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NEAM - Núcleo de Estudos e Aprofundamento Marxista – Programa de Pós Graduação de Serviço Social – PUC SP Data: 14.10.2012 Transcrição 1 da participação do professor Celso Frederico no Debate e discussão no NEAM sobre o livro: “O Jovem Marx – 1843 e 1844 – as origens da ontologia do Ser Social” Beatriz Abramides – Já há algum tempo o Celso esteve aqui no NEAM, no qual ele disse – numa tarde chuvosa eu vim aqui para debater “O jovem Marx – 843 e 844...” No mesmo ano da publicação do livro em 1995. Então faz 17 anos que o Celso veio. Era uma tarde chuvosa e agora uma noite quente... Ele vem fazer o debate do livro dele. Quero agradecer muito o Celso, embora alguns de vocês já o conheçam das atividades programadas, de alguma maneira já viveram a oportunidade de conversar com o Celso e ao mesmo tempo ter contato com a sua bibliografia. Vasta bibliografia... O Celso é professor da ECA na USP, tem participado de bancas. É sempre uma alegria e um prazer poder fazer essa conversa com o Celso. Bem vindo ao NEAM, retomado a partir desse ano. Celso Frederico – Eu é que agradeço pelo convite. Para iniciar a nossa discussão entendo ser importante comentar duas coisinhas breves. Primeiro, sobre os estudos da obra de Marx - É sempre aconselhável começar pela própria tese que Marx desenvolveu sobre o estudo da história, a famosa frase dele que o “capitalismo explica o pré-capitalismo... A anatomia do homem explica a anatomia do macaco... O mais desenvolvido explica o menos desenvolvido.”. Nós poderíamos aplicar essa ideia a própria obra de Marx. Marx não nasceu sabendo tudo, chegou aos seus melhores resultados nas obras finais, e elas explicam de certa forma os tropeços e avanços que ele deu durante a sua caminhada. É sempre conveniente começar, iniciar os estudos de Marx pelo Capital e depois voltar a esses textos juvenis, especialmente os textos de 1843 e 1844 – A crítica do Estado de Hegel e os Manuscritos Filosóficos – que são textos extremamente difíceis. E são textos difíceis não só para nós, pobres leitores, como também para o próprio Marx que estava quebrando a cabeça para encontrar um caminho e aos poucos perseguindo, encontrando pistas falsas e mudando de rota. Então é sempre o fim que ajuda entender o começo e as dificuldades de Marx. O segundo comentário que eu quero fazer é sobre a minha própria leitura de Marx. Nos anos 70 eu tinha um grande amigo que chamou um grupo de pessoas para estudar “O capital”, ficamos vários anos nos reunindo duas vezes por semana para ler Marx. O método de leitura era o mais simples possível – líamos o texto em voz alta e pausadamente e quando preciso voltava para o início da leitura. Depois de certo tempo, como costuma acontecer, o grupo foi 1 Transcrição realizada por Eliana Pereira Silva – mestranda do Programa Serviço Social PUC/SP, 2012.

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Page 1: “O Jovem Marx 1843 e 1844 as origens da … o livro: “O Jovem Marx – 1843 e 1844 – as origens da ontologia do Ser Social” Beatriz Abramides – Já há algum tempo o Celso

NEAM - Núcleo de Estudos e Aprofundamento Marxista – Programa de Pós Graduação de

Serviço Social – PUC SP

Data: 14.10.2012

Transcrição1 da participação do professor Celso Frederico no Debate e discussão no NEAM

sobre o livro: “O Jovem Marx – 1843 e 1844 – as origens da ontologia do Ser Social”

Beatriz Abramides – Já há algum tempo o Celso esteve aqui no NEAM, no qual ele disse –

numa tarde chuvosa eu vim aqui para debater “O jovem Marx – 843 e 844...” No mesmo ano

da publicação do livro em 1995. Então faz 17 anos que o Celso veio. Era uma tarde chuvosa e

agora uma noite quente... Ele vem fazer o debate do livro dele.

Quero agradecer muito o Celso, embora alguns de vocês já o conheçam das atividades

programadas, de alguma maneira já viveram a oportunidade de conversar com o Celso e ao

mesmo tempo ter contato com a sua bibliografia. Vasta bibliografia... O Celso é professor da

ECA na USP, tem participado de bancas. É sempre uma alegria e um prazer poder fazer essa

conversa com o Celso. Bem vindo ao NEAM, retomado a partir desse ano.

Celso Frederico – Eu é que agradeço pelo convite.

Para iniciar a nossa discussão entendo ser importante comentar duas coisinhas breves.

Primeiro, sobre os estudos da obra de Marx - É sempre aconselhável começar pela própria tese

que Marx desenvolveu sobre o estudo da história, a famosa frase dele que o “capitalismo

explica o pré-capitalismo... A anatomia do homem explica a anatomia do macaco... O mais

desenvolvido explica o menos desenvolvido.”.

Nós poderíamos aplicar essa ideia a própria obra de Marx. Marx não nasceu sabendo tudo,

chegou aos seus melhores resultados nas obras finais, e elas explicam de certa forma os

tropeços e avanços que ele deu durante a sua caminhada.

É sempre conveniente começar, iniciar os estudos de Marx pelo Capital e depois voltar a esses

textos juvenis, especialmente os textos de 1843 e 1844 – A crítica do Estado de Hegel e os

Manuscritos Filosóficos – que são textos extremamente difíceis.

E são textos difíceis não só para nós, pobres leitores, como também para o próprio Marx que

estava quebrando a cabeça para encontrar um caminho e aos poucos perseguindo,

encontrando pistas falsas e mudando de rota. Então é sempre o fim que ajuda entender o

começo e as dificuldades de Marx.

O segundo comentário que eu quero fazer é sobre a minha própria leitura de Marx. Nos anos

70 eu tinha um grande amigo que chamou um grupo de pessoas para estudar “O capital”,

ficamos vários anos nos reunindo duas vezes por semana para ler Marx. O método de leitura

era o mais simples possível – líamos o texto em voz alta e pausadamente e quando preciso

voltava para o início da leitura. Depois de certo tempo, como costuma acontecer, o grupo foi

1 Transcrição realizada por Eliana Pereira Silva – mestranda do Programa Serviço Social PUC/SP, 2012.

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encolhendo e ficaram apenas os dois. Terminado a leitura do Capital, resolvemos ir à fonte de

Marx e iniciamos a leitura da “Lógica de Hegel”, depois passamos a Feurbach, Adorno,

Benjamim e vários outros autores que abordavam a problemática que estava nos

interessando.

Essas leituras não tinha nenhuma finalidade prática, nós fomos guiados por mera curiosidade

intelectual e que eram coisas que nos interrogavam, nos provocavam. Fomos levados à leitura

pelo simples interesse em conhecer.

Apenas muito tempo depois, meio que por acaso, resolvemos rabiscar um pequeno livrinho

chamado “Dialética e Materialismo”, mais voltado para 1843.

O objetivo nosso, nessa época, não perseguia nenhum fim utilitário, o prazer da leitura sem

pressa. Não tinha na época o produtivismo.

Outro aspecto interessante nessa trajetória era a coisa que muito tempo depois passou a ser

reivindicado por alguns autores - a leitura lenta, leitura em voz alta e devagar. No mundo da

pressa e da agitação é natural que a gente leia no ponto de ônibus, na sala de espera do

dentista. Porém, os textos mais importantes merecem aquilo da convivência.

Recentemente surgiu um movimento propondo um modo de leitura lenta, derivado do

movimento slow food. Os textos merecem esse tratamento, os grandes merecem ser lidos

devagar e sem uma finalidade imediata. Basicamente, essa foi a história das minhas incursões

na leitura de Marx.

O que estava balizando o livro (O Jovem Marx) e as preocupações era a formação do

pensamento de Marx, onde ele dialogava com duas tendências intelectuais fortes - de um lado

a dialética hegeliana e de outro o materialismo sensualista de Feurbach.

E desse embate dos anos de formação é que Marx vai chegar a uma síntese original e vai tirar

sua ontologia do ser social. Toda a discussão nessa época está centrada nas duas grandes

figuras da filosofia clássica alemã, dois grandes pensadores da época.

O tempo que Marx começa a pensar é o tempo posterior à morte de Hegel. Hegel morreu em

1831 e a partir daí se iniciou uma grande disputa pela interpretação da sua obra.

A Alemanha fazia com que todas as questões só ganhassem dignidade quando tratadas no

jargão filosófico.

Os alemães pensavam, enquanto os outros faziam a revolução. Os franceses faziam a

Revolução Francesa e os alemães faziam a Filosofia. Construíram sistemas filosóficos

poderosos e o maior deles foi o de Hegel.

Talvez a maior aventura filosófica da história da humanidade foi Hegel – o sistema filosófico

que tudo incluía. Qual o significado desse sistema ou pensamento?

Desde o começo os alemães se dividiam em dois grupos – a esquerda hegeliana e a direita

hegeliana. E essa disputa vai se concentrar no livro mais conservador de Hegel que é a

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“Filosofia do Direito”. Nele ele faz uma glorificação da monarquia e do Estado como momento

da racionalidade.

Então, a partir dessa discussão filosófica e também política, todo mundo vai se agarrar ao

texto de Hegel para glorificar a monarquia ou para criticar a monarquia prussiana.

