os atletas paraolímpicos na imprensa análise comparativa ... · feliz a cada dia. pelo amor,...
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Os Atletas Paraolímpicos na Imprensa – Análise Comparativa
da Cobertura Noticiosa da mídia no Brasil e em Portugal de
1996-2008
Dissertação apresentada com vista à
obtenção do grau de Mestre em
Ciências da Comunicação – Área de
Especialização em Estudos de Media e
Jornalismo.
Orientador: Professor Doutor Rui Alexandre Novais
Tatiane Hilgemberg Figueiredo
Porto, Setembro de 2010
II
Ficha de catalogação
Provas de Mestrado
Figueiredo, T. (2010). Os Atletas Paraolímpicos na Imprensa – Análise
Comparativa da Cobertura Noticiosa dos mídia no Brasil e em Portugal de 1996-
2008. Porto: T. Figueiredo. Dissertação apresentada às provas de Mestrado em
Ciências da Comunicação FLUP. Edição de autor.
PALAVRAS-CHAVE: ATLETAS PARAOLÍMPICOS, MÍDIA, BRASIL,
PORTUGAL
III
Agradecimentos
Ao terminar essa jornada da minha vida percebi que o mais difícil seria escrever os
agradecimentos. Como traduzir em palavras o apoio incondicional de tantos que
cruzaram meu caminho.
Começo então a agradecer aos meus pais. Os melhores pais do mundo. Ao meu pai por
me ensinar tanto sobre a vida, por me dar forças e por ter sempre palavras de
encorajamento quando precisei. À minha mãe, pela grande mulher que é, com um
coração que não cabe no peito, por me apoiar, por me ouvir e por me manter firme nos
meus propósitos mesmo à distância.
Aos meus irmãos por me inspirarem a querer crescer cada vez mais, e por me ajudarem
a superar a saudade.
Ao Alessandro, meu marido, pela oportunidade de ver o mundo e por me fazer mais
feliz a cada dia. Pelo amor, carinho, compreensão e apoio, e pelas privações a que este
percurso acadêmico nos levaram.
Ao “mestre” desta caminhada, Prof. Rui Novais, que muito mais do que orientador é um
modelo de profissional e amigo. Soube me encaminhar com maestria, acreditou em meu
potencial, e ajudou-me a concretizar meu sonho com paciência, sempre impulsionando-
me para frente.
Aos familiares que torceram por mim. Aos amigos do Brasil que sempre me apoiaram.
Aos amigos de Portugal, em especial à Prof. Ana Luísa Pereira, por ter me indicado o
início do caminho.
À Faculdade de Comunicação Social da Universidade Federal de Juiz de Fora por me
abrir as portas ao conhecimento. E aos professores Álvaro Americano e Diogo Tourino
pelo apoio ao longo do caminho.
V
Índice
Agradecimentos ....................................................................................................................... III
Índice de Quadros .................................................................................................................. VII
Índice de Gráficos .................................................................................................................... IX
RESUMO ................................................................................................................................ XI
ABSTRACT .......................................................................................................................... XIII
1. INTRODUÇÃO .................................................................................................................... 3
2. DEFICIÊNCIA E SOCIEDADE ......................................................................................... 13
2.1 Modelo Médico ............................................................................................................. 16
2.2 Modelo Social ............................................................................................................... 18
2.3 A necessidade de um novo modelo ................................................................................ 20
3. MÍDIA E DEFICIÊNCIA.................................................................................................... 20
4. METODOLOGIA ............................................................................................................... 27
4.1 Corpus do estudo ........................................................................................................... 28
4.2 A Imprensa Brasileira e Portuguesa ............................................................................... 29
4.2.1 A imprensa brasileira ............................................................................................. 29
4.2.2 A imprensa lusa ...................................................................................................... 31
4.3 Hipóteses e objetivos .................................................................................................... 32
4.4 Codificação ................................................................................................................... 33
4.5 Sistema Categorial......................................................................................................... 35
4.5.1 Temas ..................................................................................................................... 38
4.5.2 Terminologia .......................................................................................................... 39
4.5.2.1 Tipos de Deficiência ............................................................................................ 39
4.5.3 Estereótipos ............................................................................................................ 40
5. APRESENTAÇÃO E DISCUSSÃO DOS RESULTADOS ................................................. 45
5.1 Temas ........................................................................................................................... 50
5.2 Terminologia ................................................................................................................. 71
VI
5.2.1 Tipos de Deficiência ............................................................................................... 80
5.3 Estereótipos ................................................................................................................... 84
5. CONCLUSÃO .................................................................................................................... 95
6. BIBLIOGRAFIA .............................................................................................................. 103
VII
Índice de Quadros
Quadro 1 - Dois modelos de deficiência .................................................................................. 15
Quadro 2 - Número de atletas e medalhas ................................................................................ 33
Quadro 3 – Sistema Categorial empregado na Análise de Conteúdo ........................................ 35
Quadro 4 – Número total de notícias por ano ........................................................................... 45
Quadro 5 – Número de notícias presentes em cada meio noticioso analisado no Brasil e em
Portugal por edição dos Jogos Paraolímpicos. ......................................................................... 46
Quadro 6 – Notícias de cada edição no Brasil e em Portugal (em %). ...................................... 47
Quadro 7 – Número de notícias produzidas pelo próprio jornal e adquiridas de agências de
notícia em cada edição no Brasil e em Portugal. ...................................................................... 48
Quadro 8 – Comparativo entre o número de Atletas, medalhas e notícias de Brasil e Portugal nas
quatro edições. ........................................................................................................................ 48
Quadro 9 – Temas presentes nas quatro edições analisadas no Brasil e em Portugal.
Porcentagem relativa ao número total de temas em cada edição. .............................................. 51
Quadro 10 – Percentagem das unidades de registro categorizadas da subcategoria prática
desportiva em Portugal nas quatro edições analisadas. Porcentagens relativas à subcategoria
prática desportiva. ................................................................................................................... 52
Quadro 11 – Percentagem das unidades de registro categorizadas da subcategoria prática
desportiva no Brasil nas quatro edições analisadas. Porcentagens relativas à subcategoria prática
desportiva. .............................................................................................................................. 52
Quadro 12 - Percentagem das unidades de registro categorizadas da subcategoria atleta
paraolímpico em Portugal nas quatro edições analisadas. Porcentagens relativas à subcategoria
atleta paraolímpico. ................................................................................................................. 60
Quadro 13 - Percentagem das unidades de registro categorizadas da subcategoria atleta
paraolímpico no Brasil nas quatro edições analisadas. Porcentagens relativas à subcategoria
atleta paraolímpico. ................................................................................................................. 60
Quadro 14 - Percentagem das unidades de registro categorizadas da subcategoria questões
político-econômicas em Portugal nas quatro edições analisadas. Porcentagens relativas à
subcategoria questões político-econômicas. ............................................................................. 64
Quadro 15 - Percentagem das unidades de registro categorizadas da subcategoria questões
político-econômicas no Brasil nas quatro edições analisadas. Porcentagens relativas à
subcategoria questões político-econômicas. ............................................................................. 64
Quadro 16 - Percentagem das unidades de registro categorizadas da subcategoria Jogos
Paraolímpicos em Portugal nas quatro edições analisadas. Porcentagens relativas à subcategoria
Jogos Paraolímpicos................................................................................................................ 67
Quadro 17 - Percentagem das unidades de registro categorizadas da subcategoria Jogos
Paraolímpicos no Brasil nas quatro edições analisadas. Porcentagens relativas à subcategoria
Jogos Paraolímpicos................................................................................................................ 67
Quadro 18 – Porcentagem de tipos de terminologias, relativas ao total de terminologias no ano,
de Brasil e Portugal nas edições analisadas. ............................................................................. 71
VIII
Quadro 19 – Porcentagem das unidades de registro da terminologia genérica, relativas ao total
de terminologias genéricas do ano, de Portugal nas edições analisadas. ................................... 73
Quadro 20 – Porcentagem das unidades de registro da terminologia genérica, relativas ao total
de terminologias genéricas do ano, do Brasil nas edições analisadas. ....................................... 73
Quadro 21 – Porcentagem das unidades de registro da terminologia relacionada à vitória, derrota
ou currículo do atleta, relativas ao total de terminologias deste gênero do ano, em Portugal nas
edições analisadas. .................................................................................................................. 75
Quadro 22 – Porcentagem das unidades de registro da terminologia relacionada à vitória, derrota
ou currículo do atleta, relativas ao total de terminologias deste gênero do ano, no Brasil nas
edições analisadas. .................................................................................................................. 75
Quadro 23 – Porcentagem das unidades de registro da terminologia relacionada adequadamente
à deficiência, relativas ao total de terminologias deste gênero do ano, em Portugal nas edições
analisadas. .............................................................................................................................. 77
Quadro 24 – Porcentagem das unidades de registro da terminologia relacionada adequadamente
à deficiência, relativas ao total de terminologias deste gênero do ano, no Brasil nas edições
analisadas. .............................................................................................................................. 77
Quadro 25 – Porcentagem das unidades de registro da terminologia relacionada
inadequadamente à deficiência, relativas ao total de terminologias deste gênero do ano, em
Portugal nas edições analisadas. .............................................................................................. 79
Quadro 26 – Porcentagem das unidades de registro da terminologia relacionada
inadequadamente à deficiência, relativas ao total de terminologias deste género do ano, no
Brasil nas edições analisadas. .................................................................................................. 80
Quadro 27 – Porcentagem dos tipos de deficiências registrados, em Portugal nas edições
analisadas, referentes ao total de deficiências identificadas no ano ........................................... 81
Quadro 28 – Porcentagem dos tipos de deficiências registrados, no Brasil nas edições
analisadas, referentes ao total de deficiências identificadas no ano. .......................................... 81
Quadro 29 – Número de deficiências identificadas em cada edição analisada, em Portugal e no
Brasil. ..................................................................................................................................... 83
Quadro 30 - Porcentagem dos estereótipos registrados em ambos os países, nas edições
analisadas, referentes ao total de estereótipos identificados no ano .......................................... 85
Quadro 31 – Porcentagem das unidades de registro do estereótipo Coitadinho, em Portugal nas
edições analisadas, referentes ao total do estereótipo em causa identificadas no ano. ............... 87
Quadro 32 – Porcentagem das unidades de registro do estereótipo Coitadinho, no Brasil nas
edições analisadas, referentes ao total do estereótipo em causa identificadas no ano. ............... 87
Quadro 33 – Porcentagem das unidades de registro do estereótipo Super-herói, em Portugal nas
edições analisadas, referentes ao total do estereótipo em causa identificadas no ano. ............... 89
Quadro 34 – Porcentagem das unidades de registro do estereótipo Super-herói, no Brasil nas
edições analisadas, referentes ao total do estereótipo em causa identificadas no ano. ............... 89
IX
Índice de Gráficos
Gráfico 1 – Comparativo do número de notícias por edição no Brasil e em Portugal.................47
Gráfico 2 – Número de notícias e número de deficiências identificadas no Brasil......................84
Gráfico 3 – Número de notícias e número de deficiências identificadas em Portugal.................84
XI
RESUMO
Desde os seus primórdios a sociedade sempre marginalizou e inabilitou as pessoas com
deficiência. Foi apenas nos últimos 200 anos que as políticas a favor das pessoas com
deficiência apareceram. Uma das dimensões da sociedade que terá contribuído para a
melhoria da qualidade de vida das pessoas com deficiência, foi o fenômeno social do
desporto, que facilitou seu processo de integração à sociedade. Os êxitos alcançados
nesse processo, fizeram com que o esporte adaptado deixasse de ser somente terapêutico,
para se tornar de alto rendimento. Dessa forma surgem os Jogos Paraolímpicos, que
ocupam lugar de prestígio, e a par com outros grande eventos esportivos também têm
cobertura midiática. Porém, ao se analisar a atuação da mídia no sistema de
representações e discursos referentes à pessoa com deficiência, estas se encontram
permeadas por subjetividades e, por vezes, reforçando preconceitos e estereótipos. É
nesse contexto que o futuro estudo tem como finalidade analisar e ampliar as discussões
sobre as relações entre a mídia e as Paraolimpíadas. O objetivo geral deste estudo é,
então, comparar a cobertura da mídia impressa dos Jogos Paraolímpicos de 1996, 2000,
2004 e 2008, no Brasil e em Portugal, analisando a quantidade de tal cobertura, os
temas presentes, a terminologia utilizada, os tipos de deficiência com mais tempo de
antena, e os estereótipos nos quais os atletas foram enquadrados. Neste sentido
concluímos que há uma tendência para o crescimento da quantidade de informação
sobre os Jogos Paraolímpicos ao longo do tempo, contudo este aumento é ainda muito
lento e tímido. Verificamos ainda que a imprensa brasileira foi responsável pela maior
parte da cobertura. Relativamente aos temas presentes, notamos que os temas
apresentados enquadravam a vitória dos paraolímpicos de forma a banalizar o feito dos
atletas, ao focar fundamentalmente nos resultados. No que toca à questão da
terminologia verificamos que apenas Portugal apresentou terminologia mais adequada
com o passar do tempo, o mesmo não ocorreu no Brasil. Com relação ao tipo de
deficiência mais retratada, de uma forma geral, verificamos que em quase todas as
edições, em ambos os países a deficiência com a maior taxa de ocorrências é a
Deficiência Visual, seguida pela Paralisia Cerebral. Sendo, que os estereótipos de super-
herói e coitadinho foram encontrados.
Palavras-chave: Atletas Paraolímpicos; Mídia; Portugal, Brasil.
XIII
ABSTRACT
Since the beginning the society has always marginalized and disqualify people with
disabilities. It was only in the last 200 years that the policies for peoples with
disabilities arose. One of the dimensions of the society that contributed to improve the
quality of life for these people, was the phenomenon of sport, which facilitated the
process of integration into society. The successes of this process enable the adapted
sport cease to be only therapeutic to become high performance. Thus come the
Paralympic Games that occupied a place of prestige, and alongside with the others
major events also have media coverage. However, when analyzing the role of the media
in the system of representation and discourses about people with disabilities, they are
permeated by subjectivity and, sometimes, reinforcing prejudices and stereotypes. In
this context, the future research aims to analyze and extend the debate about the
relations between media and Paralympic Games. The general purpose of this study is
compare the press coverage of the Paralympic Games of 1996, 2000, 2004 and 2008, in
Brazil and Portugal, by the analyze of the amount of coverage, the present issues, the
terminology used, the types of disability with more airtime, and stereotypes in which the
athletes were framed. In this sense we conclude that the growth of the amount of
information about the Paralympic Games over time is a trend, but this increase is slow
and timid. We verify that the Brazilian press was responsible for the most of the
coverage. Regarding the present themes, we noted that the issues presented framed the
victory of the paralympic athletes in ways that trivialize the achievement of them,
mainly by focusing on results. Regarding the terminology we found that only Portugal
had most suitable terminology over time, this did not occur in Brazil. Concerning with
the type of disability, in general, we found that in almost all editions, in both countries
the disability with the highest rate of occurrences is the Visual Impairment, followed by
Cerebral Palsy. And the stereotypes of super-crip and pitiful handicapped were found.
Key- words: Paralympic Athletes; Media; Portugal; Brazil.
INTRODUÇÃO
3
1. INTRODUÇÃO
A comunicação constitui um elemento fundamental, para não se dizer vital, para os
seres humanos sendo os meios de comunicação de massa “(…) um factor de
importância determinante e com um lugar central no funcionamento da sociedade”
(Correia, 2000, p. 13).
Apesar de encontrarmos respostas diametralmente opostas à questão “De que forma os
meios de comunicação influenciam no comportamento das audiências?”, podemos
afirmar que a mídia, direta ou indiretamente, interferem nas formas de conhecer, pensar
e agir (ibidem) do público, influenciam “(…) nos modos de conhecer e interpretar a
realidade, nas concepções e aspirações, nos hábitos e comportamentos, nas orientações e
princípios que inspiram as formas de relacionamento e de intervenção na vida social”
(Ibid., p. 16).
Da mesma forma também desempenham um papel importante no processo de
socialização, considerando o conceito de socialização descrito por Wright (1968, p. 105)
como o “(…) processo pelo qual o indivíduo adquire a cultura do seu grupo e interioriza
suas normas sociais, fazendo com que seu comportamento leve em conta as expectativas
dos outros”. Assim, podemos afirmar que a mídia ensina valores, ideologias e crenças
das quais emergem representações sociais acerca de determinados grupos (Pereira,
2008).
Os meios de comunicação, especificamente a informação e o jornalismo, mantém uma
íntima relação com a sociedade, sendo dela produto mas tendo também o poder de
interferir na mesma.
Enquanto, simultaneamente, reflexo e agente de mudança da realidade, os media são hoje, (…), uma multifacetada e poderosa máquina de
condicionamento global de opiniões, dos comportamentos e dos
valores, assumindo uma verdadeira função estruturante na organização e modelização do todo social (Correia, 2000, p. 27).
Portanto ao produzir uma mensagem, a mídia também produz sentido. Pelo exposto
percebemos a importância dos meios de comunicação em relação às pessoas com
deficiência, pois a pouca informação e contato de que dispomos sobre a questão da
deficiência advém da mídia (Pereira, 2008), dando a ela portanto o poder sobre o tipo de
informação veiculada, e os estereótipos associados.
4
Diariamente somos bombardeados por informações, que tentam, de uma forma ou de
outra, criar, mudar ou cristalizar atitudes ou opiniões nos indivíduos (Alexandre, 2001).
É o que McLuhan (1969) chamou de mundo retribalizado, onde as pessoas passam a ser
constantemente massacradas por inúmeras e variadas informações, vindas de todas as
partes do mundo. Sabendo que a mídia atinge simultaneamente uma vasta audiência de
milhares de pessoas, e em alguns casos podemos dizer milhões, em um curto espaço de
tempo, facilmente compreende-se a importância que assumem, ocupando um lugar
central no funcionamento social.
Numa sociedade influenciada pelos meios de comunicação, estes podem ter um grande
impacto em nosso conhecimento e atitude acerca das pessoas com deficiência. Por
lidarem com a produção, reprodução e disseminação de informação que fundamentam a
compreensão de grupos sociais – visão social e auto-imagem –, a mídia se tornou um
instrumento chave na divulgação e criação de representações sociais.
As representações sociais se modificam ou se atualizam dentro de
relações de comunicação diferentes. Dessa forma, a mídia, integrada
por um grupo de especialistas formadores e sobretudo difusores de representações sociais, é responsável pela estruturação de sistemas de
comunicação que visam comunicar, difundir ou propagar
determinadas representações (Alexandre, 2001).
De fato, foram apenas nos últimos 200 anos que as políticas a favor das pessoas com
deficiência apareceram. Desde os seus primórdios que a sociedade tendeu a
marginalizar e inabilitar as pessoas com deficiência apondo-lhes o estigma da diferença.
Na Antiguidade o “problema” da deficiência não existia, pois as crianças que nasciam
com algum tipo de deficiência eram abandonadas e em sua grande maioria acabavam
morrendo. Na Idade Média, com o advento do Cristianismo, o homem passa a ser visto
como manifestação de Deus, sendo, portanto, o extermínio das pessoas com deficiência
uma prática inaceitável. A visão da deficiência se transforma sendo agora atribuída ora a
desígnios divinos, ora à possessão demoníaca, por uma razão ou por outra a principal
atitude da sociedade em relação a tais indivíduos era de intolerância e punição (Aranha,
2007). A partir do século XV, a pessoa com deficiência passa a ser vista como um ser
improdutivo, ou seja, um “peso” para a sociedade.
Nos séculos XVII e XVIII, a discussão sobre a deficiência ganha certo fôlego, as
atitudes vão desde a institucionalização até o ensino especial. No século XIX e XX
alguns governos começam a reconhecer sua responsabilidade no cuidado do bem-estar
5
destes cidadãos. A partir daí o debate sobre o tema passa a ser mais amplo e novos
direitos vão sendo conquistados.
Contudo mesmo na atualidade, e apesar de vivermos numa sociedade dita inclusiva, o
preconceito para com a pessoa com deficiência é ainda prevalecente. Todo o indivíduo
que foge aos padrões de normalidade é considerado estigmatizado, sendo que tal como
afirma Pontes (2001), o estigma não está nem no sujeito, nem na deficiência, mas nos
“valores culturais estabelecidos pela sociedade que permitem categorizar as pessoas que
fogem aos padrões de normalização, aferindo a estas determinados rótulos sociais”.
Marques (2001a) refere que os estereótipos são aplicados às pessoas com deficiência,
pois são socialmente tidas como incapazes e improdutivas, e biologicamente
consideradas “anormais” (modelo médico).
Segundo a Organização Mundial de Saúde, 25% da população do planeta está
diretamente envolvida com a questão da deficiência1. Apesar disso, a mídia parece
desconhecer esta parcela da população. De acordo com estudos realizados nos anos 90,
a qualidade e a quantidade da cobertura midiática, das pessoas com deficiência
encontrava-se abaixo dos padrões, e, geralmente, tais indivíduos eram representados de
forma estereotipada e irreal.
Uma das facetas que mais tem contribuído para a melhoria da qualidade de vida das
pessoas com deficiência e facilitado o processo de integração na sociedade e na mídia, é
fenômeno do esporte. Os êxitos alcançados nesse domínio, fizeram com que o esporte
adaptado deixasse de ser meramente de cariz terapêutico, para se converter numa
atividade de alto rendimento. Os Jogos Paraolímpicos assumiram-se como corolário e
expoente máximo do desporto adaptado com um número crescente tanto de países como
de atletas participantes em cada edição.
Tais competições olímpicas adaptadas às pessoas com deficiência, até pela sua
dimensão, têm consequentemente, vindo a merecer um incremento em termos da
atenção mediática. Sendo inegável nesse respeito o contributo da mídia para a
divulgação e promoção dos eventos esportivos, transformando as grandes competições
em verdadeiros espetáculos.
1 Dados de 2005
6
Na verdade os meios de comunicação desempenham um papel crucial na construção da
realidade (Traquina, 2002) e constituem-se desde há algum tempo a esta parte como
veículos privilegiados da formação da opinião pública no que concerne a assuntos
relacionados com a sociedade em geral e com alguns grupos sociais, como o caso da
população com deficiência. Não obstante o seu potencial, o histórico da atuação dos
media em termos das representações e discursos adotados referentes à pessoa com
deficiência, porém, não raro apenas replica os preconceitos e estereótipos sociais.
Referindo estudos anteriores sobre os efeitos da media na sociedade, Schantz e Gilbert
(2001) concluíram que os meios de comunicação de massa influenciam, principalmente,
reforçando normas e atitudes.
O tratamento mediático dado ao paraolimpismo, confere ao deporto adaptado uma
consideração social, que pode trazer prejuízos ou benefícios ao desenvolvimento do
mesmo bem como à integração das populações com deficiência. (Auslander e Gold,
1999; Calvo, 2001). De acordo com Marques (2001a) as vezes o uso de certo termos,
muito difundidos e aparentemente inocentes, reforça preconceitos. Daí que a análise de
terminologias empregadas pelos meios de comunicação seja relevante, na medida em
que “se a informação não é cuidada, acaba por reforçar estigmas e posturas
preconceituosas transmitidas culturalmente, que podem significar, no mínimo, um
empecilho à evolução e ao desenvolvimento social” (Amaral 1994, p. 7). Paralelamente,
a abordagem e a terminologia utilizadas pelos media segundo o mesmo autor reflete-se
“na interpretação da sociedade sobre os principais temas de interesse colectivo”
(ibidem).
Além disso, ao se analisar a atuação da mídia no sistema de representações e discursos
referentes ao atleta com deficiência, percebe-se que esta geralmente retrata essas
pessoas de forma irreal e estereotipadamente. Schell e Duncan (1999), por exemplo,
examinaram a cobertura televisiva Norte-Americana dos Jogos Paraolímpicos de 1996,
enquanto Schantz and Gilbert (2001) analisaram a cobertura da imprensa escrita
Francesa e Alemã, enfatizando a terminologia utilizada, os estereótipos presentes e os
temas mais frequentes. Mais recentemente, Thomas e Smith (2003) exploraram a
cobertura da imprensa escrita Britânica das Paraolimpíadas de 2000 em Sydney,
focando particularmente na terminologia utilizada para descrever os atletas com
deficiência, e a linguagem e imagens usadas para retratar as performances. É de se notar,
7
que os resultados desses estudos apontam, em graus diferentes, para questões
semelhantes. Todos os estudos mencionados revelaram que a mídia (tanto audiovisual,
quanto escrita) tende a descrever as performances dos atletas com deficiência de forma
relativamente consistente com o modelo médico. Sendo assim, estes atletas tendem a ser
retratados como “vítimas” ou pessoas “corajosas” que “superaram” o próprio
“sofrimento” da deficiência para participar em um evento esportivo, um super-herói.
Este estereótipo deixa a impressão de que a pessoa com deficiência para se ajustar terá
de fazer algo extraordinário ou realizar um esforço heróico para compensar a sua
limitação (Schell e Duncan, 1999). O modelo do super-herói viria reforçar as baixas
expectativas da sociedade acerca das pessoas com deficiência (Hardin e Hardin, 2004),
e enfatizar o esforço individual dessas pessoas para se adaptarem; como se ter uma
deficiência fosse culpa das mesmas (Schantz e Gilbert, 2001). O que depreende-se deste
discurso é que as pessoas sem deficiência, quando bem sucedidas nos seus
empreendimentos, alcançariam o sucesso pelo talento ou pela inteligência; enquanto
aquelas que têm alguma deficiência o teriam feito pela necessidade de compensar o
„mal‟ que os aflige.
Nesse sentido, o tratamento midiático dado ao paraolimpismo confere a este desporto
uma consideração social diferente, com prejuízos ao desenvolvimento do mesmo, e
também à integração das populações com deficiência. (Calvo, 2001).
Este estudo, portanto, tem por finalidade perceber como são representados os atletas
com deficiência nos media portugueses e brasileiros, nos períodos de 1996, 2000, 2004
e 2008, comparando as representações em cada país. O processo de formação de
atitudes é complexo e influenciado por diversos fatores, entre eles estão, principalmente,
os antecedentes culturais e demográficos, e o contato, direto ou indireto – através dos
meios de comunicação – com pessoas com deficiência (Auslander e Gold, 1999a).
Neste sentido, antes de prosseguirmos é interessante considerar a classificação
apresentada por Ronen e Shenkar (apud Hickson e Pugh, 1995). Estes autores referem-
se a uma “torta cultural” dividindo em “fatias” os países que possuem história e
características comuns. Assim sendo, eles falam, entre outros grupos, nos Latinos. No
grupo Latino estão França, Itália, Brasil, Portugal, Argentina, México e Peru. Desta
forma, deve-se considerar que Brasil e Portugal possuem traços comuns, como por
exemplo o idioma e os valores da religião católica. Assim, eles fazem parte de um grupo
8
comum, apesar de guardarem diferenças quanto a pertencer ao chamado “velho mundo”
(Portugal) ou ao “novo mundo” (Brasil). Para além disso, estas duas nações possuem
um passado comum de mais de 300 anos, fazendo com que partilhem uma proximidade
cultural muito forte. No passado a posição de colônia-metrópole fez com que o Brasil
absorvesse partes da cultura portuguesa, algumas destas partes sobreviveram intactas,
enquanto outras foram misturadas à cultura negra ou indígena. Hoje, Portugal consome
cultura brasileira, através, principalmente, das novelas, filmes e músicas. Estes foram
alguns dos motivos que nos levaram a escolher ambos os países para a análise que se
segue.
