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O SUICÍDIO DO SENHOR THOMPSON Em um emaranhado labirinto de mentiras, difícil será para a experiente inspetora Elena Ravini e a novata inspetora Denise Dantras, desvendar os motivos inusitados que levaram o Sr. Thompson Von Campestrinni a por fim em sua própria vida, no tranquilo município de Lontras. Um drama envolvente, de amor condensado em hipocrisia, depressão e angustia, que descreve os efeitos de uma sociedade que estabelece os padrões de normalidade e felicidades. No silêncio de uma vida "perfeita" sufoca a verdade que não ousa ser revelada pela luz barulhenta de uma vida em retalhos. ANDRESSA ROBERTI

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Page 1: O SUICÍDIO DO SENHOR THOMPSONrl.art.br/arquivos/6585958.pdfA brisa da manhã tocava em seu rosto, em quanto o cenário formidável de Timbó lhe passava pela vista escorrendo: rios

O SUICÍDIO DO SENHOR THOMPSON

Em um emaranhado labirinto de mentiras, difícil será para a experiente inspetora Elena

Ravini e a novata inspetora Denise Dantras, desvendar os motivos inusitados que levaram o

Sr. Thompson Von Campestrinni a por fim em sua própria vida, no tranquilo município de

Lontras. Um drama envolvente, de amor condensado em hipocrisia, depressão e angustia, que

descreve os efeitos de uma sociedade que estabelece os padrões de normalidade e felicidades.

No silêncio de uma vida "perfeita" sufoca a verdade que não ousa ser revelada pela luz

barulhenta de uma vida em retalhos.

ANDRESSA ROBERTI

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O crepúsculo da manhã surge em cores de meia cor. A coloração

do céu estava em tom vermelho-alaranjado. O vento assoviava forte, despojava

as folhas que se amontoavam, formando um tapete no chão em cores

amareladas. As árvores, outrora, cheia de flores agora estavam despidas no

outono.

Gabriel saltou da cama. Percebeu que estava atrasado. Não

importava. Fez seu ritual matinal. Voltou-se para o espelho do quarto, a fim de

se arrumar. Viu a imagem de um homem de vinte e sete anos, esbelto e bem

sucedido. Eu me amo, pensou Gabriel. Sou um homem muito lindo.

E era de fato! Gabriel Garcia Marquetti apresentava uma

elegância nada discreta. Pode-se dizer que no tocante a aparecias, Gabriel era

tudo o que poderia ser imaginado em um homem. Era de voz madura, serena e

agradável. A pele era suave como pêssego. Possuía uma testa larga, o rosto em

linhas levemente arredondadas e os lábios carnudos. Os olhos eram castanhos e

serenos, sempre marcados com um delineador, assim como os cílios. E seu

cabelo ruivo, voluminosos e cacheados, cortados em camada leve com lateral

pouco desbastada, mantendo a franja, nuca, e topo da cabeça quase igualado, lhe

dava uma aparência ainda mais charmosa.

Com todo o seu jeito para compreender o mundo a sua volta,

havia deixado a tumultuada cidade de Florianópolis e se instalou na tranquila

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cidade de Timbó, situado no coração do charmoso Vale Europeu catarinense e

conhecida como a ―Pérola do Vale‖. Montou seu escritório no ramo de

confecção e tinha sua própria marca de roupa - Oh lá lá! - muito badaladas,

sempre atuais e revolucionárias.

Gabriel colocou seu óculo de graus wayfarer redondo e vestiu

sem pressa uma Calça jeans Skinny e rasgada, pegou uma camiseta estampada

qualquer, jogou por cima um coat longo e calçou uma Chelsea Boot.

Foi ate a cozinha e ligou o liquidificador. Concentrando-se no

ingrediente que iria utilizar, jogou a couve manteiga com outras frutas e mais

água de coco. Dez minutos depois o suco detox estava pronto. Bebeu todo o

liquido devagar.

Vou começar a fazer yoga, pensou ele. Aquilo realmente parecia

ser uma ótima ideia. Anotou em sua agenda para a próxima semana fazer uma

aula experimental.

Estava se preparando para ir ao trabalhar. Mesmos as aragens da

manhã frias naquela estação, Gabriel costumava priorizar o ciclismo como meio

de transporte. Era o único momento oportuno para se exercitar.

