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1 O LÚDICO NA PRÁTICA DOCENTE: Vivências numa classe de alfabetização duma escola pública do Município de Mesquita/RJ Raíssa Carla Sampaio Figueiredo Ferreira Gomes Escola Municipal Hélio Mendes do Amaral Mesquita - RJ, Brasil. [email protected] Eixo Temático: Alfabetização e infância Resumo: Este trabalho é um relato de experiência docente desenvolvido numa turma de 1º ano de escolaridade do Ensino Fundamental numa Escola pública dum município da Baixada Fluminense. Tem por objetivo apresentar uma reflexão sobre a relevância da prática docente lúdica no processo de ensino-aprendizagem, sobretudo, na alfabetização, à luz de referenciais teóricos como as orientações do MEC e outros, que apontam a importância do lúdico para o desenvolvimento integral e a formação dos alunos. Palavras chaves: Ludicidade. Alfabetização. Prática docente Abstract: This is the report of a teacher's first year experience in public elementary school in the city of Baixada Fluminense. It aims at introducing thoughts about the relevance of playful teaching in the teaching-learning process, mainly, in literacy, in light of theoretical frameworks such as the MEC guidelines and others who point out the importance of playfulness to the overall development and the training of students. Key words: Playful. Literacy. Teacher’s practices. 1. Introdução "Sem a curiosidade que me move, que me inquieta, que me insere na busca, não aprendo nem ensino" (Paulo Freire). Meu nome é Raíssa Carla Sampaio Figueiredo Ferreira Gomes, nasci no Rio de Janeiro, RJ, em 1992. Atuo como professora da escola pública há 5 anos, atualmente em duas turmas de 2º ano. Mas, o pensar em alfabetização, vem desde a formação inicial no magistério, quando, ainda normalista - estagiária, numa escola particular, tradicional duma cidade do Rio de Janeiro, eu me deparava com salas de aula de crianças, na faixa etária de 5/7 anos, "frias”, "chatas”, "mecanizadas", “estáticas” e, ali, mesmo ainda sem experiência, eu me questionava: Como podem essas crianças permanecer nesta escola por 4h diárias, realizando atividades, que elas não se identificam?" "O que fazer para

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O LÚDICO NA PRÁTICA DOCENTE:

Vivências numa classe de alfabetização duma escola pública do Município de

Mesquita/RJ

Raíssa Carla Sampaio Figueiredo Ferreira Gomes

Escola Municipal Hélio Mendes do Amaral

Mesquita - RJ, Brasil.

[email protected]

Eixo Temático: Alfabetização e infância

Resumo:

Este trabalho é um relato de experiência docente desenvolvido numa turma de 1º ano de

escolaridade do Ensino Fundamental numa Escola pública dum município da Baixada

Fluminense. Tem por objetivo apresentar uma reflexão sobre a relevância da prática

docente lúdica no processo de ensino-aprendizagem, sobretudo, na alfabetização, à luz

de referenciais teóricos como as orientações do MEC e outros, que apontam a

importância do lúdico para o desenvolvimento integral e a formação dos alunos.

Palavras chaves: Ludicidade. Alfabetização. Prática docente

Abstract:

This is the report of a teacher's first year experience in public elementary school in the

city of Baixada Fluminense. It aims at introducing thoughts about the relevance of

playful teaching in the teaching-learning process, mainly, in literacy, in light of

theoretical frameworks such as the MEC guidelines and others who point out the

importance of playfulness to the overall development and the training of students.

Key words: Playful. Literacy. Teacher’s practices.

1. Introdução

"Sem a curiosidade que me move, que me inquieta, que me insere na busca, não

aprendo nem ensino" (Paulo Freire).

Meu nome é Raíssa Carla Sampaio Figueiredo Ferreira Gomes, nasci no Rio de

Janeiro, RJ, em 1992. Atuo como professora da escola pública há 5 anos, atualmente em

duas turmas de 2º ano. Mas, o pensar em alfabetização, vem desde a formação inicial no

magistério, quando, ainda normalista - estagiária, numa escola particular, tradicional

duma cidade do Rio de Janeiro, eu me deparava com salas de aula de crianças, na faixa

etária de 5/7 anos, "frias”, "chatas”, "mecanizadas", “estáticas” e, ali, mesmo ainda sem

experiência, eu me questionava: “Como podem essas crianças permanecer nesta escola

por 4h diárias, realizando atividades, que elas não se identificam?" "O que fazer para

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ajudá-las?" "Como posso tornar esse tempo, pra elas e pra mim, mais agradável,

dinâmico e prazeroso?" "O dia em que eu tiver minha turma, vou fazer tudo diferente!".

Percebo que estas reflexões e indagações me constituem o ser professora

alfabetizadora e caminham comigo, ainda hoje, pelas escolas públicas do município em

que atuo.

Ao ingressar na escola as crianças se deparam com questões que antes não

faziam parte de seu universo: sua rotina diária é alterada, passa longos períodos fora de

casa, precisa conviver, brincar e trabalhar com pessoas, que, anteriormente, não faziam

parte de seu contexto social.

