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UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ DEJAIR FOITTE O PODER DA AUTORIDADE POLICIAL NA TIPIFICAÇÃO DA PRISÃO EM FLAGRANTE QUANTO AO CRIME DE TRÁFICO DE DROGAS Biguaçu 2010

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UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ

DEJAIR FOITTE

O PODER DA AUTORIDADE POLICIAL NA TIPIFICAÇÃO

DA PRISÃO EM FLAGRANTE QUANTO AO CRIME

DE TRÁFICO DE DROGAS

Biguaçu

2010

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DEJAIR FOITTE

O PODER DA AUTORIDADE POLICIAL NA TIPIFICAÇÃO

DA PRISÃO EM FLAGRANTE QUANTO AO CRIME

DE TRÁFICO DE DROGAS

Monografia apresentada à Universidade do Vale do Itajaí – UNIVALI, como requisito parcial à obtenção do grau em Bacharel em Direito.

Orientador: Dr. Gilberto Callado de Oliveira

Biguaçu

2010

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DEJAIR FOITTE

O PODER DA AUTORIDADE POLICIAL NA TIPIFICAÇÃO

DA PRISÃO EM FLAGRANTE QUANTO AO CRIME

DE TRÁFICO DE DROGAS

Esta Monografia foi julgada adequada para a obtenção do título de bacharel e

aprovada pelo Curso de Direito, da Universidade do Vale do Itajaí, Centro de

Ciências Sociais e Jurídicas.

Área de Concentração: Direito Penal e Direito Processual Penal

Local, 22 de novembro 2010.

Prof. Dr. Gilberto Callado de Oliveira UNIVALI – Campus de Biguaçu

Orientador

Prof. MSc. Nome Instituição Membro

Prof. MSc. Nome Instituição Membro

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TERMO DE ISENÇÃO DE RESPONSABILIDADE

Declaro, para todos os fins de direito, que assumo total responsabilidade

pelo aporte ideológico conferido ao presente trabalho, isentando a Universidade do

Vale do Itajaí, a coordenação do Curso de Direito, a Banca Examinadora e o

Orientador de toda e qualquer responsabilidade acerca do mesmo.

Biguaçu, novembro de 2010.

Dejair Foitte

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AGRADECIMENTOS

Á Deus, pela vida e saúde recebida, ao longo desses anos, com a certeza

que nesta caminhada andamos sempre juntos.

A minha mãe Paula e ao meu pai Henrique Osvaldo (in memoriam), pela

vida concebida, pela educação recebida, e pelo apoio dado para se chegar ate essa

etapa de minha vida.

Em especial a minha esposa Claudia, pela ajuda e compreensão ao longo

da nossa vida em comum, e pelo esforço dedicado nestes cinco anos da nossa

caminhada acadêmica.

Aos meus filhos, Michell, Jairo e Jessyca, pela compreensão na ausência e

falta de atenção durante os cinco anos do curso.

A todos os professores, pelos ensinamentos passados e a dedicação

prestada para que nossos objetivos fossem alcançados ao longo desses cinco anos,

e fica a certeza que alem dos objetivos acadêmicos, fica uma amizade e carinho

lembrados para sempre.

O respeito e carinho para com todos os colegas de turma, pelo apoio e

incentivo recebido durante a jornada acadêmica, nos estudos e trabalhos solicitados,

que em muitos momentos em grupos foram realizados, também nas horas em que

juntos estávamos em encontros e festas realizados pela turma.

A Universidade do Vale do Itajaí, aos diretores, aos coordenadores, aos

professores, aos funcionários, pelos serviços prestados e compreensão para com

todos os acadêmicos do curso de Direito.

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RESUMO

Esta pesquisa tem como objetivo analisar o poder da autoridade policial na

tipificação do crime de tráfico de drogas em casos de prisão em flagrante delito. É

feita uma descrição do inquérito policial e suas características, bem como das

atribuições da policia judiciária, além da conceituação de ‘autoridade policial’. Esta

última tem a responsabilidade pela tipificação das condutas delitivas, seja no

inquérito policial, seja no auto de prisão em flagrante. Estudam-se também as

espécies de flagrantes e os sujeitos envolvidos. Por fim, avalia-se a opinio delicti

tanto da autoridade policial, quanto do Ministério Público, as quais, embasadas na

existência de fumus delicti comissi, podem justificar ou não a manutenção de uma

prisão preventiva. Quando a autoridade policial realiza um enquadramento típico de

uma conduta supostamente delituosa, se um usuário de entorpecentes for

erroneamente enquadrado como traficante, isso pode ter sérias e danosas

conseqüências para ele, tais como a impossibilidade de livrar-se solto por meio de

pagamento de fiança, além de não ter direito à liberdade provisória ou às benesses

da Lei 9.099/95, tais como a transação penal. Assim, deve-se considerar com

atenção o poder que o delegado tem para decidir, num curto espaço de tempo,

sobre o enquadramento típico de um indivíduo, haja vista que a Lei 11.343/06 é mais

severa com traficantes e mais branda com usuários que a legislação anterior.

Palavras-chave: Poder do Delegado; Prisão em Flagrante; Tráfico de Drogas.

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6

ABSTRACT

That text has as objective analyzes the authority policeman's power in the tipificação

of the crime of traffic of drugs in cases of prison in the act crime. It is made a

description of the inquiry policeman and your characteristics, as well as of the

attributions of the it polices judiciary, besides the conceituação of ' authority policial'.

This last one has the responsibility for the tipificação of the criminal conducts, be in

the inquiry policeman, be in the prison solemnity in the act. They are also studied the

species of instants and the involved subjects. Finally, the authority policeman's opinio

so much delicti is evaluated, as of the public prosecution service, the ones which,

based in the existence of fumus delicti comissi, they can justify or not the

maintenance of a protective custody. When the authority policeman accomplishes a

typical framing of a conduct supposedly delituosa, if an user of narcotics be framed

erroneously as trafficker, that can have serious and harmful consequences for him,

such as the impossibility of getting rid free through payment of bail, besides not

having right to the temporary freedom or the benesses of the Law 9.099/95, such as

the penal transaction. Like this, he/she should be considered with attention the power

that the police officer has to decide, in a short space of time, on an individual's typical

framing, have seen that the Law 11.343/06 is more severe with traffickers and more it

brandishes with users than the previous legislation.

Word-key: Power of the Police officer; Prison in the act; Traffic of Drugs.

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“O homem que aspira à perfeição moral, ocupa-se da virtude; o

homem não comprometido com os valores morais, pensa

apenas na sua acomodação na terra; o homem ético pensa

apenas nos deveres e sanções; o homem sem ética pensa

apenas nos seus direitos e benefícios.”

(CONFÚCIO)

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ROL DE ABREVIATURAS OU SIGLAS

Arts. - Artigos

CC/02 - Código Civil Brasileiro de 2002

CP - Código Penal

CPP - Código Processo Penal

CF/88 - Constituição da República Federativa do Brasil de 1988

CRFB/1988 - Constituição da República Federativa do Brasil de 1988

MP - Ministério Público

STJ - Superior Tribunal de Justiça

STF - Supremo Tribunal Federal

VPI - Verificação da Procedência das Informações

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ..........................................................................................................11

1 DO INQUÉRITO POLICIAL.........................................................................13

1.1 ORIGEM E CONCEITO DO INQUÉRITO POLICIAL..................................13

1.2 POLÍCIA JUDICIÁRIA: COMPETÊNCIA E ATRIBUIÇÃO...........................17

1.3 CARACTERÍSTICAS DO INQUÉRITO POLICIAL ......................................19

1.3.1 Formalismo..............................................................................................19

1.3.2 Sigilo ........................................................................................................20

1.3.3 Oficialidade..............................................................................................21

1.3.4 Obrigatoriedade.......................................................................................21

1.3.5 Indisponibilidade.....................................................................................21

1.3.6 Unidirecionalidade ..................................................................................22

1.3.7 Inquisitoriedade.......................................................................................24

1.3.8 Outras características.............................................................................27

1.4 INSTAURAÇÃO DO INQUÉRITO POLICIAL..............................................28

1.4.1 De ofício ...................................................................................................30

1.4.2 Requisição ...............................................................................................32

1.4.3 Requerimento ..........................................................................................33

1.5 ENCERRAMENTO DO INQUÉRITO POLICIAL .........................................33

1.5.1 Indiciamento ............................................................................................33

1.5.2 Diligências ...............................................................................................34

1.5.3 Relatório...................................................................................................37

1.6 ARQUIVAMENTO.......................................................................................39

1.6.1 Efeito do Arquivamento..........................................................................41

1.6.2 Arquivamento Indireto ............................................................................43

2 DO AUTO DA PRISÃO EM FLAGRANTE ..................................................45

2.1 PRISÃO E PREVISÃO CONSTITUCIONAL ...............................................45

2.2 CONCEITO DE PRISÃO EM FLAGRANTE................................................46

2.3 ESPÉCIES DE FLAGRANTE DELITO........................................................49

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2.3.1 Flagrante Delito Próprio .........................................................................49

2.3.2 Flagrante Delito Impróprio .....................................................................50

2.3.3 Flagrante Delito Presumido....................................................................51

2.3.4 Flagrante Preparado ...............................................................................52

2.3.5 Flagrante Esperado.................................................................................53

2.3.6 Flagrante Forjado....................................................................................54

2.3.7 Outros Flagrantes ...................................................................................54

2.4 SUJEITOS DO FLAGRANTE DELITO........................................................57

2.4.1 Sujeito Ativo (Condutor).........................................................................57

2.4.2 Sujeito Passivo (Conduzido)..................................................................57

2.4.3 Autoridade Policial..................................................................................59

2.5 AUTO DE PRISÃO EM FLAGRANTE.........................................................63

2.6 RELAXAMENTO DA PRISÃO EM FLAGRANTE........................................64

2.7 INCORRÊNCIA DE FLAGRANTE: ART. 317 DO cÓDIGO DE

PROCESSO PENAL ..................................................................................68

3 O PODER DA AUTORIDADE POLICIAL NA TIPIFICAÇÃO DO CRIME

DE TRÁFICO DE DROGAS........................................................................70

3.1 O PODER DA AUTORIDADE POLICIAL NA TIPIFICAÇÃO DO CRIME....70

3.1.1 Fumus delicti ...........................................................................................76

3.1.2 Relatório e tipificação final.....................................................................77

3.2 AUTORIDADE POLICIAL E MINISTÉRIO PÚBLICO..................................81

3.2.1 A Opinio delicti e a Autoridade Policial................................................83

3.2.2 A Opinio delicti e o Ministério Público ..................................................84

3.3 TIPIFICAÇÃO DO CRIME DE TRÁFICO DE DROGAS..............................86

3.3.1 O artigo 33 da Lei Antitóxicos................................................................86

CONCLUSÃO ...........................................................................................................89

REFERÊNCIAS.........................................................................................................92

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INTRODUÇÃO

A tipificação delitiva realizada pela autoridade policial nos casos em que o

indiciado se sujeita às condições previstas no art. 302, do Código de Processo

Penal, é o tema central desta monografia; levando em consideração a

excepcionalidade da efetuação da prisão, em virtude do previsto no art. 5º, inciso

LXI, da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 e, a nocividade da

restrição da liberdade individual do cidadão pelo enquadramento típico equivocado

feito pela autoridade policial, sobretudo, quando tal tipificação faz referência aos

artigos 28 e 33 da Lei 11.343/2006.

O Código de Processo Penal, no particular aspecto do art. 304 e seguintes,

prevê como atribuição da autoridade policial, quando da efetivação da prisão em

flagrante, dentre outras providências, a capitulação da infração penal que teria, em

tese, sido cometida, situação esta que, em determinados casos poderá resultar em

grave prejuízo ao conduzido.

Será estudado no presente trabalho monográfico as situações de privação

da liberdade, nos casos de flagrante delito, visando investigar os institutos jurídicos

aplicados às situações de prisão repentinas ao ato criminoso. Abordará, ainda, em

resumo, o tema central, sendo o poder da autoridade policial na tipificação delitiva

quanto ao crime de tráfico de drogas e seus consectários, diante da segregação em

flagrante.

O objetivo primeiro desse trabalho é avaliar as condições do flagrante delito

por crimes previstos pela Lei 11.343/06, propondo a linha de defesa dos indivíduos

arbitrariamente enquadrados como traficantes, em combate ao abuso de poder e à

tipificação errônea da prática delituosa.

A partir desses apontamentos, será dividida a monografia, para uma melhor

elucidação do objeto geral do presente trabalho, em três capítulos.

Principia-se o estudo no primeiro capítulo com a análise do inquérito policial.

Partirá o estudo dos modos de instauração da fase investigativa, partindo para os

princípios inerentes ao inquérito policial e suas principais características

disciplinadas no Código de Processo Penal.

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Em um segundo momento, seja no próximo capítulo, realizar-se-á à análise

da prisão em flagrante, sendo veiculado nesse momento as espécies de flagrante

delito contidas na lei penal adjetiva, bem como a formalidade exigida para a

confecção do auto de prisão em flagrante.

Por derradeiro, no terceiro capítulo, seguindo o método de abordagem

dedutivo, será abordado o objetivo principal do presente trabalho monográfico,

sendo o poder da autoridade policial na tipificação da prisão em flagrante quanto ao

crime de tráfico de drogas.

O método argumentativo utilizado é o dedutivo, que pressupõe a

racionalidade como linha mestra da busca pela verdade. O raciocínio dedutivo

permite, por exemplo, que se obtenha, de maneiras diferentes, a mesma afirmação.

Logo, é o método que se presta à busca de uma verdade ou da defesa de um ponto

de vista, a partir de argumentos e posicionamentos teóricos variados.

Quanto à metodologia empregada, optou-se para a condução desta

pesquisa técnicas de documentação indireta, através da pesquisa documental, como

os princípios contidos na Constituição da República Federativa do Brasil de 1988,

como também das Leis 9.099/95, 11.343/06, jurisprudências, entre outros; a

pesquisa bibliográfica em livros, artigos, jornais, internet e revistas que tem relação

com o tema em estudo, a fim de, alcançar os objetivos do presente trabalho.

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1 DO INQUÉRITO POLICIAL

1.1 ORIGEM E CONCEITO DO INQUÉRITO POLICIAL

O termo “inquérito” origina-se no latim quaeritare, cujo sentido é buscar,

inquirir, perguntar, indagar ou mesmo incluir algo ao que já se tem. Vê-se pois que, a

etimologia da palavra é semelhante ao seu atual uso no campo jurídico1.

O Inquérito Policial é um procedimento com aspectos administrativos e

inquisitórios. É realizado, em geral, com a finalidade de apurar infrações penais, bem

como, sua autoria. Historicamente, tivemos várias concepções para o que seria um

inquérito. No Egito, 4.000 a.C., o faraó designava um funcionário chamado de

“magiaí”, para castigar rebeldes, reprimir violentos, proteger cidadãos pacíficos

(funções mais próximas do que chamamos hoje de polícia), além de acolher pedidos

de homens, ouvir acusações e promover acareações com o objetivo de obter a

verdade. Na Grécia, os magistrados, chamados “estinomos”, eram encarregados do

serviço policial, efetuando uma sindicância para obter a verdade sobre a infração

supostamente cometida, da qual um cidadão havia sido o acusador. Já na Idade

Média, julgador e acusador eram funções que se concentravam na mesma pessoa.

Tal sistema foi largamente usado no Tribunal do Santo Oficio, o qual cometeu

diversas atrocidades em nome de fé e, punia sem maiores procedimentos

investigatórios pela simples acusação de que o réu fosse um herege. 2

No tocante ao Brasil, o Ordenamento Jurídico tem início com a ocupação

mais efetiva do território pelos portugueses, pois, os nativos viviam ainda na fase da

vingança privada. As Ordenações do Reino determinavam as formas de inquérito,

de julgamento e de punição. As primeiras Ordenações a serem aqui aplicadas foram

as Ordenações Afonsinas, seguidas pelas Manuelinas, dentre as quais há pouca

distinção e, em linhas gerais, pode-se dizer que, em ambas havia o Inquérito

1 HESKETH, Cláudio. Breves apontamentos ao inquérito policial, 2007, disponível em: <http://www.jefersonbotelho.com.br/2007/02/21/a-razao-de-ser-do-inquerito/>. Acesso em fev. 2010. 2 ALVES, Leandro Martins. O valor probatório do inquérito policial. Presidente Prudente: FDPP, 2005. p. 13.

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propriamente dito e a chamada Devassa, que era uma inquirição ex officio, sem

concurso do acusado e na qual, os juízes exerciam função de polícia judiciária. A

estas Ordenações seguiram-se as Filipinas, segundo as quais, a função de polícia

era exercida gratuitamente pelos moradores, cujo controle era responsabilidade dos

alcaides, juízes e juízes de terra. As investigações poderiam ter início por delação de

um fato criminoso contra os interesses públicos ou privados.3

Sob os moldes que atualmente delimitam o procedimento, o Inquérito Policial

surge no Ordenamento Jurídico Brasileiro com a edição da Lei 2.033/1871, e tem

sua regulamentação determinada pelo Decreto – Lei 4824/1871, cujo artigo 41

dispõe que: “O Inquérito Policial consiste em todas as diligências necessárias para a

descoberta dos fatos criminosos, de suas circunstâncias e de seus autores e

cúmplices, devendo se reduzido a instrumento por escrito”.

O Código de Processo Penal de 1941 veio a apresentar, por sua vez, uma

definição mais detalhada para o Inquérito Policial, entre os artigos 4º e 23 do referido

diploma.

Para conceituar o inquérito policial hoje, deve-se primeiramente ter em

mente que, o jus puniendi evoluiu historicamente para o estágio mais neutro e justo

que pode haver, ou seja, tornou-se um direito exclusivo do Estado. Mas esse direito,

para repousar sobre bases sólidas de justiça e verdade, necessita de um processo

legal que apure com precisão os fatos e os responsáveis por eles. Desse modo,

uma vez que um ilícito penal tenha sido praticado, é dever do Estado exercer seu

direito de punir. Essa punição, contudo, só pode ser efetuada depois que alguns

requisitos básicos sejam preenchidos. Requisitos esses que se constituem na

verificação da materialidade da conduta criminosa e da especificação inequívoca de

sua autoria. A forma, por excelência, usada para o preenchimento de tais requisitos,

no Ordenamento Jurídico Brasileiro, é o inquérito policial4.

O autor Capez define o inquérito policial como o conjunto de diligências

realizadas pela polícia judiciária na intenção de apurar uma infração penal e também

3 ALVES, 2005. p. 14. 4 Ibid., p. 16.

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sua autoria, com a finalidade de que, o titular da ação possa ter embasamento

suficiente para ingressar em juízo5.

Já, Modim, muito antes e de forma mais precisa, contudo ainda incompleta,

sugeria que o Inquérito Policial fosse o registro legal, formal e cronologicamente

escrito, cuja elaboração tenha sido deixada a cargo de uma autoridade

legitimamente constituída. E, mediante tal registro, esta autoridade dá autenticidade

às investigações e diligências efetuadas como forma de apuração de quaisquer

infrações penais, das circunstâncias nas quais elas ocorreram e quem foram seus

autores6.

A definição de Mirabete é, resumidamente, de que o inquérito policial seja

um procedimento administrativo que, em regra, é necessário para a propositura da

ação penal, caso sirva de base à mesma7.

A explicação de Mossin recorre à etimologia do termo e, é quase que um

verbete de dicionário. Concisamente para ele, o Inquérito é o substantivo derivado

do “verbo inquirir, que significa perguntar indagar investigar, interrogar”. O inquérito

policial é, pois, sob sua ótica, a investigação feita pela polícia judiciária

administrativa8.

Segundo Bozolo:

A única definição legal que se tem notícia é a do Dec. 4.824, de 22.11.1871, art. 11, § 3.° (parte final), c/c art. 42, que o define como "verificação da existência da infração penal o descobrimento de todas as suas circunstâncias e da respectiva autoria". Todavia, na doutrina encontramos a definição do saudoso Prof. Augusto Mondin: "É o registro legal, formal e cronologicamente escrito, elaborado por autoridade legitimamente constituída, mediante o qual esta autentica as suas investigações e diligências na apuração das infrações penais, das suas circunstâncias e dos seus autores”9.

5 CAPEZ. Fernando. Curso de processo penal. 13. ed. São Paulo: Saraiva. 2006. 6 MODIM, Augusto. Manual do inquérito policial. 3. ed. São Paulo, 1960. 7 MIRABETE, Julio Fabbrini. Código de Processo Penal Interpretado. 9. ed. São Paulo: Atlas, 2002. 8 MOSSIN, Antonio Heráclito. Curso de Processo Penal. 2. ed. São Paulo: Atlas, 1998. 9 BOZOLO, Joel de Luna. A necessidade do inquérito policial. 2002. Disponível em: <BuscaLegis.ccj.ufsc.br>. Acesso em jun. 2010.

