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O Sistema Solar1

Nelson Vani Leister

Departamento de Astronomia

Instituto de Astronomia, Geofísica e Ciências Atmosféricas - IAG

Universidade de São Paulo - USP

1Texto: Conceitos de Astronomia (versão#1 2015)

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Capítulo 1

A formação do sistema solar

Figura 1.1: A Galáxia: nossa posição.

Desde os tempos mais remotos observações de obje-tos do Sistema Solar tem sido realizadas com umaboa precisão, embora o problema de sua origem nãomereceu atenção senão após a revolução copernicanavinte séculos depois de Aristarco de Samos ter consi-derado o Sol no centro do sistema planetário. Inicial-mente, ainda que de forma �losó�ca, os modelos ex-plicavam de forma bastante abrangente os movimen-tos observados levando em conta vários fatores taiscomo: (1) as proximidades das órbitas ao plano daórbita da Terra; (2) as órbitas serem essencialmentecirculares (com exceção de Mercúrio) e (3) que todosos planetas giravam no mesmo sentido e coincidentecom o sentido de rotação do Sol. Estas constataçõesforam levadas em conta em todas as teorias desen-volvidas até o século XIX.

Entretanto no início do século XX os pesquisadores começaram a observar um detalhe importanteligado à distribuição do momento angular no sistema solar. O Sol que carrega 99,8% de toda a massa dosistema tem apenas 2% do momento angular total daquele possuído pelos planetas. As novas contribuiçõesteóricas sobre a formação estelar, assim como os novos dados relativos a composição dos diversos corpos dosistema solar, permitiram escolher um modo coerente para a formação do Sistema Solar apesar dos váriosmecanismo físicos e químicos não serem totalmente compreendidos. A possibilidade de confrontar asnovas observações com essas teorias permitiu dizer que o modelo dos planetas que foram concebidos parao Sistema Solar é válido para planetas em torno de outras estrelas. Observações perto de estrelas jovensrepresentam um novo desa�o que não havia sido previamente explorado. Os novos sistemas planetáriosdescobertos recentemente também representam um desa�o para essas novas formulações.

1.1 A história dos modelos de formação do Sistema Solar

Foi Aristarco de Samos o único grego que por volta de 280 aC. propôs um sistema em que os planetasseguiam órbitas circulares em torno do Sol (O Sistema Heliocêntrico). Por se contrapor as ideias da escolaAristotélica, onde a Terra era considerada �xa, seu modelo foi esquecido. Foi graças a Nicolau Copérnicoo avanço na concepção de um conceito moderno de universo, em que (1) os planetas orbitam o Sol, etambém giram sobre seu próprio eixo, e onde (2) as dimensões do Sistema Solar são pequenas quandocomparada com a distância das estrelas. Em 1543, publicado em De revolutionibus orbium coelestium

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libri VI, o modelo de Copérnico veio a luz, e sem dúvida, não teria prevalecido se não fosse pelos trabalhoscientí�cos de Kepler, Galileu e Newton. Lembremos que Johannes Kepler (1571-1630) � aluno de TychoBrahe (1546-1601), ele mesmo um excepcional observador � descobriu empiricamente as leis que levam seunome. Com a ajuda de um refrator, Galileu Galilei (1564-1642) foi o primeiro pesquisador a con�rmaras teorias de Copérnico, por intermédio de um grande número de observações planetárias e estelares.Ele também anunciou os fundamentos da dinâmica denominada de princípio da inércia. Issac Newton(1642-1727) mostra em seu Philosophiae Naturalis Principia Mathematica a lei da gravitação universalque confere um caráter físico as leis de Kepler e explica os resultados de Galileu.

Entre os séculos XV e XX se tentou responder a duas questões fundamentais: (1) os planetas e oSol foram formados juntos? (2) os planetas são formados de matéria que originou o Sol ou de matériainterestelar? Durante todo esse tempo a única restrição que os modelos deveriam obedecer era a regu-laridade das órbitas planetárias que são basicamente circulares e coplanares. Por motivos claros, a faltade evidências observacionais que tivesse o consenso dos �lósofos e pesquisadores, facilitou o avanço devárias teorias. Posterior melhor conhecimento dos parâmetros orbitais, dos tamanhos e posteriormenteda composição química dos corpos que constituem o sistema solar permitiu que se traçasse um cenáriomais plausível. Com o re�namento desses conhecimentos foi possível se ter uma visão mais completa dascaracterísticas do Sistema Solar como um todo.

1.1.1 Modelos baseados em turbulência.

Figura 1.2: Detalhe de um diagrama do 1644 Prin-cipia Philosophiae de René Descartes, que descrevesua concepção do cosmos como um agregado de vór-tices contíguos, a maioria com uma estrela em seucentro. S é o Sol.

O primeiro a tentar explicar cienti�camente aexistência do Sistema Solar foi René Descartes(1596-1650) que introduziu um modelo qualita-tivo com a ideia de evolução. Em sua Théo-rie des Vortex, publicada em 1644 entende ouniverso preenchido de éter e matéria e man-tido por vórtices de diferentes tamanhos. Umadas principais objeções a este modelo foi queo mesmo não favoreceu o plano da eclíptica epor isso foi abandonado logo após a descobertadas leis de Newton restando agora apenas o in-teresse histórico. Entretanto os conceitos deatrito e turbulência de Descartes foram recon-siderados por vários autores no século passado.

