o império do imediato
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Tese de doutorado em comunicaçãoTRANSCRIPT
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MARTIN KUHN
IMPRIO DO IMEDIATO: A URGNCIA COMO
ARGUMENTO DE VENDAS NA COMUNICAO
MERCADOLGICA
Universidade Metodista de So Paulo
Programa de Ps-Graduao em Comunicao Social
So Bernardo do Campo - SP, 2011
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MARTIN KUHN
IMPRIO DO IMEDIATO: A URGNCIA COMO
ARGUMENTO DE VENDAS NA COMUNICAO
MERCADOLGICA
Tese apresentada em cumprimento parcial
s exigncias do Programa de Ps-
Graduao em Comunicao Social, da
UMESP Universidade Metodista de So Paulo, para obteno do grau de Doutor.
Orientador: Prof. Dr. Daniel dos Santos
Galindo
Universidade Metodista de So Paulo
Programa de Ps-Graduao em Comunicao Social
So Bernardo do Campo - SP, 2011
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FICHA CATALOGRFICA
K955i
Kuhn, Martin
Imprio do imediato: a urgncia como argumento de vendas na
comunicao mercadolgica / Martin Kuhn. 2011.
209 f.
Tese (doutorado em Comunicao Social) --Faculdade de
Comunicao da Universidade Metodista de So Paulo, So Bernardo
do Campo, 2011.
Orientao : Daniel dos Santos Galindo
1. Imediatismo - Comunicao de mercado 2. Sociedade de
consumo 3. Publicidade 4. Comunicao mercadolgica I. Ttulo.
CDD 302.2
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FOLHA DE APROVAO
A tese de doutorado sob o ttulo Imprio do imediato: a urgncia como argumento de
vendas na comunicao mercadolgica, elaborada por Martin Kuhn, foi defendida e
aprovada com louvor em 26 de outubro de 2011, perante banca examinadora composta por
Daniel dos Santos Galindo (Presidente/UMESP), Ciclia Maria Krohling Peruzzo
(Titular/UMESP), Wilson da Costa Bueno (Titular/UMESP), Eugnio Rondini Trivinho
(Titular/PUC-SP), Joo Lus Anzanello Carrascoza (Titular/USP/ESPM).
__________________________________________
Prof. Dr. Daniel dos Santos Galindo
Orientador e Presidente da Banca Examinadora
__________________________________________
Prof. Dr. Laan Mendes de Barros
Coordenador do Programa de Ps-Graduao
Programa: Ps-Graduao em Comunicao Social
rea de Concentrao: Processos Comunicacionais
Linha de Pesquisa: Processos de Comunicao Institucional e Mercadolgica
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AGRADECIMENTOS
A Deus, fonte de toda sabedoria e inspirao.
Ao meu orientador Daniel Galindo, por compartilhar to generosamente seu conhecimento e
direcionar com maestria os rumos desta pesquisa.
Ao Centro Universitrio Adventista de So Paulo (Unasp), por valorizar o meu trabalho e
investir com confiana na minha formao.
minha esposa Denise, pelo carinho e amor incondicional. Sua companhia me traz paz e
motivao necessria para superar os desafios de qualquer jornada.
Ao pastor e amigo Paulo Martini, por ser um lder que me inspira e por apoiar irrestritamente
minhas iniciativas.
Aos meus pais Helmo e Ester Kuhn, que sempre acreditaram no valor da educao e por
serem os meus mais importantes professores.
Aos meus sogros Claudio e Regina Vital, pela generosidade e pelo exemplo de trabalho e
interesse no semelhante.
Ao Tales Tomaz, pelos dilogos e sugestes de leituras que contriburam para ampliar a
compreenso do tema proposto e tambm pela ajuda na reviso final desta tese.
Henrianne Barbosa, pelos incentivos e validaes que elevaram a minha confiana e me
fizeram acreditar ainda mais no valor da minha pesquisa.
Ao Luis Henrique dos Santos, pela amizade e apoio incondicional nas mais variadas
situaes e por compartilhar comigo sua lucidez de pensamento.
Ao meu irmo Wagner Kuhn, que mesmo distncia encontrou caminhos para me motivar.
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Ao Ivo Suedekum, a quem considero como irmo, por compartilhar comigo sua experincia.
Seus conselhos aceleraram e ampliaram o meu amadurecimento pessoal e profissional.
Ao amigo Valdecir Lima, a quem Deus concedeu mente privilegiada e corao disposto.
Muitas das minhas ideias so frutos dos nossos dilogos.
Ao Wilton Costa (Tuiu), por levar a pesquisa dimenso do vdeo, oferecendo este trabalho
acadmico numa outra linguagem.
Aos professores Wilson da Costa Bueno, Ciclia M. K. Peruzzo, Isaac Epstein, Adolpho
Queiroz, Antonio Carlos F. Rutolo, pelas contribuies multidisciplinares.
Ao professor Paulo Bastos Martins, que abriu as primeiras portas para o stricto sensu
aceitando-me nas suas classes no departamento de Multimeios da Unicamp.
Ao amigo Adolfo Surez, pelas palavras de nimo e sugestes de leituras.
Aos colegas de ps-graduao Karla Ehrenberg, Laercio Bento, Marcos Paulo da Silva,
Claudia Gouveia Franco, pelo convvio fraterno e motivador no ambiente da Umesp.
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Ttulo:
IMPRIO DO IMEDIATO: A URGNCIA COMO ARGUMENTO DE VENDAS NA
COMUNICAO MERCADOLGICA
Autor:
Martin Kuhn
RESUMO
Esta tese analisa as relaes da comunicao de mercado com a obsesso pelo imediato
presente na cultura social contempornea. Vive-se hoje numa sociedade marcada pelo
consumo intenso, em tempo real e no restrito por distncias. Para acelerar a circulao de
produtos e servios, as empresas tentam estimular o mercado atravs de anncios
que incorporam em sua linguagem as caractersticas de urgncia e imediatismo observadas e
extradas da sociedade. Sob uma perspectiva social, esta tese discutiu a presena do elemento
tempo na vida contempornea e sua apropriao pela comunicao mercadolgica.
A pesquisa foi desenvolvida sob o mtodo de anlise de contedo em mais de trezentos
comerciais de televiso e em cerca de duzentos anncios impressos que apresentaram slidas
evidncias dessa apropriao da cultura de urgncia e imediatismo pela comunicao de
mercado. A nfase no urgente e no imediato refora e estimula o modelo social vigente. Em
outras palavras, a soma de um estilo de vida que cultua a velocidade com a presena de tais
elementos na comunicao de mercado contribui para a promoo de uma ditadura do agora,
baseada na promessa do prazer instantneo. Esses elementos que caracterizam a sociedade
contempornea so, do ponto de vista comercial, eficientemente apropriados pela
comunicao de mercado, uma vez que essa condio social, quando transformada em
argumento de vendas, contribui para provocar no consumidor um estado de consonncia com
suas cognies.
Palavras-chaves:
Comunicao de mercado, urgncia, sociedade de consumo, imediatismo, publicidade.
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Titulo:
IMPERIO DE LO INMEDIATO: LA URGENCIA COMO ARGUMENTO DE VENTAS
EN LA COMUNICACIN DE MERCADO
Autor:
Martin Kuhn
RESUMEN
Esta tesis analiza la relacin de la comunicacin de mercado con la obsesin por lo
inmediato, presente en la cultura social contempornea y manifiesta en los anuncios
publicitarios. Vivimos en una sociedad marcada por el consumo intenso en tiempo real y no
limitado por la distancia. Para mantener vivo el ritmo de consumo, las empresas tratan de
estimular el mercado a travs de anuncios que incorporan en su lenguaje las caractersticas
de urgencia e inmediatez que se observan y extraen de la sociedad. Desde una perspectiva
social, esta tesis discuti la presencia del elemento de tiempo en la vida contempornea y su
apropiacin por parte de la comunicacin mercadolgica. La investigacin se desarroll bajo
el mtodo de anlisis de contenido en ms de trescientos comerciales de televisin y
alrededor de doscientos anuncios impresos, que presentaron evidencia slida de la
apropiacin de la cultura de urgencia e inmediatez por parte de la comunicacin
mercadolgica. Este nfasis en lo urgente y en lo inmediato refuerza y fomenta el modelo
social existente. En otras palabras, la suma de un estilo de vida que adora la velocidad con la
presencia de dichos elementos en la comunicacin de mercado contribuye para la promocin
de una dictadura del ahora, basndose en la promesa del placer instantneo. Estos elementos
que caracterizan la sociedad contempornea son, del punto de vista comercial,
eficientemente adecuados por la comunicacin de mercado, ya que la condicin social
contempornea, cuando se transforma en punto de venta, contribuye para provocar en el
consumidor un estado de consonancia con sus cogniciones.
Palabras clave:
Comunicacin de mercado, urgencia, sociedad de consumo, inmediatismo, publicidad.
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Title:
EMPIRE OF THE IMMEDIATE: THE URGENCY AS A SELLING APPROACH IN THE
MARKETING COMMUNICATION
Author:
Martin Kuhn
ABSTRACT
This thesis analyzes the relationship of market communication with the obsession for
immediacy present in contemporary social culture and manifested in advertising. We live in
a society marked by intense consumption in real time and not restricted by distances. To
keep alive this pace of consumption, companies try to stimulate the market through a type of
advertising that incorporates in its language features of urgency and immediacy observed
and extracted from society. From a social perspective, this thesis discussed the presence of
the time element in contemporary life and its appropriation by marketing communication.
The research developed based on the method of content analysis studied more than three
hundred television commercials and about two hundred printed advertisements which
presented solid evidence of this appropriation of the culture of urgency and immediacy by
market communication. This emphasis on the urgent and on the immediate strengthens and
stimulates the existing social model. In other words, the sum of a lifestyle that worships
speed with the presence of such elements in the market communication contributes to the
promotion of a dictatorship of the now, based on the promise of instant gratification. These
elements that characterize contemporary society are, from the commercial point of view,
effectively appropriated by market communication as this contemporary social condition,
when transformed into selling points, contributes to cause a state of harmony with the
consumers cognitions.
Key words:
Market communication, urgency, consumer society, immediacy, advertising.
