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Boletim Informativo das Pesquisas do Projeto Paleotocas Número 19 – Novembro de 2011 Site: www.ufrgs.br/paleotocas Distribuição Dirigida Responsável: Prof. Heinrich Frank Contato: [email protected] Fone: 51.30320382 EDITORIAL Sendo este o último TocaNews do ano, aproveitamos para desejar a todos um excelente final de ano, um Feliz Natal e um Abençoado Ano Novo de 2012. Resta-nos agradecer a todos. Às pessoas que nos ajudaram a encontrar mais paleotocas. Às pessoas que nos acolheram nos vários eventos. A todos que compartilharam conosco as fascinantes descobertas que fizemos ao longo do ano. E que 2012 seja, para todos nós, um ano repleto de realizações e felicidade. Paleotocas em Evento - 1 Em setembro participamos do evento chamado “XXII Encontro dos Municípios Originários de Santo Antônio da Patrulha”, que transcorreu em Nova Hartz. O município de Santa Antônio da Patrulha foi um dos quatro municípios pioneiros do Rio Grande do Sul. Ao longo dos tempos, foi subdividido em dezenas de municípios menores. E esse Encontro, o conhecido “Raízes”, resgata aspectos históricos dos municípios, com ênfase naquele em que o evento é sediado. Quem nos fez o convite de participar foram o Simplício e a Elaine Blum. Depois de contatar os organizadores, ficou marcada uma palestra em um dos 6 dias do evento. A palestra teve por título “A Paleotoca do Arroio da Bica, Nova Hartz, RS, Brasil” e aborda essa paleotoca que tínhamos encontrado dois anos atrás. Também foi elaborado um texto com o mesmo título e 5 ilustrações, mostrando as feições da paleotoca do Arroio da Bica. Além de contribuir para o resgate histórico de Nova Hartz, a intenção da participação também foi o de divulgar a existência de paleotocas para tentar encontrar outras porventura existentes na região. Logo depois da apresentação, uma pessoa fez contato conosco e informou de uma cavidade que conhecia. Já estamos nos organizando para uma excursão a fim de conhecê-la. Paleotocas em Evento – 2 Em setembro passado transcorreu em Santa Catarina um grande evento arqueológico internacional, o XVI Congresso Mundial da UISPP” (Associação Internacional) e o “XVI Congresso da Sociedade de Arqueologia Brasileira”. Por uma série de razões não participamos do evento. Entretanto, o arqueólogo Fabrício, que trabalhou uma paleotoca no norte do Rio Grande do Sul, levou ao evento um pôster que mostra a paleotoca e que discute a questão da interpretação das paleotocas como “galerias indígenas subterrâneas”, uma interpretação arraigada da arqueologia brasileira. O Resumo apresentado no evento e o pôster com as imagens estão reproduzidos na próxima página.

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Boletim Informativo das Pesquisas do Projeto Paleotocas Número 19 – Novembro de 2011 Site: www.ufrgs.br/paleotocas Distribuição Dirigida Responsável: Prof. Heinrich Frank Contato: [email protected] Fone: 51.30320382

EDITORIAL

Sendo este o último TocaNews do ano, aproveitamos para desejar a todos um excelente final de ano, um Feliz Natal e um Abençoado Ano Novo de 2012. Resta-nos agradecer a todos. Às pessoas que nos ajudaram a encontrar mais paleotocas. Às pessoas que nos acolheram nos vários eventos. A todos que compartilharam conosco as fascinantes descobertas que fizemos ao longo do ano. E que 2012 seja, para todos nós, um ano repleto de realizações e felicidade.

Paleotocas em Evento - 1

Em setembro participamos do evento chamado “XXII Encontro dos Municípios Originários de Santo Antônio da Patrulha”, que transcorreu em Nova Hartz. O município de Santa Antônio da Patrulha foi um dos quatro municípios pioneiros do Rio Grande do Sul. Ao longo dos tempos, foi subdividido em dezenas de municípios menores. E esse Encontro, o conhecido “Raízes”, resgata aspectos históricos dos municípios, com ênfase naquele em que o evento é sediado. Quem nos fez o convite de participar foram o Simplício e a Elaine Blum. Depois de contatar os organizadores, ficou marcada uma palestra em um dos 6 dias do evento. A palestra teve por título “A Paleotoca do Arroio da Bica, Nova Hartz, RS, Brasil” e aborda essa paleotoca que tínhamos

encontrado dois anos atrás. Também foi elaborado um texto com o mesmo título e 5 ilustrações, mostrando as feições da paleotoca do Arroio da Bica. Além de contribuir para o resgate histórico de Nova Hartz, a intenção da participação também foi o de divulgar a existência de paleotocas para tentar encontrar outras porventura existentes na região. Logo depois da apresentação, uma pessoa fez contato conosco e informou de uma cavidade que conhecia. Já estamos nos organizando para uma excursão a fim de conhecê-la.

