padrões de mobilidade e crescimento urbano · taxa de motorização e consumo de combustíveis ......

106
Padrões de Mobilidade e Crescimento Urbano Análise Comparativa entre Lisboa e Florianópolis Madalena Sottomayor Machado Costa e Silva Dissertação para obtenção do Grau de Mestre em Engenharia Civil Orientador: Professor Doutor Fernando José Silva e Nunes da Silva Júri Presidente: Professor Doutor João Torres de Quinhones Levy Orientador: Professor Doutor Fernando José Silva e Nunes da Silva Vogal: Professor Doutor Filipe Manuel Mercier Vilaça e Moura Julho de 2015

Upload: buidan

Post on 14-Feb-2019

219 views

Category:

Documents


0 download

TRANSCRIPT

Padrões de Mobilidade e Crescimento Urbano

Análise Comparativa entre Lisboa e Florianópolis

Madalena Sottomayor Machado Costa e Silva

Dissertação para obtenção do Grau de Mestre em

Engenharia Civil

Orientador: Professor Doutor Fernando José Silva e Nunes da Silva

Júri

Presidente: Professor Doutor João Torres de Quinhones Levy

Orientador: Professor Doutor Fernando José Silva e Nunes da Silva

Vogal: Professor Doutor Filipe Manuel Mercier Vilaça e Moura

Julho de 2015

I

Agradecimentos

A realização deste trabalho só foi possível com o apoio de várias pessoas, às quais gostaria de

expressar os meus sinceros agradecimentos, em particular:

Ao Professor Doutor Fernando Nunes da Silva, meu orientador neste trabalho, por todo o apoio,

disponibilidade, motivação e positivismo transmitidos. Pelo seu valioso conhecimento e

conselhos transmitidos ao longo da realização deste trabalho.

Ao Professor Doutor Acires Dias, Professor Titular de Engenharia Mecânica na Universidade

Federal de Santa Catarina, por todo o apoio, disponibilidade e simpatia demonstrados durante a

minha estadia em Florianópolis.

À Professora Doutora Dora Orth, Professora Associada na Universidade Federal de Santa

Catarina, pela ajuda e informação disponibilizada que tanto me ajudou durante este trabalho.

Ao Engenheiro Gonçalo Caiado, da Câmara Municipal de Lisboa pelos dados disponibilizados e

apoio na compreensão da mobilidade em Lisboa.

À minha família e amigos por todo o apoio dado.

II

III

Resumo

Ao longo do presente trabalho pretende-se estudar a mobilidade em duas cidades

bastante distintas, Lisboa e Florianópolis, comparar os seus padrões de mobilidade, retirar

algumas conclusões quanto aos caminhos a prosseguir e verificar se é possível aproveitar alguns

ensinamentos do passado recente, se uma cidade de um país emergente pode retirar exemplos

da história de uma cidade antiga europeia. Começa-se por identificar as características

demográficas e socioeconómicas de cada cidade, analisar os padrões de mobilidade, a rede

viária e o seu desempenho, a rede de transportes coletivos e a comparação entre estes aspetos

das duas cidades. No final pretende-se sugerir algumas orientações para o futuro ou propor

soluções que possam ser usadas como base para a melhoria das condições de mobilidade

urbana.

Palavras-Chave

Mobilidade urbana, Lisboa, Florianópolis, Transportes, Cidades

IV

V

Abstract

Throughout this research we will study the mobility in two very different cities, Lisbon and

Florianopolis, compare their mobility patterns, draw some conclusions about the future and see if

you can take some lessons from the recent past, if a city of an emerging country can take

examples from the history of a European old city. We begin by identifying the demographic and

socio-economic characteristics of each city, analyzing the mobility patterns, the road network and

its performance, the network of public transport and compare these aspects of the two cities. In

the end it is intended to suggest some directions for the future and to propose solutions that can

be used as a basis for improvement of urban mobility.

Keywords

Urban Mobility, Lisbon, Florianopolis, Transports, Cities

VI

VII

Lista de Abreviaturas

AMF – Área Metropolitana de Florianópolis

AML – Área Metropolitana de Lisboa

CML – Câmara Municipal de Lisboa

CREL – Circular Regional Exterior de Lisboa

CRIL – Circular Regional Interior de Lisboa

Detran/SC – Departamento Estadual de Trânsito de Santa Catarina

IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística

IDH – Índice de Desenvolvimento Humano

IMT – Instituto da Mobilidade e dos Transportes

INE – Instituto Nacional de Estatística

IPUF – Instituto de Planejamento Urbano de Florianópolis

PIB – Produto Interno Bruto

TC – Transporte Coletivo

TI – Transporte Individual

TMDA – Tráfego Médio Diário Anual

TP – Transporte Público

VIII

IX

Índice Geral

1 - Introdução .......................................................................................................................... 1

Enquadramento e pertinência do tema ......................................................................... 1

Objetivos ........................................................................................................................ 2

Estrutura da dissertação ............................................................................................... 3

2 - Metodologia e Ponto de Partida ........................................................................................ 4

Metodologia ................................................................................................................... 4

Questões essenciais da mobilidade urbana ................................................................. 4

Evolução urbana e sistemas de acessibilidades ........................................................... 6

2.3.1 - Lisboa .................................................................................................................... 6

2.3.2 - Florianópolis .......................................................................................................... 9

3 - A procura de transportes ................................................................................................. 11

Caracterização demográfica e socioeconómica ......................................................... 11

3.1.1 - Evolução da população e densidades ................................................................. 11

3.1.2 - Emprego e pólos geradores de tráfego ............................................................... 16

Taxa de motorização e consumo de combustíveis ..................................................... 19

Repartição Modal ........................................................................................................ 22

Utilizadores do TC e evolução da procura .................................................................. 25

Modos Suaves ............................................................................................................. 26

4 - A oferta de transportes .................................................................................................... 34

Rede rodoviária e estacionamento .............................................................................. 34

4.1.1 - As redes rodoviárias e a sua cobertura espacial ................................................ 34

4.1.2 - Desempenho das redes ...................................................................................... 42

4.1.3 - Estacionamento ................................................................................................... 48

Redes de transporte coletivo ....................................................................................... 53

4.2.1 - As ligações metropolitanas/regionais .................................................................. 53

4.2.2 - Organização das redes de TC urbanas .............................................................. 56

4.2.3 - Entidades Reguladoras e Sistema Tarifário ........................................................ 61

4.2.4 - Desempenho das Redes ..................................................................................... 63

5 - Comparação dos dois casos de estudo .......................................................................... 66

X

O Sistema de Acessibilidades e a Evolução do Espaço Urbano ................................ 66

5.2 - Principais Problemas ................................................................................................... 71

Possíveis soluções ...................................................................................................... 75

6 - Conclusões ...................................................................................................................... 81

Referências Bibliográficas ........................................................................................................... 86

XI

XII

Índice de Figuras

Figura 2-1: Formação inicial de Lisboa na colina de S. Jorge 6

Figura 2-2: Crescimento da cidade de Lisboa 7

Figura 2-3: Pormenor da Baixa Pombalina do lado esquerdo, de malha ortogonal, com a zona do

Castelo, de malha irregular 8

Figura 2-4: Variação da população residente nos municípios da AML entre 2001 e 2011 8

Figura 2-5: Crescimento da cidade de Florianópolis 9

Figura 2-6: Mancha urbana da AMF com destaque para a zona do Centro e do Campeche 10

Figura 2-7: Pormenor da malha urbana no Centro de Florianópolis 10

Figura 2-8: Pormenor da malha urbana na zona do Campeche 10

Figura 3-1: Divisão do concelho de Lisboa por freguesias (Fonte: CML) 11

Figura 3-2: Divisão do município de Florianópolis em distritos 11

Figura 3-3: Distribuição da população residente nas freguesias de Lisboa (adaptado pela autora)

12

Figura 3-4: Distribuição da população residente nos distritos de Florianópolis (adaptado pela

autora) 12

Figura 3-5: Gráfico da evolução da população em Lisboa e Florianópolis 13

Figura 3-6: Distribuição da população por sexo, segundo os grupos de idade, em Florianópolis

(Fonte: IBGE, 2010) 15

Figura 3-7: Distribuição da população por sexo, segundo a idade, em Lisboa (Fonte: INE, 2011)

15

Figura 3-8: Densidade populacional de Florianópolis (adaptado pela autora) 16

Figura 3-9: Densidade populacional de Lisboa (adaptado pela autora) 16

Figura 3-10: Gráfico da evolução do emprego em Lisboa entre 1995 e 2011 17

Figura 3-11: Gráfico da evolução do PIB em Lisboa entre 1995 e 2011 17

Figura 3-12: Evolução do emprego em Florianópolis entre 1991 e 2005 17

Figura 3-13: Gráfico da evolução do PIB em Florianópolis entre 2002 e 2010 17

Figura 3-14: Rota da Inovação que inclui aeroporto, universidades, parques tecnológicos, centros

empresariais e órgãos do governo 18

Figura 3-15: Localização dos principais pólos geradores de tráfego e atividades económicas

(Fonte: Floripa 2030) 18

Figura 3-16: Principais pólos geradores de tráfego em Lisboa 19

Figura 3-17: Evolução da taxa de motorização em Lisboa e na AML 20

Figura 3-18: Evolução da frota de veículos na Grande Florianópolis 20

Figura 3-19: Evolução do consumo de combustível no transporte rodoviário de passageiros em

Santa Catarina (Fonte: SINDICOM, 2012) 21

Figura 3-20: Venda de combustíveis em Portugal (Fonte: PORDATA, 2012) 21

Figura 3-21: Repartição modal em Florianópolis (Fonte: Plamus, 2014) 24

Figura 3-22: Percentual do automóvel no total de viagens em várias cidades 25

XIII

Figura 3-23: Tempo de viagem por distância percorrida por modo (Fonte: EC, 2000) 26

Figura 3-24: Mapa de Potencial Pedonal de Lisboa (Fonte: CML, 2013) 27

Figura 3-25: Identificação das zonas com maior potencial pedonal em Florianópolis 28

Figura 3-26: Mapa de Potencial Pedonal de Lisboa (Fonte: CML, 2013) 28

Figura 3-27: Avenida da Liberdade, um exemplo de boas condições para o modo pedonal (Fonte:

http://expatinlisbon.com/2011/10/28/lisbon-random-photos-and-memories/) 29

Figura 3-28: Avenida Mauro Ramos 30

Figura 3-29: Rua Dep. Antônio Edu Vieira, junto à UFSC 30

Figura 3-30: Rede de Percursos e Corredores em Lisboa (Fonte: CML, 2013) 30

Figura 3-31: Avenida Duque de Ávila 31

Figura 3-32: Rede Ciclável de Florianópolis (Fonte: Plamus, 2015) 31

Figura 3-33: Raio alcançável por modos pedonais e de bicicleta no Centro de Florianópolis 32

Figura 3-34: Raio alcançável por modos pedonais e de bicicleta no centro de Lisboa (Fonte:

Google Maps, 2008, adaptado pela autora) 32

Figura 4-1: Variação do TMDA entre 2009 e 2013 nos principais eixos de acesso a Lisboa (nos

dois sentidos, todos os dias) 35

Figura 4-2: Rede viária da cidade de Lisboa (Fonte: CML, 2012) 37

Figura 4-3: Variação do tráfego médio horário (Fonte: Brito, J.M. (2010). Caracterização da

flutuação do tráfego na cidade de Lisboa, FCT) 38

Figura 4-4: Relação entre municípios vizinhos e Florianópolis 39

Figura 4-5: Volume de entrada em Florianópolis através das pontes (nos dois sentidos, durante

todo o dia) (Fonte: Plamus, 2015) 40

Figura 4-6: Matriz Origem-Destino dos movimentos pendulares nos quatro maiores municípios

da AMF 40

Figura 4-7: Distribuição horária das viagens por modo em Florianópolis (Fonte: Plamus, 2015)

41

Figura 4-8: Hierarquização da rede viária de Florianópolis (Fonte: PDM de Florianópolis) 41

Figura 4-9: Principais carências na rede viária de Lisboa (adaptado pela autora) 43

Figura 4-10: Principais carências na rede viária de Florianópolis (adaptado pela autora) 44

Figura 4-11: Nível de Saturação da rede viária de Lisboa na hora de ponta da manhã 45

Figura 4-12: Pormenor do Nível de Saturação da rede viária no centro de Lisboa na hora de ponta

da manhã 45

Figura 4-13: Nível de Saturação da rede viária de Florianópolis (Fonte: Plamus, 2015) 46

Figura 4-14: Pormenor dos Níveis de Saturação da rede viária no centro de Florianópolis 47

Figura 4-15: Repartição modal em função da disponibilidade de estacionamento no local de

trabalho 49

Figura 4-16: Evolução da procura diária de estacionamento ao longo do dia em Lisboa (Fonte:

TIS, Inquérito à mobilidade 2003/2004) 49

Figura 4-17: Tarifários na via pública: zona verde, amarela e encarnada 50

XIV

Figura 4-18: Localização do Sistema Zonal Azul em Florianópolis (Fonte: minhavaga.com.br) 51

Figura 4-19: Área de influência das principais operadoras de TC na AMF 54

Figura 4-20: Linhas ferroviárias com ligação a Lisboa (Fonte: CP, 2010) 55

Figura 4-21: Linhas de transporte fluvial com ligação a Lisboa 56

Figura 4-22: Evolução da procura no Metro e Carris entre 2004 e 2012 (Fonte:Transportes de

Lisboa, 2012) 57

Figura 4-23: Mapa das linhas de Metro em Lisboa 57

Figura 4-24: Mapa da rede de autocarros em Lisboa (Fonte: CARRIS, 2015) 58

Figura 4-25: Localização dos terminais de integração e das principais linhas de autocarros 59

Figura 4-26: Organização institucional dos transportes em Portugal 61

Figura 5-1: Modelo de transição da mobilidade individual 66

Figura 5-2: Desenvolvimento metropolitano nas aglomerações urbanas (Fonte: TAAFFE et al.,

1996: 178) 69

XV

Índice de Quadros

Quadro 3.1: Evolução da população em Florianópolis, AMF e no Brasil entre 1990 e 2010 ..... 13

Quadro 3.2: Evolução da população em Lisboa, AML e em Portugal entre 1991 e 2011 .......... 13

Quadro 3.3: Repartição modal das deslocações na AML por motivo de emprego e estudo...... 23

Quadro 4.1: Evolução do TMDA de 2009 a 2013 nos principais eixos de acesso a Lisboa (nos

dois sentidos, todos os dias) ....................................................................................................... 36

Quadro 4.2: Matriz Origem-Destino dos movimentos pendulares na AML em 2011 ................. 36

Quadro 4.3: Repartição modal das deslocações interconcelhias e intraconcelhias na AML por

motivo de emprego e estudo (Fonte: INE 1991, 2001 e 2011, disponibilizado pelo Eng. Gonçalo

Caiado da CML) .......................................................................................................................... 37

Quadro 4.4: Tarifário em vigor em cada zona de estacionamento por período de tempo (Fonte:

EMEL, 2015) ................................................................................................................................ 50

Quadro 4.5: Principais características das operadoras de TC na AML (Fonte: AMTL, 2010) ... 53

Quadro 4.6: Parâmetros operacionais do Sistema de Transporte Coletivo em Florianópolis .... 60

Quadro 5.1: Principais indicadores de comparação da mobilidade urbana nas duas cidades .. 74

XVI

1

1 - Introdução

Enquadramento e pertinência do tema

Entre 1850 e 1900, cerca de 60 milhões de pessoas migraram da Europa para a América

do Sul, fazendo com que a população brasileira crescesse exponencialmente. Na década de

1970 o Brasil apresentava uma população de 90 milhões de habitantes, sendo que em 35 anos

esse valor mudou para o dobro e, só entre 2000 e 2005, aumentou em 10 milhões de pessoas.

É pertinente colocar a questão do que teria acontecido com o sistema urbano europeu se esta

migração não tivesse ocorrido. Livi Bacci (1999) aborda este assunto, fazendo a seguinte

afirmação:

“¿Que habría sido de Europa sin América, y qué habría sido de América sin Europa? Que

quede bien claro que es una pregunta que un estudioso no debería plantearse nunca...”

Enquanto que em 1900 a população europeia representava 25% da população mundial,

atualmente ambos os continentes estão quase par a par. Assim, quando se compara o espaço

latino-americano com o europeu é possível identificar semelhanças e diferenças existentes entre

os dois, como por exemplo a influência que as reformas de Haussmann em Paris tiveram nas

cidades brasileiras, ou como os poderes públicos brasileiros tentaram imitar e construir espaços

à semelhança das cidades europeias através da imposição de grandes planos (Medrano, 2006).

Apesar de existirem variadas publicações e produções sobre o crescimento e mobilidade

urbana tanto do Brasil como da Europa, ainda há uma grande carência de estudos comparativos

entre cidades.

A comparação de duas cidades permite encontrar as generalidades que caracterizam

um sistema de mobilidade e avaliar e comparar os modelos em ambas as cidades, identificando

vantagens e desvantagens de ambos.

Deste modo, ao promover um estudo que englobe países inseridos em contextos tão

distintos como é o caso de Brasil e Portugal, procura-se compartilhar as experiências de ambos

no processo de desenvolvimento e gestão da mobilidade urbana. A experiência de Portugal no

contexto da União Europeia, onde a implementação do conceito de mobilidade sustentável já se

encontra bastante desenvolvido, pode ser uma grande valia para a realidade brasileira, onde

este ainda é pouco explorado. O Brasil, por outro lado, pode contribuir com a sua experiência na

gestão de cidades médias que têm experimentado um rápido crescimento em pouco tempo, além

do conhecimento de questões relacionadas com a metropolização de centros urbanos,

contribuindo para o diagnóstico e antecipação de soluções para problemas ainda não

observados nas cidades portuguesas (Costa, 2003).

Pretende-se assim mostrar o interesse na análise comparativa da mobilidade entre

Florianópolis e Lisboa. Ao analisar a história de uma cidade europeia tem-se uma ideia da

2

evolução da mobilidade nas cidades e quais os exemplos a seguir ou não, pois foi aqui que a

força do movimento sindical do pós-guerra e as ideias dos governos conduziram ao progressivo

desenvolvimento de políticas públicas de transportes e mobilidade que nunca deixaram de ter

em conta o seu caráter social e, portanto, de se orientarem para satisfazer as necessidades

básicas de deslocação da população.

No entanto, tentar transpor para os países emergentes as mesmas estratégias que estão

atualmente em curso nos países onde as diferenças sociais e de rendimento não são tão

extremadas, onde a motorização individual ultrapassou já a fase de “deslumbramento” pelo

automóvel e onde a consciência coletiva dos seus impactos propicia o desenvolvimento de

políticas de mobilidade mais equilibradas e mais atentas aos problemas ambientais e à coesão

social, só poderá esbarrar na oposição da maioria dos decisores públicos e deixar ao setor

privado a organização e exploração da oferta do transporte público.

Os resultados deverão contribuir para avaliar o estado do sistema de mobilidade urbana

de cada uma destas cidades e ser uma ferramenta de apoio a possíveis soluções no futuro desta

área.

Objetivos

Os objetivos da presente dissertação são:

Contribuir para a identificação dos principais elementos caracterizadores e atributos

relacionados com a mobilidade urbana;

Caracterizar o sistema de mobilidade da cidade de Florianópolis e de Lisboa;

Promover um estudo comparativo, avaliando o nível de informação sobre os contextos

urbanos (ou seja, dados estatísticos e informações que caracterizem aspetos

geográficos, demográficos, socioeconómicos ou ambientais);

Equacionar soluções para as áreas de estudo que possam contribuir para o

desenvolvimento de um sistema de mobilidade e transportes mais sustentável;

Exemplificar como duas cidades opostas podem ilustrar os diversos desafios que a

mobilidade urbana atual enfrenta;

Demonstrar a possibilidade de transferibilidade de soluções de uma cidade para outra.

3

Estrutura da dissertação

A presente dissertação está dividida em seis capítulos.

O primeiro capítulo corresponde à introdução, e neste é efetuado o enquadramento do tema, a

descrição do problema, a enunciação dos objetivos a alcançar e a estruturação da dissertação.

O segundo capítulo refere-se à descrição da metodologia do trabalho, com definição dos

conceitos essenciais da mobilidade urbana e breve exposição da evolução urbana e sistema de

acessibilidades da cidade de Lisboa e de Florianópolis, essenciais para a compreensão da

evolução do sistema de mobilidade em cada uma.

No terceiro capítulo realiza-se uma caracterização da procura de transportes, das características

demográficas e socioeconómicas de ambas as cidades, definindo o zonamento adotado, a

evolução da população, a sua distribuição por grupos etários e espacial e a verificação do

desenvolvimento económico e da taxa de motorização. Revela-se a repartição modal e os traços

dos utilizadores do transporte coletivo e dos modos suaves.

O quarto capítulo diz respeito à análise da oferta de transportes, tanto das redes rodoviárias

como das redes de transporte coletivo. São estudados os principais fluxos e o desempenho das

redes, analisando carências e desempenhando uma leitura crítica do sistema atual.

No quinto capítulo cumpre-se um dos objetivos principais deste trabalho, efetuando a

comparação dos dois casos de estudo, descrevendo-se as similitudes e as grandes diferenças

para todos os temas tratados ao longo do trabalho. É demonstrada como a evolução das

infraestruturas e sistemas de transportes influenciaram a evolução da ocupação urbana nas duas

cidades e apresentam-se hipóteses alternativas a explorar e apreciações críticas do grau de

dificuldade das mesmas, de tal modo que a sua aplicação pode provocar mudanças estruturais

significativas na rede de mobilidade urbana.

O último capítulo contém as conclusões e contribuições para pesquisas futuras.

4

2 - Metodologia e Ponto de Partida

Metodologia

O presente trabalho será desenvolvido primariamente com base em investigação e

análises teóricas e trabalho de campo, nomeadamente entrevistas a personalidades da área e

análise de fontes textuais especializadas.

Tendo em conta os objetivos e finalidades deste estudo, do ponto de vista da abordagem,

optou-se por realizar uma pesquisa de natureza quantitativa, usando modelos estatísticos para

explicar os dados obtidos. Os dados apoiam-se em investigações teóricas, análises sociológicas

e consultas a especialistas.

Visto que em Florianópolis ainda são escassas as fontes textuais e de dados sobre a

mobilidade urbana, para esta cidade os dados recolhidos foram maioritariamente obtidos através

de entrevistas a personalidades especializadas no tema. Em Lisboa, a investigação baseia-se

na obtenção de soluções fiáveis para os problemas expostos, através de recolhas planeadas,

sistemáticas e respetiva interpretação de dados. Deste modo, pretende-se incrementar o

conhecimento no tema a estudar apresentando dados fiáveis.

Ambos os métodos foram apoiados em bibliografia técnica e científica, quando

disponível, para assegurar a cobertura e atualidade do conhecimento mobilizado para a

resolução do problema.

