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640 O SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL NA ENCRUZILHADA DO PROGRESSO DA CIÊNCIA COM A PROTEÇÃO DA VIDA HUMANA: ANÁLISE DA DECISÃO DA ADI 3510 Sylvio Alarcon Bruno Rodriguez Caldas Nelson Nery Junior INTRODUÇÃO A importância atualmente atribuída ao Poder Judiciário brasileiro não encontra precedentes em nossa história. Não apenas o número de demandas aumenta progressivamente ano a ano, mas também, e principalmente, as matérias submetidas a julgamento perante as cortes têm transcendido o mero interesse individual das partes, repercutindo em toda a sociedade. Esse fenômeno alcança também o Supremo Tribunal Federal, órgão de cúpula do Judiciário nacional, que ultimamente tem sido defrontado com delicadas e polêmicas questões, de alta relevância política e social e de grande impacto na opinião pública. Nesse sentido, das muitas decisões suas que poderiam ser trazidas à baila, destaca-se a proferida na Ação Direta de Inconstitucionalidade 3510/DF, da relatoria do Ministro Ayres Britto, em que se questionou a compatibilidade do art. 5º da Lei 11.105/2005, a Lei de Biossegurança – que autoriza, sob certas condições e para determinados fins, a pesquisa com células-tronco embrionárias –, com os arts. 1º, III (dignidade da pessoa humana), e 5º, “caput” (inviolabilidade do direito à vida) da Constituição Federal. O dispositivo legal foi alfim julgado constitucional pela estrita margem de seis votos a cinco, demonstrando a polêmica que o julgamento causou no seio do próprio Tribunal, mobilizando também a imprensa e o interesse público. Desnecessário ressaltar a importância da decisão, especialmente em termos científicos, mas também jurídicos. Quanto a estes, que interessam mais de perto à presente análise, cumpre destacar que o Supremo foi instado a traçar os limites da proteção ao direito à vida e à dignidade da pessoa humana, manifestando-se acerca

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640

O SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL NA ENCRUZILHADA DO

PROGRESSO DA CIÊNCIA COM A PROTEÇÃO DA VIDA

HUMANA: ANÁLISE DA DECISÃO DA ADI 3510

Sylvio Alarcon Bruno Rodriguez Caldas

Nelson Nery Junior

INTRODUÇÃO

A importância atualmente atribuída ao Poder Judiciário brasileiro não encontra

precedentes em nossa história. Não apenas o número de demandas aumenta

progressivamente ano a ano, mas também, e principalmente, as matérias

submetidas a julgamento perante as cortes têm transcendido o mero interesse

individual das partes, repercutindo em toda a sociedade. Esse fenômeno alcança

também o Supremo Tribunal Federal, órgão de cúpula do Judiciário nacional, que

ultimamente tem sido defrontado com delicadas e polêmicas questões, de alta

relevância política e social e de grande impacto na opinião pública.

Nesse sentido, das muitas decisões suas que poderiam ser trazidas à baila,

destaca-se a proferida na Ação Direta de Inconstitucionalidade 3510/DF, da relatoria

do Ministro Ayres Britto, em que se questionou a compatibilidade do art. 5º da Lei

11.105/2005, a Lei de Biossegurança – que autoriza, sob certas condições e para

determinados fins, a pesquisa com células-tronco embrionárias –, com os arts. 1º, III

(dignidade da pessoa humana), e 5º, “caput” (inviolabilidade do direito à vida) da

Constituição Federal. O dispositivo legal foi alfim julgado constitucional pela estrita

margem de seis votos a cinco, demonstrando a polêmica que o julgamento causou

no seio do próprio Tribunal, mobilizando também a imprensa e o interesse público.

Desnecessário ressaltar a importância da decisão, especialmente em termos

científicos, mas também jurídicos. Quanto a estes, que interessam mais de perto à

presente análise, cumpre destacar que o Supremo foi instado a traçar os limites da

proteção ao direito à vida e à dignidade da pessoa humana, manifestando-se acerca

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do início da vida e dos parâmetros de licitude para a manipulação científica de

materiais de origem humana. Para além de questões jurídicas, o Supremo Tribunal

Federal se viu às voltas com questões de ordem científica, com profundos

desdobramentos nos planos moral e religioso, que tiveram obrigatoriamente de ser

enfrentadas como antecedentes lógicos à formação da convicção fundamentada dos

julgadores.

Partindo dessas constatações, busca-se o exame analítico do conteúdo dos

votos dos Ministros, exarados no julgamento da ADI 3510/DF, destacando e

analisando as principais linhas argumentativas aventadas pelos magistrados, os

raciocínios e técnicas de interpretação e decisão adotadas, bem como a importância

e o conteúdo da intervenção dos “amici curiae” e sua influência relativamente ao

convencimento dos julgadores. A investigação pretende pôr em relevo, a partir desta

paradigmática e histórica decisão, o papel, assumido pelo Poder Judiciário em geral,

e pelo Supremo Tribunal Federal em particular, de espaço de discussão e decisão a

respeito de relevantes questões sociais, atuação que vai muito além da típica função

de “aplicar a lei ao caso concreto”. Esta tarefa, que tem sido assumida pelas cortes

judiciais das complexas sociedades democráticas contemporâneas, exige, como

consequência, renovadas reflexões sobre o tradicional arquétipo da separação dos

poderes. É neste contexto que o presente estudo, dentro dos limites de sua

proposta, insere-se.

2 O CONTROLE JUDICIAL DE CONSTITUCIONALIDADE DAS LE IS COMO

GARANTIA DA SUPREMACIA DOS VALORES CONSTITUCIONAIS

O constitucionalismo, movimento político e jurídico de inspiração democrático-

liberal que floresceu na Europa nos séculos XVII e XVIII em reação ao absolutismo

monárquico, traz imanente a idéia de limitação do poder por meio da distribuição de

competências e do reconhecimento de direitos dos cidadãos1. Uma das mais

sensíveis modificações no cenário jurídico daí exsurgidas corresponde ao advento

das constituições escritas, compostas de comandos normativos determinantes da

1 Basta lembrar, neste passo, aquilo que propugnava o art. 16 da Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, de 1789: “A sociedade em que não esteja assegurada a garantia dos direitos, nem a separação dos poderes determinada, não tem constituição”.

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organização fundamental do Estado, das formas de aquisição, exercício e perda do

poder político e dos direitos dos cidadãos2. Cuidavam-se de verdadeiras

normatizações jurídicas da política, criando-se um pretenso estatuto do poder, que,

dada a vulnerabilidade dos princípios e das regras que as compunham, não

poderiam ser deixadas ao alvedrio dos detentores desse poder, sob pena de não se

conseguir alcançar as finalidades a que se predispunham as constituições. Cuidou-

se, então, de estabelecer procedimentos especiais, mais gravosos, para a

modificação das normas constitucionais, nascendo, assim, as chamadas

constituiões rígidas3.

Como conseqüência da rigidez, os atos tendentes à modificação da

constituição devem observar os parâmetros e as formalidades fixados por ela

própria, sob pena de resultarem inválidos. Isto implica na necessidade de todos os

atos dos destinatários dos comandos normativos do texto constitucional guardarem

estrita conformidade com tais preceitos, em seus aspectos formal e material, sob

pena de a própria idéia de constituição restar esvaziada, dada a possibilidade de sua

modificação pelos procedimentos legiferantes ordinários, o que implicaria na

redução da constituição à condição das demais leis e, em última análise, do próprio

poder constituinte ao poder constituído.

A materialização dos preceitos constitucionais em um documento escrito,

somada à rigidez de que se revestem tais disposições, conformam um ambiente

propício ao surgimento de mecanismos de controle da conduta dos destinatários de

tais comandos. Em verdade, a existência desses instrumentos é exigência de

garantia da autoridade da própria constituição4.

Dessa forma, impõe-se a necessidade de o próprio sistema jurídico

estabelecer institutos e mecanismos destinados a aferir a compatibilidade das

condutas dos destinatários do texto constitucional com os seus comandos,

promovendo, destarte, a defesa da constituição e do Estado constitucional.

Denominam-se garantias da constituição5 os meios e institutos destinados a

2 Cf. LEAL, Roger Stiefelmann. O efeito vinculante na jurisdição constitucional. São Paulo: Saraiva, 2006. p. 13-15. 3 Ibid., p. 15-16. 4 Neste sentido, não obstante o constitucionalismo europeu do século XIX ter produzido constituições escritas e rígidas, a ausência de mecanismos eficientes de fiscalização da constitucionalidade contribuiu para a pouca efetividade da normatividade constitucional. 5 As garantias da constituição não se confundem com as garantias constitucionais, embora ambas se prestem à mesma finalidade – promover a efetividade das disposições constitucionais. As primeiras voltam-se à preservação da própria constituição. Estas, diferentemente, possuem alcance subjetivo,

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assegurar a observância, aplicação, estabilidade e conservação das normas

constitucionais6. Dentre os variados mecanismos destinados a essa finalidade,

importa destacar o controle da constitucionalidade das leis e atos normativos do

Estado, que atualmente constitui um dos mais relevantes instrumentos de controle

do cumprimento das normas constitucionais e de desenvolvimento e atualização da

própria constituição7.

Em linhas gerais, o controle de constitucionalidade consiste na verificação da

compatibilidade das leis e dos atos normativos com a constituição, em seus

requisitos formais e materiais, resultando da aferição de contrariedade entre o objeto

e o parâmetro de controle o reconhecimento da invalidade da espécie normativa

impugnada. Como se vê, a existência de mecanismos de controle de

constitucionalidade representa garantia da constituição porque visa impedir a

aplicação de normas jurídicas a ela contrárias, preservando seu status normativo.

Embora o controle de constitucionalidade possa ser exercido por órgãos

políticos – Legislativo e Executivo –, adquiriu maior relevância a fiscalização

exercida pelo Poder Judiciário, o chamado controle judicial de constitucionalidade,

ou jurisdição constitucional8. Nesse passo, dois modelos básicos de organização da

jurisdição constitucional se apresentam: o sistema difuso, de origem norte-

americana (Marbury v. Madison), pelo qual todos os juízes e tribunais são

competentes para realizar o controle de constitucionalidade das leis (cumulação da

jurisdição legal com a jurisdição constitucional); e o sistema concentrado, de origem

austríaca (Constituição austríaca de 1920), pelo qual apenas um órgão estatal, o

Tribunal Constitucional, é competente para realizar o controle de constitucionalidade

das leis (monopólio da jurisdição constitucional pelo Tribunal Constitucional).

Em sua configuração atual, o sistema brasileiro de controle judicial de consistindo na possibilidade de os cidadãos exigirem do Estado a proteção dos seus direitos e o reconhecimento dos meios processuais adequados a tal finalidade. A esse respeito, cf. Canotilho, J. J. Gomes. Direito constitucional e teoria da constituição. 7. ed. Coimbra: Almedina, 2003. p. 888. Com terminologia diversa, aludindo à “garantia da constitucionalidade” para designar as da primeira espécie: MIRANDA, Jorge. Manual de direito constitucional. 2. ed. Coimbra: Coimbra Editora, 1983. t. II. p. 306. 6 Canotilho. Direito constitucional... op. cit. p. 887-888. 7 Ibid. p, 889. 8 “Jurisdição constitucional” é uma expressão plurívoca, posto empregada nas mais diversas acepções. Numa acepção ampla, é empregada para designar toda atividade jurisdicional que interpreta e aplica a Constituição. Numa acepção restrita, é utilizada para indicar a atividade exercida pelos Tribunais Constitucionais, nos sistemas jurídicos que adotam o chamado controle concentrado de constitucionalidade. Fugindo dos extremos, neste trabalho adota-se a expressão jurisdição constitucional como sinônimo de controle judicial de constitucionalidade das leis e dos atos normativos.

