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O fluxo espectral de caminhos de operadores de Fredholm auto- adjuntos em espa¸ cos de Hilbert Jeovanny de Jesus Muentes Acevedo Dissertac ¸ ˜ ao apresentada ao Instituto de Matem ´ atica e Estat ´ ıstica da Universidade de S ˜ ao Paulo para obtenc ¸ ˜ ao do t ´ ıtulo de Mestre em Ci ˆ encias ´ Area de Concentra¸ c˜ao:Matem´ atica Orientador: Prof. Dr. Pierluigi Benevieri Durante o desenvolvimento deste trabalho o autor recebeu aux´ ılio financeiro da CNPq ao Paulo, outubro de 2013

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O fluxo espectral de caminhos

de operadores de Fredholm auto-

adjuntos em espacos de Hilbert

Jeovanny de Jesus Muentes Acevedo

Dissertacao apresentadaao

Instituto de Matematica e Estatısticada

Universidade de Sao Paulopara

obtencao do tıtulode

Mestre em Ciencias

Area de Concentracao: Matematica

Orientador: Prof. Dr. Pierluigi Benevieri

Durante o desenvolvimento deste trabalho o autor recebeu auxılio financeiro da CNPq

Sao Paulo, outubro de 2013

2

O fluxo espectral de caminhos

de operadores de Fredholm auto-

adjuntos em espacos de Hilbert

Esta dissertacao trata-se da versao originaldo aluno Jeovanny de Jesus Muentes Acevedo.

Resumo

O objetivo principal desta dissertacao e apresentar o fluxo espectral de um caminho deoperadores de Fredholm auto-adjuntos em um espaco de Hilbert e suas propriedades.

Pelos resultados classicos de teoria espectral, sabemos que se H e um espaco deHilbert e L : H → H e um operador linear, limitado e auto-adjunto, H pode serescrito como soma direta ortogonal

H = H+(L)⊕H−(L)⊕KerL,

onde H+(L) e H−(L) sao os subespacos espectrais positivo e negativo de L, respecti-vamente.

No trabalho damos uma definicao de fluxo espectral baseada na decomposicaoacima, aprofundando as conexoes deste conceito com a teoria espectral dos operadoresde Fredholm em espacos de Hilbert.

Entre as propriedades do fluxo espectral, sera analisada a invariancia homotopicaque se apresenta em varias formas. Veremos o conceito de ındice de Morse relativo,que estende o classico ındice de Morse, e sua relacao com o fluxo espectral.

A construcao do fluxo espectral dada neste trabalho segue a abordagem de P. M.Fitzpatrick, J. Pejsachowicz e L. Recht em [9].

Palavras-chave: fluxo espectral, ındice de Morse, operadores de Fredholm, espacosde Hilbert, teoria espectral.

i

Abstract

The main purpose of this dissertation is to present the spectral flow of a path of self-adjoint Fredholm operators in a Hilbert space and its properties. By classical resultsin spectral theory, we know that, if H is a Hilbert space and L : H → H is a boundedself-adjoint linear operator, H may be written as the following orthogonal direct sum

H = H+(L)⊕H−(L)⊕KerL,

where H+(L) and H−(L) are the positive and negative spectral subspaces of L, respec-tively.

In this work we give a definition of spectral flow which is based on the abovesplitting, examining in depth the connection between this concept and the spectraltheory of Fredholm operators in Hilbert spaces.

Among the properties of the spectral flow we will analyze the homotopic invariance,which appears on different ways. We will see the concept of relative Morse index, whichgeneralize the classical Morse index, and its relation with the spectral flow.

The construction of the spectral flow given in this work follows the approach of P.M. Fitzpatrick, J. Pejsachowicz and L. Recht in [9].

Key-words: spectral flow, Morse index, Fredholm operators, Hilbert spaces, spectraltheory.

ii

Conteudo

Lista de Sımbolos i

Introducao iv

1 Preliminares 11.1 Alguns resultados classicos da analise funcional . . . . . . . . . . . . . 11.2 Soma, produto e quociente de espacos vetoriais e normados . . . . . . . 71.3 Matriz de operadores . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 131.4 Espacos metricos compactos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 16

2 Operadores de Fredholm e compactos 202.1 Operadores de Fredholm em espacos vetoriais reais . . . . . . . . . . . 212.2 Operadores de Fredholm em espacos de Banach . . . . . . . . . . . . . 292.3 Operadores compactos em espacos de Banach . . . . . . . . . . . . . . 332.4 Operadores congruentes modulo operador compacto . . . . . . . . . . . 40

3 Operadores de Fredholm em espacos de Hilbert 443.1 Preliminares: algumas propriedades dos espacos de Hilbert . . . . . . . 453.2 Operadores em espacos de Hilbert . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 483.3 Nocoes basicas da teoria espectral em espacos normados . . . . . . . . 553.4 Operadores de Fredholm auto-adjuntos em espacos de Hilbert . . . . . 72

4 Assinatura e ındice de Morse relativo 864.1 A assinatura em espacos de Hilbert de dimensao finita . . . . . . . . . 874.2 A assinatura generalizada para perturbacoes

compactas auto-adjuntas de uma simetria . . . . . . . . . . . . . . . . 934.3 Funcoes de operadores . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 1044.4 Pares de operadores de Fredholm e ındice de Morse relativo . . . . . . . 122

5 O fluxo espectral 1375.1 Parametrix cogradiente . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 1385.2 Fluxo espectral de caminhos de operadores de Fredholm auto-adjuntos 151

iii

5.3 Fluxo espectral para caminhos gerais de operadores de Fredholm auto-adjuntos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 160

5.4 Fluxo espectral em pontos singulares isolados . . . . . . . . . . . . . . 166

Bibliografia 177

Lista de Sımbolos

A⊥ 45 conjunto ortogonal de AA\B 8 conjunto dos pontos que estao em A que

nao estao em BC 1 corpo dos numeros complexosc0 36 espaco das sequencias com valores em R

que convergem a 0c00 36 espaco das sequencias quase nulas em c0

coKerL 21 conucleo do operador Ld(x0, E) 7 distancia de x0 a E1

E1 + E2 7 soma algebrica dos espacos E1 e E2

E1 ⊕ E2 7 soma direta dos espacos E1 e E2

E1 × E2 9 produto cartesiano dos espacos E1 × E2

E/E1 10 quociente de dois espacos vetoriais E e E1

E 57 complexificacao de um espaco real Ef ′(λ0) 167 diferencial de f em λ0

f (k) 108 derivada k-esima de ff ?(π) 139 pullback induzido por f e o fibrado π

f(λ0) 167 derivada de um caminho f em λ0

F (E,F ) 21 espaco dos operadores de E em F comimagem de dimensao finita

GL(E,F ) 4 operadores limitados inversıveis de E emF

GL+S (H) 78 conjunto dos isomorfismos definidos posi-

tivos

Γ 105 interior de uma curva fechada Γ[Γ(t1),Γ(t2)] 105 imagem Γ([t1, t2])G 140 conjunto GL(H)×KS(H)H+ 93 subespaco espectral positivo da simetria

JH− 93 subespaco espectral negativo da simetria

JH−(L) 69 subespaco espectral negativo de L

i

LISTA DE SIMBOLOS ii

H+(L) 69 subespaco espectral positivo de LindL 21 ındice de um operador de Fredholm Lind(P,Q) 123 ındice de um par de Fredholm (P,Q)ImL 1 imagem do operador L∫

Γf(ζ)dζ 107 integral da aplicacao f na curva Γ

J 152 intervalo [a, b]J 93 simetria fortemente indefinidaK(E,F ) 33 conjunto dos operadores compactos de E

em FKerL 1 nucleo do operador LKS(H) 93 espaco dos operadores compactos auto-

adjuntos em HK 1 corpo dos numeros reais ou complexos

L 59 complexificacao de um operador real LL ≥ T 62 denota que L− T e um operador nao ne-

gativoL+ 72 resticao do operador L a seu subespaco

espectral positivoL− 72 resticao do operador L a seu subespaco

espectral negativoL(E,F ) 1 espaco dos operadores lineares limitados

de E em FL ∼= T 40 congruencia modulo operador compactoLS(H) 49 espaco dos operadores auto-adjuntos reais(L1, L2) 10 produto direto dos operadores L1 e L2

L 4 aplicacao L 7→ L−1, onde L ∈ GL(E)`2 30 espaco das sequencias reais ou complexas

(xn)∞n=1 tais que∑∞

n=1 |xn|2 convergeΛΓ 105 comprimento e uma curva retificavel Γµ(L) 87 dimensao do subespaco espectral negativo

de Lµrel(L, T ) 127 ındice de Morse relativo do par (L, T )N 8 conjunto dos numeros naturaisPH+(L) 70 projecao ortogonal sobre o subespaco es-

pectral positivo de LPH−(L) 70 projecao ortogonal sobre o subespaco es-

pectral negativo de LPKerL 70 projecao ortogonal sobre o nucleo de L‖P‖ 106 norma da particao Pπ 140 fibrado localmente trivial com fibra

π−1(J )∂ω 109 fronteira de ω

LISTA DE SIMBOLOS iii

Φ(E,F ) 29 conjunto dos operadores de Fredholm deE em F

Φn(E,F ) 29 conjunto dos operadores de Fredholm deE em F de ındice n

ΦS(H) 44 conjunto dos operadores de Fredholmauto-adjuntos

Φ+S (H) 72 conjunto dos operadores de Fredholm

auto-adjuntos essencialmente positivosΦ−S (H) 73 conjunto dos operadores de Fredholm

auto-adjuntos essencialmente negativosΦiS(H) 73 conjunto dos operadores de Fredholm

auto-adjuntos fortemente indefinidosQ(L, λ0) 167 forma crossing de L em λ0

R 1 corpo dos numeros reaisR+ 72 conjunto dos numeros reais positivosR− 72 conjunto dos numeros reais negativosRe(Ω) 117 parte real dos elementos do conjunto Ωr(L) 108 raio espectral de LR(λ) 56 resolvente de L, para λ ∈ ρ(L)R 142 aplicacao raiz quadrada de operadoresρ(L) 55 conjunto resolvente de LS1/2 142 raiz quadrada nao negativa do operador SS(P,E, f) 106 soma de Riemann da particao P , a escolha

E e a aplicacao fsf(L, J) 152 fluxo espectral do caminho L no intervalo

Jsf(L, λ0) 166 fluxo espectral de L atraves de λ0

signJ (J +K, (ei±)∞i=1) 98 assinatura generalizada de J +K

signJ (J +K) 99 assinatura generalizada de J +KsignL 87 assinatura de um isomorfismo auto-

adjunto LspanA 8 espaco vetorial gerado pelo conjunto Aσ(L) 55 espectro de Lσ+(L) 72 espectro positivo de Lσ−(L) 72 espectro negativo de LΣ(L) 166 conjunto singular de LT ∗ 48 adjunto do operador Tτ 141 acao de G em ΦS(H)Υ 79 acao cogradiente% 144 secao do fibrado πς 141 acao de G em si mesmoX 2 fecho do conjunto XZ 29 conjunto dos numeros inteiros

Introducao

Um instrumento que se tornou um classico entre os metodos topologicos em Analisenao linear e o conceito de ındice de Morse. Suponhamos ter um espaco de Hilbert He um operador linear auto-adjunto L : H → H. Sabemos da teoria espectral que Hpossui a decomposicao em soma direta ortogonal

H = H+(L)⊕H−(L)⊕KerL,

onde H+(L) e H−(L) sao os subespacos espectrais positivo e negativo de L, respecti-vamente. Se dimH−(L) <∞, este numero e conhecido como ındice de Morse de L e edenotado por µ(L).

O ındice de Morse foi por exemplo aplicado por Mawhin e Willem na abordagem doproblema de bifurcacao seguinte. Sejam J = [a, b] e U uma vizinhanca de J × 0 emR×H, onde H e um espaco de Hilbert real e separavel. Suponhamos que f : U → Rseja uma aplicacao contınua tal que f(λ, 0) = 0 para todo λ ∈ J . Se diz que λ0 ∈ J eum ponto de bifurcacao para a equacao f(λ, x) = 0 se toda vizinhanca de (λ0, 0) em Ucontem ao menos um solucao (λ, x) da equacao tal que x 6= 0.

Consideremos agora uma aplicacao ψ : U → R de classe C2 tal que, para cadaλ ∈ J , 0 seja um ponto crıtico do funcional ψλ = ψ(λ, ·). Para λ ∈ J , denotemospor Lλ o Hessiano de ψλ = ψ(λ, ·) e suponhamos que La e Lb sejam nao singulares.Mawhin e Willem em [20] mostram o seguinte resultado.

Teorema 1. Se Lλ e um operador de Fredholm auto-adjunto, com dimH−(Lλ) < ∞,para cada λ ∈ J , e

µ(La) 6= µ(Lb),

existe λ0 ∈ J tal que (λ0, 0) e um ponto de bifurcacao da equacao ∇ψ(λ, x) = 0.

O fluxo espectral de um caminho L = Lλλ∈J de operadores de Fredholm auto-adjuntos cujos extremos sao inversıveis, que denotaremos por sf(L, J), e um conceitoque foi introduzido por Atiyah, Patodi e Singer em [5] e se aplica nos casos onde oındice de Morse e infinito.

Em [9], P. M. Fitzpatrick, J. Pejsachowicz e L. Recht provam o seguinte resultado,que generaliza o teorema acima.

iv

INTRODUCAO v

Teorema 2. Seja ψ : U → R como acima. Se Lλ e de Fredholm, para todo λ ∈ J ,e o fluxo espectral do caminho Lλλ∈J e nao nulo, entao toda vizinhanca de J × 0contem pontos da forma (λ, x), onde x 6= 0 e um ponto crıtico de ψλ.

Ao lado do fluxo espectral, um outro conceito que generaliza o ındice de Morsee o ındice de Morse relativo. Seja (L, T ) um par de isomorfismos auto-adjuntos cujadiferenca e compacta. Neste caso, dim(H−(L)∩H+(T )) <∞ e dim(H−(T )∩H+(L)) <∞, como veremos no Capıtulo 4. O ındice de Morse relativo de (L, T ) e definido como

µrel(L, T ) = dim(H−(L) ∩H+(T ))− dim(H−(T ) ∩H+(L)).

Na Proposicao 5.2.6 mostraremos que, se L e um caminho de operadores de Fredh-olm auto-adjuntos tal que Lλ − La e compacto para todo λ ∈ J , entao

sf(L, J) = µrel(La, Lb).

Assim, o seguinte corolario e uma consequencia de teorema anterior.

Corolario 0.0.1. Seja ψ : U→ R como acima. Assuma que

∇ψ(λ, x) = Ax+ C(λ, x),

onde A e um operador de Fredholm auto-adjunto e C e uma aplicacao compacta. Entao,o intervalo J contem pontos de bifurcacao para a equacao ∇ψ(λ, x) = 0 sempre que

µrel(La, Lb) 6= 0.

O objetivo desta dissertacao e a introducao do fluxo espectral, de sua definicao ede algumas de suas propriedades. A abordagem deste trabalho e baseada no artigode P. M. Fitzpatrick, J. Pejsachowicz e L. Recht: Spectral Flow and Bifurcation ofCritical Points of Strongly-Indefinite Functionals, Part I. General Theory, Journal ofFunctional Analysis, 162, 52-95, Academic Press, (1999).

No primeiro capıtulo veremos varios teoremas e resultados conhecidos da analisefuncional, da algebra linear e da topologia geral, que servirao como ferramenta util emtodo o trabalho.

No segundo capıtulo trataremos dos operadores de Fredholm em espacos vetoriais(ou de Banach) reais, assim como do ındice de um operador de Fredholm. Uma dessaspropriedades e que o conjunto dos operadores de Fredholm em espacos de Banach eum subconjunto aberto do espaco dos operadores lineares limitados. Os operadorescompactos em espacos de Banach, dos quais lembraremos definicao na Secao 3, estaoestritamente relacionados com os operadores de Fredholm, como veremos na Secao 4.Tal relacao sera de grande importancia na construcao do fluxo espectral.

INTRODUCAO vi

O proposito do terceiro capıtulo e apresentar algumas das propriedades dos opera-dores de Fredholm auto-adjuntos em espacos de Hilbert. Para este fim, as duas primei-ras secoes serao dedicadas a destacar algumas caracterısticas dos espacos de Hilberte dos operadores auto-adjuntos. Um dos resultados mais interessantes que veremosneste capıtulo diz que o conjunto dos operadores de Fredholm auto-adjuntos possuitres componentes conexas, que sao: o conjunto dos operadores essencialmente positi-vos (tais que o subespaco espectral negativo tem dimensao finita), o dos operadoresessencialmente negativos (tais que o subespaco espectral positivo tem dimensao finita)e o dos operadores fortemente indefinidos (que tem ambos os subespacos espectraisinfinito-dimensionais). Trata-se de um resultado conhecido mas, por outro lado, naofacil de ser encontrado na literatura, razao pela qual decidimos prova-lo.

Na primeira parte do Capıtulo 4 veremos a nocao de assinatura generalizada paraoperadores da forma J +K, onde J um oportuno operador de Fredholm auto-adjuntotal que J 2 = I e K e um operador compacto e auto-adjunto. O fluxo espectral seradefinido usando a assinatura generalizada. Na Secao 4.4 trataremos o ındice de Morserelativo e suas propriedades. Apresentaremos na Proposicao 4.4.9 uma relacao entre oındice de Morse relativo e o ındice de Morse classico.

O fluxo espectral de caminhos de Fredholm auto-adjuntos sera definido no Capıtulo5. Uma das propriedades mais importantes do fluxo espectral, que veremos na Secao5.2, e a invariancia homotopica. No Teorema 5.3.3 provaremos que, se L = Lλλ∈J eum caminho de operadores de Fredholm com dimH−(Lλ) <∞ para todo λ ∈ J , entao

sf(L, J) = µ(La)− µ(Lb).

Assim, o Teorema 1, dado acima, se torna uma consequencia do Teorema 2.Finalizaremos o trabalho com a nocao de fluxo espectral em pontos singulares iso-

lados de um caminho de operadores de Fredholm auto-adjuntos.

Capıtulo 1

Preliminares

Neste capıtulo apresentaremos alguns resultados conhecidos que serao utilizados comoferramenta ao longo deste trabalho. A maioria deles nao sera provada. Damos comopre-requisitos as nocoes de produto interno, metrica, assim como tambem os conceitosde espaco vetorial, topologico, metrico, normado e de Banach.

A primeira parte dos preliminares tratara de conceitos classicos da analise funcional.Teoremas como o da aplicacao aberta, o de Hahn-Banach, o de Riesz-Fischer, entreoutros, serao recordados.

Na segunda secao lembraremos as definicoes da soma, produto e o quociente deespacos vetoriais. Usando os teoremas apresentados na primeira secao mostraremosalgumas propriedades que possuem o produto e o quociente de espacos de Banach.Alem disso, veremos a definicao do produto direto de dois operadores lineares.

Na terceira secao veremos que podemos representar um operador linear L : E → Fentre dois espacos vetoriais com uma matriz de operadores, no caso em que os espacosE e F sejam escritos como soma direta de dois subespacos.

Na ultima secao veremos algumas propriedades dos espacos metricos compactos elembraremos a definicao de espaco metrico totalmente limitado. Este conceito serausado no proximo capıtulo.

1.1 Alguns resultados classicos da analise funcional

Dados dois espacos vetoriais E e F sobre o corpo K = R ou C, denotaremos porL(E,F ), ou simplesmente por L(E) quando F = E, o espaco vetorial dos operadoreslineares de E a F . A imagem de L ∈ L(E,F ) sera denotada por ImL e seu nucleo porKerL.

Suponhamos que E e F sejam espacos normados. Um operador linear T : E → Fe dito limitado se

sup‖Tx‖ : x ∈ E, ‖x‖ = 1 <∞.

1

CAPITULO 1. PRELIMINARES 2

Neste caso, abusando um pouco da notacao, L(E,F ) consistira dos operadores lineareslimitados de E em F . O conjunto L(E,F ) e um espaco vetorial normado, com normadada por

‖T‖ = sup‖Tx‖ : x ∈ E, ‖x‖ = 1 para T ∈ L(E,F ).

Um resultado classico da analise funcional diz que, se F e um espaco de Banach, entaoL(E,F ) e um espaco de Banach (ver por exemplo [8], pag. 11, Proposicao 1.9).

Na seguinte proposicao mostraremos algumas condicoes necessarias e suficientespara que um operador linear definido em espacos normados seja contınuo. Em [8], pag.10, Proposicao 1.17, podemos ver uma prova deste fato.

Proposicao 1.1.1. Sejam E e F dois espacos normados e L um operador linear de Eem F . As seguintes condicoes sao equivalentes:

i. L e contınuo.

ii. L e contınuo na origem de E.

iii. Existe C > 0 tal que ‖Lx‖ ≤ C‖x‖ para todo x ∈ E.

iv. Existe C > 0 tal que ‖Lx− Ly‖ ≤ C‖x− y‖ para todo x, y ∈ E.

Segue-se da proposicao anterior que todo operador limitado e contınuo e vice-versa.Usaremos os termos “contınuo” ou “limitado” dependendo do fato de querer marcar acontinuidade ou a limitacao do operador, mas com o mesmo significado.

Outro resultado classico da analise funcional e apresentado no seguinte teorema.Ele mostra uma condicao necessaria e suficiente para que um espaco normado seja deBanach. Podemos ver uma prova deste fato em [8], pag. 8, Lema 1.15.

Teorema 1.1.2. Seja E um espaco normado. Entao, E e um espaco de Banach se,e somente se, toda serie

∑∞k=0 xk convergente em E e absolutamente convergente, isto

e,∑∞

k=0 ‖xk‖ e convergente em R.

Definicao 1.1.3. Seja X um subconjunto de um espaco normado E. Denotaremospor X o fecho de X em E, isto e,

X = x ∈ E : existe (xn)∞n=1 em X convergente a x.

Nao e difıcil ver que o fecho de um subespaco de E e um subespaco de E.

Teorema 1.1.4. Sejam E um espaco normado, F um subespaco de E e G um espacode Banach. Seja L : F → G um operador limitado. Existe uma unica extensao de L aum operador limitado L : F → G tal que ‖L‖ = ‖L‖.

CAPITULO 1. PRELIMINARES 3

Podemos ver uma prova do teorema anterior em [18], pag. 75, Teorema 3.1. Ooperador L : F → G e definido como

Lx = limn→∞

Lxn,

onde (xn)∞n=1 e uma sequencia em F convergente a x ∈ F .O seguinte corolario e uma consequencia imediata do teorema anterior.

Corolario 1.1.5. Sejam E1 e E2 dois subespacos de um espaco de Banach E e L ∈L(E1, E2). Entao, existe uma unica extensao de L a um operador L ∈ L(E1, E2) talque ‖L‖ = ‖L‖.

Definicao 1.1.6. Sejam E e F espacos vetoriais. Diremos que L ∈ L(E,F ) e umoperador inversıvel (ou um isomorfismo) se e bijetor. No caso em que E e F sejamnormados, diremos que L e inversıvel se e bijetor, limitado e L−1 e limitado.

A palavra “isomorfismo” serve seja no caso so vetorial ou no caso topologico. Se forclaro do contexto, usaremos sempre este termo, mesmo tenha significados diferentes.

O seguinte teorema mostra que, se E e um espaco de Banach e L ∈ L(E) com‖L‖ < 1, entao I − L e um isomorfismo. Uma prova deste fato se pode ver em [16],pag. 375.

Teorema 1.1.7. Seja L ∈ L(E), onde E e um espaco de Banach. Se ‖L‖ < 1, entaoI − L e inversıvel e, alem disso,

(I − L)−1 =∞∑k=0

Lk = I + L+ L2 + ...,

onde a serie na direita e convergente na norma de L(E).

Como consequencia do Teorema 1.1.7 temos o seguinte corolario.

Corolario 1.1.8. Seja L ∈ L(E,F ) um operador inversıvel, onde E e F sao espacosde Banach. Se A ∈ L(E,F ) e ‖A− L‖ < 1/‖L−1‖, entao A e inversıvel.

Demonstracao. Suponhamos que ‖A− L‖ < 1/‖L−1‖. Entao,

‖L−1(A− L)‖ ≤ ‖L−1‖‖A− L‖ < ‖L−1‖(1/‖L−1‖) = 1.

Assim, o teorema anterior implica que I+L−1(A−L) e inversıvel, onde I e a identidadede E. Dado que L e inversıvel, a composicao

L(I + L−1(A− L)) = L+ A− L = A

tambem e inversıvel.

CAPITULO 1. PRELIMINARES 4

Do corolario anterior temos que, se E e F sao espacos de Banach, entao o conjuntodos operadores inversıveis de E em F , denotado por GL(E,F ), e um subconjuntoaberto de L(E,F ).

Observe que, se L e T ∈ G(E,F ), entao

L−1 − T−1 = −L−1(L− T )T−1. (1.1.1)

De fato,

L−1 − T−1 = L−1L(L−1 − T−1)TT−1 = L−1(I − LT−1)TT−1 = −L−1(L− T )T−1.

Lema 1.1.9. Se E e um espaco de Banach, a aplicacao

L : GL(E)→ GL(E)

L 7→ L−1

e contınua.

Demonstracao. Tomemos L ∈ GL(E) fixado. Seja T ∈ GL(E) tal que ‖L − T‖ <1/‖L−1‖. Assim,

‖(L− T )L−1‖ ≤ ‖L− T‖‖L−1‖ < 1.

Se segue do Teorema 1.1.7 que I + (L− T )L−1 e inversıvel em L(E). Alem disso,

(I + (L− T )L−1)−1 =∞∑k=0

((T − L)L−1)k.

Portanto,

‖(I+(L−T )L−1)−1‖ ≤∞∑k=0

‖(T−L)L−1‖k =1

1− ‖(T − L)L−1‖≤ 1

1− ‖T − L‖‖L−1‖.

Dado que T = (I − (L − T )L−1)L, entao T−1 = L−1(I + (L − T )L−1)−1. Conse-quentemente,

‖T−1‖ ≤ ‖L−1‖‖(I + (L− T )L−1)−1‖ ≤ ‖L−1‖(1− ‖T − L‖‖L−1‖)−1.

Daı, como ‖L− T‖‖L−1‖ < 1, de (1.1.1) temos

‖L−1 − T−1‖ = ‖ − L−1(L− T )T−1‖ ≤ ‖L−1‖‖L− T‖‖T−1‖≤ ‖L−1‖‖L− T‖‖L−1‖(1− ‖T − L‖‖L−1‖)−1

< ‖L−1‖‖L− T‖‖L−1‖.

Portanto, para qualquer ε > 0, se T ∈ L(E) e tal que

‖L− T‖ < minε/‖L−1‖2, 1/‖L−1‖,

entao ‖L−1 − T−1‖ < ε. Este fato prova que L e contınua.

CAPITULO 1. PRELIMINARES 5

Proposicao 1.1.10. Sejam E um espaco de Banach e F e um espaco normado. Supo-nhamos que T ∈ L(E,F ) seja injetor. Entao, T−1 : T (E) → E e contınuo se, esomente se, existe c > 0 tal que ‖Tx‖ ≥ c‖x‖ para todo x ∈ E. Alem disso, seT−1 : T (E)→ E e contınuo, entao T (E) e um espaco de Banach.

Demonstracao. Suponhamos primeiro que exista c > 0 tal que ‖Tx‖ ≥ c‖x‖ paratodo x ∈ E e provemos que T−1 : T (E) → E e contınuo. De fato, e claro queT−1 : T (E)→ E e bijetor. Se y ∈ T (E), temos

‖y‖ = ‖TT−1y‖ ≥ c‖T−1y‖.

Isto e, ‖T−1y‖ ≤ (1/c)‖y‖ para todo y ∈ T (E), o que prova que T−1 : T (E) → E econtınuo.

Reciprocamente, se T−1 : T (E) → E e contınuo, existe C > 0 tal que ‖T−1y‖ ≤C‖y‖ para todo y ∈ T (E). Como T e injetor, entao T−1Tx = x para todo x ∈ E. Daı,

‖x‖ = ‖T−1Tx‖ ≤ C‖Tx‖ para todo x ∈ E.

Consequentemente, existe 1/C > 0 tal que (1/C)‖x‖ ≤ ‖Tx‖ para todo x ∈ E.Agora provemos que T (E) e de Banach. Seja (yn)∞n=1 uma sequencia de Cauchy em

T (E). Entao, yn = Txn para uma sequencia (xn)∞n=1 em E. Agora, por hipotese,

‖xn − xm‖ ≤ (1/c)‖T (xn − xm)‖ = (1/c)‖yn − ym‖.

Este fato implica que (xn)∞n=1 e uma sequencia de Cauchy. Como E e de Banach,(xn)∞n=1 converge a um x ∈ E. Portanto, da continuidade de T temos que (yn)∞n=1

converge a T (x) ∈ T (E). Logo, T (E) e de Banach.

O seguinte teorema e um dos mais conhecidos de analise funcional: o Teorema daaplicacao aberta. Ele sera de grande importancia neste trabalho.

Teorema 1.1.11 (Teorema da aplicacao aberta). Sejam E,F espacos de Banach eL : E → F um operador linear contınuo sobrejetor. Entao, L e aberto, isto e, paratodo subconjunto aberto ∆ de E, L(∆) e aberto em F .

Uma consequencia do Teorema da aplicacao aberta e dada no seguinte corolario. Aprova e imediata.

Corolario 1.1.12. Nas condicoes do teorema anterior, se L e injetor, entao L e umisomorfismo.

O Teorema de Hahn-Banach para espacos normados, que apresentamos abaixo, serauma ferramenta de grande importancia neste trabalho. Podemos ver uma prova desteteorema em [16], pag. 221, Teorema 4.3-2.

CAPITULO 1. PRELIMINARES 6

Teorema 1.1.13 (Teorema de Hahn-Banach para espacos normados). Sejam E umespaco normado e E1 um subespaco de E. Se ϕ : E1 → K e um funcional linearlimitado, existe uma extensao de ϕ a um funcional linear limitado ϕ de E, tal que

‖ϕ‖ = ‖ϕ‖.

Neste trabalho os espacos de Hilbert separaveis tem um papel importante. Lem-bramos que um espaco normado E e dito separavel se existe uma sequencia em E quee densa em E. No resto desta secao apresentamos algumas propriedades que possuemos espacos de Hilbert separaveis.

Lembramos que um espaco normado H (real ou complexo) e um espaco com produtointerno se sua norma, denotada por ‖ · ‖, provem de um produto interno 〈·, ·〉, isto e,se

‖x‖ =√〈x, x〉 para todo x ∈ H.

Um espaco de Hilbert e um espaco de Banach com produto interno.Uma caracterizacao dos espacos com produto interno e apresentada no teorema

seguinte. Podemos ver uma prova dele em [8], pag. 17.

Teorema 1.1.14. Suponhamos que H seja um espaco normado. Entao, H e um espacocom produto interno se, e somente se, sua norma satisfaz a igualdade do paralelogramo,isto e,

‖x+ y‖2 + ‖x− y‖2 = 2‖x‖2 + 2‖y‖2 para todo x, y ∈ H.

No resto desta secao H denotara um espaco com produto interno 〈·, ·〉 e com normainduzida ‖ · ‖. Uma caracterıstica que possuem os espacos com produto interno e abem conhecida desigualdade de Cauchy-Schwarz :

|〈x, y〉| ≤ ‖x‖‖y‖ para todo x, y ∈ H. (1.1.2)

Definicao 1.1.15 (Ortogonalidade). Dizemos que dois elementos x1 e x2 em H saoortogonais se 〈x1, x2〉 = 0. Seja X um subconjunto nao vazio de H. Dizemos que X eortonormal se, para todo x1, x2 ∈ X com x1 6= x2, 〈x1, x2〉 = 0 e 〈x, x〉 = 1 para todox ∈ X.

Dizemos que um subconjunto ortonormal X de H e uma base ortonormal de H seX e um conjunto maximal ortonormal em H, isto e, para todo y ∈ H\X, existe x ∈ Xtal que 〈x, y〉 6= 0. Se X e uma base ortonormal de H enumeravel dizemos que X euma base de Hilbert de H.

O seguinte e um resultado classico da algebra linear. O metodo da demostracao echamado de processo de ortogonalizacao de Gram-Schmidt (veja-se, por exemplo, [11],pag. 278, Teorema 3).

CAPITULO 1. PRELIMINARES 7

Teorema 1.1.16. Seja β = x1, x2, ..., xn um subconjunto linearmente independentede H. Entao, existe um subconjunto ortonormal α = y1, y2, ..., yn de H que gera omesmo espaco gerado por β.

Apresentaremos agora duas propriedades que possuem os espacos de Hilbert separa-veis, cujas provas se podem ver, por exemplo, em [8], pag. 19, Teorema 1.36 e pag. 20,Teorema 1.38, respectivamente.

Teorema 1.1.17. Todo espaco de Hilbert separavel de dimensao infinita H possui umabase de Hilbert (en)∞n=1. Alem disso, se x ∈ H, entao

x =∞∑i=1

〈x, ei〉ei.

O seguinte teorema mostra que todo espaco de Hilbert separavel de dimensao infi-nita H e linearmente isometrico a `2, isto e, existe um isomorfismo L ∈ L(H, `2) talque ‖Lx‖ = ‖x‖ para todo x ∈ H.

Teorema 1.1.18 (Riesz-Fischer). Todo espaco de Hilbert separavel de dimensao infi-nita H e isometrico a `2.

1.2 Soma, produto e quociente de espacos vetoriais

e normados

Nesta secao apresentaremos as definicoes da soma, produto e quociente de espacosvetoriais e algumas das suas propriedades algebricas para o caso em que os espacos naosejam normados e das propriedades topologicas para o caso em que os espacos sejamnormados. Os espacos desta secao serao considerados sobre o corpo dos numeros reaisou complexos. Primeiro lembremos a definicao da soma de dois espacos vetoriais.

Definicao 1.2.1 (Soma de espacos vetoriais). Sejam E1 e E2 dois subespacos vetoriaisde um espaco vetorial E. A soma dos espacos E1 e E2 e definida por

E1 + E2 = x1 + x2 : x1 ∈ E1, x2 ∈ E2.

Se E1∩E2 = 0 dizemos que E1 +E2 e uma soma direta. Neste caso denotaremospor E1 ⊕ E2 a soma de E1 e E2.

E claro que a soma de dois subespacos de um espaco E e um subespaco de E.

Definicao 1.2.2. Sejam E1 um subespaco de um espaco normado E e x0 ∈ E. Adistancia de x0 a E1 e definida por

d(x0, E1) = infx∈E1

‖x0 − x‖.

CAPITULO 1. PRELIMINARES 8

Vejamos a seguinte propriedade da soma de dois subespacos de um espaco normado.

Lema 1.2.3. Seja E um espaco normado. Se E1 e um subespaco fechado de E e E2 ede dimensao finita, entao E1 + E2 e fechado.

Demonstracao. Demonstraremos o lema por inducao sobre a dimensao de E2. Supo-nhamos que E2 tenha dimensao 1. Assim, E2 = spanx0 para algum x0 ∈ E com‖x0‖ = 1. Se x0 ∈ E1, entao E1 + E2 = E1 e portanto a soma e fechada. Suponhamosque x0 nao pertenca a E1. Seja (yn)∞n=1 uma sequencia em E1 +E2 convergente a y ∈ E.Entao, yn = xn+λnx0, onde xn ∈ E1 e λn ∈ K para todo n ∈ N. Provemos que (λn)∞n=1

e limitada. De fato, dado que E1 e fechado, entao

d = d(x0, E1) = infx∈E1

‖x0 − x‖ > 0.

Alem disso, para λ ∈ K, com λ 6= 0,

d(λx0, E1) = infx∈E1

‖λx0 − x‖ = infx∈E1

|λ|‖x0 − x/λ‖ = |λ| infy∈E1

‖x0 − y‖ = |λ|d.

Se (λn)∞n=1 nao fosse limitada, entao

‖xn + λnx0‖ ≥ infx∈E1

‖λnx0 − x‖ = |λn|d,

isto e, (yn)∞n=1 nao serıa limitada. Este fato contradiz a convergencia de (yn)∞n=1, queportanto e limitada.

Dado que (λn)∞n=1 e limitada, ela possui uma subsequencia convergente a λ ∈ K.Consequentemente, (yn − λnx0)∞n=1 = (xn)∞n=1 ∈ E1 possui uma subsequencia conver-gente a x ∈ E1, pois E1 e fechado. Assim, (xn + λnx0)∞n=1 possui uma subsequenciaconvergente a x+ λx0 ∈ E1 + E2. Portanto, y = x+ λx0 ∈ E1 + E2.

Suponhamos agora que E1 + E ′1 seja fechado para qualquer subespaco E ′1 de di-mensao n−1. Seja E2 um subespaco de dimensao n. Entao, E2 = E ′2 +spanx0, ondeE ′2 e um subespaco de E2 de dimensao n − 1 e x0 ∈ E2\E ′2. Por hipotese de inducao,E1 + E ′2 e fechado. Pelo resultado da primeira parte da demonstracao temos que

E1 + E ′2 + spanx0 = E1 + E2

e fechado.

A seguinte proposicao e uma consequencia do Teorema de Hahn-Banach para espa-cos normados.

Proposicao 1.2.4. Sejam E um espaco normado e E1 um subespaco de dimensaofinita. Entao, E1 tem um subespaco complementar fechado, isto e, existe um subespacofechado E2 de E tal que E = E1 ⊕ E2.

CAPITULO 1. PRELIMINARES 9

Demonstracao. Seja α1, α2, ..., αn uma base de E1. Para i = 1, 2, ..., n, tomemos ofuncional linear α∗i : E1 → K definido por

α∗i (αj) =

0 se j 6= i1 se j = i.

E claro que α∗i e limitado, para i = 1, 2, ..., n. Pelo Teorema de Hahn-Banach, podemosestender cada α∗i a um funcional limitado de E. Podemos dar o mesmo nome a estasextensoes. Seja α∗ : E → Kn o operador linear definido por

α∗(x) = (α∗1(x), α∗2(x), ..., α∗n(x)).

Observe que α∗ e limitado, pois os α∗i sao limitados. Consequentemente, Kerα∗ efechado. E facil ver que

Kerα∗ =n⋂i=1

Kerα∗i .

Daı, E1 ∩ Kerα∗ = 0. Alem disso, dado x ∈ E, existe um, e somente um, x1 ∈ E1

tal que α∗(x) = α∗(x1). Logo, x = x1 + (x− x1), onde x− x1 ∈ Kerα∗. Os fatos acimamostram que

E = E1 ⊕Kerα∗,

o que prova a proposicao.

Definicao 1.2.5. O produto cartesiano E1 × E2 de dois espacos vetoriais E1 e E2 eum espaco vetorial com as seguintes operacoes:

i. (x, y) + (z, w) = (x+ z, y + w) para (x, y), (z, w) ∈ E1 × E2.

ii. λ(x, y) = (λx, λy) para λ ∈ K e (x, y) ∈ E1 × E2.

Se E1 e E2 sao dois espacos normados com as normas ‖ ·‖1 e ‖ ·‖2, respectivamente,entao o produto E1 × E2 e um espaco normado com a norma

‖(x, y)‖ =√‖x‖2

1 + ‖y‖22 para (x, y) ∈ E1 × E2.

E facil provar que, se E1 e E2 sao de Banach, entao E1 × E2 e de Banach.O resultado seguinte e uma consequencia do Teorema da aplicacao aberta.

Proposicao 1.2.6. Suponhamos que E seja um espaco de Banach e que E = E1⊕E2,onde E1 e E2 sao subespacos fechados de E. O operador T : E1×E2 → E definido porT (x, y) = x+ y e um isomorfismo.

CAPITULO 1. PRELIMINARES 10

Demonstracao. De fato, o operador T e contınuo, pois, para (x, y) ∈ E1 × E2,

‖T (x, y)‖ = ‖x+ y‖ ≤ ‖x‖+ ‖y‖ ≤√

2√‖x‖2 + ‖y‖2 =

√2‖(x, y)‖.

Por outro lado, dado que E1 + E2 = E e E1 ∩ E2 = 0, entao T e bijetor. PeloTeorema da aplicacao aberta temos que T e um isomorfismo.

Sejam E e F espacos de Banach e L ∈ L(E,F ) fixado. Suponhamos que E =E1 ⊕ E2 e F = F1 ⊕ F2, onde E1 e E2 sao subespacos fechados de E, F1 e F2 saosubespacos fechados de F e, alem disso, L(E1) ⊆ F1 e L(E2) ⊆ F2. Tomemos asrestricoes L1 = L|E1 : E1 → F1 e L2 = L|E2 : E2 → F2 do operador L. Entao, podemosdizer que L e soma direta de L1 e L2, em sımbolos

L = L1 ⊕ L1. (1.2.1)

Por outro lado, se E1, E2, F1 e F2 sao espacos de Banach e L1 ∈ L(E1, F1) e L2 ∈L(E2, F2), definimos o produto direto de L1 e L2 como o operador (L1, L2) : E1×E2 →F1 × F2 dado por

(L1, L2)(x, y) = (L1x, L2y). (1.2.2)

Neste caso,

‖(L1x, L2y)‖2 = ‖L1x‖2 + ‖L2y‖2 ≤ ‖L1‖2‖x‖2 + ‖L2‖2‖y‖2

≤ (‖L1‖2 + ‖L2‖2)(‖x‖2 + ‖y‖2)

= (‖L1‖2 + ‖L2‖2)‖(x, y)‖2,

isto e,‖(L1, L2)‖ ≤

√(‖L1‖2 + ‖L2‖2).

Este fato prova que (L1, L2) ∈ L(E1 × E2, F1 × F2).

Neste trabalho tambem usaremos algumas propriedades do espaco quociente.

Definicao 1.2.7. Sejam E um espaco vetorial e E1 um subespaco de E. O quocienteE/E1 e o conjunto de todos os elementos da forma

x = x+ E1 = x+ z : z ∈ E1,

onde x ∈ E. E facil ver que E/E1 e um espaco vetorial com as operacoes:

i. x+ y = x+ y se x, y ∈ E,

ii. αx = αx para x ∈ E e α ∈ K.

Definicao 1.2.8. A codimensao de E1 em E e a dimensao de E/E1.

CAPITULO 1. PRELIMINARES 11

Denotemos por π : E → E/E1 a projecao canonica de E em E/E1, isto e, π(x) =x+ E1, para x ∈ E.

Observacao 1.2.9. Observe que a codimensao de um subespaco E1 em E e finita se,e somente se, existe um subespaco de dimensao finita E2 tal que E = E1 ⊕ E2. Defato, e claro que Kerπ = E1. Seja E2 um subespaco complementar de E1 em E, istoe, E = E1 ⊕ E2 (este complementar existe sempre para espacos vetoriais). Tomemosuma base β de E2. E facil ver que π(β) = π(x) : x ∈ β e uma base de π(E) = E/E1.Consequentemente, dimE2 e finita se, e somente se, dim(E/E1) e finita. Neste casodimE2 = dim(E/E1).

Mostraremos agora duas propriedades ligadas ao conceito da codimensao de sub-espacos vetoriais.

Lema 1.2.10. Se E1 e E2 sao dois subespacos de codimensao finita de um espacovetorial E, entao E1 ∩ E2 tem codimensao finita em E.

Demonstracao. Suponhamos por contradicao que o resultado nao seja verdadeiro. Con-sideremos um complementar E ′1 de E1 ∩E2 em E1. Assim, E1 = (E1 ∩E2)⊕E ′1. Dadoque a codimensao de E1∩E2 e infinita e a codimensao de E1 e finita, entao a dimensaode E ′1 e infinita. Alem disso,

E ′1 ∩ E2 = E ′1 ∩ (E1 ∩ E2) = 0.

Portanto, a soma E ′1 +E2 e direta. Este fato contradiz a codimensao finita de E2.

Lema 1.2.11. Sejam E1 e E2 subespacos de um espaco vetorial E. Se a codimensaode E1 e finita e a dimensao de E2 e infinita, entao E1 ∩ E2 tem dimensao infinita.

Demonstracao. Suponhamos por contradicao que a dimensao de E1 ∩ E2 seja finita.Tomemos um complementar E ′1 de E1 ∩ E2 em E1. Assim,

E1 = (E1 ∩ E2)⊕ E ′1.

Como a codimensao de E1 em E e finita, entao a codimensao de E ′1 em E e finita. Eclaro que E ′1∩E2 = 0. Logo, a soma E ′1⊕E2 e direta em contradicao com a dimensaoinfinita de E2.

Se E e um espaco normado e E1 e um subespaco fechado de E, entao E/E1 se tornaum espaco normado com a introducao da norma

‖x‖ = infy∈x‖y‖ = inf

z∈E1

‖z − x‖. (1.2.3)

Nao e difıcil ver que (1.2.3) define uma norma para E/E1.

O seguinte teorema mostra que, se E e E1 sao espacos de Banach, entao E/E1 etambem de Banach. Alem disso, com estas condicoes, a projecao π e contınua. Umaprova deste fato se pode ver em [7], pag. 70.

CAPITULO 1. PRELIMINARES 12

Teorema 1.2.12. Se E e um espaco de Banach e E1 e um subespaco fechado de E,entao:

i. E/E1 e um espaco de Banach.

ii. ‖π(x)‖ ≤ ‖x‖ para todo x ∈ E e assim π e contınua.

Uma propriedade muito importante dos operadores lineares limitados e que, se aimagem de um operador limitado tem codimensao finita, entao ela e fechada. Este fatoe mostrado na seguinte proposicao.

Proposicao 1.2.13. Seja L ∈ L(E,F ), onde E e F sao espacos de Banach. Se acodimensao da imagem de L e finita, entao ImL e um subespaco fechado de F .

Demonstracao. De fato, do Teorema 1.2.12 se segue que E/KerL e de Banach. Tome-mos L : E/KerL→ F dado por

L(x) = Lx para x ∈ E.

Vejamos que L esta bem definido. Se x = y, para x, y ∈ E, entao x − y ∈ KerL.Portanto,

L(x) = L(x) = L(y) = L(y).

E facil ver que L e linear. Alem disso, para x ∈ E e x0 ∈ KerL,

‖L(x)‖ = ‖L(x)‖ = ‖L(x− x0)‖ ≤ ‖L‖‖x− x0‖.

Este fato prova que

‖L(x)‖ ≤ ‖L‖ infx0∈KerL

‖x− x0‖ = ‖L‖‖x‖,

isto e, L e limitado.E claro que L e injetor e que ImL = ImL.Dado que ImL tem codimensao finita, se segue da Observacao 1.2.9 que existe um

subespaco de dimensao finita F1 de F tal que F = ImL⊕F1. Como F1 e fechado, F/F1

e de Banach. Consequentemente, a projecao canonica de F em F/F1, que denotamospor π1 : F → F/F1, e limitada. Daı, a composicao

π1L : E/KerL→ F/F1,

e limitada.Nao e difıcil provar que a restricao

π1|ImL : ImL→ F/F1

CAPITULO 1. PRELIMINARES 13

de π1 a ImL e bijetora. Logo, como L e injetor e ImL = ImL, a composicao π1L ebijetora. Assim, o Teorema da aplicacao aberta implica que π1L e um isomorfismo.

Consideremos agora a composicao

L(π1L)−1 : F/F1 → ImL = ImL.

Observe que(π1|ImL)L(π1L)−1 = (π1L)(π1L)−1 = IF/F1 , (1.2.4)

onde IF/F1 e a identidade de F/F1. Por outro lado, se y ∈ ImL, existe x ∈ E tal quey = Lx = Lx. Daı,

L(π1L)−1π1(y) = L(π1L)−1(π1L)x = Lx = y.

Este fato prova queL(π1L)−1(π1|ImL) = IImL, (1.2.5)

onde IImL e a identidade de ImL.De (1.2.4) e (1.2.5) se segue que π1|ImL : ImL → F/F1 e um isomorfismo. Em

conclusao, ImL e de Banach sendo isomorfo a F/F1.

1.3 Matriz de operadores

Na primeira parte desta secao suporemos que E, F e G sao espacos vetoriais reais oucomplexos. Lembramos que usaremos o termo isomorfismo para um operador linearL entre espacos vetoriais quando L for injetor e sobrejetor, enquanto se M for umoperador linear injetor e sobrejetor entre espacos de Banach (ou normados), o termoisomorfismo denotara que M e limitado com inversa limitada. Quando os espacos E eF sao escritos como soma direta de dois subespacos, podemos representar um operadorL ∈ L(E,F ) por uma matriz de operadores os quais tem como domınio e contradomınioos subespacos das decomposicoes de E e de F . Esta representacao vai ser de grandeutilidade em todo o trabalho, ja que facilita ver o comportamento dos operadores ecada um dos subespacos considerados na soma direta de seu domınio e contradomınio.Para ver esta representacao suponhamos que temos as decomposicoes

E = E1 ⊕ E2 e F = F1 ⊕ F2.

Seja PE1 : E1 ⊕ E2 → E1 a projecao sobre E1 associada a decomposicao de E, isto e,

PE1 : E1 ⊕ E2 → E1, x1 + x2 7→ x1,

onde x1 ∈ E1 e x2 ∈ E2. Assim,

ImPE1 = E1 e KerPE1 = E2.

CAPITULO 1. PRELIMINARES 14

De igual forma definimos as projecoes PE2 : E1 ⊕ E2 → E2, PF1 : F1 ⊕ F2 → F1 ePF2 : F1 ⊕ F2 → F2.

Dado L : E → F linear, sejam Lij : Ej → Fi, com i, j = 1, 2, definidos por

Lij = PFiLPEj |Ej .

O operador L pode ser representado pela matriz de operadores

L =

(L11 L12

L21 L22

), (1.3.1)

onde a matriz age usando o produto usual de matrizes em dimensoes finitas, isto e,para x = x1 + x2 ∈ E, onde x1 ∈ E1 e x2 ∈ E2,(

L11 L12

L21 L22

)(x1

x2

)=

(L11x1 + L12x2

L21x1 + L22x2

)= L11x1 + L12x2 + L21x1 + L22x2.

Definicao 1.3.1. A matriz dada em (1.3.1) e chamada de matriz de operadores asso-ciada a L e as decomposicoes de E e F .

Suponhamos agora que temos as decomposicoes E = E1 ⊕ E2, F = F1 ⊕ F2 eG = G1 ⊕G2. Consideremos os operadores L ∈ L(E,F ) e T ∈ L(F,G), com matrizesde operadores associadas as decomposicoes de E, F e G dadas por

L =

(L11 L12

L21 L22

)e T =

(T11 T12

T21 T22

).

Seja x = x1 + x2 ∈ E, com x1 ∈ E1 e x2 ∈ E2. Entao,

TLx = TL(x1 + x2)

= T ((L11x1 + L12x2) + (L21x1 + L22x2))

= T11(L11x1 + L12x2) + T12(L21x1 + L22x2)

+ T21(L11x1 + L12x2) + T22(L21x1 + L22x2)

= T11L11x1 + T12L21x1 + T11L12x2 + T12L22x2

+ T21L11x1 + T22L21x1 + T21L12x2 + T22L22x2

= (T11L11 + T12L21)x1 + (T11L12 + T12L22)x2

+ (T21L11 + T22L21)x1 + (T21L12 + T22L22)x2.

Assim, a matriz da composicao TL associadas as decomposicoes de E e G e dada peloproduto das matrizes de T e L, isto e,

TL =

(T11 T12

T21 T22

)(L11 L12

L21 L22

)=

(T11L11 + T12L21 T11L12 + T12L22

T21L11 + T22L21 T21L12 + T22L22

).

Fazendo uso das matrizes de operadores, o seguinte lema dara uma condicao sufi-ciente para que um operador linear seja um isomorfismo.

CAPITULO 1. PRELIMINARES 15

Lema 1.3.2. Dadas as decomposicoes

E = E1 ⊕ E2 e F = F1 ⊕ F2,

sejam L ∈ L(E,F ) e

L =

(L11 0L21 L22

)a matriz de operadores de L associada as decomposicoes de E e F , onde 0 e o operadornulo. Se L11 e L22 sao isomorfismos, entao L e um isomorfismo.

Demonstracao. Primeiro, provemos que L e injetor. De fato, fixemos x ∈ E. Dadescomposicao de E, temos x = x1 + x2, onde x1 ∈ E1 e x2 ∈ E2. Suponhamos queLx = 0. Daı,

0 = Lx = L11x1 + L21x1 + L22x2.

Agora, L11x1 ∈ F1 e L21x1 + L22x2 ∈ F2, assim L11x1 = 0 e L21x1 + L22x2 = 0. ComoL11 e um isomorfismo, entao x1 = 0. Daı, L22x2 = 0. Portanto, x2 = 0, pois L22

tambem e um isomorfismo. Logo, x = 0. Este fato prova que L e injetor.Por outro lado, provemos que L e sobrejetor. Seja y ∈ F fixado. Da decomposicao

de F , temos y = y1 + y2, onde y1 ∈ F1 e y2 ∈ F2. Ja que o operador L11 e sobrejetor,existe x1 ∈ E1 tal que L11x1 = y1. Daı, L21x1 ∈ F2, e como L22 e tambem sobrejetor,existe x2 ∈ E2 tal que L22x2 = y2 − L21x1. Assim,

L(x1 + x2) = L11x1 + L21x1 + L22x2 = y1 + L21x1 + y2 − L21x1 = y1 + y2 = y.

Logo, L e sobrejetor. Em conclusao, L e um isomorfismo.

De forma analoga podemos provar que

L =

(L11 L12

0 L22

)e um isomorfismo se assim sao L11 e L22.

Uma consequencia imediata do lema anterior e dada no seguinte corolario.

Corolario 1.3.3. Nas condicoes do lema anterior, se

L =

(L11 00 L22

),

onde L11 e L22 sao isomorfismos, entao L e um isomorfismo.

CAPITULO 1. PRELIMINARES 16

Observacao 1.3.4. Sejam E e F espacos de Banach. Da Proposicao 1.2.6 temos que,se E = E1 ⊕E2, onde E1 e E2 sao subespacos fechados de E, entao T : E1 ×E2 → E,definido por T (x1, x2) = x1 + x2 e um isomorfismo. Observe que o operador P ′E1

:E1 × E2 → E1 definido por P ′E1

(x1, x2) = x1 e limitado. De fato,

‖P ′E1(x, y)‖ = ‖x‖ ≤

√‖x‖2 + ‖y‖2 = ‖(x, y)‖ para (x, y) ∈ E1 × E2.

E claro que PE1 = P ′E1T−1, o que prova que PE1 e uma projecao limitada.

Analogamente, PE2 , PF1 e PF2 sao projecoes limitadas. Consequentemente, se L ∈L(E,F ), entao

L =

(L11 L12

L21 L22

),

onde Lij = PFiLPEj |Ej : Ej → Fi para i, j = 1, 2, e uma matriz de operadores limitados.

1.4 Espacos metricos compactos

A compacidade em espacos metricos e uma ferramenta importante para a introducaodos operadores lineares compactos entre espacos de Banach, que sera feita no proximocapıtulo. Nesta secao veremos algumas propriedades dos espacos metricos compactos.

Definicao 1.4.1. Seja Λ um espaco topologico Hausdorff. Dizemos que Uαα∈J e umacobertura aberta de Λ se Uα e aberto para todo α e Λ =

⋃α∈J Uα. Uma sub-cobertura

de Uαα∈J e uma cobertura Uββ∈S de Λ tal que, para todo β ∈ S, β = α para algumα ∈ J .

Um subconjunto X de Λ e dito compacto se toda cobertura de X admite umasub-cobertura com um numero finito de elementos.

Dizemos que X e completo se toda sequencia de Cauchy em X e convergente emX.

O seguinte teorema e uma caracterizacao dos espacos metricos compactos. Podemosver uma prova deste resultado em [18], pag. 34, Teorema 3.8.

Teorema 1.4.2. Seja X um subconjunto de um espaco metrico M . As seguintescondicoes sao equivalentes.

i. X e compacto.

ii. Toda sequencia em X possui uma subsequencia convergente em X.

iii. X e completo e totalmente limitado, isto e, para todo r > 0, X pode ser cobertopor um numero finito de bolas de raio r.

CAPITULO 1. PRELIMINARES 17

O seguinte lema sobre espacos metricos permite provar um corolario do teoremaacima.

Lema 1.4.3. Se X e um subconjunto totalmente limitado de um espaco metrico, entaoX e totalmente limitado.

