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Ministério das Cidades Secretaria Nacional de Saneamento Ambiental PANORAMA DO SANEAMENTO BÁSICO NO BRASIL Cadernos temáticos para o panorama do saneamento básico no Brasil Volume n O VII (Versão Preliminar) Sonaly Cristina Rezende (org.) Ministério das Cidades (editora) 2011

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Ministrio das Cidades Secretaria Nacional de Saneamento Ambiental

PANORAMA DO SANEAMENTO BSICO NO BRASIL Cadernos temticos para o panorama do saneamento bsico no Brasil Volume nO VII

(Verso Preliminar)

Sonaly Cristina Rezende (org.)

Ministrio das Cidades (editora) 2011

Ministrio das Cidades Secretaria Nacional de Saneamento Ambiental

PANORAMA DO SANEAMENTO BSICO NO BRASIL Cadernos temticos para o panorama do saneamento bsico no Brasil Volume nO VII

Dilma Vana Roussef Presidenta da Repblica Mrio Silvio Mendes Negromonte Ministro das Cidades Roberto de Oliveira Muniz Secretrio Executivo do Ministrio das Cidades Leodegar da Cunha Tiscoski Secretrio Nacional de Saneamento Ambiental Viviana Simon Diretora de Articulao Institucional Mrcio Galvo Fonseca Diretor de guas e Esgotos Manoel Renato Machado Filho Diretor de Desenvolvimento e Cooperao Tcnica

Grupo de Trabalho Interinstitucional, incumbido de coordenar a elaborao e promover a divulgao do Plano Nacional de Saneamento Bsico (Portaria n. 634, de 22/10/2010 e 418, de 31/01/2011), GTI Plansab:Ministrio das Cidades - Coordenador Titular: Leodegar Tiscoski Suplente: Viviana Simon Suplente: Norma Lcia de Carvalho (de 22/10/201 a 31/01/2011) Casa Civil da Presidncia da Repblica Titular: Rodrigo Augusto Rodrigues Suplente: Katya Maria Nasiaseni Calmon Ministrio da Fazenda Titular: Rutelly Marques da Silva Suplente: Andrey Goldner Baptista Silva Ministrio do Planejamento, Oramento e Gesto Titular: Bruno Moretti Suplente: Miguel Crisstomo Brito Leite Ministrio da Integrao Nacional Titular: Sebastio Jander de Siqueira Suplente: Frederico Meira Ministrio do Meio Ambiente Titular: Srgio Antonio Gonalves Suplente: Hidely Grassi Rizo Ministrio do Turismo Titular: Ricardo Martini Moesch Suplente: Ana Clvia Guerreiro Lima Ministrio da Sade Titular: Guilherme Franco Netto Suplente: Mariely Helena Barbosa Daniel Caixa Econmica Federal Titular: Rogrio de Paula Tavares Suplente: Vladimir Bezerra Monteiro de Brito Banco Nacional de Desenvolvimento Econmico e Social BNDES Titular: Luis Incio Senos Dantas Suplente: Rodrigo de Mato Moreira Fundao Nacional de Sade FUNASA Titular: Jos Raimundo Machado dos Santos Suplente: Patrcia Valeria Vaz Areal Agncia Nacional de guas ANA Titular: Joaquim Guedes Correa Gondim Filho Suplente: Sergio Rodrigues Ayrimors Soares Companhia de Desenvolvimento dos Vales do So Francisco e do Parnaba CODEVASF Titular: Athadeu Ferreira da Silva Suplente: Rodrigo Marques Beneveli Conselho das Cidades: Trabalhadores Titular: Pedro Romildo Pereira dos Santos Suplente: Claudia Julio Ribeiro Poder Pblico Municipal Titular: Arnaldo Luiz Dutra Suplente: Adalberto Joaquim Mendes Poder Pblico Estadual Titular: Paulo Ruy Valim Carnelli Suplente: Joo Clebio Lima Machado Organizaes No governamentais Titular: Regina Ftima Cordeiro Fonseca Ferreira Suplente: Emanuel Pontes Meirelles Movimento popular Titular: Bartria Perptua Lima da Costa Suplente: Vidal Barbosa da Silva Entidades profissionais, acadmicas e de pesquisa Titular: Ronaldo Resende Pereira Suplente: Ericson Dias Mello Empresrios Titular: Paulo Roberto de Oliveira Suplente: Carlos Alberto Rosito

COORDENAO E ELABORAO Diretoria de Articulao Institucional / Secretaria Nacional de Saneamento Bsico / Ministrio das Cidades Coordenadores: Viviana Simon - setembro de 2010 a abril de 2011 Norma Lcia de Carvalho - abril de 2010 a agosto de 2011 Srgio Antonio Gonalves - maio de 2008 a maio de 2010

Equipe Tcnica: Alex Fabiano Ribeiro de Magalhes Alexandre Araujo Godeiro Carlos Ernani Ciraco de Miranda Joo Carlos Machado Johnny Ferreira dos Santos Lauseani Santoni Marta Litwinczik Tatiana Santana Timteo Pereira

Comit Tcnico de Saneamento Ambiental do Conselho das Cidades: Adalberto Joaquim Mendes (CNM), Alcir Ferreira de Matos (UNMP), Aldenora Gomez Gonzles (CONAM), Amlia Fernandes Costa (FNU), Antnia de Pdua (CM), Antonio Carlos Gerardi (ABES), Arnaldo Luiz Dutra (ASSEMAE), Bartria Perptua Lima da Costa (CONAM), Carlos Alberto Rosito (ASFAMAS), Claudia Julio Ribeiro (FISENGE), Emanuel Pontes Meirelles (CEAP), Ericson Dias Mello (ABENGE), Evanildo Barbosa da Silva (FASE), Francisco Edson Alves Ferreira (FNP), Gilberto Cardoso Aguiar (MNLM), Gilberto Carmo Lopes Siqueira (Governo do Estado do Acre), Hidely Grassi Rizo (Ministrio do Meio Ambiente), Joo Clbio Lima Machado (Governo do Estado do Amap), Joaquim Cartaxo Filho (Governo do Estado do Cear), Jos Vaz (UVB), Leodegar da Cunha Tiscoski (Ministrio das Cidades), Lcia Regina Antony(FENAVRU), Marco Antnio de Arajo Fireman (Governo do Estado de Alagoas), Marcos Antnio Landa de Souza (MNLM), Maria das Graas Silva de Souza (UNMP), Maria de Ftima Souza e Silva (ANTAC), Maria Henriqueta Arantes Ferreira Alves (CBIC), Marilene dos Santos Marchese (Governo do Estado de Mato Grosso), Marta do Socorro Farias Barriga (Governo do Estado do Par), Paulo Roberto de Oliveira (ABCON), Paulo Ruy Vallim Carnelli (FNSS), Pedro Antonio Gvozdanovic Villar (Ministrio da Sade), Pedro Romildo dos Santos (FNU), Raimundo Jorge Raiol Leal (CONAM), Rui Porto Rodrigues (CUT), Scheilla Maria Agostini (ASSEMAE), Tigua Barbosa dos Santos (CMP), Vidal Barbosa da Silva (UNMP), Walter Maria de Arruda (CONAM).

ELABORAO E EXECUO Coordenador-Geral: Lo Heller UFMG Coordenadores: Luiz Roberto Santos Moraes - UFBA Ana Lcia Britto - UFRJ Patrcia Campos Borja - UFBA Sonaly Cristina Rezende - UFMG

ELABORAO DO VOLUME N VII - CADERNOS TEMTICOS PARA O PANORAMA DO SANEAMENTO BSICO NO BRASIL

Sonaly Cristina Rezende (org.) Jairnilson Silva Paim - Universalidade, integralidade e equidade Antnio Carlos Robert Moraes - Territorializao Rose Marie Inojosa - Intersetorialidade e transversalidade Rosa Moura e Leandro Franklin Gorsdorf - Questo metropolitana Joo Batista Peixoto - Aspectos econmicos Jos Boaventura Teixeira - Saneamento rural no Brasil Heliana Ktia Tavares Campos e Marcos Helano Montenegro - Sistema Nacional de Informaes em Saneamento Bsico (Sinisa) Ccero Onofre Andrade Neto - Desenvolvimento tecnolgico Jos Esteban Castro - Gesto democrtica nos servios de saneamento Berenice Cordeiro - Desenvolvimento institucional Ena de Arajo Galvo e Ana Karina de Arajo Galvo - Capacitao profissional na rea de saneamento bsico Dieter Wartchow - Cooperao pblico-pblico e pblico-comunitria para a gesto dos servios de saneamento bsico Celina Souza - Estado e poltica de saneamento no Brasil

Ministrio das Cidades Secretaria Nacional de Saneamento Ambiental

PANORAMA DO SANEAMENTO BSICO NO BRASIL Cadernos temticos para o panorama do saneamento bsico no Brasil Volume nO VII

Braslia 2011

Copyright C 2011 Ministrio das Cidades Permitida a reproduo sem fins lucrativos, parcial ou total, por qualquer meio, se citados a fonte e o stio da Internet no qual pode ser encontrado o original em http://www.cidades.gov.br. Ttulo original: Panorama do saneamento bsico no Brasil Vol. VII - Cadernos temticos para o panorama do saneamento bsico no Brasil

Cadernos temticos para o panorama do saneamento bsico no Brasil ISBN: XXX Tiragem desta edio: X mil exemplares Impresso no Brasil 1 Edio: 2011 Diretoria de Articulao Institucional/ Secretaria Nacional de Saneamento Bsico/Ministrio das Cidades Viviana Simon Alex Fabiano Ribeiro de Magalhes Alexandre Araujo Godeiro Ernani Ciraco de Miranda Marta Litwinczik Sinoti Grupo de Trabalho constitudo no mbito do Acordo de Cooperao Tcnica celebrado entre o Ministrio das Cidades e Universidade Federal de Minas Gerais (Chamada Pblica MCidades/SNSA no. 01/2009) para a realizao do Estudo do Panorama do Saneamento Bsico no Brasil: Lo Heller coordenador geral, pela UFMG Coordenadores: Luiz Roberto Santos Moraes/UFBA, Ana Lcia Britto/ UFRJ, Patrcia Campos Borja/UFBA, Sonaly Cristina Rezende/UFMG Pesquisa realizada com o apoio de: Ministrio das Cidades/Secretaria Nacional de Saneamento Ambiental /Departamento de Articulao Institucional Capa: ... Editorao eletrnica: ... Normalizao bibliogrfica: ... Dados Internacionais de Catalogao na Publicao ______________________________________________ B823c Cadernos temticos para o panorama do saneamento bsico no Brasil./ Rezende, S.C. (org.); Andrade Neto, C. O.; Campos, H. K. T.; Castro, J. E.; Cordeiro, B.; Galvo, E. A.; Galvo, A. K. A.; Gorsdorf, L. F.; Inojosa, R. M.; Montenegro, M. H.; Moraes, A. C. R. ; Moura, R. M. G. R.; Paim, J. S.; Peixoto, J. B.; Souza, C.; Teixeira, J. B.; Wartchow, D., (autores). Braslia: Ministrio das Cidades/Secretaria Nacional de Saneamento Ambiental, 2011. Xxx p. (Panorama do Saneamento Bsico no Brasil, v.7). Coordenadores: Lo Heller (coord. Geral), Luiz Roberto Santos Moraes, Ana Lcia Britto, Patrcia Campos Borja, Sonaly Cristina Rezende. Inclui referncias. ISBN: ............................. (obra compl.) ISBN: ............................. (v.7)1. Saneamento. 2. Abastecimento de gua. 3. Esgotos. 4. Resduos slidos. 5. guas pluviais. I. Ministrio das Cidades. II. Rezende, Sonaly Cristina. III. Heller, L. IV. Moraes, Luiz Roberto Santos. V. Britto, Ana Lcia. VI. Borja, Patrcia Campos. VII. Ttulo. VIII. Srie. CDU: 628

LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLASABEP ABES ABNT ABRASCO ACNUDH ANA ANVISA APRODEH AP1MC ASA AVA AWWA BNDES BNH BVS CABES CADNICO CAIXA CEB CEDEFOP CEPAL CGI CGVAM Cintefor CLACSO CNARH CNE CNEFE CNPCT CNPq CODEVASF CONASEMS CONASS CORSAN CT-Hidro CTI DASIS DATASUS DAU Associao Brasileira de Estudos Populacionais Associao Brasileira de Engenharia Sanitria e Ambiental Associao Brasileira de Normas Tcnicas Associao Brasileira de Ps-Graduao em Sade Coletiva Escritrio do Alto Comissariado das Naes Unidas para os Direitos Humanos Agncia Nacional de guas Agncia Nacional de Vigilncia Sanitria Associao Pr Direitos Humanos Associao Programa Um Milho de Cisternas Articulao no Semi-rido Brasileiro Ambiental Virtual de Aprendizagem American Water Works Association Banco Nacional de Desenvolvimento Econmico e Social Banco Nacional da Habitao Biblioteca Virtual em Sade Catlogo Brasileiro de Engenharia Sanitria Cadastro nico para Programas Sociais do Governo Federal Caixa Econmica Federal Cmara de Educao Bsica Centro Europeu para o Desenvolvimento da Formao Profissional Comisso Econmica para a Amrica Latina e o Caribe Comits de Gesto de Indicadores Coordenao Geral de Vigilncia em Sade Ambiental Centro Interamericano de Inverstigacion y Documentatin sobre Formacin Profesional Conselho Latino-americano de Cincias Sociais Cadastro Nacional de Usurios de Recursos Hdricos Conselho Nacional de Educao Cadastro Nacional de Endereos para Fins Estatsticos do IBGE Comisso Nacional de Desenvolvimento Sustentvel dos Povos e Comunidades Tradicionais Conselho Nacional de Desenvolvimento Cientfico e Tecnolgico Companhia de Desenvolvimento dos Vales do So Francisco e Parnaba Conselho Nacional dos Secretrios Municipais de Sade Conselho Nacional de Secretrios de Sade Companhia Riograndense de Saneamento Fundo Setorial de Recursos Hdricos Comits Temticos Interdisciplinares Departamento de Anlise de Situao de Sade Banco de Dados do Sistema nico de Sade Departamento de Ambiente Urbano

DIA DNIT DNPM DRSAI EAD EJA EMBRAPA ENDEF EU FAT FEBRABAN FIOCRUZ FGTS FGV FSE FUNASA GWP IBAMA IBGE IDB IDRC IES INE INEP IPEA IUPERJ ICICT IDB INCRA INMETRO INPE IPEA ISSO IST ITI IWA LDB LIS MCidades MCT MDIC

Deteccin e Imputacin Automtica de errores para datos cualitativos Departamento Nacional de Infraestrutura de Transporte Departamento Nacional de Produo Mineral Doenas Relacionadas a um Saneamento Ambiental Inadequado Educao Distncia Educao de Jovens e Adultos Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuria Estudo Nacional da Despesa Familiar Unio Europia Fundo de Amparo ao Trabalhador Federao Brasileira de Bancos Fundao Oswaldo Cruz Fundo de Garantia do Tempo de Servio Fundao Getlio Vargas Fundo Social Europeu Fundao Nacional de Sade Global Water Partnership Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renovveis Instituto Brasileiro de Geografia e Estatstica Indicadores de Dados Bsicos Centro Internacional de Investigaes para o Desenvolvimento Instituies de Ensino Superior Instituto Nacional de Estatstica da Espanha Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Ansio Teixeira Instituto de Pesquisa Econmica Aplicada Instituto Universitrio de Pesquisas do Rio de Janeiro Instituto de Comunicao e Informao Cientfica e Tecnolgica em Sade Indicadores e Dados Bsicos Instituto Nacional de Colonizao e de Reforma Agrria Instituto Nacional de Metrologia, Normalizao e Qualidade Industrial Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais Instituto de Pesquisa Econmica Aplicada International Organizarion for Standardization Informes da Situao e Tendncias Instituto Nacional de Tecnologia da Informao International Water Association Lei de Diretrizes e Bases da Educao Nacional Laboratrio de Informaes em Sade Ministrio das Cidades Ministrio da Cincia e da Tecnologia Ministrio do Desenvolvimento, da Indstria e do Comrcio Exterior

MDL MDS MEC MI MMA MPS MS MTE MTur MUNIC NUCASE NUCASUL NURECO NURENE OGU OIT ONU OPAS PDA Plansab PMSS PNAD PNIIS PNLA PNQ PNSB PPA ReCESA REFORSUS RET-SUS RIPSA SAC SAI SBAC SEBRAE SENAC SENAI SENAR SENARC SENAT SESC

Mecanismo de Desenvolvimento Limpo Ministrio do Desenvolvimento Social e Combate Fome Ministrio da Educao Ministrio da Integrao Nacional Ministrio do Meio Ambiente Ministrio da Previdncia Social Ministrio da Sade Ministrio do Trabalho e Emprego Ministrio do Turismo Pesquisa de Informaes Bsicas Municipais Ncleo Regional da Regio Sudeste Ncleo Regional da Regio Sul Ncleo Regional da Regio Centro-Oeste Ncleo Regional da Regio Nordeste Oramento Geral da Unio Organizao Internacional do Trabalho Organizao das Naes Unidas Organizao Panamericana de Sade Personal Digital Assistant Plano Nacional de Saneamento Bsico Programa de Modernizao do Setor de Saneamento Pesquisa Nacional por Amostra de Domiclios Poltica de Informao e Informtica em Sade do SUS Portal Nacional de Licenciamento Ambiental Plano Nacional de Qualificao Pesquisa Nacional de Saneamento Bsico Plano Plurianual Rede Nacional de Capacitao e Extenso Tecnolgica em Saneamento Ambiental Reforo Reorganizao do SUS Rede de Escolas Tcnicas do SUS Rede Interagencial de Informao para a Sade Solues Alternativas Coletivas Solues Alternativas Individuais Sistema Brasileiro de Avaliao da Conformidade Servio de Apoio Pequena e Mdia Empresa Servio Nacional de Aprendizagem Comercial Servio Nacional de Aprendizagem Industrial Servio Nacional de Aprendizagem Rural Secretaria Nacional de Renda de Cidadania Servio Nacional de Aprendizagem em Transportes Servio Social do Comrcio

SESCOOP SESI SIASG SIG Cisternas SIGA SIGPlan SIH SIM SINAN SINAPI SINIMA SINIR SINISA SIPAM SISAGUA SMAPP SNIC SNIRH SNIS SNIU SNSA SRHU SUS SVS TR UCS UFBA UFES UFC UFG UFMG UFMS UFPB UFPE UFRGS UFRJ UFSC UFSCar UGC UGMs UnB

Servio Nacional de Aprendizagem do Cooperativistmo Servio Social da Indstria Sistema Integrado de Administrao de Servios Gerais Sistema de Gerenciamento do Programa Cisternas Sistema Integrado de Gesto e Auditoria Sistema de Informaes Gerenciais e de Planejamento Sistema de informaes sobre Internaes Hospitalares Sistema de Informaes sobre Mortalidade Sistema de Informao de Agravos de Notificao Sistema Nacional de Pesquisa e Custos e ndices da Construo Civil Sistema Nacional de Informaes em Meio Ambiente Sistema Nacional de Informaes sobre a Gesto dos Resduos Slidos Sistema Nacional de Informaes em Saneamento Bsico Sistema de Proteo da Amaznia Sistema de Informao de Vigilncia da Qualidade da gua para Consumo Humano Sistema de Monitoramento e Avaliao de Programas e Projetos Sistema Nacional de Informaes sobre as Cidades Sistema Nacional de Informaes em Recursos Hdricos Sistema Nacional de Informaes sobre Saneamento Sistema Nacional de Indicadores Urbanos Secretaria Nacional de Saneamento Ambiental Secretaria de Recursos Hdricos e Ambiente Urbano Sistema nico de Sade Secretaria de Vigilncia em Sade Termo de Referncia Universidade de Caxias do Sul Universidade Federal da Bahia Universidade Federal do Esprito Santo Universidade Federal do Cear Universidade Federal de Gois Universidade Federal de Minas Gerais Universidade Federal do Mato Grosso do Sul Universidade Federal da Paraba Universidade Federal de Pernambuco Universidade Federal do Rio Grande do Sul Universidade Federal do Rio de Janeiro Universidade Federal de Santa Catarina Universidade Federal de So Carlos Unidade Gestora Central Unidades Gestoras Microrregionais Universidade de Braslia

UNESCO Unicamp Unisinos USP VAE

United Nations Educational, Scientific and Cultural Organization Universidade Estadual de Campinas Universidade do Vale do Rio dos Sinos Universidade de So Paulo Validao das Aquisies da Experincia