Com base na pesquisa bibliográfica e análise de elementos teóricos sobre a mobilidade

urbana, foram definidos os principais aspetos que a condicionam e caracterizam, desde os

relacionados com o sistema de transportes e acessibilidades, aos urbanísticos e

socioeconómicos. Com base nestes elementos foi identificada uma grelha de análise que

permitiu construir um quadro comparativo das duas cidades em estudo no que se refere ao tema

da mobilidade urbana. A esta fase de caracterização do problema e do contexto em que se

desenvolve, seguiu-se a análise das experiências e soluções propostas para resolver ou minorar

os problemas identificados neste domínio, bem como a avaliação dos resultados obtidos. Tendo

por base o tipo de problema detetado em cada cidade e as soluções que foram adotadas em

Lisboa, procurou-se então analisar de que modo estas poderiam ser replicadas em Florianópolis

e em que condições particulares.

Questões essenciais da mobilidade urbana

Os transportes têm sempre estado interligados ao desenvolvimento urbano, sendo uns

dos principais promotores do crescimento das cidades, de atividades comerciais, do acesso aos

serviços de saúde e da educação e lazer. Contribuem para a correção das assimetrias sociais

no acesso a bens e serviços e do ordenamento do território, permitem uma maior equidade

territorial no acesso aos equipamentos não situados nos locais de procura, uma melhor e mais

5

rápida mobilidade de pessoas, bens e serviços e contribuem para a redução das assimetrias

socioeconómicas regionais.

Costa (2003) destaca a relação entre a mobilidade, o desenvolvimento económico e a

sustentabilidade socio ambiental do contexto urbano, referindo alguns dos aspetos essenciais

para um sistema de mobilidade sustentável: equilíbrio entre meios motorizados e não

motorizados, o planeamento sobre a demanda e oferta de transporte, a integração do sistema

de transporte com o plano de ocupação e uso do solo, entre outros.

Segundo a LEI N.º 12.587 da Política Nacional de Mobilidade Urbana do Brasil, a

mobilidade pode, então, ser entendida como a possibilidade de deslocação de um local para o

outro, ou seja, as condições em que se realizam as deslocações de pessoas e cargas no espaço

urbano. A mobilidade urbana pode ser considerada como um conjunto estruturado de modos,

redes e infraestrutura, constituindo um sistema complexo. Assim, um facto determinante para a

performance do sistema é o modo como as diversas partes constituintes se interligam, o que

está diretamente relacionado com o nível de interação e compatibilidade entre agentes e

processos intervenientes no sistema (Macário, 2004).

A mobilidade urbana adequada é obtida por meio de políticas de transporte e circulação

que visam a melhoria da acessibilidade e mobilidade das pessoas e cargas no espaço urbano,

através da priorização dos modos de transporte coletivo e não motorizados de maneira eficiente,

socialmente inclusiva e ecologicamente sustentável (Gollnick, 2010).

A melhoria da mobilidade é um dos instrumentos mais importantes de que se dispõe para

conseguir criar um ambiente de maior justiça social e equilíbrio territorial. A maior ou menor

facilidade de realizar deslocações para as diversas atividades diárias, bem como o acesso a

mercadorias e serviços, reflete diretamente na satisfação das pessoas quanto ao nível de

desenvolvimento econômico e social da sociedade na qual estão inseridas (Ferraz & Torrez,

2005).

Os Poderes Públicos, as Universidades, as empresas, as entidades representativas,

profissionais, setoriais e todos os envolvidos, devem trabalhar em conjunto para se poder

alcançar uma harmonia nas relações pessoais, graças à disponibilidade de condições para uma

“Mobilidade eficiente” (RUITEM-IFHP, 2014). No entanto, é necessário estar consciente que as

mudanças ao longo do tempo não se produzem todas ao mesmo ritmo, nem para todas as

pessoas e muito menos para todos os lugares. As mudanças são próprias de cada situação, de

cada contexto, assim como a sua velocidade de implementação.

A definição de uma política de mobilidade urbana é um tema complexo dado que está

relacionado com as características específicas do local e das respetivas prioridades políticas,

que podem variar entre localidades dentro do mesmo país e até entre comunidades servidas

pelo mesmo sistema de mobilidade. A política de mobilidade urbana funciona melhor quando é

dada pelo resultado de diferentes experiências de modelos regulamentares e organizacionais e

6

até mesmo quando é do domínio das várias entidades que providenciam os serviços de

mobilidade (Macário, 2004).

Com este aspeto em vista, antes de ser efetuada qualquer alteração no paradigma de

deslocações numa cidade é necessário conhecer como a mesma funciona, por que tipo de

pessoas é composta, quais as deslocações que estas efetuam e qual o futuro previsto para a

cidade. Não é possível pensar na modificação da mobilidade urbana sem antes conhecer todo o

comportamento da cidade.

Tanto o traçado como a disposição das ruas afetam a mobilidade e a dinâmica

socioeconómica. Assim, torna-se necessário analisar o traçado e desenvolvimento urbano das

duas cidades. Segundo Medeiros, cidades com baixo nível de integração espacial tendem a

enfrentar problemas, como maior disparidade social, transporte caro e queda no nível de

produtividade, pois gasta-se mais tempo na deslocação do que na geração de riquezas.

Evolução urbana e sistemas de acessibilidades

2.3.1 - Lisboa

Lisboa nasceu na colina do castelo de S. Jorge pelas mãos do povo romano. A sua

função de defesa estratégica resulta do reflexo do terreno e da proteção natural perante o

estuário do Tejo e o braço deste rio que então se desenvolvia a ocidente e penetrava

profundamente no território, como se observa na Figura 2-1.

Com a entrada de D. Afonso Henriques na cidade, esta expande-se para além das

muralhas nascendo então duas das zonas mais importantes da cidade: a Baixa e Alfama. É

também por volta desta altura que o braço do rio desaparece definitivamente.

Lisboa continua a crescer à volta da colina do castelo, começando a ocupar os campos

agrícolas com urbanização, face ao contínuo aumento de população. Surge o Bairro Alto, na

Figura 2-1: Formação inicial de Lisboa na colina de S. Jorge (Fonte: CML)

7

passagem para o séc. XVII, marcando a aquisição de uma consciência urbanística e

arquitetónica (CML, 2015). Esta parte da cidade apresenta uma forma orgânica de malha

irregular.

A cidade, por volta de 1750, tem uma forma grosseiramente retangular alongada no

sentido do rio mas, nos finais do século XIX, esta direção é abandonada em favor da expansão

para Norte.

O processo de expansão, realizado em várias etapas, é desencadeado pela abertura das

chamadas Avenidas Novas, consolidando a ocupação do planalto com traçados ortogonais fruto

de um planeamento prévio (Barata Salgueiro, 2002). A Baixa apresenta também este tipo de

traçado decorrente da sua reconstrução após o terramoto de 1755. As praças têm um papel

fundamental, têm um potencial articulador da malha urbana, estabelecem profundas relações

com o resto da cidade e são tidas como pontos de referência e de chegada de outros focos de

Lisboa. A morfologia do tecido urbano de Lisboa caracteriza-se por uma integração de planos

concebidos de raiz, como o caso da Baixa Pombalina e da Avenida da Liberdade, com uma

malha urbana orgânica resultado do crescimento da cidade.

Depois da segunda guerra mundial a mancha construída estende-se para fora dos limites

administrativos da cidade nomeadamente ao longo das linhas de transporte. O comboio levou a

um crescimento suburbano radial enquanto na margem sul crescem núcleos em torno dos cais

fluviais que asseguram as ligações mais rápidas com Lisboa (Cacilhas, Barreiro, Seixal) e

desenvolvem-se polos industriais (Barata Salgueiro, 2002).

1994 2008

Figura 2-2: Crescimento da cidade de Lisboa (Fonte: Barata Salgueiro (2001). Lisboa, Periferia e Centralidades, Celta, Oeiras, pp.33; adaptado

pela autora)

8

As alterações nas acessibilidades, com a construção de vias rápidas, ponte Vasco da

Gama, comboio na ponte 25 de Abril e outras, traduziram-se na dispersão da metropolização, ou

seja, o município de Lisboa começou a perder população para os municípios em seu redor.

Pela Figura 2-4 verifica-se que o município de Lisboa continua a perder população, cerca

de -3,4%, enquanto os restantes municípios apresentam crescimento, destacando-se, com

variações positivas superiores a 20%, os municípios de Mafra, Alcochete, Montijo, Sesimbra e

Cascais (INE, 2011).

Figura 2-3: Pormenor da Baixa Pombalina do lado esquerdo, de malha ortogonal, com a zona do Castelo, de

malha irregular

Figura 2-4: Variação da população residente nos municípios da AML entre 2001 e 2011 (Fonte: INE, 2011)

9

2.3.2 - Florianópolis

A ocupação de Florianópolis pelos portugueses deu-se por volta de 1600, quando a

população nativa deste local era ainda formada por indígenas.

O modo como a ilha vai sendo habitada obedece ao mesmo padrão de ocupação

portuguesa. Ocorre primeiro junto às fontes de água, estendendo-se na direção da praia da Boa

Vista, atual centro da cidade. As ruas desenvolveram-se perpendiculares ao litoral com ruas de

atravessamento fazendo a ligação entre elas, criando uma malha ortogonal. A Póvoa de Nossa

Senhora do Desterro, primeiro nome da capital do Estado de Santa Catarina, tinha uma função

estratégica militar pois estava localizada entre as duas principais cidades da época: Rio de

Janeiro e Buenos Aires (Caruso, 1983). A maior parte da população residente encontrava-se no

centro da vila, sendo que as restantes residências localizavam-se próximas à costa, mas

espalhadas pela ilha.

No século XVIII Portugal tomou a iniciativa para uma ocupação efetiva da Ilha de Santa

Catarina. O objetivo era assegurar o território conquistado, evitando assim, o domínio espanhol

da área. Entre 1748 e 1756 é registada a chegada de cerca de cinco mil imigrantes ao Desterro,

vindos das Ilhas dos Açores e da Madeira. Muitos imigrantes assentaram no centro, mas outras

famílias estabelecem-se no interior da ilha. As famílias açorianas fundaram diversas freguesias

como, por exemplo: a freguesia do Ribeirão da Ilha no sul da Ilha, a freguesia de São João do

Rio Vermelho no Norte, a freguesia de Santo Antônio de Lisboa no Oeste e a freguesia da Lagoa

da Conceição no Leste (Fuhr & Dal Santo, 2009).

1950 1970 1990

2000 2010

Figura 2-5: Crescimento da cidade de Florianópolis (Fonte: Plamus)

10

O relevo local definiu o traçado da cidade, sendo um elemento definidor das vias e

praças, orientando o crescimento e sua consolidação. A mancha urbana é descontínua, derivada

de feições geomórficas dinâmicas. Como se pode observar pela Figura 2-6, no continente a

mancha urbana é bastante concentrada e pela Figura 2-7 observa-se que tem uma malha

ortogonal. Por outro lado, na ilha a mancha urbana é mais concentrada junto ao litoral, sendo

que no interior não existe urbanização uma vez que é nesse local que o relevo é mais acidentado,

o solo não é propício à construção ou é onde estão situadas as lagoas. Nessas zonas no litoral

a malha urbana é em espinha, caracterizada por várias ruas longas paralelas entre si e que se

ligam a uma rua comum principal perpendicular. Este tipo de malha urbana em espinha pode ser

bem observado na no Campeche (Figura 2-8).

Uma das principais características da Ilha de Santa Catarina é a classificação de 42%

do seu território como Área de Preservação Permanente.

Figura 2-7: Pormenor da malha urbana no Centro de Florianópolis (Fonte: Google Maps (2015))

Figura 2-8: Pormenor da malha urbana na zona do Campeche (Fonte: Google Maps (2015))

Figura 2-6: Mancha urbana da AMF com destaque para a zona do Centro e do Campeche (Fonte: http://www.skyscrapercity.com/showthread.php?t=1642409)

Campeche

Centro

11

3 - A procura de transportes

Caracterização demográfica e socioeconómica

3.1.1 - Evolução da população e densidades

Florianópolis e Lisboa estão situadas em contextos geográficos bastante distintos, no

entanto existem semelhanças na divisão do território para fins político-administrativos sendo que

as diferenças se encontram apenas a nível da nomenclatura. Tais semelhanças podem ser

naturalmente explicadas pelo facto de o Brasil ter sido colónia de Portugal por mais de 300 anos.

Ambas as cidades, consideradas Municípios, constituem níveis de governo já que a sua

administração, em Lisboa, cabe ao Presidente da Câmara Municipal e em Florianópolis cabe ao

Prefeito Municipal. O concelho de Lisboa encontra-se ainda dividido em 24 freguesias (Figura

3-1) enquanto Florianópolis é dividida em 12 distritos administrativos (Figura 3-2). As freguesias

são geridas pelos Presidentes das Juntas de Freguesia, enquanto que os distritos no Brasil são

geridos pela mesma administração que os municípios.

Ao realizar a análise da população residente em cada freguesia no concelho de Lisboa

(Figura 3-3) é notória a grande distribuição de população nos limites do concelho, ou seja, as

freguesias do centro estão bastante menos povoadas e é preocupante a desertificação destas

áreas da cidade. Esta ocorrência pode ser explicada pelo facto de estas freguesias, como as

Avenidas Novas, Campolide ou Santo António, comportarem mais edifícios para serviços ou

comércio e serem pólos de emprego ou pela razão de possuírem edifícios mais antigos e em

estado de degradação, com menores condições de habitabilidade e de difícil acesso em

automóvel, como é o caso de Santa Maria Maior, a nova freguesia que agrupou as antigas

pequenas freguesias do centro medieval de Lisboa.

Figura 3-1: Divisão do concelho de Lisboa por freguesias (Fonte: CML)

Figura 3-2: Divisão do município de Florianópolis em distritos

(Fonte: Prefeitura Municipal de Florianópolis)

12

Por outro lado, ao realizar a mesma comparação para o município de Florianópolis

(Figura 3-4) as diferenças são evidentes. Neste caso mais de 50% da população residente no

município encontra-se concentrada no distrito Sede, isto é, mesmo no centro da cidade. É neste

local que se localizam os serviços mais importantes e os pólos de emprego, sendo que este

distrito se encontra mais desenvolvido que os restantes, tanto em termos de serviços disponíveis

como de transportes.

Figura 3-3: Distribuição da população residente nas freguesias de Lisboa (adaptado pela autora)

2

Figura 3-4: Distribuição da população residente nos distritos de Florianópolis (adaptado pela autora)

13

A grande diferença a nível da população entre as duas cidades é a sua evolução.

Enquanto em Florianópolis a população, desde 1990 até 2010, aumentou quase 65% (IBGE,

2010), em Lisboa no mesmo período houve uma diminuição na população de -18% (INE, 2011),

ou seja, Lisboa tende a perder população enquanto Florianópolis tende a ganhar e em grande

escala. Atualmente Lisboa conta com uma população de cerca de 550 mil habitantes enquanto

que em Florianópolis este número é de 420 mil. Prevê-se que, por volta de 2035, a população

em Florianópolis seja de cerca de 800 mil pessoas, sendo uma expressiva parcela de pessoas

com idade superior a 60 anos, quase triplicando os habitantes acima desta idade.

População

1990 2000 2010

Florianópolis 255 390 342 315 421 203

+34% +23%

Área Metropolitana de Florianópolis

701 346 909 105 1 140 634

Brasil 146 917 459 169 590 693 190 755 799

Quadro 3.1: Evolução da população em Florianópolis, AMF e no Brasil entre 1990 e 2010 (Fonte: IBGE 1990, 2000 e 2010)

População

1991 2001 2011

Lisboa 663 394 564 657 547 733

-15% -3%

Área Metropolitana de Lisboa

2 535 679 2 661 850 2 821 876

Portugal 9 862 540 10 356 117 10 562 178

Quadro 3.2: Evolução da população em Lisboa, AML e em Portugal entre 1991 e 2011 (Fonte: INE 1991, 2001 e 2011)

Nos quadros e gráfico acima (Quadro 3.1, Quadro 3.2 e Figura 3-5) podemos ver as

diferenças significativas da evolução da população nas duas cidades. Apesar de Lisboa ainda

ter maior número de habitantes, se a tendência dos últimos anos se mantiver, prevê-se que que

o número de habitantes em Florianópolis seja bastante mais elevado que em Lisboa. Uma análise

250000

350000

450000

550000

650000

1991 1996 2000 2003 2005 2006 2007 2009 2010

Po

pu

laçã

o (

pe

sso

as)

Ano

Evolução da população entre 1991 e 2010

Florianópolis

Lisboa

Figura 3-5: Gráfico da evolução da população em Lisboa e Florianópolis

14

aprofundada revela que desde os anos 70 Lisboa tem vindo a perder população de forma

aproximadamente constante mas é notável a mudança ocorrida de 2009 para 2010, onde esta

tendência se inverteu e o ritmo de perda reduziu muito. Entre 1991 e 2001 a cidade portuguesa

perdeu 100 mil habitantes, enquanto que nesta última década perdeu apenas 15 mil.

Pelo contrário, na cidade brasileira a tendência para o crescimento da população tem

sido bastante acentuada, com crescimentos por década à volta dos 30%. Estudos apontam

também que esta cidade cresceu o dobro da média brasileira entre 2000 e 2010. Este incremento

pode ser explicado por dois movimentos migratórios: os de pessoas que vão do interior do estado

de Santa Catarina, atraídas pelo título de Capital, e os de moradores de outros estados do Brasil

que são seduzidos pela propaganda da cidade, como Capital brasileira que tem qualidade de

vida e que se situa no litoral.

Existe ainda outro acontecimento em Portugal que contribui para esta perda de

população, principalmente jovem, na cidade de Lisboa: a crise económica desencadeada em

2008. As previsões da Comissão Europeia apontam para uma redução acumulada de 1,3%

(cerca de 130 mil pessoas) resultante do crescente desemprego e falta de qualidade de vida. Há

menos estrangeiros a chegar a Portugal e muitos mais portugueses a sair do país, contribuindo

também para o envelhecimento da população. Se há 20 anos se assistia a uma forte imigração

de brasileiros para Portugal, hoje em dia ocorre precisamente o contrário e são os portugueses

que procuram melhores condições de vida no maior país da América do Sul.

Segundo o INE, tem-se assistido a perdas populacionais no centro urbano de Lisboa (-

2,9%) entre 2001 e 2011, em detrimento dos municípios circundantes que integram a área

metropolitana. No caso destes municípios registou-se um crescimento populacional expressivo

em Mafra (mais 41,1%), Alcochete (35%), Sesimbra (31,8%), Montijo (30,8%) e Cascais (20,9%).

Este crescimento pode ser explicado pela melhoria ou construção de novas vias de acesso, como

é o caso da Ponte Vasco da Gama ou ligação da autoestrada A5 a pólos tecnológicos, e pelo

menor custo de vida apresentado nestes locais em comparação com o município de Lisboa.

Segundo dados do IGBE (2010), tanto Florianópolis, como a sua Área Metropolitana

continuam com crescimento populacional tal que o município apresentou um crescimento de 23%

enquanto para a área metropolitana esse valor é de 25,5%. Esta grande procura deve-se à

qualidade de vida aqui existente aliada às belezas naturais. O Programa das Nações Unidas

para o Desenvolvimento classificou a cidade de Florianópolis em 2013 com um Índice de

Desenvolvimento Humano de 0,847, tornando esta a capital brasileira com o melhor IDH. Este

índice é calculado com base em três dimensões: uma vida longa e saudável, acesso ao

conhecimento e um padrão de vida decente.

A partir de 1990 a população local de Florianópolis e os turistas cresceram de forma

expressiva, o que resultou em grandes e rápidas alterações nos padrões de uso e ocupação do

solo, mas sem o planeamento necessário. Florianópolis consolidou-se como um centro turístico

de renome da América Latina, em grande parte pelas belezas naturais e pelo incentivo político e

económico realizado pelos governantes e empreendedores locais. A partir do ano 2000, além de

15

ser um centro político e um centro turístico, Florianópolis transformou-se também num centro

tecnológico importante.

Uma das características mais importantes de Florianópolis, e que não pode deixar de ser

referida, é a população flutuante que esta comporta nos meses de Verão. A cidade recebe 1

milhão de turistas na temporada (Ministério do Turismo, 2013), mais de duplicando a sua

população normal, enfrentando dificuldades relacionadas com os serviços básicos, tal como,

tratamento de esgotos, abastecimento de água, eletricidade e trânsito. Esta elevada afluência à

cidade deve ser prevista nos planos de mobilidade e devem ser pensadas soluções para esses

meses. Da mesma maneira Lisboa recebe 1,4 milhões de turistas na temporada de verão

(Turismo de Portugal, 2013) no entanto, a cidade está um pouco mais preparada para os receber

com melhores facilidades e infraestrutura.

Pela análise das pirâmides etárias nas duas cidades as diferenças são óbvias.

Lisboa mantém a tendência de envelhecimento demográfico traduzido quer no topo da

pirâmide etária pelo seu alargamento, que corresponde ao acréscimo das pessoas idosas,

devido ao aumento da esperança de vida, quer pelo estreitamento na base da pirâmide

correspondente à baixa da natalidade (Figura 3-7).

Entre 2001 e 2011, a proporção de jovens e de indivíduos em idade ativa decresceu

aproximadamente 1% da população residente total, mas ocorreu um aumento da percentagem

de idosos fazendo com que o índice de envelhecimento aumentasse para 128 idosos por cada

100 jovens. O grupo etário com maior representatividade são os adultos entre os 35 e os 40

anos.

Em Florianópolis, apesar de começar a ocorrer um envelhecimento da população de

forma lenta, os jovens adultos (entre 25 e 29 anos) ainda são o grupo etário com maior

representatividade e a pirâmide etária apresenta maior concentração da população nas camadas

mais jovens, onde os jovens representam 34% da população, os adultos 57,5% e os idosos

apenas 8,5% (Figura 3-6). Nesta cidade, a taxa de envelhecimento, razão entre a população de

65 anos ou mais de idade em relação à população total, é de 7,5%.

Florianópolis Lisboa

Figura 3-7: Distribuição da população por sexo, segundo a idade, em Lisboa (Fonte: INE, 2011)

Figura 3-6: Distribuição da população por sexo, segundo os grupos de idade, em Florianópolis (Fonte: IBGE, 2010)

2010 2000

16

As diferenças entre Florianópolis e Lisboa não estão apenas limitadas às condições

geográficas sendo evidentes também em termos de escala. Enquanto mais de 420 mil habitantes

distribuem-se em uma área de 436,5 km2 em Florianópolis, os cerca de 550 mil habitantes de

Lisboa ocupam uma área equivalente a 100 km2. No entanto, Florianópolis apresenta uma área

significativa de zonas verdes e protegidas, ou seja, a área urbana efetiva é bastante menor, de

cerca de 300 km2. Como resultado tem-se uma densidade não uniformemente distribuída de

cerca de 14 habitantes/ha para Florianópolis e de 55 habitantes/ha para Lisboa.

3.1.2 - Emprego e pólos geradores de tráfego

Na primeira década deste século, o crescimento económico não acompanhou o

crescimento demográfico de Florianópolis. O crescimento do PIB no ano de 2009 foi de 15%, ou

seja, mesmo verificando-se o aumento do Produto Interno Bruto, a população ampliou-se em

ritmo mais acelerado. Tradicionalmente, a economia da Cidade baseou-se em quatro setores

principais: a administração pública, os serviços, o comércio e a construção civil. Mas tais

segmentos têm vindo a perder peso para novas atividades, com destaque para o turismo, a

aquacultura e a indústria ligada às novas tecnologias.

