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UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE EDUCAÇÃO SUPERIOR – CES VII CURSO DE DIREITO NÚCLEO DE PRÁTICA JURÍDICA COORDENAÇÃO DE MONOGRAFIA O INSTITUTO DA PRESCRIÇÃO PENAL E A INOVAÇÃO JURISPRUDENCIAL DA PRESCRIÇÃO ANTECIPADA. Monografia apresentada como requisito parcial para obtenção do grau de bacharel em Direito na Universidade do Vale do Itajaí. ACADÊMICO: NALCIR LUÍS SILVA São José (SC), outubro de 2004.

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UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE EDUCAÇÃO SUPERIOR – CES VII CURSO DE DIREITO NÚCLEO DE PRÁTICA JURÍDICA COORDENAÇÃO DE MONOGRAFIA

O INSTITUTO DA PRESCRIÇÃO PENAL E A INOVAÇÃO

JURISPRUDENCIAL DA PRESCRIÇÃO ANTECIPADA.

Monografia apresentada como requisito parcial para obtenção do grau de bacharel em Direito na Universidade do Vale do Itajaí.

ACADÊMICO: NALCIR LUÍS SILVA

São José (SC), outubro de 2004.

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UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE EDUCAÇÃO SUPERIOR – CES VII CURSO DE DIREITO NÚCLEO DE PRÁTICA JURÍDICA COORDENAÇÃO DE MONOGRAFIA

O INSTITUTO DA PRESCRIÇÃO PENAL E A INOVAÇÃO

JURISPRUDENCIAL DA PRESCRIÇÃO ANTECIPADA.

Monografia apresentada como requisito parcial para obtenção do grau de Bacharel em Direito, sob orientação da Professora Esp. Érica Lourenço de Lima Ferreira.

ACADÊMICO: Nalcir Luís Silva

São José (SC), outubro de 2004.

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UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE EDUCAÇÃO SUPERIOR – CES VII CURSO DE DIREITO NÚCLEO DE PRÁTICA JURÍDICA COORDENAÇÃO DE MONOGRAFIA

NALCIR LUÍS SILVA

A presente monografia foi aprovada como requisito para a obtenção do grau de bacharel em Direito no curso de Direito na Universidade do Vale do Itajaí – UNIVALI. São José, 18 de outubro de 2004.

Banca Examinadora:

_______________________________________________________ Prof ª. Esp. Érica Lourenço de Lima Ferreira- Orientadora

_______________________________________________________ Prof. MSc. Andréas Eisele - Membro

_______________________________________________________ Prof. MSc. Camila Tagliani Carneiro - Membro

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A todos que de qualquer modo tenham contribuído para esta conquista.

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AGRADECIMENTOS

A Deus, pelas graças concedidas, por sua proteção divina nos momentos difíceis,

pelo dom da vida e por me fazer reconhecer que só ela é o caminho do crescimento e do

aperfeiçoamento.

Aos meus pais, pela acolhida e por todo o carinho e atenção que sempre me

proporcionaram, pelo lar agradável que construíram e por toda a alegria proporcionada.

Ao meu filho Lucas Vieira e Silva, grande amigo e companheiro, pelos momentos

que teve que suportar minha ausência, pela compreensão da falta de atenção e por suas

palavras de incentivo.

Aos meus irmãos, sobrinhos e demais familiares, pelos incentivos, pela torcida e pelo

alento nas horas difíceis.

A minha orientadora Professora Érica Lourenço de Lima Ferreira, pela sua

compreensão, dedicação e valiosa contribuição na elaboração do presente trabalho.

Aos membros da banca examinadora, que com certeza contribuirão no

aperfeiçoamento do presente trabalho.

Aos amigos de Foro, que colaboraram grandemente na lida diária da operação do

Direito, que muito acrescentaram na troca de idéias e no compartilhamento do conhecimento

adquirido, pelos embates das teses e antíteses, e eventuais sínteses.

Aos escrivões Wilson Jensen e Lígia Maria Bach Costa, por todos os ensinamentos

da prática forense, e a todos os colegas que colaboraram no desenvolvimento de minhas

atividades na Segunda Vara Cível da Comarca de São José, na Terceira e Quarta Varas Cíveis

da Comarca de Florianópolis e em especial aos colegas da Segunda Vara Criminal.

Aos Mestres Samir Oséas Saad, Jaime Luiz Vicari e Ricardo Francisco da Silveira,

ilustres operadores do Direito, pelos conhecimentos transmitidos e pelos ensinamentos que

grandemente contribuíram no conhecimento dos meandros da seara jurídica.

Aos colegas de classe, local onde encontrei verdadeiros companheiros que criaram

um clima sempre cordial, amistoso e prazeroso, onde a busca do conhecimento e o

compartilhamento destes em muito engrandeceu o contato diário, em especial aos colegas

Vilmar Olavo de Souza, Rodrigo Pantaleão, Paulo Henrique dos Santos, Marcelo Fernando da

Rosa, Aline de Souza, Andressa Farinon e a Letícia Donneda Losso pela parceria sempre

positiva em inúmeros trabalhos.

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“... ainda estamos adormecidos diante de todos os ensinamentos de Deus.”

Salmo 21, 30.

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SUMÁRIO

RESUMO...................................................................................................................................9

ABSTRACT................................................................................................................................10

INTRODUÇÃO........................................................................................................................11

1. PRESCRIÇÃO PENAL......................................................................................................13

1.1. ASPECTOS HISTÓRICOS DO INSTITUTO DA PRESCRIÇÃO PENAL...13

1.2. A PRESCRIÇÃO PENAL NO ORDENAMENTO JURÍDICO PÁTRIO.......16

1.3. CONCEITOS E TIPOS DE PRESCRIÇÃO.......................................................18

1.4. IMPRESCRITIBILIDADE NO DIREITO PENAL BRASILEIRO.................20

1.5. NATUREZA JURÍDICA DA PRESCRIÇÃO....................................................21

1.6. FUNDAMENTOS DA PRESCRIÇÃO PENAL..................................................22

1.6.1. Teoria do esquecimento............................................................................23

1.6.2. Teoria da expiação moral do criminoso....................................................23

1.6.3. Teoria da piedade......................................................................................24

1.6.4. Teoria da dispersão das provas.................................................................25

1.6.5. Teoria da emenda......................................................................................25

1.6.6. Teoria da alteração psicológica.................................................................26

1.6.7. Teoria orientada por princípios de política criminal.................................27

1.6.8. Teoria da presunção de negligência..........................................................27

1.6.9. Teoria da exclusão do ilícito.....................................................................28

1.7. FIXAÇÃO DO PRAZO PRESCRICIONAL......................................................29

1.7.1. Diminuição e aumentos dos prazos prescricionais...................................30

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1.8. PRESCRIÇÃO DA PENA DE MULTA..............................................................32

1.9. PRESCRIÇÃO NA LEGISLAÇÃO ESPECIAL...............................................33

1.10. CAUSAS INTERRUPTIVAS E SUSPENSIVAS DA PRESCRIÇÃO...........34

1.11. PRESCRIÇÃO NOS CRIMES COMPLEXOS E CONEXOS.......................36

2. MODALIDADES DA PRESCRIÇÃO NO DIREITO PENAL BRASILEIRO...........37

2.1. PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO PUNITIVA.................................................37

2.1.1. Prescrição retroativa.....................................................................................39

2.1.1.1. Evolução histórica da prescrição retroativa.....................................40

2.1.1.2. Pressuposto de aplicação da prescrição retroativa...........................42

2.1.1.3 Oportunidade de Declaração.............................................................43

2.1.1.4 Concurso de crimes...........................................................................44

2.1.2. Prescrição intercorrente ou superveniente....................................................46

2.1.2.1 Fixação do prazo prescricional.........................................................48

2.2. PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO EXECUTÓRIA...........................................48

2.3. EFEITOS DA DECLARAÇÃO DA PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO

PUNITIVA E INTERCORRENTE.......................................................................................50

3. PRESCRIÇÃO ANTECIPADA........................................................................................52

3.1. A PRESCRIÇÃO ANTECIPADA E O INTERESSE DE AGIR......................54

3.2. A PRESCRIÇÃO ANTECIPADA E O PRINCÍPIO DA ECONOMIA

PROCESSUAL........................................................................................................................60

3.3. O CONSTRANGIMENTO ILEGAL CAUSADO PELO PROCESSO

PENAL....................................................................................................................................61

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3.4. A INSTRUMENTALIDADE DO PROCESSO E A PRESCRIÇÃO

ANTECIPADA.......................................................................................................................61

3.5. A PRESCRIÇÃO ANTECIPADA E O PRINCÍPIO DA

LEGALIDADE.......................................................................................................................62

3.6. A PRESCRIÇÃO ANTECIPADA E O PRINCÍPIO DA

OBRIGATORIEDADE..........................................................................................................63

3.7. A PRESCRIÇÃO ANTECIPADA E O PRINCÍPIO DO DEVIDO

PROCESSO LEGAL..............................................................................................................63

3.8. A PRESCRIÇÃO ANTECIPADA E OS PRINCÍPIOS DO

CONTRADITÓRIO E DA AMPLA DEFESA.....................................................................65

3.9. A PRESCRIÇÃO ANTECIPADA E O PRINCÍPIO DA

INOCÊNCIA...........................................................................................................................66

3.10. A PRESCRIÇÃO ANTECIPADA E O DIREITO DO RÉU A UMA

SENTENÇA DE MÉRITO....................................................................................................67

3.11. A PRESCRIÇÃO ANTECIPADA E OS EFEITOS CIVIS DA SENTENÇA

PENAL.....................................................................................................................................67

3.12. A PRESCRIÇÃO ANTECIPADA E AS CIRCUNSTÂNCIAS

JUDICIAIS..............................................................................................................................68

3.13. A PRESCRIÇÃO ANTECIPADA E A MUTATIO LIBELLI.........................69

4. CONCLUSÃO...........................................................................................................70

5. BIBLIOGRAFIA.

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RESUMO

O instituto da prescrição penal é tema que tem gerado inúmeras controvérsias desde

seu surgimento a séculos atrás, sendo apontado pela maioria de seus críticos como forma de

impunidade e de incentivo à prática delituosa. A prescrição antecipada além de suportar as

críticas comuns ao referido instituto, tem gerado ainda mais discórdia de posicionamentos

perante a doutrina e a jurisprudência, precipuamente por sua falta de previsão legal e pela fato

de sua consideração depender da projeção de eventual pena a ser aplicada, envolvendo a

ponderação de princípios e institutos conflitante de direito constitucional, de direito material e

de direito processual, onde colidem interesses antagônicos do Estado e do acusado ou do

indiciado, fazendo pairar dúvidas sobre a sua admissibilidade, foi observado no passado

embate similar que ocorreu relativamente à prescrição retroativa, e acabou por ser incorporada

ao ordenamento jurídico pátrio. Na abordagem do primeiro capítulo busca-se abordar a

evolução histórica do instituto, visando a verificação de seus fundamentos, seguir-se-á

abordando as modalidades de prescrição vigentes na legislação pátria, por fim, serão

apreciados os argumentos favoráveis e contrário ao reconhecimento da prescrição antecipada,

objetivando constatar os principais elementos a serem sopesados na eventual apreciação desta.

PALAVRAS CHAVE: Prescrição penal; Prescrição antecipada; Condições da ação.

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ABSTRACT

The criminal lapsing institution is a theme that has created big controversy ever

since its creation, centuries ago, being pointed by most of its critics as a form of impunity and

delictual practice. The anticipated lapsing, more than taking common critics to the referred

institution, has generated even more positioning discords before the doctrine and the

jurisprudence, for its lack of legal prediction and for the fact of its consideration to depend on

an eventual penalty to be applied, evolving the balance of the principles and conflicting

institutes of constitutional, material and procedural right, where the state´s antagonistic

interests collide and also from the defendant and the accused, making doubts hang over, it was

observed in the past a similar shock that occurred referring to retroactive lapsing, being

incorporated to the native legal order in the end. On the first chapter, the objective is to

approach the historical evolution of the institution, in order to check its beddings, following,

the lapsing modalities, effective on the native laws, and, finishing, arguments will be

appreciated, favorable and contrary to the recognition of the anticipated lapsing, objectifying

to evidence the main elements to be in the eventual appreciation of the anticipated lapsing .

KEY WORD: Criminal lapsing; Anticipated lapsing; Action condition

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INTRODUÇÃO

O reconhecimento da prescrição retroativa de modo antecipado, ao que denominou-

se prescrição antecipada, é criação jurisprudencial recente que tornou-se motivo de enormes

divergências perante a doutrina e jurisprudência, apresentando-se como um grande tema a ser

enfrentado, verdadeira celeuma jurídica onde colidem institutos e princípios de características

distintas, envolvendo razões plausíveis e contraditórias, perfilhando defensores em várias

correntes e sob os mais diversos argumentos.

A par dos fundamentos que justificam o instituto da prescrição, a modalidade

antecipada encontra seu maior fundamento na questão das condições da ação, no uso da

analogia civilista, o que é amparado nos termos do art. 3°, do Código de Processo Penal,

depreendendo-se que se antevista a inevitável ocorrência da prescrição retroativa faltaria ao

Estado o interesse de agir.

A doutrina ou se posiciona pela inviabilidade do reconhecimento da prescrição

antecipada, por entender que esta não encontra amparo legal e pela impossibilidade de

antevisão de eventual pena a ser aplicada, sendo lançados, ainda, argumentos de que seu

reconhecimento implicaria na violação de determinados princípios constitucionais; ou pela

sua possibilidade de reconhecimento, em face de que na análise da admissibilidade do

recebimento da denúncia ou da queixa deva ser feita uma análise perfunctória das condições

de admissibilidade da ação, com a verificação de indícios da materialidade e autoria, o que,

igualmente, exigiria a apreciação da utilidade do processo.

Paralelamente às discussões doutrinárias, verifica-se que os Tribunais superiores e a

maioria dos Tribunais estaduais afastam a possibilidade da aplicação da prescrição retroativa

antecipadamente, contudo, constata-se que as unidades jurisdicionais de primeiro grau, em

razoável número, têm aplicado esta modalidade prescricional.

Para alcançar-se a compreensão desta inovação jurisprudencial será empreendida a

constatação dos fundamentos da prescrição, suas peculiaridades, suas modalidades no direito

nacional, com especial ênfase à prescrição retroativa, da qual a antecipada surge como

variante, e pelo fato de que tal qual a modalidade em análise, esta também trata-se de

inovação trazida pelo direito brasileiro, igualmente decorrente de interpretações proferidas na

aplicação do Direito.

Para atingir os objetivos da pesquisa será aplicada a consulta de posicionamentos e

ensinamentos doutrinários relativos a prescrição penal, onde inicialmente estuda-se o

surgimento da prescrição penal e sua evolução no direito pátrio, com uma rápida constatação

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dos ensinamentos relativos as modalidades de prescrição penal, que serão desenvolvidos nos

dois primeiros Capítulos, utilizando-se o método indutivo e a pesquisa bibliográfica.

No terceiro momento, tratar-se-á da prescrição antecipada, especificamente quanto

aos principais posicionamentos relativos aos fundamentos favoráveis e contrários ao seu

reconhecimento, tendo por base os destacados por Francisco Afonso Jawsnicker, que bem

aglutinou em sua obra “A Prescrição Antecipada” os principais fundamentos relativos ao

tema, abordando os argumentos favoráveis e contrários ao reconhecimento da prescrição

retroativa antecipada, valendo para esta modalidade prescricional as considerações relativas a

prescrição da pretensão punitiva.

A consolidação dos estados democráticos de direito acabou por fomentar o

incremento dos direitos dos cidadãos, restringindo os poderes do Estado, o que abriu espaço

para a limitação do poder dever de punir deste, o que se verifica através da prescrição penal.

Há que se considerar, ainda, a incerteza da justiça tardia, posto que o exacerbado

decurso do tempo na apreciação da lide pode trazer a incerteza das provas produzidas, e a

imposição tardia da pena pode acabar por penalizar o agente já ressocializado.

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1. PRESCRIÇÃO PENAL

Visando identificar e abordar a inovação jurisprudencial relativa ao instituto da

prescrição penal, qual seja, a prescrição antecipada, impõe-se inicialmente a completa

cognição do instituto da prescrição em sede de Direito Penal, verificando sua evolução

histórica, conceitos, natureza jurídica, bem como identificação de suas modalidades, seus

fundamentos, distinção entre esta e prescrição civil, e identificar, ainda, outras modalidades

de prescrição no ordenamento jurídico, com ênfase às estabelecidas no Direito Penal, em

especial à prescrição retroativa, da qual a antecipada é uma sub modalidade, abordando estas

enquanto causa extintiva da punibilidade, nos termos do art. 107 do Código Penal, abordando,

igualmente, suas peculiaridades.

Para identificar tal instituto, cumpre estabelecer uma breve análise sobre a

punibilidade, de onde se verifica que esta consiste no direito que é estabelecido na norma

penal incriminadora possibilitando ao Estado a prerrogativa de imposição de uma penalidade

sempre que infringido o estabelecido na norma penal incriminadora. Portanto, ocorrido fato

típico,1 surge para o Estado a pretensão de impor a penalidade ao autor do fato criminoso, que

pode ser ilidido em diversos casos conforme se verificará, e no caso da prescrição esta

pretensão deve ser exercida em determinado prazo, que varia de acordo com o tipo de prática

delituosa, tendo por base o critério do máximo estipulado em abstrato da pena privativa de

liberdade, ou o quantum estipulado na sentença condenatória. Transcorrido o prazo pré

estabelecido, que é submetido a interrupções e suspensões, estará verificada a ocorrência da

prescrição da pretensão do Estado de impor a sanção ou de executá-la. (MIRABETE, 2002, p.

401; LEAL, 2004, p. 01; DAMÁSIO, 1999, p. 1-4)

Para a verificação de sua origem passasse a abordagem de seus aspectos históricos,

nas diretrizes de ensinamentos doutrinários que bem elucidam as razões e fundamentos de seu

surgimento e de sua evolução.

1.1. ASPECTOS HISTÓRICOS DO INSTITUTO DA PRESCRIÇÃO PENAL

1 É o modelo legal do comportamento proibido, compreendendo o conjunto das características objetivas e subjetivas do fato punível. (SILVA, 2003, p. 1.401)

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Historicamente, em que pese a dificuldade de determinar-se com precisão o

momento histórico de seu surgimento, tem-se que o instituto da prescrição foi identificado

primeiramente nas injunções romanas, de caráter processual, sendo também conhecido no

direito grego, este foi estabelecido no texto legal Lex Julia de Adulteriis,2estendendo-se

posteriormente a generalidade de crimes, mantendo-se exceções como no caso do parricídio,3

esta era baseada na prescrição da pretensão punitiva do Estado, limitando o interesse em punir

à certo prazo fixado em Lei, de modo a que o processo penal não se estende-se por tempo

indeterminado. (FERRARI, 1998, p. 1-2; PORTO, 1988, 7-8 e MACHADO, 200, p.1-2)

Na razão romana ao tempo do surgimento do instituto da prescrição este fundava-se

na idéia de que o decurso do tempo promoveria a purificação e o perdão do homem, aliada as

crenças religiosas, sendo fixado inicialmente o prazo prescricional em cinco anos, em razão

da festas lustrais, festejo religioso da purgação e do perdão dos indivíduos e das cidades, que

ocorria neste lapso temporal, posteriormente a teoria civilista deslocou as razões da prescrição

para a inércia do Estado, vindo seus prazos a sofrerem diversas alterações no direito romano,

sendo fixado posteriormente em cinco anos para as ações públicas e de um ano para as ações

privadas, à época de Deocleciano e Maximiliano (284-305 a.C.) o prazo prescricional foi

fixado em vinte anos, mantendo-se casos de imprescritibilidade para determinados crimes.

(FERRARI, 1998, p. 3-4; MACHADO, 2000, p. 87)

Na idade média os prazos prescricionais sofreram reduções, o que acarretou

inúmeras críticas em oposição à prescrição, inclusive postulando sua exclusão do

ordenamento jurídico, como ainda se postula atualmente, o que acarretou nova retomada da

ampliação dos prazos prescricionais pelos jurisconsultos italianos, sem considerar na fixação

destes a gravidade do ato ilícito, paralelamente foi ampliado o rol de delitos imprescritíveis.

Embora o desenvolvimento do instituto da prescrição tenha se dado no direito italiano, mesmo

entre seus juristas havia embates a sua consideração, mormente no tange aos crimes de maior

gravidade (FERRARI, 1998, p. 3-4-6; MACHADO, 2000, p. 87)

Na idade média novas acepções foram dadas ao instituto da prescrição, que nas

diretrizes da teoria da emenda passou a admitir a mitigação da pena nos casos em que, aliado

ao transcurso do tempo, o acusado manifestasse bom comportamento, não voltando mais a

2 Trata-se da Lex Julia de Adulteriis (736 ou 737 A.C.), sendo que a prescrição dos delitos nela sancionados (adultério, estupro e lenocínio) ocorria, geralmente, em cinco anos. É aventada a hipótese de que o limite de cinco anos fora naturalmente preferido por ser este o tempo estabelecido para as festas lustrais, denotando que os romanos já associavam a prescrição à idéia de perdão, que as aparatosas cerimônias qüinqüenais da lustração simbolizavam. (FERRARI, 1998, p. 2) 3 É o crime de matar o pai ou matar a mãe. (SILVA, 2003, p. 1006)

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delinqüir, inserindo a teoria da emenda como justificação da prescrição, o que não foi acatado

pelo direito germânico, que não reconheciam o instituto da prescrição em sede de direito

público, o que somente veio a ocorrer em meados dos séculos XVI e XVII. (FERRARI, 1998,

p. 5)

Relativamente aos argumentos contrários à prescrição sustentados pelos juristas

romanos Ferrari (1998, p. 6-7) destaca os seguintes:

1) contradizia os princípios de Direito Penal, uma vez que importava em

esperança de impunidade a alimentar o criminoso;

2) debilitava o efeito intimidatório da cominação da pena, anulando

qualquer tentativa da hoje denominada “prevenção geral negativa”;

3) opunha-se ao princípio fundamental de que nenhum delito poderia

ficar impune, ou seja, todo crime deveria ter uma pena;

4) constituía um prêmio aos delinqüentes mais hábeis que conseguiam

elidir a ação da justiça;

5) fomentava a impunidade incitando ao crime, impedindo o alcance da

finalidade da pena à época, qual seja, o mero retributivismo, ou

expiação pelo mal praticado;

6) não poderia ser aplicável, pois, fundada no decurso do tempo, não

afetava a culpabilidade e seu caráter permanente.

