organização e gestão da educação escolar indígena - cnte e gesto da educao... ·...

46
Organização e Gestão da educação escolar indígena Wanderley Cardoso Terena Licenciado e bacharelado em história Mestre em Desenvolvimento Local Doutor em História

Upload: trinhtuong

Post on 08-Nov-2018

224 views

Category:

Documents


0 download

TRANSCRIPT

Organização e Gestão da educação escolar indígena

Wanderley Cardoso TerenaLicenciado e bacharelado em história

Mestre em Desenvolvimento Local

Doutor em História

As organizações do Estado brasileiroresponsáveis pela Educação Escolar Indígena

• No Brasil Colônia a educação formal dosindígenas esteve primeiramente – de 1549 a1757 – sob a responsabilidade dosmissionários católicos, principalmente padresjesuítas, representantes da Companhia deJesus, os quais foram legitimados e apoiadospela Coroa Portuguesa e pelosadministradores locais.

• No Período Pombalino (1750 a 1777) porcontrariar os interesses dos colonizadores e daCoroa Portuguesa, a Companhia de Jesus foiexpulsa do Brasil, sendo instituído o Regimedo Diretório. Diretor nomeado pelogovernador.

• Marquês de Pombal pretendia instituir nolugar da “educação pública religiosa”, vigenteaté então, uma “educação pública estatal”.

• Em 1798, diante das constantesirregularidades e abusos cometidos por algunsdiretores contra os índios – dentre outras,ações de violência e a invasão das terras dasaldeias - é revogado o Diretório dos Índios.

• De acordo com Cunha (1992), apesar deextinto, o Diretório dos Índios ficouoficiosamente em vigor no período entre 1798a 1845.

• Em algumas províncias, como Ceará e Rio deJaneiro, ele foi oficialmente restabelecido.Outras províncias, como a do Maranhão,passaram a definir suas próprias diretrizes eoficializaram o regime das missões, queconsistia na permissão legal para o retorno demissionários ao Brasil sem obstáculos à suaatuação.

• Mesmo depois da instituição do Regulamentodas Missões, em 1845 (AMOROSO, 2001), osDiretórios dos Índios foram mantidos comdiretores militares naquelas províncias onde onúmero de missionários não foi suficientepara suprir a demanda e os aldeamentos eramlocalizados em áreas de fronteira.

• No Brasil Império, os missionários foramreintroduzidos oficialmente no territóriobrasileiro para de novo tratarem do governodos índios aldeados e de sua educação formal,por meio do Decreto n.º 426/1845, quedefiniu o Regulamento das Missões.

• Mas aos missionários católicos (contratados)desse período não se deu total autonomia.Assim sendo,de 1845 a 1910, o Estado dividiucom várias ordens religiosas católicas aadministração da questão indígena, incluída aía responsabilidade pela educação formal.

• Com a instauração e consolidação do regimerepublicano e da sistematização pelo Estadode uma política indigenista baseada nos ideaispositivistas, é instituído, pelo Decreto nº8.072, de 20 de julho de 1910, o Serviço deProteção aos Índios e Localização deTrabalhadores Nacionais, mais tardedenominado Serviço de Proteção aos Índios(SPI). Esse foi o primeiro órgão estatalformalmente instituído em separado dasordens eclesiásticas, com a finalidade de geriras relações entre os povos indígenas.

• Da data de sua criação até sua substituição,em 1967, pela Fundação Nacional do Índio(Funai), o SPI funcionou vinculado a diferentesministérios. De 1910 a 1930 esteve vinculadoao Ministério da Agricultura, Indústria eComércio, sendo que, até 1918, além dogoverno dos índios teve a tarefa de fixação nocampo da mão-de-obra rural não estrangeira.

• Em 1931 o SPI tornou-se uma seção doDepartamento do Povoamento no Ministériodo Trabalho, Indústria e Comércio, sendo, em1936, vinculado ao Ministério da Guerra, naInspetoria Especial de Fronteiras. Em 1939, oSPI volta a subordinar-se ao Ministério daAgricultura (LIMA, 1992:155-72).

• Percebe-se por esse histórico que a questão daproteção dos índios esteve sempre intimamenterelacionada à questão da terra, seja no sentido decolonizar, ocupar e demarcar o território, seja parafazer essa terra produzir, transformando o índio emtrabalhador rural.

• Como afirma Lima (1992), era tarefa do SPI atrair epacificar os índios,bem como conquistar suas terrassem destruí-los, a fim de que eles se transformassemna mão-de-obra necessária à execução dos ideais dedesbravamento e preparação das terras nãocolonizadas para uma posterior ocupação definitivapelos não-índios.

