o riso no brasil

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  O RISO NO BRASIL: O CAMINHO PARA A GARGALHADA RADIOFÔNICA Ticiana Lorena Acosta Martins  1  Erotilde Honório Silva 2  Resumo A comicidade brasileira antes mesmo do rádio e dos demais veículos de comunicação de massa manifestou-se e ganhou destaque no século XIX por meio da literatura e da imprensa escrita. O formato leve e fácil do folhetim, que era veiculado nos jornais semanais também trazia uma produção de histórias cômicas que se utilizava do burlesco, da surpresa e do suspense. A popularidade do rádio, favoreceu o humor que já na década de 30 constava da  programação das emissoras. A fase de ouro do rádio foi marcada pelo espetáculo e caracterizou-se pela programação voltada para o entretenimento. Em Fortaleza, a Ceará Rádio Clube, viveu na década de 1950 o seu grande momento no qual os programas humorísticos também deixaram sua marca. O presente artigo expõe as manifestações do riso e sua presença no veículo radiofônico. Autores como Ortriwano (1985), Vigil (2003) e Ferraretto (2001), foram indispensáveis para compreender a trajetória do rádio e suas especificidades no tempo atual. A história oral de vida dos fazedores do rádio e os documentos da Pesquisa História e Memória da Radiodifusão Cearense, compõem parte da metodologia do presente artigo. Palavras-chave: Rádio. Humor. Programa de Humor no Rádio.  Introdução As produções de cunho humorístico apareceram, “primeiro nos rodapés dos  jornais ou em pequenos e efêmeros pasquins semanais, depois nas margens das obras dos  próprios autores e, por fim, nas mar gens da própria produção escrita” (SALIBA, 2002, p.38). O riso que humilhava ou ridicularizava algo ou alguém não era bem visto, sendo nivelado à literatura dita pornográfica. “O cômico tolerado era aquele que provocava o bom riso, aquele que não exprimia rancor nem se dirigia contra algo ou alguém em especial, aquele que não degradava o objeto risível” (SALIBA, 2002, p.46).  1 Graduada em Jornalismo - Universidade de Fortaleza - UNIFOR  2 Coordenadora da Pesquisa História e Memória da Radiodifusão Cearense    UNIFOR

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O RISO NO BRASIL: O CAMINHO PARA A GARGALHADARADIOFÔNICA

Ticiana Lorena Acosta Martins 1 

Erotilde Honório Silva 2 

Resumo

A comicidade brasileira antes mesmo do rádio e dos demais veículos de comunicação demassa manifestou-se e ganhou destaque no século XIX por meio da literatura e da imprensa

escrita. O formato leve e fácil do folhetim, que era veiculado nos jornais semanais tambémtrazia uma produção de histórias cômicas que se utilizava do burlesco, da surpresa e dosuspense. A popularidade do rádio, favoreceu o humor que já na década de 30 constava daprogramação das emissoras. A fase de ouro do rádio foi marcada pelo espetáculo ecaracterizou-se pela programação voltada para o entretenimento. Em Fortaleza, a Ceará RádioClube, viveu na década de 1950 o seu grande momento no qual os programas humorísticostambém deixaram sua marca. O presente artigo expõe as manifestações do riso e sua presençano veículo radiofônico. Autores como Ortriwano (1985), Vigil (2003) e Ferraretto (2001),foram indispensáveis para compreender a trajetória do rádio e suas especificidades no tempoatual. A história oral de vida dos fazedores do rádio e os documentos da Pesquisa História eMemória da Radiodifusão Cearense, compõem parte da metodologia do presente artigo.

Palavras-chave: Rádio. Humor. Programa de Humor no Rádio. 

Introdução

As produções de cunho humorístico apareceram, “primeiro nos rodapés dos

  jornais ou em pequenos e efêmeros pasquins semanais, depois nas margens das obras dos

próprios autores e, por fim, nas margens da própria produção escrita” (SALIBA, 2002, p.38).

O riso que humilhava ou ridicularizava algo ou alguém não era bem visto, sendo nivelado à

literatura dita pornográfica. “O cômico tolerado era aquele que provocava o bom riso, aquele

que não exprimia rancor nem se dirigia contra algo ou alguém em especial, aquele que não

degradava o objeto risível” (SALIBA, 2002, p.46). 

1 Graduada em Jornalismo - Universidade de Fortaleza - UNIFOR 2 Coordenadora da Pesquisa História e Memória da Radiodifusão Cearense – UNIFOR

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O humor degradante e agressivo que desencadeava o mau riso, embora não tivesse

tanto espaço na literatura, persistia de forma clandestina e muitas vezes nem era publicado.

Poemas satíricos como “O elixir do Pajé” e a “Orgia dos Duendes”, de Bernardo Guimarães,

por exemplo, não foram oficialmente publicados, embora impressões clandestinas circulassem

por volta de 1875 (SALIBA, 2002).

O surgimento da imprensa e do anúncio publicitário no século XIX possibilitou o

desenvolvimento de revistas humorísticas e o avanço das técnicas de impressão e reprodução

 justifica a sua divulgação. A tradição da representação humorística já vinha do jornalismo daregência e dos boletins cômicos do segundo reinado. No período imperial cerca de 60 revistas

circulavam no Rio de Janeiro. Dentre elas a  Revista Ilustrada (1860), Encyclopedia do riso e

da galhofa3 (1863), Semana Ilustrada (1876), revista Ba-Ta-Clan (1876) e por volta de 1886

a revista  A Vida Fluminense dentre outras. Com as novas técnicas de ilustração, o uso da

caricatura e muitas das revistas já incorporando a fotografia, começa a haver uma

regularidade de publicações e na primeira década do século XX surgem as principais revistas

semanais, com destaque para a  Revista da Semana, o Malho (1902), Kosmos (1904), revistaFon-fon! (1907), Careta (1908) e outras que surgiam não só no Rio de Janeiro como em

outras capitais do País (SALIBA, 2002). Em São Paulo concentrou-se a maior produção

periodística e por volta de 1912 a capital possuía 341 periódicos, seguido pelo Rio Grande do

Sul com 124 e o Rio de Janeiro com 118.

