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CRÍTICA DA RAZÃO ESTATAL O Estado Moderno em África nas Relações Internacionais e Ciência Política O caso de Cabo Verde ODAIR BARROS-VARELA

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CRÍTICA

DA RAZÃO

ESTATAL

O Estado Moderno em África

nas Relações Internacionais

e Ciência Política

O caso de Cabo Verde

CR

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ÃO

ES

TA

TA

L

Este livro, apoiado em instrumentos analíticos das Relações Internacio-

nais e da Ciência Política, e também secundada pela perspectiva dos

Estudos Pós-coloniais, procede, primeiramente, a uma contextualização

socio-histórica crítica da emergência do Estado moderno no locus de enun-

ciação de Cabo Verde, ou seja, em África, incidindo na análise da visão

hegemónica acerca do papel do que se pactuou chamar de «moderni-

dade» na configuração estatal neste continente. Analisa-se, igualmente,

mediante incursões analítico-normativas, a problemática da estatalidade

em África, procurando lançar miradas sobre as heranças pré-coloniais, colo-

niais, o período após as independências e os desenvolvimentos contempo-

râneos, nomeadamente, no campo da Sociedade Internacional e das Éticas

Internacionais, que contribuem para que, tal como em outras partes do

globo, este continente tenha as principais características da sua estatali-

dade caldeadas na sua história tanto milenar como recente.

Este trabalho engloba, por fim, uma análise embrionária do caso cabo-

-verdiano. A escolha deste Estado prende-se fundamentalmente com facto

de apresentar-se com a seguinte singularidade: por um lado, constatou-se

que as características que encerra provam a inadequação da abordagem

hegemónica na catalogação de determinados Estados como sendo «frágeis»,

«falhados» ou «colapsados». Por outro, demonstra-se que o seu percurso

pós-colonial – considerado, por exemplo, pelas principais instituições inter-

nacionais como sendo de relativo sucesso em termos do que se convencio-

nou chamar-se de governação – deve-se principalmente ao facto da solu-

ção estatal adoptada ter-se mostrado para a sua elite dirigente, tal como

ocorreu em outros casos, como a melhor via a seguir, enquadrando-se na

abordagem normativa inovadora que se propõe aqui para a análise desse

tipo de casos.

O DA I R B A R R O S -VA R E L A

OD

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BA

RR

OS

-VA

RE

LA

Odair Bartolomeu Barros Lopes Varela

Professor Auxiliar na Universidade de Cabo Verde

[Uni-CV], onde, actualmente, também desempenha

as funções de Presidente da Comissão Executiva da

Escola de Negócios e Governação (ENG). É Professor

Convidado no Instituto Superior de Ciências Jurídi-

cas e Sociais [ISCJS] e em outras Universidades nacio-

nais e estrangeiras. É Licenciado em Relações Inter-

nacionais, Mestre e Doutor em Sociologia pelo Centro

de Estudos Sociais (CES) e Faculdade de Economia da

Universidade de Coimbra (FEUC); Realizou um Pós-

-doutoramento em Ciência Política na Faculdade de

Direito e Ciência Política da Université du Québec à

Montreal (UQAM-Canadá). É investigador associado

em diversos Centros de Pesquisa nacionais e interna-

cionais e é Presidente do Centro de Produção e Pro-

moção de Conhecimentos (CeProK), com sede em

Cabo Verde. É vencedor do Prémio Fernão Mendes

Pinto (edição 2013) atribuído pela Associação das Uni-

versidades de Língua Portuguesa (AULP), em parceria

com a Comunidade dos Países de Língua Portuguesa

(CPLP), pela Tese de Doutoramento defendida na

Universidade de Coimbra em 2012, trabalho que

também recebeu, em 2013, uma Menção Honrosa no

Prémio CES para Jovens Cientistas Sociais de Língua

Portuguesa. De entre as diversas publicações nacio-

nais e internacionais destacam-se os livros

(2014, co-organização e co-autoria) e

(2017).

As Rela-

ções Externas de Cabo Verde. (Re)leituras Contemporâ-

neas Mesti-

çagem Jurídica? O Estado e a Participação Local na Jus-

tiça em Cabo Verde. Uma Análise Pós-Colonial

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CRÍTICA

DA RAZÃO

ESTATAL

O Estado Moderno em África

nas Relações Internacionais

e Ciência Política

O caso de Cabo Verde

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À E.S.V., Núbia e Amina

Para a minha família

O ser humano deverá apenas tomar conta do chão que pisa e não procurar subjugá-lo e explorá-lo, tentando marginalizar e subalternizar os outros ocupantes desse chão global.