Basicamente, havia três temas em disputa: o primeiro deles era a relação entre o sistema e o

método da filosofia; o segundo tema é a famosa frase de Hegel – O real é racional. O racional é

real; e finalmente, o tema da religião.

Existe um sistema filosófico em Hegel que comporta a filosofia da natureza, a filosofia do

Espírito e a Estética, e havia nesse sistema um método dialético.

É claro que em Hegel o sistema e o método estavam conciliados e integrados, entretanto, os

discípulos de Hegel, tanto a esquerda como a direita, vai travar uma disputa em que a direita

vai enfatizar o sistema e a esquerda o método dialético.

Isto é, na ênfase no sistema se evidencia uma visão conservadora, você tem um sistema

filosófico acabado e um desses momentos é a Filosofia do Direito, aquele que glorifica a

monarquia.

Já a esquerda hegeliana vai enfatizar e se apoiar no método da dialética - a dialética

revolucionária. Ela propõe sempre o movimento e a negação. Se ela propõe a negação, ela vai

além do presente, além da monarquia. A história não vai parar com a monarquia prussiana. A

dialética impulsiona as coisas para frente. Isso conforma um primeiro embate – Onde se

apoiar em Hegel?

O segundo tema é a frase que está no prefácio da Filosofia do Direito de Hegel - O racional é

real, o real é racional.

É claro que a direita hegeliana vai enfatizar o real - a monarquia existe logo ela é racional.

Ao passo que a esquerda, ao invés de enfatizar o real, vai enfatizar a racionalidade e ao

enfatizar a racionalidade eles estavam, indiretamente ou diretamente, constratando a

racionalidade com a irracionalidade da monarquia numa Europa que já foi varrida pela

revolução francesa. A Alemanha era um país ainda feudalizado e atrasado – uma situação

irracional.

O Hegel já em vida passou por esse problema e foi cobrado. Ele muito cauteloso, já fez da sua

filosofia uma diferenciação entre o que ele chamava do real, que no fundo é um processo.

Ele esta no processo, separava o real do existente em um momento dado, momento empírico.

(...).

E ao mesmo tempo, Hegel era bastante cauteloso, porque e quando ele escreveu a Filosofia do

Direito – o livro que era como a glorificação da monarquia - ele fazia um elogio do Estado

Moderno como conceito e não o Estado realmente existente – a monarquia prussiana. Todo

mundo achava que era a monarquia, mas será que era mesmo?

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Mas, a luta política falou mais alto e os discípulos de Hegel vão se engalfiar e o próprio Marx

vai fazer a “Crítica da Filosofia do Direito”.

O terceiro tema que dividia os corações e mentes era a religião. A religião aparece na Filosofia

de Hegel como um dos momentos da manifestação do Espírito.

No sistema hegeliano você tem a arte, depois tem a religião e depois tem a filosofia. Ora, a

direita hegeliana vai enfatizar o teológico. A própria filosofia de Hegel que é o processo pelo

desenvolvimento do espírito, depois tem a religião e depois tem a filosofia. O sistema da

própria manifestação do espírito.

Já a esquerda vai enfatizar a racionalidade, no sistema de Hegel a religião é um segundo

momento, ela é superada pela filosofia. A religião é um momento a ser superado.

O próprio Marx junto com Stirner fizeram um livreto e não assinaram - “As trombetas do Juízo

Final contra Hegel, herege e anticristo” que era uma grande gozação. Os dois se colocaram na

condição de religiosos pietistas – “Essa filosofia de Hegel é melhor tomar cuidado, esse Hegel é

um materialista, um ateu... Tanto que a religião esta aquém da filosofia e no fundo ele defende

a razão, o pensamento. Ele é um anticristo, materialista, um ateu inrrustido”.

Todo o debate vai girar em torno desses três temas. E todos esses temas estão situados no

interior da Filosofia de Hegel e estão colocados nos termos colocados pela Filosofia de Hegel.

E a Filosofia de Hegel é um sistema grandioso que tudo inclui, por isso que o Engels disse que

esse sistema foi o maior que a humanidade já conheceu. É impossível você fazer um sistema

maior e acabar com Hegel. Esse sistema só pode ser demolido por dentro. É preciso que

alguém faça esse serviço. E quem fez esse serviço foi Feurbach.

Aparece na Alemanha um jovem hegeliano que depois se afasta de Hegel totalmente. Então,

Feurbach até na forma de escrever ele contesta Hegel.

Hegel era um pensador sistemático, todo o texto de Hegel é um encadeamento lógico movido

pela necessidade. É um pensamento totalizante e histórico, onde as identidades se desdobram

e se tornam diferenças, oposições, contradições e a dialética segue seu curso no tempo.

Feurbach já faz uma filosofia totalmente ao contrário, em vez de ter um texto lógico

encandeado, ele trabalha com aforismos, frases fragmentadas belíssimas como um artista.

Em vez de enfatizar o tempo e seu movimento inexorável, Feurbach enfatiza o espaço. Então,

vejam bem, na filosofia e Hegel o tempo leva à luta dos contrários a superação. Em Feurbach,

quando ele enfatiza o espaço, as coisas convivem no espaço. O espaço é tolerante e

conciliador, onde os opostos podem conviver em paz.

Em função dessa visão o próprio Feurbach não era chegado às conclusões definitivas, pelo

contrário, uma das obras dele chama “Teses provisórias para reforma da Filosofia”.

Ele não tinha a preocupação em fazer afirmações taxativas, tudo nele é ambíguo, poético,

aberto a interpretações. Isto é, ele escreve como um artista cheio de enigmas e procurando

fixar o sentido de uma vez por todas.

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As coisas estão abertas, então surge daí uma filosofia alternativa ao racionalismo hegeliano.

Em vez de falar em razão, processos e essas coisas todas; Feurbach toma como ponto de

partida a intuição, a sensibilidade e o olhar e a contemplação.

Então é uma filosofia centrada no sentimento e não mais na razão como Hegel. Feurbach vai

contestar Hegel tomando como alvo principal o tema da Alienação. Foi Feurbach o primeiro a

colocar essa palavra na agenda filosófica e daí vai para a psicanálise e para as várias ciências.

O que ele vai dizer? A primeira coisa - que a filosofia de Hegel é uma filosofia alienada, isto é,

uma filosofia que parte da ideia de ser. A natureza é como se fosse uma criação do

pensamento, ela vem em segundo lugar. E essa ideia, esse ser que tudo condiz é algo abstrato,

indefinido. Isso ai é Deus, uma visão teológica. E o que é isso?

Então, ao invés de partir pela ideia, pelo pensamento, Feurbach quer partir do imediato, pelo

dado visível, pelo dado sensível, não quer o ser pensado, não algo abstrato. Ele propõe de cara

uma inversão materialista.

Então essa ideia que está em Marx de colocar Hegel de cabeça para baixo, está já dada em

Feurbach. Só que evidentemente Marx vai seguir um caminho diferente. Ele não vai partir do

dado imediato visível. Ele vai dizer - se a Essência das coisas coincidisse com a aparência, não

haveria ciência. O concreto só é concreto, porque a ciência de múltiplas determinações. Ele

não parte do imediato, mas do processo.

Mas, a ideia de que as coisas estão de cabeça para baixo em Hegel foi pela primeira vez

colocada por Feurbach. Então ele vai criticar também, em segundo lugar, por ser uma teologia

que começa pelo obscuro. Ele vai dizer – Isso é pura religião. E o que é a Religião? É a famosa

tese de Feurbach. Religião é alienação.

E ao dizer que a religião é alienação, ele faz uma critica dupla a filosofia de Hegel e a

monarquia, porque depois da morte de Hegel houve um momento em que o rei coloca um

filósofo (esqueci o nome dele). E vai justificar em termos religiosos a existência da monarquia.

Então o tema que é posto na mesa por Feurbach é o tema da religião. Religião é alienação. O

que quer dizer isso?

Resumindo as coisas, alienação quer dizer separação no sentido básico da palavra. A religião é

processo onde o homem se separa dos seus atributos. O homem vai dizer que Deus é

poderoso e Deus é bondoso. Ora esses atributos, são atributos humanos. O homem retirou de

si essas qualidades e colocou num ser imaginário e se separou dessas qualidades. Ele perdeu,

ele se alienou.

Então o Homem se aliena dos seus predicados e transfere a Deus os seus predicados. E fica

vazio, pobre. Como todo – a religião revela alguma coisa, a religião revela é uma revelação da

preciosidade ocultas do homem, a manifestação pública dos seus segredos e amores.

Então, vejam bem, se diz na religião revelada pelo cristianismo que diz Cristo é Deus. Deus é o

Homem. O homem adorava Deus, mas, na verdade adorava os atributos humanos. O homem

adora na religião o próprio homem e não percebe isso.

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Como bom iluminista, Feurbach queria que os homens corrigissem isso e passassem a amar o

próprio homem. Ela estava pregando uma filosofia amorosa de adoração à humanidade.

E o jovem Marx foi achar que isso ai era o fundamento filosófico do comunismo. E por algum

momento ele passou a pensar isso.

Feurbach não é propriamente um ateu como um Marques de Sade que renega Deus e seus

atributos. Na religião o homem adora o próprio homem. É preciso que o homem tome

consciência e adore o próprio homem – os valores humanos. (...)

