o que preocupa os ceos em relação às mudanças climáticas no...

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Sexta-feira, 15 de junho de 2012 | F1 Especial Rio + 20 Para John Elkington, clima e pobreza vão ditar novos modelos de negócios F6 INICIO FIM O que preocupa os CEOs em relação às mudanças climáticas no Brasil... 77 Mudanças climáticas 85 2012 2022 77 Escassez de água 83 2012 2022 80 62 89 74 2012 2022 Energia a preços acessíveis Muito importante 83 41 86 62 2012 2022 Consumo sustentável e escassez de recursos Muito importante 65 Segurança alimentar 74 2012 2022 ...e no mundo 2012 2022 Muito importante 87 39 89 2012 2022 Muito importante 83 86 2012 2022 80 84 2012 2022 68 2012 2022 2012 2022 65 58 78 78 64 2012 2022 57 63 Energia a preços acessíveis Igualdade e inclusão social Consumo sustentável e escassez de recursos Mudanças climáticas Escassez de água Perda de biodiversidade Segurança alimentar 60 26 43 2022 2012 82 Perda de biodiversidade 82 79 Igualdade e inclusão social 79 2012 2022 Fonte: PwC - Pesquisa com 141 CEOs de empresas com faturamento entre US$$ 10 milhões e US$ 10 bilhões em abril e maio de 2012 no mundo e com 34 CEOs no Brasi Documento do Ethos sintetiza expectativas e propostas Agenda Empresas mobilizam-se para apresentar suas ideias de como fazer a transição para a economia verde. Por Carlos Vasconcellos , para o Valor, do Rio E nquanto os holofotes da Rio+20 se voltam para os chefes de Estado, o setor privado vive a expectativa da Conferência das Nações Unidas para o Desenvolvimento Susten- tável como parte do problema e — ao mesmo tempo — das possí- veis soluções para o desafio do crescimento sustentável e da preservação ambiental, com di- ferentes propostas de contribui- ção e também com demandas. No Brasil, segundo levanta- mento da consultoria Deloitte com 108 gestores de empresas de todos os portes e setores e fatura- mento correspondente a 17% do PIB do país, o setor privado está dividido em relação aos resulta- dos da conferência: 45% dos em- presários acreditam que a Rio+20 servirá para acelerar as discussões ambientais, outros 45% apostam que não haverá mudanças signifi- cativas. São expectativas seme- lhantes às de 141 CEOs de todo o mundo ouvidos pela Pricewa- terhouseCoopers: 50% deles espe- ram algum progresso nas ques- tões que estão em pauta na Rio+20 e os outros 50% acham que haverá apenas pequeno ou nenhum avanço. Um dos desafios da Rio+20, portanto, é ajudar a romper o ce- ticismo de parte da comunidade empresarial e engajá-la na causa ambiental. Para a coordenadora- executiva da Rio+20, Henrietta Elisabeth Thompson, a presença de mais de 6 mil empresários e lí- deres de associações de empresas privadas no evento é significativa. Segundo ela, parte da tarefa da conferência é provar aos líderes empresariais que sustentabilida- de não significa ineficiência ou perda de competitividade. Como fazer isso? “Apresentan- do casos de sucesso na economia verde, enquanto os governantes trabalham na criação de um mar- co institucional favorável à sus- tentabilidade. Ao mesmo tempo, a consciência do consumidor em relação aos temas ambientais au- menta e ele passa a cobrar das empresas uma atuação mais res- ponsável do ponto de vista sócio- ambiental”, enumera Thompson. Segundo Heloísa Monte, dire- tora de marketing da Deloitte, tudo indica que o empresariado brasileiro está cada vez mais in- clinado a adotar práticas sus- tentáveis. “Ao todo, 85% das em- presas pesquisadas afirmaram adotar alguma prática de sus- tentabilidade e 27% já incorpo- raram fatores de sustentabilida- de em sua política de remunera- ção de executivos.” Carlos Rossin, diretor da con- sultoria PWC Brasil e especialista em sustentabilidade, chama a atenção para a importância da mídia no engajamento da socie- dade em relação à causa verde. Em uma pesquisa realizada com CEOs pela PWC, 97% dos líderes empresariais brasileiros aponta- ram que os meios de comunica- ção terão influência significativa ou relativa no resultado da Rio+20. “A mídia terá um papel importante como catalisadora dessa mudança.” Iniciativas como o Global Com- pact, da ONU, que tenta estabele- cer metas de autorregulação para o setor privado são vistas como positivas, ainda que nem sempre tenham resultados práticos ime- diatos. No entanto, é preciso criar os estímulos certos para que o processo de transição para a eco- nomia verde avance. Keisha Gar- cia, presidente da Cropper Foun- dation, de Trinidad & Tobago, e Rosangela Capozoli Para o Valor, de São Paulo A comitiva do Instituto Ethos chega à Rio+20 certa de que boa parte do empresariado está enga- jada em um esforço coletivo rumo a uma economia verde. Uma mara- tona de três dias de debates reali- zados na Conferência Internacio- nal 2012 — “A Empresa e a Nova Economia. O que Muda com a Rio + 20?” —, que ocorreu nesta sema- na, em São Paulo, resultaram em um documento que sintetiza o po- sicionamento do instituto, dos parceiros e empresas para a cons- trução de um futuro sustentável. Com nove demandas e nove compromissos, o documento foi entregue na quarta-feira a repre- sentantes do governo brasileiro e da Organização das Nações Unidas (ONU). “Construímos propostas e agenda de transição para a econo- mia brasileira. Desenhamos metas para o governo e compromisso pa- ra o setor empresarial e para a so- ciedade civil. A ideia é a partir da sociedade fazer uma proposta de agenda de transição. A Rio +20 é um momento fundamental para isso”, explica Paulo Itacarambi, vi- ce-presidente do Ethos. A proposta também lista dez te- mas prioritários como “integrida- de, transparência e combate à cor- rupção”, passando por tópicos co- mo “cidades sustentáveis”, “ener- gia sustentável para todos”, e “agricultura e segurança alimen- tar”, entre outros. “Para cada um dos temas há três propostas”, ex- plica Itacarambi. Para a economia da biodiversidade, por exemplo, uma das propostas é criar instru- mentos fiscais tributários de mer- cado que, de fato, fomentem ativi- dades econômicas sustentáveis, garantindo direitos e benefícios justos e equitativos às comunida- des locais e tradicionais. “São 158 organizações que já aderiram aos compromissos e demandas conti- dos no documento. Nossa meta é continuar com esse processo de- pois da Rio+20, porque essa é a base para lançar a agenda de tran- sição”, explica Itacarambi. “A aproximação da Rio+20 favo- receu as discussões sobre esse tema crucial para a comunidade mun- dial, que é o desenvolvimento sus- tentável, e a realização da confe- rência nesse período foi estratégi- ca. As propostas são nossa contri- buição, e ficaremos na torcida para conseguirmos influenciar positi- vamente a elaboração dos Objeti- vos de Desenvolvimento Sustentá- vel (ODS)”, afirma Jorge Abrahão, diretor-presidente do Ethos. O seminário, que reuniu cerca de 1,1 mil participantes, incluiu debates com figuras-chave na dis- cussão da economia verde, como o subsecretário-geral da ONU e di- retor-executivo do Programa das Nações Unidas para o Meio Am- biente (Pnuma), Achim Steiner, Luciano Coutinho, presidente do BNDES, Marcelo Furtado, diretor- executivo do Greenpeace no Bra- sil, e o economista indiano, Pavan Sukhdev, consultor especializado em medir impactos da atividade econômica. Leia mais sobre a conferência nas páginas F4 a F9 de negócios uma das autoras do capítulo so- bre a América Latina e o Caribe do relatório ambiental global da ONU Geo 5, destaca a necessidade de se criar metas ambientais mais tangíveis e mensuráveis. Sem isso, fica mais difícil aumentar o enga- jamento do setor privado, que ela considera fundamental para uma economia sustentável. Para Clarissa Lins, diretora da da Fundação Brasileira para o De- senvolvimento Sustentável (FBDS), que reúne empresas brasi- leiras envolvidas na construção da economia verde, a agenda da inte- gração ambiental não pode ser apartada da agenda da eficiência. “Precisamos desmistificar o con- ceito de sustentabilidade. Esta- mos falando em conciliar boa ges- tão de negócios com gestão res- ponsável dos recursos naturais. Quem fizer isso vai ter retorno mais rápido do fluxo de caixa.” No entanto, observa Clarissa, é necessário lembrar o óbvio: o se- tor privado não é uniforme e não se move sempre na mesma dire- ção ou velocidade. “O importante é que todos avancem, mas para is- so precisamos de regras ambien- tais que não criem desigualdade ou distorções competitivas entre empresas, setores ou países”, diz. Sérgio Margulis, assessor es- pecial do Ministério do Meio Ambiente, acredita que o papel regulador do Estado será decisi- vo. “O mercado não vai se regu- lar sozinho, infelizmente o pro- cesso de adaptação do setor pri- vado à economia verde é mais lento do que se poderia espe- rar”, diz. Para ele, apesar das ini- ciativas isoladas de algumas empresas e setores, a grande transformação virá da tomada de decisões de políticas públi- cas nos grandes países.

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Jornal Valor --- Página 1 da edição "15/06/2012 1a CAD F" ---- Impressa por lmmorresi às 14/06/2012@17:32:03

Enxerto

Jornal Valor Econômico - CAD F - ESPECIAIS - 15/6/2012 (17:32) - Página 1- Cor: BLACKCYANMAGENTAYELLOW

Sexta-feira, 15 de junho de 2012 | F1

Es p e c i a lRio+20

Para John Elkington,clima e pobreza vãoditar novos modelosde negócios F6

INIC

IO

FIM

O que preocupa os CEOs em relação às mudanças climáticas no Brasil...

77

Mudanças climáticas

85

2012 2022

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Escassez de água

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2012 2022

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2012 2022

Energia a preçosacessíveis

Muitoimportante

83

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2012 2022

Consumo sustentávele escassez de recursos

Muito importante

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Segurança alimentar

74

2012 2022

...e no mundo

2012

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Muito importante

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Muito importante

83

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2012

2022

57

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Energia a preços acessíveis

Igualdade e inclusão social

Consumo sustentável e escassez de recursos

Mudanças climáticas

Escassez de água

Perda de biodiversidade

Segurança alimentar

60

26

43

20222012

82Perda de biodiversidade

8279

Igualdade e inclusão social

79

2012 2022

Fonte: PwC - Pesquisa com 141 CEOs de empresas com faturamento entre US$$ 10 milhões e US$ 10 bilhões em abril e maio de 2012 no mundo e com 34 CEOs no Brasi

Documento do Ethos sintetiza expectativas e propostas

Ag e n d a

E m p re s a smobilizam-separa apresentarsuas ideias decomo fazer atransição para aeconomia verde.Po r CarlosVa s c o n c e l l o s ,para o Valor,do Rio

E nquanto os holofotes daRio+20 se voltam para oschefes de Estado, o setor

privado vive a expectativa daConferência das Nações Unidaspara o Desenvolvimento Susten-tável como parte do problema e— ao mesmo tempo — das possí-veis soluções para o desafio docrescimento sustentável e dapreservação ambiental, com di-ferentes propostas de contribui-ção e também com demandas.

No Brasil, segundo levanta-mento da consultoria Deloittecom 108 gestores de empresas detodos os portes e setores e fatura-mento correspondente a 17% doPIB do país, o setor privado estádividido em relação aos resulta-dos da conferência: 45% dos em-presários acreditam que a Rio+20servirá para acelerar as discussõesambientais, outros 45% apostamque não haverá mudanças signifi-

cativas. São expectativas seme-lhantes às de 141 CEOs de todo omundo ouvidos pela Pricewa-terhouseCoopers: 50% deles espe-ram algum progresso nas ques-tões que estão em pauta naRio+20 e os outros 50% achamque haverá apenas pequeno ounenhum avanço.

Um dos desafios da Rio+20,portanto, é ajudar a romper o ce-ticismo de parte da comunidadeempresarial e engajá-la na causaambiental. Para a coordenadora-executiva da Rio+20, HenriettaElisabeth Thompson, a presençade mais de 6 mil empresários e lí-deres de associações de empresasprivadas no evento é significativa.Segundo ela, parte da tarefa daconferência é provar aos líderesempresariais que sustentabilida-de não significa ineficiência ouperda de competitividade.

Como fazer isso? “Apresentan -

do casos de sucesso na economiaverde, enquanto os governantestrabalham na criação de um mar-co institucional favorável à sus-tentabilidade. Ao mesmo tempo,a consciência do consumidor emrelação aos temas ambientais au-menta e ele passa a cobrar dasempresas uma atuação mais res-ponsável do ponto de vista sócio-ambiental”, enumera Thompson.

Segundo Heloísa Monte, dire-tora de marketing da Deloitte,tudo indica que o empresariadobrasileiro está cada vez mais in-clinado a adotar práticas sus-tentáveis. “Ao todo, 85% das em-presas pesquisadas afirmaramadotar alguma prática de sus-tentabilidade e 27% já incorpo-raram fatores de sustentabilida-de em sua política de remunera-ção de executivos.”

Carlos Rossin, diretor da con-sultoria PWC Brasil e especialista

em sustentabilidade, chama aatenção para a importância damídia no engajamento da socie-dade em relação à causa verde.Em uma pesquisa realizada comCEOs pela PWC, 97% dos líderesempresariais brasileiros aponta-ram que os meios de comunica-ção terão influência significativaou relativa no resultado daRio+20. “A mídia terá um papelimportante como catalisadoradessa mudança.”

Iniciativas como o Global Com-pact, da ONU, que tenta estabele-cer metas de autorregulação parao setor privado são vistas comopositivas, ainda que nem sempretenham resultados práticos ime-diatos. No entanto, é preciso criaros estímulos certos para que oprocesso de transição para a eco-nomia verde avance. Keisha Gar-cia, presidente da Cropper Foun-dation, de Trinidad & Tobago, e

Rosangela CapozoliPara o Valor, de São Paulo

A comitiva do Instituto Ethoschega à Rio+20 certa de que boaparte do empresariado está enga-jada em um esforço coletivo rumoa uma economia verde. Uma mara-tona de três dias de debates reali-zados na Conferência Internacio-nal 2012 — “A Empresa e a NovaEconomia. O que Muda com a Rio+ 20?” —, que ocorreu nesta sema-na, em São Paulo, resultaram emum documento que sintetiza o po-

sicionamento do instituto, dosparceiros e empresas para a cons-trução de um futuro sustentável.

Com nove demandas e novecompromissos, o documento foientregue na quarta-feira a repre-sentantes do governo brasileiro eda Organização das Nações Unidas(ONU). “Construímos propostas eagenda de transição para a econo-mia brasileira. Desenhamos metaspara o governo e compromisso pa-ra o setor empresarial e para a so-ciedade civil. A ideia é a partir dasociedade fazer uma proposta de

agenda de transição. A Rio +20 éum momento fundamental parai s s o”, explica Paulo Itacarambi, vi-ce-presidente do Ethos.

A proposta também lista dez te-mas prioritários como “integrida -de, transparência e combate à cor-r u p ç ã o”, passando por tópicos co-mo “cidades sustentáveis”, “ener -gia sustentável para todos”, e“agricultura e segurança alimen-tar ”, entre outros. “Para cada umdos temas há três propostas”, ex-plica Itacarambi. Para a economiada biodiversidade, por exemplo,

uma das propostas é criar instru-mentos fiscais tributários de mer-cado que, de fato, fomentem ativi-dades econômicas sustentáveis,garantindo direitos e benefíciosjustos e equitativos às comunida-des locais e tradicionais. “São 158organizações que já aderiram aoscompromissos e demandas conti-dos no documento. Nossa meta écontinuar com esse processo de-pois da Rio+20, porque essa é abase para lançar a agenda de tran-s i ç ã o”, explica Itacarambi.

“A aproximação da Rio+20 favo-

receu as discussões sobre esse temacrucial para a comunidade mun-dial, que é o desenvolvimento sus-tentável, e a realização da confe-rência nesse período foi estratégi-ca. As propostas são nossa contri-buição, e ficaremos na torcida paraconseguirmos influenciar positi-vamente a elaboração dos Objeti-vos de Desenvolvimento Sustentá-vel (ODS)”, afirma Jorge Abrahão,diretor-presidente do Ethos.

O seminário, que reuniu cercade 1,1 mil participantes, incluiudebates com figuras-chave na dis-

cussão da economia verde, comoo subsecretário-geral da ONU e di-retor-executivo do Programa dasNações Unidas para o Meio Am-biente (Pnuma), Achim Steiner,Luciano Coutinho, presidente doBNDES, Marcelo Furtado, diretor-executivo do Greenpeace no Bra-sil, e o economista indiano, PavanSukhdev, consultor especializadoem medir impactos da atividadeeconômica.

Leia mais sobre a conferência naspáginas F4 a F9

de negóciosuma das autoras do capítulo so-bre a América Latina e o Caribe dorelatório ambiental global daONU Geo 5, destaca a necessidadede se criar metas ambientais maistangíveis e mensuráveis. Sem isso,fica mais difícil aumentar o enga-jamento do setor privado, que elaconsidera fundamental para umaeconomia sustentável.

Para Clarissa Lins, diretora dada Fundação Brasileira para o De-senvolvimento Sustentável(FBDS), que reúne empresas brasi-leiras envolvidas na construção daeconomia verde, a agenda da inte-gração ambiental não pode serapartada da agenda da eficiência.“Precisamos desmistificar o con-ceito de sustentabilidade. Esta-mos falando em conciliar boa ges-tão de negócios com gestão res-ponsável dos recursos naturais.Quem fizer isso vai ter retornomais rápido do fluxo de caixa.”

No entanto, observa Clarissa, énecessário lembrar o óbvio: o se-tor privado não é uniforme e nãose move sempre na mesma dire-ção ou velocidade. “O importanteé que todos avancem, mas para is-so precisamos de regras ambien-tais que não criem desigualdadeou distorções competitivas entreempresas, setores ou países”, diz.

Sérgio Margulis, assessor es-pecial do Ministério do MeioAmbiente, acredita que o papelregulador do Estado será decisi-vo. “O mercado não vai se regu-lar sozinho, infelizmente o pro-cesso de adaptação do setor pri-vado à economia verde é maislento do que se poderia espe-rar ”, diz. Para ele, apesar das ini-ciativas isoladas de algumasempresas e setores, a grandetransformação virá da tomadade decisões de políticas públi-cas nos grandes países.

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Jornal Valor --- Página 2 da edição "15/06/2012 1a CAD F" ---- Impressa por lmmorresi às 14/06/2012@17:32:33

F2 | Valor | Sexta-feira, 15 de junho de 20 1 2

Enxerto

Jornal Valor Econômico - CAD F - ESPECIAIS - 15/6/2012 (17:32) - Página 2- Cor: BLACKCYANMAGENTAYELLOW

Especial | Rio + 20

Visão global Pelo menos seis mil empresários eexecutivos de outros países devem participar

Grandes eventosmobilizam líderesde todo o mundo

SILVIA COSTANTI/VALOR

George Kell: “Rio será uma demonstração de que as empresas, mais do que nunca, estão dispostas a fazer sua parte”

Paulo VasconcellosPara o Valor, de São Paulo

Pelo menos seis mil empresá-rios e executivos estrangeirosdevem circular pelo Brasil emtorno da Rio+20 até o fim doevento. Quase todos trazem nasmalas a intenção de participarda construção do futuro, de ten-tar formular propostas concre-tas de crescimento econômicocom inclusão social e respeito aomeio ambiente e a necessidadede uma sinalização políticacomprometida com metas desustentabilidade.

