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Filipa Rino Almeida O impacto social da informação: a prestação do serviço de informação à comunidade Dissertação de Mestrado em Ciência da Informação; orientada pela Doutora Maria Beatriz Pinto de Sá Moscoso Marques, apresentada ao Departamento de Filosofia, Comunicação e Informação da Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra 2015

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  • Filipa Rino Almeida

    O impacto social da informao:

    a prestao do servio de informao comunidade

    Dissertao de Mestrado em Cincia da Informao; orientada pela Doutora Maria

    Beatriz Pinto de S Moscoso Marques, apresentada ao Departamento de Filosofia,

    Comunicao e Informao da Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra

    2015

  • Faculdade de Letras

    O impacto social da informao:

    a prestao do servio se informao

    comunidade

    Ficha Tcnica:

    Tipo de trabalho Dissertao de Mestrado

    Ttulo O impacto social da informao: a prestao do

    servio de informao comunidade

    Autora Filipa Rino Almeida

    Orientadora Maria Beatriz Pinto de S Moscoso Marques

    Jri Presidente: Doutora Maria Manuel Lopes Figueiredo

    Costa Marques Borges

    Vogais:

    1. Doutora Olvia Manuela Marques Pestana

    2. Doutora Maria Beatriz Pinto de S Moscoso

    Marques

    Identificao do Curso 2 Ciclo em Cincia da Informao

    rea cientfica Cincia da Informao

    Data da defesa 22-10-2015

    Classificao

    Fotografia de Capa

    18 valores

    An illiteracy programme helps Chiapas women how

    to write, 2015

    (http://www.unesco.org/new/en/unesco/join-us/)

    http://www.unesco.org/new/en/unesco/join-us/

  • 2

    Nada no mundo mais perigoso que a

    ignorncia sincera e a estupidez conscienciosa.

    Martin Luther King

  • 3

    Agradecimentos

    Tudo aquilo a que nos propomos fazer ou alcanar na vida tem, em primeiro lugar, de

    partir de ns, da nossa vontade e iniciativa, mas a verdade que devido s peripcias da vida,

    a maior parte dos nossos feitos s chegam a bom porto com o apoio daqueles que nos querem

    bem e nos so mais prximos.

    Todos ns temos e teremos sempre um grupo de pessoas a quem devemos o que

    somos e o que fazemos. E a essas pessoas que vamos buscar toda a fora, todos os conselhos

    e motivao para seguirmos sempre em frente na prossecuo dos nossos objetivos. Esta

    dissertao no exceo. Ela o resultado da minha vontade e dedicao mas tambm do

    apoio das pessoas que se seguem.

    Em primeiro lugar queria agradecer minha orientadora, a Doutora Maria Beatriz

    Marques, por todos os conselhos que me deu, pela orientao ao longo deste trabalho e por

    toda a pacincia e disponibilidade.

    De seguida, gostaria de agradecer a todos os professores com que me cruzei ao longo

    de todo o meu percurso escolar e universitrio, dando particular ateno aos professores do

    Mestrado em Cincia da Informao. Alguns foram tambm professores de vida, dando-me

    preciosos conselhos que no esqueo. A todos devo o conhecimento e as competncias que

    me permitiram concluir esta dissertao.

    Um profundo agradecimento a todos os meus amigos que acompanharam de perto este

    trabalho e sobre o qual me ouviram falar interminavelmente: Elise por todos os telefonemas

    feitos com genuna preocupao, pelo apoio e por ouvir todos os desabafos; Cludia e ao

    Diogo agradeo o carinho com que sempre me acolheram em vossa casa, especialmente

    Cludia, por todas as leituras e por toda a pacincia; Ins agradeo as conversas

    interminveis, os conselhos e o facto de ter estado presente nalguns dos melhores e dos piores

    momentos; Ana Pinto, sou grata pelo carinho, preocupao e apoio que me deu durante estes

    dois anos, pelo generoso acolhimento em Viseu no 1 semestre do mestrado e pela ajuda

    nalguns aspetos mais tcnicos; Ana Loureno, presente praticamente desde o primeiro ao

    ltimo dia destes 5 anos, agradeo a partilha de tantos momentos que ficaro para sempre:

    muitas alegrias e algumas tristezas, estudo, muitos cafs, noites e trabalhos de grupo e, por

    fim, Liliana, a minha scia, agradeo todos os momentos de alegria e descompresso e a

    companhia em muitos bons momentos histricos.

    Um grande abrao a todos os meus colegas e amigos da Licenciatura de Histria que

    estiveram presentes nestes ltimos 5 anos e que foram, uma segunda famlia em Coimbra.

  • 4

    Assim como a todos os meus colegas e amigos da Seco de Defesa dos Direitos Humanos da

    Associao Acadmica de Coimbra (SDDH/AAC), sem vocs, hoje no seria,

    definitivamente, a mesma coisa, nem esta a minha dissertao.

    Agradeo tambm aos meus pais, minha av Virgnia e minha irm por toda a

    preocupao e apoio econmico, sem eles no teria sido possvel prosseguir os estudos. Por

    fim, agradeo a uma pessoa que mesmo j no estando entre ns, me ensinou muito do que sei

    e me definiu enquanto pessoa, o meu av materno.

    A todos agradeo e espero no desiludir.

  • 5

    Resumo

    Os servios de informao comunidade tm como objetivo prestar informao e

    aconselhamento aos cidados para ajudar a resolver problemas do quotidiano, por exemplo

    ligados ao emprego, direitos dos cidados, aconselhamento legal e financeiro. Estes servios

    so prestados de forma gratuita, personalizada e confidencial, tornando a informao acessvel

    a qualquer pessoa. Surgiram durante a Segunda Guerra Mundial em Inglaterra e nos EUA,

    com o objetivo de ajudar as pessoas a resolver problemas relacionados com a guerra e

    desenvolveram-se com a implementao do Estado Social.

    Este estudo tem como objetivo conhecer as origens destes servios, a sua evoluo at

    atualidade, mostrando a sua importncia, ontem e hoje, para o acesso equitativo

    informao por todos os cidados, culminando na realizao de um plano para a

    implementao de servios de informao comunidade em Portugal. Sendo um estudo

    essencialmente terico, fundamental a leitura e anlise de referncias bibliogrficas

    pertinentes e atuais sobre as temticas referidas, a anlise das normas da IFLA e da Unesco

    acerca da criao de servios de informao e tambm a consulta de sites institucionais de

    servios de informao comunidade de referncia.

    Conclui-se que os servios de informao comunidade continuam, atuais e

    pertinentes, sobretudo tendo em conta o contexto da sociedade da informao e do

    conhecimento. Estes servios tm sobrevivido ao longo do tempo devido sua versatilidade e

    capacidade de ir sempre ao encontro das necessidades de informao dos cidados,

    justificando desta forma a sua cada vez maior necessidade de evoluo e crescimento.

    Encontram-se disseminados sobretudo pelos pases anglo-saxnicos onde tiveram uma forte

    implementao, devido ao seu contexto socioeconmico e a uma forma diferente de olhar a

    sociedade e as bibliotecas.

    Conclui-se tambm que estes servios podero ser, sem dvida, a alavanca necessria

    para estreitar os laos entre as comunidades e as bibliotecas, potenciando o dinamismo e o

    desenvolvimento de ambas. Alm de contribuir para reposicionar as bibliotecas no panorama

    estratgico nacional e para diminuir as ainda gritantes desigualdades no acesso informao.

    Palavras-Chave: Servios de informao, Acesso informao, Impacto social da

    informao, Marketing da informao e Satisfao dos clientes.

  • 6

    Abstract

    Community information services aim to provide information and advice to citizens to

    help solve everyday problems, for example of employment, citizens' rights, legal and financial

    advice. These services are provided for free, personalized and confidential manner, making

    information accessible to anyone. Arose during World War II in England and the US, in order

    to help people solve the war-related problems and developed with the implementation of the

    welfare state.

    This study aims to know the origins of these services, their evolution to the present

    day, showing its importance, yesterday and today, for equitable access information for all

    citizens, culminating in the realization of a plan for the implementation of community

    information services in Portugal. Being an essentially theoretical study, it is essential reading

    and analysis of relevant and current references on these topics, the analysis of the rules of

    IFLA and UNESCO on the creation of information services and also to consult institutional

    sites of information services to the community of reference.

    We conclude that the community information services continue, yesterday and today,

    current and relevant, taking into account the current context of the information and knowledge

    society. These services have survived over time mainly because of its versatility and ability to

    always meet the citizens' information needs, thus justifying its increasing need for

    development and growth. They are disseminated mainly by Anglo-Saxon countries where

    they had a strong implementation, mainly due to their socio-economic context and a different

    way of looking at society and libraries.

    We also conclude that these services may be, without doubt, the leverage needed to

    strengthen ties between communities and libraries, enhancing the dynamism and development

    of both. In addition to contributing to reposition the libraries in the national strategic overview

    and to reduce the still glaring inequalities in access to information.

    Keywords: Information services, Access to information, Social impact of information,

    Information marketing and Costumer satisfaction.

  • 7

    Lista de siglas e abreviaturas

    ALA - American Library Association

    BP Bibliotecas Pblicas

    CAB Citizens Advice Bureau

    CABNZ - Citizens Advice Bureau of New Zealand

    CABWA Citizens Advice Bureau of Western Australia

    CAC - Consumer Advice Centres

    CAS - Citizens Advice Scotland

    CIB - Citizens Information Board

    CIDJ - Centre dinformation et de documentation jeunesse

    CIVic - Community Information Victoria

    CISVic - Community Information & Support Victoria

    DGLAB - Direco-Geral do Arquivo, dos Livros e das Bibliotecas

    ERYCA - European Youth Information and Conselling Agency

    EUA Estados Unidos da Amrica

    HAC - Housing Advice Centres

    IDH - ndice de Desenvolvimento Humano

    IFLA International Federation of Library Association and Institutions

    IPDJ - Instituto Portugus do Desporto e da Juventude

    LA The Library Association

    LAC - Legal Advice Centres

    LAIC - Local Authority Information Centers

    NAC - Neighbourhood Advice Centres

    NACAB - National Association of Citizens Advice Bureau

    NCC - National Consumer Council

    ONGs Organizaes No Governamentais

    OTS Organizaes do Terceiro Setor

    RCC - Rural Community Councils

    RNLP - Rede Nacional de Leitura Pblica

    RUSA - Reference and User Services Association

    SIC Servios de Informao Comunidade

    TIC Tecnologias de Informao e Comunicao

    TIP The Information Place

  • 8

    UNESCO Organizao das Naes Unidas para a Educao, Cincia e a Cultura

    VAB - Valor Acrescentado Bruto

    VACIC - Victorian Association of Community Information Centres

    VICs - Veterans Information Centers

  • 9

    ndice de Figuras

    Figura 1: A evoluo dos principais problemas dos clientes entre 2000 e

    2002....p.45

    Figura 2: Principais problemas dos clientes do CAB no ano 2012/2013..p. 51

    Figura 3: Assuntos mais visitados no site dos CAB em 2012/2013.p. 51

    Figura 4: Taxa de sucesso na resoluo de problemas, por assunto..p.52

    Figura 5: Impacto da resoluo dos problemas na vida dos clientes.....p.53

    Figura 6: Impacto social dos Citizens Advice Bureaup.54

    Figura 7: Fora de trabalho das organizaes da sociedade civil em percentagem da populao