Apesar dos posicionamentos contrários o instituto da prescrição acabou por difundir-

se no ordenamento jurídico das mais diversas civilizações, inclusive no direito eclesiástico,

sendo esta atualmente acatada pela grande maioria dos países. (FERRARI, 1998, p. 7-8)

O instituto da prescrição fomentou posicionamentos contrários desde seus

primórdios, sob o argumento de que cometido o delito deveria ser imposta a pena de modo a

não estimular-se o cometimento de delitos e afastando a prescrição para determinados crimes

considerados de maior gravidade, a existência de posicionamentos contrários promoveu

inúmeras alterações no referido instituto ao longo de seu desenvolvimento nos mais variados

povos e culturas, com períodos de alargamento e restrições de seus prazos. Com

desenvolvimento dos Estados e a consolidação da autoridade Estatal nos moldes modernos os

argumentos da inércia do Estado e de seu interesse em punir ganhou fôlego, aliada aos demais

fundamentos doutrinários relativos ao reconhecimento da prescrição, que serão a seguir

abordados. Certo é que este controverso instituto ainda está longe de encontrar um ponto

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pacífico posto que ainda hoje, enquanto alguns buscam fundamentos para seu alargamento,

existem posições que defendem a extinção de tal instituto.

1.2. A PRESCRIÇÃO PENAL NO ORDENAMENTO JURÍDICO PÁTRIO.

Relativamente ao direito pátrio, a primeira regulamentação verificou-se no Código de

Processo Criminal de 1832, e posteriormente na Lei n.º 261, de 03 de dezembro de 1932 e no

Regulamento n.º 120, de 31 de dezembro de 1842, que levavam em consideração a maior ou

menor gravidade do ilícito. A prescrição da condenação, ou da pretensão punitiva, que não era

reconhecida no Código Criminal do Império, foi estabelecida pelo Decreto n.º 774, de 20 de

setembro de 1890, e posteriormente codificada no Código Penal de 1890, que consagrava

duas modalidades de prescrição, a da pretensão punitiva e da pretensão executória. Com o

advento da República a prescrição foi normatizada pelo Código Penal da República, em seus

artigos 75 a 85, admitindo a prescrição da ação e da pena, fixando o prazo máximo de vinte

anos. (FERRARI, 1998, 15-16; PORTO, 1988, p. 25-26)

Atualmente a prescrição é elencada no sistema jurídico nacional como causa

extintiva da punibilidade nos termos do art. 107 do Código Penal, portando de direito

material, nos seguintes termos:

Art. 107 - Extingue-se a punibilidade: I - pela morte do agente; II - pela anistia, graça ou indulto; III - pela retroatividade de lei que não mais considera o fato como criminoso; IV - pela prescrição, decadência ou perempção; V - pela renúncia do direito de queixa ou pelo perdão aceito, nos crimes de ação privada; VI - pela retratação do agente, nos casos em que a lei a admite; VII - pelo casamento do agente com a vítima, nos crimes contra os costumes, definidos nos Capítulos I, II e III do Título VI da Parte Especial deste Código; VIII - pelo casamento da vítima com terceiro, nos crimes referidos no inciso anterior, se cometidos sem violência real ou grave ameaça e desde que a ofendida não requeira o prosseguimento do inquérito policial ou da ação penal no prazo de 60 (sessenta) dias a contar da celebração;

IX - pelo perdão judicial, nos casos previstos em lei.4 (grifei)

Assim que o agente comete um crime, concretiza-se para o Estado o Jus Puniendi e

surge a possibilidade jurídica de imposição da sanção prevista àquele que infringiu as normas

penais, a punibilidade, que é conseqüência jurídica do crime, ocorrendo crime e sendo a

conduta do agente culpável, cabe ao Estado a aplicação da sanção, estando a punibilidade

4 Redação dada pela Lei n.º 7.209, de 11.7.1984.

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vinculada a elementos com a conduta típica, a antijuridicidade, a culpabilidade5. (DE JESUS,

1999. p.1-4; MIRABETE, 2002, p.401; ZAFFARONI E PIERANGELI, 1999, p. 754)

A Código Penal Brasileiro em vigor estabelece duas espécies de prescrição, a

prescrição da pretensão punitiva, que incide em lapso temporal anterior ao trânsito em julgado

da decisão para ambas as partes, e da pretensão executória, que incide posteriormente ao

período antes mencionado, sendo a prescrição intercorrente e retroativa, espécies de

prescrição da pretensão punitiva, as quais serão abordadas no Capítulo seguinte com especial

ênfase ao desenvolvimento histórico relativo à prescrição retroativa, existindo entendimentos

jurisprudenciais e doutrinários que defendem uma terceira modalidade de prescrição da

pretensão punitiva, a prescrição antecipada, que não é prevista no ordenamento jurídico

pátrio, e afigura-se o objeto da presente monografia.

A extinção da punibilidade pela prescrição atinge os crimes de ação penal pública6 e

ação penal privada,7 e sendo a fixação das penalidades vinculada à gravidade do fato típico, a

fixação do prazo prescricional, que tem por base a pena em abstrato ou a fixada na

condenação, acaba por refletir em sua fixação uma proporcionalidade8 entre a fixação de seu

prazo e a gravidade do delito. (MARQUES, 2002, p.472-476; SALLES JÚNIOR, 1998, p.

136)

Em sede de Direito Criminal a prescrição é matéria de ordem pública9 devendo ser

decretada de ofício,10 ou a requerimento das partes, em qualquer fase do processo, conforme o

disposto no art. 61 do Código de Processo Penal,11 podendo se pleiteada nos próprios autos,

através de habeas corpus ou pela via da revisão criminal. Sendo questão de ordem pública, os

casos e as condições para sua ocorrência deverão estar expressamente regulados em lei, não

podendo ser interpretada extensivamente ou por analogia. (PIERANGELI e ZAFFARONI,

1999, p. 755; SILVA, 2003, p.1.083; DELMANTO, 2002, p. 219)

5 Em sentido mais amplo, significa a mera possibilidade de ser imputável ao agente a autoria de um delito, penal ou civil, pelo que lhe será sancionada a responsabilidade inscrita na lei respectiva, que foi transgredida. (SILVA, 2003, p. 403) 6 Quando a ação penal se exercita por iniciativa do Ministério Público, e a ele somente se comete este direito, diz-se que a ação penal é pública. (SILVA, 2003, p.41) 7 Será privada, quando cabe sua iniciativa, isto é, cabe pedir a imposição da pena a própria pessoa ofendida, ou quando somente por sua solicitação pode ser promovida a ação penal. (SILVA, 2003, p. 42) 8 No mesmo sentido: (REALE JÚNIOR. 2004, p. 194) 9 Conjunto de instituições e preceitos coagentes destinados a manter o bom funcionamento dos serviços públicos, a segurança e a moralidade das relações entre particulares, e cuja aplicação não pode, em princípio, ser objeto de acordo ou convenção. (SILVA, 2003. p. 988) 10 Do latim officium, originariamente quer exprimir o dever, a obrigação ou tudo que se deve fazer por obrigação. Neste sentido, pois, oficio confundi-se com a própria função, ou seja, a soma de atribuições ou de deveres impostos a pessoa, em virtude de cargo, de ministério, de ocupação exercida ou de mister. (SILVA, 2003, p. 979) 11 Art. 61. Em qualquer fase do processo, o juiz, se reconhecer extinta a punibilidade, deverá declará-lo de ofício.

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18

Assim, tem-se que a prescrição penal é matéria de ordem pública que estipula

determinado tempo para que o Estado efetive e consuma o seu direito de processar e julgar o

acusado, e, do mesmo modo, para que este aplique a sanção estabelecida pela sentença

condenatória, extinguindo o direito de punir, além do direito de ação. Deste modo, verifica-se

que a prescrição da pretensão punitiva do Estado sobrepõe-se a qualquer outra questão e

precede ao mérito da própria ação penal.

1.3. CONCEITOS E TIPOS DE PRESCRIÇÃO

No tocante aos conceitos atribuídos à prescrição extraem-se os seguintes

ensinamentos doutrinários:

Prescrição penal é a perda do poder-dever de punir do Estado pelo não–exercício da pretensão punitiva ou da pretensão executória durante certo tempo. Ela se diferencia da decadência e da perempção, que também constituem causas extintivas da punibilidade. A prescrição atinge em primeiro o direito de punir do Estado e, em conseqüência, extingue o direito de ação; a perempção e a decadência, ao contrário, alcançam primeiro o direito de ação e, por efeito, o Estado perde a pretensão punitiva. (DAMÁSIO, 1999, p.17) Esta é a perda do direito de punir, pelo decurso de tempo, ou, noutras palavras, o Estado, por sua inércia ou inatividade, perde o direito de punir. Não tendo exercido a pretensão punitiva no prazo fixado em lei, desaparece o “jus puniendi”. (MARQUES, 2002, p. 471) É a extinção da punibilidade pelo decurso do tempo. Atinge os crimes de ação penal pública e também os de ação penal privada. Elimina o poder punitivo estatal antes da condenação ou depois da sentença condenatória. Os prazos são fixados pela própria lei (arts. 109 e 110). (SALLES JÚNIOR, 1998, p. 136)

O Dicionário Aurélio traz prescrição com dois sentidos, o primeiro sendo a perda da

ação atribuída a um direito, que fica assim juridicamente desprotegido, em conseqüência do

não exercício do direito durante determinado tempo e a seguir coloca como a maneira pela

qual se extingue a punibilidade do autor de um crime ou contravenção, por não haver o Estado

exercido contra ele no tempo legal o seu direito de ação, ou por não ter efetivado a

condenação imposta. (BUARQUE, 1999, p. 825)

Apreciando puramente no termo jurídico, cabe o conceito do Dicionário de Vocabulário Jurídico que traz um conceito um quanto extenso, devido às inúmeras variáveis da prescrição, como se vê a seguir: A palavra prescrever é originária do latim praescribere (escrever antes), na significação exclusivamente jurídica, é ficar sem efeito ou anular-se, extinguir-se um direito, que se conservou sem exercício por certo lapso de tempo ou que não teve seu exercício integralmente consumado durante certo tempo. Em sede de Direito Penal, a prescrição não refoge ao sentido originário da extinção de direito. Entretanto, especializa-se na extinção do direito de processar o agente que supostamente cometeu um delito ou uma infração ou na extinção do direito de aplicar a pena ao condenado.

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19

Neste particular, a prescrição penal apresenta-se como prescrição da ação, extinguindo-se o direito de processar, ou prescrição da pena, prescrição do direito de punir, ou da imposição ao cumprimento da pena estabelecida. (SILVA, 2003, 1,084 e p.1.085)

O instituto da prescrição é encontrado nos mais diversos ramos do Direito,

assumindo características diversas, como a prescrição extintiva,12 que revela-se na prescrição

que proporciona a extinção do direito de ação, em virtude do que a pessoa perde o direito que

tinha, inclusive a autoridade ou poder para defendê-lo judicialmente através da perda do

direito de ação. Assim, seu fim é o de liberar o devedor da obrigação que lhe era imposta,

desde que o credor, não exerça no tempo que a lei assinalou o direito de ver a obrigação

satisfeita, não podendo mais exigi-la após o transcurso do prazo pré-fixado. (SILVA, 2003, p.

1.084)

No ramo do Direito Trabalhista SILVA (2003, p. 1.081) assinala esta ocorre nos

casos em que o empregado, por inércia durante determinado tempo, perde o direito de

apresentar reclamação trabalhista quanto aos créditos decorrentes da relação do emprego.

Atualmente a matéria é regulada no art. 7º, inciso, XXIX,13 da Constituição Federal que

estabeleceu a fixação do prazo prescricional em cinco anos para o trabalhador urbano, até dois

anos após a extinção do contrato de trabalho e em dois anos para o trabalhador rural, a contar

da extinção do vínculo empregatício, não fluindo tal prazo contra menores de dezoito anos,

nos termos do art. 44014 da Consolidação das Leis Trabalhistas. Quanto à prescrição

tributária, o mesmo autor aponta para sua previsão no art. 17415 do Código Tributário

Nacional, o qual estabelece o prazo de cinco anos contado a partir da data de constituição

definitiva (lançamento) do crédito tributário pelo sujeito ativo para a efetivação da prescrição.

Relativamente à matéria civilista tem-se que a prescrição civil, em oposição à

prescrição criminal ou penal, é a denominação atribuída a modalidade de prescrição regulada

pelo Direito Civil e pelo Direito Comercial, em virtude da qual os direitos se extinguem e se

adquirem”. (SILVA, 2003, p, 1.085)

12 A prescrição extintiva, implicando na prescrição da ação ou na extinção da capacidade defensiva de um direito, importa na extinção do próprio direito, a que corresponde, sendo indispensável para sua configuração o decurso de certo tempo pré fixado e a não ação ou negligência por parte do titular do direito. A lei que marca os prazos para as prescrições e determina os casos em que possam ocorrer assinala os de imprescritibilidade. (SILVA, 2003, p. 1.084) 13 Art. 7°, inciso XXIX – ação, quanto aos créditos resultantes das relações de trabalho, com prazo prescricional de 5 (cinco) anos para os trabalhadores urbanos e rurais, até o limite de dois anos após a extinção do contrato de trabalho. 14 Art. 440. Contra os menores de 18 (dezoito) anos não corre nenhum prazo de prescrição. 15 Art. 174. A ação para cobrança do crédito tributário prescreve em 5 (cinco anos), contados da data da sua constituição definitiva.

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20

A prescrição aquisitiva. Assim se entende a prescrição que, segundo a regra jurídica preestabelecida, promove para a pessoa, que possui a coisa, e a favor de quem um direito se extinguiu ou prescreveu, uma aquisição de um direito. Mostra-se, pois, a prescrição que, extinguindo um direito de outrem, faz passar o mesmo direito para a pessoa que possui a coisa, por um certo lapso de tempo. Prescrição civil, em oposição à prescrição criminal ou penal, é a denominação dada à prescrição regulada pelo Direito Civil e pelo Direito Comercial, em virtude da qual os direitos se extinguem e se adquirem. (SILVA, 2003, 1,084 e p.1.085)

Assim, tem-se que a prescrição aquisitiva distingue da prescrição extintiva,

porquanto na primeira ocorre a extinção de um direito que transfere-se a terceiro, enquanto na

segunda modalidade existe tão somente a perda do direito.

Distinguindo a prescrição civil da prescrição penal assinala De Jesus (1999, p. 20):

A prescrição civil se diferencia da prescrição penal nos seguintes pontos: 1º) a prescrição covil é aquisitiva e extintiva, no sentido de que por ela os direitos são adquiridos e as obrigações, extintas; a prescrição penal é sempre extintiva do poder-dever de punir do Estado. 2º) a prescrição penal se relaciona com interesses que importam ao direito público; a prescrição civil está relacionada a interesses privados. Como dizia Carrara, a prescrição penal é regida por princípios de ordem pública primária; a prescrição civil, por princípios de ordem pública secundária; 3º) a prescrição civil está determinada em favor do possuidor (prescrição aquisitiva) ou do devedor (prescrição liberatória); a prescrição penal não é em favor do agente ou do condenado, mas em face do interesse da sociedade; 4º)os efeitos da prescrição, na esfera civil, podem ser renunciados pelo interessado; a prescrição penal, de ordem pública, não pode ter seus efeitos renunciados pelo autor da infração penal; 5º na esfera civil a prescrição não corre contra quem não pode agir; no campo criminal, não importa qual a razão do não exercício da pretensão punitiva ou executória, se fuga doa gente, inércia da autoridade, autoria ignorada etc. O prazo prescricional, em regra, tem seguimento.

Conforme verificado, a prescrição possui características variáveis em ralação aos

diversos ramos do direito, podendo-se verificar pontos de similitudes em relação a estes,

como a consideração distinta aos menores de 18 anos, e o fato desta ao mesmo tempo que

destitui do direito de um, como nos casos da prescrição penal e da prescrição aquisitiva, faz

surgir o direito de outro, verificando-se em sede penal que ao mesmo tempo em que o Estado

perde o direito de punir ou de executar a pena, o beneficiado pela prescrição adquire o direito

de não mais ser processado ou de não ser sofrer a imposição da pena.

1.4. IMPRESCRITIBILDADE NO DIREITO PENAL.

Conforme já assinalado, a prescrição sempre encontrou correntes contrária entre os

doutrinadores do direito, o que também ocorreu entre a sociedade, sempre havendo pressões

sociais, buscando o seu não reconhecimento, ou a afastando de determinados delitos,

principalmente os considerados mais bárbaros ou de maior gravidade.

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21

O Código Penal brasileiro, que disciplina o instituto da prescrição penal, não prevê

casos de imprescritibilidade, porém, a Constituição Federal de 1988, em seu artigo 5º,

estabeleceu dois casos de imprescritibilidade, sendo estes o crime de racismo16, inciso XLII,

previstos na Lei n° 7.716/89, e a infração consistente na formação de grupos armados, civis

ou militares, contra a ordem constitucional e o Estado Democrático,17 inciso XLIV, estes

definidos na Lei n.° 7.170/83 (Lei de Segurança Nacional). (citar a fonte da constituição

federal)

A fixação de casos de imprescritibilidade externa os valores da sociedade que os

incorpora, podendo verificar-se no segundo caso de imprescritibilidade supra mencionado a

valoração do Estado Democrático de Direito e da ordem social; e no primeiro caso revela a

incorporação da busca do afastamento de discriminações e o respeito às distinções genéticas.

1.5. NATUREZA JURÍDICA DA PRESCRIÇÃO PENAL

No tocante a natureza jurídica da prescrição penal, discutiu-se exaustivamente na

doutrina se esta integraria o campo do direito substantivo, posto que se assenta na essência e

na finalidade da pena, enquanto outra corrente doutrinária afirma tratar-se de norma de

natureza processual, por suspender ou impedir o curso do processo, por fim, há a corrente que

afirma incidir sob o instituto da prescrição uma natureza mista,18 com caráter

simultaneamente de natureza material e processual, o que se dá em virtude de que o referido

instituto é evidenciado pela perda do interesse público na persecução e na repressão, pois,

com o passar do tempo não mais existiria razão de ser para a pena, sendo, igualmente, um

obstáculo de natureza processual. (REALE JÚNIOR, 2004, p. 194; DE JESUS, 1999, p. 17;

COSTA JÚNIOR, 2002, p.325)

De Jesus (1999, p. 18.) na apreciação da prescrição no ordenamento jurídico pátrio

aponta esta como de caráter de direito material, sob o argumento de que seu regramento está

estabelecido no Código Penal como causa extintiva da punibilidade, atingindo a punibilidade,

atingindo o processo por conseqüência. Deste modo, a natureza jurídica estaria caracterizada

por seu posicionamento no direito material.

16 Lei n.º 7.716, de 05 de janeiro de 1989, alterada pela Lei n.º 9.459, de 15 de maio de 1997. 17 Estão definidos na Lei de Segurança Nacional, Lei n.º 7.170, de 14 de dezembro de 1983. 18 Reale Júnior assinala que a maioria da doutrina adota esta posição. (REALE JÚNIOR, 1999, p. 194)

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Tal distinção ganha importância em virtude das diferentes implicações no caso de

nova lei, por exemplo, que amplie o prazo prescricional, posto que se tratando de matéria

processual ter-se-ia a aplicação imediata da regra (Código de Processo Penal, art. 2º)19, por

outro lado, tratando-se de direito material, tal dispositivo não teria aplicação, porque em

sendo mais prejudicial ao réu, tal dispositivo estaria afastado pelo disposto no art. 1º do

Código Penal, (princípio da reserva legal)20. (COSTA JÚNIOR, 2002, p.325)

No direito pátrio, a posição majoritária da doutrina considera a natureza material do

instituto, alguns por estar este inserido no diploma penal de direito material, outros apontam

para o termo inicial do prazo prescricional ser contado nos termos do art. 10 do Código

Penal21, enquanto no caso de tratar-se de direito processual não estaria incluído o dia do

começo (art. 798 do Código de Processo Penal).22 (COSTA JÚNIOR, 2002, p.325)

1.6.FUNDAMENTOS DA PRESCRIÇÃO DA AÇÃO PENAL.

Os fundamentos da prescrição em matéria penal constituem-se nas razões que

justificam a perda do direito de punir do Estado em virtude do transcurso do tempo, havendo

críticas a teorias que fundam-se em fatores diversos deste, como se verificará, sendo indicado

pela maioria das teorias o transcurso do tempo aliado outros fatores. (FERRARI, 1998, p. 25)

Reale Júnior (2004, p. 195) sustenta merecerem destaque as teorias do esquecimento,

da emenda, político criminal, da dispersão das provas e da punição do Estado pela inércia.

Bonfim e Capez (2004, p. 851) indicam como fundamento da prescrição o fato de ser

inconveniente a aplicação da pena muito tempo depois da prática da infração penal e no que

denominaram de combate a ineficácia, justificando que o Estado deve agir dentro de

determinados prazos.

De Jesus (1999, p. 18) afirma que em face de nossa legislação a prescrição teria

tríplice fundamento, sendo o primeiro o decurso do tempo (teoria do esquecimento), a

correção do condenado (teoria da emenda) e a negligência da do Estado (teoria da presunção

de negligência).

19 Art. 2° A lei processual penal aplicar-se-á desde logo, sem prejuízo da validade dos atos realizados sob a vigência da lei anterior. 20 Art. 1º - Não há crime sem lei anterior que o defina. Não há pena sem prévia cominação legal. 21 Art. 10º - O dia do começo inclui-se no cômputo do prazo. Contam-se os dias, os meses e os anos pelo calendário comum. 22 Art. 798. Todos os prazos correrão em cartório e serão contínuos e peremptórios, não se interrompendo por férias, domingo ou dia feriado.

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23

Dentre as teorias abordadas pela doutrina, destaca-se as trazidas por Ferrari (1998, p.

25-39), sendo estas a do esquecimento; do arrependimento ou expiação moral; da piedade; da

dispersão das provas; da emenda; da alteração psicológica; político-criminal; da presunção da

negligência e da exclusão do ilícito.

