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PALOTINA: COLONIZAÇÃO, VIVÊNCIAS E EXPECTATIVAS DOS COLONOS ENVOLVENDO OS CONFLITOS POR TERRAS (1954-1979)
Gabriela Thaís Mattia da Silva
UNIOESTE – Universidade Estadual do Oeste do Paraná
RESUMO
Este trabalho possui como recorte temporal os anos entre 1954 e 1979, pois foi o período em que teve início a colonização de Palotina, atraindo imigrantes de outros estados, que adquiriram por meio de compra terras ou as ocuparam como posseiros, ou vieram em busca de trabalhos temporários. A minha problemática surgiu a partir do incômodo ao perceber ausência de outros sujeitos que não os chamados pioneiros na constituição da história vista como “oficial”. Além da ausência dos sujeitos na história, a minha pesquisa também está focada na desnaturalização do sentido da colonização. Para tal, uma das principais fontes que utilizo é o livro do memorialista Pe. Pedro Reginato (História de Palotina 1954/1979). O objetivo é contrapor a ideia de colonização pacífica defendida pelo memorialista, problematizando os conflitos por terras a partir do processo judicial envolvendo a Sociedade Vicente Pallotti e Sabino Pergentino Delai (Autos de nº43/60 registrado a folhas 01 do livro número 02 de 28 de março de 1956). O estudo de caso procura evidenciar que o processo de ocupação/colonização engendrou na região oeste do Paraná, inúmeros conflitos agrários. Tais conflitos relacionados foram marcados por confrontos diretos pessoais, coletivos e por meio do acionamento do poder judiciário.
Palavras Chave: Colonização; Conflito; Processo Judicial; Terra.
1. Introdução
Na historiografia regional destaca-se a presença de uma interpretação
sobre a ocupação da terra, que se coaduna com matérias da imprensa regional,
como pacífica e harmônica. Neste sentido, em revistas e jornais que circulam na
cidade de Palotina, é possível estabelecer uma delimitação da elaboração
destas representações sociais acerca da ocupação e colonização, bem como
delas como uma das dimensões constitutivas da formação dos municípios no
Oeste do Paraná, mas que, ao mesmo, tempo são reveladoras de conflitos pela
terra, desnudando o discurso de colonização.
Se as representações sociais de afirmação da colonização propalavam
ideais de progresso, a fertilidade das terras e a bravura dos imigrantes frente à
“selva perigosa”, centralizadas no colonizador, que, nas narrativas, via-de-regra,
é o herói que enfrentou a tudo e venceu pela bravura e pelo trabalho, os conflitos
no judiciário pela terra são indícios de outros tipos de relações, as conflituosas,
de disputas e de confrontos.
Neste sentido, esta pesquisa, na contraposição da heroicização do
passado, dos agentes colonizadores e colonos, e de uma interpretação
memorialista e de parte da historiografia de interpretação de colonização como
pacífica e até harmoniosa, possui como objetivo ampliar o debate sobre a
ocupação e colonização. Neste viés centra-se no estudo das relações que
envolveram as disputas e a apropriação das terras como dimensão no processo
de constituição do município de Palotina.
Para tal, delimitamos como marco temporal o interim entre os anos de
1954 e 1979, por ser o período em que se iniciou a colonização de Palotina e,
também, por ser neste período que cresce rapidamente o número de
trabalhadores vindos de outros estados, tanto em busca de trabalhos
temporários, como no ciclo da hortelã, quanto em busca da compra de terras,
neste caso, em sua maioria de colonos.
A minha problemática de pesquisa foi tecida a partir do meu incômodo ao
perceber a ausência de outros sujeitos, que não os chamados pioneiros, na
constituição da história vista como “oficial”. E é possível verificar essa ausência
nos jornais da cidade, em revistas e eventos comemorativos do Município de
Palotina, que não dão conta da história da multiplicidade de sujeitos que
ocuparam e teceram relações diversas na formação agrária local, mostrando
apenas os migrantes descendentes de italianos e alemães. Á uma escolha
seletiva para a afirmação dos reconhecidos como propulsores da construção
socioeconômica e política do Município.