    economicamente ativa, por pas.p.68

    Figura 8: Cobertura de SIC nas bibliotecas da RNLP...p.79

    Figura 9: A existncia ou no de informao sobre o SIC nas bibliotecas que indicam ter o

    servio...p. 80

    Figura 10: Forma de Acesso aos SIC nas bibliotecas da RNLP...p. 81

    Figura 11: Localizao dos SIC nas bibliotecas da RNLP por distrito.p. 82

    Figura 12: Anlise Swot da implementao de SIC em Portugal.....p. 93

  • 10

    Sumrio

    Agradecimentos......3

    Resumo.......5

    Abstract...6

    Lista de siglas e abreviaturas..7

    ndice de figuras.....9

    Introduo......p.13

    Metodologia.......p.16

    Captulo I Enquadramento Terico

    1- Breve introduo sobre a sociedade da informao e do conhecimento.......p.19

    2 - Enquadramento conceptual...p.20

    Captulo II Histria e evoluo dos servios de informao comunidade

    1 - Origens e evoluo dos servios de informao comunidade....p.29

    2- Fatores impulsionadores da criao dos servios de informao

    comunidade....p.31

    2.1 - O conceito de Estado-Providncia.....p.31

    2.1.1 - O Estado-Providncia Britnico..p.31

    2.1.2 - O WelfareState Americano.........p.33

    3- Histria dos servios de informao comunidade ingleses.....p.34

    3.1 Os Citizens advice bureau....p.34

    3.1.1 - As primeiras dcadas do sculo XX e a II Guerra Mundial (1938-

    1945).......p.34

    3.1.2 - Ps-Guerra e fundao do Welfare State (1945-1960).......p.35

    3.1.3 - 1960-1980 Renovao dos servios de informao comunidade e

    mudana de paradigma...p.36

    3.2 - Outros centros e servios de informao comunidade....p.38

    3.2.1 - Neighbourhood advice centres....p.39

    3.2.2 - Legal advice centers....p.39

    3.2.3 - Consumer Advice Centres (CAC)...p.40

    3.2.4 - Housing Advice Centres (HAC)......p.41

    3.2.5 - Local Authority Information Centers..p.41

    3.2.6 - Other Agencies....p.41

    3.2.7 - A situao das reas rurais..p.42

  • 11

    3.2.8 - Dcadas de 80 e 90 (1980-2000).....p.43

    4 - A implementao dos SIC noutros pases.....p.44

    4.1 Canad..p.44

    4.2 Israel..p.45

    4.3 Dinamarca..p.46

    4.4 Sucia....p.47

    4.5 Esccia...p.47

    4.6 - Irlanda do Norte.....p.47

    4.7 - Irlanda do Sul ou Repblica da Irlanda......p.48

    4.8 Itlia.......p.49

    4.9 Austrlia........p.50

    4.10 - Nova Zelndia..p.51

    Captulo III Os servios de informao comunidade no mundo atual

    1 - Os Servios de informao comunidade no sculo XXI: o que mudou no novo

    milnio........p.52

    2 - Evoluo dos Citizens Advice Bureau no sculo XXI: modelo atual de

    funcionamento....p.56

    3 - O impacto do servio para a sociedade e para a satisfao dos

    clientes....p.64

    4 - O papel dos servios de informao comunidade na diminuio das assimetrias

    no acesso informao......p.67

    5 - O desenvolvimento de servios de informao em pases em

    desenvolvimento.....p.74

    5.1 - Amrica Latina.......p.74

    5.2 Nigria...p.75

    5.3 Bangladesh....p.75

    6 - O papel da Unesco na promoo de criao de centros e servios de informao

    comunidade em pases em desenvolvimento e o contributo da economia

    social...p.77

    Captulo IV Como promover os servios de informao comunidade

    1 - A necessidade de uma poltica nacional de Informao...............p.81

    2 - Perspetiva Ibero-americana vs Perspetiva anglo-saxnica do servio de informao

    comunidade.p.86

  • 12

    3 - Os servios de informao comunidade em Portugal: a situao

    portuguesa..p.88

    4 - As bibliotecas pblicas enquanto promotoras dos servios de informao

    comunidade....p.94

    Captulo V A implementao de servios de informao comunidade

    1 - A criao dos SIC: qual o enquadramento legal a escolher?................................p.98

    2 - Etapas da implementao dos SIC.......p.98

    3 - Anlise das normas da IFLA sobre este tema.p.100

    4 - Proposta de um Plano para a implementao dos SIC em Portugal.......p.103

    4.1 - Determinao da Misso...p.103

    4.2 - Objetivos.......p.104

    4.3 - Anlise SWOT......p.105

    4.4 - Determinao do pblico-alvo.......p.106

    4.5 - Etapas de concretizao do plano.....p.106

    4.6 Planificao.......p.111

    Concluso.....p.115

    Referncias Bibliogrficas...p.120

    Anexos.....p.132

    Anexo I - Levantamento dos Servios de Informao Comunidade nas Bibliotecas da

    RNLP...p.133

    Anexo II - Calendarizao do Plano de Implementao dos SIC em Portugal.......... p. 152

    Anexo III - Calendarizao da Avaliao da Qualidade e do Desempenho dos

    SIC...p.154

  • 13

    Introduo

    A presente dissertao foi feita no mbito do Mestrado em Cincia da Informao com

    vista obteno do grau de mestre e tem como tema principal a anlise da origem e da

    evoluo dos Servios de Informao Comunidade at atualidade. Estes servios, que

    surgiram ainda no sculo XIX, devolveram-se no sculo XX, nas vsperas da Segunda Guerra

    Mundial, em Inglaterra e nos EUA. Tm como principais caratersticas o fornecimento de

    informao e de aconselhamento sobre situaes com que os cidados se confrontam no seu

    quotidiano.

    Inicialmente ligados s problemticas resultantes do conflito militar, comearam a

    debruar-se sobre temas como a sade, a educao, as finanas, a habitao, os benefcios da

    segurana social, a defesa dos direitos do consumidor, entre outros.

    Estes servios de informao podem ser implementados nas bibliotecas ou de forma

    independente e autnoma, atravs de centros de informao comunidade ligados ao setor da

    economia social. Chegaram at aos nossos dias e podero ser a chave para melhorar a situao

    e a imagem das BP e para diminuir as desigualdades no acesso informao.

    Esta dissertao pretende demonstrar que os SIC mantm a sua pertinncia e

    atualidade e tm uma importncia crucial na atual sociedade da informao e do

    conhecimento.

    A escolha desta temtica para a nossa investigao prendeu-se com vrios fatores, em

    primeiro lugar, o facto de ainda existir pouca investigao sobre o assunto, o que faz com que

    tenhamos de assumir alguns riscos por no existirem de alguma forma modelos a seguir,

    mas tambm torna o processo de elaborao da dissertao muito mais interessante, havendo

    ainda muita investigao a fazer nesta rea. Para alm disto, tambm o facto de estes servios,

    apesar de pouco difundidos na realidade nacional, poderem ter uma enorme importncia para

    o desenvolvimento das comunidades em que esto inseridos, mas tambm, para o crescimento

    e dinamizao de que as bibliotecas pblicas tanto necessitam, afigurando-se-nos assim, ser

    um tema bastante pertinente e atual nos tempos que correm.

    A ltima razo pela qual escolhemos trabalhar sobre os SIC prende-se com questes

    mais pessoais, pois este tema permite-nos, por um lado, usufruir do background que

    adquirimos na licenciatura em Histria e, por outro lado, permite-nos falar de um outro tema

  • 14

    que muito nos apraz: os Direitos Humanos. Sobre este ltimo aspeto, tivemos a oportunidade

    de falar, ainda que de forma indireta, ao abordar alguns subtemas que esto diretamente

    ligados ao tema principal, como o acesso informao, o papel social da biblioteca e o

    desenvolvimento de SIC em pases em desenvolvimento.

    A dissertao encontra-se dividida em 5 captulos. O primeiro dedicado ao

    enquadramento conceptual, onde so abordados e definidos conceitos fundamentais quando se

    fala de servios de informao comunidade, incluindo o prprio conceito destes servios,

    definindo em que consistem e quais os seus objetivos e finalidades.

    O segundo captulo comea com o enquadramento histrico dos SIC, explorando a

    razo que esteve na base da criao destes servios nos dois pases pioneiros: a Inglaterra e os

    EUA, aprofundando-se depois a histria dos SIC em Inglaterra e terminando o captulo com

    os projetos de extenso destes servios a outros pases, sobretudo a pases anglo-saxnicos, na

    Europa, restante Amrica do Norte, Ocenia e ainda na sia.

    No terceiro captulo, comeamos por falar acerca dos SIC na atualidade, das suas

    estratgias de afirmao e tendncias de especializao, referindo alguns projetos bastante

    inovadores a este nvel, alguns deles desenvolvidos a partir das novas tecnologias de

    informao e de bases de dados especficas. De seguida, analisada, com algum detalhe, a

    evoluo dos Citizens Advice Bureu (CAB) ao longo do sculo XXI e dado a conhecer o

    modelo atual de funcionamento dos CAB. So tambm abordados os estudos de satisfao

    dos clientes dos CAB e quais os impactos do servio na vida dos clientes. Seguidamente,

    abordada a problemtica das desigualdades no acesso informao, dando-se especial ateno

    s desigualdades inter-regionais e tambm ao papel determinante que os SIC tm na

    diminuio destas desigualdades. Um pouco no seguimento do tpico anterior e ainda neste

    captulo, so referidos projetos de implementao dos SIC em pases em desenvolvimento,

    mais especificamente, na Amrica Latina, frica e sia. Neste captulo ainda referido o

    papel da UNESCO na promoo deste tipo de servios e a importncia da economia social e

    do terceiro setor para o desenvolvimento dos SIC.