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LISTA DE IMAGENS, GRFICOS E TABELAS
IMAGENS
Imagem 1 Anncio Telefnica Speedy .................................................................... 43
Imagem 2 Anncio Intel ........................................................................................... 46
Imagem 3 Anncio Intel ........................................................................................... 47
Imagem 4 Anncio Casas Bahia ............................................................................... 95
Imagem 5 Anncio Fiat ............................................................................................ 97
Imagem 6 Anncio leos Salada ........................................................................... 101
Imagem 7 Anncio Ecosport .................................................................................. 102
Imagem 8 Anncio Semp Toshiba ......................................................................... 106
Imagem 9 Anncio Philips ..................................................................................... 107
Imagem 10 Anncio Renner ................................................................................... 108
Imagem 11 Anncio Casas Bahia ........................................................................... 109
Imagem 12 Anncio Casas Bahia ........................................................................... 110
Imagem 13 Anncio Casas Bahia ........................................................................... 110
Imagem 14 Anncio Casas Bahia ........................................................................... 111
Imagem 15 Anncio Casas Bahia ........................................................................... 111
Imagem 16 Anncio Casas Bahia ........................................................................... 112
Imagem 17 Anncio Brastemp ............................................................................... 114
Imagem 18 Anncio Casas Bahia ........................................................................... 115
Imagem 19 Anncio Casas Bahia ........................................................................... 117
Imagem 20 Anncio Casas Bahia ........................................................................... 117
Imagem 21 Anncio Philco-Hitachi ....................................................................... 120
Imagem 22 Anncio Tok Stok................................................................................ 121
Imagem 23 Anncio Casas Bahia ........................................................................... 121
Imagem 24 Anncio Ford ....................................................................................... 131
Imagem 25 Anncio TIM ....................................................................................... 150
Imagem 26 Anncio Ford ....................................................................................... 151
Imagem 27 Compilao de cenas do anncio do Renault Clio .............................. 162
Imagem 28 Montagem a partir de anncios da campanha Porque a vida agora 180
Imagem 29 Compilao de cenas dos filmes Brahmeiro ....................................... 183
Imagem 30 Anncio Tecnomania........................................................................... 186
Imagem 31 E-mails promocionais inditos e s hoje que se repetem ............. 189
GRFICOS
Grfico 1 Convergncia comportamental ................................................................. 56
Grfico 2 Anncios que enfatizam a relao com o tempo (501) por meses no ano
de 2010 ........................................................................................................................ 79
Grfico 3 Total de anncios em proporo aos diferentes anunciantes ................... 80
Grfico 4 Categorias de anunciantes ........................................................................ 84
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TABELAS
Tabela 1 Tempo ou validade da oferta ..................................................................... 85
Tabela 2 No perder, no desperdiar oportunidade ................................................ 86
Tabela 3 Ordens de comando para reaes imediatas do consumidor ..................... 87
Tabela 4 Exclusividade da oferta em um determinado ponto de venda ................... 88
Tabela 5 Promoes identificadas por nomes de impacto e grandiosidade ............. 90
Tabela 6 Ordens que tentam evitar a passividade ou indiferena do consumidor .... 91
Tabela 7 Deslocamento do pagamento no fluxo do tempo ...................................... 92
Tabela 8 Referncia aos preos baixos, s promoes e descontos especiais .......... 93
Tabela 9 Referncia a lotao e movimentao no ponto de venda ......................... 94
Tabela 10 Exemplo da anlise em comercial das Casas Bahia ................................ 96
Tabela 11 Exemplo da anlise em comercial da Fiat ............................................... 97
Tabela 12 Amostra de comerciais de televiso no promocionais ........................ 98
Tabela 13 Meses compostos revista Veja, de 1980 a 2010 ................................. 103
Tabela 14 Presena de expresses relativas a tempo, urgncia ou imediatismo .... 105
Tabela 15 Referncia aos preos baixos, s promoes e descontos especiais ...... 112
Tabela 16 Deslocamento do pagamento no fluxo do tempo .................................. 115
Tabela 17 Caractersticas dos anunciantes ............................................................. 118
Tabela 18 Anlise da tentativa de consonncia pela comunicao mercadolgica 149
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SUMRIO
INTRODUO .................................................................................................................... 13
I FUNDAMENTOS EPISTEMOLGICOS DA VELOCIDADE ................................ 22 1. Da liberdade de movimento ditadura da velocidade ............................................. 24
2. Violncia e guerra na origem do fenmeno da velocidade ...................................... 28
3. A generalizao social da experincia da velocidade .............................................. 31
4. Impactos socioculturais da velocidade generalizada: consequncias do tempo como
presso social ............................................................................................................ 34
II A VELOCIDADE COMO MARCA SOCIAL CONTEMPORNEA ..................... 42 1. Mudanas na noo de tempo com o advento das mquinas ................................... 48
2. A aspirao por velocidade na maquinizao .......................................................... 52
3. Tempo real como pice da velocidade na contemporaneidade ................................ 55
4. A relao entre tempo real e inovao contnua ....................................................... 62
5. Produtividade no trabalho e intensidade no tempo livre .......................................... 64
III METODOLOGIA: A ANLISE DE CONTEDO ................................................. 69 1. A anlise de contedo............................................................................................... 70
2. Definio do corpus de anlise ................................................................................ 72
3. O mtodo de anlise ................................................................................................. 73
IV RESULTADOS DA ANLISE ................................................................................... 77 1. O primeiro olhar sobre o material televisivo ............................................................ 78
a. Relao de diferentes anunciantes sobre o total capturado ............................... 79
b. Quantidade de anunciantes diferentes: 83 ......................................................... 81
c. Total de anncios diferentes na amostra e grupos de anunciantes .................... 81
2. Anlise dos comerciais televisivos grupo promocional ........................................ 85 a. Tempo ou validade da oferta ............................................................................. 85
b. No perder ou desperdiar a oportunidade ........................................................ 86
c. Ordens de comando para reaes imediatas do consumidor ............................. 87
d. Exclusividade da oferta em um determinado ponto de venda ........................... 88
e. Promoes identificadas por nomes de impacto e grandiosidade ..................... 89
f. Ordens que tentam evitar a passividade ou indiferena do consumidor ........... 91
g. Deslocamento do pagamento no fluxo do tempo .............................................. 92
h. Referncia aos preos baixos, s promoes e descontos especiais ................. 93
i. Referncia a lotao e movimentao no ponto de venda ................................ 94
j. Exemplos dos anncios promocionais coletados no meio televisivo ................ 95
3. Anlise dos comerciais televisivos grupo no promocional ................................. 98 4. Anlise dos comerciais impressos revista Veja ................................................... 103
a. Presena de expresses relativas a tempo, urgncia ou imediatismo .............. 105
b. Referncia aos preos baixos, s promoes e descontos especiais ............... 112
c. Deslocamento do pagamento no fluxo do tempo ............................................ 115
d. Caractersticas dos anunciantes ....................................................................... 118
5. Concluses sobre as amostras analisadas ............................................................... 122
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V A SOCIEDADE DE CONSUMO TEM PRESSA: SENTIDO DE URGNCIA E DISSONNCIA COGNITIVA .......................................................................................... 125
1. Impacincia, um subproduto da vida em velocidade ............................................. 127
2. O consumo em todo o tempo e lugar ...................................................................... 132
3. Do consumo utilitrio e simblico para o consumo urgente .................................. 137
4. A comunicao de mercado descobre a venda no imediato para o pagamento no
futuro ...................................................................................................................... 140
5. Como o argumento da urgncia atenua possveis dissonncias ............................. 145
6. A diminuio da dissonncia explica o endividamento ......................................... 152
VI COMUNICAO MERCADOLGICA E PODER NA SOCIEDADE DE CONSUMO ......................................................................................................................... 158
1. O incentivo competio na sociedade de consumo ............................................. 160
2. Consumo: de direito a obrigao ............................................................................ 165
3. A obrigao do consumo no imediato .................................................................... 169
VII PERSUASO A QUALQUER PREO ................................................................. 172 1. Incoerncia entre discurso e prtica da comunicao mercadolgica .................... 174
2. O impacto do trauma ps-censura .......................................................................... 175
3. A construo de atributos para produtos e servios ............................................... 177
4. O dito e o no dito na comunicao mercadolgica ............................................... 179
5. A irrealidade da urgncia promovida pela publicidade .......................................... 186
CONCLUSO ..................................................................................................................... 192
REFERNCIAS BIBLIOGRFICAS ............................................................................. 198
ANEXO TABELA DE ANLISE DOS COMERCIAIS DE TELEVISO...............205
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INTRODUO
O tempo est em tudo; e tudo, a vida toda, tempo. No h um canto do nosso corpo que
no esteja impregnado dele, um pedao de nossa historia que no se faa nele, e no h
nada que ainda no exista que no nasa embebido de tempo. O tempo, essa questo
absolutamente humana, o nosso maior mistrio, e talvez seja nossa principal angstia1.
Andra Bonfim Perdigo, Sobre o tempo, 2010.
Sentido de urgncia ou obsesso pelo imediato so conceitos de variados sentidos.
Nesta tese estas expresses esto ligadas cultura contempornea de existncia em tempo
real baseada nas tecnologias de alto desempenho e caracterizam o atual modelo de
comunicao mercadolgica.
Urgncia e imediatismo implicam consequncias no modo de vida atual. So
expresses derivadas da presso do tempo, dos acontecimentos que ocorrem no seu fluxo e
do encantamento que a possibilidade e a promessa de ser mais rpido promovem nos
indivduos. Esto intimamente relacionadas com o deslumbramento que o sistema de
produo, distribuio e consumo atual exerce nas pessoas ao oferecer a possibilidade de
antecipar ou adiar a realizao dos seus sonhos de consumo no fluxo desse tempo que passa
a ser o condutor e tambm o avaliador das aes. Nesse cenrio, o tempo se transformou
num valor social.
