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Os Recursos Audiovisuais no Ensino Pré-Escolar e de 1. 0 Grau (Fundamentos Psicopedagógicos) 1 Trabalho apresentado por uma equipe de Professores(*) do Departamento de Edu- cação da UFC no I Seminário de Brinque- dos Pedagógicos realizado no Centro de Cultura Alemã em novembro de 1977. 1. INTRODUÇÃO Como decorrência do progresso científico e tecnológico do mundo atual, os objetivos da escola e os meios que ela. adota para atingi-Ias têm passado por constantes reformu- lações. O ensino baseado na exposição oral pelo professor de informações a serem memorizadas pelos alunos já não sa- tisfaz num mundo em constante mudança. É necessário que a escola adote meios mais eficientes, voltados para o desen- volvimento do raciocínio do aluno. Assim, ao lado de métodos de ensino que adotam unica- mente a exposição oral .pelo professor do material a ser aprendido, a escola moderna utiliza meios que possibilitam o contato direto do educando com esse material e/ou com re- presentação dos mesmos. (1) Emília Martins Veloso, Glaucenete Barros de Oliveira, Lindyr Saldanha Duarte, Terezinha Vera Corrêa. 137

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Os Recursos Audiovisuais no EnsinoPré-Escolar e de 1.0 Grau

(Fundamentos Psicopedagógicos) 1

Trabalho apresentado por uma equipe deProfessores(*) do Departamento de Edu-cação da UFC no I Seminário de Brinque-dos Pedagógicos realizado no Centro deCultura Alemã em novembro de 1977.

1. INTRODUÇÃO

Como decorrência do progresso científico e tecnológicodo mundo atual, os objetivos da escola e os meios que ela.adota para atingi-Ias têm passado por constantes reformu-lações. O ensino baseado na exposição oral pelo professorde informações a serem memorizadas pelos alunos já não sa-tisfaz num mundo em constante mudança. É necessário quea escola adote meios mais eficientes, voltados para o desen-volvimento do raciocínio do aluno.

Assim, ao lado de métodos de ensino que adotam unica-mente a exposição oral .pelo professor do material a seraprendido, a escola moderna utiliza meios que possibilitam ocontato direto do educando com esse material e/ou com re-presentação dos mesmos.

(1) Emília Martins Veloso, Glaucenete Barros de Oliveira, Lindyr SaldanhaDuarte, Terezinha Vera Corrêa.

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Pesquisas realizadas no campo da Psicologia da Apren-dizagem demonstram que na percepção sensorial está a basede toda aquisição de conceitos e atitudes. "Os olhos, os ou-vidos, as terminais nervosas que respondem à pressão, aocalor e ao frio, aos odores e ao sabor, são os meios atravésdos quais se realiza quase toda a aprendizagem. São os meiosde percepção" (Wittich e Schuller, 1962). A percepção é, pois,uma combinação de sensações e é dela que se origina o con-ceito de um fato ou objeto.

Os conceitos por sua vez são a base do raciocínio. Ao ra-ciocinar para a solução de um problema o aluno selecionaos conceitos que são indicados no caso, e rejeita os que nãoo são. Como a base para a formação de conceitos é a per-cepção, fica patenteado que a origem primeira do raciocíniosão as experiências persceptivas.

Em nível mais elevado, qual seja o da formação de ati-tudes, nas experiências concretas também se encontram, emúltima análise, o ponto de origem.

A experiência perceptiva é base para a formação de con-ceitos, raciocínio e atitudes. Observa-se que a relação entreestes três níveis é multidirecional.

Do exposto se conclui que da quantidade e da qualidadedas percepções conhecidas pelo aluno vai depender a forma-ção de conceitos, o desenvolvimento do raciocínio e a forma-ção de atitudes.

No presente trabalho procuramos mostrar que essas ex-periências perceptivas, no início da escolaridade, resultamde contato direto do aluno com o objeto ou fato que deveaprender. Gradativamente essa experiência direta pode sersubstituída por suas representações através dos recursos au-diovisuais, até que, em estágio mais avançado do desenvol-vimento desses alunos, possa-se dar predominância à utiliza-ção de símbolos.

Observe-se que trata-se de predominância de utilizaçãode um desses meios em cada estágio do desenvolvimento, enão de uso exclusivo de qualquer um deles. Assim, os sím-bolos serão introduzidos já na educação pré-prímáría, e a

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experiência direta também terá sua utilidade até o nívelsuperior.