    O quarto captulo comea com a problematizao da necessidade de uma poltica

    nacional de informao em Portugal, justificando-se esta necessidade atravs da exposio de

    quais seriam as suas vantagens e sugerindo algumas linhas orientadoras. Depois, so

    discutidas as perspetivas anglo-saxnica e ibero-americana na forma de encarar e desenvolver

    estes servios. Em seguida, abordada a problemtica da situao portuguesa no que se refere

  • 15

    aos SIC, explicando-se quais os motivos que contriburam para a situao atual. Ainda acerca

    deste tpico so analisados os resultados do levantamento estatstico da existncia de SIC nas

    bibliotecas da RNLP. Por fim, exposta a temtica da importncia das bibliotecas pblicas

    enquanto promotoras dos SIC, dando-se especial nfase s Diretrizes da IFLA sobre servios

    da Biblioteca Pblica.

    No quinto e ltimo captulo abordada a temtica do planeamento dos SIC,

    comeando por abordar as vrias etapas de planeamento e implementao do servio e

    tambm a anlise de algumas recomendaes da UNESCO e da IFLA sobre o assunto. Este

    ltimo captulo culmina com o desenvolvimento de um plano de implementao dos SIC em

    Portugal.

    Como tal, com a elaborao desta dissertao pretende-se contribuir para a clarificao

    do conceito e das funes dos SIC; investigar e analisar a origem e a evoluo dos SIC nos

    pases pioneiros; analisar e investigar vrios projetos de SIC ao longo do tempo e nos dias de

    hoje, em vrios pontos do globo; mostrar a importncia dos SIC para o acesso informao e

    desenvolvimento socioeconmico das comunidades; analisar a situao portuguesa no que aos

    SIC diz respeito. Sendo, por fim, a elaborao de um plano de implementao dos SIC em

    Portugal um dos grandes objetivos desta dissertao. Pretendendo-se, acima de tudo,

    demonstrar a importncia e pertinncia dos SIC nos dias de hoje.

  • 16

    Metodologia

    A elaborao desta dissertao passou por vrias fases, desde a definio do tema e da

    sua problematizao at ao final da redao. Uma vez que o tema abordado de um ponto de

    vista essencialmente terico, o processo de investigao para esta dissertao assentou,

    sobretudo na pesquisa, leitura, seleo, anlise e interpretao de literatura cientfica

    (monografias variadas, dissertaes de mestrado, teses de doutoramento, artigos cientficos e

    estudos estatsticos) considerada pertinente e adequada ao tema, procurando, sempre que

    possvel, utilizar referncias bibliogrficas recentes, que pudessem vincar nesta dissertao o

    carcter pertinente e atual da temtica em investigao.

    Foi tambm necessrio recorrer a sites institucionais, como por exemplo, o site dos

    CAB, para analisar a evoluo deste servio ao longo do tempo e definir o modelo de

    funcionamento atual deste servio; bem como aos sites institucionais de outros SIC de forma

    a dar a conhecer a sua existncia e funcionamento, dando destaque aos projetos que

    considermos mais inovadores dentro deste setor. Consultmos tambm os sites oficiais e/ou

    outras plataformas online de todas as bibliotecas da RNLP, por forma a fazer o estudo

    emprico que iremos analisar no quarto captulo. Foram ainda consultados os sites da IFLA e

    da UNESCO para conhecer e analisar as normas e diretrizes da IFLA no que diz respeito s

    BP e prestao de servios de informao pelas mesmas e o Manifesto da UNESCO e

    diversas publicaes e projetos desta organizao.

    Apesar de essencialmente terica esta dissertao culmina com a elaborao de um

    plano de implementao de SIC em Portugal. Sendo este um produto de todo o trabalho de

    investigao desenvolvido, o respetivo plano foi elaborado com base nas recomendaes da

    IFLA e da UNESCO.

    Analisemos agora, passo a passo, a metodologia desta dissertao. A primeira fase,

    ainda antes do incio da elaborao da dissertao propriamente dita foi a explorao do tema

    para poder conhecer as suas potencialidades e limitaes e construir a partir da a estrutura

    deste trabalho. Esta fase consistiu na leitura exploratria de obras acerca do que eram os SIC,

    como eram desenvolvidos e quais os desafios da atualidade para estes servios. Estas leituras

    permitiram-nos definir o tema e fazer uma primeira estrutura da futura dissertao, a qual foi

    sofrendo os devidos ajustes medida que a investigao ia avanando.

    Podemos dizer que os vrios captulos da dissertao correspondem s respostas que

  • 17

    pretendamos obter s diversas perguntas que fomos fazendo ao longo deste trabalho de

    investigao, mas que so tambm as perguntas que esto na base da maioria das

    investigaes cientficas: O que ? Em que consiste? Como surgiu? Qual a sua origem? Qual

    a sua evoluo? E na atualidade mudou alguma coisa? Quais os novos desafios? Que novos

    projetos existem? Que potencialidades tm estes servios? Quais os problemas? Que

    limitaes h? O que que falta fazer? E como fazer?

    O primeiro captulo responde s perguntas o que ? e em que consiste? Para o elaborar

    selecionmos e analismos um conjunto de documentos que nos permitissem fazer o

    enquadramento conceptual do tema, esclarecendo alguns dos principais conceitos que lhe

    esto associados e definindo da forma mais clara possvel o conceito chave da dissertao:

    servio de informao comunidade.

    O segundo captulo fruto da pesquisa, recolha e anlise de inmeros artigos, sites

    institucionais e monografias com o objetivo de reconstituir e explicar o contexto de origem e

    surgimento dos SIC e a sua evoluo at aos nossos dias, nos vrios pases onde se

    desenvolveram. Foi o captulo que exigiu mais horas de pesquisa e recolha bibliogrfica e

    que, por isso mesmo, obrigou a um maior esforo de seleo e de interpretao das mesmas,

    para o qual foi necessrio mais tempo. No entanto, foi tambm um dos quais nos deu mais

    satisfao na sua elaborao. Neste captulo pretendemos responder s perguntas: Como

    surgiu? Qual a sua origem? Qual a sua evoluo?

    O terceiro captulo aborda vrias temticas diferentes (embora relacionadas entre si) e

    foi composto por vrias fases de elaborao, fruto da anlise de vrios tipos de fontes de

    informao. Na primeira parte, respeitante aos SIC na atualidade, reunimos a bibliografia que

    considermos mais adequada para explicar alguns dos desafios e tendncias deste novo sculo

    para estes servios. Inclumos tambm nesta parte a referncia a vrios projetos inovadores de

    SIC, resultado de pesquisa online em vrios sites institucionais de bibliotecas e servios de

    informao internacionais. Depois tramos a evoluo dos CAB e definimos o seu modelo

    de servio atual e o seu impacto na vida dos clientes, com base na anlise dos relatrios de

    atividade anuais de 2000 a 2014, o ltimo relatrio do estudo de satisfao ao cliente, bem

    como de vrias brochuras sobre os servios prestados que esto disponveis online no site

    oficial dos CAB.

    Posteriormente, para abordarmos o subtema do papel dos SIC na diminuio das

    desigualdades do acesso informao, analisamos diversos textos, de inmeros autores que

  • 18

    considermos de referncia para analisar o tema, recorrendo tambm observao de alguns

    indicadores estatsticos que constavam dos dois ltimos relatrios anuais de desenvolvimento

    humano. Os dois penltimos tpicos do captulo foram elaborados com recurso a

    documentao da UNESCO e a artigos cientficos que abordavam a temtica do

    desenvolvimento dos SIC em pases em desenvolvimento. Para o ltimo tpico reunimos

    referncias sobre especialistas no assunto, que consideramos pertinentes para o

    desenvolvimento do tema, bem como estudos estatsticos o mais recentes possvel, para

    mostrar um retrato o mais fiel e atual possvel sobre a economia social. Neste captulo

    procuramos responder s questes: E na atualidade mudou alguma coisa? Quais os novos

    desafios? Que novos projetos existem? Que potencialidades tm estes servios?

    O quarto captulo provavelmente o mais reflexivo de todos, por ser um dos ltimos

    captulos, permitimo-nos fazer vrias reflexes pessoais sobretudo em dois dos tpicos deste

    captulo: a necessidade de uma poltica nacional de informao e a situao portuguesa no que

    dizia respeito aos SIC. No entanto, procurmos sustentar as nossas afirmaes recorrendo

    sempre a literatura cientfica sobre as temticas abordadas, procurando no nos desviarmos da

    temtica em investigao. No que diz respeito anlise da situao portuguesa, para alm de

    recorrermos a bibliografia de especialistas sobre o tema, expusemos as concluses sobre o

    levantamento estatstico que elabormos sobre a existncia de SIC nas bibliotecas da RNLP.

    Por fim, no ltimo tpico do captulo, sobre a promoo dos SIC por parte das BP,

    procuramos uma maior objetividade, cingindo-nos anlise do Manifesto da Unesco/IFLA

    para as bibliotecas pblicas e das diretrizes da IFLA sobre os servios da biblioteca pblica

    que se enquadravam neste subtema. Neste penltimo captulo desenvolvemos vrios subtemas

    que nos permitiram ir ao encontro das respostas s perguntas Quais os problemas? Que

    limitaes h? O que que falta fazer?

    Por fim, para elaborarmos o quinto e ltimo captulo recolhemos referncias

    bibliogrficas sobre normas e recomendaes para o planeamento e implementao de SIC

    elaboradas pela UNESCO e pela IFLA, tendo procurado fazer do plano de implementao de

    SIC em Portugal um somatrio da aprendizagem feita ao longo desta dissertao. Conclumos

    assim, a dissertao respondendo pergunta como fazer?

  • 19

    Captulo I Enquadramento Terico

    1 Breve introduo sobre a sociedade da informao e do conhecimento

    Nas ltimas dcadas temos assistido a uma mudana de paradigma socioeconmico.