Demonstracao. Seja r > 0 dado. Ja que X e totalmente limitado, existe um numerofinito de bolas B(x1, r/2), B(x2, r/2), ..., B(xn, r/2), de raio r/2 e centradas nos pontosx1, x2, ..., xn, tais que

X ⊆n⋃i=1

B(xi, r/2).

Assim,

X ⊆n⋃i=1

B(xi, r/2) =n⋃i=1

B(xi, r/2) ⊆n⋃i=1

B(xi, r).

Logo, X e totalmente limitado.

Definicao 1.4.4. Se diz que um subconjunto de um espaco topologico e relativamentecompacto se seu fecho e compacto.

Do Lema 1.4.3 e do Teorema 1.4.2 obtemos o seguinte corolario. A prova e imediatae portanto e omitida.

Corolario 1.4.5. Todo subconjunto totalmente limitado de um espaco metrico completoe relativamente compacto.

Observacao 1.4.6. Suponhamos que X e Y sejam subconjuntos compactos de umespaco normado E. Entao, X × Y e um subconjunto compacto de E ×E. Consequen-temente,

X + Y = x+ y : x ∈ X e y ∈ Y

e compacto, sendo a imagem do operador contınuo T : X × Y → X + Y definido por

T (x, y) = x+ y.

Veremos agora que em um espaco normado de dimensao infinita a esfera de raio 1com centro na origem nao e compacta.

Proposicao 1.4.7. Seja F um subespaco fechado de um espaco vetorial normado Ecom F 6= E. Seja ε > 0 fixado. Entao, existe x ∈ E, com ‖x‖ = 1, tal que

d(x, F ) = infy∈F‖x− y‖ ≥ 1− ε.

CAPITULO 1. PRELIMINARES 18

Demonstracao. Escolhamos z ∈ E que nao esteja em F . Seja yo ∈ F tal que

‖z − yo‖ 6 ( infy∈F‖z − y‖)(1 + ε).

Tomemos x =z − yo‖z − yo‖

. Entao, para y ∈ F, temos

‖x− y‖ = ‖ z − yo‖z − yo‖

− y‖ = ‖z − yo − ‖z − yo‖y‖z − yo‖

= ‖z − (yo + ‖z − yo‖y)

‖z − zo‖‖ ≥ ( inf

y∈F‖z − y‖) 1

‖z − yo‖

≥ ‖z − yo‖‖z − yo‖(1 + ε)

=1

1 + ε

≥ 1− ε,

e a prova e concluıda.

Corolario 1.4.8. Seja E um espaco normado de dimensao infinita. Entao, o conjunto

S = x ∈ E : ‖x‖ = 1

nao e compacto.

Demonstracao. Seja ε > 0 fixado. Tomemos x1 ∈ E, com x1 6= 0, e denotemos porF1 o espaco gerado por x1. Dado que F1 e fechado, da proposicao anterior temos queexiste x2 ∈ E de norma 1 tal que x2 nao pertence a F1 e d(x2, F1) ≥ 1 − ε. Seja F2

o espaco gerado por x1 e x2. Assim, F2 tem dimensao 2 e portanto e fechado. Logo,existe x3 ∈ E de norma 1 tal que x3 nao pertence a F2 e d(x3, F2) ≥ 1 − ε. Seja F3 oespaco F2 ⊕ spanx3. Desta forma, construımos uma sequencia de subespacos

F1 ⊆ F2 ⊆ ... ⊆ Fn,

onde cada Fi tem dimensao i. Como E tem dimensao infinita, temos Fn 6= E paran ∈ N. Dado que Fn e fechado, existe xn+1 ∈ E de norma 1 tal que xn+1 nao pertencea Fn e d(xn+1, Fn) ≥ 1− ε. Consequentemente, obtemos uma sequencia (xn)∞n=1 em Stal que ‖xn − xm‖ ≥ 1 − ε para todo n 6= m. E claro que esta sequencia nao possuisubsequencia convergente. Em conclusao, S nao e compacto.

Por ultimo vejamos as seguintes nocoes.

Definicao 1.4.9. Seja Λ um espaco topologico Hausdorff. Dizemos que uma coberturaaberta Uαα∈J de Λ possui um refinamento localmente finito se existe uma coberturaVββ∈J ′ de Λ com a propriedade que, para todo β ∈ J ′, existe α ∈ J tal que Vβ ⊆ Uαe, para todo x ∈ Λ, existe uma vizinhanca Bx de x com Bx ∩ Vβ 6= ∅ exceto para umnumero finito de ındices β.

Dizemos que Λ e paracompacto se qualquer cobertura possui um refinamento local-mente finito.

CAPITULO 1. PRELIMINARES 19

E facil ver que todo espaco metrico compacto e paracompacto.

Capıtulo 2

Operadores de Fredholm eoperadores compactos

Como foi dito na introducao, esta dissertacao trata da construcao do fluxo espectralpara caminhos de operadores de Fredholm auto-adjuntos em espacos de Hilbert reais.Para este fim, precisamos analisar algumas das propriedades basicas dos operadores deFredholm e, inclusive, dos operadores compactos, porque a relacao entre eles e muitoestrita. Algumas destas propriedades sao de tipo algebrico, ou seja, concernem somentea estrutura linear e portanto podem ser dadas para operadores de Fredholm em espacosvetoriais. Outras propriedades, desta vez de tipo topologico, sao mais logicamenteanalisadas em espacos normados ou de Banach. Os resultados apresentados servempara conhecer os operadores de Fredholm e passar no capıtulo seguinte ao ambientedos espacos de Hilbert, onde e feita a construcao do fluxo espectral.

Na primeira secao deste capıtulo apresentaremos varias propriedades dos operadoresde Fredholm em espacos vetoriais reais que tem uma natureza so algebrica. Provaremosque a soma de um operador de Fredholm e um operador com imagem de dimensaofinita e um operador de Fredholm. Mostraremos que a composicao de dois operadoresde Fredholm e um operador de Fredholm e que o ındice e igual a soma dos ındicesdos dois operadores. sao baseados na nocao de transversalidade, que e um conceitoclassico da algebra linear e da topologia diferencial. as propriedades apresentadas saoconhecidas, porem nao se encontram com facilidade na literatura. Resolvemos portandoprovidenciar diretamente uma prova delas.

Na segunda secao definiremos os operadores de Fredholm em espacos de Banach.Provaremos que a imagem de um operador de Fredholm e fechada. Os resultadosmostrados para operadores de Fredholm definidos em espacos vetoriais (nao necessari-amente normados) continuam sendo validos para operadores de Fredholm definidos emespacos de Banach. Mostraremos tambem que o conjunto dos operadores de Fredholme um subconjunto aberto do espaco dos operadores lineares limitados e que o ındicedefinido no conjunto dos operadores de Fredholm e uma aplicacao contınua.

20

CAPITULO 2. OPERADORES DE FREDHOLM E COMPACTOS 21

Na terceira secao lembraremos a definicao e algumas das principais propriedadesdos operadores compactos. O resultado mais interessante que apresentaremos nestasecao e que a soma do operador identidade e um operador compacto e um operador deFredholm de ındice 0. Como consequencia obteremos na ultima secao que a soma deum operador de Fredholm e um operador compacto e um operador de Fredholm.

Na ultima secao deste capıtulo veremos uma relacao que liga os operadores deFredholm aos operadores compactos. Daremos a definicao de operadores congruentesmodulo operador compacto e de operador inversıvel modulo operador compacto. Mos-traremos que um operador e de Fredholm se, e somente se, ele e inversıvel modulooperador compacto. Fazendo uso deste resultado, provaremos no final do capıtuloque a soma de um operador de Fredholm e um operador compacto e um operador deFredholm.

2.1 Operadores de Fredholm em espacos vetoriais

reais

Como ja dito na introducao, este trabalho trata do fluxo espectral para curvas deoperadores de Fredholm auto-adjuntos em espacos de Hilbert reais. Mesmo tendorecordados no capıtulo anterior varios resultados de analise funcional e algebra linearno corpo complexo, que por sua vez serao utilizados, focamos aqui a nossa atencao sobreos operadores de Fredholm em espacos (vetoriais e de Banach) em R. Esta escolha nosaproxima ao ponto central do nosso trabalho, ou seja, a construcao do fluxo espectral.

Nesta secao E e F representarao espacos vetoriais reais (de dimensao finita ouinfinita). O sımbolo F (E,F ), ou F (E) quando F = E, denotara o subespaco doL(E,F ) dos operadores lineares com imagem de dimensao finita.

O conucleo de um operador L ∈ L(E,F ) e o espaco quociente F/ ImL e seradenotado por coKerL.

Definicao 2.1.1 (Operador de Fredholm). Um operador linear L : E → F e dito deFredholm se KerL e coKerL tem dimensao finita. Neste caso, o seu ındice e o inteiro

indL = dim KerL− dim coKerL.

Observacao 2.1.2. Suponhamos que E e F sejam espacos de dimensao finita e queL ∈ L(E,F ). E claro que L e um operador de Fredholm. Alem disso, do Teorema donucleo e da imagem temos

dimE = dim KerL+ dim ImL.

CAPITULO 2. OPERADORES DE FREDHOLM E COMPACTOS 22

Consequentemente,

indL = dim KerL− dim coKerL

= dimE − dim ImL− (dimF − dim ImL)

= dimE − dimF.

Claramente um isomorfismo e um operador de Fredholm de ındice 0. Provaremosnesta secao que, se L e um operador de Fredholm e K e um operador com imagem dedimensao finita, entao a soma L+K e um operador de Fredholm do mesmo ındice deL.

Definicao 2.1.3. Dado um operador linear L : E → F , um subespaco F1 de F diz-setransverso a L se ImL+ F1 = F .

Um primeiro resultado que liga os operadores de Fredholm e a transversalidade eapresentado na seguinte proposicao.

Proposicao 2.1.4. Sejam L : E → F um operador de Fredholm e F1 um subespaco deF transverso a L. Entao, a restricao

L1 : L−1(F1)→ F1,

de L a L−1(F1), e de Fredholm com indL1 = indL.

Demonstracao. E claro que KerL1 esta contido em KerL, pois L1 e uma restricao deL. Por outro lado, se x ∈ KerL, claramente x ∈ L−1(F1), portanto KerL ⊆ KerL1.Assim,

KerL = KerL1. (2.1.1)

Tomemos um subespaco E1 de L−1(F1) tal que

L−1(F1) = E1 ⊕KerL1, (2.1.2)

e um subespaco F2 de F1 tal que

F1 = L(E1)⊕ F2. (2.1.3)

Daı,L(L−1(F1)) = L(E1 ⊕KerL1) = L(E1),

isto e, a imagem de L1 e L(E1).Vejamos que F = L(E)⊕ F2. Dado que F1 e transverso a L, temos que, se y ∈ F ,

entao y = y1 + y2, onde y1 ∈ L(E) e y2 ∈ F1 (esta soma pode nao ser univocamentedada). Pela igualdade dada em (2.1.3), existem z1 ∈ L(E1) e z2 ∈ F2 tais que y2 =z1 + z2, e assim, y = (y1 + z1) + z2. Como y1 + z1 ∈ L(E) e z2 ∈ F2, entao

F = L(E) + F2.

CAPITULO 2. OPERADORES DE FREDHOLM E COMPACTOS 23

Agora, consideremos um elemento v em L(E)∩F2. Seja w ∈ E tal que v = Lw. Osubespaco F2 esta contido em F1, logo Lw ∈ F1, isto e, w ∈ L−1(F1). De (2.1.2) temosw = w1 + w2, onde w1 ∈ E1 e w2 ∈ KerL1. Entao,

v = Lw = L(w1 + w2) = Lw1,

e portanto v ∈ L(E1). Assim, v ∈ L(E1) ∩ F2 e de (2.1.3) segue-se v = 0. Este fatoprova que

L(E) ∩ F2 = 0.

Logo,F = L(E)⊕ F2. (2.1.4)

A dimensao de F2 e finita, pois L e de Fredholm. As formulas (2.1.3) e (2.1.4)provam que

dimF2 = dim coKerL = dim coKerL1. (2.1.5)

O resultado segue-se das igualdades (2.1.1) e (2.1.5).

Observacao 2.1.5. Nas condicoes da proposicao anterior segue-se claramente que, seF1 tem dimensao finita, entao L−1(F1) tem dimensao finita. Alem disso, a Observacao2.1.2 implica que o ındice do operador L e

indL = dimL−1(F1)− dimF1.

No final desta secao provaremos que a composicao de dois operadores de Fredholm etambem um operador de Fredholm. No proximo lema damos a prova no caso particulardas composicoes TL e LS, onde T e S sao isomorfismos e L e um operador de Fredholm.

Lema 2.1.6. Sejam E,F,G e H espacos vetoriais. Suponhamos que L ∈ L(E,F ) sejaum operador de Fredholm. Se T ∈ L(F,G) e um isomorfismo, entao TL : E → G ede Fredholm com indL = indTL. Analogamente, se S ∈ L(H,E) e um isomorfismo,entao LS : H → F e de Fredholm com indL = indLS.

Demonstracao. Provemos a primeira parte do lema. E facil ver que

KerTL = KerL,

pois T e um isomorfismo.Dado que L e de Fredholm, existe um subespaco de dimensao finita F2 de F tal que

F = ImL⊕ F2.

Agora,G = T (ImL)⊕ T (F2) = ImTL⊕ T (F2).

CAPITULO 2. OPERADORES DE FREDHOLM E COMPACTOS 24

Sendo T um isomorfismo, dimT (F2) = dimF2. Portanto,

dim coKerTL = dimT (F2) = dimF2 = dim coKerL.

Em conclusao, TL e de Fredholm com indL = indTL.A prova da segunda parte do lema e analoga e portanto e omitida.

A seguinte proposicao mostra uma caracterizacao dos operadores de Fredholm deındice 0.

Proposicao 2.1.7. Se L : E → F e um operador de Fredholm de ındice 0, existe umoperador K com imagem de dimensao finita tal que L+K e um isomorfismo.

Demonstracao. Sejam E0 e F1 subespacos de E e F , respectivamente, tais que

E = E0 ⊕KerL e F = ImL⊕ F1.

Lembrando a construcao da Secao 3 do Capıtulo 1, a matriz associada a L e as decom-posicoes de E e F e dada por

L =

(L00 00 0

),

onde L00 : E0 → ImL e um isomorfismo.Como L e um operador de Fredholm de ındice 0, temos

dim KerL = dimF1 <∞.

Portanto, existe um isomorfismo K ′ de KerL em F1. Se x ∈ E, entao x = x0 + x1,onde x0 ∈ E0 e x1 ∈ KerL. Seja K : E → F definido por Kx = K(x0 + x1) = K ′x1.Assim,

dim ImK = dim ImK ′ = dimF1 <∞.Alem disso, a matriz associada a K e as decomposicoes de E e F e dada por

K =

(0 00 K ′

).

Consequentemente, a matriz de operadores de L+K e dada por

L+K =

(L00 00 K ′

).

Dado que L00 : E0 → ImL e K ′ : KerL→ F1 sao isomorfismos, o Corolario 1.3.3 provaque L+K e um isomorfismo.

Provaremos agora que a soma de um operador de Fredholm L e um operador Kcom imagem de dimensao finita e um operador de Fredholm, e que, alem disso, o ındicede L+K e igual ao ındice do operador L. Primeiro vejamos o seguinte lema.

CAPITULO 2. OPERADORES DE FREDHOLM E COMPACTOS 25

Lema 2.1.8. Assuma que E = E1⊕E2 e F = F1⊕F2. Sejam L : E → F um operadorde Fredholm e

L =

(A BC D

)a matriz de L associada as decomposicoes de E e F . Se A e invertıvel, entao o operadorD − CA−1B ∈ L(E2, F2) e de Fredholm e indL = ind(D − CA−1B).

Demonstracao. Seja T : F → F o operador associado a matriz

T =

(IF1 0−CA−1 IF2

),

onde IF1 e IF2 sao as identidades de F1 e F2, respectivamente. Do Lema 1.3.2 temosque T e um isomorfismo. Assim, segue-se do Lema 2.1.6 que TL e de Fredholm e

indTL = indL.

Agora,

TL =

(IF1 0−CA−1 IF2

)(A BC D

)=

(A B0 D − CA−1B

).

Tomemos o isomorfismo S : E → E associado a matriz

S =

(IE1 −A−1B0 IE2

).

Novamente pelo Lema 2.1.6 temos que o operador TLS e de Fredholm com

indTLS = indTL = indL.

Fazendo a composicao, obtemos

TLS =

(A B0 D − CA−1B

)(IE1 −A−1B0 IE2

)=

(A 00 D − CA−1B

). (2.1.6)

Daı, F2 e transverso a TLS, pois

F1 = A(E1) = (TLS)(E1) ⊆ Im(TLS).

Provemos que (TLS)−1(F2) = E2. De fato, seja x ∈ E tal que TLSx ∈ F2. Entao,x = x1 + x2, onde x1 ∈ E1 e x2 ∈ E2, e

TLS(x1 + x2) = Ax1 + (D − CA−1B)x2 ∈ F2.

Dado que Ax1 ∈ F1 e (D−CA−1B)x2 ∈ F2, se segue que Ax1 = 0. Logo, x1 = 0, poisA e um isomorfismo. Portanto, x = x2 ∈ E2. Este fato prova que (TLS)−1(F2) = E2.

Da Proposicao 2.1.4 concluımos que

(D − CA−1B) = TLS|E2 : E2 → F2

e um operador de Fredholm com ind(D−CA−1B) = indTLS, o que prova o lema.

CAPITULO 2. OPERADORES DE FREDHOLM E COMPACTOS 26

Teorema 2.1.9. Sejam L : E → F de Fredholm e K ∈ F (E,F ). Entao, o operadorL+K e de Fredholm e ind(L+K) = indL.

Demonstracao. Observe que a codimensao de KerK e finita. De fato, tomemos umcomplementar G de KerL em E. Daı, E = G⊕KerK e ImK = K(G) tem dimensaofinita. Dado que a restricao de K em G e injetora e a dimensao de K(G) e finita, entaodimG <∞.

Provemos que Ker(L + K) e finito-dimensional. Ja que L e L + K coincidem emKerK e KerL tem dimensao finita,

dim[Ker(L+K) ∩KerK] = dim[KerL ∩KerK] <∞.

Seja E ′ um complementar de Ker(L+K) ∩KerK em Ker(L+K), isto e,

Ker(L+K) = [Ker(L+K) ∩KerK]⊕ E ′.

Assim, a soma KerK⊕E ′ e direta. Consequentemente, a dimensao de E ′ e finita, poisa codimensao de KerK em E e finita. Este fato prova que

dim Ker(L+K) <∞. (2.1.7)

Por outro lado, provemos que dim coKer(L+K) <∞. Claramente

L(KerK) = (L+K)(KerK) ⊆ Im(L+K).

Como L e de Fredholm e a codimensao de KerK em E e finita, entao L(KerK) temcodimensao finita em F . Logo,

dim coKer(L+K) <∞. (2.1.8)

De (2.1.7) e (2.1.8) obtemos que L+K e um operador de Fredholm.Vejamos agora que ind(L+K) = indL. De fato, seja F1 um subespaco de dimensao

finita de F , transverso a L e tal que ImK ⊆ F1. Ponhamos E1 = L−1(F1). Como seviu na Observacao 2.1.5, E1 tem dimensao finita.

E claro que KerL esta contido em E1, portanto podemos escolher um subespacoE2 de E1 tal que E1 = E2 ⊕KerL. Seja E0 um subespaco de E tal que

E = E0 ⊕ E1 = E0 ⊕ E2 ⊕KerL.

Assim, sendo L injetor em E0 ⊕ E2, temos

ImL = L(E0 ⊕ E2 ⊕KerL) = L(E0)⊕ L(E2). (2.1.9)

Demonstremos que F = L(E0) ⊕ F1. Dado que F1 e transverso a L segue-se que,se y ∈ F , entao y = y0 + y1, onde y0 ∈ ImL e y1 ∈ F1. De (2.1.9) temos que existemz0 ∈ E0 e z2 ∈ E2 tais que y0 = L(z0 + z2). Assim,

y = L(z0 + z2) + y1 = Lz0 + (Lz2 + y1).

CAPITULO 2. OPERADORES DE FREDHOLM E COMPACTOS 27

Portanto, Lz0 ∈ L(E0), e como L(E2) ⊆ F1, entao Lz2 + y1 ∈ F1. Este fato prova queF = L(E0) + F1.

Provemos agora que a soma L(E0) +F1 e direta. De fato, se y ∈ L(E0)∩F1, entaoy = Lx0, para algum x0 em E0. Logo, Lx0 ∈ F1. Pela definicao de E1 se segue x0 ∈ E1.Daı, temos x0 ∈ E0 ∩ E1 = 0, pois a soma E0 ⊕ E1 e direta. Entao, x0 = 0. Estefato implica que y = 0. Assim, a soma L(E0)⊕ F1 e direta.

Consequentemente, a codimensao de L(E0) em F e finita e e igual a dimensao deF1.

Por outro lado, sejam

L =

(L00 L01

L10 L11

)e K =

(K00 K01

K10 K11

),

respectivamente, as matrizes dos operadores L e K associadas as decomposicoes

E = E0 ⊕ E1 e F = L(E0)⊕ F1.

A imagem de K esta contida em F1, portanto K00 = 0 e K01 = 0. Como L(E0)∩F1 =0, entao L10 = 0. Ja que E1 = L−1(F1), temos L(E1) ⊆ F1. Assim, L01 = 0. Logo,

L =

(L00 00 L11

)e K =

(0 0K10 K11

).

Daı,

L+K =

(L00 0K10 L11 +K11

).

O nucleo de L esta contido em E1, assim L00 : E0 → L(E0) e um isomorfismo.Por outro lado, os subespacos E1 e F1 tem dimensao finita, portanto o operador

L11 +K11 : E1 → F1 e de Fredholm com

ind(L11 +K11) = dimE1 − dimF1.

Dado que L00 e inversıvel, o lema anterior implica que

ind(L+K) = ind(L11 +K11).

Do lema anterior tambem temos

indL = indL11 = dimE1 − dimF1.

Consequentemente, indL = ind(L+K).

Como se tinha falado acima, provaremos que a composicao de dois operadores deFredholm e tambem um operador de Fredholm. Alem disso, se mostrara que o ındiceda composicao e igual a soma dos ındices dos dois operadores.

CAPITULO 2. OPERADORES DE FREDHOLM E COMPACTOS 28

Teorema 2.1.10. Sejam E,F e G espacos vetoriais e L1 : E → F e L2 : F → Goperadores de Fredholm. A composicao L2L1 : E → G e um operador de Fredholm e

indL2L1 = indL2 + indL1.

Demonstracao. Dado que KerL2 tem dimensao finita, o espaco F1 = ImL1 ∩ KerL2

tem dimensao finita. Assim, existe um subespaco de dimensao finita F2 de F , tal queKerL2 = F1 ⊕ F2. Obviamente F2 ∩ ImL1 = 0.

Sejam F0 e F3 subespacos de F tais que

ImL1 = F0 ⊕ F1 e F = ImL1 ⊕ F2 ⊕ F3.

Portanto,dim coKerL1 = dimF2 + dimF3. (2.1.10)

O conucleo de L1 tem dimensao finita, portanto F3 tem dimensao finita. Daı, o espacoF1⊕F2⊕F3 = KerL2⊕F3 tambem e finito-dimensional. Dado que a soma KerL2⊕F3

e direta, temos F3 ∩KerL2 = 0. Logo,

dimL2(F3) = dimF3.

Tomemos um subespaco de dimensao finita G1 de G, tal que G = ImL2 ⊕ G1.Entao,

dim coKerL2 = dimG1. (2.1.11)

Agora,ImL2 = L2(F ) = L2(F0 ⊕ F1 ⊕ F2 ⊕ F3) = L2(F0)⊕ L2(F3),

assimG = L2(F0)⊕ L2(F3)⊕G1. (2.1.12)

Por outro lado, como ImL1 = F0 ⊕ F1 e F1 e subespaco de KerL2, entao

ImL2L1 = L2(ImL1) = L2(F0 ⊕ F1) = L2(F0).

Logo, a expressao (2.1.12) implica que

dim coKer(L2L1) = dimL2(F3) + dimG1 = dimF3 + dimG1 <∞, (2.1.13)

pois os subespacos F3 e G1 tem dimensao finita.E claro que KerL1 e um subespaco de KerL2L1. Daı, existe um subespaco E0 de

E tal queKerL2L1 = E0 ⊕KerL1. (2.1.14)

Mostremos que L1(E0) = F1. Claramente L1(E0) ⊆ ImL1. O subespaco E0 estacontido em KerL2L1, portanto, se x ∈ E0, entao L2L1x = 0, isto e, L1x ∈ KerL2.Consequentemente,

L1(E0) ⊆ ImL1 ∩KerL2 = F1.

CAPITULO 2. OPERADORES DE FREDHOLM E COMPACTOS 29

Agora, se x ∈ F1, temos x ∈ KerL2 e x = L1y ∈ ImL1 para algum y ∈ E. Logo,x = L1y ∈ KerL2 e assim y ∈ KerL2L1 = E0 ⊕ KerL1. Portanto, y = y1 + y2, ondey1 ∈ E0 e y2 ∈ KerL1. Daı,

x = L1(y1 + y2) = L1y1 ∈ L1(E0).

Entao, F1 ⊆ L1(E0). Consequentemente, F1 = L1(E0).Ja que E0 ∩KerL1 = 0, entao

dimE0 = dimL1(E0) = dimF1.

Logo, de (2.1.14) temos

dim Ker(L2L1) = dimE0 + dim KerL1 = dimF1 + dim KerL1 <∞. (2.1.15)

Se segue de (2.1.13) e (2.1.15) que L2L1 e de Fredholm.Por ultimo, das formulas (2.1.10), (2.1.11), (2.1.13) e (2.1.15) temos

indL2L1 = dim KerL2L1 − dim coKerL2L1

= dim KerL1 + dimF1 − (dimF3 + dimG1)

= dim KerL1 + dimF1 − dimF3 − dim coKerL2

= dim KerL1 − dimF2 − dimF3 + dimF1 + dimF2 − dim coKerL2

= dim KerL1 − dim coKerL1 + dim KerL2 − dim coKerL2

= indL1 + indL2,

e a prova e concluıda.

2.2 Operadores de Fredholm em espacos de Banach

Nesta secao apresentaremos algumas propriedades dos operadores de Fredholm limi-tados entre espacos de Banach reais. Os resultados que mostraremos aqui estao dire-tamente relacionados com a topologia dos espacos, enquanto a secao anterior somentetomava conta dos aspectos algebricos.

Queremos destacar que, mesmo que alguns resultados desta secao sejam validostambem em espacos normados, preferimos, por razoes de simplicidade, trabalhar emespacos de Banach.

No resto do capıtulo, se nao se diz o contrario, vamos considerar que E e F saoespacos de Banach reais. Lembremos que neste caso L(E,F ) consiste dos operadoreslineares limitados de E em F . Denotaremos por Φ(E,F ) o subconjunto de L(E,F )dos operadores de Fredholm de E em F . Se n ∈ Z, o sımbolo Φn(E,F ) denotara oconjunto dos operadores de Fredholm de ındice n.

CAPITULO 2. OPERADORES DE FREDHOLM E COMPACTOS 30

Observacao 2.2.1. Como consequencia da Proposicao 1.2.13 temos que a imagem dequalquer operador de Fredholm L ∈ L(E,F ) e fechada.

A observacao anterior nao e sempre verdadeira se os espacos E e F nao sao com-pletos. Um exemplo que mostra este fato e o seguinte.

Exemplo 2.2.2. Um hiperplano de um espaco vetorial E e um subespaco de E decodimensao 1. Seja E1 o nucleo de um funcional linear nao limitado de um espaco deBanach E. Entao, E1 e um hiperplano nao fechado de E (ver [26], pag. 139, Teorema3.5-D). Tomemos o operador inclusao i : E1 → E, isto e, ix = x para todo x ∈ E1. Ooperador i e de Fredholm de ındice −1, porem, sua imagem, que e o espaco E1, nao efechada em E.

Vejamos alguns exemplos de operadores de Fredholm.

Exemplo 2.2.3. Seja `2 o espaco das sequencias reais (xn)∞n=1 tais que∑∞

n=1 |xn|2converge. Sabemos que `2 e um espaco de Hilbert com produto interno dado por

〈x, y〉 =∞∑n=1

xnyn, onde x = (xn)∞n=1, y = (yn)∞n=1 ∈ `2.

Para um inteiro positivo k, definamos Tk ∈ L(`2) por

Tk(x) = (xk+1, xk+2, ...) se x = (x1, x2, ....).

O operador Tk e sobrejetor e seu kernel tem dimensao k. Assim, Tk e um operador deFredholm de ındice k. Quando k = 1 este operador e conhecido como o operador shift.

Por outro lado, tomemos Sk ∈ L(`2) definido por

Sk(x1, x2, ...) = (0, ..., 0, x1, x2, ...) se x = (x1, x2, ....),

onde as k primeiras entradas de (0, ..., 0, x1, x2, ...) sao 0. O operador Sk e injetor e suaimagem tem codimensao k. Portanto, Sk e um operador de Fredholm de ındice −k.Desta forma, para qualquer inteiro k, podemos ter um operador de Fredholm de ındicek.

Uma das propriedades importantes do conjunto Φ(E,F ) e que e aberto em L(E,F ).Provaremos este fato no seguinte teorema. Alem disso, mostraremos que a aplicacaoT 7→ indT de Φ(E,F ) em R e contınua.

Teorema 2.2.4. O conjunto Φ(E,F ) e aberto em L(E,F ) e a aplicacao T 7→ indT econtınua em Φ(E,F ), protanto constante em cada componente conexa.

CAPITULO 2. OPERADORES DE FREDHOLM E COMPACTOS 31

Demonstracao. Seja L : E → F um operador de Fredholm. Desejamos provar queexiste ε > 0 tal que, se T ∈ L(E,F ) e ‖L − T‖ < ε, entao T e Fredholm. De fato, aProposicao 1.2.4 implica que podemos escolher um subespaco fechado G de E tal que

E = G⊕KerL. (2.2.1)

Como L e de Fredholm, da Proposicao 1.2.13 se segue que L(G) e um subespaco fechadode F . Consequentemente, a restricao L|G : G→ L(G) do operador L e um isomorfismo(Teorema da aplicacao aberta). Dado que a codimensao da imagem de L e finita, aObservacao 1.2.9 implica que

F = L(G)⊕Hpara algum subespaco de dimensao finita H de F e, alem disso,

dim coKerL = dimH. (2.2.2)

Ja que F = L(G)⊕H, o operador L : G×H → L(G)⊕H, definido por

L(x, y) = Lx+ y,

e limitado e bijetor. Como G × H e F sao espacos de Banach, L e um isomorfismo(ainda usando o Teorema da aplicacao aberta).

Tomemos T ∈ L(E,F ) tal que

sup‖x‖=1

x∈G

‖Tx− Lx‖ < min1/‖L−1‖, 1/‖L|G−1‖.

Ponhamos T : G×H → F definido por

T (x, y) 7→ Tx+ y.

Agora,

‖T − L‖ = sup‖(x,y)‖=1

‖Tx+ y − Lx− y‖ = sup‖(x,y)‖=1

‖Tx− Lx‖

= sup‖x‖=1

x∈G

‖Tx− Lx‖ < 1/‖L−1‖.

Portanto, do Corolario 1.1.8 temos que T e um isomorfismo. Logo, F = T (G) + H eassim T tem imagem de codimensao finita. Consequentemente, ImT e fechada pelaProposicao 1.2.13.

Vejamos que a soma T (G)+H e direta. Suponhamos que y+z = 0, onde y ∈ T (G) e

z ∈ H. Entao, y = Tx para algum x ∈ G oportuno e, alem disso, T (x, z) = Tx+z = 0.

Ja que T e um isomorfismo, temos x = z = 0. Assim, y = Tx = 0. Daı,

F = T (G)⊕H. (2.2.3)

CAPITULO 2. OPERADORES DE FREDHOLM E COMPACTOS 32

Provemos que T |G e injetor. De fato, seja x ∈ G tal que Tx = 0. Logo, T (x, 0) = 0.

Portanto, x = 0, pois T e um isomorfismo. Lembrando que a codimensao de G em Ee finita, obtemos que KerT tem dimensao finita. Dado que o conucleo e o nucleo de Te finito-dimensional, T e de Fredholm.

Por ultimo, mostremos que indT = indL. Como G e fechado e a dimensao de KerTe finita, entao G ⊕ KerT e fechado de codimensao finita. Escolhamos um subespacode dimensao finita M de E tal que

E = M ⊕G⊕KerT. (2.2.4)

De (2.2.1) e (2.2.4) se segue

dim KerL = dim KerT + dimM. (2.2.5)

Dado que ImT = T (M ⊕ G) = T (M) ⊕ T (G) e que este espaco e fechado, pois Te de Fredholm, T induz um isomorfismo linear

M ⊕G→ T (M)⊕ T (G).

Assim, dimM = dimT (M). Daı, a igualdade (2.2.3) implica que

dim coKerT = dimH − dimM. (2.2.6)

Das igualdades (2.2.5) e (2.2.6) segue-se

indT = dim KerT − dim coKerT

= dim KerL− dimM − (dimH − dimM)

= dim KerL− dimH

= indL.

Este fato prova que, para T suficientemente perto de L, indT = indL. Consequente-mente, ind e contınua, em particular localmente constante.

Uma consequencia importante do teorema anterior e dada no seguinte corolario.

Corolario 2.2.5. O conjunto Φn(E,F ) e aberto em L(E,F ) para todo n ∈ Z.

Demonstracao. E claro que

Φn(E,F ) = ind−1(n), onde n ∈ Z.

Dado que a aplicacao ind e contınua em Φ(E,F ), temos que Φn(E,F ) e aberto emΦ(E,F ) para todo n ∈ Z, sendo n aberto em Z. Portanto, Φn(E,F ) e aberto emL(E,F ).

CAPITULO 2. OPERADORES DE FREDHOLM E COMPACTOS 33

2.3 Operadores compactos em espacos de Banach

Nesta secao lembraremos algumas das propriedades mais importantes dos operadoreslineares compactos. Apresentaremos varias formas equivalentes de definir um operadorcompacto que serao usadas convenientemente para provar alguns resultados no restodo trabalho. Finalizaremos esta secao provando que, se K ∈ L(E) e compacto, entaoI −K e um operador de Fredholm de ındice 0, onde I e a identidade de E. Este fatoservira para provar um resultado mais geral: A soma de um operador de Fredholm deındice n e um operador compacto e um operador de Fredholm de ındice n.

Aqui E e F ainda denotam espacos de Banach reais, mesmo sendo possıvel trabalharem espacos normados, trabalhamos por maior simplicidade em espaco de Banach.

Definicao 2.3.1. Seja K : E → F um operador linear (nao necessariamente limitado).Dizemos que K e compacto se leva conjuntos limitados de E em conjuntos relativamentecompactos de F , isto e, se K(A) e compacto para qualquer subconjunto limitado A deE. Denotaremos por K(E,F ) o conjunto dos operadores lineares compactos de E emF ou simplesmente por K(E) quando F = E.

A definicao de operadores compactos pode ser analogamente dada em espacos nor-mados nao necessariamente completos.

Observacao 2.3.2. Equivalentemente, podemos dizer que K ∈ L(E,F ) e compacto seleva a bola aberta B de raio 1 e centro na origem de E em um conjunto relativamentecompacto de F . De fato, se K e compacto, entao K(B) e compacto. Reciprocamente,suponhamos que K(B) seja compacto. Se A e um subconjunto limitado de E, entaoA ⊆ B(0, r), onde B(0, r) e uma bola aberta com centro na origem de E e raio r > 0suficientemente grande. Dado que

B =1

rB(0, r) = x/r : x ∈ B(0, r) ,

temosK(B(0, r)) = rK(B).

Daı, K(B(0, r)) e compacto. Assim,

K(A) ⊆ K(B(0, r))

tambem e compacto. Este fato prova que K e compacto.

Analogamente podemos provar que K ∈ L(E,F ) e compacto se, e somente se, Kleva a bola fechada de raio 1 e centro na origem de E em um subconjunto relativamentecompacto de F .

Como consequencia da observacao anterior e pela linearidade dos operadores emL(E,F ), temos que K e compacto se, e somente se, K(B(x, r)) e relativamente com-pacto para qualquer bola aberta B(x, r) ⊆ E com centro em x ∈ E e raio r > 0.

CAPITULO 2. OPERADORES DE FREDHOLM E COMPACTOS 34

Na definicao de operador compacto nao foi exigida a continuidade do operador K.Porem, devido a limitacao do conjunto K(B), onde B e a bola com centro em 0 ∈ E eraio 1, temos que K e limitado. Portanto, todo operador compacto e limitado.

Mostraremos agora outra condicao suficiente e necessaria para que um operadorseja compacto. Este resultado e consequencia do Teorema 1.4.2. Primeiro vejamos oseguinte lema que vai ser usado na demonstracao.

Lema 2.3.3. Seja (xn)∞n=1 uma sequencia em um espaco metrico X convergente a x.Entao, (xn)∞n=1 possui uma subsequencia (xnk)

∞k=1 tal que

‖x− xnk‖ < 2−k para todo k ∈ N.

Demonstracao. De fato, dado que (xn)∞n=1 converge a x, para cada k = 1, existe xn1 ∈(xn)∞n=1 tal que ‖x − xn1‖ < 2−1. Para k = 2, existe xn2 ∈ (xn)∞n=1, com n2 > n1, talque ‖x−xn2‖ < 2−2. Desta forma obtemos uma sequencia finita (xnk)

mk=1 tal que, para

k = 1, 2, ...m, xnk ∈ (xn)∞n=1, n1 < n2 < ... < nm e

‖x− xnk‖ < 2−k.

Para k = m+ 1, existe xnm+1 ∈ (xn)∞n=1, com nm+1 > nm, tal que

‖x− xnm+1‖ < 2−(m+1).

Consequentemente, a subsequencia (xnk)∞k=1 construıda acima e tal que

‖x− xnk‖ < 2−k para todo k ∈ N,

como querıamos provar.

Proposicao 2.3.4. Um operador K ∈ L(E,F ) e compacto se, e somente se, dada umasequencia limitada (xn)∞n=1 em E, (Kxn)∞n=1 possui uma subsequencia convergente.

Demonstracao. Seja K ∈ L(E,F ) dado. Suponhamos que K seja compacto e que

(xn)∞n=1 seja uma sequencia limitada em E. Dado que (Kxn)∞n=1 e compacto, se segue

do Teorema 1.4.2 que a sequencia (Kxn)∞n=1 possui uma subsequencia convergente.Reciprocamente, suponhamos que, para toda sequencia limitada (xn)∞n=1 em E, a

sequencia (Kxn)∞n=1 possua uma subsequencia convergente. Sejam A um subconjuntolimitado de E e (yn)∞n=1 uma sequencia em K(A). Entao, cada yn e o limite de umasequencia contida em K(A), isto e,

yn = limm→∞

Kxmn , onde xmn ∈ A para todo n,m ∈ N.

Fixemos n ∈ N. Como (Kxmn )∞m=1 converge a yn quando m → ∞, escolhendo umasubsequencia conveniente de (Kxmn )∞m=1 e dando o mesmo nome a esta subsequencia,

CAPITULO 2. OPERADORES DE FREDHOLM E COMPACTOS 35

podemos supor, sem perda de generalidade, que ‖yn −Kxmn ‖ < 2−m para todo m ∈ N(este fato e consequencia do lema anterior). Consequentemente, podemos supor que,para todo n ∈ N,

‖yn −Kxmn ‖ < 2−m para todo m ∈ N. (2.3.1)

Dado que a sequencia (xnn)∞n=1 e limitada, (Kxnn)∞n=1 possui uma subsequencia con-vergente a algum z ∈ K(A). Podemos dar o mesmo nome a essa subsequencia e, alemdisso, pelo lema anterior, supor que

‖z −Kxnn‖ < 2−n para todo n ∈ N. (2.3.2)

Logo, de (2.3.1) e (2.3.2) temos

‖yn − z‖ < 2−n + 2−n = 2−n+1 para todo n ∈ N.

Daı, (yn)∞n=1 possui uma subsequencia convergente a z em K(A). Em conclusao, K(A)e compacto e portanto K e um operador compacto.

Da proposicao anterior obtemos uma definicao equivalente para um operador com-pacto. Esta nova definicao vai ser de grande importancia na prova de alguns resultadosnesta secao.

Observacao 2.3.5. Dado que todo subconjunto de um espaco de dimensao finita ecompacto se, e somente se, e fechado e limitado, segue-se que, se E ou F sao dedimensao finita, entao todo operador linear limitado de E em F e compacto. Conse-quentemente, se K e limitado e sua imagem tem dimensao finita, entao K e compacto.

Dado que a esfera de raio 1 com centro na origem de um espaco normado de di-mensao infinita E nao e compacta (Corolario 1.4.8), temos que o operador identidadeI : E → E nao e um operador compacto.

O seguinte teorema mostra que K(E,F ) e um subespaco vetorial fechado do espacoL(E,F ).

Teorema 2.3.6. O conjunto K(E,F ) e um subespaco vetorial fechado de L(E,F ).

Demonstracao. Denotemos por B a bola aberta de raio 1 com centro em 0 ∈ E.Mostremos que a soma de dois operadores compactos e compacta. De fato, sejam

K1, K2 ∈ K(E,F ) fixados. Dado que K1(B) e K2(B) sao subconjuntos compactos,

K1(B) +K2(B)

e compacto (Observacao 1.4.6). Como K1(B) +K2(B) ⊆ K1(B) +K2(B), entao

K1(B) +K2(B) ⊆ K1(B) +K2(B),

CAPITULO 2. OPERADORES DE FREDHOLM E COMPACTOS 36

pois K1(B) + K2(B) e fechado. Daı, K1(B) +K2(B) e um subconjunto fechado deum conjunto compacto e assim e compacto. Da Observacao 2.3.2 se segue K1 + K2 ∈K(E,F ).

Por outro lado, seja K ∈ L(E,F ) um operador compacto. Para qualquer escalar c,o conjunto K(cB) e compacto. Alem disso,

K(cB) = (cK)(B),

portanto (cK)(B) e compacto. Da Observacao 2.3.2 se segue que o operador cK ecompacto. Os dois fatos acima provam que K(E,F ) e um espaco vetorial.

Mostremos agora que K(E,F ) e fechado em L(E,F ). Seja K um operador emK(E,F ). desejamos provar que K e compacto. Pelo Lema 1.4.3 e suficiente provar queK(B) e totalmente limitado. Fixemos r > 0. Escolhamos um M ∈ K(E,F ) tal que‖K −M‖ < r/2. Como M e compacto, entao M(B) e coberto por um numero finitode bolas abertas de raio r/2, centradas nos pontos y1, y2, ..., yn ∈ F . Para cada x ∈ B,temos

‖K(x)−M(x)‖ < r/2 e ‖M(x)− yi‖ < r/2

para algum i. Daı, ‖K(x)− yi‖ < r para algum i, e portanto K(B) e coberto por umnumero finito de bolas de raio r. Logo, K ∈ K(E,F ). Assim, K(E,F ) e um subespacofechado de L(E,F ).

Na prova do teorema anterior vemos que a hipotese de que E seja de Banach nao enecessaria para que o conjunto dos operadores compactos de E em F seja um espacocompleto. O seguinte exemplo mostra que a completude de F e necessaria para queK(E,F ) seja de Banach.

Exemplo 2.3.7. Seja c0 o espaco das sequencias com valores em R que convergem a0. Este e um espaco de Banach com a norma

‖x‖ = supn|xn|, onde x = (xn)∞n=1 ∈ c0.

O subconjunto c00 das sequencias (xn)∞n=1 ∈ c0 tais que xi 6= 0 para um numero finitode ındices i e um subespaco de c0. Vejamos que c00 nao e fechado. De fato, a sequencia(xn)∞n=1, onde xn = (1, 1/2, ..., 1/n, 0, ...), pertence a c00 para todo n ∈ N. E facilver que esta sequencia converge a x = (1, 1/2, ..., 1/n, 1/(n+ 1), ...) que pertence a c0.Porem, x nao pertence a c00. Portanto, c00 nao e de Banach.

Mostremos que K(c0, c00) nao e completo. A sequencia de operadores Kn definidospor

Knx = (x1, x2/2, ..., xn/n, 0, ...), onde x = (x1, x2, ..., xn, ...) ∈ c0,

e uma sequencia de operadores em K(c0, c00), pois cada Kn e limitado e tem imagemde dimensao finita. E facil ver que esta sequencia converge ao operador K, definidopor

Kx = (x1, x2/2, ..., xn/n, xn+1/(n+ 1), ...), onde x = (x1, x2, ..., xn, ...) ∈ c0.

CAPITULO 2. OPERADORES DE FREDHOLM E COMPACTOS 37

E claro que K nao pertence a L(c0, c00), portanto K nao pertence a K(c0, c00). Assim,K(c0, c00) nao e completo.

Na Secao 2 do capıtulo anterior definimos o produto direto de dois operadoreslimitados em espacos de Banach. Na seguinte proposicao provaremos que o produtodireto de dois operadores compactos e compacto.

Proposicao 2.3.8. Sejam K1 : E1 → F1 e K2 : E2 → F2 operadores compactos, ondeE1, F1, E2 e F2 sao espacos de Banach. Entao, o produto direto

(K1, K2) : E1 × E2 → F1 × F2

e um operador compacto.

Demonstracao. Provemos primeiro que, se A1 e A2 sao subconjuntos limitados de E1

e E2, respectivamente, entao (K1, K2)(A1 × A2) e compacto. De fato, dado que oproduto cartesiano de dois conjuntos compactos e compacto, se segue que

K1(A1)×K2(A2)

e compacto. Agora,

(K1, K2)(A1 × A2) = K1(A1)×K2(A2) ⊆ K1(A1)×K2(A2).

Consequentemente,

(K1, K2)(A1 × A2) ⊆ K1(A1)×K2(A2).

Daı, (K1, K2)(A1 × A2) e compacto.Por outro lado, e claro que, se A e um subconjunto limitado de E1 × E2, existem

subconjuntos limitados C1 e C2 de E1 e E2, respectivamente, tais que A ⊆ C1 × C2.Logo,

(K1, K2)(A) ⊆ (K1, K2)(C1 × C2).

Como se provou acima, (K1, K2)(C1 × C2) e compacto, portanto (K1, K2)(A) e com-pacto. Em conclusao, (K1, K2) e um operador compacto.

Observacao 2.3.9. Suponhamos que K : E → F seja compacto. Observe que, se E1

e um subespaco qualquer de E e K(E1) ⊆ F1 para algum subespaco F1 de F , entao arestricao

K|E1 : E1 → F1

e tambem um operador compacto. De fato, seja A1 um subconjunto limitado de E1.Como K(E1) ⊆ F1, entao

K(A1) = K(A1) ∩ F1,

isto e, o fecho de K(A1) em F1 e em F coincidem (observe que nao estamos supondoF1 fechado em F ). Dado que K e compacto, temos que K(A1) e compacto. Conse-quentemente, a restricao K|E1 e compacta.

CAPITULO 2. OPERADORES DE FREDHOLM E COMPACTOS 38

Uma outra propriedade importante dos operadores compactos e que a composicaode um operador compacto e um operador limitado e um operador compacto. Este fatoe provado no seguinte teorema.

Teorema 2.3.10. Sejam E,F,G e H espacos de Banach, e T : E → F , K : F → G,S : G→ H operadores limitados. Se K e compacto, entao KT e SK sao compactos.

Demonstracao. Se C e um subconjunto limitado de E, entao T (C) ⊆ F e limitado,pois T e limitado. Assim, K(T (C)) e compacto. Daı, KT e compacto.

Por outro lado, seja A um subconjunto limitado de F . Dado que S e contınuoe K(A) e compacto, entao S(K(A)) e compacto. Agora, S(K(A)) ⊆ S(K(A)) quee fechado, portanto S(K(A)) ⊆ S(K(A)). Logo, S(K(A)) e compacto, pois e umsubconjunto fechado de um compacto. Assim, SK e compacto.

Observe que L(E) tem estrutura de anel com as operacoes soma e composicao deoperadores. O teorema acima mostra em particular que K(E) e um ideal a esquerda ea direita de L(E).

Na primeira secao deste capıtulo se provou que a soma de um operador de FredholmL e um operadorK com imagem de dimensao finita e tambem um operador de Fredholm(no sentido algebrico). No final deste capıtulo mostraremos que, se L e de Fredholm(no sentido topologico) e K e compacto, entao L + K tambem e de Fredholm com omesmo ındice de L. Vejamos primeiro que I − K e um operador de Fredholm e queind(I −K) = ind I = 0.

Teorema 2.3.11. Se K : E → E e um operador compacto, entao I−K e um operadorde Fredholm e, alem disso,

ind(I −K) = ind I = 0.

Demonstracao. Lembremos que o operador identidade I de um espaco normado F ecompacto se, e somente se, F tem dimensao finita. Agora, se x ∈ Ker(I −K), entao

Ix = Ix− (I −K)x = Ix− Ix+Kx = Kx,

isto e, a identidade restrita ao kernel de I−K coincide com K|Ker(I−K). Da Observacao2.3.9 temos que K|Ker(I−K) e compacto. Daı, I|Ker(I−K) e um operador compacto.Consequentemente, Ker(I −K) tem dimensao finita.

Mostremos agora que a imagem de I − K e fechada. Seja G um complementarfechado de Ker(I−K), isto e, E = G⊕Ker(I−K). Tomemos os operadores limitados

(I −K)|G : G→ E e K|G : G→ E,

CAPITULO 2. OPERADORES DE FREDHOLM E COMPACTOS 39

que sao as restricoes a G de I − K e K, respectivamente. E claro que (I − K)|G einjetor e que Im(I −K) = (I −K)(G). Se segue da Proposicao 1.1.10 que para provarque a imagem de I −K e fechada e suficiente provar que o operador inverso

(I −K)|−1G : (I −K)(G)→ G

e limitado, e para este fim, e suficiente provar que (I − K)|−1G e contınuo em 0 pela

Proposicao 1.1.1. De fato, suponhamos por absurdo que (I −K)|−1G nao seja contınuo

em 0. Logo, existe uma sequencia (xn)∞n=1 em G nao convergente a 0 e tal que (I −K)xn → 0. Escolhendo uma subsequencia (conveniente) podemos assumir, sem perdade generalidade, que existe r > 0 tal que ‖xn‖ ≥ r para todo n. Entao, 1/‖xn‖ 6 1/rpara todo n, e assim (I −K)(xn/‖xn‖)→ 0. Alem disso, xn/‖xn‖ tem modulo 1, logo(K(xn/‖xn‖))∞n=1 possui uma subsequencia convergente, pois K e compacto. Ja que

(I −K)

(xn‖xn‖

)=

xn‖xn‖

−K(

xn‖xn‖

)e G e fechado, segue-se que uma subsequencia de (xn/‖xn‖)∞n=1 converge a algumelemento z ∈ G. E claro que ‖z‖ = 1. Consequentemente, 0 = z −K(z) = (I −K)(z),contradizendo o fato que G ∩Ker(I −K) = 0. Portanto, (I −K)(E) = (I −K)(G)e fechado.

Provemos que (I−K)(E) tem codimensao finita. Suponhamos por absurdo que (I−K)(E) nao tenha codimensao finita. Como consequencia do Lema 1.2.3, adicionandoum subespaco de dimensao 1 a (I −K)(E) indutivamente, obtemos uma sequencia desubespacos fechados

(I −K)(E) = H0 ⊆ H1 ⊆ ... ⊆ Hn ⊆ ...,

tais que cada Hn e fechado e tem codimensao 1 em Hn+1. Pela Proposicao 1.4.7, emcada Hn existe um elemento xn tal que ‖xn‖ = 1 e ‖xn−y‖ ≥ 1−ε para todo y ∈ Hn−1.Entao, para todo k < n,

‖Kxn −Kxk‖ = ‖xn − (I −K)xn − xk + (I −K)xk‖ ≥ 1− ε,

pois xn ∈ Hn e −(I −K)xn− xk + (I −K)xk ∈ Hn−1. Este fato prova que a sequencia(Kxn)∞n=1 nao tem subsequencia convergente, contradizendo a compacidade de K. Daı,a codimensao da imagem de I −K e finita. Assim, I −K e de Fredholm.

Por ultimo, vejamos que ind(I −K) = 0. Claramente, para cada t ∈ R, o operadortK e compacto. A aplicacao t 7→ tK e contınua. Logo, a aplicacao t 7→ ind(I − tK)tambem e contınua. Dado que I − tK pertence a Φ(E) para todo t ∈ R, se segue doTeorema 2.2.4 que esta aplicacao e constante. Tomando t = 0 e t = 1, concluımos que

ind(I −K) = ind I = 0,

isto e, I −K e um operador de Fredholm de ındice 0.

CAPITULO 2. OPERADORES DE FREDHOLM E COMPACTOS 40

2.4 Operadores congruentes modulo operador com-

pacto

Veremos nesta secao uma relacao de grande importancia que liga os operadores com-pactos aos operadores de Fredholm. Esta relacao nos permitira provar facilmente quea soma de um operador compacto e um operador de Fredholm e um operador deFredholm.

Definicao 2.4.1. Sejam L, T ∈ L(E,F ) dados. Dizemos que L e T sao congruentesmodulo operador compacto se L− T e compacto, e escrevemos L ∼= T .

Em alguns livros os operadores congruentes modulo operador compacto sao chama-dos de Calkin equivalentes.

Vejamos que a congruencia ∼= e uma relacao de equivalencia. De fato, sejamL, T, S ∈ L(E,F ). Esta congruencia e reflexiva, pois claramente L ∼= L. Agora, seL ∼= T , entao L− T e compacto. Assim, T − L = −(L− T ) e compacto. Daı, T ∼= L,o que prova que a congruencia e simetrica. Por ultimo vejamos que ela e transitiva.Se L ∼= T e T ∼= S, entao L− T e T − S sao operadores compactos. Como a soma deoperadores compactos e compacta, temos que

L− T + T − S = L− S

e compacto, isto e, L ∼= S.Outra propriedade dos operadores congruentes modulo operador compacto e apre-

sentada na seguinte proposicao.

Proposicao 2.4.2. Sejam L, T ∈ L(E,F ) e L1, T1 ∈ L(G,E), onde E,F e G saoespacos de Banach. Suponhamos que L ∼= T e L1

∼= T1. Entao, LL1∼= TT1.

Demonstracao. De fato, como L − T e L1 − T1 sao compactos, se segue do Teorema2.3.10 que (L− T )L1 e T (L1− T1) sao compactos. A soma de operadores compactos ecompacta, portanto

(L− T )L1 + T (L1 − T1)

e compacto. Assim,

LL1 − TT1 = (L− T )L1 + T (L1 − T1)

e compacto, o que prova a proposicao.

Observe que, se L ∼= T e L1∼= T1, onde L, T, L1, T1 ∈ L(E,F ), entao

L+ L1∼= (T + T1).

Este fato se deve a que a soma de operadores compactos e compacta.

CAPITULO 2. OPERADORES DE FREDHOLM E COMPACTOS 41

Dizemos que L : E → F e inversıvel modulo operador compacto se existe umoperador limitado L1 : F → E tal que

L1L ∼= IE e LL1∼= IF ,

onde IE e IF denotam as identidades de E e F , respectivamente. Neste caso dizemosque L1 e uma inversa de L modulo operador compacto.

Observacao 2.4.3. Suponhamos que, para L ∈ L(E,F ), existam L1, L2 ∈ L(F,E)tais que

LL1∼= IF e L2L ∼= IE.

Vejamos que L1∼= L2 e que, alem disso, L1 e L2 sao inversas de L modulo operador

compacto. De fato, por hipotese,

K1 = LL1 − IF e K2 = L2L− IE (2.4.1)

sao compactos. Assim, temos as relacoes seguintes

LL1 − IF = K1

L2LL1 − L2 = L2K1

(K2 + IE)L1 − L2 = L2K1

K2L1 + L1 − L2 = L2K1

L1 − L2 = L2K1 −K2L1.

Este fato prova que K1,2 = L1 − L2 e compacto.Agora, vejamos que L2 e uma inversa de L modulo operador compacto. Dado que

L1 = L2 +K1,2, onde K1,2 e compacto, de (2.4.1) temos

LL2 − IF = K1 − LK1,2.