O.B.V.

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O D A I R B A R T O L O M E U B A R R O S L O P E S V A R E L A

Crítica da Razão Estatal

O Estado Moderno em África nas Relações Internacionais

e Ciência Política. O Caso de Cabo Verde

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É expressamente proibido reproduzir, no todo ou em parte, sob qualquer forma ou meio, NOMEADAMENTE FOTOCÓPIA, esta obra. As transgressões serão passíveis das penalizações previstas na legislação em vigor.

Editor: Pedro Cardoso Livraria

FICHA TÉCNICA

Título: Crítica da Razão Estatal – O Estado Moderno em África nas Relações Internacionais e Ciência Política. O Caso de Cabo Verde Autor: Odair Bartolomeu Barros Lopes Varela Capa: Pedro Mota © Autor. Direitos de edição reservados à Pedro Cardoso Livraria para edição em Língua Portuguesa

1ª Edição – Dezembro de 2017. Impressão e acabamentos: Cafilesa – Soluções Gráficas, Lda. ISBN: 978-989-99870-9-8 Depósito Legal: 434528/17 Tiragem: 500 Exemplares

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Í n d i c e

Prefácio 9 Nota Introdutória 15 Introdução Geral 17

Capítulo I

Crítica da estatalidade ocidental. Uma análise do Estado moderno em África

Introdução – As origens da estatalidade moderna 27 1.1. A estatalidade em África: o regresso colonial 33 1.2. O uso da violência como instrumento de imposição estatal 38 1.3. O panorama após a descolonização. Subsequência

do avigoramento ou declínio da estatalidade? 44 1.3.1. As consequências de uma pesada herança. Breve olhar 49

1.4. A paisagem política contemporânea. O Estado (moderno) na África Subsariana 55 1.4.1. A transição histórica ainda não terminou:

a (re)emergência do Estado 66

1.5. Nu Djunta mô. Por um normativismo contextual 82 1.5.1. As ruínas da (re)imaginação. Formas alternativas

de organização política, económica e social 94

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Capítulo II

As teses sobre Estados «frágeis», «falhados» ou «colapsados». Apreciação conceptual e doutrinal

Introdução – A consubstanciação do Estado Moderno Ocidental 109 2.1. Enquadramento espaço-temporal 113 2.2. Fragilidade, falhanço, colapso e...? 116 2.3. O conceito de soberania: a persistência do «colete-de-forças» 129 2.4. Os paradoxos do nacionalismo: critério de estatalidade

ou de exclusão? 140 2.4.1. O papel da ideologia nacionalista 142 2.4.2. A doutrina da segurança nacional: solução e/ou causa? 148 2.4.3. A concepção da segurança humana. Entre a emancipação

e a re-colonização 151

Capítulo III

A sociedade internacional em acção. Intervenções externas humanitárias: legitimidade e limites

Introdução 159 3.1. A intervenção externa multilateral: o caso do intervencionismo

humanitário 162 3.1.1. O papel da Organização das Nações Unidas (ONU):

a (des)governação em acção e/ou a acção da (des)governação 165 3.1.2. Uma visão crítica da intervenção externa multilateral 170

3.2. A emergência da intervenção externa unilateral: oscilando entre o humanitarismo e a hegemonia 177 3.2.1. As implicações negativas do unilateralismo intervencionista 190

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3.3. Para além da fórmula intervencionista multilateral e unilateral 194

3.4. O panorama actual: (des)ordem mundial de Estados excluídos ou ordem mundial desagregada? 198 3.4.1. Da ordem mundial pós-colonial à ordem mundial regional 200 3.4.2. Que ordem, que (des)ordem? 205 3.4.3. O papel da globalização: redução e/ou re-direccionamento

do Estado? 208 3.4.4. A governação global neoliberal: reforço da periferização

dos Estados do Sul 216

Capítulo IV

Éticas internacionais em confronto: o pluralismo e o solidarismo face à questão da fragilidade, falhanço ou colapso estatal

Introdução – Moralidade, diversidade e imperfeição 229 4.1. A posição defensiva da ética internacional pluralista 231

4.1.1. A Consubstanciação da societas de Estados no projecto pluralista da sociedade internacional global 233

4.2. A posição progressiva da ética internacional solidarista 240 4.2.1. A diluição da universitas de Estados no projecto

solidarista da Cosmopólis 243 4.3. Para lá do pluralismo e solidarismo ético: um olhar crítico 250