    Esta mudana traduziu-se na chamada passagem para a sociedade da informao e do

    conhecimento. Nesta sociedade, a informao tem um valor cada vez maior, sobretudo a nvel

    econmico. (Castells, 2002, p.269)

    Alguns autores, como o caso de Felici Soto (2006, p.16), afirmam que ainda

    estamos na sociedade da informao, havendo um longo caminho a percorrer para atingir a

    sociedade do conhecimento, uma vez que para se ter conhecimento preciso aceder

    informao, process-la, analis-la, apreend-la e us-la em prol do bem individual e/ou

    coletivo. Como nos mostra esta autora, as diferenas internacionais e inter-regionais no acesso

    informao ainda so muito grandes e os ndices de literacia1 dos pases que j tm bons

    nveis de acesso informao, ainda esto abaixo do que seria o ideal de uma sociedade do

    conhecimento:

    () existen personas, familias, comunidades, pueblos y naciones que an no han

    alcanzado siquiera datos o informacin necesaria para su supervivencia, resulta

    inadmisible, por no decir absurdo, afirmar, como lo hacen muchos, que estamos

    viviendo en la sociedad del conocimiento. Por todo lo expresado previamente () el

    trmino sociedad de la informacin, que es ms realista y congruente con el mundo

    que nos rodea. La sociedad del conocimiento es, a nuestro juicio, una aspiracin muy

    encomiable, pero una aspiracin al fin. (Felici Soto, 2006, p.16)

    De entre os inmeros trabalhos de Castells, este socilogo fala-nos acerca da

    sociedade da informao e do conhecimento explicando que esta sociedade no assenta

    apenas no uso da informao e do conhecimento no seu sistema econmico mas faz dela a

    1 O conceito de literacia traduz-se na capacidade de processar e analisar a informao quotidiana e de a utilizar

    corretamente na prossecuo dos seus objetivos pessoais e na vida em sociedade. Servem de base a esta

    capacidade algumas competncias bsicas: a leitura, a escrita e o clculo. (Lopes, 2011b, p.3) Por outro lado, a

    literacia da informao, refere-se capacidade de conhecendo as suas necessidades de informao, um cidado

    conseguir localizar, selecionar, analisar e usar diversos tipos de informao para suprir as suas lacunas,

    avaliando-se aqui as competncias de anlise e interpretao da informao, do manuseamento de vrios tipos de

    contedos informacionais e tambm a capacidade de aprender de forma autnoma, processando a informao e

    usando-a estrategicamente em seu proveito. (Silva, et. al, 2007, p. 3 e 4)

  • 20

    parte essencial do seu sistema produtivo, integrando o conhecimento nas vrias fases de

    produo, sendo assim, ele prprio, um produto econmico:

    as sociedades sero informacionais, no porque se encaixam num modelo especfico

    de estrutura social, mas porque organizam o seu sistema produtivo em torno de

    princpios de maximizao da produtividade baseada em conhecimento, atravs do

    desenvolvimento e difuso de tecnologias de informao, e do preenchimento dos pr-

    requisitos para a sua utilizao (sobretudo recursos humanos e infra-estruturas

    comunicacionais). (Castells, 2002, p.269)

    No mesmo sentido, este autor clarifica tambm o conceito de economia informacional:

    Assim, embora a economia informacional/global seja distinta da economia industrial,

    ela no se ope lgica desta ltima. A primeira abrange a segunda mediante o

    aprofundamento tecnolgico, incorporando conhecimentos e informao em todos os

    processos de produo material e distribuio. (Castells, 2002, p.122)

    Desta forma, outra caraterstica desta sociedade a de que o conhecimento passa a ser

    visto como um produto econmico que pode ser transacionado, o que tem consequncias na

    forma como se organizam os setores econmicos. H, como explica Castells (2002, p.284-

    298), uma tendncia para o crescimento da prestao de servios e para a diminuio do

    trabalho agrcola e industrial.

    Numa sociedade em que a informao assume um papel cada vez mais central, as

    bibliotecas pblicas (BP) e os servios de informao, por estas prestados, com especial

    destaque para o servio de informao comunidade (SIC), devem ser vistos como cada vez

    mais importantes e essenciais no quotidiano dos cidados. Devem procurar afirmar-se como

    alavancas para o desenvolvimento socioeconmico das comunidades em que se inserem,

    prestando um servio grtis, personalizado e til.

    2 Enquadramento conceptual

    Os conceitos so os alicerces fundamentais de qualquer investigao. A sua

    clarificao de extrema importncia no s para que se compreenda exatamente o que que

    est a ser estudado e investigado mas tambm e, sobretudo neste caso, para mostrar desde o

    comeo a pertinncia e a relevncia do tema. atravs dos conceitos e da sua explicao que

  • 21

    se entende, neste caso concreto, o que so os SIC, para que servem e como que podem fazer

    a diferena na atual Sociedade da Informao.

    Como tal, antes de iniciar a investigao propriamente dita acerca dos SIC

    importante clarificar bem este e outros conceitos associados tais como: servio de informao,

    sistema de informao, servio de referncia e servio de informao e referncia.

    Comecemos por esclarecer o conceito e o contexto em que surgiram os servios de

    informao.

    Os servios de informao, tal como os entendemos atualmente, nasceram na

    Antiguidade Clssica, associados ao aparecimento da escrita. Todavia, o desenvolvimento da

    cincia e o progressivo aumento da informao e do conhecimento acerca do mundo levou a

    um acumular cada vez maior de documentos, de diversas tipologias e formatos e que foram

    sendo armazenados em bibliotecas, arquivos e museus, que se foram adaptando a esta nova

    realidade, a qual exigia uma dimenso fsica cada vez maior dos edifcios. (Foskett, 1969,

    p.16-19)

    Este crescimento exponencial de informao comeou com a Revoluo Industrial, no

    sculo XVIII, e teve o seu auge entre as ltimas dcadas do sculo XIX e incios do sculo

    XX com a Primeira Guerra Mundial. Ora, foi precisamente nesta altura de maiores

    descobertas que os cientistas comearam a sentir dificuldade em conseguir, sozinhos, e num

    tempo relativamente curto, reunir toda a informao acerca de determinado assunto para, a

    partir da, desenvolver novas pesquisas. Perceberam ento que a pesquisa cientfica tinha

    alcanado um tal nvel de complexidade em que se tornava cada vez mais necessrio uma

    equipa de trabalho (Foskett, 1969, p.20-26) ou pelo menos uma pessoa que na biblioteca

    organizasse a informao por assuntos de modo a esta ser mais facilmente acessvel. Tal como

    nos diz Foskett: A funo social de um servio de informao investigar o que se conhecer

    acerca de determinado assunto e proporcionar ao consulente tanta informao quanto seja

    necessria, a fim de preencher uma lacuna em seu conhecimento. (1969, p.15)

    Os primeiros servios de informao nasceram em bibliotecas especializadas,

    cientficas e industriais, e serviam a comunidade cientfica, tal como nos demonstra o autor j

    referido:

    Embora seja um equvoco supor que somente a pesquisa cientfica requer das

    bibliotecas um servio de informao, foi sem dvida alguma neste campo que se

  • 22

    organizou a ideia de atribuir a um individuo o encargo de organizar o cervo de

    informaes recm-publicadas que seriam teis aos prprios pesquisadores. (Foskett,

    1969, p.15)

    Ora, foi neste contexto, que surgiram os servios de informao nas bibliotecas,

    mostrando que estas podem ser auxiliares preciosas no desenvolvimento econmico e

    cientfico. Depois com a disseminao das BP, sobretudo a partir do fim do sculo XIX, com

    maior nfase em Inglaterra e nas suas colnias nos Estados Unidos (EUA) e com o

    surgimento da Segunda Guerra Mundial que se comea a perceber que as bibliotecas podem

    ter um papel ainda mais importante na sociedade e particularmente nas comunidades em que

    se inserem: podem tornar a informao acessvel a todo o tipo de pessoas, com ou sem

    instruo e dot-las de conhecimento efetivo para que possam tomar decises adequadas e

    ajudar resolver muito dos seus problemas, que advm da incompreenso ou da falta de

    informao. (Marques, 2012, p. 38-44)

    Passemos agora ao conceito de sistema de informao. Comeo por esclarecer que, no

    mbito da cincia da informao, um sistema de informao no sinnimo de um sistema

    tecnolgico de informao, embora aquele possa ser estruturado informaticamente. Tal como

    refere Silva, (2006, p.162) um sistema tecnolgico de informao pode ser parte constituinte

    de um sistema de informao, de forma a processar e gerir informao em suporte digital.

    Para alm disso, antes de definir o que um sistema de informao preciso ter em

    conta a Teoria Geral dos Sistemas (Estrela, 2014, p.30), desenvolvida por Ludwing von

    Bertalanffy2. Esta teoria enuncia os princpios em que assenta a existncia de qualquer

    sistema, sendo eles: a estabilidade temporal, isto , um sistema deve ser duradouro, deve

    manter-se ao longo do tempo, prolongando-se por alguns anos ou dcadas para ser

    considerado estvel; um sistema tem na sua base uma estrutura suportada por vrios

    elementos, que funcionando harmoniosamente do origem ao sistema; existe uma correlao

    perfeita entre o todo e as partes, de modo que formam uma unidade que s possvel desta

    forma. Ou seja, a unidade no faz sentido sem as partes que a compem, porque todas so

    essenciais sua existncia e uma parte da unidade, quando isolada, perde totalmente a sua

    2 Bilogo Austraco, nascido em 1901 em Viena, viveu a maior parte da vida nos EUA, onde veio a falecer em

    1972. Defendia que os sistemas deveriam ser estudados na sua globalidade, e no divididos por reas de

    conhecimento, tendo assim criado a Teoria Geral dos Sistemas. Para saber mais sobre a vida e obra de Ludwing

    von Bertalanffy, consulte-se o artigo de Weckowicz, T. E. (1998). Ludwig von Bertalanffy (1901-1972): A

    Pioneer of General Systems Theory.

  • 23

    razo de ser.

    Depois disto estamos em condies de definir o conceito de sistema de Informao.

    Vrios autores como o caso de Silva (2006) explicam que:

    ()um Sistema de Informao uma totalidade formada pela interaco dinmica

    das partes, ou seja, possui uma estrutura duradoura com um fluxo de estados no

    tempo. () constitudo pelos diferentes tipos de informao registada ou no

    externamente ao sujeito (o que cada pessoa possui em sua memria informao do

    sistema), no importa qual o suporte (material e tecnolgico), de acordo com a

    estrutura (entidade produtora/receptora) prolongada pela aco na linha do tempo.

    (p.162)

    Ou seja, um sistema de informao uma estrutura, que como um qualquer sistema

    caraterizada por alguma durabilidade e composta por vrias partes ou organizada em vrias

    fases, agrupando pessoas e mecanismos coordenados de modo a gerir todo o processo entre a

    obteno de dados at transmisso e difuso dos mesmos, em forma de informao para os

    utilizadores ou clientes3. Como tal, um arquivo, uma biblioteca, um museu, etc., alm de

    serem organizaes com um sistema de funcionamento prprio, so tambm sistemas de

    informao, assim como as empresas e outro tipo de organizaes. Para alm disso, podem

    ser, simultaneamente, servios e sistemas de informao dependendo da sua organizao e

    estrutura. Desta forma percebemos tambm que um SIC ter necessariamente de ter como

    base um sistema de informao, que torne a prestao deste servio possvel.

    O servio de referncia um servio bibliotecrio que tem como objetivo responder s

    perguntas dos seus utilizadores relativas obteno de documentos, orientao bibliogrfica,

    aos recursos da biblioteca e forma como funciona a sua consulta ou a informaes mais

    especficas sobre onde encontrar determinado documento, informao ou servio, etc. Tal

    como refere Merlo Vega (2000, p.97), este servio pode ser desdobrado nas vertentes de

    informao, orientao e formao, resultando nas vrias funes acima descritas.

