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ORIGEM

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ORIGEM

DAN BROWN

ORIGEM

Tradução deNUNO CASTRO

Título original: OriginAutor: Dan Brown

Copyright © 2017 by Dan Brown[Todos os direitos para a publicação desta obra em língua portuguesa,

exceto Brasil, reservados por Bertrand Editora, Lda.]Rua Prof. Jorge da Silva Horta, 1

1500-499 LisboaTelefone: 21 762 60 00

Correio eletrónico: [email protected]

Design de capa: Planeta Arte & DiseñoImagens da capa: @ Opalworks

Revisão: Anabela Mesquita

Pré-impressão: Bertrand EditoraExecução gráfica: Bloco Gráfico

Unidade Industrial da Maia

Este livro não pode ser comercializado.

Em memória da minha mãe

Temos de estar dispostos a abandonar a vida que tínhamosplaneado para podermos ter a vida que nos espera.

— JOSEPH CAMPBELL

FACTO:

Todas as obras de arte e arquitetura, localiza-ções, informação científica e organizações religiosasreferidas no presente romance são reais.

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PRÓLOGO

Enquanto o velho comboio de cremalheira searrastava pela vertiginosa encosta acima, EdmondKirsch examinou o cume recortado à sua frente.À distância, esculpido na face de um precipício, oenorme mosteiro de pedra parecia suspenso sobre ovazio, como se tivesse sido magicamente fundido naparede vertical.

Havia mais de quatro séculos que o imortal san-tuário na Catalunha, Espanha, desafiava a inexorávelforça da gravidade, nunca se desviando do seu propó-sito original: isolar os seus ocupantes do mundo mo-derno.

Ironicamente, serão agora os primeiros a conhecer a ver-dade, pensou, perguntando a si próprio como reagi-riam. Historicamente, os homens mais perigosos àface da Terra eram os homens de Deus... especial-mente quando os seus deuses eram ameaçados. E euestou prestes a atirar uma lança incendiária para um ninho devespas.

Quando o comboio chegou ao seu destino, avis-tou uma figura solitária à sua espera na plataforma.

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O escanzelado ancião estava vestido com a tradicio-nal batina púrpura católica e uma sobrepeliz branca,com um solidéu na cabeça. Kirsch reconheceu as fei-ções aquilinas do seu anfitrião por fotografias e sentiuuma inesperada descarga de adrenalina.

Valdespino veio receber-me pessoalmente.O bispo Antonio Valdespino era uma figura

formidável em Espanha: não só um amigo de con-fiança e consultor do próprio rei, mas um dos maisloquazes e influentes paladinos da preservação dosvalores conservadores católicos e dos cânones polí-ticos tradicionais.

— Edmond Kirsch, suponho? — entoou obispo quando Kirsch saiu do comboio.

— Culpado — respondeu Kirsch, sorrindo en-quanto apertava a mão magra do seu anfitrião. —Vossa Excelência, gostava de lhe agradecer ter orga-nizado esta reunião.

— Eu agradeço o facto de a ter solicitado. —A voz do bispo era mais forte do que Kirsch espera-va, límpida e penetrante como um sino. — Não émuito habitual sermos consultados por homens daciência, especialmente um com a sua proeminência.Siga-me, por favor.

Enquanto conduzia Kirsch pela plataforma, afria aragem da montanha ia-lhe fustigando a batina.

— Tenho de lhe confessar que tem um aspetodiferente do que eu imaginava. Estava à espera deum cientista, mas o senhor parece bastante... —Olhou para o elegante fato K50 da Kiton e para ossapatos Barker de pele de avestruz do seu convidadocom uma ponta de desdém. — Vanguardista, seria apalavra?

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Kirsch sorriu cortesmente. Há décadas que nin-guém utiliza a palavra «vanguardista».

— Estive a ler o seu currículo e ainda nãocompreendi muito bem o que é que o senhor faz.

— Sou especialista em teoria de jogos e mode-los computacionais.

— Então o senhor dedica-se a produzir jogosde computador para crianças?

Teve a impressão de que o bispo estava a fingirignorância numa tentativa de parecer mais simpáti-co. De facto, sabia que Valdespino era um ávido se-guidor das últimas tecnologias, para cujos perigostinha frequentemente chamado a atenção.

— Não, Vossa Excelência, de facto a teoria dejogos é um campo da matemática que estuda pa-drões para poder efetuar previsões sobre o futuro.