Em meio a tantas mudanças precisa lidar com novas responsabilidades exigidas

pela escola e família, nessa nova etapa. Nesse contexto é necessário que os professores

contribuam para viabilizar a adaptação da criança a escola, a partir da valorização dos

conhecimentos trazidos por ela.

A proposta de trabalho deve ser de familiarização, integração e de

socialização, atividades com menor cobrança cognitiva e menos conteudistas,

privilegiando tarefas mais livres de exploração do contexto, de materiais e

das potencialidades presentes no educando. (...) ricas em recursos simbólicos

e exploratórias a fim de aguçar a curiosidade infantil para a busca em

aventurar-se pelo mundo do conhecimento científico que ocorrerá

gradativamente ao longo do Ensino Fundamental. (RAPPORT, 2009, p.28).

Assim que iniciei minha trajetória profissional no magistério público, aos 18

anos, encontrava-me cheia de expectativas e ansiedade para assumir minha tão esperada

e sonhada turma de alfabetização. Porém, a escola em que acabara de entrar, entregou-

me a tarefa de cuidar da Sala de Leitura (para muitos, isto significaria prêmio, porém

para mim, representou frustração, significou que eu não era "boa" o suficiente para

assumir uma turma de alfabetização).

Mas, por outro lado, estar na Sala de Leitura, possibilitou-me realizar, no meu

turno de trabalho, o curso de formação continuada do Pró-Letramento em Linguagem,

que veio ao encontro de tudo aquilo que eu já acreditava, mas, que agora dialogava com

a teoria e sistematizava-se, dando identidade à minha prática docente – construindo meu

caminho de autoria profissional.

Foram vários os momentos significativos nos encontros com o grupo e a

formadora Prof.ª Aline Dias - quem serviu de inspiração para a minha atuação, com suas

experiências e práticas. Cada encontro, uma nova aprendizagem, um novo horizonte

ampliando-se, ideias que tomavam formas. Mas, ainda havia um vazio, eu não estava

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atuando em sala de aula, portanto, não poderia aplicar, satisfatoriamente, nenhuma das

atividades propostas no curso.

Ao retornar para as escolas, percebia-me pelos corredores e portas das salas de

aula, observando, atentamente, cada movimento daquele ambiente, daqueles alunos e

professoras; na posição de professor-pesquisador, ainda que em silêncio, criticava a

dinâmica do cotidiano escolar, pensando propostas mais flexíveis e contextualizadas, a

partir das reflexões teóricas apresentadas e discutidas na formação, pensando em como

ajudar "a desmontar a armadilha que tem tornado a escola pública brasileira uma fábrica

de analfabetos. Um instrumento poderoso na perpetuação da miséria." (WEISZ, 2006 p.

227).

Assim foram por dois anos... Até que no dia 25 de março de 2013, recebo a

notícia da escola, de que precisaria me deslocar da sala de leitura por algum tempo, para

assumir a turma do 2º ano - até que chegasse um novo professor para essa turma - mas,

sem hesitar, na mesma hora, disse que a professora da turma seria eu e que a nova

professora assumiria a sala de leitura - a diretora concordou.

Desde então tenho descoberto que atuar como professora alfabetizadora,

dialogando com reflexões teóricas, é desafiador, pois significa "quebrar paradigmas e

regras" de um contexto educacional e social marcado e enraizado em estruturas

tradicionais, como aponta Telma Weisz, em seu simpósio “Alfabetização no contexto

das Políticas Públicas”, quando analisa um desses contextos:

(...) verificamos que esses alunos foram retidos porque os professores não

tiveram condições de avaliar adequadamente e acabaram utilizando

indicadores como “letra bonita” ou “caderno bem feito” para decidir o

destino escolar de seus alunos. Quando o professor trabalha com este tipo de

indicador, até avanços na aprendizagem acabam prejudicando o aluno. Por

exemplo, quando o aluno aprende a ler, é comum que ele comece a “errar” na

cópia. Isto é, deixa de copiar letra por letra e começa a ler e a escrever

grandes blocos de palavras, em geral unidades de sentido, o que faz com que

cometa erros de ortografia ou escreva palavras grudadas. Isto, que é na

verdade indicador de progresso, acaba sendo interpretado como regressão,

pois o professor não tem clara a diferença entre copiar e escrever.

Constatação reforçada por outro dado interessante: a presença de 51 alunos

não-leitores (7%) na 2ª série. Estes alunos foram promovidos porque eram

bons copistas e isso parece ter impedido o professor de perceber que não

sabiam ler e escrever. (WEISZ, 2006p. 227)

Minha ação tem exigido, entre outras coisas, planejamento e posicionamento

numa constante prática reflexiva, ousando nas mudanças, rompendo velhas estruturas,

reorganizando tempos e espaços escolares, transformando e resignificando formas de

ensinar e aprender, visando à conscientização dos demais agentes e integrantes da

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comunidade escolar (direção, responsáveis e pais, alunos e outros funcionários da

escola) sobre a importância do lúdico para o processo de alfabetização.

