os recursos vegetais e o saber local na comunidade … · espÉcies vegetais indicadas para o...

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UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO FACULDADE DE ENGENHARIA FLORESTAL Programa de Pós Graduação em Ciências Florestais e Ambientais OS RECURSOS VEGETAIS E O SABER LOCAL NA COMUNIDADE RURAL SÃO MIGUEL EM VÁRZEA GRANDE, MT: UMA ABORDAGEM ETNOBOTÂNICA JENEFFER SOARES DOS SANTOS MAMEDE CUIABÁ-MT 2015

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UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO FACULDADE DE ENGENHARIA FLORESTAL

Programa de Pós Graduação em Ciências Florestais e Ambientais

OS RECURSOS VEGETAIS E O SABER LOCAL NA

COMUNIDADE RURAL SÃO MIGUEL EM VÁRZEA

GRANDE, MT: UMA ABORDAGEM ETNOBOTÂNICA

JENEFFER SOARES DOS SANTOS MAMEDE

CUIABÁ-MT 2015

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JENEFFER SOARES DOS SANTOS MAMEDE

OS RECURSOS VEGETAIS E O SABER LOCAL NA COMUNIDADE RURAL SÃO MIGUEL EM VÁRZEA

GRANDE, MT: UMA ABORDAGEM ETNOBOTÂNICA

Orientadora: Prof. Dra. Maria Corette Pasa

Dissertação apresentada à Faculdade de Engenharia Florestal da Universidade Federal de Mato Grosso, como parte das exigências do Curso de Pós-Graduação em Ciências Florestais e Ambientais, para obtenção do título de Mestre.

CUIABÁ-MT 2015

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PUÇANGA

É cumpadre, nessa terra de meu Deus,

Tem cura pra tudo.

É verdade cumpadre...

É só plantar lá no quintal.

Colher, tá curado!

Para gripes e resfriados cumpadre?

Carucaá, japana e sabugueiro

Mas prá sinusite?

É hortelã e manjerona

Mas pra gargante e faringite?

Erva de jabuti é bacana!

Mas e prá tosse cumpadre?

Dessas?

Hortelã grande, mastruz e urucum.

Agora me diga

Prá gastrite e úlcera?

Amor crescido, losna, catinga de

mulata

Erva cidreira, pirarucu, sacaca e

sucurijú

E dá-lha cura

Pra todo mal

E haja erva cumpadre

No meu quintal

Pra ameba e giárdia cumpadre

Tome chá de hortelanzinho

E prá acabar com a caganeira?

Elixir paregórico

E marupazinho

Mas se tomar...

Boldo africano, malvarisco

Vá prá privada

Prá anemia, seu menino?

Jucá e pariri, é legal cumpadre!

Cumpadre

Prá aquela dor de urina danada?

Alfavaca, capim marinho, canarana,

Manjericão, quebra pedra e solidônia

Seu mano, aqui prá nós

E prá doença de mulher?

Alecrim, estoraque e mucuracaá

Prá curuba e pano branco?

E tudo que é imundice de pele,

Inclusive tumor e furúnculo?

É babosa, arruda e melão de São

Caetano.

Osmar Júnior e Naldo Maranhão

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Ao meu marido Rafhael Mamede por seu

incentivo e auxílio nesta caminhada. A minha

orientadora pelo apoio nos principais momentos

do trabalho e finalmente aos moradores da

Comunidade São Miguel pela receptividade e

carinho com que eles me receberam.

A Vocês Dedico!

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AGRADECIMENTOS

Aos moradores da Comunidade São Miguel pelos ensinamentos

adquiridos; pelos cafezinhos oferecidos sempre com grande satisfação; pela

enorme boa vontade nos trabalhos de campos. Por fim, OBRIGADA pela

hospitalidade. Em especial a Dona Antônia, pela atenção, carinho e dedicação.

Por terpercorridocada pedacinho da comunidade falando da importância do

presente estudo e por ter me acompanhadonas propriedades sempre com

muita alegria. Quero deixar meu carinho registrado também ao Natanael (in

memoria), grande conhecedor da utilização das plantas, que antes de partir

deixou um pouco desse conhecimento com todos que irão ler esse trabalho.

Á minha orientadora, profª Dra. Maria Corette Pasa por todos os

ensinamentos repassados e pela grande oportunidade de trabalhar ao seu

lado. Obrigada por todos os abraços carinhosos e por sempre mostrar

esperança quando parecia não haver nenhuma.

Aos professores Antônio Antonio de Arruda Tsukamoto Filho e Carla

Maria Abido Valentini pelas ótimas contribuições para este trabalho tanto na

qualificação quanto na defesa. Sempre muitos atenciosos e prestativos.

À minha família: meus pais Pedro e Silvania, meus irmãos Pollyana e

Gabriel, por estarem sempre torcendo por meus sonhos. Aos meus sobrinhos

Kestly, Anni e Leonardo, que meu esforço sirva de exemplo, a busca por um

sonho não é fácil, contudo é gratificante. Aos meus sogros, Francisco e

Eudália, pelo incentivo e pela ajuda constante em cuidar do meu pequeno;

vocês mudaram a rotina da sua casa tudo em função de me ajudar, sou

eternamente grata.

Ao Senhor José, Técnico do Herbário da Universidade Federal de Mato

Grosso, pelos ensinamentos na confecção das exsicatas e colaboração com

identificação das espécies.

A Capes pelo incentivo financeiro concedido através da bolsa de

mestrado.

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A todos os meus colegas de Mestrado, pela amizade e momentos

compartilhados.

A meus amigos de toda vida (Pedro, Bruno, Arica, Maíra, Simone,

Lariane) quero dizer que ausência não significa esquecimento. Vocês estão

sempre em meus pensamentos e em meu coração.

Ao meu filho, Eduardo, pela ausência constante no seu dia a dia,

perdendo momentos que não teram volta. Quero te pedir filho que me

entendas, quando tiver idade para isso, que minha ausência não foi em vão e

sim a busca por um sonho no qual você fez parte. A mamãe te amou desde o

primeiro dia que ficou sabendo de sua existência e nada que eu faça ou almeje

mudará isso.

Ao meu eterno companheiro Rafhael Mamede. Companheiro, esposo,

amigo, confidente, você é tudo para mim. Amor, obrigada por sempre ter me

incentivado a correr atrás do que queria, por ter sido pai e mãe quando Dudu

precisou, por não perder a paciência todas as vezes que pedi que me levasse

para realizar a pesquisa. Obrigada por ter me auxiliado todas as vezes que

recorri a você.

Por fim, a Deus que me deu a vida e por ter colocado todas essas

pessoas em meu caminho me mostrando que tudo daria certo. Deixo esse

versículo para reflexão: É melhor ter companhia do que estar sozinho, porque

maior é a recompensa do trabalho de duas pessoas. Se um cair, o amigo pode

ajudá-lo a levantar-se. Mas pobre do homem que cai e não tem quem o ajude a

levantar-se!Eclesiastes 4:9-10.

A todos o meu Muito Obrigada.

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BIOGRAFIA

Jeneffer Soares dos Santos Mamede, filha de Pedro Gomes dos

Santos e Silvania Soares dos Santos, ambos brasileiros, nasceu em Cuiabá,

Mato Grosso, em 28 de novembro de 1986. Cursou o ensino fundamental na

Escola Estadual Presidente Médici - EEPM, em Cuiabá, Mato Grosso, em

2001. Fez o ensino médio no Centro Federal de Educação Tecnológica de

Cuiabá– CEFET-MT, em Cuiabá, em 2004. Formou-se Engenheira Florestal

em 2009, pela Universidade do Estado de Mato Grosso - UNEMAT e

Especialista em Engenharia e Segurança do Trabalho no ano de 2010 pela

Universidade de Cuiabá - UNIC. Iniciou sua vida profissional com

licenciamentos ambientais em áreas rurais no ano de 2009. Em março de

2013, ingressou no mestrado acadêmico em Ciências Florestais e Ambientais

na Universidade Federal de Mato Grosso.

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SUMÁRIO

LISTA DE TABELAS ............................................................................. .............x

LISTA DE FIGURAS .......................................................................................... xi

RESUMO.......................................................................................................... xiii

ABSTRACT ....................................................................................................... xv

1. INTRODUÇÃO..............................................................................................1

2. REVISÃO DE LITERATURA ..................................................................... ..3

2.1. Etnobotânica: um pouco de história e de conceitos................................3

2.2. Importância dos estudos etnobotânicos..................................................3

2.3. Estudo da etnobotânica no Brasil e no mundo.......................................7

2.4. Estudo da etnobotânica em cerrado matogrossense............................8

2.5. Unidades de paisagem.........................................................................11

2.5.1. Cerrado.......................................................................................11

2.5.2. Quintal........................................................................................13

2.5.3. Roça...........................................................................................15

2.5.4. Matas de Galeria........................................................................16

3. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS.............................................................18

CAPÍTULO 1

RESUMO.......................................................................................................... 26

ABSTRACT ...................................................................................................... 27

1. INTRODUÇÃO .......................................................................................... 28

2. METODOLOGIA ........................................................................................ 29

2.1. Área de Estudo................................................................29

2.2. Proposta Metodológica.......................................................................31

3. RESULTADOS E DISCUSSÃO .............................................................. 332

3.1. Dados dos entrevistados..............................................................32

3.2. Estrutura física dos domicílios......................................................39

3.3. Características da saúde..............................................................44

3.4. Perfil econômico...........................................................................46

3.5. Características da organização social..........................................50

4. CONSIDERAÇÕES FINAIS ...................................................................... 52

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5. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ......................................................... 54

CAPÍTULO 2

RESUMO.......................................................................................................... 59

ABSTRACT ...................................................................................................... 60

1. INTRODUÇÃO .......................................................................................... 61

2. METODOLOGIA ........................................................................................ 62

2.1. Área de Estudo............................................................62

2.2. Proposta Metodológica..................................................................62

2.3. Sistematização e análise dos dados.............................................64

3. RESULTADOS E DISCUSSÃO ................................................................ 68

3.1. Características dos entrevistados.................................................68

3.2. As Unidades de Paisagem....................................................69

3.2.1 Quintais...............................................................................70

3.2.2. Roças.................................................................................97

3.2.3. Matas de galeria...............................................................100

4. CONSIDERAÇÕES FINAIS .................................................................... 107

5. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ....................................................... 109

4. CONCLUSÕES GERAIS ......................................................................... 114

5. DEVOLUTIVAS...........................................................................................117

ANEXOS..........................................................................................................118

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LISTA DE TABELAS

CAPÍTULO 1 TABELA 1: NÍVEL DE ESCOLARIDADE POR FAIXA ETÁRIA E SEXO DA COMUNIDADE SÃO MIGUEL. VÁRZEA GRANDE-MT. BRASIL. 2014. FONTE: AUTORES...................................................................................35

TABELA 2: DOENÇAS MAIS COMUNS E A PORCENTAGEM DE ESPÉCIES VEGETAIS INDICADAS PARA O TRATAMENTO PELOS MORADORES DA COMUNIDADE SÃO MIGUEL. VÁRZEA GRANDE-MT. BRASIL. 2014............................................................................................45 TABELA 3: ESPÉCIES CULTIVADAS NA COMUNIDADE SÃO MIGUEL. VÁRZEA GRANDE-MT. BRASIL. 2014.....................................................46 CAPÍTULO 2 TABELA 1: CARACTERÍSTICAS SOCIODEMOGRÁFICAS DA COMUNIDADE SÃO MIGUEL. VÁRZEA GRANDE-MT. BRASIL. 2014...68 TABELA2: ESPÉCIES PRESENTES NOS QUINTAIS DA COMUNIDADE SÃO MIGUEL. VÁRZEA GRANDE-MT. BRASIL. 2014............................78 TABELA 3: VALOR RELATIVO DE CONCORDÂNCIA QUANTO AOS USOS PRINCIPAIS. COMUNIDADE SÃO MIGUEL, VÁRZEA GRANDE-MT. 2014...................................................................................................89

TABELA 4: ESPÉCIES VEGETAIS CITADAS PARA FINS TERAPÊUTICOS EM ANIMAIS NA COMUNIDADE SÃO MIGUEL. VÁRZEA GRANDE-MT. BRASIL. 2014.....................................................95

TABELA5: PLANTAS DA MATA DE GALERIA USADAS PELA COMUNIDADE SÃO MIGUEL. VÁRZEA GRANDE-MT. BRASIL. 2014.102

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LISTA DE FIGURAS

CAPÍTULO 1 FIGURA 1:LOCALIZAÇÃO DA COMUNIDADE SÃO MIGUEL. VÁRZEA GRANDE-MT. BRASIL. 2014. FONTE: AUTORAS..................................29 FIGURA 2:ATIVIDADES EXERCIDAS PELOS ENTREVISTADOS DA COMUNIDADE SÃO MIGUEL. VÁRZEA GRANDE-MT. BRASIL. 2014. FONTE: AUTORES. OBSERVAÇÃO: TDEE TÉCNICO EM DESENVOLVIMENTO EDUCACIONAL ESPECIALIZADO......................34 FIGURA 3:NATURALIDADE DOS ENTREVISTADOS DA COMUNIDADE SÃO MIGUEL. VÁRZEA GRANDE-MT. BRASIL. 2014. FONTE: AUTORES.................................................................................................34 FIGURA 4:TEMPO DE MORADIA DOS ENTREVISTADOS NA COMUNIDADE SÃO MIGUEL. VÁRZEA GRANDE-MT. BRASIL. 2014. FONTE: AUTORES...................................................................................37 FIGURA 5:PRODUTOS USADOS NA ALIMENTAÇÃO DOS ANIMAIS NA COMUNIDADE SÃO MIGUEL. VÁRZEA GRANDE-MT. BRASIL. 2014. FONTE: AUTORES...................................................................................38 FIGURA 6:TIPOS DE MORADIA ENCONTRADA NA COMUNIDADE SÃO MIGUEL. VÁRZEA GRANDE-MT. BRASIL. 2014. A: ALVENARIA; B: MADEIRA; C: PAU-A-PIQUE. FONTE: AUTORES...................................40 FIGURA 7:SISTEMA IMPROVISADO COM CAIXA D’ ÁGUA PARA COLETA DE ÁGUA DA CHUVA NA COMUNIDADE SÃO MIGUEL. VÁRZEA GRANDE-MT. BRASIL. 2014. FONTE: AUTORES...................42 FIGURA 8:DESTINO DADO À PRODUÇÃO AGRÍCOLA FAMILIAR NA COMUNIDADE SÃO MIGUEL. VÁRZEA GRANDE-MT. BRASIL. 2014. FONTE: AUTORES...................................................................................47 FIGURA 9:MODELO DA TECNOLOGIA SOCIAL PAIS NA COMUNIDADE SÃO MIGUEL. VÁRZEA GRANDE-MT. BRASIL. 2014. FONTE: AUTORES...................................................................................48 FIGURA 10: MOENDA UTILIZADA PARA MOER CANA-DE-AÇÚCAR. COMUNIDADE SÃO MIGUEL. VÁRZEA GRANDE-MT. BRASIL. 2014. FONTE: AUTORES...................................................................................49 FIGURA 11: PERCURSO DA CAVALGADA NA COMUNIDADE SÃO MIGUEL. VÁRZEA GRANDE-MT. BRASIL. 2014. FONTE: AUTORES...51

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CAPÍTULO 2

FIGURA 1:LOCALIZAÇÃO DA COMUNIDADE SÃO MIGUEL. VÁRZEA GRANDE-MT. BRASIL. 2014. FONTE: AUTORAS..................................62 FIGURA 2: CURVA DE ACUMULAÇÃO DE ESPÉCIES REPRESENTANDO A QUANTIDADE DE ESPÉCIES CITADAS EM FUNÇÃO DO NÚMERO DE ENTREVISTAS REALIZADAS NA COMUNIDADE SÃO MIGUEL. VÁRZEA GRANDE-MT. BRASIL. 2014. FONTE: AUTORES...................................................................................70 FIGURA 3: FREQUÊNCIA RELATIVA DOS ENTREVISTADOS QUANTO AO MANEJO DOS QUINTAIS NA COMUNIDADE SÃO MIGUEL. VÁRZEA GRANDE-MT. BRASIL. 2014. FONTE: AUTORES...................72 FIGURA 4: RECIPIENTES UTILIZADOS PARA PLANTIO NOS QUINTAIS NA COMUNIDADE SÃO MIGUEL. VÁRZEA GRANDE-MT. BRASIL. 2014. A: COCO; B: PARTE DO ESTIPE DE BURITI; C: GARRAFA PET; D: TRONCO DE ÁRVORE. FONTE: AUTORES...........................................74 FIGURA 5: NÚMERO DE FAMÍLIAS E ESPÉCIES ENCONTRADAS NAS ETNOCATEGORIAS DE USO NA COMUNIDADE SÃO MIGUEL. VÁRZEA GRANDE-MT. BRASIL. 2014. FONTE: AUTORES...................77

FIGURA 6: MODO DE PREPARO DOS REMÉDIOS CASEIROS NA COMUNIDADE SÃO MIGUEL. VÁRZEA GRANDE-MT. BRASIL. 2014. FONTE: AUTORAS...................................................................................94

FIGURA 7: EXEMPLO DE CULTIVOS ENCONTRADO NA COMUNIDADE SÃO MIGUEL. VÁRZEA GRANDE-MT. BRASIL. 2014. A: CEBOLA, B: CARÁ-MOELA E C: MAMÃO PAPAIA. FONTE: AUTORAS.................................................................................................97 FIGURA 8: FREQUÊNCIA RELATIVA DOS CULTIVOS NAS ROÇAS DAS PROPRIEDADES RURAIS NA COMUNIDADE SÃO MIGUEL. VÁRZEA GRANDE-MT. BRASIL. 2014. FONTE: AUTORAS...................98 FIGURA 9: PRINCIPAIS FAMÍLIAS BOTÂNICAS ENCONTRADAS NA MATA DE GALERIA DA COMUNIDADE SÃO MIGUEL. VÁRZEA GRANDE-MT. BRASIL. 2014. FONTE: AUTORAS................................101 FIGURA 10: DIVERSAS FORMAS DA UTILIZAÇÃO DA MADEIRA NA COMUNIDADE SÃO MIGUEL. VÁRZEA GRANDE-MT. BRASIL. 2014. A: PRATELEIRA, B: MESA, C: BANCO; D: CABO DE FERRAMENTA, E: CASA, F: ARCO (PARA PEDRA). FONTE: AUTORAS..........................106

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RESUMO

MAMEDE, Jeneffer Soares dos Santos. Os recursos vegetais e o saber local na Comunidade Rural São Miguel em Várzea Grande, MT: uma abordagem etnobotânica. Dissertação (Mestrado em Ciências Florestais e Ambientais) – Universidade Federal de Mato Grosso, Cuiabá-MT. Orientadora: Prof. Dra. Maria Corette Pasa.

O presente estudo teve como objetivo geral caracterizar os principais aspectos socioeconômicos, culturais e ambientais da Comunidade São Miguel, bem como classificar as etnocategorias de uso dos recursos vegetais manejados pela população nas diferentes unidades de paisagem. O trabalho foi dividido em dois capítulos, sendo abordado, no primeiro, o perfil social, econômico e cultural na comunidade. O segundo capítulo abrangeu as unidades de paisagem na comunidade. Realizou-se a aplicação de entrevistas semiestruturadas. Para cada espécie foi calculado o Valor de Uso e para determinar as plantas mais importantes quanto à finalidade foi calculado o Consenso Informante por meio do Nível de Fidelidade. Foram entrevistados 46 moradores. A maior parte dos entrevistados é natural de Mato Grosso (52%). Quanto à escolaridade, 46% não concluíram o ensino fundamental. Grande parte das mulheres são donas-de-casa (44,8%). A casa de alvenaria foi o tipo de moradia mais encontrado na comunidade (95,6%) e todas possuem fornecimento de energia elétrica. Quanto ao uso da água para o consumo humano, 83% dos informantes retiram do poço artesiano, 10% retiram do rio e 7% compram água mineral. A agricultura em pequena escala é a principal atividade encontrada na região, onde grande parte planta apenas para o consumo familiar (72%). A mandioca é o cultivo principal. A maior parte dos quintais localizam-se no entorno das residências; as mulheres são na maioria responsável pelo manejo do local (43%). Os moradores usam as folhas caídas para fazer adubo. A criação de animais domésticos foi encontrada em 90% dos das residências visitadas. Nos quintais foram citadas 207 espécies, onde as principais famílias botânicas foram Asteraceae, Fabaceae e Lauraceae. O uso medicinal foi a etnocategoria mais representativa. Em relação à valoração unitária, a planta que representou muito bem o valor de uso das plantas locais (Vusp= 3,00) foi Solanum gilo Raddi. Para frequência relativa da concordância quanto aos usos principais (Pcusp) acima de 25%, são referidos 19 casos para problemas digestivos (como gastrite, azia, males do estômago) e problemas respiratórios (como gripe, bronquite, pneumonia, tosse) - 61,5% cada. Não foram mencionadas dosagens específicas para os remédios caseiros. O modo de preparo prevalecente foi o chá, obtido por decocção (45%). A parte da planta mais empregada foi a folha (55,7%). Nas matas de galerias encontramos 68 espécies vegetais. A maioria das espécies (48%) citadas apresenta hábito arbóreo. Entre as espécies que representam muito bem o valor de uso das plantas locais (Vusp > 1,50) estão Myracroduon urundeuva Allemão e Anadenanthera colubrina var. cebil (Griseb.) Reis. Entre os produtos que foram retirados destaca-se a madeira para construção (50%) e sementes para produção de mudas

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(17%). O desenvolvimento de ações nas áreas econômicas e sociais, como a implantação de postos de saúde, inclusão do ensino médio em período diurno, acompanhamento da gestantes durante o pré-natal, é imprescindível para continuação da comunidade. As unidades de paisagem oferecem meios diversificados para a sobrevivência das famílias, portanto são espaços que merecem ser estudados. Palavras-chave: Cerrado; Dados socioeconômicos; Etnocategorias de uso; Unidades de paisagens.

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ABSTRACT

MAMEDE, Jeneffer Soares dos Santos. Plant resources and local knowledge in the Rural Community in São Miguel Várzea Grande, MT: an ethnobotanical approach. Thesis (MS in Forestry and Environmental Sciences) - Federal University of Mato Grosso, Cuiabá-MT. Advisor: Prof. Dra. Corette Pasa Maria. This study aimed to characterize the main socioeconomic, cultural and environmental aspects of São Miguel Community and classify the use of etnocategorias of plant resources managed by the country's various landscape units. The work was divided into two chapters, being addressed in the first, the social, economic and cultural profile in the community. The second chapter covered the landscape units in the community. We conducted semi-structured interviews the application. For each species we calculated the use value and to determine the most important plants on the purpose we calculated the Informant Consensus through the Loyalty Level. We interviewed 46 residents. Most of the respondents were born in Mato Grosso (52%). As for education, 46% had not finished elementary school. Most women are stay-at-home (44.8%). The brick house was the type of property most commonly found in the community (95.6%), all have electricity supply. As for the use of water for human consumption, 83% of respondents derive from artesian well, 10% derive from the river and 7% buy mineral water. The small-scale farming is the main activity found in the region, where most only plant for household consumption (72%). Cassava is the main crop. Most yards are located in the vicinity of residences; women are mostly responsible for local management (43%). Residents use fallen leaves to make compost. The breeding of domestic animals was found in 90% of the visited homes. In backyards were cited 207 species where the main botanical families were Asteraceae, Fabaceae and Lauraceae. The medicinal use was the most representative ethnocategory. Regarding the unitary valuation plant that represented very well the use value of local plants (Vusp = 3.00) was Solanum gilo Raddi. For relative frequency of agreement on the main uses (Pcusp) above 25%, are referred 19 cases to digestive problems (such as gastritis, heartburn, stomach ailments) and respiratory problems (such as flu, bronchitis, pneumonia, cough) - 61, 5% each. Specific dosages for home remedies were not mentioned. The prevailing method of preparation was the tea, obtained by decoction (45%). The part of the sheet plant was used (55.7%). In the gallery forests found 68 plant species. Most species (48%) cited presents woody. Among the species that represent very good value in use of local plants (Vusp> 1.50) are Myracroduon urundeuva Allemão and Anadenanthera colubrina var. cebil (Griseb.) Reis. Among the products that were removed there is the timber (50%) and seeds for seedlings (17%). The development of actions in the economic and social areas, such as the implementation of health centers, including high school in daytime, monitoring pregnant women during prenatal care, is essential

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for continued community. The landscape units offer diversified means of survival of families, so are spaces that deserve to be studied. Keywords: Cerrado; Socioeconomic data; Etnocategorias use; Of landscape units.

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1

1. INTRODUÇÃO GERAL

O Brasil está em primeiro lugar em número de plantas,

contando com 55.000 espécies vegetais (BECKER et al., 2007). Este fato

está relacionado à grande extensão territorial e a existência de diferentes

condições edafoclimáticas e geomorfológicas encontradas no país. Esses

fatores conforme Guerra et al. (1998) proporcionam oportunidades para a

identificação de produtos com possível utilização econômica.

O conhecimento das plantas por uma comunidade faz parte da

sua cultura e está entrelaçada com sua história de vida (PASA, 2007a),

portanto, é necessária a realização de estudos que busquem recuperar o

conhecimento tradicional, existindo grandes oportunidades de transmitir

para futuras gerações.

Esta recuperação de saberes consente que outras pessoas

empreguem espécies que antes não utilizavam, incluindo mais espécies

úteis para o dia-a-dia (MING et al., 2002). Nesse sentido, os estudos

etnobotânicos assumem expressiva relevância em razão de contribuírem

para visualizar a interface entre as comunidades e esses recursos

genéticos vegetais (PASA, 2011).

Nesse contexto, o pesquisador busca conhecer a cultura e o

cotidiano da comunidade pesquisada, a maneira como a comunidade

obtém a cura das enfermidades através dos recursos naturais disponíveis

(MORAIS, 2011), como lidam com os animais domésticos e os outros

animais presente na fauna local, os recursos vegetais utilizados na

construção das habitações, ferramentas, artesanatos.

Entre as diferentes unidades de paisagem, podemos destacar

o quintal. Nesse espaço são adotados manejos executados de maneira

harmoniosa abrangendo diversas formas de vida (KUMAR e NAIR, 2004).