A revoada internacional con-firma a postura mais efetiva dosetor privado nas discussões vin-te anos depois de uma participa-ção tímida na Rio-92 ao mesmotempo em que mobiliza um apa-rato invejável e exige detalhesmeticulosos de organização paranão fazer feio exatamente no te-ma da cúpula das Nações Unidas:a sustentabilidade.

O evento mais ambicioso reú-ne 1.200 empresários e executi-vos no luxuoso Hotel Windsorda Barra da Tijuca, na zona oestedo Rio. A expectativa era chegara mais de dois mil participantescom o envolvimento de investi-dores, representantes de gover-

nos e ambientalistas. O “Fórumde Sustentabilidade Corporativada Rio+20: Inovação e Colabora-ção para o Futuro que Quere-mos”, que começa hoje e vai atéo dia 18, prevê mais de 120 ses-sões sobre desafios-chave de sus-tentabilidade em seis temas.

O encontro é promovido peloPacto Global das Nações Unidas.Vai servir também de vitrine dasprincipais inovações tecnológi-cas e sociais adotadas pelas em-presas para chamar a atençãopara a necessidade de apoio degovernos e investidores nas so-luções tecnológicas que preser-vam o meio ambiente.

“O Rio será uma demonstra-ção de que as empresas, mais doque nunca, estão dispostas a fa-zer sua parte e ajudar a moldar aagenda global”, diz George Kell,diretor-executivo do pacto Glo-bal das Nações Unidas. “Muitodo sucesso da Rio+20 será medi-do pela mudança e as ações queconseguir inspirar, embora exis-tam expectativas para resulta-dos políticos.”

O “Fórum de SustentabilidadeC o r p o r a t i v a” será o primeiroevento da ONU com o selo dewindmade — o que significa queserá abastecido integralmentepor energia eólica.

Cada participante contribuiucom US$ 45 para compensar asemissões de carbono causadaspor sua viagem à cidade. Ne-nhum livro, documento ou fo-lheto foi impresso. Publicações emateriais de apoio têm de serbaixados pela internet. Até os co-pos de café são sustentáveis e re-ciclados. A Sublime Eventos cui -dou dos detalhes do encontro or-çado em US$ 4,5 milhões desdemarço do ano passado. Tanto cui-dado se justifica pela expectativaem torno dos resultados.

“A intenção é sair dos compro-missos que não definem metasconcretas”, diz Yolanda Cerquei-ra Leite, secretária executiva doPacto Global no Brasil. “Te m o scarta compromisso, assinada porquase 200 empresas brasileiras,que propõe dez compromissospara os próximos dez anos: docrescimento econômico susten-tável à inovação tecnológica commetas concretas. A carta prevê oapoio ao governo brasileiro naadoção de medidas de apoio aoconsumo sustentável e de tecno-logias sustentáveis.”

O Hotel Windsor da Barratambém será o palco do Busi-ness Day. O evento é organizadopela Business Action for Sustai-nable Development (Basd), coa-

lizão de três grandes redes em-presariais internacionais quereúnem indústrias e varejistasde todo o mundo. Vai ser no dia19 e deve juntar presidentes degrandes corporações, políticos erepresentantes de governos. Sãoesperadas 800 pessoas.

O objetivo é promover umaaproximação entre as liderançasempresariais e quem formulapolíticas públicas, identificarações e soluções de negócios e es-tabelecer compromissos em se-tores como agricultura, química,produtos de consumo, energia,óleo & gás e transporte. Tambémserão debatidos temas transver-sais como acesso à energia, segu-rança alimentar, economia ver-de, governança internacional etecnologia em desenvolvimentos u s t e n t áv e l .

O Conselho Empresarial daAmérica Latina (Ceal), que reúnemais de 500 empresários de de-zenove países, trouxe três pro-postas concretas para encami-nhar na Rio+20: retomada emcinco anos do crescimento eco-nômico aos níveis de 2007, de5,7% ao ano, redução em 20% daextrema pobreza no mundo e in-serção de 200 milhões de pessoasno mercado em dez anos e im-posto zero sobre a cadeia deenergia renovável.

“Nossos objetivos são total-mente quantificáveis e possíveisde ser atingidos. Por isso, acredi-tamos em uma boa aceitação eem iniciativas concretas com ba-se nessas metas”, afirma o presi-dente do conselho empresarialno Brasil, Ingo Plöger.

O debate em torno da susten-

tabilidade não se restringe aos li-mites do Rio de Janeiro. O assun-to trouxe a São Paulo ontem o di-retor de pesquisa do Centro deConstruções Sustentáveis daBuilding and Construction Au-thority (BCA) de Cingapura, KianSeng Ang. Ele foi a atração princi-pal do simpósio “Eficiência noUso de Recursos e Economia Ver-de: Oportunidades para Edifíciose Cidades Sustentáveis”, do Pro-grama das Nações Unidas para oMeio Ambiente (Pnuma) e daSustainable Buildings and Cli-mate Initiative (SBCI).

No encontro, que reuniu em-presários do setor da construçãocivil, Kian Seng Ang pode expli-car como funciona a estatal BCA,que entre outras coisas operaum edifício para testar tecnolo-gias de energia zero.

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Setor quer papel mais relevante

D I V U LG A Ç Ã O

Humanidade foi orçado em R$ 44 milhões, bancados pela Fiesp, Firjan, Sesi, Senai, Fundação Roberto Marinho e governo fluminense, com apoio do Sebrae

Do Rio

O histórico Forte de Copacaba-na, um cartão postal da Zona Suldo Rio construído em 1823, ga-nhou nos últimos dias uma estru-tura inusitada: um edifício-andai-me, equivalente a um prédio deseis andares, que ocupa 7 mil dosseus 114.169 m². O espaço, que foiidealizado pela arquiteta CarlaJuaçaba e pela cenógrafa Bia Lessae abriga salas suspensas para a rea-lização de exposições, atividadesculturais e debates, é desde a últi-ma segunda-feira o palco de umdos principais eventos paralelosda Rio+20”: o Humanidade 2012.Representa para o setor empresa-rial durante a Cúpula das NaçõesUnidas para o DesenvolvimentoSustentável o mesmo que signifi-cam para os governos os pavilhõesdo Riocentro, na Zona Oeste, ou oAterro do Flamengo, também naZona Sul, para as entidades de so-ciedade civil.

O Humanidade 2012, orçadoem R$ 44 milhões, bancados pe-las federações das indústrias deSão Paulo e Rio de Janeiro (Fiesp eFirjan), Sesi, Senai, Fundação Ro-berto Marinho e governo flumi-nense, com apoio do Sebrae e daPrefeitura do Rio, é apenas um

dos eventos que mobilizam osempresários na Rio+20. O setorparece decidido a assumir umpapel de maior destaque nas dis-cussões ambientais, ao contrárioda participação quase figurativaque teve na Eco92, realizada vin-te anos atrás na cidade.

“Éramos vistos como o proble-ma, mas hoje somos parte da so-l u ç ã o”, diz Jorge Soto, diretor dedesenvolvimento sustentável daBraskem, que participa da orga-nização de vários eventos parale-los. “O setor empresarial terá des-ta vez uma participação ativa.”

Mais do que ativa. Pelo menosdois hotéis de luxo da cidade fo-ram reservados para dois gran-des encontros empresariais in-ternacionais e outro nacional. Osempresários ocuparão ainda es-paços nobres destinados aoseventos paralelos, como o PíerMauá, na zona portuária da cida-de, e o Parque dos Atletas, vizi-nho ao Riocentro. Dezenas de au-ditórios e centro de convençõesespalhados pela cidade tambémforam reservados para seminá-rios e encontros que envolvem osrepresentantes do setor.

Um túnel virtual foi criado noestande que a Confederação Na-cional da Agricultura (CNA) ocupa

no Píer Mauá para mostrar o que éuma fazenda degradada e quais astecnologias utilizadas para a suarecuperação. A ideia é que, duran-te o trajeto, o visitante acompanhetodas as fases do processo de rege-neração da propriedade.

O Espaço AgroBrasil da Rio+20,que foi inaugurado nessa quarta-feira e fica aberto à visitação públi-ca até o dia 22, será ancorado porprojetos da CNA que destacam astecnologias destinadas à produ-ção de alimentos com conservaçãoambiental. O objetivo é mostrar arealidade da agropecuária brasi-leira para o mundo.

A indústria mineral tambémocupa um espaço no Píer Mauá. Apresidente Dilma Rousseff era es-perada para a abertura do “En -contro da Indústria para a Sus-t e n t a b i l i d a d e”, promovido peloInstituto Brasileiro de Mineração(Ibram). A entidade realizará ali,no dia 18, o workshop “Minera -ção e Economia Verde: o Novo Pa-radigma de Desenvolvimento eseus Benefícios para a Coletivida-d e”, com a intenção de difundir opapel da mineração como trans-formadora dos padrões de vidada sociedade.

Oitocentos empresários eramesperados ontem no Hotel Sofi-

tel, quase em frente ao Forte deCopacabana, no “Encontro da In-dústria para a Sustentabilidade”,promovido pela ConfederaçãoNacional da Indústria (CNI). Omaior evento envolvendo apenasrepresentantes brasileiros naRio+20 estava marcado para dis-cutir um estudo encomendadopela entidade com 16 segmentosindustriais que avaliou os avan-ços na conservação do meio am-biente. Estavam confirmadas aspresenças da ministra do MeioAmbiente, Izabella Teixeira, e doministro das relações exteriores,Antônio Patriota.

O Centro Empresarial Brasileiropara o Desenvolvimento Sustentá-vel (CEBDS), que reúne os maioresgrupos empresariais do país, lançadia 22 no Pavilhão 3 do Riocentro,a versão verde-amarela do “Vision2050 – a New Agenda for Busi-ness”. O documento do World Bu-siness Council for Sustainable De-velopment (WBCSD) tem inspira-do o planejamento estratégico deempresas em todo o mundo. OCebds também participou, duran-te a cerimônia oficial de aberturada Rio+20, na quarta-feira, do lan-çamento da Bolsa Verde do Rio, pa-ra negociar ativos ambientais co-mo créditos de carbono.

Ações deverãoavançar mesmosem consensosCarlos VasconcellosPara o Valor, do Rio

Apesar dos esforços em tornoda mesa de negociações feitos porgovernos, empresários e socieda-de civil, Achim Steiner, diretor doPrograma das Nações Unidas parao Meio Ambiente (Pnuma), acre-dita que o risco de não se chegar aum acordo significativo naRio+20 é real. “O desafio maior ésaber como adotar medidas co-muns para realidades tão diferen-tes”, afirma. O papel do Brasil e daAmérica Latina, no entanto, serãodecisivos. “Nessa região estãoquase um quarto das florestas equase um terço da água potáveldo mundo”, lembra.

Já Carlos Klink, secretário demudanças climáticas e qualida-de ambiental do Ministério doMeio Ambiente, destaca que pelaprimeira vez os chefes de Estadoentraram antes no processo denegociações e que o Brasil in-cluiu a sociedade civil no debatesobre as posições a serem apre-sentadas pelo país. E sem esse en-volvimento, não há avanços pos-síveis, diz ele. “Sem o engajamen-to de todos não teria sido possí-vel atingir o nível de redução queo país alcançou no desmatamen-to da Amazônia.”

Para José Maria da Silveira, pro-fessor do Instituto de Economiada Unicamp, no entanto, a agen-da brasileira em relação ao meioambiente é equivocada. “Estamosperdendo tempo com grandes te-ses, e nos esquecemos de tomarmedidas óbvias de grande impac-to ambiental, como resolver oproblema da coleta e tratamentode lixo e esgoto no país”, diz. Sil-veira também critica o que chamade superficialidade do setor priva-do em relação aos temas ambien-tais. “Os supermercados, porexemplo, foram ambientalmenteirresponsáveis por todos essesanos e agora fazem um marketingoportunista da pior qualidade emcima da questão ecológica.”

Em uma coisa, no entanto, osespecialistas concordam: não épreciso esperar o grande consen-so global para agir. “As políticasambientais podem começar emnível local, passar ao nível nacio-nal e depois serem replicadas emoutros países”, defende JoannaKámiche, pesquisadora da Uni-versidade do Pacífico, em Lima, emembro da equipe de pesquisasdo documento da ONU Geo 5.“Nosso trabalho é apresentar es-ses casos de sucesso aos formula-dores de políticas públicas. Te-mos muitos exemplos de boaspolíticas que começaram assim,como os sistemas de trânsito rá-pido de ônibus em Curitiba, Bo-gotá e Lima”, lembra.

Na falta desse consenso, oavanço pode vir de iniciativasdescentralizadas. Margulis lem-bra o exemplo do Estado da Cali-fórnia, que conta com políticasambientais muito mais avança-das que a legislação federal ame-ricana. “A Califórnia continuasendo uma economia de ponta esem perder a competitividadepor ser verde”, afirma.

Além disso, as oportunidadescriadas pela transição para a eco-nomia verde podem ser um aliadoimportante na luta global contra odesemprego. Elas representam apossibilidade de criação de 60 mi-lhões de novos postos de trabalhoem todo o mundo nos próximos20 anos, segundo levantamento daONU. No Brasil, três milhões deempregos verdes já foram criados,o equivalente a 7% do empregoformal. O Brasil, no entanto, esbar-ra no gargalo da falta de qualifica-ção. “São vagas difíceis de preen-cher ”, alerta Rômulo Sampaio,professor de Direito Ambiental daFundação Getúlio Vargas, no Rio.

Sampaio também destaca quetodos os esforços públicos e pri-vados, em nível global, para aconstrução de uma economiaverde dependem de um único se-tor: o de energia. “Sem isso, todaa cadeia desmorona”, afirma.

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Enxerto

Jornal Valor Econômico - CAD F - ESPECIAIS - 15/6/2012 (17:33) - Página 4- Cor: BLACKCYANMAGENTAYELLOW

Especial | Rio + 20

Desenvolvimento Investimentos social e ambientalmente sustentáveis devem impulsionar a recuperação

Novos modelos podem nascer da criseLUIS USHIROBIRA/VALOR

Luciano Coutinho: “A expectativa é que a Rio + 20 seja um grande passo adiante em termos de mobilização da sociedade, do setor privado e dos governos”

Rosangela CapozoliPara o Valor, de São Paulo

Quando o tema é sustentabili-dade, o Brasil ainda tem um longocaminho a percorrer, mas tambémjá pode comemorar alguns feitos.Cresce a produção de energia re-novável, diminuem as curvas dedesmatamento e queimadas, li-nhas de créditos generosas são de-dicadas à área. E o país ainda sai nafrente com a “d á d i v a” do etanol.

Mas há muito a ser feito: “É pre-ciso criar padrões mais claros emais ambiciosos pactuados in-ternacionalmente de forma queessas iniciativas não criem dese-quilíbrios competitivos, nem se-jam usadas como forma de prote-c i o n i s m o”. Também “é importan-te que a liderança privada se en-gaje de uma forma proativa emarticulação com o governo”. Asafirmações foram feitas pelo pre-sidente do Banco Nacional de De-senvolvimento Econômico e So-cial (BNDES), Luciano Coutinho,na abertura da Conferência Inter-nacional 2012 — “A Empresa e aNova Economia. O que Mudacom a Rio + 20?” —, promovidapelo Instituto Ethos de Empresase Responsabilidade Social nestasemana, em São Paulo.

À frente do principal banco pú-blico de fomento, Coutinho afirmaque “a expectativa é que a Rio + 20seja um grande passo adiante emtermos de mobilização da socieda-de, do setor privado e dos gover-nos em direção a uma agenda maisampla e mais consistente que asso-cie desenvolvimento, inclusão so-cial e produtiva, e sustentabilida-d e”. Mas também alerta para o pe-rigo das ilusões em relação aos paí-ses pobres e em desenvolvimento.“É irrealista pensar que os paísesnão devam se desenvolver. O de-

senvolvimento é necessário, o im-portante é não repetir o padrão al-tamente emissor de carbono. Épreciso criar uma alternativa con-c i l i a d o r a”, diz.

Essas alternativas demandamenergia mais eficiente, desenvolvi-mento na indústria de processos eprodutos menos poluentes. “OBrasil tem conseguido redução nascurvas de desmatamento e quei-madas, aumenta o consumo deenergia renovável, mas é precisoainda impulsionar os mecanismosde agricultura e manejo nas bor-das das florestas”, afirma.

Os desdobramentos da criseeconômica mundial também ga-nharam força no âmbito da dis-cussão da agenda da sustentabili-dade. “Acho que a crise internacio-nal atrapalha porque os países,neste momento, estão focados emseu próprio problema de desem-prego, desorganização fiscal”, diz opresidente do BNDES. “Mas, aomesmo tempo, pode ser umaoportunidade se soubermos per-suadir lideranças internacionaisde que o investimento para o de-senvolvimento social e ambiental-mente sustentável deve ser um ei-xo para a saída da crise e recupera-ção das economia mundial. Talvezessa seja a proposta que devamoslevar para a consideração dessagrande conferência”, avalia.

“O que está em crise é o modelode desenvolvimento. Soluções pa-liativas de natureza financeira nãoresolvem, porque haverá um repi-que logo em seguida”, afirma Pau-lo Itacarambi, vice-presidente doEthos e coordenador geral da con-ferência. “O modelo de desenvolvi-mento construído há tempos é in-sustentável e nessa crise se juntamvárias crises. Não é só financeira, étambém climática, de alimenta-ção, é uma crise de energia. São vá-

rias crises juntas”, analisa. Sua su-gestão é que todo recurso financei-ro que circula no mundo em buscade rentabilidade busque rentabili-dade na produção real em basessustentáveis. “É preciso investir embases que levem ao desenvolvi-mento sustentável, com menorimpacto ambiental, com inclusãosocial e que a riqueza produzidaseja distribuída entre todos.”

Na Rio + 20, o Ethos apresentarádez propostas que vão da agricul-tura à energia, passando pela bio-diversidade, clima, água, produ-ção e consumo sustentável, cida-des e pobreza. Uma delas prevê ocompromisso dos países ricos como financiamento do desenvolvi-mento sustentável. “Reivindica -

mos a criação de um fundo inter-nacional que eleve a contribuiçãodos países desenvolvidos de 0,7%para 1,0% do PIB, acrescendo-setambém recursos provenientes dedireitos de uso dos espaços maríti-mo e aéreo, além de taxação de0,05% sobre movimentações fi-nanceiras internacionais de cará-ter especulativo”, diz Itacarambi.

Na outra ponta, o Ethos tam-bém apresentará nove demandas.“Uma delas é que o governo utilizeseu arsenal de tributos em geralpara incentivar o desenvolvimentodo setor privado para o caminhodo desenvolvimento sustentável”,diz Itacarambi, ressaltando que naEuropa há exigências crescentes eregulações, no uso de reciclados e

redução de emissões, por exemplo.“O que estamos pleiteando é a ge-neralização não só desse tipo de re-gulamentação, mas de incentivopara se colocar recursos paraapoiar a pesquisa, o desenvolvi-mento e as novas tecnologias.”