1.1.2 Teoria das Marés

A primeira teoria catastró�ca para a formação do Sistema Solar foi proposta pelo naturalista Bu�on(1707-1788), que sugeriu que o Sistema Solar foi formado a partir da ejeção de material solar causadopela colisão do Sol com um cometa a 70 mil anos atrás. (Lembrar que a natureza e as massas doscometas eram desconhecidas na época). Esta teoria, sem base cientí�ca, foi desprezada. Entretanto, maistarde, tendo em conta as objeções levantadas ao modelo nebular das teorias catastró�cas ela veio a serreexaminada. Alguns pesquisadores como Bickerton em 1880, Chamberlain, em 1901, e Moulton em 1905substituiu o cometa de Bu�on por uma estrela, e explicaram a formação dos planetas pela condensação dematerial retirado por in�uência gravitacional do Sol. A força gravitacional no momento de uma interaçãopróxima retirou um �lamento de material solar que, em seguida, entrou em órbita em torno do Sol comconsiderável momento angular. Foram Jean e Je�rey que analisaram a possibilidade da interação entreum sistema binário de estrela. Entretanto era difícil de explicar a condensação de grandes �lamentoscomo responsável pela formação de grandes planetas

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Capítulo 1 5

Este fato contribuiu para o advento de novosmodelos dentre os quais aquele que admitia queo Sol �zesse parte de um sistema binário e queos planetas tivessem se formados a partir da es-trela companheira. Uma alternativa mais van-tajosa é considerar que, devido as novas de-terminações da composição química e isotópicados planetas, a matéria planetária venha prefe-rencialmente de um meio frio e não a partir deum �lamento estelar muito quente, e neste casoo encontro do Sol se deu com uma protoestrela.

1.1.3 Teorias do acréscimo

Esta teoria admite a possibilidade do Sol acrescentarmatéria do meio interestelar. Este fato faz com quepostulemos a existência de outra estrela nas proxi-midades que permita a captura de matéria pelo Sol eque de acordo com Schmidt (1891-1956) e Safronov(1917-1999) este arranjo proporciona que o Sol con-dense a matéria dando origem a núcleos de formaçãoplanetários

Outra teoria foi proposta por Alfvén (1908-1955) e Arrhenius (1859-1927) cujo modelo supõem que oSol interaja com duas nebulosas: uma constituída de matéria não volátil para justi�car a existência deplanetas terrosos e outra de hidrogênio, que daria origem aos planetas gigantes gasosos.

1.1.4 A Teoria da Nebulosa

Kant (1724-1804) e Laplace (1749-1827) foram os que propuseram o conceito de nebulosa primitiva. Deacordo com Laplace a contração da nebulosa primitiva in�uenciada pela gravidade promove o aumento desua velocidade de rotação até que ela se colapsa em um disco. Posteriormente o anel de gás que se espalhacondensa e da origem aos planetas e satélites. Qualquer modelo teórico deve ser o mais completo possívelna explicação da fenomenologia. Pelo menos até o século XVIII, a teoria da nebulosa teve o mérito defazê-lo. Entretanto no século XIX duas di�culdades surgiram. A primeira, como Maxwell (1831-1879)mostrou, neste modelo é difícil explicar o acréscimo de um planeta a partir de um anel de matéria. Asegunda objeção trata-se do problema ligado ao baixo momento angular do Sol. Várias modi�caçõesforam propostas à teoria de Laplace o que tem respondido as novas condições à custa de torna-la maiscomplexa.

O modelo atual desde 1960 são divididos em duas categorias:

• O modelo da nebulosa na presença de grande quantidade de massa (Cameron) postula um disco deuma massa solar. Neste modelo os planetas se formaram diretamente na nebulosa gasosa atravésdas instabilidades gravitacionais. Uma grande parte (85%) do disco foi posteriormente varrida pelovento solar em tempo muito curto (105 anos), enquanto que a maior parte da massa restante foiacrescida ao Sol.;

• O modelo da nebulosa na presença de baixa massa (Safronov) propõe uma quantidade de matériade 10−2 massas solares para o disco. O disco frio acumula poeira no plano central formandoplanetesimais com alguns quilômetros de diâmetro que combinados formam corpos mais massudos(os planetoides). O gás é arrastado para fora levando consigo a poeira deixando no disco apenas

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corpos com tamanhos superiores a alguns quilômetros. Somente planetoides com massa signi�cativaretém gás.

O modelo de Safronov serviu de base para caracterizar os planetas do Sistema Solar e explica-locorretamente, mesmo que certas fases continuam a ser esclarecido.

1.1.5 As Observações

Os astrônomos que estudam a formação de estrelas ou galáxias têm uma vantagem sobre os pesquisadoresque estudam a formação de planetas. Eles dispõem de observações de estrelas e galáxias em todas as fasesde sua formação. Os planetólogos, pelo contrário, tinham - pelo menos até muito recentemente - apenasobservações dos planetas "formados"no sistema solar à sua disposição, mesmo sem saber se este sistemaera ou não o sistema planetário único no universo. Esta desvantagem está em vias de ser superada comobservações das regiões em torno de estrelas jovens; cuja detecção de vários discos circunstelares; e adetecção de planetas extra-solares aumenta rapidamente o número de planetas.