O despertar para o tema norteador da pesquisa ocorreu a partir da leitura do livro O
valor do amanh (2005), de Eduardo Giannetti da Fonseca, que procura mostrar como os
seres humanos administram a urgncia da realizao dos seus desejos em detrimento das
consequncias que tais realizaes podem trazer. Para Giannetti da Fonseca, os indivduos
vivem num conflito entre a espera e a realizao imediata, e preferem os prazeres agora,
mesmo tendo conscincia dos custos com os quais se depararo no futuro.
Nesta pesquisa, o valor do amanh se ligou aos discursos presentes na comunicao
mercadolgica com nfase no agora, no j, no s amanh. Nesse entroncamento de teorias
se encontraram: a tendncia humana de realizar os desejos no presente em detrimento dos 1 Com a finalidade de padronizar o texto, todas as citaes desta tese foram atualizadas de acordo com as
normas do Novo Acordo Ortogrfico, a menos que o texto tenha sido publicado em outro pas de lngua
portuguesa ou cuja ortografia tenha implicaes filolgicas e/ou semnticas que interfeririam no sentido
original do texto.
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custos futuros, teoria defendida por Giannetti da Fonseca (2005); a cultura contempornea
de velocidade, conforme apresentada por Paul Virilio (1996b, 1999) e Eugnio Trivinho
(2007a); e a necessidade de ajuste de cognies que estabelecem um estado de consonncia,
segundo a teoria da dissonncia cognitiva de Leon Festinger (1975). O marco central desse
entroncamento de teorias a comunicao de mercado e o objetivo deste trabalho foi
estudar suas interrelaes.
Constatou-se nesta pesquisa que a presso de tempo evidenciada nos anncios
separados como corpus se manifesta sob o apelo do urgente, do imediato, da pressa, da
velocidade. Todas essas expresses so consideradas neste estudo como tradutoras das
diversas formas com as quais o tempo (e suas manifestaes) influencia a vida
contempornea. Esta tese procurou desvelar os pontos de contato e a forma como a
comunicao de mercado se aproxima dessa sociedade impaciente, repleta de indivduos
pressionados pelo tempo.
Esta pesquisa partiu da hiptese de que a comunicao de mercado est se
apropriando da cultura de urgncia, desse imprio do imediato experimentado pela
sociedade, como argumento de persuaso em suas mensagens. Os fundamentos para
sustentar a jornada de investigao foram sendo estabelecidos, autores de base foram sendo
reunidos e a metodologia adequada foi se definindo para entender e desvelar o problema
central da pesquisa: se existe uma apropriao do fator tempo como elemento de persuaso
em anncios veiculados nos meios de comunicao, ento como essas caractersticas so
transportadas para a comunicao de mercado?
A partir da hiptese inicial e do problema-base que ela levanta, os objetivos da
pesquisa se concentraram em descobrir as caractersticas que regem a existncia social
contempornea sob a presso do tempo, essa tendncia de acelerao que resulta no que foi
denominado como imprio do imediato. O trabalho teve tambm como meta verificar se
essa presso da cultura de urgncia permeia a comunicao de mercado e constatar que
apelos relativos a esses elementos a comunicao utiliza para impactar sua audincia.
Como amostra para esta pesquisa foram analisados mais de trezentos comerciais de
televiso capturados das TVs Globo, Record e Bandeirantes durante o ano de 2010,
predominantemente no horrio noturno da programao. Esses anncios foram investigados
pelo mtodo de anlise de contedo, de Laurence Bardin (2009) e selecionados a partir de
uma amostra no probabilstica de convenincia, por ser mais acessvel e bem articulada
com a anlise (BOYD JR. e WESTFAAL, 1979).
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A anlise de comerciais de televiso constitui a base para as concluses
estabelecidas. Contudo, um pequeno contraponto foi estabelecido a fim de lanar um olhar
para o passado, na tentativa de observar se a hiptese tambm se confirmaria em fases
pregressas da comunicao mercadolgica, ou se a hiptese valida-se, de fato, apenas nos
anos recentes, ratificando a novidade. Para isso, acrescentou-se anlise do meio televisivo
um estudo sobre anncios impressos. Foram analisadas propagandas extradas da revista
Veja no perodo de 1980 a 2010. Essa parte da pesquisa sobre o meio impresso foi realizada
com o objetivo de observar a existncia dessa cultura de urgncia ou imprio do imediato
em dcadas anteriores, bem como acompanhar se existe uma tendncia de crescimento de
sua presena, a partir de 1980 at meados 2010.
A partir da definio da hiptese, do problema norteador e dos objetivos centrais, a
pesquisa transcorreu observando os problemas que a comunicao com o mercado enfrenta
cada vez mais para diferenciar seus produtos e servios perante um consumidor que dispe
de um oceano de opes. A imensa oferta de produtos e servios que prometem atender em
tempo real qualquer necessidade ou desejo do consumidor caracterstica bsica do mundo
capitalista atual. Praticamente tudo o que uma pessoa venha a necessitar est ao seu alcance
atravs de um clique, pelos corredores dos shoppings, nos hipermercados ou nas lojas
quase onipresentes de convenincia. preciso quase que fazer um esforo para evitar as
compras hoje em dia (UNDERHILL, 1999, p.33).
Essa caracterstica da sociedade de consumo atual se deve, em muito, Revoluo
Industrial e eliminao das dificuldades de produo que culminou nos tempos atuais em
uma comoditizao de produtos e servios. Logo, a dificuldade econmica se moveu da
produo de produtos e servios para a produo do consumo. Neste ltimo so investidos
bilhes de dlares em estratgias de marketing e campanhas de comunicao com o mercado
que apelam para o valor dos produtos e servios, sua utilidade e a carga simblica a eles
(produtos e servios) emprestada. E uma vez que a comunicao de mercado reconhece
nessa homogeneizao das caractersticas dos produtos e servios um obstculo para as
vendas, torna-se necessrio falar algo mais, para alm dos aspectos utilitrios ou simblicos
dos produtos.
exatamente nesse ponto que cresce a nfase no imediato, no consumo agora, para
tentar evitar que o consumidor se sinta perdido no mar de ofertas (SCHWARTZ, 2007) e
assim se defina por comprar um produto anunciado sob grande presso do tempo. Numa
poca de similaridades de tecnologia e utilidade entre os concorrentes, o tempo que surge
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como argumento de vendas. O consumo deve ser agora. A deciso, imediata. O amanh no
existe nesse simulacro onde o que impera o imediato.
A observao dos elementos de urgncia e imediatismo presentes na comunicao de
mercado, predominantemente em anncios de televiso, justificou a proposio da hiptese
desta pesquisa. A hiptese surgiu da evidncia de que, para manter o fluxo de vendas em alta
rotao, necessrio despertar no consumidor mais do que o reconhecimento de suas
necessidades bsicas. preciso que cada anncio desperte no consumidor o sentimento de
urgncia, de que a oferta do momento a melhor de todos os tempos e desperdi-la pode
custar caro. Paradoxalmente em muitos anncios as despesas so tratadas como economia,
desde que feitas imediatamente. Antes que a insegurana e o temor do desperdcio de boas
oportunidades se instalem na mente do consumidor, o apelo ao urgente se apresenta para
fomentar a deciso de consumo.
Todo anncio procura se diferenciar de alguma maneira dos seus concorrentes. A
diferenciao um dos princpios bsicos da criao publicitria. Entretanto, embora
produzidos intencionalmente para serem diferentes, possvel detectar e isolar muitos
elementos semelhantes e comuns que caracterizam esses comerciais. So essas
caractersticas semelhantes, ao aproveitarem da presso do tempo evidenciada na
comunicao de mercado, que sintetizam as razes deste estudo.
Esta tese tambm se justificou pela necessidade do entendimento das caractersticas
da comunicao com o mercado e dos recursos que ela articula para atenuar as dissonncias
cognitivas que inibem as decises de compra, atravs dos argumentos de desperdcio ou, na
sua via contrria, de urgncia nesse ambiente social que supervaloriza ou depende do
imediato.
Nessa relao, o sentido de urgncia e o imperativo do agora agem como propulsores
do consumo ao proporcionarem consonncia aos dilemas do consumidor diante do apelo ao
consumo. O consumidor vive entre dilemas: comprar agora ou depois; atender aos apelos da
publicidade, que estimulam o consumo hoje, ou guardar os recursos para investir em outros
projetos. O tempo exerce presso sobre as decises de compra e no desperdiar a melhor
oferta do mundo tende a deixar o consumidor momentaneamente em paz. Essa a busca por
consonncia a que se refere Leon Festinger (1975).
Essa sociedade de consumo adquire contornos mais complexos se analisada pela
transformao social promovida pela cultura do imprio do imediato. O apelo intenso. S
amanh! Grande liquidao! Preos jamais vistos! Compre agora! A caracterstica de
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urgncia intrnseca na comunicao de mercado refora a necessidade de tomadas de
decises no instante, sem modificar os princpios e valores anteriores que todo consumidor
carrega. Tais valores so controle de gastos, equilbrio entre receitas e despesas, que so
inibidores do consumo. Contudo, esses indivduos, mesmo convictos de que no devem
gastar agora, podem, repentinamente, mudar suas cognies, diante dos apelos persuasivos
de urgncia apropriados pela comunicao de mercado. Assim alteram momentaneamente
suas cognies anteriores, permitindo uma pequena brecha para uma deciso de compra no
instante.
Ries e Trout (2002, p.25-27) estabelecem algumas eras para a propaganda. A
primeira era a era do produto, em que os profissionais destacavam as caractersticas dos
produtos e os benefcios para o cliente. Ao perodo seguinte denominaram era da imagem,
dando valor reputao ou imagem como superior ao prprio produto no argumento de
vendas. Por fim, indicaram que o sucesso da propaganda nos anos 80 se daria pelo que
definiram como era do posicionamento, perodo em que torna-se mais importante a
definio de um segmento para as marcas ocuparem na mente do consumidor. O que se
percebe hoje conforme aponta esta tese a existncia de uma era da urgncia, um
imprio do imediato, conceito que se soma aos estudos de sistematizao das caractersticas
da comunicao de mercado.
Nessa era de comoditizao, os argumentos do urgente e do imediatismo so
excelentes alternativas para o estmulo do consumo. A obsesso pelo imediato cultura e
tambm persuaso apropriada pela comunicao de mercado.