1.6.1. Teoria do esquecimento.

Esta teoria conta com posicionamento favorável de Garraud, Girolamo Penso, Luigi

D’Antonio, Luigi Lucchini e Ortolan (apud Ferrari, 1998, p. 25 e Porto, 1988, p. 14), a qual

sustenta que o passar do tempo faria a sociedade perder a lembrança do crime. Nas diretrizes

desta teoria, o decurso do tempo extinguiria ou, ao menos, atenuaria a intranqüilidade social,

fazendo cessar o direito de punir do Estado, posto que as finalidades pretendidas pelas penas

não poderiam serem concretizadas, o que não recomendaria a aplicação da sanção.

(FERRARI, 1998, p. 25; REALE JÚNIOR, 2004, p. 195, e PORTO, 1988, p.14)

Machado (2000, p. 89) assim assinala:

esta teoria que o decurso de tempo havido desde a prática do delito sem a devida condenação e a respectiva execução desta, faz com que o crime seja esquecido pela sociedade, inexistindo interesse a ser protegido.

A teoria do esquecimento considera a eficácia da sanção a ser imposta, questionando

sua real necessidade de aplicação, posto que o transcurso do tempo não mais exigiria qualquer

espécie de punição, por razões de tranqüilidade social e pela de ressocialização e correção do

criminoso, o que justificaria a extinção da punibilidade pela prescrição da ação em

decorrência da perca das razões políticas da pena. (FERRARI, 1998, p. 26; MACHADO,

2000, p. 90)

Assim, verifica-se que a teoria do esquecimento considera um série de fatores que

constituem as razões de aplicação da pena como a paz social e a ressocialização do agente e

de política criminal, estipulando que o extenso decurso do tempo faria com que a aplicação da

reprimenda não mais fosse necessária em virtude do esquecimento do delito e do

restabelecimento da paz social.

1.6.2. Teoria da expiação moral do criminoso.

Adotada por Le Sellyer, Faunstin Hélie, Boitard e Montaigne (apud FERRARI.

1998, p. 25; PORTO, 1988, p. 17) esta justifica a prescrição da ação com fundamento no

sofrimento suportado pelo indivíduo durante a tramitação do processo, seus adeptos sustentam

que o indivíduo após o transcurso do processo por muito tempo já teria sofrido

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suficientemente a expiação23 da culpa, o que decorreria das angústias e ansiedades suportadas

durante a tramitação do processo.

Esta teoria, fundada no sofrimento moral, firma-se na convicção de que os remorsos, os sofrimentos sofridos pelo culpável ao longo do processo, são castigos suficientes. Impor uma pena a mais seria atentar contra o princípio non bis in idem, ou seja, a não aplicação de dupla penalização. Surge, portanto a idéia da compensação da pena pelo sofrimento, em face da aflição e da opressão havidas no transcurso do processo. (MACHADO, 200 p. 91)

Ferrari (1998, p. 27) assinala que o remir24 consistiria na base de fundamentação da

teoria expiatória, compreendendo-se nesta visão a prescrição da ação como um instituto muito

semelhante ao da graça, não se confundindo com este, o que é indicado pelo autor como

completo desvirtuamento das razões justificadoras da prescrição da ação. A ser assim, o

indivíduo não seria mais punido porquanto já tivesse sofrido suficientemente a expiação da

culpa, proveniente de aflição e opressão sentidas durante o processo. As correntes contrárias

aos fundamentos desta teoria sustentam que o sofrimento moral suportado durante o processo

não seria elemento da pena, não podendo compensá-la. (MACHADO, 2000, p. 91)

Conforme se verificará, a teoria da expiação do criminoso guarda diversos pontos de

congruência com outras teorias como a da piedade e da alteração psicológica.

1.6.3. Teoria da piedade.

Apontada como fundamento subsidiário da teoria do esquecimento, esta busca base

na razão de que o transcurso do tempo aliado à compaixão da sociedade fariam com que o

Estado perdoasse o agente delituoso, considerando-o recuperado, tendo por argumento que os

temores, as ânsias e as agonias que flagelam o acusado enquanto este esteve afastado da

justiça equivaleria a imposição de uma penalidade. Neste diapasão haveria um sentimento de

piedade, devendo a sociedade satisfazer-se com a retribuição importa pelas angustias

suportadas pelo condenado. (FERRARI, 1998, p. 28; PORTO, 1988, p. 15; MACHADO,

2000, p.93)

Machado (2000, p. 93) aponta como fundamento contrário a esta teoria o fato de que

desta fundar-se-ia em elementos subjetivos, abstrações e presunções que não poderiam ser

estendidas a todos indistintamente, sendo tal teoria insuficiente para justificar a prescrição.

Deste modo, tem-se que esta teoria além de levar em conta o decurso do tempo, tem

em foco que os sofrimentos e as amarguras decorrentes da lide penal equivaleriam a

23 Em sentido criminal, entende-se o cumprimento da pena que é imposta à pessoa, a quem se imputou a prática de um crime. (SILVA, 2003, p. 586) 24 Exprime propriamente o resgate ou requisição por compra de alguma coisa. (SILVA, 2003, p. 586)

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imposição de uma pena, sendo certa a crítica de que nem todos os delinqüentes, mormente os

contumazes que se aprazem na prática delituosa, suportam os aventadas aflições sustentadas

por esta teoria.

1.6.4. Teoria da dispersão das provas.

Thomazius (apud FERRARI, 1998, p. 29 e PORTO, 1988, p. 16) é indicado como o

grande formulador desta teoria, segundo a qual a concepção da dispersão da provas, ligada à

fidelidade e à incerteza probatória dos elementos de convicção, em decorrência do

distanciamento temporal dos fatos, tornariam duvidosa e por vezes impossível a plena

verificação destes, dificultando a apreciação da certeza das provas e da responsabilidade

penal.

Teoria de natureza processual, tratando da instrução das provas que é campo

processual, admite que a situação de dispersão e dubiedade das provas provocada pelo

decurso do tempo tornaria ilegítima a persecução processual, considerando, igualmente, que o

decurso do tempo prejudicaria também a defesa. (FERRARI, 1998, p. 29; PORTO, 1988, p.

17)

As críticas a esta teoria entendem que melhor seria a prescrição do procedimento

criminal, consoante a dificuldade imposta pelo lapso temporal entre o fato ocorrido e a prova

produzida, apontando-se para um fato duvidoso. (MACHADO, 2000, p. 96)

Com efeito, inegável que o distanciamento do momento do cometimento do delito

faz com que determinadas provas distanciem-se da certeza probatória e da obtenção destas, o

que se verifica, exemplificando, relativamente à prova testemunhal, posto que o decurso de

acentuados lapso temporal por vezes dificulta a localização destas, bem como influi na precisa

lembrança dos fatos e no reconhecimento do agente.

1.6.5. Teoria da emenda.

A teoria em comento funda-se na razão de que o transcurso do prazo prescricional

sem que o agente volte a cometer novos delitos imporia uma presunção de emenda do mesmo,

sem a participação do Estado. As criticas lançadas pela escola positivista contra esta teoria

buscam afastar a incidência de sua aplicação, argumentos que objetivavam ver reconhecida a

prescrição sob tal fundamento somente quando da manifestação por parte do delinqüente no

sentido de não mais delinqüir, buscando a certeza da regeneração, e não uma presunção desta.

Porto (1988, p. 18) indicando ensinamentos de Girolamo, sustenta que tal deslocamento do

sentido da prescrição implicaria em desviar-se para um novo instituo, considerando que a

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prescrição deixaria de ter o transcurso do tempo como elemento primordial do instituto. O

Código italiano de 1921, dispunha que o reconhecimento da prescrição somente se daria se

cessada a periculosidade do acusado. Este raciocínio afastaria da incidência deste instituto os

denominados criminosos natos, habituais e enfermos mentais. (MACHADO, 2000, p. 92;

FERRARI, 1988, p. 31)

Neste diapasão, em razão da influência do transcurso do tempo aliado ao não

cometimento de novos delitos, que influiriam de forma contundente no comportamento do

delinqüente, possibilitaria-se a sua correção e regeneração, sendo possível este redimir-se do

mal praticado pela ausência de outros delitos, não merecendo punição, atingindo a

ressocialização por via indireta, a legislação brasileira considera a reincidência causa

interruptiva da prescrição da pena, conforme será verificado adiante. (FERRARI, 1998, p. 31)

Pode-se considerar que a teoria da emenda, e o posicionamento dos positivistas

guardam relação com a teoria do esquecimento, posto que não mais delinqüindo a sociedade

esqueceria e perdoaria mais facilmente, incidindo a teoria da piedade.

1.6.6. Teoria da alteração psicológica do agente.

A teoria psicológica, ou da alteração psicológica, que guarda relação com a teoria

anterior, considerando que a não reincidência indicaria a hipótese de que o decurso do tempo

ter promovido alterações na constituição psíquica do acusado, desconstituindo o nexo

psicológico entre o fato e o agente em virtude do decurso do tempo, o que é o fundamento da

alteração psicológica das pessoas, de modo a não mais justificar a punição. (FERRARI, 1998,

p. 32; MACHADO, 2000, p. 93)

A consideração das modificações da psique do indivíduo como fundamento da

prescrição seria, segundo Ferrari (1998, p. 32) absurda e falível, considerando que a não

punição poderia gerar intranqüilidade social e o fomento da criminalidade, argumento que é

lançado contra todas as teorias, assinalando os ensinamentos de Costa e Silva, que afirma ser

esta teoria uma verdadeira “fantasia otimista”. (FERRARI, 1998, p. 32-33)

1.6.7. Teoria orientada por princípios de política criminal.

Funda-se na consolidação da prescrição penal como um instrumento de política

criminal, baseada em critério de oportunidade política, constituída nas idéias de transcurso de

tempo e perda do interesse social na punição do delinqüente, tornado a descriminalização

elemento de retração da intervenção estatal, pelo não exercício por parte da sociedade e do

Estado do jus puniendi. (MACHADO, 2000, p. 97)

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27

Segundo esta teoria com a prática do ilícito a sociedade exige a reafirmação das

normas jurídicas através da imposição da pena, porém, o decurso de determinado lapso

temporal sem a consolidação da punição, a sociedade aperceberia não haver a necessidade de

combater a crime praticado há muito tempo, alcançando-se certo controle social independente

da atuação do Estado, o que fundamentaria a extinção da punibilidade. (FERRARI, 1998, p.

33)

No atual momento social brasileiro que conta com um sistema carcerário

superlotado, a prescrição atua na política de intervenção mínima do Estado visando o

encarceramento tão somente em casos extremos, de modo a oportunizar vagas para os casos

de essencial necessidade de encarceramento.

1.6.8. Teoria da presunção da negligência.

Advinda dos institutos de Direito Civil, utilizando-se a analogia deste ramo do

direito, esta teoria entende ocorrer negligência por parte do Estado em fazer cumprir-se a

norma, especificamente no que se refere a persecução penal e ao cumprimento da condenação.

(MACHADO, 2000, p. 98; FERRARI, 1998, p. 34; PORTO, 1988, p. 20)

Nas diretrizes desta teoria o crime não seria punido unicamente por culpa dos agentes

estatais. Advinda do Direito Civil, a teoria da presunção da negligência do Estado estipula

como causa justificadora da prescrição, a inércia das autoridades incumbidas da efetivação do

ius persequendi, como fundamento do reconhecimento da prescrição. As autoridades, por má-

fé ou negligência, possibilitariam aos cidadãos o direito de não serem punido após o decurso

de certo tempo. A ser assim, a punição somente se justificaria se o Estado persistisse no

objetivo de perseguir o crime e o criminoso, o reflexo desta perseguição do Estado pela

condenação dá sentido ao reconhecimento de causas interruptivas do prazo prescricional,

como o recebimento da denúncia e a prolação da sentença condenatória. (FERRARI, 1998, p.

34; MACHADO, 2000, p. 98; PORTO, 1988, p. 20)

A teoria da presunção da negligência como corrente fundamentadora da prescrição

penal é criticável, a primeira crítica refere-se à falácia do pressuposto de que a prescrição

procedimental decorre da inépcia dos agentes do Estado, ora por inércia dolosa, ora por

culposa. (FERRARI, 1998, p. 34)

Segundo Ferrari (1998, p. 34) o equívoco desta teoria evidenciaria-se pela

impossibilidade de atribuir culpa ao Estado, posto ser consabido que inúmeros crimes sequer

chegam ao conhecimento dos órgãos estatais, não podendo-se atribuir culpas a seus agentes

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28

quando sequer o Estado tenha conhecimento da prática do ilícito, afirmando não haver sentido

falar-se em punição do Estado por inércia.

A segunda crítica apontada por Ferrari (1998, p. 34) consiste no fato de a própria lei

impor obstáculos para a punição e para a análise da persecução penal, partindo do pressuposto

de que por vezes ser impossível a apuração das provas em virtude de escassos inviabilizaria a

atribuição de culpa aos agentes do Estado, tendo em vista que o próprio legislador fixaria

impedimentos à possibilidade de punição.

Inúmeros casos de ocorrência da prescrição em nosso atual momento histórico

concretizam-se muito mais pela incapacidade do Estado de atender a demanda judicial do, o

que acarreta sua morosidade, do que por sua inércia, sendo comum nos locais de maior

criminalidade, onde as unidades jurisdicionais não contam com os recursos necessário ao

encaminhamento do grande número de processos, a incidência da prescrição, principalmente

em se tratando de crimes aos quais sejam cominadas penas mínimas de até dois anos

cometidos por menores de vinte e um anos.

1.6.9. Teoria da exclusão do ilícito.

Esta teoria sustenta que a desnecessidade da aplicação da sanção seria conseqüência

da ausência de necessidade da proteção penal, após decorridos largos lapsos temporais,

fundada no fato de que a proteção do bem jurídico tutelado deixaria de ter relevância social,

porquanto a sociedade em virtude da alteração de seus padrões já não mais reprovaria certo

fato considerado tipo penal e, portanto, não justificaria a imposição de uma pena, incidindo a

prescrição pela exclusão da antijuridicidade do ilícito. (FERRARI, 1998, p. 35; MACHADO;

2000, p. 99)

Segundo preceitua Ferrari, que cita o jogo do bicho no Brasil como exemplo,

podendo-se citar também o adultério (art. 240, do Código Penal)25, o motivo que enseja a não

aplicação dessa teoria à prescrição da ação, consistiria no fato de que um dos elementos

centrais da prescrição, qual seja, o transcurso do tempo, estaria afastado, constituindo-se sua

acepção em impróprio do julgador interferir na esfera legislativa. (FERRARI, 1998, p. 35)

25 Art. 240. Cometer adultério: Pena – detenção, de quinze dias a seis meses. [...]

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29

1.7. FIXAÇÃO DO PRAZO PRESCRICIONAL.

A determinação do prazo prescricional leva em conta, conforme sua espécie ou

modalidade, o quantum da pena fixada in abstrato ou a fixada na sentença condenatória,

fazendo-se o enquadramento deste nas regras estabelecidas no art. 109 do Código Penal, que

assim dispõe:

Art. 109 - A prescrição, antes de transitar em julgado a sentença final, salvo o disposto nos §§ 1º e 2º do art. 110 deste Código, regula-se pelo máximo da pena privativa de liberdade cominada ao crime, verificando-se: I - em 20 (vinte) anos, se o máximo da pena é superior a 12 (doze); II - em 16 (dezesseis) anos, se o máximo da pena é superior a 8 (oito) anos e não excede a 12 (doze); III - em 12 (doze) anos, se o máximo da pena é superior a 4 (quatro) anos e não excede a 8 (oito); IV - em 8 (oito) anos, se o máximo da pena é superior a 2 (dois) anos e não excede a 4 (quatro); V - em 4 (quatro) anos, se o máximo da pena é igual a 1 (um) ano ou, sendo superior, não excede a 2 (dois); VI - em 2 (dois) anos, se o máximo da pena é inferior a 1 (um) ano.26

O termo inicial de contagem do prazo prescricional, igualmente, difere conforme seja

a espécie de prescrição a ser considerada, antes de transitar em julgado a sentença

condenatória, nas diretrizes do art. 111 do Código Penal,27 o termo inicial da prescrição da

pretensão punitiva será, em regra, a data da consumação do resultado do ilícito (inciso I), não

importando a data do seu conhecimento, o inciso segundo do mesmo dispositivo determina

que em tratando-se de tentativa o termo inicial será o dia em que tiver cessado a atividade

criminosa, e tratando-se de crime permanente, a contagem do prazo far-se-á a partir do dia em

que cessou a permanência, nos termos do incido III, do artigo antes mencionado.

Tratando-se dos crimes de bigamia28 e de falsificação ou alteração de assentamento

de registro civil, nos disciplina do inciso IV do artigo antes mencionado, o termo inicial será a

data em que o fato tiver tornado-se conhecido.

26 Redação dada pela Lei n.º 7.209, de 11.7.1984 27 Termo inicial da prescrição antes de transitar em julgado a sentença final Art. 111 - A prescrição, antes de transitar em julgado a sentença final, começa a correr I - do dia em que o crime se consumou; II - no caso de tentativa, do dia em que cessou a atividade criminosa; III - nos crimes permanentes, do dia em que cessou a permanência; IV - nos de bigamia e nos de falsificação ou alteração de assentamento do registro civil, da data em que o fato se tornou conhecido. Redação dada pela Lei n.º 7.209, de 11.7.1984. 28 Bigamia Art. 235 - Contrair alguém, sendo casado, novo casamento: Pena - reclusão, de dois a seis anos. § 1º - Aquele que, não sendo casado, contrai casamento com pessoa casada, conhecendo essa circunstância, é punido com reclusão ou detenção, de um a três anos.

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30

Relativamente à prescrição da pretensão executória, o termo inicial será determinado

segundo as regras do art. 112, do Código Penal,29 que estipula três possibilidades em seu

inciso primeiro, sendo a primeira o dia em que transitar em julgado a sentença condenatória

para a acusação; a segunda o dia em que transitar em julgado a decisão que revogar a

suspensão condicional do processo e, por fim, o dia em que transitar em julgado a decisão que

revogue o livramento condicional, estabelecendo, ainda, as hipóteses em que haja a

interrupção da execução da pena e os casos de superveniência de doença mental.

Demais aspectos relativos ao termo inicial de contagem do prazo prescricional serão

abordados especificamente em ralação a cada espécie de prescrição.

1.7.1 Diminuições e aumentos dos prazos prescricionais.

Segundo os preceitos dotados pelo artigo 115, do Código Penal,30 também

configurando uma atenuante genérica, nos casos em que agente seja menor de vinte e um anos

na data do fato31 e nos casos em que este seja maior de 70 anos ao tempo da condenação, o

prazo prescricional determinado na sistemática do artigo 119 do Código Penal será reduzido

pela metade, e tratando-se de regra pessoal esta não se comunica aos demais agentes incluídos

no processo. (MIRABETE, 2002, p. 412; BONFIM e CAPEZ, 2004, p.856)

A figura penal em comento incidirá em todas as modalidades de prescrição penal, no

primeiro caso, ainda que o agente ultrapasse a idade de 21 anos ao tempo da sentença a regra

deverá ser observada, já no segundo caso pouco importa se o agente não tenha completado 70

anos ao tempo do crime, posto que somente deve ser considerada sua idade ao tempo da

condenação, seja esta em primeiro ou em segundo grau. A regra também incidirá ainda que o

agente seja emancipado e tenha menos de 21 anos à época dos fatos e tratando-se de crime

§ 2º - Anulado por qualquer motivo o primeiro casamento, ou o outro por motivo que não a bigamia, considera-se inexistente o crime. 29 Termo inicial da prescrição após a sentença condenatória irrecorrível Art. 112 - No caso do art. 110 deste Código, a prescrição começa a correr: I - do dia em que transita em julgado a sentença condenatória, para a acusação, ou a que revoga a suspensão condicional da pena ou o livramento condicional; II - do dia em que se interrompe a execução, salvo quando o tempo da interrupção deva computar-se na pena. Redação dada pela Lei n.º 7.209, de 11.7.1984 30 Redução dos prazos de prescrição Art. 115 - São reduzidos de metade os prazos de prescrição quando o criminoso era, ao tempo do crime, menor de 21 (vinte e um) anos, ou, na data da sentença, maior de 70 (setenta) anos. Redação dada pela Lei n.º 7.209, de 11.7.1984 31 A consideração da menoridade relativa, com a mitigação do prazo prescricional em metade de seu tempo, com a incidência do disposto no art. 115 do Código Penal, depende de comprovação documental da menoridade relativa no momento do cometimento do ato ilícito. (DE JESUS, 1999, p. 135)

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31

continuado,32 se o agente iniciou a execução destes antes de ultrapassar a idade do benefício

este deverá ser considerado, e, ainda que o tipo consigne o benefício ao tempo do crime, a

regra também incidirá nos casos de contravenções penais. (DELMANTO, 2002, p. 235)

Estipulado ao final do caput do art. 110 do Código Penal, é assinalado o caso de

aumento decorrente da reincidência, este aumento incide somente sobre a prescrição da

pretensão executória, não sendo aplicável à prescrição da pretensão punitiva, nas diretrizes da

Súmula 220 do Superior Tribunal Justiça,33 somente sendo considerado este acréscimo na

hipótese de prescrição da pretensão executória. (DELMANTO, 2002, p. 219)

Segundo Piarengeli e Zaffaroni (1999, p. 764), o mesmo aumento incide

relativamente a prescrição intercorrente, indicando posicionamento majoritário da

jurisprudência neste sentido.

Para o cálculo dos prazos prescricionais serão levadas em consideração as causas

especiais de aumento ou diminuição da pena, excetuando-se o concurso de crimes e o crime

continuado, quando sejam compulsórias ou se achem expressamente enquadradas na

acusação, incluindo-se a exacerbação correspondente à forma qualificada, (crime qualificado

em sentido amplo),34 essa porção deve ser somada ou diminuída da pena abstrata máxima;

sendo as causas fixadas em quantidades variáveis, nos casos de aumento o cálculo deverá

considerar o maior limite de aumento, ao contrário, no caso de diminuição considerar-se-á o

menor limite de diminuição. São irrelevantes, portanto, para o cálculo do prazo prescricional,

as circunstâncias agravantes e atenuantes genéricas, que não influi no limite máximo da pena

em abstrato. (DELMANTO, 2002, p. 219; MIRABETE, 2002, p. 403)

Assim, interferem na fixação do prazo prescricional, a idade do agente, o fato de

eventual reincidência, no que tange à pretensão executória, e a presença de causas de aumento

ou diminuição da pena. Tratando-se de regra de direito material, proceder-se-á a contagem do

prazo, nos termos do art. 10 do Código Penal, contando-se o dia do início e não se

interrompendo o prazo em função de férias, domingos ou feriados.