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16

No entanto, tem-se como conceituar o inquérito policial a partir da leitura e

da interpretação de autores que nos servem como guia, mesmo que isso não se

constitua como uma definição legal. Mirabete, por exemplo, além de sua

conceituação já citada parágrafos acima – tornada aqui concisa pela leitura de seu

texto – define em obra de elaboração mais antiga um conceito mais sintético e,

quiçá, mais capaz de elucidar, ainda que em termos abrangentes e pouco pontuais,

o que vem a ser esse processo que se tenta – frente aos olhos argutos que

examinam essas linhas – humildemente delinear:

Inquérito policial é todo procedimento policial destinado a reunir os elementos necessários à apuração da prática de uma infração penal e de sua autoria. Trata-se de uma instrução provisória, preparatória, informativa, em que se colhem elementos por vezes difíceis de se obter na instrução judiciária [...]10

Retomando aquilo que anteriormente já foi mencionado – no intuito de

compor um conceito estável de Inquérito Policial – ele é um procedimento

administrativo, investigatório e elaborado pela polícia judiciária e, salvo em ação

impetrada pelo Ministério Público, é efetuado sob a presidência do Delegado de

Polícia.

O inquérito policial, conforme o Delegado Joel de Luna Bozolo, não é

processo, e não está, portanto, sujeito aos rigores das nulidades. Por esse motivo,

eventuais juízos equivocados que, porventura tenham surgido no decorrer da coleta

de provas e informações, podem ser corrigidos sem que isso denote quaisquer

prejuízos à ação proposta. Segundo Bozolo, uma das finalidades básicas do

inquérito é que:

O jus puniendi do Estado seja exercido somente contra quem praticou a infração, nos exatos limites de sua culpa. Portanto, do inquérito policial está excluída a verdade formal, que pode ser criada até por omissões das partes. A verdade formal (existente no processo civil) afirma, como verdadeiras, simples ficções.11

10 MIRABETE, 2002, p. 78. 11 BOZOLO, 2002.

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Logo, percebe-se que, ainda que se já a fonte da busca pela verdade, não é

no inquérito que se encontrará a verdade forma, a qual pode, caso o inquérito seja

falho, se constituir como uma mera ficção.

1.2 POLÍCIA JUDICIÁRIA: COMPETÊNCIA E ATRIBUIÇÃO

O poder de polícia é dividido entre a polícia administrativa e a polícia

judiciária. Esta tem a função de dirigir a investigação criminal, elucidando delitos já

cometidos. A polícia judiciária é formada pela Polícia Federal e, a nível estadual,

pelas Polícias Civis.

A Constituição Federal, art. 144, § 1º e 4º, outorga à polícia judiciária, com

exclusividade, o poder investigatório para apuração de delitos. De igual modo, o

Código de Processo Penal, II, arts. 4 a 23, ao regrar o Inquérito Policial, atribui à

figura da autoridade policial, ou seja, o delegado de polícia, a função de presidir os

atos investigativos preliminares. Tem, pois, uma atuação pré-processual, coletando

provas que contribuam à elucidação do fato, sirvam ou não para a acusação.

Concluindo, para que a razão predomine sobre o poder, é necessário que a denúncia ou queixa venha acompanhada de um mínimo de provas – mas suficientes para demonstrar a probabilidade do delito e da autoria afirmados – para motivar e fundamentar a decisão do juiz de receber ou não a acusação e nisso reside a importância da investigação preliminar: fornecer elementos de convicção para justificar o processo ou o não-processo, evitando que acusações infundadas prosperem.12

A elaboração das peças que compõe o inquérito policial, como o Termo

Circunstanciado para a apuração de infrações penais de menor potencial ofensivo

ou o auto de prisão em flagrante, por exemplo. O registro de ocorrências policiais

por policiais militares sem a devida formação jurídica, pode prejudicar a investigação

12 LOPES JR., Aury. Sistemas de investigação preliminar no Processo Penal. 4. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2006. p. 67.

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do fato pela Polícia Civil, pois, requisitos básicos podem ser desrespeitados, como a

correta tipificação do delito, cadastramento das pessoas envolvidas no sistema de

dados integrado e coleta imediata de depoimentos. Conforme aduz Corrêa, há uma

controvérsia instaurada pela cessão desses poderes à polícia administrativa:

O embate mais recente ganhou notoriedade acadêmica e jurisdicional culminando com numerosas argüições de inconstitucionalidade tanto via controle difuso, como concentrado. Traz-se a baila, a título ilustrativo, a ADIN 3.309 interposta pela Associação dos Delegados de Polícia do Brasil – ADEPOLBRASIL – alegando a inconstitucionalidade da Lei complementar 75 (Estatuto do MPU) e Resolução 77 de 2004 (que regulamenta o art. 8º do Estatuto o qual dá poderes investigatórios ao MP) — e a ADI 3836, de autoria da OAB — contestando a constitucionalidade da Resolução nº 13/2006 do Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP), que legisla sobre matéria processual penal e dá poderes ao “parquet” para conduzir investigações criminais. Ambas ações ainda não foram decididas tendo como última manifestação dos postulantes (nos dois casos), em meados do corrente ano, pedido de preferência ao julgamento dos feitos.13

Há que se ter em mente que, a divisão dos poderes conferidos ao Estado é

a base da democracia e da segurança jurídica do cidadão. O jus puniendi do Estado

segue disposições constitucionais expressas desta divisão de poderes. A polícia

judiciária investiga, representando o Executivo. Ao Ministério Público cumpre

titularizar a ação penal. Por fim, o Judiciário deve julgá-la.

Tem a polícia judiciária – como parte do sistema repressivo estatal — importante papel a desempenhar na manutenção do Estado Democrático de Direito. Como titular da instrução preliminar garante uma investigação imparcial, que busca a verdade e não tendência municiar uma ou outra parte processual, mas sim embasar a viabilidade da própria existência ou não do processo.14

Dentre as polêmicas geradas pela Lei 9099/95, está a definição do termo

"Autoridade Policial", utilizado na redação de seu artigo 69. Praticamente fixou-se o

entendimento doutrinário e jurisprudencial que, o termo teria sido empregado na Lei

13 CORRÊA, Vanessa Pitrez de Aguiar. O Papel da Polícia judiciária no Estado Democrático de Direito in: Revista do Tribunal Regional Federal da 1ª. Região. v. 21, n.1, janeiro de 2009. p. 89. 14 Ibid., p. 92.

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19

dos Juizados Especiais Criminais em um sentido amplo, ou seja, além dos

Delegados de Polícia de Carreira, englobaria todo agente público que exerce função

policial repressiva e preventiva. Segundo tal interpretação, os Policiais Militares e

Policiais Rodoviários estariam autorizados a lavrar Termos Circunstanciados

autonomamente e encaminhá-los ao Juizado. A Lei 11.343/06, em seu artigo 48,

impõe a aplicação do procedimento da Lei 9099/95 para casos de posse de drogas

para consumo próprio (artigo 28, da Lei 11.343/06). Mas, no mesmo dispositivo, em

seu § 4º, faz uso da expressão "Autoridade de Polícia Judiciária", indicando que, a

"Autoridade Policial" a presidir a lavratura do Termo Circunstanciado é o Delegado

de Polícia.15

1.3 CARACTERÍSTICAS DO INQUÉRITO POLICIAL

O inquérito policial é um procedimento de natureza administrativa e

inquisitiva, ele é uma fase pré-processual ou uma fase inquisitiva da persecutio

criminis. Visa apurar e investigar a autoria e a materialidade do fato-crime.

Apresenta as seguintes características: a inquisitoriedade; o formalismo; a

sistematicidade; o sigilo; discricionariedade; a oficialidade; a indisponibilidade; a

oficiosidade; a autoridade; a obrigatoriedade e a unidirecionalidade.

1.3.1 Formalismo

O CPP exige como formalidade que, as peças do inquérito policial sejam

sempre registradas por escrito, no idioma pátrio, seja manuscrito ou datilografado. 16

15 CABETTE, Eduardo Luiz Santos. Autoridade policial e termo circunstanciado. Necessidade de revisão dos entendimentos em face da Lei de Drogas. Jus Navigandi, Teresina, ano 12, n. 1589, 7 nov. 2007. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=10622> 16 ALVES, 2005. p. 16ss

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20

O relato oral não tem validade judicial, já que, isso seria contra a determinação

disposta no artigo 9º do Código de Processo Penal, o qual dispõe claramente que:

“Todas as peças do Inquérito Policial serão num só processados, reduzidos a

escrito, ou datilografadas e, neste caso rubricadas pela autoridade”.

A finalidade dessa exigência é segundo Fernando da Costa Tourinho Filho,

fornecer as informações necessárias ao titular da ação penal para a propositura da

referida ação, por isso, não se concebe a possibilidade de inquérito policial oral17.

1.3.2 Sigilo

A exigência de que seja sigiloso, repousa sobre o que está disposto no

artigo 20 do Código Penal: “A autoridade assegurará no inquérito o sigilo necessário

à elucidação do fato ou exigido pelo interesse a sociedade”.

Esta disposição visa o êxito da autoridade policial na realização de suas

diligências sem que, em seu curso, surjam empecilhos ou obstáculos para impedir

ou dificultar a colheita de informações tais como, a destruição ou ocultação de

provas e, até mesmo, o exercício de influência sobre testemunhas e suas

declarações. Contudo, o Advogado poderá ter acesso ao inquérito policial quando

este possuir legitimatio ad procedimentum, já que o artigo 5º, inciso LVIII da

Constituição Federal, garante ao preso assistência de um advogado e que, poderá

tomar as providências necessárias em favor de seu cliente. O acesso do advogado

ao conteúdo do inquérito é negado, entretanto, se for decretado o sigilo judicial do

inquérito policial, e ele poderá realizar consultas apenas aos autos findos.18

17 TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Código de processo penal comentado. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 1999. p. 193. 18 ALVES, 2005, p. 17.

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21

1.3.3 Oficialidade

Sobre a oficialidade do inquérito policial, esta se deve ao fato de que esta

sempre será uma atividade investigatória feita por órgãos oficiais, não podendo ficar

a cargo do particular ainda que, a titularidade da ação penal seja atribuída ao

ofendido.19 Havendo crime de ação penal pública incondicionada, a autoridade

policial deve atuar de ofício, instaurando o inquérito e apurando os fatos.

1.3.4 Obrigatoriedade

O Inquérito é obrigatório para a propositura de uma ação penal pública.

Desse modo, a autoridade policial não poderá ficar inerte ao receber a notícia de

uma infração penal. Determina o texto dos artigos 5º e 6º do Código de Processo

Penal que, a autoridade policial deverá instaurar o inquérito policial para a

investigação dos acontecimentos assim que, for notificada a ela a existência da

infração. Uma notitia criminis pode ser dada ao conhecimento da autoridade policial

por várias maneiras diferentes: petição inicial da ação penal pública, por meio de

jornais, programas de televisão, rádio, confissão e muitas outras formas. Por isso se

diz que, o inquérito policial é obrigatório.20

1.3.5 Indisponibilidade

Trata-se de documento indisponível, pois uma vez instaurado, além de

sigiloso, a autoridade policial não poderia, segundo o artigo 17 do Código de

19 CAPEZ, 2006, p. 69. 20 ALVES, 2005, p. 18.

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Processo Penal, arquivá-lo em nenhuma hipótese. Isso, só pode ser feito pelo juiz a

requerimento do Ministério Publico, o qual é o titular da ação penal pública. A função

da autoridade policial é apenas colher elementos, o arquivamento dos autos do

inquérito exige a valoração do que foi colhido pelo titular da ação penal. 21

Já o autor Lima, se refere ao tema nesses termos:

Na expressão exemplar de um delegado de polícia, o inquérito policial é “um procedimento do Estado contra tudo e contra todos para apurar a verdade dos fatos”. Assim, o inquérito policial é um procedimento no qual quem detém a iniciativa é um Estado imaginário, todo poderoso, onipresente e onisciente, sempre em sua busca incansável da verdade, representado pela autoridade policial, que, embora sendo um funcionário do Executivo, tem uma delegação do Judiciário e a ele está subordinado quando da realização de investigações.22

É, pois, a manifestação do Estado que representa e zela pelo bem público,

na busca da preservação deste último face às situações em que este é posto a

perigo por atitudes delituosas cometidas no seio da sociedade.

1.3.6 Unidirecionalidade

O inquérito policial é unidirecional por ser um procedimento cujo objetivo

principal é buscar os elementos básicos da materialidade de um delito e de quem foi

sua autoria, com foco na verdade incontestável dos acontecimentos. É um

procedimento que visa à apuração sem que sirva como instrumento, nem para

acusação, nem para a defesa. Nem mesmo quando solicitado pelo Ministério Público

deve servir de meio para a acusação, porque deveria então, ensejar também defesa,

usurpando assim as funções do Judiciário.23

21 CAPEZ, op. cit, p. 88. 22 LIMA, Roberto Kant de. Direitos Civis e Direitos Humanos: uma tradição judiciária pré-republicana? In: São Paulo em Perspectiva, v. 18, 2004, p. 52. 23 MEHMERI, Adilson. Inquérito Policial (Dinâmica) Editora: Saraiva 1992, p. 16.

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23

A unidirecionalidade do inquérito policial é o fato de o delegado de polícia

não poder emitir juízo de valor a respeito da apuração dos fatos no momento da

elaboração do relatório ao final do procedimento investigativo.

Segundo Mirabete,

[...] não cabe à autoridade na sua exposição, emitir qualquer juízo de valor, expender opiniões ou julgamento, mas apenas prestar todas as informações colhidas durante as investigações e as diligências realizadas. Pode, porém, exprimir impressões deixadas pelas pessoas que intervieram no inquérito. Entendo que se há provas tanto a favor quanto contra o indiciado, deve a Autoridade, em fundamentação, proceder ao indiciamento, haja vista o princípio do in dubeo pro societatis24.

Cabe ao delegado de polícia realizar todos os atos necessários ao

esclarecimento dos fatos, procurando a verdade e, por ocasião da elaboração do

seu relatório, deve elencar somente as medidas providenciadas e seus

conseqüentes resultados, sem juízo de valor a respeito das provas.

Apesar de não poder valorar, a autoridade policial deve se manifestar sobre

a existência de indícios suficientes de autoria e materialidade do crime.

Os autores Távora e Antonni consideram que: “[...] só cabe falar em

indiciamento se houver um lastro mínimo de prova vinculando o suspeito à prática delitiva.”25

Cabe ao delegado de polícia constatar a existência desse lastro mínimo

vinculativo do suspeito ao delito para pronunciar-se a respeito do indiciamento.

Contudo, se não cabe ao delegado de polícia manifestar-se sobre as provas obtidas,

como pode fazê-lo a respeito do indiciamento de um acusado? O indiciamento não é

uma manifestação de valor?

Como já foi visto, a natureza escrita do inquérito determina que todos os

atos de investigação sejam levados a termo pela autoridade policial, conforme o

artigo 9° do Código de Processo Penal, o qual promulga que "Todas as peças do

inquérito policial serão, num só processado, reduzidas a escrito", explicitando assim

sua unidade. Excetuam-se desse procedimento os itens colacionados como provas

24 MIRABETE, 2002. 25 TÁVORA, Nestor; ANTONNI, Rosmar. Curso de direito processual penal. Salvador: JusPODIVM, 2008.

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24

(desde que se constituam de documentos já escritos, pois mesmo a documentação

audiovisual deve ser transcrita), tais como exames periciais, extratos bancários, etc.,

que apenas se juntam aos autos. Além disso, o art. 405, § 1o e 2o, do Código

Processual Penal dispõem que:

§ 1o Sempre que possível, o registro dos depoimentos do investigado, indiciado, ofendido e testemunhas será feito pelos meios ou recursos de gravação magnética, estenotipia, digital ou técnica similar, inclusive audiovisual, destinada a obter maior fidelidade das informações. § 2o No caso de registro por meio audiovisual, será encaminhado às partes cópia do registro original, sem necessidade de transcrição.

Por força do mesmo artigo 9º do Código de Processo Penal, não há ato de

inquérito meramente oral, pois o que não for documentado por escrito ou reduzido a

termo, está fora de pauta na investigação. “O inquérito policial é o procedimento

destinado à reunião de elementos acerca de uma infração penal.”26

Assim, todos os elementos que o compõem são tratados como uma unidade,

mas, não são inseparáveis uns dos outros, já que, nem tudo o que é recolhido como

prova, terá por força, a mesma importância para o aclaramento da autoria de um

crime.

1.3.7 Inquisitoriedade

O pesquisador Bodart considera que:

Afirmar que o inquérito policial caracteriza-se pela inquisitorialidade é lugar comum na doutrina. Sem muita reflexão, os autores utilizam a expressão “inquisitório”. Para designar três fenômenos distintos: (I)

26 SALLES JUNIOR, Romeu de Almeida. Inquérito Policial e Ação Penal. 4.ed. São Paulo: Saraiva, 1986. p. 03.

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coisificação do sujeito passivo, que se torna mero objeto; (II) ausência de contraditório; (III) sigilosidade e escritura27.

Parte da doutrina tende a considerar que o contraditório e ampla defesa

(garantidos pelo disposto no artigo 5º, LV, da Constituição Federal, aos litigantes, em

processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral) não são aplicáveis ao

inquérito policial. O argumento usado é que o inquérito não é processo, nele não

existe acusação. Sob essa ótica, é a propositura da ação penal que transforma o

indiciado em acusado, e a partir desse momento, são devidos o contraditório e a

ampla defesa28. Porém, mesmo tendo o inquérito policial um caráter inquisitivo, a

autoridade policial deve observar o princípio da legalidade, o qual está:

[...] consagrado no caput do art. 37 da Constituição Federal de 1988. Assim, se a autoridade policial atua no exercício da competência discricionária na condução do inquérito, deve, todavia, respeitar os direitos fundamentais do indiciado ou imputado, sob pena de incorrer em abuso de poder, sanável pelos remédios jurídicos pertinentes (Habeas Corpus, mandado de segurança etc...) e ensejador da tríplice responsabilidade: penal, administrativa e civil. A necessidade de observância do princípio da legalidade no inquérito policial levou alguns comentadores a admitir, de forma equivocada, o contraditório na fase policial. Tal se deve à interpretação inexata do conteúdo do art. 14 do CPP, in verbis: “Art. 14. O ofendido, ou seu representante legal, e o indiciado poderão requerer qualquer diligência, que será realizada ou não, a juízo da autoridade”. A hermenêutica adequada do dispositivo indica que o deferimento da diligência é ato discricionário da autoridade policial e não um direito subjetivo de natureza pública do requerente.29

Tanto para a instauração da uma ação penal pública (promovida pelo

Ministério Público), quanto para uma privada (solicitada pela parte ofendida por meio

de um advogado), faz-se necessário o inquérito policial. Tem por finalidade servir

como requisito básico para que o Juiz de Direito receba a denúncia e, dê início à

ação penal, submetendo o réu aos transtornos que esta lhe causará. Ou seja, é

27 BODART, Bruno Vinícius da Rós. Inquérito Policial, Democracia e Constituição – Modificando Paradigmas. Revista Eletrônica de Direito Processual – REDP. Volume III. Rio de Janeiro: UERJ, 2009. p. 132. 28HESKETH, 2007. 29 HESKETH, 2007. [s.p.].

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necessário que haja uma justa causa para a ação penal. A qual se constitui no

recolhimento de provas e relato dos fatos que demonstrem a existência da prática

ilícita. Tais informações e dados constituem o fumus boni juris (a “fumaça da boa

justiça”), que dê indícios suficientes sobre o ilícito praticado e sirva de sustentação à

denúncia. 30

As representações, as requisições e o auto de prisão em flagrante são peças iniciais do inquérito policial. Nos demais casos a autoridade policial deve baixar a portaria para a instauração do procedimento.31

Pode ser instalado pelo requerimento da vítima por meio de representação.

Contudo, este pode ser indeferido pela autoridade policial caso entenda que o fato

não constitui crime. É possível que, havendo indeferimento do pedido de instauração

de inquérito, se faça o recurso administrativo ao Secretário de Segurança Pública.

Entretanto, o recurso judicial é incabível. Já, a requisição é feita pela autoridade

judiciária ou pelo Ministério Público. Além disso, pode ser instaurado pela prisão em

flagrante delito, com seu auto, sendo a peça inicial do procedimento. Por outro lado,

a autoridade policial toma conhecimento da ocorrência do crime diretamente, ou

seja, por cognição imediata, o inquérito deve ser iniciado de ofício, por meio de uma

portaria. Esta é uma peça na qual a autoridade policial:

Consigna ter tomado ciência da prática do crime de ação pública incondicionada, declinando, se possível, o dia, lugar e hora em que foi cometido, o prenome e nome do pretenso autor e o prenome e nome da vítima, e conclui determinando a instauração do inquérito. Não se impede a instauração de Inquérito Policial referente a crime cuja autoria é ignorada, eis que é no âmbito do procedimento que se deve proceder às investigações para a sua identificação.32

Já Mirabete se manifesta da seguinte maneira:

30 BOZOLO, 2002. 31 NOGUEIRA, Fabyana Rafaella et NOGUEIRA NETO, Sérvulo. Inquérito Policial: Apontamentos sobre seu Valor para a Persecutio Criminis, 2008, disponível em: http://www.esmarn.org.br/ojs/index.php/revista_teste/article/viewArticle/170. 32 NOGUEIRA; NOGUEIRA NETO, 2008.