— Ah, sim. Acho que li que o senhor previuuma crise monetária europeia há alguns anos? Quan-do ninguém o ouviu, o senhor salvou-nos a todosinventando um programa informático que conseguiuressuscitar a União Europeia. Como era mesmo asua frase? «Com trinta e três anos, tenho a mesmaidade de Cristo quando realizou a Sua ressurreição.»

Kirsch encolheu-se ligeiramente.— Foi uma analogia infeliz, Vossa Excelência.

As palavras de um jovem.— De um jovem? — riu-se o bispo. — E que

idade tem agora? Quarenta, talvez?— Acabados de fazer.O ancião sorriu enquanto o vento continuava a

fustigar-lhe a batina.— Bem, supunha-se que seriam os mansos que

herdariam a Terra, mas parece que esta acabou por

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ir para os jovens. Os interessados na tecnologia, osque olham para os ecrãs em vez de para a própria al-ma. Tenho de reconhecer, no entanto, que nuncaimaginei que teria a oportunidade de conhecer o jo-vem que lidera a carga. Sabe que lhe chamam umprofeta?

— Não um muito bom no meu caso, Excelên-cia — replicou Kirsch. — Quando perguntei se mepodia reunir em privado consigo e com os seus pa-res, calculei que a probabilidade de que aceitassemseria de apenas vinte por cento.

— E como eu disse aos meus pares, os devo-tos podem sempre obter vantagens ao ouvir os des-crentes. É ao ouvir o Diabo que melhor podemosapreciar a voz de Deus. — O ancião sorriu. — Es-tou a brincar consigo, claro. Peço-lhe que desculpe omeu sentido de humor um tanto ou quanto senil. Osmeus filtros de vez em quando já falham.

Com estas palavras, o bispo Valdespino fez-lhesinal para avançarem.

— Os outros estão à nossa espera. Siga-me,por favor.

Kirsch observou o seu destino, uma colossalcidadela de pedra cinzenta, alcandorada à beira deum precipício de centenas de metros, sobre umaexuberante tapeçaria florestal. Incomodado pela al-titude, desviou o olhar do abismo e seguiu o bispopelo caminho irregular em que se encontravam, di-rigindo os pensamentos para a reunião que o trou-xera ali.

Pedira uma audiência com três proeminentes lí-deres religiosos que tinham acabado de assistir auma conferência no mosteiro.

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O Parlamento das Religiões do Mundo.Desde 1893 que centenas de líderes espirituais

de praticamente trinta religiões do mundo inteiro sereuniam em diferentes locais a cada poucos anos pa-ra passarem uma semana dedicados ao diálogo inter--religioso. Os participantes costumavam incluir umleque diversificado de padres, rabinos e mulás pro-cedentes do mundo inteiro, juntamente com pujarishindus, bhikkus budistas, jainistas, sikhs e outros.

O autoproclamado objetivo do parlamentoconsistia em «cultivar a harmonia entre as religiõesdo mundo, estender pontes entre as diversas espiri-tualidades e celebrar os pontos comuns entre todasas fés».

Um empreendimento nobre, pensou, apesar de o con-siderar um exercício de futilidade. Uma busca semsentido de pontos de correspondência aleatórios entreuma salgalhada de ficções, fábulas e mitos ancestrais.

Enquanto o bispo Valdespino o conduzia pelocaminho, olhou para a encosta aos seus pés com umpensamento sardónico. Moisés subiu à montanha paraaceitar a palavra de Deus... e eu subi para fazer exatamenteo contrário.

A sua motivação para subir aquela montanha,dissera a si próprio, era uma obrigação ética, mas sa-bia que havia uma boa dose de húbris a alimentar asua visita. Estava ansioso por sentir a gratificação dese sentar à frente dos clérigos e predizer a sua imi-nente obsolescência.

Acabou-se o tempo em que vocês definiam a nossa ver-dade.

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— Estive a dar uma vista de olhos ao seu currí-culo — disse abruptamente o bispo, olhando paraKirsch. — Vi que é um produto de Harvard.

— Não acabei a licenciatura, mas sim.— Ah. Li recentemente que, pela primeira vez

na história de Harvard, o corpo estudantil que entraé composto por mais ateus e agnósticos do que porpessoas que se definem como seguidoras de qual-quer religião. É um dado estatístico bastante revela-dor, senhor Kirsch.

