM (com base apenas no doseamento dos fosfolípidos).

De seguida centrifugou-se a 10000 rpm durante 15 min numa centrífuga Eppendorf

mini-spin de forma a remover partículas de titânio da sonda.

3.12. Espetroscopia de Fluorescência

No contexto do presente trabalho, tornou-se essencial a utilização da espectroscopia

de fluorescência na caracterização biofísica da membrana da levedura S. cerevisiae e de

vesículas multilamelares (MLV) a partir de extratos de lípidos totais, não só por esta ser

uma técnica não invasiva, extremamente sensível, que requer pequenas concentrações

de sonda, mas também porque permite obter informações relacionadas com as

propriedades físicas da membrana, tais como a ordem, distribuição da carga, e

polaridade [15]. Estas propriedades de fluorescência podem ser determinadas por

desvios espectrais, decaimento da fluorescência e anisotropia de fluorescência.

As medidas de fluorescência foram realizadas no espetrofluorímetro Spex

Fluorolog-3 v2.2 da HORIBA Jobin Yvon (Kyoto, Japão), equipado com

monocromadores duplos na excitação e na emissão, em geometria de ângulo reto,

polarizadores Glan-Thompson (prismas de calcite, que fornecem uma elevada razão de

extinção, necessária na medida de pequenas alterações na anisotropia). A deteção foi

efetuada por um tubo fotomultiplicador (PMT) modelo TBX. O espetrofluorímetro

estava ainda equipado com um sistema de agitação magnética, permitindo que as

medidas de fluorescência fossem feitas com agitação, de modo a evitar a deposição quer

da suspensão de células quer de MLV’s. A temperatura no porta-células foi atingida

através de sistema de circulação de água Lauda RM6, uma vez que o porta-células está

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revestido com uma camisa de termostatização. Foi utilizada uma sonda de temperatura

do tipo termopar de fabrico caseiro (gentilmente oferecida pelo Dr. Manuel Rosa

Nunes) que permitiu confirmar a temperatura diretamente no interior da cuvete com

uma precisão de 0,1C.

No caso da caracterização biofísica da membrana da levedura, as sondas t-PnA e

DPH foram adicionadas de modo a ficarem numa concentração de 2 µM na suspensão

de células, e incubadas durante 5 e 20 min, respetivamente, à temperatura ambiente

(24 °C) ou a 30 °C [39]. No estudo das propriedades biofísicas de MLVs a partir de

extratos lipídicos com o DPH, utilizou-se uma razão sonda/lípido de 1:200 (mol/mol),

de modo a minimizar o efeito da auto-fluorescência provocado pelo ergosterol [39].

Com a sonda t-PnA foi necessário um processo de otimização da razão sonda/lípido a

utilizar, de modo a minimizar a % de branco.

3.12.1. Espectroscopia de fluorescência em estado estacionário

As medidas de fluorescência em estado estacionário realizadas foram: espectros de

excitação e emissão de fluorescência, e anisotropia de fluorescência.

A fonte de radiação contínua utilizada para fluorescência em estado estacionário e

calibração dos monocromadores foi uma lâmpada de arco de Xénon de 450 W, e a

referência um fotodíodo.

Na caracterização biofísica da membrana da levedura com a sonda DPH utilizaram-

se células de quartzo Suprasil® com dimensões de 1 cm 1 cm (percurso ótico na

excitação percurso ótico na emissão) da Hellma Analytics. As células de quartzo de

0,4 cm 1,0 cm mostraram-se mais adequadas para as medidas de fluorescência em

estado estacionário dos ensaios contendo t-PnA, uma vez que requerem um volume

menor de amostra, e devido ao menor percurso ótico, ocorrem menos eventos de

dispersão, dependentes da dimensão e do número de partículas do dispersante no

percurso da radiação [64]. Dado que os comprimentos de onda de excitação e de

emissão no caso do t-PnA são inferiores, há a uma maior intensidade da luz dispersa.

Como este aspeto não é problemático no caso do DPH, optou-se por usar as cuvetes

com a configuração mais usual, pois permitem uma agitação mais eficiente da

suspensão.

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Os comprimentos de onda de excitação e emissão foram de 320 e 404 nm para a

sonda t-PnA, e de 358 e 430 nm com a sonda DPH, respetivamente [39]. Apesar do

t-PnA apresentar um máximo da excitação a 303 nm, a excitação foi feita a 320 nm, de

forma a evitar a excitação dos resíduos de aminoácidos aromáticos de proteínas [49].

3.12.1.1. Espectros de excitação e emissão de fluorescência

Os espectros de excitação e emissão de fluorescência foram obtidos utilizando

larguras de banda de excitação e emissão de 2 nm, e um tempo de integração de 0,2 s.

Para além da divisão pelo sinal da referência, os espectros de excitação e emissão foram

corrigidos com ficheiros de correção fornecidos pelo fabricante. Foi sempre obtido um

espetro para o branco que foi subtraído ao espetro da amostra respetiva.

3.12.1.2. Anisotropia de Fluorescência

A deteção de possíveis diferenças na ordem e fluidez da membrana, e a

determinação da temperatura de transição de fase, foram feitas com recurso a medidas

de anisotropia de fluorescência em estado estacionário. Estas serão designadas

doravante por anisotropia de fluorescência, por simplicidade de linguagem, uma vez que

não foram realizadas medidas de anisotropia de fluorescência resolvidas o tempo.

As medidas de anisotropia de fluorescência seguiram uma geometria de formato L,

que consiste no uso de apenas dois polarizadores Glan-Thomson. Inicialmente, a

amostra é excitada com uma luz polarizada verticalmente, e o polarizador de excitação é

orientado de modo a transmitir, de forma alternada, apenas componentes verticais ou

componentes horizontais da radiação para a amostra. Por sua vez, ocorre também a

rotação do polarizador de emissão, permitindo obter as componentes horizontal e

vertical da fluorescência emitida. Este método requer, assim, quatro medidas de

intensidade individuais, IVV, IHV, IHV, e IHH, em que o primeiro subscrito indica a

orientação do polarizador de excitação, e o segundo a do polarizador de emissão, e os

subscritos H e V dizem respeito à orientação horizontal e vertical, respetivamente

[46,47]. Uma vez que, o monocromador tem uma eficiência de transmissão diferente

para luz polarizada vertical e horizontalmente, o canal de emissão vai apresentar uma

sensibilidade diferencial, que pode ser corrigida usando excitação polarizada

horizontalmente. Com a excitação polarizada horizontalmente, a distribuição da

orientação dos momentos de transição das moléculas que passam ao estado excitado

apresenta simetria no plano de deteção, uma vez que ambas as orientações de deteção

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são perpendiculares ao plano de polarização da excitação. Deste modo, qualquer

diferença que seja detetada nos valores de IHH e IHV vai ser devida à sensibilidade

diferencial do sistema de deteção (incluindo o monocromador de emissão, uma vez que

este se posiciona a jusante dos polarizadores) [47,65]. Assim sendo, a anisotropia de

fluorescência (<r>) foi calculada com base na seguinte equação[46]:

Equação 3

Em que G corresponde ao fator de correção do sistema de deteção do

instrumento. Este foi determinado pela razão entre a intensidade da componente HH e a

da componente HV, e é dependente do comprimento de onda de emissão e das fendas de

emissão. A cada componente da intensidade medida para a amostra, foi subtraído o

valor de um branco adequado (amostra na ausência de sonda).

Antes de iniciar as medidas de anisotropia, os polarizadores de excitação e de

emissão foram orientados na posição vertical, para selecionar a largura das fendas, de

forma a ter um sinal elevado mas dentro da gama de linearidade do detetor

( 2 106 cps de acordo com as instruções do fabricante). A aquisição das várias

componentes foi feita na secção do software designada por Constant Wavelength

Analysis (CWA), tendo-se realizado 7 aquisições de cada intensidade.

As medidas de anisotropia em função da temperatura realizaram-se num

intervalo de temperaturas de 4 a 80 °C. Estas foram importantes na determinação da

temperatura de transição de fase. Para assegurar que a temperatura da amostra estava em

equilíbrio, a célula de quartzo contendo a amostra foi deixada a incubar a cada

temperatura, por cerca de 10 minutos antes das medidas de anisotropia.

3.12.2. Espectroscopia de fluorescência em estado transiente

Existem duas técnicas de fluorescência resolvida no tempo, a fluorimetria de

pulso e a fluorimetria de modulação de fase. No presente trabalho, recorreu-se à

fluorimetria de pulso. Nesta técnica são produzidos pulsos de luz curtos, para excitar a

amostra, sendo a resposta da fluorescência depois medida em função do tempo [46,47].

Nas medidas de fluorescência em estado transiente, recorreu-se a um controlador

eletrónico de fotão único Fluorohub v2.0 acoplado ao espectrofluorímetro utilizado nas

medidas de fluorescência no estado estacionário. As medidas foram obtidas pelo

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Materiais e Métodos

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método de cronometragem de fotão único (Single-Photon Timing, SPT). De forma

sucinta, este método permite, medir o tempo entre o pulso de excitação e a emissão do

fotão. Inicialmente, a amostra é excitada por um pulso de excitação, e

consequentemente ocorre emissão de um fotão e a transmissão de um sinal start. Este

segue até um discriminador de função constante (CFD), e continua até um conversor de

tempo em amplitude (TAC), dando início a uma rampa de voltagem. Esta vai

aumentando de forma linear com o tempo, na escala dos nanosegundos. De seguida, um

segundo pulso excita a amostra, e um sinal stop é transmitido, que ao atingir o

conversor TAC, para a rampa de voltagem. A voltagem obtida é amplificada e

convertida num valor digital pelo conversor analógico-digital (ADC). Este valor é

armazenado num histograma, por um analisador de multicanais (MCA), como um

evento único do atraso do tempo entre dois pulsos. Este processo repete-se inúmeras

vezes, obtendo-se uma curva de decaimento de fluorescência. O aumento do número de

eventos reflete-se numa maior precisão do decaimento de fluorescência[46,47].

A intensidade de fluorescência de um decaimento pode ser descrita como um

somatório de exponenciais, pela seguinte equação [9, 11, 12]:

) Equação 4

Após determinação da função multi-exponencial que melhor descreve o decaimento

de fluorescência pode-se determinar o tempo de vida médio (τ) de um fluoróforo,

sendo este definido como:

Equação 5

Em que αi e τi representam, respetivamente, a amplitude (pré-exponencial)

normalizada e o tempo de vida da componente i do decaimento [39].

É também possível determinar o tempo de vida pesado pelas amplitudes. Este

parâmetro é proporcional ao rendimento quântico do fluoróforo, podendo também ser

designado de rendimento quântico ponderado pelo tempo de vida [46,47], sendo dado

pela equação,

Equação 6

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Os decaimentos multi-exponenciais fornecem-nos informações, nem sempre

diretas, sobre as propriedades biofísicas e a abundância relativa dos domínios lipídicos

que são responsáveis pela origem de cada tempo de vida observado [15].

Os decaimentos de fluorescência de amostras contendo a sonda t-PnA foram

obtidos através da excitação da amostra a 315 nm, por um NanoLED-320 (Light

Emitting Diode) da Horiba Jobin Yvon, e a emissão recolhida a 404 nm [39]. Foram

utilizadas células de quartzo com dimensões de 0,2 x 1,0 cm, pois estudos anteriores

mostraram que células com estas dimensões são as mais indicadas para este tipo de

medidas, por apresentar uma percentagem do número de contagens do branco no canal

de contagens máximas (CCM) inferior, quando comparadas com outras células de

quartzo [64]. Os decaimentos do t-PnA foram descritos por quatro exponenciais, tendo

sido introduzida uma quinta exponencial fixa a 500 ns de forma a descrever o ruído de

fundo, e garantir que a componente mais longa não resultava de artefactos.

Para os ensaios com o t-PnA, o número de contagens no canal de contagens

máximas foi de 20000. As escalas de tempo utilizadas foram de 0,056 ns/canal;

0,111 ns/canal; e 0,223 ns/canal.

O decaimento de intensidade de fluorescência da amostra foi desconvoluído da

função de resposta instrumental (essencialmente, o perfil de excitação), tendo sido

utilizada uma suspensão de sílica coloidal (Ludox) para esse propósito. Esta suspensão

foi utilizada como dispersante, uma vez que a dispersão de luz é considerada instantânea

na escala de tempo da emissão de fluorescência e da resolução temporal do sistema de

deteção utilizado (50 ps) e portanto foi utilizado um comprimento de onda no

monocrmador de emissão correspondente ao comprimento de onda da radiação

produzida pelo NanoLED, uma e acumulou-se um valor máximo de 50000 contagens.

A análise dos decaimentos de fluorescência experimentais foi realizada com o

programa TRFA (Time-Resolved Fluorescence Analysis) data processor version 1.4

(Minsk, Belarus). O ajuste dos parâmetros aos decaimentos experimentais foi feito

utilizando um método de convolução iterativo de mínimos quadrados não linear baseado

no algoritmo de Marquardt [66]. Utilizou-se o método de análise global, na

caracterização biofísica da membrana de levedura, com o objetivo de separar a emissão

da sonda do efeito de autofluorescência por parte dos componentes das células (por

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Materiais e Métodos

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exemplo, os esteróis) [39]. Este método consiste na aquisição de um decaimento de

intensidade de fluorescência para a amostra com e sem sonda nas mesmas condições,

sendo estes depois analisados em separado. O decaimento da amostra com sonda

apresenta um número maior de componentes, em que algumas dessas componentes são

comuns ao branco (amostra sem sonda). De seguida, os decaimentos são analisados em

simultâneo, e as componentes comuns à amostra e ao branco são forçadas a terem o

mesmo valor de tempo de vida em ambos os decaimentos [15]. Assim, o decaimento

real da amostra com sonda foi obtido subtraindo a pré-exponencial não normalizada do

branco à pré-exponencial da amostra, para o mesmo componente. Quando a pré-

exponencial resultante desta correção não fosse significativamente diferente de zero, a

componente era desprezada, pois correspondia à autofluorescência da célula. A

qualidade do ajuste foi avaliada de acordo com o valor de 2

G reduzido, que se deveria

encontrar entre 1 e 1,5, e pela distribuição aleatória dos resíduos e autocorrelação dos

resíduos ponderados [39].