O bom riso predominantemente leve e cômico com finalidades positivas e

manifestado da contação de “anedotas joviais, casos galantes, chalaças e trivialidades de bom

gosto” (SALIBA, 2002, p.49) eram ainda as principais formas de humor toleradas e presentesem alguns periódicos brasileiros. Porém, o momento de transição enfrentado pelo Brasil na

passagem da monarquia para a república provocaria conflitos e lutas políticas nos dois

primeiros governos republicanos, Deodoro da Fonseca, em 1889 e Floriano Peixoto, em 1891.

Essa transição serviu de pano de fundo para uma grande produção cômica levando em

consideração rixas políticas e rancores pessoais. Era, portanto, a expressão da sátira política

que trouxe à tona o riso degradante, agressivo “aumentando a crescente percepção da

3A Encyclopedia era de autoria de Patusco Jubilado, pseudônimo do escritor alemão Eduardo Laemertconsiderado um dos pioneiros da edição e da indústria gráfica no Brasil.

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indiferenciação e da mistura entre o “bom” e o “mau” riso (SALIBA, 2002, p.57). Na última

década do império aumentaram os folhetins humorísticos e isso ocorreu principalmente a

partir do episódio do roubo das jóias da Coroa Portuguesa em março de 1882. A Imperatriz

Dona Teresa Cristina teve suas jóias roubadas no dia de seu aniversário. O episódio foi

notícia em vários jornais cariocas, dentre eles a Gazeta de Notícias. O escritor Raul Pompéia

publicou no mesmo jornal o folhetim  As jóias da Coroa e além dele outros escritores como

Artur Azevedo e José do Patrocínio escreveram, respectivamente, Um roubo no Olimpo e  A

 ponte do Catete. Outros escritores como Olavo Bilac, Pardal Mallet, Hippolyto da Silva, LimaBarreto, também se utilizaram do episódio para satirizar não só a monarquia como o regime

escravista (SALIBA, 2002). A república que se iniciava com promessas de transformação

social, gerava dúvidas quanto aos rumos do país e por isso era alvo fácil das sátiras e

chacotas. Esses questionamentos eram atrelados à ânsia de desenvolvimento tecnológico ao

cosmopolitismo que caracterizava as atitudes inspiradas nos modelos sociais europeus, desde

o período imperial. Era a busca por “máquinas, invenções, ingresias, francesias, ianquices que

acelerassem entre eles (os brasileiros) o ritmo do progresso: industrial, técnico, mecânico,  político e social”, (SALIBA, 2002, p.69). Esses aspectos favoreciam a proliferação das

representações cômicas.

Os humoristas da época eram ao mesmo tempo literatos, caricaturistas, cronistas

da imprensa, publicitários, revistógrafos e até músicos e atores. Exerciam as diversas práticas

culturais atuando, portanto, desde o jornal impresso a anúncios publicitários, passando pelo

teatro de revista, os discos de anedotas e na década de 20 o rádio. Outras características da

representação humorística brasileira era o uso da paródia, dos poemas-piadas e dosestrangeirismos trazidos pelo cosmopolitismo da época, que resultou em um processo

paródico pela junção de línguas que criariam assim uma nova língua anárquica. Nessa fase

também surgem novos vocábulos frequentemente usados pelos humoristas como:  Maracujá

de gaveta (rosto enrugado), Uruca ou Urucubaca (mau-olhado),  Afanar (furtar ou roubar),

 Angu (confusão),  Babau! (tudo perdido!),  Lero-lero (falatório) dentre outros (SALIBA,

2002). O humor, além de presente na literatura, manteve-se ligado também a outras práticas

culturais como o teatro de revista, o teatro musicado, o jornal, a publicidade, as revistas, o

cinema, o rádio e outros. A partir dos anos 1930, com o advento da indústria fonográfica, do

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cinema sonoro e a implantação do sistema radiofônico no Brasil, o humor, desenvolveu-se

acompanhando essas inovações. Muitos dos que já produziam humor em jornais e revistas

passaram a utilizar também o rádio unindo criações humorísticas e musicais.

1.  A Radiodifusão Brasileira - O riso nas ondas do rádio

A partir da década de 1930 o rádio passa da fase amadorística para o formato

comercial, profissional e popular. Com a chegada das agências publicitárias estrangeiras no

final dos anos 20 e sob a influência da bem sucedida experiência publicidade-rádio nos EUA,no Brasil, começou-se a repensar o perfil do rádio e a publicidade foi então regulamentada em

1932. A atuação dos anunciantes foi importante para popularizar e desenvolver o veículo que

facilitou o acesso da população e, consequentemente, fez surgir novas emissoras com uma

programação variada, na qual o humor estava inserido.