O que lhe sei dizer, quis replicar Kirsch, é que osnossos alunos são cada vez mais inteligentes.

O vento tornara-se mais forte ao chegarem aoantigo edifício de pedra. No interior, sob a ténue luzdo átrio, o ar estava impregnado com a pesada fra-grância de incenso queimado. Os dois homens ser-pentearam por um labirinto de corredores escuros, eos olhos de Kirsch tiveram de se esforçar para seadaptarem enquanto seguia o seu anfitrião. Chega-ram por fim a uma porta invulgarmente pequena demadeira. O bispo bateu, baixou-se e entrou, fazendoum gesto ao seu convidado para que o seguisse.

Hesitante, Kirsch atravessou o limiar.Deu consigo numa câmara retangular, de pare-

des altas repletas de tomos encadernados em couro,das quais se projetavam como costelas estantes adi-cionais, alternadas com radiadores de ferro fundido,cujos estalidos e silvos davam a estranha impressãode que a sala estava viva. Levantou o olhar para aornamentada passagem abalaustrada que rodeava osegundo andar e percebeu sem sombra de dúvidaonde se encontrava.

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A famosa biblioteca de Montserrat, compreendeu,surpreendido por ter sido admitido ali. Dizia-se queaquela sala sagrada continha textos raríssimos, aces-síveis apenas aos monges que tinham dedicado todaa sua vida a Deus sequestrados naquela montanha.

— O senhor Kirsch pediu-nos discrição —disse o bispo. — Este é o nosso espaço mais priva-do. Poucos estranhos alguma vez aqui entraram.

— Um generoso privilégio, que agradeço sin-ceramente.

Seguiu o bispo até uma grande mesa de madei-ra em que dois anciãos os esperavam sentados. O daesquerda parecia desgastado pelo tempo, com olhoscansados e uma hirsuta barba branca. Usava um fatopreto amarrotado, camisa branca e chapéu.

— Apresento-lhe o rabino Yehuda Köves.É um proeminente filósofo judeu com uma extensaobra sobre a cosmologia cabalística.

Kirsch estendeu a mão por cima da mesa ecumprimentou cortesmente o rabino Köves.

— Tenho muito prazer em conhecê-lo. Li osseus livros sobre a Cabala. Não lhe posso dizer queos tenha compreendido, mas li-os.

Köves assentiu afavelmente com a cabeça, lim-pando os olhos lacrimosos com um lenço.

— E aqui — continuou o bispo, indicando ooutro ancião — temos o respeitado allamah Syed al--Fadl.

O reverenciado académico islâmico levantou-see dirigiu-lhe um amplo sorriso. Era baixo e anafado,com uma face jovial que parecia não combinar mui-to bem com os seus penetrantes olhos escuros. Es-tava vestido com uma despretensiosa thawb branca.

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— E eu, senhor Kirsch, li as suas previsões so-bre o futuro da humanidade. Não posso dizer queconcorde com elas, mas li-as.

Kirsch sorriu cordialmente e apertou-lhe amão.

— E o nosso convidado, Edmond Kirsch —concluiu o bispo, dirigindo-se aos dois outros religio-sos —, que como sabem é um muito conceituadocientista nos campos da computação e da teoria dejogos, inventor e mesmo uma espécie de profeta domundo da tecnologia. Considerando os seus antece-dentes, foi com surpresa que recebi o seu pedido pa-ra se reunir connosco. Por esse motivo, deixo-oagora explicar o que o traz aqui.

Com estas palavras, o bispo Valdespino sen-tou-se entre os outros dois religiosos, uniu as mãose olhou expectante para Kirsch. Os três homens fi-caram virados para ele como um tribunal, criandoum ambiente mais parecido com um inquérito doque com uma reunião de académicos. Kirsch perce-beu nesse momento que o bispo nem sequer lheoferecera uma cadeira.

No entanto, sentiu-se mais divertido do que in-timidado enquanto perscrutava os três anciãos que oenfrentavam. Então esta é a Santa Trindade que eu pedi.Os meus três Homens Sábios.