Conforme os mesmos autores, o grande número de espécies presentes

nos quintais atende necessidades econômica, social e cultural

particulares do grupo envolvido.

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Esse sistema integrado de produção agrícola é representado

pelos quintais agroflorestais (CASTRO, 1995) e a importância desse

espaço está ligada à produção, já que associam espécies florestais,

plantas de múltiplos usos (medicinais, condimentares, alimentares) e a

criação de animais próximo a residência (CASTRO et al., 2009).

Outro ambiente da zona rural que merece ser lembrado são as

roças. Espaço de produção agrícola cuja formação acontece nas áreas

abertas no interior da vegetação natural ou nas bordas do campo cerrado

(PASA, 2011), cujo objetivo principal é de subsistência familiar, composta

por culturas de milho, mandioca, abóbora, feijão, bata-doce, integrada às

atividades de extração de frutas nativas como goiaba, banana, caju,

mamão, entre outras (DIEGUESet al., 2000).

Última unidade de paisagem aqui mencionada, mas não menos

importante são as Matas de Galeria. Essas se localizam na maioria das

vezes nos fundos dos vales, acompanhando os cursos de pequenos rios

e córregos (RIBEIRO e WALTER, 1998). Essas matas possuem uma

grande quantidade de usos dos recursos vegetais pelos grupos locais,

como remédios caseiros, material para construção, lenha e também como

área de lazer (PASA e ÁVILA, 2010).

A dissertação aqui apresentada teve como objetivo geral

caracterizar os principais aspectos socioeconômicos, culturais e

ambientais da Comunidade São Miguel, bem como classificar as

etnocategorias de uso dos recursos vegetais manejados pela população

nas diferentes unidades de paisagem. A estrutura da dissertação se

divide em duas seções. No capítulo 1, “Perfil social, econômico e cultural

na Comunidade Rural de São Miguel, Várzea Grande, Mato Grosso,

Brasil”, é ressaltado os principais aspectos socioeconômicos, culturais e

ambientais dessas famílias que sobrevivem da terra e na terra. O capítulo

2, “As unidades de paisagem na Comunidade Rural São Miguel, Várzea

Grande, Mato Grosso, Brasil”, destaca a importância do conhecimento

acumulado que essa comunidade possui sobre os espaços que ocupam

que pode ser transmitido ao longo das gerações.

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2. REVISÃO DE LITERATURA

2.1. Etnobotânica: um pouco de história e de conceitos

A Etnobotânica teve sua origem no final do século XIX,

constituindo uma ciência que combinava Botânica e a Antropologia

marcando sua característica interdisciplinar. Essa nomenclatura foi

designada pelo norte-americano J.W. Harshberger com a publicação, em

1896, do artigo The purposes of ethno-botany, no qual teve a

compreensão apenas do uso de plantas pelo homem considerado

“primitivo”1 (ALBUQUERQUE, 2002).

Do ponto de vista de Albuquerque (2005) a etnobotânica surge

do campo mais amplo da etnobiologia2, onde envolve as interações entre

os seres humanos e os componentes vegetais, animais e microbiológicos

do seu ambiente. Dessa forma, a etnobotânica almeja a busca de

conhecimento e resgate do saber botânico tradicional, ao uso dos

recursos da flora (PASA, 2011).

Sendo a etnobotânica uma vertente da etnobiologia é natural

que tenham sofrido a mesma influência. Clément (1998) divide a

etnobiologia em três fases de acordo com a história: O período Pré-

clássico iniciou-se final do ano de 1860, caracterizado por estudos

enfocados na coleta de informações sobre o uso de recursos; o Clássico

teve início por volta de 1954 e foi marcado por estudos da linguística e

para a categorização etnobiológica e o Pós-clássico se destaca pela

participação das populações nas pesquisas como fornecedoras de

informações ou material biológico.

Conforme as pesquisas em etnobiologia e etnobotânica foram

avançando, notou-se que o conceito que os pesquisadores davam para o

1 O autor intitulou primitivos as tribos de índios norte-americanos quando foram

realizados trabalhos com plantas. 2 A Etnobiologia origionou-se da Ecologia humana e da Antropologia Cognitiva, em

particular da Etnociência, que busca entender como o mundo é percebido, conhecido e classificado por diversas culturas humanas (ANDREOLI et al., 2014). Um dos objetivos da Etnobiologia é analisar a classificação das comunidades humanas sobre a natureza, em particular sobre os organismos, podendo contribuir para a conservação de recursos naturais (BEGOSSI, 1996).

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campo do conhecimento da etnobotânica, também sofreu avanços,

influenciados por sua formação acadêmica. Salientamos alguns

conceitos: Caballero (1979) intitula a etnobotânica como um campo

interdisciplinar que compreende o estudo e a interpretação do

conhecimento, significação cultural, manejo e usos tradicionais dos

elementos da flora. Xolocotzi (1983) definiu a etnobotânica como o campo

científico que estuda as inter-relações que se estabelecem entre o ser

humano e as plantas através do tempo e em diferentes ambientes. De um

modo simplificado, Ford (1986) intitulou como o estudo das inter-relações

diretas entre homens e plantas. Minge Amaral Junior (1995) ampliam

esses conceitos, envolvendo todos os aspectos da relação do ser humano

com as plantas em ordem concreta (uso material, conservação, uso

cultural, desuso) e aberta (símbolos de culto, folclore, tabus, plantas

sagradas).

Amorozo (1996) conceitua a etnobotânica como o estudo do

conhecimento e das conceituações desenvolvidas por diferentes grupos a

respeito do mundo vegetal, envolvendo tanto o modo como o grupo social

rotula as plantas, como os usos que dá a elas.

Para Alexiades (1996), Fonseca-kruel e Peixoto (2004) a

etnobotânica é o estudo das sociedades humanas, passadas e presentes,

e suas interações ecológicas, genéticas, evolutivas, simbólicas e culturais

com as plantas. Albuquerque (2005) entende a etnobotânica como o

estudo da inter-relação direta entre pessoas de culturas viventes e as

plantas do seu meio.

Minnis (2000) relata que mesmo as sociedades industriais e

pós-industriais não romperam sua ligação com as plantas, e que a

coadaptação entre pessoas e plantas vem sofrendo alterações com o

crescimento da urbanização e das economias internacionais.

Para Prance (1991) a participação de pesquisadores das áreas

da botânica, antropologia, ecologia, química, ambiental, engenharia

florestal e agronomia, permitem grandes avanços nas pesquisas

etnobotânicas, abordando de diversas maneiras a forma como o homem

interage com o meio em que vive. Logo, cada vez a etnobotânica vem

ganhando espaço, devido suas implicações ideológicas, biológicas,

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ecológicas e filosóficas que dão respaldo ao seu crescente progresso

metodológico e conceitual.

2.2. Importância dos estudos etnobotânicos

Os seres humanos em sua busca do desenvolvimento

econômico e do prazer das riquezas naturais se esqueceram de que os

recursos naturais são finitos e a capacidade dos ecossistemas é limitada.

Portanto, colocaram em risco diversos sistemas ambientais provocando

um processo de ameaça de desaparecimento de várias espécies de seres

vivos no planeta (TOWNSEND et al., 2006). Cresce então, o interesse

científico com relação ao conhecimento que essas populações detêm

sobre as plantas e seus usos (FARNSWORTH, 1988). Surge nesse

contexto, a ciência etnobotânica que estuda o aproveitamento dos

recursos naturais por parte das populações locais tanto nativas como

aquelas que residem em uma determinada região por muito tempo

(PASA, 2007b).

Diegues et al. (2000) salientam a importância da contribuição

que os estudos em etnobotânica têm apresentado na medida em que

procuram encontrar a lógica subjacente ao conhecimento humano do

mundo natural, as taxonomias e as classificações totalizadoras. Para

esses autores conhecimento tradicional pode ser definido como “o saber e

o saber-fazer a respeito do mundo natural e sobrenatural gerados no

âmbito da sociedade não-urbana/industrial e transmitido oralmente de

geração a geração”.

Destacar a importância da Etnobotânica é fundamental a partir

do entendimento de que os saberes empíricos e as práticas de saber local

são ferramentas indissociáveis dos valores culturais de diferentes

formações sociais a assim constituindo recursos produtivos para a

conservação da natureza e autogestão dos recursos naturais (PASA,

2007a). As espécies são componentes de conhecimento, de

domesticação e uso, são poesias para mitos e rituais das populações

tradicionais (DIEGUES et al., 2000).

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A etnobotânica envolve os três fundamentais pilares do mundo

moderno: sociedade, economia e meio ambiente (PRANCE, 1995),

portanto sua participação é fundamental em qualquer projeto que envolva

recursos vegetais e populações humanas. Assim, a etnobotânica é um

conveniente instrumento para o desenvolvimento endógeno das culturas e

comunidades locais, para a conservação da diversidade biológica em

todos os seus componentes, tangíveis e intangíveis, em nível de habitats

e ecossistemas, germoplasma e conhecimentos (BERMEJO, 1996).

A ciência etnobotânica tende o contato direto com os grupos

locais, buscando uma aproximação e uma vivência que admitam

conquistar a confiança das mesmas, resgatando, portanto, todo o

conhecimento possível sobre a relação de afinidade entre o ser humano e

as plantas de uma comunidade (SANTOS et al., 1995; ALBUQUERQUE,

2005).

É notável a importância do resgaste e da preservação do

conhecimento ecológico tradicional nos dias atuais, já que esse

conhecimento é alcançado por experiência pessoal, transmitido muitas

vezes apenas de forma oral entre os grupos locais. Experiências estas,

adquiridas através da experiência diária e com grande potencial de trazer

alternativas à globalização (HUNN, 1999).

As propostas e os efeitos da etnobotânica possibilitam

conforme Albuquerque (2002) o descobrimento de substância de origem

vegetal com aproveitamento médicos e industriais; novas aplicações para

substâncias já utilizadas; estudo das drogas vegetais e seu efeito no

desempenho individual e coletivo dos usuários frente a determinados

estímulos culturais ou ambientais; reconhecimento e a preservação de

plantas potencialmente importantes em seus respectivos ecossistemas;

histórico do conhecimento tradicional e dos complexos sistemas de

manejo e conservação dos recursos naturais dos povos tradicionais;

agenciamento de programas para o desenvolvimento e preservação dos

recursos naturais dos ecossistemas tropicais e a descoberta de

importantes cultivares manipulados tradicionalmente.

Nos estudos etnobotânicos, nota-se uma posição de destaque

das plantas medicinais (PASA et al, 2005). Contudo, o conhecimento

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observado não se reduz aos recursos medicinais, mais também aos

recursos alimentícios, pesticidas, contraceptivos e outras formas de uso,

fornecendo, informações para evitar a destruição das florestas

(ALBUQUERQUE, 2002). A literatura conservacionista enfatiza que os

povos indígenas e as comunidades tradicionais3 possuem conhecimento

dos usos para quase todas as plantas da floresta e que esse é um

caminho para compreender como pode ser favorável a conservação das

florestas tropicais (PRANCE, 1991).

O conhecimento proveniente da cultura popular se torna

irrecuperável uma vez perdido, por isso Guarim Neto e Moraes (2003)

advertem que os recursos naturais, se extintos, não permanecerão

disponíveis às gerações futuras. Assim, o “Saber Local” está cada vez

mais atraindo a atenção de pesquisadores de distintas áreas (AMOROZO,

2002).

2.3. Estudo da etnobotânica no Brasil e no mundo

Na última década a pesquisa etnobotânica cresceu

visivelmente em muitas partes do mundo, em especial na América Latina

em países como o México, a Colômbia e o Brasil (HAMILTON et al.,

2003). Realizando um levantamento na Plataforma Lattes encontrou-se

1170 Currículos Lattes (CL) de pesquisadores relacionados à área de

Etnobotânica com doutorado, sendo 1126 apenas de nacionalidade

brasileira; 1769 CLs de pesquisadores relacionados à categoria da

referida Plataforma como “demais pesquisadores” (sem a titulação de

doutor).

Neste contexto, fica claro como estudos etnobotânicos são

necessários, sobretudo no Brasil, uma vez que o seu território abriga uma

3Conforme artigo 3

o inciso I do Decreto nº 6.040, de 7 de fevereiro de 2007, Povos e

Comunidades Tradicionais são “grupos culturalmente diferenciados e que se reconhecem como tais, que possuem formas próprias de organização social, que ocupam e usam territórios e recursos naturais como condição para sua reprodução cultural, social, religiosa, ancestral e econômica, utilizando conhecimentos, inovações e práticas gerados e transmitidos pela tradição”.

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das floras mais ricas do globo, da qual 99,6% são desconhecidas

químicamente (GOTLIEB et al.,1996).

No Brasil e em vários outros países, o grande número de

trabalhos etnobotânicos proporciona o conhecimento das espécies que

são empregadas, podendo servir como ferramenta para traçar estratégias

de utilização e conservação das espécies nativas e seus potenciais

(MING et al., 2000), já que percebemos uma forte pressão antrópica nos

ecossistemas levando à perda de extensas áreas verdes, da cultura e das

tradições das comunidades que habitam estas áreas, que dependem de

recursos do meio para sobreviver.

Estes fatores deixam clara a necessidade de prosseguir

desenvolvendo estudos sobre Etnobotânica no Brasil e a participação de

pesquisadores das áreas da botânica, antropologia, ecologia, química,

engenharia florestal e agronomia, possibilitam maiores progressos nas

pesquisas etnobotânicas, abordando de diferentes modos a forma como o

homem percebe, classifica e utiliza as plantas (PRANCE, 1991).

Pesquisadores em todo o mundo evidenciam a grande procura

por estes vegetais, não só por sua importância medicinal que apresenta

posição de destaque (PASA et al, 2005), mas também pelo potencial

madeireiro que algumas espécies apresentam (ALBUQUERQUE, 2002).

Conforme a região, temos um foco diferenciado nas pesquisas

etnobotânicas, que são influenciadas e direcionadas pela realidade local e

tipos de ecossistemas que abrangem (HAMILTON et al., 2003). Segundo

Martínez-Alfaro (1994) os assuntos mais pesquisados em estudos

etnobotânicos desenvolvidos em países da América Latina são: plantas

medicinais, domesticação e origem da agricultura, arqueobotânica,

plantas comestíveis, estudos etnobotânicos em geral, sistemas

agroflorestais e quintais, uso da floresta, estudos cognitivos, estudos

históricos, e pesquisas realizadas em mercados.

2.4. Estudo da etnobotânica em cerrado matogrossense

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O Cerrado é uma unidade ecológica típica da zona tropical,

distinto por uma vegetação de fisionomia e flora própria (PINTO, 1990). É

o segundo maior bioma brasileiro em extensão, com quase 200 milhões

de hectares, ou seja, cerca de 25% do território nacional (MMA, 2014).

Envolve os Estados de Goiás, Tocantins, parte dos Estados da Bahia,

Ceará, Maranhão, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Minas Gerais, Piauí,

Rondônia e São Paulo, bem como Estados do Amapá, Amazonas, Pará e

Roraima, e Estado do Paraná (RIBEIRO e WALTER, 1998).

Segundo Coutinho (2006) o Cerrado não é um bioma único,

mas um conjunto de biomas que origina um mosaico de grupos

ecologicamente ligados, desde campo limpo a cerradão.

Conforme Pires e Santos (2000) o Cerrado está incluso na

relação dos 17 ecossistemas mais degradados do planeta, sendo que

aproximadamente 80% do Cerrado já foram transformados pelo homem, e

apenas 19% dele corresponde a áreas-fragmento nas quais a vegetação

original ainda se encontra em bom estado. Toda essa transformação tem

levado à perda de material genético vegetal nativo, muitos até

desconhecido do ponto de vista científico (VIERA e MARTINS, 2000).

A flora nativa do Cerrado é considerada a mais rica dentre as

savanas do mundo, em estimava de sete mil espécies vegetais

(MENDONÇA et al., 1998) e pode ser aplicada originando opções de uso

e renda para os produtores rurais, sendo que muitas espécies se

sobressaem como alimentícias, medicinais, madeireiras, ornamentais,

entre outras (RONDON NETO et al., 2010). Embora toda essa riqueza de

usufrutos, boa parte da vegetação nativa do Cerrado foi substituída por

pastagens plantadas, monoculturas agrícolas e áreas de mineração,

ocasionando uma perda vultosa da fauna e da flora (RIBEIRO e

WALTER, 1998).

O cerrado no estado do Mato Grosso apresenta inúmeras

possibilidades de utilização dos seus recursos vegetais, e os grupos

locais são os principais e os primeiros conhecedores dessas informações

em relação à botânica já que utilizam desses recursos vegetais (GUARIM

NETO, 2001). Assim, o desenvolvimento de estudos que possibilitem

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constituir parâmetros científicos de utilização racional para a manutenção

dessa biodiversidade é de suma importância (XAVIER et al., 2011).

No Estado de Mato Grosso vários autores tem demostrado a

relação do ser humano com os recursos vegetais através das pesquisas

etnobotânicas em comunidades tradicionais, dentre os quais podemos

destacar: Amaral e Guarim Neto (2008), Pasa et al. (2008), Moreira e

Guarim Neto (2009), Valentini et al. (2009), Pasa e Ávila (2010), Rondon

Neto et al. (2010), Cruz et al. (2011), Pasa (2011), Carvalho et al. (2011),

Daher et al. (2012), Souza e Pasa (2013), De David et al. (2014), entre

tantos outros.

Várias espécies encontradas no cerrado tem seu destaque com

a utilização para remédios caseiros como, por exemplo, a quina

(Strychnos pseudoquina A. St.-Hil.), a arnica (Camarea ericoides A. St.-

Hil.), a mangava brava (Lafoensia pacari A. St.-Hil.), a negramina

(Siparuna guianensis Aubl.); tem aquelas usadas na alimentação como o

piqui (Caryocar brasiliense Cambess.), a mangaba (Hancornia speciosa

Gomes), o buriti (Mauritia flexuosa L.); não podemos esquecer das

espécies que a madeira é aproveitada, como o angico (Anadenanthera

falcata (Benth.) Speg.), o guatambu (Aspidosperma polyneuron Müll.

Arg.), o gonçaleiro (Astronium fraxinifolium Schott); logo, fica claro que

existem diversas espécies com inúmeras utilidades no cerrado.

Encontramos no cerrado também, espécies vegetais com

múltiplos usos como o cumbaru (Dipteryx alata Vogel) utilizado tanto na

alimentação dos grupos locais como também nos remédios caseiros e na

construção; o paratudo (Tabebuia aurea(Silva Manso) Benth. & Hook. f.

ex S. Moore) que além de embelezar o local em que se encontra também

oferece madeira e ajuda nas enfermidades. Deste mesmo modo,

encontramos a pata de vaca (Bauhinia glabra Benth.),a mamica de porca

(Zanthoxylum rhoifolium Lam.) e, o jatobá (Hymenaea stigonocarpa Mart.

ex Hayne).

Diante de tudo que foi explanado, percebemos que ainda há

necessidade de pesquisas voltadas para a identificação de plantas úteis

do cerrado contribuindo com as populações locais que usufruem desses

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espaços e oferecendo novos alimentos para contribuir no sustento e na

renda.

2.5. Unidades de paisagem

Ao trabalhar a área de pesquisa dentro de Unidades de

Paisagem antes se faz necessário tecer algumas considerações sobre o

termo paisagem. Para Bertrand (2004), a paisagem não é a simples

adição de elementos geográficos e sim o resultado da combinação

dinâmica, portanto instável, de elementos físicosbiológicos e antrópicos

que, reagindo dialeticamente uns sobre os outros, fazem da paisagem um

conjunto único e indissociável, em perpétua evolução. Em outras

palavras, podemos entender o conceito ou unidade paisagem como o

resultado de uma ação relacionada com elementos naturais que a

compõem, como litologia, solos, formas de relevo, vegetação (FÁVERO et

al., 2007) e uma atuação constante e diversificada pelo homem.

O conceito de paisagem está ligado a uma das necessidades

básicas do planejamento ambiental, que é o entendimento das ações

culturais e das formas específicas de manejo dos recursos naturais

(SILVA e SANTOS, 2004).

2.5.1. Cerrado

O cerrado é considerado um hotspots4, tem uma ampla área

com uma biodiversidade muito grande, porém carecendo de preservação,

por estar ameaçado (MYERS et. al., 2000). O cerrado possui a mais rica

flora dentre as savanas do mundo além de apresentar uma riqueza em

aves, peixes, anfíbios, répteis, entre outros (KLINK e MACHADO, 2005).

O fato de o Cerrado ter sido considerado, “quer pela opinião

pública quer pelos ecologistas, como a “prima pobre” dos biomas”

4A definição de hotspot foi criado em 1988 pelo ecólogo inglês Norman Myerscom o

objetivo de descobrir quais as áreas mais importantes para preservar a biodiversidade na Terra. Hotspot é, portanto, toda área prioritária para conservação, isto é, de rica biodiversidade e ameaçada no mais alto grau.

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(SOUZA, 2012), fez com ele sofresse diversas modificações ao longo dos

anos pela ação dos homens, como por exemplo, o uso do fogo no manejo

das pastagens. Essa prática foi com certeza uma das formas de rápida

transformação do Cerrado, apesar do cerrado ser um ambiente adaptado

ao fogo, ocasionando o desaparecimento de espécies vegetais e animais

e provocando a erosão dos solos. Além das queimadas, grande parte da

vegetação nativa do Cerrado foi substituída por pastagens plantadas,

monoculturas agrícolas e áreas de mineração (RIBEIRO e WALTER,

1998).

O Cerrado possui variações em suas características, sendo

perceptíveis pelas suas fisionomias, variando desde as matas ciliares,

matas de galerias até os palmeirais. Ribeiro e Walter (2008), Bastos e

Ferreira (2010), apresentam uma classificação fitofisionômica para o

Cerrado, dividida em três formações paisagísticas:

Formações Florestais: No Cerrado, existem as seguintes formações

florestais:

Mata Seca: formações florestais que não possuem associação

com cursos de água, caracterizadas por diversos níveis de

caducifólia durante a estação seca.

Mata Ciliar: vegetação florestal que acompanha os rios de

médio porte da Região do Cerrado, em que a vegetação

arbórea não forma galerias.

Mata de Galeria: vegetação florestal que acompanha os rios de

pequeno porte ecórregos dos planaltos do Brasil Central,

formando corredores fechados (galerias) sobre o curso d’água.

Cerradão: O Cerradão é a formação florestal do bioma Cerrado

com características esclerofilas, motivo pelo qual é incluído no

limite mais alto o conceito de Cerrado sentido amplo.

Formações Savânicas: as Formações Savânicas do Cerrado englobam

quatro tipos fitofisionômicos principais: o Cerrado sentido restrito, o

Parque de Cerrado, o Palmeiral e a Vereda.

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Cerrado sentido restrito: caracteriza-se pela presença de

árvores baixas, inclinadas, tortuosas, com ramificações

irregulares e retorcidas, geralmente com evidências de

queimadas. Os arbustos e subarbustos encontram-se

espalhados, com algumas espécies apresentando órgãos

subterrâneos perenes (Xilopódeos), que permite a rebrota após

a queima ou corte.

Parque de Cerrado: formação savânica caracterizada pela

presença de árvores agrupadas em pequenas elevações do

terreno, algumas vezes imperceptíveis e outras com muito

destaque, que são conhecidas como “murundus” ou

“monchões”.

Palmeiral: diferenciadadas outras fisionomias pela presença

única de espécie de palmeira arbórea. Nesta fitofisionomia

praticamente não há destaque das árvores dicotiledôneas,

embora elas possam ocorrer com frequência.

Vereda: caracterizada pela presença da espécie Mauritia

flexuosa (Buriti) em meio a grupamentos mais ou menos

densos de espécies arbustivo-herbáceas. Essa formação se

distingue dos Buritizais por não formar dossel.

A grande riqueza de espécies no Cerrado tornam essas áreas

como espaços únicos e insubstituíveis, o que remete a necessidade de

grandes esforços para preservá-la.

2.5.2. Quintal

Os quintais são ambientes de grande valia para o sustento

humano desde o período neolítico, onde os homens abandonaram o ato

de colher os alimentos apenas da natureza e começaram a realizar cultivo

de hortas e domesticação de animais (NASCIMENTO et al., 2005).

Esse sistema integrado de produção agrícola pode ser

representado pelos quintais agroflorestais (CASTRO, 1995; MACEDO,

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2000), uma área de produção distribuída perto da casa, de fácil acesso,

onde são cultivadas espécies agrícolas e florestais, além da criação de

pequenos animais domésticos (WIERSUM, 1982; NAIR, 1993), através de

manejos concebidos e executados de maneira harmoniosa (KUMAR e

NAIR, 2004) que fornece uma renda extra para família e oferece uma

fonte de recursos alimentícios e medicinais (PASA et al., 2005).

Além da população manter uma baixa dependência de

produtos adquiridos externamente, causa impactos mínimos sobre o

ambiente, conserva os recursos vegetais e a riqueza cultural (PASA,

2004).

Os quintais são caracterizados pela elevada diversidade de

espécies (FERNANDES e NAIR,1986; COOMES e BAN, 2004), com

diferentes ciclos biológicos, o que garante uma oferta diversificada de

produtos durante todo o ano (TORQUEBIAU, 1992) formando uma

importante fonte para a alimentação familiar (NAIR, 1993).

O conhecimento sobre as plantas de múltiplo uso pelas

populações tradicionais é norteado por uma série de informações obtidas

através da relação direta dos membros da comunidade com o

ecossistema, e a difusão desses saberes é feita através da tradição oral

(MOREIRA et al., 2002). Tais experiências constituem-se em uma fonte

relevante para estudos etnoecológicos, farmacológicos, fitoquímicos e

agronômicos (AMOROZO, 1996).

Segundo Amorozo (2007) as áreas de cultivo domiciliar são

espaços de suma importância para a conservação das tradições locais e

para a segurança alimentar global, já que são ambientes sociais e

culturais. O quintal preserva parte da história cultural local (DUQUE-

BRASIL et al., 2007) e fortalece os vínculos sociais da comunidade por

meio da utilização do espaço para atividades sociais, como rezas, festas

e lazer (PASA, 2004).

Para Souza (2007) este saber tradicional local é “de caráter

coletivo e acumulativo [...] fruto de um processo constante de

experimentação científica e de adaptação aos ecossistemas, os quais são

transmitidos e melhorados de geração em geração”.