3.13. Análise da composição lipídica dos extratos lipídicos totais e

purificação dos esfingolípidos por cromatografia de Camada Fina

A análise da composição lipídica dos extratos de lípidos totais e a purificação dos

extratos de esfingolípidos foi realizada recorrendo a uma cromatografia de camada fina

(TLC de thin layer chromatography). Esta técnica cromatográfica baseia-se na

observação da separação de substâncias não voláteis em bandas no adsorvente da

camada fina [67]. Como adsorvente utilizou-se sílica gel, que é um adsorvente polar

muito utilizado na análise de lípidos por TLC. Deste modo, lípidos polares são mais

fortemente adsorvidos do que lípidos não polares, refletindo-se numa taxa de migração

mais rápida para lípidos não polares, e numa migração mais lenta para os lípidos polares

[68].Utilizaram-se como sistemas de solventes clorofórmio/metanol/água (65:25:4,

v/v/v/v) na análise da composição em fosfolípidos, e o sistema

clorofórmio/metanol/ácido acético/água (16:6:4:1,6, v/v/v/v) na análise da composição

em esfingolípidos, não só porque se pretendia fazer uma análise de lípidos polares, mas

também porque se encontra descrito na literatura que este sistema permite uma melhor

separação de esfingolípidos complexos quando comparado com outros sistemas de

solventes polares [69].

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Papel dos esfingolípidos complexos na organização da membrana plasmática da levedura Saccharomyces cerevisiae

42

Inicialmente, a placa de sílica gel 20 x 20 cm2 com tamanho de poro de 60 Å

(Merck) foi ativada numa estufa a 100 °C, durante 1 hora. O extrato de lípidos totais e o

extrato de esfingolípidos foram dissolvidos em clorofórmio/metanol (2:1, v/v). Após o

arrefecimento da placa aplicou-se entre 10 - 80 µg de amostra [68] com o auxílio de

uma pipeta automática de 20 µL, em pontos, no caso da análise das diferentes classes de

lípidos presentes nos extratos de lípidos totais, ou segundo uma linha, quando se

realizou uma TLC preparativa [70], utilizada na purificação dos esfingolípidos. A placa

foi colocada numa câmara de TLC previamente saturada com o sistema de solventes, e

deixou-se que o sistema de solventes ascendesse até cerca de 1 cm do topo da placa

[68]. A identificação de bandas foi feita segundo dois métodos, um método não

destrutivo, que consiste na coloração por exposição ao iodo, e um método destrutivo no

qual se utilizou uma solução de ácido fosfomolíbdico 5 % (em etanol, m/v). Pelo

método de exposição ao iodo, uma vez seca, a placa foi colocada numa câmara saturada

com cristais de iodo e, após alguns minutos, as bandas começaram a aparecer

apresentando uma coloração amarela/castanha [68]. A posição das bandas foi descrita

pelo fator de retardação, Rf, que é definido como o quociente da distância da banda em

relação ao ponto de aplicação pela distância entre a frente de solvente e o ponto de

aplicação [71]. Para a purificação dos esfingolípidos complexos, após revelação por

exposição a iodo, as bandas correspondentes a cada um dos esfingolípidos complexos

foram raspadas da placa de TLC e a sílica-gel foi recolhida. Os esfingolípidos foram

recuperados do pó da sílica através de múltiplas extrações com 2 mL do respetivo

sistema de solvente de desenvolvimento, e foram armazenados a -20 °C.

Nas cromatografias usando extratos totais a identificação das diferentes bandas foi

feita por comparação com os seguintes padrões: POPC; DPPE; PI; e erg. Os volumes

aplicados de cada padrão foram: 10 µL de POPC, a uma concentração de 1 mg/mL; 20

µL de PE, a 2 mg/mL; 40 µL de PI, a 1 mg/mL; e 20 µL de ergosterol, a 1,08 mg/mL.

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Materiais e Métodos

43

3.14. Microscopia de Força Atómica

A microscopia de força atómica (AFM) foi utilizada com o objetivo de estudar as

propriedades estruturais e morfológicas da membrana reconstruida a partir de extratos

de lípidos totais. De forma sucinta, esta técnica consiste na medida da força entre os

átomos da amostra e os de uma ponta extremamente afiada, que se encontra integrada

no terminal de um cantilever, responsável pela transdução de sinal. As interações entre

a ponta e a amostra são refletidas pela flexão do cantilever, sendo esta flexão

proporcional à força da interação [4]. Deste modo, a técnica de AFM, além de permitir

traçar um perfil topográfico da superfície através de variações na amplitude da

oscilação, possibilita igualmente a aquisição de imagens de fase, que fornecem

informação referente às propriedades elásticas da membrana biológica [72].

Para a formação de bicamadas lipídicas suportadas (SLB) recorreu-se ao método de

fusão de vesículas, e utilizou-se, como substrato, a mica, uma superfície hidrófila

carregada negativamente a pH neutro. Este tipo de substrato apresenta ainda a

particularidade de ser atomicamente liso, tornando-o adequado para a formação de uma

membrana lipídica [73].

Após a formação de SUV’s a partir de extratos lipídicos obtidos pelo método de

extração de Folch et al. provenientes das duas estripes estudadas numa concentração de

0,5 mM (com base apenas no doseamento de fosfolípidos), foi adicionado um

determinado volume de solução de cloreto de cálcio de forma a ficar numa concentração

final de 5 mM na suspensão de vesículas. O ião cálcio é conhecido por estabelecer uma

ponte electroestática entre os grupos negativos presentes nas regiões polares dos lípidos

da membrana e a superfície negativa da mica, favorecendo, assim, a interação entre as

vesículas e o substrato [73,74]. O raio de curvatura muito pequeno das SUV’s contribui

para que estas sejam mais suscetíveis de se romperem e fundirem, facilitando a

formação da SLB [1]. A suspensão de vesículas foi adicionada à mica, e a sua adsorção,

deformação, fusão e rutura ocorreram através da incubação a 60 °C, durante 45 min

[74]. Após este tempo de incubação, a amostra foi arrefecida à temperatura ambiente

por um período de 1 hora, e depois lavada com tampão B, de forma a remover as

vesículas que não se tinham fundido [75].

Em AFM, as medidas foram realizadas in-situ, uma vez que as amostras se

encontravam imersas em tampão. Os cantilevers foram de nitreto de silício (SNL,

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Papel dos esfingolípidos complexos na organização da membrana plasmática da levedura Saccharomyces cerevisiae

44

Bruker), com constante de força de, aproximadamente, 0.35 N/m, e possuíam uma

frequência de ressonância em líquido de 26 kHz. As imagens foram adquiridas num

microscópio Multimode Nanoscope IIIa (Digital Instruments, Veeco), à temperatura

ambiente (25 ± 1 °C). Utilizou-se o método de operação de contacto intermitente, tendo-

se mantido o valor da força o mais baixo possível.

As imagens obtidas foram tratadas no software V613r1 (Vecco Instruments), tendo

sido aplicada a função de flattening para que a imagem atingisse um nivelamento

próximo do correto pela remoção de artefactos inevitáveis do processo de aquisição de

imagens por AFM [76].

3.15. Análise estatística

Os resultados encontram-se representados como a média ± desvio padrão de pelo

menos três experiências independentes. A análise estatística dos dados experimentais foi

feita com base no teste t-Student de duas caudas por comparação de dois grupos de

resultados diferentes. As diferenças foram consideradas significativas a partir de um

valor de significância p < 0,05.

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Resultados

45

4. Resultados

4.1. Estudo do crescimento de células da levedura S. cerevisiae

Uma vez que se pretendia realizar não só a caraterização biofísica da membrana

plasmática, mas também a extração dos lípidos totais da levedura S. cerevisiae,

tornou-se importante determinar se existiam diferenças no crescimento das duas

estirpes, wt e ipt1Δ, tanto no meio líquido sintético SC, como no meio líquido rico

YPD. Na Figura 11 encontram-se representadas as curvas de crescimento das duas

estirpes nos dois meios a ser utilizados neste trabalho.

Figura 11- Curvas de crescimento das estirpes wt e ipt1Δ. Estirpe wt em meio SC ( ) e em meio YPD

( ) e estirpe ipt1Δ em meio SC ( ) e em meio YPD ( ). As células foram inoculadas a uma densidade

ótica inicial de 0,2 OD600 (1 OD600 ≈ 1,25 x 107 células/mL), e deixadas a crescer a 30 °C com agitação a

160 rpm, sendo o seu crescimento monitorizado pela leitura da absorvência a 600 nm entre curtos

intervalos de tempo. Os valores correspondem à mediana de pelo menos 3 experiências independentes

para cada curva.

Pela comparação da curva de crescimento da estirpe wt com a da estirpe mutada

ipt1Δ, no mesmo meio de crescimento, observou-se que a mutação não afetou o perfil

de crescimento, uma vez que para as duas estirpes se observaram valores semelhantes

de densidade ótica a 600 nm (Figura 11), o que está de acordo com a literatura [55]. Isto

também pode ser comprovado pelos valores dos parâmetros de crescimento celular

obtidos na fase exponencial. Deste modo, no Quadro 2 encontram-se os valores obtidos

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46

para os parâmetros de crescimento celular, taxa de crescimento (µ) e tempo de geração

ou duplicação (tg), para cada uma das estirpes nos dois meios de cultura estudados.

Quadro 2 – Parâmetros de crescimento celular obtidos a partir da fase exponencial das curvas de

crescimento das estirpes wt e ipt1Δ, nos meios de cultura SC e YPD. Os valores apresentados

correspondem à média ± desvio padrão de pelo menos 3 experiências independentes.

Meio líquido SC Meio líquido YPD

µ (h-1

) tg (h) µ (h-1

) tg (h)

wt 0,416 ± 0,005 1,666 ± 0,021 0,469 ± 0,001 1,478 ± 0,003

ipt1Δ 0,399 ± 0,002 1,739 ± 0,010 0,446 ± 0,011 1,557 ± 0,040

Ambas as estirpes apresentaram valores semelhantes dos parâmetros de crescimento

celular, apesar de em meio líquido YPD, o crescimento ser ligeiramente mais rápido

para a estirpe wt (tg = 1,5 h) quando comparada com a mutada (tg = 1,6 h).

O crescimento de células da mesma estirpe em meio líquido YPD, quando

comparado com o meio SC, não só apresenta uma maior densidade ótica, e portanto,

uma maior quantidade de células, como também o crescimento é mais rápido. Assim, o

meio de crescimento YPD torna-se mais vantajoso na extração de lípidos totais da

levedura, dado que se obtém uma quantidade maior de células, quando comparado com

o meio SC, proporcionando assim a possibilidade de obtenção de uma concentração de

lípido maior. No meio YPD, ao fim de 24 h (na fase estacionária), a estirpe ipt1Δ

apresentou valores de densidade ótica a 600 nm de 19,3 ± 0,5 OD600, que equivale

aproximadamente a 2,4108 células/mL, enquanto a estirpe wt apresentou valores de

densidade ótica a 600 nm de 25,2 ± 1,1 OD600 que equivale aproximadamente a

3,2108 células/mL.

Quanto ao estudo da caraterização biofísica da membrana plasmática das células de

levedura, este foi realizado num meio de cultura SC, não só por ser um meio mais

controlado do que o meio YPD, mas também porque já existia um protocolo otimizado

bem como resultados na literatura que utilizam este meio de cultura [28,39,50]. No

meio de cultura SC, a fase exponencial compreendeu-se no intervalo entre as 3 e 8 horas

Figura 11.

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Resultados

47

4.2. Caraterização biofísica da membrana plasmática de levedura com a

sonda t-PnA

Com o intuito de avaliar se a presença do esfingolípido mais complexo M(IP)2C

alterava os domínios ordenados da membrana plasmática, células intactas das duas

estirpes estudadas foram marcadas com uma sonda de membrana, o t-PnA. A

caraterização biofísica da membrana plasmática englobou a realização de medidas de

fluorescência no estado estacionário (espetros de absorção, excitação, emissão e

anisotropia de fluorescência) e no estado transiente.

4.2.1. Espectros de absorção, excitação e emissão do t-PnA

Na Figura 12-A estão representados o espetro de absorção da sonda t-PnA em

etanol, e os espetros de excitação e emissão da sonda t-PnA na membrana plasmática da

levedura S. cerevisiae, assim como as percentagens de branco obtidas para o espetro de

excitação (Figura 12-B) e de emissão (Figura 12-C) do t-PnA.

Figura 12 – Espectros eletrónicos da sonda t-PnA, a 24 °C. A- O espectro de absorção (azul) foi obtido

para o t-PnA em etanol. A vermelho e verde estão representados, respetivamente, os espetros de excitação

e de emissão corrigidos obtidos para a sonda incorporada na membrana plasmática, a uma concentração

celular por mL de 1,95 OD. B- % branco obtida para o espetro de excitação; C- % de branco obtida para o

espetro de emissão. A excitação foi feita a 320 nm, para o espetro de emissão, e a emissão foi detetada a

404 nm, para o espetro de excitação.

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48

O espetro de absorção do t-PnA apresentou uma banda intensa de absorção na zona

do UV (ultravioleta), típica de uma transição eletrónica -*, envolvendo naturalmente

as duplas ligações conjugadas do cromóforo tetraeno. Dentro desta banda é possível

observar 3 picos de absorção, a 287, 300 e 314 nm, sendo o máximo observado a

300 nm (Figura 12-A), o que está de acordo com espetros publicados anteriormente para

o t-PnA em etanol [49]. Estes picos correspondem a transições para diferentes níveis

vibrónicos do estado eletrónico excitado (progressão vibracional) [77].

Em relação ao espetro de excitação, este apresentou, à semelhança do espetro de

absorção, uma banda intensa de excitação, com a mesma progressão vibracional, mas

com um ligeiro desvio para o vermelho, ocorrendo os picos a 293, 305 e 320 nm, sendo

o máximo obtido aos 305 nm (Figura 12-A). O desvio observado entre espetro de

absorção em etanol e o de excitação na membrana plasmática de levedura em cerca de

6 nm resulta da sensibilidade desta sonda à polarizabilidade do microambiente em que

se encontra, uma vez que o seu cromóforo é apolar. Os espetros de excitação desta

sonda foram idênticos tanto na membrana plasmática de células da estirpe wt como na

mutada.