A relevncia desta pesquisa se d tambm por sua abordagem peculiar. Pelo menos
aos olhos limitados deste pesquisador, foram bem poucos os estudos especficos de
comunicao de mercado que realizaram produes tericas semelhantes, especialmente na
questo da anlise dessas caractersticas de urgncia e imediatismo presentes nos discursos
da publicidade. Apenas o artigo A vida no s agora: os slogans de cartes de crdito
como sintoma hipermoderno, de Marcio Acselrad e Trcia Alcntara de Freitas (2009), tem
caractersticas e estruturas semelhantes a esta tese, embora com objetos de anlise e
concluses diferentes.
A tese foi estruturada em sete captulos. No primeiro captulo foram lanados os
fundamentos epistemolgicos para o entendimento do tempo como vetor disseminador de
presso aceleradora, que culminar na cultura de urgncia e imprio do imediato. O resgate
dos fundamentos epistemolgicos vai alm das anlises originalmente desenvolvidas pelas
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cincias exatas ou pela literatura. A partir dos conceitos desenvolvidos por Paul Virilio
(1996b, 1999) e posteriormente retrabalhados por Eugnio Trivinho (2007a) e Ciro
Marcondes Filho (2005), entre outros, a velocidade ser analisada como um fenmeno
social, de impacto direto sobre o modo de vida contemporneo, com forte interdependncia
com os avanos tecnolgicos e da comunicao de massa. As primeiras anlises
desenvolvidas por Virilio em Velocidade e poltica (1996) percorrem um caminho reflexivo
inovador porque substituem o conceito de riqueza pelo de velocidade para explicar os rumos
das civilizaes. Em sua viso, a lgica que predomina na sociedade contempornea a da
presso do tempo sob a forma de existncia veloz, e no mais a da riqueza. Nesse captulo,
ser evidenciado o percurso de sistematizao e teorizao da velocidade, entendida
primeiramente no movimento das massas pela ocupao dos espaos (nas cidades e na
guerra), para ser alada, conforme Trivinho e Marcondes Filho, condio de movimento
ininterrupto e violento gerador de um estado de urgncia e de um imprio do imediato nos
indivduos e nas massas.
No segundo captulo so delineados os efeitos desse imprio do imediato que
culminam por caracterizar a sociedade contempornea como uma sociedade marcada pela
velocidade. Foram consideradas as caractersticas da sociedade miditica avanada, sua
obsesso pelo mais rpido e os efeitos da cultura vigente sobre os indivduos no seu
ambiente de trabalho, na esfera do lazer, sob a influncia das comunicaes em tempo real.
No se trata de uma crtica infundada sobre benefcios ou prejuzos advindos da evoluo
tecnolgica e das comunicaes mveis, instantneas e de alta velocidade, mas, sim, a
definio de um prisma crtico sobre um efeito proporcionado pela acelerao social que no
se pode negar. Nesse captulo constam estudos sobre a necessidade social contempornea de
ser mais rpido sempre, a dependncia econmica da velocidade no ritmo de produo e
distribuio, a cultura do tempo real, os seus efeitos sobre o tempo livre, bem como o
impacto patolgico desse ambiente social acelerado nos indivduos.
A partir desse pano de fundo estabelecido nos dois primeiros captulos, apresentam-
se nos captulos trs e quatro, respectivamente, os fundamentos metodolgicos da pesquisa e
os resultados das anlises. A metodologia utilizada foi a anlise de contedo, tendo por
referncia os estudos de Laurence Bardin, extrados da edio de seu livro revista e
atualizada em 2009. A metodologia escolhida foi fundamental para elevar esta pesquisa para
alm da sociologia ingnua (BARDIN, 2009). A confiabilidade do mtodo e as inferncias
que o mesmo permite foram fundamentais para direcionar o trabalho a concluses seguras,
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do ponto de vista cientifico, e relevantes para a contribuio social e acadmica deste
trabalho.
Os resultados apresentados no captulo quatro so o corao da pesquisa. Foram
definidas nove categorias de anlise para identificar a presena do argumento da urgncia na
comunicao de mercado e suas caractersticas. Das nove categorias definidas, quatro se
destacam por atingir o centro do alvo investigativo levantado na hiptese. A primeira delas
diz respeito ao uso do tempo ou de uma data de validade de uma oferta ou promoo. Nessa
categoria foram codificadas as principais argumentaes que sustentam a hiptese de que o
urgente apropriado pela comunicao de mercado. Essa afirmao pode ser percebida em
72% dos anncios, que se utilizaram de expresses como s amanh; um dia exclusivo;
uma semana de ofertas; amanh at o meio dia; agora; vlido at; exclusivo para hoje. A
segunda categoria mostrou o argumento de ordem direta ao consumidor para no perder ou
no desperdiar a oportunidade anunciada. Os argumentos codificados foram: aproveitar
agora; imperdvel; por pouco tempo; est acabando; um dia para aproveitar; aproveite o
dcimo terceiro salrio; aproveite o IPI zero. O imperativo desse discurso de aproveitar
agora aparece no ttulo da tese, imprio do imediato, e se harmoniza com a proposta da
teoria da dissonncia cognitiva. Ele apresenta novas informaes que acomodam as
dissonncias ao fornecer slidas cognies em harmonia com a tendncia humana pelo
imediato. A terceira categoria se soma segunda ao apontar estmulos ao imediata.
Corra; corra agora; corra para as lojas; chegue cedo; chegue primeiro; venha correndo;
ligue agora; venha antes que acabe. necessrio destacar nesta introduo ainda mais uma
categoria, que identifica a tentativa de evitar a passividade ou indiferena diante de oferta.
Os cdigos decifrados indicam uma tentativa de incomodar o consumidor e eliminar uma
possvel dissonncia. Isso feito atravs de discursos do tipo: o que voc est esperando?;
no espere nem mais um minuto; no perde tempo; no perca essa oferta; no se arrependa
depois; at quando voc vai ficar no quase; no vai sobrar nada; voc tem cinco minutos
para ligar.
Os resultados das anlises fundamentaram a escrita da parte final desta tese. No
captulo cinco foram debatidas as prticas da comunicao mercadolgica sob a perspectiva
dessa sociedade de consumo caracterizada pelo imprio do imediato e sua relao com a
teoria da dissonncia cognitiva. A velocidade caracterizada como uma nova dimenso das
relaes mercadolgicas e de consumo, definida por Bertman (1999) como fora persuasiva
do agora. O tempo passou a ser um aliado do sistema de produo, proporcionando-lhe uma
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velocidade inimaginvel. Mas esse ritmo precisou ser incorporado pelo sistema de
distribuio e consequentemente pelo consumo que o absorve. A comunicao
mercadolgica contribui para fomentar a cultura do imediato, que garante velocidade em
todas as esferas que compem esse mercado. Ela tem argumentos estruturados sob o regime
dromolgico (TRIVINHO, 2007a) para estimular o consumo, sugerindo cognies para
solucionar as dificuldades naturais de uma deciso de compra. Se o consumidor tem um
carto de credito comprometido nos prximos trs meses, a comunicao de mercado lhe
oferece um prazo para comear a pagar aps esse perodo. Se o mesmo consumidor est
propenso a cuidar do seu futuro de longo prazo, a comunicao de mercado explora a
seduo pelo prazer imediato, a curtio do momento. Se no existe uma novidade
tecnolgica revolucionria para lhe oferecer, a comunicao apela para o superdesconto de
hoje. S hoje.
No sexto captulo so analisados aspectos comportamentais dos indivduos sob a
influncia dessa sociedade de consumo que tem sua obsesso no imediato. A carga simblica
inerente aos discursos mercadolgicos sugeridos pelas marcas impe uma valorizao social
do indivduo a partir daquilo que ele consome, vindo a possuir, usufruir, ostentar e
consequentemente adquirindo a desejada aceitao. Dessa carga simblica promovida pela
comunicao mercadolgica deriva uma sugesto indireta de que o consumo no um
direito adquirido a partir dos resultados do esforo de cada indivduo em sua jornada, mas,
sim, uma obrigao a que este se encontra exposto pela necessidade ou desejo de ser e
pertencer. Com o advento do imprio do imediato, essa presso tende a aumentar, pois esse
novo argumento se soma aos anteriores, tornando a presso em direo ao consumo no s
utilitria e simblica, mas urgente.
O ltimo captulo da tese foi escrito com o objetivo de chamar a ateno para
possveis deslizes ticos ou para as dificuldades de uma prtica comunicacional que preze
pela moralidade integral, pressuposta em todas as atividades econmicas e sociais. Vive-se
hoje uma poca de valorizao de programas e aes empresariais que se preocupam com as
questes sociais, principalmente no campo da tica e da honestidade, e esse captulo analisou
as caractersticas da comunicao de mercado descortinadas das entrelinhas dos discursos,
refletindo sobre o seu discurso e sua prtica, sobre o dito e o no dito. Se um anncio diz que
uma promoo est ocorrendo apenas durante um perodo de tempo, mas, na realidade, ela se
estende para alm do perodo, ento caracteriza-se um desvio tico? E, se uma campanha
assume que oferece algo exclusivo, mas diversos concorrentes oferecem promoes
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similares, existe a possibilidade de as palavras no serem verdadeiras, ou no refletirem a
realidade observada? O objetivo do ltimo captulo foi levantar questes relacionadas
tica da comunicao de mercado, atravs de uma reflexo sobre o que dito de forma
explcita nos anncios e tambm sobre aquilo que permanece obscuro, o no dito, e que
precisa ser lido nas entrelinhas.
Por fim, a concluso reflete sobre os resultados alcanados por esta tese, demonstra a
confirmao da hiptese definida no incio da pesquisa e sugere possibilidades de pesquisas
futuras acerca do objeto deste estudo.
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I FUNDAMENTOS EPISTEMOLGICOS DA
VELOCIDADE
A velocidade a forma de xtase que a revoluo tcnica concedeu ao homem.
Milan Kundera, Slowness: a novel, 19951.