É de ressaltar-se que a menoridade relativa considerada no artigo em comento não

encontra-se em consonância com as diretrizes das alterações legislativas da esfera civil,

mormente em se considerando a diminuição da idade para votar para os 16 anos, e a

maioridade civil para 18 anos, o que reflete a alteração social e o desenvolvimento de seus

32 Dando-lhe a lei tratamento de crime único, ele não pode ser dividido. Se o agente iniciou o crime continuado antes dos 21 anos e completou depois, mesmo assim incidirá a redução pela idade. (DELAMATO, 2002, p. 235) 33 Superior Tribunal de Justiça, Súmula 220. A reincidência não influi no prazo da prescrição da pretensão punitiva. 34 TRJ 79/443; RT 465/381, 556/427; RSTJ 54/375. Apud MIRABETE. 2002, p. 403.

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32

agentes, o maior acesso a informação que os jovens obtém atualmente já não mais justificaria

a redução prevista.35

1.8. PRESCRIÇÃO DA PENA DE MULTA.

Regulada pelo art. 114, do Código Penal36, este dispõe que a prescrição se consumará

em 02 (dois) anos nos casos em que esta seja a única aplicada, ou quando seja a única prevista

in abstrato, prescrevendo no mesmo prazo previsto para pena privativa de liberdade nos casos

em que esta for imposta cumulativa ou alternativamente aplicada, nas diretrizes do

estabelecido no art. 118, do Código Penal,37 quando tratar-se de prescrição da pretensão

punitiva.

A prescrição da pena de multa relativamente à pretensão executória é distinta da

esfera penal, posto que esta passa a consistir em dívida da Fazenda Pública, nos termos do art.

51 do Código Penal38, sendo sua execução feita separadamente da pena privativa de liberdade,

incidindo as regras relativas a legislação tributária no que diz respeito as causas suspensivas e

interruptivas da prescrição, da competência e procedimento de execução, conforme o artigo

antes mencioando. (BONFIM e CAPEZ, 2004, p. 869; DE JESUS 1999, p. 64; LEAL, 2004,

p. 608)

Conforme consta dos termos do artigo antes mencionado, deve ser aplicado

relativamente a prescrição da pena de multa em sede de pretensão executória as regras de

direito tributário, porém, não tendo referido dispositivo determinado expressamente a fixação

do prazo prescricional pelas regras de Direito Tributário, que prevê um prazo de 05 9cinco)

anos, e sendo vedada a interpretação extensiva em sede de prescrição penal, o prazo será de

02 (dois) anos, nos termos do art. 114, do Código Penal, posto ser mais vantajosa ao

sentenciado.

35 Em se considerando a lentidão do sistema judiciário, principalmente nas unidades jurisdicionais de maior volume de processos, aliado a redução do prazo prescricional em metade, faz com que ocorra um grande número de prescrições entre os menores de vinte e um anos e maiores de dezoito, estimulando ainda mais a criminalidade entre os jovens, que tem aumentado em muito, face a impunidade que acaba privilegiando estes. 36 Prescrição da multa Art. 114 - A prescrição da pena de multa ocorrerá: I - em 2 (dois) anos, quando a multa for a única cominada ou aplicada; II - no mesmo prazo estabelecido para prescrição da pena privativa de liberdade, quando a multa for alternativa ou cumulativamente cominada ou cumulativamente aplicada. (redação da pela Lei nº 9.268, de 1º.4.1996) 37 Art. 118 As penais mais leves prescrevem com as mais graves. 38 Art. 51 transitado em julgado a sentença condenatória, a multa será considerada dívida de valor, aplicando-se-lhe as normas da legislação relativa à dívida ativa da Fazenda Pública, inclusive no que concerne às causas interruptiva e suspensivas.

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33

A legislação atual prevê cinco possibilidade de prescrição da pena de multa, quando

esta for a única prevista no tipo penal (inciso I, do art. 114 do Código Penal, primeira parte);

quando esta é única aplicada (inciso I, do art, 114 do Código Penal, segunda parte); sendo esta

imposta cumulativamente cominada a pena privativa de liberdade (inciso II, do art. 114, do

Código Penal, primeira parte); ou cumulativamente aplicada (inciso II, do art. 114, do Código

Penal, segunda parte); e nos casos do artigo 118 do Código Penal, na forma antes

mencionada.

1.8.PRESCRIÇÃO NA LEGISLAÇÃO ESPECIAL

Relativamente a legislação especial penal não dispondo esta sobre prescrição,

incidirá o disposto no art. 12 do Código Penal,39 como ocorre nos casos de lei do Abuso de

Autoridade,40 consumando-se a prescrição, nestes casos, em 02 (dois) anos, tanto nos casos

em que se tome por base a pena in abstrato, que tem o prazo máximo de 06 (seis) meses,

quando nos casos em que se tenha por base a sanção efetivamente aplicada, posto que será

inferior a um ano, tal prazo também será de 02 (dois) anos, o que também ocorrerá nos casos

em que seja imposta a pena de perda de cargo ou função. (BONFIM e CAPEZ, 2004, p. 871)

Nos Crimes Contra a Segurança Nacional, disciplinado pela Lei n.º 7.170 de 14 de

dezembro de 1983, Lei de Segurança Nacional, em seu art. 6º, inciso IV, prevê a prescrição

dos crimes nela trados, determinando em seu art. 7º, a observância do disposto na parte geral

do Código Penal Militar, o qual regula o cálculo da prescrição punitiva pelo máximo da pena

privativa de liberdade prevista in abstrato (art. 125 do Código Penal Militar), tendo por base

do cálculo da prescrição da pretensão executória o quantum da pena privativa de liberdade

fixado na sentença condenatória (art. 126 do Código Penal Militar).

As leis que tratam dos crimes contra a economia popular, Leis n.º1.521/54, 4.591/64

e 6.435/77 e o Decreto lei n.º 73 de 21 de novembro de 1996, bem como o Código Eleitoral,

não tratam da prescrição, desta forma, incide o disposto no art. 12 do Código Penal.

Tratando-se de crimes falimentares, nos termos do art. 199, caput, da Lei n.º

7.661/45, “a prescrição extintiva da punibilidade de crime falimentar opera-se em dois anos”,

com seu início determinado nos termos do parágrafo único do referido dispositivo que

estabelece: “começa a correr da data em que transitar em julgado a sentença que encerra a

39 Art. 12. As regras gerais deste Código aplicam-se aos fatos incriminados por lei especial, se esta não dispuser de modo diverso. 40 Lei n.° 4.898, de 9 de dezembro de 1965.

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falência ou que julgar cumprida a concordata”, deste modo, a prescrição terá o prazo de dois

anos, iniciando-se a contagem a partir da data em que for encerrado o processo falimentar, o

que dar-se-á nos casos de encerramento da falência ou que julgar cumprida a concordata.

1.10 CAUSAS INTERRUPTIVAS E SUSPENSIVAS DA PRESCRIÇÃO.

As causas interruptivas da prescrição são dispostas nos termos do art. 117 do Código

Penal, sendo estas o recebimento da denúncia, a prolação da sentença de pronúncia e pela

decisão de segunda instância que confirma este recebimento, pela sentença condenatória

recorrível, pelo início ou continuação do cumprimento da pena e a reincidência.

O recebimento de aditamento à denúncia ou à queixa somente interromperão prazo

prescricional quando incluírem novo crime, interrompendo este prazo tão somente em relação

ao novo tipo, não interferindo nos tipos antes contidos na denúncia; o prazo não será

interrompido pela rejeição da denúncia, de igual modo ocorrerá quando o recebimento da

denúncia se der por juiz incompetente (art. 567, primeira parte, do Código de Processo

Penal41); a publicação da sentença de pronúncia interromperá a prescrição dos crimes dolosos

contra a vida, bem como dos crimes em conexão a este que sejam objeto da mesma lide; caso

a sentença de primeiro grau seja absolutória e sobrevier decisão condenatória em segundo

grau, somente neste momento ocorrerá a interrupção do prazo prescricional. (CAPEZ e

BONFIM, 2004, p. 858-859)

Segundo os termos dos parágrafos primeiro do dispositivo antes mencionado, com

exceção do início ou continuação do cumprimento da reprimenda e nos casos de reincidência,

a prescrição produzirá efeitos em relação a todos os partícipes do delito, estendendo-se a

todos os crimes conexos a incidência da interrupção sobre qualquer um deles, desde que

sejam objeto do mesmo processo (art. 117, parágrafo primeiro do Código Penal, segunda

parte), a interrupção somente não fará retornar seu prazo ao marco zero nos casos em que esta

ocorrer pelo início ou retomada do cumprimento da pena (art. 117, parágrafo segundo do

Código Penal). (DELAMANTO, 2002, p.242)

As causas suspensivas da prescrição são elencadas no art. 116 do Código Penal,

sendo estas os casos em que aguardar-se a resolução em outro processo de questão da qual

dependa o reconhecimento da existência do crime (art. 116, inciso I, do Código Penal),

41 Art. 567. A incompetência do juiz anula somente os atos decisórios, devendo o processo, quando for declarada a nulidade, ser remetido ao juízo competente.

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denominadas de questões prejudiciais, enquanto o agente cumpre pena no estrangeiro (inciso

II), salvo se o fato for atípico no Brasil, e, tratando-se da prescrição da pretensão executória,

esta não transcorrerá enquanto o agente cumpra pena por outro crime (parágrafo único do

mesmo dispositivo). (BONFIM e CAPEZ, 2004, p. 859)

Além das causas suspensivas dispostas no dispositivo antes abordado, verifica-se a

ocorrência de outras possibilidades de suspensão nos casos em que, tratando-se de

parlamentar, a Câmara dos Deputados ou o Senado Federal votar por sua suspensão, caso em

que esta perdurará enquanto durar o mandato, nos termos do art. 53, parágrafos terceiro e

quinto, com redação dada pela Emenda constitucional n.º 35/2001; nos casos de aplicação do

art. 89, parágrafo 6º da Lei n.º 9.099/9542; nos casos em que o réu for citado por edital e

deixar de comparecer ao interrogatório, incidindo o disposto no art. 366 do Código de

Processo Penal; quando o réu tiver que ser citado através de carta rogatória,43 ocasião em que

a marcha processual será suspensa até que esta seja cumprida, nos termos do art. 368, do

Código de Processo Penal; nos crimes contra a ordem econômica, nos casos em que haja

acordo (parcelamento quitação verificar e acrescentar); a Lei n.º 10.409 de 11 de janeiro de

2002, que trata do tráfico ilícito de entorpecentes, trouxe inovação ao ordenamento processual

penal, estabelecendo casos em que o réu mesmo citado pessoalmente, não comparecendo ao

interrogatório, impor-se-á a suspensão do processo.

Assim, tem-se que as causas impeditivas ou suspensivas da prescrição são aquelas

que sustam o prazo prescricional, reiniciando a contagem do prazo tão somente pelo que resta,

já a interrupção, em regra, faz com que o prazo prescricional retorne ao seu marco zero,

excetuando-se o caso da prescrição da pretensão executória quando a interrupção se dá pelo

início ou continuação do cumprimento da reprimenda.

1.10 PRESCRIÇÃO DE CRIMES COMPLEXOS E CONEXOS

Sendo determinado tipo penal elemento típico de outro, a prescrição do primeiro não

irá estender-se ao segundo, Binfim e Capez (2004, p. 862) trazem o seguinte exemplo: “crime

de extorsão mediante seqüestro; a prescrição do seqüestro em nada afeta o crime complexo do

42 Art. 89. Nos crimes em que a pena mínima cominada for igual ou inferior a 1 (um) ano, abrangidos ou não por esta Lei, o Ministério Público, ao oferecer a denúncia, poderá propor a suspensão do processo, por 2 (dois) a 4 (quatro) anos, desde que o acusado não esteja sendo processado ou não tenha sido condenado por outro crime, presentes os demais requisitos que autorizam a suspensão condicional da pena (art. 77, do Código Penal). 43 Por carta rogatória entende-se a precatória que é expedida para a requisição de atos que devam ser praticados em território estrangeiro. (SILVA, 2003, p. 263)

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art. 159, do Código Penal., do mesmo modo que a prescrição de determinado crime que seja

conexo a outro não afetará a agravação da graduação da pena em virtude da conexão.

Feitas estas considerações, verifica-se que o instituto da prescrição mantém seu

caráter controvertido desde sua origem, a aproximadamente vinte e sete séculos, que recai

sobre sua existência e seus fundamentos, porém, apesar de todas as divergências relativas ao

instituto este logrou êxito em consolidar-se na esmagadora maioria dos países, sendo excluído

sua incidência somente em relação a um pequeno número de delitos.

Quanto aos fundamentos da prescrição penal, constata-se ser o decurso do tempo o

fator essencial de sua justificação, sendo considerados pelos demais fatores, que interligados,

buscam justificar a desnecessidade da imposição da pena após o transcurso de determinado

espaço de tempo, todos considerando a desnecessidade de imposição da pena.

Abordados os aspectos gerais relativos ao instituto da prescrição passa-se a análise

da modalidades específicas de prescrição no direito penal pátrio, abordando as modalidades

de prescrição da pretensão punitiva, e suas sub espécies, e a prescrição da pretensão

executória.

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2. MODALIDADES DA PRESCRIÇÃO NO DIREITO PENAL BRASILEIRO

Em sede de Direito Penal duas são as espécies de prescrição, a da pretensão

executória e da pretensão punitiva, a qual contém quatro figuras, a primeira é a prescrição da

pretensão punitiva propriamente dita, regulada no caput do artigo 109 do Código Penal, a

segunda denominada de prescrição intercorrente ou superveniente à sentença condenatória é

prevista no § 1° do art. 110 do Código Penal, a terceira modalidade é a denominada prescrição

retroativa, estabelecida na sistemática dos §§ 1° e 2° do art. 110, do Código Penal, e, por fim

a prescrição antecipada, que não encontra previsão legal, todas combinadas com o art. 109, do

Código Penal.

Havendo a substituição da pena aplicada por medida de segurança, o quantum fixado

na pena substituída deve ser usado como base para a fixação do prazo prescricional, não

havendo esta ter-se-á por base de fixação o mínimo da pena prevista in abstrato, havendo

posições contrárias no sentido de utilizar-se o limite máximo previsto in abstrato, e ainda no

sentido da inaplicabilidade da prescrição retroativa quando aplicada somente a medida de

segurança, no sentido do entendimento do Supremo Tribunal Federal em julgamento do HC

68.783. (DE JESUS, 1999, p.153)

Para uma análise apropriada das modalidades da prescrição passasse a abordá-las

individualmente para melhor consideração de suas peculiaridades.

2.1 PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO PUNITIVA

A prescrição da pretensão punitiva, impropriamente denominada prescrição da ação,

ocorre sempre que o Estado não tomar a iniciativa processual para exercer o jus puniendi,

dentro de pré determinado lapso temporal ou, se iniciado o exercício da ação, esta não for

concluída em tempo hábil, incidindo a prescrição em tempo anterior ao da prolação da

sentença condenatória irrecorrível esta será sempre da pretensão punitiva. (DAMÁSIO, 1999,

p. 23; LEAL. 2004, p. 595)

Neste tópico tratar-se-á precipuamente da modalidade básica da prescrição, que é

prevista no caput, do art. 109 do código Penal.

Segundo Bonfim e Capez (2004, p. 853) a prescrição da pretensão punitiva “ é a

perda do poder dever de punir do Estado durante determinado lapso de tempo”.

Assim, o transcurso de tempo sem a conclusão do exercício pleno da ação penal faz

com que o Estado perca seu poder-dever de punir, ou seja, de que o Poder Judiciário aprecie o

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mérito do processo oriundo da prática da infração penal e a aplicação da sanção respectiva.

(DAMÁSIO, 1999, p. 23)

A ocorrência de fato da prescrição da pretensão punitiva impede o início da

investigação criminal, podendo ser obtido o trancamento deste pela via do habeas corpus, ou

impede o seguimento da persecução penal; o reconhecimento da prescrição da pretensão

punitiva não implica em responsabilização ou apreciação da culpabilidade do agente, não

projetando-se em antecedentes criminais e nem acarretando a reincidência, afastando todos os

efeitos principais e secundários penais e extrapenais da condenação. Nos casos de ocorrência

da prescrição da pretensão punitiva antes de consolidada a sentença condenatória os prazos

serão regulados sempre pelo máximo da pena prevista em abstrato, o que não ocorre nos casos

de prescrição da pretensão punitiva nas modalidades retroativa, intercorrente e antecipada,

conforme se verificará adiante. (ZAFFARONI e PIERANGELLI, 1999, p. 755; LEAL. 2004,

p. 595; BONFIM e CAPEZ, 2004, p. 853)

Para a verificação da ocorrência da prescrição da pretensão punitiva, deverá ser

determinado o tipo penal a ser considerado, e o máximo da pena privativa de liberdade

(reclusão ou detenção), cominada para o delito, trazendo uma correlação entre o repúdio

social ao delito e a fixação do prazo prescricional, segundo Celso Delmanto, (apud

ZAFFARONI e PIERANGELL, 2004, p. 755) “ é da própria natureza da prescrição que

deve ela ser proporcional ao crime, de maneira que os mais leves prescrevem em menor

lapso e os mais graves em maior espaço de tempo”.

Assim, partindo-se do quantum máximo previsto ao tipo enquadra-se este em um dos

incisos do art. 109 do Código Penal, em seguida deverá ser verificado o tempo transcorrido

entre a data do fato e a data do recebimento da denúncia, ou o tempo transcorrido entre este

ato e a data da sentença condenatória, considerando a eventual incidência de causas

suspensivas ou interruptivas do referido prazo. Em qualquer caso, se o tempo fixado para o

transcurso do prazo prescricional exceder ao tempo transcorridos entre os atos antes

mencionados estará consumada a prescrição da pretensão punitiva. (LEAL, 2004, p. 596;

PIERANGELI e ZAFFARONI, 1999, p. 755)

O termo inicial da prescrição da pretensão punitiva é determinado pelo disposto no

art. 111, incisos I, II, III e IV, do Código Penal, na sistemática do art. 119, do mesmo diploma

penal, nas diretrizes das regras gerais da prescrição.

Nos casos de crimes continuados (art. 71 do Código Penal) ou dos concursos formal

e material (arts. 69 e 70 do Código Penal), a prescrição incidirá individualmente sobre cada

um dos delitos não sendo considerados os aumentos relativos as figuras antes mencionadas, o

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que se dá nas diretrizes do estabelecido no art. 119, do Código Penal. (CAPEZ e BONFIM,

2004, p. 854-855; DE JESUS, 1999, p. 56-59)

Portanto, ocorrido o fato típico, surgindo para o Estado a pretensão de impor a

penalidade ao infrator, esta pretensão deve ser exercida em determinado prazo, que varia de

acordo com o tipo de prática delituosa, tendo por base o critério do máximo estipulado em

abstrato para a pena restritiva de liberdade ou o determinado na sentença condenatória,

quando tratar-se das modalidades retroativa e intercorrente, quando a pena prevista ao tipo for

unicamente a de multa o prazo será de dois anos, conforme antes constatado.

2.1.1 Prescrição Retroativa.

Criação jurisprudencial firmada pela Suprema Corte, esta modalidade de prescrição

da pretensão punitiva tem sua contagem do prazo prescricional baseada na pena fixada em

decisão condenatória, sem possibilidade de aumento da reprimenda, regulando a prescrição da

pretensão punitiva do Estado de forma retroativa. Assim, fixado o quantum máximo da

reprimenda este será a base para a fixação do prazo prescricional, segundo o estabelecido no

art. 109, do Código Penal, e verificando nos lapsos temporais contados a partir da data do fato

até a publicação da sentença condenatória, considerando as causas suspensivas e interruptivas

do transcurso do prazo prescricional. (REALE JÚNIOR, 2004, p.199-200)

A prescrição retroativa, surgida com a Súmula 146 do Tribunal Regional Federal,

que na reforma de 1988, que deu origem ao hoje denominado Supremo

Tribunal Federal, com lastro nos ensinamentos doutrinários de Nelson Hungria, tem seu

cálculo do prazo prescricional baseado na pena efetivamente aplicada ao agente, possuindo a

sentença que tenha sido recorrida apenas pela defesa efeitos ex nunc, não retroagindo,

relativamente à prescrição, dependendo o feito de decisão definitiva, e somente a decisão

posterior que julga o mérito terá efeitos ex tunc, retroagindo ao tempo da instauração da ação

que é a primeira manifestação do exercício da pretensão punitiva do Estado. (COSTA

JÚNIOR, 2002, p. 327)

A prescrição retroativa poderá ocorrer entre a data da consumação do delito e a do

recebimento da denúncia ou da queixa, ou entre esta e a publicação da sentença; entre o

recebimento da denúncia e o acórdão de instância superior, sempre que provido o recurso de

sentença absolutória; caso em que será computado o período compreendido entre a data do

recebimento da denúncia ou da queixa e da decisão condenatória de segundo grau, posto que a

sentença absolutória não interrompe o prazo prescricional. Tal instituto foi inserido no

ordenamento jurídico pátrio a partir da ementa no projeto da reforma de 1984, apresentada na

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Câmara dos Deputados pelo Deputado Federal Egídio Ferreira Lima e aprovada pelo

Congresso Nacional, que acrescentou ao Código Penal o § 2º do art. 110, o que se deu após

severos embates, como se verá a seguir. (DE JESUS, 1999, p. 130-142; COSTA JÚNIOR,

2002, p. 326; BONFIM e CAPEZ, 2004, p. 864)

Em conformidade com entendimentos jurisprudenciais, Costa Júnior (2002, p. 327)

aponta como pressupostos para seu reconhecimento não haver recurso da acusação

objetivando a majoração da pena, não exige-se recurso da defesa; é possível o reconhecimento

da prescrição retroativa se a sentença de primeiro grau é absolutória e condenatória a

proferida pelo tribunal, desde que não seja interposto recurso pela acusação visando o

aumento da pena; podendo ser reconhecida a prescrição retroativa quando houver sentença

condenatória com redução da reprimenda em segunda instância que possibilite tal

reconhecimento em virtude do prazo fixado em lei.