Figura 3-9: Densidade populacional de Florianópolis (adaptado pela autora)

Figura 3-8: Densidade populacional de Lisboa (adaptado pela autora)

17

1500

3500

5500

7500

9500

2002 2004 2006 2008 2010

Milhões de Reais

PIB

Por outro lado, Lisboa tem assistido, na última década, a uma falta de crescimento da

economia, refletindo-se na queda sistemática do investimento privado, com natural impacto na

evolução desfavorável da produtividade e do nível de competitividade externa. O desemprego

em 2013, segundo um estudo do Eurostat, foi de 18,5% e o crescimento do PIB foi de apenas

1,4%. Os principais setores da economia são os serviços, o comércio e o turismo. Lisboa tem o

porto marítimo mais ativo da costa atlântica europeia e a maioria das sedes multinacionais

existentes em Portugal estão situadas nesta cidade. A economia neste local é também muito

apoiada na indústria com refinarias de petróleo, indústrias têxteis, estaleiros, siderurgia e

pesca. O turismo tem sido um dos suportes da economia na Europa durante a crise económica

e tem-se também apostado na economia criativa, com o design, artes e cultura.

Na cidade brasileira em 2010, da população ativa, 67% trabalhava no setor de serviços,

16% no comércio e os restantes dividiam-se por setores de utilidade pública, indústria de

transformação e sector da construção (IBGE, 2010). O setor terciário é o mais expressivo da

capital de estado, sendo integrado pelas sedes do governo estadual, representações de órgãos

e entidades federais, atividades bancárias, educacionais, saúde e turismo. Sendo assim, é

possível concluir que os principais pólos geradores de tráfego são os locais com maior

concentração de serviços e tecnologia, isto é, o centro da cidade, parques tecnológicos e

universidades, como se pode observar na Figura 3-15. Os principais pólos tecnológicos situam-

1 250

1 300

1 350

1 400

1 450

1 500

1995 1997 1999 2001 2003 2005 2007 2009 2011*

Milhares de pessoas

30 000

40 000

50 000

60 000

70 000

1995 1997 1999 2001 2003 2005 2007 2009 2011

Milhões de euros PIB

Figura 3-11: Gráfico da evolução do PIB em Lisboa entre 1995 e 2011 (Fonte: http://www.cm-lisboa.pt/investir/investimento/lisboa-em-

numeros/economia-de-lisboa-em-numeros)

Figura 3-10: Gráfico da evolução do emprego em Lisboa entre 1995 e 2011

(Fonte: http://www.cm-lisboa.pt/investir/investimento/lisboa-em-numeros/economia-de-lisboa-em-numeros)

Figura 3-13: Gráfico da evolução do PIB em Florianópolis entre 2002 e 2010

(Fonte: http://necat.ufsc.br/files/2011/10/Lucas-Correa-de-Souza.pdf)

Figura 3-12: Evolução do emprego em Florianópolis entre 1991 e 2005

(Fonte:www.apec.unesc.net/I%20EEC/sessoes_tematicas/Eco_Social_trabalho/artigo7a.pdf)

18

se ao longo da Rodovia SC 401 (Figura 3-14). O centro de Florianópolis, a UFSC e a Avenida

Beira Mar são os pólos de emprego mais importantes e que mais tráfego geram.

Com a atual conjuntura económica em Portugal, a capital nacional começou a apostar

em sectores não tradicionais de economia como a economia criativa, economia do mar, saúde,

economia digital e comércio. Apesar disso, os setores com mais expressão nesta cidade são

ainda os serviços e comércio assim como a investigação e desenvolvimento, à semelhança de

Florianópolis.

Figura 3-15: Localização dos principais pólos geradores de tráfego e atividades económicas (Fonte: Floripa 2030)

Figura 3-14: Rota da Inovação que inclui aeroporto, universidades, parques tecnológicos, centros

empresariais e órgãos do governo (Fonte: http://www.sapiensparque.com.br/)

19

Figura 3-16: Principais pólos geradores de tráfego em Lisboa (Fonte: DMMT - CML, 2011)

É possível verificar que, em Lisboa, grande parte dos Pólos Geradores se encontram

concentrados desde a Baixa, pelas Avenidas Novas até ao Campo Grande. Com a criação de

uma nova centralidade no Parque das Nações, este passou também a ser um pólo gerador de

tráfego devido ao elevado número de empresas e serviços que aí se situam.

Taxa de motorização e consumo de combustíveis

Segundo o INE, em 2011, 98% do parque automóvel de Portugal era constituído por

veículos ligeiros, menos 0,01% que no ano anterior. Verificou-se uma quebra generalizada em

todos os tipos de veículos, com exceção dos ligeiros de passageiros que cresceram 0,08%, um

crescimento muito pouco significativo. Os veículos de passageiros representavam cerca de 78%

do parque de ligeiros, sendo que a taxa de motorização em Portugal era de 443 veículos ligeiros

de passageiros por 1 000 habitantes.

No total de veículos, a taxa de motorização em 2007 no concelho de Lisboa era de 601

veíc./1.000 hab. Na Figura 3-17 mostra-se a evolução da taxa de motorização em Lisboa, que

apesar de ter sofrido algumas quebras em determinados anos, nos últimos anos tem vindo a

aumentar.

20

Segundo dados do Departamento Estadual de Trânsito (Detran), em cinco anos, o

número de veículos ligeiros aumentou 22% e o de motos 51%, o equivalente a 23 novos veículos

por dia em Florianópolis, como se observa na Figura 3-18.

Segundo o IBGE, em 2010, 68% da frota automóvel de Florianópolis era constituído por

veículos ligeiros, sendo que no total a taxa de motorização é de 428 veíc./1.000 hab, bastante

menor quando comparada com Lisboa. A grande diferença entre as duas cidades é, ainda, o

número de veículos na temporada de verão que em Florianópolis é quase o dobro do que no

resto do ano.

Figura 3-17: Evolução da taxa de motorização em Lisboa e na AML (Fonte: Instituto de Seguros de Portugal, 2008)

Figura 3-18: Evolução da frota de veículos na Grande Florianópolis (Fonte: Plamus, 2014)

21

Segundo dados da Petrobras, no ano de 2011 o consumo de gasolina no Brasil teve um

crescimento de 23% em relação a 2010, enquanto que entre 2009 e 2010 essa diferença tinha

sido de 18%. O consumo de combustível em Florianópolis tem vindo a crescer de ano para ano,

acompanhando a taxa de motorização, como mostrado na Figura 3-19.

A partir de 2005 houve uma quebra contínua no consumo de combustível em Portugal

(Figura 3-20), sendo que em 2011 o consumo de gasolina apresentou um decréscimo de 9% e

o de gasóleo de 6%, maioritariamente devido à conjuntura económica do país. Esta tendência

mostra a procura de novas alternativas mais económicas e ecológicas em comparação com os

combustíveis tradicionais.

À semelhança do que acontece em outras cidades europeias, a descentralização

populacional é cada vez mais uma realidade em Lisboa, tanto da zona central do concelho para

os seus limites como da cidade em direção a outros concelhos da Área Metropolitana. No centro

Figura 3-19: Evolução do consumo de combustível no transporte rodoviário de passageiros em Santa Catarina (Fonte: SINDICOM, 2012)

Figura 3-20: Venda de combustíveis em Portugal (Fonte: PORDATA, 2012)

22

os espaços estão a ficar vazios de residentes, estando mais focados para a área de serviços e

emprego, e a progressão do envelhecimento manifesta um grau particularmente intenso. Pelo

contrário, os concelhos periféricos manifestam elevados acréscimos populacionais mantendo

uma taxa jovem aproximadamente constante.

A taxa de motorização não tem apresentado crescimentos significativos mas o consumo

de combustível tem vindo a diminuir, dando lugar a novas alternativas mais sustentáveis.

Florianópolis apresenta uma situação comparável à de muitas cidades em países

emergentes, com um crescimento de população acentuado. Esta população é jovem,

maioritariamente em idade ativa e encontra-se concentrada no centro da cidade. Os municípios

em volta manifestam também um incremento demográfico, ainda que a um ritmo menos

acelerado. É uma cidade em crescimento, tanto no que se refere à economia e evolução de

emprego como à taxa de motorização e consumo de combustível.

Repartição Modal

A repartição modal pode ser definida como a divisão do total de viagens realizadas pelas

pessoas entre diferentes modos de transporte, ou seja, a alocação das viagens pelos diferentes

meios. Havendo opção de escolha para os utilizadores, a determinação do número de viagens

realizadas através de cada modo disponível permite dimensionar as frotas de modo a atender a

procura.

A análise deste indicador é importante, não só a nível interno da cidade como na

comparação entre as duas cidades, pois permite avaliar as decisões dos usuários e a qualidade

do serviço oferecido.

O fluxo com maior expressão no concelho de Lisboa é o fluxo de entrada de veículos.

Das 364.500 entradas registadas, mais de metade são realizadas em transporte coletivo e 46%

em transporte individual. Este facto pode ser explicado pelo menor poder de compra da

população que reside nos concelhos em torno de Lisboa e pela relação custo-tempo dessa

deslocação que se verifica mais atrativa para o uso do transporte coletivo.

Pelo contrário, das viagens realizadas internamente em Lisboa, o meio de transporte que

assume maior expressão é o individual, seguido logo pelo transporte coletivo. É também dentro

do concelho que o modo pedonal é mais utilizado. O tempo médio de viagem (até 30 minutos) é

bastante menor que para viagens de entrada em Lisboa (entre 30 e 60 minutos).

Nos movimentos de saída de Lisboa o transporte individual tem maior representatividade.

Estes movimentos são realizados para concelhos próximos e, como são no contra fluxo do

tráfego, o tempo de viagem é relativamente baixo, menos de 30 minutos.

Pela comparação da repartição modal entre 1991 e 2011 constata-se que tem havido

uma maior utilização do transporte individual e que o transporte coletivo tem vindo a perder

relevância. Enquanto que em 2001, 35% das viagens internas em Lisboa eram realizadas com

recurso ao transporte individual, em 2011 esse valor era já de 45%, enquanto que esses valores

23

para o transporte coletivo diminuíram de 40% para 35%. Os modos suaves ainda têm pouca

representatividade na mobilidade da população. Esta situação pode ser analisada no Quadro

3.3.

A melhoria de acessos ao concelho de Lisboa e da rede interconcelhia, nomeadamente

o aumento e melhoria da rede de autoestradas, a urbanização de terrenos agrícolas e a

construção de infraestruturas básicas, conduziu à disseminação generalizada da população pela

AML e a uma maior utilização do TI. A procura de novas localizações de residência e de emprego,

assim como as alterações demográficas, originam transformações ao nível da procura de

transporte e das características da mobilidade metropolitana.

1991 2001 2011

Internos em Lisboa

301 567 283 400 267 722

Repartição Modal TI TC Pedonal Bicicleta TI TC Pedonal Bicicleta TI TC Pedonal Bicicleta

22% 50% 25% nd 35% 40% 23% nd 45% 35% 19% 0,21%

Duração (min.) ≤ 15

16 - 30

31 - 60 ≥ 61

> 90

≤ 15

16 - 30

31 - 60 > 60 ≤ 15

16 - 30

31 - 60 > 60

33% 35% 26% 6% 39% 39% 19% 3% 42% 40% 16% 1%

De entrada em Lisboa

291 383 382 030 364 523

Repartição Modal TI TC Pedonal Bicicleta TI TC Pedonal Bicicleta TI TC Pedonal Bicicleta

26% 64% 0,59% nd 42% 54% 0,47% nd 46% 53% 0,69% 0,05%

Duração (min.) ≤ 15

16 - 30

31 - 60 ≥ 61

> 90

≤ 15

16 - 30

31 - 60 > 60 ≤ 15

16 - 30

31 - 60 > 60

2% 13% 46% 40% 4% 22% 49% 25% 5% 25% 52% 16%

De saída de Lisboa

27 664 35 326 38 719

Repartição Modal TI TC Pedonal Bicicleta TI TC Pedonal Bicicleta TI TC Pedonal Bicicleta

35% 49% 1,87% nd 65% 32% 1,57% nd 74% 24% 1,03% 0,06%

Duração (min.) ≤ 15

16 - 30

31 - 60 ≥ 61

> 90

≤ 15

16 - 30

31 - 60 > 60 ≤ 15

16 - 30

31 - 60 > 60

9% 26% 37% 28% 12% 40% 34% 14% 14% 46% 32% 6%

Quadro 3.3: Repartição modal das deslocações na AML por motivo de emprego e estudo1 (Fonte: INE 1991, 2001 e 2011, disponibilizado pelo Eng. Gonçalo Caiado da CML)

Em Florianópolis é o transporte individual o meio mais utilizado e o fluxo com mais

expressão é o de entrada na ilha, tal que a atração de viagens é bastante maior que a produção,

ou seja, os movimentos continente-ilha são os mais importantes a estudar. O transporte individual

representa 48% do transporte total utilizado nas viagens internas em Florianópolis, praticamente

o mesmo que em Lisboa. Para viagens de entrada na cidade, há uma grande discrepância com

Lisboa, dado que 88% das mesmas são realizadas com recurso a transporte individual

(automóvel e motociclo) e só 3% com recurso a transporte coletivo. Note-se que o único ponto

de entrada na ilha de Santa Catarina são as pontes Colombo Salles e Pedro Ivo Campos.

1 Nos anos de 1991 e 2001 não foi incluído o concelho da Azambuja; o TI não inclui motociclos; os movimentos

de entrada em Lisboa apenas contemplam os que têm origem noutros concelhos da AML da mesma forma que

os de saída de Lisboa apenas incluem os que têm como destino outros concelhos da AML

24

48%

26%

26%

TransporteIndividual

TransporteColectivo

Transporte NãoMotorizado

A maior diferença na repartição modal entre as duas cidades é na utilização do transporte

coletivo e do meio pedonal e bicicleta, que em Florianópolis é igual nos dois casos enquanto em

Lisboa as viagens realizadas por meios não motorizados ainda não têm grande expressão.

Para a cidade brasileira não é possível fazer a comparação da repartição modal com

anos anteriores dada a falta de dados disponíveis. No entanto, analisando a taxa de motorização,

que sofreu um grande crescimento nos últimos tempos, é possível concluir que não só o

transporte coletivo tem vindo a ser substituído pelo privado, como há mais população a trabalhar

no centro da cidade e a deslocar-se de automóvel.

A principal razão para a grande utilização do transporte individual em Florianópolis é a

fraca qualidade do transporte coletivo, o facto de o automóvel ainda ser visto como um sinal de

estatuto social, a grande melhoria das vias de comunicação e principalmente o custo direto da

viagem2, que é menor para o automóvel. Aliadas a estas razões ainda se conta o tempo de

viagem, que para o transporte coletivo (60 minutos) é o dobro do privado (30 minutos).

Na comparação de Lisboa e Florianópolis com outras cidades mundiais na utilização do

automóvel no total de viagens (Figura 3-22), verifica-se que estão ambas entre as cidades que

mais utilizam este meio de deslocação, um problema que deve ser rapidamente solucionado.

2 Entenda-se por custo direto de viagem de automóvel o custo da gasolina, do estacionamento e de portagens quando aplicável.

Figura 3-21: Repartição modal em Florianópolis (Fonte: Plamus, 2014)

25

Utilizadores do TC e evolução da procura

Dos 2.383.995 residentes na AML com 15 e mais anos, 43% é utilizador frequente de

transporte público, 16% são ex-utilizadores e 41% não utilizam este meio de transporte. É na

idade adulta (dos 35 aos 64 anos) que os TC são menos utilizados, enquanto são os jovens que

mais utilizam, assim como é na classe social mais baixa que se verifica a maior percentagem de

utilizadores.

Quando questionados sobre os motivos porque não utilizam os transportes coletivos, as

principais razões apontadas foram o tempo e o custo de deslocação quando comparado com o

transporte individual, assim como a comodidade/qualidade do sistema de transportes públicos.

60% dos não utilizadores ainda referiram que de certeza não virão a utilizar o TC, ou seja,

quaisquer que sejam as melhorias feitas no TC esta grande parte da população não irá substituir

o TI como meio de eleição (AMTL/ISCTE, 2014).

Os utilizadores do TC da AML têm uma ideia globalmente positiva destes transportes e

afirmam que o principal motivo para a utilização é económico. As barreiras à sua utilização são

o cansaço e fadiga psicológica, incumprimento de horários e o conforto e logística.

A principal razão apontada para a utilização do transporte coletivo na cidade brasileira é

por ser a única opção disponível. Se o transporte coletivo oferecesse as condições certas, como

boa relação custo-benefício, maior frequência ou mais rápidos, 82% dos usuários do automóvel

dizem estar dispostos a utilizar o transporte coletivo, uma grande diferença em comparação com

Lisboa (onde apenas 40% declaravam essa possibilidade).

Relativamente à procura de TC em Lisboa, verifica-se um decréscimo acentuado ao

longo dos anos justificado pela redução da mobilidade da população, devido à conjuntura

económica do país e à manutenção de uma elevada taxa de desemprego. A melhoria dos

acessos rodoviários é também um fator justificativo.

0% 20% 40% 60% 80% 100%

Melbourne

Chicago

Florianópolis

Lisboa

Londres

Barcelona

Nova Iorque

Paris

Madrid

Hong Kong

Figura 3-22: Percentual do automóvel no total de viagens em várias cidades

26

Também em Florianópolis a procura do transporte coletivo tem vindo a diminuir.

Enquanto em 2011, 34% da população utilizava esse meio de transporte, em 2014 esse valor é

já de 26%. Isto é consequência direta da perda de produtividade e atratividade do TC e aumento

crescente do preço da tarifa. Soma-se ainda a facilidade cada vez maior na aquisição de um

veículo particular.

Modos Suaves

Atualmente uma das principais dificuldades da mobilidade nas cidades é a falta de

sustentabilidade do sistema de transportes. Tem sido colocado um ênfase especial nos modos

pedonais e cicláveis como parte da solução para problemas típicos do tráfego automóvel nas

cidades, como os congestionamentos, desertificação do centro urbano e obesidade infantil. É

necessária uma abordagem interdisciplinar de profissionais da área para criar comunidades

saudáveis, sustentáveis e habitáveis.

A FHWA (2006) identificou um vasto conjunto de benefícios na utilização de modos

suaves como meio de transporte, que vão desde aspetos ambientais até melhorias no

funcionamento do sistema de transportes. Promovem a coesão social e a equidade, ganha-se a

consciência do “outro” e da comunidade, gerando interação social. Tornam a cidade mais segura

com a vigilância natural dos espaços públicos e ajudam a economia local, uma vez que as

pessoas são mais atraídas para o comércio de rua. Vantagens em termos do sistema de

transportes estão relacionadas com a diminuição dos congestionamentos de tráfego, a melhoria

da qualidade do ar e a diminuição dos custos de transportes.

De acordo com a Figura 3-23, os modos de transporte mais eficientes em termos de

tempo percorrido por quilómetro para viagens de curta duração são os modos suaves,

especialmente o modo ciclável. A bicicleta tem vindo a conquistar o seu espaço na atualidade

como uma alternativa ao transporte particular e um complemento ao transporte público, em

percursos de curta distância (até 6km).

Figura 3-23: Tempo de viagem por distância percorrida por modo (Fonte: EC, 2000)

27

Os modos suaves têm vindo a aumentar a sua relevância nos últimos anos, sendo que,

atualmente, são considerados o modo de transporte ao qual deve ser dada mais importância

para uma mobilidade sustentável.

Na cidade de Lisboa tem-se observado um desenvolvimento notável da infraestrutura

dedicada aos modos suaves no centro da cidade, no entanto, não se verifica ainda um aumento

da utilização dos mesmos. A utilização do modo pedonal na última década, diminuiu de 23% para

19% e o uso da bicicleta tem uma representação de apenas 0.21% para movimentos dentro do

concelho.

Também no Brasil os projetos relacionados com mobilidade sustentável ganham uma

nova relevância, sobretudo aqueles cujo objetivo passa por mudar a mentalidade dos cidadãos

brasileiros no que toca a este tema. Só em 2014 foi lançado um estudo sobre a sinalização

urbana voltada para pedestres e ciclistas que concluiu que as cidades brasileiras têm 90% dos

sinais de trânsito voltados apenas para os condutores de veículos motorizados.

Apesar de a infraestrutura para modos suaves ainda não estar muito desenvolvida em

Florianópolis, a utilização destes modos representa 26% do total de viagens, sendo o modo

pedonal o mais utilizado.

Tanto na generalidade do município português como no brasileiro, a rede de transporte

pedonal apresenta um ambiente hostil para os seus utilizadores, consequência da falta de

planeamento.

Quanto a projetos em curso nos respetivos municípios, encontra-se em fase de execução

o Plano de Acessibilidade Pedonal de Lisboa por parte da CML que prevê a adaptação de

espaços já existentes e novas medidas de apoio à mobilidade suave a pé. Quanto a Florianópolis,

o Plamus propõe algumas soluções para os modos suaves, nomeadamente a criação de zonas

30 e desenvolvimento de ciclovias.

Tem sido convicção generalizada que em Lisboa, a “cidade das sete colinas”, a maior

parte das ruas tem uma inclinação longitudinal elevada, dificultando o acesso pedonal. Segundo

a CML (2014), a situação não é tão complexa como se pensava. Apesar de as características

orográficas da cidade tornarem o planeamento mais complicado, os declives em mais de 70%

das ruas não ultrapassam os 5%, ou seja, a acessibilidade a pé no espaço público é

perfeitamente aceitável e deve ser promovida. Outra das características do território do concelho

de Lisboa é o facto de este ser maioritariamente consolidado, implicando que a melhoria das

condições de acessibilidade passa pela adaptação da edificação existente.

Também Florianópolis possui uma orografia complexa com diversos morros, mas entre

eles as zonas planas são extensas, como por exemplo o centro da cidade. Ultrapassando essas

dificuldades de elevada inclinação, a solução torna-se mais simples. Na Figura 3-25 é possível

localizar as zonas com maior potencial pedonal.

28

A análise do Mapa de Potencial Pedonal de Lisboa (Figura 3-26) revela que o centro

concentra a maior parte do potencial pedonal, nomeadamente a Baixa, colinas e zona

consolidada das Avenidas Novas até Entrecampos e Alvalade. Os pólos geradores do Parque

das Nações, Benfica, Alta de Lisboa e Alcântara têm também grandes concentrações de

potencial pedonal. Na Baixa e centro histórico existem diversas ruas dedicadas aos pedestres, a

Avenida da Liberdade (Figura 3-27) é também um bom exemplo de incentivo aos modos suaves

e os corredores verdes existentes permitem atravessar a pé ou de bicicleta quase a totalidade

da cidade.

Figura 3-25: Identificação das zonas com maior potencial pedonal em Florianópolis

(Fonte: Google Maps, 2015, adaptado pela autora)

Figura 3-26: Mapa de Potencial Pedonal de Lisboa (Fonte: CML, 2013)

29

Na generalidade do território de Lisboa existem diversos problemas na rede pedonal:

excessivo mobiliário urbano nos passeios; inadequação na provisão, dimensionamento e

sinalização de travessias pedonais; dimensionamento inadequado dos tempos de verde para os

peões, informação sinalizada deficiente e reduzida largura dos passeios. Uma das principais

causas de acidentes na rede pedonal, excluindo atropelamentos, é o revestimento dos passeios:

a típica calçada portuguesa não é o material mais adequado para promover uma mobilidade

segura, uma vez que, com falta de manutenção, potencia quedas e escorregamentos, sendo

mais gravoso em locais com inclinação.

