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ORIENTAES CURRICULARES PARA O ENSINO MDIOCincias da Natureza, Matemtica e suas Tecnologias

BIOLOGIA FSICA MATEMTICA QUMICA

Volume 2

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ORIENTAES CURRICULARES PARA O ENSINO MDIO

ORIENTAES CURRICULARES PARA O ENSINO MDIOVolume 1: Linguagem, Cdigos e suas Tecnologias Volume 2: Cincias da Natureza, Matemtica e suas Tecnologias Volume 3: Cincias Humanas e suas Tecnologias

Dados Internacionais de Catalogao na Publicao (CIP) Cincias da natureza, matemtica e suas tecnologias / Secretaria de Educao Bsica. Braslia : Ministrio da Educao, Secretaria de Educao Bsica, 2006. 135 p. (Orientaes curriculares para o ensino mdio ; volume 2) ISBN 85-98171-43-3 1. Contedos curriculares. 2. Ensino mdio. 3. Matemtica. 4. Bilogia. 5. Fsica. 6. Qumica. I. Brasil. Secretaria de Educao bsica. CDU 371.214.12 CDU 373.512.14

MINISTRIO DA EDUCAO SECRETARIA DE EDUCA BSICA

ORIENTAES CURRICULARES PARA O ENSINO MDIOCincias da Natureza, Matemtica e suas Tecnologias

BRASLIA 2006

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ORIENTAES CURRICULARES PARA O ENSINO MDIO

Secretaria de Educao Bsica Departamento de Polticas de Ensino Mdio Equipe Tcnica do DPEM Alpio dos Santos Neto Maria de Lourdes Lazzari Maria Eveline Pinheiro Villar de Queiroz Marlcia Delno Amaral Mirna Frana da Silva de Arajo Pedro Tomaz de Oliveira Neto Projeto Grco Eduardo Meneses | Quiz Design Grco Reviso de Textos Liberdade de Expresso Lunalva da Conceio Gomes DPEM/SEB/MEC PROSA Produo Editorial Ltda TDA Desenho e Arte

Tiragem: 120.041 exemplares

Ministrio da EducaoSecretaria de Educao Bsica Esplanada dos Ministrios, Bloco L, sala 500 CEP: 70.047-900 Braslia DF Tel. (061) 2104-8010 Fax: (61) 2104-9643 http:// www.mec.gov.br

Cincias da Natureza, Matemtica e suas Tecnologias

Carta ao ProfessorAs Orientaes Curriculares para o Ensino Mdio foram elaboradas a partir de ampla discusso com as equipes tcnicas dos Sistemas Estaduais de Educao, professores e alunos da rede pblica e representantes da comunidade acadmica. O objetivo deste material contribuir para o dilogo entre professor e escola sobre a prtica docente. A qualidade da escola condio essencial de incluso e democratizao das oportunidades no Brasil, e o desao de oferecer uma educao bsica de qualidade para a insero do aluno, o desenvolvimento do pas e a consolidao da cidadania tarefa de todos. Para garantir a democratizao do acesso e as condies de permanncia na escola durante as trs etapas da educao bsica educao infantil, ensino fundamental e mdio , o governo federal elaborou a proposta do Fundeb (Fundo de Manuteno e Desenvolvimento da Educao Bsica e de Valorizao dos Prossionais da Educao). A Proposta de Emenda Constituio (PEC) do Fundeb foi construda com a participao dos dirigentes das redes de ensino e de diversos segmentos da sociedade. Dessa forma, colocou-se acima das diferenas o interesse maior pela educao pblica de qualidade. Entre as vrias aes de fortalecimento do ensino mdio destacam-se o Prodeb (Programa de Equalizao das Oportunidades de Acesso Educao Bsica) e a implementao do PNLEM (Programa Nacional do Livro do Ensino Mdio). A Secretaria de Educao Bsica do MEC passou a publicar ainda livros para o professor, a m de apoiar o trabalho cientco e pedaggico do docente em sala de aula. A institucionalizao do ensino mdio integrado educao prossional rompeu com a dualidade que historicamente separou os estudos preparatrios para a educao superior da formao prossional no Brasil e dever contribuir com a melhoria da qualidade nessa etapa nal da educao bsica. A formao inicial e continuada tambm passa a ser oferecida em parceria com as Secretarias de Educao e instituies de ensino superior para a formao

dos professores, com a implantao do Pr-Licenciatura, do ProUni (Programa Universidade para Todos) e da Universidade Aberta do Brasil. Preparar o jovem para participar de uma sociedade complexa como a atual, que requer aprendizagem autnoma e contnua ao longo da vida, o desao que temos pela frente. Esta publicao no um manual ou uma cartilha a ser seguida, mas um instrumento de apoio reflexo do professor a ser utilizado em favor do aprendizado. Esperamos que cada um de vocs aproveite estas orientaes como estmulo reviso de prticas pedaggicas, em busca da melhoria do ensino.

Ministrio da Educao

Secretaria de Educao Bsica

Cincias da Natureza, Matemtica e suas Tecnologias

ApresentaoOs atuais marcos legais para oferta do ensino mdio, consubstanciados na Lei de Diretrizes e Bases da Educao Nacional (n. 9394/96), representam um divisor na construo da identidade da terceira etapa da educao bsica brasileira. Dois aspectos merecem destaque. O primeiro diz respeito s nalidades atribudas ao ensino mdio: o aprimoramento do educando como ser humano, sua formao tica, desenvolvimento de sua autonomia intelectual e de seu pensamento crtico, sua preparao para o mundo do trabalho e o desenvolvimento de competncias para continuar seu aprendizado. (Art. 35) O segundo prope a organizao curricular com os seguintes componentes: base nacional comum, a ser complementada, em cada sistema de ensino e estabelecimento escolar, por uma parte diversicada que atenda a especicidades regionais e locais da sociedade, da cultura, da economia e do prprio aluno (Art. 26); planejamento e desenvolvimento orgnico do currculo, superando a organizao por disciplinas estanques; integrao e articulao dos conhecimentos em processo permanente de interdisciplinaridade e contextualizao; proposta pedaggica elaborada e executada pelos estabelecimentos de ensino, respeitadas as normas comuns e as de seu sistema de ensino; participao dos docentes na elaborao da proposta pedaggica do estabelecimento de ensino. O grande avano determinado por tais diretrizes consiste na possibilidade objetiva de pensar a escola a partir de sua prpria realidade, privilegiando o trabalho coletivo. Ao se tratar da organizao curricular tem-se a conscincia de que a essncia da organizao escolar , pois, contemplada. Por outro lado, um conjunto de questes emerge, uma vez que o currculo traz na sua construo o tratamento das dimenses histrico-social e epistemolgica. A primeira arma o valor histrico

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e social do conhecimento; a segunda impe a necessidade de reconstruir os procedimentos envolvidos na produo dos conhecimentos. Alm disso, a poltica curricular deve ser entendida como expresso de uma poltica cultural, na medida em que seleciona contedos e prticas de uma dada cultura para serem trabalhados no interior da instituio escolar. Trata-se de uma ao de flego: envolve crenas, valores e, s vezes, o rompimento com prticas arraigadas. A Secretaria de Educao Bsica, por intermdio do Departamento de Poltica do Ensino Mdio, encaminha para os professores o documento Orientaes Curriculares para o Ensino Mdio com a inteno de apresentar um conjunto de reexes que alimente a sua prtica docente. A proposta foi desenvolvida a partir da necessidade expressa em encontros e debates com os gestores das Secretarias Estaduais de Educao e aqueles que, nas universidades, vm pesquisando e discutindo questes relativas ao ensino das diferentes disciplinas. A demanda era pela retomada da discusso dos Parmetros Curriculares Nacionais do Ensino Mdio, no s no sentido de aprofundar a compreenso sobre pontos que mereciam esclarecimentos, como tambm, de apontar e desenvolver indicativos que pudessem oferecer alternativas didtico-pedaggicas para a organizao do trabalho pedaggico, a m de atender s necessidades e s expectativas das escolas e dos professores na estruturao do currculo para o ensino mdio. A elaborao das reexes que o Ministrio da Educao traz aos professores iniciou em 2004. Desde ento, deniu-se um encaminhamento de trabalho que garantisse a articulao de representaes da universidade, das Secretarias Estaduais de Educao e dos professores para alcanar uma produo nal que respondesse a necessidades reais da relao de ensino e aprendizagem. Para dar partida a essa tarefa, constituiu-se um grupo de trabalho multidisciplinar com professores que atuam em linhas de pesquisa voltadas para o ensino, objetivando traar um documento preliminar que suscitasse o debate sobre contedos de ensino mdio e procedimentos didtico-pedaggicos, contemplando as especicidades de cada disciplina do currculo. Na elaborao de material especco para cada disciplina do currculo do ensino mdio, o grupo procurou estabelecer o dilogo necessrio para garantir a articulao entre as mesmas reas de conhecimento. A publicao do documento preliminar ensejou a realizao de cinco Seminrios Regionais e de um Seminrio Nacional sobre o Currculo do Ensino Mdio. A pauta que orientou as reunies tratou da especicidade e do currculo do ensino mdio, tendo como referncia esse documento.

APRESENTAO

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A anlise dessa produo contou com representantes das Equipes Tcnicas das Secretarias Estaduais de Educao, com professores de cada estado participante e, em alguns casos, com a representao de alunos. Aps os seminrios, deu-se incio ao processo bastante intenso de consolidao das anlises e consideraes levantadas nos debates e apresentao do trabalho a demais professores-pesquisadores para leitura crtica do resultado alcanado. Assim, este documento que chega escola fruto de discusses e contribuies dos diferentes segmentos envolvidos com o trabalho educacional. O prprio processo, envolvendo diferentes representaes e focos de anlise, indica a natureza do texto cujo resultado est aqui apresentado. Isto , um material que apresenta e discute questes relacionadas ao currculo escolar e a cada disciplina em particular. O currculo a expresso dinmica do conceito que a escola e o sistema de ensino tm sobre o desenvolvimento dos seus alunos e que se prope a realizar com e para eles. Portanto, qualquer orientao que se apresente no pode chegar equipe docente como prescrio quanto ao trabalho a ser feito. O Projeto Pedaggico e o Currculo da Escola devem ser objetos de ampla discusso para que suas propostas se aproximem sempre mais do currculo real que se efetiva no interior da escola e de cada sala de aula. oportuno lembrar que os debates dos diferentes grupos manifestaram grandes preocupaes com as bases materiais do trabalho docente. Certamente a situao funcional da equipe escolar, envolvendo jornada de trabalho, programas de desenvolvimento prossional e condies de organizao do trabalho pedaggico, tem um peso signicativo para o xito do processo de ensino-aprendizagem. Cabe equipe docente analisar e selecionar os pontos que merecem aprofundamento. O documento apresentado tem por inteno primeira trazer referncias e reexes de ordem estrutural que possam, com base no estudo realizado, agregar elementos de apoio sua proposta de trabalho. A Secretaria de Educao Bsica, por meio do Departamento de Polticas de Ensino Mdio busca incentivar, com esta publicao, a comunidade escolar para que conceba a prtica cotidiana como objeto de reexo permanente. Somente assim, se encontrar um caminho profcuo para a educao.