A religião é uma ideologia. Ela tem uma dimensão ontológica, envolve homens e seus

sentimentos. Você não vai dizer para o crente – dois e dois são quatro e não cinco. Logo Deus

não existe. Esse tipo de coisa não funciona.

A religião é uma coisa que envolve e ajuda a pessoa se comportar no cotidiano. Ela não é uma

questão só de conhecimento como achava Feurbach.

Uma coisa interessante é que ele fala que a religião é um sonho, um sonho que se revela

verdade. E que o homem adora o próprio homem.

Teve um cidadão que leu isso e levou isso muito a sério, mas nunca citou Feurbach, foi Freud.

O sonho revela uma verdade. Só que não é um predicado humano o inconsciente. Feurbach

influenciou Marx e Freud. Ele tem certo peso...

Outro ponto ligado à religião é que o homem é o único animal que tem religião. Então religião

é uma coisa que une o indivíduo ao gênero humano.

E essa relação – indivíduo e gênero humano – vai aparecer em Marx dos Manuscritos. Também

será retomado e guarda certa semelhança com essa motivação de Feurbach.

O Marx ficou absolutamente encantado com a filosofia de Feurbach que era a única novidade

revolucionária na Alemanha.

Ele vai se apegar principalmente a essa ideia de crítica da alienação e num certo momento ele

tem uma correspondência com Feurbach e o chama para participar da luta política. Têm-se os

fundamentos da crítica e Marx pega esses fundamentos e procura aplicá-los primeiro ao

Estado e depois ao Trabalho.

Feurbach recusou o convite de militância política e passou a vida inteira fazendo crítica à

religião e não saiu desse registro.

Nessa investida de Feurbach contra Hegel, houve alguns ganhos para Marx, mas também

perdas. Isto é, a filosofia de Hegel é uma filosofia do encadeamento racional, aonde as coisas

vão se desenvolvendo dialeticamente, enquanto Feurbach ao contrário é aquela filosofia que

parte do dado imediato da natureza, ao que é captado pela intuição, portanto Feurbach

aspirava a uma verdade sem mediações e sem que seja resultado das contradições. Portanto,

Feurbach vai acabar colidindo com a própria dialética de Hegel; vai negar inteiramente à

dialética.

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E isso vai, de certa forma, contaminar o texto de Marx de 1843 – Crítica a filosofia do Direito. É

uma crítica que está muito presa a Feurbarch e, portanto não é uma crítica dialética. Já nesse

momento ele se afasta completamente de Hegel para criticá-lo.

Eis que o nosso amigo Marx casou e em plena Lua de Mel levou debaixo do braço “A Filosofia

do Direito” e um caderno de anotações. E nas horas vagas ele lia o texto de Hegel e fazia

anotações críticas. Muito tempo depois acharam isso e publicaram na década de 30 do nosso

século.

É um texto difícil e também apaixonante. Um jovem de 23 anos que reproduzia o texto de um

grande filósofo – Hegel.

É impressionante o tom de Marx desabrido e a coragem de enfrentar o texto sem se intimidar

com a estatura do seu adversário. Basicamente, o que ele vai desenvolver em 43 é a aplicação

da teoria da alienação de Feurbach à filosofia do direito.

E Marx tinha certa ilusão que ao criticar a Filosofia do Direito de Hegel, ele estaria criticando à

própria realidade. Ele quer fazer um dois em um.

Vocês passaram pela Filosofia do Direito... E resumindo um pouco, na “Filosofia do Direito”

Hegel estabelece que a vida social tem três momentos básicos:

1º. Momento – uma totalidade simples, uma unidade sem contradição que ele chama de

Família. Sempre dentro do esquema vernáculo da dialética hegeliana.

2º. Momento – parece que a família cresce e se desagrega e ai vamos ter um segundo

momento dado que dá lugar ao momento da alienação que é a própria sociedade civil. Se a

família era uma unidade de sangue, uma harmonia; a sociedade civil é cada um por si e Deus

contra.

É o momento dos interesses individuais. Então, rompeu-se a totalidade e estamos em plena

alienação. E Hegel vai dizer o seguinte - essa dispersão da totalidade que se fragmenta na

sociedade civil e nos interesses individuais, está em um primeiro momento. Passado esse

primeiro momento, os indivíduos passaram a perceber que entre eles a lei da concorrência

pode ter interesses comuns, então as pessoas começam a se agrupar em associações, em

clubes e em entidades que vão dar forma e agrupar o interesse comum. Então de repente, a

forma de grande dispersão, um princípio da universalidade começa a se colocar no interior da

sociedade civil.

É isso que vai permitir a passagem para o 3º momento, que é o Estado Político. Diz Hegel que o

Estado político é o momento em que se supera o atomismo da sociedade civil e o Estado vai

representar o interesse universal e não mais os interesses individuais ou os interesses

particulares das associações.

Claro que a sociedade civil já preparou o caminho com as suas associações para essa passagem

para o universal. E o próprio Estado se relaciona com a sociedade através dos parlamentos,

dos congressos, etc. Então ele mantém um intercâmbio, uma integração com a sociedade civil.

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Esse é o espírito da dialética, tem 03 momentos – uma totalidade simples que se aliena depois

ela se reencontra e se refaz; e o universal acaba triunfando.

E para o desespero do Marx esse universal se encarna no indivíduo que é o Rei. O Rei é o

representante da razão e do interesse universal. E o Estado pratica a racionalidade usando seu

corpo de funcionários, funcionários públicos. São os funcionários do universal, eles não têm

interesses particulares, eles trabalham em prol do interesse universal, do interesse racional.

E com isso Marx vai ter razões de sobra para babar de ódio – primeiro achar que o Rei

representa o interesse universal, segundo, o interesse universal é posto em prática pelos

funcionários públicos. O Marx tinha na cola dele os sensores – um Estado que fechava os

jornais e criava esse problema.

Então, basicamente, estamos vendo aí que Marx vai se debater com esse Estado visto como

um ente racional e como ente que superou os problemas da sociedade civil.

Hegel, supera uma integração harmoniosa das três esferas – O Estado se recompõem e impõe

o Universal a todos os particulares.

O que Marx vai dizer – Hegel fez um truque, um silogismo lógico dos três momentos para

partir daí e deduzir que o Estado é uma superação da sociedade civil, que é mais que uma

superação, que há uma superação. Que na verdade não há uma integração nenhuma - o

Estado esta separado da sociedade civil. Esse Estado, portanto, é um Estado alienado.

Então, vejam bem, da mesma forma que Feurbach dizia que Deus era a alienação da Essência

Humana, Marx vai dizer que o Estado é alienação da sociedade civil. Ele faz uma crítica

completa da própria Filosofia do Direito e acaba atingindo também a própria lógica dialética de

Hegel. (...).

Marx vai ficar numa visão dualista, separando a sociedade civil do Estado. Um ser

fantasmagórico, uma alienação. O que está por trás aí é uma coisa óbvia: Marx está propondo

uma Democracia radical. Em vez de a sociedade civil delegar poderes para prefeito,

governador, presidente, etc. Ela mesma deveria exercer o poder e não alienar o poder

decisório para outro.

A sociedade civil deve recuperar a sua essência extraviada, ele está quase propondo o fim do

Estado e o autogoverno.

O que ele quer é uma democracia radical, essa era a perspectiva de 43.

Acontece que essa democracia é obra do grande Demos, como ele diz. Só que os indivíduos na

sociedade civil para Marx são vistos ainda como indivíduos atomizados. Já que não há

mediações entre eles. Marx de 43 está numa posição filosófica e empirista, numa posição

política e democrática. Ela para mais ou menos por aí a sua reflexão.

Ai, o nosso amigo Marx por conta de suas atividades jornalísticas foi posto para fora da

Alemanha e em 44 ele está em Paris. E em Paris, ele está vivendo outra realidade – uma França

que foi sacudida pela revolução francesa e que já naquela época, tinha um aguerrido

movimento operário e ideias socialistas, movimentos, partidos.

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De repente, Marx começa a se ver dentro de outra conjuntura. E começa frequentar a

assembleia de operários e começa ao mesmo tempo ler em francês os economistas ingleses.

Ela começa rapidamente a pensar – política, economia, arte e filosofia. E basicamente, vai

sentir a necessidade de fazer um ajuste de contas com Feurbach e com a dialética de Hegel.

Ele vai tanto elogiar Hegel como vai criticá-lo. E qual o elogio que ele faz?

Diz que pela primeira vez na história da filosofia, Hegel consegue a produção do homem por si

mesmo como processo. O homem como resultado do seu próprio trabalho. Pela primeira vez

na história da filosofia, alguém dá uma valorização nessa atividade chamada trabalho e diz que

ela é responsável pela formação do homem. Isso em geral já está em Hegel. Se pegarem a

história da filosofia, o trabalho sempre foi uma coisa ruim, trabalho é uma coisa escravista,

trabalho é para escravo.

O trabalho só começa ser valorizado quando o capitalismo vai se desenvolvendo e surge à

primeira figura inicial do capitalismo que é comerciante, que vem de negociante -

etimologicamente, negócio significa negar o ócio – negociante é o cara que nega o ócio e está

atento ao mundo real ao preço da mercadoria, como ela é feita, como pode comprar mais

barato.

