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OS TRATADOS INTERNACIONAIS COMO FONTES DO DIREITO Autor: Osvaldo José Rebouças Auditor Fiscal do Tesouro Estadual-sefaz/ce Doutorando Ciencias Jurídicas e Sociais pela Universidad del Museo Social Argentino (UMSA) Abril de 2009

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OS TRATADOS INTERNACIONAIS COMO FONTES DO DIREITO

Autor: Osvaldo José RebouçasAuditor Fiscal do Tesouro Estadual-sefaz/ceDoutorando Ciencias Jurídicas e Sociais pela Univer sidad del Museo Social

Argentino (UMSA)

Abril de 2009

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SUMÁRIO

1. Resumo..............................................................................................................................3

2. IntroduÇÃO.......................................................................................................................5

3. O conceito de Direito.........................................................................................................8

4. AS FONTES DO DIREITO...........................................................................................12

4.1. Conceito.................................................................................................................................12

4.2. Classificação das fontes do direito .....................................................................................15A Constituição...........................................................................................................................17A lei...........................................................................................................................................18Outras espécies de legislação....................................................................................................21

5 – OS TRATADOS INTERNACIONAIS COMO FONTES DE DIREITO...................34

5.1. Os tratados internacionais ..................................................................................................34

5.2. A Comunidade Européia.....................................................................................................37

5.3. O Direito Comunitário.........................................................................................................38

5.4. Direito Internacional............................................................................................................40

5.5. Os tratados internacionais e sua aplicação no Brasil........................................................42

6 – CONCLUSÕES.............................................................................................................45

7 - BIBLIOGRAFÍA...........................................................................................................47

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1. RESUMO

Este estudo tem como objeto verificar a possibilidade jurídica de se classificarcomo fontes de direito interno o tratado internacional. É certo que não se temuma classificação com caráter absoluto de fontes de direito e os doutrinadores,de acordo com sua tendência filosófica, científica ou política elaboram suasclassificações, no mais das vezes, as mais díspares possíveis. Primeiro, deve-sedefinir com que classificação se vai trabalhar. Algumas delas como a adotadapor Kelsen e Del Vecchio, eliminam este problema, apresentando como únicafonte do direito a lei. Outros adotam classificações tradicionais, dividindo-as emfontes materiais e fontes formais, e, a partir dessa classificação, relacionamquais institutos se enquadram em um ou outro tipo. Para se alcançar o escopopretendido, adotar-se-á neste estudo, a classificação tradicionalmente aceita porparte da doutrina, qual seja as fontes do direito podem ser materiais e formais e,a partir desse entendimento, se vai analisar cada uma delas e verificar como sepode compreender os tratados internacionais, neste contexto, como fontes dedireito, tendo como fundamento o regime jurídico ao qual eles são submetidos.

Palavras-chaves:direito; fontes de direito; classificação; regime jurídico; tratados internacionais;ordem jurídica interna; direito internacional; direito comunitário; ComunidadeEuropéia.

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RESUMEN

Este estudio tiene como objeto verificar la posibilidad jurídica de clasificarse eltratado internacional como fuentes de derecho. Es cierto que no hay unaclasificación con carácter absoluto de fuentes de derecho y los doctrinadores, enacuerdo con su tendencia filosófica, científica o política elaboran susclasificaciones, casi siempre las mas dispares posible. Primero se debe definircon que clasificación se va a trabajar. Algunas de ellas, como la adoptada porKelsen y Del Vecchio eliminan este problema presentando cómo única fuente dederecho la ley. Otros adoptan clasificaciones tradicionales dividiendolas enfuentes materiales y fuentes formales y en partida de esa clasificación,relacionan cuáles institutos se encuadran en una u otra especie. Para alcanzarseel objetivo pretendido se va a adoptar en este estudio la clasificación tradicionalacepta por la doctrina, o sea, las fuentes de derecho pueden ser materiales yformales y después de ese entendimiento se va a analizar cada una de ellas yverificar cómo se puede comprender los tratados internacionales en estecontexto, cómo fuentes de derecho, tenendo en fundamento de validad elrégimen jurídico al qual es subordinado.

Palabras clave:derecho; fuentes de derecho; clasificación; régimen jurídico; tratadosinternacionales; orden jurídica interna; derecho internacional; derechocomunitario; Comunidad Europea.

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2. INTRODUÇÃO

O Direito objetivamente entendido como o conjunto de regras

jurídicas que regula as relações da conduta humana é elemento

inseparável da sociedade fundada num recíproco interesse de

cooperação e numa necessidade mútua de defesa e assistência, e, como

fruto da vida social que é, tem sua origem em fenômenos sociais

decorrentes dessas relações. São as chamadas fontes do Direito, que

equivale ao fundamento de validade da ordem jurídica.

As fontes do direito enquanto nascedouro do disciplinamento de

relações humanas não tem recebido um tratamento uniforme por parte da

doutrina. Os doutrinadores divergem quanto à sua origem e classificação.

Em cada sistema jurídico se elaboram classificações distintas para estas

fontes, tornando, pois, qualquer estudo que se pretenda empreender

acerca do tema, uma difícil e árdua tarefa, levando constantemente a uma

análise parcial, ou, ainda que se pretenda mais aprofundada, sempre

haverá que se adotar alguma classificação, com certo viés característico

de cada corrente doutrinária.

O trabalho de que ora se cuida tem como elemento nuclear a

análise da utilização dos tratados internacionais como fontes do direito.

Para realização de tal desiderato, serão inicialmente fixados os conceitos

de direito comumente aceito e de fontes do direito. Assentados estes dois

conceitos básicos será analisada uma classificação dessas fontes do

direito, especialmente as fontes formais (ou primárias) e as fontes não

formais (secundárias) de acordo com a corrente de pensamento adotada.

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Após se discorrer sobre cada uma delas, a análise se volta para

seu objetivo principal que é a verificação da possibilidade de se atribuir

aos tratados internacionais a condição de fonte do direito. Para que se

possa discorrer sobre o assunto dando este enfoque, necessário se faz

que sejam analisados os conceitos de tratados internacionais em um

contexto comunitário onde se impõem como elemento regulador de

condutas sociais, bem assim sua natureza jurídica e conteúdo axiológico

inserido no ordenamento jurídico das nações signatárias, de citados

acordos enquanto elementos disciplinadores de relações internacionais.

Por derradeiro, o estudo se volta para identificar a posição dos

tratados internacionais na ordem jurídica interna e quais os efeitos de sua

utilização enquanto instrumento regulador de relações jurídicas

estritamente nacionais. A partir desta análise, serão examinados de que

forma esses tratados são recepcionados pela ordem jurídica interna, qual

sua natureza jurídica e como se harmonizam no sistema legal do país.

Para se desenvolver este estudo deverão ser efetuadas pesquisas

doutrinárias acerca do tema, compulsando-se autores nacionais e

estrangeiros para se chegar a um conceito e classificação do tema

adequados ao que se pretende. Também será analisado o processo

legislativo relativamente aos tratados internacionais bem como sua

posição em face, não somente da legislação interna, mas também sua

moldura constitucional e o regime jurídico a que se subordina.

Espera-se que, ao concluir o presente estudo, se tenha atingido os

objetivos colimados e que, de alguma forma, ele possa contribuir, ora

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incitando os pesquisadores a continuarem em sua permanente busca pela

descoberta e demonstração da verdadeira natureza do instituto, ora

trazendo mais luz e conhecimentos aos que se dedicam ao estudo do

tema e àqueles que, como operadores do direito em sua labuta diária

necessitam, no mais das vezes, manejar os tratados e convenções

internacionais com mais segurança e consciência dos efeitos que deles

irradiam, o que implica reconhecer ou não sua condição de fonte de

direito na ordem jurídica interna, para disciplinar relações decorrentes da

própria atividade humana em sua contínua e permanente evolução.

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3. O CONCEITO DE DIREITO

A palavra "Direito" (VENOSA, 2003), vem do latim directum, que

corresponde à idéia de regra, direção, sem desvio. Os romanos

denominavam-no de jus, diverso de justitia, que corresponde ao atual

sentido de justiça, ou seja, qualidade do direito justo.