Diretoria do Departamento de Polticas de Ensino Mdio

Cincias da Natureza, Matemtica e suas Tecnologias

SumrioCONHECIMENTOS DE BIOLOGIAIntroduo 1 Questes de contedo e metodologia 1.1 Os PCN+ e os temas estruturadores 1.2 Abordagem dos contedos no ensino de Biologia 1.3 Metodologia 2 Perspectivas de ao pedaggica 3 Avaliao Referncias bibliogrcas 15 19 21 22 25 32 39 41

CONHECIMENTOS DE FSICAintroduo 1 A Fsica no ensino mdio 2 Tratamento escolar dos contedos de Fsica: enfoques de estratgias para a ao didtica 3 Histria e Filosoa da Cincia Referncia bibliogrca Sites 45 52 61 64 65 65

CONHECIMENTOS DE MATEMTICAIntroduo 1 Questes de contedo 2 Questes de metodologia 3 O uso de tecnologia 4 Organizao curricular e projeto poltico-pedaggico 5 Temas complementares 6 Consideraes nais Referncias bibliogrcas 69 70 80 87 90 92 95 96

CONHECIMENTOS DE QUMICAIntroduo 1 Sobre os contedos e as metodologias no ensino da Qumica 101 105

1.1 A necessria reviso dos contedos do ensino 1.2 Os conhecimentos qumicos da Base Nacional Comum 1.3 A abordagem metodolgica no ensino da Qumica 1.4 A Qumica no currculo escolar 2 O professor e as perspectivas para a ao pedaggica Referncias bibliogrcas

105 109 117 125 130 134

CONHECIMENTOS DE BIOLOGIA

Consultor Paulo Takeo Sano Leitores Crticos Jos Lus Laporta Jos Mariano Amabis Luiz Marcelo de Carvalho Mrcia Zorello Laporta Nelio Marco Vincenzo Bizzo Vitor Hugo Borba Manzke

Captulo

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Cincias da Natureza, Matemtica e suas TecnologiasCONHECIMENTOS DE BIOLOGIA

INTRODUONas ltimas dcadas, o ensino de Biologia vem sendo marcado por uma dicotomia que constitui um desao para os educadores. Seu contedo e sua metodologia no ensino mdio voltados, quase que exclusivamente, para a preparao do aluno para os aos exames vestibulares, em detrimento das nalidades atribudas pela Lei de Diretrizes e Bases da Educao Nacional (Lei N 9394/96) ltima etapa da educao bsica. Alm disso, temas relativos rea de conhecimento da Biologia vm sendo mais e mais discutidos pelos meios de comunicao, jornais, revistas ou pela rede mundial de computadores Internet , instando o professor a apresentar esses assuntos de maneira a possibilitar que o aluno associe a realidade do desenvolvimento cientco atual com os conceitos bsicos do pensamento biolgico. Assim, um ensino pautado pela memorizao de denominaes e conceitos e pela reproduo de regras e processos como se a natureza e seus fenmenos fossem sempre repetitivos e idnticos contribui para a descaracterizao dessa disciplina enquanto cincia que se preocupa com os diversos aspectos da vida no planeta e com a formao de uma viso do homem sobre si prprio e de seu papel no mundo. Leis e normas A proposio das Diretrizes Curriculares para o Ensino Mdio (DCNEM) no foi suciente para denir uma nova organizao desse nvel de ensino. Houve tal distanciamento entre o ensino mdio idealizado pelas DCNEM e o ensino real praticado efetivamente nas escolas que poucas se viram reetidas naquelas propostas, que terminaram por parecer inatingveis e impraticveis. As DCNEM articulam-se em trs reas do conhecimento: Linguagens, Cdigos e suas Tecnologias; Cincias da Natureza, Matemtica e suas Tecnologias; e Cincias Humanas e suas Tecnologias. Elas estabelecem, tambm, as competncias e habilidades que devero servir como referenciais para as propostas pedaggicas, alm de recomendar a interdisciplinaridade e a contextualizao, princpios

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ORIENTAES CURRICULARES PARA O ENSINO MDIO

condutores da organizao curricular. O documento apresenta as consideraes tericas sobre esses dois princpios como recursos pedaggicos para um ensino que coloque o aluno como centro de sua aprendizagem. A implantao das DCNEM nas escolas, em seu projeto poltico-pedaggico, e pelo professor, na prtica pedaggica em sala de aula, demandam acompanhamento, orientao e capacitao de gestores escolares e docentes. A implementao das DCNEM depende largamente de fomento e apoio s escolas, notadamente por instituies responsveis por cursos de formao de professores, o que ainda no se efetivou. Como resultado, constata-se o distanciamento entre esse documento e a realidade escolar. Os Parmetros Curriculares Nacionais para o Ensino Mdio (PCNEM), em complementao s DCNEM, fazem referncia explcita s disciplinas, vinculadas s trs reas do conhecimento, propondo, entretanto, uma viso integradora das disciplinas de modo a se reconhecer a relao entre aquelas de uma mesma rea e entre as de reas diversas. Apresenta, tambm, os objetivos especcos de cada rea do conhecimento reunidos em torno de competncias gerais. Com relao Biologia, os PCNEM apresentam um dilogo que no aprofunda sucientemente suas principais questes junto aos professores; o texto perde-se em exerccios de reexo que so pouco efetivos quando aplicados em sala de aula. Embora o documento traga orientaes gerais sobre os princpios norteadores da prtica didtica, faltam, na verdade, sugestes e propostas ao professor do como fazer. No entanto, necessrio reconhecer que, pelo menos no que tange Biologia, o limite do comprazimento foi excedido em larga medida nos PCNEM. O oreado semntico dos textos gerais transforma-se, no captulo reservado aos conhecimentos de Biologia, em um caminho complicado [...]. O texto sobre Conhecimentos de Biologia nos PCNEM tenta apresentar sugestes para uma abordagem que relacione teoria e prtica. Ela seria fruto de uma educao tecnolgica bsica, na qual o educando poderia demonstrar domnio dos princpios cientcos e tecnolgicos da Biologia que presidem a produo moderna. No entanto, o texto enveredou por um caminho de frases feitas no qual os professores de Biologia podem encontrar pouca ou nenhuma contribuio para zelar pela aprendizagem de seus alunos.1

1

BIZZO, N. Cincias biolgicas: orientaes curriculares do ensino mdio. Braslia: MEC/SEB, 2004, p. 165-166.

CONHECIMENTOS DE BIOLOGIA

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Os PCN+, propostos como orientaes complementares aos PCNEM, apresentam um dilogo direto com os professores e os educadores, tornando menor a distncia entre a proposio das idias e sua execuo. O texto rearma seu compromisso com a necessidade de se articularem as competncias gerais com os conhecimentos disciplinares e organiza de forma mais sistemtica muitas das propostas pretendidas pelos PCNEM. Nesse sentido, o texto dos PCN+ representou um avano, pois prope sugestes de organizao de cursos e de aulas, alm de mltiplas abordagens sobre os temas da disciplina. O documento apresenta aos professores exemplos de aplicao das propostas previstas nos Parmetros, alm de permitir a criao de novas possibilidades, segundo o perl do aluno, a realidade de cada escola e de seu projeto poltico-pedaggico. Olhando o presente O ensino da Biologia deve enfrentar alguns desaos: um deles seria possibilitar ao aluno a participao nos debates contemporneos que exigem conhecimento biolgico. O fato de o Brasil, por exemplo, ser considerado um pas megadiverso, ostentando uma das maiores biodiversidades do planeta, nem sempre resulta em discusses na escola de forma a possibilitar ao aluno perceber a importncia desse fato para a populao de nosso pas e o mundo, ou de forma a reconhecer como essa biodiversidade inuencia a qualidade de vida humana, compreenso necessria para que se faa o melhor uso de seus produtos. Outro desao seria a formao do indivduo com um slido conhecimento de Biologia e com raciocnio crtico. Cotidianamente, a populao, embora sujeita a toda sorte de propagandas e campanhas, e mesmo diante da variedade de informaes e posicionamentos, sente-se pouco conante para opinar sobre temas polmicos e que podem interferir diretamente em suas condies de vida, como o uso de transgnicos, a clonagem, a reproduo assistida, entre outros assuntos. A lista de exemplos interminvel, e vai desde problemas domsticos at aqueles que atingem toda a populao. O ensino de Biologia deveria nortear o posicionamento do aluno frente a essas questes, alm de outras, como as suas aes do dia-a-dia: os cuidados com corpo, com a alimentao, com a sexualidade. Contraditoriamente, apesar de a Biologia fazer parte do dia-a-dia da populao, o ensino dessa disciplina encontra-se to distanciado da realidade que no permite populao perceber o vnculo estreito existente entre o que estudado na disciplina Biologia e o cotidiano. Essa viso dicotmica impossibilita ao aluno estabelecer relaes entre a produo cientca e o seu contexto, prejudicando a necessria viso holstica que deve pautar o aprendizado sobre a Biologia. O

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grande desao do professor possibilitar ao aluno desenvolver as habilidades necessrias para a compreenso do papel do homem na natureza. Para enfrentar esses desaos e contradies, o ensino de Biologia deveria se pautar pela alfabetizao cientca. Esse conceito implica trs dimenses: a aquisio de um vocabulrio bsico de conceitos cientcos, a compreenso da natureza do mtodo cientco e a compreenso sobre o impacto da cincia e da tecnologia sobre os indivduos e a sociedade.2 Partindo desse pressuposto, o conhecimento escolar seria estruturado de maneira a viabilizar o domnio do conhecimento cientco sistematizado na educao formal, reconhecendo sua relao com o cotidiano e as possiO grande desao do bilidades do uso dos conhecimentos professor possibilitar apreendidos em situaes diferenciaao aluno desenvolver as das da vida. Essa proposta depende, habilidades necessrias para para a concretizao, de que o proa compreenso do papel do fessor se torne um mediador entre homem na natureza. o conhecimento sistematizado e o aluno, para que este consiga transpor para o cotidiano os contedos apropriados em sala de aula. Para isso, fundamental que o professor seja capacitado, recebendo as orientaes e condies necessrias a uma mudana na forma de ensinar Biologia, de maneira a organizar suas prticas pedaggicas de acordo com as concepes para o ensino da Biologia, tendo como referncia os PCN. Essa capacitao dever possibilitar ao professor reconhecer que a mudana de sua ao depende de uma educao contnua, por meio de simpsios, encontros, cursos de aperfeioamento que possibilitem a construo coletiva de novas alternativas educativas e permitam, tambm, que o professor se aproprie da cultura cientca. Ou seja, [...] sem os conhecimentos e habilidades necessrias para efetuar estes novos objetivos e estratgias, o professorado no ser capaz de operar ecazmente nos cursos. Sua formao e capacitao devem ter a mesma base pedaggica que os estudantes, para uma compreenso ampla da cincia como empresa social e humana, e esta deve manter-se ao longo da carreira prossional.3

2 MILLER, J. D. Scientic literacy and citzenship in the 21st century. Science centers for this century. IN: SCHIELE, B.; KOSTER, E. H. Qubec: ditions Multimondes, 2000, p. 369-413. 3 SABBATINI, M. Alfabetizao e cultura cientca: conceitos convergentes? Cincia e Comunicao, v. 1, n. 1, 2004.