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Os quintais proporcionam o abrigo e o resgate do

conhecimento que um determinado grupo social detém sobre o uso dos

recursos naturais, nas diferentes culturas (PASA et al., 2005). Embora

esse sistema de produção de múltiplas espécies tenha provido e

sustentado milhões de pessoas economicamente, pouca atenção

científica tem sido destinada ao assunto (AMARAL e GUARIM NETO,

2008).

Normalmente, os quintais localizam-se na parte detrás da

residência, com tamanho adequado à demanda familiar, compostos por

uma variedade de espécies, e oferecem uma cobertura vegetal

diversificada sobre o solo (PASA et al, 2005). Quase sempre esses

espaços são manuseados pelas mulheres, que garantem dessa forma

uma dieta saudável a sua família (OAKLEY, 2004).

Para Holthe (2003) o ambiente quintal vai além de um

ambiente de produção agrícola e pomares, pode ser uma zona de

serviços como: cozinhas externas, lavagem de roupas ou de utensílios

domésticos, cobertura de poços e cisternas, oficinas improvisadas, casas

de banho (ou banheiros), dependências para empregados, as cocheiras e

estrebarias, etc.

2.5.3. Roça

As “roças” são espaços de pequena extensão de terra, onde os

produtores adotam procedimentos de baixo impacto; quase não se utiliza

insumos químicos sintéticos e apresentam uma alta diversidade de

espécies e variedades (CARDOSO, 2008). Conforme Pasa et al. (2005) a

roça é uma unidade de paisagem que fundamentalmente é destinada

para a produção agrícola, na maioria das vezes encontradas no interior da

vegetação natural. No Cerrado ocorre especialmente com a derrubada

das matas de galeria ou nas bordas dos campos cerrado que limitam com

as matas, cujo objetivo principal é de subsistência familiar.

A roça consolida um sistema produtivo altamente complicado e

aprimorado, que carece de um vasto conhecimento e práticas agrícolas

locais para sua manutenção (WARNER, 1991), e, pode ser compreendido

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também como um espaço arquitetado através de significados culturais

(EMPERAIRE e PERONI, 2007).

O agricultor quando modifica a paisagem para implantação da

roça não está apenas construindo um espaço agrícola, mas também

aumentando a riqueza de plantas cultivadas com as quais se relacionará,

havendo assim, a domesticação conjunta da paisagem e de várias

espécies de plantas úteis (CLEMENT, 1998).

2.5.4. Matas de Galeria

No bioma Cerrado existe um tipo de formação florestal,

designado "mata de galeria". As matas de galerias localizam-se

geralmente nos fundos dos vales, seguindo os cursos de pequenos rios e

córregos (RIBEIRO e WALTER, 1998; 2001), o que os diferenciam das

matas ciliares que acompanham os rios de médio e grande porte da

região do Cerrado, em que a vegetação arbórea não forma galerias

(RIBEIRO e WALTER, 2007).

As matas de galeria apresentam o ambiente de maior

complexidade estrutural do bioma Cerrado e são responsáveis pela

proteção e manutenção da água, fator essencial para todas as espécies

vivas (FELFILI et al., 2000). Além dessa função ecológica importantíssima

para manutenção das espécies, essas matas possuem um grande

número de usos dos recursos vegetais pelos grupos locais, que desfrutam

através do extrativismo vegetal, caça e pesca, remédios, material para

construção, lenha e também como área de lazer (PASA e ÁVILA, 2010;

PASA, 2011).

As matas de galeria podem ser influenciadas por diferentes

florações, provenientes de formas e tipos de vegetação distintos, que

produzem modificações locais provindas do clima, da latitude e dos

fatores edáficos (SAMPAIO et al., 2000). Para Ribeiro (1998) essa

formação vegetal apresenta espécies adaptadas, tolerantes ou

indiferentes a solos encharcados e ou sujeitos a inundações temporárias.

Kageyama et al. (1989) complementam informando que a mata de galeria

inclui determinadas espécies vegetais exclusivas e se constitui em

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importante habitat para animais e expressiva fonte de alimentos para os

peixes.

Conforme as características ambientais como a topografia e

variações na altura do lençol freático ao longo do ano, a Mata de Galeria

pode ser dividida em dois subtipos: Mata de Galeria não Inundável e Mata

de Galeria Inundável. A mata de galeria não inundável acontece em solos

bem drenados e possui em torno de 100 a 200 espécies lenhosas com

diâmetro igual ou superior a 5 cm; já a mata de galeria inundável é

caracterizada por drenagem deficiente com estrato arbóreo composto por

poucas espécies que podem atingir até 20 m de altura (FELFILI et al.,

2000).

Segundo Felfili et al. (2000) existem espécies que podem ser

localizadas tanto na Mata de Galeria não Inundável quanto na Mata de

Galeria Inundável como: Protium heptaphyllum (breu), Scheffler

morototoni (morototó), Tapirira guianensis (pau-pombo, pombeiro),Virola

sebifera (virola) e Psychotria carthagenensis (erva-de-gralha).

Embora possua uma marcante área de distribuição, as

florestas de galeria cobrem uma superfície proporcionalmente pequena

devida ao avanço acelerado da fronteira agrícola e urbana na região dos

cerrados (FELFILI et al., 2000). Assim fica claro que a recuperação

dessas matas suprimidas é uma das maiores preocupações dos dias

atuais.

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CAPÍTULO 1

PERFIL SOCIAL, ECONÔMICO E CULTURAL NA COMUNIDADE RURAL DE SÃO MIGUEL, VÁRZEA GRANDE, MATO GROSSO,

BRASIL

RESUMO

As famílias esforçam-se sobremaneira para viverem na terra e da terra, caminhando por uma travessia que faz das relações sociais, desafios permanentes. O presente estudo teve como objetivo caracterizar os principais aspectos socioeconômicos, culturais e ambientais dos moradores da Comunidade São Miguel, Várzea Grande-MT. Aplicou-se um pré-teste para escolher e avaliar as técnicas a serem utilizadas junto à população local para melhor ajustamento às finalidades da pesquisa. A coleta de informações consistiu na aplicação de entrevistas semiestruturadas com perguntas fechadas e abertas, e observação direta. No total foram entrevistados 46 moradores, sendo 63% do gênero feminino e 37% do gênero masculino. A média de idade entre as mulheres é de 50 anos, e entre os homens de 60 anos. A maior parte dos entrevistados é natural do estado de Mato Grosso (52%). Quanto à escolaridade, 46% não concluíram o ensino fundamental, 17% concluíram o ensino médio, 13% não são escolarizados, 11% não concluíram o ensino médio, 6,5% concluíram o ensino fundamental e o ensino superior (cada um). Grande parte das mulheres são donas-de-casa (44,8%) e os homens agricultores (82,3%). A casa de alvenaria foi o tipo de moradia mais encontrado na comunidade (95,6%). Todos os entrevistados informaram possuir energia elétrica na propriedade. Abastecimento de água para o consumo humano é obtido através de poços artesianos (75%), poços manuais (15%) e diretamente do rio (10%). Para atendimento médico a população aguarda o agendamento das datas pelo agente da saúde. Em todas as propriedades é realizada a associação entre o gás de cozinha e a lenha. A agricultura em pequena escala é a principal atividade encontrada na região, onde grande parte planta apenas para o consumo familiar (72%). A mandioca é o cultivo principal. Entre os animais que prejudicam o desenvolvimento das plantas e os cultivos, destacam-se as formigas cortadeiras. A produção de queijo, requeijão, doce de leite, rapadura de cana-de-açúcar e doces de frutas ajudam na renda das famílias. É através da Associação que os proprietários conseguem equipamentos agrícolas quando necessário. Conclui-se que é necessário o desenvolvimento de ações e de um conjunto de inovações técnicas, econômicas e sociais para evitar a migração da população local. Palavras-chave: Agricultura Familiar; Êxodo rural; Meio Rural.

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CHAPTER 1

PROFILE SOCIAL, ECONOMIC AND CULTURAL IN RURAL COMMUNITY OF SÃO MIGUEL, VÁRZEA GRANDE, MATO GROSSO,

BRAZIL

ABSTRACT

Families struggle greatly to live on earth and earth, walking along a passage that makes social relations, ongoing challenges. This study aimed to characterize the main socioeconomic, cultural and environmental aspects of the residents of São Miguel Community, Lowland Grande-MT. Applied a pretest to choose and evaluate techniques to be used by the local population to better adjustment to research purposes. Data collection consisted of the application of semi-structured interviews with open and closed questions, and direct observation. In total we interviewed 46 residents, 63% female and 37% male. The average age for women is 50 years, and among men 60 years. Most of the respondents were born in the state of Mato Grosso (52%). As for education, 46% had not finished elementary school, 17% completed high school, 13% are not in school, 11% have not completed high school, 6.5% completed primary school and higher education (each). Most women are stay-at-home (44.8%) and men farmers (82.3%). The brick house was the type of property most commonly found in the community (95.6%). All respondents reported having electricity on the property. Water supply for human consumption is obtained through boreholes (75%), hand-dug wells (15%) and directly from the river (10%). For medical care to the population awaits the schedule of dates for the health agent. In all properties the association between cooking gas and wood burning is performed. The small-scale farming is the main activity found in the region, where most only plant for household consumption (72%). Cassava is the main crop. Among the animals that affect the growth of plants and crops, the highlights are the ants. The production of cheese, cottage cheese, fresh milk, brown sugar cane-sugar and sweet fruits help in family income. It is through the Association that the owners can farm equipment when necessary. It is concluded that the development of actions and a set of technical innovations, economic and social is necessary to prevent the migration of the local population. Keywords: Family Farming; Rural exodus; Rural.

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1. INTRODUÇÃO

Uma população pode ser caracterizada por costumes e

culturas locais, de acordo com os recursos ali ofertados, e então

reconhecida e diferenciada por outras populações (AMARANTE, 2011).

Os agricultores familiares são diferenciados de outras

populações por conhecerem de modo especial e detalhado a terra, as

plantas e os animais que são seus, e que, por esta razão, sente-se

comprometido com o respeito e a preservação da natureza, possuindo “o

afeto da terra” (BRANDÃO, 1999).

O meio rural é um espaço em transformação, em reconstrução

socioespacial e ambiental, onde a população busca novas atividades

produtivas de desenvolvimento (PORTUGUEZ et al., 2012). A criação dos

assentamentos transforma uma área antes homogênea em um mosaico

habitado por muitas famílias.

Desta forma, a implantação dos assentamentos rurais

possibilita o desenvolvimento de uma agricultura de base familiar que vai

além do produtivismo que orienta a agricultura, e que é capaz de

desempenhar múltiplas funções sociais.

A partir deste entendimento, o objeto deste trabalho foi a

Comunidade São Miguel, localizada na zona rural de Várzea Grande

(MT). Para conhecer melhor a dinâmica socioeconômica dessas famílias,

este estudo objetivou caracterizar os principais aspectos

socioeconômicos, culturais e ambientais dessa comunidade.

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2. METODOLOGIA

2.1. Área de Estudo

A pesquisa foi desenvolvida na Comunidade São Miguel,

localizada na zona rural do município de Várzea Grande/MT, cujas

coordenadas geográficas são 15°30’22”S e 56°26’54”W (Figura 1).

O município de Várzea Grande, designada pelo Projeto

Radambrasil (1982) como uma região da Depressão Cuiabana, possui

extensão territorial de 949,53 km2, está localizado no Estado de Mato

Grosso, fazendo limites com as cidades de Cuiabá, Acorizal, Jangada,

Santo Antônio do Leverger e Nossa Senhora do Livramento.

Segundo a classificação de Köppen o clima da região é

caracterizado como tropical semiúmido (Aw), com precipitação

pluviométrica anual de 1.350 mm. A temperatura média anual é de 26ºC.

A umidade relativa do ar com a média anual em torno de 74%

(VERTRAG, 2007). Solo predominantemente de argila avermelhada,

principalmente na faixa marginal do Rio Cuiabá. A vegetação é composta

por savana arbórea aberta (cerrado), capoeira e mata ciliar (ROMANCINI

e MOURA, 2012).

FIGURA 1: Localização da Comunidade São Miguel. Várzea Grande-MT. Brasil. 2014. Fonte: Google Earth modificado pelas autoras.

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A Comunidade São Miguel foi criada em 12 de fevereiro de

1998 pela Superintendência Regional do Instituto Nacional de

Colonização e Reforma Agrária – INCRA, através do Projeto de

Assentamento Sadia III São Miguel.

A comunidade, com 151 famílias, possui uma área total de

4.271 hectares, sendo que cada propriedade possui de 25 a 43 hectares

de terra. A cada proprietário o Incra disponibilizou todo material

necessário para construção das casas de 40 m2, como cimento, tijolos,

telhas, pisos, entre outros.

Além desse lote de terra o proprietário possui também um lote

na vila de 20 x 30 metros. A construção de casa nesse espaço é por

conta do proprietário.

A vila é como um centro urbano, onde localizamos uma Escola

Municipal, uma Igreja Católica, uma Igreja Evangélica, dois mercados,

dois bares, uma borracharia e uma oficina de carro.

O acesso à comunidade se dá através da BR 163, de Várzea

Grande em direção à cidade de Jangada. Há meio de transporte público

que dá acesso aos moradores da comunidade para aos municípios de

Várzea Grande e Cuiabá, sendo o preço da passagem de R$ 16,005. O

ônibus saí da comunidade as 7:00 h e volta as 14:00 h, de segunda a

sábado.

A região de estudo está distante cerca de 44 km do centro de

Várzea Grande e 62 km de Cuiabá, onde podem ser encontrados

hospitais com serviço de emergência. O tempo gasto para chegar a

comunidadede é de, aproximadamente, uma hora e meia de carro e três

de ônibus.

A Escola Municipal intitulada como Advogado Osmar Milan

Capile funciona em três turnos: matutino, vespertino e noturno, com

ensino regular de educação infantil e ensino fundamental, além da

educação de jovens e adultos - EJA. Existe transporte escolar para os

moradores.

5Valor referente ao ano de 2014.

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Os recursos médicos são oferecidos pelo Posto de Saúde

Familiar – PSF, com atendimento de sistema de consulta agendada em

uma sala disponibilizada na escola local. Em casos de urgência e

emergência as pessoas recorrem aos hospitais ou postos de saúde do

município e das cidades vizinhas.

2.2. Proposta Metodológica

Os trabalhos de campo foram realizados entre março de 2013

a abril de 2014. Inicialmente, aplicou-se um pré-teste através de

entrevistas semiestruturadas com alguns dos moradores com o objetivo

de adaptar as ferramentas metodológicas que foram entrevistas

semiestruturadas, registro das falas e observação direta. Para Pasa et al.

(2013),o pré-teste serve para escolher e avaliar as técnicas a serem

utilizadas junto à população local, e ajustar aos intuitos da pesquisa.

A coleta de informações consistiu na aplicação de entrevistas

semiestruturadas (MINAYO, 1992) com perguntas fechadas e abertas, e

observação direta, abordando a história da comunidade relatada pelos

entrevistados. Essa técnica permite momentos na realidade da

comunidade através da convivência com os membros do grupo e da

interação em suas atividades diárias, reconhecendo o estilo de vida,

ideias e motivações dos membros da pesquisa (AMOROZO e VIERTLER,

2010).

O registro das falas e informações dos atores sociais que

participaram da investigação foi registrado em um diário de campo, além

de fotografias e gravações que permitiram ampliar a quantidade de dados

coletados. Essas técnicas permitiram verificar as seguintes informações:

Dados dos entrevistados a partir das informações referentes a

sexo, idade, escolaridade, religião, estado civil, composição do

grupo familiar, alimentação, tempo de residência e origem.

Estrutura física dos domicílios a partir das informações referentes

ao tipo do domicílio, saneamento (abastecimento de água e esgoto

sanitário), destinação de resíduos sólidos, energia elétrica, serviço

de correio e forma de comunicação com outros grupos sociais.

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Características da saúde a partir das informações referentes às

doenças mais comuns, forma de tratamento, uso de plantas

medicinais, origem e repasse do conhecimento de uso de plantas

medicinais, local de coleta das plantas medicinais.

Perfil econômico a partir das informações referente à profissão,

atividade extra, contato com meio urbano.

Características da organização social referente à associação ou

sindicato, eventos culturais.

As entrevistas foram realizadas com uma amostra de 46

entrevistados, conduzidas na residência dos próprios entrevistados e

ocorreram, com uma pessoa da família que estivesse no local e que

possuia informações a respeito daquele grupo familiar independente do

sexo, desde que fosse maior de 18 anos. Qualquer pessoa de uma

sociedade que tenha vivência maior nos tratos da terra, segundo Amoro

(1996) pode se constituir em um informante válido.

Para que os entrevistados não fossem influenciados por

terceiros a coleta de informação foi realizada apenas entre pesquisador e

o entrevistado. Segundo Albuquerque et al. (2010), a presença de uma

terceira pessoa durante a entrevista pode ocasionar alterações nas

respostas dos entrevistados.

Os entrevistados foram informados a respeito dos objetivos do

estudo e os que aceitaram participar da pesquisa assinaram o Termo de

Consentimento Livre e Esclarecido autorizando a realização da pesquisa.

Portanto, quanto aos aspectos éticos o presente estudo satisfaz às

diretrizes da Resolução Nº 196, de 10 de outubro de 1996, conforme a

qual os participantes devem ser informados dos objetivos do trabalho,

consultados sobre a disponibilidade em participar do estudo de forma

voluntária e assegurado do sigilo das informações individuais.

A análise dos dados foi alcançada através dos resultados

obtidos na observação direta e na escuta, suscitados pelas transcrições

das entrevistas, anotações de campo, fotografias e gravações. Para

Minayo (1994), a pesquisa qualitativa aborda um estado de realidade que

não pode ser quantificado, obedecendo ao “universo de significados,

motivos, aspirações, crenças, valores e atitudes”.

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3. RESULTADOS E DISCUSSÃO

3.1. Dados dos entrevistados

No total foram entrevistados 46 moradores, sendo 29 mulheres

e 17 homens. O fato de se encontrar mais mulheres do que homens nas

entrevistas se devem ao fato que as mulheres, grande parte, são donas

de casas, que se dedicam aos cuidados da casa e dos filhos.

Da população entrevistada, 39% apresentam idade acima de

60 anos, demostrando o envelhecimento da população nas comunidades

rurais, o que pode acarretar futuramente numa diminuição na produção

agrícola. Isso aliado ao êxodo rural, principalmente de jovens que vão

para a cidade estudar e trabalhar, acabam enfraquecendo a mão-de-obra

familiar.

No que se refere à ocupação das mulheres, o maior percentual

é de donas de casa com 44,8%, já para os homens de agricultores com

82,3% (Figura 2). A maioria das mulheres se intitula exclusivamente

donas de casa, mas trabalha na lavoura igualmente aos homens. Brumer

(2004) analisa que a divisão do trabalho por sexo na agricultura permite

que as mulheres ocupem uma posição subordinada e seu trabalho

comumente surge como ‘ajuda’, até quando elas trabalham tanto quanto

os homens ou executam as mesmas atividades que eles.

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FIGURA 2: Atividades exercidas pelos entrevistados da Comunidade São Miguel. Várzea Grande-MT. Brasil. 2014. Fonte: Autores. Observação: TDEE = Técnico em Desenvolvimento Educacional Especializado.

Quanto à naturalidade, 52% dos entrevistados são naturais do

Estado de Mato Grosso. O restante (48%) vem de outros estados como

Minas Gerais (9%), Góias (9%), Bahia (6%), Rondônia (6%), Pernambuco

(4%), Paraná (4%), Sergipe, Mato Grosso do Sul, Maranhão, Ceará e

Alagoas (2% cada um) (Figura 3).

FIGURA 3: Naturalidade dos entrevistados da Comunidade São Miguel. Várzea Grande-MT. Brasil. 2014. Fonte: Autores.

A migração em determinadas comunidades é decorrente da

precariedade das condições locais, desemprego rural, a diferença de

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salário entre o campo e a cidade, maior infraestrutura de serviços públicos

na cidade (SILVA, 2007), assim como a influência exercida pelos meios

de comunicação de massa, criando as ilusões da vida dos grandes

centros influenciando nos hábitos dos mais jovens.

Todavia, essa migração provoca a miscigenação de

trabalhadores em outras áreas, levando consigo a cultura e hábitos

diferenciados. Podemos observar essa situação no trabalho realizado por

Vilpoux e Oliveira (2011) no Mato Grosso Sul, que relataram a dificuldade

de cooperação entre os produtores de regiões diferentes.

Em relação à escolaridade, 46% dos entrevistados não

concluíram o ensino fundamental e 13% não são escolarizados (Tabela

1). Conforme relato dos entrevistados sem escolaridade, quando crianças

já ajudavam os pais nos afazeres do trabalho no campo, não tendo assim

a oportunidade de estudar, além da dificuldade de acesso à escola há

algumas décadas atrás. Para Amorozo (2002), quem se acostuma a

plantar, dificilmente deixa de exercer tal atividade, até quando migra para

áreas urbanizadas.

TABELA 1: Nível de escolaridade por faixa etária e sexo da Comunidade São Miguel. Várzea Grande-MT. Brasil. 2014. Fonte: Autores.

Nível de escolaridade Adultos

FA FR (%) M F

Não escolarizado 2 4 6 13

Ensino Fundamental Completo 0 3 3 6,5

Ensino Fundamental Incompleto 11 10 21 46

Ensino Médio Completo 3 5 8 17

Ensino Médio Incompleto 1 4 5 11

Superior 0 3 3 6,5

Total 17 29 46 100

Legenda: M = masculino; F = feminino; FA = frequência absoluta; FR = frequência relativa.

Com relação à religião, 65% dos moradores declararam serem

católicos, 33% evangélicos e 2% confirmaram não ter religião. A religião

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conforme Oliveira e Pasa (2013) está diretamente relacionada ao fato de

uma população possuir ou não conhecimento do uso das plantas, uma

vez que em certas doutrinas religiosas, o ato de fazer uso da medicina

popular é um desrespeito.

Para o estado civil, 74% são casados, 13% solteiros e viúvos.

Para Freitas et al. (2012) a condição de casado pode estar relacionado

com maior conhecimento sobre uso de plantas, pois o nascimento dos

filhos propicia a busca de soluções imediatas para o tratamento de muitas

doenças.

Os aposentados somam 26% dos entrevistados. Os

trabalhadores rurais tem direito a aposentadoria por idade a partir dos 60

anos para os homens e de 55 anos para as mulheres, como está

regulamentado no Decreto 3048/99 (arts. 51 a 55). Todavia, deve ser

cumprida a carência exigida que nesse caso é comprovada através do

exercício de atividade rural no mesmo número de meses correspondente

ao número de contribuições exigidas para a concessão do benefício.

A prova do tempo de serviço na atividade rural conforme artigo

62 do Decreto 3048/99 trata-se entre elas da declaração fundamentada

de sindicato que represente o trabalhador rural, comprovante de cadastro

do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária – INCRA, bloco

de notas do produtor rural, notas fiscais de entrada de mercadorias

emitidas pela empresa adquirente da produção, documentos fiscais

relativos à entrega de produção rural à cooperativa agrícola.

Conforme relato dos entrevistados, existe uma grande

dificuldade em obter a aposentadoria rural através do Ministério da

Previdência Social por causa da documentação solicitada para

comprovação da atividade rural, já que nem todos têm o hábito de

guardar nota fiscal de mercadorias. Assim, os proprietários que almejam a

aposentadoria recorrem aos serviços de um advogado.

Verificou-se que 85% das famílias são compostas de 2 a 4

pessoas no núcleo familiar. O número de filhos por família variou de 2 a 8.

Vale ressaltar que do total das famílias entrevistadas, 48% não possuem

nenhum filho na propriedade, pois estes vão para cidade em busca de

melhores condições de vida como educação, emprego, saúde. Outra

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ressalva a ser feita, é que algumas famílias são compostas apenas por

avós e netos (17%). Os avós acabam criando os seus netos, já que os

pais não possuem condições de sustentar ou cuidar das crianças na

cidade.

O maior tempo de moradia foi de 15 a 17 anos, conforme pode

ser visualizado na Figura 4. Para Fernandes (2011), a permanência da

população na zona rural agrega ao local a existência de uma identidade

social e cultural entre os agricultores. É na convivência que se estimula a

formação das instituições informais e os contatos entre vizinhos tendem a

estruturar a interação social.

FIGURA 4: Tempo de moradia dos entrevistados na Comunidade São Miguel. Várzea Grande-MT. Brasil. 2014. Fonte: Autores.

Quanto à criação de animais, tanto de pequeno quanto de

grande porte, 91% dos entrevistados criam algum tipo, como cachorro

(Canis lupus familiaris) - 89%, galinha (Gallus domesticus) - 74%, porco

(Sus domesticus) - 48%, gato (Felis silvestris catus) - 43%, gado (Bos

taurus) - 43%, cavalo (Equus caballus) - 15%, galinha d’ angola (Numida

galeata meleagris) - 6%, pato (Anas platyrhynchos)- 4%, peru (Meleagris

gallopavo) - 4% e periquito (Brotogeris tirica) - 2%. Vale ressaltar que

neste item os entrevistados podiam citar todos os animais encontrados na

propriedade.

A alimentação desses animais é bem variada, predominando o

uso do milho (Figura 5) que é oferecido tanto para galinhas como para os

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porcos, cavalos, patos. Grande parte do milho que alimenta esses

animais é proveniente da propriedade, onde após a colheita é

armazenada em um local designado de paiol pelos moradores. A compra

desse produto só acontece quando o armazenado acaba.

FIGURA 5: Produtos usados na alimentação dos animais na Comunidade São Miguel. Várzea Grande-MT. Brasil. 2014. Fonte: Autores.

Os moradores que não possuem meio de locomoção e assim,

contam com a colaboração do motorista do ônibus para entrega dos

insumos em sua propriedade. O proprietário realiza a compra no comércio

em Várzea Grande ou na vila local, entra em contato com o motorista e

avisa que tem mercadoria no “mercado tal”. O motorista passa no local

informado e retira o que foi avisado. A compra é despachada através do

ônibus quando o mesmo passa na frente das propriedades. Mercadorias

grandes, como saco de milho de 60 kg é cobrado R$ 3,00 cada saco para

levar.