Então, de repente, as pessoas ‘inteligentes’ resolvem pensar o mundo da produção. E

começam a dizer – De onde vem as riquezas das nações? A riqueza vem do trabalho. O

trabalho gera riqueza. E essa ideia está no ar.

Quem coloca isso na filosofia, o primeiro filósofo a tratar disso foi Hegel e Marx vai aprofundar

essa ideia e conferir ao trabalho um estatuto ontológico e uma base – como uma coisa que

estrutura a sociabilidade do homem.

O trabalho passou agora a ser atividade importante e uma atividade mediadora na relação

entre os homens e a natureza, portanto aquela visão dualista e contemplativa de Feurbach fica

pra trás. Isto é, o homem é um ser natural, mas é um ser natural humano que vai lentamente

se diferenciando da natureza através do trabalho. Então a essência do homem não é um dado

prévio como em Feurbach. Uma coisa dada de uma vez por todas. A essência do homem é o

resultado das atividades laborativas do homem. Claro, que essa visão aponta outro problema.

Agora a sociedade civil não é mais um conjunto desarticulado de indivíduos. A sociedade civil é

território articulado. A partir do trabalho, das relações sociais de produção, Marx começa

aquela caminhada em que as relações, a sociedade se articulam a partir do trabalho, vai falar

de relações sociais de produção e falará em modo de produção.

Além desse elogio a Hegel por colocar o trabalho como uma questão central da filosofia, ele

fará uma crítica a Hegel dizendo o seguinte – Hegel teve apenas o lado positivo do trabalho,

não viu o lado negativo que é o trabalho uma atividade alienada do mundo capitalista.

Isto porque, na complicadíssima filosofia de Hegel, objetivação e alienação eram vistas como

uma coisa única. Objetivar-se ou alienar-se era a mesma coisa.

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A palavra alienação em Hegel não tem um sentido negativo. Alienação é o próprio movimento

das coisas e da separação que vai engendrando e torna possível a síntese. Uma coisa

necessária e benéfica.

E Marx vai separar a objetivação, existem formas pela qual o homem se exterioriza o seu fazer

– o homem vai trabalhar, vai fazer a arte, vai fazer a ciência – e essas são formas de

objetivação, mas junto com isso tem também a alienação que é uma forma particular e

socialmente determinada.

Chega um momento do processo histórico que o homem se objetiva, mas não se reconhece

mais nas suas objetivações. Mas, isso aí é uma característica que vai se agudizar no mundo

capitalista. É algo dado historicamente e ponto.

A alienação pode ser superada pela prática dos homens, ao contrário do que diz a filosofia

existencialista que vê a alienação como um dado básico. O próprio ser lançado no mundo. Em

Marx uma coisa que precisa ser revertida.

Então a partir daí, Marx vai enfocar o trabalho humano alienado. O trabalho tem duas

dimensões: ele cria o homem historicamente, mas no mundo capitalista ele é um processo

capturado pela lógica da alienação. E contra isso Marx vai lutar pela desalienação do trabalho,

propor o comunismo de uma forma ainda imprecisa.

Muito bem. Então já em 44 e fechando essa breve exposição já encontramos os elementos

básicos da ontologia marxiana em estado nascente. Ele chega a partir de uma síntese do

materialismo feurbachiano e o idealismo hegeliano.

Ele critica Hegel porque ele vê o trabalho de uma maneira abstrata, o trabalho no conceito. Ele

está pensando no trabalho dos operários. E também critica Feurbach, que em vários

momentos começou a ver as coisas de maneira subjetiva, através da intuição e não como

resultado da atividade humana, da prática humana.

Feurbach contempla a natureza como se fosse um dado, uma realidade imediata. Ele olha para

uma cerejeira e diz – Eis a natureza! Estou vendo uma coisa imediata. Mas, não é. A cerejeira

que você está vendo não nasceu na Europa. Ela veio do oriente. A cerejeira é resultado do

comércio entre os homens da prática humana. Ela não é um dado imediato.

Tudo é mediado. As coisas que nós vemos a nossa frente são todas mediadas. Mediadas como

resultado das práticas humanas.

Essa síntese entre o materialismo e o idealismo começa através do emprego de termos

ambíguos em 1844. Marx vai falar de paixão, na paixão de Cristo, a entrega a um objeto

exterior. Paixão é passividade, é sofrimento. Quem está apaixonado sofre porque não pode

agir. Fica preso a uma coisa de fora que lhe prende, amarrado, sem poder ficar entregue a

paixão.

Porém, paixão também no romantismo em Hegel é uma força criadora, paixão também é

atividade são duas coisas contraditórias. Marx começa a falar em Paixão que não é só como

em Feurbach aquela coisa dada.

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E depois Marx vai falar em atividade humana sensível – atividade é Hegel, sensível é Feurbach.

Não é só atividade espiritual como em Hegel, mas é atividade humana sensível.

Logo depois, Marx vai tentar achar uma palavra para juntar materialismo e idealismo – ele vai

falar a partir do trabalho em práxis.

O que é o trabalho? O trabalho é uma atividade material, porém, eu vou pegar o exemplo da

abelha e do arquiteto – a diferença entre os dois é que o arquiteto antes de fazer a sua casa,

ele faz o projeto. A consciência se antecipa e no final a casa está pronta. E aquela casa pronta,

o que é? É uma síntese, o resultado do tijolo, ferro, vidro e uma ideia. O arquiteto fez um

desenho. A consciência se antecipa. Então o que é uma casa? Uma casa é matéria e uma ideia.

O que é essa mesa? É matéria e uma ideia.

Estamos no campo da dialética. Depois Marx falara em práxis, na concepção do trabalho e

também em uma ideia movida por uma ideia material. E Marx sempre retoma isso. A coisa

mais abstrata que tem é uma ideia.

Mas, quando uma ideia é incorporada pelas massas. Ela se torna uma força material, ela

modifica a realidade. É um instrumento de luta. Então é o contrário de uma coisa abstrata. É

uma coisa que tem instrumento e combate.

Marx na sua maturidade, em vez de falar em práxis, vai falar na produção da vida social – das

relações do homem com o homem, do homem com a natureza. Até chegar finalmente ao

conceito de modo de produção. Uma visão da sociedade formada pela formação das forças

produtivas.

Então Marx vai trilhar um longo caminho, aonde ele vai o tempo todo dialogando com Hegel e

Feurbach. Eu acho que ele nunca abandonou esses dois autores, mesmo nos Grundisse;

embora ele não fale em Feurbach, essa relação do indivíduo com o gênero humano, da

sensibilidade e do sensível reaparecem aqui e ali.

E Hegel perseguiu Marx a vida inteira. Ele nunca conseguiu pensar sem passar por Hegel nos

Grundrisse. Isso fica mais claro no “Capital”. A presença de Hegel é muito forte. Ele está se

debatendo...

O percurso nesses dois anos – 43 e 44 – Marx viveu muito. Foram anos de grandes impasses

sementes que foram frutificando em sua obra futura.

Isso é basicamente uma exposição sobre o livro que eu escrevi há muito tempo atrás.

Eu gostaria agora de estender um pouco essa discussão para ver que os temas de 43 e 44 vão

reaparecer nos debates contemporâneos em outros registros.

Elaborei um pequeno roteiro para conversar com vocês.

Em 43 o que está em primeiro plano é a relação do Estado com a sociedade civil.

Claro que Hegel é um autor que vai privilegiar sempre o Estado que é o momento do universal

e da harmonia social, espaço que garante a harmonia social.

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Hegel não tinha muita confiança na tal sociedade civil. Ela sozinha caminha para a

irracionalidade. Se não tiver um Estado ai presente vai se degenerar uma guerra de todos

contra todos ou as corporações contra as corporações. Os interesses particulares que não se

entendem.

A sociedade civil vai ser sempre essa esfera do público e do privado, do universal e do

particular. Ela não é mais a família. Não é mais o Estado. É um intermediário que fica ai entre

os dois.

O Marx como nós vimos, retoma essa oposição – essa relação entre sociedade civil, num

primeiro momento ele vai dizer que Hegel está totalmente enganado, está disfarçando com

artifícios lógicos, mas o que ele mostra com o livro dele e que ele não quer admitir é a

profunda separação entre sociedade civil e o Estado.

Ele não viu que o Estado não é universal. O Estado é uma alienação. E Marx, como nós vimos,

ao mesmo tempo olhava a sociedade civil como composta por indivíduos desarticulados,

atomizados, soltos, não havia uma articulação. Não havia classes sociais ainda presente.

Porém, Marx logo vai abandonar essa ideia e ver que o Estado não é o ethos da sociedade civil.

Não é um ser alienado separado da sociedade. Mas, pelo contrário, o Estado foi ocupado pelos

interesses particulares da sociedade civil. Os interesses particulares mais poderosos tomam de

assalto o Estado.

Então o Estado é o comitê executivo da burguesia, de uma forma bastante direta. Então o

Estado passa a ter um conteúdo de classe, não é aquele universal alienado.

E quanto à sociedade civil, Marx vai começar a “escafruchar” e vai dizer – O Estado se explica

pela sociedade civil e a sociedade civil tem uma anatomia, temos a economia política. Marx vai

se dedicar a economia política e não falará mais em sociedade civil. Nas suas obras maduras

ele já não está mais preocupado com o termo sociedade civil. Quem vai falar em sociedade

civil, vai repor o tema na mesa é o Gramsci, mas isso já é outro contexto.