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Diante desses desaos e da compreenso da Biologia como disciplina essencial para a formao bsica de todo cidado, o MEC promoveu, durante o ano de 2004, uma discusso nacional sobre a organizao curricular no ensino mdio. As discusses ocorridas em todas as cinco regies do pas congregaram equipes tcnicas das Secretarias de Educao, professores universitrios e do ensino mdio, alm de estudantes universitrios e do ensino mdio. A sntese dessas discusses so apresentadas a seguir. Resultado das discusses Consensualmente, os contedos e as prticas propostos pelos PCN so considerados consistentes e atualizados. A recomendao que o documento seja alvo de esclarecimentos, divulgao e discusso nas escolas. Os PCN+, por seu maior aprofundamento nas questes referentes a cada rea e disciplina, serviram de base para muitas das reexes que se seguem, com orientaes para o cumprimento dos pressupostos estabelecidos para o ensino mdio na Lei de Diretrizes e Bases da Educao Nacional/96 LDBEN, e que podem servir de subsdios escola e sistemas de ensino, na denio de seleo e ordenao de contedos, procedimentos, atitudes e valores que concretizam os caminhos a serem trilhados nessa etapa conclusiva da educao bsica. Sem pretender ser um manual de procedimentos ou um protocolo de atividades, o conjunto de orientaes a seguir objetiva estabelecer um dilogo com o professor de Biologia. Para tanto, preciso reconhecer que a efetividade da ao dar-se- no somente por meio dessas orientaes, mas, fundamentalmente, na organizao coletiva do trabalho docente, integrando, de acordo com o momento, professores da mesma rea e das diferentes reas em torno do projeto da escola, e na sala de aula, em que so protagonistas alunos e professores.

1 QUESTES DE CONTEDO E METODOLOGIAFreqentemente, o professor de Biologia se questiona quais contedos priorizar, quais os objetivos de aprendizagem a serem perseguidos e como atingi-los. Os PCNEM consideram que h um conjunto de conhecimentos que so necessrios ao aluno para que ele compreenda a sua realidade e possa nela intervir com autonomia e competncia. Esses conhecimentos constituem o ncleo comum do currculo. Consideram, tambm, um conjunto de conhecimentos especcos, a parte diversicada, constitudo por questes e problemas relativos determinada comunidade, determinada escola, e que merecem ser estudados.

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Segundo os PCNEM, [...] objeto de estudo da Biologia o fenmeno da vida em toda a sua diversidade de manifestaes. [...] O aprendizado da Biologia deve permitir a compreenso [...] dos limites dos diferentes sistemas explicativos [...] e a compreenso que a cincia no tem respostas denitivas [...].4 Assim, os contedos de Biologia devem propiciar condies para que o educando compreenda a vida como manifestao de sistemas organizados e integrados, em constante interao com o ambiente fsico-qumico. O aluno ... os contedos de Biologia devem precisa ser capaz de estabelecer repropiciar condies para que o laes que lhe permitam reconheeducando compreenda a vida cer que tais sistemas se perpetuam como manifestao de sistemas por meio da reproduo e se moorganizados e integrados ... dicam no tempo em funo do processo evolutivo, responsvel pela enorme diversidade de organismos e das intrincadas relaes estabelecidas pelos seres vivos entre si e com o ambiente. O aluno deve ser capaz de reconhecer-se como organismo e, portanto, sujeito aos mesmos processos e fenmenos que os demais. Deve, tambm, reconhecer-se como agente capaz de modicar ativamente o processo evolutivo, alterando a biodiversidade e as relaes estabelecidas entre os organismos. A escola, ao denir seu projeto pedaggico, deve propiciar condies para que o educando possa conhecer os fundamentos bsicos da investigao cientca; reconhecer a cincia como uma atividade humana em constante transformao, fruto da conjuno de fatores histricos, sociais, polticos, econmicos, culturais, religiosos e tecnolgicos, e, portanto, no neutra; compreender e interpretar os impactos do desenvolvimento cientco e tecnolgico na sociedade e no ambiente. Trata-se, portanto, de capacitar o educando para interpretar fatos e fenmenos naturais ou no sob a ptica da cincia, mais especicamente da Biologia, para que, simultaneamente, adquira uma viso crtica que lhe permita tomar decises usando sua instruo nessa rea do conhecimento.

4

BRASIL. Parmetros Curriculares Nacionais: ensino mdio. Braslia: MEC/SEB, 2002, p. 219.

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[...] Todos devem aprender cincia como parte de sua formao cidad, que possibilite a atuao social responsvel e com discernimento diante de um mundo cada dia mais complexo.5

1.1 Os PCN+ e os temas estruturadoresOs PCN+ rearmam que os contedos e as estratgias de aprendizagem devem propiciar o ensino por competncias. Nesse sentido, [] o ensino da Biologia deve servir como meio para ampliar a compreenso sobre a realidade, recurso graas ao qual os fenmenos biolgicos podem ser percebidos e interpretados, instrumento para orientar decises e intervenes. (PCN+, p. 36). Reconhecendo que os principais temas biolgicos referem-se compreenso da vida na Terra, das conseqncias dos avanos tecnolgicos e da interveno humana, os PCN+ sintetizam, a ttulo de referncia, seis temas estruturadores: 1. interao entre os seres vivos; 2. qualidade de vida das populaes humanas; 3. identidade dos seres vivos; 4. diversidade da vida; 5. transmisso da vida, tica e manipulao gnica; 6. origem e evoluo da vida. Os temas estruturadores tm a funo de ajudar o professor a organizar suas aes pedaggicas, congurando-se como meios para atingir os objetivos do projeto pedaggico da escola, e no como objetivos em si. Dessa forma, devem ser utilizados para criar situaes de aprendizagem que permitam o desenvolvimento de competncias tais como saber comunicar-se, saber trabalhar em grupo, buscar e organizar informaes, propor solues, relacionar os fenmenos biolgicos com fenmenos de outras cincias, construindo, assim, um pensamento orgnico. No se trata simplesmente de mudar o planejamento para que a ao pedaggica se enquadre nos temas estruturadores, e sim de utilizar esses temas biolgicos como instrumentos para que a aprendizagem tenha signicado, de forma que o aluno seja capaz de relacionar o que apresentado na escola com a sua vida, a sua realidade e o seu cotidiano.

5

BIZZO, N. Op. cit. , p. 157.

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ORIENTAES CURRICULARES PARA O ENSINO MDIO

Um professor que utilize o livro didtico em suas aulas conta com uma seqncia j organizada de apresentao dos assuntos. Diante da proposta dos temas estruturadores, e considerando a sua realidade especca, as necessidades de seus alunos, as particularidades de sua escola e regio, o professor pode selecionar os temas que so mais signicativos e resolver como devero ser trabalhados de modo a possibilitar situaes de aprendizagem a partir das vivncias dos alunos. Os seis temas estruturadores esto didaticamente subdivididos em quatro unidades temticas. O tema 1, Interao entre os seres vivos, por exemplo, subdividido nas seguintes unidades temticas: 1. A interdependncia da vida; 2. Os movimentos dos materiais e da energia na natureza; 3. Desorganizando os uxos da matria e da energia e 4. Problemas ambientais brasileiros e o desenvolvimento sustentvel. Alm de descrever os contedos a serem abordados em cada um dos seis temas estruturadores e em cada uma de suas unidades temticas, os PCN+ explicitam quais competncias podem ser desenvolvidas em cada tema estruturador e as sugestes de atividades que podem ser realizadas em cada unidade temtica.

1.2 Abordagem dos contedos no ensino de BiologiaUm tema de importncia central no ensino de Biologia a origem e evoluo da vida. Conceitos relativos a esse assunto so to importantes que devem compor no apenas um bloco de contedos tratados em algumas aulas, mas constituir uma linha orientadora das discusses de todos os outros temas. O tema 6 dos PCN+ origem e evoluo da vida contempla especicamente esse assunto, mas importante assinalar que esse tema deve ser enfocado dentro de outros contedos, como a diversidade biolgica ou o estudo sobre a identidade e a classicao dos seres vivos, por exemplo. A presena do tema origem e evoluo da vida ao longo de diferentes contedos no representa a diluio do tema evoluo, mas sim a sua articulao com outros assuntos, como elemento central e unicador no estudo da Biologia. Vivendo num pas com uma das maiores biodiversidades do planeta, imprescindvel que os cidados tenham conhecimento dessa diversidade biolgica e compreendam sua responsabilidade sobre esse contexto. Os PCN+ contemplam os contedos relacionados biodiversidade,6 que devem ser apresentados de forma a permitir ao aluno perceber a importncia da biodiversidade para a vida na Terra,

6

Nos PCN+ de Biologia, os contedos referentes biodiversidade esto agrupados nos temas 1. Interao entre os seres vivos e 4. Diversidade da vida.

CONHECIMENTOS DE BIOLOGIA

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destacando seus componentes e interaes, bem como os fatores que favorecem o seu surgimento e aqueles que restringem sua perpetuao. So dois os focos principais desse tema: um centrado na diversidade dos organismos e em sua interdependncia, e o outro voltado para os impactos causados pelas aes humanas. importante assinalar que a diversidade biolgica no deve ser tratada apenas em relao ao nmero de espcies, mas sim em todos os seus nveis: diversidade dos ecossistemas, das populaes, das espcies e dos genes. Com isso, o assunto deixa de ser apenas um tpico dentro de um captulo de ecologia e passa a ser tema mais central, envolvendo aspectos ecolgicos, taxonmicos e genticos. O estudo da diversidade biolgica no deve ser associado apenas aos ecossistemas terrestres, fato recorrente nos livros didticos. A diversidade dos ecossistemas aquticos bastante relevante e deve ser considerada, principalmente diante da extenso da costa litornea brasileira e da quantidade de rios e lagos do pas. Outro aspecto de importncia crucial que a abordagem da diversidade tenha um enfoque centrado mas no exclusivo na realidade brasileira. Cada vez mais decises de cunho poltico e econmico devem ter estreita relao com o domnio do conhecimento sobre a O professor deve conduzir biodiversidade brasileira. Na condio o aluno compreenso de de cidados deste pas, todos devem que todos os organismos estar instrudos sobre esse assunto. Teesto sujeitos aos mesmos mas como os usos da biodiversidade, o processos, como recepo de suprimento de produtos que ela propiestmulos do meio ... cia, os chamados servios ambientais e os saberes associados biodiversidade (inuncia da biodiversidade nos regionalismos, nas culturas tradicionais, nos costumes) devem ser trabalhados em sala de aula. Uma decorrncia quase espontnea do aprendizado sobre diversidade ou ento, um provocador desse aprendizado o estudo sobre a identidade dos seres vivos e a transmisso da vida,7 assuntos centrais da biologia celular e da hereditariedade. Esses temas, comumente tratados como itens isolados, devem possibilitar a articulao com outros temas ans, criando condies para que o aluno compreenda as relaes entre os vrios assuntos: a biologia celular e a hereditariedade se conguram justamente como pontos de convergncia dos seres vivos, conferindo-lhes, ao mesmo tempo, identidade e diversidade.