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constitucionalidade das leis e atos normativos é apontado como exemplo de sistema

misto, em que convivem os dois modelos clássicos de controle judicial supra

descritos: o difuso e o concentrado.

Inicialmente, porém, o direito brasileiro acolheu o modelo difuso de controle

de constitucionalidade, inequivocamente por influência do judicial review dos

Estados Unidos. Com efeito, a introdução do controle judicial, sob a forma difusa,

deu-se com o advento da Constituição Republicana de 1891 (arts. 59, § 1º, “a” e “b”),

e manteve-se, com pequenas variações, nas Constituições de 1934, 1937 e 1946.

A Emenda Constitucional n. 16/1965 inaugurou, no direito brasileiro, a forma

concentrada de controle de constitucionalidade. A competência para exercer esta

fiscalização foi reservada ao Supremo Tribunal Federal, que seria provocado,

exclusivamente, pelo Procurador-Geral da República, mediante a “representação

contra inconstitucionalidade de lei ou ato de natureza normativa federal ou estadual”

(art. 110, I, “k”). Diversamente do controle difuso, apreciação da constitucionalidade

da norma jurídica contestada faz-se em abstrato – isto é, fora do âmbito de um caso

concreto cuja decisão dependa do juízo de constitucionalidade –, em um processo

objetivo, cuja decisão possui eficácia “erga omnes”.

A partir de então, passaram a conviver no direito brasileiro os dois modelos

clássicos de controle de constitucionalidade, compondo um “sistema misto” de

jurisdição constitucional.

A Constituição de 1967 e a Emenda Constitucional n. 1, de 1969, não

introduziram modificações de nota nessa configuração.

O advento da Constituição Federal de 1988, por outro lado, provocou

verdadeira reviravolta no controle de constitucional do Brasil, dada a valorização e o

incremento dos mecanismos componentes da jurisdição constitucional concentrada.

A sistemática do controle difuso permaneceu inalterada: subsiste o poder de todos

os órgãos judiciais de controlar, incidentalmente, a constitucionalidade das leis,

afastando do caso concreto a(s) norma(s) reputada(s) inconstitucional(is), bem como

a competência do Senado para suspender a execução, no todo ou em parte, de lei

declarada inconstitucional por decisão definitiva do Supremo Tribunal Federal

proferida no exercício do controle difuso (art. 52, X). Por outro lado, as inovações

introduzidas no âmbito do controle concentrado demonstram a preocupação do

legislador constituinte originário em consagrar meios diversos para fazer valer os

preceptivos constitucionais, ampliando-se as ações para acionar o Supremo Tribunal

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e o rol dos legitimados a propô-las.

Com efeito, a representação contra inconstitucionalidade e a representação

interventiva, ora denominadas ação direta de inconstitucionalidade (ADI genérica) e

ação direta de inconstitucional interventiva (ADI interventiva), dividem espaço com

ação direta de inconstitucionalidade por omissão (ADI por omissão), da ação

declaratória de constitucionalidade (ADC)9 e da argüição de descumprimento de

preceito fundamental (ADPF). Com exceção da ADI interventiva, cuja legitimidade

ativa permanece restrita ao Procurador-Geral da República (art. 36, III, da CF), as

demais ações agora podem ser propostas por nove entes legitimados, nos termos

do art. 103 da Constituição Federal10.

É neste cenário que se situa o objeto de interesse desta análise. A ADI é o

instrumento que, por excelência, se presta a acionar o Supremo Tribunal Federal a

verificar a compatibilidade de leis e atos normativos com a Constituição Federal.

Uma vez instaurada a relação processual, por força da propositura da ADI, dá-se a

formação de um processo objetivo, diverso dos processos judiciais convencionais,

vez que na ADI não há lide, posto não haver conflito de interesses qualificado por

uma pretensão resistida. A finalidade da ação não é acionar o Supremo Tribunal

Federal para defender um direito subjetivo. O processo objetivo é unilateral, vez que

nele não há que se falar em partes, nem em interesse jurídico individual e

específico, tampouco em relação concreta a ser julgada. Estes elementos são

estranhos ao controle abstrato de constitucionalidade, em que os legitimados para

provocá-lo não postulam interesses subjetivos; sua pretensão consiste em

promover, em nome do interesse público de controle, a defesa da ordem

constitucional por meio da apreciação da validade de lei ou ato normativo em

abstrato, tendo como parâmetro a Constituição.11

9 Vale salientar que a ação declaratória de constitucionalidade foi introduzida na CF e incorporada à sistemática da jurisdição constitucional concentrada por meio da Emenda Constitucional n. 3, de 1993. 10 In verbis, com a redação dada pela Emenda Constitucional n. 45/2004: “Podem propor a ação direta de inconstitucionalidade e a ação declaratória de constitucionalidade: I – o Presidente da República; II – a Mesa do Senado Federal; III – a Mesa da Câmara dos Deputados; IV – a Mesa de Assembléia Legislativa ou da Câmara Legislativa do Distrito Federal; V – o Governo de Estado ou do Distrito Federal; VI – o Procurador-Geral da República; VII – o Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil; VIII – partido político com representação no Congresso Nacional; IX - confederação sindical ou entidade de classe de âmbito nacional”. Por força do disposto no art. 2º, I, da Lei n. 9.882/1999, que disciplinou o processo e o julgamento da ADPF, os legitimados para propor esta ação são os mesmos que os da ADI. 11 Cf. FERRARI, Regina Maria Macedo Nery. Efeitos da declaração de inconstitucionalidade. 5. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2004, p. 221-223; MENDES, Gilmar Ferreira. Controle de

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É precisamente o que se tem na ADI 3510. O postulante – Procurador-Geral

da República –, longe de buscar, perante o Supremo Tribunal Federal, a proteção de

um interesse individual, atua tendo em vista um interesse público, qual seja, a

garantia da Constituição Federal (mais precisamente, seus arts. 1º, III, e 5º, “caput”)

contra uma possível violação perpetrada por obra do Legislativo ordinário. Assim o

faz por que se convenceu de que o art. 5º da Lei de Biossegurança ofende, em tese,

dispositivos constitucionais. A apreciação da validade constitucionalidade do

dispositivo citado dá-se em abstrato, isto é, fora no âmbito de um caso concreto, em

que se discutiriam interesses subjetivos. As decisões proferidas pelo Supremo

Tribunal Federal, em sede de controle concentrado e abstrato de

constitucionalidade, alcançam todos os membros da comunidade – não apenas as

“partes” da ação –, ou seja, são dotadas de eficácia “erga omnes”, e também efeito

vinculante, nos termos do art. 102, § 2º, da Constituição Federal e do art. 28,

parágrafo único, da Lei n. 9.868/1999. Isto quer dizer que toda a comunidade estatal,

bem como os Poderes Executivo e Judiciário, devem guardar observância em

relação às decisões tomadas Supremo Tribunal Federal nas ADIs.

Vê-se, pois, que a decisão de mérito prolatada na ADI 3510 repercutirá,

também em termos jurídicos, sobre toda a sociedade, bem como em relação ao

Poder Judiciário e ao Poder Executivo, que não poderão contrariá-la em suas

atividades típicas, estejam ou não de acordo com o resultado do julgamento.

3 A ADI 3510-DF: VISÃO GERAL

Em 16 de maio de 2005, o então Procurador-Geral da República, Cláudio

Fonteles, ajuizou ação direta de inconstitucionalidade (ADI) perante o Supremo

Tribunal Federal, com fundamento no art. 102, I, “a”, da Constituição Federal de

1988, buscando a declaração de inconstitucionalidade do art. 5º, “caput” e

parágrafos, da Lei de Biossegurança, por ofensa aos preceitos constitucionais dos

arts. 1º, III, e 5º, “caput”.

constitucionalidade: aspectos jurídicos e políticos. São Paulo: Saraiva, 1990, p. 250-251 e 258; ZAVASCKI, Teori Albino. Eficácia das sentenças na jurisdição constitucional. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2001, p. 42-43.

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O dispositivo legal impugnado, que constitui o objeto do controle da

constitucionalidade a ser exercido pelo Supremo Tribunal Federal, apresenta a

seguinte redação:

Art. 5º É permitida, para fins de pesquisa e terapia, a utilização de

células-tronco embrionárias obtidas de embriões humanos produzidos

por fertilização in vitro e não utilizados no respectivo procedimento,

atendidas as seguintes condições:

I – sejam embriões inviáveis; ou

II – sejam embriões congelados há 3 (três) anos ou mais, na data de

publicação desta Lei, ou que, já congelados na data da publicação

desta Lei, depois de completarem 3 (três) anos, contados a partir da

data de congelamento.

§ 1º Em qualquer caso, é necessário o consentimento dos genitores.

§ 2º Instituições de pesquisa e serviços de saúde que realizem

pesquisas ou terapia com células-tronco embrionárias humanas

deverão submeter seus projetos à apreciação e aprovação dos

respectivos comitês de ética em pesquisa.

§ 3º É vedada a comercialização do material biológico a que se refere

este artigo e sua prática implica o crime tipificado no art. 15 da Lei nº

9.434, de 4 de fevereiro de 1997.

De outro lado, o autor da ação direta sustentou que foram violados os

seguintes preceitos constitucionais pelo dispositivo legal supra transcrito,

constituindo, assim, o parâmetro do controle da constitucionalidade e, em

decorrência, da validade da norma legal:

Art. 1º. A República Federativa do Brasil, formada pela união

indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-

se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos:

[...]

III – a dignidade da pessoa humana; [...].

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Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer

natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes

no País a inviolabilidade do direito à vida, [...]. (grifo nosso)

Cabe ressaltar, neste ponto, que, embora o parâmetro de controle de

constitucionalidade assinalado pelo Procurador-Geral da República sejam os arts.

1º, III, e 5º, “caput”, as ações do controle concentrado de constitucionalidade

possuem, consoante jurisprudência pacífica do Supremo Tribunal Federal, causa de

pedir aberta. Isto implica na possibilidade de os julgadores analisarem o pedido sob

fundamentos diversos dos invocados pelo autor da ação, podendo concluir, segundo

estes fundamentos diversos, pela constitucionalidade ou pela inconstitucionalidade

dos dispositivos normativos impugnados. Assim, se os julgadores considerarem que

a lei questionada viola certo preceito constitucional por razões que não aquelas

aduzidas pelo autor na petição inicial, não desimpedidos para declarar sua

inconstitucionalidade. Da mesma forma, se entenderem que a lei impugnada afronta

dispositivo constitucional diverso do apontado pelo autor da ação, a declaração da

inconstitucionalidade do diploma legal é a medida de rigor. No caso da ADI em

análise, portanto, a atividade fiscalizatória da constitucionalidade exercida pelos

Ministros não está limitada nem pelos motivos da inconstitucionalidade alegados

pelo Procurador-Geral, tampouco pelos dispositivos constitucionais indicados por ele

como parâmetro do controle.

Pois bem. A alegada inconstitucionalidade do art. 5º da Lei de Biossegurança

decorreria, segundo o postulante, de a vida humana acontecer na, e a partir da,

fecundação, isto é, da união dos gametas feminino (óvulo) e masculino

(espermatozóide), originando o zigoto. Para comprovar essa tese, o autor trouxe à

colação vasta literatura médico-científica, sempre no sentido de que o momento

inicial da vida humana corresponde à fecundação, e de que o zigoto daí resultante é

muito mais do que simples apanhado de células, correspondendo já a ser humano

em formação.

Ademais, aduziu o autor a desnecessidade da utilização de células-tronco

embrionárias para fins de pesquisa e terapia, uma vez que o uso de células-tronco

adultas – encontradiças em todos os órgãos do corpo humano e em maior

quantidade na médula óssea (tutano do osso) e no cordão umbilical-placenta – pode

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se prestar à mesma finalidade, com perspectivas avanços até mais promissores que

as células-tronco embrionárias.