Paleotocas em Evento – 2

Em setembro passado transcorreu em Santa Catarina um grande evento arqueológico internacional, o “XVI Congresso Mundial da UISPP” (Associação Internacional) e o “XVI Congresso da Sociedade de Arqueologia Brasileira”. Por uma série de razões não participamos do evento. Entretanto, o arqueólogo Fabrício, que trabalhou uma paleotoca no norte do Rio Grande do Sul, levou ao evento um pôster que mostra a paleotoca e que discute a questão da interpretação das paleotocas como “galerias indígenas subterrâneas”, uma interpretação arraigada da arqueologia brasileira. O Resumo apresentado no evento e o pôster com as imagens estão reproduzidos na próxima página.

VESTÍGIOS DA MEGAFAUNA PLEISTOCÊNICA NO PLANALTO MERIDIONAL E SUAS IMPLICAÇÕES NO CONHECIMENTO ARQUEOLÓGICO

Me. Fabrício José Nazzari Vicroski / Cristine Mallmann Vicroski A presença humana no Planalto Meridional remonta à época de transição entre os períodos Pleistocênico e Holocênico. Até o presente momento, a análise isolada de material osteológico pertencente à megafauna pleistocênica não produziu resultados significativos que permitam compor um panorama geral satisfatório acerca da interação entre os grupos de caçadores-coletores e os animais extintos da megafauna nesta região. No entanto, o desenvolvimento crescente de pesquisas sobre as estruturas de habitação utilizadas por determinados animais da megafauna, denominadas de paleotocas e crotovinas, tem exigido a revisão de modelos interpretativos tradicionais que atribuem a origem das chamadas galerias subterrâneas aos grupos humanos pré-históricos, promovendo implicações diretas no conhecimento arqueológico. Palavras-chave: Paleotocas, galerias subterrâneas, ar queologia.

Paleotocas em Evento - 3 De 9 a 14 de outubro transcorreu, em Armação dos Búzios (RJ), o XIII Congresso da Associação Brasileira de Estudos do Quaternário – ABEQUA, uma associação que congrega especialistas no estudo dos processos geológicos mais recentes.

Paleotocas em Evento - 4 Em 22 e 23 de outubro pp. transcorreu, em Arequita, no Uruguai, o 3º Encuentro Uruguayo de Espeleologia, promovido pelo Centro Espeleologico Uruguayo Mario Isola. Como no ano passado, o Projeto Paleotocas apresentou um trabalho em conjunto com o geólogo uruguaio Rafael Ogando.

Eventos em 2012 Temos vários eventos em 2012 onde novos fatos relacionados à paleotocas podem ser apresentados à comunidade científica: Junho : V TAAS – Congresso de Teoria Arqueológica na América do Sul Agosto : VIII Simpósio Brasileiro de Paleontologia de Vertebrados – Recife, PE Setembro : 46º Congresso Brasileiro de Geologia – Santos, SP Outubro : Encontro da Sociedade de Arqueologia Brasileira – Sul. Local a definir Dezembro : Reuniões Regionais PALEO da Sociedade Brasileira de Paleontologia

Neste Congresso o Projeto Paleotocas apresentou dois trabalhos. O primeiro trabalho faz um retrospecto sobre os 10 anos de pesquisas de paleotocas, mostrando como aumentou o número de ocorrências registradas e como se avançou em relação a um item que para muitas pessoas é completamente desconhecido (foto ao lado). O segundo trabalho demonstra, usando como exemplos duas paleotocas de Santa Catarina, que as “galerias indígenas subterrâneas” descritas pelos arqueólogos brasileiros nos últimos 40 anos são, todas elas, paleotocas, com ou sem sinais de reocupação indígena, como artefatos líticos, pinturas rupestres e cacos de cerâmica. Ambos os trabalhos estão disponíveis no site do Projeto Paleotocas.

Neste trabalho, o Projeto Paleotocas apresenta

as paleotocas escavadas em alteração de rocha

granítica em Porto Alegre e Viamão e as feições que

surgem em superfície quando estas paleotocas são

destruídas pelas raízes das árvores e pelas águas das

chuvas. Como grandes áreas no Uruguai são cobertas

pelo mesmo tipo de rochas, o artigo conclui que é

muito provável que haja dezenas de paleotocas

escavadas em granitos alterados aguardando seu

descobrimento no Uruguai.