Busco aproveitar as oportunidades que surgem – encontros e reuniões - para

discutir com eles o quanto é fundamental para uma criança o descobrir e o aprender a

gostar de estar na escola, de entender o porquê de estar neste ambiente, para que assim,

seu processo de aprendizagem possa fluir com naturalidade, liberdade e espontaneidade,

de forma prazerosa e significativa - apontando a educação lúdica como estratégia

essencial a essa tarefa, visto que apresenta características que atendem as

especificidades das crianças, como o brincar, conforme nos indica Kramer: (in Brasil,

2006 p. 15) "as crianças brincam e isso as caracteriza", portanto, na alfabetização levar

em conta o universo infantil é importante e facilita a apropriação dos conhecimentos.

Segundo Piaget (1945), dos dois aos seis/sete anos, a criança encontra-se no

estágio do desenvolvimento que é chamado de pré-operatório. [...]

Caracteriza-se por grande imaginação, curiosidade, movimento e desejo de

aprender e conhecer através do brincar [...] A aprendizagem está vinculada ao

lúdico [...] Destaca-se em particular a necessidade de se refletir que, ao

antecipar o ingresso na primeira série do ensino fundamental, se não houver

uma preocupação com esta questão, o tempo da criança de brincar estará

reduzido e a sua forma de aprender e de se expressar também será afetada.

(BRASIL, 2006, p.12)

Entendo ser importante refletir sobre como a criança aprende e se desenvolve e,

sobre qual é o papel do lúdico “com suas propriedades de prazer, motivação e ação

ativa”, junto à mediação docente, em estimular a aquisição de capacidades e habilidades

necessárias ao seu desenvolvimento pleno.

De acordo com os estudos de Jean Piaget (1987: in Brasil, 2012 p. 6), “a

atividade lúdica é um principio fundamental para o desenvolvimento das atividades

intelectuais da criança sendo, por isso, indispensável à prática educativa”.

Portanto, promover a experiência do brincar no ambiente escolar é abrir espaço

para esse desenvolvimento; é respeitar e tratar a criança como criança; escutá-la e

estabelecer um diálogo e encontro com sua realidade, abrangendo os aspectos

cognitivos, afetivos, psíquicos, sociais e outros, que são fundamentais no seu processo

de formação dentro e fora da escola.

Dessa forma, ao se pensar numa escola dinâmica, pensamos na educação lúdica

como proposta de grande contribuição para a prática educativa, em especial na

alfabetização, voltada para a construção e formação de um aluno criativo, crítico,

motivado a aprender e gostar de estar na escola.

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Nesse trabalho, a ludicidade será compreendida numa dimensão ampla, que

estimula o brincar, a utilização de jogos e brincadeiras para fins de assimilação de

conteúdos, propiciando aos envolvidos na atividade, experimentar o prazer, a alegria, a

satisfação de participar de forma integral das vivências propostas.

Na educação lúdica, a postura do educador como um dos sujeitos e agentes da

ação educativa é importante, pois estará junto com os alunos, envolvido, inteiramente,

no fazer pedagógico criando um ambiente atrativo e estimulante da aprendizagem.

A percepção que tenho e a proposta educativa que busco desenvolver é no

sentido de um agente do movimento de (trans) formação no/do cotidiano escolar e,

essas iniciativas tem marcado toda a minha trajetória profissional que se identifica com as

novas concepções da prática docente.

As últimas reformas educacionais propuseram objetivos como o de lograr

melhores resultados escolares, acomodar as respostas instrucionais à

diversidade dos estudantes e fazer com que os alunos aprendam criativa,

produtiva e reflexivamente. Esses objetivos educacionais implicam enormes

pressões e exigências tanto para os alunos como para os professores. Exigem

professores muito bem formados, com muitas capacidades e habilidades,

professores que entendam tanto de aprendizagem como de ensino, que

estejam familiarizados com perspectivas interdisciplinares e possam criar

pontes entre as experiências dos alunos e os objetivos curriculares (Darling-

Hammond, 1994: 5 in Weisz, 2006, p. 228)

Atualmente, concluí o Curso de Licenciatura Plena em Pedagogia na UERJ, participo

do curso de formação do PNAIC - como professora alfabetizadora, sob a orientação da Prof.ª

Mônica Albuquerque - aquela que acompanha de perto minha prática cotidiana junto a minha

turma de alfabetização na Escola Municipal Helio Mendes do Amaral - e, participo também do

GRUPENAD - Grupo de pesquisa sobre escritas docentes, formação de professores,

didática da formação, alfabetização e práticas sociais de leitura e escrita, sob a

coordenação da Prof.ª Dr.ª Mônica Pinheiro Fernandes – UFRRJ.