Uma vez que, como dito anteriormente, os meios de comunicação influenciam no
processo de socialização e na transmissão de elementos culturais de uma geração à
outra, será possível perceber estes mesmos elementos culturais na cobertura midiática
em questão, e dessa forma não só obter mais informações sobre a representação deste
evento em Portugal e no Brasil, mas mediante essa análise comparativa de dois países
histórico-culturalmente próximos, detectar eventuais diferenças na forma como o
jornalista constrói a realidade Paraolímpica.
Para este fim é necessário destacar alguns segmentos de análise, pelo que analisaremos:
a quantidade de informação presente nos media de ambos os países no período
seleccionado; os temas presentes; a terminologia empregada; os diferentes tipos de
deficiência presentes; e os estereótipos. Diversos estudos recentes apontam para
melhorias progressivas na cobertura midiática, e revelam que o atleta com deficiência
tem vindo a ser cada vez mais visto pela vertente de atleta, e não por sua deficiência.
Além disso, a terminologia utilizada tem vindo a ser progressivamente mais adequada.
Estes fatores apontam para uma representação social mais positiva destes paratletas,
pelo que nossas expectativas e hipóteses iniciais tendem para uma conclusão algo
positiva, sendo que esperamos que a quantidade de informação irá aumentar no decorrer
do tempo, que essa quantidade de informação será maior na mídia brasileira do que na
portuguesa – por razões que serão explicitadas no capítulo de metodologia –, que os
assuntos mais tratados terão a ver com a prática desportiva com ênfase nos resultados,
que a terminologia empregada tenderá a ser cada vez mais adequada ao longo das
edições dos Jogos Paraolímpicos tanto no Brasil quanto em Portugal, que a deficiência
física será mais retratada em detrimento aos outros tipos de deficiência, e em ambos os
9
países, e, finalmente, que os atletas com deficiência serão representados
estereotipadamente, em ambos os países, sendo que os estereótipos de super-herói e
coitadinho serão os mais encontrados.
Para atingir estes objetivos, esta dissertação foi estruturada da seguinte forma:
primeiramente a revisão de literatura, em que consta as relações entre deficiência e
sociedade, e entre mídia e deficiência. No Capítulo 2, intitulado Deficiência e Sociedade
apresentamos os diferentes conceitos de deficiência e como a relação entre a sociedade
e as pessoas com deficiência evolui ao longo do tempo, desde a Antiguidade até os dias
de hoje, comprovando que são os valores culturais que permitem categorizar as pessoas
que fogem as padrões de normalização, aferindo a estas determinados rótulos sociais.
Este capítulo é ainda dividido em três subcapítulos. Nos dois primeiros subcapítulos
descrevemos os dois principais modelos – médico e social – através dos quais
organizações, instituições e investigadores tentam conceitualizar a pessoa com
deficiência e a deficiência em si. No terceiro e último subcapítulo desta parte
concluímos que há a necessidade de um novo modelo que retire o melhor de cada um
dos modelos equilibrando os argumentos. No segundo capítulo, intitulado Mídia e
Deficiência ressaltamos que os avanços com a preocupação sobre o tema em questão
passam necessariamente pela informação e pelos meios de comunicação. Focamos
essencialmente a relação entre mídia e deficiência, apresentando os estereótipos através
dos quais as pessoas com deficiência são representadas pelos meios de comunicação e a
forma com que estas representações influenciam na percepção da sociedade sobre a
questão Em seguida, na segunda parte de nosso trabalho apresentamos e justificamos a
metodologia escolhida. Este capítulo metodológico está subdividido em cinco
subcapítulos; no primeiro apresentamos o corpus de nosso estudo. No segundo
subcapítulo apresentamos a história da imprensa portuguesa e brasileira, a fim de
melhor entendermos suas raízes, suas diferenças e semelhanças, assim como a
influência lusa na imprensa brasileira. No terceiro identificamos nossos objetivos e
exibimos as hipóteses iniciais. No quarto subcapítulo registramos a codificação utilizada
neste estudo. E por último anunciamos o sistema categorial escolhido, explicando e
justificando as categorias utilizadas.
Posteriormente apresentamos e discutimos os resultados encontrados, relacionando estes
resultados aos de outros estudos apresentados na revisão de literatura, bem como
10
comparando os dados encontrados no Brasil e em Portugal. Da mesma forma, conforme
proposto analisamos temporalmente a cobertura midiática, o que nos proporcionou
fundamentos para que as conclusões e a discussão fosse feita de forma longitudinal.
Neste sentido concluímos que há uma tendência para o crescimento da quantidade de
informação sobre os Jogos Paraolímpicos ao longo do tempo, contudo este aumento é
ainda muito lento e tímido. Verificamos ainda que a imprensa brasileira foi responsável
pela maior parte da cobertura. Relativamente aos temas presentes, notamos que os temas
apresentados enquadravam a vitória dos paraolímpicos de forma a banalizar o feito dos
atletas, ao focar fundamentalmente nos resultados. No que toca à questão da
terminologia verificamos que apenas Portugal apresentou terminologia mais adequada
com o passar do tempo, o mesmo não ocorreu no Brasil. Com relação ao tipo de
deficiência mais retratada, de uma forma geral, verificamos que em quase todas as
edições, em ambos os países a deficiência com a maior taxa de ocorrências é a
Deficiência Visual, seguida pela Paralisia Cerebral. Sendo, que os estereótipos de super-
herói e coitadinho foram encontrados.
Com esta estruturação o presente trabalho pretende ser um contributo para a discussão
em curso no âmbito dos estereótipos e preconceitos, bem como da terminologia
utilizada na cobertura mediática de pessoas com deficiência no âmbito específico do
desporto adaptado. E o desporto de alta competição é certamente um exemplo
paradigmático de que ainda não é dado à pessoa com deficiência o devido valor pelos
media.
REVISÃO DE LITERATURA
13
2. DEFICIÊNCIA E SOCIEDADE
O conceito de deficiência é abrangente. De um lado, os estudiosos da área têm
conceituado a deficiência como algum atributo inerente à pessoa, como algo que a
caracteriza (Bury, 2000). De outro, a delimitação da conceituação tem sido baseada em
áreas supostamente específicas de comprometimento (Omote, 1996). Assim, de acordo
com a Organização das Nações Unidas (ONU, 1981) a pessoa com deficiência é toda
aquela cujas capacidades impossibilita-a de prover por si, no todo ou em partes, as
necessidades de uma vida pessoal ou social normal, em consequência de uma
deficiência congénita ou não, das suas capacidades físicas ou mentais. Já a Organização
Mundial de Saúde (OMS) versa que a “Deficiência, representa qualquer perda ou
alteração de uma estrutura ou de uma função psicológica, fisiológica ou anatómica”
(OMS, 1989, p. 56).
Santos (2008) relaciona a deficiência aos fenômenos sociais, sendo que este conceito
percorreu um longo caminho nas diferentes sociedades e passou por significados
diferenciados. Ainda segundo este autor, há duas formas diferentes de compreender a
deficiência: como uma manifestação da diversidade humana que demanda adequação
social para ampliar os ambientes às diversidades corporais, tornando-os inclusivos; e
como uma restrição corporal que necessita de avanços na área da Medicina, para
oferecer tratamento adequado para a melhoria do bem-estar das pessoas. (ibidem). A
diferença entre corpos sempre despertou interesse da humanidade, sendo que tais
diferenças podem ser inseridas no contexto normal e anormal. Tais contextos sugerem
que existe uma dificuldade em se identificar com corpos que possuem diferenças
marcantes, e que passam a ser vistos, portanto, como patologias. “Ou seja, quando uma
pessoa com características diferentes daquelas que se esperava encontrar em
determinado ambiente é apresentada ou é vista fazendo parte dele, essa pessoa é
considerada estranha” (ibidem).
Na Antiguidade, o “problema” da deficiência não existia, pois as crianças que assim
nasciam eram abandonadas e em sua grande parte acabavam morrendo. Na Idade Média,
com o advento do Cristianismo, o extermínio das pessoas com deficiência passou a ser
considerado uma prática inaceitável; contudo a partir do século XV a pessoa com
deficiência passa a ser vista como um ser improdutivo, ou seja, um “peso” para a
sociedade.
14
Nos séculos XVII e XVIII, as atitudes vão desde a institucionalização em hospícios até
o ensino especial. Nestes séculos as mudanças sociais associadas à industrialização e a
crescente ênfase no individualismo, levaram à fragmentação dos sistemas de apoio da
comunidade tradicional e aumentou a dependência de instituições de profissionais da
reabilitação, fase em que o modelo de asilo prevaleceu. Assim, com a entrada do
modelo médico o corpo da pessoa com deficiência passou a ser representado de forma
clínica, e a deficiência passou a ser considerada como uma forma de imperfeição
biológica, cujos problemas enfrentados são resultados de suas limitações físicas e /ou
mentais e são independentes dos fatores socioculturais, físicos, e ambiente político
(Brittain, 2004). No século XIX a necessidade de estruturação de um sistema de ensino
para todos, faz com que a responsabilidade pública comece a se desenvolver. A partir
daí o debate sobre a questão tornou-se amplo, ativistas e algumas organizações
tornaram-se atores na defesa de ações afirmativas, mudanças nas legislações nacionais e
internacionais, e no combate à soberania do modelo médico. Surge o modelo social da
deficiência afirmando que a desigualdade pela deficiência não estava apenas na questão
clínica, mas também nas barreiras físicas, econômicas, políticas e sociais da vida em
sociedade (Santos, 2008). O modelo social defende que se as atitudes das pessoas
mudarem e se houver um política pública eficaz que legisle uma remodelação das
barreiras arquitetônicas, então muitos dos problemas associados às pessoas com
deficiência irão desaparecer (Brittain, 2004).
Durante um longo período do pensamento ocidental, o corpo marcado por diferenças foi
estigmatizado, ou seja, desde os seus primórdios que a sociedade tendeu a marginalizar
e inabilitar as pessoas com deficiência apondo-lhes o estigma da diferença. Mesmo na
atualidade, e apesar de vivermos numa sociedade dita inclusiva, ou seja, uma sociedade
para todos, independentemente de sexo, idade, religião, origem étnica, raça, orientação
sexual ou deficiência, uma sociedade não apenas aberta e acessível a todos os grupos,
mas que estimula a participação; o preconceito para com a pessoa com deficiência é
ainda prevalecente. Contudo do ponto de vista da moral moderna, podemos dizer que
houve avanços na maneira como a sociedade encarou a questão da deficiência (Amaral,
1994).
Sendo assim, tal como afirma Pontes, Naujorks e Sherer (2001), notamos que são os
valores culturais que permitem categorizar as pessoas que fogem as padrões de
15
normalização, aferindo a estas determinados rótulos sociais. De acordo com Maciel
(2000) o estigma da deficiência é grave, uma vez que transforma essas pessoas em seres
incapazes, improdutivos, indefesos, sempre deixados em segundo lugar na ordem das
coisas. Ou seja, as pessoas com deficiência enfrentam duplamente os efeitos da
vulnerabilidade social. Primeiro, como já dissemos, por não serem reconhecidas
socialmente como sujeitos produtivos, e consequente dificuldade de inserção no
mercado. E segundo, mesmo pela impossibilidade de garantirem sua autonomia
econômica, social e simbólica, resultando em exclusão e isolamento ao não fazerem
parte da sociedade produtiva (Santos, 2008). O sujeito com deficiência, torna-se
reduzido à essa deficiência, o que o impede de exercer seu papel social de indivíduo. O
grande obstáculo para as pessoas com deficiência não é a limitação física ou mental,
mas as atitudes da sociedade acerca da deficiência e a subsequente discriminação
(Schell e Duncan, 1999).
O desenvolvimento das atitudes perante as pessoas com deficiência atravessou diversos
períodos remetendo-nos a diferentes perspectivas em relação a este grupo. Conforme
entramos no terceiro milênio, as preocupações acerca das dimensões social e política da
deficiência intensificaram-se consideravelmente. E a exclusão das pessoas com
deficiência da vida econômica e social tornou-se objeto de protestos e mobilizações
(Barnes, Mercer e Shakespeare, 1999). E este novo foco sobre as questões da
deficiência também fez com que houvesse um crescimento do chamado Disability
Studies, e o amadurecimento da literatura sobre vários aspectos da deficiência, sendo
este um fenômeno global. E com este crescimento vimos o florescer de teorias e
modelos nos quais a deficiência começava a ser enquadrada. Atualmente dois modelos
predominam – o modelo médico e o modelo social (Quadro 1) –, através dos quais
organizações, instituições e investigadores tentam conceitualizar a pessoa com
deficiência e a deficiência em si. Estas abordagens sugerem, contudo, que não há uma
sociologia da deficiência unificada, mas sim sociologias da deficiência. Estas duas
vertentes já esboçaram tentativas de diálogo, no entanto, elas não envolvem-se, apenas
coexistem (Thomas, 2004).
Quadro 1 - Dois modelos de deficiência
Modelo Médico Modelo Social
Teoria da tragédia pessoal Teoria da opressão social
Problema pessoal Problema social
Tratamento individual Ação social
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Medicalização Auto-ajuda
Domínio profissional Responsabilidade individual e coletiva
Perícia Experiência
Identidade individual Identidade coletiva
Preconceito Discriminação
Tratamento Direitos
Controle Escolha
Políticas Política
Ajuste individual Mudança social
Fonte: Barnes, Mercer e Shakespeare, 1999, p. 30.
2.1 Modelo Médico
Com dito anteriormente na Idade Moderna as mudanças associadas à industrialização
levaram a uma crescente ênfase no individualismo. Os séculos XVII e XVIII assistem à
intensificação da comercialização e ao crescimento da industrialização e urbanização, o
consequente impacto destas mudanças na vida em comunidade e em família
influenciaram as redes e as relações sociais existentes (Barnes et al, 1999). As pessoas
que apresentavam problemas de comportamento e baixos níveis de produtividade
econômica era consideradas fardos para a sociedade, e por isso passaram a ser
institucionalizadas (Wall, 2007). A ascensão da medicina nesta época e seu sucesso em
medicalizar as doenças e deficiências legitimou a mudança radical na forma com que as
pessoas com deficiência passaram a ser tratadas.
Nas sociedades ocidentais a confluência entre medicina e ciência teve um profundo
efeito sobre a forma com que a sociedade entende e aceita as diferenças. Isto se dá
devido à autoridade científica fundamentada na tecnologia da medicina que oferece um
senso de legitimidade, confiança e previsibilidade. Aqueles que possuem o domínio
sobre o conhecimento de uma determinada área têm o poder ou a autoridade para
estabelecer discursos e padrões, que se tornam difíceis de contradizer sem a ajuda de um
grupo alternativo de especialistas (Brittain, 2004).
No modelo médico, também conhecido como individual ou tradicional, a deficiência é
vista como um problema que precisa ser tratado. Através deste modelo busca-se que as
pessoas com deficiência sejam, ou voltem a ser, funcionais para que assim possam ser
integradas à sociedade (Kama, 2004). Este modelo trabalha a partir de uma perspectiva
biológica e vê as limitações individuais como a principal causa das múltiplas
dificuldades experenciadas pelas pessoas com deficiência (Barnes et al, 1999). Também
adota as definições e percepções nas quais a deficiência é tida como uma incapacidade
17
de um indivíduo e que resulta na perda ou limitação de uma função (Thomas e Smith,
2009).
As pessoas com deficiência não são vistas como indivíduos independentes, e os
impedimentos são sempre construídos pela deficiência e não pela sociedade, como por
exemplo a inacessibilidade, a discriminação, o preconceito, etc. Este padrão de
representação deste modelo é conhecido como tragédia pessoal. Esta narrativa dissocia a
pessoa com deficiência do contexto social e cultural, e os indivíduos passam a ser
tratados como vítimas dependentes da assistência e atenção de outros.
A partir da perspectiva médica fica fácil assumir que a natureza tem um curso de ação
aceitável e que a condição de “falha” humana é o resultado de estados patológicos. Este
aspecto do modelo médico tem sido fundamental para a legitimação da narrativa sobre a
deficiência como uma tragédia pessoal (Goffman, 1980). As pessoas com deficiência
são vistas como desvio da norma e a deficiência é o que determina quem são e o que
poderão se tornar, sendo portanto um traço marcante reforçado pelas estruturas sociais
(Grenier, 2007).
Para além disso, as pressões contemporâneas para atingir padrões específicos de boa
forma e competência criam grande parte dos critérios sobre o que significa ser normal
ou sem deficiência (Barner et al, 1999). Em nossa sociedade ocidental a cultura do
consumo vende produtos e serviços relacionados à estética, inseridos na “tirania da
perfeição” como soluções para qualquer imperfeição ou desvio da norma. Vemos ainda
a medicalização do mito do corpo perfeito que faz com que a sociedade trate as pessoas
com deficiência como “outros”. O corpo é objetificado, e torna-se um acessório de
estilos de vida que deve ser moldado, modelado e esculpido através de dietas, exercícios
e cirurgias plásticas. A medicina desempenha um importante papel no encorajamento
deste discurso. Promoção de dietas e tipos de atividades físicas são geralmente
realizadas com o objetivo de melhorar a aparência. Cirurgias plásticas, próteses e outras
soluções tecnológicas são apresentadas. A implicação disso é que a deficiência é vista
como uma falha ou desvio (Hughes, 2000).
O enfoque deste modelo, portanto, recai sobre a patologia, sendo baseado no
diagnóstico e em soluções médicas. O modelo médico vê-se como sendo a voz que
legítima da verdade em todas as matérias associadas à funcionalidade do corpo (ibidem).
Deste modo, este modelo tem sido criticado por não levar em conta a experiência
18
pessoal das pessoas com deficiência ou as questões sociais envolvidas no processo de
opressão. De acordo com Barnes et al (1999) as definições e enquadramentos da
deficiência têm gerado consideráveis debates críticos pelos seguintes motivos. Primeiro
esta abordagem baseia-se principalmente em definições médicas e utiliza definições bio-
fisiológicas de normalidade, mesmo quando a identificação dos limites é questionada.
Segundo, dita que a forma de superar a deficiência e as desvantagens sociais é através
de intervenções médicas apropriadas. Em contraste o ambiente social é representado de
forma neutra, como se não tivesse qualquer influência. Terceiro, o modelo médico
coloca as pessoas com deficiência em uma posição de dependência, presumindo que
estes indivíduos são inertes e que a desvantagem é percebida como uma questão
individual e não coletiva. E, em quarto através deste modelo espera-se que as pessoas
com deficiência empreendam todos os esforços para dar o melhor de si, através de
adaptação individual e estratégias para lidar com as situações, pois este modelo presume
que a deficiência assume a identidade do indivíduo e reprime esperanças e ambições
consideradas irreais.
2.2 Modelo Social
Segundo Barnes et al (1999) a palavra Deficiência, assim como a terminologia
associada a ela, não possui caráter universal uma vez que cada cultura expressa-se de
uma determinada forma. Assim percebemos que a questão da deficiência não pode ser
restrita à jurisdição médica, tornando-se claro que o corpo se encontra no centro da vida
social e que sua constituição é tanto biológica quanto cultural (Hughes, 2000). Dessa
forma, o sentido de opressão e a alteridade da pessoas com deficiência está intimamente
relacionada com a construção da percepção negativa da deficiência na cultura pós-
moderna, sendo o olhar do médico o principal elemento de invalidação dos corpos que
não confirmam o seu ideal de normalidade (ibid., 1999).
Face à crescente insatisfação com a explicação medicalizada dominante que prevaleceu
durante o século XX, este pensamento e prática ortodoxos começaram a ser
questionados por diversas organizações autônomas a partir do final dos anos 60 quando
ativistas, especificamente pessoas com deficiência, se organizaram e ergueram
bandeiras contra o modelo vigente (Thomas e Smith, 2009; Hughes, 2000). O modelo
social surge, então, com o objetivo de oferecer resistência a esta perspectiva
medicalizada da deficiência, e é um produto da crítica ao capitalismo (Hughes, 1999).
19
Este modelo rejeita a visão de que a deficiência é causada pela presença de um “defeito”,
e transfere o foco do corpo para o ambiente e as barreiras que excluem as pessoas com
deficiência da sociedade (Thomas e Smith, 2003).
No modelo social a pessoa com deficiência é construída por mecanismos de repressão
cultural e institucional que policiam o corpo e o fabrico de um mundo inacessível. Esta
abordagem foca um conjunto de causas estabelecidas externamente, ou seja, os
obstáculo impostos às pessoas com deficiência que limitam suas oportunidades de
participar na sociedade (Barnes et al, 1999). Para além disso, o modelo social considera
uma vasta gama de fatores e condições sociais, tais como as circunstâncias familiares,
suporte financeiro, educação, mercado de trabalho, habitação, transporte e o ambiente
físico, entre outros.
Os autores vinculados a este modelo consideram que as pessoas com deficiência são um
grupo socialmente oprimido, sendo que a sociedade é a responsável por podar qualquer
possibilidade de participação social. Assim sua luta era dirigida à mudança social, bem
como à tentativa de dar autonomia às pessoas com deficiência. De acordo com Brittain
(2004) se as atitudes das pessoas mudassem e se existissem políticas públicas eficazes
que legislassem a remoção de barreiras sociais e físicas, então muitos dos problemas
associados à deficiência desapareceriam.
Tal como no modelo médico, o modelo social também foi alvo de críticas. Alguns
teóricos (entre eles Shakespeare e Watson, 20001) afirmam que o modelo social
necessita de uma reformulação e criticam o fato de alguns de seus defensores mais
fundamentalistas negarem a relação entre deficiência e limitação física, ou ainda, a
exclusão do corpo do conceito de deficiência. Este modelo então falha ao excluir várias
dimensões da vida das pessoas com deficiência e como Thomas (2004) afirma deve-se
reconhecer que o modelo social ainda não responde ao que se entende por deficiência.
Outros, como Shakespeare e Watson (2001) acreditam ainda que este modelo tornou-se
um problema, e isso significa que não pode ser reformado. Ele deixou de ser útil, e em
invés de criar críticas fragmentadas ou fornecer argumentos alternativos para preencher
lacunas ou compensar a inadequação do modelo social, é hora de deixá-lo de lado e
começar de novo.
20
2.3 A necessidade de um novo modelo
Enquanto o modelo médico enquadra a deficiência como tragédia pessoal, gerando
compaixão e pena, o modelo social narra a questão da deficiência em termos de lutas
pela inclusão e igualdade. Enquanto o modelo médico exige que a pessoa adapte-se à
sociedade, o modelo social exige mudanças na estrutura social. Contudo o panorama
contemporâneo não está mais convencido pela dualidade de pensamentos. Como dito
anteriormente, o corpo é o coração da vida social e é constituído tanto biológica quanto
culturalmente (Hughes, 2000). Portanto a tendência futura está na capacidade de se
retirar o melhor de cada um dos modelos equilibrando os argumentos. Deve-se
reconhecer a experiência individual das pessoas em todas as áreas da vida social
(incluindo o esporte), e ao analisar estes tópico irá perceber-se a complexa
interdependência que existe entre deficiência e corpo.
Assim sendo de um lado tem-se o modelo médico considerado simplista ao considerar
apenas as questões do corpo e esquecer-se das barreiras que impedem as pessoas com
deficiência de participar ativamente da sociedade. Por outro lado, tem-se o modelo
social que deixa de lado aspectos importantes da vida das pessoas com deficiência.
Acreditamos que com o passar do tempo novas teorias vão surgir, inclusive já existem
alguns modelos que diferem dos dois analisados neste trabalho como é o caso do
modelo social patológico, e irão penetrar nas discussões, fazendo com que cada teoria
evolua juntamente com o pensamento e práticas da sociedade.
3. MÍDIA E DEFICIÊNCIA
É possível notar que os avanços com a preocupação destes temas passam
necessariamente pela informação e pelos meios de comunicação e vão determinando
novas formas de pensar e agir em relação à diversidade humana, com poder na
formação de conceito e de manutenção de pré conceitos. A forma como a pessoa com
deficiência é vista pela sociedade é, em grande parte, construída com base na influência
dos meios de comunicação social. Estudos anteriores sobre os efeitos dos media na
sociedade mostraram que uma das maiores influências do mass media é reforçar normas
e atitudes existentes (Lazarsfeld e Merton, 1948). A media, então, atua como espelho da
sociedade, cujas mensagens são produto e reflexo do sistema social vigente.
21
No jornalismo o produto final da investigação e apuração jornalísticas é a notícia. Um
texto cujo conteúdo foi construído baseado, principalmente, em valores e critérios
jornalísticos. Contudo tais critérios, assim como o conceito de notícia e jornalismo, são
variados.
Ao se analisar a atuação dos media no sistema de representações e discursos referentes à
pessoa com deficiência, estes se encontram permeados por subjetividades e, por vezes,
reforçando preconceitos e estereótipos (Figueiredo e Novais, 2009). Desde logo,
existem alguns mitos sobre as pessoas com deficiência, que os estigmatizam como
pessoas sempre tristes, marcadas pela tragédia e, por conseguinte, responsáveis diretas
pela tristeza em todos que com elas convivem ou as conhecem (Marques, 2001b).
Calvo (2001) introduz uma outra dicotomia relevante para a presente discussão ao
afirmar que além de exíguas, e de retratar as pessoas com deficiência, frequentemente,
como seres incapacitados que não consegue solucionar seus problemas, as
representações mediáticas das pessoas com deficiência, transmitem, da mesma forma, a
imagem do “super-herói”, com algumas capacidades mais desenvolvidas em detrimento
de outras, acabando por reforçar estereótipos, estigmas e posturas preconceituosas.
Como já citado em outro trabalho nosso (Figueiredo e Novais, 2009), um exemplo
paradigmático da nova roupagem assumida pelos estereótipos relativos às pessoas com
deficiência pode ser encontrado no, à primeira vista inofensivo, desenho animado
“Dumbo” de Walt Disney, conforme enunciada por Amaral (1994). O personagem
principal do desenho é o elefante Dumbo que nasce com uma deformidade física – suas
orelhas são grandes demais. Dumbo, é, então, alvo de humilhações e vítima de
agressões físicas e morais. Contudo, ao participar de uma atração no circo o pequeno
elefante alça um longo voo, deixando todos maravilhados. Logo depois do fenômeno,
Dumbo se transforma em herói, astro de cinema e investimento de grande porte. “Moral
da história: só sendo herói, o diferente/deficiente tem o direito de ser feliz” (ibid., p.64).