LISTA DE FIGURAS

FIGURA 1.1: FIGURA 1.2: FIGURA 1.3: FIGURA 3.1: FIGURA 5.1: FIGURA 7.1: FIGURA 7.2: FIGURA 8.1: FIGURA 8.2: FIGURA 8.3: FIGURA 8.4: FIGURA 8.5: FIGURA 9.1: FIGURA 9.2: FIGURA 10.1: FIGURA 12.1: FIGURA 12.2: FIGURA 12.3: FIGURA 12.4: FIGURA 12.5: FIGURA 12.6: FIGURA 12.7: FIGURA 12.8: FIGURA 12.9: FIGURA 12.10: FIGURA 12.11: FIGURA 12.12: FIGURA 12.13: FIGURA 12.14: FIGURA 13.1:

Modelo de Dahlgreen e Whitehead (1991)..... ..................................................................................... Modelo de Dahlgreen e Whitehead (1991) com intervenes ............................................................. Modelo da vigilncia da sade ............................................................................................................. Evoluo do ndice de Gini no Brasil, 1995-2005 ................................................................................ Contratos e desembolsos de financiamentos do FGTS, 1995 2006................................................. Mdulos do SISAGUA.......................................................................................................................... Objetivos do SINISA ............................................................................................................................ Distribuio dos projetos aprovados em cada edital do PROSAB, por macrorregio ......................... Distribuio percentual, por macrorregio, dos projetos aprovados nos editais do PROSAB............. Numero de trabalhos apresentados nos Congressos Brasileiros da ABES por tema referente ao saneamento bsico, 1989 a 2009 ........................................................................................................ Desenhos esquemticos dos dispositivos de desvio do Projeto Cisternas ......................................... O ramal condominial e suas alternativas de localizao ..................................................................... Evoluo do processo de cidadanizao liberal democrtico.............................................................. Governabilidade inter-setorial e multi-nvel .......................................................................................... Esquema da prestao e contratao dos servios pblicos de saneamento bsico ......................... Resumo dos dispositivos legais para a gesto associada no saneamento bsico ............................. Representao esquemtica para constituio de um Consrcio Pblico Municipal .......................... Modelo de gesto associada entre Consorcio Pblico e Entes Federados Municipais ....................... Modelo de gesto associada atravs de convnio de cooperao entre Ente Federado Estadual e Ente Federado Municipal.............................................................................................................................. Modelo de gesto associada, atravs de convnio de cooperao entre Ente Federado Municipal e Ente da Administrao Direta Descentralizada (Autarquia Municipal ou Empresa Municipal) .................... Representao esquemtica de gesto associada de RSU no nvel local DMLU/Porto Alegre....... Unidade de compostagem abandonada, financiada com recursos pblicos (B. Princpio/RS) ........... Gesto associada entre Municpio e Estado, Municpio e Agncia de Regulao, Municpio e Companhia de Saneamento (caso do Rio Grande do Sul, adaptado de CORSAN, 2009) ..................................... Curso ReCESA SAA em cooperao com MCidades/SNSA/UFRGS/Assemae/DMAE e Curso ReCESA SEE em cooperao com MCidades/SNSA/UFRGS/Assemae/DMAE ............................................... Plano estratgico para fomentar cooperaes junto aos servios de saneamento bsico na Amrica Latina (elaborado a partir de Assemae, 1995) ..................................................................................... Estrutura dos centros de referncia em saneamento ambiental de Capinzal e Orleans/SC ............... Maquete do centro de referncia CISAM-SUL ORLEANS / SC .......................................................... Exemplo de cooperao local (adaptado de O Empreendedor, 2009) ................................................ Palavras chaves para uma cooperao contempornea ..................................................................... Macro instituies polticas do estado democrtico .............................................................................

LISTA DE TABELAS

TABELA 1.1: TABELA 3.1: TABELA 3.2: TABELA 3.3: TABELA 3.4: TABELA 4.1: TABELA 4.2: TABELA 4.3: TABELA 4.4: TABELA 4.5: TABELA 4.6: TABELA 4.7: TABELA 4.8: TABELA 4.9: TABELA 4.10: TABELA 4.11: TABELA 5.1: TABELA 5.2: TABELA 5.3: TABELA 6.1: TABELA 6.2: TABELA 6.3: TABELA 7.1: TABELA 7.2: TABELA 7.3: TABELA 7.4: TABELA 7.5: TABELA 7.6: TABELA 7.7: TABELA 7.8: TABELA 7.9: TABELA 7.10:

Desigualdades em sade ....................................................................................................................... Situao das polticas estaduais de gua e esgoto em cinco estados da federao, 2006................... Comparao percentual da disposio de resduos slidos no Brasil em 1989 e 2000 ........................ Nmero de desastres notificados Defesa Civil, por estado, no perodo de 01/01 a 30/06/2009 ......... Interseces entre polticas, sistemas e rgos da estrutura governamental e componentes do saneamento bsico................................................................................................................................. Participao percentual da populao das RMs no total da populao do Brasil, 1970, 1980 e 1991 .. Taxa mdia geomtrica de crescimento anual da populao das RMs(1), dos Polos(2) e do Brasil, 1970/1980 e 1980/1991 .......................................................................................................................... Participao relativa da populao no total do Brasil, incremento e taxas de crescimento da populao das RMs, 1991, 2000 e 2008 ........................................................................................................................ Domiclios particulares permanentes por grandes regies e Brasil, segundo algumas caractersticas, 2008 Porcentagem da populao residindo em domiclios que atendem s condies de qualidade, Brasil 1998, 2003 e 2008 ............................................................................................................................................ Indicadores do saneamento nas Regies Metropolitanas e Brasil, 2008 ............................................... Situao dos domiclios particulares permanentes e moradores quanto ao abastecimento de gua, Brasil e Regies Metropolitanas, 2008 ................................................................................................................ Situao dos domiclios particulares permanentes e moradores quanto ao esgotamento sanitrio, Brasil e Regies Metropolitanas, 2008 ................................................................................................................ Situao dos domiclios particulares permanentes e moradores quanto ao destino do lixo, Brasil e Regies Metropolitanas, 2008 .............................................................................................................................. Nmero de municpios com servios de manejo de guas pluviais superficiais (1) e servios de drenagem urbana subterrneos(2), Brasil e Regies Metropolitanas, 2000 ............................................................. Oportunidades, limitaes e desafios gesto metropolitana no Brasil ................................................ Matriz de arranjos organizacionais da gesto de servios pblicos ....................................................... Encargos fiscais e trabalhistas: Autarquia X Empresas Pblicas ou Estatais ............................. Informaes financeiras das empresas de saneamento pblicas, estatais e privadas (1), 2003-2007 Acesso aos servios de abastecimento de gua na rea rural, 2007 (em %)........................................ Acesso aos servios de esgotamento sanitrio na rea rural, 2007 (em %) .......................................... Acesso aos servios de coleta de lixo na rea rural, 2007 (em %) ........................................................ Dados e informaes relevantes para o SINISA .................................................................................... Indicadores utilizados no SISAGUA ....................................................................................................... Indicadores sanitrios complementares passveis de serem utilizados na vigilncia da qualidade da gua para consumo humano ........................................................................................................................... Unidades de saneamento sujeitas a licenciamento ambiental ............................................................... Doenas Relacionadas ao Saneamento Ambiental Inadequado (DRSAI) ............................................. Categorias de informaes e indicadores propostos pela IBNET .......................................................... Indicadores chave em abastecimento de gua e esgotamento sanitrio agrupados ............................. Indicadores de desempenho para a gesto dos servios pblicos de abastecimento de gua (IRAR, 2005) Indicadores de desempenho para a gesto dos servios pblicos de esgotos sanitrios (IRAR, 2005) Indicadores de desempenho dos servios pblicos de manejo de resduos slidos urbanos (IRAR, 2005)

TABELA 7.11: TABELA 7.12: TABELA 7.13: TABELA 7.14: TABELA 7.15: TABELA 7.16: TABELA 7.17: TABELA 7.18: TABELA 7.19: TABELA 7.20: TABELA 7.21: TABELA 7.22: TABELA 7.23: TABELA 7.24: TABELA 7.25: TABELA 7.26: TABELA 7.27: TABELA 7.28: TABELA 8.1: TABELA 8.2: TABELA 8.3: TABELA 9.1: TABELA 11.1: TABELA 11.2: TABELA 11.3: TABELA 11.4: TABELA 11.5: TABELA 12.1: TABELA 12.2: TABELA 12.3: TABELA 13.1: TABELA 13.2: TABELA 13.3: TABELA 13.4: TABELA 13.5:

Indicadores para avaliao de eficincia, eficcia e efetividade por componente do saneamento bsico Fontes de informao mais relevantes para o cumprimento dos objetivos do SINISA .......................... Proposta de subsistemas de base municipal para o SINISA ................................................................. Sistema Nacional de Informaes sobre Saneamento SNIS .............................................................. Censo Demogrfico CENSO / IBGE.................................................................................................... Pesquisa Nacional de Saneamento Bsico PNSB / IBGE .................................................................. Cadastramento nico para programas sociais do Governo Federal CADNICO .............................. Sistema de Gerenciamento do Programa Cisternas SIG CISTERNAS .............................................. Sistema de avaliao da Qualidade da gua, Sade e Saneamento SISAGUA ................................ Sistema Nacional de Informao sobre Meio Ambiente SINIMA ........................................................ Sistema Nacional de Informaes em Recursos Hdricos SNIRH / CNARH....................................... Painel de Indicadores do SUS DATASUS ........................................................................................... Pesquisa Nacional por Amostra de Domicilios PNAD / IBGE ............................................................. Pesquisa de Informaes Bsicas Municipais MUNIC / IBGE ............................................................ Rede Interagencial de Informao para a Sade RIPSA .................................................................... Sistema de Avaliao da Qualidade da gua, Sade e Saneamento -ATLAS DIGITAL DA GUA ...... Atlas Abastecimento Urbano de gua da ANA ...................................................................................... Sistema Nacional de Informaes das Cidades SNIC / Sistema Nacional de Indicadores Urbanos SNIU ................................................................................................................................................................ Livros publicados pelo PROSAB por tema e respectivos anos de lanamento no perodo 1999-2009 . Distribuio dos resumos de trabalhos tcnicos submetidos para apresentao no 25 Congresso da ABES em funo do vnculo do trabalho com alguma instituio, 2009 ................................................ Trabalhos apresentados por assunto e temas em destaque nos Congressos Brasileiros de Engenharia Sanitria e Ambiental (15 ao 25).......................................................................................................... Esfera pblica e participao social em tradies polticas rivais .......................................................... Quadro demonstrativo do nmero de oficinas realizadas pela ReCESA e nmero de participantes ..... Mdia de anos de estudo segundo grupos de idade, 2001 e 2004 ........................................................ Tendncias pedaggicas na prtica escolar Correntes liberais .......................................................... Tendncias pedaggicas na prtica escolar Correntes progressistas ................................................ Itinerrio formativo para a educao profissional ................................................................................... Ensaio de perguntas e respostas associadas cooperao internacional ............................................ Aspectos relacionados ao formato das UTs e forma de organizao das associaes ou cooperativas Repartio de competncias institucionais para projetos de saneamento bsico ................................. Evoluo das polticas sociais, 1980-2009 ............................................................................................. Carga tributria global e diviso federativa, 1960-2005 ......................................................................... Despesas no-financeiras do governo federal, 2001-2005 (valores atualizados pelo deflator do PIB em R$ milhes) .................................................................................................................................................. Competncias concorrentes, 2001-2005 ................................................................................................ Municpios por existncia de Consrcios Intermunicipais, excluda a sade .........................................