A busca por formação, conhecimentos e aprimoramento profissional, são alguns

fatores me influenciaram e justificaram minha decisão de escrever e apresentar este

relato: quero participar do grupo de educadores que discutem e pensam a prática

alfabetizadora, reivindicando e propondo ações no sentido de construir um modelo

educacional comprometido, não em apresentar números e cumprir programas de um

currículo distante do contexto escolar e, mais ainda, da realidade do aluno, mas, sim,

voltado para os interesses do aluno e seu envolvimento como autor de sua própria

aprendizagem, pautado em princípios de valorização docente e aprendizagem

significativa.

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Reconhecemos que a alfabetização é um processo importante na vida escolar do

indivíduo que e a utilização da ludicidade nas ações pedagógicas, podem ser uma

poderosa alternativa didática para a construção de um processo educacional de sucesso,

nesse sentido, nos reportamos ao documento legal do Sistema de Educação brasileiro: Ensino

Fundamental de nove anos - Orientações para a inclusão das crianças de seis anos de Idade, que

respalda nosso entendimento:

Partindo do princípio de que o brincar é da natureza de ser criança, não

poderíamos deixar de assegurar um espaço privilegiado para o diálogo sobre

tal temática. Hoje, os profissionais da docência estão diante de uma boa

oportunidade de revisão da proposta pedagógica e do projeto pedagógico da

escola, pois chegaram, para compor essa trajetória de nove anos de ensino e

aprendizagens, crianças de seis anos que, por sua vez, vão se encontrar com

outras infâncias de sete, oito, nove e dez anos de idade. Se assim

entendermos, (...) este é o momento de recolocarmos no currículo dessa etapa

da educação básica o brincar como um modo de ser e estar no mundo; (...)

como uma expressão legítima e única da infância; o lúdico como um dos

princípios para a prática pedagógica; a brincadeira nos tempos e espaços da

escola e das salas de aula; a brincadeira como possibilidade para conhecer

mais as crianças e as infâncias que constituem os anos/séries iniciais do

ensino fundamental de nove anos. (BRASIL, 2006 p. 9)

2. Justificativa e objetivos da experiência

Diante do reconhecimento da importância do brincar na educação das crianças e

sendo a professora-pesquisadora, regente, no ano de 2014, da turma do 1º ano de

escolaridade, em processo de alfabetização, nasce a ideia desse relato que visa

contribuir, em nível de seu alcance, como uma referência para futuros estudos e análises

que fortaleçam o movimento científico-social e educativo, em prol da conquista de uma

educação prazerosa e criativa.

Através do lúdico, buscamos construir práticas educativas significativas

centradas no interesse e envolvimento dos alunos como sujeitos no processo ensino-

aprendizagem, sobretudo, na alfabetização, por se tratar de uma etapa importante na

vida escolar das crianças.

Delimitamos como objetivos deste relato de experiência: a) narrar minhas

impressões e percepções enquanto Professora Alfabetizadora; b) compartilhar

momentos significativos que permearam as aulas; c) refletir sobre as possíveis

contribuições do lúdico no processo de ensino-aprendizagem, sobretudo na

alfabetização.

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3. Metodologia

O relato de experiência docente foi construído a partir da análise de práticas

educativas lúdicas, desenvolvidas numa turma de 1º ano de escolaridade, numa escola

pública do município de Mesquita - RJ, analisadas à luz de referenciais teóricos da

temática, entre estes, os materiais de formação do Pró- Letramento e do PNAIC.

A opção metodológica foi a pesquisa qualitativa de caráter exploratório tendo-se

em vista que o relato foi construído através da análise do trabalho desenvolvido pela

professora-pesquisadora numa interação direta com seus alunos e sua prática

pedagógica centrada numa proposta lúdica de Ensino, possibilitando analisar a

contribuição da Ludicidade no processo de desenvolvimento e na alfabetização dos

alunos participantes da pesquisa.

Nesse sentido, Godoy (p.57-63, 1995) nos fornece algumas características da

pesquisa qualitativa: o ambiente é a fonte direta dos dados, o pesquisador é instrumento

chave no processo, possui caráter descritivo e o processo é o foco principal da

abordagem e não o resultado; para analisar os dados, o pesquisador faz uso da forma

intuitiva e dedutiva, não exige utilização de métodos e técnicas estatísticas na

interpretação do fenômeno, essa se dará pelo contato direto do pesquisador com o

ambiente.

Quanto ao caráter exploratório, Gil (1991, p.46), define como pesquisa

Exploratória quando um trabalho envolve levantamento bibliográfico, entrevistas com

pessoas que tiveram (ou tem) experiências práticas com o problema pesquisado e

exemplos que estimulem a compreensão.

Assim sendo, consideramos pertinente a opção metodológica adotada nesse

trabalho que visa refletir e analisar as práticas pedagógicas desenvolvidas na

experiência dessa turma, através de referenciais teóricos, buscando identificar o

alcance e contribuições da ludicidade nesse processo educativo.

4. Cenário da Pesquisa, Instituição e os sujeitos.

“Mesquita, encontra-se localizada em uma das regiões de maior bolsão de

miséria e abandono do Estado do Rio de Janeiro, a Baixada Fluminense.”