2.1.1.1 Evolução histórica da prescrição retroativa.

Na senda evolutiva do instituto da prescrição no ordenamento jurídico brasileiro, a

prescrição retroativa sempre gerou discussão na doutrina e jurisprudência, desde a vigência do

Decreto n.º 4.780, de 27 de fevereiro de 1923, e, com a vigência do Código Penal, a partir de

1940, que fixou entendimento de que a fixação da pena, se tornada definitiva quanto ao seu

quantum máximo, deveria retroagir para beneficiar ao réu, como se fora a pena cominada pela

Lei, ou seja, o quantum fixado em abstrato daria lugar ao quantum da pena fixada como

elemento norteador da fixação do prazo prescricional segundo o art. 109, do Código Penal.

Tal entendimento foi contraposto no final de 1947, inadmitindo a retroatividade prescricional

da pena concreta, seguindo o entendimento de que o disposto no art. 110, do Código Penal,

nos termos então vigentes, fixaria tão somente o quantum do prazo da prescrição da pretensão

executória, orientação que perdurou somente até o final de 1950. (DAMÁSIO, 1999, p. 119-

120)

Já a partir de 1951, as opiniões se dividiram, de uma lado a corrente liderada por

Nélson Hungria, que posicionava-se no sentido de que a pena concretizada, na ausência de

recurso do Ministério Público seria a única que corresponderia ao direito de punir do Estado,

impondo-se o aproveitamento da quantificação da reprimenda para a estipulação do prazo

prescricional, para o então Ministro Luiz Gallotti a nossa Lei seria expressa ao atribuir efeito

interruptivo à sentença condenatória recorrível (art. 117, IV, do Código Penal), inutilizado o

prazo que fluíra anteriormente, permanecendo tal posicionamento até fins de 1959.

(DAMÁSIO, 1999, p. 121)

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Com a alteração do quadro de Ministros a partir de 1960, a tese favorável a

retroatividade da pena concreta passou novamente a ser vencedora, culminando na edição da

Súmula 146,44 em 1964, que consagrou a prescrição retroativa, seguiram-se, ainda, pontos

divergentes relativamente à prescrição retroativa até sua pacificação com as reformas de 1977

(Lei n.º 6.416/77), e de 1984 (Lei n.º 7.209/84).

O Decreto Lei n. 1.004, instituidor do Código Penal de 1969, não previu a prescrição

retroativa, vedando o efeito retroativo da fixação do quantum máximo da pena aplicada para a

fixação do prazo prescricional, incidindo tão somente a partir da data da publicação da

sentença condenatória, o que vigorava como causa interruptiva do prazo prescricional, com a

nova fixação de seu prazo daí por diante. (DAMÁSIO, 1999, p. 123)

A reforma introduzida em 1977, deu ao instituto o seguinte disciplinamento:

Art, 110 A prescrição, depois de transitar em julgado a sentença condenatória, regula-se pela pena imposta e verifica-se nos prazos fixados no artigo anterior, os quais se aumentam de um terço, se o condenado é reincidente. §1° A prescrição, depois da sentença condenatória com trânsito em julgado para a acusação, regula-se também, pela pena aplicada e verifica-se nos mesmos prazos. §2° A prescrição, de que trata o parágrafo anterior, importa, tão somente, em renúncia do Estado à pretensão executória da pena principal, não podendo, em qualquer hipótese, ter por termo inicial data anterior à do recebimento da denúncia.

A nova reforma promovida em 1984, trouxe a seguinte redação aos parágrafos 1°e 2°

do art. 110 do Código Penal, in verbis:

§ 1° A prescrição, depois da sentença condenatória com trânsito em julgado para a acusação, ou depois de improvido se recurso, regula-se pela pena aplicada. § 2° A prescrição, de que trata o parágrafo anterior, pode ter por termo inicial data

anterior à do recebimento da denúncia ou da queixa.

Deste modo, atualmente são previstas em nosso ordenamento penal duas espécies de

prescrição, a prescrição da pretensão punitiva, nos artigos 109 e 110, §§ 1° e 2°, e a prescrição

da pretensão executória, estabelecida no art. 110, caput, todos do Código Penal, diferindo do

disposto na reforma de 1977, no que se refere a possibilidade do reconhecimento da

prescrição retroativa antes do recebimento da denúncia.

Assim, consolidava-se no ordenamento jurídico pátrio o instituto da prescrição

retroativa, passando este a reconhecer as três modalidades de prescrição da pretensão

punitiva, sua modalidade básica, (art. 109, do Código Penal), a prescrição intercorrente (art.

109, § § 1°e 2°) e a prescrição retroativa (art. 110, § 2°), com possibilidade de sua aplicação

no período ao anteriormente de recebimento da denúncia, o que não era aplicável no período

44 Súmula Supremo Tribunal Federal, n.°146 A prescrição da ação penal regula-se pela pena concretizada na sentença, quando não há recurso da acusação.

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anterior reforma de 1984, e na prescrição da pretensão executória (CP, art. 110, caput) e a.

(DE JESUS, 199, p. 125-126)

Fixado o quantum da pena, tendo-se estabelecida a pena em concreto, far-se-á o

ajustamento a um dos incisos do art. 109 do Código Penal, obtendo-se, então, a determinação

do período prescricional, que será ajustado nos períodos antes mencionados. Assim, se o

prazo prescricional fixado for amplamente abrangido por um dos períodos prescricionais,

considerando eventuais suspensões deste, ter-se-á a ocorrência da prescrição retroativa, nos

termos do § 2° art. 110, do Código Penal. (DE JESUS, 1999, p. 130)

A fixação da prescrição retroativa difere da prescrição superveniente quanto ao

período de verificação da prescrição, sendo que na primeira verificar-se-á no período anterior

ao da publicação da sentença, e a segunda no período posterior ao da sentença condenatória.

(DE JESUS, 1999, p. 133)

2.1.1.2 Pressupostos de aplicação da prescrição retroativa

O primeiro pressuposto é a existência de uma sentença condenatória, sendo

descabida nos casos de decisão absolutória ou meramente declaratória da extinção da

punibilidade, sem condenar o réu, sendo também cabível nos casos de absolvição em primeiro

grau e condenação em segunda instância. (DE JESUS, 1999, p. 137)

Aplicado o perdão judicial, incide o princípio retroativo pressupondo condenatória a

sentença. Tal possibilidade não era prevista ao tempo da reforma penal de 1977, posto que na

sistemática ao tempo vigente os efeitos desta espécie de prescrição incidiam sobre a

prescrição executória da pena principal, e no perdão judicial não há previsão de pena. No

atual sistema, a possibilidade existe, posto que a prescrição retroativa consiste em prescrição

da pretensão punitiva, devendo ser considerado, neste caso, como base para a fixação do

prazo prescricional o quantum mínimo da pena in abstrato. (DE JESUS, 1999, p. 137)

Adotando-se a tese de que a sentença concessória do perdão judicial é absolutória ou

meramente declaratória da extinção da punibilidade, não há que se falar em prescrição

retroativa, posto não estar satisfeito o pressuposto de existência de sentença condenatória..

(DE JESUS, 1999, p. 137)

Pressuposto a existência de sentença condenatória, e tratando a matéria de critérios

temporais, o seguinte pressuposto trata da fixação definitiva do quantum máximo da pena,

pois não havendo aumentos nesta não poderá ocorrer o aumento da fixação do prazo

prescricional, ainda que haja a possibilidade de diminuição deste em virtude de recurso da

defesa, sendo imprescindível para a sua consideração, que não haja mais recurso para a

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acusação ou que este tenha sido improvido, consumando-se o trânsito em julgado para a

acusação. (DE JESUS, 199, p. 130)

A necessidade de recurso por parte do réu somente era prevista na interpretação do

antigo parágrafo único do art. 110 do Código Penal e da antiga Súmula 146, efetuada por

parte do primitivo Superior Tribunal Federal, o que não se faz necessário na atual sistemática,

não sendo exigida a intimação do réu dos termos da sentença para que haja sua declaração,

podendo ser declarada depois que haja a publicação da sentença, por força do disposto no

artigo 61 do Código de Processo Penal. (DE JESUS, 1999, p. 138)

2.1.1.3 Oportunidade de declaração.

Na sistemática vigente ao tempo da reforma de 1977, em que a prescrição retroativa

constituía causa de extinção da pretensão executória, pois procedente a pretensão punitiva do

Estado estaria apenas extinta a pretensão executória, não rescindindo a própria sentença. (DE

JESUS, 1999, p. 144)

Ao tempo da vigência da Súmula 146 do primitivo Superior Tribunal Federal, que se

assentava no parágrafo único do artigo 110 do Código Penal, a prescrição retroativa

constituía preliminar de mérito, sem explorar o mérito, o Tribunal deveria apreciá-la, uma

vez que extinguia a pretensão punitiva não se apreciaria o mérito. No regime da reforma penal

de 1977, permitindo tão-somente a extinção da pretensão executória, a prescrição retroativa

deixou de ser preliminar capaz de impedir a apreciação do mérito, passando os tribunais a

apreciarem primeiramente o mérito, mantida a sentença condenatória, passava-se a apreciar a

prescrição retroativa. No atual sistema penal trazido na reforma de 1984, o regime da

prescrição retroativa impede o exame do mérito. Assim, havendo recurso da defesa o

princípio retroativo impede seu exame. (DE JESUS, 1999, p. 143)

Apelando o réu e a acusação, o Tribunal em primeiro lugar julga o apelo da defesa

enfrentando o mérito, absolvendo o réu ou mantendo a condenação. Se absolvido, fica

prejudicado o apelo da acusação, mantida a condenação, passa a julgar o recurso da Justiça

Pública, do assistente ou do querelante. Improvido, ou provido de forma que não modifique o

quantum da pena, aplica-se o princípio retroativo. Havendo a redução da pena em segundo

grau, pode ser declarada a extinção da punibilidade pela prescrição retroativa. Absolvido o réu

em primeiro grau e condenado em segundo, pode ser reconhecida a prescrição retroativa. (DE

JESUS, 1999, p. 133, 142-143)

De Jesus (1999, p. 143) afirma que a prescrição retroativa não pode ser reconhecida

pela justiça de primeiro grau, sob o argumento de que esta não poderia julgar procedente a

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ação para depois julgá-la improcedente, tampouco apreciar a prescrição depois da sentença

condenatória, posto que a prolação desta faria esgotar sua jurisdição, posição que é

corroborada por Bonfim e Capez (2004, p, 856) que assinalam, no entanto, que nos casos em

que haja recurso da defesa, ao apreciar o seu processamento, o magistrado poderia declarar a

prescrição, por razões de economia processual, nas diretrizes do art. 107, inciso IV, do Código

Penal e art. 61, do Código de Processo Penal.

A possibilidade de declaração da prescrição retroativa pelo juízo da execução penal

também é afastada por De Jesus, (1999, p. 144) que sustenta que este somente poderia

apreciar a prescrição da pretensão executória, nos termos do art. 66, inciso II, da Lei de

Execuções Penais.

Nos casos de processos de competência originária dos tribunais, estes podem declarar

a prescrição retroativa em caso de sentença condenatória, não constituindo obstáculo a

eventualidade de ter sido interposto recurso especial ou extraordinário, que não têm efeito

suspensivo. (DE JESUS, 1999, p. 148)

2.1.1.4 Concurso de crimes

Nos casos de incidência do art. 69 do Código Penal (concurso material) e art. 70,

cada infração deverá ter seu prazo prescricional considerado isoladamente, nos termos do art.

119 do Código Penal45, Bonfim e Capez (2004, p. 855) trazem o seguinte exemplo, “um

acidente, matando duas pessoas, em concursos formal; uma morre na hora e a outra 6 meses

depois; a prescrição do primeiro começa a correr seis meses antes do segundo”,

Incidindo o regramento estabelecido no art. 70 do Código Penal (concurso formal),

deve ser considerado o limite da pena fixada sem a incidência do acréscimo legal. De Jesus

(1999, p. 150), traz o seguinte exemplo:

Imagine-se que o sujeito, processado por vários crimes de dano qualificado (Código Penal, art. 163. Parágrafo único), venha a ser condenado a um ano de detenção: pena-base fixada em oito meses de detenção, com acréscimo da metade. Para efeitos da prescrição retroativa deve ser considerada a pena de oito meses de detenção, ocorrendo o prazo extintivo em dois anos. Se fosse levado em conta o acréscimo, o prazo prescricional seria de quatro anos.

O mesmo ocorre nos casos da hipótese do art. 71 do Código Penal (crime

continuado), igualmente devendo ser considerado o quantum fixado sem a consideração do

aumento legal, incidindo o estabelecido na súmula 497 do primitivo STF, que determina:

“ quando se trata de crime continuado, a prescrição regula-se pela pena imposta na sentença,

45 Art. 119. No caso de concurso de crimes, a extinção da punibilidade incidirá sobre a pena de cada um , isoladamente.

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não se computando o acréscimo decorrente da continuação.” Assim, deve ser considerada a

pena de cada uma das condenações isoladamente, se iguais, ou a mais gravosa se diversas,

desconsiderando-se o aumento. (DE JESUS, 1999, p. 150)

A sentença condenatória é considerada publicada quando o Juiz a entrega ao

escrivão, independente do registro e de outras diligências, nos termos do art. 389, do Código

de Processo Penal, caso contrário a fixação do prazo ficaria ao cargo do escrivão, o que não é

previsto por lei. (DE JESUS, 1999, p. 160)

Relativamente a prescrição retroativa, o recebimento de eventual aditamento à

denúncia não interrompe o prazo prescricional, nem constitui seu termo a quo, excetuados os

casos em que o aditamento relata fato criminoso novo, caso em que o despacho que recebe o

aditamento da denúncia consistirá o termo de início do prazo tão somente em relação do novo

delito. (DE JESUS, 1999, p. 161)

Não constituindo a sentença absolutória em causa interruptiva do prazo prescricional,

havendo recurso da acusação, o prazo prescricional deverá ser considerado entre a data do

acórdão e a do recebimento da denúncia ou da queixa, ou entre esta e a data do delito,

podendo ser declarada pelo Tribunal no próprio acórdão condenatório. Sendo prolatada

sentença condenatória que depois venha a ser anulada, esta não constituirá causa interruptiva

ou impeditiva do transcurso do prazo prescricional, sendo considerado o prazo de nova

sentença que venha a prolatada em lugar da anulada. (DE JESUS, 1999, p. 162)

Assim por exemplo se o prazo prescricional couber, contando retroativamente, entre

a data em que a sentença condenatória foi publicada e data em que houve o recebimento da

denúncia, caberá a extinção da punibilidade nos termos do art. 110 § 2° do Código Penal.

Desde que transitada em julgado para a acusação, seja da sentença até a denúncia ou

da denúncia até a data da consumação ou prática do último ato de execução no caso de

tentativa (art, 14, inciso II, do Código Penal) extingue-se a pretensão punitiva.

Deste modo, verifica-se que o reconhecimento da prescrição retroativa não é

impedido pela presença de recurso do réu posto que esta deverá ser apreciada antes do mérito,

somente o recurso da acusação que vise agravação da pena, impede a prescrição retroativa;

julgado improcedente, o recurso da acusação não impede o princípio retroativo, podendo ser

reconhecido no tribunal; a prescrição retroativa atinge a pretensão punitiva, rescindindo a

sentença condenatória e seus efeitos principais e acessórios; a prescrição da pretensão

punitiva não pode ser reconhecida na própria sentença condenatória , portanto é de

competência superior pela via da apelação, revisão ou pela via do habeas corpus.

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Consolidado o instituto da prescrição retroativa em nosso ordenamento, passados

algum tempo, surgiram decisões de primeiro grau de jurisdição reconhecendo a ocorrência da

prescrição retroativa antes de prolatada a sentença, com base em uma “presunção de pena a

ser aplicada”, o denominou-se prescrição ficta ou antecipada, que será posteriormente

abordada.

2.1.2 Prescrição Intercorrente ou Superveniente.

É uma segunda espécie de prescrição da pretensão punitiva e tem também o seu

prazo regulado pela pena aplicada na decisão condenatória e não na pena em abstrato,

contando-se o prazo para o futuro, a partir da publicação da sentença condenatória.

Em precisa análise das figuras do art. 110 do Código Penal, assinala Delmanto

(2002, p. 223):

Este dispositivo contém, na verdade, três formas distintas de prescrição: 1°) No caput, disciplina a prescrição da pretensão executória (ou “da condenação”). 2°) No § 1°, a que o precedente art. 109 faz remissão e ressalva expressas, está a chamada prescrição subseqüente à sentença condenatória (ou superveniente a condenação). 3°) Pela conjunção dos seus §§ 1° e 2°, também combinados com aquela exceção resguardada pelo art. 109, encontra-se a prescrição retroativa. As três formas têm em comum conterem a prescrição pela pena fixada em concreto, e não pelo máximo previsto em abstrato pela alei ao crime. Todavia, embora inscritas todas num só artigo, não pertencem à mesma espécie prescricional. Enquanto a primeira (1ª) concernente a à prescrição da pretensão executória, as duas últimas (2ª e 3ª) dizem respeito à prescrição da pretensão punitiva.

Analisadas as demais figuras mencionadas acima, passasse a prescrição da prescrição

intercorrente, fixada no parágrafo primeiro do art. 110, do Código Penal, que é modalidade de

prescrição da pretensão punitiva, posto que incide sobre período anterior ao trânsito em

julgado para ambas as partes, tendo por base de fixação o quantum da pena aplicada, na

sistemática do art. 109, do Código Penal, incidindo sob lapso temporal decorrido entre a data

da publicação da sentença condenatória recorrível e a data do transito em julgado definitivo

desta decisão, o que somente ocorrerá após exauridos dos recurso legais ou não sendo estes

interpostos, não incidindo a prescrição se for provido recurso da acusação, que poderá ser do

Ministério Público ou do assistente que implique em aumento da pena, qualquer que seja o

seu aumento. (MIRABETE, 1999, p. 414; COSTA JÚNIOR, 2002, p. 326)

Leal (2004, 602) assinala dois períodos de incidência da prescrição superveniente à

sentença condenatória, o primeiro decorrido entre a data da publicação da sentença e a

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47

intimação do acusado, o segundo entre esta intimação e o trânsito em julgado da decisão

final.46

Não havendo recurso por parte da acusação que vise o aumento da pena, esta não

poderá mais ser agravada, nos termos do art. 617, do Código de Processo Penal,47 que

consagra o princípio da non reformatio in pejus. Assim, fixado o limite máximo da pena, este

será a base para o cálculo prescricional, ainda que incidam outros recursos que não impliquem

em aumento da pena. E ainda que haja recurso por parte da acusação que vise o aumento da

pena, caso este seja improvido, incidirá a prescrição intercorrente, o que também ocorrerá

caso o recurso seja provido, porém, ainda que considerando seu aumento, transcorra

integralmente o prazo prescricional, considerando a nova pena fixada. (BONFIM e CAPEZ,

2004, p. 863)

A prescrição intercorrente não poderá ser declarada em primeira instância, posto que

esgotada sua atividade jurisdicional com a prolação da sentença condenatória, devendo ser

apreciada pela segunda instância antes do mérito da causa, ou após julgar o recurso da

acusação que vise o aumento da pena, sendo este provido ou não, e havendo tão somente a

imposição de medida de segurança, a prescrição será calculada pelo limite mínimo da pena

abstratamente aplicada. (BONFIM e CAPEZ, 2004, p. 864)

Em que pese a orientação trazida pela Súmula 220, 48do Superior Tribunal de Justiça,

no sentido de que a reincidência somente incida no aumento da prescrição em relação à

pretensão executória, Mirabete (2000, p. 415) aponta ter sido considerado pelo tribunal antes

mencionado a incidência de tal causa de aumento do prazo prescricional, quando tratar-se de

prescrição intercorrente, embora trate esta de prescrição da pretensão punitiva afirmando ser

consistente o argumento de que tal aumento deva incidir nesta modalidade prescricional por

estarem ambas disciplinadas no mesmo dispositivo.49

Delmanto (2002, p. 225) assinala três possibilidades de incidência da prescrição

intercorrente, a primeira nos casos em que ocorra o trânsito em julgado de sentença

condenatória somente para a acusação; nos casos em que a acusação recorra e seu recurso seja

improvido ou mesmo que provido não altere o prazo de fixação da prescrição; a terceira

hipótese trata dos casos em que o acusado seja absolvido em primeira instância e condenado

46 No mesmo sentido: DELMANTO, 2002, p. 225. 47 Art. 617. O Tribunal, câmara ou turma atenderá nas suas decisões ao disposto nos arts. 383, 386 e 387, no que for aplicável, não podendo, porém, ser agravada a pena, quando somente o réu houver apelado da sentença. 48 Superior Tribunal de Justiça, Súmula 220. A reincidência não influi no prazo da prescrição da pretensão punitiva. 49 Pela não consideração do aumento relativo a reincidência (art. 110, caput, in fine): DELMANTO, 2002, p.226.

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em segunda instância, caso em que a prescrição intercorrente terá como marco inicial a

publicação desta decisão condenatória, e marco final o trânsito em julgado desta.

2.1.3 Fixação do prazo prescricional.

Imposta na sentença condenatória a pena privativa de liberdade, esta será base para a

fixação do prazo prescricional, incidindo sobre um dos incisos do art. 109 do Código Penal,

caso seja aplicada pena restritiva de direitos, o prazo será fixado nos termos do parágrafo

único do referido artigo; caso seja aplicada a pena de multa, o prazo será de 02 (dois) anos,

nos termos do art. 114, do Código Penal; estando sujeito as causas de diminuição previstas no

art. 115, do Código Penal, não sendo considerado o aumento relativo a reincidência.50 Nos

casos em que ocorram as figuras do crime continuado ou dos concursos formal ou material, o

prazo prescricional será regulado pela pena de cada um deles isoladamente, não considerando-

se os acréscimos decorrentes do concurso ou da continuação. (DELMANTO, 2002, p. 226)

Os efeitos advindos da declaração da prescrição intercorrente são os próprios da

extinção da pretensão punitiva, na forma antes mencionada.