Sérgio Mindlin, presidente doConselho Deliberativo e sóciofundador do Instituto Ethos, cha-ma a atenção para a limitação derecursos no planeta. “É precisoque os países meçam o desenvol-vimento de outra forma. O limiteambiental do mundo não é sópoluição, mas consumo de recur-sos. Não existe recurso suficientepara que todos consumam emum nível alto, o que torna neces-sário um repensar de como as

coisas são produzidas”, diz. “Éimprescindível que os produtossejam recicláveis, reaproveitá-veis, reutilizáveis, para que sepossa ter um desenvolvimentoem termos de qualidade de vidasem que necessariamente sejamconsumidos mais recursos”, ex-plica. Jorge Abrahão, diretor-pre-sidente do Instituto Ethos, enxer-ga na Rio + 20 o início de um no-vo processo de desenvolvimentosustentável. “Não vai ser um fim,mas um início. E nesse sentido, senós tivermos essa expectativa,muita coisa nova vai surgir, dan-do diretrizes para que todos pos-samos atuar: governo, sociedadecivil e empresas, no sentido deconstruir esse novo momento.”

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Soluções locais vencem a miséria

DANIEL WAINSTEIN/VALOR

Sukhdev: economia verde é diferente em países em desenvolvimento, onde é necessário elevar os níveis de educação e saúde sem aumentar a pegada ecológica

Silvia TorikachviliPara o Valor, de São Paulo

Economia verde tem tudo aver com erradicação da pobreza.Com mais de 2 bilhões pessoasque hoje estão fora do mercadosomados aos outros 2 bilhõesque farão a população mundialsubir para 9 bilhões ao longodos próximos 40 anos, as econo-mias precisam crescer. Mas ne-nhum crescimento justifica o es-gotamento dos sistemas quesustentam a economia, na opi-nião de Pavan Sukhdev, econo-mista indiano fundador da con-sultoria Gist, que assessora em-presas e governos a mensurar osimpactos sobre o capital huma-no e natural.

Na Conferência do Ethos,Sukhdev explicou por que a eco-nomia verde é uma boa saída pa-ra cumprir as quatro metas daeconomia sustentável: melhoraro bem estar, promover a igualda-de social, reduzir a disparidadede renda, melhorar da qualidadede vida de quem vive na pobreza.

Economia verde é diferenteem países em desenvolvimento,onde é necessário elevar os níveis

de educação e saúde sem aumen-tar a pegada ecológica. Sukhdevcitou iniciativas de populaçõesque inventaram suas próprias so-luções para o desenvolvimentosustentável. Em Bangladesh, ouso de fogões a querosene, res-ponsável por altos índices de in-fecções pulmonares, foi substi-tuído por painéis solares, que asdonas de casa financiaram a US$5 dólares. Hoje são 800 mil casascom energia solar e uma inusita-da movimentação da economiana cidade: o excedente da ener-gia as donas de casa vendem paraos vizinhos. A chegada da ener-gia limpa também alavancou aeconomia das regiões mais friasda China. Boa parte da popula-ção sofria de artrite por causa dasbaixas temperaturas, até quepassaram a captar a energia so-lar. A nova ordem beneficiou 40milhões de casas, melhorou aqualidade de vida das pessoas emultiplicou empregos.

Para os países desenvolvidos odesafio é a redução da pegadaecológica, que Sukhdev chamade desenvolvimento verde.

Numa transição da economiamarrom (de alto carbono) para a

economia verde, ele acredita queos governos têm um papel fun-damental: liberar o capital priva-do. Economia verde resulta emmelhoria de vida para as popula-ções de baixa renda nas zonas ru-rais — e deve fazer o mesmo efei-to nas cidades, que abrigarão80% das populações até 2050.Prédios verdes, eficiência energé-tica, transporte público de quali-dade, planejamento das cidadessão saídas sugeridas por Sukh-dev. Escola, trabalho, moradia,centro de compras num mesmolocal são fundamentais para amobilidade. Para as grandes ci-dades, com mais de 10 milhõesde habitantes, Sukhdev sugerecinturões verdes, plantio de gra-ma e o cuidado com as práticasde moradia. O economista dizque os governos deveriam pres-tar mais atenção às favelas — ne -cessárias em determinado mo-mento para resolver problemasurgentes. mas que não podemser moradias permanentes.

Sukhdev diz que nada vai mu-dar o modelo de hoje se a empre-sa, que é o agente da mudançanão mudar. Cada país tem umanecessidade e uma solução. Mui-

tos ainda não entenderam o im-pacto que a economia conven-cional tem na natureza. Se fosseobrigatório pagar pelos insu-mos, pelos materiais retirados danatureza, Sukhdev diz que aspessoas, as empresas e os pró-prios consumidores pensariamantes sobre o custo do ar, daágua, das árvores. “Temos que re-conhecer o capital natural”.

Pegada ecológica, porém, nãoestá ligada apenas ao consumo.Tem ligação direta com o ciclo devida dos bens. São esses os desa-fios das empresas que têm quecrescer e ganhar dinheiro. Sukh-dev lembra, contudo, que se oconsumo foi criado pelas empre-sas, cabe às populações resolver aquestão de forma sustentável — ecom o melhor preço também, jáque ninguém quer destruir o va-lor corporativo. “A sociedade temque ser sustentável e o planetatem que ir para frente, não paratrás”. Sukhdev diz que a econo-mia verde tem propostas claras,mas reconhece que são muitoduras para os empresários. “Aeconomia verde é a saída, aindaque tenhamos que aperfeiçoarem alguns aspectos”.

Governança éponto centralDe São Paulo

A Conferência Ethos Internacio-nal 2012 encerrou seus debates naquarta-feira com um misto de ex-pectativas e de alertas, provocadospela constatação de que, nos últi-mos 40 anos, desde a Conferênciade Estocolmo em 1972, muita coi-sa já foi feita, mas ainda há umalonga trajetória. A Rio+20 é o meiodo caminho de onde se deve lançaro olhar para 2030 e 2050, lembra-ram os discursos.

Se é verdade que o encontro doRio acontece depois de cuidadosospreparativos e com grande partici-pação da sociedade, especialmen-te das empresas, é fato tambémque boa parte dos habitantes doplaneta ainda ignora os danos queprovocam. Homenageado por suaextensa história de lutas ambien-talistas, o economista e sociólogopolonês Ignacy Sachs defendeu anecessidade de os países criaremplanos nacionais que façam frenteao que chamou de “desenvolvi -mento imprudente e insustentáveldas populações”. Ele sugeriu a cria-ção de fundos nacionais e globalque seriam gerenciados pelas Na-ções Unidas e que permitiriam atravessia desses anos de passagem.“Seriam cerca 2% do Produto Inter-no Bruto mundial, aproximada-mente um décimo de todos os in-vestimentos suficientes para aju-dar os países menos desenvolvidosa mudar drasticamente as suas es-truturas econômicas”, afirmou du-rante a palestra “Estocolmo + 40 epropostas para a Rio + 20”.

Sachs enfatizou a necessidadede olhar para o futuro, mas aomesmo tempo fazer uso do conhe-cimento adquirido no passado.“Estamos em meio à Rio+20, masdevemos imaginar o que será dis-cutido em 2016, em 2030, e naConferência Estocolmo+40. A hu-manidade deve pensar na co-habi-tação do planeta, lembrando o queaconteceu anteriormente, entrepontos positivos, negativos, vitó-rias e derrotas. O ser humano é ca-paz de aprender, e devemos estarem constante aprendizado.”

Um dos pontos mais destacadospelo economista foi a questãoenergética. “Devemos incluir con-ceitos como a pegada ecológica eparadigmas energéticos sustentá-veis. Ou seja, devemos prepararuma saída ordenada e gradual dasenergias fósseis. A sobriedade, aeficiência, o aproveitamento dasenergias renováveis são os três pi-lares dessa estratégia.”

Achim Steiner, subsecretário ge-ral das Organizações das NaçõesUnidas (ONU) e diretor executivodo Programa das Nações Unidaspara o Meio Ambiente, que tam-bém participou do debate, trouxeà tona o histórico das discussõessobre o desenvolvimento, refor-çando que o problema que estásendo debatido na Rio+20 é cu-mulativo. “Mais do que tudo, o ho-mem deve trabalhar sua autocons-cientização. O período antropoce-no deve ser de colaboração e dis-cussão contínua. Dificilmente no-vos modelos de economia agrada-rão a todos, mas o que importa éque se chegue à consciência de queo papel é de cada um, não do Esta-do ou das empresas.”

De acordo com os debatedores,tudo depende do tipo de gover-nança global que se utilize, das re-lações com a possível economiaverde e da manutenção do diálogoe das oportunidades apresentadas.“A falta do debate democrático tal-vez seja a maior causa de insucessonas investidas anteriores. Porém,qualquer mudança é melhor quenenhuma. A cada geração, deve-setirar uma lição dos erros e acertosdo passado, em um processo cu-mulativo de aprendizado”, avaliouSachs. Carlos Lopes, subsecretáriogeral das Nações Unidas, pontuouque “ainda continuamos a ver aquestão do desenvolvimento sus-tentável e desafios que temos pelafrente no mesmo caminho de sem-p r e”. “Primeiro criamos a riqueza,depois distribuímos os bens parasó depois olharmos para o meioambiente. É preciso ter uma eco-nomia mais humana e uma apro-ximação que deva ser menos con-c ê n t r i c a”, frisa. (RC)

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Enxerto

Jornal Valor Econômico - CAD F - ESPECIAIS - 15/6/2012 (17:33) - Página 6- Cor: BLACKCYANMAGENTAYELLOW

Especial | Rio + 20

PIB cresce com respeitoaos direitos humanosDe São Paulo

Se a discriminação no merca-do de trabalho desaparecesse,em muitos países o PIB poderiacrescer em até 40%. A análise é deJudith Morrison, assessora daunidade de gênero e diversidadedo Banco Interamericano de De-senvolvimento (BID), uma dasparticipantes da mesa Desem-prego, Trabalho Decente, Migra-ções e Direitos Humanos, duran-te a Conferência do Ethos.

Judith apresentou também al-guns dados que comprovam queempresas com mulheres à frentedos negócios têm mais sucesso. Arazão é simples, diz ela: mulherno comando significa maistransparência, eficiência e diver-sidade. Para ilustrar sua partici-pação no tema “trabalho decen-t e”, ela citou a importância de asempresas ficarem atentas às reaishabilidades de seus própriosfuncionários.

Além da crise que bateu forteem muitos países, a questão dodesemprego, do trabalho decen-te, das migrações e das acomoda-ções das populações ainda estápor ser resolvida. Da França, Mi-chel Doucin, embaixador parabioética e responsabilidade so-cial, lembrou de comunidadesdesalojadas que não conseguemse restabelecer.

Ele citou a Declaração Univer-sal dos Direitos Humanos, pro-

clamada pela ONU em 1948, quelevou 50 anos para que fosse ado-tada pelas empresas, mesmo de-pois que a questão dos direitoscivis tivesse sido reconhecida em1966. Embora a questão dos di-reitos humanos tenha sido con-templada com várias minutas naRio+20, ele classifica os docu-mentos como amplos e vagos.

Doucin acredita que, se a eco-nomia verde for baseada em no-vas tecnologias, poderá ser um fa-tor de diminuição de postos detrabalho – que no final das contasé uma manifestação de direitoshumanos e dignidade. As empre-sas, segundo ele, devem enfrentaros diferentes desafios para trans-formar problemas em solução. Oideal é que as corporações este-jam atentas para as populaçõesde baixa renda, que querem teracesso a produtos e serviços, e es-tes precisam ser adaptados

Para mostrar que isso é possí-vel, Michel Doucin citou um casode Bangladesh, onde uma unida-de da empresa Danone passou aproduzir o iogurte, apesar damatriz energética pouco eficien-te. “O produto ganhou escalacom os mesmos benefícios nutri-cionais e ainda gerou empregosentre as mulheres, que passarama fazer a distribuição”.

As empresas não sabem o queperdem ao negligenciar o poderdas minorias. Segundo os relatosde Judith, o Brasil é um ambiente

propício para a implementaçãode ações afirmativas. “Muitospaíses ainda têm dificuldades emlevantar dados com recorte étni-c o”, diz. “A experiência do Brasilem políticas de igualdade racial éreferência e deveria ser replica-d a”. Ela citou dados sobre o mer-cado consumidor afrodescen-dente, um contingente superiora 9 milhões de pessoas com altopoder aquisitivo. Com rendamensal familiar superior a R$ 2,3mil, boa escolaridade (45% comsegundo grau; 34% superior), sãoesquecidos das campanhas pu-blicitárias. Muitas vezes nemconseguem trabalho.

Durante a conferência o Ethoslançou a carta empresarial pelosdireitos humanos e trabalho de-cente. Para Judith Morrison, ogrande diferencial da carta é o fa-to de ter sido lançada por um gru-po de empresas. “Estamos acostu-mados a ouvir ONGs, mas ouvirempresários falando sobre direi-tos humanos é muito importan-te, uma oportunidade única”.

No documento os empresáriosse comprometem com a respon-sabilidade social e com o respei-to e promoção dos direitos hu-manos. E reconhecem que os es-forços das empresas devem estarassociados a políticas públicasconvergentes que levem a pa-drões de proteção, respeito e pro-moção dos direitos humanos atodo o mercado. (ST)

Aumenta a influência dasONGs e do setor privadoGiselle PaulinoPara o Valor, de São Paulo

No modelo da economia ver-de, que vislumbra uma socieda-de mais justa com uso sustentá-vel dos recursos naturais, entida-des privadas e da sociedade civilganham um papel fundamental.Cerca de 70% da economia globalestá nas mãos das empresas. Nãose pode falar de economia verdesem considerar o setor.

Já as ONGs não têm o poderioeconômico das empresas, mas oterceiro setor também se tornoutransnacional. O uso da internete a velocidade nas comunicaçõespossibilitaram a formação de re-des para monitorar a ação dosgovernos que deixam de respei-tar os direitos humanos e empre-sas pouco sustentáveis.

“A sociedade civil se especiali-zou e ganhou mais credibilidadedentro de debates sobre temas daatualidade ”, diz Eduardo Matias,sócio da Nogueira, Elias, Laskowis-ki e Matias Advogados. “Em algunscasos, chega a orientar Estados emnegociações internacionais quenão teriam tanto conhecimentopara agir sozinhos”, explica.

Pelo lado empresarial tambémexistem características que po-dem ser aproveitadas. “As empre-sas transnacionais possuem dina-mismo e criatividade, muito bemvindos neste momento. As em-presas também têm grande po-

der de pressão para moldar polí-ticas públicas, possuem conheci-mento sobre os impactos das po-líticas para suas atividades e têmmais informações do que o pró-prio governo sobre inúmerasquestões”, aponta Matias.

Nesse novo contexto, empresas,governo e sociedade civil podemcontribuir para o ciclo virtuoso dasustentabilidade. Segundo Matias,é preciso atentar para o fato de queo DNA das empresas não é susten-tável. A proporção de investimen-tos para as energias renováveiscontinua quase insignificante.“Não há preços adequados para re-cursos escassos. As empresas maxi-mizam lucros e o custo vai para ter-ceiros, como poluição”, afirma.

Em sua visão, provar que existeum business case de sustentabili-dade ainda é a melhor forma paraseduzir as empresas para fazer par-te da economia verde. Os resulta-dos positivos existem. Há vanta-gens como redução de riscos, ga-nhos com o controle de desperdí-cios e melhor gerenciamento dosrecursos, além de ganho na repu-tação do empreendimento.

“Podemos perceber que hávinte anos as empresas entravampara os movimentos de respon-sabilidade social mas sem inter-nalizar a estratégia na econo-m i a”, lembra Elizabeth Laville,fundadora e diretora da consul-toria Utopies. “Hoje algumas ini-ciativas que começam a despon-

tar sinalizam que o cenário podeser diferente nos próximos anos”,diz. É o que ela chama de RSE 2.0,ou seja, empresas do movimentode responsabilidade social quemudam seus produtos e serviços.

Segundo Elizabeth, essa ten-dência acontece a partir de 2010com a entrada de produtos comoo carro verde. Nesta segunda erada RSE, bancos que investiamapenas em programas de ecoefi-ciência como reciclagem de pa-pel, computadores com menorgasto de energia, hoje olham pa-ra os projetos que estão aplican-do dinheiro. “Entre 1995 e 2010 ointuito do movimento de res-ponsabilidade social era engajaras empresas. A partir disso, aideia de produzir em parceria ga-nha um dimensão. É claro quesozinhos, os carros verdes nãovão fazer diferença para o mun-do, mas esta é a tendência”, diz.

A dúvida é se casos pontuaissão suficientes para mudar a eco-nomia. “Certamente a consciên-cia aumentou muito nos últimosanos. Mas não podemos passar ospróximos 20 anos falando sobreo mesmo assunto. As empresasprecisam agora parar de falar emtransparência e processos e focarem formas para medir seus im-pactos negativos”, diz Mag Taylor,conselheira da CAO, entidade in-dependente ligada ao IFC, braçoda Corporação Financeira Inter-nacional do Banco Mundial.

Empresas devem se integrar às necessidades sociaisIsabel Dias de AguiarPara o Valor, de São Paulo

Adepto da livre economia demercado, Mark Kramer, especia-lista em gestão socialmente res-ponsável, liderança e impacto deinvestimentos, acredita que asempresas têm condições de criarsoluções para todos os tipos decrises, o que nem sempre ocorrecom os governos.

Kramer participou da Confe-rência Internacional Ethos 2012,e fez palestra com o tema “Crian -do valor compartilhado: estraté-

gias das empresas para o desen-volvimento sustentável”. Paraele, o capitalismo pode ser umaferramenta bastante útil já quepermite incluir as empresas nabusca de soluções para as crises.

Kramer diz estar otimistaquanto aos resultados a serem al-cançados com a realização da Rio+ 20. Segundo ele, o encontrocria condições para o debate so-bre o “Valor Compartilhado”, umconceito criado por ele e desen-volvido em parceria com MichaelPorter, um dos mais importantespensadores em administração da

atualidade. Kramer recomendamaior ênfase em novas formas deganhar dinheiro com baixo im-pacto ambiental.

Ele identifica oportunidadesao abordar o tema “sustentabili -d a d e”. Segundo o economista, asempresas devem envolver seusfuncionários, clientes e até a co-munidade onde atua para que sepossa criar valor compartilhado,isto é, associar a geração de valoreconômico a um valor para a so-ciedade. As empresas são movi-das mais pela competição do quepelo senso da responsabilidade,

explica. É por essa razão que oplanejamento de um negócio de-ve estar integrado às demandas enecessidades da sociedade.

Para ele, essa é a essência do ca-pitalismo, que pode ser utilizadaem uma nova dimensão e pro-porcionar importantes mudan-ças sociais. Cabe aos governosoferecer subsídios porque o re-torno dos investimentos podeocorrer no longo prazo. O suces-so da empresa deve estar conec-tado ao progresso social. Valorcompartilhado, conforme expli-ca, não é responsabilidade social,

filantropia, nem mesmo susten-tabilidade, mas um instrumentopara se alcançar o sucesso econô-mico. Esse conceito deve estar nocentro da empresa e pode desen-cadear uma mudança profundano conceito da administração.

Em sua palestra, Kramer afir-mou que um número crescentede grandes empresas está ligan-do o sucesso individual ao pro-gresso social. Muitas delas man-tinham uma posição pragmáti-ca, mas mudaram de atitude eadotaram iniciativas que podemgerar valor compartilhado.

Segundo Kramer, cabe ao gover-no estabelecer regras para a açãodas empresas de todos os tama-nhos. Há estratégias desenvolvidaspor firmas de pequeno porte noSul dos Estados Unidos, ligadas aosistema educacional, com bons re-sultados. Kramer contou que aevasão de alunos naquelas cidadesera tão grande que as empresasnão dispunham de trabalhadorespara contratar. O abandono dosbancos escolares foi atribuído àmá qualidade de ensino. As em-presas passaram a treinar os alu-nos para o trabalho.