Fenômeno similar ocorre com os atletas portadores de deficiência. Quando apenas a
deficiência está em evidência o indivíduo é visto como coitadinho, mas ao se
transformar em atleta de alto nível, recordista mundial, medalhista paraolímpico, o
indivíduo com deficiência é o herói, que superou suas próprias dificuldades.
De acordo com estudos realizados nos anos 90, a qualidade e a quantidade da cobertura
mediática, das pessoas com deficiência encontrava-se abaixo dos padrões, e, geralmente,
22
tais indivíduos eram representados de forma estereotipada e irreal. Nelson (1994) listou
os sete principais estereótipos relacionados à pessoa com deficiência: digno de pena e
patético; super-herói; sinistro, maléfico e criminoso; melhor morto; desajustado; carga;
incapaz de viver uma vida bem sucedida. Em uma perspectiva semiológica Woodill
(1994) distinguiu tipos diferentes de metáforas sobre as pessoa com deficiência: a
humanitária (deficiência como infortúnio); a médica (deficiência como doença); o de
fora (pessoa com deficiência como o outro); a religiosa (deficiência como plano divino);
a retribuição (deficiência como punição); o controle social (deficiência como ameaça); e
a metáfora do zoológico (pessoa com deficiência como entretenimento). Por sua vez
Clogston (1994) divide a cobertura jornalística em dois tipos: o modelo tradicional, que
vê o indivíduo com deficiência como disfuncional, e também onde se insere o
estereótipo do super-herói; e o modelo progressivo, vê os indivíduos como diferentes,
aceita-os e respeita-os. Em estudos recentes sobre o esporte adaptado, entretanto, os
estereótipos mais encontrados foram o coitadinho e o super-herói.
Schell e Duncan (1999), por exemplo, examinaram a cobertura televisiva Norte-
Americana dos Jogos Paraolímpicos de 1996, enquanto Schantz e Gilbert (2001)
analisaram a cobertura da imprensa escrita Francesa e Alemã. Mais recentemente,
Thomas e Smith (2003) exploraram a cobertura da imprensa escrita Britânica das
Paraolimpíadas de 2000 em Sydney, focando particularmente na terminologia utilizada
para descrever os atletas com deficiência, e a linguagem e imagens usadas para retratar
as performances. É de se notar, que os resultados desses estudos apontam, em graus
diferentes, para questões semelhantes. Todos os estudos mencionados revelaram que os
media (tanto audiovisual, quanto escrita) tendem a descrever as performances dos
atletas com deficiência de forma relativamente consistente com o modelo médico.
Sendo assim, estes atletas tendem a ser retratados como “vítimas” ou pessoas
“corajosas” que “superaram” o próprio “sofrimento” da deficiência para participar em
um evento desportivo, um super-herói. Este estereótipo deixa a impressão de que a
pessoa com deficiência para se ajustar terá de fazer algo extraordinário ou realizar um
esforço heróico para compensar a sua limitação (Schell e Duncan, 1999). O modelo do
super-herói viria reforçar as baixas expectativas da sociedade acerca das pessoas com
deficiência (Hardin e Hardin, 2004), e enfatizar o esforço individual dessas pessoas para
se adaptarem; como se ter uma deficiência fosse culpa das mesmas (Schantz e Gilbert,
2001). O que depreende-se deste discurso é que as pessoas sem deficiência, quando bem
23
sucedidas nos seus empreendimentos, alcançariam o sucesso pelo talento ou pela
inteligência; enquanto aquelas que têm alguma deficiência o teriam feito pela
necessidade de compensar o „mal‟ que os aflige (Marques, 2001a).
Essas imagens podem também levar a uma suposição de que todas as pessoas com
deficiência deveriam empreender esforços heróicos a fim de superar suas limitações
físicas ou mentais e se encaixarem – ser como qualquer um. Ao contrário do que
acontece nos desportos para pessoas sem deficiências, onde por exemplo o fracasso é
apresentado como uma perda trágica, nas Paraolimpíadas, e no esporte adaptado em
geral, os comentário parecem ser planos. Quando certo atleta ou equipe perde, os media
sugerem que o perdedor deve ser grato pela experiência Paraolímpica, este é um caso
claro de os paratletas serem retratados como “outros”, como atletas menos-do-que-
capazes.
O estereótipo do super-herói personifica a imagem popular da deficiência como algo
que deve ser superado, ao invés de aprender a ajustar-se. Tal modelo pode ser
considerado pela imaginação popular como sendo uma imagem positiva por conta de
suas “proezas super-humanas”, contudo, na verdade, não faz nada além de minar a
construção cultural da deficiência, sem dizer nada sobre os obstáculos objetivos. É de se
notar, contudo, que existem dois tipos de super-heróis: aqueles que conseguem realizar
tarefas mundanas, e rotineiras sem auxílio, o que mostra que não é esperado que as
pessoas com deficiência consigam fazê-las; e o super-herói que tem performances acima
da média (atletas de alto nível) (Kama, 2004).
O estereótipo do coitadinho é baseado em um processo de objetificação, onde a pessoa
com deficiência torna-se a personificação de sua própria deficiência. Sua existência
depende de sentimento de pena que despertam. Os media transmitem dois tipos de
mensagens, que são contraditórias. De um lado, histórias de sucesso, que exemplificam
a capacidade dessas pessoas em gozar amplamente da vida; de outro essa mensagem
cria expectativas de que nem todas podem concretizá-la.
Nesse sentido, o tratamento mediático dado ao paraolimpismo confere a este desporto
uma consideração social diferente, com prejuízos ao desenvolvimento do mesmo, e
também à integração das populações com deficiência (Calvo, 2001). Os media fazem
com que as pessoas tenham compaixão por esses paratletas, uma vez que, segundo a
24
imprensa, eles são “símbolos de superação”. De acordo com Moura (1993, p.46) tanto o
olhar de piedade quanto o de admiração parte de um único princípio, o preconceito.
[...] tanto aquele que foi marginalizado pela visão pública de deficiência como aqueles que conseguiram [...] [se] mostrar em
condições de competitividade são de certa forma vistos publicamente
como elementos não humanos: um pela sua história e seu modo
precário de vida, como elemento sub-humano, o outro pelo inverso da mesma moeda – da deficiência – como um super-humano.
Em uma sociedade altamente mediática, em que os atletas bem sucedidos assumem o
papel de heróis o culto ao corpo e à imagem física “perfeita” ainda têm espaço. “(…)
[Os atletas] representam a imagem de um determinado grupo humano ou sociedade.
Suas habilidades, aprendizagens, desempenho não são apenas tipicamente deles,
incluem toda uma gama de representatividade que exerce poderoso fascínio sobre as
massas” (Mosquera, 1984, p. 51). Portanto, o processo de identificação do tipo heróico,
além da performance, leva em conta também a dimensão corporal, pelo que o herói do
esporte adaptado não é uma „figura desportivamente simpática‟ para muitos dos que se
julgam „normais‟.
De acordo com Shell e Duncan (1999) os atletas, de alto nível, com deficiência
preferem o respeito à simpatia, querem admiração por suas habilidades, não condolência
por sua deficiência, desejam reconhecimentos por seus feitos ao invés de servir de
símbolo de superação.
METODOLOGIA
27
4. METODOLOGIA
Para alcançar os objetivos propostos neste estudo escolhemos o método de análise de
conteúdo. Esta escolha se justifica pelo fato de que a análise de conteúdo é
predominantemente útil em estudos no âmbito dos meios de comunicação social, e por
isso apropriado para auxiliar nas exigências do mesmo. De fato, este procedimento
escolhido consiste em substituir o “impressionismo” por procedimentos padronizados,
convertendo materiais “brutos” em dados passíveis de tratamento científico (Freitas,
Cunha e Moscarola, 1996).
Com efeito, a análise de conteúdo não é uma técnica que se limita a uma simples
descrição (Vala, 1986), mas tem como objetivo a interpretação das mensagens (Bardin,
1977). Este método é considerado confiável e/ou objetivo porque permite que diferentes
pesquisadores, aplicando as mesmas categorias à mesma amostra, possam chegar aos
mesmo resultados (Fonseca Júnior, 2006).
De acordo com Bardin (1977) a análise de conteúdo possui duas funções, uma função
heurística na qual existe uma tentativa exploratória, sem hipóteses, e uma função de
administração de prova em que hipóteses, questões ou afirmações temporárias são
colocadas a fim de serem verificadas. Neste estudo iremos utilizar a última, uma vez
que a revisão de literatura nos permitiu estabelecer algumas hipóteses a priori, como
veremos mais adiante.
A análise de conteúdo organiza-se em três pólos cronológicos: (1) Pré-análise, que
consiste no planejamento do trabalho, sistematizando ideias iniciais com o
desenvolvimento de operações sucessivas; (2) Exploração do material, refere-se à
análise propriamente dita, envolvendo a codificação em função de regras previamente
formuladas; (3) Tratamento dos resultados obtidos e interpretação, os resultados brutos
são, então, tratados de modo a adquirir valor e significado (Fonseca Júnior, 2006).
A fase de pré-análise, por sua vez, possui três missões: a constituição do corpus do
estudo; a formulação de hipóteses e objetivos; e a elaboração de indicadores que
fundamentarão a interpretação final. De acordo com Bardin (1977) estes três fatores não
se sucedem, obrigatoriamente, de acordo com uma ordem cronológica. No entanto
iremos seguir a ordem atrás mencionada, estabelecendo, primeiramente, os documentos
a serem analisados.
28
4.1 Corpus do estudo
A primeira operação realizada foi a escolha e seleção dos documentos a serem
analisados, dessa forma, optamos pelos media impressos pelo fato de ser de mais fácil
manuseio e arquivamento, e à época, com um considerável grau de popularidade junto
das audiências. No documento escrito a informação é mais pormenorizada e cuidada.
Neste sentido, selecionamos dois periódicos diários e uma revista semanal de cada país,
a saber: no Brasil, O Globo, O Estado de S. Paulo, e a Veja; em Portugal, Jornal de
Notícias, Público, e a Visão. A escolha foi baseada na conjugação de múltiplos critérios:
a circulação, o grau de reputação junto das audiências, e pelo fato de os jornais serem
produzidos nos principais pólos urbanos de cada país, Rio de Janeiro e São Paulo no
Brasil, e Porto e Lisboa em Portugal, respectivamente, e pelas revistas Veja e Visão
possuírem conteúdo e política editorial semelhantes.
A título de exemplo citamos os valores de tiragem, dos jornais e revistas analisados, do
período de 2008. De acordo com a Associação Portuguesa para o Controlo de Tiragem e
Circulação (2008), no quarto trimestre de 2008, os valores de tiragem foram de 113.964
para o Jornal de Notícias, de 88.465 para o Público, e de 92.850 para a revista Visão.
Para os jornais brasileiros a Associação Nacional de Jornais (2008) calcula, para o ano
de 2008, uma circulação de 281.407 do O Globo, 245.966 para o Estado de S. Paulo, a
revista Veja possui uma circulação de 1.092.588 exemplares (de acordo com a Editora
Abril, 2008).
A escolha recaiu em jornais e revistas de informação geral a fim de não segmentar a
recepção, uma vez que as publicações de informação geral tendem a atingir um público
mais vasto com diferentes interesses. É importante salientar que para a constituição do
corpus deste estudo seguimos a regra da pertinência enunciada por Bardin (1977), ou
seja os documentos são adequados ao objetivo da pesquisa em todos os aspectos.
Quanto ao período de análise, elegemos os Jogos Paraolímpicos como momento de
análise por sua grandiosidade; é o segundo maior evento desportivo do mundo em
número de participantes e provas, e importância social. Dessa forma, nos é mais
conveniente encontrar informações sobre os atletas com deficiência neste período, pelo
que, então restringimos a análise entre o dia anterior à cerimônia de abertura dos Jogos
até ao dia subsequente à cerimônia de encerramento (inclusive). Organizamos então os
seguintes períodos:
29
1996/Atlanta – de 15 a 26 de Agosto
2000/Sydney – de 17 a 30 de Outubro
2004/Atenas – de 16 a 29 de Setembro
2008/Pequim – de 5 a 18 de Setembro
Nossa escolha por este recorte temporal deveu-se ao fato de somente ser possível
encontrar dados sobre o número de representantes dos media envolvidos na cobertura
dos Jogos Paraolímpicos a partir de 1996/Atlanta.
Dentro dos documentos e dos períodos escolhidos, selecionamos apenas as notícias,
reportagens, fotolegendas e entrevistas excluindo portanto artigos opinativos, cartas ao
editor, crônicas e editoriais, da mesma forma no interior de cada documento selecionado
excluímos de nossa análise legendas, “olhos”, e infográficos pelo que consideramos
ante-títulos, títulos, subtítulos, intertítulos e boxes totalizando 407 artigos informativos.
A exclusão dos elementos acima citados deveu-se ao fato de que geralmente os “olhos”
são uma repetição de uma frase já presente no corpo do texto, e a exclusão de
infográficos e legendas deveu-se ao fato de que estão fora do corpo do texto pelo que
sua leitura pode ser considerada opcional.
4.2 A Imprensa Brasileira e Portuguesa
Uma vez que em nosso estudo procedemos a uma análise comparativa entre a imprensa
brasileira e portuguesa torna-se necessária a apresentação de um breve histórico de
ambas, a fim de melhor entendermos suas raízes, suas diferenças e semelhanças, assim
como a influência lusa na imprensa brasileira.
4.2.1 A imprensa brasileira
A imprensa brasileira tem duas datas como marcos fundadores: o lançamento do
Correio Braziliense, em 1º de junho, e a criação da Gazeta do Rio de Janeiro, em 10 de
setembro, ambos de 1808. O primeiro surge em Londres, e apesar de tratar de grandes
problemas brasileiros o órgão foi perdendo importância ao longo do tempo, pois do
exterior não tinha condições de acompanhar o interesse do povo. O segundo surge no
Rio de Janeiro com a da Corte de D. João para o Brasil, que mais do que informar
visava defender o absolutismo luso. A qual dos dois cabe o título de precursor é tema de
30
controvérsia em função das características de ambos, principalmente em torno das datas,
dos locais em que circularam suas primeiras edições e de quem os editava.
Já entre meados do século XVIII e começo do XIX instalou no país o estilo panfletário.
Contudo no transcurso do Segundo Reinado (1840-1889), o Brasil “(…) supera a fase
dos efêmeros pasquins panfletários, dando origem a jornais mais estáveis e estruturados.
O número de títulos até diminui num primeiro momento, mas as edições e as tiragens
aumentam; começa a segmentação; a contundência do embate político diminui, embora
o alinhamento com correntes políticas prossiga” (Associação Nacional de Jornais,
2008).
Com a Era Republicana a imprensa atravessou um novo ciclo de transformações, como
a inovação tecnológica que permitiu o ensaio da comunicação de massa. A relação entre
imprensa e governo oscilou entre a censura e a liberdade absoluta.
E é em um contexto de transformação editorial experimentado pelo jornalismo
brasileiro na segunda metade de 1800, que surge, no Rio de Janeiro, o jornal O Atleta;
identificado como marco do aparecimento da imprensa esportiva no Brasil. (Sousa,
2005). Contudo já em 1910 havia, em São Paulo, apesar de muitas dúvidas acerca da
importância deste tipo de jornalismo, páginas de divulgação esportiva no jornal
Fanfulla, eram apenas relatos, mas já davam os primeiros passos de inserção do esporte
na vida diária do brasileiro.
Aos poucos a imprensa brasileira consolidava-se, a passagem ao século XX assinala a
transição da pequena à grande imprensa, tornando o jornal uma indústria que vendia seu
produto, a informação. Contudo apesar desta consciência mercadológicas, o jornal
desportivo era um caso à parte. Durante todo o século XX dirigir uma redação esportiva
significa “lutar contra o preconceito de que só os de menor poder aquisitivo poderiam
tornar-se leitores desse tipo de diário” (Coelho, 2004, p. 09).
Com a vitória da seleção brasileira de futebol na Copa de 1958, este esporte – que
ocupava cerca de 80% do noticiário esportivo – se consolida como esporte das massas.
Os grandes jornais começaram a incluir cadernos de noticiário esportivo regularmente
em suas edições a partir da década de 1960, quando então o Brasil entrou
definitivamente na lista dos países com imprensa esportiva de larga escala.
31
4.2.2 A imprensa lusa
O primeiro impulso para a criação de jornais em Portugal, veio da necessidade de
informações sobre, nomeadamente, conflitos militares e desastres naturais. Nesse
sentido surgem as folhas noticiosas impressas ou relações. Contudo o primeiro jornal
português propriamente dito foi uma Gazeta de Restauração, que possuía conteúdo mais
informativo, que, como todos os impresso da época possuía um nome longo, Gazeta Em
Que Se Relatam as Novas Todas Que Houve Nesta Corte e Que Vieram de Várias
Partes no Mês de Novembro de 1641. (Tengarrinha, 1989).
De 1768, ano da criação da Real Mesa Censória, até 1807, ano da invasão francesa,
desapareceram todas as publicações periódicas do território português. Entre 1808 e
1820 Portugal sofreu dura censura, sendo que a maior parte das publicações respondia a
interesses de setores com poder da sociedade lusa. Em 1820 com a Revolução do Porto
é instaurada a liberdade de expressão, e em pouco tempo multiplicam-se o número de
jornais. Contudo em 1828 com a proclamação de D. Miguel como rei absoluto, o país
regressa à obscura situação censória anterior. De acordo com Tengarrinha (1989) havia
39 jornais em 1821 (número recorde para Portugal), desses apenas seis sobreviveram até
1824 e este número caiu para cinco em 1825. Esta violência do governo para com a
impressa estendeu-se até 1851, neste ano com a derrogação da “Lei da Rolha” a
atividade jornalística passou a ser facilitada. (Rodríguez, 1996). Os sucessivos períodos
revolucionários e a instauração da Ditadura fez com que a liberdade de impressa
oscilasse até a Revolução do Cravos em 1974, fase em que a liberdade foi finalmente
assegurada ao jornalismo.
Em uma luta paralela para conseguir se afirmar, o jornalismo esportivo só começa a ter
alguma importância no final do século XIX. Contudo apenas no período de 1910 a 1926
é que se assiste ao nascimento, em Portugal, do jornalismo esportivo. Em 1924 surge o
primeiro jornal especializado em esportes, o Diário de Sport. Pode afirmar-se que, a
consolidação da imprensa desportiva em Portugal bem como a prática de desporto,
aconteceu em meados dos anos 40, terminando um ciclo dominado pela instabilidade
das publicações. Hoje os diários esportivos são responsáveis por uma grande parte das
vendas de jornais em Portugal. (Martins, 2008).
32
4.3 Hipóteses e objetivos
O objetivo geral deste estudo, de acordo com nosso quadro teórico, é perceber como são
representados os atletas com deficiência nos media portugueses e brasileiros, nos
períodos de 1996, 2000, 2004 e 2008, comparando as representações em cada país. Para
este fim é necessário destacar alguns segmentos de análise, pelo que analisaremos:
- a quantidade de informação presente nos media de ambos os países no período
selecionado;
- os temas presentes e o grau de importância;
- a terminologia empregada;
- os diferentes tipos de deficiência presentes;
- e os estereótipos.
As análises da terminologia, dos tipos de deficiência e dos estereótipos se completam,
uma vez que servem para se verificar a forma com que o atleta é representado e quais
deficiência são mais retratadas. Ao investigarmos a terminologia analisamos a
linguagem utilizada para se referir ao atleta, portanto todas as palavras, termos e
expressões que os meios de comunicação utilizam ao se referirem aos atletas foram
levadas em consideração. Diversos estudos demonstraram que a cobertura esportiva
destes atletas parece privilegiar alguns tipos de deficiência, nomeadamente as motoras e
físicas. Isto se daria pela fato destes tipos de deficiência não se desviar do conceito
normal de corpo capaz. Deste modo ao avaliarmos os tipos de deficiência apresentados
pela mídia tencionamos averiguar se há algum tipo de deficiência que seja mais
noticiável do que outro, independente da terminologia utilizada. Apesar de já termos até
aqui ferramentas para analisarmos a representação do atleta com deficiência, ainda é
necessário verificar os estereótipos acerca do mesmo. Dessa forma o objetivo desta
última análise passa por tentar descobrir elementos que nos sugiram que o atleta com
deficiência está sendo alvo de um enquadramento estereotipado. Com estes três
elementos teremos uma análise mais completa e satisfatória das representações sociais
do atleta paraolímpico, nos meios de comunicação.
Com isso, e na prossecução da questão de base, podemos formular algumas hipóteses
que podem, ou não, ser confirmadas ao longo desta pesquisa,
1) A quantidade de informação irá aumentar no decorrer do tempo.
33
2) Essa quantidade de informação será maior nos media brasileiros do que nos
media portugueses.
3) Os assuntos mais tratados terão a ver com a prática desportiva com ênfase
nos resultados, deixando de lado experiência e história dos atletas, e
bastidores, em ambos os países.
4) A terminologia empregada tenderá a ser cada vez mais adequada ao longo
das edições dos Jogos Paraolímpicos tanto no Brasil quanto em Portugal.
5) A deficiência física será mais retratada em detrimento aos outros tipos de
deficiência, e em ambos os países.
6) Os atletas com deficiência serão representados estereotipadamente, em
ambos os países, sendo que os estereótipos de super-herói e coitadinho serão
os mais encontrados.
A hipótese 2 se justifica por dois motivos principais. Primeiro pelo fato de o Brasil ter
obtido um maior número de medalhas e de ter um maior número de atletas participantes
em todas as edições comparativamente à Portugal (Ver Quadro 2). Em segundo lugar
pela existência, já há 14 anos, no Brasil de um sólido Comitê Paraolímpico Brasileiro
(CPB), que promove workshops de media, facilita o contacto de atletas e treinadores
com jornalistas, promovendo o desporto paraolímpico. Enquanto Portugal ainda está
numa fase mais embrionária.
Quadro 2 - Número de atletas e medalhas
Brasil Portugal
Atletas Medalhas Atletas Medalhas
1996/Atlanta 58 21 35 14
2000/Sydney 64 22 53 16
2004/Atenas 48 33 48 12
2008/Pequim 188 47 35 07
4.4 Codificação
Após a seleção do corpus de estudo, passamos então à fase de organização e
codificação. A codificação corresponde a um processo de transformação dos dados
brutos de forma sistemática, segundo regras de enumeração, agregação e classificação,
visando esclarecer o analista sobre o material selecionado (Bardin, 1977). Sua principal
função é funcionar de elo entre os documentos escolhidos e a teoria do pesquisador
(Fonseca Júnior, 2006).
34
A codificação compreende três fases: a classificação e agregação, em que aponta-se as
categorias; o recorte, em que escolhe-se as unidades de análise; e a enumeração, na qual
seleciona-se as regras de contagem.
“A classificação, a categorização, é uma tarefa que realizamos quotidianamente com
vista a reduzir a complexidade do meio ambiente, estabilizá-lo, identificá-lo, ordená-lo
ou atribuir-lhe sentido” (Vala, 1986, p. 110). As categorias são os elementos-chave do
código analista, isso significa que ao reduzir a massa de dados em categorias,
objetivamos torná-los inteligíveis, e para este fim devemos investigar o que cada um
dos elementos têm em comum, permitindo seu agrupamento.
A construção de um sistema de categorias pode ser feita a priori ou a posteriori, ou
ainda através da combinação destes dois processos (Vala, 1986). A categorização a
priori acontece quando a interação entre o quadro teórico inicial do pesquisador, os
problemas que pretende estudar, e suas hipóteses permitem a formulação de um sistema
de categorias, sendo fundamental a detecção da presença ou não destas categorias no
material selecionado (ibidem). A categorização a posteriori recorre a uma outra
estratégia em que sem qualquer pressuposto teórico oriente a sua elaboração, sendo que
as técnicas utilizadas são auto-geradoras de resultado (ibidem). Neste nosso estudo
iremos utilizar a combinação dos dois processos, uma vez que há categorias formuladas
a priori através da revisão de literatura e de nossas hipóteses iniciais, e outras que
surgem a posteriori a medida em que tomamos conhecimentos de nosso material.
Além disso, a categorização envolve duas etapas, o inventário e a classificação. A
primeira consiste em isolar os elementos, e a segunda na qual repartimos os elementos,
reunindo-os em grupos similares, de forma a organizar a mensagem. De acordo com
Bardin (1977), um conjunto de boas categorias deve possuir as seguintes qualidades, a
exclusão mútua, ou seja, cada elemento não pode existir em mais de uma categoria;
homogeneidade, segundo a qual, um único princípio de classificação deve governar a
classificação; a pertinência, quando a categoria está adaptada ao material recolhido; a
objetividade e fidelidade; a produtividade, ao fornecer resultados fiéis. A apresentação e
descrição das categorias será efetuada mais à frente no ponto 4.5.
Após a escolha das categorias, fez-se necessário a seleção das unidades de análise. Tais
unidades podem ser de registro ou de contexto. A unidade de registro “é a unidade de
significação a codificar e corresponde ao segmento de conteúdo a considerar como
35
unidade de base, visando a categorização e a contagem frequencial” (ibid., p. 98).
Habitualmente distinguem-se dois tipos de unidades (Vala, 1986; Bardin, 1977), as
formais, em que podemos inserir a palavra, frase, personagem, interação, etc., e as
semânticas, na qual a unidade mais comum é o tema. A unidade de contexto, por sua
vez, “(…) serve de unidade de compreensão para codificar a unidade de registo e
corresponde ao segmento da mensagem, cujas dimensões (superiores às da unidade de
registo) são óptimas para que se possa compreender a significação exacta da unidade de
registo” (Bardin, 1977, p. 100-101). No caso deste estudo serão utilizados ambos os
tipos de unidades, pois se por um lado definimos palavras, expressões e temas
pertinentes, por outro, também foram levados em conta o seu contexto, ou seja, as
notícias como um todo. As unidades de análise serão expostas mais adiante.
Passaremos, então, à próxima fase, a definição das regras de enumeração, isto é, o modo
de quantificação das unidades de registro. Deve-se ressaltar que, as regras de
enumeração devem ser cuidadosamente ponderadas, uma vez que diferentes tipos de
regras podem conduzir a diferentes resultados (Vala, 1986). Portanto, dentre as diversas
regras de enumeração existentes (Ver Bardin, 1977), definimos como adequadas ao
nosso estudo, as seguintes: presença ou ausência, estas podem ser significativas,
funcionando como indicadores; frequência, a importância de uma unidade de registro
aumenta quanto maior for a sua frequência (ibidem); e intensidade, no sentido de análise
de valores e das atitudes, ou seja, intensidade de um verbo, tempo do verbo, advérbios
de modo, adjetivos e atributos qualificativos (ibidem).
4.5 Sistema Categorial
Como mencionado anteriormente, o nosso sistema categorial foi definido a priori de
acordo com o quadro teórico estabelecido, e a posteriori, após o contacto com o
material seleccionado. Pelo que passamos a apresentar o sistema resultante.