• Na área educacional, a ênfase no trabalhoagrícola e doméstico visava à incorporaçãodos indígenas à sociedade nacional comopequenos produtores rurais capazes de seauto-sustentarem.

• O SPI iria doutrinar os índios, “fazendo-oscompreender a necessidade do trabalho”,convertendo-os em cidadãos produtivos. Emsíntese, era nos termos do Regulamento doSPI, aprovado pelo Decreto nº 736/1936, quese sustentava a aplicação da pedagogia danacionalidade e do civismo.

• A extinção do SPI e a criação da Funai tiveramcomo motivação diversos fatores, dentre osquais destacam-se a implantação da ditaduramilitar, que desencadeia a redefinição daburocracia estatal, e a necessidade de sedifundir internacionalmente uma visãopositiva acerca das políticas e ações do Estadobrasileiro voltadas às populações indígenas,pois pesava contra o Brasil a acusação deextermínio cultural desses povos.

• A política educacional da Funai estruturou-sefundamentada nos Programas de DesenvolvimentoComunitário (PDC), respaldados pela ONU, e nasações de implantação do ensino bilíngüe nas escolasindígenas.

• Na prática, de acordo com Santos (1975), as escolassituadas em áreas indígenas foram estruturadas efuncionavam como as escolas rurais de outras partesdo Brasil, ou seja, distantes das realidades das

diferentes comunidades indígenas.

A constituição de 1988

• Art. 210

• § 2º O ensino fundamental regular seráministrado em língua portuguesa, asseguradaàs comunidades indígenas também autilização de suas línguas maternas eprocessos próprios de aprendizagem.

• Em 1991, um conjunto de Decretosdescentraliza para outros órgãos públicosdiversas ações no âmbito indigenista, atéentão de exclusiva responsabilidade da Funai.

• Essa mudança institucional na condução dapolítica indigenista é um marco importante,pois envolve novas agências do Estado nocampo da definição e execução das políticasPúblicas.

• O Decreto Presidencial nº 26/1991, o MECpassa a ser responsável, em todos os níveis emodalidades de ensino, pela definição depolíticas de educação escolar indígena dequalidade, fundamentada nos princípiosconstitucionais, e os Estados e os Municípiospassam a ser responsáveis pela execuçãodesta política educacional.

• Para definir essa política de educação escolar indígena, o MECtomou como parâmetro o trabalho pioneiro realizado na área,a partir da metade da década de 1970, por organizações não-governamentais indígenas e de apoio aos povos indígenascriando, além disso, espaços para a participação da sociedadecivil nessas definições.

• Assim, no intuito de contar com assessoria, possibilitar aparticipação dos envolvidos com a questão indígena eorientar os sistemas de ensino, o MEC, em julho de 1992,instituiu o Comitê Nacional de Educação Indígena, compostopor representantes de organizações não-governamentais,

universidades e representantes indígenas.

• Ainda em 1991, foi estruturada a Coordenação-Geralde Apoio às Escolas Indígenas (CGAEI) no âmbito daentão Secretaria de Ensino Fundamental (SEF) paracoordenar, acompanhar e avaliar as açõespedagógicas da educação escolar indígena no país.

• Além de mobilizar a atuação do Comitê e promover arealização de encontros regionais e semináriosnacionais para discussão e sensibilização dossistemas de ensino, com a participaçãorepresentantes indígenas, das organizações não-

governamentais e de docentes das universidades.

Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional

• (Lei nº 9.394/96) Art. 78. O Sistema de Ensinoda União, com a colaboração das agênciasfederais de fomento à cultura e de assistênciaaos índios, desenvolverá programasintegrantes de ensino e pesquisa, para aoferta de educação bilíngüe intercultural aospovos indígenas.

O art. 78 afirma que a educação escolar para ospovos indígenas deve ser intercultural ebilíngüe para a reafirmação de suasidentidades étnicas, recuperação de suasmemórias históricas, valorização de suaslínguas e ciências, além de possibilitar oacesso às informações e aos conhecimentosvalorizados pela sociedade nacional.

• art. 79 prevê que a União apoiará técnica efinanceiramente os sistemas de ensino estaduais emunicipais no provimento da educação interculturalàs sociedades indígenas, desenvolvendo programasintegrados de ensino e pesquisa (...) planejados comaudiência das comunidades indígenas (...), com osobjetivos de fortalecer as práticas socioculturais e alíngua materna (...) desenvolver currículos eprogramas específicos, neles incluindo conteúdosculturais correspondentes às respectivascomunidades (...), elaborar e publicarsistematicamente material didático específico ediferenciado.