2.2 PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO EXECUTÓRIA

A prescrição da pretensão executória consiste na perda que o Estado sofre de

executar seu poder-dever de concretizar a sanção imposta na sentença penal condenatória, em

face da inércia ou da sua incapacidade de fazê-lo depois de decorrido determinado espaço de

tempo fixado em lei. (BONFIM e CAPEZ, 2004, p. 867)

Também denominada de prescrição da pena ou da condenação, esta inicia depois de

transitar em julgado a sentença condenatória, quando surge para o Estado a possibilidade de

efetivar sua pretensão executória, ou seja, executar a aplicação da sanção estabelecida na

sentença, o que somente se dará com a observância do devido processo legal, estando o

Estado, tal qual no exercício da pretensão punitiva, sujeito à determinado tempo fixado em lei

para a imposição da sanção, sendo determinada a fixação deste prazo com base na pena

concretizada na condenação, seguindo-se as diretrizes do art. 109, do Código Penal, conforme

antes assinalado. Esta está disposta no art. 110, caput, do Código Penal, estabelecendo que em

sendo fixado o quantum da pena, este servirá de base de cálculo para a prescrição, havendo

majoração deste quantum nos casos em que o agente for reincidente, conforme determina o in

50 E sentido contrário: MIRABETE, 2000, p. 415.

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fine do art. 110, se assim o for reconhecido na sentença condenatória. (LEAL, 2004, p. 599 -

601)

O direito de punir do Estado, agora em efetivamente aplicar a execução da pena já

fixada tem efeito ex nunc em relação a execução da pena e ex tunc quanto ao direito de punir.

Cumprida parte da pena, e em ocorrendo a fuga do sentenciado, o prazo prescricional passará

a ser contado pelo resto da pena a ser aplicada, o que também ocorre nos casos de livramento

condicional. (DELMANTO, 2002, p. 224)

Sobre o tema, assinala Porto (1988, p. 25), que tornando-se imutável a sentença

condenatória inicia-se a contagem do prazo para que seja imposta a sanção estabelecida,

trazendo da dos históricos apontando que na legislação anterior ao Código de 1940, era

chamada de “prescrição da condenação”, e que o Código de 1969, que não chegou a entrar em

vigor, chamava-a de “prescrição da pena”, o atual Código denominou -a de “prescrição depois

de transitar em julgado a condenação”.

O termo inicial para a contagem do prazo deveria ser a data do trânsito em julgado

para a ambas as partes, no entanto, por força do disposto no art. 112, inciso I, o termo inicial é

o dia do trânsito em julgado para a acusação, computando-se o dia do começo, nos termos do

art. 10 do Código Penal. Caso o réu esteja preso em virtude do processo em que foi

condenado o cumprimento da pena passa a ser imediato, não iniciando a fluir o prazo

prescricional que será retomado somente no caso de evasão do sentenciado. (PORTO, 1988,

p. 81-82)

Caso durante o cumprimento da reprimenda corporal sobrevenha ao sentenciado

doença mental, este deverá ser encaminhado para tratamento, computando-se o tempo da

internação ao de cumprimento da pena, não ocorrendo o curso do prazo prescricional durante

tal período, nos termos do art. 112, II., do Código de Processo Penal, segunda parte,

aplicando-se o princípio da detração, nos termos do art. 42 do Código Penal.51 Nos casos de

condenação como a substituição da pena restritiva de direito aplicada por outra modalidade de

pena ou de indulto parcial (diminuição da pena), regula-se em ambos os casos pela nova pena,

o que também ocorre nos casos de diminuição da pena pela via da revisão criminal ou de

recurso extraordinário. (DE JESUS, 1999, p. 101-104)

A declaração da prescrição da pretensão executória do Estado fica impedido da

execução das penas e da medida de segurança (Código Penal, art. 96, § único), subsistindo as

51 Art. 42 Computam-se, na pena privativa de liberdade e na medida de segurança, o tempo de prisão provisória, no Brasil ou no estrangeiro, o de prisão administrativa e o de internação em qualquer dos estabelecimentos do artigo anterior.

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conseqüências de ordem secundária da sentença condenatória, como o lançamento do nome

do réu no rol dos culpados, pagamento das custas processuais, reincidência (salvo o disposto

no art. 64, inciso I)

2.3. EFEITOS DA DECLARAÇÃO DA PRESCRIÇÃO PUNITIVA E EXECUTÓRIA.

A ocorrência da prescrição de fato, é causa de obstando o início ou seguimento da

investigação policial, posto que possibilitando o trancamento de inquérito policial, ou impede

o seguimento da persecução penal; afastando os efeitos principais e secundários, penais e

extrapenais da condenação; a condenação não constará como antecedentes, ficando proibido o

fornecimento de certidão positiva mencionando o fato criminoso como antecedentes, salvo

nos casos de requisição judiciária, igualmente não permanecendo os efeitos de caracterização

de eventual reincidência. (DE JESUS, 1999, p.153-154; PORTO, 1988, p. 82)

No atual sistema da prescrição retroativa e intercorrente, extinta a punibilidade por

esta via, não subsistem quaisquer efeitos da sentença condenatória quer principais ou

acessórios, somente tendo eficácia para a fixação da quantidade da pena que regula o prazo

prescricional. (DE JESUS, 1999, p.152)

Favorecido o réu com a declaração da punibilidade pela via da prescrição retroativa,

não haverá impedimento, no caso de posterior condenação, da concessão do benefício da

substituição da pena, art. 44 do Código Penal, ou da concessão do sursis (art. 77 do Código

Penal), poderá, ainda, ser beneficiado com o livramento condicional, se preenchidos os

demais requisitos. E nos casos em que goze o réu do benefício do sursis, vindo a ser

condenado com posterior extinção da punibilidade em sua forma retroativa, torna-se

inaplicável o disposto no art. 81, inciso I do Código Penal. (DE JESUS, 1999, p.154-155)

A sentença condenatória que foi extinta a punibilidade pela ocorrência da prescrição

retroativa, não impede, ainda, a concessão de fiança em caso de novo delito, bem como não

será fundamento para a decretação da prisão preventiva. (DE JESUS, 1999, p.156)

Ao tempo da incidência da Súmula 146 do Superior Tribunal Federal, a execução da

sentença condenatória para efeitos da reparação do dano era obstada, sendo igualmente

impedido o confisco (art. 91, inciso II do Código Penal), o que também ocorria em relação ao

seqüestro, nos termos do art. 131, inciso III, do Código Penal. Havendo mais de um réu que

apele da sentença condenatória, em julgamento de segundo grau, se cabível a prescrição

retroativa, o Tribunal ou Turma de Recurso deverá declará-la de ofício. (DE JESUS, 1999. p.

152-157)

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Declarada a prescrição da pretensão executória, desaparece apenas o direito de

executar a pena, mantendo-se os demais efeitos da condenação, mantendo-se o nome do réu

no rol de culpados, permanecendo a obrigação de pagamento das custas processuais e os

efeitos para a caracterização da reincidência, e a obrigação da reparação do dano, esta

extingue tão somente a pena principal, subsistindo todos os demais efeitos penais e

extrapenais da sentença condenatória. (BONFIM e CAPEZ, 2004, p. 867, DE JESUS, 1999,

p. 95)

Salvo o disposto no artigo 64, I do Código Penal, acerca do prazo de 5 anos após o

cumprimento da condenação o réu não é considerado reincidente. Ainda cabe ao condenado

que efetuou a prestação de fiança, seu valor não obstante a extinção da punibilidade, ficando

sujeito ao pagamento das custas e reparação do dano (Código de Processo Penal art. 336 e

parágrafo único). (DE JESUS, 1999, p. 95)

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3. PRESCRIÇÃO ANTECIPADA

É próprio das ciências jurídicas a transformação de seus institutos adequando-os aos

anseios sociais, além da natural evolução na interpretação destes, partindo-se do pressuposto

de que a aplicação das leis deve considerar não os dispositivos legais isoladamente, mas

inseridos dentro de toda uma sistemática jurídica considerando todos seus princípios de

direito material e processual, e neste caminho evolutivo modalidades prescricionais advinda

da evolução exegética já foram incorporadas ao ordenamento jurídico, como a prescrição

retroativa, que teve iniciada sua aplicação ainda antes de regulada por lei, passando por todo

um processo de incorporação ao ordenamento jurídico pátrio, iniciando com a aplicações

interpretativas isoladas, até tornar-se matéria sumulada e posteriormente incorporada ao

ordenamento jurídico, permanecendo certos pontos controversos na doutrina e restrições a sua

aplicação, que deverão ainda permanecer nas argumentações doutrinárias por muito tempo.

A prescrição antecipada é também denominada de prescrição virtual, em perspectiva,

projetada ou ficta, seguindo o mesmo caminho da prescrição retroativa, iniciou sua aplicação

em diversas unidades jurisdicionais mesmo sem previsão legal, a matéria é tema bastante

controversa não sendo abordado, ainda, com a necessária profundidade pelos tradicionais

manuais relativos à matéria penal, já havendo posicionamento dos tribunais superiores no

sentido de não acolher-se tal modalidade prescritiva, no entanto algumas câmaras de tribunais

regionais dão alguns sinais de sua consideração, relativamente a certos casos específicos,

ainda timidamente, tratando-se de “criação” jurisprudencial relativamente recente, consistente

no reconhecimento da prescrição retroativa antecipadamente, ou seja, antes que seja proferida

a sentença de mérito, que é condição para o reconhecimento da prescrição retroativa, podendo

incidir tal qual esta ainda na fase extrajudicial, ou durante a persecução processual, portanto

modalidade de prescrição da pretensão punitiva, tendo seu prazo fixado a partir de hipotética

pena que seria eventualmente fixada no momento da condenação.

Leal (2004, p. 594) também asseverando que os institutos jurídicos encontram-se em

constante evolução aborda tal modalidade prescricional, indicando que esta ocorre quando o

julgador, na análise do caso concreto, é convencido de que no momento de eventual sentença

condenatória já teria decorrido o prazo prescricional, tendo por base eventual pena a ser

aplicada.

Mirabete (2000, p. 418) aponta como fundamento da prescrição antecipada a

carência do interesse de agir, e visando evitar o desgaste do prestígio do Judiciário, o que

justificaria a aplicação da modalidade prescritiva estipulada no parágrafo primeiro do art. 110,

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do Código Penal de forma antecipada, tendo por base hipotética pena a ser aplicada, levando

em consideração as circunstâncias do caso concreto, sendo possível antever-se a ocorrência da

prescrição.

Jawsnicker (2004, p.81) aponta serem favoráveis ao reconhecimento da prescrição

retroativa de modo antecipado os doutrinadores C. R. Bittencourt, Luiz Vicente Cernicchiaro,

René Ariel Dotti, Rogério Felipeto, Júlio Fabrini Mirabete, Osvaldo Palotti Júnior, Antônio

Rodrigues Porto, E. R. Zaffaroni e J. H. Pierangeli, sendo apontados em posicionamento

contrário ao seu reconhecimento Edison Aparecido Brandão, Maurício Antônio Ribeiro

Lopes, Paulo Martini, Sídio Rosa de Mesquita Júnior, Antônio F. Scheibel Padula, Dagoberto

Romani, Andrei Zenkner Schimidt e Luiz Sérgio Fernandes de Souza.

Os argumentos favoráveis ao seu reconhecimento são a carência de ação por falta de

interesse de agir, na modalidade necessidade, quando se vislumbra inevitável a ocorrência da

prescrição antecipada, posto que o seguimento da ação não surtiria qualquer efeito no mundo

jurídico, como será adiante esclarecido, bem como a desnecessidade de dispêndio de tempo e

o desgaste do prestígio da Justiça Pública, livrando o réu da penalização decorrente da

morosidade da justiça, evitando as aflições provocadas pela lide penal, o que é fundamento da

prescrição conforme já apreciado, e, por fim, a instrumentalidade do processo (Jawsnicker,

2004, p.82)

Em contraponto aos argumentos antes mencionados, os doutrinadores contrários ao

reconhecimento da prescrição antecipada tem como principal fundamento o fato de não haver

previsão legal para tal modalidade de prescrição, e que este contrariaria uma série de

princípios do Direito, como o da legalidade, da obrigatoriedade, da ampla defesa, do

contraditório, do devido processo legal e da presunção de inocência, sustentando, ainda, que o

reconhecimento da prescrição retroativa antecipadamente desprezaria a correta prestação

jurisdicional, ignorando a possibilidade de mutatio libelli, argumentado que os efeitos civis da

condenação constituiriam um óbice à aceitação do reconhecimento antecipado da prescrição

retroativa e, por fim, não ser possível antever-se eventual pena a ser aplicada. (Jawsnicker,

2004, p.82)

Jawsnicker (2004, p.80) nos da um exemplo que deixa muito claro o entendimento:

A foi denunciado por desacato (Código Penal, art. 331)52, crime que prescreve em 4 (quatro) anos, uma vez que o grau máximo da pena privativa de liberdade cominada é 2 (dois) anos (CP, art. 109, inc. V)53 Ao analisar o processo, o juiz constata que A é

52 Art. 331 - Desacatar funcionário público no exercício da função ou em razão dela: Pena - detenção, de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos, ou multa. 53 Art. 109 - A prescrição, antes de transitar em julgado a sentença final, salvo o disposto nos §§ 1º e 2º do art. 110 deste Código, regula-se pelo máximo da pena privativa de liberdade cominada ao crime, verificando-se:

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primário e tem bons antecedentes e que não existe agravantes ou causas de aumento de pena. Além disso, constata que já passaram mais de 2 (dois) anos desde a data da consumação do crime. Com base nessas constatações, o juiz conclui que, ainda que A fosse condenado, a sua pena não ultrapassaria o mínimo legal, ou seja, 6 (seis) meses. Como uma pena de 6 (seis) meses prescreve em 2 (dois) anos (CP, art. 109. inc. VI)4, o juiz deixa de receber denúncia, reconhecendo antecipadamente a prescrição retroativa.

Conforme se verifica, o reconhecimento da prescrição retroativa de modo

antecipado, presumindo a potencial fixação da reprimenda que seria imposta a A no caso de

eventual condenação, ocasionando por conseqüência o dispêndio de tempo com um processo

fadado à extinção da punibilidade, por antever-se ser esta uma ação natimorta, o que poderia

tornar-se mais evidente acrescentando-se ao exemplo a hipótese de incidir o disposto no art.

115, do Código Penal, que faria reduzir tal prazo em metade caso o agente fosse menor de 21

anos à época dos fatos ou maior de 70 anos no momento da condenação.

A aplicação da prescrição retroativa antecipadamente tem diversos pontos de

embasamento, sendo o principal destes a falta de interesse de agir, e o principal contraponto a

sua falta de previsão legal e a impossibilidade de proceder-se a cognição exauriente antes do

momento da sentença de mérito, o que, igualmente vem embasado em fortes argumentos.

Assim, cumpre efetuar-se uma análise no tocante aos argumentos doutrinários e

jurisprudenciais favoráveis e contrários ao reconhecimento da prescrição retroativa.

3.1 PRESCRIÇÃO ANTECIPADA E O INTERESSE DE AGIR

A aplicação da prescrição retroativa antecipadamente tem seu principal fundamento

na carência do interesse de agir, o que imporia a falta de justa causa para a instauração do

processo criminal ou ao seu seguimento, consoante a teoria geral do processo, posto que

faltaria uma das condições essenciais da ação, que são a possibilidade jurídica do pedido, a

legitimidade das partes e o interesse de agir, assim, segundo corrente majoritária, a falta do

interesse de agir na modalidade necessidade tornaria o Estado ou o querelante destituídos do

interesse de agir para a instauração ou seguimento do feito, posto que em dando seguimento

ao processo este não atingirá qualquer utilidade, sendo portanto desnecessário.

(JAWSNICKER, 2004, p. 82; TOURINHO FILHO, 2001, p. 163-164; BONFIM e CAPEZ,

2004, p. 866)

Conceituando as condições da ação Santos (2002, p.168, 169) afirma:

V - em 4 (quatro) anos, se o máximo da pena é igual a 1 (um) ano ou, sendo superior, não excede a 2 (dois); VI - em 2 (dois) anos, se o máximo da pena é inferior a 1 (um) ano.

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...são requisitos que esta deve preencher par que se profira uma decisão de mérito. São, pois, as condições da ação apreciadas e decididas como preliminares da sentença de mérito quanto à pretensão”, e no específico do interesse de agir este dispões que “o interesse de agir é um interesse secundário, instrumental, subsidiário, de natureza processual, consistente no interesse ou necessidade de obter uma providência jurisdicional quanto ao interesse substancial contido na pretensão.

Acrescente-se que a presença das condições da ação não devem existir somente no

momento do recebimento da denúncia ou da queixa, esta deve manter-se íntegra durante toda

a instrução processual. (JAWSNICKER, 2004, p. 91)

Ao receber a denúncia o magistrado deverá proceder a análise do preenchimento dos

requisitos estabelecidos no art. 41, do Código de Processo Penal,54 e presentes estes

requisitos, proceder-se-á a apreciação do requisitos dispostos no art. 43,55 do mesmo diploma

processual, que estabelece hipóteses em que a denúncia deve ser rejeitada, incluindo entre

estas, em seu inciso terceiro, a obrigatoriedade da rejeição da denúncia quando a ação carecer

de qualquer das condições exigidas por lei, estando disposto no inciso segundo do mesmo

dispositivo, a obrigatoriedade da rejeição da denúncia quando for reconhecida a prescrição.

(DE JESUS, 2002, 55-59)

Ao promover a instauração do processo criminal o Estado tem por interesse a

aplicação da reprimenda prevista ao tipo infringido, devendo esta possibilidade manter-se

íntegra durante toda a instrução do feito, ausente esta possibilidade, igualmente, estará ausente

o interesse de agir. Nos uso da analogia interpretativa do art. 462, do Código de Processo

Civil, que estabelece:

...se, depois da propositura da ação, algum fato constitutivo, modificativo ou extintivo do direito influir no julgamento da lide, caberá ao magistrado tomá-lo em consideração, de ofício ou a requerimento da parte, no momento de proferir a sentença.

Assim, ausente o interesse de agir sobre a lide penal, por analogia, impor-se-ia a

extinção do processo sem julgamento do mérito nos termos do artigo 267, inciso, IV, do

Código de Processo Civil, acrescente-se que tal interpretação no uso da analogia não recai

sobre a apreciação da prescrição em si, posto ser vedado o uso de tais recursos em sua

interpretação, conforme antes mencionado, tal interpretação refere-se tão somente a aplicação

da interpretação civilista relativa as condições da ação. (JAWSNICKER, 2004, p. 87)

54 Art. 41. A denúncia ou a queixa conterá a exposição do fato criminoso, com todas as suas circunstâncias, a qualificação do acusado ou esclarecimentos pelos quais se possa identificá-lo, a classificação do crime e, quando necessário, o rol das testemunhas. 55 Art. 43. A denúncia será rejeitada quando: I – o fato narrado evidentemente não constitui crime; II – já estiver extinta a punibilidade, pela prescrição ou outra causa; III – for manifesta a ilegitimidade da parte ou faltar condição exigida pela lei para o exercício da ação penal.

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Na análise do referido fundamento Jawsnicker (2004, p. 87) destaca o seguinte

julgado:

Prescrição retroativa. Reconhecimento antecipado considerada a pena em perspectiva. Denúncia rejeitada sob tal fundamento. Admissibilidade. Disposições dos arts. 41 e 43 do CPP que não limitam o exame da peça introdutória da ação penal. Interesse de agir inexistente, por falta de utilidade do provimento jurisdicional.. As disposições dos arts. 41 e 43 do CPP não limitam sob exclusividade o exame da peça introdutória da ação penal. O universo jurídico presente à atividade do juiz em tal momento leva-o ao exame dos pressupostos processuais e condições de exercício da ação. E no exame do interesse de agir não se pode arredar a verificação da utilidade do provimento jurisdicional. Se inútil este, ainda que procedente a ação, de se reconhecer a ausência daquele. Assim, pode o juiz rejeitar a denúncia arrimado na inutilidade de uma condenação já de antemão alcançada pela prescrição da ação penal, considerada a pena em perspectiva. [...] As disposições dos arts. 41 e 43 do estatuto processual penal não limitam, sob exclusividade, o exame da peça introdutória da ação penal. O universo jurídico presente à atividade do juiz, no momento de verificação da admissibilidade da ação penal, leva o juiz ao exame de todos os pressupostos processuais e condições de exercício da ação. Projeta-se evidente que há possibilidade jurídica em torno do pedido, eis que se imputa ao denunciado uma conduta descrita na lei penal, isto é, típica. A legitimidade para agir não é posta em dúvida, em face da presença do Ministério Público no pólo ativo da relação que se iniciara. O punctum pruriens da questão envolve o tema do interesse de agir. É evidente que o interesse de agir tem sabor processual. Conquanto se admita que a utilização da via jurisdicional, no ato de acusar, não leva, inexoravelmente, à imposição de pena, cabe averbar-se que o exercício da ação sob indiscutível tom de falência quanto à aplicação concreta da reprimenda revelar-se-ia atividade sem qualquer utilidade, eis que o provimento jurisdicional, se procedente a ação, desembocaria na prescrição da pretensão punitiva estatal, ante a pena concretizada. No exame do interesse de agir não se pode arredar a verificação da utilidade do provimento jurisdicional. Se inútil o provimento jurisdicional, ainda que procedente a ação, é de reconhecer-se a ausência de interesse de agir.

Conforme se verifica do julgado em comento, ao recebimento da denúncia deve o

magistrado verificar, dentre outros elementos, a utilidade da prestação jurisdicional,

considerando ser cabível ou não o recebimento da denúncia, se possível verificar-se a

inutilidade deste antevendo-se a fatal ocorrência da prescrição retroativa, e segue lançando,

ainda, os seguintes fundamentos:

A máquina estatal, movimentada pelo autor da ação, busca atingir um objetivo concreto, útil, afastada a idéia de seu uso em mera atmosfera abstrata. O mundo do Direito pode não posturar-se em tom fenomênico inteiramente dissociado do mundo concreto. A vinculação entre o fato da vida e o mundo do Direito, na esfera processual penal, é indicada, desde logo, pelo princípio da consubstanciação, que exige, no oferecimento da denúncia, a apuração do fato e autoria imputada, através de inquérito policial de documentos. Mantida a interligação entre os fatos e o mundo jurídico, verifica-se, na temática debatiam que não se pode abstrair o resultado concreto de eventual condenação, no exame de interesse de agir.