O espetro de emissão apresentou uma banda intensa entre 350 e 550 nm. Contudo,

o espetro de emissão não é simétrico ao espetro de absorção (Figura 12-A). A absorção

caraterística de polienos resulta da transição do estado fundamental (S0) para o estado

excitado de maior energia (S2), sendo esta uma transição permitida por simetria para

determinadas transições vibrónicas. Contudo, após transição de S0→S2 ocorre uma

rápida conversão interna do estado excitado S2 para um estado excitado de menor

energia, provavelmente envolvendo uma isomerização trans-cis, sendo a emissão

resultante de uma transição diferente daquela que ocorreu na excitação [78]. O máximo

de emissão para ambas as estirpes foi atingido a 406 nm.

Obteve-se uma menor percentagem de branco a 320 nm, no caso do espetro de

excitação (Figura 12-B), e a 404 nm, no caso do espetro de emissão (Figura 12-C),

sendo estas de, aproximadamente, 3,4 e 3,0 %, respetivamente. Desta forma as restantes

medidas de fluorescência foram realizadas com a excitação da amostra a 320 nm, e com

a emissão aos 404 nm, garantindo assim que a influência dos restantes componentes

celulares fosse a mínima possível.

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Resultados

49

4.2.2. Anisotropia de fluorescência

Sendo o t-PnA uma sonda com uma partição preferencial para domínios muito

ordenados, tais como domínios gel, torna-se relevante a realização de medidas da

anisotropia de fluorescência, uma vez que a partir da dinâmica rotacional desta sonda na

membrana é possível obter uma noção do microambiente em que ela está inserida.

Como até à data não existiam resultados para a anisotropia da sonda t-PnA na

membrana plasmática da estirpe mutada ipt1Δ, e de forma a comparar com os resultados

existentes, quer na literatura quer resultados não publicados obtidos no laboratório onde

esta tese foi desenvolvida, para a estirpe wt, realizaram-se ensaios em diferentes

condições experimentais: ensaio realizado a 24 °C, com incubação da sonda t-PnA a

24 °C; ensaio realizado a 24 °C, com incubação do t-PnA a 30 °C; e ensaio a 30 °C,

com incubação do t-PnA a 30 °C.

Na Figura 13 encontram-se representadas as anisotropias de fluorescência em

estado estacionário da sonda t-PnA na membrana plasmática das estirpes da levedura

S. cerevisiae estudadas, nas diferentes condições experimentais.

Figura 13 – Anisotropia de fluorescência em estado estacionário do t-PnA na membrana plasmática

de células das estirpes wt e ipt1Δ em diferentes condições experimentais. Preto - ensaio realizado a

24 °C, com incorporação da sonda t-PnA a 24 °C; Riscas – ensaio realizado a 24 °C, com incorporação do

t-PnA a 30 °C; Branco – ensaio a 30 °C, com incorporação do t-PnA a 30 °C. As células de ambas as

estirpes encontravam-se na fase exponencial de crescimento, a uma concentração celular por mL de

1,95 OD. As amostras foram excitadas a 320 nm e a emissão de fluorescência detetada a 404 nm. Os

valores correspondem à média ± desvio padrão de pelo menos 4 experiências independentes. *, p < 0,05;

**, p<0,01.

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50

As estirpes wt e a ipt1Δ apresentaram, respetivamente, um valor de anisotropia de

fluorescência do t-PnA de 0,295 ± 0,004 e 0,291± 0,010, no caso em que tanto o ensaio

como a incorporação foram realizados à temperatura ambiente (24 °C), e de

0,285 ± 0,009 e 0,289 ± 0,008, no ensaio realizado à temperatura ótima de crescimento

de leveduras (30 °C), não se observando diferenças significativas na anisotropia de

fluorescência do t-PnA entre as duas estirpes nestas condições experimentais (Figura

13). Estes valores de anisotropia consideravelmente elevados revelam uma baixa

difusão rotacional por parte da sonda t-PnA na membrana plasmática destas duas

estirpes, caraterística de ambientes mais rígidos, o que indica a presença de domínios

ordenados do tipo gel, uma vez que esta sonda tem preferência para este tipo de

domínios [39]. Os valores de anisotropia do t-PnA obtidos, apesar de serem cerca de

1,04 vezes superiores, estão de acordo com os apresentados em estudos recentes para a

estirpe wt [64].

Contudo observou-se uma diferença significativa entre as estirpes wt e ipt1Δ, nos

ensaios realizados a 24 °C, mas com a incubação da sonda a 30 °C (Figura 13). Esta

diferença será melhor discutida na secção de Discussão. O valor de anisotropia do t-PnA

na membrana plasmática da estirpe wt nestas condições experimentais encontra-se de

acordo com o referido no estudo realizado por Bastos et al.[79].

Também é de notar que a anisotropia do t-PnA nos casos em que a incubação do

t-PnA foi feita à mesma temperatura do ensaio exibiu um valor cerca de ca. 5 a 10%

inferior aqueles em que a incubação foi feita a uma temperatura diferente, no caso da

estirpe ipt1Δ (Figura 13). Esta diferença reflete o efeito da temperatura na organização

da membrana quando se transita de temperatura (dos 30 °C para os 24 °C).

4.2.3. Decaimento da intensidade de fluorescência

Sendo o t-Pna sensível a variações na quantidade e composição de domínios

ordenados, através da análise da componente longa e do tempo de vida desta sonda, é

possível detetar a presença deste tipo de domínios.

Recorreu-se a uma análise global não só de forma a obter-se o decaimento real da

sonda na amostra, evitando a in, mas também por este tipo de análise oferecer um

número maior de componentes estatisticamente significativas [15].

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Resultados

51

Na Figura 14 encontra-se representada a análise global de um decaimento da

intensidade de fluorescência do t-PnA na membrana plasmática de levedura, bem como

os resíduos e auto-correlação do ajuste.

Figura 14 – Exemplo da análise global de um decaimento de intensidade de fluorescência da sonda

t-PnA na membrana plasmática da estirpe ipt1Δ a 24 °C (A), e dos resíduos do ajuste (B) e davauto-

correlação dos resíduos (C). As células encontravam-se na fase exponencial de crescimento, e a uma

concentração celular por mL de 1,95 OD. Preto - decaimento de fluorescência da sonda t-PnA na

membrana plasmática da levedura; cinzento - decaimento dos componentes da levedura S. cerevisiae

(amostra sem sonda); laranja – melhor ajuste aos pontos experimentais da amostra com sonda; azul -

melhor ajuste aos pontos experimentais da amostra sem sonda. A amostra foi excitada a 315 nm e a

emissão fluorescência detetada a 404 nm. A escala de tempo foi de 0,223 ns/canal. Obteve-se um

2G = 1,49.

Pela Figura 14-A pode-se observar a presença de uma componente longa no

decaimento de intensidade de fluorescência do t-PnA, tal como anteriormente observado

para decaimentos desta sonda na membrana plasmática de outras estirpes desta levedura

obtidos em condições experimentais semelhantes [15,39]. O decaimento do t-PnA foi

descrito por quatro exponenciais.

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52

Figura 15 – Tempo de vida (A), amplitude normalizada da componente longa (B), e tempo de vida

médio de fluorescência (C) do t-PnA na membrana plasmática das estirpes wt e ipt1Δ obtidos a

partir do decaimento da intensidade de fluorescência, em diferentes condições experimentais. Preto-

ensaio realizado a 24 °C, com incorporação da sonda a 24 °C; Riscas – ensaio realizado a 24 °C, com

incorporação do t-PnA a 30 °C; Branco – ensaio a 30 °C, com incorporação do t-PnA a 30 °C. As células

de ambas as estirpes encontravam-se na fase exponencial de crescimento, a uma concentração celular por

mL de 1,95 OD. As amostras foram excitadas a 315 nm e a emissão de fluorescência detetada a 404 nm.

Os valores correspondem à média ± desvio padrão de pelo menos 4 experiências independentes para cada

uma das estirpes. *, p < 0,05; **, p<0,01; ***, p<0,001.

Obteve-se uma componente longa de 34,9 ± 3,1 e 35,3 ± 1,0 ns, respetivamente

para a estirpe wt e ipt1Δ, no caso dos ensaios realizados a 24 °C, com incubação da

sonda t-PnA a 24 °C. Nos ensaios a 30 °C com incubação da sonda t-PnA a 30 °C

obteve-se uma componente longa de 30,5 ± 1,0 e 29,9 ± 0,3 ns respetivamente para a

estirpe wt e ipt1Δ, não se observando diferenças significativas entre ambas as estirpes

(Figura 15-A). Os valores de anisotropia perto de 0,3 eram uma indicação da presença

de domínios muito ordenados na membrana plasmática de células ipt1Δ; os valores

obtidos para a componente longa nas experiências realizadas a 24 °C demonstram

inequivocamente que esses domínios estão numa fase gel, uma vez que estudos em

sistemas modelo [48] bem como na membrana plasmática da levedura [39] mostraram

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Resultados

53

que tempos de vida superiores a 30 ns estão associados à presença de fases sólidas

muito ordenadas, isto é domínios gel. A inexistência de diferenças na componente longa

indica uma compactação semelhante dos domínios gel nas duas estirpes. Os valores da

componente longa foram cerca de 1,15 vezes mais baixos do que os apresentados pela

literatura para a estirpe wt [39], sendo que esta diferença será discutida na secção

Discussão.

Pela Figura 15-A pode-se observar também diferenças significativas entre estudos

realizados a 24 °C e a 30 °C para ambas as estirpes, sendo o valor da componente longa

significativamente mais baixo nos ensaios a 30 °C, o que seria de esperar, uma vez que

com o aumento da temperatura há uma consequente diminuição da ordem ou rigidez da

bicamada lipídica. Este comportamento é concordante com os estudos realizados na

membrana plasmática de levedura com a sonda t-PnA, embora o valor apresentado no

presente estudo seja cerca de 1,2 vezes inferior ao da literatura [39]. Esta discrepância

também será abordada mais à frente (secção 5.1 da Discussão).

No caso dos ensaios realizados a 24 °C mas com incorporação da sonda a 30 °C, a

componente longa apresentou valores superiores aos dos restantes ensaios (Figura

15-A). O valor de anisotropia obtido nestas condições experimentais está em

concordância com os resultados do estudo realizado no grupo por Bastos et al.[79].

Não se observaram diferenças significativas entre as amplitudes normalizadas dos

decaimentos de fluorescência obtidos para as duas estirpes nos ensaios realizadas a

24 °C e a 30 °C (Figura 15-B), apesar de o valor médio ser superior no caso das células

ipt1Δ a 30ºC. Isto mostra que a abundância relativa dos domínios de gel não é afetada

pela ausência do esfingolípido complexo M(IP)2C. O facto de a amplitude normalizada

permanecer a mesma nos ensaios realizados a 24 °C e a 30 °C em células wt foi

previamente mostrado por Aresta-Branco et al.[39]. Contudo, no ensaio a 24ºC com

incorporação a 30ºC, observou-se que a amplitude normalizada do t-PnA na membrana

plasmática de células wt era significativamente superior ao valor obtido para células

ipt1Δ, o que indica que a abundância dos domínios gel, é mais afetada pelo decréscimo

de temperatura na ausência de M(IP)2C.

Apesar de a amplitude normalizada da componente longa ser inferior à das outras

componentes, a contribuição para o decaimento da intensidade de fluorescência foi

muito significativa, uma vez que se observou um tempo de vida longo, e o tempo de

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Papel dos esfingolípidos complexos na organização da membrana plasmática da levedura Saccharomyces cerevisiae

54

vida médio de fluorescência foi consideravelmente elevado (Figura 15-B) quando

comparado com o valor obtido em outras células também marcadas com a sonda t-PnA

[15].

Pela Figura 15-C não se observaram diferenças significativas entre ambas as

estirpes. Obteve-se um tempo médio de vida de 25 ns para ambas as estirpes nos

ensaios a 24 °C e a 30 °C, o que é consistente com resultados da literatura para a estirpe

wt [39]. Mais uma vez, foram visíveis diferenças significativas entre o ensaio realizado

a 24 °C mas com incorporação da sonda a 30 °C e os restantes ensaios, tendo os valores

do tempo médio de vida obtidos no presente trabalho sido cerca de 1,3 vezes superiores

aos obtidos no estudo realizado no grupo por Bastos et al. [79] nas mesmas condições.

O facto de os valores terem sido superiores aos obtidos por estudos realizados

anteriormente nos grupos de investigação onde decorreu este trabalho pode ser devido

ao facto de ter sido necessário uma escala de tempo de 0,223 ns/canal para os

decaimentos de fluorescência das amostras do presente estudo, que foi diferente da

escala de tempo utilizada no estudo de Bastos et al.[79], de 0,111 ns/canal. Não só esta

diferença do tempo médio de vida, como também a das componentes longas dos

decaimentos nos ensaios a diferentes temperaturas será discutida na secção 5.1 da

Discussão.

À semelhança dos resultados das medidas de anisotropia descritos na secção 4.2.2,

não se observaram diferenças significativas entre as duas estirpes, indicando que a

presença do esfingolípido complexo M(IP)2C não afeta a quantidade relativa de

domínios ordenados na membrana plasmática.

Outro parâmetro que foi determinado foi o tempo de vida médio pesado pelas

amplitudes (Figura 16).

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Resultados

55

Figura 16 – Tempo de vida médio pesado pelas amplitudes do t-PnA na membrana plasmática das

estirpes wt e ipt1Δ. Os valores foram obtidos a partir do decaimento da intensidade de fluorescência, em

diferentes condições experimentais. Preto - ensaio realizado a 24 °C, com incorporação da sonda a 24 °C;

Riscas – ensaio realizado a 24 °C, com incorporação do t-PnA a 30 °C; Branco – ensaio a 30 °C, com

incorporação do t-PnA a 30 °C. As células de ambas as estirpes encontravam-se na fase exponencial de

crescimento, a uma concentração celular por mL de 1,95 OD. As amostras foram excitadas a 315 nm e a

emissão fluorescência detetada a 404 nm. Os valores correspondem à média ± desvio padrão de pelo

menos 4 experiências independentes. *, p < 0,05.