O centro de Florianópolis tem ruas exclusivamente pedonais com diversos serviços

comerciais sediados no andar térreo dos edifícios históricos, como o Calçadão da Rua Felipe

Schmidt. A Avenida Beira-Mar Norte, que liga o centro da cidade à UFSC, possui na sua extensão

um calçadão e ciclovia de 8km. Estas infraestruturas são muito utilizadas pela população

residente tanto para atividades recreativas como para deslocação, no entanto, a falta de sombra

e a sua proximidade à rede viária com 3 vias por sentido são fatores negativos para a sua

utilização. Estas ruas são exceção comparativamente ao resto da ilha, pois no geral os passeios

têm uma largura reduzida e são cercados por condomínios privados, desincentivando o sentido

de comunidade, como se pode observar nas Figuras 3.28 e 3.29. Apresenta também os mesmos

problemas descritos para Lisboa, sendo neste caso mais gravosa a falta de sinalização para

pedestres.

Figura 3-27: Avenida da Liberdade, um exemplo de boas condições para o modo pedonal

(Fonte: http://expatinlisbon.com/2011/10/28/lisbon-random-photos-and-memories/)

30

A mobilidade por bicicleta só nos últimos anos começou a ter relevância e Lisboa tem já

projetos de investimento nesta rede de transporte. A rede de Percursos e Corredores (Figura

3-30), com mais de 40 km, liga os principais parques e áreas verdes da cidade por vias cicláveis

e pretende ser um complemento ao sistema de transportes local e regional. Possui mais de 40

equipamentos de apoio ao uso da bicicleta, particularmente para estacionamento das mesmas,

localizados nos mercados municipais, aeroporto, terminais ferroviários e fluviais ou perto das

estações de metropolitano.

A rede de mobilidade ciclável é bastante percetível, principalmente em parques urbanos

para atividades recreativas, como Monsanto, no entanto, notam-se descontinuidades

significativas. No futuro espera-se uma rede ciclável contínua de malha fechada, articulada com

Figura 3-28: Avenida Mauro Ramos (Fonte: Google Street View, 2008)

Figura 3-29: Rua Dep. Antônio Edu Vieira, junto à UFSC (Fonte: Google Street View, 2008)

Figura 3-30: Rede de Percursos e Corredores em Lisboa (Fonte: CML, 2013)

31

Figura 3-32: Rede Ciclável de Florianópolis (Fonte: Plamus, 2015)

os transportes públicos e com o património ecológico e cultural. A Avenida Duque de Ávila (Figura

3-31) apresenta uma ciclovia recente, um bom exemplo que pode ser extrapolado para a restante

cidade.

A rede ciclável em Florianópolis (Figura 3-32) tem uma extensão de 43 km, mas estão já

propostos para construção mais 250km de modo a promover a ligação entre o norte, este e centro

do município. Está previsto um sistema de aluguer de bicicletas para o próximo ano que contará

com 85 estações e 850 bicicletas. Atualmente o maior problema da rede de modos suaves em

Florianópolis é a falta de continuidade das vias de passeio e ciclovias e as diferentes dimensões

de um mesmo passeio.

Figura 3-31: Avenida Duque de Ávila (Fonte: http://blog.streetics.com/2012/06/avenida-duque-de-avila-estabelece-um.html)

32

3.2 km

Figura 3-33: Raio alcançável por modos pedonais e de bicicleta no Centro de Florianópolis (Fonte: Google Maps, 2008, adaptado pela autora)

A distância média que um pedestre está disposto a percorrer antes de optar por utilizar

o automóvel depende de diversos elementos, mas é aceite uma distância até 800 metros. Ao

analisar esta distância para o centro de Florianópolis verifica-se que toda a parte central está

incluída nesta extensão, ou seja, é possível percorrer grande parte da área a pé. Considerando

a distância ideal a percorrer de bicicleta até 6 km, verifica-se que, com apenas 1.2km, alcança-

se também todo o centro, fazendo a conexão com a UFSC e a parte continental. Conclui-se que

estão reunidas todas as condições para promover a adoção de modos suaves, só é preciso

providenciar a infraestrutura ideal para isso. Na Figura 3-33 é possível identificar esta

oportunidade.

Fazendo a mesma análise em Lisboa, também é possível cobrir todas as áreas centrais

e onde os volumes de tráfego são maiores, utilizando a bicicleta, como se vê na Figura 3-34. É

urgente pensar medidas que permitam a troca do automóvel pela bicicleta, seja pela permuta

total ou pelo complemento do TI com esta. Só estas medidas seriam responsáveis por uma

grande diminuição dos congestionamentos verificados naquelas áreas.

6 km

Figura 3-34: Raio alcançável por modos pedonais e de bicicleta no centro de Lisboa (Fonte: Google Maps, 2008, adaptado pela autora)

33

As ações postas em prática ao longo do tempo no sentido de melhorar o sistema de

transportes nas duas cidades, focadas na gestão e melhoria do tráfego e com vista ao aumento

da velocidade de circulação, resultaram por vezes na degradação da qualidade e segurança das

deslocações em modos suaves.

O que a experiência de Lisboa demonstra, e que pode ser extrapolado para Florianópolis,

é que sem um plano é difícil ou impossível planear modificações imprescindíveis, projetar

financiamentos, aproveitar oportunidades e prevenir a deterioração da situação. Sem um plano,

a câmara municipal não consegue ter uma ação eficaz e o processo será mais oneroso.

34

4 - A oferta de transportes

Rede rodoviária e estacionamento

4.1.1 - As redes rodoviárias e a sua cobertura espacial

A metodologia de planeamento e coordenação da mobilidade, especialmente no

transporte individual, tem adotado soluções contínuas de construção de novas infraestruturas

para responder ao aumento da procura de transporte. Esta abordagem “Predict and Provide”3

acarreta como consequência o crescimento acentuado da utilização do veículo automóvel,

promovendo um sistema de mobilidade insustentável do ponto de vista energético.

A rede viária deve ser planeada considerando a sua interação com as restantes redes

de transporte e com o estacionamento.

A análise da rede viária de uma cidade é essencial para definir a acessibilidade que pode

proporcionar, sendo que para isso começa por analisar-se a sua distribuição, densidade,

potencialidades e debilidades. Pretende-se desse modo, possibilitar a proposta de novas

medidas capazes de melhorar a acessibilidade, num contexto de desenvolvimento sustentável.

Na última década a taxa de motorização em Portugal passou de 224 para 435

veículos/1000 habitantes (ACAP, 2009), um aumento anual de aproximadamente 5%. Com esta

ocorrência, verificou-se um elevado crescimento da utilização do automóvel nas deslocações

diárias da população da AML.

Em Florianópolis, no mesmo período, a população residente cresceu cerca de 20%, no

entanto a frota de veículos aumentou para o dobro devido à facilidade de aquisição de veículos,

de financiamento e de subsídios. Apesar do crescimento da frota observado, a cidade

praticamente não mudou o perfil da sua infraestrutura urbana. Estes factos, aliados a uma falta

de planeamento urbano e de desenvolvimento dos transportes coletivos, trouxeram diversas

mudanças na mobilidade da população, sendo a mais gravosa a grande utilização do transporte

individual.

Este uso excessivo do transporte individual acarreta consequências óbvias, tanto a nível

da saúde da população como na mobilidade urbana. As taxas de saturação das vias de

comunicação são cada vez mais elevadas, sobrecarregando o sistema; os espaços públicos são

ocupados por veículos, diminuindo a qualidade de vida da população; e a produtividade diminui

como resultado dos tempos elevados de deslocação. Tem ainda contribuído para a difícil

sustentabilidade económica dos sistemas de transporte coletivo.

Neste capítulo pretende-se, após a caracterização das redes viárias das duas cidades,

realizar a respetiva análise do desempenho.

3 Previsão e Provisão, traduzido

35

Figura 4-1: Variação do TMDA entre 2009 e 2013 nos principais eixos de acesso a Lisboa (nos dois sentidos, todos os dias) (Fonte: IMT, 2013, disponibilizado pelo Eng. Gonçalo Caiado da CML)

O concelho de Lisboa é limitado pelo rio Tejo e pelo estabelecimento de relações entre

este e a zona Norte e Sul da sua área metropolitana.

A AML apresenta uma rede rodoviária estruturada com base em quatro eixos principais

a Norte, dois corredores de acesso a Lisboa a Sul e duas circulares a Norte de Lisboa (CRIL e

CREL).

Numa primeira análise estabelece-se a relação entre Lisboa e os restantes concelhos da

AML. Esta relação é traduzida por corredores de ligação nomeadamente:

- Cascais (A5);

- Sintra/Amadora (IC19 e IC16);

- Amadora/Loures (IC22)

- Corredor Oeste (A8)

- Corredor Norte (A1 e IC2);

- Ponte Vasco da Gama (A12);

- Ponte 25 de Abril (A2).

36

Pela análise da variação do TMDA entre 2009 e 2013 (Quadro 4.1) podem-se tirar

algumas conclusões:

- Em mais de 60% corredores de ligação houve uma diminuição do TMDA;

- Estima-se que, nos principais acessos a Lisboa, circulem diariamente 647.231 veículos nos

dois sentidos, representando uma diminuição de 4% em relação a 2009 e de 22% em relação a

2003;

- 364.500 veículos têm como destino o município de Lisboa, sendo os corredores Norte, de

Cascais e da Ponte 25 de Abril os principais geradores de tráfego, responsáveis por mais de

50% do tráfego total;

- Mais de 20% do tráfego de entrada provém da margem Sul;

2009 2010 2011 2012 2013

A1 (Sacavém - S.João da Talha) 91.334 91.435 93.099 91.564 89.784

A2 (Ponte 25 de Abril) 152.578 148.833 143.406 138.937 136.263

A5 (Viaduto Duarte Pacheco - Cruz das Oliveiras) 141.067 137.556 129.532 121.726 125.947

A8 (CRIL - Frielas) 43.590 45.496 45.178 44.002 48.094

A12 (Ponte Vasco da Gama) 64.985 64.183 60.341 nd 53.443

A16 (Idanha - CREL) 25.628 34.768 14.564 12.214 11.510

IC19 (Estado Maior - Damaia) 59.711 86.035 90.683 87.915 88.745

IC22 (Olival Basto - Ramada) 38.886 40.793 41.291 36.790 45.267

IC2 (Portela - Bobadela) 54.199 50.569 56.194 50.410 48.178

TOTAL 671.978 699.668 674.288 583.558 647.231

Quadro 4.1: Evolução do TMDA de 2009 a 2013 nos principais eixos de acesso a Lisboa (nos dois sentidos, todos os dias) (Fonte: IMT, 2013, disponibilizado pelo Eng. Gonçalo Caiado da CML)

Quadro 4.2: Matriz Origem-Destino dos movimentos pendulares na AML em 2011 (Fonte: INE 2011, disponibilizado pelo Eng. Gonçalo Caiado da CML)

37

1991 2001 2011

Interconcelhios na AML

436 975 627 691 645 538

Repartição Modal

TI TC Pedonal Bicicleta TI TC Pedonal Bicicleta TI TC Pedonal Bicicleta

28% 60% 1,22% nd 50%

46% 0,88% nd 58%

41% 0,96% 0,09%

Duração (min.) ≤ 15

16 - 30

31 - 60 ≥ 61

> 90

≤ 15

16 - 30

31 - 60 > 60 ≤ 15

16 - 30

31 - 60 > 60

5% 18% 42% 35% 7% 27% 43% 23% 10%

33% 43% 12%

Intraconcelhios na AML

805 556 1 002 603 1 030 098

Repartição Modal

TI TC Pedonal Bicicleta TI TC Pedonal Bicicleta TI TC Pedonal Bicicleta

20% 37% 36% nd 38%

28% 32% nd 52%

23% 25% 0,29%

Duração (min.) ≤ 15

16 - 30

31 - 60 ≥ 61

> 90

≤ 15

16 - 30

31 - 60 > 60 ≤ 15

16 - 30

31 - 60 > 60

49% 32% 15% 4% 55%

31% 11% 3% 59%

30% 9% 1%

Quadro 4.3: Repartição modal das deslocações interconcelhias e intraconcelhias na AML por motivo de emprego e

estudo (Fonte: INE 1991, 2001 e 2011, disponibilizado pelo Eng. Gonçalo Caiado da CML)

Verifica-se que entram mais veículos em Lisboa do que aqueles que já existem dentro

do concelho, o que indica a importância do volume de emprego na cidade.

Entre 1991 e 2011 houve um aumento dos movimentos interconcelhios na AML e o

aumento dos movimentos intraconcelhios não teve tanta expressão, reflexo de uma maior

complexidade do quadro funcional.

Entre os movimentos interconcelhios da AML, Lisboa apresenta-se como o principal

destino para todos os municípios da AML. Pela análise da matriz origem/destino confirma-se que

o maior centro gerador de viagens com destino a Lisboa é Sintra, seguido de Loures e Amadora.

Por outro lado, o maior pólo atractor de viagens que têm como origem Lisboa é o concelho de

Oeiras, provavelmente derivado da ligação da estrada A5 com pólos terciários que se localizaram

próximo dos nós da A5.

Relativamente à rede viária do município esta pode dividir-se em rede fundamental (rede

estruturante e de distribuição principal - 1º e 2º nível) e rede local (rede de distribuição

secundária, de proximidade e de acesso local – 3º e 4º nível).

Figura 4-2: Rede viária da cidade de Lisboa (Fonte: CML, 2012)

38

A rede fundamental deve assegurar os principais atravessamentos da cidade e a

distribuição dos maiores fluxos de tráfego. A rede de distribuição secundária deve assegurar a

distribuição próxima e a rede de 4º nível possibilita o acesso aos bairros onde o elemento

principal é o peão.

A rede viária total da cidade tem uma extensão de 1600 km. Apesar das redes de 1º e

2º nível terem menor extensão (510km) que as redes de 3º e 4º nível (1090km), absorvem mais

de 70% do tráfego rodoviário.

Pela análise do gráfico da variação do tráfego médio horário (Figura 4-3) é evidente dois

picos de tráfego nas horas de ponta 8h-10h e 17h-20h, enquanto que o tráfego é bastante

reduzido entre a 1h e as 7h.

O município de Florianópolis é composto pela ilha de Santa Catarina e uma parte

continental, sendo que é nesta parte que se estabelece a única relação entre este município e

os restantes da área metropolitana.

Na análise da relação entre Florianópolis e os restantes municípios da RMF verifica-se

que existe um movimento pendular diário entre as cidades de Biguaçú e Palhoça em direção a

São José, e desse para Florianópolis.

O principal acesso da cidade brasileira é a BR-101, através dos primeiros 5km da BR-282.

Esse trecho é constituído por uma via expressa de pista dupla. Existe também o acesso através

das vias urbanas ao norte e sul da região continental mas estas são, em geral, congestionadas

e com baixo nível de serviço.

O único ponto de entrada na ilha são as duas pontes que ligam o estreito canal que a

separa do continente, condicionando todo o fluxo de veículos proveniente da região

metropolitana, do tráfego intraurbano e até mesmo interestadual, como se observa na Figura 4-4.

A via BR-282 é a principal responsável por conduzir o tráfego entre São José e

Florianópolis e as pontes Pedro Ivo Campos e Colombo Salles fazem a ligação entre a ilha e o

continente.

Figura 4-3: Variação do tráfego médio horário (Fonte: Brito, J.M. (2010). Caracterização da flutuação do tráfego na cidade de Lisboa, FCT)

39

Por dia cruzam as pontes Ilha/Continente 196.700 veículos nos dois sentidos, sendo

8.660 veículos somente na hora de pico da tarde. Segundo dados do IPUF, em 2003 passavam

pela ponte cerca de 180.000 veículos/dia, o que representa um crescimento de 10% entre 2003

e 2014, contrastando com os 23% de diminuição de tráfego na cidade de Lisboa.

Em termos de volume, o tráfego de entrada em Florianópolis é três vezes menor que o

volume de entrada em Lisboa, no entanto, neste caso, realiza-se apenas através de um único

acesso.

Um dos dados caracterizadores deste tráfego médio diário é a sua repartição modal, tal

que 88% das viagens é realizada com recurso ao transporte individual, transportando 11.000

pessoas por hora, e apenas 3% de transporte coletivo, transportando 10.000 pessoas/hora

(Plamus, 2015).

Segundo estatísticas do Instituto MAPA (2012), 52% dos estudantes de todos os níveis

de ensino utilizam o automóvel para se deslocar diariamente, sejam condutores ou apenas

passageiros, um dado que chama a atenção dado que este é um sector que tradicionalmente

utiliza o transporte coletivo.

Uma das justificações para este facto, além da falta de oferta de transporte, é o preço da

tarifa do TC, considerado alto, o que faz com que seja economicamente preferível o transporte

individual pois apresenta um custo direto menor.

Figura 4-4: Relação entre municípios vizinhos e Florianópolis (Fonte: Google Maps 2015, adaptado pela autora)

40

A maior parte das deslocações ocorrem dentro dos próprios municípios, mas cerca de 10% do

dos movimentos intermunicipais têm como destino Florianópolis.

Pela análise da matriz origem/destino (Figura 4-6) confirma-se que tanto o maior pólo

gerador como atractor de viagens com destino ou origem em Florianópolis é São José.

Na análise da geração e atracção por parte de cada município, Florianópolis apresenta

862.142 viagens produzidas por dia enquanto que atrai 1.125.382 viagens, ou seja, a maior parte

do tráfego na capital é proveniente de outros municípios.

O interior da Ilha é constituído por um conjunto de rodovias estaduais, integralmente

dentro do território municipal, e por uma série de vias urbanas principais e coletoras que formam

uma estrutura hierarquizada e funcional, definida pelo Plano Diretor.

Figura 4-5: Volume de entrada em Florianópolis através das pontes (nos dois sentidos, durante todo o dia) (Fonte: Plamus, 2015)

Figura 4-6: Matriz Origem-Destino dos movimentos pendulares nos quatro maiores municípios da AMF (Fonte: Plamus, 2015)

41

Figura 4-7: Distribuição horária das viagens por modo em Florianópolis (Fonte: Plamus, 2015)

Relativamente à rede viária do município esta pode dividir-se em vias arteriais, que ligam

diferentes sectores da cidade, vias setoriais, que conectam áreas inteiras da cidade com as

arteriais, e vias locais, que dão acesso aos bairros. A hierarquização da rede viária pode ser

observada na Figura 4-8.

A rede viária total da cidade tem uma extensão de 1.809 km, sendo cerca de 60 km vias

arteriais. Grande parte da malha viária tem uma configuração espacial conhecida como “espinha

de peixe”, em que longas vias estão conectadas a apenas uma via principal, com muito poucas

conexões diretas entre elas. As distâncias entre as conexões na via principal são curtas mas as

distâncias no outro sentido (perpendicular à via principal) podem chegar a mais de um quilómetro.

No eixo centro-universidade existe uma alta concentração de serviços básicos que,

juntamente com a população residente, geram alta movimentação de pessoas e veículos no

local. Este eixo concentra 30% da população da cidade (126.767 pessoas).

Na análise da distribuição horária das viagens (Figura 4-7) é evidente a alta concentração

de tráfego nas horas de ponta, especialmente no modo rodoviário.

Figura 4-8: Hierarquização da rede viária de Florianópolis (Fonte: PDM de Florianópolis)

42

4.1.2 - Desempenho das redes

A malha viária da cidade de Lisboa apresenta uma estrutura do tipo radio concêntrico e

incompleto, pois, por um lado, é constituída por eixos radiais e eixos concêntricos e por outro

porque estes eixos apresentam algumas descontinuidades. Estas descontinuidades não são

apenas carências a nível físico mas também descontinuidades de capacidade.

Nos últimos anos foram realizadas diversas intervenções que contribuíram para uma

grande melhoria na malha rodoviária e respetiva mobilidade, nomeadamente a conclusão do

fecho da CRIL e o prolongamento do Eixo Norte-Sul até à CRIL, que constituem uma alternativa

à 2ª Circular e reduz a carga sobre a rede de distribuição principal da cidade, quer do tráfego de

atravessamento, quer do tráfego com origem e destino na cidade.

Tanto Florianópolis como Lisboa têm novos Planos Diretores que introduziram uma

melhoria significativa na hierarquização da rede, tanto na de distribuição principal como na de

distribuição secundária. Esta melhoria da rede foi acompanhada pelo aumento da utilização do

transporte individual.

Apesar destas melhorias, ainda existem zonas com cobertura deficiente da rede de

distribuição principal em Lisboa, nomeadamente nas zonas da Ajuda, núcleo histórico envolvente

à Baixa, Chelas/Marvila/Beato, e Coroa Periférica Norte (Lumiar-Carnide), embora os dois

últimos sejam zonas menos edificadas.

Foram identificadas as seguintes ligações em falta, identificadas na Figura 4-9:

(1) Via de distribuição principal na zona da Ajuda que se desenvolva na direção Oriente-Ocidente

de forma a ligar as vias norte-sul existentes.

(2) Via de distribuição principal, prevista no PDM, na zona de Carnide Norte, Lumiar Norte e

Charneca, complementada por vias de distribuição secundária, de modo a promover a ligação

entre vias estruturantes, como a Calçada de Carriche, e servir de elemento base para um

ordenamento urbanístico destes bairros.

(3) Desenvolvimento da malha viária em Chelas até Xabregas de modo a promover uma

cobertura espacial eficaz;

(4) Vias de distribuição local no núcleo histórico envolvente à Baixa, nomeadamente na colina

do Castelo e bairro da Graça, para reforçar a cobertura deste local e providenciar orientação

circular.

43

Embora a rede de Lisboa se encontre em fase avançada de consolidação, a implementação

destas ligações assegurará uma eficiência substancialmente superior da rede.

A malha viária de Florianópolis apresenta um modelo radial em que todo o tráfego deriva de

um ponto circulando pelo resto da ilha. Notam-se grandes descontinuidades na rede, de tal

maneira que o tráfego é encaminhado para os extremos mas não apresenta saídas alternativas,

criando pontos de acumulação.

A falta de conexão das longas vias entre si dificultam ou até mesmo inviabilizam as

deslocações pedonais entre elas, resultando numa canalização de todo o tráfego para a via

principal. Como consequência, esta via tende a ficar saturada e a concentrar uma maior

diversidade de usos, nomeadamente o de serviços e comércio.

Uma das principais dificuldades a ultrapassar em relação ao sistema viário são as

características geográficas da ilha que, com os morros, montanhas, lagoas e dunas, propicia

uma malha fragmentada e com falta de conexões entre bairros.

A dispersão da população pelo município é também um elemento incentivador do uso do

transporte individual e da fraca conectividade da malha viária.

4

3

2

1

Figura 4-9: Principais carências na rede viária de Lisboa (adaptado pela autora)

44

O município de Florianópolis apresenta as seguintes ligações em falta, identificadas na

Figura 4-10:

(1) Via Sectorial no Centro fazendo a ligação entre a Avenida Prof. Henrique da Silva Fontes e a

Avenida Osvaldo Rodrigues Cabral, tal que para isso é necessário ultrapassar o Morro da Cruz;

(2) Desenvolvimento da Avenida Mauro Ramos para via sectorial;

(3) Via Sectorial na parte continental apresentando uma alternativa à BR-282;

(4) Via subterrânea entre o Córrego Grande e a Lagoa da Conceição, promovendo um acesso

direto a estes bairros e a utilização de modos suaves que atualmente é impedida devido à

barreira do morro;

(5) Vias locais conectando as vias perpendiculares às vias principais, suavizando a configuração

de “espinha de peixe”.