7 Tais contedos compem os seguintes temas dos PCN+: 3. Identidade dos seres vivos e 5. Transmisso da vida, tica e manipulao gnica

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O professor deve conduzir o aluno compreenso de que todos os organismos esto sujeitos aos mesmos processos, como recepo de estmulos do meio, integrao e resposta, obteno, transformao e distribuio de energia, trocas gasosas, equilbrio de gua e sais em seu corpo, remoo de produtos nais do metabolismo e perpetuao da espcie. Para tanto, preciso compreender a clula como um sistema organizado, no qual ocorrem reaes qumicas vitais, e que est em constante interao com o ambiente, distinguir os tipos fundamentais de clula e a existncia de organelas com funes especcas, reconhecer os processos de manuteno e reproduo da clula (mitose e meiose) como forma de interligar a gametognese e a transmisso dos caracteres hereditrios, comparar e perceber semelhanas e diferenas entre os seres unicelulares e pluricelulares. O aluno deve compreender como as informaes genticas codicadas no DNA denem a estrutura e o funcionamento das clulas e determinam as caractersticas dos organismos. Deve tambm conhecer o princpio bsico de duplicao do DNA e saber que esse processo est sujeito a erros mutaes que originam novas verses (alelos) do gene afetado e podem, ou no, ser causadores de problemas para os diferentes organismos. preciso ressaltar que as mutaes so a fonte primria da variabilidade e, portanto, permitiram a constituio da biodiversidade hoje existente. Cabe estimular o aluno a avaliar as vantagens e desvantagens dos avanos das tcnicas de clonagem e da manipulao do DNA, considerando valores ticos, morais, religiosos, ecolgicos e econmicos. Trata-se da evoluo sob a interveno humana.8 Sobre esse tema, podem-se gerar discusses, por exemplo, em relao seleo articial, ao surgimento e perda de espcies e ao aumento da expectativa de vida da populao humana. Assim como a evoluo, os temas referentes ao ser humano devem contemplar todos os contedos. Compete ao ensino da Biologia, prioritariamente, o desenvolvimento de assuntos ligados sade, ao corpo humano, adolescncia e sexualidade. Alm das denies sobre sade e doena, dos indicadores de sade pblica, dos ndices de desenvolvimento, devem estar presentes, ainda, contedos referentes dinmica das populaes humanas e relao entre sociedade e natureza. Por intermdio desses assuntos, o aluno tem condies de analisar o crescimento populacional e avaliar as perspectivas futuras, considerando a produo de ali-

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Unidade temtica 4, tema 6 dos PCN+.

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mentos, o uso do solo, a disponibilidade de gua potvel, o problema do esgoto, do lixo e da poluio. importante criar condies para que o aluno compreenda a necessidade do manejo adequado dos recursos naturais e analise sua utilizao sob aspectos histricos e perspectivas futuras. Para que ele possa, assim, reconhecer os fatores que inuenciam a qualidade de vida das populaes humanas e o signicado do uso sustentvel dos recursos naturais, para a conservao e preservao da populao humana. Nesse contexto, inserem-se temas relativos origem do ser humano e evoluo cultural.9 Assim, no que diz respeito aos contedos, os PCN+ armam que no pretendem reinventar os campos conceituais da Biologia, mas apresentar possibilidades e destacar os aspectos essenciais vida e vida humana que vo ser trabalhados por meio dos conhecimentos cientcos referidos na prtica. (p. 41). Nesse contexto, possvel notar abordagens ora mais conservadoras, ora mais inovadoras. O mais importante que o professor tenha convico de que no A escolha de um outro existem protocolos a serem seguidos. caminho depende, primeiro, As aulas de Biologia, e das cindo projeto pedaggico cias como um todo, devem estar diselaborado pela escola, ponveis ao debate e discusso sobre considerando a realidade o papel e as inuncias exercidas pelo regional e a de seus alunos. conhecimento cientco na sociedade (MANZKE, 2000). A escolha de um outro caminho depende, primeiro, do projeto pedaggico elaborado pela escola, considerando a realidade regional e a de seus alunos. A partir dessa construo coletiva, o professor, em sala de aula, organiza o trabalho procurando, em situaes particulares, os caminhos mais signicativos para seus alunos.

1.3 MetodologiaComo fazer? Essa pergunta aige aqueles cuja tarefa possibilitar o aprendizado do aluno. No tocante s estratgias a serem aplicadas no desenvolvimento dos contedos de Biologia, os PCN+ apresentam diversas propostas teis ao professor, relacionadas tanto no item Estratgias para a ao como ao longo da descrio das quatro unidades temticas dos seis temas estruturadores. No item Estratgias para a ao, os PCN+ enfatizam que o trabalho do professor o de mediador, ou seja, responsvel por apresentar problemas ao aluno que o desaem a buscar a soluo.9

Unidade temtica 3, tema 6 dos PCN+.

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O item Estratgias para a abordagem dos temas apresenta atividades como a experimentao, o estudo do meio, o desenvolvimento de projetos, os jogos, os seminrios, os debates, a simulao, como propostas que possibilitam a parceria entre professor e alunos. Estratgias para abordagem dos temas.10 O processo ensino-aprendizagem bilateral, dinmico e coletivo, portanto necessrio que se estabeleam parcerias entre o professor e os alunos e dos alunos entre si. Diversas so as estratgias que propiciam a instalao de uma relao dialgica em sala de aula, e, entre elas, podemos destacar algumas que, pelas caractersticas, podem ser privilegiadas no ensino da Biologia. Experimentao A experimentao faz parte da vida, na escola ou no cotidiano de todos ns. Assim, a idia de experimentao como atividade exclusiva das aulas de laboratrio, onde os alunos recebem uma receita a ser seguida nos mnimos detalhes e cujos resultados j so previamente conhecidos, no condiz com o ensino atual. As atividades experimentais devem partir de um problema, de uma questo a ser respondida. Cabe ao professor orientar os alunos na busca de respostas. As questes propostas devem propiciar oportunidade para que Estratgias para os alunos elaborem hipteses, testem-nas, orabordagem dos ganizem os resultados obtidos, reitam sobre o temas. signicado de resultados esperados e, sobretudo, o dos inesperados, e usem as concluses para a construo do conceito pretendido. Os caminhos podem ser diversos, e a liberdade para descobri-los uma forte aliada na construo do conhecimento individual. As habilidades necessrias para que se desenvolva o esprito investigativo nos alunos no esto associadas a laboratrios modernos, com equipamentos sosticados. Muitas vezes, experimentos simples, que podem ser realizados em casa, no ptio da escola ou na sala de aula, com materiais do dia-a-dia, levam a descobertas importantes.

10 BRASIL. PCN+ ensino mdio: orientaes educacionais complementares aos Parmetros Curriculares Nacionais. Vol. Cincias da natureza, matemtica e suas tecnologias. Braslia: MEC/Semtec, 2002, p. 55-57.

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Estudos do meio A realizao de estudos do meio motivadora para os alunos, pois desloca o ambiente de aprendizagem para fora da sala de aula. Um estudo do meio signicativo pode ser realizado na regio onde se situa a escola, [...] e, nessas circunstncias, os alunos tm oportunidade de: avaliar as condies ambientais, identicando, por exemplo, o destino do lixo e do esgoto, o tratamento dado gua, o modo de ocupao do solo, as condies dos rios e crregos e a qualidade do ar; entrevistar os moradores, ouvindo suas opinies sobre as condies do ambiente, suas reclamaes e sugestes de melhoria; elaborar propostas visando melhoria das condies encontradas, distinguindo entre as de responsabilidade individual das que demandam a participao do coletivo ou do poder pblico; identicar as instncias da administrao pblica para as quais as reivindicaes devem ser encaminhadas.

Desenvolvimento de projetos O ensino por meio de projetos, alm de consolidar a aprendizagem, contribui para a formao de hbitos e atitudes, e para a aquisio de princpios, conceitos ou estratgias que podem ser generalizados para situaes alheias vida escolar. Trabalhar em grupo d exibilidade ao pensamento do aluno, auxiliando-o no desenvolvimento da autoconana necessria para se engajar numa dada atividade, na aceitao do outro, na diviso de trabalho e responsabilidades, e na comunicao com os colegas. Fazer parte de uma equipe exercita a autodisciplina e o desenvolvimento de autonomia, e o automonitoramento. Em um projeto pedaggico, mesmo que a idia inicial parta do professor, muito importante a participao dos alunos na denio dos temas e na elaborao de protocolos para o desenvolvimento das atividades tal encaminhamento desenvolve o sentimento de pertencimento, alm de fazer com que o aluno tenha a oportunidade de desenvolver condies de planejar de executar trabalhos e pesquisa, viabilizando maior autonomia para o estudo. Todas as etapas devem ser discutidas, com a delimitao clara do papel de cada um. Essa participao cria um comprometimento e uma responsabilidade compartilhada quanto execuo e ao sucesso do projeto. Assim, um projeto no deve ser uma tarefa determinada pelo professor, mas sim eleito e discutido por todos, professor e alunos. possvel desenvolver projetos individuais ou em duplas; em outros mais

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amplos, envolver grupos maiores de alunos; ou ainda mobilizar a classe, uma determinada srie, ou mesmo toda a escola. Jogos Os jogos e brincadeiras so elementos muito valiosos no processo de apropriao do conhecimento. Permitem o desenvolvimento de competncias no mbito da comunicao, das relaes interpessoais, da liderana e do trabalho em equipe, utilizando a relao entre cooperao e competio em um contexto formativo. O jogo oferece o estmulo e o ambiente propcios que favorecem o desenvolvimento espontneo e criativo dos alunos e permite ao professor ampliar seu conhecimento de tcnicas ativas de ensino, desenvolver capacidades pessoais e prossionais para estimular nos alunos a capacidade de comunicao e expresso, mostrando-lhes uma nova maneira, ldica, prazerosa e participativa de relacionar-se com o contedo escolar, levando a uma maior apropriao dos conhecimentos envolvidos. Utilizar jogos como instrumento pedaggico no se restringe a trabalhar com jogos prontos, nos quais as regras e os procedimentos j esto determinados; mas, principalmente, estimular a criao, pelos alunos, de jogos relacionados com os temas discutidos no contexto da sala de aula.11 [...] Seminrios Uma diculdade que os alunos geralmente apresentam a de se expressarem de maneira coerente e inteligvel. Uma estratgia para trabalhar esse tipo de diculdade o desenvolvimento de alguns temas na forma de seminrios. Por exemplo, a proposio de um seminrio com o ttulo Organismos transgnicos: perigo para o planeta ou soluo para a fome do mundo? d oportunidade aos alunos para pesquisar em diferentes fontes, visitar instituies, entrevistar especialistas, organizar as suas idias, realizar julgamentos crticos e exercitar posturas ticas. Alm disso, ensina-os a ordenar as idias para poder exp-las e defend-las perante os colegas, a ouvir crticas e debat-las. A apresentao de um seminrio propicia a utilizao de material audiovisual, da criatividade na confeco de cartazes e transparncias, e o desenvolvimento da escrita, pois devem ser produzidos textos para serem apresentados ao professor e aos colegas.