Por fim, salientou a sistemática da pesquisa científica com células-tronco

embrionárias humanas na Alemanha, disciplinada por duas leis específicas.

Postas essas premissas, sustentou o Procurador-Geral da República a ofensa

perpetrada pelo art. 5º e parágrafos da Lei de Biossegurança à inviolabilidade do

direito à vida, já que o embrião humano é vida humana; e à dignidade da pessoa

humana, eis que menoscaba a condição dos embriões humanos e os reduz à

condição de simples meios à satisfação dos desejos alheios.

No pedido, requereu o autor a declaração de inconstitucionalidade do art.

5º, “caput” e parágrafos, da Lei de Biossegurança. Solicitou, ainda, com

fundamento na parte final do § 1º do art. 9º da Lei n. 9.868/1999, a realização de

audiência pública sobre o tema, rolando as pessoas a que a Procuradoria-Geral da

República deseja ouvir e requerendo sua intimação pessoal.

Distribuída a ação em 31 de maio de 2005, designou-se como relator o Min.

Carlos Ayres Britto.

Com fundamento no § 2º do art. 7º da Lei n. 9.868/1999, admitiu-se o

ingresso no feito, na qualidade de amici curiae, das seguintes entidades: “Conectas

Direitos Humanos”, “Centro de Direitos Humanos – CDH”, “Movitae – Movimento em

Prol da Vida”, “Anis – Instituto de Bioética, Direitos Humanos e Gênero”,

“Confederação Nacional dos Bispos do Brasil – CNBB”12. As mesmas entidades, por

meio de seus representantes, manifestaram-se oralmente na sessão plenária de

julgamento da ação. O conteúdo de cada sustentação será abordado no próximo

item.

Foi determinada pelo relator, com fundamento no § 1º do art. 9º da Lei n.

9.868/1999, a realização da primeira audiência pública da história do Supremo

Tribunal Federal, a fim de fornecer aos julgadores subsídios para a tomada de

decisão e possibilitar efetiva participação da sociedade civil no enfrentamento da

controvérsia constitucional de tal relevância. Em 20 de abril de 2007, manifestam-se

na audiência 22 (vinte e duas) autoridades da comunidade científica brasileira, 12 Com base no mesmo dispositivo legal, foi indeferida pelo Ministro relator a requisição do postulante Luiz Ghisolfi para participar da presente ADI na qualidade de amicus curiae, pois, embora seja relevante a matéria ventilada na ação (primeiro requisito para participação como amicus curiae), considerou-se que o postulante não apresentava a devida representatividade (segundo requisito). Mesmo assim, o Min. Ayres Britto recebeu a peça apresentada pelo postulante como memorial e ordenou sua juntada aos autos.

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expondo os mais variados entendimentos acerca da pesquisa com células-tronco

embrionárias, destacando sua situação atual, alternativas, riscos, resultados já

alcançados e perspectivas. Também esteve em debate questões como o momento

que marca o início da vida humana, a condição, proteção e destino dado ao embrião

congelado fruto de fertilização “in vitro”, entre outras. Como de praxe, todas as

manifestações foram transcritas e encaminhadas aos Ministros para consulta e

auxílio na formação de seu convencimento motivado.

Em 6 de fevereiro de 2008, o processo é incluído na pauta do Pleno do

Supremo Tribunal Federal, designando-se o seu julgamento para o dia 5 de março

de 2008. Aberta a sessão, manifestaram-se o Procurador-Geral da República,

Antônio Fernando de Souza, pugnando, na linha de seu antecessor, pela declaração

da inconstitucionalidade do preceito legal impugnado; o Advogado-Geral da União,

José Antônio Dias Toffoli, defendendo a constitucionalidade do dispositivo; e os

representantes do amici curiae previamente admitidos. Apresentaram seus votos o

relator, Ministro Ayres Britto, e a Ministra Ellen Gracie, ambos julgando improcedente

o pedido formulado na ADI 3510. O julgamento foi, então, interrompido pelo pedido

de visto do Min. Menezes Direito. A sessão de julgamento foi retomada em 28 de

maio de 2008, com o voto-visto do Ministro Menezes Direito, julgando parcialmente

procedente o pedido veiculado na ação direta, sendo acompanhado pelo Ministro

Ricardo Lewandowski. Em seguida, proferiram seus votos a Ministra Cármen Lúcia e

o Ministro Joaquim Barbosa, julgando improcedente o pedido. Na seqüência, os

Ministros Eros Grau e Cezar Peluso proferiram seus votos, julgando improcedente,

com ressalvas, o pedido formulado na ação dieta. O julgamento foi, então,

suspenso, para ser retomado no dia seguinte, 29 de maio de 2008. Nesta sessão,

proferido seu voto o Ministro Gilmar Mendes, julgando improcedente, também com

ressalvas, o pedido formulado na ADI 3510. Por fim, foi proclamado o resultado do

julgamento: o Tribunal, por maioria e nos termos do voto do relator, julgou

improcedente a ação direta, vencidos, parcialmente e em diferentes extensões, os

Ministros Menezes Direito, Ricardo Lewandowski, Eros Grau, Cezar Peluso e Gilmar

Mendes.

A ementa e a parte dispositiva do acórdão foram devidamente publicadas no

Diário da Justiça eletrônico e no Diário Oficial da União em 04 de junho de 2008.

651

4 A PARTICIPAÇÃO DOS AMICI CURIAE

Entre as diversas inovações experimentadas pelo sistema concentrado de

controle judicial de constitucionalidade no direito brasileiro, desde o advento da

Constituição Federal de 1988, importa destacar a criação da figura do amicus curiae,

órgão ou entidade estranho ao processo, mas que tem a possibilidade de se

manifestar sobre as questões ventiladas nas ações do controle de

constitucionalidade. Essa figura possui suas origens no direito anglo-saxão, sendo

duas as possíveis formas de sua manifestação no processo: por consenso das

partes ou por determinação do julgador13.

O direito processual constitucional brasileiro adotou a segunda das formas

mencionadas. Como dispõe o § 2º do art. 7º da Lei n. 9.868/1999, que disciplinou o

processo e o julgamento da ADI e da ADC, “[o] relator, considerando a relevância da

matéria e a representatividade dos postulantes, poderá, por despacho irrecorrível,

admitir, observado o prazo fixado no parágrafo anterior, a manifestação de outros

órgãos ou entidades”. A Lei n. 9.882/1999, que cuidou do processo e julgamento da

ADPF, contempla disposição semelhante em seu art. 6º, § 2º. Assim, os amici curiae

manifestam-se em sede de ADI, ADC e ADPF após o deferimento de seu pedido de

admissão pelo Ministro relator da ação. Podem apresentar razões, manifestações

por escrito, documentos, sustentação oral, memoriais, entre outros meios14.

Sua participação, porém, subordina-se a dois requisitos: “relevância da

matéria” ventilada na ação e “representatividade do postulante”. Cuidam-se estes, é

certo, de conceitos legais indeterminados, cuja concretização somente se dará no

âmbito de cada caso concreto, por ocasião da decisão do relator acerca da

admissão de entidade postulante. Constituem, por outro lado, pontos de partida para

tal concretização do texto normativo, de um lado, a importância e o significado, em

termos morais, jurídicos, econômicos, políticos e/ou sociais, da questão objeto da

ação, e de outro, a respeitabilidade, a capacidade e o reconhecimento científicos

das pessoas e entidades que postulam a participação como amici curiae15.

A figura do amicus curiae desempenha relevantíssimo papel no âmbito dos

sistemas concentrados de controle judicial de constitucionalidade, do ponto de vista

13 Cf. NERY JÚNIOR, Nelson; NERY, Rosa Maria de Andrade. Constituição Federal comentada e legislação constitucional. 2. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2009, p. 896. 14 Cf. Ibid. p. 897. 15 Nesse sentido: Ibid.

652

da legitimidade democrática da atividade desempenhada pelos tribunais

constitucionais. Isto porque, através deste instituto, oferece-se aos diferentes grupos

e segmentos sociais um canal direto de diálogo com o tribunal constitucional,

permitindo-lhes interferir direta e incisivamente na formação do entendimento dos

julgadores acerca de questões de seu interesse. Como as Constituições

contemporâneas incorporam diversos valores, materializados, sobretudo, em

princípios jurídicos, cuja interpretação e aplicação não raro revelam colisões entre

essas normas, é fundamental que, no dirimir de tais conflitos, através do

sopesamento, os julgadores estejam atentos às opiniões e aos interesses dos

diversos destinatários de tais normas.

Como predica Peter Häberle,

Uma Constituição, que estrutura não apenas o Estado em sentido estrito, mas também a própria esfera pública (Öffentlichkeit), dispondo sobre a organização da própria sociedade e, diretamente, sobre setores da vida privada, não pode tratar as forças sociais e privadas como meros objetos. Ela deve integrá-las ativamente enquanto sujeitos16.

Assim, nos processos que envolvam a interpretação e a aplicação da

constituição, especialmente em sede de controle de constitucionalidade, não pode o

julgador fechar-se para as forças sociais e a opinião pública, decidindo unicamente

segundo seus valores e crenças. Ao revés, deve procurar canalizar para si as idéias,

pensamentos e expectativas dos destinatários das normas constitucionais que

aplica, conferindo à interpretação da Constituição um “caráter multifacetado”17.

O instituto do amicus curiae cumpre, dentro de suas limitações, essa função

de canalizar, para os membros do Supremo Tribunal Federal, a opinião e os

reclamos das diversas forças sociais, acerca da interpretação das normas

constitucionais, criando um fórum de discussão pública acerca de questões da mais

alta relevância social. O diálogo assim estabelecido é ainda mais salutar em sede de

controle de constitucionalidade das leis porque nele está em causa

adequação/inadequação da atuação do Legislativo e da Administração Pública na

interpretação e concretização da Constituição. Compreender a posição da opinião

pública sobre a conformidade ou desconformidade com a Constituição de

16 Cf. HÄBERLE, Peter. Hermenêutica constitucional: a sociedade aberta dos intérpretes da constituição: contribuição para a interpretação pluralista e procedimental da constituição. Trad. Gilmar Ferreira Mendes. Porto Alegre: Sérgio Antônio Fabris Editora, 1997, p. 33. 17 Cf. Ibid. p. 39-40.

653

determinado diploma legislativo ou ato administrativo, antes de proceder ao exame

de sua constitucionalidade, fortalece o regime democrático e o próprio Supremo

Tribunal Federal, conferindo alto grau de legitimidade às suas decisões.

No controle de constitucionalidade desencadeado pela ADI 3510, essa

pluralidade de forças sociais esteve bem representada na intervenção dos amici

curiae supra mencionados, que polarizam o debate em favor e contra a declaração

da inconstitucionalidade do art. 5º da Lei de Biossegurança. Importante destacar

que, em geral, os Ministros do Supremo Tribunal Federal estão conscientes da

importância da participação dos amici curiae nos julgamentos das ações do controle

concentrado de constitucionalidade, sendo freqüente que lancem, em votos,

considerações sobre a legitimidade das decisões tomadas sob a intervenção dos

amici. Este dado evidencia que, no direito brasileiro, o instituto não é mera

prerrogativa formal, vazia, mas desempenha função relevante na formação do

convencimento motivado nas decisões do Supremo Tribunal Federal. Na ADI 3510,

o relator, Ministro Ayres Britto, justificou a admissão dos amici curiae assinalando

que tal medida “certamente contribuirá para o adensamento do teor de legitimidade

da decisão a ser proferida na presente ADIN. Estou a dizer: decisão colegiada tão

mais legítima quanto precedida da coleta de opinião dos mais respeitáveis membros

da comunidade científica brasileira, no tema”.