Esta seletividade possivelmente tenha relação com o processo de
ocupação do espaço que compreende hoje o município de Palotina, situado no
extremo oeste paranaense, através da articulação entre instâncias de ordem
econômico-empresarial e religiosa. Neste sentido, elegemos um estudo de caso
sobre um processo de litígio de terras, envolvendo a Sociedade Vicente Pallotti
e um descendente italiano vindo do sul, chamado Sabino Pergentino Delai. Este
caso ocorreu em uma área chamada Gleba Maracaju, localizada no município
de Terra Roxa, lembrando que neste período, tanto Terra Roxa quanto Palotina
eram vilas pertencentes ao município de Guaíra.
Em 28 de março de 1956, a Sociedade Vicente Pallotti instaurou um
processo de manutenção de posse contra Sabino Pergentino Delai (Autos de nº
46/60 registrado as folhas 01 do livro nº 02 de 28 de março de 1956), que ocorreu
durante a colonização recente, dirigida pela Fundação Paranaense de
Colonização e Imigração (FPCI). A partir deste processo, e de outras fontes,
evidencia-se um processo de disputas por terras no processo de colonização por
terras, como fundamento da constituição do município de Palotina.
2. A Colonização e as Disputas por Terras
“Como as terras situadas na Serra Maracaju
são férteis e ótimas para cultura, sempre há quem a
elas volte seus olhos, cheios de cobiça, procurando um
meio para tornar-se proprietário.”
A partir deste trecho retirado da petição inicial presente nos Autos de
Manutenção de Posse (reg. A fls 1 do livro nº2 sob o número43/60, autuação dia
28 de março de 1956), podemos concluir que o período de colonização não foi
marcado por uma ausência de conflito. A escolha deste processo, vem no
sentido de contrapor a ideia de colonização “pacífica”, procurando demonstrar,
por meio de evidências contidas no processo judicial, que houveram de fato
conflitos relacionados a terra e que a justiça foi uma das alternativas encontradas
pelas pessoas para recorrerem aos seus direitos sobre a terra, mas sabemos
que muitas pessoas recorriam à outros meios, como, por exemplo, a contratação
de jagunços. Além disso, possibilita também evidenciar os desencontros, os
conflitos e confrontos existentes em uma área de fronteira.
Ao lidar com essa fonte, pretende-se explicitar como os colonos que
perdiam suas terras, seja para o Estado, para latifundiários ou instituições,
lidavam com isso sabendo que um processo judicial era demorado e suas
necessidades de resolverem seus problemas eram imediatas. Neste cenário,
outros sujeitos entram em ação, resultando em conflitos entre posseiros e
jagunços contratados por latifundiários ou empresas colonizadoras.
A escolha deste processo também se deu por conter narrativas e ele
próprio se constituir como contraposição a ideia de colonização “pacífica”,
harmoniosa. A partir de evidências contidas no processo procuramos explicitar
conflitos relacionados à terra, não só no município de Palotina, como em toda
região oeste do Paraná.
Convém frisarmos que nenhum trabalho abrangendo o extremo oeste do
Paraná e, em especial, ao território que compreende hoje o município de Palotina
foi produzido a partir de nossas proposições. A bibliografia que analisa
especificamente a colonização do município é restrita genericamente de
conteúdo apologético e ufanista. A maioria delas constitui-se de “histórias
municipais”. Destacamos, entre as quais, a obra comemorativa citada
anteriormente, referente aos 25 anos de fundação do município, chamada
“História de Palotina (1954-1979)”, do memorialista Pe. Pedro Reginato.¹
Todas, em geral, descrevem o histórico da cidade, enfocando episódios e
personagens que se destacaram principalmente pela liderança religiosa. É
importante frisar que o município de Palotina não foi, ainda, objeto de análise
mais profunda. Esse é o interesse a partir desta pesquisa.
No entanto, a ideia é construir um conhecimento fora dos paradigmas
tradicionais. Neste escopo, situamos algumas pesquisas que tratam das
questões relacionadas à ocupação oeste do Paraná, como a obra de
WACHOVICZ (1987) “Obrageiros, mensus e colonos”, a obra de Liliane Freitag
(2001)², e a monografia de Alaercio Freitag (2007)³.
Ao percebermos que o processo de colonização desse território se
inscrevia em uma conjuntura dinâmica, no qual se evidenciavam as articulações
de uma “[...] época histórica em que as experiências totalitárias demonstram um
forte apego à sacralização do político como instrumento de dominação [...]”