Na realização do plantio dos cultivos alguns proprietários levam

em conta a fase da Lua, como, por exemplo, o plantio da mandioca

realizado na Lua Crescente e do milho na Lua Nova, sempre relacionado

ao aumento na produção, como podem ser observados nos relatos:

“Mandioca planta na lua crescente, a rama cresce muito. Na nova não

vinga” (RMJ, 68 anos). “Milho planta na Lua Nova, ele produz mais”

(ADSL, 66 anos).

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Para Rodrigues (1998) a influência da lua sobre a agricultura

vem do aproveitamento da luminosidade lunar. Conforme o autor, as

plantas que recebem mais luminosidade lunar na sua primeira fase de

vida tendem a brotar rapidamente aumentando o número de folhas e

flores, consequentemente possuem maior área para realizarem a

fotossíntese, que resulta o aumento da produtividade.

Conforme Schiedeck et al. (2007), a lua tem sido o assunto

mais recorrente nas manifestações dos conhecimentos relacionados

pelos agricultores familiares. Porém, Thun (2007) afirma que os efeitos

dos ritmos cósmicos extrapola a simples influência lunar, englobando a

influência dos planetas e constelações.

Existe crença até mesmo na retirada da madeira, sendo que

para alguns dos entrevistados não se deve retirar este material na Lua

Nova e sim na minguante, pois nessa época a madeira é mais vulnerável

ao ataque de carunchos. Na lua nova as fibras da madeira estão

carregadas com muita água e se retiradas nessa época secará com os

poros ainda abertos ficando assim propicio ao ataque de insetos

(RIVERA, 2005). Já na lua minguante, a durabilidade do material é maior,

resiste mais ao ataque de pragas, uma vez que a planta está menos

concentrada de seiva, dificultando a penetração de parasitas (RAS, 2008).

Ainda em relação à retirada da madeira existem aqueles que

acreditam também na influencia do mês do ano, já que não realizam essa

atividade no primeiro dia do mês de agosto, pois afirmam que a

probabilidade de cortar a perna é maior. Tal fato talvez esteja associado à

estigmatização referente ao mês de agosto considerado o mês do

"cachorro louco", e em consequência, o número de acidentes no referido

mês seja maior.

3.2. Estrutura física dos domicílios

A casa de alvenaria foi o tipo de moradia mais encontrado na

comunidade (96%), seguido da madeira e pau-a-pique (2% cada um). No

estudo realizado nos sítios em São Miguel-RN, a casa de alvenaria foi o

tipo mais encontrado também (FREITAS, 2009). Isso demostra que o tipo

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de residência vem modificando nas comunidades rurais ao longo dos

anos, onde as casas de madeira vem se transformando em casas de

alvenaria, provavelmente, porque as pessoas acreditam que as casas de

alvenaria são melhores ou mais confortáveis.

As casas de madeira e pau-a-pique (Figura 6) são oriundas de

um costume muito comum nas comunidades rurais, onde se partilha a

propriedade quando os filhos se casam e continuam no local. Estes sem

condições financeiras imediatas para construção de uma habitação de

alvenaria aproveitam os recursos disponíveis no local como a madeira

para construção de sua casa.

FIGURA 6: Tipos de moradia encontrada na Comunidade São Miguel. Várzea Grande-MT. Brasil. 2014. A: Alvenaria; B: Madeira; C: Pau-a-pique. Fonte: Autores.

A pequena propriedade é dominante na região, sendo que a

dimensão da área rural de cada família variou de 25 a 43 hectares. O

tamanho das propriedades está de acordo com a Lei 11.326 de 24 de

julho de 2006, que considera agricultor familiar e empreendedor familiar

rural aquele que pratica atividades no meio rural, que não detenha, a

qualquer título, área maior do que quatro módulos fiscais (unidade de

medida de área). Está de acordo também com a Lei 8.629 de 25 de

fevereiro de 1993, inciso II do artigo 4 (quatro), onde a pequena

propriedade é compreendida entre um a quatro módulos fiscais, sendo o

módulo fiscal do Município de Várzea Grande de 70 hectares.

Todas as 46 propriedades visitadas possuem fornecimento de

energia elétrica. As correspondências referentes à conta da energia

elétrica são depositadas por agente específico da companhia em uma

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caixa de papelão no mercado local, já que o serviço de correio não atende

o local.

Com o programa “Luz para Todos”, o último programa de

eletrificação rural ainda em vigência, até junho de 2013, 3.220.529

famílias receberam o fornecimento de energia elétrica (GÓMEZ e

SILVEIRA, 2010). A inclusão da energia elétrica nas casas proporciona

melhoria do bem-estar, e em comunidades tradicionais a inclusão

energética vai além do conforto, devendo promover um sistema de ações

propícias ao desenvolvimento local (GÓMEZ e SILVEIRA, 2010; ELS et

al., 2012).

No que se refere ao tipo de fogão utilizado nas residências,

constatou-se que 100% das moradias utilizam uma associação entre o

gás de cozinha e lenha. Quanto ao uso da vegetação, não há preferência

por espécies vegetais, sendo utilizadas aquelas que mais facilmente são

encontradas, geralmente as que já se encontram caídas. Do mesmo

modo Barros et al. (2014), pesquisando os aspectos socioeconômicos na

microbacia hidrográfica do riacho Val Paraíso – PB, verificaram que

67,6% dos entrevistados utilizam a associação de lenha e gás de cozinha

como fonte de energia para cozimento dos alimentos, fato que expressa a

etnocategoria combustível e a grande relavância para a etnobotânica.

O abastecimento das residências é obtido através de poços

artesianos (75%), poços manuais (15%) e diretamente do rio (10%).

Alguns moradores utilizam caixas d’água para coletar água na época da

chuva, obtendo assim mais um recurso para suprir as necessidades do

cotidiano (Figura 7).

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FIGURA 7: Sistema improvisado com caixa d’ água para coleta de água da chuva na Comunidade São Miguel. Várzea Grande-MT. Brasil. 2014. Fonte: Autores.

Na época da seca a disponibilidade de água é escassa para

aqueles que não possuem poços em sua propriedade. A dificuldade

enfrentada por causa da água para os moradores locais é expressa,

literalmente, por meio da fala dos entrevistados abaixo relatadas: “(...)

puxo água através de bomba colocada no rio. (...) Na seca peço água

para os vizinhos” (M. L. C., 44 anos). “(...) até uma semana atrás levava

água no balde nas costas até em casa” (A. M. C. 35 anos).

Conforme o parágrafo 1º do artigo 12 da Lei Federal nº 9.433,

de 8 de janeiro de 1997 e o parágrafo único do artigo 11 da Lei Estadual

nº 6.945 de 05 de novembro de 1997, os pequenos núcleos populacionais

rurais não necessitam de outorga de direito de uso da água, desde que

use esse bem público para suas necessidades.

Verificou-se que nenhuma propriedade é atendida por rede

pública de esgoto; 93% das residências pesquisadas possuem fossa

negra para destinação dos dejetos e 7% eliminam os dejetos livremente.

A Lei nº 11.445, de 05 de janeiro de 2007, no inciso IV do Art. 49, define

como um dos objetivos da Política Federal de Saneamento Básico,

proporcionar condições adequadas de salubridade ambiental às

populações rurais. Fica claro que as condições encontradas na

comunidade estão em desacordo com a Lei.

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Em todas as residências visitadas constatou-se que todos

separam o lixo seco do molhado, principalmente porque as famílias criam

pequenos animais (galinhas, gatos, patos) e acabam alimentando os

animais com resto de alimentos. O lixo seco, como as garrafas pet,

sacolas plásticas, papelão, papel higiênico, entre outros, é queimado.

Esses tipos de materiais podem ser transformados em novos produtos e o

reaproveitamento é uma alternativa para melhoria da qualidade ambiental,

além de mudanças nos hábitos da população com a redução do

desperdício.

Os moradores revelaram que quando recebem visitas em suas

casas solicitam aos amigos e/ou parentes que levem novamente para

cidade os resíduos desfrutados na propriedade, como fralda descartável,

latas e garrafas plásticas. Comportamento semelhante foi encontrado por

Vasconcelos (2004) em um remanescente quilombola do Vale da Ribeira

em São Paulo e por Freitas (2009) em uma comunidade no município de

São Miguel/RN.

A prática de queimar lixo é responsável pela grande poluição

do ar, do solo e das águas, que podem acarretar prejuízos à saúde

humana e ao meio ambiente.

O rádio foi o equipamento de comunicação encontrado em

todos os domicílios na região. É um elemento barato e possui maior

independência da energia elétrica, pois na ausência desta pode ser

alimentado por baterias automotivas. Em alguns casos é o único veículo

de informação para os agricultores. Para Fagotti (2012) este meio de

comunicação comporta uma proximidade maior com os ouvintes,

ponderando que o locutor fala abertamente com os espectadores

utilizando uma linguagem coletiva provocando sentimento de

“pertencimento” em quem ouve.

Apesar de ser o equipamento mais encontrado nas

propriedades, o seu uso está enfraquecendo com o tempo.

Provavelmente devido ao advento da energia elétrica a televisão vem

roubando a cena, como pode ser observado no relato de uns dos

moradores: “Antigamente, a gente chegava nas casas do vizinho de longe

a gente ouvia o rádio, agora nem escuta mais” (ASM, 62 anos).

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O sinal para telefone fixo ou móvel chega à região,

necessitando da instalação de uma antena específica para receber o

sinal, que foi encontrado em apenas sete residências. Por causa dessa

restrição existe uma grande colaboração entre os moradores que contam

com aqueles que possuem linhas telefônicas para receber recados dos

familiares e fazer ligações quando necessário.

3.3. Características da saúde

Dos entrevistados, 83% utilizam água do poço para beber, 10%

água do rio e 7% compram água mineral. De acordo com o relato dos

entrevistados, o principal tratamento empregado na água de beber é

adição de hipoclorito de sódio e filtragem da água em filtros domésticos

doados pelo Incra. Esses resultados são semelhantes aos encontrados

por Barros et al. (2013), onde 80% dos agricultores de Cajazeiras-PB

utilizam algum tipo de tratamento na água de beber. Segundo Tavares

(2009), o tratamento da água empregada pela família é essencial, uma

vez que o emprego de água sem tratamento prévio promove a veiculação

de doenças contagiosas transportadas por via hídrica.

Para atendimento médico a população aguarda o agendamento

das datas pelo agente da saúde que passa pelas residências avisando,

mas em caso de doenças mais graves procuram atendimento no hospital

do Município ou na cidade vizinha como Cuiabá.

As doenças mais simples são tratadas na própria comunidade

utilizando plantas consideradas medicinais encontradas na região através

de seus conhecimentos tradicionais que incorporado às influências

culturais servem para tratar de enfermidades (SOUZA e PASA, 2013).

Assim, a relação entre as doenças mais comuns e as espécies vegetais

indicadas para o tratamento destas doenças (Tabela 2) indica a

importância dos recursos vegetais para a sobrevivência dos moradores na

região que não possui condições financeiras para tratar da saúde.

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TABELA 2: Doenças mais comuns e a porcentagem de espécies vegetais indicadas para o tratamento pelos moradores da Comunidade São Miguel. Várzea Grande-MT. Brasil. 2014.

Doenças Porcentagem de espécies vegetais indicadas para o

tratamento (%)

Gripe, bronquite, pneumonia, tosse. 22,0

Azia, males do estômago, verminoses. 21,0

Pressão alterada, hemorroida, anemia. 14,0

Febre, infecção, antibiótico. 10,5

Dor de cabeça, estresse, nervosismo 8,5

Ferida, machucados, micoses. 7,0

Cólica menstrual, corrimento. 6,5

Conjuntivite, dengue, viroses. 6,0

Males dos rins, bexiga e cistite. 4,5

Fonte: Autores.

Esta relação com os recursos vegetais tem garantido que o

conhecimento das propriedades medicinas encontradas nas plantas,

assim como sua forma de coleta, preparo e uso, sejam repassados dos

pais para os filhos ao longo das gerações, constituindo vínculo entre os

moradores e os recursos florestais disponíveis na região. Fato constatado

através das entrevistas com os moradores, onde 34% informaram ter

aprendido a usar as plantas como remédio com os vizinhos, 28% com os

pais, 20% alegam ter apreendido com a mãe e18% com as avós.

O conhecimento e o uso a respeito das plantas medicinais são

maiores entre as pessoas idosas. Para De David e Pasa (2013) esse fato

evidencia forte relação cultural de uso da medicina popular na

comunidade. Segundo Medeiros et al. (2004), os meios de comunicação

atuais ocasionam a perda dessa transmissão verbal dos conhecimentos

sobre os usos das plantas.

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3.4. Perfil econômico

A forma de atividade importante para a reprodução do modo de

vida das famílias encontradas na região é a agricultura de pequena escala

ou podemos designar também agricultura de subsistência. Entre os

entrevistados, o número mínimo de explorações agrícolas é de dois

(mandioca e cana-de-açúcar) e o máximo 14 (feijão de corda, feijão andu,

milho, mandioca, banana, mamão, quiabo, abacaxi, limão galego, limão

rosa, batata doce, coentro, açafrão e cana-de-açúcar). A diversidade de

cultivos nas propriedades rurais proporciona ao pequeno produtor a

diversificação da produção e geração de outras fontes de alimento e

renda (FEITOSA et al., 2011).

Entre os produtos cultivados, a mandioca constitui o cultivo

principal (Tabela 3) caracterizado por ser sem fins lucrativos. Dados

semelhantes foram encontrados por Pasa (2007), quanto ao cultivo da

mandioca, em pesquisa de estudo etnobotânico na Comunidade de

Conceição-Açu no município de Cuiabá (MT).

TABELA 3: Espécies cultivadas na Comunidade São Miguel. Várzea Grande-MT. Brasil. 2014.

Cultivos Frequência (%)

Mandioca 67,0 Milho 43,5

Banana 43,5

Cana-de-açúcar 35,0

Abobora 35,0

Mamão 24,0

Quiabo 19,5

Limão galego 19,5

Abacaxi 17,5

Feijão de corda 17,5

Cebolinha 15,0

Alface 11,0

Couve 11,0

Laranja 11,0

Limão rosa 9,0

Pimenta malagueta 9,0

Fonte: Autores.

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Foi registrado ainda que o cultivo de pomares em quintais

complementam os recursos necessários para a sobrevivência destacando

cajus, mangas, limões, goiabas. Da produção agrícola e pomares 72%

são apenas para o consumo familiar (Figura 8) e 13%, além do próprio

consumo, também vendem para cooperativa e/ou para cidades vizinhas

e/ou para vila da comunidade. Aqueles que não cultivam nada em sua

propriedade (15%) informam ser devido à dificuldade de acesso a água, já

que nem todos tem poço na propriedade. Silva et al. (2014) estudando o

perfil socioeconômico dos agricultores nas unidades produtivas da

comunidade Moura no município de Bananeiras (PB) verificaram também

que a maior parte da produção (67%) é destinada ao consumo alimentar

da família.

FIGURA 8: Destino dado à produção agrícola familiar na Comunidade São Miguel. Várzea Grande-MT. Brasil. 2014. Fonte: Autores.

Outra observação interessante a ser feita é a de solidariedade

entre os moradores, onde mesmo os proprietários que plantam com a

finalidade de obter renda, compartilham com os amigos os alimentos

produzidos e dificilmente estes saem da propriedade de mãos vazias.

Entre os animais que prejudicam o desenvolvimento das

plantas e os cultivos, os proprietários citaram a formiga cortadeira (Atta

spp.), cigarrinha (Deois flavopicta), lagarta (Anticarsiasp.), cupim

(Coptotermes sp.), grilo (Gryllus assimilis), pulgão (Metopolophium

dirhodum), besouro (Oryctes sp.), galinha (Gallus domesticus), porco

(Gallus domesticus), gado (Bos taurus), rato (Rattus sp.), capivara

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(Hydrochoerus hydrochoeris), tucano (Ramphastos toco), periquito

(Brotogeris tirica) e veado (Cervus elaphus).

Apenas duas propriedades participam da Produção

Agroecológica Integrada e Sustentável – PAIS, onde receberam curso de

capacitação pelo Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas

Empresas – Sebrae. Todo o projeto é montado em forma de um círculo

em um terreno plano, próximo a um lençol d’água, energia, irrigação e

animais. O galinheiro fica no centro, ao redor fica a horta, ao lado ficam a

caixa d’água e o quintal agroecológico (Figura 9).

FIGURA 9: Modelo da Tecnologia Social PAIS na Comunidade São Miguel. Várzea Grande-MT. Brasil. 2014. Fonte: Autores.

A tecnologia social PAIS dispensa o uso de qualquer ação que

possa prejudicar o meio ambiente, como por exemplo, o emprego de

agrotóxicos, queimadas e desmatamentos. O projeto realiza o

agrupamento da criação de animais com a produção vegetal e também

aproveita insumos da propriedade (folhas, excremento de animais) em

todo o processo produtivo (PAIS, 2009).

Conforme relatos dos proprietários até o momento não

perceberam o benefício dessa tecnologia quando se trata no aumento da

produção e na renda. Nota-se ser um sistema bem diversificado de

cultivos, onde se encontra cebolinha, coentro, alface, berinjela, quiabo,

entre outros, muito próximos em um único ambiente, utilizados como

tempero na culinária local.

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A produção e o consumo de alimentos orgânicos originam

valores expressivos para a economia brasileira e para a saúde da

população, oferecendo uma forma de sustentabilidade social e econômica

da agricultura familiar (COELHO, 2001). As diversas formas de estimulo

na Agricultura Familiar são essenciais para manter as populações no

campo e diminuir a evasão para as cidades. Para Costa (1997), o papel

do Estado de instigar a noção de responsabilidade socioambiental na

população rural é essencial, pois garante o funcionamento de um sistema

de crédito agrícola, especialmente em sistemas que favoreçam o “Uso

Sustentável” mediante as chamadas “Agriculturas de Base Ecológica”.

Verificou-se que nenhum dos proprietários entrevistados possui

posse de máquinas agrícolas para o trabalho na lavoura, quando

necessário contratam o serviço dos equipamentos disponíveis na

associação.

Quanto ao processo de agregação de valor através do

processamento de matéria prima na propriedade, este ocorre

especialmente por meio da transformação do leite na produção de

queijos, requeijão, doce de leite; beneficiamento da rapadura de cana-de-

açúcar (Figura 10) e doces de frutas que variam conforme a época. Além

da venda da carne dos animais criados nas propriedades como galinha,

porco, gado, galinha d’angola, peru e pato.

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FIGURA 10: Moenda utilizada para moer cana-de-açúcar. Comunidade São Miguel. Várzea Grande-MT. Brasil. 2014. Fonte: Autores.

Através da confecção de tapetes de crochê, colchas de

retalhos, arranjos florais, bordado, biojóias, as donas de casa obtém uma

renda extra para complementar o sustento da família. Um percentual de

24% delas informaram fazer o artesanato para uso próprio, sendo que

realizam a venda sobre encomenda.

A produção local abastece as necessidades do grupo familiar

com reduzido excedente que pode ser comercializado. Assim, o lucro

adquirido com esta comercialização é utilizado para compra de outros

produtos nos mercados locais como arroz, feijão, café, facão, entre

outros.

Outra forma de comércio existente é a relação da troca do

serviço pelo bem material. Alguns proprietários alugam o pasto em troca

de dinheiro ou serviço na própria propriedade como, por exemplo, a

capina do terreno.

3.5. Características da organização social

A comunidade possui uma Associação da Comunidade São

Miguel, havendo, portanto, expressão política ou outra forma de

organização que represente os interesses comuns dos moradores da

região. Para Silva (2007) o vínculo com o lugar motiva a comunidade para

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a luta social, a fim de, defender seu modo de vida, e proporcionar

melhoria das condições socioeconômicas e ambientais nas propriedades

rurais.

A Associação possui equipamentos agrícolas que são alugados

para os proprietários quando necessário. Através também da Associação

as famílias que não possuem meio de locomoção tem acesso ao ônibus

para ir ao centro do município e à Cuiabá.

Uma das formas de diversão encontrada na comunidade é a

cavalgada (Figura 11) que acontece todo mês de junho com duração de

quatro horas, tendo iniciado no ano de 2006 por um morador da

comunidade, que trouxe o costume de Minas Gerais com o simples intuito

de juntar cavalos.

FIGURA 11: Percurso da Cavalgada na Comunidade São Miguel. Várzea Grande-MT. Brasil. 2014. Fonte: Autores.

Esse evento conta com ajuda dos comerciantes locais e do

município, onde fornece gratuitamente aos cavaleiros a inscrição, camisa,

água e alojamento, além do apoio da polícia e da fiscalização do Instituto

de Defesa Agropecuária do Estado de Mato Grosso - Indea. Os cavaleiros

que participam do evento deslocam-se do próprio município e dos

municípios vizinhos como Jangada, Livramento e Poconé.

Participam do evento, cavaleiros com idade entre sete e 70

anos conforme relatado pelo coordenador do evento (WFM, 44 anos).

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Para ele a cavalgada é uma forma das pessoas fugirem da cidade e

terem mais contato com a natureza.

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4. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Constatou-se que os moradores da comunidade rural São

Miguel-MT apresentam baixa escolaridade, onde vários não tiveram

oportunidade de estudar já que iam para lida no campo desde muito cedo

para ajudar os pais. Apesar do ambiente escolar ter sido reduzido, o

processo de aprendizagem no campo é riquíssimo, pois aprendem na

lavoura, no cuidado com os animais e até no contato com a natureza.

A agricultura de subsistência é a atividade fundamental

encontrada na região e a mandioca é o cultivo principal. Esse cultivo é

rico em nutrientes, sendo consumida como farinha, amido ou cozido (in

natura), usada tanto na alimentação humana e animal, sendo a base da

alimentação de muitas famílias.

Os morados tratam as doenças mais simples através de

plantas medicinais encontradas na região por meio de seus

conhecimentos adquiridos com seus pais ou avós.

Observou-se que a comunidade não é atendida pelos serviços

de coleta de lixo e nem de esgoto, ficando claro o descaso do município já

que não está oferecendo condições apropriadas de salubridade ambiental

às populações rurais.

Verificou-se que população local encontra-se vulnerável em

relação aos aspectos socioeconômicos, devido à migração dos jovens em

busca de novas oportunidades de trabalho e estudo, resultando no êxodo

rural. Essa migração é evidente quando observado que 48% das famílias

entrevistadas não possuem nenhum filho na propriedade, ficando apenas

o casal responsável pela produtividade da propriedade.

É necessário o desenvolvimento de ações, como implantação

de postos de saúde, acompanhamento das gestantes durante o pré-natal,

inclusão do ensino médio em período diurno para melhorar a qualidade de

vida da população local. Além da implantação de inovações técnicas e

econômicas adaptadas às condições locais, como, por exemplo, o

estímulo à coleta de produtos florestais não madeireiros (resina, cipó,

óleo, sementes, frutos, flores, plantas ornamentais, plantas medicinais).

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Essa é uma possível alternativa para equilibrar a conservação da

biodiversidade com a geração de renda local.

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5. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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CAPÍTULO 2

AS UNIDADES DE PAISAGEM NA COMUNIDADE RURAL SÃO MIGUEL, VÁRZEA GRANDE, MATO GROSSO, BRASIL

RESUMO O presente estudo teve como objetivo catalogar, sistematizar e analisar, o conhecimento etnobotânico que os moradores rurais da comunidade de São Miguel possuem a respeito da flora local. A coleta de informações consistiu na aplicação de entrevistas semiestruturadas, observação direta, registro das entrevistas e fotografias. Para cada espécie foi calculado o Valor de Uso (UVs) e para determinar as plantas mais importantes quanto à finalidade foi calculado o Consenso Informante por meio do Nível de Fidelidade. No total foram entrevistados 46 moradores. Em geral, 80% dos quintais localizam-se no entorno das residências; apresentam, em média, um hectare e as mulheres são na maioria responsáveis pelo manejo do local (43%). A criação de animais domésticos foi encontrada em 90% dos quintais. Foram citadas 207 espécies ocorrentes nos quintais, onde as principais famílias botânicas foram Asteraceae, Fabaceae e Lauraceae. O uso medicinal foi a etnocategoria mais representativa. A planta que representou muito bem o valor de uso das plantas locais (Vusp= 3,00) foi Solanum gilo Raddi. As espécies Plectranthus barbatus Andrews, Gossypium barbadense L. e Alternanthera brasiliana (L.) Kuntze apresentaram concordância quanto aos usos principais (Pcusp) acima de 50%. Para Pcusp acima de 25%, são referidos 19 casos para problemas digestivo e respiratório (61,5% cada). Não foram mencionadas dosagens específicas para os remédios caseiros. O modo de preparo prevalecente foi o chá, obtido por decocção (45%). A parte da planta mais empregada foi a folha (55,7%). A agricultura em pequena escala é a principal atividade encontrada na região, onde grande parte planta apenas para o consumo familiar (72%) e utilizam excrementos de animais domésticos como adubo. A mandioca é o cultivo principal. Nas matas de galeriasforam identificadas 68 espécies vegetais. A maioria das espécies (48%) citadas apresenta hábito arbóreo. A planta que representou muito bem o valor de uso (Vusp > 1,50) nesta paisagem foi Myracroduon urundeuva Allemão. Dos entrevistados, 52% informaram nunca ter extraído produto da mata. Entre os produtos que foram retirados destaca-se a madeira para construção (50%) e sementes para produção de mudas (17%). As unidades de paisagem oferecem meios diversificados para sobrevivência das famílias rurais, portanto são espaços que merecem ser estudados.

Palavras-chave: Cerrado; Etnocategorias de uso; Mata de galeria; Quintal; Roça.

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CHAPTER 2

UNITS OF RURAL COMMUNITY LANDSCAPE IN SÃO MIGUEL, VÁRZEA GRANDE, MATO GROSSO, BRAZIL

ABSTRACT This study aimed to catalog, organize and analyze the ethnobotanical

knowledge that rural residents of San Miguel community have about the

local flora. Data collection consisted of the application of semi-structured

interviews, direct observation, record the interviews and photographs. For

each species we calculated the Use Value (UV) and to determine the most

important plants on the purpose we calculated the Informant Consensus

through the Loyalty Level. In total we interviewed 46 residents. Overall,

80% of gardens are located in the vicinity of residences; have, on average,

one hectare and women are mostly responsible for local management

(43%). The breeding of domestic animals was found in 90% of yards. 207

species occurring were cited in backyards, where the main botanical

families were Asteraceae, Fabaceae and Lauraceae. The medicinal use

was the most representative ethnocategory. The plant represented very

well the value in use of local plants (Vusp = 3.00) was Solanum gilo Raddi.