Seguiu a avenida do bairro das Capitais e teve a incomoda

sensação de ter visto um carro o seguindo. Mas quem? E por quê? Tudo parecia

normal. Mas, todos os seus instintos lhe diziam o contrario.

A brisa da manhã tocava em seu rosto, em quanto o cenário

formidável de Timbó lhe passava pela vista escorrendo: rios de águas cristalinas

e as ruas estavam sempre limpas; o verde exuberante da mata nativa, as

palmeiras que cercavam a cidade, harmonizava com o contraste impar da

arquitetura e, ainda, um pouco de colorido dos jardins era possível ser visto

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mesmo no Outono; ao longe era possível ouvir o canto dos pássaros habitantes

comuns.

Logo a sua frente já era possível visualizar o edifício do

escritório. Gabriel entrou no estacionamento, mostrou o cartão de identificação

na portaria eletrônica. E seguiu para o bicicletario.

O ambiente já pulsava a todo vapor, todos empenhados

trabalhando apara acompanhar o ritmo global de novas ideias de novas

tendências, e também de criar novas propagandas.

No primeiro andar ficava a facção responsável por fabricar as

peças. O conjunto de escritório ficava no segundo andar, onde se viam varias

divisórias: administração, vendas, marketing e suporte técnico.

Todo o ambiente era informal e descontraído, com áreas de

descompressão, arquibancadas para compartilhamento de ideias, pufes, redes,

dress code mais informal, assim como o clima leve das reuniões em áreas de

convivência. Tudo favorecia um clima de trabalho mais colaborativo, criativo,

espontâneo, conectivo e humanizado.

Quando Gabriel se encaminhou para sua mesa, Ruan, um dos

estilistas, logo foi ter com ele:

Bom dia, doçura! – disse alegremente Ruan.

Gabriel sorriu. Baixou a cabeça e permaneceu pensativo. A voz

dele lhe dava nos nervos.

— ...iel?... iel?... – Era o apelido carinhoso que Ruan lhe dera e

que Gabriel detestava. – Você está a um milhão de quilometro de distancia

daqui. No que você esta pensando?

A voz irritante de Ruan o arremessou de volta para o momento.

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— Em nada! – Respondeu Gabriel secamente.

— Nossa! Quanto bom humor para uma sexta-feira. – Respondeu

Ruan ironicamente. - Pensei que hoje fosse dia de happy hour.

— Você sabe muito bem que detesto que me chame de iel. Faça

o favor de manter o profissionalismo?

Ruan pegou umas folhas do ultimo relatório sobre as novas

tendências e exibiu um sorriso antipático.

— Viu isso? Os números? As cores?

Gabriel correu o olho ligeiramente. Não estava com cabeça para

trabalhar com números naquele momento. Mas não poderia deixar de

transparecer aquilo.

— Certo obrigado! Deixe aqui comigo...

— Como pretende trabalhar nesses novos looks? Você sabe que

preciso de um feedbeck.

— Eu ainda não sei. Vamos conversar sobre isso depois do

almoço. Tudo bem?

— Ah!... Também já recebemos os nomes de algumas pessoas

que aceitaram fazer propaganda com o nosso nome. Está aqui? Parece estar

dentro do nosso orçamento...

Gabriel analisou ligeiramente a lista e jogou a folha por cima da

folha do relatório.

— Depois eu vejo isso!...

— E... A proposito, a lista de clientes e o relatório não tenha

pressa, querido. Precisamos de sua assinatura para semana passada. –

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Respondeu Ruan mais uma vez ironicamente e esboçando aquele sorriso

debochado.

Gabriel permaneceu em silencio. Não queria entrar numa

discussão explosiva logo de manhã, ainda mais com Ruan.

— Ei! Que tal sairmos para jantar no sábado? – Insistiu Ruan.

— Obrigado, mas já tenho compromisso!

— E por que não almoçamos juntos hoje então? – continuou

Insistindo... – poderíamos conversar sobre todos esses relatórios num ambiente

mais descontraído.

— Eu já lhe disse... Não! Não estou interessado. – Respondeu

Gabriel rispidamente. - A empresa já é bastante descontraída. Deixe-me

trabalhando e, por favor, volte para sua sala.

— Não está interessado, mas vai ficar. Aguarde-me!