Se segue do Teorema 2.3.10 que LK1,2 e compacto. Logo, LL2 − IF = K1 − LK1,2

e compacto, pois a soma de operadores compactos e compacta. Consequentemente,LL2 − IF e L2L − IE sao compactos. Em conclusao, L2 e uma inversa de L modulooperador compacto.

Analogamente, L1 e uma inversa de L modulo operador compacto.

No proximo teorema mostraremos que L e um operador de Fredholm se, e somentese, L e inversıvel modulo operador compacto.

Teorema 2.4.4. Um operador L ∈ L(E,F ) e de Fredholm se, e somente se, e inversıvelmodulo operadores compactos. Podemos escolher uma inversa de L modulo operadorescompactos que tenha imagem de codimensao finita.

CAPITULO 2. OPERADORES DE FREDHOLM E COMPACTOS 42

Demonstracao. Suponhamos primeiro que L ∈ L(E,F ) seja um operador de Fredholme provemos que existe S ∈ L(F,E) tal que IE−SL e IF−LS sao operadores compactos.Expressemos os espacos E e F nas seguintes somas diretas

E = G⊕KerL e F = ImL⊕H,

ondeG eH sao subespacos fechados de E e F, respectivamente. Assim, L−1 : ImL→ Gexiste e e limitado pelo Teorema da aplicacao aberta. Tomemos P : ImL⊕H → ImLa projecao sobre ImL e i : G → G⊕KerL a inclusao. Seja S ∈ L(F,E) a composicaoiL−1P.

Agora, se x+ y ∈ ImL⊕H, com x ∈ ImL e y ∈ H, entao

(IF − LS)(x+ y) = IF (x+ y)− L(iL−1P )(x+ y)

= x+ y − LiL−1x

= x+ y − x= y.

Este fato prova que IF − LS e a projecao sobre H. Alem disso,

dim Im(IF − LS) = dimH = coKerL <∞,

isto e, IF − LS e compacto.Por outro lado, se x+ y ∈ G⊕KerL, onde x ∈ G e y ∈ KerL, temos

(IE − SL)(x+ y) = IE(x+ y)− iL−1PL(x+ y)

= x+ y − iL−1PLx

= x+ y − L−1Lx

= x+ y − x= y,

isto e, IE − SL e a projecao sobre KerL. Dado que

dim Im(IE − SL) = dim KerL <∞,

IE − SL e compacto.Os fatos acima mostram que S e uma inversa de L modulo operador compacto.Reciprocamente, suponhamos que T ∈ L(F,E) seja uma inversa de L modulo

operadores compactos. Assim, K = IE − TL e compacto. Portanto, TL = IE −K ede Fredholm. Este fato prova que Ker(TL) tem dimensao finita. Dado que KerL ⊆Ker(TL), temos dim KerL < ∞. Analogamente, LT e de Fredholm. Se segue daProposicao 1.2.13 que LT tem imagem fechada de codimensao finita. Alem disso,Im(LT ) ⊆ ImL. Logo, ImL e fechado e tem codimensao finita. Em conclusao, L e deFredholm.

CAPITULO 2. OPERADORES DE FREDHOLM E COMPACTOS 43

Terminamos o capıtulo mostrando que a soma de um operador compacto e umoperador de Fredholm e tambem um operador de Fredholm, estendendo o Teorema2.1.9.

Teorema 2.4.5. Se L ∈ L(E,F ) e um operador de Fredholm e K ∈ L(E,F ) e umoperador compacto, entao L+K e de Fredholm. Alem disso,

ind(L+K) = indL.

Demonstracao. Sejam L ∈ Φ(E,F ) e K ∈ K(E,F ) fixados. O Teorema 2.4.4 implicaque existem L1 ∈ L(F,E), K1 ∈ K(F, F ) e K2 ∈ K(E,E) tais que

LL1 − IF = K1 e L1L− IE = K2.

Assim,

LL1 +KL1 − IF = K1 +KL1 e L1K + L1L− IE = K2 + L1K.

Daı,

(L+K)L1 − IF = K1 +KL1 e L1(L+K)− IE = K2 + L1K. (2.4.2)

Dado que K1 + KL1 e K2 + L1K sao compactos, se segue de (2.4.2) que o operadorL1 e uma inversa de L+K modulo operador compacto. Portanto, pelo Teorema 2.4.4L+K e de Fredholm.

Por outro lado, tK e um operador compacto para todo t ∈ R. Assim, L+ tK e deFredholm para 0 6 t 6 1. Dado que a aplicacao ind e contınua, temos

ind(L+K) = ind(L+ tK) = indL,

e o teorema e provado.

Capıtulo 3

Operadores de Fredholmauto-adjuntos em espacos deHilbert

O proposito deste capıtulo e apresentar algumas das propriedades dos operadores deFredholm em espacos de Hilbert. Para este fim, nas duas primeiras secoes lembraremosalguns resultados conhecidos da analise funcional dos espacos de Hilbert, assim comoa definicao do operador adjunto. Uma atencao especial sera dada aos operadores auto-adjuntos, como premissa para a construcao do fluxo espectral. Estes resultados seraode grande importancia no resto do trabalho.

Na terceira secao mostraremos algumas nocoes basicas da teoria espectral. Lembra-remos a definicao do espectro de um operador limitado. Alem disso, para um operadorauto-adjunto L ∈ L(H), onde H e um espaco de Hilbert, veremos a decomposicaoespectral de H na soma direta dos subespacos espectrais positivo e negativo e o nucleodo operador L.

Na quarta secao provaremos que, se H e um espaco de Hilbert de dimensao infinita,real e separavel, o conjunto dos operadores de Fredholm auto-adjuntos, que denotare-mos por ΦS(H), possui tres componentes conexas ligadas a estrutura dos subespacosespectrais.

Nas tres primeiras secoes, se nao se diz o contrario, H representara um espaco deHilbert de dimensao finita ou infinita, com produto interno denotado por 〈· , ·〉, sobreo corpo K, onde K e R ou C, em quanto a quarta secao H sera considerado real.

44

CAPITULO 3. OPERADORES DE FREDHOLM EM ESPACOS DE HILBERT 45

3.1 Preliminares: algumas propriedades dos espa-

cos de Hilbert

Como tınhamos falado acima, sublinharemos alguns fatos particulares inerentes aosespacos de Hilbert (reais ou complexos) e aos operadores limitados em espacos deHilbert que serao usados no resto do trabalho. O leitor pode observar que alguns dosresultados sao validos no caso em que H seja um espaco com produto interno naonecessariamente completo.

Uma das propriedades do produto interno e a continuidade, como mostraremos noseguinte lema.

Lema 3.1.1 (Continuidade do produto interno). Se (xn)∞n=1 e (yn)∞n=1 sao duas sequen-cias em H tais que xn → x e yn → y, onde x, y ∈ H, entao 〈xn, yn〉 → 〈x, y〉.

Demonstracao. Da definicao do produto interno e da desigualdade de Cauchy-Schwarz(ver (1.1.2)), se segue

|〈x, y〉− 〈xn, yn〉| = |〈x, y〉− 〈xn, y〉+ 〈xn, y〉− 〈xn, yn〉| ≤ ‖x−xn‖‖y‖+ ‖xn‖‖y− yn‖.

Como ‖x− xn‖ → 0 e ‖y − yn‖ → 0, temos 〈xn, yn〉 → 〈x, y〉.

Definicao 3.1.2. Seja A um subconjunto de H. Dizemos que x ∈ H e ortogonal aA, se 〈x, y〉 = 0 para todo y ∈ A. O conjunto ortogonal de um subconjunto A de H,denotado por A⊥, e o conjunto dos x ∈ H que sao ortogonais a A. Se A e um subespacode H, A⊥ sera chamado de complementar ortogonal de A.

Vejamos algumas das propriedades que possui um conjunto ortogonal.

Proposicao 3.1.3. Se A e um subconjunto de H, entao A⊥ e um subespaco fechado

de H e A⊥ = A⊥

.

Demonstracao. Primeiro vejamos que A⊥ e um subespaco de H. De fato, sejam x, y ∈A⊥ e λ ∈ K. Assim, se a ∈ A, temos

〈λx+ y, a〉 = 〈λx, a〉+ 〈y, a〉 = λ〈x, a〉+ 〈y, a〉 = 0,

isto e, λx+ y ∈ A⊥. Este fato prova que A⊥ e um subespaco de H.Agora mostremos que A⊥ e fechado. Seja (xn)∞n=1 uma sequencia em A⊥ convergente

a x ∈ H. Daı, se a ∈ A e n ∈ N, a desigualdade de Cauchy-Schwarz implica que

|〈x, a〉| = |〈x, a〉 − 〈xn, a〉| = |〈x− xn, a〉| ≤ ‖x− xn‖‖a‖.

Dado que xn → x, entao 〈x, a〉 = 0 para todo a ∈ A, isto e, x ∈ A⊥, como se queriaprovar.

CAPITULO 3. OPERADORES DE FREDHOLM EM ESPACOS DE HILBERT 46

Por ultimo, provemos que A⊥ = A⊥

. E claro que A⊥ ⊆ A⊥, pois A ⊆ A. Por outro

lado, seja x ∈ A⊥. Qualquer a ∈ A e o limite de uma sequencia (an)∞n=1 em A. Assim,

|〈x, a〉| = |〈x, a〉 − 〈x, an〉| = |〈x, an − a〉| ≤ ‖x‖‖an − a‖.

Portanto, 〈x, a〉 = 0 e a ∈ A⊥. Consequentemente, A⊥ = A⊥

.

Teorema 3.1.4 (Soma direta). Seja H1 um subespaco completo de H, isto e, H1 e umespaco de Banach. Entao,

H = H1 ⊕H⊥1 .

Demonstracao. Seja x ∈ H fixado. Provemos que existe x1 ∈ H1 tal que

‖x− x1‖ = infz∈H1

‖x− z‖

e x− x1 ⊥ H1. De fato, para n ∈ N, seja yn ∈ H1 tal que ‖x− yn‖2 < d2 + 1/n, onded = infz∈H1 ‖x − z‖. Vejamos que (yn)∞n=1 e uma sequencia de Cauchy. Consideremosx− yn e x− ym. Da lei do paralelogramo temos

‖(x− yn) + (x− ym)‖2 + ‖(x− yn)− (x− ym)‖2 = 2‖x− yn‖2 + 2‖x− ym‖2.

Assim, comoyn − ym

2∈ H1, entao

‖ym − yn‖2 = 2‖x− yn‖2 + 2‖x− ym‖2 − ‖2x− (yn − ym)‖2

= 2‖x− yn‖2 + 2‖x− ym‖2 − 4‖x− yn − ym2

‖2

≤ 2(d2 + 1/n) + 2(d2 + 1/m)− 4d2 =2

n+

2

m.

Consequentemente, dado que H1 e completo, (yn)∞n=1 converge a algum ponto x1 ∈ H1.Portanto,

‖x− x1‖ = limn→∞

‖x− yn‖ = d.

Ponhamos x2 = x − x1. Assumamos que x2 nao e ortogonal a H1. Assim, existez ∈ H1 tal que 〈x2, z〉 > 0. Entao, para ε > 0, temos

‖x− (x1 + εz)‖2 = ‖x2 − εz‖2 = 〈x2 − εz, x2 − εz〉= 〈x2, x2〉 − 2ε〈x2, z〉+ ε2〈z, z〉= d2 − ε(2〈x2, z〉 − ε‖z‖2).

Ja que 〈x2, z〉 > 0, para ε suficientemente pequeno, 2〈x2, z〉 − ε‖z‖2 > 0. Daı, ‖x −(x1 + εz)‖ < d, contradizendo a definicao de d. Assim, x2 ⊥ H1. Logo, para qualquerx ∈ H podemos achar x1 ∈ H1, x2 ∈ H⊥1 tal que x = x1 + x2. Em conclusao,

H = H1 +H⊥1 .

E claro que H1 ∩H⊥1 = 0. Consequentemente, H = H1 ⊕H⊥1 .

CAPITULO 3. OPERADORES DE FREDHOLM EM ESPACOS DE HILBERT 47

Observe que o teorema anterior e valido tambem no caso em que H seja um espacocom produto interno nao necessariamente completo. Como consequencia obtemos que,para qualquer subespaco completo H1 de um espaco com produto interno H, existeum complementar fechado H2 = H⊥1 de H1, isto e, H = H1 ⊕ H2. Por outro lado,se E e um espaco normado (ou de Banach), que nao tem estrutura de espaco comproduto interno, este fato nao e sempre valido, isto e, existem subespacos completosde E que nao tem complementar fechado. Porem, como vimos na Proposicao 1.2.4,todo subespaco de dimensao finita de um espaco normado possui um complementarfechado.

Outra propriedade que possui o complementar ortogonal e que sera usada nasproximas secoes e dada na seguinte proposicao.

Proposicao 3.1.5. Se H1 e um subespaco de H, entao H1 = H⊥⊥1 .

Demonstracao. Seja x ∈ H1 fixado. Entao, 〈x, y〉 = 0 para todo y ∈ H⊥1 . Assim,x ∈ H⊥⊥1 . Este fato prova que H1 ⊆ H⊥⊥1 . Daı, H1 ⊆ H⊥⊥1 , pois H⊥⊥1 e fechado.

Por outro lado, se segue do teorema anterior que H = H1⊕H1⊥

. Logo, se x ∈ H⊥⊥1 ,

entao x = y+ z onde y ∈ H1 ⊆ H⊥⊥1 e z ∈ H1⊥

. Dado que H⊥⊥1 e um espaco vetorial,

temos z = x − y ∈ H1⊥⊥. Portanto, 〈v, z〉 = 0 para todo v ∈ H⊥1 = H1

⊥. Em

particular, 〈z, z〉 = 0, pois z ∈ H⊥1 . Isto e, z = 0, e x = y ∈ H1. Consequentemente,H1 = H⊥⊥1 .

Observe que, se H = H1 ⊕H2, onde H1 e H2 sao dois subespacos ortogonais de H,entao, para x1, y1 ∈ H1 e x2, y2 ∈ H2, temos

〈x1 + x2, y1 + y2〉 = 〈x1, y1〉+ 〈x2, y2〉.

Portanto, se x = x1 + x2, entao

‖x‖ =√‖x1‖2 + ‖x2‖2.

A igualdade acima e conhecida como o Teorema de Pitagoras: Se x1 e x2 sao doiselementos ortogonais de um espaco com produto interno, entao

‖x1 + x2‖ =√‖x1‖2 + ‖x2‖2.

.Por outro lado, se H1 e H2 sao espacos de Hilbert com produtos internos denotados

por 〈· , ·〉1 e 〈· , ·〉2, respectivamente, entao H = H1 ×H2 e um espaco de Hilbert como produto interno dado por

〈(x1, x2), (y1, y2)〉 = 〈x1, y1〉1 + 〈x2, y2〉2 para x1, y1 ∈ H1 e x2, y2 ∈ H2. (3.1.1)

CAPITULO 3. OPERADORES DE FREDHOLM EM ESPACOS DE HILBERT 48

Assim,

‖(x1, x2)‖ =√‖x1‖2

1 + ‖x2‖22 para (x1, x2) ∈ H1 ×H2.

Note que com este produto interno H1×0 e 0×H2 sao subespacos ortogonaisde H = H1 ×H2 e

H = [H1 × 0]⊕ [0 ×H2]. (3.1.2)

3.2 Operadores em espacos de Hilbert

O fluxo espectral sera definido para caminhos de operadores de Fredholm auto-adjuntos.Nesta secao lembraremos o conceito de operador adjunto para operadores em espacoscom produto interno. Alem disso, veremos algumas propriedades que ele possui e queservirao de ferramenta util nas proximas secoes.

Definicao 3.2.1 (Operador adjunto em espacos de Hilbert). Seja T : H1 → H2 umoperador limitado, onde H1 e H2 sao espacos de Hilbert. Entao, o operador adjuntoT ∗ de T e o operador T ∗ : H2 → H1 tal que, para cada x ∈ H1 e y ∈ H2,

〈Tx, y〉 = 〈x, T ∗y〉.

O seguinte teorema mostra que esta definicao faz sentido e que, alem disso, ‖T‖ =‖T ∗‖. Podemos ver uma prova deste fato em [16], pag. 196, Teorema 3.9-2.

Teorema 3.2.2. O operador adjunto T ∗ de T na definicao anterior existe, e unico ee um operador linear limitado com norma

‖T‖ = ‖T ∗‖.

Apresentaremos no seguinte teorema algumas propriedades do operador adjuntoque vao se usar neste trabalho. Uma prova se pode ver, por exemplo, em [16], pag.198, Teorema 3.9-4.

Teorema 3.2.3. Sejam H1, H2 espacos de Hilbert, L : H1 → H2 e T : H1 → H2

operadores limitados e λ ∈ K. Entao,

1) (L+ T )∗ = L∗ + T ∗.

2) (λL)∗ = λL∗.

3) (L∗)∗ = L.

4) ‖L∗L‖ = ‖LL∗‖ = ‖L‖2.

5) (LT )∗ = T ∗L∗, assumindo H1 = H2.

CAPITULO 3. OPERADORES DE FREDHOLM EM ESPACOS DE HILBERT 49

Vejamos uma propriedade que satisfaz o adjunto do produto direto de dois opera-dores limitados definidos em espacos de Hilbert. De fato, suponhamos que H1 e H2

sejam dois espacos de Hilbert reais ou complexos (H1×H2 e um espaco de Hilbert como produto interno definido em (3.1.1)) e que L1 ∈ L(H1) e L2 ∈ L(H2). Mostremosque

(L1, L2)∗ = (L∗1, L∗2). (3.2.1)

Se (x1, x2) ∈ H1 ×H2 e (y1, y2) ∈ H1 ×H2, se segue de (3.1.1) que

〈(L1, L2)(x1, x2), (y1, y2)〉 = 〈(L1x1, L2x2), (y1, y2)〉= 〈L1x1, y1〉1 + 〈L2x2, y2〉2= 〈x1, L

∗1y1〉1 + 〈x2, L

∗2y2〉2

= 〈(x1, x2), (L∗1y1, L∗2y2)〉

= 〈(x1, x2), (L∗1, L∗2)(y1, y2)〉.

A unicidade do operador adjunto implica que

(L1, L2)∗ = (L∗1, L∗2).

Por outro lado, se H = H1 ⊕ H2, onde H1 e H2 sao dois subespacos fechados eortogonais de H, invariantes por um operador L ∈ L(H), L = L1 ⊕ L2, onde L1 e L2

sao as restricoes de L a H1 e H2, respectivamente (veja-se (1.2.1)). De forma analogaao fato anterior podemos provar que

L∗ = (L1 ⊕ L2)∗ = L∗1 ⊕ L∗2. (3.2.2)

Definicao 3.2.4. Suponhamos que H1 H2 sejam espacos de Hilbert. Diremos queL ∈ L(H1, H2) e ortogonal se L∗L = IH1 e LL∗ = IH2 , onde IH1 e IH2 sao as identidadesde H1 e H2, respectivamente.

Se H = H1 = H2, L ∈ L(H) e L = L∗, diremos que L e auto-adjunto.

Observacao 3.2.5. As propriedades 1 e 2 do Teorema 3.2.3 implicam que, se H e umespaco de Hilbert real, entao o conjunto dos operadores auto-adjuntos em L(H), quedenotaremos por LS(H), e um subespaco de L(H). Provemos que LS(H) e fechado. Defato, seja (Ln)∞n=1 uma sequencia de operadores auto-adjuntos convergente a L ∈ L(H).Daı,

‖L∗ − Ln‖ = ‖L∗ − L∗n‖ = ‖(L− Ln)∗‖ = ‖L− Ln‖.

Portanto, (Ln)∞n=1 converge a L∗ ∈ L(H). Assim, L = L∗ e L ∈ LS(H).No caso complexo podemos ter T 6= 0 auto-adjunto, porem, da segunda propriedade

do Teorema 3.2.3, iT nao e auto-adjunto.

Na seguinte proposicao mostraremos uma condicao suficiente e necessaria para queum operador seja ortogonal.

CAPITULO 3. OPERADORES DE FREDHOLM EM ESPACOS DE HILBERT 50

Proposicao 3.2.6. Um operador L ∈ L(H1, H2) e ortogonal se, e somente se, e so-brejetor e

〈Lx, Ly〉 = 〈x, y〉 para todo x, y ∈ H1. (3.2.3)

Demonstracao. De fato, se L e ortogonal, entao L∗L = IH1 e LL∗ = IH2 . Este fatoprova que L e inversıvel e que verifica (3.2.3).

Reciprocamente, suponhamos que L seja sobrejetor e que verifique (3.2.3). A igual-dade (3.2.3) e a unicidade do operador adjunto implicam que L e injetor e que L∗L = I.Como L e sobrejetor, entao e um isomorfismo. Daı, L−1 = L∗, como querıamos pro-var.

A identidade e um classico exemplo de operador auto-adjunto e ortogonal. Noseguinte exemplo apresentaremos um outro operador que e auto-adjunto e ortogonal.

Exemplo 3.2.7. O operador L : `2 → `2 definido por

L(x1, x2, x3, x4, ...) = (−x1, x2,−x3, x4, ...), onde (x1, x2, x3, x4, ...) ∈ `2,

e auto-adjunto e ortogonal. De fato, sejam (x1, x2, x3, x4, ...) e (y1, y2, y3, y4, ...) em `2.Assim,

〈L(x1, x2, x3, x4, ...), (y1, y2, y3, y4, ...)〉 = 〈(−x1, x2,−x3, x4, ...), (y1, y2, y3, y4, ...)〉

=∞∑n=1

(−1)nxnyn

= 〈(x1, x2, x3, x4, ...), (−y1, y2,−y3, y4, ...)〉= 〈(x1, x2, x3, x4, ...), L(y1, y2, y3, y4, ...)〉.

Consequentemente, L = L∗ e assim, L e auto-adjunto. E facil ver que LL = I.Portanto, L−1 = L = L∗, isto e, L e ortogonal.

O Corolario 1.1.5 prova que, se L ∈ L(H1, H2), onde H1 e H2 dois subespacos de umespaco de Hilbert H, entao existe um unico operador L em L(H1, H2) tal que Lx = Lxpara todo x ∈ H1 e ‖L‖ = ‖L‖. Lembremos que o operador L e definido como

Lx = limn→∞

Lxn, (3.2.4)

onde (xn)∞n=1 e uma sequencia em H1 convergente a x ∈ H1. A seguinte proprosicaomostra algumas propriedades que possui o operador L que serao usadas para achar adecomposicao polar de um operador limitado.

Proposicao 3.2.8. Sejam L ∈ L(H1, H2) e L como acima. Se L e ortogonal (auto-adjunto), entao L e ortogonal (auto-adjunto).

CAPITULO 3. OPERADORES DE FREDHOLM EM ESPACOS DE HILBERT 51

Demonstracao. Provemos que, se L e ortogonal, entao L e ortogonal. Sejam x, y em H1

e (xn)∞n=1, (yn)∞n=1 duas sequencias em H1 convergentes a x, y, respectivamente. Peladefinicao de L, temos que LL∗xn → LL

∗x. Daı, a continuidade do produto interno

(Lema 3.1.1) implica que

〈LL∗xn, yn〉 → 〈LL∗x, x〉 e 〈xn, yn〉 → 〈x, y〉.

Dado que LL∗xn = xn para todo n, entao

〈LL∗x, y〉 = 〈x, y〉.

Logo, LL∗

= I. Analogamente, L∗L = I. Em conclusao, o operador L e ortogonal.

A prova de que, se L e auto-adjunto, entao L e auto-adjunto e analoga e portantoe omitida.

Uma propriedade muito conhecida da analise funcional e que tambem sera de grandeimportancia neste trabalho e dada na seguinte proposicao.

Proposicao 3.2.9. Se L ∈ L(H), entao KerL = (ImL∗)⊥.

Demonstracao. Seja x ∈ KerL fixado. Se y ∈ ImL∗, entao y = L∗z para algum z ∈ H.Assim,

〈x, y〉 = 〈x, L∗z〉 = 〈Lx, z〉 = 0.

Logo, x ∈ (ImL∗)⊥ e portanto

KerL ⊆ (ImL∗)⊥.

Agora, suponhamos que x ∈ (ImL∗)⊥. Entao, 〈x, y〉 = 0 para todo y ∈ ImL∗. Daı,〈x, L∗z〉 = 0 para todo z ∈ H. Consequentemente, 〈Lx, z〉 = 0 para todo z ∈ H. Estefato prova que Lx = 0, isto e, x ∈ KerL. Portanto,

(ImL∗)⊥ ⊆ KerL.

Os dois fatos acima mostram que KerL = (ImL∗)⊥.

Das Proposicoes 3.1.5 e 3.2.9 segue-se (KerL)⊥ = ImL∗. Assim,

H = ImL∗ ⊕KerL. (3.2.5)

O seguinte corolario e uma consequencia imediata da proposicao anterior.

Corolario 3.2.10. Se L e um operador auto-adjunto, entao L e o operador zero nocomplementar ortogonal de ImL.

CAPITULO 3. OPERADORES DE FREDHOLM EM ESPACOS DE HILBERT 52

Demonstracao. Da proposicao anterior temos

(ImL)⊥ = (ImL∗)⊥ = KerL.

Consequentemente, L e o operador zero no complementar ortogonal de ImL.

Definicao 3.2.11. Uma projecao ortogonal e um operador P ∈ L(H) tal que P 2x =Px para todo x ∈ H e ImP = (KerP )⊥.

Como veremos no proximo exemplo, existem operadores P ∈ L(H) tais que P 2 = Pque nao sao projecoes ortogonais.

Exemplo 3.2.12. Seja P : R2 → R2 definido por P (x, y) = (x, x) para (x, y) ∈ R2. Efacil ver que P 2 = P . Alem disso,

ImP = (x, x) : x ∈ R e KerP = (0, y) : y ∈ R.

Portanto, ImP e KerL nao sao ortogonais, isto e, P nao e uma projecao ortogonal.

Observe que, se P ∈ L(H) e um operador tal que P 2 = P e x ∈ ImP , entaoPx = x. De fato, se x ∈ ImP , entao x = Pz para algum z ∈ H. Logo,

Px = P 2z = Pz = x.

A seguinte e uma caracterizacao das projecoes ortogonais.

Proposicao 3.2.13. Seja P ∈ L(H) fixado. Entao, P e uma projecao ortogonal se, esomente se, e auto-adjunto e P 2 = P .

Demonstracao. Suponhamos que P seja uma projecao ortogonal. Por definicao temosP 2 = P. Tambem, ImP = (KerP )⊥. Este fato prova que ImP e fechado, pois (KerP )⊥

e fechado. Como P e contınua, entao KerP e fechado. Daı, o Teorema 3.1.4 implicaque

H = ImP ⊕KerP.

Assim, se x, y ∈ H, entao x = x1 + x2 e y = y1 + y2 onde x1, y1 ∈ ImP ex2, y2 ∈ KerP. Portanto, Px1 = x1, Py1 = y1 e

〈Px, y〉 = 〈P (x1 + x2), y1 + y2〉 = 〈Px1, y1〉+ 〈Px1, y2〉 = 〈Px1, Py1〉,

pois Px1 ∈ ImP e y2 ∈ KerP. Por outro lado,

〈x, Py〉 = 〈x1 + x2, P (y1 + y2)〉 = 〈x1, Py1〉+ 〈x2, Py2〉 = 〈Px1, Py1〉.

Consequentemente, 〈Px, y〉 = 〈x, Py〉 para todo x, y ∈ H e P e auto-adjunto.

CAPITULO 3. OPERADORES DE FREDHOLM EM ESPACOS DE HILBERT 53

Reciprocamente, suponhamos que P seja auto-adjunto e que P 2 = P . Como P eauto-adjunto, de (3.2.5) temos

H = ImP ⊕KerP, (3.2.6)

onde ImP e (KerP )⊥ sao ortogonais. Portanto, ImP e (KerP )⊥ sao ortogonais. Poroutro lado, se x ∈ H, entao x = Px+x−Px. Dado que Px ∈ ImP e x−Px ∈ KerP ,se segue

H = ImP ⊕KerP.

Assim, dado que ImP ⊆ ImP , de (3.2.6) temos ImP = ImP e ImP = (KerP )⊥.Em conclusao, P e uma projecao ortogonal.

O seguinte corolario e uma consequencia da proposicao anterior.

Corolario 3.2.14. Se P e Q sao projecoes ortogonais que comutam, entao PQ e aprojecao ortogonal sobre ImP ∩ ImQ.

Demonstracao. Dado que

(PQ)2 = PQPQ = P 2Q2 = PQ e (PQ)∗ = Q∗P ∗ = QP = PQ,

entao, pela Proposicao 3.2.13, PQ e uma projecao ortogonal.Se x ∈ ImP ∩ ImQ, temos Px = x = Qx. Daı, PQx = Px = x, isto e, PQ e a

identidade em ImP ∩ ImQ. Portanto,

ImP ∩ ImQ ⊆ ImPQ.

Por outro lado, suponhamos que x ∈ H. Assim, PQx ∈ ImP e QPx ∈ ImQ. Logo,PQx = QPx ∈ ImP ∩ ImQ. Entao,

ImPQ ⊆ ImP ∩ ImQ.

Consequentemente, ImPQ = ImP ∩ImQ. Os fatos acima provam que PQ e a projecaosobre ImP ∩ ImQ.

Finalizaremos esta secao com uma propriedade importante dos operadores auto-adjuntos.

Teorema 3.2.15. Se L ∈ L(H) e um operador auto-adjunto, entao

‖L‖ = sup‖x‖=1

|〈Lx, x〉|.

CAPITULO 3. OPERADORES DE FREDHOLM EM ESPACOS DE HILBERT 54

Demonstracao. Da desigualdade de Cauchy-Schwarz temos

sup‖x‖=1

|〈Lx, x〉| ≤ sup‖x‖=1

‖Lx‖‖x‖ = ‖L‖.

Provemos agora que ‖L‖ ≤ sup‖x‖=1 |〈Lx, x〉|. De fato, se Lz = 0 para todo z ∈ Hcom ‖z‖ = 1, entao L = 0. Assim,

0 = ‖L‖ = sup‖x‖=1

|〈Lx, x〉|.

No caso contrario, para qualquer z ∈ H de norma 1 tal que Lz 6= 0, tomemos

v = ‖Lz‖1/2z e w = ‖Lz‖−1/2Lz.

Entao,‖v‖2 = ‖Lz‖‖z‖2 = ‖Lz‖ = ‖Lz‖−1‖Lz‖2 = ‖w‖2. (3.2.7)

Tomemos agora y1 = v + w e y2 = v − w. Logo,

〈Ly1, y1〉 − 〈Ly2, y2〉= 〈L(v + w), v + w〉 − 〈L(v − w), v − w〉= 〈Lv, v〉+ 〈Lv,w〉+ 〈Lw, v〉+ 〈Lw,w〉 − 〈Lv, v〉+ 〈Lv,w〉+ 〈Lw, v〉 − 〈Lw,w〉= 2(〈Lv,w〉+ 〈Lw, v〉)= 2(〈L(‖Lz‖1/2z), ‖Lz‖−1/2Lz〉+ 〈L(‖Lz‖−1/2Lz), ‖Lz‖1/2z〉)= 2(〈Lz, Lz〉+ 〈LLz, z〉)= 2(〈Lz, Lz〉+ 〈Lz, L∗z〉)= 2(〈Lz, Lz〉+ 〈Lz, Lz〉)= 4‖Lz‖2,

isto e,〈Ly1, y1〉 − 〈Ly2, y2〉 = 4‖Lz‖2. (3.2.8)

Agora, para todo y 6= 0 e u = ‖y‖−1y, temos y = ‖y‖u e

|〈Ly, y〉| = |〈L(‖y‖u), ‖y‖u〉| = ‖y‖2|〈Lu, u〉| ≤ ‖y‖2 sup‖x‖=1

|〈Lx, x〉|.

Portanto, da desigualdade triangular e de (3.2.7) obtemos

|〈Ly1, y1〉 − 〈Ly2, y2〉| ≤ |〈Ly1, y1〉|+ |〈Ly2, y2〉|≤ sup‖x‖=1

|〈Lx, x〉|(‖y1‖2 + ‖y2‖2)

≤ sup‖x‖=1

|〈Lx, x〉|(〈v + w, v + w〉+ 〈v − w, v − w〉)

= 2 sup‖x‖=1

|〈Lx, x〉|(‖v‖2 + ‖w‖2)

= 4 sup‖x‖=1

|〈Lx, x〉|‖Lz‖.

CAPITULO 3. OPERADORES DE FREDHOLM EM ESPACOS DE HILBERT 55

Consequentemente, (3.2.8) implica que

4‖Lz‖2 ≤ 4 sup‖x‖=1

|〈Lx, x〉|‖Lz‖.

Daı, ‖Lz‖ ≤ sup‖x‖=1 |〈Lx, x〉|. Este fato prova que

sup‖x‖=1

‖Lz‖ ≤ sup‖x‖=1

|〈Lx, x〉|.

Em conclusao, sup‖x‖=1 ‖Lz‖ = sup‖x‖=1 |〈Lx, x〉|.

3.3 Nocoes basicas da teoria espectral em espacos

normados

Embora o argumento principal da tese, o fluxo espectral, envolva operadores em espacosde Hilbert, nesta secao vamos apresentar algumas definicoes e nocoes basicas da teoriaespectral para operadores limitados em espacos normados. Em muitos textos os concei-tos basicos da teoria espectral sao apresentados para operadores L : D(L) ⊆ E → E, ouseja, para operadores definidos em subespacos de E. Para os nossos fins, esse nıvel degeneralidade nao e necessario e portanto somente serao tratados os resultados da teoriaespectral no caso particular de operadores definidos em todo o espaco. As propriedadesmais interessantes serao dadas para operadores em espacos de Hilbert.

Fazendo uso do conceito de decomposicao polar de um operador auto-adjunto L ∈L(H), onde H e um espaco de Hilbert, daremos a definicao dos subespacos espectraispositivo e negativo do operador L, denotados por H+(L) e H−(L), respectivamente.Alem disso, mostraremos que

H = H+(L)⊕H−(L)⊕KerL

e que H+(L) e H−(L) sao invariantes por L.Na primeira parte da secao trataremos operadores em espacos normados (nao ne-

cessariamente com produto interno) e por ultimo com operadores auto-adjuntos emespacos de Hilbert.

Se nao se diz o contrario, E denotara um espaco normado sobre K, onde K = R(ou C).

Definicao 3.3.1 (Espectro de um operador). Seja L um operador em L(E). Um valorregular de L e um numero λ ∈ K tal que o operador Lλ = L − λI e inversıvel emL(E), isto e, L−1

λ existe e pertence a L(E). O conjunto de todos os valores regularesde L, denotado por ρ(L), e chamado de conjunto resolvente de L. Seu complementarσ(L) = K− ρ(L) e chamado de espectro de L. Dizemos que λ e um valor espectral de

CAPITULO 3. OPERADORES DE FREDHOLM EM ESPACOS DE HILBERT 56

L se λ ∈ σ(L). Para λ ∈ ρ(L), o operador R(λ) = (L− λI)−1 e chamado de resolventede L.

Um autovalor de um operador L e um valor λ ∈ K tal que L−λI nao e injetor. Seλ e um autovalor de L, existe um elemento v ∈ E\0 tal que Lv = λv. O elementov e chamado de autovetor de L correspondente ao autovalor λ. O autoespaco de umautovalor λ de L e o subespaco gerado pelos autovetores do operador L correspondentesa λ.

Teorema 3.3.2. Se L ∈ L(E), onde E e um espaco de Banach complexo, entaoσ(L) 6= ∅.

Podemos ver uma prova do teorema anterior em [7], pag. 196, Teorema 3.6.

Quando E tem dimensao finita, o espectro de um operador L ∈ L(E) e compostopelos autovalores de L. Este resultado e consequencia do fato que todo operador linearL em um espaco normado de dimensao finita e inversıvel se, e somente se, e injetor. Noseguinte exemplo veremos que em dimensao infinita podemos ter λ ∈ σ(L) com L−λIinjetor.

Exemplo 3.3.3. Consideremos o espaco de Hilbert `2 das sequencias de numeroscomplexos (xn)∞n=1 tais que

∑∞n=1 |xn|2 e convergente. O produto interno e dado por

〈x, y〉 =∞∑n=1

xnyn, onde x = (xn)∞n=1, y = (yn)∞n=1 ∈ `2.

Tomemos L : `2 → `2 definido por

L(a1, a2, a3, ...) = (0, a1, a2, a3, ...), onde (a1, a2, a3, ...) ∈ `2.

E facil ver que L e injetor e que ‖L‖ = 1. O operador L nao e sobrejetor, pois(1, 0, 0, ...) /∈ ImL. Assim, 0 ∈ σ(L). Provemos que

σ(L) = B = x ∈ C : ‖x‖ ≤ 1.

De fato, do Teorema 1.1.7 temos que, se |λ| > 1 = ‖L‖, entao I − (1/λ)L e inversıvel.Este fato prova que, se |λ| > 1, entao o operador L− λI e inversıvel. Portanto,

σ(L) ⊆ B.

Suponhamos que |λ| ≤ 1, com λ 6= 0. Mostremos que L − λI nao e sobrejetor.Tomemos (1, 0, 0, ...) ∈ `2. Se existir (a1, a2, a3, ...) ∈ `2 tal que (L−λI)(a1, a2, a3, ...) =(1, 0, 0, ...), entao

(−λa1, a1 − λa2, a2 − λa3...) = (1, 0, 0, ...),

isto e,a1 = −1/λ, a2 = −1/λ2, a3 = −1/λ3, ... .

CAPITULO 3. OPERADORES DE FREDHOLM EM ESPACOS DE HILBERT 57

Dado que |λ| ≤ 1, temos

(a1, a2, a3, ...) = (−1/λ,−1/λ2,−1/λ3, ...) /∈ `2.

Consequentemente, L−λI nao e sobrejetor. Daı, B ⊆ σ(L). Em conclusao, B = σ(L).

No exemplo anterior, observe que, se `2 fosse considerado sobre o corpo dos numerosreais (veja-se o Exemplo 2.2.3), entao, da Definicao 3.3.1 terıamos que σ(L) = [−1, 1] ⊆R. Da Analise funcional sabemos que um espaco vetorial real E admite uma ’comple-xificacao’, ou seja, um espaco vetorial E sobre C e uma inclusao linear canonica de Eem E. Se E for normado (de Banach), ele induz uma estrutura normada (de Banach)

em E. Assim, um operador linear L ∈ L(E) admite um operador complexificado

L ∈ L(E). Obviamente o espectro de L sera contido em C e podemos chamar σ(L)como o de espectro de L. Portanto, mesmo sendo L um operador entre espacos reais,σ(L) sera considerado como subconjunto de C. Este fato ajuda profundamente noestudo da propriedades espectrais de L.

Por outro lado, a um endomorfismo L ∈ L(Rn) e associada uma matriz real (nabase canonica do espaco euclidiano) que pode ter autovalores complexos. Consequen-temente, em dimensao finita e natural considerar em C o espectro de um operador real(o de uma matriz real). A complexificacao em dimensao infinita estende a possibili-dade de definir e usar o espectro em C de um operador real, com muitas vantagens nainvestigacao. Resumimos este conceito a partir da seguinte definicao.

Definicao 3.3.4. A complexificacao de um espaco real E e o espaco

E = x1 + ix2 : x1, x2 ∈ E

sobre o corpo dos numeros complexos com as seguintes operacoes:

i. (x1 + ix2) + (y1 + iy2) = x1 + y1 + i(x2 + y2) para x1 + ix2, y1 + iy2 ∈ E.

ii. (a+ ib)(x1 + ix2) = ax1 − bx2 + i(bx1 + ax2) para x1 + ix2 ∈ E e a+ ib ∈ C.

Mostremos que, se E e normado, com norma denotada por ‖·‖, entao, para x1+ix2 ∈E,

‖x1 + ix2‖E = maxθ

(‖cosθx1 − senθx2‖2 + ‖senθx1 + cosθx2‖2)1/2 (3.3.1)

define uma norma em E. Seja x + iy ∈ E fixado. E claro que ‖x + iy‖E ≥ 0 e‖x + iy‖E = 0 se, e somente se, x + iy = 0. Nao e difıcil provar que ‖ · ‖E satisfaz adesigualdade triangular. Vejamos que, se z = |z|(cosα + isenα) ∈ C, entao

‖z(x+ iy)‖E = |z|‖x+ iy‖E.

CAPITULO 3. OPERADORES DE FREDHOLM EM ESPACOS DE HILBERT 58

De fato,

‖z(x+ iy)‖E = ‖|z|[cosαx− senαy + i(senαx+ cosαy)]‖E= max

θ(‖|z|[cosθ(cosαx− senαy)− senθ(senαx+ cosαy)]‖2

+ ‖|z|[senθ(cosαx− senαy) + cosθ(senαx+ cosαy)‖2])1/2

= |z|maxθ

(‖(cosθcosα− senθsenα)x− (cosθsenα + senθ cosα)y‖2

+ ‖(senθcosα + cosθsenα)x− (senθsenα− cosθcosα)y‖2)1/2

= |z|maxθ

(‖cos(θ + α)x− sen(θ + α)y‖2

+ ‖sen(θ + α)x+ cos(θ + α)y‖2)1/2

= |z|maxθ

(‖cosθx− senθy‖2 + ‖senθx+ cosθy‖2)1/2

= |z|‖x+ iy‖E,

como querıamos provar.

Observe que, se E e um espaco de Banach, entao (E, ‖·‖E) e um espaco de Banach.

De fato, se (xn + iyn)∞n=1 e uma sequencia de Cauchy em E, entao, para todo ε > 0,existe um inteiro positivo N tal que, se n,m ≥ N ,

maxθ

(‖cosθ(xn − xm)− senθ(yn − ym)‖2 + ‖senθ(xn − xm) + cos θ(yn − ym)‖2)1/2 < ε.

Logo, tomando θ = 0, (‖xn − xm‖2 + ‖yn − ym‖2)1/2 < ε. Assim, ‖xn − xm‖ < ε e‖yn − ym‖ < ε. Daı, (xn)∞n=1 e (yn)∞n=1 sao sequencias de Cauchy em E. Dado que Ee de Banach, (xn)∞n=1 e convergente a algum x ∈ E e (yn)∞n=1 e convergente a algum

y ∈ E. Nao e difıcil provar que (xn+iyn)∞n=1 converge a x+iy ∈ E. Consequentemente,

E e um espaco de Banach.Suponhamos agora que E seja um espaco com produto interno denotado por 〈·, ·〉.

Vejamos que (E, ‖ · ‖E) e um espaco com produto interno. De fato, se x1 + ix2 ∈ E,temos

‖x1 + ix2‖E = maxθ

(‖cosθx1 − senθx2‖2 + ‖senθx1 + cosθx2‖2)1/2

= maxθ

(cos2θ‖x1‖2 − 2cosθsenθ〈x1, x2〉+ sen2θ‖x2‖2

+ sen2θ‖x1‖2 + 2cosθsenθ〈x1, x2〉+ cos2θ‖x2‖2)1/2

= (‖x1‖2 + ‖x2‖2)1/2.

Consequentemente,

‖x1 + ix2‖E = (‖x1‖2 + ‖x2‖2)1/2 para todo x1 + ix2 ∈ E. (3.3.2)

CAPITULO 3. OPERADORES DE FREDHOLM EM ESPACOS DE HILBERT 59

Provemos que a norma ‖ · ‖E possui a propriedade do paralelogramo, isto e,

‖x+ y‖2E

+ ‖x− y‖2E

= 2(‖x‖2E

+ ‖y‖2E

) para todo x, y ∈ E.

Sejam x = x1 + ix2 e y = y1 + iy2 ∈ E. Dado que

‖x1 +y1‖2 +‖x1−y1‖2 = 2(‖x1‖2 +‖y1‖2) e ‖x2 +y2‖2 +‖x2−y2‖2 = 2(‖x2‖2 +‖y2‖2),

pois E e um espaco com produto interno, se segue que

‖x+ y‖2E

+ ‖x− y‖2E

= ‖x1 + y1 + i(x2 + y2)‖2E

+ ‖x1 − y1 + i(x2 − y2)‖2E

= ‖x1 + y1‖2 + ‖x2 + y2‖2 + ‖x1 − y1‖2 + ‖x2 − y2‖2

= 2(‖x1‖2 + ‖y1‖2) + 2(‖x2‖2 + ‖y2‖2)

= 2(‖x1 + ix2‖2E

+ ‖y1 + iy2‖2E

)

= 2(‖x‖2E

+ ‖y‖2E

).

Consequentemente, (E, ‖ · ‖E) e um espaco com produto interno. Observe que esteproduto interno e dado por

〈x1 + ix2, y1 + iy2〉E = 〈x1, y1〉 − i〈x1, y2〉+ i〈x2, y1〉+ 〈x2, y2〉, (3.3.3)

para x1 + ix2, y1 + iy2 ∈ E. Os fatos mostrados acima implicam que, se E e um espacode Hilbert, entao E e um espaco de Hilbert.

A complexificacao de um operador L ∈ L(E) e o operador em L ∈ L(E) dado por

L(x+ iy) = L(x) + iL(y) para x+ iy ∈ E.

Assim,

‖Lx+ iLy‖E = maxθ

(‖cosθLx− senθLy‖2 + ‖senθLx+ cosθLy‖2)1/2

= maxθ

(‖L(cosθx− senθy)‖2 + ‖L(senθx+ cosθy)‖2)1/2

≤ maxθ‖L‖[‖cosθx− senθy‖2 + ‖senθx+ cosθy‖2]1/2

= ‖L‖maxθ

[‖cosθx− senθy‖2 + ‖senθx+ cosθy‖2]1/2

= ‖L‖‖x+ iy‖2E.

Portanto,‖L‖E ≤ ‖L‖.

Agora, ‖Lx‖E = ‖Lx‖ para x ∈ E. Este fato implica que

‖L‖E = ‖L‖.

CAPITULO 3. OPERADORES DE FREDHOLM EM ESPACOS DE HILBERT 60

Definicao 3.3.5. Definimos o espectro de um operador L ∈ L(E), onde E e um espacode normado real, como o espectro da complexificacao de L.

Uma propriedade do espectro de um operador limitado em um espaco de Banach ea compacidade. Este fato e provado na seguinte proposicao.

Proposicao 3.3.6. Sejam E um espaco de Banach e L ∈ L(E). O espectro de L eum subconjunto compacto de C limitado por ‖L‖.

Demonstracao. Provemos que ρ(L) e aberto em C. De fato, suponhamos que λ0 ∈ ρ(L).Assim, L− λ0I e inversıvel. Como GL(E) e aberto (veja-se o Corolario 1.1.8), para λsuficientemente perto de λ0, temos que L − λI e inversıvel em L(E). Este fato provaque ρ(L) e aberto em C. Assim, σ(L) e fechado.

Agora vejamos que σ(L) e limitado por ‖L‖. Se |λ| > ‖L‖, entao ‖L/λ‖ < 1. Sesegue do Teorema 1.1.7 que L/λ− I e inversıvel em L(E), portanto L−λI e inversıvel.Consequentemente, λ ∈ ρ(L). Em conclusao, σ(L) e limitado por ‖L‖.

Outra propriedade do espectro e apresentada na seguinte proposicao.

Proposicao 3.3.7. Sejam L ∈ L(E) e E1 e E2 subespacos fechados de E, invariantespor L e tais que E = E1 ⊕ E2. Entao,

σ(L) = σ(L1) ∪ σ(L2),

onde L1 e L2 sao as restricoes de L aos subespacos E1 e E2, respectivamente.

Demonstracao. Seja λ ∈ C fixado. Nao e difıcil ver que L−λI e inversıvel se, e somentese, as restricoes L1 − λI|E1 e L2 − λI|E2 sao inversıveis. Daı, λ ∈ ρ(L) se, e somentese, λ ∈ ρ(L1) e λ ∈ ρ(L2). Portanto,

ρ(L) = ρ(L1) ∩ ρ(L2).

Este fato prova que σ(L) = σ(L1) ∪ σ(L2).

Nesta parte da secao apresentaremos algumas propriedades do espectro dos ope-radores auto-adjuntos em espacos de Hilbert que serao muito uteis de aqui para frente.Se nao se diz o contrario, suporemos queH seja um espaco de Hilbert sobre K, onde K =R ou C. Abusando um pouco da notacao, no caso em que H seja real, identificaremosL com sua complexificacao.

Teorema 3.3.8. O espectro de um operador auto-adjunto L ∈ L(H) e um subconjuntodos numeros reais.

CAPITULO 3. OPERADORES DE FREDHOLM EM ESPACOS DE HILBERT 61

Demonstracao. Seja λ = a + ib ∈ C, com b 6= 0. Tomemos x ∈ H fixado. Dado queL− aI e auto-adjunto, temos

‖(L− λI)x‖2 = 〈(L− (a+ ib)I)x, (L− (a+ ib)I)x〉= ‖(L− aI)x‖2 − 〈(L− aI)x, ibx〉 − 〈ibx, (L− aI)x〉+ ‖bx‖2

= ‖(L− aI)x‖2 + i〈(L− aI)x, bx〉 − i〈bx, (L− aI)x〉+ ‖bx‖2

= ‖(L− aI)x‖2 + i〈bx, (L− aI)∗x〉 − i〈bx, (L− aI)x〉+ ‖bx‖2

= ‖(L− aI)x‖2 + i〈bx, (L− aI)x〉 − i〈bx, (L− aI)x〉+ ‖bx‖2

= ‖(L− aI)x‖2 + ‖bx‖2

≥ |b|‖x‖2.

Portanto, L − λI e injetor, pois |b| > 0. A Proposicao 1.1.10 implica que a restricao(L−λI) : H → Im(L−λI) do operador L−λI e inversıvel e que Im(L−λI) e fechada.Igualmente podemos provar que a restricao (L − λI) : H → Im(L − λI) do operadorL− λI e inversıvel. Assim, Ker(L− λI) = 0, isto e,

(Ker(L− λI))⊥

= H.

Provemos que Im(L − λI) = H. De fato, dado que Im(L − λI) e fechada, asProposicoes 3.1.5 e 3.2.9 e o Teorema 3.2.3 implicam que

Im(L− λI) = (Ker(L− λI)∗)⊥ = (Ker(L∗ − λI))⊥ = (Ker(L− λI))⊥ = H.

Consequentemente, (L− λI) : H → H e um isomorfismo. Logo, λ ∈ ρ(L).

Fixemos um operador auto-adjunto L ∈ L(H). Tomemos

m = inf‖x‖=1

〈Lx, x〉 e M = sup‖x‖=1

〈Lx, x〉.

Se segue do Teorema 3.2.15 que

‖L‖ = sup‖x‖=1

|〈Lx, x〉| = max|m|, |M |.

Da Proposicao 3.3.6 e o Teorema 3.3.8 temos que, se L e auto-adjunto, entao

σ(L) ⊆ [−‖L‖, ‖L‖].

E claro que [m,M ] ⊆ [−‖L‖, ‖L‖]. Na proxima proposicao mostraremos que

σ(L) ⊆ [m,M ].

Observe que, para x ∈ H, 〈Lx, x〉 e um numero real, pois

〈Lx, x〉 = 〈x, Lx〉 = 〈Lx, x〉.

CAPITULO 3. OPERADORES DE FREDHOLM EM ESPACOS DE HILBERT 62

Proposicao 3.3.9. O espectro de um operador auto-adjunto L esta contido no intervalo[m,M ], onde m = inf‖x‖=1〈Lx, x〉 e M = sup‖x‖=1〈Lx, x〉.

Demonstracao. Provemos que, se λ = m − c, onde c > 0, entao λ ∈ ρ(L). De fato,para y ∈ H com y 6= 0, tomemos z = ‖y‖−1y. Assim, y = ‖y‖z e ‖z‖ = 1. Portanto,

〈Ly, y〉 = ‖y‖2〈Lz, z〉 ≥ ‖y‖2 inf‖x‖=1

〈Lx, x〉 = 〈y, y〉m.

Logo, da desigualdade de Cauchy-Schwarz se segue

‖(L− λI)y‖‖y‖ ≥ 〈(L− λI)y, y〉 = 〈Ly, y〉 − 〈λy, y〉 ≥ (m− λ)〈y, y〉 = c‖y‖2.

Daı, ‖(L − λI)y‖ ≥ c‖y‖. Dado que c > 0, a Proposicao 1.1.10 prova que a restricaoL− λI : H → Im(L− λI) e inversıvel e que Im(L− λI) e fechada.

Provemos agora que o operador L− λI e sobrejetor. Suponhamos por contradicaoque Im(L − λI) 6= H. Como Im(L − λI) e fechado, existe x0 6= 0 ∈ H ortogonal aIm(L− λI). Ja que L e auto-adjunto e λ ∈ R,

0 = 〈(L− λI)x, x0〉 = 〈x, (L− λI)x0〉 para todo x ∈ H.

Assim, (L − λI)x0 = 0, contradizendo o fato de que ‖(L − λI)y‖ ≥ c‖y‖ para todoy ∈ H. Portanto, x0 = 0, isto e, Im(L−λI)⊥ = 0. Este fato prova que Im(L−λI) = He L− λI e sobrejetor. Em conclusao, se λ < m, entao λ ∈ ρ(L).

Analogamente podemos provar que, se λ = M + c, onde c > 0, entao λ ∈ ρ(L). Daı,se λ > M, λ ∈ ρ(L).

Consequentemente, σ(L) ⊆ [m,M ].

Definicao 3.3.10. Sejam L ∈ L(H) um operador auto-adjunto e A um subconjuntode H. Dizemos que L e positivo (negativo) em A, se 〈Lx, x〉 > 0 (〈Lx, x〉 < 0) paratodo x ∈ A, com x 6= 0.

Suponhamos que H1 seja um subespaco de H invariante por L. Se L e positivo(negativo) em H1 dizemos que L e definido positivo (definido negativo) em H1. Se〈Lx, x〉 ≥ 0 (〈Lx, x〉 ≤ 0) para todo x ∈ H1, diremos que L e nao negativo (naopositivo) em H1. Quando H1 = H e L e definido positivo (negativo) em H, diremos queL e definido positivo (definido negativo). Se L e T sao dois operadores auto-adjuntos,usaremos a notacao L ≥ T quando L− T e um operador nao negativo.

Vamos apresentar a decomposicao de H como soma direta do nucleo e dos espacosespectrais negativo e positivo de um operador auto-adjunto L. Para este fato faremosuso da raiz quadrada de um operador limitado nao negativo.

Definicao 3.3.11 (Raiz quadrada). Seja L ∈ L(H) um operador nao negativo. Umaraiz quadrada de L e um operador R ∈ L(H) tal que R2 = L.

CAPITULO 3. OPERADORES DE FREDHOLM EM ESPACOS DE HILBERT 63

E claro que, se R e uma raiz quadrada de um operador nao negativo L, entao−R tambem e uma raiz quadrada de L. Em geral, um operador nao negativo podeter varias raızes quadradas. Mostraremos que todo operador nao negativo possui umaunica raiz quadrada nao negativa. Para provar este fato precisaremos dos dois seguinteslemas, cujas provas podem ser encontradas, por exemplo, em [16], pag. 470, Teorema9.3-1 e pag. 473, Teorema 9.3-3, respectivamente.

Lema 3.3.12 (Composicao de operadores positivos). Se dois operadores auto-adjuntosL e T em L(H) sao nao negativos e comutam, entao a composicao LT e nao negativa.

Lema 3.3.13 (Sequencia monotona). Seja (Ln)∞n=1 uma sequencia de operadores auto-adjuntos em um espaco de Hilbert H tal que

L1 ≤ L2 ≤ ... ≤ Ln ≤ ... ≤ T,

onde T e um operador auto-adjunto em L(H). Suponha que qualquer Lj comute comT e com todo Lm. Entao, existe L ∈ L(H) tal que (Ln)∞n=1 converge pontualmente a L,isto e, Lnx→ Lx para todo x ∈ H. O operador L e auto-adjunto e satisfaz L ≤ T.

Teorema 3.3.14 (Teorema da raiz quadrada). Todo operador nao negativo L ∈ L(H)possui uma raiz quadrada nao negativa R, a qual e unica. O operador R comuta comtodo operador em L(H) que comute com L.

Demonstracao. Primeiro provaremos o teorema com a hipotese adicional L ≤ I. Veja-mos a existencia. Se L = 0, tomamos R = 0. Suponhamos que L 6= 0. Consideremos asequencia (Rn)∞n=1, onde R0 = 0 e

Rn+1 = Rn +1

2(L−R2

n), n = 0, 1, 2, .... (3.3.4)

Provemos que Rn converge pontualmente a um R ∈ L(H) tal que R2 = L. E facilver que cada Rn e um polinomio em L, isto e, Rn = pn(L), onde pn : K → K e umpolinomio. Assim, todos os Rn sao auto-adjuntos e todos comutam entre si. Alemdisso, observe que, se M ∈ L(H) comuta com L, entao M comuta com cada Rn.