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Dada à instrução de caráter inquisitivo, o inquérito policial tem valor informativo para a instauração da competente ação penal. Entretanto, nela se realizam certas provas periciais, que, embora sem a participação do indiciado, contêm em si maior dose de veracidade, visto que nelas preponderam fatores de ordem técnica que, além de mais difíceis de serem deturpados, oferecem campo para uma apreciação objetiva e segura de suas conclusões. Nessas circunstâncias têm elas favor idêntico aos das provas colhidas em juízo. O conteúdo do inquérito, tendo por finalidade fornecer ao Ministério Público os elementos necessários para a propositura da ação penal, não poderá deixar de influir no espírito do juiz na formação de seu livre convencimento para o julgamento da causa, mesmo porque integra os autos do processo, podendo o juiz apoiar-se em elementos coligidos na fase extrajudicial (...). Certamente, o inquérito serve para a colheita de dados circunstanciais que podem ser comprovados ou corroborados pela prova judicial e de elementos subsidiário para reforçar o que foi apurado em juízo. Não se pode, porém, fundamentar uma decisão condenatória apoiada exclusivamente no inquérito policial, o que contraria o princípio do contraditório.33

Contudo, não é o inquérito policial que condena, ele apenas fornece

elementos de convicção à acusação. Em certos casos, a ausência do contraditório

chega a ser considerada uma necessidade, haja vista que o sigilo das investigações

é tido como fundamentalmente importante para o êxito de algumas diligências, posto

que o indiciado poderia lançar mão de artifícios que viessem a confundir a polícia se

tivesse conhecimento do andamento do inquérito e das provas coletadas.

1.3.8 Outras características

Discricionariedade: é uma das características fundamentais do inquérito. À

polícia judiciária, não cabe julgar a existência ou a inexistência de culpa, contudo, o

recolhimento idôneo de informações sobre o ato criminoso tem o poder de

determinar ou não uma ação:

O inquérito policial tem a função de fornecer elementos básicos da materialidade de um crime e a sua autoria e não colocar ao membro no Ministério Público a certeza da imputação de um crime a um

33 MIRABETE, Julio Fabrini, Processo Penal. 18. ed. São Paulo: Atlas, 2006, p. 77

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indiciado, assim a autoridade policial ao realizar o inquérito policial atenderá sim a função social e não a vontade de quem o realiza. 34

O artigo 14 do Código de Processo Penal assim dispõe sobre a questão:”O

ofendido, ou seu representante legal, e o indiciado poderão requerer qualquer

diligência que será realizada ou não a juízo da autoridade”.

Sistematicidade: As investigações realizadas pela Autoridade Policial e sua

equipe devem ser documentadas nos autos do inquérito policial. Todas as peças

devem ser colocadas numa seqüência que dê a entender a ordem cronológica em

que os fatos se deram.

Autoridade ou Autoritariedade: O delegado de polícia deve presidir o

inquérito policial (art. 144, § 4º da CF).

Dispensabilidade: O inquérito policial não é imprescindível para a propositura

da ação penal. Se há elementos para lastrear a propositura, não se exige a

instauração do inquérito.

1.4 INSTAURAÇÃO DO INQUÉRITO POLICIAL

O art. 5º do CPP dispõe que nos delitos de ação pública, o inquérito policial

deverá ser iniciado ex officio a partir de requisição da autoridade judiciária ou

Ministério Público, ou então, a requerimento do ofendido ou de quem tiver qualidade

para representá-lo. Há, por outro lado, duas formas de abertura do inquérito policial:

o auto de prisão em flagrante delito e portaria. Em caso de prisão em flagrante

delito, a autoridade consoante o art. 304 do CPP, deve lavrar o auto que será a

primeira peça do inquérito. Quando a autoridade policial procede de ofício, se há

representação ou requerimento da vítima, ou ainda requisição do juiz ou promotor de

justiça, peça inaugural do inquérito é a portaria.35

34 ALVES, 2005. p. 18. 35 HESKETH, 2007.

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29

O artigo 4º do Código de Processo Penal estipula que, a apuração de

determinada infração e de sua autoria deve ser feita pela polícia judiciária, dentro da

sua circunscrição, ou seja, dentro do território em que as autoridades policiais

podem exercer suas atividades administrativas.36 A polícia judiciária é o órgão

responsável pela realização e efetivação de um inquérito policial e a função de

presidi-lo é atribuída aos delegados de polícia de carreira, salvo as exceções

descritas no artigo 144 §1º e §4º da Constituição Federal. Tal atribuição pode ser

determinada em função do local no qual houve a consumação da infração (ratione

loci) ou mesmo pela natureza da infração a ser investigada (ratione materiae).

Qualquer apuração de fatos fora dos limites da circunscrição da autoridade policial

competente só pode ser efetuada por carta precatória ou por carta rogatória.

Exceção feita à prisão em flagrante, para a qual a ratione loci tem certa

maleabilidade.37

O método costumeiro de recolhimento de elementos que embasem a ação

penal é o inquérito policial, embora não seja o único. Chama-se de persecução

penal (persecutio criminis) a somatória das diligências investigatórias efetuadas pela

polícia judiciária e a ação penal. A persecutio criminis visa à eficácia do jus puniendi

exercido pelo Estado. Há três formas possíveis para esse procedimento. O mais

usual é o sistema acusatório, que é sistema adotado pelo nosso Código. Nele, há

um órgão de acusação, um de defesa e um outro que preside os trabalhos e julga a

demanda. Já no inquisitorial, não há contraditório e as atividades se concentram na

figura do juiz, que acusa, defende e julga. O terceiro sistema é o misto, em que um

ou outro sistema predomina durante o desenrolar da ação.38

Conquanto seja o inquérito policial um procedimento inquisitorial, não há

como caracterizar um sistema misto no Brasil, dado que, o inquérito faz parte da

fase pré-processual. Durante o inquérito não há propriamente um processo, e sim,

diligências investigativas ou administrativas que constituem o suporte para o

processo no qual o sistema acusatório vigora.39

36 CAPEZ, 2006, p. 65. 37 ALVES, 2005, p. 19. 38 NOGUEIRA; NOGUEIRA NETO, 2008. 39 Ibid.

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30

Especificamente sobre a instauração do Inquérito, Iennaco considera que do

ponto de vista formal, as peças inaugurais do inquérito policial são a portaria (no

caso de instauração de ofício), o auto de prisão em flagrante ou então o

requerimento ou representação do ofendido. O inquérito pode ainda ser instaurado

por requisições do Ministério Público ou do Ministro da Justiça. 40

1.4.1 De ofício

Quando a autoridade policial tornar-se ciente da ocorrência de uma infração,

seja por seu próprio conhecimento ou pela comunicação feita por um cidadão, sendo

ele o ofendido, seu representante, ou meramente alguém que tem conhecimento da

infração praticada, deve a investigação ser iniciada de imediato, pois, se trata de

uma ação pública incondicionada. A instauração do inquérito policial nos casos de

crimes de ação penal pública incondicionada, pode se dar de ofício ou por

provocação consubstanciada em notícia de crime. Além do conhecimento direto da

autoridade policial, a notitia criminis pode acontecer por requisição do Ministério

Público, pela representação ou requerimento do ofendido, de seu representante

legal ou ainda pela delação por terceiro (a delatio criminis).41 A delação é uma

espécie de notitia criminis, além de poder vir a ser prova, caso seu signatário for

ouvido como testemunha. Contudo, a delação (mormente a de um co-réu) feita após

a instauração de inquérito, efetivamente baseado em autêntica notitia criminis,

necessita da incidência do contraditório ao interrogatório do delator para ter valor

probatório.42

Notícia de crime, delação ou denúncia anônima são termos cuja distinção é

sutil. Notícia de crime é o conhecimento de um fato criminoso pela autoridade, de

maneira espontânea ou provocada. “A notitia criminis pode ser: a) de cognição

40 IENNACO, Rodrigo. Da Validade do Procedimento de Persecução Criminal Deflagrado por Denúncia Anônima no Estado Democrático de Direito. 2006. 41 IENNACO, 2006. 42 PACHECO, Denilson Feitoza. Direito Processual Penal. 3ª ed. Niterói: Impetus, 2005. p. 220-222.

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imediata (art. 5º, I, CPP); b) de cognição mediata, por expediente escrito (art. 5º, II,

CPP); c) de cognição coercitiva, por condução do preso em flagrante (art. 302,

CPP)”.43

Já a Delatio criminis é espécie do gênero notitia criminis, é o comunicado

feito à autoridade competente por terceiro, que não o ofendido ou seu advogado44.

Contudo, Capez trata a comunicação feita pela vítima como delatio criminis. A

delação pode ser de cognição imediata se o fato for comunicado diretamente à

autoridade, ou mediata, se feita por meio de documento escrito.45

A denúncia anônima é, por sua vez, um termo impreciso, pois, não é uma

denúncia no significado jurídico do termo. É em realidade uma delação anônima. É,

pois, uma outra modalidade de notitia criminis. Contudo, ao transmitir à autoridade

imputação de prática criminosa, a denúncia anônima instaura uma contradição entre

valores constitucionais. A norma que veda o anonimato, art. 5º, IV, CR/88, busca a

preservação da incolumidade dos direitos da personalidade (honra, imagem,

intimidade). A Constituição Federal consagra a liberdade de pensamento, mas, veda

a manifestação anônima.

A notícia anônima de crime, pois, viola:

[...] em tese, o disposto no art. 5º, IV, da CR/88 e, como tal, não pode fundamentar, isoladamente, a instauração de inquérito policial ou a determinação judicial de medida que restrinja direito constitucionalmente assegurado (inviolabilidade do domicílio, do sigilo fiscal, bancário, das comunicações telefônicas, de dados etc.). Isso não significa, embora possa parecer paradoxal, que toda e qualquer notícia anônima de crime seja desconsiderada pela autoridade destinatária. Ao contrário, recebendo delação anônima, a autoridade tem o dever de verificar seu conteúdo e sua procedência – leia-se, verossimilhança das informações –, mediante a utilização de recursos ordinários de investigação que não violem frontalmente as liberdades públicas instituídas constitucionalmente. Confirmada a fidedignidade da delação, o procedimento formal será deflagrado, desvinculando-se a instauração e os conseqüentes elementos de convicção da notícia anônima original. 46

Entretanto, em situações excepcionais, a autoridade pública pode proteger

o cidadão, sob o anonimato, para que este contribua no controle da criminalidade

43 IENNACO, op. cit. 44 Ibid. 45 CAPEZ, 2006, p. 78. 46 IENNACO, 2006.

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com programas oficiais de proteção de testemunhas, se, a revelação de sua

identidade vier a comprometer sua própria segurança.47

1.4.2 Requisição

Na ação pública condicionada à requisição do Ministério Público, a fase

investigatória do inquérito, inicia-se depois de satisfeita a condição de

procedibilidade. Assim que essas condições forem cumpridas, inicia-se o

Procedimento Administrativo Investigatório Criminal, que, grosso modo, é o inquérito

presidido pelo Ministério Público.

O delegado Araújo, contudo, afirma em artigo que:

[...] quando há requisição de algum juízo ou do Ministério Público, e nesses casos deverão vir acompanhadas de informações necessárias à sua definição legal, a instauração se dá imediatamente, sem que a autoridade policial busque novos elementos de convicção ou aprecie quanto à sua oportunidade ou conveniência. 48

Em relação à instauração de inquérito no caso de ação penal pública

condicionada:

Os casos em que depende de requisição do Ministro de Justiça são: crime cometido por estrangeiro contra brasileiro fora do Brasil (art. 7º, §3º, b, do CP), crimes contra a honra do Presidente da República ou chefe de governo estrangeiro (art. 145, § único, do CP), ou contra esta e outras autoridades quando praticados através da Imprensa (art. 23, I, e 40, I, a, da Lei de Imprensa).49

47 IENNACO, op.cit. 48 ARAÚJO, Bartolomeu, A Efetivação do Inquérito Policial. (s/d). Disponível em: <BuscaLegis.ccj.ufsc.br>. Acesso em jun. 2010. 49 NOGUEIRA; NETO, 2008.

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33

1.4.3 Requerimento

Em relação aos casos de ação penal cuja iniciativa for privada, o

procedimento investigatório, de igual modo, inicia-se apenas depois que houver

requerimento de instauração por parte do legitimado.50

A queixa-crime, que se constitui como o início à ação penal privada, deve

cumprir alguns requisitos. Deve, por exemplo, expor fato evidentemente criminoso e

quais circunstâncias ocorreu; esclarecimentos que ajudem a identificar o acusado; a

classificação do crime e elencar suas testemunhas; além disso, precisa ser feita

dentro do prazo, antes da prescrição do crime; bem como, outras condições

dispostas nos artigos 41 e 43 do Código de Processo Penal. Só o ofendido ou seu

representante legal podem apresentar a queixa, salvo, se este for morto ou estiver

ausente, conforme o artigo 100, § 2º, do Código Penal, e o artigo 30 do Código de

Processo Penal. Nesses casos, o cônjuge do ofendido, um ascendente,

descendente ou irmão ganham direito de ação (art 100, § 4º, CP; e 31 do CPP).

1.5 ENCERRAMENTO DO INQUÉRITO POLICIAL

1.5.1 Indiciamento

O indiciamento formal deve se dar durante a elaboração do relatório, pois,

sendo um ato administrativo vinculado, só pode ocorrer, se houver indícios

suficientes de seu autor (art. 239 do CPP). Contudo, do mesmo modo que uma

denúncia ou queixa podem ocorrer sem inquérito, também podem ser ofertadas a

partir de um inquérito ainda não concluído, a despeito que o relatório do inquérito

colabore na confecção da denúncia ou da queixa.51

50 IENNACO, 2006. 51 HESKETH, 2007.

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O art. 5.°, no inciso LV, assegura que qualquer acusado tem direito ao

contraditório e ampla defesa. Antes de fazer uma pessoa ter que se sentar no banco

dos réus, um mínimo de indícios que sustentem o início da ação penal devem ser

coletados. O inquérito policial, por seu caráter sigiloso, garante a intimidade, a honra

e a imagem das pessoas. Enquanto a polícia judiciária reúne os elementos que

sustentem o indiciamento, não há que se falar em contraditório, mas, havendo

indiciado imperioso cumpra-se a determinação constitucional, garantindo

contraditório e ampla defesa ao acusado.

1.5.2 Diligências

Para Hesketh, as diligências durante o inquérito, são atos discricionários da

autoridade policial e, não um direito subjetivo do requerente. Tal direito, entretanto,

aplica-se em momento posterior ao indiciamento.52 O artigo 14 do CPP dispõe que:

“O ofendido, ou seu representante legal, e o indiciado poderão requerer qualquer

diligência, que será realizada ou não, a juízo da autoridade”.

No curso do inquérito, o requerimento de diligência que tenha sido indeferido

é peça morta, esse indeferimento é irrecorrível e não se aplica a analogia ao

disposto no art. 5º, § 2º do CPP.53

A apreciação de requerimento elaborado nos termos do art. 14 do CPP é ato funcional da autoridade policial, praticado em âmbito administrativo, que contém um juízo de valor sobre a oportunidade e conveniência da realização da diligência. Tal juízo, não pode ser contrastado, inclusive, pelo superior hierárquico sob pena de violação da independência funcional do delegado de polícia na direção dos trabalhos. Lógico que o superior poderá avocar o inquérito policial, na forma regimental, caso discorde da solução apresentada. Não poderá, todavia, obrigar o delegado a retratar-se.54

52 Ibid. 53 HESKETH, 2007. 54 Ibid.

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Depois de haver indiciamento, sendo válido, portanto o artigo 14 do CPP, o

indeferimento de uma diligência pela autoridade policial, não impede contudo que, o

ofendido ou o indiciado encaminhem este requerimento ao membro do Ministério

Público, o qual, desde que entenda a diligência requerida como necessária ao bom

encaminhamento da ação penal, pode requerer ao juiz a sua realização.55

O artigo 53 da Lei nº. 11.343/2006, determina que em qualquer fase da

persecução criminal, além dos procedimentos investigatórios previstos em lei, sejam

permitidos, mediante autorização judicial, outros procedimentos, tal como a

infiltração por agentes de polícia.

Esse recurso precisa, contudo, ser ponderado com cautela, pois, não há

nenhuma determinação acerca da conduta a ser seguida pelo agente infiltrado. A

infiltração pode levar o agente policial a alguma conduta criminosa que, se recusada,

gera risco de malograr as investigações. Em tese, se houver prática de atos que

possam configurar crimes, o fato terá de ser tratado pela doutrina e jurisprudência

dos tribunais. Deve-se, pois, considerar o princípio da proporcionalidade, analisando

bem, cada caso específico.56

Por outro lado, ao contrário da lei revogada (Lei nº. 10.409/02), a atual não

permite os procedimentos investigatórios previstos na Lei nº. 9.034/95, como a

captação e a interceptação ambiental, a não ser que, a investigação seja sobre

ilícitos relacionados a quadrilhas, bandos ou organizações criminosas. O caput do

artigo 53 permite a utilização de outros procedimentos investigatórios previstos em

lei, os quais, são atos de investigação previstos no próprio Código de Processo

Penal57:

[...] e em leis extravagantes, como a interceptação telefônica, que pode ser determinada em relação à investigação de qualquer delito (desde que sejam observados, evidentemente, os três incisos do art. 2º. da Lei nº. 9.296/96).

55 Ibid. 56 MOREIRA, Rômulo de Andrade. Aspectos procedimentais da nova lei de tóxicos (Lei nº 11.343/06). Jus Navigandi, Teresina, ano 10, n. 1209, 23 out. 2006. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=9075>. Acesso em: 29 nov. 2009. 57 MOREIRA, 2006.

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Em caso de prisão em flagrante, o prazo para o encerramento do inquérito é

menor, logo, há menos tempo para diligências. O Art. 10 do CPP determina que: “O

inquérito deverá terminar no prazo de 10 dias, se o indiciado tiver sido preso em

flagrante”.

O artigo 6º do CPP determina que:

Art. 6o Logo que tiver conhecimento da prática da infração penal, a autoridade policial deverá: I - dirigir-se ao local, providenciando para que não se alterem o estado e conservação das coisas, até a chegada dos peritos criminais; II - apreender os objetos que tiverem relação com o fato, após liberados pelos peritos criminais; III - colher todas as provas que servirem para o esclarecimento do fato e suas circunstâncias; IV - ouvir o ofendido; V - ouvir o indiciado, com observância, no que for aplicável, do disposto no Capítulo III do Título Vll, deste Livro, devendo o respectivo termo ser assinado por duas testemunhas que Ihe tenham ouvido a leitura; VI - proceder a reconhecimento de pessoas e coisas e a acareações; VII - determinar, se for caso, que se proceda a exame de corpo de delito e a quaisquer outras perícias; VIII - ordenar a identificação do indiciado pelo processo datiloscópico, se possível, e fazer juntar aos autos sua folha de antecedentes; IX - averiguar a vida pregressa do indiciado, sob o ponto de vista individual, familiar e social, sua condição econômica, sua atitude e estado de ânimo antes e depois do crime e durante ele, e quaisquer outros elementos que contribuírem para a apreciação do seu temperamento e caráter.

As diligências policiais são procedimentos realizados pela polícia e, somente

podem ser efetuadas, com a determinação e o conhecimento do delegado de

polícia, para apurar os fatos e investigar os crimes. Com relação à determinação das

diligências, o Juiz não pode determiná-las, mas sim, requerê-las a autoridade

policial, sob pena de ferir o sistema acusatório. Pode ocorrer que, a diligência seja

de urgência; nesta hipótese, pode-se realizar sem a autorização da autoridade

policial, mas, deve ser dada a comunicação imediata ao delegado, sendo que, se

este entender que a diligência é irregular, pode determinar que a mesma seja

paralisada, ou ainda, pode se dirigir ao local e se interar dos fatos. Segundo o autor

Luiz Carlos Rocha, diante da impossibilidade do delegado realizar pessoalmente a

diligência, os policiais devem tomar as seguintes providenciais:

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Quando da impossibilidade da autoridade policial realizar pessoalmente a diligência, os policiais que dele participam devem elaborar relatório, informando: a) nome, qualificação e endereço do preso; b) local, hora e motivo da prisão; c) valores, objetos, substâncias entorpecentes ou armas eventualmente apreendidas; d) nome, qualificação e endereço das testemunhas que presenciarem os fatos; e) qualquer incidente verificado no curso da diligência e os demais dados que ao caso se apresentarem relevantes; f) relação completa dos policiais civis que tomaram parte na diligência58.

1.5.3 Relatório

De acordo com o art. 10 do CPP, os prazos para a conclusão do inquérito,

na Justiça Comum são de dez dias caso o indiciado esteja preso ou trinta dias se o

indiciado estiver solto (Nesse caso, pode haver dilação do prazo, para efeito de

cumprimento das diligências pendentes). Quando o inquérito for concluído, a

autoridade policial deve elaborar um relatório circunstanciado, o qual se constitui

como a última peça do inquérito. Este relatório deve ser dirigido ao juiz. Prática

equivocada é a dos delegados de polícia que se dirigem ao escrivão, com

determinação de que os autos sejam remetidos ao juiz. Ao escrivão, em

conformidade com o procedimento correto, deve-se dirigir um despacho ordinatório,

fora do relatório, no qual se determine a juntada do relatório e remessa dos autos do

inquérito à Justiça.59

A despeito de que o inquérito policial termine com o relatório, lembre-se que

já na primeira fase da persecutio criminis ele está implícito no recolhimento dos

elementos que embasam a propositura da denúncia ou sugiram o arquivamento do

inquérito.

