“os caminhos do lixo” · os caminhos do lixo autor: cornÉlio zampier teixeira 1 “os caminhos...

OS CAMINHOS DO LIXO Autor:

CORNÉLIO ZAMPIER TEIXEIRA

1

“OS CAMINHOS DO LIXO”

COMÉDIA EM DOIS ATOS POR:

Cornélio Zampier Teixeira



2

Copyright 2005 by Cornélio

Zampier Teixeira

Todos os direitos reservados

e-mail: [email protected]

BELO HORIZONTE

DEZEMBRO/2004



3

CENÁRIO:

Salão comum. Pode ser construída uma coxia usando duas traves

de madeira, fechadas com cortina, para os atores que não

estiverem em cena. Modelo sugerido:

COXIAPALCO

4 x 3 m 4 x 3 m

PLATÉIA

PERSONAGENS:

1) Sô Lixo

2) Dona de Casa: Principal (SÁ DONA)

3) Três donas de casa não identificadas

4) Fiscal do Meio Ambiente

5) Agente de Saúde



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6) Jovem professora

7) Seis alunos infantis

OBJETOS DE CENA:

1) No Primeiro Ato: somente um pequeno cesto de lixo, de

plástico, abarrotado de lixo até a boca

2) No Segundo Ato: são abertas as cortinas da coxia e ela

se integra ao palco formando um único ambiente. Na parte de

trás, uma pequena mesa com uma cadeira. Nas laterais, duas

filas com 3 cadeiras cada uma, para os alunos. Um violão no

canto de fundos para o número musical da peça. QUADRO NEGRO e

QUADRO DE AVISOS DE CORTIÇA para fixar desenhos e figuras

CARACTERIZAÇÃO DOS PERSONAGENS:

1) SÔ LIXÃO

Ele entra em cena caracterizado de lixo e assim permanece

durante os dois atos da peça:

Chapéu de palha – um verdadeiro trapo!

Vestuário confeccionado como colcha de retalhos, com

algumas costuras rasgadas

Sapatos velhos com manchas de graxa ou de barro

Garrafas PET, uma grande e várias pequenas, pregadas em

todos os lugares da roupa. A grande será pregada de modo a

parecer sua genitália

Pedaços de trapo e de jornais velhos saindo dos bolsos

Uma folha de repolho (ou outra qualquer, desde que seja

grande) forrando o chapéu e com uma sobra na testa



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2) Dona de Casa (SÁ FULANA)

Vestida como uma dona de casa mesmo, mas com uma touca

meio suja na cabeça e um avental encardido

Luvas nas mãos meio rasgadas, com alguns dedos

aparecendo

Pés descalços (de vez em quando ela se abaixa e coça os

dedos, como se tivesse frieira)

3) Fiscal do Meio Ambiente (DOUTOR DO MEIO AMBIENTE)

Usa paletó e gravata

Um imenso crachá dependurado no peito com os dizeres:

“AGENTE AMBIENTAL”

Sapatos pretos, bem engraxados

Cabelo bem penteado

Pasta executiva (pode ser uma pasta de plástico A-4 do

tipo que os alunos usam para guardar cadernos e lápis) na

mão, contendo folhas e caneta esferográfica

4) Agente de Saúde (SÔ AGENTE)

Roupa comum, mas com um longo avental branco abotoado

Sapato ou tênis (na cor branca)

Sacola plástica pequena, contendo frascos plásticos com

líquidos de cores diferentes, como se fossem produtos

químicos para desinfetar o ambiente

5) Professora (DONA LINDINHA)



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Óculos de grau (ou parecendo ser)

Antena telescópica de rádio que ela usa para apontar

para os alunos e para os desenhos colocados no quadro de

avisos na parede atrás dela

Caderneta de chamada e caneta esferográfica

6) Seis alunos – 3 meninos e 3 meninas (ZEZINHO, MARCINHO,

HUGUINHO, JOANINHA, MELZINHA e BEL)

Todos vestidos com roupa de uniforme simples

Faixa de idade variando de 7 a 12 anos

Caderno e lápis para cada aluno

Buchas de papel amassado, casca de banana e qualquer

outro objeto que eles possam, eventualmente, iniciar uma

guerra enquanto a professora consulta suas anotações

7) Três donas de casa. São personagens secundários que

aparecem em cena somente no primeiro ato. Sem diálogo

Cabelos completamente despenteados como se estivessem

acabando de acordar

Vestem pijamas ou camisolas, muito simples



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PRIMEIRO ATO

PALCO QUASE VAZIO, COM UM ÚNICO OBJETO DE CENA: O PEQUENO

CESTO PLÁSTICO DE LIXO, ABARROTADO ATÉ UM POUCO ACIMA DA

BOCA. ELE ESTÁ COLOCADO JUNTO À CORTINA DA COXIA.