(LENHARO, 1988, p. 18), isso demandou a elaboração e a reelaboração de
noções, conceitos e categorias de análise, através do diálogo com as
evidências4. Ou seja, ao trabalharmos com uma questão situada nos e a partir
dos anos de 1930 e ao período do Estado Novo (Era Vargas), adentramos em
um campo permeado de construções simbólicas relacionadas à forte presença
do Estado como indutor da chamada “Marcha para o Oeste.”.
As leituras nos possibilitam entender que “[...] foi elaborado um projeto
político-ideológico extremamente bem articulado, que soube capitalizar os
acontecimentos, reforçar situações e, sobretudo, convencer da preemência de
uma nova ordem, centrada no poder do estado”. (VELLOSO, 1982). A partir
desse contexto, surgiram também outras questões, dentre elas, a presença de
um forte ideário nacionalista.
Neste contexto, ao trabalhar com um universo de evidências históricas
como caminho investigativo, é possível confrontar modos de lidar e interpretar a
realidade, o que nos permite identificar valores e interesses na visibilidade que
trazem sobre os chamados “pioneiros de Palotina” e a temporalidade em
questão. Em outros termos, assumindo os pressupostos de Milton Santos,
caracterizamos a área que compreende a nossa pesquisa como um espaço de
práticas sociais e individuais, organizada enquanto praxis coletiva, portanto,
como um lugar onde se produzem e reproduzem vivências, interesses, lógicas
de trabalho e produção, pois é um lugar de vida, e, nesse caso, testemunho de
uma história. E “[...] o espaço construído, o tempo histórico que se transformou
em paisagem, incorporado no espaço [...]” (SANTOS, 1980, p.138).
____________________
1 REGINATO, Pedro. História de Palotina 1954-1979. Santa Maria: Pallotti, 1979.
2 FREITAG, Liliane da Costa. Fronteiras Perigosas: migração e brasilidade no extremo-oeste
paranaense (1937-1954) Cascavel : Edunioeste, 2001.140p.
3 FREITAG, Alaercio da Costa. “Dai a César o que é de César..”: um caso do litígio pela terra
em Terra Roxa-PR (1953-1962). Marechal Cândido Rondon, 2007.
4 THOMPSON, E. P. A Miséria da Teoria ou um Planetário de Erros. Trad. Waltensir Dutra. Rio
de Janeiro: Zahar, 1981. 385p.
A proposta de fundação de um estado verdadeiramente nacional foi a
grande tônica do discurso político da época a qual nos dedicamos. Na óptica dos
teóricos do Estado, os escritores-funcionários naquele momento, instituíram um
novo começo histórico, uma nova ordem jurídico-política calcada na necessidade
da integração e do alargamento do território nacional. Esses intelectuais trataram
de construir a ideia de uma sociedade homogênea.
A partir dessas evidências iniciais, identificamos que, para o Estado, em
decorrência da presença de estrangeiros na fronteira extremo oeste do Paraná,
a segurança nacional estava ameaçada. Diante deste perigo, os governos da
federação e do estado do Paraná, delinearam a construção de uma sólida
consciência nacional, bem como de práticas para a defesa deste território.
Adentrar, especificamente, na política territorial do Estado Novo, foi uma
consequência lógica. Referimo-nos a Marcha para o Oeste entendendo-a como
resultado de uma elaboração discursiva dos teóricos comprometidos com a
legitimidade do regime político estadonovista e sua prática. Essa política
territorial foi um precioso elemento para a compreensão da forma pela qual
ocorreu o processo de ocupação humana da fronteira extremo oeste do Paraná.
O recuo ao período histórico estudado é de extrema importância, pois
sentimos a necessidade de identificar as políticas no plano de segurança
nacional, no decorrer do processo de formação histórica do Brasil e, desta forma,
articular, ao passado, a integração do extremo oeste na década de 1930. Diante
disso, reconhecemos que o processo de ocupação territorial, ao qual nos
referíamos, procurava assegurar os domínios de uma área geográfica de
fronteira, que se encontrava aberta a infiltrações econômico-ideológicas como
também para contingentes populacionais.