Quadro 3 – Sistema Categorial empregado na Análise de Conteúdo
Categoria Sub-categoria Unidades de Registro
Prática Desportiva
Preparação
Expectativas/Objetivos
Performance/Resultados
Comemoração da Vitória
Bastidores
36
Tema
Terminologia
Doping
Atleta Paraolímpico
História/Perfil
Perfil do Adversário
Homenagem/Premiação
Futuro
Questões político-
econômicas
Apoio/Patrocínio
Investimentos
Jogos Paraolímpicos Cerimônia de Abertura
Cerimônia de Encerramento
Estratégias de Marketing
Problemas
História/Perfil
Bastidores
Esportes
Mídia
Genérica Atleta/Competidor/Representante
Idade
Desporto/Modalidade
Nacionalidade
Alcunha
Relacionada à vitória ou
derrota ou ao currículo
do atleta
Campeão
Recordista
Medalhista
Perdedor
Vencedor
Favorito
Herói
Relacionada
adequadamente à
deficiência
(Atleta) Paraolímpico
(Atleta) com deficiência
Amputado
Cego
Amblíope
37
Atleta sem deficiência
Paratleta/Paradesportista
Cadeirante
Surdo
Mudo
Relacionada
inadequadamente à
deficiência
(Atleta ) Deficiente
(Atleta ) Não Deficiente
(Atleta) Portador de Deficiência
(Atleta) Não Portador de
Deficiência
Paralítico
Paralisado cerebral
Invisual
(Tetra) Paraplégico
Mutilado
Lesionado Medular
Termo estigmatizante
Normal/Perfeito
Andante
Tipos de Deficiência
Deficiência Intelectual
Deficiência visual
Deficiência Física/Motora
Atleta em Cadeira de Rodas
Paralisia Cerebral
Amputação
Les Autres
Estereótipos
Coitadinho Vítima
Sofrimento/Doença
Incapaz
Fardo
Mal/Problema
Anormalidade
38
Triste
Super-herói Super-atleta
Corajoso
Superação
Exemplo
4.5.1 Temas
A categoria de assuntos presentes visa apontar quais os temas que mais se destacam no
que diz respeito ao atleta paraolímpico. Aqui, vale explicitar que para além de verificar
a presença ou não dos temas em questão, também analisamos o grau de importância que
cada tema presente possui na notícia. Ou seja, entre as variáveis utilizadas
classificamos com a etiqueta primário o primeiro tema apresentado, e com a etiqueta
secundário todos os outros temas presentes no artigo. (Bennett, Lawrence e Livingston;
2006). Dessa forma, teremos uma visão mais amplas das temática presentes e de suas
importâncias hierárquicas nas notícias.
Segundo Thomas e Smith (2003) a cobertura mediática de desporto adaptado muitas
vezes foca principalmente na performance e sucesso dos atletas com deficiência,
enfatizando o significado de recordes, medalhas e tempos, com muito pouco, ou
nenhum, comentário sobre a experiência dos atletas, repercussão da medalha e
bastidores. Certamente, tal afirmativa parece sugerir que, de fato, a cobertura mediática
dos atletas com deficiência, tende a trivializar suas performances e conquistas, e
perpetuar ainda mais o modelo médico, que concebe a deficiência como um produto
meramente biológico, e, portanto os problemas que as pessoas com deficiência
enfrentam são resultado de suas limitações físicas e/ou mentais, nada tendo a ver com
elementos socioculturais, ou com o ambiente físico e político (Brittain, 2004). Tal é o
que tentamos verificar.
Para isto dividimos, a priori, a categoria “Temas” em três sub-categorias: Prática
desportiva, que analisa desde a preparação à comemoração da vitória e os bastidores da
competição; Atleta Paraolímpico, reporta os dados presentes ou ausentes no corpus de
estudo sobre o personagem central de nossa pesquisa, nos auxiliando perceber a
evolução (ou não) de seu tratamento e de seus estereótipos; e Questões político-
econômicas, pretendemos compreender as dificuldades ou facilidades relativamente ao
suporte financeiro e governamental. Com o decorrer da análise percebeu-se que seria
39
necessário incluir uma sub-categoria adicional relacionada aos Jogos Paraolímpicos, na
qual inclui-se as „Cerimônias de Abertura e Encerramento‟, „bastidores‟, „perfil‟ e
regras dos esportes disputados, „história e perfil‟ dos Jogos, presença dos meios de
comunicação e problemas, dando-nos um panorama geral do evento.
4.5.2 Terminologia
As questões terminológicas ocupam um lugar de destaque e importância em nosso
estudo. Uma vez que, como afirma Amaral (1994, p.7),
A abordagem e a terminologia utilizada pelos meios de comunicação
de massa [...] refletem na interpretação da sociedade sobre os principais temas de interesse coletivo. Se a informação não é cuidada,
acaba reforçando estigmas e posturas preconceituosas transmitidas
culturalmente, que podem significar, no mínimo, um empecilho à evolução e ao desenvolvimento social.
O tratamento mediático dado ao paraolimpismo, confere ao deporto adaptado uma
consideração social, que pode trazer prejuízos ou benefícios ao desenvolvimento do
mesmo bem como à integração das populações com deficiência (Calvo, 2001). De
acordo com Marques (2001) as vezes o uso de certo termos, muito difundidos e
aparentemente inocentes, reforça preconceitos. Tal justifica a análise de terminologias
empregadas pelos meios de comunicação, uma vez que a media tem um importante
papel na formação e reflexão das atitudes públicas (Auslander e Gold, 1999). Dessa
forma utilizaremos, como referência o quadro da American Red Cross (2006) People
First Language, que também é utilizada pelo Comité Paraolimpico Internacional, e os
artigos do consultor de inclusão social Romeu Sassaki (2002a, 2002b) de forma a
verificar a situação da terminologia nos países em questão em nossa análise.
Algumas unidades de registro desta categoria também apareceram a posteriori: Alcunha;
Favorito e Herói; Amblíope, Surdo e Mudo; Invisual, Mutilado, Lesionado Medular,
Termos estimatizantes, Normal/Perfeito e Andante. Neste ínterim, valor ressaltar que as
unidades de registro Termos estigmatizantes e Normal/Perfeito, incluem termos como
pessoa incapacitada, vítima de paralisia cerebral, pessoa que sofre com o problema; e
atletas ditos “normais”, atletas “perfeitos”, respectivamente.
4.5.2.1 Tipos de Deficiência
Esta categoria surge no sentido de avaliarmos se existe, ou não, um tipo de deficiência
que é mais retratado do que os outros. Salientamos que os tipos de deficiência que
40
constituem nosso sistema categorial como unidades de registro, são aqueles apontados
pelo Comitê Paraolímpico Internacional (2007).
Diversos estudos dos media impressos mostraram que as pessoas em cadeiras de rodas
são o grupo mais representado. Isto talvez aconteça porque a percepção do público
sobre da deficiência está historicamente vinculada a indivíduos em cadeiras de roda
(Schantz e Gilbert, 2001). Outros estudos mostraram que os jornais reportam muito
mais as pessoas com deficiências físicas, que são geralmente tratadas de forma mais
positiva pelos media do que as pessoas com deficiências psiquiátricas ou de
desenvolvimento (Auslander e Gold, 1999).
4.5.3 Estereótipos
Os estereótipos também são uma questão que deve ser elucidada. Ao se analisar a
atuação da media no sistema de representações e discursos referentes à pessoa com
deficiência, estes se encontram permeados por subjetividades e, por vezes, reforçando
preconceitos e estereótipos. Marques (2001), comenta que os estereótipos são aplicados
a estes indivíduos, pois eles são socialmente vistos como incapazes e improdutivos, e,
biologicamente, considerados “anormais”.
Diversos estudos anteriores concluíram que a cobertura mediática, principalmente de
eventos desportivos adaptados, reforça o estereótipo do coitadinho ao retratar as pessoas
com deficiência como incapazes de fazer algo por elas mesmas, e dependentes de
auxílio. Segundo Kama (2004) o paradigma do coitadinho complementa o processo de
objetificação da pessoa com deficiência, em que estes indivíduos se tornam a
personificação de suas deficiências. E como são “imperfeitos” não são capazes de
sobreviver independentes dos outros. Sendo assim, a existência das pessoas com
deficiência fica dependente de sentimentos de penas que causam àqueles que os
circulam.
O estereótipo de super-herói é tão popular quanto o de vítima, ou incapacitado, e reforça
as baixas expectativas que a sociedade tem em relação às pessoas com deficiência. A
mídia utiliza tal estereótipo, principalmente, ao atleta com deficiência (Hardin e Hardin,
2004). O estereótipo do super-herói personifica a imagem popular da deficiência como
algo que deve ser superado, ao invés de aprender a ajustar-se.
41
O objetivo desta categoria é averiguar se o atleta paraolímpico está a ser representado de
forma estereotipada, assim como Thomas e Smith (2003), e Kama (2004) encontraram
em seus trabalhos.
APRESENTAÇÃO E DISCUSSÃO DOS RESULTADOS
45
5. APRESENTAÇÃO E DISCUSSÃO DOS RESULTADOS
De um universo de 220 jornais e 24 revistas, nossa amostra é composta por 407 notícias
que foram analisadas de acordo com os parâmetros e critérios estabelecidos no capítulo
anterior. Iremos portanto neste capítulo proceder à apresentação e discussão dos
resultados obtidos desta análise levando em conta as quatro categorias definidas – temas,
terminologia, tipos de deficiência e estereótipos – os países em questão – Brasil e
Portugal –, e o período de análise – 1996, 2000, 2004 e 2008.
Quadro 4 – Número total de notícias por ano
1996
Notícias
(porcentagem)
2000
Notícias
(porcentagem)
2004
Notícias
(porcentagem)
2008
Notícias
(porcentagem)
Total
Total 63 (15,48) 89 (21,87) 172 (42,26) 83 (20,39) 407 (100)
Ao observarmos o Quadro 4 que apresenta o número de notícias totais por ano,
verificamos um aumento gradativo de 1996 a 2000 (15,48% para 21,87%), um grande
aumento de 2000 para 2004 (21,87% para 42,26%), e uma queda acentuada de 2004 a
2008 (42,26% para 20,39%). Tal fato vai de encontro à tendência evidenciada e
enunciada em estudos anteriores (Smith e Thomas, 2005; Schantz e Gilbert, 2001:
Calvo, 2001) nos quais se verificou um aumento do número de notícias ao longo do
tempo. Contudo corrobora os resultados encontrados por Pereira (2008) em um estudo
dos media portugueses, no qual verifica-se um decréscimo acentuado do número de
notícias entre o ano de 2004 e 2008.
Com 50 anos de história (desde 1960 em Roma), os Jogos Paraolímpicos são
considerados o segundo maior evento esportivo em número de dias, modalidades
envolvidas, países e atletas participantes, perdendo apenas para os Jogos Olímpicos.
Este lugar de prestígio é comprovado pelo seu crescimento exponencial, em sua
primeira edição oficial em 1960 em Roma foram 6 dias de competição que reuniram
400 atletas de 23 países competindo em 12 modalidades, já em sua última edição em
Pequim foram 12 dias de evento, 3.951 atletas de 146 países disputando medalhas em
20 modalidades.
Segundo Smith e Thomas (2005) uma conseqüência do crescimento das competições
esportivas para atletas com deficiência, como é o caso das Paraolimpíadas, seria o
aumento na quantidade de cobertura midiática direcionada a estes atletas. Nossos
46
resultados revelaram sim, um aumento quantitativo na cobertura midiática de 1996 a
2004, contudo os números não continuaram a crescer em 2008. Tal queda no número de
notícias indica um eventual menor interesse pela assunto. Esta redução pode ter
ocorrido pelo menor número de atletas ou medalhas em 2008, pela alteração dos
valores-notícia para este evento, ou mudança na política editorial de cada jornal, pelo
que tentaremos verificar cada variável em ambos os países mais a frente.
Pelo fato de ter influência na construção da realidade (Traquina, 2002), a mídia também
têm o seu papel na formação da opinião pública acerca da deficiência. Porém, ao se
analisar a atuação da mídia no sistema de representações e discursos referentes à pessoa
com deficiência, estas se encontram permeadas por subjetividades e, por vezes,
reforçando preconceitos e estereótipos. De acordo com Schantz e Gilbert (2001),
estudos anteriores sobre os efeitos da mídia na sociedade, concluíram que os meios de
comunicação de massa influenciam, principalmente, reforçando normas e atitudes.
Quadro 5 – Número de notícias presentes em cada meio noticioso analisado no Brasil e em Portugal
por edição dos Jogos Paraolímpicos.
1996 Total 2000 Total 2004 Total 2008 Total
Globo 19
44
21
30
23
63
22
50 Estado de
S. Paulo
25 9 39 28
Veja 0 0 1 0
Jornal de
Notícias
6
19
46
59
82
109
15
33
Público 11 12 23 15
Visão 2 1 4 3
Ao analisarmos o Quadro 5, verificamos que os media Portugueses seguem a tendência
geral – com aumento de notícias de 1996 a 2004, e uma queda brusca em 2008. A falta
de linearidade, contudo, é ainda mais evidente nos meios de comunicação Brasileiros,
havendo uma queda de 1996 a 2000, aumento de notícias de 2000 a 2004 e nova queda
de 2004 a 2008.
Cingindo-nos aos resultados de cada país, podemos observar que cerca de 46% de todas
as notícias provêm da imprensa portuguesa, enquanto que 54% foi produzida pela
imprensa brasileira. Contudo ao examinarmos os números em cada uma das edições
encontramos algumas diferenças entre os dois países. (Ver Quadro 6 e Gráfico 1).
47
Quadro 6 – Notícias de cada edição no Brasil e em Portugal (em %).
1996 2000 2004 2008
Brasil 69,84% 33,71% 36,63% 60,24%
Portugal 30,16% 66,29% 63,37% 39,76%
Gráfico 1 – Comparativo do número de notícias por edição no Brasil e em Portugal.
0
50
100
150
200
1996 2000 2004 2008
Brasil
Portugal
Total
Em 1996 o Brasil apresentou o maior número de notícias (69,84%), em 2000 e 2004
Portugal tomou a dianteira com a maior quantidade de cobertura midiática (66,29% e
63,37%, respectivamente), e em 2008 o Brasil voltou a crescer ultrapassando o país luso
(60,24%). Tal variação, como dito anteriormente, pode ter-se dado por diversos
motivos, alguns serão aqui analisados, como a alteração no número de atletas
participantes em cada edição e o número de medalhas, porém outros como políticas
editoriais e valores-notícia serão analisados na próxima fase deste estudo.
Já em 1922 Walter Lippman referia que nossa relação com a realidade não se dá de
maneira direta, mas sim mediada por imagens que formamos na nossa mente. Desta
forma, numa sociedade urbana complexa como a atual temos a necessidade da mediação
dos meios de comunicação, e o jornalismo, no seu percurso histórico, apresenta-se como
reflexo, testemunha e agente da realidade. Portanto esta redução na quantidade de
cobertura midiática pode ser indicativo de uma eventual diminuição no interesse pelo
assunto.
Os jornais fazem muito mais do que transmitir notícias, eles determinam o que é notícia
e apresentam-na de acordo com valores particulares. As notícias são uma espécie de
(re)construção da realidade de acordo com as normas e valores da sociedade. A mídia,
portanto escolhe dentre a grande quantidade de eventos e questões, quais e como ela
deseja transmitir (Kennedy e Hills, 2009). Segundo Kennedy e Hills (2009.) as lacunas
e o silêncio indicam que o que foi deixado de lado pode ter também um poderoso efeito,
48
tanto quanto o que está presente. Ficam então as questões: Que o motivo poderá ter
levado a tal redução? Qual a razão, ou razões, da variação na quantidade de notícias em
cada edição e em cada país?
Para responder a estas perguntas seguimos um caminho a fim de obter uma solução
lógica. Portanto nosso primeiro passo foi observar o número de notícias produzidas pelo
próprio jornal e o número de notícias de agências noticiosas (Quadro 7).
Quadro 7 – Número de notícias produzidas pelo próprio jornal e adquiridas de agências de notícia
em cada edição no Brasil e em Portugal.
1996 2000 2004 2008
Jornal Agência Jornal Agência Jornal Agência Jornal Agência
Globo 19 0 21 0 23 0 22 0
Estado de S. Paulo
25 0 9 0 39 0 28 0
Veja 0 0 0 0 1 0 0 0
Total 44 0 30 0 63 0 50 0
Jornal de
Notícias
6 0 33 13 82 0 10 5
Público 9 2 4 8 17 6 11 4
Visão 2 0 1 0 4 0 3 0
Total 17 2 38 21 103 6 24 9
A facilidade na aquisição de informações das agências de notícia poderia ser o fator de
aumento de notícias em determinados anos e de diminuição em outros. Contudo os
jornais brasileiros não apresentaram sequer uma notícia de agências e os portugueses
produziram uma quantidade muito maior de informação assinadas pelo jornal ou pelo
jornalista, do que assinada por agência. Concluímos então que, de acordo com os dados
que possuímos neste momento, o fator agência de notícias pode ser descartado como
explicação para a variação numérica. Contudo sabemos que muitas vezes as notícias
assinadas pelos jornais e jornalistas são baseadas em informações de agências de notícia,
portanto apenas através de entrevistas com editores e jornalistas, e uma análise mais
detalhada deste elemento chegaremos a uma conclusão mais sólida e irrefutável.
Nosso segundo passo foi analisar o número de medalhas e atletas presentes nas edições
em causa com o objetivo de correlacionar esta variável ao número de notícias.
Quadro 8 – Comparativo entre o número de Atletas, medalhas e notícias de Brasil e Portugal nas
quatro edições.
Brasil Portugal
Atletas Medalhas Notícias Atletas Medalhas Notícias
1996/Atlanta 58 21 44 35 14 19
2000/Sydney 64 22 30 53 16 59
2004/Atenas 48 33 63 48 12 109
2008/Pequim 188 47 50 35 07 33
49
No entanto ao traçarmos este paralelo percebemos que não há relação entre elas.
Imersos em atitudes sociais e normas profissionais, os jornalistas cobrem, selecionam e
difundem informações sobre os temas identificados como interessantes ou importantes.
Seria então de se esperar que com o aumento (ou diminuição) do número de
participantes e/ou o aumento (ou diminuição) do número de medalhas a quantidade de
notícias iria aumentar (ou diminuir). Isso porque, as informações veiculadas são
formadas pelos valores-notícia que definem os critérios e operações que fornecem a
aptidão de merecer um tratamento jornalístico, isto é, de possuir valor como notícia
(Traquina, 2002). Os valores-notícia que poderiam relacionar número de atletas e
número de medalhas ao número de notícias seria a notabilidade e a relevância,
respectivamente. A notabilidade nos diz que a quantidade de pessoas envolvida em um
evento deve ser considerada um critério de noticiabilidade, sendo assim, nos Jogos
Paraolímpicos quanto maior o número de atletas participantes maior a notabilidade. A
relevância, neste caso específico, reside nos resultados obtidos, ou seja, ao obterem
melhores resultados os atletas paraolímpicos atrairiam mais atenção da mídia. No
entanto, como é possível observar no Quadro 8, no Brasil o número de atletas e
medalhas é sempre crescente e o mesmo não ocorre com as notícias; em Portugal o
número de atletas, medalhas e notícias cresce de 1996 a 2000, e em 2008 há queda no
número participantes, medalhas e notícias, contudo o ano de 2004 há a quebra do padrão,
uma vez que há queda no número de atletas e de medalhas, mas há um aumento
vertiginoso no número de notícias, fazendo com que esta não seja a explicação mais
plausível.
Além destes valores-notícias, outros também poderiam ser analisados para se explicar a
variação do número de notícias em cada país por edição, como por exemplo a
mutabilidade entre épocas (Stephens, 2006). Além disso o dia noticioso também é um
dos critérios contextuais com interferência na noticiabilidade de um evento (Traquina,
2002), ou seja, acontecimentos simultâneos que concorrem por espaço nos meios de
comunicação. Há de se notar também que somente a partir de 2004 é que o “Projecto
Super-Atleta” toma fôlego, com campanhas publicitárias, apelo direto ao público,
associação de patrocinadores, podendo ser este o responsável pelo grande aumento de
notícias neste ano em Portugal. Devemos também referir que também em 2004, com a
finalidade de que o movimento paraolímpico tivesse ampla divulgação e maior valorização,
o CPB (Comitê Paraolímpico Brasileiro), numa estratégia ousada e inédita no país,
50
contratou a produtora de vídeo Íntegra Produções para captar, editar e transmitir
gratuitamente imagens dos jogos de Atenas, para as emissoras brasileiras interessadas.
Além disso, oito emissoras abertas e fechadas foram convidadas pelo Comitê para cobrirem
a competição; outros dez veículos também foram convidados, entre eles o jornal O Globo;
pelo que esperava-se que nesta edição o número de notícias aumenta-se muito, o que não
ocorreu.
Poderíamos aqui analisar vários outros fatores responsáveis pela variação da quantidade
de informação sobre os Jogos Paraolímpicos ao longo de suas edições, como por
exemplo as pressões de tempo e espaço a que estão sujeitos os jornalistas, as diferentes
políticas editoriais, a presença ou não de correspondentes in loco, e outros valores-
notícia e sua mutabilidade ao longo do tempo. Contudo para se ter uma resposta
satisfatória seria necessário percorrer outros caminhos, tal como entrevistas aos
jornalistas e editores de cada jornal em cada época; análises que esta fase do trabalho
não engloba.
5.1 Temas
Passemos então à análise pormenorizada do conteúdo da notícia, de modo a
compreendermos de forma mais profunda o processo que envolve a midiatização dos
atletas com deficiência e dos Jogos Paraolímpicos. Assim no Quadro 9 apresentamos os
temas presentes nas edições analisadas dos Jogos Paraolímpicos (1996; 2000; 2004;
2008) e em ambos os países alvos da pesquisa (Brasil e Portugal). De uma forma geral,
no que diz respeito a este parâmetro de observação, verificamos que a tendência das
quatro edições em ambos os países é sobrevalorizar, cada vez mais, a subcategoria
prática desportiva, tal como outros estudos também verificaram (Figueiredo e Novais,
2009; Pereira, 2008; Schantz e Gilbert, 2001; Schell e Duncan, 1999).
Tendo em conta que estamos a analisar um evento desportivo era de se esperar que os
jornais e revistas em questão abordassem mais exaustivamente as questões relacionadas
com a prática do desporto em si. De acordo com Schantz e Gilbert (2001) os meios de
comunicação de massa tendem a enfatizar ações, recordes, performances, resultados,
estatísticas e bastidores quando representam o esporte. A cobertura midiática dos atletas
com deficiência muitas vezes centra-se predominantemente sobre a performance e os
sucessos destes atletas, enfatizando a importância dos recordes, medalhas e tempos
(Smith e Thomas, 2005).
51
Quadro 9 – Temas presentes nas quatro edições analisadas no Brasil e em Portugal. Porcentagem
relativa ao número total de temas em cada edição.
*As porcentagens são apresentadas de forma arredondada
As unidades de registro de cada subcategoria também mostram-se de suma importância
para o entendimento do processo midiático. Dentro da categoria prática desportiva
foram analisadas as unidades preparação, expectativa/objetivos, resultado/performance,
bastidores, e doping.
1996 2000 2004 2008
Brasil Portugal Brasil Portugal Brasil Portugal Brasil Portugal
Prática Desportiva
50% (35)
45% (15)
66% (29)
67% (62)
62% (62)
59% (92)
69% (51)
71% (42)
Atleta
Paraolímpico
4%
(3)
3%
(1)
9%
(4)
8%
(7)
23%
(23)
9%
(14)
11%
(8)
7%
(4)
Questões
político-
econômicas
13%
(9)
3%
(1)
7%
(3)
3%
(3)
6%
(6)
9%
(14)
3%
(2)
7%
(4)
Jogos
Paraolímpicos
33%
(23)
48%
(16)
20%
(9)
22%
(20)
9%
(9)
23%
(36)
18%
(13)
15%
(9)
Quadro 10 – Percentagem das unidades de registro categorizadas da subcategoria prática desportiva em Portugal nas quatro edições analisadas. Porcentagens
relativas à subcategoria prática desportiva.
1996 2000 2004 2008
Primária Secundárias Primária Secundárias Primária Secundárias Primária Secundárias
Preparação 0% 0% 0% 3%(2) 0% 1%(1) 0% 2%(1)
Expectativas/
Objetivos 0% 7%(1) 6%(4) 16%(10) 12%(11) 15%(14) 10%(4) 12%(5)
Resultado/
Performance 87%(13) 7%(1) 60%(37) 0% 46%(42) 3%(3) 57%(24) 7%(3)
Comemoração da
Vitória 0% 0% 0% 3%(2) 0% 2%(2) 0% 0%
Bastidores 0% 0% 2%(1) 3%(2) 7%(6) 4%(4) 5%(2) 5%(2)
Doping 0% 0% 3%(2) 3%(2) 8%(7) 2%(2) 0% 2%(1)
*As porcentagens são apresentadas de forma arredondada
Quadro 11 – Percentagem das unidades de registro categorizadas da subcategoria prática desportiva no Brasil nas quatro edições analisadas. Porcentagens relativas
à subcategoria prática desportiva.
1996 2000 2004 2008
Primária Secundárias Primária Secundárias Primária Secundárias Primária Secundárias
Preparação 0% 0% 3%(1) 0% 0% 0% 2%(1) 2%(1)
Expectativa/
Objetivo 14%(5) 20%(7) 3%(1) 7%(2) 6%(4) 15%(9) 0% 10%(5)
Resultado/
Performance 63%(22) 3%(1) 62%(18) 10%(3) 65%(40) 5%(3) 73%(37) 0%
Comemoração
da Vitória 0% 0% 7%(2) 0% 3%(2) 2%(1) 0% 0%
Bastidores 0% 0% 0% 0% 0% 3%(2) 4%(2) 2%(1)
Doping 0% 0% 3%(1) 3%(1) 0% 2%(1) 2%(1) 6%(3)
*As porcentagens são apresentadas de forma arredondada
53
Como podemos observar pelos quadros 10 e 11 para além de enfatizar a prática
desportiva, a cobertura midiática enfoca especificamente nos resultados e na
performance. Em Portugal a unidade de registro resultados/performance também é a que
apresenta maior concentração como tema primário em todos os anos, contudo tal
concentração tende a variar reduzindo-se até 2004 quando se mantém praticamente
estável. Tal redução é explicada pelo aparecimento progressivo de outras unidades
temáticas. Em 1996 Portugal registrava em seus meios de comunicação notícias que
tinham a ver apenas com os resultados obtidos e as performances realizadas, e as
expectativas e objetivos, em 2000 já é possível perceber a presença de outras unidades
apesar de em pouca quantidade. Dentre esta unidade de registro temos informação dos
resultados, positivos ou negativos, finais da competição, como por exemplo, “A
nadadora Silvana Barroso e o corredor Coelho de Almeida conquistaram ontem mais
duas medalhas para Portugal nas suas respectivas especialidades (…)”2, de resultados
parciais, “João Paulo Fernandes garantiu a presença nas quartas-de-final do torneio
depois de vencer os três jogos que disputou”3. Da mesma forma ficamos a saber quando
recordes são quebrados, e detalhes das performances dos atletas,
Na natação, o dia voltou a ser de recordes, com David Grachat a bater
o seu anterior máximo nacional dos 200 metros estilos SM9, primeiro na eliminatória e depois na final, que terminou no 7º lugar. Grachat
nadou de manhã em 2m28,75s e à tarde em 2m26,13s, retirando no
total quase 5 segundos ao seu anterior recorde nacional (2m31,47)4.
