o trabalho do assistente social na equipe de saÚde …...uma realidade presente em todas as classes...
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O TRABALHO DO ASSISTENTE SOCIAL NA EQUIPE DE SAÚDE DA FAMÍLIA
EM BELO HORIZONTE: DESAFIOS DIANTE DO FENÔMENO DA VIOLÊNCIA
CONTRA IDOSOS
Aline Pinto de Souza
RESUMO
O presente artigo irá falar sobre a atuação do profissional de serviço social dentro das unidades básicas de saúde (UBS) do município de Belo Horizonte – MG, no que se refere aos casos de violência contra os idosos. Como objetivo geral tem-se o de conhecer, refletir e analisar como é realizada essa atuação, analisar a relação do assistente social com os outros profissionais da equipe de saúde da família no trabalho com esse público específico e conhecer qual a rede do município que atende casos de violência contra idosos.
Palavras-chave: Unidades Básicas de Saúde; Idosos; Violência, Serviço Social.
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1. INTRODUÇÃO
Com a implantação e implementação do Sistema Único de Saúde (SUS), através da
Constituição Federal de 1988, começa a se reconhecer a saúde como um direito a
ser assegurado pelo Estado. Todos aqueles cidadãos, independente de raça,
religião, classe econômica, tem este direito assegurado, sendo preferencialmente o
atendimento realizado em locais próximos à residência dos indivíduos, no seu
território. Nessa perspectiva, criam-se as Unidades Básicas de Saúde (UBS) para
atenderem àqueles pacientes que se encontram em sua área de abrangência, tendo
como foco o trabalho de prevenção junto à população assistida.
Conforme informado no site oficial da Prefeitura Municipal de Belo Horizonte, o
município conta atualmente com 147 UBS’s, divididas entre as nove regionais que
compõe a cidade.
Os centros de saúde ou UBS’s formam a atenção básica e possuem a equipe do BH
Vida, o Programa de Saúde da Família de Belo Horizonte composto por um médico
de família, um enfermeiro, dois auxiliares de enfermagem e seis agentes
comunitários de saúde em sua maioria. Além disto, as unidades de saúde contam
com os profissionais de apoio, como médicos clínicos, pediatras, ginecologistas,
cirurgiões-dentistas, psicólogos, dentre outros.
Além dos profissionais citados acima, têm-se nas UBS’s também a atuação do
assistente social, que trabalha como apoio às equipes de saúde da família.
O foco deste trabalho é o de conhecer o tipo de violência que os idosos estão sendo
submetidos, visualizar a estrutura da rede de atendimento no município para esse
público, analisar a relação do assistente social com os outros profissionais da equipe
de saúde da família na atuação nos casos de violência, realizar uma análise crítica
referente à intervenção do poder público diante desse fenômeno e os fatores que
desencadeiam ou propiciam a permanência desses idosos no ciclo de violência.
2.O IDOSO NO CENÁRIO BRASILEIRO
Com o aumento da expectativa de vida e a diminuição da taxa de natalidade, nota-
se a presença cada vez mais constante de idosos como atores principais nos
domicílios brasileiros. No entanto, também se têm percebido um aumento constante
desse público submetido a situações de violência familiar, dentre elas a física,
psicológica, sexual, moral, financeira, negligência, abandono, dentre outras.
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A atenção se volta para a rapidez da mudança do perfil epidemiológico que vem
ocorrendo no Brasil e que não estamos preparados para enfrentar. A perspectiva de
crescimento da população acima de 60 anos colocará o Brasil, dentro de 25 anos,
como a 6ª maior população de idosos no mundo em números absolutos(SAS/MG,
2007, p. 13).
Sobre esse panorama, foi instituída a Lei nº 8.842, em 04 de janeiro de 1994, que
dispõe sobre a Política Nacional do Idoso. Em suma, o Estado trata esses cidadãos
como detentores de direitos e não mais como beneficiários de sua benevolência
aplicada de forma esporádica. Alguns anos depois foi promulgado o Estatuto do
Idoso (Lei nº 10.471, de 01 de outubro de 2003) que veio para proteger a dignidade
das pessoas com idade mais avançada, bem como o tratamento adequado que deve
ser dispensado pelos seus familiares para com elas. De acordo com a lei em seu
artigo 3º:
É obrigação da família, da comunidade, da sociedade e do Poder Público assegurar
ao idoso, com absoluta prioridade, a efetivação do direito à vida, à saúde, à
alimentação, à educação, à cultura, ao esporte, ao lazer, ao trabalho, à cidadania, à
liberdade, à dignidade, ao respeito e à convivência familiar e comunitária
(MANDAMENTOS, 2004, p. 10).