A presença maciça de estrangeiros, como no caso dos argentinos,
proprietários de grandes extensões de terras denominadas obrages, que
absorviam uma vasta mão-de-obra, recrutada especialmente na Argentina e no
Paraguai, conhecida pelo termo mensu, passou a simbolizar a perda de um
pedaço do Brasil, pelos brasileiros.
Nos anos de 1940, a migração para o Oeste do Paraná contribuiu
fortemente para o domínio brasileiro na região. A colonização de área que
constituiria o município de Palotina foi estimulada por religiosos (padres
Palotinos), que integraram-se ao projeto colonizador da empresa colonizadora
Companhia Pinho e Terras Ltda, em uma dupla expansão econômica e religiosa.
O trabalho memorialista de Reginato (1979) nos permite compreender a forma
pela qual os Palotinos se estruturaram, respectivamente no Paraná e no Brasil.
O estudo de Marin (1994) é importante no que diz respeito ao projeto religioso
desse grupo, desde sua instalação no Brasil em 1888.
No tocante a atuação da Companhia Pinho e Terras Ltda., ela foi fundada
em 1946, com sede no município de Céu Azul – Pr, seu objetivo principal era a
compra e venda de terras, a extração, a exportação e o beneficiamento de
madeiras.
Rui de Castro, um dos acionistas da colonizadora Maripá e também da
Pinho e Terras, no ano de 1953, adquiriu da Companhia Brasileira de Viação e
Comércio (BRAVIACO) uma extensão de terra denominada Gleba Piquiri. Um
ano depois, a Pinho e Terras recebeu o direito de colonizar essa área. Sua área
de 25.310 alqueires deu origem ao espaço que compreende hoje o município de
Palotina.
Assim, já no ano de 1954, a Companhia trabalhava no processo de
abertura das estradas. Nesse ano, o contingente populacional era constituído
basicamente por trabalhadores da construção da infraestrutura, como as picadas
de acesso, as estradas, além de administradores e corretores contratados pela
empresa.
Já estavam definidos os critérios de colonização. Pelo fato de a empresa
possuir em seu quadro administrativo acionistas que também pertenciam a
Companhia Maripá, esse núcleo foi projetado de acordo com as mesmas
diretrizes empreendidas por essa última colonizadora.
O fato de a Pinho e Terras ter adquirido glebas descontínuas, encareceu
o trabalho de infraestrutura, e a necessidade de retorno imediato de lucros levou
a empresa a vender grandes áreas para madeireiras; a precariedade da
documentação em diversas áreas em que atuou veio dificultar o acerto de contas
entre ela e os compradores; muitas áreas foram objeto de ações judiciais entre
o Estado e as antigas concessionárias; as demandas entre o Estado do Paraná
e o Governo Federal, devido à faixa de fronteira, terminaram envolvendo a Pinho
e Terras em litígios.
Nessas áreas ocorreram conflitos entre os compradores de terras, as
madeireiras, especuladores e jagunços contratados pelas partes interessadas.
Em muitos casos, o Estado fez concessões a pessoas ou grupos econômicos
sem a devida documentação ou demarcação. Muitos colonos compravam essas
mesmas terras da Companhia, no entanto, quando requeriam a documentação,
a propriedade não era legítima. Frequentemente, muitos colonos e posseiros
eram expulsos de suas propriedades, outros, por não terem construído na
propriedade uma casa, perdiam seu direito de posse.
Para que os objetivos da empresa colonizadora Pinho e Terras fossem
alcançados, a mesma precisou fazer investimentos como, por exemplo, a
construção de uma infraestrutura local, com escolas, hospitais, igrejas, entre
outros. Mas também outros recursos se fizeram importantes como a escolha por
parte da empresa de um grupo seleto de corretores credenciados para atuarem
nessa colonização. Os selecionados foram os religiosos da Congregação
Palotina, ou seja, os padres que faziam parte da Sociedade Vicente Pallotti,
instituição esta que estava envolvida no processo de litigioso pela terra contra
Sabino Pergentino Delai.
Estes associaram-se então ao projeto colonizador da Companhia Pinho e
Terras Ltda., e foram os principais incentivadores da colonização da área que
compreende atualmente o município de Palotina. O que se sabe, é que
proporcionalmente a quantidade de colonos agenciados para a futura compra,
os padres recebiam em terras pelo agenciamento de compradores na Gleba
Piquiri, colonizada pela Pinho e Terras. A medida que os padres faziam esse
papel de trazer os colonos para cá a fim de efetuarem a compra de terras, estes
obtinham cada vez mais terras como forma de pagamento, aumentando assim o
patrimônio da Igreja.