A ILUMINAÇÃO É INICIALMENTE FRACA. TOCA UMA MÚSICA DE FUNDO,

CALMA, DO TIPO QUE OS EXPECTATORES OUVEM ENQUANTO OS ATORES

NÃO ENTRAM EM CENA.

ACENDEM-SE TODAS AS LÂMPADAS.

A MÚSICA É INTERROMPIDA.

ENTRA EM CENA “SÁ FULANA” PISANDO COM OS CALCANHARES E

FAZENDO CARETAS PARA A PLATÉIA. O PROPÓSITO É DESPERTAR

RISADAS.

SÁ FULANA (FALANDO PRA SI MESMA):

- HOJE É DIA DE DAR SUMIÇO DO LIXO. Ô CANSEIRA!

(PASSA AS MÃOS NO AVENTAL. CONTINUA FALANDO PRA SI MESMA):



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- MAS CADÊ O LIXÃO, GENTE!

(CAMINHA COM CERTA LERDEZA EM DIREÇÃO À COXIA).

(QUASE BERRANDO):

- Ô LIXÃO! Ô LIXÃO, SEU DESGRAÇADO! CADÊ VOCÊ!

(O LIXÃO ENTRA TODO ATRAPALHADO, COM DOIS PEQUENOS

RECIPIENTES DE LIXO NAS MÃOS, ANDANDO EM ZIG-ZAG E AFRONTANDO

A PLATÉIA DANDO “BANANAS” COM OS BRAÇOS. ENQUANTO ANDA BATE

FORTE COM OS PÉS NO PISO)

- TÔ AQUI, SÁ DONA! NÃO TÁ ME VENDO?

(DEPOIS FALA BEM MAIS BAIXO COMO SE FOSSE SÓ PARA A PLATÉIA):

- ESTA VÉIA TÁ SURDA. E AGORA TÁ FICANDO CEGA. MORRE PESTE!

(CONTINUA ANDANDO, SÓ QUE AGORA EM CÍRCULOS EM TORNO DE SÁ

DONA. VAI RETIRANDO DOS BOLSOS AS TIRAS DE PAPEL E FAZENDO

BOLINHAS COM ELAS E JOGANDO PELO CHÃO. SÁ DONA FAZ CARA DE

ESPANTO E INDIGNAÇÃO, OLHANDO CADA BOLINHA REPICANDO. NADA

DIZ)

SÁ FULANA:

- HOJE É DIA DOCÊ TRABALHAR. TÁ ESPERANDO O QUÊ?



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(SÔ LIXÃO TENTA FAZER UMA EMBAIXADINHA COM UMA BOLOTA DE

PAPEL)

SÔ LIXÃO, FALANDO IRONICAMENTE, COM SOTAQUE CAIPIRA BEM

ACENTUADO:

- A S’NHORA É QUEM DÁ AS ORDE!

(SÁ DONA FAZ UM GESTO DE CONSENTIMENTO BALANÇANDO A CABEÇA

PRA CIMA E PRA BAIXO. EM SEGUIDA PEGA O CESTO DE LIXO

COLOCADO NO CENÁRIO E DESPEJA-O LENTAMENTE NA CABEÇA DE SÔ

LIXÃO. AFASTA-SE UM POUCO PARA SE DIVERTIR COM A CARA

CONTRARIADA DE SÔ LIXÃO. AS OUTRAS TRÊS DONAS DE CASA ENTRAM

EM CENA. ANDANDO EM CÍRCULOS EM TORNO DE SÔ LIXÃO TAMBÉM

DESPEJAM O CONTEÚDO DE SEUS CESTOS EM SUA CABEÇA. AS QUATRO

DONAS DE CASA COLOCAM OS CESTOS VAZIOS NO CHÃO. ALINHAM-SE EM

FRENTE A SÔ LIXÃO)

AS QUATRO DONAS DE CASA, RINDO SIMULTANEAMENTE:

- RÁ, RÁ, RÁ!

