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Os tiros que se seguem rasgam o véu de silêncio em meio à noite escura. Na calada da noite, pistoleiros invadem uma aldeia indígena.

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Page 1: Os tiros que se seguem rasgam o véu de silêncio em meio à noite escura. Na calada da noite, pistoleiros invadem uma aldeia indígena

Os tiros que se seguem rasgam o véu de silêncioem meio à noite escura.

Na calada da noite, pistoleiros invadem uma aldeia indígena.

Page 2: Os tiros que se seguem rasgam o véu de silêncio em meio à noite escura. Na calada da noite, pistoleiros invadem uma aldeia indígena

Maria dos Anjos Paulino Guajajara,

de apenas 6 anos de idade,

em meio a seu sono de criança,

tem a vida interrompida por um tiro na cabeça.

Page 3: Os tiros que se seguem rasgam o véu de silêncio em meio à noite escura. Na calada da noite, pistoleiros invadem uma aldeia indígena

Maria dos Anjos Paulino Guajajara,

Lágrimas e lamentos ecoam pela mata, tendo apenas

a lua por testemunha.

Page 4: Os tiros que se seguem rasgam o véu de silêncio em meio à noite escura. Na calada da noite, pistoleiros invadem uma aldeia indígena

Maria dos Anjos Paulino Guajajara,

A ocorrência não ganha espaço, nem

tem repercussão na grande mídia.

‘Apenas mais um índio assassinado’, friamente calculam

os editores.

Page 5: Os tiros que se seguem rasgam o véu de silêncio em meio à noite escura. Na calada da noite, pistoleiros invadem uma aldeia indígena

Esta apresentação é dedicada à

pequena Maria dos Anjos.

Onde quer que te encontres,

pequenina índia,

brinque em paz...

Page 6: Os tiros que se seguem rasgam o véu de silêncio em meio à noite escura. Na calada da noite, pistoleiros invadem uma aldeia indígena

Onde quer que te encontres,

pequenina índia,

brinque em paz...– Maria dos Anjos Paulino Guajajara –

(2001-2008)

Page 7: Os tiros que se seguem rasgam o véu de silêncio em meio à noite escura. Na calada da noite, pistoleiros invadem uma aldeia indígena

– Séculos Indígenas –

Page 8: Os tiros que se seguem rasgam o véu de silêncio em meio à noite escura. Na calada da noite, pistoleiros invadem uma aldeia indígena

Imagem é mediação

– presença apenas

sugerida.

Um encontro entre

alteridades exige

mediações adequadas.

Page 9: Os tiros que se seguem rasgam o véu de silêncio em meio à noite escura. Na calada da noite, pistoleiros invadem uma aldeia indígena

Quando um rosto é

descoberto, algo dele

permanece oculto. Mistério, quando

experimentado, permanece

mistério.

Page 10: Os tiros que se seguem rasgam o véu de silêncio em meio à noite escura. Na calada da noite, pistoleiros invadem uma aldeia indígena

Índio todo mundo sabe o

que é.Ou criou na cabeça que

sabe.

Page 11: Os tiros que se seguem rasgam o véu de silêncio em meio à noite escura. Na calada da noite, pistoleiros invadem uma aldeia indígena

Se o ponto está

assegurado, a vista é

sempre refém dos espelhos da história...

Page 12: Os tiros que se seguem rasgam o véu de silêncio em meio à noite escura. Na calada da noite, pistoleiros invadem uma aldeia indígena

O século era o décimo sexto

para os habitantes da

Península Ibérica, Europa.

Page 13: Os tiros que se seguem rasgam o véu de silêncio em meio à noite escura. Na calada da noite, pistoleiros invadem uma aldeia indígena

Estes adoravam ora um Deus que lhes prometia

um novo mundo,

ora um mundo que lhes

prometia um novo deus.

Page 14: Os tiros que se seguem rasgam o véu de silêncio em meio à noite escura. Na calada da noite, pistoleiros invadem uma aldeia indígena

Estes adoravam ora um Deus que lhes prometia

um novo mundo,

ora um mundo que lhes

prometia um novo deus.

Outras margens

encontraram.Dão-nas por descobertas.