The species Plectranthus barbatus Andrews, Gossypium barbadense L.

and Alternanthera brasiliana (L.) Kuntze showed agreement regarding the

main uses (Pcusp) above 50%. For Pcusp above 25%, 19 cases are

referred to digestive and respiratory problems (61.5% each). Specific

dosages for home remedies were not mentioned. The prevailing method of

preparation was the tea, obtained by decoction (45%). The part of the

sheet plant was used (55.7%). The small-scale farming is the main activity

found in the region, where most only plant for household consumption

(72%) and use pet droppings as fertilizer. Cassava is the main crop. In the

woods galleries were identified 68 plant species. Most species (48%) cited

presents woody. The plant represented very well the use value (Vusp>

1.50) in this landscape was Myracroduon urundeuva Allemão. Of the

respondents, 52% reported ever having product extracted from the forest.

Among the products that were removed there is the timber (50%) and

seeds for seedlings (17%). Landscape units offer diversified means for

survival of rural families, so are spaces that deserve to be studied.

Keywords: Cerrado; Etnocategories use; Gallery forest; yard; Fields.

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1. INTRODUÇÃO

As populações locais possuem um conhecimento acumulado

sobre os espaços que ocupam que pode ser transmitido ao longo das

gerações. Novas informações são adicionadas aos conhecimentos locais

gradativamente e está passível às mudanças em resposta a inovações,

experiências e pressões ambientais externas (ARAUJO, 2007).

A procedência do saber popular está na observação constante

e metódica dos fenômenos e das características da natureza, e na

experimentação desses recursos, o que explica a importância que as

etnocategorias de usos das plantas assumem nos resultados das

investigações etnobotânicas de uma região ou mesmo de uma sociedade

(ALBUQUERQUE E ANDRADE, 2002b).

A etnobotânica surge como o campo interdisciplinar que

envolve o estudo e a explicação do conhecimento que o ser humano

possui da significação cultural, manejo e usos tradicionais dos elementos

da flora (CABALLERO, 1979). Esta ciência visa à busca de conhecimento

e o resgate do saber botânico tradicional, relacionado ao uso dos

recursos da flora (PASA, 2011).

É preciso que haja cada vez mais a realização de trabalhos

que busquem recuperar o conhecimento tradicional, havendo dessa forma

grandes chances de transmiti-lo. Portanto, o presente estudo objetivou

catalogar, sistematizar e analisar, o conhecimento etnobotânico que os

moradores rurais da comunidade de São Miguel possuem a respeito da

flora local.

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2. METODOLOGIA

2.1. Área de Estudo

A Comunidade São Miguel está localizada na zona rural do

município de Várzea Grande-MT, sob coordenada geográfica 15°30’22”S

e 56°26’54”W (Figura 1). Segundo a classificação de Köppen o clima da

região é caracterizado como tropical semiúmido (Aw), com precipitação

pluviométrica anual de 1.350 mm. A temperatura média anual é de 26ºC.

A umidade relativa do ar com a média anual em torno de 74%

(VERTRAG, 2007). Solo predominantemente de argila avermelhada,

principalmente na faixa marginal do Rio Cuiabá e vegetação composta

por savana arbórea aberta (cerrado), capoeira e mata ciliar (ROMANCINI

e MOURA, 2012).

FIGURA 1: Localização da Comunidade São Miguel. Várzea Grande-MT. Brasil. 2014. Fonte: Google Earth modificado pelas autoras.

2.2. Proposta Metodológica

Os dados foram coletados entre março de 2013 a abril de

2014. Primeiramente, aplicou-se um pré-teste através de entrevistas

semiestruturadas com alguns dos moradores. Segundo Pasa et al. (2013),

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o pré-teste serve para escolher e avaliar as técnicas a serem utilizadas

junto à população local, e ajustar aos intuitos da pesquisa.

As entrevistas foram realizadas com 46 moradores, realizadas

nas residências dos próprios entrevistados e ocorreram, com uma pessoa

da família que estivesse no local, maior de idade e que possuia

informações a respeito daquele grupo familiar independente do sexo. A

determinação da quantidade de entrevistados se deu a partir da curva de

acumulação de espécies de Colwell e Coddington (1994), demostrando o

tamanho ótimo de espécies.

Contou-se com a ajuda de uma informante para promover o

contato com os moradores por ser alguém de confiança e por participar

ativamente na comunidade. Para que os dados das entrevistas não

fossem influenciados por terceiros a coleta de informação foi realizada

apenas entre pesquisador e o entrevistado. Para Albuquerque et al.

(2010), uma terceira pessoa durante a entrevista pode gerar alterações

nas respostas dos entrevistados.

Para cada entrevistado foi esclarecido os objetivos do estudo e

os moradores que aceitaram participar da pesquisa assinaram o Termo

de Consentimento Livre e Esclarecido autorizando a realização da

pesquisa. Este termo permite que a pessoa que está sendo convidada a

participar da pesquisa entenda os procedimentos, riscos, desconfortos,

benefícios e direitos envolvidos. Para Clotet (1995) o termo é uma

obrigação moral do pesquisador, é a revelação do respeito às pessoas

envolvidas no projeto.

Para a coleta das informações foram utilizados os seguintes

instrumentos e ferramentas:

Entrevistas semiestruturadas utilizando formulários: com

perguntas fechadas e abertas. Procurou-se caracterizar a unidade

familiar, participação nos trabalhos, manejo dos cultivos, comercialização,

e aspectos relacionados com a manutenção e conservação das unidades

de paisagem (Quintais, Roças e Matas de Galeria).

Observação direta: Nesta etapa buscou-se observar a rotina da

família nas diversas atividades desenvolvidas por eles. Essa técnica

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permite lidar com as falas dos entrevistados ressaltando o papel do

entrevistado e do pesquisador.

Diário de campo: registro das informações relacionadas à

pesquisa durante o desenvolvimento do trabalho em campo, bem como

falas e informações dos atores sociais que participaram da investigação.

Registro fotográfico: as fotografias permitiram ampliar a

quantidade de dados coletados e a obtenção de dados relacionados ao

ambiente, nas diferentes unidades de paisagem, bem como eternizar os

momentos vivenciados junto aos moradores.

Levantamento etnobotânico: realização de caminhadas com os

entrevistados dentro da propriedade e/ou em seus arredores para

observação dos vegetais, que são usados pelas pessoas locais nas

diferentes unidades de paisagem informadas.

Plantas: todos os itens pertinentes às plantas citadas foram

anotados, como: origem, habitat, utilidade, aplicabilidade, dosagem, modo

de preparo, parte utilizada. As plantas citadas pelos entrevistados foram

identificadas no local da entrevista de acordo com o conhecimento dos

entrevistados. As coletas de amostras vegetais das espécies (em fases

reprodutiva e vegetativa) foram realizadas durante as caminhadas para

montagem de exsicatas. As exsicatas do material botânico foram

identificadas por especialistas do Herbário Central da Universidade

Federal de Mato Grosso (UFMT), onde se encontram catalogadas e

depositadas. A grafia dos binômios científicos foi conferida em revisões

taxonômicas recentes e/ou utilizando a base de dados Trópicos, versão

online, acessível pelo sítio http://www.tropicos.org.

2.3. Sistematização e análise dos dados

Primeiramente, elaborou-se um banco de dados com as

informações obtidas nos questionários. Para a análise dos mesmos,

utilizou-se o programa Microsoft Office Excel® 2010, sendo realizada a

estatística descritiva a partir da codificação por tabulação simples,

distribuição de porcentagens, tabelas e figuras.

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As etnocategorias de uso foram representadas de forma literal,

ou seja, como foram referidos pelos entrevistados:

Uso medicinal (Me): espécies utilizadas pelos moradores para fins

medicinais como “remédios caseiros”;

Uso alimentar (Al): espécies usadas pelos moradores como

alimento;

Uso ornamental (Or): espécies destinadas à ornamentação,

embelezamento dos quintais;

Outras (Ot): inclui espécies empregadas pelos moradores para

diversos fins, como artesanato, condimento, sombreamento, madeira,

místico-religioso, inseticida, repelente, higiene e proteção contra o vento.

Os vegetais foram genericamente divididos nos hábitos:

arbóreo (AV); arbustivo (AB); subarbustivo (SA.); herbáceo (HB), palmeira

(PAL), epífita (EPI) e trepador (TR). A origem foi dividida em nativa (N);

cultivada (C) e espontânea (E).

Para cada espécie foi calculado o Valor de Uso (UVs),

entrevistando-se uma única vez cada morador, conforme referido por

Phillips e Gentry (1993):

a. O valor de uso de cada espécie (sp) por informante (i), dado como:

Onde, Uspi é o número de usos mencionados por informante i por

espécie sp em cada evento, e nspi é o número de eventos (quantidade

de encontros) com o informante i por espécie sp

b. O valor de uso global de cada espécie (VUsp), dado como:

Onde, ns é o numero de informantes entrevistados por espécie.

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Para determinar as plantas mais importantes quanto à

finalidade foi calculado o Consenso Informante por meio do Nível de

Fidelidade que vem expresso através do Pcusp.

O Nível de Fidelidade (NF) é utilizado para estimar a

importância de cada espécie para uma finalidade particular. O NF igual a

100% demostra que existe uma consistência cultural quanto ao uso da

espécie na comunidade em estudo (AMARAL; GUARIM NETO 2008).

Através do consenso informante é possível avaliar a

importância de cada planta, calculada diretamente sobre o grau de

consenso das respostas dos entrevistados (FRIEDMAN, 1986), permitindo

definir a frequência relativa de Concordância de Usos principais (Pcusp).

Através desses valores é provável detectar as espécies vegetais

extraídas mais utilizadas e importantes para comunidade, verificando qual

espécie pode estar ameaçada quanto ao seu uso pela comunidade.

Os índices foram calculados de acordo com Friedman (1986),

adaptado por Pasa (2011), conforme a seguir:

Onde, NF é o nível de fidelidade; Fsp é a Frequência absoluta dos

informantes que citaram a espécie; Fid é a Frequência absoluta dos

informantes que citaram os usos principais.

Faz necessário a utilização do Fator de Correção (FC), devido

ocorrer diferenças no número de informantes que citaram usos para cada

espécie, conforme a fórmula abaixo:

Onde, FC é fator de correção; Fsp é o número total de informantes que

citaram a planta para algum uso; IME é o número de informantes que

citaram a espécie mais citada.

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A frequência relativa de Concordância quanto aos Usos

Principais (Pcusp) foi calculada conforme a seguir:

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3. RESULTADOS E DISCUSSÃO

3.1. Características dos entrevistados

Dos 46 entrevistados, a maior representação foi do sexo

feminino (63%), com média de idade de 50 anos. A maior quantidade de

mulheres na zona rural sugere uma maior participação destas nas

atividades agrícolas, segundo o verificado por Lucena et al. (2012) ao

pesquisarem em uma comunidade rural no nordeste brasileiro.

A maior parte dos entrevistados declarou ter o ensino

fundamental incompleto (46%). Esse resultado se deve ao fato de quando

eram crianças ajudavam a família nas atividades agrícolas.

Grande parte dos entrevistados neste estudo é natural do

estado de Mato Grosso (52%) e é possível perceber a influência de sua

origem nas atividades produtivas desenvolvidas por suas famílias, já que

a agricultura é a segunda principal atividade do estado de Mato Grosso.

Verificou-se que 54,3% dos entrevistados vivem na

comunidade há mais de 16 anos, são casados (74%) e católicos (65%),

conforme exemplificado na Tabela 1.

TABELA 1: Características sociodemográficas da Comunidade São Miguel. Várzea Grande-MT. Brasil. 2014.

CARACTERÍSTICAS CATEGORIAS FA FR (%)

Sexo Feminino 29 63,0

Masculino 17 37,0

Faixa etária (anos) 20-39 anos 7 15,2

40-59 anos 19 41,3

60-79 anos 18 39,1

>80 anos 2 4,4

Naturalidade Mato Grosso 24 52,0

Outros estados 22 48,0

Tempo de moradia 3-5 anos 2 4,3

6-8 anos 4 9,0

9-11 anos 8 17,4

Continuação...

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Continuação...

CARACTERÍSTICAS CATEGORIAS FA FR (%)

Tempo de moradia 12-14 anos 7 15,0

15-17 anos 25 54,3

Escolaridade Sem estudo 6 13,0

Ensino fundamental incompleto 21 46,0

Ensino fundamental completo 3 6,5

Ensino médio incompleto 5 11,0

Ensino médio completo 8 17,0

Ensino superior incompleto 0 0,0

Ensino superior completo 3 6,5

Profissão Agricultor (a) 24 52,2

Cozinheiro (a) 2 4,3

Do lar 13 28,3

Outros 7 15,2

Grupos religiosos Católico 30 65,2

Evangélico 14 30,4

Sem religião 2 4,4

Estado civil Casados 34 74,0

Viúvos 6 13,0

Solteiros 6 13,0

Números de filhos 0 filhos 26 56,5

1-5 filhos 19 41,3

6-10 filhos 1 2,20

filhos Legenda: FA: Frequência Absoluta; FR: Frequência Relativa. Fonte: Autores.

3.2. As Unidades de Paisagem

Com o intuito de demostrar graficamente que a utilização de 46

entrevistados foi uma amostra suficientemente representativa, a curva de

acumulação de espécies (COLWELL e CODDINGTON, 1994) apresenta-

se na sequência (Figura 2). A curva de acumulação permite avaliar o

quanto um estudo se aproxima de capturar todas as espécies do local,

sendo que em cada nova entrevista decresce o número de espécies

novas.

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FIGURA 2: Curva de acumulação de espécies representando a quantidade de espécies citadas em função do número de entrevistas realizadas na Comunidade São Miguel. Várzea Grande-MT. Brasil. 2014. Fonte: Autores.

Observa-se que já na 6° entrevista, mais de 50% das espécies

citadas nesse estudo, tinham sido representadas. Percebe-se a partir da

entrevista n° 30 inclinação mínima na curva, demostrando o acréscimo de

poucas espécies e aquelas que foram adicionadas são, em sua maioria,

espécies raras, ou seja, que foram citadas uma única vez por

determinado entrevistado.

Das unidades de paisagem abordadas no presente estudo, o

“quintal” está presente em todas as propriedades, em diferentes

localizações, com diversas espécies cultivadas e algumas hortas

domésticas para o próprio consumo da família. A roça é outra unidade de

paisagem identificada neste estudo, presente em 46% das residências.

Por último, e não menos importante as matas de galeria assim

designadas como as áreas de preservação permanente (APP) no entorno

dos rios Espinheiro e Cascavel presentes na comunidade.

3.2.1 Quintais

Em geral, 80% dos quintais da Comunidade São Miguel

localizam-se no entorno das residências, fazendo divisa com a roça e/ou

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mata de galeria. O quintal agroflorestal é uma unidade de paisagem

conceituada como uma área de produção posicionada perto da casa,

onde são cultivadas espécies agrícolas e florestais, além da criação de

pequenos animais domésticos (NAIR, 1993; BRITO e COELHO, 2001),

com manejos concebidos e executados de maneira harmoniosa (KUMAR

e NAIR, 2004). Pasa et al. (2005) afirma que o quintal é um sistema de

produção secundário a outros tipos de uso da terra, como a lavoura ou a

pecuária, que fornece uma renda extra para família e oferece uma fonte

de recursos alimentícios e medicinais.

Os quintais agroflorestais estudados possuem, em média, o

tamanho de um hectare conforme declarado pelos entrevistados. Na

comunidade rural Rio da Areia, Rondon Neto et al. (2010) encontraram

quintais com área média de 250 m2. As diferenças culturais de cada

morador podem influenciar nessas diferenças de tamanho, já que cada

ser carrega o modo de cultivar de suas origens.

As plantas remanescentes (que já existiam no local antes dos

moradores entrarem na terra) da vegetação natural que são encontradas

especialmente nos quintais, conforme os moradores são: cumbaru

(Dipteryx alata Vogel), jatobá-do-cerrado (Hymenaea courbarilL), aroeira

(Myracrodruon urundeuva Allemão), angico (Anadenanthera colubrina

(Vell.) Brenan), bocaíuva (Acrocomia aculeata (Jacq.) Lodd. ex. Mart.),

quina (Strychnos pseudoquina A. St.-Hil.) e capitão do campo (Terminalia

argentea Mart.).

Existem espécies que crescem espontaneamente conforme os

entrevistados, além das citadas acima, como o gervão (Stachytarpheta

angustifolia (Mill.) Vahl), mentrasto (Ageratum conyzoidesL.), erva de

santa maria (Chenopodium ambrosioides L.), vassorinha (Scoparia dulcis

L.), assa-peixe (Vernonia ferruginea Less) e embaúba (Cecropia sp.).

Essas plantas, por muitas pessoas, são consideradas pragas e para

outros excelentes remédios caseiros disponíveis a poucos metros de

casa. Neste caso são conservadas, pois proporcionam algum tipo de

utilidade para o proprietário (PINHO et al., 2008). A forma de dispersão

das sementes dessas espécies é diversa, anemocórica (dispersão pelo

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vento) ou zoocórica (dispersão por animais como pássaros) (ALMEIDA et

al., 2008).

As árvores frutíferas encontradas nos quintais foram

introduzidas pelos próprios moradores através do consumo das frutas que

proporcionaram as sementes para realização das mudas. De acordo com

Kabashima et al. (2009) as espécies de plantas mais encontradas na

maioria dos quintais brasileiros são frutíferas comuns como goiaba

(Psidium guajava L.), manga (Mangifera indica L.), abacate (Persea

americana Mill.) e jaboticaba (Myrciaria sp.).

Para os entrevistados, plantar no quintal é uma maneira prática

de associar alimentação com bem estar, sombra, remédio, lazer, material

para construção, embelezamento, além de outros benefícios como

fertilização do solo, proteção contra ventos fortes e erosão, oxigenação do

ambiente, alimentação e abrigo para fauna, e renda extra. Além de ser um

ambiente destinado às atividades do dia-a-dia como cozinhar, lavar roupa,

louças, desbulhar milho, entre outras.

Para Pasa e Avila (2010) os quintais são locais que as pessoas

utilizam como meio cultural, para confraternização familiar e reunião com

os vizinhos. A importância desse espaço fica evidente nos depoimentos

dos moradores: “(...) meu quintal é meu sustento” (EGM, 32 anos); “(...) as

plantas no quintal embeleza a casa, ajuda na renda, dá mais vida na

casa” (EFNM, 43 anos);

“ (...) gosto do quintal, eu pra mim tem que ter o quintal, pois

evito de comprar, uso pra comer e tratar da criação. Se eu morar e não

tiver, pra mim não tá servindo” (CVP, 62 anos);

O manejo empregado aos quintais é uma atividade realizada

principalmente pelas mulheres (43%), apesar da cooperação de todos os

membros da família, conforme Figura 3. Quanto aos serviços de mão-de-

obra, 9% dos entrevistados pagam uma pessoa para fazer a manutenção

do quintal, já que não dispõem de tempo para este serviço. De acordo

com Costantin (2005), os quintais são considerados, por muitas mulheres

como uma extensão do serviço doméstico. Para House e Ochoa (1998), a

mulher tem uma percepção multidimensional, buscando ampliar a

biodiversidade de seu quintal, enquanto o homem possui um ponto de

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vista unidimensional, empenhando-se em melhorar o rendimento de

algumas espécies em particular.

FIGURA 3: Frequência relativa dos entrevistados quanto ao manejo dos quintais na Comunidade São Miguel. Várzea Grande-MT. Brasil. 2014. Fonte: Autores.

O tempo dedicado para tratar do quintal é em média de uma a

duas horas por dia, todavia há aqueles que preferem realizar a limpeza

em apenas um dia na semana. Os entrevistados relataram que a época

do ano que mais tem trabalho com o quintal é no período das chuvas

(67%) e para outros se trata da seca (33%).

Em algumas residências verificou-se que a limpeza dos

quintais era relevante, entretanto em outras podemos observar restos de

folhas, flores, cascas de frutos, palhas de milho e bagaço de cana. Para

esses moradores, esses materiais protegem o solo e aumentam os

nutrientes para as plantas. Oliveira e Pasa (2013) encontraram dados

semelhantes na Comunidade de Santo Antônio do Caramujo, onde os

entrevistados informaram que esses restos (folhas, frutos, palhas) são

importantes para cobrir o solo colaborando para a produção de biomassa

e o retorno da matéria orgânica ao solo, bem como assegurar a umidade.

As folhas provenientes da manutenção dos quintais são

utilizadas pela maioria dos moradores para fazer adubo, outros alegaram

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queimar e tem aqueles que preferem deixar no “pé da árvore”, jogar no

pasto ou na mata, colocar tudo em um buraco, amontoar em um canto, e

até mesmo aqueles que usam para nivelar o terreno.

Na preparação do adubo, cada proprietário tem um jeito de

fazer com elementos específicos encontrados no próprio terreno como

podemos observar no relato de um entrevistado:

“Faço o adubo foliar que mistura 500 g de cinza das folhas em

100 litros de água, bosta de vaca curtida por 30 dias. Mistura tudo isso e

planta. Tem também a que usa urina de vaca curtida por 15 dias, que é só

coloca no vão que tá a planta” (EGM, 32 anos).

A urina da vaca é recolhida com um balde comum na hora da

retirada do leite, onde geralmente a vaca conforme relato do entrevistado.

O sistema de plantio utilizado no quintal é bastante

diversificado, encontramos plantas diretamente no solo, através de covas

e/ou canteiros, em vasos de latas, garrafas plásticas, máquina de lavar,

canteiros elevados de madeira com recipientes variados, e até em caules

de árvores (Figura 4). Chagas et al. (2014) verificaram que na

Comunidade São Francisco, Iranduba, AM, os diversos recipientes

usados no plantio, como vasos plásticos, latas e/ou canoas velhas, são

utilizados para as plantas empregadas na alimentação e na cura de

doenças.

FIGURA 4: Recipientes utilizados para plantio nos quintais na Comunidade São Miguel. Várzea Grande-MT. Brasil. 2014. A: Coco; B: Parte do estipe de buriti; C: Garrafa pet; D: Tronco de árvore. Fonte: Autores.

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Ao abordar os aspectos etnobiológicos locais, a criação de

animais domésticos foi encontrada em 90% dos quintais. Estes são para

consumo ou apenas de estimação, como cachorro (Canis lupus familiaris)

– 89%, galinha (Gallus domesticus) – 74%, gato (Felis silvestris catus) –

43%, galinha-d’angola (Numida galeata meleagris) – 6%, peru (Meleagris

gallopavo) – 4%, pato (Anas platyrhynchos) – 4%, porco (Sus domesticus)

- 48%, gado (Bos taurus) – 43% e cavalos (Equus caballus) – 15%.

Os cachorros, gatos, galinhas, galinhas-d’angola, perus e patos

são animais criados soltos nos quintais. Os cachorros ficam soltos a fim

de proteger a propriedade de qualquer mudança anormal, se alimentam

de ração e/ou restos de comidas. Essa alimentação também é recebida

pelo único animal que tem acesso ao quintal e a casa do proprietário que

é o gato, devido ser muito dócil. As galinhas, galinhas-d’angola, perus e

patos criados soltos nos quintais com o intuito de produzir carne, ovos e

esterco. Esses animais são alimentados com grãos de milhos, farelo de

milho e quirela, fornecidos pelos proprietários, e pelo ciscar no quintal e

arredores.

A relação entre animais e humanos é visto em culturas de todo

o mundo em várias formas de interação com a fauna local (ALVES e

SOLTO, 2011), contudo conforme Silva et al. (2013) essa relação precisa

ser cautelosa, pois existe grande possibilidade de ocorrência de

zoonoses, sobretudo em comunidades rurais onde o status sanitário,

geralmente, é baixo. Vários gêneros de helmintos e protozoários utilizam-

se dos animais domésticos como hospedeiros e podem contaminar

facilmente o homem (LEITE et al., 2007).

Os porcos são criados de forma confinada em baias de

madeira, construídas nas áreas dos quintais, onde se alimentam de cana,

milho inteiro, restos de alimentos, frutas e hortaliças oriundos dos

quintais. Esses animais produzem carne e banha, usados exclusivamente

para consumo da família. Os bovinos e equinos são encontrados nos

quintais e/ou em suas imediações, mesmo existindo piquetes com

pastagens formadas artificialmente. Em média, criam-se sete cabeças de

bovinos por propriedade, com a exclusiva finalidade de produzir leite para

consumo da família.

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Algumas propriedades apresentam hortas caseiras de pequeno

porte, cercada de tela galvanizada, a fim de evitar a entrada de animais,

especialmente de aves domésticas. As hortas são utilizadas para cultivo

de hortaliças para a subsistência da família, sendo manejadas

principalmente pelas mulheres, sem o uso de agrotóxicos e adubos

químicos, cultivadas no solo e/ou às vezes em vasilhas. Vários itens são

encontrados nessas hortas caseiras como alface, couve, cebolinha, jiló,

tomate, pepino, entre outros.

Para combater as pragas, alguns dos moradores utilizam de

insumo natural a base de plantas, como o uso da pimenta malagueta ou

do fumo, como declarou um dos entrevistados:

“Eu pego uma garrafa de plástico de 1 litro e coloco um

punhado da pimenta malagueta amassada e deixo curti por uma semana

com água, depois é só passar para matar as lagartas, as formigas

cortadeiras. Pra acabar com pulgão pego fumo, desse pronto em

mercado, deixo de molho um dia, com água e pronto” (EGM, 32 anos).

As espécies vegetais presentes nos quintais da comunidade

São Miguel expõe uma combinação entre espécies arbóreas, herbáceas e

culturas agrícolas, demostrando a diversidade vegetal que foi introduzida

para diversas finalidades de uso naquele espaço para facilitar o cotidiano

dos moradores. Foram citadas 207 espécies, sendo estas distribuídas em

64 famílias Botânicas e 153 gêneros. Dentre as quais, Asteraceae e

Fabaceae com 17 espécies cada uma, Lauraceae com 13 espécies e

Solanaceae com 10 espécies. Dentro dessa riqueza vegetal, as 207

espécies vegetais foram contempladas em cinco etnocategorias de usos,

sendo o uso medicinal a categoria mais representativa (Figura 5). É

importante ressaltar que uma espécie pode ser agrupada em mais de

uma categoria de uso, sendo comum que as citações dos entrevistados

para uma determinada planta pudessem ser agrupadas em categorias de

uso diferentes.