No Brasil o cenário é um pouco diferente, já evidenciando alguma diferença entre as
imprensas destes países. A unidade de registro resultados/ performance, assim como em
Portugal é a que apresenta o maior número de ocorrências como tema primário em todas
as edições. Contudo a principal diferença entre estes dois países reside na forma com
que esta unidade evolui ao longo dos anos. No Brasil a concentração nos resultados e
performances ao invés de diminuir aumenta, sendo inclusive um dos principais temas
secundários até 2004. Tal fato comprova estudos anteriores (Smith e Thomas, 2005;
Schantz e Gilbert, 2001) que afirmam que quando representam o esporte, os meios de
comunicação de massa em geral enfatizam os resultados, as performances, tempo e
recordes. Ao enfatizar nos recordes, medalhas e tempos dos atletas com deficiência os
meios de comunicação reportam a performance destes atletas de forma semelhante ao
2 Público, 24 de Agosto de 1996, p. 26.
3 Jornal de Notícias, 08 de Setembro de 2008, p.15. 4 Jornal de Notícias, 12 de Setembro de 2008, p. 40.
54
jornalismo desportivo em geral (Thomas e Smith, 2003); assim ficamos a saber que “O
Brasil já conquistou cinco medalhas nas Paraolimpíadas de Atlanta em apenas três
dias”5, ou que “Daniel venceu a primeira prova que disputou nos Jogos em 1m11s05,
mais de dois segundos acima do recorde que pertencia ao espanhol Sebastian Rodriguez
(1m13s39) desde Atenas”6.
Em Portugal a seguir a unidade de registro que apresenta maior concentração é a de
expectativa/objetivos. Em 1996 esta unidade aparece somente como tema secundário,
mas já a partir de 2000 percebemos que para além de apresentar a segunda maior
concentração como tema primário, é também a unidade de registro que mais aparece
como tema secundário. Este fato ilustra a evolução no tratamento do atleta com
deficiência, na medida em que esta unidade de registro representa o depósito de
confiança, a expectativa por resultados positivos e a esperança de pódio; como verifica-
se em “Boccia vai dar medalhas a Portugal”7, “(…) a equipa lusa „vai entrar para
ganhar‟(…)”8, “Todos poderão chegar ao ouro, como poderão ficar nas poules”
9.
No entanto, no Brasil o segundo tema primário com maior número de ocorrências varia
de acordo com a edição. Em 1996 e 2004 as expectativas e objetivos foram
privilegiados, na verdade em 1996 apenas os resultados e performances, expectativas e
objetivos foram apresentados pela imprensa brasileira, da mesma forma que ocorreu
com a imprensa portuguesa. Aqui vemos a primeira “evolução” na cobertura dos Jogos
Paraolímpicos, a partir de 2000 uma nova gama de unidades de registro são
apresentadas, o que nos leva a crer que a partir desta data houve uma maior variação de
unidades, principalmente no Brasil, como veremos mais a frente.
Em 1996 a expectativas/objetivos é a unidade de registro com a segunda maior
concentração em temas primários e a primeira em temas secundários. Em 2000,
permanece como a segunda maior concentração em temas secundários, mas perde seu
posto nos temas primários para a unidade comemoração da vitória com uma queda
considerável em ocorrências (de 14% em 1996 para 3% em 2000). Já em 2004 torna a
ser a segunda unidade de registro com maior concentração, e em 2008 desaparece dos
temas primários. Aqui vemos a variação de importância desta unidade ao longo das
5 O Globo, 19 de Agosto de 1996 , p. 02. 6 O Globo, 08 de Setembro de 2008, p. 07. 7 Jornal de Notícias, 12 de Setembro de 2008, p. 35.
8 Público, 19 de Outubro de 2000, p. 60. 9 Público, 17 de Setembro de 2004, p. 11.
55
edições, que chega a não ser citada como tema principal nos últimos Jogos
Paraolímpicos de 2008 em Pequim. Assim, em 1996 em Atlanta os meios de
comunicação brasileiros apresentavam possibilidades de futuras medalhas, “Com 15
medalhas, o Brasil pode subir outras vezes ao pódio das Paraolimpíadas (…)”10
e em
2004 depositavam esperanças nos paratletas nacionais, “Clodoaldo da Silva é esperança
de medalha para o Brasil na Paraolimpíada que começa hoje, em Atenas”11
.
Para além dessas unidades de registro, no país luso outras duas também aparecem como
temas primários a partir de 2000, bastidores e doping, sendo que esta última não possui
registros em 2008. A unidade de registro doping é a que apresenta o terceiro maior
número de ocorrências como tema primário em 2000 e 2004, vindo a desaparecer em
2008; pode também ser encontrada como tema secundário a partir de 2000 mas com
pouca freqüência. Nesta unidade de registro somos informados que “quatro
halterofilistas foram suspensos por acusarem positivo em testes antidoping (…)”12
; e
ficamos a saber de “Um caso recente de doping de um atleta canadiano (…)”13
, sempre
envolvendo atletas estrangeiros. A presença destas unidades está relacionada com o
número de casos de doping divulgados durante o evento, e como vai ao encontro do
valor-notícia da infração/escândalo (Traquina, 2002), espera-se que o uso de substâncias
ilícitas seja noticiado. A presença das questões acerca dos exames anti-doping e dos
testes positivos significa que o desporto para pessoas com deficiência atingiu o patamar
de desporto de alto rendimento aos olhos da mídia, uma vez que apresenta práticas
semelhantes às do deporto para pessoas sem deficiência. Nesse sentido, DePauw e
Gravon (2005) referem que, apesar de a prevalência do doping entre os paratletas não
estar bem documentada muito acreditam que o problema não é muito diferente de outras
partes do mundo desportivo.
A unidade de registro bastidores surge a partir de 2000, sendo a quarta, e última,
unidade com maior número de ocorrências em 2000 e 2004, e em 2008 passa a ser
terceira, e última, com a ausência das questões de doping. Como tema secundário possui
uma trajetória irregular. Nesta unidade os meios de comunicação dão informações sobre
o que está por detrás da prática desportiva, como por exemplo, sabe-se que aquele dia
10Estado de S. Paulo, 25 de Agosto de 1996, p. E1. 11
Estado de S. Paulo, 17 de Setembro de 2004, p. E1. 12 Jornal de Notícias, 21 de Outubro de 2000, p. 64. 13 Jornal de Notícias, 18 de Setembro de 2004, p. 06.
56
será “(…) quase de descanso para os nossos atletas”14
, e que “Na jornada de atletismo, o
dia correu mal a José Alves, ao desistir a 50 metros da meta na prova dos 200m, tendo
sido transportado de maca para fora da pista”15
. Schantz e Gilbert (2001) afirmam que a
cobertura dos esportes paraolímpicos deveria centrar-se em temas similares aos
considerados como os dignos de serem noticiados nas páginas desportivas, incluindo o
foco em histórias de bastidores, prática que os meios de comunicação portugueses
tentam incluir na cobertura paraolímpica.
No Brasil as restantes unidades de registro revezam entre os principais temas. Nesse
sentido as unidades doping e bastidores possuem particularidades ao longo das edições.
Em 2000 o doping aparece como tema principal com a mesma quantidade de
ocorrências (3%) de preparação e expectativas/objetivos, sendo o terceiro tema
secundário em importância. Em 2004 desaparece como tema primário e passa a ser
último tema secundário em nível de importância empatado com a comemoração da
vitória (2%). Em 2008 volta um dos temas principais, e é a segunda unidade de registro
com maior concentração nos temas secundários (6%). Da mesma forma como ocorre na
imprensa portuguesa, os meios de comunicação no Brasil ao se referirem ao doping, dão
informações acerca de casos confirmados e atletas suspensos, “O paquistanês Naveed
Ahmed Butt, do levantamento de peso, foi excluído dos Jogos por uso de esteróides”16
,
“(…) seis atletas foram afastados das Paraolimpíadas por uso de doping”17
, e da
igualmente a Portugal todos os casos envolvem atletas estrangeiros, uma vez que
nenhum atleta português ou brasileiro foi acusado de doping durante as edições dos
Jogos Paraolímpicos analisados. É de se notar que a partir de 2008 também discute-se o
doping tecnológico, “Campeão paraolímpico, Pistorius alimenta discussão sobre doping
tecnológico”18
.
A ausência da unidade de registro doping, tanto no Brasil quanto em Portugal, em 1996
deve-se ao fato de nenhum caso ter sido registrado nesta edição. Em 2000, 11 casos
foram documentados, em Atenas-2004 dez violações foram registradas, este número
caiu para apenas três em 2008 em Pequim. A imprensa portuguesa segue estes números
mantendo o doping como tema primário apenas em 2000 e 2004 quando o número de
14 Jornal de Notícias, 20 de Setembro de 2004, p. 14. 15
Público, 21 de Setembro de 2004, p. 37. 16
Estado de S. Paulo, 10 de Setembro de 2008, p. E4. 17 O Globo, 23 de Outubro de 2000, p. 41. 18 O Globo, 07 de Setembro de 2008 , p. 52.
57
violações foi mais elevado. No Brasil, ao contrário, o doping aparece como tema
principal em 2000 seguindo a tendência, e em 2008 quando o número de casos caí
significativamente. Essa escassez de registros nos leva a crer que é prestado menos
atenção a essa questão no desporto paraolímpico, principalmente no Brasil. Contudo,
podemos afirma também que pelo fato de os atletas envolvidos nos casos de doping não
serem nacionais a imprensa brasileira, aplicando o valor-notícia da proximidade
(Traquina, 2002), optou por não inserir tais informações de forma constante em suas
páginas noticiosas.
A imprensa brasileira não confere às histórias dos bastidores da prática desportiva a
mesma relevância que a imprensa portuguesa. Apenas em 2008 esta unidade de registro
pode ser encontrada dentre os temas primários com a segunda maior concentração de
ocorrências (4%), e como tema primário só passa a ser registrado a partir de 2004, ou
seja, em 1996 e 2000 esta unidade temática esteve ausente das páginas da imprensa
brasileira. Ao longo deste período somos informados que “(…) depois de ter
confirmado sua mudança da categoria S4 – de atletas com nível Maio de deficiência –
para S5 na natação dos Jogos Paraolímpicos de Pequim, o brasileiro Clodoaldo Silva
afirmou que perdeu a motivação (…)”19
.O fato de a unidade bastidores não ser muito
enfocada pela mídia, comprova a teoria de que, no caso do Brasil é ainda mais
verdadeiro, a cobertura midiática de desporto adaptado muitas vezes foca
principalmente na performance e sucesso dos atletas com deficiência, enfatizando o
significado de recordes, medalhas e tempos, com muito pouco, ou nenhum, comentário
sobre a experiência dos atletas, repercussão da medalha e bastidores (Thomas e Smith,
2003).
A unidade temática preparação é registrada a partir de 2000 sempre como tema
secundário nos meios de comunicação lusos. Assim, ficamos a saber que “(…) os atletas
têm feito „bons treinos e excelentes tempos‟ (…)”20
, e também da intensidade dos
treinos “Uma hora e meia de treino, cinco dias por semana (…)”21
. Era de se esperar que
esta unidade de registro não tivesse uma grande concentração e que não aparecesse com
tanta freqüência, uma vez que nosso período de análise abrange apenas o período em
que se decorrem as provas dos Jogos Paraolímpicos. Torna-se evidente portanto que o
19
O Globo, 06 de Setembro de 2008, p. 36. 20 Jornal de Notícias, 17 de Outubro de 2000, p. 58. 21 Jornal de Notícias, 17 de Setembro de 2004, p. 10.
58
período anterior à competição deveria apresentar maior concentração desta unidade de
registro, no entanto, Pereira (2008) constata, ao analisar o número de ocorrências da
preparação na imprensa portuguesa em 2004 e 2008, que esta unidade temática
apresenta valores mais elevados no período em que se desenrolam os Jogos,
contrariando nossa teoria. O que nos leva a crer que as questões de treinamento e
preparação para os Jogos Paraolímpicos possui um valor-notícia baixo para a imprensa
portuguesa.
A preparação dos atletas, que não têm tanto significado na imprensa portuguesa, no
Brasil alcança postos significativos. Como em Portugal, também só aparece em duas
edições, 2000 e 2008, no entanto com maiores concentrações neste último país, sendo
inclusive um dos principais temas primários. Os meios de comunicação brasileiros
reportam ao início da competição que “(…) o Comitê Paraolímpico Brasileiro (CPB)
deu atenção especial a algo bem mais sutil: a preparação psicológica dos atletas (…)”22
,
e ao fim que a China com o objetivo de desenvolver outros esportes investiu em “(…)
infra-estrutura esportiva, bolsas, pensões para atletas e a contratação de equipes técnicas
estrangeiras para a transferência de tecnologia”23
. Assim temos esta unidade de análise
presente no início da competição explicando o que foi feito para que os atletas tivessem
um bom desempenho, e ao final da competição como uma das justificativas pelos
resultados. A partir deste maior enfoque podemos perceber que a mídia começa a
modificar sua postura diante dos atletas com deficiência, ao enfatizar a preparação,
física e psicológica, para os Jogos Paraolímpicos os meios de comunicação transmitem
a ideia de que este é evento de alto rendimento e que para ser bem sucedido é necessário
manter um plano de treinamento e preparação similar aos dos atletas olímpicos.
A última unidade a ser referida é a comemoração da vitória. Em Portugal tal unidade de
registro aparece apenas em 2000 e 2004, sempre como tema secundário e com um
número de ocorrências muito baixo (3% e 2%, respectivamente), como em “Como, no
fundo, a vitória era de Portugal, o ambiente final foi de festa (…)”24
. Tal fato vai de
encontro aos resultados de Figueiredo e Novais (2009) em que um dos principais temas
encontrados na análise da vitória de um atleta paraolímpico foi exatamente a celebração
da mesma. Aqui a mídia brasileira mostra-se um passo a frente, uma vez que, mesmo de
22
O Globo, 17 de Outubro de 2000, p. 34 23 O Globo, 18 de Setembro de 2008, p. 36. 24 Jornal de Notícias, 25 de Outubro de 2000, p. 51
59
forma tímida mas significativa em face da proporção da cobertura, apresentaram uma
maior enfoque nas comemorações, ao relatarem que “Ádria dos Santos abraça seu guia,
Jorge Luiz Silva, o Chocolate, logo depois de vencerem a prova dos 100m rasos (…)”25
e que “Os brasileiros Danilo Glasser, Fabiano Machado, Adriano Gomes e Mauro Brasil
comemoram a conquista da medalha de bronze (…)”26
. No Brasil esta unidade de
análise, tal como na mídia portuguesa, aparece apenas em 2000 e 2004, contudo a
diferença está na concentração (7% e 2%) para os temas secundários, e na presença
desta unidade como tema primário em 2004 com 3,2% de concentração.
Passemos agora a analisar a subcategoria Atleta Paraolímpico. Em 1996 esta é a
subcategoria com a menor concentração de ocorrências tanto no Brasil quanto em
Portugal (4% e 3%, respectivamente), sendo que neste último ficou empatada com a
subcategoria questões político-econômicas, como ocorrerá nas edições de 2004 e 2008.
Em Sydney-2000, a mídia brasileira aumenta o foco nos atletas (9%) mas continua
como uma das últimos subtemas do ano; em Portugal a quantidade de cobertura
midiática chega a ser maior do que o dobro da edição anterior (8%), e passa a ser a
terceira dentre as quatro subcategorias analisadas. Em 2004, o Brasil mostra grande
interesse pelo atleta paraolímpico ao fazer deste alvo de 23% de suas notícias,
transformando esta subcategoria em uma das primeiras em importância, em Portugal o
número de ocorrências também aumenta (para 9%) mas o tema mantém-se entre os de
menor interesse. Na última edição dos Jogos Paraolímpicos, em 2008, há uma queda,
significativa no caso do Brasil, em ambos os países (para 11% no Brasil e 7% em
Portugal) fazendo com que a subcategoria voltasse a ser rankeada entre as de menor
importância.
Esta subcategoria inclui as unidades de registro história/perfil, perfil do adversário,
homenagem e futuro.
25 O Globo, 21 de Setembro de 2004, p. 02. 26 Estado de S. Paulo, 27 de Outubro de 2000, p. E2
Quadro 12 - Percentagem das unidades de registro categorizadas da subcategoria atleta paraolímpico em Portugal nas quatro edições analisadas. Porcentagens
relativas à subcategoria atleta paraolímpico.
1996 2000 2004 2008
Primárias Secundárias Primárias Secundárias Primárias Secundárias Primárias Secundárias
História/Perfil 100%(1) 0% 71%(5) 14%(1) 64%(9) 21%(3) 25%(1) 25%(1)
Perfil do
Adversário 0% 0% 0% 0% 0% 7%(1) 0% 0%
Homenagem 0% 0% 14%(1) 0% 0% 0% 0% 0%
Futuro 0% 0% 0% 0% 0% 7%(1) 0% 50%(2)
*As porcentagens são apresentadas de forma arredondada
Quadro 13 - Percentagem das unidades de registro categorizadas da subcategoria atleta paraolímpico no Brasil nas quatro edições analisadas. Porcentagens
relativas à subcategoria atleta paraolímpico.
1996 2000 2004 2008
Primárias Secundárias Primárias Secundárias Primárias Secundárias Primárias Secundárias
História/Perfil 67%(2) 33%(1) 25%(1) 75%(3) 39%(9) 52%(12) 25%(2) 63%(5)
Perfil do
Adversário 0% 0% 0% 0% 0% 0% 0% 0%
Homenagem 0% 0% 0% 0% 0% 0% 0% 0%
Futuro 0% 0% 0% 0% 0% 9%(2) 0% 12%(1)
*As porcentagens são apresentadas de forma arredondada
61
A unidade de registro com maior concentração tanto em temas primário como em
secundários (com exceção do tema secundário de 2008 em Portugal) no Brasil e em
Portugal é a história/perfil, sendo que em 1996 é a única unidade presente em ambos os
países, situação esta que se estende até 2000 no caso do Brasil. Em Portugal a
concentração desta unidade tende a diminuir como tema primário e a aumentar como
secundário ao longo das edições, já no Brasil não podemos observar uma tendência
linear, pois tanto para o tema principal quanto para o secundário há reduções e
aumentos.
De uma forma geral através desta unidade de registro tomamos conhecimento
essencialmente, do perfil do atleta, ou seja, suas conquistas anteriores “Ádria, que está
na quinta paraolimpíada e vinha de dois ouros em Sydney, nos 100m e 200m (além de
um ouro em Barcelona nos 100m) (…)”27
, “Medalha de bronze nos 10.000 metros nos
Paraolímpicos de Atlanta, em 1996, medalha de prata nos 5000 metros no Mundial de
1998, em Madrid, medalha de ouro nos 10.000, prata nos 5000 e bronze nos 1500
metros no Europeu de 1999, em Lisboa, e campeão do mundo em maratona em 1998,
são alguns dos títulos que guarda”28
e status atual do atleta “Aos 24 anos, Anderson é o
atual recordista mundial do arremesso de disco na categoria F36 (…)”29
, além de suas
histórias de vida, principalmente centradas na explicação do que teria originado a
deficiência do atleta, “O atleta, de 28 anos, perdeu a mão direita num acidente com uma
foice aos 19”30
; “Há dez anos, Roseane Santos conversava com duas amigas na calçada
de sua casa, em Recife. Um caminhão desgovernado, dirigido por um bêbado, atropelou
as três e Rosinha, como é conhecida pelos amigos, acabou perdendo a perna
esquerda”31
, “Um desastre de mota, há um ano, provocou a amputação de perna (ao
nível do joelho) da sul-africana Natalie du Toit (…)”32
.
Na maioria das notícias percebemos a necessidade de se especificar a causa da
deficiência, isso, por um lado, pode gerar compaixão pelos atletas, mas por outro pode
ser encarado com fato noticioso, uma vez que a deficiência é uma característica do
atleta, sendo então abordada dessa forma. Em Portugal percebemos então, que a medida
27 Estado de S. Paulo, 21 de Setembro de 2004, p. E3. 28 Jornal de Notícias, 21 de Outubro de 2000, p. 64. 29 O Globo, 18 de Agosto de 1996, p. 54. 30 O Globo, 23 de Outubro de 2000, p. 06. 31
O Globo, 24 de Outubro de 2000, p . 36. 32 Jornal de Notícias, 20 de Setembro de 2004, p. 14.
62
em que os atletas passam a ficar mais conhecidos pelo público menos é a necessidade de
apresentá-lo, o mesmo não ocorre no Brasil. Este último fato pode ser explicado devido
à falta de memória do brasileiro, principalmente com relação aos Jogos Paraolímpicos.
Em um estudo realizado por Guerra e Hilgemberg (2006) constatou-se que após a
realização das Paraolimpíadas de Atenas, grande parte dos entrevistados pela pesquisa
não se lembravam sequer do nome de um paratleta.
A partir de 2000 Portugal apresenta outras unidades de registro nesta subcategoria, no
Brasil esta situação só se verifica a partir de 2004. A unidade homenagem aparece
somente em Portugal e apenas em 2000 como tema primário, desaparecendo nas edições
seguintes. A ausência no caso do Brasil, e o pequeno número de ocorrências em
Portugal era esperado, uma vez que as homenagens são prestadas aos atletas em
território nacional, e a grande maioria destes atletas só voltariam para seus países após o
término do evento. A unidade perfil do adversário também só aparece em Portugal e
somente em 2004 como tema secundário, no Brasil esta unidade esteve ausente. Isto
pode ser explicado pelo fato de que os eventos esportivos são discutidos de uma forma
muito mais etnocêntrica e nacionalista. De fato ao focar no perfil dos atletas nacionais a
mídia ao invés de trivializar suas performances exaltam-nas. Este sentimento de
nacionalismo também foi encontrado nas páginas dos jornais britânicos (Thomas e
Smith, 2003), alemães e franceses (Schantz e Gilbert, 2001).
Em 2004 e 2008 Brasil e Portugal apresentam uma nova unidade de registro na
subcategoria atleta paraolímpico sempre como tema secundário. O futuro dos atletas
passa a ser discutido o que o atleta fará logo a seguir aos Jogos, “Quando voltar ao
Brasil, Ádria descansará um mês antes de retomar os treinos”33
, os planos para as
próximas Paraolimpíadas “Tenório lutou na categoria meio pesado e poderá até mudar
de categoria para disputar a paraolimpíadas da China”34
, e da possibilidade de
continuidade da carreira esportiva “(…) uma competidora nata que não pensa, para já,
no abandono”35
. Apesar do pequeno número de ocorrências a presença desta unidade já
reflete uma maior preocupação dos meios de comunicação em noticiar o futuro do
atleta, seus planos, possibilidade de aposentadoria, entre outros.
33
O Globo, 26 de Setembro de 2004, p. 50. 34 Estado de S. Paulo, 22 de Setembro de 2004, p. E4. 35 Jornal de Notícias, 28 de Setembro de 2004, p. 07.
63
As questões político-econômicas foram uma outra temática presente em nossa análise.
Esta subcategoria é a de menor importância no Brasil e em Portugal em todas as
edições, com exceção de 1996 no Brasil, em que foi o terceiro enfatizado. No Brasil
esta categoria tendeu a ter cada vez menos ocorrências ao longo das edições, chegando a
cair pela metade em 2000 (de 13% para 7%) e a ter uma queda ainda mais acentuada de
2004 a 2008 (de 6% para 3%). Portugal apresentou uma tendência contrária, de 1996 a
2004 a concentração desta subcategoria aumentou , ligeiramente de 1996 a 2000 (de 3%
para 3%), e chegou a atingir mais do dobro em 2004 (9%), e em 2008 apresentou um
declínio (7%). Dentre esta subcategoria foi possível assinalar duas unidades de registro,
apoio e patrocínio e investimento.
Quadro 14 - Percentagem das unidades de registro categorizadas da subcategoria questões político-econômicas em Portugal nas quatro edições analisadas.
Porcentagens relativas à subcategoria questões político-econômicas.
*As porcentagens são apresentadas de forma arredondada
Quadro 15 - Percentagem das unidades de registro categorizadas da subcategoria questões político-econômicas no Brasil nas quatro edições analisadas.
Porcentagens relativas à subcategoria questões político-econômicas.
1996 2000 2004 2008
Primária Secundárias Primária Secundárias Primária Secundárias Primária Secundárias
Apoio/Patrocínio 22%(2) 78%(2) 67%(2) 33%(1) 50%(3) 50%(3) 50%(1) 50%(1)
Investimento 0% 0% 0% 0% 0% 0% 0% 0%
*As porcentagens são apresentadas de forma arredondada
1996 2000 2004 2008
Primária Secundárias Primária Secundárias Primária Secundárias Primária Secundárias
Apoio/Patrocínio 0% 0% 33%(1) 33%(1) 29%(4) 57%(8) 25%(1) 50%(2)
Investimento 0% 100%(1) 0% 33%(1) 0% 14%(2) 0% 25%(1)
65
Aqui não podemos falar em uma tendência geral para o aumento ou decréscimo das
unidades de registro, em nenhum dos países. No Brasil a unidade de registro
investimento está ausente, e a unidade apoio/patrocínio está presente tanto como tema
primário com secundário em todas as edições. Já na mídia portuguesa a questão do
investimento foi encontrada em todas as edições, exclusivamente com tema secundário,
e em 1996 foi a única presente, enquanto que a unidade apoio/patrocínio só aparece a
partir de 2000 como tema primário e secundário, sendo que sua freqüência como tema
primário tende a diminuir ao longo dos anos.