Gabriel ficou analisando Ruan parado em frente a porta. Havia

algo assustador naquela entonação de voz. Gabriel tornou a se perguntar se não

seria ele o motivo de tanto desconforto. Afinal, Ruan era um individuo que

todos diziam ter fixação por ele. Mas, não, Gabriel meneava a cabeça. Não.

Precisava esquecer aquilo e pensar em outras coisas. Ruan estava apenas

colocando a prova a paciência de Gabriel naquele dia.

— Fiquei sabendo que você esta de namorado novo?... –

Continuou Ruan com as provocações. Agora está todo irritadinho, porque não

deve mais ser divertido ser a segunda opção, não é mesmo?

Que sujeitinho atrevido pensou Gabriel. Ele acha que é da sua

conta cuidar da minha vida. Gabriel se virou e olhou para ele, seriamente.

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— Chega Ruan! Vá para sua sala imediatamente! Entendeu

bem?... - Gabriel fez um gesto para que ele se retirasse.

Naquele momento Ruan se inclinou para frente e sussurrou:

— Tem uma coisa que você precisa aprender doçura: Nunca é

bom misturar a reputação com o prazer. Você esta saindo com um homem

casado que eu sei e isso não está certo!

— Na verdade, não sei o que você... – Gabriel ia dizendo, mas

preferiu não dar explicações. – Ah! Quer saber, mesmo? Não é da sua conta...

— Seja como for, eu não sei o que você viu nele! O cara é uma

almofadinha, um quadradão. Você pode se divertir muito mais comigo. – Ruan

deu uma piscadela – Você sabe o que quero dizer, não sabe?

Gabriel ficou olhando em quanto Ruan se afastava e tornou a

pensar agora de forma mais convicta: seria ele? Mas, Gabriel tentou se

controlar. Ele pôs mãos a obra. Meia hora mais tarde, em quanto trabalhava, o

telefone tocou. Levantou o rosto e viu que a ligação era de fora. Deixou a

secretaria cuidar disso.

Gabriel estava tão aflito que podia ouvir o som dos passos de

Ruan quando ele caminhava pelo corredor. Aquilo foi criando um temor em

torno de Gabriel.

Ao final do dia Gabriel ligou para o departamento de Recursos

Humanos dando ordens para que Ruan fosse despedido.

***

Sexta-feira era para ser um dia de relaxar, mas Gabriel não

conseguia nem mesmo rodeado pela tranquilidade e o silencio, de volta ao seu

lar. Por mais que tentasse focar em algo que não fosse o trabalho, a discussão

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que tivera com Ruan pela manhã, sua voz em tom ameaçador sempre voltava a

ecoar em sua mente.

Gabriel tentou despistar os pensamentos negativos, puxou o livro

―Saber cuidar: ética do humano, compaixão pela terra‖ do proeminente teólogo

e escritor catarinense, Leonardo Boff, quando percebeu que havia um recado em

seu celular:

“Você me deixou excitadíssimo da última vez. Fiquei interessado

em você. Vamos nos ver no próximo sábado à noite, conforme combinamos? Na

mesma hora no mesmo lugar”?

Gabriel fechou os olhos e ficou a lembrar dos momentos em que

estivera em Guarda do Embaú: trilhas ecológicas, praias desertas, mirantes,

cachoeiras e o mítico vale da utopia.

O nome da praia deriva da lenda dos baús com tesouros que

foram enterrados na praia pelos jesuítas durante a Guerra dos Farrapos e pelos

piratas que ali aportavam. E para ter acesso ao balneário, era necessário

atravessar o Rio Madre, que poderia ser feito por barcos guiados pelos nativos,

nadando ou caminhando quando o rio estava baixo.

Ficou a relembrar, de forma que sentia estar ainda lá, com os pés

descalços na areia branca e fina tocando o mar cristalino. Relembrando como se

ainda estivesse lá observando seu namorado catando conchinhas.

Ficou a relembrar os momentos românticos que teve com seu

amado: o chalé em estilo rústico com varanda com rede. Vista para o jardim e o

céu estrelado.

O local ficava próximo a praia, numa simpática vila de

pescadoras com ar alternativo, formada por dezenas de ruas de areia e outras

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pousadas charmosas, restaurantes e barzinhos rústicos que agitavam a noite do

vilarejo.

Ainda podia ouvir as batidas do coração em descompasso, o

abraço quente e aconchegante, depois de terem se amado completamente, sem

pudor sem medo.