A velocidade, como vetor, no um fenmeno novo. O vento sopra velozmente
desde os primrdios da histria do planeta Terra. Os rios correm em seus leitos, alguns mais
rpidos, outros nem tanto. Muitas espcies animais se movimentam de modo absolutamente
veloz, mesmo em comparao com os veculos modernos. A natureza tem suas formas de
velocidade, que, em parceria com a interveno humana, criaram meios de transporte
capazes de se movimentar mais rapidamente e com mais resistncia do que os passos de um
viajante. o caso das embarcaes vela no passado. Eram rpidas e podiam percorrer
longas distncias.
A mecanizao trouxe um novo horizonte para a velocidade. O trem movido a vapor
representava um avano sobre as embarcaes vela. Enquanto barcos vela eram
dependentes da fora dos ventos e sujeitos s intempries e aos perigos martimos, os trens
no se intimidavam com subidas, chuvas ou tempestades. A velocidade proporcionada pelo
surgimento da mecanizao atuou como vetor de acelerao e alterou radicalmente sculos
de gesto de tempo e de sensaes de acelerao e velocidade.
O filsofo e ensasta francs Paul Virilio um pensador heterodoxo, com conceitos
inovadores no mbito da velocidade e da acelerao da vida humana. Ele pode ser
considerado um dos primeiros a tocar o tema sob uma tica poltica e social, e no pela via
literria (SANTOS, 1996, p.9). A revista Famecos o define como um autor comprometido
com a inovao e engajamento: Para ele, estar na contramo das modas intelectuais uma
obrigao dos pensadores autnomos e engajados nas lutas por um mundo melhor
(VIRILIO, 2001, p.7). O autor do prefcio de sua obra Velocidade e poltica, Laymert Garcia
dos Santos (1996, p.10), afirma que esse livro que pode ser considerado o marco
revolucionrio da expresso do pensamento de Virilio no to importante pelo que diz,
como pela questo que levanta. As suas obras que discutem os fenmenos da velocidade se 1 A citao foi extrada da obra Acelerado (2000), de James Gleick.
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transformaram em referncias para estudiosos das reas da comunicao e da sociologia, e
tambm para outros profissionais interessados nos eventos que caracterizam a sociedade
contempornea. No toa que os roteiristas de Matrix, o maior Cult movie do ano 2000,
admitiram terem sido profundamente influenciados pelo aspecto sombrio de sua obra
(RIBEIRO, 2006, on-line).
Em Velocidade e poltica, Virilio percorre um caminho reflexivo inovador porque
substitui o conceito de riqueza pelo de velocidade para explicar os rumos das civilizaes.
Em sua viso, a lgica que predomina na sociedade contempornea a da velocidade, e no
a do acmulo de riqueza em si.
Na primeira parte de sua obra so lanados os fundamentos para o entendimento da
questo inicial da velocidade, partindo dos movimentos das massas. a circulao que as
caracteriza. Paradoxalmente, o contingente revolucionrio no atinge sua forma ideal nos
locais de produo, e sim na rua, quando deixa de ser, durante algum tempo, substituto
tcnico da mquina e torna-se, ele prprio, motor (mquina de assalto), isto , produtor de
velocidade (VIRILIO, 1996b, p.19). Considerando as pessoas que circulavam pela cidade
de Paris por ocasio da Revoluo Francesa, ele descreve que, para os diversos bandos
revolucionrios [...] na hora H ser mais importante conservar a rua do que ocupar este ou
aquele edifcio (VIRILIO, 1996b, p.10). So configuraes iniciais, para o autor, de uma
transferncia de poder do objeto concreto para o movimento e/ou sua velocidade. De modo
impressionante, Virilio se relaciona aqui com McLuhan, pois, se para este o meio a
mensagem, para Virilio a circulao a revoluo.
Com seu estilo polemista, de to convicto de sua tese sobre a velocidade, prope uma
correo celebre frmula de Marshall McLuhan. Para Virilio (1999, p.136), a mensagem
no o meio, mas somente sua velocidade. Avanando no tempo e na compreenso da
temtica, Virilio comenta em outra obra, A bomba informtica (1999), que a interao
homem-computador cria um novo tipo de guerra, baseada na interatividade global, que torna
mais clara sua verso alternativa ao conceito de McLuhan, porque a interatividade, a
imediatez, a ubiquidade, eis a verdadeira mensagem da emisso e da recepo em tempo
real. [...] a informao menos o contedo explcito que a rapidez do seu feedback (1999,
p.137).
Virilio chegou a esse conceito partindo da sua viso sobre a guerra, sobre a formao
das cidades, suas ruas, a circulao que as caracteriza e os movimentos das massas que as
dominam. Ele expe a maneira como, no incio da era moderna, as classes abastadas se
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apropriaram da velocidade das massas para se manterem na elite da sociedade. Elas
conseguiram esse feito ao recriar o conceito de cidade. Para Virilio, a presena das massas
no fenmeno urbano no devia ofuscar a percepo de que o que conta, na verdade, no
tanto a cidade em si, mas a circulao que ali se desenvolve. Ele se refere clssica oposio
cidade/campo em estado de transformao, sendo substituda pela ideia de
estao/circulao, mais caracterstica das cidades.
Apesar das investigaes comprobatrias sobre os traados urbanos, a cidade no foi
prioritariamente percebida como habitat humano penetrado por uma via de
comunicao rpida (rio, estrada, litoral, via frrea...). Ao que parece, esqueceu-se
que a rua to-somente uma estrada atravessando uma aglomerao urbana, ainda
que, a cada dia, entretanto, a legislao sobre a limitao de velocidade dos veculos nas cidades nos evoque essa continuidade do deslocamento, do movimento,
que apenas a lei da velocidade pode modular. A cidade apenas uma paragem, um
ponto sobre a via sinptica de uma trajetria, antigo talude de fortificao militar,
plataforma de vigilncia, fronteira ou margem, onde se associam instrumentalmente
o olhar e a velocidade de locomoo dos veculos (VIRILIO, 1996b, p.21).
As cidades representam a mudana de um paradigma, de que o domnio se daria pela
imobilizao, quando o que ocorre justamente o contrrio, pois o controle est no
movimento. Nas cidades, a rua como um novo litoral; o domiclio, um porto do transporte
de onde se pode medir a importncia do fluxo social, prever seus transbordamentos. As
portas das cidades, seus postos fiscais e suas alfndegas so barreiras, filtros fluidez das
massas, ao poder de penetrao das hordas migratrias. Se houve um tempo em que o
controle do escravo se dava pelo domnio de sua circulao, de velocidade limitada, o que
impera agora, na viso de Virilio, de modo contrrio, o controle da circulao,
determinante de riqueza.
A circulao na cidade, ponto de partida para a compreenso do valor da velocidade,
sugere que, quanto maior o movimento primeiro das pessoas, depois da informao ,
maior a riqueza e o controle. Vale a pena retornar verso alternativa ao conceito de
McLuhan: a mensagem no o meio, mas somente sua velocidade.
1. Da liberdade de movimento ditadura da velocidade
A chave para a compreenso do pensamento de Virilio aparece no final do primeiro
captulo de Velocidade e poltica, justamente no entendimento de que, para ele, a captao
dos movimentos de uma cidade em prol de sua defesa a transformam numa mquina. Para
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Virilio, a principal fortaleza a cidade-mquina (1996b, p.27), que se mantm em constante
movimento, pois a inrcia significa morrer (1996b, p.28). Se antes das cidades, no perodo
feudal, imperava uma ditadura da imobilidade, os tempos agora so da ditadura do
movimento. Na sociedade contempornea, no existe espao para a inrcia, para a no
comunicao, para o no movimento. Se houve um perodo na histria em que a punio ao
indivduo se dava por meio da imobilizao, se apresenta no contexto contemporneo uma
ditadura da mobilidade, e esta em acelerao de tudo e para tudo. Virilio (1996b, p.40-41)
comenta revolues sociais e movimentos na Frana que apontam exatamente para essa
tendncia:
Os eventos de 89 [1789] pretendiam ser uma revolta contra a sujeio, isto , a
coao imobilidade simbolizada pela antiga servido feudal que ainda subsistia,
alis, em certas regies como o Jura, revolta contra a restrio moradia e a priso
arbitrria. Mas o que ningum imaginava que a conquista da liberdade de ir e vir, to cara a Montaigne, poderia se transformar, num passe de mgica, em coao
mobilidade. O levante de massa de 1793 a instaurao de uma primeira ditadura do movimento substituindo sutilmente a liberdade de movimento dos primeiros dias
da revoluo. A realidade do poder nesse primeiro Estado moderno aparece, para
alm da capitalizao da violncia, como capitalizao do movimento.
Com essas teorias, Virilio lana um olhar para o futuro e, de certa forma, acerta o
alvo ao analisar a sociedade contempornea caracterizada pelo imprio da velocidade na
cultura informacional promovida pelas novas tecnologias da comunicao e informao. Se
antes havia um sonho de liberdade de movimento, hoje parece haver uma coao
movimentao, e esta em ritmo alucinante. Para entender a comunicao de mercado hoje,
como esta tese defende, crucial reconhecer a coao movimentao que Virilio aponta,
como nova forma de relao com o tempo. Essa a razo pela qual o estudo da apropriao
poltica e social da velocidade, como este que se empreende neste captulo, deve anteceder
qualquer anlise contempornea sobre a comunicao mercadolgica.
Mas Virilio avana mais na sua conceituao sobre a velocidade. A percepo de que
o movimento uma arma de guerra, e a circulao, seu poder blico, apresentada e
discutida pelo autor na segunda parte de Velocidade e poltica.
A violncia por intermdio da velocidade e do movimento comeou com as
estratgias blicas de ocupao dos mares. o direito ao mar o objeto de sua reflexo. O
direito ao mar rapidamente se torna o imprio dos mares (VIRILIO, 1996b, p.53). A
lgica desta estratgia era espalhar unidades de guerra (navios, submarinos, etc.) por todo o
mar e, assim, inibir o inimigo, mesmo sem atac-lo. O reconhecimento, por parte do inimigo,
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de que pode ser atacado e destrudo a qualquer momento deve dissuadi-lo de reagir. O
conceito que d nome a essa estratgia descrita por Virilio (1996b, p.50) fleet in being:
A fleet in being a logstica realizando plenamente a estratgia como arte do
movimento dos corpos no vistos [...], a presena permanente de uma frota
invisvel no mar podendo golpear o adversrio em qualquer lugar e a qualquer
momento, aniquilando sua vontade de poder com a criao de uma zona de
insegurana global onde ele nunca estar em condies de decidir com segurana, de querer, isto , de vencer. Trata-se, pois, sobretudo de uma nova ideia da violncia
que no nasce mais do enfrentamento direto, do derramamento de sangue, mas das
propriedades desiguais dos corpos, da avaliao da quantidade de movimentos que
lhes so permitidos num elemento escolhido, da verificao permanente de sua
eficcia dinmica.