Mostremos que Rn ≤ I para todo n. De fato, para n = 0, R0 = 0 ≤ I. Seja n > 0dado. Ja que I −Rn−1 e auto-adjunto,

〈(I −Rn−1)2x, x〉 = 〈(I −Rn−1)x, (I −Rn−1)x〉 ≥ 0 para todo x ∈ H,

isto e, (I −Rn−1)2 ≥ 0. Como, por hipotese, I − L ≥ 0, de (3.3.4) obtemos

0 ≤ 1

2(I −Rn−1)2 +

1

2(I − L) =

1

2(I − 2Rn−1 −R2

n−1) +1

2(I − L)

= I −Rn−1 −1

2(L−R2

n−1) = I −Rn.

CAPITULO 3. OPERADORES DE FREDHOLM EM ESPACOS DE HILBERT 64

Consequentemente, Rn ≤ I.Agora vejamos que Rn ≤ Rn+1 para todo n ∈ N. Para este fim, usaremos inducao

sobre n. Se n = 0, 0 = R0 ≤ R1 = 12L. Mostremos que, se Rn−1 ≤ Rn para um n

fixado, entao Rn ≤ Rn+1. Dado que RnRn−1 = Rn−1Rn, de (3.3.4) se segue

Rn+1 −Rn = Rn +1

2(L−R2

n)−Rn−1 −1

2(L−R2

n−1)

= Rn −1

2R2n −Rn−1 +

1

2R2n−1

= Rn(I − 1

2Rn)−Rn−1(I − 1

2Rn−1)

= Rn(I − 1

2Rn)− 1

2RnRn−1 −Rn−1(I − 1

2Rn−1) +

1

2Rn−1Rn

= Rn[I − 1

2(Rn +Rn−1)]−Rn−1[I − 1

2(Rn−1 +Rn)]

= (Rn −Rn−1)[I − 1

2(Rn +Rn−1)].

Por hipotese, Rn−Rn−1 ≥ 0 e I − 12(Rn +Rn−1) ≥ 0. Alem disso, dado que Rn−Rn−1

e I − 12(Rn +Rn−1) comutam, se segue do Lema 3.3.12 que

(Rn −Rn−1)[I − 1

2(Rn +Rn−1)] ≥ 0,

isto e, Rn+1 −Rn ≥ 0.Acima se provou que (Rn)∞n=1 e monotona e Rn ≤ I. Assim, o Lema 3.3.13 implica

que existe um operador auto-adjunto R ∈ L(H) tal que Rnx→ Rx para todo x ∈ H.De (3.3.4) temos

1

2(Lx−R2

nx) = Rn+1x−Rnx→ 0 quando n→∞.

Portanto, Lx− R2x = 0 para todo x ∈ H. Este fato implica que L = R2. Alem disso,0 = R0 ≤ Rn para todo n, isto e, 〈Rnx, x〉 ≥ 0 para todo x ∈ H. Consequentemente,〈Rx, x〉 ≥ 0 para todo x ∈ H pela continuidade do produto interno. Logo, R ≥ 0.

Seja S ∈ L(H) tal que SL = LS. Entao, RnS = SRn, pois todo operador quecomuta com L comuta com Rn. Daı, RnSx = SRnx para todo x ∈ H. Fazendon→∞, temos RS = SR.

Provemos agora a unicidade. Sejam R e T raızes quadradas nao negativas dooperador L. Entao, R2 = T 2 = L. Alem disso,

TL = TT 2 = T 2T = LT,

isto e, T comuta com L. Portanto, como se provou acima, RT = TR. Para x ∈ H,tomemos y = (R−T )x. Assim, 〈Ry, y〉 ≥ 0 e 〈Ty, y〉 ≥ 0, pois R e T sao nao negativos.

CAPITULO 3. OPERADORES DE FREDHOLM EM ESPACOS DE HILBERT 65

Ja que TR = RT e R2 = T 2, obtemos

〈Ry, y〉+ 〈Ty, y〉 = 〈(R + T )y, y〉 = 〈(R + T )(R− T )x, y〉 = 〈(R2 − T 2)x, y〉 = 0.

Logo,〈Ry, y〉 = 〈Ty, y〉 = 0.

Dado que R e nao negativo, R possui uma raiz quadrada nao negativa P . Assim,

0 = 〈Ry, y〉 = 〈P 2y, y〉 = 〈Py, Py〉 = ‖Py‖2,

isto e, Py = 0. Daı,Ry = P 2y = P (Py) = 0.

Analogamente podemos provar que Ty = 0. Entao, (R−T )y = 0. Como y = (R−T )x,temos

‖Rx− Tx‖2 = 〈(R− T )x, (R− T )x〉 = 〈(R− T )2x, x〉 = 〈(R− T )y, x〉 = 0.

Portanto, Rx− Tx = 0 para todo x ∈ H, isto e, R = T .Agora provemos o caso geral. Podemos supor que L 6= 0. Da desigualdade de

Cauchy-Schwarz se segue

〈Lx, x〉 ≤ ‖Lx‖‖x‖ ≤ ‖L‖‖x‖2.

Logo, tomando Q = (1/‖L‖)L, obtemos

〈Qx, x〉 ≤ ‖x‖2 = 〈Ix, x〉,

isto e, Q ≤ I. Como foi provado acima, Q tem uma unica raiz quadrada nao negativaB. Portanto,

(‖L‖1/2B)2 = ‖L‖B2 = ‖L‖Q = L,

isto e, ‖L‖1/2B e uma raiz quadrada nao negativa de L. A unicidade da raiz quadradade L se segue da unicidade da raiz quadrada de Q.

Seja L ∈ L(H) um operador nao negativo e R a raiz quadrada nao negativa de L.Vejamos que

KerR = KerL e ImR = ImL.

De fato, e claro que KerR ⊆ KerL. Suponhamos que x ∈ KerL. Assim,

0 = 〈Lx, x〉 = 〈RRx, x〉 = 〈Rx,Rx〉 = ‖Rx‖2.

Logo, Rx = 0. Portanto, KerL ⊆ KerR. Consequentemente, KerR = KerL.Por outro lado, das Proposicoes 3.1.5 e 3.2.9 se segue

ImL = ImL∗ = (KerL)⊥ = (KerR)⊥ = ImR∗ = ImR.

CAPITULO 3. OPERADORES DE FREDHOLM EM ESPACOS DE HILBERT 66

Alem disso, observe que L e definido positivo em ImL. De fato, tomemos x ∈ImL = ImR com x 6= 0. Assim, Rx 6= 0. Logo,

〈Lx, x〉 = 〈R2x, x〉 = 〈Rx,Rx〉 = ‖Rx‖ > 0. (3.3.5)

E facil ver que, se L ∈ L(H) e um isomorfismo e R ∈ L(H) e um operador tal queR2 = L, entao R e um isomorfismo. Consequentemente, a raiz quadrada nao negativade um isomorfismo nao negativo e um isomorfismo.

Observacao 3.3.15. Sejam L ∈ L(H) um operador nao negativo eR sua raiz quadradanao negativa. De (3.3.5) se segue que L e definido positivo em ImL.

Por outro lado, seja L ∈ L(H) um operador nao positivo. Assim, −L e nao negativo.Pelo fato acima, −L e definido positivo em ImL. Daı, L e definido negativo em ImL.

Podemos agora enunciar o teorema que apresenta a existencia e a unicidade dadecomposicao polar de um operador linear limitado.

Teorema 3.3.16 (Teorema da decomposicao polar). Seja L um operador em L(H)(nao necessariamente nao negativo). Entao, existem dois unicos operadores R e O emL(H) com as seguintes propriedades:

i. R e nao negativo,

ii. O e um operador ortogonal de ImR em ImL,

iii. KerO = KerR = KerL e

iv. L=OR.

Demonstracao. Vejamos primeiro a existencia. De fato, e facil ver que o operador L∗Le nao negativo em H. Do Teorema 3.3.14 se segue que existe um unico operador naonegativo R ∈ L(H) tal que R2 = L∗L. Para x1, x2 ∈ H,

〈Lx1, Lx2〉 = 〈L∗Lx1, x2〉 = 〈R2x1, x2〉 = 〈Rx1, Rx2〉. (3.3.6)

Assim,‖Lx‖ = ‖Rx‖ para todo x ∈ H. (3.3.7)

Este fato prova queKerR = KerL.

Para cada y ∈ ImR, existe x ∈ H tal que y = Rx. Ponhamos

Oy = ORx = Lx. (3.3.8)

Vejamos que O define um operador ortogonal de ImR a ImL. De fato, primeiroprovemos que O esta bem definido. Suponhamos que, para algum y ∈ ImR, y =

CAPITULO 3. OPERADORES DE FREDHOLM EM ESPACOS DE HILBERT 67

Rx1 = Rx2. Daı, R(x1 − x2) = 0. Dado que KerR = KerL, entao L(x1 − x2) = 0.Assim,

Oy = Lx1 = Lx2.

Consequentemente, O esta bem definido sobre a imagem de R.O operador O e linear, pois, se c ∈ K e y1, y2 ∈ ImR, entao y1 = Rx1 e y2 = Rx2,

onde x1, x2 ∈ H. Logo,

O(cy1+y2) = O(cRx1+Rx2) = OR(cx1+x2) = L(cx1+x2) = cLx1+Lx2 = cOy1+Oy2.

Alem disso, de (3.3.6) temos 〈Rx1, Rx2〉 = 〈Lx1, Lx2〉. Daı,

〈Oy1, Oy2〉 = 〈ORx1, ORx2〉 = 〈Lx1, Lx2〉 = 〈Rx1, Rx2〉 = 〈y1, y2〉.

Como O e sobrejetor, a Proposicao 3.2.6 implica que O e um operador ortogonal deImR a ImL.

Se segue do Corolario 1.1.5 e a Proposicao 3.2.8 que O pode ser estendido a umoperador ortogonal em ImR sobre ImL. O operador O ainda pode ser estendido a umoperador em L(H), o qual pode ser denotado de novo por O, tomando Ox = 0 paratodo x ∈ (ImR)⊥ = KerR. Assim, a igualdade (3.3.8) implica que

Lx = ORx para todo x ∈ H.

E claro queKerO = KerR = KerL.

Vejamos agora a unicidade. De fato, suponhamos que L = O1R1, onde R1 e naonegativo e O1 e ortogonal na imagem de R1. Assim,

L∗ = R∗1O∗1 = R1O

∗1.

Dado que O1 e ortogonal na imagem de R1, entao

O∗1O1R1 = R1. (3.3.9)

Logo, L∗L = R1O∗1O1R1 = R2

1. Daı, R1 e a raiz quadrada nao negativa de L∗L, aqual e unica pelo Teorema 3.3.14. Portanto, R1 = R. A igualdade (3.3.7) determinaa unicidade do operador O em ImR e assim em H, pois, por hipotese, O = 0 em(ImR)⊥ = KerR. Consequentemente, a decomposicao L = OR e unica.

Definicao 3.3.17. A decomposicao L = OR, dada no teorema anterior, e chamada adecomposicao polar do operador L.

CAPITULO 3. OPERADORES DE FREDHOLM EM ESPACOS DE HILBERT 68

Suponhamos agora que L seja auto-adjunto e que OR seja a decomposicao polarde L. Dado que KerL = KerR, das Proposicoes 3.1.5 e 3.2.9 temos

ImL = ImL∗ = (KerL)⊥ = (KerR)⊥ = ImR∗ = ImR.

Como R e nao negativo, da Observacao 3.3.15 concluımos que R e definido positivo emImR = ImL. Alem disso, ja que KerO = KerL, se segue que

KerO∗ = KerL∗ = KerL = KerR.

Provemos que O = O∗. De fato, se x ∈ KerR,

0 = ORx = ROx, (3.3.10)

pois KerO = KerR pelo teorema anterior. E facil ver que ORO∗ e nao negativo, poisR e nao negativo. Agora, de (3.3.9) se segue O∗OR = R. Assim,

(ORO∗)2 = ORO∗ORO∗ = ORRO∗ = LL∗ = L2 = L∗L,

isto e, ORO∗ e uma raiz quadrada nao negativa do operador L∗L. Dado que R e a raizquadrada nao negativa de L∗L, temos ORO∗ = R pela unicidade da raiz quadrada.Daı, RO = ORO∗O. Logo, RO = OR na imagem de R (O e ortogonal em ImR).Portanto,

ROx = ORx para todo x ∈ ImR. (3.3.11)

Se segue de (3.3.10) e (3.3.11) que

ROx = ORx para todo x ∈ H. (3.3.12)

Consequentemente,L = L∗ = (OR)∗ = (RO)∗ = O∗R.

Daı, L = O∗R, o qual prova que O = O∗ pela unicidade da decomposicao polar.Observe que,

se x ∈ ImL, O2x = O∗Ox = x e se x ∈ (ImL)⊥, Ox = 0. (3.3.13)

Vejamos que qualquer x ∈ ImL pode ser escrito de modo unico como

x = x+ + x−, onde Ox+ = x+ e Ox− = −x−.

De fato, e facil ver que, para x ∈ H, x+ = (I + O)x/2 e x− = (I − O)x/2 satisfazemas condicoes acima. Suponhamos que x = x+ + x− = z+ + z−, onde

Ox+ = x+, Ox− = −x−, Oz+ = z+ e Oz− = −z−.

CAPITULO 3. OPERADORES DE FREDHOLM EM ESPACOS DE HILBERT 69

Assim, x+ − z+ = z− − x−. Logo,

x+ − z+ = O(x+ − z+) = O(z− − x−) = −(z− − x−).

Portanto, x+ − z+ = z− − x− = 0.Sejam H±(L) os subespacos de ImL consistentes de todos os x tais que Ox = ±x,

isto e,H+(L) = x ∈ H : Ox = x e H−(L) = x ∈ H : Ox = −x.

Daı,ImL = H+(L)⊕H−(L).

Vejamos que os subespacos H+(L) e H−(L) sao fechados. Seja (xn)∞n=1 uma sequen-cia em H+(L) convergente a x ∈ H. Entao, Oxn = xn para todo n ∈ N. Agora,

‖Ox−x‖ = ‖Ox−Oxn +Oxn−x‖ = ‖Ox−Oxn +xn−x‖ ≤ ‖Ox−Oxn‖+‖xn−x‖.

Como xn → x, temos que Oxn → Ox. Consequentemente, Ox = x e x ∈ H+(L).Analogamente, H−(L) e fechado.

Provemos agora que H+(L) e H−(L) sao ortogonais. De fato, se x+ ∈ H+(L) ex− ∈ H−(L), entao Ox+ = x+ e Ox− = −x−. Daı,

〈x+, x−〉 = 〈x+, O∗Ox−〉 = 〈Ox+, Ox−〉 = 〈x+,−x−〉 = −〈x+, x−〉.

Assim, 〈x+, x−〉 = 0, o que prova que H+(L) e H−(L) sao ortogonais.Dado que ImL = H+(L)⊕H−(L) e KerL = (ImL)⊥, obtemos a decomposicao

H = H+(L)⊕H−(L)⊕KerL, (3.3.14)

sendo os tres subespacos dois a dois ortogonais.Agora, como O = O∗ e L = OR = RO, temos

OL = O∗L = R = LO∗ = LO.

Logo,

OLx = LOx = Lx se x ∈ H+(L) e OLx = LOx = −Lx se x ∈ H−(L).

Daı, os subespacos H+(L) e H−(L) sao invariantes por L.O operador L tambem comuta com R, pois

RL = RRO = L2O = OL2 = ORR = LR.

Por outro lado, para x ∈ H+(L), temos

Lx = LOx = Rx.

CAPITULO 3. OPERADORES DE FREDHOLM EM ESPACOS DE HILBERT 70

Como R e definida positiva em ImL, entao L e definida positiva em H+(L). Agora, sex ∈ H−(L), entao

Lx = −LOx = −Rx.Portanto, L e definida negativa em H−(L).

Observe que as projecoes ortogonais sobre os espacos H+(L), H−(L) e KerL sao,respectivamente,

PH+(L) =1

2(O2 +O), PH−(L) =

1

2(O2 −O) e PKerL = I −O2.

De fato, se x ∈ H, entao x = x++x−+x0, onde x+ ∈ H+(L), x− ∈ H−(L) e x0 ∈ KerL.Logo, de (3.3.13) temos

1

2(O2 +O)x =

1

2(O2(x+ + x−+ x0) +O(x+ + x−+ x0)) =

1

2(x+ + x−+ x+− x−) = x+.

Dado que O e auto-adjunto, PH+(L) e auto-adjunto. Consequentemente, pela Proposi-cao 3.2.13, PH+(L) e a projecao ortogonal sobre H+(L), pois PH+(L) e auto-adjunto eP 2H+(L) = PH+(L).

Analogamente podemos provar que PH−(L) e PKerL sao as projecoes ortogonais sobreH−(L) e PKerL, respectivamente. Na Secao 3 do Capıtulo 4 veremos outra expressaopara estas projecoes e, alem disso, mostraremos que elas dependem continuamente dooperador.

Provaremos que, para um operador auto-adjunto L ∈ L(H), a decomposicao dadaem (3.3.14) e unica no seguinte sentido: Se existir dois subespacos ortogonais H1 e H2

tais que a soma H = H1 ⊕ H2 ⊕ KerL e ortogonal e L e definido positivo em H1 edefinido negativo em H2, entao H+(L) = H1 e H−(L) = H2. Antes de provar este fato,vejamos primeiro o seguinte lema.

Lema 3.3.18. Sejam L ∈ L(H) um operador auto-adjunto e OR a decomposicao polarde L. Se T ∈ L(H) comuta com L, entao T comuta com R e O.

Demonstracao. O operador T comuta com o operador resolvente de L, pois, se λ ∈ρ(L), entao

(L− λI)−1T = (L− λI)−1T (L− λI)(L− λI)−1

= (L− λI)−1(L− λI)T (L− λI)−1

= T (L− λI)−1.

Analogamente, T comuta com a resolvente de L2. Assim, pelo Teorema 3.3.14, Tcomuta com a raiz quadrada nao negativa de L2, que denotamos por R.

Para provar que T comuta com O, observe que

TOR = TL = LT = ORT = OTR,

CAPITULO 3. OPERADORES DE FREDHOLM EM ESPACOS DE HILBERT 71

isto e,TOx = OTx para todo x ∈ ImR = ImL. (3.3.15)

Por outro lado, se x ∈ KerL, temos TOx = 0, pois KerL = KerO. Dado que TL =LT, entao LTx = 0, isto e, Tx ∈ KerL = KerO. Daı, OTx = 0. Consequentemente,

OTx = TOx para todo x ∈ KerL. (3.3.16)

De (3.3.15) e (3.3.16) temos TO = OT.

Consideremos, de novo, um operador auto-adjunto L ∈ L(H). Vejamos que, se H ′

e um subespaco de H invariante por L e 〈Lx, x〉 ≥ 0 para todo x ∈ H ′, entao H ′ e umsubespaco de H+(L)⊕KerL. De fato, seja OR a decomposicao polar de L. Denotemospor P ′ a projecao ortogonal sobre H ′. Ja que H ′ e invariante por L, P ′ comuta com L.Se segue do Lema 3.3.18 que P ′ comuta com O. Assim, de (3.3) temos que P ′ comutacom PH−(L). O Corolario 3.2.14 mostra que P ′PH−(L) e a projecao sobre H ′ ∩H−(L).

E claro que a intersecao H ′ ∩ H−(L) e 0, pois L e definida negativa em H−(L) e enao negativa em H ′. Logo, P ′PH−(L) = PH−(L)P

′ = 0. Assim, se x ∈ H ′, entao

PH−(L)x = PH−(L)P′x = 0,

isto e, x ∈ (H−(L))⊥ = H+(L)⊕KerL. Este fato prova que H ′ ⊆ H+(L)⊕KerL.Analogamente, se 〈Lx, x〉 ≤ 0 para todo x ∈ H ′, entao H ′ e um subespaco de

H−(L)⊕KerL = (H+(L))⊥.Os fatos mostrados acima provam o seguinte teorema.

Teorema 3.3.19 (Teorema espectral). Seja L ∈ L(H) auto-adjunto. Existe uma unicadecomposicao

H = H+(L)⊕H−(L)⊕KerL

tal que:

i. ImL = H+(L)⊕H−(L),

ii. H+(L) e H−(L) sao subespacos fechados de H invariantes por L,

iii. H+(L), H−(L) e KerL sao dois a dois ortogonais e

iv. L e definido positivo em H+(L) e definido negativo em H−(L).

Definicao 3.3.20. Para um operador auto-adjunto L ∈ L(H), os subespacos H+(L)e H−(L) definidos acima sao chamados de subespaco espectral positivo e subespacoespectral negativo de L, respectivamente.

CAPITULO 3. OPERADORES DE FREDHOLM EM ESPACOS DE HILBERT 72

Suponhamos que L seja um operador auto-adjunto em um espaco de Hilbert dedimensao finita H. Neste caso σ(L) consiste dos auto-valores de L. E claro que Le definida positiva no autoespaco gerado pelos autovetores que possuem autovalorespositivos e que e definida negativa no autoespaco gerado pelos autovetores que possuemautovalores negativos. Nao e difıcil provar que H+(L) e gerado pelos autovetores quepossuem autovalores positivos e que H−(L) e gerado pelos autovetores que possuemautovalores negativos.

Os subespacos espectrais negativo e positivo de um operador auto-adjunto L emum espaco de Hilbert de dimensao infinita H sao uma generalizacao dos autoespacos.Neste caso, e facil provar que o autoespaco gerado pelos autovetores com respectivosautovalores positivos e um subespaco de H+(L) e o autoespaco gerado pelos autovetorescom respectivos autovalores negativos e um subespaco de H−(L).

Seja L ∈ L(H) um operador auto-adjunto fixado. Dado que H+(L) e H−(L) saoinvariantes por L, podemos considerar as restricoes

L+ = L|H+(L) : H+(L)→ H+(L) e L− = L|H−(L) : H−(L)→ H−(L)

do operador L. Da Proposicao 3.3.7 temos que

σ(L) = σ(L+) ∪ σ(L−) ∪ σ(L0), (3.3.17)

onde L0 e a restricao de L a KerL. Observamos que, se KerL for nulo, σ(L0) e vazio;do contrario σ(L0) = 0.

Observacao 3.3.21. Dado que L+ e definido positivo e L− e definido negativo, segue-se de (3.3.17) e da Proposicao 3.3.9 que

σ(L+) = σ(L) ∩ R+ = σ+(L) e σ(L−) = σ(L) ∩ R− = σ−(L),

isto e, o espectro de L+ corresponde a parte positiva do espectro de L e o espectro deL− corresponde a parte negativa do espectro de L.

3.4 Operadores de Fredholm auto-adjuntos em es-

pacos de Hilbert

O proposito desta secao e mostrar que, se H e um espaco de Hilbert real, de dimensaoinfinita e separavel, o conjunto ΦS(H) dos operadores de Fredholm auto-adjuntos emL(H) possui tres componentes conexas que sao:

i. O conjunto dos operadores essencialmente positivos, denotado por Φ+S (H), que

consiste dos operadores em ΦS(H) tais que seu subespaco espectral negativo temdimensao finita.

CAPITULO 3. OPERADORES DE FREDHOLM EM ESPACOS DE HILBERT 73

ii. O conjunto dos operadores essencialmente negativos, denotado por Φ−S (H), queconsiste dos operadores em ΦS(H) tais que seu subespaco espectral positivo temdimensao finita.

iii. O conjunto dos operadores fortemente indefinidos, denotado por ΦiS(H), que con-

siste dos operadores com subespacos espectrais positivo e negativo de dimensaoinfinita.

Em particular, provaremos que Φ+S (H) e Φ−S (H) sao convexos e que Φi

S(H) e conexopor caminhos. A nao trivial prova destas conhecidas propriedades nao se encontramfacilmente na literatura. Decidimos portanto providencia-la nesta secao.

Em sımbolos, podemos escrever

ΦS(H) = Φ+S (H) ∪ Φ−S (H) ∪ Φi

S(H).

E claro que Φ+S (H), Φ−S (H) e Φi

S(H) sao dois a dois disjuntos.Os conjuntos Φ+

S (H), Φ−S (H) e ΦiS(H) sao analogamente definidos quando H e um

espaco de Hilbert real nao necessariamente separavel ou quando H tem dimensao finita.Observe que, se H tem dimensao finita, entao Φ+

S (H) = Φ−S (H) = LS(H) e ΦiS(H) e

vazio.Alem dos fatos anteriores, apresentaremos algumas propriedades dos operadores de

Fredholm auto-adjuntos nos espacos de Hilbert reais. Nesta secao, se nao se diz ocontrario, H denotara um espaco de Hilbert real de dimensao finita ou infinita.

De (3.2.5) temos que, se L ∈ L(H), entao H = ImL∗⊕KerL. No capıtulo anteriorprovamos que a imagem de um operador de Fredholm e fechada. Consequentemente,se L e um operador de Fredholm auto-adjunto,

H = ImL⊕KerL. (3.4.1)

A seguinte proposicao e uma outra consequencia de (3.2.5).

Proposicao 3.4.1. Seja L um operador auto-adjunto. Suponhamos que a imagem deL seja fechada e que dim KerL <∞. Entao, L e um operador de Fredholm e indL = 0.

Demonstracao. Dado que ImL e fechada, de (3.2.5) temos

H = ImL∗ ⊕KerL = ImL⊕KerL.

Logo,dim KerL = dim(ImL)⊥ = dim coKerL.

Este fato prova que L e de Fredholm e que indL = 0.

Observacao 3.4.2. Da proposicao anterior se segue que o ındice de qualquer operadorde Fredholm auto-adjunto e 0. Portanto, se L e um operador de Fredholm auto-adjunto,temos que KerL = 0 se, e somente se, ImL = H.

CAPITULO 3. OPERADORES DE FREDHOLM EM ESPACOS DE HILBERT 74

Seja E um espaco de Banach real. Observe que, se L ∈ L(E) e um operador deFredholm de ındice 0 (nao necessariamente auto-adjunto), entao 0 ∈ ρ(L) ou 0 e umautovalor de L. De fato, suponhamos que 0 ∈ σ(L). Como indL = 0,

dim KerL = dim coKerL.

Assim, dado que L e nao inversıvel, pois 0 ∈ σ(L), e E e de Banach, se segue que L enao injetor ou nao e sobrejetor. Em ambos os casos temos que dim KerL > 0, isto e,0 e um autovalor de L.

Vejamos algumas outras propriedades que possuem os operadores de Fredholm auto-adjuntos.

Proposicao 3.4.3. Seja L ∈ L(H) um operador de Fredholm auto-adjunto. Entao, 0nao e um ponto de acumulacao de σ(L).

Demonstracao. De fato, de (3.4.1) temos que H = ImL⊕KerL (KerL pode ser 0).Seja

L =

(L1 00 0

)(3.4.2)

a matriz de operadores de L a respeito da decomposicao de H. E claro que L1 e umautomorfismo de ImL. Como GL(ImL) e aberto em L(ImL), existe um ε > 0 tal que,se |λ| < ε, entao L1 − λI|ImL e inversıvel. Observe que, para |λ| < ε e λ 6= 0,

(L− λI)−1 =

(L1 − λI|ImL 0

0 −λI|KerL

)−1

=

((L1 − λI|ImL)−1 0

0 − 1λI|KerL

).

Logo, (L − λI)−1 ∈ L(H). Este fato prova que existe uma vizinhanca V de 0 tal queL− λI e inversıvel para todo λ ∈ V com λ 6= 0. Assim, 0 nao e ponto de acumulacaode σ(L).

Observacao 3.4.4. Outra propriedade dos operadores de Fredholm auto-adjuntos eque, para todo operador de Fredholm auto-adjunto L, existe um operador auto-adjuntocom imagem de dimensao finita K tal que L+K e um isomorfismo auto-adjunto. Estefato se obtem tomando K = PKerL, a projecao ortogonal sobre o KerL, na Proposicao2.1.7 e aplicando o Teorema da aplicacao aberta (lembramos que a Proposicao 2.1.7atua em espacos vetoriais).

Observe que, se L e um operador de Fredholm auto-adjunto, entao

ImL = H+(L)⊕H−(L),

onde H+(L) e H−(L) sao os subespacos espectrais positivo e negativo de L, respecti-vamente (veja-se o Teorema 3.3.19). Consequentemente, dado que H+(L) e H−(L) saoinvariantes por L, as restricoes

L+ = L|H+(L) : H+(L)→ H+(L) e L− = L|H−(L) : H−(L)→ H−(L)

CAPITULO 3. OPERADORES DE FREDHOLM EM ESPACOS DE HILBERT 75

de L sao isomorfismos. Destacamos que, se L nao for de Fredholm, temos que ImL =H+(L) ⊕ H−(L); neste caso, L− e L+ sao injetores, mas nao necessariamente saoisomorfismos.

Para provar que os espacos Φ+S (H) e Φ−S (H) sao convexos, primeiro vejamos o

seguinte resultado conhecido na teoria dos operadores em espacos de Hilbert, do qualdamos a prova por razoes de precisao.

Lema 3.4.5. Suponhamos que H seja um espaco de Hilbert real ou complexo. SeL : H → H e um isomorfismo definido positivo, entao existe l > 0 tal que

inf‖x‖=1

〈Lx, x〉 ≥ l.

Demonstracao. De fato, sejam x, y ∈ H e tais que 〈Lx, y〉 6= 0. Para a ∈ R, tomemoswa = x+ a〈Lx, y〉y. Como L e definido positivo, temos

0 ≤ 〈Lwa, wa〉= 〈L(x+ a〈Lx, y〉y), x+ a〈Lx, y〉y〉= 〈Lx, x〉+ 〈Lx, a〈Lx, y〉y〉+ 〈L(a〈Lx, y〉y), x〉+ 〈L(a〈Lx, y〉y), a〈Lx, y〉y〉= 〈Lx, x〉+ a〈Lx, y〉〈Lx, y〉+ a〈Lx, y〉〈Ly, x〉+ a2〈Lx, y〉〈Lx, y〉〈Ly, y〉= 〈Lx, x〉+ a〈Lx, y〉〈Lx, y〉+ a〈Lx, y〉〈Lx, y〉+ a2〈Lx, y〉〈Lx, y〉〈Ly, y〉.

Portanto, para todo a ∈ R,

〈Lx, x〉+ 2a〈Lx, y〉〈Lx, y〉+ a2〈Lx, y〉〈Lx, y〉〈Ly, y〉 ≥ 0.

Consequentemente, tomando a parte esquerda da desigualdade anterior como um poli-nomio em a, temos que o discriminante deste polinomio e menor ou igual que 0, istoe,

∆ = (2〈Lx, y〉〈Lx, y〉)2 − 4〈Lx, y〉〈Lx, y〉〈Ly, y〉〈Lx, x〉 ≤ 0.

Dado que 〈Lx, y〉 6= 0, 〈Lx, y〉〈Lx, y〉 > 0. Entao, 〈Lx, y〉〈Lx, y〉 − 〈Ly, y〉〈Lx, x〉 ≤ 0,isto e,

〈Lx, y〉〈Lx, y〉 ≤ 〈Ly, y〉〈Lx, x〉. (3.4.3)

E claro que a desigualdade anterior tambem vale quando 〈Lx, y〉 = 0, pois L edefinido positivo. Portanto, a desigualdade (3.4.3) vale para todo x, y ∈ H. Daı, se‖x‖ = 1 e y = Lx, temos

‖Lx‖4 ≤ 〈L2x, Lx〉〈Lx, x〉 ≤ ‖L2x‖‖Lx‖〈Lx, x〉 ≤ ‖L‖‖Lx‖2〈Lx, x〉,

isto e,‖Lx‖2 ≤ ‖L‖〈Lx, x〉 para todo x ∈ H com ‖x‖ = 1. (3.4.4)

CAPITULO 3. OPERADORES DE FREDHOLM EM ESPACOS DE HILBERT 76

Dado que L e um isomorfismo, existe l1 > 0 tal que

l1 ≤ inf‖x‖=1

‖Lx‖2.

Tomando l = l1/‖L‖, de (3.4.4) temos

l ≤ inf‖x‖=1

〈Lx, x〉,

o que prova o lema.

Observacao 3.4.6. Seja L ∈ L(H) un isomorfismo definido negativo em um espacode Hilbert real ou complexo H. Do lema anterior se segue que existe l > 0 tal que

l ≤ inf‖x‖=1

〈−Lx, x〉,

pois −L e um isomorfismo definido positivo.Observe que

inf‖x‖=1

〈−Lx, x〉 = − sup‖x‖=1

〈Lx, x〉.

Portanto, existe l′ = −l < 0 tal que

l′ ≥ sup‖x‖=1

〈Lx, x〉.

Como vimos no comeco desta secao, se H tem dimensao finita, entao

Φ+S (H) = Φ−S (H) = LS(H).

Neste caso, e claro que Φ+S (H) e Φ−S (H) sao subconjuntos convexos de L(H), pois

LS(H) e um subespaco de L(H). A continuacao provaremos o caso em que H temdimensao infinita.

Teorema 3.4.7. Se H e um espaco de Hilbert de dimensao infinita, entao Φ+S (H) e

Φ−S (H) sao subconjuntos convexos de L(H).

Demonstracao. Primeiro provemos que Φ+S (H) e convexo. Fixemos L, T ∈ Φ+

S (H)e t ∈ [0 , 1]. Denotemos por A o operador tL + (1 − t)T. Entao, A e auto-adjunto eportanto admite os subespacos espectraisH+(A) eH−(A). O subespacoH+(L)∩H+(T )e fechado, pois e a intersecao de dois subespacos fechados. Alem disso, H+(L) ∩H+(T ) 6= 0, ja que H+(L) e H+(T ) tem codimensao finita (Lema 1.2.10). Sejau ∈ H+(L) ∩H+(T ) com u 6= 0. Assim,

〈Au, u〉 = 〈tLu+ (1− t)Tu, u〉 = t〈Lu, u〉+ (1− t)〈Tu, u〉 > 0,

CAPITULO 3. OPERADORES DE FREDHOLM EM ESPACOS DE HILBERT 77

isto e, A e positivo em H+(L) ∩H+(T ). Logo,

H−(A) ∩ (H+(L) ∩H+(T )) = 0.

Isto prova que a somaH−(A)⊕ (H+(L) ∩H+(T )) (3.4.5)

e de fato direta.A codimensao de H+(L) ∩ H+(T ) em H e finita pelo Lema 1.2.10. Portanto, de

(3.4.5) temosdimH−(A) <∞.

Por ultimo provemos que A e de Fredholm. O operador A e injetor na intersecaoH+(L) ∩ H+(T ), pois A e positivo em H+(L) ∩ H+(T ). Portanto, dado que H+(L) ∩H+(T ) tem codimensao finita,

dim KerA <∞.

Agora mostremos que ImA tem codimensao finita. Para este fim, sabendo que A eauto-adjunto e que seu nucleo tem dimensao finita, pela Proposicao 3.4.1 e suficienteprovar que a imagem de A e fechada. Dado que a restricao L+ : H+(L) → H+(L)do operador L e um isomorfismo definido positivo, do lema anterior temos que existel1 > 0 tal que

l1 ≤ inf‖x‖=1

x∈H+(L)

〈L+x, x〉.

Daı,l1 ≤ inf

‖x‖=1

x∈H+(L)

〈L+x, x〉 ≤ inf‖x‖=1

x∈H+(L)∩H+(T )

〈Lx, x〉.

Analogamente, existe l2 > 0 tal que

l2 ≤ inf‖x‖=1

x∈H+(L)∩H+(T )

〈Tx, x〉.

Portanto, se x ∈ H+(L) ∩H+(T ) com ‖x‖ = 1,

‖Ax‖ ≥ 〈Ax, x〉 = t〈Lx, x〉+ (1− t)〈Tx, x〉 ≥ tl1 + (1− t)l2 > 0.

Logo, da Proposicao 1.1.10 se segue que a restricao

A1 = A|H+(L)∩H+(T ) : H+(L) ∩H+(T )→ A(H+(L) ∩H+(T ))

e inversıvel. Assim,ImA1 = A(H+(L) ∩H+(T ))

CAPITULO 3. OPERADORES DE FREDHOLM EM ESPACOS DE HILBERT 78

e fechada. Como H+(L) ∩ H+(T ) tem codimensao finita em H, existe um subespacode dimensao finita H2 de H tal que

ImA = ImA1 ⊕H2.

Logo, ImA = Im(tL + (1 − t)T ) e fechada, pois e a soma de um espaco fechado eum espaco de dimensao finita (Lema 1.2.3). Consequentemente, tL + (1 − t)T e deFredholm. Em conclusao, tL+ (1− t)T ∈ Φ+

S (H).

Por outro lado, e claro que um operador M pertence a Φ+S (H) se, e somente se, −M

pertence a Φ−S (H). Portanto, se L, T ∈ Φ−S (H), entao −L,−T ∈ Φ+S (H). Assim, pela

primeira parte da prova, t(−L)+(1−t)(−T ) ∈ Φ+S (H), isto e, tL+(1−t)T ∈ Φ−S (H).

Denotaremos por GL+S (H) o subconjunto de L(H) dos isomorfismos definidos po-

sitivos.Suponhamos que H seja de dimensao finita. Sejam L, T ∈ GL+

S (H) e t ∈ [0, 1]. Efacil ver que tL+ (1− t)T e definido positivo. Assim, tL+ (1− t)T e injetor. Como Htem dimensao finita, tL + (1 − t)T e um isomorfismo. Este fato mostra que GL+

S (H)e um subconjunto convexo de L(H).

Como consequencia do teorema anterior, o seguinte corolario mostra o caso em queH tem dimensao infinita.

Corolario 3.4.8. Se H tem dimensao infinita, o conjunto GL+S (H) e convexo em

L(H).

Demonstracao. De fato, sejam L e T isomorfismos definidos positivos e t ∈ [0, 1] fixa-dos. Observe que tL+ (1− t)T e definido positivo. Assim,

Ker(tL+ (1− t)T ) = 0.

Alem disso, do teorema anterior temos que tL+ (1− t)T e de Fredholm. Dado quetL+ (1− t)T e auto-adjunto, a Observacao 3.4.2 implica que

Im(tL+ (1− t)T ) = H.

Consequentemente, tL+ (1− t)T e um isomorfismo definido positivo.

Analogamente podemos provar que o conjunto dos isomorfismos definidos negativose convexo em L(H).

Na Secao 3.2 provamos que LS(H) e um subespaco fechado de L(H). ConsideremosLS(H) como subespaco topologico de L(H), isto e, com a topologia herdada de L(H).Uma outra propriedade que possui o conjunto GL+

S (H) e apresentada na seguinteproposicao.

Proposicao 3.4.9. O conjunto GL+S (H) e aberto em LS(H).

CAPITULO 3. OPERADORES DE FREDHOLM EM ESPACOS DE HILBERT 79

Demonstracao. Seja L ∈ GL+S (H) fixado. Se segue do Lema 3.4.5 que existe l > 0 tal

quel ≤ inf

‖x‖=1〈Lx, x〉.

Seja T um operador auto-adjunto tal que ‖L− T‖ < min1/‖L−1‖, l. Entao, T e umisomorfismo (veja-se o Corolario 1.1.8) e, alem disso, para x ∈ H com x 6= 0, temos

〈Lx, x〉 ≥ l〈x, x〉 > ‖L− T‖〈x, x〉 = 〈‖L− T‖x, x〉 ≥ 〈(L− T )x, x〉,

isto e,

0 < 〈Lx, x〉 − 〈(L− T )x, x〉 = 〈Tx, x〉 para todo x ∈ H com x 6= 0.

Assim, T e um isomorfismo definido positivo, o que prova a proposicao.

Agora provaremos que, se H e um espaco de Hilbert real, de dimensao infinita eseparavel, o conjunto dos operadores de Fredholm fortemente indefinidos em L(H) econexo por caminhos. Para este fim, vejamos primeiro os seguintes resultados.

Suponhamos que L ∈ ΦS(H) e S ∈ GL(H), onde H e um espaco de Hilbert real (dedimensao finita ou infinita) nao necessariamente separavel. Observe que o operador

L = S∗LS e um operador de Fredholm auto-adjunto. De fato, L e de Fredholm, poisa composicao de operadores de Fredholm e um operador de Fredholm. Alem disso,

L∗ = (S∗LS)∗ = S∗L∗S = S∗LS = L,

isto e, L e auto-adjunto.

Definicao 3.4.10 (Acao cogradiente). A acao cogradiente e a aplicacao Υ : GL(H)×ΦS(H)→ ΦS(H) definida por

Υ(S, L) = S∗LS.

No resto desta secao suporemos que H seja um espaco de Hilbert real de dimensaoinfinita.

Proposicao 3.4.11. Os espacos Φ+S (H), Φ−S (H) e Φi

S(H) sao invariantes pela acaocogradiente, isto e, para qualquer S ∈ GL(H) fixado, temos que:

i. se L ∈ Φ+S (H), entao S∗LS ∈ Φ+

S (H);

ii. se L ∈ Φ−S (H), entao S∗LS ∈ Φ−S (H);

iii. se L ∈ ΦiS(H), entao S∗LS ∈ Φi

S(H).

CAPITULO 3. OPERADORES DE FREDHOLM EM ESPACOS DE HILBERT 80

Demonstracao. Sejam L ∈ ΦS(H) e S ∈ GL(H) fixados. Ponhamos L = S∗LS.Podemos expressar o espaco H como

H = H+(L)⊕H−(L)⊕KerL e H = H+(L)⊕H−(L)⊕Ker L.

Para provar o caso i. suponhamos que L ∈ Φ+S (H). O operador L e positivo em

S−1(H+(L)), pois, se x ∈ H+(L) com x 6= 0, entao

〈LS−1x, S−1x〉 = 〈S∗LSS−1x, S−1x〉 = 〈S∗Lx, S−1x〉 = 〈Lx, SS−1x〉 = 〈Lx, x〉 > 0.

Logo, a somaS−1(H+(L))⊕H−(L) (3.4.6)

e de fato direta. Dado que S e um isomorfismo e a codimensao de H+(L) e finita, poisL ∈ Φ+

S (H), entao a codimensao de S−1(H+(L)) em H e finita. Portanto, sendo direta

a soma em (3.4.6), obtemos que dimH−(L) <∞. Daı, L ∈ Φ+S (H), o que prova i.

Agora, para o caso ii. suponhamos que L ∈ Φ−S (H). Logo, −L ∈ Φ+S (H). Pelo fato

anterior temos que S∗(−L)S ∈ Φ+S (H). Assim, S∗LS ∈ Φ−S (H).

Por ultimo, suponhamos que L ∈ ΦiS(H). Ja que L e de Fredholm,

dim Ker L <∞.

Dado que a somaS−1(H+(L))⊕H−(L)

e direta e a dimensao de S−1(H+(L)) e infinita, temos que a codimensao de H−(L) e

infinita. Portanto, como dim Ker L <∞, entao

dimH+(L) =∞.

Analogamente,dimH−(L) =∞.

Logo, L ∈ ΦiS(H), o que prova o caso iii.

A continuacao apresentaremos alguns outros resultados que tambem serao muitouteis para a construcao do fluxo espectral.

Proposicao 3.4.12. Se L ∈ ΦiS(H) e K e um operador auto-adjunto com imagem de

dimensao finita, entao L+K ∈ ΦiS(H).

CAPITULO 3. OPERADORES DE FREDHOLM EM ESPACOS DE HILBERT 81

Demonstracao. O operador L+K e de Fredholm, pois L e de Fredholm e K e compacto.Logo, como L e K sao auto-adjuntos, L+K ∈ ΦS(H).

Dado que ImK e fechada (sendo finito-dimensional) e K e auto-adjunto, de (3.2.5)temos que

H = ImK ⊕KerK.

Daı, KerK tem codimensao finita. Consequentemente, o Lema 1.2.11 implica queKerK ∩ H+(L) e KerK ∩ H−(L) tem dimensao infinita, pois H+(L) e H−(L) temdimensao infinita. Assim, ja que L e L+K coincidem em KerK, se segue que L+Ke positivo em KerK ∩ H+(L) e negativo em KerK ∩ H−(L). Este fato implica queH+(L+K) e H−(L+K) tem codimensao infinita. Portanto,

dimH+(L+K) =∞ e dimH−(L+K) =∞.

Em conclusao, L+K ∈ ΦiS(H).

Definicao 3.4.13 (Espacos contrateis). Um espaco topologico Λ e contratil se existeuma homotopia

h : Λ× [0, 1]→ Λ,

tal queh(λ, 0) = λ e h(λ, 1) = λ0 para todo λ ∈ Λ,

onde λ0 ∈ Λ e fixado.

O teorema seguinte e consequencia de um resultado devido a Kuiper (veja-se [17],Teorema 2) que diz que, se H e separavel, o conjunto GL(H) e contratil.

Teorema 3.4.14. Se H e separavel, GL(H) e conexo por caminhos.

Demonstracao. Consideremos uma homotopia

h : H × [0, 1]→ H,

tal queh(x, 0) = x e h(x, 1) = x0 para todo x ∈ H,

onde x0 ∈ H e fixado. Para x ∈ H, tomamos a aplicacao f(t) = h(x, t) para t ∈[0, 1]. E claro que f e uma aplicacao contınua que liga ao ponto x com o ponto x0.Consequentemente, H e conexo por caminhos.

Agora podemos anunciar e provar a conexidade do conjunto ΦiS(H).

Teorema 3.4.15. Se H e um espaco de Hilbert real, de dimensao infinita e separavel,o conjunto Φi

S(H) e conexo por caminhos.

CAPITULO 3. OPERADORES DE FREDHOLM EM ESPACOS DE HILBERT 82

Demonstracao. Sejam H+ e H− dois subespacos fechados de H, ortogonais, de di-mensao infinita e tais que H = H+ ⊕ H−. Fixemos o operador J ∈ L(H) que temcomo matriz de operadores

J =

(I|H+ 0

0 −I|H−

),

onde I|H+ e I|H− denotam a identidade de H+ e H−, respectivamente. E claro que Je um isomorfismo auto-adjunto. Alem disso,

H+(J ) = H+ e H−(J ) = H−,

isto e, J ∈ ΦiS(H).

Se provarmos que qualquer operador L ∈ ΦiS(H) pode ser ligado com J por um

caminho contınuo, entao teremos provado o teorema. De fato, seja L ∈ ΦiS(H) fixado.

Vejamos que, para todo t ∈ [0 , 1], o operador It : H → H definido por

It = (1− t)PH+(L)LPH+(L) + tPH+(L)IPH+(L) + (1− t)PH−(L)LPH−(L) − tPH−(L)IPH−(L)

pertence a ΦiS(H), onde PH+(L) e PH−(L) denotam as projecoes ortogonais sobre os

espacos H+(L) e H−(L), respectivamente. Dado que as restricoes dos operadores L eI ao espaco H+(L) sao isomorfismos definidos positivos e o conjunto dos isomorfismosdefinidos positivos e convexo (Corolario 3.4.8), temos que a restricao

It|H+(L) = (1− t)PH+(L)LPH+(L) + tPH+(L)IPH+(L) : H+(L)→ H+(L) (3.4.7)

e um isomorfismo definido positivo para todo t ∈ [0 , 1]. Analogamente,

It|H−(L) = (1− t)PH−(L)LPH−(L) + tPH−(L)(−I)PH−(L) : H−(L)→ H−(L) (3.4.8)

e um isomorfismo definido negativo para todo t ∈ [0 , 1]. Observe que, para t ∈ [0 , 1],o operador It e auto-adjunto, pois L, PH+(L), PH−(L) e I sao auto-adjuntos. Alemdisso, Ker It = KerL para todo t ∈ [0 , 1]. Assim, para t ∈ [0 , 1], It e um operadorde Fredholm fortemente indefinido. Alem disso, pelas formulas (3.4.7) e (3.4.8) e aspropriedades acima de It, temos que

H+(It) = H+(L), H−(It) = H−(L) e Ker It = KerL.

Daı, para t ∈ [0 , 1], It define um caminho em ΦiS(H) tal que

I0 = L e I1 = I, (3.4.9)

onde I e o operador em ΦiS(H) definido como

I|H+(L) = I|H+(L), I|H−(L) = −I|H−(L) e I|KerL = 0|KerL,

CAPITULO 3. OPERADORES DE FREDHOLM EM ESPACOS DE HILBERT 83

onde 0|KerL e o operador nulo no nucleo de L.Agora, da Proposicao 3.4.12 se segue que α(t) = I + tPKerL ∈ Φi

S(H) para todot ∈ [0, 1], onde PKerL e a projecao ortogonal sobre KerL. Logo, α : [0, 1] → Φi

S(H) eum caminho tal que

α(0) = I e α(1) = I + PKerL. (3.4.10)

Por outro lado, do Teorema 1.1.18 se segue que H+(L)⊕ KerL e isometrico a H+

e H−(L) e isometrico a H−, isto e, existem dois operadores ortogonais

M+ : H+(L)⊕KerL→ H+ e M− : H−(L)→ H−.

Tomemos o operador M : H → H dado por

M |H+(L)⊕KerL = M+ e M |H−(L) = M−.

Observe que M∗JM = I + PKerL. De fato, se x ∈ H+(L) ⊕ KerL, entao Mx =M+x ∈ H+. Assim, JM+x = M+x e

M∗JMx = M∗+JM+x = M∗

+M+x = x = (I + PKerL)x. (3.4.11)

Agora, se x ∈ H−(L), entao JMx = −M−x ∈ H−. Logo,

M∗JMx = −M∗−M−x = −x = Ix = (I + PKerL)x. (3.4.12)

De (3.4.11) e (3.4.12) obtemos

M∗JM = I + PKerL.

O Teorema 3.4.14 prova que existe um caminho M : [0, 1] → GL(H) tal queM(0) = M e M(1) = I. Se segue da Proposicao 3.4.11 que

Jt = M(t)∗JM(t) ∈ ΦiS(H) para todo t ∈ [0, 1].

Logo, para t ∈ [0 , 1], Jt define um caminho em ΦiS(H) tal que

J0 = M∗JM = I + PKerL e J1 = J . (3.4.13)

De (3.4.9), (3.4.10) e (3.4.13) se segue que, para qualquer L ∈ ΦiS(H), existe um

caminho β : [0, 1] → ΦiS(H) tal que β(0) = L e β(1) = J . Em conclusao, Φi

S(H) econexo por caminhos.

Como falamos na introducao desta secao, mostraremos que Φ+S (H), Φ−S (H) e Φi

S(H)sao as tres componentes conexas de ΦS(H). Para este fim, dado que

ΦS(H) = Φ+S (H) ∪ Φ−S (H) ∪ Φi

S(H)

e os espacos Φ+S (H), Φ−S (H) e Φi

S(H) sao conexos dois a dois disjuntos, pelos Teoremas3.4.7 e 3.4.15, e suficiente provar que Φ+

S (H), Φ−S (H) e ΦiS(H) sao abertos em ΦS(H).

Concluımos esta secao com a prova deste fato.

CAPITULO 3. OPERADORES DE FREDHOLM EM ESPACOS DE HILBERT 84

Teorema 3.4.16. Os espacos Φ+S (H), Φ−S (H) e Φi

S(H) sao subconjuntos abertos deΦS(H).

Demonstracao. Provemos primeiro que Φ+S (H) e aberto em ΦS(H). De fato, dado

que o conjunto dos operadores de Fredholm e um subconjunto aberto de L(H), temosque o conjunto dos operadores de Fredholm auto-adjuntos e um subconjunto abertode LS(H), isto e, ΦS(H) e aberto em LS(H). Tomemos L ∈ Φ+

S (H) fixado. Como arestricao L+ = L|H+ : H+(L)→ H+(L) de L e um isomorfismo, se segue do Lema 3.4.5que existe l > 0 tal que

l ≤ inf‖x‖=1

x∈H+(L)

〈Lx, x〉.

Ja que ΦS(H) e aberto em LS(H), existe ε > 0, com ε < l, tal que

B(L, ε) ∩ LS(H) ⊆ ΦS(H),

onde B(L, ε) e a bola em L(H) com centro em L e raio ε. Vejamos que B(L, ε) ∩LS(H) ⊆ Φ+

S (H). De fato, se T ∈ B(L, ε) ∩ LS(H), entao, para x ∈ H+(L) com‖x‖ = 1,

〈(L− T )x, x〉 ≤ ‖L− T‖ < ε.

Daı,

l ≤ 〈Lx, x〉 < ε+ 〈Tx, x〉 para todo x ∈ H+(L) com ‖x‖ = 1. (3.4.14)

Este fato prova que 0 < l − ε < 〈Tx, x〉 para todo x ∈ H+(L) com ‖x‖ = 1. Conse-quentemente, T e positivo em um espaco de codimensao finita. Logo, a dimensao deH−(T ) e finita, isto e, T ∈ Φ+

S (H), como querıamos provar.Por outro lado, dado que L ∈ Φ−S (H) se, e somente se, −L ∈ Φ+

S (H), da provaacima temos que existe uma bola B(−L, ε) com centro em −L e raio ε > 0 tal queB(−L, ε) ∩ LS(H) ⊆ Φ+

S (H). Portanto, dado que

−B(−L, ε) = −T : T ∈ B(−L, ε) = B(L, ε),

temosB(L, ε) ∩ LS(H) = [−B(−L, ε)] ∩ LS(H) ⊆ Φ−S (H).

Este fato prova que Φ−S (H) e aberto em ΦS(H).Por ultimo, vejamos que Φi

S(H) e aberto em ΦS(H). De fato, sejam L ∈ ΦiS(H) e

l1 e l2 tais que

0 < l1 ≤ inf‖x‖=1

x∈H+(L)

〈Lx, x〉 e 0 < l2 ≤ inf‖x‖=1

x∈H−(L)

〈−Lx, x〉.

CAPITULO 3. OPERADORES DE FREDHOLM EM ESPACOS DE HILBERT 85

Como acima, existe ε > 0, com ε < minl1, l2, tal que

B(L, ε) ∩ LS(H) ⊆ ΦS(H).

Tomemos T ∈ B(L, ε) ∩ LS(H) fixado. De forma analoga ao fato obtido em (3.4.14),obtemos que T e positivo em H+(L) e −T e positivo em H−(L). Logo, T e positivoem H+(L) e e negativo em H−(L). Consequentemente, H+(T ) e H−(T ) tem dimensaoinfinita. Portanto, T ∈ Φi

S(H) e assim B(L, ε) ∩ LS(H) ⊆ ΦiS(H). Em conclusao,

ΦiS(H) e aberto em ΦS(H).

Capıtulo 4

A assinatura generalizada e o ındicede Morse relativo

Em dimensao finita, os operadores auto-adjuntos permitem a representacao de umespaco de Hilbert H como soma direta ortogonal dos subespacos espectrais positivoe negativo e do nucleo do operador (Teorema espectral em dimensao finita). Nestecaso a assinatura de um isomorfismo auto-adjunto e definida como a diferenca en-tre a dimensao do seu subespaco espectral positivo e a dimensao do seu subespacoespectral negativo. Neste capıtulo generalizaremos esta definicao de assinatura paraperturbacoes compactas auto-adjuntas de um particular operador de Fredholm auto-adjunto fortemente indefinido, cujo quadrado e a identidade e que chamaremos desimetria. A continuidade da aplicacao assinatura, quando considerada no conjuntodos isomorfismos auto-adjuntos em um espaco de Hilbert de dimensao finita, que pro-varemos na seguinte secao, e crucial para a existencia da assinatura generalizada, ouseja, em dimensao infinita. O fluxo espectral sera definido fazendo uso da assinaturageneralizada e da acao cogradiente, definida no capıtulo anterior.

Na proxima secao veremos outras propriedades que possui a assinatura em dimensaofinita. Uma destas propriedades e a invariancia pela acao cogradiente. Alem disso,mostraremos que, dado um isomorfismo auto-adjunto L ∈ L(H), se expressarmos Hcomo a soma de dos subespacos ortogonaisH1 eH2 invariantes por L, entao a assinaturade L e igual a soma das assinaturas das restricoes do operador L a H1 e H2.

Na segunda secao apresentaremos a definicao da assinatura generalizada. Veremosque esta definicao nao e invariante pela acao cogradiente. Porem, o fluxo espectral, quesera definido no proximo capıtulo fazendo uso da assinatura generalizada, e invariantepor esta acao.