Para Gusmão, o Direito pode ser compreendido em três sentidos:

1º, regra de conduta obrigatória; 2º, sistema de conhecimentos jurídicos;

3º faculdade ou poderes que tem ou pode ter uma pessoa, ou seja, o que

pode uma pessoa exigir de outra. (GUSMAO, 2002)

Outros juristas (NUNES, 2002), entende o Direito como um ideal

sonhado por certa sociedade e simultaneamente um golpe que enterra

esse ideal. É símbolo da ordem social e simultaneamente a bandeira da

agitação, posto que se revigora na própria dinâmica vida.

Como visto, o Direito não tem um conceito que seja o

absolutamente correto; existem vários conceitos de acordo com a época e

o nível das relações sociais que se desenvolvem e por ele são reguladas.

Assim, não há uma definição plena do Direito. Como ensina DINIZ (2002),

o grande problema que se apresenta é encontrar uma definição única,

concisa e universal, que abranja as inúmeras manifestações em que se

pode apresentar o Direito e que o revele como uma entidade pura,

caracterizando sua essência de maneira que o demonstre com uma

realidade diversa das tantas outras de uma existência plural.

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A grande dificuldade que se apresenta é conseguir elaborar um

conceito que seja universalmente aceito, que abranja de modo satisfatório

toda a gama de elementos heterogêneos que o compõem. Pois para o

Direito há uma variedade ampla de experiências (histórica, sociológica,

antropológica, psicológica e axiológica) e tais experiências ainda que

diferentes entre si, são complementares, manifestam-se em um mesmo

plano e tem em comum um mesmo ponto de partida: o direito positivo.

Observe-se que na perspectiva rotineira da sociedade, o Direito é

lei e ordem, isto é, um conjunto de regras obrigatórias que garante a

convivência social graças ao estabelecimento de limites à ação de cada

um de seus membros, que são geralmente aceitos e adotados como

elementos balisadores da conduta individual ou do próprio grupo, quando

ocorrem manifestações de interesse coletivo.

O Direito enquanto conjunto de regras de conduta impõe freios

segundo os quais o fazer ou não fazer do homem deve sujeitar-se para

que as relações sociais se processem com harmonia.

O Direito é, por conseguinte, um fato ou fenômeno social; não existesenão na sociedade e não pode ser concebido fora dela. Uma dascaracterísticas da realidade jurídica é, como se vê, a sua socialidade, asua qualidade de ser social. (REALE, 1973, p.2)

Coerente, pois, os ensinamentos de Aristóteles ao afirmar que

onde houver homens agrupados, há direito (ubi societas, ibi jus).

O direito é uma realidade histórica, é um dado contínuo provêm daexperiência. Só há uma história e só pode haver uma acumulação deexperiências valorativas na sociedade. Não existe direito fora dasociedade. (VENOSA, 2003, p. 30).

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Ele refere-se ao todo social de uma determinada comunidade,

como garantia de coexistência pacífica. Se efetiva quando torna a

sociedade viva e orgânica enquanto grupamento concreto e coeso, que

não se restringe a um amontoado desconexo de pessoas, mas forma uma

ordem harmônica de cooperação, uma comunhão de fins que necessita

ser racionalmente ordenada. Daí só existir Direito em sociedade,

regulando suas relações e toda a dinâmica social que ocorre em seu

interior, fixando regras de conduta e disciplinando comportamentos a

serem adotados pelos seus membros.

É inegável que o Direito, enquanto elemento norteador das ações

humanas, disciplina condutas, impondo-se como princípio da vida social.

Para que haja disciplina nas relações interpessoais, para que os

comportamentos indesejados do homem não tornem a convivência

inviável, necessita-se de uma ordenação, mínima que seja, imposta à

sociedade como centro regulador de suas ações. “O direito positivo é o

conjunto de normas estabelecidas pelo poder político, que se impõem e regulam

a vida social de um dado povo em determinada época”. (DINIZ,2002, p.7).

Tem-se, por conseguinte, que a causa geradora do Direito é o

direito natural, qual seja aquele inerente à vida e o arbítrio humano. São

as necessidades sociais aliadas à vontade do homem que traduzem o

conteúdo e o sentido dessas necessidades e transformam as regras que

os desejos humanos impõem naquele sistema de normas impositivas e

aceitas pelo grupo, denominado direito positivo.

Como visto, não se encontra entre os estudiosos uma definição ou

conceito de Direito que alcance todos os diversos matizes dos fenômenos

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humanos que devem por ele ser disciplinados. Contudo, todos os

conceitos têm uma convergência para um aspecto em comum: sua função

é estabelecer limites à conduta humana. Não sem razão, o Prof. J. Afonso

da Silva ensina que

O Direito é fenômeno histórico-cultural, realidade ordenada ou ordenaçãonormativa da conduta segundo uma conexão de sentido. Mesmo sendo umsistema normativo amplo, pode ser estudado por unidades estruturais que ocompõem, sem perda de vista da totalidade de suas manifestações, que sedestinam a regular e limitar os comportamentos sociais, qual seja, se podeanalisar os fenômenos ocorridos sob o manto do direito em suas maisvariadas formas. (SILVA, 2007, p.189)

Contudo, para que o Direito possa alcançar seu objetivo necessário

se faz uma imposição coativa de seus preceitos. Este é o sentimento

expresso no positivismo jurídico, como se vê em Iering, ao afirmar que:

A palavra direito é empregada em sentido duplo, tanto objetivo comosubjetivo. No sentido objetivo, direito é o conjunto de leis fundamentaiseditadas pelo Estado, ou seja, o ordenamento jurídico da vida e, em sentidosubjetivo, é a atuação concreta da norma abstrata no direito específico dedeterminada pessoa” (IERING, 2004, p.29).

Explica, ainda, o jusfilósofo que o Direito não é mero pensamento,

mas sim força viva. Por isso, a justiça segura, em uma das mãos, a

balança, com a qual pesa o Direito e na outra a espada com a qual o

defende. A espada sem a balança é a força bruta, a balança sem a

espada é a fraqueza do Direito. Ambos se completam e o verdadeiro

estado de direito só existe onde a força com a qual a justiça empunha a

espada, é usada com a mesma habilidade para manejar a balança.

E esta expressão metafórica é materializada na permanente ação

do estado para manter a ordem jurídica, que implica uma luta contínua

contra as transgressões da lei, já que somente a lei pode realizar o

Direito, qual seja, um ato do poder público voltado para este fim.

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Pode-se, por fim, entender o Direito, conforme ensina FRANÇA

(1999), como o conjunto de regras sociais que disciplinam as obrigações

e poderes, sancionadas pela força do estado e dos grupos intermediários

com os quais se aparelha àquele, para impor o conjunto de regras postas

pela e para a sociedade, regulando de forma adequada, suas condutas.

4. AS FONTES DO DIREITO

4.1. Conceito

A expressão “fontes do direito” é empregada metaforicamente, pois

fonte, em sentido vernacular, é a nascente de onde brota uma corrente de

água. É uma expressão figurativa que tem mais de um sentido. E quem

bem compreendeu e traduziu a expressão foi Claude du Pasquier, citado

por Montoro, que o fez de maneira sintética e, ao mesmo tempo, concisa.

Segundo referido autor, buscar a fonte do direito é como se alguém

procurasse a nascente de um rio, que delimita o exato ponto em que as

águas surgem das profundezas da terra dando origem a um curso d’água

natural, qual seja o ponto de fluência, o lugar onde se passa de invisível a

visível, onde sobe do subsolo à superfície. Assim sendo, afirma que fonte

de regra jurídica é o ponto pelo qual ela sai das profundezas da vida

social para aparecer à superfície do Direito. (MONTORO, 1999).

A par dessa questão, um dos principais problemas que se enfrenta

ao se empreender o estudo do Direito é precisamente de onde ele

provém: leis escritas? Usos e costumes? Decisões judiciais? Fatores

políticos, históricos, sociológicos? O Direito se confunde com a própria

fonte em razão dos fatos que lhe dão origem e que ele disciplina.

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Del Vecchio afasta o problema das fontes do direito afirmando,

dogmaticamente, que o Estado é a fonte única de direito (positivismo

jurídico). Encontra as fontes da ordem jurídica unicamente nas normas

elaboradas pelos órgãos do poder público. Considera as fontes do direito

como modos de manifestação da vontade social preponderante, qual seja

aquela aceita pela maioria da população.