(SÔ LIXÃO ABAIXA A CABEÇA. LEVANTA O CHAPÉU E TIRA A FOLHA DE

REPOLHO. DÁ UMA MORDIDA NA PARTE DO TALO DA FOLHA,

POSICIONADA NA PARTE DE TRÁS DO CHPÉU. FICA MASTIGANDO COM

CARA DE DERROTADO).

SÔ LIXÃO (SE FAZENDO DE POBRE COITADO):



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- ETA MUNDO DIFÍCER! AH, SE EU ME CHAMASSE “REIMUNDO”!

(SE A PLATÉIA RIR, ELE FAZ GESTOS PEDINDO MAIS RISOS)

SÔ LIXÃO (RECOMEÇA AINDA NO PAPEL DE VÍTIMA, DEPOIS LEVANTA A

CABEÇA COM AR DE INDIGNAÇÃO):

- É ASSIM MESMO. TODO MUNDO TRIPUDIA DO LIXÃO!

(PARA UM POUCO. VOLTA-SE PARA A PLATÉIA PARA PROVOCAR MAIS

RISOS)

- TRIPUDIA! CÊS CONHECE ESTA PALAVRA, GENTE? TÔ GASTANDO

HOJE!

(SÔ LIXÃO, OLHANDO AS QUATRO MULHERES):

- OCÊS AÍ, SUAS DONA DE CASA DE M..., QUERO DIZER, MIXURUCA.

SE NÃO FOSSE EU, AI QUE CHEIRO! CÊS IA FICAR TUDO (ELE DIZ

“FUDIDA” SÓ COM O MOVIMENTO DA BOCA, SEM EMITIR O SOM DA

PALAVRA)

(AS QUATRO DONAS DE CASA VÃO SE JUNTANDO EM VOLTA DELE)



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SÁ DONA:

- ISTO É VERDADE

(VIRA-SE PARA AS OUTRAS TRÊS):

- É OU NÃO É?

(AS TRÊS CONFIRMAM COM UM GESTO DE CABEÇA. AS QUATRO SE

APROXIMAM DE SÔ LIXÃO. DÃO TAPINHAS DE CONSOLO NOS OMBROS. SÁ

DONA DÁ LOGO NA CARA. DEPOIS ELAS COMEÇAM A ABANAR AS MÃOS EM

FRENTE AOS PRÓPRIOS NARIZES PARA INDICAR QUE O CHEIRO DO “SEU

LIXÃO” NÃO ESTÁ NADA AGRADÁVEL).

SÁ DONA, OLHANDO PRO CHÃO:

- PEIDORREIRO!

SÔ LIXÃO, MUITO IRRITADO, COM SEU ACENTO CAIPIRA:

- CONTRA A “INGUINORANÇA” NUM TEM JEITO MESMO! AS “SINHORA”

NUM SABE QUE LIXÃO SOLTA GASES?

(AS QUATRO, OLHANDO UMA PRA OUTRA, ERGUEM OS QUEIXOS AO MESMO

TEMPO)

SÁ DONA, CONCORDANDO:



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- ISTO É VERDADE. É POR ISSO QUE TODO MUNDO TEM VERGONHA DO

PRÓPRIO LIXO.

(AS OUTRAS ACENAM COM A CABEÇA, CONCORDANDO)

SÔ LIXÃO:

- E DO LIXÃO TAMBÉM, NÉ SUA CACHORRA CADELA VACA ELEFANTA!

(AS QUATRO SAEM DE CENA, EMPERTIGADAS, ANDANDO EM FILA

INDIANA COMO SE FICASSEM MUITO OFENDIDAS)

SÔ LIXÃO, DANDO DE OMBROS:

- TÔ NEM AÍ!