Page 15: Os tiros que se seguem rasgam o véu de silêncio em meio à noite escura. Na calada da noite, pistoleiros invadem uma aldeia indígena

Chamam-nas ‘Nova Terra’ao que era habitação

para muitos povos.

Page 16: Os tiros que se seguem rasgam o véu de silêncio em meio à noite escura. Na calada da noite, pistoleiros invadem uma aldeia indígena

A mediação poderia ter

sido reverência,

mas o medo gera

dominação.O que poderia ter sido um encontro

transformou-se em terrível calamidade para nossas

mães e nossos pais.

Page 17: Os tiros que se seguem rasgam o véu de silêncio em meio à noite escura. Na calada da noite, pistoleiros invadem uma aldeia indígena

O que poderia ter sido um encontro

transformou-se em terrível calamidade para nossas

mães e nossos pais.

Page 18: Os tiros que se seguem rasgam o véu de silêncio em meio à noite escura. Na calada da noite, pistoleiros invadem uma aldeia indígena

Não por acaso eles nos

chegaram com a distração

dos espelhos...

Page 19: Os tiros que se seguem rasgam o véu de silêncio em meio à noite escura. Na calada da noite, pistoleiros invadem uma aldeia indígena

O que poderia ter sido um encontro

transformou-se em terrível calamidade para nossas mães e pais.

Mas, afinal, o que teriam enxergado

nossos antepassados

naquelas superfícies de

brilho reflexivo?

Page 20: Os tiros que se seguem rasgam o véu de silêncio em meio à noite escura. Na calada da noite, pistoleiros invadem uma aldeia indígena

Mas, afinal, o que teriam enxergado

nossos antepassados

naquelas superfícies de

brilho reflexivo?

Que imagem perdida? Que presença desconhecida?Que rosto é esse na face

indígena?

Page 21: Os tiros que se seguem rasgam o véu de silêncio em meio à noite escura. Na calada da noite, pistoleiros invadem uma aldeia indígena

A imagem do índio reproduzida na nossa sociedade dita

civilizada é tal que o índio nela não se

reconhece.

Page 22: Os tiros que se seguem rasgam o véu de silêncio em meio à noite escura. Na calada da noite, pistoleiros invadem uma aldeia indígena

Diante da insensatez dos livros da escola e da

espetacularização da televisão, confortavelmente agimos como se tudo

tivesse sido dito. Esgotado.

Page 23: Os tiros que se seguem rasgam o véu de silêncio em meio à noite escura. Na calada da noite, pistoleiros invadem uma aldeia indígena

Índio todo mundo sabe o que é.Ou criou na cabeça que sabe.

Page 24: Os tiros que se seguem rasgam o véu de silêncio em meio à noite escura. Na calada da noite, pistoleiros invadem uma aldeia indígena

Se o ponto está assegurado, a vista é sempre refém

dos espelhos da história...

Page 25: Os tiros que se seguem rasgam o véu de silêncio em meio à noite escura. Na calada da noite, pistoleiros invadem uma aldeia indígena

Não há síntese ou imagem que não seja

como nuvem passageira.Híbrida. Provisória.

Page 26: Os tiros que se seguem rasgam o véu de silêncio em meio à noite escura. Na calada da noite, pistoleiros invadem uma aldeia indígena

As melhores ideias a respeito de outros povos e

realidades surgem tão somente de partos

dolorosos.

Page 27: Os tiros que se seguem rasgam o véu de silêncio em meio à noite escura. Na calada da noite, pistoleiros invadem uma aldeia indígena

Merecem todo o nosso apreço.

Mas são, ainda, bem menos do que

o espírito que se almeja alcançar.

Page 28: Os tiros que se seguem rasgam o véu de silêncio em meio à noite escura. Na calada da noite, pistoleiros invadem uma aldeia indígena

O desafio de cultivar uma vivência sensível, aliada à reflexão acerca da

identidade cultural brasileira.

Page 29: Os tiros que se seguem rasgam o véu de silêncio em meio à noite escura. Na calada da noite, pistoleiros invadem uma aldeia indígena

Como enriquecer uma percepção crítica e sensível da realidade histórica e política dos povos

indígenas no Brasil contemporâneo?