Esse o modelo de estratgia indireta, em que o desespero pela presena contnua
s vezes invisvel e prolongada do adversrio pode ser to cruel quanto o prprio combate,
ao infligir-lhe contnuos sofrimentos morais e materiais que o enfraqueam e destruam [...].
Como diz o adgio: O medo o mais cruel dos assassinos; ele no mata jamais, mas vos
impede de viver (VIRILIO, 1996b, p.51). Essa estratgia reproduz os mesmos efeitos do
estado de stio da fortaleza comunal, o estado de stio permanente (1996b, p.51, 25).
Nesse estgio, o domnio do outro no se d mais pelo confronto, mas pela ameaa,
que s se realiza pela posse dos vetores tecnolgicos mais avanados. Assim, a fleet in being
estabelece outro princpio de guerra, a guerra pela presena constante, no visvel mas
percebida, suave e tambm estrondosa. Diante do prefixo grego dromo, que denota corrida,
velocidade, Virilio classifica um regime articulado pela velocidade e pela acelerao como
dromocrtico.
A fleet in being cria uma nova ideia dromocrtica; no se trata mais da travessia de
um continente, de um oceano, de uma cidade a outra, de uma margem a outra. A fleet
in being inventa a noo de um deslocamento que no teria destino no espao e no
tempo. Ela impe a ideia primordial do desaparecimento na distncia e no mais nos
riscos da conflagrao. Ela realiza continuamente uma corrida para mais longe
(VIRILIO, 1996b, p.52).
muito importante ressaltar esse deslocamento sem destino no espao e no tempo.
Pode ser feita uma analogia com a produo tecnolgica e econmica atual, cujo fim
tambm o do no retorno, da produo ad infinitum liberada de qualquer finalidade, ou
melhor, que tem por finalidade apenas estabelecer um permanente estado de stio. Aqui se
nota uma ponte de entendimento sobre a condio da economia no perodo ps-Segunda
Guerra Mundial.
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precisamente no momento em que o esquema do evolucionismo tecnolgico
ocidental sai do mar que a substncia da riqueza comea a desmoronar [...]. a
velocidade como natureza do progresso dromolgico que arruna o progresso [...].
Tal como na origem da fleet in being, a manuteno do monoplio exige que a toda
nova mquina seja logo contraposta uma mquina mais rpida. Mas com o limiar das
velocidades se estreitando sem parar, fica cada vez mais difcil de conceber o
engenho rpido. Ele frequentemente se torna obsoleto antes mesmo de ser
aproveitado; o produto est literalmente gasto antes de ser usado, ultrapassando
assim, na velocidade, todo o sistema de lucro da obsolescncia industrial! [...] Quando as riquezas, as capitalizaes, os modos de produo saram de seus antigos
enclaves, no foi para atender s trocas, ao livre comrcio, e at a sua socializao,
portanto, mas a seu poderio veicular prprio, ao mximo de sua eficincia dinmica.
Eis a a futilidade de uma riqueza desaparecida na essncia do progresso dromolgico (VIRILIO, 1996b, p.56-57).
A violncia da velocidade apontada por Virilio ser objeto de consideraes mais
concentradas adiante, no prximo item deste captulo. Por enquanto, preciso ressaltar que o
conceito de Virilio apresenta relaes com o crculo de consumo e velocidade do sistema de
trocas criticado por Zygmunt Bauman (2008, p.45). Tambm se nota a presena do
movimento, da rotao e da velocidade que os produtos precisam manifestar em seu ciclo de
existncia ao serem consumidos, fazendo girar a economia de mercado e o sistema de
consumo. O ambiente contemporneo de instabilidade e insaciabilidade dos desejos, numa
velocidade de obsolescncia considervel, estabelece aqui uma interseco terica a ser
investigada. O estado de novos lanamentos e promessas de produtos revolucionrios
demonstra evidncias que comprovam, no campo da comunicao com o mercado, as ideias
de Virilio sobre o uso da velocidade como presena e controle pelos movimentos (do
mercado) no vistos, mas percebidos pela comunicao.
Um ambiente lquido-moderno inspito ao planejamento, investimento e
armazenamento de longo prazo. De fato, ele tira do adiamento da satisfao seu
antigo sentido de prudncia, circunspeco e, acima de tudo, razoabilidade. A
maioria dos bens valiosos perde seu brilho e atrao com rapidez, e se houver atraso
eles podem se tornar adequados apenas para o depsito de lixo, antes mesmo de
terem sido desfrutados. E quando graus de mobilidade e a capacidade de obter uma
chance fugaz na corrida se tornam fatores importantes no que se refere posio e ao
respeito, bens volumosos mais parecem um lastro irritante do que uma carga
preciosa (BAUMAN, 2007, p.44).
Esse problema ser estudado um pouco mais detalhadamente em captulo prprio
desta tese, mas demonstra-se evidente em discusses sobre a cultura do excesso e
obsolescncia planificada. Schwartz (2007) discute a cultura do excesso como paralisante,
em que as muitas ofertas e opes de produtos s quais o consumidor exposto se
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transformam num veneno paralisante e se assemelham ao estado de permanente vigilncia
descrito no conceito de fleet in being.
Virilio conclui essa parte de sua anlise no segundo captulo a partir do raciocnio de
que a humanidade caminha para a diviso em dois grupos, os povos esperanosos e os
desesperanosos. Os povos esperanosos tm a permisso de esperar pelo amanh, pelo
futuro: a velocidade que eles capitalizam lhes d acesso ao possvel, isto , ao projeto,
deciso, ao infinito a velocidade a esperana do Ocidente (1996b, p.57). Por sua vez, os
povos denominados por ele como desesperanosos so imobilizados pela inferioridade de
seus veculos tcnicos, vivendo e subsistindo num mundo finito (1996b, p.57).
2. Violncia e guerra na origem do fenmeno da velocidade
O conceito de velocidade nas obras de Virilio caracterizado por comparaes e
figuras de linguagens. Ele usa o exemplo das cidades-mquinas, dos barcos na fleet in being
e se utiliza tambm do conceito de prtese. Essa ideia parte da situao dos corpos mutilados
dos soldados aps as guerras. Para ele, a ditadura do movimento exercida sobre a massa pelo
poder militar outra forma de comparao e referncia para o conceito de velocidade e
poltica resulta na promoo de corpos mutilados. Descobrira-se que os desgastes
causados na mecnica dos corpos sobreviventes pelas mquinas de guerra podiam ser
compensados por outras mquinas, as prteses (VIRILIO, 1996b, p.67). Esse conceito
mencionado por Santos (1996) no prefcio do livro e trata dos efeitos que o investimento na
velocidade tecnolgica provoca nos corpos. a lgica da corrida que inverte sua prioridade.
Deixando de investir na terra e no mundo, passa a investir progressivamente no vetor
tecnolgico como forma de manter o corpo em movimento, promovendo um verdadeiro
assalto natureza do homem.
Essa prtese corporal especialmente necessria no contexto aps as guerras pode ser
comparada s prteses modernas, que demarcam avanos tecnolgicos e que levam o
homem contemporneo, oprimido na e pela guerra atual do ser mais veloz, a alcanar seus
objetivos no espao e no tempo, transpondo distncias, eras e quaisquer outros obstculos ao
seu esprito desbravador com o auxlio das prteses tecnolgicas, vetores de sua acelerao.
Para o autor, essas prteses so necessrias para o domnio das elites dromocrticas, que
prezam a mobilidade acima de tudo, porque sabem que dominar significa poder-invadir e
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ocupar uma posio dominante, o que os leva a buscar prteses cada vez mais sofisticadas
(1996, p.12).
Esta a primeira teoria social e poltica sobre a velocidade e sua funo ou papel na
vida contempornea. O livro de Paul Virilio considerado por muitos como uma descoberta
fecunda: a supremacia do no lugar sobre o lugar. Essas ideias so as razes que deram
origem aos seus principais conceitos diretamente relacionados com a comunicao, expostos
em suas obras posteriores, como A bomba informtica (1999).
O resultado do processo dromolgico e da mudana de ateno e interesse do
territrio para o espao, das mquinas para a velocidade, estabelece a velocidade
desterritorializada como valor supremo (SANTOS, 1996, p.13), e a valorizao e/ou
dependncia da acelerao tem sua relao muito prxima com o chamado progresso
humano e social (VIRILIO, 1996b, p.95).
O estreitamento das distncias transformou-se numa realidade estratgica com
consequncias econmicas e polticas incalculveis pois equivale a negao do
espao. A manobra que consistia ontem em ceder terreno para ganhar Tempo perde
qualquer sentido; atualmente, o ganho de Tempo questo exclusivamente de
vetores e o territrio perdeu seu significado ante o projtil. De fato, o valor
estratgico do no lugar da velocidade suplantou definitivamente o do lugar, e a
questo da posse do Tempo renovou o da posse territorial [...] Com o vetor
supersnico (avio, foguete, massa de ondas), a penetrao e a destruio se
confundem, a instantaneidade da ao distncia corresponde derrota do
adversrio surpreendido mas tambm, e sobretudo, derrota do mundo como campo,
como distncia, como matria (VIRILIO, 1996b, p.123).
A questo do no lugar e da ausncia de tempo se v na comunicao de mercado na
sociedade contempornea. Os smbolos, as gratificaes psicolgicas, as representaes
imaginrias que o consumo apresenta para o consumidor no respeitam culturas, pocas e
geografias.