(E ENTÃO, PARA FAZER GRAÇA, REPETE, AGORA CANTANDO OS VERSOS

DA MÚSICA DE LUKA):

- TÔ NEM AÍ, TÔ AÍ, NÃO VEM FALAR DOS SEUS “POBREMA” QUE EU

NÃO VOU OUVIR

(AS LUZES DO PALCO SE APAGAM. SÔ LIXÃO SE RETIRA PARA A

COXIA. AS LUZES VOLTAM A SE ACENDER. CONTINUA A MÚSICA DE

FUNDO, AGUARDANDO O SEGUNDO ATO).



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SEGUNDO ATO

PALCO AINDA CHEIO DE LIXO. CORTINA FECHADA. DA COXIA SE OUVEM

AS VOZES DE DOIS MENINOS CHEGANDO PARA A AULA DO DIA. FALAM

AO MESMO TEMPO EM TOM BAIXO E NÃO SE DISTINGUE EXATAMENTE O

QUE DIZEM. A ALGAZARRA AUMENTA. CHEGAM OS DEMAIS ALUNOS.

AGORA O BARULHO É TOTAL. TODOS FALAM AO MESMO TEMPO. O QUE SE

OUVE É COMPLETAMENTE DESCONEXO.

AS LUZES DO PALCO SÃO ACESAS. CORTINA CONTINUA FECHADA. OUVE-

SE A VOZ DA PROFESSORA CHEGANDO.

DONA LINDINHA:

- CRIANÇAS, SILÊNCIO.

O ALVOROÇO CONTINUA, EXATAMENTE COMO NUMA ESCOLA ONDE É

PRECISO PEDIR SILÊNCIO UMA SEGUNDA OU UMA TERCEIRA VEZ PARA

QUE O SILÊNCIO SE FAÇA.

DONA LINDINHA (JÁ AOS BERROS):

- SILÊNCIO, SILÊNCIO!



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FINALMENTE, AS CRIANÇAS SE CALAM. OUVE-SE O ARRASTAR DE

CADEIRAS (FORMANDO DUAS FILAS DE TRÊS, ONDE SE SENTAM NUMA

DELAS OS MENINOS E NA OUTRA AS MENINAS)

DONA LINDINHA (FALANDO SUAVEMENTE);

- BOM DIA CRIANÇAS!

OS SEIS ALUNOS, AO MESMO TEMPO:

- BOM DIA, DONA LINDINHA!

DONA LINDINHA:

- ZEZINHO, FAÇA O FAVOR DE ABRIR A PORTA.

A CORTINA É ABERTA E APARECE A SALA DE AULA, AGORA SE

INTEGRANDO À FRENTE DO PALCO ONDE ESTÁ A GRANDE SUJEIRA NO

CHÃO. A PROFESSORA ESTÁ SENTADA NUMA CADEIRA ATRÁS DE SUA

MESA, CONTENDO ALGUNS PAPÉIS E A CADEERNETA DE CHAMADA.

DONA LINDINHA (OLHANDO OS PAPÉIS E SEM NOTAR A SUJEITA NO

CHÃO).

DONA LINDINHA:

- VAMOS À CHAMADA! BEL

BEL (RESPONDE CHEIA DE ENCANTAMENTO PELA PROFESSORA)

DONA LINDINHA:



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- HUGUINHO

HUGUINHO NÃO RESPONDE, DISTRAÍDO EM ENFIAR O DEDO NO NARIZ.

DONA LINDINHA ENTÃO LEVANTA O OLHAR EM SUA DIREÇÃO PARA

REPETIR A CHAMADA QUANDO VÊ TODO O LIXO ESPARRAMADO À SUA

FRENTE.

DONA LINDINHA (HORRORIZADA):

- O QUE VOCÊS FIZERAM AQUI, CRIANÇAS!

HUGUINHO (TIRANDO O DEDO DO NARIZ):

- PRESENTE! EU NÃO FUI, PROFESSORA!

OS DEMAIS ALUNOS (EM UNÍSSONO):

- NEM EU!

DONA LINDINHA:

- ENTÃO, QUEM FOI, PELO AMOR DE DEUS!

ZEZINHO (FALANDO ENTRE OS DENTES):

- EU, CHAPOLIN COLORADO!

GARGALHADA GERAL E INCONTROLÁVEL DE TODOS OS ALUNOS.