Com efeito, na presente ação, alinharam-se, de um lado, “Conectas Direitos

Humanos”, “CDH”, “Anis” e “Movitae”, defendendo a constitucionalidade do art. 5º da

Lei de Biossegurança.

A “Conectas” e o “CDH”, representados pelo advogado e professor Oscar

Vilhena Vieira, pugnaram pela constitucionalidade das pesquisas com células-tronco

humanas argumentando que um embrião não pode ser juridicamente equiparado a

uma pessoa. Destacou que a Lei de Biossegurança autoriza a pesquisa apenas com

embriões humanos inviáveis, isto é, que não tem a aptidão para um dia se tornar um

ser humano, e que, por conseguinte, deveriam servir às pesquisas com fins

terapêuticos, possibilitando a busca por soluções que preservem a vida e a

dignidade humanas daqueles que padecem de doenças. Também se destacou que

a Constituição Federal de 1988 nada dispôs a respeito do direito à vida antes do

nascimento, além de estabelecer a inviolabilidade desse direito aos brasileiros e

estrangeiros residentes no Brasil, ou seja, aos seres humanos já nascidos. Em

decorrência, não haveria que se objetar a incompatibilidade do art. 5º da Lei de

654

Biossegurança com os preceitos constitucionais consagradores da inviolabilidade do

direito à vida e da dignidade da pessoa humana.

No mesmo sentido, o “Movitae” e a “Anis”, representados pelo também

advogado e professor Luis Roberto Barroso, defenderam que as pesquisas com

células-tronco adultas não substituem as investigações com células-tronco

embrionárias, pois estas oferecem maior confiabilidade e menores riscos quanto aos

resultados, aduzindo também que as pesquisas com células-tronco embrionárias já

produzem resultados clínicos positivos. Sustentou, ademais, a irrelevância da

determinação do início da vida humana para o deslinde da questão ventilada na

ação, uma vez que a autorização legal para pesquisas com células-tronco somente

permite que estas sejam extraídas de embriões congelados há mais de três anos ou

inviáveis, que, de toda sorte, nunca serão implantados em um útero materno, não

podendo, em decorrência, ser considerados vida em potencial. Aduz que o

nascimento com vida marca o surgimento da pessoa humana, com capacidade

jurídica, e que, não obstante a lei civil resguarde os direitos do nascituro, este se

define como sendo o ser humano já concebido, em fase de desenvolvimento no

útero materno, mas ainda não nascido. Ora, os embriões congelados e conservados

em laboratório não são pessoas humanas, visto não terem nascido; não são,

tampouco, nascituros, visto não estarem alojados em útero materno. Assim, as

pesquisas com células-tronco embrionárias não afetam nem pessoas humanas nem

nascituros. Ademais, a lei impediria a “instrumentalização” do embrião, ao

determinar que sejam utilizados em pesquisas embriões inviáveis ou congelados há

mais de três anos, e ao vedar expressamente sua comercialização, a clonagem

humana e a engenharia genética. Por fim, aduz que a Lei de Biossegurança

emprestada proporcional, necessária e adequada proteção aos embriões humanos

fruto de fertilização “in vitro”, sendo fruto da atividade do Legislativo federal, órgão

de representação popular, não se podendo ignorar, também, a repercussão da

decisão sobre o futuro da medicina e o progresso da ciência no Brasil.

De outra banda, a “CNBB”, representada pelo advogado Ives Gandra Martins,

sustentou a inconstitucionalidade do dispositivo legal impugnado, embasada na

alegação de que o embrião “é um ser humano que, por força da lei natural,

continuará a crescer, amadurecer, envelhecer e morrer, segundo o ritmo de tempo

concedido a cada um”, asseverando ainda que “está cientificamente comprovado

que a vida começa com o zigoto. [...] Cientificamente, a vida começa com a

655

concepção” (grifos no original). Em decorrência, os embriões humanos são

merecedores de proteção do Estado, como forma de preservar seu direito inviolável

à vida e à dignidade. A circunstância de os embriões estarem “in vitro” ou já

implantados do útero materno é irrelevante, na medida em que a vida humana

começa com a fecundação do óvulo pelo espermatozóide, independentemente do

processo pelo qual se dá. Ademais, destacou a alternativa, plenamente viável e

aceitável, das pesquisas com células-tronco adultas, retiradas dos próprios

pacientes, que tem obtido resultados expressivos em centros de pesquisa de todo o

mundo. Por fim, reafirmou que o simples fato de os embriões humanos, mesmo

fecundados “in vitro” e congelados há mais de três anos, ou destinados ao descarte,

representarem um ser humano, exige o pleno respeito à sua integridade e dignidade,

devendo o Estado dispensar todos os meios para sua proteção.

5 OS POSICIONAMENTOS SUSTENTADOS PELOS MINISTROS

A questão debatida na ADI em estudo, indubitavelmente, é muito polêmica e

acarreta acaloradas discussões em toda a sociedade. Estas discussões, com efeito,

avultam a “importância do STF em resolver questões socialmente relevantes e

axiologicamente carregadas de valores fundamentalmente contrapostos”18. Em

outras palavras, questões como esta, repletas de valores basilares da sociedade nos

dois pólos da discussão, exigem uma atuação do STF de modo a resolver o

problema, garantindo a segurança à sociedade. A referida segurança, portanto, só

se concretiza com a decisão, que põe fim aos debates e as dúvidas sobre a questão,

estabelecendo um caminho tido como correto.

Esse sentimento, certamente, domina todas as ações de controle de

constitucionalidade. A ADI 3510, entretanto, adquiriu especial relevo. Os debates

sobre o assunto, até pela importância dos bens jurídicos debatidos, efervesciam no

seio na sociedade, dominando as conversas em todos os ambientes sociais. Este

ímpeto participativo da sociedade, obviamente, não poderia ser desconsiderado. A

questão, então, deveria ser resolvida e a resposta dada, ademais, teria que ser

18 Voto do Ministro Gilmar Mendes, cuja íntegra pode ser encontrada em: <http://www.stf.jus.br/arquivo/cms/noticiaNoticiaStf/anexo/ADI3510GM.pdf>. Acesso em: 14-05-2010.

656

democrática, ou seja, a decisão, necessariamente, deveria considerar os interesses

da sociedade e precisaria, para isso, ouvir os mais diferentes grupos sociais.

Constatando esta necessidade, abriu-se audiência pública e possibilitou-se a

participação dos amigos da corte. Esta participação de grupos da sociedade e de

especialistas no assunto analisado teve o condão de esclarecer aos Ministros, sob

os mais diversos ângulos, os pontos debatidos. Estes esclarecimentos, pois, foram

fundamentais para que os nobres Ministros formassem a convicção e

fundamentação de suas decisões.

As decisões dos Ministros, cabe ressaltar, também se mostraram bastante

divididas, e no fim, o que se viu, foi um placar apertado, já que pelos menos cinco

Ministros fizeram restrições. Os principais argumentos e aspectos jurídicos

levantados pelos julgadores serão alvo do presente tópico.

Após o pronunciamento dos julgadores, percebeu-se uma nítida divisão de

opiniões que, sinteticamente, pode ser traduzida em duas correntes. A primeira,

cabe ressaltar, pode ser resumida pela opinião da Dr.ª Mayana Zatz, professora de

genética da USP, para quem:

Pesquisar células embrionárias obtidas de embriões congelados não é aborto. É muito importante que isso fique bem claro. No aborto, temos uma vida no útero que só será interrompida por intervenção humana, enquanto que, no embrião congelado, não há vida se não houver intervenção humana. É preciso haver intervenção humana para a formação do embrião, porque aquele casal não conseguiu ter um embrião por fertilização natural e também para inserir no útero. E esses embriões nunca serão inseridos no útero. É muito importante que se entenda a diferença.19

Sendo assim, esta corrente diferencia o experimento com embriões de aborto.

Ademais, tal corrente acredita que a utilização de embriões em pesquisas é a melhor

forma, e a mais digna, de utilização dos embriões inviáveis, haja vista que sendo

impróprios para a reprodução, seriam, fatalmente, descartados. Aderiram a esta

corrente os Ministros Ayres Britto, Ellen Gracie, Joaquim Barbosa, Celso de Mello,

Cármen Lúcia e Marco Aurélio.

A segunda corrente, por sua vez, pode ser resumida pela opinião da Drª

Lenise Aparecida Martins Garcia, professora do Departamento de Biologia Celular

da UnB:

19 Voto do Ministro relator Carlos Ayres Britto, cuja a íntegra pode ser encontrada em: <http://www.stf.jus.br/arquivo/cms/noticiaNoticiaStf/anexo/adi3510relator.pdf>. Acesso em: 14-05-2010.

657

Nosso grupo traz o embasamento científico para afirmarmos que a vida humana começa na fecundação, tal como está colocado na solicitação da Procuradoria. (...) Já estão definidas, aí, as características genéticas desse indivíduo; já está definido se é homem ou mulher nesse primeiro momento (...). Tudo já está definido, neste primeiro momento da fecundação. Já estão definidas eventuais doenças genéticas (...). Também já estarão aí as tendências herdadas: o dom para a música, pintura, poesia. Tudo já está ali na primeira célula formada. O zigoto de Mozart já tinha dom para a música e Drummond, para a poesia. Tudo já está lá. É um ser humano irrepetível.

Portanto, o principal argumento desta corrente é que a vida começa com a

fecundação. Sendo assim, afirma que o embrião já é um ser vivo pronto, com todas

as características geneticamente definidas. Diante disso, afirma que os embriões

devem ter juridicamente tutelada a sua vida e dignidade. Além disso, argumenta que

as pesquisas com células-tronco podem ser desenvolvidas com células adultas ou

retiradas de cordões umbilicais. Por fim, reitera que o artigo cuja

inconstitucionalidade foi arguida não tutela suficientemente o embrião, já que não

cria comitês de ética imparciais e deixa os embriões sujeitos a interesses do

mercado que guiam o progresso científico. A esta corrente, pelo menos

parcialmente, aderiram os Ministros Ricardo Lewandowski e Menezes Direito, que

julgaram a ADI parcialmente procedente; e Cezar Peluso, Gilmar Mendes e Eros

Grau, que a julgaram improcedente, mas fizeram ressalvas.

Feitas estas considerações preliminares, passaremos agora a analisar os

principais argumentos sustentados pelos Ministros, neste interessante debate que

discutiu valores fundamentais da sociedade brasileira, tais como direito à vida e

dignidade da pessoa humana.

Inicialmente, os Ministros ressaltam a importância do desenvolvimento das

pesquisas com células-tronco, especialmente as embrionárias, haja vista o sua

maior capacidade de diferenciação. O desenvolvimento neste campo científico, cabe

ressaltar, segundo alguns cientistas, seria capaz de regenerar tecidos e curar

doenças genéticas, possibilitando uma vida melhor para milhões de pessoas que

sofrem com paralisia e a diabetes, por exemplo. Tendo em vista isso, destaca Celso

de Mello que a proibição de se desenvolver pesquisas nesta área condenaria

milhões de pessoas a desesperança20. Ainda sobre isso, o Ministro relator lembra

que, segundo a Revista Época publicada no dia 29/04/2007, existem cerca de 5 20 VOTO de Celso de Mello define posição pró-pesquisas do STF. Última Instância. Disponível em: <http://ultimainstancia.uol.com.br/noticia/51542.shtml>. Acesso em: 14-02-2010.

658

milhões de brasileiros que sofrem doenças genéticas. Ademais, baseado na mesma

fonte, acrescenta que o país conta com cerca de 10 a 15 milhões de diabéticos21.