Gabriel ficou ali relembrando aquelas cenas. Ficou a relembrar

do passeio pela Serra do Tabuleiro e os fins de tarde jantando crepioca vegana e

açaí. Gabriel ficou a sorrir sozinho, revivendo as aventuras e as brincadeiras.

Depois olhou animadamente mais uma vez o seu celular, lendo

várias vezes à mensagem. A sensação de imaginar os dois morando juntos

formando uma família era inexplicável. Ele se sentia um homem feliz, amado e

realizado.

***

Manoel Cristóvão e Lorita Silva Cristóvão estavam casados há

trinta e sete anos. Ambos haviam nascido e crescido em Lontras, um município

cortado pela antiga Estrada de Ferro Santa Catarina, localizado na Região do

Vale Europeu.

Em seus aspectos mais formidáveis, a cidade preservara os

costumes retratados na gastronomia, no artesanato e na hospitalidade de seus

moradores. É possível observar também os traços da história da colonização

alemã, registrado nas construções dos inúmeros casarios no centro e nos bairros.

Eles trabalhavam na casa da família Campestrinni. Nos dias de

folga, não perdiam o costume de namorar na Praça Henrique Schroeder e tomar

um delicioso sorvete no Guela Gela, que ficava ao lado do casarão Schroeder,

uma estrutura de detalhes expressivos na ornamentação externa e interna que

reforçam o estilo neoclássico, e diziam ser mal assombrado.

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Também eram de muita fé e frequentavam todos os domingos, a

palestra pública, na Fraternidade Espírita Chico Xavier, localizado no centro da

cidade, ao lado da Sociedade Lontrense.

A palestra daquele domingo estava imperdível. O tema abarcava

a história do Espiritismo. Como era de se esperar, o casal estava na primeira fila

ouvindo atentamente cada detalhe mencionado pelo palestrante.

“Em um humilde vilarejo – Começou a falar o palestrante em voz

tranquila, - chamado Hydesville, no estado de nova York, morava uma família

protestante. O pai, Jonh Fox e sua esposa Margareth, com suas duas filhas

Margareth e Kate. Na tosca cabana, residência da família Fox, começaram a

acontecer fatos estranhos, ruídos e pancadas inexplicáveis que se faziam ouvir

com tal intensidade que essa família não pôde mais repousar tranquilamente.

Certa noite quando as pancadas se tornaram mais persistentes e

fortes, as irmãs Fox resolveram desafiar o mistério, travando-se um diálogo com

o que todos julgavam ser o diabo: ao passo que Kate ia batendo palmas,

imediatamente se ouviram pancadas, em número igual ao das palmas.

Posteriormente, Margareth contou um, dois, três, quatro, e logo se fizeram

ouvir as pancadas correspondentes. Em seguida, Margareth perguntara se era

um espírito que fora assinado naquela casa e pedira que então batesse duas

palmas. E duas pancadas se fizera ouvir sem demora respondendo de forma

afirmativa a pergunta feita.

Entretanto, muitos curiosos, atraídos por esses fenômenos novos,

não se contentaram mais com perguntas e respostas. Um deles, chamado Isaac

Post, teve a ideia de nomear em voz alta as letras do alfabeto, pedindo ao

Espírito para bater uma pancada quando a letra entrasse na composição das

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palavras que quisesse fazer compreender. Desde esse dia, ficou descoberta a

telegrafia espiritual.

No mesmo período, na Europa, sobretudo na França, acontecia

outro fenômeno estranho, chamadas de mesas girantes ou dança das mesas, que

se movimentava, se levantava e, com um dos pés, davam certo número de

pancadas, respondendo desse modo – sim, ou – não, conforme fora

convencionado, a uma pergunta feita. Até então as pessoas utilizavam do evento

como um passatempo que animava os salões, interrogando os Espíritos sobre as

mais fúteis questões.

Foi quando em 1854, um cientista chamado Hippolyte Léon

Denizard Rivail, ao saber do evento, através de seu amigo Fortier, se dispõe

finalmente a participar pela primeira vez de uma sessão para verificar, observar

e analisar o fenômeno.

No primeiro momento Rivail não se impressiona com os fatos

verificados, pois que aquilo não havia nada de convincente para os céticos, sendo

que se podia acreditar num efeito da eletricidade, cujas propriedades eram pouco

conhecidas pela ciência de então.