Neste subtema a maior parte das informações referem-se aos problemas enfrentados
pelos atletas paraolímpicos, como por exemplo o caso do desportista português Paulo
Coelho que “Apesar de se ter licenciado em Economia há um ano, (…) continua
desempregado”36
, ou ainda outros que perderam “(…) o emprego para participar nos
Jogos Paralímpicos de Sydney”37
; as condições a que os atletas estão sujeitos, “(…) em
Portugal, as condições para os deficientes praticarem desporto ainda estão muito aquém
do necessário”38
, “Falta de local adequado e material para treinos, carência de
competições internacionais, falta de patrocínio e dificuldade de profissionalização são
queixas freqüentes”39
, “Os atletas não recebem a ajuda de custo (entre R$325 e R$725)
há dois meses”40
. Ficamos a saber que a vitória de atletas paraolímpico e olímpicos não
tem o mesmo valor , “As medalhas de ouro paralímpicas passam a valer 10 mil euros
(dois mil contos) enquanto as suas homólogas olímpicas recebem 30 mil euros, isto é, o
triplo”41
, mas que o governo já defende uma aproximação entre os valores das bolsas
para os atletas com deficiência, “Depois de salientar o desequilíbrio entre as duas (…), o
governante não coloca de lado uma diminuição entre os dois valores (…)”42
; os apoios
que recebem que “(…) somados aos patrocínios da iniciativa privada, deu aos
brasileiros a chance de uma preparação adequada (…)”43
; e as exigências para a
melhoria de condições, “(…) a FPDD vai apresentar propostas que visam „melhorar as
36 Visão, 15 a 21 de Agosto de 1996, p. 76. 37 Jornal de Notícias, 18 de Outubro de 2000, p. 58. 38 Visão, 12 a 18 de Outubro de 2000, p. 112. 39 O Globo, 18 de Setembro de 2008, p. 36 40 O Globo, 21 de Outubro de 2000, p. 41. 41
Jornal de Notícias, 18 de Setembro de 2004, p. 07. 42 Jornal de Notícias, 19 de Setembro de 2004, p. 43 Estado de S. Paulo, 17 de Setembro de 2004, p. E3.
66
condições de preparação‟ para Londres 2012 (…)”44
, “O importante é dar condições de
desenvolvimento aos paratletas, às modalidades que eles disputam”45
.
Verificamos, portanto, que apesar de a maioria dos assuntos tratados nesta subcategoria
recaírem sobre a falta de apoios e problemas enfrentados pelos paratletas, os patrocínios
obtidos e campanhas para angariação de fundos já são visíveis em nas imprensas de
ambos os países. Podemos, assim depreender que nesse sentido há uma evolução, ainda
que lenta, tendendo ser positiva.
Por fim, a última categoria analisada, a dos Jogos Paraolímpicos apresenta elevado grau
de relevância em ambos os países. No Brasil a categoria temática atingiu a segunda
colocação em importância nos anos de 1996, 2000 e 2008, sendo que em 2004 foi o
terceiro em ocorrências. Em Portugal tal importância é ainda mais evidente, nas edições
de 2000 a 2008 o tema foi o segundo em importância, e em 1996 chegou a ser o
primeiro, com um número de ocorrências ligeiramente maior do que a prática desportiva.
Dentre as unidades de registro desta categoria estão a abertura e encerramento do evento,
estratégias de marketing, problemas da organização, bastidores dos Jogos, detalhes
sobre os esportes inseridos na competição, e sobre a presença ou ausência dos meios de
comunicação.
44 Público, 18 de Setembro de 2008, p. 28. 45 O Globo, 18 de Agosto de 1996, p. 54.
Quadro 16 - Percentagem das unidades de registro categorizadas da subcategoria Jogos Paraolímpicos em Portugal nas quatro edições analisadas. Porcentagens
relativas à subcategoria Jogos Paraolímpicos.
1996 2000 2004 2008
Primárias Secundárias Primárias Secundárias Primárias Secundárias Primárias Secundárias
Abertura 0% 13%(2) 10%(2) 0% 17%(6) 0% 11%(1) 11%(1)
Encerramento 6%(1) 6%(1) 0% 5%(1) 0% 6%(2) 0% 11%(1)
Marketing 0% 0% 0% 0% 0% 0% 0% 0%
Problemas 0% 19%(3) 10%(2) 25%(5) 0% 0% 0% 11%(1)
Bastidores 13%(2) 37%(6) 25%(5) 20%(4) 44%(16) 11%(4) 0% 44%(4)
Esporte 0% 6%(1) 5%(1) 0% 11%(4) 3%(1) 11%(1) 0%
Mídia 0% 0% 0% 0% 6%(2) 3%(1) 0% 0%
*As porcentagens são apresentadas de forma arredondada
Quadro 17 - Percentagem das unidades de registro categorizadas da subcategoria Jogos Paraolímpicos no Brasil nas quatro edições analisadas. Porcentagens
relativas à subcategoria Jogos Paraolímpicos.
1996 2000 2004 2008
Primárias Secundárias Primárias Secundárias Primárias Secundárias Primárias Secundárias
Abertura 13%(3) 4%(1) 22%(2) 0% 33%(3) 11%(1) 23%(3) 0%
Encerramento 0% 9%(2) 11%(1) 11%(1) 0% 11%(1) 0% 8%(1)
Marketing 9%(2) 0% 0% 0% 0% 0% 0% 0%
Problemas 9%(2) 13%(3) 0% 22%(2) 0% 0% 8%(1) 8%(1)
Bastidores 13%(3) 4%(1) 11%(1) 11%(1) 22%(2) 0% 0% 31%(4)
Esporte 4%(1) 17%(4) 0% 11%(1) 0% 0% 8%(1) 15%(2)
Mídia 4%(1) 0% 0% 0% 0% 22%(2) 0% 0%
*As porcentagens são apresentadas de forma arredondada
68
No Brasil a unidade de registro abertura é a que aparece com maior freqüência como
tema primário em todas as edições do evento, com tendência crescente de 1996 a 2004 e
uma ligeira queda em 2008. Já em Portugal tal unidade apenas apresenta-se como tema
principal em 2008, contudo a partir de 2000 a abertura já pode ser encontrada dentre os
temas primários. O encerramento do evento só aparece como tema primário em 2000,
no Brasil, e em 1996 em Portugal, sendo tema secundário em todas edições em ambos
os países, sempre com uma pequena concentração. Acreditamos que tal se deve ao fato
de que o período de análise cinge-se até o dia seguinte ao encerramento, neste sentido
entendemos que por este motivo poucas notícias sobre a festa final foram encontradas.
A abertura dos Jogos Paraolímpicos, assim como as festas de abertura de outros grandes
eventos esportivos, configuram-se como possibilidades de observação das diferentes
representações pelas quais as nações escolheram serem vistas e identificadas (Abrahão e
Soares, 2008). Assim as notícias ressaltam a presença de autoridades e celebridades
“(…) Reeve, a cantora Aretha Franklin, (…), e o presidente do Comitê Olímpico
Internacional, Juan Antonio Samaranch, serão os grandes chamarizes (…)”46
, os
discursos “O momento mais marcante deverá realmente ser o discurso de Reeve (…)”47
,
e os detalhes do espetáculo “Mais uma vez a organização chinesa voltou a emocionar o
mundo com um espetáculo de cores, dança e fogos de artifício”48
. Sendo assim a
importância deste momento não cinge-se apenas à oficialização do início dos jogos, mas
toda a aura que este carrega em termos simbólicos, na representação da nação que sedia
os mesmos e na representação do esporte para pessoas com deficiência.
Em Portugal o tema de maior importância nas edições de 1996 a 2004 foi os bastidores
do evento, sendo a categoria temática primária com maior ocorrência e um dos temas
secundários também com maior concentração. No Brasil este tema também possui forte
concentração, classificado dentre as principais categorias temáticas em 1996, 2000 e
2004 e como principal tema secundário em 2008. Os bastidores do acontecimento
sempre avivam a curiosidade do leitor, é um relato daquilo que o público não pôde
presenciar, o que está atrás da cena apresentada pelos organizadores do evento. Assim
esta unidade de registro nos apresenta as notícias sobre a presença de autoridades “O
secretário de Estado adjunto do ministro do Trabalho e da Solidariedade, Rui Cunha,
46
O Globo, 15 de Agosto de 1996, p. 36. 47 O Globo, 15 de Agosto de 1996, p. 36. 48 O Globo, 06 de Setembro de 2008, p. 36.
69
chegou a Sydney para assistir à cerimónia de abertura e aos primeiros dias dos Jogos
Paralímpicos”49
; o apoio da torcida “Em território australiano, os atletas continuam a ter
o apoio e carinho da comunidade portuguesa”50
; situações inusitadas “Um treinador de
natação da equipe russa está a ser processado por alegadamente ter assediado
sexualmente uma mulher (…)”51
; questões de segurança “Mais de 15 mil soldados e
polícias, uma média de quatro por atleta, foram destacados pelo Governo grego para
garantir a segurança dos Jogos Paralímpicos (…)”52
, entre outros.
A unidade de registro problema também possui algum destaque nas edições de 1996,
2000 e 2008 em ambos os países. Em 2004 este tema esteve ausente, fato que aponta
para uns Jogos sem problemas de organização, e que transcorreu de forma mais
tranqüila. Contudo nas outras três edições analisadas os problemas estiveram presentes,
como por exemplo as polêmicas classificações dos atletas, “Depois de ser reavaliado
anteontem pelo Comité Paraolímpico Internacional (IPC), o atleta foi mantido mesmo
na classe (da S4 para a S5), tendo agora que competir com atletas menos
comprometidos, o que reduz suas chances nas provas”53
; e os problemas na organização
do evento, “O sistema de transporte é caótico, as acreditações dos atletas tardam em
chegar e as queixas quanto às más condições de treino são só algumas das falhas que
estão a tornar a organização dos Jogos Paraolímpicos um inferno”54
. Sendo o
negativismo um valor notícia, e neste caso aliado ao fato de estar relacionado a uma
nação de elite (Austrália, Estados Unidos e China) e a uma entidade de elite (Comitê
Paraolímpico Internacional), temos assim a explicação para o número considerável de
ocorrências sobre os problemas em tal evento desportivo.
Apesar de seu desenvolvimento, o esporte para pessoas com deficiência continua a ser
uma realidade pouco entendida pela população em geral (Varela, 1991). Dessa forma
justifica-se a presença de notícias de caráter pedagógico e cultural, com explicações
sobre provas e atividades esportivas específicas. Neste sentido, os meios de
comunicação brasileiros apresentaram tais tipos de notícias em 1996, 2000 e 2008,
enquanto que a portuguesa foi mais além apresentando os esportes paraolímpicos em
49 Jornal de Notícias, 17 de Outubro de 2000, p. 58. 50 Jornal de Notícias, 23 de Outubro de 2000, p. 69. 51 Jornal de Notícias, 25 de Outubro de 2000, p. 51. 52
Público, 19 de Setembro de 2004, p. 32. 53 O Estado de S. Paulo, 06 de Setembro de 2008, p. E8. 54 Jornal de Notícias, 19 de Agosto de 1996, p. 29.
70
todas as edições. Nesta unidade de registro ficamos a saber que “O ciclismo paralímpico
engloba, essencialmente, atletas das áreas da deficiência visual (total ou parcial),
paralisia cerebral, amputados e lesões da espinha dorsal”55
, e que a bocha “(…) destina-
se a atletas com paralisia cerebral e doenças neuromusculares e é praticado em Portugal
por cerca de 300 atletas, de 31 associações e clubes”56
, e que o atletismo “Consta do
programa paralímpico desde Roma 1960”57
, além de que “O futebol para paralisados
cerebrais tem basicamente as mesmas regras que o similar regido pela FIFA”58
.
A unidade de registro marketing, que informa sobre algumas estratégias de vendas dos
produtos relacionados aos Jogos Paraolímpicos está presente apenas no Brasil na edição
de 1996, ano em que os mascotes esgotaram nas lojas, estando ausente nas outras
edições e completamente em Portugal. Tal unidade temática não apresenta nenhum dos
principais valores-notícia (Ver Traquina, 2002) utilizados como critérios de
noticiabilidade, justificando-se portanto a ausência do mesmo em nossa análise, visto
não se tratar de hard news.
Outra unidade de registro pouco presente no corpus de estudo foi a mídia, ou seja,
notícias que relatavam a presença ou ausência dos meios de comunicação para a
cobertura do evento in loco, “Estão presentes 44 rádios e televisões de 40 países”59
,
“Em Portugal, os Jogos são transmitidos por duas cadeias televisivas e duas
radiofónicas”60
; também ficamos a saber que “Pela primeira vez na história da
Paraolimpíada, as competições dos atletas portadores de deficiências poderá ser vistas
em todo o mundo”61
, e que com a cobertura midiática espera-se “(…) não apenas dar
retorno aos patrocinadores e valorizar os atletas, como também mudar a visão que a
sociedade brasileira tem dos deficientes”62
Em Portugal encontramos tal unidade
temática apenas em 2004, com uma pequena concentração tanto como tema primário
(6%) quanto como secundário (3%). No Brasil as matérias sobre a mídia aparecem em
duas edições, em 1996 como tema primário, e da mesma forma que em Portugal com
uma pequena taxa de ocorrências (4%), e em 2004 como tema secundário, mas dessa
55 Jornal de Notícias, 16 de Setembro de 2004, p. 12. 56 Jornal de Notícias, 13 de Setembro de 2008, p. 44. 57 Público, 17 de Setembro de 2004, p. 41 58 O Globo, 17 de Agosto de 1996, p. 31. 59 Jornal de Notícias, 18 de Setembro de 2004, p. 06. 60
Público, 18 de Setembro de 2004, p. 34. 61 Estado de S. Paulo, 17 de Agosto de 1996, p. E9. 62 Estado de S. Paulo, 17 de Setembro de 2004, p. E3.
71
vez com uma concentração mais elevada (22%). Ao discutir-se a presença e ausência
dos meios de comunicação e a importância da cobertura dos Jogos Paraolímpicos, a
mídia mostra o início de uma conscientização, uma vez que a mesma é a grande
responsável por pautar aquilo que será discutido (agenda setting), os meios de
comunicação têm o poder sobre o conhecimento, as opiniões e o modo de ver a
realidade. A mídia deve, então, usar esse poder para transformar o desconhecido em
familiar, e dessa forma o Brasil encontra-se um pouco à frente de Portugal, uma vez que
apresenta notícias sobre o tema em duas edições e com concentração mais elevada na
última.
5.2 Terminologia
A abordagem e a terminologia utilizada pelos meios de comunicação de massa refletem
na interpretação da sociedade sobre os principais temas de interesse coletivo. Se a
informação não é cuidada, acaba reforçando estigmas e posturas preconceituosas
transmitidas culturalmente, que podem significar, no mínimo, um empecilho à evolução
e ao desenvolvimento social. Amaral (1994, p.7), afirma que
A abordagem e a terminologia utilizada pelos meios de comunicação
de massa [...] refletem na interpretação da sociedade sobre os principais temas de interesse coletivo. Se a informação não é cuidada,
acaba reforçando estigmas e posturas preconceituosas transmitidas
culturalmente, que podem significar, no mínimo, um empecilho à evolução e ao desenvolvimento social.
Por este motivo observamos a utilização de terminologia relacionada aos atletas
paraolímpicos. (Quadro 18).
Quadro 18 – Porcentagem de tipos de terminologias, relativas ao total de terminologias no ano, de
Brasil e Portugal nas edições analisadas.
*São apresentadas somente a primeira casa decimal da percentagem
O tratamento mediático dado ao paraolimpismo, confere ao deporto adaptado uma
consideração social, que pode trazer prejuízos ou benefícios ao desenvolvimento do
mesmo bem como à integração das populações com deficiência. (Calvo, 2001). De
1996 2000 2004 2008
Brasil Portugal Brasil Portugal Brasil Portugal Brasil Portugal
Genérica 48%
(198)
60%
(123)
63%
(148)
79%
(453)
69%
(374)
69%
(437)
65%
(267)
79%
(193)
Relacionada
ao Currículo
9%
(37)
9%
(19)
10%
(24)
7%
(41)
10%
(55)
11%
(71)
8%
(32)
4%
(9)
Adequada à
deficiência
9%
(38)
8%
(17)
6%
(14)
11%
(64)
7%
(39)
16%
(99)
13%
(53)
13%
(31)
Inadequada
à deficiência
34%
(140)
23%
(47)
21%
(48)
3%
(18)
14%
(74)
4%
(26)
14%
(58)
4%
(10)
72
acordo com Marques (2001a) as vezes o uso de certo termos, muito difundidos e
aparentemente inocentes, reforça preconceitos. Apesar de ainda serem encontrados
termos que reforçam atitudes negativas para com as pessoas com deficiência, já pode-se
perceber, através de alguns estudos, uma tomada de consciência, por parte da imprensa
e de jornalistas.
No que concerne a abordagem e a terminologia utilizadas pelos mídia, os resultados
evidenciaram que em ambos os países, os termos Genéricos são massivamente
utilizados em detrimento dos outros gêneros, em todas as edições, corroborando outros
estudos (Novais e Figueiredo, 2009; Pereira, 2008; Schantz e Gilbert, 2001). Dessa
forma observamos que a maior presença de termos genéricos pode ser revelador da
exigência jornalística da neutralidade ou, em alternativa, pode indiciar a existência de
uma conscientização por parte de jornais e jornalistas de que a terminologia utilizada,
relativamente às pessoas com deficiência, pode refletir e influenciar as atitudes em torno
das mesmas, criando e/ou perpetuando estereótipos (Novais e Figueiredo, 2009;
Auslander e Gold, 1999a).
Contudo ao observamos os demais gêneros no Brasil percebemos que apesar de os
termos genéricos serem os mais utilizados, a segunda terminologia com maior
concentração em todas as edições é a terminologia relacionada inadequadamente à
deficiência, contudo o número de ocorrências deste tipo de termos tende a diminuir
(34%, 21%, 14%, e 14% em 1996, 2000, 2004, e 2008, respectivamente), evidenciando
que apesar de estar a cair em desuso (Kama, 2004) a terminologia inadequada ainda faz
parte das rotinas mediáticas, comprovando que o processo de assimilação por parte dos
media tende a ser lento.
Em Portugal somente em 1996 a terminologia inadequada foi a que obteve a segunda
maior concentração. Em 2000 o número de ocorrência destes termos cai de forma
abrupta, e também a partir desta data passa a ser substituída pela terminologia
relacionada adequadamente à deficiência. Neste caso Portugal encontra-se um passo à
frente do Brasil.
Além disso, no Brasil a linguagem mais adequada e as relacionadas ao currículo do
atleta revezam-se em nível de importância ao longo das edições. Contudo é de se notar
que os termos “corretos” tendem a aumentar de concentração, enquanto que o número
de termos relacionados ao currículo do atleta permanece praticamente estável. No país
73
luso a terminologia relacionada corretamente ao atleta tem concentração estável; e a
terminologia relacionada ao currículo do atleta é a terceira em concentração de 1996 a
2004, caindo para último em 2008 com uma redução brusca em ocorrências (de 11% em
2004 para 4% em 2008).
Vários esforços têm sido feitos para fornecer aos jornalistas e pesquisadores guias e
manuais com a terminologia mais adequada a ser utilizada. Contudo as próprias
organizações, associações e instituições têm dificuldades em encontrar um consenso
relativamente a este tipo de terminologia.
Quadro 19 – Porcentagem das unidades de registro da terminologia genérica, relativas ao total de
terminologias genéricas do ano, de Portugal nas edições analisadas.
1996 2000 2004 2008
Atleta/Competidor/
Jogador
40%(49)
39%(175) 42%(184) 37%(72)
Idade 2%(2) 2%(7) 1%(5) 1%(1)
Desporto/Modalidade 11%(14) 9%(39) 14%(59) 11%(22)
Nacionalidade 47%(58) 51%(232) 43%(189) 49%(95)
Alcunha 0% 0% 0% 2%(3)
*As porcentagens são apresentadas de forma arredondada
Quadro 20 – Porcentagem das unidades de registro da terminologia genérica, relativas ao total de
terminologias genéricas do ano, do Brasil nas edições analisadas.
1996 2000 2004 2008
Atleta/Competidor/
Jogador 56%(110) 29%(43) 19%(71) 26%(69)
Idade 0% 0% 1%(2) 1%(2)
Desporto/Modalidade 7%(15) 15%(22) 22%(82) 18%(48)
Nacionalidade 36%(72) 55%(81) 54%(201) 54%(145)
Alcunha 1%(1) 1%(2) 5%(18) 1%(3)
*As porcentagens são apresentadas de forma arredondada
Referindo-nos mais concretamente às unidades de registro, passamos a analisar mais
especificamente a terminologia genérica, que inclui atleta/competidor/jogador, termos
relacionados à idade do atleta, ao desporto/modalidade na qual compete, a sua
nacionalidade, e a alcunha, tratamento informal, auferida ao mesmo. Em ambos os
países os termos relacionados à nacionalidade do atleta foram os que apresentaram um
maior número de ocorrência em quase todas as edições. Em Portugal apenas em 2004 os
termos atleta/competidor/jogador supera-os, e no Brasil o mesmo acontece em 1996.
O nacionalismo reporta-se ao fato de o atleta ser identificado com o seu país, renovando
o espírito de nação inserido em competições esportivas. É uma forma de representar e
veicular uma coletividade. A posição dos meios de comunicação, quando está em causa
uma representação nacional, é a tomada de partido declarada e óbvia a favor dessa
74
representação, neste sentido “(…) a parcialidade manifestada pelos jornalistas é vista
como uma espécie de obrigação moral – de patriotismo” (Coelho, 2004). Nos discursos
da imprensa os atletas nacionais são representados como aqueles que são capazes de
colocar o país em uma posição de destaque na cena internacional. “Este é um discurso
habitual na imprensa desportiva (como na generalista, aliás), segundo o qual a
representação nacional é tida como o mais alto valor e interesse na prática desportiva
competitiva” (ibidem). Sendo o mesmo também verdadeiro no caso dos atletas
paraolímpicos, uma vez que os termos nacionalistas, como “(…) os atletas nacionais
(…)”63
, “O brasileiro (…)”64
, “(…) os atletas portugueses (…)”65
, foram os mais
utilizados dentre a terminologia generalista.
Em Portugal a unidade de registro com a segunda maior taxa de ocorrências foi a
atleta/jogador/competidor, com exceção de 2004 em que tal unidade foi a primeira.
Seguida pela modalidade praticada pelo atleta e pela idade. A unidade alcunha foi
registrada apenas em 2008, com uma pequena taxa de ocorrência (2%).
No Brasil as taxas de ocorrências modificaram-se em cada edição fazendo com que as
unidades de registro se alternassem em termos de importância. Em 1996 a unidade
atleta/competidor/jogador foi a primeira, e por conta de uma queda em sua taxa passa a
ser a segunda em 2000, caindo ainda para terceiro em 2004, perdendo o lugar para a
modalidade. Em 2008 volta a ser a segunda. A modalidade praticada pelo atleta teve o
terceiro maior número de ocorrências, dentre a terminologia genérica, em todas as
edições, com exceção de 2004 quando foi o segundo, como dissemos anteriormente. Ao
contrário de Portugal, a alcunha foi utilizada no Brasil em todas as edições, ao contrário
da idade que só aparece nas edições de 2004 e 2008.
É de se notar aqui que, para além da diferença na freqüência da unidade de registro
alcunha, os países analisados também apresentam diferença na forma com que registram
a mesma. Em Portugal encontra-se apenas referência à alcunha “Blade Runner”66
auferida ao atleta sul-africano Oscar Pistorius pela imprensa internacional. A imprensa
63 O Globo, 24 de Agosto de 1996 , p. 33. 64
O Globo, 07 de Setembro de 2008, p. 52. 65 Jornal de Notícias, 11 de Setembro de 2008, p. 40. 66 Jornal de Notícias, 17 de Setembro de 2008, p. 47.
75
brasileira, ao contrário, criou alcunhas para os atletas brasileiros, como “Clodoaldo
Recorde da Silva do Brasil”67
, “Michael Phelps brasileiro”68
, “Tubarão paraolímpico”69
.
“A emoção é a própria alma do esporte” (Barbeiro e Rangel, 2006, p. 45), portanto para
que um texto jornalístico seja considerado atraente precisa conter o máximo de
informações relevantes de maneira clara e criativa (ibidem). A utilização de uma
linguagem predominantemente afetiva é então um fator de apelo que permite que a
mensagem atinja com mais eficácia o seu receptor (Fernández, 1974). Portanto a
atribuição de alcunhas aos atletas dão um tom apaixonado à cobertura (Jáuregui, 2008).
Dessa forma notamos que a imprensa brasileira, ao contrário da portuguesa, procura
traduzir de forma emocionante os momentos esportivos, através do uso de uma
linguagem afetiva. É, também, de se notar que tal fato não é exclusivo das
Paraolimpíadas, uma vez que a história do jornalismo esportivo brasileiro está recheado
de exemplos de alcunhas não só atribuídas a atletas, mas também a clubes de futebol,
estádios e ginásios poliesportivos.
Quadro 21 – Porcentagem das unidades de registro da terminologia relacionada à vitória, derrota
ou currículo do atleta, relativas ao total de terminologias deste gênero do ano, em Portugal nas
edições analisadas.
1996 2000 2004 2008
Campeão 47%(9) 39%(16) 63%(45) 22%(2)
Recordista 16%(3) 32%(13) 10%(7) 22%(2)
Medalhista 16%(3) 7%(3) 15%(11) 22%(2)
Perdedor 0% 0% 0% 0%
Vencedor 21%(4) 17%(7) 11%(8) 33%(3)
Favorito 0% 5%(2) 0% 0%
Herói 0% 0% 0% 0%
*As porcentagens são apresentadas de forma arredondada
Quadro 22 – Porcentagem das unidades de registro da terminologia relacionada à vitória, derrota
ou currículo do atleta, relativas ao total de terminologias deste gênero do ano, no Brasil nas edições
analisadas.
1996 2000 2004 2008
Campeão 22%(8) 25%(6) 38%(21) 38%(12)
Recordista 57%(21) 33%(8) 15%(8) 12%(4)
Medalhista 14%(5) 4%(1) 27%(15) 38%(12)
Perdedor 0% 0% 0% 0%
Vencedor 8%(3) 29%(7) 13%(7) 3%(1)
Favorito 0% 8(2)% 5%(3) 9%(3)
Herói 0% 0% 2%(1) 0%
*As porcentagens são apresentadas de forma arredondada
67
O Globo, 20 de Setembro de 2004, p. 08Esporte. 68 O Globo, 26 de Setembro de 2004, p. 49. 69 Estado de S. Paulo, 19 de Setembro de 2004, p. E5.
76
Apesar de os Jogos Paraolímpicos tratarem-se de uma competição entre atletas ou entre
equipes, em que um saíra vencedor e o outro perdedor, os termos relacionados a esta
vitória ou derrota não apresentaram um grau de importância muito elevado em nenhum
dos dois países analisados. No Brasil ficou a rondar os 10% em todas as edições, assim
como em Portugal, com a exceção de 2008 em que apenas 4% dos termos estavam
relacionados a esta linguagem.