DONA LINDINHA (OUTRA VEZ COM IRRITAÇÃO):



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- SILÊNCIO, TURMA! EU SÓ QUERO SABER QUEM FOI.ISTO AQUI ESTÁ

FEDENDO!

OS ALUNOS CONCORDAM, ABANANDO AS MÃOS DIANTE DO NARIZ. NO

CANTO DE FUNDO DA COXIA UM COBERTOR VELHO SE MOVE.

FINALMENTE, O COBERTOR É JOGADO DE LADO E DE BAIXO DELE SURGE

O “SEU LIXÃO”.

ALUNOS (APONTANDO PARA “SEU LIXÃO”):

- É ELE, PROFESSORA!

“SEU LIXÃO” SE ERGUE. DE CIMA DELE CAEM NO CHÃO CASCAS DE

BATATA, FOLHAS MURCHAS DE ALFACE, FRASCOS DE REMÉDIOS, PILHAS

DE LANTERNA, CACOS DE TIJOLOS, VIDROS E UMA EMBALAGEM DE

FORMICIDA.

“SEU LIXÃO” (FAZENDO CARA DE DESÂNIMO):

- JOGARO TUDO ISTO NI MIM DE NOITE!

SÁ DONA ENTRA EM CENA TRAZENDO MAIS LIXO. A LUVA NA MÃO

DIREITA ESTÁ RASGADA E O DEDO INDICADOR APARECE POR INTEIRO.

SÁ DONA (APONTANDO O DEDO PARA “SEU LIXÃO”):

- VÊ SE FICA QUIETO! O SENHOR NÃO SABE QUE SEU PAPEL É

RECOLHER TODA A SUJEIRA?

“SEU LIXÃO” ABRE A BOCA PARA RESPONDER, MAS É INTERROMPIDO

POR UM ESTRANHO QUE ENTRA EM CENA REPENTINAMENTE.



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DONA LINDINHA (SE LEVANTANDO DA MESA E CAMINHANDO RAPIDAMENTE

NA DIREÇÃO DO ESTRANHO):

- ALTO LÁ. ONDE O SENHOR PENSA QUE VAI?

O ESTRANHO APONTA O DEDO EM DIREÇÃO AO PRÓPRIO PEITO

INDICANDO O CRACHÁ ONDE ESTÁ ESCRITO “AGENTE AMBIENTAL”.

AGENTE AMBIENTAL (COM AR DE AUTORIDADE):

- A SENHORA NÃO SABE LER? SOU O AGENTE AMBIENTAL. ESTOU AQUI

PARA ATENDER A UMA DENÚNCIA!

SÁ DONA, “SEU LIXÃO” E DONA LINDINHA SE OLHAM MUTUAMENTE,

DENOTANDO GRANDE SURPRESA. OS ALUNOS APROVEITAM PRA COMEÇAR A

ALGAZARRA DE CHUTAR LIXO UNS NOS OUTROS.

SÔ LIXÃO, SÁ DANA E DONA LINDINHA FALANDO AO MESMO TEMP:

- DO QUE O SENHOR TÁ FALANDO, SENHOR AGENTE?

AGENTE AMBIENTAL:

- RECEBI A DENÚNCIA DE LIXO DEPOSITADO IRREGULARMENTE NESTE

LUGAR!

“SEU LIXÃO” (IMUNDO DA CABEÇA AOS PÉS E RESPONDENDO COM CARA

DE INOCENTE):

- NÃO TEM NADA DE IRREGULAR AQUI!



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AGENTE AMBIENTAL (SE APROXIMANDO DE “SEU LIXÃO” E OLHANDO

HORRORIZADO TUDO O QUE ESTÁ NELE):

- OLHA ESTA IMUNDÍCIE, ESTE CHEIRO!

“SEU LIXÃO”:

- ALTO LÁ! MEU CHEIRO É ESTE MESMO. SÃO OS GASES DA MATÉRIA

OR-GÂ-NI-CA!

AGENTE AMBIENTAL:

- ENTÃO... OS GASES PRECISAM SER ELIMINADOS!

“SEU LIXÃO” (LEVANTANDO LIGEIRAMENTE UMA PERNA COMO SE FOSSE

SOLTAR UM PUM):

- TÁ BOM, ENTÃO VOU ELIMINAR!