Todas estas pessoas, além daquelas vítimas de acidentes, poderiam se beneficiar

das citadas pesquisas, adquirindo grande acréscimo na qualidade de vida. Esta real

possibilidade de revolução qualitativa na vida de milhões de pessoas22,

indubitavelmente, se reflete no imenso apoio popular as pesquisas, Ora, conforme

relatado pelo Ministro Marco Aurélio, pesquisa realizada pelo prestigiado Ibope

detectou que 95% (noventa e cinco por cento) dos brasileiros são a favor das

pesquisas23.

Evidencia-se, então, a grande relevância das citadas pesquisas, bem como o

desejo popular pelos seus resultados. No entanto, seriam os meios necessários para

atingir estes fins um consenso na população? A manipulação de embriões viola o

nosso direito? Estas questões particulares sobre o embrião, devido a sua

complexidade, serão avaliadas no sub-tópico que segue.

4.1 A questão dos embriões

Primeiramente, deve-se acrescentar que nunca houve, e ainda não há,

consenso quando se trata de definir o momento de início e do fim da vida.

Começaria ela com a fecundação? Ou seria necessário o desenvolvimento, mesmo

que inicial do sistema nervoso central? Tal questão, por ser polêmica, divide a

sociedade. Não obstante a isso, não precisa ser respondida para se obter um

posicionamento na questão em debate, já que o centro da discussão, como bem

frisa o Ministro Gilmar Mendes, não é determinar o início da vida, mas sim a postura

do Estado em relação aos embriões, principalmente quando em face das novas

tecnologias24. Portanto, a questão deveria definir qual é a tutela jurídica adequada

que se deve ter um embrião. Definido este primeiro critério, deveria responder se a

21 Voto do ministro relator. Op. cit. 22 Se levarmos em conta os números citados pelo relator, pelo menos 10% (dez por cento) da população nacional. Isto mesmo, se considerarmos que a população nacional é de cerca de 200 milhões de habitantes, e que destes, cerca de 5 milhões possuem doenças genéticas e outros 15 milhões possuem diabetes, desconsiderando os acidentados, teremos 20 milhões de pessoas que se beneficiariam das pesquisas. 23 Voto do ministro Marco Aurélio, que pode ser conferido na íntegra em <http://www.stf.jus.br/arquivo/cms/noticiaNoticiaStf/anexo/ADI3510MA.pdf>. Acesso em: 14-05-2010. 24 Voto do Ministro Gilmar Mendes. Op. cit.

659

tutela legalmente representada no art. 5º da Lei de Biossegurança protegia

suficientemente os embriões, abarcando todo o conceito do critério definido em

debates.

Para alguns Ministros, cabe ressaltar, a vida é um processo evolutivo, ou,

como bem definiu o relator: uma metamorfose. Sendo assim, da mesma forma que o

lagarto não é crisálida e esta não é borboleta, o embrião não é feto e este não é ser

humano. Este ponto de vista, ademais, segundo o relator, é reforçado pelo fato de a

tutela jurídica ser distinta em cada fase da vida. Exemplifica o raciocínio afirmando

que o cadáver é tutelado em nosso direito penal, no entanto, não com a mesma

amplitude com que se protege uma pessoa viva. O aborto, por sua vez, protege a

vida intra-uterina. No entanto, a pena prevista para esse tipo penal é inferior a

referente à homicídio. Destaca, ainda, que o aborto não tutela o embrião congelado,

mas somente aquele que se desenvolve no interior do útero materno, haja vista que

o tipo penal não faz referência à placa de Petri. Por fim, considera, como bem fez a

Dr.ª Mayana Zatz que a pesquisa com embriões congelados não se equipara ao

aborto, haja vista que nesta conduta, o embrião se desenvolve no útero materno e

consistirá em vida se não for interrompido por uma ação humana. No que tange aos

embriões congelados, porém, a situação é radicalmente inversa. O embrião não se

desenvolverá se não houver uma atitude de caráter positivo.25 Essa linha

argumentativa, cabe ressaltar, também permeia os votos dos Ministros Joaquim

Barbosa26 e Marco Aurélio27. O último, com efeito, acrescenta que, devido ao

raciocínio da professora da USP, não se pode tutelar, da mesma forma, a vida intra-

uterina e a extra-uterina. No que tange a primeira, avulta, ainda existe a

possibilidade de aborto terapêutico e em caso de estupro. Sendo assim, a proteção

do embrião deve ser ainda menor28.

Esta argumentação supracitada, contudo, é rebatida, brilhantemente, pelo

Ministro Peluso que corrige o equívoco técnico da argumentação exposta. Afirma o

nobre julgador que não convém afirmar que a pena cominada no tipo penal não

possibilita avaliar se existe um valor menor da vida extra-uterina em relação à intra-

uterina, já que as penas não são estabelecidas apenas segundo o valor do bem 25 Voto do Ministro relator. Op. cit. 26 Voto do Ministro Joaquim Barbosa, cuja íntegra se encontra disponível em: <http://www.lrbarroso.com.br/pt/casos/celulastronco/votos/joaquim_barbosa.pdf>. Acesso em: 14-05-2010. 27 Voto do Ministro Marco Aurélio. Op.cit. 28 Ibid.

660

jurídico, mas sim, e principalmente, segundo a reprovabilidade de cada conduta

típica29. Portanto, a quantidade das penas previstas nos tipos penais não tem o

condão de valorar a diferença entre os bens jurídicos, mas somente de atribuir maior

censura a uma conduta em detrimento da outra.

Além da tutela jurisdicional prestada pelo direito penal, outro argumento

utilizado no debate se deu, justamente, com a tentativa de definir o momento de

início da vida. Este ponto, cabe ressaltar novamente, está longe de apresentar um

consenso. Como bem destacou o Ministro Marco Aurélio, existem várias correntes

no que tange ao início da vida. Sendo assim, existem os que consideram que a vida

começa com a: concepção; ligação do feto à parede do útero materno; formação das

características individuais do feto; percepção pela mãe dos primeiros movimentos; e

por fim, com o nascimento30. Essas diversas correntes, com efeito, também se

dividiram nos votos dos Ministros, cujas principais posições passaremos a expor nas

próximas linhas.

O Ministro Menezes Direito foi o único a afirmar, com veemência, que o

embrião é indivíduo desde a fecundação e, por isso, deve ter a sua dignidade

preservada, haja vista que ela não se perde com o congelamento31. Sendo assim,

seu posicionamento se coaduna com o da CNBB, para quem o “embrião é um ser

humano, que, por força da lei natural, continuará a crescer, amadurecer, envelhecer

e morrer, segundo o ritmo de tempo concedido a cada um”32. O nobre Ministro

adiciona que “se para salvar uma vida sacrificamos uma outra, ficará sem salvação o

homem. É necessário fazer o bem a partir do bem e não a partir do mal”33.

Diferente, porém, é o posicionamento dos outros julgadores. Ellen Gracie, por

exemplo, afirma que antes de 14 dias de vida não há diferenciação celular e

portanto, não existe, se quer o embrião, mas apenas um organismo pré-embrionário

que, poderia, sim, ser submetido a pesquisas34. Já o Ministro Ayres Britto defende o

ponto de vista de que como nossa legislação define a morte cerebral como fim da

29 Voto do Ministro Cezar Peluso, cuja íntegra se encontra disponível em:<http://www.lrbarroso.com.br/pt/casos/celulastronco/votos/cezar_peluso.pdf>. Acesso em: 14-05-2010. 30 Voto do Ministro Marco...Op.cit. 31 HENRIQUES, Andréia; RIBEIRO, Danielle. Após três horas, Menezes Direito afirma que ação é parcialmente procedente. Última Instância. Disponível em: <http://ultimainstancia.uol.com.br/noticia/51469.shtml>. Acesso em: 14-05-2010. 32 Voto do Ministro Cezar Peluso.Op. cit. 33 HENRIQUES; RIBEIRO. Op. cit. 34 Voto da Ministra Ellen Gracie, cuja íntegra se encontra disponível em:< http://www.stf.jus.br/arquivo/cms/noticiaNoticiaStf/anexo/adi3510EG.pdf>. Acesso em: 14/05/2010.

661

vida, o início da mesma se daria com o início das atividades cerebrais. Sendo assim,

para o relator, o embrião não seria um ser vivo, posto que não possui cérebro35. Este

argumento, contudo, foi refutado, mais uma vez, por Cezar Peluso. O atual

presidente da Corte afirmou que a morte cerebral não corresponde à morte

biológica, que se dá com o fim de todas as atividades vitais, mas apenas a uma

ficção jurídica que permite o aproveitamento de órgãos para transplante e doação,

com o manifesto propósito de salvar vidas ao invés de manter outra em estado

vegetativo. Além disso, se posiciona no sentido de considerar o início da vida se dá

com a fixação do óvulo fecundado na parede do útero materno. Portanto, segundo a

linha de raciocínio deste Ministro, a realização de pesquisas com embriões

congelados não interrompe o curso da vida, já que esta sequer se iniciou no embrião

congelado36.Posicionamento semelhante ao de Peluso é defendido por Eros Grau.

Para ele, o embrião faz parte do gênero humano e, por isso, deve ter reconhecido o

direito constitucional à vida e à dignidade. Contudo, frisa o Ministro, vida é

movimento, o que não se configura nos embriões congelados. Portanto, conclui, só

existe vida quando o embrião está no útero materno. Logo, os embriões congelados

não possuem vida e muito menos dignidade37.

A verdade é que o embrião deve ser protegido, mas a sua produção

excessiva leva a três possibilidades: congelamento perpétuo, descarte e pesquisa.

As duas primeiras possibilidades, com efeito, não são nobres. Manter os embriões

congelados ou descartá-los, na verdade, seria mais indigno e repulsivo que destiná-

los a pesquisas benéficas à humanidade38. Sendo assim, repara-se um enorme

caráter ético na aprovação das pesquisas, já que estas possibilitam que embriões

inviáveis, que jamais seriam utilizados sirvam à humanidade. Logo, o melhor juízo é

aquele que reconhece os direitos aos embriões, mas também percebe que no outro

pólo da discussão existe o direito a vida de milhões de pessoas (crianças, adultos e

idosos) que possuem a esperança de obter um tratamento para as suas doenças,

ainda sem cura39.

Evidencia-se, então, a necessidade de se desenvolver as pesquisas. Por

outro lado, avulta-se o dever de impor balizar ao desenvolvimento científico. Um 35 Voto do Ministro relator. Op. cit. 36 Voto do Ministro Cezar Peluso. Op.cit. 37 Voto do Ministro Eros Grau, cuja íntegra se encontra disponível em:< http://www.stf.jus.br/arquivo/cms/noticiaNoticiaStf/anexo/adi3510EGrau.pdf>. Acesso em: 14/05/2010. 38 Voto do Ministro Cezar Peluso.Op.cit. 39 Voto do Ministro Joaquim Barbosa.Op.cit.

662

estudo mais aprofundado sobre as possibilidades de pesquisa, com efeito, será feito

no próximo tópico.

4.2 Os limites que devem ser impostos pelo art. 5º da Lei de Biossegurança

A Constituição estabelece no art. 218 o compromisso do Estado de promover

e incentivar o desenvolvimento científico, a pesquisa e a capacitação tecnológica.

Este incentivo, contudo, não pode sobrepor valores fundamentais da sociedade, tais

como o direito à vida e a dignidade da pessoa humana. Sendo assim, há de se

ressaltar a necessidade de se estabelecer limites ao progresso, de modo a balizar,

pela ética, as condutas e possibilidades dos cientistas.

No que tange a Lei de Biossegurança, o mesmo artigo que prevê a

possibilidade de pesquisas com células embrionárias é o responsável por delimitar

os limites de atuação. O artigo em questão é o 5º que submete a pesquisa a 3

condições: o embrião deve ser inviável; deve haver consentimento dos genitores; a

doação para pesquisas deve ser gratuita.