Desafios Sociólogo britânico vêum novo perfil do empreendedor

Pobreza eclima ditamos modelosde negócios

LUIS USHIROBIRA/VALOR

John Elkington, sociólogo britânico que cunhou o conceito do “triple bottom line”: as grande ideias ficam aprisionadas nas gavetas de empresas tracidionais

Silvia TorikachviliPara o Valor, de São Paulo

Os novos modelos de negócioserão ditados pelo clima e pelapobreza. Vender produtos maisbaratos para quem não pode pa-gar e obter bons resultados fi-nanceiros são desafios que todaempresa enfrenta. Mas não serãoas grandes corporações que indi-carão o caminho a seguir, segun-do John Elkington, o sociólogobritânico que cunhou o conceitodo triple bottom line.

Na conferência do Ethos, El-kington disse que os empreende-dores de hoje têm um perfil dife-rente dos CEOs que comandaramas empresas nos últimos 40 anos.Empresas de porte menor enfren-tam a realidade de forma diferen-te. Em lugar de resolver os proble-mas na sala de reuniões, levamseus executivos para comunidadespobres, de onde voltam com umanova forma de tratar os temas.

Os últimos quatro anos têm si-do determinantes para que asempresas tomem a decisão demudar seus modelos de negócio.“Mas elas preferem acreditar quea economia global passa por ummomento de recessão, por umperíodo de baixa e que a econo-mia se recuperará como se fosseum fênix”, diz Elkington. Chega-rá o momento em que não have-rá saída: as empresas terão depensar em água, energia, segu-rança, alimentos. Como as gran-des corporações precisam demais tempo e mais pessoal paradecidir, as mudanças, diz Elking-ton, virão dos players menores.

Inovações não faltam. A ques-tão é que as grandes ideias ficamaprisionadas nas gavetas das em-presas tradicionais — não por in-sensibilidade, mas porque cultu-ralmente estão limitadas e en-gessadas em seus modelos tradi-cionais. A questão é como liberaressas inovações.

“Sempre haverá estratégias de-fensivas dentro das grandescompanhias, que insistem em seproteger de grandes desafios”,diz. A propósito dessa questão,durante a apresentação de El-kington, o Ethos propôs umaquestão para a plateia compostade cerca de 600 representantesde empresas: sua companhia estáfazendo investimentos em novosmodelos de negócios sustentá-veis? Resultado: 36% concordamparcialmente; 24% concordaramplenamente. Mais da metade daaudiência, portanto, vê novosmodelos — a questão é ousadiasuficiente para colocar em ação.

Lideranças empresariais estãoem pé de igualdade com os líderesdo governo, na opinião de Elking-ton. “Embora os líderes de hoje se-jam apenas seguidores, estamosdiante de uma transformação; ahistória mostra que, sempre quenos defrontamos com uma mu-dança de paradigma, a energia co-meça a surgir”. Na política, Elking-ton acredita que “coisas muito in-teressantes” poderão acontecerdentro de três ou quatro anos.

Em nova interação com a pla-teia, o Ethos colocou outra questãoaos participantes: vocês acreditamque em dez anos o Brasil será reco-nhecido internacionalmente por

seu avanço na economia verde, in-clusiva e responsável? Resposta:15% concordam plenamente; 36%concordam parcialmente. Elking-ton interpretou o resultado comoum misto de otimismo e realismo.“O Brasil tem um realismo quasepessimista que precisa ser traba-l h a d o”, disse. E lembrou que emseis anos o Brasil se transformouno principal parceiro comercial decommodities: “Vocês estão senta-dos em uma mina de ouro, masnão sei se estão percebendo”.

Ele vê com otimismo o papeldas empresas brasileiras. As com-panhias que operam em nívelmundial estão todas no Brasil,

um país bem posicionado porcausa de um elemento críticoque é a economia verde, que temtudo a ver com ecossistema e re-cursos naturais. A questão, diz, éque empresas e índices interes-santes ainda precisam ganhar es-cala que garanta um futuro dese-jável para o Brasil.

Fundador do S u s t a i n A b i l i t y,conselheiro do Global ReportIniciative (GRI), Elkington re-nunciou aos cargos para fundar aVo l a n s , empresa que funcionacomo uma espécie de laborató-rio do futuro, onde ele pretendedialogar sobre as presentes e fu-turas inovações na economia.

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Jornal Valor --- Página 7 da edição "15/06/2012 1a CAD F" ---- Impressa por lmmorresi às 14/06/2012@17:34:08

Sexta-feira, 15 de junho de 2012 | Valor | F7

Enxerto

Jornal Valor Econômico - CAD F - ESPECIAIS - 15/6/2012 (17:34) - Página 7- Cor: BLACKCYANMAGENTAYELLOW

Especial | Rio + 20

Desperdício Avanço depende de uma nova consciência do comprador

“Sonho de consumo” v iraum pesadelo ambiental

LUCIANA WHITAKER/VALOR

Hélio Mattar: “Sou a favor do capitalismo, mas devemos considerar impactos sociais e ambientais da produção”

Jacilio SaraivaPara o Valor, de São Paulo

A população mundial já conso-me 50% mais recursos naturais re-nováveis do que o planeta é capazde recuperar, segundo dados doWorldwatch Institute (WWI), ins-tituto internacional de pesquisaem meio ambiente sediado emWashington. “Apenas 16% da hu-manidade são responsáveis por78% de todo o consumo. Se todo omundo gastasse como os habitan-tes mais ricos do planeta, seriamnecessários quase cinco planetaspara suprir essa demanda”, diz He-lio Mattar, diretor-presidente doInstituto Akatu, PhD em engenha-ria industrial e um dos painelistasda Conferência Ethos Internacio-nal 2012, encerrada quarta-feira,em São Paulo (SP). “É preciso mu-dar práticas da sociedade de con-sumo e modelos de produção an-tes que seja tarde demais.”

Mattar destaca alguns pontoscríticos que não foram incluídosno documento sobre o estabeleci-mento de padrões sustentáveis deprodução e consumo para aRio+20, como um fundo de em-presas de publicidade voltado pa-ra a educação do consumidor; a re-dução da jornada de trabalho glo-bal para diminuir a concentraçãode renda da população, e a orien-tação de jovens e crianças para oconsumo consciente.

Em 50 anos, de 1960 a 2010, oconsumo de produtos e serviçosdomésticos aumentou seis vezes,de US$ 5 trilhões para US$ 32 tri-lhões, em todo o mundo, enquan-to a população cresceu apenas 2,2

vezes no período. Ao mesmo tem-po, 150 milhões de pessoas ingres-sam, ao ano, na classe média. “Essegrupo se unirá a mais 3 bilhões deconsumidores, em 20 anos.”

De acordo com relatório doWWI, somente em 2008 foramvendidos 68 milhões de veículos,85 milhões de refrigeradores, 297milhões de computadores e 1,2 bi-lhão de celulares. Para Mattar, ofreio das compras foi destravado apartir da Segunda Guerra Mun-dial, quando surgiu a expressão“sonho de consumo”. Hoje, indiví-duos e empresas colaboram para odesequilíbrio entre oferta e de-manda, segundo o especialista.“Sou a favor do lucro e do capitalis-mo, mas devemos considerar osimpactos econômicos, sociais eambientais dos bens produzidos.”

Para empacotar tantas merca-

dorias, a saída tem sido queimarmais recursos naturais. Entre 1950e 2005, de acordo com o WWI, aprodução de metais cresceu seisvezes, o consumo de petróleo, oitovezes e o de gás natural, 14 vezes.Hoje, um cidadão europeu conso-me em média 43 quilos em recur-sos naturais ao dia, enquanto umamericano usa 88 quilos diários.

Em pesquisa realizada pelo Ins-tituto Akatu, em nove regiões me-tropolitanas brasileiras, 51% dosmil entrevistados concordam que“são o que usam”. Entre os consu-midores considerados “conscien -tes”, essa taxa sobe para 66%.

Mattar lembra ainda que a in-dústria de telefonia celular é umdos exemplos de produção orien-tada à “obsolescência programa-d a”, quando as mercadorias jásaem das fábricas com um prazo

de validade apertado. “Os consu-midores não criticam se os recur-sos agregados aos novos aparelhossão realmente necessários para aconstante troca de modelos.”

O presidente do Akatu afirmaque é preciso fazer valer a equaçãoconsumo consciente mais mudan-ças tecnológicas e políticas públi-cas, para mudar o rumo do consu-mo acelerado. Com o intuito de fa-zer essa receita funcionar, o insti-tuto estabeleceu dez indicações deapelo sustentável.

A lista inclui o consumo que va-loriza mais os produtos duráveisdo que os descartáveis; a produçãoe o desenvolvimento local, com or-ganizações comunitárias que ven-dem produtos regionais, e o usocompartilhado de bens, como asbicicletas públicas, já disponíveisno Rio de Janeiro e em São Paulo.

Prática corruptatrava evoluçãoda área socialSilvia TorikachviliPara o Valor, de São Paulo

A questão da corrupção em seusdiversos níveis e formatos nãoconsta do Rascunho Zero daRio+20. Resta, então, à sociedadecivil manifestar-se, pressionar ogoverno a oferecer melhores me-canismos de proteção e exigir queas empresas tenham mais transpa-rência. Essa é a opinião da repre-sentante da Transparência Inter-nacional, Delia Ferreira Rubio, queparticipou do painel sobre corrup-ção na conferência do Ethos.

Ela deixou claro que exigirtransparência de todos os poderesé uma forma de “colocar empeci-lhos a práticas que abalam a legiti-midade dos governos, desviam osinvestimentos da produção e tra-vam o crescimento econômico.”

Argentina, Delia é advogada deformação e citou seu país para ilus-trar o que disse: “O governo resolveos problemas da inflação manipu-lando os números, ignorando atransparência e induzindo a popu-lação a acreditar que os preços nãos o b e m”. Se a transparência fosseuma prática exigida pela socieda-de civil, Delia acredita que a cor-rupção não teria atingido níveistão preocupantes e os recursosdesviados estariam onde deveriamestar: na educação, saúde, infraes-trutura. A Argentina aparece em109 o lugar no ranking da corrup-ção que relaciona 180 países. Nes-sa lista da TI, o Brasil aparece em73 o l u g a r.

A corrupção consome 2,3% doPIB brasileiro, o que em 2011 cor-respondeu a R$ 95 bilhões. Os cál-

culos fazem parte de um estudo daFederação das Indústrias do Esta-do de São Paulo (Fiesp). As conse-quências das práticas corruptassão baixo desempenho do Brasilno IDH, onde está em 84o l u g a r,mesmo despontando como a sextaeconomia do mundo. Corrupção,contudo, não pode ser encaradacomo uma questão restrita a umcírculo de pessoas que querem ga-nhar mais sem se importar com asnecessidades de outras. “É necessá-rio que a corrupção seja fiscalizadae combatida por todos; pelos go-vernos, que devem impor leis maisrígidas, pelas empresas, que de-vem estar mais atentas, pelos con-sumidores, pela mídia”, acredita.

Se tivesse que responder à per-gunta da Rio+20 sobre o futuroque queremos, Ernst Ligteringen,da Global Reporting Iniciative(GRI), repetiu que a economia pre-cisa desenvolver fundamentos elógicas diferentes de forma a rein-ventar o interesse coletivo e o pri-vado. “O movimento ‘Occupy WallStreet ’, que mobilizou as pessoasem Nova York, foi uma manifesta-ção de desconfiança; um movi-mento contra a ganância, a avare-za, o ‘e u í s m o’ ”, disse.

A luta contra a impunidade éessencial. Para Delia Rubio, quan-do as pessoas lembram escânda-los do passado e se perguntam oque aconteceu com a empresa en-volvida, ou por qual razão nãohouve punição, a descrença seaprofunda, a justiça fica abalada,as instituições perdem legitimi-dade e as ações prescrevem. “Mes -mo sem pagar propina, a corrup-ção atinge a todos nós.”

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F8 | Valor | Sexta-feira, 15 de junho de 20 1 2

Enxerto

Especial | Rio + 20

Conta da energia precisa mudarDe São Paulo

Incorporar custos sociais e am-bientais nas contas da produçãode energia, envolver o consumidore incentivar a educação para o te-ma são as principais propostas so-bre energia que fazem parte do do-cumento que o Ethos leva paraRio+20. “Para uma área complexacomo esta vamos sair com propos-tas consistentes e viáveis. Educaçãopara o uso de energia é uma ques-tão importante que não estavacontemplada. A questão do consu-mo, por exemplo, entra como umanova dimensão no documento”,diz Henrique Lian, gerente de rela-ções institucionais do InstitutoEthos. “Algumas propostas forammelhoradas para apresentar ele-mentos que não estavam explíci-tos na redação do documento dog o v e r n o”, diz.

Essa é a primeira vez que a ques-tão da energia aparece como temacentral num encontro da ONU. Pa-ra Lian, os países têm grande ne-cessidade de promover uma ma-triz mais diversificada, criar opor-tunidades para modelos alternati-vos de energia e retirar subsídiosdas energias tradicionais que ge-ram impactos negativos para oambiente. Este último ponto é on-de há maior divergência.

De acordo com a Organizaçãodas Nações Unidas (ONU) existem1,4 bilhão de pessoas em todo omundo sem acesso à eletricidade.Outro bilhão tem acesso parcial. Ameta da ONU é garantir a univer-salização aos serviços de energiaaté 2030. Com base nos dados de2009, a ONU também quer dobrara eficiência energética até 2030.

A Agência Internacional deEnergia (IEA) estima que para

que essa meta de universalizaçãoocorra até 2030 será necessárioum investimento de US$ 641 bi-lhões. África, Ásia, América Lati-na e Índia seriam as regiões prio-ritárias para receber o investi-mento. O que está em questãoagora é se o documento apresen-tado pelo governo será suficientepara atingir estes objetivos.

De toda forma, estabelecermetas é necessário. Para a ONU, alimpeza da matriz energéticapassaria por três momentos. Até2020, os governos deveriam di-minuir a demanda por energia,reduzir a expansão de fontes fós-seis e promover a expansão de re-nováveis. Até o ano de 2030, oconsumo global de energia seriareduzido e as fontes fósseis subs-tituídas por renováveis. “No en-tanto, as metas devem ser vistascomo um caminho para a limpe-

za da matriz energética. Não co-mo um fim em si mesma”, diz An-tônio Farinha , gerente de parce-rias da Roland Berger.

O WWF acrescenta que até2050, os países devem atingir ní-veis sustentáveis de demanda porenergia e usar 100% de recursoslimpos. O Clean Economy, LivingPlanet, documento divulgado pelaWWF nesta semana, levantou cin-co principais fatores de sucesso pa-ra os avanços de uma economiasustentável. Políticas de governo,incentivos à pesquisa e desenvolvi-mento, disponibilidade de capital,fomentos a tecnologias limpas eestabelecimento de uma cadeia devalor robusta são os principais ele-mentos para esta transição.

“Políticas governamentais de lo-go prazo e que deem segurança aoinvestidor é que vão fazer transfor-mações”, diz Farinha. (GP)

Rosangela CapozoliPara o Valor, de São Paulo

O Brasil não escapou do risco dafome – há 60 milhões de brasilei-ros que ainda sofrem com a inse-gurança alimentar. Ao mesmotempo, o país já convive com ummal típico de país rico — 50% dapopulação tem excesso de peso e18,9% são obesos. Nas duas pontas,ambas de alto risco para a saúde,estão os hábitos inadequados dealimentação, causadores de doen-ças, debilidades e redutores da ca-pacidade de trabalho. A segurançaalimentar, como a questão é cha-mada, é um dos temas cruciais a se-rem debatidos na conferênciaRio+20. A agricultura é a base deamplas cadeias produtivas volta-das à produção de alimentos, ener-gia, fibras e produtos de base flo-restal. A degradação dos ecossiste-mas – pela simples retirada deágua ou por cultivos inadequados– é em grande parte responsávelpela fome e pela alimentação des-regrada, principalmente nos paí-ses em desenvolvimento.

“O Brasil é uma potência queainda convive com uma das maio-res desigualdades do mundo, on-de 36 milhões de pessoas vivem nap o b r e z a”, diz Gleyse Peiter, repre-sentante da Rede de MobilizaçãoSocial no Conselho Nacional de Se-gurança Alimentar e Nutricional(Consea). Gleyse falou terça-feira,segundo dia da Conferência Inter-nacional 2012, promovida peloInstituto Ethos de Empresas e Res-ponsabilidade Social.

O painel de que participou tra-tou do tema “Agricultura e Segu-rança Alimentar”. Gleyse, que tam-bém é coordenadora da área desustentabilidade e meio ambienteda Eletrobrás, diz que apesar de oBrasil ser a 6a economia mundial,um terço da população padece dealgum tipo de insegurança ali-mentar. “O Nordeste concentra omaior índice de pessoas que so-frem de insegurança alimentargrave, mas o país também convivecom populações sofrendo em grauleve e moderado”, informa.

As dificuldades encontradas emalgumas regiões nordestinas po-dem ser vistas em muitos pontosdo planeta. Os Indicadores do De-senvolvimento Mundial do BancoMundial apontam que 70% da po-pulação pobre do mundo vive emáreas rurais e tem na agriculturasua principal fonte de renda e tra-balho. O estudo ressalta que a de-gradação da terra e dos recursosnaturais colocam sérios desafiosem relação às condições de vida depopulações rurais pobres e à pro-dução de alimentos para a popula-ção urbana. Ainda de acordo coma Avaliação Ecossistêmica do Milê-nio, cerca de 60% dos serviços dosecossistemas têm sido degradadosou utilizados de forma não susten-tável. “É preciso avaliar o impactode cada produção agrícola e miti-gar seus danos. Esse é o grande de-safio na agricultura”, afirma AndréNassar , diretor geral do Institutode Estudos do Comércio e Nego-ciações Internacionais (Icone), quetambém participou do painel.

Burocracia afetaa biodiversidadeGiselle PaulinoPara o Valor, de São Paulo

Para avanços nas questões dabiodiversidade, empresas pedemimplementação do Protocolo deNagoya, criação de atividades eco-nômicas sustentáveis como mane-jo florestal e fomento para instru-mentos econômicos tributários efiscais que estimulem a conserva-ção sustentável. “Hoje é muitomais burocrático e custoso teracesso ao patrimônio genético e àgestão da biodiversidade do quefazer investimentos em atividadesperversas que causam impacto ne-gativo para o meio ambiente”, ex-plica Tatiana Trevisan, coordena-dora de projetos do InstitutoEthos. “Nessas propostas tambémse inclui a necessidade de conside-rar os direitos de repartição de be-nefícios dos povos tradicionais.”

No Brasil, a questão se resumeem ratificar ou não o Protocolo deNagoya, acordo alcançado duran-te a 10a Conferência das Partes daConvenção sobre Diversidade Bio-lógica (COP-10), em 2010, que de-fine as bases e orienta o acesso à re-partição dos benefícios do uso dabiodiversidade e dos conhecimen-tos tradicionais. Apesar do acordo,para que o documento entre emvigor é preciso que seja ratificadopor 50 países.

O Brasil assinou carta sinalizan-do sua intenção de implementar oacordo, no entanto o processo fi-cou parado. “Existe a insegurançade que outros países não assumamos princípios de Nagoya. Se nãohouver pressão, pode demorar dé-cadas para que os governos to-mem uma posição”, diz BráulioDias, secretário executivo da Con-venção sobre Diversidade Biológi-ca da ONU. A Convenção dos Direi-tos dos Mares demorou quase 20anos para entrar em vigor.