Seguindo ainda o raciocínio positivista, KELSEN (1994) reduzindo

o Direito à sua mais expressiva referência no âmbito da dogmática

jurídica, afirma que a única fonte do direito é a norma, já consolidada e

integrada ao ordenamento jurídico positivo. Ou seja, de acordo com o

pensamento kelseniano, ao enfrentar a questão da fonte do direito,

despreza qualquer fato social, moral ou político que tenha contribuído

para o surgimento de uma regra. Apenas os aspectos jurídicos devem ser

considerados para sua condição de norma, onde aquela superior

(Constituição) é a fonte das normas gerais que regula a produção da

norma inferior e assim sucessivamente, vale dizer, todo o sistema de

produção normativa encontra fundamento de validade em uma hierarquia

de normas. Ou seja, compreendendo-se as fontes do direito como método

de criação jurídica original, onde toda norma superior regula a criação de

norma inferior, tem-se como fundamento de validade jurídico-positivo de

uma norma a constituição, norma hierarquicamente superior a todas.

Por outro lado, o termo fonte também pode ser empregado em um

sentido não jurídico, como fatos que influenciam a função criadora do

direito tais como os princípios morais e políticos, as teorias jurídicas os

pareceres de especialistas e outras manifestações culturais e sociais que

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de forma indireta contribuem na criação da ordem jurídica, constituindo-se

em fatores de importância secundária.

Mas a história do Direito é bem mais complexa no que se refere à

sua criação. Algumas fontes de direito desempenham um papel, ora

secundário, ora capital, de acordo com a época em que são utilizadas. A

jurisprudência, por exemplo, desempenhou um papel capital na formação

e desenvolvimento do commum law inglês e um papel menos importante,

embora não desprezível, nos outros direitos europeus. Já a doutrina,

sobretudo a que foi construída com base no direito romano renascido na

Baixa Idade Média e na época moderna, constituiu-se em importante

instrumento de elaboração e de expressão do direito nestes períodos.

Já o professor Miguel Reale assenta o seguinte entendimentosobre as fontes do direito: "designamos os processos ou meios emvirtude dos quais as regras jurídicas se positivam com legítima forçaobrigatória, isto é, com vigência e eficácia no contexto de uma estruturanormativa”. (REALE, 1973, p.130)

Pode-se concluir, assim, que as fontes do direito são modos de

formação e revelação das normas jurídicas, constituindo-se no ponto de

partida da criação normativa. Na fonte está contida a norma jurídica em

estado latente e inerte, sendo sua criação, a exteriorização de seu

conteúdo jurídico, a origem primária do Direito, de maneira a se fazer

possível e simplificada sua análise e compreensão enquanto elemento

regulador das condutas sociais.

E finalizando com BOBBIO (1999), tem-se que fontes do direito são

aqueles fatos ou atos dos quais o ordenamento, em um sistema positivo,

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faz depender a produção de normas jurídicas, regulando por inteiro seu

processo produtivo até materialização como regra jurídica.

4.2. Classificação das fontes do direito

4.2.1. Noções gerais

Os estudiosos neste tema também não manifestam um

posicionamento uniforme em relação à classificação das fontes de direito.

Surgem divergências, as mais variadas, na doutrina disponível. O já

citado professor REALE (1993), classificou as fontes do direito com base

na sua Teoria Tridimensional do Direito da seguinte forma: lei;

jurisprudência; costume; e o ato negocial. Estas fontes representam os

elementos centrais da elaboração jurídica, a própria matéria-prima a partir

da qual se produzem as normas. De logo, o professor brasileiro entende

que a doutrina não é uma fonte do direito propriamente dita, mas apenas

um instrumento adicional, embora que de muita importância, que junto

com outros modelos jurídicos formam as fontes direito.

Outros autores como DINIZ (1991), incluem a doutrina como fonte

de direito e somente reconhecem as fontes formais ou materiais e estatais

e não-estatais. As fontes estatais dividem-se em legislativas (as leis,

decretos, regulamentos, etc) e jurisprudenciais (sentenças, precedentes

judiciais, súmulas, etc). Devem também ser acrescidas as convenções

internacionais. Seguem-se as fontes não-estatais, que abrangem

basicamente o direito consuetudinário (costumes), o direito científico

(doutrina) e as convenções em geral.

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E explicitando o sentido de fontes estatais do direito GUSMÃO

(2002), afirma que são aquelas constituídas de normas escritas, vigentes

no território do Estado, por ele promulgadas, no qual tem validade e no

qual são aplicadas pelas autoridades administrativas ou judiciárias. Assim

sendo, as fontes estatais tem sua aplicação notoriamente precisa,

partindo-se do pressuposto de que, por ser criada e exercida pelo Estado,

ou seja, seus representantes, à conduta contrária ao que a legislação

prevê, associar-se-á uma sanção.

No sistema jurídico-positivo as fontes estatais do direito assumem

enorme importância, pois são os instrumentos de materialização da

consciência coletiva. Contudo, as fontes não estatais também, mesmo

nesses sistemas jurídicos, podem ser consideradas como elementos

decisivos na consolidação e aplicação do Direito enquanto instrumento de

harmonização e manutenção continuada da sociedade.

4.2.2. A Classificação adotada

Contudo, para a realização do presente trabalho, fez-se a opção

por adotar a classificação das fontes do direito tradicionalmente aceita

pela doutrina pátria, (fontes formais e fontes materiais) conforme

MONTORO (1999) ensina e seguir se demonstra:

4.2.2.1. Fontes formais

As fontes formais são fatos que dão a uma regra o caráter de

direito positivo e obrigatório. Classificam-se em:

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a) A legislação

Pode-se entender legislação em sentido amplo como aquele

conjunto de normas editadas pelo poder competente, através de órgãos

especiais criados para este fim, que representam toda a comunidade

social e possuem autoridade para estabelecer em seu nome, regras de

observância impositiva para todos.

A legislação nos países de direito escrito e constituição rígida é a

mais importante das fontes formais de onde brota o conjunto normativo,

qual seja, a formulação do Direito é obra do legislador. Já nos países que

adotam o sistema consuetudinário (os anglo-saxões, como por exemplo, a

Inglaterra), há forte predominância dos costumes. E nos sistemas

jurídicos onde predomina o direito escrito, a constituição sobrepõe-se a

todas as demais normas integrantes do ordenamento. Ela define como se

deve produzir outras normas, prescrevendo o conteúdo ou a forma que

devem conter e qual a estrutura adequada a cada uma delas.

A Constituição

Para CANOTILLO, (1998), a definição do cosmos normativo tem

como origem a constituição enquanto fonte de conhecimento. Apresenta

claramente três funções como norma primária sobre a produção jurídica:

a) identifica as fontes do direito do ordenamento jurídico;

b) estabelece os critérios de validade e eficácia de cada uma das

fontes;

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c) determina a competência das entidades que revelam as normas

de direito positivo.

Constituem-se em verdadeiro conjunto de sobrenormas já que não

tratam diretamente da produção normativa de condutas do indivíduo, mas

apenas oferece os elementos e os fundamentos necessários a elaboração

das regras jurídicas, pondo-os à disposição do aparelho estatal incumbido

de veicular e ordenar as normas reguladoras das condutas sociais.

A lei

E neste contexto a lei é por excelência, a mais importante fonte do

direito das que formam o conjunto da legislação. Ao ser prescrita a norma,

ela passará a ser lei e será objetivamente uma forma de punição à atos

ilícitos, ou será uma forma de se preservar boas condutas. A lei, portanto,

é a forma pela qual, o Estado, por meio de seus representantes, impõe

sua vontade para a ordenação harmônica da comunidade.

A palavra lei, (VENOSA, 2003), é originaria do verbo legere = ler;

ou decorre do verbo ligare, e vale esclarecer que legere também significa

eleger, escolher. No entanto, pode representar não apenas normas

jurídicas, mas também religiosas, cientificas, naturais, enfim, uma série de

outras significações.

É imperativo, ainda, lembrar, que a norma por si só não exige, nem

proporciona direitos. Para que se tenha o direito exercível, é preciso que a

prescrição tenha caráter legal, ou seja, deverá ser emanada do órgão

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estatal competente para editá-la, após percorrer todo o processo

legislativo estruturado para conceber a sua criação.