A análise dos níveis de saturação é feita de uma forma visual que permite uma

interpretação rápida e simplificada das zonas de maior concentração de tráfego na cidade.

Permite identificar os troços mais carregados e onde ocorre o congestionamento nas horas de

ponta. Troços com saturações superiores a 90% indicam uma circulação condicionada e muito

instável e estão representados no mapa como sendo trânsito lento (vermelho).

1 2

3 4

5

Figura 4-10: Principais carências na rede viária de Florianópolis (adaptado pela autora)

45

Nas figuras 4.11 e 4.12 está representado o grau de saturação da malha viária de Lisboa

no período de ponta da manhã.

Figura 4-11: Nível de Saturação da rede viária de Lisboa na hora de ponta da manhã (Fonte: Google Maps, 2015)

Figura 4-12: Pormenor do Nível de Saturação da rede viária no centro de Lisboa na hora de ponta da manhã (Fonte: Google Maps, 2015)

46

Através da análise do mapa de saturação da rede viária de Lisboa na hora de ponta da

manhã, constata-se que as vias com saturação superior a 90% são as que dão acesso ao centro

de Lisboa nomeadamente IC19, A5, 2ª Circular e Ponte 25 de Abril. Dentro do município as vias

mais saturadas são as mais próximas dos pólos de emprego, ou seja, as vias de distribuição

para o centro, como Avenidas Novas, Avenida Almirante Reis e Av. Infante Dom Henrique.

No período de ponta da tarde ocorre a mesma situação, mas neste caso para sair de

Lisboa. Verifica-se que os níveis de saturação são mais baixos que de manhã e existe um menor

número de vias saturadas.

Nas figuras seguintes está representado o grau de saturação da malha viária de

Florianópolis nos períodos de ponta da manhã e da tarde.

Segundo dados do Detran/SC (2012), a capacidade das Pontes Colombo Salles e Pedro

Ivo Campos é de 40 mil veículos por dia. No entanto, verifica-se que a sua utilização é de 197

mil veículos por dia, ultrapassando a sua capacidade em 5 vezes. Isto significa que para as duas

pontes funcionarem para a capacidade que foram projetadas, seriam necessárias mais três

pontes iguais a essas, ou seja, uma solução inviável e que na prática atrairia mais tráfego

automóvel.

Mais de 40 vias da capital operam acima da sua capacidade nos horários de pico e

apresentam elevados níveis de saturação, entre os 80% e os 100%. Aqui, as velocidades

praticadas são baixas e apresentam congestionamentos.

Na temporada de Verão os congestionamentos são bastante superiores, principalmente

nas vias de acesso às praias, visto que no horário de pico da tarde, dos 14 mil banhistas, 60%

Figura 4-13: Nível de Saturação da rede viária de Florianópolis (Fonte: Plamus, 2015)

47

se desloca de transporte individual. Neste período, as filas ultrapassam facilmente os 30 minutos

de espera. Considerando a vocação turística da cidade e a economia gerada por essa atividade,

a questão do congestionamento torna-se ainda mais crítica.

Dos R$543.8 milhões investidos na expansão viária entre 2000 e 2011, 40% foi aplicado

na recuperação da Ponte Hercílio Luz, uma via onde não transita nenhum tipo de veículo ou

pedestre e que, de momento, tem um valor meramente patrimonial.

Através da análise do mapa de saturação da rede viária de Florianópolis na hora de

ponta da tarde (Figura 4-14), tal como acontece em Lisboa, constata-se que as vias com

saturação superior a 90% são as que dão acesso ao centro da cidade e que, dentro do município

as vias mais saturadas são as mais próximas dos pólos de emprego. Assim tem-se as pontes, a

SC-404 e SC-405 e dentro do município a Avenida Mauro Ramos, Av. Beira Mar e Av. Prof.

Henrique da Silva Fontes.

Tanto Lisboa como Florianópolis são pólos atractores de tráfego estando rodeadas por um

conjunto de concelhos que diariamente geram tráfego de entrada nas cidades.

Nos últimos anos, na maior parte dos corredores de acesso a Lisboa assistiu-se a uma

diminuição dos volumes de tráfego, consequência do aumento de desemprego, perda de poder

económico e de qualidade de vida. A este facto aliou-se um aumento da utilização do transporte

Figura 4-14: Pormenor dos Níveis de Saturação da rede viária no centro de Florianópolis (Fonte: Google Maps, 2015)

48

individual em detrimento do transporte coletivo e dos modos suaves, o que, parecendo

contraditório, tem a sua possível explicação no elevado valor das tarifas de TC.

Por outro lado, em Florianópolis os volumes de entrada têm aumentado continuamente e

o transporte individual ainda é o modo mais utilizado, não havendo grandes benefícios na

utilização do transporte coletivo. Como a capacidade do sistema viário é limitada e não

acompanha o incremento da procura, congestionamentos e aumentos nos tempos de viagens

são cada vez maiores e mais frequentes.

O tráfego de atravessamento em Lisboa, que diariamente era cerca de 1/3 do tráfego total,

era também um dos grandes problemas que afetava a cidade, mas que com a conclusão da

CRIL e do eixo N-S diminuiu significativamente.

O aumento da utilização do transporte individual em relação a outros modos de transporte

é também uma questão problemática na mobilidade urbana. A procura de soluções para os

problemas de congestionamento ainda concentra esforços na expansão do sistema viário a fim

de adequar a capacidade ao volume crescente de veículos motorizados. Elevados recursos são

gastos pelo poder público na construção de viadutos, rodovias em áreas urbanas e outras obras

viárias. Esta prática é limitada ao longo do tempo pois acaba por atrair mais veículos e atingir a

sua taxa de saturação num curto espaço de tempo.

4.1.3 - Estacionamento

O estacionamento é um elemento essencial nos planos de mobilidade pois está

diretamente relacionado com a acessibilidade, uso do espaço público e, principalmente, como

regulador da repartição modal, pelo condicionamento da acessibilidade em transporte individual.

Representa um papel importante na solução para os engarrafamentos, visto que cerca de 20 a

30% dos automóveis que circulam pelas ruas de uma cidade a qualquer momento procuram um

espaço livre para estacionar.

A existência de estacionamento no local de destino da viagem e a sua gestão são

elementos condicionadores na escolha do transporte individual pois tem um impacto direto no

custo associado à utilização do automóvel.

A maior parte das viagens onde se utiliza o transporte individual é o percurso casa-

trabalho-casa, o que implica que o automóvel fica parado 90% do tempo, ocupando espaço

privado e público, mesmo este sendo limitado nas áreas com maior exigência de espaço de

estacionamento, como nas áreas centrais da cidade.

Verifica-se, na Figura 4-15, que quanto maior a disponibilidade de estacionamento no

local de trabalho, maior irá ser a utilização do transporte individual, sendo imperativo a

apresentação de soluções para este problema.

49

Figura 4-15: Repartição modal em função da disponibilidade de estacionamento no local de trabalho (Fonte: Les politiques de stationnement après la loi SRU, Pourquoi? Comment?, CERTU, 2003)

A oferta de estacionamento pode ser decomposta em função dos regimes de acesso

(público ou privado), do regime de pagamento (gratuito ou pago) ou da sua localização (na via

ou fora desta).

Todos os dias 600 mil automobilistas disputam 350 mil lugares de estacionamento na

cidade de Lisboa. Em 2003, estimou-se que cerca de 30% do número de veículos total

permaneciam imóveis durante todo o dia, criando uma grande necessidade de estacionamento.

Essa procura diária encontra-se exposta na Figura 4-16.

Figura 4-16: Evolução da procura diária de estacionamento ao longo do dia em Lisboa (Fonte: TIS, Inquérito à mobilidade 2003/2004)

50

O estacionamento em Lisboa encontra-se a cargo da EMEL (Empresa Municipal de

Mobilidade e Estacionamento de Lisboa).

Acerca do estacionamento na via pública (Figura 4-17), estão disponíveis 150 mil lugares

sendo 45 mil tarifados. Os lugares tarifados da via pública, maioritariamente concentrados nas

áreas centrais, são de curta duração e com limites máximos de tempo de estacionamento,

divididos em três zonas:

- Zona verde, nas zonas menos centrais e com um custo por hora mais económico;

- Zona amarela, na zona central da cidade, bem servida de transportes públicos e com

um custo mais elevado que a tarifa verde,

- Zona encarnada, nos principais eixos da cidade, com um custo duas vezes superior ao

verde, sendo apenas permitido o estacionamento por um período máximo de 2 horas.

O pagamento do estacionamento pode ser feito nos diversos parquímetros existentes,

com títulos de estacionamento previamente adquiridos ou através da aplicação da EMEL na

Internet. No Quadro 4.4 apresenta-se o tarifário em vigor para cada zona de estacionamento.

Os residentes e os comerciantes da cidade podem solicitar um cartão que os isenta do

pagamento do estacionamento, o dístico de residente. Atualmente existem 43 mil dísticos de

residentes em Lisboa.

00h15 00h30 1h00 1h30 2h00 2h30 3h00 3h30 4h00

Zona Verde € 0.25 € 0.40 € 0.80 € 1.20 € 1.60 € 2.00 € 2.40 € 2.80 € 3.20

Zona Amarela € 0.35 € 0.60 € 1.20 € 1.80 € 2.40 € 3.00 € 3.60 € 4.20 € 4.80

Zona Vermelha € 0.45 € 0.80 € 1.60 € 2.40 € 3.20

Quadro 4.4: Tarifário em vigor em cada zona de estacionamento por período de tempo (Fonte: EMEL, 2015)

Figura 4-17: Tarifários na via pública: zona verde, amarela e encarnada (Fonte: EMEL, 2015)

51

Devido à falta de dados sobre o estacionamento em Florianópolis não é possível saber ao

certo o número de lugares de estacionamento existente na cidade. No entanto em Florianópolis a

questão do estacionamento é mais gravosa que em Lisboa, visto que o transporte público tem uma

qualidade menor e há uma maior utilização do transporte individual.

Foi posto em prática, ainda no ano corrente, um sistema de estacionamento rotativo com

parquímetros eletrónicos através do Programa Zona Azul, concessionado pela empresa privada Dom

Parking Estacionamentos Ltda.. Os serviços da Zona Azul contam com 5 mil lugares tarifados na via

pública, maioritariamente concentrados nas áreas centrais (Figura 4-18), de curta duração e com

limites máximos de tempo de estacionamento, à semelhança do existente em Lisboa. Na primeira fase

de implantação, apenas foi abrangido o Centro de Florianópolis, mas numa segunda fase será

estendido ao Continente, Trindade e Beira Mar Norte.

A tarifa é igual em todas as zonas, com um valor horário de R$ 2 para automóveis e R$ 1 para

motociclos. Tal como na aplicação da EMEL, este sistema de pagamento funciona via internet, e não

é necessário colocar o recibo dentro do automóvel, tal que o motorista paga apenas o tempo utilizado.

Além dos lugares na via pública, em Lisboa existem 150 parques de estacionamento de

acesso público em funcionamento, os quais totalizam mais de 80 mil lugares, distribuídos por

parques de rotação ou de curta duração, parques de longa duração que podem funcionar como

parques de Park & Ride e parques de centros comerciais.

Em Lisboa começou agora a ser adotado o sistema Park & Ride, tal que para isso foi

criado um título integrado Park & Ride que combina Carris, Metro e estacionamento em parque

por 30 dias. Este título tem um preço de 51.5€ e concede ao utilizador o direito ao transporte na

Carris e Metropolitano de Lisboa e a estacionar nos 9 parques aderentes da EMEL e EMPARK

situados em pontos vitais.

Figura 4-18: Localização do Sistema Zonal Azul em Florianópolis (Fonte: minhavaga.com.br)

52

A capital catarinense possui mais de 40 parques de estacionamento tarifados de acesso

público, um número bastante reduzido comparado com Lisboa, e ainda não é discutido o conceito Park

& Ride.

Alguns dos bairros históricos de Lisboa, como Alfama, Bairro Alto, Castelo e Santa

Catarina/Bica, são zonas de acesso automóvel condicionado de modo a contrariar o

estacionamento desordenado de veículos e privilegiando o modo pedonal, aumentando a

segurança dos residentes, comerciantes locais e visitantes.

O número de lugares de estacionamento ainda não é suficiente para a demanda do transporte

individual em Florianópolis. Por toda a cidade observam-se situações de incumprimento das regras de

tráfego, principalmente por estacionamento abusivo.

Um dos problemas mais marcantes é a grande oferta de estacionamento num dos principais

pólos atractores de tráfegos, a UFSC. Grande parte da área da universidade federal é ocupada por

parques de estacionamento grátis, o que leva a uma grande utilização do transporte individual por

parte de estudantes.

A solução para o problema de estacionamento na cidade brasileira não passa por criar uma

maior oferta de lugares, pois isso apenas iria atrair um maior número de automóveis, mas por melhorar

as condições do transporte público e modos suaves principalmente nos acessos a zonas de

concentração de comércio, lazer e serviços. A par com a intervenção nos outros modos de transporte,

o estacionamento deve ser submetido a uma fiscalização rígida e pode haver um maior número de

lugares sujeitos a tarifa.

Apesar da notável evolução que o sistema e gestão de estacionamento foi submetido

nos últimos anos, a taxa de utilização do transporte individual ainda representa a maior parcela

da repartição modal na cidade de Lisboa.

O estacionamento pode ter um importante papel nesta situação e para isso podem ser

tomadas diversas medidas em ambas as cidades:

- Fiscalização contínua que garanta o respeito pelas regras de estacionamento e que

evite infrações;

- Promoção de estacionamento na zona periférica dos municípios, junto às interfaces de

transporte público, como parques de Park & Ride.

- Desincentivar o estacionamento junto a estações de metro (em Lisboa) no centro da

cidade através da aplicação de tarifas mais elevadas e incentivando dessa forma a utilização do

metropolitano nas deslocações no interior da cidade;

- Tarifas mais elevadas nos estacionamentos na via pública quando situados junto a

parques de estacionamento públicos tarifados.

- Dimensionamento da oferta de estacionamento, tendo em consideração a

acessibilidade em modos de transporte mais sustentáveis (transporte público e modos suaves)

e a necessidade de proteger determinadas áreas da cidade.

53

A diferença mais marcante nas duas cidades é o número de lugares pagos de

estacionamento. Enquanto que a probabilidade de estacionar num lugar pago no centro da

cidade é de 10% nas cidades brasileiras, esse valor aumenta para 70% nas cidades europeias.

Além disto, é ainda bastante evidente que em Florianópolis os motoristas dão por assegurado o

estacionamento, mas como Enrique Peñalosa refere, o “estacionamento não é um direito

constitucional em lugar algum; é uma questão privada que deveria ser resolvida em espaços

privados, com fundos privados”.

No estudo do sistema de estacionamento em qualquer cidade deve ser tida em conta

que este é bastante complexo e um instrumento fundamental das políticas urbanas e de

mobilidade. Numa cidade existem diversas dinâmicas associadas quer à sua localização quer

aos múltiplos atores envolvidos. Esta diversidade de situações implica a necessidade de

implementação de políticas diferenciadas de estacionamento.

Redes de transporte coletivo

4.2.1 - As ligações metropolitanas/regionais

A ligação entre a AML e Lisboa por transporte coletivo é realizada em três modos de

transporte: autocarro, comboio e barco. Atualmente existem 15 empresas de transporte a

operarem na AML, mas as principais operadoras responsáveis por esse transporte são:

- CP, Fertagus e Metropolitano de Lisboa, para o modo ferroviário;

- Transtejo e Soflusa, para o modo fluvial.

- TST, CARRIS, TCB, Sulfertagus, Setubalense, Barraqueiro, RL, Scotturb e Vimeca, entre

outras, para os autocarros;

No Quadro 4.5 apresentam-se as principais características de algumas das operadoras.

Rede (km) Nr. Estações Percurso

médio/pass.

Passageiros Transportados

(2010)

CP 143 143 15.7 94 711 885

Fertagus 54 14 17.13 22 927 510

Metro 43.2 55 4.74 182 781 204

Transtejo/SL 38.91 9 9 28 531 369

Carris (autocarros) 678 2106 3.4 220 554 380

TST 3418 3790 7.24 72 364 373

Vimeca 1490 2153 5.97 53 807 245

Quadro 4.5: Principais características das operadoras de TC na AML (Fonte: AMTL, 2010)

54

De uma forma geral, com exceção dos operadores ferroviários que atravessam diversos

concelhos da AML, a maioria dos operadores apresenta áreas de exploração relativamente bem

definidas e onde atuam praticamente sem concorrência.

Em Florianópolis os únicos meios de transporte coletivo são os autocarros e

semicolectivos, tanto dentro do município como na ligação entre este e a respetiva área

metropolitana. São 7 os operadores principais de transporte coletivo que atuam na Área

Metropolitana de Florianópolis, sendo que 3 fazem a ligação entre Florianópolis e os outros

municípios, todas elas de autocarros:

- Jotur, que faz a ligação entre São José e Florianópolis;

- Estrela, ligando o Norte de São José e Florianópolis;

- Biguaçu, que atende os municípios de Florianópolis, Biguaçu, Antônio Carlos, Governador

Celso Ramos e Tijucas.

As empresas que atuam na ilha são Canasvieiras, Transol e Insular enquanto que as

empresas que atuam na parte continental são a Emflotur e Estrela.

A maneira mais simples de quantificar o número de pessoas que entram em Florianópolis

através de transporte público é analisando os movimentos nas pontes. Assim, verificou-se que,

de todo o tráfego que atravessa a ponte apenas 3% é de autocarros, transportando 10 mil

pessoas por hora e ocupando 1% da capacidade da ponte. Estes números correspondem a 240

autocarros no sentido do continente para a ilha que, na hora de pico, teriam capacidade para

transportar 18 mil pessoas e que poderiam tirar da ponte 12 000 automóveis por hora,

considerando que a taxa de ocupação por automóvel é de 1.5 passageiros.

Figura 4-19: Área de influência das principais operadoras de TC na AMF

55

Azambuja

Sintra

Cascais Sado

Na AMF, as áreas de exploração dos diferentes operadores sobrepõem-se em diversas

áreas, principalmente no centro da cidade junto às pontes, na parte continental e insular.

Existem três tipos diferentes de contratos celebrados entre o Estado e os operadores de

transporte: (1) concessão de serviço público, onde o operador é remunerado total ou

parcialmente através das tarifas cobradas e a assunção maioritária do risco de exploração cabe

ao operador; (2) prestação de serviço público, onde as receitas tarifárias são alocadas ao Estado

e não há transferência do risco de exploração para o operador; (3) misto.

Pelo menos 10 operadores em Lisboa são privados com serviços concessionados por

linha (mais de 12.000 kms) e pelo prazo de 10 anos renováveis de cinco em cinco. Acresce a

exploração do comboio suburbano (Fertagus), atravessando a Ponte sobre o Tejo, numa

contratualização a 30 anos (renovável). Como operadores públicos há a Carris, Metro, CP,

Transtejo e Soflusa.

Dos operadores da AML, a CP é a mais utilizada para a entrada em Lisboa devido à sua

operação alargada, abrangendo concelhos bastante populosos. No entanto, quando comparada

com a Fertagus, a sua imagem percebida não é muito positiva, sobretudo devido à falta de

investimento nas vias, estações e carruagens, ao que acrescem problemas de segurança

nalgumas linhas.

A oferta ferroviária em Lisboa é ao nível da exploração realizada em 5 linhas: Linha da

Azambuja, Linha de Sintra, Linha de Cascais, Eixo Norte-Sul, Linha do Sado. A oferta varia de

linha para linha, localizando-se os troços mais carregados na Linha de Sintra entre Queluz/

Massamá e Campolide e na Linha de Cascais entre Oeiras e Cais do Sodré, todos eles com uma

oferta acima das 20 circulações/ hora.

Relativamente ao transporte fluvial este é totalmente explorado pela Transtejo e Soflusa,

estabelecendo a ligação entre as duas margens utilizando 11 terminais, sendo 5 na margem

norte (Cais do Sodré, Belém, Parque das Nações e 2 no Terreiro do Paço) e 6 na margem sul

(Barreiro, Cacilhas, Seixal, Montijo, Trafaria e Porto Brandão).

Fertagus

Figura 4-20: Linhas ferroviárias com ligação a Lisboa (Fonte: CP, 2010)

56

O principal ponto de concentração da oferta é o Cais do Sodré, com cerca de 300

serviços diários (em ambos os sentidos), seguindo-se o Terreiro do Paço com 154 serviços.

Relativamente ao transporte rodoviário a oferta entre os municípios da AML e Lisboa é

realizada através de um grande número de operadores, que de uma forma geral possuem

concessão de áreas de exploração diferenciadas, exceto nas vias rápidas ou nos eixos de

entrada na cidade. As áreas com maior oferta deste tipo de transporte são as que não estão

servidas por outro tipo de transporte coletivo. O rebatimento destas carreiras é feito sobre as

principais interfaces de transporte coletivo suburbano.

Todas as empresas de transportes a operar na Grande Florianópolis são privadas com

concessão de serviço público. No município, a gestão dos transportes coletivos por autocarros

está a cargo do Consórcio Fênix, determinando a operação do sistema por um único

concessionário. Este Consórcio incluiu as empresas Canasvieiras, Emflotur, Estrela, Insular e

Transol.

4.2.2 - Organização das redes de TC urbanas

No concelho de Lisboa existem apenas três operadores de transporte coletivo: a Carris,

o Metropolitano de Lisboa e a CP, através da linha de Cintura, que no entanto não apresenta

procuras elevadas para viagens urbanas.

Nos últimos anos tem-se assistido a uma contínua melhoria dos transportes coletivos na

área do município, nomeadamente em relação à cobertura da rede e integração com diferentes

redes, no entanto a procura e a utilização do TC têm diminuído ao longo dos anos. A utilização

do TC nos movimentos internos em Lisboa era de 50% em 1991, 40% em 2001 e em 2011

diminuiu para 35%. O rápido crescimento na aquisição de automóvel é a principal razão para

esta redução da quota do TC na repartição modal, já que veio substituir os outros meios

motorizados, a sua introdução na cidade não veio acompanhada por restrições de utilização e

entrada em Lisboa e não houve um desenvolvimento correspondente por parte do TC, como

também está a acontecer em Florianópolis.

Figura 4-21: Linhas de transporte fluvial com ligação a Lisboa (Fonte: Transtejo)

57

Figura 4-23: Mapa das linhas de Metro em Lisboa (Fonte: Metropolitano de Lisboa, 2015)

Metropolitano de Lisboa

O Metropolitano de Lisboa conta com quatro linhas autónomas, com cerca de 43.2 km

de comprimento e 55 estações, sendo que a distância média entre elas é de 770 metros. O

intervalo entre passagens de comboios tem uma média de 6 minutos, sendo ajustado conforme

o horário e linha, e a velocidade comercial é de 27km/h.