Até o fim do ano há grandeschances de que o documento sejafinalmente aprovado. SegundoDias, o tema foi encaminhado aoCongresso pela presidente Dilma.“Agora é preciso que as empresasfaçam lobby para que a sociedadee governadores entendam a im-portância do tema.”

De fato, há uma busca muitogrande pelas empresas para conse-guir inserir a biodiversidade nosnegócios e fazer que a economiagire em torno disso. “Esta é a única

forma de aumentar a escala da de-manda por estes produtos. A legis-lação está em construção. A lei quetemos não dá respaldo para asboas iniciativas pois dá brechaspara muitas interpretações”, dizRenata Puchala, gerente de susten-tabilidade e sociobiodiversidadeda Natura. “Essa falta de estruturasólida coloca mais entraves do quefomenta a economia sustentável.Com tantos critérios e exigênciasas empresas que querem trabalharcom a biodiversidade precisam fa-zer um grande esforço”, diz.

Hoje no Brasil o comando e con-trole ainda prevalecem como prin-cipal mecanismo de conservação.A tendência é que os países deixemesta forma antiga de cuidar domeio ambiente e passe a adotarsistemas econômicos, assim comotem acontecido em países maismodernos da Europa. “É precisopensar em acesso a créditos, finan-ciamento e legislação fiscal, nãoapenas para criar impostos, maspara incentivar as atividades sus-tentáveis. Comando e controle éuma imposição. Com o incentivo, aempresa escolhe se quer o benefí-c i o”, diz Dias.

O grande conflito é que quemse beneficia da biodiversidadenão é exatamente quem paga oscustos de sua recuperação. Este éum grande desafio. Mas especia-listas apontam que a respostapode estar na criação de cadeiasde valores que beneficiem pro-dutos mais sustentáveis do ex-trativismo. É importante consi-derar aquele que está no final dacadeia.

“Em termos gerais, os concei-tos sobre biodiversidade não sãoamplamente entendidos pela so-ciedade. As empresas tambémnão entendem o impacto de suasatividades e o quanto seus negó-cios são dependentes destes pro-cessos”, afirma David Steuer-mant, diretor de programa Em-presas e Biodiversidade da Con-venção sobre Diversidade Bioló-gica da ONU. “Outra dificuldadeé conseguir rastrear os principaisproblemas, pois em grande par-te, os impactos negativos podemacontecer ao longo da cadeia deprodução. Ou ponto apontadopor Steuermant é que o governonão crie políticas públicas queincentivem atividades perversascomo a pesca predatória.

Segurança alimentar Uso inadequado da terra e degradação de ecossistemas afetam mais os mais pobres

Métodos agrícolas precisam de revisãoSegundo Nassar, o Brasil tem

chances de se tornar não apenas omaior fornecedor de alimentosmundial, mas também o maiorfornecedor de biocombustíveis,principalmente oriundos da cana-de-açúcar. Esse cenário – diz Nas-sar — torna de extrema importân-cia as metodologias para avaliar asmudanças no uso da terra, que têmse mostrado incompletas e incapa-zes de mensurar a dinâmica do usono caso brasileiro.

“Defendemos uma agriculturade base agroecológica com tecno-logia, redução de subsídios e dedesperdícios, transição rápida eequitativa, que respeite os limites.Cerca de 70% da produção internavem da agricultura familiar, sendoque a agricultura de grande escalaestá direcionada à exportação”,afirma Gleyse.

Após o debate foram elencadastrês das 10 propostas de políticaspúblicas que serão discutidas na

Rio + 20. A primeira tem como mo-te promover o zoneamento ecoló-gico-econômico, com a regulariza-ção fundiária e ambiental de pro-priedades agrícolas, garantindo osdireitos de povos indígenas e co-munidades tradicionais. A outrademanda foca a ampliação, pro-dutividade e inovações na produ-ção nos modelos de negócio, nascadeias de valor, no financiamentoe nas formas de organização dosmercados que proporcionem pro-

dução e manejo sustentável, tantopara agricultura familiar quantoindustrial, com equidade e inclu-são social. A última demanda de-fende a ampliação de investimen-tos em infraestrutura, ciência e tec-nologia voltadas à produção agrí-cola. O bojo da proposta contem-pla ainda o aproveitamento sus-tentável da biodiversidade e mo-dernização dos mecanismos de in-vestimentos e financiamentos daprodução agrícola.

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Sexta-feira, 15 de junho de 2012 | Valor | F9

Enxerto

Especial | Rio + 20

Florestas Especialistas preveem perda de 10% da biodiversidade global até 2050 e aumento da poluição

Planeta azul tem prognósticos cinzentosIsabel Dias de AguiarPara o Valor, de São Paulo

Uso de combustíveis fósseis emudança no método de explora-ção da agricultura são algumasdas principais causas do aumentoda concentração de gases de efei-to estufa na Terra. Eventual aque-cimento médio em mais 2°C natemperatura global poderá oca-sionar graves danos ao planeta,com perda de até 10% na biodi-

versidade global. O prognósticonegativo foi apresentado peloagrônomo e mestre em economiaagrícola André Guimarães, naconferência do Ethos. Ele tomoucomo base documento preparadopela Organização para a Coopera-ção e o Desenvolvimento (OCDE),intitulado Panorama Ambiental,apresentado na palestra “Florestase Mudanças Climáticas”.

Tasso Azevedo, da Fundação Suí-ça para o Meio Ambiente – Avina –

também participou da apresenta-ção. Guimarães também é diretorexecutivo da Conservação Interna-cional (CI-Brasil), que conta com32 escritórios em todo o mundo,entidade que tem por principalobjetivo promover o bem estar efortalecer a sociedade.

O representante da CI-Brasil tra-çou um quadro sombrio em rela-ção ao cenário a ser observado noplaneta em 2050. A perda de 10%da biodiversidade, segundo Gui-

marães, poderá resultar na dupli-cação no número de mortes pre-maturas por exposição à poluição.Significa que 3,6 milhões de pes-soas poderão morrer a cada ano,além do expressivo aumento noscustos para mitigar os riscos climá-ticos. Ele disse ainda que, desde já,os níveis de CO² na atmosfera ba-tem recorde no Ártico e chegam a400 ppm (partes por milhão).

Para que a temperatura médiaglobal não aumente 2°C será ne-

cessário limitar a emissão de CO²na atmosfera em até 450 ppm. Pa-ra isso, governos tentam chegar aum acordo sobre as metas globaisde redução de GEE (gases efeito es-tufa) e financiamento de medidasde mitigação de agentes causado-res do aquecimento global. Mas,segundo documento distribuídodurante a Conferência Ethos, háainda resistência por parte de al-guns países em aderir ao projeto.Canadá, Japão e Rússia recusam-sea aderir ao novo período de vigên-cia do Protocolo de Kyoto. De acor-do com a ONU, estima-se em US$ 2bilhões por ano os recursos paraações de mitigação e adaptação àsmudanças climáticas.

Guimarães fez uma espécie deapologia ao Brasil. Segundo afir-mou, é o único país a ter nomede árvore e a contar com cincobiomas florestais. Apesar dasagressões sofridas por nossas re-servas naturais, o diretor execu-tivo da CI-Brasil disse ainda queo país é responsável por ampliar

as áreas protegidas, que hoje jáalcançam 100 mil hectares. Masnão deixou de apontar mazelas:o desmatamento é responsávelpor 70% das emissões de GEE; oBrasil dispõe de pequena áreacom florestas plantadas e aquise pratica manejo incipiente dasflorestas nativas. Guimarães la-menta o fato de só restarem 10%da Mata Atlântica, bioma ondeas atividades econômicas sãoresponsáveis por três quartos doPIB e de onde se retira água parao abastecimento de dez maiorescidades do país. Para ele, a MataAtlântica é o segundo biomamais ameaçado do planeta, sóatrás do de Madagascar.

Para o palestrante da Confe-rência Ethos, o país carece demais florestas produtivas e maisflorestas plantadas para conter apressão sobre as espécies nativas.“É preciso olhar para a Amazôniacomo um ativo, para o qual se de-ve adotar manejo sustentável pa-ra maior agregação de valor.”

Centro urbano acumula problemasJane SoaresPara o Valor, de São Paulo

As 25 maiores cidades globaisjá respondem por 50% da riquezamundial. Em 2050, a populaçãourbana global será de 6,4 bilhõesde pessoas. Hoje, São Paulo abri-ga 10% da população brasileira eproduz 40% do PIB do país. Todosesses números impressionantesforam citados pelo arquiteto eurbanista Jorge Wilheim, um dospalestrantes do painel CidadesSustentáveis, junto com OdedGrajew, coordenador-geral daRede Nossa São Paulo, realizadodurante a Conferência Interna-cional Ethos 2012, em São Paulo.

Com o crescimento desorde-nado das cidades, os problemasse acumulam. E eles são muitos:pobreza, exclusão, trânsito, faltade infraestrutura e acesso à saú-

de, habitação inadequada, polui-ção do ar e da água, entre outros.Wilheim lembrou que o desen-volvimento das cidades — e não ocrescimento — está baseado naprodutividade, nos recursos (edesperdícios) e no trabalho, aanalisou as contradições existen-tes nesses aspectos. O trabalhopenoso, por exemplo, que se cho-ca com a satisfação pessoal. A po-luição que impacta o PIB de for-ma positiva.

Mas a pergunta que foi feita é seseria possível transformar São Pau-lo em uma cidade sustentável, le-vando-se em conta a definiçãoadotada pelo Ethos: “uma cidadeconsiderada sustentável é organi-zada de modo a garantir a partici-pação efetiva dos cidadãos, bemcomo torná-los capazes de satisfa-zer suas necessidades e de assegu-rar o seu bem estar sem prejudicar

ou colocar em perigo as condiçõesde vida de outras pessoas e do am-biente, agora e no futuro”.

Wilheim acredita que sim. O ca-minho a percorrer é longo e passanecessariamente por uma mudan-ça cultural de todos os atores, deum novo contrato social entre Es-tado, produtores e sociedade, e dese encontrar formas de financiarum orçamento verde, discutidaspor todos. “Tudo é uma questão dedecisão política”, explica.

Grajew começou sua palestraperguntando em quantos distritosSão Paulo é dividida. Poucas pes-soas levantaram a mão. Ele citouainda que na maior cidade do país,uma pessoa sem plano de saúde le-va três meses para ser atendida porum médico. Outros quatro mesespara fazer um exame e mais setemeses para fazer uma cirurgia.Nessas circunstâncias, é possível

falar em cidade sustentável?Depois da apresentação, foram

escolhidas três propostas para se-rem encaminhadas à Rio+20.“Promover a cultura e a educaçãopara a cidadania e engajar escolaspúblicas e privadas em progra-mas sobre políticas públicas, de-mocracia e sustentabilidade”;“Evoluir de políticas setoriais dedireito à moradia para políticasde direito à cidade (“construirbairros e cidades e não apenas ca-sas”) . . .” e “A ONU, a sociedade civile os governos devem avançar naimplementação de sistemas degovernança participativa, insti-tuindo legislação que estabeleça,em todos os municípios, um Pla-no de Meta para cada gestão, ba-seado em indicadores e articula-do com o Plano Diretor, que ga-ranta transparência, controle so-cial e democracia participativa”.

Água deve tervalor definido egerenc iamentoRosangela CapozoliPara o Valor, de São Paulo

Logo chegará o dia em que aágua, vista por muitos como umbem inesgotável, será precificada egerenciada como outro ativo qual-quer. Para os brasileiros, pode pa-recer um cenário distante, mas nãoé. Apesar de dispor de 12% da re-serva de água doce do planeta, de-ter mais da metade dos manan-ciais de água doce da América doSul e possuir o maior rio em volu-me, o país ainda convive com re-giões que padecem com a escassezdo recurso. Despertar para essarealidade deve ser uma iniciativade todos os consumidores, masprecisa ser gerenciada pelo poderpúblico e devidamente precifica-da. “A água é um bem livre, de aces-so a todos, mas seu valor ainda nãoé devidamente reconhecido. Aágua não tem ainda uma etiquetade preços, por isso é desperdiça-d a”, afirma George Kell, diretorexecutivo do Pacto Global das Na-ções Unidas que participou na ter-ça-feira da Conferência Internacio-nal 2012, do Ethos.

Kell classifica a água como um“a t i v o” que deve ser gerenciadocom metas e proteção. “Após 10anos mobilizando empresas ao re-dor do mundo, fizemos algunsprogressos e hoje temos evidên-cias crescentes de que a longo pra-zo valores e princípios universaissão importantes para os negócios”,declara. Participante do painel“Gestão Responsável e Sustentávelda Água”, Kell manifestou esperan-ça de que tenha chegado o mo-mento para que líderes de negó-cios e investidores conduzam suasiniciativas de sustentabilidadejunto com os governos, autorida-des locais e grupos da sociedade ci-vil. “Nossa esperança é que aRio+20 forneça um incentivo mui-to forte para a sustentabilidadecorporativa. Com isso, seremos ca-pazes de demonstrar que a maio-ria das soluções de que precisamosjá existem. Podemos chegar à inte-gração das questões ambientais edar um salto na área de recursosnaturais”, acrescenta.

O diretor executivo do PactoGlobal defende o uso em larga es-cala de sistemas inovadores nosentido de reduzir o uso da água,por exemplo, na área agrícola. Elecita o caso do Brasil, onde o consu-mo de água divide-se em 59% des-tinados à agricultura, 22% para ouso doméstico e os 19% restantesabsorvidos pela indústria. “Hojehá aparelhos para irrigação quesão capazes de diminuir o gasto daágua na agricultura em até 80%. Atecnologia permite essas soluções,mas ainda não são aplicadas emlarga escala e precisamos pressio-nar os governos nesse sentido”,

prega. Pelos cálculos de Kell, atual-mente os investimentos em tecno-logia verde no mundo já somamUS$ 1,7 trilhão. “Mas o ideal é che-gar a US$ 5 trilhões”, completa.

Ashok Chapagain, consultor sê-nior do WWF do Reino Unido paraa água, que também participou dodebate, ressalta que “a escassez deágua afeta pelo menos 2,7 milhõesde pessoas em 201 bacias fluviaisdurante pelo menos um mês pora n o”. Ele destaca o fato de a ques-tão da água ser vista hoje como umdrama universal. “O comércio in-ternacional e a globalização da ca-deia de fornecimento fazem comque a escassez de água seja umaquestão global. O crescimento po-pulacional é um dos responsáveispela escassez além de intervençãoh u m a n a” enfatiza. Entretanto, nãose espera que a necessidade dimi-nua. “Cada vez mais recursos hídri-cos subterrâneos têm sido explo-rados para atender à crescente de-m a n d a”, afirma. O consultor doWWF lembra que esse processotriplicou nos últimos 50 anos.

Dados da ONU demonstramque o planeta está desperdiçandoágua em uma escala colossal. Maisde 80% da água utilizada na Terranão é nem coletada nem tratada.

Espera-se que a demanda porágua cresça em até 55% nas próxi-mas quatro décadas, de acordocom um novo estudo apresentadona França. O Framing the WaterReform Challenge, da Organiza-ção para a Cooperação e Desenvol-vimento Econômico (OCDE),aponta que a rápida urbanização,as mudanças climáticas e as mu-danças na economia global estãocolocando cada vez mais pressãono abastecimento de água. Emaproximadamente 40 anos, maisde 40% da população mundial –3,9 bilhões de pessoas – estarão su-jeitas a viver em áreas ribeirinhassob severo “estresse hídrico”. AONU alerta que isso também po-derá ser sentido em partes da Eu-ropa, afetando pelo menos 44 mi-lhões de pessoas até 2070. “A solu-ção está realmente na boa gestão.A resposta não está apenas na efi-ciência, mas na economia do pro-duto e em bons mecanismos. Épreciso uma boa regulação paracuidar dos emissários submari-nos”, sugere Chapagain.

Kell não abre mão da necessida-de de dar um preço à água. “Nãovejo outra alternativa senão preci-ficar o produto. É preciso investir,mas na falta de investimento, omelhor a fazer é atribuir preço àá g u a”, afirma. Do seu ponto de vis-ta, o mundo nunca foi tão interde-pendente como hoje. “É hora deinvestir no que nos liga e não noque nos divide. Preocupa-me queos países não estejam dando a de-vida atenção aos bens públicos.”

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Jornal Valor --- Página 10 da edição "15/06/2012 1a CAD F" ---- Impressa por lmmorresi às 14/06/2012@17:35:20

F10 | Valor | Sexta-feira, 15 de junho de 20 1 2

Enxerto

Jornal Valor Econômico - CAD F - ESPECIAIS - 15/6/2012 (17:35) - Página 10- Cor: BLACKCYANMAGENTAYELLOW

Especial | Rio + 20

Te n d ê n c i a Empresas são avalistas da construção doVisão 2050, documento que projeta cenário futuro

Corporações agoraaparecem comoparte da solução

LEONARDO RODRIGUES/VALOR

Fred Gelli, da Tátil: “É impossível imaginar um mundo com 9 bilhões e uma quantidade equivalente de a u to m ó ve i s ”

Silvia TorikachviliPara o Valor, de São Paulo

Tratadas como vilãs na Rio-92,as empresas são protagonistas naRio+20. Elas são avalistas daconstrução e da aplicação do Vi-são 2050, documento do WorldBusiness Council for SustainableDevelopment (WBCSD) redigidocom a colaboração de 29 empre-sas globais e que projeta um ce-nário bastante provável das pró-ximas quatro décadas, quando apopulação do mundo deverá ul-trapassar os 9 bilhões.

Adaptado à realidade brasilei-ra pelo Conselho EmpresarialBrasileiro para o Desenvolvimen-to Sustentável (Cebds), o Visão2050 funciona como um farolpara líderes, governantes e ges-tores do presente e do futuro.Contém nove pilares interdepen-dentes e interligados e raras sãoas empresas que não se incluemem quase todos.

Para Marina Grossi, presidenteexecutiva do Cebds, o documentomostra a importância e o benefí-cio de práticas como fazer maiscom menos, criar valor, prospe-rar, elevar a condição humana. “OBrasil tem uma vantagem ímparsobre os demais países em rela-ção à sustentabilidade”, diz.

A adaptação tropicalizada doVisão 2050 conta com sugestões ecompromissos de mais de 70 em-presas, o que pode ser traduzido

como um consenso maior em re-lação ao original. Atender ao au-mento da demanda por consumodurante os próximos 40 anos e aomesmo tempo diminuir a quanti-dade de insumos utilizados é ape-nas um dos desafios.

As empresas deverão estar aten-tas a seus planos de negócios deforma a disparar ações compro-metidas com a garantia de saúde,educação, alimentação, moradia,água, saneamento, energia, mobi-lidade, desenvolvimento e bem es-tar sem comprometer as possibili-dades do planeta. Dobrar a produ-ção de alimentos e ao mesmo tem-po zerar o desmatamento são me-

tas ambiciosas – mas possíveis, se-gundo Eduardo Bastos, diretor derelações institucionais da D o w.

Dos 200 milhões de hectaresde pastagem que o Brasil dispõe80 milhões de hectares estão de-gradados. Como forma de atin-gir as metas do plano de mudan-ças climáticas, 15 milhões dehectares fazem parte de um pro-jeto de recuperação. Valor da em-preitada: R$ 500 por hectare, oque representa R$ 7,5 bilhões.

Embora exista a lógica econô-mica, são indispensáveis leis emecanismos de governança emcadeia que pressionem e penali-zem produtores que ainda prefe-rem derrubar árvores a recuperaráreas degradadas. Aproveitar oque existe, fazer mais com menossão questões ligadas à educaçãoe à informação – fundamentaispara a elevação da produção decarne no Brasil em 250% comuma área 35% menor.