(SILVA 2007 p. 26)

A Escola Municipal Hélio Mendes do Amaral, colaboradora deste relato,

pertence à Rede Municipal de Educação de Mesquita, município da Baixa Fluminense,

no Rio de Janeiro, que teve seu processo de emancipação em 1999.

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A sua localização geográfica, no Bairro da Chatuba, é conhecida por altos

índices de violência e, apresenta graves problemas sociais, sendo também, desassistido

pelo poder público, o que demanda a construção de uma proposta pedagógica criativa,

contextualizada e facilitadora da ação educativa.

A escola atende, aproximadamente, 220 alunos e oferece atendimento no

período matutino e vespertino para alunos do 1º ao 5º ano de escolaridade do Ensino

Fundamental, contendo um total de 10 turmas.

Neste relato, compartilharei experiências vividas com a turma 102, no ano letivo

de 2014, cuja qual, neste ano de 2015, no 2º ano de escolaridade, continua sendo minha

turma.

A classe é composta por 20 alunos, matriculados e frequentes, sendo 10 meninas

e 10 meninos, na faixa etária de 6/7 anos. De forma geral, a turma é participativa e com

grande interesse por aprender.

Trata-se de 1º ano de escolaridade, etapa inicial do ciclo de alfabetização,

portanto no início do período letivo, o contato dos alunos com o sistema de escrita era

pequeno.

4.1 Conhecendo um pouco da nossa rotina

Nossas aulas foram recheadas de descobertas, aprendizados e possibilidades

outras de criar e recriar o conhecimento.

Segundo Borba (2007, p.43) "se incorporarmos, de forma efetiva, a ludicidade

nas nossas práticas, estaremos potencializando as possibilidades de aprender e o

investimento e o prazer das crianças no processo de conhecer”.

Em minha prática cotidiana, destaco alguns momentos significativos, que foram

estratégias que pautaram todas as nossas aulas, a saber:

Leitura literária contada pela professora - histórias, notícias, fábulas, poesias,

receitas - sempre buscando diversificar o gênero textual.

Vi, a cada leitura, o encantamento dos alunos diante das histórias lidas e o

interesse em apropriar-se delas para recontar.

Cantinho literário – momento livre e espontâneo dos alunos para realizar uma

leitura de seu interesse.

Ler é bom demais! Se deixar é toda hora... Eu me divirto com eles lendo. A

imaginação deles é muito fértil!Assim propiciamos ricos momentos lúdicos,

prazerosos, de interação e espontaneidade.

Conhecimentos, das diferentes áreas, construídos a partir de jogos, brincadeiras,

confecção de materiais com sucata.

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Os alunos diziam que as atividades eram divertidas, ficavam entusiasmados e

animados para cumprir e participar de todas elas. É muito legal poder brincar

e aprender ao mesmo tempo.

A interação, essencial ao processo de aprender, sempre presente, no

desenvolvimento das atividades.

Em todos os momentos, destacaram-se a valorização da troca entre os alunos,

reconhecendo-a como importante meio de promover a aprendizagem além de

estimular a construção das relações interpessoais na turma.

Em muitas situações a turma foi organizada em grupos, para que pudessem

trocar ideias e compartilhar conhecimentos e experiências, o que proporcionou

enriquecimento e facilitou a aprendizagem, pois o que poderia parecer difícil, na

interação entre os colegas, se tornou fácil e agradável.

Acreditamos que a aprendizagem pode acontecer com a participação de

todos, deixando de ser o professor, o único mediador do processo e abrindo

caminhos para que os alunos interajam, discutam e compartilhem suas ideias.

Ao ajudar um colega na realização de uma tarefa, por exemplo,

instantaneamente eles estão aprendendo mais ainda.

Diferentes atividades foram propostas envolvendo escrita e formação de

palavras, letras do alfabeto, situações-problemas de adição e subtração, mas sempre com

o foco de apresentá-las de forma dinâmica, dentro da proposta de uma educação lúdica.

E vamos que vamos! Brincando livre, de forca, com o bingo, adedonha, num

"mercadinho" na sala de aula, criando brinquedos de sucatas, com o teatro,

histórias de faz de conta , construindo uma nova concepção de ensinar e

aprender - desconstruindo a ideia de que estudar é "chato", que aprender a ler,

escrever e resolver situações problemas é difícil.

No processo de alfabetização a participação do professor é imprescindível, sua

postura lúdica favorecerá a construção de um ambiente incentivador e prazeroso e, a

mediação no processo de construção e produção do conhecimento se dará numa relação

afetiva e amigável com o aluno; o planejamento de atividades interessantes e adequadas,

buscando integrar jogos e brincadeiras e propiciar alegria no momento da realização das

tarefas, dará sentido e novo significado ao ambiente escolar, facilitando o aprendizado.

Não existe ensino sem que ocorra aprendizagem e esta não ocorre se não for

pela transformação do educando pela ação facilitadora do professor, no

processo de busca e construção do conhecimento que deve ser despertado no

aluno. É nesse contexto que o lúdico ganha espaço.