As cavernas no meio do caminho Seguindo pistas e boatos sobre cavernas, sempre na busca por paleotocas, a gente visita lugares muito pitorescos e cênicos. Escondidas em meio à mata fechada, conhecidas por poucas pessoas, às vezes próximas a cascatas, já investigamos dezenas de “grutas” e “cavernas”, algumas das quais muito interessantes, outras nem tanto. Neste contexto, desejamos compartilhar o último parágrafo do trabalho apresentado pelo arqueólogo Dr. Jorge Clarke Bleyer em 1924 no 20º Congresso de Americanistas: “Investigações sobre o Homem Prehistorico no Brasil Meridional”. O texto reproduz, de forma poética e emocionada, essa moldura do trabalho do arqueólogo, algo semelhante ao trabalho com paleotocas:

“Estes segredos do passado desvendei, afastando-me da zona do mar, com seus

rochedos pittorescos de granito e as suas dunas de areia movediça acariciadas

pelo sol da manhã; apartando cortinas vegetais de densas florestas; passando

nas margens dos rios em escuras selvas, debaixo do tecto de arvoredo

farfalhante, entrelaçado de liames vegetaes; subindo no cume das serras ou

cordilheiras, - com elevações até 2.000 metros sobre o nivel do mar, - envoltos

não raro, na aurora ou ao anoitecer em brancas nuvens de neblina; descendo

montes; contemplando píncaros abruptos, farpados de penedos, onde abutres se

aninham; percorrendo veredas íngremes ou abruptas, à cuja beira se erguem

graciosas palmeiras com folhagens sussurrantes e estranhos fetos de hastes

pendentes; penetrando em grutas e abrigos sob rocha, occultos em rochedos

romanescos, tapizados no meio de uma vegetação de lichens e musgos com

mimosas orchideas, de flores em matizes brancos ou roxos, ou cactaceas,

exhibindo círios amarellos, côr do sol, derramando luz que as pequenas tunas

amorosas pretendem ostentar, secundadas pelas tochas multicores das grandes

amaryllis quando em flor, transitando na borda de abysmos por picadas

tristonhas e humidas, debaixo da nevoa brumosa das cascatas, nascentes de

fontes com caracteres de pias (de porphyro, de diábase ou de grês), cheias de

aguas crystallinas, que, cahindo de rocha em rocha, fallam como vozes

plangentes sobre o passado, numa entonação mais grave ou no rhytmo

melodioso dos liquidos refulgentes, gottejantes.”

Um “Rio Subterrâneo” em Gravataí, RS

A entrada na porção subterrânea situa-se no flanco Oeste do Morro Itacolomi (Gravataí, RS), nas coordenadas 29º50´59,62´´S, 50º58´53´´ W, em propriedade particular. O canyon está situado na propriedade do Sr. João (moradia em 29º50´48,7´´ S, 50º58´51,89´´W).

A “Caverna dos Maragatos” em Solitária Alta, Nova Hartz, RS Solitária Alta é uma localidade situada a meio caminho entre Nova Hartz e Igrejinha. Seguindo algumas pistas e contando com a ajuda indispensável de pessoas que conhecem o lugar, fomos conhecer uma gruta ou caverna onde, segundo reza a tradição, “os maragatos se escondiam”. Foram nossos guias o Sr. Simplício Blume, o Sr. Ireno (o popular “Russo”, que passou sua infância naquele local) e um morador, porque a cavidade está muito escondida em meio à mata fechada. A cavidade tem uns 10 metros de comprimento, dois metros de altura e pouco mais de um metro de largura, situada aproximadamente nas coordenadas 29º32´46´´S, 50º51´30´´W.

Seguindo a busca por paleotocas, encontramos um rio subterrâneo! É um arroio que desce um morro, flui uns 60 metros por debaixo da pedra-grês (arenito Botucatu) e depois forma um canyon com 20 m de comprimento, 4 m de altura e meio metro de largura. Deve ser o único rio subterrâneo da região!

Não é uma paleotoca, mas uma fratura na rocha basáltica. A fratura é paralela às curvas de nível e provavelmente deve-se a um bloco grande, subjacente, que escorregou um pouco morro abaixo, enquanto o bloco superior se manteve na posição original.

NOVAS OCORRÊNCIAS - 1 A Paleotoca da Propriedade Willemann

Em 1971, o Padre João Alberto Rohr publicou o seguinte conjunto de informações sobre

uma “galeria indígena subterrânea” em Urubici, Santa Catarina, sob o código SC-URUBICI-15:

“Proprietário: Alberto Warmeling

Localidade: Rio Cachimbo

Delimitação e Descrição do Sítio: uma série de galerias subterrâneas, cavadas em rocha

mole de arenito, correndo umas paralelas às outras e interligadas entre si; outras laterais e

divergentes, com quatro bocas pequenas, abertas, sendo preciso entrar de rasto. Internamente

possuem formato cilíndrico, com metro e meio a dois metros de diâmetro. Nas paredes há sinais

de picareta e de cavadeira, que deixa marcas como que de garras de animais.