    A designao deste servio , por vezes, alvo de alguma ambiguidade terminolgica

    3 Em relao a esta problemtica sobre a forma de encarar as pessoas que usam os servios de informao, em

    particular as bibliotecas pblicas consulte-se a tese de Marques, M. B. P. de S. M. (2012). A satisfao de

    servios de informao: As bibliotecas pblicas da regio centro, p.286-302 e o artigo da mesma

    exclusivamente sobre o assunto: Marques, M.BP. de S. M. (2013b). Utilizadores ou Clientes? Inovao na viso

    dos servios de informao do sculo XXI, p.209-224.

  • 24

    que se deve ao facto de se ter adotado a traduo direta do termo ingls reference, sendo que

    tanto em Portugal como em Espanha o termo referncia embora seja utilizado e aceite na

    terminologia biblioteconmica, esta aceo ainda no includa no dicionrio. Sendo que,

    muitas vezes, so usadas outras expresses sinnimas para denominar este servio, tais como:

    servio de informao bibliogrfica, servio de orientao, servio de consulta e servio de

    pesquisas documentais. (Merlo Vega, 2000, p.97)

    Vrias so as definies apontadas: a Reference and User Services Association

    (RUSA), uma diviso da American Library Association faz a distino entre reference

    transactions e reference work. Pelo primeiro entende ser a consulta de informao por parte

    do bibliotecrio para responder a um pedido ou a uma necessidade de informao:

    Reference Transactions are information consultations in which library staff

    recommend, interpret, evaluate, and/or use information resources to help others to

    meet particular information needs. Reference transactions do not include formal

    instruction or exchanges that provide assistance with locations, schedules, equipment,

    supplies, or policy statements.(Reference and User Services Association, 2008)

    Reference work um termo mais amplo que inclui as reference transactions e todo o

    trabalho que envolve a criao, gesto e avaliao de informao, servios ou recursos:

    Reference Work includes reference transactions and other activities that involve the creation,

    management, and assessment of information or research resources, tools, and services.

    (Reference and User Services Association, 2008)

    Para Martins & Ribeiro (1972, p.26) o objetivo do servio de referncia : possibilitar

    a recuperao das informaes que em algum lugar, sob alguma forma foram preservadas,

    enquanto que a sua finalidade : servir a comunidade, atravs do consulente, informando-o

    ou proporcionando-lhe a assistncia capaz de enriquecer a sua cultura e conhecimento. No

    entanto, a definio de Hutchins (1973), mais prxima daquela que foi avanada pela

    RUSA, pois para esta autora o servio de referncia: inclui a assistncia direta e pessoal

    dentro da biblioteca a pessoas que buscam informaes para qualquer finalidade, e tambm as

    diversas atividades biblioteconmicas destinadas a tornar a informao to acessvel quanto

    seja possvel. (p.4)

    O servio de referncia e o SIC podem, primeira vista, confundir-se. No entanto, as

    funes, objetivos e informaes prestadas so completamente distintas nestes dois servios,

  • 25

    como veremos de seguida.

    Existe ainda um termo tambm usado quando falamos de servios de informao: o

    servio de informao e referncia. Alguns autores fazem a distino entre servio de

    referncia e servio de informao e referncia. Rose Day (2007, p.103), define este servio

    da seguinte forma: the act of providing information to connect people with services and

    resources that promote their well-being and independence, and protects their interests and

    rights. I & R depends on access to current and comprehensive community information.

    No entanto, nem todos os autores concordam com esta definio. Jodi Poe (2006,

    p.36) afirma que o servio de informao e referncia bastante semelhante ao servio de

    referncia. J Merlo Vega (2000, p.94) entende que esta distino apenas existe porque antes

    o servio de referncia tratava dos pedidos de informao mais simples, deixando os mais

    complexos para os servios de informao. Atualmente todos os pedidos de informao so

    solucionados da mesma forma, atravs das mesmas fontes ou recursos de informao, como

    as bases de dados informatizadas, sendo que, segundo o autor, a expresso servios de

    informao e referncia serve para designar a juno desses dois antigos servios que hoje so

    um s.

    Estamos agora em condies de conseguir definir com clareza o que so servios de

    informao comunidade.

    Como podemos ento definir estes servios? A expresso servio de informao

    comunidade surgiu nos EUA para definir os j existentes Citizens Advice Bureau (CAB)

    ingleses. (Working Party on Community Information, 1980, p.9)

    Os SIC so, exatamente isso, servios de informao destinados a satisfazer as

    necessidades de informao de uma dada comunidade. Existem para que qualquer cidado,

    independentemente da raa, nacionalidade, religio ou nvel de instruo, possa esclarecer

    toda e qualquer dvida que surja no seu quotidiano. Dvidas sobre os seus direitos, sobre

    emprego, sobre a habitao, sobre finanas, etc. Apesar da prestao de SIC, como veremos

    adiante, no se restringir apenas s BP, verificmos que o Manifesto da Unesco sobre as

    Bibliotecas Pblicas corrobora o que foi dito anteriormente, dando indicaes concretas sobre

    as condies em que devem funcionar este tipo de servios:

    Os servios da biblioteca pblica devem ser oferecidos com base na

    igualdade de acesso para todos, sem distino de idade, raa, sexo, religio,

  • 26

    nacionalidade, lngua ou condio social. Servios e materiais especficos devem ser

    postos disposio dos utilizadores que, por qualquer razo, no possam usar os

    servios e os materiais correntes, como por exemplo minorias lingusticas, pessoas

    deficientes, hospitalizadas ou reclusas. (Unesco, 1994)

    Para alm disto, devem funcionar de forma gratuita, personalizada, confidencial e,

    sobretudo, devem fazer chegar a cada cidado a informao da forma que for mais adequada

    ao seu entendimento, tendo para isso, vrios suportes de informao disposio dos

    cidados. O grande objetivo destes servios tornar a informao acessvel a todos,

    transmitindo-a da forma que mais se adequar a cada pessoa.

    Podem estar, ou no, ligados s bibliotecas. Nos EUA, Canad, Inglaterra, Austrlia

    estes servios existem com maior nfase atravs dos chamados Community Information

    Centres, Advice Centres ou Neighbourhood Centres.

    A Library Association (LA) definiu estes servios da seguinte forma:

    Community information services can therefore be defined as services which

    assist individuals and groups with daily problem-solving and with participation in the

    democratic process. The services concentrate on the needs of those who do not have

    ready access to other sources of assistance and on the most important problems that

    people have to face, problems to do with their homes, their jobs and their

    rights."(Working Party on Community Information, 1980, p.12)

    Analisando esta definio da LA destacam-se mais dois pontos que ainda no foram

    mencionados: a necessidade de ajudar sobretudo as pessoas que tm nestes servios a nica

    forma de aceder informao e a importncia que estes podem ter para ajudar a construir uma

    sociedade mais democrtica e justa.

    Em 1988, a Unesco avanou a seguinte definio, que mais uma vez, vai ao encontro

    do que j foi dito anteriormente:

    Servicio de Informacin a la Comunidad es aquel que ofrece a individuos y

    grupos de una comunidad dada, la informacin, orientacin y asistencia que les facilite

    el conocimiento y acceso a los servicios y recursos disponibles, y que les permita

    optar, decidir y actuar, para la solucin de sus problemas y necesidades de la vida

    diaria, incorporarse a la dinmica social y hacer efectiva su participacin en los

  • 27

    procesos democrticos. Se orienta particularmente hacia las reas de necesidades y

    problemas vinculados con los hogares, empleos, gestiones y derechos de distinta

    naturaleza, de aquellos individuos y grupos de una comunidad que, por diversos

    factores econmicos, sociales, culturales, etc. no tienen acceso a otras fuentes de

    informacin y asistencia que contribuyan a la solucin de dichas necesidades y

    problemas. (p.10)

    Tambm de acordo com a Unesco (1988), os objetivos fundamentais dos SIC so os

    seguintes:

    1 - Proporcionar a los individuos de una comunidad dada, la informacin, orientacin

    y asistencia que le permita conocer, acceder y beneficiarse de los servicios y recursos

    disponibles para resolver necesidades y problemas cotidianos y mejorar la calidad de

    vida.

    2 - Proporcionar a los individuos de una comunidad dada, la informacin, orientacin

    y asistencia que le permita optar, decidir y actuar en la solucin de sus necesidades y

    problemas de la vida diaria, incorporarse a la dinmica social y hacer efectiva su

    participacin en los procesos democrticos. (p.10)

    Corroborando tudo o que foi referido Rose Day (2007) d-nos uma esclarecedora

    definio do termo informao comunidade:

    Any information that helps citizens with their day to day problems and enables them

    to fully participate as members of their democratic community. It is information

    pertaining to the availability of human services such as health care, financial

    assistance, housing, transportation, education and childcare services; as well as

    information on recreational programs, clubs, community events, and information about

    all levels of government.(p.103)

    O SIC ainda hoje uma expresso que gera confuso (Working Party on Community

    Information, 1980, p.9), no s por causa dos vrios significados que lhe podem ser

    atribudos, mas tambm devido ao facto do desenvolvimento destes servios ter acontecido

  • 28

    em simultneo com o desenvolvimento do Estado Providncia4. A sua criao deu origem

    ao desenvolvimento de vrios programas comunitrios e projetos de ajuda social, como so

    exemplos, em Inglaterra os Community Development Projects, fundados pelo Home Office, o

    departamento do governo ingls encarregado do desenvolvimento destes programas.

    (Working Party on Community Information, 1980, p.9)

    Assim sendo, o SIC facilmente confundido com outros servios, prestados nesta

    poca no mbito acima referido. Segundo a LA, em 1980 havia poucas bibliotecas inglesas

    que tivessem implementado ou que colaborassem no desenvolvimento dos SIC. A razo

    principal para este facto, devia-se ao desconhecimento destes servios e dos seus benefcios

    para as comunidades e para as bibliotecas que os prestassem. (Working Party on Community

    Information, 1980, p.7) Este , ainda hoje, um problema a resolver que iremos abordar

    posteriormente, de forma mais detalhada.

    E assim defino a problemtica que me conduziu ao incio desta dissertao: esclarecer

    o conceito de SIC e os vrios conceitos que lhe esto associados, na esperana de contribuir

    para a clarificao dos objetivos e funes dos SIC e sobretudo para demonstrar a importncia

    dos mesmos.