Apesar de no ensaio a 24 °C, o tempo médio de vida pesado pelas amplitudes ( )

não apresentar diferenças significativas, nos ensaios com incorporação da sonda a 30ºC

observou-se que este parâmetro era cerca de 1,16 vezes inferior na estirpe ipt1Δ em

comparação com a wt (Figura 16). Dado que o é proporcional ao rendimento quântico

da sonda na membrana [47], pode-se dizer o t-PnA tem um rendimento quântico

ligeiramente inferior na membrana plasmática da estirpe ipt1Δ, uma vez que apesar de

esta diferença não ser estatisticamente significativa quando a medição foi efetuada a

24 ºC, ela torna-se significativa (p < 0,05) quando a incorporação da sonda é feita a

30 ºC. Esta diferença pode ser explicada pelo facto de se ter observado que amplitude

normalizada da componente longa do t-PnA na membrana plasmática de células wt era

superior em relação a células ipt1Δ (Figura 15-B), indicando que a abundância dos

domínios gel é mais afetada por alterações da temperatura na ausência de M(IP)2C.

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Papel dos esfingolípidos complexos na organização da membrana plasmática da levedura Saccharomyces cerevisiae

56

4.3. Caraterização biofísica da membrana plasmática da levedura com a

sonda DPH

Com o intuito de perceber como a membrana plasmática de forma global

responde à ausência do esfingolípido complexo M(IP)2C, a membrana plasmática

também foi marcada com a sonda DPH, uma sonda sensível às propriedades globais da

membrana, não apresentado partição preferencial por um tipo de domínio em particular.

Apenas foram realizaram medidas de fluorescência em estado estacionário com o DPH,

uma vez que os tempos de vida desta sonda são muito menos sensíveis à compactidade

e natureza dos domínios que o t-PnA, exceto em casos em que haja uma perturbação da

bicamada tão forte que ocorra a penetração de água até perto do centro da bicamada

[80].

4.3.1. Espectros de absorção, excitação e emissão do DPH

Na Figura 17-A estão representados o espetro de absorção da sonda DPH em

metanol, e os espetros de excitação e emissão do DPH na membrana plasmática da

levedura S. cerevisiae, assim como as percentagens de branco obtidas para o espetro de

excitação (Figura 12-B) e de emissão (Figura 12-C) do DPH.

À semelhança da sonda t-PnA, o espetro de absorção do DPH em metanol

apresentou uma banda intensa de absorção com 3 picos vibrónicos a 336, 352, e 371 nm

(Figura 17-A). No espetro de excitação do DPH na membrana plasmática da estirpe

ipt1Δ ocorreu um desvio de cerca de 6 nm para o vermelho relativamente ao espetro de

absorção da sonda em metanol, dando-se o máximo de excitação a 377 nm (Figura 17-

A), sendo este desvio devido ao aumento de polarizibilidade do microambiente

relativamente ao solvente orgânico [46].

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Resultados

57

Figura 17- Espectros eletrónicos da sonda DPH, a 24 °C. A - O espectro de absorção (azul) foi obtido

para o DPH em metanol. A vermelho e verde estão representados, respetivamente, os espetros de

excitação e de emissão corrigidos para a sonda incorporada nas membranas da levedura S. cerevisiae, a

uma concentração celular por mL de 1,95 OD. B - % branco obtida para o espetro de excitação; C- % de

branco obtida para o espetro de emissão. A excitação foi feita a 358 nm, para o espetro de emissão, e a

emissão foi detetada a 430 nm, para o espetro de excitação.

Do mesmo modo, o espetro de emissão do DPH apresentou uma banda intensa

que, ao contrário do observado com a sonda t-PnA, apresentou 3 picos de emissão a

406, 428, e 452 nm, sendo o máximo observado aos 428 nm (Figura 17-A). É também

notável o reduzido desvio de Stokes observado entre o espetro de absorção e o de

emissão. No caso do DPH, o espetro de emissão mostrou-se simétrico ao de absorção

(Figura 17), indicando que o espaçamento entre os níveis de energia vibracionais no

estado excitado é semelhante ao do estado fundamental [46]. Os espetros de excitação e

de emissão desta sonda foram idênticos tanto na membrana plasmática de células da

estirpe wt como na ipt1Δ.

Obteve-se uma menor percentagem de branco a 358 nm, no caso do espetro de

excitação (Figura 17-B), e a 430 nm, no caso do espetro de emissão (Figura 17-C),

sendo estas de, aproximadamente, 1,0 e 1,4 %, respetivamente. Desta forma as medidas

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Papel dos esfingolípidos complexos na organização da membrana plasmática da levedura Saccharomyces cerevisiae

58

de anisotropia de fluorescência foram realizadas com a excitação da amostra a 358 nm,

e com a emissão a 430 nm, para que a influência dos restantes componentes celulares

fosse a mínima possível.

4.3.2. Anisotropia de fluorescência em estado estacionário

Realizaram-se também medidas de anisotropia de fluorescência em estado

estacionário com a sonda DPH, de forma a obter informação relativa à ordem global da

membrana plasmática das duas estirpes estudadas, visto que a observação de um

aumento da anisotropia da sonda, reflete a presença de uma membrana mais ordenada.

Figura 18- Anisotropia de fluorescência em estado estacionário do DPH na membrana plasmática

de células wt e ipt1Δ na fase exponencial e estacionária do crescimento celular. Barra preta – células

da estirpe wt; barra branca – células da estirpe ipt1Δ. Os ensaios foram realizados a 24 °C e a uma

concentração celular por mL de 1,95 OD. As amostras foram excitadas a 358 nm e a emissão

fluorescência detetada aos 430 nm. Os valores correspondem à média ± desvio padrão de, pelo menos, 3

experiências independentes. **, p<0,01; ***, p<0,001.

Como se pode ver pela Figura 18, a anisotropia de fluorescência do DPH aumentou

significativamente nas células da estirpe ipt1Δ, quando comparadas com células da

estirpe wt, revelando assim que a estirpe ipt1Δ, e consequentemente a ausência de

M(IP)2C, leva a uma ordem global maior da membrana plasmática. Os valores

apresentados para a estirpe wt estão de acordo com resultados recentes para a sonda

DPH [39,50]. Nas células ipt1Δ os valores de anisotropia desta sonda são superiores aos

obtidos para as células wt à semelhança do observado nas células de outras estirpes com

mutações em genes envolvidos no metabolismo lipídico, como as células erg6Δ e scs7Δ

[39].

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Resultados

59

Outro aspeto interessante recai no facto de o valor de anisotropia de fluorescência

não ser afetado pela fase de crescimento em que as células se encontram, isto é não se

observaram diferenças entres a fase exponencial e a estacionária de crescimento da

mesma estirpe (Figura 18), apesar de estar descrito na literatura que o lipidoma sofre

algumas alterações consoante a fase de crescimento [20], o que pode resultar da

capacidade da levedura para ajustar a sua composição lipídica de forma a manter uma

certa ordem da membrana.

4.4. Otimização das condições experimentais de extração de lípidos totais

Uma vez que um dos objetivos desta tese de mestrado passava pela extração de

lípidos totais da levedura S. cerevisiae, e consequente extração e purificação dos

esfingolípidos complexos, inicialmente optou-se por um método de extração que

favorecesse ao máximo a extração desta classe de lípidos. Estudos de Hanson e Lester

mostraram que para a extração de lípidos muito polares como os esfingolípidos

complexos era necessário um método de extração que utilizasse uma mistura de

solventes rica em água [56]. Também por estudos destes autores, mostrou-se que a

extração com uma mistura de etanol/água (4:1, v/v) a 100 °C era mais eficiente quando

comparada com outros métodos, apresentando uma percentagem superior a 90 % de

lípidos totais extraídos, não se tendo observado diferenças, em termos da quantidade de

lípidos extraídos, entre as experiências realizadas tanto na fase exponencial como na

fase estacionária de crescimento [56].

Desta forma começou-se por realizar a extração dos lípidos totais pelo método de

Hanson e Lester (ver mais detalhes na secção 3.7.1 dos Materiais e Métodos). Partindo

de um precipitado de células intactas lavadas com cerca de 5 g obteve-se um extrato de

lípidos totais com uma massa de 0,25 ± 0,034 e 0,26 ± 0,05 g para a estirpe wt e ipt1Δ,

respetivamente. Durante a dissolução do extrato lipídico numa mistura de

clorofórmio/metanol (2:1, v/v) não foi possível dissolver toda a massa do extrato. Isto

está de acordo com a literatura, que refere que métodos de extração com misturas de

solventes ricas em água levam à extração não só de lípidos mas também de uma

quantidade considerável de material não lipídico que é mais polar que a maioria dos

fosfolípidos da levedura [56,58]. Através da quantificação dos lípidos do extrato pelo

método de doseamento do fosfato inorgânico (explicado na secção 3.9. dos Materiais e

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Papel dos esfingolípidos complexos na organização da membrana plasmática da levedura Saccharomyces cerevisiae

60

Métodos) obteve-se uma concentração de fosfolípidos de 3,6 ± 1,4 e 5,0 ± 1,3 mM num

volume de 7 mL para a estirpe wt e ipt1Δ (n=5), respetivamente.

Também por estudos de Hanson e Lester [56] mostrou-se que extrações com

misturas como clorofórmio/metanol falhavam ao não conseguir uma extração completa,

sendo os piores resultados obtidos na fase estacionária (< 14 % dos lípidos totais

extraídos). Foram ainda apontados outros problemas associados a este método clássico

de extração lipídica que residem no facto de não serem muito eficientes na extração de

lípidos a partir de células intactas, e de poderem levar à ativação de fosfolipases durante

o procedimento de extração [56]. Se, de facto, a lise de células com solventes neutros,

como o metanol, levar à ativação de fosfolipases, isto pode afetar a proporção de

fosfolípidos nos extratos de lípidos totais obtidos por este método. Assim, de seguida,

com o intuito de perceber se de facto o método de extração de Hanson e Lester era o

mais adequado para o presente estudo, realizaram-se também extrações pelo método

clássico de extração proposto por Folch et al. Muito sucintamente este método envolve

a utilização de 20 vezes o volume da mistura clorofórmio/metanol (2:1, v/v) por volume

de precipitado de células lisadas. Contudo este método requereu um longo processo de

otimização das condições experimentais de forma a obter-se uma concentração que

fosse razoável (concentração em fosfolípidos superior a 0,1 mM) para a realização das

medidas de fluorescência. Contrariamente às células animais para as quais o método de

Folch et al. foi proposto, as células de levedura possuem parede celular que tem que ser

destruída para haver uma extração eficaz dos lípidos.

No Quadro 3 encontra-se um resumo das alterações ao protocolo de extração de

Folch et al., sendo apresentadas as concentrações com base no doseamento dos

fosfolípidos dos extratos lipídicos obtidos pelas diferentes modificações.

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Resultados

61

Quadro 3 - Alterações ao protocolo proposto por Folch et al. [57,58] e respetivos valores da

concentração em fosfolípidos obtida para os extratos de lípidos totais de células da estirpe wt e ipt1Δ

da levedura S. cerevisiae. As células de ambas as estirpes cresceram em meio líquido YPD durante 24 h,

encontrando-se assim na fase estacionária. A extração foi realizada a partir de um precipitado de células

intactas de 5 g segundo uma variante do método de extração de Folch et al. [57,58]. Todos os extratos

foram dissolvidos em cerca de 6 mL de clorofórmio/metanol (2:1, v/v). A concentração de fosfolípidos

foi determinada pela quantificação do fosfato inorgânico (secção 3.9 dos Materiais e Métodos).

Alterações ao protocolo proposto por Folch et al.

Estirpe [Pi] do extrato

lipídico (mM) Número de ciclos de

vórtex – gelo Adição de DTT 10 mM

3 - wt 0,021

ipt1Δ 0,010

7 - wt 0,024

ipt1Δ 0,017

7 + wt 0,320

ipt1Δ 0,406

Inicialmente a lise celular foi feita pela adição de um volume de esferas de vidro

equivalente ao volume ocupado pelo precipitado de células intactas lavado, assumindo

que 1 g de precipitado equivale a 1 mL [58], seguida de 3 ciclos de 2 min no vórtex -

2 min no gelo. Este passo mostrou ser pouco eficiente pois obteve-se uma concentração

em fosfolípidos de 0,021 e 0,010 mM para os extratos da estirpe wt e ipt1Δ

respetivamente. De seguida optou-se por aumentar o número de ciclos de vórtex – gelo

para 7 tendo-se obtido extratos lipídicos de células de wt e ipt1Δ com concentração em

fosfolípidos de 0,024 e 0,017 mM respetivamente. Este aumento para além de não

aumentar a concentração em fosfolípidos, também se mostrou ser insuficiente para a lise

da parede celular através da observação do lisado de células ao microscópio ótico, o que

está de acordo com os dados da literatura que referem que células de levedura na fase

estacionária de crescimento apresentam uma parede celular muito espessa [81] .

Deste modo, investigou-se se a adição do agente redutor DTT, bastante eficaz na

formação de esferoblastos (células de levedura às quais foi removida a parede celular)

na fase estacionária de crescimento, quando comparado com outros agentes redutores,

melhorava de alguma forma a extração de lípidos totais [82]. Este agente redutor leva à

redução de ligações persulfureto das proteínas da parede celular, conhecidas por

apresentar um papel importante na integridade da parede celular da levedura [82].

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62

Obteve-se 0,320 e 0,406 mM de concentração em fosfolípidos para os extratos obtidos a

partir de células wt e ipt1Δ respetivamente. Assim a adição de DTT ao precipitado de

células aumentou em cerca de 15 vezes a concentração em fosfolípidos dos extratos de

wt obtidos pelo primeiro procedimento experimental do método de Folch et al. É

também importante referir que, contrariamente ao extratos obtidos pelo método de

Hanson e Lester, não houve quaisquer dificuldades na dissolução do extrato de lípidos

obtidos pelo método de Folch et al. modificado em 6 mL de clorofórmio/metanol (2:1,

v/v), indicando que a lavagem com uma solução salina é de facto necessária para a

remoção de material não lipídico, o que mais uma vez se encontra de acordo com a

literatura [58].