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Op. cit., p. 56. Os PCN+ apresentam exemplos prticos do desenvolvimento de alguns projetos e jogos.

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Debates Uma outra estratgia que desperta grande interesse nos alunos a que envolve uma pesquisa, individual ou em grupos, sobre um tema, e o debate em sala de aula das concluses a que chegaram os diferentes grupos. Um tema adequado para esse tipo de abordagem a Origem e evoluo da vida. Os alunos seriam estimulados a pesquisar textos diversos sobre a origem da vida com explicaes cientcas atuais; explicaes cientcas do sculo XIX; lendas indgenas, lendas da cultura oriental, textos extrados da mitologia grega ou da Bblia. Aps a seleo dos textos, seria organizado um frum de discusso para estabelecer distino entre as concepes cientcas e no cientcas, e um debate em que parte dos alunos, baseados em argumentos construdos cienticamente, defenderia o acaso no surgimento da vida, e a outra parte defenderia a existncia de um projeto orientando o seu aparecimento. Simulao Os alunos poderiam ser orientados na proposio e na realizao de experimentos simples para testar, por exemplo, as hipteses sobre biognese ou abiognese, ou a simulao de cruzamentos genticos, a partir dos quais os alunos construiriam os conceitos bsicos da transmisso das caractersticas hereditrias. Vrias outras estratgias poderiam ainda ser sugeridas. O essencial, no entanto, que a seleo leve em conta se a estratgia a mais adequada para explorar o assunto e, principalmente, para desenvolver as competncias privilegiadas para aquele instante. (PCN+, 2002) Nas unidades temticas,12 so apresentadas idias gerais descritivas de cada unidade. Como exemplo, a unidade temtica 1. A interdependncia da vida (tema estruturador 1. Interao entre os seres vivos) traz a seguinte idia: identicar no globo terrestre as regies de maior diversidade de seres vivos associando essa concentrao e variedade de vida com as condies de luz e umidade. A partir desse item descritivo, devem ser propostas diversas atividades. O professor pode solicitar aos alunos que pesquisem, por exemplo, a taxa anual de precipitao e o nmero de espcies de animais ou plantas nativas das diversas regies mundiais. Com esses dados, os alunos podem construir um grco que

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BRASIL. PCN+ ensino mdio: orientaes educacionais complementares aos Parmetros Curriculares Nacionais. Vol. Cincias da natureza, matemtica e suas tecnologias. Braslia: MEC/Semtec, 2002, p. 42-51.

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relacione ndice anual de precipitao e nmero de espcies. Ao nal, a associao entre biodiversidade e um fator climtico poderia ser discutida a partir dos dados pesquisados pelos alunos, e at, pensando-se na interdisciplinaridade, discutir a questo da ocupao urbana, no seu contexto histrico, geogrco e social. Em todas as unidades temticas so propostas idias descritivas que permitem ao aluno a compreenso da realidade. Em outro exemplo, no tema estruturador 2, unidade temtica 2: A distribuio desigual da sade pelas populaes, sugere-se que os alunos entrevistem membros de comunidades de bairros diferentes para identicar a percepo em relao aos servios de sade e outros, ofertados pelo poder pblico, e saber como encaminhar as reivindicaes. Uma atividade como essa coloca o aluno como protagonista frente a uma situao de realidade social, possibilitando que ele avalie a desigualdade de distribuio dos servios de sade e os fatores associados a esse problema. importante insistir que as estratgias sugeridas podem e devem ser usadas, e que no so, necessariamente, dependentes de laboratrios, equipamentos sosticados ou de atividades complexas. A adoo dessas estratgias e propostas de atividades depende, na verdade, da capacidade do professor de perceber que o centro da aprendizagem o aluno, que deixa de ser um mero receptor passivo das informaes e passa a ser o elemento ativo de sua aprendizagem. O professor pode adotar procedimentos bastante simples mas que exijam a participao efetiva do aluno. Por exemplo, pode solicitar aos alunos que, durante determinada aula, anotem o que ficou claro a partir das explicaes do professor e o que ficou O professor pode adotar obscuro. Esse procedimento requer procedimentos bastante que o aluno fique atento e, mais do simples mas que exijam a que isso, avalie o que foi apresenparticipao efetiva do aluno. tado pelo professor. O relato feito pelos alunos tambm permite ao professor avaliar as dificuldades referentes a determinado assunto e ento decidir como proceder. Outra estratgia solicitar ao aluno que compare suas anotaes com aquelas feitas por outro colega. Esse procedimento pode ser feito ao longo da aula, em breves interrupes, e permite complementar e corrigir anotaes incorretas. Outro exemplo solicitar a grupos de alunos que relacionem o que est sendo estudado na aula com o que foi visto em aulas anteriores. Ou que reitam sobre um problema apresentado e relatem a que concluso o grupo chegou. De qualquer

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modo, todas essas estratgias bastante simples favorecem a aprendizagem ativa e o desenvolvimento de competncias. Com relao s atividades prticas realizadas em laboratrio, necessrio observar que o ideal seria a participao do aluno em todas as etapas da atividade, inclusive na proposio do procedimento a ser seguido. Possibilitar ao aluno um possvel, no entanto, possibilitar a comportamento crtico e aprendizagem ativa mesmo que a criativo diante do processo participao do aluno seja limitada e dos resultados deve a algumas etapas. Por exemplo, ao se ser um dos objetivos da propor a realizao de uma atividaexperimentao. de de laboratrio, pode-se solicitar ao aluno que relate os resultados esperados a partir do procedimento que ser seguido. Ou que reita sobre as conseqncias para os resultados, se algum item do procedimento for alterado. Mesmo que a escola no disponha de laboratrio, possvel realizar atividades relacionadas s experimentaes. O professor pode fornecer os resultados de um determinado experimento, como, por exemplo, das taxas de fotossntese de uma determinada planta submetida a concentraes diferentes de CO2, e solicitar que os alunos elaborem um grco, analisem os resultados e cheguem a alguma concluso. Pode, tambm, apresentar um problema relativo a qualquer tema biolgico, por exemplo, como vericar a origem do bicho da goiaba, e solicitar aos alunos que proponham um procedimento de laboratrio. Ao organizar uma atividade prtica, o professor deve valorizar o processo, explorar os fenmenos e analisar os resultados sob vrios ngulos. Caso os resultados obtidos sejam diferentes dos esperados, deve aproveitar a situao para discutir o processo de produo cientca. Ou seja, possibilitar ao aluno vivenciar as etapas do mtodo cientco. Um cuidado a ser tomado evitar a relativizao do tudo possvel e nada certeza. O professor pode aproveitar a atividade prtica para discutir o que seriam erros de procedimento e a mltipla possibilidade de resultados e de interpretaes que, s vezes, caracteriza a cincia. Possibilitar ao aluno um comportamento crtico e criativo diante do processo e dos resultados deve ser um dos objetivos da experimentao. A proposta de prticas que apenas conrmem a aula terica rotina comum nas aulas de Biologia, mas deve ser evitada tanto quanto possvel pelo professor. As aulas prticas, longe de constiturem mera conrmao dos fenmenos ensinados na teoria, devem desaar o aluno a relacionar informaes.

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No devem ser, simplesmente, a aula terica dada de outra maneira. Embora a manipulao correta de materiais e equipamentos seja uma habilidade a ser desenvolvida, no deve ser a nalidade nica da experimentao. A aula de laboratrio deve estimular a proliferao e sistematizao de idias que conjuguem teoria e prtica. Dessa forma, exerccios de problematizao de fenmenos e processos, elaborao de hipteses, sistematizao de dados, anlises e generalizaes certamente contribuiro para ampliar os conhecimentos do aluno. Tanto em situaes em que a escola disponha de um laboratrio em condies apropriadas para o desenvolvimento de demonstraes, experimentos e projetos quanto nas situaes em que isso no ocorra, o professor deve explorar tambm situaes e materiais comuns, de fcil obteno. Um vaso de planta, um aqurio ou um terrrio feito em uma garrafa podem permitir o desenvolvimento de mltiplos contedos sem grandes gastos de dinheiro ou de tempo. Mais do que contornar uma situao desfavorvel, tais prticas permitem ao aluno um novo olhar sobre o corriqueiro. O uso de espaos alm da sala de aula tambm interessante para o aprendizado em Biologia. Desde a visita a um museu ou a uma instituio cientca quando isso possvel at o uso do ptio, da horta ou do jardim da escola para o desenvolvimento de atividades, todas essas aes podem conduzir a uma maior efetividade do aprendizado. O importante o professor ter presente que os fenmenos e os processos biolgicos no esto ocorrendo em situaes distantes de si e de seus alunos. preciso enfatizar que esses fazem parte da realidade de todos os seres vivos, da vida dos alunos e professores.

2 PERSPECTIVAS DE AO PEDAGGICAAo contribuirmos para a elaborao ou desenvolvimento do projeto pedaggico da escola em que lecionamos, ao estruturarmos nosso plano anual de trabalho, ao reetirmos sobre a identidade da disciplina que ensinamos, que referncia devemos ter? O que fazer para ter uma viso mais abrangente e, ao mesmo tempo, mais profunda sobre essas questes? O ensino de Biologia, assim como seu desenvolvimento, deve ser pensado e executado tendo por base as nalidades do ensino mdio expressas na LDBEN/96, nos seguintes termos: Art. 35. O ensino mdio, etapa nal da educao bsica, com durao mnima de trs anos, ter como nalidades:

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I - a consolidao e o aprofundamento dos conhecimentos adquiridos no ensino fundamental, possibilitando o prosseguimento de estudos; II - a preparao bsica para o trabalho e a cidadania do educando, para continuar aprendendo, de modo a ser capaz de se adaptar com exibilidade a novas condies de ocupao ou aperfeioamento posteriores; III - o aprimoramento do educando como pessoa humana, incluindo a formao tica e o desenvolvimento da autonomia intelectual e do pensamento crtico; IV - a compreenso dos fundamentos cientco-tecnolgicos dos processos produtivos, relacionando a teoria com a prtica, no ensino de cada disciplina. (LDBEN, 1996). O professor deve ter clareza e segurana de que contedo, ao, desenvolvimento e avaliao no ensino de Biologia devem estar voltados para tais nalidades. A consolidao e o aprofundamento dos conhecimentos adquiridos no ensino fundamental talvez sejam, entre os objetivos do ensino mdio, os que mais amplamente tm se cumprido. O que no signica que isso ocorra da maneira mais apropriada. Isso se deve, em grande parte, compreenso equivocada de que o ensino mdio congura-se exclusivamente como preparatrio e como possibilidade de acesso ao ensino superior. Com isso, houve nfase cada vez maior no acmulo de informaes e pouca ateno para a sistematizao e a signicao desse conhecimento visando ao desenvolvimento. Que desperta no aluno a conscincia crtica e o torna socialmente responsvel. As aes, nesse nvel de ensino, devem propiciar que as informaes acumuladas se transformem em conhecimento efetivo, contribuindo para a compreenso dos fenmenos e acontecimentos que ocorrem no mundo e, particularmente, no espao de vivncia do aluno. Isso exige que o professor tenha conscincia de que sua misso no se limita mera transmisso de informaes, principalmente levando-se em conta que, atualmente, as informaes so transmitidas pelos meios de comunicao e pela rede mundial de computadores, quase imediatamente aps os fatos terem ocorrido, a um nmero cada vez maior de pessoas. O papel do professor possibilitar que, ao acessar a informao, o aluno tenha condies de decodic-la, interpret-la e, a partir da, emitir um julgamento. O professor de Biologia se depara, tambm, com uma outra tarefa: con-