No Visão 2050 fica claro que ogoverno deve ser o indutor docrescimento e não uma barreira,como diz Eduardo Bastos, daDow. A adaptação do documentoà realidade brasileira teve tam-bém a participação do Itaú Uni-b a n c o. Denise Hills, superinten-dente de sustentabilidade, dizque o desafio do setor é financiara geração de energia limpa e me-nos transmissora de carbono. Oplano é integrar bicicleta, ônibuse metrô numa grande cirandamodal. Inclusão social e financei-ra também estão nos planos denegócios do Itaú Unibanco. In-cluir pessoas, promover a gera-ção de renda entre grupos menosprivilegiados – tudo integradocom os princípios do investi-mento responsável.

Sustentabilidade é assim: tudose relaciona. Disparar ações inte-gradas ao longo dos próximos 40anos para uma população que,no Brasil, deve bater nos 260 mi-

lhões, com boa saúde, educação ealimentação adequada para to-dos é uma perspectiva inspirado-ra, na opinião de Jorge Soto, dire-tor de sustentabilidade da Bras -kem. Ele lembra que o Brasil dehoje tem 48% de sua energia totalrenovável contra 15% dos paísesdesenvolvidos e 7% dos demais.

Para orientar as empresas, oVisão 2050 oferece um passo apasso. Em lugar de apenas co-mentar de forma abstrata ondetodos poderiam chegar, o docu-mento facilita o planejamentodas organizações e aponta cami-nhos para que seja garantida asobrevivência das populaçõessem comprometer a sobrevivên-cia das próximas gerações.

O Brasil, que vem buscandoconsenso para alavancar a miti-gação, é liderança nas discussõessobre mudanças climáticas, se-gundo Soto. Além disso, vem in-

Setor agropecuário vai enfatizar a produtividadeJane SoaresPara o Valor, de São Paulo

A agricultura e a pecuária vãopegar carona na Conferência dasNações Unidas sobre Desenvolvi-mento Sustentável, a Rio+20, pa-ra mostrar como, em 50 anos, oBrasil passou de importador aum dos maiores produtoresmundiais de alimentos.

Para isso, uma verdadeira for-ça tarefa vem sendo realizadadesde setembro do ano passado,envolvendo várias organizaçõesdo setor, como a Confederaçãoda Agricultura e Pecuária do Bra-sil (CNA), as federações da agri-

cultura dos Estados, a EmpresaBrasileira de Pesquisa Agrope-cuária (Embrapa), a AssociaçãoBrasileira dos Criadores de Zebu(ABCZ), a Sociedade Rural Brasi-leira (SRB), a Associação Nacio-nal de Defesa Vegetal (Andef),entre outras.

Sob a batuta da CNA, o setorvai divulgar, no dia 18, um docu-mento à Rio+20 no qual defen-derá a criação de áreas de preser-vação permanentes (APP) em to-do o mundo. A ideia já foi apre-sentada no 6o Fórum Mundial daÁgua, realizado em Marselha, emmarço deste março. O documen-to também aborda o problema

da água, uma insumo básico pa-ra o setor, principalmente a pre-servação das nascentes.

Outro aspecto a ser discutidopelo paper são as estratégias etecnologias a serem empregadaspara garantir a sustentabilidadeda pecuária e da agricultura e pa-ra fortalecer a economia verde,frente a necessidade de aumen-tar a produção de alimentos e re-duzir a pobreza.

No dia 18 também será feita aabertura oficial do Espaço AgroBrasil, instalado no Pier Mauá,um dos locais oficiais da Rio+20.“Vamos mostrar como o Brasil setornou um dos maiores produto-

res mundiais de alimentos ocu-pando apenas 27% do território,utilizando técnicas e práticas ge-nuinamente nacionais, como oplantio direto, que evita a ero-s ã o”, explica a senadora KátiaAbreu, presidente da CNA.

Uma das atrações do EspaçoAgro Brasil será um túnel multi-sensorial onde os visitantes po-derão acompanhar a transfor-mação de uma fazenda degrada-da em uma propriedade susten-tável com a ajuda do Projeto Bio-mas, uma parceria entre a CNA ea Empresa Brasileira de PesquisaAgropecuária (Embrapa). O pro-jeto envolve investimentos de

US$ 20 milhões e 240 pesquisa-dores que estão desenvolvendosoluções técnico-científicas paraa proteção e o uso sustentável dosespaços nos diferentes biomas.

“Vamos repassar gratuitamen-te aos pequenos e médios produ-tores os avanços obtidos com oProjeto Biomas e mostrar a elesque produzir de forma sustentá-vel faz bem a ele, à sua família e aoseu patrimônio”, diz a senadora.

O Espaço Agro Brasil tambémvai oferecer uma longa programa-ção científica, com a realização deseminários com temas como opróprio Projeto Biomas, Agricultu-ra de Precisão, Bioenergia, Merca-

do Agropecuário de Redução deEmissões, entre outros. EduardoBiagi, presidente da AssociaçãoBrasileira dos Criadores de Zebu(ABCZ), será um dos expositores.

“Vamos mostras ao mundoque preservação e lucratividadeandam juntas”, explica, lembran-do que, há 30 anos, se produzia0,5 cabeça por hectare. Hoje, é1,2 cabeça por hectare e é possí-vel avançar muito mais. “Alémdisso, novas técnicas de produ-ção, como a integração lavoura-pecuária-floresta, permite au-mentar a produtividade, recupe-rar áreas degradadas e preservaro meio ambiente.”

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Proposta inclui cobrança da águaLUCIANA WHITAKER/VALOR

Walfredo Schindler: “Energia economizada é mais barata que a gerada”

Paulo VasconcellosPara o Valor, do Rio

Já estão nas mãos das autori-dades ambientais brasileirasduas propostas de impacto paraa transição do Brasil rumo a umaeconomia verde. A primeira de-fende reajustes mais frequentesdo preço da gasolina e do diesel.A outra prega a universalizaçãoda cobrança da taxa de água.

As sugestões integram o estu-do “Diretrizes para uma Econo-mia Verde no Brasil”, elaboradopela Fundação Brasileira para oDesenvolvimento Sustentável(FBDS). São doze cadernos com odiagnóstico de setores comoagronegócio e energia e temascomo o destino dos resíduos sóli-dos nas grandes cidades e a mo-bilidade urbana.

A coletânea teve o patrocínioda A m b e v, BNDES, JSL, Light,Shell e Tetra Pak. Custou R$ 540mil. O caderno menor, 28 pági-nas, é o que tem o título mais lon-go: “Redução de Emissões porDesmatamento e DegradaçãoFlorestal: Construindo os Alicer-ces da Economia Verde no Brasil”.O maior, com 56 páginas, é “Ener -gia e Economia Verde: Cenários

Futuros e Políticas Públicas”. Asobras levam a assinatura de espe-cialistas como Marilene Ramos,presidente do Instituto Estadualdo Ambiente (Inea), do Rio de Ja-neiro, e Paulo Moutinho, diretordo Instituto de Pesquisa Ambien-tal da Amazônia (Ipam). Foramentregues em maio à ministra doMeio Ambiente, Izabella Teixeira,e serão levadas à Rio+20.

“Os trabalhos propõem inicia-tivas de médio e longo prazo, mastambém medidas que podem seraplicadas de imediato para evitara sensação de desânimo comumdiante do desafio da migraçãopara uma economia verde”, dizWalfredo Schindler, diretor supe-rintendente da FBDS.

Uma das principais recomenda-ções é a eliminação dos subsídiosaos combustíveis fósseis. A precifi-cação correta da gasolina e do die-sel incentivaria a produção de eta-nol e estimularia os investimentosem energias alternativas. O Brasil,que já tem o maior programa deenergia renovável do mundo, res-ponsável pela economia de quaseum milhão de barris de petróleopor dia, poderia disparar na lide-rança se os estímulos à gasolina eao diesel não fossem um entrave.

O fascículo “Opções Tecnológi-cas em Energia: Uma Visão Brasi-l e i r a” aponta reflexos do proble-ma. O Zoneamento Agroecológi-co da Cana-de-Açúcar constatouque existem 64 milhões de hecta-res aptos para o plantio da cultu-ra, mas ela ocupa apenas 8 mi-lhões. A matriz energética limpa,que responde por 87% da gera-ção de eletricidade, aos poucosestá se sujando por causa da im-plantação de novas termelétri-cas, entre outras coisas porque émais fácil o licenciamento am-biental de uma termelétrica doque para hidrelétrica.

O país poderia ganhar muitotambém com a reativação dos pro-gramas de eficiência energética.“Energia economizada é muitomais barata que energia gerada”,diz Walfredo Schindler, da FBDS. Oganho energético com a moderni-zação de hidrelétricas pode variarde 2,5% a 20% sem qualquer acrés-cimo de barragem.

Já a precificação da água éapontada como uma das melho-res alternativas para a preserva-ção de um patrimônio que o Bra-sil tem de sobra ainda que maldistribuído. A cobrança é previstano Plano Nacional de Recursos

Hídricos, de 2006, mas enfrentaresistências. Apenas quatro riosde bacias federais (Piracicaba,São Francisco, Doce e Paraíba doSul) têm cobrança. Só Rio de Ja-neiro, São Paulo, Ceará e MinasGerais cobram pela água de seusrios estaduais. O preço varia de R$1,00 a R$ 4,00 por metro cúbico –contra quase R$ 50,00 na França.

A tese de que água é questão decompetitividade perpassa doiscadernos: “Água, Gestão e Transi-ção para uma Economia Verde noBrasil” e “Recursos Hídricos e aEconomia Verde: Setor Privado”.“Água é um recurso findável”,afirma Schindler. “O dinheiroproveniente da cobrança alavan-caria programas de recuperaçãodas bacias hidrográficas.”

O estudo ataca um ponto cen-tral da sustentabilidade: o destinodos resíduos sólidos. Cerca de 40%do lixo produzido nas grandes ci-dades vai para lixões. A ideia é criarconsórcios entre municípios paradividir as despesas e compartilharo uso de aterros sanitários moder-nos. A FBDS recomenda a intensifi-cação do processo de reciclagem ea implantação de compras verdes,começando pelo governo até che-gar à cadeia produtiva.

Dobrar a produção dealimentos e tambémzerar o desmatamentosão metas ambiciosas,mas possíveis

fluenciando mecanismos como oRED, de redução de desmata-mento. “O grande foco do Visão2050 é a empresa vincular o do-cumento à sua própria visão def u t u r o”, diz.

As empresas que ainda não seengajaram nessa nova ordemeconômica não têm outra saída.Corporações que entram no pla-nejamento ambiental, por forçade lei, acabam se convencendodas vantagens quando se depa-ram com os bons resultados. “Em1992 as empresas eram vistas co-mo problema; hoje são encara-das como parte da solução”, dizSoto. “Incluir as empresas naquestão da sustentabilidade faztoda a diferença e a gestão globalpode ser o diferencial para a erra-dicação da pobreza”.

Até 2050 as pessoas podemdeixar de ser consumidoras paraserem desfrutadoras. Possuir um

bem poderá ser substituído pordesfrutar de um bem. Os carrossubutilizados na garagem ou noestacionamento poderão inte-grar uma imensa frota de auto-móveis de aluguel, que o desfru-tador utiliza o tempo que preci-sar e, por meio de um aplicativo, adespesa aparece na fatura do car-tão de crédito. É assim que FredGelli, da Tá t i l , prevê a mobilidadeurbana nos próximos 40 anos.

“É impossível imaginar ummundo com 9 bilhões e umaquantidade equivalente de auto-móveis”, afirma. Gelli acreditaque, quando romper com a lógi-ca do hiperconsumo e introduziro desfrute, as pessoas entenderãoque colaborar é mais importanteque competir. O documento su-gere que é impossível convivercom a lógica do crescimentoeterno e para quem não acreditarnisso, o preço pode ser alto.

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Jornal Valor --- Página 12 da edição "15/06/2012 1a CAD F" ---- Impressa por lmmorresi às 14/06/2012@17:36:14

F12 | Valor | Sexta-feira, 15 de junho de 20 1 2

Enxerto

Jornal Valor Econômico - CAD F - ESPECIAIS - 15/6/2012 (17:36) - Página 12- Cor: BLACKCYANMAGENTAYELLOW

Especial | Rio + 20

Energia Setores público e privado querem ampliar as discussões para aumentar a participação de renováveis

Brasil protagoniza uso de fontes limpasEUGENIO SAVIO/VALOR

Carvalho Neto: “Somos a terceira empresa limpa no setor de energia elétrica do mundo, segundo a “N ewswe e k ””

Salete SilvaPara o Valor, de São Paulo

O tema energia ganhou impor-tância na Rio+20 com a escolha de2012 como ano da Energia Susten-tável para Todos pela AssembleiaGeral das Nações Unidas.

Empresas e o governo brasileirovão aproveitar a oportunidade pa-ra marcar presença como líderesmundiais no uso de fontes limpase renováveis e ampliar as discus-sões para tornar crescente a parti-cipação dessas fontes na produçãoglobal de energia.

Uma das principais patrocina-doras oficiais do evento e um dosmaiores players mundiais no mer-cado internacional de energia lim-pa, com 85% de sua matriz forma-da por energia hidrelétrica, a Ele -trobrás se beneficia dessa experti-se nos debates. “Somos a terceiramaior empresa limpa no setor deenergia elétrica do mundo, segun-do a revista “Newsweek”, e quere-mos ser a primeira até 2020”, diz opresidente da companhia, José daCosta Carvalho Neto.

A empresa baseia-se em expe-riências próprias para defenderiniciativas de universalização aoacesso de energia e eficiência ener-gética. “Hoje um sexto da popula-ção mundial não tem energia”,lembra Carvalho. O Luz para Todose o Programa Nacional de Conser-vação de Energia Elétrica (Procel) ,ele cita, são programas bem-suce-didos da empresa nessa área. Noestande montado no Parque dosAtletas, a companhia promove di-versas palestras, além de manteruma agenda de debates em parce-rias com secretários e técnicos doMinistério de Minas e Energia.

O vice-presidente de energia ealterações climáticas da Funda-ção das Nações Unidas Detchon

Reid enfatiza também a impor-tância do governo brasileiro e daEletrobrás nos debates do setor.“Reconhecemos a elevada per-centagem de energia no Brasilproduzida a partir de energias re-nováveis e também o sucesso doLuz para Todos, iniciativa que am-plia o acesso à energia para asáreas rurais remotas”, afirma.

Ele diz, no entanto, que maisações desse tipo devem ser adota-das no país. “Mas entendemos queo governo e a Eletrobrás vão fazerum grande esforço para levar ele-tricidade a toda a população brasi-l e i r a”, diz. Entre os eventos maisimportantes realizados durante aconferência, Reid destaca o Dia daEnergia, no dia 19, no Riocentro,além do SE4All, no dia 21, em queempresas, governos e sociedadedevem assumir compromissos.

Reid ressalta ainda a importân-cia da energia solar no âmbito so-cial em virtude do baixo custo des-sa fonte em algumas regiões em re-lação às alternativas convencio-nais. A energia solar, segundo ele, éuma oportunidade para fornecereletricidade a um custo menor. “Is -so vai exigir algum financiamentopara reduzir o custo inicial dessessistemas, mas no longo prazo émais barato do que o investimentoem extensão da grade ou geraçãode motores a diesel”, compara.

As empresas brasileiras vãomostrar ainda tecnologia e ino-vação. A Usina Hidrelétrica deFu r n a s apresenta o projeto de

pesquisa e desenvolvimento dalinha de transmissão com capaci-dade até duas vezes maior do queas convencionais.

Os desafios da mobilidade elé-trica é outro tema abordado porFurnas, que sediará, no dia 18, oFórum Global de Mobilidade Elé-trica, evento promovido pela ONUem parceria com a Coppe, a Asso-ciação Brasileira de Veículos Elétri-cos (ABVE), entre outras.

Ampliar a participação dasenergias renováveis e da bioener-gia na matriz, como etanol e bioe-letricidade, é a expectativa do setorde açúcar e bioetanol, representa-do pela União da Indústria de Ca-na-de-Açúcar (Unica). O gerentede sustentabilidade da entidade,Luiz Fernando Amaral, usa dadosestatísticos para mostrar a impor-tância do Brasil nessa questão.

Do total de energia ofertada em2010 no Brasil, 45,5% eram renová-veis, mostra levantamento da Uni-ca, que compara seus dados aos daOrganização para Cooperação eDesenvolvimento Econômico (OC-DE), segundo os quais apenas 7,6%da energia ofertada no mundo em2009 eram provenientes de fontesrenováveis. Da matriz energéticabrasileira, 17,8% são provenientesda cana-de-açúcar, a primeira fon-te de energia renovável do país.

Amaral e outros representan-tes da Unica participam de pales-tras em eventos paralelos e aindaacompanham as negociações ofi-ciais. A defesa das energias reno-váveis como fontes energéticasessenciais para o “Futuro queQueremos”, mote da Rio+20, de-verá permear as apresentações.Uma delas é sobre potencial dabioenergia sustentável que seráapresentada, dia 18, no seminá-rio promovido pelo Global Bioe-nergy Partnership (GBEP).

“Tecnologias e ações que redu-zem as emissões dos combustíveisfósseis são importantes, mas a dis-cussão sobre energia não pode selimitar a isso”, afirma Amaral. Amaior participação das energiasrenováveis, segundo ele, é que vaipermitir atingir o objetivo de dis-ponibilizar energia sustentável pa-ra todos. Esse argumento tem co-mo base o último relatório do Pai-nel Intergovernamental sobre Mu-danças Climáticas (IPCC) da ONU.Segundo Amaral, o documentonota que a biomassa como o eta-nol e a bioeletricidade, tem poten-cial para estar entre as três maiorestecnologias necessárias para obterum sistema energético mundial debase renovável até 2050.

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Eventos paralelos ajudam a mobilizar

D I V U LG A Ç Ã O

Malu Nunes, diretora da Fundação Grupo Boticário de Proteção à Natureza: “Queremos ampliar ações voltadas para a conservação e fortalecer o PSA”

Amélia AlvesPara o Valor, de São Paulo

Os debates em prol da econo-mia verde anteciparam-se ao iní-cio da Rio+20 por meio de açõesparalelas que acontecem desde omês passado na capital flumi-nense. A vontade de mostrar tra-balho, ganhar um lugar ao sol efazer a diferença nesta vitrinebrasileira que tem atraído olha-res do mundo inteiro nos últi-mos meses não refletem o valordos investimentos — guardado asete chaves pelas empresas.

A Braskem, que terá aproxima-damente 30 pessoas atuando dire-tamente na Rio +20, lidera o ran-king de ações independentes. Aotodo são sete. Do encontro com aindústria, passando por uma ex-posição de tecnologias de basessustentáveis à promoção de umcongresso internacional, até 22 dejunho a empresa promete se desta-car em duas rotas: apoio e partici-pação nas discussões. Na avaliaçãoda petroquímica, os eventos para-lelos são parte essencial das discus-sões que constroem o melhor en-tendimento entre as partes inte-ressadas. “Queremos mostrar co-

mo podemos contribuir e proversoluções para o desenvolvimentos u s t e n t áv e l ”, afirma André Leal,coordenador de desenvolvimentosustentável da Braskem.