A palavra lei tem o sentido compreensivo de toda norma geral de condutaque define e disciplina as relações de fato incidentes no direito e cujaobservância o poder do Estado impõe coercitivamente, como são asnormas legislativas, as costumeiras e as demais admitidas pelo legislador.(RÁO, 1952, p.202).

A lei é instrumento contínuo de nascimento do direito, enraizado

em sua essência. Se analisada sob a ótica de seu nascedouro, a lei é

sempre certa e predeterminada. Há sempre um momento no tempo, e um

órgão estatal do qual emana o direito legislado.

Ainda, Canotilho, propõe uma definição de lei como uma norma ou

um conjunto de normas de direito, relativamente gerais e pertinentes, na

maior parte dos casos escritas, impostas por aquele ou aqueles que

exercem o poder num grupo sóciopolítico mais ou menos autônomo. “A lei,

como expressão de uma vontade jurídica consciente e deliberada constitui o

grau mais elevado e mais perfeito de formação do direito positivo”

(CANOTILHO, 1998, p. 326). A lei, então, é uma regra geral, não se dirige

a um caso particular, mas a um numero indeterminado de indivíduos.

No Direito atual da grande maioria das nações, as leis stricto sensu

são atos emanados do poder legislativo e constituem apenas uma das

categorias das leis lato sensu, que compreendem todos os atos

normativos produzidos pela vontade soberana da nação, que edita regras

gerais e permanentes do comportamento humano tais como os decretos,

os regulamentos, etc., por meio das autoridades a quem foram atribuídas

competências para a prática de tais atos.

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A origem da lei, ou seja, de onde ela provem, não deixa qualquer

dúvida, porquanto o órgão que tem competência para editá-la já está

anteriormente previsto, com seu âmbito de atuação claramente definido

no espaço e no tempo, o qual, diante de um complexo de fatos e valores,

opta por uma determinadaa solução normativa com características de

objetividade e que atenda aos interesses coletivos.

Pode-se encontrar variados sentidos e classificações para as leis.Segundo Tércio Sampaio Ferraz Jr. "lei no sentido formal, ou, leiformal é expressão que designa um modo de produção de normas, comoexaminamos até agora. Lei no sentido material, ou lei material, designaseu conteúdo" (FERRAZ JR. 2001).

Já quanto à origem legislativa de onde promanam, as leis são

federais, estaduais e municipais. Em relação à duração, as leis são

temporais e permanentes e se analisadas sob o aspecto da amplitude ou

ao alcance, são gerais, especiais, excepcionais e singulares.

A lei, pois, como a principal fonte de direito, emana das

necessidades sociais e normatiza as condutas que a sociedade considera

serem úteis para regular e permitir a convivência entre os homens de

maneira harmônica e eficiente, facilitando, destarte, sua evolução

contínua e segura através dos tempos. É a mais importante das fontes

formais, é a forma ordinária de expressão do Direito. Ela fixa as linhas

fundamentais no sistema jurídico e serve de base para a solução dos

problemas do Direito que surgem na rotina das sociedades.

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Outras espécies de legislação

O conceito de legislação, como visto, alberga ainda outras

importantes espécies normativas, utilizadas como fontes do direito tais

como:

a) medidas provisórias: são normas que se encontram

hierarquicamente em posição similar a da lei ordinária, embora não sejam

leis. São expedidas pelo Presidente da República para atender os casos

de urgência e relevância e situações graves, que estão a exigir do

governo uma manifestação imediata. Posteriormente são submetidas ao

Congresso Nacional, que poderá aprová-las ou rejeitá-las. Na hipótese de

rejeição, o parlamento deverá regular as relações jurídicas dela

decorrentes, já que enquanto não foi rejeitada ou apreciada pelo

Congresso (no prazo de 60 dias), ela irradia efeitos jurídicos;

b) decretos legislativos: são normas aprovadas pelo Congresso

Nacional por maioria simples, sobre matéria de sua exclusiva

competência (art. 49, da Constituição Federal);

c) resoluções do Senado: tais instrumentos normativos têm força

de lei ordinária por serem deliberações de uma das casas legislativas, ou,

do próprio Congresso, sobre assunto de seu peculiar interesse (p. ex.

licença ou perda do cargo por deputado ou senador);

d) decretos regulamentares: são normas jurídicas gerais, abstratas

e impessoais estabelecidas pelo Poder Executivo para dar plena

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aplicabilidade a uma lei, detalhando suas disposições e explicitando sua

execução no plano concreto.

Ainda aparecem listadas por alguns autores como fontes do direito,

as instruções ministeriais, as circulares, as portarias, etc. colocadas em

níveis mais baixos na pirâmide da hierarquia normativa. Contudo, estas

aqui comentadas, são as principais formas de manifestação da legislação,

chamadas de normas primárias, pois revelam, de imediato, o direito

positivo e por bastarem a si mesmas, no processo de formação do direito.

b) Os Costumes

O costume é a mais antiga fonte de direito. Nos povos primitivos

inexistiam normas jurídicas escritas. O comportamento tradicional regula

a conduta dos membros da comunidade e constitui a fonte substancial do

direito. Com o decorrer do tempo, as leis escritas passam a ter

predominância na formulação do Direito, mas o costume se mantem em

todos os povos e constitui em todos uma das fontes formais do sistema

jurídico de cada agrupamento humano. Com a evolução da sociedade,

eles se desprendem, paulatinamente, das regras morais, religiosas,

sociais etc. e se convertem em regras jurídicas distintas das demais, com

sentido próprio e conteúdo de imposição.

Os costumes são práticas continuas e repetitivas de uma

coletividade, sendo com a sua habitualidade, tornados obrigatórios. Estes

devem ser perceptíveis, palpáveis, não apenas realizados, mesmo

porque, os costumes não são normas escritas e, como já citado, devem

partir da conscientização coletiva. Formam um conjunto de usos de

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natureza jurídica que adquiriram força obrigatória num grupo sóciopolítico

dado, pela repetição de atos públicos e pacíficos durante um período de

tempo relativamente longo.

O costume brota da própria sociedade, da repetição de usos de

determinada parcela do corpo social. Quando o uso se torna obrigatório,

converte-se em costume enquanto comportamento social.

Refletem de maneira imediata e autêntica, os desejos, as vontades

e as aspirações de um povo e devem ser observados voluntariamente

por todos, pois os comprometem sobremodo a particularidade, a

insegurança e a incerteza de seus comandos imperativos.

Já em sentido jurídico os costumes são uma repetição constante

de determinados comportamentos na vida de uma comunidade

acompanhada da convicção de sua necessidade, ao ponto de poderem os

interessados exigir o respeito a esse comportamento pela força, em caso

de transgressão. Costume jurídico, pois, segundo Conviello, é norma

jurídica que resulta de uma prática geral, constante e prolongada,

observada com convicção de que é juridicamente obrigatória

(MONTORO, 1999). Vale dizer, é aquilo que a doutrina chama de

convicção de obrigatoriedade, ou seja, a prática reiterada normalmente

aceita pela comunidade como de cunho obrigatório.

Os costumes para serem considerados costumes jurídicos devem

revestir-se de determinadas características, quais sejam:

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a) o uso praticado por longo tempo de forma constante e geral,

aplicando-se a todos os casos compreendidos naquela espécie;

b) necessidade e convicção de que ele é obrigatório, de que

constitui uma regra ou preceito correspondente a uma necessidade

jurídica individual ou de interesse coletivo.

O costume jurídico surge no e do próprio seio da coletividade. Ele é

fruto da prática social individualizada, caso a caso e nasce obrigatório

porque as partes envolvidas assim o entendem e se auto-obrigam. Ele

provem da convicção interna de cada partícipe de sua objetivação em

fatos sociais particulares, que obriga a todos os que neles se envolverem.