E na velhice que o idoso vê-se necessitado cada vez mais de cuidados,
apresentando maior dependência de seus familiares ou cuidadores, maior está o
grau de vulnerabilidade e o risco dele estar submetido a algum tipo de violação. Não
se pode deixar de mencionar que nem sempre a violência contra idosos é realizada
de forma intencional, pois muitas vezes têm-se nos domicílios famílias muito
vulneráveis economicamente e culturalmente, totalmente despreparadas para
assumir os cuidados com seu ente acima de 60 anos.
O assunto proposto torna-se de grande relevância para a sociedade, visto que é
uma realidade presente em todas as classes sociais e famílias e muitas vezes esses
idosos que são vítimas, possibilitam que essa violência não se torne visível, porque
eles se sentem responsabilizados por estarem denunciando o agressor, o que
reforça o grau de dependência e medo diante dos familiares.
No próximo tópico serão apresentados os tipos de violência na qual os idosos
podem ser expostos e as consequências destas no bem estar físico e psicológico
das pessoas acima dos 60 anos.
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3.TIPOS DE VIOLÊNCIA CONTRA IDOSOS
A violência tem sido uma constante no cotidiano da humanidade. No geral, identifica-
se a violência como criminalidade e/ou agressão física. Porém as ações vistas como
manifestações de violência representam diferentes tipos de comportamentos.
Assim, violência seria a tendência a destruição do outro, ao desrespeito e a negação
do outro, podendo sua ação situar-se no plano físico, psicológico e ético. A violência
limita a liberdade de um indivíduo ou de um grupo, reprimindo e ofedendo de forma
física ou moral a sua integridade. Abaixo serão apresentados alguns tipos de
violências.
3.1 VIOLÊNCIA FÍSICA
É um tipo de manifestação em que um outro (os) sujeito (os) utiliza-se de força física
para forçar o idoso a fazer algo que não quer, para lhe causar dores, incapacidade
ou até mesmo a morte.
3.2 VIOLÊNCIA PSICOLÓGICA
É um tipo de violência silenciosa, pois os efeitos são sentidos através da alteração
do comportamento daquela vítima. Visa provocar dano à autoestima, ao
desenvolvimento da pessoa idosa.
3.3 VIOLÊNCIA SEXUAL
Acontece quando o idoso é coagido por uma outra pessoa que tem uma relação de
poder sobre o mesmo, a fazer ou presenciar um jogo sexual, onde o agressor deseja
obter excitação ou satisfação sexual.
3.4 VIOLÊNCIA ECONÔMICA/FINANCEIRA/PATRIMONIAL
É o tipo de violência em que uma outra pessoa apropria-se ilegalmente, sem o
consentimento do patrimônio, bens pessoais, recursos financeiros do idoso
3.5 VIOLÊNCIA INSTITUCIONAL
É o tipo de violência realizada pelos serviços públicos, tanto por ação ou omissão do
Estado.
3.6 ABANONO/NEGLIGÊNCIA
A negligência é o ato de omissão do responsável pelo idoso em prover as
necessidades básicas para sua sobrevivência e bem estar.
3.7 AUTO NEGLIGÊNCIA
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É o tipo de violência em que o próprio idoso, através de sua conduta, ameaça sua
saúde e segurança.
Percebe-se que em alguns casos, o idoso não está submetido somente a um tipo de
violência, mas a várias, que se intercalam de acordo com o momento e o agente
violador. É uma violência silenciosa, porque muitas vezes o idoso depende daquele
agressor, no que se refere aos cuidados, entretanto, em muitas famílias mineiras,
também percebemos uma dependência financeira do agressor em relação à vítima.
Relação contraditória que coloca o idoso em uma situação de fragilidade, pois
realizar a denúncia contra alguém tão próximo pode lhe causar maiores transtornos.