AGENTE AMBIENTAL (PULANDO NA SUA FRENTE PARA IMPEDIR):

- NÃO É ASSIM QUE SE ELIMINAM OS GASES.

O AGENTE AMBIENTAL CAMINHA COM SUA PASTA EM DIREÇÃO À MESA DA

PROFESSORA. SEM PEDIR LICENÇA, ABRE-A E TIRA UM PEDAÇO DE

TUBO DE PVC E UM ISQUEIRO.

AGENTE AMBIENTAL (VOLTANDO-SE NOVAMENTE PARA O “SEU LIXÃO”):

- VOU TE ENSINAR COMO SE FAZ. DEITA AÍ!

“SEU LIXÃO” OBEDECE E SE DEITA DE COSTAS, ENCOLHENDO-SE.



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AGENTE AMBIENTAL (INTRODUZINDO O TUBO NA BOCA DE “SEU LIXÃO”

ENQUANTO AS LUZES DO PALCO SE APAGAM PARA MAIOR REALCE DOS

EFEITOS ESPERADOS. O ISQUEIRO, AJUSTADO PARA TER UMA CHAMA

BEM LONGA, É INTRODUZINDO NA BOCA DE CIMA DO TUBO DE PVC E É

ACESO).

AGENTE AMBIENTAL (FELIZ COM O RESULTADO ENQUANTO AS LUZES SE

ACENDEM NOVAMENTE E “SEU LIXÃO” SE LEVANTA):

- PRONTO, NÃO TEM MAIS CHEIRO.

BORBURINHO GERAL, COM TODOS CONCORDANDO, INCLUSIVE “SEU

LIXÃO”.

“SEU LIXÃO”, PEGANDO UM VIOLÃO E SE DIRIGINDO À FRENTE DO

PALCO NO MEIO DA SUJEIRA DO CHÃO, COMEÇA A CANTAR.

- LIXO, LIXO, LIXO

C

- CÊ É O CÃO, CÊ É O BICHO

C F7

- PARECE PRAGA DE CARRAPICHO

D7

- RABO CORTADO DE “LARGATIXO”

F7

- PÊLO GRUDADO NO RABICHO.

C

“SEU LIXÃO” SE RETIRA PARA O CANTO DO PALCO, SÓ FAZENDO O

ACOMPANHAMENTO. SOBE UM TOM PARA AS CRIANÇAS CANTAREM O



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REFRÃO. ATRÁS DAS CRIANÇAS DONA LINDINHA, SÁ DONA E O AGENTE

AMBIENTAL FICAM DE BRAÇOS DADOS, DANÇANDO.

- O LIXO É MUITO FEDORENTO

D

- DELE NINGUÉM SE LIVRA, NÃO!

A

- QUEIMAR O GÁS DO PEIDORRENTO

Em

- ESTA VAI SER A SOLUÇÃO.

F7 D

AS CRIANÇAS, DONA LINDINHA, SÁ DONA E O AGENTE AMBIENTAL SE

VÃO PARA O FUNDO DO PALCO. “SEU LIXÃO” RETORNA AO CENTRO DA

CENA PARA A SEGUNDA PARTE.

- VOU ME LIVRAR DESSA SUJEIRA

C

- PRA NINGUÉM MAIS FALAR BESTEIRA

C F7

- NEM A SÁ DONA ALCOVITEIRA

D7

- NEM O AGENTE LÁ NA BEIRA

F7

- QUE VAI QUERER ME DAR RASTEIRA.

C

“SEU LIXÃO” RETORNA AO CANTO DO PALCO PARA FAZER O

ACOMPANHAMENTO DAS CRIANÇAS NO MESMO REFRÃO E ENCERRAR A

PARTE MUSICAL DA PEÇA.



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- O LIXO É MUITO FEDORENTO

D

- DELE NINGUÉM SE LIVRA, NÃO!

A

- QUEIMAR O GÁS DO PEIDORRENTO

Em

- ESTA VAI SER A SOLUÇÃO.

F7 D

TODOS RECUAM NO PALCO ENQUANTO DONA LINDINHA DÁ TRÊS PASSOS À

FRENTE.

