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o PRAD NO CONTEXTO DA RECUPERAÇÃO DAS BACIAS HIDROGRÁFICAS DO ESTADO DE SÃO PAULO RESUMO o texto apresentado contempla a necessidade de recuperação de áreas degradadas pela atividade minerária (especificamente pela extração de areia para construção civil) e sua relação com a recomposição do ambiente ribeirinho no Estado de São Paulo. Em linhas gerais são fornecidos no trabalho todos os aspectos envolvidos na recuperação dessas áreas, nos âmbitos federal, estadual e municipal. No decorrer do texto, são abordados alguns conceitos sobre a recomposição do ambiente ribeirinho já amplamente discutidos na literatu- ra. Além dessas informações, o trabalho também forne- ce uma análise da distribuição dosPlanos de Recuepração de Áreazs Degradadas (PRAD's) protocolados na SMA de outubro de 1989 a dezembro de 1991 , nas diferentes regiões do estado de São Paulo, identificando a região leste do estado como a de maior ocorrência desses empreendimentos. São relacionados os principais fato- res que contribuem para esta concentração, quais se- jam: geológicos, geomorfológicos e econômicos. É ain- da apresentada a atuação do Departamento de Avalia- çãode ImpactoAmbiental- DAIAnaanálisedos PRAD's, salientando anecessidade de um enfoque regional para a avaliação desses documentos, visando sua concor- dância com as leis ambientais em vigor e, sobretudo, com os programas ambientais de cada bacia hidrográfica do estado de São Paulo. Palavras-chave: plano de recuperação, recuperação, mineração, mata ciliar, 1 INTRODUÇÃO Um dos objetivos do presente trabalho é trazer mais uma vez à discussão um tema ainda pouco incor- porado nas avaliações do impacto ambiental que é a questão dos recursos minerais como integrantes da ecodiversidade, o que significa enfatizar a importância da problemática da mineração nos programas institucionais de recuperação dos recursos ambientais. (1) Secretaria do Meio Ambiente do Estado de São Paulo CPLAjOAIA - Mineração. Maria Cristina de O. L. MURGEL1 Maria Aparecida de M. G. PEREIRA1 Ricardo Magalhães SIMONSEN1 Hilda R. TEIXEIRA1 Neide ARAUJ01 Elzira Dea BARBOUR1 Lúcia M. SOLDA TELLl1 ABSTRACTS The presented text shows the necessity of reclamation of degradated areas through mining (specifically through sand exploration used for civil construction) and its relation with the reclamation of the riverside environment in the State of São Paulo. In general lines, this presentation offers ali envolved legal aspects in the rehabilitation of these areas, at federal, state and municipal leveI. This presentation also shows an analysis of PRAD's - Plano de Recuperação de Áreas Degradadas - Reclamation Plan for Deqradated Areas, entered in the Secretaria do Meio Ambiente from october 1989 to december 1991 in the different regions of the State of São Paulo.ln the east region one can identifythe greatest occurence of these projects. The main factors which contribute for this concentration are discussed, specially the fisical (geological and geomorphological) and economic characteristics. The activity developed in the Environmentallmpact Assesment Department in the analysis of the PRAD's, stressing the need for a regional strategy for the analysis of these documents according to the environmental legislation, specially with the environmental programs for each hydrographic basin of the State of São Paulo. Key words: reclamation, rehabilitation, mining, gallery forest. Os bens minerais provêem de ambientes geológi- cos que não se podem reproduzir na escala de tempo ou na velocidade das atividades econômicas. Dessa limita- ção decorre a condição de não renovabilidade dos recur- sos minerais e o caráter patrimonial atribuindo a suas dotações. Assim, uma das características dos recursos mine- rais é a sua rigidez locacional e a distribuição aleatória dos seus jazimentos, razão pela qual os empreendimen- Anais - 2º Congresso Nacional sobre Essências Nativas - 29/3/92-3/4/92 937

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o PRAD NO CONTEXTO DA RECUPERAÇÃO DASBACIAS HIDROGRÁFICAS DO ESTADO DE SÃO PAULO