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Não há interesse de agir se a pena em perspectiva, uma vez concretizada, leva ao reconhecimento da prescrição da ação penal. O denunciado é primário, trata-se de concurso formal em crimes de lesões corporais culposas. Revela-se indiscutível, no plano do id quod plerumque accidit, que a reprimenda não chegará ao limite máximo de um ano. Situando-se em quantum inferior a um ano a pena em perspectiva, a prescrição da pretensão punitiva já se definiu, eis que o fato é de 13.07.1987, sob prazo de dois anos.

A justificativa do reconhecimento da falta de interesse de agir, no presente caso, é

fundada na admissão da possibilidade de abstrair-se o resultado concreto, ao qual se chega

considerando a incidência de eventuais causas de aumento da pena, podendo-se afirmar que

tão somente na consideração dos elementos trazidos pelo inquérito policial, foi antevista, com

base nos dados ali constantes, eventual pena a ser aplicada, procedendo-se a análise de

eventual dosimetria da pena.

Em sentido contrário, colhe-se o seguinte julgado proferido pela segunda Câmara

Criminal do Tribunal de Justiça do Estado de Santa Catarina:

RECURSO CRIMINAL - SENTENÇA QUE DECRETOU EXTINTA A PUNIBILIDADE DO DENUNCIADO – INADMISSIBILIDADE - PRESCRIÇÃO CALCULADA EM PENA HIPOTETICAMENTE FIXADA - NULIDADE DA DECISÃO MONOCRÁTICA - RECURSO MINISTERIAL PROVIDO. [...] ACORDAM, em Segunda Câmara Criminal, por votação unânime, dar provimento ao recurso ministerial. [...] Assiste razão ao Órgão Ministerial! Primeiramente, destacam-se as palavras do doutrinador Julio Fabbini Mirabete, no que tange ao tema da prescrição: “Prescri ção é a perda do direito de punir do Estado pelo decurso do tempo. O desaparecimento do interesse estatal na repressão do crime, em razão do tempo decorrido, justifica o instituto, perdendo a sanção penal sua finalidade quando o infrator não reincide e se readapta à vida social. Ocorrido o crime, nasce para o Estado a pretensão de punir o autor do fato criminoso, que deve ser exercida dentro de determinado lapso temporal, que varia de acordo com a figura criminosa e segundo o critério do máximo cominado em abstrato da pena privativa de liberdade. Escoado esse prazo, que é submetido a interrupções ou suspensões previstas em lei, ocorre a prescrição da pretensão punitiva, chamada impropriamente de prescrição da ação penal.” Nessa hipótese, que ocorre sempre antes de trânsito em julgado da sentença condenatória, são totalmente apagados todos os seus efeitos civis, administrativos, processuais etc., que decorreriam do processo ou da sentença condenatória.” (Código Penal Interpretado, 2ª ed., SP: Atlas, 2001, págs. 657/658). [...] A prescrição de pretensão punitiva do Estado, utilizando-se como base de cálculo suposta pena a ser concretizada numa possível e futura sentença condenatória, inexiste em nosso ordenamento jurídico. O MM. Juiz de Direito de primeiro grau fundamentou que a reprimenda para o delito de lesão corporal de natureza grave não superaria o patamar do mínimo legal, desconsiderando, ainda, a menoridade (fls. 02, 14 e 15). Por estes motivos, foi decretada a prescrição, com perda do interesse processual. Todavia, impossível o reconhecimento desse tipo de prescrição. Esta é a posição e o entendimento de Damásio E. de Jesus:

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“A declaração da extinção da punibilidade pela prescrição retroativa pressupõe a existência de uma sentença condenatória. Em face disso, não pode ser reconhecida antes da condenação” (Prescrição Penal, 2ª ed., SP: Saraiva, p. 145). E da jurisprudência, colheu-se os seguintes ensinamentos: “Pretendido trancamento da ação penal, pela extinção da punibilidade, segundo a pena a ser ainda concretizada em futura sentença. Inadmissibilidade. Writ indeferido. Antes da sentença a pena é abstratamente cominada e o prazo prescricional se calcula pelo máximo, não podendo ser concretizada por simples presunção.” (STF – RT 639/389). [...] “A p rescrição antecipada toma como referência dado aleatório, ou seja, suposta data de trânsito em julgado de sentença condenatória, ou hipotética condenação. Há evidente obstáculo constitucional. A condenação não pode ser aceita pela parte. Urge desenvolver o processo em todas as etapas. Só a sentença gera status de condenado. Impor-se-iam, ademais, todas as conseqüências, de que são exemplos configuração de antecedente penal e título executório no cível. Insista-se, inadmissível em nosso quadro constitucional. A condenação reclama o devido processo legal.” (RSTJ 68/970, JC 80/665, Rel. Des. Nilton Macedo Machado). [...] A prescrição da pretensão punitiva com base na pena hipoteticamente aplicada, não é aceitável, porquanto a causa extintiva só pode ser analisada após a sentença que compor a lide penal, apreciando autoria, materialidade, tipicidade e culpabilidade. Em caso de condenação, aplica-se a pena e, com base no tempo decorrido, pode-se extinguir a punibilidade do agente por eventual prescrição da pretensão punitiva na forma retroativa. A extinção da punibilidade pela prescrição da pretensão punitiva antes da sentença só pode ocorrer em face da pena abstratamente considerada, nos prazos e forma previstos no artigo 109, do Código Penal. (sublinhei)

Como se verifica do supra sublinhado, o julgado em comento impôs a nulidade da decisão que declarou a prescrição em sua modalidade antecipada, sob o argumento da inexistência de previsão legal, o que imporia que o reconhecimento da prescrição antes da publicação da sentença condenatória somente poderia se dar com base no máximo da pena prevista in abstrato, também sendo aventada a impossibilidade de tal reconhecimento por ferir princípios constitucionais, como o devido processo legal.

Do corpo do mesmo julgado segue-se:

Sobre o tema em tela, extraiu-se do corpo do acórdão de apelação criminal n. 97.015819-0, as célebres asseverações do Exmo. Sr. Des. Nilton Macedo Machado, in verbis: “(...) temos os fundamentos impeditivos para tal reconhecimento da pr escrição antecipada: a) orientação legalista — não encontra respaldo na lei, não podendo o juiz fazer as vezes do legislador. Antes da sentença a pena é abstratamente cominada (art. 109, do CP) e o prazo se calcula pelo máximo, não podendo ser concretizada por simples presunção, diante de um arbitrário juízo de probabilidade. Na jurisprudência, vide, no Supremo Tribunal Federal (RT, 639/389) e no Superior Tribunal de Justiça, neste afirmando-se: ‘Delira da lógica e da legislação de regência pretender-se obter declaração de extinção da punibilidade pela prescrição retroativa, ponderada em face da pena concretizada, se a ação criminal a que submetido o paciente ainda pende de julgamento em primeira instância’ (RT 703/349); b) ocorreria a violação dos princípios constitucionais do contraditório, da ampla defesa, do devido processo legal e da presunção de inocência, consagrados no art. 5º, incisos LV, LIV e LVII, da CF, já que a decretação desta prescrição supõe ser o acusado culpado antes mesmo de uma efetiva sentença condenatória; c) o réu, enquanto não ocorreu a prescrição pela pena em abstrato, tem direito a uma decisão de mérito, pois poderá ser absolvido com reconhecimento de sua inocência;

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d) o magistrado não pode prever se a sentença será condenatória, e se assim não balizar sua conduta, certamente estará prejulgando um fato do qual não se fez prova em juízo, ferindo frontalmente o princípio do contraditório; e) durante o processo pode haver uma modificação ensejadora da emendatio ou da mutatio libelli (arts. 383, 384, par. único, 408, § 4º e 569, do CPP); f) dificilmente o julgador poderá formar uma convicção própria do iudicium causae, envolvendo diretrizes judiciais do art. 59, do CP, pois a própria apuração (ampla reconstituição fática), não se completou em razão do precário contexto probatório. Estará caracterizada, então, e deve ser repudiada, a ‘ditadura do caso concreto, havendo equívoco em substituir o arbítrio do julgador pelo arbítrio do juiz’ (Min. Ruy Rosado de Aguir, “Interpretação”, in Ajuris, 45/15).” [...] Em tese não é possível falar-se em prescrição da pretensão punitiva com base na pena em concreto sem que haja sentença condenatória; não é admissível o reconhecimento da prescrição tendo como fundamento um provável ou possível apenamento. Somente com a instrução completada é que o juiz, na sentença, pode aferir todos os elementos probatórios referentes às circunstâncias que influem na fixação da pena, que, em tese, pode atingir o máximo cominado abstratamente. (...) Com fundamento na falta de interesse de agir e para evitar desgaste do prestígio da Justiça Pública, também se tem afirmado que a prescrição referida no art. 110, §§ 1º e 2º pode ser reconhecida antecipadamente considerada a pena virtual, em perspectiva, tendo em vista as circunstâncias do caso concreto em que se antevê uma pena que certamente levaria à prescrição. Entretanto, nossos tribunais, entendendo que não é possível falar-se em prescrição com fundamento em pena aplicada por simples presunção, quando ainda não há sentença, não tem admitido tal interpretação.” (Código Penal Interpretado, 2ª ed., SP: Atlas, 2001, págs. 674 e 676). Portanto, não há como se declarar a prescrição retroativa para esta situação, pois a mesma é dada como impossível quando inexiste sentença condenatória transitada em julgado para a acusação. Tal sentença é indispensável, pois, aplicada a pena in concreto, determina-se e conta-se o prazo prescricional a partir desta pena, conforme determina os artigos 109 e 110, §§ 1º e 2º, do Código Penal. Assim, diante do exposto, dá-se provimento ao recurso ministerial, anulando-se a decisão que declarou extinta a punibilidade do recorrido, devendo o feito prosseguir nos ditames legais.56

Os fundamentos que dão base o decisório supra consignado encontram forte

consistência, posto tratarem da salvaguarda de princípios constitucionais, mas que devem ser

sopesados conjuntamente com os fundamentos que sustentam os entendimentos contrários.

Porém, é de ser afastada a mencionada presunção de culpa, posto que em que pese a

quantificação aproximada de eventual pena a ser aplicada, tal procedimento não aprecia a

ocorrência ou não da culpa.

Abordando a questão da interpretação das leis, Beccaria (2003, p.22-23) afirma que

seu aplicador deve abster-se de elaborar raciocínios em ralação a estas, restringindo-se tão

somente em proferir um silogismo perfeito, afirmando relativamente a prescrição que caberia

unicamente a lei determinar o espaço de tempo e as condições de sua aplicação afirmando que

“ se o juiz tivesse esse direito estaria exercendo as funções de legislador.

56 Tribunal de Justiça do Estado de Santa Catarina, Acórdão: 02.003746-0. DES. RELATOR: Sérgio Roberto Baasch Luz. Órgão Julgador: Segunda Câmara Criminal, em 23 de abril de 2002..

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Como os princípios acima mencionados, também os ensinamentos antes apontados

devem ser interpretados frente ao conjunto de ensinamentos, não visualizando-se estes

isoladamente, neste diapasão vale destacar o ensinamento de Beccaria relativo a utilidade,

onde este aponta ser falsa a idéia de que se deva preocupar-se mais com inconvenientes

particulares do que com os gerais, fazendo silenciar a razão e o pensamento, sacrificando

vantagens verdadeiras em receio de desvantagem em conjecturas. (BECCARIA, 2003, p. 94)

Com efeito, eventual declaração da perca do interesse de agir em função da

presunção de pena a ser aplicada, em que pese eventualmente contraposta a princípios e regras

de direito, de outro lado encontram-se, igualmente, outros princípios que não podem ser

desconsiderados, e nem sempre a acolhida de um em detrimento do outro afigura-se efetiva

violação deste.

3.2 A PRESCRIÇÃO ANTECIPADA E O PRINCÍPIO DA ECONOMIA PROCESSUAL

Segundo os preceitos do princípio da economia processual, em verificando-se a

disponibilidade de duas alternativas processuais deve-se optar pela que seja mais adequada de

modo a causar o mínimo de encargos para as partes. (MIRABETE, 2000, p. 49)

Segundo Antônio Lopes Baltazar (apud Jawsnicker, 2004, p. 94) temos:

o reconhecimento da prescrição retroativa, antes da sentença, com base na pena a que o réu seria condenado, evitando assim, o desperdício de tempo na apuração de coisa nenhuma, pois já se sabe, antecipadamente, que o resultado será a extinção da punibilidade.

A prescrição retroativa antecipada encontra elemento de fundamentação, também, no

princípio da economia processual, posto que seria inútil movimentar o sistema judiciário com

o seguimento de um processo visando o exercício do jus puniendi uma vez que este já teria

sucumbido de fato. (BONFIM e CAPEZ, 2004, p. 866)

Além dos argumentos próprios da economia processual, a aplicação da prescrição

antecipada também se mostra eficaz em evitar-se o dispêndio de recursos públicos, atendente

ao princípio da moralidade administrativa, (JAWSNICKER, 2004, p. 94)

Deste modo, verifica-se que observância do princípio da economia processual efetiva

não somente os fundamentos desta, mas também corrobora em benefício do Estado, evitando-

se o desgaste inútil de recursos e a possibilidade de evitar-se a prescrição em outros

processos, disponibilizando os recursos poupados no seguimento daqueles que efetivamente

possibilitem a efetivação dos efeitos de eventual sentença condenatória.

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3.3 O PROCESSO PENAL E O COSNTRANGIMENTO ILEGAL DO CAUSADO.

O constrangimento ilegal do processo criminal está intimamente ligado ao interesse

de agir, posto que nos casos em que o decurso do tempo já tenha exaurido a possibilidade da

aplicação da reprimenda, com a fatal incidência da prescrição antecipada, as aflições

decorrentes da imposição da persecução penal não se mostrariam legítimas, não havendo,

portanto, justa causa ao seguimento da ação penal, o que enseja a impetração de habeas

corpus, nos termos do art. 648, do Código de Processo Penal.57 (JAWSNICKER, 2004, p.

95/96)

Tal princípio também encontra amparo nos fundamentos da prescrição, conforme já

esclarecido, não sendo razoável que seja imposto ao acusado as mazelas da persecução penal

quando esta não surtirá qualquer efeito ante a ocorrência de fato da prescrição com base na

pena antevista.

É inegável que estar-se sobre a égide do processo penal causa angústias ao homem,

pois como bem assinalou Santo Agostinho (apud CARNELUTTI, 2001, p. 47) “ a tortura, nas

formas mais cruéis está abolida, ao menos sobre o papel; mas o processo por si mesmo é uma

tortura”.

3.4 A INSTRUMENTALIDADE DO PROCESSO E A PRESCRIÇÃO ANTECIPADA

A instrumentalidade do processo penal consiste na consideração deste como meio

legal de obtenção da tutela jurisdicional, como atividade meio, regendo todo o sistema de

interpretação das normas processuais com o fim de buscar-se a aplicação do direito material

com o provimento jurisdicional que resulte utilidade. (JAWSNICKER, 2004, p. 87;

MALCHER, 1999, p. 8-9)

Cintra, Grinover e Dinamarco (2000, p. 41), trazem o seguinte ensinamento

relativamente ao princípio da economia processual:

A instrumentalidade do processo é aquele aspecto positivo da relação que liga o sistema processual à ordem jurídico-material e ao mundo da pessoas e do Estado, com realce a necessidade de predispô-lo ao integral cumprimento de todos os seus escopos sociais, políticos e jurídicos. Falar-se da instrumentalidade nesse sentido positivo, pois, é alertar para a necessária efetividade do processo, ou seja, para a necessidade de ter-se um sistema processual capaz de servir de eficiente caminho à ordem jurídica justa. Para tanto , não só é preciso ter a consciência dos objetivos a atingir, como também conceber e saber superar os óbices econômicos e jurídicos que se antepõem ao livre acesso à justiça.

57 Art. 648. A coação considerar-se-á ilegal quando: I – quando não houver justa causa. [...]

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Firmando a instrumentalidade do processo como fundamento ao reconhecimento da

prescrição retroativa antecipada JAWSNICKER (2004, p. 97) traz ensinamento de Luiz

Wanderley Gazoto, asseverando sua alusão ao disposto no art. 3º do Código de Processo

Penal, que estipula que “ a lei processual penal admitirá a interpretação extensiva a aplicação

analógica , bem como o suplemento dos princípios gerais de direito”, o que daria amparo ao

magistrado a aplicação às normas e princípios gerais de direito que melhor atendam aos

princípios da eficiência e economia, sem afastar-se das garantias individuais do indivíduo.

Deste modo, percebe-se a ligação da instrumentalidade do processo, que é meio para

a efetivação da tutela jurisdicional, a necessidade da presença do interesse de agir e ao

princípio da economia processual, formando elementos concatenados favoráveis ao

reconhecimento da prescrição retroativa antecipada.

3.5 A PRESCRIÇÃO ANTECIPADA E O PRINCÍPIO DA LEGALIDADE

O princípio da legalidade estabelece que somente mediante a observação das regras

legais poderá ser desenvolvido o processo penal, restringindo o seguimento da ação as regras

estabelecidas na legislação Federal, posto ser, em regra, vedado aos estados legislar sobre

matéria processual. (MALCHER, 1999, p. 63) ,

Tal princípio é utilizado como fundamento contrário a prescrição antecipada na

consideração de que o disposto no art. 110, §§ 1º e 2º do Código Penal, apenas prevê a

retroatividade da prescrição com base na pena concretizada na sentença, e não havendo

sentença deveria o prazo prescricional ser regulado pela pena máxima prevista no tipo em que

o agente é incurso, aplicando-se uma interpretação estritamente legalista. (JAWSNICKER,

2004, p. 87)

Em contraponto ao fundamento do princípio da legalidade como elemento que vede

o reconhecimento da prescrição retroativa, JAWSNICKER (2004, p. 104-105) cita

ensinamentos de Ricardo Pieri Nunes e Renee de Ò Souza, o primeiro fundando-se no

princípio da razoabilidade, sustentando não haver racionalidade entre o motivo ensejador da

lide penal, a condenação, seu meio, o processo, e seu fim pretendido pela acusação, a

condenação, posto que esta não se revestiria de efetivação em virtude dos efeitos de posterior

declaração da extinção da punibilidade pela ocorrência da prescrição retroativa. Já em relação

ao segundo afirma não ser a inexistência da falta de previsão legal obstáculo a existência da

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prescrição antecipada, sob o argumento de que esta funda-se na falta de interesse de agir, que

encontra amparo legal nos termos do art. 43, inciso III, do Código Penal, conforme já

verificado.

Contrariamente ao argumento da falta de previsão legal para a configuração da

prescrição antecipada pode-se invocar o histórico da prescrição retroativa, nos termos já

abordados, que também surgiu como interpretação jurisprudencial peculiar ao ordenamento

jurídico pátrio, que acabou por ser incorporada ao ordenamento jurídico, o que quiçá

futuramente poderá ocorrer com a prescrição antecipada. (JAWSNICKER, 2004, p.106)

3.6 A PRESCRIÇÃO ANTECIPADA E O PRINCÍPIO DA OBRIGATORIEDADE.

O princípio da obrigatoriedade é apontado como fundamento contrário ao

reconhecimento prescrição penal antecipada sob o argumento de que o promotor é obrigado

ao oferecimento da denúncia e ao seguimento do processo, no teor dos artigos 4258 e 57659,

ambos do Código de Processo Penal, que consolidam o princípio da indisponibilidade da ação

penal pública por parte do Ministério Público, não possuindo o órgão do Ministério Público

poder discricionário para oferecer ou não a denúncia, posto que havendo os elementos

dispostos nos artigos 41 e 43 do Código Penal, este estará obrigado ao oferecimento da

denúncia, estando, o magistrado, igualmente, obrigado à devida prestação jurisdicional,

promovendo os atos processuais até final decisão de mérito. (JAWSNICKER, 2004, p.107;

MALCHER, 1999, p. 60)

Em argumentação contrária ao princípio da obrigatoriedade como obstáculo ao

reconhecimento da prescrição antecipada, deve-se observar que tal princípio está sujeito aos

demais regramentos do ordenamento jurídico, in casu os requisitos necessários a sustentação

das condições da ação, somente subsistindo o princípio da obrigatoriedade se satisfeitas as

condições necessárias ao seu seguimento. (JAWSNICKER, 2004, 108-109)

3.7 A PRESCRIÇÃO ANTECIPADA E O PRINCÍPIO DO DEVIDO PROCESSO LEGAL

Estampado no art. 5º, inciso LIV, da Constituição Federal de 1988, este estabelece

que “ ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal”, bem

como no inciso XXXV, do mesmo dispositivo constitucional onde se consigna que “ a lei não

58 Art. 42. O Ministério Público não poderá desistir da ação penal. 59 Art. 576 O Ministério Público não poderá desistir do recurso que haja interposto

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excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça de direito”; e, ainda, no inciso

LIV, que estipula: “aos litigan tes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em

geral são assegurados o contraditório e a ampla defesa, com os meios e recursos a ela

inerentes”. (ARAÚJO, 1999, p. 198)

Tal princípio consiste na salvaguarda de que ninguém será privado de sua liberdade

ou de seus bens, sem a garantia da tramitação de um processo justo desenvolvido na forma

estabelecida em lei, tendo por base a Declaração Universal dos Direitos do Homem,

formulada pela ONU, que estabelece em seu artigo 8°: “Toda pessoa tem recurso perante os

tribunais nacionais competentes, que a ampare contra atos que violem seus direitos

fundamentais, reconhecidos pela constituição ou pela lei.”, estabelecendo, ainda referida

declaração que:

Toda pessoa tem direito, em condições de plena igualdade, a ser ouvida publicamente e com justiça por um tribunal independente e imparcial, para determinação de seus direitos e obrigações ou para exame de qualquer acusação contra ela em matéria penal.