De forma independente, dentroe fora do Riocentro, a Vo l k s w a g e ntambém pretende reiterar seucompromisso com o desenvolvi-mento sustentável na apresenta-ção de práticas ligadas aos três pi-lares: ambiental, social e econômi-co, como ratifica Josef-Fidelis Senn,vice-presidente de recursos huma-nos e responsável pelas ações desustentabilidade da montadorano Brasil. A ação será marcada pelaapresentação formal do “ThinkB l u e”, soluções e produtos ecologi-camente corretos.

No Parque dos Atletas, um es-tande mostrará o conceito de pro-jetos sobre energias renováveis ereutilização de materiais, inova-ções da marca e apresentação doprotótipo do e-Bulli (veículo movi-do por motor elétrico), além deoutras iniciativas sociais. O concei-to, diz Senn, sintetiza a atuação daempresa em favor de nova cons-ciência, voltada à preservação am-biental, refletida não apenas emseus produtos e estratégias empre-

sariais, mas em ações de incentivoe conscientização junto aos seuscolaboradores e familiares. “Pa r anós, produzir veículos com redu-ção da emissão de CO2 é apenas oc o m e ç o”, assinala.

Ao lado da Coca-Cola Brasil e doItaú Cultural, a Volks ainda patro-cina uma das principais atraçõesculturais da Rio +20: a mostra sen-sorial Brasil Cerrado, especialmen-te criada para o evento pelo artistaplástico Siron Franco, patrocinadopela montadora. A videoinstala-ção, com mais de 600 m2, foi con-cebida para aproximar o visitantedas belezas do Cerrado e explicitara urgência de sua preservação. Aexposição vai até 23 de junho, noMuseu de Arte Moderna.

A Fundação Grupo Boticário deProteção à Natureza também viuno evento paralelo uma formapromissora de disseminar peloBrasil o Projeto Oásis, mecanismode pagamento por serviços am-bientais, que alia conservação danatureza e desenvolvimento fi-nanceiro-econômico. A iniciativapioneira lançada em 2006 visa es-timular a criação de leis de PSA,possibilitando ações de longo pra-zo, como o estímulo à criação de

Reservas Particulares do Patrimô-nio Natural. Para Malu Nunes, di-retora-executiva da Fundação, aexpectativa é que o projeto ganheescala pelo Brasil.

As competições esportivasmundiais — Copa 2014 e Olim-píada 2016 —, são motes do even-to paralelo que a Green BuildingCouncil Brasil, ONG que fomentaa indústria de construções sus-tentáveis no país desde 2007, pro-move no dia 16, no Riocentro. Oobjetivo é colocar em pauta asconstruções sustentáveis. “E mos-trar que há saídas para o setor deconstrução civil, um dos que maisimpactam o meio ambiente”, en-fatiza Felipe Faria, gerente de re-lações governamentais e institu-cionais da companhia.

Em busca de parcerias, a Novo -zymes participará de mais de cemeventos paralelos. Ideia é compar-tilhar seu know-how em soluçõesbiotecnológicas no desenvolvi-mento de alternativas em prol doambiente. “Queremos mostrar quenossa tecnologia pode contribuircom soluções que reduzem o con-sumo de energia e de matérias-pri-mas”, diz Pedro Luiz Fernandes,presidente regional da empresa.

Construtoras têmtecnologia verdeMarcelo PinhoPara o Valor, do Rio

A construção civil integra deforma única diversos outros seto-res e tecnologias capazes de redu-zir o impacto ambiental de pré-dios e cidades. Por conta dessa ca-racterística, o setor prepara a cria-ção de um grupo de trabalho sobreconstrução sustentável com o ob-jetivo de implementar conceitos,indicadores e metas para o uso derecursos naturais, eficiência ener-gética e redução das emissões degases de efeito estufa.

Essa será a principal propostaque a Câmara Brasileira da Indús-tria da Construção (CBIC), o Con-selho Brasileiro de ConstruçãoSustentável (CBCS), a Confedera-ção Internacional de Construtorese o Conselho Empresarial Brasilei-ro para o Desenvolvimento Sus-tentável (CBEDS) vão apresentarem evento paralelo da Rio+20, nopróximo dia 17.

Para o presidente do ConselhoBrasileiro da Construção Sustentá-vel, Marcelo Takaoka, é mais fáciltrabalhar com setor que integra asindústrias. “Nós construímos as ci-dades com base na atuação das ou-tras áreas. Podemos melhorar a efi-ciência de consumo de energia ematé 30%. Outros países até mais,porque consomem energia emaquecimento. A construção temparticipação muito relevante nodesenvolvimento sustentável”, diz.

Paulo Safady, presidente da Câ-mara Brasileira da Indústria daConstrução, destaca algumas dasatrações do evento. “Vamos trazerum arquiteto que está fazendo umprojeto exemplar em Masdar, naArábia Saudita. É um caso exem-plar que ele vai nos mostrar pro-vando que é possível montar umacidade sustentável. Também va-mos levar à ONU um documentofinal com uma proposta ousada,de formação de um grupo mun-dial sob coordenação da organiza-ção. A ONU então deve desenhar osconceitos, indicadores e metas pa-ra um projeto de construção sus-tentável no mundo. Ao fim dessa

etapa faremos cronograma paraaplicar isso mundo afora”, diz.

De acordo com Safady, o setorprecisa mudar a impressão deque é um grande poluidor. “Osetor mostra que é depredadorda natureza, emissor de gases,desperdiça materiais. Precisa-mos combater isso e para isso te-mos que mexer na construçãono mundo todo”, diz.

O grupo de trabalho irá atuarem diversas áreas como energia,água, emissão de gases, reduçãosistemática de materiais naturais.

De acordo com o presidente daCBIC, as empresas do setor estãoalinhadas com o projeto. “O pro-jeto de construção sustentávelque a CBIC mostrou teve a parti-cipação de todos os setores. Cadaum com código de obra, tributa-ção, entrosamento entre setor,ciência e academia. Inovação é apalavra de ordem”, afirma.

Para Safady, as grandes empre-sas já apresentam nos seus proje-tos comerciais um desempenhosatisfatório em relação à susten-tabilidade. “São empresas quetêm capital para desenvolver is-so. Essas grandes obras já têmconceitos avançadas sobre isso.”

Apesar disso, o percentual deobras tocadas pelas grandes em-presas é muito pequeno. A maiorparte é desenvolvida por peque-nas e médias. Essas, mesmo ten-do avançado nos últimos anosem seus processos de construção,ainda estão distantes do ideal.

“O desafio é atingir as peque-nas e médias, que são 170 mil es-palhadas pelo Brasil”, afirma.

Marcelo Takaoka lembra quenão adianta haver ações isoladasde construção sustentável. Paraele, é necessário haver um traba-lho mais amplo, envolvendo ascidades como um todo. “Reco -mendamos que o prédio façaseu próprio tratamento de águae esgoto. Mas se trabalharmosem bairro e cidade podemosmelhorar isso. Não adianta só oprédio. Tem que ser espaço ur-bano e toda a infraestrutura dac i d a d e”, defende.

Segundo levantamentoda Unica, 45,5% dototal de energiaofertada em 2010 noBrasil eram renováveis A Unica terá representantes

ainda em eventos organizadospor outras entidades, como In-ternational Center for Trade andSustainable Development(ICTSD), Ministério do Meio Am-biente da Itália, Federação das In-dústrias do Estado de São Paulo(FIESP), Eletrobrás, além deapoiar eventos da ConfederaçãoNacional da Indústria (CNA) e doWorld Green Summit.

A Raízen, joint venture entre aRoyal Dutch Shell e a Cosan, amaior exportadora de açúcar e eta-nol do país, também vai enfatizar aimportância da energia limpa e re-novável da cana-de-açúcar não sópara melhorar a matriz energéticado Brasil e do mundo, mas tam-

bém para tornar os serviços ener-géticos mais acessíveis à popula-ção. “Energia renovável é limpa,mais barata, sustentável e contri-bui para gerar energia elétrica pa-ra todos os povos”, diz o vice-presi-dente de sustentabilidade e rela-ções exteriores da Raízen, LuizEduardo Osório. “Além disso, nos-sos investimentos em energia dediversos materiais orgânicos per-mitem dobrar a produção com amesma capacidade instalada.”

A companhia terá representan-te no debate sobre Energia Susten-tável Para Todos, previsto nas dis-cussões do dia 18. “Nossa expecta-tiva é que seja criado marco regu-latório para atrair mais investi-mentos”, diz Osório.

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Jornal Valor --- Página 13 da edição "15/06/2012 1a CAD F" ---- Impressa por lmmorresi às 14/06/2012@17:37:22

Sexta-feira, 15 de junho de 2012 | Valor | F13

Enxerto

Jornal Valor Econômico - CAD F - ESPECIAIS - 15/6/2012 (17:37) - Página 13- Cor: BLACKCYANMAGENTAYELLOW

Ônibus e bicicletários são destaques

Especial | Rio + 20

Automóveis estão menospoluentes, aponta Anfavea

LEO PINHEIRO/VALOR

Júlio Lopes: “É relevante pensar também na criação de outras dinâmicas de mobilidade urbana, por isso, o debate”

Maria Carolina NomuraPara o Valor, de São Paulo

Considerado um dos ramosmais poluentes da indústria, osetor automobilístico diz quefez a lição de casa e avançou ru-mo à sustentabilidade: desde1987, o Brasil reduziu em 97% osníveis de emissões veiculares e,entre 2008 e 2011, o consumode água por veículo produzidobaixou de 5,5 m3 para 3,52 m3,de acordo com a Associação Na-cional dos Fabricantes de Veícu-los Automotores (Anfavea).

Além disso, dados do Progra-ma de Controle da Poluição do Arpor Veículos Automotores (Pro-conve) apontam que os veículosleves atualmente fabricados nopaís emitem cerca de 28 vezesmenos poluentes do que aquelesproduzidos no final dos anos 80.Para a Anfavea, o avanço da legis-lação de emissões e o desenvolvi-mento da indústria impulsiona-ram a modernização do setor ge-rando investimentos em labora-tórios de controle e de tecnolo-gias, promovendo a melhoria daqualidade dos combustíveis, co-mo, por exemplo, a eliminaçãodo chumbo na gasolina.

No estudo “Indústria Automoti-va e Sustentabilidade”, que seráapresentado durante a conferên-cia, o Brasil é o 4o maior mercado eo 6o maior produtor automotivomundial, que só em 2010 faturouUS$ 107 bilhões. Projeções indi-cam que o potencial do mercadointerno é de 6,3 milhões de veícu-los por ano em 2020.

A boa notícia é que os veículosflex já representam mais de 40% dafrota de veículos leves no Brasil.Lembrando que os ganhos am-bientais da produção e do consu-mo do etanol são positivos, consi-derando que as emissões de CO2

durante o consumo são compen-sadas pelo cultivo de cana-de-açú-car para a sua produção.

Outros programas como a re-novação da frota e a adoção deprogramas de inspeção veicularem nível nacional concorrem,

segundo a Anfavea, para a me-lhoria da qualidade ambiental,da mobilidade urbana e da se-gurança de trânsito.

No Rio de Janeiro, medidas co-mo a implantação do “IPVA Verde”a partir de 2013 deverá estimular oconsumo de carros menos poluen-tes, que terão descontos de 10% a20% no imposto, seguindo umaclassificação do Instituto Brasileirodo Meio Ambiente e dos RecursosNaturais Renováveis (Ibama). Des-de 2009, o programa do Ibama in-forma os níveis de emissão de ga-ses de todos os veículos leves pro-duzidos no país. Os modelos rece-bem de uma a cinco estrelas, notamáxima oferecida aos melhoresem eficiência ambiental.

Contudo, para Oded Grajew,presidente da Rede Nossa São Pau-lo, a situação dos automóveis noBrasil e principalmente nas gran-des cidades está longe do ideal. Ele

De São Paulo

Como cartão-postal da Rio+20,a cidade maravilhosa pretende os-tentar ao mundo não só suas ri-quezas naturais, mas, principal-mente, os avanços que tem feitoem relação ao transporte público eà mobilidade urbana – vitrine tam-bém para a Copa de 2014 e Olim-píada de 2016. Além de serem uti-lizados ônibus e carros menos po-luentes nos traslados de autorida-des e convidados, a organizaçãodo evento também estimulará ouso de bicicletas e haverá uma sé-rie de debates sobre o tema.

O secretário de Transportes doRio de Janeiro, Júlio Lopes, afirmaque o Estado progrediu muito nes-sa questão, tanto na pesquisa de al-ternativas menos poluentes decombustível para os ônibus, quan-to pelo aumento do número de bi-cicletas e bicicletários na capital.

“É relevante pensar tambémna criação de outras dinâmicasde mobilidade urbana. Por isso, odebate “Megacidades – Transpor -te, Energia e DesenvolvimentoU r b a n o”, em parceria com a Câ-mara de Comércio e IndústriaBrasil-Alemanha do Rio de Janei-ro, será uma oportunidade mui-to importante para discutir o fu-

turo do transporte público”, ex-plica Lopes. Ele cita ainda a ênfa-se na pesquisa do uso do gás porcausa da Bacia de Campos e dogasoduto Brasil-Bolívia. “Te m o sum mercado de gás enorme e eleé mais econômico do que as al-ternativas de diesel e tem grandereceptividade internacional.”

Entre algumas novidades noevento está o ônibus com tecnolo-gia flex GNV (gás natural veicular)e diesel, desenvolvido pela iniciati-va privada dentro do ProgramaRio Transporte Sustentável, do go-verno do Rio. Utilizando tecnolo-gia nacional, o ônibus, que trans-portará autoridades e convidados,pode rodar com até 90% de GNVno seu sistema de injeção, dimi-nuindo em 20% a emissão de CO2.O ônibus deverá ser fabricado emescala a partir de 2013, de acordocom o secretário de turismo.

O protótipo foi desenvolvidocom tecnologia nacional pelaMAN Latin America, fabricantedos caminhões e ônibusVo l k s w a g e n , em parceria com aRobert Bosch América Latina. Se-gundo a MAN, o ônibus apresen-ta uma alternativa real para odiesel porque reduz a utilizaçãodo combustível e a emissão depoluentes na atmosfera.

Outras iniciativas já existentescomo o Transoeste, o primeirocorredor BRT (Bus Rapid Transit)do Rio de Janeiro, que foi finan-ciado pela Bloomberg Philantro-pies, também devem chamar aatenção do público.

Luis Antonio Lindau, diretor-presidente da Embarq Brasil,companhia que deu auxílio téc-nico à prefeitura para a realizaçãodo projeto, afirma que o BRT é umavanço para a mobilidade menospoluente da cidade. “Uma ques-tão é a sustentabilidade, outra é otransporte coletivo. Na BRT, fo-ram investidos R$ 6 bilhões paraconstruir 135 quilômetros emcorredores. Onde passam 1300carros por hora, transitarão 13mil pessoas. É o uso mais eficientedo espaço viário”, explica.

O espaço aéreo também serápalco de testes de combustíveismenos poluentes. A companhiaAzul promete fazer o primeiro voocom biocombustível de cana-de-açúcar. O voo batizado de “Azul +Ve r d e” é fruto de parceria entre aAmyris, empresa integrada de pro-dutos renováveis, Embraer e GE.

Segundo a prefeitura, o Riotem ao todo 250 quilômetros deciclovia, 60 bicicletários e 600 bi-cicletas em vários pontos. (MCN)

Pesquisa Meta é traçar indicadores confiáveis para medir a evolução

Diagnóstico da indústriaressalta as boas práticas

Monica Messenberg: “A indústria virou a parteira, aquela que sempre ajuda”

Paulo VasconcellosPara o Valor, do Rio

Poucos lugares parecem me-nos indicados para a instalaçãode um jardim do que o telhadode uma casa. Mas a solução ar-quitetônica que já ganhou escalacomercial e virou um bom negó-cio para algumas empresas é umdos exemplos de como a indús-tria da construção tem contribuí-do para a sustentabilidade.

O caso poderia ilustrar um estu-do da Confederação Nacional daIndústria (CNI) em que o setor pa-rece querer virar a página da histó-ria na qual aparecia como vilãoambiental. Há exemplos de con-quista na redução das emissões degases do efeito estufa, práticas sus-tentáveis de produção e até avan-ços tecnológicos que põem algu-mas empresas na ponta de lançado corporativismo ambiental.

A pesquisa tenta retratar o ce-nário da sustentabilidade em de-zesseis setores industriais repre-sentativos de 90% do PIB brasilei-ro. Às vésperas da Rio+20 foi de-batido por 800 empresários no“Encontro da Indústria para aS u s t e n t a b i l i d a d e”, no Rio de Ja-neiro. A próxima meta é traçar in-dicadores verdes confiáveis paramedir a evolução efetiva da sus-tentabilidade na indústria.

“A indústria deixou de ser o pro-blema na questão ambiental e vi-rou a parteira, aquela que semprea j u d a”, diz Monica Messenberg, di-retora de relações institucionais daCNI. “As empresas fizeram o deverde casa em busca da sustentabili-dade, mas ainda dependem de

uma métrica mais precisa que es-tabeleça o custo da inovação e oprazo para a sua implantação.”

O que o estudo do CNI revela é oponto de partida. Desde a Eco-92,nada menos de 90% das empresasdo setor de máquinas e equipa-mentos adotam políticas para mi-nimizar o impacto ambiental. Oprojeto Carbono Zero, criado em2009, incentiva medidas para re-duzir as emissões de CO2.

As indústrias elétricas e eletrô-nicas investem em tecnologiasinovadoras para aumentar a efi-ciência energética e a produtivida-de. As ações criadas pelo ProgramaNacional de Conservação de Ener-gia Elétrica (Procel) resultaram naeconomia de 6,131 milhões deKWh. Geladeiras e condicionado-res de ar consomem 60% menosenergia que há dez anos. Desde2010, geladeiras e condicionado-res de ar não usam mais o CFC, gásresponsável pelo buraco na cama-da de ozônio.

O setor químico já reduziu em47% as emissões de gases de efei-to estufa. Nas fábricas, o consu-mo de óleo combustível caiu65%, substituído pelo gás naturale combustíveis renováveis.

As indústrias de alumínio reci-clam 97,6% das embalagens e emi-tem 4,2 toneladas de CO2 por tone-lada produzida contra a médiamundial de 9,7 toneladas. Toda amadeira usada na produção de ce-lulose e papel vem de florestasplantadas. O setor reciclou, em2010, 43,5% de todo o papel quecirculou no país.

As fábricas de cimento trans-formaram 870 mil toneladas de

resíduos em insumo energéticoou na substituição de matéria-pri-ma. Oitenta e cinco dos 198 proje-tos de crédito de carbono no Bra-sil, que até 2020 terão compensa-do ou evitado a emissão de 34,8milhões de toneladas de CO2, sãoda cadeia de alimentação.

Empresas têxteis já consegui-ram neutralizar 100% de seusefluentes com inovação tecnoló-gica. Um automóvel fabricadohoje no Brasil é 28 vezes menospoluente que um veículo produ-zido 30 anos atrás.

No setor de construção, novosprodutos e modelos de habitações,como o Casa Eficiente e o Light Ste-el Framing, garantem obras mais

sustentáveis, com menos entulho enível de consumo zero de energia.

Nas indústrias de aço os índicesde recuperação de água chegam a97,6%. Na mineração, 90% da águaé reciclada na exploração de ferro,ouro, bauxita e carvão mineral.Empresas que lavram minério deferro já transportam a produçãocom o auxílio da gravidade em mi-nerodutos que ligam as minas àsregiões portuárias.

“O que a indústria precisa ago-ra é referendar o compromissode promover avaliações regula-res e qualificar os indicadores pa-ra avançar de forma mais consis-tente na sustentabilidade”, dizMonica Messenberg, da CNI.