Primeiramente, então, há de se considerar a viabilidade do embrião. Ora,

segundo os médicos a viabilidade de um embrião congelado a mais de três anos é

praticamente nula. Ademais, este prazo é razoável, já que possibilita os genitores

optarem pela implantação ou não do embrião. Em outras palavras, um casal infértil

resolve congelar 10 embriões. Então, terá três anos para implantar quantos

embriões quiser, concretizando o direito do planejamento familiar,

constitucionalmente garantido. Após este período, então, os embriões já serão

impróprios à fecundação, posto que inviáveis. Nesta situação, há três opções, o

descarte, congelamento eterno e a pesquisa. Diante deste cenário, a Ministra Ellen

Gracie acredita que a lei é razoável ao permitir a pesquisa, pois estes pré-

embriões40 não teriam destino diverso do descarte41. A Ministra Cármen Lúcia, por

sua vez, afirma que a restrição aos embriões inviáveis como objeto de pesquisa é,

40 Vale lembrar que a ministra segue a filosofia de que o organismo só é embrião quando possui diferenciação celular, fato que ocorre com 14 dias. 41 Voto da Ministra Ellen Gracie. Op.cit.

663

justamente, o fator que garante a não violação do direito à vida na presente

questão42.

O embrião utilizado na pesquisa, então, deve ser inviável a reprodução, posto

que congelado por mais de três anos. Diante desse cenário, como bem afirmou Ellen

Gracie, só existem três possibilidades: congelamento, descarte ou pesquisa. As

duas primeiras possibilidades, cabe ressaltar, são praticamente sinônimas no caso

em tela, haja vista que o esquecimento do embrião congelado, basicamente, é um

descarte. Portanto, o embrião, inapto à procriação será descartado ou objeto de

pesquisas. Frente a este cenário, o Ministro Marco Aurélio trouxe, em seu voto, a

opinião do biólogo David Battimore, ganhador de um prêmio Nobel, que afirmou que

“a discussão é sem sentido, já que os embriões serão destruídos de qualquer modo.

A questão é saber se serão destruídos fazendo o bem a outras pessoas ou não”43.

Evidencia-se, pois, a maior nobreza em destinar os embriões à pesquisa, haja vista

a maior utilidade que os embriões podem ter neste fim. Esta finalidade mais nobre,

com efeito, é chamada pela Ministra Ellen Gracie de princípio utilitarista e consiste

no principal argumento de Cármen Lúcia.

Segundo esta ministra, a utilização de células-tronco embrionárias para

pesquisa voltada a tratamentos de saúde não agride a dignidade humana. Pelo

contrário, a valoriza, já que o destino destes embriões seria o lixo. Lembra a

julgadora que o princípio da dignidade da pessoa humana é o princípio fundante do

ordenamento jurídico pátrio, ou seja, serve de base para todo o sistema jurídico e

político do Brasil. Com efeito, este princípio dispõe que a espécie humana deve ser

respeitada em sua dignidade. Esta dignidade, frisa a Ministra, atinge toda a

humanidade, abarcando, portanto, os embriões e os mortos. Sendo assim, os

embriões devem ter a sua dignidade respeitada. Ocorre que os embriões não

aproveitados no procedimento de implantação seriam destinados ao lixo, tratamento

este, indubitavelmente indigno. A pesquisa, todavia, consiste, justamente, na

possibilidade de transformar o embrião na vida futura de alguém. Ora, ressalta a

Ministra, a biomedicina deve se comprometer com a libertação do ser humano e se

não houvesse a possibilidade de pesquisar e transformar para melhor, o homem

seria um escravo de sua própria prisão (física, psíquica e mental). Portanto, a

42 Voto da Ministra Cármen Lúcia, cuja íntegra se encontra disponível em:< http://www.stf.jus.br/arquivo/cms/noticiaNoticiaStf/anexo/adi3510CL.pdf>. Acesso em: 14/05/2010. 43 Voto do Ministro Marco Aurélio. Op.cit.

664

legislação, segundo esta Excelência, não contraria o princípio da dignidade da

pessoa humana e tampouco viola o direito à vida. Pelo contrário, a pesquisa “torna

parte da existência humana o que vida não seria, dispondo para os que esperam

pelo tratamento a possibilidade real de uma nova realidade de vida”44.

Sentido semelhante evidencia-se no voto do Ministro Ayres Britto, para quem

a possibilidade do desenvolvimento científico na seara em debate:

Longe do desprezo ou desrespeito aos congelados embriões “in vitro”, significa apreço e reverência a criaturas humanas que sofrem e se desesperam nas ânsias de um infortúnio que muitas vezes lhes parece maior que a ciência dos homens e a própria vontade de Deus45.

Superado a imposição legislativa a respeito da inviabilidade dos embriões, há

de se tecer um breve comentário a respeito da necessidade de autorização dos

genitores. Para o relator o consentimento dos genitores revela que o casal não tem

intenção de converter o embrião em vida humana, estando, portanto, sujeito ao

descarte ou a pesquisa46. A escolha dentre estas opções, como bem frisa Joaquim

Barbosa é conferida aos genitores. Trata-se, portanto, de uma faculdade e não uma

imposição legal. Sendo assim, os genitores poderão tomar a decisão de acordo com

as suas crenças e valores. Logo, segundo o Ministro, a lei concilia os valores

pessoais, incluindo os religiosos e a liberdade47. O referido consentimento,

acrescenta o Ministro Direito deve ser prévio e expresso48. Ademais, acrescenta

Lewandowski, deve ser precedido de informações precisas e leais no que tange às

consequências que sofrerá o embrião, bem como esclarecedora no que diz respeito

às outras alternativas49.

A última restrição legislativa, por fim, refere-se gratuidade das doações dos

embriões. Em outras palavras, os genitores ao permitirem que o embrião inviável

seja alvo de pesquisa não podem receber e nem exigir nenhuma contraprestação

financeira. Sendo assim, a doação é de caráter humanitário e tem o condão de

auxiliar o desenvolvimento de uma técnica científica que pode revolucionar a

qualidade de vida de milhões de pessoas. Proíbe-se, portanto, o comércio de 44 Voto da Ministra Cármen Lúcia. Op.cit. 45 Voto do Ministro relator. Op.cit. 46 Voto do Ministro relator. Op. cit. 47 Voto do Ministro Joaquim Barbosa. Op.cit. 48 HENRIQUES; RIBEIRO. Op. cit. 49 LEWANDOWSKI segue Direito e vota parcialmente contra pesquisas. Última Instância. Disponível em:< http://ultimainstancia.uol.com.br/noticia/51492.shtml>. Acesso em: 14-05-2010.

665

embriões que, indubitavelmente, significaria uma ofensa à dignidade humana. Como

bem disse a Ministra Cármen Lúcia, o embrião é parte da humanidade e portanto

tocado pelo princípio da dignidade da pessoa humana. Logo, a comercialização

destes organismos significaria grave afronta a Constituição e a moral social e,

portanto, foi taxativamente vedada pelo dispositivo legal.

Finalmente, após analisar as balizas legalmente impostas ao desenvolvimento

de pesquisas com células-tronco embrionárias no Brasil, há de se comparar as

previsões nos ordenamentos estrangeiros. Ao realizar esta tarefa, o Ministro

Joaquim Barbosa constatou que todos os países impõem três condições: as

pesquisas devem visar o bem comum; só podem ser utilizados embriões

excedentes, isto é, não podem ser produzidos embriões para este fim; e, finalmente,

deve haver consentimento expresso dos genitores. Estas condições, anotou o

Ministro, são satisfatoriamente preenchidas pelo ordenamento pátrio, e, portanto, a

lei deve ser considerada constitucional 50.

A conclusão obtida por Joaquim Barbosa, contudo, não foi a mesma obtida

por outros julgadores que consideram que a lei nacional deveria estabelecer balizas

mais rígidas para nortear as presentes pesquisas. Estas posições, que consideraram

que os limites estabelecidos são insuficientes serão mais bem estudadas no próximo

tópico.

4.3 Das críticas quanto a constitucionalidade

A ADI em análise, conforme relatado no decorrer do trabalho, foi marcada por

um grande debate nas tribunas do STF. As discussões acaloradas, somadas a

polêmica do tema em estudo, com efeito, não conseguiu atingir um consenso nos

votos dos Ministros, fato que se evidencia no apertado placar final, com 6 votos pela

improcedência da ação contra 5 votos críticos. O presente artigo, até então, contudo,

pautou sua exposição, principalmente, pelos argumentos proferidos pelo lado

vencedor. Diante disso, urge a necessidade de focar um pouco mais, no presente

momento, nos argumentos proferidos pelo lado vencido.

50 Voto do Ministro Joaquim Barbosa. Op.cit.

666

Sendo assim, primeiramente, deve-se citar a crítica do Ministro Lewandowski

que criticou a técnica legislativa do questionado dispositivo legal. Para este julgador,

a técnica adotada deixa dúvidas no que tange aos limites impostos ao

desenvolvimento científico51.

O Ministro Gilmar Mendes, por sua vez, não criticou a clareza do dispositivo

legal, mas a deficiente proteção conferida pelas balizas impostas. O Excelentíssimo

julgador, afirmou em seu voto que o avanço científico não deve ser barrado,

entretanto, deve ser limitado por uma barreira ética, qual seja, o princípio da

responsabilidade. Para este Ministro, porém, os limites estabelecidos não são

suficientes para garantir a proteção desejada aos bens jurídicos envolvidos. Esta

falha, ressalta o julgador, tem o seu ponto de partida com a pouca regulamentação

da questão em exame. Ora, trata-se de um assunto que envolve direitos

fundamentais e, portanto, a redação deveria tutelar os bens jurídicos de forma mais

ampla e segura, ou seja, a tutela deveria ser proporcional à grandeza dos valores

envolvidos. Evidencia a sua argumentação citando a legislação de outros países

sobre o mesmo assunto. Para ele52, a legislação estrangeira é mais rigorosa, já que

a regulamentação pátria é extremamente sucinta e, por isso, incapaz de abordar

aspectos essenciais ao tema. Neste ponto, cabe ressaltar, compara a legislação

pátria com a lei espanhola que carrega 90 artigos sobre a temática debatida no

trabalho53.

A falta de regulamentação, pela insuficiência de texto, ademais, se evidencia

com a não criação, pela Lei de Biossegurança, dos citados comitês de ética. Além

disso, critica a falta de cláusula de subsidiariedade, constante na legislação externa.

Ora, argumenta, o avanço das pesquisas com células-tronco adultas pode dispensar

a utilização de embriões humanos. Sendo assim, antes deveria haver uma cláusula

de subsidiariedade que garantisse a não utilização de embriões em caso de haver

outros métodos menos gravosos54.

Não obstante as críticas e deficiências apresentadas, o Ministro Gilmar

Mendes acredita que a ausência do art. 5º da Lei nº 11.105/05 seria ainda mais

maléfica para a ordem jurídica e social, haja vista que criaria um vácuo normativo a

respeito do tema. Diante disso, considera a ação improcedente, mas fixa

51 LEWANDOWSKI. Op.cit. 52 Diferentemente do que ocorre com o Ministro Joaquim Barbosa. 53 Voto do Ministro Gilmar Mendes. Op.cit. 54 Ibid.

667

interpretação em consonância com o princípio da responsabilidade e da

proporcionalidade de modo a impedir proteção deficiente55.