Trazendo dados mais recentes repassados pela analista de políticas públicas do
Conselho Municipal do Idoso de Belo Horizonte (CMI/BH), a Sra. Sandra de
Mendonça Mallet, percebemos que ainda existem muitos casos de violência contra
idosos subnotificados, temos um quantitativo muito pequeno de notificações, diante
da realidade que se tem vivenciado na prática profissional.Vejamos os dados
referentes ao ano de 2014:
DENÚNCIAS RECEBIDAS PELO CMI/BH – 2014
ÓRGÃO ENCAMINHADOR TOTAL %
Conselho Estadual do Idoso 1 0,2
Ouvidoria 1 0,2
GERASA 90 18,7
Familiar 66 13,8
Anônima 135 29
Conhecido 34 7
Espontâneo 29 6
Delegacia do idoso 1 0,2
UNIMED 1 0,2
UPA 8 1,7
CDPI 4 0,9
GERASC 11 2,3
NASF 2 0,4
Centro de Saúde 20 4,2
Ministério Público 5 1
Hospitais 39 8,1
6
Disque 100 8 1,7
Conselheiros 2 0,4
Pastoral do idoso 1 0,2
Defesa Civil 1 0,2
CRAS 1 0,2
Usuário do serviço denunciado 1 0,2
Vigilância sanitária 1 0,2
CREAS 19 3,9
*Os atendimentos que não vieram de órgãos públicos ou privados, chegaram de
forma presencial ou por telefone.
DADOS DA SUPOSTA VIOLAÇÃO DE DIREITOS DENUNCIADA NO CONSELHO
MUNICIPAL DO IDOSO DE BELO HORIZONTE, 2014.
Total de denúncias: 481 denúncias
Denúncias por regional administrativa/2014
REGIONAL ADMINISTRATIVA TOTAL DE DENÚNCIAS – CMI/BH
BARREIRO 59
CENTRO SUL 36
LESTE 53
NORDESTE 63
NOROESTE 94
NORTE 44
OESTE 41
PAMPULHA 41
VENDA NOVA 50
TOTAL DAS DENÚNCIAS 481
Fonte: CMI/BH – 2014
Denúncias por sexo/2014
DENÚNCIA POR SEXO TOTAL DE DENÚNCIAS - 2014
Coletivo (Instituição/organização) 19
Feminino 300
Masculino 132
Misto (casal de idosos – irmãos,
parceiros)
30
7
TOTAL 481
Fonte: CMI/BH – 2014
Tipos de violências denunciadas
Tipos Negligência Psicológica Abandono Financeira Física Autonegligência
Sexo
Masculino 80 casos 24 casos 39 casos 20 casos 15
casos
22 casos
Feminino 185 casos 100 casos 53 casos 62 casos 52
casos
28 casos
Misto ou
Coletivo
27 casos 14 casos 2 casos 10 casos 7
casos
2 casos
TOTAL 292 casos 138 casos 94 casos 92 casos 74
casos
52 casos
Fonte: CMI/BH – 2014
Outros tipos de violência
Tipos Cárcere
Privado
Insuficiência
Familiar
Problemas na
desospitalização
Estrutural (riscos
ambientais)
Sexo
Masculino 6 casos 3 casos 4 casos Nenhum caso
Feminino 11 casos 11 casos 4 casos Nenhum caso
Misto ou Coletivo 2 casos 1 caso Nenhum caso 1 caso
TOTAL 19 casos 15 casos 8 casos 1 caso
Fonte: CMI/BH – 2014
*O total das tipologias da violência é superior ao número total de casos denunciados,
porque cada denúncia apresenta mais de um tipo de violência.
Conforme as estatísticas acima realizadas pelo Conselho Municipal do Idoso, grande
maioria dos casos de denúncias de violência contra idosos são denunciadas de
forma anônima e o público mais suscetível são os idosos do sexo feminino. Destaca-
se a negligência como a violência com maior incidência tanto no público feminino,
quanto no masculino, mas vê-se também um número bem elevado de casos de
violência psicológica.