Ao selecionar o conteúdo a ser aprendido pelos alunos,o professor se defronta com a difícil tarefa de selecionaraquele conteúdo que está efetivamente adequado ao estágiode desenvolvimento de seus alunos. Em geral, a aprendiza-gem de um conceito pressupõe a aprendizagem prévia deoutros conceitos. Assim, ao longo do seu desenvolvimentocognitivo o aluno parte de uma situação em que possuipoucos conceitos, para uma situação em que possui muitosconceitos. O mesmo acontece em relação ao desenvolvimentodo raciocínio e formação de atitudes.

A maneira como adquire esses conceitos evolui de umestágio inicial em que necessita de experiências diretas comobjetos e fatos, até um estágio em que lida com símbolos(verbais ou numéricos).

2. O DESENVOLVIMENTOINTELECTUAL DA CRIANÇA,SEGUNDO JEAN PIAGET

Acreditava-se anteriormente que as capacidades men-tais, de percepção, algumas noções de tempo e até mesmocertos conceitos fossem inatos. Piaget e colaboradores obser-varam que o desenvolvimento mental é produto gradativo deum aperfeiçoamento constante, do desafio oferecido pelo am-biente e das respostas criativas das crianças a esses desafios.Piaget colocou, portanto, a inteligência como um exemplode comportamento adaptativo pelo qual a criança enfrentao ambiente e as situações novas. Essa adaptação iniciar-se-iacom o comportamento reflexo básico do recém-nascido e am-pliar-se-ia até o raciocínio lógico e formal do adulto.

Ficou demonstrado que as crianças não herdam as ca-pacidades mentais. O que se herda realmente é a estruturafísica da inteligência (sistema nervoso e reflexos básicos desobrevivência). A inteligência, propriamente, como capaci-dade cada vez mais complexa de resolução de problemas, éconstruí da através do tempo em aquisições, organizações

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e adaptações sUcessivas. Sobre conceitos iniciais básicos acriança incorpora novos desafios, dá-lhes respostas ou solu-ções e incorpora novos esquemas de ação mais apropriadospa:a essas novas situações. De início, como esquemas deaçoes, esses conjuntos de comportamento que constituem oarsenal básico com que a criança enfrenta o mundo, passacom a conquista da linguagem a anexar uma nova aquisição- o esquema representacional - que é a incorporação dosímbolo e seu significado à vida da criança.s= melhor compreendermos a teoria piagetiana ne-cessano se faz que sejam introduzidos alguns de seus con-ceitos básicos OUaspectos fundamentais. Entre eles temos _o CONTEÚDO,a ESTRUTURA e a FUNÇÃO.

O CONTEÚDO- refere-se a dados fundamentais sobreo que o indivíduo pensa, seus interesses e formas de resolu-ção de problemas. Os conteúdos são manifestos e revelam ama~ei.ra peculiar de pensar de cada indivíduo. Porém o quemais mteressa no desenvolvimento da teoria piagetiana nãoé a qualificação desse conhecimento, mas sim a sua quali-dade, ou seja, Os processos subjacentes ao pensamento.

A ESTRUTURA- o conceito de estrutura é nitidamentebiológico. Como o desenvolvimento intelectual é resultantetambém da transmissio hereditária das estruturas físicasum certo tipo de comportamento inicial básico permaneceno início da vida pós-natal. Piaget observou que esses re-flexos ?áSicoS dão origem posteriormente a um novo tipo dem_ec~m~mo- a estrutura psicológica ou cognitiva - quenao e díretamenjj, herdada, mas sim, produto da criatividadedo indiví~uo e de sua interação com o ambiente. A criançapassa entao a repetir uma seqüência de atos "esquemas deação" que ~em a finalidade de obter efeitos em sua relaçãocom o ambI.ente. Logo que é desenvolvido o esquema de ação~assa a ~plIc~r.se a toda situação ou objeto novos, a fim deíncorporá-Ios a experiência da criança. O esquema de ação é,portanto, um padrão de comportamento que se manifestacorr: ordem ~ ~oerência e descreve um tipo regular de açãoaplicada a vanos objetos.

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FUNÇÕES INVARIANTES - Segundo Piaget, todas asespécies herdam duas tendências básicas - a ADAPTAÇÃOe a ORGANIZAÇÃO.

Por adaptação deveremos entender a função pela qualtodos os organismos reagem ao ambiente tentando adaptar--se a situações novas. A Adaptação possui dois aspectos - aASSIMILAÇÃOe a ACOMODAÇãO.