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Capítulo V

O caso de Cabo Verde: entre a singularidade e o mito da especifidade

Introdução 261 5.1. 1975-1990: As continuidades estatais modernas

e/ou coloniais 265 5.1.1. O aparato institucional estatal: uma síntese moderna 276 5.1.2. A classe política dirigente: um cosmopolitismo

hegemónico focalizado para a sobrevivência? 286

Conclusão: à procura de uma governação 291 global pós-colonial 291 Bibliografia 305 Lista de acrónimos 323

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P r e f á c i o 1

Para um cientista político canadense que sou, mesmo que de origem latino-americano, este livro do Odair é antes de tudo uma provocação, com críticas agudas e reflexões profundas que recusam cair no con-vencional. Mesmo não sendo muito extenso, este livro é uma obra ambiciosa e multifacetada. Se o tom do Odair é às vezes ácido, eu sempre vejo nele a possibilidade de dialogar e de fazer evoluir a aná-lise política. Só por conta disso, este livro já seria muito bem-vindo.

A meu ver, o primeiro elemento da contribuição deste livro, e o mais importante, já está no título: Crítica da Razão Estatal. Odair procura fazer uma nova reflexão, por fora das tradições acadêmicas ocidentais, sobre o papel do Estado na organização da vida política de diversas sociedades, sobretudo na África mas também em outras partes do mundo.

Essa discussão abrange não só as reflexões clássicas sobre o Estado como monopólio do constrangimento legítimo ou como o conjunto de território, governo e população e assim ator preponderante do sistema internacional (Vestefália), mas também propostas mais novas, basea-das em visões pluralistas, solidárias e comunitárias da vida política (Cosmópolis), passando pelos herdeiros da teoria da dependência. Odair examina e critica tudo com paciência e precisão, indicando os alcances e os limites de cada perspetiva. Seu intuito é o de propor uma análise que nos permita estudar fenômenos como a desterritorializa-ção, a privatização dos espaços públicos, as contradições inerentes ao conceito de Estado-nação.

Sua proposta de sair do paradigma do Estado sem romper necessa-riamente com ele – situando-se, portanto, entre essas duas posições –, (1) O prefácio foi escrito na versão brasileira da língua portuguesa pelo Professor Julián

Durazo-Herrmann.

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não é um meio-termo nem uma tentativa de conciliação, mas sim um esboço de uma nova pista de reflexão, baseado em uma grande revisão da literatura existente e também à procura de novas trilhas. Este livro é curto demais para desenvolver todos os caminhos abertos por essa perspectiva inovadora, mas dá para começarmos a imaginar uma nova aproximação com o papel e a pertinência das diversas formas de orga-nização política no mundo. Num momento em que a reforma política do Estado está na agenda em muitos países da América à África, pas-sando pela Europa, essa pista que Odair nos oferece é pertinente e tem um ótimo timing.

Ao mesmo tempo, e na contracorrente das tendências atuais, Odair nos lembra que a Ciência Política e as Relações Internacionais são apenas duas faces distintas de uma única disciplina e que os elos empíricos e analíticos entre elas são extremamente fortes. Não con-vém esquecer tais laços nem apagá-los e sim desenvolvê-los, pois uma compreensão apropriada da vida política de um país passa pelo enten-dimento de suas relações exteriores bem como de seus equilíbrios internos. A proposta do Odair de ir para além do Estado como con-ceito central da Ciência Política e das Relações Internacionais é um bom exemplo dessa perspetiva. A possibilidade de afirmação de um Estado-nação moderno ou de construção de outras alternativas políti-cas está no cruzamento dessas duas dimensões. O argumento do livro é apenas um esboço dessa análise e ainda precisamos – junto com dele – continuar essa reflexão e descobrir e explorar novos pontos de con-tato entre essas duas dimensões.

Sempre a partir desse cruzamento da Ciência Política e das Rela-ções Internacionais, Odair propõe jogar fora as noções de fragilidade, falhanço e colapso estatal por serem inadequadas ao estudo dos fenô-menos apontados. Para além da falta de consenso e mesmo da possi-bilidade de desenvolver nuances específicas no uso desses termos e assim resolver essa polissemia, Odair rejeita-os por serem a concreti-zação de uma visão normativa das relações políticas (tanto internas quanto internacionais) que apenas reproduz analiticamente e empirica-mente a hierarquia atual do poder. Se o autor se refere constantemente a esses termos, isso é devido ao uso que eles têm nas análises contem-porâneas e são sempre «grampeados» para indicar a distância do autor com esses conceitos.