Formado com essa convicção de obrigatoriedade, pode-se tê-lo como

legitimo e atualizado. (NUNES, 2002)

Têm-se ainda algumas classificações para os costumes. São elas:

secundum legem, praeter legem e contra legem. Veja-se cada uma das

modalidades antes indicadas.

a) secundum legem é exatamente aquele costume criado, erguido

em lei que, no entanto, mantem suas características de costume

propriamente dito;

b) praeter legem é o que está referido no art. 4º da Lei de

Introdução ao Código Civil, aquele que preenche lacunas. É um recurso

muito útil ao juiz nos casos em que a lei é omissa;

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c) contra legem é o que se opõe ao dispositivo de uma lei,

denominando-se costume ab-rogatorio; ou seja, quando torna uma lei não

utilizada, ao que se denomina desuso (VENOSA, 2003).

O costume, assim, se apresenta como verdadeira norma jurídica

cuja característica é ser criada espontaneamente pela consciência

comum do povo e não editada pelo poder público. Há a convicção de ser

juridicamente obrigatório. A lei representa uma fase posterior, mais

evoluída de formação jurídica.

O costume, então, se expressa como fonte originária de direito.

c) A jurisprudência

A expressão jurisprudência como fonte do direito tem o sentido de

conjunto de decisões uniformes e constantes dos tribunais, resultante da

aplicação de normas a casos semelhantes, constituindo uma norma geral

aplicável a todas as hipóteses similares. Nessa mesma linha de

entendimento (VENOSA, 2003), tem-se que é aplicado o nome

jurisprudência ao conjunto de decisões dos tribunais, ou uma serie de

decisões similares sobre uma mesma matéria. E estas decisões são

formadas em decorrência da atividade rotineira desses tribunais, como

manifestação viva e concreta do sistema normativo em funcionamento,

sendo-lhe, ainda, reservado o importante papel de colmatar as lacunas do

ordenamento, nos casos concretos de inexistência de norma específica

para ser aplicada a um determinado caso com o qual guarde similitude.

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A jurisprudência, pois, é um conjunto de normas jurídicas extraídas

das decisões judiciárias. Em geral as decisões só valem entre as partes

no processo; não enunciam normas jurídicas gerais e, mesmo que o

façam na sua motivação, essas normas não têm força vinculativa erga

omnes. No entanto, os juízes, sobretudo os juízes profissionais formados

pela cátedra jurídica (em oposição aos juízes populares) têm tendência a

interpretar a lei e o costume como o fizeram os seus antecessores,

conservando as manifestações. Por outro lado, a segurança jurídica é

função da autoridade reconhecida aos precedentes. Na Inglaterra, por

exemplo, esta autoridade tornou-se considerável em virtude do princípio

stare decisis, não é permitido aos juízes modificar a interpretação do

direito fixado por certas jurisdições superiores (common law).

Interessante a abordagem feita por KELSEN (1994), ao explicar

que a aplicação do direito existe tanto na produção de normas jurídicas

gerais por via legislativa ou consuetudinária como nas resoluções das

autoridades administrativas e nos atos jurídicos negociais. Os tribunais

aplicam as normas jurídicas gerais nas quais é estatuída uma sanção

concreta: uma execução ou uma pena. Sob a perspectiva da dinâmica do

direito o estabelecimento da norma individual pelo tribunal representa um

estágio intermediário do processo que começa com a elaboração da

Constituição e segue através da legislação e do costume até a execução

da sanção. Neste processo normativo, o Direito se recria em cada

momento, tanto na parte geral como para o individual. É um processo de

individualização ou concretização sempre crescente.

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Observe-se, por oportuno, que o papel da jurisprudência tem sido

relevante no decurso dos séculos XIX e XX, realizando, por conseguinte,

uma uniformidade real na interpretação das leis, uma segurança jurídica

acrescida pela sua própria capacidade de fixação e uma adaptação

constante às realidades da vida social.

Outra importante função da jurisprudência no sistema normativo,

para mantê-lo eficaz e em sintonia com os anseios e sentimentos da

comunidade é fazer a atualização da interpretação da lei ao longo do

tempo, em um processo permanente de modernização e criação do

Direito, tornando-o sempre adequado às necessidades sociais e às

aspirações de cada grupamento humano.

d) A Doutrina

Não é pacífico o entendimento de que a doutrina é fonte primária

de direito. Alguns estudiosos como Miguel Reale não a consideram como

tal. Não, ao menos como fonte formal; seria então fonte material. Veem-

na apenas como elemento auxiliar no processo de criação normativa. Já

para outros autores como o Prof. Franco Montoro a doutrina se constitui

como importante fonte de direito.

Abstraindo-se a questão acima posta, o fato é que não se pode

compreender a doutrina em termos absolutos. Ela tem que ser

contextualizada no sistema jurídico para que se possa ter a dimensão de

sua importância no conjunto normativo. Em Roma, na época do

Imperador Adriano, a opinião de certos jurisconsultos tinha força

obrigatória em determinadas situações (communis opinio doctorum).

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Na idade medieval e até na idade moderna admitia-se a doutrina

como fonte subsidiária da lei, quanto à obra de determinados autores

(Ordenações Afonsinas, em relação às opiniões de Bartolo e Acúrsio).

Atualmente a doutrina vem ganhando cada vez mais importância

na formação do direito, seja através de construções teóricas e

elaborações doutrinárias que atuem sobre a legislação e jurisprudência,

seja pela investigação científica e descoberta de novas fontes como usos

sociais obrigatórios e a multiplicidade de ordens jurídicas no dinamismo

real da sociedade moderna.

A obra dos juristas fornece subsídios para a elaboração de

inúmeras disposições de lei e a inspiração de julgados que inovam e

aperfeiçoam o Direito, em sua perpétua busca de realização da justiça.

É da produção científica dos doutores que muitas vezes se tem a

criação de ordens normativas novas, como por exemplo, o abuso de

formas, os direitos sociais, as gerações de direitos de acordo com a

matéria analisada, etc., constituindo-se em importante elemento de

transformação e criação do direito moderno.

A doutrina enquanto conjunto de princípios que serve de base a um

sistema filosófico e cientifico, exerce papel fundamental como instrumento

auxiliar para a compreensão do sistema jurídico em seus múltiplos e

complexos aspectos. Conforme o entendimento de Nunes é com o

manejo da doutrina que se torna possível entender e estudar o Direito

com profundidade, ou seja, pelo esforço e concretude da obra grandiosa

dos pensadores ao longo do tempo, possibilita uma contínua construção

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científica com a manutenção de antigos vocábulos, pensamentos e

entendimentos e a criação de novos significados surgidos da

compreensão da realidade e da percepção clara dos fenômenos sociais

surgidos em determinada época (NUNES, 2002).

A doutrina é o conjunto de normas jurídicas, ainda que intrínsecas,

formuladas por grandes juristas nas suas obras. Na realidade, os juristas,

não investidos de um poder político ou judiciário, não podem criar normas

jurídicas. Mas em certas concepções do Direito, pode-se constatar sua

existência, mesmo que não formulado. Descobrem um Direito que se

supõe preexistir às suas constatações. Neste caso, a doutrina pode

desempenhar um papel considerável, como por exemplo, em certas

épocas da história do direito romano.

Como ensina GILISSEN (2001), a doutrina pode também contribuir

para introduzir um direito estrangeiro como direito supletivo no

ordenamento jurídico interno das nações. Foi precisamente o que

aconteceu nos finais da Idade Média, quando a doutrina romanista, ou

seja, as obras dos juristas formados nas universidades no estudo e

análise de direito romano, fez penetrar e fixar uma parte deste direito na

maior parte dos países.

E o autor citado assenta que

Por fim, a doutrina está na base da ciência do direito. Pelos seus esforçosde classificação, de sistematização, de análise e de síntese, os juristasletrados fizeram do direito uma ciência. Muitas vezes, criou-se, deste modo,um “direito letrado”, um “direito dos professores”, um “Júristenrecht” (direitodos juristas), factor importante do progresso jurídico, mas também, pormuitas vezes, causa de uma diferenciação cada vez mais marcada dodireito teórico, por exemplo, o ensinado nas universidades, em relação aodireito realmente em vigor. (GILISSEN, 2001, p.28).

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Portanto, hodiernamente, a doutrina tem ocupado posição de

destaque no processo de criação e formação do direito, constituindo-se

em importante instrumento de modernização e elemento indispensável na

evolução e regulação dos sistemas normativos em consonância com as

necessidades de cada povo em determinado espaço e período de tempo.