No Quadro 4 encontra-se um resumo dos valores de massa do extrato lipídico,

da concentração em fosfatos do extrato lipídico, e da massa de lípido em mg por mL dos

extratos lipídicos obtidos pelos dois métodos de extração de lípidos totais utilizados no

presente trabalho, para as duas estirpes estudadas.

Quadro 4- Resumo dos resultados obtidos pelos dois métodos de extração de lípidos totais de células

da estirpe wt e ipt1Δ da levedura S. cerevisiae. As células de ambas as estirpes cresceram em meio

líquido YPD durante 24 h, encontrando-se assim na fase estacionária de crescimento. A extração foi

realizada a partir de um precipitado de células intactas de 5 g segundo variantes dos métodos de

extração de Hanson e Lester [56], e Folch et al. [57,58] conforme o descrito na secção 3.7 dos Materiais e

Métodos. A concentração de fosfolípidos foi determinada pela quantificação dos fosfatos (secção 3.9 dos

Materiais e Métodos). Os valores apresentados representam a média ± desvio padrão de pelo menos 5

experiências independentes para cada uma das estirpes.

Método de Hanson e Lester Método de Folch et al.

Estirpe wt ipt1Δ wt ipt1Δ

Massa do extrato

lipídico (mg) 247,9 ± 33,6 262,2 ± 51,7 82,4 ± 6,0 66,8 ± 9,0

mol de Pi do extrato

lipídico 22,8 ± 9,2 29,8 ± 7,6 1,9 ± 0,6 2,4 ± 1,5

Dissolvendo o extrato de lípidos totais da estirpe wt e ipt1Δ em cerca de 6 mL,

este continha aproximadamente 13,7 e 11,1 mg de lípido/mL, respetivamente. Dados da

literatura referem que os extratos lipídicos por este método de extração permitem a

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Resultados

63

obtenção de aproximadamente 0,1-1,0 mg de lípido/mL [58], sendo que o valor do

extrato lipídico obtido a partir de células wt no presente trabalho é 13,7 vezes superior

ao valor máximo apresentado pela literatura [58]. Esta diferença pode-se dever ao facto

de se ter partido de uma massa de precipitado de cerca de 5 g, enquanto nas

experiências realizadas por Schneiter et al., se partia de precipitados entre 0,5 - 2 g, para

além de que foram realizadas algumas alterações experimentais ao método de extração

utilizado por estes autores [58]. Em relação aos extratos obtidos pelo método de Hanson

e Lester, estes apresentaram uma massa total de lípido cerca de 3 vezes superior ao

valor obtido pelo método de Folch et al. no caso da estirpe wt. A comparação dos dois

métodos de extração será feita na secção 5.2 da Discussão.

As experiências a partir das quais se obtiveram os resultados que se apresentam

nas secções que se seguem foram desenvolvidas com base numa concentração lipídica

que é uma estimativa que tem em conta o doseamento de fosfolípidos e dados da

literatura que referem que a proporção de ergosterol/fosfolípidos é próxima de

1 (mol/mol) [8,24,27], como já foi referido na secção 3.11. dos Materiais e Métodos.

Como tal, doravante, e se nada for referido em contrário, a concentração lipídica

apresentada corresponderá ao dobro daquela determinada pelo método de doseamento

de fosfatos.

4.5. Análise lipídica dos extratos de lípidos totais e de esfingolípidos

De forma a averiguar a composição lipídica dos extratos lipídicos obtidos pelos dois

métodos de extração referidos na secção anterior a partir das duas estirpes estudadas

realizou-se uma cromatografia de camada fina.

Os vários lípidos presentes nos extratos lipídicos obtidos pelos dois métodos de

extração foram separados e identificados usando cromatografia em camada fina (Figura

19).

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64

Figura 19 - Análise da composição em glicerofosfolípidos dos extratos lipídicos totais das estirpes wt

e ipt1Δ, por TLC. Utilizou-se placas cromatográficas de sílica-gel e o sistema de solventes

clorofórmio/metanol/água (65:25:4, v/v/v). 1 - Extrato de lípidos totais de células wt pelo método de

Hanson e Lester; 2 - Extrato de lípidos totais de células ipt1Δ pelo método de Hanson e Lester; 3 - POPC;

4 - DPPE; 5 - PI; 6 - PS; 7 - Ergosterol; 8 - Extrato de lípidos totais de células ipt1Δ pelo método de

Folch et al.; 9 - Extrato de lípidos totais de células wt pelo método de Folch et al.; O – Origem da

aplicação. Os lípidos foram detetados pelo método de coloração com ácido fosfomolibdico (A) e de

exposição a iodo (B). A distância entre o ponto de aplicação e a frente de solvente foi de 16 cm.

Relativamente à composição em glicerofosfolípidos dos extratos lipídicos totais,

pela Figura 19 observou-se que os extratos lipídicos obtidos para ambas as estirpes pelo

método de Hanson e Lester apresentaram uma composição semelhante, não se

observando uma diferença acentuada entre as várias bandas. O mesmo se observou para

os extratos lipídicos totais de ambas as estirpes obtidos pelo método modificado de

Folch et al.. Contudo os extratos lipídicos obtidos pelos dois métodos de extração

apresentaram diferenças bem pronunciadas no número de bandas, pois os extratos de

lípidos totais obtidos pelo método de Folch et al. apresentaram mais quatro bandas que

os extratos obtidos pelo método de Hanson e Lester, o que já seria de esperar uma vez

que o método de Folch et al. favorece a extração dos vários glicerofosfolípidos [58],

enquanto o outro método utiliza uma mistura muito polar não favorecendo tanto a

extração dos glicerofosfolípidos.

A deteção das bandas também foi feita pelo método de exposição ao iodo, contudo

o método de coloração com ácido fosfomolíbdico revelou-se mais eficiente, ainda que

seja um método destrutivo (Figura 19).

A B

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Resultados

65

De seguida determinou-se o valor do fator de retardação da banda obtida para cada

padrão utilizado (Quadro 5).

Quadro 5 – Fatores de retardação das bandas obtidas para cada um dos padrões de lípidos

utilizados: POPC, DPPE, PI, PS, Erg. A distância entre o ponto de aplicação e a frente de solvente foi

de 16 cm.

Padrões Rf

Erg 0,80

PE 0,41

PC 0,25

PS 0,22

PI 0,19

A ordem com que os padrões migraram está de acordo com dados da literatura [1]

sendo o ergosterol o lípido que apresenta um maior Rf, neste sistema de solvente, e por

isso o lípido que migrou mais.

Comparando as bandas obtidas para os extratos com as bandas dos padrões foi

possível identificar-se alguns dos constituintes lipídicos da amostra (Figura 19 e Quadro

5).

Quadro 6- Fatores de retardação das várias bandas obtidas para cada uma das amostras. A sua

identificação foi feita por comparação com os Rf’s dos padrões de lípidos utilizados. A distância entre o

ponto de aplicação e a frente de solvente foi de 16 cm.

Rf

Método de extração de Hanson e Lester Método de extração de Folch et al.

wt ipt1Δ wt ipt1Δ

PI 0,19 0,18 0,16 0,16

PS 0,19 0,18 - 0,24

PC 0,28 0,26 0,28 0,28

PE 0,41 0,43 0,41 0,41

Erg 0,81 0,81 0,80 0,80

LN 0,88 0,88 0,86 0,86

X - - 0,63 0,64

Os extratos lipídicos obtidos neste trabalho apresentaram os principais

glicerofosfolípidos (PI, PS, PC, e PE) e ergosterol. Os lípidos neutros foram

identificados com base na ordem de migração apresentada pela literatura [83,84].

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Papel dos esfingolípidos complexos na organização da membrana plasmática da levedura Saccharomyces cerevisiae

66

Observou-se ainda uma banda muito intensa, assinalada como banda X, presente nos

extratos de lípidos totais obtidos pelo método de Folch et al., podendo esta banda

corresponder a uma contaminação dos extratos (Figura 19).

De seguida, como um dos objetivos deste trabalho era tentar extrair e purificar os

esfingolípidos complexos, realizou-se uma hidrólise alcalina do extrato de lípidos totais

de forma a remover os glicerofosfolípidos pela hidrólise das ligações éster [21], e

procedeu-se à sua separação por TLC (Figura 20).

Figura 20- Análise da composição em esfingolípidos dos extratos de esfingolípidos complexos das

estirpes wt e ipt1Δ. Os extratos foram obtidos pelo método de Hanson e Lester a partir das estirpes wt (A)

e ipt1Δ (B) e para a separação por TLC em sílica-gel utilizou-se o sistema de solventes

clorofórmio/metanol/ácido acético/água (16:6:4:1,6, v/v/v/v). Separação dos esfingolípidos usando o

mesmo sistema de solventes apresentado por Uemura et al. [69] (C). O – Ponto da aplicação. LN- Lípidos

neutros. Os lípidos foram detetados pelo método de revelação de exposição ao iodo. A distância entre o

ponto de aplicação e a frente de solvente foi de 16 cm.

A TLC dos extratos de esfingolípidos complexos revelou cinco bandas no caso dos

extratos provenientes de células de estirpe wt (Figura 20- A) e quatro no caso de células

ipt1Δ (Figura 20- B). Por comparação com a TLC apresentada por Uemura et al. a

primeira banda do extrato de SL de células wt correspondeu ao M(IP)2C, uma vez que

este esfingolípido complexo sendo bastante polar vai migrar menos ficando próximo da

origem [59,69]. Por outro lado esta banda não está presente no extrato de SL de células

ipt1Δ, o que confirma a identificação da banda, dado que esta estirpe não expressa o

enzima necessário ao passo de conversão de MIPC em M(IP)2C. As duas bandas

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Resultados

67

seguintes dos extratos de SL das duas estirpes estudadas corresponderam

respetivamente à MIPC e IPC, por comparação com os dados da literatura (Figura 20-

C). É importante referir que a identificação das bandas de esfingolípidos obtidas por

Uemura et al. (Figura 20-C) foram obtidas por autoradiografia dos lípidos marcados

radioactivamente (método de revelação mais sensível), e por isso parece haver mais

quantidade de esfingolípidos quando comparada com as TLC realizadas no presente

trabalho. A última banda corresponde a lípidos neutros e, eventualmente, a ergosterol,

dado que quando se realizou uma TLC dos extratos de lípidos totais neste sistema de

solvente (dados não mostrados), por comparação com os padrões, observou-se que o

ergosterol migrava com a frente de solvente.

Segundo os resultados de Uemura et al., a incubação das células num meio de

cultura com CaCl2 numa concentração final de 100 mM durante 1 h a 30 °C deveria

melhorar a separação dos esfingolípidos complexos utilizando o mesmo sistema de

solvente que foi utilizado na TLC apresentada na Figura 20. Contudo não se observaram

quaisquer diferenças na separação dos esfingolípidos por TLC entre os extratos obtidos

a partir de células incubadas num meio de cultura com e sem CaCl2 (dados não

mostrados).

De forma a confirmar se a purificação dos esfingolípidos tinha sido eficaz tentou-se

analisar cada uma das bandas obtidas por ESI-MS, mas por problemas de contaminação

do capilar de injeção da amostra, obtiveram-se espetros de massa com bastante ruído

(picos com intensidades muito elevadas) que impediram a visualização e identificação

dos picos da amostra.

4.6. Transição de fase do extrato de lípidos totais com a sonda t-PnA

De forma a se obter informação relativa a propriedades termotrópicas dos extratos

de lípidos totais obtidos realizaram-se medidas de anisotropia de fluorescência da sonda

t-PnA em função da temperatura. Esta sonda tem sido incluída neste tipo de estudo por

reportar uma transição gel-fluido [39,54,77].

Inicialmente começou-se por realizar um processo de otimização que passou não só

pela determinação da concentração de lípido a usar de MLV’s como pela escolha da

razão sonda/lípido a utilizar da sonda t-PnA, de forma minimizar a percentagem de

branco da amostra nas medidas de fluorescência. No Quadro 7 estão representados os

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Papel dos esfingolípidos complexos na organização da membrana plasmática da levedura Saccharomyces cerevisiae

68

valores de anisotropia, bem como as percentagens de branco nas diferentes condições

experimentais.

Quadro 7 – Otimização das condições experimentais das medidas de anisotropia de fluorescência

para a sonda t-PnA quando incorporada nas MLV’s preparadas a partir dos extratos lipídicos

obtidos pelo método de extração de Hanson e Lester a partir da estirpe wt.

[MLV]*

(mM) <r>

% de branco Razão

sonda/lípido

(mol/mol)

em

(nm) VV VH HH HV

0,4 (0,2) 0,21 17,7 22,4 22,6 22,8 1:200 404

0,4 (0,2) 0,22 12,5 16,8 17,3 17,4 1:200 430

0,4 (0,2) 0,23 8,7 11,6 11,8 12,0 1:100 404

0,4 (0,2) 0,25 7,0 10,0 10,0 10,7 1:100 430

0,2 (0,1) 0,23 22,3 28,0 28,7 29,4 1:200 404

0,2 (0,1) 0,23 26,4 33,7 33,4 33,7 1:200 430

0,2 (0,1) 0,24 14,5 19,5 20,2 20,8 1:100 404

0,2 (0,1) 0,23 12,8 17,8 18,2 18,5 1:100 430

* Concentração lipídica corresponde a uma estimativa feita com base na informação de que a proporção

de ergosterol/fosfolípidos é próxima de 1 (mol/mol). Entre parenteses encontra-se representada a

concentração com base no doseamento em fosfolípidos.

De acordo com os valores apresentados obteve-se uma percentagem mais baixa

das várias componentes das medidas de anisotropia no ensaio com MLV’s a 0,4 mM,

uma razão sonda/lípido de 1:100 e em que a emissão foi recolhida a 430 nm. Deste

modo os resultados que serão apresentados doravante foram realizados nestas

condições.

Apesar de apenas ser apresentada a curva de anisotropia de fluorescência em

função da temperatura para o t-PnA incorporado em MLV preparadas a partir de

extratos de lipídicos obtidos pelo método de Folch et al. provenientes de células da

estirpe ipt1Δ (Figura 21), as curvas obtidas para os restantes extratos tiveram o mesmo

tipo de comportamento, sendo portanto esta curva representativa da anisotropia em

função da temperatura dos extratos obtidos pelos dois métodos de extração a partir das

estirpes estudadas.