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FIGURA 5: Número de famílias botânicas e espécies encontradas nas etnocategorias de uso na Comunidade São Miguel. Várzea Grande-MT. Brasil. 2014. Fonte: Autores.

A maioria das espécies (64%) citadas é de origem cultivada,

seguida das nativas (26%) e as espontâneas (10%). As cultivadas são

encontradas nas hortas e quintais das residências. Vale ressaltar que as

nativas (espécies do Cerrado) podem ser remanescentes, espontâneas

ou cultivadas. O hábito herbáceo (39%) é o mais representativo, seguido

de arbustivo (26%), arbóreo (22%), subarbustivo (7%), trepadeira (4%),

epífita e palmeira (1% cada um).

As espécies de plantas medicinais nativas continuam sendo

bastante usadas, apesar do número de espécies de plantas medicinais

cultivadas serem maior, em relação às plantas citadas. Para Pasa et al.

(2005) a ampla quantidade de herbáceas deve-se ao fato de que muitas

destas espécies podem ter sido introduzidas por imigrantes devido à sua

facilidade de transporte de um lugar para o outro.

Na Tabela 2 são apresentadas as espécies presentes nos

quintais da Comunidade São Miguel, classificadas conforme ordem

decrescente do Vusp facilitando visualizar a importância das plantas.

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TABELA 2: Espécies presentes nos quintais da Comunidade São Miguel. Várzea Grande-MT. Brasil. 2014. Nome Vernacular Nome Científico Família Usos Vusp Hábito Origem

Jiló Solanum gilo Raddi Solanaceae Al, Me 3,00 SA C

Neen Azadirachta indica A. Juss. Meliaceae Me, Or, Ot 2,33 AV C

Café Coffea arabica L. Rubiaceae Al, Me 2,00 AB C

Pimenta malagueta Capsicum frutescens L. Solanaceae Me, Ot 2,00 SA C

Aroeira Myracrodruon urundeuva Allemão Anacardiaceae Me, Ot 1,86 AV N

Laranja Citrus aurantium L. Rutaceae Al, Me 1,83 AB C

Acerola Malpighia glabra L. Malpighiaceae Al, Me 1,82 AB C

Feijão andu Cajanus cajan (L.) Huth Fabaceae Al, Me 1,75 AB C

Goiaba Psidium guajava L. Myrtaceae Al, Me, Ot 1,75 AB C

Limão galego Citrus sp. L. Rutaceae Al, Me 1,73 AB C

Açafrão Crocus sativus L. Iridaceae Me, Ot 1,67 HB N

Abacaxi Ananas comosus (L.) Merril Bromeliaceae Al, Me 1,60 HB C

Guiné Petiveria alliacea L. Phytolaccaceae Me, Ot 1,60 HB C

Abacate Persea americana Mill. Lauraceae Al, Me, Ot 1,50 HB C

Alho Allium sativum L. Amaryllidaceae Me, Ot 1,50 HB C

Amora Morus nigra L. Moraceae Al, Me 1,50 AV C

Carapiá Dorstenia cayapia Vell. Moraceae Al, Me 1,50 HB E

Chico-magro Guazuma ulmifolia Lam. Malvaceae Me, Ot 1,50 AV N

Fortuna Bryophyllum pinnatum (Lam.) Oken Crassulaceae Or 1,50 HB C

Jurubeba Solanum lycocarpum A. St.-Hil. Solanaceae Al, Me 1,50 AB C

Mangava mansa Hancornia speciosa Gomes Apocynaceae Me 1,50 AV N

Pau-de-óleo Copaifera langsdorffii Desf. Fabaceae Me 1,50 AV N

Seriguela Spondias lutea L. Anacardiaceae Al, Ot 1,50 AV C

Tamarindo Tamarindus indica L. Fabaceae Al, Me, Ot 1,50 AV C

Vergateza Anemopaegma arvense (Vell.) Stellfeld ex J.F. Souza

Bignoniaceae Me 1,50 AB N

Continuação...

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80

Continuação...

Nome Vernacular Nome Científico Família Usos Vusp Hábito Origem

Lima Citrus limetta Risso Rutaceae Al, Me 1,40 AB C

Bocaiúva Acrocomia aculeata (Jacq.)Lodd. ex. Mart.

Arecaceae Al, Me 1,33 PAL N

Cana-de-açúcar Saccharum officinarum L. Poaceae Al, Me 1,33 AB C

Capitão do campo Terminalia argentea Mart. Combretaceae Me 1,33 AV N

Ipê roxo Handroanthus heptaphyllus (Vell.) Mattos

Bignoniaceae Me, Or 1,33 AV N

Jenipapo Genipa americana L. Rubiaceae Al, Me, Ot 1,33 AV C

Mamona Ricinus communis L. Euphorbiaceae Me 1,33 AB C

Manga Mangifera indica L. Anacardiaceae Al, Me, Ot 1,33 AV C

Cajú Anacardium occidentale L. Anacardiaceae Al, Me 1,30 AB N

Urucum Bixa urucurana Willd. Bixaceae Me, Ot 1,30 AB C

Arruda Ruta graveolens L. Rutaceae Me, Ot 1,25 SA C

Imbé Philodendron imbe Schott ex Endl. Araceae Me, Or 1,25 HB C

Jabuticaba Myrciaria cauliflora (Mart.) O. Berg. Myrtaceae Me, Or 1,25 AB C

Eucalipto Eucalyptus sp. L’Hér. Myrtaceae Me, Or 1,20 AV C

Babosa Alloe vera L. Asphodelaceae Me, Or 1,18 HB C

Quiabo Hibiscus esculentus L. Malvaceae Al, Me 1,18 SA C

Barbatimão Stryphnodendron adstringens (Mart.)Coville

Fabaceae Me, Ot 1,17 AV N

Carambola Averrhoa carambola L. Oxaliadaceae Al, Me 1,17 AV C

Colônia Alpinia speciosa (Blume) D. Dietr. Zingiberaceae Me 1,14 HB C

Cumbarú Dipteryx alata Vogel Fabaceae Al, Me, Ot 1,14 AV N

Capim-cidreira Cymbopogon citratus (DC.) Stapf Poaceae Al, Me 1,12 HB C

Jatobá-do-cerrado Hymenaea courbaril L. Fabaceae Me, Ot 1,11 AV N

Mamão papaia Carica papaya L. Caricaceae Al, Me 1,11 AB C

Continuação...

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81

Continuação...

Nome Vernacular Nome Científico Família Usos Vusp Hábito Origem

Alfavacão Ocimum gratissimum L. Lamiaceae Me 1,07 TR N

Alfavaquinha Ocimum sp. L. Lamiaceae Me 1,00 TR N

Algodão Gossypium barbadense L. Malvaceae Me 1,00 AB N

Algodãozinho Brosimum gaudichaudii Trécul Moraceae Me 1,00 AB N

Algodãozinho-do-campo Cochlospermum regium (Schrank) Pilg. Bixaceae Me 1,00 HB N

Alho social Tulbaghia violaceaHarv. Amaryllidaceae Or 1,00 HB C

Anador Justicia pectoralis Jacq. Acanthaceae Me 1,00 HB C

Antúrio Anthurium andraeanum Linden Araceae Or 1,00 HB C

Araticum Annona crassiflora Mart. Annonaceae Al 1,00 AB C

Arnica-do-campo Brickelliasp. Elliott Asteraceae Me 1,00 HB E

Artemije Artemisia verlotorum Lamotte Asteraceae Me 1,00 HB C

Assa-peixe Vernonia ferruginea Less. Asteraceae Me 1,00 SA N

Ata Annona squamosa L. Annonaceae Al 1,00 AB C

Avelós Euphorbia sect. Tirucalli Boiss. Euphorbiaceae Me 1,00 AB C

Avenca Adiantum capillus Sw. Pteridaceae Or 1,00 HB C

Bacuri Rheedia brasiliensis (Mart.)Planch. & Triana

Clusiaceae Al, Me 1,00 AV N

Bálsamo Cotyledon orbiculata L. Crassulaceae Me 1,00 HB C

Batata inglesa Solanum tuberosum L. Solanaceae Al 1,00 HB C

Batata maruleite Operculina macrocarpa (L.) Urb. Convolvulaceae Al, Me 1,00 AB C

Begônia Begoniasp. L. Begoniaceae Or 1,00 HB C

Boa noite Catharanthus roseus (L.) G. Don Apocynaceae Or 1,00 HB C

Boldo Plectranthus barbatus Andrews Lamiaceae Me 1,00 AB C

Cacto Cactus sp. L. Cactaceae Or 1,00 HB C

Cacto mandacaru Cactus grandiflorus L. Cactaceae Me, Or 1,00 AV C

Caferana Vernonia polyanthes (Spreng.)Less. Asteraceae Me 1,00 AB C

Continuação...

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82

Continuação...

Nome Vernacular Nome Científico Família Usos Vusp Hábito Origem

Cajá-manga Spondias dulcis L. Anacardiaceae Al 1,00 AV C

Caldo santo Cnicus benedictus L. Asteraceae Me 1,00 HB C

Camomila Matricaria recutita L. Asteraceae Me, Ot 1,00 HB C

Camomila amarela Matricaria sp. L. Asteraceae Me 1,00 HB C

Cana-de-macaco Costus arabicus L. Costaceae Me 1,00 HB C

Cancerosa Synadenium grantii Hook. f. Euphorbiaceae Me 1,00 AB C

Capim-amargoso Digitaria insularis (L.) Fedde Poaceae Me 1,00 HB N

Cará-moela Dioscorea bulbifera L. Dioscoreaceae Al 1,00 TR C

Carrapicho-de-carneiro Acanthospermum australe (Loefl.) Kuntze

Asteraceae Me 1,00 HB E

Caruru Amaranthus viridis L. Amaranthaceae Al, Me 1,00 HB E

Cebolinha Allium fistulosum L. Liliaceae Ot 1,00 HB C

Cedro Cedrela fissilis Vell. Meliaceae Ot 1,00 AV N

Coco-da-baía Cocos nucifera L. Arecaceae Al, Or, Me 1,00 AV C

Coentro Cichorium endivia L. Asteraceae Ot 1,00 HB C

Coentro bravo Eryngium foetidum L. Apiaceae Ot 1,00 HB E

Colírio de Santa Luzia Commelina nudiflora L. Commelinaceae Me 1,00 HB C

Comigo-ninguém-pode Dieffenbachia picta Schott Araceae Or 1,00 HB C

Confrei Symphytum officinale L. Boraginaceae Me 1,00 HB C

Congonha-de-bugre Rudgea viburnoides (Cham.) Benth. Rubiaceae Me 1,00 AB N

Coração amargurado Solenostemon scutellarioides (L.) Codd Lamiaceae Or 1,00 HB C

Cordão-de-são-francisco

Marsypianthes chamaedrys (Vahl) Kuntze

Lamiaceae Me 1,00 HB E

Dipirona Alternanthera Forssk. Amaranthaceae Me 1,00 HB C

Elixir Pothomorphe umbellata (L.) Miq. Piperaceae Me 1,00 TR E

Continuação...

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Continuação...

Nome Vernacular Nome Científico Família Usos Vusp Hábito Origem

Embaúba Cecropia pachystachya Trécul Urticaceae Me 1,00 AV E

Erva cidreira Lippia alba (Mill.) N.E. Br. ex Britton & P. Wilson

Verbenaceae Al, Me 1,00 HB E

Erva-de-santa-maria Chenopodium ambrosioides L. Amaranthaceae Me 1,00 HB E

Espada de ogum Sansevieria cylindrica Bojer ex Hook. Asparagaceae Or, Ot 1,00 HB C

Espada-de-são-jorge Sansevieria trifasciata Prain Asparagaceae Or 1,00 HB C

Espinheira santa Maytenus ilicifolia Mart. ex Reissek Celastraceae Me 1,00 AB C

Espirradeira Nerium oleander L. Apocynaceae Me, Or 1,00 AV C

Espondi Mimosasp. L. Fabaceae Me 1,00 AV N

Estomalina Gymnanthemum amygdalinum (Delile) Sch. Bip. ex Walp.

Asteraceae Me 1,00 HB C

Fedegoso Senna occidentalis (L.) Link Fabaceae Me 1,00 AB E

Figo Ficus carica L. Moraceae Al 1,00 AB C

Filodendro Philodendron sp. Schott Araceae Or 1,00 HB C

Flor da Amazônia Tithonia diversifolia (Hemsl.) A. Gray Asteraceae Me, Or 1,00 AB C

Flor-de-finado Senecio scandensBuch.-Ham. ex D. Don

Asteraceae Or 1,00 AB C

Folha santa Bryophyllum calycinumSalisb. Crassulaceae Me, Or 1,00 HB C

Fruta pão Artocarpus altilis (Parkinson) Fosberg Moraceae Al 1,00 AB N

Fruta-do-conde Annona reticulata L. Annonaceae Al 1,00 AB C

Fumo Nicotiana tabacum L. Solanaceae Me 1,00 SA C

Gengibre Zingiber officinale Roscoe Zingiberaceae Ot, Me 1,00 HB C

Gervão Stachytarpheta angustifolia (Mill.)Vahl Verbenaceae Me 1,00 HB E

Gonçaleiro Astronium fraxinifolium Schott Anacardiaceae Me, 1,00 AV N

Graviola Annona muricata L. Annonaceae Al, Me 1,00 AV C

Guatambu Aspidosperma polyneuron Müll. Arg. Apocynaceae Me, Ot 1,00 AV N

Continuação...

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Continuação...

Nome Vernacular Nome Científico Família Usos Vusp Hábito Origem

Gueiroba Syagrus oleracea (Mart.) Becc. Arecaceae Al 1,00 AV C

Hortelã doce Mentha arvensis L. Lamiaceae Me 1,00 HB C

Hortelã pimenta Plectranthus amboinicus (Lour.) Spreng.

Lamiaceae Me 1,00 HB C

Hortelão do campo Hyptis crenata Pohl ex Benth. Lamiaceae Ot, Me 1,00 HB C

Hortelãzinha Mentha piperita L. Lamiaceae Me 1,00 HB C

Imburana Amburana cearensis (Allemão) A.C. Sm.

Fabaceae Me 1,00 AV C

Ingá Inga edulis Mart. Fabaceae Al, Me 1,00 AV C

Ingá-do-mato Inga heterophylla Willd. Fabaceae Al, Me 1,00 AV N

Insulina Cissus sicyoides L. Vitaceae Me 1,00 HB C

Jaborandi Piper tuberculatum Jacq. Piperaceae Me 1,00 AB N

Jaca Artocarpus integrifolia L. f. Moraceae Al 1,00 AV C

Jamelão Syzygium jambolanum (Lam.) DC. Myrtaceae Al 1,00 AV C

Jasmim Gardenia jasminoides J. Ellis Rubiaceae Or 1,00 AB C

Jucá Caesalpinia ferrea Mart. Fabaceae Me 1,00 AV N

Laranja cida Citrus sp.L. Rutaceae Al 1,00 AB C

Limão rosa Citrus sp.L. Rutaceae Al 1,00 AB C

Língua de vaca Orthopappus angustifolius (Sw.) Gleason

Asteraceae Me 1,00 HB C

Língua-de-cão Cynoglossum creticum L. Boraginaceae Me 1,00 HB C

Lírio-da-paz Spathiphyllum wallisii Regel Araceae Or 1,00 HB C

Lírio-são-José Hemerocallis flava (L.) L. Xanthorrhoeaceae Or 1,00 HB C

Lixeira Curatella americana L. Dilleniaceae Me 1,00 AV N

Lixinha Davilla elliptica A. St. -Hil Dilleniaceae Me 1,00 AB N

Losna Artemisia absinthium L. Asteraceae Me 1,00 SA C

Louro pardo Cordia trichotoma (Vell.) Arráb. ex Steud.

Boraginaceae Ot 1,00 AV N

Continuação...

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Continuação...

Nome Vernacular Nome Científico Família Usos Vusp Hábito Origem

Malva amarela Melochia tomentosa L. Malvaceae Me 1,00 HB E

Malva branca Malva sp.L. Malvaceae Me 1,00 HB E

Mamão formosa Carica sp. L. Caricaceae Al 1,00 AB C

Mamica-de-porca Zanthoxylum rhoifolium Lam. Rutaceae Me 1,00 AV N

Mandioca Manihot esculenta Crantz Euphorbiaceae Al 1,00 AB C

Mangava brava Lafoensia pacari A.St.-Hil. Lythraceae Me 1,00 AV N

Maracujá Passiflora edulis Sims Passifloraceae Al, Me 1,00 TR C

Maravilha Mirabilis jalapa L. Nyctaginaceae Or 1,00 HB C

Maria-pobre Dilodendron bipinnatum Radlk. Sapindaceae Me 1,00 AV N

Mentrasto Ageratum conyzoides L. Asteraceae Me 1,00 HB N

Mirindiba Buchenavia tomentosa Eichler Combretaceae Me 1,00 AV N

Nó-de-cachorro Heteropterys tomentosa A. Juss. Malpighiaceae Me 1,00 HB N

Noni Morinda citrifolia L. Rubiaceae Me 1,00 AB C

Ora-pro-nobis Pereskia aculeataMill. Cactaceae Me 1,00 HB E

Orquídea cebola Oncidium cebolleta (Jacq.) Sw. Orchidaceae Or 1,00 EPI N

Orquídea roxa Cattleya violaceae (Kunth) Rolfe Orchidaceae Or 1,00 EPI N

Papoula Hibiscus rosa-sinensis L. Malvaceae Or 1,00 AB C

Paratudo Tabebuia aurea (Silva Manso) Benth. & Hook. f. ex S. Moore

Bignoniaceae Me, Or, Ot 1,00 AB N

Pata-de-vaca-do- campo Bauhinia bongardiiSteud. Fabaceae Me 1,00 HB N

Pata-de-vaca Bauhinia rufa (Bong.) Steud. Fabaceae Me, Or, Ot 1,00 AB N

Pau-terra macho Qualea multiflora Mart. Vochysiaceae Me 1,00 AV N

Pé-de-anta Cybistax antisyphilitica (Mart.) Mart. Bignoniaceae Me 1,00 AV N Pega-pinto Boerhavia diffusa L. Nyctaginaceae Me 1,00 HB E

Picão branco Bidens gardneri Baker Asteraceae Me 1,00 SA N

Continuação...

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86

Continuação...

Nome Vernacular Nome Científico Família Usos Vusp Hábito Origem

Picão preto Bidens pilosa L. Asteraceae Me 1,00 SA N

Pimenta bodinha Capsicum sp. L. Solanaceae Al 1,00 SA C

Pimenta chumbinho Capsicum sp. L. Solanaceae Me, Ot 1,00 SA C

Pimenta preta Capsicum sp. L. Solanaceae Ot 1,00 SA C

Pimenta-de-cheiro Capsicum odoratum Steud. Solanaceae Me, Ot 1,00 SA C

Pingo de ouro Duranta erecta L. Verbenaceae Or 1,00 AB C

Pinhão roxo Jatropha gossypiifolia L. Euphorbiaceae Me 1,00 AB C

Pinhão branco Jatropha curcas L. Euphorbiaceae Me 1,00 AB C

Pitanga Eugenia uniflora L. Myrtaceae Al 1,00 AB C

Piteira Agave angustifoliaHaw. Asparagaceae Me 1,00 HB C

Pitomba Talisia esculenta (A. St.-Hil.) Radlk. Sapindaceae Al 1,00 AB C

Poejo Mentha pulegium L. Lamiaceae Me 1,00 HB C

Poncã Citrus reticulata Blanco Rutaceae Al 1,00 AB C

Primavera laranjada Bougainvillea sp. Comm. ex Juss. Nyctaginaceae Or 1,00 AB C

Primavera vermelha Bougainvillea glabra Choisy Nyctaginaceae Or 1,00 AB C

Pronto-alívio Achillea millefolium L. Asteraceae Me 1,00 HB C

Quebra pedra Phyllanthus orbiculatus Rich. Phyllanthaceae Me 1,00 HB E

Quina Strychnos pseudoquina A. St.-Hil. Loganiaceae Me, Ot 1,00 AV N

Rabo-de-bugiu Phlebodium aureum (L.) J. Sm. Polypodiaceae Me, Or 1,00 HB C

Romã Punica granatum L. Lythraceae Al, Me 1,00 AB C

Rosa vermelha Rosa gallica L. Rosaceae Or 1,00 SA C

Sabugueira Sambucus nigra L. Adoxaceae Me 1,00 AV C

Saião Kalanchoe brasiliensis Cambess. Crassulaceae Me, Or 1,00 HB C

Continuação...

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Continuação...

Nome Vernacular Nome Científico Família Usos Vusp Hábito Origem

Samambaia Nephrolepis exaltata (L.) Schott Davalliaceae Or 1,00 HB C

Samambaia chifre-de-veado

Platycerium bifurcatum (Cav.) C. Chr. Polypodiaceae Or 1,00 HB C

Samambaia macaco Dicranopteris nervosa (Kaulf.) Maxon Gleicheniaceae Or 1,00 HB C

Samambaia paulista Nephrolepis cordifolia (L.) C. Presl Davalliaceae Or 1,00 HB C

Sangra D'água Croton salutaris Casar. Euphorbiaceae Me 1,00 AV N

Sete copas Terminalia catappa L. Combretaceae Me, Ot 1,00 AV C

Singônio Syngonium angustatum Schott Araceae Or 1,00 HB C

Tapera velha Hyptis suaveolens (L.) Poit. Lamiaceae Me 1,00 HB E

Tento Abrus precatorius L. Fabaceae Ot 1,00 TR E

Terramicina Alternanthera brasiliana (L.) Kuntze Amaranthaceae Me 1,00 HB N

Timbó Magonia pubescens A. St.-Hil. Sapindaceae Ot 1,00 AB N

Tomate cereja Solanum lycopersicum L. Solanaceae Al 1,00 HB C

Tripa de galinha Bauhinia glabra Jacq. Fabaceae Me 1,00 TR N

Unha de boi Bauhinia rufa (Bong.) Steud. Fabaceae Me 1,00 SA N

Unha de lagartixa z (Willd.) DC. Rubiaceae Me 1,00 TR E

Vassourinha Scoparia dulcis L. Plantaginaceae Me 1,00 HB E

Vick Mentha spicata L. Lamiaceae Me 1,00 HB C

Legenda: Usos: medicinal (Me), alimento (Al), condimento (Co), ornamental (Or) e outros (Ot).Vusp= Valor de uso de cada espécie. Hábito: HB= Herbácea; SA= Subarbustivo; AB= Arbustivo; AV= Arbóreo; PAL= Palmeira; EPI= Epífita; TR=Trepadeira. Origem: N= Nativa; C= Cultivada; E= Espontânea. Fonte: Autoras.

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Para o cálculo do Valor de Uso, o número de usos

mencionados para uma espécie estabelece a importância dela para a

comunidade de São Miguel, pois demostra o valor de uso da planta

estatisticamente. A valoração utilitária das espécies apresentadas na

Tabela 2 mostrou que 75% das mesmas possuem Vusp = 1,00. As

plantas que representaram muito bem o valor de uso das plantas locais

foram: Vusp = 3,00: jiló (Solanum gilo); Vusp = 2,33: neem (Azadirachta

indica); Vusp = 2,0: café (Coffea arabica), pimenta malagueta (Capsicum

frutescens L.) e aroeira (Myracrodruon urundeuva).

Albuquerque e Andrade (2002a) afirmam que as espécies mais

importantes para uma comunidade não são necessariamente as mais

abundantes ou as mais empregadas para diferentes fins, comprovando

que as espécies raras às vezes possuem mais diversificação de uso que

as mais comuns. Portanto, os dados de valor de uso são mais elevados

em espécies mencionadas por apenas poucas pessoas, já que estas

pessoas conhecem e utilizam uma determinada espécie para diversos

fins.

Pasa (2004) salienta que a categoria de uso de uma espécie

vegetal pode ser cumulativa, uma espécie pode ser utilizada para a

alimentação e ser medicinal. Neste estudo, as espécies que se

destacaram por apresentar usos múltiplos foram: cumbaru (Dipteryx

alata), tamarindo (Tamarindus indica), abacate (Persea americana),

goiaba (Psidium guajava), jenipapo (Genipa americana), coco-da-baía

(Cocos nucifera), paratudo (Tabebuia aurea), tripa de galinha (Bauhinia

glabra) e neem (Azadirachta indica).

Para Aquino et al. (2007) algumas espécies podem ser

utilizadas para outros fins diferentes que não foram aqui consideradas,

tais como: apícola (mangava mansa - Hancornia speciosa), aromatizante

(algodãozinho -Brosimum gaudichaudii), artesanal (vinhático -

Plathymenia reticulata), tanífero (cajú - Anacardium occidentale) e tintorial

(pau-de-óleo - Copaifera langsdorffii).

Do total das espécies, 50 são utilizadas como alimentícias,

pertencentes às famílias: Fabaceae, Moraceae e Solanaceae (10% cada

uma). As espécies mais frequentes nos quintais na categoria alimentar

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foram manga (Mangifera indica) - 24%, acerola (Malpighia glabra) - 22%,

mamão formosa (Caricasp.) - 20%, caju (Anacardium occidentale) e limão

galego (Citrus sp.) -18% cada um.

Na categoria ornamental foram registradas 43 espécies

vegetais, preponderando às famílias Araceae (14%), Crassulaceae e

Nyctaginaceae (7% cada uma). Dentro desse grupo 37% das espécies

são consideradas pelos entrevistados como ornamentais e medicinais,

como o caso babosa (Alloe vera), imbé (Philodendron imbe), espirradeira

(Nerium oleander) e folha santa (Bryophyllum calycinum). Assim, ao

mesmo tempo em que embelezam os quintais das propriedades, são

remédios caseiros de fácil acesso aos moradores.

Nas outras categorias foram registradas 30 espécies,

distribuídas em 23 famílias botânicas. Entre as espécies encontradas nos

quintais como arruda (Ruta graveolens), comigo-ninguém-pode

(Dieffenbachia picta), espada de ogum (Sansevieria trifasciata), espada-

de-são-jorge (Sansevieria cylindrica) e guiné (Petiveria alliacea) foram

mencionadas como de “proteção” fundamentado no uso em crenças e

ritos espirituais.