Um dos primeiros programas humorísticos surgiu em 1931 na Rádio Sociedade do

Rio de Janeiro. Era uma pequena audição de cinco minutos interpretada pelos atores de teatro

da época, Artur de Oliveira e Salu de Carvalho, respectivamente Manezinho e Quintanilha

(TAVARES, 2001). Ainda na década de 1930 surgiram programas como Cenas Escolares 

mais tarde modificado no seu formato, passando a se chamar Piadas do Manduca. Criado por

Renato Murce, o programa ficou no ar por 25 anos e contou com a participação de Lauro

Borges que posteriormente criou o clássico do humor radiofônico: PRK-30. O programa era

comandado pelo próprio Lauro Borges e por Castro Barbosa, e permaneceu no ar por 20 anos,

de 1944 a 1964, em diferentes emissoras, Rádio Clube do Brasil, Rádio Mayrink Veiga,

Nacional e Tupi. A proposta era parodiar o próprio rádio. Os dois locutores fingiam fazer

parte de uma rádio chamada PRK-30 onde todas as atrações eram voltadas para o humor e

zombaria. Segundo Tavares (2001) Megatério Nababo do Alicerce (Castro Barbosa) e Otelo

Trigueiro (Lauro Borges) eram respectivamente a figura do apresentador desinformado com

sotaque português, emitindo opiniões equivocadas e o locutor sedutor, com voz sensual e um

vasto repertório de clichês românticos.

Além de PRK-30 o humor ainda foi a matéria de programas como  Balança Mais

 Não Cai, Levertimentos, Vai da Valsa, A Cidade se Diverte, Tancredo e Trancado, Cadeira

de Barbeiro, Vila da Arrelia, As aventuras de Nhô Totico, Escola de Dona Olinda, Praça da

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 Alegria, dentre tantos outros que surgiram não apenas no Rio de Janeiro e São Paulo, mas em

outras capitais do país. A Rádio Nacional do Rio de Janeiro, criada em 1936, foi o principal

caminho para a expansão do rádio popular proporcionando variedade na programação e

servindo inclusive de modelo para as outras rádios do país. “O veículo adquire, dessa forma,

audiência massiva, tornando-se no início dos anos 50, a primeira expressão das indústrias

culturais do país”, (FERRARETTO, 2001, p.113). 

No Ceará, a pioneira Ceará Rádio Clube, fundada em 28 de agosto de 1931 em

Fortaleza por iniciativa de João Dummar, viveu na década de 1950 o seu grande momento.Surgiram os programas de auditório e o chamado elenco de ouro do rádio, além da expansão

do radioteatro. Segundo Augusto Borges (entrevista 04.06.08) muitos dos programas

humorísticos eram produções nacionais como Vai da Valsa e a Cidade se Diverte. As rádios

locais recebiam o script do programa e escalavam seus próprios radioatores para interpretar,

mas havia, paralelamente, as produções locais. Nessa fase os programas Clube das

Gargalhadas e Pensão Paraíso atraiam a audiência e  faziam sucesso. O clube era uma

animada sequência do programa “  Noturno Pajeú”, apresentado às terças-feiras naprogramação noturna, no qual as piadas remetidas pelos ouvintes eram contadas por Augusto

Borges e o “cast” de comediantes da emissora (LOPES, 1994). Já Pensão Paraíso, criado por

A. G. Melo Júnior e apresentado diariamente a partir das 11:30hs, girava em torno dos

personagens dona Paraíso (Ângela Maria) dona da pensão e mãe de Bombinha (José Ramos) e

os hóspedes seu Bifúzio (Mozart Marinho) e Oscarzinho (Augusto Borges).

A pensão era um achado. Passava dentro da programação do meio dia e naqueles

idos quando o comércio e os bancos fechavam para o almoço, era notória a correriadas pessoas na pressa de chegarem em casa a tempo de assistirem as tiradasdeliciosas dos personagens da pensão. (...) as pessoas que não podiam chegar emcasa a tempo, paravam num bar, num botequim ou em frente a uma loja ondehouvesse um rádio ligado (...) a cidade parava para ouvir o programa que ainda hojeé lembrado como o que de melhor se fez em matéria de humor no rádio local.(LOPES, 1994, p.187) 

A revista Folha do Rádio datada de Abril de 1954 em sua coluna

“Programolândia” trazia uma nota na qual confirmava o sucesso de Pensão Paraíso, “é sem

favor algum o melhor cartaz humorístico do rádio”, além de ressaltar o talento de seu

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idealizador A.G Melo Júnior que “firmou-se como um dos grandes produtores, especializado

como ele é, no difícil metier do humorismo sadio” (FOLHA DO RÁDIO, 1954, p.20). Esse

“humorismo sadio” também era a marca de outro programa, Escolinha do Professor Bikini , de

mesma autoria de A.G Melo. O programa era apresentado de segunda a sábado às 12:30 na

Ceará Rádio Clube e o riso se dava em torno do professor Bikini e seus alunos “pouco

inteligentes e malcriados” com exceção da aplicada aluna Juju (FOLHA DO RÁDIO, março

1954).  Outro programa humorístico era   A Carrocinha comandado por Augusto Borges.

Transmitido às 11:15hs antes do programa Pensão Paraíso, era composto por doispersonagens, Babau e Nôno, que se utilizavam da comicidade para criticar os problemas da

cidade: 

Era um programa humorístico crítico. Falávamos das mazelas da cidade e da loucurados políticos. Todo comentário que fazíamos terminávamos dizendo “Bota naCarrocinha” (que se tratava de uma carrocinha de lixo) “Bota o cachorro pramorder”. (...) a Prefeitura era o alvo, o objetivo eram os problemas deresponsabilidade da Prefeitura. (AUGUSTO BORGES, radialista e apresentador deTV, entrevista em 04.06.08).