    4 Esta temtica ser abordada com maior pormenor no captulo II.

  • 29

    Captulo II Histria e evoluo dos servios de informao comunidade

    1 - Origens e evoluo dos servios de informao comunidade

    Os SIC surgiram em simultneo em Inglaterra e nos EUA no sculo XIX mas s se

    comearam a desenvolver em ambos os pases, durante o perodo da Segunda Guerra

    Mundial. Contudo, em Inglaterra, o desenvolvimento destes servios ocorreu de forma

    contnua, permanecendo at hoje a estrutura que foi criada h mais de sete dcadas, para os

    SIC em Inglaterra. Nos EUA, a evoluo dos SIC, passou por vrias fases ao longo dos

    tempos, que se materializaram em duas etapas e modelos de servio diferentes: a primeira

    durante e aps a Segunda Guerra Mundial, e a segunda, j nos anos 60, com um novo modelo

    inspirado no que j se fazia em terras de sua majestade. (V.F. Santos, 2007, p.85)

    Em Inglaterra o desenvolvimento destes servios deveu-se aos CAB que, inicialmente,

    ajudaram a resolver os problemas das pessoas relacionados com a Guerra, tais como,

    problemas com a habitao, problemas financeiros, etc. As BP inglesas s mais tarde

    comearam a prestar servios de cariz social e at a colaborar com os CAB e com outros

    centros de aconselhamento que comearam a surgir nas dcadas de 60 e 70. (V.F. Santos,

    2007, p.87 e 88)

    Nos EUA este tipo de servios comeou com os Veterans Information Centers

    (VICs) que tinham como objetivo ajudar antigos combatentes e veteranos da Segunda Guerra

    Mundial na sua reabilitao e reintegrao na sociedade. Mais tarde, j na dcada de 70, os

    EUA adaptaram o modelo britnico mas em conjunto com as bibliotecas que, fruto da sua

    gnese, demonstraram, no caso americano, estarem desde logo mais atentas s necessidades

    de informao dos cidados. (V.F. Santos, 2007, p.85)

    Surgiu ento o Neighbourhood Information Centre Project. (Unesco, 1988, p.5) Este

    projeto, inspirado nos j existentes CAB, foi o ponto de partida do modelo de SIC

    desenvolvido nos EUA. Pretendeu criar uma espcie de servios de informao e referncia,

    com a ajuda das bibliotecas, cujo objetivo era estabelecer a ligao entre o utilizador que

    tivesse um problema concreto e a autoridade ou organizao mais adequada para o resolver.

    Depois do problema estar resolvido, fazia chegar respetiva autoridade a opinio do

    utilizador acerca do servio prestado. Esta iniciativa foi financiada pelo Estado e

    implementada nas BP de cinco cidades norte-americanas: Atlanta, Cleverland, Detroit,

    Houston e Queens, servindo de base implementao destes servios noutras BP do pas.

  • 30

    Surgiram assim SIC com denominaes e funes distintas de acordo com as necessidades de

    cada comunidade, tais como, The Information Place, Neighborhood Information Center,

    Library Information Center, Public Information Center, entre outros.

    Nos EUA as BP foram a alavanca fundamental para o desenvolvimento dos SIC pois,

    ao contrrio do que acontecia, e ainda acontece na Europa, cedo despertaram para a

    necessidade de repensarem os seus servios e o seu papel na sociedade devido a dois alertas: a

    crise econmica que se sentiu nos primeiros anos aps a Segunda Guerra Mundial, que fez

    com que muitas BP vissem o seu financiamento limitado e a diminuio das taxas de uso das

    mesmas. (V.F., Santos, 2007, p.86)

    Devido crise econmica, as bibliotecas comearam a criar alternativas para se

    tornarem competitivas face a outras instituies pblicas. A prestao de SIC surgiu como

    alternativa vivel devido, sobretudo, possibilidade de atrair linhas alternativas de

    financiamento, uma vez que o Estado americano tinha como prioridade combater a crise e

    havia criado programas para financiar projetos sociais, como o The Great Society War on

    Poverty. (V.F., Santos, 2007, p.86) Houve assim a possibilidade de, ao redirecionarem os seus

    servios para aquilo que era a prioridade do Estado e as necessidades imediatas da populao,

    conseguirem, no s resolver algumas limitaes de financiamento que haviam sido impostas

    pelas circunstncias econmicas, mas tambm mostrar ao Estado e sociedade em geral, o

    valor e a utilidade das bibliotecas.

    Para alm disso, a prpria classe bibliotecria despertava cada vez mais para as causas

    sociais diretamente ligadas sua profisso, nomeadamente, para os problemas em aceder

    informao por parte das classes mais desfavorecidas. (V.F., Santos, 2007, p.86)

    Esta preocupao social enraizou-se, desde cedo, nas bibliotecas anglo-saxnicas. Tal

    como nos explica Marques (2012), no sculo XVIII em Inglaterra comeam a surgir: ()

    vrias Bibliotecas, com fins morais, filantrpicos e religiosos () promovidas por

    associaes ou entidades privadas, e constitudas atravs de aquisies cooperativas de livros

    () (p.36) Reforando o que foi dito anteriormente, a autora acrescenta ainda que:

    A chamada responsabilidade social das pessoas ricas, que sustentavam a

    criao e o desenvolvimento destas Bibliotecas, foi talvez a base do que entendemos

    hoje por mecenato, e que imps como regra elementar de financiamento moderno das

    Bibliotecas inglesas e em particular norte-americana. (2012, p.36)

  • 31

    Tanto em Inglaterra como nos EUA, outro fator importante foi a criao do Estado

    Providncia que trouxe nas dcadas que se seguiram ao fim da Segunda Guerra Mundial,

    muitos financiamentos a diversos projetos de cariz social, o que ajudou tambm a impulsionar

    estes servios. Como tal, faremos agora uma breve contextualizao sobre o seu surgimento

    nos referidos pases, tambm eles precursores do Estado-Providncia.

    2 - Fatores impulsionadores da criao dos servios de informao comunidade

    2.1 - O Conceito de Estado - Providncia

    Estado-Providncia ou Estado Social um conceito essencialmente de cariz poltico

    que sucedeu e que se ope ao Estado Liberal. O Estado-Providncia traduz-se na interveno,

    a nvel social e econmico, do Estado na vida dos cidados para controlar os agentes

    econmicos. (Mozzicafreddo, 1994, p.27) O objetivo desta interveno, para alm de regular

    a economia, assegurar as necessidades dos cidados sobretudo as mais bsicas. Desta forma,

    o Estado-Providncia pode ser caraterizado da seguinte forma:

    Um Estado social, de carcter universal e redistributivo e, ao mesmo tempo,

    de interveno na economia de mercado, a fim de relanar a atividade industrial, em

    face da forte desagregao das estruturas sociais e da recesso econmica. () a

    estrutura poltica e institucional j a de um Estado Protector com () um acentuado

    papel de interveno na sociedade. (Mozzicafreddo, 1994, p.27)

    2.1.1- O Estado Providncia Britnico

    Desde os finais do sculo XVIII, at aos dias de hoje, o Estado- Providncia Ingls

    passou por 45 fases distintas: entre 1780-1885, durante o desenvolvimento da industrializao

    e urbanizao, que potenciou alguns problemas sociais; de 1885-1939, fase durante a qual se

    desenvolveram os fundamentos do Estado-Providncia; entre 1940 e 1979 criou-se e

    consolidou-se o Estado-Providncia sobretudo aps a Segunda Guerra Mundial, atravs da

    forte interveno do Estado em matrias socioeconmicas e, por fim, a partir de 1979 entrou

    5 Na realidade poderamos considerar 5 se recuarmos ate idade moderna, aquando da criao das Poor Laws

    em 1597 e 1601. Sobre este assunto consulte-se Jensen, H. (2002). The Welfare State Past, Present, Future

    Jensen, p. 33-35.

    http://www.infopedia.pt/http://www.infopedia.pt/

  • 32

    numa quarta fase que se prolonga at aos nossos dias, em que se assistiu e assiste a um

    declnio e crise do Estado-Providncia: inicialmente devido s polticas neoliberais de

    Margareth Thatcher6 e, atualmente, devido a uma nova crise econmica e diminuio da

    natalidade e do emprego. (Fraser, 2009, p.14)

    Foi, sobretudo, no perodo entre as duas Guerras Mundiais, devido Grande

    Depresso, que teve incio em 1929, que se renovou a necessidade de uma poltica social

    eficaz. Com a Segunda Guerra Mundial comearam as primeiras iniciativas neste sentido,

    sendo de referir o conhecido Beveridge Report de 1942 onde j so defendidos alguns dos

    princpios bsicos do que viria a ser o Estado-Providncia, tais como, penses e subsdios

    para assegurar na doena, no desemprego e na velhice, programas de habitao social, para

    alm de defender a educao grtis e a criao de um sistema nacional de sade equitativo.

    (Fraser, 2009, p.14)

    ento no ps-guerra que Clement Atlee, primeiro-ministro ingls entre 1945 e 1951,

    pe em funcionamento o Estado- Providncia que ampara os cidados desde o comeo ao fim

    da vida e universaliza os cuidados de sade. Nos 30 anos que se seguiram, o Estado ingls

    assegurou a continuao e consolidao do Estado-Providncia intervindo ativamente, tal

    como Keynes7 defendia. Este perodo conhecido na Europa como os 30 gloriosos foi

    marcado pelo crescimento econmico, pelo pleno emprego e, no geral, por prosperidade, a

    qual foi posta em causa nos anos 70 por uma nova crise econmica resultante de dois choques

    petrolferos8. (Fraser, 2009, p.14)

    Desde ento inaugurou-se uma nova era, a partir de 1979, com Margareth Thatcher,

    marcada por uma nova ideologia socioeconmica: o neoliberalismo. Esta nova ideologia

    considerava o Estado-Providncia desajustado para a realidade que se vivia nos anos 80,

    tendo sido marcada pelos cortes nas despesas sociais, pelas privatizaes e pelo desemprego.

    Alguns primeiros-ministros das dcadas seguintes, nomeadamente Tony Blair (de 1997 a

    2007) e Gordon Brown (de 2007 a 2010) tentaram um equilbrio entre as polticas liberais

    6 Primeira-ministra inglesa de 1979 a 1990.

    7 Sobre a vida e obra de John Keynes consulte-se: Moreno, M. G. (2012). John Maynard Keynes (I): Genio y

    figura.p. 71-75, e acerca das polticas econmicas que Keynes defendia, consulte-se: Mozzicafreddo, J. P.

    (1994). O Estado-Providncia em transio, p.19 e Leite, K. V. B. da S., Filho, P. F. de M. B. C. & Cordeiro, A.

    D. (2011). Do fim de Bretton Woods crise Sub-prime: a securitizao como soluo e causa de duas crises

    financeiras, p. 4-7. 8 Sobre a Crise econmica dos anos 70 ver: Leite, K. V. B. da S., Filho, P. F. de M. B. C. & Cordeiro, A. D.