Área financeiralança projetosna conferênciaMarcelo PinhoPara o Valor, do Rio

O setor financeiro está mobili-zado para discutir o desenvolvi-mento sustentável durante aRio+20. A BM&FBovespa vai lan-çar o banco de dados do projeto“Relate ou explique”, uma inicia-tiva da bolsa para recomendarque as empresas listadas indi-quem se publicam relatório desustentabilidade - ou um docu-mento similar - e onde está dis-ponível. Em caso negativo, de-vem explicar o motivo.

“O investidor por meio dos ba-lanços financeiros é capaz de co-nhecer toda a vida financeira daempresa, mas isso apenas nãobasta. É preciso saber quais são asatividades da empresa para tor-nar seu negócio sustentável. Oprojeto visa dar visibilidade a es-sas ações”, diz Sonia Favaretto, di-retora de sustentabilidade daBM&FBovespa.

A Bolsa acredita que a medidapermitirá uma adesão progressi-va das companhias à prática dereportar informações e resulta-dos relacionados às dimensõessocial, ambiental e de governan-ça corporativa. A meta é disponi-bilizar ao público esse banco dedados na Rio+20.

Para o Itaú Unibanco, o Brasilprecisa assumir um papel de li-derança das questões ambien-tais. “No cenário macro da confe-rência, entendemos que é preci-so detalhar mais o que é necessá-rio ser feito e finalmente obter ocompromisso dos países. E parachegar a este compromisso vai

ser necessário bastante articula-ção. E pelo que temos visto, umdos maiores desafios, até pelaimportância que o Brasil ganhouno cenário econômico mundialnos últimos anos, é como nostornamos um exemplo para omundo na integração das ques-tões socioambientais na nossaagenda de desenvolvimento demaneira transversal e planeja-d a”, diz Denise Hills, superinten-dente de Sustentabilidade doItaú Unibanco.

O banco também vai participardo evento paralelo oficial da ONUpara o setor privado, chamado Fó-rum de Sustentabilidade Corpora-tiva. “Participaremos dos debatessobre instituições financeiras.Também temos participado ativa-mente junto com outras segurado-ras brasileiras da construção dosprincípios para seguro sustentá-vel, que serão lançados durante aRio+20”, diz Denise.

Já o Banco do Brasil participadesde o ano passado dos debatespreparatórios para a conferên-cia, colaborando com importan-tes insumos para o desenvolvi-mento dos seus temas principais:economia verde no contexto dodesenvolvimento sustentável eda erradicação da pobreza; e oquadro institucional para o de-senvolvimento sustentável.

Em sua carta de princípios deresponsabilidade socioambiental,a postura do BB tem como premis-sa a crença na viabilidade de conci-liar o atendimento aos interessesdos acionistas com o desenvolvi-mento de negócios social e ecolo-gicamente sustentáveis.

Falta de mobilidade levaa pessoa a gastar quasetrês horas do dia notrânsito, ou seja, ummês por ano, diz Grajew

defende que a questão da mobili-dade urbana passa pela possibili-dade de se realizar as tarefas a pé,sem necessidade de transporte.

“A falta de mobilidade leva apessoa a gastar quase três horas dodia no trânsito, ou seja, um mêspor ano. As cidades devem ser pla-nejadas e ter ênfase total no trans-porte coletivo. Não sou contra acompra do carro, mas uma coisa éadquiri-lo, outra é usá-lo. É issoque tem de ser repensado.”

As montadoras, por sua vez, jáinvestem na parte que lhes cabe.Cerca de 40% dos novos modelosdo BMW Group, por exemplo, ofe-recem redução no consumo decombustível e, consequentemen-te, de emissões de até 23%. Na linhade produção, o BMW Group utilizacompostos à base de água na pin-tura dos carros, o que reduz 30% ouso de recursos naturais.

O BMW, que é um dos apoia-dores do evento, mostra cincoveículos elétricos e promoveações de test drive no Autódro-mo de Jacarepaguá.

A Vo l k s w a g e n do Brasil apresen-ta a nova versão do Fox BlueMo-tion, terceiro modelo da montado-ra a contar com o conceito Blue-Motion Technologies, que visa re-duzir o consumo de combustíveise emissões – os primeiros foram oPolo BlueMotion (abril de 2009) eo Gol G4 Ecomotion (abril de2010) – e que terá preço acessívelde mercado, cerca de 3% mais carodo que o Fox 1.6 atual.

Segundo a montadora, a utili-zação de pneus de baixa resistên-cia ao rolamento, os chamados"pneus verdes", que contémmaior quantidade de sílica nasua composição, associado a umaumento da pressão de enchi-mento, mostrou uma redução naresistência ao rolamento de 23%.

Já a PSA Peugeot Citroën vaiapresentar a tecnologia híbridadiesel HYbrid4 com o biodieseldo Projeto Biodiesel Brasil Abas-tecidos com biodiesel B30 paratestes, 100% vegetal e brasileiro.

A Nissan aposta no carro 100%elétrico, o Nissan Leaf que já foieleito o “Carro do Ano” na Euro-pa e “Carro Mundial do Ano” nosEstados Unidos. Atualmente,existem duas unidades de táxiNissan Leaf circulando na cidadede São Paulo em um projeto daPrefeitura para ter uma frota in-teira com esse perfil. Contudo, oautomóvel ainda não será co-mercializado no Brasil.

Em relação ao sistema de pro-dução mais sustentável, a Fordinaugurou um sistema avançadode tratamento de água na fábricade Taubaté, interior paulista, quedispensa produtos químicos epermite o reaproveitamento decerca de 2.500 m3 por mês paraabastecer o seu lago interno, usa-do como refúgio de animais sil-vestres. O reaproveitamento daágua evita o seu lançamento narede pública de esgoto, aliviandoa demanda sobre o sistema.

D I V U LG A Ç Ã O

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Jornal Valor --- Página 14 da edição "15/06/2012 1a CAD F" ---- Impressa por lmmorresi às 14/06/2012@17:38:24

F14 | Valor | Sexta-feira, 15 de junho de 20 1 2

Enxerto

Jornal Valor Econômico - CAD F - ESPECIAIS - 15/6/2012 (17:38) - Página 14- Cor: BLACKCYANMAGENTAYELLOW

Giselle PaulinoPara o Valor, de São Paulo

Entre a Eco-92 e a Rio+20 muitacoisa mudou nas empresas. E tam-bém na percepção da sociedadeem relação a seu papel. “Costumodizer que existem empresas con-vencionais que olharam para seusprocessos de produção e mexeramem pontos importantes como con-sumo de água e de energia. Outrasmais avançadas fizeram inovaçõestecnológicas. Hoje, algumas em-presas já nascem com propostastotalmente inovadoras com inves-timentos em produtos verdes”, dizo Virgílio Viana, superintendentegeral da Fundação Amazônia Sus-tentável (FAS).

Na definição do Pnuma, a eco-nomia verde é aquela “que resultaem melhoria do bem estar huma-no e da equidade social enquantoreduz riscos ambientais e escasseze c o l ó g i c a .” Mas para que essa eco-nomia mais inclusiva realmentedecole, as empresas precisam setornar mais criativas e buscar ne-gócios sustentáveis em outras par-tes do Brasil. “É preciso que o setorempresarial saia da posição deconforto dos centros de São Pauloe olhe para o conjunto de oportu-nidades que estão na Amazônia. Sebons negócios não forem feitos naregião, haverá espaço para ativida-des insustentáveis”, alerta Viana.Em sua visão, faltam investimentosnas cadeias produtivas da florestacomo o cacau, a borracha, pesca-do, entre outros.

Mas se por um lado as empresasse tornam protagonistas na solu-ção de problemas, por outro, algu-mas ONGs saem da posição de

confronto — assumida duranteanos — e passam a ter um compor-tamento de parceiras na constru-ção de novos caminhos e na trans-ferência de conhecimentos para asempresas. “Vivemos um momentomais interessante com as empre-sas. Nos últimos 15 anos, houveuma clara evolução na relação en-tre empresas e ONGs”, diz AndréGuimarães, diretor-executivo daConservação Internacional. “AsONGs tinham o papel de criticar,apontar problemas e questões que

precisavam ser trabalhadas. Essaposição foi fundamental. Mas ho-je, empresas e ONGs buscam umobjetivo mais comum”, diz.

“Entendemos que há um meiotermo a ser preenchido”, diz AnaCristina Barros, representantenacional da The Nature Conser-vance (TNC). “As parcerias têm si-do eficientes para os objetivos dap r e s e r v a ç ã o.”

Um exemplo emblemático decomo as parcerias podem funcio-nar é a mobilização de governo,

ONGs e produtores rurais no Esta-do do Pará com o objetivo de freara degradação da Floresta Amazô-nica causada pela agropecuária. Aarticulação reverteu os altos índi-ces de desmatamento. Em 2010,graças a mobilizações, o municí-pio de Paragominas, no Pará, saiuda lista suja do desmatamento dogoverno federal. O caso inspirou acriação da rede de municípios ver-des, que replicou o modelo decombate ao desmatamento.

Ainda assim, para as ONGs, a

pressão sobre as empresas conti-nua importante para o avanço dasustentabilidade. “Ter uma socie-dade civil forte e atuante é funda-mental se o país quiser ver mu-danças”, acredita Marcelo Furta-do, diretor-executivo do Green-peace no Brasil.

A Moratória da Soja, firmadapela primeira vez em 2006, nas-ceu a partir da pressão da socie-dade civil, explica. Depois de de-núncias de que a soja consumidana Europa viria de áreas de des-

matamento ilegal na Amazônia,empresas declararam que deixa-riam de importar grãos prove-nientes de áreas do desmata-mento no Brasil. O acordo forçouos produtores a terem compro-missos mais responsáveis com omeio ambiente. Juntos, ONGs,governo e setor empresarial pas-saram a monitorar por imagensde satélite a região e a tirar domercado produtores que nãorespeitassem o ambiente. Hojeacredita-se que o cultivo da sojadeixou de ser o grande responsá-vel pelo desmatamento a Ama-zônia. “A pressão do mercadoainda é o mecanismo mais im-portante para mobilizar as em-presas”, diz Furtado.

“Sem pressão pesada, exposiçãode marca e riscos, as empresas nãomudam de comportamento” dizLeonardo Sakamoto, diretor daONG Repórter Brasil. O Pacto Na-cional pela Erradicação do Traba-lho Escravo no Brasil, que hojecongrega 230 empresas, é outroexemplo de pressão bem-sucedi-da. O pacto levou setores como oda soja, têxtil e do combustível aolharem para suas cadeia de pro-dução. “Foi um trabalho de parce-ria entre ONGs, governo e empre-sas que implementou ferramentaspara que o setor empresarial e a so-ciedade brasileira deixassem decomercializar produtos de forne-cedores que usaram trabalho es-cravo. Ele dá resultado porque ex-clui do mercado empresas que uti-lizam o trabalho escravo”, diz Sa-kamoto. “As ONGs devem se abrirpara o diálogo, mas não devemosceder em relação às metas e à natu-reza de acordos.”

Especial | Rio + 20

Te n d ê n c i a s Empresários que defendem a causasocioambiental veem melhorias graduais no cenário

Líderes esperamavanços reais quevalidem o discurso

DANIEL WAINSTEIN/VALOR

Penido: “A sociedade se qualificou e as escolas estão educando os quadros que se formaram em décadas passadas”

Marleine CohenPara o Valor, de São Paulo

Um banho de ciência e ummergulho na inovação. Só assimo Brasil se tornará apto a exibir ascredenciais de uma economia debaixo carbono e inclusão social.

É dessa forma que as princi-pais lideranças nacionais, enga-jadas com a questão da susten-tabilidade, entendem o rito depassagem que o país deve atra-vessar para ir além do “eloquen -te discurso verde” e usar sua“aguçada consciência ambien-tal” em prol de estabelecer osalicerces de um novo paradigmas o c i o e c o n ô m i c o.

“O roteiro de baixo carbono éinevitável no Brasil”, opina PedroPassos, copresidente do Conse-lho de Administração da NaturaCosméticos e membro do Institu-to Empreender Endeavor. Masdesenhar produtos e serviços in-teligentes, calcados na cultura doconsumir menos e fazer maiscom menos, requer dois pré-re-quisitos, segundo o empresário:“É preciso fazer agregação de va-lores” – ou seja, “conferir preço àágua e à árvore em pé”, taxandoou até mesmo sobretaxando odesperdício de matas ciliares,energia e demais recursos.

Mais que tudo, na visão de LuísNorberto Pascoal, presidente doGrupo DPaschoal, empresa deserviços automotivos, e da Funda-ção Educar DPaschoal, “é necessá-rio que a verdadeira inovação –aquela que imprime mudançasna empresa e provoca transfor-mações sociais e ambientais – sejauma iniciativa do CEO. Ela deveestar na agenda do presidente”.

Exemplos não faltam entre osempresários de vanguarda: naprópria Natura, uma das metasinternas, aplicada a toda a cadeiade produção, é usar álcool orgâ-nico na perfumaria, “vegetali -zando as fórmulas, substituindo

fontes não renováveis por outras,r e n o v áv e i s ”, explica Passos.

O redesenho dos negóciostambém permite integrar à ca-deia de produção e distribuição apopulação de baixa renda – emespecial aquela que colaboracom a coleta de insumos na flo-resta amazônica –, atenuando asdiferenças sociais mediante re-partição dos benefícios.

Na DPaschoal, o bordão repe-tido diversas vezes pelo principalgestor da rede – “uma sociedadeque desperdiça não é sustentá-vel” – deu lugar, a partir de 2007,a um novo modelo de negócios,ancorado no chamado ProgramaEconomia Verde. “Nas nossas lo-jas, os clientes são recebidos coma seguinte proposta: antes de tro-car um pneu ou uma peça, vamosavaliar se isso é realmente neces-s á r i o”, explica Pascoal.

Em muitos casos, ele afirma,basta uma orientação técnica,como, por exemplo, fazer umaboa calibragem dos pneus. Issoajuda a não desperdiçar gasoli-na. “Se cumprida, a calibragem

também permite uma economiade até 25% na vida útil de pneus,amortecedores, freios e baterias”,garante o empresário.

Este é, sem dúvida, o tipo de“ação que envolve o dia a dia dasempresas”, na opinião de FábioBarbosa, presidente executivo daAbril, quando se trata de encon-trar soluções para as questões so-

cioambientais a nível corporati-vo. Com passagem marcante pe-lo Banco Real, Barbosa afirmaque implantar critérios socioam-bientais nas análises de riscos dasinstituições financeiras podiaparecer sem sentido, há uma dé-cada – “e nós fomos muito criti-cados por isso, mas sabíamos queera o caminho certo a tomar. Ho-je, várias instituições realizam omesmo processo”.

Esse tipo de iniciativa é, toda-via, “um trabalho de formiga”,avalia Luís Pascoal, apontandonovos e necessários parceirospara o efetivo avanço da susten-tabilidade: “Apesar de o Brasilestar indo tecnicamente bem,falta-lhe coerência política; me-tas claras, exequíveis, lógicas. Pa-ra crescer gastando menos e en-tregando mais, o Executivo e oParlamento devem participarmais”, pondera.

Para Pedro Passos, governo eempresários devem, de fato,abandonar resquícios de conser-vadorismo e promover algunsajustes: “Talvez os economistaspudessem ajudar a rever a formacomo medimos o Produto Inter-no Bruto”, sugere, explicandoque “não pode haver mudançade paradigma quando se atribuiuma importância zero aos recur-sos naturais”. Paralelamente aesse viés econômico, de precifi-cação do patrimônio ambiental,a inovação tecnológica e a cons-ciência ecológica são, na opiniãodo executivo, os ingredientesque podem dar amálgama àmoeda da sustentabilidade.

Para José Luciano Penido, pre-sidente do Conselho de Adminis-tração da Fibria Celulose, paraavançar, “basta que cada vezmais empresas assumam com-promissos públicos de perseguirresultados impactantes e pres-tem conta deles à sociedade”.

Otimista em relação ao posi-cionamento do Brasil, o executi-

vo argumenta que no ano 2000,“se tínhamos uma mão cheia deempresários entendendo e prati-cando os conceitos de sustenta-bilidade, era muito”. Hoje, avaliaele, “a sociedade se qualificouplenamente nesses temas e as es-colas de management estão edu-cando os quadros que se forma-ram em décadas passadas”.

Ao mesmo tempo, “há um sen-tido de urgência, um chama-mento novo para a economiaverde e a inclusão social”, e elesimpõem novas posturas: no seuRelatório de Sustentabilidade2011, a Fibria, líder mundial naprodução de celulose de eucalip-to, com capacidade produtiva de5,25 milhões de toneladas ao anoe uma base florestal total de1,077 milhão de hectares – dosquais 405 mil destinados à con-servação ambiental –, anuncioumetas públicas para 2025 que in-cluem reduzir em um terço a áreanecessária para produzir celulo-se, duplicar a absorção de carbo-no da atmosfera, hoje na faixa de21 milhões de toneladas, e dimi-nuir em 91% a quantidade de re-síduos sólidos industriais desti-nados a aterro. No ano passado, aempresa reaproveitou 40 mil to-neladas de resíduos sólidos, oque representou uma economia

Relação de ONGs e empresas ganha novos contornosSILVIA COSTANTI/VALOR

André Guimarães, diretor-executivo da Conservação Internacional: “Nos últimos 15 anos, houve uma clara evolução na relação entre empresas e ONGs”

“Na Natura, umadas metas é usarálcool orgânicona perfumaria,s u b st i t u i n d otodas as fontesnão renováveispor renováveis

de R$ 6,1 milhões.Também faz parte dos planos

da empresa ajudar a comunida-de a tornar autossustentáveis70% dos projetos de geração derenda que ela apoia.

Um deles, chamado Assenta-mentos Sustentáveis com Agro-florestas e Biodiversidade, resul-ta de parceria entre a empresa e ogoverno da Bahia, o Movimentodos Trabalhadores Sem-Terra

“Inovação econsciênciaecológica sãoingredientes quepodem daramálgama àmoeda das u st e n t a b i l i d a d e

(MST) e a Escola Superior de Agri-cultura Luiz de Queiroz da Uni-versidade de São Paulo(Esalq/USP). No mês passado, oprojeto lançou o marco funda-mental do Centro de Formação,Educação e Pesquisa em Agroflo-restas no Assentamento Jaci Ro-cha, localizado no municípiobaiano de Prado.

O programa tem como objeti-vo dar às famílias do Movimentodos Sem Terra assentadas na re-gião e a algumas comunidadesde municípios situados no extre-mo sul do Estado acesso à for-mação técnica, educacional e or-ganizacional para a produção dealimentos com base nos princí-pios agroflorestais e agroecoló-gicos e na organização social.

A iniciativa ilustra a análiseque tece o conselheiro do Institu-to Ethos de Empresas e Respon-sabilidade Social, Ricardo Young,acerca do momento atual: “Asempresas nacionais têm buscadoformas de trabalhar com a baseda pirâmide. A estratégia de de-senvolvimento do país ainda nãoé a economia verde, mas a pronti-dão está se disseminando nas es-tratégias de negócios, por contade um mercado mundial cadavez mais intolerante nas ques-tões socioambientais”.

E, por mais que o Brasil aindaesteja a meio caminho entre odiscurso efusivo e a postura con-servadora, as multinacionais es-tão aí, acredita Young, para ser-vir de “locomotiva da redefini-ção das premissas básicas daeconomia verde”, puxando ocomboio dos negócios rumo àsustentabilidade.