APRESENTAOA Lei n 11.445, de 5/1/2007, regulamentada pelo Decreto n 7.217, de 21/6/2010, estabelece diretrizes nacionais para o saneamento bsico no Pas e determina no seu art. 52, a elaborao do Plano Nacional de Saneamento Bsico, sob a coordenao do Ministrio das Cidades. A elaborao do Plano Nacional de Saneamento Bsico Plansab tem como funo, dentre outras, definir diretrizes nacionais para o saneamento bsico, sendo nele estabelecidos os objetivos e metas nacionais e macrorregionais, em busca da universalizao e do aperfeioamento na gesto dos servios em todo o Pas, e visa se constituir no eixo central da poltica federal para o saneamento bsico. O Plano pretende promover a articulao nacional dos entes federados, sendo instrumento fundamental para a retomada da capacidade orientadora e planejadora do Estado na conduo da poltica pblica de saneamento bsico e, conseqentemente, da definio das metas e estratgias de governo, para um horizonte de 20 anos. O Plansab resultado de um processo planejado em trs etapas: i) a formulao do Pacto pelo SaneamentoBsico: mais sade, qualidade de vida e cidadania , que marca o incio do processo participativo de elaborao do Plano em 2008; ii) a elaborao, em 2009 e 2010, do presente estudo o Panorama do Saneamento Bsico no Brasil , composto por sete volumes; iii) a Consulta Pblica, que submete a verso preliminar do Plano sociedade, de modo a promover ampla discusso com vistas consolidao de sua forma final para posteriores encaminhamentos e execuo.

Para o desenvolvimento do Panorama do Saneamento Bsico no Brasil, o Ministrio das Cidades selecionou, por meio da Chamada Pblica n 001/2009, a Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), a Universidade Federal da Bahia (UFBA) e a Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). O estudo, composto por sete volumes, compreende ampla pesquisa, com sistematizao e anlise de informaes, produo conceitual e desenvolvimento de prognsticos, contemplando: a Anlise situacional das condies do saneamento bsico no Brasil, incluindo a caracterizao do dficit no acesso aos servios, anlise dos programas existentes e avaliao poltico-institucional do setor; a identificao das condies a serem enfrentadas e a formulao de uma Viso estratgica para a poltica pblica de saneamento bsico no Pas para um horizonte de 20 anos; estudo sobre Anlise dos investimentos necessrios para a concretizao das metas propostas; a produo de Cadernos temticos, em nmero de 13, para o aprofundamento conceitual em assuntos de relevante interesse para as definies do Plansab.

O estudo, portanto, constitui elemento chave para o Plansab, o subsidiando em seus principais elementos e o complementando, na compreenso mais pormenorizada de alguns de seus aspectos. Para a elaborao do Panorama do Saneamento Bsico no Brasil, diversas etapas e atividades foram percorridas, com vistas ao levantamento de aspectos essenciais que orientem o contedo do Plansab. O presente documento corresponde ao volume 7 Cadernos temticos, escrito por 13 diferentes autores, e aborda temas de importncia fundamental para a discusso conceitual do processo de planejamento, incluindo os desafios para a efetiva implementao do Plansab no Brasil.

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SUMRIOAPRESENTAO ......................................................................................... 1. Universalidade, integralidade e equidade ..................................................Jairnilson Silva Paim1.1 Introduo .................................................................................................................... 1.2 Universalidade, equidade e integralidade: desenvolvimento histrico dessas noes, a partir do sanitarismo e dos sistemas de proteo social ................................................... 1.3 Qualidade de vida e desenvolvimento, como referncias para a formulao de polticas pblicas baseadas na universalidade, equidade e integralidade......................................... 1.4 Universalidade ............................................................................................................... 1.5 Equidade ....................................................................................................................... 1.6 Integralidade ................................................................................................................. 1.7 Plansab como oportunidade histrica de desenvolvimento de polticas pblicas intersetoriais pautadas na universalidade, equidade e integralidade .................................. 1.8 Comentrios finais ......................................................................................................... 1.9 Referncias ...................................................................................................................

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2. Territorializao.......................................................................................Antnio Carlos Robert Moraes2.1 Geografia e saneamento bsico ...................................................................................... 2.2 A geografia e as divises do espao terrestre .................................................................. 2.3 Territrio, territorialidade e territorializao ..................................................................... 2.4 Divises do territrio e polticas pblicas no Brasil ........................................................... 2.5 Regio e planejamento no Brasil ..................................................................................... 2.6 A diversidade municipal no territrio brasileiro ................................................................ 2.7 Comentrio final ............................................................................................................ 2.8 Referncias ...................................................................................................................

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3. Intersetorialidade e transversalidade.........................................................Rose Marie Inojosa3.1 A lgica disciplinar e sua metamorfose ............................................................................ 3.2 Dilemas do saneamento bsico como tema transversal e ao intersetorial ....................... 3.3 Desenvolvimento humano e o saneamento bsico ........................................................ 3.4 Mudanas climticas e o Plano Nacional de Saneamento Bsico ....................................... 3.5 Possibilidades e desafios para o Plano Nacional de Saneamento Bsico ............................. 3.6 Referncias ................................................................................................................

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4. Questo metropolitana.............................................................................Rosa Moura e Leandro Franklin Gorsdorf4.1 Introduo .................................................................................................................... 4.2 A metropolizao no Brasil.............................................................................................. 4.3 A questo metropolitana .............................................................................................. 4.4 A difcil prtica da gesto dos espaos aglomerados .........................................................

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4.5 A gesto do saneamento ................................................................................................ 4.6 Consideraes finais ....................................................................................................... 4.7 Referncias ...................................................................................................................

5. Aspectos econmicos...............................................................................Joo Batista Peixoto5.1 Introduo .................................................................................................................... 5.2 Aspectos preliminares .................................................................................................... 5.3 Aspectos gerais da regulao dos servios pblicos .......................................................... 5.4 Regulao econmica dos servios pblicos ..................................................................... 5.5 Estratgia e poltica de financiamento ............................................................................. 5.6 Eficincia na gesto dos servios .................................................................................... 5.7 Estrutura do sistema de cobrana (estrutura tarifria) ...................................................... 5.8 Poltica de subsdios ....................................................................................................... 5.9 Concluso...................................................................................................................... 5.10 Referncias ..................................................................................................................

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6. Saneamento rural no Brasil......................................................................Jos Boaventura Teixeira6.1 Introduo ........................................................................................................... 6.2 Saneamento na Amrica Latina e Caribe ................................................................. 6.3 Saneamento no Brasil: cobertura urbana e rural ...................................................... 6.4 O Brasil rural hoje ................................................................................................ 6.5 O saneamento rural no Brasil perpectivas ..................................................................... 6.6 Concluso...................................................................................................................... 6.7 Referncias ...................................................................................................................

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7. Sistema Nacional de Informaes em Saneamento Bsico (Sinisa)..............Heliana Ktia Tavares Campos e Marcos Helano Montenegro7.1 Introduo .................................................................................................................... 7.2 Avaliao do SNIS como precursor do SINISA .................................................................. 7.3 Avaliao das bases de dados e informaes de potencial interesse para o saneamento bsico ......................................................................................................... 7.4 Experincias estrangeiras relevantes ............................................................................... 7.5 Objetivos do SINISA....................................................................................................... 7.6 Uma proposta de concepo para o SINISA ..................................................................... 7.7 Referncias ................................................................................................................... Anexo I - Tabelas com informaes sobre bases de dados de potencial interesse para o saneamento bsico ................................................................................................ Anexo II - CNARH: campos mnimos de compartilhamento de dados com os usurios .............. Anexo III - Indicadores do sistema de avaliao da qualidade da gua, sade e saneamento ....................................................................................................... Anexo IV - Sinopse do Relatrio da 1 Oficina SINISA ............................................................

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8. Desenvolvimento tecnolgico................................................................... 17

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Ccero Onofre Andrade NetoApresentao ...................................................................................................................... 8.1 Introduo .................................................................................................................... 8.2 Situao da pesquisa em saneamento bsico no Brasil ..................................................... 8.3 Desenvolvimento tecnolgico no domnio do saneamento bsico no Brasil ......................... 8.4 Tecnologia disponvel, tendncias e paradigmas .............................................................. 8.5 Perspectivas e expectativas do cenrio futuro .................................................................. 8.6 Consideraes finais ....................................................................................................... 8.7 Referncias ...................................................................................................................

9. Gesto democrtica nos servios de saneamento.......................................Jos Esteban Castro9.1 Introduo .................................................................................................................... 9.2 As dimenses conceituais da gesto democrtica ............................................................. 9.3 A gesto democrtica dos servios de saneamento em perspectiva histrica ..................... 9.4 Concluses: os desafios que enfrenta a democratizao substantiva da gesto do saneamento .................................................................................................................. 9.5 Referncias ...................................................................................................................

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10. Desenvolvimento institucional.................................................................Berenice CordeiroApresentao ...................................................................................................................... 10.1 Desenvolvimento institucional: abordagens terico-conceituais e possibilidades de apropriao para o campo do saneamento ............................................................... 10.2 Determinantes do novo ordenamento jurdico do setor: desafios e condicionantes para o desenvolvimento institucional do saneamento .............................. 10.3 O Plansab na perspectiva do desenvolvimento institucional: instrumento de aprimoramento da poltica pblica e da gesto dos servios ........................................... 10.4 Propostas de apoio ampliao da capacidade de gesto dos titulares dos servios de saneamento bsico..................................................................................... 10.5 Referncias ..................................................................................................................

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11. Capacitao profissional na rea de saneamento bsico...........................Ena de Arajo Galvo e Ana Karina de Arajo GalvoApresentao ...................................................................................................................... 11.1 Histrico ...................................................................................................................... 11.2 Objetivos ..................................................................................................................... 11.3 Os servios de saneamento bsico e o processo de trabalho ........................................... 11.4 O processo educativo ................................................................................................... 11.5 Relao entre processo de trabalho e processo educativo ............................................... 11.6 Capacitao x correntes pedaggicas ............................................................................ 11.7 Eixos norteadores para a construo de uma nova prtica educativa ............................... 11.8 Consideraes finais ..................................................................................................... 11.9 Referncias ..................................................................................................................