Algumas espécies, como a guiné, são utilizadas para proteção

(“mau-olhado”), localizada bem na entrada da casa, pois acreditam que a

planta é um ser tão sensível que absorve a influência negativa antes da

pessoa entrar em sua casa. A guiné também é utilizada em banhos

protetores, que podem estar relacionados apenas a uma parte do corpo

ou no corpo inteiro, dependendo da parte do corpo que o mal acomete.

Pasa (2007) refere-se à guiné, como uma planta indicada para espantar

maus espíritos, inveja e mau-olhado. Igualmente a espada-de-são-jorge,

arruda, alho, café, para fazer banho do “corpo todo” e defumação da

casa.

Algumas espécies usadas como temperos no dia a dia dos

moradores também são empregadas na medicina caseira como gengibre

(Zingiber officinale), pimenta malagueta (Capsicum frutescens), urucum

(Bixa urucurana) e açafrão (Crocus sativus).

Quanto às medicinais, 119 espécies são utilizadas no

tratamento de doenças, sobressaindo às famílias Fabaceae (13%),

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Asteraceae (12%) e Lamiaceae (6%). Em uma comunidade rural do

semiárido da Paraíba, Santos et al. (2012) encontraram uma grande

riqueza de plantas medicinais registrando 143 espécies pertencentes a 43

famílias. O número significativo de espécies de plantas medicinais citadas

comprova o rico conhecimento etnobotânico da população local.

As famílias com destaque para categoria medicinal no presente

estudo foi comumente encontradas como as mais significativas em outros

estudos etnobotânicos no estado de Mato Grosso, como Souza e Felfili

(2005), Fracaro e Guarim (2008), Pasa (2011), Almeida et al. (2014). Esse

fato pode estar relacionado à presença de compostos fitoquímicos que

são na maioria das vezes empregados em medicamentos (MING e

AMARAL JUNIOR, 1995).

As plantas usadas como medicinais mais citadas foram: aroeira

(Myracrodruon urundeuva) - 26 citações, acerola (Malpighia glabra) - 20

citações, limão (Citrus sp.) - 19 citações, cana-de-açúcar (Saccharum

officinarum) - 16 citações, goiaba (Psidium guajava) - 14 citações e

laranja (Citrus aurantium) - 11 citações.

Foram encontradas 26 espécies vegetais usadas tanto na

alimentação como na medicina caseira, destacando acerola (Malpighia

glabra), amora (Morus nigra), abacaxi (Ananas comosus), caju

(Anacardium occidentale), cana-de-açúcar (Saccharum officinarum),

capim-cidreira (Cymbopogon citratus), entre outras.

Para a obtenção do resultado da Porcentagem de

Concordância quanto aos usos principais (Pcusp) foi utilizada somente as

espécies da etnocategoria medicinal, pois apresentaram maior número de

citação comparado às outras categorias. Os resultados encontram-se na

Tabela 3, que está ordenada em função do Pcusp em ordem decrescente,

elucidando as espécies mais importantes.

As oito espécies consideradas mais importantes para a

população estudada, em ordem decrescente de Concordância de uso são

(Tabela 3): boldo (Plectranthus barbatus), algodão (Gossypium

herbaceum), terramicina (Alternanthera brasiliana), sabugueira

(Sambucus nigra), capim-cidreira (Cymbopogon citratus), jatobá

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(Hymenaea stigonocarpa), quina (Strychnos pseudoquina) e losna

(Artemisia absinthium).

TABELA 3: Valor relativo de concordância quanto aos usos principais. Comunidade São Miguel, Várzea Grande-MT. 2014.

Nome comum Aplicação NU FID FSP NF FC Pcusp(%)

Boldo Estomago 5 17 20 85,00 1,00 85

Algodão Inflamação 7 11 16 68,75 0,80 55

Terramicina Inflamação 3 11 14 78,57 0,70 55

Capim-cidreira Calmante 5 9 15 60,00 0,75 45

Jatobá Tuberculose 10 8 20 40,00 1,00 40

Quina Dor de cabeça 9 8 16 50,00 0,80 40

Losna Estomago 3 7 9 77,78 0,45 35

Aroeira Diarreia 10 7 14 50,00 0,70 35

Caferana Estomago 3 7 8 87,50 0,40 35

Alfavacão Febre 8 7 16 43,75 0,80 35

Goiaba Desinteria 1 7 10 70,00 0,50 35

Mangava-brava Úlcera 5 6 10 60,00 0,50 30

Romã Inflamação 2 6 8 75,00 0,40 30

Erva de santa maria Verme 5 6 9 66,67 0,45 30

Hortelãzinha Verme 3 6 7 85,71 0,35 30

Lima Calmante 3 6 7 85,71 0,35 30

Gervão Gastrite 5 6 7 85,71 0,35 30

Manga Tosse 4 5 12 41,67 0,60 25

Flôr da amazônia Dor no estomago 3 5 6 83,33 0,30 25

Urucum Pressão alta 6 5 12 41,67 0,60 25

Barbatimão Infecção 4 5 6 83,33 0,30 25

Noni Câncer 2 5 6 83,33 0,30 25

Sabugueira Sarampo 2 5 4 125,00 0,20 25

Anador Gripe 3 5 5 100,00 0,25 25

Camomila Diarreia 4 5 8 62,50 0,40 25 Melão-De-São-Caetano Coceira 6 5 9 55,56 0,45 25

Avelos Gastrite 3 5 5 100,00 0,25 25

Angico Tuberculose 5 5 5 100,00 0,25 25

Hortelã Tosse 6 5 11 45,45 0,55 25

Acerola Gripe 3 5 7 71,43 0,35 25

Carambola Pressão alta 2 5 5 100,00 0,25 25

Ipê roxo Expectorante 2 4 2 200,00 0,10 20

Pata-de-vaca Diabete 2 4 5 80,00 0,25 20

Açafrão Garganta 4 4 4 100,00 0,20 20

Malva branca Corrimento 3 4 5 80,00 0,25 20

Vassorinha Machucado 3 4 4 100,00 0,20 20

Continuação...

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Continuação...

Nome comum Aplicação NU FID FSP NF FC Pcusp(%)

Erva cidreira Calmante 2 4 8 50,00 0,40 20

Pau-terra macho Diarreia 1 4 4 100,00 0,20 20

Colônia Calmante 3 4 8 50,00 0,40 20

Cancerosa Cicatrizante 2 4 6 66,67 0,30 20

Angelim margoso Figado 6 4 7 57,14 0,35 20

Cumbarú Fígado 12 4 12 33,33 0,60 20

Tripa de galinha Desinteria 5 4 6 66,67 0,30 20

Passo livre Males do Rim 1 3 3 100,00 0,15 15

Guatambu Diabete 1 3 3 100,00 0,15 15

Velame branco Cicatrizante 2 3 4 75,00 0,20 15

Assa-peixe Gripe 3 3 4 75,00 0,20 15

Picão Diuretico 4 3 4 75,00 0,20 15

Paratudo Pulmão 4 3 5 60,00 0,25 15

Arnica-do-campo Machucado 4 3 6 50,00 0,30 15

Nó-de-cachorro Dor de barriga 3 3 5 60,00 0,25 15

Amora Hormonio 2 3 4 75,00 0,20 15

Guiné (Tipi) Reumatismo 2 3 4 75,00 0,20 15

Gengibre Gripe 3 3 4 75,00 0,20 15

Babosa Hemorroida 9 3 14 21,43 0,70 15

Mamona Dor de cabeça 7 3 7 42,86 0,35 15

Tamarindo Hemorroída 6 3 7 42,86 0,35 15

Poejo Dor de barriga 4 3 7 42,86 0,35 15

Arruda Cólica 3 3 7 42,86 0,35 15

Embaúba Bronquite 5 3 7 42,86 0,35 15

Legenda: NU: número de usos mencionados pelo informante para cada espécie; FID: número de informantes que recomendaram o uso de uma espécie para uma finalidade maior; FSP: número total de informantes que citaram a planta para algum uso; NF: Nível de fidelidade; FC: fator de correção; Pcusp: frequência relativa de concordância quanto aos usos principais. Fonte: Autores.

Três espécies apresentaram concordância quanto aos usos

principais (Pcusp) acima de 50%, possivelmente sendo essas as mais

utilizadas pela população. O Boldo (Plectranthus barbatus) destacou-se

em primeiro lugar entre os moradores da comunidade, apresentando

frequência relativa de concordância quanto aos usos principais (Pcusp) de

85%, sendo amplamente utilizado para o tratamento de doenças do

estômago, fígado e indigestão. O Algodão (Gossypium barbadense) e a

Terramicina (Alternanthera brasiliana) ocupam o segundo lugar com 55 %

cada uma.

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Uma espécie que tenha vários entrevistados acordando com

um mesmo uso terapêutico, pode-se confirmar estatisticamente uma real

efetividade no tratamento da afecção (PINTO et al., 2006) e, podem

auxiliar na constatação da eficácia de determinada espécie para uso

medicinal, que, no futuro, poderão servir de base para estudos

farmacológicos buscando a descoberta de novas curas para doenças e/ou

a melhoria de medicamentos já existentes (ROQUE et al., 2010).

Das 31 espécies que apresentaram concordância quanto aos

usos principais (Pcusp) acima de 25%, são referidos 19 casos para

problemas digestivo e respiratório (61,5% cada); sete casos para

problemas circulatório e nervoso (22,5%); e o restante representa 16%.

Na comunidade São Miguel, 23% das plantas foram citadas para três

tipos de doenças (NU = 3), 19% para cinco tipos de doenças (NU = 5),

17% para quatro tipos de doenças (NU = 4), 13% para seis tipos de

doenças (NU = 6), 12% para dois tipos de doenças (NU = 2) e 17% para

as outras quantidades de doenças citadas.

O alto número de indicações para afecções do sistema

respiratório também foi encontrado na abordagem etnobotânica feita por

Zucchi et al. (2013) na comunidade de Ipameri pertencente ao Estado de

Goiás. A alta incidência de problemas respiratórios possivelmente seja

devido à grande quantidade de poeira proveniente das estradas de chão e

da falta de água local.

A dosagem dos remédios caseiros variou entre as pessoas,

não sendo mencionadas dosagens específicas. Para Pasa et al. (2011) a

utilização de uma posologia informal pode acarretar consequências

graves aos seres humanos, pois conforme Oliveira et al. (2009) várias

plantas úteis aos seres humanos podem produzir substâncias

potencialmente tóxicas, se utilizadas em dosagens inadequadas.

O uso adequado das espécies medicinais através do resgaste

e da difusão de conhecimento é muito importante, pois várias pessoas

não sabem identificá-las, ou as preparam e as empregam de maneira

incorreta (SILVA et al., 2013). Como afirma Carlini (2004), que os

principais problemas causados pelo uso indiscriminado e prolongado de

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espécies medicinais, estão nas reações alérgicas e os efeitos tóxicos em

vários órgãos.

Algumas espécies vegetais possuem substâncias tóxicas em

sua composição química, havendo necessidades especiais em sua

administração. Para que uma planta venha a ser avaliada como espécie

tóxica, sua toxicidade deve ser confirmada experimentalmente, conforme

Matos et al. (2011): “Os testes de toxicidade são elaborados com o

objetivo de avaliar ou prever os efeitos tóxicos que uma substância pode

produzir e estabelecer as condições de uso seguro para não causar dano

ao meio ambiente e à saúde dos animais de outros seres vivos”. Para

esses autores todas as partes da espirradeira (Nerium oleander L.) são

tóxicas para homens, animais e insetos, assim como os frutos da

carambola (Averrhoa carambola L.), o látex do avelós (Euphorbia sect.

Tirucalli Boiss.), a semente do pinhão-branco (Jatropha curcas L.), entre

outras.

Algumas espécies citadas pelos moradores da comunidade

tiveram alguma atividade farmacológica encontrada na literatura, como:

Gossypium herbaceum (algodão): restaura fluxo menstrual e limpeza

interna dos órgãos femininos; Curatella americana (lixeira): atividade anti-

hipertensiva e vasodilatadora; Matricaria chamomila (camomila): efeito

sedativo; Myracrodruon urundeuva (aroeira): atividade cicatrizante, anti-

inflamatória e analgésica.

O modo de preparo prevalecente foi o chá, obtido por

decocção, com 45% (Figura 6). A parte da planta mais empregada foi a

folha (55,7%), seguida da casca do tronco (18,5%), raiz (9,5%), fruto

(6,2%) e semente (3,9%). De modo similar, o largo uso das folhas na

preparação dos remédios também foi detectado por Souza e Pasa (2013),

que analisaram a preferência da folha no preparo dos remédios caseiros

como um cuidado com a conservação de recursos naturais da região,

retirando partes que possam ser repostas sem causar maiores danos à

planta.

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FIGURA 6: Modo de preparo dos remédios caseiros na Comunidade São Miguel. Várzea Grande-MT. Brasil. 2014. Fonte: Autoras.

Algumas espécies medicinais além do uso humano também

são empregadas no tratamento de enfermidades de animais (Tabela 4).

Este recurso é uma opção de baixo custo, que pode ser associada a

outras formas de tratamento. Segundo Vieira (2003), o uso da fitoterapia

no controle de verminoses visa reduzir o custo com a aquisição de anti-

helmínticos, além de prolongar o aparecimento de resistência por uso

contínuo desses medicamentos.

TABELA 4: Espécies vegetais citadas para fins terapêuticos em animais na Comunidade São Miguel. Várzea Grande-MT. Brasil. 2014. Família/ Nome científico/ Nome vulgar

Parte Utilizada

Indicação Terapêutica

Espécie Animal

Amaranthaceae

Chenopodium ambrosioides L. (erva-de-santa-maria)

Folha Vermífugo Tosse

Galináceo Canino Suíno

Alternanthera brasiliana (L.) Kuntze (terramicina)

Folha Cicatrizante Doença

Galináceo Canino Suíno Equino Bovino

Continuação...

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96

Continuação...

Anacardiaceae

Myracrodruon urundeuva Allemão (aroeira)

Folha Doença Galináceo

Caryocaraceae

Caryocar brasiliense Cambess. (pequi)

Casca Cicatrizante Bovino

Euphorbiaceae

Jatropha curcas L. (pinhão-branco) Fruto Doença Galináceo Suíno Equino Bovino Fabaceae

Dipteryx alata Vogel (cumbarú) Casca Disenteria Bovino

Copaifera langsdorffii Desf. (pau d’ Oléo)

Óleo Cicatrizante Canino Suíno Equino Bovino

Malvaceae

Gossypium barbadense L. (algodão)

Folha Cicatrizante Galináceo Canino Suíno Equino Bovino Meliaceae

Azadirachta indica A. Juss. (neen)

Folha Carrapato Coceira Repelente

Bovino Canino

Rubiaceae

Chiococca brachiata Ruiz & Pav. (cainca)

Casca Estimulador de apetite

Equino

Rutaceae

Zanthoxylum rhoifolium Lam. (mamica-de-porca)

Folha Coceira Canino

Zingiberaceae

Alpinia speciosa (Blume) D. Dietr. (colônia)

Folha Vermífugo

Suíno

Fonte: Autoras.

Entre as nove indicações gerais mencionadas, três se

destacaram: anti-helmíntica e anti-inflamatória (21% cada uma), e anti-

coceira (14%). Fica evidente a importância das plantas com ação

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antiparasitária, principalmente para comunidades onde o medicamento

convencional é de difícil aquisição.

Alguns animais também são usados no tratamento de

enfermidades na Comunidade São Miguel, como o Caramujo associado

com a erva-de-santa-maria usado na cura de “feridas bravas” (conforme

relato de moradores o uso da gosma do caramujo fecha ferida em metade

do tempo que levaria normalmente, sem receber nenhum outro remédio);

a banha da Cascavel para dores no corpo; o mel de Jataí para bronquite e

o chifre do boi (leva o chifre no fogo de lenha e raspa as bolhas que vão

formando) para criança “assustada”.

3.2.4. Roças

As roças são ambientes de produção agrícola que acontecem

nas áreas abertas no interior da vegetação natural, proveniente da

derrubada da mata ripária ou nas bordas do campo cerrado fazendo limite

com as matas (PASA, 2011). Foram levantadas 48 variedades de cultivos

alimentares (Figura 7), abrangendo as árvores frutíferas. O manejo nesta

unidade é realizado apenas pelas unidades familiares.

FIGURA 7: Exemplo de cultivos encontrado na Comunidade São Miguel. Várzea Grande-MT. Brasil. 2014. A: Cebola, B: Cará-moela e C: Mamão papaia. Fonte: Autoras.

Entre os entrevistados, o número mínimo de produção agrícola

é de dois, como a Manihot esculenta (mandioca) e a Saccharum

officinarum (cana-de-açúcar), e o máximo 14, sendo Vigna unguiculata

(feijão de corda), Cajanus cajan (feijão andu), Zea mays (milho), M.

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esculenta (mandioca), Musa parasidiaca (banana), Carica papaya

(mamão), Hibiscus esculentus (quiabo), Ananas comosus (abacaxi),

Citrussp. (limão galego), Citrussp. (limão rosa), Ipomoea batatas (batata

doce), Cichorium endivia (coentro), Cucurbita pepo (abobrinha) e

Saccharum officinarum (cana-de-açúcar). A diversidade de cultivos nas

propriedades rurais proporciona ao pequeno produtor a diversificação da

produção e gera outras fontes de alimento e renda (FEITOSA et al.,

2011).

As culturas com maior número de citações foram a mandioca

(67%), o milho (43%), a banana (43%) e, cana-de-açúcar e abóbora (cada

uma com 35%), as frutíferas somam 24% do total das variedades e os

restantes 19% correspondem às hortaliças (Figura 8). Resultados

parecidos foram encontrados por Pasa et al. (2005) em estudo

etnobotânico na Comunidade de Conceição-Açu em Cuiabá, quanto ao

cultivo da mandioca.

FIGURA 8: Frequência relativa dos cultivos nas roças das propriedades rurais na Comunidade São Miguel. Várzea Grande-MT. Brasil. 2014. Fonte: Autoras.

O uso dos produtos agrícolas destina-se na maioria (72%) para

o próprio consumo da família e para tratar dos animais domésticos, 13%

além do próprio consumo, também vendem para cooperativa e/ou para

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cidades vizinhas e/ou para vila da comunidade e 15% não produzem.

Resultados semelhantes foram encontrados por Silva et al. (2013) que

estudando o perfil socioeconômico dos agricultores nas unidades

produtivas da comunidade Moura no município de Bananeiras (PB)

verificaram também que a maior parte da produção (67%) são destinadas

para o consumo alimentar da família.

Aqueles que nada cultivam informam ser devido à dificuldade

de acesso a água, já que nem todos têm poço na propriedade. Essas

pessoas sobrevivem dos salários e da aposentadoria.

Uma característica a ser destacada dessa comunidade é o

potencial de cooperação existente entre eles, pois até mesmo os

proprietários que cultivam com a finalidade de obter renda, compartilham

com os amigos os alimentos produzidos.

Do total de 46 entrevistas, somente dois moradores participam

da Produção Agroecológica Integrada e Sustentável – PAIS, onde

receberam curso de capacitação pelo Serviço Brasileiro de Apoio às Micro

e Pequenas Empresas – Sebrae. O projeto é organizado em forma de um

círculo em um terreno plano na convivência com animais e plantas. Deste

modo, gera alimento saudável e diversificado, melhorando a qualidade de

vida dos produtores. Além de oferecer aos animais os alimentos que não

pode ser consumido por humanos (PAIS, 2009).

Os alimentos orgânicos geram valores significativos para a

economia brasileira e para a saúde da população, proporcionando uma

forma de sustentabilidade social e econômica da agricultura familiar

(COELHO, 2001). As diversas formas de estimulo na Agricultura Familiar

são essenciais para manter as populações no campo e diminuir a evasão

para as cidades. Para Costa (1997), o papel do Estado de instigar a

noção de responsabilidade socioambiental na população rural é essencial,

pois garante o funcionamento de um sistema de crédito agrícola,

especialmente em sistemas que favoreçam o “Uso Sustentável” mediante

as chamadas “Agriculturas de Base Ecológica”.

Em 72% das propriedades os adubos utilizados nas roças são

provenientes dos excrementos de animais domésticos, restos de

alimentos, urina de gado e folhas aproveitadas da manutenção do quintal.

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Apenas 28% dos proprietários utilizam adubos químicos como

fertilizantes, normalmente aqueles que comercializam a sua produção. Os

restos de comida são cascas de verduras e legumes. Pasa (2011)

realizando estudo etnobotânico na Comunidade Conceição-Açu verificou

que 80% das propriedades utilizavam o esterco de animais domésticos e

restos de alimentos como adubo.

Para o preparo do solo nas lavouras são usados equipamentos

agrícolas alugados da Associação local, logo que nenhum dos

proprietários entrevistados possui posse de máquinas agrícolas. A

aquisição de máquinas agrícolas representa um dos mais elevados

investimentos do produtor, e sua obtenção depende de diversos fatores

como os produtos cultivados, abertura de fronteiras agrícolas,

rentabilidade do produtor.

Entre os animais que prejudicam o desenvolvimento das

plantas e os cultivos, os proprietários citaram formiga cortadeira (Atta sp.),

cigarrinha (Deois flavopicta), lagarta (Anticarsia sp.), cupim (Coptotermes

sp.), grilo (Gryllus assimilis), pulgão (Metopolophium dirhodum), besouro

(Oryctes sp.), galinha (Gallus domesticus), porco (Gallus domesticus),

gado (Bos taurus), rato (Rattus sp.), capivara (Hydrochoerus

hydrochoeris), tucano (Ramphastos toco), periquito (Brotogeris tirica) e

veado (Cervus elaphus).

Os animais considerados pragas como o pulgão, lagarta,

cupim, são controlados através de plantas como, por exemplo, o uso da

pimenta malagueta. Outros são mantidos cercados (galinha, gado, porco)

para evitar que prejudiquem as plantações e tem aqueles que não se têm

o que fazer como o tucano, o periquito, a capivara e o veado.

3.2.5. Matas de galeria

As matas protegem a vegetação nativa e são consideradas

como Áreas de Preservação Permanente - APP resguardadas conforme

artigo 3 e 4 da Lei nº 12.651, de 25 de maio de 2012, tanto em zonas

rurais quanto urbanas, “com a função ambiental de preservar os recursos

hídricos, a paisagem, a estabilidade geológica e a biodiversidade, facilitar

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o fluxo gênico de fauna e flora, proteger o solo e assegurar o bem-estar

das populações humanas”. Portanto, a presença da mata de galeria é de

grande importância na vida da população regional, pois oferece remédios

e alimentos para a subsistência das famílias, e consequentemente

contribui para a conservação dos recursos nela existentes.

Entre as espécies vegetais foram identificadas um total de 68

espécies vegetais distribuídas em 39 famílias botânicas e 63 gêneros

(Figura 9). As espécies citadas foram contempladas em três

etnocategorias de Usos: Alimento (5 espécies), Medicinal (59 espécies) e

Outras (20 espécies). A maioria das espécies (48%) citadas apresenta

hábito arbóreo, seguido de arbustivo (15%), herbáceo (13%),

subarbustivo (9%), trepadeira (7%), epífita e palmeira (3% cada um).

FIGURA 9: Principais famílias botânicas encontradas na Mata de Galeria da Comunidade São Miguel. Várzea Grande-MT. Brasil. 2014. Fonte: Autoras.

Na Tabela 5 estão relacionadas as plantas encontradas na

Mata de Galeria em ordem descrescente do Vusp, promovendo a

visualização da importância das plantas nessa unidade de paisagem.

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TABELA 5: Plantas da mata de galeria usadas pela Comunidade São Miguel. Várzea Grande-MT. Brasil. 2014.

Nome comum Nome Científico Família Usos Hábito VUsp

Aroeira Myracrodruon urundeuva Allemão Anacardiaceae Me, Ot AV 1,86

Angico Anadenanthera colubrina var. cebil (Griseb.) Reis Fabaceae Me, Ot AV 1,71

Cainca Chiococca brachiata Ruiz & Pav. Rubiaceae Me AB 1,50

Carapiá Dorstenia cayapia Vell. Moraceae Al, Me HB 1,50

Chico-magro Guazuma ulmifolia Lam. Malvaceae Me, Ot AV 1,50

Mangava mansa Hancornia speciosa Gomes Apocynaceae Me AV 1,50

Olho-de-boi Diospyros hispida A. DC. Ebenaceae Me AV 1,50

Pau-de-óleo Copaifera langsdorffii Desf. Fabaceae Me AV 1,50

Vergateza Anemopaegma arvense (Vell.) Stellfeld ex J.F. Souza Bignoniaceae Me SA 1,50 Bocaiúva Acrocomia aculeata (Jacq.) Lodd. ex. Mart. Arecaceae Al, Me PAL 1,33

Ipê roxo Handroanthus heptaphyllus (Vell.) Mattos Bignoniaceae Me, Ot AV 1,33

Cipó Imbé Philodendron imbe Schott ex Endl. Araceae Me, Ot EPI 1,25

Barbatimão Stryphnodendron adstringens (Mart.) Coville Fabaceae Me, Ot AV 1,17

Cumbarú Dipteryx alata Vogel Fabaceae Al, Me, Ot AV 1,14

Jatobá Hymenaea stigonocarpa Mart. ex Hayne Fabaceae Me, Ot AV 1,12

Abacaxi-do-cerrado Ananas ananassoides (Baker) L.B. Sm. Bromeliaceae Me HB 1,00

Angelim margoso Vatairea macrocarpa (Benth.) Ducke Fabaceae Me, Ot AV 1,00

Azedinha Oxalis hirsutissima Mart. ex Zucc. Oxalidaceae Me HB 1,00

Bambu Bambusa vulgaris Schrad. ex J.C. Wendl. Poaceae Ot HB 1,00

Bucha Luffa cylindrica (L.) M. Roem. Cucurbitaceae Ot TR 1,00

Calção de velho Cordia insignis Cham. Boraginaceae Me AB 1,00

Calunga Simaba ferruginea A. St.-Hil. Simaroubaceae Me AB 1,00

Carvão branco Callisthene fasciculata Mart. Vochysiaceae Ot AV 1,00

Carvão vermelho Diptychandra aurantiaca Tul. Fabaceae Ot AV 1,00

Cedro Cedrela fissilis Vell. Meliaceae Ot AV 1,00

Curraleira Croton antisyphiliticus Mart. Euphorbiaceae Me HB 1,00

Contiuação...