O proposito da terceira secao e provar que aplicacao que associa a um operadorauto-adjunto L a projecao ortogonal PH−(L) sobre seu subespaco espectral negativo(positivo) e contınua. Para este fim, com base no Teorema integral de Cauchy paraaplicacoes complexas, veremos primeiro que, se E e um espaco de Banach complexo,

86

CAPITULO 4. ASSINATURA E INDICE DE MORSE RELATIVO 87

L ∈ L(E) e f : ∆ → C e uma aplicacao regular, onde ∆ e um subconjunto abertode C que contem o espectro de L, f(L) e bem definido como um operador em L(E).Fazendo uso do fato anterior, provaremos que, se H e um espaco de Hilbert complexo eL ∈ L(H) e auto-adjunto e 0 nao e ponto de acumulacao de σ(L), a projecao ortogonalsobre o subespaco espectral negativo de L pode ser expressada como um operadorχ(L), onde χ : ∆→ C e uma oportuna aplicacao regular tal que σ(L) ⊆ ∆. De formaanaloga podemos representar a projecao ortogonal sobre o subespaco espectral positivode L. Esta nova expressao para tais projecoes permitira mostrar que elas dependemcontinuamente do operador, fato que sera fundamental no resto do trabalho.

Na quarta secao definiremos o ındice de Morse relativo para pares de isomorfismosauto-adjuntos em espacos de Hilbert. No ultimo capıtulo provaremos que o fluxoespectral de um caminho de perturbacoes compactas auto-adjuntas de um operador deFredholm fixado e igual ao ındice de Morse relativo do par formado pelos extremos docaminho.

4.1 A assinatura em espacos de Hilbert de dimen-

sao finita

Como foi dito na introducao deste capıtulo, nesta secao veremos a definicao e algu-mas das propriedades que possui a aplicacao assinatura sign : GLS(H) → R, ondeGLS(H) denota o conjunto dos isomorfismos auto-adjuntos em um espaco de Hilbertde dimensao finita H. Uma destas propriedades e a continuidade, que sera provada nofinal desta secao.

A assinatura generalizada, que sera definida na proxima secao, nao e invariantepela acao cogradiente. Porem, mostraremos que a assinatura de um operador inversıvelauto-adjunto em um espaco de Hilbert de dimensao finita e invariante por esta acao.As propriedades da assinatura, que apresentaremos nesta secao, serao fundamentais nadefinicao da assinatura generalizada.

Nesta secao vamos supor que H seja um espaco de Hilbert real de dimensao finita.Para um operador auto-adjunto L ∈ L(H), denotaremos por µ(L) a dimensao dosubespaco espectral negativo de L. Este numero e tambem conhecido como ındice deMorse do operador.

Definicao 4.1.1. A assinatura de um isomorfismo auto-adjunto L ∈ L(H) e definidapor

signL = µ(−L)− µ(L).

A definicao acima quer dizer que a assinatura de um isomorfismo auto-adjunto emum espaco de Hilbert de dimensao finita e igual a diferenca entre as dimensoes dos seussubespacos espectrais positivo e negativo, isto e,

signL = dimH+(L)− dimH−(L).

CAPITULO 4. ASSINATURA E INDICE DE MORSE RELATIVO 88

Lembremos que, se L ∈ L(H) e auto-adjunto, entao H+(L) coincide com o au-toespaco gerado pelos autovetores de L relativos aos autovalores positivos e H−(L)coincide com o autoespaco gerado pelos autovetores relativos aos autovalores negati-vos.

Observacao 4.1.2. Seja L ∈ L(H) auto-adjunto. Observe que, como

H+(L) = spanv : v e um autovetor de L com autovalor positivo

eH−(L) = spanv : v e um autovetor de L com autovalor negativo,

a dimensao de H+(L) e igual ao numero de autovalores positivos de L (contando asmultiplicidades) e a dimensao de H−(L) e igual ao numero de autovalores negativos deL (contando as multiplicidades). Estas igualdades se obtem pelo fato de que, se L eauto-adjunto em um espaco de Hilbert de dimensao finita, a multiplicidade algebricade cada autovalor λ de L, isto e, o numero de vezes que λ se repete como raiz dopolinomio caracterıstico de L, coincide com sua multiplicidade geometrica1, ou seja,a dimensao do autoespaco gerado pelos autovetores correspondentes a λ. Portanto,a assinatura de L e igual a diferenca entre o numero de autovalores positivos de L(contando as multiplicidades) e numero de autovalores negativos de L (contando asmultiplicidades).

Como falamos na introducao desta secao, a assinatura e invariante pela acao cogra-diente. Este fato e mostrado na seguinte proposicao.

Proposicao 4.1.3. Se L : H → H e um isomorfismo auto-adjunto e S ∈ GL(H),entao

signS∗LS = signL.

Demonstracao. E suficiente provar que

dimH+(S∗LS) = dimH+(L) e dimH−(S∗LS) = dimH−(L).

Denotemos por L o operador S∗LS. Ja que L e L sao isomorfismos auto-adjuntos,temos

H = H+(L)⊕H−(L) = H+(L)⊕H−(L). (4.1.1)

Em (3.4.6) vimos que a soma S−1(H+(L)) ⊕H−(L) e de fato direta. Agora, dadoque dimS−1(H+(L)) = dimH+(L),

dimH−(L) ≤ dimH−(L). (4.1.2)

1Sabemos que, se L nao for auto-adjunto, a multiplicidade geometrica do autovalor pode ser estri-tamente menor que sua multiplicidade algebrica.

CAPITULO 4. ASSINATURA E INDICE DE MORSE RELATIVO 89

Analogamente,dimH+(L) ≤ dimH+(L). (4.1.3)

De (4.1.1), (4.1.2) e (4.1.3) temos

dimH+(L) = dimH+(L) e dimH−(L) = dimH−(L),

o que prova o proposicao.

Sejam L ∈ GL(H) um operador auto-adjunto e H um espaco de Hilbert com

dim H = dimH < ∞. Observe que, se O ∈ L(H,H), entao O∗LO e auto-adjunto em

L(H), pois(O∗LO)∗ = O∗L∗O = O∗LO.

O seguinte lema e consequencia imediata da prova da proposicao anterior.

Lema 4.1.4. Sejam H e H espacos de Hilbert com dimH = dim H < ∞. Se L ∈GL(H) e auto-adjunto e O ∈ L(H,H) e um isomorfismo, entao O∗LO e um isomor-

fismo auto-adjunto em L(H) e, alem disso,

sign(O∗LO) = signL.

Demonstracao. Acima provamos que o operador O∗LO e auto-adjunto em L(H). Ob-serve queO∗LO e um isomorfismo, sendo composicao de isomofismos. De forma analogaa prova da proposicao anterior podemos mostrar que

dimH+(O∗LO) = dimH+(L) e dimH−(O∗LO) = dimH−(L).

Consequentemente, sign(O∗LO) = signL.

Lema 4.1.5. Seja L ∈ L(H) um isomorfismo auto-adjunto. Suponhamos que H =H1 ⊕H2, onde H1 e H2 sao subespacos ortogonais de H, e que a matriz de operadoresassociada a L e a esta soma seja da forma

L =

(L1 00 L2

).

Entao,signL = signL1 + signL2.

Demonstracao. E claro que L1 : H1 → H1 e L2 : H2 → H2 sao isomorfismos auto-adjuntos, portanto admitem as decomposicoes

H1 = H+(L1)⊕H−(L1) e H2 = H+(L2)⊕H−(L2).

CAPITULO 4. ASSINATURA E INDICE DE MORSE RELATIVO 90

Assim,H = H+(L1)⊕H−(L1)⊕H+(L2)⊕H−(L2).

E facil ver que H+(L1)⊕H+(L2) ⊆ H+(L) e H−(L1)⊕H−(L2) ⊆ H−(L). Consequen-temente, ja que H = H+(L)⊕H−(L), obtemos que

H+(L) = H+(L1)⊕H+(L2) e H−(L) = H−(L1)⊕H−(L2).

Daı,

signL = dimH+(L)− dimH−(L)

= dimH+(L1) + dimH+(L2)− dimH−(L1)− dimH−(L2)

= signL1 + signL2,

o que prova o lema.

Observe que, se L1 : H1 → H1 e L2 : H2 → H2 sao isomorfismos auto-adjuntos,onde H1 e H2 sao espacos de Hilbert de dimensao finita, entao, de (3.2.1), o produtodireto (L1, L2) : H1 × H2 → H1 × H2 e um isomorfismo auto-adjunto. Como vimosem (3.1.2), a soma H = [H1 × 0]⊕ [0 ×H2] e ortogonal. Neste caso, a matriz deoperadores associada a (L1, L2) e a decomposicao de H e da forma

L =

(L1 0

0 L2

),

onde L1 : H1 × 0 → H1 × 0 e definido por L1(x, 0) = (L1x, 0) e L2 : 0 ×H2 →0 × H2 e definido por L2(0, x) = (0, L2x). Como consequencia imediata do lemaacima temos o seguinte corolario.

Corolario 4.1.6. Nas condicoes acima, sign(L1, L2) = signL1 + signL2.

Demonstracao. Dos fatos mostrados acima e do Lema 4.1.5, obtemos que

sign(L1, L2) = sign L1 + sign L2.

Nao e difıcil provar que sign L1 = signL1 e sign L2 = signL2. Consequentemente,sign(L1, L2) = signL1 + signL2.

Seja L ∈ L(H) um isomorfismo auto-adjunto. O lema anterior mostra que, seH = H1 ⊕H2, onde H1 e H2 sao subespacos ortogonais de H invariantes por L, entaoa assinatura de L e igual a soma das assinaturas das restricoes de L aos espacos H1 eH2.

CAPITULO 4. ASSINATURA E INDICE DE MORSE RELATIVO 91

Antes de apresentar a proxima proposicao, lembramos que, se e1, e2, ..., en e umabase ortonormal de H, entao, dado x ∈ H e sua representacao x =

∑ni=1 xiei, temos

‖x‖ =

√√√√ n∑i=1

|xi|2 (4.1.4)

De fato,

‖x‖2 = 〈n∑i=1

xiei,

n∑j=1

xjej〉 =n∑i=1

xi〈ei,n∑j=1

xjej〉 =n∑i=1

xi〈ei, xiei〉 =n∑i=1

|xi|2.

Finalizamos esta secao demonstrando que a aplicacao assinatura e contınua.

Proposicao 4.1.7. A aplicacao sign : GLS(H)→ R dada por

L 7→ signL

e contınua.

Demonstracao. Denotemos por n a dimensao de H. Seja L ∈ GLS(H) fixado. De-vemos mostrar que existe uma vizinhanca V ⊆ GLS(H) de L tal que, para todoT ∈ V , signT = signL. De fato, tomemos bases ortonormais e1, e2, ..., ek de H+(L) eek+1, ek+2, ..., en de H−(L) formadas por autovetores de L. Assim, para i = 1, 2, ..., n,

Lei = λiei, onde λi > 0 para i = 1, ..., k e λi < 0 para i = k + 1, ..., n.

Sejam λ = min|λi| : i = 1, 2, ..., n > 0 e B(L, λ) ⊆ LS(H) a bola com centro emL e raio λ. Tomemos T ∈ B(L, λ) fixado. Vejamos que T e um isomorfismo e quesignT = signL. De fato, para provar que T e um isomorfismo e suficiente provar queT e injetora, pois H e de dimensao finita. Suponhamos por absurdo que exista z ∈ H

tal que ‖z‖ = 1 e Tz = 0. Entao, z =n∑i=1

ziei, onde z1, z2, ..., zn ∈ R. De (4.1.4) temos

‖∑n

i=1 λiziei‖2 =∑n

i=1 |λizi|2, portanto

‖Tz − Lz‖2 = ‖Lz‖2 = ‖n∑i=1

λiziei‖2 =n∑i=1

|λizi|2 ≥ |λ|2n∑i=1

|zi|2 = λ2‖z‖2 = λ2.

Logo, ‖T − L‖ = sup‖x‖=1 ‖Tx − Lx‖ ≥ λ, contradizendo o fato de que T ∈ B(L, λ).Assim, T e injetor e portanto sobrejetor, isto e, T e um isomorfismo.

CAPITULO 4. ASSINATURA E INDICE DE MORSE RELATIVO 92

Agora provemos que signT = signL. Vejamos primeiro que T e definida positiva emH+(L). Suponhamos por absurdo que 〈Ty, y〉 ≤ 0 para algum y =

∑ki=1 yiei ∈ H+(L),

com ‖y‖ = 1. Daı,

〈Ly − Ty, y〉 = 〈L

(k∑i=1

yiei

)− T

(k∑i=1

yiei

),

k∑j=1

yjej〉

= 〈k∑i=1

λiyiei,

k∑j=1

yjej〉 − 〈T

(k∑i=1

yiei

),

k∑j=1

yjej〉

=k∑i=1

λi〈yiei,k∑j=1

yjej〉 − 〈Ty, y〉

≥k∑i=1

λi〈yiei, yiei〉

=k∑i=1

λi|yi|2

≥ λk∑i=1

|yi|2

= λ.

Dado que L− T e auto-adjunto, do Teorema 3.2.15 se segue

‖L− T‖ = sup‖x‖=1

|〈Lx− Tx, x〉| ≥ λ,

contradizendo o fato de que T ∈ B(L, λ). Portanto, T e positivo em H+(L). Conse-quentemente, a soma H+(L) +H−(T ) e direta. Daı,

dimH−(T ) ≤ dimH−(L). (4.1.5)

Analogamente, T e negativo em H−(L). Assim, a soma H−(L) + H+(T ) e direta.Entao,

dimH+(T ) ≤ dimH+(L). (4.1.6)

Como T e um isomorfismo auto-adjunto, temos

dimH+(T ) + dimH−(T ) = dimH+(L) + dimH−(L) = n. (4.1.7)

De (4.1.5), (4.1.6) e (4.1.7) se segue

dimH+(T ) = dimH+(L) e dimH−(T ) = dimH−(L).

Logo, signL = signT. Em conclusao, sign e contınua.

Dado que a aplicacao assinatura toma valores inteiros, da proposicao anterior temosque esta aplicacao e localmente constante.

CAPITULO 4. ASSINATURA E INDICE DE MORSE RELATIVO 93

4.2 A assinatura generalizada para perturbacoes

compactas auto-adjuntas de uma simetria

Nesta secao estenderemos a definicao da assinatura, dada na secao anterior, para per-turbacoes compactas auto-adjuntas de uma simetria em um espaco de Hilbert real,separavel de dimensao infinita, lembrando, inclusive, a definicao de simetria. Alemdisso, veremos algumas propriedades que possui esta extensao. A assinatura genera-lizada sera definida fazendo uso da aproximacao de Galerkin para operadores em umespaco de Hilbert separavel. Mostraremos que esta generalizacao nao e invariante pelaacao cogradiente.

No resto do trabalho H denotara um espaco de Hilbert real de dimensao infinita eseparavel. Denotaremos por KS(H) o espaco dos operadores compactos auto-adjuntosem H. Observe que KS(H) e um subespaco fechado de L(H), pois e a intersecao dossubespacos fechados K(H) e LS(H).

Sejam H− e H+ dois subespacos fechados de H, de dimensao infinita, ortogonais etais que

H = H+ ⊕H−. (4.2.1)

Tomemos o operador J ∈ L(H) que tem a seguinte matriz de operadores associada adecomposicao (4.2.1):

J =

(IH+ 00 −IH−

),

onde IH+ e IH− sao as identidades de H+ e H−, respectivamente. E claro que J e umisomorfismo auto-adjunto. Alem disso,

H+(J ) = H+ e H−(J ) = H−.

Consequentemente, J e um operador fortemente indefinido, pois H+ e H− tem di-mensao infinita.

O operador J e uma simetria, isto e, J 2 = I. No resto do trabalho, se nao temosambiguidade, o termo simetria sera usado para chamar operadores do tipo definidoacima, denotados por J , e, alem disso, H+ e H− denotarao os subespacos H+(J ) eH−(J ), respectivamente.

Sejam (e+i )∞i=1 e (e−i )∞i=1 bases de Hilbert de H+ e H−, respectivamente. Logo,

J e+i = e+

i para todo i ∈ N e J e−i = −e−i para todo i ∈ N. (4.2.2)

Para cada numero natural n, denotamos por Hn o subespaco de H de dimensao 2ngerado por (e±i )ni=1, isto e,

Hn = spane±i : i = 1, ..., n = x ∈ H : x =n∑i=1

(aie+i + bie

−i ), onde ai, bi ∈ R.

CAPITULO 4. ASSINATURA E INDICE DE MORSE RELATIVO 94

Consequentemente, (e±i )∞i=n+1 se torna uma base de Hilbert para o espaco H⊥n . Assim,para cada numero inteiro k ≥ 1, temos

Hn+k ∩H⊥n = spane±i : i = n+ 1, ..., n+ k. (4.2.3)

Observacao 4.2.1. E facil provar que

J (Hn) = Hn e J (H⊥n ) = H⊥n .

Consideremos as restricoes

J |Hn : Hn → Hn e J |Hn+k∩H⊥n : Hn+k ∩H⊥n → Hn+k ∩H⊥n .

Da expressao dada em (4.2.2) temos

H+(J |Hn) = spane+i : i = 1, ..., n e H−(J |Hn) = spane−i : i = 1, ..., n.

Logo,sign(J |Hn) = dim(H+(J |Hn))− dim(H−(J |Hn)) = 0.

Por outro lado, as igualdades (4.2.2) e (4.2.3) implicam que

H+(J |Hn+k∩H⊥n ) = spane+i : i = n+ 1, ..., n+ k

eH−(J |Hn+k∩H⊥n ) = spane−i : i = n+ 1, ..., n+ k.

Portanto,sign(J |Hn+k∩H⊥n ) = 0.

Como tınhamos falado acima, a seguir definiremos a assinatura de uma perturbacaocompacta auto-adjunta da simetria J usando a aproximacao de Galerkin de operadoresem espacos de Hilbert separaveis.

Definicao 4.2.2. Seja Pn a projecao ortogonal de H sobre Hn. Para um operadorL ∈ L(H) e um inteiro positivo n, o operador Ln : Hn → Hn definido como a restricaode PnL ao subespaco Hn e chamado de n-esima aproximacao de Galerkin de L.

Daqui a frente, se nao se diz o contrario, a n-esima aproximacao de Galerkin seratomada a respeito dos subespacos Hn e das bases (e±i )∞i=n+1 dadas anteriormente.

Observe que, se x ∈ H, entao

x =∞∑n=1

(ane+n + bne

−n ) = lim

n→+∞Pnx,

isto e, a sequencia (Pn)∞n=1 converge pontualmente a I. Nao e difıcil provar que

‖Pn − Pm‖ = 1 para todo n,m ∈ N, com n 6= m.

Consequentemente, (Pn)∞n=1 nao converge a I em L(H). Porem, (Pn)∞n=1 convergeuniformemente a I em qualquer subconjunto compacto de H. Para mostrar este fato,vejamos primeiro o seguinte lema.

CAPITULO 4. ASSINATURA E INDICE DE MORSE RELATIVO 95

Lema 4.2.3. Sejam (Tn)∞n=1 uma sequencia de operadores em L(E,F ) e T ∈ L(E,F ),onde E e F sao espacos de Banach. Suponhamos que exista M > 0 tal que ‖Tn‖ ≤Mpara todo n ∈ N. Se Tnx → Tx para todo x ∈ E, entao Tn converge uniformemente aT em qualquer subconjunto compacto de E, isto e,

supx∈C‖Tnx− Tx‖ → 0 quando n→∞

para qualquer subconjunto compacto C de E.

Demonstracao. Ja que C e um subconjunto compacto de E, ele e totalmente limitado(Teorema 1.4.2), isto e, para qualquer ε > 0, existe um numero finito de elementosx1, x2, ..., xm em C tais que C ⊆ ∪mi=1B(xi, ε), onde B(xi, ε) e a bola com centro em xie raio ε. Dado que, para i = 1, 2, ...m, Tnxi → Txi quando n→∞, existe um numeroni ∈ N, em correspondencia a xi, tal que

‖Tnxi − Txi‖ < ε para n > ni.

Sejam x ∈ C e n > maxni : i = 1, 2, ...,m. Como C ⊆ ∪mi=1B(xi, ε), temos que‖x− xi‖ < ε para algum xi. Consequentemente,

‖Tnx− Tx‖ ≤ ‖Tnx− Tnxi‖+ ‖Tnxi − Txi‖+ ‖Txi − Tx‖≤ ‖Tn‖‖x− xi‖+ ε+ ‖T‖‖x− xi‖≤Mε+ ε+ ‖T‖ε= (M + 1 + ‖T‖)ε.

Logo,supx∈C‖Tnx− Tx‖ → 0 quando n→∞,

o que prova o lema.

Dado que cada uma das projecoes Pn tem norma 1 e que a sequencia (Pn)∞n=1

converge pontualmente a I, se segue do lema anterior que esta sequencia convergeuniformemente a I em qualquer subconjunto compacto de H. O seguinte lema e umaconsequencia do fato anterior.

Lema 4.2.4. Se K e um operador compacto, a sequencia (PnK)∞n=1 converge unifor-memente a K em L(H).

Demonstracao. Tomemos C = K(B), onde B e a bola de raio 1 e centro em 0 ∈ H.Seja ε > 0 fixado. Dado que C e compacto, do lema anterior se segue que existe uminteiro positivo N tal que, se n ≥ N, entao supy∈C ‖y−Pny‖ < ε. Portanto, se n ≥ N,

‖K − PnK‖ = supx∈B‖(K − PnK)x‖ = sup

x∈B‖(I − Pn)Kx‖

= supy∈K(B)

‖(I − Pn)y‖ = supy∈C‖y − Pny‖ < ε.

Este fato implica que (PnK)∞n=1 converge uniformemente a K em L(H).

CAPITULO 4. ASSINATURA E INDICE DE MORSE RELATIVO 96

A proposicao que apresentaremos a seguir e fundamental para a definicao da assi-natura de uma perturbacao compacta auto-adjunta da simetria J .

Proposicao 4.2.5. Sejam L = J + K ∈ GLS(H) uma perturbacao compacta auto-adjunta de J e, para n natural, Ln a n-esima aproximacao de Galerkin de L. Entao,existe um inteiro positivo N tal que signLn e independente de n ≥ N .

Demonstracao. Provemos que existe um inteiro positivo N tal que, para n ≥ m ≥ Ne 0 ≤ t ≤ 1, o operador

Jn,m(t) = t[J + PnK]|Hn + (1− t)[J + PmKPm]|Hn : Hn → Hn (4.2.4)

e inversıvel, onde Hn e o subespaco definido acima. Supondo por absurdo que naoexista tal N , entao, para cada k ∈ N, existem tk ∈ [0, 1] e duas sequencias estritamentecrescentes de inteiros positivos, (mk)

∞k=1 e (nk)

∞k=1, tais que nk ≥ mk e, alem disso,

Jnk,mk(t) : Hnk → Hnk

nao e inversıvel. Logo, para cada k, existe um vetor unk em Hnk , que podemos pegarsem perda de generalidade de norma 1, tal que

tkJ unk + PnkKunk + (1− tk)J unk + (1− tk)PmkKPmkunk = 0.

Assim,

J unk + tkPnkKunk + (1− tk)PmkKPmkunk = 0 para todo k. (4.2.5)

Pela compacidade de [0, 1], podemos supor que tk → t ∈ [0, 1].O Teorema 2.3.10 implica que

−tJ −1K − (1− t)J −1K = −J −1K

e um operador compacto. Logo, da Proposicao 2.3.4 obtemos que

−tJ −1Kunk − (1− t)J −1Kunk = −J −1Kunk

possui uma subsequencia, a qual podemos dar o mesmo nome sem perda de generali-dade, convergente a algum u ∈ H.

Como consequencia do Lema 4.2.4 temos que −tkJ −1PnkK− (1− tk)J −1PmkKPmkconverge uniformemente a −tJ −1K − (1− t)J −1K. Daı, dado ε > 0, existe um inteiropositivo N tal que, se k ≥ N ,

‖ − tJ −1K − (1− t)J −1K − (−tkJ −1PnkK − (1− tk)J −1PmkKPmk)‖ < ε.

CAPITULO 4. ASSINATURA E INDICE DE MORSE RELATIVO 97

Logo, como −tJ −1K − (1− t)J −1K = −J −1K,

‖ − J −1Kunk − (−tkJ −1PnkK − (1− tk)J −1PmkKPmk)unk‖≤ ‖ − J −1K − (−tkJ −1PnkK − (1− tk)J −1PmkKPmk)‖‖unk‖= ‖ − J −1K − (−tkJ −1PnkK − (1− tk)J −1PmkKPmk)‖< ε.

Este fato implica que −tkJ −1PnkKunk − (1 − tk)J −1PmkKPmkunk converge a u. De(4.2.5) se segue que

unk = −tkJ −1PnkKunk − (1− tk)J −1PmkKPmkunk para todo k. (4.2.6)

Assim, unk converge a u, que se torna portanto de norma 1.Do Lema 4.2.4 obtemos que a sequencia J + tkPnkK + (1− tk)PmkKPmk converge

uniformemente a J + tK + (1− t)K = J +K. Portanto, dado que unk converge a u,

J unk + tkPnkKunk + (1− tk)PmkKPmkunk converge a J u+Ku.

Ja que J unk + tkPnkKunk +(1− tk)PmkKPmkunk = 0 para todo k, entao J u+Ku = 0,contradizendo o fato de que J + K e inversıvel. Em conclusao, existe N > 0 tal que,para n ≥ m ≥ N e 0 ≤ t ≤ 1, o operador Jn,m(t) definido em (4.2.4) e um isomorfismo.

Consideremos portanto um inteiro positivo N tal que, para n ≥ m ≥ N e 0 ≤ t ≤ 1,o operador Jn,m(t) definido na formula (4.2.4) seja inversıvel. Sejam n ≥ m ≥ Nnumeros fixos. Os operadores

[J + PnK]|Hn = [J + PnKPn]|Hn : Hn → Hn e [J + PmKPm]|Hn : Hn → Hn

sao auto-adjuntos, pois J , PnKPn e PmKPm sao auto-adjuntos. Consequentemente,Jn,m(t) : Hn → Hn e um caminho de isomorfismos auto-adjuntos. Pela continuidadeda assinatura se segue signJn,m(0) = signJn,m(1), isto e,

sign([J + PmKPm]|Hn) = sign([J + PnK]|Hn) = sign([Pn(J +K)]|Hn) = signLn.

E claro que Hm e Hn ∩H⊥m sao invariantes por J + PmKPm, pois sao invariantespor J e PmKPm. Como Hn = Hm ⊕ [Hn ∩H⊥m], do Lema 4.1.5 e da Observacao 4.2.1temos

sign([J + PmKPm]|Hn) = sign([J + PmKPm]|Hm) + sign([J + PmKPm]|Hn∩H⊥m)

= signLm + sign([J ]|Hn∩H⊥m + [PmKPm]|Hn∩H⊥m)

= signLm + sign([J ]|Hn∩H⊥m)

= signLm.

Assim, signLn = signLm para n ≥ m ≥ N , o que prova a proposicao.

CAPITULO 4. ASSINATURA E INDICE DE MORSE RELATIVO 98

Como consequencia obtemos a seguinte definicao.

Definicao 4.2.6. Seja L = J +K ∈ GL(H) uma perturbacao compacta auto-adjuntade J . Entao, sua assinatura, denotada por signJ (L, (ei

±)∞i=1), e definida por

signJ (L, (ei±)∞i=1) = lim

n→∞signLn.

Provemos que a Definicao 4.2.6 nao depende da escolha das bases de H+ e H−. Defato, sejam (e+

i )∞i=1 e (e−i )∞i=1 outras bases de Hilbert de H+ e H−, respectivamente.Sejam O+ : H+ → H+ e O− : H− → H− os operadores ortogonais definidos por

O+e+i = ei

+ e O−e−i = ei

− para todo i ∈ N.

Tomemos O ∈ L(H) definido por

Oe±i = O±e±i = ei

± para todo i ∈ N.

Nao e difıcil provar que O e ortogonal.Mostremos que O−1JO = J . De fato, seja x =

∑∞i=1(aie

+i + bie

−i ) ∈ H fixado.

Daı,

O−1JOx = O−1J (O∞∑i=1

(aie+i + bie

−i )) = O−1J (

∞∑i=1

(aie+i + bie

−i ))

= O−1(∞∑i=1

(aie+i − bie−i )) =

∞∑i=1

(aie+i − bie−i )

= J (∞∑i=1

(aie+i + bie

−i )) = J x,

isto e, O−1JOx = J x para todo x ∈ H.Denotemos por Hn o espaco gerado por e±k : 1 ≤ k ≤ n e por Pn a projecao

ortogonal sobre Hn. Da definicao de O temos Hn = O(Hn). Logo, as restricoes

O : Hn → Hn e O−1 : Hn → Hn sao bem definidas e, alem disso, isomorfismos.Observe que OPn|Hn = PnO|Hn . De fato, se x ∈ Hn, entao Ox ∈ Hn. Consequente-

mente,OPnx = Ox = PnOx para todo x ∈ Hn.

Por outro lado, vejamos que O−1Pn = PnO−1. Seja x ∈ H fixado. Daı, x =

x1 + x2 ∈ Hn ⊕H⊥n , onde x1 ∈ Hn e x2 ∈ H⊥n . Portanto, O−1x1 ∈ Hn e O−1x2 ∈ H⊥n .Assim,

PnO−1(x1 + x2) = PnO

−1x1 + PnO−1x2 = O−1x1 = O−1Pnx1 = O−1Pn(x1 + x2),

o que prova que O−1Pnx = PnO−1x.

CAPITULO 4. ASSINATURA E INDICE DE MORSE RELATIVO 99

Dado que O−1 = O∗, o operador compacto O−1KO e auto-adjunto. Logo, daProposicao 4.2.5 se segue que existe n suficientemente grande tal que

signJ (J +K, (ei±)∞i=1) = sign([J + PnKPn]|Hn) (4.2.7)

esignJ (J +O−1KO, (e±i )∞i=1) = sign([J + PnO

−1KOPn]|Hn).

Ja que O−1Pn = PnO−1 e OPn|Hn = PnO|Hn , do Lema 4.1.4 temos

sign([J + PnO−1KOPn]|Hn) = sign([J +O−1PnKPnO]|Hn)

= sign(O−1[J + PnKPn]O|Hn)

= sign([J + PnKPn]|Hn),

isto e,sign([J + PnO

−1KOPn]|Hn) = sign([J + PnKPn]|Hn). (4.2.8)

Como na prova da Proposicao 4.2.5, temos que existe N ∈ N tal que, se n > N e0 6 t 6 1,

J + tPnKPn + (1− t)PnO−1KOPn : Hn → Hn

e um isomorfismo auto-adjunto. A continuidade da assinatura (ver Proposicao 4.1.7)implica que

sign([J + PnKPn]|Hn) = sign([J + PnO−1KOPn]|Hn). (4.2.9)

Assim, de (4.2.7), (4.2.8) e (4.2.9) temos

signJ (J +K, (ei±)∞i=1) = sign([J + PnKPn]|Hn) = sign([J + PnKPn]|Hn),

isto e,signJ (J +K, (ei

±)∞i=1) = signJ (J +K, (e±i )∞i=1).

Este fato prova que a Definicao 4.2.6 nao depende das bases escolhidas para H+ e H−,respectivamente. Consequentemente, daqui a frente denotaremos simplesmente por

signJ (J +K)

a assinatura generalizada do operador J +K.

O seguinte resultado e consequencia da independencia da assinatura da escolha dasbases de H+ e H−.

Proposicao 4.2.7. Seja K ∈ L(H) um operador auto-adjunto com imagem de di-mensao finita. Suponhamos que V seja um subespaco de dimensao finita de H, inva-riante por J e tal que ImK ⊆ V. Entao,

signJ L = sign([J +K]|V )− sign([J ]|V ), (4.2.10)

onde L = J +K.

CAPITULO 4. ASSINATURA E INDICE DE MORSE RELATIVO 100

Demonstracao. De fato, tomemos uma base v1, v2, ..., vs de V. Consideremos basesde Hilbert (e±i )∞i=1 de H±. Assim,

vk =∞∑i=1

xki e+i +

∞∑i=1

yki e−i para k = 1, 2, ..., s.

Sejam

v+k =

∞∑i=1

xki e+i ∈ H+ e v−k =

∞∑i=1

yki e−i ∈ H− para k = 1, 2, ..., s.

Pelo processo de ortogonalizacao de Gram-Schmidt, para k = 1, 2, ..., s, existem vetoresortonormais u+

k ∈ H+ e u−k ∈ H− tais que

spanu±k : k = 1, 2, ..., s = spanv±k : k = 1, 2..., s.

Portanto, V e um subespaco de Hs = Hs+ ⊕ Hs

−, onde

Hs± = spanu±k : k = 1, ..., s.

Podemos estender as bases de Hs± a bases de Hilbert de H±. Denotaremos por Hn

o espaco gerado pelos n primeiros termos das novas bases de H±. Seja n ≥ s tal que

signJ (J +K) = sign([J +K]|Hn).

Ponhamos V ⊥n = V ⊥ ∩ Hn. Assim, Hn = V ⊕ V ⊥n . Observe que V ⊥n e invariantepor J . De fato, seja x ∈ V ⊥n fixado. Dado que V e invariante por J , para todo y ∈ V,temos que J y ∈ V. Daı,

〈J x, y〉 = 〈x,J ∗y〉 = 〈x,J y〉 = 0 para todo y ∈ V,

isto e, J x ∈ V ⊥ ∩ Hn = V ⊥n .

Sejam PV : Hn → V e PV ⊥n : Hn → V ⊥n as projecoes ortogonais sobre V e V ⊥n ,

respectivamente. Se x ∈ Hn, entao x = v+ v⊥, onde v ∈ V e v⊥ ∈ V ⊥n . Ja que V e V ⊥nsao invariantes por J , se segue que PV ⊥n J v = 0 e PVJ v⊥ = 0. Como a imagem de Kesta contida em V , temos que PV ⊥n Kv = 0 e PV ⊥n Kv

⊥ = 0. Entao,

(J +K)x = (PV + PV ⊥n )(J +K)(PV + PV ⊥n )x

= PV (J +K)v + PV (J +K)v⊥ + PV ⊥n (J +K)v + PV ⊥n (J +K)v⊥

= PV (J +K)v + PVKv⊥ + PV ⊥n J v

⊥.

Se segue do Corolario 3.2.10 que Kv⊥ = 0. Daı,

(J +K)(v + v⊥) = PV (J +K)v + PV ⊥n J v⊥.

CAPITULO 4. ASSINATURA E INDICE DE MORSE RELATIVO 101

Logo, a matriz de operadores da restricao [J + K]|Hn : Hn → Hn associada a decom-

posicao Hn = V ⊕ V ⊥n e dada por

[J +K]|Hn =

([J +K]|V 0

0 [J ]|V ⊥n

).

O Lema 4.1.5 implica que

sign([J +K]|Hn) = sign([J +K]|V ) + sign([J ]|V ⊥n ).

Da Observacao 4.2.1 e do Lema 4.1.5 segue-se

0 = sign([J ]|Hn) = sign([J ]|V ) + sign([J ]|V ⊥n ).

Consequentemente,

signJ L = sign([J +K]|Hn) = sign([J +K]|V )− sign([J ]|V ),

o que prova a proposicao.

Se um operador L pode ser escrito como uma perturbacao auto-adjunta compactade duas simetrias J e J ′ poderıamos ter signJ ′ L 6= signJ L. Este fato e mostradono seguinte exemplo, onde, inclusive, provamos que signJ L nao e invariante pela acaocogradiente.

Exemplo 4.2.8. Seja J ′ ∈ ΦiS(H) uma simetria tal que, para uma base de Hilbert

ei : −∞ < i <∞ de H,

H+(J ′) = spanei : i ≥ 0 e H−(J ′) = spanei : i ≤ −1.

Seja S : H → H definido por

Sei = ei−1 para −∞ < i <∞.

Observe que S e ortogonal (S leva base ortonormal a base ortonormal). TomemosJ ′′ = S∗J ′S. Assim,

J ′′ei = ei se i ≥ 1 e J ′′ei = −ei se i ≤ 0.

Portanto, J ′′ e uma simetria em ΦiS(H), onde

H+(J ′′) = ei : i ≥ 1 e H−(J ′′) = ei : i ≤ 0.

Seja K : H → H o operador tal que

Ke0 = −2e0 e Kei = 0 para i ∈ Z− 0.

CAPITULO 4. ASSINATURA E INDICE DE MORSE RELATIVO 102

E facil ver que J ′ = J ′′ −K. A imagem de K, que e o subespaco H0 = spane0, einvariante por J ′′. Da Proposicao 4.2.7 se segue

signJ ′′ J ′ = signJ ′′(J ′′ −K) = sign([J ′′ −K]|H0)− sign([J ′′]|H0).

Como (J ′′ − K)e0 = J ′e0 = e0, entao sign([J ′′ − K]|H0) = 1. Agora, J ′′e0 = −e0.Assim, sign([J ′′]|H0) = −1. Daı,

signJ ′′ J ′ = 2 6= 0 = signJ ′′ J ′′.

Na Proposicao 4.2.11 apresentaremos uma outra propriedade da assinatura gene-ralizada, que tem a ver com o produto direto de dois operadores em espacos de Hilbert.Para este fim, vejamos primeiro os seguintes resultados.

Sejam H1 e H2 dois espacos de Hilbert reais. Consideremos o espaco de HilbertH1×H2 com o produto interno definido em (3.1.1). De (3.2.1) temos que, se L1 ∈ L(H1)e L2 ∈ L(H2), entao (L1, L2)∗ = (L∗1, L

∗2).

Lema 4.2.9. Se L1 ∈ L(H1) e L2 ∈ L(H2) sao operadores auto-adjuntos, entao

H+(L1, L2) = H+(L1)×H+(L2), H+(L1, L2) = H+(L1)×H+(L2)

e Ker(L1, L2) = KerL1 ×KerL2.

Demonstracao. De fato,

(L1, L2)(H+(L1)×H+(L2)) = L1(H+(L1))× L2(H+(L2)) ⊆ H+(L1)×H+(L2),

isto e, H+(L1)×H+(L2) e invariante por (L1, L2).Por outro lado, se (x1, x2) ∈ H+(L1)×H+(L2), com x1, x2 6= 0, de (3.1.1) temos

〈(L1, L2)(x1, x2), (x1, x2)〉 = 〈(L1x1, L2x2), (x1, x2)〉 = 〈L1x1, x1〉+ 〈L2x2, x2〉 > 0.

Portanto, (L1, L2) e definido positivo em H+(L1)×H+(L2).Analogamente, H−(L1)×H−(L2) e invariante por (L1, L2) e, alem disso, (L1, L2) e

definido negativo em H−(L1)×H−(L2).E facil ver que

Ker(L1, L2) = KerL1 ×KerL2.

Consequentemente, o Teorema 3.3.19 implica que H+(L1, L2) = H+(L1)×H+(L2) eH−(L1, L2) = H−(L1)×H−(L2).

Lema 4.2.10. Se P1 : H1 → H1 e P2 : H2 → H2 sao projecoes ortogonais sobreImP1 e ImP2, respectivamente, entao (P1, P2) : H1×H2 → ImP1× ImP2 e a projecaoortogonal sobre ImP1 × ImP2.

CAPITULO 4. ASSINATURA E INDICE DE MORSE RELATIVO 103

Demonstracao. E claro que Im(P1, P2) = ImP1 × ImP2. Agora,

(P1, P2)2 = (P1, P2)(P1, P2) = (P1P1, P2P2) = (P1, P2),

isto e, (P1, P2) e uma projecao. Por outro lado, dado que

(P1, P2)∗ = (P ∗1 , P∗2 ) = (P1, P2),

(P1, P2) e auto-adjunto. Consequentemente, a Proposicao 3.2.13 implica que (P1, P2) ea projecao ortogonal sobre ImP1 × ImP2.

Observe que, se J1 e J2 sao simetrias em H1 e H2, respectivamente, entao (J1,J2)e uma simetria em H1×H2. De fato,

(J1,J2)2 = (J1,J2)(J1,J2) = (J 21 ,J 2

2 ) = (IH1 , IH2) = IH1×H2 (4.2.11)

e, alem disso, o Lema 4.2.9 implica que

H+(J1,J2) = H+(J1)×H+(J2) e H−(J1,J2) = H−(J1)×H−(J2).

Por outro lado, do Lema 2.3.8 temos que o produto direto de operadores compactose compacto.

Proposicao 4.2.11 (Assinatura do produto). Sejam L1 = J1 +K1 ∈ GL(H1) e L2 =J2 + K2 ∈ GL(H2) perturbacoes compactas auto-adjuntas das simetrias J1 ∈ Φi

S(H1)e J2 ∈ Φi

S(H2), respectivamente. Entao,

sign(J1,J2)[(J1,J2) + (K1, K2)] = signJ1(J1 +K1) + signJ2(J2 +K2).

Demonstracao. Sejam (e±1,i)∞i=1 e (e±2,i)

∞i=1 bases de Hilbert para H±(J1) e H±(J2), res-

pectivamente. Consideremos os subespacos

H1,n = spane±1,i : i = 1, ..., n e H2,n = spane±2,i : i = 1, ..., n.

Denotemos por L1,n e L2,n as n-esimas aproximacoes de Galerkin de L1 e L2, respec-tivamente, com respeito as bases dadas acima. Entao, L1,n = P1,nL1 e L2,n = P2,nL2,onde P1,n e P1,n sao as projecoes sobre H1,n e H2,n, respectivamente. Se segue do lemaanterior que (P1,n, P2,n) e a projecao sobre H1,n ×H2,n. Logo,

(L1,n, L2,n) = (P1,nL1, P2,nL2) = (P1,n, P2,n)(L1, L2),

isto e, (L1,n, L2,n) e a projecao de Galerkin do operador (L1, L2).Seja n um inteiro positivo tal que

signJ1(J1 +K1) = signL1,n e signJ2(J2 +K2) = signL2,n.

CAPITULO 4. ASSINATURA E INDICE DE MORSE RELATIVO 104

Do Lema 4.1.5 temos

sign(L1,n, L2,n) = signL1,n + signL2,n = signJ1(J1 +K1) + signJ2(J2 +K2).

Assim,

sign(J1,J2)[(J1,J2) + (K1, K2)] = limn→∞

sign(L1,n, L2,n)

= signJ1(J1 +K1) + signJ2(J2 +K2),

o que prova a proposicao.

4.3 Funcoes de operadores

Como falamos na introducao deste capıtulo, o objetivo desta secao e mostrar que aaplicacao que a cada operador auto-adjunto associa a projecao ortogonal sobre seusubespaco espectral negativo (positivo) e contınua. Esta propriedade sera de grandeutilidade, tanto como para a proxima secao, onde trataremos o ındice de Morse relativopara pares de isomorfismos cuja diferenca e compacta, que se definira em funcao dasprojecoes sobre os subespacos espectrais negativos, como tambem para o resto dotrabalho.

Seja L ∈ L(E), onde E e un espaco de Banach complexo. Com base no Teoremada formula integral de Cauchy, nesta secao veremos que, se f : ∆→ C e uma aplicacaoregular2, onde ∆ e um subconjunto aberto de C que contem σ(L), podemos definir ooperador f(L) ∈ L(E) como

f(L) = − 1

2πi

∫Γ

f(λ)(L− λI)−1dλ, (4.3.1)

onde Γ e um caminho (ou um numero finito de caminhos que nao se intersectam)fechado, simples, positivamente orientado, contido em ∆ e que contem σ(L) no seuinterior. Para este fim, primeiro lembraremos alguns conceitos, tais como: caminhosretificaveis (fechados, simples ou positivamente orientados), aplicacoes regulares, in-tegral de Riemann de aplicacoes regulares, entre outras. Alem disso, apresentaremosalgumas propriedades que possui a integral de Riemann de aplicacoes regulares aolongo de caminhos retificaveis, assim como tambem o Teorema da formula integral deCauchy. A maioria destes resultados se podem ver, por exemplo, em [15] ou em [2].Fazendo uso destas nocoes da analise complexa, sera clara a formula acima que defineo operador f(L). Schechter em [25], §6.3 e §6.4, faz uma apresentacao bem detalhadadesta construcao.

Finalmente, provaremos que, se L ∈ L(H) e auto-adjunto, onde H e um espaco deHilbert complexo, e 0 nao e ponto de acumulacao de σ(L), a projecao ortogonal sobre o

2Uma aplicacao regular e tambem conhecida como holomorfa.

CAPITULO 4. ASSINATURA E INDICE DE MORSE RELATIVO 105

subespaco espectral negativo de L se pode expressar da forma χ(L), onde χ : ∆→ C euma oportuna aplicao regular e ∆ e um subconjunto aberto dos complexos que contemσ(L). No caso real, tomaremos a complexificacao L do operador L e provaremos que

a parte real do operador χ(L) coincide com a projecao ortogonal sobre o subespacoespectral negativo de L. Com esta representacao das projecoes podemos mostrar queelas dependem continuamente dos operadores.

Nesta secao, se nao se diz o contrario, E denotara um espaco de Banach complexoe ∆ um subconjunto aberto de C.

Definicao 4.3.1. Seja Γ : [a, b] → C um caminho, isto e, uma aplicacao contınua.Para qualquer particao de [a, b], dada por P = t0, t1, ..., tm, definimos

ΛΓ(P ) =m∑k=1

‖Γ(tk)− Γ(tk−1)‖.

SeΛΓ = supΛΓ(P ) : P e uma particao de [a, b]

e finito, entao dizemos que Γ e retificavel e seu comprimento e o supremo acima.

Definicao 4.3.2. Seja Γ : [a, b]→ C um caminho.Dizemos que Γ e fechado se Γ(a) = Γ(b). Neste caso o interior de Γ, denotado por

Γ, e a regiao de C limitada por Γ.Dizemos que Γ e simples se Γ(t1) 6= Γ(t2) para t1, t2 ∈ [a, b], com t1 6= t2 e pelo menos

um dos dois e ponto interior de [a, b]. Se t1 < t2, usaremos a notacao Γ(t1) < Γ(t2),sempre que Γ(t1) seja diferente de Γ(t2). Para simplificar, mesmo que seja improprio,chamaremos de intervalo a imagem Γ([t1, t2]) e a denotaremos por [Γ(t1),Γ(t2)]. Alemdisso, escreveremos λ ∈ Γ para denotar que λ pertence a imagem de Γ.

Um caminho fechado Γ e positivamente orientado se e percorrido no sentido anti-horario, isto e, o seu interior fica a esquerda, ao se percorrer Γ. Por simplicidade,um caminho fechado, simples, retificavel e positivamente orientado Γ : [a, b]→ C serachamado de curva fechada.

Definicao 4.3.3. Dizemos que uma aplicacao f : ∆→ E e regular (ou holomorfa) emλ0 ∈ ∆, se existe em E o limite

limλ→λ0

f(λ)− f(λ0)

λ− λ0

= f ′(λ0).

Se f e regular em cada ponto de ∆, dizemos que f e regular em ∆ ou simplesmenteque f e regular.

Proposicao 4.3.4. Seja L ∈ L(E) dado. A aplicacao R : ρ(L) → L(E) dada porR(λ) = (L− λI)−1, para λ ∈ ρ(L), e regular.

CAPITULO 4. ASSINATURA E INDICE DE MORSE RELATIVO 106

Demonstracao. Sendo λ 7→ L−λI contınua, do Lema 1.1.9 se segue que R e contınua.Fixemos λ0 em ρ(L). Observe que, se λ ∈ ρ(L), de (1.1.1) obtemos

(L− λI)−1 − (L− λ0I)−1 = −(L− λI)−1(λ0I − λI)(L− λ0I)−1,

isto e,(L− λI)−1 − (L− λ0I)−1

(λ− λ0)= (L− λI)−1(L− λ0I)−1.

Consequentemente,

limλ→λ0

(L− λI)−1 − (L− λ0I)−1

(λ− λ0)= (L− λ0I)−2,

o que prova a proposicao.

Lembremos agora a definicao da integral de uma aplicacao ao longo de um caminhocontido no plano complexo. Consideremos um caminho retificavel Γ : [a, b]→ ∆. Umaparticao da imagem de Γ e um subconjunto P = λ0, λ1, λ2, ..., λn ⊆ Im(Γ), ondeλ0 = Γ(a) e λn = Γ(b), tal que

λ0 < λ1 < λ2 < ... < λn.

Dizemos que uma particao P ′ da imagem de Γ e mais fina que P se P ⊆ P ′. A normade uma particao P da imagem de Γ e definida por

‖P‖ = max|λi − λi−1| : i = 1, ..., n.

E facil ver que, se P ′ e mais fina que P , entao ‖P ′‖ ≤ ‖P‖. Tomemos agora umaaplicacao f : ∆ → E e um caminho retificavel Γ : [a, b] → ∆. Para uma particaoP = λ0, λ1, λ2, ..., λn da imagem de Γ, seja E = ζ1, ζ2, ..., ζn, onde ζi ∈ [λi−1, λi],para i = 1, 2, ..., n. Neste caso diremos que (P,E) e uma particao pontuada de Γ.Consideremos a soma

S(P,E, f) =n∑i=1

(λi − λi−1)f(ζi). (4.3.2)

Definicao 4.3.5. Dizemos que f : ∆ → E e integravel no caminho Γ se existe umnumero A com a seguinte propriedade: Para todo ε > 0, existe uma particao pontuada(Pε, Eε) da imagem de Γ tal que para cada particao P = λ0, λ1, λ2, ..., λn mais finaque Pε e cada escolha dos pontos E = ζ1, ζ2, ..., ζn, onde ζi ∈ [λi−1, λi], temos que

|S(P,E, f)− A| < ε.

Neste caso usaremos a notacao

lim‖P‖→0

S(P,E, f) = A.

CAPITULO 4. ASSINATURA E INDICE DE MORSE RELATIVO 107

O numero A e chamado de integral de f no caminho Γ e sera denotado por∫Γ

f(λ)dλ.

No caso das funcoes contınuas reais de variavel real, o analogo da nocao de integralacima e equivalente a definicao classica de integral de Riemann, dada com as somassuperiores e inferiores.

Teorema 4.3.6. Se f : ∆→ E e contınua, entao ela e integravel em qualquer caminhoretificavel Γ contido em ∆.

Podemos encontrar uma prova do teorema anterior, por exemplo, em [15], Capitulo3, §9. Como consequencia obtemos que, se f e contınua, para qualquer sequencia departicoes pontuadas (Pn, En)∞n=1 de Γ tal que lim

n→∞‖Pn‖ = 0, entao∫

Γ

f(λ)dλ = limn→∞

S(Pn, En, f).

A seguir apresentaremos alguns resultados classicos da teoria das funcoes complexasque serao usados nesta secao. Os dois seguintes resultados sao os bem conhecidosTeorema integral de Cauchy e a Formula integral de Cauchy, cujas provas se podemencontrar, por exemplo, em [15], pag. 57, Teorema 2, e pag. 61, respectivamente.

Teorema 4.3.7 (Teorema integral de Cauchy). Sejam f : ∆ → E uma aplicacaoregular e Γ0 uma curva fechada contida em ∆. Suponhamos que Γ1, Γ2, ..., Γm sejamcurvas fechadas contidas no interior de Γ0 e que cada uma delas esteja contida noexterior de todas as outras. Isto e, para cada i = 1, 2, ...,m, Γi esta contida no exteriorde cada uma das curvas Γ1, Γ2, ..., Γi−1, Γi+1,..., Γm. Entao,∫

Γ0

f(λ)dλ =

∫Γ1

f(λ)dλ+

∫Γ2

f(λ)dλ+ ...+

∫Γm

f(λ)dλ,

sempre que todas as curvas fechadas e as regioes anulares entre Γ0 e os Γi, para i =1, 2, ...,m, estejam contidas inteiramente em ∆.

Teorema 4.3.8 (Formula integral de Cauchy). Seja f : ∆→ E uma aplicacao regular.Se Γ e uma curva fechada, entao a formula

f(ζ) = − 1

2πi

∫Γ

f(λ)

ζ − λdλ (4.3.3)

e valida para todo ponto ζ no interior de Γ, sempre que Γ e seu interior estejam contidosinteiramente em ∆.

CAPITULO 4. ASSINATURA E INDICE DE MORSE RELATIVO 108

Uma caracterıstica das aplicacoes regulares com valores em C e que todas suasderivadas de ordem superior existem e, alem disso, elas se podem expressar localmentecomo uma serie de potencias, como mostra o seguinte teorema. Uma prova desteteorema se pode ver em [15], pag. 79, Teorema 1.

Teorema 4.3.9. Sejam f : ∆ → C uma aplicacao regular e λ0 ∈ ∆. Entao, existeuma, e somente uma, serie de potencias da forma

∞∑k=0

ak(λ− λ0)k,

a qual converge ao menos na maior bola contida em ∆ com centro em λ0 e representaa funcao f(λ) em tal bola. Alem disso,

ak =1

k!f (k)(λ0).

Fixemos um operador L ∈ L(E). E sabido que, para um polinomio p : C→ C dadopor p(λ) =

∑nk=0 akλ

k, podemos definir o operador p(L) como

p(L) =n∑k=0

akLk, onde L0 = I.

Vamos agora abordar a definicao de f(L), onde f : ∆ → C e uma aplicacao regulartal que σ(L) ⊆ ∆, como foi introduzida na formula (4.3.1). Primeiro mostraremos ocaso em que ∆ e uma bola aberta em C e depois o caso geral. Antes de apresentaresta definicao, primeiro vejamos os seguintes resultados, cujas provas se podem ver, porexemplo, em [7], pag. 197, Proposicao 3.8 e [25], pag. 150, Lema 6.28, respectivamente.

Lema 4.3.10. Se L ∈ L(E), entao o limite

limk→∞‖Lk‖1/k

existe e coincide commaxλ∈σ(L)

|λ|.

O numero r(L) = maxλ∈σ(L)

|λ| no lema anterior e chamado de raio espectral de L.

Lema 4.3.11. Se A e um subconjunto compacto de ∆, existe um conjunto abertolimitado ω tal que:

i. A ⊆ ω,

ii. ω ⊆ ∆,

CAPITULO 4. ASSINATURA E INDICE DE MORSE RELATIVO 109

iii. a fronteira de ω consiste de um numero finito de curvas fechadas Γ1, Γ2,...,Γn asquais nao se intersectam.

Denotaremos por ∂ω a fronteira de ω. Tomando A = σ(L) no lema anterior, obtemosque

σ(L) ⊆ ω =n⋃i=1

Γi ⊆n⋃i=1

Γi ⊆ ∆. (4.3.4)

Sejam L ∈ L(E) e f : B(0, ε) → C uma aplicacao regular tal que σ(L) ⊆ B(0, ε).Do Teorema 4.3.9 se segue que

f(λ) =∞∑k=0

akλk para todo λ ∈ B(0, ε).

Definimos, analogamente, a serie formal de potencias de L

∞∑k=0

akLk

e provemos que converge em L(E). De fato, observe que

r(L) = maxλ∈σ(L)

|λ| < ε,

pois σ(L) ⊆ B(0, ε) e σ(L) e compacto. Assim,

σ(L) ⊆ B(0, δ), onde δ = (r(L) + ε)/2. (4.3.5)

Dado quelimk→∞‖Lk‖1/k = r(L),

existe N ∈ N tal que ‖Lk‖1/k < δ < ε para k ≥ N . Como consequencia do Teorema4.3.9, temos que a serie

∑∞k=0 |ak|δk e convergente em C. Por outro lado,

∞∑k=N

‖akLk‖ ≤∞∑k=N

|ak|‖L‖k ≤∞∑k=N

|ak|δk ≤∞∑k=0

|ak|δk.

Este fato implica que a serie∑∞

k=0 ‖akLk‖ e convergente. Portanto, dado que L(E)e um espaco de Banach, pelo Teorema 1.1.2 concluımos que

∑∞k=0 akL

k converge emL(E). Consequentemente, o operador

f(L) =∞∑k=0

akLk ∈ L(E) (4.3.6)

CAPITULO 4. ASSINATURA E INDICE DE MORSE RELATIVO 110

e bem definido. Como resultado analogo ao Teorema 4.3.8 (formula integral de Cauchy),provaremos que f(L) coincide com a integral

− 1

2πi

∫Γ

f(λ)(L− λI)−1dλ,

onde Γ e uma curva fechada contida em B(0, ε) que contem no seu interior o espectro deL. Para este fim, vejamos o seguinte teorema, cuja demostracao pode ser encontrada,por exemplo, em [25], pag. 136, Teorema 6.12.