No que diz respeito aos idosos, no Brasil não há estudos que forneçam dados sobre
números de casos e perfil das vítimas ou agressores. A experiência de alguns
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serviços, recentemente criados, mostra que o perfil assemelha-se ao encontrado em
outros países. As vítimas são, geralmente, mulheres viúvas, de idade avançada,
com problemas físicos ou cognitivos e que moram em companhia de familiares
(Ministério da Saúde, 2001, p. 8).
4. A ATUAÇÃO DO ASSISTENTE SOCIAL NAS UBS’S
Os assistentes sociais nas UBS’s de Belo Horizonte são efetivados como
profissionais “técnicos superiores de saúde”, compondo a equipe de apoio dessas
unidades. Trabalham totalmente interligados com as equipes de saúde da família
(ESF), que em sua maioria são compostas por médicos de saúde da família,
enfermeiros, auxiliares de enfermagem e agentes comunitários de saúde (ACS).
Além dos ACS’s, os assistentes sociais também têm como uma de suas ações,
quando necessário, a realização de visita domiciliar. É através desse instrumental
que o profissional poderá conhecer melhor a dinâmica familiar em que esse idoso
vítima de violência está submetido, quais os seus laços afetivos e comunitários e o
que ele representa diante desse contexto familiar. Vale ressaltar que esse não é o
único meio para se atuar nos casos, poderão ser realizados atendimentos individuais
e grupais, discussões de caso com a rede de proteção, contatos institucionais e os
encaminhamentos, conforme necessário.
A técnica de visita domiciliar é parte da história da profissão do assistente social.
Entramos no âmbito privado da vida das pessoas, no espaço residencial, doméstico.
Certamente, para usar a linguagem biomédica, um procedimento invasivo. A visita
domiciliar proporciona essa leitura sobre o privado, uma busca por informações que
personalizam a ação do profissional com seu usuário; portanto, uma ferramenta
perfeita ao modelo flexível de saúde (CORTEZ, 2010, p. 464).
Em realidade, o assistente social atende diversos tipos de demandas, principalmente
àquelas relacionadas à violação de direitos, tanto por parte do poder público, quanto
da população em geral. Grandes são os desafios enfrentados para desvelar a
realidade de cada família que vive no território de abrangência da UBS e é de
extrema importância essa aproximação com todos os atores envolvidos.
Para a saúde coletiva, o território tornou-se o foco da ação; milimetricamente
esquadrinhado, os hábitos e as manifestações da cultura local são colocados como
determinantes sociais da saúde. Aliás, nunca os determinantes sociais foram tão
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evidentes à saúde, operando de forma clara, marcando a esfera da reprodução
social (CORTEZ, 2010, p. 464).
Vale ressaltar que um dos principais papéis do assistente social no campo da
violência contra idosos é o de educador, pois intervém na realidade dos sujeitos com
a finalidade de torná-los protagonistas do seu processo saúde-doença e dessa
relação muitas vezes antagônica entre os interesses do Estado e dos usuários.
Muitos desses idosos quando diante de uma situação de risco, omitem-se com o
temor de algo acontecer com o suposto agressor. Nesse sentido, é de extrema
relevância que os profissionais de saúde que atuam na área de abrangência dessas
vítimas, estejam com o olhar e escuta capacitados, para que consigam captar o que
de fato possa estar acontecendo com aquele idoso em seu ambiente de convivência.
Importante mais uma vez ressaltar a valorização dos ACS’s nesse trabalho, uma vez
que eles realizam visitas domiciliares mensalmente, conhecem em sua maioria a
dinâmica familiar desses idosos e apresentam uma relação de confiança e
proximidade com esse público. Um vínculo que merece atenção e pode ser fonte de
conhecimento, que são uma porta de entrada para um possível atendimento mais
humanizado.
O assistente social, enquanto agente protetor de direitos deverá, diante de uma
situação de suposta violação contra algum idoso, junto com a equipe de saúde da
família (ESF), estudar estratégias para possíveis intervenções no caso. O assistente
social da saúde, no que se refere à temática da violência, atua com a preocupação
com a vítima, de forma a trazer ao centro do problema a promoção da saúde e
qualidade de vida.
É mister realizar uma análise da atuação desse profissional diante dos casos de
violência, de maneira a entender o problema, assim como buscar a otimização de
sua atuação diante da mesma, de forma a termos a concretização da prevenção,
promoção, reabilitação e cura do usuário que se apresenta na unidade de saúde,
além de trabalhar em prol da autonomia e da emancipação do mesmo como sujeitos
de direitos (CORTEZ, 2010, p. 486).