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Contiuação...

Nome comum Nome Científico Família Usos Hábito VUsp

Douradão do campo Palicourea rigida Kunth Rubiaceae Me AB 1,00 Douradinha Palicourea coriacea (Cham) K. Schum. Rubiaceae Me SA 1,00

Embaúba Cecropia pachystachya Trécul Urticaceae Me AV 1,00

Erva-de-bicho Polygonum acre Lam. Polygonaceae Me HB 1,00

Espinheira santa Maytenus ilicifolia Mart. ex Reissek Celastraceae Me AB 1,00

Esporão de galo Celtis iguanaea (Jacq.) Sarg. Cannabaceae Me AB 1,00

Fruta-do-conde Annona reticulata L. Annonaceae Al AV 1,00

Gervão Stachytarpheta angustifolia (Mill.) Vahl Verbenaceae Me HB 1,00

Gonçaleiro Astronium fraxinifolium Schott Anacardiaceae Me, AV 1,00

Gravatá Bromelia balansae Mez Bromeliaceae Me BR 1,00

Guatambu Aspidosperma polyneuron Müll. Arg. Apocynaceae Me, Ot AV 1,00

Ingá-do-mato Inga heterophylla Willd. Fabaceae Al, Me AV 1,00

Jaborandi Piper tuberculatum Jacq. Piperaceae Me AB 1,00

Jucá Caesalpinia ferrea Mart. Fabaceae Me AV 1,00

Lixeira Curatella americana L. Dilleniaceae Me AV 1,00

Lixinha Davilla elliptica A. St. -Hil Dilleniaceae Me AB 1,00

Louro pardo Cordia trichotoma (Vell.) Arráb. ex Steud. Boraginaceae Ot AV 1,00

Mamica-de-porca Zanthoxylum rhoifolium Lam. Rutaceae Me AV 1,00

Mangava-brava Lafoensia pacari A.St.-Hil. Lythraceae Me AV 1,00

Maria-pobre Dilodendron bipinnatum Radlk. Sapindaceae Me AV 1,00

Marmelada-bola Cordiera edulis (Rich.) Kuntze Rubiaceae Me AB 1,00

Melão-de-são-caetano Momordica charantia L. Cucurbitaceae Me TR 1,00 Milho-de-grilo Lantana lilacina Desf. Verbenaceae Me SA 1,00

Murici Byrsonima verbascifolia (L.) DC. Malpighiaceae Me AV 1,00

Muricizinho Byrsonima orbignyana A. Juss. Malpighiaceae Me AB 1,00

Contiuação...

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Contiuação...

Nome comum Nome Científico Família Usos Hábito VUsp

Negramina Siparuna guianensis Aubl. Siparunaceae Me AV 1,00

Panaceia Solanum cernuum Vell. Solanaceae Me SA 1,00

Paratudo Tabebuia aurea (Silva Manso) Benth. & Hook. f. ex S. Moore

Bignoniaceae Me, Ot AV 1,00

Pau-doce Vochysia rufa Mart. Vochysiaceae Me AV 1,00

Pau-terra macho Qualea multiflora Mart. Vochysiaceae Me AV 1,00

Pé-de-anta Cybistax antisyphilitica (Mart.) Mart. Bignoniaceae Me AV 1,00

Peroba Aspidosperma tomentosum Mart. Apocynaceae Ot AV 1,00

Porangaba Cordia sp. L. Boraginaceae Me SA 1,00

Quebra pedra Phyllanthus orbiculatus Rich. Phyllanthaceae Me HB 1,00

Quina Strychnos pseudoquina A. St.-Hil. Loganiaceae Me, Ot AV 1,00

Salsaparrilha Smilax sp. L. Smilacaceae Me TR 1,00

Sete sangria Euphorbia sp. L. Euphorbiaceae Me HB 1,00

Suma roxa Anchietea salutaris A. St.-Hil. Violaceae Me TR 1,00

Três folha Galactia glaucescens Kunth Fabaceae Me TR 1,00

Unha de boi Bauhinia rufa (Bong.) Steud. Fabaceae Me AB 1,00

Velame branco Macrosiphonia velame (A. St.-Hil.) Müll. Arg. Apocynaceae Me SA 1,00

Vinhático Plathymenia reticulata Benth. Mimosaceae Ot AV 1,00

Legenda: Categorias de uso: medicinal (Me), alimento (Al) e outros (Ot) = artesanato, condimento, lenha, madeira. Vusp= Valor de uso de cada espécie; Hábito: HB= Herbácea; SA= Subarbustivo; AB= Arbustivo; AV= Arbóreo; PAL= Palmeira; EPI= Epífita; TR= Trepadeira. Origem: N= Nativa; C= Cultivada; E= Espontânea. Fonte: Autoras.

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A valoração utilitária das espécies apresentadas na tabela 5 mostrou

que 79% das mesmas possuem Vusp = 1,00, como carvão branco (Callisthene

fasciculata), carvão vermelho (Diptychandra aurantiaca), mamica de porca

(Zanthoxylum rhoifolium), entre outras.

Outras espécies que representam muito bem o valor de uso das

plantas locais (Vusp > 1,50) são: aroeira (Myracroduon urundeuva), angico

(Anadenanthera colubrina), cainça (Chiococca brachiata), carapiá (Dorstenia

cayapia), chico-magro (Guazuma ulmifolia), mangava mansa (Hancornia

speciosa), olho-de-boi (Diospyros hispida), pau-de-óleo (Copaifera langsdorffii)

e vergateza (Anemopaegma arvense).

Com valoração utilitária Vusp >1,0 e < 1,5, tem-se: bocaiúva

(Acrocomia aculeata), ipê-roxo (Handroanthus heptaphyllus), imbé

(Philodendron imbe), barbatimão (Stryphnodendron adstringens), cumbaru

(Dipteryx alata) e jatobá (Hymenaea stigonocarpa).

Poucas espécies conseguiram alto valor de uso, assim como em

Chocó, Colômbia, onde se constatou que a maioria das espécies utilizáveis

possuía baixos valores de uso, enquanto altos valores estavam concentrados

em apenas quatro espécies (GALEANO, 2000). Em Alagoinha, Albuquerque et

al. (2005) também relataram a concentração de poucas espécies com altos

valores de uso. Os dados revelam que algumas plantas possuem seu uso mais

difundido do que outras, havendo a necessidade de produção dessas plantas

para que não sejam existintas.

Quanto à coleta de produtos na mata de galeria, 52% informaram

nunca ter extraído produto, enquanto 48% confirmaram já ter tirado produto

dessa unidade de paisagem, como madeira para construção (50%), sementes

para produção de mudas (17%), frutas para consumo (9%) e sementes para

confecção de biojóias (24%).

Outras espécies presentes nas matas da região, como jatobá

(Hymenea stignocarpa), ipê-roxo (Handroanthus heptaphyllus), inga (Inga

heterophylla), quina (Strychnos pseudoquina) e cedro (Cedrela fissilis), são

bastante conhecidas e utilizadas pela população local. São árvores de terra

firme e de certos lugares úmidos. Sua madeira é usada para confecção de

móveis, prateleiras, bancos, cercas e mourões (Figura10). Alguns frutos são

comestíveis e usados como remédio na medicina caseira. Vale ressaltar que as

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plantas lenhosas foram utilizadas apenas para atividades de subsistência e não

ao comércio, assim como no estudo de Galeano (2000).

FIGURA 10: Diversas formas da utilização da madeira na Comunidade São Miguel. Várzea Grande-MT. Brasil. 2014. A: Prateleira, B: Mesa, C: Banco; D: Cabo de ferramenta, E: Casa, F: Arco (para pedra). Fonte: Autoras.

A característica de algumas plantas terem utilização múltipla

expressa os valores dados às mesmas. Logo, aquelas que acumulam o uso de

alimentar com outros dois ou três (medicinal, artesanal, madeira, etc) são as

mais valoradas por serem as mais utilizadas pela população local. Angico

(Anadenanthera colubrina), cumbaru (Dipteryx alata) e aroeira (Myracrodruon

urundeuva) foram as espécies associadas ao maior número de categorias de

uso, mas destacaram-se pelos seus usos madeireiros.

Notou-se um grande constrangimento por parte dos entrevistados

quando mencionaram as madeiras que foram retiradas da mata, principalmente

a aroeira (M. urundeuva), considerada ameaçada de extinção conforme art. 4º

da Instrução Normativa no6, de 23 de setembro de 2008. Entretanto, conforme

o art. 69 da Lei Complementar n° 233 de 21 de dezembro de 2005, é permitido

a utilização dessa espécie por parte dos proprietários dentro de sua

propriedade, sendo proibida a sua comercialização. . Por falta de conhecimento

dessa legislação por qual são amparados, os entrevistados preferem se

resguardar omitindo certas informações.

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4. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Os quintais localizam-se no entorno das residências, oferecendo

alimentos, remédios, lazer, tudo próximo a casa. O cuidado com essa unidade

de paisagem é uma atividade realizada especialmente pelas mulheres, onde

ocorre um sistema de plantio bem diversificado com garrafas plásticas, troncos

de árvores e até mesmo diretamente no solo como as árvores frutíferas.

A criação de animais domésticos do tipo bovino é para alguns uma

forma de complementar a renda da família e a alimentação do dia-a-dia.

Nos quintais as plantas que se destacaram quanto ao valor de uso,

demostrando a sua importância para a comunidade, foram o jiló (Solanum gilo),

o neen (Azadirachta indica), o café (Coffea arabica), a pimenta malagueta

(Capsicum frutescens L.) e a aroeira (Myracrodruon urundeuva). Essas

espécies comprovam que as espécies raras às vezes possuem mais

diversificação de uso que as mais comuns.

O cumbaru (Dipteryx alata), tamarindo (Tamarindus indica), abacate

(Persea americana), goiaba (Psidium guajava), jenipapo (Genipa americana),

coco-da-baía (Cocos nucifera), paratudo (Tabebuia aurea), tripa de galinha

(Bauhinia glabra) e neen (Azadirachta indica) foram as espécies que

apresentaram usos múltiplos.

O boldo (Plectranthus barbatus), o algodão (Gossypium barbadense)

e a terramicina (Alternanthera brasiliana) tiveram os maiores valores no

Consenso do Informante. Logo, esse resultado pode contribuir para verificação

da eficácia das espécies para uso medicinal, servindo como base para novos

estudos farmacológicos.

Tanto nos quintais quanto as matas de galeria, as plantas são

utilizadas principalmente para fins medicinais. Observamos que o uso de uma

planta pode ser empregada para mais de uma enfermidade, e que várias

espécies podem ser usadas separadamente ou em combinação para tratar

uma doença.

Algumas espécies medicinais também são usadas na cura de

enfermidades de animais, sendo, portanto uma opção barata para o

proprietário segundo relato dos informantes locais.

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Nas roças, os cultivos com maior número de citações foram à

mandioca, o milho, a banana e a cana-de-açúcar. A variedade nos cultivos

oferece uma diversificação na produção, além de uma fonte de alimento para

família e para cuidar dos animais e, uma renda extra.

Os adubos utilizados nas roças são procedentes dos dejetos de

animais domésticos, restos de alimentos, urina de gado e folhas da

manutenção do quintal. Os proprietários não possuim equipamentos agrícolas,

quando necessário alugam da Associação local.

A mata de galeria é muito importante para a comunidade, uma vez

que proporciona remédio, alimento, madeira para construção, sementes para

produção de mudas, artigos para artesanato, além de protegem a vegetação

nativa. Na mata de galeria, o angico (Anadenanthera colubrina), o cumbarú

(Dipteryx alata) e a aroeira (Myracrodruon urundeuva) foram as espécies com

maior número de categorias de uso.

Os estudos etnobotânicos podem ser uma importante ferramenta no

auxilio à conservação do conhecimento de populações como a comunidade

São Miguel. Portanto, esse tipo de estudo pode ser uma alternativa para evitar

a perda das informações presentes na cultura da comunidade com o passar do

tempo e assim evitando a erosão cultural local.

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5. REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA ALBUQUERQUE, U. P.; ANDRADE, L. H. C. Conhecimento botânico tradicional e conservação em uma área de caatinga no Estado de Pernambuco, Nordeste do Brasil. Acta Botânica Brasílica, São Paulo, v.16, n.3, p. 273-285, 2002a. ALBUQUERQUE, U. P.; ANDRADE, L. H. C. Uso de recursos vegetais da caatinga: o caso do Agreste do Estado de Pernambuco (Nordeste do Brasil). Interciência, Caracas, v. 27, n. 7, p. 336-346, 2002b. ALBUQUERQUE, U. P.; ANDRADE, L. H. C.; SILVA, A. C. O. Use of plant resources in a seasonal dry forest (Northeastern Brazil).Acta Botânica Brasílica,São Paulo, v. 19, n. 1, p. 27-38, 2005. ALBUQUERQUE, U.P.; LUCENA, R.F.P.; ALENCAR, N.L. Métodos e técnicas na coleta de dados etnobiológicos. In.: ALBUQUERQUE, U.P. de; LUCENA, R. F. P. de; CUNHA, V. F. C. de. Métodos e Técnicas na Pesquisa Etnobiológica e Etnoecológica. São Paulo: NUPEEA, 2010. p. 65-82. ALBUQUERQUE, U.P.; LUCENA, R.F.P.; CUNHA, L.V.F.C. Métodos e técnicas na pesquisa etnobotânica. 2ª Ed. Recife: Comunigraf, 2008. 323p. ALMEIDA, S. E.; PASA, M. C.; GUARIM, V. L. M. S. Uso da biodiversidade em quintais de comunidades tradicionais da Baía de Chacorore, Barão de Melgaço, Mato Grosso, Brasil. Biodiversidade, Cuiabá,v.13, n. 1, p. 141-155, 2014. ALMEIDA, S. R. de; WATZLAWICK, L. F.; MYSZKA, E.; VALERIO, A. F. Florística e síndromes de dispersão de um remanescente de Floresta Ombrófila Mista em sistema faxinal.Revista Ambiência, Guarapuava, v. 4, n. 2, p. 289-297, 2008. ALVES, R. R. N.; SOUTO, W. M. S. Ethnozoology in Brazil: currentstatus and perspectives. Journal of Ethnobiology and Ethnomedicine, v. 7, n. 22, p. 1 - 18, 2011. AMARAL, C. N.; GUARIM NETO, G. Os quintais como espaços de conservação e cultivo de alimentos: um estudo na cidade de Rosário Oeste (Mato Grosso, Brasil). Boletim Museu Paraense Emílio Goeldi. Ciências Humanas, Belém, v. 3, n. 3, p. 329-341, 2008. AQUINO, F. G.; RIBEIRO, J. F.; WALTER, B. M. T. Espécies vegetais de uso múltiplo em reservas legais de Cerrado, Balsas/MA. Revista Brasileira de Biociências, Porto Alegre, v. 5, n. 1, p. 147-149, 2007. ARAÚJO, L. G. Etnobotânica Caiçara: diversidade e conhecimento de recursos vegetais no litoral Paulista. 2007. 195f. Dissertação (Mestrado em Ecologia) - Universidade de Campinas, Campinas-SP.

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4. CONCLUSÕES GERAIS

Através da análise das condições socioeconômicas da população,

verificou-se necessária a implantação de inovações técnicas e econômicas

adaptadas às condições locais capazes de promover a valorização dos

recursos produtivos em suas diversas combinações, como por exemplo, o

incentivo a coleta de produtos florestais não madeireiros, uma possível

alternativa para equilibrar a conservação da biodiversidade com a geração de

renda. Portanto, mais estudos nesse sentido são necessários, buscando cruzar

informações sobre o conhecimento local e medidas de extração.

Para evitar a migração da população local se faz necessário o

desenvolvimento de ações, como implantação de postos de saúde,

acompanhamento das gestantes durante o pré-natal, inclusão do ensino médio

em período diurno. A migração dos jovens em busca de melhores

oportunidades sejam elas na educação ou no trabalho é evidente quando

observado que 48% das famílias entrevistadas não possuem nenhum filho na

propriedade, ficando apenas o casal responsável pela produtividade da

propriedade.

Tanto o homem quanto a mulher apresentaram posição de destaque

nas atividades de conservação e biodiversidade dos quintais, introduzindo

novas espécies, e mantendo formas de manejo ecológico. A interação das

pessoas com o ambiente propicia experiências que resultam no

desenvolvimento de um conhecimento sobre os recursos naturais e sobre o

ambiente.

Os quintais desempenham diversas funções socioambientais

importantíssimas para vida do homem na zona rural, permite a conservação da

biodiversidade, ao mesmo tempo em que valoriza os aspectos culturais da

agricultura familiar. Para os moradores em questão, este ambiente corresponde

à extensão de suas casas, onde a família se reúne em momentos de

comemoração, descontração, etc. Trata-se de um local cujos alimentos são

cultivados de acordo com o gosto e tradição das famílias, além do que muito do

que se produz nos quintais é consumida pelas famílias, principalmente

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verduras e frutas, consomem também os animais criados nesse sistema de

manejo e seus derivados, essa prástica minimiza significativamente o impacto

na renda das famílias e ajuda na segurança alimentar.

Os quintais da comunidade em estudo, por serem de grande

expansão, proporcionam o cultivo de plantas para diversas finalidades, sendo o

uso medicinal a categoria mais representativa. As famílias dos entrevistados

fazem uso de plantas consideradas medicinais na região para prevenção e

cura de diversas doenças. Este conhecimento etnobotânco revelou a existência

de 119 plantas utilizadas como medicinais demostrando que os entrevistados

possuem vasto conhecimento das espécies vegetais com propriedades

curativas.

As roças oferecem produção agrícola (verduras, legumes) que

garantem qualidade e o complemento das refeições diárias das famílias com

reduzido excedente que pode ser comercializado, onde o lucro adquirido com

esta venda é usado para compra de outros produtos como arroz, feijão, café,

facão, entre outros nos comércios locais. E as características dessas unidades

são definidas pelas condições estabelecidas pelos proprietários e pela

detenção de conhecimento transmitido entre as gerações. Não existem roças

coletivas na comunidade.

As matas de galerias possuem uma grande função ambiental, pois

preservam os recursos hídricos, a paisagem, a biodiversidade, protegem o

solo, além de garantir o bem-estar das populações humanas e disponibilizar

recursos para sua alimentação, tratamento de enfermidades, materiais para

construção, ente outros.

As unidades de paisagem oferecem meios diversificados para

sobrevivência das famílias que vivem na terra e da terra, portanto são espaços

que merecem ser estudados. Logo, estudos voltados para o resgaste do

etnoconhecimento pode ser uma alternativa para evitar a perda das

informações presente na cultura das comunidades com o passar do tempo.

Tanto o Cerrado como as espécies arbóreas encontradas nessas

unidades comprovam a valorização dos elementos naturais por parte da

agricultura familiar, que contribuem de maneira real para a preservação da

biodiversidade e a grande utilização dessas espécies para “remédios caseiros”

demostra o potencial para a indústria farmacêutica. Desta forma, oferece-se

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uma importante contribuição, a fim que surjam outras pesquisas para ampliar o

conhecimento do bioma, especialmente no que se refere à exploração racional

dos seus recursos naturais.

As informações levantadas neste estudo reforçam a importância da

região de Várzea Grande como um panorama de oportunidades para o

desenvolvimento de estudos e de estratégias integradas que tendam à

conservação in situ da biodiversidade local, bem como a conservação e o

resgate do etnoconhecimento. Assim, a universidade, através dos Programas

de Pós Graduação assume um papel importantíssimo nestas comunidades,

pois através de suas pesquisas contribui para a valorização e conservação do

saber local e das formas de construção deste saber.

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5. DEVOLUTIVAS

Será elaborada uma cartilha informativa como atividade devolutiva

dos resultados desta pesquisa, com os principais resultados obtidos nesse

levantamento etnobotânico, destacando a importância da conservação dos

remanescentes florestais nativos, tanto para a manutenção da diversidade

biológica, como pelo potencial de recursos vegetais que apresenta, conforme

citados pelos entrevistados.

Abordará também as principais plantas utilizadas na comunidade; a

automedicação; cuidados com o cultivo, coleta e armazenamento das plantas

medicinais; fabricação de remédios caseiros; precauções sobre o uso desses

medicamentos; plantas tóxicas; indicações terapêuticas e efeitos colaterais dos

vegetais.

Este material será desenvolvido com linguagem acessível e com

diversas ilustrações, para ser distribuído aos entrevistados da pesquisa e para

a biblioteca da escola local.

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ANEXOS

TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO

Você está sendo convidado (a) a participar como informante, em uma

pesquisa sobre conhecimento popular. Após ser esclarecido (a) sobre as

informações a seguir, no caso de aceitar fazer parte do estudo, assino no final

deste documento, que está em duas vias. Uma delas é sua e outra e do

pesquisador responsável. Em caso de dúvida, você pode entrar em contato

com a Coordenadação da Pós-graduação de Ciências Florestais e Ambientais.

INFORMAÇÕES SOBRE A PESQUISA:

Título do projeto: A Etnobotânica na Comunidade São Miguel, Várzea Grande,

MT.

Pesquisadora Responsável: Jeneffer Soares dos Santos Mamede

Pesquisadora Orientadora: Prof. Dra. Maria Corette Pasa/UFMT

Telefone para contato: (65) 3615-8685

Nome e assinatura do pesquisador:

CONSENTIMENTO DA PARTICIPAÇÃO DA PESSOA COMO SUJEITO

Eu, ____________________________________, portador do RG

___________________ e CPF _______________________, abaixo assinado,

concordo em participar do estudo como informante, disponibilizando

informação de interesse da pesquisa como relatos, gravações e fotografias,

desde que não me exponha perante a comunidade. Fui devidamente informado

e esclarecido pela pesquisadora sobre a pesquisa, os procedimentos nela

envolvidos.

Local e data: _______________________________________________

Nome e assinatura do sujeito ou responsável: __________________________

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FORMULÁRIO

1. Nome:..............................................................................................................

2. Sexo: ..............................................................................................................

3. Idade: ..............................................................................................................

4. Estado de Origem: ..........................................................................................

5. Estado Civil:....................................................................................................

6. Grau de Escolaridade: ....................................................................................

7. Quanto Tempo Reside no Local?....................................................................

8. Religião da Família?........................................................................................

9. Número de Pessoas na Família:.....................................................................

10. Número de filhos:

11. Todos Trabalham Na Propriedade? (....) Sim (....) Não

12. Quem trabalha fora desenvolve qual atividade?.............................................

13. Tem alguém aposentado? Quantos?..............................................................

14. Que atividade exerce atualmente?..................................................................

15. Que tipos de cultivos possuem na propriedade?............................................

...............................................................................................................................

...............................................................................................................................

16. Faz algum tipo de artesanato? (...) Sim (...) Não

17. Qual?...............................................................................................................

18. Em que situação? (....) Uso Próprio (....) Para Vender (....) Outros

19. De onde vem a água que vocês usam para beber e cozinhar?......................

20. Quais os implementos agrícolas que vocês usam?........................................

PLANTAS MEDICINAIS

21. Tem plantas que curam? Quais são? Modo de preparo? Qual parte da

planta usa? Seca ou fresca? É associada a outras plantas? Como é

armazenada?........................................................................................................

...............................................................................................................................

22. Como aprendeu? ............................................................................................

23. Frequência de uso?.........................................................................................

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DADOS DO I MÓVEL

24. Forma de apropriação do imóvel:

( )proprietário ( )aluguel ( ) mora de favor ( )outro

25. Documento que possui: ................................................................................. 26. Dimensão do imóvel: ...................................................................................... 27. Área construída: ............................................................................................. 28. Área de (quintal): ....................................outras áreas: ................................ 29. Tipo de habitação: (...) Alvenaria (...) Madeira (...) Estuque 30. Possui energia elétrica? ................................................................................. 31. Possui água encanada? ................................................................................. 32. Possui fossa séptica? .....................................................................................

QUINTAL

33. Localização do quintal: ( )fundos ( )ao lado ( )na frente ( )entorno

34. Planta no quintal? ( ) sim ( ) não

35. Ha quanto tempo............................................................................................

36. Por quê?.........................................................................................................

37. Quais as plantas remanescentes da vegetação natural?

...........................................................................................................................................

............

38. Quem cuida do quintal?..................................................................................

39. Quanto tempo gasta diariamente cuidando do quintal?..................................

40. Qual época do ano tem mais trabalho com o quintal?....................................

41. como planta? (conhecimento empregado): ....................................................

...........................................................................................................................................

............

42. Com quem aprendeu a plantar? .....................................................................

43. O que faz com as folhas e restos de capinas do quintal?

44. ( )queima ( )joga no lixo ( )faz adubo (composto) ( ) outro

45. Caso faça composto, explicar como?.............................................................

...........................................................................................................................................

...........

46. Compra algum insumo para usar no quintal? ( ) não ( ) sim

47. Quais?.......................................................................................................................

48. Cultivam plantas em outras áreas da residência? ( ) sim ( ) não

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49. Onde? Quais? Para que?

................................................................................

50. Usa os resíduos:

( ) na horta ( )nas fruteiras ( ) nas ornamentais( )vende

51. Outras utilidades das plantas no quintal..........................................................

Dados sobre atividades realizadas no quintal

52. É costume reunir no quintal? ( ) sim ( ) não 53. Paraque?..................................................................................................................

............

54. Outras atividades no quintal (por que?):.........................................................

...............................................................................................................................

55. Qual a importância do quintal para o sr.(a)? .................................................

56. Você já tirou/tira produtos da mata?.............................................................

61. Quais as plantas, por que e para que?

...............................................................................................................................

...............................................................................................................................

Animais

57. Cria animais na residência? ( ) sim ( ) não

58. Quais as espécies?

59. Quantidade (unidade): ....................................................................................

60. Instalações:( ) cercado ( ) solto

61. Alimentação:

62. Que animais são encontrados no quintal?..................................................... ............................................................................................................................... 63. Existem animais no quintal que prejudicam o crescimento e Desenvolvimento das plantas?............................................................................. ............................................................................................................................... 64. Como lidam com esses animais?.................................................................. ............................................................................................................................... 65. Como eles agem nas plantas?...............................................................................................................................