Na ASSIMILAÇÃOo indivíduo incorpora o objeto a seuorganismo - introjeta-o, faz com que ele se torne parte desi. Na ACOMODAÇãOo indivíduo age sobre o ORGANISMOfazendo com que ele se acomode para aceitar o objeto.Diante de uma situação nova o indivíduo não possuindo es-quema de ação para fazer frente àquela situação reage aco-modando-se, tentando ajustar-se ao ambiente.

A organização refere-se à tendência de todas as espéciesa sistematizar e organizar seus processos em sistemas coeren-tes, que podem ser físicos ou psicológicos.

Píaget observou também que o desenvolvimento mentalocorre em 4 etapas distintas às quais deu o nome de:

1. FASE SENSÓRIO-MOTORAque se estende do nasci-mento aos 2 anos, caracterizada apenas pelas aquisições re-ferentes ao mecanismo sensorial e de movimentação do in-divíduo.2. FASE DO PENSAMENTO PRÉ-OPERATÓRIO - 2 a 6anos. Nesta época a criança já atravessa uma fase de pensa-mento capaz de relacionar os estímulos como representativosde outros objetos, embora ainda não haja conexão total dosímbolo com a realidade. Podemos denominar esta fase comoa FASE DO PENSAMENTO MAGICO, tendo em vista que acriança coloca a realidade conforme seus desejos e visto doseu prisma o mundo todo é um mágico "faz de conta". Oraciocínio, neste período, é transdutivo.

RACIOCíNIO TRANSDUTIVO - do particular ao par-ticular. A criança elabora melhor os seus conceitos com umagradual coordenação das relações lógicas. Embora ocorraeste fato, o pensamento é ainda imperfeito, as conclusões sãointuitivas baseadas na observação. A criança já é capaz de

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agrupar objetos reunindo-os em classes de acordo com suaspercepções de similaridade. Este súbito enriquecimento deconceitos também é resultante da comunicação verbal. Mas,somente aos 7 anos torna-se capaz de perceber conceitos deinvariância ou constância dos objetos (sólidos, líquidos, etc.1e de reversibilidade das operações e ações.3. OPERAÇÕESCONCRETAS- Na fase de 7 a 12 anos acriança já utiliza a lógica e o raciocínio de um modo elemen-tar, porém só a aplica na manipulação de objetos concretos,não em proposições verbais. Nesta fase alguma representaçãojá é possível.4. OPERAÇÕESFORMAIS - é a fase que surge no inter-valo etário denominado adolescência (por volta dos 11-12anos). Se durante a fase de operações concretas a criançaera capaz de contar e classificar, colocando em série váriosobjetos, agia segundo as suas percepções concretas da reali-dade. Na fase formal a criança passa a ser capaz de operarcom as operações simbólicas. Enquanto as operações no pen-samento concreto são respostas a situações reais, no pensa-mento formal o adolescente pode lidar com conceitos hipoté-ticos que representem "a representação da representação".A linguagem dos adolescentes torna-se também abreviada csucinta. Ele torna-se capaz de raciocínio científico e de lógicaformal na argumentação verbal. Além disso avalia, critica ereflete sobre a qualidade de seus próprios pensamentos.Deixa de necessitar de manipulação concreta e confinar suashipóteses e atenção à situação imediata. Segundo Piaget eInhelder, o adolescente nessa fase atingiu o ponto crítico nodesenvolvimento intelectual.

3. PRINCíPIOS PIAGETIANOS BASICOS QUE FUNDA-MENTAMA'EDUCAÇAOPRÉ-PRIMARIA.

O ensino pré-escolar (alfabetização) corresponde ao pe-ríodo pré-operatório, que está situado entre o final do períodosensório-motor e o período de operações concretas, atingidopor volta dos 7 anos, aproximadamente. Neste estágio dedesenvolvimento o pensamento da criança é irreversível por