Enfim, o assistente social não trabalha em nenhum momento sozinho quando se
está dentro de uma UBS, em um território com múltiplos sujeitos e realidades. É
esse mister de saberes, de olhares que irão possibilitar que um idoso que de início
nos aparece em situação de violação de direitos, consiga em algum momento
reverter-se em um idoso que consiga ser um promotor de sua saúde e bem-estar.
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5. REDE DE ENFRENTAMENTO À VIOLÊNCIA EM BELO HORIZONTE
Quando se fala em rede, tem-se uma ideia de algo interligado, articulado, de junção,
de suporte e solidariedade entre pessoas e instituições que dela fazem parte. Cada
instituição e sujeito tem sua importância diante do fenômeno da violência, tanto no
que se refere à prevenção, mobilização, tratamento, atendimento à vítima e até
mesmo ao suposto agressor. Não se pode desmerecer em uma rede a função de
cada ente envolvido, pois cada um, de acordo com a sua especialidade, é que dará
sustentação para que a vítima consiga desvencilhar-se do ciclo de violência pelo
qual está submetido.
É sabido no campo social, que o papel da rede é de extrema importância para a
condução de casos de violência e violação, que os atores envolvidos atuando em
conjunto podem pensar mais possibilidades para o caso a ser atendido. Vale
salientar que algumas vezes não só a vítima necessita desse acompanhamento
especializado, muitas vezes o agente violador também demanda esse cuidado, por
razões de ordem social, econômica ou cultural.
O município de Belo Horizonte possui diversas instituições que compõem a rede de
enfrentamento à violência que atuam direta ou indiretamente nos casos de violência
contra idosos, dentre eles: as equipes de saúde da família (PSF), os Núcleos de
Apoio a Saúde da Família (NASF), Serviços de Saúde Mental (como o CERSAM e
CERSAM AD), Serviços de Atenção Especializada (Urgência e Emergência),
Centros de Referência da Assistência Social (CRAS), Centro de Referência
Especializado da Assistência Social (CREAS), Polícia Militar, Delegacia de Polícia,
Instituto Medico Legal (IML), Conselho Municipal do Idoso, Ministério Público,
Defensoria Pública, Casa Abrigo, Organizações da Sociedade Civil e Centros de
Referência.
Todo o caso suspeito ou confirmado de violência contra a pessoa idosa deverá ser
notificado, pelo profissional de nível superior que acolheu a demanda, utilizando-se a
“Ficha de Notificação/Investigação Individual – Violência Doméstica, Sexual e/ou
Outras Violências”, do Ministério da Saúde. Além desse documento, deverá ser
preenchido também a “Ficha Protetiva de Violência contra Idosos”, da Secretaria
Municipal de Saúde de Belo Horizonte. No município, essas fichas são
encaminhadas para a Gerência de Saúde da Regional em que o idoso reside e os
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técnicos desse local realizarão os devidos encaminhamentos de acordo com a
demanda para a rede de enfrentamento à violência.
No entanto, percebemos que para essa rede de enfrentamento à violência funcionar,
é necessário um esforço coletivo, a construção de espaços de discussão, de troca
de saberes para que as ações não sejam realizadas de maneira fragmentada. Deve-
se realizar um trabalho direcionado para a consolidação do Estatuto do Idoso, com o
intuito de possibilitar que esse ciclo de violência não perpetue, através da
interlocução ativa com toda a rede de apoio do município para a proteção da vítima.
Deve-se salientar a importância de um trabalho também com essa família, com a
perspectiva de preservação do espaço de convívio desse idoso e dos vínculos
afetivos.
Muitas pesquisas demonstram que, mesmo quando o Estado consegue colocar à
disposição de sua população os serviços necessários para ela, se a população não
tem uma mínima organização, se essa sociedade não está minimamente organizada
em igrejas, sindicatos, clubes, associação de moradores etc., ela não consegue
usufruir desses serviços. Então, não é só uma questão de o estado prover os
serviços, mas a sociedade, para poder aproveitar esses serviços, tem que estar
organizada (NAVCV, 2005, p.160)
A questão da notificação compulsória é um assunto que provoca ainda muita
resistência por parte dos profissionais de saúde, que em muitas ocasiões não
possuem capacidade técnica para identificar uma situação de violência ou violação,
pelo medo de represálias por parte da família da vítima e até mesmo por acreditar
que sua denúncia não irá surtir nenhum efeito, pela ineficiência dos órgãos de
direito.