No entanto, conforme as perguntas eram mais desenvolvidas

chegando, assim, a formular palavras e frases respondendo às perguntas

propostas, a precisão das respostas e sua correlação com a pergunta deixou

Rivail intrigado, pois não poderiam ser atribuídas aquilo ao acaso, um vez que

não poderia a mesa se mover se ela não possui músculos ou formular respostas

se ela não tem um cérebro. E assim concluiu: que por trás daqueles eventos

havia uma força inteligente.

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A partir dai Hippolyte cria meio mais eficazes de se comunicar

com os Espíritos. Foram nessas reuniões, na casa da família Baudin, que ele

iniciou seus estudos sérios a respeito do fenômeno. E através do auxilio de vários

médiuns, que registravam os ensinos universais dos Espíritos, Hippolyte

codifica obras como O Livro Dos Espíritos, O Livros Dos Médiuns, O

Evangelho Segundo O Espiritismo, A Gênese e O Céu E O Inferno, com o

pseudônimo de Allan Kardec. Surge assim a doutrina dos Espíritos, aliado a

ciência, filosofia e religião, buscando uma melhor compreensão não apenas do

universo tangível, mas também do universo transcendente.

Na introdução em o Livro Dos Espíritos, item 6, Allan Kardec,

resume os pontos principais da nova doutrina, tendo como fundamento a

existência de um Deus; Jesus como guia e modelo para toda a humanidade; a

comunicação útil com os espíritos através de médiuns; a reencarnação; e a

pluralidade dos mundos habitados.

E em 1869 desencarna Allan Kardec deixando o legado da

terceira revelação prometida por Jesus: a doutrina espírita. O Espiritismo é a

nova ciência que vem revelar aos homens, por meio de provas irrecusáveis, a

existência e a natureza do mundo espiritual e suas relações com o mundo

material; o Espiritismo também é a chave para se fizer compreender problema

tão obscuro e tão controvertido do passado e do futuro da Humanidade. Era, em

suma, toda uma revolução nas ideias e nas crenças”.

Ao final da palestra, todos se organizavam para tomar o passe e

seguir para seus lares. Manoel e Lorita gostavam de prosear com os

trabalhadores da casa a fim de continuar em torno daquela simpática sintonia

que emanava do ambiente.

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Depois de muito conversarem o casal resolveu que iriam

começar, nas terças-feiras, o estudo sistematizado da doutrina espírita – ESDE -

e trazer o neto para o estudo evangelizador aos sábados.

***

Ângela Von Campestrinni começou a perceber os ruídos

domésticos pela manhã. Ela estava tonteada e mal sabia o dia da semana.

La embaixo, pisadas pelo corredor, passos apressados e tão cedo.

Em seguida, se fazia ouvir o ruído da porta da sala que estavam sendo abertas.

O guizo das argolas da cortina correndo quando puxadas, o ruído da pá de lixo,

da vassoura, no passeio da casa, e da voz sem igual de Lorita cantarolando.

Como consegue ser tão feliz logo de manhã cedo, pensou

Ângela.

Por mais meia hora, os ruídos domésticos continuaram, nada

discretos, culminando de passos descontrolados pelo corredor. Em seguida, o

tinido de louça espatifando pelos chãos e, de repente, um estranho silencio

pairava.

Da luz típica de um dia apático, invadindo o quarto, ouviu-se a

porta do quarto se abrir e Lorita estava entrando sem cerimonias. A Sra. Ângela

grunhiu, resmungou e virou-se para o outro lado.

— O Sr. Thompson está no escritório... — Disse Lorita sem

folego, histérica, não conseguindo terminar a frase, apenas desabafando: — Oh,

que coisa mais horrível!

Ângela assentou-se na cama. Reuniu todos os seus sentidos

dispersos e procurou inteirar-se da situação.

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— Há... O quê? – Disse ela irritadamente, olhando para Lorita,

que estava parada ao pé da cama. – Vai lá buscar meu café imediatamente e

chega de escândalos.

Ângela agora estava completamente acordada. Resmungando,

ela vestiu seu roupão e saiu do quarto. Caminhou pelo corredor e desceu a

escada, ao pé do qual se acotovelava o restante dos empregados, em soluços.

Manoel, o jardineiro, adiantou-se com um ar trêmulo.

— Graças a Deus a senhora veio. Tinha ordenado que nada fosse

feito antes da senhora chegar. Acha que eu já deveria ter chamado a policia?