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falta de mobilidade e capacidade de abstração. A criançanestes períodos, por não dispor de esquemas mentais, recorreà ação efetiva e pela ação retira os dados para o exercício daatividade mental. O pensamento pré-operatório, devido à irre-versibilidade, fixa-se num sentido único e rígido: uma novarepresentação mental anula a outra. É um pensamento ego-cêntrico porque está centrado na ação do momento. A me-dida que a criança vai coordenando as ações, internalizan-do-as, parte para um novo nível de pensamento. Desta for-ma, as construções mentais superiores resultam de açõeselementares que foram um desafio para a mente infantil.Para Piaget, cada estágio do desenvolvimento cognitivo temsua própria forma de atividade. Considerando estas caracte-rísticas de organização mental, Piaget atribui uma impor-tância relativa aos recursos audiovisuais no ensino pré-es-colar. Para ele um estímulo só é estímulo na medida em queé significativo e ele só é significativo na medida em que háuma estrutura que permite sua assimilação. A assimilação,para Piaget, é um mecanismo fundamental da aprendizageme consiste na internalização de esquemas. Esquema é uma se-qüência bem -defínida de ações físicas ou operações mentais.Assimilação para ele é uma forma ativa de agarrar a reali-dade. Sem a atividade assimiladora não há didática ou peda-gogia eficientes.

Como a criança no pré-operatórío carece de representa-ção mental, o ensino para Piaget, neste período, tem que sereminentemente ativo, dinâmico, experiencial a ponto de esti-mular e permitir a atividade mental do aluno. Só assim I)

raciocínio se torna gradativamente mais efetivo, interioriza-do, operatório.

Piaget, apesar de reconhecer que os recursos audiovisuaisrepresentam um progresso em relação a métodos de ensinotradicionais, admite que eles não são suficientes para desen-volver atividade operatória, pois concretizam o ensino demodo figurativo. A representação figurativa além de dificul-tar a mobilidade de pensamento não substitui o esforço ope-ratório efetivo. Para Piaget os recursos audiovisuais são posi-tivos na medida da atividade que provocam, na medida em

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que a imagem leva à ação mental, ao exercício da atividadeoperatória.

O audiovisual é extremamente valioso para o desenvol-vimento de automatismos - é o caso básico do ensino de~ínguas estrangeiras - mas o objetivo do ensino, para Piaget,e algo mais que o automatismo.

Se o conhecimento é a assimilação da realidade a umae~tru!ura, é necessário que a didática esteja adequada à orga-mzaçao progressiva dos estágios mentais.

Analisando as idéias educacionais de Piaget, percebe-seque há muita coerência entre sua teoria de desenvolvimentocognitivo e suas sugestões para renovação do ensino pré--escolar.

Aplicação - Confrontemos suas sugestões com formasde ensino pré-escolar:

1. O ensino figurativo não é apropriado para o pré--operatório. É difícil para a criança, neste período, realizarcompensações, alterar a configuração perceptiva. O pensa-mento pré-operatório fixa-se num sentido único, uma novarepresentação mental anula a outra.

2. O ensino deve ser dinâmico; o importante não étransmitir conhecimento mas exercitar o raciocínio da crian-ça. Não tem sentido levar a criança a memorizar, o impor-tante é organizar, dinamicamente, o pensamento da criança.

3. O pensamento da criança é sincrético, por isso o me-lhor método de ensino da linguagem é o experiencial e nãoo método da silabação ou palavração que são analíticos.

4. No desenvolvimento cognitivo a discriminação e in-tegração são processos igualmente importantes.

5. O ensino deve ser dinâmico, favorecendo a mobili-dade de pensamento e a criatividade.

6. O ensino deve ser adaptado à estrutura mental dacriança, de tal forma que a compreensão seja imediata.

7. A noção de n.o no período pré-operatório deve seformar através de exercícios de correspondência e seriação.Antes de estas noções terem sido adquiridas, é inadequadolevar a criança a operar.

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8. Piaget reforça a necessidade de experiências ativaspara que a criança estruture as sucessivas percepções e passede um estado de indiferenciação para um estado analítico. Aaprendizagem de qualquer noção só será significativa namedida em que a criança tiver oportunidade de construí-Iaatravés da manipulação de objetos.

9. A aprendizagem deve ser progressiva, tanto em ter-mos de quantidade como em termos de qualidade.

10. Considerando que o desenvolvimento do raciocínioé caracterizado por coordenações e relacionamentos cada vezmais numerosas, deve-se usar uma multiplicidade de modosde apresentação nas tarefas escolares. O ensino nestes mol-des enriquece as experiências do indivíduo, tornando-o abertoa novas coordenações.