Na seara penal o devido processo legal desdobra-se em garantia da preservação da

presunção de inocência até a decisão definitiva transitada em julgado, a não identificação

criminal de quem, seja civilmente identificável, ressalvadas as hipóteses previstas em lei, a

determinação de que somente mediante prisão em flagrante ou por ordem judicial emanada da

autoridade competente o cidadão civil poderá ser preso, sendo garantia a imediata

comunicação da prisão ao juiz competente e à família do preso ou à pessoa por ele indicada,

de ser informado de seus direitos constitucionais e de permanecer calado, o direito de ter a

identificação dos responsáveis por efetuarem a prisão, a obrigação da autoridade judiciária de

relaxar de imediato qualquer prisão eivada de ilegalidade, não podendo o gente ser levado ou

mantido encarcerado quando foi admissível a concessão do benefício da liberdade provisória,

e a impossibilidade de haver prisão civil, ressalvados os casos de inadimplemento voluntário

de obrigação de prestar alimentos. (ARAÚJO, 1999, p.200)

Segundo José Ulisses Jacoby Fernandes (apud Araújo, 1999, p. 200)

A Declaração dos Direitos Humanos consagra, nos arts. X e XI, o princípio due process of law, consistente na garantia de que ninguém poderá ser privado dos seus direitos, sem a observância do devido processo legal. Essa garantia traduz o direito público subjetivo de que, infringindo a norma legal, o agente violador terá assegurado um processo específico, com procedimento próprio, previamente estabelecido em Lei, açambarcando a fiel observância de vários outros princípios.

Na análise do devido processo legal frente a declaração da prescrição retroativa de

modo antecipado JAWSNICKER (2004, p. 110) aponta uma série de julgados no sentido de

que o reconhecimento desta modalidade prescricional infringiria tal princípio, consistindo o

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fundamento de tal violação preponderantemente no fato de não ser possível a antevisão de

eventual pena a ser aplicada, posto que implicaria em “condenação” da parte, o que não seria

possível sem a observância do devido processo legal. Em sentido contrário é lançado o

argumento de que o reconhecimento da prescrição retroativa antecipadamente viria

justamente homenagear o princípio do devido processo legal, em virtude das razões relativas a

falta de interesse de agir, conforme ante abordado, considerando que o seguimento de uma

ação na qual não se sustentam suas condições, violando o princípio do devido processo legal.

(JAWSNICKER, 1999, p. 111-112)

3.8 A PRESCRIÇÃO ANTECIPADA E OS PRINCÍPIOS DO CONTRADITÓRIO E DA

AMPLA DEFESA.

Os princípios do contraditório e da ampla defesa são estabelecidos como direitos

constitucionais, nos termos do inciso LV, do art. 5º da Constituição Federal, sendo

estabelecido que “ aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em

geral são assegurados o contraditório e a ampla defesa, com os meios e recursos a ela

inerentes;”

O princípio do contraditório é considerado inerente ao próprio processo, em

decorrência da bilateralidade deste, colocando a atividade judicante entre as partes de modo

imparcial e eqüidistante, estando estas em igualdade, estabelecendo a síntese das

manifestações apresentadas pelos litigantes através do processo dialético, e, em decorrência

de tal princípio exige-se a ciência das partes de todos os atos e termos do processo praticadas

pela parte contrária e pelo juízo, de modo a dar ciência e amplo conhecimento dos termos

destes às partes. (CINTRA, GRINOVER e DINAMARCO, 2000, p. 55-56)

O princípio da ampla defesa é decorrente do princípio do contraditório e da adoção

do regime democrático e da valorização da liberdade e da dignidade individual, sendo

indispensável no processo penal a defesa técnica, sendo porém dispensável a auto defesa,

posto que no momento do interrogatório é dado ao acusado o direito de permanecer calado

sem que isto possa ser utilizado em desfavor deste. (CINTRA, GRINOVER e DINAMARCO,

2000, p. 55-56; MALCHER, 1999, p. 64; ARAÚJO, 1999, p. 190)

Malcher (1999, p. 64) enumera como conseqüências do princípio da ampla defesa a

necessidade de cientificação das partes dos atos praticados pelo juízo e pelas partes; o que

denominou termo de contrariedade do qual afirma a necessidade de concessão de igual prazo

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para contraditar alegações proferidas pela parte contrária; o direito de produção de provas em

igualdade, podendo uma das partes participar da produção da prova requerida pela outra,

como acontece na produção de laudos periciais, em que oportunizado a ambas as partes o

oferecimento de quesitos, independentemente de quem tenha solicitado a produção desta, se

as partes ou o juízo; a obrigatoriedade da defesa técnica, cabendo ao juiz nomear defensor ao

acusado sempre que este não poder constituir um ou seja revel, com a gratuidade de tal

nomeação.

Antônio Lopes Baltazar (apud JAWSNICKER, 1999, p. 112) afirma que “ a

prescrição antecipada não pode ser reconhecida porque depende de uma sentença

condenatória e ninguém pode ser condenado sem a garantia do contraditório e da ampla

defesa”, o que é afastado ao argumento de que o contraditório e a ampla defesa tem origem no

direito de ação, e no caso da prescrição antecipada este direito estaria obstado pela falta de

interesse de agir. Assim, a carência de interesse de agir não infringiria os princípios em

comento, posto que atingiriam a ação antes mesmo de consolidados os referidos princípios.

3.9 A PRESCRIÇÃO ANTECIPADA E O PRINCÍPIO DA INOCÊNCIA.

O princípio da inocência vem consagrado no inciso LVIII, art. 5º da Constituição

Federal, que dispõe que “ ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de

sentença penal condenatória”, consignou no ordenamento jurídico pátrio princípio

assegurado na Declaração Universal do Direitos do Homem, de 1948.

Tal princípio impõe como regra que o acusado ou indiciado não poderá ser atribuída

a qualidade de culpado sem que finde o processo com a sua condenação definitiva, estando

este fundado precipuamente em valores ideológicos. (ARAÚJO, 1999, p. 204)

Este princípio é considerado como obstáculo ao reconhecimento da prescrição

retroativa antecipadamente sob o argumento de que a antevisão da pena implicaria em

presumir-se, igualmente, a condição de culpado ao acusado, o que violaria tal princípio, sendo

este argumento afastado ante a verificação de que a antevisão da penalidade a ser

eventualmente aplicada apreciaria tão somente a possibilidade da condenação, e não sua

efetivação, e afastando-se o início ou seguimento da lide penal seria inviável falar-se em

condenação. (JAWSNICKER, 1999, p. 204)

Relativamente ao princípio em comento, é preciso a abordagem feita por Carnelutti,

in verbis:

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“Esta é, porém uma daquelas normas as quaisservem somente a demonstrar a boa

fé daqueles que a elaboram; ou, em outras palavras, a incrível capacidade de iludir-se da

qual são dotadas as revoluções. Infelizmente a justiça humana é assim, que nem tanto faz

sofrer os homens porque são culpados quanto para saber se são culpados ou inocentes.

3.10 A PRESCRIÇÃO ANTECIPADA E O DIREITO DO RÉU A UMA SENTENÇA DE

MÉRITO.

Os defensores de que o reconhecimento da prescrição retroativa de modo antecipado

fere o direito do réu a uma sentença de mérito argumentam que no processo penal a sentença

seria útil tanto para condenar quanto para absolver o acusado, sendo ambas respostas ao jus

puniendi, argumento que é contestado tendo como contraponto o fato de que para o

processamento e conseqüentemente para a prolação da sentença de mérito faz-se necessário

estarem presentes as condições da ação. (JAWSNICKER, 1999, p. 116)

Afastando qualquer violação do direito do acusado a apreciação do mérito encontra-

se o fato de que o reconhecimento da prescrição da pretensão punitiva desnatura por completo

os efeitos da sentença condenatório, como se o mérito jamais tivesse sido apreciado, Diolinda

Kurrle Hannusch (apud Jawsnicker, 1999, p. 117) sustenta que o processo penal tem

finalidade pública e não privatista, existindo para que o Estado exerça seu jus puniendi e não

para que o acusado demonstre suas virtudes, e não sendo o processo útil ao Estado para o

exercício do jus puniendi o direito do acusado não poderia sobrepor-se ao interesse estatal.

3.11 A PRESCRIÇÃO ANTECIPADA E OS EFEITOS CIVIS DA SENTENÇA PENAL.

Dentre os efeitos secundários da sentença penal tem-se os efeitos civis desta

regulados pelo disposto no art. 91, inciso I do Código Penal, e art. 63 do Código de Processo

Penal, que tornam certa a reparação do dano e o direito de execução da sentença condenatória

na esfera cível, no que tange ao direitos da vítima.(TOURINHO FILHO, 2001, p. 644)

Jawsnicker (1999, p. 117), enumera os seguintes reflexos cíveis da sentença penal

condenatória:

(a) a sentença penal condenatória com trânsito em julgado é título executivo para se promover no juízo cível a execução da reparação do dano;

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(b) faz coisa julgada no cível a sentença penal que reconhecer ter sido o ato praticado em estado de necessidade, em legítima defesa, em estrito cumprimento do dever legal ou no exercício regular do direito (art. 65 do Código de Processo Penal);

(c) a sentença absolutória no juízo criminal não impedirá a ação civel de ressarcimento, salvo quando tiver reconhecido, categoricamente, a inexistência material do fato. (art. 66 do Código de Processo Penal)

(d) não impedem a propositura da ação civil o despacho de arquivamento do inquérito policial ou das peças de informação; a decisão que julga extinta a punibilidade; a sentença absolutória que decidir que o fato não constitui crime (art. 67, inciso I a III do Código de Processo Penal).

3.12 A PRESCRIÇÃO ANTECIPADA E AS CIRCUNSTÂNCIAS JUDICIAIS.

Considerando que a declaração da prescrição retroativa de modo antecipado exige a

projeção de eventual pena a ser aplicada, as circunstâncias judiciais, que vem dispostas no art.

59 do Código Penal, conforme supra mencionado, natural a obrigatoriedade de apreciação

destes elementos, advindo a crítica de que somente consolidada a instrução processual é que o

aplicador do direito teria em mãos todos os elementos necessários para sua apreciação

Acrescente-se que a presença das condições da ação não devem existir somente no momento

do recebimento da denúncia ou da queixa, esta deve manter-se íntegra durante toda a

instrução processual. (JAWSNICKER, 2004, p. 120)

Os argumentos contrários a este posicionamento apontam para a plena possibilidade

da apreciação destes elementos, apontando para o fato de tal apreciação ocorrer como se dá

na oportunidade em que o Ministério Público verifica a possibilidade do oferecimento da

transação penal (art. 76 da Lei n.º 9.099/95)60, indicando também o disposto nos incisos VIII e

IV do art. 6º do Código de Processo Penal, argumentado que tais elementos apreciados em

consideração dos demais termos da peça inquisitorial forneceriam os elementos necessários

par a apreciação das circunstâncias judiciais. (JAWSNICKER, 2004, p. 121)

Tais argumentos buscam amparo também no fato de que a verificação do interesse de

agir exige uma análise do mérito, ainda que perfunctória, verificando a presença de indícios

da materialidade e da autoria, ao que se deve proceder já ao recebimento da denúncia,

baseando-se, necessariamente, nos elementos trazidos no inquérito policial ou em outra peça

informativa (JAWSNICKER, 2004, p. 121-122)

3.13 A PRESCRIÇÃO ANTECIPADA E A MUTATIO LIBELI

60 Art. 76. Havendo representação ou tratando-se de crime de ação penal pública incondicionada, não sendo caso de arquivamento, o Ministério Público poderá propor a aplicação imediata de pena restritiva de direitos ou multa, a ser especificada na proposta.

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A mutatio libeli segundo Tourinho Filho (2002, p. 635), consiste na hipótese de “o

juiz reconhecer a possibilidade de nova definição jurídica do fato, em conseqüência de prova

existente nos autos de circunstâncias elementar contida explícita ou implicitamente, na

denúncia ou na queixa”, o que poderia majorar, diminuir ou manter a pena que seria

estipulada ao delito inicialmente capitulado, devendo proceder-se, conforme o caso, nos

termos do art. 384 do Código de Processo Penal61.

Assim, a possibilidade de que durante a persecução criminal seja dada nova

capitulação ao tipo imputado ao acusado ou ao indiciado, que poderia alterar o prazo

prescricional, é apontada como elemento contrário ao reconhecimento da prescrição

antecipada.

Afastando tal argumento JAWSNICKER (2004, p. 124), colaciona consideração

proferida por Renee de Ó Souza, nos seguintes termos:

se constatada antes de iniciada a ação penal, ou seja, ainda na fase inquisitiva, a questão levantada mostra-se menos trabalhosa porque o arquivamento do inquérito policial sempre deve possuir a ressalva do art. 18 do Código de Processo Penal, que permite o prosseguimento de novas pesquisas pela autoridade policial, se de outras provas tiver notícia. Essa providência praticamente elimina qualquer obste à contemplação da prescrição virtual visto que qualquer nova prova que altere a capitulação do delito e conseqüentemente a sua pena ensejadora do cálculo prescricional servirá de base para uma nova análise e apreciação do caso, resultando em novo arquivamento ou no oferecimento da denúncia.

Relativamente ao reconhecimento da prescrição antecipada durante a instrução do

feito, JAWSNICKER (2004, p. 124) aponta ensinamento do mesmo doutrinador no sentido de

que a extinção do feito pela falta de interesse de agir não obstaria que, no caso da constatação

de novos elementos que majorem a pena e conseqüentemente o prazo prescricional, fosse

proposta nova lide, posto que na aplicação do art. 3º do Código de Processo Penal, em

consonância com os termos do art. 267, do Código de Processo Civil, haveria a possibilidade

de instaurar-se nova lide para a apreciação do mérito na forma de eventual mutatio que

majorasse a pena fazendo ressurgir o interesse de agir.

61 Art. 384. Se o juiz reconhecer a possibilidade de nova definição jurídica do fato, em conseqüência de prova existente nos autos de circunstância elementar; não contida, explícita ou implicitamente, na denúncia ou na queixa, baixará o processo, a fim de que a defesa, no prazo de oito dias, fale e, se quiser, produza prova, podendo ser ouvidas até três testemunhas.

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CONCLUSÃO

A atividade acadêmica no ramo jurídico comumente impõe grandes desafios na

abordagem de temas controversos, o que se afigura fundamental e imprescindível à formação

crítica e cidadã, posto que antes mesmo de aprofundar-se aos tema por demais controverso,

exercita a prática do inconformismo e da tomada de posição, fomentando o desenvolvimento

temático e argumentativo.

Sob o prisma doutrinário, o reconhecimento da prescrição antecipada é assunto

controvertido, o mesmo ocorrendo perante o próprio instituto da prescrição penal, consistindo

seus principais obstáculos na falta de previsão legal, o que atingiria a uma série de princípios

processuais e constitucionais, e a impossibilidade de antever-se eventual pena a ser aplicada, o

que, igualmente, segundo seus críticos, atingiria direitos assegurados ao agente infrator.

Os pontos polêmicos gravitam entre as normas de direito constitucional, material e

processual; que em posicionamentos contrários ao reconhecimento da prescrição retroativa de

modo antecipado figuram aspectos concernentes a eventual violação de princípios como o da

legalidade, da obrigatoriedade, do devido processo legal, do contraditório, da ampla defesa,

princípio da inocência, o direito do réu a uma sentença de mérito, os reflexos de tal declaração

em relação aos efeitos civis da sentença criminal e a possibilidade de mutatio libelli, razões

que se confrontam com a carência do interesse de agir, ao princípio da economia processual,

ao constrangimento ilegal do acusado, ao princípio da instrumentalidade e da eficiência, que

alimentam as discussões doutrinária e jurisprudenciais sobre a possibilidade ou não de seu

reconhecimento.

A par dessa celeuma, procurou-se no primeiro capítulo constatar as linhas gerais do

surgimento e desenvolvimento do instituto da prescrição penal, resgatando os fundamentos da

prescrição penal, constatando os argumentos trazidos pelas principais teorias, ao que se

constata estarem estas em sua maioria vinculadas ao transcurso de tempo aliado a outros

fatores como a desvinculação psicológica do acusado com o fato delituoso, a regeneração do

agente, o restabelecimento da paz social, que culminariam na desnecessidade de aplicação da

reprimenda.

No segundo capítulo extraiu-se os ensinamentos doutrinários relativos as espécies de

prescrição da pretensão punitiva e da pretensão executória, com ênfase na prescrição

antecipada, modalidade de prescrição da pretensão punitiva, valendo para a modalidade

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antecipada o atinente a prescrição da pretensão punitiva no que tange a contagem do prazo,

efeitos e demais aspectos próprios desta modalidade prescricional.

O primordial aspecto para a verificação da prescrição antecipada, singe em verificar-

se a possibilidade de antevisão da pena, sendo certo que esta não se dará em estabelecer

precisamente a quantificação desta, mas tão somente em verificar-se um patamar aproximado,

levando em consideração todos os eventuais fatores de influência em sua fixação, devendo

reconhecer-se a carência do interesse de agir tão somente nos casos em que se estabeleça a

convicção motivada de que nenhuma utilidade terá o processo, sendo que em caso de dúvidas

esta não deve ser reconhecida, incidindo o in dúbio pro societatis.

Admitindo-se a possibilidade de estabelecimento de uma projeção aproximada de

eventual pena a ser aplicada, e verificando-se a fatalidade da ocorrência da prescrição

retroativa, efetivamente, ter-se-á a inutilidade da ação, posto que tratando-se de modalidade

da prescrição da pretensão punitiva, a sentença condenatória não surtirá qualquer efeito no

mundo jurídico, posto que será desconstituída pela extinção da punibilidade pela prescrição, e

não sendo o procedimento útil, na aplicação das regras de processo civil, pelo uso da analogia,

razoável a extinção do processo penal ou o impedindo sua instauração.

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REFERÊNCIAS

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SUMÁRIO

RESUMO....................................................................................................................................9

ABSTRACT................................................................................................................................10

INTRODUÇÃO........................................................................................................................11

1. PRESCRIÇÃO PENAL......................................................................................................13

1.9. ASPECTOS HISTÓRICOS DO INSTITUTO DA PRESCRIÇÃO

PENAL...13

1.11. A PRESCRIÇÃO PENAL NO ORDENAMENTO JURÍDICO PÁTRIO.....16

1.12. CONCEITOS E TIPOS DE PRESCRIÇÃO.....................................................18

1.13. IMPRESCRITIBILIDADE NO DIREITO PENAL BRASILEIRO...............20

1.14NATUREZA JURÍDICA DA PRESCRIÇÃO....................................................21

1.15FUNDAMENTOS DA PRESCRIÇÃO PENAL..................................................22

1.15.1 Teoria do esquecimento............................................................................23

1.15.2 Teoria da expiação moral do criminoso....................................................23

1.15.3 Teoria da piedade......................................................................................24

1.15.4 Teoria da dispersão das provas.................................................................25

1.15.5 Teoria da emenda......................................................................................25

1.15.6 Teoria da alteração psicológica.................................................................26

1.15.7 Teoria orientada por princípios de política criminal.................................27

1.15.8 Teoria da presunção de negligência..........................................................27

1.15.9 Teoria da exclusão do ilícito.....................................................................28

1.16FIXAÇÃO DO PRAZO PRESCRICIONAL......................................................29

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1.16.1 Diminuição e aumentos dos prazos prescricionais...................................30

1.17PRESCRIÇÃO DA PENA DE MULTA..............................................................32

1.18PRESCRIÇÃO NA LEGISLAÇÃO ESPECIAL...............................................33

1.10. CAUSAS INTERRUPTIVAS E SUSPENSIVAS DA PRESCRIÇÃO...........34

1.11. PRESCRIÇÃO NOS CRIMES COMPLEXOS E CONEXOS.......................36

2. MODALIDADES DA PRESCRIÇÃO NO DIREITO PENAL BRASILEIRO...........37

2.1. PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO PUNITIVA.................................................37

2.1.1. Prescrição retroativa.....................................................................................39

2.1.1.1. Evolução histórica da prescrição retroativa.....................................40

2.1.1.2. Pressuposto de aplicação da prescrição retroativa...........................42

2.1.1.3 Oportunidade de Declaração.............................................................43

2.1.1.4 Concurso de crimes...........................................................................44

2.1.2. Prescrição intercorrente ou superveniente....................................................46

2.1.2.1 Fixação do prazo prescricional.........................................................48

2.2. PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO EXECUTÓRIA...........................................48

2.3. EFEITOS DA DECLARAÇÃO DA PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO

PUNITIVA E INTERCORRENTE.......................................................................................50

3. PRESCRIÇÃO ANTECIPADA........................................................................................52

3.1. A PRESCRIÇÃO ANTECIPADA E O INTERESSE DE AGIR......................54

3.2. A PRESCRIÇÃO ANTECIPADA E O PRINCÍPIO DA ECONOMIA

PROCESSUAL........................................................................................................................60

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3.3. O CONSTRANGIMENTO ILEGAL CAUSADO PELO PROCESSO

PENAL....................................................................................................................................61

3.4. A INSTRUMENTALIDADE DO PROCESSO E A PRESCRIÇÃO

ANTECIPADA.......................................................................................................................61

3.5. A PRESCRIÇÃO ANTECIPADA E O PRINCÍPIO DA

LEGALIDADE.......................................................................................................................62

3.6. A PRESCRIÇÃO ANTECIPADA E O PRINCÍPIO DA

OBRIGATORIEDADE..........................................................................................................63

3.7. A PRESCRIÇÃO ANTECIPADA E O PRINCÍPIO DO DEVIDO

PROCESSO LEGAL..............................................................................................................63

3.8. A PRESCRIÇÃO ANTECIPADA E OS PRINCÍPIOS DO

CONTRADITÓRIO E DA AMPLA DEFESA.....................................................................65

3.9. A PRESCRIÇÃO ANTECIPADA E O PRINCÍPIO DA

INOCÊNCIA...........................................................................................................................66

3.10. A PRESCRIÇÃO ANTECIPADA E O DIREITO DO RÉU A UMA

SENTENÇA DE MÉRITO....................................................................................................67

3.11. A PRESCRIÇÃO ANTECIPADA E OS EFEITOS CIVIS DA SENTENÇA

PENAL.....................................................................................................................................67

3.12. A PRESCRIÇÃO ANTECIPADA E AS CIRCUNSTÂNCIAS

JUDICIAIS..............................................................................................................................68

3.13. A PRESCRIÇÃO ANTECIPADA E A MUTATIO LIBELLI.........................69