A maior quantidade de críticas, todavia, se deu em relação a falta de previsão

legal no que tange a fiscalização das pesquisas. Segundo a Ministra Cármen Lúcia,

o art. 225, §1º, II da Carta da República, que outorga ao Poder Público o dever de

“fiscalizar as entidades dedicadas à pesquisa e manipulação de material genético”

requer maior severidade no controle das instituições de pesquisa e dos serviços de

saúde que as realizem56. A mesma linha, cabe ressaltar, é seguida pelo Ministro

Eros Grau que atenta para o risco de concentrar a fiscalização e aprovação das

pesquisas em comitês de ética vinculados às própria instituições pesquisadoras.

Exige, então, a participação do Ministério da Saúde nestes processos

fiscalizatórios57. Cezar Peluso, ademais, segue o mesmo raciocínio, reclamando por

uma fiscalização estatal que submeta as pesquisas ao Ministério da Saúde,

Conselho Nacional de Saúde e Agência Nacional de Vigilância Sanitária58.

Crítica mais contundente, porém é a do Ministro Menezes Direito. Sedento por

controle a estas atividades, reclama pela participação da ANVISA que segundo o

Ministro, deve realizar fiscalização nos estabelecimentos e cadastro nos embriões.

Tamanha precaução, segundo o Ministro, se justifica pelo risco de ocorrência de

experiências genéticas, incluindo clonagem humana59. Preocupação semelhante,

com efeito, contém o Ministro Eros Grau que temendo atitudes eugênicas, defende,

em sua argumentação, a proibição da seleção genética. Ademais, o último Ministro,

critica a falta de limitação de embriões a serem produzidos por ciclo. Ora, a elevada

produção de embriões aumenta o número de excedentes, o que favorece as

pesquisas, mas contraria a intenção do legislador. Conforme exposto até então, a lei

tem o fulcro de possibilitar a realização de pesquisas com aqueles embriões

excedentes, que pelo decorrer do tempo já se tornaram inviável a implantação.

Trata-se, portanto, de utilizar estes embriões, que seriam descartados, em um fim

mais digno, em uma ação humanitária, concretizado o que a Ministra Ellen Gracie

denominou de princípio utilitarista. Ocorre que a ausência de limitação na

fecundação de embriões, possibilita a burla da lei, já que permite aos cientistas

55 Ibid. 56 Voto da Ministra Cármen Lúcia. Op.cit. 57 Voto do Ministro Eros Grau. Op.cit. 58 Voto do Ministro Cezar Peluso. Op.cit. 59 HENRIQUES; RIBEIRO. Op. cit.

668

congelarem 10, 20, 30 embriões de uma única vez. Sendo assim, o que deveria ser

aproveitamento do excedente passaria a ser produção para fins de pesquisa, o que

foi legalmente proibido. Eros Grau, então, evidencia os interesses políticos e

econômicos que permeiam esta pesquisa60. Estes interesses, segundo este nobre

julgador, colocam em risco o bloco de constitucionalidade e deixam vidas à mercê

do inescrupuloso mercado. Diante disso, faz a pertinente crítica e propõe a fixação

do limite máximo de 4 embriões por ciclo61.

6 O CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE E A FUNÇÃO POLÍ TICA DO

JUDICIÁRIO

Primeiramente, deve-se constatar que, desde sempre, os filósofos, cientistas

políticos e juristas se questionam a respeito do impacto do político nos problemas

concretos da normatividade do Estado62. Diante de tal quadro, a constitucionalista

portuguesa Cristina Queiroz afirma com precisão que “por detrás de cada fórmula

jurídica esconde-se uma decisão política”63. Ora, a imposição de condutas através de

normas é um ato de poder, e, todo ato de poder é político64. Evidencia-se, portanto,

uma relação de interdependência entre o direito e o poder político65. Esta relação, com

efeito, inicia-se com a própria constituição do direito e do poder político. Ora, como

bem afirma Habermas, o direito constitui o poder político e este constitui o direito66.

Em outras palavras, a criação deste, se dá pelo sistema legislativo (político), que

objetiva conferir um tratamento racional às questões políticas. A criação daquele, por

outro lado, se dá pelo direito, haja vista que é a norma que estrutura o legislativo,

conferindo-lhe competência normativa. Dessa forma, observa-se que o direito cria o

sistema político e, este, por sua vez, é responsável por criar normas, isto é, o direito67.

60 Argumento também defendido pelo Ministro Ricardo Lewandowski. 61 Voto do Ministro Eros Grau. Op. cit. 62 Cf. QUEIROZ, Cristina M.M. Os actos políticos no Estado de Direito: o problema do controle jurídico do poder. Coimbra: Almedina, 1990. p. 11. 63 Ibid. p. 200 64 LEITE, Glauco Salomão. A “politização” da jurisdição constitucional: uma análise sob a perspectiva da teoria dos sistemas de Niklas Luhmann, in Revista de Direito Constitucional e Internacional, São Paulo: Revista dos Tribunais, ano 16, n. 64, p. 151-185, jul./set. 2008. p. 159 65 NEVES. Entre Têmis e Leviatã: uma relação difícil. 2. ed. São Paulo: Martins Fontes, 2008. p. 89. 66 Cf. HABERMAS, Jürgen. Direito e Democracia: entre factilidade e validade. Trad. Flávio Beno Siebeneichler. V.1. 2.ed. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003. p. 211. 67 Ibid. p. 212-213.

669

Essa relação, vale acrescentar, adquire relevo ainda maior quando o assunto é

Constituição, já que a Lei Maior é responsável por fundar uma ordem jurídica nova,

definindo a estrutura do Estado. Diante disso, não restam dúvidas quanto à força

política da Carta Magna, haja vista que ela estrutura o próprio Poder estatal,

repartindo-o (por exemplo, em Executivo, Legislativo e Judiciário) e delimitando as

esferas de atuação de cada uma de suas divisões.

Atualmente, porém, com a superação do Estado liberal e com o advento do

Estado Social e Democrático de Direito, as Constituições contemporâneas não tem se

limitado a instituir o Estado através de sua mera divisão política. Pelo contrário,

hodiernamente há uma preocupação global em definir, no texto constitucional, uma

ordem dos direitos dos cidadãos. Dessa maneira, é traçado na Constituição um plano

ou projeto de Estado-modelo que indica, através de normas programáticas68,

preceitos que visam dirigir a sociedade a um fim. Devido a isso, as Leis Maiores com

estas características têm sido classificadas pela doutrina como constituições

dirigentes, haja vista que não se limitam a estruturar o Estado, dividindo os seus

poderes e atribuições, mas também estabelecem um objetivo de sociedade a se

buscar. Em outras palavras, a Constituição, quando dirigente, estabelece um projeto

de Estado a ser alcançado, considerando, na elaboração do supracitado modelo, os

princípios e valores de uma determinada sociedade, em um determinado espaço de

tempo, e, então, cria compromissos69 através de normas programáticas, ou seja,

normas “que impõem uma atividade e dirigem materialmente a concretização

constitucional”70, com o fulcro de atingir os objetivos constantes no plano almejado.

Sendo assim, o ordenamento jurídico deixa de ser um mero regulador de

68 Neste ponto, é importante salientar que o conceito de norma programática adotado no presente texto refere-se à obra de Canotilho. Para este autor, as normas programáticas são aquelas que estabelecem um programa de direção política, ou seja, dirigem o Estado para a concretização de um compromisso político definido. Sendo assim, o seu conceito difere muito do adotado por José Afonso da Silva que utiliza a mesma expressão para definir as normas que necessitam de regulamentação legislativa para ter efetividade. Para maiores detalhes dos conceitos adotados, ver: CANOTILHO, J.J. Gomes. Constituição dirigente e vinculação do legislador: contributo para a compreensão das normas constitucionais programáticas. Coimbra: Limitada, 1982; SILVA, José Afonso da. Aplicabilidade das normas constitucionais. 7. ed. São Paulo: Malheiros, 2007. 69 Cf. CANOTILHO. Constituição... op.cit. p. 141. 70 CANOTILHO. Direito Constitucional... op. cit. p. 1176. Ainda neste assunto, há de se destacar a distinta posição adotada por Manoel Gonçalves Ferreira Filho que considera que a Constituição brasileira não é dirigente, mas sim “Total”, haja vista que estabelece em um mesmo texto a Constituição política, a Constituição social e a Constituição econômica. Para maiores informações sobre o assunto conferir FERREIRA FILHO. Aspectos do direito constitucional contemporâneo. São Paulo: Saraiva, 2003. p. 74.

670

conflitos intersubjetivos e passa a ser um elemento de transformação social71.

Confirmando o exposto, afirma Peter Häberle: “Constituição é a ordem jurídica

fundamental de um Estado e de uma sociedade. Não é apenas a limitação do poder

estatal, mas também a limitação do poder social e a própria autorização do poder

estatal”72. Dessa maneira, estes preceitos constantes nas normas programáticas

caracterizam-se por conterem decisões políticas fundamentais e, por esse motivo,

vinculam todas as autoridades às suas disposições e princípios73. Portanto, os atos de

todas as autoridades devem obedecer ao previsto no texto constitucional. Tal

obediência, com efeito, deve ser tanto no aspecto formal (procedimental) quanto no

material (conformidade do conteúdo dos atos com os dispositivos constitucionais)74.

A extrema relevância da Lei Suprema, contudo, deve ser garantida. Ora,

exatamente para garantir a superioridade e eficácia do texto constitucional é que

existe o controle de constitucionalidade. Tal atividade, faz mister acrescentar se

caracteriza por ter natureza híbrida, haja vista seu papel político e jurídico. Com efeito,

a jurisdição constitucional é política, na medida em que possui um objeto político, qual

seja, a Constituição. Em contrapartida, também possui natureza jurídica, pois sua

atuação não se dá por métodos políticos, mas exclusivamente jurídicos75.

Ademais, é justamente no “exercício da jurisdição constitucional que se verifica

um maior atrito entre os sistemas jurídico e político”76. Esse maior atrito, com efeito,

se verifica, principalmente, na relação existente entre o controle de

constitucionalidade e a democracia. A este respeito, Barruffini esclarece que a

legitimidade do controle de constitucionalidade encontra-se na idéia de

complementariedade entre Democracia e Estado de Direito, já que a democracia se

pauta na soberania popular e, portanto, consubstancia-se no governo da maioria. O

Estado de Direito, por sua vez, pauta-se na supremacia das normas jurídicas, entre as

quais se destacam as normas constitucionais. Estas, entretanto, estabelecem a

proteção aos direitos fundamentais e ao controle jurisdicional do poder estatal e, por

71 LEITE. Op. cit. p. 158 72 Cf. HÄBERLE, Peter. Jurisdição Constitucional como força política. In. TAVARES, André Ramos (coord). Justiça Constitucional: pressupostos teóricos e análises concretas. Belo Horizonte: Fórum, 2007. p.66. 73 Cf. QUEIROZ. Op. cit. p. 138-139. 74 Cf. CANOTILHO. Direito Constitucional...Op. cit. p. 246. 75 Cf. QUEIROZ. Op. cit. p. 166. 76 LEITE. Op. cit. p. 177.

671

isso, tutelam, também, os interesses das minorias77. Não obstante a opinião do nobre

autor sobre a democracia, há de se considerar que, atualmente, tal conceito evoluiu.

Sendo assim, a sociedade democrática não se caracteriza por seguir a mera vontade

da maioria, mas sim, por garantir o respeito e participação de todos os grupos e

classes sociais. Dessa forma, a jurisdição constitucional não se encontra entre a

democracia e o Estado de Direito, mas atua como forma de garantir os valores

democráticos, defendendo o pluralismo de nossa sociedade78. Nota-se, então, que a

jurisdição constitucional apresenta-se de forma bem mais ampla e importante do que

a apresentada pelo autor, já que se trata de um instrumento de legitimação dos

valores democráticos, tutelados, invariavelmente, por todas as constituições

dirigentes.