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O elemento mais provocativo da exposição do Odair é precisa-mente sua relação com a dimensão normativa da análise política. Ele investiga as conseqüências do paradigma atual do Estado-nação, que apaga a possibilidade de um desenvolvimento político contemporâneo que rompa com a razão estatal e denuncia sua contribuição para a reprodução da hierarquia do poder internacional, com os países oci-dentais no topo e os países africanos e latino-americanos em baixo da escala. Porém, Odair não faz a apologia da neutralidade axiológica de Weber, pois está em busca de critérios de análise que permitam às sociedades africanas, latino-americanas e outras procurarem seus pró-prios caminhos de desenvolvimento político, estejam eles marcados ou não pela presença do Estado, seja qual for sua natureza. Afinal, como afirma o autor, o Estado metarregulador neoliberal não tem razão de ser a única avenida, nem analítica nem normativa, para o desenvolvimento político de nossas sociedades.

Até aqui, tudo bem. Mas, bom crítico, o Odair cobra também de seus colegas acadêmicos as pegadas de posição políticas mais do que analíticas, sejam elas no campo da teoria ou da reflexão empírica. Sem ser tão explícito quanto quiséssemos, o autor nos propõe uma análise científica, sistemática e organizada, sempre enquadrada pela teoria e seu confronto constante com a realidade empírica (será que Odair é um comparativista sem nos dizer?). É claro que ele está preocupado não apenas com a objetividade da análise, mais também com a possi-bilidade do diálogo científico. Esse aí é um elemento-chave, porém tácito, da contribuição do livro ao debate sobre o papel da análise engajada na reflexão científica. Instamo-lo aqui a prosseguir essa reflexão frutífera e a propor-nos novas contribuições em trabalhos futuros.

As discussões do Odair produzem em mim, que sou tanto cientista político quanto latino-americano, uma nova reflexão sobre conceitos aceitos sem controvérsias há muito tempo. Explico-me: todo interna-cionalista latino-americano aprende que os conceitos de igualdade, reciprocidade entre os Estados (a doutrina Calvo) e de não-interven-ção nos assuntos internos de outros Estados (a doutrina Estrada) são contribuições centrais da América latina às relações internacionais, pois serviram para proteger a consolidação desses Estados que con-quistaram e afirmaram sua independência no século XIX. A Conven-ção de Montevidéu de 1933 – que o Odair examina neste livro –, é

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precisamente a culminação do processo de inserção dos conceitos de não-intervenção e de igualdade entre Estados no Direito Internacional Público.

Assim, não é fácil para mim vê-los criticados como instrumentos da reprodução do sistema atual de poder no âmbito internacional. O argumento do autor é convincente, mas faz-me pensar na importância da História na análise política, não só como contagem de fatos de longo prazo, mas sim como análise sistemática do devir dos processos políticos. Até onde vai a capacidade de apropriação política e analítica do sistema internacional contemporâneo? E, para reforçar as provoca-ções do Odair, onde estarão as contribuições deste livro daqui a cem anos? É assim que escondo meu orgulho ferido de não ver Odair dis-cutir o que significaram em seu momento as doutrinas Calvo e Estrada (chamadas assim por conta dos nomes dos ministros argentino e mexi-cano que as propuseram no início do século XX).

O capítulo final, um estudo sobre a natureza do Estado em Cabo Verde, é também uma contribuição importante deste livro, sobretudo para aqueles que, como eu, que pouco ou nada conhecemos desse país. É sempre importante lembrar-se de que as grandes generalizações são perigosas e que cada caso é único. Como aponta Odair, não adianta considerá-los apenas como exceções, sem pôr cobro à teoria. Precisa-mos de integrá-los à análise e, se for preciso, fazer mudanças no modelo teórico num processo conscientemente dialético.

Neste trabalho o Odair analisa com maior profundidade o papel do Estado e da heterogeneidade social no processo de independência e de posterior consolidação da República de Cabo Verde. No entanto ele remete-nos, através de pequenas referências, para outras pesquisas onde ele mostra-nos como a sociedade se investe nas fissuras do Estado e pode contribuir, como se fez, por exemplo, no caso cabo-ver-diano a partir das estruturas de participação popular, na consolidação e legitimação e até mesmo na evolução pacífica e estável do sistema político. Com isso, o autor mostra que conseguiu fazer, em outras pes-quisas, uma demonstração ainda melhor do caráter importante, mas não apenas único e às vezes nem sequer central, do Estado na vida política.