Já  Mariquinha e Maricota eram duas fofoqueiras interpretadas, respectivamente,

  pelos comediantes José Júlio Barbosa, o homem “arranca gargalhada” e Clóvis Matias, o

“humorista da tesoura”. Tribunal Paupular  era transmitido às 21:30 dos sábados. Era de

autoria de Albuquerque Pereira e parodiava um tribunal popular com “direito” a um juiz

severo “munido de um martelo que pesa mais ou menos uma arroba”, um promotor que “sabe

  promover a confusão no tribunal” e um advogado “cuja barba preta denuncia os seus

conhecimentos jurídicos” (FOLHA DO RÁDIO, abril 1954, p.12). Dentre os locutores

participantes estavam Aderson Braz, João Ramos e Augusto Borges.

Todo o programa Tribunal Paupular é desenrolado dentro de rimas a dois versos,tornando-se interessante dentro de um ritmo que agrada ao ouvido. As testemunhasdepõem em versos, tudo muito vivo e alegre, vindo depois às paródias engraçadas ebem feitas. Depois dão-se os debates, que são interrompidos, abruptamente, pelomartelo gigante do meritíssimo juiz. Tudo gosado, tudo muito bom. (FOLHA DORÁDIO, Abril 1954, págs 12 e 13)

O programa Dona Pinóia e seus brotinhos baseava-se em uma escola onde as

crianças engraçadas, interpretadas pelos radioatores, João Ramos, Augusto Borges, Francisco

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Brilhante, Clóvis Matias e José Júlio Barbosa, enlouqueciam a professora Maria José Braz.

“Esse programa fez um sucesso incrível, pois também era apresentado nos teatros e nos

 bairros” (AUGUSTO BORGES, entrevista 04.06.08).

Dentre os muitos programas ainda se destacavam   Escola da Fuzarca e o 

  Restaurante Vuco Vuco. As esquetes, geralmente de 10 minutos também estavam sempre

  presentes entre as programações. “Teve fases em que eu fazia de três a quatro esquetes por 

dia, como “  Delegacia Baião de Dois”, “O Encrencadinho”, “  Zé lefone” e outras”,

(AUGUSTO BORGES, entrevista 04.06.08). Os programas eram todos roteirizados, atémesmo as esquetes. Quanto à qualidade do humor no rádio em sua fase de grande prestígio,

Augusto acredita que a receita estava no respeito ao ouvinte: 

Qualquer tipo de humor, exceto o humor pornográfico, é importante e interessantepara fazer rir e fazer rir é muito mais difícil do que fazer chorar. É você brincar comas coisas sérias sem cair na irresponsabilidade e isso é uma questão ética. Você podebrincar, pode até mexer com uma autoridade, mas nunca com a pessoa física,sempre com o cargo dessa pessoa, mas nunca no aspecto pessoal. Tínhamos muitocuidado com isso, você não pode se dar a esse direito, precisa respeitar. (...) você

pode criticar, ser engraçado, mas sem achincalhar (AUGUSTO BORGES, entrevistaem 04.06.08).

Quanto a dados concretos que possam atestar a presença de programas

humorísticos em outras emissoras de rádio cearense na época, o que pode ser percebido é que

o humor estava muitas vezes inserido em programas de variedades. A programação da Rádio

Dragão do Mar, disponível na revista Folha do Rádio (1959) tinha entre suas atrações, por

exemplo, o programa E o espetáculo continua, transmitido às 21hs e 5 mim no qual além de

música e poesia, também havia espaço para as anedotas, “tudo bem dosado e com muitoespírito”. Sendo assim é notório que o humor conferia prestígio e importância e contribuía

para o sucesso do rádio em sua fase de ouro. A criação de personagens copiava os tipos

regionais como o caipira, o nordestino, o estrangeiro e outros, e este mesmo estilo de humor

serviu de modelo para o que seria posteriormente feito na TV. Muitos dos programas

originários do rádio migraram para a TV e não apenas os programas, mas os personagens, até

hoje inspiram as novas criações. Para Maranhão Filho (1998) perceber o humor no rádio é

refletir sobre a importância do gênero para os outros segmentos como o jornalismo, o esporte,

a música e o radioteatro:

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Conduzir o humor no rádio exigia um domínio do meio, superior ao simples ofíciode gerar notícias; o radiojornalismo viveu, sempre, do impacto da informação,embora o seu formato valorizasse a presença do meio pela instantaneidade. Muitasvezes, o humor contribuiu, nas resenhas e retrospectos, quando se exigia areprodução e a imitação; uma pitada de graça deu peso a notícias municipais,nacionais e mundiais. Na dramaturgia radiofônica, o humor marcou presença pelaopção, feita por novelistas e comediógrafos, por tipos que se classificavam de“caricatos” nas intervenções do rádio teatro. Era raro uma novela que não inserisseem seu enredo, um ator característico para provocar o riso. (MARANHÃO FILHO,1998, p.100)

Dessa forma, a efervescência do gênero humor durante a fase de ascensão do

rádio e na atualidade com o aparecimento das novas mídias é um elemento indispensáveldentro da programação.