Page 30: Os tiros que se seguem rasgam o véu de silêncio em meio à noite escura. Na calada da noite, pistoleiros invadem uma aldeia indígena

Recuperar ritos e tradições esquecidas.

Page 31: Os tiros que se seguem rasgam o véu de silêncio em meio à noite escura. Na calada da noite, pistoleiros invadem uma aldeia indígena

O vermelho do urucum,o azul, quase negro, do jenipapo,

e outras tantas cores essenciais que pelo caminho, por descuido, ficaram

abandonadas.

Page 32: Os tiros que se seguem rasgam o véu de silêncio em meio à noite escura. Na calada da noite, pistoleiros invadem uma aldeia indígena

Em meio à dispersão geral

dos tempos conturbados

que vivenciamos,

ter olhos,cultivar

um coração capaz de

reconhecer e valorizar a

herança poética que dos índios recebemos.

Page 33: Os tiros que se seguem rasgam o véu de silêncio em meio à noite escura. Na calada da noite, pistoleiros invadem uma aldeia indígena

Uma herança poética, ética,

humana e estética,

capaz de nos reconduzir a

desejos e aspirações imemoriais, de banhar a

nossa jornada comum por este pequeno planeta com significado, beleza, poesia

e encanto.

Page 34: Os tiros que se seguem rasgam o véu de silêncio em meio à noite escura. Na calada da noite, pistoleiros invadem uma aldeia indígena

Como usar o tempo a nosso

favor?

Como resgatar os valores espirituais

que apenas na

contemplação, no silêncio

e no repouso são

estabelecidos?

Page 35: Os tiros que se seguem rasgam o véu de silêncio em meio à noite escura. Na calada da noite, pistoleiros invadem uma aldeia indígena

O ritual iniciático a nos conduzir ao ‘mais que humano’ que

habita em nós.

Page 36: Os tiros que se seguem rasgam o véu de silêncio em meio à noite escura. Na calada da noite, pistoleiros invadem uma aldeia indígena

O ritual iniciático a nos conduzir ao ‘mais que humano’ que

habita em nós.

A criança pequenina – cabocla, negra, indígena –

que um dia, não tão distante, fomos.

Page 37: Os tiros que se seguem rasgam o véu de silêncio em meio à noite escura. Na calada da noite, pistoleiros invadem uma aldeia indígena

A seiva ancestral que percorre nossas veias,

e alimenta as nossas mais profundas raízes.

Page 38: Os tiros que se seguem rasgam o véu de silêncio em meio à noite escura. Na calada da noite, pistoleiros invadem uma aldeia indígena

Contemplar um outro mundo possível,

– onde o estranhamento cederá lugarao reconhecimento, diálogo e fraternização na diferença.

Page 39: Os tiros que se seguem rasgam o véu de silêncio em meio à noite escura. Na calada da noite, pistoleiros invadem uma aldeia indígena

Se voltássemos sempre de novo a enxergar o mundo como criança,

nos surpreenderíamos menos com nossos sonhos.

Page 40: Os tiros que se seguem rasgam o véu de silêncio em meio à noite escura. Na calada da noite, pistoleiros invadem uma aldeia indígena

Reconhecer-me-ia numa síntese

minha com traços indígenas?

Page 41: Os tiros que se seguem rasgam o véu de silêncio em meio à noite escura. Na calada da noite, pistoleiros invadem uma aldeia indígena

Falaria que língua?O que comeria aos

domingos?(mas haveria domingos?)

Page 42: Os tiros que se seguem rasgam o véu de silêncio em meio à noite escura. Na calada da noite, pistoleiros invadem uma aldeia indígena

Quem e quantos seriam

a minha família?

Page 43: Os tiros que se seguem rasgam o véu de silêncio em meio à noite escura. Na calada da noite, pistoleiros invadem uma aldeia indígena

Que nome daria a meus sentimentos?

Page 44: Os tiros que se seguem rasgam o véu de silêncio em meio à noite escura. Na calada da noite, pistoleiros invadem uma aldeia indígena

Minha melhor síntese está por ser realizada.

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Tema musical: “And When I Touched You”, Ernesto Cortazar

Formatação: [email protected]

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Texto adaptado da exposição “Séculos Indígenas”Organizada pelo ‘Museu do Índio’

Brasília, Outubro 2011

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