Fazendo uma pausa para reivindicar o seu do-mínio da situação, dirigiu-se à janela e olhou para oimpressionante panorama do exterior. Uma mantade retalhos de terras ancestrais de pastoreio, ilumi-nadas pelo sol, estendia-se por um profundo vale atéaos cumes da serra de Collserola. A quilómetros de

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distância, em algum ponto por cima do mar das Ba-leares, um ameaçador maciço de nuvens tempestuo-sas começava a formar-se no horizonte.

Uma imagem adequada, considerou, pressentindoa turbulência que em breve causaria naquela sala eem todo o mundo que a rodeava.

— Cavalheiros — começou, virando-se brus-camente para eles —, parece-me que o bispoValdespino já lhes transmitiu o meu pedido de con-fidencialidade. Antes de continuarmos, gostaria ape-nas de esclarecer que o que vou partilhar convoscotem de ser mantido no mais absoluto segredo. Empoucas palavras, peço a todos um voto de silêncio.Aceitam o meu pedido?

Os três homens fizeram gestos de tácita aquies-cência, que Kirsch sabia serem provavelmente re-dundantes. Vão estar certamente mais interessados ementerrar esta informação do que em divulgá-la.

— Encontro-me aqui hoje porque fiz uma des-coberta científica que penso que considerarão sur-preendente. É um assunto a que dediquei muitosanos de trabalho, desejando dar respostas a duas dasperguntas mais fundamentais da experiência huma-na. Agora que as obtive, dirigi-me aos senhores es-pecificamente porque acredito que esta informaçãoafetará os crentes de todo o mundo de um modo pro-fundo, causando muito provavelmente uma altera-ção que só poderá ser descrita como, digamos,disruptiva. De momento, porém, sou a única pessoano mundo que possui a informação que lhes vouagora revelar.

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Com estas palavras, tirou do casaco um enor-me smartphone, um modelo que tinha concebido econstruído para servir as suas necessidades específi-cas. O telemóvel tinha um invólucro de cores vi-brantes e ele ergueu-o como um televisor à frentedos três anciãos. Dentro de momentos, utilizaria odispositivo para aceder a um servidor ultrasseguro,introduziria a sua palavra-passe de quarenta e setecaracteres e reproduziria uma apresentação.

— O que vão agora ver é uma versão rudimen-tar de uma comunicação que espero partilhar com omundo inteiro talvez dentro de um mês. Mas antesgostaria de consultar alguns dos pensadores religio-sos mais influentes do mundo, para obter infor-mação em primeira mão de como estas notíciasserão recebidas por aqueles que serão mais afetadospor elas.

O bispo suspirou ruidosamente, parecendomais aborrecido do que preocupado.

— Um preâmbulo intrigante, senhor Kirsch.Fala como se o que nos vai mostrar abalasse os ali-cerces das religiões do mundo inteiro.

Kirsch olhou para o ancestral repositório detextos sagrados. Não os vai abalar, vai pulverizá-los.

Examinou os três homens à sua frente. O queeles não sabiam era que dentro de apenas três diastencionava divulgar a apresentação de forma impres-sionante e meticulosamente coreografada. E, quando ofizesse, as pessoas do mundo inteiro perceberiam queas doutrinas de todas as religiões tinham realmente umaspeto comum.

Estavam todas completamente enganadas.

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CAPÍTULO 1

O professor Robert Langdon olhou para o cãode treze metros sentado na praça. O pelo do animalera uma tapeçaria viva de ervas e fragrantes flores.

Estou a tentar apreciar-te, pensou. Estou realmente atentar.

Examinou a criatura durante mais algum tempoe depois continuou ao longo de uma passagem sus-pensa, descendo por uma ampla escadaria cujo pisodesigual estava pensado para perturbar o ritmo e opasso do visitante. Missão cumprida, decidiu, quase tro-peçando duas vezes nos degraus irregulares.

Ao fundo da escada, estacou estupefacto peranteum enorme objeto que avistou à distância.

Agora posso verdadeiramente dizer que já vi de tudo.Uma enorme viúva-negra erguia-se à sua fren-

te, com umas esguias pernas que suportavam umcorpo esférico a mais de oito metros de altura. Doseu ventre encontrava-se pendurado um saco deovos de rede de arame, cheio de globos de vidro.

— Chama-se Maman — disse uma voz.Langdon olhou para baixo e viu um homem

magro debaixo da aranha. Estava vestido com um

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sherwani de brocado negro e tinha um bigode recur-vado à Salvador Dalí, que era quase cómico.