4.2.2.2. Fontes materiais

As fontes materiais são representadas pelos elementos que

concorrem para a formação do conteúdo ou matéria da norma jurídica.

Geram o conteúdo ou a matéria do Direito. São assim denominadas

porque, segundo TORRÉ (1957), as fontes materiais compõem os

elementos e fatores que determinam o conteúdo das normas jurídicas.

São elas:

a) Realidade social

É composta de dados de fato representada pelos aspectos

sociológicos da atividade humana. A realidade social é o fator básico na

elaboração do direito. É representada por problemas econômicos, sociais,

religiosos, culturais, políticos, etc., que o Direito busca resolver. Todos

estes aspectos influem poderosamente na elaboração e transformação

das normas jurídicas. Por exemplo, um aspecto econômico que influiu

enormemente na elaboração e modernização normativa foi a Revolução

Industrial. Sob o aspecto religioso percebe-se uma forte influência no

direito de família e em outros ramos do direito civil. Quanto aos fatores

políticos, também se revelam criadores de sistemas normativos, vez que

os modelos políticos (capitalismo, socialismo, etc.) geralmente são

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acompanhados de um direito próprio, aplicável às relações sociais em

determinado período.

b) Valores

São aqueles que o Direito procura realizar (aspectos axiológicos)

para aplicar a justiça. Esta é utilizada como critério inspirador do direito.

São valores que informam o sistema normativo como, por exemplo, a

dignidade da pessoa humana, a busca de uma sociedade livre, justa e

solidária, a justa indenização, igualdade de todos perante a lei, ditames

da justiça social, etc., servindo como lume ao ordenamento jurídico.

Assim é que Del Vechio, relembrando o jurista François Geny,

afirma que no fundo, o direito não encontra seu conteúdo próprio e

específico senão no conceito primário e fundamental de “justo”. Em todas

as normas jurídicas, de forma mais ou menos perfeita, está presente essa

exigência fundamental de justiça. Como visto, é a justiça que dá sentido

ao direito e explica o conteúdo essencial das normas jurídicas.

Portanto, estes valores são os vetores que informam e orientam o

sistema jurídico de uma determinada comunidade de acordo com a

concepção por ela adotada e calcada em um processo de evolução

histórica das crenças, religião e costumes de seus membros

sedimentados ao longo de sua evolução.

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4.2.2.3. Outras fontes do direito

Alguns autores ainda classificam as fontes do direito como

primárias e secundárias, considerando como estas últimas a doutrina, a

jurisprudência, a analogia, os princípios gerais de Direito e a eqüidade.

Veja-se, então, estas espécies ainda não analisadas.

a) Analogia

A compreensão expressa por FERRAZ JR. (2001) em relação ao

instituto é de que a analogia é forma típica de raciocínio jurídico pelo qual

se estende a facti species de uma norma a situações semelhantes para

as quais, em princípio, não havia sido estabelecida, ou seja, situações

específicas não previstas no ordenamento e não reguladas pelo direito.

Como o próprio termo já sugere, pode-se entender a analogia

como uma forma de analise mais atenta e profunda de casos complexos.

Trata-se de um processo de raciocínio lógico pelo qual o juiz estende um

preceito legal a casos não diretamente compreendidos na ordem jurídica.

O juiz procura compreender a vontade da lei, para aplicá-la aos casos que

a letra do texto legal não havia disciplinado, ou seja, o aplicador do Direito

busca uma norma válida que possa ser aplicada a casos semelhantes

não regulados por outro comando.

A analogia consiste, objetivamente analisando, em se aplicar a um

caso não previsto a norma que rege outro caso semelhante. É necessário,

contudo, que exista a mesma razão para que o caso seja decidido de

igual modo.

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Em síntese tem-se que o uso da analogia se dará quando houver à

necessidade de uma interpretação mais complexa, para se preencher as

lacunas existentes no ordenamento jurídico, já que é impossível se

estabelecer regras jurídicas para normatizar toda uma variada gama de

condutas humanas.

b) Princípios gerais de Direito

A idéia na qual se pode compreender os princípios gerais do Direito

é, no contexto jurídico, aquela que os coloca como os elementos

estruturantes de regulação de toda a conduta humana e sob a ótica

metajurídica, reporta-se ao direito natural, aqueles elementos essenciais à

própria existência do indivíduo. O entendimento firmado por VENOSA

(2003), é que os princípios gerais de direito são regras oriundas da

abstração lógica do que constitui o substrato comum do Direito. Os

princípios são de grande importância para o legislador, como fonte

inspiradora da atividade legislativa e administrativa do Estado.

Estes princípios, sob uma ótica positivista, são aqueles

historicamente contingentes e variáveis, que inspiraram a formação de

cada legislação concretamente considerada e pairam no ordenamento

jurídico como normas de sobredireito que norteiam e orientam toda a

formação legislativa da comunidade.

c) Equidade

A compreensão que se pode extrair de eqüidade é a de que,

enquanto o Direito regula a sociedade com normas que demonstram o

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justo e o igualitário, a eqüidade irá adequar a norma a um caso concreto.

É uma forma de manifestação de justiça que tem o condão de atenuar a

aspereza de uma regra jurídica buscando torná-la justa e suavizando seu

rigor.

Assim sendo, é razoável se compreender a eqüidade como a forma

do julgador de fazer a devida, a melhor e a mais coerente interpretação

da lei, para aplicá-la ao caso concreto, tendo como resultado dessa

aplicação, a mais correta e a mais justa solução que seria possível se

obter nos quadrantes do Direito para regular especificamente a situação

que se procura por a termo.

5 – OS TRATADOS INTERNACIONAIS COMO FONTES DE DIREI TO

Como pode ser observado, não há uma uniformidade entre os

doutrinadores e estudiosos do Direito em relação a uma classificação

pura das fontes do direito. Para efeito do estudo que aqui se desenvolve,

adota-se posição doutrinária que inclui entre as fontes do direito os

tratados internacionais. Neste tópico far-se-á uma análise da utilização

dessas convenções como fonte produtora de conjuntos normativos no

âmbito interno e internacional (soberania das nações).

5.1. Os tratados internacionais

5.1.1. Conceito

Os tratados internacionais são acordos celebrados pelas nações

para regular determinadas condutas. "Tratado é o acordo formal, concluído

entre sujeitos de direito internacional público, e destinado a produzir efeitos

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jurídicos" (RESEK, 1984, p. 21). E lembra, ainda, o festejado autor, que a

produção de efeitos jurídicos é essencial ao tratado, que deve ser visto na

sua dupla qualidade de ato jurídico e de norma. O acordo formal entre

Estados é o ato jurídico que produz a norma, e que, justamente por

produzi-la, desencadeia efeitos de direito, gera obrigações e prerrogativas

a todos impostas, observância obrigatória, caracterizando, na plenitude de

seus dois elementos, o tratado internacional.

5.1.2. A Posição dos tratados na ordem interna

A posição dos tratados internacionais na ordem jurídica interna é

objeto de controvérsias e infindáveis polêmicas em razão de não haver

uma hierarquização clara no topo da pirâmide entre as normas

constitucionais, o direito internacional e o direito comunitário. Na falta de

disposição constitucional expressa, via de regra, deverá ser considerada

a superioridade hierárquico-normativa das normas constitucionais, em

decorrência do princípio da natureza infraconstitucional dos preceitos de

direito internacional. Esta conclusão deverá ser, hoje, abrandada pela

permanência de um direito dos povos internacional cuja, observância se

impõe como dever imperativo dos estados.

Conforme afirma LAPATZA (2007) o estado considerado como um

todo pode celebrar tratados internacionais que uma vez publicados,

integram o ordenamento jurídico interno, ocupando nele um nível

supralegal, já que as suas disposições só poderão ser revogadas ou

suspensas na forma prevista nos próprios tratados ou de acordo com as

normas gerais de direito internacional.

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As disposições contidas nos tratados originam a modalidade do

direito internacional conhecida com o nome mais adequado de direito

supranacional. Deve ser qualificado como direito supranacional o direito

comunitário isto é, o conjunto de comando normativos emanado de

tratados e convenções internacionais.