DONA LINDINHA (DIRIGINDO-SE AOS ALUNOS):

- CRIANÇAS, HORA DO RECREIO.

ALUNOS (JÁ RETORNANDO À ALGAZARRA, ENQUANTO DISPARAM PARA

FORA DO PALCO):

- OBA! OBA!

O PALCO FICA VAZIO ENQUANTO HÁ UM BREVE CORTE DE ILUMINAÇÃO

DEIXANDO-O MOMENTANEAMENTE ESCURO. QUANDO AS LUZES REAPARECEM

O AGENTE DE SAÚDE ESTÁ EM CENA, EMPERTIGADO, COM AS MÃOS

ENFIADAS NOS BOLSOS FRONTAIS DE UM LONGO AVENTAL BRANCO.

ELE PIGARREIA COMO SE QUISESSE PEDIR A ATENÇÃO DO PÚBLICO

PARA COMEÇAR A FALAR.

AGENTE DE SAÚDE (MOSTRANDO UM CARTAZ)



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- QUEM MORA NA ROÇA CONSOME QUE TIPO DE ÁGUA?

(ALGUÉM COLOCADO NA PLATÉIA GRITA: “DE CISTERNA”)

AGENTE DE SAÚDE

- PARABÉNS, É ISSO MESMO. E O QUE VEM A SER A ÁGUA DE

CISTERNA? É A ÁGUA DE CHUVA QUE INFILTRA PELO TERRENO E FORMA

UM DEPÓSITO FEITO UMA ESPONJA CHEIA DE ÁGUA. TÃO ENTENDENDO?

SE A ÁGUA DE CHUVA ATRAVESSAR UMA CAMADA DE LIXO A ÁGUA FICA

POLUÍDA. VOCÊS BEBEM A ÁGUA E FICAM DOENTES. ALGUÉM AQUI QUER

FICAR DOENTE.

(UM CORO DE VOZES GRITA DA COXIA: “EU NÃO”)



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AGENTE DE SAÚDE:

- ALÉM DISSO O CHORUME DO LIXO QUE SE MISTURA COM A ÁGUA DO

SOLO PODE TER COISAS MUITO PERIGOSAS E ATÉ MATAR. ALGUÉM AQUI

QUER MORRER?

(UM CORO DE VOZES GRITA DA COXIA: “EU NÃO”)

AGENTE DE SAÚDE:

- ALGUÉM AQUI SABE O QUE É “MEIO AMBIENTE”?

ENTRAM EM CENA A PROFESSORA E OS ALUNOS DE MÃOS DADAS. PARAM

NA LATERAL DO PALCO E RESPONDEM PAUSADAMENTE:

- É TUDO AQUILO QUE NÃO SOU EU MESMO.

AGENTE DE SAÚDE:

- ESTOU IMPRESSIONADO COM A RESPOSTA. PARABÉNS, PROFESSORA!

PRIMEIRO ALUNO, TIRANDO UMA FOLHA DO BOLSO E LENDO:

- SÓ EU POSSO CAUSAR DANOS A ELE.

SEGUNDO ALUNO, REPETINDO O GESTO:

- A NATUREZA É SEMPRE INOCENTE EM SEUS ATOS.

TERCEIRO ALUNO, REPETINDO O GESTO:



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- SÓ O HOMEM BOM PODE SER GUARDIÃO DA NATUREZA

QUARTO ALUNO, REPETINDO O GESTO:

- A NATUREZA É SEMPRE GRATA AOS QUE CUIDAM BEM DELA.

O FISCAL DO MEIO AMBIENTE, SÁ DONA E AS OUTRAS MULHERES

VOLTAM À CENA. PALCO CHEIO. TOCA UMA MÚSICA SUAVE FAZENDO

FUNDO PARA O AGENTE DE SAÚDE APRESENTAR SUA MENSAGEM FINAL:

AGENTE DE SAÚDE, EMOCIONADO:

- O RICO E O POBRE, O DOUTOR E O MENDIGO, O POLÍTICO E O

HOMEM DO POVO, NINGUÉM ESTÁ LIVRE DE PRODUZIR LIXO. O QUE

DIFERENCIA UNS DOS OUTROS ESTÁ DENTRO DE SI, UMA COISA QUE

APONTA O DEDO PARA CADA UM QUANDO ELE AGRIDE O MEIO AMBIENTE.