RESUMOo texto apresentado contempla a necessidade de

recuperação de áreas degradadas pela atividademinerária (especificamente pela extração de areia paraconstrução civil) e sua relação com a recomposição doambiente ribeirinho no Estado de São Paulo. Em linhasgerais são fornecidos no trabalho todos os aspectosenvolvidos na recuperação dessas áreas, nos âmbitosfederal, estadual e municipal. No decorrer do texto, sãoabordados alguns conceitos sobre a recomposição doambiente ribeirinho já amplamente discutidos na literatu-ra. Além dessas informações, o trabalho também forne-ce uma análise da distribuição dosPlanos de Recuepraçãode Áreazs Degradadas (PRAD's) protocolados na SMAde outubro de 1989 a dezembro de 1991 , nas diferentesregiões do estado de São Paulo, identificando a regiãoleste do estado como a de maior ocorrência dessesempreendimentos. São relacionados os principais fato-res que contribuem para esta concentração, quais se-jam: geológicos, geomorfológicos e econômicos. É ain-da apresentada a atuação do Departamento de Avalia-çãode ImpactoAmbiental- DAIAnaanálisedos PRAD's,salientando anecessidade de um enfoque regional paraa avaliação desses documentos, visando sua concor-dância com as leis ambientais em vigor e, sobretudo,com os programas ambientais de cada bacia hidrográficado estado de São Paulo.

Palavras-chave: plano de recuperação, recuperação,mineração, mata ciliar,

1 INTRODUÇÃO

Um dos objetivos do presente trabalho é trazermais uma vez à discussão um tema ainda pouco incor-porado nas avaliações do impacto ambiental que é aquestão dos recursos minerais como integrantes daecodiversidade, o que significa enfatizar a importânciada problemática da mineração nos programasinstitucionais de recuperação dos recursos ambientais.

(1) Secretaria do Meio Ambiente do Estado de São Paulo CPLAjOAIA - Mineração.

Maria Cristina de O. L. MURGEL1Maria Aparecida de M. G. PEREIRA1Ricardo Magalhães SIMONSEN1Hilda R. TEIXEIRA1Neide ARAUJ01Elzira Dea BARBOUR1Lúcia M. SOLDA TELLl1

ABSTRACTSThe presented text shows the necessity of

reclamation of degradated areas through mining(specifically through sand exploration used for civilconstruction) and its relation with the reclamation of theriverside environment in the State of São Paulo. Ingeneral lines, this presentation offers ali envolved legalaspects in the rehabilitation of these areas, at federal,state and municipal leveI. This presentation also showsan analysis of PRAD's - Plano de Recuperação de ÁreasDegradadas - Reclamation Plan for Deqradated Areas,entered in the Secretaria do Meio Ambiente from october1989 to december 1991 in the different regions of theState of São Paulo.ln the east region one can identifythegreatest occurence of these projects. The main factorswhich contribute for this concentration are discussed,specially the fisical (geological and geomorphological)and economic characteristics. The activity developed inthe Environmentallmpact Assesment Department in theanalysis of the PRAD's, stressing the need for a regionalstrategy for the analysis of these documents according tothe environmental legislation, specially with theenvironmental programs for each hydrographic basin ofthe State of São Paulo.

Key words: reclamation, rehabilitation, mining, galleryforest.

Os bens minerais provêem de ambientes geológi-cos que não se podem reproduzir na escala de tempo ouna velocidade das atividades econômicas. Dessa limita-ção decorre a condição de não renovabilidade dos recur-sos minerais e o caráter patrimonial atribuindo a suasdotações.

Assim, uma das características dos recursos mine-rais é a sua rigidez locacional e a distribuição aleatóriados seus jazimentos, razão pela qual os empreendimen-

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tos minerários apresentam peculiaridades que os dife-renciam de outras atividades produtivas.

Sendo a mineração uma indústria extrativa, é ine-rente ao desenvolvimento de suas atividades a apropri-ação de outros recursos naturais, como a água e o solo,o que acarreta uma degradação na base dos recursos.

Assim sendo, a recuperação das áreas degrada-das pela mineração, ou o retorno do sítio degradado auma forma de utilização, implica no desenvolvimento demodelos de manejo ambiental que visem à conservaçãoda base de recursos, de acordo com um plano pre-estabelecido para o uso do solo.

Esses objetivos exigem formações de naturezatécnica-científica que começam a ser explicitadas naspreocupações com a "Caracterização ambiental" conti-das nos ElA/RI MAS, reconhecidamente insuficientes parauma avaliação dos custos ambientais decorrentes daapropriação de recursos envolvida na atividade proposta.No caso da mineração, por exemplo, há dificuldade paraum "diagnóstico ambiental" em áreas complexas, comoas planícies aluviais de sedimentação recente.