A hierarquia e o valor do direito comunitário perante o direito

interno dos estados signatários continua sendo um problema em aberto

porque faltam regras expressas para definir sobre conflitos de normas

porque a problemática à resposta dessa questão em que medeia a ordem

jurídica interna e ordem jurídica internacional é autônoma. Contudo

GILISSEN (2001), afirma que em caso de conflito entre o tratado e a lei

interna, ou seja, entre a ordem jurídica internacional e a nacional, é o

tratado que se sobrepõe, obtendo primazia sobre a norma interna.

Isso indica que os preceitos primários e secundários do direito têm

aplicação imediata e preferente sobre as normas contrárias de direito

interno, tendo por limites de aplicação os direitos fundamentais dos

cidadãos e a estrutura da própria nação.

E nessa linha de raciocínio tem-se que

A execução/concretização da primazia de aplicação do direito comunitárioobriga as autoridades e tribunais nacionais a, no caso de conflito entre odireito interno e o direito comunitário, darem prevalência a este último. Odever de interpretação do direito nacional em conformidade com o direitocomunitário e o dever oficioso de não aplicação do direito internodesconforme com o direito comunitário constituem os dois instrumentosmetódicos básicos para assegurarem o primado de aplicação do direitocomunitário. (CANOTILHO, 1998, p. 919-920).

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Na comunidade europeia parece se poder afirmar a doutrina da

recepção automática das normas de direito internacional geral ou comum.

Isso implica que estas normas são diretamente aplicáveis pelos tribunais eoutras autoridades encarregadas de aplicar o direito. Não necessitando dequalquer transformação em lei ou outro acto de direito interno para poderemser considerados incorporadas ao ordenamento interno as normas dedireito internacional comum entram em vigor ao mesmo tempo queadquirem vigência na ordem internacional. (CANOTILHO, 1998, p. 814)

Registre-se, também, que o princípio da integração (artigo 7/6 –

exercício comum dos poderes necessários à construção da União

Européia) e o princípio da capacidade funcional da Comunidade apontam

preferência para a aplicação do direito internacional ou supranacional,

prevalecendo sobre a ordem jurídica interna.

5.2. A Comunidade Européia

Modernamente surgiram alguns blocos econômicos e políticos

formados por nações com interesses comuns como a União Européia

(bloco mais antigo) e o MERCOSUL (de formação mais recente e

composto por países situados no cone sul). Por ser o bloco mais antigo

vale registrar que a União Européia é resultado da unificação de três

organizações distintas:

a) Comunidade Européia do Carvão e do Aço (CECA), inaugurada

pelo Tratado de Paris (18/4/1951);

b) Comunidade Econômica Européia (CEE) atualmente CE,

resultante do Tratado de Roma (25/3/1957); e a

c) Comunidade Européia de Energia Atômica (EUROTOM).

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Estas três comunidades foram unificadas e transformadas pelo

Acto Único Europeu (17/2/1986) e posteriormente pelo Tratado de

Maastricht (7/2/1992), passando a compor uma comunidade única

formada por várias nações européias, sob a denominação de

Comunidade Européia, dispondo de organização e estrutura próprias,

inclusive e especialmente no que se refere ao conjunto normativo por ela

editado através de tratados, convenções, regulamentos comunitários e

diretivas comunitárias, formando um direito comunitário, decorrente de

acordos celebrados entre as nações que compõem o bloco e de

observância obrigatória para todos eles.

5.3. O Direito Comunitário

O Direito comunitário é um direito supranacional que tem por

instrumento de veiculação os tratados e convenções internacionais

celebrados entre as nações que compõem a Comunidade.

Nestes países, um poder supranacional pode para o futuro impor

obrigações não apenas aos estados da comunidade, mas também

diretamente aos particulares desses estados. Em caso de conflito entre o

tratado e a lei interna, ou seja, entre a ordem jurídica comunitária e a

nacional, é o tratado que obtém a primazia. Daí resulta que, além das leis,

decretos e despachos nacionais, são também aplicáveis os regulamentos

da CE nos países-membros da comunidade.

Merece referência o Tratado de Roma de 29 de outubro de 2004,

que estabeleceu uma Constituição para a Europa, onde tem como

fundamento a decisão de “continuar la obra realizada em el marco de los

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Tratados constitutivos de las Comunidades Europeas y del Tratado de la Unión

Europea, garantizando la continuidad del acervo comunitário” (UNIÓN

EUROPEA, 2004, p.9) e em seu artigo 1-5, item 2, estabelece que:

Conforme al principio de cooperación leal, la Unión y los Estados,miembros se respetáran y asistirán mutuamente en el cumplimiento de lasmisiones derivadas de la Constitución. Los Estados miembros adoptarán todaslas medidas generales o particulares apropiadas para aseguraren cumplimientode las obligaciones derivadas de la Constitución o resultantes de los actos de lasinstituciones de la Unión. Los Estados Miembros ayudarán a la Unión en elcumplimiento de su misión y se absterán de toda medida que pueda poner enpeligro la consecución de los objetivos de la Unión. (UNION EUROPEA, 2004,p. 18).

Portanto, nos países que compõem a União Européia, o direito

comunitário goza de posição hierárquica superior ao regramento legal

interno, desde que naturalmente preservadas as individualidades,

especialmente quando se trata de direitos humanos, até porque foi

instituído e atribuído poder regulamentar ao o Conselho e a Comissão das

Comunidades Européias previstas nos tratados.

Além dos tratados e convenções internacionais como acima visto, a

Comunidade edita também outros atos normativos de observância

obrigatória por todos. Os instrumentos normativos principais são os

regulamentos comunitários e as diretivas comunitárias, formando assim o

conjunto normativo de direito comunitário ou supranacional, com

aplicação impositiva entre os países signatários. Veja-se, a seguir, estas

espécies normativas supranacionais:

a) Regulamentos comunitários : tem natureza normativa e são

fontes primárias do direito comunitário logo a seguir aos tratados. Não

existem atos comunitários formados por leis. Eis suas características mais

relevantes:

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i) natureza e alcance geral;

ii) obrigatoriedade em todos os seus elementos;

iii) aplicabilidade direta em todos os estados-membros.

Importante observar que os regulamentos são auto-

aplicativos,operando diretamente no ordenamento jurídico interno sem

necessidade de ato externo de execução.

b) Diretivas comunitárias : são atos normativos que apresentam

duas características distintas: a) vinculam os estados-membros a uma

obrigação de resultado, deixando a estes a discricionariedade quanto à

forma de alcançá-los; e b) permite regimes particulares nacionais: os

princípios devem informar os resultados.

5.4. Direito Internacional

A par dessa estrutura normativa acima demonstrada, tem-se ainda

o direito costumeiro nas relações internacionais, qual seja, aquele

constituído pelos usos e costumes internacionais com força obrigatória,

bem como outras regras editadas pelos organismos internacionais.

Na falta de legislador supranacional, o costume é e continua a ser

a principal fonte de direito no domínio do direito internacional, tanto

público como privado, ou no direito comercial. Uma parte do direito

internacional consuetudinário foi, no entanto, reduzido a escrito sob a

forma de tratado adotado num certo número de países. Eram pouco

numerosos antes deste século, mas o número destes tratados cresce

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continuamente. No entanto, apenas um pequeno número obriga a maioria

das nações já que para os outros países, que não fazem parte do tratado,

o conteúdo destes é muitas vezes considerado como direito

consuetudinário. Um exemplo, entre outros, é o Tratado de Viena de 1971

sobre as relações diplomáticas.

Também na área do comércio internacional têm grande relevância

as codificações privadas emanadas de organismos internacionais. Veja-

se, por exemplo, a codificação privada ao serviço de corporações

profissionais internacionais como a Câmara de Comércio Internacional e o

Comitê Marítimo Internacional ou organismos especializados da O.N.U.

como a Comissão das Nações Unidas para o Direito Comercial

Internacional (C.N.U.D.C.I). Estas codificações privadas são mais

maleáveis do que um tratado, pois permitem adaptações freqüentes

segundo a evolução do costume. Assim são as “Normas de Varsóvia e de

Oxford” de 1928 e de 1932, estabelecidas para a venda CIF pela

Internacional Law Associatión, as Normas Uniformes relativas aos

créditos titulados por documento, revistas em 1974, etc. Não é, de resto,

raro neste domínio que uma norma de direito convencional seja

derrogada por uma norma de direito consuetudinário mais recente.