Neste tipo de Constituição, cabe afirmar, os três poderes constituídos têm o

poder-dever de transformar o plano normatizado em realidade, fazendo o Estado

evoluir no sentido do norte constitucionalmente estabelecido. Ocorre que o objetivo a

ser alcançado pode exigir a participação ativa e simultânea de mais de um órgão

constitucional. Neste caso, deve-se ressaltar a importância de cada poder agir

conforme a competência delimitada. Ora, evidentemente, todos os órgãos

constitucionais possuem suas atividades vinculadas ao texto constitucional. Esta

vinculação, conforme afirmado anteriormente, se dá tanto na esfera ativa quanto na

esfera passiva. Dessa maneira, não obstante o fato dos três poderes terem o dever de

concretizar as normas constitucionais, eles também tem o dever de agir nos limites de

sua competência. Portanto, apesar de a tarefa constitucional abranger mais de um

órgão, ocorre, muitas vezes, de o privilégio da concretização, em um ponto específico,

ser exclusivo a um poder79. Observa-se, assim, que, embora seja importante a

concretização dos fins do Estado, também é importante a observância dos meios

estabelecidos, já que tenciona-se impedir, como princípio democrático, a

concentração de poderes em um só órgão. Logo, quando um poder age, mesmo que

de forma a concretizar valores constitucionais, interferindo na competência de outro

órgão, ele atua de forma abusiva, pondo em risco os valores democráticos inerentes

ao Estado Social. 77 Cf. BARRUFFINI, José Carlos Tosetti. O controle de constitucionalidade e a jurisdição constitucional. Franca: 2007. (Tese de Livre-docência em Direito Constitucional). Departamento de Direito Público da Faculdade de História, Direito e Serviço Social da Universidade Estadual Paulista. p. 95. 78 Cf. HÄBERLE. Jurisdição... Op.cit. p. 62. 79 Cf. CANOTILHO. Constituição... Op.cit. p. 179.

672

Essa problemática, contudo, inegavelmente, adquire grandes dimensões

quando o assunto é jurisdição constitucional. A aplicação deste instituto, como bem

demonstrado até aqui, não é somente jurídica, mas também política. Este viés político,

cabe ressaltar, se acentua em países cujo grau de fruição de direitos fundamentais é

insatisfatório, como o Brasil, haja vista a própria pressão social sobre a jurisdição

constitucional como forma de efetivar os direitos previstos na Lei Suprema. Trata-se

de uma reivindicação, inclusive nos meios acadêmicos, de atuação mais ativa do

Judiciário, de modo a diminuir o fosso entre a realidade fática e a realidade

normativa80. Essa atuação, contudo, deve ser limitada, sob pena de transformar o

Judiciário em uma nova Casa legislativa. Ora, a excessiva “politização” da jurisdição

constitucional pode levar a um “governo de juízes”, o que acarretaria no

questionamento a respeito de sua legitimidade democrática81.

Do mesmo modo, a problemática também ocorre com a interpretação da

Constituição. Com efeito, as constituições dirigentes modificaram, radicalmente, a

função do Judiciário que, deixa de ser mero aplicador da lei em resolução de conflitos

intersubjetivos e passa a ser instrumento político de transformação social,

trabalhando, diariamente, com novos direitos, como por exemplo, os direitos

coletivos82. Ora, as constituições dirigentes, como afirmado anteriormente,

estabelecem uma ligação com a atividade de direção política e, normalmente, se

manifestam através de conceitos legais indeterminados. Tais expressões, por serem

amplas e gerais, atribuem grande margem a interpretação, que será variável de

acordo com a evolução da sociedade a respeito do conceito em questão. Entretanto,

esta interpretação não pode representar, como muitas vezes ocorre, uma criação de

direito, função particular e inerente ao Legislativo83.

Verifica-se, portanto, que a Carta da República funda a ordem estatal,

estruturando os poderes e tutelando os direitos e garantias fundamentais. Esta

divisão, com efeito, delimita a esfera de ação, competência, de cada poder constituído

de modo a não permitir a excessiva concentração de poder em um único órgão.

Possibilita-se, assim, uma maior fruição dos princípios democráticos. Como

decorrência disso, deve-se criticar os apelos ao ativismo judicial. Esta prática, com

efeito, defende que os magistrados transpassem os limites legais e constitucionais, ou

80 Cf. LEITE. Op. cit. p. 161. 81 Ibid. p. 162-163. 82 Cf. LEITE. Op. cit. p. 159. 83 Cf. QUEIROZ. Op. cit. p. 148-149 e 168.

673

seja, permite que o Judiciário realize atos da esfera do Legislativo. Ora, há de se

ressaltar que, antes de qualquer coisa, os juízes são seres humanos. Sendo assim,

possibilitar que eles desconsiderem as leis democraticamente elaboradas segundo os

valores de uma sociedade, permite a imposição de crenças e preconceitos pessoais

nas decisões84. Em outras palavras, o ativismo judicial resulta na “politização da

justiça”, ou seja, a tomada de decisões segundo critérios políticos85. Trata-se, pois, de

uma manifestação de poder arbitrária do julgador, o que contraria o Estado

Democrático de Direito86.

Este problema, ademais, se agrava quando o órgão julgador em questão é o

Supremo Tribunal Federal. Ora, este órgão é justamente o responsável por proteger a

coerência do ordenamento jurídico e a supremacia da Constituição87. Dessa forma, a

Suprema Corte possui a responsabilidade de vigiar a manutenção da Constituição a

começar pelos “procedimentos e normas organizacionais dos quais depende a

eficácia legitimativa do processo democrático”88. Em outras palavras, o STF, como

protetor e defensor dos dispositivos constitucionais deve ser o primeiro a atentar para

os seus dispositivos, entre os quais, se incluem as normas que delimitam a esfera de

competência atinente a cada poder constituído. Esta competência, no entanto, mudou

com a evolução do constitucionalismo. Ora, o Judiciário como um poder constituído

possui o dever de concretizar o plano constitucional. Este dever, com efeito, fez com

que a atuação política deste poder aumentasse exponencialmente. Verifica-se, então,

um processo de judicialização da política, que se configura com a sobrecarga de

questões políticas a competência do Judiciário.

Dessa forma, destaca-se que, com a evolução do constitucionalismo,

principalmente com o advento das constituições dirigentes, o Judiciário deixou de ser

um mero aplicador do texto legal, passando a desempenhar um papel de

transformação do Estado rumo a um plano constitucionalmente positivado. Esta

atuação, no entanto, deve ser limitada conforme o preceituado na Carta da República,

haja vista que ultrapassar estas balizas significa exercer um poder arbitrário, ilegal, e

portanto, contrário ao Estado Democrático de Direito. O cuidado para não ultrapassar

estes limites, com efeito, deve ser ainda maior no âmbito da jurisdição constitucional,

84 Cf. HABERMAS. Op.cit. p. 266. 85 NEVES. Op.cit. p. 235. 86 Ibid. p.95 87 Cf. HABERMAS. Op.cit. p. 299 e 302. 88 Ibid. 327.

674

já que, conforme o exposto, é justamente o controle de constitucionalidade que

possibilita uma maior atuação do Judiciário na esfera política.

Na decisão da ADI 3510, diversamente de outras decisões de alta relevância

jurídica e política julgadas recentemente, o Supremo Tribunal Federal não excedeu os

limites da atividade jurisdicional traçados pela Constituição Federal, não incorrendo no

funesto ativismo judicial. Os julgadores ativeram-se, essencialmente, à verificação da

compatibilidade do art. 5º da Lei de Biossegurança com os preceitos constitucionais

do art. 1º, III, e 5º, caput, nos estritos moldes do controle de constitucionalidade,

apresentando votos bem fundamentados, de modo a sustentar as várias orientações

defendidas por cada Ministro, sob entendimentos e interpretações plurais. Entretanto,

data venia, há de se ressalvar a postura adotada pelo Ministro Eros Grau, que, em

seu voto, decidiu a questão estabelecendo termos aditivos, isto é, impondo novas

condições para a aplicação do art. 5º não previstas na Lei de Biossegurança, o que

caracteriza atividade criativa, típica do Poder Legislativo. Não obstante a pertinência

das condições e interpretações postas pelo Ministro, não é papel do Judiciário exercer

essa atividade criativa, já que lhe é constitucionalmente vedado estabelecer normas

gerais e abstratas.

Quanto à fundamentação da decisão, pode-se afirmar que, em geral, a

argumentação tecida pelos Ministros foi coerente com as decisões proferidas em cada

voto. Entretanto, algumas ressalvas merecem ser destacadas. Os Ministros Gilmar

Mendes, Eros Grau e Cármen Lúcia, por exemplo, constataram a insuficiência da

proteção conferida pelo art. 5º da Lei de Biossegurança aos embriões fecundados “in

vitro”, principalmente no que tange à fiscalização do emprego de tais materiais.

Todavia, ignoraram tal problemática e julgaram improcedente o pedido de declaração

de inconstitucionalidade do dispositivo. Tal postura revela uma grande contradição

dos julgadores com o entendimento geral do Supremo Tribunal Federal na matéria, já

que sempre se enalteceu a importância dos bens jurídicos ali envolvidos. Sendo

assim, detectada e apontada a falha da lei, a mesma não poderia ser ignorada.

Percebe-se, então, que a grande repercussão popular e a cobertura dada pela mídia

ao caso podem ter pressionado alguns dos Ministros que, ao que parece, não

conseguiram imprimir em seus votos a postura vigorosa que gostariam de adotar.

A Lei de Biossegurança, por certo, está longe da perfeição, merecendo maior

atenção por parte do legislador e do intérprete/aplicador do direito. O objeto da Lei e

os propósitos a que se destina são de grande relevância, podendo afetar quase 10%

675

da população brasileira. Ademais, cerca de 95% dos brasileiros manifestaram apoio

às pesquisas com células-tronco embrionárias, que a Lei de Biossegurança veio

regulamentar, demonstrando a grande legitimidade de que goza este diploma legal,

que se coaduna com os valores e interesses de toda a sociedade. No entanto, um

assunto tão importante, e com tanto respaldo social, merecia um maior cuidado do

Legislador, que deveria ter se valido de uma técnica legislativa que garantisse maior

proteção aos bens jurídicos envolvidos, a começar pela fiscalização dos empregos

dos embriões humanos fecundados “in vitro”. As disposições legais, no que tange a

este ponto, são muito vagas e pouco precisas, gerando ambigüidades e incertezas na

interpretação da matéria. Há, nesse sentido, a necessidade de criação de comitês de

fiscalização ligados ao Estado, não às instituições de pesquisa, como forma de

garantir sua imparcialidade e isenção. Da igual maneira, destaca-se a necessidade de

previsões legais que limitem o número de embriões formados por ciclo, tal como

sugeriu o Ministro Eros Grau em seu voto. Como dito, embora se sustente que

estabelecer tais limitações em decisões judiciais aditivas não seja a forma mais

adequada democraticamente de exercício da jurisdição constitucional, trata-se de uma

real necessidade, como forma de garantir que as pesquisas não se submetam aos

interesses do mercado. Vale dizer, os embriões pesquisados devem ser unicamente

os excedentes do processo de fecundação “in vitro” com fins reprodutivos, e não os

resultantes de uma produção em larga escala, com o único e exclusivo fim de produzir

material para pesquisa.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BARRUFFINI, José Carlos Tosetti. O controle de constitucionalidade e a jurisdição

constitucional. Franca: 2007. (Tese de Livre-docência em Direito Constitucional).

Departamento de Direito Público da Faculdade de História, Direito e Serviço Social

da Universidade Estadual Paulista.

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contributo para a compreensão das normas constitucionais programáticas. Coimbra:

Coimbra Editora, 1982.

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