Embora os discos circunstelares que têm sido observados con�rmam o modelo desenvolvido para ex-plicar a formação do Sistema Solar, o mesmo não se pode dizer para os planetas extra-solares descobertosaté hoje. A maioria desses planetas é enorme e orbitam perto de sua estrela, ou têm órbitas altamenteexcêntricas, assim que suas propriedades são diferentes das dos planetas do Sistema Solar. No entanto asequência de eventos que explicam os planetas no Sistema Solar tem vários pontos divergentes. É possívelque as 1011 estrelas das 1011 galáxias do universo tenham produzido uma incrível diversidade de sistemasplanetários.

Vamos resumir algumas das características do sistema solar.

1. A mais importante, mas também a mais óbvia, característica do Sistema Solar é a regularidade dasórbitas dos planetas e de seus satélites. Quase todas as órbitas são coplanares, e perto do plano daeclíptica. Já no século 18 sabia-se que os corpos do Sistema Solar orbitavam o Sol e giravam em seuseixos na mesma direção. Laplace foi o primeiro a sugerir que estes corpos eram derivados de umanebulosa primitiva, um disco de gás e poeira que girava em torno do Sol. Hoje em dia, um grandenúmero de corpos é conhecido no Sistema Solar. A maioria obedece a essa regularidade, e cadaexceção encontrado tem uma explicação que pode ser integrado no modelo que Laplace propos.

2. Outra característica importante do sistema solar é a composição dos planetas. Planetas e satélitesinteriores são rochosos. Na parte externa os planetas são gasosos, e os pequenos corpos, comosatélites e cometas são constituídos principalmente de gelo. As atmosferas dos planetas gigantestêm composições químicas muito próximas a do Sol, mas esses planetas têm uma proporção menorde hidrogênio e hélio que o Sol, e também possuem núcleos rochosos. Apesar de sua semelhançaexterna, Júpiter e Saturno diferem fundamentalmente de Urano e Netuno. Estes últimos são muitomais pobres em H e He, e seus núcleos são formados principalmente de gelo. Esta diversidade nacomposição química dos planetas é difícil de ser explicada considerando-se que os planetas foramformados por fraccionamento de uma nebulosa gasosa. No modelo em que os pequenos corpos sólidossão formados por acreção, como mecanismos para a matéria se condensar, com um disco de poeiraenvolvendo, permite que os embriões planetários tenham uma maior diversidade de composição.

3. A presença dos asteroides sugere que eles sejam restos de um disco de planetesimais que foi dispersapor perturbações diretas ou indiretamente causadas por Júpiter. Perturbações de Júpiter aumentaas velocidades relativas nas colisões. Nesta zona em particular, as colisões destrutivas entre plane-tésimos evitou a formação de uma grande massa, bem como ejetou a maioria dos corpos do sistemasolar exterior. A composição química dos asteroides varia com a distância ao Sol, e sugere queeles foram in�uenciados pelo período de maior atividade que a Sol experimentou no início de suavida. O fato de que esta estrutura tenha sido preservada sugere que Júpiter e o disco dos asteroidesestavam presentes logo após do nascimento do Sol

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Capítulo 1 7

4. Tem sido possível efetuar datação do material planetário com um alto grau de precisão, graçasàs medidas das abundâncias de átomos radioativos com vidas muito longas, aplicando as técnicasutilizadas para as rochas terrestres, amostras lunares e para meteoritos.

5. Em geral, o princípio da datação radioativa considera que a composição isotópica dos meteoritos ésemelhante ao das rochas terrestres e das amostras da Lua. Desvios importantes, no entanto, sãoobservados em alguns elementos, e atribuídos a três processos físicos e químicos: fracionamento demassa; reações nucleares induzidas quando os grãos são irradiados; e o decaimento de elementosradioativos que enriquece o grão de isótopos. Este último processo tem uma aplicação muitoimportante: a concentração de isótopos permite que as principais etapas da evolução dos meteoritossejam datadas. Um elemento radioativo p decai em um elemento d de acordo com:

dp

dt= −dd

dt= −λp

λ é a constante de decaimento radioativo, o inverso da meia-vida. Temos, então, para o tempo t:

d = do + p(eλt − 1)

aqui do é a abundância original da elemento d. Se d′ é um isótopo estável de d, temos então, noinstante t:

d

d′=

(d

d′o

)+p

d′(eλt − 1)

Para medir a idade do Sistema Solar, as espécies usadas são os pares (40K :40 Ar), (87Rb :87 Sr), e(238U :238 Pb), que têm constantes de decaimento de 5, 8x10−11, 1, 4x10−11, e 1, 5x10−11 por ano,respectivamente. Medições feitas nestes elementos em amostras de meteoritos têm mostrado que aidade do Sistema Solar é 4, 55x109 anos. Além disso, a medição das abundâncias de plutônio-244 eiodo-129 (que são elementos radioativos com meias-vidas mais curtas) no momento em que o ma-terial planetário se solidi�ca, mostram que se passaram, no máximo, 108 anos entre a separação domaterial protosolar do meio interestelar e a formação dos planetas. Por conseguinte, este resultadoimplica que o Sol e o Sistema Solar surgiram ao mesmo tempo.