Em suma, o jogo é a atividade escolar preferida porPiaget para o ensino pré-escolar. O jogo, segundo ele, reúneo aspecto sensório-motor e o simbólico. Outro aspecto posi-tivo do jogo é socializar a criança, levá-Ia a aceitar normascomuns. O egocentrismo infantil vai sendo substituído, len-tamente, pela socialização da criança. Ao descrever o que vêe ao confrontar sua descrição com a relatada por outrascrianças que têm outro ângulo de visão, a criança ganha umaexperiência nova e valiosa, no sentido de vencer o seu egocen-trismo e chegar à objetividade. Fara Piaget o indivíduoatinge o pensamento científico exercitando sua observação.Desta forma o jogo, para Píaget, não envolve apenas umaatitude receptiva, é um exercício exploratório ativo que levaa criança a explorar e reconstruir o que viu ou ouviu. O es-sencial para o pensamento é levar a criança a compreendertransformações e estabelecer relações.

Finalmente, o ensino baseado numa metodologia pia-getiana consiste em falar à criança na sua linguagem, obede-cendo às estruturas mentais do seu pensamento e sobretudolevar a criança a reinventar, ao invés de reproduzir simples-mente. A lógica não deve ser ensinada à criança mas cons-truída por ela, em decorrência de suas atividades.

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4. RECURSOS AUDIOVISUAISNO ENSINO DE1.0 GRAU

O ensino de 1.0 grau no Brasil decorre em grande partedurante o período que Piaget chama de Operações Concretas(que se inicia por volta dos seis ou sete anos) e alcança afase das Operações Formais (que se inicia por volta dos 11primeiros anos).

O período das operações concretas tem como atividadestípicas as estruturas invariantes de classe, relações e núme-ros. E o período das operações formais tem como atividadestípicas o pensamento lógico ou hipotético.

Segundo Piaget, o desenvolvimento do pensamento -aspecto intelectual - é básico para a realização da apren-dizagem. É necessário que o aluno tenha atingido um deter-minado grau de desenvolvimento do pensamento, para quepossa integrar determinados conteúdos. Por isso, o professorde 1.0 grau deve partir do nível em que a classe se encontra,oportunizando experiências que sejam capazes de atender àsnecessidades dessa classe e que permitam um crescimentosignificativo dos elementos que a integram. Se, de início, nafase sensório-motora, a criança constrói seu desenvolvimentointelectual com base nas impressões sensoriais e nos movi-mentos, na fase operacional concreta já utiliza a capacidadede representar um objeto.

Na fase das Operações Concretas (que se estende dos 7aos 11 anos), os sistemas de ação, antes externos, tornam-semais internos e móveis, e reunem-se em conjuntos mais inte-grados e coerentes, com propriedades estruturais. Piaget pas-sa a falar então de operações. Operações é qualquer ato re-presentacional que é parte de um conjunto de atos interre-lacionados. Piaget descreve grande variedade dessas opera-ções lógicas como: adição, subtração, multiplicação, divisão,correspondência de termos, classificação, operações infra-ló-gicas, envolvendo quantidade, mensuração, tempo, espaço ~mesmo operações que dizem respeito a sistemas de valores einteração interpessoal. Piaget então introduz, a: essa altura,

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as estruturas lógico-matemáticas como modelos das estrutu-ras cognitivas.

Dos 12 anos em diante a criança inicia o estágio dasOperações Formais, quando já é capaz de resolver problemasa respeito de todas as relações possíveis entre eventos. O ado-lescente, nesta fase, já é capaz de pensar em termos abstra-tos, de formular hipóteses e testá-Ias sistematicamente. Ele écapaz de pensar em termos de possibilidades. Isto se refletena compreensão de noções científicas e, para Piaget, quandoo adolescente atinge o estágio das operações formais já temtodos os elementos necessários para utilizar o método expe-rimental da ciência. Reflete-se também nas preocupações doadolescente com problemas abstratos de valores, ideologias,preocupações com o futuro. Piaget propõe, como modelodessas estruturas formais, as estruturas lógico-matemáticas,como a multiplicação de características de objetos chegandoa uma matriz como a do tipo seguinte:

objetos vermelhosA

objetos não vermelhosA'

objetos redondos ABB

A'B

objetos não redondos AB'B'

A'B'

(Adaptado de Baldwin, 1967)(citado por Biaggio, 1976)

Multiplicação biunívica declasses.

Neste período o indivíduo já é capaz de pensar em ter-mos de tal matriz e utilizar proposições verbais. E, segundoPiaget, neste estágio, o adolescente já é capaz desse tipo deraciocínio formal.

Os recursos audiovisuais têm papel muito importante,obretudo os que se enquadram dentro de uma representaçãotiva e figurativa. É que os audiovisuais têm de ser introdu-

zidos no ensino, de acordo com a presença na criança, de es-

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truturas que permitam o seu uso. Assim, se de início o en-sino deve ser experiencial, ativo, aos poucos pode-se utilizarrecursos que exijam mais a visualização, ou seja, a utilizaçãode imagens.