No extremo oeste paranaense, os Palotinos arregimentaram colonos
sulistas, determinando os seus padrões comportamentais, seus códigos de
honra e de fé. O padre Hermogênio Borin, um dos principais responsáveis pelo
trabalho da colonização, em entrevista para o livro “História de Palotina, relatou
que:
Eu aproveitei a única oferta que Dom Manoel me deixou: permitindo que trouxéssemos colonos do Sul [...] O Sr. Alfredo Ruaro fez uma proposta aos Palotinos, que foi levada por mim ao Superior Provincial, Pe. Casemiro Tronco. E recebi licença de trabalhar por três meses na colonização. No mês de junho, havendo escrito ao provincial, muitas cartas pedindo a vinda do Pe. Rafael Pivetta, vê finalmente chegar o almejado que passa quieto por Toledo e se instala na colonização, para cuidar das terras da Congregação. (REGINATO, 1979, p.62)
O trecho da citação anterior nos leva a acreditar que era do interesse
destes padres comercializar o maior número de colônias possíveis, haja vista
que, como foi dito anteriormente, quanto mais comercializassem, maior seria a
comissão recebida. Dessa forma, os Palotinos e a Pinho e Terra Ltda.,
associaram-se em um trabalho de comércio de terras.
Nesse sentido, a política colonizatória levada a efeito em Palotina denota
a realização de um duplo desejo, tanto por parte da Congregação dos padres
quanto da Companhia Colonizadora, ou seja, fundar um núcleo católico e
maximizar os lucros. A situação pela qual passa o padre Borin, “a passagem de
ônibus ida e volta custou aos bolsos do Pe. Borin, vinte contos de réis
(20.000,00)”, indica as estratégias utilizadas para que seus objetivos fossem
alcançados. (REGINATO, 1979, p. 62).
Dessa maneira que as “vozes” que projetaram o incentivo à colonização
do espaço palotinense atuaram, incentivando a migração de descendentes de
europeus e principalmente, da religião católica. Diante disso, percebemos que a
construção do grupo entre os colonos se deu em torno do catolicismo. E, que os
valores religiosos operavam e determinavam grande parte do comportamento do
núcleo colonizatório. Logo, a vida sócio-política dos migrantes que ocuparam
esse espaço estava centrada na religião.
Assim, o prestígio e a liderança exercidos pelos padres e seu projeto
disciplinar orientavam e organizavam os indivíduos, normatizando-os e
regulando-os em todos os momentos das suas vidas, seja na família, na escola,
na igreja, no trabalho, no lazer, na política, nas relações sociais e na imprensa.
Somando-se a isso, a própria comunidade encarregava-se da vigilância,
preservando as normas e os valores da Igreja Católica. O projeto dos Palotinos
atingiu todos os níveis da sociedade, em uma relação de interdependência e de
continuidade.
Com o objetivo de redefinir os valores e corrigir as práticas e hábitos
contrários à ortodoxia católica, produziram um novo modelo de conduta de vida,
que se associava aos interesses econômicos da companhia colonizadora. Diante
destas evidências, podemos concluir que os resultados desse projeto
colonizador efetivaram-se pela sólida articulação interna que existiu entre as
propostas da empresa colonizadora Pinho e Terras e dos padres Palotinos.
Articulando as instâncias de ordem política, econômica, cultural e
religiosa, foi possível compreender o processo de construção histórica de um
núcleo colonizatório e de uma região. A integração proposta da Marcha para o
Oeste, a instrumentalização de um terreno cultural orientado e preparado pela
atuação dos padres Palotinos e o empreendimento realizado pela Companhia
Pinho e Terras constituem três faces, as quais visualizamos no município de
Palotina o resultado da integração destas três proposições.