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12. Cooperao pblico-pblico e pblico-comunitria para a gesto dos servios de saneamento bsico...............................................................Dieter Wartchow12.1 Introduo e objetivos .................................................................................................. 12.2 Contextualizao da cooperao pblica no saneamento bsico ...................................... 12.3 Conceito de cooperao pblico-pblico e pblico-comunitria ........................................ 12.4 A legislao aplicada cooperao ................................................................................ 12.5 Formas de cooperao ................................................................................................. 12.6 Experincias de cooperao inovadoras ......................................................................... 12.7 Possibilidades de cooperao na esfera do governo federal ............................................ 12.8 Cooperao internacional.............................................................................................. 12.9 Caminhos e desafios para a cooperao ........................................................................ 12.10 Referncias ................................................................................................................

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13. Estado e poltica de saneamento no Brasil...............................................Celina Souza13.1 Introduo ................................................................................................................... 13.2 Estado e polticas pblicas ............................................................................................ 13.3 Estado e polticas pblicas no Brasil............................................................................... 13.4 Por que algumas polticas sociais foram consolidadas? ................................................... 13.5 A poltica de saneamento bsico no Brasil ...................................................................... 13.6 Possibilidades e obstculos da poltica de saneamento bsico no Brasil ............................ 13.7 Referncias ..................................................................................................................

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PANORAMA DO SANEAMENTO BSICO NO BRASIL

Caderno temtico n 1

1. Universalidade, integralidade e equidadeJairnilson Silva Paim

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1.1 INTRODUOA formulao do Plano Nacional de Saneamento Bsico Plansab pode significar a oportunidade de proposio de um pacto pelo saneamento bsico. No caso do Caderno Temtico 1, objeto do presente texto, tem como perspectivas revisar e discutir noes como universalidade, equidade e integralidade, considerando questes de sade, qualidade de vida e cidadania. Trata-se de um esforo no sentido de recuperar, ainda que superficialmente, a historicidade dessas idias e propostas, contextualizando-as para a sociedade brasileira, especialmente na conjuntura posterior promulgao da Constituio de 1988. Nesse sentido, busca realizar incurses sobre o estado da arte acerca dessa temtica, com base numa reviso da literatura disponvel, sistematizando definies, crticas, conceitualizaes, redefinies e proposies. O seu carter exploratrio por referncia ao tema do saneamento bsico no exclui o reconhecimento de que essas noes tenham sido objeto de reflexo e de trabalho terico no sentido de transform-las em conceitos a partir das contribuies da filosofia, do direito, da economia e das cincias sociais e polticas, entre outras. Na sade, enquanto rea do saber, tais noes tm estado presentes em documentos doutrinrios e tcnicos nos ltimos sessenta anos. A criao da Organizao Mundial da Sade, a implantao de sistemas de sade universais, mesmo em pases capitalistas, a Declarao de Alma Ata, em 1978, e a proposta de Sade para Todos, no ano 2000 (SPT2000), aprovada pela Assemblia Mundial da Sade, podem ter contribudo, no sentido de reconhecer tais noes como princpios e diretrizes (PAIM, 2002). Justamente num contexto internacional em que as desigualdades entre pases, regies, classes, grupos sociais e tnico-raciais mais se avolumam, organismos internacionais multilaterais tm recorrido, tambm, retrica da equidade (PAIM, 2006a; PAIM; VIEIRA DA SILVA, 2006). Esta vem sendo reiterada como uma das principais referncias para a formulao de polticas pblicas, avaliao de reformas setoriais e reorientao de intervenes, embora, em muitos casos, como contraposio universalidade. J a integralidade, entre as trs noes contempladas neste Caderno, parece ser a menos considerada e problematizada na literatura internacional. No Brasil, esses termos vm sendo progressivamente utilizados em documentos tcnicos, normativos e doutrinrios (CONSELHO NACIONAL DE SECRETRIOS DE SADE-CONASS, 2003; KADT; TASCA, 1993; PINHEIRO et al., 2005). A equidade aparece como princpio reiterado, junto integralidade, como diretrizes para a consolidao do Sistema nico de Sade (SUS), aparentemente entendida como sinnimo de igualdade. Entretanto, essa expresso no consta entre os princpios do SUS, seja na Constituio, seja na Lei Orgnica da Sade. Os princpios centrais nesses marcos legais so a igualdade e a universalidade (Sade, direito de todos e dever do Estado). J o atendimento integral, com prioridade para as aes preventivas, sem prejuzo dos servios assistenciais, aparece como diretriz, tanto no art. 196 da Constituio, como na Lei Orgnica da Sade (CONASS, 2003). O acesso universal e igualitrio s aes e servios para a promoo, proteo e recuperao, tal como previsto pela Carta Magna, permitiria alcanar a integralidade. Em vez de entender a sade de forma reducionista apenas como setor responsvel pela assistncia mdica curativa, a Constituio, ao proclamar o direito sade, reconhece que este depende de polticas econmicas e sociais. Este conceito ampliado de sade, expresso na Carta Magna, estimulou o aprofundamento e o alargamento da noo de integralidade, possibilitando um dilogo profcuo com diversos setores: Portanto, no exclui nenhuma das possibilidades de se promover, prevenir, restaurar a sade e reabilitar os indivduos (CAMPOS, 2003, p.577). O saneamento, por exemplo, representa um dos setores com grande interface com

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a sade, seja na concepo restrita, seja na ampliada. A primeira envolve o abastecimento de gua e o esgotamento sanitrio. A segunda inclui, tambm, o lixo urbano, a coleta, tratamento e destino final dos resduos slidos industriais, a drenagem urbana, a proteo de mananciais, o controle de vetores e o controle da qualidade do ar (NAJAR; FISZON, 1989, p.146). Assim, entre as competncias do SUS, estabelecidas pela Constituio (Brasil, 2002), encontra-se a de participar da formulao da poltica e da execuo das aes de saneamento bsico (art. 200, inciso IV). Segundo o art. 21, inciso XX, compete Unio instituir diretrizes para o desenvolvimento urbano, inclusive habitao, saneamento bsico e transportes urbanos (BRASIL, 2002). Do mesmo modo, saneamento e meio ambiente foram reconhecidos, pela Lei no 8080/90 (art. 13, inciso II), como atividades especiais a cargo de comisses intersetoriais, para a articulao de polticas e programas (CONASS, 2003). No caso da Lei no 11.445/07, que estabelece as diretrizes nacionais para o saneamento bsico e para a poltica federal desse setor, alm dos princpios fundamentais e definies, cabe destacar o captulo referente aos objetivos da poltica (art. 49) e ao processo de elaborao de planos (art. 51 e art. 52). Para os efeitos desta Lei considera-se saneamento bsico como o conjunto de servios, infra-estruturas e instalaes operacionais que envolvem:a) abastecimento de gua potvel: constitudo pelas atividades, infra-estruturas e instalaes necessrias ao abastecimento pblico de gua potvel, desde a captao at as ligaes prediais e respectivos instrumentos de medio; b) esgotamento sanitrio: constitudo pelas atividades, infra-estruturas e instalaes operacionais de coleta, transporte, tratamento e disposio final adequados dos esgotos sanitrios, desde as ligaes prediais at o seu lanamento final no meio ambiente; c) limpeza urbana e manejo de resduos slidos: conjunto de atividades, infra-estruturas e instalaes operacionais de coleta, transporte, transbordo, tratamento e destino final do lixo domstico e do lixo originrio da varrio e limpeza de logradouros e vias pblicas; d) drenagem e manejo das guas pluviais urbanas: conjunto de atividades, infra-estruturas e instalaes operacionais de drenagem urbana de guas pluviais, de transporte, deteno ou reteno para o amortecimento de vazes de cheias, tratamento e disposio final das guas pluviais drenadas nas reas urbanas.

Portanto, o Plano Nacional de Saneamento Bsico (Plansab) procura indicar contedos, fundamentos e diretrizes da Poltica Federal de Saneamento Bsico, com nfase em: equidade no acesso; promoo da salubridade ambiental; sustentabilidade; promoo do desenvolvimento institucional; fomento ao desenvolvimento cientfico e tecnolgico; minimizao dos impactos ambientais. Nessa perspectiva, o presente texto corresponde ao Caderno Temtico 1, cujo objetivo sistematizar reflexes, estudos e pesquisas sobre as noes de universalidade, equidade e integralidade, no sentido de subsidiar a formulao de polticas de saneamento, a partir do Plansab.

1.2 UNIVERSALIDADE, EQUIDADE E INTEGRALIDADE: DESENVOLVIMENTO HISTRICO DESSAS NOES, A PARTIR DO SANITARISMO E DOS SISTEMAS DE PROTEO SOCIALDo mesmo modo que no possvel compreender, suficientemente, as noes referentes universalidade, equidade e integralidade, atravs de consultas aos dicionrios, a sua utilizao enquanto princpios e diretrizes de polticas pblicas e enquanto conquistas histricas, no pode ser explicada pela abordagem sistmica. possvel at utilizar o termo "sistema" para contemplar as vrias agncias e agentes envolvidos com o saneamento bsico, por exemplo, recorrendo expresso Sistema Nacional de Saneamento (COSTA, 1998). Mas neste caso estaremos empregando esse termo mais como um enfoque do que como teoria. O enfoque sistmico pode ser considerado um marco conceitual ou um modelo, cujas noes adotadas permitem uma aproximao realidade. uma representao esquemtica de um dado objeto. J uma