Água mais próxima: a dez metros, arroio.

Vegetação: num morro, coberto de mata, com pinheiros esparsos.

Material arqueológico encontrado: Não foi aberta trincheira alguma naquelas galerias.

Observações: as galerias encontram-se relativamente limpas, mas apenas raras vezes

foram visitadas.”

Devido à ausência de qualquer localização geográfica precisa nesse relato, iniciamos nossa

procura pela lista telefônica de Santa Catarina disponível na internet. Muitos reais de conta

telefônica mais tarde, ligando para conhecidos e parentes de Alberto Warmeling, conseguimos

localizar a propriedade e fazer contato com o atual proprietário. Não diretamente, mas através de

um vizinho. Semanas mais tarde organizamos uma viagem a Urubici e visitamos a propriedade,

falando pessoalmente com os atuais proprietários. Na carona de uma carreta agrícola puxada a

trator, porque a galeria é longe da casa e o acesso não serve para carro, chegamos ao local.

Tinha um buraco na colina, na realidade parte de um túnel com o teto desabado. Entrando

para a direita, o túnel tinha pouco mais de um metro de diâmetro, as paredes cobertas de marcas de

garra e um comprimento de 10 metros. Entrando para a esquerda, em torno de 12 metros de uma

passagem estreita, entupida e desabada, e depois um “salão”: o ponto de encontro de 7 túneis com

mais de um metro de diâmetro. Seis deles entupidos com sedimentos, mas um completamente livre:

25 metros de comprimento, quase 3 metros de altura, gigantescas marcas de garra do teto até o piso

e pouco mais de um metro de largura. Uma estrutura como nunca tínhamos visto e que ainda não

conseguimos entender. Essa rede de túneis, portanto, é o que sobrou de um enorme abrigo

subterrâneo, cujo tamanho exclui os tatus gigantes como autores. Grande assim, acredito que deve

ser de preguiça-gigante, bichos com mais de 800 kg de peso.

O túnel de 25 metros, um dos ramais do abrigo subterrâneo. A trena estendida no chão, lá no

fundo estou eu (Frank) sentado. Provavelmente os outros 6 túneis que irradiam desse ponto de

encontro – o “salão” – tinham as mesmas dimensões.

Depois de duas horas lá dentro, entre 4 adultos, nosso guia começou a bocejar devido ao

baixo nível de oxigênio. Saímos imediatamente. Na próxima visita, temos que levar gerador,

exaustor e mangueira de lona para jogar ar fresco nos túneis, porque não circula ar lá dentro.

Na saída, ao lado da casa do

proprietário, a “sobremesa”: quatro

paleotocas entupidas (crotovinas)

no barranco! A imagem da direita

mostra uma delas: o teto desabou,

ela encheu com barro e na borda da

esquerda ainda dá para ver as

marcas de garra bem preservadas.

NOVAS OCORRÊNCIAS – 2 A caverna da Fazenda Revive

Uma fotografia que circulou pelo Orkut foi a primeira pista: um buraco em um paredão de

pedra-grês (arenito Botucatu) localizado em uma Fazenda no flanco Oeste do Morro Itacolomi, no

município de Gravataí, RS. Entramos em contato com os responsáveis pela Fazenda, obtivemos a

autorização de acesso e fomos conhecer a ocorrência.

Trata-se de um túnel com apenas 5 metros de comprimento que faz uma curva suave para

dentro do paredão. Um túnel gostoso: seco, sem barro, sem aranhas, bem iluminado, de fácil acesso.

Nas paredes expostas à chuva e ao vento há buracos na rocha, não se vê muita coisa. Mas na porção

interna da toca, protegido das intempéries, há um monte da marcas de garra muito bem preservadas.

Conversamos com outras

pessoas nas proximidades para

detectar outras paleotocas/cavernas,

mas, aparentemente, esta é a única

da região.

Como toda a geologia desta

região é dominada pelo Arenito

Botucatu, é provável que haja mais

paleotocas. Por isso estamos nos

organizando para trabalhar as furnas

já conhecidas em Taquara,

imediatamente ao Norte do Morro

Itacolomi.

Duas furnas já investigadas

em Glorinha mostraram não ser

paleotocas. Uma é uma fresta entre

grandes blocos desabados no vale

de um arroio, outra é um espaço

(“gruta”) que restou após o

desabamento de parte de um

paredão.

Marcas de garra no teto da paleotoca. Os espaços brancos e pretos da escala correspondem, cada um, a 10 cm.