Dentre as unidades de registro, os termos campeão, vencedor, recordista e medalhista
foram os que apareceram com maior freqüência em todas as edições, tanto no Brasil
como em Portugal. O termo favorito só passa a ser registro em 2000 e com um pequena
taxa de ocorrência. Tal deve-se ao fato de que o período de análise deste estudo
compreende o evento em si, e não os momentos que o antecedem, acreditamos que no
período pré-competição este verbete apareceria com maior freqüência. Outra unidade de
registro pouco encontrada foi herói, que apareceu apenas no Brasil, na edição de 2004 e
com uma pequena taxa de ocorrência (1,8%).Como veremos mais a frente um dos
estereótipos mais freqüentemente associados aos atletas com deficiência é o de super-
herói ou super-atleta, o papel que estes desempenham como representantes de uma
nação, transpondo obstáculos favorece a construção deste arquétipo (Rubio, 2001).
Contudo apesar de serem apresentados como detentores de qualidade morais superiores
e como tendo capacidades de superar as dificuldades impostas, raramente estes mesmos
atletas são classificados de forma aberta como heróis. Isto porque o herói esportivo é
quase sempre visto como um modelo a ser seguido (Morin, 1977), e muitos deles são
apresentados ao público como alguém que tem um dom, um mérito e competências
pessoais, como se não existisse relações de poder, como se houvesse uma disposição
genética, um atributo especial para aquele indivíduo se tornar um herói (Pilotto, 2007).
Enquanto que o atleta com deficiência é considerado super-herói por ter superado suas
próprias dificuldades e compensado sua própria deficiência, sendo esta última o impulso
para que o atleta torne-se vencedor.
A unidade de registro perdedor esteve ausente em Portugal e no Brasil. Este fato
confirma a ideia de Schell e Duncan (1999) de que os meios de comunicação banalizam
as derrotas dos atletas paraolímpicos e, que ao contrário do que acontece nos esportes
para pessoas sem deficiência em que o fracasso é apresentado com uma perda trágica,
nas Paraolimpíadas quando um certo atleta ou equipe perde, os meios de comunicação
77
sugerem que o perdedor deve ser grato pela experiência esportiva, como se não
houvesse possibilidade de perda, pois ao competir o atleta já estaria ganhando.
Quadro 23 – Porcentagem das unidades de registro da terminologia relacionada adequadamente à
deficiência, relativas ao total de terminologias deste gênero do ano, em Portugal nas edições
analisadas.
1996 2000 2004 2008
Atleta Para(o)límpico 6%(1) 2%(1) 23%(23) 23%(7)
Atleta com Deficiência 6%(1) 16%(10) 19%(19) 32%(10)
Amputado 65%(11) 6%(4) 10%(10) 6%(2)
Cego 23%(4) 47%(30) 19%(19) 19%(6)
Amblíope 0% 30%(19) 24%(24) 19%(6)
Atleta sem Deficiência 0% 0% 4%(4) 0%
Paratleta 0% 0% 0% 0%
Cadeirante 0% 0% 0% 0%
Surdo 0% 0% 0% 0%
Mudo 0% 0% 0% 0%
*As porcentagens são apresentadas de forma arredondada
Quadro 24 – Porcentagem das unidades de registro da terminologia relacionada adequadamente à
deficiência, relativas ao total de terminologias deste gênero do ano, no Brasil nas edições analisadas.
1996 2000 2004 2008
Atleta Para(o)límpico 18%(7) 29%(4) 21%(8) 4%(2)
Atleta com Deficiência 37%(14) 43%(6) 13%(5) 26%(14)
Amputado 34%(13) 0% 18%(7) 21%(11)
Cego 3%(1) 7%(1) 38%(15) 30%(16)
Amblíope 0% 0% 0% 0%
Atleta sem Deficiência 0% 0% 0% 6%(3)
Paratleta 8%(3) 7%(1) 0% 2%(1)
Cadeirante 0% 14%(2) 3%(1) 11%(6)
Surdo 0% 0% 5%(2) 0%
Mudo 0% 0% 2%(1) 0%
*As porcentagens são apresentadas de forma arredondada
A linguagem nos meios de comunicação é importante na medida em que nos oferece
uma forma de entender as mudanças de comportamento da sociedade em relação à
pessoa com deficiência. De forma semelhante, como a linguagem tem o poder de definir
grupos sociais, a terminologia utilizada pela mídia tem implicações tanto na auto-
percepção das pessoas com deficiência, quanto no percepção do público em geral sobre
o tema (Haller, Dorries e Rahn, 2006). “A construção de uma verdadeira sociedade
inclusiva passa também pelo cuidado com a linguagem. Na linguagem se expressa,
voluntariamente ou involuntariamente, o respeito ou a discriminação em relação às
pessoas com deficiências” (Sassaki, 2003).
Neste sentido percebemos que a presença de uma terminologia adequadamente
relacionada à deficiência torna-se vital no auxílio à mudança de estereótipos e estigmas.
Portugal, como foi dito anteriormente, mostra-se um passo à frente do Brasil, ao utilizar
78
com mais freqüência termos adequados, sendo a segunda terminologia mais utilizada a
partir de 2000. Percebemos também que as unidades de registro “atleta com deficiência”
e “atleta para(o)límpico” são cada vez mais utilizadas com o passar do tempo (de 6%
em 1996 para 32% em 2008; e 6% em 1996 para 23% em 2008), o que vai ao encontro
do “People First Language”, ou seja focar antes a pessoa (ou atleta no caso) do que a
deficiência, como verificaram outros estudos (Clogston, 1994; Pereira, 2008).
A ausência das unidades de registro paratleta e cadeirante deve-se ao fato de que estes
termos são utilizados apenas na linguagem do Brasil. Neste último país verificou-se que
apesar de os termos “atleta com deficiência” e “atleta paraolímpico” serem as unidades
mais presentes neste tipo de terminologia, em quase todas as edições (exceção de 2008),
não pode-se verificar um aumento significativo no uso dos mesmos. No Brasil, apesar
de a terminologia adequadamente relacionada à deficiência não inserir-se entre as mais
utilizadas, nota-se um aumento do uso da mesma ao longo do tempo, apesar de lento.
Além disso, o termo “paratleta” passa a ser cada vez menos usado pela imprensa
brasileira (8%; 7%; 0%; 2%; em 1996, 2000, 2004, 2008, respectivamente) tal deve-se
ao fato de o termo não ser consensual. Alguns argumentam que paratleta remete a atleta
paralelo, ou incompleto, enquanto outros assumem que o prefixo refere-se ao mesmo
prefixo dos Jogos ao qual remete.
Ao mesmo tempo em que a linguagem adequada auxilia na mudança de estigmas, as
referências negativas podem servir para perpetuar mitos e estereótipos negativos. De
acordo com Auslander e Gold (1999b) se por um lado as terminologias servem para
uniformizar o vocabulário e facilitar a comunicação, por outro serve para separar e
rotular um determinado grupo da sociedade, dessa forma o uso de termos inadequados
podem resultar na transmissão de uma ideia estereotipada e prejudicial ao grupo
rotulado.
Em relação a este estudo, verificamos que nas diferentes edições dos jogos encontramos
terminologia adequada e inadequada. Em Portugal a terminologia mais adequada foi
mais utilizada em detrimento da incorreta, no Brasil, apesar da diminuição no uso de
termos menos adequados, este tipo de terminologia ainda está fortemente presente nas
edições analisadas.
79
Portanto, apesar de a linguagem inadequada ser cada vez menos freqüente, palavras
como “invisual”70
e “paralisado cerebral”71
, ainda estão muito presentes neste estudo.
Em Portugal a gama de unidades de registro desta terminologia tende a diminuir, sendo
que em 2008 apenas os termos deficiente e portador de deficiência ainda são utilizados.
No Brasil, a quantidade de unidades de registro encontradas não tem tendência em
diminuir, no entanto a utilização destas sim, ou seja, as unidades aparecem em todas as
edições mas com menor freqüência.
Em ambos os países verificamos a forte presença do termo deficiente em todas as
edições. De acordo com Vivarta (2003) e Sassaki (2003) tal termo é considerado
pejorativo uma vez que considera que a pessoas é deficiente no seu todo, o que não
contribui para a mudança das representação social das pessoas e atletas com deficiência
(Pereira, 2008). Contudo, Haller et. al (2006) afirma que a palavra “deficiente” encaixa
perfeitamente nas normas do jornalismo, por ser de menor extensão do que por exemplo
“pessoas com deficiência”, levando em conta as restrições espaciais do jornalismo
impresso podemos perceber que o uso do termo deficiente torna-se mais adequado ao
jornal.
Entretanto o uso também freqüente da unidade de registro “portador de deficiência”
leva-nos a questionar esta justificação. As pessoas não portam deficiência como porta-se
um guarda-chuva, ou seja, não é algo que possa desfazer-se.
É interessante também notar a presença de termos estigmatizante, principalmente no
Brasil. Esta linguagem auxilia na perpetuação de estereótipos e subjugam os atletas,
apresentando-os apenas em termos de suas deficiência ao invés de como pessoas
multidimensionais. Esta unidade de registro inclui expressões como “pessoa
incapacitada”72
, “pessoa que sofre com o problema”73
, “vítima”74
.
Quadro 25 – Porcentagem das unidades de registro da terminologia relacionada inadequadamente
à deficiência, relativas ao total de terminologias deste gênero do ano, em Portugal nas edições
analisadas.
1996 2000 2004 2008
Deficiente 47%(22) 56%(10) 38%(10) 70%(7)
Portador de Deficiência 0% 11%(2) 19%(5) 30%(3)
Paralítico 4%(2) 0% 0% 0%
70 Jornal de Notícias, 27 de Agosto de 1996, p. 20. 71 O Globo, 17 de Agosto de 1996, p. 31. 72
Público, 27 de Agosto de 1996 , p. 30. 73 O Globo, 18 de Agosto de 1996, p. 54. 74 O Globo, 29 de Setembro de 2004, p. 42.
80
Paralisado cerebral 0% 0% 0% 0%
Invisual 28%(13) 28%(5) 23%(6) 0%
Paraplégico 11%(5) 5%(1) 12%(3) 0%
Mutilado 2%(1) 0% 0% 0%
Lesionado medular 2%(1) 0% 0% 0%
Termo Estigmatizante 4%(2) 0% 4%(1) 0%
Normal/Perfeito 0% 0% 4%(1) 0%
Não Portador de
Deficiência 0% 0% 0% 0%
Andante 0% 0% 0% 0%
Não Deficiente 0% 0% 0% 0%
*As porcentagens são apresentadas de forma arredondada
Quadro 26 – Porcentagem das unidades de registro da terminologia relacionada inadequadamente
à deficiência, relativas ao total de terminologias deste gênero do ano, no Brasil nas edições
analisadas.
1996 2000 2004 2008
Deficiente 52%(73) 67%(32) 68%(50) 72%(42)
Portador de Deficiência 21%(29) 15%(7) 5%(4) 5%(3)
Paralítico 4%(5) 0% 0% 0%
Paralisado cerebral 16%(22) 15%(7) 19%(14) 10%(6)
Invisual 0% 0% 0% 0%
Paraplégico 1%(2) 0% 5%(4) 3%(2)
Mutilado 0% 0% 0% 0%
Lesionado medular 1%(2) 0% 0% 0%
Termo Estigmatizante 3%(4) 2%(1) 1%(1) 0%
Normal/Perfeito 0% 2%(1) 1%(1) 5%(3)
Não Portador de
Deficiência 1%(1) 0% 0% 0%
Andante 0% 0% 0% 2%(1)
Não Deficiente 1%(1) 0% 0% 2%(1)
*As porcentagens são apresentadas de forma arredondada
Apesar de a linguagem inadequada ainda estar presente no jornalismo, já se verifica a
presença de termos mais adequados, diminuição de termos incorretos, e tendência para o
uso de terminologia genérica. Parece então que os meios de comunicação, de uma forma
geral, estão cada vez mais sensibilizados pela causa e conscientes da importância que o
uso das palavras adquiri neste contexto. O principal problema que se verifica, como
afirma Vivarta (2003) é que os profissionais da área não dominam a terminologia, e há
ainda falta de consenso, fato que reflete também no trabalho dos jornalistas. Torna-se
então necessário a união de organizações, instituições e associações a fim de se criar um
manual ou guia coerente, e transmitir essa informação a jornalistas.
5.2.1 Tipos de Deficiência
Diferentes tipos de deficiência podem provocar diferentes tipos de reações. Diversos
estudos mostraram, por exemplo, que a sociedade apresenta atitudes mais positivas em
relação às pessoas com deficiência física do que com relação àquelas com deficiência
81
intelectual. (Auslander e Gold, 1999a). A cobertura midiática da deficiência parece
variar dentre os diferentes tipos de deficiência. Estudos sobre a programas televisivos e
filmes mostram que a deficiência intelectual é retratada mais freqüentemente do que os
outros tipos; por outro lado, a mídia impressa tende a reportar mais a deficiência física
(ibidem).
Outros estudos sobre a cobertura de esportes paraolímpicos mostraram que os meios de
comunicação tendem a privilegiar alguns tipos específicos de deficiência (Schantz e
Gilbert, 2001; Auslander e Gold, 1999a). Estes autores afirmam que isso ocorre porque
a percepção do público sobre o atleta com deficiência está historicamente ligada à
deficiência física ou motora, e a pessoas em cadeira de rodas (Schantz e Gilbert, 2001).
Em nosso estudo este fato não foi comprovado, pelo contrário, nossos dados apontam
em outra direção.
Quadro 27 – Porcentagem dos tipos de deficiências registrados, em Portugal nas edições analisadas,
referentes ao total de deficiências identificadas no ano
1996 2000 2004 2008
Deficiência Intelectual 0% 16%(17) 5%(5) 0%
Deficiência Visual 44%(16) 45%(48) 36%(35) 45%(5)
Deficiência
Motora/Física 11%(4) 2%(2) 19%(18) 9%(1)
Cadeira de Rodas 17%(6) 1%(1) 2%(2) 9%(1)
Paralisia Cerebral 6%(2) 25%(26) 25%(24) 27%(3)
Amputação 22%(8) 4%(4) 12%(12) 9%(1)
Les Autres 0% 8%(8) 0% 0%
*As porcentagens são apresentadas de forma arredondada
Quadro 28 – Porcentagem dos tipos de deficiências registrados, no Brasil nas edições analisadas,
referentes ao total de deficiências identificadas no ano.
1996 2000 2004 2008
Deficiência Intelectual 0% 22%(8) 0% 2%(1)
Deficiência Visual 29%(26) 32%(12) 49%(39) 44%(19)
Deficiência
Motora/Física 33%(29) 16%(6) 10%(8) 14%(6)
Cadeira de Rodas 4%(4) 8%(3) 6%(5) 7%(3)
Paralisia Cerebral 22%(20) 19%(7) 27%(21) 9%(4)
Amputação 10%(9) 3%(1) 6%(5) 16%(7)
Les Autres 1%(1) 0% 1%(1) 7%(3)
*As porcentagens são apresentadas de forma arredondada
De uma forma geral, verificamos que em quase todas as edições, em ambos os países a
deficiência com a maior taxa de ocorrências é a Deficiência Visual, com exceção de
1996 no Brasil em que o maior número de registro se verificou para a Deficiência
Motora/Física. Estes dados contrariam estudos anteriores (Schantz e Gilbert, 2001;
82
Schell e Duncan, 1999; Auslander e Gold, 1999a; Calvo, 2001) segundo os quais a
deficiência física e as pessoas em cadeira de rodas eram as mais retratadas, contudo
também corroboram estudos mais recentes realizados no âmbito da imprensa portuguesa
(Monteiro, Pereira, Silva e Pereira, 2008; Pereira, 2008) . Para além disso em Portugal,
nas edições de 2000, 2004 e 2008, e no Brasil na edição de 1996, 2000 e 2004, a
Paralisia Cerebral figura entre as deficiências mais retratadas, resultados que também
vão de encontro aos estudos anteriores que relatam que os atletas com Paralisia Cerebral
são raramente retratados pela mídia. Contudo estes mesmos estudos também afirmam
que a Deficiência Intelectual é uma das menos presentes nos meios de comunicação,
fato que comprovamos; em Portugal tal deficiência esteve ausente em 1996 e 2008 e foi
uma das menos citadas em 2000 e 2004, no Brasil esteve ausente em 1996 e 2004, foi a
menos citada em 2008, a edição de 2000 é a única que não mantém a tendência, sendo a
Deficiência Intelectual a segunda mais presente. A ausência, e a baixa presença, pode
ser explicada pelo fato de em nenhum dos países os atletas com deficiência intelectual
tiveram resultados positivos, e em 2000 o Brasil apresenta uma taxa mais elevada de
ocorrência por relatar os resultados negativos destes atletas, “A seleção de basquete para
deficientes mentais perdeu para a Espanha (…)”75
, e ao confundir paralisia cerebral com
deficiência intelectual, acabou por divulgar o resultado do futebol de sete de forma
equivocada, “No futebol, categoria para deficientes mentais, a seleção brasileira
masculina fez sua melhor partida (…)”76
.
Levando em consideração os dados obtidos por este estudo no que toca aos temas mais
freqüentes, em que os resultados e performances são os mais constantes, este fato parece
estar mais relacionado com os resultados obtidos pelos atletas nos Jogos Paraolímpicos
do que propriamente com a deficiência em causa.
Em todos os anos a imprensa, portuguesa e brasileira, faz referência a quase todos os
tipos de deficiência incluídas nos Jogos Paraolímpicos, sendo em Portugal a Deficiência
Visual e a Paralisia Cerebral a mais citada em todas as edições e, contrariando todas as
expectativas, os atletas em Cadeira de Rodas figuram entre as menos citadas na maior
parte das edições. No Brasil o mesmo ocorre, a Deficiência Visual é a que apresenta
maior taxa de ocorrência, com exceção de 1996 em que é a segunda, e os atletas em
Cadeira de Rodas também encontram-se entre os menos citados. Além da Deficiência
75 O Globo, 21 de Outubro de 2000, p. 41. 76 Estados de S. Paulo, 28 de Outubro de 2000, p. E8
83
Visual, a Paralisia Cerebral, e a Amputação também estão entre as mais encontradas, em
2000, 2004, 2008, respectivamente. Tais fatos também podem ser explicados pelos
números de medalhas. No país luso os atletas com deficiência visual e paralisia cerebral
foram responsáveis por mais de 80% das medalhas nacionais. No Brasil ocorre o menos
sendo que a deficiência visual e a deficiência motora/física são aquelas que mais
recebem medalhas e menções nas edições analisadas.
Dessa forma parece estar desconstruída a ideia que associa a deficiência à pessoa em
cadeira de rodas, reforçando a importância dos resultados como critério de
noticiabilidade. Verifica-se aqui uma evolução, na medida em que qualquer atleta pode
ser noticiado, ficando este dependente apenas de seu resultado e performance. Neste
sentido, noticia-se que “(…) no futebol de cinco (deficiência visual), a seleção brasileira
derrotou a Coréia por 3 a 0 (…)”77
, “Português invisual ganha medalha de prata nos
Paraolímpicos”78
. Contudo este valor-notícia não restringe-se aos resultados nacionais,
atletas de importância internacional também são citados, assim como os outros
competidores que completaram os pódios em que um nacional esteve presente; “(…) o
recorde mundial do lançamento de disco para paralisados cerebrais [foi] batido pelo
australiano Damien Burroughs (…)”79
, “Oscar Pistorius [amputado de ambas as pernas]
concretizou o seu objectivo de conquistar três medalhas de ouro no atletismo (…)”80
Torna-se também interessante notar a freqüência com que os tipos de deficiência foram
identificados (Quadro 29).
Quadro 29 – Número de deficiências identificadas em cada edição analisada, em Portugal e no
Brasil.
77 O Globo, 08 de Setembro de 2008, p. 07. 78
Jornal de Notícias, 21 de Outubro de 2000, capa desporto. 79 O Globo, 26 de Agosto de 1996, p. 04. 80 Público, 17 de Setembro de 2008, p. 28.
1996 2000 2004 2008
Brasil Portugal Brasil Portugal Brasil Portugal Brasil Portugal
Deficiências
identificadas
89
36
37
106
79
96
43
11
84
Gráfico 2 – Número de notícias e número de deficiências identificadas no Brasil.
0
20
40
60
80
100
1996 2000 2004 2008
Brasil- nº de notícias
Brasil - nº de deficiências
Gráfico 3 – Número de notícias e número de deficiências identificadas em Portugal.
0
20
40
60
80
100
120
1996 2000 2004 2008
Portugal - nº de notícias
Portugal - nº de
deficiências
De acordo com os dados apresentados percebemos que o número de vezes em que as
deficiências está relacionado ao número de notícias por cada ano, este resultado vai de
encontro à ideia de que a deficiência do atleta deixa de ser referenciada com o passar do
tempo (Pereira, 2008).
5.3 Estereótipos
Muito freqüentemente os meios de comunicação “constroem” e enquadram as pessoas
com deficiência em suas histórias e imagens, retratando-as como diferentes ou como
pessoas que não se enquadram na sociedade. Sendo assim alguns autores (Haller, 2000)
vêm as representações midiáticas não como disseminações de informações, mas sim
como um enquadramento e um reforço de uma visão específica sobre as pessoas como
deficiência. Dessa forma as atitudes acerca destes indivíduos a partir das representações
midiáticas podem se desenvolver em um misto de piedade e inspiração pelo
enfrentamento (ibidem).
Segundo Kama (2004) o paradigma do coitadinho complementa o processo de
objetificação da pessoa com deficiência, em que estes indivíduos se tornam a
85
personificação de suas deficiências. E como são “imperfeitos” não são capazes de
sobreviver independentes dos outros.
Por outro lado, os atletas com deficiência também são retratados como super-heróis e
pessoas com habilidades extraordinárias para lidar e superar seus obstáculos. Essa
imagem de super-heroísmo são problemáticas, uma vez que leva-nos à suposição de que
todas as pessoas com deficiência devem esforçar-se heroicamente para superar suas
limitações e ajustar-se (Schell e Duncan, 1999).
Os dados de nosso estudo revelam que ambos os estereótipos foram registrados (Quadro
30). De acordo com Moura (1993, p.46) tanto o olhar de piedade quanto o de
admiração parte de um único princípio, o preconceito.
[...] tanto aquele que foi marginalizado pela visão pública de deficiência como aqueles que conseguiram [...] [se] mostrar em
condições de competitividade são de certa forma vistos publicamente
como elementos não humanos: um pela sua história e seu modo precário de vida, como elemento sub-humano, o outro pelo inverso da
mesma moeda – da deficiência – como um super-humano.
As raízes do preconceito contra as pessoas com deficiência são profundas. Durante
séculos, contos de fadas retrataram de forma estigmatizada, e mais recentemente as
histórias em quadrinhos relacionam criminalidade e deficiência. Alguns autores
afirmam que os estereótipos divulgados pela mídia são reflexos dos medos e ansiedades
do público, ou seja, nós evitamos falar sobre a possibilidade da deficiência, em nós ou
em alguém próximo, e o que tememos geralmente estigmatizamos (Longmore, 1985).
Quadro 30 - Porcentagem dos estereótipos registrados em ambos os países, nas edições analisadas,
referentes ao total de estereótipos identificados no ano
*As porcentagens são apresentadas de forma arredondada
No Brasil não há uma tendência entre os tipos de estereótipos, sendo que em 1996 e
2008 o super-herói é o mais encontrado, em 2004 o coitadinho impera e em 2000 ambos
encontram-se com a mesma taxa de ocorrência. No entanto apenas em 1996 a uma
diferença significativa entre as taxas de ocorrência (67% para super-herói e 34% para
coitadinho), a partir de 2000 as taxas permanecem equitativas, mostrando um equilíbrio
1996 2000 2004 2008
Brasil Portugal Brasil Portugal Brasil Portugal Brasil Portugal
Coitadinho 33%
(8)
71%
(5)
50%
(5)
0% 53%
(10)
31%
(5)
44%
(4)
22%
(2)
Super-herói 67% (16)
29% (2)
50% (5)
100% (3)
47% (9)
69% (11)
56% (5)
78% (7)
86
entre os dois estereótipos, com tendência para o super-herói, visto que o estereótipo de
coitadinho apresenta uma maior taxa de ocorrência apenas em 2004.
Em Portugal a situação é diferente. Apenas em 1996 o estereótipo coitadinho é mais
abundante, a partir de 2000 o super-herói é o que impera. Aqui as taxas de ocorrência
apresentam diferenças significativas em todas as edições, sendo que a partir de 2000 o
estereótipo de super-herói apresenta taxas superiores a 60%. Também é de se notar que
na edição de Sydney-2000 o estereótipo de coitadinho esteve ausente. O projeto “Super
Atleta” anteriormente citado, pode ter contribuído para a manutenção do estereótipo de
super-herói a partir de 2004, pois influenciou a mídia na forma como se referem a estes
atletas. A tendência para o estereótipo de super-herói vai ao encontro de outros estudos
(Schell e Duncan, 1999; Smith e Thomas, 2005).
O estereótipo do coitadinho perpetua a imagem das pessoas com deficiência como
objetos de pena. Neste estigma as pessoas são geralmente retratadas como vítimas de
um trágico destino, como incapazes, dependentes, o que as diminui, degrada e
desumaniza, mostrando-as como passivas e como necessidades de cuidado e pena
(Nelson, 1994).
O estereótipo de super-herói lida com a luta comovente de alguém que enfrenta o
trauma da deficiência, e com grande coragem, perseverança e determinação triunfa ou
sucumbe heroicamente (Nelson, 1994). De acordo com Hardin e Hardin (2004) este tipo
de estigma é mais comumente voltado para os atletas com deficiência, e desencadeia
duas ideias: primeiro, a deficiência não é socialmente construída, mas é equivalente a
uma limitação que pode e deve ser superada pela dedicação dos indivíduos; e, segundo,
por padrão, todas as pessoas com deficiência que não atingem esse tipo de performance
são consideradas preguiçosas e sem auto-disciplina. Ou seja, este estereótipo faz com
que as outras pessoas com deficiência que não realizam feitos extraordinários sejam
julgadas negativamente (Kama, 2004).
Este modelo pode ser considerado pelo imaginário popular como positivo por conta de
suas proezas super-humanas, mas, na verdade reforça preconceitos e não muda a
construção cultural da deficiência (ibidem).
Passemos agora a analisar as unidades de registro encontradas em cada um dos
estereótipos.
87
Quadro 31 – Porcentagem das unidades de registro do estereótipo Coitadinho, em Portugal nas
edições analisadas, referentes ao total do estereótipo em causa identificadas no ano.
1996 2000 2004 2008
Vítima 40%(2) 0% 40%(2) 50%(1)
Sofrimento/Doença 40%(2) 0% 60%(3) 0%
Incapaz 20%(1) 0% 0% 0%
Fardo 0% 0% 0% 50%(1)
Mal/Problema 0% 0% 0% 0%
Anormalidade 0% 0% 0% 0%
Triste 0% 0% 0% 0%
*As porcentagens são apresentadas de forma arredondada
Quadro 32 – Porcentagem das unidades de registro do estereótipo Coitadinho, no Brasil nas edições
analisadas, referentes ao total do estereótipo em causa identificadas no ano.