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teoria ou marco terico supe a articulao de conceitos produzidos mediante um trabalho terico. Portanto, prtica terica representa a transformao de uma noo em conceito, atravs de uma atividade que emprega meios de trabalho especficos. O enfoque sistmico tem sido til para descrever uma dada realidade e apontar certas relaes entre as partes, alm de mecanismos de comunicao e bloqueio. Entretanto, mostra-se limitado para analisar contradies, conflitos e disputas de poder, alm de no contemplar a dimenso da historicidade dos saberes e prticas (PAIM, 1994). Nessa perspectiva, fazem-se necessrias algumas reflexes sobre aspectos conceituais, relativos natureza e historicidade dessas propostas. Diante das articulaes que se estabelecem entre as polticas sociais e a estrutura das sociedades, nas suas instncias econmica, poltica e ideolgica, cada formao social engendra, historicamente, o seu sistema de proteo social e as intervenes sanitrias (sade, saneamento bsico e meio ambiente, por exemplo), ainda que influenciada pelas relaes internacionais. Para Ianni (1997), em tempos de globalismo essas influncias tendem a crescer, no s pela atuao de organizaes vinculadas s Naes Unidas, como ocorreu no boom do capitalismo depois da segunda Guerra Mundial, possibilitando a expanso do Welfare State, mas, fundamentalmente, pela difuso da ideologia neoliberal e pelo poder das agncias multilaterais vinculadas ao capital financeiro (PAIM; VIEIRA DA SILVA, 2006). Consequentemente, a anlise e a comparao de polticas pblicas e de sistemas universais, integrais e equitativos, seja de sade, seja de saneamento, no podem deixar de considerar a historicidade dos mesmos. Assim, os modos pelos quais as sociedades identificam problemas e necessidades, buscam a explicao e se organizam para enfrent-los variam historicamente e dependem de determinantes estruturais econmicos, polticos e ideolgicos (PAIM, 2002). No caso particular do saneamento bsico, a reflexo e a anlise da incorporao de noes como universalidade, equidade e integralidade, para fundamentar polticas pblicas, demanda, preliminarmente, a identificao de dois vetores para o estudo do seu desenvolvimento histrico: o sanitarismo e os sistemas de proteo social. Portanto, antes de procedermos a uma reviso crtica das noes acima mencionadas, apresentaremos, de modo sumrio, a constituio desses dois vetores. O sanitarismo, embora surgido em sociedades capitalistas, com predomnio do liberalismo econmico e poltico no sc. XIX, defendia a interveno do Estado, particularmente nos problemas que os indivduos e a iniciativa privada no fossem capazes de resolver. Representa um movimento ideolgico que tem como marcos o Relatrio Chadwick, na Inglaterra, e o Relatrio Shattuck, nos EUA. Os reformadores sociais de ento propunham uma legislao sanitria e o saneamento do meio, para o enfrentamento de epidemias e da morbi-mortalidade, constituindo as bases do que se reconhece como Sade Pblica (PAIM, 2006b). Apesar de os livros de Sade Pblica geralmente mencionarem um conjunto de aes sobre o ambiente e sobre coletivos humanos desde a Antiguidade, tais como os banheiros pblicos e esgotamentos sanitrios em Roma (ROSEN, 1994), estas aes no chegam a configurar o iderio de um movimento ideolgico e poltico, at a emergncia do modo de produo capitalista. Na realidade, desde Hipcrates, as condutas preventivas se confundem com as aes coletivas, em defesa da sade e no controle de doenas (ROSEN, 1979, 1994), mas isto no significa a conformao de organizaes, polticas e normas legais que conferissem institucionalidade a tais intervenes. Assim, o campo da Sade Pblica que se vem desenvolvendo, desde a passagem do feudalismo para o capitalismo e, especialmente, a partir da Revoluo Industrial, sofre as influncias de determinantes sociais e passa por recomposies, em funo de novas relaes entre a sociedade e o Estado. Nesse contexto, a sociedade europeia foi atravessada por um conjunto de movimentos ideolgicos e sociais que, aliados ao poltica e produo de conhecimentos, influenciam a conformao da Sade Pblica hegemnica.

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Sob as influncias das ideologias liberais o sanitarismo, nas suas origens, estabelecia intervenes especficas, via Estado, sobre a populao e o meio ambiente, contando com a participao da iniciativa privada. Por exemplo, quando Snow investigou a epidemia de clera em Londres entre 1849 e 1854,a gua contaminada era distribuida por duas empresas privadas: a Lambeth e a Southwark-Vauxhall (MACMAHON et al., 1969). Em contraposio ao liberalismo, emergiu das lutas sociais da Frana e da Alemanha no sc. XIX o movimento da medicina social, que destacava o carter social das doenas e das epidemias, apoiada nos seguintes pressupostos: a sade do povo um objeto de inequvoca responsabilidade social; condies econmicas e sociais devem ser submetidas investigao cientfica; medidas para promover a sade e combater a doena devem ser sociais e mdicas (ROSEN, 1979). Se as doenas eram produzidas socialmente, caberia sociedade organizada responder pela sua preveno e controle, alm da assistncia. E o Estado democrtico representaria, por excelncia, essa ao social organizada. Tratava-se, portanto, de uma ampla interveno estatal, ao ponto de um cientista e militante do porte de Rudolf Virchow considerar que a poltica seria a medicina em larga escala (ROSEN, 1979). No Brasil, o reconhecimento do saber cientfico sobre o saneamento desenvolvido na Europa, a partir de meados da dcada de 1850, quando se verificou a participao da gua na transmisso de doenas, possibilitou a adoo de medidas de saneamento bsico. A epidemia de clera no Rio de Janeiro, capital do Imprio, levou construo de uma rede de esgotos, quando apenas as capitais europias Londres e Paris dispunham de sistemas coletores. Nessa iniciativa, o governo imperial contratava servios para a instalao da rede de esgotamento sanitrio, podendo conceder, empresa contratante, o privilgio de explorao desses servios. Desse modo, estavam lanadas as bases para a explorao capitalista do saneamento bsico no Pas, apesar da defesa da concepo de saneamento como um conjunto de aes de Sade Pblica (NAJAR; FISZON, 1989, p.154). Ainda que a ideologia liberal dominante na poca admitisse a ao supletiva do Estado naquilo que o individuo e a iniciativa privada no fossem capazes de atuar efetivamente, o estmulo de explorar economicamente o servio de saneamento, por empresas, no seria estranho s funes de um Estado capitalista que ento se estruturava. Paralelamente a essas intervenes sanitrias, os pases europeus foram desenvolvendo sistemas de proteo social que sofriam, tambm, as influncias de determinantes econmicos, polticos e ideolgicos de cada sociedade. Assim, nos pases em que prevalecia o liberalismo, instituiu-se um sistema de proteo social, baseado na assistncia, dirigido fundamentalmente aos pobres que, para tanto, precisavam provar a sua situao de carncia e no, necessariamente, a condio de cidados. Este tipo de proteo social, ainda vigente em muitos pases, conhecido como residual, correspondendo a uma cidadania invertida. Nesse caso, no caberia considerar noes como universalidade, equidade e integralidade. No final do sc. XIX teve incio na Alemanha o sistema de proteo social, conhecido como seguro social, no qual trabalhadores, empresrios e o Estado contribuiriam para a proteo dos indivduos em casos de morte, aposentadorias, acidentes e doenas. O acesso a tais benefcios dependeria da contribuio prvia dos usurios, de modo que este tipo de sistema de proteo social denominado de meritocrtico. Admite uma cidadania regulada, sendo que o acesso aos benefcios no universal, nem se baseia na integralidade e na equidade, mas no mrito da contribuio. Enquanto os direitos civis passaram a ser reconhecidos no sc. XVIII e os direitos polticos no sc. XIX, no sc. XX foram se afirmando em vrios pases os direitos sociais. O Relatrio Beveridge, apresentado em 1942 na Inglaterra, representa um marco para as polticas pblicas de carter universal e uma das referncias para a conformao dos Welfare State. A partir de ento, configura-se um terceiro tipo de sistema de proteo social, conhecido como Seguridade Social. Supe a solidariedade da sociedade para a

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sua manuteno, de modo que o seu financiamento tem origem nos impostos coletados de todos. Apresenta um carter institucional e o acesso aos seus benefcios inerente condio de cidadania (GIOVANELLA et al., 2008). Nesse particular, a universalidade e a integralidade passam a ser noes contempladas para a sua caracterizao e, num momento ulterior, ganha espao a noo de equidade. No caso da sade, pases desenvolvidos tm lidado com distintos projetos de reforma, que se movem em diversas direes. No final da dcada de quarenta, destaca-se a criao do National Health Service (NHS) no Reino Unido, considerada a reforma mais ampla de carter universal e natureza estatal num sistema de sade de pas capitalista. Entretanto, desde a crise do capitalismo do incio da dcada de 70, observam-se repercusses no Welfare State (BEHRING, 1998; PAIM, 2002). Houve tentativas de retrocesso contra o NHS, na poca de Margareth Thatcher, quando tentou privatiz-lo e introduziu mecanismos de competio no interior da gesto pblica. A Itlia, cuja Reforma Sanitria arrastava-se desde 1948, quando foi reconhecido o direito sade, teve a sua lei do Sistema Nacional de Sade aprovada trinta anos depois (BERLINGUER et al., 1988). Contudo, pases como Espanha e Portugal, que passavam por processos de redemocratizao, desenvolveram propostas mais progressistas (ALMEIDA, 1995; JUAN, 1995). Na Amrica do Norte, alm da reforma do sistema de sade canadense, surgiu, no primeiro governo Clinton, uma proposta de reorganizao dos servios de sade, para assegurar a ampliao do acesso, mantendo a lgica individualista e de mercado (DUSSAULT, 1995; QUINHES; FLEURY, 2005; UNITED STATES OF AMERICAN-USA, 1993). Na Amrica Latina, na dcada de 90, organismos internacionais, inspirados no Consenso de Washington, promoveram reformas setoriais nos pases, tendo o Chile e a Colmbia como referncias centrais (LABRA, 2002; HERNNDEZ, 2002; ORGANIZACIN PANAMERICANA DE LA SALUD-OPS, 2001; 2002). Apenas Cuba conseguiu manter o seu sistema de sade universal que, junto Costa Rica, apresentava a maior proporo de gasto pblico (GIOVANELLA, 2003). Muitas das mudanas nas polticas sociais dizem respeito ao financiamento e prestao de servios. Inquritos realizados na Austrlia, Canad, Nova Zelndia, Reino Unido e Estados Unidos apontam diferentes problemas no desempenho dos servios. Assim, nos sistemas de sade universais aparecem as questes do financiamento, da administrao e das filas, enquanto nos EUA o problema maior o acesso (DONELAN et al., 1999). Mesmo nos pases com acesso universal e financiamento pblico, aumentam as presses econmicas para novas polticas governamentais que racionalizem os recursos e se observam dificuldades na continuidade da ateno (VAN DER HORST, 1992; WEIL, 1993). A partir do Relatrio da World Health Organization-WHO (2000), que avaliou o desempenho de 191 pases, estabelecendo um ranking entre os mesmos, verificou-se um debate intenso em relao a esta temtica (ALMEIDA et al., 2001; BRAVEMAN et al., 2001; MURRAY; FRENK, 2001; NAVARRO, 2000; NORD, 2002). Grande parte das reaes decorreu do resultado artificial da avaliao, com base em um indicador global do desempenho do pas, que correspondia sntese de outros indicadores referentes a trs dimenses do sistema: a efetividade, a justia no financiamento e a responsividade. Esta palavra corresponde a um anglicismo derivado de responsiveness, uma noo introduzida na literatura tcnico-cientfica, a partir do relatrio da WHO (2000). Diz respeito capacidade do sistema em responder s expectativas da populao (PAIM; VIEIRA DA SILVA, 2006). A comparao feita entre pases com diferentes histrias, contextos, valores e sistemas de sade (NORD, 2002) e a constatao de inconsistncias conceituais, polticas (NAVARRO, 2000) e metodolgicas (ALMEIDA et al., 2001), em relao aos trs componentes utilizados, reforaram a crtica a tal avaliao. Alm disso, nesse debate pouca nfase foi concedida aos determinantes histricos e estruturais que incidiram na configurao dos diferentes sistemas.