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Em conclusão, este livro é uma ótima leitura, estimulante e infor-mativa. Como dizia algum professor, «lo bueno, si breve, es dos veces bueno». As ideias propostas – e não apenas as que eu discuti neste prefácio – ficam em nossa cabeça e continuam a nos interpelar muito tempo depois da conclusão do texto. Elas nos estimulam a prosseguir essa reflexão e esse diálogo a que nos convida Odair. Não o façamos esperar.

Julián Durazo-Herrmann

Professor de Política Comparativa

Université du Québec à Montréal (Canada)

17 de Julho de 2015

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N o t a I n t r o d u t ó r i a

Este trabalho é fruto de um longo e profundo projecto de investi-gação – cujo substracto é o Estado cabo-verdiano inserido no locus de enunciação da estatalidade moderna africana – iniciado em 2003 e concluído em 2012. Foram diversas as personalidades, instituições, familiares, amigos e conhecidos, a nível nacional e internacional, que contribuíram para que esse projecto chegasse a bom porto pelo que me abstenho de os nomear aqui, não só para evitar um exercício deveras maçador para o leitor mas também para não correr o risco de olvidar, de forma injusta, algum desses colaboradores.

A primeira fase da pesquisa culminou numa Tese de Mestrado em Sociologia intitulada Para Além de Vestefália e Cosmópolis: Que Gover-nação para os Estados «Frágeis», «Falhados» ou «Colapsados»?, rea-lizada na Faculdade de Economia da Universidade de Coimbra (FEUC) e defendida em Julho de 2005, sob orientação do Prof. Doutor José Manuel Pureza. A realização dessa fase teve o apoio financeiro do Fundo de Apoio ao Ensino e Formação (FAEF) de Cabo Verde.

A segunda fase começou em 2006, incidindo na análise do caso de Cabo Verde. Esta fase foi financiada pela Fundação Calouste Gulbenkian (FCG) e Fundação para Ciência e Tecnologia (FCT) de Portugal. Parte do resultado da investigação – que está, em grande parte, integrada neste trabalho – foi publicada com o título: «Cabo Verde: A Máquina Burocrática Estatal da Modernidade (1614-1990)», in Sarmento, Cris-tina Montalvão; Costa, Suzano (orgs.) (2013), Entre África e a Europa. Nação, Estado e Democracia em Cabo Verde. Coimbra: Almedina, pp. 173-208. Esta segunda fase da pesquisa originou, igualmente, a uma Tese de Doutoramento em «Pós-colonialimos e Cidadania Global» denominada Mestiçagem Jurídica? O Estado e a Participação Local na Justiça em Cabo Verde. Uma Análise Pós-colonial, realizada na FEUC e defendida em Junho de 2012, sob orientação do Prof. Doutor

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Boaventura de Sousa Santos e da Doutora Paula Meneses. Este traba-lho foi agraciado com o Prémio Fernão Mendes Pinto, edição 2013, pela Associação das Universidade de Língua Portuguesa (AULP) e Camões Instituto da Cooperação e da Língua; e com uma Menção Honrosa na 8.ª edição do Prémio CES para Jovens Cientistas Sociais de Língua Portuguesa também em 2013.

É a partir desta imersão inter, trans e in-displinar pelos caminhos da produção de conhecimentos nos campos das Relações Internacio-nais, Ciência Política, Sociologia e Estudos Pós-coloniais, que surge a possibilidade de edição de uma trilogia intitulada: Da Colonialidade à Des-colonialidade das Relações Internacionais, Ciência Política, Sociologia Política e Sociologia do Direito. Esta tríade é composta pelos seguintes volumes:

Mestiçagem Jurídica? O Estado e a Participação Local na Justiça em Cabo Verde. Uma Análise Pós-colonial (editado em 2017 pelo Camões Instituto da Cooperação e da Língua).

Crítica da Razão Estatal. O Estado Moderno em África nas Rela-ções Internacionais e Ciência Política. O caso de Cabo Verde.

Os Estudos Pós-coloniais em África. O Repto da Colonialidade e da Des-colonialidade. Para Além do Colonialismo, Para Lá da Des-colonização.