6. A análise da estrutura e composição química dos meteoritos é um dos pilares dos estudos sobrea formação do Sistema Solar. Estes, e as amostras da Lua, são os únicos materiais extraterresteque podem ser analisados em laboratório. Além disso, os meteoritos não foram submetidos astransformações (como a erosão, etc.) que o material planetário estiveram sujeitos. Condritos1, queconstituem mais de 80% dos meteoritos, é composto de uma mistura de materiais muito primitivos.Eles são principalmente compostos de material solar, exceto os voláteis, que estão ausentes emmeteoritos, e também o deutério, os quais são sub abundantes no Sol e têm uma origem comum.Isso mostra que o material do sistema planetário e do Sol tem origem comum. Mas tambémmostra que o material dos planetas não foi alterado pelas reações termonucleares que ocorrem nocentro do Sol. A maioria dos meteoritos, originários principalmente na parte interna do cinturão deasteroides, são muito mais velhos do que o material terrestre (3, 8x109 a 4, 3x109 anos), ou mesmoaqueles provenientes da Lua (4, 4x109 anos). A maioria dos condritos contêm pequenas esferas devidro de silicato de poucos milímetros de diâmetro, conhecidos como côndrulos2, que testemunhamo arrefecimento rápido. Os côndrulos são os objetos mais antigos do Sistema Solar, formados a4, 56x109 anos atrás. Outros condritos, mais jovens (de 4, 55x109 anos), não contêm quaisquercôndrulos. Certos condritos carbonáceos contem grãos que se originaram no meio interestelar, quesobreviveram ao aquecimento na nebulosa primordial, e que foram criados no material ejetado desupernovas, novae, ou de vários outros tipos de estrelas. Além disso, estas anomalias revelam quea nebulosa não mistura material de diferentes composições, da fase anterior a formação do Sol emum único material, ela promove uma mistura homogênea.

1http://www.igc.usp.br/museu/met_oque.htm2http://ppegeo.igc.usp.br/scielo.php?pid=S0101-90822011000200005&script=sci_abstract

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7. Uma parte signi�cativa de dados refere-se a abundância de deutério. O deutério está presente namatéria interestelar, mas é destruído nas estrelas. De fato, no ciclo de próton-próton que transformahidrogênio em hélio, o deutério é transformado em hélio-3 pela reação:

2D +1 H →3 He+ γ,

em um tempo médio de cerca de um minuto, na presença de material a uma temperatura de10 milhões K. Tal como em outras reações do ciclo próton-próton, eles têm tempos médios dereação superior a 106 anos. O deutério no Sol foi, portanto, completamente destruído logo queas reações nucleares começaram. O valor D/H em Júpiter é maior do que o valor encontrado nomeio interestelar. Na ausência de processos capazes de criar deutério, a grandes distâncias do Sol,podemos interpretar estas medidas como sendo a abundância de deutério na nebulosa protosolara 4, 6x109 anos atrás. Se o material planetário originou-se de uma ejeção de material solar, aabundância de deutério deveria ser zero, como no Sol A abundância de deutério em cometas sugereque eles vêm de gases permanentemente congelados dentro da nebulosa. Menção também deve serfeita da presença signi�cativa do hélio e dos elementos como C, N, e S, assim como aos seus isótopos.A abundância desses elementos permite que se obtenha informações da temperatura obtida a partirde suas condensações. Da mesma forma, a abundância do lítio medido em meteoritos é comparávelàquela encontrada no meio interestelar, enquanto que sua abundância no Sol é desprezível.

8. O estudo da dinâmica dos pequenos corpos do Sistema Solar contribui signi�cativamente paradeterminar a sequência correta dos eventos que levaram a formação dos planetas. O comportamentocoletivo de pequenos corpos, ou seja, dos asteroides, cometas, anéis planetários, e daqueles do discode Kuiper-Belt, podem ser considerados como representativos da dinâmica do disco protoplanetário.O processo de acresção nos discos dos pequenos corpos não ocorreu, nem devido as colisões que sãomuito raras (como entre os asteroides e o disco Kuiper-Belt), nem devido ao efeito de maré causadapela proximidade de um planeta interferindo nesse processo (como em anéis planetários). O estudodestes discos revelou os complexos mecanismos que estão em jogo nessas regiões que in�uenciamo comportamento dessas partículas tais como: ressonâncias, fragmentação, ondas de gravidade,e efeitos de con�namento. Por outro lado, no entanto, alguns dos pequenos corpos, como certosplanetas menores e os objetos do Cinturão de Kuiper se mantiveram inalteradas desde a formaçãodo Sistema Solar, e seu estudo constitui um dos desa�os para a astrofísica.

9. As superfícies de muitos corpos do Sistema Solar são cobertas de crateras de todos os tamanhos(de um mícron a milhares de quilômetros de diâmetro). Na Lua, por exemplo, há mais de 10.000crateras com mais de 30 km de diâmetro, e a Mare Orientale, uma cratera de multi-aneis tem 900km de diâmetro. A velocidade de degradação das crateras nos permite datar a evolução de uma emrelação as outras. Somos, portanto, capaz de traçar um cenário evolutivo numérico dos impactosao longo do tempo para uma dada superfície. O número absoluto de crateras depende do tempode solidi�cação da superfície, o que não é conhecido para a maioria dos corpos. Para a Lua, somoscapazes de medir a idade pelas amostras trazidas para a Terra. Isto permite calibrar as curvasque mostram o número de impactos em função do tempo, e, assim traçar o histórico do número debombardeios promovidos por pequenos corpos depois que a crosta dos planetas solidi�cou. A idadedo impacto que produziu o Mare Orientale na lua foi estimada em 3, 845x109 anos.