ALMEIDA 1998. p, 37.

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Professora e alunos estimulados foram envolvidos de forma espontânea nas

propostas, e consequentemente as metas e objetivos traçados, foram mais facilmente

alcançados, havendo maior disposição para ensinar e aprender.

Como educadora mediadora e facilitadora sinto-me realizada em ser agente e

promotora de novos sentimentos, contribuindo na construção de

aprendizagens significativas e prazerosas, acho muito curioso e motivador a

diversidade de estratégias, ideias e opiniões compartilhadas e criadas pelos

alunos, isso tornou o ambiente agradável e construtivo para todos nós.

As atividades lúdicas como estratégias de ensino-aprendizagem ajudaram a

compor as nossas aulas.

Ferreira, Misse e Bonadio (2004: in BRASIL, 2012 p.9), afirmam: “o brincar

deve ser um dos eixos da organização escolar: a sala de aula fica mais enriquecida de

desenvolvimento motor, intelectual e criativo da criança”.

Bittencourt e Ferreira (2002: in BRASIL, 2012, p.7) dizem que: “as brincadeiras

podem motivar as crianças para se envolverem nas atividades e despertam seu interesse

pelos conteúdos curriculares".

4.2 Descrição e Análise de algumas atividades desenvolvidas

Trabalho com os nomes dos alunos

Nos primeiros momentos com a turma, conversamos sobre os nossos nomes,

cada um teve a oportunidade de apresentar-se e contar sobre a história do nome: quem

havia escolhido, o porquê, o significado, enfim, trazer informações sobre o próprio

nome .

Após, os nomes da turma foram registrados e apresentados de diferentes formas:

através de jogos e brincadeiras, como quebra-cabeça do nome, alfabeto móvel, músicas,

crachás, lista de nomes... Para que, inicialmente, cada aluno pudesse identificar e

escrever seu próprio nome, contando as letras e observando a letra inicial e final e, a

partir do convívio com a turma, reconhecer e escrever também o nome dos colegas, e

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poder estabelecer diversas relações que favorecessem e auxiliassem na produção do

conhecimento.

Essas atividades desenvolvidas de forma lúdica propiciaram a interação entre

os alunos com atitudes de cooperação, alegria e solidariedade, o

desenvolvimento da linguagem e contato com o Sistema de escrita de forma

prazerosa.

Produção de texto oral e escrito

Trabalhar textos envolve primeiro uma situação de prazer. [...] ouvir o

professor ler textos e contar histórias, fazer leitura compartilhada ou

individual, ouvir colegas lendo textos e fazer comentários, comparar versões,

fazer pesquisas e outros atos de leitura devem despertar no alfabetizando o

envolvimento no tema, o interesse pelo assunto, a curiosidade pelo desenrolar

dos fatos e, principalmente, o gosto pela leitura.

RUSSO, 2012, p. 132.

Durante as aulas foram propostas diversas atividades relacionadas à produção

textual oral e escrita. Estas proporcionaram momentos ricos, estimulantes, envolventes e

criativos para a elaboração e construção do conhecimento de escrita.

Diferentes temas foram abordados e diversas estratégias foram utilizadas para o

envolvimento e produção dos alunos, como: contação de histórias, apresentação de

vídeos, situações imaginárias, textos a partir de imagens, utilização de notícias, textos

de memória, escrita de listas de palavras de um mesmo campo semântico.

Escritores em ação... Eles se sentem o máximo quando eu passo para eles a

minha caneta e deixo-os “brincarem” de escrever. “Só os fortes” entendem

que KAO é CAVALO, MIGEU é MIGUEL e, assim vai...

Escrita de listas

Diferentes listas foram elaboradas: frutas, animais, partes do corpo humano,

programas de televisão favoritos da turma - com a participação e ideias dos alunos, e

construídas tanto oralmente e registrado pela professora, quanto pela contribuição da

produção escrita individual do aluno.

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Buscou - se aliar a criatividade, o dinamismo e a espontaneidade do lúdico

nesses momentos de produção, como: desenhar um corpo humano no quadro e chamar

um aluno por vez para escolher e registrar escrevendo o nome de um órgão do nosso

corpo;

Antes dessa atividade de escrita formal, uma aluna da turma foi escolhida

para ser "recurso de experiência" prática da turma - ela deitou sobre uma

folha, os demais alunos ficaram ao redor e, enquanto a professora fazia o

contorno do corpo com uma caneta, eles puderam observar alguns detalhes

do corpo humano. Um dos que mais chamou a atenção e o interesse da turma

foi a garganta (eles ficaram bem empolgados nesta atividade

Para a construção da lista de frutas, foi pedido no dia anterior a essa atividade,

que os alunos trouxessem suas frutas favoritas e, assim, com as frutas na sala, foram

várias as produções - gráfico das frutas favoritas da turma, a própria lista de frutas,

culminando em um "amigo oculto" de frutas.