Não há, na lei, definição específica de quais são os requisitos que o relatório

deve ter. Contudo, é seguro que, deve ser uma peça de caráter objetivo e não

opinativo. De praxe, divide-se o relatório em três partes: a) cabeçalho: no qual

58 ROCHA, Luiz Carlos. Manual do Delegado - Procedimentos Policiais. São Paulo: Edipro, 2002, p.164. 59 ROCHA, 2002.

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informa-se o número do inquérito, a incidência penal, os nomes da vítima e do

indiciado, bem como, o local e a hora em que o delito ocorreu, além de outras

informações que se afigurem de maior utilidade; b) a segunda parte da peça deve

descrever o fato e elencar as provas coligidas no inquérito; c) a terceira parte é a

conclusão, ou desfecho, com ou sem indiciamento do imputado.60

Contudo, se o delito investigado tiver alguma relação com substâncias

entorpecentes, já existem linhas gerais que delineiam a estrutura e os elementos

constantes no relatório. A Lei nº. 11.343/2006, em seu artigo 52, apresenta a

iniciativa do Legislador de reduzir ao máximo a subjetividade na elaboração dessa

peça tão importante:

Art. 52. Findos os prazos a que se refere o art. 51 desta Lei, a autoridade de polícia judiciária, remetendo os autos do inquérito ao juízo: I - relatará sumariamente as circunstâncias do fato, justificando as razões que a levaram à classificação do delito, indicando a quantidade e natureza da substância ou do produto apreendido, o local e as condições em que se desenvolveu a ação criminosa, as circunstâncias da prisão, a conduta, a qualificação e os antecedentes do agente. II - requererá sua devolução para a realização de diligências necessárias. Parágrafo único. A remessa dos autos far-se-á sem prejuízo de diligências complementares: I - necessárias ou úteis à plena elucidação do fato, cujo resultado deverá ser encaminhado ao juízo competente até 3 (três) dias antes da audiência de instrução e julgamento; II - necessárias ou úteis à indicação dos bens, direitos e valores de que seja titular o agente, ou que figurem em seu nome, cujo resultado deverá ser encaminhado ao juízo competente até 3 (três) dias antes da audiência de instrução e julgamento.

Conscienciosamente, a Lei determina que, o relatório do inquérito policial dê

indicação expressa da qualificação jurídica do fato. Isso evita, em tese, que usuários

sejam indiciados como traficantes, por arbitrariedade. O Delegado de Polícia

precisará, assim, explicitar todos os elementos que o levaram às suas conclusões e

ao indiciamento por um ou por outro crime. Como o relatório não pode conter

nenhum juízo de valor, a exigência de justificativa para uma determinada tipificação

penal visa evitar a adoção de critérios abstratos e subjetivos, conforme os quais, a

autoridade policial classificava um crime de tóxico, não apenas pelos elementos

60 Ibid.

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indubitáveis, mas também, com base em sua experiência com casos anteriores, ou

mesmo pressentimento. Isso contraria o princípio de in dubio pro reo, de acordo com

o qual, a qualificação de qualquer delito não pode ser feita enquanto houver dúvida

sobre a realidade estrita do ocorrido.61

1.6 ARQUIVAMENTO

A notitia criminis que enseje o início das investigações policiais não descarta

a necessidade de que a queixa seja ofertada em juízo no prazo legal; ainda que, o

inquérito policial não esteja concluído. Em casos de ação penal de iniciativa privada,

a inexistência de queixa no prazo legal não impede a decadência e a prescrição,

determinantes para o arquivamento do inquérito. A justa causa para a instauração

do inquérito não implica na justa causa para a propositura de ação penal, e no

desenrolar do inquérito, tornar-se evidente que a notitia criminis era falaciosa ou

desproporcional; o arquivamento pode se configurar como uma economia de

esforços administrativos desnecessários e improfícuos. Além disso, a prescrição, a

decadência, e a morte do agente são causas evidentes de extinção da punibilidade e

tanto impedem a instauração do inquérito como podem determinar seu

arquivamento62.

O arquivamento, contudo, não depende da autoridade policial, pois o art. 17

do CPP dispõe que: “A autoridade policial não poderá mandar arquivar autos de

inquérito”.

Além do inquérito propriamente dito, o arquivamento das VPI, que são os

expedientes para Verificação da Procedência das Informações sobre um fato

supostamente delituoso, é aplicável quando não forem constatados os requisitos

para a abertura de inquérito. Caso se constate a atipicidade do fato ou mesmo a

extinção da punibilidade, realiza-se o arquivamento do inquérito policial ou então das

peças de informação. Estas últimas, as VPI, têm natureza meramente declaratória e,

61 MOREIRA, 2006. 62 HESKETH, 2007.

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portanto, não precisam ser encaminhadas à Justiça se houver causa evidente de

extinção da punibilidade ou atipicidade do fato.63

Se após as diligências realizadas durante o inquérito policial e,

eventualmente, depois dos pedidos de dilação de prazo a finalidade do

procedimento extrajudicial não for atingida, ou seja, o exame do Promotor de Justiça

ao referido inquérito, concluir que não há elementos firmes de convicção em torno

de um fato típico, duas alternativas se colocam: o Promotor de Justiça pode requerer

o retorno dos autos à Delegacia de Policia, requisitando novas diligências ou então,

requerer o arquivamento.64

O arquivamento do inquérito policial é, pois, sua paralisação devido à sua

inaptidão de se transformar em ação penal por motivos jurídicos relevantes. Esse

arquivamento é uma causa neutralizante, a qual suspende a vitalidade do inquérito.

Esse procedimento tem cunho social, já que objetiva limpar a imagem de quem

esteja sob investigação extrajudicial, além de uma finalidade jurídica, pois, se

constitui numa medida de economia processual. Não há fundamentos lógicos a

propositura de uma ação penal baseada num inquérito sem elementos suficientes

que sustentem a denúncia ou queixa-crime.65

Os requisitos necessários para o arquivamento do inquérito policial são as

provas inconsistentes, atipicidade do fato ou extinção da punibilidade pela

prescrição. O artigo 107 do Código Penal Brasileiro, estabelece como causas de

extinção da punibilidade, a prescrição, a morte do agente, anistia, graça ou indulto,

pela retroatividade da lei que não mais considera o fato como criminoso,

decadência, perempção, renúncia do direito de queixa, além da autoria

desconhecida.66

Após a conclusão das investigações feitas pela Polícia Judiciária, com seu

respectivo relatório conclusivo (artigo 10, parágrafos 1 e 2º, CPP), as providências

adotadas pelo Ministério Público são o oferecimento da denúncia, a devolução dos

autos à autoridade policial para a realização de novas diligências ou o requerimento

de arquivamento do inquérito policial. Se requerido o arquivamento, a autoridade

63 Ibid. 64 REZENDE, Vinicius Santos de; COELHO, Vânia Maria Bemfica Guimarães Pinto. Arquivamento do Inquérito Policial, 2006. 65 Ibid. 66 REZENDE; COELHO, op. cit..

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judiciária pode concordar com o pedido formulado pelo Ministério Público ou remeter

os autos à Procuradoria Geral de Justiça ou Câmara de Coordenação e Revisão

Criminal, caso esteja em desacordo com proposta ministerial, para que seja feita a

avaliação do pedido de arquivamento (artigo 28, CPP). O pedido de arquivamento

deve ser explícito, ao que a matéria se torna indiscutível, a menos que surjam novas

provas.67

1.6.1 Efeito do Arquivamento

De acordo com Pereira:

É entendimento pacífico na jurisprudência que, uma vez arquivado o inquérito policial ou peças de informação, não é possível ao ofendido ou a quem o represente ou suceda ajuizar ação penal privada subsidiária da pública. Nem mesmo é isso possível se o MP requer diligências. Tal entendimento resulta da interpretação dos artigos 29, que trata do cabimento da ação penal subsidiária, e 18, ambos os dispositivos do CPP. Este último autoriza a autoridade policial a proceder novas pesquisas para apurar infração, cuja apuração originária resultou fracassada, não propiciando elementos suficientes para que o MP oferecesse a denúncia. Em decorrência desse segundo dispositivo, o STF erigiu o enunciado 524, que admite ajuizamento de denúncia em caso de inquérito arquivado, porém apenas com base em novas provas.68

A propositura de ação penal subsidiária está impedida de ser feita quando

há arquivamento, pois, o artigo 29 do CPP, pressupõe a inércia do Ministério Público

quando ele requer o arquivamento do Inquérito Policial ou de peças de informação.

Que seja a inscrição da ação penal subsidiária uma garantia individual disposta pela

Lei Maior, artigo 5º, LIX, não modifica a interpretação dos dispositivos do CPP

mencionados. O Código de Processo Penal comum determina ser impossível ao

ofendido a tentativa de estabelecer a persecução penal em juízo nos crimes de ação 67 LEITE, Ravênia Márcia de Oliveira. O Inquérito Policial e a tese do arquivamento indireto. 24 DE MAIO DE 2009. Disponível em: www.investidura.com.br 68 PEREIRA, Carlos Frederico de Oliveira. Arquivamento de inquérito policial. (2006) Disponível em: <BuscaLegis.ccj.ufsc.br>. Acesso em jun. 2010.

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pública, uma vez que, tenha sido arquivado o inquérito.69 A validade ética dessa

orientação jurisprudencial repousa no fato de que, em última medida, é a própria

sociedade que se pronunciou, já que, cabendo ao Ministério Público a sua defesa,

interpreta-se, por conseguinte, que o pronunciamento deste representa a vontade

daquela. Por outro lado, desconfianças em relação à lisura do procedimento, não

são em geral fundadas porque, o arquivamento de Inquérito Policial e de peças de

informação exige a participação do Poder Judiciário, o qual tem o poder de discordar

do pedido:

[...] quando a última palavra será do procurador-geral, posto que é ele o chefe da instituição ministerial, e o IP e peças de informação têm por destinatário não o juiz, mas o promotor de Justiça que deles necessita para formular a sua opinio delicti. Ademais, é defeso ao juiz obrigar o Ministério Público a oferecer denúncia.70

Tomando-se contudo, a hipotética situação de que, um inquérito seja

arquivado enganosamente, é impossível a ação penal subsidiária e, a oferta

denunciatória dependerá do aparecimento de novas provas, salvo no tocante aos

crimes contra a economia popular, para os quais determina a Lei nº 1.521/51, artigo

7:

Art. 7º Os juízes recorrerão de ofício sempre que absolverem os acusados em processo por crime contra a economia popular ou contra a saúde pública, ou quando determinarem o arquivamento dos autos do respectivo inquérito policial.

Há entretanto, dois inconvenientes para essa possibilidade: em primeiro

lugar, promover um acréscimo desnecessário e volumoso de serviço, sendo que, o

arquivamento defeituoso é a exceção e não a regra; além disso, cria-se uma

desconfiança para com os protagonistas do arquivamento (o promotor de Justiça e o

juiz), pois, presume-se falta de lisura na atuação de ambos, enquanto deve-se,

“presumir sempre a boa-fé, jamais o contrário”.71

69 Ibid. 70 Ibid. 71 PEREIRA, 2006.

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1.6.2 Arquivamento Indireto

Um instituto comum nas esferas judiciais é o denominado arquivamento

indireto, o qual se confunde com o arquivamento implícito, mas os dois são de

naturezas diferentes 72.

Entende-se por arquivamento implícito o fenômeno de ordem processual decorrente de o titular da ação penal deixar de incluir na denúncia algum fato investigado ou alguns dos indiciados, sem expressa manifestação ou justificação deste procedimento. Este arquivamento se consuma quando o Juiz não se pronuncia na forma do art. 28 com relação ao que foi omitido na peça acusatória.73 O arquivamento indireto surge quando o membro do Ministério Público se vê sem atribuição para oficiar em um determinado feito e o magistrado, por sua vez, se diz com competência para apreciar a matéria. O arquivamento indireto nada mais é do que uma tentativa por parte do membro do Ministério Público de arquivar a questão em uma determinada esfera.74

Ou seja, o arquivamento indireto do inquérito policial, decorre da recusa do

órgão do Ministério Público em propor demanda perante Juízo ou Tribunal que,

considera incompetente para o processo e julgamento. Essa recusa, em geral, é

precedida de um requerimento de declínio indeferido pelo órgão jurisdicional.75

Nesses casos, o Artigo 28 do CPP vem sendo aplicado por analogia:

O vigente Código de Processo Penal carece de um artigo que diga claramente quando o Ministério Público deve requerer o arquivamento e, a contrario sensu, quando deve apresentar denúncia. Entretanto, o art. 43 elenca os casos em que o Juiz deve rejeitar a denúncia. Por via de conseqüência, nestas hipóteses previstas, a ação penal não deve ser proposta e o inquérito ou peças de informação devem ser arquivados.76

72 LEITE, 2009. 73 JARDIM, Afrânio Silva. Direito Processual Penal. 11 ed. Rio de Janeiro: Forense, 2007. p. 170 74 LEITE, op. cit. 75 JARDIM, 2007, p. 167ss. 76 Ibid., p. 168.

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A aplicação analógica do artigo 28 do Código de Processo Penal propõe que

o magistrado encaminhe os autos à Justiça e o juiz que receber os autos poderá

suscitar o conflito negativo de competência a ser dirimido pelo Superior Tribunal de

Justiça. O Supremo Tribunal Federal elaborou uma construção teórica que visa o

controle, em segunda instância, de posicionamentos divergentes entre o órgão do

Ministério Público e o juiz. De acordo com essa construção teórica, o juiz, na

ausência de denúncia por parte do Ministério Público, deve receber tal manifestação

como arquivamento, remetendo os autos ao órgão de controle revisional no

respectivo Ministério Público. Assim, o juiz ainda esteja subordinado à decisão de

última instância do parquet, como ocorre em relação ao arquivamento direto.77

77 LEITE, 2009.

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45

2 DO AUTO DA PRISÃO EM FLAGRANTE

2.1 PRISÃO E PREVISÃO CONSTITUCIONAL

O ordenamento jurídico brasileiro prevê duas espécies de prisão: a prisão

com pena e, prisão sem pena. A primeira espécie, também chamada de prisão-

pena, prisão ad poenam ou prisão-sanção, é a aplicação de uma sentença penal

condenatória. Divide-se em reclusão e detenção, sendo que, à pena de reclusão

aplica-se as infrações de maior potencial ofensivo. Deve ser cumprida em regime

fechado, mas, ao condenado sem antecedentes, pode-se aplicar o regime semi-

aberto, se a pena for superior a quatro e inferior a oito anos78.

A detenção é atribuída a delitos com menor potencial ofensivo, sendo que essa pena pode ser cumprida em regime semi-aberto, qualquer que seja a quantidade, desde que não reincidente, salvo se houver necessidade comprovada de transferência para o regime fechado. Também pode ser cumprida em regime aberto, apenas quando a pena for igual ou inferior a quatro anos. Outrossim, existe a prisão pena na modalidade de prisão simples que ocorre na prática das contravenções penais. A pena de prisão simples deve ser cumprida, sem rigor penitenciário, em estabelecimento especial ou seção especial de prisão comum, em regime semi-aberto ou aberto, conforme reza o art. 6º da Lei das Contravenções Penais. A outra espécie de prisão é denominada de prisão sem pena, também conhecida como prisão sem o caráter de pena. Essa prisão não defluiu de condenação penal. O ordenamento jurídico criminal brasileiro permite essa modalidade prisão na prisão administrativa, civil, disciplinar e na cautelar de natureza processual, que vem a ser a prisão anterior à condenação e consiste em uma limitação mais ou menos intensa da liberdade física de uma pessoa, por uma finalidade processual penal. [...] A prisão cautelar de natureza processual se apresenta em cinco modalidades: prisão preventiva em sentido estrito; prisão temporária; prisão resultante de pronúncia; prisão decorrente de sentença condenatória recorrível e; prisão em flagrante [ ...]79

78 GARCIA, Wilson Roberto Barbosa. Da prisão em flagrante: aspectos práticos e doutrinários. 2006. Disponível em: <http://jusvi.com>. Acesso em jun. 2010. 79 Ibid.

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O Código Penal vigente continua a estabelecer duas modalidades de pena

privativa de liberdade, a reclusão e a detenção; a despeito que, essa distinção nunca

tenha sido respeitada, pois, a rigor, detentos e reclusos sempre compartilharam as

mesmas celas. Por outro lado, a manutenção de tal distinção só se valida pelas

disposições do artigo 33, o qual orienta que, a reclusão será cumprida em regime

fechado ou semi-aberto; já a detenção, deve ser aplicada em regime semi-aberto e

aberto.80

A privação de liberdade pode ocorrer como cumprimento de pena (prisão

penal), quando o réu foi julgado e o juiz proferiu sentença condenatória, ou, pode ser

uma prisão sem pena (processual, administrativa). A prisão processual, ou provisória

tem caráter cautelar e abarca tanto a prisão em flagrante quanto a preventiva. A

prisão em flagrante delito é a única que pode ser efetuada sem ordem escrita da

autoridade competente; isso, protege o cidadão do abuso de autoridade de agentes

do Estado.

2.2 CONCEITO DE PRISÃO EM FLAGRANTE

A prisão em flagrante delito é uma modalidade de prisão provisória. São

cinco, essas modalidades, conforme previstas pela doutrina:

[...] flagrante (art. 301 e segs., CPP); preventiva (art. 311 e segs., CPP); em virtude de pronúncia (art. 408, §1o, CPP); decorrente de condenação recorrível (art. 393, I, e 594, CPP); e temporária (Lei 7.960/89). As duas primeiras (flagrante e preventiva) encontram-se previstas no título IX do Código de Processo Penal. Todavia, ainda àquelas previstas fora do título IX (“da prisão”), aplicam-se as disposições gerais do capítulo I do Título IX.

[...]

A prisão pode ser cumprida a qualquer momento (dia ou noite), respeitadas as normas sobre inviolabilidade do domicílio (art. 5o, XI,

80 OLIVEIRA, Renata Soares, Tipos de Prisões: Liberdade Provisória e Relaxamento de Prisão. 2007. Disponível em: <BuscaLegis.ccj.ufsc.br>. Acesso em jun. 2010.

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CR/88): a casa é asilo inviolável, salvo hipóteses de flagrante, desastre, socorro e ordem judicial (durante o dia).81

A Carta Magna, que prevê a prisão em flagrante, contudo, não é explicita

quanto ao seu conteúdo. Assim, o norteador para a elaboração do tipo processual é

o art. 302 do CPP. Para que haja estado de flagrância que autorize a prisão, o

elemento temporal é essencial. Os incisos do art. 302 do CPP dilatam, de forma

progressiva, o limite temporal que caracteriza o flagrante delito.

O texto da Constituição Federal que prevê a prisão em flagrante, citado

anteriormente, está presente no art. 5 º, inciso LXI, segundo o qual:

[...] ninguém será preso senão em flagrante delito ou por ordem escrita e fundamentada de autoridade judiciária competente, salvo nos casos de transgressão militar ou crime propriamente militar, definidos em lei.

Deste modo, cuida-se do direito à liberdade a essência dos direitos

fundamentais, tendo a Carta Maga brasileira, ademais, ressaltado o trâmite do

devido processo legal para a privação da liberdade de alguém.

Neste sentido, dispõe Vicente:

Sendo o direito a liberdade um dos mais elementares direitos fundamentais, é natural que a Constituição, como uma de suas garantias, considere a prisão de um indivíduo medida marcadamente excepcional, restrita a casos determinados, ou somente passíveis de ser imposta por autoridade específica. [...] A Constituição de 1988 limitou às autoridades judiciárias a competência para determinar a prisão, salvo quando se trata de prisão em flagrante ou militar. Assim, a ordem de prisão terá que partir do Poder Judiciário, ficando extintas, não recepcionadas, todas as normas pretéritas que previam decretação de prisão por autoridades administrativas.82

Desta feita, sabe-se que, ordinariamente, a prisão de qualquer pessoa

deverá ser precedida de ordem judicial fundamentada, sob pena de violação ao 81 IENNACO, 2006, p. 24-5. 82 VICENTE, Paulo. Direito constitucional descomplicado. Rio de Janeiro: Impetus, 2007.

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princípio da liberdade individual. Resguarda, outrossim, a Carta Magna, a garantia

constitucional de concessão de hábeas corpus nos casos de ameaça ou privação da

liberdade de locomoção, por ilegalidade ou abuso de poder das autoridades

competentes. Sobre a necessidade de fundamentação e a caracterização

acautelatória das prisões, assinala Eugênio Pacceli de Oliveira:

[...] as privações da liberdade antes da sentença final devem ser judicialmente justificadas e somente na medida em que estiverem protegendo o adequado e regular exercício da jurisdição penal. Pode-se, pois, concluir que tais prisões devem ser cautelares, acautelatórias do processo e das funções da jurisdição penal. Somente aí se poderá legitimar a privação da liberdade de quem é reconhecido pela ordem jurídica como ainda inocente.83

No entanto, a própria Constituição Federal, bem como a legislação

processual penal, autorizam a prisão do agente tido como criminoso, sem ordem da

autoridade judicial competente, nos casos em que, o mesmo se encontra em estado

de flagrância, sendo que, a prisão poderá ser efetuada por qualquer do povo ou pela

autoridade judicial e seus agentes. Assim, tendo a norma constitucional outorgado

aos cidadãos o poder de privar a liberdade individual do criminoso, a legislação

processual penal, forte no art. 302, regulou as situações de flagrância, in verbis:

Art. 302. Considera-se em flagrante delito quem: I - está cometendo a infração penal; II – acaba de cometê-la; III – é perseguido, logo após, pela autoridade, pelo ofendido ou por qualquer pessoa, em situação que faça presumir ser autor da infração; IV – é encontrado, logo depois, com instrumentos, armas, objetos ou papéis que façam presumir ser ele o autor da infração.