10. A distribuição do momento angular entre o Sol e os planetas tem sido por muito tempo umaanomalia. A maior parte do momento angular do Sistema Solar é encontrada nos planetas. Maso Sol, que contém 99,8% da massa total do Sistema Solar, deveria ter mantido a maior parte domomento angular, e girar com velocidade muito alta, o que não é o caso. Seu período de rotação é de26 dias no equador. Se o Sol tivesse adquirido a totalidade do momento angular do Sistema Solar, seuperíodo de rotação seria a metade de um dia. Uma estrela em rotação pode perder massa atravésdo movimento das partículas ao longo das linhas de força associados a um centro de atividademagnética. As partículas podem ser transportadas para o meio interplanetário a uma distânciamuito além do raio estelar R. Uma pequena perda de massa pode, por conseguinte, produzir uma

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considerável perda do momento angular se levarmos em conta que a perda é proporcional a R2. Paraum valor de a/R de 10, a perda resultaria em apenas 0, 003M� que é su�ciente para frear a Sol queatingiria a taxa atual de rotação. Somado a este mecanismo, que é extremamente e�caz, o ventosolar também exerce um efeito considerável no transporte de material. Numerosas observações(medições de ventos equatoriais, intensidade das linhas espectrais ligados à atividade estelar, etc.)têm mostrado que estrelas jovens passam por intensa atividade magnética e de perda de massa; àmedida que envelhecem diminuem as taxas de rotação estelar bem como a sua atividade magnética.O Sol é, portanto, apenas um exemplo dessa evolução. O período de atividade intensa ocorreu edesempenhou o seu próprio papel na formação do Sistema Solar.

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Capítulo 2

O surgimento de um "Modelo Padrão"

Há duas abordagens que podem ser consideradas para explicar a formação de planetas a partir de umdisco de gás e poeira originário do meio interestelar. A primeira é a fragmentação do disco em planetasgasosos, alguns dos quais perdem o gás posteriormente. A segunda é a criação de corpos sólidos emum disco de poeira, o que talvez mais tarde acrescente gases. Durante o período mais ou menos entre1950 e 1980, os dois modelos coexistiram, até o segundo se tornar aceito, levando ao "modelo padrão".Planetas que resultam destes dois mecanismos têm características muito diferentes, e é hoje aceito queas características reais dos planetas, e, em especial, as diferenças na composição química só podem serexplicadas por um processo de formação de materiais sólidos. O modelo de instabilidade gasoso não deve,contudo, ser completamente abandonada, porque ela poderia ser capaz de explicar as características deplanetas extra-solares.

2.1 O Modelo de Protoplaneta gasoso (ou Formação em discomaciço)

Planetas podem se formar através de instabilidades que ocorre em um disco circunstelar, similar à maneiracomo as estrelas se formam. Este processo requer um disco de massa, aproximadamente igual a massada estrela central. Essas instabilidades podem formar corpos de massas iguais a de Júpiter em escalade tempo correspondente a alguns milhões de anos, ou menor. Este processo que é rápido tem grandein�uência na evolução do disco planetário. Um planeta maciço exerce uma força repulsiva em torno dodisco formado de gás. Este torque cria um anel vazio entre as órbitas dos planetas, o que faz cessar oacréscimo de material. Se a massa do disco é signi�cativa, a porção externa do disco pode fazer com queplaneta migre na direção da estrela, e possivelmente venha a cair sobre ela.

Este método de formação tem consequências previsíveis para a composição dos planetas. Eles devemter composições químicas homogêneas, ou pelo menos mostrar uma variação regular em função da dis-tância até a estrela. A formação de planetas sólidos por este processo requer a diferenciação de materialno interior da estrela, seguido pela perda dos gases. Planetas gigantes formados desta maneira nuncapodem ter um núcleo sólido. Às pressões esperadas no centro para um corpo de 40 massas terrestres, asrochas e os gases estão completamente misturados e o processo de diferenciação que produziria um núcleosólido não se realizaria. É por isso que o modelo de protoplanetas gasosos foi abandonado como ummeio de explicar os planetas do Sistema Solar a favor do processo de formação de um disco de poeira. Omecanismo protoplanetário gasoso, no entanto, tem a vantagem de formar planetas maciços perto de umaestrela, e pode se �rmar para explicar as características encontradas no caso dos planetas extra-solares.

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2.1.1 O "modelo padrão"

A segunda abordagem é baseada na diferenciação rápida de um disco de poeira de uma nebulosa gasosade baixa massa. Aqui, pequenos corpos sólidos, os planetesimais, são formados. Eles se acumulam emprotoplanetas através de colisões, e os mais maciços são capazes de atrair gás. Este modelo explica todasas características do Sistema Solar que foram descritos anteriormente. Certas características de algunsobjetos do sistema solar, tais como inclinações extremas, bem como a composição da Lua são explicáveispor eventos catastró�cos que se encaixam bem com a sequência de eventos básico. A di�culdade comeste esquema, ligado ao ritmo lento com que o mecanismo se processa para a formação de protoplanetas,foi hoje em dia resolvido por um processo envolvendo o que chamamos de acreção transitório. Provasadicionais que con�rmam este modelo são o cinturão de asteroides e a recente descoberta, além da órbitade Netuno, do Cinturão de Kuiper, ambos remanescentes do disco de planetesimais. O processo totalpode ser dividido em várias etapas, de�nido não só pelos mecanismos físicos envolvidos, mas tambémpelos diferentes métodos de estudo necessários. A complexidade dos mecanismos físicos envolvidos requerpreparar as analises de cada fase, separar, por vezes, arbitrariamente, os vários mecanismos, de modoque eles possam ser modelados analiticamente ou numericamente. A primeira etapa é a condensação eacúmulo de grãos de poeira em objetos que têm cerca de um quilômetro de diâmetro. Nas outras fases,o papel mais importante é realizado pela gravitação. O acréscimo de planetesimais através das colisõese atrações gravitacionais leva à formação de planetas embrionários. O embrião de maior massa atrai ecaptura gás. O vento solar remove o gás e a poeira do Sistema Solar, e, �nalmente, os planetas ejetam amaioria dos pequenos planetesimais restantes.