Odair Barros Varela

Praia, 1 de Setembro de 2017

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I n t r o d u ç ã o G e r a l

Apesar das raízes do colonialismo europeu remontarem ao início da segunda metade do século XV, foi com a expansão colonial euro-peia no século XIX que começou igualmente a propagação do conceito de Estado-nação por todo o planeta. A partir daí, a percepção, e a pos-terior atribuição, do estatuto de possível, ou futuro, Estado soberano a um território colonizado passaram a decorrer de pressupostos norma-tivos exclusivamente europeus, e, mais especificamente, do conceito de Estado moderno,1 que forneceram os parâmetros para que o reco-nhecimento da soberania pudesse ser feito, e para outorgar personali-dade jurídica internacional à entidade territorial. Estes critérios incluíam o conceito de «nível de civilização», assim como de «governo efec-tivo». Na senda deste colonialismo e expansionismo, todo o planeta passou a ser catalogado segundo critérios europeus. De igual forma, Estados que nunca foram colonizados, como Japão e Turquia, tiveram de afirmar a sua «estatalidade» segundo estes términos.

A consequência foi o estabelecimento de impérios coloniais por todo o planeta, sobretudo em África (continente que, à excepção de Etiópia e da Libéria, foi totalmente repartida pela Europa, na Confe-rência de Berlim, em 1885), com o argumento principal de que estes territórios eram incapazes de reclamar para si o direito à auto-determi-nação, já que não contavam com «graus de civilização» suficientes e nem com «governos efectivos». Por isso, tornaram-se susceptíveis de

(1) As raízes afro-asiáticas do Estado moderno europeu e/ou ocidental, são analisadas, por

exemplo, em: Cheikh A. Diop, Les fondements culturels, techniques et industriels d’un futur état fédéral d’Afrique noire, Paris, Présence Africaine, 1960; Théophile Obenga, L’Afrique dans l’Antiquite: Egypte pharaonique, Afrique noire, Paris, Presence africaine, 1973; Martin Bernal, Black Athena. The Afroasiatic Roots of Classical Civilization: The Fabrication of Ancient Greece 1789-1985, Vol. I, New Jersey, Rutgers University Press, 1987.

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serem legal e legitimamente conquistados e colonizados pelas potên-cias europeias. Desta forma, as regras de jogo estavam favorável e imperiosamente estabelecidas a favor dos, supostamente, «civilizados» povos ocidentais.

Os referidos pressupostos utilizados para catalogar realidades eco-nómicas, sociais, culturais e políticas radicalmente variadas e diferen-ciadas, no sentido de legitimar o trilho da exploração e colonização europeia, foram os mais utilizados pelos defensores do colonialismo para barrar ou atrasar o caminho das colónias, sobretudo africanas, no sentido da reconquista da sua independência. A hegemonia europeia permitiu-lhe desenhar um direito internacional (conhecido como clás-sico ou positivo) que legitimasse a ideia de um «Estado soberano» caracterizado por uma comunidade política estável no interior de um território e subordinado a um sistema legal, como se prova, segundo Juan Álvarez Cobelas, designadamente com a Convenção de Montevi-deu sobre Direitos e Deveres dos Estados, que confere, no artigo 1.º, personalidade jurídica aos Estados que reúnam os predicados seguintes: População, Território, Organização Política e Soberania.1

Com a validação normativa do que constitui a essência «Estado sobe-rano», a capacidade para pôr em prática este conceito tornou-se um apanágio de poucos Estados, essencialmente europeus, mais do que um direito de todos. Isso demonstra que sistema estatal europeu não passou de um sistema dualista composto por um núcleo de potências europeias, e o restante espaço exterior, formado por «outras realida-des». Os considerados pais do Direito Internacional Público, como Hugo Grócio, conceberam este sistema dual como compreendendo um círculo interior, onde se encontravam as potências europeias cristãs, e um círculo exterior que abarcava o resto da humanidade submetida, supostamente, à «lei da natureza». Desde a segunda metade do século XIX que este dualismo internacional foi sendo codificado formalmente, legitimando a polarização entre Estados soberanos e territórios coloni-zados, tendo como ponto culminante a convenção de Montevideu.

(1) Convenção de Montevideu sobre Direitos e Deveres dos Estados, 26/12/1933, 165 L.N.T.

19-25, apud Juan Álvarez Cobelas, «El África Subsariana Y el Concepto del Falling State: Sus Consequencias en el Derecho Internacional», in: Francisco Javier Peña Esteban (ed.), África en el Sistema Internacional, Madrid, Catarata, pp. 131-164, 2001.