— E eu chamo-me Fernando — continuou. —E estou aqui para lhe dar as boas-vindas ao museu.— Perscrutou uma coleção de etiquetas com nomesque tinha à frente. — Podia dizer-me o seu nome,por favor?

— Claro. Robert Langdon.Os olhos do outro levantaram-se imediata-

mente.— Ah. Peço-lhe imensas desculpas. Não o re-

conheci.Eu próprio praticamente não me reconheço, pensou

Langdon, avançando rigidamente com o laço bran-co, a casaca preta e o colete branco. Pareço um membrodos Whiffenpoof. A sua casaca clássica tinha quase trin-ta anos, guardada dos seus tempos de membro doIvy Club em Princeton, mas, graças ao seu fiel regi-me diário de natação, ainda lhe servia razoavelmentebem. Com a pressa ao fazer a mala, tinha pegado nosaco errado do guarda-fatos, deixando o habitualsmoking em casa.

— O convite indicava fato de cerimónia. Espe-ro que a casaca seja apropriada?

— As casacas são um clássico! Está ótimo! —O outro homem dirigiu-se apressadamente paraLangdon e colou-lhe uma etiqueta na lapela do casa-co. — É uma honra conhecê-lo. Imagino que já nostenha visitado antes?

Langdon olhou através das pernas da aranhapara o brilhante edifício que tinham à frente.

— Para dizer a verdade, é um pouco embara-çoso, mas não, é a primeira vez que aqui venho.

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— Não me diga isso. — O homem do bigodefingiu que desmaiava. — Não aprecia arte moderna?

Sempre apreciara o desafio da arte moderna,principalmente a exploração do porquê de determi-nadas peças serem aclamadas como obras-primas: osquadros de pingos de Pollock, as latas de sopaCampbell’s de Andy Warhol, os simples retângulosde cor de Mark Rothko. No entanto, sempre se sen-tira mais confortável a discutir o simbolismo religio-so de Hieronymus Bosch ou a pincelada de Goya.

— Sou mais classicista — replicou. — Sinto--me mais à vontade com Da Vinci do que com DeKooning.

— Mas Da Vinci e De Kooning são tão pare-cidos!

Langdon sorriu pacientemente.— Imagino que tenha bastante a aprender so-

bre De Kooning.— Só lhe posso dizer que veio ao sítio certo.

— O homem fez um gesto com a mão para o dirigirpara o enorme edifício. — Neste museu, encontraráuma das melhores coleções de arte moderna à faceda Terra! Espero que aprecie.

— Espero que sim — replicou Langdon. —Embora neste momento só gostasse de saber por-que é que estou aqui.

— O professor e todos os outros! — riu-sealegremente o homem, abanando a cabeça. — O seuanfitrião tem sido muito enigmático sobre o propó-sito do evento desta noite. Nem sequer o pessoal domuseu sabe o que vai acontecer. O mistério é metadeda diversão. Já temos rumores para todos os gostos!

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Há muitas centenas de convidados no interior, incluin-do muitas caras famosas, e ninguém faz a menor ideiade qual é o programa desta noite.

Langdon teve de sorrir. Muito pouca gente teria aousadia de enviar convites de última hora que essencial-mente diziam: Sábado à noite. Não falte. Confie em mim.E ainda menos seria capaz de persuadir centenas de VIPa abandonar todos os seus planos e apanhar o avião pa-ra o norte de Espanha a fim de assistir ao evento.

Ao sair de baixo da aranha e seguindo caminho,olhou para um enorme estandarte vermelho que ondula-va ao vento por cima das suas cabeças.

UMA NOITE COM

EDMOND KIRSCH

O certo é que Edmond nunca teve falta de autoconfiança,pensou, divertido.

Há cerca de vinte anos, o jovem Eddie Kirsch ti-nha sido um dos seus primeiros alunos em Harvard,um nerd guedelhudo que fora levado por um inusitadointeresse no estudo dos códigos a matricular-se na suadisciplina de primeiro ano: Códigos, Cifras e a Lingua-gem dos Símbolos. A sofisticação do seu intelectoproduzira uma profunda impressão em Langdon e,apesar de o jovem ter acabado por abandonar o poei-rento mundo da semiótica pela brilhante promessa doscomputadores, tinham acabado por estabelecer umarelação de professor e aluno que os mantivera em con-tacto ao longo das duas últimas décadas.