Não se pode olvidar que a prisão de qualquer pessoa deve ser incontinenti

comunicada ao Juízo competente, isto dentro de 24 horas, depois do ato privativo,

com o fito de que homologue ou não, a prisão em flagrante.

83 OLIVEIRA, Eugênio Pacelli, Curso de processo penal, 11. ed. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2009.

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2.3 ESPÉCIES DE FLAGRANTE DELITO

2.3.1 Flagrante Delito Próprio

A classificação da doutrina, no que diz respeito ao flagrante, é cediça.

Acerca do tema, é o escólio de Nucci:

Flagrante próprio ou perfeito (inciso I): ocorre quando o agente está em pleno desenvolvimento dos atos executórios da infração penal. Nessa situação, normalmente havendo a intervenção de alguém, impedindo, pois, o prosseguimento da execução, pode redundar em tentativa [...]. Flagrante Próprio ou perfeito (inciso II) ocorre quando o agente terminou de concluir a prática da infração penal, em situação de ficar evidente a prática do crime e da autoria. Embora consumado o delito, não se desligou o agente da cena do crime, podendo, por isso, ser preso [...].84

Ademais, o Código de Processo Penal, impõe formalidades para a

manutenção da prisão em flagrante. Assim, o preso deverá ser apresentado perante

a autoridade policial competente, a fim de que, após o interrogatório do acusado,

bem como o das testemunhas que presenciaram o fato, possa o Delegado de Polícia

aferir, defronte à imputação que é feita ao agente que perpetrou a conduta ilícita, a

medida correta a ser tomada, seja o relaxamento da prisão em flagrante ou o

recolhimento à prisão.85

O autor e pesquisador Carvalho diz o mesmo, de maneira mais sintética,

porém, menos detalhada no tocante às circunstâncias e elementos relacionados ao

delito: “Diz-se flagrante no sentido próprio,quando o agente é surpreendido na

infração penal, isto é, surpreendido no instante mesmo da prática da infração, ou

então quando acaba de cometê-la”. 86

84 NUCCI, Guilherme de Souza. Código de processo penal. 8. ed. ver, atual. São Paulo: Revista dos Tribunais. 2008. 85 NUCCI, op. cit. 86 CARVALHO, Marco Antonio Coelho de. Prisões provisórias. 2009. Disponível em: <BuscaLegis.ccj.ufsc.br>. Acesso em jun. 2010.

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2.3.2 Flagrante Delito Impróprio

O flagrante impróprio se dá quando alguém é perseguido logo após a

ocorrência do fato delituoso, por agente policial ou qualquer pessoa e, em situação

onde presuma-se que, aquele que é alvo da perseguição, seja o autor da infração.

Como não se tem a visibilidade do fato e sim a fuga, é necessário que haja cuidado

na interpretação desse preceito legal, já que, são inúmeras as razões que podem

justificar o afastamento de alguém que se ache em situação na qual possa ser

identificado como autor do fato. Afastamento este que, pode se afigurar

enganosamente como a fuga do autor do crime. 87

Conforme Nucci:

Flagrante impróprio ou imperfeito (inciso III): ocorre quando o agente conclui a infração penal – ou é interrompido pela chegada de terceiros – mas sem ser preso no local do delito, pois consegue fugir, fazendo com que haja perseguição por parte da polícia, da vitima ou de qualquer pessoa do povo [...].88

Já Mossin considera que:

[...] somente ficará caracterizado o flagrante delito quando o agente for surpreendido imediatamente após a sua consumação. Deve haver uma rigorosa imediatidade entre o cometimento do crime e o surpreendimento de seu autor. Caso contrário, deixa de haver a flagrância delitiva, não podendo o agente ser preso.89

Há urgente necessidade de que, a perseguição, se dê logo após o

cometimento do crime, pois, como esclarece Mossin: “[...] para legitimar-se a

presunção do inciso sub examine, é inconcusso que haja relação temporal imediata

entre a infração praticada e as circunstâncias em que se funda a presunção”.90

87 CARVALHO, 2009. 88 Ibid. 89 MOSSIN, Heráclito Antônio. Comentários ao código de processo penal: à luz da doutrina e da jurisprudência. Barueri: Manole, 2005, p. 584. 90 Ibid., p. 586.

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Tourinho Filho assevera, contudo que, a duração da perseguição não é

relevante, desde que, não seja excessiva, importa a sua subseqüência imediata ao

ato delituoso: “Entretanto, se a perseguição iniciar-se imediatamente após a

infração, pouco importa que a prisão se realize dentro de cinco ou vinte horas. O que

se exige é que a perseguição seja logo após a prática da infração”.91

2.3.3 Flagrante Delito Presumido

O flagrante presumido é, conforme a lei, a hipótese de alguém que seja

encontrado com instrumentos, armas, objetos ou papéis permitindo presumir-se que

seja ele o autor da infração. Noutras palavras, ocorre quando uma pessoa é

encontrada portando algo que se caracterize como um indício da autoria, ou

participação na prática, de um delito recém cometido.92

Na ótica de Nucci:

Flagrante Presumido ou Ficto (Inciso IV): não deixa de ser igualmente impróprio ou imperfeito. Constitui-se na situação do agente que, logo depois da prática do crime, embora não tenha sido perseguido, é encontrado portando instrumentos, armas, objetos ou papéis que demonstrem, por presunção, ser ele o autor da infração penal [...].93

Conforme o inciso IV do artigo 302, o caso de flagrante presumido é aquele

em que, tem-se uma quase flagrância ou uma flagrância ficta. Desconhecido é ainda

o autor do delito, mas, a perseguição iniciada imediatamente após o cometimento do

delito, faz com que se encontre, em tempo não muito dilatado, um indivíduo suspeito

de porte da arma, instrumento ou objeto que, faça supor, tenha sido usado no crime.

Nas palavras de Mossin:

91 TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Processo penal. 22. ed. rev. atual. ampl. São Paulo: Saraiva, 2000, p. 442. 92 CARVALHO, 2009. 93 NUCCI, 2008.

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[...] deve ser o suposto autor do fato punível encontrado com objetos relacionados com o delito também em tempo rigorosamente próximo ao seu cometimento, ou seja, quando ele ainda estiver ardendo. Logo, se o encontro der-se em tempo não razoável não haverá a configuração do quase-flagrante, uma vez que a situação foge do fingimento preconizado pelo legislador. 94

Nos casos de quase flagrância (incisos III e IV), há uma margem mais ampla

de presunção da não-autoria, logo, maior deve ser a atenção da autoridade

competente em relação ao procedimento a ser adotado, já que, o valor probatório do

flagrante próprio, é muito maior que o do flagrante ficto.

2.3.4 Flagrante Preparado

Há outras modalidades de flagrante cujos elementos e circunstâncias não

estão previstos pelo artigo 302 do CPP, como por exemplo, o flagrante provocado

ou preparado. Nele, a situação de flagrância sofre uma intervenção antes de

praticado o crime. Ocorre em casos onde, a polícia ou a vítima, tem de antemão,

conhecimento de que o crime pode vir a ser realizado, e dado esse conhecimento,

prepara-se para a prisão em flagrante, antes que o delito seja consumado por

completo. Difere do flagrante esperado por este ser considerado válido, por parte da

doutrina, enquanto o flagrante preparado não é entendido como detentor de tal

validade. A principal reprovação do flagrante preparado é o fato de que esteja

contaminado por ação de terceiro que, prepara uma cena para que o crime se

consume, e que, não será considerado culpado. No dizer de Oliveira:

A rejeição ao flagrante dito preparado se dá geralmente por dupla fundamentação, a saber: a primeira, porque haveria na hipótese a intervenção decisiva de um terceiro a preparar ou a provocar a prática da ação criminosa, e, assim, do próprio flagrante; a segunda (fundamentação) porque dessa preparação, por parte das autoridades e agentes policiais, resultaria uma situação de

94 MOSSIN, 2005, p. 588.

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impossibilidade de consumação da infração de tal maneira que a hipótese se aproximaria do conhecido crime impossível.95

A súmula 145 do STF discorre sobre o flagrante preparado, seu texto

determina que: “Súmula nº 145. Não há crime, quando a preparação do flagrante

pela polícia torna impossível a sua consumação”.

Mesmo com tal entendimento por parte do STF, há divergência acerca do

assunto na doutrina. Heráclito Mossin, por exemplo, entende que a prisão em

flagrante, mesmo com a ação viciada pelo preparo policial anterior à conduta, é

válida.96

O entendimento em relação ao tráfico de drogas, no entanto, mesmo

havendo flagrante preparado, é consensual desde quando vigorava a Lei 6.368/76.

Qual seja, por se tratar de crime permanente, não há que se falar em flagrante

preparado, pois a ação delituosa perpetua-se no tempo.

2.3.5 Flagrante Esperado

No caso do flagrante esperado não há que se falar em invalidade, tendo em

vista, a não intervenção direta de terceiros na prática do delito. O que há, na

verdade, é a ciência de que o delito será cometido.97

Para doutrina majoritária no flagrante preparado há a figura de alerta quer por vigilância assídua ou até mesmo por recebimento de informações, sem incitar a pratica da infração. Assim, no flagrante esperado há unicamente a espera, por causas já conhecidas, de que o agente irá cometer o fato criminoso, e em praticando, terá como conseqüência a consumação do delito. O flagrante esperado difere do provocado, visto que, naquele há o agente provocador como um dos sujeitos, ou seja, ocorre o induzimento, enquanto que na

95 OLIVEIRA, Eugênio Pacelli de. Curso de processo penal. 5. ed. rev. atual. ampl. Belo Horizonte: Del Rey, 2005 p. 413. 96 MOSSIN, 2005, p. 591. 97 OLIVEIRA, op. cit., p. 414.

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modalidade em questão, acontece o monitoramento, a vigilância, não tendo a ação direta de influenciar como elementar do crime98.

A autoridade policial, aqui, apenas aguarda e observa, sem participar ou

provocar a ação delituosa do acusado, sendo, portanto, válido o flagrante nesse

caso.99

2.3.6 Flagrante Forjado

O flagrante forjado ocorre quando o agente policial ou outro indivíduo

qualquer, forja a prova de um suposto crime com interesse na incriminação do

suspeito, de forma que, este sofra a prisão em flagrante delito. Em geral, se dá com

indivíduo que possui habitualidade criminal. Contudo, é caso em que não há

qualquer situação de flagrante delito, muito menos a prática, pelo suspeito, do crime

que lhe é atribuído. Os autores de tal manobra devem responder penalmente por

manifesta violação de norma de direito. 100

2.3.7 Outros Flagrantes

O flagrante diferido ou controlado é possibilitado, principalmente, em razão

do que está disposto na Lei 9.034 de 1995, que trata dos crimes praticados por

organizações criminosas. Por necessitar de uma investigação mais minuciosa e

complexa, a lei assegura o retardamento da atuação policial, leia-se da prisão em

flagrante, no tempo. Assim, a prisão poderá vir a ocorrer no momento mais eficaz

98 OLIVEIRA, Renata Soares, Tipos de Prisões: Liberdade Provisória e Relaxamento de Prisão. 2007. Disponível em: http://www.viajus.com.br/viajus.php?pagina=artigos&id=1175>. Acesso em set. 2010. 99 Ibid. 100 OLIVEIRA, 2005, p. 416.

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das investigações de condutas delituosas da organização criminosa, diferindo-se no

tempo, ou seja, adiando-se a possibilidade da prisão em flagrante, porquanto

interessante à prévia investigação. Além disso, a Lei 10.217 de 11 de abril de 2001,

veio alterar os artigos 1º e 2º da lei supra citada, para inserir no texto destes, como

examina Oliveira101, a:

[...] possibilidade de se permitir a captação e a interceptação ambiental de sinais eletromagnéticos, óticos ou acústicos, e o seu registro e análise, mediante circunstanciada autorização judicial (art. 2º, V, Lei 9.034/95).

Quanto ao crime permanente, para o qual a prisão em flagrante delito é

válida a qualquer momento, de acordo com definição de Capez, é o crime cujo:

[...] momento consumativo se protai no tempo, e o bem jurídico é continuamente agredido. A sua característica reside em que a cessação da situação ilícita depende apenas da vontade do agente, por exemplo, o seqüestro (art. 148 do CP)102.

Em outras palavras, o crime se consuma com uma ação, mas, o seu

resultado é prolongado no tempo. Nucci dá um exemplo esclarecedor:

Aquele que seqüestra determinada pessoa, enquanto a detiver em seu poder, cerceando sua liberdade, está em franca execução do crime. O delito consumou-se no momento da privação da liberdade, arrastando esse estado na linha do tempo, pois continua a ferir o bem jurídico protegido. Logicamente, por uma questão de bom senso, cabe prisão em flagrante a qualquer momento (art. 303, do CPP)103.

Em relação ao crime habitual, seu flagrante se assemelha ao flagrante em

infrações permanentes. A distinção entre eles está na definição de crime habitual e

de crime permanente.

101 OLIVEIRA, 2005, p. 417. 102 CAPEZ, 2005, p. 252. 103 NUCCI, Guilherme de Souza. Código de processo penal comentado: estudo integrado com o direito penal e execução penal, apresentações esquemáticas da matéria. 4. ed. rev. atual. ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2005, p. 538.

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Como se trata de um crime que se manifesta pela pluralidade de ações, não

há, estritamente falando, uma prisão em flagrante delito, já que, não existe um

momento preciso no qual o delito se consuma. Já, o flagrante em fato punível

continuado tem um critério para efeito da prisão em flagrante”104. De acordo com

Sznick:

O delito continuado é uma série de ações que são, por si, crimes autônomos que são unificados, pelo legislador, como se fossem crime único. Por serem várias ações, cada uma delas se constitui em delito e a descoberta de uma dessas ações em flagrante positiva o crime. Verdade que o flagrante interrompe a série continuada de crimes, colocando aí um fim em relação à série de crimes continuados anteriores à flagrância.105

Há, neste caso, a possibilidade de se praticar a prisão em flagrante em

qualquer momento em que seja cometida a conduta delituosa. O exemplo de Mossin

ajuda a esclarecer:

Se o caixa de um supermercado vem de forma constante subtraindo valores por ele recebidos, nada impede que em determinado momento em que está realizando nova subtração seja preso em flagrante. Os furtos anteriores não impossibilitam, devido às suas autonomias, que se caracteriza o flagrante, que no caso atinge um só evento típico de modo isolado106.

Essas outras espécies de flagrante, contudo, não são aplicáveis ao tema

central desse trabalho. Afiguram-se, portanto, nestas páginas apenas como

elementos complementares às possibilidades de prisão em flagrante, posto que,

aqui, trata-se das prisões cuja motivação são as condutas enquadradas na Lei

11.343/06.

104 Ibidem, p. 597. 105 SZNICK, Valdir. Liberdade, prisão cautelar e temporária. São Paulo: Leud. 1994, p. 378. 106 MOSSIN, 2005, p. 597.

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2.4 SUJEITOS DO FLAGRANTE DELITO

Aquele que leva o preso à presença da autoridade judicial, o chamado

condutor ou sujeito ativo, na maior parte dos casos, é o próprio indivíduo que deu

voz de prisão àquele que cometeu o delito. Este é chamado na doutrina de

conduzido ou sujeito passivo da prisão em flagrante delito.

2.4.1 Sujeito Ativo (Condutor)

A determinação dos sujeitos ativos com capacidade para prender o indivíduo

que esteja em situação de flagrante delito é feita pela lei processual penal. O artigo

301 do CPP dispõe que: “[...] qualquer do povo poderá e as autoridades policiais e

seus agentes deverão prender quem quer que seja encontrado em flagrante delito”.

Ou seja, é dada ao particular a faculdade de vir a prender quem comete ou

acabou de cometer a ação delituosa devido ao interesse comum no bem estar

social; enquanto que, a autoridade policial e seus agentes, estão obrigados a

efetuarem a prisão quando encontrarem um indivíduo em flagrante delito pelo dever

jurídico que lhes é atribuído.

2.4.2 Sujeito Passivo (Conduzido)

A Lei, no entanto, não é explícita em relação ao sujeito passivo da prisão em

flagrante. Como não há distinção, seria de se supor que, qualquer um pode vir a ser

um preso em flagrante delito. Contudo, há várias exceções, segundo as quais, pelo

menos momentaneamente, um indivíduo não pode ser preso em flagrante. Essas

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exceções são reguladas pela função que o indivíduo exerce no Estado Democrático

de Direito. Como observa Mossin107:

Os representantes diplomáticos, chefes de governos estrangeiros, sua comitiva e demais pessoas que gozam de imunidade, em relação às quais não se aplicam a lei penal e processual penal pátrias. (art. 1º do CPP).

Deputados federais e senadores também não podem ser presos em

flagrante delito, a não ser que, tenham praticado crime inafiançável, conforme o

artigo 53, § 2º, da Constituição Federal, ou caso tenham cometido crime dentro do

Congresso Nacional, de acordo com a súmula 397 do STF.108 Também o presidente

da república, pois reza o artigo 86, § 3º, da Constituição Federal que: “[...] enquanto

não sobrevier sentença condenatória, nas infrações comuns, o Presidente da

República não estará sujeito à prisão”.

O pesquisador Colli enumera ainda uma última exceção:

Os membros do Ministério Público também possuem prerrogativas e somente poderão ser presos por ordem judicial escrita, exceto em caso de flagrante de crime inafiançável. Nesse caso, o membro será, no prazo de 24 horas, apresentado ao Procurador-Geral de Justiça (art. 40. III, da Lei Orgânica Nacional do Ministério Público). 109

Já em relação aos menores de idade, o artigo 106 do Estatuto da Criança e

do Adolescente dispõe que, a prisão em flagrante é uma das poucas situações em

que um adolescente pode ser privado de sua liberdade: “Art. 106 - Nenhum

adolescente será privado de sua liberdade senão em flagrante de ato infracional ou

por ordem escrita e fundamentada da autoridade judiciária competente”.

De acordo com Lopes Jr., num Estado de Direito não é possível que o

sujeito passivo do inquérito e, por extensão, da prisão em flagrante, seja

considerado um mero objeto da investigação face às garantias e princípios de

valorização do indivíduo presentes na Carta Magna e que, forçosamente, exigem

107 MOSSIN, 2005, p. 582. 108 COLLI, Maciel. Algumas Considerações sobre a Possibilidade da Conversão da Prisão em Flagrante Delito para Prisão Preventiva. Porto Alegre: PUC, 2006, p. 66. 109 Ibid.

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uma leitura do CPP, seja feita de forma constitucional, adaptando à realidade de um

verdadeiro Estado de Direito.110

Seguindo a mesma linha de raciocínio de Lopes Jr., Choukr declara que: “O

modelo não pode prescindir de um respeito à figura do suspeito, exteriorizado no

sentido de vê-lo como sujeito das investigações e não como seu objeto”.111

2.4.3 Autoridade Policial

O termo "Autoridade Policial", presente no artigo 69 da Lei 9099/95 gerou

grandes discussões. Prevaleceu em parte da doutrina, o entendimento de que, não

só o Delegado de Polícia poderia elaborar o Termo Circunstanciado e encaminhar

os envolvidos aos Juizados Especiais Criminais. No entanto, o posicionamento

contrário a tal entendimento, atribuindo unicamente ao Delegado de Polícia de

Carreira, integrante da Polícia Civil ou da Polícia Federal, a condição de Autoridade

Policial.112

Fatores jurídicos práticos tornam inviável uma leitura ampliativa do conceito

de "Autoridade Policial" no artigo 69, da Lei 9099/95, mesmo antes do advento da

Lei 11.343/06. Do ponto de vista jurídico, a elaboração do Termo Circunstanciado, a

despeito de que seja um procedimento simples:

[...] é constitucionalmente reservada às Polícias Civis, sob a presidência de Delegados de Polícia de Carreira, Bacharéis em Direito (artigo 144, § 4º, CF) e, em termos semelhantes, à Polícia Federal, também chefiada por Bacharéis em Direito, Delegados de Polícia Federais (artigo 144, § 1º, IV, CF).113

Ainda que se aceite a ampliação do conceito de Autoridade Policial, nem a

Constituição e nem a Lei 9099/95, atribuem funções de polícia judiciária a outros 110 LOPES JR., 2006, p. 145. 111 CHOUKR, Fauzi Hassan. Garantias Constitucionais na Investigação Criminal. 3ª ed., Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2006, p. 139. 112 CABETTE, 2007. 113 Ibid.

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órgãos de Segurança Pública, como a Polícia Militar, por exemplo. Tais funções são

atribuições da Polícia Civil. Qualquer ato em contrário é inconstitucional, ou como diz

Tavares, é uma "fraude à Constituição":

[...] todo ato que, aparentemente conforme com o texto da Constituição, acabe por minar seus fundamentos ou por distorcer suas finalidades, ainda que se utilize de meios e formas admissíveis e previstos constitucionalmente.114

A impossibilidade prática de uma interpretação ampliativa do conceito resulta

da deficiência jurídica na formação do Policial Militar. Isso prejudica ou impede a

devida tipificação de condutas.