— Chamar a policia? Para que? Por que o café da manhã ainda

não está servido?

O jardineiro lançou um olhar de espanto para Lorita que estava

soluçando histericamente no ombro da cozinheira.

— Eu pensei que Lorita já tivesse lhe avisado.

Lorita falou ofegante:

— Ora, encontrar uma coisa daquelas! Eu estava tão nervosa,

minhas pernas começaram a tremer e vi tudo embrulhado, não consegui dizer

nada.

— Lorita, como é natural, esta muito agitada, senhora, tendo sido

ela a autora da descoberta macabra – explicou Manoel. – Entrou no escritório,

como de costume, para correr as cortinas, ajeitar tudo e... Deu de cara com o

sinistro.

Ao dizer aquilo Manoel fez um sinal da cruz em sinal de

respeito.

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Ângela ainda não estava compreendo a situação. Quando

finalmente conseguiram lhe explicar o ocorrido, Ângela mal conseguia se

segurar.

— Você quer dizer... – perguntou Ângela com a voz falhando. –

que meu marido... Está morto... De fato?

O jardineiro assentiu e acrescentou.

— ...Talvez fosse melhor a senhora nem ir lá ver.

***

— Alo. Sim, é da Policial, quem está falando?

O Policial Dirceu Farias Borguezan estava quase terminando seu

turno. Com uma mão segurava sua orelha de gato, que degustava calmamente, e

com a outra segurava o telefone naturalmente.

— Oh, bom dia Manoel. – Era o jardineiro quem havia

telefonado para a emergência policial.

O tom de voz do policial passou por uma ligeira modificação.

Tornou-se menos informal, reconhecendo a voz do amigo de longa data.

— Em que lhe posso ser útil?... Desculpe, mas não compreendi

bem... Disse que o senhor?... Sim, sim... Como preferir... Está bem... Está

dizendo que... Sim, o horário exato desconhece?... Está bem. Pode deixar tudo

por minha conta.

Dirceu colocou o telefone novamente no gancho, tirou um longo

assobio e começo a discar para o seu superior.

***

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Todas as manhãs, o policial Escarpa Arruda de Oliveira

costumava se deliciar com um generosa fatia da tradicional torta de queijo, na

padaria Estação, no centro de Lontras. Ele ia dar sua primeira garfada dos

deuses quando o celular começou a tocar. A chamada o intrigou.

Ora essa! – Bufou Escarpa, olhando irritadíssimo para o telefone

que tocava. — Quem será?

De forma impaciente, o fez silenciar, atendendo aquele chamado.

— Alô – disse Escarpa irritado.

— É você, Oliveira?

Escarpa ficou um tanto surpreso. Sabia que naquela hora Dirceu

também estaria tomando seu café.

— Sim, sou eu. Você caiu da cama foi, Dirceu?

— Aconteceu a coisa mais pavorosa, senhor.

— O que foi agora?

— Acabei de ser informado que o Sr. Campestrinni se enforcou.

Escarpa achou por alguns instantes que Dirceu estivesse fazendo

uma piada de muito mau gosto àquela hora da manhã.

— Você o que? Não brinca homem...

— Eu sei, não dá para acreditar, não é? Eu pensei que essas

coisas só aconteciam com os outros.

— Mas que horas foi isso?

— Eu não sei!

— Não sabe?

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— Eu não sei. A Sra. Campestrinni não faz a menor ideia... Nem

ela nem os criados da casa perceberam que ele se fazia presente em casa

naquela madrugada. Mas lá está o homem, pendurado por uma corda, mortinho

da silva.

Dirceu fez uma pausa para respirar.

— Bem... — continuou ele. — A Sra. Campestrinni parecia

bastante histérica do outro lado, gritando que ele estava na gandaia.

— Gandaia? Como assim?

— Sim, é o que ela estava esbravejando...

Escarpa colocou a mão sobre a testa.

— Segue na frente que eu já vou ao encontro do local. —

Escarpa limitou-se a essa ordem de primeiro momento.

***

Escarpa ligou a viatura, seguindo pela Praça Henrique

Schroeder, contornando o trevo do centro e passando em frente ao Casarão

Schroeder. Em seguida, passou em frente ao Aeroporto Helmut Baugarten, indo

sentido ao bairro do Riachuelo.