1.1 O Riso nas FMs

O surgimento da TV, fez com que o rádio nos anos 1960 enfrentasse uma crise. O

rádio viveu a perda de prestígio ao se ver atrelado a um público ouvinte enquadrado na

categoria de baixa renda (TAVARES, 1999). Maranhão Filho (1998) acrescenta ainda que a

fase de crise do rádio não foi devido, especificamente, ao advento da TV, mas primeiramente  pela expansão da indústria fonográfica, pois o disco “tomaria conta do mundo e do Brasil,

como substituto das orquestras, conjuntos e instrumentistas, todos com presença marcante e

ao vivo” (p.101). Com o surgimento das FM o rádio voltou a se dirigir também a uma

audiência classe média, com uma linguagem voltada para o público jovem. O período inicial

da implantação da FM (frequência modulada) no Brasil foi em meados da década de 1970. A

tecnologia foi desenvolvida por Edwin Howard Armstrong antes mesmo da segunda guerra

mundial (1939), porém, após esse evento a nova tecnologia passou a ser regularmente

empregada nos Estados Unidos. Foi atribuída a Rádio Difusora FM de São Paulo o

pioneirismo da transmissão em frequência modulada no Brasil, em dezembro de 1970.

 No início as FM eram musicais e o modelo “música de qualidade” era o formato

dominante. Em 1974 a Rádio Cidade do Rio de Janeiro moldou uma programação

segmentada para um público jovem, inspirada no padrão de rádio FM da Califórnia que aliava

músicas a uma presença humorística nas sátiras e brincadeiras entre os locutores. Daí 

renasceram os programas humorísticos agora com nova roupagem. Nos anos 1940 e 1950 os

programas de humor parodiavam o próprio rádio e suas atrações. Com o advento da TV, esse

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novo “mundo” passou a ser parodiado pelas FMs. O Café com Bobagem, criado na década de

1980 em São Paulo, parodiava as principais atrações da TV, como os programas esportivos,

os policiais, os de auditório, as telenovelas e até mesmo os anúncios. Por volta de 1987,

surgiu em Fortaleza o programa  Nas Garras da Patrulha até hoje permanece veiculado pela

frequência AM, na Rádio Verdes Mares, tendo sua versão televisiva transmitida pela TV

Diário.  Nas Garras da Patrulha também adota o estilo parodístico utilizando como alvo os

programas policiais sensacionalistas como o Patrulha Policial, criado em 1980, na Rádio AM

do Povo que lhe serviu de inspiração.Outros tantos programas surgiram no rádio FM atraídos por um estilo de humor

que se utiliza da crítica, da bizarrice e muitas vezes do apelo pornográfico. Muitos seguem o

estilo de criação de personagens e outros encarnam a própria figura do “locutor -comunicador-

humorista”.

Para Maranhão Filho (1998) a febre FM minimizou o humor no rádio e não lhe dá

espaço a partir do momento em que vai institucionalizando a figura do “comunicador”. Este

seria, portanto, aquele que comanda o programa e volta-se diretamente ao público ouvinte enesse contato manifesta expressões humorísticas marcadas pela linguagem provocativa,

utilizando expressões de baixo calão, gracejos de duplo sentido, enfim, um apelo ao grotesco.

Esse recurso alia-se ao improviso, ao uso de efeitos sonoros que produzem risadas e demais

ruídos, geralmente extravagantes. Dessa nova linha de humor surgiram programas com

transmissões para várias localidades do país e outros com veiculação local. Essa abrangência

é possível graças aos transmissores FM via satélite a partir dos anos 1990, que possibilitaram

a criação de redes de rádio afiliadas em todo o país.O novo estilo de humor seria, portanto, a marca de programas como  Djalma Jorge

(Jovem Pan FM , décadas de 1980 e 1990, SP), Pânico (Jovem Pan FM, SP), Mução (Rede

 Estação Sat, PE), Paulo Jalaska (Jovem Pan FM, SP), Encrenca no Almoço (Jangadeiro FM,

Fortaleza, 2005), Boi na linha (Jovem Pan FM, SP), Chuchu Beleza (rádio Mix FM, SP)

Tesouradas do Cochinha e Lasca tudo por dinheiro (Rádio FM 93, Fortaleza), A Hora do

 João Rufino (Rádio Mix FM, Fortaleza) e tantos outros que tiveram vida curta e outros ainda

em atividade. Alguns dos programas citados são na verdade no formato de esquetes,

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transmitidas no decorrer das programações musicais como é o caso de Chuchu Beleza,

Tesouradas do Cochinha e Lasca Tudo Por Dinheiro.

2.  Características da linguagem radiofônica e da mensagem sonora

A atitude humorística no rádio deve ser analisada à luz dos elementos que

caracterizam o veículo e o torna apto a transmitir uma mensagem de modo que atinja o

ouvinte e o envolva. O humor ou qualquer outro gênero no rádio só é viável pela presença dos

elementos que compõem a estrutura da linguagem radiofônica assim conhecida: Linguagem

oral, Penetração, Mobilidade, Baixo custo, Imediatismo, Instantaneidade, Sensorialidade e

Autonomia, e ainda a mensagem sonora composta pela palavra, música, ruído ou efeito

sonoro.

2.1  A Oralidade

No rádio a palavra sonora está condicionada à escrita. No radiojornalismo, por

exemplo, a postura de quem fala deve ser formal, contida para denotar objetividade,neutralidade, confiança e autoridade. Havia na era de ouro do rádio um padrão a ser seguido a

exemplo da formalidade do repórter Esso. “A BBC ditava padrões internacionais de

“radiogenia” exigia de seus locutores que lessem as notícias vestidos a rigor, com roupas de

grife” (LEWIS e BOOTH, Apud MEDITSCH, 1997, p.5). 