Do ponto de vista da cadeia produtiva, há dificulda-de para lidar com os fatores indiretos do impactoambiental, como a demanda de bens minerais, o queacarreta um desequilíbrio na distribuição dos custos derecuperação.

A experiência das últimas duas décadas demons-tra que o desenvolvimento de políticas conservacionistasna produção mineral vem implicando não só no estabe-lecimento de critérios mais seletivos para a lavra mineral,com base no aparecimento de novas tecnologias demanejo ambiental, mas também uma maior eficiência nouso dos materiais, o que resulta uma diminuição naintensidade do uso das matérias-primas minerais, combenefícios globais para todo o sistema produtivo.

No momento, a equipe técnica de mineração daCPLA/DAIA vem trabalhando não só no inventário dasáreas a serem recuperadas, mas também na fixação doscritérios técnicos para análise dos estudos e projetos derecuperação das áreas degradadas apresentados pelosempreendedores em cumprimento à Resolução SMA018 de 23.10.89.

A etapa seguinte deverá ser a articulação dessescritérios com as exigências formais de recuperação decada bacia hidrográfica, considerando ser essa uma daspolíticas estratégicas da SMA.

2 ASPECTOS LEGAIS

Do ponto de vista legal, a necessidade de recupe-ração ambiental de áreas degradadas por atividades demineração é contemplada e disciplinada por uma sériede disposições federais, estaduais e municipais.

No âmbito federal tem-se:a) a Constituição da República Federativa do Bra-

sil, que no artigo 225, parágrafo 2°, estipula que "aqueleque explorar recursos minerais fica obrigado a recuperaro meio ambiente degradado, de acordo com a soluçãotécnica exigida pelo órgão público competente";

b) a Lei Federal 6938/81, que dispõe sobre a

Política Nacional do Meio Ambiente, que em seu artigo2°, inciso VIII, estabelece que a recuperação de áreasdegradadas é um dos meios para se atingir os objetivosdefinidos nesta lei;

c) o Decreto Federal 97632 de 10/04/89, queobrigou os empreendimentos minerários a apresenta-rem o Plano de Recuperação de Área Degradadas -PRAD - juntamente com o ElA/RIMA, estabelecendo,também, que os empreendimentos já licenciados deve-riam apresentar o PRAD num prazo de 180 dias após apublicação do referido decreto;

No âmbito estadual, o estado de São Paulo, atra-vés da Secretaria do Meio Ambiente - SMA, consideran-do o disposto no Decreto Federal 97632/89 e a sistemá-tica adotada neste estado para o cumprimento da Reso-lução CONAMA 01/86, publicou em 23/10/89 a Resolu-ção SMA 018, pela qual estabeleceu que:

a) os empreendimentos minerários em processode licenciamento devem anexar ao ElA/RIMA o respec-tivo PRAD;

b) os empreendimentos já existentes e devidamen-te licenciados pela CETESB devem apresentar o PRADà regional da CETESB, nos termos estabelecidos noDecreto Federal.

Para efeito do cumprimento dos aspectos técnicosestabelecidos no Decreto Federal 97632/89, a Resolu-ção SMA 018/89 indica um roteiro básico de elaboraçãodo PRAD, que considera os critérios genéricos a seremadequados à especificidade de cada empreendimento.Basicamente, um PRAD deve conter: I) o histórico daárea; 11) a caracterização do sítio do empreendimento edo entorno imediato, contemplando os aspectos físicos,bióticos e sócio-econômicos; 111) a caracterização doempreendimento, indicando o método de lavra, o planode lavra, a vida útil, etc.; IV) as medidas adotadas paraamenizar os efeitos advindos da atividade; e V) odetalhamento do plano proposto, discriminando o usofuturo, o projeto de revegetação, o destino dos rejeitos e,a configuração final da área.

Assim, a partir de outubro de 1989, o PRAD passoua integrar o procedimento de licenciamento da atividademinerária no Estado de São Paulo, conforme mostradona FIGURA 1.