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Resultados

69

Figura 21- Anisotropia (●,●) e intensidade (●) de fluorescência representativa da sonda t-PnA em

função da temperatura, em MLV’s construídas através de extratos de lípidos totais obtidos pelo

método de Folch et al. a partir de células da estirpe ipt1Δ. A azul está representado os valores de

anisotropia obtidos tendo sido subtraído a cada componente da amostra (HH, HV, VH, e VV) o respetivo

valor de branco (amostra sem sonda); a verde está a anisotropia da amostra sem a subtração do respetivo

branco; e a verde encontra-se representada a intensidade de fluorescência da amostra. A excitação foi

realizada a 320 nm, e a emissão foi recolhida a 430 nm. A concentração lipídica das MLV’s foi de

0,4 mM e a razão sonda/lípido foi de 1:100. A temperatura foi obtida através da termostatização do porta-

células, sendo controlada com uma precisão de 0,1 °C.

Pela Figura 21 podemos ver que no caso da sonda t-PnA o parâmetro da

anisotropia de fluorescência é menos sensível à temperatura do que a intensidade, o que

está de acordo com a literatura [77]. Isto deve-se ao facto de a anisotropia não ser

proporcional à quantidade de sonda em cada fase, como ocorre para a intensidade, mas

sim à sua emissão[77]. Tendo em conta que a sonda t-PnA reflete a preferência da sonda

pela fase gel, a perda de intensidade de fluorescência pode ser devida a uma baixa

quantidade de domínios gel nos MLV’s construídos a partir dos extratos, apesar de

também ocorrer alguma degradação da sonda ao longo da experiência.

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Papel dos esfingolípidos complexos na organização da membrana plasmática da levedura Saccharomyces cerevisiae

70

Figura 22- Espetros de excitação (vermelho) e emissão (verde) corrigidos do t-PnA incorporado em

MLV’s de extratos de lípidos totais. Os espetros de cores mais escuras foram obtidos a 24 °C, enquanto

os de cores mais claras foram obtidos a 4 °C. Fez-se um inset dos espectros de excitação e emissão

normalizados, obtidos a 24 °C. A – Espectros de excitação e emissão; B - % branco obtida para o espetro

de excitação; C- % de branco obtida para o espetro de emissão. A excitação foi feita a 320 nm, para o

espetro de emissão, e a emissão foi detetada a 430 nm, para o espetro de excitação.

Como já foi referido e como se pode ver pela Figura 22, um dos problemas que se

levantou no estudo das propriedades termotróficas de MLV’s construídos a partir de

extratos foi que com a diminuição da temperatura a intensidade de fluorescência

também diminuía. Com a diminuição da fluorescência da sonda, a emissão da amostra

passou a corresponder à emissão da fluorescência dos vários componentes das MLV’s

na ausência de sonda (branco), sendo que a temperaturas muito elevadas (50 °C)

obteve-se percentagens de branco superiores a 50 %.

A razão pela qual não foi possível obter uma curva de anisotropia de fluorescência

em função da temperatura será discutida na secção Discussão.

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Resultados

71

4.7. Transição de fase de extratos de lípidos totais com a sonda DPH

Como a sonda t-PnA não permitiu determinar uma temperatura de transição de fase

dos extratos de lípidos totais obtidos, optou-se por utilizar uma sonda também muito

usada neste tipo de experiências, o DPH.

A Figura 23 mostra a variação da anisotropia da sonda DPH em lipossomas

preparados a partir de extratos lipídicos de células das duas estirpes de levedura

estudadas em função da temperatura (entre os 4 e os 65 °C).

Figura 23- Anisotropia de fluorescência em estado estacionário da sonda DPH em função da

temperatura em MLV’s reconstituídas a partir dos extratos de lípidos totais de células da estirpe wt

(cinzento) e ipt1Δ (preto) obtidos pelo método de extração de Folch et al.[57,58]. As MLV’s

encontravam-se numa concentração lipídica final de 0,4 mM, e a razão sonda/lípido foi de 1:200

(mol/mol). As amostras foram excitadas a 358 nm, e a emissão recolhida a 430 nm. A temperatura foi

obtida através da termostatização do porta-células, sendo controlada com uma precisão de 0,1 °C. Os

pontos representados na figura correspondem à média ± desvio padrão de pelo menos 4 experiências

independentes para cada uma das curvas.

Para ambas as suspensões de MLV’s preparadas a partir dos extratos lipídicos das

duas estirpes é visível o decréscimo dos valores da anisotropia com o aumento da

temperatura, sendo que as curvas apresentadas na Figura 23 correspondem à curva de

transição de fase gel para fase fluida com a forma caraterística sigmoide observada em

alguns estudos existentes na literatura com a sonda DPH [85,86]. Este comportamento é

consistente com o facto de com o aumento da temperatura ocorrer a fusão das fases gel,

com uma diminuição da ordem das cadeias acilo, refletindo-se num aumento da fluidez

da bicamada lipídica [85,86]. Contudo na Figura 23 também se observou que o

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72

decréscimo da anisotropia não era tão acentuado como num sistema onde ocorre apenas

transições gel/fluido, sendo que isto se deve à presença de domínios lo nos extratos

lipídicos. Pela Figura 23 observou-se que a temperaturas inferiores a 10 °C, os valores

de anisotropia de MLV’s preparados a partir de extratos de lípidos totais de células das

estirpes wt e ipt1Δ foram de cerca de 0,27 e 0,25 respetivamente, sendo estes valores

significativamente diferentes (p <0,01). Esta diferença indica que os MLV’s construídos

a partir de extratos lipídicos de células wt são mais ordenados do que os obtidos a partir

da estirpe ipt1Δ. Acima de 65 °C, a anisotropia de fluorescência é constante

apresentando um valor próximo de 0,1 (valor caraterístico de fase fluida).

Ao contrário da sonda t-PnA, o DPH mostrou-se mais adequado na determinação de

Tm dos extratos lipídicos obtidos. Apenas se realizou a determinação da Tm dos extratos

lipídicos obtidos pelo método de Folch et al. uma vez que apenas se realizou uma curva

de anisotropia vs temperatura para os extratos lipídicos obtidos pelo método de Hanson

e Lester. A temperatura média de transição de fase dos extratos foi determinada pela

anisotropia de fluorescência do DPH em função da temperatura, tomada como a

temperatura correspondente ao ponto médio da intersecção das retas ajustadas a cada

regime, sendo eles o regime inicial (gel), intermediário (gel e fluido) e final (fluido)

[54]. Obteve-se uma Tm de 31,4 °C e de 32,3 °C para os lipossomas preparados a partir

dos extratos lipídicos provenientes de células wt e ipt1Δ respetivamente. Estes valores

obtidos de Tm são superiores quando comparados com temperaturas de transição de fase

de extratos lipídicos de células de mamífero ( 25 °C) [85], indicando que as interações

de van der Waals entre as caudas hidrófobas dos fosfolípidos dos extratos lipídicos de

células de mamíferos são mais fracas relativamente às dos fosfolípidos dos extratos

obtidos a partir de células de levedura neste trabalho.

4.8. Estudo preliminar da formação de domínios com os extratos de lípidos

totais

Para estudar as propriedades estruturais e morfológicas da membrana reconstruida a

partir de extratos de lípidos totais obtidos pelo método de Folch et al. provenientes de

células das estirpes estudadas recorreu-se à microscopia de força atómica. As Figura 24

e Figura 25 correspondem a medidas de AFM in-situ realizadas em bicamadas lipídicas

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Resultados

73

suportadas em mica preparadas a partir dos extratos de lípidos totais provenientes de

culturas de células da estirpe wt e ipt1Δ, respetivamente.

Figura 24- Formação de domínios em bicamadas lipídicas suportadas em mica preparadas a partir

dos extratos lipídicos obtidos pelo método de Folch et al. a partir de células da estirpe wt. A- imagem

de AFM topográfica; B- imagem de AFM de fase; e C- perfil topográfico correspondente à linha colorida

traçada. As imagens de AFM apresentadas correspondem a uma SLB de extrato lipídico obtido pelo

método de Folch et al. a partir de células da estirpe wt depositada na mica. As imagens foram obtidas in-

situ, à temperatura ambiente. 2. Z = 20 nm (A); Z = 5 ° (B).

Pela Figura 24-A e C foi possível observar a formação de domínios ordenados

com uma diferença de espessura de cerca de 1,6 nm, relativamente às regiões

desordenadas da bicamada. Como a imagem foi obtida à temperatura ambiente

(25 ± 1 °C), e sabendo que a Tm obtida para lipossomas preparados a partir de extratos

lipídicos wt foi de 31,4 °C, é possível que a bicamada se encontre num regime

intermédio (gel e fluido) o que explica a coexistência de regiões ordenadas e regiões

desordenadas (Figura 24-A e B). Através da imagem de fase foi possível ver que os

domínios mais ordenados apresentam uma estrutura química diferente do resto da

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Papel dos esfingolípidos complexos na organização da membrana plasmática da levedura Saccharomyces cerevisiae

74

bicamada (Figura 24-C). Também através do perfil topográfico traçado (Figura 24-C)

pode-se dizer que a espessura da bicamada foi de 5,2 nm.

Figura 25 - Formação de domínios em bicamadas lipídicas suportadas em mica preparadas a partir

dos extratos lipídicos obtidos pelo método de Folch et al. a partir de células da estirpe ipt1Δ. A-

imagem de AFM topográfica; B- imagem de AFM de fase; e C- perfil topográfico correspondente à linha

colorida traçada. As imagens de AFM apresentadas correspondem a uma SLB de extrato lipídico obtido

pelo método de Folch et al. a partir de células da estirpe ipt1Δ depositada na mica. As imagens foram

obtidas in-situ, à temperatura ambiente. As imagens correspondem a uma área de 5 5 m2. Z = 15 nm

(A); Z = 10 °.

Á semelhança dos extratos lipídicos de células wt também foi possível observar a

separação de fases na bicamada preparada a partir de extratos da estirpe ipt1Δ por AFM

(Figura 25). Neste caso observou-se a formação de regiões ordenadas com uma

espessura superior em cerca de 2,2 nm relativamente às regiões desordenadas da

bicamada (Figura 25–C) sendo este valor ~1,4 vezes superior ao obtido para a bicamada

formada a partir de extratos de wt (Figura 24-C). Esta diferença será abordada na secção

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Resultados

75

de Discussão. A Figura 25–B mostra que os pequenos domínios mais ordenados

apresentam uma estrutura química diferente do resto da bicamada. A presença de

regiões ordenadas e desordenadas pode ser também explicada pelo facto de a bicamada

preparada a partir dos extratos ipt1Δ à temperatura ambiente se encontrar num regime

intermédio (gel e fluido), uma vez que para lipossomas formados a partir destes extratos

se obteve uma Tm de 32,3 °C. Neste caso não foi possível determinar a espessura da

bicamada, uma vez que não foram encontradas regiões do substrato descoberto com

área suficiente para determinar com precisão esse valor.

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Discussão

77

5. Discussão

Com este trabalho pretendeu-se não só extrair e purificar os esfingolípidos

complexos de células de levedura S. cerevisiae, mas também estudar qual a influência

do esfingolípido complexo M(IP)2C na organização da membrana plasmática e na

composição lipídica da levedura através da caraterização biofísica com duas sondas de

membrana, o t-PnA e o DPH. Para tal, os estudos efetuados nesta tese foram realizados

na estirpe wt, na qual está presente o esfingolípido M(IP)2C, e na estirpe ipt1Δ que não

apresenta este esfingolípido.

5.1. Estudos biofísicos realizados na membrana plasmática de células de

levedura

Estudos da composição lipídica de células da estirpe ipt1Δ mostraram que a

ausência do esfingolípido M(IP)2C não era letal para a célula, mas que a sua ausência

era compensada pelo aumento da quantidade de IPC e MIPC tanto na membrana

plasmática como no complexo de Golgi [55]. É de salientar que se observou que esta

estirpe mutada era resistente a antibióticos poliénicos, tais como a nistatina, o que indica

o M(IP)2C desempenhará um papel importante, por exemplo, na composição e rigidez

de domínios de membrana que sejam importantes para a atuação do antimicótico [55].

Para tal no presente trabalho avaliou-se se a ausência deste esfingolípido complexo afeta

de forma significativa a organização da membrana plasmática das células de levedura.

Inicialmente começou-se por realizar a caraterização biofísica utilizando a sonda t-PnA

com o intuito de se avaliar se ocorriam alterações nos domínios mais ordenados da

membrana plasmática. É de referir que se obtém uma anisotropia de fluorescência

elevada desta sonda na membrana plasmática, apresentando um valor de 0,29 para

ambas as estirpes wt e mutada, sendo este valor caraterístico de domínios mais rígidos.

Assim, este tipo de domínios estará presente em ambas as estirpes. No entanto, dada a

preferência do t-PnA por domínios em fase gel bem estabelecida em sistemas modelo

[48], não é possível a partir do valor de anisotropia de fluorescência em estado

estacionário estimar a fração desses domínios. No entanto, em células wt foi

estabelecido que eles deverão ser minoritários, tenho em conta também os dados obtidos

a partir dos decaimentos de intensidade de fluorescência do t-PnA e utilizando também

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Papel dos esfingolípidos complexos na organização da membrana plasmática da levedura Saccharomyces cerevisiae

78

os resultados obtidos com o DPH [39]. A inexistência de diferenças na anisotropia de

fluorescência do t-PnA entre as estirpes wt e ipt1Δ está de acordo com os resultados

obtidos com outra sonda fluorescente de membrana (TMA-DPH) que mostraram que as

células da estirpe ipt1Δ são capazes de ajustar a sua composição lipídica de forma a

compensar a ausência do esfingolípido complexo M(IP)2C, mantendo uma certa ordem

da membrana (r = 0,27) [55].

As diferenças observadas, para cada estirpe, na anisotropia de fluorescência do

t-PnA medida nos ensaios em que a incorporação da sonda foi feita à mesma

temperatura do ensaio e a uma temperatura diferente (Figura 13), refletem que a

organização da membrana plasmática, tanto de células wt como de ipt1Δ, é afetada pela

temperatura. Para a membrana plasmática de células ipt1Δ nestas condições

experimentais obteve-se um valor de anisotropia de fluorescência do t-PnA

significativamente superior ao da estirpe wt. Estes resultados mostram que, nestas

condições, a membrana da estirpe ipt1Δ é mais ordenada do que no caso em que a

incorporação é feita a 24ºC, sugerindo que na ausência do M(IP)2C, a organização da

membrana é mais sensível à temperatura, o que poderá indicar um possível papel

biológico para o M(IP)2C.