Com esta lista também, foram abordados temas como: a alimentação

saudável e o cuidado com o nosso corpo (abordando as diferentes áreas do

conhecimento, fazendo uso da interdisciplinaridade).

Receitas: Sorvete de Maracujá para o Dia das Mães

Buscando aproveitar todas as oportunidades para estimular a autoria e

aprendizagem das crianças, na semana de comemoração do dia das mães, a professora

decidiu que não iria seguir o padrão de lembrancinha da escola, em que os professores

teriam que produzir flores em E.V.A e colar em uma caneta hidrocor. Propôs, então, a

produção de uma receita junto aos alunos: eles iriam fazer, com suas próprias mãos, um

sorvete para suas mães.

Antes, da produção desse sorvete, na sala de aula, a professora apresentou aos

alunos um livro de Receitas com o tema da novela Carrosel, nesse momento, perguntou

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sobre o que eles imaginavam que se tratavam os textos ali registrados e, muitas

hipóteses e contribuições foram compartilhadas: "sobre comida", "muitos pratos pra

gente comer", "a minha vó tem isso na casa dela". Todos tiveram a oportunidade de

apresentar seus conhecimentos para o grupo e de folhear o material.

Após esse momento compartilhado e de contato ao material do gênero textual

Receita, partimos para o “vamos ver” – fomos todos para o pátio da escola, e lá, os

alunos sob a minha orientação, manipularam os ingredientes (suco de maracujá e leite

condensado), misturaram tudo no liquidificador e levaram ao congelador da cozinha

para gelar. Foi um momento rico, divertido e de descobertas, pois, todos puderam

participar e produzir uma receita que seria usada para presentear as mães, além disso,

foi construído para cada aluno um "chapéu" de chef., o que os encantou e os atraiu ainda

mais à proposta. A partir daí, seguimos para sistematização do Gênero: questionamos

sobre como foi preparo do sorvete, explorando as características do texto - Título,

Ingredientes e Modo de Fazer - e registramos coletivamente essa receita.

Leitura

A leitura faz parte da rotina diária da criança [...] No entanto, na escola,

alguns alunos demonstram bloqueio para a leitura, principalmente quando os

textos apresentados são poucos significativos para eles. A sala de aula deve

dar continuidade à leitura prazerosa, aquela que estimula a criança, que aguça

sua curiosidade, sensibilizando-a de alguma maneira.

(RUSSO, 2012, p. 235).

Acreditamos que tratar a leitura como um ato mecânico - de palavras soltas,

sílabas isoladas, textos descontextualizados, repetições sem fim - e separada da

compreensão é um desastre que resulta no desinteresse e rejeição das crianças. Por isso,

nas nossas aulas escolhemos mostrar aos alunos o que se aprende e o que se ganha com

a leitura, através de atividades atraentes e que fizessem sentido, permitindo e

possibilitando a elas situações de exploração de materiais escritos, deixando-as entrar

em contato com eles sem pressão e sem cobrança. Assim, a leitura prazerosa - em

situações de jogo e brincadeira, espontaneidade e criatividade - entrou em cena e abriu

espaço para muitas descobertas.

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Leitura literária de livros do acervo do Cantinho de Leitura da sala

Todos os dias, ao entrarem na sala de aula, os alunos escolhem um livro de

histórias para ler. Esse momento tornou-se espontâneo para as crianças, como

acordar e tomar café, pois, elas mal chegam à sala e já logo pedem para ler

um livro. A sensação que dá é que elas "acordam" as histórias que dormem

nos livros, porque ao caminhar pela sala, é possível perceber grandes leituras

e histórias sendo construídas pela imaginação e criatividade delas.

Leitura de Parlendas

Aproveitando o interesse das crianças pelas parlendas, utilizamos nas práticas

lúdicas de leitura, esses textos para facilitar e estimular a leitura de forma prazerosa e

ampliar o nível vocabular dos alunos.

Diversas parlendas foram apresentadas a classe, escritas em cartazes, no

quadro branco, em fichas e também foi construído um banco de parlendas

(nos mesmos moldes de banco de palavras).

Inicialmente as leituras foram feitas em voz alta pela professora junto com os

alunos, a partir daí, os alunos memorizaram e cantaram as parlendas e muitas atividades

foram propostas desde hipóteses sobre a escrita de palavras, frases e texto passando pela

leitura e recitação em voz alta pelos alunos diante da turma até a utilização da

intersdisciplinaridade.

O lúdico na matemática

Recorrer aos jogos, brincadeiras e outras práticas sociais nos trazem um

grande numero de possibilidades de tornar o processo de Alfabetização

Matemática na perspectiva do letramento significativo para as crianças. [...]

O que se espera, no entanto, é que os professores sintam-se encorajados a

fazer uso dessas coisas que estão presentes em nossos afazeres diários, em

nosso mundo "ao redor", e explorem situações matemáticas possíveis e

desejáveis de serem levadas para dentro das salas de aula.

BRASIL, 2014 p.25

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Mercadinho

Os alunos foram divididos em dois grupos: os vendedores e os compradores.