Teorema 4.3.12. Sejam L um operador em L(E) e Γ : [a, b] → C um curva fechadatal que σ(L) ⊆ Γ. Entao, para cada inteiro positivo k, temos

Lk = − 1

2πi

∫Γ

λk(L− λI)−1dλ.

Sejam L ∈ L(E) e f : B(0, ε) → C uma aplicacao regular tal que σ(L) ⊆ B(0, ε).Consideremos uma curva fechada Γ : [0, 1] → C tal que σ(L) ⊆ Γ ⊆ B(0, ε) (Γ podeser, por exemplo, a curva dada por Γ(t) = δe2πit, isto e, a circunferencia de raio δ, ondeδ = (r(L) + ε)/2 como em (4.3.5)). Entao, de (4.3.6) e do teorema anterior, temos

f(L) =∞∑k=0

akLk = − 1

2πi

∞∑k=0

ak

∫Γ

λk(L− λI)−1dλ

= − 1

2πi

∫Γ

∞∑k=0

akλk(L− λI)−1dλ = − 1

2πi

∫Γ

f(λ)(L− λI)−1dλ,

o que prova que a formula (4.3.1) e valida para o caso ∆ = B(0, ε).

De forma analoga a expressao acima podemos definir o operador f(L) para qualqueraplicacao regular f : ∆ → C, onde ∆ ⊆ C e um subconjunto aberto (nao necessaria-mente uma bola aberta em C) que contem o espectro de L, como veremos na seguintedefinicao.

Definicao 4.3.13. Suponhamos que L ∈ L(E) e que f : ∆ → C seja uma aplicacaoregular tal que σ(L) ⊆ ∆. Seja ω ⊆ C um aberto tal que sua fronteira consista de umnumero finito de curvas fechadas Γ1,...,Γn e

σ(L) ⊆ ω =n⋃i=1

Γi ⊆n⋃i=1

Γi ⊆ ∆.

O operador f(L) e definido como

f(L) = − 1

2πi

∫∂ω

f(λ)(L− λI)−1dλ. (4.3.7)

CAPITULO 4. ASSINATURA E INDICE DE MORSE RELATIVO 111

A existencia da integral (4.3.7) se deve a que ∂ω consiste de um numero finito decurvas fechadas e que a aplicacao

λ 7→ f(λ)(L− λI)−1

e regular em ∂ω e portanto contınua.Na definicao anterior nao foi exigida a conexidade de ∆ ou de σ(L). Como con-

sequencia do Lema 4.3.11 temos que, se σ(L) e conexo, existe uma curva fechada Γcontida em ∆ e que contem no seu interior o espectro de L. Assim,

f(L) = − 1

2πi

∫Γ

f(λ)(L− λI)−1dλ.

Suponhamos agora queσ(L) = σ1 ∪ σ2,

onde σ1 e σ2 sao subconjuntos de C separados, isto e, existem dois conjuntos abertosdisjuntos ∆1 e ∆2 tais que σ1 ⊆ ∆1 e σ2 ⊆ ∆2. Nao e difıcil provar que σ1 e σ2 saosubconjuntos compactos de C. Seja f uma aplicacao complexa e regular em ∆0 =∆1 ∪∆2. Se Γ1 e Γ2 sao duas curvas fechadas tais que

σ1 ⊆ Γ1 ⊆ ∆1 e σ2 ⊆ Γ2 ⊆ ∆2,

entao, por definicao,

f(L) = − 1

2πi

∫Γ1∪Γ2

f(λ)(L− λI)−1dλ,

isto e,

f(L) = −(

1

2πi

∫Γ1

f(λ)(L− λI)−1dλ+1

2πi

∫Γ2

f(λ)(L− λI)−1dλ

). (4.3.8)

Por outro lado, alem das condicoes do caso anterior, suponhamos tambem que fseja regular em uma regiao conexa ∆ que contem ∆0 e que Γ0 seja uma curva fechadacontida em ∆ e que contem no seu interior as curvas Γ1 e Γ2. Se segue do Teorema4.3.7 (Teorema integral de Cauchy), para o caso de integrais de aplicacoes definidas emL(E), que

1

2πi

∫Γ0

f(λ)(L− λI)−1dλ =1

2πi

∫Γ1

f(λ)(L− λI)−1dλ+1

2πi

∫Γ2

f(λ)(L− λI)−1dλ.

Este fato mostra que, se ∆ e uma bola aberta com centro em 0, a definicao do operadorf(L) dada em (4.3.7) coincide com (4.3.6).

No caso em que σ(L) e o domınio de f possuam um numero finito de componentesconexas, obtemos uma expressao do operador f(L) analoga a dada acima.

CAPITULO 4. ASSINATURA E INDICE DE MORSE RELATIVO 112

Observacao 4.3.14. Suponhamos que temos f(L) como em (4.3.7). E facil ver que Lcomuta com (L− λI)−1 para λ ∈ ρ(L). Assim,

Lf(L) = L

(− 1

2πi

∫∂ω

f(λ)(L− λI)−1dλ

)= − 1

2πi

∫∂ω

f(λ)L(L− λI)−1dλ

= − 1

2πi

∫∂ω

f(λ)(L− λI)−1Ldλ =

(− 1

2πi

∫∂ω

f(λ)(L− λI)−1dλ

)L

= f(L)L.

Logo,Lf(L) = f(L)L. (4.3.9)

Outras duas propriedades importantes que possui o operador f(L) sao apresentadasnos dois seguintes lemas, cujas provas se podem encontrar, por exemplo, em [25], pag.138, Lema 6.15 e pag. 139, Teorema 6.17, respectivamente.

Lema 4.3.15. Seja L ∈ L(E) fixado. Suponhamos que f : ∆ → C e g : ∆ → Csejam duas aplicacoes regulares e que σ(L) ⊆ ∆. Se h : ∆ → C e definida comoh(λ) = f(λ)g(λ), entao

h(L) = f(L)g(L).

Lema 4.3.16. Seja L ∈ L(E) fixado. Se f : ∆ → C e regular em uma vizinhanca deσ(L), entao

σ(f(L)) = f(σ(L)),

isto e, λ ∈ σ(f(L)) se, e somente se, λ = f(ζ) para algum ζ ∈ σ(L).

Com falamos na introducao desta secao, provaremos que a projecao ortogonal sobreo subespaco espectral negativo de um operador auto-adjunto L, definido em um espacode Hilbert complexo H, se pode expressar da forma χ(L), onde χ e uma aplicacaoregular em um subconjunto aberto que contem o espectro de L. Mais geralmente,veremos que, se σ(L) = σ1∪σ2, onde σ1 e σ2 sao dois subconjuntos separados de σ(L),entao:

i. existe um subespaco fechado H1 ⊆ H tal que H1 e H⊥1 sao invariantes por L,

ii. os espectros das restricoes L|H1 : H1 → H1 e L|H⊥1 : H⊥1 → H⊥1 do operador Lsao σ1 e σ2, respectivamente, e

iii. a projecao ortogonal sobre H1 pode ser expressada em funcao de L.

De fato, sejam H um espaco de Hilbert complexo e L ∈ L(H) um operador auto-adjunto. Neste caso σ(L) e um subconjunto dos numeros reais. Suponhamos que

σ(L) = σ1 ∪ σ2

CAPITULO 4. ASSINATURA E INDICE DE MORSE RELATIVO 113

e que exista uma bola aberta B(a, ε) com centro em a ∈ R e raio ε > 0 tal que

σ1 ⊆ B(a, ε) e σ2 ⊆ C\B(a, ε).

Assim, como em (4.3.5), existe uma bola aberta B(a, δ), com 0 < δ < ε, tal queσ1 ⊆ B(a, δ). Tomemos Γ : [0, 1]→ C definido por

Γ(t) = a+ δe2πit, (4.3.10)

isto e, Γ e uma parametrizacao (orientada positivamente) da circunferencia de centroem a e raio δ. Daı,

σ1 ⊆ Γ ⊆ B(a, ε).

Por outro lado, observe queσ2 = σ′2 ∪ σ′′2 ,

onde σ′2 = σ2 ∩ (−∞,minσ1) e σ′′2 = σ2 ∩ (maxσ1,+∞) (σ′2 ou σ′′2 podem ser vazios,porem, obviamente nao ambos). Como vimos acima, existem dois curvas fechadas Γ′ eΓ′′ contidas em C\B(a, ε) tais que

σ′2 ⊆ Γ′ ⊆ C\B(a, ε) e σ′′2 ⊆ Γ′′ ⊆ C\B(a, ε).

A aplicacao χ dada por

χ(λ) =

1 se λ ∈ B(a, ε)

0 se λ ∈ C\B(a, ε)

e regular no conjunto aberto ∆ = B(a, ε) ∪ C\B(a, ε). Assim,

χ(L) = − 1

2πi

∫Γ∪Γ′∪Γ′′

(L− λI)−1dλ.

De (4.3.8) temos

χ(L) = − 1

2πi

∫Γ

(L− λI)−1dλ. (4.3.11)

Proposicao 4.3.17. O operador χ(L) e uma projecao ortogonal.

Demonstracao. Denotemos por P o operador χ(L). Dado que χ(λ)χ(λ) = χ(λ) paratodo λ ∈ ∆, do Lema 4.3.15 temos

P 2 = χ(L)χ(L) = χ(L) = P.

Vejamos que P e auto-adjunto. De fato, nao e difıcil provar que, para qualqueroperador T ∈ L(H),

ρ(T ∗) = λ : λ ∈ ρ(T ),

CAPITULO 4. ASSINATURA E INDICE DE MORSE RELATIVO 114

onde λ denota o conjugado de λ ∈ C. Logo, dado que L e auto-adjunto e Γ ⊆ ρ(L), seλ ∈ Γ, entao L−λI e inversıvel. Dada uma particao A = λ0, λ1, ..., λn da imagem deΓ, onde Γ(0) = λ0 < λ1 < λ2 < ... < λn = λ0, tomemos EA = λ1, λ2, ..., λn. Sejam Ra aplicacao resolvente do operador L e x, y ∈ H. Logo, como na formula (4.3.2), temos

〈S(A,EA,−R/2πi)x, y〉 = 〈− 1

2πi

n∑k=1

(λk − λk−1)(L− λkI)−1x, y〉

= 〈x, 1

2πi

n∑k=1

(λk − λk−1)(L∗ − λkI)−1y〉

= 〈x, 1

2πi

n∑k=1

(λk − λk−1)(L− λkI)−1y〉.

A definicao de Γ (ver (4.3.10)) implica que λk ∈ Γ e que λn < λn−1 < ... < λ0 = λn.Para k = 0, 1, ..., n, seja ξk = λn−k. Assim, ξ0 < ξ1 < ... < ξn = ξ0, isto e, B =ξ0, ξ1, ..., ξn e uma particao da imagem de Γ. Consideremos EB = ξ0, ξ2, ..., ξn−1.Consequentemente,

〈x, 1

2πi

n∑k=1

(λk − λk−1)(L− λkI)−1y〉 = 〈x, 1

2πi

n∑k=1

(ξn−k − ξn−k+1)(L− ξn−kI)−1y〉

= 〈x,− 1

2πi

n∑k=1

(ξn−k+1 − ξn−k)(L− ξn−kI)−1y〉

= 〈x,− 1

2πi

n∑j=1

(ξj − ξj−1)(L− ξj−1I)−1y〉

= 〈x, S(B,EB,−R/2πi)y〉.

Portanto,

〈S(A,EA,−R/2πi)x, y〉 = 〈x, S(B,EB,−R/2πi)y〉 para todo x, y ∈ H. (4.3.12)

Da definicao de P, obtemos que

lim‖A‖→0

S(A,EA,−R/2πi) = P = lim‖B‖→0

S(B,EB,−R/2πi).

Portanto, de (4.3.12) e da continuidade do produto interno,

〈Px, y〉 = 〈x, Py〉 para todo x, y ∈ H,

isto e, P = P ∗, o que prova a proposicao.

CAPITULO 4. ASSINATURA E INDICE DE MORSE RELATIVO 115

Da proposicao anterior se segue que H = Imχ(L) ⊕ Kerχ(L) e que, alem disso,Imχ(L) e Kerχ(L) sao subespacos ortogonais de H. Por outro lado, de (4.3.9) temos

Lχ(L) = χ(L)L. (4.3.13)

Portanto, Imχ(L) e Kerχ(L) sao invariantes por L. Para a seguinte proposicao deno-taremos por L1 e L2 as restricoes

L|Imχ(L) : Imχ(L)→ Imχ(L) e L|Kerχ(L) : Kerχ(L)→ Kerχ(L)

do operador L, respectivamente.

Proposicao 4.3.18. Os espectros das restricoes L1 e L2 sao σ1 e σ2, respectivamente.

Demonstracao. Como na proposicao anterior, seja P = χ(L). A Proposicao 3.3.7 provaque

σ(L) = σ(L1) ∪ σ(L2).

Provemos que σ(L1) = σ1. De fato, seja ξ ∈ C um ponto que nao pertenca a σ1.Denotemos por ∆1 = B(a, δ) e ∆2 = C\B(a, ε). Seja ∆′1 ⊆ ∆1 subconjunto aberto talque σ1 ⊆ ∆′1 e ξ /∈ ∆′1. Assim, ∆′1 ∪∆2 e uma vizinhanca aberta de σ(L). Tomemos

g(λ) =

χ(λ)/(ξ − λ) se λ ∈ ∆′10 se λ ∈ ∆2

.

Entao, g e regular em ∆′1 ∪∆2. Observe que χ(λ)g(λ) = 0 = g(λ) para λ ∈ ∆2 e

χ(λ)g(λ) = χ(λ)χ(λ)/(ξ − λ) = χ(λ)/(ξ − λ) = g(λ) para λ ∈ ∆′1.

isto e, χ(λ)g(λ) = g(λ) para todo λ ∈ ∆′1 ∪∆2. Logo,

Pg(L) = χ(L)g(L) = g(L).

Consequentemente, ImP e invariante por g(L). Consideremos a restricao g(L)|ImP :ImP → ImP do operador g(L). Como χ(λ) = g(λ)(ξ − λ) para todo λ ∈ ∆′1 ∪ ∆2,entao

P = χ(L) = g(L)(ξI − L).

Assim, g(L)|ImP : ImP → ImP e a inversa da restricao (ξI − L)|ImP : ImP → ImP ,pois P |ImP e a identidade de ImP. Este fato prova que ξI|ImP −L1 e inversıvel, isto e,ξ ∈ ρ(L1). Em conclusao, σ(L1) ⊆ σ1.

Analogamente podemos provar que σ(L2) ⊆ σ2.Por outro lado, como

σ(L) = σ1 ∪ σ2 = σ(L1) ∪ σ(L2),

σ1 e σ2 sao disjuntos e σ(Li) ⊆ σi para i = 1, 2, temos que σ(Li) = σi.

CAPITULO 4. ASSINATURA E INDICE DE MORSE RELATIVO 116

Definicao 4.3.19. O operador χ(L), definido acima, e chamado de projecao sobre osubespaco espectral de L correspondente a σ1.

Demonstremos agora que, se σ1 = σ−(L), para um operador auto-adjunto L ∈L(H), e se 0 nao e ponto de acumulacao do espectro de L, o operador χ(L) em (4.3.11) ea projecao ortogonal sobre o subespaco espectral negativo de L. De fato, seja L ∈ L(H)auto-adjunto. Primeiro provemos que

λ0 = maxλ∈σ(L)

λ = M = sup‖x‖=1

〈Lx, x〉. (4.3.14)

Da Proposicao 3.3.9 se segue λ0 ≤ M. Suponhamos por contradicao que M > λ0.Assim, L −MI e inversıvel e nao positivo. Consequentemente, a Observacao 3.3.15implica que L−MI e definido negativo. Pela Observacao 3.4.6, temos que existe l < 0tal que

sup‖x‖=1

〈(L−MI)x, x〉 ≤ l. (4.3.15)

Porem,

sup‖x‖=1

〈(L−MI)x, x〉 = sup‖x‖=1

(〈Lx, x〉 −M〈x, x〉) = sup‖x‖=1

〈Lx, x〉 −M = 0,

contradizendo (4.3.15). Portanto, M = λ0.Analogamente podemos provar que

minλ∈σ(L)

λ = inf‖x‖=1

〈Lx, x〉. (4.3.16)

Suponhamos ainda que L ∈ L(H) seja um operador auto-adjunto e que 0 nao sejaponto de acumulacao de σ(L). E claro que existem duas bolas abertas disjuntas B1, eB2 em C tais que

σ−(L) ⊆ B1, 0 ∪ σ+(L) ⊆ B2.

Como em (4.3.11), podemos definir a projecao P− sobre o subespaco espectral de Lcorrespondente a σ−(L) como um operador χ(L). Logo,

H = ImP− ⊕KerP−,

onde a soma e ortogonal.Agora, o espectro da restricao L|ImP− : ImP− → ImP−, que e σ−(L) pela Proposi-

cao 4.3.18, e um conjunto de numeros reais negativos. Se segue de (4.3.14) que

0 > maxλ∈σ(L|ImP− )

λ = sup‖x‖=1

〈L|ImP−x, x〉 para x ∈ ImP−,

CAPITULO 4. ASSINATURA E INDICE DE MORSE RELATIVO 117

isto e, L|ImP− e definida negativa. Consequentemente,

〈Lx, x〉 < 0 para todo x ∈ ImP−, x 6= 0. (4.3.17)

Analogamente, de (4.3.14),

0 ≤ minλ∈σ(L|KerP− )

λ = inf‖x‖=1

〈L|KerP−x, x〉 para todo x ∈ KerP−,

isto e,〈Lx, x〉 ≥ 0 para todo x ∈ KerP−. (4.3.18)

Dado que a soma H = ImP− ⊕KerP− e ortogonal, se segue de (4.3.17), (4.3.18) edo Teorema 3.3.19 que ImP− = H−(L), KerP− = H+(L)⊕KerL e que P e a projecaoortogonal sobre H−(L).

De forma analoga, a projecao ortogonal sobre H+(L) pode ser expressada da formadada em (4.3.11).

A projecao apresentada em (4.3.11) somente e valida para o caso em que o espacoseja complexo. Usando a complexificao de um operador em um espaco de Hilbertreal, podemos representar tal projecao de forma similar. Suponhamos que H seja umespaco de Hilbert real e L ∈ L(H) seja um operador auto-adjunto. Seja L ∈ L(H) acomplexificacao de L. Assim,

H = H+(L)⊕H−(L)⊕Ker(L).

Se x = x+ iy ∈ H, onde x, y ∈ H, a parte real de x e definida por Rex = x.Para um subconjunto Ω de H, definamos

Re(Ω) = Rex : x ∈ Ω.

E claro que L e L coincidem em Re(Ω) para qualquer subconjunto Ω de H. Identifica-

remos L : H → H com a restricao L|Re(H) : Re(H)→ Re(H).

Vejamos que L(H+(L)) ⊆ H+(L), onde

H+(L) = x1 − ix2 : x1 + ix2 ∈ H+(L), x1, x2 ∈ H.

De fato, seja x = x1 + ix2 ∈ H+(L), com x1 ∈ H e x2 ∈ H. Daı,

Lx = L(x1 − ix2) = Lx1 − iLx2 = Lx1 + iLx2 = Lx.

Como Lx ∈ H+(L), temos Lx ∈ H+(L), como querıamos provar.

CAPITULO 4. ASSINATURA E INDICE DE MORSE RELATIVO 118

Mostremos que L e definido positivo em H+(L). Seja x ∈ H+(L), onde x ∈ H+(L)

com x 6= 0. De (3.3.3) obtemos que 〈Lx, x〉 = 〈Lx, x〉. Logo, como 〈Lx, x〉 > 0,

〈Lx, x〉 = 〈Lx, x〉 = 〈Lx, x〉 > 0.

Analogamente, L e definido negativo em H−(L). E claro que Ker(L) = Ker(L).Assim, se segue do Teorema 3.3.19 que

H+(L) = H+(L) e H−(L) = H−(L). (4.3.19)

Lema 4.3.20. Com as condicoes acima,

H = Re(H+(L))⊕Re(H−(L))⊕Re(Ker(L)),

e, alem disso,

H+(L) = Re(H+(L)), H−(L) = Re(H−(L)) e Ker(L) = ReKer(L). (4.3.20)

Demonstracao. Seja x ∈ H dado. Logo, x = x + i0 ∈ H. Portanto, existem x+ ∈H+(L), x− ∈ H+(L) e x0 ∈ Ker(L) unicos tais que

x = x+ + x− + x0. (4.3.21)

Daı,x = Rex = Rex+ +Rex− +Rex0. (4.3.22)

De (4.3.19) se segue Rex+ = (x+ + x+)/2 ∈ H+(L), Rex− = (x− + x−)/2 ∈ H−(L) e

Rex0 = (x0 + x0)/2 ∈ Ker(L). De (4.3.22) e da unicidade da soma (4.3.21) temos queRex+ = x+, Rex− = x− e Rex0 = x0. Este fato prova que

H = Re(H+(L)) +Re(H−(L)) +Re(Ker(L)).

Alem disso, para x ∈ Re(H+(L)),

Lx = LRex = ReLx ∈ Re(H+(L)).

Logo, Re(H+(L)) e invariante por L. De igual forma podemos provar que Re(H−(L))e invariante por L.

Observe que

Re(H+(L)) = (x+ x)/2 : x ∈ H+(L) ⊆ H+(L) +H+(L) = H+(L).

Consequentemente, L e definido positivo em Re(H+(L)). Analogamente,

Re(H−(L)) ⊆ H−(L) e ReKer(L) ⊆ Ker(L).

Os fatos acima mostram a decomposicao (4.3.20) e, alem disso,

H+(L) = Re(H+(L)), H−(L) = Re(H−(L)) e Ker(L) = ReKer(L),

o que prova o lema.

CAPITULO 4. ASSINATURA E INDICE DE MORSE RELATIVO 119

Sejam L ∈ L(H) um operador auto-adjunto em um espaco de Hilbert real H tal que0 nao seja ponto de acumulacao de σ(L). Tomemos uma curva fechada Γ que contemno seu interior o conjunto σ−(L) e no seu exterior o conjunto 0∩σ+(L). Como vimosacima,

P = − 1

2πi

∫Γ

(L− λI)−1dλ (4.3.23)

e a projecao ortogonal sobre H−(L). Daı, a restricao

P |ReH : ReH → ReH

do operador P e a projecao ortogonal sobre ReH−(L) = H−(L). Abusando um poucoda notacao, no caso em que H seja um espaco de Hilbert real, identificaremos talrestricao com a projecao dada em (4.3.23).

Concluiremos esta secao com dois resultados que tem a ver com a continuidade dasprojecoes ortogonais. Antes disso, vejamos primeiro o seguinte lema, cuja prova sepode encontrar, por exemplo, em [15], pag. 45, Teorema 5.

Lema 4.3.21. Se f : ∆ → E e regular, onde E e um espaco de Banach, entao, paraqualquer caminho retificavel Γ ⊆ ∆,∥∥∥∥∫

Γ

f(λ)dλ

∥∥∥∥ ≤Ml,

onde M = supλ∈Γ |f(λ)| e l e o comprimento de Γ.

Teorema 4.3.22. Sejam J = [a, b] ⊆ R e L : J → LS(H) um caminho de operadoresauto-adjuntos. Suponhamos que exista c ∈ R tal que, para cada λ ∈ J,

σ(Lλ) ⊆ (−∞, c) ∪ (c,+∞).

Entao, para λ ∈ J , a projecao Pλ sobre o subespaco espectral de Lλ correspondente aσ(Lλ) ∩ (−∞, c) existe e, alem disso,

P : J → LS(H)

λ 7→ Pλ

e um caminho de projecoes ortogonais.

Demonstracao. E claro que a aplicacao ϕ : J → R definida por

λ 7→ ϕ(λ) = ‖Lλ‖ = sup‖x‖=1

|〈Lλx, x〉|

CAPITULO 4. ASSINATURA E INDICE DE MORSE RELATIVO 120

e contınua. Ja que J e compacto, existe

l = maxλ∈J

ϕ(λ) ∈ R.

Se segue da Proposicao 3.3.6 que

σ(Lλ) ⊆ [−l, l] para λ ∈ J. (4.3.24)

Agora, se c ≤ −l, entao Pλ = 0 para todo λ ∈ J, pois σ(Lλ) ∩ (−∞, c) = ∅. Nestecaso o teorema e claramente valido.

Por outro lado, suponhamos que c > l. Sejam

σ1 =⋃λ∈J

[σ(Lλ) ∩ (−∞, c)] e σ2 =⋃λ∈J

[σ(Lλ) ∩ (c,+∞)].

Mostremos que c nao e ponto de acumulacao do conjunto

σ = σ1 ∪ σ2 =⋃λ∈J

[σ(Lλ) ∩ (−∞, c)] ∪⋃λ∈J

[σ(Lλ) ∩ (c,+∞)] =⋃λ∈J

σ(Lλ).

De fato, suponhamos por absurdo que c seja ponto de acumulacao de σ. Assim, existeuma sequencia (αn)∞n=1 contida em σ que converge a c. Pela definicao de σ, existeuma sequencia de operadores (Lλn)∞n=1 ⊆ Im L, tal que αn ∈ σ(Lλn) para todo n.Como J e compacto, (Lλn)∞n=1 possui uma subsequencia convergente a Lλ ∈ Im L. Semperda de generalidade, podemos dar o mesmo nome a esta subsequencia. Vejamos quec ∈ σ(Lλ). De fato, suponhamos, novamente por absurdo, que c /∈ σ(Lλ). Entao, Lλ−cIe inversıvel. Dado que o conjunto dos operadores inversıveis e aberto e (Lλn − αnI)∞n=1

converge a Lλ − cI, existe N ∈ N tal que Lλn − αnI e inversıvel para todo n > N. Estefato contradiz que αn ∈ σ(Lλn) para todo n. Logo, c ∈ σ(Lλ), contradizendo nossahipotese que, para λ ∈ J, c /∈ σ(Lλ). Em conclusao, c nao e ponto de acumulacao de σ.

Por outro lado, de (4.3.24) e do fato anterior se segue que existem a1, a2 ∈ R, com−l < a1 < c < a2 < l, tais que

σ1 ⊆ B(−l, a1 + l) e σ2 ⊆ B(l, l − a2).

Consequentemente,

Γ1(t) = (−l, 0) + (a1 + l)e2πit e Γ2(t) = (l, 0) + (l − a2)e2πit, para t ∈ [0, 1],

sao curvas fechadas tais que σ1 ⊆ Γ1 e σ2 ⊆ Γ2. Tomemos

∆1 = (x, y) ∈ C : x < c e ∆2 = (x, y) ∈ C : x > c.

Logo, σ1 ⊆ Γ1 ⊆ ∆1 e σ2 ⊆ Γ2 ⊆ ∆2. Definindo a aplicacao χ : ∆1 ∪∆2 → C como

χ(z) =

1 se z ∈ ∆1

0 se z ∈ ∆2,

CAPITULO 4. ASSINATURA E INDICE DE MORSE RELATIVO 121

temos que, se λ ∈ J,Pλ = − 1

2πi

∫Γ1

(Lλ − ζI)−1dζ

e a projecao ortogonal sobre o subespaco espectral de Lλ correspondente a σ(Lλ) ∩(−∞, c).

Agora provemos a continuidade de P. Fixemos λ0 em J . De (1.1.1) obtemos

(Lλ0 − ζI)−1 − (Lλ − ζI)−1 = −(Lλ0 − ζI)−1(Lλ0 − Lλ)(Lλ − ζI)−1 para ζ ∈ Γ1.

Assim,

Pλ0 − Pλ = − 1

2πi

∫Γ1

(Lλ0 − ζI)−1dζ +1

2πi

∫Γ1

(Lλ − ζI)−1dζ

= − 1

2πi

∫Γ1

((Lλ0 − ζI)−1 − (Lλ − ζI)−1)dζ

=1

2πi

∫Γ1

(Lλ0 − ζI)−1(Lλ0 − Lλ)(Lλ − ζI)−1dζ.

E facil ver que φ : J × Γ1 → L(H), definida por φ(λ, ζ) = (Lλ − ζI), e contınua.Portanto, do Lema 1.1.9 se segue que a aplicacao (λ, ζ) 7→ (Lλ − ζI)−1 e contınua emJ×Γ1, sendo composicao de aplicacoes contınuas. Daı, como J×Γ1 e compacto, existeM > 0 tal que

sup(λ, ζ)∈J×Γ1

‖(Lλ − ζI)−1‖ ≤M.

Assim,‖(Lλ0 − ζI)−1(Lλ0 − Lλ)(Lλ − ζI)−1‖ ≤M2‖Lλ0 − Lλ‖.

Logo, se ‖Lλ0 − Lλ‖ < ε, para qualquer ε > 0, entao, pelo Lema 4.3.21,

‖Pλ0 − Pλ‖ ≤1

2πM2lε,

onde l e o comprimento de Γ. Consequentemente, P e contınua.

Da prova do teorema anterior temos o seguinte corolario.

Corolario 4.3.23. A aplicacao P : GLS(H)→ L(H) que associa a cada operador L ∈GlS(H) a projecao ortogonal PH−(L) sobre seu subespaco espectral negativo e contınua.

Demonstracao. Seja L ∈ GLS(H) fixado. Assim, existe c > 0 tal que ‖Lx‖ ≥ c‖x‖para todo x ∈ H. Seja B(L, c/2) ⊆ GLS(H) a bola aberta com centro em L e raio c/2e tomemos T ∈ B(L, c/2). Mostremos que, se λ ∈ R com |λ| < c/2, entao λ ∈ ρ(T ).De fato, fixemos λ ∈ R com |λ| < c/2 e z ∈ H de norma 1. Observe que

‖Tz‖ ≥ ‖Lz‖ − ‖Lz − Tz‖ ≥ c− c/2,

CAPITULO 4. ASSINATURA E INDICE DE MORSE RELATIVO 122

isto e, ‖Tz‖ ≥ c/2. Consequentemente,

‖(T − λI)z‖ ≥ ‖Tz‖ − ‖λz‖ ≥ c

2− |λ| > 0.

Este fato mostra que Ker(T − λI) = 0. Logo, a Proposicao 1.1.10 implica que aimagem de T −λI e fechada. Alem disso, como T −λI e auto-adjunto, das Proposicoes3.1.5 e 3.2.9 obtemos que Im(T − λI) = H. Em conclusao, λ ∈ ρ(T ).

Por outro lado, ja que ‖T‖ ≤ ‖L‖ + c/2, entao, para λ ∈ R com |λ| > ‖L‖ − c/2,λ ∈ ρ(T ) pela Proposicao 3.3.6. Os fatos acima mostram que

σ(T ) ⊆ [−(‖L‖+ c/2),−c/2] ∪ [c/2, ‖L‖+ c/2] para todo T ∈ B(L, c/2).

Como provamos no Teorema anterior, existem duas curvas fechadas disjuntas Γ1 e Γ2

tais que σ−(T ) ⊆ Γ1, σ+(T ) ⊆ Γ2 e

PH−(T ) = − 1

2πi

∫Γ1

(T − ζI)−1dζ

e a projecao ortogonal sobre o subespaco espectral de T correspondente a σ−(T ), istoe, PH−(T ) e a projecao ortogonal sobre H−(T ). A continuidade de P se segue da provado teorema anterior.

4.4 Pares de operadores de Fredholm e ındice de

Morse relativo

Lembremos que o ındice de Morse de um operador essencialmente positivo L ∈ L(H)e definido como a dimensao do seu subespaco espectral negativo, e que o denotamospor µ(L). Como ja foi dito, o fluxo espectral e um conceito que e introduzido quandoo ındice de Morse nao existe. Aqui apresentaremos um conceito que e chamado deındice de Morse relativo, que e definido para pares de isomorfismos auto-adjuntos cujadiferenca e compacta. No proximo capıtulo veremos que o ındice de Morse relativo e ofluxo espectral estao estritamente ligados.

Para definir o ındice de Morse relativo, introduziremos primeiro a nocao de “par deFredholm”e seu ındice, e usaremos as propriedades dos operadores congruentes modulooperador compacto, que foram apresentadas no Capıtulo 2.

Sejam H um espaco de Hilbert e (L, T ) um par de isomorfismos auto-adjuntos emL(H). Veremos que, se H tem dimensao finita, o ındice de Morse relativo do par (L, T )coincide com a diferenca dos ındices de Morse de L e T , isto e, µ(L)− µ(T ).

No final da secao veremos uma relacao que liga o ındice de Morse relativo com aassinatura generalizada de uma perturbacao compacta auto-adjunta de uma simetria,definida na Secao 2 deste capıtulo.

CAPITULO 4. ASSINATURA E INDICE DE MORSE RELATIVO 123

Definicao 4.4.1. Dizemos que um par de projecoes ortogonais (P,Q) e um par deFredholm se ImP ∩ KerQ e ImQ ∩ KerP tem dimensao finita. O ındice de (P,Q) edefinido por

ind(P,Q) = dim(ImP ∩KerQ)− dim(ImQ ∩KerP ).

Apresentaremos na seguinte proposicao uma relacao que liga os operadores con-gruentes modulo operador compacto aos pares de Fredholm.

Proposicao 4.4.2. Seja (P,Q) um par de projecoes ortogonais em L(H). Se P − Qe compacto, entao (P,Q) e um par de Fredholm.

Demonstracao. Denotemos por K o operador compacto P −Q. Entao,

K = P −Q = P (I −Q) + PQ−Q = ((I −Q)P )∗ − (I − P )Q

e(I − P )Q = (Q+ I −Q− P )Q = (Q− P )Q = −KQ.

Os dois fatos acima implicam que

((I −Q)P ))∗ = (I − P )Q+K = −KQ+K = K(I −Q).

Logo,(I −Q)P = (K(I −Q))∗ = (I −Q)∗K∗ = (I −Q)K.

Consequentemente, os operadores (I − P )Q = −KQ e (I − Q)P = (I − Q)K saocompactos.

Agora, e facil ver que (I − P )Q restrito a ImQ ∩ KerP e a identidade. Dado quea identidade de um espaco de Banach e compacta se, e somente se, seu domınio temdimensao finita, temos que

dim(ImQ ∩KerP ) <∞.

Analogamente, (I −Q)P restrito a ImP ∩KerQ e a identidade e portanto

dim(ImP ∩KerQ) <∞.

Assim, (P,Q) e um par de Fredholm.

Em seguida veremos algumas das propriedades que possui o ındice de um par deFredholm.

Lema 4.4.3. Se (P,Q) e um par de Fredholm em L(H) e o operador O ∈ L(H) eortogonal, entao (O∗PO,O∗QO) e um par de Fredholm e

ind(P,Q) = ind(O∗PO,O∗QO).

CAPITULO 4. ASSINATURA E INDICE DE MORSE RELATIVO 124

Demonstracao. Sejam P = O∗PO e Q = O∗QO. Entao,

P ∗ = (O∗PO)∗ = O∗P ∗O = O∗PO = P ,

isto e, P e auto-adjunto. Analogamente, Q e auto-adjunto. Dado que P 2 = P eQ2 = Q, se segue da Proposicao 3.2.13 que P e Q sao projecoes ortogonais.

E facil ver que Ker P = O∗(KerP ) e Ker Q = O∗(KerQ). Assim, como ImO = He O∗ = O−1, temos que

Im P ∩Ker Q = Im(O∗PO) ∩O∗(KerQ) = O∗(ImPO) ∩O∗(KerQ)

= O∗[(ImPO) ∩ (KerQ)] = O∗[P (ImO) ∩ (KerQ)]

= O∗[ImP ∩KerQ].

Logo,dim(Im P ∩Ker Q) = dim(ImP ∩KerQ).

Analogamente,

dim(Im Q ∩Ker P ) = dim(ImQ ∩KerP ).

Os dois fatos acima mostram que (O∗PO,O∗QO) e um par de Fredholm e que,alem disso, ind(P,Q) = ind(O∗PO,O∗QO).

Na Proposicao 4.4.5 provaremos que o ındice de um caminho de um par de projecoesde Fredholm e constante. Para este fim, vejamos primeiro o seguinte lema.

Lema 4.4.4. Se (P,Q) e um par de projecoes de Fredholm, entao o complementarortogonal de Q(ImP ) em ImQ e ImQ ∩KerP .

Demonstracao. Seja z ∈ ImQ ∩ KerP fixado. Assim, Qz = z e Pz = 0. Se y ∈Q(ImP ), entao y = QPx para algum x ∈ H. Agora,

〈y, z〉 = 〈QPx, z〉 = 〈Px,Qz〉 = 〈Px, z〉 = 〈x, Pz〉 = 0.

Logo, z ∈ (Q(ImP ))⊥, isto e,

ImQ ∩KerP ⊆ (Q(ImP ))⊥. (4.4.1)

Por outro lado, seja z ∈ ImQ tal que 〈x, z〉 = 0 para todo x ∈ Q(ImP ). Entao,〈QPy, z〉 = 0 para todo y ∈ H. Daı,

0 = 〈QPy, z〉 = 〈Py,Qz〉 = 〈Py, z〉 = 〈y, Pz〉 para todo y ∈ H.

Logo, Pz = 0, isto e, z ∈ KerP . Consequentemente,

ImQ ∩ (Q(ImP ))⊥ ⊆ ImQ ∩KerP. (4.4.2)

De (4.4.1) e (4.4.2) temos ImQ ∩ (Q(ImP ))⊥ = ImQ ∩ KerP , o que prova olema.

CAPITULO 4. ASSINATURA E INDICE DE MORSE RELATIVO 125

Do lema anterior se segue que

ImQ = Q(ImP )⊕ (ImQ ∩KerP ).

Seja agora Q : ImP → ImQ a restricao de Q a ImP . E claro que

dim Ker Q = dim(KerQ ∩ ImP ), (4.4.3)

pois Ker Q = KerQ∩ ImP . Alem disso, do Lema 4.4.4 temos (Im Q)⊥ = ImQ∩KerP.Assim,

dim coKer Q = dim(ImQ ∩KerP ). (4.4.4)

De (4.4.3) e (4.4.4) se segue que Q : ImP → ImQ e um operador de Fredholm deındice

ind Q = dim(KerQ ∩ ImP )− dim(ImQ ∩KerP ).

Este fato implica que ind(P,Q) coincide com o ındice de Q : ImP → ImQ.

No resto da secao, J denotara um intervalo [a, b] e (Pt, Qt)t∈J um caminhocontınuo de pares de Fredholm, no sentido de que t 7→ Pt e t 7→ Qt sao contınuas.

Proposicao 4.4.5. O ındice do caminho (Pt, Qt)t∈J e constante.

Demonstracao. Para provar que ind(Pt, Qt) e constante e suficiente provar que ele elocalmente constante, pois J e conexo. Para este fim, tomemos t0 ∈ J fixado. Dacontinuidade de t 7→ Pt e t 7→ Qt temos que

At = (I − Pt)(I − Pt0) + PtPt0t∈J e Bt = (I −Qt)(I −Qt0) +QtQt0t∈J

sao contınuos. Sendo At0 = Bt0 = I, existe uma vizinhanca conexa Ω de t0 em J talque At e Bt sao isomorfismos para t ∈ Ω e, assim, as restricoes At : ImPt0 → At(ImPt0)e Bt : ImQt0 → Bt(ImQt0) sao isomorfismos.

Mostremos que

At(ImPt0) = ImPt e Bt(ImQt0) = ImQt.

De fato, se y ∈ ImPt0 , entao y = Pt0x para algum x ∈ H. Consequentemente,

Aty = ((I − Pt)(I − Pt0) + PtPt0)Pt0x = (I − Pt)(I − Pt0)Pt0x+ PtPt0Pt0x = PtPt0x

= Pty.

Assim,At(ImPt0) ⊆ ImPt. (4.4.5)

Agora, suponhamos que y pertenca a (ImPt0)⊥. Entao, Pt0y = 0 e (I − Pt0)y = y.

Logo,Aty = (I − Pt)y.

CAPITULO 4. ASSINATURA E INDICE DE MORSE RELATIVO 126

Este fato prova queAt((ImPt0)

⊥) ⊆ (ImPt)⊥. (4.4.6)

Dado que, para t ∈ Ω, At e um isomorfismo,

H = At(H) = At[ImPt0 ⊕ (ImPt0)⊥] = At(ImPt0)⊕ At((ImPt0)

⊥).

Consequentemente,

ImPt ⊕ (ImPt)⊥ = H = At(ImPt0)⊕ At((ImPt0)

⊥). (4.4.7)

De (4.4.5), (4.4.6) e (4.4.7) temos

At(ImPt0) = ImPt e At((ImPt0)⊥) = (ImPt)

⊥.

Analogamente,

Bt(ImQt0) = ImQt e Bt((ImQt0)⊥) = (ImQt)

⊥.

Da composicao das restricoes

At = At|ImPt0: ImPt0 → ImPt, Qt = Qt|ImPt : ImPt → ImQt

e(Bt)

−1 = B−1t |ImQt : ImQt → ImQt0 ,

obtemos o operador(Bt)

−1QtAt : ImPt0 → ImQt0 .

Como consequencia das formulas (4.4.3) e (4.4.4), se segue que Qt e um operador deFredholm com

ind Qt = ind(Pt, Qt) para todo t ∈ Ω. (4.4.8)

Dado que At e Bt sao isomorfismos, (Bt)−1QtAt e um operador de Fredholm que tem

o mesmo ındice de Bt para t ∈ Ω. Ja que

(Bt)−1QtAtt∈Ω

e um caminho de operadores de Fredholm com o mesmo domınio e contradomınio,a continuidade do ındice de Fredholm (Teorema 2.2.4) implica que ind((Bt)

−1QtAt) econstante em Ω. Assim, o ındice de Fredholm do caminho Qtt∈Ω tambem e constante.

De (4.4.8) se segue que ind(Pt, Qt) e constante para todo t ∈ Ω, como querıamosprovar.

CAPITULO 4. ASSINATURA E INDICE DE MORSE RELATIVO 127

Lembramos que na Secao 4 do Capıtulo 2 deste trabalho foi introduzido o conceitode operadores congruentes modulo operador compacto. Por simplicidade, se L e T saooperadores congruentes modulo operador compacto, diremos que L e T sao congruentes.Sejam L e T em L(H) dois isomorfismos auto-adjuntos congruentes. Da seguinteproposicao se segue que faz sentido definir o ındice do par (L, T ). Como veremos naproxima definicao, este ındice sera chamado de ındice de Morse relativo. Para umoperador auto-adjunto L ∈ L(H), denotaremos por PH−(L) a projecao ortogonal sobreH−(L), o subespaco espectral negativo de L.

Proposicao 4.4.6. Sejam L e T dois isomorfismos auto-adjuntos congruentes. Entao,as projecoes ortogonais sobre os espacos espectrais negativos de L e T sao congruentes.

Demonstracao. E imediata se os espectros negativos de L e de T sao vazios, pois,neste caso, PH−(L) = PH−(T ) = 0. Suponhamos que L tenha espectro negativo naovazio. Dado que L e T sao isomorfismos, 0 nao pertence nem e ponto de acumulacaode σ(L) ∪ σ(T ). Portanto, existe uma curva fechada Γ (veja-se Definicao 4.3.2) quecontem no seu interior os espectros negativos de L e T e no seu exterior os seus espectrospositivos. Daı,

PH−(L) = − 1

2πi

∫Γ

(L− λI)−1dλ e PH−(T ) = − 1

2πi

∫Γ

(T − λI)−1dλ.

Assim,

PH−(L) − PH−(T ) =1

2πi

∫Γ

(L− λI)−1(T − L)(L− λI)−1dλ.

Dado que Mλ = (L − λI)−1(T − L)(L − λI)−1 e compacto para cada λ ∈ Γ, ascombinacoes lineares finitas dos Mλ sao operadores compactos. Como a integral e olimite de uma sequencia formada de combinacoes lineares finitas dos Mλ e o espaco dosoperadores compactos e fechado, temos que PH−(L) − PH−(T ) e compacto, o que provaa proposicao.

Na Proposicao 4.4.2 provamos que, se a diferenca de duas projecoes ortogonais Pe Q e compacta, entao (P,Q) e um par de Fredholm. Assim, da proposicao anteriorobtemos que, se L e T sao isomorfismos auto-adjuntos tais que L − T e compacto,(PH−(L), PH−(T )) e um par de Fredholm. Consequentemente,

dim(ImPH−(L) ∩KerPH−(T )) <∞ e dim(ImPH−(T ) ∩KerPH−(L)) <∞. (4.4.9)

Portanto, a seguinte definicao faz sentido.

Definicao 4.4.7 (Indice de Morse relativo). Seja (L, T ) um par de isomorfismos auto-adjuntos congruentes. O ındice de Morse relativo do par (L, T ) e definido por

µrel(L, T ) = ind(PH−(L), PH−(T )).

CAPITULO 4. ASSINATURA E INDICE DE MORSE RELATIVO 128

Suponhamos que H tenha dimensao finita. E claro que, se (L, T ) e um par deoperadores auto-adjuntos, entao L e T sao congruentes. Veremos que se L e T saoisomorfismos auto-adjuntos, o ındice de Morse relativo do par (L, T ) coincide com adiferenca dos ındices de Morse de L e de T , isto e,

µrel(L, T ) = µ(L)− µ(T ).

Mais geralmente, se H tem dimensao infinita e L, T ∈ Φ+S (H) sao isomorfismos con-

gruentes, mostraremos que a formula acima tambem e valida. Para provar estes fatos,vejamos primeiro o seguinte lema.

Lema 4.4.8. Sejam U e V dois subespacos de dimensao finita de H. Entao,

dimU − dimV = dim(U ∩ V ⊥)− dim(V ∩ U⊥).

Demonstracao. Primeiro vejamos que V ⊥ ∩ U = (V + U⊥)⊥. De fato, tomemos x ∈V ⊥ ∩ U fixado. Para w ∈ V + U⊥, w = wV + wU⊥ , onde wV ∈ V e wU⊥ ∈ U⊥. Logo,

〈x,w〉 = 〈x,wV + wU⊥〉 = 〈x,wV 〉+ 〈x,wU⊥〉 = 0.

Este fato prova que x ∈ (V + U⊥)⊥. Daı,

V ⊥ ∩ U ⊆ (V + U⊥)⊥.

Agora, dado que U⊥ ⊆ V + U⊥, entao

(V + U⊥)⊥ ⊆ U⊥⊥ = U

(U tem dimensao finita e portanto e fechado). Por outro lado, V ⊆ V + U⊥, assim

(V + U⊥)⊥ ⊆ V ⊥.

Logo,(V + U⊥)⊥ ⊆ V ⊥ ∩ U.

Dos fatos acima se segue

(V + U⊥)⊥ = V ⊥ ∩ U.

Agora, sejam P : V → U a restricao a V da projecao ortogonal sobre U e Q : U →V ⊥∩U a restricao a U da projecao ortogonal sobre V ⊥∩U. Ja que V ⊥∩U = (V +U⊥)⊥,temos KerQ = U ∩ (V + U⊥). Dado que V ⊥ ∩ U e subespaco de U , se segue que Q esobrejetora. Do Teorema do nucleo e da imagem temos

dimU = dim KerQ+ dim ImQ = dim(U ∩ (V + U⊥)) + dim(V ⊥ ∩ U). (4.4.10)

CAPITULO 4. ASSINATURA E INDICE DE MORSE RELATIVO 129

Tomemos u ∈ U fixado. Se u = P (v) para algum v ∈ V , entao u = v + (P (v)− v),onde (P (v)− v) ∈ U⊥. Consequentemente, u ∈ U ∩ (V + U⊥) e assim Q(u) = 0.

Reciprocamente, se Q(u) = 0, temos u = v + a com v ∈ V e a ∈ U⊥. Daı,

u = P (u) = P (v + a) = P (v) + P (a) = P (v).

Os dois fatos acima provam que

ImP = U ∩ (V + U⊥) = KerQ.

E claro que KerP = V ∩ U⊥. Logo, pelo Teorema do nucleo e da imagem,

dimV = dim KerP + dim ImP = dim(V ∩ U⊥) + dim KerQ. (4.4.11)

Portanto, de (4.4.10) e (4.4.11) temos

dimU − dimV = dim(V ⊥ ∩ U) + dim KerQ− dim(V ∩ U⊥)− dim KerQ

= dim(V ⊥ ∩ U)− dim(V ∩ U⊥),

o que prova o lema.

Proposicao 4.4.9. Se L, T ∈ L(H) sao isomorfismos essencialmente positivos e con-gruentes, entao

µrel(L, T ) = µ(L)− µ(T ).

Demonstracao. Dado que, por hipotese, H−(L) e H−(T ) tem dimensao finita, do lemaanterior se segue que

dim(H−(L))− dim(H−(T )) = dim[H−(L) ∩ (H−(T ))⊥]− dim[H−(T ) ∩ (H−(L))⊥],

isto e,

µ(L)− µ(T ) = dim[H−(L) ∩ (H−(T ))⊥]− dim[H−(T ) ∩ (H−(L))⊥].

Assim, como consequencia da definicao do ındice de Morse relativo obtemos

µrel(L, T ) = dim[H−(L) ∩ (H−(T ))⊥]− dim[H−(T ) ∩ (H−(L))⊥] = µ(L)− µ(T ),

o que prova a proposicao.

Observacao 4.4.10. Se H tem dimensao finita e (L, T ) e um par de isomorfismosauto-adjuntos, de forma analoga a prova da proposicao anterior, obtemos que

µrel(L, T ) = µ(L)− µ(T ).

CAPITULO 4. ASSINATURA E INDICE DE MORSE RELATIVO 130

Demonstraremos agora algumas outras propriedades que possui o ındice de Morserelativo para pares de isomorfismos auto-adjuntos. Para este fim, vejamos primeiro oseguinte resultado.

Lema 4.4.11. Se L ∈ ΦS(H) e K ∈ KS(H), entao L + K pertence a mesma compo-nente conexa de ΦS(H) a qual pertence L.

Demonstracao. Primeiramente, observe que a aplicacao α : [0, 1] → ΦS(H) definidapor α(t) = L+ tK e contınua. Assim, sua imagem, α([0, 1]), e conexa.

Consideremos primeiro que L ∈ Φ+S (H). Suponhamos por absurdo que L + K /∈

Φ+S (H). Entao, L+K ∈ Φ−S (H) ∪ Φi

S(H). Consequentemente,

U = α([0, 1]) ∩ Φ+S (H) e V = α([0, 1]) ∩ [Φ−S (H) ∪ Φi

S(H)]

sao subconjuntos disjuntos nao vazios cuja uniao e igual a α([0, 1]). Observe que U eV sao subconjuntos abertos da imagem de α (Φ+

S (H), Φ−S (H) e ΦiS(H) sao abertos de

ΦS(H)), o que contradiz o fato de que α([0, 1]) e conexo. Em conclusao, L+K ∈ Φ+S (H).

De forma analoga podemos provar o caso em que L pertence as outras duas com-ponentes conexas de ΦS(H).

Suponhamos que L ∈ GL+S (H), K ∈ KS(H) e que L + K ∈ GLS(H). Do Lema

4.4.11 obtemos que µ(L + K) < ∞. Assim, dado que µ(L) = 0, a Proposicao 4.4.9implica que

µrel(L+K,L) = µ(L+K). (4.4.12)

A seguinte proposicao e uma consequencia do fato de que o ındice de um caminhode pares de Fredholm e constante (Proposicao 4.4.5).

Proposicao 4.4.12. Se (Lt, Tt)t∈J e um caminho de pares de isomorfismos auto-adjuntos congruentes, entao µrel(Lt, Tt) e constante.

Demonstracao. Como (Lt, Tt)t∈J e um caminho de pares de isomorfismos auto-adjun-tos, entao, se t ∈ J , 0 nao pertence a os espectros dos operadores Lt e Tt. Como foivisto na prova do Teorema 4.3.22, existe uma curva fechada simples Γ em C tal que noseu interior ficam os espectros negativos dos operadores Lt e Tt, para todo t ∈ J, e noseu exterior ficam os espectros positivos. Daı, as representacoes integrais das projecoesortogonais dos operadores Lt e Tt sobre seus subespacos espectrais negativos sao dadaspor

PH−(Lt) = − 1

2πi

∫Γ

(Lt − λI)−1dλ e PH−(Tt) = − 1

2πi

∫Γ

(Tt − λI)−1dλ,

para t ∈ J , respectivamente. Do Teorema 4.3.22 se segue que t 7→ PH−(Lt) e t 7→ PH−(Tt)

sao contınuas. Portanto, pela Proposicao 4.4.6,

(PH−(Lt), PH−(Tt))t∈J

CAPITULO 4. ASSINATURA E INDICE DE MORSE RELATIVO 131

e um caminho de pares de projecoes ortogonais congruentes. Da Proposicao 4.4.5 temosque

µrel(Lt, Tt) = ind(PH−(Lt), PH−(Tt))

e constante, o que prova a proposicao.

Provemos agora que, se S ∈ L(H) e um isomorfismo auto-adjunto e O ∈ L(H) eortogonal, entao

O∗PH−(S)O = PH−(O∗SO). (4.4.13)

De fato, vejamos primeiro que O∗(H−(S)) = H−(O∗SO). Denotemos por S o operadorO∗SO. Se x ∈ H−(S),

〈O∗SO(O∗x), O∗x〉 = 〈O∗Sx,O∗x〉 = 〈Sx, x〉 ≤ 0.

Assim, S e negativa em O∗(H−(S)). Alem disso,

S(O∗(H−(S))) = O∗SO(O∗(H−(S))) = O∗S(H−(S)) = O∗(H−(S)). (4.4.14)

Analogamente, S e positiva em O∗(H+(S)) e

S(O∗(H+(S))) = O∗(H+(S)). (4.4.15)

E facil ver que Ker S = O∗(KerS). Consequentemente, de (4.4.14) e (4.4.15) e doTeorema 3.3.19 se segue

H−(S) = O∗(H−(S)) e H+(S) = O∗(H+(S)).

Por outro lado, dado que PH−(S)(H) = H−(S), temos

Im(O∗PH−(S)O) = O∗PH−(S)(ImO) = O∗PH−(S)(H) = O∗(H−(S)).

Alem disso, o operador O∗PH−(S)O e uma projecao ortogonal, pois e auto-adjunto e(O∗PH−(S)O)2 = O∗PH−(S)O (veja-se Proposicao 3.2.13). Em conclusao, O∗PH−(S)O e

a projecao ortogonal sobre O∗(H−(S)) = H−(S).

Uma consequencia do Lema 4.4.3 e de (4.4.13) e dada na seguinte proposicao.

Proposicao 4.4.13. Seja (L, T ) um par de isomorfismos auto-adjuntos congruentesem L(H). Se O ∈ L(H) e ortogonal, entao

µrel(L, T ) = µrel(O∗LO,O∗TO).

CAPITULO 4. ASSINATURA E INDICE DE MORSE RELATIVO 132

Demonstracao. E claro que O∗LO e O∗TO sao congruentes, pois

O∗LO −O∗TO = O∗(L− T )O

e compacto pelo Teorema 2.3.10. Por outro lado, do Lema 4.4.3 temos que

µrel(L, T ) = ind(PH−(L), PH−(T )) = ind(O∗PH−(L)O,O∗PH−(T )O).

Da igualdade (4.4.13) se segue

µrel(O∗LO,O∗TO) = ind(PH−(O∗LO), PH−(O∗TO))

= ind(O∗PH−(L)O,O∗PH−(T )O).

Consequentemente, µrel(L, T ) = µrel(O∗LO,O∗TO).

A seguinte proposicao mostra um resultado mais geral que o fato anterior: o ındicerelativo de Morse relativo e invariante pela acao cogradiente.

Proposicao 4.4.14. Sejam L e T em L(H), isomorfismos auto-adjuntos e congruen-tes. Se S ∈ GL(H), entao S∗LS e S∗TS sao congruentes e, alem disso,

µrel(S∗LS, S∗TS) = µrel(L, T ).

Demonstracao. Observe que S∗LS e S∗TS sao congruentes, sendo S∗LS−S∗TS com-pacto. Seja S = OR a decomposicao polar de S. Aqui, O e ortogonal e R denota araiz quadrada nao negativa do operador S∗S (ver Teorema 3.3.16). Ja que R e I saoisomorfismos definidos positivos, do Corolario 3.4.8 temos que, para cada t ∈ [0 , 1], ooperador (1− t)R + tI e um isomorfismo definido positivo. Definamos

St = O((1− t)R + tI) para t ∈ [0, 1].