Em relação à análise dos decaimentos de fluorescência do t-PnA na membrana

plasmática das células wt e ipt1 obtiveram-se tempos de vida da componente longa

> 30 ns (Figura 15-A, na secção 4.2.3 dos Resultados), o que, segundo dados da

literatura de estudos em sistemas modelo [48] bem como na membrana plasmática da

levedura [39], revelam a presença de fases sólidas muito ordenadas, isto é domínios gel.

Estudos de Aresta-Branco et al. [39] apresentaram tempos de vida da componente longa

superiores aos apresentados neste trabalho. Esta diferença pode estar relacionada com o

facto de se ter usado t-PnA de diferente proveniência e pureza. Com efeito, o t-PnA

usado neste trabalho pode conter até cerca de 10 % de cis-parinárico. O tempo de vida

do cis-PnA na fase gel é mais curto que o do t-PnA, o que vai levar a que a componente

longa do decaimento de fluorescência diminua, uma vez que na análise do decaimento a

pequena contribuição do cis-PnA não vai ser resolvida, afetando as componentes mais

longas do decaimento [87].

Nos ensaios realizados a 30 °C, a componente longa do t-PnA na membrana

plasmática foi inferior quando comparada com o valor obtido em ensaios realizados a

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Discussão

79

24 °C. Este resultado está de acordo com estudos de Aresta-Branco et al. realizados

com a mesma sonda na membrana plasmática de células wt, que mostraram que com o

aumento da temperatura do ensaio havia uma diminuição da componente longa do

decaimento [39]. Este resultado está também de acordo com o facto de o aumento da

temperatura estar associado a uma consequente diminuição da ordem ou rigidez dos

domínios de gel. Um outro aspeto importante foi a inexistência de diferenças

significativas entre as componentes longas do decaimento de fluorescência do t-PnA

para ambas as estirpes, sugerindo que os domínios de gel na membrana plasmática têm

uma compactação semelhante nas duas estirpes. As amplitudes normalizadas dos

decaimentos de fluorescência da sonda t-PnA obtidas em ambas as estirpes nos ensaios

a 24 °C e 30 °C não apresentaram diferenças significativas indicando que a abundância

relativa dos domínios de gel não é afetada pela ausência do esfingolípido complexo

M(IP)2C. Também nos tempos de vida médios de fluorescência da sonda não se

observaram diferenças significativas entre as duas estirpes estudadas. O facto de não se

ter observado diferenças tanto nos tempos de vida como nas amplitudes normalizadas

sugere que este esfingolípido complexo não será o componente maioritário destes

domínios, ou mesmo que nem deva ser um componente importante nesses domínios.

Estes resultados sugerem que a maior resistência das células ipt1 a antimicóticos não

deve ser devida a diferenças na quantidade relativa e compactação de domínios gel. Isto

está de acordo com a sugestão avançada em Aresta-Branco et al. [39], de que os

domínios gel ricos em esfingolípidos sejam formados maioritariamente por IPC, uma

vez que estudos de Klose et al. [86] mostraram que a Tm deste esfingolípido era de

53,4 °C, sendo esta temperatura semelhante à determinada em lipossomas preparados a

partir de extratos lipídicos provenientes da membrana plasmática (Tm ≈ 42 °C) [39].

Contudo, quando a incubação da sonda foi feita a uma temperatura diferente da do

ensaio, a amplitude normalizada da componente longa apresentou diferenças

significativas entre as duas estirpes (Figura 15-B na secção 4.2.3 dos Resultados), sendo

maior na membrana plasmática de células wt. O tempo médio de vida pesado pelas

amplitudes ( ) para o t-PnA na membrana plasmática também apresentou diferenças

entre as estirpes apenas no ensaio a 24 °C com incorporação da sonda a 30 ºC,

apresentando um valor cerca de 1,2 vezes superior na presença de M(IP)2C (Figura 16

na secção 4.2.3. dos Resultados). Este resultado já era de esperar uma vez que a

amplitude normalizada da componente longa foi superior também na presença de

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Papel dos esfingolípidos complexos na organização da membrana plasmática da levedura Saccharomyces cerevisiae

80

M(IP)2C. Considerando que este parâmetro tem a contribuição de cada componente do

decaimento, uma alteração, como o aumento da amplitude normalizada da componente

longa, pode resultar num aumento do seu valor. No caso do tempo de vida médio, as

amplitudes não têm uma influência tão grande pelo facto dos tempos de vida das

componentes aparecerem elevados ao quadrado (Equação 5 na secção 3.12.2. dos

Materiais e Métodos), e portanto nesse caso a diferença não foi significativa. O facto do

ser superior na presença de M(IP)2C poderá justificar os resultados obtidos para a

anisotropia de fluorescência do t-PnA na membrana plasmática, em que esta exibiu um

valor maior na ausência deste esfingolípido complexo, pois uma diminuição do tempo

de vida por si só provoca um aumento da anisotropia de fluorescência. No entanto é

pouco provável que assim seja, uma vez que as variações no tempo de vida são

relativamente pequenas, não sendo sequer significativas no tempo de vida médio, e em

geral nestes casos, a correlação entre tempo de vida e anisotropia do t-PnA é positiva. A

origem do maior valor da anisotropia em células ipt1Δ nesta condição experimental é

difícil de racionalizar com os dados atuais e serão necessárias experiências adicionais

para a compreender.

De forma a perceber melhor as diferenças na organização das membranas devidas à

ausência de M(IP)2C, observadas apenas em determinadas condições experimentais,

realizou-se ainda a caraterização biofísica utilizando a sonda DPH, conhecida por dar

informação relativa à ordem global das membranas da célula. Assim, observou-se um

aumento da anisotropia do DPH significativo de membranas das células ipt1Δ quando

comparada com as células wt (Figura 18 na secção 4.3.2 dos Resultados). Este resultado

sugere que na ausência de M(IP)2C existe uma ordem global maior da membrana

plasmática. Apesar a anisotropia de fluorescência com a sonda TMA-DPH ser idêntica

(0,27) em células ipt1Δ e células wt [55], no presente trabalho foram observadas

diferenças utilizando a sonda DPH. Esta diferença de comportamento entre as duas

sondas pode ser explicada por alterações distintas na estrutura de domínios

intracelulares e da membrana plasmática, uma vez que, ao contrário da sonda

TMA-DPH, o DPH não marca apenas a membrana plasmática, mas também as

membranas intracelulares [53]. É também importante referir que apesar de estudos de

Klose et al. [20], mostrarem que o lipidoma varia consoante a fase de crescimento

celular em que as células se encontram, a inexistência de diferenças significativas entre

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Discussão

81

os resultados obtidos com a sonda DPH na mesma estirpe em fase exponencial e em

fase estacionária (Figura 18) podem revelar mais uma vez a capacidade que as células

têm para manter uma certo nível de organização da membrana, mesmo quando a sua

composição lipídica é diferente.

Estudos da ação de fármacos antimicóticos, como a nistatina, têm mostrado que este

interage com o ergosterol, o principal esterol de membranas fúngicas, formando poros,

levando à libertação dos constituintes celulares, podendo mesmo conduzir à morte

celular [55,88,89]. Alguns estudos da literatura mostraram que estirpes com composição

semelhante de esteróis mostraram diferentes sensibilidades a estes fármacos [55]. Isto

pode indicar que talvez estejam envolvidos fatores adicionais que sejam responsáveis

pela diferente sensibilidade observada a essas drogas. Estudos de Leber et al. mostraram

que a estirpe ipt1Δ, quando comparada com a estirpe wt, era mais resistente a

antifúngicos, sugerindo a interação do antimicótico com a membrana pode ser

dependente de domínios ricos em M(IP)2C e ergosterol. O facto do esfingolípido

complexo M(IP)2C apresentar uma cabeça polar muito grande (Figura 4, secção 1.3.2.2

da Introdução) quando comparada com os restantes fosfolípidos e esfingolípidos, pode

levar a que o volume livre entre as cadeias de M(IP)2C seja ocupado por mais moléculas

de ergosterol quando comparado com outros domínios lo, de acordo com o “umbrela

model”. Este modelo sugere que o esterol pode interagir com outros lípidos com cabeça

polar grande de forma a “proteger” o esterol da água, podendo explicar o mecanismo de

formação de domínios lo [90]. Uma vez que estes antimicóticos requerem a presença de

ergosterol [55,89] , a existência destes domínios lo mais ricos em ergosterol e M(IP)2C,

pode aumentar a interação destes fármacos com a membrana, havendo a maior

probabilidade de este formar poros. Esta suposição também pode ser apoiada pelos

resultados da caraterização biofísica da membrana, que mostrou que as membranas da

estirpe ipt1Δ são globalmente mais ordenadas que a estirpe wt. Considerando que em

células wt se formam domínios do tipo lo ricos em ergosterol e M(IP)2C, que requerem

maior quantidade de moléculas de ergosterol para preencher o espaço entre as cadeias

acilo do esfingolípido do que no caso da estirpe mutada, em que este esfingolípido é

substituído por MIPC ou IPC, com grupos polares de menores dimensões, não serão

necessárias tantas moléculas de ergosterol para formar domínios lo. Assim, uma vez que

dados da literatura mostraram que a concentração de ergosterol era semelhante na

membrana plasmática das duas estirpes [55], deverá haver maior quantidade de

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Papel dos esfingolípidos complexos na organização da membrana plasmática da levedura Saccharomyces cerevisiae

82

ergosterol nas regiões mais fluidas (ld), o que pode explicar o aumento da ordem global

da membrana da estirpe mutada. De forma a confirmar esta hipótese é importante

realizar-se estudos biofísicos em sistemas modelo contendo cada um dos esfingolípidos

complexos purificados de células de levedura e ergosterol, e eventualmente estabelecer

um digrama de fases para cada um deles.

5.2. Estudos realizados em extratos lipídicos de células de levedura

Com o intuito de se extrair e separar as diferentes classes de esfingolípidos

complexos de S. cerevisiae, procurou-se encontrar o método de extração que fosse o

mais vantajoso para a concretização deste objetivo.

Comparando os resultados obtidos pelos dois métodos de extração realizados neste

trabalho (secção 4.4 dos Resultados), partindo da mesma quantidade de precipitado de

células lavadas ( 5 g), pelo método de Hanson e Lester obteve-se uma massa de extrato

lipídico cerca de 3,5 vezes superior à obtida por Folch et al., podendo este resultado ser

explicado pelo facto de que métodos que utilizam misturas ricas em água poderem levar

à extração de uma grande quantidade de material que provavelmente não é lipídico e é,

no entanto, mais polar que a maioria dos fosfolípidos polares da levedura [56]. Esta

hipótese pode explicar porque nem toda a massa do extrato de lípidos totais obtida pelo

método de Hanson e Lester é dissolvida em clorofórmio/metanol (2:1, v/v). À partida o

uso desta mistura de solventes não iria solubilizar este material não lipídico, contudo os

lípidos têm tendência para reter material não lipídico que é solúvel em água, tal como

açucares, aminoácidos, e sais, dentro de micelas lipídicas invertidas [58], “protegendo”

este material do solvente orgânico. Deste modo, parte deste material pode passar para o

extrato lipídico e assim influenciar os resultados de caraterização biofísica de bicamadas

reconstruídas a partir destes extratos. Um aspeto que poderia melhorar e evitar este

problema seria, após a extração dos lípidos totais, remover este material não lipídico

com soluções aquosas salinas, ou seja, introduzir um dos passos cruciais do método de

Folch et al. [58]. Também uma forma de confirmar se de facto este método extrai este

material não lipídico seria realizar o doseamento proteico dos extratos lipídicos obtidos

por este método, e, eventualmente, usar anticorpos por exemplo para a âncora GPI de

levedura.

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Discussão

83

É também importante referir que foi necessário um processo de otimização do

método de extração descrito por Folch et al. a partir de células na fase estacionária de

crescimento. Uma característica morfológica das células nesta fase de crescimento é a

sua espessa e pouco porosa parede celular [81]. Ao contrário de células na fase

exponencial, células na fase estacionária apresentam a capacidade de sobreviver a

períodos de tempo prolongados, tanto em água como num meio de cultura sem

nutrientes adicionais [81]. Isto explica porque a adição de DTT numa concentração final

de 10 mM, a qual promove a lise da parede celular das células, melhora a extração dos

lípidos.

Em suma, pode-se concluir que o método de Hanson e Lester é aparentemente o

mais vantajoso em termos quantitativos, quando comparado com o método de Folch et

al., não só por ser mais eficiente pois permite a extração de uma quantidade de lípido,

quantificada em termos de Pi, cerca de 12 vezes superior à obtida pelo método de Folch

et al., mas também por não envolver um passo de lise celular, o qual é difícil de realizar

de forma reprodutível e convenientemente em microescala [56].

Os extratos lipídicos obtidos a partir das duas estirpes estudadas não aparentam

apresentar diferenças entre eles na composição em fosfolípidos e em ergosterol,

constituindo uma vantagem para o estudo da influência do M(IP)2C na organização de

membranas reconstruidas a partir de extratos. Contudo, os extratos lipídicos obtidos

pelo método de Folch et al. apresentaram um maior número de bandas comparado com

o método de Hanson e Lester, o que pode ser devido ao facto de o método proposto por

Folch et al. favorecer mais a extração das várias classes de glicerofosfolípidos [58]

quando comparado com o outro método.

Pela análise dos extratos de esfingolípidos obtidos observou-se que de facto o

esfingolípido M(IP)2C estava presente na estirpe wt mas não na estirpe ipt1Δ, por

comparação com dados da literatura [69]. Este resultado sugere que em princípio se

conseguiu a extração dos esfingolípidos complexos. Contudo é importante a análise das

bandas obtidas por espectrometria de massa de forma a confirmar se de facto a extração

e purificação dos esfingolípidos foi eficiente. Um problema que se levantou foi a

co-migração das várias espécies de IPC e MIPC, com diferente número de

hidroxilações. Uma forma de se contornar este obstáculo seria raspar as várias bandas

correspondentes a vários níveis de hidroxilação (A, B’,B, C e D) de IPC e MIPC, e

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Papel dos esfingolípidos complexos na organização da membrana plasmática da levedura Saccharomyces cerevisiae

84

tentar fazer uma nova separação por TLC mas experimentando outro sistema de

solvente.