O que Gramsci vai dizer – ele vai pensar a especificidade da situação italiana e vai dizer –

podemos repetir a revolução russa e tomar de assalto o Palácio de Inverno.

Isso tinha sentido e a numa sociedade em que o Estado era muito forte e a sociedade civil

muito fraca como a Rússia. Então você toma o poder onde ele está e você a partir daí muda a

sociedade.

Na Itália que ele chama de ocidente, a sociedade civil é muito forte e o Estado não precisa ser

forte. Ele é fraco. Então o poder não está todo concentrado. Ele está plasmado e realizado nos

institutos, associações da sociedade civil. Então ele passaria a sociedade civil como um sistema

de trincheiras onde se luta pela hegemonia para se chegar ao socialismo. Então a luta não é

apenas tomar de assalto o Estado, mas você obter hegemonia no interior da sociedade civil. O

poder já está espalhado aí uma concepção ampliada de Estado. Até ai tudo bem.

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3

As coisas começam há complicar muito tempo depois, quando a sociedade civil fará a sua volta

triunfal política outsiders num novo contexto. O contexto da desagregação da União Soviética

e a ofensiva do neoliberalismo.

Nesse momento, os setores ponderáveis da esquerda passa a incorporar um discurso liberal e

passam a ver o Estado como o espaço do autoritarismo e a sociedade civil como espaço da

liberdade.

Então a sociedade civil é onde existe autonomia, associação voluntária e pluralismo. Começa

um novo movimento onde a solidariedade representava a sociedade civil contra o Estado

autoritário. Logo a sociedade civil é o lugar bacana, gostos, simpático, vamos fazer o curso da

sociedade civil!

Marx vai dizer que tudo bem, tem a sociedade civil e tem a sua anatomia, tem a economia

política, mas não se fala mais em economia política. Desaparece o modo de produção

capitalista que impõe a sua lógica a toda a sociedade. A sociedade agora é vista como uma

coisa que se desagregou em fragmentos, em instituições. Todas têm o mesmo peso e a

economia é apenas uma das dimensões da sociedade civil. E o resto seria cair em um

determinismo econômico.

E, portanto, na sociedade civil vai reinar a atomização. Não há mais classes estruturadas a

partir da economia da luta sobrevivência e da reciprocidade dos meios de produção. No lugar

das classes vamos ter grupos de interesses.

Voltamos à política outsiders liberal - você tem grupos de interesse, ou na visão mais pós-

moderna, a sociedade civil é o lugar onde as identidades afirmam suas diferenças e os

indivíduos só se reconhecem a partir dos seus estilos de vida e de padrões de consumo.

Então chegamos num ponto de padrão ideológico e rosa da sociedade civil. Onde a sociedade

civil é onde está o mercado, portanto é uma estrutura de poder.

Há um belo livro de Ellen Wood “Democracia e Estado” em que ela estuda essas mutações da

sociedade civil e num certo momento ela vai dizer o seguinte – Os antigos déspotas exerciam o

seu poder sobre a sociedade. A partir do exercício de força do poder, do terror. Mas,

coitadinhos, eles nunca imaginaram uma estrutura de poder em que o poder invade a casa das

pessoas através da televisão, dos meios de comunicação. O poder invade a intimidade das

pessoas, através da propaganda, da ideologia. Nenhum déspota imaginou uma maneira tão

completa de poder como esta que está dada nos tempos modernos através não do Estado,

coitado, mas do mercado.

Então estamos vivendo ai uma grande apologia da sociedade civil e do neoliberal, e um horror

do Estado. Eu leio o Estadão e vire e mexe aparece expressão do tipo: “aparar as garras do

Estado”.

Evidentemente, nem toda esquerda foi adotar esse discurso liberal. Mas, a crítica do Estado

vai ganhar uma versão que atinge a própria concepção de política.

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Na década de 70, István Mészáros escreveu um artigo na revista italiana ‘crítica marxista’,

onde ele vai dar uma grande ênfase ao texto de Marx de 43. O Rei da Prússia (As Glosas críticas

marginais).

A partir daí o professor Chasin vai retomar essa ideia de Mészáros e vai fazer a critica da

política, como atividade negativa. A onto-negatividade da política. E a partir do Chasin, os seus

discípulos no Brasil inteiro e se renovam. Que coisa fantástica isso! Um cara que já morreu há

tantos anos, tem discípulos que nunca o conheceram.

Eu tenho lá certa implicância com essa tese pelo seguinte: primeiro uma implicância política –

a política é uma atividade negativa. Não é uma atividade que emancipa homem. Logo,

conclusão possível – porque Chasin não pensava assim, mas fica aberta a porta. Eleição para

prefeito não vai emancipar, não vou sujar as minhas mãos com isso. Eleição para reitor não vai

emancipar... A atividade política mantém uma posição aristocrática de recusa - quando for

fazer a revolução vocês me avisem que eu quero sair para as ruas, mas antes disso eu não vou

sujar as minhas mãos. É um convite ao absenteísmo, essa é uma consequência pratica da crise

da política.

Enquanto que o velho Lênin tem a política revolucionária, tem também aquela política

cotidiana e cinzenta, as pequenas lutas dia a dia. Portanto, não são revolucionárias, mas criam

condições para a Revolução. Porque nenhuma revolução nasce do nada.

Mas, o eixo da questão é o seguinte, essas “Glosas do Rei da Prússia” é um texto em que Marx

está muito Feurbachiano. Ele está contrapondo razão política e razão social, mas no fundo fica

a ideia de fazer política é relacionar-se com o Estado.

E o que é o Estado? É uma esfera alienada. Logo a ação política está envolta da alienação. Está

se emaranhando com o Estado na lógica da disputa dos cargos do Estado. E não sai disso.

Então cuidado com esse negócio. O Estado foi ocupado por interesses particularistas nos

tempos modernos pelos monopólios, mas o Estado também é um campo de batalha, através

da política, da eleição você pode modificar o Estado, compor posição social do Estado,

afastando os setores monopolistas mais nocivos. E cobrando os setores.

Não é nenhuma maravilha do mundo, mas é um salto no processo histórico e num patamar

para outras coisas que poderão vir daí para frente.

Ainda sobre a relação do Estado e a sociedade civil - dá pra pensar toda a história moderna do

Brasil a partir dessa tensão entre Estado e Sociedade Civil. Lembrando que todo o período pré

30 era um momento marcado pelo liberalismo no Brasil. Principalmente, o que diz respeito às

relações de trabalho – os conflitos trabalhistas eram resolvidos com o código penal. O

capitalista ligava para a polícia – tem uns bagunceiros na minha fábrica que pararam o serviço.

Então a questão social era um caso de polícia. E as coisas sofrem uma mudança radical com a

revolução de 30. Que também é objeto de uma grande disputa ideológica no Brasil.

Acontece que em 30 o Estado foi tomado por um grupo no Rio Grande do Sul, formado pela

filosofia positivista e resolveram moldar o Brasil a partir do ideário positivista que dizia que a

sociedade é um organismo de partes solidárias, esse organismo tem uma cabeça que é o

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Estado, cabe o Estado fazer o que – o planejamento da economia. Criar empresas estatais,

depois o Estado vai manter o equilíbrio social combater os egoísmos – como ele faz isso? Se

intrometendo nas relações entre capital e trabalho, CLT é isso, são os fiscais do Ministério do

Trabalho que vão às fábricas verificar se as pessoas tem banheiro, se tem contrato de trabalho.

Então Vargas cometeu a indelicadeza de colocar na relação entre o capital e o trabalho, o

Estado para o desespero da burguesia vai fixar o salário mínimo e vai criar o sindicato no Brasil.

Sindicato de grandes massas. Não mais sindicatos de minorias ativistas. Então vamos ter uma

rede sindical, pela primeira vez vamos ter um sindicato burocrático.

Como é que ele concebia o sindicato? Ele concebia o sindicato como órgão de colaboração

com o poder público. O sindicato era uma mediação entre os operários e o Estado. Ele era

importante para os operários porque superava o egoísmo dos operários. Em vez, de o cara

resolver sozinho o problema com o chefe de seção, ele vai se reunir no sindicato e dá uma

expressão mais coletiva para a sua reivindicação. Um princípio de universalidade.

E vai levar essa proposta para o Estado e levar a proposta do Estado para a classe operária.

Então o sindicato é um órgão de colaboração com o poder público. Claro que a burguesia

nunca mais perdoou Vargas.

Quando chega a ditadura militar, essa estrutura toda foi mantida e começa a luta contra a

ditadura. E aí a esquerda volta a ter um discurso liberal. O que se dizia na época – O Estado

está divorciado da sociedade civil. O Estado está agindo sozinho.

O Estado estava sendo financiado por grandes grupos econômicos. Delfim Neto recebia o

presidente de grandes corporações sem marcar audiência. Então não havia nenhum divórcio.

O governo militar trabalhava de acordo com o grande capital internacional e o grande capital

nacional. Precisava organizar a sociedade civil para se contrapor a esse Estado. A sociedade

civil só estava desorganizada para nós (os outros), porque para a FIESP e para os banqueiros,

sempre estiveram bem organizados.