Os pontos de partida de Virilio so as condies da guerra, das conquistas e da
organizao da sociedade em torno das cidades, do trabalho e da poltica, no contexto de
desvalorizao da importncia do territrio diante da supremacia do projtil. Esse novo olhar
para os fenmenos sociais e tecnolgicos demarca as matrizes desta tese: as distncias no
tm importncia se o projtil no est submetido s limitaes caractersticas do percurso. O
lugar no tem importncia na era da velocidade.
mesmo na sua relao com a guerra ou estado de guerrear que as analogias com a
velocidade so mais esclarecedoras: velocidade como estado de violncia e de vantagem
competitiva no combate. A guerra exige o aperfeioamento incessante das proezas dos
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engenhos, ou seja, de sua capacidade de reduzir a nada ou quase nada o espao geogrfico
(VIRILIO, 1996b, p.126). o imperativo da velocidade dos vetores em contraste com a
potncia. Com efeito, sem a violncia da velocidade, a das armas no seria to temvel
(1996, p.126). Diversos autores, como se ver no segundo captulo, atestam para a
necessidade de uma reflexo sobre os efeitos da acelerao e velocidade incorporadas ao
viver na contemporaneidade. Esses efeitos so provocados pela potncia de reduo do
espao na sociedade cibercultural. Fenmeno contraditrio, as perspectivas iniciais de que a
cibercultura provocaria um isolamento do indivduo, quando se percebe justamente o
contrrio, a no distncia como resultado da circulao de tudo o que existe em tempo real
ao alcance de um clique.
Cada perodo da histria tem nas guerras uma rica descrio de sua cultura,
tecnologia e poder. Para Virilio, a guerra hoje de velocidade, e o desarmamento seria
questo de desacelerao, pois o conflito moderno desregulou a questo do tempo e dos
lugares e determinou que a sofisticao dos vetores superasse toda vantagem obtida por
manobras tticas. A contagem regressiva torna-se o campo de enfrentamento, a ltima
fronteira (VIRILIO, 1996b, p.127). O que est em jogo hoje no so mais os explosivos,
mas as suas performances, delineadas pelo poder dos seus vetores de entrega nuclear. Logo,
Se, h mais de trinta anos, o explosivo nuclear encerrava o ciclo das guerras do
espao, neste final de sculo, o implosivo (mais do que territrios invadidos poltica
e economicamente) inaugura a guerra do tempo. Em plena coexistncia pacfica,
sem declarao de hostilidade e mais seguramente do que por qualquer tipo de
conflito, a celeridade nos livra deste mundo. Precisamos nos render evidncia:
hoje, a velocidade a guerra, a ltima guerra (VIRILIO, 1996b, p.127).
A velocidade to determinante no contexto das guerras que o desenvolvimento
constante de seus vetores tecnolgicos pode gerar o aviso prvio de guerra para aqum do
minuto fatdico (1996b, p.128), diminuindo radicalmente a capacidade da interveno
humana, lembrando as tenses entre os presidentes Nixon (dos Estados Unidos) e Brejnev
(da antiga URSS). Numa situao em que o espao territorial no tem mais importncia
frente ao aparato tecnolgico (engenho), a perda do espao material significa governar
apenas o tempo (1996b, p.129), e, nesse caso, a velocidade na guerra contempornea no
conhece limitaes de distncia.
Os meios de comunicao contemporneos do um sentido de valor ao que chega
antes, ao que bate o recorde, ao que se antecipa aos fenmenos. V-se hoje essa realidade,
exposta por Virilio originalmente ainda na dcada de 1970. A possibilidade de antecipao
dos fenmenos proporciona um estado de permanente tenso. A acelerao da informao
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antecipa os confrontos, na esfera contempornea, s tomadas de decises, a que esta tese
chama de estado de urgncia e obsesso pelo imediato. Se algo ser bom, que venha logo. Se
tal produto tem novidade, preciso dele ontem.
Para Virilio, ento, a questo do xito e do sucesso nestes tempos no se encerra mais
nos territrios, mas nos vetores, isto , nos veculos portadores de velocidade. Vetores so o
projtil, o avio, o foguete, a massa de ondas (que se supe serem ondas eletromagnticas,
onde os meios eletrnicos de comunicao atuam), meios de transporte e, por fim, o estado-
mquina (por vezes chamado de vetor-Estado ou aparelho do Estado). Ele prope que a
velocidade do progresso tecnolgico seja vista como uma mquina de guerra que contm
um duplo movimento de imploso e exploso (1996b, p.124). Exploso, por causa da
capacidade de destruir matria, corpos, objetos, planeta, enfim, tudo que composto de
tomos. Imploso, por causa da capacidade de fazer desaparecer simbolicamente a
importncia do lugar sempre da perspectiva da oposio lugar x no lugar como locus de
atuao do homem. A violncia da velocidade tornou-se, simultaneamente, o lugar e a lei, o
destino e a destinao do mundo. (1996, p.137).
No Brasil o principal interlocutor com Paul Virilio o professor Eugnio Trivinho,
da PUC-SP, que se baseou nos fundamentos de Virilio para compreender tais fenmenos e
aprofundar ainda mais os estudos sobre esse tema, lanando luz para novas vertentes
hipotticas, especialmente observando a acelerao provocada pela e na cibercultura.
Para Trivinho (2007a, p.89), de todas as formas de violncia atualmente existentes,
talvez a mais silenciosa e invisvel e, por isso, a mais implacvel seja a violncia da
velocidade. No entendimento do tempo real e suas implicaes na vida social ora
predominante, essa compreenso esclarece a prosperidade do interesse pela comunicao,
pois esta faz girar um mundo que se acelera sempre mais, a fim de atingir um estado de
relaes cada vez mais velozes, que atravessam a vida de cada indivduo com acesso a
informao por mltiplas telas, textos, imagens, comentrios, aparelhos mveis e toda
forma de reverberao da informao em tempo real.
3. A generalizao social da experincia da velocidade
O conhecimento de que a velocidade no mais simples acelerador da economia, de
vantagem para a conquista de territrios e da produo em escala, necessrio para entender
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suas implicaes totais na vida social atual. A velocidade no , portanto, um
acontecimento. Ela , pelo contrrio, o que caracteriza a prpria presentidade: tempo
irreversvel de imediatez, inexorvel em sua natureza e em sua tendncia complexizao
progressiva (TRIVINHO, 2007a, p.91).
Essa complexizao progressiva ocorre sempre que, existindo um processo
tecnolgico que proporciona aumento de velocidade provocando acelerao do estado
existente at ento , se faz necessrio um ajuste, uma adaptao. Esse o ciclo de
complexizao progressiva: aumento de velocidade, que provoca acelerao, que, por sua
vez, gera necessidade de adaptao. Sempre em transformao das condies sociais
vigentes pelo vetor tecnolgico, pelas mquinas. Trivinho (2007a, p.92) associa esse
fenmeno violncia da tcnica.
a violncia (to pulverizada quanto contnua) do aparato produtivo e de suas
exigncias programticas e funcionais; a violncia do dinamismo formal do aparato
cultural-comunicacional e de seus apelos ldicos sedutores; , enfim, a violncia de
toda a organizao urbana sobre os corpos e o imaginrio dos viventes (TRIVINHO,
2007a, p.93).
A absoro da velocidade na sociedade um processo estrutural naturalizado, que
no necessita de um discurso de legitimao, pois se autope e se autopromove
independentemente. A violncia da velocidade o combustvel da civilizao
contempornea. O que move a tudo e a todos e que a tudo fecunda (TRIVINHO, 2007a,
p.93-95). James Gleick tambm observa a dominao social da velocidade em vrios
captulos de sua obra, identificando fatores da vida cotidiana, da poltica, dos esportes e at
de aspectos ligadas atividade sexual dos indivduos acelerados ou vitimados pela violncia
da velocidade (2000, p.122, 130, 134, 139). a vida sempre em alta produtividade e
intensidade. Um forno de microondas pode economizar 4 minutos de tempo todos os dias.
Uma mulher entre dezoito e cinquenta anos de idade gasta 55 minutos preparando comida
sem um forno de microondas e 51 minutos se possuir um aparelho em sua cozinha
(GLEICK, 2000, p.110). So quatro preciosos minutos de economia de tempo. Mas o
impacto da velocidade pode ser percebido no mesmo pargrafo, onde o autor menciona uma
tendncia de economia de tempo: uma pessoa pode pegar-se digitando 88 segundos, em vez
de 90, porque mais rpido pressionar o mesmo dgito duas vezes (GLEICK, 2000, p.110).
Uma lava-loua pode economizar um minuto de tempo (GLEICK, 2000, p.111). Enfim, a
velocidade e sua violncia atingiu a tudo e a todos sem que houvesse alguma forma de
compreenso dos seus efeitos.
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A rigor, no objetivo desta tese mapear detalhadamente esses efeitos, como o tempo
que se perde ou economiza com a tecnologia; seria pretensiosa arrogncia. Sua inteno,
sim, manifesta na hiptese, verificar se essa velocidade est presente na comunicao com
o mercado, que estaria se utilizando dos apelos relativos pressa para impactar a audincia.
Se a vida contempornea ditada pela velocidade cultural e tcnica, isso pode ser
percebido no cotidiano, no trabalho, nas relaes sociais das mais variadas formas, nas
manifestaes sociais, que evidenciam a ansiosa busca pela valorizao do tempo. No ritmo
de produtividade e intensidade, tanto adulto como crianas tomam caf da manh a
caminho de sua prxima atividade (GLEICK, 2000, p.119), afinal, o trajeto de carro um
tempo desperdiado que deve ser economizado para outros fins. Nesse compasso, as coisas
vo se aperfeioando naturalmente a serem mais rpidas, e a intensidade do aproveitamento
de tempo se transforma num efeito de violncia.
Enquanto o ritmo bsico de vida na cozinha se acelerou, outros produtos
alimentcios, que antes poupavam tempo, passaram a desperdi-lo: a limonada
instantnea em p originalmente era mais rpida que ficar espremendo limes; agora,
demora mais que abrir garrafas. Fazer um bolo colocando o glac a partir de uma
mistura pronta mais rpido que faz-lo do zero; porm, mais lento que tir-lo de
uma lata com uma colher. Misturas prontas para panquecas e waffles s poupavam o
tempo necessrio para misturar o acar e o bicarbonato de sdio com a farinha, mas
era suficiente a menos que voc prefira a economia de tempo ainda maior das panquecas e waffles congelados (GLEICK, 2000, p.119).