Parecer 14/1999 CNE

• Criação da categoria Escola Indígena;

• Estrutura e funcionamento da EscolaIndígena;

• Definição das respectivas competências entrea União, os estados e os municípios;

Resolução 03/1999 CEB/CNE • “Estabelece, no âmbito da Educação Básica, a

estrutura e o funcionamento das escolasindígenas, reconhecendo-lhes a condição deescolas com normas e ordenamento jurídicopróprios e fixando as diretrizes curriculares doensino intercultural e bilíngüe, visando àvalorização plena das culturas dos povosindígenas e a afirmação e manutenção de suadiversidade étnica”.

• Em 2002, o Comitê Nacional de Educação EscolarIndígena foi substituído pela Comissão Nacional deProfessores Indígenas, formada por trezeprofessores.

• Em 2004, em atendimento à propostas ereivindicações do movimento indígena essaComissão foi transformada em Comissão Nacional deEducação Escolar Indígena, passando a ser compostapor professores e lideranças indígenas, por entendero movimento que ela não deveria ser formadaapenas professores.

• A Coordenação-Geral de Apoio às EscolasIndígenas (CGAEI) atuou até julho de 2004,quando, por meio do Decreto Presidencial nº5.159/2004, foi transformada emCoordenação-Geral de Educação EscolarIndígena (CGEEI) vinculada a Secretaria deEducação Continuada, Alfabetização eDiversidade e Inclusão(Secadi).

Desafios• i) a falta de regulamentação sobre o regime decolaboração que rege a relação entre as três esferasde governo; ii) a descontinuidade da ação dossistemas de ensino, a difi culdade de estabelecer umdiálogo intercultural, ouvindo e compreendendo asperspectivas indígenas;

• iii) problemas de gestão que mantêm as escolasindígenas sem receber insumos básicos para seufuncionamento, como merenda escolar e materialdidático; iv) falta de transparência na aplicação dos

recursos públicos.

Coneei• Nesse sentido, a proposição do movimento indígena

de criação de um Sistema de Educação EscolarIndígena, com mecanismos legais e normativos quegarantam a autonomia tão buscada pelas escolasindígenas e assegurem a aplicação dos recursospúblicos disponíveis para a educação escolar.

• Em novembro/2009 foi realizada a I ConferênciaNacional de Educação Escolar Indígena - CONEEICongresso dos professores indígenas que defendeuesse encaminhamento.

Noticia – Conae 2010 e Indios• “Representantes de comunidades indígenas

estão mobilizados na Conferência Nacional deEducação (Conae), que termina no fim datarde de hoje (1°) em Brasília. Eles recolhemassinaturas para uma moção em defesa dasresoluções da Conferência de EducaçãoEscolar Indígena. Realizado em 2009, oencontro preparatório envolveu cerca de 40mil indígenas.

• “Entre as reivindicações das comunidades estáa criação de um sistema nacional de educaçãovoltado para esses povos, com fundo definanciamento próprio. Natalina Messias,coordenadora das escolas indígenas deRoraima e liderança macuxi na Raposa Serrado Sol (RR), defende a criação de um sistemacom autonomia e participação dascomunidades”.

• A regulamentação desse sistema gerariamecanismos legais, normativos e gerenciaisque tornariam mais claro para as Secretariasde Educação o tratamento que essas escolasdevem receber. Hoje, no máximo, são feitasadaptações em um quadro legal pré-existenteque não condiz com as perspectivas daeducação escolar intercultural.

Formação de Professores• O Mec, desde 2003, vem priorizando um conjunto de

ações que visam impulsionar a formação deprofessores indígenas em nível superior, habilitando-os para a docência nos anos finais do EnsinoFundamental e no Ensino Médio.

• O Prolind contou com recursos da Sesu, repassadospara as ações de custeio das Universidades Federais.O Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), financiador do Programa Diversidade na Universidade,acolheu as propostas da CGEEI/Secad dereformulação das bases do programa, pensadasinicialmente para oferecer cursos de vestibular e

promover o acesso indígena às universidades.

Formação em nível médio• Em MS há dois cursos um para os

Guarani/Kaiowá denominado Ará Verá e ooutro denominado Povos do Pantanal paraatender demais etnias.

• Cada turma terá em 2015 40 cursisitas.

• Há um Centro de formação que abriga o cursoe cuida da parte administrativa e pedagógica.