Para Walter Ong (Apud MEDITSCH, 1997) “a oralidade eletrônica é

essencialmente uma oralidade mais deliberada e autoconsciente, (...) prepara as coisas

cuidadosamente para ter a certeza de que saem verdadeiramente espontâneas” (p.6). PaulZumthor (1997) trabalha com as questões inerentes à oralidade, a escrita e a memória. O autor

faz um paralelo entre o papel do intérprete e o do ouvinte, para ele o intérprete é “o indivíduo

de que se percebe, na performance, a voz e o gesto, pelo ouvido e pela vista” (p.225) e o

ouvinte é aquele que “possui dois papéis: o de receptor e de co -autor” (p.242). Portanto, só há

intérprete se houver ouvinte. Recai sobre o intérprete a primazia nessa relação porque ele é o

responsável pela performance, é a partir de sua interpretação, de seu desempenho que a reação

do ouvinte se fará com maior intensidade, seja auditiva, corporal ou emocional. Na linguagem

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radiofônica temos o produtor-redator e o intérprete e nesse caso é o intérprete aquele que faz o

contato com o ouvinte servindo-se da peculiaridade da sua voz, o seu timbre e a sua

interpretação, portanto, a palavra sonora interpretada tem primazia sobre a palavra escrita.  

A performance do intérprete é, pois, a responsável pela sua força enquantodisseminador do texto oral. A intimidade do intérprete com o poema ou do narradorcom o que está lendo vai ser avaliada pelo efeito que sua performance terá sobre opublico ou sobre o ouvinte, de convencimento, de emoção ou de desprezo(CARNEIRO, 2003).

Nos atuais programas humorísticos veiculados nas rádios FM, os intérpretes

aproximam-se da oralidade espontânea mesmo estando no meio eletrônico, pelo fato de

fazerem os programas de improviso e não usarem uma produção escrita, um roteiro. Observa-

se que existe uma permanente empatia entre o intérprete e o ouvinte gerando um resultado

qualitativo, o público alvo mantém um interesse compatível ao do intérprete garantindo sua

audiência.

2.2  A Penetração, a mobilidade e o baixo custo

O público do rádio onde quer que esteja se houver um receptor ligado recebe a

informação, portanto, o rádio está ao alcance do ouvinte. Quanto à mobilidade, devido a sua

menor complexidade tecnológica, pode chegar mais facilmente aos acontecimentos e

proporcionar maior rapidez de divulgação. O rádio é artigo encontrado com facilidade em

qualquer pequeno comércio de produtos variados e o seu custo pode se tornar insignificante se

levado em consideração o poder de comunicação que proporciona.

2.3  A Instantaneidade

Por ser imediato, “permite “trazer” o mundo ao ouvinte enquanto os

acontecimentos estão se desenrolando” (ORTRIWANO, 1985, p. 80). A questão do

imediatismo e da instantaneidade, aspectos que fazem a diferença no sistema radiofônico, se

assemelha ao artifício do humor. Uma piada ou um chiste, por exemplo, para ser bem

sucedida e provocar o riso e a graça necessitam da brevidade, do caráter imediato da surpresa

e do espanto que causam ao ouvinte. Ao mesmo tempo em que uma piada é cuidadosamente

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elaborada, sua transmissão, deve seguir os mesmos cuidados sob pena de pôr em risco o efeito

cômico.

2.4  A Sensorialidade

O rádio envolve o ouvinte trazendo a sensação, no momento da escuta de que há

uma conversa a dois, ao mesmo tempo em que vai aguçando a imaginação, diferente da TV

que de imediato restringe a fantasia: a imagem está pronta, diante dos olhos do expectador,

não precisa criar, sequer precisa pensar, ela está dada. A voz radiofônica é sensorial eenvolvente e, por sensorialidade entende-se as produções e alterações materiais que um corpo

realiza ao interagir com diferentes mídias. Ou seja, é a capacidade que o corpo tem de

processar sons, imagens, sinais gráficos, texturas e outros estímulos sensoriais que atingem o

corpo e o leva a responder com um repertório de significados, ações e emoções. “Se uma

imagem vale mais que mil palavras, o rádio ao usar as mil palavras para criar uma imagem

permite então que se criem não uma, mas várias, mais do que mil imagens mentais”

(ORTRIWANO, 1985, p.81).

2.5  A Autonomia

Por fim, a autonomia que o rádio proporciona ao ouvinte simultaneamente ao ato

de escutar, ou seja, realiza várias atividades como dirigir, trabalhar, se exercitar etc. O veículo

funciona como um pano de fundo em qualquer ambiente, que o faz não menos importante,

mas um meio de comunicação adaptável às circunstâncias.

3.  Constitutivos da natureza estrutural da mensagem sonora

A comunicação ou o ato de comunicar-se remete ao estabelecimento de um

vínculo, de um compartilhamento da mensagem que, por sua vez, constitui um conjunto de

elementos reunidos em uma sequência de signos. Partindo da percepção de Abraham Moles,

Balsebre (2005) afirma que pode ser designada a natureza estrutural da mensagem sonora do

rádio por meio de três sistemas expressivos: a palavra, a música e o ruído ou efeito sonoro,

aos quais Balsebre ainda acrescenta um quarto fator que é o silêncio. A linguagem

radiofônica, portanto, é um conjunto de formas sonoras e não sonoras representadas por esses

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elementos e cuja significação resulta de recursos técnicos aliados à percepção imaginativo-

visual dos ouvintes. Vigil (2003) caracteriza esses aspectos como a voz tripla do rádio que se

constitui da voz humana, expressa em palavras ou outros sons, da voz da natureza e do

ambiente, provocada pelos efeitos sonoros e a voz do coração e sentimentos, expressa por

meio da música.