    (2011). Do fim de Bretton Woods crise Sub-prime: a securitizao como soluo e causa de duas crises

    financeiras, p. 11-16.

  • 33

    anteriormente seguidas e as polticas sociais, aumentando o financiamento para a rea social.

    No entanto, hoje o conceito de Estado-Providncia tal como foi concebido e posto em prtica

    at aos anos 70, gera bastante controvrsia, quer em Inglaterra, quer no resto do mundo,

    sobretudo na Europa, onde tem as suas razes e onde se encontra mais implementado. (Fraser,

    2009, p.15)

    2.1.2 O Welfare-State Americano

    A criao do Estado-Providncia Americano surgiu aps o crash da bolsa de valores

    de Nova Iorque em 1929 que ps fim aos anos de prosperidade que se viviam desde o fim da

    Primeira Guerra Mundial. Foi marcado e consolidado atravs do chamado New Deal, o

    programa governamental posto em prtica a partir de 1933 pelo presidente Franklin

    Roosevelt, com o objetivo de solucionar a grave crise econmica. (Meyer, 2014, p.32)

    Este programa pressupunha a interveno ativa do Estado em matrias sociais e

    econmicas e previa um pacote alargado de medidas, por forma a regular a economia,

    incentivar o poder de compra, promover o desenvolvimento econmico e acautelar condies

    de vida dignas para os cidados, tendo-se introduzido nesta altura o salrio mnimo e o

    subsidio de desemprego mas tambm uma srie de outras medidas para acautelar situaes de

    velhice, doena, orfandade ou viuvez, atravs da promulgao do Social Security Act, em

    1935. (Meyer, 2014, p.32)

    Outras medidas caratersticas do New Deal foram: a introduo dos sindicatos, o

    estabelecimento das 40 horas de trabalho semanais, de leis reguladoras dos principais sectores

    econmicos e a execuo de grandes obras pblicas (como estradas, pontes, caminhos de

    ferro, barragens, etc.) que possibilitou, por um lado, a criao de emprego, aumentando assim

    o poder de compra da populao e, por outro, a criao de infraestruturas necessrias para

    impulsionar o desenvolvimento econmico. Em 1935, Roosevelt aprovou um novo pacote de

    medidas, o chamado Segundo New Deal que vigorou at 1937. ((Meyer, 2014, p.42 e 43)

    Para alm do contexto socioeconmico j referido, outro fator explica a criao dos

    SIC direcionados s classes mais desfavorecidas (sobretudo durante as primeiras dcadas),

    tanto nos EUA como em Inglaterra: o facto de se ter percebido, em ambos os pases, que

    apenas se poderia prestar um bom SIC se este fosse circunscrito a um grupo homogneo de

    pessoas. (V.F. Santos, 2007, p.91) J nesta altura se tinha chegado concluso que o ideal era

    segmentar o pblico-alvo destes servios e responder s necessidades de uma classe

  • 34

    homognea de pessoas, como iremos mostrar no prximo captulo. Foi, em grande medida,

    dada prioridade s classes mais desfavorecidas, mas nalguns casos surgiram tambm servios

    de informao especializados para empresas ou dirigidos a classes especficas de

    profissionais.

    3 - Histria dos servios de informao comunidade ingleses

    A Inglaterra um dos pases pioneiros neste tipo de servios9 e estabeleceu a rede de

    servios de informao comunidade mais conhecida e carismtica (mesmo mundialmente),

    os CAB, cujo modelo inspirou a criao destes servios em vrias partes do mundo. Por este

    motivo ser o pas a que iremos dar mais destaque ao mostrarmos a histria e evoluo at aos

    nossos dias dos SIC.

    3.1- Os Citizens advice bureau

    A Histria dos SIC em Inglaterra tem de comear invariavelmente pelos CAB, pois

    estes foram os primeiros SIC a ser criados e continuam atualmente a ser os mais populares em

    Inglaterra. Tm como lema: aliviar a aflio pessoal e confuso, fornecendo, gratuitamente,

    conselho ou informao confidencial, imparcial e independente sobre qualquer assunto a

    qualquer pessoa que o pedir. (Working Party on Community Information, 1980, p.14)

    3.1.1 - As primeiras dcadas do sculo XX e a II Guerra Mundial (1938-1945)

    Foi nos anos 30 do sculo XX que o governo ingls pensou em criar uma rede

    nacional de centros locais que prestassem informaes e aconselhamento gratuito. No entanto,

    esta rede s anos mais tarde que foi fundada pelo Conselho Nacional de Assistncia Social,

    em 1939, impulsionado pelo incio da Segunda Guerra Mundial. Foi em 1938, s vsperas da

    guerra que se percebeu a fragilidade e a impreparao dos cidados, sobretudo dos menos

    favorecidos, para lidar com os vrios problemas socioeconmicos que da iriam advir.

    (Citizens Advice Bureau, 2009a, p.3).

    Quando a guerra comeou, no incio de Setembro de 1939 os CAB j estavam prontos

    a funcionar (Citizens Advice Bureau, 2009a, p.4). Nos primeiros tempos desenvolveram-se

    9 Facto que no causa estranheza tendo em conta que as primeiras bibliotecas pblicas surgiram em Inglaterra e

    tambm nos EUA. Sobre este assunto, consulte-se a tese de doutoramento de Marques, M. B. P. de S. M. (2012).

    A satisfao de servios de informao: As bibliotecas pblicas da regio centro, p. 38-43.

  • 35

    sobretudo atravs de servios mveis e em parceria com outras associaes locais de cariz

    social, com os municpios e tambm com as bibliotecas. Durante a guerra (Citizens Advice

    Bureau, 2009a, p. 4 e 5) ajudaram e aconselharam as pessoas em problemas por ela

    provocados: falta de alojamento devido aos bombardeamentos, falta de recursos, dvidas,

    perda das cadernetas de racionamento, procura de familiares desaparecidos ou prisioneiros de

    guerra, etc.

    Rapidamente os CAB tornaram-se uma referncia a nvel nacional (Citizens Advice

    Bureau, 2009a, p. 5) e a rede de gabinetes de aconselhamento cresceu rapidamente: ao fim de

    2 meses j eram 200 gabinetes e em 1942 chegaram aos 1000 gabinetes, todos a funcionar

    exclusivamente com voluntrios.

    3.1.2 - Ps-Guerra e fundao do Welfare State (1945-1960)

    Depois de terminar a guerra, na conferncia nacional dos CAB em 1945, chegou-se

    concluso que os gabinetes de aconselhamento continuavam a fazer todo o sentido visto que

    havia uma srie de problemas ainda decorrentes da guerra que era necessrio resolver:

    reintegrao de militares, o racionamento da comida (que se manteve at Julho de 1954) e,

    sobretudo, o problema da habitao (Citizens Advice Bureau, 2009a, p. 6). Este era, sem

    dvida, um dos principais problemas do ps-guerra. Milhares de pessoas tinham ficado sem

    casa devido a bombardeamentos e era necessrio reconstruir e/ou reparar as casas.

    Apesar disso, o governo ingls ainda nos anos 40, reduziu o financiamento dos CAB

    para os descontinuar na dcada de 50. Isto levou a que os gabinetes fossem reduzidos para

    metade e tivessem de procurar outras fontes de financiamento, sobretudo fundaes, a

    Nuffield Foundation, Carnegie Trust e a Joseph Rowntree Foundation. (Citizens Advice

    Bureau, 2009a, p. 6)

    No entanto, a j referida implementao do Estado-Providncia acabou por ajudar a

    reverter esta situao, provocando um aumento dos pedidos de ajuda aos CAB, sobretudo

    devido ao facto de ser um organismo independente, podendo dar informaes e

    aconselhamento gratuito, confidencial e, acima de tudo, imparcial. (Citizens Advice Bureau,

    2009a, p. 6) Nos primeiros anos de criao do Estado-Providncia, os CAB tinham como

    principais funes informar as pessoas acerca dos programas de apoio social e dos benefcios

    e subsdios a que estas se poderiam candidatar, e analisar individualmente cada situao, por

  • 36

    forma a aconselhar qual a melhor forma de ultrapassar os problemas apresentados. (Citizens

    Advice Bureau, 2009a, p. 7)

    3.1.3 - 1960-1980 Renovao dos servios de informao comunidade e mudana de

    paradigma.

    Foi sobretudo a partir dos finais dos anos 60 e incio dos anos 70 do sculo XX que os

    SIC tiveram um novo impulso e crescimento. Aps a Segunda Guerra Mundial, surgiram

    outros SIC para alm do CAB. Existem alguns fatores (V.F, Santos, 2007, p. 87 e 88) que

    ajudam a explicar o sucedido:

    Decadncia dos centros das cidades, cada vez mais habitados por pessoas de baixos

    recursos econmicos;

    Falta de uma rede informativa nas cidades, devido construo urbanstica em massa,

    que no favorecia as relaes informais entre vizinhos nem uma ocupao saudvel

    dos tempos livres;

    Aumento da burocracia do setor pblico e progressivo crescimento e complexidade da

    legislao que afetava a vida diria das coletividades. Esta tornava-se, muitas vezes,

    incompreendida pelos cidados que assim acabavam por no saber exatamente quais

    os seus direitos e de como os fazer valer;

    Uma maior preocupao dos cidados em obter orientao e informao rigorosa e

    imparcial.

    No entanto, no existia at ento uma poltica nacional de servios de informao. Em

    1977 surgiu, em Londres, um relatrio do National Consumer Council (NCC) intitulado The

    fourth right of citizenship, que pedia uma poltica que regulasse os servios de informao,

    sem fazer qualquer referncia s BP. (Working Party on Community Information, 1980, p.7)

    Tal como explica Bunch (2001, p.28), o autor Peter Jackaman10

    tinha, j em 1973,

    alertado para o facto de as BP no estarem a ir ao encontro das necessidades de informao

    quotidiana dos cidados. Jackaman chamou tambm a ateno para a falta de proatividade das

    mesmas, pois continuavam a prestar os seus servios sobretudo com base em livros e material

    10

    Bibliotecrio londrino e autor de diversas obras entre as quais:Public libraries, information and the

    community e Basic Reference and Inforation work.

  • 37

    impresso, faltando solues alternativas para satisfazer melhor as necessidades de informao

    dos cidados. Bunch (2001, p.28 e 29) refere tambm algumas sugestes dadas pelo referido

    bibliotecrio, de aes que as BP podiam levar a cabo, entre as quais se destaca, a

    possibilidade de estas disporem de um servio de recolha e compilao de informao para

    apoiar outras agncias de informao.