Atribuir a condição legal de Autoridade Policial a qualquer policial é o mesmo que atribuir a qualidade de Autoridade Judicial ao meirinho, ao esbirro, ao beleguim, ao escrevente, ao vigilante judiciário ou ao chofer do Presidente do Tribunal. 115

A controvérsia gerada acerca do conceito de Autoridade Policial torna-se

mais clara com a Lei 11.343/06. No tocante às condutas que se enquadrem em seu

artigo 28, os artigos 48, § 3º e 4º, dispõem:

§ 3o Se ausente a autoridade judicial, as providências previstas no § 2o deste artigo serão tomadas de imediato pela autoridade policial, no local em que se encontrar, vedada a detenção do agente. § 4o Concluídos os procedimentos de que trata o § 2o deste artigo, o agente será submetido a exame de corpo de delito, se o requerer ou se a autoridade de polícia judiciária entender conveniente, e em seguida liberado.

Claro está, portanto, que a Autoridade Policial com poder de substituir a

Autoridade Judicial é o Delegado de Polícia, pois, o termo Autoridade de Polícia

Judiciária não pode ser aplicado a qualquer policial.

114 TAVARES, 2007, p. 8. 115 PENTEADO FILHO, Nestor Sampaio. Da inconstitucionalidade do Provimento n. 758/2001 do Conselho Superior da Magistratura de São Paulo (conceito de autoridade policial na Lei n. 9099/95). 2001. Disponível em: <www.jusnavigandi.com.br>. Acesso em jun. 2010.

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[...] a Lei 11.343/06 não deixa margem a qualquer espécie de polissemia ou interpretação ampliativa referente ao termo "Autoridade Policial". Muito ao contrário, deixa patente que a "Autoridade Policial" a que se refere é somente uma, qual seja, a "Autoridade de Polícia Judiciária", sinônimo incontestável de "Delegado de Polícia de Carreira" civil ou federal. 116

No mesmo sentido, argumenta Oliveira sobre a interpretação inequívoca do

termo Autoridade Policial, no texto da Lei 11.343/06:

Note-se que o legislador empregou no sobredito dispositivo a expressão ‘autoridade de polícia judiciária’, que vem a ser os Delegados de Polícia Civil e Federal, no âmbito respectivo das Justiças Estaduais e Federal, afastando antiga discussão surgida à época da publicação da Lei 9099/95, cuja redação adotava o termo ‘autoridade policial’, havendo divergência acerca de seu exato sentido, especificamente se estaria inserido em seu âmbito o Policial Militar.117

Preconiza o artigo 13 do CPP que:

Incumbirá ainda à autoridade policial: I – fornecer às autoridades judiciárias as informações necessárias à instrução e julgamento dos processos; II – realizar as diligências requisitadas pelo juiz ou pelo Ministério Público; III – cumprir os mandados de prisão expedidos pelas autoridades judiciárias; IV – representar acerca da prisão preventiva.

Quem é, pois, a autoridade policial referida no Código, Delegados de Polícia

ou qualquer policial? Tomando por base a Constituição Federal, conclui-se que, a

Polícia Civil tem como atribuição as funções de polícia judiciária e a apuração de

infrações penais, salvo as militares; já, a Polícia Militar deve ocupar-se da

manutenção da ordem pública. Deduz-se então que, a autoridade policial

responsável pela condução da investigação criminal, ou seja, a função de Polícia

Judiciária, é o Delegado de Polícia de carreira. Para que não se configure nem

impropriedades, nem abuso de poder nas funções policiais, no que se refere à

116 CABETTE, 2007. 117 OLIVEIRA, 2007, p. 45.

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prisão em flagrante e ao inquérito, é necessário que, se aclare quais são as

atribuições exclusivas da Polícia Civil e, quais são utilizadas para manutenção da

ordem pública.118

Disciplina o artigo 4º do CPP que: “A polícia judiciária será exercida pelas

autoridades policiais no território de suas respectivas circunscrições e terá por fim a

apuração das infrações penais e da sua autoria”.

Apenas ao Delegado de Polícia, enquanto exerce a função de polícia

judiciária, considera-se como Autoridade Policial para a lavratura do auto de prisão

em flagrante, bem como prisão preventiva, formalização do Auto de Apreensão de

adolescente infrator, indiciamento, etc. Qualquer outro agente policial fizer uso de

tais atribuições, atua em desacordo com a constitucionalidade. Tal procedimento

pode configurar a tipificação penal de usurpação de função pública. Além disso, a

Constituição Federal em seu artigo 144 define as atribuições policiais; entende-se

que, o texto da Carta Magna deve ser respeitado em sua íntegra, num Estado

Democrático de Direito.119

Mesmo antes de 1988, conforme o artigo 241 do Código de Processo Penal,

via-se que, somente ao Delegado de Polícia eram conferidas as atribuições de

Autoridade Policial: “Quando a própria autoridade policial ou judiciária não a realizar

pessoalmente, a busca domiciliar deverá ser precedida da expedição de mandado”.

Se qualquer outro policial pudesse ser considerado como a Autoridade

Policial, não haveria necessidade expedir-se mandado. O mesmo se dá com a

lavratura do auto de prisão em flagrante. Há boas razões para isso: ao Delegado de

Polícia, exige-se que seja Bacharel em Direito e que comprove seus conhecimentos

jurídicos por meio de concurso público, de modo análogo a qualquer carreira

jurídica. Tal exigência na condição de "juiz de fato" que exerce, pois a ele cabe

depurar eventuais irregularidades de uma ocorrência que, por vezes, é apresentada

no calor dos acontecimentos. Já, a um policial militar não se exige essa formação

jurídica, logo, não pode analisar juridicamente casos concretos e, de imediato,

decidir se o fato é típico, antijurídico, se há alguma causa que determine a extinção

de punibilidade ou excludente de culpabilidade, nem definir com precisão se o delito

é de menor potencial ofensivo ou não. Para que se elabore um Termo, não há 118 CARVALHO, 2007. 119 Ibid.

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necessidade de conhecimento jurídico, entretanto, deliberar pela sua feitura e

analisar o caso concreto, tipificando-o corretamente, exige a formação técnica.120

Conforme disserta o autor Jorge, à Polícia Militar cabe o policiamento

ostensivo e preventivo com vistas na preservação da ordem pública. As funções de

polícia judiciária são da alçada da Polícia Civil. Já a autoridade policial, referida pelo

artigo 69, caput, da Lei 9.099/95, é o ocupante do cargo de Delegado de Polícia da

unidade policial da respectiva circunscrição, seja de carreira ou não (possibilidade

esta que está em desacordo com parte da Doutrina). Quando a prisão em flagrante

delito é feita pela polícia militar, deve o preso ser conduzido à autoridade civil

competente para a lavratura do auto.121

2.5 AUTO DE PRISÃO EM FLAGRANTE

O Auto de Prisão em Flagrante é um documento elaborado pela autoridade

policial, no qual devem constar as características e circunstâncias do delito cometido

e da prisão. Não há um prazo estipulado para que seja lavrado, mas, como o auto

de culpa deve ser entregue em até vinte e quatro horas após a afetivação da prisão,

a lavratura do auto da prisão em flagrante deve se dar também nesse ínterim.

Determina o artigo 290 do CPP que, o auto de flagrante seja elaborado no município

em que ocorreu a prisão, a despeito de que, o delito tenha sido cometido noutra

localidade. Na ausência de autoridade apta para a elaboração do auto no município

em que aconteceu o flagrante, o preso deve ser levado até o município mais próximo

onde haja autoridade competente para tal.122

A seqüência para a elaboração do auto de prisão em flagrante deve ser a

seguinte:

120 CARVALHO, 2007. 121 JORGE, Higor V. Nogueira. A “carnavalização” do ordenamento jurídico e o provimento 758/01. 2009. Disponível em: <BuscaLegis.ccj.ufsc.Br>. Acesso em jun. 2010. 122 RIOS, André Ricardo de Oliveira. Prisão em Flagrante. 1986. Disponível em: <www.direitonet.com.br>. Acesso em jun. 2010.

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Em primeiro lugar, a autoridade policial deve ouvir o condutor, ou seja,

aquele que conduziu o preso desde o local do crime até a delegacia, seja agente

policial ou qualquer do povo. Não há a necessidade de que o condutor tenha

presenciado o crime, ou que seja aquele que deu voz de prisão ao conduzido. Deve

a autoridade em seguida ouvir pelo menos duas testemunhas. Caso o condutor

tenha presenciado o ilícito, pode ser também ouvido como testemunha. Na hipótese

de que não haja o mínimo de testemunhas requerido, ainda assim, o auto poderá ser

lavrado pela autoridade policial, o qual será então assinado por duas testemunhas

de apresentação, que são pessoas que presenciaram o momento no qual o condutor

apresentou o preso à autoridade123.

Conforme prevêem os artigos 185 a 196 do CPP, a autoridade policial deve

interrogar o indiciado, o qual tem o direito de permanecer em silêncio, de acordo

com o artigo 5, LXIII, da Carta Magna. Caso o preso seja menor de 18 anos é

necessário que se nomeie um curador para acompanhar a lavratura do auto. Sem tal

nomeação, o valor probatório da confissão é retirado. A finalização da lavratura do

auto se dá pela assinatura da autoridade, do condutor, das testemunhas, do curador

e do indiciado. Se este não quiser, não puder ou não souber assinar, o auto deverá

ser assinado por duas testemunhas que tenham presenciado a leitura do auto feita

ao preso. Depois disso, o delegado enviará a sua cópia ao juiz competente, nos

termos do artigo 5, LXII da Lei Maior124.

Em menos de vinte e quatro horas após a prisão em flagrante, a Autoridade

Policial deve redigir a Nota de Culpa, documento pelo qual, o preso é notificado dos

motivos de sua prisão, do nome das testemunhas e do condutor. Caso não seja

entregue essa nota de culpa, o flagrante deve ser relaxado125.

2.6 RELAXAMENTO DA PRISÃO EM FLAGRANTE

De acordo com Lennaco, diz-se que, relaxamento de prisão em flagrante:

123 RIOS, 1986. 124 Ibid. 125 Ibid.

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Confrontando o estudo da prisão provisória com o da liberdade provisória, convém notar que a prisão ilegal deve ser atacada com o pedido de “relaxamento de prisão em flagrante” (ou, eventualmente, habeas corpus), restituindo-se ao preso sua liberdade genuína e incondicional (não provisória). A prisão legal (flagrante) poderá ser desfeita com o pedido de “liberdade provisória – com ou sem fiança” (eventualmente, habeas corpus). Já a prisão preventiva, insubsistentes os requisitos ou os motivos de sua decretação, desafia o pedido de “revogação da prisão preventiva” (eventualmente, habeas corpus). Percebe-se que o habeas corpus (ação autônoma de impugnação, de índole constitucional) é cabível sempre que se verificar restrição (ou ameaça) ilegal ao status libertatis.126

O relaxamento de prisão pode ser definido como a soltura ou cessação da

prisão em flagrante devido à ilegalidade desta. O inciso LXV, do art. 5° da Lei Maior,

garante esse direito ao acusado. O prazo para a solicitação de relaxamento de

prisão em flagrante vai até o pronunciamento da sentença. Caso o pedido de

relaxamento seja julgado improcedente, pode-se impetrar hábeas corpus ao tribunal

competente, mas, se concedido, a condição de liberdade deve ser restituída

imediatamente ao preso. Porquanto, anula a prisão em flagrante, não anula a ação

penal127.

A prisão em flagrante deverá ser relaxada quando ausentes os motivos

ensejadores de manutenção prisional do indivíduo. O artigo 304, § 1º, do CPP

dispõe que:

§ 1º - Resultando das respostas fundada a suspeita contra o conduzido, a autoridade mandará recolhê-lo à prisão, exceto no caso de livrar-se solto ou de prestar fiança, e prosseguirá nos atos do inquérito ou processo, se para isso for competente; se não o for, enviará os autos à autoridade que o seja.

Conforme o texto legal, o conduzido somente pode ser recolhido à prisão se

não houver dúvidas da conduta delitiva. Isso requer um juízo de veracidade

presumida pela autoridade policial por meio daquilo que foi narrado pelo condutor,

pelas testemunhas ou pelo próprio conduzido. Tornaghi ensina que: 126 LENNACO, 2006. 127 OLIVEIRA, 2007.

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Aplicando tudo isso ao que está dito no art. 304, § 1º, do Código de Processo Penal, pode afirmar-se que haverá fundada suspeita contra o conduzido quando os fatos apontados pelas pessoas que depuserem perante a autoridade permitirem ter como provável que ele, conduzido, seja autor da infração. Não basta a suspeita, a suposição, a conjetura, a dúvida; é necessária a presunção fundada em fatos, em realidade. Evidentemente só quem pode saber se há suspeita, ou não, é a autoridade que preside ao ato e à qual a lei deixou a valoração das provas nesse primeiro momento. Mas esse, como todos os atos da autoridade policial, está sujeito ao posterior contraste do juiz a quem a prisão é comunicada128.

A autoridade policial pode relaxar a prisão em flagrante delito se não obtiver

indícios claros da autoria do crime na narração dos fatos pelos sujeitos da prisão.

[...] encerrada a lavratura do auto de prisão em flagrante e resultado das inquirições efetuadas pela autoridade “fundada suspeita contra o conduzido”, mandará ele recolhe-lo à prisão. A contrario sensu, se não surgir essa “fundada suspeita” das declarações colhidas no auto, a autoridade deverá relaxar a prisão129.

No caso de livrar-se solto, ou seja, “defender-se em liberdade, sem

necessidade de dar qualquer garantia ou assumir qualquer compromisso perante a

autoridade”130, o conduzido deverá ser posto em liberdade imediatamente após a

lavratura do auto de prisão em flagrante. Essa situação tem amparo legal no art.

321, I e II do Código de Processo Penal. Nos casos de crime afiançável, previstos no

artigo 322 do Código de Processo Penal, a autoridade policial deverá relaxar a

prisão em flagrante concedendo liberdade provisória ao conduzido.

A respeito da observação feita no parágrafo anterior, faz-se salutar o estudo

do artigo 310 do Código de Processo Penal, o qual lida com as hipóteses onde o

juiz, ao verificar que o fato praticado pelo conduzido enquadra-se em uma das

128 TORNAGHI, Hélio. Curso de processo penal: volume 2. 6. ed. São Paulo: Saraiva, 1989. p. 67. 129 MIRABETE, Julio Fabbrini. Código de processo penal interpretado. 11. ed. São Paulo: Atlas, 2003. p. 769. 130 TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Código de processo penal comentado: volume 1: arts. 1º a 393. 7. ed. rev. atual. São Paulo: Saraiva, 2003. p. 681.

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circunstâncias excludentes de antijuridicidade previstas no art. 23, I, II e III, relaxa a

prisão em flagrante por ausência de ação juridicamente reprovável.

A redação do art. 310 do CPP assim rege:

Art. 310 – Quando o juiz verificar pelo auto de prisão em flagrante que o agente praticou o fato, nas condições do art. 19, I, II e III, do Código Penal, poderá, depois de ouvir o Ministério Público, conceder ao réu liberdade provisória, mediante termo de comparecimento a todos os atos do processo, sob pena de revogação. Parágrafo único. Igual procedimento será adotado quando o juiz verificar, pelo auto de prisão em flagrante, a inocorrência de qualquer hipóteses que autorizam a prisão preventiva (arts. 311 e 312).

Por meio da reforma penal dada pela Lei 7.209 de 11 de julho de 1984, onde

se lê “nas condições do art. 19, I, II e III”, deve-se entender como sendo o texto do

art. 23, I, II e III. Como bem observa Mossin, trata-se de “mera questão de

renumeração, uma vez que o conteúdo normativo no antigo art. 19 do Código Penal

revogado continua sendo o mesmo no art. 23 do diploma vigente”.131 Nesses casos,

a prática do fato típico está amparada sob uma das causas excludentes de

antijuridicidade, quais sejam, as previstas no art. 23 do CP, legítima defesa, estado

de necessidade, estrito cumprimento do dever legal e exercício regular de direito. Na

observância dessa situação deverá o juiz relaxar a prisão em flagrante, tendo em

vista o conduzido estar amparado por norma legal que lhe assegura ter agido em

conformidade à lei penal, não podendo ser punido por esta. Assim esclarece Tucci:

“repugna, na verdade, ao senso comum manter preso o agente, quando se tem

consciência de sua atuação naquelas circunstâncias aptas a retirar-lhe o caráter de

ilicitude penal”132.

Apesar da matéria relativa às causas excludentes de antijuridicidade ser de

mérito, a concessão de liberdade provisória nesses casos não deve ser encarada

como de antecipação de sentença absolutória. Como observa Mossin:

[...] isto porque, em última análise, a mantença do indivíduo na enxovia deve ser uma medida excepcional, que deve ser evitada,

131 MOSSIN, 2005. p. 612. 132 TUCCI, Rogério Lauria. Persecução Penal, Prisão e Liberdade. São Paulo: Saraiva, 1980.

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dentro do possível, até que haja o trânsito em julgado formal da decisão de que vier a dar provimento à pretensão punitiva133.

Trata-se de situação em que o magistrado, ao verificar a existência de elementos suficientes à conclusão de que se trata de fato típico, acobertado pelo art. 23 do CP, concederá a liberdade provisória evitando a manutenção da prisão.

2.7 INCORRÊNCIA DE FLAGRANTE: ART. 317 DO CÓDIGO DE PROCESSO

PENAL

Conforme preceitua o art.317 do CPP: "a apresentação espontânea do

acusado à autoridade não impedirá a decretação da prisão preventiva nos casos em

que a lei a autoriza".

Sobre o tema, Mirabete afirma que:

Deve-se considerar, entretanto, que a apresentação espontânea do acusado, para ser preso, se aliada a sua primariedade e outras condições pessoais, é indício de que não há necessidade ou conveniência da custódia, ainda que já decretada. Com maior razão, também se tem entendido que a apresentação do autor do fato de autoria ignorada ou imputado a outrem pode indicar a desnecessidade da medida134.

No mesmo sentido, Tomaghi considera que: “Apresentação espontânea [...]

pode ser levada em conta pelo juiz como elemento de convicção, pois não deixa de ser,

quase sempre, indício de que o acusado não se quer subtrair à ação da justiça”.135

Sobre a prisão em flagrante quando o autor de apresentar

espontaneamente, Espíndola entende que:

133 MOSSIN, 2005, p. 613. 134 MIRABETE, 2006, p. 571. 135 TORNAGHI, Hélio Bastos. Instituições de processo penal. São Paulo: Saraiva, 1978, p. 342.

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Não é de ser recolhido à prisão provisória o indivíduo acusado, ou suspeitado de uma infração penal, pelo fato de apresentar-se, por motivo próprio, à autoridade policial ou judiciária, que está com encargo, presidindo o inquérito ou ação penal, promover a apuração do autor de tal infração e de conduzir sobre a sua responsabilidade.136

Dessa forma, o recolhimento imediato à cadeia não deveria acontecer,

sendo necessário que o juiz decrete a prisão preventiva, de acordo com os

requisitos legais, tendo em vista que ninguém será preso senão por meio de ordem

escrita judicial, salvo em flagrante delito. Tal consideração parte do ponto de vista de

que ninguém está em flagrância delitiva pelo motivo de se apresentar

espontaneamente à autoridade competente. Seria injusto que a lei tratasse

igualmente o agente que foge ou se oculta da lei persecução penal e aquele que se

apresenta espontaneamente, facilitando o trabalho da polícia137.

[...] a autoridade policial deve empreender a uma análise acerca da espontaneidade da apresentação do acusado. Assim, a espontaneidade estará caracterizada, em linhas gerais, quando o acusado houver tido a possibilidade de fugir, porém não o fez. Por razões de política criminal, não ocorre nesta hipótese a prisão em flagrante, pois o acusado demonstrou a sua vontade de colaborar com a aplicação da Justiça, não furtando-se à persecução penal138.

Desse modo, torna-se necessário que a autoridade policial utilize de bom

senso para determinar as medidas que precisam ser tomadas em cada caso

específico. A apresentação espontânea do indivíduo que é alvo de uma persecução

criminal é já um forte indício de que ele pretende colaborar com as atividades

policiais, reconhecendo sua culpa ou confiante de sua capacidade de provar sua

inonência.

136 ESPÍNDOLA, Eduardo. Código de Processo Penal Brasileiro - Anotado, p. 520. 137 LEANO, Marcelo Luiz. Da Prisão em Flagrante. Editora Lawbook, 2005, p. 74. 138 Ibid., loc.cit.

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3 O PODER DA AUTORIDADE POLICIAL NA TIPIFICAÇÃO DO CRIME DE

TRÁFICO DE DROGAS

A Lei 9099/95 gerou certa polêmica acerca da definição do termo

"Autoridade Policial", no tocante à sua utilização na redação de seu artigo 69. O

entendimento doutrinário e jurisprudencial caminhou no sentido de que, na Lei dos

Juizados Especiais Criminais, esse termo tinha em um sentido amplo e, além dos

Delegados de Polícia de Carreira, abarca também todo agente público que exerce

função policial repressiva ou preventiva. Contudo, a Lei Antidrogas (Lei 11.343/06),

de acordo com seu artigo 48, impõe a aplicação do procedimento da Lei 9099/95

para os casos de posse de drogas para consumo próprio (artigo 28, da Lei

11.343/06). Nesse mesmo artigo 48, em seu § 4º, há a menção à expressão

"Autoridade de Polícia Judiciária" em referência à "Autoridade Policial". Logo,

conclui-se que, sob a égide dessa lei, o termo indica inegavelmente o Delegado de

Polícia de Carreira, o único que pode realizar as funções atribuídas à Autoridade

Policial pela lei 11.343/06139.