E facil ver diretamente da definicao que (S∗tLSt, S∗t TSt)t∈[0,1] e um caminho depares de isomorfismos auto-adjuntos congruentes. Assim, das Proposicoes 4.4.12 e4.4.13 temos

µrel(S∗LS, S∗TS) = µrel(S

∗0LS0, S

∗0TS0) = µrel(S

∗1LS1, S

∗1TS1)

= µrel(O∗LO,O∗TO) = µrel(L, T ),

o que prova a proposicao.

No seguinte lema vamos supor que L1, T1 ∈ L(H1) e L2, T2 ∈ L(H2), onde H1

e H2 sao espacos de Hilbert e, alem disso, para evitar confusao, denotaremos por[L1, L2] ∈ L(H1 × H2) e [T1, T2] ∈ L(H1 × H2) os produtos diretos dos operadoresenvolvidos.

CAPITULO 4. ASSINATURA E INDICE DE MORSE RELATIVO 133

Lema 4.4.15. Se (L1, T1) e (L2, T2) sao pares de isomorfismos congruentes, entao([L1, L2], [T1, T2]) e um par de isomorfismos congruentes e, alem disso,

µrel([L1, L2], [T1, T2]) = µrel(L1, T1) + µrel(L2, T2).

Demonstracao. O operador [L1, L2] − [T1, T2] = [L1 − T1, L2 − T2] e compacto pelaProposicao 2.3.8. E claro que [L1, L2] e [T1, T2] sao isomorfismos. Daı, ([L1, L2], [T1, T2])e um par de isomorfismos congruentes.

Por outro lado, o Lema 4.2.9 implica que

H±[L1, L2] = H±(L1)×H±(L2) e H±[T1, T2] = H±(T1)×H±(T2).

Assim,

µrel([L1, L2], [T1, T2]) = ind(PH−[L1,L2], PH−[T1,T2])

= dim(ImPH−[L1,L2] ∩KerPH−[T1,T2])

− dim(ImPH−[T1,T2] ∩KerPH−[L1,L2])

= dim([H−(L1)×H−(L2)] ∩ [H+(T1)×H+(T2)])

− dim([H−(T1)×H−(T2)] ∩ [H+(L1)×H+(L2)])

= dim([H−(L1) ∩H+(T1)]× [H−(L2) ∩H+(T2)])

− dim([H−(T1) ∩H+(L1)]× [H−(T2) ∩H+(L2)])

= dim(H−(L1) ∩H+(T1)) + dim(H−(L2) ∩H+(T2))

− [dim(H−(T1) ∩H+(L1)) + dim(H−(T2) ∩H+(L2))]

= [dim(H−(L1) ∩H+(T1))− dim(H−(T1) ∩H+(L1))]

+ [dim(H−(L2) ∩H+(T2))− dim(H−(T2) ∩H+(L2))]

= µrel(L1, T1) + µrel(L2, T2).

Isto e, µrel([L1, L2], [T1, T2]) = µrel(L1, T1) + µrel(L2, T2).

Finalizaremos este capıtulo apresentando uma relacao que liga o ındice de Morserelativo com a assinatura generalizada de uma perturbacao compacta auto-adjunta deuma simetria J .

Proposicao 4.4.16. Sejam La = J +Ka e Lb = J +Kb dois operadores inversıveis,onde Ka e Kb pertencem a KS(H). Entao,

1

2[signJ Lb − signJ La] = µrel(La, Lb). (4.4.16)

Demonstracao. Sejam (e±i )∞i=1 bases de Hilbert de H±(J ) e

Hn = spane±i : i = 1, ..., n para n ∈ N.

CAPITULO 4. ASSINATURA E INDICE DE MORSE RELATIVO 134

Denotemos por Pn a projecao sobre Hn para n ∈ N. De forma analoga a prova daProposicao 4.2.5 podemos provar que existe um inteiro positivo N tal que

Lλ,t,n = J + tKλ + (1− t)PnKλPn : H → H

e injetor para todo n ≥ N , 0 ≤ t ≤ 1 e λ = a, b. Alem disso, dado que

(PnKλPn)∗ = P ∗nK∗λP∗n = PnKλPn,

temos que PnKλPn e auto-adjunto para λ = a, b e n ∈ N. Como J , Kλ e PnKλPnsao auto-adjuntos, para λ = a, b e n ∈ N, entao La,t,n e Lb,t,n sao auto-adjuntos parat ∈ [0, 1]. Assim, Lλ,t,n e um operador de Fredholm auto-adjunto para λ = a, b, eportanto indLλ,t,n = 0. Logo, ImLλ,t,n = H, pois KerLλ,t,n = 0. Consequentemente,existe um inteiro positivo N tal que Lλ,t,n e um isomorfismo para todo n ≥ N , 0 ≤ t ≤ 1e λ = a, b.

Se n ≥ N , entao (La,t,n, Lb,t,n)t∈[0,1] e um caminho de pares de isomorfismos auto-adjuntos congruentes, pois

La,t,n − Lb,t,n = t(Ka −Kb) + (1− t)Pn(Ka −Kb)Pn

e compacto para todo t ∈ [0, 1]. Assim, a Proposicao 4.4.12 prova que, se n ≥ N ,

µrel(La,0,n, Lb,0,n) = µrel(La,1,n, Lb,1,n),

isto e,

µrel(J + PnKaPn,J + PnKbPn) = µrel(J +Ka,J +Kb). (4.4.17)

Denotemos por Lλ,n a n-esima aproximacao de Galerkin de Lλ para λ = a, b. E claro queHn e H⊥n sao invariantes pelos operadores J +PnKaPn e J +PnKbPn. Alem disso, dadoque Pn e a projecao sobre Hn, temos que, se y ∈ H⊥n , entao PnKaPny = PnKbPny = 0.Este fato prova que

J + PnKaPn e J + PnKbPn coincidem com J em H⊥n . (4.4.18)

E claro que µrel(J |H⊥n ,J |H⊥n ) = 0. Assim, de (4.4.18) e do Lema 4.4.15 temos

µrel(J + PnKaPn,J + PnKbPn)

= µrel(J + PnKaPn|Hn ,J + PnKbPn|Hn) + µrel(J + PnKaPn|H⊥n ,J + PnKbPn|H⊥n )

= µrel(J + PnKaPn|Hn ,J + PnKbPn|Hn) + µrel(J |H⊥n ,J |H⊥n )

= µrel(J + PnKaPn|Hn ,J + PnKbPn|Hn)

= µrel(La,n, Lb,n).

CAPITULO 4. ASSINATURA E INDICE DE MORSE RELATIVO 135

Logo,µrel(J + PnKaPn,J + PnKbPn) = µrel(La,n, Lb,n). (4.4.19)

Portanto, de (4.4.17) e (4.4.19) temos que, se n ≥ N , entao

µrel(La, Lb) = µrel(La,n, Lb,n). (4.4.20)

Por outro lado, pela definicao da assinatura generalizada como o limite das assi-naturas das aproximacoes de Galerkin, existe um inteiro positivo, que podemos seguirchamando de N , tal que

signJ Lλ = signLλ,n para n ≥ N, λ = a, b.

Consequentemente, de (4.4.20) se segue que a igualdade em (4.4.16) sera provada semostrarmos que

1

2[signLb,n − signLa,n] = µrel(La,n, Lb,n) para n ≥ N.

Para provar a igualdade acima, observe primeiro que

µ(La,n) + µ(−La,n) = dimHn = 2n = µ(Lb,n) + µ(−Lb,n).

Assim,

1

2[signLb,n − signLa,n] =

1

2[µ(−Lb,n)− µ(Lb,n)− (µ(−La,n)− µ(La,n))]

=1

2[2n− µ(Lb,n)− µ(Lb,n)− (2n− µ(La,n)− µ(La,n))]

=1

2[−2µ(Lb,n) + 2µ(La,n)]

= µ(La,n)− µ(Lb,n),

isto e,1

2[signLb,n − signLa,n] = µ(La,n)− µ(Lb,n). (4.4.21)

Pelo lema anterior temos

µ(La,n)− µ(Lb,n) = dim(H−(La,n))− dim(H−(Lb,n))

= dim(H−(La,n) ∩ (H−(Lb,n))⊥)− dim(H−(Lb,n) ∩ (H−(La,n))⊥)

= ind(PH−(La,n), PH−(Lb,n))

= µrel(La,n, Lb,n).

Se segue de (4.4.21) e do fato anterior que

µrel(La,n, Lb,n) =1

2[signLb,n − signLa,n],

o que prova a proposicao.

CAPITULO 4. ASSINATURA E INDICE DE MORSE RELATIVO 136

Como consequencia temos que, se K ∈ KS(H) e J +K e um isomorfismo, entao

µrel(J ,J +K) =1

2[signJ (J +K)− signJ (J )] =

1

2[signJ (J +K)].

Capıtulo 5

O fluxo espectral de caminhos deoperadores de Fredholmauto-adjuntos

Neste capıtulo vamos construir o fluxo espectral para caminhos de operadores de Fre-dholm auto-adjuntos e, alem disso, veremos algumas das suas propriedades. Para estefim, sera introduzido, na proxima secao, o conceito de parametrix cogradiente parauma famılia de operadores fortemente indefinidos, e usaremos a nocao de assinaturageneralizada, apresentada no capıtulo anterior.

Na segunda secao o fluxo espectral sera definido primeiramente para caminhos emΦiS(H) com extremos inversıveis. Veremos que esta nocao se pode estender a ca-

minhos fechados em ΦiS(H), onde seus extremos nao necessariamente sao inversıveis.

Mostraremos que o fluxo espectral e invariante por acao cogradiente e tambem porhomotopias.

Na Secao 3 abordaremos o caso para caminhos com valores nas outras duas com-ponentes conexas de ΦS(H), ou seja, em Φ+

S (H) e em Φ−S (H). Veremos que, seL = Lλλ∈J e um caminho de operadores essencialmente positivos com extremos in-versıveis, entao o fluxo espectral de L e igual a diferenca

µ(La)− µ(Lb).

Finalizaremos o trabalho na quarta secao, onde daremos a definicao do fluxo espec-tral em pontos singulares isolados de um caminho de operadores de Fredholm auto-adjuntos. O proposito desta secao e mostrar que, se L = Lλλ∈J e um caminhocontinuamente diferenciavel de operadores de Fredholm auto-adjuntos e λ0 e um pontosingular isolado de L, entao o fluxo espectral de L em λ0 coincide com a assinatura dodiferencial Lλ0 restrito ao nucleo de Lλ0 .

137

CAPITULO 5. O FLUXO ESPECTRAL 138

5.1 Parametrix cogradiente

O objetivo desta secao e mostrar que toda famılia de operadores de Fredholm auto-adjuntos fortemente indefinidos, parametrizada por um espaco topologico paracom-pacto e contratil, possui uma parametrix cogradiente, que definiremos mais adiante.Como premissa para a prova deste fato, primeiro lembraremos algumas nocoes basicasda analise funcional, da teoria dos grupos e da topologia algebrica.

Nesta secao H denotara um espaco de Hilbert real, separavel e de dimensao infinita.

Definicao 5.1.1 (Forma bilinear). Sejam H1 e H2 espacos de Hilbert reais. Umaforma bilinear e uma aplicacao

h : H1 ×H2 → R

tal que, para todo x, x1, x2 ∈ H1, y, y1, y2 ∈ H2 e a, b ∈ R,

i. h(ax1 + bx2, y) = ah(x1, y) + bh(x2, y) e

ii. h(x, ay1 + by2) = ah(x, y1) + bh(x, y2).

Se H1 = H2 e h(x, y) = h(y, x) para todo x, y ∈ H1 dizemos que h e simetrica.Uma forma bilinear h : H1 ×H2 → R e limitada se existe c > 0 tal que

|h(x, y)| ≤ c‖x‖‖y‖ para todo (x, y) ∈ H1 ×H2.

Neste caso, o numero‖h‖ = sup

‖x‖=1, x∈H1

‖y‖=1, y∈H2

|h(x, y)|

e chamado de norma de h.

O seguinte teorema, cuja prova se pode ver, por exemplo, em [16], pag. 192, Teorema3.8-4, e o bem conhecido Teorema da representacao de Riesz para formas bilineares.

Teorema 5.1.2 (Teorema da representacao de Riesz). Sejam H1, H2 espacos de Hilbertreais e h : H1×H2 → R uma forma bilinear limitada. Entao, h tem uma representacao

h(x, y) = 〈Sx, y〉

onde S : H1 → H2 e um operador linear limitado, unicamente determinado por h, e

‖h‖ = ‖S‖. (5.1.1)

Observacao 5.1.3. Nas condicoes do teorema anterior, e claro que, se H1 = H2 eh : H1 ×H1 → R e simetrica, entao S e auto-adjunto.

CAPITULO 5. O FLUXO ESPECTRAL 139

Definicao 5.1.4 (G-acao). Sejam (G, ·) um grupo e X um conjunto. Uma G-acaosobre X e uma aplicacao α : G×X → X com as seguintes propriedades;

i. Para todo x ∈ X, α(e, x) = x, onde e e o elemento neutro de G.

ii. Para todo x ∈ X, g, h ∈ G, α(g · h, x) = α(g, α(h, x)).

Neste caso dizemos que X e um G-grupo.

Se g ∈ G e x ∈ X, o elemento α(g, x) sera denotado por αg(x). A definicao acimaimplica que, para cada g ∈ G, a aplicacao αg : X → X, que podemos, se necessario,denotar por αg(x) = gx para x ∈ X, possui a inversa αg−1 : X → X, definida porαg−1(x) = g−1x para x ∈ X. Portanto, se G e um grupo topologico e X e um espaco

topologico, para cada g ∈ G, a aplicacao αg e um homeomorfismo. E claro que todogrupo G e um G-grupo.

Definicao 5.1.5. Sejam G um grupo e X, Y dois G-grupos com G-acoes α e β, res-pectivamente. Uma aplicacao ψ : X → Y e G-equivariante se

ψ(αg(x)) = βg(ψ(x)) para todo x ∈ X e g ∈ G.

Neste caso dizemos que ψ e equivariante entre os G-grupos X e Y .

Definicao 5.1.6 (Fibrado). Sejam X, B e F tres espacos topologicos. Uma aplicacaocontınua e sobrejetora π : X → B e um fibrado trivial com fibra F e base B se existeum homeomorfismo φ : X → B × F tal que

π(x) = π1φ(x) para todo x ∈ X,

onde π1 : B × F → B e a projecao sobre a primeira coordenada.Mais geralmente, dizemos que π : X → B e um fibrado localmente trivial com

fibra F e base B se para qualquer ponto b ∈ B existe uma vizinhanca U de b e umhomeomorfismo φU : π−1(U)→ U × F tal que

π(x) = π1φU(x) para todo x ∈ π−1(U).

A aplicacao φU e chamada uma trivializacao sobre a vizinhanca U de b.Sejam B′ um espaco topologico e f : B′ → B uma aplicacao contınua. O pullback

induzido por f e pelo fibrado π : X → B e a aplicacao f ?(π) : X ′ → B′, onde X ′ e osubespaco do produto B′ ×X consistente dos pares (b′, x) para o qual f(b′) = π(x), ef ?(π) e a aplicacao definida pela projecao (b′, x) 7→ b′ para todo (b′, x) ∈ X ′.

Os dois seguintes resultados, cujas provas se podem ver, por exemplo, em [23], pag.61, Lema 1.3 e pag. 75, Proposicao 3.5, respectivamente, serao fundamentais nestasecao.

CAPITULO 5. O FLUXO ESPECTRAL 140

Lema 5.1.7. Sejam π : X → B um fibrado localmente trivial com fibra F e f : B′ → Buma aplicacao contınua. Entao, o pullback induzido por f e π, f ?(π) : X ′ → B′, etambem um fibrado localmente trivial com fibra F e base B′.

Proposicao 5.1.8. Seja π : X → B um fibrado localmente trivial com fibra F . Se Be paracompacto e contratil, entao π e um fibrado trivial.

Definicao 5.1.9 (Parametrix cogradiente). Sejam Λ um espaco topologico e L =Lλλ∈Λ uma famılia de operadores de Fredholm auto-adjuntos fortemente indefini-dos, isto e, uma aplicacao contınua L : Λ→ Φi

S(H). Uma parametrix cogradiente paraL relativa a uma simetria J ∈ Φi

S(H) e uma famılia M = Mλλ∈Λ de operadores emGL(H) tal que, para cada λ ∈ Λ,

M∗λLλMλ = J + Kλ,

onde Kλ ∈ KS(H). Neste caso diremos que as famılias L e M sao cogradientes.

No final desta secao mostraremos que, se Λ e paracompacto e contratil, entao umafamılia de operadores L = Lλλ∈Λ possui uma parametrix cogradiente. Para este fim,primeiro veremos alguns resultados que serao usados nesta prova.

Tomemos G = GL(H)×KS(H) e ΦiS(H) como espacos topologicos com as topologias

herdadas de L(H)×L(H) e de L(H), respectivamente. Se segue da Proposicao 3.4.11que, se M ∈ GL(H) e L ∈ Φi

S(H), entao MLM∗ ∈ ΦiS(H). Alem disso, se K ∈ KS(H),

do Lema 4.4.11 temos MLM∗ +K ∈ ΦiS(H). Seja

π : G → ΦiS(H)

(M,K) 7→MJM∗ +K.

Dos Teoremas 3.2.2 e 3.2.3 se segue que o operador que assina a cada L ∈ L(H)seu adjunto L∗ e um operador linear limitado. Portanto, π e contınua, sendo soma ecomposicao de aplicacoes contınuas.

Mostraremos que π e um fibrado localmente trivial com fibra π−1(J ). Para estefim, primeiro provemos que G pode ser dotado com uma estrutura de grupo topologico.

Proposicao 5.1.10. A operacao

g · g′ = (MM ′, K +MK ′M∗), para g = (M,K), g′ = (M ′, K ′) ∈ G, (5.1.2)

define uma estrutura de grupo topologico para o conjunto G.

Demonstracao. De fato, g·g′ ∈ G, pois MM ′ ∈ GL(H) e K+MK ′M∗ ∈ KS(H). E facilver que o elemento neutro de G e (I, 0), onde I e a identidade emGL(H) e 0 e o operadornulo. Por outro lado, se g = (M,K) ∈ G, entao g−1 = (M−1,−M−1K(M−1)∗), pois

(M,K) · (M−1,−M−1K(M−1)∗) = (MM−1, K +M(−M−1K(M−1)∗)M∗) = (I, 0)

CAPITULO 5. O FLUXO ESPECTRAL 141

e

(M−1,−M−1K(M−1)∗) ·(M,K) = (M−1M,−M−1K(M−1)∗+M−1K(M−1)∗) = (I, 0).

E claro que g−1 ∈ G. Por ultimo vejamos que o produto dado em (5.1.2) e associativo.Se (M1, K1), (M2, K2) e (M3, K3) sao elementos de G, entao

((M1, K1) · (M2, K2)) · (M3, K3) = (M1M2, K1 +M1K2M∗1 ) · (M3, K3)

= (M1M2M3, K1 +M1K2M∗1 +M1M2K3(M1M2)∗)

= (M1M2M3, K1 +M1K2M∗1 +M1M2K3M

∗2M

∗1 )

= (M1M2M3, K1 +M1(K2 +M2K3M∗2 )M∗

1 )

= (M1, K1) · (M2M3, K2 +M2K3M∗2 )

= (M1, K1) · ((M2, K2) · (M3, K3)).

Consequentemente, (G, ·) e um grupo.Por outro lado, e claro que

ς : G × G → G dada por ς(g, g′) = g · g′ (5.1.3)

e contınua. Pelo Lema 1.1.9, a aplicacao M 7→ M−1, para M ∈ GL(H), e contınua.Logo,

g 7→ g−1 = (M−1,−M−1K(M−1)∗), onde g = (M,K) ∈ G,e tambem contınua. Portanto, G e um grupo topologico.

Agora vejamos que existe uma G-acao sobre ΦiS(H) de tal modo que π : G → Φi

S(H)se torna uma aplicacao equivariante entre G e Φi

S(H).

Proposicao 5.1.11. A aplicacao τ : G × ΦiS(H)→ Φi

S(H) definida por

τg(L) = MLM∗ +K para L ∈ ΦiS(H) e g = (M,K) ∈ G

e uma G-acao contınua sobre ΦiS(H). Alem disso, π e equivariante entre G e Φi

S(H).

Demonstracao. E claro que τ e contınua. Provemos que τ e uma acao de G em ΦiS(H).

De fato, denotando τ(g, L) = τg(L), temos

τ((I, 0), L) = L para todo L ∈ ΦiS(H).

Agora, fixemos g = (M,K), g′ = (M ′, K ′) ∈ G e L ∈ ΦiS(H). Assim,

τ((M,K) · (M ′, K ′), L) = τ((MM ′, K +MK ′M∗), L)

= MM ′L(MM ′)∗ +K +MK ′M∗

= MM ′L(M ′)∗M∗ +K +MK ′M∗

= M(M ′L(M ′)∗ +K ′)M∗ +K

= M(τ((M ′, K ′), L))M∗ +K

= τ((M,K), τ((M ′, K ′), L)).

CAPITULO 5. O FLUXO ESPECTRAL 142

Este fato prova que ΦiS(H) e um G-grupo.

Por outro lado, denotando ςg(g′) = ς(g, g′), sendo ς definida na (5.1.3),

πςg(g′) = π(g · g′) = π((MM ′, K +MK ′M∗)) = MM ′J (MM ′)

∗+K +MK ′M∗

= MM ′J (M ′)∗M∗ +K +MK ′M∗ = M(M ′JM ′∗ +K ′)M∗ +K

= M(π(M ′, K ′))M∗ +K = τ(M,K)(π(M ′, K ′))

= τgπ(g′).

Daı,

πςg(g′) = π((M,K) · (M ′, K ′)) = M(π(M ′, K ′))M∗ +K = τgπ(g′). (5.1.4)

Consequentemente, π e equivariante entre os G-grupos G e ΦiS(H).

Provaremos que existe uma vizinhanca U do operador J no espaco ΦiS(H) e uma

aplicacao contınua % : U → G tal que π% = I|U , ou seja, π%(L) = L para todo L ∈ U .Primeiro vejamos os seguintes resultados.

Tomemos D = a+ ib ∈ C : a > 0 e seja

γ : D → C, dada por λ 7→ λ1/2 = |λ|1/2eiArg z

2 , (5.1.5)

onde Arg z denota o argumento principal de z. Podemos ver, por exemplo, em [6], pag.64, Exemplo 15, que γ e regular. E claro que γ(λ)γ(λ) = λ para topo λ ∈ D.

Lembremos que a raiz quadrada nao negativa de um operador nao negativo L ∈L(H) e um operador nao negativo R ∈ L(H) tal que R2 = L. Como mostramos noTeorema 3.3.14, a raiz quadrada de um operador nao negativo existe e e unica. Usandoa aplicacao γ, definida acima, provaremos o seguinte lema.

Lema 5.1.12. A aplicacao

R : GL+S (H)→ GL+

S (H)

L 7→ L1/2,

onde L1/2 denota a raiz quadrada nao negativa do operador L ∈ GL+S (H), e contınua.

Demonstracao. Tomemos L ∈ GL+S (H) fixado. Para demonstrar a continuidade de

R, primeiro mostremos que existe uma vizinhanca U de L tal que, para todo T ∈ U ,o operador T 1/2 e igual a γ(T ), onde γ : D → C e a aplicacao definida na formula(5.1.5). Lembramos que γ(T ) e definida segundo a formula (4.3.1). Seja c > 0 tal que‖Lx‖ ≥ c‖x‖ para todo x ∈ H (veja-se Proposicao 1.1.10). De forma analoga a provado Corolario 4.3.23 podemos ver que, para todo T ∈ B(L, c/2) ⊆ GL+

S (H),

σ(T ) ⊆ [c/2, ‖L‖+ c/2].

CAPITULO 5. O FLUXO ESPECTRAL 143

Consideremos a seguinte parametrizacao da circunferencia em C de centro (‖L‖, 0) eraio ‖L‖ − 1

6c:

Γ(t) = (‖L‖, 0) + (‖L‖ − 1

6c)e2πit, para t ∈ [0, 1].

Daı, para cada T ∈ B(L, c/2), σ(T ) ⊆ Γ e, alem disso,

γ(T ) = − 1

2πi

∫Γ

λ1/2(T − λI)−1dλ.

Mostremos que γ(T ) = T 1/2. Para este fim, provaremos que γ(T )2 = T e γ(T ) e naonegativo. De fato, dado que γ(λ)γ(λ) = λ para topo λ ∈ D, do Lema 4.3.15 obtemosque γ(T )2 = T. Vejamos agora que γ(T ) e auto-adjunto. Para cada n ∈ N, tomemosuma particao Pn = λ0, λ1, ..., λn de Γ, com

2‖L‖ − c/6 = λ0 < λ1 < λ2 < ... < λn = λ0

e tais que, para cada k = 1, ..., n, |λk − λk−1| → 0 quando n → ∞. Alem disso, parak = 0, 1, ..., n, seja ξk = λn−k. Assim, ξk ∈ Γ e ξ0 < ξ1 < ... < ξn = ξ0. Dados x, y ∈ H,temos

〈n∑k=1

λ1/2k (λk − λk−1)(T − λkI)−1x, y〉 = 〈x,

n∑k=1

λ1/2

k (λk − λk−1)(T − λkI)−1y〉

= 〈x,n∑k=1

ξ1/2n−k(ξn−k − ξn−k+1)(T − ξn−kI)−1y〉

= 〈x,−n∑k=1

ξ1/2n−k(ξn−k+1 − ξn−k)(T − ξn−kI)−1y〉

= 〈x,−n∑j=1

ξ1/2j−1(ξj − ξj−1)(T − ξj−1I)−1y〉.

Portanto,

〈− 1

2πi

n∑k=1

λ1/2k (λk−λk−1)(T−λkI)−1x, y〉 = 〈x,− 1

2πi

n∑j=1

ξ1/2j−1(ξj−ξj−1)(T−ξj−1I)−1y〉.

Dado que

limn→∞

− 1

2πi

n∑k=1

λ1/2k (λk − λk−1)(T − λkI)−1 = γ(T )

= limn→∞

− 1

2πi

n∑j=1

ξ1/2j−1(ξj − ξj−1)(T − ξj−1I)−1,

CAPITULO 5. O FLUXO ESPECTRAL 144

se segue que 〈γ(T )x, y〉 = 〈x, γ(T )y〉 para todo x, y ∈ H. Este fato prova que γ(T ) eauto-adjunto.

Por ultimo, mostremos que γ(T ) e nao negativo. Do Lema 4.3.16 obtemos que

σ(γ(T )) = γ(σ(T )).

Assim, como o espectro de T e positivo, entao o espectro de γ(T ) e positivo. Dasequacoes (4.3.16) e (4.3.14) obtemos, respectivamente, que

maxλ∈σ(γ(T ))

λ = sup‖x‖=1

〈γ(T )x, x〉 e minλ∈σ(γ(T ))

λ = inf‖x‖=1

〈γ(T )x, x〉.

Consequentemente, dado que minλ∈σ(γ(T ))

λ ≥ 0, se segue que γ(T ) e nao negativo.

Os fatos acima mostram que γ(T ) e a raiz quadrada nao negativa do T .Agora provemos a continuidade deR. Tomemos T ∈ B(L, c/2). De (1.1.1) obtemos

(L− λI)−1 − (T − λI)−1 = −(L− λI)−1(L− T )(T − λI)−1 para λ ∈ Γ.

Assim,

γ(L)− γ(T ) = − 1

2πi

∫Γ

λ1/2(L− λI)−1dλ+1

2πi

∫Γ

λ1/2(T − λI)−1dλ

= − 1

2πi

∫Γ

λ1/2[(L− λI)−1 − (T − λI)−1]dλ

=1

2πi

∫Γ

λ1/2(L− λI)−1(L− T )(T − λI)−1dλ.

Como na prova lo Lema 1.1.9, existe M > 0 tal que

‖(T − λI)−1‖ ≤M para λ ∈ Γ e T ∈ B(L, c/2).

Assim,

‖λ1/2(L− λI)−1(L− T )(T − λI)−1‖ ≤ mM2‖L− T‖, onde m = maxλ∈Γ|λ1/2|.

Logo, dado ε > 0, se ‖L− T‖ < ε, entao, pelo Lema 4.3.21,

‖R(L)−R(T )‖ = ‖γ(L)− γ(T )‖ < 1

2πmM2lε,

onde l e o comprimento de Γ. Consequentemente, R e contınua.

Lema 5.1.13. Existe uma vizinhanca U do operador J no espaco ΦiS(H) e uma secao

% : U → G de π, isto e, uma aplicacao contınua % tal que π% = I|U .

CAPITULO 5. O FLUXO ESPECTRAL 145

Demonstracao. Escolhamos uma vizinhanca U de J em ΦiS(H) que consista de ope-

radores inversıveis (isto e possıvel pois J e inversıvel e o conjunto de operadores in-versıveis e aberto). Para cada T ∈ U , sejam P+

T e P−T as projecoes ortogonais de Hsobre os subespacos espectrais H+(T ) e H−(T ), respectivamente. Do Corolario 4.3.23segue-se que elas dependem continuamente de T em U . Denotemos por H+ o subespacoH+(J ) e por H− o subespaco H−(J ).

Dividiremos o resto da prova em varios passos:

Passo 1: Provemos que podemos escolher U suficientemente pequeno tal que cadaT ∈ U tenha a propriedade que as restricoes P+

T |H+ : H+ → H+(T ) e P−T |H− : H− →H−(T ) sejam dois isomorfismos. Para este fim, tomemos U suficientemente pequenotal que o operador P : U → L(H), definido por

P (T ) = P+T P

+J + P−T P

−J : H → H, para T ∈ U , (5.1.6)

seja uma bijecao. Este fato e possıvel pois P (J ) = I, as projecoes dependem continua-mente de T , portanto P (T ) depende continuamente de T, e o conjunto dos isomorfismose aberto. Da sobrejetividade de P temos

H+(T )⊕H−(T ) = H = P (T )(H) = (P+T P

+J + P−T P

−J )(H)

⊆ P+T P

+J (H) + P−T P

−J (H) = P+

T (H+)⊕ P−T (H−),

isto e, H = P+T (H+)⊕ P−T (H−). Consequentemente, como P±T (H±) ⊆ H±(T ),

P±T (H±) = H±(T ).

Da injetividade de P se segue que P±T leva H± injetivamente sobre H±(T ). Logo,se T ∈ U , a restricao de P±T a H± e um isomorfismo sobre H±(T ). Denotemos porQ±T : H± → H±(T ) tal restricao.

Passo 2: Existem duas aplicacoes contınuas S+ : U → GL(H+) e S− : U →GL(H−) tais que

〈S+(T )P+T TP

+T S

+(T )u, v〉 = 〈u, v〉 e 〈S−(T )P−T TP−T S−(T )w, z〉 = −〈w, z〉

para todo T ∈ U , u, v ∈ H+ e w, z ∈ H−. De fato, para cada T ∈ U tomemos a formabilinear B+(T ) em H+ dada por

B+(T )(u, v) = 〈TQ+T u,Q

+T v〉 para u, v ∈ H+. (5.1.7)

Entao, B+(T ) e simetrica e limitada. Pelo Teorema da representacao de Riesz (Teorema5.1.2), B+(T ) e representado pelo operador auto-adjunto A(T ) = Q+

T∗TQ+

T ∈ L(H+) e

supv∈H+,‖v‖=1

u∈H+,‖u‖=1

|B+(T )(u, v)| = supu∈H+,‖u‖=1

‖A(T )u‖. (5.1.8)

CAPITULO 5. O FLUXO ESPECTRAL 146

Provemos que a aplicacao A : U → L(H+) que associa a cada operador T ∈ U ooperador A(T ) ∈ L(H+) e contınua. Seja T ∈ U fixado. Ja que Q±L = P±L para L ∈ U ,de (5.1.7), (5.1.8) e da desigualdade de Cauchy-Schwarz, se segue que, para S ∈ U ,

‖A(S)− A(T )‖ = supu∈H+,‖u‖=1

‖(A(S)− A(T ))u‖

= supv∈H+,‖v‖=1

u∈H+,‖u‖=1

|〈(SP+S − TP

+T )u, (P+

S − P+T )v〉|

≤ supv∈H+,‖v‖=1

u∈H+,‖u‖=1

‖(SP+S − TP

+T )u‖‖(P+

S − P+T )v‖

≤ ‖SP+S − TP

+T ‖‖P

+S − P

+T ‖

= ‖(S − T )(P+S − P

+T ) + T (P+

S − P+T ) + (S − T )P+

T ‖‖P+S − P

+T ‖

≤ [‖S − T‖‖P+S − P

+T ‖+ ‖T‖‖P+

S − P+T ‖+ ‖S − T‖‖P+

T ‖]‖P+S − P

+T ‖.

Agora, seja ε > 0 dado. Como as projecoes dependem continuamente de T e S, existeδ > 0, com δ < minε1/4, ε1/4/‖P+

T ‖, tal que, se ‖T − S‖ < δ, entao

‖P+T − P

+S ‖ < minε1/2, ε1/4/3, ε1/4/(3‖T‖),

√ε/(3‖P+

T ‖).

Consequentemente, se ‖T − S‖ < δ,

‖A(T )− A(S)‖ < 1

3[ε1/4ε1/4 + ε1/2 + ε1/4ε1/4]ε1/2 = ε,

o que prova que A e contınua.Fixemos T em U . Observe que A(T ) e definido positivo. De fato, dado que P+

T einjetor em H+, se u ∈ H+ com u 6= 0, entao P+

T u 6= 0. Assim, como P+T u ∈ H+(T ),

〈A(T )u, u〉 = 〈TQ+T u,Q

+T u〉 = 〈TP+

T u, P+T u〉 > 0.

Nao e difıcil provar que A(T ) e um isomorfismo. Os fatos acima mostram que A(T ) eum isomorfismo definido positivo.

Seja S+T ∈ L(H+) a raiz quadrada nao negativa da inversa de A(T ), isto e,

S+T = (A(T )−1)1/2.

E facil ver que(S+

T )−1(S+T )−1 = A(T ).

Como S+T e auto-adjunto, temos

((S+T )−1)∗ = ((S+

T )∗)−1 = (S+T )−1.

CAPITULO 5. O FLUXO ESPECTRAL 147

Assim, para u, v ∈ H+, de (5.1.7) e (5.1.8) obtemos

〈u, v〉 = 〈(S+T )−1S+

T u, (S+T )−1S+

T v〉 = 〈((S+T )−1)∗(S+

T )−1S+T u, S

+T v〉

= 〈(S+T )−1(S+

T )−1S+T u, S

+T v〉 = 〈A(T )S+

T u, S+T v〉

= 〈TP+T S

+T u, P

+T S

+T v〉 = 〈S+

T P+T TP

+T S

+T u, v〉.

Portanto, a aplicacao

S+ : U → GL(H+)

T 7→ S+(T ) = S+T

e tal que, para todo T ∈ U e u, v ∈ H+,

〈u, v〉 = 〈S+(T )P+T TP

+T S

+(T )u, v〉. (5.1.9)

Dado que a aplicacao T 7→ A(T ) para T ∈ U e contınua e S+(T ) = (A(T )−1)1/2, sesegue dos Lemas 1.1.9 e 5.1.12 que S+ e contınua.

Por outro lado, tomemos a forma bilinear

B−(T )(u, v) = −〈TQ−T u,Q−T v〉 para u, v ∈ H−.

Entao, B−(T ) e limitada e definida positiva. Como acima, podemos construir umaaplicacao contınua

S− : U → GL(H−)

T 7→ S−(T ) = S−T

com a propriedade que, para todo T ∈ U e u, v ∈ H−,

−〈u, v〉 = 〈S−(T )P−T TP−T S−(T )u, v〉. (5.1.10)

Passo 3: A aplicacao S : U → GL(H) dada por

S(T ) = P+T S

+T P

+J − P

−T S−T P

−J

e contınua e S(T )∗TS(T ) = J para todo T ∈ U . Dado que P+T S

+T P

+J e P−T S

−T P

−J

sao contınuas, se segue que S e contınua. Das igualdades (5.1.9) e (5.1.10) temos,respectivamente, que

S+T P

+T TP

+T S

+T |H+ = I|H+ e S−T P

−T TP

−T S−T |H− = −I|H− .

CAPITULO 5. O FLUXO ESPECTRAL 148

Assim, como P−T TP+T = 0 = P+

T TP−T e S+

T , S−T e as projecoes sao auto-adjuntas, entao

S(T )∗TS(T ) = (P+T S

+T P

+J − P

−T S−T P

−J )∗T (P+

T S+T P

+J − P

−T S−T P

−J )

= ((P+T S

+T P

+J )∗ − (P−T S

−T P

−J )∗)T (P+

T S+T P

+J − P

−T S−T P

−J )

= (P+J∗S+T∗P+T∗ − P−J

∗S−T∗P−T∗)T (P+

T S+T P

+J − P

−T S−T P

−J )

= (P+J S

+T P

+T − P

−J S−T P

−T )T (P+

T S+T P

+J − P

−T S−T P

−J )

= P+J S

+T P

+T T (P+

T S+T P

+J − P

−T S−T P

−J )− P−J S

−T P

−T T (P+

T S+T P

+J − P

−T S−T P

−J )

= P+J S

+T P

+T TP

+T S

+T P

+J + P−J S

−T P

−T TP

−T S−T P

−J

= P+J IP

+J − P

−J IP

−J

= (I|H+)⊕ (−I|H−)

= J .

Daı, para todo T ∈ U , S(T )∗TS(T ) = J .Passo 4: A aplicacao

% : U → GT 7→ ((S(T )−1)∗, 0)

e contınua e π(%(T )) = I|U . De fato, e claro que % e contınua. Alem disso, para T ∈ U ,

π(%(T )) = π((S(T )−1)∗, 0) = (S(T )−1)∗J S(T )−1 = T.

A prova e concluıda.

Lema 5.1.14. A aplicacao π : G → ΦiS(H) e sobrejetora.

Demonstracao. Sejam L ∈ ΦiS(H) e K a projecao ortogonal sobre KerL. Da Ob-

servacao 3.4.4 se segue que T = L + K e um isomorfismo auto-adjunto. Alem disso,o Lema 4.4.11 mostra que T ∈ Φi

S(H). Como consequencia do Teorema 1.1.18, temosque existe um isomorfismo A = A+ ⊕ A− em L(H) tal que A+ : H+(J ) → H+(T ) eA− : H−(J )→ H−(T ) sao isomorfismos. Sejam

B+(T )(u, v) = 〈TA+u,A+v〉 para u, v ∈ H+(J )

eB−(T )(u, v) = −〈TA−u,A−v〉 para u, v ∈ H−(J ).

E facil ver que B+(T ) e B−(T ) sao formas bilineares definidas positivas. Procedendoanalogamente a prova do Lema 5.1.13, com A± em vez de Q±T , podemos mostrar queexiste um elemento S(T ) ∈ GL(H) tal que (S(T )−1)∗J S(T )−1 = T . Daı,

L = (S(T )−1)∗J S(T )−1 −K = π((S(T )−1)∗,−K).

Logo, π e sobrejetora.

CAPITULO 5. O FLUXO ESPECTRAL 149

Proposicao 5.1.15. A aplicacao π : G → ΦiS(H) e a projecao sobre a base de um

fibrado localmente trivial com fibra π−1(J ).

Demonstracao. Pelo Lema 5.1.13 podemos escolher uma vizinhanca U de J e umaaplicacao % : U → G tal que π% = I|U . Suponhamos que L ∈ U e g ∈ π−1(J ). Entao,se %(L) = (M,K),

L = π%(L) = MJM∗ +K.

Portanto, dado que π(g) = J , de (5.1.4) temos

π(%(L) · g) = Mπ(g)M∗ +K = MJM∗ +K = L. (5.1.11)

Este fato prova que, se L ∈ U e g ∈ π−1(J ), entao %(L) · g ∈ π−1(U). Daı, podemosdefinir

η : U × π−1(J )→ π−1(U)

(L, g) 7→ %(L) · g = ς(%(L), g).

A aplicacao η e contınua, pois % e ς sao contınuas (veja-se (5.1.3)).Observe que a aplicacao

ϑ(g) = (π(g), [%(π(g))]−1 · g) para g ∈ π−1(U)

e contınua e e a inversa de η. De fato, se g ∈ π−1(U) temos

ηϑ(g) = η(π(g), [%(π(g))]−1 · g) = %(π(g)) · [%(π(g))]−1 · g = g.

Alem disso, se (L, g) ∈ U × π−1(J ), de (5.1.11) se segue

ϑη(L, g) = ϑ(%(L) · g) = (π(%(L) · g), [%(π(%(L) · g))]−1 · (%(L) · g))

= (L, [%(L)]−1 · (%(L) · g)) = (L, g).

Por outro lado, de (5.1.11) temos que πη(L, g) = L para todo L ∈ U e g ∈ π−1(J ).Assim, η define uma trivializacao sobre uma vizinhanca de J .

Usando a transitividade da acao, esta trivializacao pode ser transportada a qualqueroperador em Φi

S(H). De fato, fixemos L0 em ΦiS(H). Da sobrejetividade de π podemos

escolher um elemento g0 em G tal que π(g0) = τg0(J ) = L0. Definamos U ′ = τg0(U).Entao, U ′ e uma vizinhanca de L0 e τg0(·) : U → U ′ e um homeomorfismo. SejamL′ ∈ U ′ e g ∈ π−1(J ). Assim, π(g) = J e

τg−10

(L′) ∈ τg−10

(U ′) = τg−10

(τg0(U)) = U ,

isto e, τg−10

(L′) ∈ U . Logo, o Lema 5.1.13 implica que π%(τg−10

(L′)) = τg−10

(L′). Se

%(τg−10

(L′)) = (M ′, K ′), entao

τg−10

(L′) = π%(τg−10

(L′)) = M ′J (M ′)∗ +K ′.

CAPITULO 5. O FLUXO ESPECTRAL 150

Portanto, de (5.1.4) se segue

π(g0 · %(τg−10

(L′)) · g) = πςg0(%(τg−10

(L′)) · g) = τg0π(%(τg−10

(L′)) · g)

= τg0π((M ′, K ′) · g) = τg0(M′π(g)(M ′)∗ +K ′)

= τg0(M′J (M ′)∗ +K ′) = τg0(τg−1

0(L′))

= L′.

Daı, para L′ ∈ U ′ e g ∈ π−1(J ), temos

π(g0 · %(τg−10

(L′)) · g) = L′ e g0 · %(τg−10

(L′)) · g ∈ π−1(U ′). (5.1.12)

Tomemos a aplicacao

η′ : U ′ × π−1(J )→ π−1(U ′)(L′, g) 7→ g0 · %(τg−1

0(L′)) · g.

Provemos que

ϑ′(g) = (π(g), [g0 · %(τg−10

(π(g)))]−1 · g) para g ∈ π−1(U ′)

e a inversa de η. Seja g em π−1(U ′). Assim,

η′ϑ′(g) = η′(π(g), [g0 ·%(τg−10

(π(g)))]−1 ·g) = g0 ·%(τg−10

(π(g))·[g0 ·%(τg−10

(π(g)))]−1 ·g = g.

Agora, se (L′, g) ∈ U ′ × π−1(J ), de (5.1.12) se segue

ϑ′η′(L′, g) = ϑ′(g0 · %(τg−10

(L′)) · g)

= (π(g0 · %τg−10L′ · g), [g0 · %(τg−1

0[π(g0 · %τg−1

0L′ · g)])]−1 · g0 · %τg−1

0L′ · g)

= (L′, [g0 · %(τg−10L′)]−1 · g0 · %τg−1

0L′ · g) = (L′, g).

Portanto, ϑ′ e a inversa de η′. Alem disso, ϑ′ e contınua, pois e composicao de aplicacoescontınuas.

Dado queπ1ϑ

′(g) = π(g) para todo g ∈ π−1(U ′),

a aplicacao ϑ′ define uma trivializacao sobre uma vizinhanca U ′ do operador L0. Emconclusao, π : G → Φi

S(H) e um fibrado localmente trivial com fibra π−1(J ).

Teorema 5.1.16 (Existencia da parametrix cogradiente). Sejam Λ um espaco topologi-co paracompacto e contratil e L = Lλλ∈Λ uma famılia de operadores de Fredholmfortemente indefinidos. Entao, L possui uma parametrix cogradiente.

CAPITULO 5. O FLUXO ESPECTRAL 151

Demonstracao. Se segue da proposicao anterior que a aplicacao π : G → ΦiS(H) e um

fibrado localmente trivial com fibra π−1(J ) e base ΦiS(H). Seja Ξ o subespaco do

produto Λ× G definido por

Ξ = (λ, g) ∈ Λ× G : Lλ = π(g).

Consideremos o pullback L?(π) : Ξ→ Λ induzido por L e π, isto e,

L?(π)(λ, g) = λ para todo (λ, g) ∈ Ξ.

Do Lema 5.1.7 temos que L?(π) e um fibrado localmente trivial com fibra π−1(J ) ebase Λ. Dado que Λ e paracompacto e contratil, se segue da Proposicao 5.1.8 que L?(π)e um fibrado trivial, isto e, existe um homeomorfismo φ : Ξ→ Λ× π−1(J ) tal que

L?(π)(λ, g) = λ = π1φ(λ, g) para todo (λ, g) ∈ Ξ, (5.1.13)

onde π1 : Λ × π−1(J ) → Λ e a projecao sobre a primeira coordenada. Consequente-mente, φ e da forma

φ(λ, g) = (λ, ψ(λ, g)) para (λ, g) ∈ Ξ, (5.1.14)

onde ψ : Ξ→ π−1(J ) e uma aplicacao contınua. Fixemos g0 ∈ π−1(J ) e tomemos

φ−1g0

: Λ→ Ξ

λ 7→ φ−1(λ, g0).

A aplicacao φ−1g0

e contınua, pois φ−1 e contınua. Agora, como φ−1g0

(λ) ∈ Ξ, de (5.1.14)se segue que φ−1

g0(λ) e da forma

φ−1g0

(λ) = (λ,Mλ,Kλ),

onde Mλ ∈ GL(H), Kλ ∈ KS(H) e π(Mλ,Kλ) = Lλ, para todo λ ∈ Λ. E claro queM = Mλλ∈Λ e K = Kλλ∈Λ sao famılias contınuas, pois φ−1

g0e contınua. Ja que

π(Mλ,Kλ) = Lλ para λ ∈ Λ, obtemos que

Lλ = π(Mλ,Kλ) = MλJM∗λ + Kλ,

o que prova o teorema.

5.2 Fluxo espectral de caminhos de operadores de

Fredholm auto-adjuntos

No comeco desta secao apresentaremos a definicao e as propriedades principais do fluxoespectral para caminhos de operadores fortemente indefinidos com extremos inversıveis.

CAPITULO 5. O FLUXO ESPECTRAL 152

A nocao do fluxo espectral se pode estender a caminhos fechados em ΦiS(H) cujos

extremos nao necessariamente sao isomorfismos, como mostraremos mais adiante. Nofinal da secao daremos a definicao para qualquer caminho (fechados ou com extremosinversıveis) de operadores de Fredholm auto-adjuntos.

Denotemos por J o intervalo [a, b]. Observe que J e contratil. De fato, a aplicacao

h : J × [0 , 1]→ J

(x, λ) 7→ x(1− λ) + aλ

e contınua e, alem disso, para todo x ∈ J, h(x, 0) = x e h(x, 1) = a. Por outro lado,dado que J e compacto, entao e paracompacto.

Seja L = Lλλ∈J um caminho de operadores auto-adjuntos fortemente indefinidos.O Teorema 5.1.16 implica que, para cada simetria J ∈ Φi

S(H), L e cogradiente a umcaminho de perturbacoes compactas auto-adjuntas de J . Deste fato temos a seguintedefinicao.

Definicao 5.2.1 (Fluxo espectral). Seja L = Lλλ∈J um caminho de operadores deFredholm auto-adjuntos, fortemente indefinidos e com extremos inversıveis. O fluxoespectral de L no intervalo J e definido por

sf(L, J) =1

2[signJ (J + Kb)− signJ (J + Ka)],

onde J ∈ ΦiS(H) e uma simetria e J + Kλλ∈J e um caminho de perturbacoes com-

pactas auto-adjuntas de J que e cogradiente a L.

Provemos que a definicao acima e independente das escolhas da simetria J e da pa-rametrix. De fato, suponhamos que J e J ′ sejam duas simetrias de H e que Mλλ∈Je M′λλ∈J sejam duas parametrix cogradientes de Lλλ∈J relativas a J e J ′, respec-tivamente. Assim, para λ ∈ J ,

M∗λLλMλ = J + Kλ e (M′λ)∗LλM

′λ = J ′ + K′λ,

onde Kλ e K′λ sao operadores compactos auto-adjuntos. Observe que os caminhosJ + Kλλ∈J e J ′ + K′λλ∈J sao cogradientes. De fato, para λ ∈ J ,

J ′ + K′λ = (M′λ)∗(M∗λ)

−1(J + Kλ)M−1λ M′λ = (M−1

λ M′λ)∗(J + Kλ)M

−1λ M′λ,

Consequentemente,J ′ + K′λ = N∗λ(J + Kλ)Nλ, (5.2.1)

onde Nλ = M−1λ M′λ.

A Proposicao 4.4.16 prova que

1

2[signJ (J + Kb)− signJ (J + Ka)] = µrel(J + Ka,J + Kb). (5.2.2)

CAPITULO 5. O FLUXO ESPECTRAL 153

Da invarianca do ındice de Morse relativo pela acao cogradiente (Proposicao 4.4.14),temos

µrel(J + Ka,J + Kb) = µrel(N∗a(J + Ka)Na,N

∗a(J + Kb)Na). (5.2.3)

Por outro lado, observe que, para cada λ ∈ J , N∗λJNλ e uma perturbacao compactade J ′, pois N∗λJNλ = J ′ + K′λ − N∗λKλNλ. Assim, se λ ∈ J , entao

N∗a(J + Ka)Na − N∗λ(J + Kb)Nλ = J ′ + K′a − N∗λJNλ − N∗λKbNλ

= J ′ + K′a − (J ′ + K′λ − N∗λKλNλ)− N∗λKbNλ

= K′a − K′λ + N∗λKλNλ − N∗λKbNλ.

Logo,N∗a(J + Ka)Na − N∗λ(J + Kb)Nλ

e compacto para cada λ ∈ J . Este fato prova que

(N∗a(J + Ka)Na,N∗λ(J + Kb)Nλ)λ∈J

e um caminho de pares de isomorfismos auto-adjuntos congruentes. Assim, pela conti-nuidade do ındice de Morse relativo (Proposicao 4.4.12), temos

µrel(N∗a(J + Ka)Na,N

∗a(J + Kb)Na) = µrel(N

∗a(J + Ka)Na,N

∗b(J + Kb)Nb). (5.2.4)

Da Proposicao 4.4.16 se segue

µrel(J ′ + K′a,J ′ + K′b) =1

2[signJ ′(J ′ + K′b)− signJ ′(J ′ + K′a)]. (5.2.5)

Dado que N∗a(J + Ka)Na = J ′ + K′a e N∗b(J + Kb)Nb = J ′ + K′b, das igualdades(5.2.2)-(5.2.5) concluımos que

1

2[signJ (J + Kb)− signJ (J + Ka)] =

1

2[signJ ′(J ′ + K′b)− signJ ′(J ′ + K′a)].

Consequentemente, a definicao do fluxo espectral e independente da escolha da simetriae da correspondente escolha da parametrix cogradiente.

Observacao 5.2.2. Observe que, de (5.2.1), a relacao “ser cogradiente a” e transitiva.E facil ver que esta relacao e simetrica e reflexiva, portanto ela define uma relacao deequivalencia.

Definicao 5.2.3. Um caminho de operadores com extremos inversıveis sera chamadode admissıvel.

Vejamos agora algumas propriedades do fluxo espectral. No resto da secao L deno-tara um caminho Lλλ∈J em Φi

S(H) e J o intervalo [a, b].

CAPITULO 5. O FLUXO ESPECTRAL 154

Proposicao 5.2.4 (Normalizacao). Se L e um caminho de isomorfismos, entao

sf(L, J) = 0.

Demonstracao. Seja J +Kλλ∈J um caminho cogradiente a L. E claro que, para todoλ ∈ J , J +Kλ e um isomorfismo, pois e cogradiente ao isomorfismo Lλ. Da Proposicao4.4.16 temos

sf(L, J) =1

2[signJ (J + Kb)− signJ (J + Ka)] = µrel(J + Ka,J + Kb).

Como J + Kλ,J + Kbλ∈J e um caminho de pares de isomorfismos auto-adjuntoscongruentes, a Proposicao 4.4.12 implica que µrel(J + Kλ,J + Kb) e constante paraλ ∈ J . Isto e, para cada λ ∈ J ,

µrel(J + Ka,J + Kb) = µrel(J + Kλ,J + Kb) = µrel(J + Kb,J + Kb) = 0.

Portanto, sf(L, J) = 0.

Em seguida apresentaremos uma das mais importantes propriedades do fluxo es-pectral, isto e, a sua invariacia pela acao cogradiente.

Proposicao 5.2.5 (Invariancia pela acao cogradiente). Seja L um caminho admissıvel.Entao, para qualquer caminho M = Mλλ∈J de operadores em GL(H),

sf(L, J) = sf(M∗LM, J),

onde M∗LM = M∗λLλMλλ∈J .

Demonstracao. Seja J +Kλλ∈J um caminho cogradiente a L. Observe que o caminhoJ + Kλλ∈J tambem e cogradiente a M∗LM. Portanto,

sf(L, J) =1

2[signJ (J + Kb)− signJ (J + Ka)] = sf(M∗LM, J)

pela definicao do fluxo espectral.

Proposicao 5.2.6 (Fluxo espectral para perturbacoes compactas de um operadorfixado). Seja L um caminho admissıvel tal que Lλ − La e compacto para todo λ ∈ J .Entao,

sf(L, J) = µrel(La, Lb). (5.2.6)

Demonstracao. Por hipotese, para cada λ ∈ J , podemos escrever Lλ = La+Kλ, onde Kλe compacto e auto-adjunto. Escolhamos um operador M ∈ GL(H) tal que M∗LaM =J + K, onde K ∈ KS(H) (isto e possıvel aplicando o Teorema 5.1.16 ao caminhoconstante Laλ∈J). Logo,

M∗LλM = J + Cλ,

CAPITULO 5. O FLUXO ESPECTRAL 155

onde Cλ = K + M∗KλM e compacto para todo λ ∈ J . Consequentemente, o caminhoconstante M = Mλ∈J e uma parametrix cogradiente para L. Este fato prova queJ + Cλλ∈J e cogradiente a L. Assim, pela definicao de fluxo espectral,

sf(L, J) = µrel(J + Ca,J + Cb) = µrel(M∗LaM,M

∗LbM).

Dado que µrel(M∗LaM,M

∗LbM) = µrel(La, Lb), entao sf(L, J) = µrel(La, Lb).

Proposicao 5.2.7 (Aditividade). Se o caminho L e admissıvel em [a, c] e em [c, b],entao

sf(L, [a, b]) = sf(L, [a, c]) + sf(L, [c, b]).

Demonstracao. De fato, seja J + Kλλ∈J um caminho cogradiente a L. Entao,

sf(L, [a, c])+ sf(L, [c, b])

=1

2[signJ (J + Kc)− signJ (J + Ka) + signJ (J + Kb)− signJ (J + Kc)]

=1

2[signJ (J + Kb)− signJ (J + Ka)]

= sf(L, [a, b]).

Este fato prova a proposicao.

Para a seguinte proposicao suporemos que H1 e H2 sejam espacos de Hilbert reais,separaveis e de dimensao infinita. Alem disso, consideraremos dois caminhos L1 =L1,λλ∈J e L2 = L2,λλ∈J em Φi

S(H1) e ΦiS(H2), respectivamente, e denotaremos por

(L1, L2) = (L1,λ, L2,λ)λ∈J ⊆ H1 ×H2 o produto direto destes caminhos.

Proposicao 5.2.8 (Fluxo espectral de um produto direto de operadores). Se L1 e L2

sao caminhos admissıveis de operadores de Fredholm auto-adjuntos fortemente indefi-nidos em H1 e H2, respectivamente, entao

sf((L1, L2), J) = sf(L1, J) + sf(L2, J).