A razão pela qual se estudou a anisotropia de fluorescência em função da

temperatura passou também pela tentativa de se perceber quais seriam as diferenças na

organização de bicamadas preparadas a partir de extratos na ausência (extrato lipídico a

partir de células ipt1Δ) e na presença de M(IP)2C (extrato lipídico a partir de células

wt). Inicialmente realizou-se este estudo em membranas reconstruidas a partir de

extratos de lípidos totais obtidos pelo método de Hanson e Lester marcadas com t-PnA.

Porém não se conseguiu obter uma curva de anisotropia de fluorescência em função da

temperatura, uma vez que se observou um decréscimo muito acentuado da intensidade

de fluorescência da sonda t-PnA com a temperatura, que provavelmente foi devido não

apenas à fusão de domínios de gel, mas também a fotobranqueamento da sonda. Para

tentar averiguar se se tratava de um problema dos extratos obtidos pelo método de

Hanson e Lester, realizou-se o mesmo estudo mas em MLV’s preparadas a partir de

extratos lipídicos obtidos pelo método de Folch et al. Contudo também não se

conseguiu obter uma curva de anisotropia de fluorescência do t-PnA em função da

temperatura em bicamadas preparadas a partir de extratos obtidos pelo método de Folch

et al., apresentado o mesmo comportamento que as bicamadas preparadas a partir de

extratos lipídicos obtidos pelo método de Hanson e Lester. A obtenção destes resultados

pode ser explicada pelo facto de a incorporação com a sonda t-PnA ter sido feita a 75 °C

durante uma hora, que sendo uma temperatura elevada, pode levar por exemplo a

alterações conformacionais da sonda. Outra hipótese seria a influência do material não

lipídico para o extrato lipídico obtido pelo método de Hanson e Lester, uma vez que já

foi mostrado que iões monovalentes (K+, Na

+, etc.) podem tornar a estrutura de uma

bicamada contendo fosfolípidos carregados negativamente mais fluida, baixando o valor

da Tm, enquanto iões divalentes (Ca2+

) induzem um aumento da Tm [91]. Dada a

presença abundante de iões monovalentes como o K+ e Na

+ nas células, estes podem ser

extraídos conjuntamente com os lípidos e assim solubilizados no extrato pelo

mecanismo já referido, baixando desta forma a Tm das bicamadas reconstruídas, o que

pode explicar a perda de intensidade repentina do t-PnA, uma vez que esta sonda

apresenta um rendimento quântico reduzido quando se encontra em fases pouco

ordenadas. Uma forma de se comprovar esta suposição seria efetuar um estudo das

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Discussão

85

transições termotrópicas dos lipossomas preparados a partir dos extratos lipídicos com

outra técnica que não envolva o uso de uma sonda fluorescente, como a calorimetria

diferencial de varrimento, ou a espectroscopia de infravermelho com transformada de

Fourier. Estudos com sistemas modelo binários contendo ergosterol e DPPC ou

ergosterol e POPC reportaram que acima dos 30 % de ergosterol a membrana encontra-

se numa fase líquida ordenada [92,93]. Uma vez que dados da literatura referem que a

proporção de ergosterol/fosfolípidos de extratos de lípidos totais é próxima de 1

(mol/mol) [8,24,27], em princípio haverá uma propensão mais reduzida para a formação

de domínios gel nos extratos de lípidos totais, podendo justificar também o facto de não

se ter conseguido resultados com o t-PnA.

Uma vez que os resultados com o t-PnA estavam a ser inconclusivos, realizou-se o

mesmo tipo de estudo mas com a sonda DPH. Observou-se uma curva de anisotropia de

fluorescência do DPH em função da temperatura em que a variação não foi tão

acentuada como a observada em sistemas onde apenas ocorrem transições gel/fluido.

Isto pode sugerir a presença de domínios lo, ricos em ergosterol, que tornam a

diminuição da anisotropia com a temperatura mais moderada [39]. Os valores de

anisotropia apresentados para as membranas preparadas a partir dos extratos lipídicos

foram 0,220 ± 0,016 e 0,197 ± 0,004, provenientes de células wt e ipt1Δ,

respetivamente, a 24 °C. Comparando estes valores de anisotropia com os obtidos na

caraterização biofísica com o DPH em suspensões celulares (Figura 18), observou-se

que, o valor do DPH nas membranas celulares era cerca de 1,4 vezes inferior à

anisotropia do DPH obtida para os lipossomas à mesma temperatura. Este resultado está

de acordo com estudos biofísicos da literatura realizados em células wt e esferoblastos

de células wt com a sonda DPH, que revelaram que a ordem global da membrana era

maior em esferoblastos do que em células intactas, indicando que a parede celular leva a

uma destabilização dos domínios gel ricos em esfingolípidos, levando a que estes se

misturem nos restantes domínios da membrana (por exemplo lo) ou se internalizem,

observando-se o aumento da ordem global [39]. Outro aspeto que é importante também

realçar é que os MLV’s de extratos obtidos pelo método de Folch et al. provenientes das

células wt apresentarem valores de anisotropia superior ao das células ipt1Δ, tendo

observado o comportamento inverso na caraterização biofísica com esta sonda da

membrana plasmática das duas estirpes. Estas diferenças podem ser explicadas, não só

pelo facto do método de extração de Folch et al. não favorecer a extração de

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Papel dos esfingolípidos complexos na organização da membrana plasmática da levedura Saccharomyces cerevisiae

86

esfingolípidos mas sim de glicerofosfolípidos, mas também por se estar a estudar

extratos de lípidos totais, em que os esfingolípidos acabam por ficar em menores

proporções do que aquelas em que estão presentes na membrana plasmática. Também é

possível que outros fatores que influenciam a organização da membrana plasmática de

células, nomeadamente interações com o citoesqueleto, proteínas de membrana e até

mesmo com a parede celular [39], componentes que não estão presentes nos extratos de

lípidos totais, e ainda a perda de assimetria transmembranar na distribuição dos lípidos

[94] possam contribuir para aquele resultado.

Pela determinação da temperatura média de transição de fase de bicamadas

formadas a partir dos extratos lipídicos obtidos pelo método de Folch et al. obteve-se

uma Tm de 31,4 °C e de 32,3 °C para os lipossomas preparados a partir dos extratos

lipídicos provenientes de células wt e ipt1Δ respetivamente. Estudos da dependência da

temperatura em membranas isoladas da bactéria Acholeplasma laidlawii B reportaram

uma Tm de 34 °C [95], sendo as Tm dos extratos lipídicos de levedura obtidos neste

trabalho muito semelhantes à de membranas isoladas de bactérias.

A espessura média de membranas de levedura é de cerca de 7,1 ± 0,4 nm, sendo

que a membrana plasmática é significativamente mais espessa, apresentando um valor

de 9,2 ± 0,4 nm, sendo que estas espessuras foram obtidas por microscopia eletrónica

[96]. Obteve-se no presente estudo uma espessura da bicamada preparada a partir de

extratos da estirpe wt de cerca de 5,2 nm. Este valor é cerca de 1,7 vezes inferior ao

indicado para a espessura da membrana da membrana plasmática, sendo que esta

diferença pode ser explicada pelo facto de na membrana plasmática da célula estarem

presentes proteínas da membrana plasmática que podem aumentar a espessura. Contudo,

tendo em conta as regiões ordenadas observadas por AFM na bicamada preparada a

partir de extratos da estirpe wt (Figura 24Figura 25), a espessura da bicamada é de

7 nm, o que está próximo da espessura média de membranas de levedura [96].

Apesar de ser um resultado preliminar, a análise de bicamadas preparadas a

partir dos extratos lipídicos obtidos pelo método de Folch et al. por AFM, revelou que a

diferença de espessura entre domínios ordenados e menos ordenados é menor no caso

de bicamadas de extratos lipídicos wt. Considerando que não foi possível determinar a

espessura total da bicamada preparada a partir de ipt1, este resultado pode ser

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Discussão

87

consequência de domínios ordenados com diferentes organizações e, consequentemente,

diferentes espessuras ou pode advir da formação de domínios desordenados com

espessuras distintas numa e outra situação. Por outro lado, a maior fração de domínios

ordenados na bicamada de wt corrobora, em certa medida, os resultados obtidos para a

anisotropia do DPH em bicamadas preparadas também a partir de extratos. Uma vez que

estes extratos foram obtidos pelo método de Folch et al., o qual não favorece a extração

de esfingolípidos, este resultado indica que em baixas concentrações de esfingolípido

M(IP)2C, a bicamada torna-se mais ordenada mas não tão compacta, que é o

comportamento observado na ordem da membrana plasmática que mostrou que na

ausência de M(IP)2C, as membranas exibiam uma ordem global maior. Assim, apesar de

este esfingolípido não afetar significativamente a abundância e compactação dos

domínios de gel, tem uma influência significativa na ordem global da membrana em

S. cerevisiae.

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Conclusões e Perspetivas Futuras

89

6. Conclusões e Perspetivas Futuras

Os estudos realizados nesta tese de mestrado revelaram que a ausência do

esfingolípido complexo M(IP)2C nas células da levedura Saccharomyces cerevisiae não

afeta a compactação dos domínios gel da membrana plasmática, mas sim a ordem global

da membrana, sendo esta mais ordenada na sua ausência. Assim, formulou-se a hipótese

de que este esfingolípido complexo, cuja cabeça polar é relativamente maior que a dos

restantes esfingolípidos, está envolvido na formação de domínios lo ricos em ergosterol

e M(IP)2C. No entanto, os estudos em que a incubação da sonda t-PnA foi efetuada a

uma temperatura diferente daquela a que o ensaio foi realizado mostraram que o

M(IP)2C pode influenciar, em certa medida, a abundância relativa de domínios gel. Os

estudos realizados nesta tese de mestrado permitiram, ainda, uma otimização de dois

métodos de extração de lípidos totais das células de levedura, em que o método de

Hanson e Lester se mostrou o mais adequado para o caso concreto deste estudo, tendo

apresentado um maior rendimento em termos de quantidade de lípido extraída quando

comparado com o método de Folch et al. A caraterização biofísica de extratos lipídicos

obtidos pelo método de Folch et al. com a sonda DPH revelou uma maior ordem global

nas bicamadas, na ausência de M(IP)2C, sugerindo que, uma vez que este método não

favorece a extração de esfingolípidos, a diminuição da quantidade de M(IP)2C leva a um

aumento da ordem global da membrana. Por AFM foi possível detetar uma menor

diferença de espessura entre domínios ordenados e menos ordenados para SLB

preparadas a partir de extratos provenientes de células wt (em que M(IP)2C está

presente) quando comparadas com SLB de extratos ipt1 (ausência de M(IP)2C).

É de realçar a importância de todo o processo de otimização dos métodos de

extração de lípidos de forma a possibilitar a extração e purificação de cada um dos

esfingolípidos complexos da levedura. Desta forma, será possível testar futuramente a

hipótese acima proposta acerca da formação de domínios lo ricos em ergosterol e

M(IP)2C, recorrendo a sistemas modelo contendo cada um dos esfingolípidos

purificados e ergosterol. Após a purificação dos esfingolípidos complexos seria

igualmente interessante a sua reconstituição em vesiculas unilamelares gigantes a partir

de uma mistura de cada esfingolípido com fosfolípidos e ergosterol de forma a estudar a

formação de domínios e eventualmente seguir a interação de antimicóticos com a

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Papel dos esfingolípidos complexos na organização da membrana plasmática da levedura Saccharomyces cerevisiae

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membrana, por microscopia confocal de fluorescência. Na possibilidade de se confirmar

a existência destes domínios lo ricos em ergosterol e M(IP)2C, seria igualmente

interessante abordar em estudos futuros qual a sua relação com os compartimentos

MCC e MCP que se sabe estarem presentes na membrana plasmática de levedura.

Tendo em conta que o método de extração de Hanson e Lester se mostrou mais

eficiente na extração de lípidos, o passo seguinte poderá passar por melhorar ainda

alguns aspetos deste método, nomeadamente identificar a origem da massa de extrato

que não se dissolve em clorofórmio/metanol, uma vez que a presença de material não

lipídico pode afetar os resultados dos estudos biofísicos. Desta forma seria esclarecedor

fazer o doseamento proteico dos extratos lipídicos obtidos, ou mesmo usar, por

exemplo, um anticorpo para a âncora GPI de levedura.

Outro aspeto relevante é a identificação das bandas obtidas por separação do extrato

de esfingolípidos reveladas por TLC, recorrendo à espectrometria de massa de forma a

comprovar que, de facto, a extração de esfingolípidos está a ser eficiente, com o intuito

de prosseguir para a fase seguinte deste projeto, que inclui o estudo em sistemas

membranares modelo contendo os vários esfingolípidos purificados, a construção de

diagramas de fase e o estudo da interação de fármacos antifúngicos como por exemplo a

nistatina com estes esfingolípidos complexos. Pela análise dos extratos de

esfingolípidos obtidos observou-se que as várias hidroxilações de IPC e MIPC não eram

eficientemente separadas, tratando-se também de um aspeto a melhorar.

Uma vez que a análise dos extratos lipídicos por AFM tratou-se apenas de um

estudo preliminar, torna-se relevante para este trabalho a repetição desta análise, de

forma também a confirmar se de facto existe uma diferença entre a espessura dos

domínios ordenados formados numa bicamada reconstruida a partir de extratos lipídicos

provenientes das estirpes wt e ipt1Δ. Eventualmente, até se pode testar o efeito da

adição de um antimicótico à bicamada lipídica e observar se este tem efeito nos

domínios ordenados formados.

Em suma, com o trabalho realizado nesta tese de mestrado pode-se tirar a conclusão

de que a ausência do esfingolípido complexo M(IP)2C afeta a ordem global das

membranas de levedura, e este resultado abre novas vias de abordagem para estudos

futuros do papel deste esfingolípido na resistência a antimicótocos.

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Referências Bibliográficas

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