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duzir o educando compreenso dos fundamentos cientco-tecnolgicos dos processos produtivos, relacionando a teoria com a prtica, outro dos objetivos do ensino mdio. Por um lado, temas prprios da Biologia fazem parte cada vez mais do dia-a-dia das pessoas e das decises que devem tomar, individual ou coletivamente. Por outro lado, existe um grande distanciamento entre a realidade dos alunos, da sala de aula e do prprio professor e a forma como se pretende que a apropriao desse conhecimento se faa. Por forma, entenda-se aqui no somente a maneira como assuntos e contedos so apresentados, mas tambm as condies estruturais e pedaggicas para faz-lo. Uma possibilidade de ao o estabelecimento, pelo professor, de vnculos diretos e claros entre o contedo e a realidade. Trata-se da contextualizao. O ponto de partida para o estudo e a compreenso da Biologia, portanto, deve ser o contexto do aluno e da escola. Se a realidade dos alunos, seus conhecimentos e vivncias prvias, forem considerados como ponto de partida, o ensino da Biologia far sentido para o aluno e a compreenso dos processos e fenmenos biolgicos ser possvel e efetiva. Concorre a favor da contextualizao o fato de que estamos inseridos em um mundo biolgico, mais do que isso, fazemos parte dele. Alm disso, em um mundo cada vez mais globalizado, acontecimentos distantes podem afetar diretamente a vida do aluno e constituir pontos de partida para tornar os contedos biolgicos mais atraentes. Dessa forma, no faltam exemplos e possibilidades de trabalho. Existe, porm, uma ressalva importante: contextualizar, aqui, no signica meramente exemplicar com situaes vividas pelos alunos. So muito freqentes, principalmente nos livros didticos, situaes em que o contexto serve apenas como acessrio informao e no como ponto de partida para o aprendizado. Destaca-se que, para que haja contextualizao, o primeiro movimento deve ser do professor, que, ao olhar ao seu redor, consegue reconhecer situaes que possibilitem ou facilitem o aprendizado. Esse processo, para o qual no existem protocolos, requer a reorganizao das informaes. Em uma escola situada em rea de grande produo agropecuria, a realidade dos alunos ser uma, e os assuntos usados como pontos de partida para a contextualizao sero diferentes, por exemplo, dos de uma escola situada no meio de uma grande metrpole, onde os problemas e a realidade so distintos. Contudo, ambas as escolas podero trabalhar conceitos que vo desde ecologia e impacto humano no meio ambiente at mutaes no DNA, usando prioritariamente exemplos e situaes de sua realidade. Da ser fundamental a participao do professor na elaborao do projeto poltico-pedaggico da escola.

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O professor deve ter presente que a contextualizao pode e deve ser efetivada no mbito de qualquer modelo de aula. Existe a possibilidade de contextualizao tanto em aulas mais tradicionais, expositivas, quanto em aulas de estudo do meio, experimentao ou no desenvolvimento de projetos. A prpria escola e seu entorno podem servir de ponto de partida para a contextualizao. A presena ou a ausncia de elementos biolgicos nesse espao congura-se como um bom elemento para iniciar qualquer assunto na disciplina. Se o aluno comear a enxergar para alm de sua realidade cotidiana, se perceber novos fatos e levantar novas questes, mesmo sobre lugares e coisas que no lhe so to familiares, ento o princpio da contextualizao ter acontecido. o respeito e a valorizao das especicidades locais que garantem a reconstruo permanente do currculo de qualquer disciplina. importante, tambm, que o professor perceba que a contextualizao deve ser realizada no somente para tornar o assunto mais atraente ou mais fcil de ser assimilado. Mais do que isso, permitir que o aluno consiga compreender a importncia daquele conhecimento para a sua vida, e seja capaz de analisar sua realidade, imediata ou mais distante, o que pode tornar-se uma fonte inesgotvel de aprendizado. Alm de valorizar a realidade desse aluno, a contextualizao permite que o aluno venha a desenvolver uma nova perspectiva: a de observar sua realidade, compreend-la e, o que muito importante, enxergar possibilidades de mudana. Por outro lado, para que sejam ecazes, as aes pedaggicas devem considerar a problemtica da juventude, ou seja, necessrio se conhecer quem so os jovens e quais so suas relaes com a realidade escolar. Ou seja, no ensino mdio, a realidade tal como percebida pelo jovem, que pouco ou nunca considerada, paradoxalmente, de importncia central. O conhecimento do protagonismo juvenil e as culturas prprias da juventude devem ser levados em conta. Na maior parte das vezes, o jovem v-se pouco reetido nas propostas pedaggicas para esse segmento do ensino, o que causa estranhamento e distanciamento, e impede a construo de uma relao signicativa com o ambiente escolar. Cada escola, cada turma e cada realidade demandam temas diferentes que serviro para estabelecer os vnculos com a realidade. Portanto, a proposio de qualquer frmula ou modelo padro seria insustentvel, parcial e ineciente. O uso das culturas prprias da juventude como ponto de partida para o trabalho pedaggico pode relacionar-se diretamente ao objetivo do ensino mdio de preparar o educando para o mundo do trabalho. No ensino mdio, o trabalho considerado princpio educativo em dois sentidos. No primeiro, porque proporciona a compreenso do processo histrico de produo cientca e tec-

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nolgica, como conhecimentos desenvolvidos e apropriados socialmente para a transformao das condies naturais e ampliao das capacidades, potencialidades e dos sentidos humanos. No segundo sentido, porque coloca exigncias especcas para o processo educativo, visando participao direta dos membros da sociedade no trabalho socialmente produtivo.13 Sob essa tica, busca-se que o aluno compreenda as cincias e as tecnologias como um conjunto de conhecimentos produzidos coletivamente ... busca-se que o aluno pela humanidade, e que geram as tccompreenda as cincias e nicas e os procedimentos do trabalho as tecnologias como um produtivo. conjunto de conhecimentos No se trata, assim, de o professor produzidos coletivamente prossionalizar o aluno em Biologia, pela humanidade ... mas de instrumentaliz-lo nos mtodos e nas prticas dessa cincia, de estimular, nesse aluno, uma postura de busca do conhecimento, de continuidade do aprendizado mesmo fora da escola por iniciativa prpria e de discernimento para vislumbrar outras e novas possibilidades de insero no mercado de trabalho. Entretanto, para que se processem tais aes, o professor necessitar de meios que lhe permitam qualicao permanente para o atendimento das demandas manifestadas. No ensino da Biologia, existem vrios campos de atuao que podem ser explorados e evidenciados pelo professor, tomados como ponto de partida e contextualizao de suas aulas. O agronegcio, as questes de sade pblica, o turismo ambiental, as medidas de qualidade e de servio ambiental, a prpria divulgao cientca e a transmisso do conhecimento so todos exemplos que podem ser destacados. Cada realidade certamente propicia um enfoque e uma abordagem distintos, e cabe ao professor estar atento e selecionar os temas que mais seduziro seus alunos. Outra possibilidade de ao pedaggica a ser desenvolvida, complementar contextualizao, a abordagem interdisciplinar dos contedos. Idealmente, a interdisciplinaridade deve ser construda no contexto do projeto pedaggico da escola. No entanto, mesmo iniciativas isoladas, embora limitadas e no to efetivas, podem facilitar a aprendizagem dos alunos.

13 RAMOS, M. Na. O projeto unitrio de ensino mdio sob os princpios do trabalho, da cincia e da cultura. In: FRIGOTTO, G.; CIAVATTA, M. (Org.) Ensino mdio: cincia, cultura e trabalho. Braslia: MEC/Semtec, 2004, p. 37-52.

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Um primeiro passo, que pode ser produtivo e conduzir posteriormente interdisciplinaridade sistmica, a abordagem simultnea de um mesmo assunto por diferentes disciplinas. Isso exige um acerto de planos de aula e de cronogramas entre os professores, respeitando-se as especicidades de cada disciplina. Nessa ao, professores de diferentes disciplinas e reas podem descobrir contedos que permitam um trabalho conjunto. Podem, tambm, vericar como um mesmo conceito, processo ou fenmeno, abordado nas diferentes disciplinas e investigar pontos em comum que podem ser explorados nas aulas. A idia no uniformizar, mas expor o aluno multiplicidade de enfoques, informaes e conhecimentos de forma que perceba que os conhecimentos de cada disciplina apresentam mltiplas interfaces, sendo capaz de inter-relacionar fenmenos, conceitos e processos, e de construir um pensamento orgnico. importante observar que a interdisciplinaridade no acontece somente por fora da lei ou pela vontade do professor, do diretor ou do coordenador pedaggico. A interdisciplinaridade s possvel em um ambiente de colaborao entre os professores, o que exige conhecimento, conana e entrosamento da equipe, e, ainda, tempo disponvel para que isso acontea. Da a importncia do projeto pedaggico da escola, que deve prever tempo, espao e horrios de atividades dos professores para que um programa de interdisciplinaridade possa ocorrer. No se deve, tambm, esperar que a interdisciplinaridade aore por si s, sem que haja um movimento para isso A interdisciplinaridade e independentemente do contexto das s possvel em um disciplinas. Cada disciplina possui caambiente de colaborao ractersticas e assuntos que lhe permientre os professores, o tiro conexes com outras disciplinas que exige conhecimento, com maior ou menor facilidade. Assim, conana e entrosamento em Biologia mais freqente haver coda equipe ... nexes com assuntos da Qumica ou da Fsica, mesmo porque os temas dessas trs disciplinas so trabalhados em uma mesma rea de conhecimento no ensino fundamental: Cincias. Igualmente, devem tentar estabelecer vnculos com outras disciplinas. A Educao Fsica oferece vrias possibilidades de assuntos a serem trabalhados nos tpicos do corpo humano, por exemplo. A Geograa pode ser conectada a assuntos relativos ao meio ambiente e ecologia. A Histria pode permitir que o aluno entenda o processo das descobertas cientcas como fruto de contextos histricos e sociais. Dessa forma, o professor pode identicar a vinculao entre as disciplinas e estabelecer pontos de mtuo interesse para investigao.