3.1 O PODER DA AUTORIDADE POLICIAL NA TIPIFICAÇÃO DO CRIME

Segundo a Constituição Federal de 1988 (art. 144), a segurança pública é

dever do Estado. Esta legislação também divide a polícia em ramos de natureza

federal, civil e militar, sendo que, a Polícia Federal está subordinada à União e, no

entanto, a Polícia Civil e a Polícia Militar aos Estados.

Dentro da polícia existem hierarquias. O Delegado de Polícia é a autoridade

que chefia e determina o trabalho dentro de sua circunscrição, sendo ela no âmbito

139 CABETTE, Eduardo Luiz Santos. Autoridade policial e termo circunstanciado. Necessidade de revisão dos entendimentos em face da Lei de Drogas. Jus Navigandi, Teresina, ano 12, n. 1589, 7 nov. 2007. [s./p..] Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=10622>. Acesso em jun. 2010.

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estadual, desde que, obedecida a lei e as ordens superiores. Sua função primordial

é dirigir os policiais civis que o auxiliam, e também tendo a incumbência de lavrar o

Auto de Prisão em flagrante.140

Para que a prisão em flagrante seja legal, a conduta supostamente delituosa

deve se tanto ao correspondente tipo penal como às hipóteses de flagrância.

Entretanto, a prisão em flagrante será considerada ilegal quando o fato perpetrado

não preencher os elementos previstos no tipo penal, como também não forem

obedecidos os casos de flagrante delito estatuídos no art. 302 do Código de

Processo Penal. Além disso, para que a prisão seja considerada legal deverá

obedecer aos preceitos formais exigidos na lei processual penal (art. 304), sob pena

de ser relaxada.141.

Em relação ao tráfico ilícito de drogas, a prisão em flagrante precisa ser

aplicada com cautela, pois, a tipificação equivocada pode causar danos ao jus

libertatis. Sobre o assunto, preleciona Mirabete:

Apresentado o preso capturado em situação de flagrância à autoridade competente deve esta lavrar o auto respectivo. Não se trata, porém, de ato automático da autoridade policial pela simples notícia do ilícito penal pelo condutor. A autuação em flagrante delito pressupõe a certeza absoluta da materialidade do crime e indícios mínimos da autoria. Inexistentes tais elementos, a atuação em flagrante delito pode constituir-se em abuso de autoridade142.

Deste modo, surge a possibilidade de a Autoridade Policial mesmo que

transitoriamente, proceder à tipificação do delito em relação ao fato ensejador da

segregação, haja vista que, somente até 24 (vinte e quatro) horas da prisão em

flagrante o auto será encaminhado à autoridade judicial competente para a

homologação, relaxamento ou, até mesmo, se for o caso, para a decretação da

prisão preventiva.143

140 SCHOUCAIR, João Paulo Santos. O poder investigatório do Ministério Público brasileiro na esfera criminal, 2009. Disponível em: <www.buscalegis.com.br>. Acesso em jun. 2010. 141 IENNACO, 2006, p. 26 142 MIRABETE, 2006. 143 Ibid.

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Destarte, consoante à jurisprudência abaixo colacionada, infere-se que, a

subjetividade do Delegado de Polícia na avaliação do fato tido como criminoso,

redundará em sérios reflexos, o que ocorre, por exemplo, quando a Autoridade

Policial enquadra tipicamente a conduta do agente preso em flagrante no crime de

tráfico de drogas; tendo ulteriormente, o Ministério Público, diante da análise contida

dos autos da fase pré-processual, concluído pela caracterização da figura típica do

consumo de drogas, fato que, pelo disposto no art. 28 da Lei 11.343/2006, não se

pode originar pena privativa de liberdade.

Por oportuno, segue a jurisprudência suscitada:

HABEAS CORPUS – PRISÃO EM FLAGRANTE POR TRÁFICO – PEDIDO DE LIBERDADE PROVISÓRIA FUNDADO EM ALEGAÇÃO DE EQUÍVOCO NA TIPIFICAÇÃO DA CONDUTA – EXAME APROFUNDADO DA PROVA INDISPENSÁVEL À ANÁLISE DO PLEITO INCABÍVEL NA VIA ESTREITA DO WRIT – BENEFÍCIO, ADEMAIS, EXPRESSAMENTE VEDADO (ART. 2º, II, LEI N. 8.072/90) – CONSTRANGIMENTO ILEGAL INEXISTENTE – ORDEM DENEGADA A pretensão, através da qual o impetrante objetiva a liberação do paciente sob o argumento de não ter ele cometido o crime de tráfico de entorpecentes, mas tão-só o de porte para uso próprio, carece de amparo legal, pelo que a denegação da ordem, como bem obtempera o ilustre Procurador de Justiça, é medida que se impõe. Com efeito, pois “havendo indícios de autoria do delito, por parte do recorrente, descabe analisar profundamente a prova carreada aos autos de forma a atestar a alegada inocência que não se mostra flagrante e incontroversa” Ora, ainda que não seja a via eleita a adequada para o aprofundado exame dos elementos probatórios, há que se reconhecer que a prisão do paciente foi efetuada por ter sido flagrado, após denúncia anônima e perseguição policial, portando considerável quantidade de substância entorpecente. O fato assim descrito apresenta-se, portanto, e em princípio, como passível de ser tipificado como tráfico de drogas, autorizando a prisão em flagrante (art. 302, II, do Código de Processo Penal), não havendo nenhum óbice, diante desses indícios, à instauração de procedimento judicial tendente a apurar a responsabilidade criminal. Por tais razões, deve a sua conduta ser melhor analisada em consonância com as provas que forem amealhadas durante a instrução, o que, sem dúvida, ilide a possibilidade de alterar-se a tipificação do crime pelo qual denunciado, o que, aliás, da maneira como postulada, implicaria até mesmo em trancamento da ação penal144.

144 RHC n. 12075/SP, Rel. Min. José Arnaldo da Fonseca, j. em 19.02.02. (Habeas corpus n. 2005.012887-7, da Capital)

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Acerca do assunto, assinala Nucci que, o artigo 28 da Lei de Tóxicos prevê

os mesmos verbos nucleares do crime de tráfico, quais sejam ‘adquirir’, ‘guardar’,

‘ter em deposito’, ‘transportar’ e ‘trazer consigo’. Contudo, este artigo dispõe sobre

infrações de menor potencial ofensivo, cujas penalidades previstas são bem mais

brandas que aquelas listadas no art. 33, caput, da Lei 11.343/2006, que tipifica um

crime equiparado a hediondo e gera pena de reclusão de 5 a 15 anos, além de

multa elevada. Por outro lado, o crime de consumo pessoal não constitui delito

equiparado ao hediondo; não havendo a possibilidade de pena privativa de

liberdade, isto porque, a finalidade do agente é tão somente o uso. Por fim relata

que, em razão disso, muitos traficantes buscam como meio de defesa, a

desclassificação da infração penal da figura do art. 33 (antigo art. 12 da Lei

6.368/76), para o tipo do art. 28 (antigo art. 16 da Lei nº 6.368/76). Em contrapartida,

inúmeros usuários acabam injustamente autuados como traficantes, quando

merecem a desclassificação para o consumo pessoal.145

Sendo infração de menor potencial ofensivo, não pode haver imposição de

prisão em flagrante ao crime de consumo pessoal de entorpecentes, o que não

ocorre com o tráfico de drogas. Logo, por meio da tipificação errônea do crime pela

autoridade policial, o acusado poderá ter sua liberdade privada, gerando várias

conseqüências prejudiciais ao mesmo. Como se trata da hipótese de uma tipificação

errônea de tráfico de entorpecentes, supõe-se que, tal tipificação possa ocorrer

quando um indivíduo é flagrado com uma quantidade da substância ilícita levando o

agente policial ou a autoridade a crer na prática de mercancia, sendo certa a

dificuldade de comprovação do porte da droga tão somente para consumo

pessoal.146

O princípio da insignificância sugere a interpretação restritiva aos tipos

penais e, a partir da insignificante importância das lesões ou danos aos interesses

sociais causados pelo delito. Segundo esse princípio, o legislador não possui

competência para castigar pela sua imoralidade, condutas não lesivas a bens

jurídicos. A insignificância não faz parte das características do tipo delitivo. É apenas

um auxílio de interpretação que, restringe o teor literal do tipo formal pela

145 NUCCI, Guilherme de Souza. Leis penais e processuais penais comentadas. 4. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2009. 146 Ibid.

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conformação a condutas socialmente admissíveis, dadas as proporções mínimas

das lesões aos bens juridicamente tutelados147.

[...] só pode ser castigado aquele comportamento que lesione direitos de outras pessoas e que não é simplesmente um comportamento pecaminoso ou imoral; [...] o Direito Penal só pode assegurar a ordem pacífica externa da sociedade, e além desse limite nem está legitimado nem é adequado para a educação moral dos cidadãos148.

Note-se porém que, se a incidência da insignificância exclui a tipicidade, há

que se aplicá-la com cautela e propriedade. De acordo com Gomes:

O fato torna-se irrelevante, em virtude da presença de todos os requisitos bagatelares (resultado, conduta e culpabilidade bagatelares), tornando-se a pena desnecessária. Sua dispensa, nesse caso, não chega a afetar o seu aspecto preventivo geral149.

Brutti afirma que, a propositura de ação penal só é válida quando há

lesividade e cita Maurício Ribeiro Lopes para fomentar seu ponto de vista:

[...] através do princípio da lesividade, só pode ser penalizado aquele comportamento que lesione direitos de outrem e que não seja apenas um comportamento pecaminoso ou imoral; o direito penal só pode assegurar a ordem pacífica externa da sociedade e além desse limite não está legitimado e nem é adequado para a educação moral dos cidadãos. As condutas puramente internas ou individuais, que se caracterizem por ser escandalosas, imorais, esdrúxulas ou pecaminosas, mas que não afetem nenhum bem jurídico tutelado pelo Estado, não possuem a lesividade necessária para legitimar a intervenção penal150.

No artigo 28 da Lei 11.343/06 consta que:

147 BRUTTI, Roger Spode. O princípio da insignificância frente ao poder discricionário do delegado de polícia. 2006. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=9145>. Acesso em jun. 2010. 148 ROXIN apud BRUTTI, op. cit. 149 GOMES apud BRUTTI, op. cit. 150 LOPES, apud BRUTTI, op. cit.

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§ 2º. Para determinar se a droga destinava-se a consumo pessoal, o juiz atenderá à natureza e à quantidade da substância apreendida, ao local e às condições em que se desenvolveu a ação, às circunstâncias sociais e pessoais, bem como à conduta e aos antecedentes do agente.

Ora, essas circunstâncias podem, de antemão, ser analisadas pela

Autoridade Policial, evitando um constrangimento desnecessário a quem não o

merece e, primando pela economia processual para que ações penais de maior valia

à sociedade, possam ter andamento mais célere.

De outro lado, a prisão em flagrante é uma prisão cautelar, traduz uma

cautela do Estado com vistas na facilitação de seus interesses. Sua finalidade

primeira é uma forma de autodefesa da sociedade por meio da suspensão da

perturbação à ordem pública151. Existe a possibilidade do autuado ser inimputável

diante do excessivo consumo de drogas, o que afasta, por completo, a possibilidade

de prisão em flagrante, eis que a respectiva conduta não comporta a imposição de

pena privativa de liberdade.

Ademais, dispõe o artigo 45 da Lei supracitada que:

É isento de pena o agente que, em razão da dependência, ou sob o efeito, proveniente de caso fortuito ou força maior, de droga, era, ao tempo da ação ou da omissão, qualquer que tenha sido a infração penal praticada, inteiramente incapaz de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento.

Assim, trazer consigo uma quantidade que pudesse tipificar a conduta do

agente como tráfico, é ação que pode se enquadrar como infração cometida em

razão da dependência, o que pode gerar a inimputabilidade, com a respectiva

exclusão da pena.152

151 OLIVEIRA, 2007. 152 Ibid.

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3.1.1 Fumus delicti

Um dos requisitos para a manutenção de uma prisão em flagrante é a

fumaça da existência de um delito. Não se exige certeza de sua existência e da

autoria, mas pelo menos uma probabilidade razoável. O fumus delicti exige que haja

sinais externos e que permitam deduzir por meio de um raciocínio lógico, a

ocorrência de um delito cuja realização e conseqüências dela derivadas, apresentem

um sujeito concreto como possível responsável153.

Porém, o valor das provas de culpabilidade exigidas para que alguém seja

detido é o mesmo necessário para que seja processado? Há que se fazer uma

distinção entre juízo de probabilidade e juízo de possibilidade. Existe possibilidade

ao invés de probabilidade, se as razões favoráveis e contrárias à hipótese, são

equivalentes. Para o processamento, um juízo de possibilidade seria suficiente, já

que, o Ministério Público deve provar a culpabilidade do réu de forma plena no curso

do processo. Contudo, para a aplicação de uma medida cautelar é necessário um

juízo de probabilidade, ou seja, a predominância das razões positivas. A

possibilidade basta para a imputação, porém, não é suficiente para a detenção154.

A existência de todos os requisitos positivos e a inexistência dos requisitos

negativos do delito se fazem necessárias a um juízo de probabilidade. Os requisitos

positivos do delito são as provas de que a conduta é aparentemente típica, ilícita e

culpável. Já, os requisitos negativos do delito são as causas de exclusão da ilicitude,

tais como legítima defesa ou estado de necessidade, ou ainda, as causas de

exclusão da culpabilidade (inexigibilidade de conduta diversa, erro de proibição,

etc.)155.

Por isso, para haver fumus delicti, primeiro deve-se demonstrar a aparente

tipicidade da conduta do autor, mesmo que, a prova não seja plena, pois, exige-se

probabilidade e não certeza. Assim, deve-se avaliar os elementos que integram o

153 LOPES JR., Aury Celso Lima. Breves considerações sobre os fundamentos e requisitos das prisões cautelares. Disponível em: <Buscalegis.com.b>. Acesso em jun. 2010. [s./p.]. 154 LOPES JR., [s./p.] 155 TOURINHO FILHO, 2005, p. 7-10.

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tipo penal, quais sejam, a conduta humana voluntária e dirigida a um fim, a presença

de dolo ou de culpa, o resultado do ato praticado, o nexo causal e a tipicidade156.

Quando se analisam os requisitos das medidas cautelares, é comum que se

mencionem o fumus boni iuris e o periculum in mora, ou periculum in libertatis .

Porém, não há fumaça de bom direito em relação a uma prática criminosa. O fumus

delicti, ou fumus commissi delicti (fumaça do delito cometido) é a probabilidade da

ocorrência de um delito; o fumus boni iuris é a fumaça de um bom direito que deverá

ser tutelado pelo Estado157.

Além disso há o periculum libertatis (periculum in mora) que determina a

necessidade da prisão do indiciado, que em liberdade poderia efetivamente

prejudicar o andamento do processo ou de seu resultado. Tal requisito para a

decretação de uma prisão preventiva, e para sua manutenção, está disposto pelo

art. 312 do CPP:

Art. 312. A prisão preventiva poderá ser decretada como garantia da ordem pública, da ordem econômica, por conveniência da instrução criminal, ou para assegurar a aplicação da lei penal, quando houver prova da existência do crime e indício suficiente de autoria.

Desse modo, não pode ocorrer a segregação de alguém sem os devidos

motivos necessários a qualquer prisão, motivos estes que constituem o fumus delicti.

3.1.2 Relatório e tipificação final

Os arts. 50 a 53 da Lei nº 11.343/06 tratam da fase de investigação criminal

(pré-processual).

Diz a Carta Magna que, "ocorrendo prisão em flagrante, a autoridade de

polícia judiciária fará, imediatamente, comunicação ao juiz competente, remetendo-

lhe cópia do auto lavrado", tal como determina o art. 5º., LXII da Constituição

Federal. Exige-se também, segundo o art. 50, caput, da Lei 11.343/06, que seja

156 LOPES JR., op. cit., [s./p.] 157 Ibid.

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"dada vista ao órgão do Ministério Público, em 24 (vinte e quatro) horas." Para efeito

da lavratura do auto de prisão em flagrante e estabelecimento da materialidade do

delito, é suficiente o laudo de constatação da natureza e quantidade da droga,

firmado por perito oficial ou na falta deste, por pessoa idônea (laudo provisório).

Excepcionalmente, de acordo com art. 52 da Lei 11.343/06, o relatório do

inquérito policial deve indicar, expressa e justificadamente, a qualificação jurídica do

fato, evitando-se assim que, arbitrariamente sejam indiciados meros usuários como

traficantes, com todas as conseqüências daí decorrentes, como, por exemplo, a

impossibilidade de prestar fiança ou mesmo de se livrar solto. Deverá o Delegado de

Polícia explicitar em suas conclusões o que o levou ao indiciamento por este ou

aquele crime, regra interessante e inovadora em relação ao Código de Processo

Penal. 158

Se a conduta for tipificada como infração de menor potencial ofensivo, não

há que se falar em prisão em flagrante. Com certeza, há diversos fatores que devem

ser levados em conta para a tipificação correta da infração. O conceito de Tipicidade

pode ser definido como “a contradição entre uma conduta e o ordenamento

jurídico”.159 Contudo, a tipicidade não se consuma tão só pela concordância lógico-

formal do fato ao tipo, como também deverá obedecer ao elemento subjetivo

inerente ao tipo penal, seja no presente caso, o dolo160.

O Delegado de Polícia é o primeiro receptor do caso em concreto, sendo-lhe compelido pelo ordenamento jurídico agir com cautela e prudência ante a íntima proximidade das suas atribuições para com o direito fundamental da liberdade da pessoa humana161.

A despeito de que, a atividade policial pela natureza de suas atribuições

tenha o poder de tolher o direito à liberdade do indivíduo, deve-se levar em

consideração que, como assevera Brutti162, se ao próprio Estado-juiz é imperioso

observar cautelosamente esse direito constitucional, a Autoridade Policial deve

igualmente tomar tais cautelas:

158 NUCCI, 2009, p. 392. 159 MIRABETE, apud BRUTTI, 2006. 160 BRUTTI, op. cit., [s.p.]. 161 Ibid. 162 Ibid.

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Pois não é fadado a esta cometer abusos manifestos contra os direitos da pessoa humana, sob o argumento de que não lhe é conferido pela norma competência para se levar a efeito, de acordo com o seu discernimento, a medida mais adequada ao caso concreto163.

A discricionariedade presente nas decisões da Autoridade Policial se presta

à precaução contra possíveis abusos baseados. “Na letra fria da Lei, ausentes de

qualquer interpretação mais acurada, separadas da lógica e do bom senso.”164

A fundamentação plausível deve ser elemento sempre unificado ao ato

discricionário da Autoridade Policial. Mencionado ato será sempre legítimo, se

devidamente fundamentado. De fato, dentro do nosso ordenamento encontra-se o

princípio elementar da proporcionalidade, com raiz na lógica e no bom senso. O

direito à liberdade, tratado como inviolável pela Constituição, coaduna-se com a

orientação internacional quanto aos direitos do homem, o que, por si só, aliás, afeta

a faculdade concedida ao Juiz em outorgar livramento provisório, para torná-la

investida de caráter não-facultativo, mas obrigatório e compulsório. Este status da

norma, além do mais, dispensa a própria existência do artigo 310, parágrafo único,

do Código de Processo Penal. O não cabimento da liberdade provisória sem fiança

em crime de tráfico de drogas encontra amparo no art. 44 da Lei 11.343/06 (nova Lei

de Tóxicos), que é norma especial em relação ao parágrafo único do art. 310 do

CPP e ao art. 2º, II da Lei de Crimes Hediondos, cuja nova redação foi dada pela Lei

11.464/2007165.

Porém, eminentes penalistas sustentam a inconstitucionalidade da vedação

legal à liberdade provisória prevista no art. 44 da Lei nº 11.343/2006:

EMENTA: HABEAS CORPUS. PENAL, PROCESSUAL PENAL E CONSTITUCIONAL. TRÁFICO DE ENTORPECENTES. PRISÃO PREVENTIVA. GRAVIDADE DO CRIME. FUNDAMENTO INIDÔNEO. ADITAMENTO DA DECISÃO QUE INDEFERIU A LIBERDADE PROVISÓRIA. IMPOSSIBILIDADE. ARTIGO 44 DA LEI N. 11.343/06. INCONSTITUCIONALIDADE: NECESSIDADE DE ADEQUAÇÃO DESSE PRECEITO AOS ARTIGOS 1º, INCISO III, E 5º, INCISOS LIV E LVII DA CONSTITUIÇAÕ DO BRASIL.