Cabe ressaltar que a análise técnica do PRADéderesponsabilidade da SMA e que para a efetiva aprovaçãoe implantação de um dado plano este deve estar emconformidade com uma série de disposições legais,estabelecidas pelas diferentes esferas do poder público,tais como:

a) o Código Florestal, Lei 4771/65, alterada pelaLei 7883/89, que, em seu artigo 2°, determinacomo de preservação permanente as florestas edemais formas de vegetação natural situadasao longo de qualquer curso d'água, ao redor delagos naturais ou artificiais, das nascentes, emtopo de morro, em encostas com inclinaçãosuperior a 45°, nas restingas como fixadoras dedunas ou estabilizadoras de mangues, nas bor-das de tabuleiros ou chapadas e em altitudessuperiores a 1800 m, entre outras;

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PROTOCOLO TEn LIC.DO~

CETESB NAO EPRAD NA OU DISP. ANTERIORSM DE LIC.? 1977 ?

SIn SIn

SMANALISEDOPRAD

FATOS MARCANTES

HAO APRRESEN-TACAO DEEIA-RlnA- •••••PRAD

HAO EANTERIOR1986?

SIn

a:rISB IINICIOPROCESSOLICENCIAn •• =_----------

- LEI 997/76 (REGULAMENTADA PELO DEC.8.468/76)- RESOLUÇÃO CONAMA 00~/86- DECRETO 97.632/89- RESOLUÇÃO SMA ~8/89

FIGURA 1 - Fluxograma para regularização dos PRAD's perante a resolução SMA 18/89

b) a Resolução CONAMA 04/85, que definiu comoreserva ecológica as áreas de preservação permanenteestabeleci das pelo Código Florestal;

c) a Resolução CONAMA 20/86, para a classifica-ção das águas doces, salobas e salinas;

d) a Lei 997, que dispõe sobre os padrões delançamento de efluentes industriais em drenagens natu-rais, e o Decreto 8468/76, que a regulamentou;

e) as Normas Técnicas da CETESB; ef) outras disposições legais de órgãos federais e

estaduais, como o DAEE, o SDR e o CONDEPHAAT,além das diversas Leis Orgânicas Municipais.

3 A EXTRAÇÃO DA AREIA E O MEIO AMBIENTE

Dentre os inúmeros empreendimentos mineráriosocorrentes no Estado de São Paulo, a extração de areiapara a construção civil tem, nos últimos anos, chamadoatenção dos órgãos de controle e fiscalização ambiental,pela intensa disseminação deste tipo de atividade, con-centrada principalmente na região leste do Estado e,sobretudo, pelos danos ambientais que tem causado.

Os portos de areia, ou também os chamadosareeiros, utilizam basicamente dois métodos de lavra: adragagem e o desmonte hidráulico.

A dragagem é utilizada para a retirada do materialdo leito dos corpos d'água ou de cavas submersas. Já o

desmonte hidráulico consiste no uso de um jato d'águasobre o corpo do minério para efetuar seu desmonte.Neste caso, forma-se uma polpa de água, rejeito eminério, que é tratada para a efetiva separação da areiadas demais fases.

Como exemplo dos impactos ambientais causadospor esses dois métodos de extração tem-se, entre ou-tros:

a) o desmatamento;b) o rebaixamento do leito com modificação do

regime hidráulico;c) o incremento da taxa de erosão pela modifica-

ção do regime;d) a possibilidade de criação de pontos de erosão

concentrada (ravinas e voçorocas);e) a perda do solo vegetal;f) a poluição (sólidos em suspensão) e

assoreamento da coleção hídrica superlicialpelos finos da mineração;

g) a modificação das características ecológicas docorpo d'água pela remoção dos sedimentos defundo;

h) a perda da mata ciliar, tanto pela ocupação dasmargens quanto pelo eventual solapamento dasmesmas;

i) a formação de grandes lagoas originadas dascavas de extração;

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j) a descaracterização da paisagem, pela perda epela criação de grandes taludes de solo e cons-trução de bacias de decantação de finos;

k) o barramento de drenagens secundárias; eI) a apropriação de água superficial para o

jateamento e beneficiamento.De um modo geral, os impactos listados são colo-

cados como de pouca relevância quando se considera aação de um empreendimento isolado, sobretudo, devidoà pequena área de abrangência de cada um deles.Entretanto, verifica-se que a ação conjunta de uma sériede vários portos de areia em uma dada região propicia aoaparecimento de um efeito cumulativo de degradação,muitas vezes superior à capacidade de absorção domeio, podendo até causar o rebaixamento do nível do rio.