Há ainda que se discutir que apesar da obrigatoriedade da notificação pelos
profissionais de saúde, não existe garantia de sigilo dessa notificação, nem de
proteção da integridade do denunciante. Isso acaba por ocasionar uma resistência
dos profissionais em realizar tal denúncia por medo de represálias ou ameaças
(CORTEZ, 2010, p. 491).
Um outro importante instrumento de trabalho de rede é a contrarreferência, que é o
retorno dos encaminhamentos dados pelo profissional que está acompanhando o
caso na UBS, em sua maioria das vezes, o assistente social. Ela é de extrema
importância para a condução do trabalho que está sendo realizado com o idoso e
sua família, à medida que se passa a ter um conhecimento integral das ações
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efetivadas e possibilita repensar novas estratégias diante daquelas que não surtiram
efeito positivo.
Sendo assim, é de extrema importância o assistente social da saúde adquirir cada
vez mais conhecimento no que se refere à temática da violência e dos outros fatores
associados, para que sua atuação seja de fato resolutiva para a vítima. A superação
da violência não será possível se todos os profissionais não atuarem de maneira
interdisciplinar, sistematizando suas ações e realizando ações que vão transformar
para melhor a vida desse sujeito. É sabido que são muitos os limites e desafios a
serem enfrentados, porém deve-se pensar que temos uma rede de serviços, de
possibilidades que podem nos auxiliar na efetivação de uma qualidade de vida para
o idoso, para que de fato ele seja concebido como sujeito de direitos.
6.CONSIDERAÇÕES FINAIS
A proposta deste trabalho foi de maior conhecimento sobre a realidade dos idosos
do município de Belo Horizonte e a atuação do assistente social, juntamente com os
outros profissionais da equipe de saúde da família diante do fenômeno da violência
contra os idosos no atendimento realizado na UBS’s. Vê-se que são vários tipos de
violências a que o idoso pode estar submetido e que em alguns casos, ele pode
estar exposto a mais de um tipo de violência. São idosos que são vítimas também
da ineficiência de políticas públicas, de serviços de saúde cada vez mais
precarizados, de famílias desorganizadas, sem o suporte necessário, de um Estado
que não tem olhos para os seres humanos que passaram dos 60 anos.
O assistente social deve pautar sua atuação principalmente em um atendimento
humanizado, que consiga respeitar o momento que o idoso vítima de violência está
vivenciando, de forma que as possibilidades de atendimento e conduta sejam
construídas em conjunto com o idoso e sua família. O trabalho com a rede de
atendimento e enfrentamento à violência é de extrema importância, vários atores
pensando e agindo juntos com o objetivo de promover a autonomia do sujeito.
Vê-se que dentro do território onde o idoso está inserido, o trabalho torna-se mais
fácil, com maior possibilidade de adesão e acompanhamento contínuo. O
profissional de serviço social deve utilizar-se desta estratégia para a formação de
vínculos positivos dos idosos com a comunidade. Encaminhamento para serviços
como CRAS, Academias da Cidade, Grupos de Terceira Idade podem ser pilares
sustentadores para saída do ciclo de violência.
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Sabe-se que infelizmente ainda enfrentamos alguns problemas como: falta de
profissionais qualificados na ponta, reduzido número de profissionais nos
equipamentos, falta de suporte financeiro, dificuldades de controle social, estruturas
dos serviços de enfrentamento precarizados, dentre tantas outras.
Para tanto, vê-se que os assistentes sociais que estão na linha de frente, atuando
com esses idosos vítima de violência e suas famílias no território, tem que dar conta
de trabalhar essa violência e suas múltiplas dimensões, fazendo sempre uma
análise crítica da conjuntura e da relação que se estabelece entre Estado/sociedade,
não esquecendo que a intervenção do Serviço Social deve ser de acordo com o
projeto ético-político da profissão e com as diretrizes do SUS.
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