3. Considerações Finais
A partir dessa análise, o núcleo de colonização que compreende hoje o
município de Palotina, é o resultado da combinação dos objetivos dessas três
instâncias que aglutinaram-se entre si. A consolidação da fronteira do extremo
oeste do Paraná viabilizou-se na ideia de bandeirantismo e de nacionalismo,
tendo como lógica de ocupação territorial a participação de uma apresa de
capital privado que atuou nesta região no intuito de acumular capitais, unindo-se
assim aos padres Palotinos. Estabeleceu-se então uma sintonia entre os
interesses desse grupo empresarial e os interesses políticos do Estado. A Pinho
e Terras estabeleceu alguns critérios étnicos e culturais considerados
indispensáveis para levar adiante seu projeto.
Sendo a religião católica um dos requisitos básicos da Companhia Pinho
e Terras para poder aliciar os colonos, esta se comprometia em fornecer ao
núcleo de colonização assistência educacional e religiosa. Por isso a importância
da análise de atuação da Congregação dos padres Palotinos, os quais após a
década de 1940, aliaram-se a essa empresa de colonização.
Os padres Palotinos serviram de atrativo às migrações, em uma dupla
política de expansão do cristianismo e também em busca de vantagens
econômicas que visassem aumentar seu patrimônio. Foram eles os principais
incentivadores da colonização da área que compreende atualmente o município
de Palotina.
Entretanto, este processo não se fez sem conflitos como evidencia o
confronto judicial por uma área envolvendo a Sociedade Vicente Pallotti e Sabino
Pergentino Delai. A partir do estudo deste, procuramos explicitar que o processo
de ocupação que engendrou na região oeste do Paraná, em toda a sua extensão,
não ocorreu de forma pacífica. Houveram inúmeros conflitos agrários. Tais
conflitos relacionados foram marcados por confrontos diretos pessoais, coletivos
e por meio do acionamento do poder judiciário.
4. Fontes
AUTOS de Manutenção de Posse reg. A fls 1 do livro nº2 sob o nº43/60, autuação
dia 28 de março de 1956.
REGINATO, Pe. Pedro. História de Palotina (1954-1979). Santa Maria – RS: Editora Pallotti,1979.
5. Bibliografia
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FREITAG, Liliane da Costa. Fronteiras Perigosas: migração e brasilidade no extremo-oeste paranaense (1937-1954) Cascavel: Edunioeste, 2001.
LENHARO, Alcir. A sacralização política. 2. Ed. – Campinas: Papirus, 1986.
MARTINS, José de Souza. A questão agrária brasileira e o papel do MST. A reforma agrária e a luta do MST/STÉDILE, João Pedro (org) Petrópolis, RJ. Editora Vozes, 1997.
Martins, José de Souza. Os camponeses e a política no Brasil. As lutas sociais no campo e seu lugar o processo político. Petrópolis, RJ: Vozes, 1981.
MOTTA, Márcia Maria Menedes. Nas fronteiras do poder: conflito de terra e direito à terra no Brasil do século XIX. Rio de Janeiro: Arquivo Público do Estado do Rio de Janeiro, 1998.
PORTELLI, Alessandro. A filosofia e os fatos. Narração, interpretação e significado nas memórias e nas fontes orais. Tempo, Rio de Janeiro, n.02, p.59-72, dez, 1996.
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SCOTT, James. A dominação e a arte da resistência. 1ª Edição, 1992.
THOMPSON, E.P. A Miséria da Teoria ou um Planetário de Erros. Trad. Waltensir Dutra. Rio de Janeiro: Zahar, 1981.385 p.
6. Dissertações e Teses:
MARIN, Jerri Roberto. ORA ET LABORA: O Projeto de Restauração Católica na Ex-Colônia de Silveira Martins. Porto Alegre: UFRGS, 1993. Dissertação.
SCHREINER, Davi Felix: Entre a exclusão e a utopia: Um estudo sobre os processos de organização da vida cotidiana nos assentamentos rurais (Região Sudoeste/Oeste do Paraná). São Paulo: USP, 2002. Tese.
7. Trabalhos acadêmicos:
FREITAG, Alaércio da Costa. “Dai a César o que é de César...”: um caso do litígio pela terra em Terra Roxa-PR (1953-1962) Marechal Cândido Rondon, 2007.
MYSKIW, Antonio Marcos. Titulação de Terras no Oeste Paranaense; Uma análise documental. Marechal Cândido Rondon, 2000. P.101, Trabalho Acadêmico – História – Universidade Estadual do Oeste do Paraná – UNIOESTE.