Especificamente em relação à perda das matasciliares remanescentes, com base nos casos analisa-dos, pode-se inferir que, particularmente no caso daextração em leito de rio, em cada empreendimentoperde-se, em média, cerca de 50 - 60 m de extensão damata nos chamados pátios de beneficiamento, o quesignificaria 2500 - 3000 m2 da faixa de preservaçãopermanente nos rios de 50 m de largura e 5000 - 6000 m2

nos rios com mais de 50 m de largura.Além das áreas de mata ciliar perdidas nos chama-

dos pátios de beneficiamento, deve-se computar tam-bém as áreas dessa formação que eventualmente seperdem ao longo do chamado trecho de extração emfunção de solapamentos das margens, bem como aremoção da vegetação das planícies aluviais e meiaencostas, onde ocorre a extração, de areia pelo métodode escavação, drenagem e desmonte hidráulico.

4 A RECUPERAÇÃO DAS ÁREASDEGRADADAS

o objetivo do PRAD é devolver ao sítio degradadouma condição estável em conformidade com os valoresambientais, estéticos e sociais da circunvizinhança, deforma que o local recuperado tenha condições mínimasde estabelecer uma nova forma de uso.

A recuperação ambiental de uma área alteradapela atividade minerária abrange diversos aspectos, taiscomo: o controle da qualidade dos recursos hídricossuperficiais e subterrâneos, de maneira a garantir, nomínimo, a manutenção dos padrões que atendam ao seuuso anterior; o controle das emissões atmosféricas, demodo a manter a qualidade do ar; e o tratamentoadequado do solo, considerando os aspectos físicos ebióticos.

Como parte dos projetos freqüentemente propos-tos para a recuperação de áreas degradadas para em-preendimentos minerários tem-se a revegetação, queenvolve a preparação de um substrato, seguida pelaimplantação de uma comunidade vegetal que pode serconstituída por espécies autóctones ou alóctones, (noscasos em que o objetivo da recuperação é a simplesestabilização do terreno).

Em relação aos portos de areia do estado de SãoPaulo, verifica-se que as principais áreas a serem recu-peradas constituem basicamente as chamadas áreas depreservação permanente ao longo dos cursos d'água. Arecuperação destas áreas deve atender à legislação(Código Florestal e Resolução CONAMA 04), comotambém evitar a intensificação de processos de degra-dação, tais como a erosão das margens e o assoreamentodos corpos d'água.

Independente do uso futuro proposto para essasáreas, a imediata recuperação da faixa de preservaçãopermanente constituirá uma valiosa contribuição à prote-ção do recurso hídrico contra o assoreamento, além daimportância intrínseca desta medida na reconstituiçãodo equilíbrio ecológico local regional.

Segundo KAGEYAMA (1987), a recomposição dematas ciliares visa obter duas classes de benefíciosambientais distintas, mas não excluentes:

I) serviços ambientais abióticos, principalmenteaqueles voltados à função hidrológica da cobertura flo-restal e

11) serviços bióticos, voltados aos organismos dafloresta. Para efetiva implantação e recuperação dessasáreas, é preciso considerar as características das dife-rentes espécies no processo de sucessão, desde a fasede pioneiras até a de clímax.

O conhecimento das características florísticas efitossociológicas das florestas nativas de cada região doestado é fundamental para o melhor entendimento dacomposição a ser recuperada. Do mesmo modo, osaspectos biológicos das diferentes formas utilizadas, taiscomo a existência de dormência, as exigências para agerminação e a manutenção das sementes, são informa-ções necessárias para garantir a viabilidade dos planospropostos.

Além dos aspectos de caráter biológico, deve-seconsiderar também os condicionantes físicos, tais comoas características climáticas e topoclimáticas; os níveisde fertilidade do solo e sua textura; e o regime hídrico daregião. Na medida do possível, esses dados devem serinvestigados em áreas com níveis de degradação dife-rentes, de maneira a estabelecer modelos adequados derecuperação.

Cumpre salientar que a busca de um modeloadequado decorre da inerente complexidade do ambien-te ribeirinho. Obviamente, num dado rio, as característi-cas desse tipo de ambiente dependem diretamente dosaspectos geológicos, geomorfológicos, edáficos,hidrológicos e hidrográficos locais e regionais.

No estado de São Paulo existem vários tipos devárzeas e planícies aluviais e terraços de diferentesaltitudes e idades de formação. Ao longo de um mesmorio encontram-se trechos encaixados em terrenos detopografia acidentada, bem como trechos meadrantessobre extensas planícies. Assim, dependendo damorfologia do vale, pode-se encontrar formações flores-tais compostas por espécies vegetais peciliares, alta-mente dependentes da água, ou, de outra forma, forma-ções justafluviais, que são parte das florestas originaiscircundantes.