E mais que isso, a constituição vai transferir para a esfera pública essa visão organicista de

Vargas que estava dentro da esfera estatal.

Então vejam bem. O que estava na esfera estatal vai para a esfera pública. Então por exemplo,

os sindicatos agora estão desatrelados do Estado, eles não são mais órgãos de colaboração de

poder. Então o Ministério do Trabalho não tem mais aquele poder de intervenção nos

sindicatos.

E mais que isso; a constituição criou um Ministério Público, um órgão que age independente

do Estado em defesa da cidadania. Então para quem gosta de Gramsci e da noção do Estado

ampliado, nós chegamos a outro patamar na nossa república.

É claro que boa parte a da nossa constituição ficou aberta ainda para regulamentação

posterior, dispositivos e a luta continua feia ainda... E logo esse caráter republicano vai levar a

uma férrea oposição.

Os neoliberais agora não gostaram muito dessa inclusão na ordem pública, eles querem jogar

as coisas para a ordem privada e para o código civil. Como eles não podem mexer na

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constituição onde as leis estão codificadas, congeladas e enrijecidas. Eles começam a valorizar

a sociedade civil como a esfera da liberdade, isto é você tem o que está legislado e o que uma

camisa de forças para as classes sociais. Mas, você pode também ter o que o que é negociado.

As partes podem negociar livremente vários acordos trabalhistas ao arrepio da constituição.

Tudo pode ser negociado entre as partes – redução de carga horária, salários e a flexibilização

das leis. De novo a sociedade civil passa a ser vista como essa maravilhosa esfera da liberdade.

Finalmente, voltando agora para 1844 – Em 1844, Marx firma o esboço da sua concepção

ontológica. O que serviu, lembrando que esse texto foi publicado tardiamente, portanto ele

veio a publico em 1932 e o Marxismo já estava consolidado como doutrina.

E havia duas correntes básicas, concepções canonizadas – um que foi sistematizada por Stalin

que retomou algumas ideias que estava em Engels e que basicamente via o marxismo como

um sistema fechado, completo e fechado. E tinha duas disciplinas, o materialismo histórico e o

materialismo dialético.

E o tal materialismo dialético, a parte filosófica do conhecimento, tinha por base o reflexo. O

que era o conhecimento? Era o reflexo da realidade consciente. Reflexo da matéria. Então o

conhecimento é o reflexo da matéria na consciência.

Ora, entre a consciência e a matéria, você não tem mediações. Você não tem o trabalho como

elemento mediador estruturador das coisas. Uma visão bastante dualista e problemática do

que vem a ser o processo do conhecimento. É o reflexo de uma realidade. As coisas não são

criadas pelas praticas dos homens. O conhecimento é só um espelho e ele interfere. Ele

espelha a realidade. Não é conhecimento ativo e transformador.

A outra coisa é o materialismo histórico. Engels cometeu um equívoco ao querer pensar

dialéticas que se desenvolvem. Então a matéria se desenvolve pelas leis da dialética, leva a

consciência social e a vida social via produzir esse movimento que é a dialética. Então a

dialética existe em primeiro lugar na natureza e depois se prolonga para a história dos

homens.

Ora, a história dos homens passa a ser determinada de uma forma mecânica pelas leis naturais

e tem a mesma força que operam as leis da natureza. Então o que sobra para prática humana?

O homem não faz o conhecimento, ele reconhece o movimento das coisas até as etapas

necessárias e no máximo apressa as coisas que são inexoráveis. Isto é, a prática humana fica

prisioneira da necessidade férrea das leis naturais. Não há mais invenção do futuro. Não há

mais liberdade de você escolher entre possíveis. Você segue um caminho pré-determinado

para o mundo mágico do socialismo, tem vários modos de produção que se encaixam e

pronto. Está tudo certinho e pronto. Não se tem invenção.

Então esse foi o pensamento mais ou menos hegemônico. E contra esse pensamento que vai

se voltar na década de 20, o que eu chamaria das “filosofias da consciência” - Lukács “História

e consciência de classe”.

(...)

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A prática é uma atividade da consciência. Ela não tem mais como modelo o trabalho que

impõem certos limites à liberdade do homem. O homem para derrubar uma árvore não vai dar

asas à imaginação livremente e fazer com que a arvore caia da cabeça dele. A árvore tem certa

legalidade. Tem que conhecer a estrutura da árvore, como cortá-la...

Então vejam bem, agora tudo é uma questão de consciência. De prática e consciência.

É um ativismo muito forte dos anos 20. E Lukács também vai falar da unidade do sujeito e

objeto com a visão ultra-hegeliana das relações entre o sujeito e objeto.

Onde também não há trabalho, não há ações – tudo uma questão de tomada de consciência

revolucionária.

Então, eram essas as duas fortes correntes, sendo que essas “filosofias da consciência” vão

abrir o caminho para uma terceira corrente, dando continuidade a elas, porém sem o seu

caráter revolucionário e ativista que é o chamado marxismo ocidental - A Escola de Frankfurt,

que vai construir toda uma teoria crítica onde o trabalho não comparece, e não comparece

também essa separação entre objetivação e alienação.

Se a gente pegar um livro do Adorno “Dialética e o Esclarecimento” como é que ele vê o

processo histórico? O processo histórico em Marx é o recuo das barreiras naturais – o homem

lutando pela sobrevivência, as forças produtivas. Adorno vê todo o processo histórico como

um caminhar no processo de alienação que começou com a viagem de Ulisses...

Enfim, a história é o caminhar progressivo da razão instrumental, portanto um caminhar da

razão, da ideia. Estamos diante de uma concepção idealista do processo histórico, isto porque

suprimiu com a natureza, o trabalho. Aquelas coisas palpáveis.

Parece que é bom a gente voltar para essa questão da alienação e da objetivação para ver que

o homem é um ser que se objetiva, tem a prática social. E isso pode trazer modificações para o

mundo alienado.

O Adorno chegou ao limite de falar em reificação absoluta. Se há uma reificação nesses

termos. Acabou, viramos coisa. Não há um espaço para a invenção, para a prática humana e

daí pra frente...

É bom se voltar para esse tema que Lukács vai desenvolver na sua ontologia – as

consequências da separação entre objetivação e alienação, porque me parece que na

universidade que estamos vivendo esse marxismo ocidental, sem classes, sem classe

operária... E isso se tornou o máximo do marxismo possível.

O que se estuda na História e consciência de classe é o problema da reificação. Enquanto

reificação você tem a arte vanguardista e a teoria crítica.

E mesmo a arte o Adorno vai dizer que a vanguarda envelheceu. Então é que fica uma

ambiguidade. Acabamos ficando prisioneiros do processo de reificação. E o homem perdeu a

capacidade... Porque na realidade não é mais contraditório. A realidade é essa. Deixou de ser

contraditória e foi colonizada totalmente pelo processo de reificação. E os homens ficarão

contentes com essa condição de serem coisas. Não é bem assim!

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O trabalho e a classe operária, às vezes, faz greves porque quer se diferenciar das coisas, quer

ganhar um pouco mais e viver melhor.

Pequenos detalhes que faz com que a história, apesar de tudo, caminhe. Apesar de tudo, as

objetivações – a arte, a ciência – continuam interferindo e modificando o curso da realidade

onde os homens lutam.

Então, resumo da ópera - nós temos aqui em 43 uma reflexão sobre o Estado e a sociedade

civil, a questão da dialética e seus desdobramentos e tem uma visão ontológica em 44 que

permite sair da “enclaracada” em que o marxismo se meteu no século 20, em que ele ficou

bastante prisioneiro de três correntes fortes.

É claro que tudo isso bastante fraco para enfrentar os novos desafios da realidade – o

capitalismo na sua fase moderna, a globalização, novos conflitos sociais... Então nós estamos

precisando de uma teoria, precisamos voltar ao núcleo duro do marxismo que tem ainda o que

dizer e necessita de desenvolvimento.

Então, basicamente era isso que eu tinha que dizer. Levantar questões para vocês. Agora vocês

levantem as questões...

Professora Beatriz Abramides – Então vamos abrir para as questões, problematizações,

dúvidas. Vamos nos aquecer.

Então enquanto as pessoas se aquecem, eu quero trazer algumas questões, não para discutir

agora, mas para continuar discutindo.

A primeira delas é que você diz o seguinte: com certa implicância, mas não é o que o Chasin

falou. Você tem razão é que os marxistas contemporâneos utilizam da onto-negatividade da

política como uma perspectiva imobilista em relação à possibilidade da própria política. Então

só ai já é um tema.

Por que no Chasin não há elementos para isso. Por que na realidade quando ele traz essa

discussão ou mesmo os seus discípulos, e você tem razão quando diz que ele tem discípulos

que se quer o conheceram. Quando ele morreu, há mais ou menos 10 anos. E há discípulos

recentes, temos 02 aqui na sala que não vieram hoje...

E esse é um tema que sempre vem no NEAM, à questão da onto-negatividade da política. Acho

que esse é um ponto do aprofundamento, porque na realidade a discussão que é feita no

âmbito da própria questão do Chasin – é a questão da onto-negatividade pensando a

perspectiva da emancipação humana.

Ou seja, do fim do Estado e a auto-organização dos indivíduos. Ou seja, numa outra sociedade.