E demonstrando a importância e aplicabilidade dos tratados

internacionais, com muita propriedade, CANOTILHO (1998, p. 492),

afirma que:

O estatuto do Tribunal Internacional de Justiça, estabelecido pelo Tratadode S. Francisco de 1945 define, no seu art. 38º o costume “como...umaprática geral deste Tribunal: “usos aceites geralmente como consagrandoprincípios de direito”.

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O costume internacional repousa sobre usos e sobre a opinio necessitatisou seja, sobre a convicção do carácter obrigatório da norma. No domínio docomércio internacional, em que se recorre frequentemente à arbitragem,formou-se uma lex mercatoria universal, autônoma em relação aos direitosestatais.

Portanto, a tendência moderna é cada vez mais a busca da

uniformização das relações internacionais através de uma normatização

sistemática e geral aplicável a todas as nações, com caráter

supranacional e de observância impositiva por todos quantos a ela se

sujeitem, respeitadas, de qualquer sorte, a soberania dos povos.

5.5. Os tratados internacionais e sua aplicação no Brasil

5.5.1. O regime jurídico

O sistema jurídico brasileiro impõe um ritual próprio para a

recepção dos tratados e convenções internacionais de que o Brasil seja

signatário. A Constituição Federal estabelece regime jurídico especial

para inserção dos acordos internacionais no ordenamento pátrio.

Inicialmente a Carta Magna estabelece que o Brasil rege-se nas

suas relações por princípios, dentre eles: a) autodeterminação dos povos;

b) igualdade entre os Estados; e c) cooperação entre os povos para o

progresso da humanidade.

Estabelece, também, no parágrafo único do artigo 4º, que a

República Federativa do Brasil buscará a integração econômica, política,

social e cultural dos povos da América Latina, visando à formação de uma

comunidade latino-americana de nações, de natureza ampla e com bases

em interesses diversos como instrumento de realização da integração.

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Prevê, ainda, o Estatuto Constitucional no parágrafo segundo do

artigo 5º que os direitos e garantias expressos nesta Constituição não

excluem outros decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados,

ou dos tratados internacionais em que a República Federativa do Brasil

seja parte. Ou seja, os acordos celebrados têm garantia constitucional de

validez e aplicabilidade na ordem interna.

E ainda para dar mais força aos tratados e convenções, deu-lhes

dignidade constitucional ao assegurar no parágrafo terceiro do citado

artigo 5º, o status de emenda constitucional, verbis:

§ 3º Os tratados e convenções internacionais sobre direitos humanos queforem aprovados, em cada Casa do Congresso Nacional, em dois turnos,por três quintos dos votos dos respectivos membros, serão equivalentes àsemendas constitucionais.

Tal procedimento, no entanto, não é privilégio somente do direito brasileiro.

Várias nações, dentre elas a Argentina atribuem caráter supralegal aos

tratados que cuidam de direito humanos. Leia-se a este propósito o texto a

seguir:

Con la reforma constitucional de 1994, los tratados internacionales dederechos humanos enumerados en el inc. 22 del art. 75, tienen jerarquíaconstitucional y, por tanto, rango superior al resto de los tratados noenumerados (aunque fuesen de derechos humanos)) y a la ley. (VEGAS,1996, p. 40)

Portanto, os tratados ou convenções internacionais celebrados pelo

Brasil cujo objeto seja direitos humanos, caso sejam referendados pelo

Congresso Nacional, por três quintos dos votos de seus membros,

passam a equiparar-se a emenda constitucional, constituindo-se, pois, em

norma integrante da Carta Maior do país.

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O rito estabelecido para celebração dos tratados é o que segue: o

Presidente da República celebra o acordo internacional, representando a

República Federativa do Brasil (artigo 84, VIII); após a celebração,

submete o tratado ou a convenção ao referendo do Congresso Nacional

que resolve definitivamente sobre o acordo (artigo 49, inciso I, C.F);

referendado o acordo através de Decreto Legislativo, o Presidente da

República edita decreto ratificando o ato praticado pelo Congresso e

inserindo na ordem jurídica interna os termos contidos no tratado que

passam a ter vigência e eficácia no mundo jurídico pátrio.

Demonstra-se que tal instrumento normativo tem natureza de

legislação, qual seja, ele é introduzido no mundo jurídico seguindo um

ritual legislativo que, uma vez cumprido, faz com que as regras postas no

acordo internacional passem a disciplinar relações jurídicas surgidas na

ordem interna, com caráter de observância obrigatória por todos que

estejam sujeitos às leis nacionais.

Resta claro, pois, como sobejamente demonstrado, que estes

acordos internacionais, veiculados por meio de tratados ou convenções,

ao cumprirem o ritual a eles reservados, revestem-se, induvidosamente

da condição de legislação tendo, por conseguinte, validade e eficácia

plenas no território nacional, com status de norma constitucional

anteriormente visto, se revestido das formalidades próprias, ou de

legislação ordinária, constituindo-se, pois, como uma das mais

importantes (senão a mais importante) fonte de direito dos sistemas

jurídicos positivos hodiernos que reservam a estes acordos, regime

jurídico semelhante ao apresentado neste estudo.

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6 – CONCLUSÕES

O problema das fontes de direito tem trazido muitas discussões e

criado diversas polêmicas sobre sua natureza e classificação. Como visto

no presente estudo, os autores divergem quanto a estes aspectos das

fontes, de acordo com a formação filosófica ou teórica de cada um.

Alguns, como Kelsen, consideram que a única fonte de direito válida é a

lei (onde uma norma de hierarquia superior serve de fundamento de

validade para a norma imediatamente inferior, sendo a constituição, o

fundamento de validade de todo o ordenamento positivo). Outros autores,

como Miguel Reale, adotam uma classificação que não inclui a doutrina

como fonte primária de direito, por lhe faltar estrutura de poder, mas

apenas a compreende como elemento auxiliar destas, emprestando,

todavia, importantíssimo papel no desenvolver da experiência jurídica e

na dinâmica do ordenamento jurídico.

No sistema jurídico pátrio os acordos internacionais podem ou não

assumir a condição de fontes de direito. E, ainda, podem ser

caracterizados como fontes primárias, com dignidade constitucional ou

revestidas da condição de legislação, dependendo do rito a que sejam

submetidos e da matéria de que tratam. E na hipótese de não serem

aprovados pelo Poder Legislativo, não irradiam efeitos jurídicos na ordem

interna, não se revestindo da condição de fonte de direito.

Se a matéria objeto do acordo ou convenção internacional for

direitos humanos e caso seja aprovado no Congresso Nacional com

maioria de três quintos dos votos dos congressistas, nas duas casas

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legislativas, o acordo se posiciona no ordenamento com status de norma

constitucional, passando, pois, a inserir-se no ordenamento maior. Caso

seja o acordo celebrado, aprovado submetendo-se ao rito ordinário de

elaboração normativa, através de simples manifestação do Legislativo e

com sua ratificação pelo Chefe do Poder Executivo através de decreto, os

comandos normativos nele contidos assumem a condição de legislação e

passam a irradiar efeitos jurídicos na ordem interna, disciplinando as

condutas por ele normatizadas.

Nestas hipóteses susocitadas, os tratados e convenções

internacionais assumem, induvidosamente, a condição de fontes

primárias do direito, pois seu conteúdo regula, por si próprio, os

comportamentos que foram objeto da normatização e se inserem na

ordem jurídica interna e, por serem de observância obrigatória, passam a

regular as condutas de todos aqueles sujeitos ao ordenamento jurídico

pátrio.

É certo que esta é uma conclusão a que se chega neste estudo

que não deve ser analisada com caráter absoluto, vez que outros estudos

mais aprofundados ou a própria evolução do direito podem chegar a

conclusões diversas dessa que aqui se expõe.

Espera-se, todavia, que este trabalho possa servir de estímulo a

estudiosos da matéria e novas pesquisas possam ser desenvolvidas e

tragam novas luzes sobre este polêmico tema, de tanta relevância para a

evolução do direito e, por conseguinte, da própria sociedade, realizando

seu valor maior, a justiça.

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