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Nesse sentido, entende-se que qualquer plano derecuperação de área degradada que compreenda arecomposição do ambiente ribeirinho deverá levar emconta as características locais e regionais das áreas aserem recuperadas.

5 A DISTRIBUiÇÃO DOS PRAD'S DE PORTODE AREIA DENTRO DO ESTADO DE SÃOPAULO

A FIGURA 2 mostra a distribuição dos PRAD's deportos de areia protocolados na SMA, de outubro de1989 a dezembro 1991 ,nas diferentes zonas hidrográficasdo estado de São Paulo estabelecidas pelo DAEE (DAEE,1968; CETESB 1990).

Verifica-se que a distribuição desses empreendi-mentos nas referidas zonas se dá de maneira heterogê-nea, sendo que cerca de 84% desses documentosreferem-se aáreas localizadas nas unidades hidrográficasda região leste do estado de São Paulo: Alto Tietê,Jaguari, Jundiaí, Piracicaba, Sorocaba, Tietê MédioSuperior, Paraíba do Sul, Moji-Guaçu e Pardo.

A maior ocorrência desta atividade minerária nessaregião do estado deve-se à conjugação de diversosfatores, quais sejam:

a) GEOLÓGICOS: a existência de rochas cristali-nas que originam sedimentos arenosos ocorrentes emplanícies aluvionares ou em depósitos sedimentaresmais antigos (freqüentes na Região Metropolitana deSão Paulo);

b) GEOMORFOLÓGICOS: a ocorrência de valesabertos, permitindo o desenvolvimento de extensas pla-nícies aluviais, isto é, terrenos baixos e mais ou menosplanos junto às margens dos rios sujeitos periodicamen-te a inundações, dependendo da área - fonte essas

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planícies aluviais são constituídas por areiasinconsolidadas de granulação variável, argila ecascalheiras;

c) ECONÔMICOS: a maior proximidade das reser-vas aos centros consumidores, o que barateia o custofinal do produto.

Do ponto de vista ambiental, a intensa dissemina-ção da extração de areia nessa região tem, ao longo dosanos, gerado inúmeros conflitos, tais como:

a) a localização de empreendimentos em áreasdecretadas de preservação permanente;

b) a localização de empreendimentos junto a im-portantes mananciais metropolitanos, tais como os dasbacias do Guarapiranga e Alto Tietê;

c) a existência desta atividade dentro dos limites deunidades de conservação decretadas pela União, estadoou municípios, tais como a APA do Piracicaba, do Tietê,etc.

d) a interferência direta com outros usos do solo,como, por exemplo, a horticultura, loteamentos urbanose de lazer;

e) o comprometimento da qualidade da água emcursos utilizados para a captação pública; e

f) o incremento da taxa de assoreamento, acarre-tando problemas de enchentes.

6 A ATUAÇÃO DO DAIA

Diante do exposto, a Secretaria do Meio Ambientedo Estado de São Paulo, através do Departamento deAvaliação de Impacto Ambiental - DAIA, tem procuradoestabelecer um procedimento de análise dos PRAD'sque leve em conta os condicionantes ambientais dossítios aserem recuperados e, sobretudo, sua inserção nocontexto regional.

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FIGURA 2 - Distribuição dos PRAD's protocolados na SMA de ouV89 a dezj91 por zona hidrográfica

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FIGURA 3 - Porcentagens dos PRAO's protocolados na SMA por zona hidrográfica no período de outj89 a dez/91

Para tanto, num primeiro momento, foi computadoo número de empreendimentos de cada bacia hidrográfica,bem como o tipo de extração e sua localização municipal,de maneira a verificar a situação da atividade mineráriaem cada região.

Para uma primeira experiência na análise regionaldos PRAO'sfoi escolhidaabaciahidrográficadorio Moji-Guaçu, não só pelo grande número de empreendimen-tos já existentes, mas também por sua importância am-biental, já objeto de proteção pela Lei Estadual 7641 /91.

A análise preliminar desses documentos constatouque, embora se trate sempre do mesmo tipo de empre-endimento, situados ao longo de um mesmo rio, asinformações constantes dos PRAO's são pontuais elimitadas, variando bastante de um documento a outro,tanto em função de sua qualidade técnica, quanto no queconcerne aos aspectos abordados.