Aos vendedores ficou a responsabilidade de apreçar os produtos e fazer os cálculos ao

final de cada compra e, os compradores receberam uma determinada quantidade de

dinheirinho de brinquedo e foram às compras. Estes deveriam saber quantos e que

produtos poderiam comprar com o dinheiro que receberam. * Para a soma dos produtos

pode-se usar a calculadora.

Eles amam comprar... A nossa sala de aula sempre vira uma loja, seja de

brinquedos, de livros, um supermercado... Situações estas que provocam

contas e mais contas.

Jogando Uno

Por que tentar ensinar matemática com continhas no quadro se eu posso fazer

isso jogando meus jogo preferido com meus alunos?! Acredito que a

principal condição para aprender é a presença de um professor e alunos

criadores, instigadores, inquietos, curiosos, humildes e persistentes... Isso eu

tenho de sobra na minha sala de aula. A dica é: Matemática e Uno -

combinação perfeita.

5. CONSIDERAÇÕES FINAIS:

Em linhas gerais, a realização desta pesquisa sobre as contribuições da

ludicidade na prática educativa a partir da análise do relato de experiência da professora

da turma do 1º ano de escolaridade, em processo de alfabetização; traz indicações no

sentido de reafirmar que a proposta pedagógica pautada nas atividades lúdicas:

brincadeiras, jogos, brinquedos e o divertir-se na sala de aula; aliados a postura lúdica

do educador são ricos recursos para estimular e facilitar no desenvolvimento integral do

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aluno e contribuir no processo de construção de conhecimento; sobretudo, para crianças

em processo de alfabetização.

O Educador Paulo Freire (1996, p.26) destaca que as condições para aprender

criticamente “implicam ou exigem a presença de educadores e de educandos criadores,

instigadores, inquietos, rigorosamente curiosos, humildes e persistentes.” e assim “nas

condições de verdadeira aprendizagem os educandos vão se transformando em reais

sujeitos da construção e da reconstrução do saber ensinado, ao lado do educador,

igualmente sujeito do processo”.

Ficou evidente na experiência da turma colaboradora que as brincadeiras, os

jogos e as diferentes atividades lúdicas, desenvolvidas junto aos alunos, contribuíram,

de forma significativa, em seu desenvolvimento possibilitando o envolvimento dos

participantes das atividades de forma plena, o interesse por aprender foi aguçado;

através da interação professor – aluno/ aluno – professor / alunos-alunos, foi construído

um novo processo ensino-aprendizagem que proporcionou o desenvolvimento de

diversas capacidades/habilidades: cognitivas, psíquicas, sociais, culturais e afetivas.

Esse estudo reconhece que é necessário e primordial fazer da sala de aula um

ambiente prazeroso e favorável ao aprendizado dos alunos; que uma aula estruturada

numa proposta lúdica pode ser uma ótima estratégia para desenvolver a livre expressão

e a criatividade das crianças e contribuir no alcance dos objetivos almejados no projeto

pedagógico.

No entanto, para que o clima favorável seja viabilizado é necessário atentarmos

para alguns aspectos, como bem observa Tânia Fortuna: em uma sala de aula

ludicamente inspirada, convive-se com a aleatoriedade, com o imponderável; o

professor renuncia à centralização, à onisciência e ao controle onipotente e reconhece a

importância de que o aluno tenha uma postura ativa nas situações de ensino, sendo

sujeito de sua aprendizagem; assim sendo, a espontaneidade e a criatividade são

constantemente estimuladas.

Convém lembrar que o lúdico propicia uma compreensão de mundo, do

conhecimento de forma mais ampla e significativa para o aluno. E trabalhar com uma

proposta de lúdica é estar afinado com a marca principal do universo infantil, é construir

uma interlocução positiva na relação professor/aluno e ensino/aprendizagem.

Nessa relação será possível estabelecer a comunicação eficaz, a mediação

saudável e necessária para que alunos e professores desenvolvam suas potencialidades

de forma natural e prazerosa.

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A escola e o educador conscientes da importância da decisão de engajar-se na

proposta lúdica de educação devem estar cientes dos benefícios e desafios a serem

enfrentados no dia a dia do trabalho escolar: poucos recursos, flexibilização de espaços

e tempos, planejamento e acompanhamento, avaliação e outros.

Nesse sentido, sugerimos que manter o aluno como o foco das ações será

importante na realização da tarefa, na construção das ações para assegurar o

desenvolvimento do aluno e de suas habilidades/capacidades numa perspectiva

democrática e cidadã. A valorização do aluno, de seu saber, de seus interesses, de suas

diferenças deve nortear as ações da escola e do educador comprometido e engajado.

Diante do exposto faz-se necessário seguir aprofundando os estudos da temática

para que educadores, educadoras e alunos sejam beneficiados com o modelo de

educação lúdica em prol da construção de um novo modelo que dê aos seus

participantes, alegria de ensinar, aprender e viver proporcionada pelo ato de brincar.

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