3.1  A Palavra

O uso da palavra no rádio é fundamental. Segundo Balsebre (2005) a linguagemradiofônica é artificial e a palavra, mesmo quando busca transmitir a naturalidade da

comunicação interpessoal, é elaborada, imaginada e estabelecida ali com um propósito

definido, portanto, cuidadosamente tratada. Esse tratamento ocorre exatamente na integração

entre o texto escrito e a improvisação verbal. O discurso verbal é produzido de forma a tentar

eliminar o efeito distanciador, buscando a intimidade e o máximo de naturalidade. O texto

escrito que terá no rádio a função sonora, necessita dos recursos expressivos da voz que

enfatizam a ideia da espontaneidade da fala improvisada. Seria a “arte de colorir uma notícia”.

Esse colorido ou “as cores do som” teriam como elementos determinantes para a sua

produção: a intensidade, o volume, o intervalo e o ritmo. Esses fatores proporcionam um

tratamento à palavra de modo a ser dita e ouvida satisfatoriamente. A própria fala do locutor,

que pode determinar uma relação de empatia e identificação, se dita de forma mais grave

projeta a sensação de presença e proximidade, já um timbre de voz mais agudo não é

acolhedor, não remete à familiaridade e por consequência distancia o ouvinte.

Quanto à musicalidade da palavra, esta se define pela melodia ou a entonação

dada. A melodia traz a ideia de transição de um momento a outro do discurso e se um locutor,

por exemplo, não fica atento ao tom melódico de sua fala, ele cai na monocordia prejudicando

a comunicação, uma vez que o ouvinte poderá se cansar e perder o interesse. Por mais rico

que seja o conteúdo da mensagem, o tom horizontal, a repetição da mesma linha melódica na

fala, sem as curvas expressivas, torna o discurso enfadonho. Outra característica do processo

de criação sonora da palavra é a harmonia, definida pela “superposição ou justaposição das

vozes de uma seqüência” (BALSEBRE, 2005, p.332), a fim de proporcionar credibilidade e

verossimilhança na composição da realidade ali apresentada. Balsebre cita como exemplo a

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utilização da voz masculina e feminina, pois a diferença de timbre produz uma harmonia

estética significativa. Um último aspecto seria o ritmo da palavra no rádio que resulta na

cadência das sequências sonoras. É o ritmo que delineia as pausas, a melodia e a harmonia.

Ele atua, portanto, equilibrando a velocidade e intensidade das ações. Na verdade o ritmo

determina a dinâmica do andamento musical da palavra.

3.2  A Música

Segundo Vigil (2003) o ouvido humano é musical e muitas pessoas, por exemplo,ligam o rádio simplesmente para ouvir música. A palavra, em seu sentido primordial seria um

fenômeno expressivo que significa encantamento, ou seja, a sedução pelo canto. As formas

sonoras musicais, em se tratando do rádio, produzem sensações e proporcionam a criação de

imagens auditivas. Na linguagem radiofônica os usos da música juntamente com a palavra

resultam em uma harmonia que favorece a transmissão da mensagem. Balsebre (2005) aponta

duas funções estéticas básicas da música radiofônica: a função expressiva que é quando a

música cria um clima emocional e uma atmosfera sonora e a função descritiva que é quando amúsica favorece a descrição de uma paisagem ou o cenário de ação de um relato. Ela é,

  portanto, a “imagem” do rádio, considerada a linguagem da emoção que envolve e cativa o

receptor e o conduz à imaginação criativa, individual, especial para cada ouvinte.

3.3 O Efeito sonoro ou ruído 

Os efeitos sonoros auxiliam na “fabricação” da realidade radiofônica e foram

sempre muito utilizados nas programações radiofônicas. A radionovela, gênero por excelênciada época de ouro do rádio não teria metade do seu glamour e projeção, se não fossem os

toques sonoros aliados à interpretação dos atores reproduzindo e proporcionando realidade e

fantasia.

É nesse conjunto harmônico dos distintos sistemas expressivos da linguagemradiofônica que se constrói a especificidade significativa do meio. Por exemplo, oefeito sonoro da chuva, pode tanto informar a condição do tempo, como estimular,pela associação de idéias, que o ouvinte construa uma imagem de um ambientesubjetivo intimista, solitário (BALSEBRE, 2005, p.334).

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O efeito sonoro teria, portanto, quatro funções: ambiental, expressiva, narrativa

(quando ocorre como uma ligação entre cenas, ou quando proporciona uma mudança de

tempo narrativo sem a necessidade de usar palavras) e ornamental (estético). Vigil (2003), no

entanto, chama a atenção para o pouco uso hoje em dia dos recursos sonoros no rádio. Os

efeitos que davam um colorido especial ao rádio na sua fase de ascensão teriam sido

considerados, atualmente, como um recurso fora de moda. “Para um roteirista é fácil escrever 

parágrafo após parágrafo, diálogos nus, textos sem qualquer ambientação sonora. E para um

operador é ainda mais fácil abrir microfones e soltar disco após disco. Da comodidade fez-sevirtude” (p. 60). Os programas humorísticos exploram essa vertente, uma vez que os efeitos

auxiliam a atitude engraçada e se de fato o efeito sonoro tem sido pouco utilizado no rádio,

pelo menos no humor, ele está presente e é muito explorado.

Quanto ao ruído, considerado um obstáculo para a boa transmissão da mensagem,

pode ser visto também como um fator positivo em se tratando do rádio. No diálogo normal

entre pessoas frente a frente, qualquer ruído pode ser amenizado por mecanismos como

gestos, apoios visuais, movimentos e mímicas. Já o rádio não dispõe desses recursos e sendoassim, o ruído ou som, elaborado para fins específicos, funciona para dar suporte, ou seja, é

um complemento a mais para a compreensão da mensagem.