Em quanto a paisagem de Lontras era deslumbrante, por outro

lado as estradas era uma dessas esquecidas pelo tempo. A viatura tinha

dificuldade de seguir em velocidade máxima. Não havia calçamento, era cheia

de quebra-molas, sulcos, buracos e paralelepípedos em desalinhos.

Quinze minutos depois Escarpa estava chegando à casa do casal

Campestrinni. Ele estacionou a viatura no meio fio da calçada. Jamais pensara

que iria naquela propriedade para tal ocorrência.

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Localizado em uma região privilegiada, onde a natureza é

exuberante. A casa é marcada pelos telhados inclinados, bem ao estilo

Fachwerk, feita de paredes com hastes de madeira encaixadas entre si, de forma

inclinada, e o preenchimento entre o espaço feito de tijolo aparente.

As cores vibrantes em tonalidade marrom vermelho e laranja

compõem um visual sóbrio, mas, ao mesmo tempo, marcante e definido — até

impactante, de certa forma, – criando uma paisagem vibrante e quente,

preenchendo a composição da atmosfera de forma completa.

Escarpa foi caminhando em direção à entrada cuja porta lhe foi

aberta pela Lorita.

O policial Dirceu surgiu logo depois nos degraus da entrada e

parecia um tanto zonzo.

— Escarpa?... Que bom que chegou. – Indagou Dirceu.

— Já eu não posso dizer o mesmo. Receber essa notícia logo no

café da manhã... – Escarpa limpou a garganta.

— Pois é...

Os dois policiais permaneciam na sala aguardando a Sra.

Campestrinni ir ter com eles.

Escarpa observava atentamente cada detalhe. No interior da casa,

no térreo, estava localizada a área social, com todas as salas integradas e

cercadas pelos jardins laterais do terreno. Subindo as escadas, no piso superior,

estão os quartos, interligados por uma varanda contínua, que permite aproveitar

a vista da piscina e da natureza abundante presente na região.

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Não havia nenhum monitoramento de câmeras ou alarme de

segurança. E para um dia daqueles, a casa estava tranquila de mais de forma que

não era natural, pensou Escarpa.

— E a Sra. Campestrinni?... – Questionou Escarpa olhando em

direção a Lorita. – Vai demorar muito?

Ângela se recusava a descer. E os criados permaneciam em

silencio.

— Chamei à psicóloga do departamento. – Comentou Dirceu

rompendo o silencio. - Precisa que alguém esteja com ela. Caso contrário,

sofrerá um colapso.

— Onde está o corpo? - Perguntou Escarpa de forma automática

e indiferente.

Dirceu fez um gesto com a cabeça em direção ao escritório

— La dentro, senhor. – Dirceu estava visivelmente pálido.

Dirceu tomou a dianteira no corredor, a passos curtos, dirigindo-

se para o lado oriental da casa, conduzindo Escarpa até o escritório.

Do lado de fora da porta do escritório estava um policial de

guarda, a mando de Dirceu, um jovem que chegara a pouco tempo na cidade.

— Eis ali. – disse Dirceu dramaticamente. – Nada foi tocado

desde então.

Escarpa entrou no escritório e parou, chocado. Naquela manhã, o

escritório não tinha nada de característico com aquele episódio: o cômodo

possuía uma apaixonante porta francesa que dava acesso ao jardim dos fundos.

O ambiente era amplo e sereno, sem excessos e com um toque minimalista.

Havias alguns pufes que dava um toque final. A escrivaninha ficava rente à

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porta francesa. As gavetas eram todas cuidadosamente organizadas. Todos os

pendrives tinham numeração e eram separados por cores. O Sr. Campestrinni

utilizava muito pouco papel e caneta, e como tinha preferencia utilizar os

arquivos digitais, a estante era pequena e havia poucos livros. No máximo

aqueles do seu extremo interesse que abordavam temas sobre o Direito.

No teto ficava fixado o data show personalizado, que ao ser

ligado era possível ver a imagem amplamente logo a frente. E meio central do

escritório, com a corda pendurado pelo data show, jazia a figura sombria de seu

corpo pendurado.

O Policial Escarpa esticou o pescoço e o analisou mais de perto.