2.1.2 A cronologia dos acontecimentos.

Os eventos mais antigos da história do Sistema Solar são os envolvidos na formação dos côndrulos, inclu-sões que são observadas em meteoritos, que foram criados por uma sucessão de episódios de condensaçãoe evaporação, durante o colapso da nebulosa há 4, 56x109 anos. O estudo das superfícies das craterasmostra que o bombardeio por planetesimais cessou quase completamente há 3, 8x109 anos. Os planetasse formaram no intervalo de cem milhões de anos; intervalo muito curto quando comparado com a idadedo sistema solar. Durante o rápido colapso da nebulosa, a temperatura aumentou durante um períodode 105 anos, após o que a nebulosa lentamente se resfria, como ocorreu. A queima do hidrogênio começafazendo com que o Sol passe por períodos de intensa atividade do tipo FU-Orionis1 e T-Tauri 2, períodoque dura cerca de 106 anos. O vento estelar resultante reverteu o �uxo de material que cessou de cairsobre a estrela. O meio interplanetário foi varrido, e, em seguida, a luminosidade do Sol estabilizou aum nível de 20% abaixo do seu valor presente. Hidrogênio, hélio e elementos voláteis foram arrastadospara fora do Sistema Solar interior, onde apenas os maiores planetesimais sobreviveu. Dentro do disco degás, a diferenciação do disco de poeira levou entre 104 a 106 anos para se concretizar. Instabilidades nodisco e colisões criaram planetesimais de aproximadamente um quilômetro de extensão em 104 anos. Oselementos voláteis (isto é, água) condensado na região onde a temperatura era inferior ao ponto de solidi-�cação, e o núcleo de Júpiter se formaram e acrescentaram gás em 106 anos. Os outros planetas giganteslevaram 107 − 108 anos para se formar. O núcleo dos planetas terrestres também levou algumas dezenasde milhões de anos para se formar. A maioria dos planetesimais no cinturão de asteroides foi expulsapela presença de Júpiter, que já existia, tendo se formado em uma zona relativamente despovoada.

Colisão com corpos grandes proporcionou a formação de discos ao redor dos planetas, possibilitando,em seguida, a formação de satélites. Modelos envolvendo colisões com corpos grandes também têm sidosugeridas para explicar a inclinação do eixo de rotação de Urano e a composição de Mercúrio. Alémdisso, a teoria mais considerada hoje para explicar a origem da Lua é que um impacto sobre a Terra deum corpo do tamanho de Marte ocorreu a 4, 44x109 anos atrás.

1http://www.aavso.org/vsots_fuori2http://www.aavso.org/vsots_ttau

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Capítulo 2 13

2.1.3 A nebulosa.

A formação do Sol foi produzida por uma nebulosa circunstelar. O conhecimento desse estágio é baseadoem observações de regiões de formação estelar, em que foi possível observar discos circunstelares de dife-rentes idades das estrelas centrais. Estrelas como o Sol se formam principalmente em nuvens molecularesque tem de 2 a 5 pc de tamanho, densidades de 103 a 104 átomos/cm3, e idades entre 107 e 108 anos.Uma nuvem interestelar de gás e poeira entra em colapso, como resultado de uma perturbação. Tem sidosugerido que a onda de choque de uma supernova poderia causar este colapso, mas observações mostramque a formação de estrelas ocorre coletivamente, através da propagação de uma instabilidade a partir dointerior da nuvem em direção ao exterior, cujo mecanismo destrói rapidamente a nuvem. A temperaturae a pressão aumenta no centro da nuvem, o que evapora promove a evaporação da poeira. O colapsodura entre 105 e 106 anos. A protoestrela se forma no centro da nebulosa, parando o colapso no centrodo disco circunstelares. Uma grande parte do gás circundante continua a cair na protoestrela. Quandochega até a estrela, este material, orientado pelo forte campo magnético, é ejetado ao longo do eixo daestrela em rotação, na forma de jatos. Esta estrutura, que consiste de um disco de acreção e de jatos, temsido observada pelo Telescópio Espacial Hubble. A temperatura atinge 1500 K a 2, 5 UA do Sol no planodo disco, mas apenas 500 K a 0, 1 UA cima do plano. Forças produzindo um efeito centrífugo forma umdisco, que resfria e se achata, nivelando sob seu próprio peso. Depois de algumas centenas de milharesde anos, a temperatura cai e a formação de planetesimais ocorre dentro de uma nebulosa "fria", ou seja,onde a temperatura é de 160 K a uma distância de 5 UA. A complexa composição de meteoritos, ondeencontramos componentes que se condensam em temperaturas altas e baixas, sugere pulsos de aqueci-mento, extremamente localizadas no tempo e no espaço, onde eram possivelmente zonas frias, fora doplano do disco, ocasionalmente sujeitos a súbitas explosões de aquecimento solar. É possível se estimar amassa mínima e a estrutura do disco a partir do qual os planetas se formaram. A nebulosa primordial,que se originou no meio interestelar, era formada de 98, 2% de hidrogênio e hélio, de 1, 4% de gelo esilicatos, além de 0, 4% de metais. A partir desse cenário, pode-se calcular a massa total da nebulosanecessária para a criação de cada planeta. As projeções teóricas chegam, por exemplo, a conclusão quesão necessárias 300 massas terrestres de material da nebulosa para criar a Terra. Um cálculo similar paratodos os planetas mostra que a nebulosa tinha uma massa de, no mínimo, um por cento da massa do SolEsse cálculo também nos permite estimar a densidade super�cial da nebulosa. Esta densidade diminuisuavemente em função da distância do Sol, com uma de�ciência de material próxima do Sol, exatamentedentro da órbita de Júpiter, e com uma acentuada falta de matéria além de Netuno.