Apresenta bons níveis de oferta, com intervalos entre comboios inferiores a 4 minutos

nas horas de ponta e até 12 minutos nos períodos de menor procura.

O sistema de metro tem o custo mais elevado de implantação, no entanto, permite

transportar o maior número de passageiros, cerca de 80 a 90 mil passageiros por hora. Este

sistema não ocupa o espaço urbano e permite a sua requalificação, atenua problemas de

congestionamento e reduz a pressão sobre o estacionamento. É responsável pela distribuição

dos fluxos suburbanos que chegam diariamente à cidade. Só em 2013, o Metropolitano de Lisboa

transportou mais de 135 milhões de passageiros. As estações de Metro que movimentam mais

passageiros são as estações da Baixa/Chiado, Marquês de Pombal, Campo Grande e Alameda,

todas elas estações de cruzamento de linhas.

0

50

100

150

200

250

300

2004 2006 2008 2010 2012

Pas

sage

iro

s Tr

ansp

ort

ado

s (m

ilhõ

es)

Evolução da procura

Metro

Carris

Figura 4-22: Evolução da procura no Metro e Carris entre 2004 e 2012 (Fonte:Transportes de Lisboa, 2012)

58

CARRIS

A Carris possui a concessão exclusiva dos serviços de transporte coletivo de superfície

de Lisboa, os quais são explorados através de 745 autocarros, 54 elétricos, 3 ascensores e 1

elevador.

A rede de autocarros percorre uma extensão de 667 km e tem 78 carreiras, abrangendo

praticamente toda a área do concelho. A idade média da frota é de 7.58 anos e a velocidade

comercial é de 14.6km/h.

Em 2013, a Carris foi a operadora que transportou mais passageiros na AML. Esse

número foi de mais de 170 milhões de passageiros transportados, uma quebra face a 2012, ano

em que transportou 180 milhões de passageiros.

Apesar da cidade de Lisboa contar com mais de 80 km de corredores BUS e ter um

sistema que prioriza o TC nos cruzamentos semaforizados, não se verificou uma melhoria nas

condições de circulação dos autocarros, isto é, a velocidade praticada tem-se mantido constante

nos últimos anos. Este desempenho traduz-se na perda de passageiros para outros meios de

transporte, facto esse acentuado nos últimos anos por um grande aumento nas tarifas (cerca de

25%) e redução de linhas e serviços (na ordem dos 20% por km percorridos) devido às

orientações do governo quanto à redução do défice de exploração da empresa.

Figura 4-24: Mapa da rede de autocarros em Lisboa (Fonte: CARRIS, 2015)

59

No que respeita à oferta total, esta varia conforme as carreiras. Verifica-se que nos

períodos de maior procura, os intervalos entre serviços são, em média, de 10 minutos, e que nos

restantes períodos esse tempo é o dobro.

Consórcio Fênix

No município de Florianópolis os transportes coletivos funcionam num Sistema Integrado

de Transportes, gerido pelo Consórcio Fênix. As seis empresas que fazem parte do Consórcio

são independentes e encontram-se interligadas a um sistema de transporte estabelecido a partir

de seis terminais de integração operando através de bilhetagem eletrónica. Os passageiros

podem fazer qualquer transbordo dentro dos terminais sem que lhes seja cobrado mais um título

de transporte, ao contrário do que sucede em Lisboa.

Os seis terminais de integração (TICEN, TITRI, TILAG, TIRIO, TISAN, TICAN) estão

distribuídos pela ilha, conforme indicado na Figura 4-25, sendo o principal o TICEN (terminal de

integração do Centro de Florianópolis) onde todas as linhas são conectadas, seja do lado da ilha

seja do continente. Este terminal do Centro concentra 70% das viagens realizadas.

Figura 4-25: Localização dos terminais de integração e das principais linhas de autocarros

(Fonte: Mobfloripa, 2014)

60

Os terminais TISAC e TIJAR estão desativados desde 2003, enquanto que o TICAP

nunca foi utilizado, ou seja, do lado do continente não existe nenhum terminal em utilização, o

que faz com que todo o tráfego se concentre no TICEN.

O Consórcio Fênix possui atualmente um total de 524 veículos, com uma idade média

de 5,4 anos. A rede tem mais de 200 carreiras, incluindo Executivos (autocarros de maior

qualidade que param em qualquer ponto do percurso que o passageiro escolher) e Madrugadões

(que fazem o percurso no início da manhã), e dividem-se em linhas: alimentadora, principal

expressa, principal paradora, principal semi-expressa, complementar circular, complementar

periférica e periférica. A velocidade média a que os autocarros circulam nas horas de ponta é

bastante baixa, apenas 8km/h, visto que estão sujeitos ao mesmo congestionamento que o

transporte individual. Existem 1019 paragens e a distância entre elas está entre os 200 e os 400

metros.

No Quadro 4.6, são apresentados os principais parâmetros operacionais do Sistema de

Transportes de Florianópolis para cada empresa de autocarros. No geral observa-se que há uma

procura de 54 milhões de passageiros por ano, cerca de ¼ do verificado na CARRIS em Lisboa.

No estudo realizado pelo Plamus (2015), verificou-se que a distribuição horária de

embarques está toda concentrada nos horários de pico, ou seja, 70% dos embarques ocorrem

tanto na hora de pico da manhã como na de tarde.

No que respeita à oferta total esta varia conforme as carreiras. Verifica-se que nos

períodos de maior procura, os intervalos mínimos entre serviços são de 10 minutos para carreiras

com muita procura, mas em média esse tempo é de 20 minutos.

No município existem ainda duas linhas hidroviárias que ligam a Lagoa da Conceição à

Costa da Lagoa, por não existir nenhuma ligação terrestre para veículos automóveis com esta

comunidade.

Quadro 4.6: Parâmetros operacionais do Sistema de Transporte Coletivo em Florianópolis (Fonte: Secretaria Municipal de Transportes, Mobilidade e Terminais / Prefeitura Municipal de Florianópolis –

SMTMT/PMF, 2011)

61

4.2.3 - Entidades Reguladoras e Sistema Tarifário

Em Lisboa, a organização institucional em relação aos transportes é a apresentada na

Figura 4-26. Os decisores políticos estão no topo da cadeia, assim como em Florianópolis,

seguindo-se a Autoridade Reguladora Nacional (IMT) que tem o poder de decisão a nível do

território nacional, para a área metropolitana de Lisboa a Autoridade Metropolitana de

Transportes e, ao nível do município, o poder decisivo cabe às Câmaras Municipais, exceto no

caso de Lisboa onde é o governo nacional que tutela diretamente as empresas públicas.

O sistema tarifário aplicado em cada rede de transportes deve ter em conta a situação

atual da cidade e dos operadores de transportes, na medida em que a sua modelação deve

promover a utilização dos transportes coletivos numa ótica intermodal e ser financeiramente

equilibrado, com uma adequada remuneração dos diferentes modos e operadores de transportes

públicos.

Ao nível do concelho de Lisboa, o sistema tarifário permite a articulação modal entre a

Carris, o Metropolitano e os comboios dentro da área do município.

Os principais títulos de transporte em vigor em Lisboa são:

- Para viagens únicas: o bilhete simples, com um custo de 1.40€ para toda a área do

concelho, que pode ser usado nos autocarros ou no metro. É um cartão que pode ser reutilizado

até ao seu prazo de validade.

- Para viagens multimodais: o bilhete Zapping, um bilhete recarregável onde o valor da

viagem vai sendo descontado ao saldo remanescente do cartão, consoante a tarifa e as

condições de utilização de cada operador. Pode ser utilizado na Carris, Metro, comboios e

barcos. O valor de uma viagem com Zapping Carris ou Metro tem o custo de 1.25€.

- Para tarifas mensais: os passes Navegante, válidos no Metro, Carris e percursos

urbanos de Lisboa da CP, durante 30 dias consecutivos; ou os passes mensais, válidos nos

Figura 4-26: Organização institucional dos transportes em Portugal (Fonte: IMT, 2010)

62

modos de transporte que operam nas diferentes zonas que integram a estrutura de coroas da

Área Metropolitana de Lisboa.

Todos estes bilhetes são do tipo bilhética sem contacto. Existem bastantes mais títulos

de transporte na área metropolitana de Lisboa, dependendo de cada operador e das

combinações entre operadores diferentes, mas para circular dentro do concelho de Lisboa, os

títulos apresentados acima são os essenciais. Existe ainda um sistema de tarifas reduzidas

aplicáveis a crianças, idosos ou pessoas com rendimentos reduzidos, geralmente entre os 25 e

os 50% de desconto.

A comparação dos custos entre o utilizador de transportes públicos e o do automóvel é

complexa, independentemente do critério aplicado.

Utilizando a metodologia de Silvestre (2013) considerou-se um custo4 para o automóvel

de 0.15€/km. Este valor foi obtido considerando o consumo médio 7 l/100km, com a gasolina a

1,7 €/l. Isto origina um valor de 0,12 €/km. Os restantes 0,03 €/km são os custos periódicos das

mudanças de óleo, revisões, mudanças de pneus, etc.

O utilizador do TC possui passe, originando o custo de 35 € ao mês, por pessoa. Em

média, em Lisboa cada pessoa faz 2 viagens por dia (CML, 2009), tal que em 30 dias paga 0,60

€ por viagem. Se cada viagem é de 5km (INE, 2012), o utilizador de transporte coletivo suporta

um custo de 0.12€/km.

Verifica-se que o custo de utilização do transporte individual é muito semelhante ao custo

do transporte coletivo, ou seja, utilizando apenas o critério do custo da viagem o automóvel

mostra-se mais atrativo. No entanto, não se está a considerar nestes cálculos o custo do

estacionamento, das portagens nas pontes e nas autoestradas que ligam Lisboa aos concelhos

vizinhos ou o tempo de viagem. Se estes indicadores fossem introduzidos, o custo do automóvel

seria mais elevado.

No Brasil, após os decisores políticos segue-se a Secretaria Nacional de Transporte e

da Mobilidade Urbana do Ministério das Cidades para a regulação dos transportes. Ao nível do

Estado de Santa Catarina a Agência Reguladora de Serviços Públicos de Santa Catarina

assegura, entre outros, a prestação de serviços de transportes pelos concessionários adequados

e, no município de Florianópolis, o serviço de transporte coletivo é administrado pela Prefeitura

Municipal através da Secretaria Municipal de Transportes e Terminais. O transporte público em

Florianópolis tem vindo a ser estabelecido a partir de acordos construídos ao longo do tempo

entre operadores privados e poder público.

A implantação do Sistema Integrado de Transporte possibilitou a integração tarifária,

criando o Passe Rápido, um sistema de bilhetagem eletrónico que utiliza um cartão sem contacto

4 Os cálculos foram realizados para uma taxa de ocupação do automóvel de 1 pessoa por veículo. É necessário ter em atenção que, se o veículo for ocupado por mais passageiros, o custo da viagem por automóvel vai ser mais baixo.

63

à semelhança do existente em Lisboa. Funciona com a Tarifa Única, cujo valor é de R$2.98

(0.88€) para cartão pré-pago, e são aplicados descontos a estudantes, idosos e cidadãos de

baixo rendimento. Não é aplicado um sistema de passes mensais, ou seja, o passageiro paga

sempre o mesmo valor por viagem independentemente de comprar um ou mais bilhetes.

O custo para o automóvel é de R$0.24/km (0.07€/km), considerando um consumo médio

de 7 l/100km, a gasolina ao preço de R$3/l e R$0.03/km para custos periódicos. Este valor é

cerca de metade do verificado para Lisboa.

O custo para o utilizador de transporte coletivo é de R$0.43/km (0.12€/km), tendo em

conta que uma viagem custa 2.98R$ e a distância média por viagem é de 7km5. É exatamente o

mesmo custo que em Lisboa, mas para uma cidade brasileira este valor deveria ser mais baixo.

Com esta grande diferença de custos, o dobro para o transporte coletivo, é justificável a

repartição modal observada para Florianópolis.

4.2.4 - Desempenho das Redes

Assim como acontece na rede viária, também para o TC em Lisboa, a procura concentra-

se nos eixos tradicionais de serviços, como a Baixa, Avenida da Liberdade, Av. Almirante Reis,

Av. Da República… A coincidência dos principais eixos de oferta da Carris com os do

Metropolitano traduz a falta de articulação multimodal da rede de transportes no concelho.

A oferta de serviços da Carris no corpo do dia, entre as 10h e as 17h, é considerada

insuficiente por parte dos utilizadores da mesma, sendo que os intervalos de passagem são

superiores a 15 minutos. Esta situação também se verifica, e é mais gravosa, nas novas

centralidades, como o Parque das Nações ou a Alta de Lisboa, zonas que deveriam ser bem

servidas de TC para propiciar o seu desenvolvimento.

Os problemas apresentados pela operadora de transporte terrestre decorrem da sua falta

de inovação e adaptação aos tempos modernos, não garantindo fiabilidade e regularidade na

oferta. O facto de os corredores BUS apresentarem descontinuidades em pontos críticos e de as

distâncias entre paragens serem pequenas (200 metros) contribuem também para a baixa

velocidade comercial praticada. O aumento de 1km/h na velocidade comercial significaria uma

poupança de 5 milhões de euros por ano.

Nos últimos anos, devido à diminuição da utilização do transporte público, a Carris

diminuiu a cobertura da sua rede, de modo a diminuir os custos operacionais, mas por outro lado,

investiu em inovações tecnológicas como internet a bordo, piso rebaixado e serviço de

mensagens de telemóvel que indicam em tempo real o tempo de espera em cada paragem e

para cada linha.

5 Valor deduzido pela autora, considerando que a maior parte das deslocações são realizadas no centro da cidade.

64

Uma das adversidades que as empresas públicas, como a Carris e o Metropolitano, têm

tido mais dificuldade em ultrapassar é o crescente endividamento, os elevados défices

operacionais e, no geral, uma situação económica bastante desfavorável.

O desempenho da rede de transporte coletivo em Florianópolis fica muito aquém do

desejado. A principal dificuldade é a diminuta velocidade comercial do transporte coletivo,

consequência dos congestionamentos constantes na cidade. A não existência de pistas

exclusivas de autocarros é o principal fator contribuinte para esta situação pois não potencia uma

alternativa ao transporte individual, já que estão sujeitos aos mesmos congestionamentos, ou

seja, mesmo tempo de viagem e ainda apresenta um maior custo que o automóvel. A estrutura

do transporte coletivo não evoluiu a par da procura da cidade e a população não utiliza o sistema

pois não apresenta vantagens quando comparado com o transporte individual.

O agravamento do congestionamento dos principais eixos reduz a eficiência do sistema,

dado que mais veículos são necessários para prestar o mesmo serviço mas com menos

qualidade.

A falta de integração entre modais e sistemas é também uma questão na mobilidade da

cidade, como por exemplo a integração com o sistema intermunicipal.

O maior problema que os transportes coletivos enfrentam nas duas cidades é a

capacidade política para intervir. Muitos intervenientes políticos apontam soluções para as

dificuldades mas a capacidade real para fazer diferença é pouca ou nenhuma. As empresas

operadoras no concelho são dependentes do Estado e o poder reivindicativo da Câmara

Municipal não se tem mostrado eficaz nas ações realizadas, não proporcionando a visão de qual

a real capacidade de atuação e quais as competências do município nesta matéria.

Nenhum destes problemas pode ser resolvido se não houver uma mudança na lógica do

sistema. Em Florianópolis, com a concessão do serviço de transporte coletivo ao Consórcio

Fênix, as mesmas empresas continuam a operar o sistema e se a Prefeitura não interceder pelos

interesses públicos o sistema continuará precário, caro e ineficiente.

A mudança de lógica da operação do transporte coletivo requer uma separação dos

poderes políticos, que são instáveis, e uma aposta num órgão forte e independente de

planeamento e gestão dos transportes onde existe um profundo conhecimento técnico na área.

Uma das soluções mais acessível para pôr em prática é a criação e aumento de

corredores BUS, negociações com os principais operadores de TC da cidade e financiamento do

custo dos títulos de transporte, à semelhança do que acontece noutros países europeus. Um

melhor e mais regular serviço de TC, a um preço mais atrativo, aliado a uma política de

estacionamento mais eficaz e dissuasora de longa duração na área central, conduz a uma

transferência modal na ordem dos 15 a 20%.

65

A crise económica sentida em Portugal nos últimos anos trouxe diversas consequências

a nível dos transportes, principalmente no aumento dos tarifários e na redução da oferta dos

transportes públicos. A elevada diminuição do poder de compra da população e a forte subida

do desemprego levaram também a uma quebra de procura do transporte coletivo. Por outro lado,

a desvalorização do euro face ao dólar e os mercados mundiais do petróleo foram a causa dos

preços mais elevados de sempre dos combustíveis.

No Brasil, o contínuo aumento demográfico, que não é acompanhado pelo

desenvolvimento da infraestrutura e operação dos transportes, tem levado a um sistema precário

e instável que não apresenta vantagens face ao transporte individual. Falta uma visão de

continuidade, de integração de políticas, de aprimoramento tecnológico e de reservas de capital.

Os programas apresentados pelo governo têm dificuldades na sua aplicação prática por falta de

competência administrativa e técnica.

No futuro dos transportes coletivos têm de ser previstos fortes ganhos de eficiência

operacional e tem de ser definida e assumida uma exigente orientação estratégica relativa ao

uso do transporte individual em áreas urbanas. É necessário um maior envolvimento dos

municípios na definição das redes de transporte coletivo e na oferta de novas soluções, com

custos mais reduzidos que as soluções atuais e com melhor ajuste entre a oferta e a procura.

66

5 - Comparação dos dois casos de estudo

O Sistema de Acessibilidades e a Evolução do Espaço Urbano

A composição do espaço urbano deriva de uma diversidade de fatores, entre eles a

economia, as relações sociais e as opções institucionais que decorrem num dado local e período.

Estes fatores influenciam a disposição urbana na medida em que a ocupação do solo com

diversas atividades, a sua intensidade e padrão de ocupação, as deslocações da população e o

sistema de transportes, se vão modificando consoante a situação nesse período.

Os transportes têm tido um papel decisivo na evolução do crescimento urbano,

principalmente na localização dos centros urbanos, na sua expansão e no seu desenvolvimento

interno (Vuchic, 1981). As acessibilidades e a evolução do espaço urbano apresentam uma

relação bilateral, na medida em que tanto o sistema de transportes e respetivas infraestruturas

influenciam o modo como a cidade vai crescendo, como esta evolução implica adaptações de

transportes por parte da população. Deste modo é inviável delinear um sistema de transportes

numa cidade sem ter em conta o respetivo planeamento urbano.

Historicamente existe uma relação entre as diferentes tecnologias de transporte urbano e

a forma de crescimento urbano (Hall, 1969). A organização do espaço urbano e o seu

desenvolvimento estiveram a par com o progresso tecnológico do sector dos transportes.

A mudança das relações económicas e do desenho urbano manifestaram-se em

alterações das condições de mobilidade individual (Figura 5-1). Numa primeira fase, as

deslocações são geralmente individuais, de pequena distância e recorrendo ao modo pedonal,

evidenciando a concentração das atividades residenciais e de emprego e do fraco poder

económico da população nessa altura.

Figura 5-1: Modelo de transição da mobilidade individual (Fonte: adaptado de (Rodrigue et al., 2004))

67

Em Lisboa esta fase ocorre com o início da revolução industrial, no século XIX, e

consequente aumento demográfico exponencial. Até esta data, Lisboa estava concentrada junto

ao rio Tejo, expandindo-se sempre ao largo deste, evidenciando a importância do transporte

fluvial na economia da cidade. Com a revolução industrial, surgem bairros operários de tal forma

que a cidade começa a estender-se para norte.

Em Florianópolis não se sentiu os efeitos da revolução industrial, até porque esta cidade

não desenvolveu essas atividades, portanto até 1950 a maior parte da população encontra-se

no centro da cidade.

Esta limitação na mobilidade nas duas cidades conduziu a uma configuração urbana

compacta, onde os diferentes usos e funções se reuniam no centro da cidade.

Começou depois a expansão das áreas residenciais para locais cada vez mais afastados

do centro, resultante do aumento do rendimento, da valorização das áreas mais centrais das

cidades e da disponibilização de modos de transporte mais rápidos e acessíveis. Aumentou,

assim, a importância das deslocações motorizadas, recorrendo aos transportes coletivos. Este

segundo ciclo é dominado pela introdução do elétrico, em Lisboa em 1900, e dos bondes de

tração animal em Florianópolis em 1915.

Os primeiros subúrbios em Lisboa refletem, na sua posição e forma, o transporte que

lhes esteve na origem. O elétrico e os primeiros autocarros para as principais portas da cidade

explicam o desenvolvimento precoce de núcleos de porta como são Algés, Venda Nova ou

Moscavide (Barata Salgueiro, 2002).

Surge o modo ferroviário que promove o mesmo desenvolvimento urbano, mas neste

caso, os núcleos são formados em torno das estações. Com estas novas acessibilidades

aparecem eixos industriais, tanto a norte do Tejo ao longo da linha férrea, como na margem sul

junto aos cais fluviais.

A cidade adota uma forma radial, tal que as novas urbanizações se desenvolvem ao

longo destas linhas de transporte.

Com a utilização dos modos rodoviários, nomeadamente o automóvel, inicia-se uma fase

muito importante no desenvolvimento urbano. A maior flexibilidade deste modo permitiu o

preenchimento dos espaços intersticiais entre os eixos radiais definidos pelos transportes

ferroviários, configurando-se uma forma urbana mais uniforme e concêntrica (Marques da Costa,

2007). Em Lisboa, o automóvel assumiu grande importância após a segunda guerra mundial e

propiciou a ligação dos núcleos suburbanos com o centro, estendendo a urbanização em mancha

de óleo.

Numa última fase, as alterações nas acessibilidades, nomeadamente o desenvolvimento

de vias rápidas para circulação automóvel, traduziram-se na extensão da metropolização,

facilitando a maior dispersão do povoamento periférico, aumento das residências secundárias e

diversidade da ocupação dos territórios periurbanos. Esta forte diferenciação espacial trouxe,

mais uma vez, uma forma urbana radial.

68

Nas duas cidades, este facto foi evidente com a construção das pontes, a ponte 25 de

Abril em Lisboa em 1965, e a ponte Hercílio Luz em Florianópolis em 1926.

Em Lisboa, a nova ponte implicou verdadeiras explosões demográficas na margem sul.

A construção de outras vias rápidas, ponte Vasco da Gama e comboio na ponte 25 de Abril,

tiveram como resultado uma alta especulação imobiliária ao longo destes eixos e permitiram o

crescimento económico e turístico de zonas que antes não eram tão acessíveis, como por

exemplo, a região do Algarve.

Com a ponte Hercílio Luz em Florianópolis apareceram também as empresas de

autocarros coletivos que faziam a ligação entre a ilha e o continente. Esta ligação desempenhou

um papel importante na urbanização da cidade, na medida em que fomentou uma grande

expansão imobiliária do lado do continente, nomeadamente Estreito e Coqueiros, de tal maneira

que a população de classe mais alta transferiu a sua área residencial para esse local, o que

perdurou até ao início da década de 1950.