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O Brasil construiu, ao longo das ltimas dcadas, seu prprio caminho a Reforma Sanitria Brasileira (RSB) no qual o setor Sade integra a Seguridade Social, juntamente com a Previdncia e a Assistncia Social. Justamente num perodo em que a ordem capitalista internacional e os respectivos Estados pareciam prescindir da legitimao advinda da implantao de sistemas universais e de implementao de polticas sociais, o Brasil tem resistido s presses internacionais, no processo de construo do Sistema nico de Sade (SUS) de carter universal e integral, conforme seu arcabouo legal (PAIM, 2008). Entretanto, a anlise concreta do "SUS que temos" parece indicar uma situao ainda muito distante da imagem de um sistema universal e integral, tendo em conta a segmentao existente entre o sistema pblico (SUS) e o privado (sistema de sade suplementar, ou planos de sade, e o sistema de desembolso direto), bem como a constatao de certa timidez na implantao de polticas intersetoriais. Assim, a implementao de um conjunto de reformas como a tributria, agrria e urbana, bem como a articulao de polticas sociais e ambientais, a exemplo da seguridade social, saneamento bsico e ambiente, ainda enfrentam grandes obstculos e desafios no sc. XXI.

1.3 QUALIDADE DE VIDA E DESENVOLVIMENTO, COMO REFERNCIAS PARA A FORMULAO DE POLTICAS PBLICAS BASEADAS NA UNIVERSALIDADE, EQUIDADE E INTEGRALIDADEQuando tematizamos o saneamento bsico e discutimos qualidade de vida, sade e cidadania, como posto pelo Plansab, temos que analisar polticas pblicas e sistemas prestadores de bens e servios, capazes de influir sobre o modo de viver dos grupos humanos. Implica compreender as suas diversas dimenses e explicar os determinantes sociais, ambientais e culturais da qualidade de vida e da sade. Como essas questes no dependem exclusivamente de respostas individuais, nem se restringem aos aspectos naturais fsicos, biolgicos e ecolgicos , impe-se uma reflexo preliminar sobre as polticas de Estado e desenvolvimento. No entanto, no caso do saneamento, as polticas tm sido caracterizadas mais como polticas de governos do que como polticas de Estado:O primeiro Plano Nacional de Saneamento foi elaborado em 1953 (trata-se do Primeiro Plano Nacional de Financiamento para Abastecimento de gua), lanando a proposta de um arcabouo institucional que desse respaldo financeiro aos municpios, sem ser implantado (...). Somente na dcada de 60, com a passagem da competncia da formulao poltica e financeira do saneamento bsico para o BNH (Banco Nacional de Habitao), foram criadas condies para a implementao do Plano Nacional de 1 Saneamento, em 1971 (NAJAR; FISZON, 1989, p.146) .

Contudo, essas polticas, ainda que tenham origem em governos, podem ser capazes de ultrapass-los, adquirindo certa permanncia, institucionalidade e sustentabilidade. Este pode ser o caso do Plano Nacional de Saneamento Bsico Plansab, sobretudo quando se considera que, entre as diretrizes da Poltica Federal de Saneamento Bsico, encontra-se a melhoria da qualidade de vida e das condies ambientais e de sade pblica (art. 48, inciso V da Lei no 11.445/07). Uma interveno constituda pelo conjunto dos meios (fsicos, humanos, financeiros, simblicos) organizados em um contexto especfico, em um dado momento, para produzir bens ou servios, com o objetivo de modificar uma situao problemtica (CONTANDRIOPOULOS et al., 1997, p.31). No caso do saneamento bsico, as aes propostas nos mbitos do abastecimento pblico de gua, esgotamento sanitrio, manejo de resduos slidos e drenagem e manejo de guas pluviais, ao requererem transversalidade em relao a outras polticas pblicas correlatas, envolvem uma interveno complexa, a requerer um marco conceitual de referncia capaz de facilitar o dilogo e a pactuao com outras polticas1

Para uma reviso histrica sobre o tema do saneamento desde o Brasil Colnia ao final do sc. XX ver Cynamon et al. (1992).

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pblicas e setores governamentais. Interessa nessa discusso certo entendimento sobre sistemas universais e integrais, alm da avaliao das intervenes voltadas para a resoluo de problemas e para o atendimento de necessidades no redutveis a problemas, como o caso do ideal correspondente qualidade de vida. Usualmente, as intervenes sanitrias realizadas pelas polticas pblicas tm como propsito resolver problemas como doenas, riscos, carncias, etc. Entretanto, tais problemas representam uma leitura reducionista e negativa de necessidades humanas. Se estas forem pensadas para alm de problemas, danos ou riscos, elas podem contemplar projetos ou ideais de modos de vida. Presentemente, quando so formuladas polticas pblicas voltadas para a qualidade de vida, por exemplo, trata-se de um ideal que no se confunde com problema. Direitos sociais ou projetos de felicidade podem ser objetos de polticas pblicas, numa dimenso positiva e no negativa, como o caso das doenas, carncias e riscos. Esta noo de qualidade de vida, propositadamente colocada em aspas neste pargrafo, precisa ser definida no mbito dos Cadernos Temticos, ainda que no necessariamente neste texto. Tratando-se de uma iniciativa que tem como preocupao bsica sistematizar a produo de conhecimentos para a formulao de polticas, caberia um trabalho terico para transformar essa noo em conceito (prtica terica). O rigor conceitual exigido para tal esforo poderia evitar tratar tal questo na perspectiva do senso comum, alis como tem sido muitas vezes verificado no discurso mdico, na mdia e na publicidade. Mesmo reconhecendo a inteno de buscar certa convergncia para uma dada poltica, qualidade de vida pode ser um mote ou mesmo uma imagem-objetivo, mas no uma soluo para a questo tericoconceitual. A polissemia que contamina esta noo pode produzir, sem o trabalho terico mencionado, mais confuso do que consenso. Do mesmo modo, no havendo um acordo quanto a sua conotao, nem onde se pretende chegar, as estratgias e atividades propostas podem ser inconsistentes e/ou antagnicas. Finalmente, mais difcil ainda seria identificar os indicadores para o monitoramento e a avaliao. s vezes se confunde qualidade de vida com outros conceitos e noes correlatos, tais como: condies de vida, estilo de vida, modo de vida, padro de vida, etc. (MINAYO et al., 2000). Como algumas dessas expresses podem representar variveis utilizadas em modelos explicativos (PAIM, 1994; POSSAS, 1989) do prprio fenmeno que se quer enfatizar com o termo qualidade de vida, tornam-se necessrias as respectivas definies, especialmente no estabelecimento de prioridades. Esse processo de definio de prioridades, por sua vez, no se reduz a uma questo tcnica ou cientfica. Trata-se de uma definio poltica e, como tal, requer regras e prticas democrticas pautadas em valores ticos e escolhas que implicam argumentos e discusses na esfera pblica. No caso do desenvolvimento, faz-se necessrio discuti-lo para alm de programas de acelerao do crescimento. O desenvolvimento no se resume ao crescimento econmico ou acumulao capitalista. Vincula-se a um projeto de nao e, portanto, deve ser integral e sustentvel, contemplando as dimenses econmicas, polticas, sociais, culturais e ambientais. Conseqentemente, no momento do ciclo das polticas pblicas em que se privilegia a formulao cabe indagar: qual desenvolvimento? para que? para quem? como dirigir o crescimento econmico, garantindo a incluso social e uma melhor distribuio da riqueza? como adotar um modelo de desenvolvimento que no deteriore o meio ambiente, nem sacrifique as geraes futuras dos seres vivos, especialmente os humanos? Considerar a qualidade de vida na formulao de polticas pblicas representa uma oportunidade de discutir sobre os modos de viver na nossa sociedade e o papel do Estado nesse contexto, e tambm de perguntar sobre condies de vida e estilos de vida a que esto sujeitos os segmentos sociais, alm das

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questes biolgicas, ecolgicas e assistenciais. E se pensamos na qualidade de vida, as instituies que atuam nas reas afins no podem ficar insuladas. Nesse particular, adquirem grande relevncia as polticas pblicas saudveis que tomam a qualidade de vida, a partir de uma definio mais precisa, como referente central para a formulao de polticas econmicas e sociais (PAIM, 2003). Caberia rever um conjunto de polticas econmicas e sociais no sentido de atender necessidades, prevenir riscos sade e de promover a qualidade de vida das pessoas e das comunidades. No caso do saneamento bsico, desde a criao do Plano Nacional de Saneamento PLANASA, foi dada nfase na auto-sustentao financeira cujos investimentos privilegiaram reas com maior poder aquisitivo, em detrimento das demais, a fim de obter melhores condies de retorno das aplicaes efetuadas. Face escassez crnica de recursos para o saneamento bsico, o clientelismo poltico representava outro vetor para a escolha das reas de atuao da Fundao SESP, responsvel pelas intervenes numa poltica de municipalizao (NAJAR; FISZON, 1989). Ainda que existissem recursos para investimento em reas centrais de cidades inseridas no polo dinmico da economia, os autores citados destacavam certa carncia em outros municpios. Embora a atuao da FSESP nos municpios no possa ser confundida com municipalizao, o uso de aspas para tal expresso no pargrafo anterior pretendeu indicar que no se tratava de uma municipalizao verdadeira:Em fins de dos anos 60 os servios de saneamento no Brasil eram bastante deficientes e alguns poucos centros urbanos respondiam pela quase totalidade dos sistemas existentes. A concentrao dos servios era to elevada, que estima-se em 40% da populao urbana brasileira que tinha acesso ao abastecimento de gua adequado em 1967 (NAJAR; FISZON, 1989, p.146).