    A no referncia das BP no referido relatrio gerou alguma preocupao entre as

    bibliotecas levando a que, em 1978 a Leeds School of Librarianship desenvolvesse um projeto

    de um ano com o intuito de procurar formas de inovar no campo da informao

    comunidade. (V.F., Santos, 2007, p.88) O projeto resultou em 3 modelos de servios: o apoio,

    dado atravs de equipas de informao comunidade que contactavam com agncias externas

    para produzir material de apoio; a autoajuda, que tinha como objetivo aproximar e fazer

    chegar aos cidados legislao e regulamentao governamental, sobretudo, a que dizia

    respeito aos benefcios oferecidos pelo Estado Social, e o Servio direto que era prestado em

    colaborao com outras agncias de servios de informao.

    Depois de Leeds, vrias BP desenvolveram projetos de implementao de SIC. So

    exemplos a Biblioteca de Longsight, nos arredores de Manchester, e tambm bibliotecas em

    Bradford e em Peterborough. (Bunch, 2001, p.34)

    Para alm deste acordar das BP para estarem mais prximas dos cidados, o que

    tambm se traduziu em inmeros servios de extenso, Bunch, destaca ainda outras mudanas

    (2001, p. 29 e 30) que ocorreram na dcada de 70 e que favoreceram a renovao e melhorias

    nos SIC: os governos comearam a reconhecer que a participao pblica dos cidados era

    essencial para fomentar a democracia mas que, para isso, era necessrio fazer chegar a

    informao aos cidados de forma adequada e reiteraram essa sua vontade em vrios

    relatrios governamentais. Depois de reconhecerem a importncia dos SIC, procuraram criar

    melhores condies, quer do ponto de vista administrativo, quer atravs do financiamento de

    vrios projetos de implementao destes servios.

    Mais tarde, j em 1978, o NCC publicou um novo relatrio The right to know acerca

    dos SIC em reas rurais, onde ao contrrio do relatrio anterior destaca o potencial das BP.

    (Bunch, 2001, p.36) Sendo as agncias de informao geral mais prximas das comunidades

    rurais, estas tinham a possibilidade de usar as bibliotecas mveis para prestar aconselhamento

    e informao e podiam assumir-se tambm como a entidade privilegiada para fornecer

    informao local.

  • 38

    Ainda relativamente aos CAB, estes continuaram a fazer sentido na vida das pessoas,

    pois medida que a sociedade foi evoluindo, tambm surgiram novos problemas e novas

    necessidades de informao a satisfazer. Sempre que saa uma nova legislao, as dvidas

    surgiam. Os CAB continuaram assim a ser os provedores de informao por excelncia.

    Sendo a maior agncia de informao e aconselhamento do pas, os CAB viram a sua

    influncia aumentar, mesmo a nvel poltico. Foram e so at aos dias de hoje, um lobby em

    prol dos cidados, lutando pelos seus direitos junto do governo e colaborando com o mesmo

    na elaborao de polticas pblicas que vo ao encontro das suas necessidades. Nos anos 60, o

    governo ingls destacou o papel primordial dos CAB no que toca resoluo de problemas

    ligados habitao. Nas dcadas seguintes os CAB continuaram a exercer a sua influncia

    junto dos governos, impulsionando medidas no sentido de ajudar a resolver ou a tentar

    minimizar os principais problemas que marcaram cada uma das dcadas at ao fim do sculo

    XX. (Citizens Advice Bureau, 2009c, p. 29-32)

    Na dcada de 60, os principais pedidos de ajuda estavam relacionados com a

    habitao, e com as leis do divrcio e do arrendamento. J na dcada de 70, as principais

    questes prenderam-se com as preocupaes ligadas aos direitos dos consumidores e tambm

    com as alteraes relativas s leis do emprego, que previam a introduo de despedimentos

    por razes econmicas. (Citizens Advice Bureau, 2009d, p. 6)

    3.2 - Outros centros e servios de informao comunidade

    Os Advice Centres so a expresso pela qual ficaram conhecidos os SIC que surgiram

    em Inglaterra na dcada de 60, e que tiveram, entre 1970 e 1980, um rpido crescimento

    sobretudo em grandes cidades, como Londres. Estes servios apesar de se inspirarem nos

    CAB assumiam-se como uma alternativa significativa. Alguns destes servios, como

    desenvolveremos mais frente, primavam por contactar mais diretamente com as

    comunidades, enquanto os outros servios j se tinham especializado, para atender s

    necessidades e problemas mais frequentes da populao, como por exemplo, problemas com a

    habitao, problemas legais ou esclarecimento dos cidados sobre os seus direitos como

    consumidores.

    A Library Association (LA), em 1980, dava-nos conta de que nas cidades e vilas mais

    pequenas estes servios eram mais raros ou inexistentes. (Working Party on Community

    Information, 1980, p.13) Muitas vezes, apenas existiam as bibliotecas, que aqui assumiam

  • 39

    especial importncia por serem os nicos centros de informao local a que estas

    comunidades tinham acesso. Existe assim uma grande assimetria em relao distribuio

    destes servios quando comparamos zonas rurais com zonas urbanas. Esta discrepncia

    explica-se pela maior concentrao de populao, tendo a maioria carncias econmicas, e

    pela existncia de grandes ncleos de pobreza e marginalizao dentro das cidades

    provocadas pela falta de emprego, falta de instruo e forte emigrao.

    3.2.1 - Neighbourhood advice centres (NAC)

    Os Neighbourhood advice centres, (Working Party on Community Information, 1980,

    p.16) so, como o nome indica, centros de aconselhamento informal baseados nas relaes de

    cooperao em cada comunidade. Variam bastante uns dos outros porque, dependendo do

    local, da comunidade em que se formam e das suas necessidades, podem ter caratersticas

    diferentes. Concentram-se nas zonas mais centrais e mais pobres das cidades e funcionam

    com a ajuda de voluntrios, associaes locais ou grupos comunitrios. Muitas vezes,

    funcionam como lobbies para influenciar na tomada de decises em relao comunidade.

    So financiados por um programa governamental de ajuda local, o Urban Aid Programme e

    geridos maioritariamente por comits locais. No entanto, estes centros acabam por durar

    pouco tempo devido tanto falta de recursos materiais, sobretudo material informativo, como

    de recursos humanos, pois uma vez que dependem de voluntrios, os horrios de

    funcionamento so condicionados em funo dessa limitao, sendo que a maioria destes

    centros acaba por funcionar em part-time.

    No entanto, muitas pessoas preferem estes centros informais, baseados nas relaes

    comunitrias aos CAB, pois acabam por ser mais acolhedores, desenvolvendo-se, por vezes,

    um verdadeiro esprito de ajuda e de comunidade que acaba por aproximar as pessoas,

    fazendo com que elas se identifiquem mais com os seus objetivos.

    3.2.2 - Legal Advice Centres (LAC)

    Apesar de alguns gabinetes do CAB terem advogados que prestavam sesses de

    aconselhamento legal a ttulo gratuito, um grupo de advogados voluntrios criou centros

    especializados para dar resposta aos problemas legais da populao, os LAC (Working Party

    on Community Information, 1980, p.16 e 17). Esta era e , sem dvida, uma das principais

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    necessidades de informao dos cidados, pois para alm das burocracias associadas s

    questes legais, para muitos os encargos financeiros que lhes esto inerentes eram, e so,

    incomportveis.

    Inicialmente estes centros tinham algumas limitaes: o horrio dos centros era

    reduzido e o seguimento dos casos era feito por um perodo fixo de tempo. Para suprir estas

    limitaes, a partir da dcada de 70 alguns advogados decidiram criar estes centros de Direito

    com advogados pagos e que tivessem renunciado Ordem de Advogados britnica para

    poderem oferecer aconselhamento e uma vasta gama de servios legais grtis.

    Estes centros eram financiados por vrias autoridades, tais como, o Legal Aid Fund,

    doaes das autoridades locais, doaes do programa de ajuda urbana, o Fundo Social da

    Comunidade Econmica Europeia, o escritrio Lord Chancellor e a ajuda de fundos de

    caridade ou outras fontes voluntrias. Os LAC so geridos por comits independentes das

    autoridades locais. A maioria localiza-se em Londres.

    3.2.3 - Consumer Advice Centres (CAC)

    Surgiram aquando do aumento de legislao e da preocupao com os direitos dos

    consumidores, sobretudo a partir do Trade Description Act em 1968 e tambm com a criao

    de Associaes de Consumidores. Tudo isto fez com que os cidados tomassem conscincia

    dos seus direitos enquanto consumidores. (Working Party on Community Information, 1980,

    p.17 e 18)

    O governo apoiou a criao e financiamento de cerca de 120 centros que eram

    dirigidos sobretudo pelos departamentos de defesa do consumidor. Alguns dos centros so

    ambulantes e percorrem sobretudo pequenas localidades ou vilas rurais, enquanto outros

    funcionam sediados em bibliotecas.

    Intervm a vrios nveis: antes da compra, prestam aconselhamento aos consumidores

    sobre os seus direitos e esclarecem dvidas sobre esta temtica; aps a compra, ajudam na

    resoluo de problemas e nas reclamaes. Alguns destes centros especializaram-se apenas

    num destes nveis de ao, havendo por exemplo, CAC que se dedicam apenas a tratar das

    reclamaes dos clientes.

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    3.2.4 - Housing Advice Centres (HAC)

    Os problemas com a habitao eram um dos que levavam mais pessoas aos centros de

    informao e aconselhamento. Da que no seja de admirar a criao de centros

    especializados para resolver todos os problemas relacionados com a habitao (problemas no

    arrendamento, habitao social, falta de habitao, etc.). Os HAC foram criados entre o final

    da dcada de 60 e o incio da dcada de 70, impulsionados pelo relatrio Seebohm sobre

    servios sociais, publicado em 1968 e por um memorando do Ministrio da Habitao em

    1971. (Working Party on Community Information, 1980, p.18 e 19) Foram financiados pelo

    programa do Estado especializado nestas questes, Urban Aid Programme. Em 1980 havia

    190 HAC sendo que dois teros eram dirigidos pelas autoridades locais e apenas um tero

    tinha um carter independente.

    3.2.5 - Local Authority Information Centers (LAIC)

    ainda importante mencionar os servios de informao prestados pelas autoridades

    locais, sobretudo pelos municpios. Como habitual este tipo de servios varia muito de local

    para local, devido no s s caratersticas dos servios mas tambm s caractersticas de cada

    municpio. (Working Party on Community Information, 1980, p.19)

    Alguns dos LAIC assumem a funo de relaes pblicas, outros fazem a ponte entre

    os organismos centrais e os cidados e outros ainda, oferecem apenas informao de carcter

    geral sobre lazer, turismo e informaes municipais. No entanto, estes servios na dcada de

    70 tinham ainda um peso significativo para a populao.

    3.2.6 - Other Agencies

    Para alm de