Acho que isso é importante, porque se não a gente cai exatamente nessa emboscada que você

esta trazendo. Acredito que esse é o aspecto que a gente tem que aprofundar. Porque o

próprio Marx vai colocar e depois o Lênin. Quando o Celso traz que as lutas imediatas são lutas

históricas. Tanto que toda a discussão que Lênin vai fazer no “O que fazer?” é a crítica ao

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economicismo, mas não a perspectiva da luta econômica, expressão da luta imediata e da luta

histórica. Então são elementos que se combinam.

Celso Frederico – Lembrando também que Lênin criticava o critinismo parlamentar. Achar que

através do parlamento você chegaria ao socialismo. O Engels tem um texto sobre o socialismo

jurídico, através das leis você não chega ao socialismo. Não é por aí. Mas, ninguém vai deixar

de participar... É importante participar, precisa estar lá dentro.

E o direito não é uma coisa fechada. O direito é um campo de batalhas. Não vai participar dos

Direitos, das lutas?! O direito é uma coisa apaixonante nesse sentido. Na formatação da vida

social, logo as coisas, os conflitos humanos passam pelo Direito.

Se as leis fossem tão “bonitinhas” não precisaria de advogado, nem promotor. O cara pegava

as leis e enquadrava e tal... Mas, ao contrário, cada lei e cada problema são uma interrogação

e embate. Vejam o exemplo do mensalão.

Evandro – O mensalão é luta política a todo o momento. Apesar de ser mediático.

Beatriz Abramides – Estou trazendo para vocês e lembrando porque acho que são coisas

importantes de serem aprofundadas e que já estiveram aqui.

Outro tema ainda é em relação às “Glosas do Rei da Prússia”, ainda que se pese que cada obra

precisa ser analisada se discutida em seu período e o seu tempo, a discussão que a gente faz

das Glosas e a relação com a profissão, à discussão com a assistência e de como isso vem na

história... A crítica de Marx a essa questão... E sobre isso seria importante vocês lerem agora o

artigo da última revista serviço social e sociedade, o primeiro artigo que é do Zé Paulo vai fazer

uma discussão exatamente nessa direção, uma discussão que ele já vem fazendo desde o CBAS

de Foz do Iguaçu. E eu coloquei no Facebook para vocês um vídeo que ele vai fazer essa

discussão num curso de formação da ABEPSS.

No fundo é aquilo que você trazendo, o que significa o retorno do pensamento neoliberal na

crise estrutural do capital e do capitalismo e o desmonte das políticas. Aonde a política de

assistência que historicamente vem e para conter e hoje ela passa a ter uma centralidade. Isso

tudo conversa com o momento contemporâneo. Então são esses dois pontos que eu gostaria

de lembrar que apareceram aqui no debate.

Marisa – Você está trazendo o lugar que a sociedade civil passa a ocupar como resposta... Por

exemplo, a gente vê alguns autores discutindo a lógica de punição como impossibilidade do

Estado de Direito. A gente tem como resposta o Estado Penal.

Eu fico me perguntando, hoje quem está no movimento social está tentando resgatar para que

o menino não morra mais. E eu tenho me perguntado, mas aonde a gente vai gastar energia,

por a gente está vivendo um movimento de genocídio da juventude negra, de um

aprisionamento em massa, de incêndios criminosos.

Então pensar simplesmente, eu sei que você não quis dizer simplesmente, mas pensar que

vamos entrar na luta política na perspectiva de vamos ver quem é o melhor...

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Hoje a barbárie do capital se apresenta de uma forma ferrenha e respostas poucas. Eu vejo

que a gente está cada vez mais enxugando gelo e cada vez mais se afogando nesse gelo...

Estou cada vez mais com dificuldade de entender. Eu não tenho nada a ver com Chasin, mas eu

tenho dificuldade de entender. Eu tenho me perguntado quanta energia a esquerda tem

utilizado mesmo para reforçar a disputa política, para entrar nesse “parlamento”.

Eu entendo a importância, mas vejo cada vez menos essa importância considerando que nos

temos por um lado o capital acirrado impossibilitando os movimentos.

Celso Frederico - É que vocês do Serviço Social estão no olho do furação. Esse é que é o

problema. Vocês estão numa divisa tremenda. Eu devolvo a pergunta para você nos seguintes

termos. Tudo bem, o capital tem uma lógica destrutiva e incontrolável. Mas, tanto faz Serra ou

Haddad?

Marisa - Sinceramente. Não sei. Quando eu vejo a política de Belmonte... Os desmontes das

políticas públicas... Os índios morrendo e a rede de proteção desesperada... Eu sou funcionária

do Estado e tenho claro que essa aliança não é comigo, trabalhadora. A aliança é com o outro

grupo... Eu sinceramente tenho dúvidas. Acho que os profissionais da saúde vão ganhar mais,

os professores... Mas, a lógica é que vamos apenas remediar.

Celso Frederico - Só para assustar um pouco, vocês não acham que as coisas podem ser muito

pior? Vocês viram o debate nos EUA? O sistema de saúde nos EUA que maravilha que é? O

Obama quer fazer o nosso SUS lá. E isso é visto como comunismo. Então chegaram a tal ponto

que a interferência do Estado no rentável ramo da saúde é comunismo. O Obama quer fazer

um Sistema Universal de Saúde.

Marisa - Acontece hoje o que com o SUS? Professor eu acho que a gente tem que ter um

pouco de cuidado, de chegar ao ponto de entregar o bastão - é melhor você! Melhor você

como?

Celso Frederico – Não é uma questão de entregar o bastão porque em política a gente tem

que ter poder, tem que ter autonomia e pressionar, porque sem se pressionar, não se

consegue nada.

Marisa - Então vou dar um exemplo, Comitê da Juventude se reuniu. Esse comitê é formado

por 10 organizações, entidades fortes. Sabe do que acontece a partir de uma política

cooptadora do governo federal? As ONGs que nunca trabalharam com isso, agora vão ter

dinheiro. Estão cooptando os movimentos. Agora são eles que estão trabalhando é lógico que

não vão enfrentar o problema... Eu acho criminosa a cooptação das lideranças e dos

movimentos sociais. Justamente, no sentido que o senhor falou – tem que ter luta, mas o que

está acontecendo nessa política do PT?!

Celso Frederico – O que está acontecendo guarda semelhança com o que aconteceu com ação

de Vargas. De repente chega ao poder um grupo que não é de esquerda ou que deixou de ser

esquerda como o PT. Faz uma aliança política assistencialista que beneficia setores

consideráveis da população pobre. O que esquerda faz? Perde o referencial. Ela fica perdida.

Você vai ser contra o Lula junto com os miseráveis? Não dá! Complicado esse negócio. Vai dar

carta branca? Também não. É uma questão...

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Beatriz Abramides - Posso falar um pouquinho? Acho que são duas coisas distintas. Acho que

tem o campo da luta social que é retomada da autonomia e independência de classe. Todos

nós sabemos do desastre, por exemplo, de você ter uma CUT governista. De fechar com uma

Força sindical que não precisa nem o governo falar porque eles estão regulamentando a

questão da terceirização.

Guardada as devidas proporções, acabo de voltar de Néuquen. Muito diferente do que

encontrei naquele Congresso de trabalhadores onde tudo era Kirchner. Eu fui a Néuquen na

Patagônia, acabei de voltar onde tem um Estado de muita luta em uma região petroleira onde

apesar da Kirchner o peronismo e toda a situação da Argentina... Você tem um processo de

luta e muita mobilização.

Então na terça-feira tinha greve de trabalhadores em serviço público e universitários que

juntaram nas duas pontes de Néuquen - uma cidade com 300 mil habitantes – você tem seis

mil pessoas! E não é pouca coisa!

E a gente, não consegue no 1º de maio na Pça da Sé, porque a CUT e a força sindical... Bom,

todo mundo sabe disso... Essa é uma questão...

A outra é que também foi morto, nesta semana, um militante campesino. Tal qual os nossos

que estão aqui e diferentemente de parte da cooptação no Brasil que tem no movimento

social. Saiu todo mundo para a rua.

Eu gostaria de dar esses exemplos, porque tem mobilização, tem movimento social. É

importante a gente ver do ponto de vista da nossa América Latina. Como é que estão? Porque

isso dá elementos...

Depois eu fui para um debate, quando há dois anos o Mariano Ferreira que era um ferroviário

terceirizado de 23 anos de idade, eu estava em La Plata fazendo um debate sobre a

precarização do trabalho no dia que chegou a notícia que Mariano tinha sido assassinado. E ele

foi assassinado pela “patota” da burocracia sindical. E com a conivência da própria Cristina

Kirchner. Todo mundo pressionando.

Um pouco do que a gente faz com o governo federal dizendo – Olha guarda nacional, tem que

ir por lá, por que os índios estão morrendo e vai ninguém! Então acontece na Argentina. Você

tem o setor da burocracia que vai desde o período do peronismo...

Tanto que o setor combativo está começando a discutir... E eu fiz reunião com vários deles.

Vários grupos, discutindo a autodefesa. Porque os caras estão matando! E a burocracia está

viva. Bom e agora faz dois anos e saiu um livro - “Quem matou Mariano Ferreira?” Um

jornalista escreveu. Quero ler com calma.