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I N T R O D U Ç Ã O G E R A L

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O carácter inerentemente ocidental que vai impregnar o conceito de Estado moderno provou-se com a extensão do direito a ser um «Estado soberano» para o mundo após a colonização. Desde logo, o efeito da doutrina positivista no Direito Internacional Público de cariz ocidental, derivado da Convenção de Montevideu, obrigava a que se questionasse o grau de «estatalidade» das novas realidades surgidas do desaparecimento dos impérios coloniais, e os efeitos do seu reconhe-cimento como Estados independentes, embora o Direito Internacional nunca tenha chegado a proporcionar uma definição de «estatalidade». Assim, tornou-se bastante difícil determinar o que constitui um «Estado soberano», apesar de uma observação empírica da realidade poder levar a uma conclusão relativa sobre o que seja esta entidade. É mani-festo que todos os Estados tidos como soberanos contam formalmente com o seu território, sua população e seu governo, mas não existem no Direito Internacional, critérios jurídicos, derivados do direito consuetu-dinário, nem derivados do direito convencional, que nos possam dar sinais sobre que dimensão territorial, número de nacionais ou que forma de governo são requeridos para se considerar um Estado como sendo soberano.

De facto, a Assembleia Geral da Organização das Nações Unidas (ONU), nas suas resoluções, estabeleceu que critérios como o tama-nho, o âmbito geográfico e a quantidade de recursos, não podem ser considerados válidos para o reconhecimento, ou não, da «estatalidade» de determinada entidade. Mas, apesar de esse argumento ter sido fun-damental para o reconhecimento do direito à auto-determinação dos povos das colónias europeias, o facto do reconhecimento desse direito ter sido automaticamente acompanhado pela extensão e prossecução prática do direito a ser um «Estado soberano» para o mundo ex-colo-nial, revelou-se em muitos casos, nomeadamente em África, contra-producente devido ao problema de derivar a forma político-organiza-tivo do conceito notoriamente alógeno de Estado moderno. Surge, assim, o argumento de que a descolonização moderna não implicou senão uma nova forma de dualismo, com uma «estatalidade empírica», baseada numa efectiva existência do Estado, que constituiu uma prer-rogativa quase exclusiva do Ocidente, e com uma «estatalidade jurídica», baseada na doutrina da libertação incondicional dos territórios subme-tidos ao domínio colonial.

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C R Í T I C A D A R A Z Ã O E S T A T A L

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Contudo, isso não significa que o «empírico» e o jurídico sejam mutuamente exclusivos nesses dois tipos de «estatalidade», caracteri-zando mais os seus distintos percursos históricos de formação, do que a sua situação contemporânea. Este dualismo pós-descolonização deu lugar ao nascimento de realidades «estatais», sobretudo na África Subsariana, cujo fracasso deu lugar aos apelidados Estados «frágeis», «falhados» ou «colapsados» que decompõem a actualidade desde a Somália ao antigo Zaire, os Balcãs, a Chechénia, a Libéria, a Colômbia, o SriLanka, o Ruanda, etc.

Não obstante as consequências negativas da exportação do con-ceito de estatalidade – que vários factores como, por exemplo, o jogo da Guerra Fria, contribuíram para «camuflar», sendo que após o término do conflito bipolar no início da década de 90 do século XX assiste-se à emergência de fenómenos cognominados de Estados «frágeis», «falha-dos» ou «colapsados» – na estrutura do sistema internacional, nomea-damente no seu pilar normativo ou legal constituído pelo direito nacional e internacional, o conceito de estatalidade constitui ainda uma ferramenta essencial ao funcionamento da engrenagem deste sistema. Num primeiro relance, isso demonstra nitidamente que a sociedade internacional1 (que tem a sua génese na sociedade internacional euro-peia), mesmo após a ONU passar a integrar o enfrentamento de situa-ções apelidadas de fragilidade, falhanço ou colapso estatal, a partir do início dos anos (19)90, nunca demonstrou um sério empenho no sen-tido pôr em causa, ou pelo menos rever, o suposto carácter hegemó-nico do conceito clássico de Estado-nação e de muitos conceitos dele derivados, tidos como pacíficos por aquela sociedade, tendo as suas respostas sobretudo um carácter situacional e marcadamente conser-

(1) Conceito adoptado por nós para caracterizar o actual espaço internacional. Outros auto-

res preferem conceitos como o de Comunidade Internacional e/ou Sistema Internacio-nal. Contudo, isto não nos impede de utilizar também neste trabalho os conceitos de sistema internacional – quando, por exemplo, se estudam temáticas usualmente ligadas à estrutura anárquica e estatocêntrica da sociedade internacional – ou de comunidade internacional – quando, por exemplo, se analisam alguns processos de globalização que, alegadamente, demandam a adopção de princípios e acções comunitárias por parte da mesma sociedade. Sobre a discussão sobre esses conceitos, cf., entre outros, Hedley Bull, A Sociedade Anárquica, Brasília, UnB, 2002; Marcelo Suano, «O Discurso Teó-rico nas Relações Internacionais», Civitas – Revista de Ciências Sociais, 5 (2), 2005, pp. 245-274.