A partir de 1950 assistiu-se a uma transformação notável na cidade de Florianópolis,

iniciada com a transferência da sede da Eletrosul para o centro da ilha. A cidade começou a

entrar num ciclo acelerado de crescimento económico e de reformas urbanas: ponte Colombo

Salles, Beira Mar Norte, implementação de propaganda turística, criação da UFSC e

urbanização.

Construiu-se a via rápida SC-401 que ligou o centro ao norte da ilha, criando aí, no início

um importante ponto turístico que depois se transformou em zona residencial, a zona de

Canasvieiras. Ao longo do eixo desta via desenvolveram-se pólos de empreendimentos e houve

uma explosão imobiliária. O mesmo aconteceu com a construção da SC-406 que liga o norte ao

sul da ilha, mas neste caso, houve um maior desenvolvimento da atividade residencial em vez

de serviços. É bastante percetível nesta cidade um desenvolvimento urbano pelo crescimento

tentacular ao longo das principais vias radiais.

A evolução dos modos de transporte influenciam tanto o crescimento como a forma

urbana e cada modo de transporte vai deixando a sua marca na configuração das aglomerações

urbanas. A introdução de novos meios de transporte conduzem à transformação do uso do solo

e adaptação do seu espaço às suas características e capacidades, num sistema dinâmico.

Segundo Van Wee (2002), o padrão de mobilidade é definido pela interação entre a

localização de atividades, necessidades da população e facilidade de deslocação. O aumento

da intensidade de ocupação do solo traduz-se na redução da procura de transporte, pois as

origens e destinos das viagens ficam mais próximas. Uma alteração num dos três componentes

provoca um desequilíbrio do sistema, de tal forma que este procurará um novo ajustamento.

A diversificação dos usos do solo tem um efeito direto na procura de transporte, uma vez

que, misturando atividades residenciais, de emprego e serviços na mesma área, as distâncias a

percorrer tornam-se menores. Esta ação permite também uma melhoria da acessibilidade ao

transporte coletivo, contribuindo para a alteração da repartição modal.

69

O que se verifica em Florianópolis é uma fraca diversificação dos usos do solo, já que

no Centro estão concentradas maioritariamente atividades de emprego e serviços e que as

funções residenciais se encontram espalhadas por toda a ilha. Esta característica é responsável

por fluxos de tráfego todos no mesmo sentido e consequentes congestionamentos na hora de

ponta.

Em Lisboa, apesar de também haver uma certa tendência para a pouca diversificação

do uso do solo, esta não é tão acentuada e, atualmente, a função residencial começa a ganhar

mais uma vez importância no centro da cidade.

Na Figura 5-2 observa-se a evolução da ocupação urbana com o desenvolvimento dos

transportes, nas suas diversas fases.

A forma urbana é uma das características das cidades que apresenta grande relevância

ao estudar a sua mobilidade. Esta vai variar de cidade para cidade consoante a sua história de

crescimento e desenvolvimento e, em grande parte das vezes, é uma condicionante no modo de

deslocação da sua população.

A forma urbana vai ter um papel preponderante no consumo energético e respetiva

participação na realização dos objetivos de sustentabilidade ambiental, económica e social dos

sistemas urbanos. Distinguem-se duas formas urbanas principais: a forma dispersa e a forma

compacta.

A forma compacta apresenta elevada densidade, usos mistos do solo urbano e elevado

dinamismo, populacional, económico e do próprio processo de densificação populacional. Este

aumento da compacidade contribui para a redução do consumo de recursos energéticos e dos

níveis de emissão de poluentes, visto que as residências e o emprego se situam mais próximos

e as distâncias a percorrer são menores, dando oportunidade à utilização de modos suaves de

transporte.

Figura 5-2: Desenvolvimento metropolitano nas aglomerações urbanas (Fonte: TAAFFE et al., 1996: 178)

70

Lisboa apresenta características de uma cidade compacta, onde os diferentes usos do

solo se misturam e existe uma maior facilidade, não só de mobilidade, mas também de eficiência

dos transportes coletivos. Com a procura de transportes mais concentrada num local é possível

prever facilitadamente a demanda e não é necessário percorrer distâncias elevadas para

responder à maior parte da procura.

A forma dispersa está relacionada com baixas densidades urbanas, que se estende até

aos limites das metrópoles, pelo elevado consumo de solo, por usos de solo localizados de forma

aleatória, descontínua e compartimentada, pela proliferação de espaços mono funcionais e

essencialmente dependentes da utilização do automóvel (Camagni, Gibelli, & Rigamonti, 2002).

Em relação à mobilidade nestas condições, apresenta-se mais complexa uma vez que os

padrões de acessibilidade às infraestruturas são deficietários e descontínuos.

Neste caso, a relação entre a densidade populacional e o consumo de combustivel é

inversamente proporcional, uma vez que quando a densidade diminui as deslocações usando

modos motorizados aumentam.

Esta forma é característica da cidade de Florianópolis, onde as diversas urbanizações se

encontram dispersas pela ilha, com grandes áreas verdes naturais entre elas. Há um aumento

da procura de transportes, em particular do automóvel, pois o transporte público apresenta-se

economicamente pouco atractivo nestas áreas de baixa densidade de procura. Deste modo

aumenta o congestionamento em direcção ao centro, onde estão localizados os usos de emprego

e serviços, tanto devido à ausência de alternativas de transporte colectivo de qualidade como

pela dificuldade de integração desse transporte com o individual. Estes congestionamentos, em

determinadas horas do dia, vão sendo cada vez mais prolongados e frequentes, contribuindo

para o aumento dos custos médios de deslocação e negativamente para a eficiência e

sustentabilidade da economia urbana.

A morfologia do sistema urbano é um dos elementos para a sua diferenciação e

consequente capacidade competitiva, já que a sustentabilidade das cidades é condição para a

competitividade entre as diferentes aglomerações urbanas (Marques da Costa, 2007).

Algumas das soluções propostas para uma adequação dos usos do solo com os

transportes passam pela promoção e revitalização dos centros das cidades, promoção do

desenvolvimento urbano em torno das interfaces principais existentes, o desencorajamento da

dispersão urbana e a extensão do serviço de transporte público a zonas mais isoladas. A forma

da cidade deve ser desenvolvida segundo núcleos urbanos de elevada densidade ligadas entre

si por um sistema de transporte público de grande capacidade e rodeados por áreas de menor

densidade, garantido-se de igual forma o serviço público nessas áreas.

71

5.2 - Principais Problemas

Lisboa e Florianópolis são cidades com histórias de ocupação marcadamente distintas, mas

com características físicas e sociais semelhantes, nomeadamente no que se refere à existência

de um rio/mar que separa o centro principal da restante área metropolitana, uma oferta de TC

muito dependente do serviço em autocarro, uma dimensão demográfica semelhante e uma

segregação social espacial entre centro e periferia idêntica. Ambas são centros urbanos que

enfrentam grandes desafios para a inter-relação entre os diversos sistemas que a constituem.

A análise comparativa entre duas cidades, situadas em continentes muito diferentes,

permite a partilha de experiências no processo de desenvolvimento e gestão da mobilidade

urbana. Este não é um problema recente, é um desafio que permanece e se modifica, embora

alguns dos seus elementos principais sejam constantes ao longo dos tempos mais recentes.

Pretende-se ao longo do presente capítulo analisar as carências e vantagens de cada

cidade ao nível da mobilidade urbana de modo a apresentar possíveis soluções.

Lisboa apresenta uma área quatro vezes menor que Florianópolis, sendo percetíveis as

diferenças na densidade populacional em cada cidade. Não obstante, ambas têm uma morfologia

semelhante, com os seus morros e colinas e a sua proximidade ao mar/rio.

Uma diferença marcante entre Lisboa e Florianópolis é a evolução de cada uma ao longo

do tempo: enquanto que a primeira apresentou um crescimento negativo na última década,

crescendo apenas na sua periferia e mantendo pouco alterado o tecido urbano central, a segunda

iniciou um ciclo de crescimento exponencial característico dos países emergentes. Numa

década, o município de Lisboa perdeu cerca de 15% da sua população, mas por outro lado o

município brasileiro aumentou a sua população em 35%.

Lisboa tem sofrido uma certa desertificação (menos 300 mil habitantes desde 1970),

onde a população tem saído do centro para os municípios da periferia, o que acarreta como

consequência a falta de diversificação do uso do solo, concentrando atividades de emprego e

serviços no centro. Florianópolis começa a acompanhar este percurso, na medida em que há

uma centralização dessas mesmas atividades, deixando para áreas periféricas a função

residencial. Apesar disso, o distrito Sede, continua a ser o que apresenta maior densidade

residencial, com mais de metade da população do município a residir nesse local, principalmente

do lado continental.

A análise da pirâmide etária de cada cidade apresenta resultados evidentes, tal que a

população de Florianópolis é bastante mais jovem que a de Lisboa. Lisboa exibe um

comportamento típico das antigas cidades europeias, com uma população envelhecida, ao

contrário das cidades em países emergentes.

Floripa, assim denominada pelos locais, está em contínuo crescimento em todos os

aspetos, desde o PIB, à economia, ao emprego e taxa de motorização, não se podendo dizer o

mesmo em relação a Lisboa.

72

Em relação ao sistema de transportes, a repartição modal é semelhante nas duas

cidades, com uma grande percentagem do transporte individual. Esta situação não é aceitável

em Lisboa pois esta possui um sistema de transporte coletivo bem desenvolvido, com diversas

opções e com um custo direto menor que o do automóvel. Em Florianópolis já não é esse o caso,

existindo apenas uma opção de transporte coletivo, os autocarros, que têm um custo superior ao

do transporte individual. Uma das ocorrências comuns é ainda a elevada taxa de ocupação do

transporte coletivo nas horas de ponta em contraste com o restante corpo do dia que essas taxas

mostram-se insuficientes para uma atividade economicamente eficiente.

Os modos suaves têm maior representatividade na cidade brasileira (26%) em

comparação com a cidade portuguesa (20%).

Ambas são pólos atractores de tráfego na sua região metropolitana, mas enquanto que

Florianópolis tem vindo a apresentar um aumento dos volumes de entrada de tráfego, esses

volumes em Lisboa têm vindo a diminuir. Isto traduz-se numa aposta financeira mais elevada na

rede viária na capital catarinense em contraste com uma recente aposta nos modos suaves na

capital portuguesa, o que associado aos efeitos da crise económica explica a menor utilização

do TI.

Em termos de estacionamento ainda há diversas medidas que podem ser tomadas.

Florianópolis tem pouco estacionamento tarifado, apesar das novas ações nesse sentido, mas

os pólos geradores de tráfego ainda não se encontram inseridos nesse esquema, o que seria

essencial para uma diminuição da utilização do automóvel. Lisboa é bastante forte neste tema,

com lugares tarifados nas áreas centrais mais importantes.

Onde se encontram bastantes semelhanças entre as duas aglomerações urbanas é nas

suas características geográficas. Ambas possuem declives acentuados em diversos locais, com

colinas ou morros, e têm o centro delimitado por uma barreira hídrica, o rio Tejo no caso de

Lisboa e as Baías Norte e Sul em Florianópolis. Isto significa que os sistemas de acessibilidades

têm de conseguir não só ultrapassar estas barreiras mas encontrar a melhor relação com as

mesmas, isto é, um desenvolvimento eficiente e de qualidade. Com as suas formas radiais, o

tráfego é encaminhado para os mesmos lugares onde não há alternativas de fuga, sendo

inevitável a procura de soluções para a sua dispersão.

Em termos de governança de transportes este é um ponto crítico, pois, por mais

mudanças e investimentos que se façam em todo o sistema de mobilidade de uma cidade, uma

gestão eficiente é essencial para o seu bom funcionamento. Um fator comum a ambas as cidades

é a dispersão do poder dentro das organizações, neste caso, as câmaras municipais. A

responsabilidade pela mobilidade e transportes na CML encontra-se distribuída por áreas onde

os problemas de comunicação podem ser uma constante. Do mesmo modo funciona a prefeitura

de Florianópolis onde o poder é difuso e não se tem uma ideia clara de quem defende os

interesses públicos em relação aos transportes.

73

Os problemas de mobilidade e transportes tanto em Lisboa como em Florianópolis

assumem uma função crítica no funcionamento das cidades e na qualidade de vida dos cidadãos,

sendo consensual que estes problemas não são resolúveis pela simples construção de mais

infraestruturas.

O grande desafio destas cidades não é a aposta na ampliação da rede viária, mas a

gestão integrada dos usos do solo e dos vários sistemas de transportes, num relacionamento

intermodal e que ofereça aos seus utilizadores a possibilidade de escolha do modo de transporte

a utilizar, com a qualidade desejada.

Para o transporte coletivo existe claramente uma falta de infraestruturas, especialmente

na cidade brasileira, de modo a colmatar as falhas de cobertura de território e de serviço a

funções urbanas.

Deste modo, identificam-se de seguida os principais problemas relativos ao sistema de

mobilidade da cidade portuguesa e da brasileira, cuja solução permitirá uma mudança estrutural

no sentido de uma mobilidade mais sustentável.

Lisboa

1) Grande volume de entrada de tráfego em Lisboa, apesar de ter vindo a diminuir nos últimos

anos. Os principais eixos de entrada são a Ponte 25 de Abril, a A5 e o IC19, responsáveis por

40% do tráfego total.

2) Grande utilização do automóvel quando comparado com os outros modos, sendo que este

valor tem vindo a aumentar de modo sustentado nas últimas décadas.

3) Baixa velocidade comercial dos autocarros (menos de 15km/h), de tal modo que este

transporte não se mostra atrativo para os utilizadores de TI.

4) Pouca utilização dos modos suaves, principalmente da bicicleta.

5) Gestão dos transportes dividida entre as autarquias e o Estado, obrigando a soluções de

colaboração e compromisso que não se têm verificado.

Florianópolis

1) Grande utilização do automóvel. Na travessia das pontes Pedro Ivo e Colombo Salles: 85%

das viagens são de pessoas que moram no continente e trabalham ou estudam na ilha, e mais

de metade dessas pessoas fazem esse percurso de automóvel.

2) Pouca utilização dos TC. Sistema de autocarros está subutilizado, operando apenas a 60%

da sua capacidade devido à sua fraca qualidade (irregularidade nos horários, baixa frequência e

indução de deslocações desnecessárias).

3) Rede viária saturada. A taxa de ocupação das pontes é de 99%, estando completamente

saturadas nas horas de ponta.

4) Fraca qualidade da infraestrutura pedonal

74

5) Grande concentração de empregos e serviços no Centro, provocando movimentos pendulares

de grande volume.

No quadro seguinte sintetizam-se os principais indicadores de comparação utilizados.

Lisboa Florianópolis

Caracterização demográfica e

socioeconómica

População (habitantes) 547 733 421 203

Superfície (km2) 100 436.5

Densidade (hab/ha) 55 14

Estratos etários (%)

≤ 19 anos 15 34

20 a 65 anos 61 57.5

> 65 anos 24 8.5

Taxa motorização (veic/1000hab) 601 428

Nº médio de viagens por habitante por dia

Todos os modos

2.76 1.8

Só transporte motorizado

2.2 1.3

Distância média percorrida (km) por habitante por dia

5 7

Rede Viária Repartição modal (%)

TI 45 48

TC 35 26

Modos suaves 20 26

TMDA (veic/dia) 647 231 196 700

Transporte Coletivo

Modos em operação 2 (rodoviário, ferroviário)

1 (rodoviário)

Nº operadores6 7 1

Autocarros

Nº autocarros 745 524

Nº carreiras 78 200

Idade média (anos)

7.6 5.4

Velocidade comercial

(km/h) 14.6 8

Passageiros transportados

por ano (milhões pessoas)

170 54

Tarifário Nº bilhetes disponíveis

4 1

Custo TC 0.12 €/km 0.43 R$/km

Custo TI 0.15 €/km 0.24 R$/km

Estacionamento Nº lugares tarifados na via pública 45 000 5 000 Quadro 5.1: Principais indicadores de comparação da mobilidade urbana nas duas cidades

6 Considerando empresas que operam na área metropolitana mas também oferecem serviços ao nível do município.

75

Possíveis soluções

A gestão estratégica dos sistemas de mobilidade de um centro urbano assume-se como

uma questão complexa que envolve a participação de diversos agentes e a sua resolução

depende de vários fatores. As futuras políticas de mobilidade sustentável devem incorporar os

novos desafios que diariamente surgem nas cidades.

Apenas a intervenção equilibrada entre o planeamento e a gestão do território e a definição

de um plano de mobilidade na escala metropolitana, poderão contribuir para a diminuição da

necessidade de transporte e para um modelo de mobilidade sustentável.

Não só é essencial a integração da mobilidade na gestão do território mas também a

recolha de dados e análise dos mesmos de modo a servir de suporte à tomada de decisão. Não

é possível a apresentação de soluções para um determinado sistema de mobilidade sem ter o

conhecimento prévio de todos os elementos que o constituem e o seu modo de funcionamento,

pois medidas que funcionam numa aglomeração urbana podem não apresentar resultados

favoráveis noutra, simplesmente pelo facto de a cultura ser diferente.

Ao longo do presente capítulo pretende-se apresentar algumas hipóteses alternativas ao

sistema atual de mobilidade em ambas as cidades, de tal forma que os principais problemas

possam ser ultrapassados. Não se pretende assumir que todas sejam de fácil aplicabilidade, mas

antes que sejam uma indicação para o futuro, dado o seu comprovado sucesso em sistemas

semelhantes.

“A mobilidade sustentável é a capacidade de dar resposta às necessidades da sociedade

em deslocar-se livremente, aceder, comunicar, negociar e estabelecer relações, sem

sacrificar outros valores humanos e ecológicos hoje ou no futuro”.

Fonte: World Business Council for Sustainable Development

De acordo com a definição sobre mobilidade sustentável é evidente que hoje em dia não se

cumprem os objetivos definidos, tanto em Lisboa como em Florianópolis. Faltam recursos para

responder às necessidades de deslocação da população, principalmente ao nível do transporte

coletivo, e na maior parte das vezes sacrifica-se a qualidade de vida em comunidade pelo

interesse individual.

A qualidade da mobilidade proporcionada por uma cidade pode medir-se segundo dois

critérios:

- A sua multimodalidade, ou seja, a existência de diferentes modos de transporte na cidade;

- A intermodalidade, a relação estabelecida entre esses diferentes modos de transporte e a

facilidade com que os utilizadores passam de um modo para o outro.

Apostando nestes dois eixos está encontrado o caminho para a mobilidade sustentável

que as cidades anseiam e precisam.

76

Lisboa

A primeira medida a ser tomada com vista à melhoria das condições de mobilidade em

Lisboa está relacionada com a intervenção ao nível do transporte individual. Este é o modo de

transporte que ocupa mais espaço na cidade, espaço público que deveria ser aproveitado para

outras atividades em benefício da qualidade de vida em sociedade. Não é justificável que, com

a grande oferta de transporte coletivo existente em Lisboa, a maior parcela da repartição modal

seja do transporte individual.

Uma das primeiras medidas a serem tomadas passa pela tarifação do uso do automóvel.

Visto que em Lisboa a tarifação do estacionamento está bem desenvolvida é preciso aumentar

a eficácia da fiscalização do mesmo, visto que essa é uma maneira de reduzir a sua utilização

por grandes períodos de tempo, dificultando e desincentivando a utilização do automóvel para

deslocações regulares, com o veículo a estar parado no mesmo lugar ao longo de quase todo o

dia. Esta medida não implica uma elevada utilização de recursos financeiros, nem de recursos

humanos, logo a sua aplicabilidade é imediata e apresenta resultados a curto prazo.

Como já observado noutras cidades, como por exemplo em Londres, é possível a

tarifação da entrada do automóvel no centro urbano, com a denominada taxa de

congestionamento. Esta taxa é cobrada em quase todos os veículos motorizados numa

determinada área pré-definida, entre as 7h e as 18h nos dias úteis, e tem como objetivo a redução

do volume de tráfego nas áreas centrais e a recolha de fundos para investir no transporte coletivo.

Os resultados em Londres apontam para uma diminuição de 20% nos volumes de tráfego na

última década, numa receita de 1.2 bilhões de libras investidos no transporte público, rede viária

e rede de modos suaves, num aumento da utilização de transporte público em 25% e das

bicicletas em 49%, confirmando mudanças significativas nos padrões de mobilidade. Conclui-se

que é possível a aplicabilidade desta medida com sucesso e é expectável que, nos primeiros

tempos, esta não seja tão bem aceite pela população, o que implica uma forte força política.

Implica, inicialmente, o investimento em material e recursos humanos, mas que ao longo do

tempo serão recompensados pelas receitas obtidas com esta medida.

A par das medidas dissuasoras da utilização do automóvel encontram-se as medidas de

promoção dos restantes modos de transporte. Numa situação ideal, a população deslocar-se-ia

por modos suaves quando a distância a percorrer fosse inferior a 6 km e de transporte coletivo

para distâncias maiores.

Para a utilização de modos suaves é imperativo a melhoria da qualidade da

infraestrutura, isto é, aumento da largura dos passeios, pavimento propício ao modo pedonal,

vias cicláveis em todas as ruas principais, aposta nas zonas 30 para diminuição da velocidade

de circulação dos automóveis, e no geral, ambiente propício e que incentive a caminhada, com

sombras, comércio e vida local. A única contrariedade que se pode colocar face a estes desafios

é a falta de recursos financeiros, justificável pelo ambiente de crise em que Portugal se encontra.

77

Não obstante, é possível encontrar alternativas a esse problema como a utilização das receitas

provenientes das medidas dissuasoras de utilização do automóvel.

Na questão dos transportes coletivos trata-se de oferecer a melhor relação qualidade-

preço. A principal questão apontada pelos utilizadores deste modo de transporte é o tempo de

viagem que é considerado elevado quando comparado com o TI. Uma solução passa por

aumentar a velocidade comercial dos autocarros, com a delimitação de vias dedicadas a estes

numa área de maior abrangência da atualmente existente e maior distância entre paragens. Para

melhorar a qualidade dos autocarros pode-se apostar nos serviços de informação aos

passageiros, tanto nas paragens como a bordo dos veículos ou mesmo utilizando aplicações

móveis, de modo a possibilitar a informação em tempo real da localização dos veículos ou do

tempo de espera. A pontualidade é outro dos problemas apontado pelos utilizadores que pode

ser melhorado com um maior número de faixas BUS.

A extensão do metropolitano de Lisboa a novas polaridades e áreas com pouca cobertura

da rede de TC é essencial na mobilidade dos residentes e na promoção de comportamentos tipo

Park & Ride. Além disso, também a melhoria da qualidade do serviço pode dar frutos neste

contexto, ajustando a oferta à procura, articulando com outros transportadores e a dinamizando

zonas comerciais nas diversas estações da rede, como fator de captação e fidelização de

passageiros.

Sendo o maior volume de entrada de tráfego na cidade proveniente da ponte 25 de Abril

é impreterível a promoção dos transportes coletivos nesse trajeto. A Fertagus, empresa de

comboios responsável por essa ligação, passa uma imagem bastante positiva aos utilizadores

pelo que, para uma maior aderência da população, pode apostar na divulgação de informação

por planos de marketing. O transporte fluvial pela Transtejo representa uma parcela importante

desse volume de entrada, no entanto, tem vindo a perder passageiros. Requere um serviço mais

eficiente e eficaz, com a adaptação da oferta à procura, seja em número ou tamanho das

embarcações.