E por último, fui visitar a fábrica ocupada, a Zanon, ocupada há 11 anos. Primeiro eles tem uma

formação política permanente. Segundo, ele tem clareza que não é socialismo num só país,

nem o socialismo no mundo da fábrica. Mas, a formação política da escola política dos

trabalhadores e trabalhadoras... A ideia é que você tenha proporcionalidade política na

direção, ou seja, as frações. Mas, só que na CUT isso acabou há muito tempo... E o

pensamento majoritário, quem leva mais... Vocês sabem o que é a luta pela democracia

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sindical operária que foi um legado revolucionário do século XX da luta da classe operária. Que

é o que o Celso está trazendo aqui.

Outro elemento é que substituível a qualquer tempo, os trabalhadores hoje estão na rádio,

amanhã na comunicação do jornal e depois no chão de fábrica.

Então, por que eu estou trazendo? Porque isso é uma escola do ponto de vista daquilo que

agente pensa e também um pouco para balizar isso do ponto de vista da organização dos

trabalhadores.

Outra questão, que o Lowy falava um pouco lá e eu acompanhava o debate – a decepção que é

o desastre que o governo Lula e o governo Dilma hoje em função do grande capital.

E hoje de manhã, um aluno que veio falar na disciplina, o Vinicius, fazendo essa discussão que

estamos no processo de luta na mesma base, e ele dizia – Entre o mal e o desastre, ele vai

Haddad e que eu disse como “Bia” eu anularia o meu voto. Agora é um voto nulo

programático? Não.

Agora se você pegar o horror é o Serra e o desastre que é o Haddad... Em relação à política vou

pegar o exemplo da cracolândia que foi citada aqui, que a política de governo é a mesma coisa.

Não estou fantasiando, estou falando com base no programa de governo. A política nacional é

essa. Então, tudo isso para dizer o seguinte - é claro que muitos vão votar pensando entre a

barbárie e a barbárie e meia. Muitos vão pensar - vou votar na barbárie.

Eu só quero concluir... Independentemente de qualquer coisa, quem está aqui - ou vai votar no

Haddad ou vai anular, porque não tem outra saída.

Agora o que eu acho que unifica a gente é a possibilidade de continuar na luta independente.

Essa é a minha posição. Não vou supervalorizar a questão eleitoral.

Celso Frederico – Uma pergunta. Qual a postura dos candidatos para a cracolândia e qual a

postura do serviço social?

Beatriz Abramides - a postura do serviço social, primeiro a questão do direito desses

trabalhadores e desses usuários as políticas públicas; segundo contra uma política higienista

criminalizadora, terceiro contra a internação compulsória e a favor de uma política de saúde e

não uma política de segurança pública.

Isso está deliberado programaticamente nas nossas discussões, nos encontros CFESS/CRESS,

nos encontros de formação do exercício profissional, etc.

...

Evandro - Penso que toda essa questão é importante e que nos faz pensar sobre uma coisa

importante do pensamento de Marx. O Estado é só autoritarismo? E a sociedade civil é o reino

da liberdade?

É uma questão de contradição. A contradição se coloca, reflete no formato de uma posição

que uma hora a gente tem que tomar.

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O jovem Marx se debateu o tempo todo com as contradições.

Toda a posição que a gente toma... E eu acho que é isso que o pensamento de Marx traz. No

entanto, na esquerda não é fácil tomar posicionamento. E não se consegue ver o contraditório

e o que vai além do contraditório...

Beatriz Abramides – Quero fazer um à parte de uma questão teórica no seguinte sentido - do

ponto de vista da esquerda, nós temos que ter um processo constante de formação política e

teórica. Segundo, hoje há também uma situação como eu vejo da esquerda no Brasil, que não

está conseguindo trabalhar com unidade de ação na luta (...). Isso é um equívoco, um erro.

Porque cada central sindical é uma unidade na luta, independente de ser evangélico, católico,

ateu do partido x ou y.

O problema é que a gente está vivendo essa questão de aprofundamento nessa direção. Outra

questão de tática e estratégia é a que gente tem que ter clareza de todos aqueles que lutam

conosco, independente da questão partidária, se estão ou não estão na luta.

Senão a gente vai ter uma visão dogmática que é diferente da ortodoxia. Ainda, por exemplo,

se tem companheiros que estão lá... Lutam, e é lógico que estamos apoiando. Assim como a

gente tem hoje gente dentro do PT setores da esquerda que se reivindicam revolucionários,

trotskistas. Como há setores que se dizem revolucionários que estão no PSOL.

... Mas eu gostaria que o Celso trouxesse um pouquinho, o que não está ligado à política

eleitoral e tem a ver com essa divisão. É em relação ao que você tocou um pouco da Escola de

Frankfurt. E que também retomasse um pouco de Lukács quando ele vai falar lá na estética, a

questão da suspensão... Ou seja, nem tudo é alienação na vida cotidiana. Porque eu estou

dizendo isso? Porque eu acho que tem a ver com essa discussão que a gente está trazendo das

contradições, dos contrários. Senão teríamos uma visão determinista não dialética da própria

história. Se você puder falar um pouquinho...

Celso Frederico – O problema da Escola de Frankfurt que você colocou aí, talvez uma das

origens do problema seja um texto de um cidadão chamado Pollock, que era um economista

da Escola de Frankfurt. Ele fez um texto na década de 30 em que ele defendia a tese do

Capitalismo Estado e dizia o seguinte: o capitalismo chegou a um estado brutal que não há

mais crises. Há um controle cada vez maior estatal da economia. Portanto, se é assim, todas as

decisões agora saem do campo da economia e são decisões políticas e técnicas. Então se

desenvolve toda uma teoria do controle social.

E para economia política perdeu o seu objeto. Agora é tudo política, não há mais economia.

Essa ideia de estabilidade do capitalismo vai de certa forma estar presente no pensamento dos

frankfurtianos. Se assim, está mais para ensaio da economia. Vamos pensar a superestrutura.

Eles fizeram isso. Mas, tem uma base por trás. Tem um pensamento econômico já pronto que

era a tese que não tinha conflito social – os sindicatos burocratizados. Então a tendência do

capitalismo é o controle social.

E depois a indústria cultura vai trabalhar na esfera da consciência, o lazer vai ser alienado.

Então, um pensamento que caminhou no sentido de colocar um fim as contradições sociais.

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Elas deixaram de existir. No Adorno você não vai encontrar a ideia de crise da economia

também. Está tudo dominado.

É claro que os sindicatos se burocratizaram lá e depois aqui e demorou um pouco mais veio

com força total. O pessoal aqui andou confundindo você ocupar posição na sociedade civil com

ocupar cargos públicos no Estado. Mais ou menos a confusão foi essa. Todo mundo viveu de

certa forma empregado Estado. Onde é está o Jair Mengueli e outras figuras como Vicentinho

e outros mais? Basicamente, os frankfurtianos levam essa ideia.

E tem algo curioso no meio intelectual que é o fascínio pelas ideias. Que no fundo é um grande

idealismo. Acabam automatizando as ideias.

Esses dias na ECA encontrarei com um rapaz que trabalha na revista da EDUSP. Ele me

convidou para um debate do pessoal pela liberdade de expressão e acabar com os monopólios

da comunicação. Eles querem democratizar a comunicação e fizeram um evento com muitas

dificuldades dentro da ECA.

Falei aqui, na ECA, estudar comunicação é estudar a recepção das novelas da rede globo. “O

pau está comendo” e as pessoas estão se distraindo com outras coisas. Eles não estão vivendo

em um país real, então acho que as ideias que aparecem podem ser despregadas da realidade.

E Frankfurt e seu fascínio - é um pouco por aí... Essa visão, bonita – um pensamento brilhante

– só que tem a realidade é marcada pelas crises. O capitalismo não tem mais crise? O Estado

não tem nenhum papel em lugar nenhum?

Então a reivindicação da ontologia é importante porque vai ao campo do objeto. Vamos sair do

campo do objeto. Vamos sair do campo da teoria e vamos ver como as coisas são na realidade.

Então se meus colegas estão vivendo num país imaginário, há um país real que está gritando

aí...

O problema da comunicação é terrível uma coisa que me chateia muito nesse processo

eleitoral. Por mais que o Lula tenha feito concessões e a Dilma. Você não tem um único órgão

de imprensa que seja minimamente simpático ou neutro com relação. É impressionante ver

um massacre desse tipo. Agora é engraçado que quando a imprensa vai de um lado à opinião

pública vai para outro. Eles falam para quem? Os comentaristas econômicos do Estadão, eu

fico pasmo com eles. Eles não dão o braço a torcer – a situação está boa para eles, está boa

para burguesia, está boa para o povo e eles não admitem isso. O salário acima da inflação. A

timidez do governo em adotar medidas econômicas, austeridade. Vejam em Portugal,

Espanha, Irlanda... Maravilha! No Brasil está tudo parado... É uma coisa assustadora e as coisas

podem piorar muito...

Mas, enfim acho que a prova nos “nove” é objeto é a realidade. A ontologia é esse convite.

Vamos ler as teorias e vamos ver se eles têm algo a dizer sobre a realidade. A realidade pede

outra teoria. E o que eu vejo é um descompasso.

...

Beatriz Abramides – Vamos agradecer a vinda do Celso.

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