1996 2000 2004 2008
Vítima 38%(3) 0% 40%(4) 75%(3)
Sofrimento/Doença 0% 60%(3) 40%(4) 25%(1)
Incapaz 12%(1) 20%(1) 0% 0%
Fardo 0% 0% 10%(1) 0%
Mal/Problema 50%(4) 0% 0% 0%
Anormalidade 0% 20%(1) 0% 0%
Triste 0% 0% 10%(1) 0%
*As porcentagens são apresentadas de forma arredondada
Ao lermos estes quadros (31 e 32) constatamos que a unidade de registro vítima é a
mais presente tanto em Portugal – 40%, 40% e 50%, em 1996, 2004 e 2008,
respectivamente – quanto no Brasil – 38%, 40% e 75%, em 1996, 2004 e 2008,
respectivamente. Em Portugal a gama de unidade de registros deste estereótipo é
limitada, cingindo-se apenas a vítima, sofrimento/doença e incapaz em 1996; ausência
do estereótipo em 2000; sofrimento/doença e novamente vítima em 2004; fardo e
repetição de vítima em 2008.
No Brasil a gama de unidades é mais ampla. Em 1996 encontramos mal/problema,
vítima e incapaz; em 2000 sofrimento/doença, anormalidade e novamente incapaz; em
2004 o leque é ainda maior com vítima, sofrimento/doença, fardo e triste; e em 2008
apenas vítima e sofrimento/doença.
A vitimização das pessoas com deficiência reforça o paradigma do coitadinho pois
complementa o processo de objetificação da pessoa com deficiência, em que estes
indivíduos se tornam a personificação de suas deficiências (ibidem). Sendo o propósito
desta unidade de registro o de evocar compaixão e caridade, por se centrarem na
tragédia pessoal destes atletas, “Um acidente ainda durante a gravidez da mãe foi o
88
primeiro obstáculo (…)”81
; “Vivia fechado no seu mundo, enclausurado dentro das
quatro paredes de um apartamento em Lisboa, antes de fazer desporto”82
; “Um acidente
(…) atirou-o para uma cadeira de rodas”83
. Outra unidade que anda de mãos dadas a
esta é o sofrimento/doença, que refere-se exatamente ao sofrimento e dor causados pela
deficiência, ao declarar que o atleta “(…) sofre de paralisia cerebral desde a nascença”84
,
ou que os atletas paraolímpico merecem uma atenção especial pois “(…) todos tiveram
algum tipo de trauma, e nem todos o superaram completamente”85
. Além de ser vista
como causadora de sofrimento às pessoas, nesta unidade vemos que a deficiência ainda
é considerada como doença. Esta visão está de acordo com o modelo médico que
defende que a deficiência é causada por uma doença, limitação e que incorpora
sofrimento e algumas desvantagens sociais.
Outra unidade de registro encontrada é Fardo. Descrever as pessoas como fardo reflete a
visão de que o dever impele a família, amigos, ou a sociedade a atender as necessidades
destes indivíduos. Ao mesmo tempo, temos a ideia de que um fardo é difícil de suportar
e é também evitado. Dessa forma essa visão desumaniza os atletas com deficiência
(Nelson, 1994). “(…) os irmãos mais velhos faziam revezamento, ora colocando-o sobre
„cangote‟ (pescoço), nos ombros, nos braços, para poder levar o irmão ao médico,
escola, lazer”86
. A unidade de registro triste aparece apenas em 2004 no Brasil, que
reforça todas as outras ao estigmatizar as pessoas com deficiência como pessoas sempre
tristes, marcadas pela tragédia e, por conseguinte, responsáveis diretas pela tristeza em
todos que com elas convivem ou as conhecem. (Marques, 2001b).
Percebemos a tendência para a manutenção de unidades de registro que podem ser
consideradas menos politicamente incorretas, e o desaparecimento das unidades mais
agressivas como por exemplo mal/problema que surge apenas em 1996 no Brasil,
incapaz que pode ser verificado em 1996 em Portugal e em 1996 e 2000 no Brasil, e
anormalidade que foi registrado apenas em 2000 no Brasil. As unidades de registro
incapaz e anormalidade também se relacionam. Carvalho (1994, p.6 apud Marques,
2001a, p.53) comenta que os estereótipos são aplicados aos deficientes, pois eles são
81 O Globo, 18 de Agosto de 1996, p. 54. 82 Visão, 15 a 21 de Agosto de 1996, p. 74. 83 Jornal de Notícias, 27 de Setembro de 2004, p. 18. 84
Visão, 15 a 21 de Agosto de 1996, p. 76. 85 O Globo, 17 de Outubro de 2000, p. 34. 86 Estado de S. Paulo, 23 de Setembro de 2004, p. E5.
89
socialmente vistos como incapazes e improdutivos, e, biologicamente, considerados
“anormais”. Marques (2001b) reforça esta ideia ao afirmar que a forma como a mídia
vem tratando a questão da deficiência reforça a ideia de anormalidade e de afastamento
do padrão estabelecido como bom e desejável. Como exemplo temos, “(…) dentro do
imaginário popular, eles são coitados e não cidadãos produtivos”87
. Nessa mesma linha
tem-se a unidade mal/problema, que é registrada apenas em 1996 no Brasil, “Consciente
do mal (…)”88
, “Constatado o mal irreversível, os pais o matricularam nas aulas de
natação para tentar minimizar o problema”89
. Esta unidade também vai ao encontro do
modelo médico ao referir-se à deficiência como um mal ou um problema, colocando as
pessoas com deficiência à margem do processo social, e concentra-se nos esforços de
devolver às pessoas com deficiência o funcionamento „apropriado‟ para que possam
então ser inseridas na sociedade (Kama, 2004). Ao caracterizar a deficiência como um
problema individual dissocia-se as experiências das pessoas com deficiência de
qualquer contexto social.
Quadro 33 – Porcentagem das unidades de registro do estereótipo Super-herói, em Portugal nas
edições analisadas, referentes ao total do estereótipo em causa identificadas no ano.
1996 2000 2004 2008
Super-Atleta 0% 0% 18%(2) 0%
Corajoso 0% 0% 9%(1) 0%
Superação 50%(1) 67%(2) 67%(7) 86%(6)
Exemplo 50%(1) 33%(1) 9%(1) 14%(1)
*As porcentagens são apresentadas de forma arredondada
Quadro 34 – Porcentagem das unidades de registro do estereótipo Super-herói, no Brasil nas
edições analisadas, referentes ao total do estereótipo em causa identificadas no ano.
1996 2000 2004 2008
Super-Atleta 0% 0% 11%(1) 0%
Corajoso 12%(2) 20%(1) 33%(3) 40%(2)
Superação 75%(12) 40%(2) 33%(3) 60%(3)
Exemplo 12%(2) 40%(2) 22%(2) 0%
*As porcentagens são apresentadas de forma arredondada
O estereótipo de super-herói está ainda mais presente na cobertura midiática analisada.
Como foi dito anteriormente, este modelo é comumente aplicado aos atletas com
deficiência (Hardin e Hardin, 2004; Schantz e Gilbert, 2001) e exacerba os já existentes
desafios que a pessoa com deficiência enfrenta (Hardin e Hardin, 2004). Em Portugal as
unidades mais utilizadas neste estereótipo são o de superação e exemplo, que são
87
O Globo, 29 de Outubro de 2000, p. 52. 88 O Globo, 18 de Agosto de 1996, p. 54 89 O Globo, 18 de Agosto de 1996, p. 54
90
registrados em todas as edições; em 2004 para além destes dois aparecem também o
super-atleta e o corajoso. No Brasil a situação é bem semelhante, pois além de
superação e exemplo, o corajoso também é registrado em todas as edições; e também
em 2004 o super-atleta aparece.
A superação é a principal representação do super-herói, pois o atleta com deficiência
supera vários obstáculos, principalmente sua própria deficiência, e triunfa. O estereótipo
do super-herói corresponde precisamente à noção de realizações heróicas (Schell e
Duncan, 1999) através da superação de obstáculos quase intransponíveis. Aqui os
atletas paraolímpicos são “(…) triunfos do espírito humano na luta contra (…) as
limitações do corpo”90
, e o esporte para estes atletas passa a ser “(…) uma nova vida
[para] supera(r) o trauma”91
, e é também “(…) uma oportunidade única para a maioria
deles provar ao mundo que também podem vencer”92
. Percebemos que há a criação de
um drama sobre coisas que são consideradas rotineiras pelas pessoas sem deficiência, e
a deficiência em si, é vista como algo trágico e terrível que deve ser ultrapassado, e não
apenas como diferença, “(…) a deficiência não impõe limites ao jovem, que toca bateria,
esta na faculdade de educação física (quer estudar mecatrónica), namora, reza, tem blog
(…) e página no orkut”93
.
Esta unidade de registro, ao mesmo tempo em que destaca a ideia de superação de
barreiras e obstáculos está constantemente atrelada ao discurso que exalta o sofrimento
do atleta e sua tragédia pessoal.
Dessa forma os super-heróis servem como modelos, exemplos de pessoas com
deficiência que superaram as dificuldades e tornaram vitoriosas. Uma metáfora comum
é a do lutador que mobiliza recursos internos a fim de combater a deficiência, contra
todas as expectativas, o lutador sobrevive em um mundo hostil, e torna-se um símbolo
venerado (Kama, 2004). O que nos leva à segunda unidade de registro mais utilizada, o
exemplo. Os paratletas são considerados exemplos de superação e sacrifício. Aqui
novamente conta-se a história trágica, a superação e o atleta torna-se então o
representante do grupo minoritário, servindo “(…) de exemplo para que milhões de
90 O Globo, 25 de Agosto de 1996, p. 59. 91
O Globo, 24 de Outubro de 2000, p. 36. 92 Visão, 12 a 18 de Outubro de 2000, p. 112. 93 Estado de S. Paulo, 14 de Setembro de 2008, p. E8.
91
pessoas que perderam o norte tentem voltar a viver”94
. Os próprios atletas interiorizam
este discurso, “(…) as medalhas devem servir para que os deficientes do Brasil
recuperem a auto-estima”95
. A noção de herói aqui envolve mais do que a proeza
esportiva, o que é enfatizado é a transcendência da deficiência para representar a fonte
de força e esperança para os outros.
No seguimento desta unidade de análise surge outra, a coragem já evidenciada em
outros estudos (Schantz e Gilbert, 2001; Schell e Duncan, 1999; Thomas e Smith, 2003).
Nesta unidade fica a ideia de que o atleta com deficiência transcende-se pois é provido
de “(…) coragem, determinação e espírito de luta (…)”96
, e por ser “(…) um
batalhador”97
.
Em 2004 notamos a presença da unidade de registro Super-Atleta em ambos os países.
Em Portugal, a explicação para este fato talvez seja a divulgação do Projeto Super-
Atleta que teve início exatamente neste ano. Os objetivos deste projeto são mobilizar a
sociedade para a causa do Movimento Paraolímpico, promover novas modalidades e
captar novos praticantes, angariar os apoios que permitam proporcionar aos atletas os
meios e as condições que necessitam para a sua preparação desportiva e garantir o
futuro das Missões Paraolímpicas (FPDD, 2008). No Brasil, a unidade de registro
também aparece apenas em 2004, porém aqui não há relação com projetos, há sim a
noção de atingir um feito super-humano, a superação vai além da deficiência, “(…) mas
há mais uma inclusão que deixa boquiabertos os que tentam conhecer melhor este
brasileiro de ouro: para treinar, levanta às 4h30m, embarca em dois ônibus e ainda se
locomove (em cadeiras de rodas) por mais dez minutos até chegar ao CT do Sesi de
Natal”98
.
Apesar de os atletas sem deficiência também serem representados de forma heróica pela
mídia, tal representação é mais prejudicial aos atletas com deficiência pois perpetua a
noção de que todos os indivíduos com deficiência devem lutar heroicamente para
superar suas deficiências, independentemente de custos pessoais (Schell e Duncan,
1999).
94 O Globo, 25 de Agosto de 1996, p. 59. 95 Estado de S. Paulo, 29 de Setembro de 2004, p. E4. 96
O Globo, 15 de Agosto de 1996, p 36. 97 Estado de S. Paulo, 23 de Setembro de 2004, p. E5. 98 O Globo, 29 de Setembro de 2004 – nº 25986, p. 42.
92
Ao longo das últimas décadas a cobertura dos Jogos Paraolímpicos aumentou
ligeiramente e já é possível notar algumas mudanças no tratamento dos atletas com
deficiência pela imprensa, principalmente em Portugal. Contudo os dados de nosso
estudo nos levam a crer que o tipo de cobertura não melhorou. Os meios de
comunicação continuam a focar primeiramente na deficiência ao invés de o atleta. Estes
estereótipos e emoções reforçam as percepções dos atletas com deficiência como sendo
coitadinhos, corajosos e super-heróis.
Nesse sentido, muitas vezes olhamos para estes atletas como tendo uma vida vazia onde
não há espaço para o amor, casamento, filhos, emprego, etc. (Nelson, 1994; Ross, 2001);
por outro lado, também as olhamos como super-humanos que ultrapassam as
adversidades através de atos heróicos e, por isso, passam a ser modelo de referência
(Clogston, 1994; Ross, 2001). Percebemos portanto que o estigma da deficiência é
grave, e transforma as pessoas em seres incapazes, indefesos, sem direitos, sempre
deixados em segundo plano na ordem das coisas (Maciel, 2000).
CONCLUSÃO
95
5. CONCLUSÃO
Ao veicular quaisquer acontecimentos e informações, a mídia institui um contrato de
leitura, um vínculo com seu leitor, telespectador, ou ouvinte. Assim, ela passa a
organizar sua agenda de acordo com o interesse do público baseado na aceitação,
atualidade, empatia, interesse público, índices de audiência, entre outros. Os meios de
comunicação transformam, dessa forma, os acontecimentos em espetáculos movidos
pela cultura de massas, e também, por uma busca incessante por maiores índices de
audiência.
Quando retratam um acontecimento, a mídia não é somente reprodutora de informações,
mas produtora de sentidos, já que se caracteriza como lugar de construção simbólica dos
acontecimentos. Nesta perspectiva, acrescenta-se que não há objetividade jornalística,
como pregam muitos autores, pois a produção de uma notícia é uma atividade simbólica,
realizada por um indivíduo social, que mobiliza estratégias próprias para estabelecer seu
modo de dizer e produzir sentidos. Apesar de não se saber de forma definitiva qual a
influência que meios de comunicação têm sobre a sociedade, sabemos da particular
importância dos mesmos na representação das pessoas com deficiência, pois além de
refletir as percepções do público, têm um papel fundamental na formulação destas
percepções.
Vemos, então, a importância do jornalista no papel de desmistificador da deficiência, já
que ele tem “nas mãos” um forte instrumento no combate ao preconceito, podendo levar
os cidadãos a adquirirem uma nova postura diante dos indivíduos com deficiência.
Contudo a relação entre deficiência e meios de comunicação, na maioria das vezes , não
é positiva. Para além de exíguas as representações dos atletas com deficiência são feitas
de forma estereotipada e preconceituosa, o que afeta tanto a visão do público sobre a
deficiência quanto o próprio auto-conceito das pessoas com deficiência.
Diante de uma sociedade marcada por inúmeras e constantes mudanças ao longo do
tempo, e partindo do pressuposto de que os meios de comunicação se apresentam como
um produto e reflexo da sociedade mutante, cujas mensagens evidenciam formas de agir
e pensar, este estudo teve portanto como objetivo comparar a cobertura da mídia
impressa dos Jogos Paraolímpicos de 1996, 2000, 2004 e 2008, analisando a quantidade
de tal cobertura, os temas presentes, a terminologia utilizada, os tipos de deficiência
96
com mais tempo de antena, e os estereótipos nos quais os atletas foram enquadrados.
Neste sentido retornamos às hipóteses iniciais que dirigiram este trabalho.
As duas primeiras hipóteses, a quantidade de informação irá aumentar no decorrer do
tempo; e essa quantidade de informação será maior na mídia brasileira do que na
mídia portuguesa, estão relacionadas, contudo somente a primeira foi totalmente
confirmada. Ao observarmos o número total de notícias (somatório das notícias de
Brasil e Portugal) em 1996, 2000, 2004 e 2008 – 63, 89, 172, 83 –, percebemos que
apesar de haver um decréscimo entre as edições de 2004 e 2008, a tendência é um
aumento da cobertura. O mesmo se verifica com o número total de notícias em cada
edição no Brasil e em Portugal separadamente. É importante aqui ressaltar, contudo, que
apesar de haver a tendência para o crescimento da quantidade de informação sobre os
Jogos Paraolímpicos ao longo do tempo, este aumento é ainda muito lento e tímido.
Essa alteração ao mesmo tempo em que sugere uma maior valorização do atleta
paraolímpico e do evento em si, pelo aumento na quantidade de cobertura, ainda está
muito distante do ideal.
Imaginávamos também que pelo fato de o Brasil possuir um Comitê Paraolímpico
Brasileiro já organizado e sólido há vários anos, e investindo em estratégias de
comunicação, enquanto que em Portugal os primeiros passos ainda estão sendo dados
nessa direção, o Brasil apresentaria aumento, quantitativo e qualitativo, da cobertura das
Paraolimpíadas, contudo tal não foi totalmente verificado. No total de notícias foi
verificado que a imprensa brasileira foi responsável pela maior parte da cobertura, ainda
que com uma diferença de apenas oito pontos percentuais para Portugal, contudo os
países alternaram-se com a maior quantidade de informação em cada edição.
Percebemos, portanto, que apesar de o Comitê Paraolímpico Brasileiro facilitar o acesso
dos jornalistas à informação e aos atletas, este não é o único fator que influencia a
noticiabilidade ou não do evento. Outros fatores como o dia noticioso, política editorial
e quantidade de informação adquirida são fundamentais para entender a variação no
número de notícias em cada edição, análise que pretendemos efetuar no futuro.
Relativamente aos temas presentes, notamos que os temas apresentados enquadravam a
vitória dos paraolímpicos de forma a banalizar o feito dos atletas, ao focar
fundamentalmente nos resultados, confirmando nossa terceira hipótese, os assuntos
97
mais tratados terão a ver com a prática desportiva com ênfase nos resultados, deixando
de lado experiência e história dos atletas, e bastidores, em ambos os países.
Diversos estudos revelaram que a cobertura midiática do esporte adaptado muitas vezes
restringe-se principalmente na performance e sucesso dos atletas com deficiência,
enfatizando o significado de recordes, medalhas e tempos, com muito pouco, ou
nenhum, comentário sobre a experiência dos atletas, repercussão da medalha e
bastidores. Nosso estudo corrobora esta ideia uma vez que a prática esportiva foi o
tema mais presente, com foco principal nos resultados e performance, enquanto que os
temas relacionados diretamente ao atleta paraolímpico enquadraram-se entre os menos
encontrados. Para além de se situarem entre os temas menos registrados a maior parte
das notícias relativas ao atleta paraolímpico focam na causa da sua deficiência. Tal fato
por um lado, pode gerar compaixão pelos atletas, mas por outro pode ser encarado com
fato noticioso, uma vez que a deficiência é uma característica do atleta, sendo então
abordada dessa forma.
Nossa quarta hipótese diz respeito à terminologia utilizada, acreditávamos que a mesma
tenderia a ser cada vez mais adequada ao longo das edições dos Jogos Paraolímpicos
tanto no Brasil quanto em Portugal. Neste sentido foi parcialmente confirmada, uma vez
que apenas Portugal apresentou terminologia mais adequada com o passar do tempo, o
mesmo não ocorreu no Brasil. Estudos anteriores mostram que o recurso a terminologia
cada vez mais adequada por parte dos media deve-se à maior conscientização dos
jornais e jornalistas, sobre a importância que as palavras assumem na auto-percepção
das pessoas com deficiência, bem como no que o público em geral acredita acerca das
mesmas. Contudo a falta de manual em que conste a terminologia mais adequada
dificulta o trabalho dos jornalistas.
Ao longo do tempo aconteceram mudanças, em Portugal a terminologia incorreta cai em
desuso, e no Brasil apesar de ainda estar presente nos meios de comunicação a
concentração diminui com o passar das edições. Assim os profissionais da comunicação
parecem estar cada vez mais sensibilizados para estas questões, integrando pouco a
pouco novos termos, menos pejorativos. Entretanto, como o uso da linguagem é algo
poderoso que pode influenciar a construção das representações sociais da deficiência,
apesar de se verificar uma evolução positiva, ainda que tímida como no caso do Brasil,
não consideramos ser suficiente. Dessa forma os jornalistas precisam se conscientizar da
98
importância que as palavras adquirem no contexto social, e, da mesma forma, as
associações e organizações que lidam com as questões da deficiência devem se unir e
criar um consenso acerca de qual terminologia é realmente a mais adequada.
Com relação ao tipo de deficiência mais retratada, de acordo com nossa revisão de
literatura, acreditávamos em nossa hipótese inicial que a deficiência física seria mais
retratada em detrimentos aos outros tipos de deficiência, e em ambos os países, contudo
tal hipótese foi refutada. De uma forma geral, verificamos que em quase todas as
edições, em ambos os países a deficiência com a maior taxa de ocorrências é a
Deficiência Visual, seguida pela Paralisia Cerebral. Como também em todos os anos a
imprensa, portuguesa e brasileira, faz referência a quase todos os tipos de deficiência
incluídas nos Jogos Paraolímpicos acreditamos na relação entre os resultados obtidos
pelos atletas e os tipos de deficiência citados. Percebemos assim a maior importância
dada aos resultados e desempenhos dos atletas, da mesma forma que ocorre nos esportes
para atletas sem deficiência.
Por fim, nossa última hipótese declarava que os atletas com deficiência seriam
representados estereotipadamente, em ambos os países, sendo os estereótipos de super-
herói e coitadinho os mais frequentes. Podemos dizer que esta hipótese foi confirmada,
visto que ambos os estereótipos foram encontrados, com tendência do uso mais
frequente do estigma do super-herói, tanto no Brasil quanto em Portugal. Outros estudos
já evidenciaram que a presença de ambos os estereótipos é frequente nos meios de
comunicação.
Desde os seus primórdios que a sociedade tendeu a marginalizar e inabilitar as pessoas
com deficiência apondo-lhes o estigma da diferença. Mesmo na atualidade, e apesar de
vivermos numa sociedade dita inclusiva, o preconceito para com a pessoa com
deficiência é ainda prevalecente, todo o indivíduo que foge aos padrões de normalidade
é considerado estigmatizado. E, no caso específico dos atletas paraolímpicos, os
estigmas aplicados são o coitadinho quando apenas a deficiência está em evidência, e
super-herói quando trata-se do atleta de alto nível, recordista mundial, medalhista
paraolímpico, que superou suas próprias dificuldades e transcendeu a capacidade
humana.
Muitas investigações sugerem que os atletas com deficiência são representados de
forma negativa pelos meios de comunicação em geral – impresso, rádio, televisão –,
99
através do uso de terminologia inadequada, e de estereótipos que enfatizam a
deficiência e não o atleta. Contudo em nossa pesquisa, ao analisarmos quatro edições do
evento (1996, 2000, 2004 e 2008) em dois países (Portugal e Brasil) percebemos que o
atleta paraolímpico é representado de forma cada vez mais positiva. Devemos dizer no
entanto que esta evolução ocorre de forma muito lenta e controversa.
Todas as categorias analisadas neste estudo podem nos dar uma ideia geral da forma
com que a cobertura midiática evolui ao longo do tempo. Apesar de os resultados da
generalidade dos estudos presentes em nosso quadro teórico demonstrarem que o atleta
paraolímpico é referenciado através de terminologia inadequada, que este mesmo atleta
é descrito de forma estereotipada, que os assuntos que mais se destacam na cobertura
dos Jogos Paraolímpicos têm a ver com os resultados obtidos e a performance, e que os
tipos de deficiência retratada não variam muito, nosso resultados contradizem essa forte
negatividade com relação à mídia. Percebemos que a representação estereotipada dos
atletas detém um valor reduzido, a terminologia utilizada tende a ser cada vez mais
adequada e fortemente genérica, Apesar de muitos autores criticarem o fato de a
cobertura midiática enfocar os resultados e performances dos atletas, devemos notar que
estes são os principais valores-notícias quando se trata da cobertura de eventos
esportivos, e da mesmo forma ocorre com os Jogos Olímpicos por exemplo.
Diversos estudos prévios, indicam que há influência da cultura em relação às atitudes
acerca das pessoas com deficiência, no entanto não há um consenso sobre o porquê de
tais diferenças. Com nosso estudo percebemos que a cobertura midiática dos Jogos
Paraolímpicos Brasil e Portugal apresentam mais semelhanças do que diferenças. A
quantidade de notícias foi equiparada; a prestação desportiva foi o tema mais
frequente, com foco nos resultados e na performance; o uso de terminologia genérica
prevaleceu, com a diferença de que em Portugal a terminologia inadequada caiu em
desuso, enquanto que no Brasil ela ainda foi bastante utilizada; a Deficiência Visual e a
Paralisia Cerebral figuraram entre as deficiências mais presentes; e ambos os
estereótipos analisados foram encontrados, com tendência para o super-herói.
Em suma, nossos resultados mostraram que em certos aspectos a cobertura midiática
das Paraolímpiadas é diferente nos países analisados, contudo as semelhanças chamam
mais a atenção. Este fato pode ser explicado pela proximidade cultural entre os países,
100
antes colônia e metrópole, e hoje considerados países irmãos, e que por isso partilham
não só a mesma língua, mas também algumas práticas culturais.
Nosso estudo comprovou que a forma com que os atletas com deficiência são retratados
pela mídia impressa vem mudando, e para melhor. Muitos são os fatores que interferem
no trabalho do jornalista e na cobertura midiática, alguns de ordem econômica, política
ou deontológicas, por este motivo é preciso analisar não só a notícia em si, mas também
seu processo de produção e sua recepção.
Esta investigação não se esgota neste trabalho, é apenas o primeiro passo de uma longa
caminhada. Ainda há muito o que se fazer no sentido de mudar a forma com que os
Jogos Paraolímpicos, e em consequência os atletas com deficiência, são representados
pelos meios de comunicação, e para quebrar os paradigmas instituídos acerca da
deficiência. Neste sentido, pensamos que interessante seria percorrer todo o processo
comunicativo, desde a construção da notícia até a sua recepção. Compreender como é
produzida a notícia, e investigar como estas notícias são recebidas, interpretadas e
apreendidas. Verificar quais critérios de noticiabilidade os jornalistas utilizam (se
utilizam) na decisão do que será noticiado, a percepção dos jornalistas face ao
desenvolvimento da opinião pública e analisar as pressões sofridas por esta classe
profissional na cobertura de determinado evento. Da mesma forma compreender o modo
como os atletas paraolímpicos recebem as notícias a seu respeito. Só assim teremos
informações sobre o modo como aquele que é alvo da notícia avalia essa mesma notícia.
Talvez, dessa forma, tenhamos elementos que possam contribuir para a reflexão da
construção do produto jornalístico sobre a pessoa e o atleta com deficiência.
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