163 BRUTTI, 2006. 164 Ibid. 165 Ibid.

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EXCEÇÃO À SÚMULA N. 691-STF. 1. A jurisprudência desta Corte está sedimentada no sentido de que a gravidade do crime não justifica, por si só, a necessidade da prisão preventiva. Precedentes. 2. Não é dado às instâncias subseqüentes aditar, retificar ou suprir decisões judiciais, mormente quando a falta ou a insuficiência de sua fundamentação for causa de nulidade. Precedentes. 3. Liberdade provisória indeferida com fundamento na vedação contida no art. 44 da Lei n. 11.343/06, sem indicação de situação fática vinculada a qualquer das hipóteses do artigo 312 do Código de Processo Penal. 4. Entendimento respaldado na inafiançabilidade do crime de tráfico de entorpecentes, estabelecida no artigo 5º, inciso XLIII da Constituição do Brasil. Afronta escancarada aos princípios da presunção de inocência, do devido processo legal e da dignidade da pessoa humana. 5. Inexistência de antinomias na Constituição. Necessidade de adequação, a esses princípios, da norma infraconstitucional e da veiculada no artigo 5º, inciso XLIII da Constituição do Brasil. A regra estabelecida na Constituição, bem assim na legislação infraconstitucional, é a liberdade. A prisão faz exceção a essa regra, de modo que, a admitir-se que o artigo 5º, inciso XLIII estabelece, além das restrições nele contidas, vedação à liberdade provisória, o conflito entre normas estaria instalado. 6. A inafiançabilidade não pode e não deve --- considerados os princípios da presunção de inocência, da dignidade da pessoa humana, da ampla defesa e do devido processo legal --- constituir causa impeditiva da liberdade provisória. 7. Não se nega a acentuada nocividade da conduta do traficante de entorpecentes. Nocividade aferível pelos malefícios provocados no que concerne à saúde pública, exposta a sociedade a danos concretos e a riscos iminentes. Não obstante, a regra consagrada no ordenamento jurídico brasileiro é a liberdade; a prisão, a exceção. A regra cede a ela em situações marcadas pela demonstração cabal da necessidade da segregação ante tempus. Impõe-se porém ao Juiz o dever de explicitar as razões pelas quais alguém deva ser preso ou mantido preso cautelarmente. Ordem concedida a fim de que o paciente seja posto em liberdade, se por al não estiver preso166.

Resta saber quando será cabível a liberdade provisória já que, quando

presentes os motivos para a decretação da prisão cautelar ela é proibida (art. 324,

IV) e, quando ausentes estes motivos, a hipótese é de revogação da prisão.

166 HC 97346 / SP - SÃO PAULO - HABEAS CORPUS - Relator(a): Min. EROS GRAU - Julgamento: 25/05/2010

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3.2 AUTORIDADE POLICIAL E MINISTÉRIO PÚBLICO

O § 4.º do art. 144 da Constituição Federal determina que, às polícias civis,

são atribuídas as funções de polícia judiciária e a apuração de crimes, atividades

estas que devem ser realizadas sob a direção da Autoridade Policial. Já o Ministério

Público tem duas funções principais. É fiscal da lei (custos legis) e titular da ação

penal pública. Como fiscal da lei, cumpre ao Ministério Público acompanhar a

aplicação da lei pelo juiz. Em casos relacionados a áreas de família, registro e

filiação, sucessões e defesa dos incapazes, o Ministério Público não é parte no

processo, é um órgão interveniente. Já como titular da ação penal pública, está

encarregado de acionar o Poder Judiciário em nome do Estado, pois detém a

responsabilidade exclusiva de desenvolver a acusação no processo criminal167.

Segundo a nova Lei Anti-tóxicos, art. 54:

Art. 54. Recebidos em juízo os autos do inquérito policial, de Comissão Parlamentar de Inquérito ou peças de informação, dar-se-á vista ao Ministério Público para, no prazo de 10 (dez) dias, adotar uma das seguintes providências: I - requerer o arquivamento; (art. 28, CPP) II - requisitar as diligências que entender necessárias; (art. 13, II do Código de Processo Penal); III - oferecer denúncia, arrolar até 5 (cinco) testemunhas e requerer as demais provas que entender pertinentes.

O prazo, como se lê, é de 10 dias; caso, porém, o indiciado esteja preso,

entendemos que este prazo será de 5 dias, atendendo-se à regra geral estabelecida

no art. 46 do Código de Processo Penal, mais favorável e aqui utilizada

subsidiariamente. Neste prazo, não se conta o primeiro dia se o indiciado estiver

solto (art. 798, § 1º., CPP). Se preso, inclui-se o primeiro dia, na forma do art. 10 do

Código Penal (STF, RTJ, 58/81). Já, o número de testemunhas não foi alterado em

relação ao antigo procedimento. Neste número não são computadas as que não

167 ARANTES, Rogério Bastos. Direito e política: o Ministério Público e a defesa dos direitos coletivos. Rev. bras. Ci. Soc., São Paulo, v. 14, n. 39, Feb. 1999 . Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0102-69091999000100005&lng=en&nrm=iso>. Acesso em 20 Out. 2010. [s./p.] .

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prestaram compromisso, as referidas, as judiciais e as que nada souberem que

interesse à decisão da causa (arts. 209 e 398 do Código de Processo Penal).168

A nova lei não mais possibilita ao Ministério Público "deixar,

justificadamente, de propor ação penal contra os agentes ou partícipes de delitos",

como constava do art. 37, IV da revogada Lei nº. 10.409/02. Era, aliás, uma clara

mitigação ao princípio da obrigatoriedade da ação penal (que já havia sido mitigado

pela possibilidade da transação penal prevista no art. 76 da Lei nº. 9.099/95).

Observa-se que, esta hipótese era diversa do pedido de arquivamento. Com efeito, o

arquivamento pode ser requerido em razão da atipicidade do fato, extinção da

punibilidade, falta de justa causa, autoria desconhecida, ausência de interesse de

agir, etc., já que: “O legislador não tratou expressamente das hipóteses de

arquivamento, mas sim dos casos em que a ação não deve ser exercitada (art.

43)”.169

Assim, por exemplo, caso o indiciado tivesse colaborado com as

investigações, poderia o Ministério Público deixar de oferecer a denúncia em relação

a ele, acusando os demais autores cujas participações puderam ser efetivamente

esclarecidas com a colaboração processual deste primeiro indiciado. Poderia,

igualmente, deixar de ser oferecida a denúncia atendendo às circunstâncias do fato,

à insignificância participação no crime ou à condição de que o agente, ao tempo da

ação, era inteiramente incapaz de entender o caráter ilícito do fato e de determinar-

se de acordo com esse entendimento, em razão de dependência grave, comprovada

por peritos. O desiderato da custódia cautelar é retirar de circulação sujeitos que,

pela sua conduta irregular, oferecem risco à sociedade. Em síntese, o risco precisa

abalar a ordem pública, quer seja pela intensidade da ofensa, quer seja pela

reiteração de um conjunto de ofensas, conforme o art.312 do CPP.170

168 Ibid. 169 JARDIM, Afrânio Silva. Ação Penal Pública – Princípio da Obrigatoriedade. 3. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2004, p. 46. 170 Ibid.

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3.2.1 A Opinio delicti e a Autoridade Policial

Em geral, os grandes traficantes são presos após prolongado período de

investigação. Os acusados flagrados transportando ou vendendo as substâncias

ilícitas, são normalmente ocupantes de níveis mais baixos na hierarquia de um

grupo criminoso. Essas prisões podem ocorrer em locais próximos aos pontos de

venda de drogas ou no próprio local. Assim, usuários podem, por vezes, ser

confundidos com traficantes, pois, há jovens de classe média que, sendo usuários

de entorpecentes, preferem adquirir quantidades maiores, evitando a visita

constante aos pontos de venda, normalmente localizados em periferias ou locais

cujo ambiente é radicalmente oposto ao seu círculo social171.

O delegado deve, pois, ao autuar agente suspeito de mercancia de

entorpecentes, agir de acordo com os preceitos do art. 52 da Lei antitóxicos

(anteriormente descritos):

a) “relatar sumariamente” , ou seja, de modo sucinto;

b) “as circunstâncias do fato”, isto é, hora, local, sujeitos envolvidos no

delito e quaisquer elementos que contribuam para a constatação da

existência de prática delituosa;

c) “justificando as razões que o levaram à classificação do delito”, ou por

outras palavras, com base no fato relatado e em suas circunstâncias,

explicitar objetivamente o porquê do enquadramento típico;

d) “indicando a quantidade e a natureza da substância ou do produto

apreendido”, cuja análise deve, preferencialmente ser feita por perito;

e) “o local e as condições em que se desenvolveu a ação criminosa”,

conforme disposição já implícita no relato das circunstâncias do fato;

f) “as circunstâncias da prisão”, ou seja, se o agente realizava a venda do

produto, se simplesmente estava de posse da droga apreendida, ou se a

mantinha em estoque, etc.;

171 Ibid.

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g) “a conduta, a qualificação e os antecedentes do agente”, isto é, relatar as

condições em que se encontrava o agente, se ele é ou não dependente

químico e se estava sob efeito da droga no momento da prisão, se reagiu

à prisão, se exerce alguma profissão ou se pode ser presumido que

obtém renda com atividade ilícita, se tem histórico de outros delitos

praticados e assim por diante.172

O objetivo disso é agir de modo que o delegado não venha a enquadrar

tipicamente como tráfico uma conduta que em verdade se trata de posse e uso de

drogas.

3.2.2 A Opinio delicti e o Ministério Público

Como já foi mencionado, a finalidade do inquérito policial é a investigação

sobre a existência de fato criminoso e sua autoria, ou seja, a justa causa para a

ação penal. Ele dá elementos para a formação da opinio delicti do órgão acusador

e, embasamento fático a ação penal. A opinio delicti é a convicção do órgão

acusador de que existe justa causa para o início da ação penal e, depois de

formada, se materializa pela apresentação da denúncia pelo órgão acusador. Com

essa materialização da opinio delicti, se encerra a fase administrativa da persecução

penal, iniciando-se a fase jurisdicional173.

O Ministério Público forma sua opinio delicti a partir de uma diversidade de

elementos, entre os quais, o inquérito policial. O art. 27, CPP, articulado com os arts.

12; 39, § 5º; 46, § 1º, CPP, expõe a possibilidade de ajuizamento da peça

acusatória, alheia ao suporte de uma investigação policial. Além disso, há as

disposições dos arts. 26, I, b; II e IV e §§ 1º e 2º, da L. 8.625/93, mais os arts. 129,

VI e VIII da CF e art. 47, CPP174.

172 JARDIM, 2004. 173 SILVA JR. Promotor natural na Opinio delicti. In: Jus puniendi. Disponível em: <www.juspuniendi.com .br>. [s.p.], [s.d.]. 174 Ibid.

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A formação, pelo órgão acusatório, da opinião sobre o fato, na sua materialidade típica e autoria, a causa objetiva e subjetiva, a opinio delicti, expressão de sabor doutrinário e forense, não deve e não pode contar com a colaboração de juiz, autoridade policial, etc. Esta última, na prática diária, limita sua colaboração à feitura da informatio delicti, atividade que não é essencial ao magistério acusatório na deflagração da relação processual175.

A Lei Maior oferece ao MP meios para a busca da verdade indispensável à

justa composição do litígio (art. 129, VI e VIII), além das previsões da Lei 8.625/93.

Em face do sistema acusatório, quase pleno (art. 129, I, CF), copiosa é nossa jurisprudência, no sentido de que ao magistrado, na direção do processo, é defeso o indeferimento de pedidos de realização de diligências, tidas pela acusação como imprescindíveis ao oferecimento da denúncia (art. 16, CPP). Admissível a posição judicial, de avaliação da necessidade da diligência solicitada, a opinio delicti estaria sendo deslocada do âmbito da ação penal para a jurisdição, pese embora, a clareza do texto constitucional. Sobre a solicitação de diligências não deve incidir qualquer juízo de valoração quanto a seu cabimento, pela autoridade judiciária ou policial.176

Na persecução penal pelo órgão acusador existe um momento no qual

ocorre a formação da opinio delicti, isto é, com base nos elementos apurados no

inquérito, o promotor convencido da existência de justa causa para a ação penal,

oferece a denúncia, encerrando a fase administrativa da persecução penal.177

175 Ibid.. 176 SILVA JR., [s.d]. 177 BIANCHINI, Alice et al. Nova lei de drogas comentada. São Paulo: RT, 2006, p. 78.

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3.3 TIPIFICAÇÃO DO CRIME DE TRÁFICO DE DROGAS

3.3.1 O artigo 33 da Lei Antitóxicos

O artigo 33, caput, e § 1º cuidam do tráfico de drogas e de condutas

equiparadas. A redação do caput é praticamente igual a do artigo 12, caput, da lei

antiga, mas, a pena foi aumentada para o mínimo de cinco e o máximo de quinze

anos de reclusão e, pagamento de 500 a 1.500 dias-multa. O § 1º, inciso I, do artigo

12 da antiga lei de tóxicos foi mantido pelo artigo 33, § 1º, inciso I, mas, sua

definição é um pouco diferente. Os objetos materiais passam a ser não somente a

matéria prima, mas também, o insumo ou outro produto químico destinado à

preparação de drogas. A semeadura, o cultivo ou a colheita de plantas destinadas à

preparação de drogas para o tráfico, é conduta equiparada ao caput do artigo 33,

com pena equivalente. Essa conduta vem definida no artigo 33, § 1º, inciso II178.

Aquele que utilizar local ou bem de qualquer natureza de que tenha a

propriedade, posse, administração, guarda ou vigilância, ou consentir que dele se

utilize para o tráfico de drogas, praticará o ilícito penal previsto no artigo 33, § 1º,

inciso III, cuja pena, é a mesma do caput do dispositivo. Se a finalidade da utilização

do local ou bem for o uso indevido de drogas pelo próprio sujeito, o fato em si será

atípico, a não ser que se enquadre no artigo 28, caput.179

O legislador entendeu que, aquele que simplesmente induz, instiga ou

auxilia alguém ao uso indevido de drogas, não merece ter pena semelhante à do

traficante. Por isso, criou dispositivo específico com pena sensivelmente reduzida,

ou seja, detenção de um a três anos e pagamento de multa no valor de 100 a 300

dias-multa. O eventual oferecimento de droga e sem objetivo de lucro, a pessoa do

relacionamento do agente, para uso em conjunto, passou a ser punido de forma

autônoma com pena de detenção de seis meses a um ano e, pagamento de 700 a 178 BIANCHINI, 2006, p. 78. 179 MOREIRA, Rômulo de Andrade. Aspectos procedimentais da nova lei de tóxicos (Lei nº 11.343/06). in: Jus Navigandi, Teresina, ano 10, n. 1209, 23 out. 2006. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=9075>. Acesso em: 01 mar. 2010.

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1.500 dias-multa, sem prejuízo das penas previstas no art. 28, ou seja, aquelas

aplicadas ao usuário de drogas (art. 33, § 3º). Essa conduta era tratada como tráfico

de drogas para alguns e, porte ou posse para uso próprio, para outros. Após a

vigência da lei, a conduta de oferecer será considerada como tráfico (art. 33, “caput”)

quando o oferecimento for feito com certa habitualidade, ou com objetivo de lucro,

ou quando a pessoa não for do relacionamento do agente, ou quando não for para

uso em conjunto. Isso porque, somente haverá adequação típica no artigo art. 33, §

3º, quando todos os requisitos previstos em sua definição estiverem presentes

(oferecimento eventual, gratuidade, pessoa de seu relacionamento e consumo em

conjunto).180

O § 4º do artigo 33 prevê a redução da pena dos crimes previstos no seu

“caput” e § 1º, quando o agente for primário, possuir bons antecedentes, não se

dedicar às atividades criminosas e nem integrar organização criminosa. Faltando

qualquer um desses requisitos, a diminuição da pena, que pode ser de um sexto a

dois terços, não poderá ser aplicada. Cuida-se de dispositivo que visa beneficiar o

pequeno e eventual traficante. O artigo 13, da Lei nº 6.368/76, com algumas

mudanças em sua definição, agora é previsto no artigo 34 da lei nova, com pena de

três a dez anos de reclusão e, pagamento de 1.200 a 2.000 dias-multa. 181

A divergência doutrinária que pode ocorrer quanto ao crime de

financiamento ou custeio do tráfico de drogas é se o crime é habitual ou instantâneo.

Entendido como habitual, não ocorrendo a reiteração de atos, o sujeito será partícipe

do crime para o qual financiou ou custeou (arts. 33, “caput”, § 1º ou 34); com a

causa de aumento de pena prevista no artigo 40, inciso VII (o agente custear ou

financiar a prática do crime). Por outro lado, entendido como crime instantâneo, não

poderá ser aplicado essa causa de aumento de pena àquele que estiver incurso no

crime do artigo 36 a fim de que, não ocorra dupla valoração (bis in idem). 182

Cuidando-se de qualquer crime descrito nos artigos 33 a 39 da Lei nº

11.343/2006, praticado por agente em situação de inimputabilidade em razão de

dependência, ou sob o efeito de droga proveniente de caso fortuito ou força maior,

deverá ser aplicado o artigo 45, “caput”, do referido diploma legal, que determina a

180 BIANCHINI,op. cit., p. 84. 181 Ibid. 182 MOREIRA, 2006.

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isenção de pena. Nessas mesmas circunstâncias, praticado o crime por agente em

situação de semi-imputabilidade, a pena aplicada será reduzida de um a dois terços

(art. 46). Nas situações retratadas, não se aplica o artigo 26 ou 28 do Código Penal,

mas as disposições da lei especial.183

183 Ibid.

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CONCLUSÃO

Em um Estado democrático de direito, como a República Federativa do

Brasil, a Constituição Federal é a norma suprema, da qual emanam as leis que virão

a complementar o ordenamento jurídico. A atual Carta Magna consagra dos

princípios inerentes e relacionados diretamente com o status libertatis do autor do

fato possivelmente criminoso. Em um primeiro lugar, a instituição de um princípio

afirmativo da situação de inocência de todo aquele que estiver submetido à

persecução penal. Não se pode olvidar, ainda, da garantia de que toda prisão seja

efetivamente fundamentada e por ordem escrita da autoridade judiciária competente.

Restou analisado pelo presente trabalho, mormente pela análise

jurisprudencial, existirem inúmeras situações prejudiciais ao acusado, em razão da

equivocada tipificação delitiva na fase inquisitiva ao fato perpetrado, sendo certo

que, a legislação processual penal restringe certas benesses a determinados ilícitos

penais; tais como, a concessão da liberdade provisória com ou sem fiança, o direito

de permanecer solto, entre outras consequências jurídicas, gerando ao final,

violação ao direito constitucional da liberdade individual.

Há severas consequências que podem ser causadas ao conduzido preso em

flagrante quando a autoridade policial procede erroneamente a tipificação da

infração penal ao caso concreto. Por conta disso, é necessário que a autoridade

policial possua capacitada formação jurídica, estando asseguradamente apto a

avaliar todos os elementos e circunstâncias adjacentes a uma conduta

supostamente delituosa.

Destacou-se a ilegalidade da prisão em flagrante em decorrência da errônea

tipificação delitiva quanto à infração penal no tocante a conduta perpetrada, nos

casos de apuração do comércio ilícito de substâncias entorpecentes.

Também restou analisado que, a caracterização do crime de tráfico de

drogas, por força da Lei n. 11.343/2006, não permite várias benesses admitidas,

ordinariamente, pela lei processual penal. Por exemplo, é vedada a liberdade

provisória, a substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos, a

fixação de regime prisional inicial senão o fechado, sendo, ainda, equiparado a

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hediondo, tendo em vista a alta gravidade do delito em comento para com a

sociedade.

A contrario sensu, uma possível abordagem a certas pessoas pela força

policial, encontrando em sua posse substâncias entorpecentes, poderá gerar de

imediato a prisão em flagrante delito, porquanto, em tese, estaria caracterizado o

crime previsto no art. 33 da Lei 11.343/2006, em razão dos vários verbos nucleares

contidos no respectivo tipo penal.

Ocorre que, por certas vezes, o conduzido na posse de drogas não vem a

praticar o crime de tráfico ilícito de entorpecentes, mas sim, no entanto, a conduta

criminosa do consumo pessoal, previsto tipicamente no art. 28 da Lei 11.343/2006.

Com base nessa situação hipotética, é certo que, o crime de consumo

pessoal não comporta pena privativa de liberdade, não esquecendo que, o

respectivo crime constitui infração penal de menor potencial ofensivo, não tendo a

possibilidade de prisão em flagrante no presente caso.

Diante disso, analisou-se que errônea tipificação da autoridade policial

poderia gerar sério constrangimento ilegal caso submetido a prisão por conta do

flagrante delito, quando, na verdade, a conduta praticada caracterizaria o crime de

consumo pessoal, de menor gravidade.

Abordou-se também que, a análise da caracterização do crime de tráfico de

drogas ou do consumo pessoal será avaliada mediante a averiguação de provas.

Desta forma, com o respectivo ato equivocado da autoridade policial que

lavrou o auto de prisão em flagrante, torna-se complexa a concessão da liberdade

do acusado mediante a garantia constitucional da liberdade que é a impetração de

ordem de habeas corpus, haja vista que, em regra, não se admite a análise de

provas pela via estreita do respectivo writ.

Portanto, terá o acusado que aguardar o oferecimento da ação penal para

que a acusação oficial proceda ao enquadramento típico adequado, ou tão somente

no processo penal, levando em consideração a dilação probatória, para que a

defesa, em virtude do contraditório, busque a mudança da tipificação, podendo,

neste ínterim, o acusado ficar segregado indevidamente.

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Com efeito, sérias conseqüências podem vir da equivocada tipificação da

conduta pela autoridade policial na prisão em flagrante, tendo em vista que, as

medidas a serem tomadas pela caracterização do crime de tráfico de drogas e

consumo pessoal são completamente diferentes.

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