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CRÍTICA

DA RAZÃO

ESTATAL

O Estado Moderno em África

nas Relações Internacionais

e Ciência Política

O caso de Cabo Verde

CR

ÍTIC

A D

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ÃO

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TA

TA

L

Este livro, apoiado em instrumentos analíticos das Relações Internacio-

nais e da Ciência Política, e também secundada pela perspectiva dos

Estudos Pós-coloniais, procede, primeiramente, a uma contextualização

socio-histórica crítica da emergência do Estado moderno no locus de enun-

ciação de Cabo Verde, ou seja, em África, incidindo na análise da visão

hegemónica acerca do papel do que se pactuou chamar de «moderni-

dade» na configuração estatal neste continente. Analisa-se, igualmente,

mediante incursões analítico-normativas, a problemática da estatalidade

em África, procurando lançar miradas sobre as heranças pré-coloniais, colo-

niais, o período após as independências e os desenvolvimentos contempo-

râneos, nomeadamente, no campo da Sociedade Internacional e das Éticas

Internacionais, que contribuem para que, tal como em outras partes do

globo, este continente tenha as principais características da sua estatali-

dade caldeadas na sua história tanto milenar como recente.

Este trabalho engloba, por fim, uma análise embrionária do caso cabo-

-verdiano. A escolha deste Estado prende-se fundamentalmente com facto

de apresentar-se com a seguinte singularidade: por um lado, constatou-se

que as características que encerra provam a inadequação da abordagem

hegemónica na catalogação de determinados Estados como sendo «frágeis»,

«falhados» ou «colapsados». Por outro, demonstra-se que o seu percurso

pós-colonial – considerado, por exemplo, pelas principais instituições inter-

nacionais como sendo de relativo sucesso em termos do que se convencio-

nou chamar-se de governação – deve-se principalmente ao facto da solu-

ção estatal adoptada ter-se mostrado para a sua elite dirigente, tal como

ocorreu em outros casos, como a melhor via a seguir, enquadrando-se na

abordagem normativa inovadora que se propõe aqui para a análise desse

tipo de casos.

O DA I R B A R R O S -VA R E L A

OD

AIR

BA

RR

OS

-VA

RE

LA

Odair Bartolomeu Barros Lopes Varela

Professor Auxiliar na Universidade de Cabo Verde

[Uni-CV], onde, actualmente, também desempenha

as funções de Presidente da Comissão Executiva da

Escola de Negócios e Governação (ENG). É Professor

Convidado no Instituto Superior de Ciências Jurídi-

cas e Sociais [ISCJS] e em outras Universidades nacio-

nais e estrangeiras. É Licenciado em Relações Inter-

nacionais, Mestre e Doutor em Sociologia pelo Centro

de Estudos Sociais (CES) e Faculdade de Economia da

Universidade de Coimbra (FEUC); Realizou um Pós-

-doutoramento em Ciência Política na Faculdade de

Direito e Ciência Política da Université du Québec à

Montreal (UQAM-Canadá). É investigador associado

em diversos Centros de Pesquisa nacionais e interna-

cionais e é Presidente do Centro de Produção e Pro-

moção de Conhecimentos (CeProK), com sede em

Cabo Verde. É vencedor do Prémio Fernão Mendes

Pinto (edição 2013) atribuído pela Associação das Uni-

versidades de Língua Portuguesa (AULP), em parceria

com a Comunidade dos Países de Língua Portuguesa

(CPLP), pela Tese de Doutoramento defendida na

Universidade de Coimbra em 2012, trabalho que

também recebeu, em 2013, uma Menção Honrosa no

Prémio CES para Jovens Cientistas Sociais de Língua

Portuguesa. De entre as diversas publicações nacio-

nais e internacionais destacam-se os livros

(2014, co-organização e co-autoria) e

(2017).

As Rela-

ções Externas de Cabo Verde. (Re)leituras Contemporâ-

neas Mesti-

çagem Jurídica? O Estado e a Participação Local na Jus-

tiça em Cabo Verde. Uma Análise Pós-Colonial

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CRÍTICA

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ESTATAL

O Estado Moderno em África

nas Relações Internacionais

e Ciência Política

O caso de Cabo Verde

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