Uma cultura que valoriza a acelerao dos processos em todos os nveis da atuao
dos indivduos parece tomar conta da sociedade na totalidade de formas de existncia que a
caracterizam. Controlar o tempo uma prtica to enraizada na cultura vigente que difcil
imaginar como viviam populaes sem relgio ou calendrio. Aos ouvidos do homem
contemporneo, a cadncia da vida em outros sculos pode at soar como monotonia ou falta
de produtividade. Mas o sentido de tempo livre no pode ser entendido como a total falta de
compromissos, como se a existncia do indivduo pudesse ser transformada, em alguns
momentos, numa agenda absolutamente em branco. Na economia reinante, o tempo livre,
caracterizado pela sua intensidade, baseia-se na lgica do preenchimento, do consumo do
lazer em todas as suas formas de cultura, entretenimento, esportes, gastronomia, viagens,
passeios, encontros familiares, tantas coisas que a fruio do no trabalho acaba se tornando
mais tensa do que a jornada de trabalho propriamente dita.
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4. Impactos socioculturais da velocidade generalizada:
consequncias do tempo como presso social
Como visto, a acelerao sempre provoca a adaptao de toda a sociedade, o que
resulta na generalizao da experincia da velocidade. Mas, se observado pelo olhar crtico
do ensasta Paul Virilio, o fenmeno da acelerao da vida contempornea traz consigo ainda
a evidncia de suas tragdias. Ele lembra que os acidentes s surgem depois da inveno do
objeto. preciso inventar uma jangada para que ela afunde. Para Virilio (2001, p.10), o
acidente a demonstrao dos limites de uma tcnica.
O fracasso de certas tcnicas mecnicas pde ser visto pelo naufrgio do Titanic, pela
queda do Concorde. Cada tcnica tem o seu acidente, reafirma Virilio (2001, p.10). O
acidente da cibercultura, da vida interligada em todas as esferas, quer no trabalho, lazer,
poltica ou entretenimento, a acelerao. Essa acelerao da sociedade contempornea,
resultado da potncia da tecnologia com a obsesso pela interatividade, produz o seu
acidente. O mximo de interao, numa perspectiva de que em pouco tempo grande parte do
mundo esteja conectado, pode produzir o que Virilio (2001, p.14 e 15) profetiza como a
aldeia global da asfixia por falta de espao. [...] Com as novas tecnologias de transmisso
do rdio internet s se aumentou a velocidade de contato. No pensamento de Gleick,
empresas e pessoas necessitam de conexo e velocidade. O estado de estar conectado torna-
os mais eficientes talvez mais geis. O triste que isso tambm faz com que se sintam
mais ocupados talvez at sobrecarregados (2000, p.71).
O estado de conexo potencializa os efeitos de um fenmeno. De modo semelhante
propagao das epidemias, que ocorre atravs da conexo de pessoas em contato, o
fenmeno da interatividade mundial, glocal, como denominou Trivinho (2007a, p.20 e 414),
traz consigo esse risco, o de propagar crises os acidentes, nas palavras de Virilio. O
prprio da ciberntica a unidade de tempo e de espao da interao, de modo que o
acidente da internet, logo da ciberntica, geral, passvel, potencialmente, de atingir todos e
tudo ao mesmo tempo, no mesmo instante (VIRILIO, 2001, p.12). Para Virilio, o acidente
da conexo, da vida contempornea delineada pala cibercultura, a velocidade. Ele a
classifica como sucessora dos acidentes anteriormente provocados pelos sistemas de
transportes ou industriais.
Depois dos naufrgios e dos descarrilamentos da acelerao martima e ferroviria,
das colises e quedas de carro ou de avio, das impressoras a vapor e rotativas
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tradicionais at as rotativas alimentadas pela imagem da iluso flmica, agora sero
os feixes de ondas que reproduziro, com os sinais de rdio e de vdeo, suas
catstrofes especficas (VIRILIO, 1996a, p.30).
De forma contundente, criticada por alguns pelo seu esprito pessimista ou de
descrena nos benefcios da tecnologia, Virilio cita Ren Char com a frase suprimir a
distncia mata (1996a, p.30) e emenda seu comentrio ctico a respeito das vantagens de
tanta interao. Afirma ele:
Aumentar continuamente a fora de libertao dos meios de comunicao
aproximar desmedidamente o que estava oculto pela distncia ou pelo secreto,
distante e naturalmente estranho a cada um de ns; portanto correr o risco de
reinventar aqui e agora uma barbrie (brbaros, estrangeiros, aquele que no fala a
mesma lngua...), ou seja, inventar o inimigo (VIRILIO, 1996a, p.30-31).
O constante contato com as mais variadas formas de contedos e informaes teis
ou inteis, dependendo da realidade e objetivo de cada indivduo torna a vida conectada,
em ritmo de intensidade, uma espcie de guerra. a guerra para acompanhar tudo, estar
informado. A guerra para entender tudo que dito em tantas linguagens, estilos, concepes,
como diz Virilio, barbries informacionais. De algum modo, nota-se o excesso, que se
transforma em elementos estranhos, por sua vez estabelecidos como inimigos violentos.
Quanto mais as pessoas falam e escrevem sobre os fenmenos de massa ocasionais
que captam a ateno histrica da cultura norte-americana O. J. Simpson, El Nio, Monica Lewinsky, Ano 2000 , mais querem ouvir. Quanto mais os jornalistas ouvem, mais sentem-se capazes at na obrigao de continuar falando e escrevendo (GLEICK, 2000, p.73).
Assim segue o ritmo da acelerao da vida. Do sempre mais e mais. Seja informao,
seja consumo, seja entretenimento, a intensidade levada a sua potncia mxima. A pressa
uma necessidade irrefutvel? As pessoas dizem que esto sempre atrasadas com certo
orgulho, um senso de que so mais teis. Talvez caiba uma reflexo sobre como a sociedade
chegou a esse ponto. Para Gleick (2000, p.72), no mundo anterior FedEx, onde a
remessa definitiva e positivamente no podia estar l no dia seguinte, raramente era
necessrio que estivesse. Parece que ele est insinuando que o homem criou sua prpria
demanda por velocidade, ou dependncia, de acordo com o ngulo de observao.
Isso extremamente plausvel, pois a criao de demandas no uma novidade.
Steve Jobs segue esse caminho, quando antecipa uma tendncia por completo, ao invs de
pesquisar o que as pessoas realmente precisam. Seus inventos so exemplos de que o
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mercado no sabe exatamente qual sua prxima necessidade de produtos ou servios, at a
sua inveno.
Desde o primeiro lanamento do seu Macintosh, em 1984, Steve Jobs e a marca
Apple so sinnimos de inovao (APPLE..., 2010, on-line). Ele tambm foi descrito
como revolucionrio da tecnologia (RYDLEWSKI, 2004, p.91). A entrada no mercado de
tecnologia do modelo iPod foi um sucesso to grande que a manifestao de desejo e apego
ao produto pelos consumidores foi comparada com objeto de culto, um divisor de estilo de
vida que coloca de um lado quem tem e de outro quem no tem iPod (RYDLEWSKI, 2004,
p.91). Junto com o produto, diversos acessrios confirmam a chegada de um novo jeito de
ser dos seus adeptos, que at o momento no imaginavam que agora no poderiam mais
viver sem o produto. Roberto Menna Barreto menciona uma entrevista coletiva que Akio
Morita concedeu a representantes da indstria eletrnica dos Estados Unidos. Um dos
participantes da coletiva perguntou ao senhor Morita qual o segredo de ele, mesmo no
gastando nada em pesquisa, em cinco anos conquistar 15% do mercado? A resposta de Akio
Morita foi:
no penso que haja nada de errado com as pesquisas de mercado americanas. J tive
em mos varias dessas pesquisas e pude comprovar que elas so muito acuradas,
cientficas e competentes em sondar o mercado, em conhec-lo a fundo. Acontece
apenas que, no nosso caso, ns no pesquisamos o mercado. Ns criamos o mercado
(BARRETO, 1997, p.37).
De muitas maneiras, esses exemplos se encaixam na viso de Virilio, Gleick e
Trivinho de que a acelerao da vida contempornea tornou a sociedade dependente da
velocidade e sujeita aos seus efeitos, quer sejam eles de natureza positiva ou negativa. Gleick
faz uma abordagem relevante, nesse mesmo vis de anlise, ao afirmar que
O correio com entrega no dia seguinte, como muitas das tecnologias do
apressamento, deu aos primeiros clientes uma vantagem competitiva. Quando todos
adotaram o servio, a igualdade foi restaurada e s o ritmo universalmente mais
rpido prevaleceu (GLEICK, 2000, p.72).
Para os indivduos, empresas ou organizaes que usaram a velocidade de forma a se
diferenciar do seu ambiente natural, pode-se dizer que houve efetivamente um benefcio. No
instante em que a velocidade foi oferecida a todos, ento se pode afirmar que ela se
transformou numa commodity social e que efetivamente s restou a acelerao da vida como
sua violncia.
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As empresas que se anteciparam na percepo do valor da velocidade como
vantagem econmica obtiveram sucesso mundial em seus segmentos. A Federal Express e o
McDonalds criaram novos segmentos inteiros da economia ao compreender, capitalizar e,
cada qual a sua maneira, alimentar nossa pressa (GLEICK, 2000, p.17). possvel incluir
ainda muitas outras empresas que se valeram do uso da velocidade como eixo central de seus
negcios. Mais do que empresas, criaram-se segmentos inteiros destinados a capitalizar, cada
um ao seu modo, a velocidade como diferenciao e benefcio. Os segmentos de comida
rpida, de entrega rpida, de conexo rpida, elevadores rpidos, educao rpida, veculos
rpidos, entretenimento rpido so confirmaes da demanda social por acelerao, ao
mesmo tempo em que deixam um rastro de consequncias, aquilo que Gleick afirma ser o
alimento da nossa pressa.
Trivinho descreve essas consequncias como dromopatologias (2007a, p.99). Gleick