ESTA COISA SE CHAMA CONSCIÊNCIA. A CULTURA DO DESPERDÍCIO DE

ALIMENTOS NO BRASIL É UM CRIME. QUASE 60% DO QUE SE PRODUZ

NÃO SE COME. VAI PARA OS DEPÓSITOS DE LIXO. QUANDO EU JOGO O

LIXO FORA DO LIXO ELE ACABA INDO PARAR NA ÁGUA, SEJA DEBAIXO

DA TERRA, SEJA NOS CÓRREGOS, RIBEIRÕES E RIOS. ÁGUA DOENTE É

DOENÇA DO PLANETA TERRA. ALIMENTO DESPERDIÇADO VIRA LIXO

ORGÂNICO, QUE SE TRANSFORMA EM GASES, QUE POLUEM O AR E

ESQUENTAM A TERRA. QUEM JOGA COMIDA FORA NÃO PODE RECLAMAR DE

CALOR. O LIXO DAS FAZENDAS TEM DE SER JOGADO LONGE DAS CASAS,

DAS CISTERNAS E DAS NASCENTES. MUITAS DOENÇAS APARECEM QUANDO

SE BEBE A ÁGUA CONTAMINADA PELO CHORUME PRODUZIDO PELO LIXO.

AGENTE DE SAÚDE, OLHANDO A PROFESSORA:

- A SENHORA QUER DIZER ALGUMA COISA?



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PROFESSORA:

- LIXO É TUDO QUE SOBRA DEPOIS DE CONSUMIR O QUE COMPRAMOS OU

PRODUZIMOS. ESTE É O TIPO DE EXCESSO QUE NÃO FAZ BEM À

NATUREZA. SOMOS FILHOS DA MESMA TERRA, TANTO QUANTO AS

PLANTAS, OS ANIMAIS, AS SERRAS, OS RIOS, AS CACHOEIRAS E O AR

QUE RESPIRAMOS. OS HUMANOS PRECISAM COMPREENDER QUE SÓ ELES

CAUSAM A DESTRUIÇÃO DOS DEMAIS.

A PROFESSORA OLHA PARA O FISCAL DO MEIO AMBIENTE.

FISCAL DO MEIO AMBIENTE:

- LIXO BOM É AQUELE QUE PODE SER RECICLADO E VOLTA À CADEIA

DE CONSUMO SEM A NECESSIDADE DE RETIRAR MAIS COISAS DO MEIO

AMBIENTE. SEMPRE NO SENTIDO DE POUPAR OS RECURSOS NATURAIS. É

A RESSURREIÇÃO DESTES RECURSOS, POIS O QUE JÁ PODIA SER

CONSIDERADO MORTO VOLTA A TER VIDA PARA SATISFAZER ÀS

NECESSIDADES DE CONSUMO DE NOSSA SOCIEDADE.

PROFESSORA:

O LIXO É TUDO AQUILO QUE DESPREZAMOS. POR ISSO NOS

ENVERGONHAMOS TANTO DELE. NOSSO CARÁTER FICA TOTALMENTE

ESTAMPADO NAS COISAS QUE DESCARTAMOS, DESDE AS CARTAS DE AMOR

QUE NUNCA TIVEMOS CORAGEM DE ENVIAR ATÉ OS OBJETOS DOS QUAIS

QUEREMOS NOS LIVRAR, COMO UM ÁLBUM DE UM CASAMENTO QUE ACABOU

E DEIXOU FERIDAS ABERTAS.

SUGESTÃO:



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PODEM SER FEITAS PROJEÇÕES ENQUANTO OS ATORES SE RETIRAM PARA

UM LOCAL ESCURO NA COXIA ANTES DE VOLTAREM À CENA PARA

AGRADECIMENTO. POR EXEMPLO:

TRABALHADORES IRRIGANDO HORTALIÇAS COM A ÁGUA DO RIO,

SUGERINDO QUE A ÁGUA PODERÁ CONTER ALGUMA CONTAMINAÇÃO.

PESSOAS BEBENDO ÁGUA POTÁVEL.

F I M

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