2.2 A origem da Lua

Após a exploração da Lua que ocorreu nos anos 1970, algumas considerações vieram a tona a respeito daorigem do satélite da Terra. Três modelos foram propostos para explicar sua origem.

1. Fissão de parte do manto de uma Terra �uida em rápida rotação (2 horas). Este modelo baseia-senas densidades semelhantes (3, 3g/cm3) e na composição primária similar dos dois corpos. Emparticular, explica o baixo teor de ferro pelo fato de que este elemento estava concentrado no núcleoterrestre no momento da �ssão. Análise que leva em conta a distribuição de sideró�los3 e elementosrefratários4, no entanto, impõe restrições sérias sobre este modelo. Ainda mais importante, háobjeções a este modelo por motivos dinâmicos. Em particular, parece difícil explicar a proporçãode 81: 1 na razão das massas e do ângulo de 5o entre a órbita lunar e o plano da eclíptica;

2. - Captura pela Terra, neste caso a Lua foi formada em outra parte do Sistema Solar. Este modelo ésugerido baseado no estudo da evolução da órbita lunar através do efeito de maré, o que indica quea lua estava mais próxima da Terra no passado. A principal objeção é estatística: um evento comoesse é altamente improvável. Além disso, a órbita inicial teria que ser muito próxima a da Terra,

3http://www.igc.usp.br/experimental/Pesquisa.html4http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0366-69132002000200003

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com um semieixo maior entre 0, 95 e 1, 05 UA. É difícil compreender como um objeto formado namesma distância heliocêntrica que a Terra poderia ter uma composição global tão diferente, semum núcleo com tamanho considerável;

3. Acreção na órbita ao redor da Terra. O principal mérito deste modelo é que ele não requer qualquerevento cataclísmico. Por outro lado, ele não resolve a objeção levantada para o modelo de capturacom respeito à composição geral: poderíamos esperar que esses dois objetos, a Terra e a Lua,tendo se formado na mesma região do Sistema Solar, tivessem materiais acumulados similares emcomposição.

Dois novos signi�cativos desenvolvimentos teóricos foram apresentados no início da década de 1980.Em um deles, simulações numéricas de caos na dinâmica planetária mostrou que as órbitas planetáriaspodem ser estáveis durante milhões de anos, e evoluírem rapidamente como resultado das perturbaçõescausadas pelos planetas gigantes. Este resultado mostrou que a colisão entre corpos maciços poderiaocorrer no início da história do Solar-System. Na segunda hipótese, simulações tridimensionais hidrodi-nâmicos têm mostrado que o resultado de um impacto de um corpo do tamanho de Marte com a Terrapode ter provocado a ejeção, na órbita da Terra, de uma porção do manto dos dois corpos celestes envol-vidos, acompanhados pela fusão dos dois núcleos que é formado por elementos pesados. Este cenário écompatível com a órbita da Lua, que era altamente excêntrica e inclinada, como con�rmado pelos mode-los que calculam a órbita a partir das medições atuais da taxa de recessão da Lua (4 cm por ano). Eletambém tem a vantagem de levar em conta os resultados dos modelos numéricos de formação planetária,que parecem indicar que pelo menos vinte corpos do tamanho dos planetas terrestres foram formadosinicialmente. Isto signi�ca que deve ter havido grandes impactos entre estes corpos celestes que reduziuo seu número ao dos planetas terrestres observados hoje.

Deve-se notar que os modelos dinâmicos que predizem que os planetas terrestres passaram por umcomportamento caótico no percurso de sua história, poderia ter outra implicação muito signi�cativa: naausência da Lua, a inclinação do eixo de rotação da Terra poderia ter aumentado até chegar a 60o. Essavariação, que pode afetar os outros planetas terrestres, teria, sem dúvida, importantes consequências parao clima da Terra, e possivelmente também no desenvolvimento da vida na Terra.