Em função da precariedade das informações apre-sentadas, a equipe de mineração do OAIA procurou,através de estudos pré-existentes e de vistorias à área,diagnosticar as principais características dessa bacia ea relação da atividade de extração de areia com os

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diferentes aspectos naturais e ocupacionais da mesma.Assim, verificou-se que no trecho compreendido

pelos municípios de Itapira, Moji-Mirim, Moji-Guaçu,Araras, Leme e Pirassununga ocorre uma grande con-centração deste tipo de empreendimento (cerca de 20),sendo que em alguns locais os chamados "trechos deextração" são contíguos e os pátios de beneficiamentoguardam entre si alguns poucos quilômetros.

O uso do solo dessa região da bacia hidrográfica dorio Moji-Guaçi é representado, principalmente, pelo cul-tivo de cana-de-açúcar, seguido de citrus e refloresta-mento, além de uma intensa industrialização.

Especificamente no trecho entre os municípios deMoji-Mirim e Leme foi observada uma grande concentra-ção de ranchos de pescaria, em pequenos lotes, interca-lados pelos portos de areia. Nessa área, os maioresremanescentes da "mata ribeirinha" encontram-se pre-ferencialmente na margem direita do rio, sobretudo naEstação Ecológica de Moji-Guaçu. No restante da bacia,esta formação florestal restringe-se a pequenas man-chas, distribu ídas de forma aleatória ao longo do rio, semapresentar o mínimo de continuidade.

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TABELA 1 -Zonas hidrográficas do Estado de São Pauloe suas respectivas unidades

ZONAHIDROGRÁFICA

UNIDADES

1a. Alto Tietê.JaquariJundiaíPiracicabaSorocabaTietê Médio Superior

2a. ParanáTietê Médio Inferior

3a.4a. Paranapanema5a. Litoral Sul

Ribeira6a. Paraíba7a. Moji Guaçu

Pardo8a.9a. Rio Grande·

O conhecimento dessas informações possibilitama identificação dos principais conflitos entre a atividademinerária e a realidade ocupacional dessa região, po-dendo-se citar, entre outros:

a) a localização de empreendimentos em áreas depreservação permanente;

b) a coexistência dessa atividade com áreas des-tinadas ao lazer (ranchos de pescaria);

c) a proximidade dessa atividade a perímetrosurbanos; e

d) a interferência dessa atividade com áreas des-tinadas à agricultura.

Ressalta-se que, em relação à faixa de preserva-ção permanente, todos os empreendimentos analisadospossuem seus pátios de beneficiamento dentro destafaixa, sendo que em alguns a distância das pilhas de es-tocagem e lavagem de areia a margem não atinge 15 m.

Em função desse "quadro", a equipe do DAIA tembuscado estabelecer critérios técnicos que possibilitem,se não solucionar, minimizar esses conflitos.

Numa primeira etapa, pretende-se uniformizar asinformações constantes dos PRAD's, de maneira quepara cada sítio a ser recuperado se tenh~ o grau dedegradação atual e futuro, avaliado em funçao da carac-terização dos mesmos parâmetros físicos e bióticos.

Ainda que cada sítio possua o seu projeto derecuperação em função de suas peculiaridades físicas eoperacionais, a visão conjunta das diferentes áreasdegradadas será importante, na medida em que estapossibilitará discriminar as diretrizes básicas para apro-vação, implantação e fiscalização desses planos, taiscomo tamanho da faixa de preservação permanente a

ser recuperada, principais espécies vegetais a seremutilizadas na recomposição, a escala temporal dessesprojetos, a forma de monitoramento mais adequada, etc .:

7 CONCLUSÕES

Considerações de ordem técnica e metodológicaverificam claramente que, para o estabelecimento detais diretrizes, o DAIA deverá buscar o apoio não só deoutros departamentos da SMA, como o DEPRN, mastambém de outros órgãos estaduais e municipais, comoa CETESB, DAEE, P.M., Secretaria da Agricultura, etc.

Como já dito, qualquer PRAD que venha a seraprovado pelo DAIA deverá estar em concordância comas leis ambientais em vigor, bem como com eventuaisprogramas de planejamento ambiental previstos para abacia do Moji-Guaçu, tais como:

a) gestão da apropriação de recursos hídricos;b) macrozoneamentos;c) planos diretores; ed) políticas industriais;

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