A oferta dos transportes públicos que servem Lisboa deve ser estruturalmente ajustada

e adaptada para responder aos padrões de mobilidade e à dinâmica da cidade. O seu

planeamento e gestão devem ser competência pública e o município deve ter um papel ativo no

planeamento, gestão e operação das empresas de transporte público, defendendo o interesse

coletivo.

Uma outra estratégia a adotar é a articulação entre transportes e usos do solo, com ação

na política de estacionamento, no desenvolvimento de novas centralidades urbanas associadas

a nós do sistema de transportes e novas linhas de transporte coletivo em sítio próprio.

O problema relativo à mobilidade em Lisboa não é a falta de soluções realistas e

exequíveis social e tecnicamente. O problema são as forças políticas que procuram soluções a

curto prazo que sejam fáceis e rápidas de aplicar, muitas vezes aplicadas sem conhecimentos

técnicos suficientes. Os tempos políticos, marcados pelos calendários eleitorais, interferem na

78

definição das prioridades e, normalmente, relegam para segundo plano as intervenções com

carácter mais estruturante e essenciais para alterar os hábitos e as opções individuais que

condicionam a mobilidade urbana atual.

Florianópolis

Como já se viu ao longo do trabalho, a forte presença do transporte individual é o maior

problema desta cidade em questões de mobilidade. Esta situação é muito semelhante à de

Lisboa nos anos 60/70, quando houve uma massificação do automóvel e começaram a surgir as

grandes preocupações com a segurança da população e crescente poluição atmosférica. A

cidade brasileira vai passando por etapas de evolução semelhantes às que ocorreram em Lisboa

em termos de mobilidade, com a grande diferença que esta evolução acontece num espaço de

tempo bastante mais curto, ou seja, todas as medidas tomadas agora vão ter um impacto

decisivo no futuro da mobilidade urbana em Florianópolis.

Florianópolis está no início de uma grande transformação e tem já verbas e recursos

assegurados para a sua concretização. Ao contrário de Lisboa, cujas soluções para a mobilidade

são pontuais, as soluções em Florianópolis implicam grandes obras de infraestruturas e

mudanças ativas na mentalidade da população.

Para reduzir a dependência do automóvel e a sua pressão no contexto urbano, tem de se

agir simultaneamente através de uma política de restrição de estacionamento e de circulação

automóvel e promover alternativas atrativas ao uso do automóvel. Para isso é indispensável taxar

o uso do automóvel, de modo a que esse custo seja superior ao do transporte coletivo. Assim,

os lugares de estacionamento no centro da cidade têm de ser reduzidos e tarifados, com tarifas

mais exigentes e com uma fiscalização eficaz e consistente. Os campi universitários,

nomeadamente a UFSC, passam a adotar uma política de estacionamento mais restritiva,

introduzindo um pagamento equivalente ao valor dos bilhetes do transporte coletivo. Seria fácil

a Prefeitura levar a que os Reitores adotassem essa medida, bastaria aumentar a tarifa do

estacionamento público na zona envolvente e ser implacável com a sua fiscalização. Face ao

número de estudantes universitários que hoje se deslocam em TI, a adoção de tal medida

contribuiria para a redução de bastantes veículos em circulação na cidade.

Os morros constituem barreiras físicas e psicológicas entre diferentes partes da cidade e

fazem uma divisão do território de tal maneira que as deslocações são desestimuladas. À

semelhança do posto em prática na ilha da Madeira, em Portugal, a construção de túneis

ultrapassa esta dificuldade e aproxima diversas áreas da cidade. Além de permitir encurtar

distâncias e tempos de viagem em automóvel, permite a utilização de bicicletas, o que na

situação corrente não é possível.

O problema mais gravoso em relação ao transporte individual é a entrada ou saída da ilha

através das pontes Colombo Salles e Pedro Ivo Campos. Antes de mais, é óbvia a necessidade

de uma alternativa na entrada na ilha. Porém esta alternativa não deve ser de todo dedicada ao

79

transporte individual, pois isso só iria atrair maior volume de automóveis, saturando ainda mais

uma rede viária finita e sem alternativas.

Deste modo, a criação de uma nova ponte totalmente dedicada ao transporte coletivo seria

uma solução não só viável como desejável para a atração da população para este modo de

transporte. Esta ponte deveria fazer a ligação a uma rodovia de 1ª ordem ligando Florianópolis

aos municípios a norte. As pontes do transporte individual iriam continuar congestionadas,

funcionando como elemento dissuasor do uso do carro, visto que há uma nova alternativa mais

rápida e económica se bem dimensionada. Visto que existe um forte apreço por parte de todo o

município em relação à ponte Hercílio Luz, esta poderia ser a ponte dedicada apenas ao

transporte coletivo. A infraestrutura já existe mas precisa de uma forte remodelação e integração

na rede de transportes já existente, mas é uma solução bastante viável.

Para além dessa nova ligação Ilha-Continente, seria ainda possível incluir um transporte

aquaviário como complemente ao transporte público, tão ou mais eficiente que o mesmo

transporte de Lisboa. Não é possível admitir que numa ilha, numa cidade envolta por água, não

exista um transporte que ultrapassa essa barreira física.

Quanto ao transporte coletivo dentro do município, a Prefeitura iniciou já as obras do anel

viário com corredor exclusivo de autocarros. Este anel viário terá 17 km de vias exclusivas de

autocarros e contornará a região central, passando pelo TICEN, Beira-mar Norte e UFSC e tem

um custo estimado de R$ 150 milhões. Esta é uma das medidas que podem dar a volta ao

sistema de mobilidade de Florianópolis, na medida em que melhorará a rede de transporte

coletivo, apresentando-se como alternativa atrativa ao TI. Espera-se que, no futuro, as vias

dedicadas exclusivamente aos autocarros se estendam por toda a ilha, servindo os principais

pólos geradores de tráfego e criando novas centralidades.

A aposta nos autocarros deve ser feita, não só ao nível da infraestrutura, mas em termos

de qualidade e serviço. A frequência deve ser aumentada e os horários cumpridos, respondendo

aos requisitos de pontualidade.

Se numa fase inicial este sistema de autocarros é o ideal para responder às necessidades

da cidade, no futuro poderá não ser assim, já que esse sistema de BRT tem capacidade limitada.

Com o crescimento demográfico exponencial que se tem vindo a observar em Florianópolis, é

expectável que, com a aderência da população ao transporte coletivo, este deixe de ser suficiente

para responder à demanda. Prevê-se uma mudança do BRT para VLT (veículo leve por trilhos)

sendo para isso necessária apenas a introdução dos carris e outros elementos estruturais, visto

que as vias para esse transporte já existem no terreno.

A promoção dos modos suaves apresenta-se muito fraca nesta cidade brasileira, com

passeios em más condições e automóveis ocupando o espaço público. É urgente a melhoria das

condições da calçada, a expansão das redes de ciclovia, a implantação de zonas 30 e a

revitalização de ruas no Centro. É ainda urgente uma mudança da mentalidade dos condutores

de automóvel, para que o peão passe a ser a prioridade. Para isso pode ser introduzido o sistema

80

de controlo de semáforo integrado, colocada sinalização horizontal e vertical e faixas para

pedestres bem sinalizadas.

Mais importante que a criação de diferentes modos de transporte, é a integração entre

eles. Uma boa intermodalidade tem de ser capaz de proporcionar soluções em cadeira que

permitam a conexão de diferentes modos de transporte, tendo em vista a satisfação de uma

determinada deslocação. Uma forma de fazer isso é com a implementação de um sistema de

gestão e monitorização em tempo real dos diversos sistemas de transporte que permita transmitir

essa informação aos utilizadores da rede.

Nenhuma destas soluções pode ser colocada em prática se não houver recursos humanos

qualificados. É preciso investir em técnicos e em gestão especializada que encontre soluções

para os problemas que vão surgindo, aliados a uma força política com capacidade de atuação.

Tanto em Lisboa como em Florianópolis assiste-se a uma resistência por parte da

população em separar-se do seu automóvel e da ligação estabelecida com este e que continua

a ser um símbolo forte de poder, de realização e de status. A mudança desta mentalidade é

complexa e lenta e aliada à falta de conhecimento sobre a melhoria nas redes de transporte

público, continuam a acreditar que o TC não assegura com conforto, segurança e eficácia muitos

dos trajetos que optam por fazer de carro particular.

Só a promoção dos transportes coletivos, com novas formas mais eficientes e cómodas

de organização, assentes no reforço da intermodalidade e na comodidade das interfaces poderá

vir a constituir uma alternativa sustentável. Este reforço deverá integrar o transporte individual,

que poderá constituir, em muitos casos, uma primeira componente de percursos envolvendo

vários modos.

É essencial que as políticas para a mobilidade urbana assentem numa visão estratégica

de longo prazo, com possibilidade de aliar as perspetivas e objetivos dos diversos agentes

envolvidos, de modo a garantir a sustentabilidade do sistema.

81

6 - Conclusões

Ao longo do presente trabalho foram abordados uma diversidade de temas e de fenómenos

que permitiram concretizar os objetivos propostos no início, originando um conjunto de sugestões

no domínio das políticas de mobilidade sustentável.

Os problemas relacionados com a mobilidade urbana são antigos e acompanham a

história da cidade. A rápida urbanização acarreta consequências graves para o sistema de

mobilidade e é uma tarefa complexa ajustar a rede de transportes às mudanças de necessidades

de deslocação que ocorrem ao longo do processo. Florianópolis é um exemplo destes

acontecimentos, na medida em que o seu crescimento rápido fez com que o perfil da cidade se

transformasse radicalmente e, com isso, também o perfil de mobilidade dos cidadãos. A cidade

apresenta uma situação em múltiplos problemas, dificuldades de integração e baixa qualidade

no serviço de transporte coletivo.

Segundo Jackson & Cameron (1983) as soluções modernas de transporte têm seguido

ao longo do tempo os exemplos europeus de sistemas intermodais, como sendo as alternativas

com mais sucesso para as cidades médias. A existência de diferentes modos de transporte e a

integração inteligente entre eles está presente no caso de Lisboa, ainda que a prática não utilize

todos os avanços tecnológicos conseguidos, carecendo por isso de diversos melhoramentos.

Na primeira parte do trabalho, foram identificadas as principais características de

Florianópolis e Lisboa, destacando as semelhanças e diferenças entre as duas cidades e

metrópoles. Procedeu-se à caracterização sociodemográfica da população, analisando a sua

evolução, distribuição, emprego e crescimento económico.

Com base nestes elementos assumiu-se que seria possível desenvolver um estudo

comparativo entre as duas cidades, uma vez que apresentam semelhanças na divisão do

território e, de certa maneira, têm apresentado comportamentos idênticos no que se refere ao

crescimento e distribuição da população nesses centros urbanos.

Deste capítulo retira-se que a metrópole de Lisboa tem sofrido uma desconcentração,

com perda de população da cidade centro para os concelhos vizinhos e com grande progressão

do seu envelhecimento. Por outro lado, Florianópolis apresenta um crescimento de população

acentuado, maioritariamente jovem e concentrada no centro da cidade.

Nos capítulos seguintes procurou-se responder ao segundo objetivo de caracterização

do sistema de mobilidade, analisando os diversos modos de transporte disponíveis em ambas

as cidades, como o transporte individual, o transporte coletivo e os modos suaves.

Sobre a rede viária retiram-se como principais conclusões que ambas as cidades são

pólos atractores de tráfego e apresentam uma grande utilização do transporte individual. No

entanto, enquanto que em Lisboa o tráfego de entrada tem vindo a diminuir, em Florianópolis

esse volume continua a aumentar. Verificou-se que a taxa de saturação das vias é muito elevada

e continuam a ser aplicados esforços na expansão da rede viária a fim de adequar a capacidade

82

ao volume crescente de veículos motorizados. Esta prática mostra-se inadequada e limitada já

que acaba por atrair um maior número de veículos a curto prazo.

Pelo diagnóstico do transporte coletivo em Lisboa identificaram-se as problemáticas

fundamentais: diminuição da procura, redução da oferta dos transportes, aumento das tarifas e

qualidade do serviço insuficiente para os padrões desejados pelos utilizadores. Em Florianópolis

o caso é bastante pior, visto que há apenas uma alternativa de transporte coletivo, não dando

poder de escolha aos passageiros; o desenvolvimento da infraestrutura não acompanhou o

crescimento da população e, no geral, o sistema de TC não apresenta vantagens em relação ao

transporte individual.

A melhoria das condições dos modos suaves é também essencial. Precisa de se voltar

a repensar nas ruas como espaços sociais, onde estas não são utilizadas apenas para

deslocações mas também para o convívio entre a população e o aproveitamento do espaço que

os rodeia. Pode-se melhorar os passeios, arborizar as avenidas e investir no comércio de rua.

No estudo do sistema de acessibilidades e da sua relação com a evolução do espaço

urbano constata-se que o transporte assume um papel central nos sistemas de produção que

pode, e deve, ser percebido a diferentes escalas, desde o nível global ao nível local, permitindo

ou facilitando as relações entre os diferentes territórios e, simultaneamente, diferenciando-se na

exata medida em que promove diferenças de acessibilidade. Discutiu-se, ainda, a relação entre

o transporte e a configuração urbana, associando-se o papel do transporte ao processo de

urbanização e à forma urbana. Em ambas as cidades confirmou-se uma fraca utilização dos

instrumentos do planeamento e do ordenamento do território, com pouca diversificação do uso

do solo e repartição desequilibrada de infraestruturas.

O capítulo 9 responde ao terceiro objetivo do estudo comparativo, onde, depois na

análise realizada nos capítulos anteriores, se sintetiza as principais conclusões e se identificam

os problemas relativos ao sistema de mobilidade cuja solução permite uma mudança estrutural

para um modelo mais sustentável. O problema mais marcante identificado em ambas as cidades

é a elevada percentagem de utilização do transporte individual e a importância dada a este, tanto

em relação aos seus utilizadores como ao investimento em infraestrutura.

Outro dos problemas que Florianópolis enfrenta é a falta de conhecimento e de dados

relativos ao tráfego e mobilidade. Apesar de atualmente estar em desenvolvimento o Plamus,

Plano de Mobilidade Urbana Sustentável da Grande Florianópolis, que se bem aplicado trará

uma grande evolução ao estudo da mobilidade em Florianópolis, até agora todas as mudanças

realizadas nesta cidade foram efetuadas sem qualquer base científica, sem dados ou

pressupostos que dessem uma indicação do caminho a percorrer. O plano que está em

desenvolvimento não deve ser apoiado apenas nos poderes políticos, uma vez que estes mudam

com cada eleição, mas sim apoiados por instituições independentes e universidades que tenham

o compromisso de continuar a desenvolvê-lo no futuro e o envolvimento da população em geral.

83

Em Lisboa, um dos problemas que deve ser rapidamente encarado é a falta de

mobilidade no conjunto de bairros históricos no centro da cidade. Estes bairros, com perda

acelerada de população e residentes maioritariamente envelhecidos, precisam de programas de

revitalização sem perder o carácter e imagem. Não é possível dotar estes bairros de oferta de

estacionamento como os adotados em novas urbanizações, pelo que a carência de

acessibilidade deve ser suprida com o recurso a um sistema de transporte leve e capaz de vencer

grandes declives. A conjugação desta oferta com o regime de densificação seletiva nas

proximidades das paragens e estações (articulação com o uso do solo) constituem elementos

centrais do que se espera ser uma estratégia de revitalização desses bairros. As redes de

transporte coletivo de superfície devem complementar melhor as redes pesadas (como o metro)

e devem dar maior atenção à cobertura espacial dos bairros. Observa-se também que o

transporte coletivo em toda a cidade, principalmente o metro, desenvolveu-se principalmente ao

longo dos eixos tradicionais de emprego e de serviços, privilegiando zonas ainda não

consolidadas ou bairros periféricos ao município, deixando de atender às necessidades de

mobilidade de alguns dos principais bairros da cidade (como Campo de Ourique/Estrela).

O transporte coletivo enfrenta também um problema novo, na medida em que tem de

atender a duas procuras distintas: por um lado, a dos cidadãos idosos, que existem cada vez em

maior número e frequentemente sem outras opções de mobilidade motorizada; e por outro, a dos

cidadãos com acesso ao automóvel, a quem é necessário oferecer um serviço que lhes seja

suficientemente agradável para poder ser escolhido. Mas os requisitos destes dois segmentos –

proximidade no primeiro caso, frequência e rapidez no segundo – são suficientemente diferentes

para que uma só resposta com segmentação da oferta possa ser eficiente.

Além de todos estes problemas, tanto em Florianópolis como em Lisboa, existem outros

mais que são precisos adereçar e dar atenção. Os principais exemplos que se podem retirar da

mobilidade de Lisboa que podem ser aplicados em Florianópolis são, em primeiro lugar que a

construção de uma nova ponte destinada ao uso do automóvel não é solução, uma vez que a

Ponte Vasco da Gama construída para aliviar o tráfego na Ponte 25 de Abril não resolveu

qualquer problema a esse nível e apenas serviu para fomentar a especulação imobiliária do outro

lado do rio. Em segundo lugar, verifica-se que Florianópolis necessita de uma diversificação dos

meios de transporte e desenvolvimento da rede de autocarros existente, tendo em vista o

conceito de intermodalidade e integração modal. Como em Lisboa o transporte fluvial é

suficientemente eficiente, também na cidade brasileira seria possível adotar um sistema

semelhante mas com especial atenção à sua integração com a rede de autocarros, tanto no lado

da ilha como no lado do continente, e que fosse economicamente atrativo. Por último, um dos

grandes exemplos que se pode retirar da história de Lisboa é a criação de novas centralidades,

como é o exemplo do Parque das Nações (antiga Expo 98), que tanto serve como um centro de

negócios como local residencial. Estas novas centralidades podem ter bastante sucesso se

acompanhadas com um planeamento de mobilidade e transportes de acordo com a futura

demanda.

84

Em todo o caso, a principal conclusão que se pode retirar com o estudo comparativo da

mobilidade nas duas cidades é a urgente necessidade de planeamento, estudo e

acompanhamento por parte da população das ações realizadas no domínio da mobilidade e

melhoria das condições de deslocação.

Os resultados obtidos permitem retirar algumas conclusões relevantes para as

orientações de política com vista a uma mobilidade sustentável. Os sistemas de mobilidade

urbana contribuem para o desenvolvimento equilibrado das cidades, a sua ocupação racional e

adequada para os cidadãos. O contraste entre uma cidade que quase não cresceu no seu núcleo

central no século XX e outra cuja população cresceu exponencialmente, permitiu mostrar como

exemplos tão extremos podem ilustrar alguns dos múltiplos desafios da mobilidade urbana.

85

86

Referências Bibliográficas

ACAP. (2009). Estatísticas do Sector Automóvel em Portugal. Lisboa: Associação Automóvel

de Portugal.

AMTL/ISCTE. (2014). Área Metropolitana de Lisboa: os transportes públicos aos olhos da

população. Lisboa: AMTL.

Barata Salgueiro, T. (2002). Desenvolvimento Urbano de Lisboa. Revista de Estudos Regionais

nº5, pp. 7-22.

Camagni, R., Gibelli, M. C., & Rigamonti, P. (2002). Forme Urbaine et Mobilité: Les coûts

collectifs des différents types d'extension urbaine dans l'agglomération Milanaise.

Revue d'Économie Régionale et Urbaine, 105-139.

Caruso, M. (1983). O Desmatamento da Ilha de Santa Catarina de 1500 aos Dias Atuais.

Florianópolis: UFSC.

CML. (2009). Relatório do Estado do Ordenamento do Território. Lisboa: Câmara Municipal de

Lisboa.

CML. (2015). História de Lisboa. Obtido em 30 de 03 de 2015, de Câmara Municipal de Lisboa:

http://www.cm-lisboa.pt/municipio/historia

Costa, M. d. (2003). Mobilidade urbana sustentável: um estudo comparativo e as bases de um

sistema de gestão para Brasil e Portugal. Escola de Engenharia de São Carlos. São

Carlos: Universidade de São Paulo.

Ferraz, A., & Torrez, I. (2005). Transporte Público Urbano. São Paulo: Rima.

Fuhr, C., & Dal Santo, M. A. (2009). A expansão urbana na Ilha de Santa Catarina e suas

implicações na comunidade do Santinho. XII Encuentro de Geógrafos de América

Latina. Montevideo.

Gollnick, S. (27 de Abril de 2010). Cidades. Obtido em 30 de 03 de 2015, de Viver

Urbanamente: http://gollnick.blog.terra.com.br/2010/04/27/cidades/

Hall, P. (1969). Transportation. Urban Studies 6, 408-435.

IBGE. (2010). Censo Demográfico. Brasília: IBGE.

INE. (2011). Censos. Lisboa: INE.

INE. (2011). Censos 2011 - Resultados Preliminares. Lisboa, Portugal: Instituto Nacional de

Estatística.

INE. (2012). Mobilidade em cidades médias. Lisboa: Instituto Nacional de Estatística.

Jackson, P., & Cameron, J. R. (1983). System Development. France: Lavoisier.

87

Macário, R. (2004). Integration in Urban Mobility Systems: Quality Upgrading or Competition

Blockade? World Conference on Transport Research. Lisboa, Portugal: CESUR -

Instituto Superior Técnico.

Marques da Costa, N. (2007). Mobilidade e Transporte em Áreas Urbanas. O caso da Área

Metropolitana de Lisboa. Universidade de Lisboa. Lisboa: Faculdade de Letras de

Lisboa.

Medrano, R. H. (2006). Comparação de alguns elementos do traçado urbano nas cidades de

São Paulo e Buenos Aires, na virada do século XIX para o XX. Cadernos de Pós-

Graduação em Arquitetura e Urbanismo. São Paulo: Faculdade de Arquitetura e

Urbanismo da Universidade de São Paulo.

Ministério do Turismo. (2013). Dados e Fatos. Obtido em 23 de 04 de 2015, de Ministério do

Turismo: http://www.dadosefatos.turismo.gov.br/dadosefatos/home.html

Plamus. (2015). Plano de Mobilidade Urbana Sustentável da Grande Florianópolis.

Florianópolis: Governo de Santa Catarina.

RUITEM-IFHP. (2014). Sintesis y Conclusiones de las Aportaciones realizadas en el Seno del

Grupo de Trabajo "Ciudad y Movilidad". La Movilidad Urbana en Diversas Áreas

Metropolitanas de Latinoamerica. San Salvador: UPC Barcelona.

Silvestre, P. (2013). Sistemas de Transporte Colectivo na cidade de Lisboa. Lisboa: Instituto

Superior Técnico.

Turismo de Portugal. (2013). Os resultados do turismo - 3º trimestre de 2013. Obtido em 15 de

10 de 2014, de Turismo de Portugal:

http://www.turismodeportugal.pt/Portugu%C3%AAs/ProTurismo/estat%C3%ADsticas/a

n%C3%A1lisesestat%C3%ADsticas/osresultadosdoturismo/Anexos/Os%20Resultados

%20do%20Turismo%20-%203%C2%BA%20Trimestre%20de%202013.pdf

Van Wee, B. (2002). Land use and transport: research and policy changes. Journal of Transport

Geography 10, 259-261.

Vuchic, V. (1981). Urban Public Transportation. Systems and Technology. New Jersey:

Prentice-Hall.