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O que no se deve fazer forar situaes articiais em nome de uma estratgia pedaggica que, ao nal, pode redundar em pouca efetividade ou, o que pior, em decincias na aprendizagem. Ou ento desconsiderar o que prprio de cada disciplina em favor de uma pretensa interdisciplinaridade que termina por no ser obtida. Deve-se evitar que a interdisciplinaridade se resuma a um discurso generalista que pouco ou nada signica. A interdisciplinaridade s possvel a partir da existncia de disciplinas e do estabelecimento de um conjunto slido de conhecimentos que elas propiciam. O que deve ser buscado o dilogo entre esses conhecimentos para que sejam possibilitadas novas aprendizagens. No que diz respeito formao do educando como cidado e como personalidade tica e crtica, a Biologia tem grande contribuio a dar. Tambm aqui, certamente, a aproximao do contedo especco com a realidade do aluno trar maior eccia ao aprendizado. Por exemplo, o estudo da Citologia e da Fisiologia Celular ser mais atraente se o ponto de partida for o prprio aluno, em vez de serem tomados exemplos genricos, de clulas genricas. Uma questo o aluno saber que existem clulas, como elas funcionam e que organelas contm. Realidade bem diferente ele se dar conta de que todos esses processos e acontecimentos tm lugar em seu prprio corpo e em sua prpria pele e outros rgos, como resultado de fenmenos biolgicos complexos e intrincados que devem ser cuidados e preservados. O aprendizado que permite tal constatao deve conduzir, por sua vez, a atitudes para alm do conhecimento cientco, levando o aluno a desenvolver atitudes de valorizao da prpria vida e da de seus semelhantes. Em tempos em que a violncia alcana nveis intolerveis, no deixa de ser oportuna qualquer iniciativa no sentido da valorizao da vida e do resgate da auto-estima do cidado. Outro exemplo ilustra bem essa contribuio que a Biologia pode dar na formao tica do cidado: o ensino da Gentica pode levar o aluno compreenso de que, apesar da diversidade de fentipos, de culturas, de origens geogrcas, todos os seres humanos possuem uma mesma ascendncia e compartilham caractersticas semelhantes, de maneira que no existem bases biolgicas que justiquem atitudes de preconceito. A formao tica e o pensamento crtico podem ser estimulados, em Biologia, pela exposio do aluno a questes como: produzir ou no em larga escala organismos geneticamente modicados; quais os riscos e benefcios da utilizao de transgnicos; apoiar ou no uma lei que prev o desmatamento de um trecho da Amaznia para a produo de alimentos e a gerao de empregos; apoiar ou no a destruio de uma rea de mangue para a construo de casas populares; usar ou no, terapeuticamente, clulas-tronco embrionrias. So situaes-problema

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em que o aluno, explicitamente, obrigado a tomar decises fundamentadas em conhecimentos cientcos e relacionadas aos seus valores pessoais ou sociais. Um caso tpico de contraposio entre cincia e valor no caso, o valor religioso a discusso sobre o ensino (ou no) do criacionismo em aulas de Biologia em que se discute sobre a origem e a evoluo da vida. Longe de apenas polemizar ou de buscar respostas evasivas, essa uma valiosa oportunidade para que o professor destaque o papel da cincia, mais especicamente da Biologia, na tentativa de esclarecer questes por meio de evidncias, de fatos, e pelo uso de procedimentos e metodologias que lhe so prprios. No caso das escolas pblicas, deve-se assegurar o carter laico do ensino, conforme determina a lei. Existem dois equvocos igualmente perniciosos que alguns professores chegam a cometer nos momentos em que h contraposio entre valores e conhecimento cientco: ou a explicao cientca apresentada como verdade imutvel e absoluta, nica possibilidade de crena, ou ento o conhecimento cientco horizontalmente colocado com todas as demais crenas, congurando-se apenas como mais uma explicao entre tantas. Tais manifestaes dogmatizadoras em nada contribuem para o desenvolvimento de uma personalidade crtica, e a isso o professor deve estar muito atento. Os PCNEM armam que o conhecimento da Biologia deve subsidiar o julgamento de questes polmicas [...].14 Ou seja, embasado em informaes e conhecimento, o cidado deve construir suas decises. O erro a ser evitado a suposio de que apenas a informao cientca suciente para permitir a tomada de decises e a emisso de julgamentos. Ao professor cabe mediar o dilogo entre informao cientca, valores e crenas de cada educando, pois ora esses elementos caminharo juntos, ora contrapor-se-o. Cabe, tambm esclarecer que, na maioria das vezes, respostas a questes complexas no so simples armaes ou negaes. Existem fatos e informaes a serem ponderados antes que uma deciso seja tomada e, uma vez isso feito, tampouco signica que seja denitivo, pois diante de novos fatos e evidncias, tanto o cidado quanto a prpria Cincia reavaliam suas decises. A prpria estruturao de um novo valor muitas vezes vem embasada pelo avano do conhecimento cientco.

3 AVALIAOO processo de avaliao visa a julgar como e quanto dos objetivos iniciais denidos no plano de trabalho do professor foram cumpridos. Necessariamente, deve14

PCNEM, p. 219 (grifo nosso).

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estar estreitamente vinculado aos objetivos da aprendizagem. Alm disso, tem a nalidade de revelar fragilidades e lacunas, pontos que necessitam de reparo e modicao por parte do professor. Ou seja, a avaliao deve estar centrada tanto no julgamento dos resultados apresentados pelos alunos quanto na anlise do processo de aprendizado. Em um ensino por competncias, o processo de avaliao no se limita a instrumentos com perguntas que exigem apenas operaes cognitivas simples como a memorizao. A formao de indivduos treinados apenas para memorizar frases e responder a perguntas com respostas determinadas incompatvel com o desenvolvimento de cidados socialmente inseridos e com esprito crtico aguado, um dos objetivos da educao. Os PCN+ consideram que, entre outras caractersticas, o processo de avaliao deve: retratar o trabalho desenvolvido; possibilitar observar, interpretar, comparar, relacionar, registrar, criar novas solues usando diferentes linguagens; constituir um momento de aprendizagem no que tange s competncias de leitura e interpretao de textos; privilegiar a reexo, anlise e soluo de problemas; possibilitar que os alunos conheam o instrumento assim como os critrios de correo; proporcionar o desenvolvimento da capacidade de avaliar e julgar, ao permitir que os alunos tomem parte de sua prpria avaliao e da de seus colegas, privilegiando, para isso, os trabalhos coletivos. (PCN+, p. 137). O professor deve, tambm, ter como parmetro para avaliao os objetivos mais especcos da disciplina, o projeto pedaggico da escola e as nalidades do ensino mdio expressas na LDBEN. Em especial, quatro parmetros podem servir como critrios no processo de avaliao: a) apropriao dos conhecimentos adquiridos no ensino fundamental; b) relao entre a teoria e a prtica; c) preparao do aluno para o mundo do trabalho e o exerccio da cidadania; d) formao tica e desenvolvimento de uma personalidade autnoma e crtica. Para cada um desses critrios podero ser desenvolvidas mltiplas formas de avaliao, desde uma prova com perguntas dissertativas at a execuo de seminrios e debates, nos moldes do que propem os PCN+. Ao elaborar uma prova com questes dissertativas, por exemplo, o professor precisa considerar as caractersticas da avaliao propostas nos PCN+, ou seja,

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privilegiar situaes em que o aluno seja levado reexo, anlise e resoluo de problemas. Ao propor um seminrio com a apresentao de temas, pode averiguar a consolidao dos contedos referentes a esse assunto. Estar, portanto, avaliando os resultados da aprendizagem. A avaliao pode ser realizada sob a forma de um estudo de caso ou de um debate sobre diversos assuntos, explorando uma multiplicidade de aes que permite, ao professor, averiguar os conhecimentos adquiridos e vericar se o aluno capaz de correlacionar teoria e prtica. Os temas de natureza mais polmica, como o uso de transgnicos na alimentao, sade coletiva, clonagem teraputica, efeitos da poluio sobre a clula, desnutrio, entre muitos outros, ensejam a realizao de debates, desenvolvimento de projetos ou mesmo de jogos que permitam ao professor avaliar o desenvolvimento da conscincia crtica e a condio argumentativa dos alunos, sua formao tica e suas posies quanto aos valores pessoais e sociais. Com isso, avaliam-se processo e resultado. Outra possibilidade a vericao do quanto o conhecimento inicial do aluno foi modicado (ou no), dado o desenvolvimento da disciplina. A partir da, pode-se gerar uma discusso bastante vantajosa sobre o aprendizado ao mesmo tempo em que se avalia o quanto, como e por que o aprendizado se deu. Mais importante, porm, que os exemplos ou a forma, o objetivo dessa avaliao. Dele decorrem a forma e os meios. Os objetivos do ensino mdio expressos pela lei e as metas do projeto pedaggico da escola em que o professor leciona passam a constituir as orientaes necessrias para o processo ensino aprendizagem. Nesse sentido, a escola dever assegurar: ao aluno, uma boa formao, tornando-o capaz de realizar a transposio dos contedos formais na interpretao do cotidiano e na valorizao dos conhecimentos no formais gerados na comunidade; ao professor: os meios necessrios para proporcionar ao aluno uma formao contnua, de qualidade, que lhe garanta atualizao permanente para enfrentar os avanos da sociedade.

REFERNCIAS BIBLIOGRFICASBIZZO, N. Cincias Biolgicas. In DPEM/SEB/MEC. Orientaes Curriculares do Ensino Mdio. Braslia: MEC/SEB. 2004 BRASIL. Lei de Diretrizes e Bases da Educao Nacional, Lei no. 9.394, de 20 de dezembro de 1996. _______. Diretrizes Curriculares para o Ensino Mdio, resoluo CEB no. 3 de 26 de junho de 1998.

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_______. Ministrio da Educao (MEC), Secretaria de Educao Mdia e Tecnolgica (Semtec). Parmetros Curriculares Nacionais para o Ensino Mdio, Braslia: MEC/Semtec, 1999. _______. Ministrio da Educao (MEC), Secretaria de Educao Mdia e Tecnolgica (Semtec). PCN Ensino Mdio: orientaes educacionais complementares aos Parmetros Curriculares Nacionais Cincias da Natureza, Matemtica e suas Tecnologias. Braslia: MEC/Semtec, 2002. _______. Ministrio da Educao (MEC), Secretaria de Educao Mdia e Tecnolgica (Semtec). Orientaes Curriculares do Ensino Mdio. Braslia: MEC/ SEB, 2004. _______. Ministrio da Educao (MEC), Secretaria de Educao, Alfabetizao e Diversidade (Secad). Unidade na diversidade e a reviso dos PCN do Ensino Mdio. MEC/Secad, mimeo, 2005a. _______. Ministrio da Educao (MEC), Secretaria de Educao, Alfabetizao e Diversidade (Secad). Proposta para a incluso nas Orientaes Curriculares para o Ensino Mdio. MEC/Secad, mimeo, 2005b. FRIZOTTO, G. & CIAVATTA, M. (orgs.) 2004. Ensino Mdio: Cincia, Cultura e Trabalho. MEC/SEMTEC. Braslia. LODI, L. H. 2004. Subsdios para uma reexo sobre o Ensino Mdio. In DPEM/SEB/MEC. Orientaes Curriculares do Ensino Mdio. Braslia: MEC/ SEB. 2004.