 No entanto, não é qualquer “ruído” que funciona como um fator positivo, aqueles

provocados por falhas técnicas são fatores que comprometem a qualidade e eficácia da

mensagem radiofônica. O desenvolvimento tecnológico da reprodução sonora e o uso

adequado dos efeitos sonoros, são mecanismos complementares, são ruídos significantes.

Sendo assim, percebe-se nos programas humorísticos atuais o aproveitamento por parte doscomunicadores, dos ruídos, dos mal-entendidos, para a partir daí forjarem o humor.

3.4 O Silêncio ou pausa

Quanto ao quarto elemento, o silêncio, Vigil faz uma observação. Existe, sob seu

ponto de vista, uma diferença entre buraco e pausa. O buraco é provocado por um silêncio

inesperado, não previsto e causado por quaisquer falhas. Já a pausa planejada é carregada de

sentido, pois significa o tempo previsto para salientar uma frase ou uma situação, tempo esse

adequado à percepção que se espera do ouvinte.

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O que seria dos romances sem os melosos momentos que transcorrem depois dobeijo dos amantes incompreendidos, momentos que nos permitem esvaziar a alma ederramar algumas lágrimas? Todas as emoções se intensificam com pausasoportunas que as seguem ou precedem. (VIGIL, 2003, p.57)

Todos os gêneros radiofônicos, dentre eles o humor, fazem uso da pausa,

indispensável para a apreensão do significado da mensagem. A piada ou dramatização

necessita desse lapso de tempo necessário para alcançar a reação por parte do ouvinte. Em se

tratando do humor, o resultado é o riso, a gargalhada. Para Vigil, o silêncio não chega a ser

um quarto elemento da linguagem radiofônica e sim algo que pertence ao próprio ritmo dosoutros três elementos. Ele funciona como um catalisador, o elemento sem o qual a reação

química não acontece. Da mesma forma que o efeito sonoro ou ruído funciona como suporte

da mensagem quando colocado intencionalmente, o silêncio ou a pausa tem a mesma

propriedade. Ao ocorrer uma pausa por falha técnica ou qualquer outro obstáculo no ato

comunicativo, o comunicador de acordo com a sua desenvoltura e presença de espírito pode

revertê-la positivamente para o significante.

4.  A Percepção-recepção na linguagem radiofônica

Além dos aspectos analisados e que são fundamentais à linguagem radiofônica,

outros são ainda importantes para que o rádio exerça seu papel de comunicador. Entendemos

que da relação dos quatro elementos surge um quinto que compõe a linguagem radiofônica ao

qual denomino de clima perceptível e diferenciado a cada edição dos programas humorísticos,

por exemplo, é o ponto ótimo, o equilíbrio que faz fluir a mensagem. O efeito cômico no

rádio recairá, portanto, sob esses constituintes: a palavra, a música, o ruído (efeitos sonoros

intencionais ou imprevistos), o silêncio e o clima. Alguns artifícios da linguagem podem

estar inseridos no rádio como o uso de expressões regionais, metáforas e comparações, ditos

populares, exageros, bordões repetitivos, perguntas, exclamações, ordens, e frases

engenhosas. Esse leque de artifícios se encaixa muito bem aos programas humorísticos.

Sendo assim, o humor, o chiste, a paródia, o grotesco ou qualquer outra manifestação de

comicidade nutre-se desses aspectos da linguagem. O que pode provocar desequilíbrios ou

quaisquer outras barreiras é o uso desordenado e apelativo desses elementos que geram outro

tipo de cômico, aquele que escandaliza.

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A linguagem específica do rádio favorece a objetividade e clareza das mensagens.

Para Balsebre (2005) o rádio cria uma nova poesia: a poesia do espaço, pois entre suas metas

está a de reconstituir e recriar o mundo real e a criação de um mundo imaginário e fantástico,

um produtor de sonhos que se utiliza de uma espécie de gramática particular para que o seu

objetivo seja alcançado.

5.  Considerações finais

Ao finalizar essa análise pontual do riso no rádio percebemos um distanciamentoe uma diferenciação natural do rádio e do riso no decorrer das décadas. Antes quando o rádio

fazia a diferença, ou seja, quando a sua presença era fundamental como ferramenta de

informação e entretenimento, o humor era elaborado, atrativo e característico do “bom riso”.

A fase de ouro do rádio cearense viveu uma efervescência de programas de humor que

abusavam das caracterizações, das paródias, da criatividade e dos jogos cênicos dentro dessa

perspectiva. Os fazedores do rádio acreditavam que a receita de sucesso dos humorísticos era

o respeito aos ouvintes.

No século XXI os atuais programas humorísticos radiofônicos vem com uma nova

roupagem, a proposta é promover um riso fácil e despreocupado no qual o próprio ouvinte

também assume o papel de mediador desse humor moleque que incita à distração e ao

entretenimento. Não se configura crítico e sim circunstancial no qual a junção da palavra com

o efeito sonoro incitam ao riso. Por não haver uma formalidade ou uma sequência que

obrigatoriamente tenha que ser seguida, a brincadeira é a tônica dos programas que seguem

com naturalidade.

O locutor-comunicador-humorista consegue juntar elementos da cultura como

piadas, notícias bizarras, charadas, desafios com premiações, rimas e trocadilhos, além de

elementos muito específicos da linguagem radiofônica, o ruído ou efeito sonoro, a

interpretação, a pausa, conjurando um clima muito especial no decorrer dos programas,

conseguindo, portanto, um resultado positivo de audiência e participação do ouvinte de

classes sociais e idades diferenciadas.

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