Ensino Médio Intercultural• Promover a implantação do Ensino Médio

intercultural nas escolas indígenas a partir dosprincípios da educação diferenciada comodireito educacional dos povos indígenas.

• A ocupação desses alunos, em alguns casos,era de provedor do sustento da família, sejana roça ou como feirante, ou mesmotrabalhador em empresas próximas à Aldeia,como foi o caso dos terenas nos municípios deDois Irmãos do Buriti e Sidrolândia.

• o Curso de Ensino Médio apoiou-se no eixometodológico Língua- Cultura-Terra centrada naAlternância Regular de Estudos.

• Na parte diversificada do currículo, além dadisciplina Língua Terena, foram inseridas asdisciplinas Módulo de Produção, que tinha o objetivode trabalhar conteúdos relacionados à prática docotidiano da aldeia no provento de seu sustento, eQuestões Indígenas, cujo conteúdo estaria ligado àsdiscussões sobre os índios do Brasil e do Estado deMato Grosso do Sul nos vários aspectos: educação,

saúde, fundiário, cultural e outros.

Projetos de apoio / Jovem de Futuro

• Programa Ensino Médio Inovador- PROEMI/Jovem de Futuro -Rosane Kassay que- entre as escola por ela supervisionada - aEeiem Pascoal Leite Dias conseguiu o melhor índice decrescimento em Língua Portuguesa - 39,8%- ultrapassando ameta de 25% almejada pelo programa- e o segundo melhoríndice em Matemática- 15,9%.

• Professora Terena Marcilene Gabriel que acompanhou aturma durante os três anos do Projeto em Língua Portuguesae Arcenio Dias e Carmencilda Damasceno Silva Severo (não-índia) pelo trabalho em Matemática,

• Coordenadora Telma Dias Terena no acompanhamentopedagógico.

• Apoio para publicação;

• Visita dos alunos a museus pontos turísticoscomo o Parque das nações indígenas emCampo Grande;

• Viagem de professores;

• Instalação da rádio escola.

Plano Nacional de Educação

• Art. 8º

• § 1º Os entes federados deverão estabelecernos respectivos planos de educaçãoestratégias que:

• II - considerem as necessidades específicas daspopulações do campo e das comunidadesindígenas e quilombolas, asseguradas aequidade educacional e a diversidade cultural;

Meta 7 • Desenvolver currículos e propostas pedagó-

gicas específicas para educação escolar paraas escolas do campo e as comunidadesindígenas e quilombolas, incluindo osconteúdos culturais correspondentes àsrespectivas comunidades e considerando ofortalecimento das práticas socioculturais e dalíngua materna de cada comunidade indígena,produzindo e disponibilizando materiaisdidáticos específicos, inclusive para os/asalunos/as com deficiência;

Meta 12 - educação superior

• 12.13) expandir atendimento

específico a populações do

campo, comunidades indígenas e

quilombolas, em relação a

acesso, permanência, conclusão

e formação de profissionais

para atuação nestas populações;

Resolução 5/2012 do Conselho nacional de educação

• Art. 8º A Educação Infantil, etapa educativa e decuidados, é um direito dos povos indígenas que deveser garantido e realizado com o compromisso dequalidade sociocultural e de respeito aos preceitosda educação diferenciada e específica.

• § 1º A Educação Infantil pode ser também umaopção de cada comunidade indígena que tem aprerrogativa de, ao avaliar suas funções e objetivos apartir de suas referências culturais, decidir sobre aimplantação ou não da mesma, bem como sobre aidade de matrícula de suas crianças na escola.

• Art. 9

• § 2º O Ensino Fundamental deve promover oacesso aos códigos da leitura e da escrita, aosconhecimentos ligados às ciências humanas,da natureza, matemáticas, linguagens, bemcomo do desenvolvimento das capacidadesindividuais e coletivas necessárias ao convíviosociocultural da pessoa indígena com suacomunidade de pertença e com outrassociedades.

• Art. 10 O Ensino Médio, um dos meios defortalecimento dos laços de pertencimentoidentitário dos estudantes com seus grupossociais de origem, deve favorecer acontinuidade sociocultural dos gruposcomunitários em seus territórios.

• Art. 11 A Educação Especial é uma modalidade deensino transversal que visa assegurar aos estudantescom deficiência, transtornos globais dodesenvolvimento e com altas habilidades esuperdotação, o desenvolvimento das suaspotencialidades socioeducacionais em todas asetapas e modalidades da Educação Básica nasescolas indígenas, por meio da oferta deAtendimento Educacional Especializado (AEE).