CONHECIMENTOS DE FSICA

Texto consolidado pela equipe tcnica do Departamento de Polticas de Ensino Mdio /SEB/MEC, com edio nal de Susana de Souza Barros.

Captulo

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Cincias da Natureza, Matemtica e suas TecnologiasCONHECIMENTOS DE FSICA

INTRODUO*As reas do conhecimento de Cincias da Natureza apresentam caractersticas comuns: procedimentos metodolgicos, linguagem, modalizao, investigao sistemtica da natureza e aproximao com a tecnologia. Mas possuem tambm aspectos prprios e objetos de investigao distintos que as diferenciam. Bem mais por convenincias prticas e histricas do que epistemolgicas, o reconhecimento social de reas de pesquisa, como a Fsica, a Qumica, a Biologia e a Matemtica, inuenciou a criao de disciplinas escolares com o mesmo nome. Para se adequarem ao ensino de Fsica, inclusive em termos didticos, os contedos Na escola, uma das do currculo escolar precisaram passar ne1 caractersticas mais cessariamente por transformaes. importantes do processo Isso leva a questionamentos por parte de aprendizagem do professor: Como feita a transposio? a atitude reexiva e Que conhecimentos devero ser ensinados? autocrtica diante dos At hoje a resposta se encontra principossveis erros. palmente nos livros didticos e nos exames vestibulares, que orientam os contedos escolares como se fossem as nicas alternativas. Muito freqentemente ensinam-se as respostas sem formular as perguntas! E h um aspecto para o qual os professores devem se voltar com especial ateno, relacionado com a caracterstica fundamental da cincia: a sua dimenso investigativa, dicilmente trabalhada na escola nem solicitada nas provas vestibulares. importante que os mtodos de ensino sejam modicados, capacitando o aluno a responder a perguntas e a procurar as informaes necessrias, para utiliA elaborao deste documento teve como referncia o texto Conhecimentos de Fsica de autoria de Elio Carlos Ricardo, Jos Francisco Custdio e Mikael Frank Rezende Jnior. Braslia. 2005. 1 Esse processo pelo qual um objeto de saber chega escola como objeto de ensino chamado de transposio didtica. Para aprofundamento, ver: ASTOLFI, J. P.; DEVELAY, M. A didtica das cincias. So Paulo: Papirus, 1995; e CHEVALLARD, Y. La transposicin didctica: del saber sabio al saber enseado. Buenos Aires: Aique Grupo Editor, 1991.*

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z-las nos contextos em que forem solicitadas. Na escola, uma das caractersticas mais importantes do processo de aprendizagem a atitude reexiva e autocrtica diante dos possveis erros. Essa forma de ensino auxilia na formao das estruturas de raciocnio, necessrias para uma aprendizagem efetiva, que permita ao aluno gerenciar os conhecimentos adquiridos. Os PCN+ e o professor A compreenso do que sejam as competncias um dos maiores obstculos para a implementao dos Parmetros Curriculares na escola. A noo de competncias, por ter sua origem na formao prossional, reete mudanas signicativas nas relaes de produo e trabalho. Sendo o objetivo principal do ensino mdio a formao da autonomia crtica do educando, esta deve dar-se sob trs aspectos: intelectual, poltico e econmico. Em seu aspecto intelectual, a autonomia permite o pensamento independente, ou seja, educar sujeitos que utilizem seus conhecimentos, que pensem por si mesmos. Em sua dimenso poltica, a autonomia garante a participao ativa dos sujeitos na vida cidad. A autonomia econmica deve assegurar uma formao para a sobrevivncia material por meio do trabalho. As competncias e os saberes escolares na relao didtica Uma formao autntica precisa considerar a noo de competncias sob dois enfoques: i. como referncia dos saberes escolares; e ii. como relao didtica. A Fsica escolar diferente da cincia Fsica, embora ambas estejam intimamente relacionadas. Os saberes ensinados so simplicados para possibilitar seu ensino. Seria ento a cincia do cientista a nica referncia para os contedos disciplinares? Ao que parece, a transposio direta no seria suciente. Devem-se assumir tambm as prticas como referncias e formas de articular teoria e prtica, pois, alm das pesquisas cientcas, fundamentais ou aplicadas, tambm as prticas domsticas, industriais, ideolgicas, polticas e tecnolgicas, bem como suas funes sociais, devem servir s escolhas didticas. Busca-se proporcionar aos alunos a aquisio de elementos de compreenso e/ou manuseio de aparatos tecnolgicos, de mquinas e dos processos de produo industrial e outras atividades prossionais. Essa pode ser uma forma de se entender a preparao para o trabalho da qual trata a Lei de Diretrizes e Bases da Educao Nacional/1996 e as Diretrizes Curriculares Nacionais do Ensino Mdio. A tecnologia merece ateno especial, pois aparece nos Parmetros Curriculares como parte integrante da rea das Cincias da Natureza. Observa-se que nos livros didticos os contedos disciplinares selecionados e trabalhados pouco tm

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a ver com a tecnologia atual, cando essa, na maioria das vezes, como simples ilustrao. Deve-se tratar a tecnologia como atividade humana em seus aspectos prtico e social, com vistas soluo de problemas concretos. Mas isso no signica desconsiderar a base cientca envolvida no processo de compreenso e construo dos produtos tecnolgicos. A to falada metfora da alfabetizao cientca e tecnolgica aponta claramente um dos grandes objetivos do ensino das cincias no nvel mdio: que os alunos compreendam a predominncia de aspectos tcnicos e cientcos na tomada de decises sociais signicativas e os conitos gerados pela negociao poltica. Uma formao crtica exige por parte dos sujeitos a capacidade de discutir abertamente questes resolvidas em instncias tecnocrticas, que devem estar amparadas em slida formao cientca e tecnolgica. Implica que seja possvel discriminar o domnio da cincia e A noo de competncias da tecnologia do debate tico e poltico. deve ser entendida como O critrio utilizado para a compra de uma possibilidade de uma geladeira contm aspectos tcnicos colocar a relao didtica e pode ser auxiliado por conhecimentos em perspectiva. cientcos. Mas quando se solicita a posio do cidado sobre clonagem, pesticidas agrcolas ou uso de energia nuclear, entra tambm o debate tico e poltico, na medida em que esse uso compromete a prpria existncia humana. Mesmo quando se defende a clonagem teraputica ou o uso pacco da energia nuclear, devem ser discutidos os perigos potencialmente envolvidos nisso, j que a histria deixou ensinamentos to dolorosos quanto os escombros de Hiroshima. A formao por competncias deve ter por objetivo possibilitar ao sujeito opinar nessas esferas. A concepo da noo de competncias como problema de referncia dos saberes escolares d sentido aos contedos escolares e vai alm. A noo de competncias deve ser entendida como uma possibilidade de colocar a relao didtica em perspectiva. Devem-se evitar oferecer aos alunos contedos especcos fragmentados ou, em muitos casos, tcnicas de resoluo de exerccios, j que o retorno ser isso mesmo: contedos reprodutivos, na melhor das hipteses, de pouca utilidade fora dos bancos escolares. Projeto de ensino A relao didtica se estabelece na escola quando h um projeto de ensino com inteno de aprendizagem. Essa relao construda por um conjunto de regras

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implcitas e explcitas, que determinam as obrigaes e as responsabilidades que ocorrem entre professor e aluno. Nessa relao didtica existe um terceiro componente: o conhecimento a ser ensinado, que j passou por uma srie de transformaes e redues at chegar nos programas e nos livros didticos. Assim, a relao didtica muito complexa e vai alm das variveis professor, aluno e contedo porque: o professor depende de seus colegas de prosso, de seu ambiente de trabalho, e tem seus saberes, concepes e convices j estabelecidos; e o aluno depende do contexto social; de suas expectativas para alcanar objetivos pessoais e coletivos; e das relaes entre aluno e professor; aluno e aluno; aluno e classe; aluno e conhecimentos a serem ensinados; aluno e saberes individuais; e aluno e representaes sociais. Verica-se que a relao didtica formada por um complexo conjunto de elementos que inuenciam diretamente seu funcionamento. possvel sintetizar essa relao no seguinte esquema,2 em que A representa o aluno; P, o professor; S, o saber a ser ensinado, que no coincide necessariamente com o saber trabalhado na sala de aula; e Sa, as situaes de aprendizagem.Esquema 1

AInterao didtico-pedaggica Estratgias de aprendizagem

Sa P S

Elaborao de contedos e metodologias

Essas interaes e mediaes esto relacionadas entre si, e ocorrem dentro de um sistema didtico que, por sua vez, est inserido em um sistema de ensino, com inuncias internas e externas. Sendo que toda relao didtica est denida dentro da escola, a noo de competncias pretende que o aluno mobilize seus conhecimentos em contextos distintos daquele em que aprendeu, para poder se relacionar com o mundo. Num tempo posterior, a escola e o professor saem de cena, e espera-se que o aluno continue a manter uma relao independente com os saberes escolares construdos.2

Adaptado de ASTOLFI, J.-P. et al. Mots-cls de la didactique des sciences. Bruxelles: De Boeck & Larcier, 1997. p.72.

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No incio da relao didtica, o professor precisa identicar meios de fazer emergir os conhecimentos que os alunos mobilizam para responder a determinadas situaes. Para isso, situaes de aprendizagem que os exponham a problemas que exijam a elaborao de hipteses e a construo de modelos esto prximas No incio da relao do que sugerem as competncias. didtica, o professor precisa Quando os contedos disciplinares identicar meios de fazer so apresentados nos livros didticos, emergir os conhecimentos a seqncia das transformaes pelas que os alunos mobilizam quais passaram acaba mascarando dipara responder a culdades, e eles so mostrados to simdeterminadas situaes. plicados que parece ao aluno ser necessrio apenas decorar as frmulas e os principais conceitos, sem a necessidade de perguntar de onde vieram esses saberes. Ser que Newton expressou a lei da gravitao universal tal como a conhecemos, F = GMm/r2 ? Foi essa a forma originalmente proposta por ele? Tempo didtico, tempo de aprendizagem e relao didtica signicativa Outro fator relevante na relao didtica: o tempo. Os programas esto limitados a um cronograma denido, no qual so distribudos os bimestres, as aulas e o que dever ser ensinado. Mas os alunos tm um tempo de aprendizagem prprio que nem sempre coincide com o tempo didtico. Assim, o acmulo de informaes no garante a aprendizagem em novas situaes que certamente se do em um tempo posterior escola, quando a pertinncia dos saberes escolares colocada prova. com isso que a noo de competncias se preocupa quando enfoca a relao didtica. Ou seja, a escola teria de repensar seu ensino no para funcionar somente dentro de seus muros, mas para ultrapass-los e possibilitar aos seus alunos a continuidade de sua apren