Figura 2.1: Variação na inclinação do eixo da Terra segundo J.Laskar

No momento, a distância média entre a Terra e a Lua é de 384.402 km. Esta distância aumenta,por causa dos efeitos de maré, em 4 cm por ano (um efeito semelhante está fazendo Deimos recuar emrelação a Marte e, Phobos se aproximar do planeta). Supondo-se que a quantidade de energia dissipadamanteve-se constante no passado, calcula-se que a Lua estava mais próximo da Terra há 2 bilhões deanos atrás. Esperaríamos encontrar efeitos consideráveis da maré que datam deste período em rochaslunares, as mais jovens das quais solidi�cou há 300 milhões de anos, mas não é o caso. Na realidade, nãoexiste nenhuma razão para a energia dissipada permanecer constante; sabemos, de fato, que o processoocorre principalmente em oceanos, e admite-se que a distribuição dos continentes e oceano tem variadoconsideravelmente ao longo da história da Terra. Não há nada, portanto, que sugere que o afastamentoda Lua não tenha começado nas primeiras fases da história do Sistema Solar.

Efeitos de maré são igualmente responsáveis pelo fato da Lua apresentar sempre a mesma face para aTerra: sob a ação das marés os períodos de rotação e translação da Lua se tornaram iguais, como de um

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modo geral são afetado todos os outros sistemas de satélites.

Além disso, devido à excentricidade da órbita da Lua que não é zero (0, 054), a velocidade orbital nãoé constante, como seria, caso a trajetória fosse circular. Como resultado, a rotação sofre uma variaçãofazendo com que periodicamente a Lua sofra um ligeiro avanço ou atraso em seu movimento orbital.Esta oscilação do movimento da Lua em relação à Terra é conhecida como libração em longitude, que éacompanhada por uma libração em latitude. Este último, a libração em latitude, devido ao ângulo de5, 8o que o eixo de rotação da Lua faz com o plano da elíptica. Os efeitos combinados permitem que 59%da superfície da Lua seja observada a partir da Terra.

O Sol e os planetas perturbam a órbita da Lua. Podemos mencionar o avanço do perigeu lunar, o queresulta na rotação da linha das apsides com um período de 8, 85 anos. A linha dos nodos em si tem ummovimento retrógrado, com um período de 18, 6 anos.

Diferentes meses lunares podem serde�nidos. Dois deles dependem se aposição da Lua é dada em relação àTerra ou em relação as estrelas. Omês sideral corresponde ao tempo ne-cessário para a Lua voltar à mesmaposição em relação a uma referência�xa, e é igual a 27, 32 dias solaresmédios. O período compreendido en-tre duas fases lunares idênticas é omês sinódico (29, 53 dias), que é maislongo do que o anterior por causa domovimento da Terra em sua órbitaao redor do Sol

Figura 2.2: Diagrama ilustrando períodos de rotação si-nódicos e siderais da Lua.

2.3 A Formação de Júpiter

O taxa da variação da composição no cinturão de asteroides é resultado de um processo de aquecimentoque ocorreu muito cedo na vida do Sol e parece não ter sido destruída até então. Isso mostra que ocinturão de asteroides é estável desde sua formação. Em segundo lugar, os meteoritos que chegaram até aTerra a partir da região interna do cinturão de asteroides nos permitiu datar a formação desses asteroides.Esses fatores, juntamente com a proporção signi�cativa de gás (hidrogênio e hélio) presente no planetaJúpiter, nos leva a crer que o planeta se formou muito cedo na história do Sistema Solar.

O processo de formação dos planetas gasosos a partir dos planetesimais exige a formação de um núcleoplanetário que seja su�cientemente massivo para juntar gás antes da nebulosa ser destruída (após 106

anos). Um núcleo de 10 massas terrestres é necessário para criar Júpiter.

A distribuição da matéria na nebulosa sugere uma densidade super�cial de 4g/cm2 a uma distânciacorrespondente a da órbita de Júpiter. Tal densidade proporciona a formação de um núcleo de 10 massasterrestres em 108 anos, o que é tempo demasiado para aglomeração qualquer gás a partir da nebulosa. Noentanto, Júpiter �ca a uma distância especial do Sol. A esta distância, a temperatura da nebulosa torna-se menor do que a temperatura de condensação de água, o que aumenta consideravelmente a densidadeda superfície da nebulosa. Fora deste limite, o material sólido consistia não só de partículas rochosas, mastambém de gelo, o que aumentou consideravelmente a densidade da superfície da nebulosa e, portanto,a velocidade com que os corpos foram formados. Além disso, os materiais voláteis expulsos do interiordo sistema solar condensam a esta distância. A densidade super�cial poderia ter atingido um valorsu�cientemente alto para levar em conta a rápida formação do núcleo de Júpiter.

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2.4 A dispersão do gás,

Assim que uma estrela do tipo solar chega a fase da Sequência Principal, essas estrelas passam por fasesde violenta atividade, durante as quais pode ejetar 10-8 massas solares por ano. Esta fase afeta fortementea estrutura do disco, expulsando o gás. Esta grande ejeção de material também explica a redução domomento angular da estrela.

Por analogia com o que atualmente se observa em estrelas jovens, podemos imaginar que o Sol expe-rimentou intensa atividade durante os primeiros estágios de sua existência. Podemos estimar a força dovento solar como sendo 108 vezes o seu valor atual. No início da história do Sistema Solar, a pressão dovento foi de 105, intenso como a pressão de radiação atual, e o vento solar teria sido forte o su�cientepara varrer todas as partículas menores do que alguns centímetros de diâmetro. Os planetesimais noSistema Solar interior que escaparam deste processo não teriam sido capaz de atingir o tamanho que lhespermitiria acrescentar gás.