Demonstracao. Sejam J1 +K1λλ∈J e J2 +K2λλ∈J caminhos cogradientes a L1 e L2,respectivamente. Assim, existem dois caminhos M1 = M1λλ∈J e M2 = M2λλ∈J emGL(H1) e GL(H2), respectivamente, tais que, para cada λ ∈ J ,

M1λ∗L1λM1λ = J1 + K1λ e M2λ

∗L2λM2λ = J2 + K2λ.

De (3.2.1) temos a relacao seguinte para caminhos de operadores em H1 e H2:

(M1λ,M2λ)∗(L1λ, L2λ)(M1λ,M2λ) = (M1λ

∗,M2λ∗)(L1λ, L2λ)(M1λ,M2λ)

= (M1λ∗L1λM1λ,M2λ

∗L2λM2λ)

= (J1 + K1λ,J2 + K2λ)

= (J1,J2) + (K1λ,K2λ).

CAPITULO 5. O FLUXO ESPECTRAL 156

Este fato prova que (J1,J2) + (K1λ,K2λ)λ∈J e cogradiente ao caminho de operadores(L1λ, L2λ)λ∈J .

Em (4.2.11) provamos que (J1,J2) e uma simetria. De (3.2.1) temos que (K1λ,K2λ)e auto-adjunto. Assim, (K1λ,K2λ) e compacto e auto-adjunto. Consequentemente, dadefinicao do fluxo espectral e da Proposicao 4.2.11, temos

sf((L1, L2), J)

=1

2[sign(J1,J2)((J1,J2) + (K1b,K2b))− sign(J1,J2)((J1,J2) + (K1a,K2a))]

=1

2[signJ1(J1 + K1b) + signJ2(J2 + K2b)− (signJ1(J1 + K1a) + signJ2(J2 + K2a))]

=1

2[signJ1(J1 + K1b)− signJ1(J1 + K1a) + signJ2(J2 + K2b)− signJ2(J2 + K2a)]

= sf(L1, J) + sf(L2, J).

Isto e, sf((L1, L2), J) = sf(L1, J) + sf(L2, J).

Uma propriedade importante do fluxo espectral e a invariancia homotopica. Apre-sentaremos aqui esta propriedade em varias versoes. Primeiramente, observamos que[0, 1]× J e contratil. De fato, a aplicacao

h : [0, 1]× J × [0, 1]→ [0, 1]× J (x, y, λ) 7→ (x(1− λ), y(1− λ) + aλ)

e contınua e, alem disso, para todo (x, y) ∈ [0, 1]× J, temos

h(x, y, 0) = (x, y) e h(x, y, 1) = (0, a).

Teorema 5.2.9 (Invariancia homotopica). Seja

L = L(s,λ)(s,λ)∈[0,1]×J

uma famılia de operadores em ΦiS(H) tal que, para cada s ∈ [0, 1], o caminho L(s,·) =

L(s,λ)λ∈J e admissıvel. Entao, sf(L(s,·), J) e independente de s.

Demonstracao. Dado que [0, 1] × J e compacto e contratil, o Teorema 5.1.16 implicaque podemos escolher uma parametrix M = M(s,λ)(s,λ)∈[0,1]×J relativa a J para L.Logo,

M∗(s,λ)L(s,λ)M(s,λ) = J + K(s,λ), onde K(s,λ) ∈ KS(H) para (s, λ) ∈ [0, 1]× J.

Dado s ∈ [0, 1], tomemos M(s,·) = M(s,λ)λ∈J . Da definicao do fluxo espectral e daProposicao 4.4.16 temos que, para cada s ∈ [0, 1],

sf(L(s,·), J) = sf(M∗(s,·)L(s,·)M(s,·), J) = µrel(M∗(s,a)L(s,a)M(s,a),M

∗(s,b)L(s,b)M(s,b)).

CAPITULO 5. O FLUXO ESPECTRAL 157

Ja que, para cada s ∈ [0, 1], M∗(s,a)L(s,a)M(s,a) e M∗(s,b)L(s,b)M(s,b) sao isomorfismosauto-adjuntos congruentes, a Propoposicao 4.4.12 mostra que

µrel(M∗(s,a)L(s,a)M(s,a),M

∗(s,b)L(s,b)M(s,b))

e constante em [0, 1]. Este fato prova que sf(L(s,·), J) e independente de s.

A seguinte propriedade e uma outra versao da invariancia homotopica do fluxoespectral, neste caso para caminhos cujos extremos sao cogradientes.

Teorema 5.2.10 (Invariancia homotopica de caminhos com extremos cogradientes).Seja L = L(s,λ)(s,λ)∈[0,1]×J uma famılia de operadores em Φi

S(H) tal que os cami-nhos L(0,·) = L(0,λ)λ∈J e L(1,·) = L(1,λ)λ∈J sao admissıveis e os caminhos L(·,a) =L(s,a)s∈[1, 0] e L(·,b) = L(s,b)s∈[1, 0] sao cogradientes. Entao,

sf(L(0,·), J) = sf(L(1,·), J).

Demonstracao. Escolhamos uma parametrix M = M(s,λ)(s,λ)∈[0,1]×J relativa a J paraL. Sejam M(·,a) = M(s,a)s∈[1, 0] e M(·,b) = M(s,b)s∈[1, 0]. Dado que, por hipotese, oscaminhos L(·,a) e L(·,b) sao cogradientes e admissıveis, temos que

M∗(s, a)L(s, a)M(s, a) = J + K(s, a)s∈[0, 1] e M∗(s, b)L(s, b)M(s, b) = J + K(s, b)s∈[0, 1]

sao caminhos cogradientes admissıveis. Assim, a invariancia do fluxo espectral pelaacao cogradiente implica que

sf(M∗(·, a)L(·, a)M(·, a), [0 , 1]) = sf(M∗(·, b)L(·, b)M(·, b), [0 , 1]).

Pela definicao do fluxo espectral, esta igualdade pode ser expressada como

signJ (J + K(1, a))− signJ (J + K(0, a)) = signJ (J + K(1, b))− signJ (J + K(0, b)).

Assim,

signJ (J + K(0, b))− signJ (J + K(0, a)) = signJ (J + K(1, b))− signJ (J + K(1, a)),

isto e,sf(J + K(0,·), J) = sf(J + K(1,·), J).

Portanto, sf(L(0,·), J) = sf(L(1,·), J).

O teorema acima nos leva a estender a definicao do fluxo espectral a caminhosfechados (La = Lb) sem qualquer hipotese sobre inversibilidade dos extremos, comoveremos na proxima definicao.

CAPITULO 5. O FLUXO ESPECTRAL 158

Definicao 5.2.11 (Fluxo espectral para caminhos fechados). Sejam L um caminhofechado em Φi

S(H) e K um operador compacto auto-adjunto tal que La +K = Lb +Ke inversıvel. O fluxo espectral de L e dado por

sf(L, J) = sf(L +K, J), (5.2.7)

onde L +K = Lλ +Kλ∈J .

Como vimos na Observacao 3.4.4, para qualquer operador de Fredholm auto-adjuntoL, podemos escolher um operador compacto auto-adjunto K tal que L + K e umisomorfismo auto-adjunto. Provemos que a definicao acima e independente da escolhado operador K. De fato, sejam L um caminho fechado em Φi

S(H) e K1 e K2 doisoperadores compactos auto-adjuntos tais que La +K1 = Lb +K1 e La +K2 = Lb +K2

sejam inversıveis. Tomemos h : [0, 1]× J → ΦiS(H) definido por

h(s, λ) = Lλ + sK1 + (1− s)K2 para (s, λ) ∈ [0, 1]× J.

Assim, os caminhos

h(0,·) = Lλ +K2λ∈J e h(1,·) = Lλ +K1λ∈J

sao admissıveis. Observe que, como La +K2 = Lb +K2, para todo s ∈ [0, 1],

h(s, a) = La + sK1 + (1− s)K2 = Lb + sK1 + (1− s)K2 = h(s, b),

isto e, h(s, a) = h(s, b) para todo s ∈ [0, 1]. Portanto, o teorema anterior implica que

sf(h(0,·), J) = sf(h(1,·), J).

Logo,sf(L +K2, J) = sf(L +K1, J),

o que prova que a formula (5.2.7) e independente da escolha do operador K.

O fluxo espectral de um caminho fechado tem a propriedade de invariancia ho-motopica por homotopias de caminhos fechados. Este fato e provado na seguinte pro-posicao.

Proposicao 5.2.12 (Propriedade de homotopia livre para caminhos fechados). SejaL = L(s,λ)(s,λ)∈[0,1]×J uma famılia de operadores em Φi

S(H) com a propriedade queL(s,a) = L(s,b) para todo s ∈ [0, 1]. Entao,

sf(L(0,·), J) = sf(L(1,·), J).

CAPITULO 5. O FLUXO ESPECTRAL 159

Demonstracao. Observe que podemos escolher um operador compacto auto-adjuntoK ′, tal que L(0,a) + K ′ e L(1,a) + K ′ sejam inversıveis. De fato, dado que a dimensaodo nucleo de L(0,a) e finita, a projecao ortogonal P sobre Ker L(0,a) e compacta. Alemdisso,

L(0,a) + P e inversıvel.

Agora, L(1,a) +P e um operador de Fredholm auto-adjunto (e a soma de um opera-dor de Fredholm e um operador compacto), portanto seu nucleo tem dimensao finita.Denotemos por Q a projecao ortogonal sobre Ker(L(1,a) + P ).

Vejamos que, para ε > 0 suficientemente pequeno, o operador compacto K ′ =P + εQ tem a propriedade desejada. De fato, como L(0,a) + P e inversıvel, entao, paraε suficientemente pequeno, temos que

L(0,a) +K ′ = L(0,a) + P + εQ e inversıvel.

Por outro lado, dado que Q e a projecao ortogonal sobre Ker(L(1,a) +P ), entao L(1,a) +P+εQ e inversıvel para qualquer ε 6= 0. Consequentemente, para ε > 0 suficientementepequeno,

L(0,a) +K ′ = L(0,a) + P + εQ e L(1,a) +K ′ = L(1,a) + P + εQ (5.2.8)

sao inversıveis, como querıamos provar.Da definicao de sf(L(0,·), J) e sf(L(1,·), J), temos

sf(L(0,·), J) = sf(L(0,·) +K ′, J) e sf(L(1,·) +K ′, J) = sf(L(1,·), J). (5.2.9)

Agora, tomemos a homotopia

h(s,λ) = L(s,λ) +K ′ para 0 6 s 6 1, λ ∈ J.

Ja que, por hipotese, L(s,a) = L(s,b), de (5.2.8) se segue que os caminhos h(0,·) =h(0,λ)λ∈J e h(1,·) = h(1,λ)λ∈J sao admissıveis. Alem disso,

h(s,a) = L(s,a) +K ′ = L(s,b) +K ′ = h(s,b) para todo s ∈ [0, 1].

Logo, o Teorema 5.2.10 implica que

sf(h(0,·), J) = sf(h(1,·), J).

Portanto, de (5.2.9) obtemos

sf(L(0,·), J) = sf(L(0,·) +K ′, J) = sf(h(0,·), J) = sf(h(1,·), J) = sf(L(1,·) +K ′, J)

= sf(L(1,·), J),

o que prova a proposicao.

CAPITULO 5. O FLUXO ESPECTRAL 160

5.3 Fluxo espectral para caminhos gerais de opera-

dores de Fredholm auto-adjuntos

Na secao anterior definimos o fluxo espectral para caminhos em ΦiS(H), onde H e um

espaco de Hilbert real separavel de dimensao infinita. Veremos nesta secao que estadefinicao pode ser estendida a caminhos que estao nas outras duas componentes deΦS(H), isto e, para caminhos em Φ+

S (H) e Φ−S (H), e inclusive para o caso em queH tem dimensao finita. Mostraremos que o fluxo espectral para caminhos gerais emΦS(H) satisfaz as propriedades apresentadas na secao anterior. Provaremos que o fluxoespectral para um caminho L = Lλλ∈J em Φ+

S (H) coincide com a diferencia entre osındices de Morse de La e Lb.

Nesta secao H denotara um espaco de Hilbert real separavel de dimensao finita ouinfinita.

Para definir o fluxo espectral para caminhos em ΦS(H), vejamos primeiro a seguinteconstrucao. Fixemos um espaco de Hilbert real separavel de dimensao infinita auxiliarH0. Tomemos o espaco de Hilbert

H = H0 ×H ×H0,

dotado do o produto interno

〈(u1, v1, w1), (u2, v2, w2)〉 = 〈u1, u2〉0 + 〈v1, v2〉+ 〈w1, w2〉0,

onde (u1, v1, w1), (u2, v2, w2) ∈ H, e 〈·, ·〉0 e 〈·, ·〉 sao os produtos internos em H0 e H,respectivamente. Observe que a soma

[H0 × 0 × 0]⊕ [0 ×H × 0]⊕ [0 × 0 ×H0]

e ortogonal.A qualquer operador de Fredholm auto-adjunto L ∈ L(H) associamos o operador

L : H → H definido porL(u, v, w) = (u, L(v),−w),

isto e,L = (IH0 , L,−IH0). (5.3.1)

Nao e difıcil provar que L e limitado.De forma analoga a prova da igualdade dada em (3.2.1) podemos provar que

L∗ = (IH0 , L∗,−IH0).

Assim, dado que L e auto-adjunto, L e auto-adjunto.Por outro lado, como resultado analogo ao Lema 4.2.9, temos

H+(L) = H0×H+(L)×0, H−(L) = 0×H−(L)×H0 e Ker L = 0×KerL×0.

CAPITULO 5. O FLUXO ESPECTRAL 161

Daı,H = H+(L)⊕H−(L)⊕Ker L.

Este fato prova que L e um operador de Fredholm auto-adjunto fortemente indefinido.

Com base na construcao feita acima, obtemos a seguinte definicao.

Definicao 5.3.1 (Fluxo espectral para caminhos em ΦS(H)). Seja L = Lλλ∈J umcaminho admissıvel ou fechado em ΦS(H). Para cada Lλ, consideremos o operador

associado Lλ costruıdo acima. O fluxo espectral de L e definido como o fluxo espectraldo caminho Lλλ∈I ⊆ Φi

S(H), isto e,

sf(L, J) = sf( L, J).

No resto desta secao L = Lλλ∈J denotara um caminho admissıvel ou fechado deoperadores em ΦS(H).

Vejamos que, se H tem dimensao infinita e L e um caminho em ΦiS(H), esta nova

definicao coincide com a dada na Definicao 5.2.1. De fato, a Proposicao 5.2.4 implicaque

sf(IH0λ∈J , J) = sf(−IH0λ∈J , J) = 0.

Alem disso, de (5.3.1) e da propriedade do fluxo espectral do produto direto (Proposicao5.2.8), se segue que

sf( L, J) = sf(IH0λ∈J , J) + sf(L, J) + sf(−IH0λ∈J , J) = sf(L, J),

como querıamos provar.

Mostremos agora que a formula (5.2.6) e tambem valida para o caminho L, sempreque Lλ − La seja compacto para todo λ ∈ J .

Proposicao 5.3.2. Suponhamos que, para o caminho L, o operador Lλ− La seja com-pacto para todo λ ∈ J . Entao,

sf(L, J) = µrel(La, Lb). (5.3.2)

Demonstracao. Primeiro, observe que Lλ− La ∈ L(H) tambem e compacto para todoλ ∈ J , pois

Lλ − La = (IH0 − IH0 , Lλ − La,−IH0 + IH0) = (0, Lλ − La, 0).

Consequentemente, da Proposicao 5.2.6 temos

sf( L, J) = µrel( La, Lb). (5.3.3)

CAPITULO 5. O FLUXO ESPECTRAL 162

Vejamos que µrel( La, Lb) = µrel(La, Lb). Dado que H−( Lλ) = 0 ×H−(Lλ)×H0 para

λ = a, b, entao [H−( Lλ)]⊥ = H0 × [H−(Lλ)]

⊥ × 0. Assim,

H−( La) ∩ [H−( Lb)]⊥ = [0 ×H−(La)×H0] ∩ [H0 × [H−(Lb)]

⊥ × 0]= [0 ∩H0]× [H−(La) ∩ [H−(Lb)]

⊥]× [H0 ∩ 0]= 0 × [H−(La) ∩ [H−(Lb)]

⊥]× 0.

Logo, dim(H−( La) ∩ [H−( Lb)]⊥) = dim(H−(La) ∩ [H−(Lb)]

⊥). Analogamente,

H−( Lb) ∩ [H−( La)]⊥ = 0 × [H−(Lb) ∩ [H−(La)]

⊥]× 0.

Portanto, dim(H−( Lb) ∩ [H−( La)]⊥) = dim(H−(Lb) ∩ [H−(La)]

⊥). Daı,

µrel( La, Lb) = dim(H−( La) ∩ [H−( Lb)]⊥)− dim(H−( Lb) ∩ [H−( La)]

⊥)

= dim(H−(La) ∩ [H−(Lb)]⊥)− dim(H−(Lb) ∩ [H−(La)]

⊥)

= µrel(La, Lb).

Consequentemente, a definicao de sf(L, J) = sf( L, J) e a formula (5.3.3) implicam que

sf(L, J) = µrel(La, Lb),

o que prova a proposicao.

As demais propriedades do fluxo espectral que foram provadas na secao anteriorpara caminhos em Φi

S(H), se podem mostrar de forma analoga para caminhos emΦS(H).

No seguinte teorema mostraremos que o fluxo espectral para caminhos admissıveisde operadores essencialmente positivos coincide com a diferenca dos ındices de Morsedos extremos do caminho.

Teorema 5.3.3. Se L e um caminho admissıvel de operadores essencialmente positivos,entao

sf(L, J) = µ(La)− µ(Lb).

Demonstracao. Primeiro provemos que, se S, T e R sao isomorfismos essencialmentepositivos e congruentes, entao

µrel(S, T ) = µrel(S,R) + µrel(R, T ). (5.3.4)

De fato, tomemos R = S + K1 e T = R + K2, onde K1 e K2 pertencem a KS(H). Aconvexidade de Φ+

S (H) implica que S+λK1 ∈ Φ+S (H) para 0 ≤ λ ≤ 1 e R+(λ−1)K2 ∈

Φ+S (H) para 1 ≤ λ ≤ 2. Seja M : [0, 2]→ Φ+

S (H) definido por

Mλ =

S + λK1 se 0 ≤ λ ≤ 1

R + (λ− 1)K2 se 1 ≤ λ ≤ 2.

CAPITULO 5. O FLUXO ESPECTRAL 163

Entao, M e um caminho de operadores de Fredholm essencialmente positivos congruen-tes, tal que M0 = S, M1 = R e M2 = T sao inversıveis. Assim, aplicando a Proposicao5.2.7 para caminhos gerais temos

sf(M, [0, 2]) = sf(M, [0, 1]) + sf(M, [1, 2]).

Logo, como M e um caminho de operadores congruentes, a formula (5.3.2) implica que

µrel(S, T ) = µrel(S,R) + µrel(R, T ).

Alem disso, de (4.4.12) temos que, se T e definido positivo, entao

µrel(S, T ) = µrel(T − (K1 +K2), T ) = µ(T − (K1 +K2)) = µ(S). (5.3.5)

Agora, consideremos os seguintes casos:Caso (i). Suponhamos que os operadores do caminho sejam congruentes. Entao,

de (5.3.2) temossf(L, J) = µrel(La, Lb).

Provemos que, se s > ‖La‖ e se K e a projecao ortogonal sobre H−(La)⊕Ker La, entaoT = La + sK e um isomorfismo definido positivo congruente a La. De fato, e claro quesK e definida positiva em Ker La. Portanto, dado que T coincide com La em H+(La) ecom sK em Ker La, T e definido positivo em H+(La)⊕Ker La. Agora, como s > ‖La‖,temos

〈−Lax, x〉 ≤ ‖La‖‖x‖2 < s‖x‖2 = 〈sx, x〉 para x ∈ H com x 6= 0.

Assim, La + sI e definido positivo.Observe que La + sI coincide com T em H−(La), pois

(La + sI)x = Lax+ sx = Lax+ sKx = Tx para todo x ∈ H−(La).

Logo, T e definido positivo em H−(La). Os fatos acima mostram que T e definidopositivo para s > ‖La‖.

Por outro lado, dado que T e de Fredholm auto-adjunto com KerT = 0, aProposicao 3.4.1 implica que T e um isomorfismo. Em conclusao, T e um isomorfismodefinido positivo congruente a La.

Como, por hipotese, La e Lb sao congruentes, entao T e congruente a Lb. De (5.3.4)e (5.3.5) temos

sf(L, J) = µrel(La, Lb) = µrel(La, T ) + µrel(T, Lb)

= µrel(La, T )− µrel(Lb, T )

= µ(La)− µ(Lb).

CAPITULO 5. O FLUXO ESPECTRAL 164

Assim, no primeiro caso a proposicao e provada.Caso(ii). Suponhamos que os extremos do caminho sejam isomorfismos definidos

positivos. Neste caso devemos provar que sf(L, I) = 0, pois µ(La) = µ(Lb) = 0.Consideremos a homotopia

h(s, λ) = sLλ + (1− s)I, 0 ≤ s ≤ 1, a ≤ λ ≤ b.

Da convexidade de Φ+S (H) temos que h(s, λ) ∈ Φ+

S (H) para 0 ≤ s ≤ 1, a ≤ λ ≤ b.Alem disso, dado que o conjunto dos isomorfismos auto-adjuntos definidos positivos econvexo (Corolario 3.4.8), se segue que, para cada s ∈ [0, 1],

h(s, a) = sLa + (1− s)I e h(s, b) = sLb + (1− s)I

sao isomorfismos definidos positivos (La e Lb sao isomorfismos definidos positivos porhipotese). Assim, h e uma homotopia de caminhos admissıveis entre L e o caminhoconstante Iλ∈J . Pela Proposicao 5.2.4 e o Teorema 5.2.9, temos

sf(L, J) = sf(Iλ∈J , J) = 0.

Finalmente consideramos o caso geral. Como se provou acima, existem operadoresauto-adjuntos compactos Ka e Kb tais que La+Ka e Lb+Kb sao isomorfismos definidospositivos. Para 0 ≤ t ≤ 1, definamos

At = La + (1− t)Ka e Bt = Lb + tKb.

Pela convexidade de Φ+S (H), temos que At e Bt pertencem a Φ+

S (H) para 0 ≤ t ≤ 1.

E claro que A = Att∈[0,1] e B = Btt∈[0,1] sao caminhos de operadores congruentes.Portanto, do primeiro caso se segue

sf(A, [0, 1]) = µ(A0)− µ(A1) = µ(La +Ka)− µ(La) (5.3.6)

esf(B, [0, 1]) = µ(B0)− µ(B1) = µ(Lb)− µ(Lb +Kb). (5.3.7)

Seja C : [0, 1]→ Φ+S (H) definido por

Ct =

A3t se 0 ≤ t ≤ 1/3

L(3t−1)b+(2−3t)a se 1/3 ≤ t ≤ 2/3B3t−2 se 2/3 ≤ t ≤ 1.

Entao, C e contınua t e

C0 = La +Ka, C1/3 = La, C2/3 = Lb e C1 = Lb +Kb,

CAPITULO 5. O FLUXO ESPECTRAL 165

isto e, C e um caminho em Φ+S (H) com extremos definidos positivos. Logo, pelo se-

gundo caso considerado, seu fluxo espectral e zero. Pela aditividade do fluxo espectral,temos que

0 = sf(C, [0, 1])

= sf(C, [0, 1/3]) + sf(C, [1/3, 2/3]) + sf(B, [2/3, 1])

= sf(A, [0, 1]) + sf(L, [a, b]) + sf(B, [0, 1]).

Agora, dado que µ(La +Ka) = µ(Lb +Kb) = 0, de (5.3.6) e (5.3.7) se segue

sf(L, [a, b]) = − sf(A, [0, 1])− sf(B, [0, 1])

= µ(La)− µ(La +Ka)− (µ(Lb)− µ(Lb +Kb))

= µ(La)− µ(Lb),

o que prova o teorema.

Como consequencia do teorema anterior temos o seguinte corolario.

Corolario 5.3.4. Se L e um caminho admissıvel de operadores essencialmente negati-vos, entao

sf(L, J) = µ(−Lb)− µ(−La).

Demonstracao. De fato, e facil ver que, para um caminho admissıvel T de operadoresde operadores de Fredholm auto-adjuntos fortemente indefinidos,

sf(T, J) = − sf(−T, J).

Agora, dado que −Lλλ∈J e um caminho admissıvel de operadores de Fredholm auto-adjuntos essencialmente positivos, se segue da teorema anterior que

sf(−L, J) = µ(−La)− µ(−Lb).

Consequentemente,

sf(L, J) = − sf(−L, J) = −(µ(−La)− µ(−Lb)) = µ(−Lb)− µ(−La),

isto e, sf(L, J) = µ(−Lb)− µ(−La).

Por ultimo vejamos o caso em que H tem dimensao finita.

Proposicao 5.3.5. Se L e um caminho de operadores auto-adjuntos em um espaco deHilbert de dimensao finita H, entao

sf(L, J) = µ(La)− µ(Lb).

CAPITULO 5. O FLUXO ESPECTRAL 166

Demonstracao. E claro que L e um caminho de operadores dois a dois congruentes.Consequentemente, da Proposicao 5.3.2 obtemos

sf(L, J) = µrel(La, Lb).

Como H−(La) e H−(Lb) tem dimensao finita, do Lema 4.4.8 se segue

µrel(La, Lb) = dim(H−(La) ∩H−(Lb)⊥)− dim(H−(Lb) ∩H−(La)

⊥) = µ(La)− µ(Lb).

Em conclusao, sf(L, J) = µ(La)− µ(Lb).

5.4 Fluxo espectral em pontos singulares isolados

Para um caminho de operadores de Fredholm auto-adjuntos L = Lλλ∈J , o conjuntosingular de L e definido como

Σ(L) = λ ∈ J : Lλ nao e inversıvel.

Nesta ultima parte do trabalho definiremos o fluxo espectral para caminhos de ope-radores de Fredholm auto-adjuntos em um ponto λ0 ∈ J que seja isolado no seuconjunto singular.

Dado um caminho L em ΦS(H), consideremos um ponto interior λ0 de J isoladoem Σ(L). Para este ponto singular isolado definimos o fluxo espectral de L atraves deλ0 por

sf(L, λ0) = limδ→0

sf(L, [λ0 − δ, λ0 + δ]). (5.4.1)

Observe que este limite existe sempre que λ0 seja um ponto interior de J e isolado emΣ(L). De fato, se λ0 e isolado em Σ(L), existe ε > 0 tal que Lλ e inversıvel para todoλ ∈ [λ0− ε, λ0 + ε] e λ 6= λ0. Assim, para qualquer 0 < δ < ε, o caminho L e admissıvelnos intervalos [λ0− ε, λ0− δ], [λ0− δ, λ0 + δ] e [λ0 + δ, λ0 + ε], pois Lλ e inversıvel paraλ ∈ λ0 − ε, λ0 − ε, λ0 + δ, λ0 − ε. Se segue da Proposicao 5.2.7 que

sf(L, [λ0−ε, λ0 + ε])

= sf(L, [λ0 − ε, λ0 − δ]) + sf(L, [λ0 − δ, λ0 + δ]) + sf(L, [λ0 + δ, λ0 + ε]).

Como Lλ e inversıvel para todo λ em [λ0 − ε, λ0 − δ] ∪ [λ0 + δ, λ0 + ε], da propriedadede normalizacao do fluxo espectral (Proposicao 5.2.4), temos que

sf(L, [λ0 − ε, λ0 − δ]) = sf(L, [λ0 + δ, λ0 + ε]) = 0.

Assim, sf(L, [λ0 − ε, λ0 + ε]) = sf(L, [λ0 − δ, λ0 + δ]) para todo 0 < δ < ε. Este fatoprova a existencia do limite em (5.4.1).

Veremos algumas propriedades que possui o fluxo espectral um ponto λ0 de Σ(L)quando o caminho L e continuamente diferenciavel. Para este fim, primeiro vejamos osseguintes conceitos.

CAPITULO 5. O FLUXO ESPECTRAL 167

Definicao 5.4.1. Sejam E e F espacos de Banach e U um subconjunto aberto de E.Consideremos uma aplicacao f : U → F e x0 ∈ U . Dizemos que que f e diferenciavel1

em x0 se existem um operador linear contınuo Mx0 : E → F e uma aplicacao r : U0 → Fdefinida em uma vizinhaca suficientemente pequena U0 de 0 ∈ E, com valores em F ,tais que, para h ∈ E, com norma suficientemente pequena,

f(x0 + h)− f(x0) = Mx0(h) + r(h) e limh→0

r(h)

‖h‖= 0. (5.4.2)

Denotaremos por f ′(x0) o operador Mx0 e o chamaremos de diferencial de f no pontox0. Dizemos que f e de classe C1, ou continuamente diferenciavel, se f ′(x) existe paratodo x ∈ U e a aplicacao f ′ : U → L(E,F ) definida por x 7→ f ′(x) e contınua.

Podemos ver uma apresentacao detalhada da nocao anterior e das suas propriedadesem, por exemplo, [18], Capıtulo XIII, § 2.

Observacao 5.4.2. Seja f : J → F um caminho contınuamente diferenciavel. Entao,dado que seu diferencial f ′(λ0) : R→ F em um ponto interior λ0 de J e um operadorlinear de R em F , obtemos que

f ′(λ0)(λ) = λf ′(λ0)(1) para todo λ ∈ R.

Assim, abusando um pouco da notacao, podemos identificar o operador f ′(λ0) com oelemento f ′(λ0)(1) de F .

Definicao 5.4.3. O operador f ′(λ0)(1) da observacao anterior sera denotado por f(λ0).

No resto do trabalho, L = Lλλ∈J ⊆ ΦS(H) denotara um caminho continuamentediferenciavel.

Definicao 5.4.4. A um ponto λ0 de Σ(L) associamos a forma quadratica Q(L, λ0) noKer Lλ0 definida pela restricao da forma 〈 Lλ0h, h〉 a Ker Lλ0 , isto e,

Q(L, λ0)(h) = 〈 Lλ0h, h〉 para h ∈ Ker Lλ0 . (5.4.3)

A forma Q(L, λ0) sera chamada de forma crossing de L em λ0.

Seja λ0 um ponto de Σ(L). Dizemos Q(L, λ0) e nao degenerada se a restricaoP Lλ0P |Ker Lλ0

e injetora, onde P e a projecao ortogonal sobre o nucleo de Lλ0 . Seλ0 e isolado em Σ(L) e Q(L, λ0) e nao degenerada, λ0 sera chamado de ponto singularregular de L.

Finalizaremos o trabalho provando que, se λ0 e um ponto singular regular de L,entao

sf(L, λ0) = signQ(L, λ0) = sign(P Lλ0P |Ker Lλ0).

Para este fim, primeiro mostraremos a diferenciabilidade de algumas aplicacoes queserao consideradas nesta prova.

1E o classico conceito de diferenciabilidade segundo Frechet.

CAPITULO 5. O FLUXO ESPECTRAL 168

Teorema 5.4.5. A aplicacao

L : GL(H)→ GL(H)

L 7→ L−1

e continuamente diferenciavel.

Demonstracao. Fixemos L ∈ GL(H). Da continuidade de L, que foi provada no Lema1.1.9, temos que, para T ∈ L(H) com norma suficientemente pequena, o operador(L + T )−1 existe. E claro que T 7→ −L−1TL−1 define um operador linear limitado deL(H) em L(H). Tomemos r : L(H)→ L(H) dado por

r(T ) = L−1TL−1 + L(L+ T )− L(L)

e mostremos que

limT→0

r(T )

‖T‖= 0. (5.4.4)

De fato, de (1.1.1) obtemos que

L(L+ T )− L(L) = (L+ T )−1 − L−1 = −(L+ T )−1TL−1.

Assim,

‖r(T )‖‖T‖

=‖L−1TL−1 − (L+ T )−1TL−1‖

‖T‖≤ ‖L

−1 − (L+ T )−1‖‖T‖‖L−1‖‖T‖

= ‖L−1 − (L+ T )−1‖,

o que mostra o limite em (5.4.4). Os fatos acima provam que L e diferenciavel emL e que L′(L)(T ) = −L−1TL−1 para T ∈ L(H). Nao e difıcil provar que L 7→L′(L), para L ∈ GL(H), e uma aplicacao contınua. Em conclusao, L e continuamentediferenciavel.

Considerando LS(H) como subespaco topologico de L(H), GL+S (H) e um subcon-

junto aberto de LS(H) (Proposicao 3.4.9). Provaremos que existe uma vizinhancaU0 ⊆ GL+

S (H) do operador identidade tal que a aplicacao raiz quadrada e continua-mente diferenciavel em U0. Para provar este fato, precisaremos do Teorema da aplicacaoinversa, cuja prova se pode ver, por exemplo, em [18], pag. 361, Teorema 1.2. Antesde apresentar o Teorema da aplicacao inversa vejamos a seguinte definicao.

Definicao 5.4.6. Suponhamos que E e F sejam espacos de Banach e U seja umsubconjunto aberto de E. Seja f : U → F uma aplicacao continuamente diferenciavel.Dizemos que f e um isomorfismo C1 sobre a imagem f(U), se f(U) e um subconjuntoaberto de F e se existe uma aplicacao g : f(U) → U continuamente diferenciavel talque g f e f g sao as aplicacoes identidades em U e f(U), respectivamente. Dizemosque f : U → F e um difeomorfismo local C1 em um ponto x0 ∈ U se existe umsubconjunto aberto U0 ⊆ U tal que x0 ∈ U0 e a restricao de f a U0 e um isomorfismocontinuamente diferenciavel.

CAPITULO 5. O FLUXO ESPECTRAL 169

Para o seguinte teorema, E e F denotarao espacos de Banach.

Teorema 5.4.7 (Teorema da aplicacao inversa). Seja U um subconjunto aberto de Ee seja f : U → F uma aplicacao continuamente diferenciavel. Tomemos x0 ∈ U eassumamos que f ′(x0) ∈ L(E,F ) seja um isomorfismo. Entao, f e um difeomorfismolocal C1 em x0.

Lema 5.4.8. A aplicacao

C : GL+S (H)→ GL+

S (H)

L 7→ L2

e continuamente diferenciavel e, alem disso,

C ′(L)T = LT + TL

para L ∈ GL+S (H) e T ∈ LS(H).

Demonstracao. E claro que C e contınua. Fixemos L ∈ GL+S (H). E claro que T 7→

LT + TL, para T ∈ LS(H), define um operador linear contınuo de LS(H) em LS(H).Agora, tomando r(T ) = T 2 para T ∈ LS(H), obtemos que

limT→0

r(T )

‖T‖= 0

e

C(L+ T )− C(L) = (L+ T )2 − L2 = L2 + LT + TL+ T 2 − L2 = LT + TL+ r(T ).

Portanto, C ′(L)T = LT+TL para L ∈ GL+S (H) e T ∈ LS(H). E facil ver que L 7→ C ′(L)

e contınua. Assim, C e continuamente diferenciavel.

Como consequencia do Teorema da aplicacao inversa e do lema anterior temos aseguinte proposicao.

Proposicao 5.4.9. A aplicacao

R : GL+S (H)→ GL+

S (H)

L 7→ L1/2

e continuamente diferenciavel em uma vizinhanca aberta da identidade.

Demonstracao. Observe que a aplicacao C definida no lema anterior e a inversa daaplicacao R. De fato, para L ∈ GL+

S (H), temos

RC(L) = R(L2) = L = C(L1/2) = CR(L),

CAPITULO 5. O FLUXO ESPECTRAL 170

pois L e definido positivo. Se segue do Lema 5.4.8 que

C ′(I)T = 2T para todo T ∈ LS(H).

E claro que C ′(I) e um isomorfismo. Como consequencia do Teorema da aplicacaoinversa, existe uma vizinhanca aberta U0 ⊆ GL+

S (H) de I tal que R : U0 → GL+S (H)

e continuamente diferenciavel, como querıamos provar.

Lema 5.4.10. Se α : J → L(H) e β : J → L(H) sao duas aplicacoes continuamentediferenciaveis, entao (αβ)(λ) = α(λ)β(λ) : J → L(H) e continuamente diferenciavele, alem disso, para λ ∈ J e v ∈ R,

(αβ)′(λ)v = α(λ)[β′(λ)v] + [α′(λ)v]β(λ).

Podemos ver uma prova do lema anterior, por exemplo, em [18], pag. 336.

Em conclusao do trabalho, apresentaremos um resultado (Teorema 5.4.14) que mos-tra a conexao entre a forma crossing e o fluxo espectral atraves de um ponto singularisolado. Antes de enunciar o teorema, precisamos de alguns resultados preliminares.

Observacao 5.4.11. Observe que, se L e um operador auto-adjunto com ‖L‖ < 1,entao I − L e um isomorfismo definido positivo. De fato, se segue do Teorema 1.1.7que I − L e um isomorfismo. Por outro lado, se x ∈ H com ‖x‖ = 1, temos

〈x, x〉 > ‖L‖ = sup‖z‖=1

|〈Lz, z〉| ≥ 〈Lx, x〉,

isto e, 〈(I − L)x, x〉 > 0 para todo x ∈ H com ‖x‖ = 1. Consequentemente, I − L edefinido positivo.

Teorema 5.4.12. Sejam P = Pλλ∈J um caminho continuamente diferenciavel deprojecoes ortogonais e λ0 um ponto interior de J . Entao, existem um intervalo Jδque contem λ0 e um caminho continuamente diferenciavel U = Uλλ∈Jδ de operadoresortogonais, tais que

Uλ0 = I e UλPλU−1λ = Pλ0 para todo λ ∈ Jλ0 .

Demonstracao. Fixemos λ0 no interior de J . Para λ ∈ J, tomemos

Rλ = (Pλ0 − Pλ)2 = Pλ0 + Pλ − Pλ0Pλ − PλPλ0 .

Entao,

RλPλ0 = (Pλ0 + Pλ − Pλ0Pλ − PλPλ0)Pλ0 = Pλ0Pλ0 + PλPλ0 − Pλ0PλPλ0 − PλPλ0Pλ0= Pλ0 − Pλ0PλPλ0 = Pλ0 + Pλ0Pλ − Pλ0Pλ − Pλ0PλPλ0= Pλ0(Pλ0 + Pλ − Pλ0Pλ − PλPλ0) = Pλ0Rλ.

CAPITULO 5. O FLUXO ESPECTRAL 171

Analogamente,RλPλ = PλRλ.

Como o caminho P e contınuo, existe δ > 0 tal que

‖Rλ‖ = ‖(Pλ0 − Pλ)2‖ < 1 para |λ− λ0| < δ.

Denotemos por Jδ o intervalo (λ0−δ, λ0+δ). Dado que Rλ e auto-adjunto e ‖Rλ‖ < 1para λ ∈ Jδ, da Observacao 5.4.11 se segue que I −RλJδ e um caminho de isomorfis-mos definidos positivos. Assim, existe a raiz quadrada do operador I−Rλ para λ ∈ Jδ.Pela Proposicao 5.4.9 podemos supor (diminuindo o intervalo Jδ se for necessario) que(I −Rλ)

1/2λ∈Jδ e continuamente diferenciavel. Tomemos

Uλ = (PλPλ0 + (I − Pλ)(I − Pλ0))(I −Rλ)−1/2 para λ ∈ Jδ.

Ja que o caminho P e continuamente diferenciavel, o Lema 5.4.10, o Teorema 5.4.5 ea Proposicao 5.4.9 implicam que o caminho U : Jδ → L(H), definido por U(λ) = Uλ,e continuamente diferenciavel. Alem disso,

Uλ0 = (Pλ0Pλ0 + (I − Pλ0)(I − Pλ0))(I − (Pλ0 − Pλ0)2)−1/2 = (Pλ0 + I − Pλ0)−1/2 = I.

Provemos que Uλ e ortogonal para λ ∈ Jδ. De fato, dado que Pλ e Pλ0 sao projecoesortogonais, segue-se

U∗λ = [(PλPλ0 + (I − Pλ)(I − Pλ0))(I − (Pλ0 − Pλ)2)−1/2]∗

= [(I − (Pλ0 − Pλ)2)−1/2]∗[(PλPλ0 + (I − Pλ)(I − Pλ0))]∗

= [(I − (Pλ0 − Pλ)2)∗]−1/2[(PλPλ0)∗ + ((I − Pλ)(I − Pλ0))∗]

= (I − (Pλ0 − Pλ)2)−1/2(Pλ0Pλ + (I − Pλ0)(I − Pλ))= (I −Rλ)

−1/2(Pλ0Pλ + (I − Pλ0)(I − Pλ)).

Tomemos

U ′λ = PλPλ0 + (I − Pλ)(I − Pλ0) e U ′′λ = Pλ0Pλ + (I − Pλ0)(I − Pλ).

Assim,

U ′′λU′λ = (Pλ0Pλ + (I − Pλ0)(I − Pλ))(PλPλ0 + (I − Pλ)(I − Pλ0))

= Pλ0Pλ(Pλ0 + (I − Pλ)(I − Pλ0)) + (I − Pλ0)(I − Pλ)(PλPλ0 + (I − Pλ0))= Pλ0PλPλ0 + (I − Pλ0)(I − Pλ)(I − Pλ0)= Pλ0PλPλ0 + (I − Pλ − Pλ0 + Pλ0Pλ + PλPλ0 − Pλ0PλPλ0)= I − Pλ0 − Pλ + Pλ0Pλ + PλPλ0= I − (Pλ0 − Pλ)2

= I −Rλ.

CAPITULO 5. O FLUXO ESPECTRAL 172

Analogamente,U ′λU

′′λ = I −Rλ.

Portanto,

U∗λUλ = (I −Rλ)−1/2U ′′λU

′λ(I −Rλ)

−1/2 = (I −Rλ)−1/2(I −Rλ)(I −Rλ)

−1/2 = I.

Observe que Pλ e Pλ0 comutam com (I −Rλ)−1. De fato, como Pλ e Pλ0 comutam

com Rλ, entao

(I −Rλ)Pλ = Pλ(I −Rλ)

(I −Rλ)−1(I −Rλ)Pλ(I −Rλ)

−1 = (I −Rλ)−1Pλ(I −Rλ)(I −Rλ)

−1

Pλ(I −Rλ)−1 = (I −Rλ)

−1Pλ

e

(I −Rλ)Pλ0 = Pλ0(I −Rλ)

Pλ0(I −Rλ)−1 = (I −Rλ)

−1Pλ0 .

Daı,

UλU∗λ = U ′λ(I −Rλ)

−1/2(I −Rλ)−1/2U ′′λ

= [PλPλ0 + (I − Pλ)(I − Pλ0)](I −Rλ)−1[Pλ0Pλ + (I − Pλ0)(I − Pλ)]

= (I −Rλ)−1[PλPλ0 + (I − Pλ)(I − Pλ0)][Pλ0Pλ + (I − Pλ0)(I − Pλ)]

= (I −Rλ)−1(I −Rλ)

= I.

Consequentemente, U e um caminho de operadores ortogonais.Por ultimo, vejamos que UλPλU

∗λ = Pλ0 para todo λ ∈ Jδ. Dado que Pλ comuta

com (I − Rλ)−1, o Teorema 3.3.14 implica que Pλ comuta com (I − Rλ)

−1/2. Alemdisso,

U ′′λPλ = (Pλ0Pλ + (I − Pλ0)(I − Pλ))Pλ = Pλ0(Pλ0Pλ + (I − Pλ0)(I − Pλ)) = Pλ0U′′λ .

Portanto, como Pλ0 comuta com (I −Rλ)−1/2, entao

U∗λPλUλ = (I −Rλ)−1/2U ′′λPλU

′λ(I −Rλ)

−1/2

= (I −Rλ)−1/2Pλ0U

′′λU′λ(I −Rλ)

−1/2

= Pλ0(I −Rλ)−1/2U ′′λU

′λ(I −Rλ)

−1/2

= Pλ0(I −Rλ)−1/2(I −Rλ)(I −Rλ)

−1/2

= Pλ0 ,

o que prova o teorema.

CAPITULO 5. O FLUXO ESPECTRAL 173

Teorema 5.4.13. Seja L = Lλλ∈J um caminho de operadores em ΦS(H). Supo-nhamos que exista um intervalo fechado [c, d] tal que nem c nem d pertencam ao espectrode Lλ para λ ∈ J . Entao, para λ ∈ J , existe a projecao Pλ sobre o subespaco espectralde Lλ correspondente a σ(Lλ) ∩ [c, d]. Alem disso, se L e continuamente diferenciavel,P = Pλλ∈J e continuamente diferenciavel.

Demonstracao. Tomemos Γ : [0, 1]→ C, definido por

Γ(t) = (c+ d

2, 0) + (

d− c2

)ei2πt

(a circunferencia com centro em (c+ d

2, 0) e raio

d− c2

). Assim, de (4.3.11) se segue

Pλ = − 1

2πi

∫Γ

(Lλ − ζI)−1dζ para λ ∈ J.

No Teorema 4.3.22 mostramos que λ 7→ Pλ e contınua.Suponhamos agora que L seja continuamente diferenciavel e provemos que, para

λ0 ∈ J , Pλ0 e o operador

Bλ0 =1

2πi

∫Γ

(Lλ0 − ζI)−1 Lλ0(Lλ0 − ζI)−1dζ

(a existencia desta integral se deve a que a aplicacao definida por

ζ 7→ (Lλ0 − ζI)−1 Lλ0(Lλ0 − ζI)−1, para ζ ∈ Γ,

e contınua). Seja ε > 0 dado. Tomemos δ > 0 tal que, se |λ− λ0| < δ, entao∥∥∥∥Lλ − Lλ0λ− λ0

− Lλ0

∥∥∥∥ < ε e (Lλ0 − ζI)−1 − (Lλ − ζI)−1 < ε para ζ ∈ Γ.

Consideremos

Aλ = (Lλ − ζI)−1(Lλ − Lλ0)(Lλ0 − ζI)−1 − (λ− λ0)(Lλ0 − ζI)−1 Lλ0(Lλ0 − ζI)−1.

Assim,∥∥∥∥ Aλλ− λ0

∥∥∥∥ =

∥∥∥∥(Lλ − ζI)−1(Lλ − Lλ0)(Lλ0 − ζI)−1

λ− λ0

− (Lλ0 − ζI)−1 Lλ0(Lλ0 − ζI)−1

∥∥∥∥=

∥∥∥∥[(Lλ − ζI)−1(Lλ − Lλ0)

λ− λ0

− (Lλ0 − ζI)−1 Lλ0

](Lλ0 − ζI)−1

∥∥∥∥≤∥∥∥∥(Lλ − ζI)−1

[Lλ − Lλ0λ− λ0

− Lλ0

]+ ((Lλ0 − ζI)−1 − (Lλ − ζI)−1) Lλ0

∥∥∥∥.∥∥(Lλ0 − ζI)−1

∥∥≤ [‖(Lλ − ζI)−1‖+ ‖ Lλ0‖]‖(Lλ0 − ζI)−1‖ε≤ [M + ‖ Lλ0‖]Mε,

CAPITULO 5. O FLUXO ESPECTRAL 174

ondeM = sup

λ∈J, ζ∈Γ‖(Lλ − ζI)−1‖.

Por outro lado, para λ ∈ J , temos

Pλ − Pλ0 = − 1

2πi

∫Γ

(Lλ − ζI)−1dζ +1

2πi

∫Γ

(Lλ0 − ζI)−1dζ

= − 1

2πi

∫Γ

((Lλ − ζI)−1 − (Lλ0 − ζI)−1)dζ

=1

2πi

∫Γ

(Lλ − ζI)−1(Lλ − ζI − Lλ0 + ζI)(Lλ0 − ζI)−1dζ

=1

2πi

∫Γ

(Lλ − ζI)−1(Lλ − Lλ0)(Lλ0 − ζI)−1dζ.

Consequentemente, pelo Lema 4.3.21,∥∥∥∥Pλ − Pλ0λ− λ0

− Bλ0

∥∥∥∥ =

∥∥∥∥ 1

2πi

∫Γ

Aλλ− λ0

∥∥∥∥ ≤ 1

2π[M + ‖ Lλ0‖]Mlε,

onde l e o comprimento de Γ. Em conclusao, Bλ0 = Pλ0 .Por ultimo, vejamos a continuidade de P. Fixemos λ0 em J . Seja ε > 0 dado. Pela

continuidade de λ 7→ (Lλ − ζI)−1 Lλ(Lλ − ζI)−1, para λ ∈ J (λ 7→ Lλ e contınua porhipotese), existe δ > 0 tal que, se |λ− λ0| < δ,

‖(Lλ0 − ζI)−1 Lλ0(Lλ0 − ζI)−1 − (Lλ − ζI)−1 Lλ(Lλ − ζI)−1‖ < ε.

Portanto,

‖Pλ0 − Pλ‖ =

∥∥∥∥ 1

2πi

∫Γ

[(Lλ0 − ζI)−1 Lλ0(Lλ0 − ζI)−1 − (Lλ − ζI)−1 Lλ(Lλ − ζI)−1]dζ

∥∥∥∥≤ 1

2πlε

e a prova e concluıda.

Finalmente, como se tinha falado acima, provaremos que, se λ0 e um ponto singularregular do L, isto e, λ0 e isolado em Σ(L) e a forma crossing Q(L, λ0) e nao degenerada,entao o fluxo espectral de L em λ0 coincide com a assinatura da forma crossing de Lem λ0.

Teorema 5.4.14. Sejam λ0 no interior de J um ponto singular regular de L e Q(L, λ0)a forma crossing de L em λ0. Entao,

sf(L, λ0) = signQ(L, λ0) = sign(Lλ0|Ker Lλ0). (5.4.5)

CAPITULO 5. O FLUXO ESPECTRAL 175

Demonstracao. Como provamos no comeco da secao, dado que, por hipotese, λ0 e iso-lado em Σ(L), entao sf(L, λ0) existe. Alem disso, 0 e isolado em σ(Lλ0) pela Proposicao3.4.3. Portanto, podemos escolher ε > 0 suficientemente pequeno tal que o unico pontono espectro de Lλ0 em [−ε, ε] seja 0 (0 pertence a σ(Lλ0) pois Lλ0 nao e inversıvel). Daı,

Lλ0 − αI e inversıvel para todo α ∈ [−ε, ε]− 0.

Assim, pela continuidade de L, existe ρ > 0 tal que Lλ − εI e Lλ + εI sao inversıveispara λ ∈ Jρ = [λ0 − ρ, λ0 + ρ]. Logo, se λ ∈ Jρ, se segue que ε e −ε nao pertencemao espectro de Lλ. Consequentemente, para λ ∈ Jρ, podemos definir a projecao orto-gonal sobre o subespaco espectral de Lλ correspondente a σ(Lλ)∩ [−ε, ε] (ver Teorema5.4.13). Denotemos por Pλ esta projecao. Como L e continuamente diferenciavel, oTeorema 4.3.22 implica que P = Pλλ∈Jρ e um caminho continuamente diferenciavelde projecoes ortogonais. Do Teorema 5.4.12 temos que existe um intervalo abertoJλ0 ⊆ Jρ que contem λ0 e um caminho continuamente diferenciavel U = Uλλ∈Jλ0 deoperadores ortogonais, tais que

Uλ0 = I e UλPλU−1λ = Pλ0 para todo λ ∈ Jλ0 . (5.4.6)

Se segue da invariancia do fluxo espectral pela acao cogradiente que

sf(L, λ0) = sf(ULU−1, λ0).

Denotemos por H0 o espaco Ker Lλ0 . De (4.3.13) obtemos LλPλ = PλLλ. Logo, paracada λ ∈ Jλ0 , Ker(Pλ) e Ker(Pλ)

⊥ sao invariantes por Lλ. Portanto, a relacao (5.4.6)implica que

UλLλU−1λ Pλ0 = UλLλU

−1λ UλPλU

−1λ = UλLλPλU

−1λ = UλPλLλU

−1λ = Pλ0UλLλU

−1λ .

Daı, H0 e H⊥0 sao invariantes por UλLλU−1λ . Como, por hipotese, Lλ e um isomorfismo

para λ suficientemente perto de λ0 com λ 6= λ0, entao o fato anterior implica que arestricao

UλLλU−1λ : H⊥0 → H⊥0

e um isomorfismo para todo λ suficientemente perto de λ0. Assim, das propriedades dofluxo espectral do produto direto e da normalizacao do fluxo espectral, obtemos que

sf(ULU−1, λ0) = sf(ULU−1|H0 , λ0) + sf(ULU−1|H⊥0 , λ0) = sf(ULU−1|H0 , λ0).

Tomemos `λ = UλLλU−1λ |H0 . Como sf(L, λ0) = sf(ULU−1, λ0), a formula anterior implica

quesf(L, λ0) = sf(`, λ0). (5.4.7)

Se segue do Lema 5.4.10 que, para λ ∈ J,

˙λ = UλLλU

−1λ |H0 + Uλ LλU

−1λ |H0 + UλLλU

−1

λ |H0 .

CAPITULO 5. O FLUXO ESPECTRAL 176

Entao, ja que Lλ0 e auto-adjunto e Uλ0 = I, para u e v em Ker Lλ0 = Ker `λ0 temos

〈 ˙λ0u, v〉 = 〈[Uλ0Lλ0U−1λ0|H0 + Uλ0 Lλ0U

−1λ0|H0 + Uλ0Lλ0U

−1

λ0|H0 ]u, v〉

= 〈[Uλ0Lλ0|H0 + Lλ0|H0 + Lλ0U−1

λ0|H0 ]u, v〉

= 〈Uλ0Lλ0|H0u, v〉+ 〈 Lλ0|H0u, v〉+ 〈Lλ0U−1

λ0|H0u, v〉

= 〈 Lλ0|H0u, v〉+ 〈U−1

λ0|H0u, Lλ0v〉

= 〈 Lλ0|H0u, v〉= 〈 Lλ0u, v〉.

Consequentemente, as formas crossing de L e ` em λ0 sao iguais, isto e,

Q(L, λ0) = Q(`, λ0). (5.4.8)

De (5.4.7) e (5.4.8) temos que a prova estara completa se mostrarmos que

sf(`, λ0) = signQ(`, λ0). (5.4.9)

Como, por hipotese, a forma Q(L, λ0) e nao degenerada, da igualdade (5.4.8) temos quea forma Q(`, λ0) em H0 e tambem nao degenerada. Daı, ˙

λ0 e um operador inversıvelem H0. Assim, ja que GL(H0) e aberto, existe α > 0 tal que

˙λ0 + A e inversıvel para A ∈ L(H0) com ‖A‖ < α. (5.4.10)

Por outro lado, podemos escolher δ > 0 tal que∥∥∥∥ `λλ− λ0

− ˙λ0

∥∥∥∥ =

∥∥∥∥`λ − `λ0λ− λ0

− ˙λ0

∥∥∥∥ < α

sempre que 0 < |λ − λ0| < 2δ (`λ0 = 0 pela definicao de `). Tomemos a homotopiah : [0, 1]× [λ0 − δ, λ0 + δ]→ L(H0) definida por

h(t, λ) = (1− t)(λ− λ0) ˙λ0 + t`λ = [λ− λ0][ ˙

λ0 + t(`λ/(λ− λ0)− ˙λ0)].

Dado que

‖t[(`λ − `λ0)/(λ− λ0)− ˙λ0 ]‖ < α para 0 < |λ− λ0| < 2δ e t ∈ [0, 1],

entao (5.4.10) implica que h(t, λ) e inversıvel para 0 ≤ t ≤ 1 e λ = λ0 ± δ. Portanto,para 0 ≤ t ≤ 1 o caminho ht = h(t, ·) e admissıvel. Da invariancia homotopica do fluxoespectral se segue

sf(`, λ0) = sf(h1, λ0) = sf(h0, λ0) = sf((λ− λ0) ˙λ0 , λ0).

CAPITULO 5. O FLUXO ESPECTRAL 177

Agora, do Corolario 5.3.5 temos

sf((λ− λ0) ˙λ0 , λ0) = µ((λ0 − δ − λ0)( ˙

λ0))− µ((λ0 + δ − λ0)( ˙λ0))

= µ(−δ( ˙λ0))− µ(δ( ˙

λ0))

= µ(− ˙λ0)− µ( ˙

λ0)

= sign ˙λ0 ,

e assim, sf(`, λ0) = sign ˙λ0 , como querıamos provar.

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