Um rapaz ainda jovem. Vestia uma roupa descontraída, pensou Escarpa, de

modo que não aparentava estar trabalhando na noite anterior. Escarpa não tocou

no corpo. Apenas observara: o rosto estava grosseiramente inchado e azulado,

os dedos apertavam freneticamente a corda no pescoço, como se tivesse lutando

num ultimo suspiro suspendo no ar. Compreendeu então que aquela sena tão

macabra não fazia o menor sentindo.

— Está vendo agora o que quero dizer? Não parece real! – disse

Dirceu, quebrando o estranho silencio que pairava naquele instante.

— O que eu não posso compreender é: – disse Escarpa – o que

levou Thompson a tomar essa decisão tão drástica. Ele poderia estar em

depressão... Mas, isso não teria sentido, não é? Ele não aparentava estar com

problemas ou com depressão. Ele estava muito feliz. Tínhamos marcado um

almoço essa semana para conversamos. Ele tinha pretensão de me contar

algumas novidades. Mas, quais novidades?

Naquele momento entrou Ângela no escritório, fazendo Escarpa

silenciar-se.

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— Não... Não tem sentido. – disse ela aos berros. — O que esse

cretino tinha na cabeça?

Ângela parecia mais furiosa do que triste.

As palavras rudes da Sra. Campestrinni fizeram o Policial

Escarpa sair de seu transe, se virando em direção a ela. No fim Escarpa disse em

tom moderado:

— Posso compreender como você se sente nesse caso...

A atenção de Escarpa imediatamente se voltou para o barulho de

um carro que rangeu sobre o cascalho do lado de fora. Do carro saiu um médico

da policia. E num segundo carro da policia tinha descarregado dois homens

vestidos em trajes comuns, um deles estava carregando uma câmera fotográfica.

— Deve ser a outra equipe policial, o legista e seus assistentes,

trazendo o material para ensacar o corpo... – Disse Dirceu afobado.

Escarpa dirigiu-se imediatamente a porta, sentindo-se

imensamente aliviado quando pode sair daquele escritório.

Sem cerimonias a outra equipe policial entrou na casa e com o

consentimento do Policial Escarpa, começaram a vasculhar o primeiro andar da

casa. Depois seguiram por uma linda escadaria que dava para o andar de cima,

logo adiante encontraram a porta de um quarto entreaberta. Era o quarto do

casal Campestrinni.

***

Ao anoitecer, Escarpa estava de volta a sua tranquila casa.

Estava exausto e com uma dor de cabeça que parecia que ia explodir seu crânio

várias vezes. Desejava que aquele dia não tivesse sido real, pensou ele. Ainda

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podia ouvir os gritos histéricos da Sra. Campestrini. Ele sabia que Ângela não

era uma mulher fácil de lidar.

Em cima de sua mesa havia outros relatórios, de outros casos de

suicídio que ocorriam todo mês na região. Ele era o responsável pelas

investigações, levantamentos de dados e mecanismos de prevenção. Uma

grande responsabilidade que pesava em seus ombros.

Decidiu lutar por esse caso quando sua esposa, Grasiela, há dois

anos, decidiu tirar a própria vida.

Ele se aproximou de sua escrivaninha e desatou a chorar. Sentia-

se esgotado e solitário naquela causa. As pessoas a sua volta pareciam

indiferentes a esse problema. Não se sentiam confortáveis em falar sobre o

assunto e isso dificultava em explicar para as pessoas a importância de prevenir

o suicídio.

O relatório do Sr. Thompson permanecia destacado sobre sua

mesa desorganizada. Uma xícara com um pouco de café frio. Uma foto antiga

de Grasiela numa viagem que haviam feito, semanas antes do acontecimento

trágico, em foz do iguaçu. Gostava de olhar aquela foto e lembrar o quanto não

poderia desistir daquela causa. O quanto era importante continuar se esforçando

para que mais pessoas escolhessem viver.

O Sr. Thompson não era só mais um homem que havia cometido

suicídio, pensava Escarpa, ele também era seu amigo desde a infância. Não era

alguém desconhecido. Thompson confiava muito em Escarpa, qualquer

problema que ele estivesse passando iria lhe confidenciar. Isso era certo! Então,

por que tomara uma atitude tão drástica?

Decidira se dedicar inteiramente a esse caso.

Na manhã seguinte, Escarpa recebera uma ligação.

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— Policial Oliveira? Aqui quem fala é o legista. Acabo de

concluir o laudo do Sr. Campestrinni... Você não vai acreditar!