Mesmo com a maior quantidade de recursos alocada, tendo como fonte o FGTS h quatro dcadas atrs, o saneamento bsico ficou atrelado aos interesses do desenvolvimento de infraestrutura, ficando em segundo plano adequar a sua expanso, no sentido de promover melhorias sanitrias ou proteo ambiental (NAJAR; FISZON, 1989, p.146). Alm disso, a multiplicidade de rgos pblicos federais, estaduais e municipais, bem como organizaes e empresas privadas, dificultava um direcionamento da poltica. Antes da Constituio de 1988, s em relao gesto da gua, havia 13 ministrios envolvidos (NAJAR; FISZON, 1989). Portanto, para o equacionamento dessa descoordenao, seria necessria uma articulao interinstitucional e intersetorial, com uma gesto mais compartilhada entre ministrios, secretarias, rgos dos governos e organizaes no governamentais (ONGs), no sentido de melhor atingir as suas finalidades. Nesse contexto, a intersetorialidade representa uma diretriz estratgica. Significa, em palavras simples, trabalhar juntos para alcanar resultados melhores. Em linguagem tcnica, quer dizer combinao de recursos para obter eficincia, eficcia e efetividade. Portanto, cumpre aproveitar a oportunidade de a sociedade expressar qual desenvolvimento deve ser compatvel com a melhoria da qualidade de vida e, assim, contribuir para formulao de polticas pblicas saudveis, com carter intersetorial e voltadas para a sua promoo da sade. o caso, por exemplo, da Lei no 8080/90 quando reconhece, no art. 3o que, A sade tem como fatores determinantes e condicionantes, entre outros, a alimentao, a moradia, o saneamento bsico, o meio ambiente, o trabalho, a renda, a educao, o transporte, o lazer e o acesso a bens e servios essenciais (CONASS, 2003). No mbito do saneamento, o Projeto de Lei Complementar no 199, desde 1993, propunha uma Poltica Nacional de Saneamento e um Fundo Nacional de Saneamento - Fusan, ampliando o conceito de saneamento e introduzindo as idias de saneamento ambiental e de salubridade ambiental, alm de apontar para uma possvel articulao entre os setores de desenvolvimento urbano e sade (COSTA, 1998).

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Entretanto, o veto do Executivo ao PLC 199, inviabilizou a experimentao, na dcada passada, de uma poltica intersetorial. Novas perspectivas, porm, surgem com a Lei no 11.445, sancionada em 5 de janeiro de 2007, contemplando os seguintes elementos:a) abastecimento de gua, esgotamento sanitrio, limpeza urbana e manejo dos resduos slidos, realizados de formas adequadas sade pblica e proteo do meio ambiente; b) disponibilidade, em todas as reas urbanas, de servios de drenagem e de manejo das guas pluviais, adequados sade pblica e segurana da vida e do patrimnio pblico e privado; c) adoo de mtodos, tcnicas e processos que considerem as peculiaridades locais e regionais; d) articulao com as polticas de desenvolvimento urbano e regional, de habitao, de combate pobreza e de sua erradicao, de proteo ambiental, de promoo da sade e outras de relevante interesse social voltadas para a melhoria da qualidade de vida, para as quais o saneamento bsico seja fator determinante.

Com efeito, o saneamento bsico, o meio ambiente e o acesso a bens e servios essenciais podem ser considerados determinantes e condicionantes da qualidade de vida e da sade, isto , determinantes sociais. Essas proposies, ainda que tenham sido desenvolvidas, originalmente, no mbito das polticas sociais e do setor sade, em particular, apresentam grande potencialidade no dilogo com setores afins. Assim, a perspectiva do presente texto , tambm, contribuir para esse dilogo intersetorial, examinando as possibilidades e limites da sua utilizao no Plano Nacional de Saneamento Bsico Plansab. H quase quarenta anos vm sendo realizados no Brasil estudos epidemiolgicos, apontando as desigualdades na distribuio espacial de mortes e doenas, bem como suas relaes com as condies de vida, especialmente o saneamento, a educao e a renda. Portanto, muito antes de o tema ser objeto de comisses, redes e grupos de pesquisas internacionais, j se produziam no pas conhecimentos capazes de fundamentar a reorientao de polticas pblicas, econmicas e sociais. Nesse sentido, a concretizao dos princpios e diretrizes da universalidade, equidade e integralidade representam grandes desafios postos para o Estado, diante de uma sociedade to inqua como a brasileira.

1.4 UNIVERSALIDADEA ideia de universalidade tributria de certa noo de igualdade, quando se defende o acesso de todos aos bens e servios produzidos na sociedade. Est presente no lema da Revoluo Francesa (Liberdade, Igualdade e Fraternidade) e nas promessas dos socialistas utpicos. Ainda que os tericos marxistas questionassem a igualdade formal, estabelecida na superestrutura jurdico-poltica de diversos pases aps a revoluo burguesa, as possibilidades de a luta poltica dos sujeitos defenderem a igualdade real propiciaram certos ganhos para as classes subalternas, atravs de reformas (GRUPPI, 1980). Como se observou no tpico 1.2 deste Caderno, sistemas de proteo social de carter universal ou polticas pblicas universais, a exemplo de sade e educao, desenvolvem-se nas sociedades capitalistas, a partir da emergncia do chamado Estado de Bem-Estar Social, especialmente nos anos cinquenta e sessenta do sc. XX. Antes disso, experincias desse tipo s haviam ocorrido nos pases socialistas. Assim, o tipo de sistema de proteo social, conhecido como Seguridade Social, difunde-se especialmente at a dcada de setenta, quando a crise do petrleo e a ampliao dos gastos sociais serviram de justificativas para a conteno da interveno do Estado na economia e nas polticas sociais.

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Nessa mesma poca organizaes vinculadas ao sistema das Naes Unidas promoveram a Conferncia Internacional de Cuidados Bsicos de Sade, realizada em Alma-Ata na Unio Sovitica, divulgando uma famosa Declarao que defendia o direito sade e a ateno primria com o lema Sade para Todos no ano 2000. Esta incorporao do princpio da universalidade foi ratificada, em 1979, pela Assemblia Mundial da Sade, oportunidade em que os pases membros se comprometeram com as estratgias da SPT-2000 (PAIM, 2002). No Brasil, embora no tenha implantado o Welfare State, disps, desde a era Vargas, de um seguro social para trabalhadores urbanos, atravs dos Institutos de Aposentadoria e Penses, por categorias profissionais (IAPC, IAPI, IAPB, IPASE, IAPM, IAPETEC, etc.). Em 1966, esses institutos, com exceo do IPASE, foram unificados no Instituto Nacional de Previdncia Social (INPS) e, aps a criao do Ministrio da Previdncia e Assistncia Social e a incluso de trabalhadores rurais na dcada de setenta, foi institudo o Sistema Nacional de Previdncia e Assistncia Social (SINPAS), com um destaque para o INPS, exclusivamente voltado para os benefcios, e o INAMPS, responsvel pela assistncia mdica previdenciria (PAIM, 2003a). Possivelmente influenciado pela Declarao de Alma-Ata e pela SPT-2000, o Brasil implantou programas de extenso de cobertura de servios de sade (PECs), como os programas de assistncia integral sade da mulher e da criana (PAISM e PAISC). Entre os PECs implantados no Brasil, destaca-se o Programa de Interiorizao das Aes de Sade Saneamento do Nordeste (PIASS), a partir de 1976. Na dcada de oitenta, essas iniciativas se ampliaram, atravs da estratgia das Aes Integradas de Sade (AIS) e dos Sistemas Unificados e Descentralizados de Sade (SUDS), que incorporaram segmentos da populao excludos dos servios de sade, tendo em conta os princpios da universalidade e integralidade (PAIM, 2003a, 2008). Em vez de um Estado de Bem-Estar Social, o Brasil teve, como contrapartida, um Estado desenvolvimentista, que permitiu a ampliao de benefcios e servios, atravs da Previdncia Social (FIORI, 1995). Este sistema de proteo social aproximava-se ao tipo correspondente ao seguro social. No entanto, com a proposta de criao do Sistema nico de Sade (SUS), em 1979, pelo movimento de democratizao da sade, durante o 1o Simpsio de Poltica Nacional de Sade, promovido pela Comisso de Sade da Cmara dos Deputados, e com a realizao da 8 Conferncia Nacional de Sade (8 CNS), em 1986, a universalidade tornou-se um princpio com ampla aceitao da sociedade. No documento intitulado Pelo Direito Universal Sade, apresentado pela Associao Brasileira de PsGraduao em Sade Coletiva, foram revisadas questes terico-polticas e recuperados princpios e diretrizes do movimento pela democratizao da sade. Propunha que a sade deveria ser vista como "fruto de um conjunto de condies de vida que vai alm do setor dito de sade" (ASSOCIAO BRASILEIRA DE PS-GRADUAO EM SADE COLETIVA-ABRASCO, 1985, p.8), questionando a concepo de desenvolvimento, que desligou a dimenso econmica da social. Defendeu a participao popular na poltica da sade, bem como o controle da sociedade sobre o aparelho estatal e no ignorava a profunda crise da economia mundial a partir da segunda metade da dcada de setenta, identificando a seguinte conseqncia:Ressurgimento de teorias e polticas de cunho neo-liberal, que lutam pela derrocada das polticas estatais identificadas com o Estado de Bem-Estar Social, j que vem nestas medidas um fator de aumento da crise fiscal do Estado (ABRASCO, 1985, p.14).

Reconhecia a sade como funo pblica, advogando que a mesma fosse uma concesso do Estado, embora j visualizasse movimentos contrrios a tal proposio naquela conjuntura:[...] A ampliao das companhias seguradoras privadas, tanto multinacionais como subsidirias do capital financeiro de grandes bancos, configura a emergncia de um

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poderoso aliado de projetos contrrios reorientao mais radical da poltica de sade do Estado, no sentido da universalizao, equidade e democratizao (ABRASCO, 1985, p.33).

Contudo, somente com a Constituio de 1988 foi possvel incorporar os direitos sociais ligados condio de cidadania, absorvendo o modelo da Seguridade Social, composta por trs elementos: sade, previdncia e assistncia social. Nesse contexto foi incorporado o princpio da universalidade, para um conjunto de polticas pblicas, a exemplo da sade, quando foi reconhecida como direito de todos e dever do Estado (BRASIL, 2002). Antes de a Constituio completar dois anos de existncia, o Governo Federal criou o Instituto Nacional de Seguro Social (INSS), cuja prpria denominao sinalizava para a subverso da concepo de Seguridade Social. As reformas da previdncia subseqentes contriburam para implodir a Seguridade Social criada pela Carta Magna2. Entretanto, s depois de indicar a relevncia das polticas econmicas e sociais para a