A nível operatório, a distinção entre figurativo e opera-tivo torna-se importante porque as contribuições respectivasdos aspectos figurativo e operativo deixam de ser determi-nadas organicamente.

É possível, utilizando a analogia do "Cone de Experiên-cias" de Dale (1969) elaborar um cone com as fases dodesenvolvimento cognitivo de Piaget. O cone classifica váriostipos de materiais instrucionais de acordo com o relativo graude experiência concreta de cada estágio. Os vários níveis docone sugerem o método mais apropriado para o ensino deconceitos abstratos de acordo com as necessidades da crian-ça e as habilidades particulares de cada idade. Ao mesmotempo, sugere a natureza interrelacional e interdependentedas experiências de aprendizagem e dos materiais instrucio-nais.

Da base para o vértice o cone se dirige no sentido cres-cente de abstração e os materiais mais abstratos - as pala-vras, símbolos verbais - são usados em cada nível, uma vezque as crianças continuam a usar a palavra em todas as suasexperiências de aprendizagem.

O cone representa níveis de experiências audiovisuais,desde o primeiro estágio sensório-motor, de ação, até a co-municação simbólica, passando pelo estágio da experiênciafigurativa (pictórica).

Entre as experiências ativas citam-se experiências reais,experiências simuladas, dramatização, fantoches, etc.

Entre as experiências pictóricas, demonstrações, gravuras,slides.

Entre as experiências simbólicas, símbolos visuais, dia-gramas, gráficos, cartas didáticas, cartazes educativos, charge.

A base do cone representa atividades próprias do estágiosensório-motor em que as experiências precisam ser diretas,concretas, experiências que são o fundamento da aprendiza-gem. São experiências numerosas e ricas que provocam ím-

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pressões sensoriais, que envolvem significados e percepções,fruto da exploração do mundo.

No estágio das operações concretas, recursos audiovisuais,tais como demonstrações, amostras, feiras, filmes, televisão,rádio, gravadores e figuras, são importantes, proporcionandoexperiências que a criança observa, e que, observando, par-ticipa delas. Há um envolvimento da imaginação e criaçãode empatia.

No cume do cone estão os símbolos verbais, caracterís-ticos do estágio das Operações Formais. Aqui os símbolosverbais são usados como abstrações, conceitos, sem represen-tação ativa ou pictórica.

Como analogia visual, o cone de experiências não podeoferecer uma exata e detalhada relação entre os complexoselementos nele representados. Não é uma completa descriçãodo vasto complexo orgânico que constitui o procseso de co-municação e aprendizagem. Não há rigidez ou inflexibilidade,mas uma interação contínua entre essas experiências e osrecursos audiovisuais utilizados para a aprendizagem.

5. CONCLUSÃO

A partir das considerações apresentadas no decorrerdesse trabalho, gostaríamos de sugerir que, ao adotar re-cursos audiovisuais como um meio para facilitar o seu tra-balho, o professor tenha em mente que a escolha dessesrecursos deve estar na dependência de um conhecimento dosdados fornecidos pela moderna psicologia da educação comsuas contribuições sobre aprendizagem e desenvolvimentohumano.

Observamos que boa parte dos educadores vêem na uti-lização de um material audiovisual diversificado uma medidaque aumenta o interesse do aluno de hoje, proveniente deuma sociedade dominada por rica variedade de meios de co-municação. Concordamos com este ponto de vista na medidaem que acreditamos que muitas vezes os problemas de deva-neios e indisciplina por parte dos alunos resulta do fato de

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que as técnicas de ensino tradicionais não facilitam ou atédificultam a aprendizagem. O emprego de técnicas audio-visuais adequadas, poderá maximizar a aprendizagem do con-teúdo, minimizando assim os problemas acima referidos (de-vaneios, indisciplina, etc.) , o que por sua vez gera um climamais propício à aprendizagem na sala de aula.

Acrescente-se porém que a utilização de recursos audio-visuais não deve objetivar apenas o despertar do interesse doeducando. Deve, além disso e principalmente, possibilitar umcontato do aprendiz com o material a ser aprendido (ou comrepresentação desse) tendo com vistas à percepção de fatosbásicos para a formação de conceito, desenvolvimento do ra-ciocínio e formação de atitudes.

6. BIBLIOGRAFIA

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